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2 EVOLUÇÃO DAS AÇÕES COLETIVAS: MELHORANDO O AMBIENTE DE LITÍGIO NO BRASIL

©US Chamber Institute for Legal Reform, Agosto de 2014. Todos os direitos reservados.

Esta publicação, ou parte dela, não deve ser reproduzida, de qualquer forma, sem autorização escrita do US Chamber Institute for Legal Reform.Envie pedidos de permissão para reprodução para: Reprint Permission Office, U.S. Chamber Institute for Legal Reform, 1615 H Street, N.W.,Washington, D.C. 20062-2000 (202.463.5724).

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ÍNDICESumário Executivo .........................................................................................................1

Panorama do Sistema Judiciário Brasileiro ......................................................................2

Mudanças políticas dos anos 1980s e seus Impactos no Sistema Judiciário Brasileiro .........4

Propostas Atuais e Antigas de reforma na Legislação das Ações Coletivas .......................12

Porque o Projeto de Lei 282 é Equivocado ......................................................................16

Conclusão ..................................................................................................................30

Prepared for the U.S. Chamber Institute for Legal Reform by

Fernando Dantas M. Neustein, Mattos Muriel Kestener

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1 EVOLUÇÃO DAS AÇÕES COLETIVAS: MELHORANDO O AMBIENTE DE LITÍGIO NO BRASIL

SUMÁRIO EXECUTIVOEste artigo tem o objetivo de explicar as razões que motivam as propostas de modificação da lei que disciplina as ações coletivas no Brasil, fazendo um juízo crítico sobre as mudanças propostas.

O artigo parte de uma breve descrição do sistema judiciário brasileiro. Após, faz uma explicação contextualizada das mudanças introduzidas no sistema jurídico com a adoção da Constituição de 1988 e como essas mudanças impactaram na lei que disciplina as ações coletivas.

Em uma visão crítica das mudanças propostas a essa lei, o artigo adentra as especificidades do projeto de lei em debate no Senado, com ênfase nas suas incompatibilidades com o princípio constitucional do devido processo legal, notadamente nos dispositivos que (i) permitem a imposição de condenações líquidas em ações versando sobre direitos individuais homogêneos; (ii) modificam os prazos prescricionais; (iii) permitem a inversão do ônus da prova na sentença; (iv) autorizam o juiz a conceder liminares “ex officio”; (v) “monetarizam” as ações coletivas ao permitirem a concessão de compensação financeira às associações civis.

O artigo conclui que o projeto de lei em discussão no Senado brasileiro não só é desbalanceado, como também representa

uma oportunidade perdida para aprimorar a proteção coletiva do consumidor, prevenindo abusos. Esses aprimoramentos incluiriam (i) a instituição de um critério mais claro para definir o que sejam direitos individuais homogêneos; e (ii) a inclusão de um dispositivo segundo o qual as associações civis, assim como os réus das ações coletivas, devem arcar com os custos econômicos da demanda, incluindo os ônus sucumbenciais.

Por fim, o artigo sugere que, se o Congresso aprovar o projeto de lei, deveria acatar sugestões que visam a corrigir essas desarmonias. Particularmente importantes são as sugestões voltadas a criar critérios para se aferir se uma ação pode prosseguir sob a forma coletiva, sobretudo pela inclusão do parâmetro da predominância, i.e., um mecanismo que obriga o juiz a determinar se as questões coletivas predominam sobre as individuais; e do parâmetro da superioridade, um mecanismo que determina que a ação coletiva é a melhor forma de se litigar sobre tais casos.

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Um panorama do Sistema Judiciário BrasileiroO sistema judiciário brasileiro é dividido entre justiça comum e justiça especializada. A justiça especializada inclui a justiça do trabalho, justiça eleitoral e justiça militar. A justiça comum cuida dos assuntos que não são das áreas trabalhista, eleitoral e militar e se subdivide nas instâncias federal e estadual. Ações coletivas interpostas contra entidades públicas federais são julgadas pela justiça federal. Sem envolvimento de entidades públicas federais, as ações coletivas são julgadas pela justiça estadual.

Tanto a justiça estadual como a federal possuem duas intâncias. Na primeira instância, os casos são julgados por juiz singular, que toma posse após advogar por pelo menos três anos e passar em concurso público.

Na segunda instância, os recursos são normalmente julgados por grupo de três desembargadores. Estes são designados ao tribunal pelo governador do Estado (para a justiça estadual) ou pelo presidente da República (para a justiça federal), conforme critérios de mérito e tempo de serviço. Um quinto dos assentos dos Tribunais é obrigatoriamente preenchido por membros da promotoria e advogados militantes. A segunda instância é livre para tratar de matérias de fato e de direito. Recursos contra decisões proferidas na segunda instância devem ser encaminhados ao

Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal.

O Superior Tribunal de Justiça cuida de recursos contra decisões que violam leis federais ou que atribuíram a elas novas interpretações.1 O Superior Tribunal de Justiça (STJ) restringe-se a julgar matérias de lei.

Recursos contra decisões proferidas na segunda instância também podem ser interpostos no Supremo Tribunal Federal, se a decisão recorrida violar a Constituição Federal, entre outras hipóteses.2 Para recorrer, a parte deve comprovar que a matéria exposta no recurso possui repercussão geral.3

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Cortes civis não promovem julgamentos em júri. Os júris somente ocorrem em processos criminais. Os precedentes judiciais, salvo quando proferidos sob

circunstâncias específicas no Supremo Tribunal Federal4, não são vinculantes, apesar de possuírem papel importante na persuasão do juiz.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

SUPERIOR TRIBUNALDE JUSTIÇA

TRIBUNALDE JUSTIÇA (27)

JUSTIÇA ESTADUAL

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL (5)

JUSTIÇA FEDERAL

Um panorama do Sistema Judiciário Brasileiro

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As mudanças políticas dos anos 80 e seu impacto no Sistema Judiciário BrasileiroEntre os anos de 1964 e 1985, o Brasil viveu sob ditadura militar. Quando o país voltou à democracia, diferentes setores da sociedade tinham inúmeras demandas distintas. A Constituição de 1988 agiu como um tipo de esponja, que absorveu todas essas demandas. O resultado foi uma Constituição extensa e politicamente ambiciosa.

Entre os princípios da Constituição, estão a cidadania e a dignidade humana.5 E, entre seus objetivos, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, erradicando a pobreza, reduzindo as desigualdades regionais e promovendo o bem-estar de todos.6 A Constituição também contém uma longa lista de direitos fundamentais, subprodutos da “inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.”7

O texto constitucional é tão promissor que os acadêmicos passaram a usar a expressão “constituição dirigente”, criada pelo jurista português José Joaquim Gomes Canotilho, que a usou para descrever a situação jurídica e sociológica na qual a sociedade seria radicalmente transformada pela aplicação da Constituição.8 Contudo, apesar dos avanços institucionais inegáveis no Brasil nos últimos 25 anos, um número significativo de promessas feitas pela Constituição não foi completamente cumprido.

Acesso à JustiçaUm dos resultados do retorno do Brasil à democracia foi a ampliação ao acesso à justiça. A nova Constituição garantiu assistência jurídica integral e gratuita aos desfavorecidos;9 criou tribunais especiais para julgarem casos civis menos complexos;10 e ampliou o accesso às ações diretas em face de leis supostamente inconstitucionais, incluindo confederações

Contudo, apesar dos avanços institucionais inegáveis no Brasil nos últimos 25 anos, um número significativo de promessas feitas pela Constituição não foi completamente cumprido.

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sindicais e entidades de classe de âmbito nacional.11

Como resultado, o Brasil experienciou uma explosão de litigiosidade desde a promulgação da Constituição Federal de 1988.12 O número de advogados formados aumenta gradualmente a cada ano, permitindo maior acesso da população à orientação jurídica.13 Apesar disso, há uma percepção generalizada de que a estrutura do Poder Judiciário e as leis vigentes são inadequadas para o atendimento da crescente demanda por justiça no país.

Quanto ao Poder Judiciário, existe um abismo entre o que a tecnologia oferece e como ela é aproveitada, sendo que a estrutura permanece deficiente. Quanto à legislação, o Código de Processo Civil brasileiro foi concebido no início dos anos 70, para atender a uma realidade muito menos complexa do que a vivida atualmente. Não por acaso, a busca de soluções alternativas de controvérsias, até pouco tempo atrás tímida no país, irrompeu. A arbitragem foi disciplinada por lei em 1996, com o declarado propósito de “desobstruir o Judiciário, seguindo o que se tem visto em diversos países, especialmente europeus e sul-americanos” 14. Tem-se vulgarizado no país, por

outro lado, a adoção de procedimentos de conciliação em segunda instância, como derradeira tentativa de se evitar o movimento da pesada máquina judicial.

A sobrecarga de trabalho na primeira e segunda instâncias15, aliada à ausência de parâmetros objetivos de segurança jurídica, tem motivado a introdução no direito brasileiro de mecanismos jurídicos inspirados na “common law”. É o caso da súmula vinculante16 e do critério da repercussão geral do recurso extraordinário17, ferramentas que objetivam dotar a administração da justiça de maior racionalidade e previsibilidade. Instrumentos semelhantes estão sendo discutidos no Congresso Nacional para desobstruir a pauta do Superior Tribunal de Justiça - a mais alta corte brasileira com jurisdição para analisar a aplicação do direito federal e uniformizar decisões divergentes dos tribunais de segunda instância.18

Aumento do poder dos juízes Até o fim dos anos 70, o pensamento judiciário brasileiro era predominantemente influenciado pelos conceitos formais e liberais. O direito era concebido como método de solução de controvérsias individuais, tendo o patrimônio como

“ Da população á orientação juridica Brasil experienciou uma explosão de litigiosidade desde a promulgação da Constituição Federal de 1988. O número de advogados formados aumenta gradualmente a cada ano, permitindo maior acesso à orientação jurídica à população.

Apesar disso, há uma percepção generalizada de que a estrutura do Poder Judiciário e as leis vigentes são inadequadas para o atendimento da crescente demanda por justiça no país.”

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principal objeto. Com a redemocraização ocorrida na virada dos anos 70 para os anos 80, novos conceitos sobre o papel do judiciário passam a ocupar o debate público, incluindo a necessidade de uma postura mais “ativa” deste na solução dos problemas do país.

A Constituição de 1988 respondeu a essas demandas com o aumento significativo do papel do Judiciário, não só o provendo de responsabilidades objetivas adicionais, mas principalmente usando um novo tipo de linguagem, na qual princípios possuem força de lei e são usados como guias para a aplicação da lei, tendo prioridade sobre outras disposições legais.

Esta linguagem é utilizada como um meio de aplicação do fenômeno inicialmente voltado a dar “efetividade” à Constituição e que, após certa análise acadêmica, culminou na “Teoria da Constitucionalização do Direito”, segundo a qual o Judiciário deve interpretar a lei com base em valores e definir o significado e o escopo da lei de forma compatível com os princípios constitucionais.

Esta ferramenta posicionou o Judiciário em um pântano, onde juízes ficam divididos entre aplicar o direito positivo e julgar o conteúdo da lei de acordo com a Constituição. Isto ocorre porque os princípios são dinâmicos e multifacetados, o que significa que as disputas judiciais estão abertas para inúmeras formas de interpretação. Como resultado, a subjetividade e politização dos julgamentos têm aumentado. O Brasil não vive mais sob um Estado de Direito, mas sob um “Estado de Justiça”.

Um dos exemplos desse fenômeno é o princípio da “dignidade humana”, mencionado no artigo 1º, III, da Constituição, conhecido como um dos princípios fundadores do Estado Brasileiro. Este princípio tem sido citado em inúmeras disputas judiciais, até mesmo em casos extremamente técnicos, como, por exemplo, no prazo prescricional a ser aplicado ou na interpretação de cláusulas contratuais.

Os tribunais interpretaram esse princípio de inúmeras maneiras diferentes. Por exemplo, alguns juízes acreditam que

“ Esta ferramenta posicionou o Judiciário em um pântano, onde juízes ficam divididos entre aplicar o direito positivo e julgar o conteúdo da lei de acordo com a Constituição. Isto ocorre porque os princípios são dinâmicos e multifacetados, o que significa que as disputas judiciais estão abertas para inúmeras formas de interpretação. Como resultado, a subjetividade e politização dos julgamentos têm aumentado. O Brasil não vive mais sob um Estado de Direito, mas sob um “Estado de Justiça.”

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forçar um devedor a pagar alta taxa de juros, mesmo que previamente pactuada com o credor, viola o princípio da dignidade humana. Outros juízes vêem na recusa de pagamento do débito uma violação ao mesmo princípio.

Após anos de deslumbre acadêmico com a constitucionalização da lei, teve início uma reação crítica em razão do alto nível de ativismo judiciário (politização da lei; voluntariedade do juiz) causado por este fenômeno19, que enfraqueceu outros valores importantes, como a certeza e a segurança jurídica.

O surgimento e a evolução das ações coletivas no Brasil, e os atuais desafios que tal instituto enfrenta, devem ser avaliados de acordo com esse contexto, que inclui a ampliação ao acesso à justiça, bem como o chamado “Estado de Justiça”.

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Ações coletivasIntrodução ao sistemaAlém do papel mais ativo do Judiciário, as liberdades políticas, que começaram a florescer no final da década de 1970, também geraram uma série de exigências, muitas vezes não relacionadas com o direito, que passaram a ganhar maior atenção. Uma dessas demandas foi a proteção para os chamados direitos “transindividuais”; isto é, direitos que transcendem da mera perspectiva individual e envolvem, inicialmente, o ambiente em que se está inserido.

O primeiro passo nesse sentido foi a promulgação da Lei ederal nº. 6938, em 1981, que dispunha sobre a Política Nacional do Meio Ambiente. A lei conferia legitimidade ao Ministério Público para a propositura de ação civil contra o poluidor do meio ambiente, sem, contudo, criar uma disciplina processual específica de tutela coletiva.

Em 1985, é promulgada a Lei da ação civil pública, um marco na tutela dos danos de massa no Brasil. A lei consagra a tutela jurisdicional dos direitos metaindividuais, alargando os interesses a serem protegidos mediante a ação judicial e ampliando os entes legitimados à sua propositura.

Em 1991 entra em vigor o Código de Defesa do Consumidor, uma iniciativa conjugada de legisladores e estudiosos da matéria. A ação coletiva ganha novo relevo

e sofisticada técnica. As associações civis tornaram-se atores relevantes na defesa de direitos coletivos em juízo.

Como funciona a ação coletivaA Lei da ação civil pública e o Código de Defesa do Consumidor formam um bloco normativo que disciplina a tutela jurisdicional de direitos metaindividuais. De acordo com essas leis, a ação coletiva pode ser ajuizada para a reparação de danos causados:20

i. ao meio ambiente;ii. ao consumidor;iii. a bens e direitos de valores artístico,

estético, histórico, turístico e paisagístico;

iv. a interesses difusos e coletivos;v. à ordem econômica e economia popular;

evi. à ordem urbanística.

Têm legitimidade para propor ação coletiva:21

i. A União, os Estados e os Municípios;ii. Autarquia, empresa pública, fundação e

sociedade de economia mista;iii. Ministério Público;iv. Defensoria Pública; ev. Associação civil constituída há pelo

menos um ano e que inclua a defesa dos direitos mencionados acima em sua finalidade institucional.22

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9 EVOLUÇÃO DAS AÇÕES COLETIVAS: MELHORANDO O AMBIENTE DE LITÍGIO NO BRASIL

O Autor da ação coletiva está isento de recolher custas judiciais, pagar honorários periciais e honorários de sucumbência, salvo comprovada má-fé.23 O juiz pode inverter o ônus da prova, se convencido da verossimilhança da alegação deduzida pelo Autor ou da sua hipossuficiência.24

Quando a ação não for proposta pelo Ministério Público, o órgão atuará obrigatoriamente como custus legis25, emitindo pareceres sobre as questões debatidas pelas partes, conforme determinação do juiz.

São três tipos de direitos que podem ser tutelados pelas ações coletivas: difusos, coletivos e individuais homogêneos. Os difusos são os detidos por cidadãos indeterminados, como as vítimas de propaganda enganosa e do dano ambiental. Os coletivos são os direitos indivisíveis pertencentes a um grupo, como os acionistas de uma determinada empresa. Os individuais homogêneos são os que decorrem de origem comum, como os que

surgem por morte decorrente de desastre aéreo.

As leis brasileiras que tratam das ações coletivas não incluem um procedimento de certificação (i.e., o controle em relação ao número de partes em um processo; tendo representatividade adequada, etc.). A lei brasileira presume que as entidades legitimadas à propositura da ação representarão adequadamente os interessados. Uma exceção se aplica às associações civis, que devem ser constituídas pelo menos um ano antes do ajuizamento da ação, incluir os direitos a serem defendidos no caso entre suas finalidades institucionais26 e se submeter a uma regra da Constituição Federal de aplicação controvertida. Também, de acordo com a lei, o juiz não tem o dever de definir a classe no estado preliminar do processo. Em ações que versem sobre direitos individuais homogêneos, a classe será definida na sentença de procedência.

Outras características das ações coletivas no Brasil:

• A sentença deve ser genérica, não estabelecendo valor.27 Os favorecidos liquidarão seus danos em ações individuais, comprovando o nexo de causalidade. A liquidação individual poderá ser ajuizada no foro do domicilio do favorecido, não necessariamente coincidente com o foro onde foi proferida a sentença coletiva.28

• A sentença faz coisa julgada erga omnes “nos limites da competência territorial do órgão prolator”.29 Disso decorre que os efeitos da decisão proferida por um juiz estadual limitam-se ao Estado onde o juiz atue. Esse dispositivo tem sido objeto de dura crítica pela doutrina, que o considera contrário à ratio da ação coletiva, na medida em

“ O Autor da ação coletiva está isento de recolher custas judiciais, pagar honorários periciais e honorários de sucumbência, salvo comprovada má-fé. O juiz pode inverter o ônus da prova, se convencido da verossimilhança da alegação deduzida pelo Autor ou da sua hipossuficiência.”

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que propicia o ajuizamento de diversas ações semelhantes para obtenção do mesmo resultado. O Superior Tribunal de Justiça vinha confirmando a limitação territorial,30 mas em julgado recente adotou entendimento oposto.31 A questão ainda está em debate.

• A coisa julgada nas ações que discutem direitos individuais homogêneos opera-se “secundum eventum litis”. Isto é, se a ação for julgada procedente, a decisão beneficia todos os membros da classe.32 Se a ação for julgada improcedente, a decisão não impede o ajuizamento de ações individuais, tampouco afeta as ações individuais em curso.33 A decisão de improcedência no mérito, porém, impede o ajuizamento de nova ação coletiva.

• A legislação brasileira prevê o “opt in” e o “opt out”, ambos para os casos de prévia existência de ação individual34, na forma indicada abaixo:

• O “opt in” opera-se quando o Autor da ação individual requer a suspensão do processo em trinta dias, contados da ciência do ajuizamento da ação coletiva. Exercido o “opt-in”, o Autor individual se beneficia da decisão de procedência da ação coletiva, podendo retomar o curso da ação individual caso a ação coletiva seja julgada improcedente.

• O “opt-out” ocorre quando o Autor individual não requer a suspensão do processo após tomar conhecimento do ajuizamento de demanda coletiva. Nesse caso, se a ação coletiva for julgada procedente, seus efeitos não se estendem ao Autor individual.

• nexistindo prévia ação individual, os interessados podem requerer seu ingresso na ação coletiva como

litisconsortes, submetendo-se, nesse caso, ao risco do litígio: aproveitam-se da procedência da ação, mas ficam proibidos de ajuizar demanda individual caso a ação coletiva seja julgada improcedente.35

Uso e Relevância Econômica das Ações ColetivasEstatísticas sobre a utilização das ações coletivas consolidaram-se em 2007, com um estudo produzido pelo Centro Brasileiro de Pesquisas e Estudos Judiciais em parceria com o Ministério da Justiça.36 O estudo coletou dados de todas as justiças estaduais e federais e concluiu que “o sistema judiciário vigente, como é interpretado pelas cortes, provou ser ineficiente em relação ao aumento no número de ações coletivas (e individuais também) que foram interpostas, sendo, também, incapaz de atingir um dos principais objetivos das ações coletivas, a prevenção de milhões de ações judiciais individuais”.

Apesar desta pesquisa ter apurado que “uma porcentagem relevante de decisões de instâncias inferiores estavam se resolvendo a favor dos autores das ações coletivas”, o oposto estava acontecendo nos Tribunais. Os Tribunais de Justiça que compilaram dados sobre o assunto descobriram que o número de ações coletivas procedentes (no todo ou em parte) durante o período de cinco anos era inferior ao número de ações improcedentes.37

Levando em conta o fato de que as decisões judiciais de segunda instância são proferidas por um grupo de juízes, o que, em teoria, torna-as menos suscetíveis a erro, os dados refutam a suposição comum de que a lei está inevitavelmente

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do lado dos autores das ações. No entanto, os réus devem suportar o tempo e a despesa de julgamentos de primeira e segunda instância antes de receberm um resultado positivo. Esta é uma informação importante, que deve ser levada em conta quando se avalia o presente e o futuro das ações coletivas no Brasil.

Com relação à expressão econômica das decisões, os dados existentes referem-se a julgamentos relacionados a direitos difusos, em que o juiz está autorizado a definir um valor específico e executável. Em 2013, por exemplo, esses valores variaram entre R$200 e R$4.5 milhões (cerca de U$85,00 a U$2 milhões), de acordo com dados do Ministério da Justiça.38

“ O estudo coletou dados de todas as justiças estaduais e federais e concluiu que “o sistema judiciário vigente, como é interpretado pelas cortes, provou ser ineficiente em relação ao aumento no número de ações coletivas (e individuais também) que foram interpostas, sendo, também, incapaz de atingir um dos principais objetivos das ações coletivas, a prevenção de milhões de ações judiciais individuais.”

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Propostas atuais e antigas de reforma na Legislação das Ações Coletivas O Ímpeto do Estado de Justiça para Modificar a LegislaçãoPropostas anteriores e atuais que buscam a alteraração da lei das ações coletivas têm procurado expandir seu alcance, quer aumentando o leque de entidades com legitimidade para propô-las; quer pela gama de questões que podem ser ao juízo. Esta expansão é apresentada como um modelo de progresso legislativo apoiado em certos princípios constitucionais, como a cidadania.

De acordo com os defensores dessas mudanças, as regras processuais atuais e as salvaguardas para garantir um processo objetivo e justo devem ser relegadas a um papel mais periférico, pois os fins (um

suposto “aumento da cidadania”, qualquer que seja o significado desse conceito) devem justificar os meios (remoção de obstáculos processuais para o sucesso do Autor).

Obviamente, essa posição ignora o aumento significativo de litígios no Brasil (em 2012, por exemplo, mais de 20 milhões de ações foram propostas nas justiças estaduais em todo o país).39 Qualquer solução para este problema grave deve desencorajar litígios inúteis, incluindo ações coletivas sem mérito. Dentro desse contexto, o principal desafio colocado a processos judiciais em geral, e em especial para as ações coletivas, é o de como dotá-los de maior racionalidade e eficiência, ao invés de simplesmente buscar formas de incentivar o seu uso. Em vez de estimular

“ o principal desafio colocado a processos judiciais em geral e em especial para as ações coletivas é o de como dotá-los de maior racionalidade e eficiência, ao invés de simplesmente buscar formas de incentivar o seu uso. Em vez de estimular a propositura de ações coletivas, o sistema deveria garantir que essas ações sejam decididas de forma rápida e eficaz e que produzam apenas resultados justos e eficientes. O acesso à justiça não trata apenas do acesso do Autor da ação à justiça, mas deve significar que todas as partes em litígio terão uma oportunidade justa e eficiente para alcançar um resultado justo.”

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13 EVOLUÇÃO DAS AÇÕES COLETIVAS: MELHORANDO O AMBIENTE DE LITÍGIO NO BRASIL

a propositura de ações coletivas, o sistema deveria garantir que essas ações sejam decididas de forma rápida e eficaz e que produzam apenas resultados justos e eficientes. O acesso à justiça não trata apenas do acesso do Autor da ação à justiça, mas deve significar que todas as partes em litígio terão uma oportunidade justa e eficiente para alcançar um resultado justo.

O Projeto de Lei 5.139/09: Justificação, Patrocinadores, Intenções e ResultadosA primeira tentativa mais articulada de modificar a lei de 1985 que trata das ações coletivas ocorreu em 2009, quando o Poder Executivo apresentou o Projeto de Lei 5.139/09 na Câmara dos Deputados. A intenção do Projeto de Lei 5.139/09 era “adaptar-se às mudanças econômicas, políticas, tecnológicas e culturais que ocorriam no mundo e que haviam acelerado significativamente desde a virada do século 20, a fim de fornecer proteção aos direitos dos cidadãos não consolidados no âmbito da lei das ações coletivas de 1985.”40 O projeto de lei não foi aprovado, mas a sua existência é importante para a compreensão dos atuais esforços para que ocorram alterações no quadro geral das ações coletivas.

O Projeto de Lei 5.139/09 foi criado com base em diversos estudos realizados por um grupo de especialistas em ações coletivas que já haviam se envolvido na produção dos chamados “Códigos Modelo” para as ações coletivas no Brasil e nos países ibero-americanos. Esse grupo foi apoiado pelo Ministério da Justiça durante o segundo mandato do ex-presidente Lula.

O Projeto de Lei 5.139/09 aumentava a lista de legitimados para ajuizar ações coletivas, incluindo partidos políticos e outras organizações. O projeto permitia alterações no pedido e na causa de pedir a qualquer momento ou instância; suspendia prazos nas ações individuais quando da citação do réu; permitia medidas provisórias “ex officio”. Ademais, o Projeto permitia ao juiz inverter o ônus da prova a qualquer momento e aos demandantes proporem pedido de revisão de decisão para reabertura de caso, se novas provas fossem descobertas.

O objetivo do Projeto de Lei era claro: garantir o êxito aos Autores das ações coletivas, tendo a ação mérito ou não, dando origem a uma série de questões constitucionais e processuais. O melhor exemplo das intenções do Projeto de Lei está na proposta de permitir a mudança do pedido e da causa de pedir a qualquer momento, bem como a instituição de regra segundo a qual o pedido deveria ser interpretado extensivamente.

Tradicionalmente, as regras processuais brasileiras que tratam de modificações do pedido e da causa de pedir dispõem que: (i) o pedido só possa ser alterado antes de o réu ser citado;41 (ii) após a citação, o pedido e a causa de pedir só possam ser alterados com a concordância do réu42; e (iii) uma vez saneado o processo, o pedido e a causa de pedir não poderão mais ser modificados.43

Há uma razão para essa regra. Ela expressa o princípio da estabilidade processual, fundamental para que o litígio proceda de forma ordenada.44 Estabilidade, de acordo com os juristas brasileiros, é um valor que está “praticamente inerente à idéia de Lei”, e a busca por estabilidade “tem sido uma constante ao longo da história das civilizações e é ligada aos ideais de segurança e previsibilidade.”45

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Na Constituição Federal, essas ideias estão retratadas nos princípios do devido processo legal e da ampla defesa46, os quais pretendem assegurar um litígio previsível, que permita ao Réu exercer sua defesa dentro dos limites objetivos e subjetivos determinados livremente pelo Autor da ação.

Propostas como o Projeto de Lei 5.139/09 não só prejudicam esses princípios, como tornam mais lento o processamento das ações coletivas. Uma vez alterados o pedido e a causa de pedir, o Réu deve ter a oportunidade de se manifestar, novas preliminares processuais podem ser postuladas, exceções podem ser feitas, e novas provas podem ser produzidas. Na verdade, tudo muda.

Quando o Projeto de Lei faz referência a uma interpretação extensiva do pedido, modifica-se um modelo que se manteve inalterado no Brasil desde, pelo menos, o Código de Processo Civil de 193947, i.e., o pedido deve ser interpretado restritivamente.48

Permitir esse tipo de mudança seria prejudicar injustamente o Réu, que seria forçado a adivinhar o alcance do pedido. O dispositivo afetaria o equilíbrio formal que deve existir entre as partes, pondo a

estabilidade do litígio ainda mais em risco e aumentaria o perigo de um uma surpresa desagradável no futuro, o que foi descrito por um dos grandes juristas brasileiros como “radicalmente incompatível com os postulados do Estado de Direito.”49

Estes e outros aspectos do Projeto de Lei atraíram a atenção das comunidades jurídica e empresarial, que fizeram chegar ao Congresso as suas preocupações através do Conselho Federal da OAB, do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados, da Confederação Nacional da Indústria, e de vários respeitados juristas.50

A reação foi ouvida na Câmara, cuja Comissão de Constituição e Justiça rejeitou o Projeto de Lei 5.139/09, em uma decisão inusitada, dado que a proposta havia sido apresentada pelo Executivo. A opinião majoritária foi a de que:

“Em suma, a proposição não resolve os problemas do modelo atual das ações civis públicas, gera insegurança jurídica em escala inimaginável, fomenta a ida irresponsável a juízo para a defesa de interesses coletivos sem qualquer garantia de que esses interesses estejam sendo bem representados, e expõe toda a economia, toda a sociedade e todos os indivíduos ao risco

“ Propostas como o Projeto de Lei 5.139/09 não só prejudicam estes princípios, como reduzem a velocidade em que ações coletivas podem prosseguir. Uma vez que o pedido e a causa de pedir forem alterados, o Réu deve ter a oportunidade de se manifestar, novos argumentos preliminares podem ser postulados, exceções podem ser feitas, e novas evidências podem ser produzidas. Na verdade, tudo muda.”

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de se tornarem réus numa ação em que serão tratados como párias, do começao ao seu longínquo fim.”51

Um recurso contra a decisão da Comissão foi apresentado ao Plenário da Câmara, e ainda não foi apreciado.

A atual proposta de reforma da ação coletiva: um caso de Déjà VuO Projeto de Lei 5.139/09 foi rejeitado em março de 2010. Menos de 2 anos depois, um movimento para alterar o Código de Defesa do Consumidor (“CDC”) começou no Senado. Os defensores dessa reforma inicialmente focaram seus esforços em assuntos não abrangidos pelo Código, ou seja, comércio eletrônico e superendividamento.

No entanto, quando o Projeto de Lei 282 foi formalmente apresentado no Senado, em agosto de 2012, incluíram-se, também, alterações no capítulo do CDC que disciplina as ações coletivas. As alterações propostas foram bastante semelhantes às do Projeto de Lei 5.139/09, principalmente no que se refere a:

• fixação de indenização individual na sentença genérica do processo coletivo (artigo 95-A);

• imposição ex officio de obrigações (artigos 95-A, §3º e 90-G, I, II e III);

• interrupção do prazo de prescrição das demandas individuais ou coletivas direta ou indiretamente relacionadas com a controvérsia em uma ação coletiva (artigo 90-A, §5º);

• flexibilização dos prazos prescricionais (artigo 81, § 5 º);

• inversão do ônus da prova na sentença (artigo 90-D, VI);

• compensação financeira como estímulo à litigância (artigo 87, § 3 º); e

• eliminação do prazo em dobro para resposta na hipótese de pluralidade de patronos (artigo 90-C).

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Por que o Projeto de Lei 282 é Equivocado Como no Projeto de Lei 5.139/09, várias disposições do Projeto de Lei 282 criam um sistema desequilibrado, focado no aumento das chances de sucesso do Autor da ação, em vez de aprimorar a legislação existente a fim de torná-la mais justa e razoável. O Projeto de Lei 282 parece ser inspirado não apenas na suposição de que ações coletivas devem se tornar mais populares, mas que devem sempre resultar em uma decisão favorável ao Autor. O projeto mostra um viés legislativo em favor dos Autores das ações coletivas, independentemente do mérito de suas reivindicações. Esta posição é contrária aos princípios da igualdade e do devido processo legal.

Além disso, muitas disposições do projeto de lei minam o propósito de acelerar a prestação jurisdicional. Em uma tentativa de fazer pender a balança em favor do Autor, o projeto de lei dá ensejo a uma avalanche de ações coletivas movidas por advogados que procuram recompensas financeiras, obstruindo ainda mais um sistema judiciário já sobrecarregado.

O Projeto de Lei 282 resultaria em um ambiente desequilibrado de litígioFIxAÇãO DE INDENIzAÇãO INDIvIDUAL NA SENTENÇA GENéRIcA

Ao tratar dos direitos individuais homogêneos, o caput do artigo 95-A

do Projeto de Lei 282 estabelece que, sempre que possível, o juiz fixará o valor da indenização individual devida a cada membro do grupo na própria sentença condenatória.52 Alternativamente, prevê que o juiz estabeleça um valor mínimo para a reparação do dano. De acordo com o §1º do art. 95-A, esses valores podem ser determinados na sentença coletiva quando forem uniformes, prevalentemente uniformes ou passíveis de serem reduzidos a uma fórmula matemática.53

O problema da proposta é que a sentença condenatória por danos a direitos individuais homogêneos somente pode ser genérica, pois não existe meio viável para o juiz investigar, no processo coletivo, o dano e o nexo causal individual. É por isso

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que os direitos individuais homogêneos são submetidos a procedimento específico de liquidação, denominado pela doutrina de “liquidação imprópria”.

Nesses casos, após a prolação da sentença, além de apurar o valor devido, será necessário verificar: “(a) os fatos e alegações referentes ao dano individualmente sofrido pelo demandante; (b) a relação de causalidade entre esse dano e o fato potencialmente danoso acertado na sentença; (c) os fatos e alegações pertinentes ao dimensionamento do dano sofrido.”54

A necessidade de averiguar esses elementos não constitui mero formalismo legal, mas sim decorrência lógica da natureza individual desses direitos. Direitos que são diferentes entre si não podem ser tratados indistintamente. Como o evento danoso traz consequências diversas aos lesados, é imprescindível que a liquidação individual da sentença seja específica e considere todas as particularidades do caso.

A liquidação e a execução da sentença genérica proferida em ação coletiva de tutela dos direitos individuais homogêneos ocorrem em um novo processo – proposto individualmente55. Em cada caso concreto, deve-se comprovar a existência de dano e o correspondente nexo causal. Essa é a posição da jurisprudência56 e da doutrina57.

O §1° especifica que os valores das indenizações, quando uniformes, serão fixados na própria sentença. Na prática, isso é inviável. O juiz não poderá concluir se os valores são ou não uniformes sem aferir cada situação e calcular o montante devido a cada um dos lesados. A fixação dos valores, na tutela de direitos individuais homogêneos, deve ocorrer necessariamente na fase de liquidação da

sentença genérica. O PLS 282/2012, e o Substitutivo do Relator, não esclarecem como o juiz poderia avaliar os danos individuais na fase de apreciação genérica do mérito da ação.

Ao permitir que o juiz fixe na sentença o valor da reparação (ou, ainda, um valor mínimo), o projeto de lei subverte a lógica e o propósito do sistema de ações coletivas, que é justamente tratar de forma conjunta os direitos coletivos, para obter maior celeridade e economia processuais. Aprovada a proposta, o juiz teria que avaliar as peculiaridades de cada caso já na ação coletiva, prejudicando a economia processual. A ação coletiva não terminará nunca, ou resultará em injustiça.

Mesmo que seja possível fixar um valor mínimo, não haveria o benefício da celeridade a partir desse novo método proposto, já que a fase posterior de liquidação continuaria sendo indispensável para se chegar ao valor justo da condenação.

IMPOSIÇãO “Ex OFFIcIO” DE OBRIGAÇõES PARA A TUTELA DE DIREITOS INDIvIDUAIS HOMOGêNEOS

O artigo 90-G do Projeto de Lei 282 permite ao juiz determinar a condenação do réu em obrigações de fazer e de pagar quantia certa, independentemente de pedido do autor.58 De acordo com o §3º do artigo 95-A, o juiz pode impor obrigações “ex officio” aos direitos individuais homogêneos.59

A proposta não é adequada. Segundo os princípios da inércia da jurisdição e da adstrição do juiz ao pedido, o julgador não é parte e só deve agir sob provocação. O juiz deve manter-se equidistante das partes para evitar excessivo e perigoso poder de ingerência do Estado no processo. Como salienta a doutrina:

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“A jurisdição é inerte e, para sua movimentação, exige a provocação do interessado. É a isto que se denomina princípio da ação: nemo iudex sine actore. Tanto no processo penal como no civil a experiência mostra que o juiz que instaura o processo por iniciativa própria acaba ligado psicologicamente à pretensão, colocando-se em posição propensa a julgar favoravelmente a ela. Trata-se do denominado processo inquisitivo, o qual se mostrou sumamente inconveniente pela constante ausência de imparcialidade do juiz. (...) E, enfim, como terceira manifestação do princípio da ação, decorre a regra pela qual o juiz – que não pode instaurar o processo – também não pode tomar providências que superem os limites do pedido: ne eat iudex ultra petita partium (ver CPC, arts. 459 e 460).”60

A decisão judicial deve ater-se àquilo que foi pleiteado pelo autor. Se assim não requereu, é porque não teve a pretensão de que o réu fosse condenado na forma do art. 90-G. Não se pode dar ao magistrado o poder de substituir a vontade do autor. Se o autor pode desistir da ação, por maiores motivos pode escolher as medidas que pretende ver o réu condenado a cumprir.

A determinação, pelo juiz, de medidas que não tenham sido requeridas pelas partes fere o princípio dispositivo, segundo o qual a elas cabe o ônus de iniciação do processo, determinação do objeto e produção de provas. O sistema dispositivo é expressão do devido processo legal e do Estado Democrático de Direito, à medida que limita a atuação do juiz às demandas trazidas ao processo pelas partes.

Por fim, as medidas propostas são demasiadamente amplas e subjetivas. Na ausência de parâmetros claros que norteiem sua definição pelo juiz, as partes não saberão de antemão em que exatamente consistirão as obrigações destinadas à reconstituição do bem e mitigação do dano, tampouco em que termos serão determinadas.

Se aprovado, o dispositivo causará incerteza e imprevisibilidade sobre o que as partes devem esperar do exercício da jurisdição. Prejudica o autor, cuja pretensão poderá resultar em determinação diversa daquela que buscava, e não necessariamente adequada às suas necessidades. Prejudica também o réu, que não terá ciência das obrigações que lhe poderão ser impostas e não saberá contra o que se defender. Tudo isso em prejuízo à segurança jurídica, à efetividade do processo e à ampla defesa.

INTERRUPÇãO DO PRAzO PREScRIcIONAL DAS AÇõES INDIvIDUAIS

O parágrafo 5º do artigo 90-A do Projeto de Lei 282 estabelce que a citação válida do réu em uma ação coletiva interrompe o prazo de decadência ou prescrição das ações individuais e coletivas, que estejam direta ou indiretamente relacionadas com a controvérsia. A interrupção do prazo prescricional retroagiria desde a distribuição da ação até o final do processo coletivo, ainda que extinto sem julgamento de mérito.61

O dispositivo vai de encontro às recentes mudanças legislativas, que buscam a redução dos prazos prescricionais, a fim de mitigar a instabilidade causada pela longa expectativa do litígio. Um exemplo disso é o prazo de prescrição estabelecido pelo Direito Civil: o Código Civil de 1916 previa prazo geral de 20 anos; o Código Civil de

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2002, por sua vez, reduziu o prazo geral para 10 anos e até três anos – como no caso da pretensão de reparação civil.62

Os institutos da prescrição e decadência são formas de garantir segurança jurídica, na medida em que estabilizam situações nas quais as partes interessadas não tenham buscado efetivar o direito de que eram titulares. Para que esses prazos sejam interrompidos, deve haver a prática de um ato inequívoco do titular do direito demonstrando a sua intenção de perseguí-lo.

O projeto de lei passa ao largo dessa regra, pois admite a interrupção de pretensão individual quando houver citação válida em uma ação coletiva proposta por um legitimado extraordinário, que não possui relação com o titular do direito individual. Este, apesar de sua inércia, seria beneficiado em sede de tutela individual pela diligência de terceiro estranho a esta relação processual.

Além disso, o texto do parágrafo 5º, do artigo 90-A, do Projeto de Lei 282 não é claro. Vale-se de conceito indeterminado (“direta ou indiretamente relacionados com a controvérsia”) e não esclarece quais casos estarão ou não abrangidos por determinada ação coletiva para que se possa operar a suspensão ou interrupção da prescrição.

FLExIBILIzAÇãO DOS PRAzOS PREScRIcIONAIS

O parágrafo 5º do artigo 81 do Projeto de Lei 282 permite que o Judiciário ignore o prazo prescricional estabelecido pelo Código de Defesa do Consumidor («CDC») sempre que a lei geral determinar prazo mais favorável ao titular do direito material.63

O dispositivo subverte o princípio contido no parágrafo 2 º, do artigo 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil, pois permite que uma lei geral prevaleça sobre dispositivo do CDC – que é lei especial adequada às situações específicas que regula - com base na conveniência de uma das partes, e não em expressa e inequívoca determinação legal. Esse mecanismo é conhecido como «diálogo das fontes», teoria que tem sido severamente criticada por alguns dos maiores juristas do Brasil64 e cuja aplicação no caso concreto tem sido rejeitada pelo Superior Tribunal de Justiça.65

O Legislador é o detentor da tarefa de definir os prazos que regem as relações jurídicas. O prazo prescricional para as ações coletivas deve estar previamente determinado no CDC. Se o objetivo do projeto de lei é alterar o prazo de prescrição aplicável às ações coletivas, deve fazê-lo expressamente, respeitando-se o princípio da segurança jurídica e deixando claro que “as pretensões de direito material prescrevem no prazo estabelecido por este Código”.

INvERSãO DO ôNUS DA PROvA NA SENTENÇA

O artigo 90-D, inciso VI, do Projeto de Lei 282 permite ao juiz inverter o ônus da prova na sentença, transferindo-o à parte que possua maior facilidade em produzi-la, em razão de deter conhecimentos técnicos, científicos ou informações específicas sobre os fatos da causa.66

Embora o artigo 90-D determine o dever de assegurar o contraditório, a possibilidade de inversão do ônus da prova no julgamento da causa viola as garantias constitucionais do devido processo legal e do próprio contraditório,67 como tem sido apontado por juristas68 e pelo Superior Tribunal de Justiça69.

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A inversão do ônus da prova na sentença viola os princípios do contraditório e da ampla defesa, pois impossibilita à parte onerada apresentar novos elementos de convicção para cumprir um encargo que até o momento da sentença não lhe cabia. Além disso, impõe à parte onerada um dever no exato momento em que se torna impossível e inútil o exercício do direito que lhe corresponde.

Ressalta-se que o Projeto de Lei 166/2010, que institui um novo Código de Processo Civil (“CPC”), foi aprovado pelo Senado em dezembro de 2010 (ainda pendente de análise final pelo Senado antes de ir à sanção presidencial) que reconheceu a necessidade de se respeitar o contraditório e dar à parte incumbida do ônus a oportunidade de produzir as provas de forma adequada. O parágrafo 1º, do artigo 358, do texto aprovado em 2010 assim determina:

“Artigo 358. Considerando as circunstâncias da causa e as peculiaridades do fato a ser provado, o juiz poderá, em decisão fundamentada, observado o contraditório, distribuir de modo diverso o ônus da prova, impondo-o à parte que estiver em melhores condições de produzi-la.

§ 1 º. Sempre que o juiz distribuir o ônus da prova de modo diverso do disposto no art. 357, deverá dar à parte oportunidade para o desempenho adequado do ônus que lhe foi atribuído.”

Portanto, é clara a mensagem do Senado no sentido de que a inversão do ônus da prova não deve ocorrer na sentença. O Projeto de Lei 282 deve levar esse fato em consideração, e evitar a inclusão de regra semelhante.

cOMPENSAÇãO FINANcEIRA cOMO ESTíMULO à LITIGâNcIA

O artigo 87, parágrafo 2º, do Projeto de Lei 282, disciplina os honorários sucumbenciais devidos às associações quando seu trabalho profissional tiver sido complexo.

70 O inciso I permite que os honorários sejam fixados em percentual superior a 20% do valor da condenação, sem, no entanto, estabelecer um limite máximo. O inciso II determina que, na hipótese de impossibilidade de aplicação da regra vislumbrada no inciso I, o juiz deverá arbitrar o valor dos honorários, de acordo com os critérios de proporcionalidade e razoabilidade.

“ A inversão do ônus da prova na sentença viola os princípios do contraditório e da ampla defesa, pois impossibilita à parte onerada apresentar novos elementos de convicção para cumprir um encargo que até o momento da sentença não lhe cabia. Além disso, impõe à parte onerada um dever no exato momento em que se torna impossível e inútil o exercício do direito que lhe corresponde.”

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A função da verba de sucumbência é remunerar o trabalho técnico do advogado que houver patrocinado a parte vencedora. No caso das ações coletivas, só incide sucumbência contra o réu. Ou seja, a legislação em vigor já estabelece uma vantagem exclusivamente para uma das partes. O Projeto de Lei 282 propõe ampliar essa vantagem, acentuando a diferença de tratamento entre os litigantes, com a justificativa de estimular o ajuizamento de ações coletivas.

Passados 20 anos da vigência do CDC, as ações coletivas estão muito bem sedimentas no ordenamento jurídico e na prática forense brasileira. Não há, hoje, justificativa para que se adotem novas regras que encorajem o ajuizamento dessas ações, especialmente quando o incentivo utilizado é puramente financeiro. O verdadeiro desafio é torná-las mais eficazes.

A nova redação proposta para o artigo 87, parágrafo 2º, não ajuda em nada a busca desse objetivo. Vai, ao contrário, na direção oposta: mercantiliza a ação e dá ensejo ao seu manejo inconsequente.

O cálculo dos honorários de sucumbência com base na complexidade da causa apenas poderia ser adotado como um critério de orientação a ser seguido pelo juiz dentro de limites fixados pelo Legislativo. Caso contrário, o critério se tornaria excessivamente subjetivo e sujeito ao arbítrio exclusivo do juiz. Não é razoável que se submeta a parte sucumbente a onerosidade quase automática, de valor ilimitado e imprevisível.

O que se espera é a fixação por lei de um teto para a verba de sucumbência, e não de um piso. Essa é a regra que vem sendo adotada pelos tribunais brasileiros, com base no parágrafo 3º, do artigo 20, do Código de Processo Civil71, o qual estabelece limite máximo de 20% para os honorários de sucumbência.

Além do tratamento desproporcional dos honorários de sucumbência devido às associações nos termos do parágrafo 2º do artigo 87, o parágrafo 3º do mesmo dispositivo72 autoriza o juiz a fixar compensação financeira, em caráter adicional à verba de sucumbência, a ser suportada pelo réu, na hipótese de “relevante interesse público” direta ou indiretamente satisfeito pela demanda da associação.

O pagamento de honorários de sucumbência em porcentagem razoável é positivo e necessário para compensar a associação que patrocina e vence demanda coletiva. O mesmo não pode ser dito da compensação financeira referida no parágrafo 3º, que só pode ser interpretada

“ Passados 20 anos da vigência do CDC, as ações coletivas estão muito bem sedimentas no ordenamento jurídico e na prática forense brasileira. Não há, hoje, justificativa para que se adotem novas regras que encorajem o ajuizamento dessas ações, especialmente quando o incentivo utilizado é puramente financeiro. O verdadeiro desafio é torná-las mais eficazes.”

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como um prêmio para associações e punição ao réu da ação coletiva.

Ao vincular a compensação adicional à presença de “interesse público, direta ou indiretamente satisfeito” pela ação coletiva, o projeto torna praticamente certa a condenação do réu ao seu pagamento, independentemente do resultado da ação. Ainda que determinado interesse público, que sequer precisa ser objeto da ação, seja indiretamente atendido, o réu poderá ser punido com pagamento de prêmio adicional aos autores.

Diante da perspectiva de obter compensação financeira adicional às associações, aliada à ausência de obrigação de pagar verba de sucumbência, a premiação prevista pode dar ensejo à propositura inconsequente de demandas infundadas. O aumento de ações coletivas ajuizadas iria, certamente, sobrecarregar o Judiciário, um total contrassenso à tendência atual de se perseguir a celeridade da prestação jurisdicional.

As ações coletivas são instrumentos importantes, mas devem ser utilizadas apenas em situações excepcionais. O que se deve incentivar é o seu manejo de forma racional, eficaz e razoável, e não o seu uso indiscriminado em busca de compensação

financeira e da punição do réu. A regra proposta é inaceitável e arriscada, na medida em que monetariza as ações judiciais.

Como se não bastasse, o parágrafo 3º, do artigo 87, do Projeto de Lei 282 contraria os interesses do próprio Projeto, que menciona em sua justificação o objetivo de “desjudicializar os conflitos entre consumidor e fornecedor, reforçando a utilização de outras vias e, no plano do processo, implementando os meios consensuais de solução de controvérsias”.

A possibilidade de receberem um prêmio pela vitória gera um flagrante conflito de interesses entre as associações e seus patrocinados. Em vez de buscarem exclusivamente a reparação a eles devida, as associações passarão a ter interesse próprio na demanda. Ao buscarem o prêmio pela vitória na ação, as associações poderão atuar em detrimento dos interesses de seus associados.

As medidas propostas, além de injustas, sobrecarregam demasiadamente o réu, distorcem a estrutura de incentivos para o uso das ações coletivas e podem servir como fonte de enriquecimento injustificado não só do autor, mas, também, das associações que o representarem.

“ Diante da perspectiva de obter compensação financeira adicional às associações, aliada à ausência de obrigação de pagar verba de sucumbência, a premiação prevista pode dar ensejo à propositura inconsequente de demandas infundadas. O aumento de ações coletivas ajuizadas iria, certamente, sobrecarregar o Judiciário, um total contrassenso à tendência atual de se perseguir a celeridade da prestação jurisdicional.”

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A ELIMINAÇãO DO PRAzO EM DOBRO PARA RESPOSTA NA HIPóTESE DE PLURALIDADE DE PATRONOS

O artigo 90-C73 do Projeto de Lei 282 estabelece que o prazo para resposta nas ações coletivas será de vinte a sessenta dias, não se lhe aplicando outros benefícios referentes à resposta do réu constantes do CPC ou de leis especiais.

Em se tratando de ações coletivas, é comum a pluralidade de réus com advogados distintos. Nesses casos, por motivo de coerência, razoabilidade e proporcionalidade, deve-se aplicar o mesmo entendimento que levou o CPC a adotar a regra do artigo 19174, que concede prazo em dobro nos casos em que os liticonsortes apresentam advogados diferentes.

A lei processual estabelece os prazos conforme a natureza do ato a ser realizado, a fim de garantir às partes tempo suficiente para a sua prática de forma satisfatória, dentro de lapso temporal suficiente e conveniente à dialética processual. Quando há pluralidade de réus com patronos distintos, o prazo para resposta é comum a todos e corre para todos eles ao mesmo tempo.

Nesse prazo comum, os autos do processo ficam retidos em cartório e os procuradores só podem retirá-los em conjunto ou mediante prévio ajuste por petição nos autos (artigo 40, parágrafo 2º, CPC75). A restrição do acesso aos autos é o que justifica a majoração do prazo para a prática do ato processual. A concessão de prazo processual maior legitima-se frente à necessidade de tempo suficiente para analisar os autos e praticar o ato.

A prerrogativa de dispor de maior prazo para praticar o ato processual atende

também o princípio da igualdade material. Ao conceder prazo maior aos réus que possuam advogados distintos, está-se tentando igualar a situação desses réus à do autor que, por possuir apenas um advogado, não se submete à regra da restrição de acesso aos autos. Isso é o que destacam os juristas brasileiros:

“Com efeito, existe mais dificuldade para os litisconsortes praticarem atos no processo, quando são representados por advogados diferentes, pois todos os litigantes têm direito de consultar os autos, circunstância que se torna mais penosa quando há mais de um advogado atuando no processo na defesa de litisconsortes. O benefício de prazo, pois, é justificável e se amolda ao princípio constitucional da isonomia.” 76

Por essas razões, deve ser adicionado parágrafo ao artigo 90-C do Projeto de Lei 282, com a seguinte redação: “Quando os litisconsortes tiverem procuradores diferentes, o prazo previsto no caput não poderá ser inferior a trinta dias.”

Uma oportunidade perdida: A Revisão do Benefício da Assistência Judiciária / Regra “O Perdedor Paga” e o Critério da PredominânciaO Projeto de Lei 282 deixa de abordar duas questões delicadas no capítulo que trata de ações coletivas no CDC: (1) os autores continuam não correndo qualquer risco em ajuizar ações coletivas, pois não estão sujeitos ao pagamento de custas ou qualquer outra despesa processual, bem como não poderão ser condenados em honorários advocatícios; e (2) a proposta ignora a necessidade de se definir com precisão o conceito de direitos individuais

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homogêneos a fim de estabelecer como um dos requisitos para a propositura da ação coletiva a predominância das questões coletivas sobre as individuais.

ASSISTêNcIA JUDIcIáRIA GRATUITA/ A REGRA DA SUcUMBêNcIA

O Projeto de Lei não altera o artigo 87 do CDC em vigor, segundo o qual nas ações coletivas reguladas pelo Código, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais ou qualquer outra despesa, nem condenação da associação autora em honorários advocatícios, custas ou despesas processuais, salvo nos casos em que for comprovada a má-fé.

Há, no Brasil, um entendimento distorcido do significado da assistência judiciária nas ações coletivas e nas ações judiciais de um modo geral77. Esse mecanismo é conhecido como “assistência judiciária gratuita”, apesar de que nada é de graça quando se trata de serviços prestados pelo Estado. A sociedade paga pelo processo judicial, em nome dos economicamente desfavorecidos.

A assistência judicária gratuita é figura importante e atende a um anseio por igualdade social. A falta de recursos econômicos não deve impedir um indivíduo de ir a Juízo em busca da tutela dos seus direitos. Todavia, levando em consideração a obrigação geral de administrar corretamente as despesas públicas diretas ou indiretas, é aconselhável a criação de ferramentas que permitam à sociedade avaliar a conveniência de arcar com o custo de uma demanda judicial.

Uma avaliação judicial preliminar acerca da probabilidade de sucesso de uma ação coletiva ajuizada sob o manto da “assistência judicária gratuita” é medida responsável e necessária, que poderia ser adotada no Brasil, a exemplo do que ocorre na Alemanha. 78 De fato, uma avaliação judicial preliminar de probabilidade de sucesso da demanda seria vantajosa em todas as ações coletivas, uma vez que permitiria ao juiz atuar como um “filtro” a fim de se evitar o desperdício de recursos judiciais em casos que não deveriam ser ajuizados em nome de uma coletividade.

Uma decisão antecipada nesse sentido desencorajaria os legitimados a ajuizarem ações coletivas sem fundamentos jurídicos consistentes. No que tange às ações coletivas, metade das demandas movidas em um estado brasileiro foram extintas sem resolução de mérito. Todas elas foram ajuizadas sob o benefício da “assistência judiciária gratuita “. Se se tivesse procedido a um exame preliminar de suas chances de sucesso como ações coletivas, provavelmente a maioria delas nem sequer teriam sido processadas.

E a questão se torna ainda mais intrigante se olharmos para a dispensa de pagamento, pelos beneficiários da assistência judiciária gratuita, das despesas processuais nos casos em que forem perdedores na lide.

A falta de recursos econômicos não deve impedir um indivíduo de ir a Juízo em busca da tutela dos seus direitos. Todavia, levando em consideração a obrigação geral de administrar corretamente as despesas públicas diretas ou indiretas, é aconselhável a criação de ferramentas que permitam à sociedade avaliar a conveniência de arcar com o custo de uma demandajudicial.

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25 EVOLUÇÃO DAS AÇÕES COLETIVAS: MELHORANDO O AMBIENTE DE LITÍGIO NO BRASIL

Por que é, então, que a parte perdedora da ação coletiva deve arcar com seus custos? Por que o réu não tem direito ao reembolso dos custos por ele suportados em razão de uma ação sem fundamento? A regra sdasucumbência foi concebida para proteger as partes, o Judiciário e a lei contra abusos e desperdício de tempo. Parece-nos, contudo, que, após 20 anos de existência das ações coletivas no Brasil, essa regra deve ser revista.

A PREDOMINâNcIA E A SUPERIORIDADE DAS qUESTõES cOLETIvAS

Disciplinada pelos artigos 91 a 100 do CDC, a ação coletiva para defesa dos direitos individuais homogêneos foi uma das principais inovações do CDC. 79 A proteção dos direitos individuais homogêneos se justifica por sua conveniência, agilidade e uniformidade na busca por justiça. 80

Para que esta modalidade de ação coletiva possa prosseguir, é necessário que os direitos individuais discutidos sejam homogêneos, que tenham origem comum. 81 Se os direitos individuais são tão distintos entre si que sua satisfação exigirá posterior liquidação individualizada em tudo semelhante a um processo individual de conhecimento, a sentença genérica do processo coletivo, prevista no artigo 95, do CDC82, será inócua. Nesse caso, a demanda não deveria prosseguir. Ada Pellegrini Grinover, um das mais conceituadas especialistas em ação coletivas no Brasil, resume bem a questão:

“Mas, mesmo no Brasil, não se poderá dar preferência aos processos coletivos, se estes não se revestirem de eficácia, no mínimo igual, à que pode ser alcançada em processos individuais. Se uma sentença coletiva não servir para facilitar o acesso à justiça, se os indivíduos forem obrigados a exercer, num processo de liquidação, as mesmas atividades processuais que teriam que desenvolver numa ação condenatória de caráter individual, o provimento jurisdicional terá sido inútil e ineficaz, não representando qualquer ganho para o povo.” 83

O que se observa na experiência prática brasileira é a ausência de critérios claros que permitam ao juiz verificar, na fase inicial do processo, se os aspectos coletivos dos direitos individuais demandados justificam sua tutela em conjunto. O Projeto de Lei 282 é oportunidade valiosa para debater alternativas para suprir essa deficiência. A experiência estrangeira oferece exemplos para o aperfeiçoamento da legislação brasileira em dois pontos principais: a necessidade de predominância e superioridade das questões coletivas e a verificação prévia do cabimento da ação coletiva.

A ação coletiva para proteção de direitos individuais homogêneos, conforme descrita no CDC84, tem inspiração na class action for damages norte-americana.85 Assim como a ação coletiva prevista no artigo

“ A experiência estrangeira oferece exemplos para o aperfeiçoamento da legislação brasileira em dois pontos principais: a necessidade de predominância e superioridade das questões coletivas e a verificação prévia do cabimento da ação coletiva.”

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91 do CDC, a ação coletiva prevista na Rule 23(b)(3) não é requerida pela natureza dos direitos envolvidos e nem sempre será cabível. Para que seja admitida, a class action for damages deve cumprir diversos requisitos, dois dos quais são particularmente relevantes: predominância e superioridade.

O requisito da predominância busca assegurar que a ação coletiva somente seja aceita pelo juízo se as questões comuns a todos os autores forem mais significativas do que as questões individuais. No caso Amchem Products, Inc v. Windsor, 86 por exemplo, a Suprema Corte dos Estados Unidos invalidou acordo judicial firmado em instância inferior em ação coletiva cujos autores buscavam indenização por alegada contaminação por asbesto. A Suprema Corte fundamentou sua decisão na ausência de predominância, pois as variações entre as formas e períodos de exposição ao asbesto, bem como das consequências físicas para os autores, tornavam as questões de fato tão díspares que não se deveria tratá-las em conjunto.

O requisito da superioridade obriga o juiz a aferir se o processo coletivo é a melhor forma de resolver a demanda, ou se ações propostas individualmente pelos autores alcançariam melhor resultado. A Rule 23(b)(3) contém parâmetros que guiam a avaliação da superioridade pelo juiz: (a) o interesse de cada autor em controlar o andamento de sua demanda, (b) a extensão e a natureza de demandas iniciadas anteriormente e relacionadas aos fatos da ação coletiva, (c) a conveniência de se concentrar todas as demandas em uma jurisdição e (d) as possíveis dificuldades de administrar a ação coletiva.

De acordo com Ada Pellegrini Grinover, os requistos da Rule 23 (b)(3) são informados pelo princípio do acesso à justiça, em dois aspectos principais: a facilidade de tratamento processual das demandas individuais e a efetividade da decisão.87 Com base nesses requisitos, os tribunais norte-americanos têm admitido ações de natureza verdadeiramente coletiva, como aquelas oriundas de desastres aéreos e ambientais88, e negado prosseguimento de ações que seriam resolvidas de forma mais apropriada pela tutela individual. 89

A adoção desse mecanismo é recomendável também nos sistemas civilistas. É por essa razão que o Código-Modelo de Processos Coletivos para Ibero-América, elaborado com a contribuição de diversos especialistas e sob a égide do Instituto Ibero-Americano de Direito Processual, incorpora os institutos da predominância e da superioridade em seu art. 2°, parágrafo 9091.

A Exposição de Motivos do Código-Modelo, ao justificar a opção, menciona especificamente a experiência brasileira, e Ada Pellegrini Grinover defende a adequação dos requisitos ao nosso ordenamento jurídico, buscando a aproximação da predominância com a possibilidade jurídica do pedido, e da superioridade com o interesse de agir.92

No regime atualmente vigente no Brasil, mesmo ações em que as questões individuais se sobreponham às comuns podem prosseguir de forma coletiva, ainda que a decisão seja ineficaz para satisfazer os direitos dos autores. Exigir a predominância de questões comuns e a aferição da superioridade da tutela coletiva traria benefícios à administração da justiça, à efetividade do processo e aos direitos individuais pleiteados.

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27 EVOLUÇÃO DAS AÇÕES COLETIVAS: MELHORANDO O AMBIENTE DE LITÍGIO NO BRASIL

Adotados os requisitos da predominância e da superioridade, convém que a lei preveja com clareza o momento processual em que o cumprimento desses requisitos será avaliado pelo juiz. A fase inicial do processo é o momento apropriado para essa aferição. Permitir que uma ação coletiva avance à fase de instrução ou que seja julgada no mérito sem que se verifique previamente o cumprimento dos requisitos legais para seu cabimento traz incerteza e custos desnecessários às partes e ao Poder Judiciário, em desarmonia com os princípios da segurança jurídica, economia processual e efetividade do processo.

Esse é o momento certo para se incluir regra prevendo que os requisitos da predominância e da superioridade na ação coletiva deverão ser examinados em conjunto com as demais condições da ação. Isso permitiria ao Judiciário rejeitar, em prazo relativamente curto, as ações despidas dos pressupostos procedimentais que autorizariam o seu processamento pela via coletiva, concentrando tempo e energia naquelas que efetivamente exijam tratamento transindividual.

O cUSTO PARA A SOcIEDADE: SOMOS TODOS cONSUMIDORES; PAGAREMOS POR ISSO NO FINAL

O debate para alterar o procedimento das ações coletivas no âmbito do CDC não é encorajador. O Projeto de Lei 282 precisa ser discutido de forma moderada, a fim de se encontrar um ponto de equilíbrio, tendo em vista que as regras atuais já proporcionam aos autores da ação coletiva uma série de direitos e privilégios. Isso significa aceitar diferentes pontos de vista sobre a tutela coletiva das relações de consumo nos tribunais, especialmente aqueles que apontam as inconsistências que claramente existem no sistema.

Uma corda já esticada em seu limite tem pouca tolerância para uma pressão adicional. Um gesto descuidado, ainda que bem-intencionado, poderia facilmente rompê-la. Para o CDC, isso resultaria em um quadro excessivamente tendencioso à proteção dos direitos do consumidor, e o custo disso recairá, inevitavelmente, sobre todos nós, consumidores.

Esse é o momento certo para que seja incluída regra prevendo que os requisitos da predominância e da superioridade na ação coletiva deverão ser examinados em conjunto com as demais condições da ação.

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ConclusãoAs mudanças propostas para o regramento das ações coletivas não são positivas, pois criam mecanismos que estimulam a propositura dessas ações (como a atribuição de compensação financeira a associações civis e a flexibilização dos prazos prescricionais em favor do autor), ou enfraquecem salvaguardas atualmente em vigor garantindo procedimentos imparciais e previsíveis (como a inversão do ônus da prova na sentença e a possibilidade de imposição de ofício de obrigações para o réu, entre outros).

No entanto, o desafio brasileiro no que diz respeito ao Judiciário em geral, e especificamente em relação às ações coletivas, é exatamente o oposto, ou seja, criar ferramentas eficazes para reduzir o número de demandas judiciais, a fim de desafogar o Judiciário; e adotar soluções inovadoras para garantir que as ações coletivas sejam utilizadas apenas quando necessárias. Acima de tudo, qualquer proposta de alteração no procedimento das ações coletivas deve fortalecer, e não enfraquecer, os princípios constitucionais da imparcialidade judicial e do devido processo legal.

Se, no entanto, os legisladores optarem por aprovar um sistema que estimule ainda mais os litígios no Brasil, um contrapeso deve ser criado, pois para cada direito há uma obrigação correspondente. Por exemplo, se os legisladores brasileiros

decidirem permitir que associações civis façam jus à polêmica “compensação financeira” nos casos de êxito na ação coletiva, a regra que dispensa essas associações do pagamento de custos e despesas processuais, caso venham a perder a ação, deve, necessariamente, ser eliminada.

Tal medida não restringiria o acesso das associações ao judiciário, uma vez que as associações civis cujas reivindicações sejam legítimas e bem fundamentadas provavelmente terão sucesso nas ações propostas. No entanto, aquelas que venham a ajuizar ações coletivas sem fundamento devem correr o risco econômico do litígio, ou seja, devem ser obrigadas a pagar as custas judiciais e sujeitar-se à regra da sucumbêbcia. Não há nenhuma razão legítima para a sociedade apoiar economicamente uma ação inútil. Qualquer

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29 EVOLUÇÃO DAS AÇÕES COLETIVAS: MELHORANDO O AMBIENTE DE LITÍGIO NO BRASIL

mudança na lei deve promover o uso responsável do sistema judiciário.

Esse é também o momento de revisitar a definição de direitos individuais homogêneos no Brasil, a fim de se atribuir à expressão conceito e alcance mais objetivos. O projeto de lei tem ignorado essa questão. Contudo, não deveria ignorá-la. Incluir os requisitos da predominância das questões coletivas sobre as individuais, e da superioridade do processo coletivo sobre o individual restringiria a disseminação de “falsas” ações coletivas (que não passam de um grupo de ações individuais com roupagem de ações coletivas).

A inclusão do critério de predominância das ações coletivas no ordenameto jurídico brasileiro estaria em consonância com o objetivo que cada legislador deve perseguir ao considerar a alteração de leis existentes ou a criação de novas leis processuais: garantir que um processo, independentemente da sua natureza, sirva adequadamente à finalidade para a qual foi criado.

Ações coletivas foram criadas para tutelar direitos coletivos por meio de um procedimento mais célere e econômico. A experiência demonstrou que essa meta não foi atingida. Na ausência dos critérios de predominância e de superioridade, não há garantias de que uma ação coletiva resolverá o problema, pois interesses individuais poderão ser o cerne da questão, tornando impossível para o tribunal emitir uma única decisão que abarque todos os envolvidos na ação coletiva. Quando as ações coletivas prosseguem sem a adoção de mecanismos que permitam filtrar o que é realmente de interesse coletivo, o resultado é, na melhor das hipóteses, um desperdício de tempo e de recursos econômicos, e, na pior das hipóteses, uma justiça distorcida que acaba por prejudicar os réus. Os legisladores deveriam aproveitar a oportunidade para restaurar o equilíbrio do sistema de maneira sensata e significativa

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NOTAS DE FIM 1 Constituição Federal, artigo 104, III.

2 Constituição Federal, artigo 102, III.

3 Constituição Federal, artigo 102, § 3º.

4 Constituição Federal, artigo 103-A.

5 Constituição Federal, artigo 1º, II e III.

6 Constituição Federal, artigo 3º, III e IV.

7 Constituição Federal, artigo 5º.

8 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda (org). Canotilho e a Constituição Dirigente. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

9 Constituição Federal, artigo 5º, LXXIV.

10 Constituição Federal, artigo 98, I.

11 Constituição Federal, artigo 103, IX.

12 Estatística oficial disponível no site do Conselho Nacional de Justiça que indica que, no ano de 2012, havia aproximadamente 92,2 milhões de casos sendo julgados no país. http://www.cnj.jus.br/images/pes-quisas-judiciarias/Publicacoes/sumario_exec_jn2013.pdf)

13 Pesquisa feita pela Ordem dos Advogados do Brasil em 2008 que concluiu que havia 571,360 adogados praticantes no país.

14 Exposição de motivos na Lei Federal nº 9.307/96.

15 Estatística oficial disponível no site do Supremo Tribunal Federal que indica que o Superior Tribunal de Justiça decidiu aproximadamente 78.400 apelações em 2013.

16 Constituição Federal, artigo 103-A: “O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em r elação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.”

17 Constituição Federal, art. 102 § 3º: “No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que

o Tribunal examine do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.”

18 Proposta de Emenda Constitucional nº. 358/2005.

19 GRAU, Eros Roberto. Por que tenho medo dos juízes. São Paulo: Malheiros, 2013, pp. 117-119; MORAES, Maria Celina Bodin de. Na medida da pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2010, prefácio; RAMOS, Elival da Silva. Ativismo judicial – parâmetros dogmáticos. São Paulo: Saraiva, 2010, pp. 23, 141; SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo para céticos. São Paulo: Malheiros, 2012, pp. 60-84.

20 Lei 7.347/85, artigo 1º.

21 Lei 7.347/85, artigo 5º.

22 O requisito da pré-constituição pode ser dispensados pelo juiz caso “haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido” (Código de Defesa do Consumidor, art. 82, IV e §1º).

23 Lei 7.347/85, artigo 17. Código de Defesa do Consumidor, artigo 87.

24 Código de Defesa do Consumidor, artigo 6º, VIII.

25 Lei 7.347/85, atigo 5º, § 1º.

26 Constituição Federal, art. 5º, XXI: “as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente.” (grifos acrescentados).

27 Código de Defesa do Consumidor, artigo 95.

28 Código de Defesa do Consumidor, atigo 98, § 2º, I e artigo 101, I.

29 Lei 7.347/85, artigo 16.

30 STJ. ED no CC 64.328/PI, rel. Min. José Delgado, j. 28.11.2007. STJ. CC nº. 56.228/MG, rel. Min. Eliana Calmon, j. 14.11.2007. STJ. AgRg no REsp nº. 422.671/RS, rel. Min. Francisco Falcão, j. 16.8.2007.

31 STJ. REsp 1.243.887, rel. Luis Felipe Salomão, j. 19.10.2011. REsp 1.243.286, rel. Nancy Andrighi, j. 12.6.2012.

32 Código de Defesa do Consumidor, artigo 103, III.

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31 EVOLUÇÃO DAS AÇÕES COLETIVAS: MELHORANDO O AMBIENTE DE LITÍGIO NO BRASIL

33 Código de Defesa do Consumidor, artigo, § 3º.

34 Código de Defesa do Consumidor, artigo 104.

35 Código de Defesa do Consumidor, artigo 103, § 2º.

36 http://www.cebepej.org.br/pdf/acoes_coletivas.pdf

37 De acordo com os dados do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, foram encontradas 761 ações coletivas total ou parcialmente fundamentadas, durante o período de cinco anos, enquanto 788 foram consideradas sem fundamento e extintas sem julgamento de mérito, durante o mesmo período. http://portal.mj.gov.br/cfdd/main.asp?ViewID=%7B2148E3F3%-2DD6D1%2D4D6C%2DB253%2D633229A61E-C0%7D&params=itemID=%7BB83C48F5%-2D2761%2D4BB3%2D86FB%2DDF5F2759C477%-7D;&UIPartUID=%7B2868BA3C%2D1C72%-2D4347%2DBE11%2DA26F70F4CB26%7D

38 http://www.cnj.jus.br/BOE/OpenDocument/ 1308221209/OpenDocument/opendoc/open Document.jsp

39 http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=99639434EAC5D5875F-7D2EE6039D9438.node2?codteor=651669&filena-me=PL+5139/2009

40 Código Processual Civil, artigo 294: “Antes da citação, o autor poderá aditar o pedido, correndo à sua conta as custas acrescidas em razão dessa iniciativa”

41 Código Processual Civil, artigo 264: “Feita a citação, é defeso ao autor modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o consentimento do réu, mantendo-se as mesmas partes, salvo as substituições permitidas por lei.”.

42 Código Processual Civil, artigo 264, parágrafo único: “A alteração do pedido ou da causa de pedir em nenhuma hipótese será permitida após o saneamento do processo.”

43 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 269.

44 Os atos processuais são regidos pelo princípio da interdependência, cada um desenvolvendo-se em função dos outros (Código de Processo Civil, artigos 248 e 249), o que dá ao procedimento a característica de progressividade (neste contexto, ver CINTRA, Antônio Carlos de Araújo [et. al.]. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 288).

45 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; WAMBIER, José Miguel Garcia Medina. O dogma da coisa julgada: hipóteses de relativização. São Paulo: RT, 2003. p. 63.

46 Constituição Federal, artigo 5º, LIV e LV. Jurisprudência: STJ, AgRg no Ag. 660814, rel. Fernando Gonçalves, k. 16.8.2005; Rio de Janeiro. STJ, AC nº. 2006.001.24300, min. Antonio Cesar Siqueira, j. 30.5.2006; São Paulo. STJ, AI nº. 316.598-5/5, rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 9.4.2003, Rio de Janeiro. STJ, AC no. 2006.002.01878, rel. Roberto Felinto, j. 11.4.2006. Doutrina: DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, vol. II. São Paulo: Malheiros, 2001. pp. 67-75; FUX, Luiz. Curso de Direito Processual. Rio de Janeiro: Forense, 2004. pp. 199-203.

47 PASSOS, José Joaquim Calmon de. Comentários ao Código de Processo Civil, vol. III. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 236.

48 Código de Processo Civil, artigo 293: “Os pedidos são interpretados restritivamente, compreendendo-se, entretanto, no principal os juros legais.”

49 ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 185.

50 Um exemplo foi o artigo escrito por José Ignacio Botelho de Mesquita, professor emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, sob o título de “Reformas incessantes do Processo Civil”, publicado no jornal Valor Econômico em 10 de janeiro de 2012.

51 http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mos-trarintegra?codteor=754582&filename=Tramitacao-PL+5139/2009

52 Artigo 95-A. “Na sentença condenatória reparação pelos danos individualmente sofridos, sempre que possível, o juiz fixará o valor da indenização individual devida a cada membro do grupo ou um valor mínimo para a reparação do dano.”

53 § 1º. “Quando os valores dos danos individuais sofridos pelos membros do grupo forem uniformes, prevalentemente uniformes ou puderem ser reduzidos a uma fórmula matemática, a sentença coletiva indicará esses valores, ou a fórmula de cálculo da indenização individual, e determinará que o réu promova, no prazo que fixar, o pagamento do valor respectivo a cada um dos membros do grupo, que tiverem se habilitado.”

54 DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 4. Salvador: Jus Podivm, 2009, p. 375.

55 ZAVASCKI, Teori Albino. Processo Coletivo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 178.

56 STJ. Resp. nº 1098242/GO, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 21.10.2010.

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57 GRINOVER, Ada Pellegrini, et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 2001, pp. 795- 797.

58 Artigo 90-G. “Na ação reparatória referente a interesses e direitos difusos e coletivos, a condenação, independentemente de pedido do autor, consistirá: I – na prestação de obrigações destinadas à reconstituição específica do bem e à mitigação dos danos; II – em medidas para minimizar a lesão e evitar que se repita; e III – na indenização pelos danos, patrimoniais e morais “

59 § 3º: «Aplica-se aos interesses ou direitos individuais homogêneos o disposto no art. 90-G.»

60 CINTRA, Antônio Carlos Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2005, pp. 59-61.

61 § 5º: «Quando for o caso, a citação válida nas ações coletivas interrompe o prazo de decadência ou prescrição das pretensões individuais e coletivas, direta ou indiretamente relacionados com a controvérsia, retroagindo a interrupção desde a distribuição até o final do processo coletivo, ainda que haja extinção do processo sem resolução do mérito.»

62 Artigo 206. Prescrição: §3º. “Em três anos: V - ações cíveis de indenização.”

63 § 5º. «As pretensões de direito material prescrevem, se for o caso, no prazo estabelecido por este Código ou pela lei, observado aquele que for mais favorável ao seu titular.»

64 “Digo que essa colocação é exorbitante porque traz em si a proposta de, em nome de uma ideologia paternalista, afastar as normas contidas no Código de Defesa do Consumidor sempre que confrontadas com outras, do Código Civil, mais favoráveis ao consumidor. (...) O Código de Defesa do Consumidor é sim uma lei protetiva, alargando a responsabilidade do fornecedor de bens ou produtos mediante diferentes instrumentos (...). Esse é realmente um microssistema protetivo, que, como todo microssistema, goza de significativo grau de autonomia em relação ao sistema central, sendo assistemática a mesclagem de preceitos vindos de lá e de cá, em nome de uma exacerbada e paternalista proteção. Ou se aplica o microssistema em toda sua legítima autonomia, ou nega-se sua existência na ordem jurídica.” “(...) No sistema do Código consumerista o prazo prescricional é mais breve, mas isso é compensado pelo diferimento do dies a quo, o qual não será o da ocorrência do dano mas o do efetivo conhecimento pelo lesado (CDC, art. 27). Eis o equilíbrio dos sistemas. Prazo mais longo, fluência diferida ao momento da ciência. Seria assistemática e sobretudo injusta essa interpenetração de normas, rompendo

arbitrariamente o equilíbrio entre os dois sistemas para pinçar lá e cá, segundo as conveniências de uma das partes e a pretexto de um paternalismo incompatível com o due process of law.” DINAMARCO, Cândido Rangel. Relações de consumo, prescrição e diálogo das fontes. In: LOPEZ, Teresa Ancona. Estudos e pareceres sobre livre-arbítrio, responsabilidade e produto de risco inerente: o paradigma do tabaco aspectos civis e processuais. Rio de Janeiro: Renovar, 2009. pp. 117, 124-125.

65 REsp nº. 304.724, rel. Gomes de Barros, DJe 22.8.2005

66 Artigo 90-D. “Não obtida a conciliação e apresentada a defesa pelo réu, o juiz designará audiência ordinatória, tomando fundamentadamente as seguintes decisões, assegurado o contraditório: (...) VI – esclarecerá as partes sobre a distribuição do ônus da prova e sobre a possibilidade de sua inversão, em favor do sujeito vulnerável, podendo, desde logo ou no julgamento da causa, invertê-lo, sem prejuízo do disposto no art. 6°, VIII, atribuindo-o à parte que, em razão de deter conhecimentos técnicos ou científicos ou informações específicas sobre os fatos da causa, tiver maior facilidade em sua demonstração.”

67 Constituição Federal, artigo 5º: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”

68 “Justamente por depender da apreciação subjetiva do magistrado sobre os fatos da demanda, a inversão ope iudicis – ou, simplesmente, inversão do ônus da prova – é uma regra de atividade, e não de julgamento, o que significa que o magistrado não poderá dela se valer se não conferiu à parte a quem imputou o ônus de provar a oportunidade de produzir sua prova (...) A regra de inversão do ônus da prova é regra de processo, que autoriza o desvio de rota; não se trata de regra de julgamento, como a que distribui o ônus da prova. Assim, deve o magistrado anunciar a inversão antes de sentenciar e em tempo do sujeito onerado se desincumbir do encargo probatório, não se justificando o posicionamento que defende a possibilidade de a inversão se dar no momento do julgamento, pois ‘se fosse lícito ao magistrado operar a inversão do ônus da prova no exato momento da sentença, ocorreria a peculiar situação de, simultaneamente, se atribuir um ônus ao réu, e negar-lhe a possibilidade de desincumbir-se do encargo que antes inexistia. Deve a inversão, pois, ser feita em momento que permita àquele que assumiu o encargo

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33 EVOLUÇÃO DAS AÇÕES COLETIVAS: MELHORANDO O AMBIENTE DE LITÍGIO NO BRASIL

livrar-se dele.” (grifos acrescentados). (...) Reser-var a inversão do ônus da prova ao momento da sentença representa uma ruptura com o sistema do devido processo legal, ofendendo a garantia do contraditório. Não se pode apenar a parte que não provou a veracidade ou inveracidade de uma determinada alegação sem que se tenha conferido a ela a oportunidade de fazê-lo (lembre-se que o ônus subjetivo acaba por condicionar a atuação proces-sual da parte). Por outro lado, exigir que o fornece-dor, apenas por vislumbrar uma possível inversão do ônus da prova em seu desfavor, faça prova tanto dos fatos impeditivos, extintivos ou modificativos que eventualmente alegar, como da inexistência do fato constitutivo do direito do consumidor, é tornar legal a inversão que o legislador quis que fosse judicial (tanto que exigiu o preenchimento, no caso concreto, de certos requisitos)”. DIDIER JR, Fredie.; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 2. Salvador: Ed. Jus Podivm, 2009, pp 81-83, 85.

69 “RECURSO ESPECIAL. CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE POR VÍCIO NO PRODUTO (ART. 18 DO CDC). ÔNUS DA PROVA. INVERSÃO ‘OPE JUDICIS’ (ART. 6º, VIII, DO CDC). MOMENTO DA INVERSÃO. PREFERENCIALMENTE NA FASE DE SANEAMENTO DO PROCESSO. A inversão do ônus da prova pode decorrer da lei (‘ope legis’), como na responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço (arts. 12 e 14 do CDC), ou por determinação judicial (‘ope judicis’), como no caso dos autos, versando acerca da responsabilidade por vício no produto (art. 18 do CDC). Inteligência das regras dos arts. 12, §3º, II, e 14, §3º, I, e. 6º, VIII, do CDC.

A distribuição do ônus da prova, além de constituir regra de julgamento dirigida ao juiz (aspecto objetivo), apresenta-se também como norma de conduta para as partes, pautando, conforme o ônus atribuído a cada uma delas, o seu comportamento processual (aspecto subjetivo). Doutrina.

Se o modo como distribuído o ônus da prova influi no comportamento processual das partes (aspecto subjetivo), não pode a inversão ‘ope judicis’ ocorrer quando do julgamento da causa pelo juiz (sentença) ou pelo tribunal (acórdão).

Previsão nesse sentido do art. 262, §1º, do Projeto de Código de Processo Civil. A inversão ‘ope judicis’ do ônus probatório deve ocorrer preferencialmente na fase de saneamento do processo ou, pelo menos, assegurando-se à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo, a reabertura de oportunidade para apresentação de provas.

Divergência jurisprudencial entre a Terceira e a Quarta Turma desta Corte.

RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO” STJ. REsp.

802.832/MG, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseveri-no, Segunda Seção, julgado em 13.04.2011, DJe 21.09.2011.

70 Artigo 87 (...) § 2º “Em caso de procedência da demanda coletiva, os honorários advocatícios devidos às associações, quando o trabalho profissional tiver sido complexo, poderão ser fixados em porcentagem superior a vinte por cento, calculada sobre o valor da condenação, observados os critérios da proporcionalidade e razoabilidade”.

71 Artigo 20. “A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Esta verba honorária será devida, também, nos casos em que o advogado funcionar em causa própria. § 3º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez por cento (10%) e o máximo de vinte por cento (20%) sobre o valor da condenação, atendidos: a) o grau de zelo do profissional; b) o lugar de prestação do serviço; c) a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu servi-ço.”

72 § 3º. «Na hipótese de relevante interesse público, direta ou indiretamente satisfeito pela demanda movida pela associação, o juiz, sem prejuízo da verba de sucumbência, poderá fixar compensação financeira, suportada pelo réu, observados os critérios de proporcionalidade e razoabilidade”.

73 Artigo 90-C. “O juiz fixará o prazo para resposta nas ações coletivas, que não poderá ser inferior a vinte ou superior a sessenta dias, atendendo à complexidade da causa ou ao número de litigantes, contados a partir da data da realização da audiência de conciliação ou da última sessão do procedimento conciliatório. Parágrafo único. Ao prazo previsto no caput não se aplicam outro benefícios para responder estabelecidos no Código de Processo Civil ou em leis especiais”.

74 Artigo 191. “Quando os litisconsortes tiverem diferentes procuradores, ser-lhes-ão contados em dobro os prazos para contestar, para recorrer e, de modo geral, para falar nos autos”.

75 “Art. 40. (...)§ 2º Sendo comum às partes o prazo, só em conjunto ou mediante prévio ajuste por petição nos autos, poderão os seus procuradores retirar os autos, ressalvada a obtenção de cópias para a qual cada procurador poderá retirá-los pelo prazo de 1 (uma) hora independentemente de ajuste.”

76 NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, pp. 93-94.

77 A Lei Federal 1.060, de 2 de maio de1950, obriga as autoridades públicas a conceder assistência judiciária gratuita aos necessitados. De acordo

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com a lei, a assistência judiciária compreende (i) os honorários advocatícios; (ii) as custas judiciais e os custos do Ministério Público e de seus funcionários; (iii) as despesas com publicações em jornais para a divulgação de atos oficiais; (iv) as indenizações pagas a testemunhas que, quando empregados, deverão receber seus salários completos de seus empregadores , como se estivessem realizando suas funções, ressalvado o direito de regresso contra as autoridades federais do Distrito Federal e dos Territórios, ou contra as autoridades públicas dos Estados; (v) os honorários do advogado e do perito; (vi) as despesas de exames de DNA, quando solicitados pela autoridade judicial na investigação de paternidade ou maternidade. A lei estabelece que a concessão dos benefícios deverá ocorrer com uma simples declaração na denúncia inicial dizendo que a parte não está em condições de arcar com as custas judiciais e honorários advocatícios, sem prejudicar a si mesmo e a sua família.

78 Diz-se que, na Alemanha, a justiça gratuita só é concedida quando o juiz está convencido de que as chances de sucesso da ação são tão grandes que é justificável a sociedade suportar os custos do processo. A matéria é regulada pelo artigo 114 do Código de Processo Civil alemão (“Zivilprozessordnung”).

79 GRINOVER, Ada Pellegrini. Da Class Action for Damages à Ação de Classe Brasileira: os requisitos de admissibilidade. Revista de Processo n° 101, 2001, p. 11.

80 BARROSO, Luís Roberto. A Proteção Coletiva dos Direitos no Brasil e Alguns Aspectos da Class Action Norte-Americana. Revista de Processo n° 130, 2005, p. 135.

81 Art. 81. “A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo. Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de: (...) III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.”

82 Art. 95. “Em caso de procedência do pedido, a condenação será genérica, fixando a responsabilidade do réu pelos danos causados.”

83 GRINOVER, Ada Pellegrini. Ob. cit., p. 27.

84 Ibidem, p. 26. Also: BARROSO, Luís Roberto. Ob. cit., p. 135.

85 Artigo 91. “Os legitimados de que trata o art. 82 poderão propor, em nome próprio e no interesse das vítimas ou seus sucessores, ação coletiva de responsabilidade pelos danos individualmente sofridos, de acordo com o disposto nos artigos seguintes”.

86 Amchem Products, inc. v. Windsor; 117 S.Ct. 2231 (1997).

87 GRINOVER, Ada Pellegrini. Ob. cit., p. 15.

88 Id, p. 16.

89 Para exemplos e descrição detalhada de precedentes nesse sentido, ver Grinover, Ada Pellegrini. Ob. cit., p. 17-19.

90 “Para tratar dos direitos individuais homogêneos, nos voltamos para o sistema dos EUA para olhar para os testes que estabelecem se os interesses comuns tem predominancia sobre os interesses individuais e a utilidade da ação coletiva em cada caso específico (predominância e superioridade) (...).” Instituto Ibero-Americano de Direito Processual. Modelo Ibero-Americano de Código para Ações Coletivas. Justificativas. Revista do Processo, n ° 121, 2005, p. 137.

91 Artigo 2º. (...) § 1 º. “Para a tutela dos interesses ou direitos individuais homogêneos, além dos requisitos indicados nos n. I e II deste artigo, é também necessária a aferição da predominância das questões comuns sobre as individuais e da utilidade da tutela coletiva no caso concreto”.

92 GRINOVER, Ada Pellegrini. Ob. cit., p. 21-24.

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