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ROSEMEIRE LOVO FACEBOOK: Leitura, discurso e o escrileitor FRANCA 2012

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ROSEMEIRE LOVO

FACEBOOK: Leitura, discurso e o escrileitor

FRANCA 2012

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ROSEMEIRE LOVO

FACEBOOK: Leitura, discurso e o escrileitor

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Linguística da Universidade de Franca como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Linguística. Orientadora: Profa. Dra. Maria Regina Momesso.

FRANCA 2012

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ROSEMEIRE LOVO

FACEBOOK: Leitura, discurso e o escrileitor

Comissão Julgadora do Programa de Mestrado em Linguística Presidente: ___________________________________________________ Nome: Profa. Dra. Maria Regina Momesso Instituição: Universidade de Franca Titular 1: ______________________________________________________ Nome: Dra. Elci Antonia de Macedo Ribeiro Patti Instituição: Universidade de Franca Titular 2: ______________________________________________________ Nome: Dra.Glória Maria Palma Instituição:Universidade do Sagrado Coração

Franca, 14/08/2012.

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DEDICO este trabalho à minha família, em especial aos meus filhos Heitor e Hugo pela silenciosa compreensão daqueles momentos em que estive ausente ou omissa.

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AGRADEÇO a Deus por me amparar nos momentos difíceis,

por me dar força interior para superar as dificuldades, mostrar os caminhos nas horas incertas e me suprir em todas as minhas necessidades; à minha orientadora Dra. Maria Regina Momesso, por ter me conduzido com toda paciência, ajudando-me o quanto foi preciso; às professoras Dra.Elci Patti e Dra.Glória Palma por aceitarem fazer parte da banca e pela valiosa contribuição; à minha irmã Ritieres, por não permitir que eu desistisse, e foram tantas vezes; à minha querida Diretora Zulmira Vanini Engracia, por me permitir a flexibilidade do horário e me dar seu colo e ombro amigo sempre; à Maria Ângela de Freitas Chiachiri (querida Susi) por tanta ajuda; à Nathalia Soares, um anjo que Deus colocou em meu caminho no momento mais difícil; a todos os professores do Mestrado, com um carinho especial pela Professora Dra. Maria Flávia por tantas conversas psicanalíticas; aos meus amigos do Mestrado, especialmente Dalva, Diane, Andréia e Acir por tantos momentos de descontração e felicidade; ao apoio CAPES/INEP/OBEDUC que oportunizaram a bolsa de estudos do Projeto Observatório da Educação UNIFRAN e pela oportunidade de me tornar uma mestra.

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O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.

João Guimarães Rosa

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RESUMO

LOVO, R. Facebook: leitura, discurso e o escrileitor. 2011. 78 f. Dissertação (Mestrado em Linguística) - Universidade de Franca, Franca. . Esta pesquisa é parte do Projeto do Observatório da Educação - Edital/2010 intitulado “Linguagens, Códigos e Tecnologias: práticas de ensino de leitura e de escrita na Educação Básica – Ensino Fundamental e Médio” que trata da questão da dificuldade da leitura e da escrita presentes nas escolas, assunto que tem sido debate e preocupação de muitos teóricos e educadores em diversos campos de conhecimento no Brasil. É sabido que a internet e as redes sociais disseminam informações de todos os tipos. O espaço virtual tornou-se um lugar importante de comunicação cotidiana, em que os jovens de faixa-etária entre 11 e 18 anos podem, facilmente e quase sem custo, ter acesso a dados localizados nos mais distantes pontos do universo, como também criar e distribuir informações em larga escala e relacionar-se virtualmente seja por motivos pessoais, profissionais, lazer ou acadêmico. Assim, novas práticas sociais, culturais, ideológicas, educacionais e de aprendizagem se fazem e requerem habilidades de leitura e de escrita diferentes das de outros suportes, tais como, por exemplo, a do impresso. Objetiva-se identificar e refletir sobre as práticas discursivas, identitárias e de leitura e escrita que se fazem no Facebook, utilizadas por estudantes do Ensino Fundamental do 9º ano de uma escola pública de Franca. O corpus da pesquisa é um recorte do discurso de alunos do 9º ano do ensino fundamental que possuem facebook, há também o recorte dos posts e comentários que fazem, já que são muitos. Os 13 perfis analisados fazem parte do universo de 140 alunos do 9º ano da escola pública mencionada. O aporte teórico-metodológico é a perspectiva discursiva francesa, derivada de Pêcheux. Os estudos de Foucault também serão utilizados, autor que considera o sujeito discursivo em constante processo de construção a partir de fatores sociais, históricos, ideológicos que se tecem nas relações de saber e poder, as quais produzem práticas e ordens discursivas para a construção do sujeito e de sua identidade. Entende-se neste trabalho que a observação das práticas discursivas, identitárias e de leitura que circulam no facebook dos adolescentes pode revelar como o sujeito aluno se constrói, seus modos de pensar e agir no mundo. Trabalha-se com a hipótese de que o conhecimento das condições de produção discursiva, da identidade e da leitura dos alunos no espaço virtual pode servir de subsídio para o professor no preparo de aulas e de recursos para melhorar o ensino e aprendizagem da leitura e da escrita na escola. Os resultados apontam que as práticas discursivas e de leitura existentes nas redes sociais ainda não estão completamente sistematizadas como meio de uma prática de leitura reflexiva e de interpretação mais apurada. No caso específico da escola analisada, o acesso às redes sociais ainda é ínfimo e os poucos que o fazem preocupam-se com o entretenimento visando às relações afetivas e não os aspectos culturais que esse meio pode trazer a eles. O resultado da pesquisa mostra que pode auxiliar os professores em como utilizar a internet, em especifico – o facebook, para fomentar as aulas de leitura, escrita e interpretação textual na escola,partindo das escrileituras realizadas por esses discentes também fora das práticas de leitura e escrita formais. Palavras-chave: Facebook; Práticas discursivas e Identitárias; Leitura; Escrileitor e

Sujeito.

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ABSTRACT

LOVO, R. Facebook: leitura, discurso e escrileitor. 2012. 78 f.Dissertação(Mestrado em Linguística) - Universidade de Franca, Franca.

This research is part of Projeto do Observatorio da Educação - Edital /2010 named “Languages, Codes and Technology”: reading and writing teaching practices in Elementary School – High School”. It’s a Project that deals with reading and writing learning difficulties among schools. It’s a concerned issue that has been discussed and it has been a worrying for many researchers and educators in many knowledge fields in Brazil. Many reading printing materials haven’t been enough in young people’s lives, nowadays; much new technology has joined young’s lives actively. Internet and social networks started spread information in many kinds. This virtual space became an important place for daily communication in which young people from 11 to 18 years old can easily have access to data in distant location in the universe as well as create and distribute information in a large scale and also create a relationship virtually for many personal, professional, leisure or academic purposes with a low cost. This way, new social educational learning practice takes pace and it requires different reading and learning skills different from the other resources like the printing. The aim is identify and reflect about many discursive identity practices in reading and writing at Facebook used by students from elementary School up to ninth year from a public school in Franca. The analyzed corpus is a discourse cutting taken from students in the ninth year in elementary school that has Facebook. There’s also a cutting from posts and comments they made. The thirteen profiles analyzed are part of 140 students universe from ninth year of elementary school from the public school mentioned. The theorical and methodological approach is a French discursive perspective from Pêcheux. Foucault studies will also be used in which is considered the discursive subject in constant construct practice from social, historical, and ideological factors that happens in knowledge and powerful relations that produces practice and discursive orders in order to construct the subject and its identity. It’s understood in this work that the observation of discursive identity practices in reading occurred in Facebook among teenagers can reveal how the student subject is build, its ways of thinking and acting in the world. The work is done with the hypotheses that the knowledge of the conditions in discursive identity reading production in this virtual space could be a base for the teacher when preparing classes and resources to improve teaching and learning reading and writing skills at school. The results pointed that the discursive and reading practices in social network aren’t completely systematized as a reflective reading and deeply interpreting practice. In the specific analyzed school the access of social network is still pitiful and the small amount that does it are concerned about entertainment in order to develop affective relations and not cultural aspects that it can offer them. The result of this research shows that it can help teachers in how to use internet specifically Facebook to improve reading, writing and text interpretation in class at school having in mind the writer-reading made by teachers also done in formal and informal written practices. Key Word:Facebook; Discursive practices and identity; Reading; Writer-reader;

Subject.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...........................................................................................................10

1 TEORIA EM FOCO: A ANÁLISE DE DISCURSO FRANCESA ............................ 13

1.1 PANORAMA DA AD COMO TEORIA E METODOLOGIA ................................... 13

1.2 AD: UMA TEORIA LINGUÍSTICA DE INTERPRETAÇÃO E DE LEITURA....................................................................................................................17 2.LEITURA NA INTERNET: SUJEITO NA CONTEMPORANEIDADE ................... 24

2.1 LEITURA, LEITOR E SUPORTE VIRTUAL ........................................................ 24

2.2 AS PRÁTICAS DISCURSIVAS E AS TÉCNICAS DE SI REVELANDO O

SUJEITO CONTEMPORÂNEO.................................................................................28

3 FACEBOOK: UMA ANÁLISE DAS PRÁTICAS DISCURSIVAS, IDENTITÁRIAS E

DE LEITURA DE ADOLESCENTES DE UMA ESCOLA PÚBLICA ................... ....37

3.1 O FACEBOOK: CARACTERIZANDO O CORPUS DE ANÁLISE....................... 38

3.2 PRÁTICAS DISCURSIVAS DE LEITURA E DE ESCRITA EM FACEBOOKS....45

CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................70

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................73

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INTRODUÇÃO

Este trabalho nasceu diante de diversas inquietações desta pesquisadora

a respeito do cenário educacional no tocante às novas tecnologias da informação e

da comunicação, especialmente a internet, a qual fez nascer um discurso a respeito

do uso das tecnologias no processo ensino-aprendizagem e, consequentemente,

sobre a inserção de novas práticas de leitura nas escolas brasileiras.

Não há dúvida de que, atualmente, a utilização de novas maneiras de

interação on-line supre muitas necessidades dos sujeitos. Pode-se comprovar essa

afirmação devido ao acesso imediato e eficiente às informações rápidas e relevantes

que contribuem para a melhoria em relação à qualidade da comunicação,

principalmente entre os jovens. Essas novas maneiras de interação são hoje

viabilizadas pelas diversas ferramentas interativas disponíveis como weblogs,

fotoblogs, chats, webfólios, MSN, além das comunidades públicas virtuais, como o

Orkut e o Facebook. Reconhece-se que nos dias atuais as novas tecnologias

tornaram-se indispensáveis. No entanto, há aqueles que ainda não têm acesso a

elas ou simplesmente não sabem como utilizá-las. Assim, são excluídos do mundo

virtual, tanto quanto o analfabeto é excluído do mundo da escrita.

Em princípio, não há dúvida de que há um lugar central atribuído às TIC1,

mas também não se sabe até onde se pode delimitá-las.

Lévy (1999) entende que, no limite, as TIC estão postas como elemento

estruturante de um novo discurso pedagógico, bem como de relações sociais que,

por serem inéditas, sustentam neologismos como "cibercultura".

Sob o ponto de vista de Mattelart (2002, p. 9), a segunda metade do

século XX foi marcada pela "formação de crenças no poder miraculoso das

tecnologias informacionais". Mesmo que, em princípio, pareça ingênuo, este último

movimento está inscrito em um modo de objetivação das TIC inextricavelmente

ligado à concepção de "sociedade da informação".

Dessa maneira, este trabalho tem como objetivo geral identificar as

práticas sociais de leitura e escrita no facebook de adolescentes de uma escola

pública de Franca, que cursam o nono ano da educação básica e como tais práticas

1 TIC: Tecnologias da Informação e da comunicação, termo usado por Júnior, Lévy e neste trabalho

pela autora do mesmo.

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constroem o sujeito discursivo e seus efeitos de sentido fora da escola. Para

preservar os sujeitos da pesquisa, os nomes dos discentes e da escola foram

omitidos,uma vez que se os alunos soubessem,teriam perdido a naturalidade de

suas ações,mas a escola faz parte do projeto e assinou o termo concordando com a

pesquisa.

Os objetivos específicos consistem em a) refletir sobre os fundamentos

teóricos de análise; b) identificar quais práticas sociais de leitura e de escrita

emergem das homepages de facebooks de adolescentes do nono ano do ensino

fundamental; c) pensar sobre a construção discursiva desse sujeito discursivo por

meio do discurso presente no espaço virtual do facebook .

Entendemos que é por meio das práticas discursivas de leitura e de

escrita que o sujeito expressa conteúdos de sua consciência humana individual ou

social. Nele, encontram-se vontades, saberes e posicionamentos, portanto, a

interação entre esses sujeitos no espaço virtual pode ajudar a entender como o

adolescente de uma escola pública de nível social desfavorecido se expressa,

interage e participa das transformações das novas tecnologias.

Hipotetiza-se que o conhecimento dessas práticas sociais e discursivas

presentes fora do âmbito escolar pode servir como subsídio para o professor no

preparo de aulas e de recursos para melhorar o ensino e a aprendizagem da leitura

e da escrita na escola.

O corpus da pesquisa foi selecionado a partir da inserção, na plataforma

do facebook, dos nomes de alunos das listas de presença de quatro turmas do nono

ano da referida escola. Num universo de cento e quarenta alunos, selecionaram-se

aqueles que apresentavam um perfil com acesso público para qualquer usuário da

rede, perfazendo um total de treze perfis, sendo cinco do sexo masculino e oito do

sexo feminino. A escola selecionada para esta pesquisa é integrante do Projeto de

Pesquisa do Observatório da Educação, Edital 2010, intitulado “Linguagens, códigos

e tecnologias: práticas de ensino de leitura e de escrita na educação básica – ensino

fundamental e médio”, e a autora deste trabalho participa do corpo docente e é

coordenadora pedagógica do Ensino Fundamental da instituição escolhida para

seleção do corpus.

O aporte teórico-metodológico para a análise do corpus é a perspectiva

discursiva, derivada de Michel Pêcheux e da contribuição teórica de Foucault para a

análise do discurso francesa, tendo por base conceitos como discurso, práticas

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discursivas, sujeito, arquivo e identidade. Nessa perspectiva, considera-se que o

sujeito discursivo encontra-se em constante processo de construção a partir de

fatores sociais, históricos e ideológicos e a observação das práticas de leitura e

escrita pode revelar como esse sujeito constrói seus modos de pensar e agir no

mundo.

A pesquisa baseia-se também nos estudos culturais acerca das práticas

de leitura, mais especificamente nas ideias de Chartier (1998) que entende que a

leitura é sempre apropriação, invenção, produção de significados. Para tratar das

questões sobre identidade e contemporaneidade, as ideias de autores como

Bauman (2001; 2005) e outros iluminam os caminhos da análise.

O trabalho é composto por três capítulos: no primeiro, intitulado a Teoria

em Foco: a análise de discurso francesa, abordam-se pressupostos teóricos da

análise do discurso francesa, bem como os conceitos relevantes para a análise do

corpus escolhido, entre eles, formação discursiva, memória discursiva, práticas

discursivas e identitárias, sujeito, discurso e técnicas de si.

No segundo capítulo, tem-se como objetivo situar as teorias que se

ocupam da leitura e do sujeito contemporâneo, as relações entre as novas

tecnologias e a escola.

No terceiro capítulo, traça-se um perfil da história e do surgimento do

Facebook e de que maneira os adolescentes leitores o utilizam, antecipando a

análise propriamente dita das práticas discursivas dos sujeitos apresentados.

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1. TEORIA EM FOCO: A ANÁLISE DE DISCURSO FRANCESA

A perspectiva teórica adotada neste trabalho para análise de discursos

que circulam no mundo virtual, entre jovens estudantes, no facebook, é a da Análise

do Discurso Francesa, delineada entre as décadas de 1960 e 1980, na França.

Neste capítulo, traça-se um panorama sucinto da origem desse aporte

teórico construído como suporte para uma nova metodologia de abordagem da

leitura e compreensão de textos por filósofos e linguistas que vieram depois de

Saussure. Esse arcabouço passou por reformulações significativas que permitem

assinalar três épocas distintas nessa evolução do que veio a configurar-se como

uma teoria linguística de interpretação e de leitura.

Conceitua-se o que é o discurso para a Análise do Discurso Francesa e

como ela entende a leitura, a interpretação e a compreensão de textos na prática de

“escuta” de seus possíveis sentidos. Colocam-se ainda aspectos importantes como

a noção de formação discursiva quando se adota essa perspectiva para pensar

sobre as práticas de leitura e as modificações históricas por que passam com o

advento das novas tecnologias. Ao permitir o acesso do sujeito leitor a um mundo

virtual, o texto eletrônico se transforma em uma espécie de caleidoscópio que

modifica significativamente os modos de leitura e o acesso ao discurso.

Neste espaço situa-se o sujeito de pesquisa na noção de sujeito

contemporâneo do discurso, aquele ligado à internet, à era da inteligência coletiva,

que tanto lê como escreve na web, o “escrileitor”2.

1.1 - PANORAMA DA AD3 COMO TEORIA E METODOLOGIA

A década de 1960 do século XX marca um período de acontecimentos

políticos e sociais, no mundo ocidental, que deram origem a uma grande

efervescência no campo das ideias, principalmente na área das ciências sociais,

particularmente na França. Inicia-se um período de renovação do pensamento

político e social, pautada pelo materialismo histórico, que influencia a forma de

pensar as ciências. Historiadores, filósofos, sociólogos, linguistas, psicólogos e

2 O termo escrileitor é utilizado por MOMESSO (2006).

3 De ora em diante o termo Análise de Discurso Francesa será tomado por AD.

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outros intelectuais da época preocupam-se em renovar o pensamento no interior da

ciência que estudam.

É nesse ambiente de ebulição que Michel Pêcheux (1938-1983), filósofo

de formação linguística, delineia os primeiros passos de uma teoria do discurso,

entremeada a ciências como a Linguística, a História, a Sociologia, a Filosofia, a

Psicanálise. Essa teoria veio a denominar-se Análise do Discurso Francesa.

Pêcheux (1997), baseado nas pesquisas de Saussure sobre o estatuto da

língua – na Linguística – nas considerações de Marx sobre a ideologia das classes

dominantes – na História – e nas descobertas de Freud sobre o inconsciente – na

Psicanálise –, esboça uma teoria linguística de interpretação e de leitura.

Inicialmente, Pêcheux buscava um método de análise dos discursos

políticos. Ele queria desenvolver uma maquinaria capaz de realizar a análise

automática do discurso, sem possibilidades de erros, com o máximo de objetividade,

cientificidade e fidelidade com a verdade. Influenciado pela leitura de Althusser, de

quem foi aluno, visava a construir uma teoria materialista do discurso, aliada a um

projeto político de intervenção na luta de classes, com base no marxismo-leninismo.

A “análise automática” do discurso dominou suas concepções na primeira fase de

seus estudos.

Foi no Estruturalismo, derivado das pesquisas de Saussure, fundador da

Linguística, que Pêcheux entreviu, primeiramente, uma metodologia de análise que

cria a maquinaria capaz de fazer a análise automática do discurso, embasando-se

na palavra e na sintaxe da língua. Mas a visão sistemática da língua, no método

estruturalista, não considerava a fala, o sujeito do discurso, o discurso, as condições

de produção do mesmo.

Pêcheux trabalhou em um método que colocasse o discurso como objeto

de estudo, que levasse em conta o contexto social, histórico e ideológico em que ele

foi produzido. O discurso abordaria elementos ideológicos e sociais porque ele é a

materialização da linguagem.

O método de Análise do discurso foi então criado para trazer também à

tona as manifestações ideológicas de ordem sócio-histórica enunciadas pelos

sujeitos do discurso. Por isso, a AD se situa no entremeio de três áreas do saber

científico: a Linguística, para explicar os processos de enunciação; o Materialismo

Histórico para explicar os fenômenos sociais e o assujeitamento do sujeito pela

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ideologia e a Psicanálise que explica a subjetividade e a relação do sujeito com o

simbólico (GREGOLIN, 2003).

As noções de discurso, de sujeito e de sentido, principalmente,

formuladas e reformuladas muitas vezes, por Pêcheux, sofreram influência, não sem

embates, de outros estudos e de outros pensadores, como o filósofo Michel Foucault

(1926-1984).

Embora em momentos diferentes e com ideias próprias a respeito da

língua, do discurso, do sujeito e da História, esses dois filósofos contribuíram para a

construção de conceitos e para a consolidação do aparato metodológico da Análise

de Discurso Francesa.

Desde o início, a Análise do Discurso Francesa foi marcada por uma

constante elaboração e reelaboração de conceitos que refletem as revisões teóricas

que Pêcheux introduziu conforme ele era influenciado pelas ideias de Althusser (com

base em Marx) e conforme estudava sobre as descobertas de Freud e o

inconsciente. Entre discordâncias e concordâncias, o filósofo Foucault, mais tarde,

foi uma figura decisiva para a consolidação do aparato metodológico desse campo

do saber.

Por causa das constantes revisões teóricas e metodológicas, que

envolvem a articulação dos conceitos básicos de discurso, língua, sujeito e História,

Pêcheux (1997c) menciona as “três épocas da análise do discurso”, embora não

seja uma divisão cronológica.

Na “primeira época” da AD, Pêcheux luta contra o formalismo das

análises centradas na língua, em sua estrutura e gramaticidade, reflexos das

pesquisas de Saussure sobre a língua considerada como um sistema. Ele desloca o

objeto de análise para o discurso, processo de comunicação e significação, em que

a língua é considerada em seu caráter social e em sua sistematicidade, que

envolvem o sujeito e a História. Essa primeira época é marcada pela obra de

Pêcheux, Análise automática do discurso, de 1969 (GREGOLIN, 2004).

Nesse período, que se denominou de AD1, o sujeito do discurso era

considerado não em sua individualidade, mas como um sujeito social, sempre

assujeitado a uma ideologia. Esse modo de enxergar o sujeito discursivo é fruto das

influências das teses althusserianas a respeito dos aparelhos ideológicos e do

assujeitamento, em Pêcheux. A visão de um sujeito do discurso atravessado pela

ideologia e pelo inconsciente significa um sujeito que não é fonte nem origem de seu

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dizer, que apenas reproduz o já dito (GREGOLIN, 2004).

O discurso, no primeiro momento da AD, era compreendido como

discurso político, engajado nas lutas de classes, em embate com as ideias

marxistas, ou discurso religioso, ambos fechados em si mesmos. Os sujeitos do

dizer reverberavam as ideias dos grupos sociais, por isso, Pêcheux afirma que “os

sujeitos acreditam que ‘utilizam’ seus discursos quando na verdade são seus

‘servos’ assujeitados, seus suportes” (PÊCHEUX, 1997c, p. 311).

A “segunda época”, AD2, caracterizou-se pelo questionamento de

Pêcheux sobre a própria metodologia de análise do discurso. Entre polêmicas,

principalmente com Foucault, e reformulações de conceitos, Pêcheux explicita, em

um artigo, sua vinculação com Saussure, Marx e Freud e apura a análise da relação

entre língua, discurso, ideologia e sujeito, ao formular, segundo Gregolin (2004, p.

62), sua “teoria dos ‘dois esquecimentos’: sob a ação da interpelação ideológica, o

sujeito pensa que é a fonte do dizer, pois este se apresenta como uma evidência” .

Ainda na AD2, Pêcheux (1998, p. 161) toma emprestado de Foucault a

noção de “formação discursiva” reformulando-a; acrescenta ao conceito foucaultiano

a reflexão sobre a materialidade do discurso e do sentido: “os indivíduos são

interpelados em sujeitos falantes (em sujeitos de seu discurso) pelas formações

discursivas que representam, ‘na linguagem’, as formações ideológicas que lhes são

correspondentes”.

Para Pechêux:

[...] a noção de formação discursiva, tomada de empréstimo a Michel Foucault, começa a fazer explodir a noção de máquina estrutural fechada na medida em que o dispositivo da FD está em relação paradoxal com seu ‘exterior’: uma FD não é um espaço estrutural fechado, pois é constitutivamente ‘invadida’ por elementos que vêm de outro lugar (isto é, de outras FD) que se repetem nela, fornecendo-lhe suas evidências discursivas fundamentais (por exemplo, sob a forma de ‘preconstruídos’ e de ‘discursos transversos’) (PÊCHEUX, 1997c, p. 314).

Foucault conceitua formação discursiva como:

No caso em que se puder descrever, entre um certo número de enunciados, semelhante sistema de dispersão, e no caso em que entre os objetos, os tipos de enunciação, os conceitos, as escolhas temáticas, se puder definir uma regularidade (uma ordem, correlações, posições e funcionamentos, transformações), diremos, por convenção, que se trata de uma formação discursiva [...] (FOUCAULT, 2000, p. 43).

Na AD2 explode a noção de maquinaria, no entanto, o sujeito ainda

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permanece assujeitado.

Pêcheux afasta-se de algumas posições que sustentava; na AD3 ele

encontra-se decepcionado com a crise das esquerdas francesas, do marxismo e do

estruturalismo e, influenciado pelas ideias de Bakhtin sobre a heterogeneidade do

sujeito e do discurso, aproxima-se das propostas bakhtinianas e foucaultianas. É

também na AD3 que o estudioso passa a rever também o conceito de sujeito e a

considerá-lo não mais como interpelado por uma ideologia, mas por várias

ideologias. Pêcheux percebe que no interior de uma formação discursiva coexistem

discursos provenientes de outras FDs e que essas relações nem sempre são

pacíficas.

O discurso começa a ser visto não como um bloco homogêneo, idêntico a

si mesmo, pois ele reflete a contradição presente na formação discursiva (FD) da

qual decorre. Dessa maneira, a formação discursiva passa a ser caracterizada pela

heterogeneidade, o que determina, consequentemente, a natureza heterogênea do

discurso.

Gregolin (2004, p.157) argumenta que Pêcheux, na AD3, apropria-se dos

conceitos foucaultianos sobre o método arqueológico de fazer a “leitura de arquivo”,

logo, a terceira fase estaria sob a égide das fontes da “tríplice aliança” (Marx,

Saussure e Freud) e pelas confluências do pensamento de Pêcheux, Foucault,

Bakhtin e a “Nova História”.

No quadro da construção da teoria transdisciplinar da análise de discurso

Pêcheux desconstrói e reconstrói constantemente conceitos e aparatos

metodológicos de análise, assim, reordenou o que hoje se conhece por AD.

1.2 – AD: UMA TEORIA LINGUÍSTICA DE INTERPRETAÇÃO E DE LEITURA

A AD é tomada por seus precursores e estudiosos como uma teoria

linguística de interpretação e de leitura. Assim foi se consolidando a Análise de

Discurso (AD) francesa que surgiu como reação a duas fortes tendências no campo

da linguagem: o estruturalismo e a gramática gerativa transformacional. Até então,

estudar uma língua restringia-se à prática da ‘compreensão de textos’, por meio de

questões de naturezas diferentes, visando dar conta do conteúdo e da forma.

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Pêcheux (1997a) observou que, por meio de questões como ‘De que fala

este texto?’ ‘Quais são as ideias principais contidas neste texto?’ e ‘Este texto está

em conformidade com as normas da língua?’ ou então ‘Quais são as normas

próprias a este texto?’, colocadas todas ao mesmo tempo, em referência aos usos

semânticos e sintáticos evidentes no texto, o professor ensinava o aluno a buscar

respostas às indagações a respeito do sentido do texto (o que o autor ‘quis dizer’). A

respeito do papel da Linguística, então, Pêcheux (1997a, p. 61) criticou:

[...] Em outros termos, a ciência clássica da linguagem pretendia ser ao mesmo tempo ciência da expressão e ciência dos meios desta expressão, e o estudo gramatical e semântico era um meio a serviço de um fim, a saber, a compreensão do texto [...].

Na busca por um novo caminho teórico e para aplacar sua angústia

quanto à interpretação de textos que envolvessem aquilo que é exterior, mas que

tem sentido no texto, Pêcheux percebeu que as escolhas lexicais que os falantes

fazem revelam a presença de ideologias que podem se opor e revelar discursos que

expressam, a respeito de um mesmo assunto, posições de diferentes grupos de

sujeitos. Assim, “uma mesma palavra pode ter sentidos diferentes, conforme o lugar

socioideológico daquele que a emprega” (PÊCHEUX, 1997a, p. 78).

Dessa maneira, ao procurar uma nova forma de olhar e compreender os

textos, Pêcheux propõe um outro objeto de estudo, o discurso, que não se confunde

com o texto nem com o enunciado mas que, segundo Gregolin (2003, p. 23) “opera

a articulação entre o linguístico e o histórico”, configurando-se como “um novo

campo de investigação”.

Esse novo campo de investigação, segundo Pêcheux e Fuchs (1997b, p.

164), articula “três regiões do conhecimento científico”, a saber, o materialismo

histórico (como teoria das formações sociais e de suas transformações,

compreendida aí a teoria das ideologias); a linguística (como teoria dos mecanismos

sintáticos e dos processos de enunciação ao mesmo tempo) e a teoria do discurso

(como teoria da determinação histórica dos processos semânticos) (PÊCHEUX;

FUCHS, 1997b, p. 163-4).

Segundo Gregolin (2003, p. 23) essas três regiões do conhecimento

científico seriam ainda “atravessadas por uma teoria da subjetividade, de natureza

psicanalítica”. Conforme a autora, ao apoiar-se numa teoria linguística, numa teoria

da história e numa teoria do sujeito, a AD configura-se como um campo de estudo

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que está sempre em movimento.

O conceito de leitura, neste trabalho, tem significativa importância, porque

remete ao modo como os adolescentes lidam com a leitura no social e no virtual,

que reflete muitas vezes, direta ou indiretamente, na aprendizagem e/ou na leitura

do ambiente escolar.

Para a AD, seguindo as reflexões de Pêcheux (1997a), o ponto de partida

da leitura são as condições de produção, recepção e de circulação da leitura, da

escrita e do discurso. Para proceder à análise do discurso e da leitura que permeia

um texto, é indispensável observar não só o contexto comunicacional e o contexto

situacional, mas também permear nos meandros do social, do ideológico, da

historicidade e da subjetividade daquele que lê, pois esses campos atravessam e

alinhavam o discurso presente no texto que se lê.

No Brasil uma das grandes estudiosas da perspectiva discursiva francesa

e da leitura é Orlandi (1999) que aponta aspectos importantes quando se adota a

perspectiva discursiva para pensar a leitura. Um primeiro aspecto é aquele de que

sujeito e sentidos se constituem recíproca e simultaneamente e são determinados

historicamente. Isso significa que o sujeito inscreve-se em um conjunto de

formações discursivas que regem a sociedade de que participa, regulando

historicamente as formas de dizer já instituídas. Por causa dessa determinação

histórica, os sentidos não são únicos, alguns podem ser lidos e outros não. Quando

o sujeito se identifica com uma dada formação discursiva, ele está construindo

sentidos para esse discurso. Por isso, o sentido nunca pode ser tomado como literal.

Um segundo aspecto é a observação de que o sujeito não interage com o

texto, mas com outros sujeitos inscritos no texto - o autor e o leitor virtual - que, este

último, historicamente, está suposto, inscrito no que se lê. De acordo com a autora,

se o sujeito interagisse com o texto, assumir-se-ia haver um sentido único para ele.

A relação entre o leitor virtual (leitor para quem o autor destina o texto) e o leitor real

(sujeito que lê o texto) é muito distante.

Um terceiro aspecto diz respeito à existência de múltiplos e variados

modos de leitura, o que implica diferentes formas de relação do leitor com o texto.

Sendo assim, a leitura dependerá dos modos e efeitos de leitura de cada época e

segmento social. Leitura, na escola, significa aprender a ler e a escrever; no meio

acadêmico pode significar a construção de um aparato teórico e metodológico de

aproximação de um texto.

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Outros fatores interferem no processo de leitura, pois não é só quem

escreve produz sentidos, mas também quem lê, em condições determinadas

socialmente. Como não há como se dizer tudo, o autor joga com a ausência dos

sentidos ou com outros sentidos que poderiam ser ditos. Isso significa que todo dizer

é incompleto, não por falta de palavras, mas porque até o que não é dito significa. É

preciso, nesse espaço, relacionar o processo de significação aos processos de

produção e de compreensão.

De acordo com Orlandi (1999), há leituras previstas para um texto, pois os

sentidos se sedimentam conforme as condições em que são produzidos, e há

leituras imprevistas, que resultam também do contexto sócio-histórico. Isso resulta

na possibilidade de se ler um texto de várias maneiras, de se estabelecer múltiplos

sentidos para uma mesma enunciação. Para a autora (p. 86), toda leitura tem sua

história, “leituras que são possíveis, para um mesmo texto, em certas épocas não o

foram em outras e leituras que não são possíveis hoje o serão no futuro”.

Outro teórico, advindo dos estudos culturais, que trata das práticas e dos

modos de leitura é Chartier (1998, p.77), para quem “a leitura é sempre apropriação,

invenção, produção de significados”; o leitor desloca e subverte o que o livro

pretende impor-lhe, mas ele não é totalmente livre para criar os sentidos, isso

depende de limitações provenientes das capacidades de leitura, das convenções e

hábitos que caracterizam as práticas de leitura. O autor assume a comparação que

Michel de Certeau faz do leitor com “um caçador que percorre terras alheias” em:

Segundo a bela imagem de Michel de Certeau, o leitor é um caçador que percorre terras alheias. Apreendido pela leitura, o texto não tem de modo algum – ou ao menos totalmente – o sentido que lhe atribui seu autor, seu editor ou seus comentadores. Toda história da leitura supõe, em seu princípio, esta liberdade do leitor que desloca e subverte aquilo que o livro lhe pretende impor. Mas esta liberdade leitora não é jamais absoluta. Ela é cercada por limitações derivadas das capacidades, convenções e hábitos que caracterizam, em suas diferenças, as práticas de leitura. Os gestos mudam segundo os tempos e lugares, os objetos lidos e as razões de ler. Novas atitudes são inventadas, outras se extinguem (CHARTIER, 1998, p. 77).

Logo, o conceito de leitura para Chartier atrela-se à ideia de construção

de sentido que se faz por meio de um conjunto de práticas sociais.

Nesse sentido, tanto Orlandi (1999) como Chartier (1998), não concebem

a leitura como algo livre. Eles reconhecem a historicidade da leitura, onde ora os

sentidos permanecem ora são multiplicados ou “produzidos”.

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Nesse caso, o texto, ao permitir que seus sentidos partam em múltiplas

direções, consiste em uma unidade que permite o acesso ao trabalho com a língua,

os jogos de sentido, a discursividade e as condições de produção, entre outros

aspectos.

A leitura fica assim atrelada às ideias de interpretação e de compreensão

como processos de instauração de sentidos. Estes dependerão de diferentes gestos

de interpretação, amarrados a diferentes posições do sujeito, inseridos em diferentes

formações discursivas, podendo tanto estabelecer como deslocar sentidos.

Interpretar, para Orlandi, não é apreender, mas atribuir sentidos, mesmo

porque eles não existem a priori. Os sentidos são muitos, mas não quaisquer porque

são atrelados à memória. Compreender, por sua vez, pressupõe saber como um

objeto simbólico produz sentidos, é saber como as interpretações funcionam, “é

‘escutar’ outros sentidos que ali estão, compreendendo como eles se constituem”

(ORLANDI, 1999, p. 26).

No que se refere às práticas da leitura, vários fatores interferem em sua

história, segundo Chartier (2001): o acesso à leitura; o estilo da leitura que

determina a relação entre leitor e objeto lido; as habilidades ou competências

lexicais do leitor - que variam entre a leitura silenciosa e oral, por exemplo, e a

leitura da letra de forma e a leitura da letra cursiva; a produção dos textos, ou seja, a

partir das escolhas textuais do autor para escrever o texto, ele impõe um protocolo

de leitura; e a produção dos livros, que é quando o editor, por meio do aparato

tipográfico, pode, a partir da sua impressão, sugerir leituras diferentes de um mesmo

texto.

É importante resgatar, neste momento, que as leituras estão

condicionadas tanto ao leitor – e dependem de suas habilidades e competências, da

maneira como ele interage com o objeto lido -, como ao autor, ao editor. Elas

dependem ainda de um conjunto de condicionamentos, convenções e códigos que

se imprimem no texto.

Posto o que se entende por leitura, é imprescindível, neste trabalho,

lançar olhos para as práticas de leitura que se fazem hoje, no mundo virtual, pelo

texto eletrônico e observar como elas se modificam historicamente.

Um cenário de transformações sociais, culturais e cognitivas em que a

presença dos elementos tecnológicos na sociedade, especialmente a internet,

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possibilita sucessivas mudanças nos suportes de textos e nos modos de leitura vem

transformando o modo de os jovens se comunicarem.

As práticas contemporâneas de leitura têm suscitado preocupações dos

estudiosos quanto à necessidade de discussão sobre estas novas categorias de

leitura. Lévy (1999) e Bauman (2004) têm contribuído para a reflexão sobre a

leitura de textos na tela, observando o aspecto da temporalidade próprio deste novo

modo de leitura e suas implicações na cultura jovem contemporânea. Ainda de

acordo com Lévy (1999), presenciamos o surgimento de uma inteligência coletiva4

que contempla a complexidade e a multiplicidade de visões, graças a essas novas

formas de cooperação e coordenação do tempo real, registrando a potencialização

da sensibilidade, da percepção, do pensamento e da imaginação.

Chartier (1998) fala do impacto do aparecimento do texto eletrônico na

sociedade atual. Segundo ele, os livros eletrônicos organizam de maneira nova a

relação entre a demonstração e as fontes, a organização da argumentação, os

critérios da prova, ou a relação com os leitores. O hipertexto5 contém vínculos – links

- para outros documentos, permitindo ao leitor que se desloque de um lugar para

outro, que se movimente. Neste tipo de texto, o leitor pode desenvolver sua

argumentação, segundo uma lógica que não é mais necessariamente linear e

dedutiva, mas aberta, fragmentada e relacional.

A lógica linear e disciplinar organiza o texto em livros, partes ou capítulos

de um discurso único, dispostos numa ordem pré-determinada, fazendo parte de

uma só obra. As possibilidades do texto eletrônico convidam o jovem leitor a

consultar, por ele mesmo, os documentos que são os objetos ou materiais de

pesquisa abandonando a suposição de que o conhecimento deve ser adquirido

segundo uma ordem previamente determinada.

Segundo Chartier, a revolução nas estruturas do suporte de leitura influi

nas maneiras de ler:

4 Inteligência coletiva - este termo surgiu com Pierre Lévy (1996), e caracteriza-se pela forma do

homem pensar e compartilhar seus conhecimentos com outras pessoas, utilizando os novos meios de comunicação, no caso a internet. 5 Para Lévy (1996, p. 44) "o hipertexto digital seria definido como uma coleção de informações

multimodais disposta em rede para a navegação rápida e ‘intuitiva’". O autor acrescenta que “é um texto móvel, caleidoscópio, que apresenta suas facetas, gira, dobra-se e desdobra-se à vontade diante do leitor." Para o mesmo autor (1996, p. 45) "a hipertextualização dos documentos pode ser definida como uma tendência à indistinção, à mistura das funções de leitura e de escrita".

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A inscrição do texto na tela cria uma distribuição, uma organização, uma estruturação do texto [...]. O fluxo seqüencial do texto na tela, a continuidade que lhe é dada, o fato de que suas fronteiras não são mais tão radicalmente visíveis, como no livro que encerra, no interior de sua encadernação ou de sua capa, o texto que ele carrega, a possibilidade para o leitor de embaralhar, de entrecruzar, de reunir textos que são inscritos na mesma memória eletrônica: todos esses traços indicam que a revolução do livro eletrônico é uma revolução nas estruturas do suporte material do escrito assim como nas maneiras de ler. (CHARTIER, 1998, p. 12-13)

Ao mesmo tempo em que o jovem leitor contemporâneo presencia, nesse

mundo textual sem fronteiras, uma revolução técnica de produção e uma revolução

do suporte da escrita, já que o texto lhe chega, por processos telemáticos, a uma

tela de computador, ele participa de uma revolução das práticas de leitura.

2 LEITURA NA INTERNET: SUJEITO E CONTEMPORANEIDADE

A segunda parte desta dissertação trata de refletir sobre a leitura na

internet, sobre o leitor e os suportes virtuais. A reflexão ampara-se em Lévy (1993,

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1996, 1999, 2005) estudioso das questões que envolvem a virtualidade e o digital,

Chartier (1998) e Momesso (2006, 2011) no que tange ao leitor e suas práticas de

leitura e escrita em suportes virtuais.

2.1 LEITURA, LEITOR E SUPORTE VIRTUAL

Para (LÉVY, 1993), a leitura hipertextual, por meio de links, permite ao

adolescente leitor uma leitura não linear, na qual ele se engaja em um processo de

interconexões que podem levá-lo tanto para o interior do próprio espaço de leitura,

quanto para outros textos em outros lugares do ciberespaço. Mas, embora o texto

eletrônico faça parte dessa história de liberdade das leituras, ele restaura práticas da

leitura anteriores ao século XVIII. Isso significa dizer que, para se ler um texto

eletrônico é preciso estar sentado em frente à tela, em um lugar adequado e

específico – não necessariamente um escritório, onde se possa ter acesso a um

computador conectado ou não à Internet.

A partir do século XVIII, acredita Chartier (1998), a história das leituras é

também uma história da liberdade na leitura, pois se observa que ela vem se

tornando cada vez mais livre e desordenada. Como atesta esse autor (p.78), “é no

século XVIII que as imagens representam o leitor na natureza, o leitor que lê

andando, que lê na cama”. Antes disso, o leitor era representado pela iconografia

como alguém que lê no interior de um gabinete, em um espaço reservado e privado,

sentado e, em função dos suportes de leitura da época, com poucas possibilidades

de mobilidade.

Vale lembrar o que Chartier (1998, p. 16) comenta a esse respeito: “a

leitura do eletrônico junta, e de um modo que ainda se deveria estudar, técnicas,

posturas, possibilidades que, na longa história da transmissão do escrito,

permaneciam separadas”.

Contemporaneamente, a virtualidade de um espaço compartilhado,

público, em que qualquer um pode participar modifica radicalmente a noção de

contexto e, consequentemente, o próprio processo de construção de sentido.

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No ciberespaço, o texto aponta para várias direções de leitura, pois há

sempre uma relação que ele estabelece com outros textos. Nessa leitura não linear,

é bem possível que aflorem a heterogeneidade6 e a polifonia7 discursivas.

Conforme Momesso (2011, p.6), a prática de leitura e escrita do texto

digital é descontínua, não linear, maleável, possui mobilidade por abrir-se via

hiperlinks etc. “O escrileitor é convidado também a modificar, editar, deslocar-se

rapidamente de uma tela a outra, desdobrar arquivos [...]” A autora refere-se ao

twitteiro, internauta que navega no twitter, como “escrileitor”8 por entender que esta é

uma das nomenclaturas que melhor define o leitor da internet e de seus dispositivos,

pois ao mesmo tempo em que ele lê, também pode interferir na escrita.

Em outro trabalho, ao mencionar as práticas de leitura de blogs

jornalísticos, Momesso (2006, p. 138) argumenta que “o gênero digital como os

blogs impõe desafios ao escrileitor, uma vez que aparecem múltiplos papéis na

leitura e na produção do texto digital”. A autora observa que a existência de textos

mais curtos, nesse ambiente, “produz maior dinamicidade na leitura e torna o texto

mais atrativo e móvel, o que pode ser comparado a um caleidoscópio”.

Ao comparar a multiplicidade de textos curtos que circulam no espaço

virtual de um blog com um “caleidoscópio”, a autora explica:

Tudo está para o escrileitor como um cardápio recheado de uma superabundância de informações, em que o papel do leitor virtual é ter o poder de conduzir tudo como melhor lhe convier. Além disso, há o poder de falar o que quiser e quando quiser, enfim ser um sujeito “livre”, que tem a ilusão de ser dono de seu discurso (MOMESSO, 2006, p. 138).

É certo que a leitura não linear configura novas possibilidades para os

adolescentes leitores inseridos na tecnologia digital e, consequentemente, novas

produções de sentidos e representações no interpretar a realidade.

6 AUTHIER-REVUZ (1990) parte da premissa de que a própria linguagem é heterogênea em sua constituição e o conceito por ela cunhado reconhece que em todo discurso há outras vozes que permeiam o discurso, essa heterogeneidade ora é mais evidente ora menos, as quais a autora denomina de heterogeneidade mostrada para a primeira e heterogeneidade constitutiva para a segunda. 7 O conceito de polifonia foi elaborado por Bakhtin (2002, p.4) que define polifonia como “a presença

da multiplicidade de vozes e consciências independentes e imiscíveis e a autêntica polifonia de vozes plenivalentes constituem, de fato, a peculiaridade fundamental dos romances de Dostoiévski”. 8 Escrileitor – sujeito que lê e ao mesmo tempo produz informação e conhecimento no texto lido, ou seja, um leitor ativo, participante da produção do texto. Isso se dá no ambiente virtual, a internet, em que é possível modificar os textos.

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Os modos de leitura no ciberespaço, característicos da

contemporaneidade, aqui delineados, evidenciam que se está diante de uma nova

configuração da produção de sentido pelos diferentes atos de leitura.

Diante destas considerações, importa à pesquisadora e à comunidade

educacional, saber quais são as práticas de leitura de adolescentes leitores

contemporâneos, estudantes, nesse mundo virtual.

Sabe-se que nesse contexto virtual, os textos mudam tanto em sua

estrutura e organização como na maneira que estabelecem suas fronteiras,

permitindo modos rápidos de acessar outros textos por meio dos hiperlinks. Na

Internet, segundo Lévy (2005), o texto torna-se um hipertexto que leva a outros

hipertextos em uma imensa rede de nós conectados entre si, permitindo que a

leitura se torne uma hiperleitura, ou ainda, uma escrita.

No facebook, quando se começa a ler uma mensagem de um internauta,

é possível afirmar que nem o texto nem a leitura se encerram ali, pois o leitor pode

clicar em um dos links do comentário do seu interlocutor e acessar imediatamente a

página do perfil de outro “amigo”, que é como se denominam os sujeitos que fazem

parte desse contexto de produção de enunciados, e ler o comentário feito por ele, e

mais outro e mais outro. Assim, a leitura e o texto só terminam quando o leitor parar

de navegar pela rede e desligar o seu computador.

Retomando Lévy (1996), um texto, ao ser lido, é todo esburacado,

riscado, cheio de brancos. Esses buracos e brancos são as palavras que o leitor não

compreende e que desconsidera, deixando-as de lado durante a leitura. Para ele, ler

é começar a negligenciar, ou seja, a desler o texto. O “desler” é a seleção que o

leitor faz de acordo com seu repertório. Desler seria tirar do texto só o que faz

sentido para um determinado leitor e desligar todo o resto, ou seja, ler o que pode

ser lido de acordo com a sua bagagem. As palavras negligenciadas fazem parte da

leitura porque sua falta cria novos sentidos ao texto; aquilo que não foi selecionado

interfere na forma de interpretar o que se seleciona.

Essa “desleitura” abrange o que é selecionado e o que é negligenciado.

Cada nova leitura pode, no entanto, contemplar diferentes seleções e fazer

diferentes atualizações. Para Lévy (1996), ler é “descosturar” o texto, descobrir as

relações que lhe deram essa aparência de unidade, desfazer a trama do tecido que

o compõe. O leitor, quando lê, atualiza o texto de uma maneira, seguindo ou não o

caminho traçado pelo autor. Antes que a leitura se realize, o espaço do sentido não

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27

existe, ele é fabricado pelo leitor que o atualiza continuamente relacionando-o a

outros textos, outras imagens, outros discursos.

A atividade do leitor independe do suporte textual. Ele constrói

interpretações em diferentes textos impressos, em textos fílmicos, em textos da

rede, em textos da TV, em textos das obras de arte. A leitura é algo que é sempre

recortado pela subjetividade do leitor. E a leitura hipertextual, segundo Lévy (1996),

é completamente diferente da que é feita de um texto impresso. Enquanto o texto

impresso tem uma estrutura linear e por isso permite que se volte a ele, que se faça

uma releitura, o mesmo não acontece com o hipertexto. Sua edição é única, sendo

quase impossível retomar os caminhos e conexões feitas para se voltar ao

hipertexto construído. Pela sua própria forma de construção ele é fragmentado,

recortado e nem sempre as suas diferentes partes estão articuladas.

Lévy (1996) observa que se trata de outra noção de texto em que a

articulação de sentidos não ocorre de forma organizada, mas de uma maneira

múltipla e desordenada. Para o autor, a leitura na web é, pela própria estrutura de

seu suporte, fragmentada. O texto é o caminho, mas a rede que o leitor estabelece

ao ler pode ser mais ou menos fragmentada, mais ou menos articulada.

Na internet, estabelece-se um modo inteiramente diferente de se ler. É

no hipertexto que o leitor/usuário pode realmente se fazer autor porque ele não

percorre uma rede pré-estabelecida, mas cria sempre novas ligações criando a sua

própria rede. Nessa situação, para Lévy (1996), a leitura e a escrita trocam seus

papéis. No hipertexto toda leitura torna-se também um ato de escrita. Muitas vezes o

usuário/leitor, na internet, age como o zappeador com a TV, ele conecta e lê várias

referências ao mesmo tempo, construindo uma leitura que pode estar articulada ou

não.

Essa constante passagem de autor para leitor, de interior para exterior e

vice-versa opera o que Lévy (1999) chama de “desterritorialização” da autoria na

leitura hipertextual. A escrita e a leitura trocam seus papéis constantemente. A

desterritorialização, para o autor, é uma marca do texto digital. O ciberespaço

mistura noções antes entendidas separadamente. Vale apontar as noções de

unidade, de identidade e de localização. As redes digitais fizeram emergir um texto

que não tem fronteiras rígidas e não há mais um texto, mas texto em movimento,

sempre em mudança, ou seja, desterritorializou-se o texto e, consequentemente, o

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discurso. A interpretação no ciberespaço se refere à apropriação sempre singular

de um leitor. A leitura em hipertexto jamais é duas vezes a mesma.

Mota (2001) reflete que a capacidade de ler na internet depende da

habilidade topográfica do novo leitor, pois o deslocamento pela multiplicidade

instável é uma das principais características do processo de leitura virtual. Logo,

nesse universo labiríntico perder-se pode ser a melhor forma de encontrar-se. Para

a autora a metáfora que melhor retrata este tipo de procedimento de leitura é o

funcionamento de nossas redes neurais e que na leitura virtual as redes seriam

feitas entre os fatos, as sujeitos e as coisas do mundo.

2.2 – AS PRÁTICAS DISCURSIVAS E AS TÉCNICAS DE SI REVELANDO O

SUJEITO CONTEMPORÂNEO

Parte-se do pressuposto, como já afirmado anteriormente, de que o

sujeito discursivo encontra-se em constante processo de construção a partir de

fatores sociais, históricos e ideológicos. Tal construção ocorre por meio de práticas

sociais e discursivas que o sujeito estabelece consigo mesmo e com os outros.

Dessa forma, para observar essa construção do sujeito adolescente nos oceanos da

internet, mais especificamente na rede social do facebook, pode-se partir da

identificação e da descrição das práticas discursivas e das tecnologias do eu que o

sujeito revela em suas práticas de leitura e escrita no espaço virtual. Antes de se

observar e identificar tais práticas, torna-se importante que se reflita sobre o conceito

de prática discursiva e tecnologia de si.

A noção de “prática discursiva” em Foucault (2000) decorre do modo

como ele pensa o discurso, ou seja, como um conjunto de enunciados que têm suas

próprias condições de existência dentro de um tempo histórico:

Ele [o discurso] é constituído de um número limitado de enunciados, para os quais podemos definir um conjunto de condições de existência; é, de parte a parte, histórico – fragmento de história, unidade e descontinuidade na própria história, que coloca o problema de seus próprios limites, de seus cortes, de suas transformações, dos modos específicos de sua temporalidade (FOUCAULT, 2000, p. 132-133).

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Por isso, o autor recomenda que se observe o movimento dos enunciados

praticados por sujeitos historicamente colocados. Ele afirma que uma prática

discursiva não é somente um ato de fala, não é uma ação concreta e individual de

pronunciar discursos, mas é todo um conjunto de produção de enunciados. As

práticas discursivas são:

[...] um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço, que definiram, em dada época e para uma determinada área social, econômica, geográfica ou linguística, as condições de exercício da função enunciativa. (Foucault 2000, p. 136)

Isso significa dizer que, mesmo que uma prática discursiva dependa da

nossa vontade, ela não é suficiente para gerar o discurso. Todo esse conjunto de

produção de enunciados é regido por condições sociais, geográficas ou linguísticas,

econômicas de exercício da função enunciativa.

A esse respeito, Pêcheux (2002) já dizia que o enunciado é repetível, mas

nunca constrói as mesmas significações, pois a enunciação é um acontecimento que

não se repete, ela é “singular”. Segundo Foucault (2000), dentro do acontecimento,

o sentido do discurso nunca é o mesmo, ele muda conforme as relações que um

enunciado estabelece com os outros enunciados. No interior de uma formação

discursiva, os discursos se negam, afirmam-se e se distinguem, mas nunca se

repetem.

Foucault (2000) diz que as práticas discursivas moldam os objetos de que

falam e que os discursos não são meramente o resultado da combinação de

palavras que representam as coisas do mundo, nem são também um conjunto de

elementos significantes (signos), que remetem a conteúdos (coisas, fenômenos etc.)

que estão no mundo, exteriores aos próprios discursos. Pelo contrário, os discursos

nunca estão fora do acontecimento e dos poderes que o acontecimento coloca em

circulação.

Para Foucault (2000), as práticas discursivas são objetos de luta, elas

determinam que nem tudo pode ser dito, pois os discursos são regulados por e

submetidos a uma ordem discursiva. Segundo o filósofo, há mecanismos que

possibilitam o controle dos discursos e definem as práticas que determinam o que

dizer, quem pode dizer, em que circunstância pode dizer e de que posição pode

dizer. São regras próprias das práticas discursivas de uma época.

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De acordo com o aparato desta teoria linguística de interpretação e de

leitura, a AD, ao considerar o discurso com prática, pode-se analisar ‘quem fala’, ‘o

lugar da fala’ e ‘a posição de quem fala’ para entender melhor a constituição do

sujeito. Mas isso só é possível porque existe um complexo de formações discursivas

interligadas, em que o sujeito, ao adotar certa posição, acaba por inscrever-se em

uma delas, formando, dentro dela, uma relação de identidade.

Tendo em vista que o discurso, para Foucault (2000, p. 135), é “um

conjunto de enunciados, na medida em que se apoiem na mesma formação

discursiva; [...] é constituído de um número limitado de enunciados para os quais

podemos definir um conjunto de condições de existência”, observa-se que o discurso

está também intimamente ligado a uma formação discursiva.

Uma formação discursiva, na AD, é vista como uma “grande família de

enunciados” e sua análise consistirá na descrição dos enunciados que a compõem:

No caso em que se puder descrever, entre um certo número de enunciados, semelhante sistema de dispersão, e no caso em que entre os objetos, os tipos de enunciação, os conceitos, as escolhas temáticas, se puder definir uma regularidade (uma ordem, correlações, posições e funcionamentos, transformações), diremos, por convenção, que se trata de uma formação discursiva [...] (FOUCAULT, 2000, p. 43)

Segundo Pêcheux (1997a), a formação discursiva é o lugar da

constituição do sentido e da identificação do sujeito.

É importante ressaltar que a noção de sujeito, neste trabalho, considera

as ideias de Pêcheux (1997c), que vê o sujeito interpelado por várias ideologias,

heterogêneo, disperso e que não controla os efeitos de sentido de seu dizer e que

esse sujeito pode ocupar diferentes posições dentro do discurso.

Alia-se a essa noção o conceito de sujeito para Foucault (2000), que o vê

não como algo dado, mas construído por meio das práticas discursivas, sociais e em

relação com o outro. Esse sujeito é produzido no entrecruzamento do discurso, da

sociedade e da história, ou seja, o sujeito se constitui por relações linguísticas,

históricas e de poder. Para o Foucault (2000), o sujeito constitui-se por meio do e no

discurso.

Sendo assim, um dos principais pontos de convergência entre as

concepções desses dois filósofos que contribuíram para a construção de uma

metodologia de análise de discursos, a AD francesa, recai sobre a questão do

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sujeito do discurso: o sujeito é heterogêneo e constituído por meio da e na

linguagem.

Pêcheux (1997c) foca a questão das diferentes posições do sujeito dentro

do discurso, ou seja, dos lugares sociais e ideológicos ocupados pelo mesmo,

enquanto fala. O mesmo sujeito pode falar ora do ponto de vista de um sociólogo,

ora do ponto de vista de um consumidor, ora do ponto de vista de um pai de família.

Foucault (1995, p. 231-49) olha para os diferentes modos de subjetivação

do ser humano, isto é, para os diferentes modos como o sujeito se coloca como

objeto de análise. Ao longo de seus estudos, o autor observou três modos de

subjetivação que transformam os seres humanos em sujeitos: a objetivação de um

sujeito no campo dos saberes, trabalhada na fase arqueológica de sua pesquisa; a

objetivação de um sujeito nas práticas do poder, que divide e classifica, trabalhada

na fase genealógica e a subjetivação de um sujeito que pensa sobre si mesmo,

trabalhada na fase da ética.

O que se depreende é que, para Foucault (1995), o sujeito torna-se

sujeito pelos modos de investigação, pelas práticas divisórias e pelos modos de

transformação que os outros lhes aplicam e que ele aplica sobre si mesmo.

O terceiro modo de subjetivação, ou seja, a subjetivação de um sujeito

que trabalha e pensa sobre si mesmo, consiste no que Foucault (1995) denomina de

“técnicas de si”.

Neste trabalho, usa-se como aparato teórico para análise da construção

da identidade do sujeito adolescente que lê o que seus pares dizem sobre si,

escreve também sobre si e inscreve-se em uma formação discursiva que circula no

meio digital, o terceiro modo de subjetivação proposto por Foucault (1995), as

“técnicas de si”.

O que se quer observar, nesta pesquisa, são as práticas discursivas, ou

seja, o conjunto de regras anônimas que circulam, contemporaneamente, no

facebook, um espaço virtual, que determina a proliferação de um dado conjunto de

enunciados que formam, sistematicamente, os objetos de que falam, no caso, as

identidades dos próprios sujeitos discursivos, adolescentes alunos de escola pública.

Resta saber como se veem, como se mostram, como veem o outro, o que valorizam,

o que desprezam, o que leem, o que deixam de ler, o que pensam da leitura dos

textos literários ou acadêmicos.

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Para que a observação acima seja levada a termo, é importante verificar

as práticas discursivas para descobrir os regimes que as constituem e são por elas

constituídos. Sendo assim, Foucault (2010) se propõe a estudar a constituição do

sujeito como objeto para si próprio e pensa em procedimentos pelos quais o sujeito

é levado a observar-se, analisar-se, decifrar-se e reconhecer-se como campo do

saber possível:

Trata-se, em suma, da história da ’subjetividade’, se entendermos essa palavra como a maneira pela qual o sujeito faz a experiência de si mesmo em um jogo de verdade, no qual ele se relaciona consigo mesmo. (FOUCAULT, 2010, p. 236)

Observa-se que, ao realizar um jogo de verdade consigo mesmo, o sujeito

faz a experiência de si mesmo, onde entra em contato com a sua subjetividade. Ao

se referir aos jogos de verdade, Foucault (2010) pondera sobre as relações entre o

falso e o verdadeiro, relações que são construídas para delimitar o entendimento

que cada um tem do mundo e de si mesmo. Esses limites indicam aquilo que pode e

deve ser pensado, ou seja, um regime de verdade que permite esses jogos.

As “tecnologias do eu”, para Foucault (1997), seriam o fio condutor mais

útil para avaliar os modos instituídos do conhecimento de si e de sua história.

Tecnologias do eu ou “técnicas de si” são:

os procedimentos que, sem dúvida, existem em toda civilização, pressupostos ou prescritos aos indivíduos para fixar sua identidade, mantê-la ou transformá-la em função de determinados fins, e isso graças a relações de domínio de si sobre si ou de conhecimento de si por si. (Foucault, 1997a, p.109)

A preocupação consigo mesmo, o cuidado de si como uma tecnologia do

eu remonta à cultura greco-romana, onde constituía-se em uma das regras mais

significativas para a conduta pessoal e social na arte de si, era o objeto e busca do

cuidado de si.

Foucault (1994) descreve e problematiza essas técnicas antigas que

aparecem sempre mescladas entre si e não de forma isolada. São técnicas que se

estabelecem não apenas entre o discípulo e o mestre, mas também aquelas em que

cada um se relaciona consigo mesmo. Trata-se de um conjunto de técnicas que

podem ser agrupadas em quatro tipos:

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1) tecnologias de produção, que nos permitem produzir, transformar ou manipular as coisas; 2) tecnologias de sistemas de signos, que nos permitem utilizar signos, sentidos, símbolos ou significados; 3) tecnologias de poder, que determinam a conduta dos indivíduos, submetem-nos a certos tipos de fins ou de dominação, e consistem numa objetivação do sujeito; 4) tecnologias do eu, que permitem que os indivíduos efetuem, por conta própria ou com a ajuda de outros, certo número de operações sobre seu corpo e sua alma, pensamentos, conduta ou qualquer forma de ser, obtendo, assim, uma transformação de si mesmos, com o fim de alcançar certo estado de felicidade, pureza, sabedoria ou imortalidade (FOUCAULT, 1994, p. 2).

A técnica do “cuidado si” (epimeleia heautou), estudada por Foucault, na

concepção dos gregos, é a estratégia onde se tematiza a ética e onde, por

consequência, se possibilita a prática da liberdade. Quando os gregos recomendam

o cuidado de si, na verdade, para Foucault (1994), referem-se ao cuidado da alma,

como espaço para o pensamento, para a reflexão, o diálogo, o encontro com o

semelhante.

Contemporaneamente, essa noção perdeu sua força e fica obscura para

os sujeitos. Foucault (1994, p. 4) observa que, ao colocar-se à sociedade a questão

“qual é o princípio moral que domina toda a filosofia da Antigüidade?”, a resposta

imediata não é “tome conta de você mesmo”, mas o princípio délfico, gnôthi seauton,

“conhece-te a ti mesmo”.

Isso acontece porque, na tradição cristã, houve uma inversão e o

“conhecimento de si” passou a ofuscar o “cuidado de si”, no sentido de que é preciso

conhecer-se para renunciar a si. Mas Foucault mostra que, nos dois contextos,

“cuidar de si” não significa estar interessado em si mesmo, ter fascínio por si, é sim

uma estratégia que demanda uma atitude de trabalhar ou de estar preocupado

consigo, o que implica um saber, uma técnica e certa atenção sobre si como uma

prática constante.

Entre os gregos, no primeiro e segundo século, a relação consigo deveria

sempre apoiar-se na relação com um mestre, um diretor, ou, em todo caso, com um

outro. Admitia-se o princípio de que não se pode ocupar-se de si sem a ajuda de um

outro.

Os hupomnêmata, na Grécia antiga, eram as cadernetas individuais onde

se anotavam citações, fragmentos de obras, exemplos e ações que foram

testemunhadas, reflexões e pensamentos que serviam de lembrete e passaram a

ser utilizados como livros de vida, guias de conduta. Pelo fato de serem anotadas,

escritas para si mesmo ou para outro, entre o público culto eram oferecidas como

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um tesouro acumulado para leitura e meditação. Por meio da ânsia de captar o já-

dito, lido ou ouvido, a citação, o uso dos hupomnêmata tornou-se uma técnica

orientada para o cuidado de si com objetivos definidos como recolher-se em si,

atingir a si mesmo, viver consigo mesmo, bastar-se a si mesmo, aproveitar e gozar

de si mesmo (FOUCAULT, 1994).

Segundo Foucault (2010, p. 149), o objetivo dos hupomnêmata é fazer do

recolhimento do lógos fragmentário e transmitido pelo ensino, pela escuta, ou pela

leitura um meio para o estabelecimento de uma relação de si para consigo mesmo

tão adequada e perfeita quanto possível.

A hipótese que se sustenta neste trabalho é a de que as páginas virtuais

do facebook, na contemporaneidade, fazem o papel dos hupomnêmata, as

cadernetas de anotações onde se registram observações sobre si mesmo, onde o

outro participa opinando sobre essas impressões. Assim, tem-se o dispositivo do

facebook como uma técnica de si contemporânea, em que o sujeito se constrói por

meio das práticas discursivas, de leitura e de escrita das coisas de que gosta, das

suas opiniões sobre os temas que circulam na sociedade, dos seus anseios e

desejos, das impressões que tem sobre o mundo em que vive, enfim, sobre tudo

aquilo que quer expressar e que na interação com o outro vão se tecendo os fios

discursivos de um determinado sujeito virtual contemporâneo que pode dar-se a

revelar nas páginas do facebook.

O sujeito da contemporaneidade, segundo Bauman (2005), é fluido, pois

não consegue traduzir adequadamente a realidade em que vive. A ambivalência

tornou-se constante em suas experiências. Atualmente, o homem não consegue

fixar-se, determinar-se como um ser individual ou social, porém tudo o leva para ser

ambíguo, flexível, pois para sobreviver precisa sempre ter a possibilidade de ter

“identidades” que traduzam os sentimentos de pertencimento a determinadas

comunidades, círculos culturais, nação, mas ao mesmo tempo deve ser individual e

diferente. Assim, o sujeito nunca é alguém em definitivo, único e singular, mas sim

um sujeito fragmentado, flexível e mutável conforme as circunstâncias exigem que o

seja.

O sociólogo Bauman (2001, p. 10) usa a expressão “modernidade

líquida”, ao se referir à realidade ambígua e multiforme em que se vive

contemporaneamente, para designar a desintegração de discursos sólidos, fixos,

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previsíveis, institucionalizados, tanto no aspecto econômico como no social e no

político. Para esse autor:

Os primeiros sólidos a derreter, os primeiro sagrados a profanar eram as lealdades tradicionais, os direitos costumeiros e as obrigações que atavam pés e mãos, impediam que os movimentos e restringiam as iniciativas

A desintegração da solidez das instituições serviu para dar lugar às

individualidades. As noções de classe, etnia, como pontos históricos de orientação

dos sujeitos são vistas hoje por outros parâmetros. Agora os sujeitos é que ditam os

parâmetros de comportamento, chocando-se com outros novos padrões

multifacetados de convívio social, cada vez mais micros, mais fluidos, em curtos

espaços de tempo.

Os poderes que liquefazem passaram do sistema para a sociedade, da

sociedade para as políticas da vida, ou desceram do nível macro para o nível “micro”

do convívio social (BAUMAN, 2001, p. 14).

Essa efemeridade das relações, dos bens de consumo, a dinâmica das

comunicações resultam em uma necessidade de identificação, motivo pelo qual os

sujeitos vivem em busca de uma identidade. Bauman (2001, p. 15) denomina esse

fenômeno como sendo a “liquidez da vida”, característica da “sociedade líqüido -

moderna”. Para ele, nessa sociedade, tudo dura muito pouco e os contatos com

várias culturas são inúmeros, fazendo com que a identidade do sujeito seja uma

mescla de várias identidades.

A expressão “Modernidade Líqüida” surgiu a partir da globalização e se caracteriza “pela não territorialidade das transações político-econômicas, pelas trocas culturais e de saberes locais, pela fluidez das informações sem barreiras unindo diferentes povos, de diferentes regiões, línguas e etnias, pelo trânsito do conhecimento” (BAUMAN, 2001, p. 21).

Para Momesso (2005, p. 89) “esse sujeito não é real, mas também não é

irreal, ou seja, existe a possibilidade de vir a ser ou simplesmente continuar a ser a

representação escolhida para ser apresentada no meio digital como um determinado

sujeito”.

Ao pensar que o sujeito não é nem real e nem virtual, mas sim a

possibilidade de vir a ser, então para essa pesquisa é importante conhecer o sujeito

aluno da sala de aula em sua prática discursiva, de leitura e de escrita nas redes

sociais para saber como ele se apresenta dentro do ciberespaço, se o mesmo

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procura encontrar-se e redefinir-se ou até mesmo reforçar a imagem que possui no

espaço social real do cotidiano.

Hoje, o sujeito contemporâneo é concebido por alguns estudiosos, por

exemplo, Lévy, como aquele ligado à internet, à era da inteligência coletiva, ao

conhecimento e inteligência social.

Para Bauman (2001), as exigências da contemporaneidade não se

centram na estabilidade, tudo está em mutação. Por isso, o sujeito muda

constantemente de acordo com a necessidade do grupo a que ele quer pertencer.

Assim, os sujeitos não escapam aos efeitos das condições sócio-históricas do

momento vivido, modificando-se de acordo com a ordem estabelecida em cada

época.

Essa noção de sujeito mostra que ele encontra-se em constante processo

de transformação, mutação, e isso faz com que se constituam várias identidades

para esse mesmo sujeito.

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3. FACEBOOK: UMA ANÁLISE DAS PRÁTICAS DISCURSIVAS, IDENTITÁRIAS E DE

LEITURA DOS ADOLESCENTES DE UMA ESCOLA PÚBLICA

A questão das novas práticas de leitura e de escrita que emergem diante

do acesso às novas tecnologias, especialmente no que concerne à internet e às

redes sociais, tem sido tema de inúmeras discussões de cunho teórico e prático no

universo que rege a educação. O espaço virtual permite o acesso, a criação e a

distribuição de informações de toda ordem, em qualquer parte do mundo, e assumiu

uma posição de destaque como instrumento de comunicação em ampla escala.

O acesso à internet foi declarado pela Organização das Nações Unidas

(ONU), segundo Rosa e Santos (jun. 2011), em reportagem à revista Galileu, um

direito fundamental do ser humano, assim como a saúde, a moradia e a educação.

Tendo em vista esse novo movimento, fruto dos processos de

comunicação realizados no meio virtual – estabelecidos tanto no âmbito pessoal,

como no profissional e acadêmico –, observa-se o impacto gerado pela leitura

realizada diante da tela do computador. Novas práticas sociais de aprendizagem e

educação se fazem presentes nesse novo espaço cotidiano, exigindo novas

habilidades de leitura e de escrita, diferentes das necessárias em outros suportes,

tais como o impresso, como já tratado anteriormente.

Outro fator importante é que a internet é utilizada não só como meio de

comunicação e interação, mas também como um espaço de simulações, simulacros

da vida em todos os seus aspectos: profissional; social; interpessoal; lazer;

sentimental, etc. Aparentemente, ela proporciona ao seu usuário a possibilidade da

criação de um mundo virtual que pode se tornar real, além disso, cada participante

desse mundo pode mostrar-se, fazer-se visível ao outro com a identidade que queira

criar.

É sabido que profissionais da área de Recursos Humanos das empresas,

quando precisam recrutar pessoal, buscam avaliar nos perfis dos candidatos em

redes sociais se os mesmos são adequados às vagas oferecidas ou não. Assim, as

redes sociais contribuem para se conhecer os sujeitos e se delinear a identidade dos

mesmos.

Assim, como o mercado de trabalho busca nas redes sociais informações

para conhecer melhor seus colaboradores e/ou futuros colaboradores, a escola

também pode, por meio dessa ferramenta, saber quais são as preferências de

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leitura, os modos de ler, de escrever, de pensar o mundo de seus discentes. Esse

conhecimento pode subsidiar o trabalho do professor quando estiver preparando

aulas de leitura, de interpretação e de produção de textos, partindo desse espaço de

interlocução de seus discentes e de suas preferências, de forma que os alunos terão

mais atenção nas aulas, já que as práticas discursivas que se atualizam ali revelam

o ambiente em que ele gosta de viver. E para descobrir esse mundo virtual dos

discentes, o professor precisa também ter um perfil nessas redes sociais, adicionar

os perfis de seus alunos ao seu no espaço do facebook e, a partir da perspectiva

teórica dada, olhar o discurso que permeia as práticas de linguagem de seus alunos

como construção de identidades que possibilitarão transformar sua aula em

momentos de conhecimento e ensino-aprendizagem prazeroso.

Diante do exposto, este capítulo tem por objetivo analisar os facebooks de

alunos do nono ano de uma escola pública de Franca, com o intuito de se verificar

quais práticas discursivas, identitárias, de leitura e de escrita se fazem no espaço

virtual, ou seja, conhecer as condições de produção dessas práticas fora da escola,

que podem servir de subsídio para melhorar o trabalho do professor dentro da sala

de aula.

3.1 – O Facebook: caracterizando o corpus de análise

Neste item, apresentam-se as principais características do website de

redes sociais Facebook9, “criado no dia 4 de fevereiro de 2004 por Mark Zuckerberg,

Dustin Moskovitz e Chris Hughes, alunos da Universidade de Harvard” como uma

rede social que tem por objetivo, desde o seu surgimento, estabelecer um espaço no

ambiente virtual em que os sujeitos possam se relacionar, trocando mensagens e

imagens de forma simples e rápida com a finalidade primeira de entretenimento.

O Facebook é uma plataforma de comunicação online, uma “rede social”, como é caracterizada pelos média, que permite, segundo a página oficial, “comunicar e partilhar com as pessoas que fazem parte da tua vida” (www.facebook.com). O Facebook é um espaço virtual onde actores trocam informações, partilhadas por largos milhões de utilizadores, uma RSSC (redes sociais suportadas por computadores). Esta rede virtual de contactos é composta por várias aplicações, presentes numa página frontal, com apresentação apelativa e de fácil acesso (FONSECA, 2010, p. 4).

9 Ver site http://www.facebook.com

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A página inicial do Facebook, para quem quer participar da rede social

virtual de relacionamento, apresenta-se no seguinte formato:

Figura 1 – Facebook – página inicial Fonte: http://www.facebook.com

A homepage de entrada anuncia que o usuário pode conectar-se com

quem quiser e for importante para si, para compartilhar informações, desejos, enfim

o que quiser, influenciando e sendo influenciado pelos seus amigos. Tal fato parece

estar denotado na imagem que caracteriza o facebook na tela acima: uma rede de

sujeitos que se interligam e interagem mantendo contato com amigos e conhecidos

ou não e podem se expressar e serem ouvidos não só localmente, mas também

globalmente.

Inicialmente, a página inicial era acessível apenas a um público restrito,

os estudantes da própria Universidade de Harvard, de acordo com Santana (2011).

Já em 2005, o facebook passou por uma reestruturação e atualização por parte de

seus produtores, no intuito de torná-lo mais atrativo aos usuários, fazendo com que

os universitários passassem a interagir mais por meio da plataforma.

A rede social foi gradualmente expandindo-se ainda dentro do ambiente

acadêmico, entre o final de 2005 e o início de 2006, para outras universidades e

institutos superiores de educação norte-americanos e em diversas partes do globo,

chegando aos colégios de nível secundário.

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Tendo, a partir do final de 2006, seu acesso liberado ao compartilhamento

com empresas e demais usuários, hoje, o facebook encontra-se ao alcance de

qualquer internauta, estando disponível em qualquer parte do mundo, bastando que

o usuário tenha acesso à internet.

Segundo os mais recentes dados divulgados por Mark Zuckerberg,

fundador e CEO da empresa e publicados por Sbarai (2012) no site da revista Veja,

a rede social criada em 2004 alcançou, em março [2012], a marca de 901 milhões de usuários ativos (pessoas cadastradas que acessaram o serviço ao menos uma vez no mês) – um acréscimo de 41% em relação ao mesmo período de 2011 (680 milhões). O site se aproxima, assim, da marca de 1 bilhão de pessoas conectadas. O documento revela também que o número de cadastrados no Brasil cresceu 180% no último ano, maior crescimento registrado no período, chegando à marca de 45 milhões em março.

Figura 2 – Dados estimativa de número de usuários ativos por mês no facebook Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/vida-em-rede/facebook/facebook-tem-900 milhoes-de-usuarios-5-sao-brasileiros/

Ao acessar o endereço eletrônico www.facebook.com, os usuários criam

perfis com fotos, informações de interesses pessoais, profissionais, sociais, culturais,

ideológicos, religiosos, políticos e de entretenimento, e podem então localizar e

adicionar os amigos que farão parte de sua rede de contatos. Uma vez formada a

sua rede, pode trocar mensagens públicas e privadas com os demais usuários, tanto

individualmente como também com participantes de grupos de amigos.

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Quanto à privacidade, a visualização na íntegra dos dados constantes dos

perfis dos usuários pode estar restrita aos amigos aceitos pelo próprio usuário e

adicionados à sua rede de contatos ou aberta à visitação por qualquer outro membro

da rede se assim determinar o próprio usuário. Para a presente pesquisa, foram

utilizados os perfis de alunos com acesso à visitação desta professora pesquisadora.

A plataforma do facebook oferece diversas ferramentas e recursos que

podem ser utilizados pelos integrantes para se conectar aos demais usuários da

rede, conforme descritos a seguir.

No alto da página, estão dispostos, à esquerda, três ícones, geralmente

acompanhados de números, que sinalizam ao usuário a existência de novas

solicitações de amizade, mensagens e notificações por ele recebidas desde seu

último acesso. Na sequência, aparece uma caixa para pesquisa e localização de

amigos ou grupos. Mais à direita, surgem três guias referentes a diferentes páginas

criadas dentro do perfil: a primeira conduz o usuário ao seu próprio perfil; a segunda,

ao espaço de localização de amigos e a terceira, à página inicial. À direita da tela

encontra-se o espaço direcionado ao bate-papo, contendo uma relação de links com

fotos dos amigos e a sinalização de disponibilidade (on-line ou off-line) para

estabelecer conversas em tempo real.

A página de perfil, além dos dados anteriormente mencionados, contém

ainda os registros das atividades realizadas pelo sujeito internauta, sua rede de

amigos, e as postagens e compartilhamentos de mensagens por ele efetuadas. A

aba destinada à localização de amigos sugere uma listagem extensa de possíveis

conhecidos do usuário, com base nas listagens de amigos pertencentes às redes de

seus amigos já adicionados, e ainda diversos recursos para refinar sua busca e

facilitar a localização de novos amigos.

Já a página inicial constitui o espaço em que se encontram os principais

recursos disponíveis e utilizados pelos usuários. À esquerda, a barra lateral dispõe

diversos links divididos nas seções favoritos, aplicativos, grupos e amigos, conforme

figura 3. No centro da página, no alto, aparecem o espaço com a imagem do usuário

e uma caixa para publicação de mensagens; mais abaixo, o mural, espaço de

postagens e compartilhamento de mensagens entre os usuários. À direita,

informações sobre aniversariantes do dia pertencentes à rede do usuário,

informações de outros aplicativos por ele utilizados, sugestões de sujeitos que talvez

o usuário conheça e links de patrocinadores.

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Figura 3 – Barra lateral da página inicial de um pefil do facebook

Fonte: http://www.facebook.com/#!/

Os aplicativos do facebook permitem variadas interações: convite para

outros usuários, que ao serem aceitos são classificados como amigos do Facebook;

elaboração de um perfil com informações e preferências pessoais, profissionais,

sociais, culturais, ideológicas, religiosas, política e de entretenimento; permite

publicação de mensagens (comentários, comunicações verbais de vários tipos) e

imagens, vídeos e podcasts em um mural de caráter assíncrono, semelhante aos e-

mails, pois não se exige uma espera de resposta da outra parte, mas se tem a

certeza de que as mensagens são sempre entregues; chats que permitem

comunicação simultânea; espaço para postagem de notícias (Feed de Notícias) para

divulgação de eventos (Eventos), para a apresentação dos amigos linkados àquele

perfil (Amigos), para criação de anúncios (Patrocinado), para chamar a atenção de

outros usuários (Cutucadas); jogos (Citville, Birthdary Cards, Sinuca by Gazeus,

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Music Challenge etc) e outros aplicativos (Causes, Badoo, Daily Horoscope, My

Super Fans, Phrases).

Segundo Pavão e Sbarai (2011), em matéria intitulada “O que quer o

senhor das redes” publicada na Revista Veja de outubro de 2011, “o crescimento do

Facebook é alimentado por três desejos bem humanos: compartilhar informações,

influenciar semelhantes e manter-se informado (ainda que, ou especialmente,

acerca de trivialidades)”10. Assim sendo, esses autores concluem que “a ascensão

do facebook pode significar uma profunda transformação da internet – a passagem

definitiva da era das buscas para a era social”.

Hoje, grande parte dos sujeitos de todos os lugares com acesso à

internet dá vida ao Facebook ao publicar ali textos, imagens, vídeos e links que são

imediatamente consumidos por tantos outros. Ao fazê-lo, eles põem a rede à sua

disposição e a reinventam.

Diante do exposto, a presente pesquisa, elaborada a partir de um recorte

da rede social facebook, selecionou como corpus para análise treze perfis

discursivos de discentes do 9º ano de uma escola da rede pública estadual de

ensino da cidade de Franca (SP), localizada em uma região periférica da cidade, os

quais participam de um grupo de amigos no facebook da professora pesquisadora. A

escola e os sujeitos da pesquisa não serão identificados para preservação da

identidade dos participantes, bem como os e-textos analisados não apontam para

identificação de seus autores.

A escola participante deste trabalho é uma das integrantes do Projeto de

Pesquisa do Observatório da Educação, Edital 2010, intitulado “Linguagens, códigos

e tecnologias: práticas de ensino de leitura e de escrita na educação básica – ensino

fundamental e médio11”, a pesquisadora faz parte do corpo docente e é

coordenadora pedagógica do Ensino Fundamental.

10

Ver Revista Veja p. 95. 11

Projeto que tem como objetivo trabalhar com “as práticas de leitura e escrita em diversos suportes e “novas” linguagens. É por meio da aprendizagem e do domínio da língua e de procedimentos e práticas de leitura e de escrita que professores e alunos podem melhorar seu nível de compreensão, interpretação, participação e atuação na sociedade em geral, seja na vida pessoal, acadêmica ou profissional. Outro ponto importante que justifica o projeto em questão é o fato de ser um trabalho que tem por objetivo socializar os conhecimentos acadêmicos e científicos desenvolvidos nos projetos de seus professores/pesquisadores e orientandos e nas pesquisas do Mestrado em Linguística da Universidade de Franca, permitindo, assim, que as dissertações e seus resultados não fiquem apenas guardados em bancos de dados digitais ou em bibliotecas para serem consultados” (UNIFRAN, 2010). Ou seja, podem-se divulgar os estudos na área de leitura e escrita em todos os níveis, para que melhore o trabalho entre professores e alunos.

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É importante fazer uma breve descrição da escola em foco para que se

possa ter uma noção das condições estruturais, sociais e culturais que envolvem o

contexto escolar dos alunos. O corpo discente dessa escola é formado por 679

alunos do 6º ao 9º ano, na faixa etária de 11 a 15 anos, e 344 alunos cursando do 1º

ao 3º ano do Ensino Médio, na faixa etária de 15 a 17 anos. Ao que concerne a esta

pesquisa, cujo enfoque está pautado nas práticas discursivas, identitárias e de

leitura e escrita, e mais especificamente no ambiente virtual, é interessante observar

que a escola possui em sua infraestrutura biblioteca e um laboratório de informática

com treze computadores com acesso à internet. A disponibilidade de acesso, tanto

aos equipamentos quanto à internet, ainda é ínfima para o número de alunos.

Essa escola fica em um bairro periférico, na cidade de Franca, localizada

no nordeste do estado de São Paulo, com cerca de 320.000 habitantes, uma

população economicamente ativa, mas como em muitos municípios do país, ainda

há defasagens na área da saúde, segurança e educação. Pelo fato de a escola estar

inserida em uma região menos favorecida socioeconômica e culturalmente, há

algumas limitações de diversas ordens que acabam por contribuir para o

desfavorecimento do ambiente de ensino-aprendizagem, tais como problemas

decorrentes de violência, desemprego, transporte, saneamento básico, erosão,

presença de terrenos baldios que servem como depósitos de lixo e um aumento

significativo do consumo de drogas. Alguns outros fatores ainda dificultam o

desenvolvimento de atividades extraclasse, como a distância física de instituições e

órgãos como bancos, cartórios, agência dos correios, postos de saúde, escolas

particulares e clubes.

O nível socioeconômico-cultural dos alunos pode ser considerado limitado

e, por essa razão, o acesso à leitura de livros, jornais e revistas encontra-se restrito

ao ambiente escolar. Embora a escola tenha uma biblioteca cujos livros encontram-

se à disposição dos alunos, poucos são aqueles que se interessam pela prática da

leitura de forma convencional. No âmbito familiar, de modo geral, a difusão cultural

se faz por meio da televisão, forma de consumo de lazer e cultura acessível a

grande parte da população. O estímulo à leitura formal, dessa forma, está

distanciado do ambiente familiar e cultural. Observa-se ainda que os alunos, em sua

maioria, possuem diminuída autoestima, o que os leva à desistência escolar, uma

vez que não conseguem vislumbrar em seu futuro a continuação dos estudos, por

meio de um curso de graduação.

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Oportunamente, investigaram-se quantos dos alunos do 9º ano possuíam

acesso à internet e estavam vinculados ao website facebook. Tal verificação foi

realizada pela abordagem indireta. Para tanto, foram selecionadas as listas de

chamada de todas as turmas do 9º ano da referida escola dos anos de 2010-2011, e

pesquisados dentre os nomes dos alunos aqueles que possuíam homepage em seu

nome nessa rede social. Dado o nível cultural e socioeconômico descrito acima,

observou-se que poucos são os que possuíam acesso à internet. De um universo de

140 alunos do 9º ano dessa escola, foram encontrados apenas 13 perfis que

possuíam facebook. Dos treze sujeitos analisados, oito são do sexo feminino e cinco

do sexo masculino.

De forma geral, pode-se notar que os alunos apresentam muitas

dificuldades nas práticas de leitura e de escrita, o que pode ser comprovado pelo

resultado da avaliação apurado pelo Índice de Desenvolvimento da Educação do

Estado de São Paulo (IDESP), que foi, em 2011, de 2,98 para o ensino fundamental

e de 1,75 para o ensino médio.

Diante do exposto, importa a este estudo (re)conhecer quais práticas

discursivas, identitárias e de leitura e escrita, se fazem fora da escola, mais

especificamente no ambiente virtual da rede social facebook, mas que,

indiretamente, interferem no processo de ensino-aprendizagem dentro da escola.

3.2 Práticas discursivas, de leitura e de escrita em facebooks

A internet, esse novo meio de comunicação, veio revolucionar e

modificar a vida dos sujeitos no processo de leitura e de escrita. No início, restrita ao

meio acadêmico, mais tarde foi disponibilizada para os chamados usuários

domésticos e empresas. Assim, o texto virtual aparece como uma revolução no

mundo da escrita. Segundo Chartier (1999, p.12):

A inscrição do texto na tela cria uma distribuição, uma organização, uma estruturação do texto que não é de modo algum a mesma com a qual se defrontava o leitor em rolo da Antiguidade ou o leitor medieval, moderno e contemporâneo do livro manuscrito ou impresso, onde o texto é organizado a partir de sua estrutura em cadernos, folhas e páginas. O fluxo sequencial do texto na tela, a continuidade que lhe é dada, o fato de que suas

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fronteiras não são mais radicalmente visíveis, como no livro que encerra, no interior de sua encadernação ou de sua capa, o texto que ele carrega, a possibilidade para o leitor de embaralhar, de entrecruzar, de reunir textos que são inscritos na mesma memória eletrônica: todos esses traços indicam que a revolução do livro eletrônico é uma revolução nas estruturas do suporte material do escrito, assim como nas maneiras de ler.

Diante dessa perspectiva, no texto eletrônico, de acordo com reflexão em

capítulo anterior, autor e leitor passam a ocupar o mesmo espaço de leitura e

escrita, surgindo o então denominado escrileitor – ou seja, aquele que, além de ser

espectador, torna-se um produtor de informação e conhecimento, cujas publicações

se dão na web, nos mais variados espaços – sites especializados, blogs pessoais,

redes sociais. Enfim, na tela do computador, o espaço de escrita e leitura

aparentemente restringe-se ao computador, porém, é permitido ao usuário acessar

mais de uma página da internet simultaneamente, o que amplia não só o acesso no

ambiente virtual, como também a interação entre os textos.

De acordo com Chartier (1998), antes o espaço de escrita no rolo de

papiro ou pergaminho não permitia retomadas, interpelações ou alterações no texto,

o escrileitor adquire total liberdade para construir seu texto, fazer retomadas,

avanços, correções, inclusões, dando estrutura e conferindo novos sentidos aos

textos que manipula. Dessa forma, a internet instala mudanças não só na

comunicação como também nas condições de leitura e escrita, que trazem à tona o

surgimento desse leitor que também se torna autor.

Nesse intrincado processo, observa-se, segundo Foucault (1992), que o

papel do autor remete a uma das possíveis figurações do eu. Ao falar de si, cada

sujeito é autor da sua própria “fala”. No espaço virtual de sites de comunicação há

muitos usuários criando seus perfis (individuais), como também as comunidades

(organizadas em grupo), assim o sujeito se (re)constrói como sujeito por meio de

suas práticas discursivas, uma vez que a virtualidade pode projetar situações reais

ou imaginárias. Todavia, cabe aqui ressaltar que o impacto identitário das novas

tecnologias de socialização ainda é pouco conhecido.

Nesse contexto, é possível observar que o sujeito do século XXI tem uma

ânsia pelo encontro com o seu próprio “eu”, em busca de identificar-se na sociedade

em que vive, como, por exemplo, encontrar seu próprio espaço de experiência e

comunicação, uma vez que nem todos em uma sociedade são iguais. Observando-

se essa diversidade e a necessidade de convivência, intercâmbio e comunicação

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entre os sujeitos, faz sentido se destacar o pensamento de Hall (2002, p. 12),

segundo o qual “o sujeito [...] não tem uma identidade fixa, essencial ou

permanente”. Ele se modifica por meio do contato com o mundo exterior, carregado

de diferentes discursos.

Por isso o sujeito se fragmenta, compartilhando distintos focos de

atenção, passando a ser confrontado por uma multiplicidade desconcertante de

identidades possíveis, com cada uma das quais pode identificar-se

temporariamente. Assim, ainda de acordo com Soares e Barros (2007), o sujeito é

social, pois concretiza uma enunciação em determinado tempo e espaço em que se

encontra inserido.

As redes sociais, ambiente de extensa atuação por parte dos sujeitos

sociais, tornaram-se expoentes na internet a partir do ano de 2010, ao serem

adotadas como ferramentas de comunicação por diversos segmentos – empresas,

sujeitos públicos, anônimos. Por essa razão, frente ao oceano de possibilidades

oferecidas pela internet, nesta investigação, recortou-se a rede social do Facebook

para entender as práticas de leitura e escrita ali presentes.

Ao observar as práticas de leitura e de escrita dos sujeitos pesquisados

pode-se também ter acesso às práticas discursivas e identitárias que circulam no

ambiente virtual do grupo, consequentemente, tem-se uma noção de como as

práticas discursivas e identitárias constroem o sujeito adolescente dessa escola

participante da pesquisa.

Segundo Foucault (2000), o sujeito se constitui durante as práticas

discursivas, ou seja, ele é sempre resultado de uma prática. Portanto, esse resultado

da constituição do sujeito não é aleatório, mas é feito por meio de contatos

estabelecidos em um grupo social, inserido em uma determinada conjuntura

histórica, social, econômica e discursiva, que dita regras, modos de dizer, de pensar

e de ser.

Ao se observar a rede social facebook como um espaço virtual de troca e

compartilhamento de informações entre milhões de usuários, torna-se possível

analisar e identificar as diversas práticas discursivas que ali se fazem, tais como os

modos de dizer, de pensar e de ser de um dado grupo social, e como tudo isso

constrói o modo como esses sujeitos leem e interpretam o mundo onde vivem e

também como expressam isso por meio de sua escrita.

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Podem-se observar as representações sociais dos sujeitos no intuito de

reforçar ideias ou resistir a elas, ou ainda contrapô-las entre outras. A leitura e a

escrita, a partir da perspectiva discursiva, podem então ser percebidas como

práticas socioculturais inseridas nas relações de poder da sociedade. Pêcheux

(2007) e Foucault (2009-2010) corroboram esse entendimento ao afirmar que as

práticas discursivas e, consequentemente, de leitura e de escrita são partes dos

processos de instauração do(s) sentido(s) determinado(s) histórica, ideologicamente

e pelas relações de saber/poder.

Nas diversas práticas de leitura e de escrita presentes na sociedade, os

sujeitos e os sentidos se constituem simultaneamente, num mesmo processo, o qual

se configura de formas muito diferentes, dependendo da relação (distância maior ou

menor) que se estabelece entre o leitor virtual e o real. Portanto, a leitura e a escrita,

na perspectiva discursiva, constituem um processo, pois levam em consideração as

condições de sua produção, sendo necessário ler, interpretar e adquirir

conhecimento para só então se produzir um texto, observando as posições histórica

e socialmente definidas de cada interlocutor. Orlandi (2008) argumenta que se

devem observar também as relações de saber/poder, bem como a “incompletude”.

A utilização das novas tecnologias de informação e comunicação (NTICs)

como ferramenta para as práticas escolares em qualquer nível de ensino pode

proporcionar uma contribuição, mais um instrumento para o desenvolvimento das

práticas de ensino-aprendizagem. Porém, percebe-se um descompasso entre o

discurso acadêmico e o discurso do senso comum nesse sentido, em que o primeiro

tende a ser reforçado por olhares prescritivistas sobre as práticas discursivas,

quando nos referimos ao ambiente da internet. Por outro lado, o discurso que

alcança e impressiona o senso comum é o discurso alarmista, que chama a atenção

para o pretenso dano que certos usos da linguagem na internet acarretariam sobre a

escrita de adolescentes e jovens em contextos formais.

O discurso acadêmico, mesmo estando embasado em resultados obtidos

por meio de pesquisas científicas, não conseguiu ainda alterar essa realidade,

alimentada até mesmo por muitos professores de língua portuguesa. O referido

discurso alarmista, viabilizado pelas diferentes formas de mídia, gerou um termo

específico, o “internetês”, para designar as práticas de linguagem em voga em chats,

blogs e fóruns de discussão.

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O que podemos ressaltar é que não é possível utilizar uma rede social, ou

a própria internet, num âmbito geral, sem que seja necessária a aplicação das

habilidades de leitura e compreensão, para que se possibilite a prática da escrita.

Para Marcuschi (2004), em relação aos recursos hipermidiáticos e multissemióticos,

a internet se configura antes de tudo como espaço privilegiado para práticas de

escrita e de leitura.

Orlandi (2001) aponta que o texto é um local privilegiado de escrita dos

processos discursivos que não se iniciam nem se encerram nele. A porta de entrada

material para se vislumbrar a maneira como o discurso se filia a uma memória do

dizer e, portanto, é também o lugar de onde se podem observar as práticas

discursivas e identitárias. Como aponta a autora:

Uma vez atingido [por meio da análise] o processo discursivo, que é o que faz o texto significar o texto, ou os textos particulares analisados desaparecem como referências específicas para dar lugar à compreensão de todo um processo discursivo do qual eles – e outros que nem mesmo conhecemos – são parte. Não são pois só aqueles textos os responsáveis pelos processos de significação que se atinge, e eles não estão tampouco relacionados só aos processos que eram objeto de sua análise. Eles são matéria provisória da análise (ORLANDI, 2001, p. 89).

Sendo assim, justamente por ser matéria provisória da análise é que se

utiliza o texto/discurso virtual para desenvolver esse papel, pois seu caráter

provisório se acentua pelo fato de estar sujeito a modificações e interferências de

uma forma mais ágil e intensa do que aquela sofrida por um texto/discurso formal

(impresso). A internet, dessa forma, surge como ambiente privilegiado de difusão

desse tipo de material por promover um espaço permanentemente aberto e

disponível a essa finalidade.

A rede social facebook configura-se nesse status e atua como um

importante instrumento de infinitas possibilidades para envio, encaminhamento e

troca de mensagens, a qualquer momento, bastando que o sujeito tenha acesso à

internet. Quando se trocam mensagens pelo facebook não é necessário que haja a

resposta imediatamente, como em uma interação verbal com perguntas e respostas.

Ou seja, o discurso acontece, há troca de informações, porém respeita-se o tempo

dos interlocutores, que podem tanto dialogar a partir de momentos distintos como

interagir instantaneamente.

Essa forma de comunicação oferece ainda a possibilidade da não

obrigatoriedade de resposta às mensagens ou comentários enviados ou postados

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por meio da rede. Uma vez que nem todos os textos/discursos postados têm

propósitos específicos, podem ou não ser respondidos, curtidos, ignorados e até

mesmo deletados.

Por meio das postagens efetuadas, dos compartilhamentos de

informações e das preferências manifestadas, os usuários da rede social facebook

vão construindo uma identidade com a qual atuam no ambiente virtual e elaborando

perfis identitários daqueles com quem interagem. A esse respeito:

O actor, quando confrontado com o quadro de interacção (o Facebook), opera uma construção identitária tendo como ferramentas as aplicações do Facebook. Efectua comentários a fotos e afirmações, cria discussões, publica vídeos e músicas. Neste patamar de comunicação, a rotatividade de papéis é intensa, pois o actor que opera um determinado desempenho sob a forma de publicação para uma audiência transforma-se numa questão de segundos em audiência de um outro desempenho (FONSECA, 2010, p. 65)

A comunicação torna-se tão direta e intensa que os usuários se referem

uns aos outros como se conhecessem o estilo de cada um, os temas preferidos,

voltando-se para um discurso do cotidiano, indiferente e passageiro. Formulam e

reformulam os enunciados instaurando a repetibilidade, assim as mensagens se

lançam sucessivamente para manter atualizada a rotina de todos os envolvidos no

processo de interação.

Ao se efetuar a análise dos perfis selecionados para essa pesquisa,

detectou-se a presença de diversos tipos de discurso, os quais, além de se

interligarem, marcam as práticas discursivas dos usuários analisados que vão desde

o humor12 à informação e à reflexão.

Observou-se que a partir da página destinada à publicação do perfil dos

usuários do facebook, contendo as informações e preferências pessoais, inicia-se o

processo de identificação com temas, músicas, livros, esporte e outros, tanto do

próprio usuário como com aquele que é ou tornar-se-á um possível novo amigo

virtual.

As práticas discursivas que se estabelecem nesses perfis se traduzem por

meio de uma escrita sintética, com uso de termos genéricos, principalmente por

substantivos próprios que nomeiam bandas, livros e outros, e que expressam gostos

e preferências. Em dois dos treze perfis analisados tem-se as seguintes escritas

12

Humor (ô) sm. 1. Fisiol. Substância orgânica líquida ou semilíquida. 2. Disposição de espírito. 3. Veia cômica; espírito, graça. 4. Capacidade de perceber ou expressar o que é cômico ou divertido. (FERREIRA, 2000, p. 369). No contexto acima é utilizado com o significado de ‘disposição de espírito / capacidade de perceber ou expressar o que é divertido’

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sintéticas, no perfil 3: “Saudade de vc13!!!” / “Vo volta logo14” / “te adooro seu

lindooo15!”; no perfil 10: “ano que vem si Deus quise vo ta dano rolezin16 de hornet17!

/ “galera desculpasss eu nem vi os parabens aq no face, amo vcs18”. Percebe-se,

por meio desses dois exemplos, que tanto o público feminino quanto o masculino

abreviam as palavras quando consideram necessário, e prolongam outras, as quais,

aparentemente, têm mais importância, no caso de “adooro”, “lindooo” e

“desculpasss”. Essas frases representam momentos em que os usuários da rede

social facebook dialogam com os amigos e contam o que lhes acontece. No perfil 3,

o sujeito fala da saudade de alguém, sobre o seu breve retorno e sobre gostar de

alguém; já no perfil 10, o sujeito exterioriza a vontade de poder dirigir uma

motocicleta, e faz um pedido de desculpas aos amigos virtuais por não ter visto as

felicitações de aniversário. Assim, observa-se que os usuários do facebook mantêm

diálogo com os amigos e não se preocupam com a escrita correta, apenas em

transmitir a mensagem.

Abaixo, apresenta-se um quadro com características divulgadas pelos

próprios sujeitos nos treze “perfis” do facebook analisados para a composição deste

trabalho.

Quadro 1 – Dados coletados dos perfis analisados

Perfil Analisado

Esportes Filmes Jogos Livros Músicas Televisão (programas)

1 – Feminino

Amanhecer, Eclipse, Lua Nova, Crepúsculo

Resident Evil, The Sims

Adele, Evanescence, Bob Marley, Michael Jackson, Demi Lovato

Rebelde, Pânico na TV

2 – Feminino

Par Perfeito, qual é seu número? Amizade Colorida, Sexo sem Compromisso

Ivete Sangalo, Katy Perry, Black Eye Peas, Beyoncé, Riahna

Multishow, Pânico na TV, Piadas Fall, Tele Cine Pipoca

3 – Reino dos Percy Geral Rindo no

13

Vc = você 14

Vo volta logo = Vou voltar logo 15

Te adooro seu lindooo = Adoro você, seu lindo 16

Ano que vem si Deus quise vo ta dano rolezin de Hornet = Ano que vem, se Deus quiser vou estar dando uma volta de Hornet 17

Hornet: uma motocicleta da marca Honda, referência CB 600. 18

Galera desculpasss eu nem vi os paraben aq no face = Galera, desculpas, eu não vi os parabéns aqui no facebook

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52

Feminino Jogos online

XoX Jogos

Jackson Curtindo, Alex Ty, Indireta

Face

4 – Feminino

Ludimila Feber nunca pare de lutar

19

5 – Feminino

Atleta Ricardo Kaká

Eclipse, Amizade Colorida, Crepúsculo

Mário Kart Wii, Counter Strike, God of War III, Uno

Lua Nova

Jorge e Matheus, Katy Pery, Jonas Brothers, Adele, Bruno Mars, Linkin Park, Pitty, Capital Inicial, Lifehouse, Slipknot, David Guetta, Beyoncé, Black Eyed Peas, Lady Gaga, Rihanna

Comédia MTV, Glee, The Vampires Diaries, Os feiticeiros Warverly Place

6 – Feminino

Reino dos jogos online

LoL Banda Gallos, Meu mundo Girou, Geral Curtindo

Rindo no Face

7 – Feminino

Adele, Charlie Brown Jr, Panic! At The Disco, Capital Inicial, The Beatles, Aerosmith, Red Hot Chili Peppers, Scorpions, Metallica, Pink Floyd, Queen, Nirvana, Alice in Chains, Nickelback, Jack Johnson, Kings of Leon, Legião Urbana, Lifehouse, Bon Jovi, Engenheiros do Hawaii, Foo Fighters, System of a Down

Multishow, Pra toda mulher

20

8- Feminino Capitain Jack Sparrow,

Melhores do Face,

Geral Curtindo,

19

Música religiosa – Gospel ou Evangélica. Ver http://www.youtube.com/watch?v=9_s8YYxEpaQ 20

Ver http://www.facebook.com/#!/PraTodaMulher, canal youtube http://www.facebook.com/#!/PraTodaMulher

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Crepúsculo, Pirates of the Caribbean, Frases marcantes

Não Mesmo, Percy Jackson

Indireta, Jorge e Matheus

9 – Masculino

Futebol de Salão, Futebol – Atletas (Cristiano Ronaldo, Luís Fabiano, Leo Messi)

Todo mundo em pânico

GTA Asking Alexandria

FC Banda Gallos

Meu mundo girou

Michel Teló

Esporte Interativo, Legendários (oficial), Pânico na TV

10 – Masculino

Futebol American Pie, Ghost Rider, Diários de Motocicleta

God of war, Dante’s Inferno, fear 2

Ghost Rider

Evanescence, Sepultura, Asking Alexandria, U2, Iron Maiden

CSI, The Listener, Prison Break, Lie to me, The Simpsons

11 – Masculino

The Simpsons, Se beber não case, Lords of dog Town, Deck Dog, The Walking Dead

Resident Evil, God of war, Pro evolution soccer brasil

Harry Potter

Charlie Brown Jr, Acústico MTV – Legião Urbana, FC Banda Gallos Meu mundo Girou

Legendários (oficial), Comédia MTV, Pânico na TV, CQC, Quinta Categoria

12 – Masculino

Futebol –

Atletas (Cristiano Ronaldo, Boleiro Diz, Neimar

Ctyville (Português)

Breezing Lizards

Esporte Interativo, Legendários (oficial),

13 – Masculino

Time São Paulo FC

Doom, American Pie, Ghost Raider, Diários de Motocicleta

God of War, Dante’s Inferno, Fear 2, Doom 3, World of Warcraft

Ghost Rider

Evanescence, Sepultura, System of a Down, Asking Alexandria, Kills witch Engage, Dimmu

CSI: Miami, The Listener, Prison Break, Lie to me, The Simpsons, Dois homens e meio

Todas essas características remetem a determinados discursos

vivenciados pelos adolescentes sujeitos de pesquisa. Esses discursos serão

abordados após uma breve contextualização de alguns termos utilizados por eles e

citados no quadro acima.

Entre os livros citados tem-se: a) Percy Jackson é personagem da saga

Percy Jackson & the Olympians escrita por Rick Riordan. Gênero aventura, mistura

de mitologia, semideuses na aventura do personagem em resolver problemas

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cotidianos que envolvem os adolescentes, tais como aqueles com baixa autoestima,

dislexia, hiperatividade, bulling e outros21; b) LoL não se refere a um livro, embora o

sujeito tenha classificado em suas preferências como livro de leitura preferida.

Lolando LoL é uma página de humor que se caracteriza no alto da homepage com o

seguinte enunciado: “Isto é uma página de humor portanto todo conteúdo presente,

está aqui somente para proporcionar alegria e jamais discriminar alguém.”22; c)

Ghost Rider, livro de relatos de viagem e aventura escrito por Neil Peart, além de

escritor, motociclista, é também baterista da Banda de Rock canadense Rush23; d)

Páginas de humor são indicadas como livros: Melhores do Face24 e Não Mesmo25,

como se nota no perfil 8.

Os sujeitos citam músicas dos mais diversos estilos, entre estes, o estilo

Gospel, religioso26, aparece em um perfil, o que mostra que mesmo acessando sites

de redes sociais, prevalece um pouco da cultura própria. Quando fazem referência a

filmes, um dos perfis analisados indica o link ‘Frases marcantes’, uma página do

próprio site facebook, que divulga frases marcantes de filmes, músicas e seriados27.

Nota-se, diante do quadro e da justificativa para alguns nomes de filmes,

vídeos, músicas citados pelos perfis que, embora os usuários exponham escolhas

individuais e opções sobre aquilo que pessoalmente desejam tornar público, há uma

semelhança nas informações relatadas, ou seja, o caráter de pertencimento ao

grupo evidencia as características preferenciais próprias da faixa etária que

representam, não obstante a presença da individualidade. Assim, é possível dizer

que ‘os usuários se limitam a agregar aos perfis apenas informações que

consideram interessantes aos olhos dos demais usuários da rede, aquilo que lhes

conferiria um caráter de pertencimento a um grupo.’28

21

Ver http://pt.wikipedia.org/wiki/Percy_Jackson. 22

Ver http://www.facebook.com/#!/lolandolol . 23

Ver: http://www.viagemdemoto.com/index.php?option=com_content&view=article&id=157:viagem-de-moto-neil-peart-rush-livro&catid=121:livros&Itemid=321; http://forum.batera.com.br/forum_posts.asp?TID=58113&title=livro-ghost-rider-do-neil-peart; http://marriedinny.blogspot.com.br/2005/08/comecei-ler-ghost-rider-estou.html; http://www.ipadiponeipod.com/ghost-rider-o-melhor-livro-comic-sempre-MTI4NTMx.html, ) 24

Ver http://www.facebook.com/gabrielle.moreira.92/favorites?ref=ts#!/MelhoresDoFace 25

Ver http://www.facebook.com/gabrielle.moreira.92?ref=ts#!/naomesmo 26

Feber nunca pare de lutar - Música religiosa – Gospel ou Evangélica. Ver http://www.youtube.com/watch?v=9_s8YYxEpaQ 27

Ver http://www.facebook.com/gabrielle.moreira.92?ref=ts#!/FraseMarcante 28

Hipótese criada pela autora, baseada na relação de que nem sempre são expostas as informações completas, mas apenas o que há de comum para todos os perfis analisados na rede social facebook para o desenvolvimento deste trabalho.

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Considera-se, neste exame, que o usuário, ao adentrar no perfil de seu

amigo virtual para verificar o que este tem como preferência, está praticando uma

leitura utilitária, informativa e de entretenimento que pode criar diversos efeitos de

sentido, dentre eles o de identificação com aquilo que se lê e se escreve.

A prática de leitura e escrita virtuais presentes nos perfis exige

habilidades de seu escrileitor na medida em que este precisa saber sintetizar e

organizar as informações de forma a construir uma determinada representação de si

para outro que o vê e o lê.

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

Pressupõe-se que sujeitos ou grupos sociais que dominam o uso dessa

leitura e da escrita virtuais, possuem habilidades e atitudes necessárias para uma

participação ativa e competente em situações em que práticas de leitura e/ou de

escrita virtuais têm uma função essencial, qual seja a de manter com os outros e

com o mundo que os cerca formas de interação, atitudes e simulacros de um sujeito

que se filia a determinados modos de pensar, agir e ser dentro da sociedade. Tal

fato constrói um marketing individual e pode tornar aquele usuário mais visível e

importante aos olhos de seu grupo social, o que para esses adolescentes pode criar

o efeito de poder e saber sobre os outros, com isso o sujeito pode sentir-se

importante e apreciado por seu grupo de amigos.

Desse modo, observa-se, por exemplo, que os únicos perfis que

divulgaram preferências esportivas optaram pelo futebol e são do sexo masculino,

apenas um perfil do sexo feminino colocou em esportes a preferência por um

jogador no caso Kaká.

É sabido que o futebol para os brasileiros é muito mais que um esporte,

um entretenimento ou hobby, tornou-se parte da cultura do país. No imaginário

masculino o futebol, além de esporte é profissionalização. Tornar-se um jogador de

um time importante leva muitos rapazes na faixa-etária dos 07 aos 15 anos,

principalmente, os de camadas menos favorecidas da população, é um dos sonhos

a ser realizado. Em grande maioria são acompanhados e incentivados pelos

próprios pais (como exemplo pode-se citar o jogador Neymar) a terem como foco a

dedicação a esse esporte como um meio de tornar-se um profissional famoso,

participar de times importantes e conquistar riqueza, mulheres e uma vida

diferenciada da maioria.

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Ao se fazer uma busca no Google sobre “a presença do futebol na vida do

brasileiro” encontram-se diversos textos que confirmam que esse esporte é

presença vital na vida de muitos brasileiros, pois muitos jogadores tornam-se

modelos de comportamento, de modo de pensar, de dizer e de agir para muitos

brasileiros, especialmente, para adolescentes.

Mostra disso são as coreografias realizadas pelo jogador Neymar a cada

jogo, que após fazê-las são copiadas pelos fãs, além disso, a música e o cantor

passam a ser hit de sucesso e de destaque nas diversas mídias.

Para exemplificar esta reflexão e o discurso produzido pelo brasileiro

sobre a importância do futebol em suas vidas, recortou-se da busca no Google sobre

“a presença do futebol na vida do brasileiro”, o seguinte enunciado29:

Em nossa vida também somos artilheiros, outras vezes ficamos na defesa e em outras tantas, assumimos a posição de goleiros para que o adversário não nos atinja. Muitas vezes a bola entra na rede e não conseguimos ficar imune à ação do inimigo, mas a verdade é que a luta faz parte da vida e viver é ganhar, mas também, com a cabeça erguida e com dignidade, saber perder. Assim como no jogo, cada um de nós também tem uma torcida, a nossa família e amigos que vibram com nossos gols e nos apoiam quando perdemos a partida. A Copa é de quatro em quatro anos, mas a vida é diária e sempre há tempo de recomeçar, de jogar de novo, de ouvir o técnico experiente (representado na figura de nossos pais ou avós), ainda que, nossa luta não seja reconhecida, nem aplaudida e que nossos gols, muitas vezes passem despercebidos. Os exemplos dos jogadores, sobretudo pela superação em cada jogo de seus próprios limites, é algo a ser seguido como bússola para nossa existência. O futebol também nos proporciona a visão do trabalho em equipe, pois ninguém é capaz de fazer o gol sozinho, sem um passe certo de bola e na vida também é assim, pois precisamos uns dos outros. O importante é que acreditemos, assim como Ronaldo, em nosso potencial e talento e não nos intimidemos com as críticas ferozes de nossos adversários, pois só assim poderemos fazer uma grande diferença no mundo e para aqueles que nos amam, apóiam e admiram (CABRAL, 2006, p.1).

A prática discursiva assumida acerca do futebol é de que o esporte é

como a vida, ambos funcionam a partir de um jogo que testa a todos os instantes os

limites, é competição feroz que quando vencida tem como prêmio o reconhecimento

e torna-se motivo de alegria, pois farão parte de um rol de pessoas diferenciadas

que conseguem poder e fama e em contrapartida serão amados, apoiados e

admirados por seus familiares e, consequentemente, pelos amantes do futebol

também.

29

Ver http://gramadosite.com.br/cgi/cultura/cassiano/id:8320/xcoluna:1/leiapage:1

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57

Por outro lado, tal prática discursiva é levada as últimas consequências

por muitos brasileiros, que se tornam fanáticos e agressivos provocando brigas,

desentendimentos e até mortes, como se pode ver nas páginas dos jornais

frequentemente.

Os jogadores de futebol também fazem parte do universo feminino de

adolescentes brasileiras. É possível ver na mídia notícias das mulheres e

namoradas dos jogadores que acabam por ficar em destaque e ganhar status por

ser a companheira de determinado jogador. Há diversos sites tanto brasileiros

quantos estrangeiros que publicam matérias sobre as mulheres e namoradas de

jogadores de futebol, são conhecidas como WAGs (Wifes and girlfriends).

Diante do exposto, 05 perfis dos 13 colocam o futebol como destaque de

preferência, e um perfil feminino um jogador de futebol, ou seja, 6 perfis citam o

futebol. Tal fato pode servir de subsídio ao professor na medida em que tem esta

leitura como indicação de um possível mote para redação, reflexão sobre a

importância do futebol na vida do brasileiro. Dessas reflexões e debates podem

surgir várias formas de expressão da opinião dos mesmos sobre o assunto, pode

explorar desde a feitura de memes, história em quadrinhos, charges, artigos de

opinião entre outros.

Quanto aos filmes, assim como nas músicas, há uma preferência pelas

produções de origem estrangeira, com exceção de alguns perfis que citam nomes de

cantores brasileiros como Ivete Sangalo, Jorge e Matheus, Michel Teló, Charlie

Brown Jr., Legião Urbana, Capital Inicial, estes junto com os demais citam bandas e

grupos que cantam em inglês. Tal escolha revela uma possível necessidade de

demonstrar interesse e conhecimento de uma realidade diversa à nacional, o que

atribuiria ao usuário um caráter de maior alcance cultural.

Por meio da prática discursiva efetuada ao demonstrar o gosto musical,

observa-se, além da preferência por gêneros, que a escolha das letras e melodias

revela a expressão do modo de ver a vida, de comportar-se socialmente etc. Dessa

forma, notam-se as relações de saber/poder que se fazem presentes e o imaginário

que se constrói nesses adolescentes que estão em fase de construção de si

mesmos e de sua formação acadêmica fundamental.

Mesmo que o mundo que eles prefiram seja o estrangeiro, já que a

influência deles sobre os brasileiros, principalmente jovens, é exorbitante, o

educador de inglês, por exemplo, pode trabalhar o vocabulário, já o de português

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pode trazer a tradução e trabalhar com a interpretação. Nota-se com isso, que o que

está faltando ao educador, é conhecer mais o mundo virtual vivido pelos

adolescentes fora da escola.

A escolha dos jogos citados Resident Evil e GTA representa o interesse

pela ação. Já a opção pelo The Sims revela a necessidade de vivenciar a

experiência de habitar um mundo diferente do seu. No caso do Pro Evolution Soccer

Brasil está nítido o interesse pelo esporte. Assim, os adolescentes revelam aquilo

com o que se identificam, ou melhor, como visualizam a vida.

Quando se faz referência aos programas de televisão, nota-se uma

preferência por humor e comédia, seja por meio de piadas ou de um desenho. Isto é,

há uma necessidade de se encontrar e interagir por meio de formas de diversão, rir,

gargalhar, compartilhar momentos de alegria, em que a cultura, o conhecimento são

transmitidos de forma diferente do convencional. Como exemplo, foi citado o

programa CQC, que apresenta críticas através do humor; Quinta Categoria, em que,

baseadas em diversos temas sugeridos, são realizadas ações e falas de improviso;

Pânico na TV, que apresenta paródias e intervenções lúdicas envolvendo

personalidades de destaque nos meios artístico, esportivo, político entre outros;

Legendários, um programa que trata de assuntos ecológicos, políticos e variados,

também através do humor.

Assim, nota-se que quando se adentra o universo da leitura, percebe-se

um vácuo. A resistência ao assunto revela-se pelo fato de apenas dois dos treze

perfis trazerem informações de preferência por algum tipo de leitura impressa. Tal

expressão pode demonstrar falta de interesse pelos conhecimentos alheios ao

mundo virtual, denotando a falta de contato com as práticas de leitura

sistematizadas na escola, tais como os livros literários, filosóficos ou didáticos, ou

até mesmo uma certa “inibição” por parte dos demais usuários em demonstrar

conhecimento distinto, uma vez que necessitam exercitar o pertencimento ao grupo

e que, como menciona Possenti (2004), para um discurso acontecer, necessitamos

do outro:

O outro é o que faz sistematicamente falta a um discurso e lhe permite fechar-se em um todo. É aquela parte de sentido que foi necessário que o discurso sacrificasse para constituir sua identidade – e cujos elementos nunca são tomados, ou retomados a não ser como simulacros (POSSENTI, 2004, p.384).

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Assim, percebe-se o quanto o discurso da identificação é importante para

esses usuários, eles dependem do outro para constituir seu mundo, seu modo de

agir, e dessa forma publicam apenas o que lhes convém mediante a

sociedade/comunidade em que estão inseridos. Sociedade essa que vive em

constante processo de transformação, em que adolescentes de 14 anos optam por

vincular-se a um mundo exterior ao seu, pessoal ou culturalmente, seja por meio da

escolha pelas letras musicais e pelos filmes estrangeiros, e até mesmo pelos

programas de humor, instâncias de representação avessa, muitas vezes, à realidade

experimentada pelos adolescentes. Portanto, se esse mundo exterior é levado para

o cotidiano – a escola – ele passa a fazer mais sentido, e começa a não ter

vergonha de expor o que pensa, pois se tudo é dado a todos em horário comum,

não há necessidade de se inibir e assim a formação do sujeito passa a ser mais

completa, contando tanto sua vontade como a vontade do outro que o cerca.

Para entender melhor, o discurso veiculado por esses adolescentes,

realizamos uma pequena classificação dos discursos utilizados pelos treze usuários

do facebook analisados.

a) Discurso romântico

Ao voltar à reflexão acerca das escolhas das canções citadas como

preferências nos perfis analisados, podemos observar que as músicas traduzem a

expressão do modo de ver a vida e de se comportar socialmente eleitos pelos

sujeitos, uma vez que carregam um discurso prescritivo, que direciona o ouvinte a

pensar e agir de determinada forma em certas situações.

Tomemos por exemplo a música Oceans, de Evanescence, cuja

tradução30 revela o pedido de ajuda para conter o sofrimento amoroso, ou seja, tem-

se um discurso aos moldes da literatura romântica. O enunciador quer ter forças

para dizer adeus, sofre por isso:

Oceans (Original letras.mus.br)

Cross the oceans in my mind

Find the strength to say goodbye

Everything that we believed in was a lie

30

Ver site letras.mus.br - http://letras.terra.com.br/evanescence/1952913/traducao.html

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[…]

And we never learn

So we fall down again

Heaven help me find a way to dream within this nightmare

Oceanos (Tradução letras.mus.br)

Atravessar os oceanos em minha mente Buscando a força para dizer adeus Tudo o que nós acreditávamos era mentira

[...]

Nós nunca soubemos Então, caímos de novo Ajude-me, ajude-me a encontrar uma forma de vencer este pesadelo

Assim, para um adolescente que pode estar vivenciando um momento de

término de uma paixão e precisa encontrar um apoio para essa necessidade de se

elaborar e aprender a equilibrar-se diante das novas experiências emocionais que

vivencia, nesse caso uma necessidade de se adaptar a rompimentos e despedidas

em um relacionamento, a letra dessa música pode produzir uma identificação com a

questão de se desvincular de um sentimento ou de alguém.

Na música A lesson never learned31, de Askia Alexandria, outro exemplo

citado, representa um pedido de ajuda e de reflexão sobre o que é puro ou impuro. A

canção apresenta um pedido de socorro, uma voz de alguém que precisa descobrir

o que é certo ou errado, tem-se também aqui uma prática discursiva aos moldes do

romantismo:

A lesson never learned (Original letras.mus.br))

Please, you have to help me

This is not my true face

If you could see my soul,

As I have seen my soul

I could show it to you

It's rotten

It's poison

Help me please

[…]

Hear me now

31

Ver site letras.mus.br - http://letras.terra.com.br/asking-alexandria/1864611/traducao.html

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Get off your knees

Nothing changes when you pray

I'm the closest thing to a god you'll ever know

Get of your knees

Uma lição jamais aprendida (Tradução letras.mus.br))

Por favor, você tem que me ajudar

Este não é meu verdadeiro eu

Se você pudesse ver minha alma,

Assim como eu a vi

Eu poderia te mostrar

É podre,

É venenosa

Me ajude por favor

[...]

Ouça-me agora

Não fique de joelhos

Nada irá mudar quando você rezar

Eu sou a coisa mais próxima de deus, você nunca irá saber

Não fique de joelhos

Nota-se então que, além de informar e se informar, se identificar, o

adolescente que transita nesse ambiente virtual pede ajuda, busca respostas, e

direcionamento nas diversas questões que envolvem sua existência, pois apoio é -

lhe necessário obter e ofertar conhecimento e também alcançar o reconhecimento

de seu pares, demonstrar aos demais seu envolvimento cultural e social, por meio

da difusão de informações, seja de seu país, do mundo, com relação a músicas,

filmes, livros entre outros. Assim esse adolescente acaba por buscar uma

autoafirmação de sua própria existência.

As músicas aqui comentadas poderiam servir de subsídio para o trabalho

com a poesia em sala de aula, partir de textos musicais que são apreciados pelos

adolescentes e ensiná-los a interpretar poesias que embora sejam de outro gênero o

conteúdo exprime o sofrimento amoroso, que em cada época a forma de expressão

dos sentimentos se dá maneira diferente.

b) Discurso da autoafirmação

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A prática discursiva da autoafirmação se encontra nos perfis analisados

através de postagens que definem os usuários de forma mais clara e profunda do

que é permitido apreender das informações que acrescem aos seus perfis pessoais.

Essas postagens, usualmente feitas pelos próprios usuários, ou

compartilhadas a partir de postagens de seus amigos, reafirmam a identidade dos

sujeitos com a intenção de promover o que se pensa, em que se acredita, ou até

mesmo aquilo que se considera divertido.

Nos treze perfis analisados, encontra-se em uma maior parte postagens

de links que o próprio facebook libera aos usuários com frases e imagens, como

pode ser verificado no quadro 2.

Quadro 2 – Posts coletados dos perfis analisados

Perfis dos usuários

Exemplos de posts realizados no facebook

Perfil 1

Perfil 2

Perfil 3

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Perfil 4 ----------------------------------------

Perfil 5

Perfil 6

Perfil 7

Perfil 8

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Perfil 9

Perfil 10

Perfil 11

Perfil 12

Perfil 13 -

É possível perceber, diante dessas publicações, que não basta aos

usuários contar de que se gosta, mas mostrar o que se pensa, uma forma de

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reafirmar-se na sociedade virtual. Cada perfil apresenta aqui uma publicação

diferente, mas todas trabalham questões voltadas à vida pessoal, gostos,

preferências e modos de pensar e sentir próprios de cada um. Quer seja definindo-

se através de uma música ou por uma frase, por um jogo que fez da sua infância um

momento feliz, a importância dos amigos ou por uma frase que represente uma

crença de que tudo é possível. Ou seja, não se coloca apenas como um simples

usuário do facebook que gosta de filmes, músicas e programas de TV, também se

procura mostrar como um sujeito que reflete sobre determinadas questões acerca da

vida em si.

Além dessas postagens de links compartilhados, há também postagens

de frases, criadas e recriadas pelos próprios escrileitores, uma vez que, aqui, a

questão de autoria já não é importante, mas sim o conferir sentido ao que se quer

transmitir:

Quadro 3 – Posts realizados pelos próprios alunos no facebook

Perfis Frases postadas no facebook

Perfil 1 “Estar com os amigos faz toda a diferença”

Perfil 2 “Humildade não é ser pobre, é ser digno”

Perfil 3 “As vezes é preciso abri mão de coisa que gostamos pra ganha coisas que merecemos”

Perfil 4 “só aponte meus defeitos quando os seus forem EXEMPLO”

Perfil 5 “Quando alguém falar mal de você pelas costas, não ligue, é sinal de você está na frente.”

Perfil 6 “Meu Deus é maior que meus problemas”

Perfil 7 “O tempo passa tão rápido”

Perfil 8 “Não desisti, só não insisto mais”

Perfil 9 “Coragem é quando você não sabe se vai dar certo e mesmo assim tenta”

Perfil 10 “Seja o que Deus quiser”

Perfil 11 “Senhor, eu te agradeço por mais um dia de vida”

Perfil 12 “Uns vêm pra te ver cair, outros vêm pra te levantar”

Perfil 13

As frases dos perfis mostram um discurso de autoafirmação e

pertencimento. Autoafirmação no sentido de tomarem essas frases como suas e

como atitudes a serem tomadas – ‘Estar com os amigos faz toda a diferença’, pois

demonstra quem realmente sou, o que faço e o que quero que os outros vejam em

mim; e pertencimento ao utilizarem o pronomes da primeira pessoa do singular ‘eu,

meu’ – ‘Senhor, eu te agradeço por mais um dia de vida’ / ‘só aponte os meus

defeitos quando os seus forem exemplo’. Além disso, os enunciados anunciam os

valores e as crenças dos adolescentes para o grupo ao qual pertencem, seja através

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de postagens com imagens e frases prontas ou apenas com frases que eles criam

ou recriam. Todas as frases colocam-se como afirmativas e posicionamentos do

sujeito diante do mundo em que vive.

O perfil 1 coloca a importância da amizade “estar com os amigos” pode

significar pertencer ao grupo, ser social, popular como os adolescentes afirmam nas

rodas de amigos. O adolescente considerado “popular” representa o poder de saber

relacionar-se e também ser o centro das atenções.

Esse discurso da autoafirmação e pertencimento é valorizado na

sociedade virtual, pois demonstra o quê e o quanto ele conhece pessoas e é

considerado um ser bem relacionado com o seu grupo, e também a sua participação

e interação na rede, uma vez que o sujeito tem sua identidade construída sempre a

partir da sua própria inserção sócio-histórico-ideológica e do contato com o outro.

O enunciado do Perfil 2 remete ao discurso do senso comum e das frases

feitas, bem como a prática discursiva estabelecida da humildade como dignidade,

como uma qualidade, a humildade como expressão de sabedoria, do ouvir, do valor

que engrandece o Ser Humano que deixa melhor diante dos outros.

Nos perfis 3, 8 e 9 os enunciados trazem o discurso das escolhas diante

da vida do adolescente “As vezes é preciso abri mão de coisas que gostamos pra

ganha coisas que merecemos” / “Não desisti, só não insisto mais” / “Coragem é

quando você não sabe se vai dar certo e mesmo assim tenta”. A linguagem próxima

da fala marca o enunciado desse perfil, e acaba por mostrar a simplicidade do

adolescente que mesmo não tendo o refinamento e apropriação da linguagem

escrita consegue mesmo assim fazer-se entender. Esses enunciados poderiam ser

utilizados em sala de aula como exemplificação para o professor mostrar a diferença

da linguagem falada e da escrita, reconstrução da frase, concordância nominal e

verbal, entre outros, ao mesmo tempo em que se poderia discutir o conteúdo

expressado na frase.

Nos perfis 4, 5 e 12, há a presença do discurso do sujeito que quer se

mostrar forte e superior aos demais sujeitos, falando aos outros: “só aponte meus

defeitos quando os seus forem EXEMPLO” / “Quando alguém falar mal de você

pelas costas, não ligue, é sinal de você está na frente.” / “Uns vêm pra te ver cair,

outros vêm pra te levantar”. Aqui, o discurso da autoafirmação se faz presente ao ter

que demonstrar aos demais usuários do facebook, que o “eu” é independente, e não

importa o que pensam ou digam, ele existe e tem opinião própria.

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Perfis 6, 10 e 11, “Meu Deus é maior que meus problemas” / “Seja o que

Deus quiser” / “Senhor, eu te agradeço por mais um dia de vida” – nessas frases,

aparece o discurso religioso, apresentando a crença e a fé desses usuários, e por

meio da religião, mais uma vez, eles se reafirmam, isso é perceptível por marcas

como “meu Deus”, “Senhor, eu te agradeço”. Ou seja, não importa a forma, nem as

palavras utilizadas; mas sim o que essas palavras passam. E todas elas, nas frases

apresentadas, apontam adolescentes em busca do seu próprio “eu”.

c) Discurso de interação

Retomemos uma citação de Brait, relevante para este momento:

Bakhtin [..] insiste no fato de que o discurso não é individual, [...] porque se constrói entre pelo menos dois interlocutores que, por sua vez, são seres sociais; não é individual porque se constrói como um “diálogo entre discursos” (BRAIT, 2001, p. 33).

Neste momento da pesquisa, depara-se com os resultados colhidos a

partir da análise da utilização das ferramentas interativas, como é o caso do

aplicativo curtir, das postagens de fotos com amigos, da ferramenta de adicionar

novos amigos e até mesmo das postagens de comentários em facebooks alheios.

Percebe-se que há a necessidade de manter contato com o outro e demonstrar seu

interesse em realizar um discurso, uma vez que para esse acontecer é necessária a

interlocução de, ao menos, dois sujeitos. Esse discurso acontece com frequência

diversificada para cada ação, e na tentativa de representá-lo aqui, observamos os

perfis durante o período de um mês (30 dias) todos os dias, e demonstramos essas

ações no gráfico a seguir:

Gráfico 1 – Frequência dos discursos proferidos pelos alunos no facebook

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Durante o tempo de observação, pôde-se notar que a ação mais praticada

por todos os usuários analisados foi a de adicionar amigos, ou seja, a interação

acontece aderindo-se novas pessoas ao grupo de amigos. Em segundo lugar, o

aplicativo curtir, de forma que todos os perfis analisados praticam essa ação,

interagindo com os demais usuários virtuais. Em terceiro lugar, os comentários, em

que os autores dos perfis refletem sobre publicações de amigos ou efetuam

publicações pessoais nos murais dos amigos no intuito de manter contato.

Observou-se, finalmente, que o recurso menos utilizado pelos usuários

analisados foi o aplicativo de adicionar fotos, quer seja pela ausência de recursos

pessoais, como câmeras que permitam o acesso a fotografias, ou pela não

necessidade de divulgar momentos vividos através de imagens, já que este não é o

recurso mais chamativo para obter amigos, e sim os interesses pessoais – música,

filme, programa de TV, esporte.

Nota-se nos discursos observados anteriormente, como já mencionado, o

discurso parafrástico, ou seja, mesmo que de forma distinta, usualmente os usuários

do facebook, em específico aqui os treze analisados, publicam, postam, interagem

de forma semelhante: querem se identificar, informando seus gostos e preferências

pessoais; autoafirmam-se, publicando imagens e frases referentes as suas vidas ou

a própria vida em si, sobre o que pensam e como refletem sobre determinadas

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situações; e interagem com o outro, curtem, comentam, compartilham, adicionam

amigos. Isto é, realizam as mesmas ações a todo o momento.

Para alguns, o já dito é fechamento do mundo. Porque estabelece, delimita, imobiliza. No entanto, também se pode pensar que aquilo que se diz, uma vez dito, vira coisa no mundo, ganha espessura, faz história. E a história traz em si a ambiguidade do que muda e do que permanece (ORLANDI, 2003, p. 9).

Assim, percebe-se que, além de repetirem determinadas situações,

algumas são consideradas ideias imobilizadas, pois já estão no mundo, já fazem

parte da sociedade virtual, e assim não mudam a sua essência, mesmo que

recriadas ou ditas de outra forma.

E, quando se confronta o universo da leitura nas redes sociais com a ideia

de leitura e interpretação escolar, encontramos um embate com relação ao discurso

da repetibilidade, porque, sem acesso a esse mundo virtual vivido pelos educandos,

na escola é sugerido a eles leituras, as quais são consideradas pelos estudantes

prontas; e eles não se dão conta de que leitura pronta é o que encontram na mídia,

já que apenas repetem e recriam o que já viram para constituírem seu próprio “eu”.

Assim, deve-se mostrar ao aluno através da escola, lugar onde ele tem uma

orientação, que não pode e nem deve se contentar com o que está imóvel, pronto,

mas deve, sim, modificá-lo, refazê-lo, reconstruí-lo, dando uma nova imagem e

interpretação no momento da escrita, como podemos apreender nos parâmetros

estabelecidos na Proposta Curricular do Estado de São Paulo:

[...] é importante destacar que o domínio das linguagens representa um primordial elemento para a conquista da autonomia, sendo a chave para o acesso a informações e permitindo a comunicação de ideias, a expressão de sentimentos e o diálogo, necessários à negociação dos significados e à aprendizagem continuada. (PROPOSTA CURRICULAR DO ESTADO DE SÃO PAULO, 2008, p. 18)

Assim, independente da leitura realizada pelo estudante, no caso do

presente estudo na faixa etária dos 14 anos, é necessário que ele adquira, através

da leitura e da interpretação, tanto do texto impresso como do texto virtual, a

autonomia para prosseguir aprendendo, ou seja, ter a aprendizagem continuada. E

para tal, deve-se permitir que o estudante leve a sala de aula os tipos de texto que

gosta de ler e trabalhar, porque assim o educador terá mais um novo recurso para

demonstrar ao aluno o quanto o mundo da linguagem o rodeia e o quanto é

essencial conhecê-lo e, de certa forma, dominá-lo.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Percebe-se diante das práticas discursivas analisadas nessa página do

Facebook, que os estudantes convivem com diferentes formas de linguagem e suas

práticas de leituras não se dão apenas na escola, mas, em grande parte, fora dela.

Isso é perceptível no momento em que eles divulgam os interesses para adquirirem

conhecimento, e seus interesses são em filmes, programas de TV, músicas.

Assim, como já visto no terceiro capítulo, que o professor pode trabalhar

com a ideia do futebol na sala de aula e com a questão da música estrangeira, o

educador pode, também, preparar suas aulas através dos filmes e programas de TV.

Se o professor tem acesso a essas informações, ele pode trazer o dia-a-dia dos

estudantes para a aula, tornando-a mais interessante e atrativa. Como exemplo,

além de trabalhar com charges, história em quadrinhos, artigos, entre outros; pode-

se passar um filme – o qual tenha um conteúdo que possa ser retirado para o

trabalho em sala de aula –, dos citados pelos treze perfis apontados acima,

podemos utilizar “Amizade colorida” com o intuito de trabalhar a necessidade de ter

um parceiro, como tê-lo, o assunto da paquera tão em alta entre os adolescentes;

“Crespúsculo”, “Amanhecer” (a saga dos vampiros) para mostrar a diferença entre

realidade e ficção. Ou seja, há várias formas de atrair a atenção do aluno e fazer

com que este se sinta mais a vontade durante as aulas e tenha o mesmo interesse

de leitura dentro e fora da escola, pois são as práticas de leitura que demonstram o

pensamento e conhecimento desse jovem atual.

E durante essas práticas de leituras pode-se notar a necessidade de se

autoafirmar que esses jovens têm, pois o tempo todo, quando acessam o facebook

estão preocupados em publicar algo que os defina, ou que mantenha contato com

demais usuários, ou seja, a leitura deles, por mais que possa ser ampla pela

dimensão do mundo virtual, torna-se limitada quando o assunto é facebook, eles não

conseguem se desvincular do mundo virtual e limitado, isto é, trabalham com o “já

dito, pois esse já faz parte da história” como afirma Orlandi (2003).

Assim,

O discurso da mídia [...] apresenta uma imagem de sujeito e das condições sociais e históricas da sociedade brasileira contemporânea. A mídia, através do texto de auto-ajuda, pressupõe um sujeito apegado a imagens [...]. No discurso da mídia, entendemos também a referência feita, de forma sub-reptícia, à constituição dos argumentos [...], ou seja, imagens persuasivas que seduzem o leitor. (OLIVEIRA, 2006, p.27)

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Com isso, nota-se o quanto a sociedade é dependente de determinados

discursos, valorizando-se e recriando-se por eles. E independente dos discursos

reconhecidos e utilizados pelos estudantes analisados neste trabalho, todos

trabalham com o quesito autoajuda, em que os discentes buscam demonstrar quem

são e se reconhecerem. Essa ferramenta, mesmo sendo considerada persuasiva

pode ser de grande utilidade a esses jovens, desde que a usem de forma coesa e

coerente em suas vidas.

Ou seja, adquirem conhecimento, sim, isso é fato, mas um conhecimento

que não gera o fator cognitivo da crítica, como o desejado pelos educadores e pelo

âmbito escolar. O adolescente que vive o mundo digital acaba de certa forma sendo

privado da reflexão crítica, pois tudo lhe é dado pronto e acabado, e não há ninguém

por perto para lhe demonstrar como ler, interpretar e analisar determinados textos

virtuais.

Assim, pensar a leitura é pensar a emancipação, a descoberta de si no

outro e o contrário também, é conhecer-se e gostar de si mesmo, pois mais do que

um emaranhado de palavras, a leitura é o passaporte para outro mundo mais

sensível, mais compreensível, mais próximo e esta proximidade prática ganha

relevância nesse contexto. A leitura não deve ser tratada como algo estático que

aponta para um horizonte, pois este horizonte não existe, ou se existe se molda e se

modifica a cada leitura, a cada contato, a cada toque, a cada pensar. A leitura deve

ser trabalhada como algo singular, mas que se pluraliza a partir do momento em que

tem leitores críticos e interpretativos.

Então, torna-se importante conhecer a realidade dos alunos, seus gostos

e preferências, pois ao conhecermos as condições de produção discursiva, de leitura

e escrita teremos subsídios para iniciarmos a inserção desses sujeitos também no

mundo letrado, dos livros, da arte literária, de uma cultura mais refinada e

acadêmica. No sentido, dos sujeitos dominarem não só as novas tecnologias, mas

também as que são necessárias para se expressarem e interagirem no mundo real.

Participar da formação do outro na disciplina de Língua Portuguesa é superar uma atividade apenas voltada para a informação. Desejamos formar nossos alunos para o mundo do conhecimento por meio da linguagem. Conhecer é o ato cognitivo de compreender para transformar a si e ao mundo em que vivemos, construindo relações entre os diversos significados de uma mesma idéia ou fato. Conhecimento é uma rede de significados. Quem conhece, conhece algo ou alguém e conhecer algo, portanto, é participar no processo constante de transformar e atribuir significados e relações ao objeto do conhecimento, seja o verbo, seja o

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resumo ou o texto literário, por exemplo. (Proposta Curricular do Estado de São Paulo, 2008, p. 41)

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SOARES, Nathalia Maria; BARROS, Tamara Carrijo de. Assinale a alternativa correta: o discurso sobre o vestibular – expectativas e desafios em múltiplas

perspectivas. 2007. 65 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Letras) – Centro Universitário de Franca (Uni-FACEF), Franca. UNIVERSIDADE DE FRANCA. Programa de Pós-Graduação em Linguística – Stricto Sensu. Linguagens, códigos e tecnologias: práticas de ensino de leitura e de escrita na educação básica – ensino fundamental e médio. Projeto Observatório da Educação, 2010. Franca: Unifran, 2010.