rompendo barreiras atitudinais no contexto da educação especial
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Rompendo barreiras atitudinais no contexto da educação especial na
perspectiva inclusiva
Adriano Henrique Nuernberg
Professor da Graduação e da Pós-Graduação em Psicologia da UFSC
De onde falo?
• Formação em psicologia/ciências humanas
• Experiência de 13 anos no ensino universitário e em projetos de pesquisa e extensão no contexto da educação especial, inclusão escolar e acessibilidade em todos os níveis da Educação.
Educação especial na perspectiva inclusiva
• Exige um olhar interdisciplinar
• Diferentes dimensões: política, jurídica, econômica, cultural, tecnológica, social, subjetiva.
• Apropriação do aluno com deficiência pelo ensino público.
Diversas barreiras
• Arquitetônica, comunicacional, informacional, metodológica, instrumental, programática
• É a raiz de todas as demais barreiras, comunicacionais, informacionais, educacionais e arquitetônicas.• Além dos preconceitos, referem-se aos medos e ao desconhecimento em como agir adequadamente diante da PcD • Barreiras atitudinais: as atitudes fundam-se em preconceitos, estereótipos que produzem a discriminação.
• Amaral (1998) “são anteparos nas
relações entre duas pessoas, onde uma
tem uma predisposição desfavorável
em relação a outra, por ser esta
significativamente diferente, em
especial quanto às condições
preconizadas como ideais” (p. 17).
Barreiras Atitudinais
Paradoxos
• Os dados da pesquisa realizada pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), sobre a percepção dos direitos humanos no Brasil mostram que 92% das pessoas entrevistadas consideram a igualdade
entre pessoas com e sem deficiência uma questão de direitos humanos e concordam com as políticas de atenção às PcD
• Por outro lado, vários estudos como FERREIRA (2009) mostram o quanto a discriminação aos alunos com deficiência ainda está presente de forma intensa.
Disablism
• Termo inglês equivalente aos termos “sexismo” e “racismo” para designar o preconceito contra pessoas com deficiência, ainda sem tradução para língua portuguesa.
Ferreira (2009)
Discriminação visível : o ato se manifesta de forma explícita, ou Discriminação velada : superproteção (baixa crença no potencial da pessoa com deficiência, por exemplo)------Discriminação negativa : quando se dá um tratamento diferenciado visando menosprezar uma pessoa ou um grupo social, impedindo sua participação social em condições de igualdade ou provocando constrangimento.Ou Discriminação positiva : objetiva equiparar as oportunidades do sujeito da garantindo sua igualdade de direitos. Ex. ações afirmativas.
Igualdade versus diferença
Formas de discriminação
Barreiras atitudinais: generalização indevida
• Generalização indevida consiste no juízo que transforma a condição de limitação de uma pessoa em sua totalidade, ou seja, ela torna-se TODA deficiente por ter um impedimento específico.
Barreiras atitudinais: correlação linear• Na correlação linear,
relaciona-se características singulares à deficiência, igualando entre si todas pessoas com uma deficiência, bem como distinguindo-as das pessoas sem deficiência. Elas deixam de ser pessoas “comuns”.
Barreiras atitudinais: Contágio Osmótico
• O "contágio osmótico" é o temor do contato e do convívio, numa espécie de recusa em ser visto como se fosse uma pessoa com deficiência ou ainda ser “contaminado” pela convivência com a deficiência.
• Falas “a inclusão prejudica ‘os mais capazes’, “nivela por baixo”.
Barreiras atitudinais no contexto institucional
• O contraste entre o princípio de valorização da diversidade da educação inclusiva com nosso desejo de aproximação de todos alunos ao padrão ideal de aluno (autônomo, disciplinado, sem lesões e impedimentos, etc)
• A lógica de funcionamento da escola no “atacado”, a estratégia histórica da homogeneização onde a diferença é um problema.
Fatores subjetivos das barreiras atitudinais
• As pessoas não “boas” ou “más”diante da discriminação.
• Medo: pautados exclusivamente pelo modelo biomédico da deficiência, os professores vem a deficiência uma ameaça a seu saber-fazer, levando-os a um sentimento de desamparo, impotência. “não estou preparado”
• Daí a importância de se desmistificar
a deficiência e a partir do próprio
conhecimento docente para construir a educação inclusiva
Outras barreiras atitudinais� Consideração de que o aluno com
deficiência está ali apenas para socializar-se
� Concepção fatalista da deficiência (Martinez, 2005)
� Tendência a não cobrar do aluno com deficiência as mesmas regras e comportamentos
� Como a deficiência opera como uma “lente de aumento”, sugere-se que apenas esses alunos precisam de maior apoio.
� Pena e superproteção do aluno com deficiência
� Preconceito e bullying entre os alunos� Posturas que re-inventam a segregação
no contexto da sala de aula.
Exemplos
• “É preciso primeiro a escola e os professores serem preparados para depois incluir”
• “Alunos de inclusão”
• “Tenho 30 alunos e dois de inclusão”
• “Aqui na escola temos uma professora ótima, que aceita as crianças com deficiência”
• “É melhor encaminhar seu filho para uma escola especializada”
Pensando formas de enfrentamento das barreiras atitudinais
• Caminhos: pensar (mudança de concepção), conviver/experenciar, enfrentar (medos, resistências) identificar as barreiras para sua evitação e eliminação.
• Maior conhecimento da perspectiva de direitos humanos que fundamenta a educação inclusiva
• Modelo social da deficiência: superação da tensão entre o discurso técnico-especializado da segregação com a perspectiva de direitos humanos da inclusão.
Direitos Humanos
• Transcende ao direito formal: é uma proposta ética
• O direito de conviver com os pares da mesma geração, da mesma comunidade.
• O direito a participar da vida social em condições de igualdade e justiça.
• Amartya Sem e Martha Nussbaum
Visão tradicional da deficiência
• A deficiência é um incidente isolado, uma condição anômala, analisada como fato de origem exclusivamente orgânica;
• A desvantagem tem origem na natureza, no corpo da pessoa com deficiência.
• Um fardo social que implica em gastos com reabilitação ou demanda ações de caridade;
• É objeto de uma política especial, raramente contemplado nas políticas públicas gerais;
• A pessoa com deficiência é passiva.
Modelo Social da Deficiência
• Desloca a compreensão da deficiência para o contexto, apontando para as barreiras sociais;
• A deficiência deixa de ser apenas um problema médico para ser um problema econômico, social, de direitos humanos, cultural, etc;
• Retira a deficiência da ideologia do inesperado, da exceção, da “tragédia humana” e a situa no contexto geral da diversidade humana;
• A deficiência pode ser considerada um modo de vida, uma possibilidade digna na condição humana – a cultura e comunidade da deficiência;
• A pessoa com deficiência como cidadã: a deficiência é uma questão de Direitos Humanos;
• O pressuposto da vida independente.• A transversalidade da deficiência
DINIZ, D. O que é deficiência? São Paulo:Brasilense, 2007.
Convenção da ONU
• “Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentosde natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.” (Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, 2008).
Por que é importante pensar sobre esses modelos?
• No modelo social, por considerarmos que mais importante é a pessoa e não a lesão/impedimento, superamos a noção de que apenas o especialista
dá conta do aluno com deficiência.
• Focamos a criança, o adolescente, a pessoa, e não apenas a deficiência
• Passamos a priorizar as transformações institucionais e não a lógica de adaptação e patologização
Barreiras mais intensas: deficiência intelectual e autismo
• Barreiras atitudinais mais intensas
• Onde a confusão entre doença e deficiência é mais significativa, levando à hegemonia do cuidado e medicalização e não da educação
• Intelectualidade e interação de tipo “padrão” como condição de permanência e pertencimento ao espaço escolar
Considerações Finais
• O problema da inclusão escolar deve ser pensado no contexto dos diversos outros desafios da educação: da formação docente, do projeto pedagógico à estrutura física da escola.
• Promover a inclusão não passa apenas pela atenção às necessidades educacionais específicas e acessibilidade, mas pelo fortalecimento dos educadores no exercício de seu ofício
• Muito mais do que um projeto, a inclusão deve ser um princípio compartilhado entre todos agentes do espaço escolar (professores, pais e alunos)
• Os desafios da inclusão, portanto, passam pela transformação de aspectos mais básicos da educação
• Pensar um projeto pedagógico que acolha e promova a diversidade implicando todos os agentes nesse processo
Referências BibliográficasAMARAL, L. Sobre crocodilos e avestruzes. In: AQUINO, J. Diferenças e preconceitos na escola. SP: Sumus, 1998.BAPTISTA, C. ROBERTO, BOSA, CLEONICE (orgs). Autismo e Educação. Porto Alegre, Artmed, 2002.DAMÁZIO, Mirlene Ferreira Macedo; SILVA, Alessandra da; LIMA, Cristiane Vieira de Paiva. Atendimento educacional
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