romilson santos
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Dissertação de mestradoTRANSCRIPT
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
FACULDADE DE EDUCAO
MESTRADO EM EDUCAO
OS SENTIDOS E SIGNIFICADOS DO LAZER NA FORMAO ESCOLAR NA REGIO DE
XING.
Autor
Romilson Augusto dos Santos
Orientador
Roberto Sidnei de Macedo
SALVADOR - BA
2001
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
FACULDADE DE EDUCAO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO
OS SENTIDOS E SIGNIFICADOS DO LAZER NA FORMAO ESCOLAR
NA REGIO DE XING
ROMILSON AUGUSTO DOS SANTOS
SALVADOR-BAHIA
2001
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
FACULDADE DE EDUCAO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO
CURSOS DE MESTRADO E DOUTORADO
OS SENTIDOS E SIGNIFICADOS DO LAZER NA FORMAO ESCOLAR
NA REGIO DE XING
DISSERTAO DE MESTRADO
ROMILSON AUGUSTO DOS SANTOS
SALVADOR BAHIA
2001
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ROMILSON AUGUSTO DOS SANTOS
OS SENTIDOS E SIGNIFICADOS DO LAZER NA FORMAO ESCOLAR
NA REGIO DE XING
ORIENTADOR: PROF Dr. ROBERTO SIDNEI DE MACEDO
Dissertao submetida ao Colegiado do Programa de Ps
Graduao em Educao da Faculdade de Educao da
Universidade Federal da Bahia, em cumprimento parcial dos
requisitos para obteno do grau de Mestre em Educao.
Banca Examinadora:
Prof. Dr. Roberto Sidnei de Macedo (UFBA)
Prof. Dra. Celi Nelza Zulke Taffarel (UFBA)
Prof. Dr. Vitor Melo (UFRJ)
SALVADOR BAHIA
2001
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Biblioteca Ansio Teixeira - Faculdade de Educao/ UFBA S237 Santos, Romilson Augusto dos. Os sentidos e significados do lazer na formao escolar na regio de Xing / Romilson Augusto dos Santos. 2001. 204 f. Dissertao (mestrado) Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Educao, 2001. Orientador: Prof. Dr. Roberto Sidnei de Macedo. 1. Lazer e educao Xing (mesoregio). 2. Lazer Trabalho. 3. Lazer Currculo. I. Macedo, Roberto Sidnei. II. Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Educao. III. Ttulo. CDD 370.119 - 22. ed.
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TITULO
OS SENTIDOS E SIGNIFICADOS DO LAZER NA FORMAO ESCOLAR
NA REGIO DE XING
ROMILSON AUGUSTO DOS SANTOS
BANCA EXAMINADORA:
____________________________________
Prof. Dr. Roberto Sidnei Macedo
__________________________________
Prof. Dra. Celi Nelza Zulke Taffarel
_________________________________
Prof. Dr. Vitor Andrade Melo
Salvador.
2001
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DEDICATRIA
Dedico este trabalho aos sujeitos polticos desta pesquisa que
contriburam para o meu crescimento, dando me oportunidade de perceber
como importante a cooperao, solidariedade, e como necessrio lutar por
melhores dias em uma sociedade to injusta como a nossa, onde os valores do
ter predominam em relao ao ser, onde o capital dita a ordem causando uma
grande desordem quele que no o detm, ficando este merc da explorao
e excludo do mundo do trabalho e sem direito ao prprio lazer, apesar de ter
tempo livre.
Dedico tambm ao nosso Nordeste que, mesmo cantado em
verso e prosa, sofre as discriminaes e excluses de um pas que no
conseguiu ainda enxergar que, mesmo com todas as diferenas, somos iguais.
Gostaria tambm de dedicar este trabalho a todos os estudiosos
do campo do lazer, e, em especial, pessoa que durante a minha formao
acadmica sempre me motivou a trilhar os caminhos que me levaram a ousar
em produzir conhecimento, mesmo com as limitaes que considero ter. Ao
meu grande professor e amigo Joaquim Maurcio Cedraz Nery.
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AGRADECIMENTOS
... e aprendi que se depende sempre, de tanta muita,
diferente gente.
Todas as pessoas sempre so as marcas das lies dirias
de outras tantas pessoas. E to bonito quando a gente
entende que a gente tanta gente, onde quer que a gente v.
E to bonito quando a gente sente que nunca est sozinho
por mais que pense estar.
Gonzaguinha
Percebi em minha caminhada que, mesmo nos momentos mais
difceis da elaborao deste trabalho, nunca estive sozinho. Nesse sentido,
que agradeo a todas as pessoas que me ajudaram a ter as marcas dirias de
tantas outras pessoas. Marcas estas que me fizeram perceber o quanto
importante caminhar coletivamente, na construo de uma sociedade justa e
humana.
Neste momento torna-se difcil fazer agradecimentos, pois posso
incorrer no deslize de esquecer algum, no entanto tentarei no cometer este
equvoco. Diante disso, agradeo inicialmente a todos os sujeitos polticos que
participaram direta ou indiretamente desse processo de construo rdua e
difcil para um marinheiro de primeira viagem.
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Mesmo fazendo essa forma de agradecimento, no poderei deixar
de citar algumas pessoas que viveram de perto toda minha dificuldade em
querer contribuir na construo do conhecimento de forma sistematizada.
Meu agradecimento muito especial pessoa que foi muito mais
que um orientador, foi amigo, conselheiro, paciente. Cobrando no momento
certo e apoiando sempre que necessrio, exigindo disciplina. Quero agradecer
de corao o apoio e orientao dados pelo professor Roberto Sidnei Macedo.
Ao professor Srgio Coelho Borges Farias pela sua grande
contribuio no s na minha dissertao de mestrado como meu primeiro
orientador, mas tambm na minha prpria vida. Minha eterna gratido.
minha nova amiga Celi Taffarel pelo apoio, crtica e contribuio
efetiva dada na elaborao desta dissertao de Mestrado.
equipe da REDPECH. Aos amigos Lvia, Alan, Patrcia, Paul, e
sempre acolhedora, professora Terezinha Fres Burnham.
equipe da rea Temtica Gesto Ambiental, Educao e
Trabalho do Projeto Xing Mayave, Llis, Daguia, Carla, Luciana, Cristiane,
Guto, Dlson, pela acolhida, hospitalidade e grande colaborao para a minha
pesquisa.
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Aos professores Robrio R. Matos e Denise Scheyrl, por terem se
prontificado a fazer a traduo do resumo deste trabalho para o ingls e o
alemo.
Aos meus pais Joo Augusto e Maria de Lourdes pela sua
rdua luta para que hoje eu pudesse estar aqui.
Aline, minha companheira, sempre pondo meus ps no cho
quando necessrio.
s amigas Isaura e Zoraya, que colaboraram comigo nos
momentos mais difceis da pesquisa e da minha vida.
Aos meus colegas do Departamento de Educao Fsica, pelo
estmulo.
A Meire Conceio Ges, Orlando Hage, Cristina Bassalo.
A lvaro Cardoso, pela sua colaborao na correo gramatical.
Rozane Suzart, minha monitora do Projeto Lazer Cidado: uma
ao comunitria.
Aos amigos Wilson Brito Lima Filho, Marco Bahia e Humberto
Santos, Anax do Lago e Rodrigo Poegere, pela grande fora.
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Ao professor Menandro Ramos, pelo grande auxlio e paciente
colaborao, sempre que necessitei.
comunidade de Xing, por colaborar nesta nova etapa da minha
vida,
A Deus,
o meu muitssimo obrigado!
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SUMRIO
Pagina
RESUMO 15
ABSTRACT 17
ZUSAMMENFASSUNG 18
1. INTRODUO Delimitando a problemtica e as
possibilidades investigativas.
1.1 A necessidade do estudo: a relevncia social.
1.2 A problematicidade: o problema investigativo.
1.2.1 O lazer: tentativa de um contrato social amplo.
1.2.2 Objetivos e questes
1.3 O mtodo como caminho e itinerncia de pesquisa.
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19
20
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CAPITULO I DILOGO E INSPIRACES TERICAS 45
I Um olhar conceitual sobre o lazer 45
II Lazer em uma sociedade capitalista: recuperando
elementos da crtica
62
III O significado das praticas corporais e sua relao
com o lazer: uma anlise crtica das propostas no campo
da educao fsica.
83
IV A festa e o jogo enquanto espao de aprendizagem. 95
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CAPITULO II
2. O DILOGO INTERPRETATIVO COM A REALIDADE
PESQUISADA Sentidos e significados dos processos de
narrativas dos atores educativos sobre o lazer.
a) A escola UNEX
b) A hermenutica do estudo
115
120
121
3. CONCLUSES
144
4. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
151
5. ANEXOS Anexo I
Anexo II Anexo III
195 196 199 201
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...Que a leitura seja um brinquedo...
Que a alma voe, descolando-se do texto para fazer suas prprias
aventuras...
Que haja coragem para pensar o inslito...
Que o pensamento seja capaz de contemplar os fundamentos.
Roland Barthes
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RESUMO
O presente estudo insere-se entre os que investigam as
problemticas da formao e do currculo. Tem como objeto os sentidos e
significados atribudos pelos futuros trabalhadores ao lazer nos processos
educativos. Foi desenvolvido no mbito de uma proposta interinstitucional de
articulao em rede para o desenvolvimento de uma regio semi-rida do
Nordeste, na rea de abrangncia do Programa Xing. Objetivou identificar
relaes existentes entre o lazer e processos educativos, a partir dos sentidos
e significados atribudos pelos futuros trabalhadores aos contedos culturais do
lazer, enquanto elementos do ensino - aprendizagem na comunidade, em
busca de subsdios para uma educao para e pelo lazer1 onde o jogo do
saber 2 se torne veculo de construo de cidadania3 .
Dos procedimentos investigativos, contaram o dilogo crtico com
os autores que tratou da relao Lazer Trabalho Educao e anlise das
falas e produes dos futuros trabalhadores vinculados aos processos
educativos do projeto Xing. Os dados foram sistematizados a partir das falas,
identificando-se categorias impregnadas de contedos significativos que
permitem reconhecer os sentidos atribudos pelo coletivo de aluno da UNEX 1
(Unidade Escolar de Xing 1), ao Lazer e seus contedos culturais. Inferimos
da, que os elementos de mais ricas possibilidades educativas relacionadas ao
1 Podemos encontrar mais sobre o assunto em Renato Requixa, 1974. As Dimenses do lazer. P-13 2 Abordagem utilizada por Nelson Carvalho Marcelino, em seu livro Pedagogia da Animao 1996. 3 Seria interessante ler mais sobre a temtica em Ester Buffa, Educao e Cidadania: quem educa o cidado?-5a. Ed So Paulo: Cortez, 1995.
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lazer e a formao do futuro trabalhador so as festas, os meios de
comunicao rdio, TV, e as linguagens diversificadas mmica, dana, jogo.
Durante a pesquisa, utilizei elementos das metodologias
qualitativas, que foram organizados e desenvolvidos em torno do dilogo ora
com a literatura, ora com as vivncias prticas e ora com os futuros
trabalhadores para desvelar os sentidos e significados atribudos ao lazer na
formao do trabalhador.
Busquei elementos na etnografia das prticas educativas
pautadas na socio-fenomenologia crtica para que pudesse obter descries
detalhadas de situaes, eventos, pessoas, interaes e comportamentos
observados; citaes literais do que as pessoas falam sobre suas experincias,
atitudes, crenas e pensamentos; trechos ou ntegras de documentos,
correspondncias, atas ou relatrios de casos, fato esse possvel devido ao
grau de liberdade e agilidade para a reflexo que esse tipo de investigao
permite (Patton,1986 apud Alves 1991:22).
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ABSTRACT
This paper is an interinstitutional proposal of net articulation for the
development of the northeastern desert of Brazil in the area of Projeto Xing.
Its aim is identifying the relationships between leisure and the educational
process, as well as discussing perspectives of the meanings of cultural contents
of leisure as components of the teaching/learning process in the community in
search of an education for leisure and through leisure.
Different conceptions are presented trying to check the various
ways of understanding leisure, the formation of the future worker, the way
leisure is regarded by the school and its community and the role it plays in the
well-being of the population.
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ZUSAMMENFASSUNG
Die vorliegende Arbeit Konstituiert auf dem inter-institutionellen
Vorschlag, zur Entwicklung des Trockengebietes im Nordosten, im Rahmen des
Xing Programms, beizutragen.
Die Ziele der Forschung sind zum einen, die bestehenden
Zusammenhng zwischen Freizeit und Bildungsprozess zu erkennen, zum
anderen, die Perspektiven der Bedeutung Kultureller Inhalte von Freizeit, als
Teil des Lehr-Lernprozesses in der Gemeinschaft, zu diskutieren, um
letztendlich eine auf freizeitorientiente Bildung zu finden.
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1. INTRODUO
DELIMITANDO A PROBLEMTICA E AS POSSIBILIDADES
INVESTIGATIVAS
1.1. A necessidade do estudo: a relevncia social
As inspiraes e inquietaes primeiras deste trabalho foram
constitudas por vivncias concretas no ensino da disciplina Recreao do
Curso de Licenciatura em Educao Fsica, da Universidade Federal da Bahia,
e tambm como professor da rede pblica de ensino bsico. Inquietava-me o
menosprezo da escola pela festa, o ldico, o jogo, ainda considerado profano
e inspirou-me lanar elementos que trouxessem para o centro da discusso do
Currculo de formao de trabalhadores o que lhe de grande sentido e
significado - os contedos do lazer: as festas, a mmica, o potico, o jogo, a
dana.
Tivemos tambm como antecedente uma pesquisa de Educao
Fsica Escolar, realizada por ns em Curso de Ps - Graduao em
Metodologia da Educao Fsica Infantil, onde constatamos que o significado
das prticas corporais na educao fsica analisada de forma acrtica e que
as questes pertinentes relao entre lazer e educao so pouco discutidas.
Nega-se s crianas o que lhes de grande significado para construir sentidos
de vida, o prazer do jogo, da brincadeira, da festa, da dana.
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1. 2 . A problemtica: o problema investigativo
Ao longo deste trabalho, apresentamos diferentes concepes
sobre o lazer a partir do dialogo com autores que discutem a temtica,
destacando quais so as abordagens reconhecidas nas categorias tericas
privilegiadas, procurando identificar as vrias formas de entendimento do lazer.
Dialogamos tambm com os trabalhadores, participantes do Projeto Xing,
analisando sentidos e significados atribudos pelos mesmos em relao aos
contedos educativos do lazer. Desse profcuo dilogo foi possvel delimitar o
problema, apontar dados e discutir a centralidade da questo, no estaramos
excluindo dos processos educativos na formao do futuro trabalhador os mais
ricos elementos culturais para estimular aprendizagens significativas para o
lazer, com o lazer?
Durante a realizao da pesquisa vrias formulaes foram
tomando corpo, na busca de respostas para as nossas questes bsicas. A
partir da leitura das obras citadas em nosso trabalho, bem como da anlise dos
dados de campo de nossa pesquisa, elegemos e delimitamos problemas
investigativos e identificamos categorias de anlise que vieram a nortear a
temtica central.
Em nosso trabalho consideramos as questes relacionadas aos
sentidos e significados do lazer para a populao de Xing, o significado nas
prticas corporais e sua relao com lazer, para questionar a relao do lazer
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com a prtica pedaggica e a relao do lazer com a construo da cultura
pedaggica da escola.
Das narrativas dos atores participantes desta pesquisa e das
minhas leituras tericas, surgiram categorias empricas, aqui entendidas como
grau de desenvolvimento do conhecimento da pratica social especfica do
lazer.
Ao longo dos anos, vimos percebendo a acriticidade na prtica e
utilizao dos contedos culturais do lazer, como tambm uma fragilidade nas
discusses sobre as relaes entre o lazer e a educao, o que nos provocava
algumas inquietaes. Estaramos negando a construo de sentidos e
significados a serem construdos a partir da escola, aos contedos culturais do
lazer?
O que dizem os autores sobre isto? O que pensam e dizem os
futuros trabalhadores em processo de escolarizao?
O que podemos concluir enquanto construo para
redimensionar/reconceptualizar o currculo nos aspectos relativos aos
contedos culturais do lazer?
Para estabelecer esta interlocuo investigativa entre a base
concreta da existncia humana - com seus pensamentos, suas percepes,
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seus sentidos e significados socialmente construdo elegemos o contexto do
Programa Xing.
O Programa Xing; um programa de cunho multidisciplinar,
sendo uma iniciativa do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento
Cientfico e Tecnolgico), em parceria com a CHESF (Companhia Hidroeltrica
do So Francisco).
O programa Xing originou-se a partir do entendimento de que a
prosperidade dos povos se d em decorrncia da educao, associada
explorao das potencialidades e vocaes, abrangendo todos os aspectos do
ensino, da profissionalizao e da produo. Abrange os municpios e
povoados de Alagoas, Bahia, Pernambuco e Sergipe, atendendo em seu
programa as seguintes cidades: Alagoas - Delmiro Gouveia, Olho D gua do
Casado, Piranhas, gua Branca, Po de Acar e Parinconha; Bahia - Abar,
Chorroch, Rodelas, Glria, Paulo Afonso, Macurur e Cura; Pernambuco
Belm do So Francisco, Floresta, Itacuruba, Petrolndia, Tacaratu, Santa
Maria da boa Vista, Terra Nova, Cabrob, Jatob e Oroc; Sergipe Canind
do So Francisco, Monte Alegre, Nossa Senhora da Glria, Poo Redondo,
Porto da Folha e Gararu. Seu objetivo aproveitar a infra-estrutura usada na
construo da usina de Xing, no rio So Francisco, com a inteno de
constituir um Instituto voltado para a promoo do desenvolvimento sustentvel
da regio, denominado Instituto Xing.
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Alm dos parceiros citados, o Programa Xing conta tambm com
as seguintes Instituies: SUDENE (Superintendncia do Desenvolvimento do
Nordeste), Comunidade Solidria, COEP (Comit de Entidades Pblicas no
Combate Fome e pela Vida), CEPEL (Centro de Pesquisas de Energia
Eltrica), EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria), ETFAL
(Escola Tcnica Federal de Alagoas), INPE (Instituto de Pesquisas Especiais),
UFAL (Universidade Federal de Alagoas), UFBA (Universidade Federal da
Bahia), UNEB (Universidade do Estado da Bahia), UEFS (Universidade
Estadual de Feira de Santana), UFPE (Universidade Federal de Pernambuco),
UFRPE (Universidade Federal Rural de Pernambuco), UFS (Universidade
Federal de Sergipe). O programa tem seu desenvolvimento a partir das
seguintes reas temticas: Aqicultura, Atividades Agropastoris, Arqueologia e
Patrimnio Histrico, Biodiversidade, Educao, Fontes Alternativas de
Energia, Gesto Ambiental e Trabalho, Recursos Hdricos e Turismo.
A construo da hidroeltrica de Xing teve incio na dcada de
80; operrios de diversas regies do Brasil se deslocaram para Xing, trazendo
consigo valores sociais e culturais, que se incorporaram cultura local. Foram
aproximadamente nove mil trabalhadores.
Nesse perodo se configurou uma nova arquitetura. A vegetao
tpica da regio, a Caatinga, comeou a ser substituda pelo concreto.
Ergueram no local uma vila operria para abrigar os trabalhadores, dotados de
clubes, bancos, centro comercial, escolas, fazendo com que Xing viesse a
sofrer impactos ambientais, econmicos, sociais e culturais. Na dcada de 90, moradores da regio de Xing comearam a
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desenvolver novas atividades. As transformaes causadas nas estruturas
produtivas, mercantis, fundirias e tecnolgicas da regio de Xing, implicaram
em mudanas que afetaram a sustentabilidade das famlias, resultando em
transfigurao e num certo modo decadente de suas fontes de renda, de sua
relao com ambiente, com o tempo, com o ldico e com o lazer.
nesse contexto desenvolvemse contedos culturais
relacionados ao lazer, e que nos interessa enquanto realidade formativa.
Ressaltamos a importncia de discutir as questes pertinentes ao lazer, pois,
seja como necessidade, seja como direito assegurado pela Constituio, essa
manifestao cultural constituda historicamente e est impregnada de
sentidos e significados atribudos aos trabalhadores.
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1.2.1 O LAZER: TENTATIVA DE UM CONTRATO SOCIAL
AMPLO.
Desde a Revoluo Industrial, at os dias atuais vrias
formulaes tericas sobre o lazer vm tomando corpo. Algumas na
perspectiva de construo de uma sociedade justa com possibilidade de
acesso para todos, outras, na lgica capitalista de excluso social. Dentre os
documentos que tm sido divulgados sobre o tema, vale destacar a importncia
da Carta do Lazer, documento este que vem dando referncia formulao de
polticas pblicas setoriais de lazer. Esta carta representa um significado
atribudo ao lazer, nem sempre presente, nem compartilhada no ambiente
cultural dos trabalhadores.
Abaixo, apresentamos a Carta do Lazer, desenvolvida em
Bruxelas, para explicitar e com isto reconhecer subsdios para uma melhor
compreenso dos sentidos e significados atribudos ao lazer e ao tempo livre,
como direito a ser garantido a todo cidado, bem como, referencial significativo
para a formao dos trabalhadores.
Nesse documento esto traadas diretrizes para o usufruto dos
contedos culturais centrados no lazer. Defende-se o direito e acesso ao lazer
a todo cidado. No entanto, sendo o lazer um bem com caractersticas
subjetivas e de escolha pessoal, gerado em relaes de produo de vida
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capitalista, em uma sociedade de classes sociais, na prtica, nem todos tm
direito ou acesso ao lazer.
Carta do Lazer
Artigo 1o -Todo homem tem direito ao lazer. Como criador autor e
animador de relaes sociais, tem, sobretudo, direito s atividades de lazer de
sua prpria escolha, no importando sua idade, sexo, nvel de educao ou
condio social.
Artigo 2 -O tempo livre no o tempo desocupado, e as atividades
de lazer so precisamente caracterizadas pelo tempo durante o qual o homem
capaz de realizar-se de acordo com suas aspiraes pessoais, e expressar
sua identidade de maneira criativa.
Artigo 3o -O uso do tempo livre varia de acordo com os padres
sociais. Como objetivo comum, devem existir, contudo, a salvaguarda e a
promoo do desenvolvimento fsico e mental, mantendo e estimulando o
contato com a natureza e a cultura, intensificando a vida social e comunitria,
encorajando o comprometimento, a participao voluntria, o esprito esportivo,
a apreciao do turismo como componente da autorealizao e a compreenso
entre pases.
Artigo 40 - A famlia, a escola e todos os educadores tm papel
determinante a desempenhar quando da iniciao da criana numa atividade
ldica e ativa de lazer, na qual a freqente contradio entre o ensino e a
realidade necessita ser eliminada.
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Artigo 50- _ O tempo livre, em decorrncia de doena, idade,
desemprego, emprego ocasional, pode ser transformado em significativa
atividade de lazer, desde que esteja garantida a seguridade social. Todo ser
humano que seja compelido a uma situao de inatividade, total ou parcial, tem
direito a exercer suas aptides criadoras para participar da vida social. A
sociedade deve organizar-se para possibilitar esta oportunidade aos indivduos.
Artigo 60 -As autoridades devem garantir a realizao das atividades
de lazer, efetivamente baseadas nas possibilidades pessoais de escolha.
Podem contribuir para isso atravs de legislao, oramento, investimento,
criao de equipamentos adequados, estimulo animao e formao de
pessoal. Devem evitar, ainda, a explorao das atividades de lazer que
conduzam a falsas necessidades e formas de recreao incompatvel com a
liberdade criadora e a dignidade humana.
Artigo 70 - Mesmo sendo dever do Estado e de todos os organismos
pblicos garantir condies jurdicas e materiais para atividades de lazer, no
devem deter o monoplio da organizao. Os grupos polticos, sociais, culturais
e religiosos e, sobretudo, os cidados, tm o direito de assumir sua
responsabilidade especfica dentro de uma democracia participativa.
Artigo 8 0 _ Os meios de comunicao devem ser parte de todas as
polticas de lazer e devem ser utilizados para concretizar os princpios
constantes desta carta
(Seminrio Mundial de Lazer, promovido pela Fundao Van Cl-
Bruxelas, abril, 1976).
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Na era dos Direitos segundo Bobbio (1992), nunca se
sistematizaram tantos direitos, em cartas, sejam elas manifestos de
reivindicaes ou Cartas Magnas Constituies, no entanto, nem sempre so
atendidas, cumpridas ou consideradas como sentidos e significados
socialmente construdos e historicamente acumulados.
Bobbio (1992) afirma que o nosso problema fundamental,
atualmente em relao aos direitos dos homens, extrapola a esfera filosfica,
alcanando a dimenso poltica, ou seja, no basta apenas justific-los,
devemos, alm disso, proteg-los. Torna-se relevante ressaltar o que diz
Bobbio, com qual concordo plenamente.
Com efeito, o problema que temos diante de ns no
filosfico, mas jurdico, num sentido mais amplo, poltico.
No se trata de saber quais e quantos so esses direitos,
qual a sua natureza e seu fundamento, se so direitos
naturais ou histricos, absolutos ou relativos, mas sim
qual o modo mais seguro para garant-los, para impedir
que, apesar das solenes declaraes, eles sejam
continuamente violados Bobbio (1992:25).
Essa afirmao nos faz lutar pela garantia desses direitos juntos
aos setores competentes, para que todo cidado venha ter acesso e usufruto
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aos bens culturais do lazer de forma igualitria, onde a escolha no fique
subordinada aos condicionantes da sociedade capitalista, predominando muito
mais o consumo de produtos e servios relacionados ao lazer, do que
propriamente o lazer, ou seja, o desenvolvimento do lazer com liberdade.
1.2.2 OBJETIVOS E QUESTES
O processo reflexivo dessa investigao nos levou a delimitar
como objeto do presente estudo os sentidos e significados atribudos pelos
futuros trabalhadores ao lazer e seus contedos culturais, enquanto elementos
educativos.
Identificar as relaes existentes entre o lazer e o processo
educativo, bem como, discutir questes sobre os sentidos e significados dos
contedos culturais do lazer, enquanto elemento educativo na
escola/comunidade, nos permite dialogar no campo educacional em busca de
uma educao para e pelo lazer4 ; uma educao que redimensiona o prprio
sentido da pedagogia, transcendendo os muros da escola rumo a uma
sociedade pedaggica, onde trabalho, educao e lazer no apaream como
insularidades alienadas e alienantes. De forma ampliada, aqui que se
configura o objetivo maior desse estudo.
4 Renato Requixa, 1974. As Dimenses do Lazer. P-13. O autor aponta para a necessidade de se aprender a usar o tempo livre, percebendo o aspecto educativo existente no lazer, ou seja, educar atravs do lazer e educar para o lazer. Suas argumentaes partem do princpio de que existe duplo aspecto educativo apresentado pelo lazer; em primeira instncia como veculo de educao, isto , a educao, atravs das atividades de lazer; e em segunda instncia, como objeto da educao, isto , a educao para o lazer.
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30
A partir desse delineamento, delimitamos as seguintes questes
investigativas do estudo:
Quais os contedos culturais do lazer vivenciados por professores e alunos
comunidade/escola investigada?
Que sentidos e significados tais contedos culturais do lazer assumem na
prtica educativa da Escola Pblica UNEX 1 e seus entornos comunitrios?
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1.3 O MTODO COMO CAMINHO E ITINERNCIA DE PESQUISA
Aps a formulao das questes bsicas, estabelecemos
procedimentos investigativos na perspectiva de delinear o mtodo que norteou
a investigao. Percorremos diversos caminhos. Os caminhos percorridos
foram cheios de dificuldades, prprios a um estudo que exige:
a) O dilogo com os autores da rea anlise de contedo dos
textos de livros, peridicos e outros;
b) Observao e registro de prticas educativas;
c) Opinio e anlise das falas dos futuros trabalhadores para
reconhecer os sentidos e significados atribudos ao lazer e
seus contedos culturais.
Vale ressaltar que, nesta trajetria busquei elementos na
etnografia das prticas educativas pautadas na sociofenomenologia5 crtica.
Portanto, caminhar na trilha etnogrfica tentar ler um manuscrito estranho,
desbotado, cheio de elipses, incoerncias, emendas suspeitas e comentrios
tendenciosos, escritos no com sinais convencionais do som, mas com
exemplos transitrios de comportamento modelado (Geertz, 1978, pp. 321 e
20 apud Magnani 1984).
5 Podemos encontrar mais sobre o assunto em Cirigliano. Fenomenologia da Educao, 1974.
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32
Uma outra compreenso da natureza etnogrfica a qual tenho
concordncia apresentada por Macedo (1998), quando o mesmo analisa as
opes metodolgicas de cunho qualitativo, principalmente a etnopesquisa:
A opo da etnopesquisa se evidencia pela etnografia
semiolgica como recurso metodolgico bsico e suas
especificidades clnicas ou qualitativas. Tais
especificidades do mtodo etnogrfico nos remeteu, de
alguma forma, noo de pesquisa qualitativa, podendo
assumir esta noo conotaes diferentes, dependendo
da orientao terica de quem utiliza. Tomando de
emprstimo as elaboraes de Ldke e Andr(1986)
sobre as pesquisas que priorizam os mbitos qualitativos
da Educao, podemos dizer que as etnopesquisas
apresentam as seguintes caractersticas metodolgicas:
Tem o contexto como sua fonte direta de dados e o pesquisador
como seus principais instrumentos; supe o contato direto do
pesquisador com o ambiente e a situao que est sendo
investigada; os dados da realidade so predominantemente
descritivos, e aspectos supostamente banais em termos de status de
dados significativamente valorizados.
Nestes aspectos, valoriza-se intensamente a perspectiva
qualitativa-fenomenolgica, que orienta ser impossvel
entender o comportamento humano sem tentar estudar o
quadro referencial e o universo simblico dentro dos quais
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os sujeitos interpretam seus pensamentos, sentimentos e
aes. (1998:144).
Nessa caminhada ter a compreenso mais alargada da
metodologia exercitada, de fundamental importncia para fundamentar
orientar o processo de investigao, para a tomada de decises, na seleo
dos conceitos, das percepes sensibilizadoras, tcnicas e dados. A propsito,
Thiollent nos indica um caminho reflexivo a ser percorrido na busca do mtodo.
... Consiste em analisar as caractersticas dos vrios
mtodos disponveis, avaliar suas capacidades,
potencialidades, limitaes ou distores e criticar os
pressupostos ou as implicaes de sua utilizao. Ao
nvel mais aplicado, a metodologia lida com a avaliao
de tcnicas de pesquisa e com a gerao ou a
experimentao de novos mtodos que remetem aos
modos efetivos de captar e processar informaes e
resolver diversas categorias de problemas tericos e
prticas da investigao. Alm de ser uma disciplina que
estuda os mtodos, a metodologia tambm considerada
como modo de conduzir a pesquisa (1992:25).
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34
Utilizei recursos qualitativos e quantitativos, baseados nos
pressupostos filosficos da sociofenomenologia6, assumindo trabalhar a partir
da complexidade7 da situao concreta da rea, evitando estudos e aes
estanques e pontuais, partindo da construo da metodologia de trabalho
dentro de uma abordagem multirreferencial8, sempre que possvel, buscando a
pluralidade metodolgica a partir de sistemas de referncia diversificados,
entretanto pertinentes, visando enriquecer o olhar sobre o objeto.
Segundo Cirigliano (1974), na realidade no existe o um
mtodo e sim uma atitude, onde nos colocamos e nos apoiamos.
Cabe, ento, apresentar os elementos argumentativos que
Cirigliano (1974:35) utiliza e nos quais me inspirei:
6 Encontraremos mais sobre o assunto em Jacques Ardoino. Editorial: De uma Ambigidade prpria pesquisa ao. As confuses mantidas pelas Prticas de Interveno. R. bras. Est. Pedag. Braslia, v74, n. 178, p.701.712, set. /dez. 1993. 7 Ver E. Morin, Terra Ptria, p. 147-152. Seria interessante tambm ver as argumentaes sobre complexidade apresentadas por Burnham, Terezinha Fres. Complexidade, Multirreferencialidade, Subjetividade: trs referencias polemicas para a compreenso do currculo escolar. Revista em Aberto, Braslia, Ano 12 nmero 58, Abril/Junho 1993, p-3 13. 8 Ver Multirreferencial. Considerando a concepo ampliada dada pelo grupo da AT Gesto Ambiental, a Multirreferencialidade, adotamos o mesmo conceito utilizado pela AT, junto ao Programa Xing, cujo objetivo de manter uma relao de constante troca no s quanto ao saber acadmico, mas tambm aos demais saberes das populaes locais, visando apreenso da realidade atravs da observao, da investigao, da escuta, do entendimento, da descrio por ticas e sistemas de referencia diferentes, aceitos como definitivamente irredutveis uns aos outros e traduzidos por linguagens distintas, supondo como exigncia a capacidade do pesquisador de ser poliglota, dispor-se a realizar leituras polissmicas e ter uma postura aberta para um processo de permanente construo . Esta perspectiva encaminha a si mesma (como implicao), uma viso de mundo propriamente cultural e requer uma compreenso hermenutica da situao em que sujeito ai implicado interage, intersubjetivamente (Cf> ARDOINO, J. Complexit. Paris: Universit de Paris VIII, juin, 1992(mimeo) e De la clinique. Paris: Universit de Paris VIII, avril, 1989 (mimeo) e BARBIER, R. L Approche Tranversalle: Sensibilization a lcoute mytho - potique en education. Paris. Universit de Paris VIII, 1992 (Note de Synthse en vue de lhabilitation a diriger des recherches) e LEcoute sensible en education. Texto original da conferencia apresentada na 15a Reunio Anual da ANPED. Caxambu, MG, 1992.
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Embora no julguemos poder contar com todos os
elementos e capacidade para atingir uma real
fenomenologia, precisando dispor de um mtodo,
preferimos, antes de utilizar algum, apoiarmos nos
numa corrente que essencialmente metdica. Pois,
conforme esta interpretao, estudar fenomenologia no
utilizar um mtodo previamente considerado desta, porm
simplesmente cingir se a regras formais dirigidas
especialmente ao fenmeno. No existe ou
mtodo fenomenolgico, mas uma atitude. Nesta atitude
nos colocamos; nessa atitude nos apoiamos....
Para realizar as observaes, optei em participar do processo9
atravs de leitura e interpretao critica da realidade que envolvia os processos
culturais caractersticos da regio, com os contornos de especificidade que lhe
confere a populao local.
Do nosso ponto de vista, um grande fator importante em uma
pesquisa quantitativa a possibilidade de desenvolv-la dentro de uma
abordagem crtica. O estudo de caso possibilita essa abordagem. Nesse
sentido, quanto ao modo de investigao, optei em utilizar o estudo de caso
contextualizado e relacional.
9 Seria interessante a leitura da a abordagem de pesquisa participante que Teresa Maria Frota Haguete apresenta em seu livro Metodologias Qualitativas na Sociologia, p. 66 78, 1987.
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36
Macedo (1998) apresenta uma abordagem mais detalhada sobre
estudo de caso. O autor aponta em seu livro A Etnopesquisa Critica e
Multirreferencial nas Cincias Humanas e na Educao, a possibilidade da
busca de uma densidade significativa, apresentando caractersticas
importantes para que o pesquisador venha fazer sua opo metodolgica.
Ao mesmo tempo, Macedo (1998) justifica a importncia em
trabalhar a partir do estudo de caso, chegando a afirmar que a preocupao
principal dessa opo metodolgica compreender uma instancia singular,
especial. Macedo (1998) chega a firmar que os estudos de caso visam
descoberta, partindo do entendimento de que o conhecimento algo sempre
em construo e se re-significa a todo o momento. (1998:150).
Assim, o estudo de caso tem por preocupao principal
compreender uma instancia singular, especial. O objeto
estudado tratado como nico, ideogrfico (especial,
singular) mesmo compreendendo-o enquanto
emergncia molar e relacional, isto , consubstancia-se
numa totalidade composta de e que compe outros
mbitos ou realidades. Desse modo, a questo sobre o
caso ser ou no tpico, isto , empiricamente
representativo de uma populao determinada torna-se
inadequado; o objeto no recortado por uma
amostragem com preocupaes nomotticas, j que cada
caso tratado como tendo um valor prprio. Alm disso,
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37
em face da inerente flexibilidade dos estudos pontuais, da
abertura que cultiva face ao inusitado, os casos
estudados vo constituir teorias em ato, impregnadas
dos aspectos inerentes temporalidade da emergncia
complexa das realidades vivas ( Macedo 1998:150).
Como tcnicas de coleta de dados, utilizei recursos metodolgicos
tais como a entrevista semi-estruturada, a observao participante, a fotografia,
grupo focal ou entrevista coletiva;
Durante a realizao da pesquisa, utilizei como forma de registro,
formulrios, fotografias, gravaes, conversas informais com membros da
comunidade, bem como o dirio de campo com descrio densa da minha
itinerncia de pesquisa.
Macedo (1998) diz:
O pesquisador etno uma pessoa que chega totalizado e
totalizando-se para realizar seu fieldwork; no deixa em
seu bureau suas convices, sua itinerncia, como
estudioso de fenmenos humanos, bem como defronta-se
arduamente enquanto sujeito/pessoa com suas prprias
observaes, pondo em evidencia suas implicaes,
consubstanciadas nas suas motivaes, perspectivas e
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38
finalidades.Compreende que para suspender preconceitos
necessrio t-los explcitos (1998:145).
No que concerne pertinncia e relevncia dos recursos
metodolgicos utilizados, temos que uma pesquisa qualitativa aquela que nos
permite reconhecer a partir da descrio, anlise e interpretao dos dados
adquiridos durante o processo investigativo, os sentidos e significados dos
atores sociais e torn-los contextualizados aos nossos achados, sem uma
preocupao em generalizar.
Conforme diz Airton Negrine (1999):
... Os modelos metodolgicos adotados nesse tipo de
pesquisa apresentam, no momento, uma franja
interessante e, de certo modo, ampla. Variam desde os
estudos hermenuticos e fenomenolgicos, utilizados com
freqncia no campo da filosofia, at estudos etnogrficos
que esto muito presentes nas investigaes
antropolgicas (1999:61).
Segundo Magnani (1984), a fala dos sujeitos permite reconhecer
o nosso objeto de estudo com maior detalhe, podendo, a partir da, re-signific-
lo, percebendo cada atitude, cada detalhe que possibilite sentidos e
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39
significados que venham aparecer durante a pesquisa, ou seja, ir alm das
aparncias que normalmente esto presentes nas pesquisas de cunho nica e
exclusivamente quantitativo.
Magnani nos diz:
... preciso estar atento a cada gesto, palavra ou hbito
por mais insignificante que possam aparecer. Para
compreender seu significado e poder relacion-los com
outros aspectos do sistema cultural imprescindvel, alm
das explicaes dos nativos, observ-los no contexto da
vida tribal. Faz-se necessrio inclusive manter, de alguma
forma, esta situao de estranhamento, pois medida
que o desconhecido vai se tornando familiar, corre-se o
risco de prestar ateno apenas a questes
supostamente mais importantes. (Magnani, 1984:10).
O lcus da pesquisa foi basicamente a Regio do Programa
Xing, permetro do Irrigado do So Francisco, especificamente na Unidade
Escolar de Xing e a comunidade do seu entorno.
A seleo dos sujeitos se deu da seguinte maneira: Foram
escolhidos dois alunos de cada srie do Ensino Fundamental da Escola UNEX
I (Unidade Escolar de Xing), do Projeto Canind para fazer parte da nossa
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40
pesquisa, podendo ser lderes de classes ou no, perfazendo um total de 32
alunos que voluntariamente se apresentaram querendo participar do estudo. O
critrio, portanto, foi da motivao em narrar suas experincias a respeito da
temtica.
Em relao ao corpo docente, foram realizadas entrevistas com
professores de Educao Fsica e Educao Artstica, devido ao fato de ambas
as disciplinas tratarem dos contedos culturais do lazer na escola. Foram
ouvidos, tambm, professores de outras disciplinas que costumavam organizar
eventos culturais na escola.
Alm dos sujeitos envolvidos diretamente com o processo de
escolarizao, foram entrevistados sujeitos da comunidade que tinham ou no
passado por um processo de escolarizao, mas que estabeleceram vivncias
com a escola, influenciando no currculo, principalmente o oculto.
Moreira diz:
De particular importncia para a anlise e a maior
compreenso da prtica curricular tem sido o conceito de
currculo oculto, difundido pelos autores da teoria crtica
de currculo. Entendido como normas e valores que so
implcitas, porm efetivamente transmitidos pelas escolas
e que habitualmente no so mencionados na
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41
apresentao feita pelos professores dos fins ou
objetivos (Apple 1982, p.127), o conceito de currculo
oculto aponta para o fato de que o aprendizado
incidental durante o curso pode contribuir mais para a
socializao do estudante que o conceito ensinado em
curso. Ainda que acentuando, em suas primeiras
teorizaes, o papel reprodutor da escola e do currculo, a
idia de currculo oculto vem a ampliar-se e passa a
significar no s o terreno por excelncia de controle
social, mas tambm o espao no qual se travam lutas
ideolgicas e polticas, passvel, portanto, de abrigar
intervenes que visem mudanas sociais(Whitty1985).
Em outras palavras a viso reducionista da escola e do
currculo como instrumentos utilizados para manuteno
dos privilgios de classes e grupos dominantes acaba por
ser substituda por uma perspectiva mais complexa, na
qual contradies, conflitos e resistncias vm a
desempenhar papel de relevo (Moreira, 1997:14).
As narrativas apresentadas no desenvolvimento da nossa
pesquisa permitiram identificar informaes significativas, que deram
representatividade ao contexto pesquisado. Dessa forma, as interpretaes
referentes aos atores sociais puderam ser codificadas e categorizadas de
forma relevante e significativa, tomando o contexto estudado e sua produo.
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Nossa opo metodolgica, buscou articular os contedos e
mtodos da sociofenomenologia com o marxismo libertrio encontrada no
interior das elaboraes e estudos da nova sociologia da educao.
A preocupao em articular etnopesquisa, mtodo dialtico e a
nova sociologia da educao nasceu do vazio deixado pela fenomenologia que
fundamenta a etnopesquisa, quando parte para anlise das particularidades de
uma determinada estrutura social no atentando para as contradies de um
mundo desenhado no insupervel conflito entre capital e trabalho.
Macedo (1998) apresenta possibilidades de articulao entre a
etnopesquisa e o marxismo libertrio. Suas argumentaes apontam para a
necessidade um marxismo sensvel existncia, que possibilite uma
etnopesquisa implicada e engajada com as transformaes das prticas
inquas, e uma prxis solidria, vinculada a uma tica comunitria:
(...) As questes ideolgicas e a problemtica da falsa
conscincia constituem-se num n de difcil resoluo
para o fenomenlogo. Alm disso, a scio-fenomenologia
tem pouco a dizer sobre o conflito estrutural numa
sociedade e quase nada argumenta sobre o entendimento
dialtico da mudana histrica e as condies materiais
de existncia que embora socialmente produzidas,
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tornam-se objetificadas, portanto, no podem
simplesmente ser racionalizadas. Priorizando a
intersubjetividade ao desreificar os sistemas de
pensamento e as aes que lhes configuram, a
abordagem scio-fenomenolgica carece de articulaes,
onde a desreificao prtica deve fazer-se mais potente
pelas vias das relaes sociais, para ser mais preciso,
pela via da prxis (Sarup, 1986). (...) Se a scio-
fenomenologia resgata compreensivamente na histria
um sujeito interessado, o mtodo dialtico o v a partir
dos coletivos sociais, forjando, aqui, uma dialtica que
aponta inexoravelmente para a humanizao concreta e
transformadora do ser social pela suas condies
concretas. (...). Via mtodo dialtico, o fenmeno
estudado dever apresentar ao leitor de tal forma que ele
o apreenda em sua totalidade. Para tanto, necessrias se
fazem aproximaes sucessivas e cada vez mais
abrangentes. No se trata, aqui, de uma totalidade que
vai abarcar tudo estaticamente, mas uma totalizao em
curso, como quer Sartre, que se configura a cada relao
estabelecida (Macedo, 1998:131-132).
Nesse sentido, acreditamos existir a possibilidade de um convvio
harmnico entre a sociofenomenologia e o marxismo libertrio, pois, a partir
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dessa confluncia que poderemos problematizar noes de racionalidade,
mtodo, infncia, educao, trabalho, lazer e, principalmente, currculo.
Para expor os frutos da investigao, estruturamos os captulos
da seguinte maneira:
No primeiro capitulo, apresentamos o dilogo com os principais
autores que tratam da relao educao trabalho lazer para desvelar
sentidos e significados atribudos que podem ser captados no discurso.
No segundo capitulo, descrevemos as vivncias desenvolvidas e
o dilogo mantido com os futuros trabalhadores para desvelar sentidos e
significados. Discutiremos tambm as relaes e contradies reconhecidas
em sentidos e significados atribudas pelos tericos, assumidas nas vivncias e
explicitadas pelos trabalhadores.
Com estes elementos nos possvel discutir o currculo de
formao do futuro trabalhador e a construo de sentidos e significados de
uma relevante dimenso humana: O lazer e seus contedos culturais.
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CAPITULO I
DILOGOS E INSPIRAES TERICAS
1. UM OLHAR CONCEITUAL SOBRE O LAZER
Traar um olhar conceitual sobre o lazer ser nosso objetivo neste
momento, sem perder a dimenso de que, ao conceitu-lo no pretendemos
limitar a possibilidade de avanar nas discusses, seguindo caminhos lineares
e sim conceituar na perspectiva de buscar novas referncias tericas, no
sentido de transpor os horizontes j traados tentando estabelecer relaes
entre autores clssicos como Jofre Dumazedier e autores contemporneos,
como Nelson Carvalho Marcelino, Camargo, na inteno de constatarmos ou
no, as indagaes levantadas por ns.
Quais os contedos culturais do lazer vivenciados por professores
e alunos comunidade/escola em Xing?
Que sentidos e significados os contedos culturais do lazer
assumem na prtica educativa no contexto escolar e seus entornos
comunitrios, em Xing?
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Entre os autores que se dedicam ao estudo sobre o lazer, no
existe um consenso sobre o seu conceito, podendo-se, entretanto, identificar
duas grandes linhas. Numa delas, aparece com predominncia o aspecto
atitude, considerando o lazer como um estilo de vida, portanto independente
de um tempo determinado; a outra linha privilegia o aspecto tempo, situando-o
como tempo liberado do trabalho, ou como tempo livre, no s do trabalho,
mas de outras obrigaes sejam elas familiares, sociais ou religiosas,
considerando tambm a qualidade das ocupaes desenvolvidas.
Marcelino diz que:
(...) O lazer considerado como atitude ser caracterizado
pelo tipo de relao verificada entre o sujeito e a
experincia vivida, basicamente a satisfao provocada
pela atividade. Assim, qualquer situao poder se
constituir em oportunidade para a prtica de lazer - at
mesmo o trabalho. (...) J o conceito que restringe o lazer
a um tempo determinado tambm engloba aspectos
nebulosos, uma vez que, uma mesma pessoa pode num
certo perodo de tempo, desenvolver mais de uma
atividade; por exemplo, ouvir msica enquanto trabalha.
Alm disso, tempo algum pode ser considerado livre de
coaes ou mesmo conduta social. Talvez, fosse mais
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correto falar em tempo disponvel, ao invs de tempo livre
(Marcelino, 1987:29).
No Brasil, muito embora sejam observadas tendncias, ainda que
no muito bem definidas, relacionadas s duas orientaes referidas acima, a
grande maioria dos estudos sobre o lazer, seja qual for o enfoque ou rea de
atuao, tem como referncia o conceito defendido pelo socilogo Dumazedier.
(1974). Ele defende que o lazer o:
... conjunto de ocupaes s quais o indivduo pode
entregar-se de livre vontade seja para repousar, seja para
divertir-se, recrear-se e entreter-se ou ainda para
desenvolver sua formao desinteressada, sua
participao social voluntria, ou sua livre capacidade
criadora, aps livrar-se ou desembaraar-se das
obrigaes profissionais, familiares e sociais.
J Requixa (1980) define lazer como:
... ocupao no obrigatria, de livre escolha do indivduo
que a vive, e cujos valores propiciam condies de
recuperao psicossomtica e de desenvolvimento
pessoal e social.
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Para Medeiros (1980), o lazer :
... o espao de tempo no comprometido, ao qual
podemos dispor livremente, porque j cumprimos nossas
obrigaes de trabalho e da vida.
Do ponto de vista de Cavalcanti (1984), o lazer deveria ser um
espao para o real desenvolvimento do indivduo; no entanto, devido a uma
laicizao10 do tempo livre, causado pura e exclusivamente pelo processo de
industrializao, o que se tem percebido na realidade da atual sociedade, no
seria o lazer e sim o antilazer, isto , as exigncias causadas e impostas pela
nossa sociedade. Cavalcanti (1984-67) nos leva a compreender melhor este
fenmeno, quando diz:
Nesse contexto, o lazer surge como uma construo
ideolgica, sob a qual o antilazer aproveita-se para
penetrar mais eficazmente no modo de vida das pessoas
com objetivo de mant-las perfeitamente integradas na
sociedade industrial e urbana.
O lazer entendido por Marcelino (1987), como cultura
compreendida no seu sentido mais amplo, vivenciada (praticada ou fruda) no
tempo disponvel.
10 Expresso utilizada por Cavalcanti (1984), em seu livro Esporte para todos: um discurso ideolgico. So Paulo: IBRASA, que significa regulamentao do tempo, uma doutrinao, um controle regido pelas instituies sociopolticas e culturais, tirando a autonomia diante da escolha do lazer.
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Marcelino afirma ainda que:
O importante, como trao definidor, o carter
desinteressado dessa vivncia. No se busca, pelo
menos fundamentalmente, outra recompensa alm da
satisfao provocada pela situao. A disponibilidade de
tempo significa possibilidade de opo pela atividade
prtica ou contemplativa. Marcelino (1987- 31).
A diversidade verificada quanto ao conceito permanece, quando
se examina a questo da ocorrncia do lazer na vida social, do ponto de vista
histrico. Alguns autores consideram que os homens sempre trabalharam, mas
tambm sempre paravam de trabalhar, existindo, assim, um tempo de no-
trabalho, e que esse tempo seria ocupado por atividades de lazer, mesmo nas
sociedades tradicionais. Para outros, o lazer fruto da sociedade moderno-
urbano-industrial.
Na realidade, no h, a rigor, um antagonismo entre os autores
que defendem as duas correntes; mas sim, enfoques diferentes. Alguns
abordam a necessidade de lazer, sempre presente, e outros se detm nas
caractersticas que essa necessidade assume na sociedade. Afirmando que o
lazer sempre existiu, variando apenas os conceitos sobre o que era e quais os
seus significados.
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Marcelino (1993) afirma que, em algumas formas de organizao
social, o que se verifica o no - isolamento entre as atividades obrigatrias e
as ldicas, o que de modo algum significaria a no - existncia do ldico. E
mais ainda o que no nos permite prever se essa diviso trabalho/lazer,
verificada atualmente na sociedade moderno - urbano - industrial, permanecer
efetivamente ou no.
Entretanto, so exatamente as produes tericas dos estudiosos
contemporneos brasileiros do lazer que nos vm trazendo motivao para
pesquisar sobre o tema em questo, possibilitando-nos, na medida do possvel,
re-significar os conceitos construdos historicamente, tentando superar as
vises funcionalistas, compensatrias e romnticas do lazer e apontar
caminhos para o usufruto dos bens culturais do lazer dentro e fora da escola
como forma de promoo social e difuso cultural, na superao do
conformismo e apontando para a criticidade.
Ao admitirmos a atividade de lazer como veculo de educao11,
considerando suas potencialidades para o desenvolvimento social e pessoal
dos indivduos, cumpre-nos refletir sobre o modelo de trabalho predominante
em uma sociedade como a nossa, industrial capitalista, a qual, ao gerar novas
condies de vida, necessitou de novas prticas sociais que auxiliassem na
adaptao dos indivduos a esse modelo.
11 Termo utilizado por Nelson Carvalho Marcelino no livro Lazer e Educao Campinas, SP: Papirus, 1987. As argumentaes apresentadas pelo autor partem do principio de que o lazer tem um alto potencial educativo, ou seja, pelo lazer pode-se educar. P-60.
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Esta sociedade, moldada pelos valores polticos de obedincia e
disciplina e pelos valores econmicos de racionalidade tcnica e eficincia,
trata o lazer como do produto prefixado que deve ser consumido
indiscriminadamente, levando o indivduo perda da autonomia pessoal,
estabelecendo um elo de ligao entre o que produzido e o que consumido
pela sociedade, fazendo prevalecer o ter em contraposio do ser, onde estaria
disposio de um raro prazer ou o sucesso casual estabelecido pela
propaganda ideolgica da chamada cultura do lazer12.
Vale dizer que o lazer compreendido como fenmeno scio-
cultural-histrico do mundo ocidental e oriental moderno, motor de
reivindicaes sociais a partir da Revoluo Industrial e oriundo das
necessidades de um tempo legal de folga, devido existncia de jornadas
excessivas de trabalho. Com os movimentos trabalhistas europeus, surgem as
primeiras leis nesse sentido, as quais geraram a reduo da jornada de
trabalho, o descanso remunerado durante os fins-de-semana, as frias e os
feriados.
Ao mesmo tempo em que o lazer representa conquista pelo direito
a espaos de tempo, que pudessem se contrapor s obrigaes cotidianas do
trabalho, representa, tambm, demanda por um tempo disponvel e privilegiado
12 Termo utilizado por Edgar Morin no livro Terra Ptria Porto Alegre: Sulina, 1995. Cultura do lazer para Morin significa cultura forjada a partir da industrializao onde tem como predominncia o consumo de produtos e servios relacionados s atividades de lazer e no o prprio desenvolvimento do lazer.O autor enfatiza o desenvolvimento de atitudes relacionadas ao ter em relao ao ser, presentes hoje na nossa sociedade de consumo.
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para a concretizao de experincias ldicas, por momentos de jogar a vida e
por qualidade no viver.
Compreendendo o lazer no seu sentido mais amplo como
cultura vivenciada no tempo disponvel das pessoas, Nelson Carvalho
Marcelino enfatiza que a disponibilidade de tempo implica a possibilidade de
opo pelo lazer, entretanto, o que realmente tem acontecido a recuperao
psicossomtica do indivduo, mantendo-o mais perfeitamente adequado para o
seu lazer, criando a chamada cultura do lazer.
No entanto, por fora do prprio estilo de vida que,
historicamente, o gera como tempo de no-trabalho, o lazer vem sendo em
nossa sociedade, valorizado como meio de recuperao no campo
psicofisiolgico ou para reciclar as foras de trabalho, atravs do alvio das
tenses provocadas pela rotina do trabalho e da moralizao, que requer o
modo de produo dominante.
No entanto, surgem discursos contraditrios, pois, ao mesmo
tempo em que o lazer depreciado por alguns como tempo no srio, intil, de
"vagabundagem", por ocupar o seu tempo de no-trabalho, ele valorizado
por outros como tempo no srio de atividades recreativas, ampliando, por
isso, seu valor de mercado.
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Recorrendo a Bourdieu e Passeron (1992), em sua obra a
Reproduo, nos possvel compreender como no mercado se colocam os
contedos culturais vivenciados no lazer como produto de consumo. As
atividades recreativas, como bens simblicos, receberam valores diferenciados
entre si e em relao a outros contedos culturais.
Nesse mercado capitalista, entendido como o conjunto das
condies sociais de produo e de reproduo dos produtores e
consumidores, onde o lazer est inserido, o xito de uma atividade est em
funo do capital cultural, isto , em funo dos bens culturais transmitidos
pelas diferentes atividades de lazer inclusive as aes pedaggicas cujos
valores, enquanto capital cultural, esto em funo da distncia entre o
arbitrrio cultural, inculcado, pela ao pedaggica familiar, os diferentes
grupos e classes.
importante considerar que vivemos em uma sociedade onde
convivem grupos diferenciados, com condies materiais de existncia e
caractersticas culturais prprias sem, contudo, viverem isoladamente. Apesar
desses grupos se relacionarem uns com os outros em certos lugares e
momentos, os padres culturais dos grupos dominantes vm sendo
considerados como superiores em relao aos demais, influenciando a
valorizao da vivncia de certos contedos culturais do lazer13.
13 O que estou considerando Contedos Culturais do Lazer so as atividades denominadas por Jofre Dumazedier, de interesses culturais do lazer tendo o mesmo significado. Os interesses culturais do lazer esto divididos em Interesses fsico-esportivos, manuais, intelectuais, artsticos, sociais e tursticos.
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Jofre Dumazedier (1976) classifica as atividades de lazer de
acordo com os interesses culturais, o mesmo as denomina da seguinte
maneira:
Interesses Fsico-Esportivos - Atividades essas relacionadas s prticas
corporais que o indivduo desenvolve. Por exemplo: Jogar futebol, caminhar,
pedalar;
Interesses Manuais - Todas as atividades de lazer relacionadas com as
prticas de jardinagem, lavar um carro, bricolagem, artesanato;
Interesses Intelectuais - Todas as atividades que tenham em sua
realizao, relaes com o lgico-racional. Exemplo: a leitura de um livro, um
jogo de xadrez;
Interesses Artsticos - Todas as atividades relacionadas com obras de arte,
como a ida ao cinema, ao teatro;
Interesses Sociais - O desenvolver de atividades ao qual estabelea a
participao de grupos, reunies, festejos;
Aps a denominao dada por Jofre Dumazedier, criado por um
dos seus seguidores um outro interesse. Interesse Turstico Este, na
realidade, foi desenvolvido por Lus Octvio de Camargo, em seu livro O que
lazer, tendo relao com passeios, viagens, excurses.
Cabe ressaltar que essa classificao meramente didtica, pois,
podem-se desenvolver diversos interesses em uma s atividade de lazer,
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55
havendo em alguns momentos predominncia de um interesse em relao a
outro.
Vale salientar que o desenvolvimento do lazer se d em trs
formas de ao, podendo estabelecer conexes entre si, seja no praticar,
assistir e estudar; portanto, o desenvolvimento do lazer deveria se dar,
resgatando a etimologia da palavra no latim, buscando a compreenso desse
fenmeno na sua dinmica cultural; portanto, lazer significa licere14 em latim e
em sua traduo ser permitido, ser lcito.
importante ressaltar que a forma primitiva da palavra lazer era
lezer, se configurando em outras palavras como lezeira, lezo. Um exemplo
prtico dessa configurao a expresso: Eu hoje estou com lezeira,
remetendo ao significado de preguia, pouca vontade de trabalhar.
Segundo Bramante (1997) as variveis que compem o lazer so:
tempo, atitude, espao e experincias ldicas. Sendo que trs eixos bsicos se
interligam em nvel conceitual, ou seja, tempo de no-trabalho, espao de sua
vivncia e atitude do indivduo em relao ao seu interesse cultural pelo lazer,
resultando em uma experincia denominada por Bramante (1997), de
experincia ldica e que acrescentaramos de experincia prazerosa. .
14 Termo utilizado por Inezil Penna Marinho no livro Razes Etimolgica, Histrica e Jurdica do Lazer. Braslia, 1979.
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Um outro fator importante dentro do entendimento do lazer
a sua propriedade; ela d o trao definidor do lazer. Lazer resulta de livre
escolha, ou seja, a liberao de certo gnero de obrigaes; portanto tem o
carter liberatrio presente; lazer resulta de seu carter desinteressado15, lazer
detm o carter hedonstico. Dumazedier (1974:95) define esta ltima
propriedade da seguinte maneira:
De incio definido negativamente com respeito s
obrigaes institucionais e s finalidades impostas pelos
organismos de base da sociedade, o lazer se define
positivamente no tocante s necessidades da pessoa,
mesmo quando esta as realiza dentro de um grupo de sua
escolha. Na quase totalidade das pesquisas empricas, o
lazer marcado pela busca de um estado de satisfao,
tomando como fim em si. Esta busca de natureza
hedonstica. Certamente, a felicidade no se reduz ao
lazer, ela pode acompanhar o exerccio das obrigaes
sociais de base. A alegria no o resultado automtico
deste artifcio social que deveria servir para gerar a
alegria: o jogo. Mas a procura do prazer, da felicidade ou
da alegria, um dos traos fundamentais do lazer da
sociedade moderna. (Dumazedier: 96- 1974).
15 Sobre o carter desinteressado, ver as argumentaes de Jofre Dumazedier, em seu livro Sociologia Emprica do Lazer: Perspectivas, p. 94, 1974.
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Uma outra propriedade apresentada pelo lazer o de escolha
pessoal, podendo o indivduo utilizar o lazer seja para repousar, seja para
divertir-se ou ainda para o seu desenvolvimento pessoal e social. Digo que
isso na realidade no vem acontecendo, devido ao fato da perda de autonomia
pessoal causada pelas exigncias sociais voltadas para o consumo de
produtos e servios ligados ao mundo do lazer.
Verifica-se que as valorizaes do consumo de certos contedos
culturais do lazer vm cada vez mais requerendo a oferta especfica e
sistemtica de bens e servios, assim como interveno de profissionais
variados para atender a uma grande demanda.
Muitos desses profissionais so considerados como
socializadores de saberes, cujas aes pedaggicas centram-se no fazer pelo
fazer, ressaltando os contornos do fazer mecnico, fundado em normas e
tcnicas pr - estabelecidas, e cada vez mais distante de realizaes ldicas.
Isso indica que o lazer, em nosso contexto social , muitas vezes, usado como
instrumento de manobras, sobretudo, de controle do corpo e do elemento
ldico.
Segundo Riesman (1961) surgiram e se firmaram os
especialistas do lazer que os denominava de Consultores de lazer:
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Para levar o indivduo a estabelecer um contato que no
o amedronte em face da nova srie de oportunidades de
consumo, necessrio alguns guias e sinalizaes. Em
nossa sociedade urbana, especialista, isto poder exigir
consultores de lazer .
A consultoria de lazer poder parecer um termo um tanto
clnico para descrever as atividades empreendidas por um
nmero de profisses em crescimento relativamente
rpido nos Estados Unidos, incluindo agentes de viagem
e turismo, tcnicas em hotelaria, treinadores e
professores de esportes, diretores de estncias de frias,
professores de artes, professores de dana e assim por
diante.(1961 p 370 371).
A satisfao ldica requer a participao dos sujeitos na
construo de atitudes, no espao e no tempo brincante. Torna-se, portanto,
pice de projeto de quem implica a arquitetura de sonhos e aventuras com
gosto e empenho, correndo riscos, sem constrangimento, e levando a srio,
sem sisudez, todos os momentos jogados, desde os mais singelos aos mais
significativos, reconstruindo novas formas de viver e reviver emoes, sob a
tica da sensibilidade, da esttica, do jogo, do brinquedo e do ldico.
Viver o lazer e o ldico significa a recriao de novas formas de
sentir, pensar e agir, em tempo e espao estabelecidos na relao entre quem
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joga e jogado, sem perder de vista os sonhos que fazem o nosso imaginrio
transcender o mundo real.
O que nos faz concordar com Leila Mirtes (1995), quando ela
afirma que:
Viver o lazer como esforo por concretizar o ldico ,
sobretudo, renovar relaes interpessoais, experincias
corporais, ambiente, temporalidade e energia;
reencontrar consigo mesmo, com o que gosta e deseja;
compreender como nossos sonhos se constituem no
contexto em que vivemos, transbordar a crtica e a
criatividade; e saborear o momento presente como
possibilidade de vivncias de utopias, ou seja, com
alegria, buscar interferir nos horizontes que se enunciam
no presente.
Enfim, viver o lazer buscar, a partir das multirreferncias que a
sociedade nos coloca, as possibilidades de transpor o mundo do imaginrio
social e reinventar os rumos da nossa histria, valorizando a criana na escola
e fora dela, o jogo, no sentido de favorecer a construo de uma sociedade
justa e humana.
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Para Roberto Sidnei Macedo, em seu artigo intitulado Por uma
epistemologia multirreferencial e complexas nos meios educacionais. Revista
da FAEEBA, nmero7, 1997 p. 33-52, multirreferncias supe a capacidade
de falar vrias lnguas (inteligibilidades) sem as confundir Suas
argumentaes esto baseadas nos pensamentos de Jacques Ardoino e Edgar
Morin.
Macedo (1997) enfatiza a necessidade de uma articulao critica
de diversas inteligibilidades dentro da multirreferncialidade; chega a sugerir a
reflexo da prpria interdisciplinaridade, levando em considerao as
limitaes e possibilidades histricas da mesma. Chega ainda a alertar que a
especificidade da inspirao complexa da multirreferncialidade no est na
prtica complementar, aditiva, ou do domnio absoluto do conhecimento, mas
na afirmao dos diversos campos do saber, da tomada de conscincia da
necessidade do rigor fecundante, da nossa ignorncia enquanto inquietao
(1997:62).
Quanto construo de uma sociedade justa e humana,
acreditamos que ela deva est pautada na felicidade, na alegria, na
possibilidade de sonhar por um mundo, onde a escola, a criana, o ldico
tenham novas configuraes, em busca da educao para e pelo lazer. Sem
negao da utopia, nem pregao do infantilismo, to pouco romntica, mas
com possveis realizaes onde o prazer e a dor sejam saborosamente
saborosos, onde a dialtica determine esse convvio, dando possibilidade de
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criar, recriar e recrear esse espao de difuso e produo cultural que o
lazer.
Concluindo a anlise dos conceitos, podemos admitir que na
realidade o lazer vem perdendo o seu significado real, devido s impregnaes
causadas pela sociedade do consumo, ou seja, seu sentido tem se re-
significado.
Apesar do lazer, ter sido forjado a partir das reivindicaes
trabalhistas, o mesmo adquiriu sentidos no qual desencadeou em sua perda de
autonomia pessoal, deixando de ser uma atividade nica e exclusivamente de
escolha pessoal, com liberdade. No entanto, acreditamos que, mesmo com
todas as mudanas que o capitalismo causou nas prticas de lazer, torna-se
possvel termos uma atitude crtica com relao a essa atividade, aonde a
democratizao venha existir, dando condio e possibilidade a todos do
acesso e direito ao lazer com um maior significado.
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II. LAZER EM UMA SOCIEDADE CAPITALISTA:
RECUPERANDO ELEMENTOS DA CRTICA
Economizar tempo de trabalho aumentar o tempo livre,
isto , o tempo que serve ao desenvolvimento completo
do individuo. O tempo livre para distrao, assim como
para as atividades superiores, transformar naturalmente
quem dele tira proveito num individuo diferente... K. Marx,
1957.
No presente capitulo estarei apresentando os principais
argumentos de estudiosos de diferentes reas que permitem reconhecer e
sistematizar contribuies acerca do Lazer nas relaes capitalistas de
produo e reproduo da vida, buscando tambm elementos na trajetria
histrica do processo civilizatrio.
Dito isso, recuperamos da histria da humanidade que desde o
inicio do seu nascimento, o ser humano busca novos horizontes, seja no ato
inaugural da criao do fogo, da roda, no descobrimento da plvora, seja na
inveno da mquina; este ser vive uma ciranda de ousadias e riscos
descortinando as fronteiras do at ento desconhecido.
Autores como Norbert Elias (1994) nos apresentam dados
significativos com relao ao processo civilizatrio. Elias (1994), ao justificar
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sua abordagem, leva em considerao inicialmente o conceito de civilizao,
afirmando existir uma grande variedade de fatos responsveis pela sua
conceituao. Fatores como nvel de tecnologia, tipos de maneiras,
desenvolvimento dos conhecimentos cientficos, s idias religiosas e aos
costumes, determinam o sentido de civilizao.
Um outro fator importante abordado por Elias (1994), em relao
funo geral do conceito de civilizao a conscincia que o mundo
ocidental atribui a si mesmo.
Elias (1994) diz:
Mas se examinarmos o que realmente constitui a funo
geral do conceito de civilizao, e que qualidade comum
leva todas essas vrias atitudes e atividades humanas a
serem descritas como civilizadas, partimos de uma
descoberta muito simples: este conceito expressa a
conscincia que o Ocidente tem de si mesmo.
Poderamos at dizer: a conscincia nacional. Ele resume
tudo em que a sociedade ocidental dos ltimos dois ou
trs sculos se julga superior a sociedades mais antigas
ou a sociedades contemporneas mais primitivas . Com
essa palavra, a sociedade ocidental procura descrever o
que lhe constitui o carter especial e aquilo de que se
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orgulha: o nvel de sua tecnologia, a natureza de suas
maneiras, o desenvolvimento de cultura cientifica ou viso
do mundo , e muito mais(p-23).
No af de dominar a si prpria e sua exterioridade, a humanidade
torna-se cada vez mais desafiadora de seus prprios limites, vivenciando,
ento, desequilbrios internos e externos, numa implicao tal que, muitas
vezes, a humanidade torna-se escrava de sua prpria criao.
Se, por um lado, h uma contribuio significativa no sentido da
(re) construo da sociedade pela civilizao, criando novas possibilidades e
facilidades vida humana; por outro lado, criaes humanas a exemplo do
capital e das tecnologias, so elementos importantes nas transformaes das
percepes. Criador, criao e criatura se confundem assumindo formas de
olhar muitas vezes capitalizadas, automatizadas, liberalizadas (Beck 1994),
naturalizando, assim, as suas prprias invenes, conceitos e valores, que,
muitas vezes, anestesiam a sensibilidade em relao s discrepncias sociais,
to bem caracterizadas na voz de Renato Russo16, "a humanidade
desumana.
A existncia humana tem sido marcada por ciclos de
desequilbrios. Durante sua transio do mundo rural para o mundo urbano
industrial, a forma de organizao social sofreu uma transformao que
16 Msico e compositor brasileiro Cd Legio Urbana: as quatro estaes. Faixa 4, Quando o sol bater na janela do teu quarto.Emi Odeon Fonogrfico Indstria e Eletrnica Ltda. Sp, 1995.
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implicou em fortes alteraes nas relaes culturais e cognitivas de seus atores
sociais. Atividades como a caa, a pesca, a agricultura e o prprio sentido do
trabalho estavam entendidos como produo da humanidade, no sentido de
existncia humana.
Havia uma relao direta entre vida e trabalho, pois, ao mesmo
tempo em que o homem produzia para a sua sobrevivncia, ele festejava e
relacionava-se com essa produo, de uma forma coletiva. Os festejos, as
danas no se separavam da vida do trabalho, criando uma relao humana
entre os sujeitos sociais.
A partir da revoluo industrial, essas relaes tomaram novas
configuraes. A Revoluo Industrial perodo de transio da economia
agrria para a industrial, que marcou o incio de um novo perodo da histria.
Seus impactos foram limitados mesmo na Europa, at 1820 e em muitos
pases, at meados do sculo XIX. No mundo todo, as conseqncias s foram
sentidas bem mais tarde.
O processo teve incio na Gr Bretanha que no perodo de
1730, j ostentava uma economia prspera.
Na Segunda metade do sculo XVIII cresce a produo de bens
de capital e de consumo em virtude das inovaes e invenes. Entre elas, as
novas mquinas de fiao e os teares, a fundio do coque e a introduo do
ao fundido.
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Um outro fator importante da poca foi mquina a vapor que
proporcionou indstria nova fonte de energia e permitiu que pequenas
oficinas fossem substitudas por grandes fbricas. Mas este processo ocorreu
aos poucos e a fbrica s se tornou uma unidade caracterstica de organizao
industrial, aps 1830.
A questo da temporalidade, por exemplo, passou a ter
predominncia aos ciclos da vida. O homem passou a organizar-se com
tempos especficos para o trabalho, tempo para o festejo, tempo para o
descanso, tempo para o lazer, acentuando a diviso social do trabalho, que se
tornou cada vez mais especializado e fragmentado, obedecendo ao ritmo da
mquina e a um tempo mecnico, afastando os indivduos da convivncia nos
grupos primrios e despersonalizando as relaes, perdendo assim a
referncia de identidade. Vale pena considerar o que diz Marcelino:
"As pessoas passam a fazer parte de grupos variados,
sem ligaes uns com os outros. Caracteriza-se o binmio
trabalho /lazer e as aes se desenvolvem como na
gravao de um filme, onde os atores participam de
cenas estanques, sem conhecer a histria de seus
personagens, cenas essas freqentemente interrompidas
para serem retomadas em seqncias totalmente
diferenciadas". (Marcelino, 1983: p 21).
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A existncia da segmentao das atividades, especialmente entre
as chamadas atividades produtivas e as chamadas atividades ldicas, isto ,
do tempo do trabalho e do no-trabalho, implicou na criao dos mundos
separados do saber e do sabor, compreendendo o saber segundo Rubem
Alves - como o mundo da utilidade e da eficincia. Acrescentaramos:
(o mundo da informao); e o mundo do sabor - como o mundo do prazer, da
felicidade, da alegria, da possibilidade de reencontrar com o prprio Homem re
- humanizando-o, ao que ns acrescentaramos: um mundo de signos que
exerce, atravs de impresses um sentido relacional nas formas humanas e
(des)-humanas de ser e estar no mundo.
No momento histrico, em que fica caracterizada a dicotomia
trabalho e no trabalho, o modo de produo capitalista se impe, a mquina
ganha status e o saber ganha um poder extraordinrio. Aceleram-se um
processo de automao e consumo, predominando, ento, valores vinculados
ao ter, e acumulao num modelo social extremamente exploratrio.
Vale pena citar as cenas do filme Os Tempos Modernos 17 ,
que retratam esse modo de produo de forma satrica, criando um modelo de
produo alienante, advinda da Revoluo Industrial, assim como o filme " A
Classe Operria Vai ao Paraso", que caracteriza esse mundo do saber.
17Charlie Chaplin O Filme.
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Esses so documentos que nos permitem acompanhar alguns
aspectos do processo de transformao de valores atravs do qual se
reconfigurou a sociedade e seus grupamentos educativos.
O ento chamado modelo de sociedade burguesa predomina e
com ele a dominao, a expropriao, o individualismo, a acumulao ganham
espao surgindo, ento, os desnecessrios, termo cunhado por Rifkin (1997),
que para Gentili (1996), corresponde a sociedade da excluso.
Registram-se, ento, leituras desse quadro, como a de Althusser
(1970), que caracteriza os aparelhos ideolgicos do estado", enquanto
mantenedores da ordem vigente. Percebemos quanto o mundo do saber pode
estar vinculado tese "ordem e progresso", ao mesmo tempo em que se
apontam algumas instituies, como a escola, localizada no ponto de
interseo da infra-estrutura e dos aparelhos repressivos e ideolgicos do
Estado, tendo como funo bsica a reproduo das relaes materiais e
sociais de produo.
Vale dizer que a escola aparece, tambm, como responsvel pelo
escamoteamento das relaes de expropriao e de desigualdade a que se
sujeitam os atores sociais, assegurando a reproduo da fora de trabalho,
transmitindo qualificaes necessrias para o mundo do trabalho, fazendo com
que os indivduos se sujeitem estrutura de classes.
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"A reproduo da fora de trabalho exige no somente
uma reproduo da sua qualificao, mas ao mesmo
tempo uma reproduo de sua submisso s regras da
ordem estabelecida, i. e., uma reproduo da sua
submisso ideologia dominante para os operrios e uma
reproduo de sua capacidade de bem manejar a
ideologia dominante para os agentes da explorao e da
represso, a fim de assegurar, tambm pela palavra a
dominao da classe dominante.(Althusser 1970:p 6)
Hoje, somos filiados a leituras que consideram a possibilidade da
aventura humana tornar-se autodestruio, assim como se torna
autoregenerao, em virtude do seu inerente dinamismo, aonde a sociedade
moderna vem determinando sua formao de classes, camada, ocupao,
papis, famlia nuclear, setores de negcio.
As formas sociais (industriais) desencrustam-se, desossificam-se
(Beck 1994), ao tempo em que formas configuram-se, delineiam-se, atravs
das mltiplas referncias e at mesmo das determinaes globais e locais,
assim como dos mltiplos projetos de autoria via as idiossincrasias e
transfigurando para uma modernizao reflexiva, (Beck 1994).
Essas formas sociais apontam para a crtica da sociedade, na
qual a escola transmuta-se para o modelo do sabor, atravs de prticas e
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reflexes que sempre coexistiram no seio desta instituio e que durante a
crise paradigmtica que vive ganham fora e espao.
Como fica um currculo onde a produo de conhecimento se d
sem uma concepo de conscincia; um currculo nascido de forma
fragmentada e linear, onde escola, famlia, comunidade, natureza, o prprio
mundo no se inter-relacionam?
Currculo esse formulado exclusivamente enquanto instrumento
estabelecido atravs de objetivos, mtodos, contedos, avaliaes, sem levar
em conta a "prpria vida do indivduo numa situao de mundo", a partir do
experienciado, isto , do "mundo vivido pelo sujeito, considerado como ser
transformador? (Martins, 1992).
Nos contrapomos, ento, a leituras que se aproximam da lgica
linear e que informam, por exemplo, que sob o slogan educar, cabe formar
cidados para servir sociedade, de forma disciplinar e obediente.
Portanto, seja na perspectiva sob a qual formam-se mais
excludos ou na perspectiva da construo ou (re) construo de cidados e do
saber com mais sabores - a autoria, enquanto construo e/ou afirmao de
identidade, se perde, pois j que nesta lgica de cidadania, o cidado ,
meramente, o fruto de um super poder, muitas vezes oculto e quase sempre
perverso.
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Ressaltamos, porm, a validade das contribuies de Foucault
(1987), que nos oferece elementos para a percepo do poder, vivenciado nas
aes e relaes do cotidiano escolar, tais como os sistemas de avaliao e
sanes escolares.
A disciplina fabrica assim corpos submissos e
exercitados corpos dceis. A disciplina aumenta as foras
do corpo (em termos econmicos de utilidade) e diminui
essas foras (em termos econmicos de obedincia). Em
uma palavra: ela dissocia o poder do corpo; faz dele por
um lado uma aptido, uma capacidade que ela procura
aumentar; e inverte por outro lado energia, a potncia
que poderia resultar disso, e faz dela uma relao de
sujeio estrita. Se a explorao econmica separa a
fora e o produto do trabalho, digamos que a coero
disciplinar estabelece no corpo o elo coercitivo entre uma
aptido aumentada e uma dominao acentuada".
FOUCAULT, (1987: p127).
Com essas consideraes, ns inferimos que, tanto o corpo
mercador, como o corpo mercadoria regido por sanes normativas nas
quais; o til e o inteligvel esto presentes, criando a docilizao desses
corpos (FOULCAULT, 1987).
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Poderamos concluir, explicitando uma compreenso da
humanidade, a partir desse quadro social capitalista e dos olhares at aqui
sistematizados? Ser que neste momento de transio ou transformao
humanas, e de utilizao de novas descobertas cientficas tecnolgicas, a
humanidade se humaniza? E se humaniza, por que precisa docilizar e explorar
sujeitos?
Neste sentido, concordamos com Morin (1995), quando diz que:
Aprender a ser aprender a viver, a partilhar, a comunicar, a comungar
enquanto humanos do planeta Terra"; e da premncia dessa aprendizagem.
E se pensarmos nos grupamentos educativos enquanto lcus do
saber, que, por muitas vezes, se apresentam sem sabor, e sob a gide de que
ela reforou e refora valores de submisso e expropriao. Podemos ter a
impresso de que nos tornaremos mais individualistas, mais egostas e que
usaremos exclusivamente, o mundo do saber em funo da prpria
sobrevivncia, causando-nos desequilbrios de ordem interna e externa.
Mas, em meio desenfreada busca do ter mais, e dos rgidos
valores do mundo do trabalho, onde predomina a construo da mais valia, que
implica na ampliao e aprofundamento das desigualdades sociais, emergem
demandas, de resistncias s tendncias institudas, em configuraes sociais
alternativas, processo individuao, torna-se impossvel debrear esses e outros
movimentos que acontecem concomitantemente ao quadro antes descrito.
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Se a Revoluo Industrial no satisfaz aquele homem que veio da
pedra lascada at chegar aos nveis de automao atuais, j que hoje ele
necessita transpor o mundo das mquinas e viajar por uma nova tecnologia
que lhe possibilite uma comunicao de velocidade inimaginvel, superando
barreiras que a ele mesmo surpreende, essas novas necessidades incitam-no
a uma nova transcendncia que implicar em novas configuraes, impossveis
de serem precisamente delineadas de formas apriorsticas.
Tomando-se os estudos de Rifkin, em sua apoc