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Romantismo o caso alemão, entre o ético e o estético

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Romantismo

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Page 1: Romant is Mo

Romantismoo caso alemão, entre o ético e o estético

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“Adivinha-se em que lugar era colocado, com isso, o grande ponto de interrogação sobre o valor da existência. Será o pessimismo necessariamente o signo do declínio, da ruína, do fracasso, dos instintos cansados e debilitados - como ele o foi entre os indianos, como ele o é, segundo todas as aparências, entre nós, homens e europeus "modernos"? Há um pessimismo da fortitude? Uma propensão intelectual para o duro, o horrendo, o mal, o problemático da existência, devido ao bem-estar, a uma transbordante saúde, a uma plenitude da existência? Há talvez um sofrimento devido à própria superabundância? Uma tentadora intrepidez do olhar mais agudo, que exige o terrível como inimigo, o digno inimigo em que pode pôr à prova a sua força? Em que deseja aprender o que é "temer"? O que significa, justamente entre os gregos da melhor época, da mais forte, da mais valorosa, o mito trá gico? E o descomunal fenômeno do dionisíaco? O que significa, dele nascida, a tragédia? - E, de outra parte: aquilo de que a tragédia morreu, o socratismo da moral, a dialética, a suficiência e a serenojovialidade do homem teórico - como? Não poderia ser precisamente esse socratismo um signo de declínio, do cansaço, da doença, de instintos que se dissolvem anárquicos? É a "serenojovialidade grega" do helenismo posterior, tão-somente, um arrebol do crepúsculo? A vontade epicúria contra o pessimismo, apenas uma precaução do sofredor? E a ciência mesma, a nossa ciência - sim, o que significa em geral, encarada como sintoma da vida, toda a ciência? Para que, pior ainda, de onde - toda a ciência? Como? É a cientificidade talvez apenas um temor e uma escapatória ante o pessimismo? Uma sutil legítima defesa contra - a verdade? E, moralmente falando, algo como covardia e falsidade? E, amoralmente, uma astúcia? ó Sócrates, Sócrates, foi este porventura o teu segredo?, ironista misterioso, foi esta, porventura, a tua - ironia?”

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• O projeto romântico diz respeito a uma nostalgia de uma unidade original como sintoma de deslocação da modernidade, de fragmentação e afastamento, uma vez que o romântico inaugura a idade moderna como problema;• A plenitude do homem passa a ser buscada na relação tensional

entre o próprio e o além, projeto crítico porque em crise permanente com suas condições de possibilidade;

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Uma teorização relevante para compreender a dimensão do projeto romântico, aparece em Max Scheler, já no final do séc. XIX, trata-se da contraposição entre comunidade e sociedade, entre o relacional e o atomista:

“no lugar da “comunidade” e sua estrutura surge a “sociedade”, na qual os homens são arbitraria e artificialmente unidos pela promessa e pelo contrato. (...) Sempre que a unidade da vida comunitária torna-se incapaz de prevalecer e de formar os indivíduos em seu corpo como um órgão vivo, surge a “sociedade” enquanto uma unidade baseada meramente no contrato. Se o “contrato” e sua validade deixam de existir, surge então a “massa” completamente desorganizada, unificada apenas por um estímulo sensorial momentâneo e por contágio. A moral moderna é, contudo, essencialmente “moral de sociedade”, e também a maioria de suas teorias é construída sobre essa noção básica.”

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Resulta daí que a força do projeto romântico, particularmente o Primeiro Romantismo Alemão, está em recuperar a intricação mútua entre arte e política, entre estética e ética, ou em termos apropriados da crítica contemporânea, introduz o romantismo a possibilidade de uma estetética, nos moldes do que um século mais tarde Nietzsche retoma como a tarefa própria da filosofia. Trata-se então de propor modos de vida sutis, pois a arte, na esteira do que pensam Nietzsche e seus epígonos deve se constituir como forma de exercício da vida: em arte-existência.

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A sinfilosofia, “filosofar com”, representa exatamente essa tendência integracionista, que busca a superação das lacunas entre pensamento e prática, entre experiência estética e envolvimento ético. Em um fragmento de Athenäum, afirma Schlegel:

“Muitas vezes não se pode evitar o pensamento de que dois espíritos poderiam no fundo pertencer um ao outro, como metades separadas, e só juntos ser tudo que pudessem ser”

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Trata-se igualmente de uma nostalgia como mitologismo moderno, na medida em que se reconhece no mito a força do comum de um povo, portanto o “filosofar com”, sua força poética singular de religar a existência em um todo significativo que não é meramente estético, mas principalmente de exercício comunitário, em outras palavras diz respeito ao ethos do homem, sua morada partilhada que é, no sentido aristotélico, também sua natureza.

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A arte, e dentre elas pensa-se no privilégio da literatura e da música no romantismo alemão, fazem as vezes de médium entre o homem e o absoluto. É porque a estética perde a sua função meramente ilustrativa e ornamental, afeita de certa forma ao esgotamento do classicismo, e propicia de forma retornada uma atividade que se pode dizer do romantismo uma tentativa de superação da deslocação, em outros termos, uma metafísica em atividade, na qual o poético se configura como prática ativa da vida.

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A arte, e dentre elas pensa-se no privilégio da literatura e da música no romantismo alemão, fazem as vezes de médium entre o homem e o absoluto. É porque a estética perde a sua função meramente ilustrativa e ornamental, afeita de certa forma ao esgotamento do classicismo, e propicia de forma retornada uma atividade que se pode dizer do romantismo uma tentativa de superação da deslocação, em outros termos, uma metafísica em atividade, na qual o poético se configura como prática ativa da vida.

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A literaturaLampejos precoces do romantismo em Fichte, a identidade

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“Tão certo quanto o homem possui razão, ele é seu próprio fim, isto é, ele não é porque deve ser algo outro, – mas ele é simplesmente porque Ele deve ser: seu mero ser é o fim último de seu ser, ou, o que significa a mesma coisa, não se pode perguntar sem contradição por nenhum fim de seu ser. Ele é, porque ele é. Este caráter do ser absoluto, do ser em virtude de si mesmo, é seu caráter ou sua destinação, na medida em que ele é considerado apenas e tão somente como ser racional.”

Ora, o que Fichte coloca em questão é a reiteração tautológica da própria natureza humana, em outras palavras, a exigência da identidade consigo mesmo. Outro paradoxo que será desenvolvido pelos primeiros românticos, pois é apenas pela mediação poética que o eu se reconhece como morada de si mesmo, como identidade original em si. É preciso portanto que a literatura, pensada na forma da metafísica em atividade, se comprometa com a identificação ao mesmo tempo atômica do indivíduo e comunitária do comum. Nesse movimento, Fichte propõe, de certa forma, a própria linha de fuga da sua proposta, já que converte o ato de identificação em atividade exploratória da razão, o que os românticos converterão em poética no sentido amplo.

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A literaturaLampejos precoces do romantismo em Schiller, homem e natureza

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“Eles são o que nós fomos; são o que devemos vir a ser novamente. Fomos natureza como eles, e nossa cultura deve nos reconduzir à natureza pelo caminho da razão e da liberdade. São, portanto, expressão de nossa infância perdida, que para sempre permanece como aquilo que nos é mais precioso; por isso, enchem-nos de uma certa melancolia. Ao mesmo tempo, são expressões de nossa suprema completude no Ideal, transportando-nos, por isso, a uma sublime comoção.”

Trata-se aí do contato entre o homem civilizado e os objetos naturais, representados por uma nostalgia identitária, de identificação mesmo, dialética entre o ser do homem que convida ao ser das coisas. Schiller acredita que a razão purificada recuperaria uma tal unidade original, no entanto, renega o caráter selvagem do contato, pois que deve ser mediado por um discurso poético capaz de contrabanlaçar, harmonizar o sentimento melancólico com o objeto retornado, o próprio do homem na volta do objeto em si mesmo contido.

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A arte se converte assim em segunda natureza, uma contradição em termos demonstrando a tensão interna buscando termo no reconhecimento de sua debilidade.

“Não é, portanto, mera licença poética, mas também um acerto filosófico, chamarmos a beleza nossa segunda criadora. Pois embora apenas torne possível a humanidade, deixando à nossa vontade livre o quanto queremos realizá-la, a beleza tem em comum com nossa criadora original, a natureza, o fato de que nos concede nada mais senão a capacidade para a humanidade, deixando o uso da mesma depender da determinação de nossa própria vontade.”

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A literaturaO caso Pólen, Novalis e Schlegel

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Tendo recebido os fragmentos para publicação do texto Pólen, de Novalis, Schlegel resolve acertadamente não excluir nenhum fragmento, mas passa a intervir na organização desses fragmentos com o intuito de viabilizar o projeto original de Novalis, de alcançar uma suficiência de sentido para cada fragmento. Em outras palavras, uma vez se tornando inviável um sentido total pela própria organização fragmentária de Pólen, ainda é possível, mesmo que em um gesto de atomização de sentidos, coordená-los por uma estrutura comum que tem na autonomia de sentido do fragmento uma metodologia precisa. E, caso o resultado do procedimento ainda seja insatisfatório, é o próprio Schlegel que deve interpor suas palavras nas lacunas do texto, num esforço fraterno e contínuo de totalização:

“Vocês vêem que tomei dele com humildade. Encontrei também nos meus alguns que são suficientemente flores para poder devolvê-los a ele, para que a ação recíproca fraternal fique bem perfeita”

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Nota-se, nesse exemplo, como subjaz no romantismo a literatura a formal e ética orientação para um tipo de nostalgia como sinfilosofia, fraternidade de pensamento, médium ou espaço do reencontro, mas também esforço de totalização, o que significa resistência frente a diluição e liquidez da experiência moderna. Na esteira da desintegração, o romântico alterna entre aceitação interessada – o fragmento – e negação peremptória – a totalização. A literatura representa dramaticamente a tensão necessária, a dobra da experiência em seu presumível apagamento.

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O paradoxo ou tensão entre continuidade e termo:

O que Novalis talvez determine melhor com a afirmação acima é que o fragmento se torna a atestação de um sentido em devir, daquilo que se iniciou mas ainda não se concluiu – daí a preponderância do tempo verbal imperfeito que expressa um passado inacabado – adiamento sempre renovado pela esperança de um termo, porém, garantindo assim a própria continuidade do pensar.

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A literaturaA natureza como vontade criadora, obra de arte, em Schlegel

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“Cícero estima as filosofias pela utilidade para o orador; do mesmo modo também se pode perguntar qual a mais adequada ao poeta. Certamente não um sistema que esteja em contradição com as resoluções do sentimento e do senso comum; ou que transforme o real em aparência; ou que se abstenha de toda decisão; ou que impeça o impulso para o suprassensível; ou que só construa a humanidade com o óbolo dos objetos externos. Portanto, nem eudemonismo, nem fatalismo, nem idealismo, nem ceticismo, nem materialismo, nem empirismo. E que filosofia resta ao poeta? A producente, que parte da liberdade e da crença nela, e então mostra como o espírito humano em tudo imprime sua lei e como o mundo é sua obra de arte.”

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Nesse caso há um transito de mão dupla entre natureza e cultura: a natureza é, aos olhos do homem, um fato da cultura, e a cultura, uma emanação da natureza. Como a mediação não se dá imediada, isto é, como sobreposição, a tarefa do poeta se torna producente, o que significa que a arte produz natureza na mesma medida em que a encontra, colocando-se ao mesmo tempo na origem cega do natural e na sua criação artificial. A tensão entre o movimento que vai da natureza à cultura e seu contrário constitui a dialética da prática artística do romantismo alemão, bem como repete, em níveis menos amplos, o formal no temático, a configuração na figura, etc.

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A literaturaAlgumas considerações

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• Embora se tenha analisado exclusivamente o projeto alemão, deve-se lembrar que o romantismo adquiriu em cada país matizes novos. O caso brasileiro é, nesse caso, exemplar: esteve ligado à afirmação de uma cultura autóctone que representava menos a integração existencial do que um artifício político na formação de uma comunidade imaginada, nos moldes das teorizações de Benedict Anderson.• O conceito de literatura que subjaz o projeto romântico a torna algo

mais e algo menos do que um objeto de valor estético ou pedagógico, mas uma oportunidade, um acontecimento, uma passagem de vida que deseja suprimir-se enquanto mediação, necessária, mas com pretensões ao seu apagamento continuado. É também nesse sentido que o romântico vê a sua atividade como uma tarefa infinita sempre adiada, pois deposita na mediação a fé em seu ultrapassamento.

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Ainda Schlegel e a superação dos discursos, sua unificação em um gênero comum, ou, comunitariamente construído, um tipo de gênero total que, novamente de forma paradoxal, mantém os aspectos de diferença enquanto tenta superá-los na unificação.

“A poesia romântica é uma poesia universal progressiva. Sua destinação não é apenas reunificar todos os gêneros separados da poesia e pôr a poesia em contato com filosofia e retórica. Quer e também deve ora mesclar, ora fundir poesia e prosa, genialidade e crítica, poesia-de-arte e poesia-de-natureza, tornar viva e sociável a poesia, e poéticas a vida e a sociedade, poetizar o chiste, preencher e saturar as formas da arte com toda espécie de sólida matéria para cultivo, e as animar pelas pulsações do humor. Abrange tudo o que seja poético, desde o sistema supremo da arte, que por sua vez contém em si muitos sistemas, até o suspiro, o beijo que a criança poetizante exala em canção sem artifício.”

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Proposta de atividade:

Com base na exposição, discorra sobre a relação entre os tópicos da insignificância, do fragmentário e do inacabado e o projeto ético-estético do romantismo de raiz alemã.Para tanto se utilize dos fragmentos de Pólen do poeta Novalis.