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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE LETRAS CLÁSSICAS E VERNÁCULAS PROGRAMA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA EM LITERATURAINFANTIL E JUVENIL ANDRÉ RODRIGUES DOMICIANO Jogos de Representação O Live Action e a criação de mundos fantásticos São Paulo 2008

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Page 1: rl.art.br4 AGRADECIMENTO S Agradeço à minha namorada pela eterna compreensão e por ceder o espaço que, por direito, muitas vezes pertencia a ela para que pudesse me dedicar ao

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE LETRAS CLÁSSICAS E VERNÁCULAS

PROGRAMA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA EM

LITERATURAINFANTIL E JUVENIL

ANDRÉ RODRIGUES DOMICIANO

Jogos de Representação

O Live Action e a criação de mundos fantásticos

São Paulo

2008

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ANDRÉ RODRIGUES DOMICIANO

Jogos de Representação

O Live Action e a criação de mundos fantásticos

Relatório final de Pesquisa apresentado à

Comissão de Pesquisa da Faculdade de

Filosofia, Letras e Ciências Humanas da

Universidade de São Paulo. Trabalho

contemplado com bolsa PRP/IC.

Orientador: Profa. Dra. Maria Zilda da Cunha

São Paulo

2008

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À minha namorada, Luana Gonsaga, pelo

amor, compreensão, paciência e por me

apoiar em todos os momentos.

Principalmente, por acreditar em minha

capacidade.

Obrigado por fazer parte de minha

jornada: é minha mentora, minha arma

mágica e meu maior tesouro. Acima de

tudo, é meu talismã protetor.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à minha namorada pela eterna compreensão e por ceder o espaço que, por

direito, muitas vezes pertencia a ela para que pudesse me dedicar ao trabalho.

À Professora Doutora Maria Zilda da Cunha pela paciência, pela confiança, pela

orientação e por acreditar em meu potencial e em minha seriedade. Obrigado por aturar

meus momentos de desespero e por me tirar, sempre, do caminho sombrio, da caverna

oculta, do ventre da baleia.

Ao Professor Marcos Tanaka Riyis, amigo de tantas aventuras, companheiro de

tantas jornadas, pelo incentivo, apoio, por autorizar a publicação e análise de suas aventuras

e experiências – as quais, muitas vezes, pude presenciar – e pelas primeiras provações.

À Equipe Jogo de Aprender pelo eterno aprendizado, pela criatividade, alegria e por

todas as viagens aos confins desse reino desconhecido.

À Equipe de monitores e à Coordenação pedagógica do Parque da Biquinha e

Parque da Água Vermelha, em Sorocaba, por confiar em meu trabalho e por me aceitar de

forma tão alegre e hospitaleira.

À Cia. Teatral Coligação Um Peixe e a todos os amigos, deixo minhas desculpas

por me ausentar em certos momentos que, sei, deveria estar presente.

Por fim, agradeço à minha família, tão compreensiva, pela força, apoio, amor e por

estar presente em todos os momentos.

Muito obrigado!

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................................p.08

CAPÍTULO I – OS JOGOS DE REPRESENTAÇÃO......................................................p.13

1.1. Definição.....................................................................................................................p.13

1.2. Modalidades e estruturas.............................................................................................p.19

1.2.1. A Aventura Solo.....................................................................................................p.20

1.2.2. Jogo de Mesa..........................................................................................................p.22

1.2.3. Live Action.............................................................................................................p.25

1.3. O Live Action em evidência........................................................................................p.28

CAPÍTULO II – TEORIAS NARRATOLÓGICAS..........................................................p.30

2.1. Uma breve explicação sobre Narratologia..................................................................p.30

2.1.1. As esferas de ação....................................................................................................p.31

2.1.1.1. Os Arquétipos........................................................................................................p.31

2.1.2. Estrutura Épica.........................................................................................................p.33

2.1.2.1. As etapas da Jornada do Herói Mitológico...........................................................p.35

2.1.3. Estrutura Maravilhosa..............................................................................................p.40

CAPÍTULO III – ANÁLISE..............................................................................................p.46

3.1. Procedimentos de análise............................................................................................p.46

3.2. Análise dos Jogos de Representação segundo as Teorias Narratológicas...................p.47

3.2.1. Jogo de Mesa: Perdidos na Selva.............................................................................p.47

3.2.1.1. Equação e análise..................................................................................................p.47

3.2.1.2. Resultado da análise..............................................................................................p.60

3.2.2. Live Action: O Caminho para o Vale Encantado.....................................................p.61

3.2.2.1. Equação e análise..................................................................................................p.62

3.2.2.2. Resultado da análise..............................................................................................p.87

3.3. Resultado: Jogo x Texto..............................................................................................p.88

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CAPÍTULO IV – JOGOS DE REPRESENTAÇÃO & EDUCAÇÃO..............................p.90

4.1. RPGista Educador x Educador RPGista.....................................................................p.90

4.2. O espaço dos Jogos de Representação na Educação...................................................p.92

4.2.1. Jogo de Mesa: Perdidos na Selva.............................................................................p.92

4.2.1.1. Personagens...........................................................................................................p.93

4.2.1.2. A aventura e sua aplicação....................................................................................p.97

4.3. O espaço dos Live Actions na Educação...................................................................p.101

4.3.1. Live Action: O Caminho para o Vale Encantado...................................................p.103

4.3.1.1. A aventura e sua aplicação..................................................................................p.103

CAPÍTULO V – CRIAÇÃO DE MUNDOS FANTÁSTICOS.......................................p.107

5.1. Gênese: o Tutorial dos Mundos Fantásticos.............................................................p.107

5.2. Os mundos criados em Jogos de Representação.......................................................p.113

5.2.1. Análise dos mundos criados...................................................................................p.113

5.3. Panorama geral..........................................................................................................p.118

CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................p.120

LISTA DE ILUSTRAÇÕES............................................................................................p.124

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................p.125

ANEXOS..........................................................................................................................p.130

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Fiquei diante de uma caverna escura, desejando adentrá-la e tremi ao

pensar que não poderia ser capaz de encontrar o caminho de volta.

Emanuel Swedenborg1

1 Relato de sonho extraído de O Herói de Mil Faces, Joseph Campbell (2007).

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INTRODUÇÃO

O trabalho que apresentamos tem como objetivo descrever e analisar os Jogos de

Representação e suas modalidades mais recorrentes, procurando legitimá-lo como campo

de estudo nos meios acadêmicos, além de descrever sua orientação estrutural – os

elementos que compõem o enredo da aventura – e os processos criacionais que envolvem o

desenvolvimento do jogo. Para tanto, buscamos em referenciais teóricos – no meio

acadêmico e fora dele – argumentos que pudessem orientar e sustentar nossa pesquisa.

A inspiração para o trabalho surgiu durante as aulas de Literatura Infantil e Juvenil

IV ministradas pela Professora Doutora Maria Zilda da Cunha. Sendo jogador e Mestre2 de

Roleplaying Games e fazendo parte de uma equipe3 que trabalha com a aplicação de RPGs

em contextos educacionais desde o ano de 2001, sempre duvidei do espaço que esses jogos

pudessem ter no meio acadêmico. No entanto, no primeiro dia de aula em Literatura Infantil

e Juvenil, vi que um dos temas propostos para elaboração de seminário tratava justamente

do RPG.

No final do semestre, após a realização do seminário sobre RPG, a Professora

Doutora Maria Zilda da Cunha se mostrou aberta para diálogo e interessada em minhas

experiências com o jogo. Decidi, então, lançar-lhe a proposta de ser minha orientadora em

um possível trabalho de Iniciação Científica sobre Roleplaying Games. A resposta foi

positiva.

E aqui estamos nós.

Este trabalho assumiu, como veremos a seguir, um aspecto lúdico muito forte:

brincando com termos técnicos de teorias narratológicas, optei por conduzir o leitor dentro

de minha Jornada particular rumo ao Mundo Desconhecido. Essa linguagem não foi

escolhida ao acaso, pois, durante todo o tempo, estivemos em contato com formas

narrativas épicas e maravilhosas, que põem o leitor na posição de protagonista.

2 A nomenclatura usada para se referir ao Narrador do jogo. 3 Equipe Jogo de Aprender (http://www.jogodeaprender.com.br)

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Por conta disso, vemos claramente as etapas do trabalho: desde o Chamado à

Aventura até o Retorno para o Mundo Comum.

Mundo Comum

No ano de 1993, entrei em contato com um livro de características peculiares. Uma

prima me emprestara. Era relativamente grosso, com uma capa verde-amarelada. Nela, uma

criatura de língua bifurcada vestida em andrajos marrons olhava diretamente para o leitor.

Estava no meio de uma floresta, ao lado de um tronco caído, cheio de musgos, e os raios de

sol passavam pelas copas das árvores, iluminando parte do cenário. Acima da figura, à

direita, via um escudo verde que iria estar presente em boa parte de minha infância: era o

símbolo da série Aventuras Fantásticas, um conjunto de livros-jogo publicado, na época,

pela Editorial Verbo. O nome do livro não poderia ser menos chamativo: A Floresta da

Morte4.

Chamado à Aventura

Anos mais tarde, sendo jogador e um Mestre experiente de RPG, fui convocado pelo

Professor Marcos Tanaka Riyis a participar de um projeto que tinha como objetivo levar

alunos da rede pública da cidade de Sorocaba (e arredores) para um acantonamento de dois

dias. Durante algumas semanas, realizamos esse trabalho e, ali, vimos a possibilidade de

aplicação do RPG em ambiente educacional. Marcos Tanaka já era professor há algum

tempo, jogador e Mestre de RPG e já tinha realizado algumas experiências na área. Mas o

trabalho que realizamos com aquelas crianças em Sorocaba foi realmente um Chamado à

Aventura.

4 Numa nova edição, já sendo publicado pela Editora Marques Saraiva, o livro passou a ser chamado A Floresta da Destruição. O título original em inglês, no entanto, é The Forest of Doom.

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O Caminho das provas

Aceitando nossa missão, e acompanhados de nossos aliados da recém-formada Jogo

de Aprender, nos arriscamos no caminho de provações. Criamos e levamos nossos jogos

educativos para escolas, faculdades, parques, empresas e hotéis. Nesse percurso, Marcos

Tanaka escreveu seu livro SIMPLES (2004) e eu iniciei minha pesquisa sobre RPG.

A Caverna Escura

Agora, estamos aqui, diante da entrada da Caverna Escura. O que encontraremos lá

dentro?

A Missão

Nessa missão, buscaremos legitimar o RPG no meio acadêmico, procurando uma

definição oficial para o jogo e a descrição ideal para cada uma de suas modalidades.

Essa etapa foi regida por ampla pesquisa em referencial teórico e é constituída por

dois itens de interesse: a Definição e a Descrição de Modalidades

A Definição traz a palavra de diversos autores – acadêmicos ou não – a respeito do

RPG. Podemos identificar a recorrência de elementos descritivos, atribuída ao status de

verdade absoluta que o RPG adquiriu no decorrer do tempo. Confrontando essas opiniões,

identificamos os elementos que podem fortalecer e comprovar a existência de uma

definição oficial.

A Descrição de Modalidades apresenta os três tipos mais comuns de RPG: Aventura

Solo, Jogo de Mesa e Live Action. Essa etapa identifica suas características formais,

estabelece suas diferenças e semelhanças e descreve, por meio de exemplos extraídos de

jogos, a mecânica que cada modalidade possui.

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Encontro com o Mentor

Em seguida, adquirimos o Auxílio Sobrenatural dos Mentores Joseph Campbell

(2007) e Vladimir Propp (1984). Seus ensinamentos a respeito das teorias narratológicas

nos colocou em contato com as estruturas narrativas do mito e do conto maravilhoso,

respectivamente. Com esse conhecimento em mãos, analisamos o enredo e as estruturas

narrativas de duas aventuras de RPG: o Jogo de Mesa Perdidos na Selva e o Live Action O

Caminho para o Vale Encantado.

A análise nos permitirá responder à questão: será que o jogo mantém seu aspecto

lúdico quando analisado fora de um contexto de jogo? Ou será que ele deixa de ser jogo e

se transforma num texto estático, passível de análise textual e estrutural apenas?

Provações e Testes

Depois, seremos submetidos a Provações e testes, onde colocaremos em foco a

aplicação prática em ambiente pedagógico dos jogos analisados, discutindo o papel do RPG

dentro de um contexto educacional. Aqui, identificaremos os elementos didáticos presentes

numa aventura de RPG, comprovando se o conteúdo é realmente trabalhado dentro do jogo

e enquanto jogo ou se, ao contrário, se transforma em pano de fundo deste, adquirindo o

aspecto de “desculpa para que o jogo aconteça”.

A Arma Mágica

Por fim, de posse da Arma Mágica chamada Gênese, de Celli e Diegues (s/d),

faremos o estudo analítico da criação ficcional de mundos fantásticos nos jogos já citados.

Esse material levanta tópicos que se propõem ajudar o autor na criação de sua

narrativa. Mas será que a Gênese funciona apenas no ato de criação? Ou será que mundos

já criados podem ser analisados a partir desse guia?

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Retorno para casa

Só tendo cumprido essa jornada, estaremos aptos a voltar ao nosso Mundo Comum,

trazendo conosco o Elixir Restaurador e prontos para colher os louros da Recompensa.

Será que conseguiremos encontrar as respostas para todas as perguntas que

levantamos nesse capítulo introdutório?

Embarque conosco nessa aventura e confira!

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CAPÍTULO I – OS JOGOS DE REPRESENTAÇÃO 1.1. DEFINIÇÃO

Para o público já familiarizado com Jogos de Representação, descrevê-los é

praticamente desnecessário. Muito se foi convencionalizado e a tentativa de definir Jogos

de Representação acabou gerando equívocos, lugares-comuns e pequenas confusões. Sendo

assim, é importante salientar o porquê da escolha da nomenclatura Jogos de Representação.

Nosso objeto de estudo é o jogo mundialmente conhecido pela sigla RPG (no

inglês, Roleplaying Game) que, em português, poderia facilmente ser traduzido por Jogo de

Interpretação de Papéis5.

Na busca pela definição de o que é RPG?, recorremos a algumas obras bem

conhecidas no meio RPGístico, principalmente a livros de autoria nacional, além de estudos

acadêmicos sobre o tema. Essas obras serão de interesse para nossa análise, especialmente

aquelas que se dizem específicas para a utilização do RPG na educação e as que buscam

estabelecer uma relação entre RPG e criação literária.

Abaixo, listaremos seis definições encontradas que, embora muito semelhantes,

apresentam alguma divergência entre si, o que dificulta a credibilidade e a aceitação de uma

definição oficial do RPG, levando-nos a crer que as definições que circulam nas variadas

obras tratam-se apenas de clichês transmitidos e comunicados há tanto tempo, com tanta

recorrência, que adquiriram status de verdade absoluta.

A primeira definição foi extraída do livro-jogo No Coração dos Deuses, uma

adaptação do filme homônimo feita por Luiz Eduardo Ricón (2000):

[...] Este não é um livro comum, onde você simplesmente lê a história. Este é um livro de RPG, uma mistura de história e jogo, na qual você decide que rumo a aventura vai seguir. [...] Neste livro, você é o herói! (RICON, 2000, p.5)

Esta definição, aplicada essencialmente ao livro-jogo (do qual falaremos adiante),

resume bem o que seria o RPG e, principalmente, como funciona a estrutura formal do

livro-jogo: uma mistura de história e jogo. Essa colocação nos deixa claro que não iremos

5 Ou JIPs, como tentaram introduzir alguns autores. A tentativa, no entanto, não agradou ao público e aos jogadores mais experientes, que mantiveram a nomenclatura original inglesa.

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encontrar no livro uma história comum, como estamos habituados a encontrar nos livros.

Da mesma forma, o leitor nessa primeira etapa, não recebe maiores informações sobre o

jogo que está tão intimamente ligado à história. Sabe-se apenas que é um jogo e, portanto,

seguindo as definições de Huizinga (2007):

a. Não é vida corrente nem vida real, mas sim uma evasão da vida real para uma

esfera temporária de atividade com orientação própria;

b. É isolado e limitado no tempo e no espaço, possuindo um caminho e sentido

próprio;

c. Processa-se e existe no interior de um campo previamente delimitado, seja

material ou imaginário, deliberado ou espontâneo;

d. Cria e é ordem, sendo que qualquer desobediência ou quebra de regras estraga o

jogo;

e. Gera tensão – incerteza ou acaso – o que faz com que o jogador procure superá-

la através da vitória;

f. Possui um ar de mistério envolvente;

Huizinga ainda irá dizer que o

Jogo é uma atividade livre, conscientemente tomada como “não-séria” e exterior à vida habitual, mas ao mesmo tempo capaz de absorver o jogador de maneira intensa e total. É uma atividade desligada de todo e qualquer interesse material, com a qual não se pode obter qualquer lucro, praticada dentro de limites espaciais e temporais próprios, segundo uma certa ordem e certas regras. Promove a formação de grupos sociais com tendência a se rodearem de segredo e a sublinharem sua diferença em relação ao resto do mundo por meio de disfarces ou outros meios semelhantes. (HUIZINGA, 2007, p.16)

Por fim, Ricón (2000) encera sua definição com o bordão imortalizado pela série de

livros-jogo da década de 80, Aventuras Fantásticas, que sempre traziam os dizeres “Uma

aventura emocionante onde o leitor é o herói!” abaixo do título.

Pois bem. Sabemos, até então, que RPG é uma mistura de história e jogo. A

próxima definição talvez nos adicione algo:

Num Roleplaying Game você finge que é um herói, pirata, piloto espacial ou qualquer outra coisa... exatamente como se fazia quando éramos crianças. A diferença é que agora existem

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regras. As regras de um RPG podem ser simples ou estar escritas em vários livros. Não faz a menor diferença. RPG é faz-de-conta. (CONTIKYAN, 1996, p.5)

Este trecho, extraído do livro de sistema (um conjunto de regras e cenários de RPG)

Toon: o RPG do mundo dos desenhos animados, nos adiciona um elemento importante: o

faz-de-conta. Ora, esse é o princípio, a essência do jogo. Tudo que virá depois está

alicerçado sobre a idéia de que RPG é um faz-de-conta semelhante àquele que brincávamos

quando crianças. O outro ponto de interesse que essa definição nos traz é a presença das

regras. Mas, mais interessante, é a forma como essas regras são tratadas: “[ser simples ou

estar descritas em vários livros] não faz a menor diferença”. Esse é o espírito que deve

prevalecer no jogo de RPG. As regras podem existir – e, se realmente assumirmos que o

RPG é um jogo, elas sempre estarão presentes, consciente ou inconscientemente – mas não

devem ultrapassar o limite imposto pelo lúdico, pelo faz-de-conta.

Seguindo nossa busca, e já tendo descoberto que o RPG, além de ser uma mistura de

história e jogo, é um faz-de-conta e, como desconfiávamos na primeira definição, possui

regras – que não interferem na sensação de ludicidade – partiremos para uma terceira

definição, encontrada num sistema de RPG nacional, o Opera RPG:

RPG significa Role Playing Game, que por sua vez, é traduzido por Jogo de Representação. Na realidade não é bem um jogo, mas sim um teatro interativo de improviso, onde existe um diretor que dá o tema e organiza a peça, e os atores, que além de atuarem, interferem o tempo todo nessa história. Eles provocam tamanhas reviravoltas no enredo, que às vezes o diretor não tem como assumir a encrenca em que os atores se enfiaram! (ANDRADE e GODOY, 2004, p.11)

Os autores do Opera RPG assumem posição singular – e, por assim dizer, digna de

questionamento. Eles trazem o RPG para fora do âmbito do jogo e o trazem para os

domínios do teatro. Pois bem. Essa afirmação é, no mínimo, um exemplo das pequenas

confusões mencionadas acima. Primeiro, por que tentar negar ao RPG o seu caráter

enquanto jogo? Formalmente falando, o RPG possui todas as características de um jogo.

Em segundo lugar, devemos assumir que o teatro também é uma modalidade cuja origem e

aspectos formais estão ligados ao domínio do lúdico. Sabe-se que o teatro é um jogo de

representação e, já que tocamos no assunto, é importante salientar que, para Huizinga

(2007), uma das funções do jogo é a representação de alguma coisa (representar, aqui, com

o sentido de mostrar). Portanto, a definição sugerida por Andrade e Godoy (2004) não está

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de todo errada, mas houve certa perda de tempo em tentar separar jogo de teatro. RPG é

jogo! E também é uma forma de teatro!

Na seqüência, temos a definição extraída de um livro que se diz voltado para a

aplicação pedagógica do RPG: O Livro das Lendas:

Com alicerce na criatividade e no poder da imaginação, os jogadores fazem parte de uma história como seus atores principais, uma espécie de teatro verbal dentro de uma aventura proposta. O roleplaying game (jogo de criar e interpretar histórias) é uma grande aventura, em que um dos participantes, o narrador, chamado de mestre, conduz a partida ou jogo. Ele descreve o ambiente, interpreta os personagens que os jogadores encontrarão pelo caminho, organiza as questões das disciplinas a serem testadas e determina os resultados das ações, mas são os jogadores que decidem o que seus personagens vão dizer ou fazer. (MARCONDES, 2004, p.5)

Marcondes é um bom exemplo de autor que decidiu agregar todas as definições já

dadas numa só: para ele, RPG é jogo de interpretação e criação de histórias, teatro, uma

grande aventura alicerçada na criatividade e na imaginação. Essa é uma definição que busca

ser a mais democrática e abrangente possível, abraçando todos os campos que se

relacionam com o RPG. Mas, ao mesmo tempo em que essa definição beira a posição ideal,

acaba pecando pela simplicidade ao não explicar nenhum conceito utilizado. Marcondes

lança mão de definições já existentes, agrupando-as de modo a obter uma forma mais

completa de explicação, no entanto, pode-se dizer que o autor faz uma “belíssima salada”:

bonita, justa e democrática, mas “sem tempero”.

Indo de encontro à definição e à proposta pedagógica de Marcondes, está o livro de

Marcos Tanaka Riyis (2004), um sistema simplificado de regras voltado para professores

que queiram se aventurar na aplicação do RPG em sala de aula:

Imagine uma peça de teatro. Agora imagine essa peça, mas com as pessoas da platéia sendo os atores e atrizes e construindo a história enquanto a interpretam e vivenciam. Agora imagine aquela antiga roda em torno de uma fogueira e uma senhora contando histórias. Finalmente, imagine um jogo de tabuleiros, com regras, estratégias e o fator sorte, ligado aos dados, cartas, moedas e outros. Junte tudo isso e temos um jogo de RPG, sigla para designar Role-Playing Game, ou Jogo de Representação. Basicamente é um jogo onde cada jogador deve representar um personagem, de acordo com suas características. Um dos jogadores, denominado Mestre, é o responsável pela descrição do ambiente, pelo resultado das ações dos personagens dos jogadores e pela interpretação dos NPCs (sigla em inglês para designar personagens não-jogadores). Os jogadores, após descrição do ambiente pelo mestre, descrevem oralmente as ações dos seus personagens, de maneira coerente com suas características. As ações, então, têm o resultado determinado pelo Mestre, sempre baseado em regras pré-estabelecidas pelo sistema. (RIYIS, 2004, pp.20-21)

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Riyis também estabelece relações entre as mais diversas áreas em que o RPG pode

estar apoiado: cita o teatro, a contação de histórias e os jogos de tabuleiro, sorte e

estratégia. Só não foi pelo mesmo caminho de Marcondes (2004) porque utilizou essas

relações, apelando para o imaginário de um leitor pressuposto, como exemplo para definir o

RPG, levando seu leitor a – juntamente com ele – construir esse conhecimento acerca do

jogo. De qualquer forma, faltou-lhe uma conclusão e o RPG ficou definido apenas no nível

do subentendido: exemplificou-se o RPG, esperando que, através da mecânica, o leitor

entenda a essência do jogo.

RPG seria, então, uma mistura de história e jogo, uma brincadeira de faz-de-conta

com regras, um teatro verbal interativo e improvisado, uma grande aventura alicerçada na

criatividade e na imaginação. Isso tudo já definiria bem o que seria RPG. Mas, como temos

certo gosto por construções anelares, vamos trazer outra definição dada por Ricón (1999B)

em um dos seus livros da série Mini-GURPS:

O RPG é um jogo de criar e contar histórias, no qual cada ouvinte faz o papel de um personagem. O narrador dessa história (chamado de Mestre do Jogo) descreve a situação, mas são os ouvintes que decidem o que seus personagens dizem ou fazem. O Mestre do Jogo (GM) é quem conduz a partida, criando o enredo da história, atuando como árbitro e fazendo o papel de todos os personagens que os jogadores encontrarão durante suas aventuras. O RPG é uma brincadeira de contar histórias. Ele é como uma conversa na qual os participantes imaginam o cenário onde a história se passa e definem o que seus personagens fariam em cada situação descrita. (RICÓN, 1999B, p.6)

Ricón vai direto ao ponto: RPG é um jogo de criar e contar histórias. Não poderia

ser mais simples nem mais completo. O mérito só não foi de Marcondes (2004) porque este

não mencionou que sua definição, em muito, dependia desses dizeres de Ricón.

Essa definição engloba tudo: é teatro, é faz-de-conta, é aventura, é imaginário, é

criatividade e é jogo!

Pra finalizar e amarrar todas essas linhas que traçamos, vamos detalhar um pouco

cada um dos elementos que definem o RPG e que, por assim dizer, assumiremos em nossa

própria definição. O RPG seria, então:

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1. Uma mistura de história e jogo;

2. Um teatro verbal interativo e de improviso;

3. Uma contação de histórias coletiva;

4. Um jogo de sorte, estratégia e tabuleiro;

5. Uma brincadeira de faz-de-conta com regras;

6. Um jogo de criar e contar histórias.

Mas será só isso?

Nesse trabalho, buscaremos essa resposta. Temos o objetivo de nos aprofundarmos

nos diversos tópicos já levantados acerca do RPG. Pretendemos, assim, mostrar as muitas

facetas do RPG, dando uma atenção especial para suas características ou suas modalidades

mais esquecidas e obscuras.

E é por isso a escolha do nome Jogo de Representação: primeiro, porque é um dos

nomes mais usados mas, ao mesmo tempo, mais carente de uma explicação detalhada.

Segundo, porque, como já mencionamos acima, representar é mostrar, e aqui pretendemos

mostrar o lado ainda escuro, ainda não explorado, dos Jogos de Representação.

E como toda boa aventura sempre termina com um gancho para uma próxima

história, deixamos aqui um trecho do trabalho de Andréa Pavão, A aventura da leitura e da

escrita entre mestres de roleplaying game (2002):

[o RPG] constitui-se de dois componentes básicos: aventura e fantasia. Toda aventura pressupõe a existência de um sujeito, que neste contexto é reconhecido como um herói. Cada personagem é um herói, cada qual com sua busca, seja ela qual for. É a busca que define a aventura. A trajetória de aventura do herói é uma trajetória de autoconhecimento, de auto-superação, de autoconstrução. (PAVÃO, 2002, p. 13)

Com isso em mente, percebemos que, nesse momento, somos os heróis nessa

jornada em busca de respostas. Em nossa primeira missão, encontrar uma definição que

legitime os Jogos de Representação no meio acadêmico, obtivemos sucesso: a partir desse

momento, os Jogos de Representação serão descritos através da definição Jogos

Cooperativos de Criar e Contar Histórias. Agora, estamos perto do primeiro limiar, em

frente à boca da baleia que nos conduzirá a um mundo novo de aventuras, descobertas e

aprendizado. Mas ainda nos falta uma chave: um objeto mágico que conduzirá nossa

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jornada. Nesse capítulo, ainda correremos atrás desse elemento que nos falta: o elemento

central de nossa pesquisa que dará o tom e o foco de todo trabalho.

1.2. MODALIDADES E ESTRUTURAS

Os Jogos de Representação possuem uma característica fixa: eles sempre precisam

da presença de duas figuras para que funcionem. Essas figuras são o narrador e o jogador.

O que determinará a modalidade do jogo é justamente a relação entre essas duas partes.

Podemos, dessa forma, destacar três tipos de jogo:

a) Aventuras Solo;

b) Jogo de Mesa;

c) Live Action.

É importante dizer que a maioria dos teóricos não contempla em seus estudos todas

as modalidades. Normalmente, são colocados em foco o Jogo de Mesa e as Aventuras Solo,

com raras exceções. Por conta desse interesse acadêmico a recorrentes modalidades, nosso

trabalho se destinará a estudar, principalmente, os Live Actions.

Essa exclusão de uma das modalidades pode ser vista em trabalhos acadêmicos

como o de Cristina de Matos Martins (2007), em sua dissertação de mestrado Um estudo do

perfil textual de role playing games ‘pedagógicos’:

Há duas modalidades de role playing game: o jogo de mesa e o jogo solo. Ambas são jogadas a partir de um livro, conhecido como livro-jogo. A modalidade solo é individual. O jogador “joga” o próprio texto da aventura e nele desempenha a função de herói. A modalidade mesa é coletiva: um grupo de jogadores reúne-se para jogar a aventura, sob orientação do Mestre (o “narrador” da partida). (MARTINS, 2007, p.17)

Em nota de rodapé, a autora justifica a exclusão da modalidade de sua pesquisa:

Há outras modalidades de role playing game além das que estudamos, o card game (baralho ilustrado) e o live action (uma forma de peça teatral). Por isso, ressaltamos que o role playing game aqui focalizado é apenas aquele abertamente difundido como pedagógico (característica que ainda não é associada ao card game nem ao live action). (op. cit. pp.17-18)

Ora, a autora, em sua explicação, acaba por cometer dois equívocos: primeiro ao

associar os card games aos roleplaying games, sabendo-se que estes pertencem ao âmbito

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dos jogos de representação e aqueles, ao âmbito dos jogos de estratégia6. Segundo por

inferir que os Live Actions não possuem um caráter pedagógico difundido abertamente.

Quanto a essa afirmação, somos obrigados a discordar: os Live Actions tem se mostrado

uma ferramenta pedagógica amplamente aceita e são aplicados tanto em escolas como em

acampamentos, estudos de meio, cursos de férias, dentre outros. Nosso trabalho destacará,

mais adiante, as possibilidades pedagógicas do Live Action, além de descrever algumas

aplicações feitas entre os anos de 2001 e 2008 no ambiente educacional.

A seguir, descreveremos rapidamente cada uma das três modalidades destacadas

anteriormente, levando em consideração a relação entre narrador e jogador:

1.2.1. A Aventura Solo

Também conhecida como livro-jogo ou jogo-solo, a Aventura Solo é a modalidade

mais simples em termos de sistema de regras e organização dentre os Jogos de

Representação. Como seu nome sugere, são jogadas individualmente.

Aqui, a figura do narrador está inserida no texto (diferente das outras modalidades,

em que o narrador aparece como função de um dos jogadores). Esse narrador, não-

onisciente, conta a história a partir dos olhos do herói, mas sem se tornar o protagonista. Na

verdade, poderíamos dizer, se existisse tal classificação, que a narrativa se dá numa “2ª

pessoa”: você.

[...] À medida que o fogo da lareira esmorece suavemente, você começa a adormecer, e pelo seu espírito passam imagens de duendes, com rostos verdes e aos gritos. Subitamente, nos arbustos à sua esquerda, ouve o estalido de um ramo que se quebra debaixo de um pé desajeitado. Você levanta-se e agarra na espada. (LIVINGSTONE, 1985, pp.18-19)

O jogador assume, então, a função de protagonista da história. Por conta disso, o

herói é um personagem genérico, sem descrição, inserido adequadamente em um

determinado contexto (em O Ladrão da Meia-Noite7, por exemplo, o herói é um aprendiz

de ladrão aspirando a uma posição dentro da Guilda dos Ladrões). Cabe ao leitor imaginá-

6 É certo que alguns card games possuem cenários (ambientações) derivados ou baseados em cenários de roleplaying games, como é o caso do jogo Magic: The Gatering, ambientado num mundo medieval fantástico claramente espelhado nos mundos explorados pelo RPG Dungeons & Dragons. 7 Volume 19 da série Aventuras Fantásticas.

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lo, além de, é claro, tomar suas decisões, fato esse que consiste, justamente, no jogo

propriamente dito. “Você é o herói! Neste livro é você quem decide que rumo a história vai

seguir. Cada caminho leva a um final diferente e você nunca sabe como a aventura

termina”. (RICÓN, 2000)

Resumidamente, o jogo possui a seguinte estrutura e mecânica: o texto é dividido

em pequenos trechos, numerados em ordem crescente8. Mas o leitor mais atento vai logo

perceber que um trecho não é a seqüência direta do trecho anterior. Por exemplo: o trecho

41 não é a seqüência do trecho 40, mas sim do trecho 227. Essa estrutura dá ao livro um

aspecto de narrativa linear mas não-seqüencial. O jogador, portanto, tem a liberdade de

fazer seu próprio percurso narrativo a partir de opções pré-estabelecidas, podendo nunca

chegar ao final da história ou, em cada vez que jogar, chegar num final completamente

diferente.

Abaixo, segue o exemplo de uma das possíveis decisões que o leitor pode tomar:

109 Em breve a vereda sai das árvores e entra numa grande planície com erva alta, que termina, mais adiante, nalgumas colinas baixas. A vereda divide-se e continua em três direções: Se quiser ir para oeste, siga para 124 Se quiser ir para leste, siga para 72 Se quiser continuar para norte, siga para 309

Digamos que o leitor decida pegar o caminho para norte. Folheia o livro até

encontrar o trecho número 309:

309 A vereda penetra na vegetação, que lhe dá pela cintura. Apesar da visibilidade ser boa, você sente-se preocupado, pois várias criaturas podem estar a espreitá-lo de ambos os lados. Subitamente, a vegetação à sua esquerda mexe-se e aparecem dois tubos de madeira que apontam para si. Pertencem a PIGMEUS que sopram duas setas na sua direcção. Teste a sua sorte duas vezes, uma para cada seta. Se tiver sorte das duas vezes, nenhuma das setas o atinge. Siga para 77. Se não tiver sorte, então uma ou as duas setas alojar-se-ão no seu pescoço. Vá para 197.9

E assim segue-se o jogo. Repare que nesse último trecho pede-se ao jogador que

teste sua sorte. Trata-se de um pequeno sistema de regras associado a dois dados de seis

8 os livros da série Aventuras Fantásticas, por exemplo, são numerados, em geral, de 1 a 400 9 Trechos extraídos de A Floresta da Morte e colados aqui de forma seqüencial. No livro, os trechos são separados por várias páginas (não numeradas).

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faces. Esse teste consiste em tirar o mesmo número ou menos que o número indicado no

espaço denominado Sorte em sua ficha de personagem ao jogar os dois dados. Por

exemplo: digamos que possuímos, em nossa ficha de personagem, Sorte 9. Ao fazer um

teste, jogamos os dois dados. Se o resultado for 9 ou menos, obtivemos sucesso. Caso

contrário, falhamos e não tivemos sorte. Além dos testes de sorte, esse sistema é usado em

batalhas contra monstros ou vilões que possam aparecer no caminho do herói. Como

dissemos anteriormente, as Aventuras Solo possuem um sistema de jogo simplificado, pois

o foco não está no jogo em si, mas na narrativa que se constrói e só se resolve com a

intervenção do leitor. Dados e sistemas de regras mais complexos serão mais comuns em

outra modalidade de Jogos de Representação: o Jogo de Mesa, que descreveremos a seguir.

1.2.2. Jogo de Mesa

Conhecido por ser a modalidade mais tradicional e de maior circulação e adesão – o

que inclui maior interesse acadêmico e experiências realizadas no setor educacional – o

jogo de mesa pode ser caracterizado por seus sistemas de regras complexos10 (dentre os

quais destacam-se Dungeons & Dragons – o primeiro RPG comercial e que, durante muito

tempo, passou a chamar-se Advanced Dungeons & Dragons; GURPS – Generic Universe

RolePlaying System; e Vampiro: A Máscara), pelos dados multifacetados que enchem de

cor o ambiente de jogo e pela quantidade quase absurda de textos, fichas, planilhas e livros

que compõem o dia-a-dia dos jogadores.

Da mesma forma que fizemos com a Aventura Solo, analisaremos o Jogo de Mesa a

partir da relação narrador-jogador.

Diferentemente do livro-jogo, o Jogo de Mesa é jogado de forma coletiva, sendo

que não existe um número fixo de jogadores11 nem uma faixa etária adequada. Aqui, a

função de narrador recai sobre um dos jogadores (que pode receber o nome de Mestre,

Dungeon Master, DM, Game Master, GM, Mestre do Jogo, dentre outras ocorrências

10 Alguns sistemas são tão detalhados que chegam a discriminar o nível de resistência de cada parte do corpo de um artrópode. 11 No entanto, é desinteressante ter um grupo de jogadores com menos de três participantes e pouco aconselhável ter um com mais de dez. Mesmo assim, isso depende do narrador, da aventura e, em algumas vezes, do sistema ou da proposta de aplicação. Em aplicações pedagógicas, por exemplo, dificilmente o professor-narrador terá um grupo com menos de 30 pessoas.

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menores. Para o seguinte estudo, adotaremos a nomenclatura Narrador). Esse jogador,

então, é responsável por descrever as situações e contextualizar os demais jogadores, julgar

as ações dos personagens dos jogadores e interpretar personagens secundários e

antagonistas.

[MESTRE:] Vocês não conseguem acreditar no que estão vendo! Ao redor de vocês, os homens gritam e caem ao chão, crivados de flechas, abatidos por tiros de mosquete ou feridos por pedras. Mais à frente, os guerreiros guaranis avançam berrando gritos de guerra, golpeando ferozmente com suas bordunas. O impossível parece estar acontecendo: a bandeira está sendo derrotada. Mas vocês não têm tempo para pensar muito sobre isso: vocês precisam lutar por suas vidas! (RICÓN, 1999B, p.29)

Os demais jogadores serão os personagens da aventura. Cabe a eles descrevê-los

(muitas vezes a descrição vem acompanhada de desenhos ou fotos referenciais), criar sua

história (quase como na elaboração da gênese de personagens que muitos atores fazem

antes de montar um espetáculo) e determinar suas características (que, em Jogos de

Representação, muitas vezes estão associadas ao sistema de regras12). A criação de

personagens, bem como a de cenários e enredos será melhor abordada adiante.

Criados os personagens, os jogadores deverão interpretá-los no desenrolar da

aventura. Importante dizer que, em muitos momentos, é exigido ao jogador que fale e pense

como o personagem (como em conversas com outros personagens), o que garante a

conservação da narrativa que ali se constrói. Não interpretar um personagem no momento

em que a história está sendo contada é o equivalente a quebrar a magia da brincadeira. O

jogador, nesse caso, seria considerado um desmancha-prazeres, como vai dizer Huizinga

(2007):

O jogador que desrespeita ou ignora as regras é um “desmancha-prazeres”. [...] [o desmancha-prazeres abala] o próprio mundo do jogo. Retirando-se do jogo, denuncia o caráter relativo e frágil desse mundo no qual, temporariamente, se havia encerrado com outros. Priva o jogo da ilusão – palavra cheia de sentido que significa literalmente “em jogo”. [...] O desmancha-prazeres destrói o mundo mágico, portanto, é um covarde e precisa ser expulso. (HUIZINGA, 2007, pp.14-15. Grifos nossos)

12 As características dos personagens normalmente são reduzidas a categorias (como Força, Destreza, Inteligência, etc.) e vêm acompanhadas de um valor numérico. Esse valor será importante em testes envolvendo dados que podem acontecer no desenrolar da aventura e que são determinados pelas regras descritas no sistema que está sendo utilizado no momento.

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Interpretar os personagens oralmente é a essência dos Jogos de Representação. A

mecânica do jogo pode ser explicada da seguinte forma:

[...] No início da aventura, cada jogador representará um papel: será um personagem. O mestre começa descrevendo o lugar (ambiente ou cenário) onde estão os personagens, seus níveis tecnológicos, costumes e detalhes que julga importante (sic), conduzindo a história até o ponto em que os personagens começam a agir, enfrentando situações, resolvendo enigmas e uma série de outros desafios. O sucesso do jogo depende totalmente do esforço coletivo – com uma boa dose de improviso -, em que os desafios e surpresas são expostos pelo mestre, e as ações e iniciativas ficam por conta dos jogadores (personagens). (MARCONDES, 2004, p.7)

Para melhor visualização, utilizaremos um exemplo de condução de aventura

descrito na obra de Alfeu Marcatto (1996):

- Vocês ouvem um ruído grave, como de ondas batendo numa praia. Um de vocês sobe em cima do ônibus e vê, a pouca distância, o mar. Há uma praia aí. Vocês não estão em sua cidade. (...) – Vamos para a praia, então – adiantou-se Sílvia, já entrando no espírito da brincadeira. - Vocês correm para lá e agora, em terreno aberto, podem ver o teto do ônibus aparecendo em meio à vegetação. Há também uma montanha, não muito alta, relativamente perto de onde estão. - Há alguém na praia? – perguntei. - Não (...) a praia tem cerca de três quilômetros de extensão e não há nenhum sinal de vida humana. No horizonte só se vê o mar aberto. Está bastante quente, o sol muito forte. (...) – Em que posição está o sol? – completou Célia. - Está a 45 graus, mais ou menos. - A leste ou oeste? - Vocês não têm bússola. Não há como saber isto agora. - Se esperarmos mais alguns minutos – Janaina sugeriu – saberemos. Se o sol subir no céu, está a leste. Se descer, está a oeste, entardecendo portanto. (MARCATTO, 1996, pp.8-9)

E assim a aventura vai, aos poucos, progredindo e a narrativa se construindo. O

final, ainda indeterminado, só será alcançado com o auxílio de todos os jogadores e o

enredo só se estruturará a partir da interação entre narrador e jogadores. Reparem, pois, que

o narrador possui apenas, no começo da aventura, uma idéia geral de onde a aventura se

desenrola, quem são os personagens envolvidos e onde ele pretende chegar (no exemplo,

mostramos uma aventura pedagógica que tinha como objetivo a orientação espacial e a

determinação de espaço por meio das características morfológicas deste: clima, vegetação,

relevo, etc.). Tudo que acontece ali vai depender das ações e reações dos personagens, o

que pode conduzir a história para um sem-número de possibilidades. Infelizmente o

exemplo não contemplou o quesito interpretação de personagem (os alunos do exemplo

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representavam a si mesmos) por tratar de jogadores iniciantes. Em aventuras mais

complexas ou com jogadores mais experientes, o nível de representação cresce de forma a

assemelhar-se a uma peça de teatro oralizada. Esse aspecto teatral será uma característica

central na próxima modalidade que descreveremos: o Live Action.

1.2.3. Live Action

Os Live Actions são a modalidade menos estudada no setor acadêmico. Os teóricos e

pesquisadores que têm como objeto de estudo os Jogos de Representação normalmente

reservam seu tempo unicamente para o trabalho com Jogos de Mesa. Poucos são os que

trabalham com as Aventuras-Solo e raríssimos são aqueles que, ao menos, mencionam a

existência do Live Action.

Há pouco, quando traçávamos um rápido panorama sobre as modalidades de Jogos

de Representação, citamos a pesquisa de Cristina de Matos Martins (2007). Em nota, a

autora justifica a ausência do Live Action em seu estudo alegando que a modalidade não é

abertamente difundida como pedagógica. Já mostramos, também, nossa discordância em

relação a tal assertiva. Falaremos disso adiante. Por enquanto, cabe a nós ressaltarmos que

tanto o Live Action é utilizado em contextos pedagógicos como será a peça central de nosso

trabalho.

Sendo a modalidade pouco abordada em estudos acadêmicos, fica difícil

encontrarmos uma definição oficial ou de fonte confiável, sendo que boa parte dessas

definições acaba assumindo a posição de verdade absoluta difundida oralmente ou por

meio da internet.

Em um live action você não imagina o cenário narrado pelo Mestre (ou Narrador), mas utiliza o espaço à sua volta como o cenário de jogo. Em uma sessão de RPG comum, cada jogador pega a sua ficha e senta em um (sic) mesa, como em um jogo qualquer, representando ali o seu papel sem nenhuma interação real com outros jogadores: Já o live action é o estilo de RPG que mais se aproximaria de um teatro de verdade. Você representa o seu personagem exatamente como um ator representaria um papel. É exatamente como uma peça de teatro, onde cada jogador representa um personagem: As diferenças são que esses personagens foram construídos antes com ajuda do mestre, e que estes personagens não seguem um 'script' pré-definido.13

13 http://pt.wikipedia.org/wiki/Live_action Acesso em 28 de Outubro de 2008.

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A maioria se limita a descrever o Live Action como sendo uma espécie de peça

teatral. A afirmação, no entanto, é um tanto quanto precipitada: o Live Action não é uma

peça teatral, mas possui elementos teatrais. Devemos sempre lembrar que, em primeiro

lugar, é um Jogo de Representação e, portanto, possui características enquanto jogo. Em

segundo, que possui características morfológicas próprias, que lhe dão autonomia enquanto

modalidade e, ao mesmo tempo em que isso o aproxima do âmbito do jogo, afasta-o do

âmbito do teatro.

Sobre o Live Action, o professor Marcos Tanaka Riyis (2004) vai dizer:

O Live Action é uma modalidade de RPG que é jogada “ao vivo”, ou seja, é como se fosse um grande teatro interativo “de improviso”. Como o Live Action é jogado em um espaço maior, a figura do mestre é ligeiramente diferente do mestre do RPG comum. Ele é como um diretor de teatro, e fica coordenando o jogo como um todo enquanto vários “mestres locais”, ou auxiliares/monitores interagem com os jogadores para resolver as ações e conduzir a aventura em conjunto com eles e com o mestre principal. (RIYIS, 2004, p.35)

Assim como nas outras modalidades, fica clara no Live Action a relação entre

narrador e jogador. Aqui o narrador continua sendo função de um jogador, mas existe uma

pequena diferença: encontramos pelo menos dois tipos de narradores no Live Action. Um

atua como um narrador geral: será ele quem conduzirá a história. Os outros serão

narradores-auxiliares e acompanharão de perto as ações dos jogadores, julgando-as e

descrevendo-as. Também podem ser esses narradores-auxiliares que interpretarão os

personagens secundários (os personagens não-jogáveis do Jogo de Mesa) e os antagonistas.

Os jogadores, no entanto, continuam em sua função de interpretar um único personagem.

O que mais chama a atenção nos Live Actions é seu aspecto visual. Como a tradução

do termo Live Action pressupõe, nessa modalidade a ação se dá ao vivo. Personagens saem

da mente do jogador e ganham vida no espaço, com direito a ambientação cenográfica (os

Live Actions, normalmente, são jogados em sítios, parques ou lugares isolados da

circulação de pessoas não-jogadoras) e figurinos. O jogo, então, ocorre de forma similar ao

Jogo de Mesa, com elementos narrados oralmente, mas também com a realização física dos

eventos que constituem a modalidade. Infelizmente, é difícil ilustrar uma partida de Live

Action em palavras. Descrever uma cena ou um acontecimento de forma descontextualizada

destruiria o grande atrativo do jogo, indo contra, inclusive, as definições de Huizinga

(2007) em relação à esfera em que o jogo se desenvolve: é impossível trazer o jogo em sua

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essência pura e verdadeira para fora de seu círculo mágico14. Descrevê-lo aqui seria uma

tentativa frustrada de emulação. Mesmo assim, como nosso trabalho põe o Live Action em

evidência, iremos nos apoiar, nos próximos capítulos, nas teorias estruturais das narrativas

épicas e maravilhosas para entender melhor como funcionam as etapas que constituem essa

modalidade dos Jogos de Representação. Utilizaremos, como objeto de análise, um jogo de

autoria nossa, aplicado em Janeiro de 2008, em Sorocaba, no interior de São Paulo. A

seguir, destacaremos um pequeno trecho deste jogo para tentar ilustrar minimamente o Live

Action.

FLORESTAN – Muito bem, jovens companheiros! Vocês conseguiram as chaves! E, mais importante que isso, completaram os seus Mapas da Sabedoria! Agora, aqui, em frente às Chamas de Sharyou, vamos realizar o encanto que abrirá as portas para a última floresta do mundo! (Fazer algum jogo com todos os participantes. Pode ser o Nó Humano ou algo do tipo. Completado o “ritual”, o Portal se abre. Efeitos de luz, fumaça, música, etc. Aberto o Portal, Velho Ferro aparece) VELHO FERRO – Huá, huá, huá!!! Enfim encontrei vocês, Florestan e Esfinge! Pelo visto vocês não perderam essa mania repulsiva de tentar mudar o mundo! Só vocês não percebem que isso é praticamente impossível! FLORESTAN – Impossível por quê, posso saber? VELHO FERRO – Mas não é óbvio??? Vocês ainda não perceberam que as pessoas estão confortáveis em suas vidinhas? Ninguém quer mudar! Pra quê? As pessoas trabalham, compram, gastam, produzem, poluem...todo dia, ano após ano...tudo funciona muito bem assim! ESFINGE – Você está errado, Velho! Esses bravos heróis, que estão conosco, fizeram sua parte essa semana! Conseguiram convencer pessoas que antes pensavam como você! E, graças a isso, encontraram o caminho secreto para o Vale Encantado! VELHO FERRO – Bravo! Bravo! Mas não pensem que as coisas serão tão fáceis, daqui por diante! Lembrem-se que meu poder cresce cada dia mais! FLORESTAN – Você está errado, Velho... (Velho Ferro faz um passe de mágica e congela Florestan) VELHO FERRO – É você quem deve se calar, seu tolo! Cansei de sua impertinência! ESFINGE – Florestan!!!!!!!

14 “Todo jogo se processa e existe no interior de um campo previamente delimitado, de maneira material ou imaginária, deliberada ou espontânea. (...) A arena, a mesa de jogo, o círculo mágico, o templo, o palco, a tela, o campo de tênis, o tribunal etc., têm todos a forma e a função de terrenos de jogo, isto é, lugares proibidos, isolados, fechados, sagrados, em cujo interior se respeitam determinadas regras. Todos eles são mundos temporários dentro do mundo habitual, dedicados à prática de uma atividade especial.” (HUIZINGA, p.13)

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VELHO FERRO – É tarde para seu amigo, Esfinge! Que ele sirva de exemplo a você e a todas essas crianças mimadas! DESISTAM AGORA ou sofram o mesmo destino de seu amigo! ESFINGE – Nós nunca desistiremos, Velho Ferro! Nunca! Unidos, iremos salvar nosso amigo e derrotar você de uma vez por todas! VELHO FERRO – Que seja! Meu aviso está dado! Eu vou-me embora afinal, não há nada que vocês possam fazer! Só com os Quatro Artefatos de Sharyou vocês poderiam me derrot...ops! Quase falo demais! Deixem-me ir! Boa sorte em sua missão suicida, “heróis”! Huá, huá, huá!!! (vai embora)15

A cena acima descreve o momento em que os jogadores encontram, pela primeira

vez, o antagonista da história: o Velho Ferro. Importante notar alguns aspectos presentes

nessa cena: a) Os narradores assumem o papel dos personagens Florestan, Esfinge e Velho

Ferro e, por conta disso, possuem um texto pré-estabelecido (mas que não precisa,

necessariamente, ser seguido em sua totalidade. O que importa realmente é que a história

contida ali seja contada, da forma que os narradores bem entenderem.); b) os jogadores

realizam atividades físicas: para abrir o portal, eles precisam realizar uma tarefa. No

exemplo, é sugerida a execução de uma atividade cooperativa chamada nó humano16; c) a

ação utiliza elementos teatrais e cenográficos: narradores na função de atores, a cena se

desenrola em volta de uma fogueira, personagens utilizando figurinos, efeitos de luz,

fumaça e sonoplastia, dentre outros.

1.3. O LIVE ACTION EM EVIDÊNCIA

Com isso, podemos, mesmo que rapidamente nesse momento, perceber o quão

diferente os Live Actions são das outras modalidades de Jogos de Representação, apesar de

manter certas semelhanças que os englobam numa mesma categoria: são jogos;

estabelecem uma relação clara entre narrador e jogador; o jogador se torna protagonista da

15 Texto extraído do Live Action “O Caminho para Vale Encantado”, de autoria nossa. 16 Jogos cooperativos são aqueles que não prevêem vencidos ou vencedores. Os Live Actions de nossa autoria são formados, em essência, por esses jogos. O Nó Humano usado no exemplo consiste em fazer com que os jogadores formem um círculo e dêem as mãos. Em seguida, os jogadores são embaralhados. Após um comando de estátua, os jogadores, sem se mover, devem dar as mãos para as mesmas pessoas que estavam de mãos dadas a eles anteriormente (exemplo: Pedro, no círculo, deu a mão direita para Maria e a esquerda para João. Após o movimento de embaralhamento, Pedro deve voltar a dar a mão direita para Maria e a esquerda para João, sem se mover e independente de onde seus companheiros estejam). Feito isso, percebe-se que os jogadores deram um verdadeiro nó. O objetivo do jogo, então, é desfazer o nó sem soltar as mãos, formando o círculo novamente.

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história, tomando decisões e ajudando a criar e desenvolver a narrativa, dando movimento e

organização ao processo. Contudo, não deixam de ser modalidades diferentes, de

características únicas e singulares que as diferenciam e permitem essa classificação:

Aventuras Solo são jogadas individualmente e possuem aspecto formal ainda ligado ao

texto escrito, ao formato livro; Jogo de Mesa é jogado coletivamente de forma oral; e Live

Action é igualmente jogado de forma coletiva, mas de forma teatral. Podemos, inclusive,

arriscar uma brincadeira ao dizer que os Jogos de Representação, da forma que os

descrevemos, ilustraram um processo evolutivo que partiu do imaginário puro até sua

concretização: saímos dos livros, do jogo textual, visto na Aventura Solo; passamos pela

oralização desses jogos narrativos, como observamos nos Jogos de Mesa; e finalizamos

com a teatralização e fisicalização desse mesmo jogo no Live Action.

Ao mesmo tempo em que descrevemos esse panorama, analisamos e destacamos as

principais características contidas nos Jogos de Representação e que serão de interesse no

decorrer desse trabalho. Tendo o Live Action como ponto central, nossa arma mágica,

poderemos, enfim, atravessar o portal que nos levará ao reino perdido. Nessa jornada,

procuraremos relacionar essas características formais dos Jogos de Representação com as

teorias narratológicas apresentadas por Propp (1984) e Campbell (2007). Para isso,

delimitamos um corpus constituído por dois jogos: um Jogo de Mesa chamado Perdidos na

Selva e um Live Action de nome O Caminho para o Vale Perdido. Esses jogos serão

analisados a partir dessas teorias que descrevem as estruturas narrativas dos contos

maravilhosos e das narrativas épicas a fim de por em evidência suas estruturas formais

enquanto texto e questionando a força do vínculo entre jogo enquanto texto e jogo enquanto

jogo. Em seguida, os mesmo jogos serão analisados do ponto de vista pedagógico,

colocando o conteúdo e a mecânica do jogo em foco. Por fim, estudaremos os processos de

criação ficcional, trazendo como mediador um tutorial distribuído em palestra sobre criação

literária. Apresentado o material, colocaremos novamente nosso corpus em análise

buscando averiguar os processos de criação que imperaram na elaboração dessas aventuras.

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CAPÍTULO II – TEORIAS NARRATOLÓGICAS

2.1. UMA BREVE EXPLICAÇÃO SOBRE NARRATOLOGIA

O seguinte capítulo vem explicar, resumidamente, a teoria utilizada nas análises que

constituem este trabalho. Segundo o dicionário de Narratologia

A narratologia é uma área de reflexão teórico-metodológica autônoma, centrada na narrativa como modo de representação literária e não-literária, bem como na análise dos textos narrativos [...] Concebendo a narrativa numa perspectiva organicista, a narratologia procura, pois, descrever de forma sistemática os códigos que estruturam a narrativa, os signos que esses códigos compreendem, ocupando-se, de um modo geral, da dinâmica de produtividade que preside à enunciação dos textos narrativos. Por outro lado, a narratologia, ao contemplar prioritariamente as propriedades modais da narrativa, não privilegia em exclusivo os textos narrativos literários, nem se restringe aos textos narrativos verbais; ela visa também práticas narrativas como o cinema, a banda desenhada ou a narrativa de imprensa. (REIS e LOPES, 1994, pp. 285-286)

Dentre os teóricos da narratologia, o dicionário aponta os estudos de Propp (1984)

em torno do folclore russo. Em nosso trabalho, destacaremos dois teóricos e suas estruturas:

Vladimir Propp e sua Morfologia do Conto Maravilhoso e Joseph Campbell (2007) e sua

Jornada do Herói, também chamadas, de agora em diante, respectivamente, Estrutura

Maravilhosa e Estrutura Épica.

Esse capítulo, então, descreverá o aspecto formal de cada uma dessas teorias,

atentando às etapas que constituem ambas as estruturas.

As estruturas – tanto maravilhosa quanto épica – são constituídas por etapas bem

delimitadas mas que podem possuir ordenação flexível. Em nosso trabalho, veremos que a

estrutura, em nenhum momento, assumirá organização fixa. Essas etapas, como decidimos

chamar, são a representação do que Propp chamará de Funções. Segundo ele, “por função,

compreende-se o procedimento de um personagem, definido do ponto de vista de sua

importância para o desenrolar da ação”17. As Funções Proppianas serão descritas mais

tarde.

17 PROPP, 1984:26.

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2.1.1. As Esferas de Ação

Essas Funções descritas por Propp (1984) podem ser agrupadas de maneira lógica,

formando esferas de ação. Essas esferas estão relacionadas às funções que cada

personagem assume no decorrer da narrativa, não estando relacionadas à personagem

propriamente dita, mas à categoria de personagem. Propp identifica sete esferas de ação, as

quais descreveremos a seguir. Desse ponto em diante, assumiremos que as esferas de ação

se realizarão tanto na teoria Proppiana quanto nos estudos de Campbell (2007). Sendo

assim, para fins de análise, adotaremos a nomenclatura Arquétipo para nos referirmos às

esferas de ação.

2.1.1.1. Os Arquétipos

São identificados sete Arquétipos nas teorias narratológicas em questão: Herói,

Antagonista (ou Sombra), Mentor (ou Doador), Guardião do Limiar, Arauto (ou

Mensageiro), Pícaro (ou Companheiro ou Auxiliar) e Camaleão (ou Falso Herói).

Também é possível encontrar a presença do Arquétipo Princesa (ou Tesouro) associada à

figura do Guardião (que pode assumir a figura paterna), da Sombra ou, em alguns

momentos, no lugar do primeiro. Importante salientar que alguns dos Arquétipos podem

não aparecer numa jornada e que, muitas vezes, um personagem assume mais que uma

função (Arauto-Pícaro, Mentor-Camaleão, etc.).

a. Herói

O Arquétipo de Herói aparece na figura – normalmente – do protagonista da

aventura. A história segue seus passos e o leitor só tem acesso à jornada através de seus

movimentos. Sobre o Herói, Campbell irá dizer:

O herói composto do monomito18 é uma personagem dotada de dons excepcionais. Freqüentemente honrado pela sociedade de que faz parte, também costuma não receber reconhecimento ou ser objeto de desdém. Ele e/ou o mundo em que se encontra sofrem de

18 Segundo Campbell, todas as histórias seguem uma mesma ordenação (a qual descrevemos através das etapas da Jornada do Herói Mitológico). O conjunto formado por essas histórias formalmente idênticas é o que chamamos monomito.

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uma deficiência simbólica. Nos contos de fadas, essa deficiência pode ser tão insignificante como a falta de um certo anel de ouro, ao passo que, na visão apocalíptica, a vida física e espiritual de toda a terra pode ser representada em ruínas ou a ponto de se arruinar. Tipicamente, o herói do conto de fadas obtém um triunfo microcósmico, doméstico, e o herói do mito, um triunfo macrocósmico, histórico-universais. Enquanto o primeiro – o filho mais novo ou desprezado que se transforma em senhor de poderes extraordinários – vence os opressores pessoais, este último traz de sua aventura os meios de regeneração de sua sociedade como um todo. (CAMPBELL, 2007, pp.41-42)

b. Antagonista

Em movimento contrário ao do Herói, o Antagonista (ou Sombra) é a representação

do vilão, podendo aparecer na forma de um personagem (a representação do mal ou da

divergência de idéias), de uma situação (o Antagonista pode ser uma situação de crise,

uma doença, um teste) ou do próprio protagonista (culpa, medo, necessidade de

superação). A Sombra pode ter a mesma jornada do Herói, almejando o mesmo objeto

mágico ou ser o causador do Dano e, dessa forma, o possuidor ou guardião do objeto

mágico. Em ambos os casos, a Sombra submete o Herói a testes e desafios.

c. Mentor

Como veremos adiante, o Mentor é a representação da instrução. Ele acompanhará o

Herói até determinado ponto de sua jornada, auxiliando e ensinando-lhe os caminhos

necessários para superar os desafios impostos pela Sombra. O elo formado entre Herói

e Mentor pode se assemelhar ao elo existente entre pai e filho, tornando o Mentor um

ponto-fraco que o Antagonista pode explorar. De qualquer forma, sendo morto, raptado,

enfeitiçado ou simplesmente abandonando o Herói à própria sorte, o Mentor sempre

deixa que o Herói prossiga sozinho em sua jornada a partir de determinado ponto.

d. Guardião

O Guardião é um arquétipo cuja aparição se dá em momentos de transição: ele

vigia as portas do covil do dragão, protege a passagem para o mundo desconhecido ou

guarda a chave do tesouro. Pode estar tanto a serviço da Sombra como pode se tornar

um aliado do Herói, normalmente, após submetê-lo a algum teste.

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e. Arauto

O Arauto é o Arquétipo que desencadeia o movimento da aventura. É ele o

responsável por comunicar ao Herói o Dano ou fazer o Chamado à aventura. Em

alguns casos, como já dissemos anteriormente, pode vir associado a outro arquétipo

(como o Mentor ou o Pícaro).

f. Pícaro

É a representação do companheiro, o auxiliar que possui características contrárias

ou complementares às do Herói: um personagem cômico em oposição a um Herói

trágico, uma atitude hipócrita em oposição à honradez do Herói, etc. Em geral, assume

vínculos emocionais com o Herói de forma similar ao Mentor, podendo também ser um

alvo da Sombra. Sua principal função é ser a consciência do Herói, lembrando-lhe de

sua missão e suas características primordiais.

g. Camaleão

O Camaleão representa a mudança. Em geral, possui características contrárias às do

Herói e caráter duvidoso, de ações imprevisíveis. Em alguns casos, assume a figura do

espião ou do traidor, aliando-se ao Herói a pedido da Sombra e vice-versa.

h. Princesa

O Arquétipo da Princesa nem sempre recai sobre um personagem. Sua esfera de

ação recai sobre o objeto mágico, o objeto de busca do Herói. Pode ser um ente querido

raptado ou amaldiçoado, um bem valioso perdido ou roubado, ou um elemento mágico

capaz de sanar todos os males.

2.1.2. Estrutura Épica

Nosso trabalho abordará as estruturas descritas por Propp (1984) e Campbell

(2007). Sobre o trabalho de Campbell, principalmente a respeito de sua obra O Herói de

Mil Faces, Luiz Eduardo Ricón irá dizer:

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Paralelamente às teorias de Carl Jung sobre os arquétipos e o inconsciente coletivo, Campbell trabalha a noção de que as histórias (todas elas) estão ligadas a um fio condutor comum. Assim, desde os mitos antigos, passando pelas fábulas e os contos de fada até os mais recentes estouros de bilheteria do cinema americano, a humanidade vem contando e recontando sempre as mesmas histórias. [...] Segundo Campbell, seria possível estruturar qualquer história a partir do roteiro básico da “Jornada do Herói”, e vice-versa, ou seja, é possível “desmontar” as histórias, identificando nelas os passos que constituem a “Jornada”. (RICÓN, s/d)

Durante os dois primeiros Simpósios RPG & Educação (realizados entre os anos de

2001 e 2002), foi realizada a oficina Criando uma aventura paradidática, onde os

participantes receberam uma apostila que continha o seguinte quadro, também escrito por

Ricón, baseado no trabalho de Christopher Vogler:

ROTEIRO DE CRISTOPHER VOGLER

(a partir de Joseph Campbell) PRIMEIRO ATO – APRESENTAÇÃO MUNDO COMUM Conhecemos o Herói em seu mundo cotidiano e

ordinário, uma pessoa comum. CHAMADO À AVENTURA Algo impele o nosso “Herói” na direção de uma

BUSCA, uma JORNADA, uma AVENTURA. RECUSA DO CHAMADO O Herói reluta em empreender a jornada. ENCONTRO COM O MENTOR O Herói recebe um conselho, item ou ajuda de

um “MENTOR”. TRAVESSIA DO PRIMEIRO LIMIAR O Herói diante do “PONTO SEM RETORNO”, o

portal que leva ao mundo oculto. O Herói atravessa o portal, cai, é arrebatado, transportado ou transformado. O Herói deixa o seu mundo e se aventura no mundo desconhecido.

SEGUNDO ATO – CONFLITO TESTES, ALIADOS E INIMIGOS O Herói tem de enfrentar “TESTES” que vão

“QUALIFICÁ-LO” como digno de vencer. APROXIMAÇÃO DA CAVERNA OCULTA

De posse da “ARMA MÁGICA”, o Herói se aproxima do COVIL DO INIMIGO.

PROVAÇÃO SUPREMA O embate com o ANTAGONISTA. RECOMPENSA O Herói conquista sua vitória e o “PRÊMIO”.

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TERCEIRO ATO – RESOLUÇÃO CAMINHO DE VOLTA O Herói inicia a jornada de volta para casa. RESSURREIÇÃO O Herói é revivido por poderes sobrenaturais. RETORNO COM O ELIXIR O Herói emerge do mundo inferior com a

“SOLUÇÃO MÁGICA”.

Nesse quadro são descritas as etapas da Jornada do Herói Mitológico de Campbell

(2007), seguindo a ordenação que o próprio autor propõe em seus estudos19. Essas etapas

serão parte do fio que conduzirá parte de nosso trabalho, e atuará em parceria com as

teorias Proppianas.

Abaixo, descreveremos sucintamente cada uma das etapas presentes na Jornada do

Herói Mitológico. Essas etapas serão resgatadas no Capítulo III deste trabalho, onde

aparecerão de forma mais detalhada.

2.1.2.1. As etapas da Jornada do Herói Mitológico

a. Mundo comum

Campbell não descreve as etapas da Jornada do Herói Mitológico de forma didática,

mas dentro do contexto do mito. Dessa forma, o que convencionalizou-se chamar

Mundo comum não nos é apresentado de forma descritiva, mas o autor o coloca dentro

de uma situação, como vemos nos seguintes dizeres: “Um herói vindo do mundo

cotidiano se aventura numa região de prodígios sobrenaturais” (CAMPBELL, 2007,

p.36).

Mundo comum, então, seria todo o percurso narrativo anterior à separação, ao

chamado à aventura e à transição de mundos.

b. Chamado à aventura

Habitando seu Mundo comum, o Herói recebe a visita do Arauto, o arquétipo

responsável por comunicar a crise ou intriga (que Propp denominará Dano) ao

protagonista da aventura. Essa comunicação desencadeará um movimento no Herói,

19 A Jornada do Herói não precisa, necessariamente, seguir rigorosamente a ordem descrita por Campbell, apesar desta ser a mais comum.

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que pode ser tanto negativo quanto positivo. Se positivo, o Herói aceita imediatamente

sua missão e parte em sua jornada. Se negativo, o Herói se recusa e decide permanecer

no Mundo comum.

c. Recusa do chamado

O Herói, ao receber o Chamado à aventura, pode recusar-se a aceitá-la. Um dos

motivos mais freqüentes é o do protagonista não se sentir especial (como vimos

anteriormente, o Herói muitas vezes é retratado como sendo um objeto de desdém),

digno ou apto para enfrentar a situação que lhe é proposta. Sendo assim, ele se recusa a

aceitar a missão. Ao recusar, o Herói passa por uma fase denominada Punição onde,

para ser impulsionado de volta à esfera da ação, sofre um novo Dano: a perda de um

ente querido, uma maldição recai sobre seu vilarejo ou sobre ele próprio, o roubo de um

bem precioso. Sendo vítima desse novo Dano, o Herói aceita a missão.

d. Encontro com o Mentor

Em determinado ponto da jornada – que pode variar, podendo ocorrer tanto no

início como em etapas mais avançadas – o Herói se depara com a figura do Mentor, o

Arquétipo que representa a instrução, aquele que ensina, o próprio conhecimento e a

consciência, podendo, em alguns casos, assumir a função paterna, inclusive. O Mentor é

aquele que prepara o Herói para enfrentar o desconhecido, submetendo o protagonista a

testes e provações. Essas provas seguem até o ponto em que o Mentor abandona o

Herói: a partir dali, este terá de prosseguir sozinho.

e. Travessia do primeiro limiar

Nesse momento, o Herói – já absorvido plenamente pela missão – chega ao ponto

sem retorno, entrando no mundo desconhecido. A passagem abaixo, extraída de

Aventuras de Alice no País das Maravilhas, resume bem a passagem entre dois mundos

(o comum e o desconhecido):

[...] Alice levantou-se sem demora, pois assaltou-a a idéia de que jamais vira na sua vida um coelho de colete e bolso, e muito menos com relógio dentro. Ardendo de curiosidade, correu atrás do Coelho campo afora, chegando justamente a tempo de vê-lo enfiar-se numa grande toca sob a cerca.

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Logo depois Alice entrou atrás dele, sem pensar sequer em como sairia dali outra vez. A toca do Coelho se alongava em linha reta como num túnel e de repente abria-se numa fossa, tão de repente que Alice não teve nem um segundo para pensar em parar, antes de ver-se caindo no que parecia ser um poço muito profundo. (CARROLL, s/d, pp. 9-10)

Como podemos identificar no trecho citado, nosso Herói (Alice), movido por um

Chamado à Aventura (a aparição do Coelho Branco), decide atravessar o primeiro

limiar (a toca do coelho20), de onde não se tem volta (a queda num poço sem-fim).

f. Testes, aliados e inimigos

Entrando no mundo desconhecido, o Herói é submetido a novos testes, onde acaba

encontrando aliados de sua jornada (normalmente, a aparição dos Arquétipos do Pícaro

e do Camaleão se dá nessa etapa) e inimigos (aliados da Sombra, também chamados

atrapalhantes, ou o próprio Camaleão, nesse momento, revela sua segunda face,

mostrando-se um espião ou um traidor). É nessa etapa em que o Herói encontra o

Objeto Mágico (ou Meio Mágico, Arma Mágica, ou ainda, Espada Encantada ou

Mágica), um elemento essencial – que pode ser concreto (uma espada ou outra arma,

um amuleto, um instrumento musical, um objeto variado ou animal raro) ou abstrato

(um conhecimento, um sentimento, um talento) – para derrotar o Antagonista (Sombra).

g. Aproximação da Caverna Oculta

A Caverna Oculta, também chamada de segundo limiar, ventre da baleia ou Covil

do Dragão é o momento que antecede a provação suprema do Herói. É o momento de

superação do eu, onde o Herói deixa para trás sua vida anterior, no mundo comum e

passa a se aceitar como o Escolhido. Em geral, temos uma morte simbólica do Herói

seguida de um renascimento:

A idéia de que a passagem do limiar mágico é uma passagem para uma esfera de renascimento é simbolizada na imagem mundial do útero, ou ventre da baleia. O herói, em lugar de conquistar ou aplacar a força do limiar, é jogado no desconhecido, dando a impressão de que morreu. [...] a passagem do limiar constitui uma forma de auto-aniquilação. [...] o herói vai para dentro, para nascer de novo. [...] O desaparecimento corresponde à entrada do fiel no templo – onde ele será revivificado pela lembrança de quem e do que é, isto é, pó e cinzas, exceto se for imortal. O interior do templo, ou ventre

20 O Primeiro limiar assume vários nomes dentre os pesquisadores: caverna escura, floresta escura, toca do coelho, submundo, etc.

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da baleia, e a terra celeste, que se encontra além, acima e abaixo dos limites do mundo, são uma só e mesma coisa. Eis por que as proximidades e entradas dos templos são flanqueadas e defendidas por colossais gárgulas: dragões, leões, matadores de demônios com as espadas desembainhadas, anões rancorosos e touros alados. Eles são guardiães [sic] do limiar, a quem cabe afastar todos os que forem incapazes de encontrar os silêncios mais elevados do interior do templo. São encarnações preliminares do aspecto perigoso da presença e correspondem aos ogros mitológicos que marcam os limites do mundo convencional, ou às fileiras de dentes da baleia. Ilustram o fato de o devoto, no momento de entrar num templo, passar por uma metamorfose. Sua natureza secular permanece lá fora [...] (CAMPBELL, 2007, pp.91-93)

De frente à Caverna Oculta, o Herói encontra e enfrenta um Guardião: um dragão,

um leão ou algum monstro. Todavia, a figura do Guardião, não importando a forma que

esta assuma, revelar-se-á como sendo a própria representação do Herói: é o Herói de

frente ao espelho enfrentando a si mesmo.

h. Provação suprema

Obtendo êxito no confronto com o Guardião, é chegado o momento do Herói

enfrentar seu Antagonista. A Arma Mágica que conseguiu no decorrer da jornada, se

concreta, demonstrar-se-á inútil no embate final: a verdadeira arma é todo o

conhecimento, todo o amadurecimento e transformações que o Herói sofreu durante seu

percurso. Acima disso, a arma é a própria superação do eu, iniciada no momento em

que o Herói se viu diante da Caverna Oculta. Ao descobrir isso, o Herói derrota a

Sombra e está livre para iniciar o caminho de volta.

Novamente em Aventuras de Alice no País das Maravilhas, vemos a passagem em

que Alice realiza sua provação suprema ao questionar as decisões da Rainha de Copas,

representando, dessa forma, a passagem da infância à fase adulta:

- Não, não! – gritou a Rainha. – Primeiro a sentença, o veredicto depois. - Mas que bobagem! – disse Alice em voz alta. – Quem já viu sentença antes de veredicto? - Dobre essa língua! – disse a Rainha, com o rosto vermelho de raiva. - Não, nunca! – respondeu Alice. - Cortem-lhe a cabeça! – berrou a Rainha o mais alto que pôde. Mas ninguém se moveu. - E quem se importa com você? – disse Alice (que tinha acabado de voltar ao seu tamanho normal). – Vocês não passam de um baralho de cartas! (CARROLL, s/d, p.153)

i. Recompensa

Vitorioso, o Herói adquire o direito de possuir seu objeto de busca: o amor de uma

princesa, um objeto mágico capaz de quebrar o encanto que caiu sobre si ou sobre um

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ente querido, ou o direito de retornar para seu mundo. Esse objeto de busca é chamado

Elixir.

j. Caminho de volta

De posse do Elixir – de caráter reparador – o Herói inicia o movimento contrário de

sua jornada e deve voltar a seu mundo comum. No entanto, ele encontrará novos perigos

nesse retorno: sofrerá perseguição, cairá em armadilhas ou ficará tentado a não voltar

para casa. Essa etapa funcionará, então, como uma comprovação da superação do

Herói. Odisséia conta a história do retorno interrompido de Odisseu a Ítaca, após sair

vitorioso da guerra de Tróia. Todas as passagens da epopéia estão inseridas nesses

perigos que o Herói encontra no caminho de volta para casa: a terra dos ciclopes, a ilha

de Calipso, as sereias.

k. Ressurreição

Antes de voltar a seu mundo, o Herói passa por um período de apoteose: ele deixa

para trás sua antiga vida e é elevado ao nível divino. Aqui, uma nova morte simbólica

acontece, muitas vezes acompanhada de uma morte real da personagem. Quando

acorda, o Herói está completamente metamorfoseado, maduro e consciente de seus

feitos. A ressurreição é o símbolo máximo da transição de fases: a primavera após o

inverno, a infância deixada de lado, a puberdade que chega, a fecundidade da terra.

l. Retorno com o elixir

Renascido, o Herói consegue atravessar, em sentido contrário, o limiar que o separa

o mundo desconhecido do mundo comum. Em seu retorno, traz consigo o objeto de sua

busca capaz de sanar todo o Dano instaurado antes de sua partida. A restauração do

Dano permite que o Herói permaneça em seu mundo, mas a metamorfose sofrida

durante sua jornada divide o Herói: ele tem livre acesso aos dois mundos, mas não

pertence a nenhum deles.

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Como veremos a seguir, essas etapas descritas por Campbell (2007) serão retomadas

nas teorias Proppianas em torno das funções. Por conta disso, decidimos utilizá-las

conjuntamente.

2.1.3. Estrutura Maravilhosa

Acima, dissemos que este trabalho assumirá um caráter analítico a partir das teorias

de Campbell e Propp (1984) sobre as estruturas narrativas. Ambas as teorias possuem

pontos de convergência que nos serão úteis nos próximos capítulos.

Utilizando os contos e fabulas do folclore russo como corpus, Propp vai traçar

relações entre essas histórias populares com os ritos de iniciação usados em sociedades

primitivas21. Segundo seus estudos, a estrutura da fábula (e do conto maravilhoso) repete a

estrutura do mito.

Rodari vai dizer que:

Aquilo que é narrado pelas fábulas – ou o que escondem em suas metamorfoses – tem seus paralelos: atingida uma certa idade os meninos eram separados da família e levados ao bosque (como Pequeno Polegar, como João e Maria, como Branca de Neve) onde o chefe da tribo, assustadoramente vestido, com o rosto coberto por horríveis máscaras (que nos remetem logo aos mágicos e às bruxas)... submetia-os a provas difíceis, senão mortais (elas estão presentes no caminho de todos os heróis fabulares)... os meninos escutavam a narrativa dos mitos da tribo e recebiam armas em consignação (os dons mágicos distribuídos por doadores sobrenaturais aos heróis em perigo)... e finalmente retornavam às suas casas, freqüentemente com um outro nome (também o herói das fábulas reaparece incógnito)... e estavam maduros para o casamento (nove, entre dez fábulas, acabam com uma festa de núpcias)... (RODARI, 1992, pp. 64-65)

Ora, nas etapas acima podemos ver claramente que a estrutura detectada por Propp

(1984) e ali retomada por Rodari segue exatamente a mesma estrutura identificada por

Campbell (2007). Vemos uma etapa de separação, marcada pelo Chamado à aventura da

estrutura épica (“atingida uma certa idade os meninos eram separados da família e levados

ao bosque”), seguida da passagem entre mundos, representada pela presença do

“antagonista” (“onde o chefe da tribo, assustadoramente vestido, com o rosto coberto por

horríveis máscaras”). Ali, o “herói” deve enfrentar provações (“submetia-os a provas

difíceis, senão mortais”). Para superá-las, encontra o auxílio de um “mentor” e de algum

21 O mesmo vale para Campbell, que traça as mesmas relações a partir dos mitos universais.

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“objeto mágico” (“os meninos escutavam a narrativa dos mitos da tribo e recebiam armas

em consignação”). Vencido o desafio, estavam livres para voltar ao seu mundo comum (“e

finalmente retornavam às suas casas, freqüentemente com um outro nome”) onde tinham

acesso à sua recompensa (“e estavam maduros para o casamento”).

A partir dessa estrutura, Propp determinou que:

1) “Os elementos constantes e estáveis da fábula são as funções dos personagens,

independentemente do executor e do modo de execução”;

2) “O número das funções presentes nas fábulas mágicas é limitado”;

3) “A sucessão das funções é sempre idêntica”. (PROPP in RODARI, 1992, p.66)

Em seguida, Propp descreverá 33 funções22, as quais enumeraremos. No entanto,

não nos deteremos na descrição de cada função, uma vez que esta aparecerá

detalhadamente, acompanhada de exemplos, no capítulo posterior.

1) Situação inicial

Para Propp (1984), essa situação não constitui uma função, mas é um elemento

morfológico importante. É o momento inicial da narrativa, onde são enumerados

os membros da família ou o Herói é apresentado.

2) Afastamento

A primeira função descrita por Propp mostra o distanciamento de algum familiar

(pai, mãe, tio) ou pessoa próxima do Herói (amigo, namorada), deixando-o

sozinho ou em companhia de estranhos.

3) Proibição

É imposta uma proibição ao Herói (não entrar na floresta, não sair de casa) ou

lhe é feita uma proposta, pedido ou conselho.

4) Transgressão

O Herói ignora o conselho ou a proibição, executa a ordem ou aceita a proposta.

22 Propp fala, na verdade, em 31 funções. Entretanto, decidimos dar atenção a outras três que, apesar de não aparecerem como funções, possuem importância na estrutura proposta pelo autor.

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5) Interrogatório

O Antagonista (ou algum de seus aliados) busca informações a respeito do

Herói, daqueles que o cercam ou dos bens que possui. Para isso, questiona o

Herói ou alguém próximo a ele.

6) Informação

O Antagonista recebe as informações que necessita.

7) Ardil

O Antagonista elabora uma cilada – normalmente disfarçado – para capturar o

Herói ou alguém próximo, ou roubar seus pertences.

8) Cumplicidade

Herói se deixa enganar involuntariamente, caindo na armadilha do inimigo.

9) Dano

Essa é a função que desencadeia o movimento da aventura. O Antagonista (ou

um de seus aliados) causa dano ou algum prejuízo ao Herói ou a alguém de sua

família (ente querido é raptado, um objeto de valor é roubado, etc.)

10) Carência

A falta de alguma coisa (ente querido, bens valiosos, objeto mágico) faz com

que o Herói se ponha em movimento.

11) Mediação

O dano é comunicado ao Herói: é enviado um pedido de socorro ou lhe é dada

alguma ordem.

12) Início da reação

Herói aceita a missão (essa etapa pode vir precedida de uma inicial recusa).

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13) Partida

Herói parte em busca do objeto reparador do dano ou da carência.

14) Primeira função do doador

Herói encontra Doador, que irá submetê-lo a provas que o preparem para o

recebimento de um meio mágico.

15) Reação

O Herói reage à ação do Doador, podendo ser bem-sucedido na prova ou não.

16) Fornecimento e transferência do meio mágico

O meio mágico em posse do Doador passa às mãos do Herói de acordo com o

resultado do teste.

17) Deslocamento de espaço entre reinos

O Herói é transportado ao lugar em que o objeto de sua busca se encontra.

18) Combate

Herói enfrenta seu antagonista em combate

19) Estigma

O Herói é ferido ou amaldiçoado durante o combate.

20) Vitória

Herói, de posse da arma mágica, vence o Antagonista em combate.

21) Reparação do dano ou carência

Herói consegue ou recupera o objeto de busca.

22) Regresso

Herói inicia o movimento de volta para casa.

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23) Perseguição

Herói sofre perseguição por meio de aliados do Antagonista ou por este próprio.

24) Resgate

O Herói escapa da perseguição com ajuda de meios mágicos, de aliados ou por

meio de astúcia.

25) Chegada incógnito

Herói chega disfarçado ou sem ser reconhecido em casa ou em outro reino.

26) Pretensões infundadas

Um falso herói tenta se passar pelo Herói ou assumir seu lugar de direito.

27) Tarefa difícil

É proposta uma tarefa difícil que só o verdadeiro Herói é capaz de realizar.

28) Realização

O verdadeiro Herói cumpre a prova.

29) Reconhecimento

Herói é reconhecido imediatamente, após a realização da tarefa ou através do

estigma.

30) Desmascaramento

Falso herói é desmascarado imediatamente ou após a não-realização da tarefa.

31) Transfiguração

Herói recupera sua antiga aparência ou recebe uma nova.

32) Castigo

Antagonista ou falso herói é punido, expulso ou morto.

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33) Casamento

Herói sobe ao trono e se casa.

Essas funções, quando colocadas em sucessão, como propõe Propp (1984),

descrevem formalmente todos os contos e fábulas analisados pelo autor. Pelo que pudemos

observar, as funções de Propp colocam de forma mais detalhada as etapas apresentadas por

Campbell (2007). O exemplo que demos no início dessa sessão comprova esse argumento.

Sendo assim, podemos inferir que ambas as teorias, apesar da divergência em torno do

corpus analisado, possuem pontos comuns. Portanto, assumiremos, de agora em diante, que

as duas teorias, colocadas em conjunto, ao qual nomearemos teoria Campbell-Proppiana,

serão o fio condutor de nossa análise.

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CAPÍTULO III – ANÁLISE

3.1. PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE

Inicialmente, dedicamos espaço para a busca de definições para Jogos de

Representação. Dentre as mais recorrentes, decidimos adotar aquela que diz que Jogos de

Representação são jogos cooperativos de contar e criar histórias. Sendo assim, mediados

pela relação narrador-jogador, discorremos a respeito das modalidades de Jogos de

Representação: Aventura Solo, Jogo de Mesa e Live Action. Percebemos, nessa etapa, que

os Live Action possuem espaço reduzido no meio acadêmico e, por conta disso, optamos

por dedicar nossa pesquisa a essa modalidade.

No capítulo seguinte, apresentamos nosso referencial teórico. Vimos que as

estruturas narrativas épicas e maravilhosas possuem pontos de convergência, portanto,

decidimos, a partir de então, tratá-las de forma unificada, buscando descrever nosso objeto

de estudo dentro dessa visão Campbell-Proppiana, atentando para as ocorrências que não

se enquadrem nessa visão das duas teorias. Nas teorias narratológicas, destacamos a relação

entre os arquétipos e as funções Proppianas, e observamos que essa relação se equipara à

Jornada do Herói Mitológico descrita por Campbell (2007).

Para a seguinte análise, escolhemos os jogos Perdidos na Selva, um Jogo de Mesa

pedagógico, parte integrante do livro Simples (RIYIS, 2004) e O Caminho para o Vale

Encantado, um Live Action de nossa autoria e que teve aplicação prática com crianças entre

7 e 12 anos de idade na cidade de Sorocaba, no interior de São Paulo. Os jogos serão

analisados etapa por etapa: primeiro, faremos sua transposição para as equações

Proppianas, em seguida, analisaremos cada uma das passagens, relacionando-as com as

teorias de Campbell. No capítulo seguinte, discutiremos a questão dos Jogos de

Representação pedagógicos, onde faremos uma breve análise do corpus seguindo essa

mesma metodologia e buscando identificar quais os elementos pedagógicos contidos no

texto. Por fim, colocaremos em foco, ainda seguindo as teorias estruturais, a criação de

mundos ficcionais exclusivos para Jogos de Representação.

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3.2. ANÁLISE DOS JOGOS DE REPRESENTAÇÃO SEGUNDO AS TEORIAS NARRATOLÓGICAS 3.2.1. Jogo de Mesa: Perdidos na Selva

Perdidos na Selva é um Jogo de Mesa pedagógico que tem como objetivo trabalhar

conteúdos da área de geografia. A história começa em São Paulo, na cidade de Sorocaba,

onde os heróis são intimados a participar de uma experiência científica. Um homem

misterioso chamado Lorde Nathan está trabalhando com o teletransporte de partículas e

moléculas, mas deseja testar seu invento em cobaias humanas. Para sorte dos heróis, o

invento funciona. Após passarem pela máquina, eles acordam em uma floresta. A missão

deles é simples: voltar para casa.

Essa é a premissa do jogo do professor Marcos Tanaka Riyis (2004). A seguinte

análise procurará enquadrar esse enredo nas teorias Proppianas de estruturas narrativas

maravilhosas. Em meio à análise de cada etapa, estabeleceremos a relação, se necessário,

entre as funções de Propp (1984) e os estudos de Campbell (2007) acerca das narrativas

épicas. Cabe a nós ressaltar que, sendo um Jogo de Representação, ficará faltando à análise

estrutural o elemento interativo, só passível de realização com a presença dos jogadores. A

análise, então, nos indicará se o jogo mantém suas características primordiais intactas

mesmo sem a interação de jogadores ou se, ao contrário, deixa de ser jogo para tornar-se

uma narrativa comum.

3.2.1.1. Equação e análise

α γ² δ² A7 a5 B² C � D10 E-10 F¹ G4 H¹ J¹ K84 �neg w³

O jogo Perdidos na Selva segue com rigor e de forma linear a seqüência de funções

descrita por Propp, onde o Herói encontra-se numa situação inicial (α), sofre um dano (A),

é enviado em uma missão (B, C e �), recebe o auxílio de um objeto mágico (F), confronta e

derrota um antagonista (H e J), restaura o dano (K), volta para casa (�) e obtém sua

recompensa (w). Analisaremos, de forma mais clara, cada passagem do enredo,

relacionando-as com a morfologia proposta por Propp e Campbell.

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α - Situação Inicial.

15 de dezembro de 2002, 4:03 horas da manhã. Os personagens, que não se conhecem,

estão se dirigindo para o local determinado pela carta que todos receberam. ( RIYIS,

2004, p.59)

No início da aventura, os personagens estão em suas casas, levando suas vidas

rotineiras, quando, de repente, algo de inesperado acontece e altera a rota de suas vidas (no

caso, representado pela chegada de uma carta misteriosa assinada por um homem chamado

Lorde Nathan). Segundo Propp, “o conto maravilhoso, habitualmente, começa com certa

situação inicial. Enumeram-se os membros de uma família, ou o futuro herói é apresentado

simplesmente pela menção de seu nome ou indicação de sua situação” (PROPP, 1984,

p.31). Essa passagem, que dá o primeiro movimento ao arquétipo do Herói, é chamada

Situação Inicial.

γ² - Proibição: Ordem ou Proposta.

[...] o misterioso Nathan, que assinava a carta em que oferecia cem mil reais se os

personagens conseguissem completar as tarefas que ele proporia a eles naquela noite.

(RIYIS, 2004, p.59)

Na carta misteriosa recebida pelos personagens, oferece-se uma recompensa de 100

(cem) mil reais caso os heróis cumpram uma determinada tarefa que seria especificada por

Lorde Nathan em sua própria casa. Essa cena é descrita por Propp como parte integrante de

uma função chamada Proibição. Durante essa etapa, o Herói muitas vezes entra em contato

com algum elemento de aspecto duvidoso que vai por em xeque sua integridade, sua

conduta ou sua moral. Usando um exemplo mais claro, se analisarmos o conto

Chapeuzinho Vermelho, essa etapa fica em evidência justamente quando a mãe de

Chapeuzinho a proíbe de passar pela floresta. No jogo em análise, essa função vem na

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forma de uma proposta que desafia os Heróis e os põe em movimento, inspirados pela

função seguinte.

δ² - Transgressão: Ordem é executada.

[...] estão se dirigindo para o local determinado pela carta [...] (RIYIS, 2004, p.59)

Os personagens, após lerem a carta, dirigem-se ao local indicado. Essa etapa é

descrita como uma Transgressão. Transgressão porque o Herói, normalmente, quebra a

promessa, infringe a regra ou aceita a proposta feita. Toda a conduta do Herói é moldada e

representada nas figuras paternas, o ato de transgressão seria, então, um primeiro

confrontamento que colocará o Herói em movimento de autodescoberta. A Jornada do

Herói nada mais é, então, do que a jornada do eu. Sendo assim, na aventura analisada, o

fato dos Heróis aceitarem a proposta de Lorde Nathan indica o início de sua jornada

particular: o que os motiva? Será dinheiro? Fama? Superação? Em Jogos de Representação,

os jogadores, ao criarem seus personagens, são incentivados a pensar nisso, a criar

objetivos claros que dêem movimento aos Heróis.

A7 – Dano: Provoca um desaparecimento repentino.

Aceitam alguma bebida, chá, café, refrigerante, vinho, água? (...) Quase instantaneamente

os personagens caem no sono e, em seguida, acordam em uma clareira no meio de uma

densa floresta, com um calor muito forte e alta umidade, ruídos de animais e vários insetos

– principalmente mosquitos – atacando os personagens. (RIYIS, 2004, p.60)

Os heróis, já na casa de Lorde Nathan, são induzidos a beberem algo.

Aparentemente, existe algum tipo de droga na bebida e todos eles perdem a consciência.

Quando eles acordam, não estão mais no mesmo local, mas sim em meio a uma floresta, em

local desconhecido.

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A função descrita por Propp (1984) implica em gerar algo no Herói que dê início ao

seu movimento dentro da história. “Esta função é extremamente importante, porque é ela na

realidade que dá movimento ao conto maravilhoso [...] Geralmente, este desaparecimento é

o resultado de meios mágicos ou ardilosos” (PROPP, 1984, p.36). O Dano, normalmente,

está vinculado à noção de perda ou de ameaça: o seqüestro de um ente querido, uma

maldição recai sobre o Herói ou alguém próximo a ele, um objeto de valor inestimável

(muitas vezes, emocional) é roubado, dentre outras.

Em Perdidos na Selva, o fato de colocar os Heróis em ambiente desconhecido e,

portanto, hostil, é o próprio Dano sendo infligido, na subdivisão provocar um

desaparecimento repentino, não de entes queridos ou tesouros, mas dos próprios

personagens.

a5 – Carência: Carência de uma forma racionalizada.

Ótimo, já descobriram que estão em algum lugar da África, pelo visto do centro para o sul,

onde estão as florestas. Consigam chegar a uma cidade com telefone, que vocês me

contatam para eu mandar dinheiro para a volta de vocês. (RIYIS, 2004, p.61)

Após o transporte, os personagens precisam descobrir onde foram parar. Nesse

momento, Lorde Nathan consegue entrar em contato com os heróis e diz que lhes enviará

dinheiro para pagar seu retorno. Os heróis, então, precisam encontrar um caminho para uma

cidade e uma forma de entrar em contato com Lorde Nathan.

A função denominada Carência diz respeito a algo que falta no Herói. Muitas

vezes, essa carência é justamente a motivação de sua jornada: tesouro, poder, o amor de

uma mulher. No caso analisado, a Carência é o próprio retorno para casa que só será

possível mediante o cumprimento da missão que lhes concederá uma quantia de dinheiro

suficiente para realizar a viagem de volta. Nesse caso, chamamos a Carência de Carência

de uma forma racionalizada, ou seja, de dinheiro.

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B² – Mediação: Herói é enviado imediatamente.

A comunicação de Lorde Nathan instrui os heróis a seguirem determinado caminho

(no caso, procurar uma cidade próxima), prometendo a eles retorno seguro para casa. Propp

irá dizer que “o envio do herói é dado em forma de ordem ou pedido. No primeiro caso é,

às vezes, acompanhado de ameaças, no segundo, de promessas; às vezes, de ambos

simultaneamente” (PROPP, 1984, p.39). Dessa forma, os heróis decidem iniciar sua

jornada. Essa função se identifica simultaneamente à Carência (a5), no trecho citado acima, mais especificamente em “Consigam chegar a uma cidade com telefone” (RIYIS,

2004, p.61).

C � - Início da Reação e Partida.

Os heróis, após descobrirem sua localização e a comunicação de Lorde Nathan,

aceitam sua “missão” e partem em direção à cidade mais próxima. Esse trecho não é

colocado de forma explícita no texto, como a descrição de Propp nos alertou “às vezes, este

momento não é mencionado com palavras, mas a decisão de vontade precede

evidentemente a procura” (PROPP, 1984, p.40), que deixa subentendido que os jogadores

que representam os personagens devem tomar a decisão de seguir em frente em sua

jornada. Isso fica claro na passagem “Logo após, onde quer que os personagens estejam

(...)” (RIYIS, 2004, p.61. Grifo nosso).

D10 – Primeira função do Doador: Mostra-se ao herói um objeto mágico e propõe-se uma troca.

Entra no conto um novo personagem, que pode ser denominado doador.[...] Geralmente, ele é encontrado por acaso na mata, no caminho, etc.[...] Tanto o herói-buscador, como o herói-vítima, recebem dele um objeto (geralmente um meio mágico) que lhes permite superar o dano sofrido. Mas antes de receber o meio mágico, o herói é submetido a certas ações bem diferentes entre si, embora todas elas o levem a tomar posse do objeto mágico”. (PROPP, 1984, p.41)

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Enquanto os personagens pensam no que vão fazer, chega perto deles um grupo de uns 20

homens negros muito altos e magros, vestidos com roupas de pele de animais, e um

comportamento um tanto agressivo. (...) um teste de línguas (...) indicará que o chefe deles

quer um revólver para dizer onde há uma cidade. (RIYIS, 2004, pp.61-62)

Um grupo de nativos africanos aparece para os heróis. Após tentativas de

comunicação, os heróis percebem que o chefe do grupo está oferecendo informação

(informação aqui aparece na função de objeto mágico) em troca de uma arma de fogo.

A função de Doador geralmente aparece nos contos maravilhosos ou nas narrativas

épicas na forma do arquétipo Mentor, um personagem que irá instruir o Herói de alguma

forma e irá propiciar seu amadurecimento, apresentar-lhe as armas com as quais poderá

vencer seu Antagonista. O Mentor constantemente testa o Herói, submetendo-o a testes de

força física, mental ou espiritual, colocando em xeque sua moral e sua conduta. Nas teorias

de Campbell (2007), os testes põem o Herói em confrontamento consigo mesmo.

E assim é que se alguém – em qualquer sociedade – assumir por si mesmo a tarefa de fazer a perigosa jornada na escuridão, por meio da descida, intencional ou involuntária, aos tortuosos caminhos do seu próprio labirinto espiritual, logo se verá numa paisagem de figuras simbólicas (podendo qualquer delas devorá-lo) [...] esse é o segundo estágio do Caminho, o estágio da “purificação do eu”, em que os sentidos são “purificados e tornados humildes” e as energias e interesses, “concentrados em coisas transcendentais”; ou, num vocabulário mais moderno: trata-se do processo de dissolução, transcendência ou transmutação das imagens infantis do nosso passado pessoal. Em nossos sonhos, os perigos, gárgulas, provações, auxiliares secretos e guias ainda são encontrados à noite; e podemos ver refletidos, em suas formas, não apenas todo o quadro de nossa presente situação, como também a indicação daquilo que devemos fazer para ser salvos. (CAMPBELL, 2007, p.105. Grifos nossos)

As provações, então, seriam essa luta contra nosso passado infantil, intrincado em

nosso psicológico: as experiências traumáticas, as travas geradas nos primeiros anos de

vida, as fobias, neuroses ou psicoses. Os nossos guias, nossos Mentores, aparecem

associados ao âmbito da noite, da escuridão. São seres ocultos que encontram o Herói à

beira da caverna, no meio da floresta escura ou através dos sonhos.

E-10 – Reação do herói: Herói aceita a troca mas usa a força do objeto contra o doador.

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Se os personagens derem [o revólver ao chefe dos nativos], e tiver balas, o chefe irá atirar

em qualquer direção. (...) Caso acerte alguém, esse perde 2-3 PR [Pontos de Resistência]

(pega de raspão) e desmaia. (RIYIS, 2004, p.62. Grifos nossos)

Heróis decidem fazer a troca, entregando o revólver de Spectro ao chefe do grupo

de nativos. Aqui existe uma inversão da função proposta por Propp (1984). O autor

identifica a seguinte ocorrência: “Um velho propõe ao cossaco uma espada que corta

sozinha, em troca de um barril mágico. O cossaco aceita a troca, e ordena imediatamente à

espada que corte a cabeça do velho, o que lhe permite recuperar o barril (270)” (PROPP,

1984, p.43). Pois bem, em nossa ocorrência, encontramos uma inversão parcial da função:

os heróis aceitam a troca, mas é o doador que – por acidente – acaba voltando o poder do

objeto obtido (no caso, a arma de fogo) contra os heróis. Mesmo assim, a função invertida

não se completa totalmente, pois, mesmo usando o objeto contra os heróis, o doador não

tem desejo de pegar de volta o objeto doado (no caso, informação). Por conta dessa

ocorrência, nomeamos a função como (E-10).

A aceitação por parte do Herói muitas vezes indica a ingenuidade deste em relação a

um golpista, ou uma inicial superação interior. O Herói vence o teste inicial, aceita a

proposta ou responde à pergunta com êxito e, dessa forma, se torna apto a seguir viagem ou

a receber os ensinamentos ou objetos mágicos do Doador/Mentor.

F¹ – Fornecimento-recepção do meio mágico: objeto se transmite imediatamente.

Após passar essa confusão, o chefe indica uma cidade a uns 10 km ao norte, mas devem

tomar cuidado, pois há vários perigos na selva, e o principal deles é o Mountain-Yeti, o

gigante invisível. E que é necessário ter um feiticeiro poderoso para derrotá-lo. O chefe,

também, oferece uma poção. Se decidirem tomar, restaurará até 2 PR de cada

personagem. (RIYIS, 2004, p.62)

Tendo efetuado a troca, os heróis recebem do chefe dos nativos a informação que

necessitavam: a indicação do caminho para a cidade mais próxima e o aviso para tomarem

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cuidado com o monstro que habita a floresta, além de entregar aos heróis uma poção de

cura que sana qualquer ferimento.

O Fornecimento de meio mágico é uma das funções mais importantes dentro da

Jornada do Herói. Até então, o Herói estava impossibilitado de enfrentar seu Antagonista e

restaurar o Dano: faltava-lhe um conhecimento a respeito da fraqueza do Antagonista,

treino em alguma luta ou arte mística, uma espada ou arma envolta em magia. A partir do

momento em que esse Meio Mágico chega às mãos do Herói, ele se modifica e é capaz de

superar seu Antagonista.

O Doador, no caso analisado, acaba assumindo não a função do Mentor, mas sim da

Figura Protetora. Quanto a essa definição, Campbell irá dizer:

Para aqueles que não recusaram o chamado, o primeiro encontro da jornada do herói se dá com uma figura protetora (que, com freqüência, é uma anciã ou um ancião), que fornece ao aventureiro amuletos que o protejam contra as forças titânicas com que ele está prestes a deparar-se. (CAMPBELL, 2007, p.74)

A Figura Protetora seria, então, esse personagem que aparece logo no início da

jornada do herói, entregando-lhe um amuleto ou conhecimento que o protegerá dos perigos

que encontrará. Em Perdidos na Selva, o chefe dos nativos, além de entregar uma poção

restauradora e indicar o caminho aos heróis, dá a eles uma dica importante para enfrentar o

perigo iminente: “é necessário ter um feiticeiro poderoso para derrotá-lo”, referindo-se ao

monstruoso Mountain Yeti.

Ainda sobre a ajuda sobrenatural exercida pelo Mentor ou Doador, Campbell diz:

Não é tão incomum que o ajudante sobrenatural assuma a forma masculina. Nos contos de fadas, pode se tratar de algum ser que habite a floresta, algum mágico, eremita, pastor ou ferreiro, que aparece para fornecer os amuletos e o conselho de que o herói precisará. [...] O herói ao qual esse tipo de auxiliar aparece é, tipicamente, o herói que atendeu ao chamado. O chamado foi, na verdade, o primeiro anúncio do aparecimento desse sacerdote iniciatório. (CAMPBELL, 2007, p.77)

G4 – Deslocamento de espaço entre dois reinos: Indicam o caminho ao herói.

Pela direção do sol, os personagens vão seguindo para o norte, conforme indicado, até que

ameaça cair uma tempestade. Nesse meio tempo, Magali sente seu colar queimando e ouve

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a voz de sua avó pedindo para ela tomar muito cuidado, pois passarão pelo cemitério dos

elefantes. (...) Após isso, ao entrar no cemitério dos elefantes (...) o tempo escurece

completamente e todos parecem sentir tudo girando, enquanto as armas dos personagens

que as carregam e os óculos de Magali parecem queimar. Tudo continua a girar (...) [os

heróis] percebem que as posições mudaram, mas está escuro e eles têm de ir para o norte.

(RIYIS, 2004, p.62)

A informação dada pelos nativos leva os heróis em direção à cidade mais próxima,

mas também os leva de encontro ao Antagonista da história. Mas antes do encontro, os

heróis devem passar pelo Cemitério de Elefantes, claramente escolhido para ser o ponto de

transição entre os reinos por ser um elemento carregado de um imaginário coletivo de

caráter mítico ou folclórico (caráter esse indicado no texto pela ação do colar da

personagem Magali).

Sobre essa função, Propp diz que “geralmente o objeto de busca se encontra em

‘outro’ reino. Este reino pode-se encontrar bem distante em linha horizontal ou bem acima

ou embaixo em linha vertical” (PROPP, 1984, p.49). A saber, os heróis da aventura

passaram por dois reinos: o primeiro, quando foram teleportados para a floresta; o segundo,

quando entraram no Cemitério de Elefantes. O cemitério, então, pode não atuar como Reino

distinto, mas como Covil do Antagonista. O caminho para esse novo ambiente pode ser

indicado por algum personagem (alguém que leva o Herói até a entrada da caverna ou lhe

conta por que caminhos seguir), indicado por algum objeto (um talismã, uma bússola, um

mapa) ou mesmo ser descoberto ao acaso. O exemplo abaixo foi tirado do livro A Faca

Sutil, da série Fronteiras do Universo:

[...] Novamente saltou para trás, mas dessa vez bem menos assustada. Depois de mais alguns segundos farejando, tateando e fremindo os bigodes, a curiosidade venceu o medo. A gata avançou alguns passos e desapareceu. Will piscou, duvidando do que havia visto. Então ficou imóvel, grudado ao tronco da árvore mais próxima, enquanto um caminhão virava a esquina e seus faróis deslizavam sobre ele. Depois que o caminhão passou, ele atravessou a rua, olhos fixos no local onde a gata estivera. Não era fácil, pois nada havia para marcar o lugar, mas quando chegou lá e olhou em volta com atenção, ele viu. Pelo menos de alguns ângulos. Era como se alguém tivesse cortado um pedaço do ar a uns 2 metros da calçada, um pedaço que formava um quadrado grosseiro com menos de um metro de lado. Para quem estivesse vendo pelo lado, ele ficava quase invisível, e por trás era totalmente invisível; só podia ser visto pelo lado mais próximo da calçada, e mesmo assim com dificuldade, pois tudo que se podia ver através dele era exatamente o mesmo tipo de

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coisa que havia na frente dele deste lado: um trecho de gramado iluminado por um poste de rua. Mas Will sabia, sem a menor dúvida, que aquele gramado do outro lado ficava em outro mundo. (PULLMAN, 2007, p.19)

A passagem mostra a forma que o Herói Will descobre o caminho, a entrada, para

um novo mundo. A gata que observava encontra, ao acaso, a passagem secreta e indica o

caminho para Will. Da mesma forma, em Perdidos na Selva, os heróis são conduzidos ao

Cemitério de Elefantes graças às indicações dos nativos da floresta.

H¹ - Combate: Lutam em campo aberto.

Mais meia hora de caminhada e um personagem – que não seja Magali – recebe um golpe

vindo aparentemente de lugar nenhum. É o Mountain Yeti, que vai golpeando os

personagens que desmaiam. (RIYIS, 2004, p.63)

Após a transição ocorrida no Cemitério de Elefantes, os heróis são atacados

repentinamente por uma força invisível. Lembrando o aviso dado pelos nativos, eles

chegam à conclusão que o atacante é Mountain Yeti, o gigante invisível. Começam as ações

para derrotar o monstro.

A função de Combate é o clímax da jornada do herói. É o momento de superação

máxima, a provação final que vai indicar se o Herói é realmente digno, se conseguiu

superar a si mesmo. O Herói só tem êxito nessa função se a jornada for executada com

precisão: o Herói deve passar nos testes, adquirir a Arma Mágica, confrontar a si mesmo de

mãos limpas na caverna das ilusões ou em frente ao espelho23. Caso contrário, o

Antagonista vence a disputa e o Herói parte numa nova jornada, carregando em si o peso

da derrota (Dano) e motivado pela superação (Carência). De qualquer forma, a vitória do

Antagonista só prova que o Herói ainda não estava pronto. Essas cenas costumam

acontecer com heróis apressados, inconseqüentes, ansiosos ou prepotentes, e trazem em si 23 Passagens como a da Caverna das Ilusões ou do Espelho podem ser identificadas claramente em filmes como Guerra nas Estrelas e A História sem fim, respectivamente. Em Guerra nas Estrelas: Episódio V, Luke Skywalker, em treinamento, é conduzido por Yoda até a entrada de uma caverna. Lá, ele enfrenta e vence Darth Vader, mas descobre que o vilão é, na verdade, ele mesmo. Da mesma forma, Atreyu, em A História sem fim, ao buscar o Oráculo do Sul, deve passar por dois portais. O segundo, o mais terrível de todos, é o Espelho da Verdade, onde o herói mais forte foge gritando ao defrontar-se com seu pior inimigo: ele mesmo.

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um fundo pedagógico, uma moral que fará o Herói refletir e deixar de lado sua conduta

duvidosa e deficiente.

J¹ - Vitória: Antagonista é vencido em campo aberto.

Witch Lady faz chover e transforma o chão em lama, dando para ver as pegadas do Yeti,

ou faz nevar, com o mesmo efeito. Daí, uma paulada, pedrada, luta, ou sei-lá-o-que fere o

danado. (RIYIS, 2004, p.63)

Aqui existe uma diferença entre o texto analisado e as funções descritas por Propp

(1984). O Antagonista apresentado no jogo, ao ser derrotado, revela-se um “aliado” e uma

vítima de um possível “verdadeiro antagonista” (Lorde Nathan). Mesmo assim, não

podemos considerar a cena como pertencente à função (D), pois Mountain Yeti também

não assume a função de doador. Agindo sob feitiço de Lorde Nathan, Mountain Yeti

acabou assumindo a posição de Guardião, um dos arquétipos descritos nas teorias

narratológicas. De qualquer forma, por falta de melhor nomenclatura e pretendendo seguir

apenas a descrição das funções indicadas em Morfologia do Conto Maravilhoso,

manteremos a designação (J).

Como descrevemos acima, a vitória do Herói só foi possível após a aprovação nas

diversas provações e a obtenção da Arma Mágica. Vencer o Antagonista significa, acima de

tudo, vencer a si próprio. O Herói muitas vezes percebe que a arma capaz de derrotar o

inimigo estava, antes de mais nada, com ele o tempo todo: uma habilidade escondida, um

conhecimento considerado até então inútil, um objeto guardado há muitos anos. Vencer o

Antagonista é mais do que obter força mística, é saber articulá-la.

K84 – Reparação do Dano: Personagem enfeitiçado volta ao normal seguido de obtenção

do objeto é resultado das ações precedentes.

O Mountain Yeti fala: “Obrigado. Agora estou livre da maldição. Poderei me curar e

voltar para casa”. E começa a ficar visível (...) ele fala que foi um cara muito malvado

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chamado Lorde Nathan que o transformou em macaco invisível e o obrigou a nocautear

todo ser humano que passasse por aquela estrada. Ele tinha sido contratado para uma

experiência na qual ganharia 100 mil reais, e estava muito feliz por ter sido libertado da

maldição. (...) O caminho então está livre, basta se apressarem e chegarem na cidade a

tempo. (RIYIS, 2004, pp.63-64)

Neste momento temos uma dupla-função. Ao derrotar o Mountain Yeti, os heróis

livram-no de um feitiço e descobrem que, na verdade, ele não é o Antagonista da história,

mas um Guardião do caminho. Ao mesmo tempo, ele libera a passagem e os heróis

finalmente chegam ao seu destino, cumprindo, dessa forma, a missão imposta por Lorde

Nathan.

Reparar o Dano consiste em quebrar maldições, encontrar o tesouro escondido ou

resgatar a princesa aprisionada no alto da torre. Em alguns casos, além da reparação do

Dano infligido no início da aventura, o Herói acaba se deparando com Danos secundários –

alguns que nada tem a ver com sua própria missão – e acaba por repará-los, também. No

caso observado, os heróis da história quebram a maldição colocada sobre o Mountain Yeti

(Reparação de Dano secundário) e, com isso, podem reparar seu próprio Dano.

�neg – Retorno: negado

Andando mais um pouco, os personagens chegam ao topo de uma colina, onde vêem a

cidade e pessoas acenando para vocês (sic). Descendo lá, o mesmo homem (mordomo) que

os recebeu em Sorocaba aparece dizendo: “Parabéns, meus amigos cobaias, vocês foram

aprovados no teste de Lorde Nathan, e de maneira inesperada conseguiram sobreviver. Os

moradores dessa cidade foram instruídos a cuidarem muito bem de vocês e convence-los a

permanecer essa noite na cidade, para festejar. Desta forma, infelizmente, vocês perderão

a conexão para Nairóbi, mas isso não é meu (sic). Aproveitem a estadia aqui, e aguardem

novas comunicações de Lorde Nathan. Até a próxima”. (RIYIS, 2004, p.64)

Aqui encontramos outra ocorrência não-descrita por Propp (1984): a negação do

retorno. Após concluírem sua jornada, os heróis chegam à cidade na esperança de,

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finalmente, voltar pra casa e receber o dinheiro prometido. Porém, no último instante, eles

são impedidos de viajar e instruídos a permanecer na cidade até receberem novas instruções

de Lorde Nathan, o que poderia indicar uma nova e futura aventura. Em outras palavras,

teríamos aqui um retorno não-concluído: os heróis iniciam o processo de retorno mas não o

concluem. Para tanto, renomeamos a função para (�neg).

A função de Retorno indica que o Herói está apto a deixar o mundo escondido e

voltar a seu próprio domínio. Ele venceu todos os testes, superou todos os perigos e

inimigos. Sua vitória reparou os Danos, trouxe a Bênção Última.

Sobre o estado que antecede a bênção, Campbell vai dizer:

A facilidade com que a aventura é realizada aqui significa que o herói é um homem superior, um rei nato. Essa facilidade distingue numerosos contos de fadas, bem como todas as lendas das façanhas de deuses encarnados. Onde o herói comum teria um teste diante de si, o eleito não encontra nenhum empecilho e não comete erros. (CAMPBELL, 2007, p.163)

Em verdade, a vitória sobre o Antagonista eleva o Herói a um patamar divino: o

Escolhido, o Eleito, o Salvador, o Prometido. A vinda desse Herói Escolhido costuma ser

narrada em profecias ou antigas escrituras, em lendas locais. A superação de todas as etapas

de sua jornada comprova a veracidade dos vaticínios e o Herói assume o manto do poder, o

comando da cidade, as honras reais: torna-se senhor de dois mundos – o real, cotidiano e

rotineiro, anterior à jornada; e o mágico, escondido, imaginário, místico, espiritual ou

metafísico. O Herói pode voltar para casa, mas tem livre acesso – e muitas vezes será

chamado de volta – para seu segundo mundo, para o lugar onde é rei e mestre.

A liberdade de ir e vir pela linha que divide os mundos, de passar da perspectiva da aparição no tempo para a perspectiva do profundo causal e vice-versa – que não contamina os princípios de uma com os da outra e, no entanto, permite à mente o conhecimento de uma delas em virtude do conhecimento da outra – é o talento do mestre. (CAMPBELL, 2007, p.225)

Em Perdidos na Selva, no entanto, essa viagem de volta é impedida, indicando que

ainda existem missões que o Herói deve cumprir. Ele ainda não se tornou o Escolhido, não

superou todas as provas e não venceu o verdadeiro Antagonista. Ele venceu apenas uma

prova e agora pode descansar enquanto os próximos testes não vêm.

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w³ - Casamento: Recompensa em dinheiro ou outra compensação.

(...) o povo da cidade abraça os personagens e os carrega nos ombros, como heróis que

derrotaram o Mountain Yeti. Porém, se quiserem reencontrar Lorde Nathan ou receber a

recompensa, terão que esperar pelo próximo chamado. (RIYIS, 2004, p.64)

Cumprida a missão, os personagens são recebidos como heróis pelos habitantes da

cidade. A história ainda termina com um gancho e uma promessa de uma recompensa ainda

maior, dando um aspecto de história sem fim ao jogo. Por conta desse caráter infinito,

algumas funções descritas por Propp (1984) – mais apropriadas a uma estrutura linear

limitada – acabaram recebendo pequenas modificações.

Propp descreve a função de Casamento como sendo o estágio final da jornada do

Herói. Voltando para casa trazendo a Bênção Última, o Herói pode enfim repousar e

superar a Carência que o movia até então: dinheiro, amor, conhecimento. Na aventura

estudada, nossos heróis, como vimos acima, não encerraram sua jornada, ainda não

obtiveram a Bênção Última e, portanto, não sendo senhores de dois mundos, não têm

direito a superar sua Carência. Mesmo assim, recebem uma recompensa parcial: o

reconhecimento do povo da cidade.

3.2.1.2. Resultado da análise

Esta análise nos permitiu identificar as semelhanças formais entre a estrutura

narrativa literária e a estrutura narrativa do jogo (mais especificamente, do Jogo de

Representação de Mesa) sob a visão da Morfologia do Conto Maravilhoso e da Jornada do

Herói Mitológico. No que diz respeito à linearidade, podemos dizer que o Jogo de Mesa e a

narrativa maravilhosa e épica são formalmente idênticos, podendo ser resumidos pela

equação αABC�Kw, todos elementos recorrentes em ambos os lados. Mesmo assim, a

narrativa literária proposta por Propp (1984) possui uma limitação – a história precisa

acabar – não identificada (e muitas vezes negada) no Jogo de Representação. Por conta

dessa característica, certas funções de personagens sofreram modificações a fim de

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suprirem a necessidade de não-finitude do jogo. A modificação mais significativa diz

respeito à função (�), que pode acontecer, não acontecer ou acontecer em parte, atendendo

à necessidade da presença de um gancho para um possível jogo futuro.

É possível perceber, também, que certas funções só são executáveis e passíveis de

análise e classificação dentro dos Jogos de Representação se subentendida a participação

dos jogadores e suas opções de ação mais previsíveis. Como se trata de um jogo cujas

características permitem a múltipla escolha de resoluções, torna-se praticamente impossível

dizer com certeza que as estruturas Proppianas e as teorias de Campbell (2007) conseguem

descrever de forma fixa e imutável as aventuras de Jogos de Representação. O ideal é

afirmar que existe uma estrutura que segue as teorias narratológicas, mas que esta assume

uma forma flutuante, podendo ter desdobramentos de funções, retornos imprevistos,

funções não descritas e, obviamente, desarticulação de funções, quebra da linearidade.

Logo, é evidente que os Jogos de Representação na modalidade Jogo de Mesa,

apesar de se enquadrarem, em termos de enredo, nas teorias narratológicas maravilhosa e

épica, não possuem forma fixa e dependem essencialmente da participação dos jogadores

para se realizarem. A suposição de ações por parte dos jogadores é um artifício que gera

uma simulação passível de análise. O jogo, se estudado dentro de um contexto real de

aplicação, perde totalmente a propriedade da análise dentro de esquemas fixos e torna-se

uma teia de articulações possíveis.

A análise seguinte, onde tratamos do Live Action, demonstra bem os possíveis

desdobramentos estruturais e, mais uma vez, a flexibilidade do enredo dentro das estruturas

narrativas.

3.2.2. Live Action: O Caminho para o Vale Encantado

O Caminho para o Vale Encantado é um Live Action pedagógico de nossa autoria.

Foi feito especificamente para a realização de um curso de férias realizado em Janeiro de

2008 no Parque da Biquinha, na cidade de Sorocaba, no interior de São Paulo. O curso

tinha como tema as questões relacionadas a lixo e reciclagem e, para a elaboração do jogo,

que tinha como alvo crianças entre 7 e 12 anos, aconselhou-se a utilização (e adaptação

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para Live Action) do livro O Caminho para o Vale Perdido (que acabou inspirando o nome

do jogo), de Patrícia Engel Secco (2003).

Publicado recentemente e trazendo um aspecto claramente educativo, buscando

mostrar às crianças os problemas que o lixo pode causar e quais são as possíveis soluções

para essa questão, a história mostra um pequeno rato, morador de um lixão e filho de um

rico rato industrial – que encontra sua matéria-prima no lixo – que se encanta com as velhas

histórias de seu avô, um rato do campo, sobre um cenário bem diferente daquele em que o

ratinho vive: uma floresta. A partir de então, o jovem ratinho busca convencer seus pais e

toda a sociedade residente do lixão que o ideal seria voltar às origens e buscar um caminho

para a floresta. É claro que o ratinho encontrará antagonistas em sua jornada: a própria

sociedade. Os animais que vivem no lixão – urubus, baratas, moscas e vermes – encontram-

se num estado cômodo, e não pretendem abandonar a vida que construíram para correr atrás

de um sonho vindo de um jovem.

Para o Live Action, então, reunimos elementos contidos na história que pudessem

conduzir a trama: reutilizamos o cenário colocado pela autora e demos nova organização à

relação herói-sociedade. Adicionamos a isso um novo Antagonista e um Objeto Mágico a

ser buscado, além do auxílio sobrenatural e a presença de Mentores.

A seguir, analisaremos o Live Action seguindo os mesmos princípios que utilizamos

no estudo de Perdidos na Selva, colocando o jogo em sintonia com as teorias narratológicas

e observando o comportamento deste em relação a uma organização fixa.

3.2.2.1. Equação e análise

α A³ a² B¹ C� D° (D6 E6 F¹ + D¹ E¹ F¹ + D¹ E¹ F¹ + D7

E7 F¹) E° F°1 G² H¹ –J¹ +° [αneg A¹¹ a² B4 C� D° (D¹ E¹

F¹) D7+ G³ + {A¹5 a4 B6 C� D¹ E¹ F¹ D7+ G4 D8 E8 F6+ –

E7+ F¹+} – E7

+ F¹+ K8 + (D¹ E¹ F¹) E° F°1] G³ H¹ J¹ K4 �

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O Caminho para o Vale Encantado, diferentemente de Perdidos na Selva, segue

uma seqüência linear das funções mas apresenta uma grade desestruturada e reorganizada

em diversos pontos – um indício da influência do aspecto mórfico e flutuante contido nos

Jogos de Representação –, apresentando repetição de funções e características não

levantadas por Propp (1984), como a negação de funções e outras ocorrências que

descreveremos a seguir. Mesmo assim, percebeu-se que existe uma seqüência básica fixa (a

qual denominamos Missão ou Jornada Principal), semelhante à do Jogo de Mesa:

αABC�GHJKw. Observou-se, também, o aparecimento de desdobramentos da

Jornada Principal: missões secundárias, novas jornadas, nova situação inicial, etc. Sendo

assim, analisaremos esse jogo de forma mais detalhada, seguindo, novamente, as funções

propostas por Propp e as teorias de Campbell (2007). No decorrer da análise, procuraremos

esclarecer as características das funções não descritas em Morfologia do Conto

Maravilhoso, além de tentarmos justificar sua ocorrência e sua nomenclatura. Vale lembrar

que estamos analisando uma modalidade de jogo diferente, agora. Muitas das funções não

são textuais, mas situacionais, encontram-se subentendidas e são observáveis apenas na

aplicação prática da atividade. Tais funções terão a devida identificação.

α − Situação Inicial

ESFINGE – Fnord! Saudações, amigos da Natureza! Meu nome é Mestre Esfinge e trago

comigo notícias não muito boas e uma missão repleta de aventuras e perigos! Mas antes,

vou contar a vocês uma história.

A Situação Inicial de O Caminho para o Vale Encantado é uma das funções que não

se encontram em texto e, de certa forma, não faz parte do jogo propriamente dito. No jogo

em questão, os heróis são os próprios participantes24 (que não estão interpretando

personagem algum), portanto, a situação inicial seria o próprio momento antes do início do

jogo: sendo o jogo parte integrante de um curso de férias, seria a situação dos participantes

24 Como o jogo foi aplicado para 60 participantes, nenhum jogador de RPG, optou-se por não criar personagens para os jogadores, mas só conduzi-los para dentro de uma história maravilhosa.

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até então. Essa situação se mantém até o momento em que o mago Florestan, o Sábio e seu

companheiro, o Mestre Esfinge, aparecem e convocam os heróis para uma jornada

fantástica.

Percebe-se, então, uma convergência estrutural entre as duas modalidades de Jogos

de Representação analisadas. Pode-se afirmar que todo jogo de aventura possui sua situação

inicial: o Herói dormindo em sua casa, trabalhando, levando sua vida rotineira.

A³ - Dano: Saqueia ou destrói o que foi semeado.

Mas o lixão começou a extrapolar seu limite, invadindo as vilas, as cidades...tomando

conta do mundo. Tudo isso por causa das ações de um homem: o Velho Ferro! Um grande

industrial que fabrica pouca coisa, mas produz muito lixo! Todo lixo que ele produz em

suas indústrias, ele joga pela janela, direto no lixão, sem nem olhar. Seu esgoto vai direto

para os rios e córregos nas proximidades, sem nenhum tratamento.

Durante a Situação Inicial, ocorre a aparição misteriosa dos personagens Florestan e

Esfinge, que vêm em busca de auxílio. Essa primeira interação entre a figura comunicadora

do Dano (normalmente, representada pelo arquétipo do Arauto) e o Herói é nomeada

Chamado à Aventura. É no Chamado à Aventura que

[...] o indivíduo entra numa relação com forças que não são plenamente compreendidas. [...] Como manifestação preliminar dos poderes que estão entrando em jogo, [o personagem], que surgiu como por milagre, pode ser considerado o “arauto”; a crise do seu aparecimento é o “chamado da aventura”. [...] Ele pode anunciar o chamado para algum grande empreendimento histórico, assim como pode marcar a alvorada da iluminação religiosa. Conforme o entende o místico, ele marca aquilo a que se deu o nome de “o despertar do eu”. [...] Mas, pequeno ou grande, e pouco importando o estágio ou o grau da vida, o chamado sempre descerra as cortinas de um mistério de transfiguração – um ritual, ou momento de passagem espiritual que, quando completo, equivale a uma morte seguida de um nascimento. O horizonte familiar da vida foi ultrapassado; os velhos conceitos, ideais e padrões emocionais, já não são adequados; está próximo o momento da passagem por um limiar. (CAMPBELL, 2007, pp.60-61)

A aparição dos Arautos (que, mais tarde, assumirão a função de Mentores) chama os

jogadores para a jornada. Esse chamado se dá no momento em que o Dano é comunicado

através da história contada pelos dois personagens, como vimos no trecho acima. Como

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observamos na análise anterior, o Dano é o que move o Herói em direção à jornada e,

normalmente, possui algum apelo emocional, envolvendo familiares ou entes queridos do

Herói na crise. Em O Caminho para o Vale Encantado, é o próprio futuro da humanidade

que está em risco, e é isso que comove o Herói, enquanto membro da sociedade e ser

humano.

a² - Carência: Carência de um objeto mágico.

FLORESTAN – É por isso que estamos aqui, velho amigo! Nós iremos ajudá-los a

encontrar um artefato místico capaz de neutralizar os poderes malignos do Velho Ferro,

fazendo com que ele volte a ser um homem bonzinho!

ESFINGE – Não me diga que você está falando do Livro Verde?!

FLORESTAN – Exatamente, Esfinge!

Os agora Mentores explicam aos heróis que existe uma solução para o problema. A

única forma de reparar o Dano é obtendo um Objeto Mágico chamado O Livro Verde.

Novamente, instaura-se uma Carência no Herói. Como já descrevemos, a Carência é a

função que motiva, de alguma forma, o Herói. Muitas vezes, está diretamente associada ao

objetivo: é a própria princesa raptada, o tesouro escondido, a jóia roubada.

B¹ - Mediação: Pedido de socorro e envio do herói.

ESFINGE: (...) E é preocupado com isso que um grande amigo meu, Florestan, o Sábio,

decidiu vir até aqui hoje, falar com vocês!

FLORESTAN – Olá, companheiros! O nosso amigo, Esfinge, já contou a vocês a trágica

história que pode, mais cedo ou mais tarde, acabar com nosso planeta! Não é uma coisa

muito legal, é? Mas venho aqui alertá-los que nem tudo está perdido! E é por isso que

estou aqui! Existe uma solução!!!

ESFINGE – Não acredito, Florestan! De novo você e essas idéias! Você quer arriscar a

vida desses jovens corajosos numa missão suicida?

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FLORESTAN – Meu amigo...sei o quanto você se preocupa com essas crianças, mas elas

são nossa última esperança! Sim! Eles são os Recicladores de Idéias! Pessoas que têm o

PODER de MUDAR O MUNDO!

ESFINGE – Mudar o mundo???

FLORESTAN – Sim! Acabar com todo esse lixo! Mas pra fazer isso, eles vão precisar

derrotar o responsável por tudo que existe de ruim nesse mundo!

O pedido de ajuda é uma função que constantemente aparece associada a outras. Até

o momento em que se inicia a Partida do Herói, todas as funções podem ocorrer ao mesmo

tempo ou de forma desestruturada. Carência pode aparecer antes de Dano e assim por

diante. A única função que podemos considerar fixa é a Situação Inicial. Dessa forma,

podemos observar no jogo em análise a concomitância entre as funções Dano, Carência e

Mediação, todas feitas no primeiro contato entre Arautos-Mentores e Heróis.

C� - Início da Reação e Partida.

FLORESTAN – Mas eles conseguirão, Esfinge! Nessa semana, nós mudaremos o mundo!

ESFINGE – Mas para mudar o mundo, é necessário conhecimento! Muito conhecimento!

FLORESTAN – Sim! E por isso nossa primeira missão será encontrar os Mapas da

Sabedoria!

Assim como em Perdidos na Selva, esse momento não é descrito textualmente, mas

está subentendido que os jogadores aceitarão a missão de Esfinge e Florestan. A Reação e

Partida do Herói às vezes são mediadas por um período de preparação e despedida, em

outros casos, pode passar por um período de Negação ou Recusa do chamado. Nesse último

caso, quando ocorre, o Herói sofre uma Punição: um castigo físico, psicológico ou

espiritual, de ordem mística ou não, que irá motivá-lo, encorajá-lo ou chantageá-lo a aceitar

a missão. Em geral, pode-se dizer que é instaurada uma nova Carência ao Herói, onde ele

próprio se torna a vítima.

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Com freqüência, na vida real, e com não menos freqüência, nos mitos e contos populares, encontramos o triste caso do chamado que não obtém resposta; pois sempre é possível desviar a atenção para outros interesses. A recusa à convocação converte a aventura em sua contraparte negativa. Aprisionado pelo tédio, pelo trabalho duro ou pela “cultura”, o sujeito perde o poder da ação afirmativa dotada de significado e se transforma numa vítima a ser salva. Seu mundo florescente torna-se um deserto cheio de pedras e sua vida dá uma impressão de falta de sentido [...] Tudo o que ele pode fazer é criar novos problemas para si próprio e aguardar a gradual aproximação de sua desintegração. (CAMPBELL, 2007, pp.66-67)

D° - Primeira função do Doador: Missão Primordial.

ESFINGE – Mas como pegaremos o Livro Verde? Há anos ele está escondido no Vale

Encantado e, como você sabe, ninguém consegue abrir o Portal Sagrado e entrar no Vale!

(...) FLORESTAN – Agora eles precisam encontrar o caminho para o Vale Encantado!

Esta é a primeira função que aparece no jogo e que não é descrita por Propp (1984).

Trata-se de uma tarefa que conduzirá todo o desenrolar da primeira parte da história (no

caso, encontrar o caminho para o Vale Encantado) e que só poderá ser cumprida com o

cumprimento de outras tarefas (chamadas missões secundárias). Importante dizer que a

Missão Primordial só se cumprirá no final da jornada em andamento (seja ela primária,

secundária ou terciária), que acontece, muitas vezes, antes do momento de transição entre

reinos (G). Optamos pela nomenclatura (D°) exatamente por se tratar de uma função de

doador que antecederia todas as demais.

( ) – Desdobramento de Funções: Missões secundárias.

Aqui encontramos outra função não identificada por Propp: o desdobramento em

missões secundárias. Essas missões secundárias são fundamentais para a conclusão da

missão primordial, pois só conseguindo concluí-las o Herói poderá superá-la. A partir de

agora, então, toda equação que se localizar entre parêntesis será identificada como

pertencente a uma missão secundária. No caso analisado, os heróis, para conseguir abrir o

Portal Sagrado que sela o Vale Encantado, devem encontrar quatro chaves. Para conseguir

as chaves, precisarão cumprir tarefas propostas por personagens (que possuem função de

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Doadores). Todas essas tarefas serão, portanto, consideradas missões secundárias. Como

todas possuem a mesma estrutura (DEF), iremos analisá-las em blocos.

D6 E6 F¹ - Missão Secundária de Resolução de Contenda.

As moscas devem brigar o tempo todo, falando que um jogo é melhor que o outro. Seu

Varejo, o pai, não sabe mais o que fazer e pede ajuda dos heróis, dizendo que dá qualquer

coisa em troca. No final, as moscas percebem que todos os jogos são legais e que, juntos,

ficam melhores ainda. Assim, decidem fazer as pazes. Seu Varejo, agradecido, entrega os

itens.

Nessa missão, pede-se aos heróis que solucionem uma contenda entre os

personagens. Cumprida a missão, eles receberão em troca a chave que será utilizada na

resolução da missão primordial.

A função Missão: Resolução de Contenda é descrita por Propp (1984) como sendo

uma situação de discussão, briga ou disputa entre dois ou mais personagens (que assumem

a função de Doadores ao fim da resolução) e que só pode ser resolvida mediante o

conhecimento, treinamento, astúcia ou objeto pertencente ao Herói. Este, muitas vezes, se

depara acidentalmente com a situação e se propõe resolver o problema sem que o pedido de

auxílio parta dos contendores. Resolvida a disputa, o Herói pode: a) exigir algo em troca de

seus favores, normalmente, parte do objeto em disputa (dinheiro, animais, mulheres,

despojos de guerra) ou b) ser presenteado, em sinal de agradecimento, pelos contendores

com parte do objeto disputado. Em alguns casos, a contenda pode aparecer como cilada, e a

retribuição que o Herói recebe tem aspecto negativo. Nesse caso, em específico, a situação

pode ser conduzida pelo arquétipo do Camaleão, de índole mutável, que hora favorece o

Herói, hora prejudica-o. A cilada, em geral, aparece em outra etapa da jornada do Herói,

durante o Regresso, chamada Perseguição. Nessa etapa, o Antagonista ou algum auxiliar

procura impedir o retorno ao lar do Herói. Para isso, vale-se de alguns artifícios, como a

cilada, onde se disfarça ou se transforma em algo atraente para chamar a atenção do Herói.

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+ - Indicador de nova missão.

Não se trata exatamente de uma função, mas adotamos essa simbologia (+) para

indicar o acúmulo de uma nova função (no caso, outra missão secundária) às demais.

Todas essas cadeias de funções, juntas, formam a missão secundária, no caso analisado.

D¹ E¹ F¹- Missão Secundária de Prova.

Dom Urubu é um homem envolvido em “jogos ilegais de charadas”. Mas existe uma série

de enigmas que nem ele consegue desvendar. Se os jogadores conseguirem, ele faz

qualquer negócio.

Madame Rata Zanna viu em sua bola de cristal um futuro terrível, que está relacionado ao

dia de hoje e ao de ontem e ao de anteontem e ao...enfim! Os heróis devem viajar no tempo

e realizar as pequenas ações (atividades de reciclagem) para impedir o futuro previsto.

Nesse momento de missões secundárias, foram encontradas duas ocorrências

semelhantes, em que os personagens Doadores submetem os heróis a uma prova (física,

intelectual, etc) e só entregam o objeto desejado (as chaves) com seu cumprimento.

Essa função é uma das mais recorrentes, segundo o corpus apresentado por Propp

(1984), dentro da jornada do Herói. As provas físicas ou de intelecto põem as habilidades, a

astúcia e a moral do Herói em evidência25.

D7 E7 F¹ - Missão Secundária de outros pedidos.

Dona Baratatinha entra revoltadíssima, acusando quatro ‘pessoas’. Ela quer saber quem

matou o Seu Barateiro. Ela chora e exige a verdade. Diz que dá uma boa recompensa pra

25 os doze trabalhos de Hércules, os testes feitos a Jasão para obter o velo de ouro, o enigma da Esfinge a Édipo, a prova dos arcos a qual é submetido Odisseu.

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quem decifrar esse mistério. Esfinge e Florestan bancam os detetives e mostram um dossiê

aos jogadores.

Nessa missão secundária, é pedido aos heróis que realizem uma investigação

criminal. Realizada a tarefa e descobrindo o criminoso, eles recebem o objeto desejado.

A Missão categorizada como Outros Pedidos envolve uma série de ocorrências que,

por serem menos constantes, não foram descritas uma-a-uma por Propp. Aqui, então,

decidimos enquadrar o Pedido de investigação criminal destacado no jogo em análise. O

caráter investigativo, assim como as provas de interrogatório, trás à luz as habilidades

cognitivas do Herói: análise, persuasão, intimidação, lábia.

E° - Reação do Herói: Herói supera Missão Primordial.

Aqui temos, novamente, uma função não identificada por Propp (1984). Ela poderia

muito bem ser representada pela função (E¹), mas optamos por criar a nomenclatura (E°)

para completar a equação iniciada por (D°). Dessa forma, então, uma equação iniciada com

a Missão Primordial (D°) só será completada com a superação dessa missão (E°) e,

logicamente, com a obtenção do Objeto Primordial (F°), o qual veremos a seguir. No jogo

observado, após cumprirem as tarefas propostas, os heróis obtêm as Quatro Chaves que

abrem o Portal Sagrado para o Vale Encantado, transportando a aventura para um novo

cenário.

F°1 – Fornecimento-recepção do objeto mágico: Objeto Mágico Primordial é transferido

diretamente.

FLORESTAN – Muito bem, jovens companheiros! Vocês conseguiram as chaves!

Completando a equação iniciada pela Missão Primordial está a obtenção do Objeto

Mágico Primordial, no caso, o conjunto formado pelas Quatro Chaves. A obtenção do

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Objeto Primordial segue as funções propostas por Propp, nesse caso, (F°1) trata-se de um

objeto transferido imediatamente aos heróis após a conclusão de suas tarefas.

O Fornecimento direto do objeto mágico, segundo Propp, “geralmente têm um

caráter de recompensa” (PROPP, 1984, p.44). O Doador, tendo o cumprimento de seu teste

por parte do Herói, presenteia-o com algum objeto ou informação que possa ser útil na

jornada. Às vezes, o objeto a ser doado repara a Carência ou faz parte de um aparato maior

que irá repará-la. No caso observado, os objetos doados até então são parte integrante da

jornada. Se pensarmos na divisão entre Missão Primordial e Missão secundária, essas

chaves são o objeto de Carência das Missões Secundárias, mas são só o elemento de

transição entre reinos da Missão Primordial.

G² - Deslocamento de espaço entre dois reinos: Herói se desloca por terra.

FLORESTAN – Agora, aqui, em frente às Chamas de Sharyou, vamos realizar o encanto

que abrirá as portas para a última floresta do mundo!

Aqui as funções voltam a seguir o levantamento de Morfologia do Conto

Maravilhoso, o que nos indica um constante retorno à linearidade e à forma fica proposta

por Propp (1984). Por mais que a estrutura do Jogo de Representação estilo Live Action

possua desdobramentos que o tornam menos linear, ela sempre acaba voltando para a

equação padrão já apresentada (αABC�GHJKw). Em O Caminho para o Vale Encantado,

os heróis vivenciam um momento de transição tanto na história como fisicamente. Como

explicamos anteriormente, o jogo é parte integrante de um curso de férias para crianças e,

da mesma forma que a Situação Inicial está mais para a vida real dos participantes do que

para a vida fictícia dos heróis, a Transição entre Reinos acaba seguindo a mesma idéia: não

é apenas na história que os heróis vão para outro lugar, os participantes entram num ônibus

de viagem e são transportados até um hotel-fazenda onde o restante da aventura se

desenrolará. Essa transição foi simbolicamente representada em torno de uma fogueira, à

meia-noite.

Como explicamos na análise de Perdidos na Selva, o objeto de desejo do Herói

encontra-se, muitas vezes, em outro mundo. Para adentrar nesse reino perdido, no

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submundo, na floresta escura, o Herói passa por uma morte simbólica – a representação da

mudança: a maturidade que chega, a puberdade, as cerimônias de iniciação – onde lhe é

aconselhado deixar todas as suas armas – conhecimento previamente adquirido, antigas

condutas, emoções infantis – para trás.

Tendo as personificações do seu destino [os auxiliares mágicos e os Mentores] a ajudá-lo e a guiá-lo, o herói segue em sua aventura até chegar ao “guardião do limiar”, na porta que leva à área da força ampliada. Esses defensores guardam o mundo nas quatro direções – assim como em cima e embaixo –, marcando os limites da esfera ou horizonte de vida presente do herói. Além desses limites, estão as trevas, o desconhecido e o perigo, da mesma forma como, além do olhar paternal, há perigo para a criança e, além da proteção da sociedade, perigo para o membro da tribo. A pessoa comum está mais do que contente, tem até orgulho, em permanecer no interior dos limites indicados, e a crença popular lhe dá todas as razões para temer tanto o primeiro passo na direção do inexplorado. (CAMPBELL, 2007, p.82. Grifo nosso)

H¹ - Combate: Lutam em campo aberto.

VELHO FERRO – Huá, huá, huá!!! Enfim encontrei vocês, Florestan e Esfinge! Pelo visto

vocês não perderam essa mania repulsiva de tentar mudar o mundo! Só vocês não

percebem que isso é praticamente impossível!

FLORESTAN – Impossível por quê, posso saber?

VELHO FERRO – Mas não é óbvio??? Vocês ainda não perceberam que as pessoas estão

confortáveis em suas vidinhas? Ninguém quer mudar! Pra quê? As pessoas trabalham,

compram, gastam, produzem, poluem...todo dia, ano após ano...tudo funciona muito bem

assim!

Após a transição de reinos, os heróis encontram – pela primeira vez – o antagonista:

Velho Ferro. O vilão enfrenta Florestan e Esfinge num duelo de magias e palavras.

Tendo o Herói passado nos testes, parado em frente ao Covil do Dragão e decidido

entrar, ele estará apto a encontrar seu Antagonista. Que fim esse conflito terá dependerá da

conduta do Herói: o humilde, que deixou suas armas e proteções na entrada da caverna

obterá a vitória; o presunçoso estará fadado à derrota. Enfrentar seu Antagonista num

primeiro encontro, se deixando levar pelos sentimentos, normalmente conduz o Herói à

ruína.

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Vale lembrar que nem sempre esse é o único combate que o Herói enfrenta. No

caminho das provas, ele pode ser testado fisicamente em competições que envolvam a luta

e o combate armado. Propp (1984) diz que

É preciso distinguir esta forma de combate da luta contra um doador hostil. As duas formas se diferenciam pelas conseqüências. Se o herói, como resultado desse confronto, recebe um objeto que deve auxiliá-lo na continuação de sua busca, estamos diante de um elemento D [Doador hostil]. Por outro lado, se, como resultado da vitória, o herói consegue o próprio objeto de sua procura, pelo qual foi enviado, estamos diante de um elemento H. (PROPP, 1984, p.50. Grifo nosso)

–J¹ - Derrota: Herói é vencido em campo aberto.

VELHO FERRO – É tarde para seu amigo, Esfinge! Que ele sirva de exemplo a você e a

todas essas crianças mimadas! DESISTAM AGORA ou sofram o mesmo destino de seu

amigo!

ESFINGE – Nós nunca desistiremos, Velho Ferro! Nunca! Unidos, iremos salvar nosso

amigo e derrotar você de uma vez por todas!

VELHO FERRO – Que seja! Meu aviso está dado! Eu vou-me embora, afinal, não há nada

que vocês possam fazer! Só com os Quatro Artefatos de Sharyou vocês poderiam me

derrot...ops! Quase falo demais! Deixe-me ir! Boa sorte em sua missão suicida, “heróis”!

Huá, huá, huá!!! (vai embora)

Nesse momento da história acontece algo interessante mas não explorado por Propp:

a derrota do Herói. Propp chega a descrever o Herói sendo ferido em batalha, função que

ele denominou Estigma (I), mas não fala em momento algum da ocorrência da derrota do

Herói nas mãos do Antagonista. Isso pode se explicar com a não-ocorrência dessa função

no corpus utilizado em Morfologia do Conto Maravilhoso. De qualquer forma,

encontramos a ocorrência no jogo observado e, portanto, decidimos retratá-lo como a

negação, o contrário, de Vitória (J), por isso, a designação (-J), sendo que os índices

acompanham a designação dada por Propp (-J¹ para derrota em campo aberto; -J² para

derrota em competição, etc.).

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Como descrevemos acima, o Herói que tenta enfrentar seu Antagonista num

primeiro encontro está destinado a perder. Algo – um conhecimento, um poder, um artefato

– falta para que o duelo se realize de igual para igual. Em O Caminho para o Vale

Encantado, Velho Ferro menciona a existência dos Quatro Artefatos de Sharyou que, ao

que parece, podem derrotá-lo. Resta aos heróis, então, encontrar esses artefatos. Instaura-se,

nesse momento, uma nova jornada: inflige-se novo Dano ao Herói (no caso analisado, a

perda de um Mentor) e uma nova Carência é detectada (necessidade de um elemento

mágico capaz de salvar o Mentor).

+° - Início de uma nova Jornada dentro da Jornada Principal.

ESFINGE – Era isso que faltava, amigos! Perdemos nosso amigo Florestan mas ganhamos

uma dica valiosíssima: para derrotarmos o Velho Ferro não precisamos encontrar apenas

o Livro Verde mas também os Quatro Artefatos de Sharyou!

Nesse momento, com a derrota dos heróis, encontramos a ocorrência de uma nova

Situação Inicial (agora negativa), de um novo Dano e uma nova Carência. Por conta disso,

consideramos que os protagonistas encontram-se numa nova jornada dentro da Jornada

Principal. É importante lembrar que os heróis possuem uma Jornada Principal (encontrar o

Livro Verde e salvar o Vale Encantado) e ela não será esquecida em nenhum momento da

aventura. Mas outros problemas atravessaram o caminho dos heróis e, portanto, eles se

embrenharam numa nova jornada (que chamamos Jornada Secundária). A Jornada

Principal só poderá se completar com o cumprimento da Jornada Secundária.

[ ] – Desdobramento de Funções: Jornada Secundária.

Da mesma forma que observamos no desdobramento em Missões Secundárias ( ),

toda função que vier dentro de colchetes fará parte da Jornada Secundária. Como

explicamos acima, só será possível cumprir a Jornada Principal no momento em que se

completar a Jornada Secundária. Esse, mais uma vez, é um elemento não levantado por

Propp (1984). A Jornada Secundária possui a mesma estrutura que a Jornada Principal,

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podendo terminar após a Recepção do Meio Mágico por parte do Doador ou após a derrota

de um segundo Antagonista. Analisaremos mais detalhadamente essa nova jornada:

αneg – Situação Inicial Negativa.

Tendo saído de uma recente derrota, o Herói, com o sentimento de perda ou

impotência, inicia sua nova jornada. Assim como a Situação Inicial descrita anteriormente,

essa pode vir explícita no texto ou não.

Em alguns casos, o Herói é marcado no combate prematuro com o Antagonista: fica

cego, perde uma parte do corpo, é assolado por alguma doença ou maldição, tem a pele

marcada por cicatriz. Essa etapa, muito similar à Punição, é denominada, como já

dissemos, Estigma. O Estigma possui dupla função: lembrar o Herói o motivo de sua

derrota, tornando-o humilde; e incentivá-lo em sua jornada em busca de amadurecimento e

auto-superação.

A¹¹ - Dano: Antagonista enfeitiça algo ou alguém.

Velho Ferro faz um passe de mágica e congela Florestan.

Da mesma forma que se tem uma nova Situação Inicial, tem-se um novo Dano. No

caso analisado, o Antagonista Velho Ferro petrifica com um encantamento o Mentor

Florestan. É esse Dano o responsável, juntamente com a Derrota do Herói, pelo início da

Jornada Secundária.

a² - Carência: Carência de um objeto mágico.

ESFINGE – Agora, antes de mais nada, precisamos encontrar uma forma de ajudar nosso

amigo! Mas como vamos fazer isso??? Já sei! Na bolsa de Florestan sempre existe algum

tipo de pó mágico! Vamos procurar...

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Aqui, um novo objeto mágico é requerido para restaurar o Dano causado: os heróis

precisam encontrar um pó mágico capaz de quebrar o feitiço lançado sobre Florestan.

B4 – Mediação: Comunica-se o dano.

Diferentemente da Jornada Principal, nessa os heróis decidem partir em missão

mediante a comunicação do Dano causado. O fato de Florestan ter sido petrificado gerou,

nos heróis, o movimento de partida.

C� - Início da Reação e Partida

ESFINGE - Bom...como Scarface disse: eu conheço as regras e, sendo assim, infelizmente

não poderei ajudá-los por enquanto. O Senhor dos Ladrões adora jogos e desafios, e é isso

que ele vai fazer com vocês. Dêem a ele uma boa partida e quem sabe ele irá ajudá-los.

Desistam do jogo, e ele não ficará muito contente. Trapaceiem, e ele exigirá que paguem

com suas vidas.

Só posso dar-lhes uma dica: esse é um jogo de enigmas. Decifrem a charada e ela os

levará até algum lugar. Lá, vocês provavelmente encontrarão um novo enigma. O enigma

final será o que levará vocês até Scarface.

Boa sorte!

A nova jornada tem início quando os heróis decidem procurar nos pertences de

Florestan algo que possa ajudá-lo e encontram uma mensagem e um desafio de Scarface, o

líder dos Ladrões. Pode-se dizer até que o desafio proposto assume o lugar de um novo

Chamado à aventura.

D° - Primeira função do Doador: Missão Primordial.

Já vimos essa nova função na Jornada Principal. No jogo, a missão primordial da

Jornada Secundária é conseguir o Pó Mágico para salvar Florestan, e os Quatro Artefatos

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de Sharyou para derrotar Velho Ferro. Lembrando que, além desses objetos, os heróis

precisam encontrar o objeto de Carência da Jornada Principal: o Livro Verde.

(D¹ E¹ F¹) - Missão Secundária de Prova.

A mensagem de Scarface propõe aos heróis uma busca conduzida por meio de

enigmas. Teoricamente, cumprindo essa tarefa, eles receberiam o Pó Mágico para salvar

Florestan. Mas isso não se realizará dessa forma. Ao invés do Pó, os heróis recebem um

outro objeto que estava sendo procurado (mas que não parecia tão emergencial quanto o Pó

Mágico): A Poção alabastrina, um dos Quatro Artefatos de Sharyou, item necessário para

derrotar Velho Ferro.

SCARFACE - Como vocês derrotaram meus enigmas, vou dar a vocês (...) a Poção

Alabastrina! Ela deve ser consumida pelo Velho Ferro até A ÚLTIMA GOTA após a

Flauta Ébano ter sido tocada! Entenderam? ATÉ A ÚLTIMA GOTA, lembrem-se bem!!!

D7+ - Primeira função do doador: Tarefa adicional de outro pedido.

SCARFACE - Vocês vieram atrás disso (e mostra o pó mágico) para salvar seu pobre

amiguinho, Florestan, o não-tão-sábio! Muito bem... aqui na Guilda nós possuímos um

lema que alguns de vocês já devem ter ouvido por aí: uma mão lava a outra! Em outras

palavras: eu entrego o pó para vocês se vocês me fizerem um pequeno favor.

Além de um dos Artefatos Mágicos, o Doador faz uma nova proposta,

acompanhada de uma promessa, aos heróis: entregar o Pó Mágico mediante o cumprimento

de uma nova missão. Os heróis devem encontrar uma jóia (o Olho do Dragão) e levá-la até

Scarface.

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G³ - Deslocamento de espaço entre dois reinos: Herói é conduzido.

ESFINGE - Vocês deverão procurar o esconderijo dos Corsários. Felizmente, dessa vez eu

poderei acompanhá-los até lá, mas não poderei entrar. Não sou uma pessoa bem-vinda ali.

Mas vamos! Mostrarei o caminho.

Novamente, os heróis são transportados a outro Reino. No caso, à Ilha dos

Corsários, onde serão introduzidos à Jornada Terciária. Percebe-se, a partir daqui, a

repetição dos desdobramentos de função, sempre recorrendo aos mesmos esquemas

estruturais: comunica-se um Dano ou uma Proposta, que instaura o início de uma missão

ou jornada de valor secundário mas que é relevante para a conclusão da Jornada Principal.

Os heróis continuam sendo submetidos a testes por meio dos Doadores, recebendo objetos

mágicos como recompensa.

+ { } – Desdobramento de Funções: Jornada Terciária.

BARBEKILL - Homens, peguem esses invasores e façam o favor de trancá-los na

masmorra! Aliás...pensei melhor! Vamos levá-los até a Ilha da Caveira! Não existe

possibilidade de eles fugirem de lá!

Acompanhada do Indicador de nova missão (+), essa função também não descrita

por Propp (1984) designa uma nova jornada dentro da Jornada Secundária. Em outras

palavras, tudo que estiver entre chaves { } será considerado como componente da Jornada

Terciária. O início de uma nova jornada pode vir após a derrota do Herói ou após uma

transição de Reinos, mas, obrigatoriamente, virá acompanhado de um novo Dano infligido.

Como vimos no início desse capítulo, é o Dano que movimenta o Herói. Sendo assim,

sempre existirá essa função dentro da narrativa de aventura.

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A¹5 - Dano: Antagonista encarcera ou retém alguém.

Vamos levá-los até a Ilha da Caveira! Não existe possibilidade de eles fugirem de lá!

Os heróis são levados ao covil dos Corsários, onde serão mantidos cativos. Essa

situação de encarceramento do Herói coloca-o em posição de vítima, em alguém que

precisa ser resgatado ou encontrar uma saída, elaborar uma fuga. Essa posição de vítima é

descrita por Propp e está diretamente vinculada à função (B), onde ele diz:

Esta [função de Mediação] é a função que introduz o herói no conto. [...] Os heróis do conto maravilhoso podem ser de dois tipos: 1) Se a jovem foi raptada, e desapareceu assim das vistas de seu pai (bem como do horizonte do leitor), e Ivan parte à procura da jovem, então o herói do conto é Ivan, e não a jovem raptada. Podemos denominar buscadores a este tipo de heróis. 2) Se uma jovem ou um menino são raptados ou expulsos, e o conto centrado em quem foi raptado ou expulso, não se interessando pelos que ficaram, então o herói do conto é a jovem (ou o menino) raptada(o) ou expulsa(o). Nestes contos não há buscador, e o personagem principal pode ser denominado herói-vítima [...] (PROPP, 1984, p.39. Grifo nosso)

a4 - Carência: Carência de uma forma específica.

Para escapar do cativeiro, o Herói precisa encontrar certos objetos que facilitem sua

ação, algo que abra a passagem e permita a fuga.

B6 – Mediação: Herói condenado à morte é libertado secretamente.

Essa função virá concomitantemente às funções (C� D¹ E¹ F¹). Os heróis se lançam

a procurar os objetos facilitadores da fuga e escapam secretamente. A próxima etapa da

equação será analisada num único bloco, por sua simultaneidade com esta e por sua

recorrência.

Nesse momento da jornada, é apresentada ao Herói a possibilidade de partir (uma

função que aparece e caracteriza o Herói-vítima). A possibilidade de fuga se associa, no

caso, a uma provação.

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C� D¹ E¹ F¹ - Início da reação, Partida e Missão de Prova.

BARBEKILL – Muito bem...vocês conseguiram fugir da Ilha da Caveira! Ninguém NUNCA

fugiu de lá antes! Como prova de minha admiração, aqui está a Flauta Ébano,

Plastitânicos! Ela deve ser tocada ANTES DE TUDO quando vocês encontrarem o Velho

Ferro!

Os heróis procuram e obtém os objetos necessários para sua fuga secreta do

cativeiro. Nessa etapa da jornada, a Partida do Herói está diretamente ligada ao

cumprimento de uma prova. A realização dessa tarefa presenteará ao Herói os elementos

necessários para que a fuga se concretize.

D7+ - Primeira função do doador: Tarefa adicional de outro pedido.

BARBEKILL - Eu precisaria de um motivo muito bom para entregar essa jóia a vocês.

Vocês têm algum? Não??? Foi o que eu imaginei! Façamos o seguinte: me tragam a

Luneta Dourada, um artefato preciosíssimo que está nas mãos do Faraó! Se o fizerem, eu

entrego o Olho do Dragão!

Após a fuga dos heróis, Barbekill entrega a eles o segundo artefato de Sharyou mas

não entrega o objeto pedido por Scarface. Para entregá-lo, propõe aos heróis uma nova

tarefa adicional: trazer para ele a Luneta Dourada.

Da mesma forma que vimos no final da missão que envolvia Scarface, os heróis são

recompensados por fugir do cativeiro com um dos Artefatos de Sharyou e recebem nova

proposta de missão, seguida de promessa de recompensa.

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G4 - Deslocamento de espaço entre dois reinos: Indicam o caminho ao Herói.

ESFINGE - Mas vamos uma coisa de cada vez! Agora, temos que conseguir a Luneta que

está em poder do meu irmão, o Faraó! Ele é um homem insano, obcecado por poder!

Muito cuidado quanto entrarem em seus domínios! Muito CUIDADO!

Mais uma vez os Heróis são transportados a um novo reino. Dessa vez, são

encaminhados aos domínios do Faraó.

Percebe-se que em O Caminho para o Vale Encantado toda nova jornada pressupõe

um Dano e um novo Deslocamento no espaço, o que indica uma forma fixa de estruturação

do enredo que pode ser resumida em: AaBDEFG.

D8 – Primeira função do doador: Ser hostil tenta aniquilar o Herói.

ESFINGE – Cuidado, pessoal! Ele está aqui, e veio com seus guardas!

FARAÓ – Pode se acalmar, Esfinge! Só vim até aqui dizer que eu NUNCA entregarei a

Luneta Dourada a vocês! Nem a Luneta, nem um dos Artefatos de Sharyou que se encontra

em meu poder! Sua missão, meu irmão, termina aqui!

Essa etapa da jornada apresenta um Doador diferente dos já descritos: ao invés de

aplicar um teste físico ou cognitivo, o Doador é um personagem de conduta hostil que

tentará impedir o progresso do Herói.

E8 - Reação do Herói: Herói se salva dos ataques.

ESFINGE – (...) precisamos banir de uma vez meu irmão para a Zona Negativa!

Precisamos fazer uma Poção capaz de envia-lo para outra dimensão, onde não fará mal a

ninguém!

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Após a ameaça do Doador hostil, o Herói encontra um meio de derrotá-lo – por meio de

astúcia, força física ou meios místicos – e obter o objeto que está em seu poder.

F6+ – Fornecimento-recepção do objeto mágico: Objeto e objeto adicional aparecem

súbita e espontaneamente.

ESFINGE – É agora! (faz uma “conjuração”. Faraó some, deixando a Luneta Dourada e

as Runas Mágicas) Conseguimos, amigos! Aqui estão a Luneta e o TERCEIRO

ARTEFATO DE SHARYOU: as Runas Mágicas!

Derrotando o Doador hostil, o corpo desaparece e em seu lugar ficam os objetos

buscados pelo Herói. A função descrita por Propp (1984) menciona aparição de meios

mágicos a partir da terra, um arbusto que brota, animais, anões, etc.

– - Indicador de Regresso à Missão Anterior.

ESFINGE – (...) Agora, é só entregar a Luneta para Barbekill! Vamos!!!

Da mesma forma que indicamos o início de uma nova missão (+), decidimos indicar

o retorno à missão anterior através do símbolo (-). Esse jogo possui essa característica: o

avanço seguido do retorno para cumprir uma missão maior. Importante não confundir essa

nova função com a função Retorno descrita na Morfologia do Conto Maravilhoso. A

diferença entre as duas recai diretamente no andamento da jornada: no Retorno, o Herói já

recuperou o objeto de Carência e restaurou o Dano; no Regresso à Missão, o Herói apenas

cumpriu parte de sua jornada em um terceiro ou quarto Reino, deixando a missão

primordial de lado para cumprir missões secundárias, e agora retorna para essa jornada

principal, munido de meios mágicos ou acompanhado de aliados capazes de ajudar na

vitória sobre o Antagonista.

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E7+ - Reação do Herói: Herói realiza outro serviço pertencente à missão adicional.

BARBEKILL – Hum...pelo visto vocês conseguiram a Luneta Dourada! Onde ela está?

Optamos, novamente, por representar graficamente essa diferenciação na função

(E7). O símbolo (+) acompanhado de (E7) indica que a missão adicional proposta por um

Doador foi cumprida.

F¹+ – Fornecimento-recepção do objeto mágico: Objeto adicional se transmite

diretamente.

BARBEKILL – Muito bem...aqui está, Esfinge! Desconfiado como sempre! Peguem! (eles

trocam os artefatos) Foi bom fazer negócio com vocês! Mandem lembranças minhas ao...

ao... ao... TROMBADINHA! (cospe no chão três vezes e passa o pé em cima) Agora saiam

daqui e nunca mais venham me pedir nada!

Assim como vimos na função anterior, o Fornecimento nessa etapa é acompanhado

do símbolo (+), encerrando a Jornada Terciária. Na próxima etapa da equação, o Herói

voltará à Jornada Secundária.

– E7+ - Reação do Herói: Herói realiza outro serviço pertencente à missão adicional.

SCARFACE – E então? Trouxeram a Jóia???

Essa função é idêntica à já descrita: faz-se um retorno à missão anterior e cumpre-se

a tarefa adicional anteriormente determinada.

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F¹+ – Fornecimento-recepção do objeto mágico: Objeto adicional se transmite

diretamente.

SCARFACE – Está bem, Esfinge! Não se pode nem brincar um pouco hoje em dia...Aí está

o Pó Mágico! Agora, se não for incômodo, retirem-se de minha casa e não voltem mais!

Estamos entendidos? Adeus!

O ciclo de tarefas adicionais é encerrado com o Fornecimento do meio mágico que

movia a Carência da Jornada Secundária.

K8 – Reparação do dano: Personagem enfeitiçado volta ao normal.

ESFINGE – Agora é o grande momento, pessoal! Finalmente, vamos quebrar esse encanto

do maldito Velho Ferro! Onde está o Pó? Pronto! Agora é só jogar em cima do Florestan

e...PIMBA! (eles jogam o pó. Florestan volta ao normal!)

De posse meio mágico, o Herói pode restaurar o Dano que movia sua Jornada

Secundária e voltar à Jornada Principal. Como podemos ver no trecho extraído do jogo O

Caminho para o Vale Encantado, esse é o momento em que os Heróis obtêm o Pó Mágico

e libertam Florestan do feitiço.

+ (D¹ E¹ F¹) - Missão Secundária de Prova.

AGENTE – Saudações, bravos e jovens heróis! Venho aqui em nome de todos os povos que,

um dia, viram a beleza da Natureza! Vocês encontraram os meus envelopes? Então, por

favor... (ele recolhe os envelopes). Em agradecimento, devo lhes presentear com o último

Artefato de Sharyou: as Palavras Cabalísticas!

Uma última missão secundária é proposta ao Herói. Essa missão será a última etapa

para concluir a Jornada Secundária.

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E° - Reação do Herói: Herói supera Missão Primordial.

FLORESTAN – Agora, companheiros, com os Quatro Artefatos de Sharyou podemos

derrotar o Velho Ferro! Vamos encontra-lo! Será muito fácil! Ele emana uma energia

negativa que é facilmente detectado pela minha bola de cristal! Vamos!

Herói consegue realizar a Missão Primordial da Jornada Secundária. No caso

observado, eram dois os objetivos dos Heróis: conseguir os Quatro Artefatos de Sharyou e

salvar Florestan.

F°1 – Fornecimento-recepção do objeto mágico: Objeto Mágico Primordial é transferido

diretamente.

Os Doadores encerram sua função na história, pondo fim à Jornada Secundária.

Herói retorna, automaticamente, à Jornada Principal.

G³ - Deslocamento de espaço entre dois reinos: Herói é conduzido.

ESFINGE – É aqui, pessoal! Eu sinto o fedor desse verme putrefato de longe!!! Ele está

escondido bem aqui!!!

Uma última movimentação no espaço conduz o Herói à etapa final de sua jornada: o

embate decisivo com o Antagonista.

H¹ - Combate: Lutam em campo aberto.

FLORESTAN – Rápido! É esse o momento! Usem os Artefatos de Sharyou!!! Qual era a

ordem mesmo???

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O combate com o Antagonista se inicia. De posse dos meios mágicos, o Herói não

precisa se preocupar com a derrota: a jornada foi cumprida, o Estigma foi curado e todas as

armas capazes de colocá-lo no mesmo patamar do Antagonista foram encontradas.

J¹ - Vitória: Antagonista é vencido em campo aberto.

FLORESTAN – Parabéns, companheiros! Nossa jornada foi um sucesso! Derrotamos o

odioso Velho Ferro!

Com a utilização dos meios mágicos, Herói derrota Antagonista. No jogo

observado, o Antagonista não é morto, castigado ou exilado, mas purificado. Aqui, o

Antagonista pode ser representado pelo arquétipo do Camaleão, deixando de ser um

personagem de função hostil para se tornar um aliado.

K4 – Reparação do dano ou carência: Obtenção do objeto é resultado das ações precedentes.

FLORESTAN – Verdade! E no dia de hoje, vocês ainda não mudaram o mundo! Mas

deram um passo importante: derrotaram o Velho Ferro! Só que ele não é o único inimigo

da Mãe Natureza! Existem muitos outros espalhados por aí! E cabe a nós, todos nós,

combatê-los! (...)

ESFINGE – Acima de tudo, Florestan, nossos amigos adquiriram CONHECIMENTO!

FLORESTAN – Sim! E o Livro Verde nada mais é do que isso: conhecimento!

Conhecimento acumulado! Eis a salvação, a verdadeira chave para o Vale Encantado!

A derrota do Antagonista faz com que o objeto de busca seja transferido diretamente

às mãos do Herói, restaurando o Dano inicial.

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� - Regresso.

ESFINGE – E agora?

FLORESTAN – Agora, meu amigo, é hora de irmos embora! Voltar à nossa vidinha...

De posse do objeto de busca, o Herói pode retornar para seu mundo, levando

consigo a Bênção Última, o Elixir Restaurador.

w³ - Casamento: Recompensa em dinheiro e outra compensação.

FLORESTAN – Faço minhas suas palavras, Esfinge! Lembrem-se: CONHECIMENTO é a

única grande arma capaz de mudar o mundo! Não se esqueçam disso JAMAIS! E, mais

importante, passem isso adiante! Avisem seus amigos, seus pais, as pessoas na

rua...CONHECIMENTO! Adeus e FNORD!

Encerrando a Jornada Principal e, dessa forma, a aventura, o Herói tem direito à

sua Recompensa. O caso analisado mostra uma recompensa de aspecto cognitivo:

conhecimento. Conhecimento este que, ao fim da aventura, demonstrou ser o grande aliado

e o meio mágico capaz de derrotar o Antagonista. O Livro-Verde era a representação de

todo o conhecimento que girava em torno do jogo.

3.2.2.2. Resultado da análise

A segunda análise também nos põe em contato com as semelhanças formais

existentes entre as estruturas narrativas literárias e as do Live Action, tendo como mediador

as teorias narratológicas de Propp (1984) – Morfologia do Conto Maravilhoso e Campbell

(2007) – Jornada do Herói Mitológico. Percebemos que, assim como ocorre com o Jogo de

Mesa, o Live Action possui uma estrutura que se enquadra nas teorias propostas,

principalmente no que diz respeito às funções e aos arquétipos. No entanto, nosso objeto de

análise demonstrou possuir características próprias que não são passíveis de análise se

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seguirmos as teorias de forma rígida: a presença de funções não-descritas e a constante

desconstrução e reconstrução de linearidade só podem ser descritas se levarmos em

consideração a flexibilidade das teorias narratológicas e, da mesma forma que constatamos

no Jogo de Mesa, a simulação da interferência que o jogador implica no jogo, o que

comprova – uma vez mais – a estrutura flutuante, mutável e muitas vezes não-linear dos

Jogos de Representação.

Estruturalmente falando, os enredos de Live Action e Jogo de Mesa não possuem

diferença. As divergências encontradas são próprias de objetos de análise diferenciados,

mas que estão desligadas das características formais do jogo e de suas modalidades. Esse

argumento é facilmente comprovado pela presença da estrutura-matriz αABC�Kw,

presente em ambos os casos analisados, mostrando que os enredos de Jogos de

Representação, apesar dos desdobramentos e repetições de funções ainda possuem uma

estrutura interna que segue esse modelo.

Se pensarmos a partir das teorias de Campbell, todo Jogo de Representação possui o

seguinte andamento, desconsiderando os desdobramentos de funções e a repetição de

etapas:

Situação Inicial (apresentação do Herói) > Chamado à Aventura (Arauto) > Auxílio

Sobrenatural (Mentor) > Passagem pelo primeiro limiar (Guardião) > Caminho de provas >

Covil do dragão (Antagonista) > Vitória, bênção última e retorno para casa.

3.3. RESULTADO: JOGO X TEXTO

Sendo assim, não encontrando divergências que comprovem a diferença estrutural

dos Jogos de Representação nas teorias narratológicas, podemos afirmar que o que separa

uma modalidade de outra são as características formais do jogo e que já descrevemos ao

analisar cada uma das modalidades: a saber, número de participantes (individual ou

coletivo), relação narrador-jogador (narrador textual ou como função do ator) e forma de

representação (narrativa escrita, oral ou dramática).

As teorias narratológicas mostraram como os Jogos de Representação se comportam

quando colocados dentro de uma estrutura fixa. Apesar da ineficácia em descrever em sua

totalidade o Live Action em análise, as funções de Propp (1984) e as teorias de Campbell

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(2007) comprovaram que o jogo, quando retirado de seu contexto, perde as características

de jogo e passa a ser tratado como um texto literário qualquer.

Logo, o jogo só pode existir enquanto jogo dentro de sua própria esfera, que se dá

no ato de realização, na situação e no contexto adequado. Quanto a isso, parafraseamos

Huizinga (2007) a respeito do jogo: jogo possui um caminho e um sentido próprio, se

processando e existindo no interior de um campo previamente delimitado, de maneira

material ou imaginária26.

Por fim, queremos enfatizar que as teorias narratológicas são eficazes apenas na

descrição de enredos utilizados em Jogos de Representação, mas não na análise do jogo

propriamente dito. A transcrição de um jogo e a não-participação dos jogadores no ato da

análise propiciaram à pesquisa um caráter de mera emulação do que um Jogo de

Representação estilo Live Action é capaz de proporcionar em termos de construção de

enredo.

26 Tentar trazer o jogo para um ambiente de análise é condená-lo à inexistência.

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CAPÍTULO IV – JOGOS DE REPRESENTAÇÃO & EDUCAÇÃO

No capítulo anterior, nos detivemos à análise dos enredos de Jogos de

Representação a partir das teorias narratológicas descritas por Vladimir Propp (1984) e

Joseph Campbell (2007). Vimos que o jogo fora de seu contexto torna-o passível de uma

análise superficial que gira em torno de seu enredo, mas não de suas características formais

enquanto jogo. O capítulo seguinte tratará da criação de mundos em Jogos de

Representação, mas antes, decidimos abrir um parêntesis para descrever a posição dos

Jogos de Representação no contexto educacional: quem são os professores que se propõem

a colocá-lo em função da educação? Como os Jogos de Representação são colocados em

sala de aula? E de que maneira os conteúdos pedagógicos são inseridos na aventura? Esse

capítulo tentará responder e discutir essas questões.

4.1. RPGISTA EDUCADOR X EDUCADOR RPGISTA

A partir do final da década de 90, começaram a se desenvolver no Brasil os primeiros estudos sobre a aplicação dos RPGs – do inglês, Roleplaying Games (jogos de interpretação) – na Educação. O que inicialmente eram iniciativas isoladas, aos poucos se tornou uma verdadeira corrente de estudo, originando seminários especializados no assunto. O Brasil, inclusive, é hoje um dos países mais avançados nessa área. Contudo, todas as aplicações dos RPGs num contexto pedagógico partiram de profissionais que já possuíam uma vivência anterior com esse instrumento. Ou seja, existe o grande desafio de capacitar o educador que nunca vivenciou um jogo de RPG antes em sua vida a aplicá-lo na sala de aula. (RIYIS, 2004, p.7)

Com esses dizeres, Marcelo Telles, professor de música da Rede Municipal do Rio

de Janeiro e coordenador do portal REDERPG27, introduz o livro do professor Marcos

Tanaka: um sistema simplificado de Jogos de Representação voltado a professores

interessados em utilizar a atividade como uma ferramenta motivadora em suas aulas. Como

podemos notar, essa aplicação pedagógica dos Jogos de Representação não é nenhuma

novidade, mas ainda carece de capacitação apropriada e, principalmente, facilitadores que

ajudem o professor inexperiente a realizar sua experiência em classe. O material que

encontramos, na maioria das vezes, tem, como público-alvo, jogadores de RPG que têm

como objetivo a aplicação de seu hobby num contexto educacional. Esse cenário, há certo

27 http://www.rederpg.com.br

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tempo, nos fez levantar a questão: será que existe uma diferença entre o RPGista Educador

e o Educador RPGista?

Educador RPGista é a pessoa interessada em ensinar utilizando o RPG como canal,

como ferramenta facilitadora no processo ensino-aprendizagem. RPGista Educador

costuma ser o jogador interessado em por seu hobby em contexto educacional. A diferença

entre as duas categorias está no foco da ação: o primeiro põe a educação em primeiro plano,

não importando para ele sistema, regras, dados e outros elementos constituintes do RPG

comercial. Para ele, importa o processo educacional, como o educando apreende, relaciona

e soluciona questões através do Jogo de Representação, além de trabalhar habilidades e

competências, todas girando em torno desse conteúdo em comunicação; o segundo põe o

jogo em evidência, quer inserir regras complexas, incentivar a leitura de livros de RPG,

alguns chegam, inclusive, a ministrar aulas introdutórias de história do RPG. Normalmente,

são puristas, não admitem modificações em sistemas de regras que facilitem no processo

ensino-aprendizagem, alegando que, com as modificações, o jogo deixa de ser RPG pra se

tornar uma simples ferramenta.

Somos obrigados a discordar das justificativas dos RPGistas Educadores. O Jogo de

Representação modificado de forma a se adequar ao contexto educacional não deixa de ser

RPG pois não perdeu suas características formais básicas que o estabelecem enquanto jogo

e que descrevemos anteriormente. Continua sendo lúdico, continua sendo jogado

coletivamente (no caso do Jogo de Mesa e do Live Action) ou individualmente (no caso das

Aventuras Solo), continua estabelecendo a mesma relação entre narrador e jogador, e

continua sendo jogo cooperativo de contar e criar histórias. Sendo jogo, já se pressupõe a

existência consciente ou inconsciente de regras (afinal, insistimos sempre que lúdico é e

instaura ordem) portanto, a não-utilização de sistemas de regras comerciais não defende o

argumento que RPG adaptado para contextos pedagógicos deixa de ser RPG.

Mesmo assim, são poucos os materiais voltados para Educadores RPGistas. Livros

como os da série MiniGURPS ou O Livro das Lendas, de Gustavo César Marcondes

(2004), se dizem voltados para o setor educacional, mas ainda trazem esse complicador que

é o sistema de regras.

Após a descrição do jogo e a exposição desses argumentos, o professor poderá identificar com facilidade dois dos três elementos importantes para uma atividade lúdica e educativa: a

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motivação decorrente do jogo e o caráter cooperativo do mesmo. Já o terceiro elemento irá requerer um pouco de reflexão e trabalho, pois, até agora, são quase inexistentes os RPGs comerciais que se dedicam ao uso em sala de aula. O professor, então, terá que adaptar a técnica e a estratégia do RPG ao seu trabalho didático. Ou seja, o professor será o “Mestre do Jogo” para um grupo de alunos, em um cenário descrito/criado/adaptado por ele para garantir que o aspecto de conteúdo seja adequadamente tratado na aventura. (RIYIS, 2004, p.10)

4.2. O ESPAÇO DOS JOGOS DE REPRESENTAÇÃO NA EDUCAÇÃO

Em nosso trabalho, destacaremos algumas experiências realizadas com a aplicação

dos Jogos de Representação em contexto educacional. É preciso lembrar que, assim como o

conteúdo acadêmico, nem todas as modalidades de Jogos de Representação recebem o

devido destaque nas aplicações pedagógicas. Jogos de Mesa e Aventuras Solo continuam

sendo, aqui, as modalidades de maior difusão comercial. Mesmo assim, existem registros e

relatos que descrevem a aplicação dos Live Actions com fins educacionais.

O seguinte capítulo destacará um exemplo prático de Jogos de Representação

aplicados em sala de aula ou com conteúdos pedagógicos. O Jogo de Mesa Perdidos na

Selva é de autoria do professor Marcos Tanaka Riyis, um Educador RPGista, e está inserido

em seu livro, Simples (2004). Discutiremos brevemente a aplicação desse jogo, sua

estrutura e seus objetivos, a fim de compreender e comprovar a idéia que Jogos de

Representação comerciais e Jogos de Representação pedagógicos, apesar de possuírem

objetivos diferentes (o lúdico puro para o primeiro e o processo ensino-aprendizagem para

o segundo) ainda são o mesmo jogo, diferenciando-se, apenas, em questões formais ligadas

a sistemas de jogo.

4.2.1. Jogo de Mesa: Perdidos na Selva

O Jogo de Mesa Perdidos na Selva é uma aventura criada com fins pedagógicos,

estruturada para ter duração de aproximadamente trinta minutos e trabalhar conteúdos da

área de geografia: localização espacial, clima, vegetação, fuso horário e temas relacionados.

O sistema de regras utilizado é o proposto por Riyis (2004) e descrito em seu livro: dois

dados de seis faces são jogados, quando pedido, para determinar se o jogador foi bem

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sucedido ou não em uma ação. Para ser bem sucedido, o jogador deve obter nos dados um

resultado igual ou menor ao que foi estabelecido pelo Narrador.

É sugerido que o jogo seja aplicado com a sala toda de duas possíveis formas: os

alunos dividem-se em grupos e cada grupo interpreta um personagem (nesse caso, o

professor atuaria como o Narrador da história) ou os alunos, ainda divididos em grupos,

possuem um Narrador próprio (normalmente, um aluno por grupo que foi devidamente

treinado alguns dias antes para a aplicação do jogo)

4.2.1.1. Personagens

Os personagens, diferente de outros Jogos de Mesa comerciais, são apresentados

prontos aos jogadores28. Suas fichas de descrição são extremamente simplificadas e

objetivas. Abaixo, colocaremos em comparação as fichas de personagem de Perdidos na

Selva e de um RPG comercial: Dungeons & Dragons:

28 Na maioria dos RPGs, modalidade Jogo de Mesa, os personagens devem ser construídos pelos próprios jogadores. Para isso, existem certas regras que delimitam a escolha de habilidades e características físicas e psicológicas, de forma a deixar o personagem mais verossímil e coerente, de acordo com o cenário proposto. Nos RPGs pedagógicos, pode-se escolher entre as duas propostas: deixar que o jogador crie seu personagem ou trazê-lo pronto. Isso dependerá do objetivo do educador e de suas estratégias.

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A figura 1 mostra uma planilha complexa, com inúmeros campos a serem

preenchidos com números e outros elementos. Num Jogo de Representação convencional,

não-pedagógico, o preenchimento dessa ficha assemelha-se a um ritual. É um momento

íntimo entre jogador e personagem, onde cada detalhe é pensado de forma a deixar o

personagem mais crível e equilibrado possível. É um momento de criação, onde o jogador,

com o auxílio do Narrador, vai dar os primeiros passos rumo ao círculo mágico que será

criado no momento da realização do jogo. Entretanto, num jogo pedagógico, uma ficha tão

complexa talvez não seja de interesse. Afinal, numa aventura que precisa durar trinta

minutos, não existe tempo para explicar cada regra, muito menos preencher tantos campos.

E, mesmo se houvesse tempo suficiente, provavelmente a maioria dos elementos

Figura 1 – Ficha de personagem de Dungeons & Dragons

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constituintes da planilha não seria utilizada numa aventura. Aqui caberia, novamente, a

discussão a respeito de Educador RPGista e RPGista Educador. Os últimos, com certeza,

apoiariam a utilização de uma ficha de personagem completa, mesmo se isso representasse

uma ocupação de tempo demasiada. Os primeiros, no entanto, apelariam para uma maneira

mais simplificada. O exemplo são as fichas de personagem de Perdidos na Selva.

a) Johannes: 23 anos, 1,90m de altura, 100Kg, forte e musculoso. Faixa Preta de Jiu-jitsu e sabe lutar outras artes marciais. Carrega uma faca do tipo “Rambo”. Tem pouca inteligência e muito medo de coisas sobrenaturais. Se acha o bonitão. Tem 14 pontos de vida. b) João Spectro: 20 anos, pequeno, magrinho e fraco. Passou muita necessidade quando pequeno, e chegou a cometer pequenos furtos. Muito veloz e tem a “inteligência das ruas”, o que faz com que descubra problemas mais facilmente que os outros, além de uma excelente lábia. Carrega um pequeno revólver .32 com 5 balas. Tem pouca auto-estima, estudou somente até a 5a série e tem muito medo de passar fome. Tem 11 pontos de vida. c) Glória: 21 anos, extremamente bonita e inteligente. Faz faculdade de medicina, adora essa profissão e carrega sempre um estojo com apetrechos médicos (gaze, esparadrapo, bisturi, água oxigenada, ponto, soro fisiológico, e outras coisinhas). Sabe muito sobre Biologia, Matemática, e outras matérias escolares, além de sempre ter boas idéias. Recentemente sofreu um acidente que a deixou mancando muito de uma perna. Não consegue andar grandes distâncias sozinha. Tem 8 pontos de vida. d) Magali: 21 anos, muito bonita. Trabalhadora e pobre, bisneta de escravos, tem o que se chama de “sexto sentido”, ou seja tem o poder de: Sentir Perigo 9 (sempre que quiser usar o poder, deve tirar 9 ou menos em 2 dados), Detectar Mentira 9, Flash Luminoso 7, Hipnose (a critério do mestre, de acordo com a dificuldade ou resistência do alvo) e Controle do Clima (pode ser usado apenas 2 vezes por dia e por apenas 30 segundos) 10. Carrega sempre consigo um colar que lhe foi dado pela avó, que considera a coisa mais preciosa do mundo. Usa óculos com 8 graus de miopia, o que faz com que praticamente não enxergue sem eles. Tem 6 pontos de vida. e) André(a): Personagem “coringa”, que pode ser homem ou mulher, dependendo da vontade do professor e/ou seus alunos. Se forte é a comunicação e o carisma. Tem o poder de saber todas as línguas faladas na Terra e de causar sempre uma boa impressão quando se comunica com alguém. É bom músico e carrega uma flauta de bambu. Detesta violência e não pode ver sangue, senão desmaia. Tem medo de ficar sozinho. Tem 8 pontos de vida. (RIYIS, 2004, pp.58-59)

Numa aventura pedagógica é necessário clareza no sistema de jogo e nos objetivos.

Os personagens foram elaborados a partir das situações que o próprio jogo pede, cada qual

com suas habilidades (sexto sentido, saber todas as línguas, habilidades médicas),

características positivas (força, lábia, carisma) e negativas (medo de ficar sozinho, medo do

sobrenatural, miopia) que, quando colocados em conjunto, se completam, se anulam ou

acionam. Por exemplo: Magali é a personagem com poderes sobrenaturais, ao passo que

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Johannes é o personagem que possui medo de misticismo. Magali usar seu poder pode ser

útil numa determinada situação (e isso se comprova na aplicação do jogo), mas isso afetaria

Johannes de alguma forma. Daí cabe ao Narrador julgar a melhor ação e aos jogadores a

interpretação correta da situação (provavelmente, Johannes entraria em pânico ao ver

Magali usando seus poderes e os outros personagens precisariam acalmá-lo).

Percebamos que a utilização de um jogo não-adaptado, um RPG comercial, num

contexto educacional é possível mas passível de complicações desnecessárias. Se tomarmos

a ficha de personagem de Dungeons & Dragons como exemplo para aplicar um jogo como

Perdidos na Selva, não teria sentido o preenchimento de campos como Iniciativa, Classe de

Armadura, Chances de falha arcana, dentre outros.

Abaixo, destacamos três momentos do jogo Perdidos na Selva que demonstram a

utilização das características das personagens, comprovando que o uso de uma ficha

complexa seria só um capricho cujo único propósito e função é por o jogo acima da

necessidade pedagógica.

MOMENTO 1: Enquanto todos tentam descobrir onde estão, João Spectro ouve uma voz

com muita interferência, dizendo: “João, João, está me ouvindo? Vocês foram

teletransportados e, pelo visto, com sucesso. Estão todos vivos? Inteiros? Ótimo, mas,.....

onde vocês estão? É o Lorde Nathan se comunicando. O transmissor, então foi colocado

em João Spectro. É importante dizer que somente ele ouve alguma coisa e os outros só

ficam sabendo do fato de ele decidir contar. Se ele começar a falar sozinho, faça um teste

de pânico com Johannes, que achará que é algo sobrenatural, com dificuldade 8 (tem que

tirar 8 ou menos em 2 dados). Se ele surtar, baterá no mais próximo, causasndo [sic]

desmaio e perda de 2 PV (pontos de vida). Para ele parar, teste de força de vontade com

dificuldade 6, ou alguma boa idéia do grupo (música tocada por André, ou algo assim),

senão, porrada em outro, e assim por diante.

MOMENTO 2: Logo após, onde quer que os personagens estejam, faça Magali fazer um

teste de Sentir Perigo e detectar uma presença estranha do lado direito do grupo.

Enquanto os personagens pensam no que vão fazer, chega perto deles um grupo de uns 20

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homens negros muito altos e magros, vestidos com roupas de pele de animais, e um

comportamento um tanto agressivo.

Soluções violentas irão causar reação dos nativos, que provavelmente causarão danos ao

grupo. A melhor forma de resolução, aqui, é uma conversa, aproveitando o poder de André

e a lábia de Spectro.

MOMENTO 3: Mais meia hora de caminhada e um personagem – menos Magali – recebe

um golpe vindo de lugar nenhum. É o Mountain Yeti, que vai golpeando os personagens

que desmaiam e perdem 2 PV. Dê-lhes tempo para pensar, se não conseguirem, faça

Gloria pensar na solução : Magali faz chover e transforma o chão em lama, dando para

ver as pegadas do Yeti, ou faz nevar, com o mesmo efeito. Daí, uma paulada, pedrada, luta,

ou sei-lá-o-que fere o danado. (RIYIS, 2004, pp.59-64)

Os trechos acima põem as características e habilidades dos personagens em ação: o

medo de Johannes, a habilidade com línguas de André, os poderes sobrenaturais de Magali.

Analisando a ficha de personagens simplificadas, podemos ver que praticamente todas as

características são usadas ou o jogo permite a utilização das mesmas.29 Mais uma vez, é

visível que fichas complexas em Jogos de Representação pedagógicos podem ser utilizadas,

mas não são absolutamente necessárias para que o jogo aconteça com qualidade, diversão e,

segundo o discurso pedagógico que esses jogos assumem, com caráter educativo.

4.2.1.2. A aventura e sua aplicação

Apresentados aos personagens, os jogadores podem fazer sua escolha (ou os

mesmos podem ser sorteados pelo Narrador) e a aventura tem início. Abaixo, selecionamos

três momentos do jogo que demonstram claramente o teor pedagógico da aventura. Os

trechos em negrito são sugestões feitas pelo autor quanto à ação do Narrador e as possíveis

soluções que os jogadores podem ter.

29 Lembrando que os jogadores são livres para utilizar as habilidades que quiserem numa aventura.

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MOMENTO 1: [...]Quase instantaneamente os personagens caem no sono e, em seguida,

acordam em uma clareira no meio de uma densa floresta, com um calor muito forte e alta

umidade, ruídos de animais e vários insetos – principalmente mosquitos- atacando os

personagens. Restaurar o valor inicial de Pontos de Vida dos personagens. O sol está no

céu, mais ou menos a um ângulo de 45o.

Nesse momento, identificar o sol e fazer uma referência ao horário que estavam no

início, por volta das 4:30 da manhã. Ver o que eles vão fazer, se querem tentar alguma

coisa juntos, separar, etc.

MOMENTO 2: [...] Os personagens devem descobrir o seguinte :

- São +- 9:30 da manhã – dá para saber porque o sol está subindo(basta observar o sol

num intervalo de 10-15 minutos), e num ângulo de aprox. 45o .

- Através do fuso horário, percebe-se que eles estão a leste do Brasil, numa distância

longa.

- Pelo clima quente e úmido, estão numa região tropical, provavelmente na África.

Após descobrirem tudo isso, nova comunicação : “Ótimo, já descobriram que estão em

algum lugar da África, pelo visto do centro para o sul, onde estão as florestas. Consigam

chegar a uma cidade com telefone, que vocês me contatam para eu mandar dinheiro para a

volta de vocês, e zzzzzzzzzzzzzzzz...........”.

A comunicação foi perdida.

MOMENTO 3: [...] Pela direção do sol, os personagens vão seguindo para o norte,

conforme indicado, até que ameaça cair uma tempestade. Nesse meio tempo, Magali sente

seu colar queimando e ouve a voz da sua avó pedindo para ela tomar muito cuidado, pois

passarão pelo cemitério dos elefantes. Novamente temos a questão que somente ela ouve a

voz da avó. Contar ou não aos outros? Se Johannes ouvir, o teste de pânico é com

dificuldade 4.

Após isso, ao entrar no cemitério dos elefantes – Testes de Sexto Sentido mostram que o

local é ali, além do perigo. – e o tempo escurece completamente e todos parecem sentir

tudo girando, enquanto as armas dos personagens que as carregam e o [sic] óculos de

quem o usa parecem queimar. Tudo continua a girar até que eles jogam as armas no chão

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e elas derretem. Vocês percebem que as posições mudaram, mas está escuro, e eles têm

de ir para o norte. Faça Gloria descobrir que seu canivete está imantado, e os

personagens conseguirem montar uma bússola. Num teste mais apurado, Magali

descobrirá uma mensagem de sua bisavó, dizendo “quando estiver difícil, lembre que o

importante é o tempo”. (RIYIS, 2004, pp.59-64)

Estes são os momentos em que os jogadores entram em contato com o conteúdo

desenvolvido no jogo. O início da aventura (que pode ser conferida na íntegra nos Anexos)

deve ser o mais simples possível, dando a possibilidade dos jogadores se conhecerem e

entrarem em contato com o enredo. Como vimos no capítulo anterior, durante a análise das

estruturas de Perdidos na Selva, o início da aventura representa as funções Situação Inicial,

Dano e Carência.

É possível notar que as situações-problema propostas na aventura possuem caráter

de aplicação prática simulada de conhecimentos estudados em sala de aula, principalmente

no que diz respeito à orientação espacial. Os trechos em negrito mostram que os jogadores

devem descobrir o horário e a direção a seguir através da posição do sol.

Aqui abrimos um parêntesis para comparar a aventura pedagógica proposta por

Riyis (2004) com as de outros autores. Martins (2007), em sua dissertação de mestrado,

coloca a aventura O Resgate de “Retirantes”, de Carlos Eduardo Lourenço (2003), em

análise. Segundo ela, o conteúdo pedagógico é mal-trabalhado pois existem, por exemplo,

momentos em que

o texto pretende tratar da “identidade política de Portinari”. O texto é da Cena [sic] é bastante “simétrico”, pois apenas quatro linhas parecem ser suficientes para transmitir quatro informações sobre o pintor: “Filou-se ao PCB em 1945. Foi candidato à Câmara dos Deputados naquele mesmo ano. Em 1947, ao Senado, mas nunca se elegeu. Durante o governo Dutra, exilou-se no Uruguai, fugindo da perseguição aos comunistas”. Como vemos, o texto não tem a preocupação de estabelecer qualquer relação entre esses acontecimentos, mas apenas os apresenta “mecanicamente”. (MARTINS, 2007, p.112. Grifo nosso)

Lourenço, em sua aventura, coloca as informações que seriam o foco do jogo como

pano de fundo para aventura, apresentando-as de forma desconexa e arbitrária (a

informação pela informação). Este é um bom exemplo da aplicação pedagógica feita por

um RPGista Educador: o jogo se tornou mais importante que o caráter pedagógico da

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aventura. Preferiu-se focar nas ações investigativas dos personagens em torno do roubo de

uma das telas de Portinari (enredo da aventura) do que se dedicar ao estudo do pintor, sua

obra, sua linguagem e sua relação com a sociedade. O jogo deixou de ser didático para se

tornar uma brincadeira de pega-pega que poderia muito bem ser realizada fora do âmbito

educacional sem que Portinari se tornasse uma desculpa para que o jogo acontecesse.

Por outro lado, a aventura Perdidos na Selva traz as situações pedagógicas para o

contexto do jogo, permitindo aos jogadores uma aplicação prática dos conhecimentos já

tratados em sala de aula pelo professor. As informações não são jogadas para o aluno, mas

colocadas de forma que o jogador só terá êxito na aventura se relacionar os conteúdos

apreendidos com a situação proposta pelo Narrador.

É perceptível, além disso, que o jogo, apesar do caráter pedagógico, possui ainda os

mesmo elementos que um Jogo de Mesa convencional, puramente lúdico. A função dos

jogadores permanece intacta: a ação do Narrador interpretando personagens secundários,

descrevendo cenários, colocando os personagens em situações-problema e julgando suas

soluções; os demais jogadores interpretando seus personagens de forma coerente, seguindo

as características descritas em ficha de personagem. A mecânica do jogo também segue o

padrão já descrito: narrativa iniciada pelo Narrador dando espaço para a interação dos

jogadores em determinados pontos. Portanto, podemos dizer com certeza que RPG

comercial e RPG pedagógico são o mesmo jogo, diferindo-se apenas em questão de

objetivos. Sistema de regras, assim como num jogo não-pedagógico, pode ou não existir,

ser simplificado ou complexo.

Por fim, comprovamos a utilização da ficha de personagem simplificada pelas

passagens do jogo. Todas as características foram exploradas em determinados momentos

da aventura: a força de Johannes para vencer Mountain Yeti, o poder de Magali para fazer

chover ou sentir perigo, a lábia de Spectro e a habilidade com línguas de André na hora de

conversar com os nativos, a medicina de Glória para curar os feridos, etc. Novamente,

ressaltamos que é necessário ter clareza nos objetivos para a aplicação de um Jogo de

Representação pedagógico. Só assim pode-se simplificar um sistema de regras e otimizar o

tempo de aplicação do jogo numa sala de aula sem prender-se a detalhes que complicariam

tal aplicação.

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4.3. O ESPAÇO DOS LIVE ACTIONS NA EDUCAÇÃO

Segundo a já criticada passagem da dissertação de mestrado de Cristina de Matos

Martins (2007), apenas as Aventuras Solo e os Jogos de Mesa possuem lugar de destaque

no contexto educacional. Novamente, os dados são mascarados pela influência comercial,

pois a autora ignorou toda e qualquer experiência prática já realizada a respeito da

aplicação pedagógica do Live Action. Cito novamente a obra do professor Marcos Tanaka

Riyis (2004), que dedica praticamente um capítulo para descrever alguns dos trabalhos

realizados, sendo muitos deles Live Actions.

De qualquer forma, as experiências práticas em torno do Live Action são isoladas e,

se a aplicação pedagógica dos Jogos de Mesa já traz um certo nível de complexidade, como

vimos acima (simplificar sistemas de jogo, adequar a aventura ao tema e ao tempo de

aplicação, etc.), o Live Action traz em dobro. Segundo nossa própria descrição da

modalidade, o Live Action possui características que dificultam ainda mais a aplicação

pedagógica. Levar um jogo que exige movimento e interpretação cênica, praticamente

teatral, para dentro da escola é trabalhoso.

A seguir, transcrevemos dois exemplos que Riyis relata em seu livro:

ETE Guaracy Silveira Essa é uma escola técnica estadual, portanto, de Ensino Médio e técnico, localizada no bairro de Pinheiros, em São Paulo-SP. O professor Marcos Tanaka leciona Educação Física nessa escola desde 1995. A clientela é formada, basicamente, por jovens de 14-18 anos de classe média baixa das zonas sul e oeste da cidade de São Paulo, e de cidades próximas, como Cotia, Taboão da Serra, Embu e outras. Veja algumas atividades interdisciplinares baseadas em RPG. Jogo da Literatura – 2001: Esse jogo envolve o componente curricular LPLB (Língua Portuguesa e Literatura Brasileira). As equipes têm como missão livrar a princesa “Inculta e Bela” dos encantamentos feitos pelo Tio Sam, que quer, com esse encanto, dominar a nossa língua para dominar toda a cultura, facilitando a invasão do Brasil. Para impedir os planos do Tio Sam, as equipes devem pegar alguns artefatos com alguns escritores de Língua Portuguesa (no caso, com autores estudados pelas classes envolvidas no trabalho, ambas do 1o ano do Ensino Médio), tais como Luís de Camões, Gil Vicente, Machado de Assis, Paio Soares de Taveirós, e outros, não sem antes cumprirem algumas tarefas, tais como: - Com algumas informações simples, descobrir qual é o nome do escritor. - Identificar, entre 4 opções, o texto escrito por esse autor e explicar o porquê. - Recriar um texto com as características do referido autor. Após isso, as equipes devem descobrir que somente através da ajuda mútua a solução do problema é possível. Nesse Live, no que diz respeito aos conteúdos do componente curricular (Literatura de Língua Portuguesa), os alunos tiveram contato com as características principais dos

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escritores, souberam identificar trechos de suas obras e recriaram esses autores, modificando a linguagem, mas preservando suas características essenciais. Esse jogo foi feito por mim e foi aplicado em conjunto com a professora Marisa De Mitri, de LPLB. Jogo da Paz – 2001: Esse jogo foi feito por mim e aplicado em um trabalho conjunto com as professoras Marisa de Mitri, de Língua Portuguesa e Sandra, de Geografia, motivados pelos acontecimentos pós-11 de setembro de 2001. O objetivo desse jogo era mostrar aos alunos dos 1os anos do Ensino Médio alguns conflitos históricos da região do Oriente Médio no século XX, suas origens, causas, motivações e o papel das grandes potências do Ocidente nesses conflitos. Os alunos foram divididos em 6 equipes, sendo 3 equipes chamadas de “pró-americanas”, lideradas pelo personagem Capitão América, e outras 3 chamadas de “anti-americanas”, lideradas pelo personagem Gengis Khan. A missão principal das equipes era promover a paz, através da derrota do líder inimigo (isso era o que eles pensavam). Como em outros jogos, para derrotar o líder inimigo, as equipes deveriam pegar algumas armas com outros personagens não-jogadores, que tinham o seguinte procedimento: 1) Se apresentar, dizendo qual conflito ele representava (por exemplo, Guerra do Golfo, Guerra Irã x Iraque, Guerra do Afeganistão, Conflitos na Faixa de Gaza, e outros). 2) Perguntar para a equipe quais os lados em disputa (por exemplo, na Guerra do Golfo os lados eram Iraque e EUA). 3) Perguntar para a equipe qual lado ela apóia (por exemplo, na Guerra Irã x Iraque, uma equipe pró-americana deveria dizer que ela apóia o Iraque, por exemplo). 4) Pedir para a equipe localizar, em um mapa do Oriente Médio, a região do conflito. 5) Dar uma pequena “aula” sobre o conflito em questão. 6) Perguntar quais as reivindicações do lado apoiado pela equipe nesse conflito. 7) Pedir para a equipe escrever um tratado de paz para a região, apontando os pontos cruciais em sua reivindicação e os pontos em que aceita ceder. Se a equipe tinha sucesso nos 7 itens, podia ganhar uma arma. As equipes, então, percebiam que tinham que juntar as armas das 3 equipes do mesmo “lado” para trocá-las com seu líder por uma entre duas escolhas: uma arma mortal contra o líder inimigo ou metade de algo até então não identificado. Claro que, do lado adversário estava ocorrendo o mesmo e, se algum lado escolhesse a arma mortal, todos perderiam, pois iriam contrariar a missão primordial, que é promover a paz. Ao invés disso, deviam escolher as metades que formariam um elemental30 da paz, ou seja, um manifesto com todos os tratados de paz escritos pelas equipes durante o jogo. Com esse jogo, os conteúdos do componente curricular (Geografia – atualidades, Língua Portuguesa – produção de texto e História – Oriente Médio, além de temas transversais), foram desenvolvidos de maneira excelente, pois os alunos viram os diversos conflitos no Oriente Médio durante o século XX, causas, antecedentes, o papel do Ocidente, produziram textos com posicionamento e textos pela paz. (RIYIS, 2004, pp.41-44)

As experiências de Riyis mostram que, assim como nos Jogos de Mesa, os Live

Actions pedagógicos devem sofrer pequenas modificações que facilitem sua aplicação sem,

no entanto, perder suas características formais ou afetar o conteúdo didático. Dentre essas

modificações, estão a exclusão de personagens interpretados pelos jogadores (que

representam a si mesmos), uma substituição de tarefas de caráter puramente representativo

30 Elemental pode ser tanto uma força da Natureza (elemental do fogo, elemental da água, etc.) como pode ser um “talismã”, brasão ou mandala.

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(como diálogos, debates e interrogatórios) por tarefas práticas (procurar um objeto, escrever

um texto, fazer uma brincadeira) e a não-utilização de indumentárias por parte dos

jogadores (resumindo o uso aos Narradores-juízes e personagens não-jogadores).

Novamente, o objetivo deve estar no caráter pedagógico, não no jogo em si.

4.3.1. Live Action: O Caminho para o Vale Encantado

O Caminho para o Vale Encantado é um Live Action pedagógico de nossa autoria e

foi aplicado em Janeiro de 2008 no Parque da Biquinha, na cidade de Sorocaba, no interior

de São Paulo, com crianças entre 7 e 12 anos de idade. O Parque da Biquinha é conhecido

na região por realizar nos meses de Janeiro e Julho um curso de férias chamado Eco

Biquinha, cujo objetivo é despertar nas crianças e adolescentes a consciência ambiental.

Para tanto, os cursos são constituídos de oficinas de reciclagem, palestras ou micro-aulas,

visitas e estudos do meio, e jogos.

Os jogos são, em sua maioria, realizados nos cinco dias em que o curso acontece,

tendo sua finalização na etapa final do Eco Biquinha, chamada Madrugada Ecológica, onde

os participantes são levados a um sítio numa cidade vizinha e passam a madrugada inteira

participando de um grande jogo.

O Live Action em questão possui sistema simplificado, onde os jogadores não

possuem personagens e devem realizar tarefas práticas que tenham como objetivo questões

ambientais ou a difusão de jogos cooperativos31.

4.3.1.1. A aventura e sua aplicação

Num Live Action convencional, poderíamos fazer uma análise mais detalhada de

cada personagem, suas características e habilidades, e como se comportam no jogo. Como o

Live Action em foco não coloca personagens à disposição dos jogadores, não podemos fazer

uma análise comparativa entre as duas formas de aplicação. Portanto, passemos à análise do

conteúdo pedagógico abordado na aventura.

31 A cooperação é um elemento muito trabalhado nos cursos do Parque da Biquinha e estão diretamente envolvidos nas relações e soluções para questões ambientais.

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A seguinte análise busca descrever o conteúdo pedagógico contido no Live Action O

Caminho para o Vale Encantado. Diferente de Perdidos na Selva, esse jogo não traz o

conteúdo a ser trabalhado inserido textualmente. Esses conteúdos são desenvolvidos dentro

das situações propostas. Para ilustrar melhor o funcionamento, daremos um exemplo:

MINI-JOGO – MAPA DA SABEDORIA OBJETIVO: Cada grupo deve encontrar seu Mapa da Sabedoria. COMO: Cada grupo recebe uma pista relacionada a seu nome (uma lata para os Aluminosos, uma pet para os Plastitânicos, etc). Eles, então, devem encontrar o local certo para depositar essas pistas (os latões de reciclagem, que estarão espalhados em locais diversos do parque). Lá, os grupos encontrarão uma pista que os levará até um local específico do parque (ex: a biblioteca, a bica, o playground, etc). Nesse local estará escondido o Mapa da Sabedoria da respectiva equipe. Durante todos os jogos, os grupos receberão Conhecimentos que devem ser colados nesses mapas. No final, os mapas se revelarão as páginas do Livro Verde. PERSONAGENS: Florestan, o sábio + monitores das equipes. MATERIAL: 4 Mapas da Sabedoria (um para cada equipe, na respectiva cor, etc. Deve ser feito num material mais resistente e duro); 1 lata de refrigerante, 1 garrafa pet, 1 garrafa de vidro (muito cuidado!!!) e 1 placa de papelão; 4 pistas de referência (uma para cada equipe/local do parque)

A etapa acima mostra uma das missões que os jogadores recebem durante o jogo.

Essa ficha com instruções fica em poder dos Narradores-juízes (que, preferencialmente,

devem decorá-la) e contém as instruções sobre a missão em desenvolvimento. As missões

de O Caminho para o Vale Encantado possuem claro teor pedagógico e estão diretamente

relacionadas ao tema proposto (no caso, lixo e reciclagem). No exemplo, vemos uma

missão que coloca em prática o conhecimento previamente adquirido sobre as latas de lixo

reciclável: cada tipo de lixo possui seu lugar e uma cor de padrão internacional que o

identifica (amarelo para o alumínio, verde para o vidro, azul para o papel e vermelho para o

plástico). Para conduzir a aplicação desse conhecimento, a missão recorreu a elementos

Figura 2 – Ficha de jogo de O Caminho para o Vale Encantado

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lúdicos, adotando um aspecto de caça ao tesouro, com enigmas que levam os jogadores a

diversos pontos do ambiente em que a atividade se realiza.

Assim como observamos nos aspectos pedagógicos dos Jogos de Mesa, o conteúdo

trabalhado no Live Action não pode ser uma desculpa para a realização do jogo. O

importante na missão ilustrativa é colocar os jogadores em contato com o conhecimento a

respeito de reciclagem e os latões de lixo, para isso, utilizou-se o jogo. É o jogo em função

do conhecimento, não o contrário (como vimos no exemplo de Resgate de “Retirantes”).

Importante dizer que a missão usada no exemplo é a primeira que os jogadores

recebem, por isso seu baixo grau de dificuldade. Nesse Live Action procurou-se

desenvolver conhecimentos a respeito de lixo, reciclagem, consciência ambiental e

cooperativismo. Esses temas foram abordados pouco-a-pouco no decorrer do jogo, que foi

ficando gradualmente mais complexo. Abaixo, podemos ver um exemplo de uma das

últimas missões do jogo:

3. O IRMÃO DE ESFINGE – TIPO MÁQUINA DO TEMPO X VÍRUS

OBJETIVO: Mandar a Múmia de volta para seu tempo. COMO: Jogadores devem conseguir os ingredientes da poção mágica que abrirá o portal do tempo. Para isso, devem passar nas estações. Mas existe um detalhe: as equipes devem se mesclar, dividindo-se através das classes (as baratas do Azul se juntam com as do verde, etc). Cumpridas as tarefas, eles conseguem os ingredientes: tintas nas seguintes cores – vermelho, azul, amarelo e preto (o controlador terá a tinta branca). Mas, para ativar o portal, será necessário 10 cores diferentes (não vale tonalidade: azul claro, azul escuro, etc) FINAL: Cumprida a tarefa, os grupos recebem a Luneta Dourada e os VIDRÚNICOS ganham as Runas Mágicas (código para desvendar as Palavras Cabalísticas). PERSONAGENS: Faraó, 4 Eunucos + controladores de jogo. MATERIAL: Potes de tinta azul, amarela, vermelha, branca e preta; local para por as 10 cores (um amuleto que possa ser pintado, um círculo mágico, etc), Luneta Dourada, Runas Mágicas e 4 Cartas-código.

Esse segundo exemplo mostra o avanço no grau de dificuldade contido no jogo.

Alguns conceitos, como o de cooperação e os relacionados à questão do lixo, já foram

Figura 3 - Ficha de jogo de O Caminho para o Vale Encantado

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trabalhados no Live Action. A missão em questão põe em prova tudo que os jogadores

viram na semana em que o jogo se realizou: as tarefas só podem ser cumpridas mediante a

união de todos os grupos e retomam os conhecimentos que foram transmitidos no decorrer

do curso.

O Live Action, então, apesar de possuir modificações que facilitem sua aplicação

num contexto educacional, ainda mantém características primordiais que o legitimam

enquanto Jogo de Representação: o jogo coletivo, a presença de Narrador, Narradores-

juízes e jogadores, a interpretação cênica de uma história, a estrutura flutuante que só se

constitui com a intervenção dos jogadores.

Da mesma forma que o Jogo de Mesa, o Live Action pedagógico deve facilitar o

desenvolvimento de conteúdos, mas também de competências e habilidades. O conteúdo a

ser trabalhado não deve ser tratado como pano de fundo para que a aventura aconteça, mas

deve instigar nos jogadores o questionamento, a busca por soluções e colocá-los em

vivência, de forma prática, estabelecendo, dessa forma, relações interdisciplinares, que

permeiam fora do ambiente escolar.

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CAPÍTULO V – CRIAÇÃO DE MUNDOS FANTÁSTICOS 5.1. GÊNESE: O TUTORIAL DOS MUNDOS FANTÁSTICOS

Dedicamos esse último capítulo ao estudo da criação ficcional em Jogos de

Representação. Tendo colocado em análise as estruturas narrativas e observado de que

forma elas se comportam quando aplicadas aos jogos, concluímos que, estruturalmente, os

jogos não podem ser analisados fora de sua esfera de atuação. O que obtivemos, portanto, é

uma análise estrutural do enredo pressupondo a ação dos jogadores que, como se sabe,

interferem diretamente na organização estrutural e na linearidade das aventuras de Jogos de

Representação.

Com isso em mente, decidimos analisar o mesmo corpus utilizado nos capítulos

anteriores a partir de material distribuído em um encontro sobre Literatura Fantástica: o

FANTASTICON. O evento ocorreu em Julho de 2008, em ocasião do Encontro

Internacional de RPG, realizado no colégio Arquidiocesano, em São Paulo.

A palestra em que o material foi distribuído discutia a criação de mundos fantásticos

dentro de Jogos de Representação. Os comunicadores se guiaram pelo material, explicando-

o passo-a-passo, descrevendo cada tópico e de que forma aquilo poderia ajudar na criação

ficcional – principalmente entre escritores iniciantes ou jogadores de Jogos de

Representação.

Obviamente, o material não deve ser tido como um manual de criação literária, mas

um facilitador, um guia ao qual o escritor pode recorrer para deixar sua narrativa mais clara

e estruturada.

Em nota de rodapé, o material distribuído adverte:

Esse material foi desenvolvido pelos autores com o intuito de servir como um guia para a criação de mundos fantásticos, não sendo considerado como material didático ou completo para esse conhecimento, sendo necessário o conhecimento prévio do uso de seu conteúdo por parte de seus utilizadores. (CELLI e DIEGUES, s/d)

Tal material é mostrado na seqüência:

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Figura 4 – Gênese: material distribuído no FANTASTICON 2008

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Transcreveremos os tópicos constituintes de Gênese para melhor visualização e posterior análise do corpus.

a. Planejamento:

Qual o direcionamento do mundo a ser criado?

- Fantasia

- Ficção científica

b. O Universo Físico:

Como é a configuração do universo onde ele está?

- Baseado no nosso

- Com regras e leis físicas próprias

Quais as principais características desse universo?

- Astros centrais. Quantos?

- Estrelas e corpos celestes

- Outros planetas. Destes quantos são conhecidos em seu mundo, quantos são

visíveis a partir de seu mundo e quantos possuem uma órbita definida?

c. Geografia do mundo

Quais são as principais características do seu mundo?

- Possui movimento de rotação

- Possui movimento de translação

- Possui satélite natural. Quantos?

- Seu eixo possui inclinação

- Ocorrem atividades sísmicas

- O ambiente possui componentes tóxicos

- Existe mais de uma realidade paralela

- Existe mais de um plano concomitante

Como se deu o surgimento físico de seu mundo?

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Quais os principais relevos existentes?

- Montanhas

- Tundras

- Florestas

- Campos

- Desertos

- Savanas

- Pântanos

- Cordilheiras

- Mares

- Geleiras

- Planícies

- Mangues

Quais os principais climas distribuídos?

- Glacial

- Equatorial

- Temperado

- Desértico

- Tropical

- Desértico gelado

d. População:

Como a vida surgiu em seu mundo?

- Evolução

- Magia

- Colonização

Os habitantes do seu mundo:

- Encontram-se em início de evolução

- Encontram-se em evolução avançada

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- Possuem conceitos de misticismo

- Possuem crenças e/ou religiões. Quantas?

- Existem raças distintas. Quantas?

e. Sócio-política:

Nos conceitos sócio-políticos de seu mundo, existem:

- Conceitos de classes e/ou castas

- Diferenças de costumes e modo de vida

- Regiões com governos. Quais regimes e diferenças?

A estrutura social possui valores a respeito de:

- Família

- Atividade

- Faixa etária

- Sexo

- Riqueza

- Conhecimento

Nos conceitos econômicos de seu mundo, existem:

- Acordos e comércio baseado em escambo

- Acordos de subserviência trabalhista

- Materiais com função monetária. Comuns a algumas regiões e/ou raças, todo

o seu mundo ou todo o universo?

f. Ciência e desenvolvimento:

Que conhecimentos existem em seu mundo:

- Tecnologia

- Física

- Química

- Magia

- Astro-física

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- Extra-sensoriais

Como o conhecimento é transmitido:

- Não é, fica condicionado apenas a vivência

- É transmitido pessoalmente pelos habitantes

- Por instituições de ensino específicas

- De forma dirigida desde o nascimento

Existe algum habitante de destaque na história?

Existe algum evento de destaque na história?

Quais conceitos e práticas são comuns aos habitantes:

- Linguagem

- Ciência

- Desenvolvimento

- Físico

- Religião

- Magia

- Origem

- Sensoriais

- Locomoção

- Comunicação

- Essência

- Belicosidade

- Aparência

- Política

- Comércio

- Alimentação

- Vestuário

- Sexualidade

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Tendo apresentado o conteúdo do material distribuído no FANTASTICON,

passaremos a análise dos Jogos de Representação Perdidos na Selva e O Caminho para o

Vale Encantado a partir dos tópicos levantados por Celli e Diegues (s/d), comprovando a

possibilidade de aplicação do material na criação de mundos fantásticos em Jogos de

Representação.

5.2. OS MUNDOS CRIADOS EM JOGOS DE REPRESENTAÇÃO

Para essa análise, compararemos os elementos apresentados pelos jogos Perdidos na

Selva e O Caminho para o Vale Encantado com as propostas descritas na Gênese de Celli e

Diegues, verificando, dessa forma, se o material pode ser aplicado em um mundo ou

aventura já criados ou se, ao contrário, funciona apenas como ponto de partida.

5.2.1. Análise de Mundos criados

a. Sobre Planejamento e o Universo Físico:

Perdidos na Selva é uma narrativa de ficção científica com elementos de fantasia,

baseada em nosso mundo real. Nos apresenta uma narrativa verossímil, onde o único

elemento extraído diretamente das narrativas de ficção científica é a máquina de

teletransporte ainda em fase de testes, além do monstro Mountain Yeti, uma figura que é

claramente inspirada nos mitos e em folclore de certas regiões do mundo e que permeiam

no conhecimento popular. Já O Caminho para o Vale Encantado pode ser considerada uma

narrativa de Fantasia, apresentando um mundo regido por magia (Florestan e Esfinge são

magos, além do antagonista Velho Ferro), onde animais falantes (Ratos, Urubus, Moscas e

Baratas) convivem com piratas, ladrões, faraós e agentes secretos.

b. Sobre a Geografia do mundo:

O Jogo de Mesa em análise foi elaborado, coincidentemente, para ser aplicado em

aulas de geografia. Sendo assim, dedicou-se um tempo à descrição de relevo, clima e

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vegetação da história. A aventura, por se passar num mundo semelhante ao nosso, descreve

esses elementos geográficos como sendo cópias fiéis do que encontramos na realidade:

[...] acordam em uma clareira no meio de uma densa floresta, com um calor muito forte e

alta umidade, ruídos de animais e vários insetos – principalmente mosquitos- atacando os

personagens. (RIYIS, 2004, p.60)

O Live Action, no entanto, não nos apresenta elementos geográficos exatos. Sabe-se

apenas que eles seguem o direcionamento da Fantasia: o Vale Encantado, por exemplo, é

uma terra lacrada por um portal mágico. Nela, constatamos a presença de alguns pontos de

referência, como a Guilda dos Ladrões (“Isto aqui é a assinatura de outro homem que não

vale absolutamente nada...ou menos que nada. Seu nome é Scarface! Ele é líder de um

grupo de criminosos conhecido como ‘A Guilda dos Ladrões’.”), o Covil dos Corsários

(“Certo! Vocês deverão procurar o esconderijo dos Corsários. Felizmente, dessa vez eu

poderei acompanhá-los até lá, mas não poderei entrar. Não sou uma pessoa bem-vinda

ali.”), a Ilha da Caveira (“Aliás...pensei melhor! Vamos leva-los até a Ilha da Caveira! Não

existe possibilidade de eles fugirem de lá!”) e a Tumba do Faraó (“Façamos o seguinte: me

tragam a Luneta Dourada, um artefato preciosíssimo que está nas mãos do Faraó! Se o

fizerem, eu entrego o Olho do Dragão! Feito? Então, peguem a SENHA para entrar na

Tumba do Faraó!”). Nenhuma delas possui descrição, só referências ao nome.

c. Sobre a População:

Novamente, sendo Perdidos na Selva uma aventura ambientada em um mundo

similar ao nosso, podemos inferir que a vida surgiu por meio de evolução e, no momento

em que a aventura se desenrola, pode-se dizer que os habitantes encontram-se num patamar

avançado de evolução. Personagens como Magali demonstram que existem conceitos de

misticismo, além de crenças e religiões:

Pela direção do sol, os personagens vão seguindo para o norte, conforme indicado, até que

ameaça cair uma tempestade. Nesse meio tempo, Magali sente seu colar queimando e ouve

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a voz da sua avó pedindo para ela tomar muito cuidado, pois passarão pelo cemitério dos

elefantes. (RIYIS, 2004, p.62)

Também é possível identificar a distinção entre etnias:

Enquanto os personagens pensam no que vão fazer, chega perto deles um grupo de uns 20

homens negros muito altos e magros, vestidos com roupas de pele de animais, e um

comportamento um tanto agressivo. (RIYIS, 2004, p.61)

O Caminho para o Vale Encantado não deixa nada explícito em relação ao

surgimento da vida ou sobre os habitantes do mundo. Pode-se dizer que, tendo humanos e

animais convivendo como raças sapientes, a vida surgiu através de magia. De qualquer

forma, existe uma variação muito grande entre os grupos apresentados: sabemos que

Baratas, Moscas, Urubus e Ratos possuem uma conduta claramente capitalista, ao passo

que Corsários, Ladrões e Faraós parecem viver em sociedades primitivas.

No entanto, fica clara a presença de raças distintas no Live Action: humanos (magos,

corsários, ladrões), baratas, moscas, ratos e urubus.

d. Sobre as questões Sócio-políticas:

No que diz respeito às questões sócio-políticas, podemos dizer que Perdidos na

Selva possui relações semelhantes às do mundo real: sociedade dividida em classes

econômicas, sendo que Spectro e Magali, pela descrição, aparecem como representantes

das classes menos favorecidas:

João Spectro: 20 anos, pequeno, magrinho e fraco. Passou muita necessidade quando

pequeno, e chegou a cometer pequenos furtos. Muito veloz e tem a “inteligência das ruas”,

o que faz com que descubra problemas mais facilmente que os outros, além de uma

excelente lábia. Carrega um pequeno revólver .32 com 5 balas. Tem pouca auto-estima,

estudou somente até a 5a série e tem muito medo de passar fome. Tem 11 pontos de vida.

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Magali: 21 anos, muito bonita. Trabalhadora e pobre, bisneta de escravos, tem o que se

chama de “sexto sentido”. (RIYIS, 2004, p.58)

De qualquer forma, o jogo em análise não nos dá dados suficientes para melhor

descrever como se dão as relações de costume, modo de vida e governo, nem como

funcionam as relações de hierarquia dentro da sociedade. No entanto, a passagem que põe

os personagens em contato com alguns nativos africanos indica a presença de um chefe, o

que pode significar uma possível organização tribal.

Se optarem por isso, um teste de línguas a cada frase falada (não é necessário testar para

ouvir) indicará que o chefe deles quer um revólver para dizer onde há uma cidade. Se os

personagens derem, e tiver balas, o chefe irá atirar em qualquer direção. (RIYIS, 2004,

p.62)

Por último, as questões econômicas retratadas demonstram uma sociedade

capitalista: a recompensa de cem mil reais oferecida por Lorde Nathan é o elemento que

dará movimento à aventura.

Se ninguém quiser tocar a campainha, faça-os bater na porta, pois, afinal de contas, todos

querem por a mão em 100 mil reais. (RIYIS, 2004, p.59)

As estruturas sociais, políticas e econômicas de O Caminho para o Vale Encantado

não são colocadas em evidência, textualmente falando, mas é perceptível a existência de

certos costumes, principalmente em torno da economia, onde vemos, por exemplo, uma

ação de troca similar aos acordos baseados em escambo: “Então está combinado! Tragam O

Olho do Dragão e eu lhes entregarei o tal Pó Mágico!”. Também detectamos a presença de

posições hierárquicas bem definidas: o líder dos Ladrões, o chefe dos Corsários, o Faraó,

em posição mais elevada, em oposição a seus subordinados, ladrões, piratas e eunucos.

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e. Sobre Ciência e Desenvolvimento:

O Jogo de Mesa em análise nos apresenta um mundo plenamente desenvolvido em

áreas tecnológicas e místicas: a máquina de teletransporte é um exemplo de

desenvolvimento na área de Física, enquanto que os poderes paranormais de Magali e a

presença de criaturas como Mountain Yeti representam desenvolvimento em áreas místicas

e extra-sensoriais.

Por ser a aventura parte integrante de um universo maior – e que não está em análise

– não podemos por em questão a existência de um personagem ou evento que tenha

destaque na história do mundo onde a aventura se desenrola. De qualquer forma, fica

evidente que alguns conceitos e práticas são comuns neste cenário. É possível identificar,

por exemplo, a pluralidade de elementos culturais, como costumes e língua:

A melhor forma de resolução, aqui, é uma conversa, aproveitando o poder de André e a

lábia de Spectro. Se optarem por isso, um teste de línguas a cada frase falada (não é

necessário testar para ouvir) indicará que o chefe deles quer um revólver para dizer onde

há uma cidade. (RIYIS, 2004, pp.61-62)

O Live Action apresenta elementos de magia e habilidades extra-sensoriais:

Florestan, Esfinge e Velho Ferro são apresentados como possuidores de poderes mágicos.

VELHO FERRO – Bravo! Bravo! Mas não pensem que as coisas serão tão fáceis, daqui

por diante! Lembrem-se que meu poder cresce cada dia mais!

FLORESTAN – Você está errado, Velho... (Velho Ferro faz um passe de mágica e congela

Florestan)

Além disso, sendo O Caminho para o Vale Encantado uma aventura inserida num

universo próprio, finito, podemos identificar os eventos históricos e os personagens de

destaque para a construção dos acontecimentos da aventura. A seguinte passagem ilustra

tais elementos:

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Há muitos anos um enorme lixão foi instalado no que um dia fora um belo parque, e ali as

mais diversas criaturas – ratos, moscas, baratas e urubus – encontraram seu lar. Mas o

lixão começou a extrapolar seu limite, invadindo as vilas, as cidades...tomando conta do

mundo. Tudo isso por causa das ações de um homem: o Velho Ferro! Um grande industrial

que fabrica pouca coisa, mas produz muito lixo! Todo lixo que ele produz em suas

indústrias, ele joga pela janela, direto no lixão, sem nem olhar. Seu esgoto vai direto para

os rios e córregos nas proximidades, sem nenhum tratamento. O lixo adquiriu tamanha

força que quase atingiu a última floresta do mundo: o Vale Encantado. Se essa floresta

desaparecer, também, embaixo de tanto lixo, não existirão mais plantas, nem animais

(exceto aqueles que vivem no lixo, é claro). E ninguém quer isso, quer?

Pois, ao saber da enorme produção de lixo, o grande mago conhecido como Florestan, o

Sábio decidiu pedir ajuda aos seus amigos – os Recicladores de Idéias – para que

convencessem aqueles que vivem no lixo a buscar uma vida melhor. Eles precisam

encontrar o único artefato capaz de devolver a humanidade do Velho Ferro: o Livro

Verde!

Mas o Livro Verde está escondido no Vale Encantado, e os jogadores devem primeiro

encontrar o caminho para a última floresta do mundo a fim de acabar de uma vez com a

proliferação do lixo.

Acima, identificamos o evento histórico central que move a aventura (“um enorme

lixão foi instalado no que um dia fora um belo parque [...] Mas o lixão começou a

extrapolar seu limite, invadindo as vilas, as cidades...tomando conta do mundo.”) e os

personagens de destaque nessa história: um antagonista (“Tudo isso por causa das ações de

um homem: o Velho Ferro! Um grande industrial que fabrica pouca coisa, mas produz

muito lixo!) e um herói (“Pois, ao saber da enorme produção de lixo, o grande mago

conhecido como Florestan, o Sábio decidiu pedir ajuda aos seus amigos”).

5.3. PANORAMA GERAL

Para encerrar este capítulo destinado à análise dos mundos criados segundo a

Gênese de Celli e Diegues (s/d), podemos concluir que mundos já criados não são passiveis

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de uma análise total a partir do material indicado. Gênese, como os autores informam, é um

guia para a construção de mundos fantásticos, não uma base de análise. Sendo assim,

quando os mundos criados são postos em relação com os tópicos levantados por Celli e

Diegues, o que temos é apenas uma equivalência parcial entre o corpus e o instrumento de

análise.

A análise do cenário criado tanto no Jogo de Mesa quanto no Live Action mostrou

que determinados elementos constituintes dessas narrativas obedecem às propostas de

Gênese. No entanto, é visível que a tentativa de aplicar um mundo já criado a um material

que se comporta como guia de construção soa falsa: o guia, por ter um caráter instrutivo e

por ser dirigido a escritores iniciantes, possui aspectos generalizados ou extremamente

simples, focados principalmente nas características físicas do mundo a ser criado (relevo,

clima, etc) ou nas características sócio-políticas. As características situacionais (história,

personagens importantes) foram rebaixados a um segundo plano, sendo concedido a elas

um espaço quase inexistente no material.

Isso comprova que o guia Celli e Diegues (s/d) é um instrumento de análise

insuficiente para estudar a criação ficcional em sua totalidade, pois um mundo ficcional só

se constrói a partir de situações e acontecimentos (uma guerra – como é mostrado no

universo em que Perdidos na Selva está inserido32 – ou um problema ambiental – como em

O Caminho para o Vale Encantado). Elementos físicos são apenas complementos capazes

de enriquecer e completar a história, mas não de conduzir uma narrativa.

32 Perdidos na Selva é uma aventura introdutória para o universo Brasil.org, de Marcos Tanaka Riyis. Nesse cenário, somos apresentados a um conflito ideológico entre Sociais (Socialistas) e Davos (Capitalistas) que dizimou parte do mundo, modificando totalmente o Brasil, em termos políticos, econômicos e culturais.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nossa Jornada chega ao fim.

Segundo Campbell (2007):

O círculo completo, a norma do monomito, requer que o herói inicie agora o trabalho de trazer os símbolos da sabedoria, o Velocino de Ouro, ou a princesa adormecida, de volta ao reino humano, onde a bênção alcançada pode servir à renovação da comunidade, da nação, do planeta ou dos dez mil mundos. (CAMPBELL, 2007, p.195)

Agora, no fim de tudo, podemos olhar para trás e ter consciência de tudo que

passamos. O trabalho que apresentamos, com o passar do tempo, adquiriu a forma de uma

grande Aventura, uma Jornada em busca de conhecimento. Nossa missão se dividiu em

quatro etapas distintas:

1. Legitimar os Jogos de Representação no meio acadêmico:

Tornou-se nosso Chamado à Aventura. Foi necessário buscar em material teórico

referências que pudessem sustentar nossos argumentos, permitindo que elaborássemos uma

definição precisa, que fugisse ao status de verdade absoluta que, até então, tomava conta

dos Jogos de Representação. Percebemos, nessa etapa, a carência em torno de documentos

de cunho científico que corroborassem com a idéia de uma definição oficial. Mesmo assim,

ao destacarmos definições não-oficiais utilizadas por diversos autores em contextos

variados – em sistemas, livros-jogo, trabalhos acadêmicos – foi possível identificar

elementos descritivos recorrentes que, quando colocados num mesmo contexto, permitiram

a elaboração de uma definição ideal que, pretendemos, se legitime como sendo oficial:

Jogos de Representação são Jogos Cooperativos de Criar e Contar Histórias.

Também ficou evidente, ao descrevermos as modalidades mais comuns de Jogos de

Representação, que pesquisadores da área privilegiam as categorias Jogo de Mesa e

Aventura Solo. Dessa forma, notou-se uma saturação de objeto de estudos no setor

acadêmico. Mediante esse cenário, optamos por colocar a modalidade Live Action em foco,

atentando para suas definições e para a análise de suas estruturas formais.

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Com isso, notamos que seria de interesse dissecar o enredo, a aplicação dos Jogos

de Representação e os processos criacionais que os cercam.

2. Analisar os enredos de Jogos de Representação:

Quando optamos por analisar os enredos de Jogos de Representação, percebemos

que havia necessidade de uma teoria literária que não prejudicasse as características

primordiais do jogo em questão. Os Jogos de Representação possuem estrutura flutuante,

mutável graças à intervenção do jogador. Nessa etapa de trabalho, encontramos nosso

Mentor: as teorias narratológicas.

A análise dos jogos – um Jogo de Mesa (Perdidos na Selva) e um Live Action (O

Caminho para o Vale Encantado) – a partir das teorias de Morfologia do Conto

Maravilhoso33 e Jornada do Herói Mitológico34, demonstrou que, apesar do enredo de

ambos os jogos se adequar perfeitamente às estruturas propostas, o elemento lúdico – que

pressupõe a desconstrução da linearidade da narrativa por parte dos jogadores – se perde

quando tentamos descrever as etapas do jogo. Isso acontece porque, enquanto

pesquisadores, precisamos de um objeto fixo para estudar. Sendo o jogo um objeto em

constante transformação que só mantém suas características básicas no momento de

realização35, a única forma de transformá-lo em material passível de análise é quando

transcrevemos sua estrutura em conjunto com a ação dos jogadores (e para isso seria

necessário o registro da atividade em vídeo ou áudio, o que não ocorreu) ou, caso essa

condição não possa ser executada, simularmos a ação de um possível jogador. O artifício

demonstrou ser falho, pois segue a lógica determinada pelo enredo e não a lógica

determinada pela criatividade que apenas um jogador real possui.

Apesar disso, a análise dos enredos mostrou que as aventuras de Jogos de

Representação, tanto em Jogos de Mesa como em Live Actions, seguem as teorias propostas

por Propp (1984) e Campbell (2007), o que nos permite dizer que esse tipo de narrativa está

em sintonia com os contos maravilhosos ou com os mitos. Dessa forma, é possível afirmar

que as aventuras criadas para Jogos de Representação baseiam-se, consciente ou

inconscientemente, em estruturas tradicionais.

33 PROPP, 1984. 34 CAMPBELL, 2007. 35 Jogo só funciona enquanto jogo e pelo jogo.

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3. Analisar a aplicação e as possibilidades pedagógicas de Jogos de Representação:

Essa etapa foi caracterizada pelo teor prático. Foi nossa Provação Suprema. O jogo

O Caminho para o Vale Encantado foi aplicado com crianças entre 7 e 12 anos de idade.

Durante a aplicação, comprovamos a potencialidade do jogo dentro do ambiente

educacional e a necessidade inerente que o jogo tem de interação para que funcione

plenamente.

A aplicação no parque permitiu às crianças entrar em contato com um conteúdo que,

até então, só tinham acesso de forma teórica – através de aulas expositivas, palestras, livros

didáticos ou por mídia televisiva. Quando inseridas no jogo, puderam experimentar de

forma prática ações sociais, como consciência ambiental (reciclagem de materiais) e

cooperativismo. Dessa forma, foi permitido aos jovens estabelecer relações entre o

conteúdo visto numa aula teórica com sua aplicação na vida real, mesmo que colocada num

contexto de fantasia. Dentre os conteúdos que nos propusemos trabalhar, o de cooperação

mostrou-se extremamente eficaz. A comprovação se deu quando um dos participantes, um

menino de 7 anos de idade, disse: “não importa quem venceu ou perdeu. O importante é

que todos brincaram e foram importantes”.

Ao trazer o jogo educativo para a análise, notamos que, apesar da divergência de

opiniões entre profissionais de educação que utilizam o jogo em sala de aula, os Jogos de

Representação não sofrem alterações em sua constituição formal quando alocados em

contexto escolar, mantendo-se fiéis ao seu caráter lúdico.

4. Estudar os processos de criação de cenários de Jogos de Representação:

Por fim, com o Objeto de busca em mãos, decidimos iniciar a jornada de volta. A

última etapa desse trabalho colocou os Jogos de Representação em análise a partir de um

guia de criação de mundos fantásticos: a Gênese de Celli e Diegues (s/d).

Esse estudo demonstrou que, apesar de adequar-se a diversos tópicos do guia, os

Jogos de Representação que já possuem mundos criados não são passíveis de análise total

ou mais aprofundada tendo a Gênese como ponto de partida. O material distribuído em

palestra sobre criação literária provou ser um “ponto de partida” para escritores e autores de

Jogos de Representação iniciantes, oferecendo elementos facilitadores para a elaboração de

uma narrativa – seja ela pertencente ao âmbito do jogo ou não.

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Agora que retornamos ao nosso Mundo Comum, podemos concluir, de forma

resumida, dizendo que os Jogos de Representação, a partir de agora, podem assumir uma

definição oficial embasada em referenciais teóricos.

Ao colocar o Live Action em evidência, percebemos que, apesar da mecânica

ligeiramente diferenciada, sua estrutura formal continua idêntica à modalidade Jogo de

Mesa, diferenciado-se apenas no aspecto visual – cenário, figurino, maquiagem, objetos de

cena – e na forma que o jogo se desenvolve – interpretado dramaticamente, não oralmente.

A análise de enredo de Jogos de Representação provou que, fora de sua esfera de

ação, o jogo não se realiza e, sendo assim, não admite análise enquanto jogo. No entanto, a

análise do enredo, segundo teorias narratológicas, demonstrou forte influência de estruturas

épicas ou maravilhosas. A criação de mundos ficcionais em Jogos de Representação

também sugere a presença de jogadores no processo. Isso fica evidente ao compararmos as

propostas de Celli e Diegues (s/d) com nosso corpus, pois a criação sugerida pelos autores

gira em torno de elementos físicos, e não situacionais. Logo, o material distribuído por eles

permite ao autor elaborar um cenário rico em elementos mas vazio em conteúdo. É

necessário, portanto, a intervenção do jogador para dar vida e movimento ao cenário criado

pelo narrador.

Com isso em mente, podemos afirmar, sem medo, que trouxemos conosco o Elixir

capaz de restaurar os Danos causados.

A nossa aventura termina aqui, mas é importante ficar atento: o Coelho Branco está

sempre atrasado e pronto para nos conduzir rumo ao desconhecido.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Ficha de personagem de Dungeons & Dragons

Figura 2 – Ficha de jogo de O Caminho para o Vale Encantado

Figura 3 – Ficha de jogo de O Caminho para o Vale Encantado

Figura 4 – Gênese: material distribuído no FANTASTICON 2008

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MÍDIA TELEVISIVA OU CINEMATOGRÁFICA

A História sem fim. Wolfgang PETERSEN, Warner Bros., 1984.

Alice no país das maravilhas. Walt DISNEY, EUA, Walt Disney, s/d.

Heroes. Tim KRING, EUA, Universal Channel, 2006.

Labirinto. Jim HENSON, Inglaterra, Jim Henson company & Lucasfilm ltd., 1986.

Mad Max. George MILLER, Austrália, Warner Bros., 1979.

O Senhor dos anéis. PETER JACKSON, WARNER BROS., 2001.

Os Goonies. Steven SPILBERG; Richard DONNER, EUA, Warner Bros., 1985.

Star Wars. George LUCAS, EUA, Lucasfilm ltd., 1977.

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ANEXOS

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PERDIDOS NA SELVA

Temas: Fuso-Horário, Orientação Espacial, Cooperação

Personagens:

a) Johannes: 23 anos, 1,90m de altura, 100Kg, forte e musculoso. Faixa Preta de Jiu-jitsu e

sabe lutar outras artes marciais. Carrega uma faca do tipo “Rambo”. Tem pouca

inteligência e muito medo de coisas sobrenaturais. Se acha o bonitão. Tem 14 pontos de

vida.

b) João Spectro: 20 anos, pequeno, magrinho e fraco. Passou muita necessidade quando

pequeno, e chegou a cometer pequenos furtos. Muito veloz e tem a “inteligência das ruas”,

o que faz com que descubra problemas mais facilmente que os outros, além de uma

excelente lábia. Carrega um pequeno revólver .32 com 5 balas. Tem pouca auto-estima,

estudou somente até a 5a série e tem muito medo de passar fome. Tem 11 pontos de vida.

c) Glória: 21 anos, extremamente bonita e inteligente. Faz faculdade de medicina, adora

essa profissão e carrega sempre um estojo com apetrechos médicos (gaze, esparadrapo,

bisturi, água oxigenada, ponto, soro fisiológico, e outras coisinhas). Sabe muito sobre

Biologia, Matemática, e outras matérias escolares, além de sempre ter boas idéias.

Recentemente sofreu um acidente que a deixou mancando muito de uma perna. Não

consegue andar grandes distâncias sozinha. Tem 8 pontos de vida.

d) Magali: 21 anos, muito bonita. Trabalhadora e pobre, bisneta de escravos, tem o que se

chama de “sexto sentido”, ou seja tem o poder de: Sentir Perigo 9 (sempre que quiser usar o

poder, deve tirar 9 ou menos em 2 dados), Detectar Mentira 9, Flash Luminoso 7, Hipnose

(a critério do mestre, de acordo com a dificuldade ou resistência do alvo) e Controle do

Clima (pode ser usado apenas 2 vezes por dia e por apenas 30 segundos) 10. Carrega

sempre consigo um colar que lhe foi dado pela avó, que considera a coisa mais preciosa do

mundo. Usa óculos com 8 graus de miopia, o que faz com que praticamente não enxergue

sem eles. Tem 6 pontos de vida.

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e) André(a): Personagem “coringa”, que pode ser homem ou mulher, dependendo da

vontade do professor e/ou seus alunos. Se forte é a comunicação e o carisma. Tem o poder

de saber todas as línguas faladas na Terra e de causar sempre uma boa impressão quando se

comunica com alguém. É bom músico e carrega uma flauta de bambu. Detesta violência e

não pode ver sangue, senão desmaia. Tem medo de ficar sozinho. Tem 8 pontos de vida.

Início:

15 de dezembro de 2002, 4:03 horas da manhã. Os personagens, que não se

conhecem, estão se dirigindo para o local determinado pela carta que todos receberam.

Uma casa pequena, dentro da vila residencial da rua 7 de setembro, número 369. Todos

chegam praticamente ao mesmo tempo, sem se conhecerem, nem ao seu anfitrião, o

misterioso Nathan, que assinava a carta em que oferecia cem mil reais se os personagens

conseguissem completar as tarefas que ele proporia a eles naquela noite. É hora dos

personagens interagirem, se apresentando. Provavelmente, com Johannes “xavecando” as

garotas do grupo, e cada um tentando agir de acordo com seu personagem.

Após algum tempo dessa interação, entre outras coisas para um tentar saber o que o

outro está fazendo ali, quem toca a campainha, etc. Descreva aporta da casa como alta, de

madeira muito forte, aparentemente muito antiga e com um trinco com uma figura

monstruosa esculpida. A campainha é uma corda e, se decidirem toca-la, ela emite um som

que parece um grito de dor de alguém sendo muito torturado. Se ninguém quiser tocar a

campainha, faça-os bater na porta, pois, afinal de contas, todos querem por a mão em 100

mil reais.

Eles são recebidos por um homem alto, magro, de aproximadamente 60 anos,

falando pausadamente, levemente com sotaque latino:

“Queiram desculpar, senhores, mas Lorde Nathan não pode estar presente hoje, mas

insistiu que eu adiantasse alguns pontos da missão de vocês. Aceitam alguma bebida, chá,

café, refrigerante, vinho, água?” – fazer com que todos aceitem alguma coisa. Se alguém

não quiser, o mordomo chama 5-6 guarda-costas monstruosamente grandes e fortes

(maiores que o Johannes), que pegarão a pessoa que não quer nada e darão uma injeção e

uns tapas nela, tirando 1-2 ponto de vida desse personagem.

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“Muito bem, senhoras e senhores, Lorde Nathan está fazendo uma experiência de

transmissão teletransportiva, onde partículas subatômicas podem ser mudadas de local.

Falta apenas fazer uma coisa: testar com seres humanos, que, obviamente, são vocês.

Quando acordarem, vão estar em algum lugar do planeta e, se voltarem para contar história,

receberão o prêmio. Ah, e será instalado no cérebro de um de vocês um comunicador, para

que Lorde Nathan possa dar algumas orientações ao grupo de otá... quero dizer, de pessoas

inteligentes. Bons sonhos”.

Quase instantaneamente os personagens caem no sono e, em seguida, acordam em

uma clareira no meio de uma densa floresta, com um calor muito forte e alta umidade,

ruídos de animais e vários insetos – principalmente mosquitos- atacando os personagens.

Restaurar o valor inicial de Pontos de Vida dos personagens. O sol está no céu, mais ou

menos a um ângulo de 45o.

Nesse momento, identificar o sol e fazer uma referência ao horário que estavam no

início, por volta das 4:30 da manhã. Ver o que eles vão fazer, se querem tentar alguma

coisa juntos, separar, etc.

Enquanto todos tentam descobrir onde estão, João Spectro ouve uma voz com muita

interferência, dizendo: “João, João, está me ouvindo? Vocês foram teletransportados e, pelo

visto, com sucesso. Estão todos vivos? Inteiros? Ótimo, mas,..... onde vocês estão? É o

Lorde Nathan se comunicando. O transmissor, então foi colocado em João Spectro. É

importante dizer que somente ele ouve alguma coisa e os outros só ficam sabendo do fato

de ele decidir contar. Se ele começar a falar sozinho, faça um teste de pânico com

Johannes, que achará que é algo sobrenatural, com dificuldade 8 (tem que tirar 8 ou menos

em 2 dados). Se ele surtar, baterá no mais próximo, causando desmaio e perda de 2 PV

(pontos de vida). Para ele parar, teste de força de vontade com dificuldade 6, ou alguma boa

idéia do grupo (música tocada por André, ou algo assim), senão, porrada em outro, e assim

por diante.

Os personagens devem descobrir o seguinte :

- São +- 9:30 da manhã – dá para saber porque o sol está subindo(basta observar o

sol num intervalo de 10-15 minutos), e num ângulo de aprox. 45o .

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- Através do fuso horário, percebe-se que eles estão a leste do Brasil, numa distância

longa.

- Pelo clima quente e úmido, estão numa região tropical, provavelmente na África.

Após descobrirem tudo isso, nova comunicação : “Ótimo, já descobriram que estão

em algum lugar da África, pelo visto do centro para o sul, onde estão as florestas.

Consigam chegar a uma cidade com telefone, que vocês me contatam para eu mandar

dinheiro para a volta de vocês, e zzzzzzzzzzzzzzzz...........”.

A comunicação foi perdida.

Logo após, onde quer que os personagens estejam, faça Magali fazer um teste de

Sentir Perigo e detectar uma presença estranha do lado direito do grupo. Enquanto os

personagens pensam no que vão fazer, chega perto deles um grupo de uns 20 homens

negros muito altos e magros, vestidos com roupas de pele de animais, e um comportamento

um tanto agressivo.

Soluções violentas irão causar reação dos nativos, que provavelmente causarão

danos ao grupo. A melhor forma de resolução, aqui, é uma conversa, aproveitando o poder

de André e a lábia de Spectro.

Se optarem por isso, um teste de línguas a cada frase falada (não é necessário testar

para ouvir) indicará que o chefe deles quer um revólver para dizer onde há uma cidade. Se

os personagens derem, e tiver balas, o chefe irá atirar em qualquer direção. Os personagens

devem fazer um teste de velocidade para escaparem do tiro, com dificuldade variável para

cada personagem. Caso acerte alguém, esse perde 2-3 PV (pega de raspão) e desmaia. Após

passar essa confusão, o chefe indica uma cidade a uns 10 km ao norte, mas devem tomar

cuidado, pois há vários perigos na selva, e o principal deles é o Mountain-Yeti, o gigante

invisível. E que é necessário ter um feiticeiro poderoso para derrotá-lo. O chefe, também,

oferece uma poção. Se decidirem tomar, restaurará até 2 PV de cada personagem.

Antes de andarem, é importante saber se vão em fila indiana, quem vai primeiro, quem

vai ajudar os feridos, principalmente a Glória, que não consegue caminhar direito.

Pela direção do sol, os personagens vão seguindo para o norte, conforme indicado,

até que ameaça cair uma tempestade. Nesse meio tempo, Magali sente seu colar queimando

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e ouve a voz da sua avó pedindo para ela tomar muito cuidado, pois passarão pelo cemitério

dos elefantes. Novamente temos a questão que somente ela ouve a voz da avó. Contar ou

não aos outros? Se Johannes ouvir, o teste de pânico é com dificuldade 4.

Após isso, ao entrar no cemitério dos elefantes – Testes de Sexto Sentido mostram

que o local é ali, além do perigo. – e o tempo escurece completamente e todos parecem

sentir tudo girando, enquanto as armas dos personagens que as carregam e o óculos de

quem o usa parecem queimar. Tudo continua a girar até que eles jogam as armas no chão e

elas derretem. Vocês percebem que as posições mudaram, mas está escuro, e eles têm de ir

para o norte. Faça Gloria descobrir que seu canivete está imantado, e os personagens

conseguirem montar uma bússola. Num teste mais apurado, Magali descobrirá uma

mensagem de sua bisavó, dizendo “quando estiver difícil, lembre que o importante é o

tempo”.

Após isso, os personagens seguem andando, lembrando que estão desarmados,

cansados, Magali não enxerga, Gloria não consegue andar direito, até que o sol reaparece, a

75o na direção oeste, indicando +- 1 hora da tarde, quando João ouve novamente a voz de

Nathan: “João, descobri um efeito colateral. Vocês deverão chegar na cidade que o nativo

falou – Webstreish – para pegar um helicóptero até Nairóbi, capital do Quênia. Essa

chegada em Webstreish tem de ser até às 3 horas da tarde, portanto, é bom se apressarem.

Faz 30 minutos que vocês saíram do cemitério, indicando que andaram 3 km desde lá, e, do

ponto que vocês encontraram os nativos até o cemitério, pelo meu mapa são 10 km,

portanto, faltam 7 km, e 2 horas, e essa é minha última comunicação, pois meu

comunicador cerebral está pfffffffffffffffffff.....”.

Mais meia hora de caminhada e um personagem – menos Magali – recebe um golpe

vindo de lugar nenhum. É o Mountain Yeti, que vai golpeando os personagens que

desmaiam e perdem 2 PV. Dê-lhes tempo para pensar, se não conseguirem, faça Gloria

pensar na solução : Magali faz chover e transforma o chão em lama, dando para ver as

pegadas do Yeti, ou faz nevar, com o mesmo efeito. Daí, uma paulada, pedrada, luta, ou

sei-lá-o-que fere o danado.

O Mountain Yeti fala: “Obrigado. Agora estou livre da maldição. Poderei me curar

e voltar para casa”. E começa a ficar visível: ele é um macacão grande, vermelho de

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bigodes brancos e pés enormes se transformando em um homem de uns 30 anos, de bigode

preto, careca e um sapato enorme.

Se os personagens perguntarem, ele fala que foi um cara muito malvado chamado

Lorde Nathan que o transformou em um macaco invisível e o obrigou a nocautear todo ser

humano que passasse por aquela estrada. Ele tinha sido contratado para uma experiência

na qual ganharia 100 mil reais, e estava muito feliz por ter sido libertado da maldição.

Fica tão contente que sai correndo na direção oposta à cidade.

O caminho então está livre, basta se apressarem e chegarem na cidade a tempo. O

estojo de primeiros socorros pode ser usado, junto com os conhecimentos medicinais, para

recuperar os feridos, mas sem aumentar os PV.

Andando mais um pouco, os personagens chegam ao topo de uma colina, onde

vêem a cidade e pessoas acenando para vocês. Descendo lá, o mesmo homem (mordomo)

que os recebeu em Sorocaba aparece dizendo: “Parabéns, meus amigos cobaias, vocês

foram aprovados no teste de Lorde Nathan, e de maneira inesperada conseguiram

sobreviver. Infelizmente os moradores dessa cidade foram instruídos a cuidarem muito bem

de vocês e convencê-los a permanecer essa noite na cidade, para festejar. Infelizmente

vocês perderão a conexão para Nairóbi, mas é problema de vocês. Aproveitem a estadia

aqui, e aguardem novas comunicações de Lorde Nathan. Até a próxima”.

E sai, furtivamente, enquanto o povo da cidade abraça os personagens e os carrega

nos ombros, como heróis que derrotaram o Mountain Yeti. Porém, se quiserem reencontrar

Lorde Nathan ou receber a recompensa, terão que esperar pelo próximo chamado. Quem

sabe na próxima aula...

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LIVE ACTION – O CAMINHO PARA O VALE ENCANTADO

LOGÍSTICA

PARTICIPANTES: 80 Crianças entre 7 e 12 anos.

EQUIPES: Quatro (4)

• ALUMINOSOS (Amarelo)

• VIDRÚNICOS (Verde)

• PAPELÉTRICOS (Azul)

• PLASTITÂNICOS (Vermelho)

OBJETIVOS:

1. CONVENCER OS CONSERVADORES;

2. CONSEGUIR CONHECIMENTO;

3. CONSEGUIR AS CHAVES DO PORTAL SAGRADO;

4. ACHAR O LIVRO VERDE;

5. DERROTAR O VELHO FERRO.

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HISTÓRIA RESUMIDA: Há muitos anos um enorme lixão foi instalado no que um dia

fora um belo parque, e ali as mais diversas criaturas – ratos, moscas, baratas e urubus –

encontraram seu lar. Mas o lixão começou a extrapolar seu limite, invadindo as vilas, as

cidades...tomando conta do mundo. Tudo isso por causa das ações de um homem: o Velho

Ferro! Um grande industrial que fabrica pouca coisa, mas produz muito lixo! Todo lixo que

ele produz em suas indústrias, ele joga pela janela, direto no lixão, sem nem olhar. Seu

esgoto vai direto para os rios e córregos nas proximidades, sem nenhum tratamento. O lixo

adquiriu tamanha força que quase atingiu a última floresta do mundo: o Vale Encantado. Se

essa floresta desaparecer, também, embaixo de tanto lixo, não existirão mais plantas, nem

animais (exceto aqueles que vivem no lixo, é claro). E ninguém quer isso, quer?

Pois, ao saber da enorme produção de lixo, o grande mago conhecido como Florestan, o

Sábio decidiu pedir ajuda aos seus amigos – os Recicladores de Idéias – para que

convencessem aqueles que vivem no lixo a buscar uma vida melhor. Eles precisam

encontrar o único artefato capaz de devolver a humanidade do Velho Ferro: o Livro Verde!

Mas o Livro Verde está escondido no Vale Encantado, e os jogadores devem primeiro

encontrar o caminho para a última floresta do mundo a fim de acabar de uma vez com a

proliferação do lixo.

ENREDO:

1. FLORESTAN, O SÁBIO SE APRESENTA;

2. JOGO DOS LATÕES – ENCONTRANDO O MAPA DA SABEDORIA;

3. JOGO DAS MOSCAS – JOGO TIPO ESTAÇÕES;

4. JOGO DO URUBU – JOGO TIPO ENIGMA DA PIRÂMIDE ;

5. JOGO DOS RATOS – JOGO TIPO ESCOLA - RECICLAGEM;

6. JOGO DA BARATA – JOGO TIPO DETETIVE;

7. A JORNADA DO VALE ENCANTADO;

8. FINAL.

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PRIMEIRA PARTE - APRESENTAÇÃO

ESFINGE – Fnord! Saudações, amigos da Natureza! Meu nome é Mestre Esfinge e trago

comigo notícias não muito boas e uma missão repleta de aventuras e perigos! Mas antes,

vou contar a vocês uma história: Há muito anos um enorme lixão foi instalado no que um

dia fora um belo parque, e ali as mais diversas criaturas – ratos, moscas, baratas e urubus –

encontraram seu lar. Mas o lixão começou a extrapolar seu limite, invadindo as vilas, as

cidades...tomando conta do mundo. Tudo isso por causa das ações de um homem: o Velho

Ferro! Um grande industrial que fabrica pouca coisa, mas produz muito lixo! Todo lixo que

ele produz em suas indústrias, ele joga pela janela, direto no lixão, sem nem olhar. Seu

esgoto vai direto para os rios e córregos nas proximidades, sem nenhum tratamento. O lixo

adquiriu tamanha força que quase atingiu a última floresta do mundo: o Vale Encantado. Se

essa floresta desaparecer, também, embaixo de tanto lixo, não existirão mais plantas, nem

animais (exceto aqueles que vivem no lixo, é claro). E ninguém quer isso, quer?

E é preocupado com isso que um grande amigo meu, Florestan, o Sábio, decidiu vir até

aqui hoje, falar com vocês!

(Florestan entra)

FLORESTAN – Olá, companheiros! O nosso amigo, Esfinge, já contou a vocês a trágica

história que pode, mais cedo ou mais tarde, acabar com nosso planeta! Não é uma coisa

muito legal, é? Mas venho aqui alertá-los que nem tudo está perdido! E é por isso que estou

aqui! Existe uma solução!!!

ESFINGE – Não acredito, Florestan! De novo você e essas idéias! Você quer arriscar a vida

desses jovens corajosos numa missão suicida?

FLORESTAN – Meu amigo...sei o quanto você se preocupa com essas crianças, mas elas

são nossa última esperança! Sim! Eles são os Recicladores de Idéias! Pessoas que têm o

PODER de MUDAR O MUNDO!

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ESFINGE – Mudar o mundo???

FLORESTAN – Sim! Acabar com todo esse lixo! Mas pra fazer isso, eles vão precisar

derrotar o responsável por tudo que existe de ruim nesse mundo!

ESFINGE – O Velho Ferro!

FLORESTAN – O Velho Ferro!

ESFINGE – Mas como eles conseguirão derrotar o Velho Ferro? Ele é muito poderoso!!!

FLORESTAN – É por isso que estamos aqui, velho amigo! Nós iremos ajuda-los a

encontrar um artefato místico capaz de neutralizar os poderes malignos do Velho Ferro,

fazendo com que ele volte a ser um homem bonzinho!

ESFINGE – Não me diga que você está falando do Livro Verde!

FLORESTAN – Exatamente, Esfinge!

ESFINGE – Mas como pegaremos o Livro Verde? Há anos ele está escondido no Vale

Encantado e, como você sabe, ninguém consegue abrir o Portal Sagrado e entrar no Vale!

FLORESTAN – Mas eles conseguirão, Esfinge! Nessa semana, nós mudaremos o mundo!

ESFINGE – Mas para mudar o mundo, é necessário conhecimento! Muito conhecimento!

FLORESTAN – Sim! E por isso nossa primeira missão será encontrar os Mapas da

Sabedoria!

(Explicam o jogo do Mapa da Sabedoria)

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MINI-JOGO – MAPA DA SABEDORIA

OBJETIVO: Cada grupo deve encontrar seu Mapa da Sabedoria.

COMO: Cada grupo recebe uma pista relacionada a seu nome (uma lata para os

Aluminosos, uma pet para os Plastitânicos, etc). Eles, então, devem encontrar o local certo

para depositar essas pistas (os latões de reciclagem, que estarão espalhados em locais

diversos do parque). Lá, os grupos encontrarão uma pista que os levará até um local

específico do parque (ex: a biblioteca, a bica, o playground, etc). Nesse local estará

escondido o Mapa da Sabedoria da respectiva equipe. Durante todos os jogos, os grupos

receberão Conhecimentos que devem ser colados nesses mapas. No final, os mapas se

revelarão as páginas do Livro Verde.

PERSONAGENS: Florestan, o sábio + monitores das equipes.

MATERIAL: 4 Mapas da Sabedoria (um para cada equipe, na respectiva cor, etc. Deve ser feito num material mais resistente e duro); 1 lata de refrigerante, 1 garrafa pet, 1 garrafa de vidro (muito cuidado!!!) e 1 placa de papelão; 4 pistas de referência (uma para cada equipe/local do parque) MONITORES FAZEM:

• Acompanham equipes; • Verificam se nada foi tirado do lugar.

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SEGUNDA PARTE – CONVENCENDO OS CONSERVADORES

ESFINGE – Eles conseguiram, Florestan!!! Mas e agora?

FLORESTAN – Agora eles precisam encontrar o caminho para o Vale Encantado!

ESFINGE – Mas eu já disse que ninguém pode abrir o Portal Sagrado!

FLORESTAN – Eles precisam das chaves, meu amigo! As Quatro Chaves que abrem o

Portal Sagrado do Vale Encantado!

ESFINGE – Mas com quem estão essas chaves, Florestan?

FLORESTAN – Com os Conservadores! Pessoas da sociedade e que, garanto, não vão

entregar as chaves tão facilmente!

ESFINGE – Os Conservadores? Está falando de Seu Varejo, Dona Baratatinha, Madame

Rata Zanna e Dom Urubu de la Pena Preta?

FLORESTAN – Exatamente!

ESFINGE – Então, devo corrigi-lo! Não é que eles não vão entregar as chaves tão

facilmente! Eles não vão entregar as chaves NUNCA!

FLORESTAN – Não seja tão pessimista, Esfinge! O que essas pessoas precisam é de

informação e um bom argumento para serem convencidas! Elas precisam de ajuda!

ESFINGE – Que seja...vou dar meu voto de confiança a você, Florestan! Afinal, você é

conhecido por aí como sendo O SÁBIO!

(explicam o que deve ser feito)

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FLORESTAN – Agora, vocês devem procurar o Seu Varejo! Lembrem-se, qualquer

dúvida, basta procurar por nós! Estaremos sempre perto de vocês! FNORD!

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1. JOGO DAS MOSCAS – TIPO OLIMPÍADA – As moscas devem brigar o tempo todo, falando que um jogo é melhor que o outro. Seu

Varejo, pai, não sabe mais o que fazer e pede ajuda dos heróis, dizendo que dá qualquer

coisa em troca. No final, as moscas percebem que todos os jogos são legais e que, juntos,

ficam melhores ainda. Assim, decidem fazer as pazes. Seu Varejo, agradecido, entrega os

itens.

OBJETIVO: Ajudar o Seu Varejo a acabar com a briga das 4 filhas (moscas), que disputam

o tempo todo qual jogo é melhor.

COMO: As equipes devem passar pelas 4 estações (pode-se fazer essa atividade com duas

equipes por vez, ao invés das quatro). A cada 3 – 5 minutos, toca-se um apito e as equipes

trocam de estação. Concluída cada estação, a equipe ganha uma medalha. Juntando as 16

medalhas (4 de cada equipe) as moscas se convencem que todos os jogos, no fim, são bons.

FINAL: Cumprida a tarefa, todos os grupos recebem um Conhecimento sobre reciclagem

de plástico e os Plastitânicos recebem a chave vermelha.

JOGOS SUGERIDOS: Futebol cego, Freesbe, Mensagem secreta e Carrega

PERSONAGENS: Seu Varejo, 4 moscas + controlador (pode ser o Mestre Esfinge ou o

Florestan, ou os dois)

MATERIAL: Bolas, freesbe, vendas para os olhos, 2 baldes, 3-4 bisnagas, 16 medalhas (4

de cada cor), 4 Conhecimentos sobre Plástico e 1 chave vermelha.

MONITORES FAZEM:

• Interagem com a equipe;

• Verificam se a equipe está toda junta;

• Aplicam a tarefa;

• Ao final, entregam a medalha da respectiva cor ao grupo;

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• Quando tudo terminar, encenação final;

• Seu Varejo entrega a Chave Vermelha aos PLASTITÂNICOS e um

CONHECIMENTO para cada grupo.

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2. JOGO DO URUBU – TIPO ENIGMA DA PIRÂMIDE – Dom Urubu é um homem envolvido em “jogos ilegais de charadas”. Mas existe uma

série de enigmas que nem ele consegue desvendar. Se os jogadores conseguirem, ele faz

qualquer negócio.

OBJETIVO: Convencer o Urubu adivinhando suas charadas.

COMO: Achando as pirâmides. Existem dois tipos de pirâmides: as brancas e as coloridas.

Para pegar as brancas, os grupos devem primeiro encontrar as coloridas, que estão dividias

em 6 partes cada. Para achar os pedaços das pirâmides, os grupos devem procurar um

indicador (uma pirâmide pintada com as 4 cores das equipes) que estará em algum lugar

visível (presa numa árvore, em cima de uma pedra, etc. OBS: os jogadores NÃO podem

tirar essa pirâmide-indicadora do lugar). O indicador serve para avisar aos jogadores que

um pedaço de pirâmide está escondido por ali, num raio de 10 metros. Encontrados os 6

pedaços correspondentes a cada equipe (Papelétricos só pegam azul, Plastitânicos,

vermelho, etc), os grupos devem descobrir o nome de sua pirâmide branca (os pedaços da

pirâmide colorida devem formar uma palavra). Feito isso, eles podem pegar a pirâmide

branca (cada equipe tem uma também) que possui 3-5 enigmas em seu interior. Se as

equipes responderem todos os enigmas, vencem.

FINAL: Cumprida a tarefa, todos os grupos recebem um Conhecimento sobre reciclagem

de vidro e os Vidrúnicos recebem a chave verde.

PERSONAGENS: Dom Urubu de la Pena Preta + 4-8 monitores (com cada equipe) +

controlador de jogo

MATERIAL: 4 pirâmides brancas com nome, 4 pirâmides coloridas divididas em 6

pedaços cada (cada pedaço deve conter parte do nome de uma pirâmide branca), 6

pirâmides–indicadoras (pintadas com as 4 cores), 5 enigmas (podem ser os mesmos para

todas as equipes), 4 Conhecimentos sobre vidro e uma chave verde.

MONITORES FAZEM:

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• Acompanham equipes;

• Verificam se nada foi tirado do lugar e se o grupo pegou o pedaço certo da

pirâmide;

• No final, ajudam na organização;

• Encenação final;

• Dom Urubu entrega a Chave Verde aos VIDRÚNICOS e um CONHECIMENTO

para cada grupo.

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3. JOGO DOS RATOS – TIPO ESCOLA

– Madame Rata Zanna viu em sua bola de cristal um futuro terrível, que está relacionado

ao dia de hoje e ao de ontem e ao de anteontem e ao...enfim! Os heróis devem viajar no

tempo e realizar as pequenas ações (atividades de reciclagem) para impedir o futuro

previsto.

OBJETIVO: Jogadores devem impedir o futuro previsto pela Madame Rata Zanna.

COMO: Equipes devem passar pelas 4 estações (Passado, Futuro, Presente e Pretérito

Mais-Que-Perfeito) e cumprir tarefas de reciclagem (ex: escultura com resíduos, banda de

sucata, etc). Cumprindo a tarefa, ganham uma assinatura no boletim. Com as 4 assinaturas,

eles podem cumprir a tarefa final de Madame Zanna (uma tarefa cooperativa que envolva

todos os grupos, de preferência. Pode ser o Nó Humano). Mas muito cuidado com o

Exterminador de Pragas do Futuro! Se ele pegar um grupo, pode tirar uma assinatura!

FINAL: Cumprida a tarefa, todos os grupos recebem um Conhecimento sobre reciclagem

de papel e os Papelétricos recebem a chave azul.

PERSONAGENS: Madame Rata Zanna + 4 estações (Passado, Presente, Futuro e Pretérito

Mais-Que-Perfeito) + Exterminador de Pragas do Futuro + controlador de jogo

MATERIAL: 4 boletins (um pra cada equipe), canetas para as estações, sucata em geral (de

preferência, um tipo pra cada estação. Ex: Passado só tem papel, Futuro só tem vidro, etc),

4 Conhecimentos sobre Papel e uma chave azul.

MONITORES FAZEM:

• Interagem com a equipe;

• Verificam se a equipe está toda junta;

• Aplicam a tarefa;

• Se a equipe cumprir a tarefa, assinam o boletim!!!;

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• Se a equipe não cumprir a tarefa, manda para Florestan ou Esfinge;

• No final, ajudam na organização;

• Madame Rata Zanna aplica a tarefa final com TODOS os grupos juntos;

• Encenação final;

• Madame Rata Zanna entrega a Chave Azul para os PAPELÉTRICOS e um

CONHECIMENTO para cada grupo.

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4. JOGO DAS BARATAS – TIPO DETETIVE

– Dona Baratatinha entra revoltadíssima, acusando quatro “pessoas”. Ela quer saber

quem matou o Seu Barateiro. Ela chora e exige a verdade. Diz que dá uma boa

recompensa pra quem decifrar esse mistério. Esfinge e Florestan bancam os detetives e

mostram um dossiê aos jogadores.

OBJETIVO: Descobrir quem matou o marido de Dona Baratatinha, com que “arma”, por

qual motivo e em que lugar.

COMO: Equipes passam por estações (os 4 suspeitos) e cumprem tarefas/respondem

perguntas. Se conseguirem, ganham uma carta em cada estação (com exceção de uma).

Existem 16 cartas no jogo. Os grupos só conseguem 12. As 4 que faltarem serão a resposta

do crime. Para descobrir isso, as equipes devem se juntar no final.

FINAL: Cumprida a tarefa, todos os grupos recebem um Conhecimento sobre reciclagem

de alumínio e os Aluminosos recebem a chave amarela.

PERSONAGENS: Dona Baratatinha + 4 estações/suspeitos (Dona de casa, Dedetizador,

Moleque travesso e Lagartixa) + 2 controladores de jogo

MATERIAL: 4 cartas suspeitos, 4 cartas de armas, 4 cartas locais, 4 cartas motivos, dossiê

(papel tipo boletim, com todas as opções de armas, locais, etc), apresentação de slides (com

foto dos suspeitos e etc), 4 Conhecimentos sobre Alumínio e uma chave amarela.

MONITORES FAZEM:

• Interagem com a equipe;

• Verificam se a equipe está toda junta;

• Aplicam tarefa/pergunta;

• Se a equipe cumprir, dão a carta. Se não, mandam para Florestan ou Esfinge;

• No final, ajudam na organização;

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• Encenação final;

• Dona Baratatinha entrega a Chave Amarela para os ALUMINOSOS e um

CONHECIMENTO para cada grupo.

LOGÍSTICA:

• DONA DE CASA – PLASTITÂNICOS, ALUMINOSOS e VIDRÚNICOS

• DEDETIZADOR – PLASTITÂNICOS, ALUMINOSOS e PAPELÉTRICOS

• MOLEQUE TRAVESSO– PLASTITÂNICOS, PAPELÉTRICOS e VIDRÚNICOS

• LAGARTIXA – ALUMINOSOS, PAPELÉTRICOS E VIDRÚNICOS

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TERCEIRA PARTE – O PORTAL SAGRADO DO VALE ENCANTADO

FLORESTAN – Muito bem, jovens companheiros! Vocês conseguiram as chaves! E, mais

importante que isso, completaram os seus Mapas da Sabedoria! Agora, aqui, em frente às

Chamas de Sharyou, vamos realizar o encanto que abrirá as portas para a última floresta do

mundo!

(Fazer algum jogo com todos os participantes. Pode ser o Nó Humano ou algo do tipo.

Completado o “ritual”, o Portal se abre. Efeitos de luz, fumaça, música, etc. Aberto o

Portal, Velho Ferro aparece)

VELHO FERRO – Huá, huá, huá!!! Enfim encontrei vocês, Florestan e Esfinge! Pelo visto

vocês não perderam essa mania repulsiva de tentar mudar o mundo! Só vocês não percebem

que isso é praticamente impossível!

FLORESTAN – Impossível por quê, posso saber?

VELHO FERRO – Mas não é óbvio??? Vocês ainda não perceberam que as pessoas estão

confortáveis em suas vidinhas? Ninguém quer mudar! Pra quê? As pessoas trabalham,

compram, gastam, produzem, poluem...todo dia, ano após ano...tudo funciona muito bem

assim!

ESFINGE – Você está errado, Velho! Esses bravos heróis, que estão conosco, fizeram sua

parte essa semana! Conseguiram convencer pessoas que antes pensavam como você! E,

graças a isso, encontraram o caminho secreto para o Vale Encantado!

VELHO FERRO – Bravo! Bravo! Mas não pensem que as coisas serão tão fáceis, daqui por

diante! Lembrem-se que meu poder cresce cada dia mais!

FLORESTAN – Você está errado, Velho... (Velho Ferro faz um passe de mágica e congela

Florestan)

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VELHO FERRO – É você quem deve se calar, seu tolo! Cansei de sua impertinência!

ESFINGE – Florestan!!!!!!!

VELHO FERRO – É tarde para seu amigo, Esfinge! Que ele sirva de exemplo a você e a

todas essas crianças mimadas! DESISTAM AGORA ou sofram o mesmo destino de seu

amigo!

ESFINGE – Nós nunca desistiremos, Velho Ferro! Nunca! Unidos, iremos salvar nosso

amigo e derrotar você de uma vez por todas!

VELHO FERRO – Que seja! Meu aviso está dado! Eu vou-me embora afinal, não há nada

que vocês possam fazer! Só com os Quatro Artefatos de Sharyou vocês poderiam me

derrot...ops! Quase falo demais! Deixem-me ir! Boa sorte em sua missão suicida, “heróis”!

Huá, huá, huá!!! (vai embora)

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1. A PRISÃO DE FLORESTAN – TIPO CAÇA AO TESOURO PARTE 1

ESFINGE – Era isso que faltava, amigos! Perdemos nosso amigo Florestan, mas ganhamos

uma dica valiosíssima: para derrotarmos o Velho Ferro não precisamos encontrar apenas o

Livro Verde, mas também os Quatro Artefatos de Sharyou! Sharyou foi um grande mago,

protetor de todas as coisas vivas dessa terra. Era um bom homem...e era o Mestre de

Florestan! Agora, antes de mais nada, precisamos encontrar uma forma de ajudar nosso

amigo! Mas como vamos fazer isso??? Já sei! Na bolsa de Florestan sempre existe algum

tipo de pó mágico! Vamos procurar... (ele vasculha a bolsa e encontra um frasco. Nele,

existe um pequeno papel enrolado. De um lado está uma mensagem, do outro, um enigma)

Mas isso não é possível! Será que todos os meliantes do planeta decidiram se intrometer?

Isto aqui é a assinatura de outro homem que não vale absolutamente nada...ou menos que

nada. Seu nome é Scarface! Ele é líder de um grupo de criminosos conhecido como “A

Guilda dos Ladrões”. Leia o que está escrito aqui.

(Entrega o papel para alguém do grupo)

Querido Esfinge e seus amigos infantilóides Huá-huá-huá!

Parece que seu querido Florestan não acordou muito bem hoje. Acho que dormiu de mau-jeito e está um pouco tenso, meio duro... Faça uma massagem no pobre-coitado. Mas, haja o que houver, não o jogue na água! Huá-huá-huá!!!

Creio possuir algo que vocês desejam! Mas vocês já conhecem as regras...

Atenciosamente S.F.

(Do outro lado dessa mensagem deve existir um ENIGMA)

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Bom...como Scarface disse: eu conheço as regras e, sendo assim, infelizmente não poderei

ajudá-los por enquanto. O Senhor dos Ladrões adora jogos e desafios, e é isso que ele vai

fazer com vocês. Dêem a ele uma boa partida e quem sabe ele irá ajudá-los. Desistam do

jogo, e ele não ficará muito contente. Trapaceiem, e ele exigirá que paguem com suas

vidas.

Só posso dar-lhes uma dica: esse é um jogo de enigmas. Decifrem a charada e ela os levará

até algum lugar. Lá, vocês provavelmente encontrarão um novo enigma. O enigma final

será o que levará vocês até Scarface.

Boa sorte!

OBJETIVO: Conseguir o pó mágico capaz de quebrar o feitiço que foi jogado sobre

Florestan.

COMO: Equipes devem encontrar o esconderijo de Scarface, o ladrão, através de um Caça

ao Tesouro noturno (!!!)

FINAL: Cumprida a tarefa, os ALUMINOSOS recebem a Poção Alabastrina (para derrotar

o Velho Ferro) e a senha para entrar no esconderijo dos Corsários. Na segunda vez, Pó

Mágico (após o Olho do Dragão - para ajudar Florestan)

PERSONAGENS: Scarface + 2 Controladores de jogo.

MATERIAL: 10-15 enigmas com locais da madrugada (x 4), Pó mágico e poção

alabastrina (suco de gnomo - hehehe...eu gosto muito disso! Até a última gota!)

MONITORES FAZEM:

• Acompanham as equipes;

• Verificam se nada foi tirado do lugar;

• No final, ajudam na organização;

• Scarface dá a Poção Alabastrina aos ALUMINOSOS.

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PARTE 2

(Concluindo os enigmas, o grupo chega até a Guilda dos Ladrões. Lá, Scarface os

aguarda, ansioso.)

SCARFACE - Bem-vindos, amiguinhos!Huá-huá-huá!!!

E então? Gostaram do jogo? Eu gostei! Adorei ver vocês correndo de um lado para o

outro como baratas tontas! Huá-huá-huá!!! Como vocês derrotaram meus enigmas, vou dar

a vocês, Aluminosos, a Poção Alabastrina! Ela deve ser consumida pelo Velho Ferro até A

ÚLTIMA GOTA após a Flauta Ébano ter sido tocada! Entenderam? ATÉ A ÚLTIMA

GOTA, lembrem-se bem!!!

Pois bem...eu sou Scarface! Sim, sim, eu sei que é uma honra me conhecer, mas vamos

deixar de lado essa bajulação barata! Posso saber por que vieram até aqui, arriscando-se ao

entrar no Covil dos Ladrões?

Oh, sim! Tinha esquecido! Huá-huá-huá!!!

Vocês vieram atrás disso (e mostra o pó mágico) para salvar seu pobre amiguinho,

Florestan, o não-tão-sábio! Muito bem...aqui na Guilda nós possuímos um lema que alguns

de vocês já devem ter ouvido por aí: uma mão lava a outra! Em outras palavras: eu entrego

o pó para vocês se vocês me fizerem um pequeno favor.

Existe uma jóia valiosíssima – e muito bela, diga-se de passagem – que eu procuro

há anos, chamada O Olho do Dragão. Infelizmente, ela foi encontrada por aqueles porcos

salafrários: os Corsários (cospe no chão)! Agora, os malditos querem que eu dê

praticamente todo o dinheiro que eu roubei honestamente em minha vida como pagamento

pela jóia! Nunca!!! Sou um ladrão honrado! Trabalhador! Não sou como

esses...esses...Piratas (cospe no chão)!!!

E então? Temos um trato, ou não?

Então está combinado! Tragam O Olho do Dragão e eu lhes entregarei o tal Pó Mágico!

Peguem aqui a SENHA para entrar no esconderijo dos Corsários! Agora saiam daqui e não

voltem sem a jóia!

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2. NO COVIL DOS CORSÁRIOS – TIPO FUGA DE ALCATRAZ

PARTE 1 ESFINGE - E então? Como foram?

Certo! Vocês deverão procurar o esconderijo dos Corsários. Felizmente, dessa vez eu

poderei acompanhá-los até lá, mas não poderei entrar. Não sou uma pessoa bem-vinda ali.

Mas vamos! Mostrarei o caminho.

(Esfinge leva-os até a porta do esconderijo dos Corsários)

É aqui. Como eu disse, não poderei entrar com vocês. Tenham cuidado! Os Piratas são tão

perigosos quanto os Ladrões, mas possuem menos paciência. Se eles acharem que vocês

não têm utilidade nenhuma para eles...

Boa sorte!

(Os jogadores falam a senha e entram.)

BARBEKILL - Parem onde estão, seus mandriões!!!

Quem vocês pensam que são para entrar assim, de cabeça erguida e sem permissão, na

Fortaleza Negra, lar dos Corsários e de seu senhor – Barbekill, o Terrível???

(O grupo explica)

AH! Quá-quá-quá-quá-quá!!!

Então vocês vieram TENTAR recuperar o Olho do Dragão!?!? São muito ingênuos...

Primeiro, por aceitarem uma missão estúpida como essa! E segundo, por acreditarem na

palavra furada de Scarface! Tolos! Vocês nunca conseguirão por suas mãos no Olho do

Dragão! E mesmo que consigam, serão mais tolos ainda se o entregarem aos Ladrões (e

cospe no chão)! Mas chega de conversa! Homens, peguem esses invasores e façam o favor

de trancá-los na masmorra! Aliás...pensei melhor! Vamos leva-los até a Ilha da Caveira!

Não existe possibilidade de eles fugirem de lá!

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(Um grupo de piratas leva os heróis até o ponto inicial do jogo. Os jogadores são

amarrados pelo pulso, dois a dois. Esfinge aparece para ajuda-los, explica o jogo)

OBJETIVO: Conseguir fugir do esconderijo dos Corsários

COMO: Os jogadores são divididos em duplas, dentro das equipes (e têm as mãos

amarradas). Eles devem conseguir os 4 objetos fundamentais para fugir da Ilha-Esconderijo

dos Corsários: o bote, o remo, água e comida. Esses objetos estão com os 4 piratas: Mão-

de-gancho, Perna-de-pau, Olho-de-vidro e Cara-de-mau. Para conseguir os itens, os grupos

devem cumprir tarefas estilo “chame a outra equipe”. Mas cuidado com o Vigia. Se ele

pegar um grupo com sua lanterna, pode tirar um de seus objetos ou até mesmo levar o

grupo de volta ao início.

FINAL: Cumprida a tarefa, os PLASTITÂNICOS recebem a Flauta Ébano (para derrotar o

Velho Ferro) e a senha para a Tumba do Faraó. Na segunda vez, Olho do Dragão (após a

Luneta - para Scarface)

PERSONAGENS: Barbekill, o Corsário; 4 piratas + controladores de jogo + Vigia

MATERIAL: Lanterna para o vigia; barbante (pra prender as duplas); 4 fichas de bote, 4

fichas de remo, 4 fichas de comida e 4 fichas de água; Olho do Dragão; Flauta Ébano (pode

ser uma flauta doce normal)

MONITORES FAZEM:

• Interagem com a equipe;

• Verificam se a equipe está toda junta e se as duplas estão formadas;

• Pedem para que a equipe procure e traga outra para a estação;

• Aplicam a tarefa para as DUAS EQUIPES JUNTAS!;

• Cumprida a tarefa, entregam a ficha para a equipe “LÍDER” (a que trouxe a outra);

• No final, ajudam na organização;

• Barbekill dá a Flauta Ébano aos PLASTITÂNICOS.

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PARTE 2

BARBEKILL – Muito bem...vocês conseguiram fugir da Ilha da Caveira! Ninguém

NUNCA fugiu de lá antes! Como prova de minha admiração, aqui está a Flauta Ébano,

Plastitânicos! Ela deve ser tocada ANTES DE TUDO quando vocês encontrarem o Velho

Ferro! Mas agora fiquei curioso. Para que vocês precisam levar o Olho do Dragão para

Scarface?

(O grupo explica)

Com mil centopéias mancas!!! A cada dia que passa esses trombadinhas (cospe no

chão) estão mais exigentes! Quá-quá-quá-quá-quá!!! Trocar o Olho do Dragão por um reles

Pó Mágico!

Eu precisaria de um motivo muito bom para entregar essa jóia a vocês. Vocês têm

algum? Não??? Foi o que eu imaginei! Façamos o seguinte: me tragam a Luneta Dourada,

um artefato preciosíssimo que está nas mãos do Faraó! Se o fizerem, eu entrego o Olho do

Dragão! Feito? Então, peguem a SENHA para entrar na Tumba do Faraó!

Boa sorte na jornada de vocês!

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3. O IRMÃO DE ESFINGE – TIPO MÁQUINA DO TEMPO X VÍRUS

PARTE 1

ESFINGE – Muito bom, meus amigos! Agora falta pouco! Já temos DOIS dos QUATRO

ARTEFATOS DE SHARYOU! Mas ainda temos um bocado de trabalho! Precisamos

encontrar a tal Luneta Dourada, entregar o Olho do Dragão para Scarface e, só assim,

conseguir o Pó Mágico para salvar Florestan! Além disso, não podemos nos esquecer do

Livro Verde!

Mas vamos uma coisa de cada vez! Agora, temos que conseguir a Luneta que está em poder

do meu irmão, o Faraó! Ele é um homem insano, obcecado por poder! Muito cuidado

quanto entrarem em seus domínios! Muito CUIDADO!

FARAÓ – Mas por que cuidado, irmãozinho?

ESFINGE – Cuidado, pessoal! Ele está aqui, e veio com seus guardas!

FARAÓ – Pode se acalmar, Esfinge! Só vim até aqui dizer que eu NUNCA entregarei a

Luneta Dourada a vocês! Nem a Luneta, nem um dos Artefatos de Sharyou que se encontra

em meu poder! Sua missão, meu irmão, termina aqui!

ESFINGE – É o que você pensa, Faraó! Nós iremos derrota-lo e pegar os artefatos, nem

que seja à força!!!

FARAÓ – Se é assim que você quer, irmãozinho...fique à vontade para tentar! Mas já

adianto: do jeito que as coisas estão, vocês não conseguirão NADA! Nunca sigam aquele

velho ditado: “em time que está ganhando não se meche”! O mundo é feito de mudanças,

Esfinge! E é hora de vocês mudarem! Adeus! (sai)

ESFINGE – Ele tem razão, pessoal! Para derrota-lo, precisamos mudar! O que faremos? (os

grupos devem sugerir a mudança nas equipes) Perfeito! Agora que estamos mudados,

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precisamos banir de uma vez meu irmão para a Zona Negativa! Precisamos fazer uma

Poção capaz de envia-lo para outra dimensão, onde não fará mal a ninguém! Tenho aqui

comigo um ingrediente: o BRANCO! Mas preciso de outros! Agora, é com vocês!

OBJETIVO: Mandar a Múmia de volta para seu tempo.

COMO: Jogadores devem conseguir os ingredientes da poção mágica que abrirá o portal do

tempo. Para isso, devem passar nas estações. Mas existe um detalhe: as equipes devem se

mesclar, dividindo-se através das classes (as baratas do Azul se juntam com as do verde,

etc). Cumpridas as tarefas, eles conseguem os ingredientes: tintas nas seguintes cores –

vermelho, azul, amarelo e preto (o controlador terá a tinta branca). Mas, para ativar o

portal, será necessário 10 cores diferentes (não vale tonalidade: azul claro, azul escuro, etc)

FINAL: Cumprida a tarefa, os grupos recebem a Luneta Dourada e os VIDRÚNICOS

ganham as Runas Mágicas (código para desvendar as Palavras Cabalísticas).

PERSONAGENS: Faraó, 4 Eunucos + controladores de jogo.

MATERIAL: Potes de tinta azul, amarela, vermelha, branca e preta; local para por as 10

cores (um amuleto que possa ser pintado, um círculo mágico, etc), Luneta Dourada, Runas

Mágicas e 4 Cartas-código.

MONITORES FAZEM:

• Interagem com a equipe;

• Verificam se a equipe está toda junta;

• Aplicar a tarefa;

• Se não conseguirem, mandam para Esfinge; se conseguirem, entregam a cor;

• No final, ajudam na organização;

• Runas são entregues aos VIDRÚNICOS.

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LOGÍSTICA:

• EUNUCO 1 – ENTREGA COR PARA PLASTITÂNICOS

• EUNUCO 2 – ENTREGA COR PARA VIDRÚNICOS

• EUNUCO 3 – ENTREGA COR PARA PAPELÉTRICOS

• EUNUCO 4 – ENTREGA COR PARA ALUMINOSOS

PARTE 2

ESFINGE – Muito bem! Vocês conseguiram os DEZ ingredientes da Poção! Agora, vamos

confrontar meu irmão!

FARAÓ – Me procurando outra vez, maninho!

ESFINGE – Sim! E aqui está a arma capaz de detê-lo de uma vez por todas: a poção para a

Zona Negativa!

FARAÓ – Não! A Zona Negativa, não!!!!

ESFINGE – É agora! (faz uma “conjuração”. Faraó some, deixando a Luneta Dourada e

as Runas Mágicas) Conseguimos, amigos! Aqui estão a Luneta e o TERCEIRO

ARTEFATO DE SHARYOU: as Runas Mágicas! Agora, é só entregar a Luneta para

Barbekill! Vamos!!!

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ENTRE-ATO – O RETORNO DE FLORESTAN

EQUIPES VOLTAM ATÉ BARBEKILL

BARBEKILL – Hum...pelo visto vocês conseguiram a Luneta Dourada! Onde ela está?

ESFINGE – É bom você não bancar o espertinho pra cima da gente, Barbekill! Mostre o

Olho do Dragão! (aqui pode haver um novo “caça ao tesouro” se o tempo estiver

sobrando)

BARBEKILL – Muito bem...aqui está, Esfinge! Desconfiado como sempre! Peguem! (eles

trocam os artefatos) Foi bom fazer negócio com vocês! Mandem lembranças minhas

ao...ao...ao...TROMBADINHA! (cospe no chão três vezes e passa o pé em cima) Agora

saiam daqui e nunca mais venham me pedir nada!

EQUIPES VOLTAM ATÉ SCARFACE

SCARFACE – E então? Trouxeram a Jóia???

ESFINGE – Aqui está, Scarface! Agora, nos dê o Pó Mágico!

SCARFACE – Que Pó Mágico???

ESFINGE – Eu sabia! Sabia desde o início que não podíamos confiar em você! Vamos!

Deixe de brincadeiras e nos entregue o Pó!

SCARFACE – Está bem, Esfinge! Não se pode nem brincar um pouco hoje em dia...Aí está

o Pó Mágico! Agora, se não for incômodo, retirem-se de minha casa e não voltem mais!

Estamos entendidos? Adeus!

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EQUIPES VOLTAM ATÉ FLORESTAN

ESFINGE – Agora é o grande momento, pessoal! Finalmente, vamos quebrar esse encanto

do maldito Velho Ferro! Onde está o Pó? Pronto! Agora é só jogar em cima do Florestan

e...PIMBA! (eles jogam o pó. Florestan volta ao normal!)

FLORESTAN – Obrigado, companheiros! Muito obrigado! Pelo visto, eu perdi o melhor

da festa e, ainda por cima, dei o maior trabalho a vocês...

ESFINGE – Que isso, Florestan! Nós não poderíamos te abandonar nunca! Não é

pessoal???

FLORESTAN – Poxa! Obrigado novamente! Mas e aí? Vocês conseguiram o livro???

ESFINGE – Ainda não! Mas descobrimos que, para derrotar o Velho Ferro, não precisamos

apenas do Livro Verde, mas também dos Quatro Artefatos de Sharyou!

FLORESTAN – Os Quatro Artefatos???

ESFINGE – Sim! Até agora conseguimos três: a Poção Alabastrina, a Flauta Ébano e as

Runas Mágicas. Só falta um...

FLORESTAN – Muito bem...então vamos procurar!!!

ESFINGE – Espere um pouco, Florestan! O que é isso colado nas suas costas? Parece um

envelope...

(Ele pega, abre o envelope onde está a primeira carta-código)

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4. O AGENTE SECRETO – TIPO ESPIONAGEM

OBJETIVO: Encontrar o Agente Secreto.

COMO: Jogadores recebem uma carta-código que os levará a algum lugar do sítio. Lá, cada

grupo recebe um rádio (ou algo similar. Se não houver rádio, inventa-se outro modo). Esse

rádio irá passar informações para os grupos: enigmas, localizações, dicas, etc. Durante o

jogo, as equipes devem encontrar 4 envelopes Top-Secret. Ao final, eles encontram o

Agente Secreto e devem lhe entregar os envelopes.

FINAL: Cumprida a tarefa, os PAPELÉTRICOS recebem as Palavras Cabalísticas (para

derrotar Velho Ferro. As palavras devem estar em código, que só pode ser desvendado com

as Runas) e uma maleta (mala, bolsa, etc. Deve ter um cadeado. A chave estará com o

Velho Ferro). O Livro Verde está dentro dela!

PERSONAGENS: Agente Secreto + Controladores de jogo

MATERIAL: 4 rádios, 16 envelopes Top-Secret, Palavras Cabalísticas, Maleta com

cadeado, Livro Verde (só as capas, as páginas serão os mapas da sabedoria – as capas

devem ter o mesmo tamanho dos Mapas da Sabedoria)

MONITORES FAZEM:

• Acompanham as equipes;

• Verificam se nada foi tirado do lugar;

• No final, ajudam na organização;

• Agente dá as Palavras Cabalísticas para os PAPELÉTRICOS.

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FLORESTAN – Bom, pessoal...parece que esse é o destino final! Ali está o homem que

procuramos!

AGENTE – Saudações, bravos e jovens heróis! Venho aqui em nome de todos os povos

que, um dia, viram a beleza da Natureza! Vocês encontraram os meus envelopes? Então,

por favor... (ele recolhe os envelopes). Em agradecimento, devo lhes presentear com o

último Artefato de Sharyou: as Palavras Cabalísticas! Aqui, Papelétricos! Cuidado...seu

segredo é um mistério que já dura muitos séculos! Se vocês desvendarem, as palavras aí

encontradas devem ser ditas em voz alta após o Velho Ferro ter tomado a Poção

Alabastrina ATÉ A ÚLTIMA GOTA! Entenderam? As palavras vêm no final! No Final!!!!

E falando em final, tomem aqui esta maleta! Como podem ver, ela está trancada! A chave

se encontra em poder do Velho Ferro! Assim que vocês o derrotarem, peguem a chave em

seu pescoço e abram a maleta! Muitos segredos se encontram aí dentro!

Agora, preciso ir! Fnord!

FLORESTAN – Fnord, Mãe Gaia...digo...Fnord, Agente Secreto! Fnord!

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FINAL – A DERROTA DE VELHO FERRO

FLORESTAN – Agora, companheiros, com os Quatro Artefatos de Sharyou podemos

derrotar o Velho Ferro! Vamos encontra-lo! Será muito fácil! Ele emana uma energia

negativa que é facilmente detectado pela minha bola de cristal! Vamos!

(Eles procuram o esconderijo do Velho Ferro)

ESFINGE – É aqui, pessoal! Eu sinto o fedor desse verme putrefato de longe!!! Ele está

escondido bem aqui!!!

(Aparição do Velho Ferro. Efeitos de luz, fumaça e som!)

VELHO FERRO – Huhauahuahauahuahau!!! Então, vocês vieram??? Não desistiram

ainda? Só porque conseguiram livrar seu amiguinho de meu feitiço, não significa que

conseguirão me deter! Hauhauhauahau!!!

FLORESTAN – Rápido! É esse o momento! Usem os Artefatos de Sharyou!!! Qual era a

ordem mesmo???

Com os 4 artefatos mágicos (poção alabastrina, flauta ébano, palavras cabalísticas e

runas mágicas) os jogadores podem confrontar o Velho Ferro. Primeiro, devem paralisá-lo

com a flauta. Depois, usam a poção. Por fim, lêem as palavras. Quando ele cair, eles

podem pegar a chave em seu pescoço e abrir a maleta. No final, devem perceber que o

livro em si não é nada, mas o conhecimento que eles adquiriram durante a semana é que é

a grande arma capaz de mudar o mundo. Eles devem ler os conhecimentos e, nesse

momento, Velho Ferro deverá acordar. Se ele disser “amigos”, terão vencido. Agora, se

ele disser “peripatéticos”, tudo estará perdido...

MATERIAL: Chave da maleta, recursos áudio-visuais, etc

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FLORESTAN – Parabéns, companheiros! Nossa jornada foi um sucesso! Derrotamos o

odioso Velho Ferro!

ESFINGE – E não só isso, Florestan! Nessa semana, nossos jovens amigos demonstraram

que é aos poucos e fazendo uma coisa por vez, por menor que ela seja, que iremos

conseguir MUDAR O MUNDO!

FLORESTAN – Verdade! E no dia de hoje, vocês ainda não mudaram o mundo! Mas

deram um passo importante: derrotaram o Velho Ferro! Só que ele não é o único inimigo da

Mãe Natureza! Existem muitos outros espalhados por aí! E cabe a nós, todos nós, combatê-

los!

ESFINGE – Exato! Além disso, vocês devem ter percebido que se “conformar” com a

situação não leva a nada! E que, sim, é possível mudar a opinião das pessoas que pensam

desse jeito! Muitas vezes, elas só precisam de um pouco de instrução ou de ajuda!

FLORESTAN – E são essas pessoas, muitas vezes, que possuem a chave capaz de ajudar a

salvar nosso mundo! Ah...também é importante dizer que vocês aprenderam que é possível

fazer as coisas sem a ajuda de um velho mago não-tão-sábio! Vocês se viraram bem sem

mim!

ESFINGE – Que isso, Florestan! Você fez muita falta! Mas foi importante sua ausência,

pois percebemos que até os nossos maiores “inimigos” possuem papel importante na hora

de salvar o mundo! Se não fosse Scarface, Barbekill e o Faraó, nós nunca teríamos

conseguido! E quem era aquele agente secreto?

FLORESTAN – Um homem muito sábio, pode acreditar! Muito sábio mesmo! Ele já andou

muito por aqui...e sempre estará conosco!

ESFINGE – Acima de tudo, Florestan, nossos amigos adquiriram CONHECIMENTO!

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FLORESTAN – Sim! E o Livro Verde nada mais é do que isso: conhecimento!

Conhecimento acumulado! Eis a salvação, a verdadeira chave para o Vale Encantado!

ESFINGE – E agora?

FLORESTAN – Agora, meu amigo, é hora de irmos embora! Voltar à nossa vidinha...

ESFINGE – Concordo! Sei que o mundo ficará em ótimas mãos! Nas mãos dos nossos

bravos heróis! Foi uma honra lutar ao seu lado!

FLORESTAN – Faço minhas suas palavras, Esfinge! Lembrem-se: CONHECIMENTO é a

única grande arma capaz de mudar o mundo! Não se esqueçam disso JAMAIS! E, mais

importante, passem isso adiante! Avisem seus amigos, seus pais, as pessoas na

rua...CONHECIMENTO! Adeus e FNORD!

ESFINGE – FNORD, bravos heróis! Até a próxima!

(E desaparecem no ar!)

FIM