ricard, isabelle - procedimentos sobre legionella no brasil e no mundo

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Procedimentos sobre Legionella no Brasil e no mundo Isabelle Ricard Mestrado (D.E.A): Ciências dos Alimentos - Controle de Qualidade - Biotecnologias - Graduação em Bioquímica – Genética molecular - Universidade Bordeaux – França Gerente técnico da Ondeo Nalco Brasil Divisão Envirolab Mestranda da faculdade de Saúde Pública – Departamento Práticas de Saúde. A legionella é uma bactéria ubiqüitária, ou seja, presente em todos os corpos de águas naturais e artificiais. Ela prolifera em lagos, rios, córregos e em sistemas construídos pelo homem, como torres de resfriamento,caixas d´água quente e fria e água potável, chuveiros spas umidificadores e nebulizadores. A contaminação no ser humano se dá através da inalação de aerossóis contendo a bactéria virulenta. Há também evidências de contaminação através da inalação da bactéria durante a ingestão de água contaminada. Em muitos aspectos a bactéria Legionella e a doenças dos legionários são conseqüência da era tecnológica. A tecnologia favoreceu muitas das epidemias proporcionando meios eficientes de transmissão da bactéria e aumentando o número de suscetíveis, graças aos avanços da medicina. A população de risco inclui idosos, imuno-comprometidos, pessoas com doenças pulmonares prévias ou disfunções hepáticas. O risco aumenta para a população masculina, fumante, acima dos 40 anos. A transmissão de pessoa a pessoa ainda não foi descrita e a dose mínima para contágio não foi determinada, mas não é seguro admitir que baixas concentrações de Legionella não possam provocar danos a saúde. Os principais fatores de crescimento da bactéria são a temperatura, entre 20 e 45ºC, a presença de nutrientes e água estagnada. Qualquer infecção por Legionella é chamada de legionelose, e provoca desde uma sintomatologia de gripe severa até uma pneunomia fatal, em função da virulência da bactéria e da suscetibilidade do hospedeiro. A Doença do Legionário é uma forma muito especifica de legionelose, e é causada pela Legionella pneumophila sorogrupo 1. Todos os outros sorogrupos de L..pneumophila, inclusive algumas legionellas fluorescentes , podem causar pneumonia. O índice de letalidade da doença em sua forma mais grave gira em torno de 12%, mas este índice pode chegar a 20% entre a população mais suscetível. Brasil e mundo No Brasil existem poucas ou nenhuma informação sobre a incidência da doença. Entre 1990 e 1993, a unidade de nefrologia do Hospital das Clinicas de São Paulo teve vários casos comprovados de Legionelose, inclusive com óbitos, mas é um dos raros casos documentados existentes no país. O CDC (Center for Disease Control and Prevention) estima que entre 10.000 e 20.000 casos de Doença dos Legionários ocorram a cada ano nos Estados Unidos. Desses, só 1.500 a 1.800

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Procedimentos sobre Legionella no Brasil e no mundo Isabelle Ricard

Mestrado (D.E.A): Ciências dos Alimentos - Controle de Qualidade - Biotecnologias - Graduação em Bioquímica – Genética molecular - Universidade Bordeaux – França

Gerente técnico da Ondeo Nalco Brasil Divisão Envirolab Mestranda da faculdade de Saúde Pública – Departamento Práticas de Saúde.

A legionella é uma bactéria ubiqüitária, ou seja, presente em todos os corpos de águas naturais e artificiais. Ela prolifera em lagos, rios, córregos e em sistemas construídos pelo homem, como torres de resfriamento,caixas d´água quente e fria e água potável, chuveiros spas umidificadores e nebulizadores. A contaminação no ser humano se dá através da inalação de aerossóis contendo a bactéria virulenta. Há também evidências de contaminação através da inalação da bactéria durante a ingestão de água contaminada. Em muitos aspectos a bactéria Legionella e a doenças dos legionários são conseqüência da era tecnológica. A tecnologia favoreceu muitas das epidemias proporcionando meios eficientes de transmissão da bactéria e aumentando o número de suscetíveis, graças aos avanços da medicina. A população de risco inclui idosos, imuno-comprometidos, pessoas com doenças pulmonares prévias ou disfunções hepáticas. O risco aumenta para a população masculina, fumante, acima dos 40 anos. A transmissão de pessoa a pessoa ainda não foi descrita e a dose mínima para contágio não foi determinada, mas não é seguro admitir que baixas concentrações de Legionella não possam provocar danos a saúde. Os principais fatores de crescimento da bactéria são a temperatura, entre 20 e 45ºC, a presença de nutrientes e água estagnada. Qualquer infecção por Legionella é chamada de legionelose, e provoca desde uma sintomatologia de gripe severa até uma pneunomia fatal, em função da virulência da bactéria e da suscetibilidade do hospedeiro. A Doença do Legionário é uma forma muito especifica de legionelose, e é causada pela Legionella pneumophila sorogrupo 1. Todos os outros sorogrupos de L..pneumophila, inclusive algumas legionellas fluorescentes , podem causar pneumonia. O índice de letalidade da doença em sua forma mais grave gira em torno de 12%, mas este índice pode chegar a 20% entre a população mais suscetível. Brasil e mundo No Brasil existem poucas ou nenhuma informação sobre a incidência da doença. Entre 1990 e 1993, a unidade de nefrologia do Hospital das Clinicas de São Paulo teve vários casos comprovados de Legionelose, inclusive com óbitos, mas é um dos raros casos documentados existentes no país. O CDC (Center for Disease Control and Prevention) estima que entre 10.000 e 20.000 casos de Doença dos Legionários ocorram a cada ano nos Estados Unidos. Desses, só 1.500 a 1.800

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são notificados às autoridades sanitárias. Na Inglaterra, 150 a 200 casos são notificados anualmente, mas a estimativa é que na realidade o número de casos gire em torno de 1.100 por ano. Desde 1990 foram descritos 54 surtos de Legionelose na Espanha, afetando um total de 805 pessoas. Na França, o Hospital Georges Pompidou foi temporariamente interditado em Julho do ano passado até conseguir manter sob controle os casos de Legionelose, 6 deles fatais. O assunto, portanto, é sério e os países europeus já estão trabalhando para prevenir e controlar o risco de transmissão da doença. Na Inglaterra, o Health and Safety Executive (HSE), órgão regulador, tornou obrigatório em Janeiro de 2001 o controle da bactéria Legionella em sistemas de águas. A Europa, que já possui diversas normas e recomendações técnicas, deve se alinhar seguindo orientações da Comissão Européia. Os Estados Unidos não possuem uma regulamentação federal mas a OSHA (Occupational Safety and Health Admin.), o CTI (Cooling Tower Institute) e a ASHRAE (Amer.Soc. of Heating, Refrig. And Air Conditioning Engineers) já publicaram recomendações técnicas sobre o assunto. No Brasil, algumas de nossas maiores empresas, cujas sedes ficam na Europa ou Estados Unidos, já têm orientações quanto à necessidade de prevenir o risco de transmissão da doença. Essa conscientização, ainda que incipiente, já movimenta as empresas do mercado. A pesquisa da bactéria, por si só, requer estruturas e procedimentos específicos e adequados, pois a Legionella é uma bactéria fastidiosa que exige metodologias analíticas e know-how especializados para poder ser detectada com sensibilidade suficiente. Metodologias analíticas inadequadas freqüentemente fornecem “falsos negativos” ou “falsos positivos”. A confiabilidade da análise é fundamental, porém, não suficiente. Um resultado negativo pode dar uma sensação de segurança falsa, e um resultado positivo pode criar uma situação de alarme injustificado. Então o que fazer? A abordagem mais adequada no que diz respeito ao controle da Legionella é o conceito de Risco. O Risco é o perigo ou a possibilidade do perigo de um determinado evento acontecer e integra dois componentes essenciais : a freqüência e a magnitude do evento, relacionadas de maneira inversamente exponencial. Assim, um evento que apresenta uma taxa de fatalidade 100 vezes superior a outro evento qualquer, por exemplo um acidente de avião, tem uma probabilidade mais de 100 vezes inferior de acontecer do que eventos de menor magnitude, por exemplo, cair de bicicleta. Entretanto, para quaisquer eventos, não existe o risco zero. É com base neste conceito que foi desenvolvida a legislação Inglesa, de maneira bastante criteriosa, a respeito do controle de Legionella. É necessário, antes de mais nada, verificar se um determinado sistema de água reúne as condições necessárias à entrada, proliferação e transmissão da bactéria naquele sistema. A identificação da Legionella na água unicamente não permite avaliar o risco que a instalação oferece no que diz respeito à transmissão da doença. A estratégia de controle também deve priorizar a prevenção da exposição dos suscetíveis aos

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aerossóis contaminados. Para isso um levantamento criterioso das instalações e sistemas de águas é necessário, estabelecendo, além dos dados técnicos das instalações, canais de comunicação, responsabilidades e procedimentos : é a Análise de Risco. A análise das informações levantadas, por profissionais especializados e tecnicamente competentes, sua atualização periódica e seu gerenciamento permitem determinar as ações necessárias para a minimização do risco. O trabalho deve ser encarado como um programa continuado de controle de qualidade, em todos os sistemas de água. A análise da água para fins de pesquisa da presença da bactéria é somente um dos critérios de avaliação do risco, e não pode ser de forma alguma o único critério. Assim, é fundamental que essa preocupação com a Saúde Pública, que já faz parte das boas práticas de gerenciamento nos países ditos de primeiro mundo, chegue ao Brasil com o conceito correto. É importante que a exposição a agentes biológicos como fator de agressão à saúde humana, que já faz parte das preocupações dos órgãos de Saúde Pública Brasileiros através da Portaria 3523 de 1998 do Ministério da Saúde e da Resolução ANVISA 176 de 2000, inclua a exposição ao agente biológico Legionella e que as medidas de controle necessárias sejam adotadas na sua totalidade, corretamente e que não se tornem somente mais uma “febre” para fazer análises de Legionella.