revista quincas | edição cicatriz

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AGOSTO 2014_REVISTA COLABORATIVA QUINCAS_Edicão 03_CICATRIZ

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A Revista Quincas é um projeto de revista cultural colaborativa.

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AGOSTO 2014_REVISTA COLABORATIVA QUINCAS_Edicão 03_CICATRIZ

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AGOSTO 2014

Edição 03_ Revista ColaborativaCICATRIZ

Projeto Gráfico_NATALIA NUNESEdição_GIOVANA MORAES SUZIN

Capa_GABRIELA PORTILHO

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colagens_NATALIA NUNES

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Sofri um seqüestro e fui expurgada. Não devo mais ser encontrada com freqüência entre linhas e orações. Antes, era uma insígnia de distinção, sinônimo de independência em qualquer argüição. Era como uma cicatriz, que não permite jamais o esquecimento. Por conseqüência, quem antes omitia, comigo não podia mais calar. A eloqüência ficava mais eloqüente. A cada cinqüenta anos, dez qüinqüênios felizes. Até o enxágüe no banho era melhor. Mas os reformistas não me agüentaram. Apagaram meu rastro. Tremo só de pensar. Eu, que só queria formar autos-relevos de tinta em cada página talhada de significados. Minha tranqüilidade acabou. Virei delinqüente.

editora de Quincas_GIOVANA MORAES SUZIN

TREMA

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COLABORADORES

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É historiador e doutor em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Professor no Departamento de Estudos Especializados em Educação do Centro de Ciências da Educação da UFSC. Dedica-se também à construção de materiais didáticos e formação de professores, além de ser letrista e compositor, com um CD gravado de forma independente. Para saber mais, conheça o http://clioinsone.blogspot.com.br/.

JÉFERSON DANTAS_ (BAGÉ RS, 1973)

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É caipira do interior de São Paulo, mas vive em Florianópolis há 7 anos. Não acredita em futebol, mas é torcedor do Clube Atlético Linense, o Elefante da Noroeste. Ganha o pão como funcionário público, atuando na promoção dos direitos humanos dos trabalhadores. Cavalga nuvens como poeta e compositor. Está finalizando as gravações de seu primeiro álbum. Mais em https://soundcloud.com/manfra.

BRUNO MANFRA_(LINS SP, 1981)

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André Luiz Massayuki Ota é mais conhecido pelo codinome de Tofu Verde. Formado em Desenho Industrial pela Unesp de Bauru, é filósofo de banheiro que mais retweeta porque não sabe escrever. Desde pequeno é desenhista de parede e tinha mais de um amigo imaginário e por isso não tinha tempo para os “reais”. Site: www.behance.net/tofuverde.

TOFU VERDE_(Bauru SP, 1982)

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Fernando desenha desde pequeno. Formado em Desenho Industrial, atua no mercado há 10 anos – mas ultimamente tem se arriscado na área da fotografia e da caligrafia. Ilustrações e quadrinhos sempre fizeram parte de seu universo e são fontes de inspiração para seus trabalhos. Faz uso de diversas técnicas, da aquarela a pintura digital, sempre à procura de resultados surpreendentes. http://redcapstudio.tumblr.com

FERNANDO MENEZES_(Marília SP, 1984)

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Nascida em São Bernardo, às 22h45, prematura. Trabalha como redatora publicitária em horário comercial. Em horário não-comercial, escreve em seu blog Abra a Janela (www.abrajanela.com.br), mantém seu projeto de fotografia/linguagem, o Bonito Português (www.bonitoportugues.com.br) e ainda o Feel the Butterfly (sobre amor, claro www.feelthebutterfly.com). Além disso, escreve cartas e e-mails gigantes, já que estes não tem a maldita opção “mensagem visualizada”.

BRUNA CASTRO_(São Bernardo do Campo SP, 1988)

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É paulistana crescida no interior, de onde vieram algumas das suas cicatrizes – já se mudou de casa mais de 17 vezes. Jornalista, escreve sobre ciências e astronomia, mas pira mesmo é em astrologia. Com a fotografia, tem um caso de amor. É do time dos fotógrafos amadores, os fotógrafos por amor. Nas horas vagas, faz parte do projeto The Smell of Dust, e do coletivo paulistano Socionautas. Muda de humor a cada lua, sonha com água quase todos os dias e anda apaixonada pela palavra “mistério”. Para ver mais: http://gabiportilho.com/

GABRIELA PORTILHO_(São Paulo SP, 1986)

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Se envolveu no mundo do grafite quando tinha 13 anos, no bairro da Mooca em São Paulo. Ele e mais um amigo começaram a decorar o bairro com formas e cores, apresentando o grafite a pessoas que não tinham acesso à arte na década de 90. Ao longo dos anos, Corte veio trabalhando e aperfeiçoando técnicas e estilos. Atualmente usa formas geométricas que representam a cidade, como uma extensão da arquitetura urbana, porém com cores. A ideia é contrastar o colorido com o cinza.

ANDY CORTE_(Santos SP, 1983)

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hq_TOFU VERDE

CASA, COZINHA E BANHEIRO

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prosa poética_JÉFERSON DANTAS

VOZES CICATRIZADAS Dias de portas fechadas e um bilhete na mesa contando da ausência. Lembro-me da carta última, da doçura do beijo que fizeste questão de registrar como algo bom de nossa turva intimidade. Dias de mastins furiosos, cheiros aziagos pela casa; por certo roupas e louças sujas num concerto nauseabundo a infestar quartos e a pequena sala semimobiliada. Um toco de cigarro na sacada. Acendo-o e firo os dedos amarelecidos. Três baforadas. Está amanhecendo na cidade-ilha. Pássaros em sinfonia combinam arranjos sonoros com grilos e sapos próximos de um fétido córrego que carrega os túrgidos pensamentos.

*** (Voz um): “Preciso ser amada e idolatrada e rejeito o teu amor piedoso. Tua piedade é escape e rota de fuga. Vontade de não encarar tudo o que macula tua rasteira verdade”.(Voz dois): “Preciso ser amado. Você se contenta com flores arrancadas da garganta. Eu necessito de todo o sangue e de toda entrega sem limites”!

*** Dei-me conta tardiamente que ela amava as flores arrancadas da garganta e os destinos da perversidade. Abandonamos o leito há muito tempo e o amor se transformou em retilíneo esquecimento. Nenhuma fábula cavalheiresca seria capaz de nos desnudar como nos tempos das promessas pueris. O meu espírito inquieto só conseguia desfrutar as excentricidades da mente.

Mas, evidente que não fui capaz de esquecê-la. Joia de precipícios e os seios de fogo que brincavam em minha boca como brincadeira de frescor perfeito. O costume do gozo era a nossa dádiva depois de cada fim de dia ordinário. E aquele bilhete foi a véspera de uma solidão eterna. A história se acabara... e eu com os reflexos passados, fábulas de vento que não dormia... O esquecimento é pior do que a morte. No fundo de nossa ruína este foi o elevado preço do mergulho de nossas vozes. O esquecimento é a última etapa de um auto-abandono. Aos poucos tudo é terra arrasada. Antes, nossas bocas despertavam muito antes da aurora e os nossos corpos se impregnavam de sinfonias angélicas sob as peles incandescentes. E olhávamos para o empíreo e tínhamos certeza de que o catarro da discórdia dava vazão para um firmamento verde-esmeralda... e esse era o pulmão do mundo imaginado... uma transcendência límpida que ardia nossos olhos e lacrimejávamos como se estivéssemos na dimensão infante dos primeiros desejos. Tudo se desmanchava diante dos horários fixos de raros prazeres. O despertar do transe era de uma violência singular. Ficávamos grudados e não queríamos sair do leito. Os exploradores só existem para nos deixar com essa cara de vira-latas abatidos... Os teus olhos eram rochas despencando... e a arte era covarde para expressar todo o martírio... portas batendo...vazios e giletes dilacerando o peito...

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ilustração_FERNANDO MENEZES

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SERPENTES DA NOITEpoesia_BRUNO MANFRA

Da noite o pouco que sobra às cobras no chão invadindo os pensamentos Que o vento não levou ficou um rasgo na pele da mordida desta temida traiçoeira a marca o resto o que sobrou o que não vai não sai não cai

no esquecimento por mais que tento o vento não leva de jeito nenhum de forma nenhuma e a forma não é vazio é frio é frio é frio do calafrio

do veneno desta intrusa residente permanente no lar de uma cabeça pensante não-triunfante não-esquecente que não deixou passar o que o

que ficou ficou ficou fincou os dentes em fila como um pente de pontas agudas e venenosas injetou o veneno o veneno do não-esquecimento do lamento residente na mente na mente na mente como uma culpa absurda e suja gravada no hiperespaço do hipocampo o veneno o veneno o veneno

O que sobra da noite a culpa a culpa de não ter feito tudo tudo ouo oposto não ter deixado nada nada nada nada negligenciado um estalo

me veio agora como se visse uma criança que chora quando descobre o mundo não mudo e deixa o veneno derramar depois de tanto o guardar

em barris de carvalho envelhecendo dentro da cuca da cuca da cuca e de fato derrama e some e volta toda a fome sem nome do tudo no mundo.

ilustração_FERNANDO MENEZES

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decidimos que passaríamos a noite juntos, pela primeira vez. quando tirou sua camiseta, havia uma cicatriz que atravessava do peito até a barriga. ele era praticamente um desconhecido para mim e a intimidade veio, primeiro, em forma de sexo. mais tarde, já cansados, acomodei minha cabeça no seu ombro, e fiquei tentando imaginar como ele havia se machucado. parecia tão profundo. tão logo, ele mesmo contou que seu coração foi transplantado. duas vezes. o primeiro, seu corpo rejeitou. fiquei em silêncio e me acomodei nele para escutar sua história. mas, no fundo, eu estava concentrada escutando suas batidas. era outro ritmo e outra intensidade. eu e essa mania de escutar o coração do outro, ao mesmo tempo em que conto as minhas batidas no pulso. sempre acho que se tiver batendo ao mesmo tempo, é um bom sinal. eu não conseguia parar de pensar que aquele homem do meu lado teve em seu corpo o coração de outras duas pessoas. era um sobrevivente. irônico. só eu sei o quanto eu quis dizer que eu também tinha uma cicatriz tão profunda, coincidentemente, também causada por um coração fraco. só era invisível aos olhos de um desconhecido.

PROFUNDOtexto_BRUNA CASTRO

ilustração_FERNANDO MENEZES

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CICATRIZESfotografias_GABRIELA PORTILHO

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CRATERAS, bactérias sobre pele, São Paulo, 1998

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FERIDA ABERTA, lascas de epiderme sobre carne, São Paulo, 2014

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ACIDENTE, chão áspero sob pele, ilha de Koh Phangan, Tailândia, 2012

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TATUAGEM, tinta sob epiderme, São Paulo, 2011

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RACHADURAS, compressão de dentes sobre língua, Marília, SP, 1956

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FERIDA ABERTA, lascas de epiderme sobre carne, São Paulo, 2014

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ANEURISMA, catéter intra-arterial, São Paulo, 2011

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UMBIGO, queda natural de cordão umbilical, 1985

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PEITO ABERTO, bisturi à frio com ruídos espirituais, verão, 1989

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CORTEgrafite_ANDY CORTE

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PUBLICAÇÃO INDEPENDENTE

Todos os direitos reservados aos autores

direção de arte_NATALIA NUNES (Macatuba SP, 1984)

É jornalista e historiadora e trabalha no Almanaque Abril, na Editora Abril, em São Paulo. É curiosa, insone, exagerada e coleciona pequenos prazeres - seus e alheios. Nascida gaúcha, tem o coração catarinense, mas seus pés são ciganos e não gostam de acomodação. Gosta de gente, de se perder em viagens e em sonoridades múltiplas. Escreve sobre música e outras pirações no blog http://pandorga.mus.br/

É designer de formação, e o que mais gosta de fazer é se envolver em propostas como a Quincas. Adora mesmo, pararia todo o resto do que está fazendo para se debruçar em projetos atraentes. Mantém alguns blogs de referências, os quais também acha atraentes, como o http://fuckmeproperly.tumblr.com/

edicão_GIOVANA MORAES SUZIN (Vacaria RS, 1987)

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