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2015/1 REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO DESPORTO

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Page 1: REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO …Mariana de Carvalho, Filip Boen, José Pedro Sarmento, Jeroen Scheerder. Adaptação para a população portuguesa de intrumentos de avaliação

2015/1REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO DESPORTO

Page 2: REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO …Mariana de Carvalho, Filip Boen, José Pedro Sarmento, Jeroen Scheerder. Adaptação para a população portuguesa de intrumentos de avaliação

ÍNDICE

Nota Editorial — Uma proclamação

digna da Universidade: Haja decência,

equidade e respeito!

Jorge Bento.

What brings youngsters

into the stadium? Sociopsychological

predictors of soccer attendance

among Belgian and Portuguese

young fans

Mariana de Carvalho, Filip Boen, José Pedro

Sarmento, Jeroen Scheerder.

Adaptação para a população

portuguesa de intrumentos

de avaliação da qualidade,

satisfação e fidelização

de clientes em centros de fitness

Arnaldino Ferreira, Cláudia Dias,

António Manuel Fonseca.

Transferência intermanual

de aprendizagem: o efeito

da aquisição em tarefas

de destreza manual

Shirley Regina Batista, Paula Rodrigues,

Luís Moreira, Olga Vasconcelos.

9

21

41

64

79

99

115

Liderança dos presidentes

das federações olímpicas brasileiras:

Análise da autopercepção

das competências em função

da formação académica

Daiane Miranda de Freitas, Israel Teoldo Costa,

Maria José Carvalho, António Manuel Fonseca.

Prontidão motora. Uma revisão

do conceito, operacionalização

e sua aplicação no contexto escolar

Cláudia Malafaya, Go Tani, José Maia.

Contributos para uma cultura

da nutrição humana

José Augusto Rodrigues dos Santos.

2015/1REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO DESPORTO

Page 3: REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO …Mariana de Carvalho, Filip Boen, José Pedro Sarmento, Jeroen Scheerder. Adaptação para a população portuguesa de intrumentos de avaliação

Pablo Greco (UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS)

Paula Mota (UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO)

Paulo Farinatti (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO)

Paulo Machado (UNIVERSIDADE MINHO)

Pedro Sarmento (UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA)

Ricardo Petersen (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL)

Sidónio Serpa (UNIVERSIDADE TÉCNICA LISBOA)

Silvana Göllner (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL)

Valdir Barbanti (UNIVERSIDADE SÃO PAULO)

Víctor da Fonseca (UNIVERSIDADE TÉCNICA LISBOA)

Víctor Lopes (INSTITUTO POLITÉCNICO BRAGANÇA)

Víctor Matsudo (CELAFISCS)

Wojtek Chodzko-Zajko (UNIVERS. ILLINOIS URBANA-CHAMPAIGN)

FICHA TÉCNICA DA RPCD

Revista Portuguesa de Ciências do Desporto Publicação quadrimestral da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto [ISSN 1645-0523]

DESIGN E PAGINAÇÃO

Rui Mendonça

COLABORAÇÃO Noémia Guarda

IMPRESSÃO E ACABAMENTO

Sersilito

TIRAGEM 500 exemplares

FOTOGRAFIA NA CAPA

André Gonçalves, 2015

© A REPRODUÇÃO DE ARTIGOS, GRÁFICOS

OU FOTOGRAFIAS DA REVISTA SÓ É PERMITIDA

COM AUTORIZAÇÃO ESCRITA DO DIRECTOR.

ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA

REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO DESPORTO Faculdade de Desporto da Universidade do Porto Rua Dr. Plácido Costa, 91 4200.450 Porto — Portugal Tel: +351—225074700; Fax: +351—225500689 www.fade.up.pt [email protected]

PREÇO DO NÚMERO AVULSO

Preço único para qualquer país: 20€

A Revista Portuguesa de Ciências do Desportoestá representada na plataforma SciELO Portugal

— Scientific Electronic Library Online [site], no SPORTDiscus e no Directório e no Catálogo Latindex — Sistema regional de informação em linha para revistas científicas da América Latina, Caribe, Espanha e Portugal.

CORPO EDITORIAL DA RPCD

DIRECTOR Jorge Olímpio Bento (UNIVERSIDADE DO PORTO)

CONSELHO EDITORIAL Adroaldo Gaya (UNIVERSIDADE FEDERAL RIO GRANDE SUL, BRASIL) António Prista (UNIVERSIDADE PEDAGÓGICA, MOÇAMBIQUE)

Eckhard Meinberg (UNIVERSIDADE DESPORTO COLÓNIA, ALEMANHA)

Gaston Beunen (UNIVERSIDADE CATÓLICA LOVAINA, BÉLGICA)

Go Tani (UNIVERSIDADE SÃO PAULO, BRASIL)

Ian Franks (UNIVERSIDADE DE BRITISH COLUMBIA, CANADÁ)

João Abrantes (UNIVERSIDADE TÉCNICA LISBOA, PORTUGAL)

Jorge Mota (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)

José Alberto Duarte (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL) José Maia (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL) Michael Sagiv (INSTITUTO WINGATE, ISRAEL)

Neville Owen (UNIVERSIDADE DE QUEENSLAND, AUSTRÁLIA)

Rafael Martín Acero (UNIVERSIDADE DA CORUNHA, ESPANHA)

Robert Brustad (UNIVERSIDADE DE NORTHERN COLORADO, USA)

Robert M. Malina (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE TARLETON, USA)

EDITOR CHEFE António Manuel Fonseca (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)

EDITORES ASSOCIADOS Amândio Graça (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)

António Ascensão (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)

João Paulo Vilas Boas (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)

José Maia (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)

José Oliveira (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)

José Pedro Sarmento (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)

Júlio Garganta (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)

Olga Vasconcelos (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)

Rui Garcia (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)

CONSULTORES Alberto Amadio (UNIVERSIDADE SÃO PAULO)

Alfredo Faria Júnior (UNIVERSIDADE ESTADO RIO JANEIRO)

Almir Liberato Silva (UNIVERSIDADE DO AMAZONAS)

Anthony Sargeant (UNIVERSIDADE DE MANCHESTER)

António José Silva (UNIVERSIDADE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO)

António Roberto da Rocha Santos (UNIV. FEDERAL PERNAMBUCO)

Carlos Balbinotti (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL)

Carlos Carvalho (INSTITUTO SUPERIOR DA MAIA)

Carlos Neto (UNIVERSIDADE TÉCNICA LISBOA)

Cláudio Gil Araújo (UNIVERSIDADE FEDERAL RIO JANEIRO)

Dartagnan P. Guedes (UNIVERSIDADE ESTADUAL LONDRINA)

Duarte Freitas (UNIVERSIDADE DA MADEIRA)

Eduardo Kokubun (UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA, RIO CLARO)

Eunice Lebre (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)

Francisco Alves (UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA)

Francisco Camiña Fernandez (UNIVERSIDADE DA CORUNHA)

Francisco Carreiro da Costa (UNIVERSIDADE TÉCNICA LISBOA)

Francisco Martins Silva (UNIVERSIDADE FEDERAL PARAÍBA)

Glória Balagué (UNIVERSIDADE CHICAGO)

Gustavo Pires (UNIVERSIDADE TÉCNICA LISBOA)

Hans-Joachim Appell (UNIVERSIDADE DESPORTO COLÓNIA)

Helena Santa Clara (UNIVERSIDADE TÉCNICA LISBOA)

Hugo Lovisolo (UNIVERSIDADE GAMA FILHO)

Isabel Fragoso (UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA)

Jaime Sampaio (UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO)

Jean Francis Gréhaigne (UNIVERSIDADE DE BESANÇON)

Jens Bangsbo (UNIVERSIDADE DE COPENHAGA)

João Barreiros (UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA)

José A. Barela (UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA, RIO CLARO)

José Alves (ESCOLA SUPERIOR DE DESPORTO DE RIO MAIOR)

José Luis Soidán (UNIVERSIDADE DE VIGO)

José Manuel Constantino (UNIVERSIDADE LUSÓFONA)

José Vasconcelos Raposo (UNIV. TRÁS-OS-MONTES ALTO DOURO)

Juarez Nascimento (UNIVERSIDADE FEDERAL SANTA CATARINA)

Jürgen Weineck (UNIVERSIDADE ERLANGEN)

Lamartine Pereira da Costa (UNIVERSIDADE GAMA FILHO)

Lilian Teresa Bucken Gobbi (UNIV. ESTADUAL PAULISTA, RIO CLARO)

Luis Mochizuki (UNIVERSIDADE SÃO PAULO)

Luís Sardinha (UNIVERSIDADE TÉCNICA LISBOA)

Luiz Cláudio Stanganelli (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA)

Manoel Costa (UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO)

Manuel João Coelho e Silva (UNIVERSIDADE DE COIMBRA)

Manuel Patrício (UNIVERSIDADE DE ÉVORA)

Manuela Hasse (UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA)

Marco Túlio de Mello (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO)

Margarida Espanha (UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA)

Margarida Matos (UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA)

Maria José Mosquera González (INEF GALIZA)

Markus Nahas (UNIVERSIDADE FEDERAL SANTA CATARINA)

Mauricio Murad (UNIVERS. ESTADO RIO DE JANEIRO E UNIVERSO)

Ovídio Costa (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)

A RPCD TEM O APOIO DA FCT

PROGRAMA OPERACIONAL CIÊNCIA,

TECNOLOGIA, INOVAÇÃO DO QUADRO

COMUNITÁRIO DE APOIO III

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NORMAS DE PUBLICAÇÃO NA RPCD

TIPOS DE PUBLICAÇÃOINVESTIGAÇÃO ORIGINAL

RPCD publica artigos originais relativos a todas as áreas das ciências do desporto;

REVISÕES DA INVESTIGAÇÃO

A RPCD publica artigos de síntese da literatura que contribuam para a generalização do conhecimento em ciências do desporto. Artigos de meta-análise e revisões críticas de literatura são dois possíveis modelos de publicação. Porém, este tipo de publicação só estará aberto a especialistas convidados pela RPCD.

COMENTÁRIOS

Comentários sobre artigos originais e sobre revisões da investigação são, não só publicáveis, como são francamente encorajados pelo corpo editorial;

ESTUDOS DE CASO

A RPCD publica estudos de caso que sejam considerados relevantes para as ciências do desporto. O controlo rigoroso da metodologia é aqui um parâmetro determinante.

ENSAIOS

A RPCD convidará especialistas a escreverem ensaios, ou seja, reflexões profundas sobre determinados temas, sínteses de múltiplas abordagens próprias, onde à argumentação científica, filosófica ou de outra natureza se adiciona uma forte componente literária.

REVISÕES DE PUBLICAÇÕES

A RPCD tem uma secção onde são apresentadas revisões de obras ou artigos publicados e que sejam considerados relevantes para as ciências do desporto.

REGRAS GERAIS DE PUBLICAÇÃOOs artigos submetidos à RPCD deverão conter dados originais, teóricos ou experimentais, na área das ciências do desporto. A parte substancial do artigo não deverá ter sido publicada em mais nenhum local. Se parte do artigo foi já apresentada publicamente deverá ser feita referência a esse facto na secção de Agradecimentos.Os artigos submetidos à RPCD serão, numa primeira fase, avaliados pelo editor-chefe e terão como critérios iniciais de aceitação: normas de publicação, relação do tópico tratado com as ciências do desporto e mérito científico. Depois desta análise, o artigo, se for considerado previamente aceite, será avaliado por 2 “referees” independentes e sob a forma de análise “duplamente cega”. A aceitação de um e a rejeição de outro obrigará a uma 3ª consulta.

PREPARAÇÃO DOS MANUSCRITOSASPECTOS GERAIS

Cada artigo deverá ser acompanhado por uma carta de rosto que deverá conter:

— Título do artigo e nomes dos autores; — Declaração de que o artigo nunca foi previamente publicado.

FORMATO:

— Os manuscritos deverão ser escritos em papel A4 com 3 cm de margem, letra 12 com duplo espaço e não exceder 20 páginas; — As páginas deverão ser numeradas sequencialmente, sendo a página de título a nº1.

DIMENSÕES E ESTILO: — Os artigos deverão ser o mais sucintos possível; A especulação deverá ser apenas utilizada quando os dados o permitem e a literatura não confirma; — Os artigos serão rejeitados quando escritos em português ou inglês de fraca qualidade linguística;

— As abreviaturas deverão ser as referidas internacionalmente.

PÁGINA DE TÍTULO:

— A página de título deverá conter a seguinte informação: — Especificação do tipo de trabalho (cf. Tipos de publicação); — Título conciso mas suficientemente informativo; — Nomes dos autores, com a primeira e a inicial média (não incluir graus académicos) — “Running head” concisa não excedendo os 45 caracteres; — Nome e local da instituição onde o trabalho foi realizado; - Nome e morada do autor para onde toda a correspondência deverá ser enviada, incluindo endereço de e-mail

PÁGINA DE RESUMO:

— Resumo deverá ser informativo e não deverá referir-se ao texto do artigo; — Se o artigo for em português o resumo deverá ser feito em português e em inglês — Deve incluir os resultados mais importantes que suportem as conclusões do trabalho; — Deverão ser incluídas 3 a 6 palavras-chave; — Não deverão ser utilizadas abreviaturas; — O resumo não deverá exceder as 200 palavras.

INTRODUÇÃO:

— Deverá ser suficientemente compreensível, explicitando claramente o objectivo do trabalho e relevando a importância do estudo face ao estado actual do conhecimento; — A revisão da literatura não deverá ser exaustiva.

MATERIAL E MÉTODOS:

— Nesta secção deverá ser incluída toda a informação que permite aos leitores realizarem um trabalho com a mesma metodologia sem contactarem os autores; — Os métodos deverão ser ajustados ao objectivo do estudo; deverão ser replicáveis e com elevado grau de fidelidade; — Quando utilizados humanos deverá ser indicado que os procedimentos utilizados respeitam as normas internacionais de experimentação com humanos (Declaração de Helsínquia

de 1975); — Quando utilizados animais deverão ser utilizados todos os princípios éticos de experimentação animal e, se possível, deverão ser submetidos a uma comissão de ética; — Todas as drogas e químicos utilizados deverão ser designados pelos nomes genéricos, princípios activos, dosagem e dosagem; — A confidencialidade dos sujeitos deverá ser estritamente mantida; — Os métodos estatísticos utilizados deverão ser cuidadosamente referidos.

RESULTADOS:

— Os resultados deverão apenas conter os dados que sejam relevantes para a discussão; — Os resultados só deverão aparecer uma vez no texto: ou em quadro ou em figura; — O texto só deverá servir para relevar os dados mais relevantes e nunca duplicar informação; — A relevância dos resultados deverá ser suficientemente expressa; — Unidades, quantidades e fórmulas deverão ser utilizados pelo Sistema Internacional (SI units). — Todas as medidas deverão ser referidas em unidades métricas.

DISCUSSÃO:

— Os dados novos e os aspectos mais importantes do estudo deverão ser relevados de forma clara e concisa; — Não deverão ser repetidos os resultados já apresentados; — A relevância dos dados deverá ser referida e a comparação com outros estudos deverá ser estimulada; — As especulações não suportadas pelos métodos estatísticos não deverão ser evitadas; — Sempre que possível, deverão ser incluídas recomendações; — A discussão deverá ser completada com um parágrafo final onde são realçadas as principais conclusões do estudo.

AGRADECIMENTOS:

— Se o artigo tiver sido parcialmente apresentado publicamente deverá aqui ser referido o facto; — Qualquer apoio financeiro deverá ser referido.

REFERÊNCIAS

— As referências deverão ser citadas no texto por número e compiladas alfabeticamente e ordenadas numericamente; — Os nomes das revistas deverão ser abreviados conforme normas internacionais (ex: Index Medicus); — Todos os autores deverão ser nomeados (não utilizar et al.) — Apenas artigos ou obras em situação de “in press” poderão ser citados. Dados não publicados deverão ser utilizados só em casos excepcionais sendo assinalados como “dados não publicados”; — Utilização de um número elevado de resumos ou de artigos não “peer-reviewed” será uma condição de não aceitação;

EXEMPLOS DE REFERÊNCIAS:

ARTIGO DE REVISTA

1 Pincivero DM, Lephart SM, Karunakara RA (1998). Reliability and precision of isokinetic strength and muscular endurance for the quadriceps and hamstrings. Int J Sports Med 18: 113-117 LIVRO COMPLETO Hudlicka O, Tyler KR (1996). Angiogenesis. The growth of the vascular system. London: Academic Press Inc. Ltd. CAPÍTULO DE UM LIVRO Balon TW (1999). Integrative biology of nitric oxide and exercise. In: Holloszy JO (ed.). Exercise and Sport Science Reviews vol. 27. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 219-254FIGURAS

— Figuras e ilustrações deverão ser utilizadas quando auxiliam na melhor compreensão do texto; — As figuras deverão ser numeradas em numeração árabe na sequência em que aparecem no texto; - As figuras deverão ser impressas em folhas separadas daquelas contendo o corpo de texto do manuscrito. No ficheiro informático em processador de texto, as figuras deverão também ser colocadas separadas do corpo de texto nas páginas finais do

manuscrito e apenas uma única figura por página; — As figuras e ilustrações deverão ser submetidas com excelente qualidade gráfico, a preto e branco e com a qualidade necessária para serem reproduzidas ou reduzidas nas suas dimensões; — As fotos de equipamento ou sujeitos deverão ser evitadas.QUADROS

— Os quadros deverão ser utilizados para apresentar os principais resultados da investigação. — Deverão ser acompanhados de um título curto; — Os quadros deverão ser apresentados com as mesmas regras das referidas para as legendas e figuras; — Uma nota de rodapé do quadro deverá ser utilizada para explicar as abreviaturas utilizadas no quadro.

SUBMISSÃO DOS MANUSCRITOS— A submissão de artigos para à RPCD poderá ser efectuada por via postal, através do envio de 1 exemplar do manuscrito em versão impressa em papel, acompanhada de versão gravada em suporte informático (CD-ROM ou DVD) contendo o artigo em processador de texto Microsoft Word (*.doc). - Os artigos poderão igualmente ser submetidos via e-mail, anexando o ficheiro contendo o manuscrito em processador de texto Microsoft Word (*.doc) e a declaração de que o artigo nunca foi previamente publicado.

ENDEREÇOS PARA ENVIO

DE ARTIGOS

Revista Portuguesa de Ciências do Desporto Faculdade de Desporto da Universidade do Porto Rua Dr. Plácido Costa,Porto Portugal(+351) 914 200 450e-mail: [email protected]

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PUBLICATION NORMS

WORKING MATERIALS (MANUSCRIPTS)ORIGINAL INVESTIGATION

The PJSS publishes original papers related to all areas of Sport Sciences.

REVIEWS OF THE LITERATURE

(STATE OF THE ART PAPERS): State of the art papers or critical literature reviews are published if, and only if, they contribute to the generalization of knowledge. Meta-analytic papers or general reviews are possible modes from contributing authors. This type of publication is open only to invited authors.

COMMENTARIES: Commentaries about published papers or literature reviews are highly recommended by the editorial board and accepted.

CASE STUDIES: Highly relevant case studies are favoured by the editorial board if they contribute to specific knowledge within the framework of Sport Sciences research. The meticulous control of research methodology is a fundamental issue in terms of paper acceptance.

ESSAYS: The PJSS shall invite highly regarded specialists to write essays or careful and deep thinking about several themes of the sport sciences mainly related to philosophy and/or strong argumentation in sociology or psychology.

BOOK REVIEWS: the PJSS has a section for book reviews.

GENERAL PUBLICATION RULES: all papers submitted to the PJSS are obliged to have original data, theoretical or experimental, within the realm of Sport Sciences. It is mandatory that the submitted paper has not yet been published elsewhere. If a minor part of the paper was previously published, it has to be stated explicitly in the acknowledgments section.

All papers are first evaluated by the editor in chief, and shall have as initial criteria for acceptance the following: fulfilment of all norms, clear relationship to Sport Sciences, and scientific merit. After this first screening, and if the paper is firstly accepted, two independent referees shall evaluate its content in a

“double blind” fashion. A third referee shall be considered if the previous two are not in agreement about the quality of the paper.After the referees receive the manuscripts, it is hoped that their reviews are posted to the editor in chief in no longer than a month.

MANUSCRIPT PREPARATION GENERAL ASPECTS:

The first page of the manuscript has to contain: — Title and author(s) name(s) — Declaration that the paper has never been published

FORMAT:

— All manuscripts are to be typed in A4 paper, with margins of 3 cm, using Times New Roman style size 12 with double space, and having no more than 20 pages in length. — Pages are to be numbered sequentially, with the title page as n.1.

SIZE AND STYLE:

— Papers are to be written in a very precise and clear language. No place is allowed for speculation without the boundaries of available data. — If manuscripts are highly confused and written in a very poor Portuguese or English they are immediately rejected by the editor in chief. — All abbreviations are to be used according to international rules of the specific field.

TITLE PAGE:

— Title page has to contain the following information: — Specification of type of manuscript (but see working materials-manuscripts). — Brief and highly informative title. — Author(s) name(s) with first and middle

names (do not write academic degrees) — Running head with no more than 45 letters. — Name and place of the academic institutions. — Name, address, Fax number and email of the person to whom the proof is to be sent.

ABSTRACT PAGE:

— The abstract has to be very precise and contain no more than 200 words, including objectives, design, main results and conclusions. It has to be intelligible without reference to the rest of the paper. — Portuguese and English abstracts are mandatory. — Include 3 to 6 key words. — Do not use abbreviations.

INTRODUCTION:

— Has to be highly comprehensible, stating clearly the purpose(s) of the manuscript, and presenting the importance of the work. — Literature review included is not expected to be exhaustive.

MATERIAL AND METHODS:

— Include all necessary information for the replication of the work without any further information from authors. — All applied methods are expected to be reliable and highly adjusted to the problem. — If humans are to be used as sampling units in experimental or non-experimental research it is expected that all procedures follow Helsinki Declaration of Human Rights related to research. — When using animals all ethical principals related to animal experimentation are to be respected, and when possible submitted to an ethical committee. — All drugs and chemicals used are to be designated by their general names, active principles and dosage. — Confidentiality of subjects is to be maintained. — All statistical methods used are to be precisely and carefully stated.

RESULTS:

— Do provide only relevant results that are useful for discussion. — Results appear only once in Tables or Figures. — Do not duplicate

information, and present only the most relevant results. — Importance of main results is to be explicitly stated. — Units, quantities and formulas are to be expressed according to the International System (SI units). — Use only metric units.

DISCUSSION:

— New information coming from data analysis should be presented clearly. — Do no repeat results. — Data relevancy should be compared to existing information from previous research. — Do not speculate, otherwise carefully supported, in a way, by insights from your data analysis. — Final discussion should be summarized in its major points.

ACKNOWLEDGEMENTS:

— If the paper has been partly presented elsewhere, do provide such information. — Any financial support should be mentioned.

REFERENCES:

— Cited references are to be numbered in the text, and alphabetically listed. — Journals´ names are to be cited according to general abbreviations (ex: Index Medicus). — Please write the names of all authors (do not use et al.). — Only published or “in press” papers should be cited. Very rarely are accepted “non published data”. — If non-reviewed papers are cited may cause the rejection of the paper.

EXAMPLES:

PEER-REVIEW PAPER

1 Pincivero DM, Lephart SM, Kurunakara RA (1998). Reliability and precision of isokinetic strength and muscular endurance for the quadriceps and hamstrings. In J Sports Med 18:113-117COMPLETE BOOK Hudlicka O, Tyler KR (1996). Angiogenesis. The growth of the vascular system. London:Academic Press Inc. Ltd.BOOK CHAPTER Balon TW (1999). Integrative

biology of nitric oxide and exercise. In: Holloszy JO (ed.). Exercise and Sport Science Reviews vol. 27. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 219-254FIGURES

— Figures and illustrations should be used only for a better understanding of the main text. — Use sequence arabic numbers for all Figures. — Each Figure is to be presented in a separated sheet with a short and precise title. — In the back of each Figure do provide information regarding the author and title of the paper. Use a pencil to write this information. — All Figures and illustrations should have excellent graphic quality I black and white. — Avoid photos from equipments and human subjects.TABLES — Tables should be utilized to present relevant numerical data information. — Each table should have a very precise and short title. — Tables should be presented within the same rules as Legends and Figures. — Tables´ footnotes should be used only to describe abbreviations used.

MANUSCRIPT SUBMISSION The manuscript submission could be made by post sending one hard copy of the article together with an electronic version [Microsoft Word (*.doc)] on CD-ROM or DVD. Manuscripts could also be submitted via e-mail attaching an electronic file version [Microsoft Word (*.doc)] together with the declaration that the paper has never been previously published.

ADDRESS FOR MANUSCRIPT SUBMISSION

Revista Portuguesa de Ciências do Desporto Faculdade de Desporto da Universidade do Porto Rua Dr. Plácido Costa, Porto Portugal(+351) 914 200 450e-mail: [email protected]

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9 — RPCD 15 (1): 09-20

Nota Editorial

Uma proclamação

digna da Universidade:

Haja decência, equidade

e respeito!

Há horas na história que intimam a não ficar na superfície; exigem mergulhar na raiz das

circunstâncias com palavras e atos radicais. Esta é uma dessas horas, europeia e portu-

guesa (e, quiçá, mundial), porquanto está em causa a preservação do Humano. Ou seja, é

uma hora de radicalidade na reflexão e na ação, não por opção, mas por estrita obrigação.

Quem se esquivar a este dever, torna-se cúmplice de crimes contra a civilização, a Huma-

nidade e a Sociedade.

I. Os factos reluzem, são incontornáveis e inegáveis. Dispensemos os eufemismos e os

adoçamentos e ponhamos de lado o filtro da parcimónia para os caraterizar. Vivemos um

tempo de esplendor tecnológico e de apagamento da luz dos ideais, das causas e utopias

da Modernidade. Os mitos humanistas, iluministas e republicanos colapsaram sob a pata

dos poderes da corrupção. A política tornou-se uma forma atualizada da prostituição e a

democracia uma ‘bancocracia’ cleptomaníaca, faminta e insaciável de cupidez e ganância.

A captura do interesse público pelo privado é escandalosa. Roubar e ficar impune é direito

constitucional; o latrocínio é uma virtude e a integridade um defeito. Os personagens polí-

ticos ajoelharam e têm relações incestuosas com a teia do complexo aparelho económico-

-financeiro e o submundo dos negócios obscuros. A ficção democrática continua latente,

porém num estado vegetativo. A confiança, a credibilidade e fiabilidade, que os jornais e

EJorge Olímpio Bento 1

1 Diretor da Revista Portuguesa de Ciências do Desporto

É possível enganar todas as pessoas parte do tempo,

e parte das pessoas o tempo todo, mas não é possível

enganar todas as pessoas o tempo todo. 1

1 A autoria desta frase não é conhecida, embora seja comumente atribuída a Abraham Lincoln (1809-1865).

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11 — RPCD 15 (1)

o jornalismo deviam garantir ao público, estão assaz combalidas; os órgãos ditos de in-

formação, os comentadores e jornalistas vivem em conúbio com os poderosos e, a mando

destes, difundem patranhas e contam fábulas, num sofisticado jargão técnico, prenhe de

termos incompreensíveis e de elegantes mistificações. Sob os holofotes da ribalta, arti-

manhas insidiosas dão às mentiras o banho e o brilho da verdade, e esta é compelida a

resignar-se ao segredo dos túmulos.

O vocábulo ‘novo’ é um sinal da magia desta época de fratura social. O que é ‘novo’ é bom;

o que é ‘velho’ é mau, transporta em si a ‘peste grisalha’, perigosa toxicidade, demasiada ge-

nerosidade perante o desemprego, a pobreza e o caduco Estado Social, este, sim, culpado de

tudo, tanto dos novos como dos velhos males. De frente dos nossos olhos estarrecidos avista-

-se um horripilante estendal de miséria material e ruína moral. Aos adultos e idosos foi rou-

bada a estabilidade, aos jovens a identidade; os primeiros são obsoletos e descartáveis, os se-

gundos são condenados a abandonar as ‘margens de conforto’, por mais apertadas que sejam.

A aparência induz a essência: um panorama existencialmente amargurado! Por dentro

e por fora, na alma e no corpo, as pessoas apresentam feridas lacerantes. Para culminar,

como a cereja no topo do bolo, o exercício da cidadania é quase nulo; e, mesmo assim, vê-

-se objetiva e seriamente condicionado e penalizado.

Quem ler a Mensagem, de Fernando Pessoa, e olhar o estado do nosso país (e o do mun-

do) com a lupa crítica da consciência acordada, reconhecerá que nos encontramos no

“auge da suprema prova”, apontado pelo poeta naquela obra. Afinal, todos os tempos encer-

ram desafios e colocam à prova a civilidade. Contudo, a hora presente é de uma gravidade

tão ameaçadora para a manutenção da ilusão de uma sociedade regulada pela decência

que leva a encarar o vate como um vidente.2

Urge escutar, decifrar e atender os apelos pungentes do poeta, não para elogiarmos a

sua clarividência e lhe darmos razão, mas para nos pormos a salvo da acusação de coni-

vência com a assustadora e ultrajante progressão do mal.

Victor Hugo (1802-1885) sentenciou, mais ou menos assim, que somente vive quem re-

siste e luta contra o mal. E este anda por aí à rédea solta, soltando risadas de gozo e triunfo

e exibindo uma pose de invencibilidade. Pudera! Foi-lhe atribuído o glamoroso óscar de

melhor ator no filme de histórias reais de chantagem, crime e tráfico de influências, com

cenas policiais mais ou menos brutais, refinadas e palacianas.

Não é exagero, assumamos que esta é uma era de escuridão e de Armagedão. Ainda não

é o horror absoluto, mas o cenário do dia-a-dia e os caminhos da sociedade e da humani-

dade já foram tomados por uma manifesta e trágica regressão civilizacional, pela banali-

dade da habituação à destruição de marcos paradigmáticos da civilização, aos crimes mais

hediondos, perpetrados não na calada da noite, mas nas janelas escancarados do dia. A

barbárie ronda-nos a porta e não pede licença para entrar.

Sim, os cavaleiros do apocalipse estão aí, cavalgando a toda a brida, empunhando a

cartilha de um neoliberalismo de pendor darwinista e a espada afiada, cruel e gélida do

Goldman Sachs e de outros generais da mesma tropa. Para os governantes contam mais a

amizade e obediência aos banqueiros do que a honestidade e retidão devidas aos cidadãos.

Os mais entrados na idade jamais imaginaram que seria desmoralizador e ultrajante o de-

senlace da sua passagem pela vida. Resta-lhes protestar e reagir com toda a radicalidade

de que sejamos capazes, para não sermos mortos-vivos!

II. Num capítulo (“Uma história natural do mal”) do livro Danos colaterais: desigualda-

des sociais numa era global, Zygmunt Bauman, porventura o mais conceituado e brilhante

hermeneuta da contemporaneidade ‘líquida’, aponta a necessidade de rasgar as cortinas

montadas e penduradas na frente do mundo, parafraseando Milan Kundera. Ele constata

o desvirtuamento do conceito da razão elaborado por Kant, que traduziu os preceitos da

linguagem sagrada, nomeadamente os mandamentos de Moisés, para a linguagem secula-

rizada dos categóricos ‘imperativos morais’. Agora a esperteza calculista perverte a razão

e coloca-a ao serviço do poder, anulando ou adormecendo os escrúpulos éticos dos fortes

e roubando a esperança aos fracos.

Tomando como ponto de partida a ‘banalidade do mal’, descrita por Hannah Arendt, Bauman

recorre a outros estudiosos, nomeadamente Littell e Philip Zimbardo. O primeiro viu em Eich-

mann “um robô sem face e sem alma”; o segundo confirma que os praticantes de crimes hedion-

dos, como, por exemplo, os cometidos na prisão de Abu Ghraib, no Iraque, são gente comum,

simpática, popular, transformada em monstros e transportada a uma espécie de “lugar nenhum”.

Bauman conclui que o mal mais horrendo é praticado por gente que pensa. Estamos razoavel-

mente precavidos e protegidos contra os crimes e ameaças dos monstros. Só que estes não têm

rótulo que os identifique. São gente normal, que coabita connosco, frequenta os mesmos lugares,

compartilha sentimentos e costumes idênticos aos nossos e não está, portanto, sob qualquer

suspeita. O monstro é, afinal, algo ou alguém ‘adormecido’ dentro de nós, que revela inclinação

ou vulnerabilidade para praticar atos indignos, em face de circunstâncias condicionantes.

E

2 Este contexto faz ressoar aos nossos ouvidos as conhecidas palavras de Ruy Barbosa (1849-1923):

“De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça,

de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude,

a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.”

Afinal, a honestidade é virtude difícil de alcançar em todas as eras, atendendo à constatação

de William Shakespeare (1564-1616): “Ser honesto, tal como o mundo está, é ser um homem

escolhido entre dez mil.” (Escrito na Pedra, Jornal Público, p. 48, 16.09.2014.)

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13 — RPCD 15 (1)

O perfil psicológico de Eichmann aponta-o como pai extremoso, cuidando da família de

maneira irrepreensível. Conhecedor e culto, enquadra-se na imagem dos torturadores

apresentada no filme A Lista de Schindler. Segundo Littell, ele não era irracional ou do-

minado por paixões desprezíveis: “Decerto ele não era o inimigo da humanidade descrito

em Nuremberg”, “nem tampouco uma encarnação do mal banal”, mas, pelo contrário, “um

burocrata muito talentoso, extremamente competente em suas funções, com certa desen-

voltura e um considerável senso de iniciativa pessoal”.

Bauman remata : “Como administrador, Eichman decerto seria o orgulho de qualquer

firma europeia de prestígio (poderíamos acrescentar: incluindo empresas com donos ou

altos executivos judeus).” 3

Pode parecer excessivo, mas esta excursão afigura-se-me necessária para a imperiosa

ponderação da burocratização que, nos últimos anos, se foi instalando paulatina e sorratei-

ramente na Universidade. Ela é potenciadora de consequências maléficas, das quais gos-

tamos de nos abstrair, quando, como alertou Bertolt Brecht (1898-1956), não nos afetam

imediatamente. Todavia o perigo de nos tornarmos aprendizes e vítimas dos feiticeiros do

mal está comprovado; logo não deve ser descartado.

III. Como fazer frente a isto? Recordando, reavivando e assumindo o legado de Imma-

nuel Kant (1724-1804): estamos obrigados a ‘imperativos morais’. Estes não permitem

que cerremos os olhos ao avanço das sombras da insensibilidade, ao abismo do pasmo, ao

elevado grau de espezinhamento e humilhação, de desespero e indignidade a que estão a

ser forçados tantos seres humanos.

Ninguém escapa a este desapiedado e doloroso aguilhão, a não ser que não consiga

transpor a cerca do curral da animalidade. Todo o indivíduo decente e lúcido está a ser

insultado, ao presenciar a desfaçatez com que os vários poderes impingem intrujices e

praticam falcatruas, umas atrás de outras, visando aumentar e perpetuar o reinado do

seu ilimitado e incontido regabofe. É demais! Em cada um dos humilhados e ofendidos é

vilipendiada toda a humanidade.

Não podemos esperar, de braços cruzados, em quietude de ânimo, de boca fechada e de

mãos atadas, pelo milagre da vinda de um regime que instaure a justiça e a moral ou res-

taure o seu índice suficiente. Cada um de nós tem que traçar e percorrer sozinho o roteiro

coerentemente ético da sua vida, ser um exemplo na comunidade laboral e convivial. Tem

que, nas palavras e nos atos, proclamar a imperiosa necessidade de uma equidade universal,

aplicável a todo o sujeito humano, independentemente do estatuto cultural, intelectual e

profissional, das circunstâncias de nascimento e das condições e nível de desenvolvimento.

Sim, Kant (e antes dele Pico della Mirandola, 1463-1494, na Oração sobre a dignidade do

homem) disse-o sem sofismas: somos obrigados à filiação nesta causa, por mais distan-

te que se apresente a concretização do seu teor idealista ou utópico. Somos obrigados a

segui-la e a honrar os compromissos e princípios que ela aponta. Recebemos esta herança,

vinda do fundo dos tempos e prescrita no Talmude da Babilónia, sendo agora a nossa vez

de a aumentar e difundir. Sabendo que arrostamos com o perigo da ofensa de sermos acu-

sados de loucos, radicais e excessivos, por nos inscrevermos em tais fileiras.

O obsessivo desmantelamento de estruturas e formas essenciais dos serviços públicos

de educação, saúde e segurança social, ocorrido nas últimas décadas e ainda em curso,

de modo intensificado e jihadista até ao extermínio total, intima-nos a assumir a letra e o

sentido do mandamento da responsabilidade cívica e social.

Por mais dissemelhantes que sejam os figurantes do mundo, dado haver desigualdades

inevitáveis, exijamos o respeito como pressuposto de todos, simplesmente pelo facto de

pertencerem ao grupo dos humanos e estes serem portadores de uma dignidade que não

tem preço. Exijamos para todos os humanos um respeito ideal e material, uma ponte que

permita a todos atravessar e seguir em frente, de cabeça levantada, por cima do fosso da

desigualdade e da diferença.

Richard Sennett, numa obra notável, mostra-nos a devastação da sociedade hodierna pela

notória e chocante escassez de “expressões de respeito e reconhecimento pelos outros”. Quan-

to mais necessitadas, fracas e frágeis são as criaturas, menor é o grau de respeito que lhes está

agregado; elas não são vistas “como um ser humano pleno, cuja presença tem importância”.

O ilustre académico prescreve rigorosa e taxativamente: “Quando uma sociedade trata

a grande maioria das pessoas desta forma, julgando apenas alguns poucos dignos de re-

conhecimento, é criada uma escassez de respeito, como se não houvesse bastante desta

preciosa substância para todos. Como muitas formas de escassez, esta é produzida pelo

homem; ao contrário da comida, o respeito nada custa.” Por isso é de estranhar que haja

“uma crise de oferta” deste bem inestimável. 4

IV. Cada vez é maior a legião de indivíduos deixados para trás e atirados pela borda fora.

A sociedade desfigura-se numa multidão aturdida, solitária e refém de inseguranças, de

medos e receios, carente de convivência e autoconfiança. Logo agudiza-se a necessidade

de nos tornarmos mais conscientes uns dos outros, de considerarmos o facto de existirem

outros Eus e não apenas o nosso, de nos abrirmos à compreensão da alteridade e plurali-

dade de circunstâncias e condições.

3 Zygmunt Bauman, Danos Colaterais: Desigualdades sociais numa era global, p. 162-187.

Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2013.

4 Richard Sennett, Respeito: a formação do caráter em um mundo desigual, p. 13-17.

Rio de Janeiro: Record, 2004.

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15 — RPCD 15 (1)

Não estou a falar da prática da caridade, da piedade e de uma versão apodrecida da com-

paixão, que os fortes gostam de demonstrar de modo ostensivo e com toques de trombeta,

porquanto isso lhes confere o poder e garante a oportunidade de degradar, de desrespeitar,

ferir, ofender e tratar os pobres como bens danificados. Vão às igrejas e batem no peito

como um percussionista no tambor, mas esquecem a advertência de Cristo: a mão esquer-

da não precisa de saber o que faz a direita.

Ao invés, estou a convocar, para vir ao palco, a trilogia republicana, particularmente a

pulsão para a fraternidade e solidariedade. Mas isto requer vontade vigilante e consciência

desejante. O comportamento altruísta, cívico e ético não é natural; é uma aprendizagem

imposta, uma norma adquirida, que regula a interação e comunicação com os outros, por

meio de instrumentos e significantes compartilhados. É a dimensão relacional da persona-

lidade individual. Resulta de contratos entre pares vinculados pelo apreço mútuo e recípro-

co, porque sem confiarmos uns nos outros, não conseguimos ‘conviver’, viver juntos e em

harmonia, fazer coisas relevantes. A troca é, neste plano, o princípio social por excelência.

É ela que nos leva à solidariedade, ou seja, a sentir a dor do outro, mesmo que esta não seja

nossa. A respeitar as carências dos que são diferentes, heterogéneos.

Como se sabe, a forma como os animais comunicam entre si é um critério de avaliação

da sua inteligência. Isto não nos diz nada? Não terá aplicação a esta quadratura em que re-

duzimos as modalidades de comunicação e é discutível se o modo predominante congrega

os padrões de uma genuína comunicação? Como valoramos o retrato de uma realidade em

que se erguem muros à comunicação interpessoal e de proximidade, surgimos de costas

voltadas uns aos outros e nos estranhamos e ignoramos? Seria tolo Friedrich Nietzsche

(1844-1900) ao declarar que o contrário do amor não é o ódio, mas a indiferença?

V. Retomemos o fio da meada. Porque é que a conduta moral requer uma vontade vigilante

e uma consciência desejante?

Sendo a desigualdade uma inevitabilidade fundamental da existência humana, é imperio-

so instituir nela um sentido construtivo e não um estigma ou instrumento de aviltamento e

destruição do outro e da sua autoestima. Isto reclama que se afirme e conserve a conside-

ração e o respeito devidos a cada um num mundo desigual.

A dependência une as pessoas na vida familiar e afetiva e serve para desenvolver o sen-

timento de completude, assente na salutar interdependência que nos aprimora e afeiçoa

as formas e expressões do corpo, a elevação e o habitáculo da alma. Porque há de ser um

fator de exploração e manipulação, de insegurança e prejuízo no contexto social, porque

não há de este ser uma configuração da interdependência ideal?

Será benfazejo admitir no credo político a tese de Margareth Tatcher de que não existe

sociedade, mas tão-somente indivíduos e as suas famílias? Mais, se esta tese tivesse legi-

timidade e validade, não daria que pensar o tipo e a vida dos indivíduos e famílias nesta so-

ciedade da multidão acantonada no silêncio e no esquecimento, desprovida de autonomia

e de fé num radioso porvir, maioritariamente abandonada à sua sorte?

Carecemos da largueza de um espírito voltado para prover os défices alheios, para a gene-

rosidade em relação aos outros, que acabe ou atenue a estranheza, que não envolva a procura

de relações de dependência almejada, mas tão-somente o cuidar dos outros, por isto ser um

dever e fonte da nossa realização. Esta exigência não visa erguer a bandeira da igualdade ab-

soluta, nem, muito menos, tecer armas por ela; mas visa, sim, ondular a flâmula da eliminação

da necessidade material e a da garantia da preservação da dignidade de todos e de cada um. 5

Estamos cansados e fartos de discursos de compaixão e comiseração, e de lamentação

do sofrimento alheio, que, por estar longe da nossa vista, também o está do nosso coração.

É urgente que se faça e torne público o inventário da consideração concreta e contabiliza-

da que é devida aos outros!

VI. Consequentemente, o Estado de bem-estar social não pode ser limitado ou reduzido e,

muito menos, sacrificado. Ele carece de ser reanimado e reforçado; e de ser libertado da

pirâmide burocrática que anseia asfixiá-lo, sem retorno.

Sendo isto muito, no entanto não basta! O Estado de bem-estar social é devedor aos indiví-

duos não apenas de alguma devolução monetária das contribuições que eles lhe deram. Uma

vida ativa de trabalho árduo e dedicado não tem equivalente monetário; é merecedora de

muito mais. Reclama consideração e reconhecimento. Pede um tratamento de reciprocidade

ontológica, uma prática da segurança que sustenta o nosso ser e a sua expansão positiva.

Exijamos, pois, que cesse o ataque ao serviço público, o fim do escárnio e menosprezo

dos seus servidores. Porque estes fazem coisas belas e úteis para o bem comum, coisas

imprescindíveis que vale a pena fazer.

5 Caio Júlio Higino (Gaius Julius Higinus, ca. 64-17 a.C.) escreveu uma famosa fábula sobre o cuidado.

“O texto (…) conta como Cuidado modelou uma figura a partir do barro, pedindo depois a Júpiter que

lhe insuflasse o espírito, levantando-se então uma disputa sobre quem deveria dar o nome a essa

figura, pois esse direito era reclamado por Cuidado, por Júpiter e pela Terra. No meio da contenda,

foi escolhido Saturno como juiz, que assim decidiu: o nome para a nova criatura será "homem", pois

foi feito a partir da terra, "ex humo" (em latim); na morte, Júpiter receberá o seu espírito e a Terra

acolherá o corpo. Mas quem o manterá e terá solicitude com ele enquanto viver será Cuidado. Saturno

(o Tempo) escolheu Cuidado precisamente pelo papel decisivo que cuidar desempenha na formação,

desenvolvimento e manutenção do ser humano até à morte, incluindo o morrer. Para Heidegger, o

cuidado é um existenciário, estrutura originária da existência.”

(Anselmo Borges, Francisco, Bismarck e as bem-aventuranças, Diário de Notícias, Lisboa, 31.03.2013).

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17 — RPCD 15 (1)

Exijamos respeito. Encontremos e usemos palavras e gestos que façam com que ele

seja percebido e a sua expressão abundante e convincente. Voltemo-nos para fora de nós

e declamemos os três axiomas do respeito, que a Modernidade nos legou:

Fazer alguma coisa da própria vida;

Cuidar de si mesmo;

Ajudar os outros.

Proclamemos que, acima de todas as desigualdades aceitáveis, impera o código único

da cidadania. Apenas à luz deste e sobre as fundações da garantia da equidade, pode a

desigualdade ser aceite e construída.

Não nos enganemos e iludamos. Nos dias de hoje, quem se afastar da denúncia das

agruras, das aflições e vilanias que atingem o seu semelhante, afasta-se de si mesmo,

porque elas atentam contra todos nós. Assumamos o compromisso implícito na forma

como Richard Stennett conclui a atinente análise contida no seu livro: “Na sociedade, e

particularmente no welfare state, a essência do problema que enfrentamos é como os for-

tes podem praticar respeito em relação àqueles destinados a permanecerem fracos…” A

sociedade não pode olvidar que a teimosa realidade da divisão continua a ser um problema;

nem pode virar-lhe as costas.6

Se não pusermos em marcha uma arte de atenuação e limitação das desigualdades, de

contenção da rapacidade e da corrupção, cairemos na pauperização absoluta dos mais

frágeis e na proletarização da grande maioria da população.

VII. O mapa mundi da desigualdade é acintoso e intolerável. Ora a Universidade não pode in-

vocar inocência, nem lavar as mãos. Ao invés, tem pesadas responsabilidades neste cartório

da amoralidade. Com efeito, o obsceno panorama da desigualdade não resulta linearmente

do modelo de globalização em vigor. Este, como afirma Zygmunt Bauman, entre outros reco-

nhecidos estudiosos do fenómeno, é um produto das filosofias ou teorias de gerenciamento

ou managerialismo do mercado. E estas foram elaboradas no seio da Universidade.

Para agravar as culpas da Universidade, acresce que, como assinala José Dias Sobrinho,

há uma “relação de mútua interação” entre o neoliberalismo económico e a educação su-

perior. Ou seja, “a educação superior é a principal instância promotora” do modelo neolibe-

ral de sociedade atualmente vigente. 7

Mais, será mentira que um número deveras significativo dos autores de fraudes e viga-

rices, cometidas por esse mundo afora, ostenta no seu currículo um MBA ou um doutora-

mento na mesma ‘especialidade’, obtido em reputadas escolas universitárias?

Não cerremos os olhos à verdade nua e crua. As doutrinas mercadológicas, saídas de

‘laboratórios’ universitários, inventaram e ditaram um vocabulário estupefaciente e para-

lisante que apregoa receitas e “mensagens de volatilidade, fluidez, flexibilidade e curta

duração”, num ambiente de relativismo e de fragmentação de todas as esferas da vida

social, em mutação constante, ambíguo, efémero, incerto, plástico, vago, de vínculos frou-

xos, no qual a conservação, a solidez e durabilidade de orientações e referências são vistas

como prejuízo, a sabedoria é indesejável e suspeita e é conveniente que os conhecimentos

envelheçam e se esgotem depressa. Tudo quanto ameace introduzir ordem e regulação

neste intrincado labirinto de caos e liquidez é rejeitado, porquanto ele oferece melhores

possibilidades para tirar partido da incerteza e insegurança. E ajuda a subtrair ao controlo

do civilizacional e cultural o irracional, o impulsivo, o instintivo, o animalesco.8

Eis aqui resumido o método escolhido pelas filosofias e teorias gerenciais, repete-se,

geradoras do modelo de globalização em curso, para abater as barreiras institucionais que

restringem o raio de ação das forças propulsoras das aberrantes desigualdades.9

Elas advogaram, no incisivo dizer de Zygmunt Bauman, a “desregulamentação abran-

gente”, cujo alvo é o desmembramento dos “padrões de procedimento firmes e rígidos que

a burocracia moderna procurou impor”. Em consequência, “a intuição, o impulso e os es-

tímulos do momento” situam-se “acima do planeamento e dos projetos meticulosos”. 10

A ‘desregulamentação’ é o ADN que perpassa as filosofias e teorias de gerenciamento

e managerialismo desta era, objetivamente desenvolvidas para manipular a incerteza em

benefício dos detentores da informação privilegiada e em prejuízo dos que neles delegam

confiança, depósitos e votos. Elas consagram a multiplicação e difusão dos poderes e a

divisão do bolo entre eles, embora sob a batuta de um: o sistema financeiro e bancário.

Quão visionário foi o Padre António Vieira (1608-1679): “As varas do poder, quando são

muitas, elas mesmo se comem, como famintas sempre de maiores postos!” 11

6 Richard Stennett, ibidem, p. 298.7 José Dias Sobrinho, Evaluación, educación superior, docencia: problemas y dilemas. Conferencia

magistral, V Coloquio Internacional de la RIIED “Experiencias de evaluación de la docencia: debates

en Iberoamérica”, 3, 4 y 5 de septiembre de 2014. Instituto de Investigación y Desarrollo Educativo,

UABC, Ensenada, Baja California, México.

8 Por mais estranho que pareça aos desatentos e ingénuos, este léxico adentrou a Universidade,

com um séquito de consequências e implicações funestas. Um dia não longínquo, assim o espero,

os académicos vão ter vergonha do seu consentimento, da sua insanidade, cobardia, cumplicidade,

conivência e passividade face a esta involução.9 Zygmunt Bauman, ibidem, p. 65-66. 10 Esta ‘desregulamentação’ é deveras ‘interessante’: dá rédea solta às instituições privadas e

submete as públicas a uma tresloucada onda de burocratização e regulamentação, de controlo e

controladores externos, sem precedentes. Isso mesmo é bem visível e pernicioso no ambiente

instaurado dentro da Universidade.11 Escrito na Pedra, Jornal Público, p. 47, 10 de agosto de 2014.

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19 — RPCD 15 (1)

Agucemos o olhar. Os donos do conhecimento usufruem do crédito de se situarem perto

das fontes da incerteza. Foi assim no passado; é assim no presente. Só que antes os ‘conhe-

cedores’ usavam esse crédito em favor do bem geral, enquanto agora blindam o acesso à

informação e servem-se dela para favorecer as suas clientelas que, como paga, reforçam o

seu poder. Se antes ela era malquista, agora é procurada e bem-vinda pelos proveitos que ela

traz aos grupos que a controlam e exploram, investindo nela um capital altamente lucrativo

É este o cerne das ditas filosofias ou teorias. Mas é também um sinal de decadência e

de indecorosa captura do interesse público pelo privado, do poder político pelo império

económico-financeiro, da rutura da confiança entre os representantes e os representados,

estes sem nada que os proteja da ambição e ganância daqueles.

Por efeito da ‘arma da insegurança’, por elas fabricada, o mundo converteu-se num

“conglomerado de lugares repletos de pessoas prontas a sofrer sem reclamar qualquer

regime fabril, ainda que cruel, em troca de qualquer salário para o sustento, ainda que

miserável”, como observa Zygmunt Bauman. 12

VIII. As teorias e propostas do neoliberalismo (Estado mínimo e privatização dos direitos

e obrigações socias) são falaciosas. Põem nos ombros dos indivíduos a solução de todos os

seus problemas e angústias. Fingem ignorar que não há solução individual para problemas

socialmente fabricados. A desigualdade é um deles.

A desigualdade é crescente e assombrosa. Quem o afirma são os relatórios da ONU e os

estudos de especialistas rigorosos e fiáveis. É verdade que há um considerável crescimen-

to económico em muitos países e uma aproximação entre eles. Porém este crescimento

não se traduz no aumento da igualdade dentro dos países. Pelo contrário, a desigualdade

é galopante e potencia o enriquecimento dos que já são ricos. 13

A ‘desregulamentação’ política dos mercados e da circulação e movimentação do dinhei-

ro, sempre à procura de regiões de baixos salários e ínfimos padrões de vida, é um efeito

hediondo das ditas teorias, servindo para aumentar a gula nunca satisfeita da concentra-

ção de riqueza por uma minoria. 14

Para cúmulo, quando a oportunidade surge, nacionalizam-se os prejuízos e privatizam-

-se os ganhos e lucros. Isto revela bem o desaforo a que chegamos. Não há mais contra-

tos de mutualidade. Os mandarins multiplicam, a bel-prazer, as vítimas das teorias em

curso. Para tingir a hipocrisia, têm o descaramento de tratar os explorados como ‘danos

colaterais’, como se estes não fossem intencionalmente procurados e o seu número não

constituísse o índice de sucesso dos exploradores. Haja Deus!

E bem precisamos d’Ele, porquanto, conclui Zygmunt Bauman, “o crescimento incessan-

te da distância entre os que ‘têm’ e os que ‘não têm’, conhecido na Europa dos primórdios

do século XIX, está de volta, como uma vingança”. 15

Cada um de nós, no respetivo mister, tem que ser arauto da denúncia expressiva dos ma-

les assinalados e da concretização expansiva dos preceitos enunciados. Tem que reavivar

a crença e a esperança no homem ético, estético, íntegro e virtuoso e renovar as forças

para lutar pela sua prevalência.

Por sermos académicos, o nosso dever afigura-se acrescido. Mas… entre a prática do

fingimento e o cultivo da autenticidade para onde se inclina hoje a balança que julga a

assunção de responsabilidade social pelos académicos?

A impressão, que se colhe da sua conduta neste capítulo, encaixa-se no vaticínio, nada

abonatório, feito pelo escritor inglês Samuel Johnson (1709-1784): “Quem não se importa

com o próprio estômago, dificilmente se irá importar com outra coisa.” 16

Ora como o salário, apesar de ser cada vez mais magro, ainda dá para forrar as paredes es-

tomacais, a maioria dos académicos não parece estar muito sensível ao histórico desígnio da

Universidade, nem empenhada em contribuir para o enfadonho labor de perceber, interpretar

e aliviar as buscas, contradições, perguntas e dores da existência e deste mundo atormentado.

Todavia, a Universidade não pode ser o lugar onde os académicos se deitam no berço esplên-

dido do conformismo, da demissão e do oportunismo. Esse remanso deve ser procurado noutra

instância. Na Universidade, pela sua incumbência humanista e social, espiritual, intelectual e

universalista, é obrigatório levantar e ouvir a voz da exigência e da indignação cívicas, face ao

absurdo afrontamento e esquecimento da decência, da equidade e do respeito. As ideias e as

palavras ditas podem mudar o mundo, muito mais do que os papers e os rankings.

Retiremos a venda da opacidade. Infelizmente, a Universidade está a precisar de uma bar-

rela que lhe limpe a sujeira da subserviência aos amos desta hora de regressão civilizacional e

moral. Na barra dos tribunais que julgam as falácias em circulação, ela vai ter que confessar a

traição e assumir um convincente arrependimento. Entregou-se a modismos fúteis e pseudo-

-produtivos, pensa pouco, verga-se e ajoelha demasiado. Vende-se nela muito gato por lebre!

12 Zygmunt Bauman, ibidem, p. 59. 13 Veja-se a Pirâmide da Riqueza Global 2015, recentemente apresentada pelo Credit Suisse.14 “2015 será recordado como el primer año de la serie histórica en el que la riqueza del 1% de la

población mundial alcanzó la mitad del valor del total de activos. En otras palabras: el 1% de la

población mundial, aquellos que tienen un patrimonio valorado de 760.000 dólares (667.000 euros

o más), poseen tanto dinero líquido o invertido como el 99% restante de la población mundial.

Esta enorme brecha entre privilegiados y el resto de la humanidad, lejos de suturarse, ha seguido

ampliándose desde el inicio de la Gran Recesión, en 2008. La estadística de Credit Suisse, una de las

más fiables, solo deja una lectura posible: los ricos saldrán de la crisis siendo más ricos, tanto en

términos absolutos como relativos, y los pobres, relativamente más pobres”. (El 1% más rico tiene

tanto patrimonio como todo el resto del mundo junto, jornal El País, 13 de outubro de 2015)

E

15 Zygmunt Bauman, ibidem, p. 69. 16 Escrito na Pedra, Jornal Público, p.48, 09 de agosto de 2014.

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21 — RPCD 15 (1): 21-40

Enfim, a Universidade hodierna naufraga no mar da convulsão e do conformismo. Ela e

os seus membros têm muita dificuldade em acompanhar o pêndulo no seu movimento da

confusão para a simplicidade, da penumbra para a claridade.

Serão estes dias de uma impenetrável complexidade ou seremos nós que temos pouca

apetência para a clarividência? A nossa atenção não consegue ser indivisa e caminhar o

suficiente para chegar à clareira da Humanidade.

Que grandeza do humano ansiamos edificar no nosso tempo, no nosso mundo? Em vez

de um mundo mercantilizado, calculista e desumano, importa dar prioridade à erradicação

das grandes fontes de sofrimento.

Que contributo quer dar a Universidade para isso? Talvez devesse voltar a cultivar o

jardim do ócio criativo e abandonar a tentação do negócio lucrativo!

Como a cantora brasileira Ana Carolina, concluo com esta proclamação: “Minha espe-

rança é imortal. E eu repito, IMORTAL! Sei que não dá para mudar o começo, mas, se a

gente quiser, dá para mudar o final.”

What brings youngsters

into the stadium?

Sociopsychological predictors

of soccer attendance among

Belgian and Portuguese

young fans

KEYWORDS:

Soccer attendance motives. Sociopsychological

factors. Lifestyle. Team identification. Youngsters.

ABSTRACT

While in some countries across Europe soccer games attract full stadiums on a regular

basis, in other countries, such as Portugal, the stadiums reveal many empty seats in big

up-to-date facilities. On the other hand, in Belgium, the construction of bigger stadiums

is being planned to substitute the current out-dated facilities. In both cases, it is impor-

tant to understand why people, and specifically the young fans, attend or do not attend

games. Therefore, the main objective of this research is to find out what takes Belgian and

Portuguese youngsters into the soccer stadium. We performed a fandom related survey

to 16-19 years old fans, more specifically 173 Belgian (81.5% male) and 188 Portuguese

(50.5% male) high school students. We analysed data employing structural equation mod-

elling in AMOS. Lifestyle, defined as a set of patterns, distinct from others, based on values,

attitudes, and orientations, emerged as the strongest predictor of soccer attendance for

youngsters. Team identification was also a significant predictor for Belgian young fans.

Marketing implications of these findings are discussed.

AUTORES:

Mariana de Carvalho 1, 2

Filip Boen 3

José Pedro Sarmento 2

Jeroen Scheerder 1

1 Policy in Sports & Physical Activity Research Group, Department of Kinesiology, University of Leuven, Belgium

2 CIFI2D, Faculdade de Desporto, Universidade do Porto, Portugal

3 Physical Activity, Sports & Health Research Group, Department of Kinesiology, University of Leuven, Belgium

Correspondência: Mariana de Carvalho, Tervuursevest 101 – box 1500, room GYM 02.101, 3001 Leuven, Belgium;

0032485272062; ([email protected]).

SUBMISSÃO: 24 de Fevereiro de 2015ACEITAÇÃO: 27 de Abril de 2015

01

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23 — RPCD 15 (1)

01O que traz os jovens ao estádio?

Preditores psicossociais da assistência ao futebol

de jovens adeptos belgas e portugueses

RESUMO

Enquanto em alguns países europeus os jogos de futebol enchem regu-

larmente estádios, noutros países, como por exemplo Portugal, os mo-

dernos estádios estão muitas vezes vazios. Por outro lado, na Bélgica

está a ser planeada a construção de estádios maiores para substituir as

instalações antigas e desatualizadas que existem atualmente. Em am-

bos os casos, é importante perceber porque é que as pessoas, e especi-

ficamente os jovens, vão ou não assistir a jogos de futebol. Assim, o ob-

jectivo principal deste trabalho é descobrir o que leva os jovens belgas e

portugueses aos estádios de futebol. Jovens adeptos entre os 16 e os 19

anos, especificamente, 173 estudantes belgas (81.5% do sexo masculi-

no) e 188 estudantes portugueses (50.5% do sexo masculino), respon-

deram a um questionário sobre os seus hábitos de consumo de futebol.

Os dados foram analisados através de modelagem por equações estru-

turais, com o programa AMOS. Estilo de vida, definido como um conjunto

de padrões de comportamento, distinto de outros, baseado em valores,

atitudes e orientações, emergiu como o maior preditor de assistência a

jogos de futebol entre os jovens. Identificação com a equipa também

emergiu como preditor de assistência a jogos para os jovens adeptos

belgas. As implicações de marketing destes resultados são discutidas.

PALAVRAS-CHAVE:

Motivos para assistência ao futebol. Factores sociopsicológicos.

Estilo de vida. Identificação com a equipa. Jovens.

INTRODUCTION

Can someone imagine a Real Madrid vs. Barcelona or a Chelsea vs. Manchester United with

empty stands? Hardly, we would say. The soccer industry is almost inseparable from the

spectators that fill the stadium with colourful shirts and chants. Still, while some countries

across Europe, such as Germany, Spain, England, or the Netherlands, have full stadiums

during the regular professional league soccer games, others have to deal with empty seats.

Portugal is one of the countries facing this problem of absence of spectators and empty

stadiums (8). Several stadiums were built or rebuilt for the European Championship of 2004,

and, for that reason, the facilities are modern and big. Nevertheless, despite the tradition

in soccer, both at the organisational and the competitive level, the occupation rate of the

Portuguese stadiums is only 40% (5). The stadiums of Algarve, Aveiro, and Leiria, are exam-

ples of so-called ‘white elephants’, that is, empty stadiums that fight to keep running due to

the lack of use (14). The problem is accentuated by the fact that in Portugal, the majority of

the fans are affiliated with the three main clubs, which are located in Porto (Futebol Clube

do Porto) and in Lisbon (Sport Lisboa e Benfica, and Sporting Clube de Portugal) (8). Even

when people live in the countryside or Algarve, they often are fans from a club that is lo-

cated at a rather far distance from their home, and therefore, much more difficult to reach,

when it comes to the distance and to the time it takes to get there. This situation consti-

tutes a financial problem for the local clubs, for the cities, and for the country in general.

By contrast, in Belgium the stadiums are old and rather small. However, Steven Martens,

the General Secretary of the Royal Belgian Football Association, recently stated ‘(…) our

long-term goals include an increase of the number of football fans (…). This is only possible

if we have modern stadiums that can assure a good hospitality for the fans. Therefore, we

would like to establish five brand new stadium cases’ (23). Regardless of these contextual

differences, Belgium and Portugal are in a similar situation when it comes to the number of

inhabitants (around 11 million) and to the number of spectators who attend soccer games

(around 10.000 spectators/ game) (30). The possibility to collect data from Belgium and

Portugal within the same research design was a good opportunity to include two different

soccer attendance cultures, and to compare some results regarding the profile of the fans

(e.g., financial status and interest for soccer).

Hence, the main objective of this paper is to identify predictors of soccer attendance on

16-19 year old youngsters in Belgium and in Portugal. The reasons why we chose for young-

sters are explained next. The potential of the youth consumer has been acknowledged by the

sport industry, for example, by the largest sporting goods companies (36). Teens are important

target groups for marketeers because they are considered to be trendsetters, because they

influence their parents’ spending, and because they are a future market (18, 50). In Western

societies youngsters have substantial amounts of money to spend on their needs and wants,

which qualify them as an important primary market (26). Besides, they develop brand loyalty

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25 — RPCD 15 (1)

01at an early age, and those positive attitudes toward brands last into adulthood (26). However,

previous research on sport attendance has not paid attention to this target group, making it a

gap on the literature. The main focus so far was on adult fans and university students. In this

research we want to understand if young fans have the same motives as adult fans to attend

soccer games. A better understanding of the young sport consumers and their motives to go

into the stadium, can help to build a more complete framework about the sport consumers.

It can also provide evidence for sport marketeers and for the clubs to find the best strategies

to market their core product, that is the game itself and their supplementary services, with

the specific target constituted by the youngsters.

THEORETICAL FRAMEWORK

The value that fans create at the stadium is undeniable, either for the show they help to

perform, or for the influence they have in the decisions of the stakeholders. Not only the

revenues from tickets, merchandising, food, and drinks are dependent on the number of

spectators during the games, but also the sponsorships, advertising partners, and media

rights are related to it (10). Clubs could not survive without their fans, nor without their

spectators. While a fan is an enthusiastic devote of a team, an athlete, or a sport, (21) it does

not mean that he/ she attends games on a regular basis. Which are the motives that take

fans into the stadium, and turn them into live spectators as well?

Based on several studies (20, 28, 32, 33, 39), de Carvalho and colleagues categorised the factors

influencing attendance in professional team sports in four clusters, from the perspective

of the fan (11). Their model includes (1) demographics; (2) fanographics – features relative

to the person as a fan, such as interest in soccer, or age at which they became a fan; (3)

external factors – factors related with the supply, that is, sportscape or physical environ-

ment, game related, marketing actions of the club, and economical issues; these factors

are similar to the ones proposed by Smith and Stewart (33); and (4) sociopsychological fac-

tors – were not included in previous categorisations and include the sociopsychological

motives for attendance, team identification (TI) and place attachment to the stadium. Al-

though all these factors are important, in this paper we give emphasis to the sociopsycho-

logical motives, with a specific focus on social interaction, and to the relationship of social

interaction with TI, specifically among youngsters.

SOCIOPSYCHOLOGICAL MOTIVES

Numerous authors have examined sociopsychological motives influencing sport consump-

tion and attendance in particular (6, 16, 17, 24, 39, 45). Social interaction (SI), also named sociali-

sation by some authors (16), has been included in the majority of the models. SI is the desire

for contact with spectators, participants, friends, and family (16). Sport is mostly consumed

in the presence of others (less than 2% of people attend games on their own), and market-

eers may remember that the sport product creates social facilitation (28). Weed (47) showed

that watching significant sport events remotely, but in the presence of others, could pro-

duce just as much delight or disappointing as actual attendance. The author focused on

people attending soccer games at the pub. He suggested that the need for proximity was

not for proximity to the event, but to others partaking in the experience of watching the

event, enhancing in this way the social aspect of spectatorship. However, Melnick (27) stated

that live sport spectating has developed into a major urban organisation where people

come together to enrich their sociopsychological lives through the relationships acces-

sible. Even though other sociopsychological motives might be important for the sport at-

tendance, social interaction is gaining place in a modern society full of urbanisation, indi-

vidualism, interpersonal competition, technology, and geographical mobility, and where

people, namely the young people, have difficulties to find social ties. Sport attendance

might be a way for young people to find these social ties. In this way, we propose that SI

is positively related to attendance (Hypothesis 1).

TEAM IDENTIFICATION (TI)

TI refers to the extent to which a fan feels psychologically connected to a team, is involved

and invested in the team, and sees the team as an extension of the self; it is a particular

instance of social identification (42, 43), which is a concept from the social identity theory (41).

Identification with a certain team corresponds to the concept of in-group identification (40). In-group identification is the part of social identity related to the degree to which the

in-group is included in the self. In fact, an individual forms a relationship with the group

in order to maintain his or her self-definition, and, consequently, behaves in accordance

with group norms and expectations. In this manner, a member who is identified with the

group behaves in order to show his/ her loyalty. Group membership and the adoption of

an identity based on group membership are really important to take into account in the

sport context (15). In this context, attendance is one instantiation of group loyalty. Thus, a

soccer fan shows this behavioural loyalty to the group by, for instance, attending games (2). Accordingly, TI was shown to predict attendance in adults (22, 42, 49). During adolescence,

the peer influence within the group is even stronger as groups are chosen on the basis of

existing similarities, but also seem to foster resemblance in behaviour and attitudes, once

the relationship has been established (37). Hence, we predict that also among young fans, TI

is positively related to attendance (Hypothesis 2).

When a fan identifies with the team, and moreover largely enjoys being at the stadium be-

cause of the SI with other people, such as family, friends and other fans, the gathering of both in-

stances might accelerate the attendance numbers. We predict that for youngsters with a strong

TI, the relationship between SI and attendance will be maximised. Therefore, we hypothesise

that the interaction between TI and SI is positively related to attendance (Hypothesis 3).

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01MATERIAL AND METHODS

SAMPLING AND DATA COLLECTION

Two cities with respectively 97.000 (Aveiro, Portugal), and 78.000 inhabitants (Leuven,

Belgium) were selected for the data collection. One medium level soccer club played in

the first league in each city, namely Sport Club Beira-Mar, and Oud-Heverlee Leuven. We

chose these cities because they are rather similar when it comes to the dimension of the

local clubs (e.g., number of fans, ranking, and importance within the country), number of

inhabitants, and they both are university cities.

Six secondary schools from Aveiro and five secondary schools from Leuven participated

in this research with some classes of different levels and study areas. Individuals were

addressed at their classroom, with the presence of their teacher, with a brief explanation

about the content of the study.

The students filled out a twenty minutes survey, and as an extra motivation to do it prop-

erly, a lottery of a prize was carried out across the schools. This sample was not repre-

sentative of the overall population, it was a convenience sample instead, because only

some selected classes filled out the survey. However, because the entire classes had to do

it, we could collect data from a varied range of youngsters (different financial status, dif-

ferent interest in soccer, different number of games attended, etc.). The surveys have been

completed during March and April 2012.

We collected data from fans (people who mentioned that they were fans of a specific

club) and from non-fans (not a fan of any specific club). From the Belgian students, 62%

were non-fans, whereas among the Portuguese students, 13% were non-fans. However, in

the present study we want to focus on fans only, and on their relationship with their club.

Therefore, we kept the 38% of Belgian youngsters and the 87% of Portuguese youngsters

who were fans. The final sample consisted of 361 fans, including students from the last

two years of secondary school from Aveiro (nPT = 188) and from Leuven (nBE = 173). Among

these students, 32% were female (n = 113; nPT = 88; nBE = 25), and 68% were male (n = 236;

nPT = 95; nBE = 141). Portuguese respondents were only slightly older than their Belgian

counterparts (xage PT = 17.74±1.43; xage BE = 17.43±0.95, t(319) = 2.40, p<.05).

INSTRUMENT

After the implementation of a pilot study (11), the final version of the survey was completed

both in Dutch and in Portuguese including (i) a part on sociodemographic items (age, sex

with Female = 0 and Male = 1, origin with Portugal = 0 and Belgium = 1, financial status

measured in a scale from 1 = really difficult to live at home, to 5 = really easy to live at

home, education, favourite sport(s) to attend and to practice, and active sports partici-

pation); and (ii) a part on the person as a fan (or not), with questions about their soccer

consumption habits, that is interest in soccer measured in a scale from 1 = not interested

at all, to 5 = very much interested, attendance (number of games attended during the sea-

son), favourite professional soccer club, since what age they were fans, who were their

socialisation agents in order to become a fan (7), the sociopsychological motives scale, and

the sport spectator identification scale.

SOCIOPSYCHOLOGICAL MOTIVES SCALE (SMS)

The items regarding the sociopsychological motives were collected from the work of sev-

eral authors, as shown before; all the items of the SMS are presented in Table 1. After an

in-depth analysis of different scales and with the support of the pilot study we maintained

items related to interaction with other fans (two items), family (two items), friends (two

items), vicarious achievement (two items), escape (two items), tradition (two items), en-

tertainment (two items), and team (one item). The options ranged from 1 = totally disagree,

to 5 = totally agree.

An exploratory factor analysis (EFA) was conducted for the total sample on the 18 items

of the SMS with oblimin rotation (Table 1). The Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) was .92. Bart-

lett’s test of sphericity χ2(153) = 3242.67, p<.001, indicated that correlations between items

were sufficiently large for EFA. An initial analysis was run to obtain eigenvalues for each

factor in the data. After analysis of the scree plot and eigenvalues together, three factors

were retained explaining 62% of the total variance. The content of the items that loaded

highly on Factor 1 suggest that it represents Enjoyment (e.g., ‘A soccer game at the sta-

dium is a good entertainment for me’, or ‘I enjoy being with friends at the stadium’). En-

joyment refers to the fun that the person has with the activity (31). The items loading on

this factor represent this joy and pleasure of being at the event itself. Factor 2 represents

Lifestyle. Lifestyle is a set of patterns, distinct from others, based on values, attitudes, and

orientations, and the items loading on this factor relate to the way of life, and the traditions

of the individual and of the people surrounding him/ her (e.g., ‘It is a tradition to attend

SG at the stadium in my family’, or ‘Attending SG at the stadium is part of my lifestyle’) (35).

Finally, Factor 3 represents Vicarious Emotions, that is, feeling together or in harmony with

the team (e.g., ‘I get a success feeling when the team I’m supporting wins’) (1). The SMS

factors showed a good reliability (α ≥ .79). Factors 1 and 2 include items related to social

interaction. In fact, the totality of items loading on Factor 2 is related to social interaction.

Because we want to investigate social interaction, we use both dimensions in our model.

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01TABLE 1. Factor loadings for exploratory factor analysis with oblimin rotation of the SMS (n = 361)

ITEMSFACTOR

ENJOYMENT LIFESTYLE VICARIOUS EMOTIONS

13 – A SG at the stadium is a good entertainment for me .882

5 – I enjoy being with friends at the stadium .728

15 – I feel relaxed when I attend a SG at the stadium .715

12 – I like following rituals at the SG .674

6 – I enjoy being with other fans and part of the crowd at the stadium, I feel like I belong to a group or tribe .615

16 – I feel that I can let go my emotions when I attend a SG at the stadium .604 .327

14 – I feel that I can escape from reality when I attend a SG at the stadium .501 .315

2 – It is a tradition to attend SG at the stadium in my family .849

1 – Attending SG at the stadium is part of my lifestyle .665

3 – It is a tradition to attend SG at the stadium in my group of friends .611

7 – It is important meeting/networking with people that can help me in my professional life at the stadium .592

18 – I like to celebrate special occasions (birthdays, holidays or others) attending a SG at the stadium .534

4 – I enjoy being with family at the stadium .457

9 – I get a failure feeling when the team I’m supporting looses .676

8 – I get a success feeling when the team I’m supporting wins .664

17 – I feel that a SG can be too exciting or stressing .638

10 – I enjoy guessing the plays that are going to happen next during the SG .408

11 – My presence is important either economically or sentimentally .316

Number of items 7 6 5

Eigenvalues 8.28 1.52 1.35

% of variance 46.01 8.44 7.50

α .91 .85 .79

Note. Factor loadings <.30 were suppressed to assist the screening; SG = soccer game(s)

SPORT SPECTATOR IDENTIFICATION SCALE (SSIS)

The SSIS was used to assess levels of TI among the soccer fans (38, 42, 43). The options ranged

from 1 = low identification, to 7 = high identification. An EFA was conducted on the 7 items

of the SSIS with oblimin rotation. The KMO measure confirmed the sampling adequacy for

the analysis, KMO = .91. Bartlett’s test of sphericity χ2(21) = 1499.07, p<.001, indicated that

correlations between items were sufficiently large for EFA. An initial analysis was run to

obtain eigenvalues for each factor in the data. One factor had an eigenvalue over Kaiser’s cri-

terion of one and explained 64% of the variance. The SSIS with seven final items (e.g., ‘How

strongly do you see yourself as a fan of the team?’) showed an excellent reliability (α = .90).

DATA ANALYSIS

We conducted descriptive analyses using SPSS 21.0, and multivariate analyses using

AMOS 21.0. For the multivariate analysis, AMOS requires a listwise deletion. Thus, a sam-

ple with no missing values was analysed (n = 223; nPT = 133; nBE = 90). We performed

curve estimation for all the relationships in our model, and determined that all relation-

ships were sufficiently linear to be tested using a co-variance based structural equation

modelling algorithm used in AMOS.

MULTICOLLINEARITY DIAGNOSIS AND CONFIRMATORY FACTOR ANALYSIS

To confirm the EFA, we conducted a confirmatory factor analysis (CFA) of the measures

included in this research, that is, the SSIS, and the factors of the SMS that included the

concept of social interaction items, that is, Enjoyment, and Lifestyle. The CFA measure-

ment model displayed in Figure 1 represented a good fit. We declined four items with load-

ings below .60. Based on the modification indices proposed to improve the model, we al-

lowed some error terms to co-vary. The absolute fit measures goodness-of-fit index (GFI

= .91), standardised root mean square residual (SRMR = 0.05), and root mean square error

of approximation (RMSEA = 0.06, p>.05) indicated moderate and good fit respectively (19).

The chi-square test statistic (χ² = 186.7, df = 98, χ²/ df = 1.9) was good, but significant

(p<.001); this was likely inflated by the size of the calibration sample (25). The incremental

fit measure adjusted goodness-of-fit index (AGFI = .88) and the parsimonious fit measure

comparative fit index (CFI = .96) indicated great fit (19). We tested the invariance between

groups (Belgian and Portuguese sample) and the model showed invariance. We also tested

for common method bias, employing the unmeasured latent factor method (29), and we

concluded that this was not a serious concern, as there was less than 50% of common

variance between factors.

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31 — RPCD 15 (1)

01

FIGURE 1. Measurement model illustrating the relationship among the three latent variables tested using CFA.

Table 2 shows the means and standard deviations of the main constructs of this research,

that is, SSIS, Enjoyment and Lifestyle. In the same table we see that the measurement

model presented convergent and discriminant validity as well. The average variance ex-

tracted (AVE), the maximum shared variance (MSV), and the average shared variance

(ASV), were good. The composite reliability (CR) of each scale was above .7 and CR > AVE.

The correlations among the scales were statistically significant and moderate (r ≤ .72,

p<.001). The magnitude of the correlations demonstrated that it was feasible to test a

theoretically based structural model.

TABLE 2. Factor correlation matrix, convergent and discriminant validity, means, and standard deviations for scores of the latent variables TI, Enjoyment and Lifestyle (n = 223)

Measure TI Enjoyment Lifestyle CR AVE MSV ASV M SD

Team identification (SSIS) .84 - - .92 .71 .51 .48 5.07 1.43

Enjoyment (SMS Factor 1) .72*** 0.72 - .88 .55 .51 .49 3.45 0.98

Lifestyle (SMS Factor 2) .66*** 0.68*** 0.70 .82 .49 .46 .45 2.38 0.95

Note: SSIS = Sport Spectator Identification Scale (7-point scales); SMS = Sociopsychological Motives Scale (5-point scales); CR = Composite reliability; AVE = Average variance extracted, with square root of the AVE on the diagonal; MSV

= Maximum shared variance; ASV = Average shared variance***p<.001

MODEL SPECIFICATION AND MODIFICATION

The structural model consisted of the previously hypothesised relationships. The struc-

tural model included paths from TI, Enjoyment and Lifestyle to attendance (Hypothesis 1

and Hypothesis 2). We specifically tested the interactions of TI with Enjoyment and of TI

with Lifestyle (Hypothesis 3). We also included paths to attendance from several control

variables such as age, sex, financial situation, and time to stadium. Finally, we performed

multigroup moderation in order to find differences between the Belgian and the Portu-

guese samples. We performed model modifications by eliminating a single path with a

non-significant t-value at a time, and then re-estimating the model. We removed paths

with non-significant t-values because no substantive meaningful interpretation can be de-

livered for the parameter estimates.

RESULTS

Table 3 shows the results for the entire sample, including comparisons between the Bel-

gian and the Portuguese sample. As we can see in the table, respondents in the Belgian

sample showed a stronger financial status, and a stronger interest in soccer. Moreover,

Belgian students were three times more likely to attend games than the Portuguese stu-

dents. Portuguese students became fans at a younger age, and they were significantly

more influenced by a family member to become a fan than the Belgian participants (χ2(1)

= 115.54, p<.001). Portuguese students also lived further from the stadium of their club.

We found that 86% of the fans followed the clubs Futebol Clube do Porto, Sport Lisboa e

Benfica, or Sporting Clube de Portugal. Only 7% of the Portuguese fans were fans of Sport

Clube Beira-Mar, the local club. In the Belgian sample, it was also found that Sporting

Anderlecht and Club Brugge attracted 45% of the fans, but Oud-Heverlee Leuven, the local

club, still attracted 29% of the Belgian fans.

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01TABLE 3. Summary of descriptive statistics about the fans (total sample, Belgium Vs. Portugal)

TotalM (SD) / (n = 223)

BelgiumM (SD) / (n = 90)

PortugalM (SD) / (n = 133)

Financial situation 3.50 (0.86) 3.90 (0.82) 3.23 (0.78) t(221) = -6.22 ***

Interest in soccer 3.97 (1.18) 4.31 (0.98) 3.74 (1.25) t(216) = -3.79 ***

Attendance (n.º games attended/season) 4.70 (6.59) 7.37 (8.33) 2.89 (4.25) t(121) = -4.70 ***

Time to stadium of their team (hours) 2:15 (1:34) 1:16 (0:41) 2:55 (1:39) t(191) = 10.13 ***

Age they became a fan 7.52 (3.85) 9.54 (3.93) 6.14 (3.13) t(162)= -6.86 ***

Team identification (SSIS) 5.07 (1.43) 4.96 (1.30) 5.14 (1.51) t(209) = 0.93

Enjoyment (SMS Factor 1) 3.45 (0.98) 3.47 (0.92) 3.44 (1.02) t(221) = -0.23

Lifestyle (SMS Factor 2) 2.38 (0.95) 2.40 (0.91) 2.37 (0.97) t(221) = -2.61

Vicarious Emotions (SMS Factor 3) 3.32 (0.89) 3.06 (0.85) 3.50 (0.87) t(221) = 3.70 ***

Note. SSIS = Sport Spectator Identification Scale (7-point scales); SMS = Sociopsychological Motives Scale (5-point scales); *** p < .001, two-tailed.

STRUCTURAL EQUATION MODELLING

The final structural model presented in Figure 2 represented an enough good fit to the data.

The absolute fit measures GFI = .96, SRMR = .085, presented a good fit, and the RMSEA =

.09 (p=.02), presented a moderate fit (19). The chi-square test statistic (χ2 = 37.49, df = 13,

χ2/ df = 2.88) was significant (p<.001); this was likely inflated by the size of the calibration

sample (n = 223) (25). The incremental fit measure AGFI = .89, and the parsimonious fit

measure CFI = .97 presented a good fit (19).

FIGURE 2. Results of the structural model with the regression standardised coefficients (β). To improve the clarity of the figure, the items are not included, and significant relationships are presented in bold (p≤.001). e = disturbance term.

Lifestyle positively predicted attendance confirming Hypothesis 1. There was no sig-

nificant relationship between attendance and TI, or between attendance and Enjoyment.

Therefore, Hypothesis 2 could not be confirmed.

The control variables time to stadium, and financial status were related to attendance.

The variable time to stadium showed a negative relationship with attendance. The variable

financial status presented a positive relationship with attendance. From our findings it was

clear that sex and age were not predictors of attendance for youngsters.

We tested both the interaction of TI with Lifestyle and the interaction of TI with Enjoy-

ment. None of the interactions was a significant predictor of attendance. TI was not found

to be a positive moderator in the relationship between Lifestyle and attendance, or be-

tween Enjoyment and attendance. Thus, Hypothesis 3 was not confirmed.

The model explained 34% of the variance in attendance, with Lifestyle explaining the big-

gest part of this variance. In this manner, the more games youngsters attended, the higher

they scored on the Lifestyle motive, the closer they lived to the stadium, and the higher

their financial status was.

To investigate the differences between the Belgian sample and the Portuguese sample, we tested

multigroup moderation. We found several differences between the Belgian sample and the Por-

tuguese sample. There was a significant difference (p<.05) on the relationship between TI and

attendance. While the relationship between TI and attendance is positive in the Belgian sample

(β= .32, p<.05), in the Portuguese sample is negative and non-significant (β= -.16, p>.05).

The control variable time to stadium also presented a significant difference (p<.05) be-

tween countries. While for the Belgian sample, the relationship between time to stadium

and attendance was negative (β= -.20, p<.05), for the Portuguese sample, there was no

significant relationship between time to stadium and attendance (β= .13, p>.05). Relative-

ly to the financial status, there was a significant difference between countries as well. For

the Belgian sample, the relationship between financial status and attendance was positive

(β= .18, p<.05), for the Portuguese sample there was no significant relationship.

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35 — RPCD 15 (1)

01DISCUSSION

First, we present the discussion about the comparison between the sample from Belgium

and the sample from Portugal, including the multigroup moderation. Second, we present

the discussion of the structural model for the total sample.

Although the sample is not representative of the general population, in both countries

data was collected in the same way, as we described before. We found a difference be-

tween the financial status of the Belgian and of the Portuguese fans. This result is in con-

sonance with the current economic situation in Europe, where inhabitants from countries

such as Portugal, and others in Southern Europe, face economic problems.

The interest in soccer varies according to the origin of the youngsters, with fans from Bel-

gium being more interested in soccer than the ones from Portugal. There is a general cultural

engagement of Portuguese people with soccer (8). This means that in Portugal almost eve-

ryone is a fan of a club, even when they are not specifically interested in soccer. Accordingly,

almost all respondents in the Portuguese sample were fans (87%), whereas only around one

third of the Belgian students were fans (38%). The interest of the Portuguese overall partici-

pants, that is, fans and non-fans, is more homogeneous, whereas the Belgian sample shows

a huge gap between the ones that were involved with a club as fans and the ones that were

not. This may indicate that the Portuguese people are, in general, fans of a club whether they

are interested in soccer or not, but the Belgian people who are really into fandom are more

interested in the sport itself. In Portugal, soccer belongs to the identity of the people, and it

is omnipresent in society (8). For instance, there are three daily sport newspapers, and several

daily television debates and shows about soccer during the entire week. For Belgian people,

cycling takes a similar central place in their national sport identity (12).

Portuguese fans live further from their home stadium than the Belgian fans. This difference

is in harmony with the results showing that Portuguese people are fans of one of the three

big clubs, regardless the place where they live. These three clubs are so hegemonic in the

country that children learn to distinguish between red (SL Benfica), blue (FC Porto) and green

(Sporting CP) referring to the colours of these clubs (8). Only 7% of the Portuguese fans are fans

of Beira-Mar, the local club. This finding also confirms that Portuguese people are fans of a

so-called big club firstly, and only second one is a fan of a local club (13). In the Belgian sample,

Anderlecht and Club Brugge attract a lot of fans, but Oud-Heverlee Leuven still attracts one

third of the Belgian fans, showing that the connection with the local club is stronger.

The average number of games attended by the Belgian fans is also much higher. Since Por-

tuguese fans live further from the stadium of their club, it might be more difficult for them

to reach the stadium, physically, and therefore they are going significantly less to the games.

The financial situation of the respondents might also contribute to their absence from the

stadium. In the Portuguese culture, soccer is commonly considered as a religion (9). Resem-

bling other religions, Portuguese people proclaim their passion for their clubs but do not

practice what they preach, given that paradoxically the attendance numbers are really low (8).

In addition, Portuguese fans are fans of the club since a younger age than it is the case

for Belgian fans. This finding can also be related to the fact that the Portuguese fans are

significantly more influenced by a family member to become a fan than the Belgian ones.

Relatively to the multigroup moderation, we identify that there are some differences between

groups, when it comes to predicting attendance. Differently to what the SEM shows to the Belgian

and the Portuguese fans together, TI is positively related to attendance for the Belgian fans. This

result partially confirms Hypothesis 2 and it is in accordance with previous research (22, 42, 49). For

the Belgian fans financial status positively predicts attendance, and time to stadium negatively

predicts attendance. For the Portuguese fans, there are no unique predictors of attendance. This

lack of relationship between number of games attended and other factors such as team identifi-

cation, time to stadium or financial status, might be related to the fact that attendance presents

a small variability in the Portuguese sample. The fact that TI was not a predictor of attendance

as it is described in previous literature (22, 42, 49) might have another explanation for the Portuguese

sample: the fact that the respondents are mainly fans of one of the three big clubs in Portugal,

which are located pretty far, might condition their will to attend games. In other words, if these

youngsters lived in the city of their team, maybe TI could take them to the stadium. However,

because they live far and they cannot decide for themselves to travel, as they are still living with

their parents and dependent of them, they are conditioned not to attend games at the stadium.

Lifestyle can be considered the strongest predictor of attendance, both for young Bel-

gian and Portuguese fans. This relationship is much stronger than the relationship of TI

with attendance for both subsamples. This may mean that for young people, the decision

to attend a soccer game or not is less related with TI, and much more related, for example,

with tradition within the family and within the group of friends, and the kind of life stage.

Within sports research, the concept of lifestyle has been previously related to the practice

of extreme sports, such as windsurfing, skateboarding or rock climbing (48). In the present

study, we define lifestyle from a sociological perspective, more specifically as a distinctive

mode of living, with routines and tangible behaviour patterns, (34) such as sports attend-

ance. We found that the number of games attended is higher when the lifestyle enclave

in which the youngster is involved, includes the game attendance behaviour. The lifestyle

enclave is formed by people who share some features of private life, patterns of appear-

ance, and consumption and leisure activities (4). In the youngsters’ life, this enclave is, still

mainly constituted by the parents. Therefore, at this age, the parents still primarily influ-

ence consumption, as has been described in research on consumer behaviour (3).

Page 20: REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO …Mariana de Carvalho, Filip Boen, José Pedro Sarmento, Jeroen Scheerder. Adaptação para a população portuguesa de intrumentos de avaliação

37 — RPCD 15 (1)

The interaction between TI and Lifestyle or between TI and Enjoyment do not represent

significant relationships with attendance. This might be related with the fact that neither

TI nor Enjoyment are significant predictors of attendance, as the only clear predictor of

attendance was Lifestyle.

CONCLUSIONS

In the present study, we wanted to test whether the findings from previous research on sport

attendance of adults could be replicated among youngsters. We did not find previous research

about sport attendance conducted specifically with youngsters, and this paper improves this

field of knowledge in that sense. Moreover, we found that the motives for youngsters to attend

soccer games are different from the ones previously found for adults. As a summary of the major

findings of this research, we can conclude that for young Belgian and Portuguese fans, Lifestyle

is the strongest predictor of attendance, and not TI, as previous research showed among adults.

The distance to the home stadium is negatively related to attendance. The model explained 34%

of the variance in attendance, with Lifestyle explaining the biggest part if this variance.

One added value of this research is that we reach attendants and non-attendants by

means of the educational system, instead of asking people who are attending at the sta-

dium. In this manner, it is possible to understand the factors influencing attendance for

spectators with different kind of attendance habits, including people with a limited amount

of games attended. Also the fact that we collected data from two countries allows us to

ascertain an interesting international perspective.

LIMITATIONS AND FUTURE RESEARCH

The current study includes a convenience sample of high school students, limiting its gen-

eralisability. The fact that the sample consists of young people involves that variables re-

lated to age (such as age itself, age at which they became a fan, and the number of years

as a fan) have a smaller amount of variability than it would happen with a larger sample

including other age groups. Also the fact that Portuguese youngsters do not attend games

on a regular basis, limits the establishment of some relationships.

The fact that data were collected in cities without big clubs might also have somehow

biased the results. More specifically, only a small percentage of youngsters were fan of the

local club, especially in Portugal. In this manner, they possibly were much more conditioned

by the distance to the stadium to attend games of their favourite team, than if they were liv-

ing in the city of their club. In other words, maybe if the data were collected in a city with a

big club the results would have been different, and TI would have been a stronger predictor

than lifestyle. Future research could try to find if these relationships still remain by replicat-

01ing this study with youngsters in a city with a big club. However, it is important to notice

that lifestyle still emerged as a much stronger predictor than distance to the stadium in this

research, which enhances its importance. Besides, from our perspective, the fact that we

conducted this research in a city without a big club is also an added value, because usually

research about attendance and TI is always conducted in big clubs. In this manner, this

study adds to the knowledge about fans and their consumption behaviour.

Future research should also try to understand if lifestyle as a predictor of attendance

is something that happens during a certain period of the person’s life, in this case, during

youth, especially, because the youngsters are still dependent on their parents to decide, or

if this relationship between lifestyle and attendance is an imminent cultural change, with

these youngsters becoming adults and still having lifestyle as main predictor of attend-

ance, instead of TI from the older generations.

In this research, we focused on consumer behaviour related to soccer clubs, such as

motives to attend games. However, in addition to being a fan of their club, or sometimes,

even when they are not following a particular club, people support the national team. From

our perspective, it would be interesting to understand what moves fans towards the na-

tional team games. The motives of these national team fans might be totally different and

from a sociological perspective, it would be noteworthy to understand them.

MARKETING IMPLICATIONS

Lifestyle is a major predictor of attendance in professional soccer both for Belgian and Por-

tuguese young fans. Clubs should put emphasis on family activities, group promotions, spe-

cial offers, and social activities with the friends, or for instance the school. To maintain and

build attendance, opportunities for attendees to socialise with others before and during the

game should be provided. For instance, youngsters like to celebrate special occasions, such

as their birthday, at the stadium (Table 1). Therefore, clubs could present special packages,

including the ticket for the game and other special features, such as a small present or a spe-

cial activity with the team, if the person decides to spend a special occasion at the stadium.

The distance fans live from the stadium, in general, and specially in Belgium, is nega-

tively related with attendance. This is an expected result, but marketeers cannot mistreat

that fact. For fans living further from the stadium, the total price of the game is not only the

price of the ticket itself, but the price of the food and of the travel, as well (11). Besides, the

time people have to spend to reach the stadium can also demotivate youngsters to attend

a soccer game, or they can even be forbidden by their parents to go so far, and eventually

they must choose for another entertainment activity. Special prices and special transpor-

tation should be provided, and for certain games a ‘youngsters bus’ could be a great invest-

ment on the future loyalty of the future consumers.

Page 21: REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO …Mariana de Carvalho, Filip Boen, José Pedro Sarmento, Jeroen Scheerder. Adaptação para a população portuguesa de intrumentos de avaliação

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01Moreover, we found that a lot people are fans of a club from another city, especially in Portu-

gal, with the three main clubs getting the majority of the attention. In a world of entertainment

full of consumption offers for the youngsters, the local clubs should listen to the city inhabitants

since a young age. Co-creating value with the locals, for instance through the social networks or

activities at their schools or sports school, getting to know them and using their ideas, expecta-

tions and motivations should be a huge opportunity to establish a relationship with the children,

and try to attract them to be fans of the club of the city, and not of a team from far away.

ACKNOWLEDGEMENTS

This work was supported by the Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), Portugal,

under grant number [SFRH / BD / 68925 / 2010]. This paper was partially presented at

the 11th European Association for Sociology of Sport Conference, Utrecht, May, 2014 (Oral

communication). We would like to thank Jos Feys, from the KU Leuven, for proficiently

placing the survey online.

Page 22: REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO …Mariana de Carvalho, Filip Boen, José Pedro Sarmento, Jeroen Scheerder. Adaptação para a população portuguesa de intrumentos de avaliação

41 — RPCD 15 (1): 41-63

02Adaptação para a população

portuguesa de intrumentos

de avaliação da qualidade,

satisfação e fidelização

de clientes em centros

de fitness

PALAVRAS CHAVE:

Qualidade de serviços. Satisfação. Fidelização.

Centros de fitness. Análise factorial confimatória.

RESUMO

A elevada proliferação de centros de fitness registada nos últimos anos desencadeou uma

forte concorrência neste sector. Esta competitividade incentiva uma crescente e generali-

zada exigência de mais e melhor qualidade dos serviços prestados, pois só essa qualidade

leva à satisfação e conseuqentemente manutenção dos clientes. A presente investigação

procurou avaliar as características psicométricas de instrumentos de avaliação da Quali-

dade, Satisfação e Fidelização de clientes em centros de fitness. As escalas foram traduzi-

das para a língua portuguesa, após o que foi avaliada a sua fiabilidade - através do cálculo

dos alfa de Cronbach e da análise das correlações item-factor - e a validade de constructo

- através da Análise Factorial Confirmatória - das suas versões portuguesas. A análise dos

resultados evidenciou que todas as escalas revelaram valores aceitáveis relativamente à

sua consistência e validade de constructo, razão pela qual se recomenda a sua utilização,

em conjunto ou individualmente, por parte dos investigadores nacionais interessados em

desenvolver estudos sobre esta temática.

AUTORES:

Arnaldino Ferreira 1

Cláudia Dias 2

António Manuel Fonseca 2

1 Escola Secundária Alberto Sampaio Braga, Portugal

2 CIFI2D, Faculdade de Desporto Universidade do Porto, Porto, Portugal

Correspondência: Arnaldino Ferreira. Escola Secundária Alberto Sampaio.

R. Álvaro Carneiro, 4715-086 Braga. Portugal.

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SUBMISSÃO: 18 de Agosto de 2014ACEITAÇÃO: 3 de Fevereiro de 2015

Page 23: REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO …Mariana de Carvalho, Filip Boen, José Pedro Sarmento, Jeroen Scheerder. Adaptação para a população portuguesa de intrumentos de avaliação

43 — RPCD 15 (1)

02Adaptation of quality, satisfaction

and loyalty assessment instruments

to the Portuguese population

ABSTRACT

In recent years, the high proliferation of fitness centers triggered a

fierce competition in the sector. This competitiveness encourages a

growing and widespread demand for more and better service quality

since only that quality leads to customer’s satisfaction and subsequent

maintenance. The present research sought to evaluate the psychometric

characteristics of Quality, Satisfaction and Customer Loyalty in fitness

centers assessment tools. The scales were translated into Portuguese,

after which the reliability - by calculating the Cronbach’s alpha and by

the analysis of item-factor correlations - and construct validity - by Con-

firmatory Factor Analysis – of their Portuguese versions were evaluated.

The results showed that all scales showed acceptable consistency and

construct validity values, which is why it we recommend its use, jointly

or individually, by national researchers interested in developing studies

on this subject.

KEY WORDS:

Service quality. Satisfaction. Loyalty. Fitness centers.

Confirmatory factor analysis.

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, a indústria do fitness tem-se afirmado como um sector em franco

crescimento. Em 2013, cerca de 138 milhões de pessoas em todo o mundo eram membros

de um health club, um número que, em 2009, não ultrapassava os 120 milhões. No mes-

mo período (i.e., 2009-2013), o número de centros de fitness e health clubs aumentou de

128.500 para 165.300. A Europa é a região com mais clubes de fitness, os quais, em 2013,

possuíam cerca de 45 milhões de membros. A receita global da indústria de fitness atingiu

os 78 mil milhões de dólares em 2013, o valor mais alto até à data e 11 mil milhões mais

elevado do que em 2009. Desta receita, quase 33 mil milhões de dólares foram gerados na

Europa, tornando esta região o maior mercado mundial de health clubs (29).

Por outro lado, independentemente do tamanho da indústria envolvida ou dos serviços

oferecidos, os centros de fitness e health clubs têm, de uma forma geral, baixas taxas de

retenção (1). Dados da International Health Racquet and Sportsclub Association (IHRSA)

e da Fitness Industry Association (FIA) demonstram que a assiduidade dos clientes de

clubes de fitness diminui claramente com o tempo, sendo que, por volta do sexto mês após

a inscrição, quase 44% dos membros frequentam o ginásio menos de uma vez por semana

– acabando eventualmente por abandonar totalmente -, enquanto 27% se pautam por uma

assiduidade reduzida (quatro a sete vezes por mês); apenas 29% usam o clube oito ou mais

vezes por mês, num padrão que se pode considerar ‘activo’ (27).

Estes dados sugerem que os centros de fitness se constituem actualmente como uma

excelente oportunidade de negócio, devido ao lucro que podem proporcionar, o que pode

ajudar a explicar a sua rápida e elevada proliferação; todavia, também importa não esque-

cer que esta proliferação gerou inevitavelmente uma elevada concorrência. Assim, num

contexto em que a taxa de retenção é geralmente baixa, e constituindo os clientes a sua

principal fonte de receita, é fundamental que os centros de fitness sejam capazes não só

de atrair esses clientes, mas também de os manter (10). Na verdade, existem evidências de

que a atracção de novos clientes se pode tornar cinco a seis vezes mais dispendiosa do que

a manutenção dos antigos (28). O caminho para o sucesso passa então pela fidelização dos

clientes, existindo investigadores que defendem que a fidelização pode ser o melhor predi-

tor de um lucro futuro, constituindo-se, hoje em dia, como o grande desafio estratégico das

gestões dos centros de fitness (16, 19).

Por um lado, a fidelização parece estar grandemente subordinada à satisfação dos clien-

tes, porquanto só em relação a clientes satisfeitos são fundadas as expectativas de fide-

lização (13, 22, 32). Por outro lado, a satisfação das expectativas e necessidades dos clientes

envolve a qualidade dos serviços prestados, a qual deverá exceder essas expectativas (12).

Nessa medida, a qualidade de serviços pode ser considerada um dos principais elementos

a afectarem a retenção dos clientes e rentabilidade a longo prazo de uma organização (32).

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45 — RPCD 15 (1)

02A qualidade de serviços gera clientes satisfeitos e uma elevada satisfação leva, por exem-

plo, a uma melhor reputação, menos custos para atrair novos clientes, menos recursos

devotados à gestão de queixas, e mais recomendações por parte dos clientes (19).

Ainda a propósito da qualidade de serviços, importa sublinhar que, tradicionalmente, o con-

ceito de qualidade se referia à eficiência do serviço, mas, recentemente, passou a centrar-

-se no cliente, sendo por isso definido como ‘aquilo que o cliente deseja’ (13). A constatação

desta tendência (i.e., centralização no cliente) sugere que as equipas de gestão dos centros

de fitness conheçam profundamente o processo específico de distribuição dos serviços de

fitness. Paralelamente, é fundamental que essas mesmas equipas conheçam o que o cliente

espera dos seus serviços para poderem ir ao encontro das suas expectativas e necessidades,

conseguindo, deste modo, gerar a sua satisfação e alcançar a sua fidelização.

Neste contexto, assumiu particular relevância o trabalho de Chang (4), que procurou de-

senvolver uma abordagem sistémica à qualidade dos serviços prestados por centros de

fitness, relacionando-a com a satisfação e a fidelização dos seus clientes. Chang efectuou

um estudo que visava, a partir da caracterização da generalidade dos serviços, analisar

especificamente os serviços de fitness e, com base nessa análise, distinguir as dimensões

especificas que os caracterizam. Para realizar o seu estudo, o autor começou por anali-

sar de forma detalhada a literatura produzida nesta área, associando e relacionando três

ideias fundamentais a partir das quais desenvolveu o seu modelo sistémico da qualidade,

satisfação e fidelização de clientes em centros de fitness.

A primeira ideia refere-se às perspectivas teóricas que explicam as relações causais

entre os constructos de qualidade, satisfação e fidelização de clientes referenciadas na

literatura (e.g., 9, 32), as quais sustentam que a qualidade antecede a satisfação e que esta, por

sua vez, antecede a fidelização. A segunda relaciona-se com a perspectiva dos sistemas

de produção e consumo de serviços, designadamente no que se refere às interacções en-

tre produtos/ serviços, pessoas, processos e ambiente. A qualidade resulta da interacção

entre estes quatro constructos, estando necessariamente ligada às três partes mais signi-

ficativas do processo de fornecimento de qualquer serviço: a organização, quem fornece o

serviço e o cliente. Por último, a terceira ideia diz respeito ao princípio que determina que

qualquer avaliação da qualidade global dos serviços deve incluir as percepções e reacções

dos clientes a todo o processo de distribuição do serviço. A amálgama das caracterís-

ticas das três partes do processo anteriormente referidas - a organização, o fornecedor

do serviço e o cliente - irá gerar as percepções de qualidade nos clientes; esta noção é

fundamental, principalmente nas organizações onde os clientes usufruem do serviço em

estreito contacto com as três partes referidas.

Os centros de fitness são um bom exemplo de uma organização onde o cliente é a figura

central do serviço. De uma forma geral, são organizações relativamente pequenas, onde

os clientes têm uma grande oportunidade para compreender a organização, bem como a

forma como é desempenhado o processo de gestão. Além disso, contactam com os funcio-

nários mais frequentemente e durante mais tempo do que é normal nas demais organiza-

ções de serviços. E, por último, como nos centros de fitness são atendidos vários clientes

ao mesmo tempo; eles interagem entre si. Em resultado, a percepção dos clientes sobre

a qualidade do serviço não se confina ao resultado final que deriva do processo de produ-

ção do serviço. Pelo contrário, as avaliações da qualidade são feitas também à custa da

avaliação do processo de fornecimento/ distribuição do serviço (4). Verifica-se assim uma

participação alargada no desempenho do serviço. Além do(s) responsável(eis) pelo forne-

cimento do serviço, o próprio cliente e outros clientes são também elementos a considerar

no processo de avaliação do serviço.

Adicionalmente, Chang (4) considerou que os diversos elementos de uma organização

como um centro de fitness (i.e., propriedades organizacionais, características dos funcioná-

rios, atributos dos clientes) podem ser concebidos como inputs, troughputs e/ ou outputs. A

gestão, os funcionários responsáveis pelo serviço e os clientes são entendidos como alguém

que traz orientações e atributos para o sistema de distribuição do serviço (inputs); as interac-

ções entre os funcionários e os clientes num determinado ambiente (e.g., no encontro com

o serviço) constituem a fase throughput do sistema; a fase output corresponde à percepção

da qualidade, relativamente ao serviço fornecido (5). Finalmente, a satisfação de ambos, o

cliente e os funcionários, refere-se aos resultados.

Para além do valor intrínseco do modelo conceptual proposto, Chang e Chelladurai (5) desen-

volveram ainda instrumentos de avaliação das diferentes variáveis constantes do modelo pro-

posto - qualidade, satisfação e fidelização - com vista a possibilitar a sua avaliação empírica.

No que respeita à qualidade de serviços, foi desenvolvido um instrumento de medida, o Ser-

vice Quality in Fitness Services (SQFS) (4), constituído por nove dimensões. Este instrumento

tem como base de trabalho alguns itens das escalas Scale of Atributes of Fitness Services

(SAFS) (6), SERVQUAL (26), RECQUAL (20), e Quality and Excellence in Sport Centres (QUESC) (18),

acrescidos de alguns itens gerados pelos investigadores.

A SAFS (6) é uma escala desenvolvida para descrever um serviço de fitness, sendo cons-

tituída por 30 itens, divididos por cinco dimensões: serviços profissionais, serviços para

clientes, serviços periféricos, instalações e equipamentos e serviços secundários (e.g.,

serviços de bar). As primeiras quatro dimensões estão relacionadas com os serviços pri-

mários oferecidos por centros de fitness, mas a última – serviços secundários - não está

relacionada com o fitness per se (19). Não obstante esta escala medir apenas os atributos

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47 — RPCD 15 (1)

Posteriormente, com base na ideia de que avaliação da qualidade dos serviços é influen-

ciada directamente apenas pelas percepções daí resultantes (9, 30) - e não, como Parasura-

man et al. (26) defendiam, pela diferença entre as expectativas e as percepções dos clientes

-, Kim e Kim (18) desenvolveram o QUESC. O QUESC procura identificar os serviços que os

utentes desejam, permitindo definir áreas específicas que requerem uma maior atenção

por parte dos gestores. Este instrumento contempla 33 itens divididos por 11 dimensões:

ambiente, atitude dos funcionários, eficiência dos funcionários, informação, actividades,

consideração pessoal, privilégios, preço, paz de espírito (ease of mind), estimulação e co-

modidade. Este instrumento também não esteve isento de críticas. Por um lado, apesar

de as suas dimensões terem sido apoiadas por uma análise factorial exploratória, três

factores - preço, privilégio e estimulação – possuem apenas um item, o que levou Lam et

al. (19) a questionarem a sua estabilidade. Adicionalmente, estudos posteriores não apoia-

ram a estrutura factorial original do instrumento. Mais especificamente, Papadimitrious e

Karteroliotis (25) recorreram ao QUESC para avaliarem a qualidade de serviços em clubes

de fitness gregos, mas, em vez da estrutura original, os resultados sugeriram a existência

de quatro dimensões: qualidade dos instrutores, atractividade das instalações e operações,

disponibilidade e entrega de programas e outros serviços.

Como referimos anteriormente, o SQFS foi desenvolvido com base nestas quatro escalas

(i.e., SAFS, SERVQUAL, RECQUAL e QUESC), possuindo o potencial de ser um instrumento

específico de centros de fitness que permite avaliar os serviços partindo da avaliação da

qualidade percebida pelos clientes. Além disso, deriva de um modelo conceptual no âmbi-

to do qual foram também desenvolvidas escalas que permitem avaliar a satisfação e a fide-

lização de clientes (esta última resultante da renovação da inscrição): a Client Satisfaction

Scale e a Renewal Intention Scale (4). Em conjunto, estas três escalas permitem estudar de

forma integrada variáveis chave do cliente de centros de fitness, isto é, permitem avaliar

simultaneamente os três constructos no âmbito das organizações ou dos serviços de des-

porto, e particularmente nos serviços de fitness, justificando, de forma sustentada, a sua

adaptação à realidade nacional.

Em decorrência do exposto, o presente estudo debruçou-se sobre o processo de tradu-

ção e adaptação à realidade portuguesa dos instrumentos de avaliação da qualidade, sa-

tisfação e fidelização de clientes apresentados por Chang (4), bem como sobre a avaliação

das suas propriedades psicométricas, designadamente a sua fiabilidade e a sua validade.

dos serviços de fitness (e não a qualidade daí resultante), os itens podem, segundo Chang (4), ser usados para medir esta característica. Lam et al. (19) criticaram o processo de cons-

trução da SAFS, designadamente o facto de Chelladurai et al. (6) não terem recorrido à

análise factorial exploratória para analisar a estrutura factorial do instrumento, tendo a

retenção dos itens sido determinada apenas pelas correlações item-total. Lam et al. sus-

tentam que uma interpretação adequada dos resultados de cada dimensão de uma escala

só é possível com uma aplicação correcta da metodologia de análise factorial.

O SERVQUAL (26) avalia a discrepância entre as expectativas dos clientes (o nível de qua-

lidade desejado) e as suas percepções relativamente ao serviço recebido. Basicamente, é

perguntado ao cliente como é que ele imagina a empresa ideal num dado ramo de actividade;

em seguida, é-lhe perguntado como avalia o desempenho real daquela empresa e, em segui-

da, faz-se a comparação entre a empresa ideal e a real. Nessa medida, a escala é composta

por 22 itens para medir o nível desejado e 22 para medir o nível real, em cinco dimensões

de qualidade: confiança, receptividade, segurança, empatia e tangibilidade. Apesar de este

instrumento se constituir como a escala de avaliação da qualidade mais referenciada na lite-

ratura (4, 30), nos anos 90 do século XX começou a ser alvo de diversas críticas, relacionadas,

entre outros aspectos, com a sua (não) generalização a diferentes contextos, designada-

mente a serviços de recreação (3, 19, 20, 31), o número excessivo de itens (1), o número excessivo

de indicadores e a falta de dimensões para a valorização do serviço (24), bem como a falta de

estabilidade do modelo de medida (3). Adicionalmente, a um nível mais substantivo, Cronin

e Taylor (9) criticam os pressupostos conceptuais na base do instrumento, sustentando que

medir o diferencial entre as expectativas e percepções dos resultados do serviço é menos

útil que medir as percepções dos clientes após terem, de facto, experimentado o serviço.

No início dos anos 90, procurando suprir a necessidade de uma medida de avaliação da

qualidade de serviços específica de serviços de recreação, MacKay e Crompton (20) modifi-

caram o SERVQUAL no sentido de este instrumento poder ser aplicado nestes contextos. Os

autores concluíram que, neste contexto específico, a qualidade de serviços pode ser descrita

por quatro, em vez das cinco dimensões originais – confiança, segurança, receptividade e

tangibilidade –, tendo o instrumento final, denominado RECQUAL, 25 itens que corporizam

as quatro dimensões referidas. As explicações para a diferença nas dimensões foi atribuída

a disparidades no tipo de serviços, sector e até país (os dados de MacKay e Crompton fo-

ram recolhidos em Halifax, no Canadá) (8). Deste modo, ao sugerir a necessidade de medidas

específicas da qualidade de serviços – e em contraponto a uma medida supostamente ‘uni-

versal’, como o SERVQUAL – pode afirmar-se que o RECQUAL ajudou a lançar alguma luz no

respeitante à avaliação da qualidade de serviços.

02

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49 — RPCD 15 (1)

METODOLOGIA

PARTICIPANTES

Participaram neste estudo 263 indivíduos de ambos os sexos (nhomens = 107; 40.7%; nmulheres =

156; 59.3%), com idades compreendidas entre os 20 e os 40 anos, que frequentavam diver-

sas actividades disponíveis em dois centros de fitness: aeróbica, localizada, body pump, body

combat, cardio-training, musculação, artes marciais, natação, hidroginástica e dança.

INSTRUMENTOS

Scale of Quality in Fitness Services (SQFS)

Esta escala foi desenvolvida para avaliar as percepções da qualidade de serviços em cen-

tros de fitness. Numa primeira fase, a SQSF continha 71 itens que reflectiam as nove di-

mensões (sub-escalas) da qualidade em serviços de fitness. Estas sub-escalas estavam

distribuídas pelas três fases que compreendem a perspectiva sistémica adoptada por

Chang (4): (a) a fase input, que se refere aos pressupostos dos serviços e que inclui as

sub-escalas de Compromisso da Gestão com um Serviço de Qualidade, Clima do Serviço

e Programas– Actividades; (b) a fase throughput, que respeita à distribuição do serviço

propriamente dito e que abrange as sub-escalas de Interacções Pessoais, Interacções

com a Tarefa, Contacto com o Ambiente Físico, Contacto com os Outros Clientes e Falhas

no Serviço e Restabelecimento; e (c) a fase output que concerne aos resultados do serviço,

bem como as relações que estabelecem entre si, e que compreende a sub-escala de Per-

cepção da Qualidade do Serviço.

Posteriormente, o instrumento foi objecto de um processo de revisão, no âmbito do qual

foi reduzido no sentido de uniformizar e diminuir o número de itens por dimensão (cinco itens

por dimensão). Deste processo resultou um instrumento com 45 itens, divididos pelas nove

sub-escalas anteriormente referidas: Compromisso da Gestão com um Serviço de Qualidade

(e.g., ”Os serviços são fornecidos de acordo com o prometido”), Clima do Serviço (e.g., ”No

momento em que se chega a conhecer melhor os funcionários, eles vão embora”) e Progra-

mas – Actividades (e.g., ”O clube tem uma oferta variada de actividades para os seus clien-

tes”); Interacções Pessoais (e.g., “Os funcionários são versáteis e eficientes”), Interacções

com a Tarefa (e.g., “Os funcionários certificam-se de que todos os clientes estão a fazer os

exercícios de acordo com as suas capacidades”), Contacto com o Ambiente Físico (e.g., “O

clube oferece instalações limpas e atraentes”), Contacto com os Outros Clientes (e.g., “Os

clientes auxiliam-se mutuamente”); Falhas no Serviço e Restabelecimento (e.g.,” Quando

algo corre mal o problema é rapidamente resolvido”); Percepção da Qualidade do Serviço

(e.g., “A qualidade do serviço oferecido pelo clube é excelente”).

Client Satisfaction Scale (CSS)

Esta escala, desenvolvida concomitantemente com a SQFS, procura avaliar a satisfação dos

clientes com os serviços de fitness fornecidos em duas dimensões (sub-escalas): Satisfação

com os Serviços (e.g., “Estou satisfeito(a) com os serviços deste clube”) e Satisfação com o

Envolvimento Pessoal (e.g., “Estou satisfeito(a) com a melhoria do meu desempenho”). Num

primeiro momento, esta escala compreendia 12 itens, os quais, num segundo momento, fo-

ram reduzidos para 10 itens.

Renewal Intention Scale (RIS)

Esta escala foi desenvolvida conjuntamente com a SQFS e a CSS, visando avaliar a inten-

ção dos clientes renovarem a sua inscrição no centro de fitness, sendo constituída apenas

pela dimensão Intenção de Renovar a Inscrição (e.g., “Se me fosse inscrever agora es-

colheria outro clube”). Inicialmente, esta escala era constituída por seis itens, os quais

foram posteriormente reduzidos para cinco.

Em qualquer uma das escalas, é solicitado aos inquiridos que indiquem a sua opinião,

relativamente a cada um dos itens que a compõem, recorrendo a escalas de resposta tipo

Likert de 7 pontos (de 1 = discordo completamente ou completamente falso, a 7 = concor-

do completamente ou completamente verdadeiro).

PROCEDIMENTOS

TRADUÇÃO DOS INSTRUMENTOS

Considerando que estes instrumentos foram desenvolvidos nos Estados Unidos da Améri-

ca, em língua inglesa, tornava-se necessário, numa primeira fase, traduzi-los e adaptá-los

à nossa língua e cultura para, numa segunda fase, determinar as características psicomé-

tricas das versões resultantes desse processo.

Para efectuarmos a tradução seguimos a metodologia proposta por Fonseca (11). Assim, com

o intuito de assegurar que a versão portuguesa do instrumento se aproximasse o mais pos-

sível da versão original, tanto em termos semânticos como de conteúdo, foi efectuada uma

tradução inicial recorrendo à ajuda de duas especialistas no ensino do inglês (i.e., licenciadas

em Inglês). Em seguida, o resultado da tradução foi sujeito à análise de um júri constituído por

peritos das áreas em questão (quatro professores de educação física, com experiência em ser-

viços de fitness, e três professoras licenciadas em inglês). Tendo em conta as alterações pro-

postas, uma nova versão foi elaborada e submetida a um júri constituído por três professores

de educação física, com experiência em serviços de fitness, e duas professoras licenciadas em

inglês. Uma vez que esta versão mereceu a concordância unânime dos elementos que consti-

tuíram este júri, considerámos elaboradas as versões portuguesas do SQFS, da CSS e da RIS.

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51 — RPCD 15 (1)

AFERIÇÃO DA COMPREENSIBILIDADE E UNIFORMIDADE INTER-CONTEXTUAL

Os instrumentos foram aplicados a um grupo heterogéneo de indivíduos (com diferentes

idades, sexos e habilitações académicas) que, no momento, utilizavam ou já haviam utili-

zado serviços de fitness. O principal objectivo desta aplicação foi verificar a inteligibilidade

das escalas, para nos certificarmos de que não subsistiam ambiguidades interpretativas,

já que, se o instrumento as permitisse, corríamos o risco de recolher respostas diferen-

tes, correspondentes não a diferentes opiniões mas sim a diferentes interpretações. Pelo

facto de não terem sido detectadas quaisquer dificuldades por parte dos inquiridos, foi

elaborada a última versão dos instrumentos, contemplando apenas pequenas alterações

relativas às instruções de preenchimento e a aspectos gráficos. No sentido de optimizar a

futura aplicação dos instrumentos, avaliámos o tempo médio necessário ao seu completo

preenchimento, que, no total, foi de aproximadamente 15 minutos.

RECOLHA DOS DADOS

Os questionários foram distribuídos, nos dois centros de fitness, pelos funcionários da re-

cepção e pelos professores, no fim das aulas ou dos períodos de actividade física. Dos 450

questionários distribuídos foram recolhidos 263, resultando portanto numa taxa de retor-

no superior a 50%, que podemos considerar como aceitável para estudos desta natureza.

Para além do SQFS, da CSS, e da RIS, e atendendo aos objectivos deste estudo, foi solici-

tada aos inquiridos a indicação de alguns outros dados, como a idade, o sexo e a profissão.

PROCEDIMENTOS ESTATÍSTICOS

Para determinarmos a fiabilidade, decidimos recorrer à avaliação da consistência interna, a

partir do cálculo do coeficiente alfa de Cronbach para cada uma das dimensões, bem como

à análise das correlações item-factor. Para determinarmos a validade de constructo con-

siderámos ser mais correcto proceder à realização de uma análise factorial confirmatória

(AFC), porquanto ela revela uma superior utilidade relativamente a outras técnicas quando

o objectivo consiste na validação de um instrumento já desenvolvido (21), como acontecia no

nosso caso. Para efectuar a AFC, optámos por utilizar a versão 8.30 do LISREL.

Na linha do efectuado por Chang (4), que, a partir da análise dos dados recolhidos num

primeiro momento, procurou não só uniformizar o número de itens por dimensão mas tam-

bém reduzir esse número, decidimos ainda tentar reduzir o número de itens da versão por-

tuguesa de modo a tornar mais fácil e simples a sua aplicação, procurando, contudo, que

essa redução não implicasse qualquer perda das suas qualidades psicométricas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

ESTUDO DA FIABILIDADE

No quadro 1 apresentam-se os valores estimados para os coeficiente alfa (α) de Cron-

bach, relativos a cada uma das escalas e respectivas sub-escalas, bem como os valores

correspondentes encontrados por Chang (4) para a versão original.

QUADRO 1. Valores do alfa (a) de Cronbach para os itens de cada dimensão, do SQFSp (presente estudo) e do SQFS (4)

ESCALAS Sub-escalas (dimensões) presente estudo Chang (4)

ESCALA DA QUALIDADE

CGSQ Compromisso da Gestão com o Serviço de Qualidade .87 .81

CS Clima do Serviço .75 .68

DESA Programas – Actividades .77 .71

II Interacções Interpessoais .92 .86

IT Interacções com as Tarefas .85 .89

CAF Contacto com o Ambiente Físico .94 .73

COC Contacto com os outros Clientes .89 .85

FSR Falhas no Serviço e Restabelecimento .90 .89

PQS Percepção da Qualidade do Serviço .94 .91

ESCALA DA SATISFAÇÃO

SS Satisfação com os Serviços .94 .91

SEP Satisfação com o seu Envolvimento Pessoal .91 .89

ESCALA DA FIDELIZAÇÃO

IRI Intenção de Renovar a Inscrição .87 .85

No nosso estudo, os valores do alfa variavam entre .75 (para a sub-escala Clima do Ser-

viço) e .94 (para as sub-escalas Contacto com o Ambiente Físico, Percepção da Qualidade

do Serviço e Satisfação com os Serviços). Ou seja, todos eles foram superiores ao valor crí-

tico de α = .70, proposto por Nunnally (23) para se considerar como aceitável a consistência

interna de uma dada sub-escala. Deste modo, os resultados obtidos parecem expressar a

elevada consistência de cada uma das sub-escalas do nosso instrumento.

Ao compararmos os nossos resultados com os de Chang (4), verificámos que, à excepção

da sub-escala relativa às Interacções com as Tarefas, os valores encontrados no presente

estudo foram todos superiores. Assim sendo, pareceu evidente não subsistirem quaisquer

dúvidas acerca da elevada consistência interna da versão portuguesa do SQFS.

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53 — RPCD 15 (1)

Através da consulta ao quadro 2, é possível verificar que todas as correlações item-factor

foram superiores a .44. Aliás, da totalidade dos 48 itens, apenas dois (da sub-escala da Qua-

lidade) apresentaram um valor inferior a .50, com 37 deles a apresentarem um valor igual ou

superior a .70. No caso das sub-escalas da Satisfação e da Fidelização podemos mesmo veri-

ficar que todos os itens apresentaram uma correlação com o respectivo factor superior a .70.

Da análise dos resultados verificámos também que não sobrevinha vantagem em elimi-

nar qualquer dos itens que constituíam as diferentes sub-escalas, não só porque todos os

valores de alfa eram à partida superiores ao valor mínimo proposto por Nunnally (23), mas

também porque, no único caso em que a eliminação de um item poderia aumentar o valor

alfa da respectiva sub-escala (i.e., item DESA 4, da sub-escala Programas – Actividades,

da escala da Qualidade), o aumento era mínimo (de .77 para .78).

ANÁLISE FACTORIAL CONFIRMATÓRIA

Foi com base na conceptualização de Chang (4) que foram definidos os modelos de medida

(dois para a escala da Qualidade [Service Quality in Fitness Services] e um para cada uma

das escalas da Satisfação [Client Satisfaction Scale] e da Fidelização [Renewal Intention

Scale]) a submeter à AFC, e que são apresentados, em seguida, de forma pictográfica.

Numa primeira fase, decidimos analisar os seguintes indicadores: o χ2, a razão entre o

χ2 e os graus de liberdade (χ2/ gl), o índice de bondade do ajustamento (GFI), o índice de

bondade do ajustamento ajustado (AGFI), a raiz quadrada da média dos erros por apro-

ximação (RMSEA), o índice de ajustamento normalizado (NFI) e o índice de ajustamento

comparativo (CFI). Na base desta decisão esteve não só o facto de, em termos gerais, eles

serem os mais referidos na bibliografia específica deste domínio do conhecimento, mas

também porque haviam sido os utilizados por Chang (4), e dessa forma poderíamos estabe-

lecer algumas comparações entre os resultados dos dois estudos.

A segunda fase da confirmação dos modelos centrou-se na avaliação da bondade do

ajustamento dos parâmetros individuais, designadamente no que respeita aos valores de

saturação dos itens no factor respectivo e aos valores de t.

Quadro 2. Correlações item-factor e valores do alfa (a) de Cronbach, caso fossem eliminados os itens

ESCALASSub-escalas (dimensões) Item Correlação

item-factorValores do alfa (a)se eliminado o item

ESCALA DA QUALIDADE

Compromisso da Gestão com o Serviço de Qualidade

(α = .87)

CGSQ 2 .74 .82CGSQ 4 .64 .87CGSQ 6 .77 .81CGSQ 7 .74 .83

Clima do Serviço

(α = .75)

CS 3 .44 .75CS 4 .53 .70CS 5 .65 .63CS 7 .58 .68

Programas – Actividades

(α = .77)

DESA 1 .67 .67DESA 2 .60 .70DESA 3 .60 .69DESA 4 .44 .78

Interacções Interpessoais

(α = .92)

II 2 .82 .90II 3 .87 .89II 4 .86 .89II 5 .76 .92

Interacções com as Tarefas

(α = .85)

IT 2 .75 .80IT 3 .65 .83IT 4 .73 .80IT 6 .68 .83

Contacto com o Ambiente Físico

(α = .94)

CAF 3 .89 .91CAF 4 .82 .93CAF 5 .86 .92CAF 6 .86 .92

Contacto com os outros Clientes

(α = .89)

COC 2 .76 .85COC 3 .75 .85COC 5 .79 .84COC 6 .70 .87

Falhas no Serviço e Restabelecimento

(α = .90)

FSR 1 .76 .87FSR 2 .72 .88FSR 6 .77 .87FSR 7 .83 .84

Percepção da Qualidade do Serviço

(α = .94)

PQS 1 .87 .91PQS 4 .90 .90PQS 6 .80 .93

PQS 11 .84 .92ESCALA DA SATISFAÇÃO

Satisfação com os Serviços

(α = .94)

SS 1 .84 .93SS 3 .86 .92SS 4 .86 .92SS 5 .87 .92

Satisfação com o seu Envolvimento Pessoal

(α = .91)

SEP 2 .85 .88SEP 3 .81 .89SEP 4 .80 .90SEP 7 .78 .90

ESCALA DA FIDELIZAÇÃO

Intenção de Renovar a Inscrição

(α = .87)

IRI 1 .71 .85IRI 2 .71 .85IRI 4 .75 .83IRI 6 .78 .83

02

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55 — RPCD 15 (1)

FIGURA 1. Representação pictográfica do modelo da escala da Qualidade

QUADRO 3. Indicadores da bondade do ajustamento global do modelo do SQFSp (presente estudo) e do SQFS (4)

INDICADORES presente estudo Chang (4)

χ2 χ2 (558) = 1224.32; p < .01 χ2

(909) = 257.62; p < .01

χ2/ gl 2.19 2.83

GFI .80 .75

AGFI .77 .72

RMSEA .06 .07

NFI .86 .82

CFI .92 .84

02ESCALA DA QUALIDADE - SERVICE QUALITY IN FITNESS SERVICES

No que diz respeito à qualidade, foi definido um modelo constituído por 36 itens distribuídos

por nove sub-escalas (ver Figura 1). Na apresentação pictográfica, os ξ representam as

nove sub-escalas – ou variáveis latentes – que integram a escala da qualidade [ξ1= Com-

promisso da Gestão com o Serviço de Qualidade (CGSQ); ξ2= Clima do Serviço (CS); ξ3=

Programas – Actividades (DESA); ξ4= Interacções Interpessoais (II); ξ5= Interacções

com as Tarefas (IT); ξ6= Contacto com o Ambiente Físico (CAF); ξ7= Contacto com os

Outros Clientes (COC); ξ8= Falhas no Serviço e Restabelecimento (FSR); ξ9= Percepção

da Qualidade do Serviço (QS)] e os X1-36 indicam os itens propostos para avaliar cada uma

das sub-escalas. Os λ e osδ1-36 representam, respectivamente, o factor de saturação e o

erro de medida relativos a cada um dos itens. Por fim, as correlações entre as sub-escalas

surgem numa secção legendada por ⏀ na representação pictográfica.

No modelo de medida inspeccionado (ver Quadro 3) verificámos que, apesar do valor da

estatística doχ2 ter sido elevado e estatisticamente significativo, o que poderia evidenciar

problemas no ajustamento do modelo formulado, a razão χ2/ gl apresentou um valor in-

ferior a 3. A este propósito, Joreskog (15) referiu que um valor para a razão entre o χ2 e os

graus de liberdade igual ou inferior a 3.0 representa uma correspondência aceitável entre

o modelo proposto e os dados obtidos.

Por outro lado, os valores dos índices da bondade do ajustamento (GFI) e da bondade

do ajustamento ajustado (AGFI), apesar de relativamente elevados, foram inferiores a .90,

valor normalmente considerado empiricamente como o valor de corte para a aceitação ou

rejeição de um modelo (7, 21).

Contudo, os valores dos restantes indicadores (RMSEA, NFI e CFI) pareceram revelar

a bondade do ajustamento e sugerir a aceitação do modelo examinado. Efectivamente, no

que se refere à RMSEA, valores compreendidos entre .05 e .08, como foi o caso, revelam

um ajustamento aceitável do modelo (2, 14). Do mesmo modo, os valores de NFI e de CFI fo-

ram muito próximos de .90, valor sugerido como indicador de um ajustamento aceitável (17).

No mesmo sentido, ao compararmos os nossos resultados com os do estudo de Chang(4)

verificámos que, de uma forma geral, os valores dos diferentes indicadores parecem reve-

lar um melhor ajustamento global do modelo da versão portuguesa comparativamente ao

modelo da versão original.

No quadro 4 encontram-se os valores estimados para os indicadores utilizados para a

avaliação da bondade do ajustamento dos parâmetros individuais. Todos os itens apresen-

taram um valor não estandardizado de saturação no factor respectivo igual ou superior a

.78 e um valor t elevado e estatisticamente significativo, o que evidencia a importância de

cada item na construção da respectiva sub-escala.

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57 — RPCD 15 (1)

QUADRO 4. Indicadores do ajustamento dos parâmetros individuais (valor de saturação não estandardizado do item no seu factor e valor t) do modelo da escala da qualidade

SUB-ESCALAS

ITENSCGSQ CS DESA II IT CAF COC FSR PQS valor t

X1 CGSQ 2 1.38 16.43 *

X2 CGSQ 4 1.18 14.17 *

X3 CGSQ 6 1.20 15.51 *

X4 CGSQ 7 1.12 16.16 *

X5 CS 3 0.83 8.40 *

X6 CS 4 1.06 11.55 *

X7 CS 5 1.39 14.25 *

X8 CS 7 0.99 1.47 *

X9 DESA 1 0.88 13.94 *

X10 DESA 2 0.91 13.73 *

X11 DESA 3 1.03 12.18 *

X12 DESA 4 0.78 8.92 *

X13 II 2 0.90 17.69 *

X14 II 3 1.00 19.63 *

X15 II 4 1.10 19.40 *

X16 II 5 0.86 15.49 *

X17 IT 2 1.11 14.17 *

X18 IT 3 0.96 14.40 *

X19 IT 4 1.09 15.18 *

X20 IT 6 0.87 14.15 *

X21 CAF 3 1.54 2.23 *

X22 CAF 4 1.48 17.28 *

X23 CAF 5 1.55 18.59 *

X24 CAF 6 1.31 18.83 *

X25 COC 2 1.23 15.81 *

X26 COC 3 1.15 15.03 *

X27 COC 5 1.29 16.64 *

X28 COC 6 1.16 14.91 *

X29 FSR 1 1.17 15.30 *

X30 FSR 2 1.02 14.68 *

X31 FSR 6 1.21 17.06 *

X32 FSR 7 1.49 19.74 *

X33 PQS 1 1.35 19.38 *

X34 PQS 4 1.32 19.90 *

X35 PQS 6 1.11 16.64 *

X36 PQS 11 1.28 18.51 *

* p < .01

02MODELO TRIDIMENSIONAL DA ESCALA DA QUALIDADE

Segundo Chang (4), a SQFS assume um carácter tridimensional, no sentido em que três

das suas dimensões se reportam à fase input da distribuição do serviço, cinco à fase

throughput e uma à fase output. Neste contexto, foi definido um modelo de medida cuja

qualidade do ajustamento foi igualmente avaliada através dos mesmos indicadores já

referenciados (ver Figura 2).

Na apresentação pictográfica, os η representam as nove sub-escalas que integram a es-

cala da qualidade e os ξ as fases de distribuição do serviço [η1= Compromisso da Gestão

com o Serviço de Qualidade (CGSQ); η2= Clima do Serviço (CS); η3= Programas – Activi-

dades (DESA); η4= Interacções Interpessoais (II); η5= Interacções com as Tarefas (IT);

η6= Contacto com o Ambiente Físico (CAF); η7= Contacto com os Outros Clientes (COC);

η8= Falhas no Serviço e Restabelecimento (FSR); η9= Percepção da Qualidade do Serviço

(QS); ξ1 = fase input; ξ2 = fase throughput; ξ3 = fase output]. Os λ e os δ1-9 represen-

tam, respectivamente, o factor de saturação e o erro de medida relativos a cada uma das

sub-escalas. Por fim, os ⏀ indicam a correlação entre as fases.

FIGURA 2. Representação pictográfica do modelo tridimensional da escala da qualidade

De um modo geral, os valores estimados sugerem um ajustamento global aceitável para o

modelo tridimensional, porquanto se aproximam dos encontrados por Chang (4), considerados por

ele como reflexo de um bom ajustamento global do modelo examinado (ver Quadro 5).

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59 — RPCD 15 (1)

QUADRO 5. Indicadores da bondade do ajustamento global do modelo tridimensional da escala da qualidade do SQFSp (presente

estudo) e do SQFS (4)

INDICADORES PRESENTE ESTUDO CHANG (4)

χ2 χ2 (24) = 171.25; p < .01 χ2

(25) = 133.31; p < .01

χ2/ gl 7.14 * 5.33

GFI .88 .93

AGFI .78 .87

RMSEA .15 .11

NFI .90 .94

CFI .91 .95

* Calculado por nós com base nos valores indicados pelo autor

ESCALA DA SATISFAÇÃO – CLIENT SATISFACTION SCALE

Para a escala da satisfação foi elaborado um modelo com dois factores, cada um dos quais

com quatro itens (ver Figura 3).

Osξrepresentam as duas sub-escalas – ou variáveis latentes – que integram a escala da

satisfação [ξ1= Satisfação com os Serviços (SS); ξ2= Satisfação com o seu Envolvimento

Pessoal (SEP)], enquanto os X1-8 indicam os itens propostos para avaliar essas mesmas

sub-escalas. Osλe osδ1-8 representam, respectivamente, o factor de saturação e o erro de

medida relativos a cada um dos itens, e o f indica a correlação entre as sub-escalas.

FIGURA 3. Representação pictográfica do modelo da escala da satisfação

02Ao analisarmos os resultados relativos ao ajustamento global do modelo verificámos que

apesar dos valores do χ2, da χ2/ gl e da RMSEA terem sido ligeiramente superiores aos dese-

jáveis, todos os restantes indicadores (i.e., GFI, AGFI, NFI e CFI) evidenciaram um bom ajusta-

mento do modelo examinado. Para além disso, de referir que, uma vez mais, a generalidade dos

valores encontrados no nosso estudo revelou um ajustamento aos dados do modelo de medida

da versão portuguesa superior ao encontrado para a versão original (ver Quadro 6).

QUADRO 6. Indicadores da bondade do ajustamento global do modelo da escala da Satisfação, do SQFSp (presente estudo) e do SQFS (4)

INDICADORES PRESENTE ESTUDO CHANG (4)

χ2 χ2 (19) = 68.62; p < .01 χ2

(34) = 121.34; p < .01

χ2 /gl 3.61 3.57

GFI .94 .93

AGFI .89 .89

RMSEA .10 .08

NFI .96 .95

CFI .97 .96

Quanto aos parâmetros individuais, foi evidente que todos os itens saturaram de forma

positiva com um valor não estandardizado superior a .73 no factor respectivo, e que o seu

valor t foi elevado e estatisticamente significativo, resultados estes reveladores da impor-

tância de cada item na construção de sub-escala respectiva (Quadro 7).

QUADRO 7. Indicadores do ajustamento dos parâmetros individuais (valor de saturação não estandardizado do item no seu factor e

valor t) do modelo da escala da satisfação

ITENS SS SEP VALOR T

X1 SS 1 1.16 17.64 *

X2 SS 3 1.23 19.13 *

X3 SS 4 1.11 18.05 *

X4 SS 5 1.10 18.67 *

X5 SEP 2 0.80 19.00 *

X6 SEP 3 0.81 17.78 *

X7 SEP 4 0.89 16.54 *

X8 SEP 7 0.73 16.09 *

* p < .01

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61 — RPCD 15 (1)

ESCALA DA FIDELIZAÇÃO – RENEWAL INTENTION SCALE

No modelo da escala da Fidelização, a variável latente representa a Intenção de Renovar a

Inscrição [ξ1= Intenção de Renovar a Inscrição (IRI)] e os X1-4 os itens propostos para

avaliar essa mesma escala. Osλe osδrepresentam, respectivamente, o factor de satura-

ção e o erro de medida relativos a cada um dos itens (Figura 4).

FIGURA 4. Representação pictográfica do modelo da escala da Fidelização

A partir da consulta ao quadro 8, é possível verificar que, tal como no caso anterior,

também para este modelo os valores do χ2, da χ2/ gl e da RMSEA foram superiores aos

normalmente considerados como desejáveis. Todavia, também desta vez, todos os restan-

tes indicadores (i.e., GFI, AGFI, NFI e CFI) evidenciaram um bom ajustamento do modelo

proposto aos dados analisados.

Do mesmo modo, também neste caso a maior parte dos valores dos indicadores consi-

derados no nosso estudo revelou que a qualidade do ajustamento aos dados do modelo da

versão portuguesa foi superior ao da versão original.

QUADRO 8. Indicadores da bondade do ajustamento global do modelo da escala da Fidelização (presente estudo) e do RIS (4)

INDICADORES PRESENTE ESTUDO CHANG (1998)

χ2 χ2 (2) = 15.63; p < .001 χ2

(5) = 24.07; p < .01

χ2/ gl 7.81 4.81

GFI .97 .97

AGFI .87 .92

RMSEA .15 .10

NFI .97 .96

CFI .98 .98

02Similarmente ao que se verificou relativamente às escalas da Qualidade e Satisfação, to-

dos os itens saturaram de forma positiva (neste caso com valores não estandardizados supe-

riores a 1.05) e os seus valores t foram elevados e estatisticamente significativos, resultados

que evidenciaram a importância de cada item na construção desta escala (Quadro 9).

QUADRO 9. Indicadores do ajustamento dos parâmetros individuais (valor de saturação não estandardizado do item no seu factor e valor t) do modelo da escala da Fidelização

ESCALA/ ITENS IRI VALOR T

X1 IRI 1 1.05 14.58 *

X2 IRI 2 1.21 13.97 *

X3 IRI 4 1.30 15.35 *

X4 IRI 6 1.13 16.79 *

* p < .01

CONCLUSÃO

O presente estudo debruçou-se sobre o processo de tradução e adaptação à realidade por-

tuguesa dos instrumentos de avaliação da qualidade, satisfação e fidelização de clientes

apresentados por Chang (4), bem como a avaliação das suas propriedades psicométricas,

designadamente a sua fiabilidade e a sua validade.

Da análise global e individual de todos os dados encontrados ao longo do nosso estudo pa-

receu resultar claramente que todas as sub-escalas dos instrumentos analisados revelaram

valores aceitáveis relativamente à sua consistência interna e validade de constructo, sendo in-

clusivamente, e de uma forma geral, superiores aos encontrados relativamente à versão origi-

nal (4). Assim sendo, somos da opinião de que os investigadores nacionais podem recorrer com

segurança à utilização das escalas aqui examinadas, seja individualmente seja em conjunto,

consoante os objectivos definidos para essas mesmas investigações.

Todavia, consideramos mesmo assim que devem ser desenvolvidos mais estudos no sen-

tido do estabelecimento claro e inequívoco das suas propriedades psicométricas.

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02REFERÊNCIAS

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65 — RPCD 15 (1): 64-78

Transferência intermanual

de aprendizagem: O efeito

da aquisição em tarefas

de destreza manual

PALAVRAS CHAVE:

Transferência intermanual da aprendizagem.

Destreza manual fina. Destreza manual global.

Efeito da prática.

RESUMO

Este estudo pretendeu avaliar o efeito da aquisição na transferência intermanual da apren-

dizagem em duas tarefas de destreza manual: fina e global, considerando ainda os fatores

género, idade, prática desportiva e direção da transferência. Participaram neste estudo 67

destrímanos (33 do género masculino e 34 do género feminino) entre os 8 e os 84 anos. A

preferência manual foi avaliada através do Dutch Handedness Questionnaire (17). A destreza

manual fina foi avaliada através do Purdue Pegboard Test, 32020 (5) e a destreza manual glo-

bal através do Minnesota Manual Dexterity Test, 32023 (4) (versão de colocação). Na destreza

manual fina os rapazes, as crianças e os não praticantes apresentaram uma transferência

intermanual da aprendizagem mais elevada após a aquisição (com treino) comparativamente

à situação sem aquisição (sem treino). A direção da transferência foi testada da mão preferida

para a mão não preferida e vice-versa. Os principais resultados demonstraram que na destre-

za manual global não se verificaram diferenças entre a transferência com e sem aquisição.

Na direção da mão não preferida para a mão preferida, os resultados demonstraram uma

transferência intermanual da aprendizagem mais elevada com aquisição comparativamente

a sem aquisição. Na direção da mão preferida para a mão não preferida, não se verificaram di-

ferenças significativas. Concluímos que a fase de aquisição é importante para a transferência

intermanual da aprendizagem principalmente numa tarefa de destreza manual fina.

AUTORAS:

Shirley Regina A Batista 1

Paula Rodrigues 1, 2

Luís Moreira 2

Olga Vasconcelos 1

1 Laboratório de Aprendizagem e Controlo Motor, CIFI2D, Faculdade de Desporto – Universidade do Porto

2 RECI - Research in Education and Community Intervention - Instituto Piaget

Correspondência: Shirley Regina de Almeida Batista. Rua Aval de cima nº256, 3º Esquerdo - Paranhos-Porto, CEP:

4200-106 ([email protected]).

SUBMISSÃO: 18 de Setembro de 2014ACEITAÇÃO: 30 de Abril de 2015

Intermanual transfer of learning: The effect

of the acquisition in tasks of manual dexterity

ABSTRACT

The aim of this study was to investigate the effect of the acquisition on in-

termanual transfer of learning into two tasks of manual dexterity: fine and

global, having in consideration factors as sex, age, sport practice and the

direction of transfer. The sample comprised 67 right-handers (33 male and

34 female), aged between 8 and 84 years old. Manual preference was as-

sessed through the Dutch Handedness Questionnaire (17). Fine manual dex-

terity was tested with the Purdue Pegboard Test, 32020 (5) and global man-

ual dexterity was tested with the Minnesota Manual Dexterity Test, 32023 (4) (version of placement). Transfer direction was tested from the preferred

to non- preferred hand and vice versa. The main results demonstrated that

in fine manual dexterity boys, children and non-practitioners presented a

higher intermanual transfer of learning after the acquisition (with practice)

compared to the situation without acquisition (without training). On global

manual dexterity differences were not found between groups with and with-

out acquisition. In the direction of non-preferred to preferred hand, results

demonstrated a higher intermanual transfer after acquisition, compared to

those without acquisition. No significant differences were observed in the

direction of the preferred to non-preferred hand. We concluded that the ac-

quisition phase is important for intermanual transfer of learning mainly in a

fine manual dexterity task.

KEY WORDS:

Intermanual transfer of learning.

Fine manual dexterity. Global manual dexterity.

Practice effects.

03

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67 — RPCD 15 (1)

03INTRODUÇÃO

A transferência de aprendizagem é uma área do comportamento motor que atualmente

suscita atenção científica, pois aborda o desempenho de uma ação motora em um contex-

to diferente, ou a influência desse desempenho na aquisição de uma nova tarefa motora,

considerando inúmeros fatores internos e externos (12-14).

A transferência intermanual da aprendizagem (TIMA) é o fenómeno de transferência de

aprendizagem da mesma tarefa entre diferentes membros. Isto é, quando aprendemos

uma habilidade unilateralmente, através de um dos membros superiores, essa habilidade

poderá ser executada ou mais facilmente aprendida pelo membro não treinado após uma

determinada fase de aquisição ou treino com o membro que iniciou a aprendizagem. Há

uma tendência de que o membro inicialmente treinado na tarefa seja o membro preferido

do individuo (11). Desta forma, o aprendiz não necessita recomeçar do início o processo de

aprendizagem quando é confrontado com uma situação em que irá realizar a mesma tarefa

com o membro contra lateral que ainda não iniciou a prática.

O processo de aprendizagem de uma habilidade motora unilateral requer a execução de

movimentos que solicitam a destreza manual (DM), podendo esta apresentar caracterís-

ticas mais finas (DMF) ou ser de caráter mais global (DMG). Latash e Turvey (8) afirmam

que a destreza não é inata, podendo ser uma capacidade exercitada, desenvolvida e treina-

da. A destreza motora não pode ser desenvolvida sem treino, tornando-se necessário que

existam numerosas repetições e tempo de treino (10). No âmbito desta linha de pesquisa,

as opiniões destes autores levam-nos a refletir sobre os processos de transferência da

aprendizagem, assim como sobre a sua magnitude em situações diferentes de aprendiza-

gem unilateral. Será que existe uma TIMA elevada relativamente a um dos membros para

aqueles indivíduos que não treinam previamente com o membro contralateral? Como ocor-

re a TIMA quando a tarefa motora não é treinada diversas vezes por um dos membros?

Estas questões não têm tido uma resposta clara na literatura, nomeadamente na investi-

gação do efeito da fase de aquisição (AQ) na magnitude e na direção da TIMA em tarefas

de DMF e DMG. Especificamente, pouco se conhece sobre a TIMA no desempenho de uma

tarefa motora unilateral realizada pelos mesmos indivíduos em diferentes situações, por

exemplo, uma situação utilizando a AQ e a outra sem recorrer a essa fase.

Existem poucos estudos que tenham analisado se efetivamente a melhoria de um mem-

bro decorre da AQ do membro contralateral e não apenas da experiência inicial efetuada

por esse membro quando analisados os resultados finais (3). Estes autores pretenderam

avaliar se uma tarefa seriada de antecipação-coincidência realizada com uma mão produz

incrementos na performance da mão não treinada e investigar as mudanças neurofisioló-

gicas no córtex motor primário (M1), associadas à transferência bilateral da aprendizagem

na realização de diferentes tarefas envolvendo controlo de força fina. Os sujeitos foram di-

vididos em dois grupos, o primeiro grupo com 12 sujeitos que no início do teste realizaram

dez tentativas com a MP e as mesmas com a MNP, tendo realizado depois 6 blocos de 30

tentativas com cada mão, iniciando sempre com a MP e depois com a MNP. Um segundo

grupo de 7 sujeitos realizou no início 10 tentativas com a MP seguidas de 10 tentativas

com a MNP e repetiu o teste 30 minutos depois, sem a fase de treino, a fim de caracterizar

se o treino induzia a alguma modificação fisiológica. Os autores concluíram que a prática

resultou em melhorias significativas na velocidade e precisão na mão treinada e na mão

esquerda destreinada. Estes resultados levantam a hipótese de uma contribuição de mo-

dulação de inibição intracortical curta e inter-hemisférica, ou uma interação entre ambas

havendo transferência intermanual depois de aprender uma tarefa sequencial de força.

Todavia, a maior parte desses estudos tenta responder a esta questão envolvendo dife-

rentes amostras ou introduzindo no estudo um grupo de controlo (e.g. 7, 9). Furuya, Nakamura

e Nagata (7) conduziram uma pesquisa com o objetivo de avaliar se a prática motora numa

velocidade submáxima resulta num aumento da velocidade máxima dos movimentos dos

dedos em sujeitos treinados e em sujeitos destreinados. Participaram neste estudo seis

indivíduos jovens destros (21.3 ± 1.8 anos) do sexo masculino (“grupo de treino”) e seis

indivíduos (20.9 ± 2.5 anos) (“grupo de controlo”). A experiência consistiu numa sessão de

treinos durante quatro dias consecutivos (apenas para o grupo de treino) e sessões de pré

e pós-teste antes e após a sessão de treinos (para ambos os grupos). Cada participante do

grupo de controlo teve um descanso de 20 minutos entre o pré-teste e o pós-teste de cada

dia, o que correspondeu aproximadamente à duração de 50 ensaios no grupo de treino. Os

autores comentam que a transferência de aprendizagem facilita o domínio eficiente das di-

versas competências sensório-motoras. Concluem que se verificou um aumento na veloci-

dade máxima de movimentos do dedo hábil da mão treinada depois de praticar o movimen-

to numa velocidade submáxima. Sustentam que a facilitação da velocidade do movimento

em indivíduos treinados e em indivíduos destreinados são sequências de provas de apoio

para a transferência intermanual da prática motora nos movimentos dos dedos hábeis.

Este aumento de velocidade máxima de movimentos dos dedos manteve-se dois meses

após a prática, confirmando a facilitação dos movimentos do dedo rápido seguido de uma

prática de piano a uma velocidade submáxima. Além disso, os resultados indicaram os

efeitos de transferência intermanual de prática no piano sobre a velocidade máxima de

movimentos dos dedos hábeis.

Também Liu e Wrisberg (9) realizaram um estudo com o objetivo de examinar a nature-

za e persistência da transferência bilateral de uma habilidade de arremesso numa grande

amostra de crianças de ambos os géneros, tendo estas sido aleatoriamente distribuídas por

um grupo experimental e por outro grupo de controlo, com um número igual de meninos e

meninas em ambos os grupos. A experiência teve a duração de dois dias e consistiu de um

pré-teste, uma fase prática, um teste de transferência imediata e um teste de transferência

tardia. No pré-teste, cada participante realizou 10 tentativas de uma tarefa de atirar com

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69 — RPCD 15 (1)

uma só mão. Depois do pré-teste, os participantes do grupo experimental praticaram a ha-

bilidade com a mão oposta à utilizada durante o pré-teste, até atingirem com sucesso um

critério correspondente à sua idade. Os participantes do grupo de controlo realizaram uma

atividade de equilíbrio. Após a fase prática, todos os participantes realizaram um teste de

transferência imediata (10 minutos mais tarde) e tardia (24 horas depois), sob as mesmas

condições que o pré-teste. Os resultados não revelaram diferenças entre os grupos no pré-

-teste, mas a precisão de arremesso foi significativamente maior no grupo experimental do

que no grupo de controlo em ambos os testes de transferência. Além disso, a precisão de

arremesso dos meninos foi significativamente superior à das meninas. Metodologicamente,

estes desenhos anteriormente referidos não são, em nossa opinião, tão rigorosos quanto

o estudo dos mesmos sujeitos nas duas situações, com uma fase de AQ e sem AQ. Neste

sentido, buscando contribuir para o enriquecimento dessa temática, o presente estudo visa

avaliar o efeito da AQ na TIMA considerando ainda os fatores género, classe de idade, práti-

ca desportiva e direção da transferência (DT), em duas tarefas, uma de DMF e uma de DMG.

METODOLOGIA

AMOSTRA

O presente estudo é de cunho transversal, descritivo e comparativo. Participaram no es-

tudo 67 destrímanos de ambos os géneros (33 homens, 34 mulheres; cuja faixa etária

oscilou entre 8 e 84 anos), todos frequentando Escolas Básicas, Instituições Particulares

e Universidades Públicas no Porto, em Portugal. Para caracterização e análise, a amostra

foi dividida em quatro classes de idade [Crianças: 8 -10 anos, n=16 (prática desportiva,

PD): 8 praticam (P) e 8 não praticam (NP); Jovens: 11-20 anos, n=20 (PD: 12P e 8 NP);

Adultos: 21-59 anos, n=17 (PD: 8P e 9NP); Idosos: 60-84 anos, n=14 (PD: 3P e 11NP)].

Relativamente à PD, os participantes que relataram realizá-la não apresentam uma práti-

ca estruturada, sistematizada, praticando uma diversidade de atividades que incluem, por

exemplo, a natação, o futebol e a dança. Estas práticas decorrem até duas, raramente três,

vezes por semana. Os participantes foram contrabalançados em relação à mão de início

da tarefa e tarefa. Critérios de inclusão: apresentar aptidão funcional para execução dos

testes de DMF e DMG. Foram excluídos da pesquisa os indivíduos com deficiência intelec-

tual, com deficiência física dos membros superiores, e com incapacidade para realizar o

teste. Os indivíduos que não concluíram a avaliação foram também excluídos. O anonimato

e confidencialidade dos dados foram assegurados.

03PROCEDIMENTOS

Os procedimentos do estudo foram aprovados pela Comissão de Ética da Faculdade de

Desporto da Universidade do Porto. O estudo foi realizado em conformidade com a de-

claração de Helsínquia. Inicialmente foi realizado o contato com a direção das Escolas

Básicas, Instituições Particulares e Universidades Públicas no Porto com o objetivo de

explicar os procedimentos para a realização da pesquisa. Foi repassado para a direção

das escolas o “Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)”, para ser lido e assi-

nado pelos responsáveis das crianças, assim como para os jovens, adultos e idosos. Após

o recebimento dos TCLE assinados pelos responsáveis e pelos demais participantes, os

sujeitos foram selecionados tendo como critério a mão preferida para escrever (direita).

Numa fase posterior, os participantes foram novamente avaliados relativamente à sua PM,

desta vez de uma forma padronizada através do Dutch Handedness Questionnaire (17). Este

questionário consiste em 10 itens relativos a atividades simples, unimanuais, da vida di-

ária. Para execução de cada atividade, os participantes foram solicitados a responder se

utilizavam a mão direita, a mão esquerda ou se não tinham preferência pela utilização de

qualquer uma delas. Para as crianças, além das perguntas, foi aplicado o método demons-

trativo, utilizando objetos, para que pudessem executar as tarefas solicitadas com maior

segurança. Atribuiu-se à opção pela mão esquerda –1, à opção pela mão direita +1 e à

opção por “qualquer delas” 0. A pontuação pode variar entre –10 (PM esquerda para todas

as atividades) e 10 (PM direita para todas as atividades). Posteriormente foi aplicado o tes-

te de destreza manual fina (DMF) e o de destreza manual global (DMG). Os participantes

foram classificados em relação ao género, à classe de idade, à mão de início da tarefa e

tarefa motora (DMF e DMG).

A DMF foi avaliada através do Purdue Pegboard Test, modelo nº 32020 (5). Para testar a

direção da transferência (DT), os participantes foram divididos em dois grupos. O Grupo G1

(n=34) realizou 30 tentativas de 30” cada, sendo 5 tentativas na avaliação inicial (AI) com

a mão preferida (MP), 20 tentativas na aquisição (AQ) com a mão não preferida (MNP) e

5 tentativas na avaliação final (AF) com a MP. O grupo G2 (n=33) realizou o mesmo teste,

mas no sentido oposto (MNP - MP - MNP). Em cada situação (AI, AQ e AF) registou-se o

número de pinos introduzidos, pela ordem indicada e colocando um de cada vez, não inter-

rompendo a contagem do tempo em caso de queda do pino. A percentagem de TIMA foi

calculada da seguinte forma: (segundos despendidos na AF – segundos despendidos AI /

segundos despendidos na AI) x 100. Os participantes foram igualmente contrabalançados

em relação à mão de início da tarefa e tarefa.

Page 37: REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO …Mariana de Carvalho, Filip Boen, José Pedro Sarmento, Jeroen Scheerder. Adaptação para a população portuguesa de intrumentos de avaliação

71 — RPCD 15 (1)

A DMG foi avaliada através do Minnesota Manual Dexterity Test, modelo nº 32023 (4),

(versão de colocação). Para testar a direção da transferência (DT), os participantes foram

divididos em dois grupos. G1 (n=34): colocou 60 discos no menor tempo possível nos res-

petivos 60 orifícios do tabuleiro, de acordo com o protocolo para a versão de colocação,

sendo, 5 tentativas na AI com a MP, 10 tentativas na AQ com a MNP e 5 tentativas na AF

com a MP. O grupo G2 (n=33) realizou o mesmo teste, mas no sentido oposto (MNP - MP -

MNP). Em cada situação (AI, AQ e AF) registou-se o tempo em segundos. A percentagem

de TIMA foi calculada da seguinte forma: (segundos despendidos na AI – segundos des-

pendidos na AF / segundos despendidos na AI) x 100. Os participantes foram igualmente

contrabalançados em relação à mão de início da tarefa e tarefa.

Os mesmos sujeitos repetiram os mesmos testes uma semana depois mas sem a fase de

aquisição, de forma a se poder averiguar alguma alteração na TIMA.

Para o teste de DMF sem a fase de AQ, cada participante teve um descanso de cerca de

6 minutos (ajustado à sua faixa etária) entre a AI e a AF, correspondente ao tempo médio

de duração de 20 tentativas realizadas na fase de AQ.

Para o teste de DMG realizado sem a fase de AQ, cada participante teve um descanso

de cerca de 12 minutos (ajustado à sua faixa etária) entre a AI e a AF, correspondente ao

tempo médio de duração de 10 tentativas realizadas na fase de AQ.

ANÁLISE ESTATÍSTICA

Foi efetuada uma análise exploratória dos dados utilizando o SPSS, versão 21.0. Seguida-

mente, efetuou-se uma análise estatística utilizando o t-test de medidas emparelhadas para

cada fator (género, classe de idade, prática desportiva e DT) com o propósito de observar os

principais efeitos na percentagem de TIMA realizada após fase de AQ e sem AQ, nas duas

tarefas motoras (DMF e DMG). Em seguida foi realizada a ANOVA de medidas repetidas no

fator aquisição (AQ) para verificar as principais interações entre os fatores género, classe

de idade, prática desportiva e DT na percentagem de TIMA realizada após fase de AQ e sem

fase de AQ, em cada uma das tarefas motoras (DMF e DMG). O fator classe de idade foi ana-

lisado através do teste de Post Hoc de Tukey. O nível de significância fixou-se em 5%.

03RESULTADOS

De acordo com os objetivos delineados no que respeita às capacidades DMF e DMG apre-

sentam-se os resultados relativamente à primeira capacidade (Quadro 1).

QUADRO 1 – Valores descritivos da média, desvio padrão (DP), t, p do efeito dos fatores género, classe de idade, prática desportiva e DT na percentagem de TIMA na tarefa de DMF realizada após fase de aquisição (AQ) e sem AQ.

FATORESMÉDIA±DP

Após fase de AQMÉDIA±DP

Sem AQt p

GéneroMasculinoFeminino

9.02±7.766.19±7.632.97±5.985.79±6.40

3.1640.238

0.0030.813

Classe de Idade

CriançasJovensAdultosIdosos

10.20±7.75 3.32±7.12 2.269 0.038

7.01±7.02 2.94±4.09 2.050 0.054

4.89±6.84 4.14±4.66 0.407 0.689

8.67±9.37 8.03±8.55 0.168 0.869

Prática Desportiva

PraticaNão Pratica

6.32±7.458.68±7.97

3.52±6.745.16±5.89

1.3512.058

0.1870.047

Direção da Transferência

MNP- MP 8.64±7.51 3.16±5.15 3.511 0.001

MP-MNP 6.50±8.00 5.68±7.17 0.393 0.697

Relativamente ao fator género, os resultados revelaram efeitos estatisticamente signifi-

cativos na TIMA no género masculino. A TIMA foi mais elevada quando a tarefa motora

relativa à DMF foi realizada após fase de AQ (com treino) do que quando realizada sem AQ

(sem treino). Quanto ao género feminino, os resultados não revelaram efeitos estatistica-

mente significativos, mostrando que os valores de TIMA foram semelhantes.

No fator classe de idade, podemos observar que, entre as quatro classes analisadas,

apenas a classe das crianças revelou diferenças estatisticamente significativas na TIMA

com e sem fase de AQ. Estes resultados mostram que a TIMA foi mais elevada após a

fase de aquisição do que quando realizada sem aquisição. As demais classes de idade não

revelaram efeitos estatisticamente significativos.

No que se refere ao fator prática desportiva, os resultados demonstram efeitos estatis-

ticamente significativos para o grupo sem prática desportiva, mostrando que a TIMA foi

mais elevada após fase de AQ do que sem fase de AQ. Quanto ao grupo dos praticantes, os

resultados não revelaram efeitos estatisticamente significativos.

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73 — RPCD 15 (1)

No fator direção da transferência, os resultados demonstram efeitos estatisticamente

significativos na direção da MNP para MP. A TIMA foi mais elevada na direção da MNP

para MP quando a tarefa motora manual foi realizada após fase de AQ do que quando foi

realizada sem AQ. Na direção da MP para MNP, os resultados não revelaram efeitos esta-

tisticamente significativos quando comparámos a tarefa realizada após fase de AQ e sem

AQ, observando-se valores de TIMA semelhantes.

Foi realizado posteriormente o teste ANOVA com medidas repetidas no fator AQ, com

os fatores que revelaram efeitos significativos nas análises anteriores, a fim de se poder

observar as interações.

Foram observadas as seguintes interações: género e AQ (F1.38=9.488; p=0.004), prática

desportiva e AQ (F1.38=8.474; p=0.006), género, classe de idade e AQ (F1.38=3.617; p=0.022),

classe de idade, direção da transferência e AQ (F1.38=2.883; p=0.048) e género, classe de

idade, direção da transferência e AQ (F2.38=3.762; p=0.032).

A interação entre género e AQ demonstrou que a diferença entre com AQ e sem AQ na

% de TIMA é mais elevada no género masculino do que no feminino, revelando que os

homens transferiram mais quando tiveram a fase de AQ do que quando não a tiveram. O

contrário verificou-se nas mulheres (figura 1).

FIGURA 1 – Interação: Género x Aquisição.

A interação entre prática desportiva e AQ revela que a diferença na TIMA com AQ e sem

AQ é mais elevada no grupo de não praticantes do que no grupo de praticantes, demons-

trando estes uma TIMA mais elevada quando tiveram a fase de AQ do que quando não a

tiveram. O contrário verificou-se no grupo de praticantes (figura 2).

03

FIGURA 2 – Interação: Desporto x Aquisição.

A interação entre género, classe de idade e AQ confirma os resultados do t-teste onde

apenas na classe das crianças foi verificada uma diferença estatisticamente significativa

entre TIMA com AQ e sem AQ. Esta diferença parece ser influenciada pelo fator género.

Através da observação da figura 3 pode verificar-se que em ambos os géneros a TIMA é

mais elevada quando a tarefa é realizada após fase de AQ, apresentando o género mascu-

lino valores mais elevados.

FIGURA 3 – Interação: género x classe de idade (crianças) x AQ.

A interação entre classe de idade, DT e AQ confirma que a TIMA foi mais elevada na clas-

se das crianças na direção da MNP para MP quando a tarefa motora manual foi realizada

após fase de AQ do que quando realizada sem fase de AQ (figura 4).

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75 — RPCD 15 (1)

FIGURA 4– Interação: Classe de idade x Direção da transferência x Aquisição na direção da MNP-MP

Pela observação dos resultados pode constatar-se que a fase de AQ teve um efeito significa-

tivo na TIMA, revelando os rapazes, as crianças e os não praticantes, uma TIMA mais elevada

após a fase de AQ comparativamente a sem fase de AQ. Considerando ainda o efeito da fase de

AQ na DT, os participantes na direção MNP-MP demonstraram uma TIMA mais elevada.

Os resultados relativos à DMG são ilustrados pelo quadro 2, que representa os valores

descritivos da média, desvio padrão (DP), t, p do efeito dos fatores género, classe de idade,

prática desportiva e DT na percentagem de TIMA na tarefa de DMG realizada após fase de

AQ e sem fase de AQ.

QUADRO 2 – Valores descritivos da média, desvio padrão (DP), t, p do efeito dos fatores género, classe de idade, prática desportiva e DT na percentagem de TIMA na tarefa de DMG realizada após fase de aquisição (AQ) e sem AQ.

FATORESMÉDIA±DP

Após fase de AQMÉDIA±DP

Sem AQt p

GéneroMasculinoFeminino

6.55±4.505.83±8.31

5.78±4.864.20±7.05

0.6430.920

0.5250.364

Classe de Idade

CriançasJovensAdultosIdosos

4.86±5.21 5.00±5.10 0.066 0.948

6.05±4.41 6.87±3.78 0.582 0.567

5.89±4.59 5.08±4.76 0.564 0.580

8.24±11.55 2.13±9.73 1.775 0.099

Prática Desportiva

PraticaNão Pratica

4.88±4.987.31±7.73

6.05±4.204.06±7.26

0.9911.983

0.3290.055

Direção da Transferência

MNP- MPMP- MNP

6.91±6.555.39±6.82

4.14±5.725.90±6.42

2.2850.289

0.0290.774

MNP: mão não preferida; MP: mão preferida

03Não foram encontrados quaisquer efeitos estatisticamente significativos para os fatores

género, classe de idade e prática desportiva na TIMA realizada após fase de AQ e sem AQ

na tarefa de DMG. Os resultados revelam que a TIMA após fase de AQ e sem AQ apresen-

tou resultados similares para os fatores analisados.

No fator DT, os resultados demonstram efeitos estatisticamente significativos na direção

da MNP para MP. A TIMA foi mais elevada nesta direção quando a tarefa motora manual

foi realizada após fase de AQ do que quando realizada sem AQ. Na direção da MP para MNP,

os resultados não revelaram efeitos estatisticamente significativos quando comparamos

a tarefa realizada após fase de AQ com a tarefa sem AQ, demonstrando que a TIMA foi

semelhante nesta direção.

DISCUSSÃO

Com este estudo pretendemos investigar o efeito da AQ na TIMA considerando ainda os

fatores género, classe de idade, prática desportiva e direção da transferência (DT), em

duas tarefas, uma de DMF e uma de DMG.

Pela observação dos resultados pode constatar-se que a fase de AQ teve um efeito significativo

na TIMA na tarefa de DMF, revelando os participantes, nomeadamente, os rapazes, as crianças

e os não praticantes, uma TIMA mais elevada após a fase de AQ comparativamente à sem AQ.

No que se refere à tarefa de DMG, os resultados são distintos dos encontrados na DMF, ob-

servando-se apenas um efeito significativo no fator DT. Os participantes, na direção MNP-MP,

demonstraram uma TIMA mais elevada após a fase de AQ do que sem fase de AQ. Na direção

da MP-MNP, os resultados demonstraram que a TIMA foi idêntica. Neste caso, a fase de AQ

não teve importância na TIMA, pois a prática não interferiu nos resultados da transferência.

Os nossos resultados corroboram os de Liu e Wrisberg (9) os quais não observaram di-

ferenças entre os grupos no pré-teste, muito embora a precisão de arremesso tenha sido

significativamente superior no grupo experimental relativamente ao grupo de controlo,

em ambos os testes de transferência. Além disso, a precisão de arremesso dos meninos

foi significativamente superior à das meninas. Os nossos resultados também corroboram

este fato e, ainda que o foco do nosso estudo não tenha sido investigar a precisão, ob-

servamos uma percentagem de TIMA mais elevada nos homens do que nas mulheres na

interação entre género e AQ (tarefa realizada após AQ e sem AQ). Os indivíduos do género

masculino transferiram mais quando tiveram a fase de AQ do que quando esta fase não

ocorreu. O contrário verificou-se no género feminino. Os nossos resultados corroboram

também os de Furuya, Nakamura e Nagata (7) pois no seu estudo o treino influenciou os re-

sultados da TIMA, tendo-se verificado um aumento na velocidade máxima de movimentos

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77 — RPCD 15 (1)

do dedo da mão treinada depois de esta praticar o movimento numa velocidade submáxi-

ma, observando-se isto somente no grupo experimental, aquele submetido à fase de AQ.

É de realçar que o desenho experimental do estudo destes autores é idêntico ao do nosso

estudo, em que, para o teste realizado sem a fase de AQ, na DMF, cada participante teve

um descanso de 6 minutos entre a avaliação inicial (AI) e a avaliação final (AF), o que

corresponde à média de duração de 20 tentativas realizadas na fase de AQ, e na DMG teve

um descanso de 12 minutos entre a AI e a AF, o que corresponde à média de duração de

10 tentativas realizada na fase de AQ. No nosso estudo, o treino influenciou os resultados

da TIMA, mostrando-se esta mais elevada após a fase de AQ comparativamente à sem AQ.

Os nossos resultados corroboram ainda os de Camus, Ragert, Vandermeeren e Cohen (3),

embora os autores tivessem avaliado grupos de sujeitos diferentes. Os autores observa-

ram melhorias significativas na velocidade e precisão na mão direita, treinada, e na mão

esquerda, não treinada, resultantes da prática. Estes resultados levantam a hipótese de

uma contribuição de modulação de inibição intracortical curta e inter-hemisférica, ou uma

interação entre ambas havendo transferência intermanual depois de ter ocorrido o treino

de uma tarefa sequencial de força.

Os resultados do fator DT nas tarefas de DMF e DMG mostram que na direção da MNP para

MP a TIMA foi mais elevada quando a tarefa motora manual foi realizada após fase de AQ do

que quando realizada sem AQ. Neste caso, percebe-se que o treino interferiu no resultado da

TIMA. Estes resultados têm suporte nos achados de Andrean, Faquin, Dascal e Okazaki (2). Os

autores referem que, como a mão esquerda possui menor experiência motora por ser a mão

de menor uso em destrímanos nas atividades do quotidiano, esta mão estaria mais suscetível

ao efeito da transferência de aprendizagem. Este resultado responde ao modelo Caloso de

Taylor e Heilman (16) que explica os mecanismos da ocorrência de TIMA conforme a DT. Este

modelo defende que os programas motores ficam armazenados no hemisfério dominante,

que é normalmente o esquerdo (foi o caso do nosso estudo, pelo fato dos participantes en-

volvidos na nossa pesquisa serem todos destros) e não depende da mão usada para o treino

da habilidade. Em consequência, a mão direita possui acesso direto aos programas motores,

enquanto a mão esquerda possui apenas acesso indireto dado através do corpo caloso. No

entanto, este modelo beneficia mais através do treino da MNP do que a situação inversa, isto

é, ocorre maior transferência da MNP para a MP (15). Quanto ao fato de que a TIMA foi mais

elevada quando a tarefa motora manual foi realizada após fase de AQ (com treino) do que

quando realizada sem AQ (sem treino) é justificável pelo fato de que deve haver uma quan-

tidade expressiva de aprendizagem e de aperfeiçoamento no desempenho, decorrentes da

prática, para que a transferência intermanual ocorra (6).

03Na direção da MP para a MNP, os resultados não revelaram efeitos estatisticamente

significativos quando comparamos a tarefa realizada após fase de AQ com a tarefa sem

fase de AQ. Como tal, nesta direção, verificou-se uma TIMA semelhante nas duas tarefas

motoras. Estes resultados contrapõem os observados nos estudos de Ammons (1; citado em 18).

O autor sugere que ocorre maior transferência da mão direita (a preferida, nos participantes

da amostra testada) para a esquerda, pois a mão direita teria mais experiência em tarefas

com componentes semelhantes aos praticados. Deste modo, o grau de aprendizagem que

ocorreria a fim de se atingir proficiência com a mão direita não seria tão grande quanto o

grau apresentado para a mão esquerda, mais suscetível à aprendizagem por se encontrar

em um nível menos avançado. Esta racionalidade é baseada no princípio da treinabilidade,

que indica que, quanto mais treinado for um indivíduo, menos treinável ele será e vice-versa.

Ou seja, quanto mais experiências um aprendiz possuir, maior será o seu desempenho e, con-

sequentemente, menos suscetível ao aperfeiçoamento ele será. A recíproca também seria

verdadeira, de modo que, quanto menor for a experiência do aprendiz, mais sensível à prática

ele se apresentará para o aperfeiçoamento do seu desempenho. Deste modo, como a mão

direita possui maior experiência, esta mão necessitaria de mais prática para apresentar mo-

dificação expressiva no seu desempenho. No entanto, isso não ocorreu no nosso estudo, pois

a fase de treino realizada com a MP não interferiu nos resultados da TIMA, demostrando que

a TIMA foi semelhante nesta direção em ambas as tarefas.

CONCLUSÃO

Na DMF, os participantes masculinos, as crianças e os não praticantes apresentaram uma

TIMA mais elevada após a AQ (com treino) comparativamente à situação sem AQ. O gé-

nero masculino obteve valores mais elevados de TIMA e o género feminino apresentou

valores semelhantes. As crianças revelaram uma TIMA mais elevada do que as demais

classes de idade. O grupo sem prática desportiva obteve valores mais elevados de TIMA,

enquanto o grupo dos praticantes obteve valores idênticos. A TIMA foi superior na direção

da MNP para a MP e na direção da MP para a MNP os valores foram semelhantes.

Na DMG, não se verificaram diferenças entre a transferência com e sem AQ. A TIMA foi

similar nos fatores género, classe de idade e prática desportiva, mostrando que os grupos

não diferiram. Na direção da MNP para a MP a TIMA foi mais elevada, e na direção da MP

para a MNP a TIMA foi semelhante.

Sugerimos que pesquisas futuras contemplem, no âmbito deste mesmo tema, outros

tipos de análise como: investigar a TIMA incluindo outras nacionalidades, incluindo a pre-

ferência manual e testando outras tarefas de destreza manual, para clarificar a relação

desta capacidade, nas suas expressões mais global ou mais fina, com a TIMA.

Page 41: REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO …Mariana de Carvalho, Filip Boen, José Pedro Sarmento, Jeroen Scheerder. Adaptação para a população portuguesa de intrumentos de avaliação

79 — RPCD 15 (1): 79-98

REFERÊNCIAS

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14. Schmidt RA (1988). Motor control and learning. Champaign, Human Kinetics.15. Schulze K, Luders E, Jancke L (2002) Intermanual transfer in a simple motor task. Cortex, 38 (5): 805-15.16. Taylor HG, Heilman KM (1980). Left-hemisphere motor dominance in righthanders. Cortex, 16(4): 587-603.17. van Strien J (2003). The Dutch Handedness Ques-tionnaire. Retirado de http://hdl.handle.net/1765/956.18. Vasconcelos O (1991). Avaliação das capacidades coordenativas. Documento não publicado. Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física da Uni-versidade do Porto.

Liderança dos presidentes das

federações olímpicas brasileiras:

Análise da autopercepção

das competências em função

da formação académica

PALAVRAS CHAVE:

Gestor esportivo. Competência de liderança.

Federação esportiva olímpica.

Formação académica.

RESUMO

O objetivo desta pesquisa foi analisar as autopercepções da competência de liderança dos

presidentes das federações olímpicas brasileiras, tendo como fator mediador a formação

académica ao nível de graduação. Esta pesquisa compreende dois estudos complementares.

No primeiro estudo participaram 85 presidentes, que preencheram a versão traduzida e adap-

tada para a realidade brasileira do Managerial Behaviour Instrument. No segundo estudo, fo-

ram entrevistados 10 presidentes das federações de Minas Gerais, tendo seus depoimentos

sido submetidos à análise de conteúdo; complementarmente, foram consultados os estatutos,

no que se refere às suas funções. Os resultados de ambos os estudos mostraram que os pre-

sidentes se percebiam como competentes, apenas tendo sido encontradas, no primeiro estu-

do, diferenças significativas entre os presidentes com formação em educação física e aqueles

com outros cursos na competência ‘Competidor’. No segundo estudo, os presidentes também

revelaram percepções diferentes quanto à competência ‘Competidor’, tendo surgido ainda

evidências de que o conhecimento advindo do aprendizado formal e informal era importante

para o sucesso no desempenho das funções gerenciais. Em suma, para além de a formação

parecer não ter determinado consideráveis diferenças entre as autopercepções de competên-

cias de liderança dos presidentes, estes ressaltaram a importância dos conhecimentos mul-

tidisciplinares advindos dos diferentes tipos de cursos oferecidos pelas universidades, bem

como das suas experiências prévias, para o exercício das funções gerenciais.

AUTORES:

Daiane Miranda de Freitas 1

Maria José Carvalho 2

Israel Teoldo da Costa 3

António Manuel Fonseca 2

1 Faculdade de Ciências Biológicas e da Saúde, Viçosa, Brasil

2 CIFI2D, Faculdade de Desporto Universidade do Porto, Porto, Portugal

3 Departamento de Esportes, Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, Brasil

Correspondência: Daiane Miranda de Freitas. Faculdade de Ciências Biológicas e da Saúde. Av. Maria de Paula

Santana, 3815. Silvestre, Vioçosa, 36570000, MG, Brasil. ([email protected]).

04

SUBMISSÃO: 29 de Julho de 2014ACEITAÇÃO: 30 de Abril de 2015

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04The leadership of the presidents of the Brazilian

olympic federations: Analysis of the perceived

competence considering the academic education

ABSTRACT

This research aimed to analyse the self-perception of leadership compe-

tencies of presidents of the Brazilian Olympic Federations, taking their

undergraduate degree into account. This study comprised two comple-

mentary studies. The sample of the first study included 85 participants

who filled out a translated and adapted version to the Brazilian context

of the Managerial Behaviour Instrument. In the second study, ten presi-

dents of the Olympic Sport Federations of Minas Gerais were interviewed

and their answers were content analysed; complementary, the statutes of

their organizations in what concerns to their duties were also consulted.

The results of both studies showed that the presidents perceived them-

selves as being competent; in the first study, there was only one significant

difference, regarding the ‘Competitor’ competency, between presidents

graduated in physical education and in other courses. Furthermore, in

the second study, the presidents reported different perceptions regard-

ing the ‘Competitor’ competency; additionally, they also underlined that

the knowledge from various types of formal and informal training/ edu-

cation was important for success in performing their managerial leader-

ship functions. In sum, the type of undergraduate degree did not seem

to determine differences in the self-perception of leadership competen-

cies in the presidents of Olympic federations in Brazil. Additionally, the

presidents considered that multidisciplinary knowledge carried from the

different types of courses offered by universities, along with previous ex-

periences, are important to the exercise of their managerial functions.

KEY WORDS:

Sport manager. Leadership competency.

Olympic sport federation. Academic background.

INTRODUÇÃO

Há mais de cinco décadas, desde o primeiro programa de mestrado institucionalizado na

Universidade de Ohio, nos Estados Unidos, verifica-se uma crescente oferta de cursos de

formação em gestão esportiva pelo mundo, os quais continuam ganhando popularidade e

reconhecimento, tanto nos Estados Unidos, onde tiveram início, quanto em outros países,

como Austrália, Brasil, Canadá, Índia, Inglaterra e Nova Zelândia (19, 24, 39). Neste cenário,

observa-se que o campo da gestão esportiva tem vindo a se desenvolver, traduzindo-se

numa crescente oferta (e demanda) de cursos na área, na organização de associações

profissionais e num número cada vez maior de gestores trabalhando nos campos rela-

cionados. Naturalmente, o papel político, econômico e social que o esporte representa na

sociedade atual também não é alheio a este interesse pela gestão esportiva (35).

No Brasil, os primeiros passos em termos de formação do gestor esportivo foram dados

no início da década de 1970, com a oferta de um curso de extensão em administração es-

portiva, através de um convênio entre o Conselho Nacional de Desportos (CND) e a Pontifí-

cia Universidade Católica do Rio de Janeiro (4). Nesta época, foi publicado o Diagnóstico da

Educação Física/ Desportos no Brasil, mostrando a deficiência nos aspectos relacionados

com a gestão esportiva e a necessidade de formação de gestores esportivos no país (9).

Diante deste contexto, a Universidade Gama Filho, no Rio de Janeiro, estruturou o primeiro

curso de especialização em Administração Esportiva, ajudando a impulsionar outras ins-

tituições, como a Universidade de São Paulo e a Escola de Educação Física de Joinville, a

oferecerem formação nesta área (4). Na década seguinte, tanto a Universidade Gama Filho

quanto a Universidade de Campinas, em São Paulo, também passaram a ofertar em seus

cursos de mestrado em educação física a área de concentração em gestão esportiva. En-

tretanto, estes cursos de pós-graduação só operaram até meados da década de 1990 e,

desde então, não houve mais oferta, entre as universidades brasileiras, de cursos desta

natureza. Assim, desde esta época os esforços estiveram concentrados na estruturação e

disponibilização de cursos de pós-graduação stricto sensu em educação física, com linhas

de pesquisa em gestão esportiva (3). Já no que refere a formação ao nível de graduação, é

possível constatar a existência de 43 cursos regulares e ativos em gestão esportiva sendo

oferecidos atualmente em diferentes estados brasileiros (25), para além de cursos de licen-

ciatura e bacharelado em educação física com disciplinas relacionadas com gestão espor-

tiva nos respectivos currículos (29). Dos cursos específicos em gestão esportiva, apenas um

é bacharelado, oferecido pela Universidade Federal do Paraná; os demais são tecnológicos,

sendo a maioria presencial e oferecida nas regiões Nordeste e Sudeste do país.

81 — RPCD 14 (3)

Page 43: REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO …Mariana de Carvalho, Filip Boen, José Pedro Sarmento, Jeroen Scheerder. Adaptação para a população portuguesa de intrumentos de avaliação

83 — RPCD 15 (1)

No entanto, apesar da crescente oferta e procura por formação para o gestor esportivo

no Brasil, ainda não há, infelizmente, nenhuma diretriz sobre os conteúdos básicos e apli-

cados para os cursos de gestão esportiva. Em contraste, nos Estados Unidos e na Europa

já existe uma consolidação das diretrizes de formação dos gestores esportivos, a qual foi

promovida, respectivamente, em 1993 e 2006 (6, 30). Estas diretrizes curriculares têm como

pressuposto o alcance do objetivo educacional de formar gestores esportivos com compe-

tências para atuação no campo de trabalho, sendo que, no currículo europeu, a proposta

se direciona para o tipo de organização em que o gestor irá atuar, como clubes, academias,

organizações municipais e federações esportivas (6).

No contexto brasileiro, o que se verifica são cursos com currículos diversificados, mas que,

em alguns conteúdos, convergem nos aspectos abordados em outros países europeus e nos

Estados Unidos, especialmente, no que diz respeito às disciplinas fundamentais de gestão. Um

estudo de Mazzei, Amaya e Bastos (25) demonstrou que o curso de bacharelado desenvolvido

no Brasil, dado seu foco nos aspectos culturais e de contextualização social, evidencia maior

contraste com os currículos dos Estados Unidos e Europa, enquanto que os cursos tecnológi-

cos se aproximam mais destes currículos internacionais, pois contemplam, proporcionalmen-

te, conteúdos das áreas aplicadas com foco no esporte, e das áreas bases com foco na gestão.

As discussões sobre o currículo a ser desenvolvido nas instituições de ensino, para for-

mação de gestores esportivos, tomam por base as competências e os conhecimentos que

devem ser adquiridos por estes profissionais. Estas discussões, presentes na literatura

desde o final da década de 80 do século passado, têm mostrado que as competências a

serem desenvolvidas pelos gestores têm como base o aprendizado de alguns conhecimen-

tos que, tipicamente, se adquirem no meio académico (6, 12, 34). A premissa para o desenvol-

vimento deste conhecimento advindo da educação formal advém do fato do mesmo servir

de base para as habilidades técnicas e para a melhoria da capacidade de assimilação da

experiência no local de trabalho. Contudo, para esta experiência se tornar enriquecedora, é

necessário o recurso a ferramentas conceituais sobre a tarefa e o processo de trabalho; só

desta forma se consegue promover o desenvolvimento e/ ou atualização de competências

aplicadas ao contexto laboral (27).

No que refere às competências dos gestores, as investigações no domínio da gestão

do esporte têm explorado a sua aplicação a partir de diversas variáveis organizacionais,

tais como nível hierárquico (1, 17), dimensão da organização (1, 20), setor de atuação (1, 17) e

formação académica (17). Entre as várias competências apontadas na literatura como sen-

do importantes para gerir as organizações esportivas destacam-se, no presente estudo,

aquelas relacionadas com a liderança. Estas competências mostram-se essenciais devido

às relações pessoais que os gestores normalmente estabelecem no cargo de direção des-

tas organizações e dos objetivos organizacionais a serem alcançados (44, 45). Além disso, a

liderança é uma das funções mais estudadas e pode mesmo ser considerada a mais impor-

04tante no âmbito das pesquisas em gestão esportiva, destacando-se a sua influência nos re-

sultados organizacionais (28, 44). Na maioria das situações profissionais, os comportamentos

que líderes e gestores desempenham são fruto das respectivas habilidades e qualidades,

que se sobrepõem em um mesmo indivíduo e se complementam na ação (28).

No que concerne à natureza da instituição, verifica-se uma escassez de estudos. de-

signadamente no contexto internacional, sobre as competências de gestores esportivos

responsáveis por federações esportivas. Esta escassez é provocada, provavelmente, pela

dificuldade de acesso aos gestores que estão no topo da hierarquia, bem como à disso-

nância de entendimento sobre os conteúdos curriculares de formação (2). No Brasil, esta

insuficiência é ainda maior porque a área vem se desenvolvendo lentamente e ainda carece

de amplitude e consistência ao nível da investigação (29). Adicionalmente, em relação aos

cargos de presidência nestas organizações, não existe no país uma lei que descreva as

competências ou formação que são requeridas para a sua assunção, ficando as indicações

de suas funções restritas e vinculadas nos estatutos das entidades. Deste modo, é possível

encontrar presidentes de federações brasileiras com distintas formações académicas, tal

como, de resto, ocorre em outros setores de atuação descritos em diferentes pesquisas,

como, por exemplo, em clubes e academias (7, 9, 38).

Diante das múltiplas possibilidades de formação para gerir as federações esportivas,

acredita-se que um estudo sobre a autopercepção de dirigentes com diferentes (per)

cursos de formação ao nível de graduação constitui-se como útil e pertinente, pois pode

contribuir para fornecer indicações sobre o modo como eles entendem a competência no

exercício de seu cargo. Acresce que uma avaliação feita a partir da combinação de méto-

dos quantitativos e qualitativos com base no entendimento do próprio gestor quanto à sua

capacidade de desempenho (33) se pode constituir uma estratégia valiosa para examinar os

seus comportamentos gerenciais, as suas limitações e potencialidades, fornecendo aos

indivíduos um conjunto de expectativas em relação ao seu desempenho e, permitindo, pos-

teriormente, orientar e modificar o seu comportamento (31, 43).

Neste sentido, perante as evidências anteriormente apresentadas, esta pesquisa teve

como principal objetivo analisar como os presidentes percebiam suas competências de lide-

rança, tendo em consideração as suas formações académicas. Para tal, utilizando uma abor-

dagem mista de métodos, foram desenvolvidos dois estudos complementares. O primeiro, de

caráter quantitativo, objetivou verificar se existiam diferenças nas autopercepções das com-

petências de liderança de presidentes com formações diversas (educação física, administra-

ção e afins e outros cursos). O segundo estudo, de caráter qualitativo, objetivou aprofundar

um pouco mais a compreensão sobre a temática. Para tal, recorreu-se a entrevistas, as quais

permitiam aos presidentes expressar como percebiam a sua competência nas funções de

liderança gerencial, em suas respectivas entidades. Paralelamente, foram também analisa-

dos os estatutos das federações, no que diz respeito às funções dos presidentes.

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85 — RPCD 15 (1)

ESTUDO 1

METODOLOGIA

PARTICIPANTES

Participaram deste estudo 85 presidentes de federações olímpicas brasileiras. Entre estes

presidentes, 49.4% possuíam formação em educação física, 34.1% em administração e áre-

as afins (controladoria, ciências contábeis, economia, comunicação social, relações públicas,

gestão pública, gestão esportiva e direito) e 16.5% em outros cursos (medicina, odontologia,

medicina veterinária, letras, pedagogia, engenharia civil, engenharia de agrimensura, enge-

nharia da computação e processamento de dados). Os participantes eram predominante-

mente do sexo masculino (90.9%) e possuíam idade média de 48.6 (± 11.62) anos.

INSTRUMENTO

O instrumento adotado foi a versão traduzida e adaptada para as organizações esportivas bra-

sileiras do Managerial Behaviour Instrument (MBI), originalmente desenvolvido por Lawrence,

Lenk e Quinn (22). O MBI é composto por 36 comportamentos gerenciais, 12 competências de

liderança e quatro dimensões (Colaborar, Criar, Controlar e Competir). A primeira parte do

instrumento compõe-se por questões sócio-demográficas de caracterização dos participantes,

e a segunda parte por 36 comportamentos relacionados com as 12 competências de liderança

do gestor. As alternativas de resposta para os comportamentos basearam-se numa escala tipo

Likert que variava entre Discordo plenamente (1) e Concordo plenamente (5).

Entre as dimensões que compõem o instrumento, a dimensão Colaborar corresponde

aos comportamentos gerenciais que contribuem para as interações com as pessoas, no

sentido de promover o envolvimento, desenvolvimento e comprometimento dos membros

da organização; esta dimensão engloba as competências ‘Facilitador’, ‘Mentor’ e ‘Empáti-

co’. Na dimensão Criar, os gestores deverão focar-se nas necessidades de quem está en-

volvido com a organização, implementa mudanças e motiva os membros da organização;

as competências associadas são ‘Visionário’, ‘Inovador’ e ‘Motivador’. A dimensão Contro-

lar engloba os comportamentos de acompanhamento da execução das tarefas, controle

dos projetos e clarificação das políticas institucionais; as competências que integram esta

dimensão são ‘Regulador’, ‘Monitor’ e ‘Coordenador’. A dimensão Competir reúne compor-

tamentos ligados ao foco competitivo, esforço e empenho do líder, bem como à rapidez

com que este executa as suas tarefas e resolve os problemas que surgem; as competên-

cias que a identificam são ‘Competidor’, ‘Produtor’ e ‘Condutor’ (22, 36).

04O MBI foi traduzido e adaptado para a língua portuguesa (MBIbr) por Freitas, Carvalho,

Costa e Fonseca (14) para ser aplicado no contexto das federações esportivas brasileiras,

tendo a análise fatorial confirmatória realizada à sua estrutura revelado que todos os ín-

dices de ajustamento global do modelo eram adequados (c2 576 = 1072.59, p ≤ .01, c2/ gl =

1.86; SRMR = 0.06; RMSEA = 0.07; NNFI = .99; e CFI = .99), demonstrando, portanto, a sua

fiabilidade e validade para utilização neste tipo de estudos.

RECOLHA DE DADOS

O contato com os presidentes das federações olímpicas brasileiras foi realizado por meio

digital ou telefônico. Após estabelecido o contato, foi enviado um e-mail convite que reu-

nia as seguintes informações: (a) convite de participação, (b) esclarecimento da natureza

e finalidade da pesquisa, (c) importância e cuidados éticos (anonimato, confidencialidade e

uso exclusivo dos dados para a pesquisa), (d) consentimento de participação, e (e) link do

instrumento on-line com as questões da pesquisa (dados sócio-demográficos e comporta-

mentos). Os contatos (eletrônico e telefone) da responsável da pesquisa foram disponibili-

zados de forma que os presidentes pudessem, em caso de necessidade, retirar as dúvidas

sobre o preenchimento do questionário e participação na pesquisa. Todos os procedimentos

da pesquisa foram conduzidos de acordo com as normas estabelecidas pela Resolução do

Conselho Nacional de Saúde (466/ 2012) e pelo Tratado de Ética de Helsínquia (2008) para

pesquisas realizadas com seres humanos. Este estudo foi aprovado pela comissão de ética

da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto por meio do parecer CEFADE10/2013.

ANÁLISE DOS DADOS

Inicialmente, a normalidade e homogeneidade dos dados foram verificadas através do tes-

te de Kolmogorov-Smirnov e do teste de Levene, respectivamente. Ao verificar que a dis-

tribuição dos dados não era normal, utilizou-se o teste não paramétrico de Kruskal-Wallis

para comparar os valores referentes aos três grupos de formação (i.e., educação física,

administração e áreas afins e outros cursos).

Todos os procedimentos estatísticos foram realizados com recurso aos softwares Statis-

tical Package for Social Science (SPSS) for Windows® (versão 20.0), e EQS 6.1 for Windo-

ws®, tendo sido adotado o nível de significância de 5%.

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87 — RPCD 15 (1)

RESULTADOS

Os resultados, apresentados no quadro 1, mostram que, de uma forma geral, todos os pre-

sidentes participantes desta pesquisa se consideravam competentes no exercício de sua

liderança gerencial. A única diferença significativa entre as percepções dos presidentes

surgiu na competência ‘Competidor’ (dimensão Competir). Esta diferença foi identificada

entre os presidentes com formação em educação física e aqueles com formação em outros

cursos, sendo mais valorizada por estes últimos.

QUADRO 1 – Média, desvio padrão, ranking e nível de significância na comparação entre os valores das competências de liderança percebidas pelos presidentes das federações olímpicas brasileiras conforme suas formações académicas ao nível de graduação.

EDUCAÇÃO FÍSICA ADMINISTRAÇÃO E AFINS OUTROS

Dimensão Competência M dp Ranking M dp Ranking M dp Ranking p

Colaborar

facilitador 4.56 0.43 1 4.68 0.36 1 4.78 0.38 1 .16

mentor 4.29 0.75 8 4.53 0.57 3 4.24 0.80 10 .31

empático 4.45 0.48 2 4.57 0.38 2 4.14 1.07 11 .43

Criar

visionário 4.29 0.75 9 4.39 0.57 7 4.38 0.55 5 .98

inovador 4.42 0.53 3 4.43 0.54 5 4.35 0.53 7 .86

motivador 4.17 0.61 10 4.37 0.59 8 4.42 0.49 4 .25

Controlar

regulador 4.38 0.59 5 4.40 0.52 6 4.38 0.55 6 .96

monitor 4.40 0.54 4 4.35 0.58 9 4.45 0.60 3 .84

coordenador 4.34 0.49 7 4.44 0.49 4 4.30 0.72 9 .69

Competir

competidor* 3.84 1.00 12 4.08 0.80 12 4.57 0.52 2 .03

produtor 4.16 0.76 11 4.13 0.82 11 3.97 1.12 12 .95

condutor 4.36 0.60 6 4.26 0.65 10 4.35 0.59 8 .89

* diferenças significativas entre educação física e outros cursos (p = .011)

Todavia, uma análise mais atenta e individualizada dos dados de cada grupo permite

ressaltar alguns resultados interessantes. Com efeito, se, por um lado, todos os presiden-

tes se assemelhavam, ao considerarem que eram, fundamentalmente, ‘Facilitadores’, por

outro lado, aqueles que tinham formação em outros cursos que não o de educação física,

administração e áreas afins reportaram valores mais elevados na competência ‘Compe-

tidor’. De fato, esta competência (‘Competidor’) era a menos valorizada, entre todas as

competências, pelos presidentes com formação académica em educação física e em admi-

nistração e áreas afins. Em contraste, a competência ‘Empático’ era uma das mais enfati-

zadas pelos presidentes com formação em educação física e administração e áreas afins,

ao contrário dos presidentes provindos de outros cursos.

04ESTUDO 2

METODOLOGIA

PARTICIPANTES

Participaram neste estudo 10 presidentes de federações olímpicas de Minas Gerais. Entre es-

tes presidentes, 60% possuíam formação em Administração e áreas afins, 30% em Educação

Física, e 10% em outros cursos. A participação de presidentes do sexo masculino foi predomi-

nante (9 homens e 1 mulher) e a idade média dos participantes foi de 51.3 (± 10,92) anos.

INSTRUMENTO

Neste estudo foi aplicada uma entrevista semiestruturada elaborada com base no enqua-

dramento conceitual do modelo dos valores concorrentes. O roteiro constituiu-se de 42

questões abertas, compreendendo, numa primeira parte, os dados sócio-demográficos e

funcionais dos presidentes, e, numa segunda parte, as competências de liderança.

O roteiro da entrevista foi certificado por três peritos, todos com grau de doutor em ciências

do desporto. Estes peritos, que também possuíam expertise em pesquisa qualitativa, avalia-

ram o roteiro e sugeriram pequenas alterações. Após a inclusão das sugestões o roteiro foi no-

vamente analisado por estes peritos, que o aprovaram de forma unânime. De posse do roteiro

aprovado, procedeu-se a um estudo piloto com um vice-presidente de uma federação olímpica

brasileira envolvido diretamente na sua gestão, ao qual foi solicitado um retorno sobre a com-

preensão das questões, a pertinência do roteiro e o processo da entrevista. Após este processo,

não foi realizada alteração substancial, resultando no roteiro de entrevista final.

RECOLHA DE DADOS

Os presidentes das federações olímpicas mineiras que aceitaram participar desta pesqui-

sa foram contatados previamente por meio telefônico, agendando-se as entrevistas con-

forme local e horário convenientes para os mesmos. Antes de iniciar a entrevista, os pre-

sidentes foram relembrados do objetivo da pesquisa, da confidencialidade e do anonimato.

Em seguida, procedeu-se à assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido e à

entrevista propriamente dita, a qual foi gravada com a autorização do entrevistado. Com o

objetivo de complementar algumas informações obtidas nas entrevistas, principalmente

sobre as funções dos presidentes, os estatutos das respectivas federações foram solicita-

dos e cordialmente disponibilizados.

Todos os procedimentos da pesquisa referentes aos cuidados éticos foram semelhantes

aos realizados e mencionados anteriormente no Estudo 1.

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89 — RPCD 15 (1)

ANÁLISE DOS DADOS

Primeiramente, tendo em vista a familiarização dos investigadores com o material e con-

cretização de um primeiro nível de enfoque temático, procedeu-se à audição e transcrição

na íntegra (ad verbatim) das entrevistas com os presidentes. Seguidamente, procedeu-se

a análises repetidas das entrevistas, no sentido de promover a imersão dos investigadores

nos dados e, consequentemente, absorver a sua extensão e profundidade. Após esta eta-

pa, os dados foram identificados e incorporados em categorias temáticas, relacionando-se

com a realidade a ser analisada e com o modelo teórico adotado neste estudo (22, 36).

A redundância de relatos foi evitada, exceto quando essa redundância, em si mesma, foi

reveladora de aspectos teóricos e práticos fundamentais para a compreensão do tema e

da realidade em análise (42). Neste passo buscou-se também evitar a saturação de dados,

na medida em que, por vezes, uma maior quantidade de dados se pode revelar contra-

-produtiva (13). Assim, os aspectos qualitativos de relevância e que contribuíram para dar

aprofundamento às questões levantadas no estudo quantitativo foram realçados e catego-

rizados conforme o construto teórico adotado neste estudo (22, 36).

Relativamente aos estatutos das federações, procedeu-se à sua análise no que refere às

funções aplicadas a serem desempenhadas pelos presidentes. Após esta análise, proce-

deu-se ao agrupamento e categorização das funções, resultando em nove aspectos aplica-

dos, comuns a todos os estatutos analisados: (a) tomar decisões, (b) convocar e presidir a

reuniões, (c) gerir recursos humanos, financeiros e patrimoniais, (d) supervisionar, coorde-

nar, dirigir e fiscalizar as atividades internas e externas da organização, (e) gerir projetos

e eventos esportivos, (f) assinar contratos, (g) relacionar-se com membros e filiados; (h)

relacionar-se com órgãos públicos e privados; e, por fim, (i) representar a federação.

RESULTADOS

Os excertos das entrevistas apresentados a seguir buscam conceder um aprofundamento da

compreensão dos resultados advindos dos dados quantitativos apresentados no estudo an-

terior (Estudo 1), considerando como eixo norteador o modelo dos valores concorrentes e as

funções advindas dos estatutos das entidades pesquisadas. Os trechos das entrevistas identi-

ficados como E1, E2, E3, E4, E5 e E7 se relacionam com os presidentes que possuem formação

em administração e área afins; aqueles identificados como E6, E9 e E10 tinham formação em

educação física; o presidente E8 representava o grupo com formação em outros cursos.

04Os extratos das entrevistas a seguir mostram que os entrevistados, de uma forma geral, se per-

cebiam como competentes no exercício das funções gerenciais previstas nos estatutos de suas

respectivas federações, reconhecendo a importância dos conhecimentos oriundos de suas for-

mações para o sucesso no desempenho das suas atividades gerenciais nas federações olímpicas.

Acredito que minha formação em educação física e especialização em treinamento esportivo e gestão e marketing esportivo me permitem exercer bem as funções de presidente princi-palmente quanto à direção e coordenação das pessoas, comunicação com os colaboradores, clubes e atletas. Para já com o conhecimento que tenho vou tomando as decisões e temos tidos bons resultados. (E9)

Contudo, além das formações académicas, os entrevistados consideravam que as práticas

esportivas e gerenciais vivenciadas tinham impacto positivo sobre a forma e a rapidez como

avaliavam e respondiam às demandas. Paralelamente, também destacaram que a experiência

em outros setores do poder executivo público os ajudava a compreenderem melhor as expec-

tativas do governo em relação ao papel da federação junto à comunidade, permitindo uma me-

lhor sintonia entre os projetos advindos do governo e da federação em assistência à sociedade.

Fui árbitro e fui atleta. Eu sei exatamente o que eles esperam da federação. Eu também sou vice-secretário de esporte aqui em XXX (nome da cidade foi suprimido), por isso também sei o que o poder público quer de retorno da federação. Assim, eu consigo ter bom diálogo com eles e em conjunto atendemos melhor a sociedade através de nossos projetos em colaboração. (E10)

Como os entrevistados apontaram que suas formações eram importantes para o exercí-

cio da liderança gerencial à frente das suas instituições, foram questionados quanto às

formações que consideravam pertinentes para o gestor de uma federação olímpica. Os

excertos das entrevistas a seguir mostram uma certa convergência das áreas da educação

física/ esporte, administração/ gestão, direito, contabilidade e economia. Neste sentido, e

com base nas descrições estatutárias das funções dos presidentes, os resultados apontam

para cursos que trazem consigo conhecimentos que dão suporte a todas as nove funções

previstas nos estatutos, mencionadas anteriormente.

Você precisa da economia, da área contábil, da área jurídica, da prática, do conhecimento da modalidade, então não precisa falar mais nada, você precisa saber de tudo... Eu tenho apren-dido tudo isso fazendo, no dia-a-dia da gestão mesmo. (E8)Outro ponto que eu percebo que seria muito interessante (...) para qualquer presidente de fe-deração é um maior entendimento sobre o funcionamento da nossa estrutura governamental e das leis que regem a gestão pública... Tudo isto contribuiria muito para o exercício da função de gerir projetos e relacionar com os políticos destes órgãos públicos. (E4)

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91 — RPCD 15 (1)

Neste quesito da formação, um ponto recorrentemente destacado pelos entrevistados para

além da formação ao nível de graduação referia-se à formação contínua e permanente dos

gestores esportivos. A formação contínua se constitui uma alternativa para quem está na

função gerencial e carece de atualização ou aquisição de novos conhecimentos através de

cursos que, normalmente, são aplicados e de curta duração. Os entrevistados referiram

que estes cursos tinham permitido o aprendizado de alguns conhecimentos essenciais

para o sucesso de procedimentos e ações/ atividades desenvolvidas pelas federações.

É bom estarmos atualizados... Acho que não podemos parar, temos sempre que estar fazen-do algum curso de capacitação, complementando o conhecimento que temos da graduação. Sempre que posso faço cursos rápidos de fim de semana que me ajudam muito a entender algumas coisas no dia-a-dia e orientar as pessoas que trabalham comigo. (E6)Tenho feito muitos cursos rápidos que me dão uma boa referência de coisas que só tive acesso depois que assumi este cargo. (E2)

Para além destes cursos, o entrevistado E7 também destacou a importância de um curso

de formação ao nível de pós-graduação stricto sensu, curso este que também permitiu a

atualização e aprofundamento de conhecimento.

Quando eu entrei para a federação senti necessidade de buscar mais conhecimento na área de ges-tão para que eu pudesse contribuir de forma significativa para o desenvolvimento da entidade que eu abracei. Voltei para a faculdade e fui fazer administração de empresas. Sou formado pela XXX (suprimido o nome da instituição) e hoje estou fazendo mestrado em administração também. (E7)

No que refere à competência ‘Competidor’, a qual, recorde-se, era valorizada de forma diferente

pelos presidentes com diferentes formações académicas (Estudo 1), verificou-se que os presiden-

tes tinham o objetivo de desenvolverem trabalhos em colaboração com as federações quando o

assunto estava relacionado com o desenvolvimento das modalidades esportivas como um todo.

Parceira... não adianta nossa federação estar de um lado e as outras do outro. A gente tem que agir em conjunto. (E10)Eu acho que somos parceiros em todos os sentidos, tanto com as federações de outros estados porque nós precisamos, acredito que todos queiram o crescimento do XXX (supri-mido o nome do esporte), então seja federação mineira, paulista, carioca, paranaense, ca-pixaba... todo mundo tem que ser parceiro para construir um modelo de gestão mais forte para o XXX brasileiro (suprimido o nome do esporte)... Inclusive o ano passado tivemos uma experiência muito boa de uma maior aproximação entre a nossa federação, a do vôlei, a do handebol e a do futsal. Então trabalhamos em conjunto e em prol do esporte. (E4)

04Por outro lado, também se observou que alguns presidentes, especialmente aqueles que esta-

vam há pouco tempo no cargo, tinham dificuldade em fazer as parcerias interinstitucionais, seja

com as federações do seu próprio estado ou de outros estados. Conforme explicitado nos excer-

tos, isto acontecia devido ao fato de alguns presidentes não conhecerem os seus congéneres

das outras federações, ou pela própria limitação de ações em função do tempo de presidência.

Ainda não conheço muita gente porque estou começando (primeiro ano de mandato)... Eu acho que o esporte poderia alcançar um patamar maior se existisse uma colaboração, integração entre os presidentes e os esportes. (E1)Eu sou parceiro, mas estou engatinhando ainda. Nós pegamos em junho do ano passado (primeiro ano de mandato) e ficamos só apagando incêndio. Não tive tempo para mais nada a não ser focar nas nossas necessidades. (E8)

A competição, quando destacada pelos presidentes, aparecia direcionada para a parte téc-

nica, quando aconteciam torneios nacionais e disputa entre as seleções estaduais. Neste

caso, existia um desejo de que os resultados fossem positivos e que a federação estivesse

bem representada pelos seus atletas.

Claro. Nas competições nacionais é importante que tenhamos bons resultados. Isto mos-tra que nossos esforços administrativos estão se consumando em resultados técnicos. ...Gosto de ver o atleta no pódio. Esta é a minha alegria. (E9)

A competição também era enfatizada nos procedimentos administrativos internos a se-

rem realizados dentro da federação e na motivação dos funcionários em buscar a eficácia,

provavelmente com o objetivo de serem melhores para alcançar em credibilidade, apoio

governamental, patrocínio, praticantes da modalidade, entre outros.

É muito complicado trabalhar com tantas dificuldades. Mas tento mostrá-los (membros) que se conseguirmos ser melhores e atingir algumas metas, as condições mudam para todos. Assim, eles a cada dia tentam ser cada vez melhores no que fazem e aprendem no-vas coisas que nos ajudam a ganhar credibilidade junto aos patrocinadores e atletas. (E8)

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93 — RPCD 15 (1)

DISCUSSÃO GERAL

Esta pesquisa teve como objetivo analisar as percepções dos presidentes em relação às

suas competências de liderança gerencial, procurando ver se existiam diferenças em fun-

ção das suas formações ao nível de graduação.

Todavia, antes de apresentar a discussão geral dos estudos, importaria ressaltar que

algumas dissonâncias, de um estudo para o outro, podem ter relação com o fato das re-

alidades a que os presidentes pertenciam serem relativamente diferentes: enquanto no

primeiro estudo a amostra se reportou à realidade de diferentes estados do Brasil, no se-

gundo a amostra se reportou a nível estadual. Esta circunstância levou a que a distribuição

da formação não era rigorosamente a mesma em ambos os estudos.

Os resultados advindos do estudo quantitativo (Estudo 1) mostraram que todos os pre-

sidentes, independentemente do seu histórico de formação ao nível de graduação, se con-

sideravam competentes no desempenho das suas funções de liderança gerencial. Este

resultado se revela interessante, uma vez que as pesquisas têm indicado que a capacidade

de desempenhar múltiplas competências é importante para a potencialização da eficácia

da liderança gerencial e organizacional (16, 21, 22) e que a formação qualificada permite o

alcance de metas e resultados institucionais e esportivos (4, 29)

Na comparação intergrupos, verificou-se que somente a competência ‘Competidor’ apre-

sentava diferença significativa, sendo mais valorizada pelos presidentes de outros cursos do

que por aqueles com formação em educação física. Relativamente a esta diferença, o estudo

qualitativo sugeriu que as dissonâncias de avaliação residiam em quatro aspectos associa-

dos às atividades das federações: (a) cooperação interinstitucional para desenvolvimento do

esporte para a comunidade, (b) fragilidade no processo de transição de gestões, que coloca

limitações à apresentação de resultados à sociedade (especialmente nas federações que

possuem novos presidentes), (c) visão sobre o desempenho técnico em competições oficiais

da modalidade, e (d) desenvolvimento do espírito competitivo e de motivação dentro da en-

tidade, de forma a melhorar procedimentos administrativos e impactar na atividade fim da

federação e também na sua credibilidade junto a órgãos públicos, patrocinadores e atletas.

Sobre este aspecto, a literatura tem evidenciado que as organizações esportivas sem

fins lucrativos se diferenciam das organizações com fins lucrativos, especialmente no que

se refere à sua produtividade (32) e que os gestores com formações distintas possuem focos

diferentes sobre os critérios de produtividade destas organizações. Conforme apontam

alguns estudos, os gestores com formação na área esportiva têm como referência a com-

petição em termos de resultados esportivos relacionados com o número de medalhas e de

atletas em competições nacionais e internacionais, resultados organizacionais associados

à participação e promoção de eventos nacionais e internacionais, projetos esportivos e o

número de atletas e praticantes em geral (37). Já os gestores com outras formações valo-

rizam mais esta competência no desempenho das funções gerenciais na federação, tendo

como critérios de desempenho organizacional os procedimentos administrativos, a rela-

ção interpessoal e a aquisição de recursos. Entretanto, na presente pesquisa não houve

nenhum resultado que evidenciasse ou corroborasse esta constatação, porque tanto os

presidentes com formação em educação física quanto aqueles com formação em outros

cursos pareciam valorizar o desempenho técnico dos seus atletas em competições esta-

duais, nacionais e internacionais, assim como também o empenho dos funcionários para o

desempenho de suas funções administrativas.

Outro aspecto também ressaltado pelos presidentes no estudo qualitativo diz respeito à

aquisição de conhecimento por via das experiências anteriores e ensino formal. No que refe-

re às experiências anteriores, outros estudos também já destacaram que a experiência como

praticante ou atleta ajudava o gestor a compreender o contexto do esporte e sua inserção

na sociedade, para além, obviamente, de auxiliar na compreensão dos aspectos técnicos

inerentes à modalidade de sua federação (7, 23). Os presidentes entrevistados também res-

saltaram que experiências prévias em atividades gerenciais se revelavam importantes para

promover conhecimentos úteis para o aprimoramento e/ ou diversificação das competências

necessárias para gerir as organizações esportivas. Os participantes sublinharam que estas

experiências podem ser especialmente úteis para o aprendizado de conhecimento técnico

e de condutas de liderança que permitem a gestão de recursos humanos e o desenvolvi-

mento de uma relação de confiança que, conforme apontam diversas pesquisas, permitirá

equilibrar ou facilitar as relações entre os líderes e seus liderados, em busca de uma gestão

participativa e interativa que facilite o alcance de resultados institucionais (5, 41).

Todavia, para além do aprendizado informal, a literatura e os entrevistados também res-

saltaram a importância do aprendizado de conhecimento e o desenvolvimento de compe-

tências através do ensino formal oferecido por universidades e outras instituições de ensi-

no (40). De fato, os presidentes disseram que, além de promoverem, também incentivavam

seus colaboradores a fazerem cursos de atualização e aprofundamento de conhecimentos

relacionados com as demandas de suas entidades (e.g., cursos de fundamentação técnica

da modalidade, gestão estratégia, marketing esportivo, direito esportivo, recursos huma-

nos). Neste aspecto, eles relataram que os cursos de formação contínua e, em especial,

os cursos de curta duração, possuem valor bastante considerável e ajudam a qualificar o

trabalho desenvolvido no dia-a-dia das federações. Ademais, alguns presidentes também

reconheceram que obter novas certificações em áreas diferentes da primeira formação,

fossem elas ao nível da graduação ou pós-graduação, ajudava bastante na qualificação das

habilidades e nas competências necessárias para o rendimento laboral.

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95 — RPCD 15 (1)

Sobre a conexão e aproveitamento dos conhecimentos advindos do aprendizado informal

e formal, a literatura tem indicado, desde a década de 80 do século XX, que a formação do

gestor esportivo deve contemplar múltiplos conteúdos advindos de áreas diversas, como fi-

nanças, economia, direito ou esporte, entre outras, e associá-los com estágios que permitam

ao gestor aplicar estes conhecimentos na prática (17, 18, 26). Esta recomendação advém pelo

fato de experts na área da gestão, como Mintzberg (27, p.19), afirmarem que “... a gestão não é

uma ciência, nem uma profissão, muito menos uma função ou a combinação delas. Gestão

é prática e, portanto, deve ser estimada através da experiência em contexto.”. Mintzberg (27)

complementa esta afirmação acrescentando a ideia de que o conhecimento é importante,

mas é a sabedoria de sua aplicação aos múltiplos contextos de gerenciamento que irá ser

decisiva para o sucesso das atividades gerenciais e para a conquista de metas institucionais.

Na presente pesquisa, os resultados mostraram que os presidentes valorizavam bas-

tante esta conexão entre teoria e prática para as formações e desempenho das funções

previstas nos estatutos das federações. Inclusive, as áreas de formação destacadas pelos

presidentes se relacionavam diretamente com aquelas já apresentadas na literatura (10, 11,

15, 18, 26), o que sugere que as qualidades de formação académica e prática se reforçam mu-

tuamente no contexto brasileiro. Conforme aponta a literatura, isto acontece porque as ba-

ses teórica e científica ajudam a explicar o mundo incerto das organizações e, através dos

seus conhecimentos, clarificam as análises e visões do contexto, tornando-o mais tangível

e compreensível. Neste contexto, Daft et al. (10) sugerem que aprendizados académicos

importantes ajudam a pegar num problema que não está claro ou está em disputa e trazem

soluções para eles. Assim, o que a literatura tem sublinhado sobre a questão da forma-

ção não passa necessariamente pelo gestor fazer infindáveis cursos ou ter numerosas

experiências prévias, mas sim buscar aprendizado teórico e/ ou pesquisas científicas que

permitam provocar mudança de atitude ou na forma de ver e avaliar o contexto por parte

do gestor, impactando diretamente suas práticas, a sua reputação pessoal e o sucesso or-

ganizacional (11, 28). Nesta perspectiva, Davis (11) ressaltou que a maximização do alinhamen-

to da experiência prática e da formação académica será mais facilmente obtida quando

as teorias permitirem aos práticos negarem as condutas usualmente adotadas, ou parte

delas, e os desafiarem a compreender o problema de outra forma e sob nova perspectiva.

Neste âmbito, tomando por base estas considerações sobre a importância da combinação das

formações teóricas e práticas de gestores esportivos, a realidade brasileira evidenciada nesta

pesquisa e as indicações da literatura sobre o desenvolvimento e aprimoramento de competên-

cias de liderança, os dados da presente investigação parecem sugerir que algum impacto positivo

na gestão das federações olímpicas poderia advir de duas ações governamentais. A primeira

estaria relacionada com a incorporação, por parte do governo, de alguns critérios ou parâmetros

de avaliação dos projetos esportivos a serem financiados e desenvolvidos para a sociedade. Es-

pecificamente, se a questão da sinergia entre gestões dentro de uma mesma federação pudesse

ser avaliada, ou se se apoiasse a cooperação de projetos a serem desenvolvidos com base em

multi-esportes, poderiam não só ser atendidas as recomendações pedagógicas relacionadas

com a formação esportiva (8), mas também seria impulsionada a comunicação inter-federações

e o trabalho conjunto em prol do desenvolvimento esportivo para e na sociedade. Tal poderia ser

conseguido, por exemplo, através de um projeto que abarcasse todos os esportes praticados em

quadra, potencializando-se a participação de praticantes de diferentes modalidades em outras

modalidades, no sentido de encontrar o “rei da quadra”, ou seja, aquele que mais pratica esportes.

A segunda ação governamental se relaciona com o fato do governo, para além das ações

que já realiza, criar critérios para apoiar todas as federações olímpicas através da liberação

de recursos financeiros para a formação de recursos humanos em diferentes cursos oferta-

dos (graduação, pós-graduação e de curta duração), em especial aqueles que oferecessem

os aprendizados multi e transdisciplinares apontados pela literatura e pelos presidentes en-

trevistados como sendo importantes para o desenvolvimento das competências necessárias

para a liderança gerencial das federações olímpicas no Brasil. Esta ação impactaria de forma

decisiva as ações de gestão destas entidades, especialmente aquelas com maior debilidade

funcional e estrutural, uma vez que a qualificação do corpo administrativo poderia promover

melhor atendimento das demandas da sociedade e a busca por recursos financeiros através

de projetos financiados por empresas nacionais e internacionais.

CONCLUSÃO

A presente pesquisa demonstrou que, independentemente da formação académica, to-

dos os presidentes se consideravam competentes na execução da liderança gerencial e

das suas funções advindas dos estatutos de suas respectivas federações olímpicas. Estas

funções podiam estar relacionadas com uma ou mais competências de liderança em si-

multâneo. Quando comparadas as autopercepções dos presidentes em função do curso de

graduação que possuíam, verificou-se que elas eram semelhantes. Com efeito, apenas a

competência ‘Competidor’ apresentou diferença significativa nos mandatários com forma-

ção em educação física e aqueles com formação em outros cursos. Posteriormente, através

do estudo qualitativo, ficou evidenciado que a dissonância encontrava-se em quatro aspec-

tos relacionados com as atividades das federações. O primeiro referia-se ao fato destes

presidentes considerarem que não existia competição, e sim cooperação inter-federações

para a promoção e desenvolvimento do esporte na sociedade. O segundo associava-se ao

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fato de algumas relações interinstitucionais não terem sido resguardadas ou desenvolvidas

em função do processo de transição de presidência, ou pela limitação temporal relacionada

com a posse e início das atividades na federação, limitação essa que não permitia ao novo

presidente conhecer os demais colegas e as demais políticas desenvolvidas nas outras fe-

derações. O terceiro reflete a competição no seu sentido mais técnico, tendo os presidentes

demonstrado preocupações com resultados esportivos (e.g., boa performance, medalhas,

pódio). Por último, o quarto aspecto referia-se ao desenvolvimento da mentalidade compe-

titiva dentro das federações, representada na realização de procedimentos administrativos

com eficácia, de forma a ganhar credibilidade junto da sociedade, governo e patrocinadores.

Para além destes aspectos, a pesquisa qualitativa também evidenciou que os presidentes

entrevistados consideravam a formação e aquisição de conhecimento muito importantes para

o sucesso organizacional. Sobre este ponto, apresentaram um reconhecimento considerável,

tanto para o conhecimento advindo de forma informal, (i.e., através das experiências prévias

como atleta ou gerenciais em outros cargos), quanto aquele advindo de maneira formal (i.e.,

através de cursos de graduação e pós-graduação nas universidades ou de cursos de formação

contínua, normalmente mais curtos e fornecendo informações básicas para uma atualização

em assuntos relacionados especificamente com as necessidades das federações).

Uma das limitações deste estudo, e que não nos permite um maior aprofundamento nos

resultados, advém do fato de não se terem tomado em conta as características dos currícu-

los de formação destes gestores. Assim, afigura-se importante, futuramente, explorar os

métodos de ensino e conteúdo curricular nas universidades que contemplam as diferentes

formações e estágios académicos, a fim de verificar em que aspectos eles podem contribuir

para a formação gerencial de seus profissionais e impactar nos resultados destas organi-

zações esportivas. Além disto, sugere-se que futuros estudos aprofundem a investigação

quanto à(s) relação(ões) que se estabelece(m) entre a formação académica e as compe-

tências de liderança, incluindo as formações complementares dos presidentes, tais como

cursos de curta duração ou pós-graduações em gestão esportiva ou em áreas correlatas.

AGRADECIMENTOS

Este trabalho teve o apoio da CAPES (Bolsista da Capes – Proc. nº 13262/13-0) e da SETES/

MG através da LIE.

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05Prontidão motora.

Uma revisão do conceito,

operacionalização

e sua aplicação

no contexto escolar

PALAVRAS-CHAVE:

Prontidão motora. Adolescentes.

Ensino. Educação Física.

RESUMO

Identificar níveis de prontidão de crianças e jovens em contexto escolar é uma preocu-

pação de vários profissionais de educação, nos quais se incluem os professores de Edu-

cação Física. Esta preocupação resulta da necessidade sentida em adequar as propostas

didático-metodológicas das aulas às características dos alunos, respeitando as diferenças

interindividuais existentes. A avaliação da prontidão é um processo difícil e complexo, exi-

gindo uma visão abrangente de natureza multivariada. Embora na literatura da Educação

Física e Ciências do Desporto não se encontrem ainda métodos objetivos que ajudem os

professores a diagnosticar a prontidão motora dos seus alunos, foram sugeridas por al-

guns autores propostas de enorme utilidade para os professores sobre procedimentos a

adotar. Os propósitos deste estudo são: (1) abordar a ideia de prontidão à luz de diferentes

conceções, características e perspetivas; (2) situar a prontidão motora no contexto do pro-

cesso de ensino-aprendizagem na escola; (3) ligar prontidão motora a períodos críticos;

(4) apresentar a informação empírica disponível para marcar a noção de prontidão motora.

AUTORES:

Cláudia Malafaya 1

Go Tani 2

José Maia 3

1 Departamento de Expressões, Escola Básica de Leça da Palmeira, Matosinhos. Portugal

2 Laboratório de Comportamento Motor, Escola de Educação Física e Esporte, Universidade de São Paulo. São Paulo, SP. Brasil

3 CIFI2D & Laboratório de Cineantropometria e Gabinete de Estatística Aplicada, Faculdade de Desporto da Universidade do Porto, Porto, Portugal

SUBMISSÃO: 8 de Março de 2015ACEITAÇÃO: 30 de Abril de 2015

Correspondência: Maria Cláudia d’Athayde Malafaya Tavares de Lima. Escola Básica de Leça da Palmeira,

Rua do Sol Poente, 4450-793 Leça da Palmeira, Portugal ([email protected]).

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101 — RPCD 15 (1)

Motor readiness. Reviewing the concept,

operationalization and its application

in the school context.

ABSTRACT

Identifying readiness levels of school children and youth is a concern of

education professionals, therein included Physical Education teachers.

This concern stems from the need to adapt teaching approaches to the

characteristics of the students, by respecting their inter-individual dif-

ferences. Evaluating readiness is a difficult and complex process which

requires a comprehensive view of multivariate nature. The Physical Edu-

cation and Sport Sciences literature is almost devoid of guidelines and

methods for helping teachers to diagnose the motor readiness of their

students. Even so a few authors have advanced some very useful pro-

posals with procedures to be adopted by teachers. This paper aims at:

(1) address the idea of readiness in light of different conceptions, fea-

tures and perspectives; (2) setting the motor readiness within the school

teaching-learning process; (3) link motor readiness with the critical pe-

riod concept; (4) present available empirical information to mark the

motor readiness concept and its uses.

KEYWORDS:

Motor readiness. Adolescents. Teaching. Physical Education.

INTRODUÇÃO

Identificar, com clareza e rigor, níveis de prontidão de crianças e jovens em contexto es-

colar é uma preocupação de vários profissionais de educação, nos quais se incluem os

professores de Educação Física. A Educação Física (EF) na escola tem como uma de suas

preocupações centrais o desenvolvimento da competência motora. Sendo o seu contri-

buto único para o desenvolvimento da proficiência motora, as aulas de EF devem, como

enfatizam Tani, Teixeira e Ferraz (32), possibilitar a todas as crianças e jovens a exploração

máxima das suas potencialidades.

Muitas exigências colocadas pelos professores não contemplam as possibilidades reais de

sucesso dos diferentes alunos. Estudos sobre a prontidão motora (PM) realizados na popula-

ção estudantil portuguesa têm chamado a atenção para as preocupações que os professores

de EF deveriam ter com as opções pedagógicas face aos níveis diferenciados de PM dos

alunos, bem como para o modo como são planeadas as diversas unidades didáticas (12, 14, 30).

Pode o professor partir do princípio de que estão presentes em todas as crianças e

jovens as competências/ aptidões para aprender as habilidades motoras dos diferentes

conteúdos de ensino? Pode o professor construir situações de aprendizagem adequadas

às características e necessidades dos alunos sem conhecer os seus níveis de prontidão?

Pode o professor respeitar as diferenças interindividuais de crianças e jovens do mesmo

ano de escolaridade sem conhecer os pressupostos de partida? Pode o professor, sem

esse conhecimento, diferenciar o ensino, acompanhar a progressão dos alunos e ajuizar

da sua evolução? Estas são questões fundamentais que norteiam toda a ação pedagógica

do professor. Apesar de o presente estudo não responder diretamente a nenhuma delas, é

nosso entendimento que na sua base repousa o sério problema da definição de prontidão

motora, a sua operacionalização, descrição dos seus valores e interpretação adequada do

seu significado. Daqui que os propósitos deste estudo sejam os seguintes: (1) abordar a

ideia de prontidão à luz de diferentes conceções, características e perspetivas; (2) situar

a prontidão motora no contexto do processo de ensino-aprendizagem na escola; (3) ligar

prontidão motora a períodos críticos; (4) apresentar a informação empírica disponível para

marcar a noção de prontidão motora. Face à complexidade dos temas em apreço, decidiu-

-se abordá-los a partir de um compromisso entre as características próprias de um ensaio

temático e uma revisão da literatura seguindo a ordem dos objetivos apresentados.

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05METODOLOGIA

A pesquisa bibliográfica decorreu entre novembro de 2012 e janeiro de 2013. A busca foi

realizada nas bases de dados electrónicas Scopus, EBSCO e SciELO. Para outras publica-

ções (livros e teses) recorreu-se aos catálogos disponíveis na Biblioteca Virtual da Univer-

sidade do Porto e na Biblioteca da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto. Foram

utilizadas as seguintes palavras-chave: (i) prontidão motora; (ii) adolescentes; (iii) ensino;

(iv) Educação Física. Os critérios de inclusão considerados foram os seguintes: (i) ano de

publicação; (ii) qualidade dos artigos; (iii) estudos empíricos realizados em contexto esco-

lar; (iv) amostragem de crianças e jovens portugueses do ensino básico. Em função dos

critérios de inclusão estabelecidos, foram selecionadas 33 publicações, realizadas entre

1957 e 2012, que incluem: os primeiros estudos sobre o conceito de prontidão escolar (5)

e as diferentes conceções (10, 23); contributos de autores tidos como de referência na área

sobre o conceito e características da prontidão motora (5, 6, 9, 11, 12, 15, 19, 20, 23, 28, 31), os fins e

propósitos do desporto na Educação Física (1), o desenvolvimento e aprendizagem das ha-

bilidades motoras (8, 18, 22, 32), a relação entre maturação biológica e desempenho motor (2, 3, 7,

17, 21, 24, 33), a relação entre prontidão motora e períodos críticos (4, 11, 13, 16, 19, 26, 27); estudos em-

píricos (12, 14, 29) abordando a relação entre o conceito de prontidão e sua operacionalização

em contexto escolar (refira-se que só foram encontrados estes três estudos sobre o tema).

Embora o tema da prontidão motora tenha sido profusamente tratado no contexto do des-

porto de “competição” não o foi no âmbito da Educação Física na escola o que justifica a

nossa preocupação com o estudo deste problema.

Ao contrário do formalismo esperado para uma revisão da literatura (sistemática ou de

meta-análise), o estudo presente percorrerá quatro pontos fundamentais tal como referido

no final da introdução: (1) apresentação do conceito de prontidão e suas características; (2)

ligação da noção de prontidão motora ao processo de ensino-aprendizagem concretamente

na disciplina de Educação Física; (3) exposição brevíssima do vínculo entre período crítico e

prontidão motora; (4) apresentação dos estudos empíricos disponíveis na literatura.

PRONTIDÃO: CONCEÇÕES E CARACTERÍSTICAS

A prontidão, do inglês readiness, é um conceito plural com aplicabilidade em diversas ati-

vidades humanas. Contextualmente referenciada, é frequentemente utilizada por especia-

listas do desenvolvimento humano para indicar quando um indivíduo chegou a determinado

ponto no seu processo de desenvolvimento que lhe permite realizar um conjunto variado

de tarefas para as quais evidencia indicadores que pressagiam sucesso. Por exemplo, es-

tar pronto para iniciar a leitura, estar pronto para iniciar a escrita, estar pronto para lançar

uma bola com precisão, estar pronto para agir em situações de emergência.

Em contexto escolar, pensa-se ter sido Brenner (5) quem propôs o conceito de pronti-

dão, tendo procurado também esclarecer a sua natureza e significado. Para Brenner, a

prontidão é caracterizada pelos níveis de desenvolvimento individual e pelas exigências

das tarefas para as quais o organismo está pronto num determinado momento, sendo a

prontidão para a escola uma relação funcional entre o desenvolvimento individual – físi-

co, intelectual, emocional, social, cultural e económico – e as exigências das tarefas de

aprendizagem. Prontidão para responder com sucesso às exigências das aprendizagens

escolares é o resultado da interação constante entre a personalidade da criança (expressa

de modo multifacetado pelos domínios físico, mental, emocional e social) e a sua família,

bairro, igreja, professor, colegas e escola (5).

Na literatura sobre educação e desenvolvimento infantil, o conceito de prontidão escolar

tem sido abordado e analisado à luz de diferentes pressupostos teóricos. Por exemplo,

High (10) e Meisels (23) referem os pontos de vista de quatro importantes conceções:

a) Na conceção “idealista/ nativista”, a prontidão é vista como um fenómeno endógeno, que

vem de dentro da criança, em que o meio ambiente tem pouco ou nenhum impacto. Todas as

crianças se desenvolvem através de estágios previsíveis e universais, seguindo as mesmas

etapas, e a diferença entre elas é definida por variações de distinta ordem e grandeza no seu

património genético. Esta abordagem, determinista, sugere que as crianças estão prontas

para a escola quando atingem um nível de maturidade que lhes permite ter autocontrole,

estabelecer relações entre colegas e demonstrar capacidade de seguir instruções;

b) Na conceção “empirista/ ambientalista”, a prontidão é determinada pelo que as crian-

ças sabem e como se comportam. Ela é entendida como o resultado direto do que foi en-

sinado à criança e verifica-se nas evidências externas da sua aprendizagem (como por

exemplo, saber cores, formas, letras do alfabeto, contar, escrever o seu nome);

c) Na conceção “social/ construtivista”, é rejeitada a ideia de que a prontidão é um pro-

cesso endógeno (visão idealista) ou algo externo à criança (visão empirista). A prontidão

é vista em termos sociais e culturais, pelo que a comunidade e o meio ambiente em que a

criança vive - seus valores e expetativas - precisam ser considerados. O foco desta abor-

dagem é a comunidade e o meio ambiente, e não a criança. A prontidão pode variar de uma

comunidade para outra, fornecendo uma reduzida ou nula orientação sobre como resolver

as diferenças encontradas entre as comunidades, escolas ou salas de aula;

d) Na conceção “interacionista/ relacional”, a prontidão é entendida como um processo

de relação e interação entre a criança e o meio ambiente. O foco desta abordagem está na

criança, no ambiente e na interação constante entre ambos. Esta conceção sugere que o

sucesso educativo depende da relação recíproca entre a escola e a criança, particularmen-

te da orientação do professor.

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105 — RPCD 15 (1)

05Das quatro conceções apresentadas sobre prontidão escolar, a interacionista é a mais

abrangente. Nela, a prontidão não é vista como um fenómeno exclusivamente interno ou

externo à criança; ela é bi-direcional, ou seja, uma construção relacional e de interação que

se concentra tanto nas habilidades das crianças como nas condições do meio ambiente

em que as crianças crescem, vivem e são ensinadas. A prontidão é um fenómeno que se

concentra na aprendizagem das crianças e, portanto, dependente da capacidade das esco-

las de atender às necessidades individuais de seus alunos (23). Nesse sentido, a prontidão

escolar inclui a prontidão da criança, em particular, mas também a “prontidão” da escola

para apoiar o seu desenvolvimento (10).

Vários autores (5, 6, 9, 11, 12, 19, 20, 23, 28) apontam importantes características da prontidão e

sugerem que ela é individualizada, dinâmica, específica, temporária e permanente.

A prontidão é individualizada e única para cada criança, visto que as histórias de vida

diferem de criança para criança. Prontidão é o ponto da história de vida de uma criança

em que os elementos críticos ou antecedentes necessários para adquirir conhecimentos,

habilidades ou comportamentos estão presentes (9). Sendo a prontidão o produto da intera-

ção entre as experiências anteriores, a herança genética, o estado de maturação, e toda a

gama de experiências ambientais e culturais que as crianças encontram (23), as diferenças

interindividuais também ficam a dever para estes fatores. Crianças diferentes atingem es-

tados de prontidão de forma diferenciada e em momentos distintos (6). Crescimento físico,

maturação biológica e desenvolvimento ocorrem simultaneamente, interagem e mostram

uma considerável variabilidade interindividual (19), sendo as diferenças interindividuais a

norma, e não a exceção, nesses processos de mudança (11).

A prontidão é dinâmica porque ocorrem estados de transição e mudança nos fatores que

a influenciam. O nível de prontidão modifica-se com o crescimento físico, a maturação bio-

lógica, o desenvolvimento do indivíduo e com a sua adaptação às exigências das tarefas (11).

A prontidão é processo e ao mesmo tempo resultado desse processo; é parte e resultado

de um contínuo processo de desenvolvimento em que crescimento físico, desenvolvimento

e aprendizagem ocorrem mediante constante interação entre o indivíduo e o ambiente (6).

A prontidão é específica porque cada atividade ou tarefa coloca exigências diferenciadas.

No caso das atividades desportivas, a avaliação da prontidão deve ser feita com base nas

tarefas motoras relevantes e nas exigências de envolvimento que lhes são próprias (11, 28).

A prontidão é temporária quando se pensa na aprendizagem de uma tarefa específica, devi-

damente contextualizada num momento particular da história de vida de um indivíduo (11).

A prontidão é permanente quando se considera a continuidade dos desafios da criança

ao longo da sua vida escolar ou, no caso do desporto, as tarefas inerentes à sua carreira

desportiva que demandam aptidões, competências e saberes renovados (5, 11).

A prontidão refere-se à habilidade do indivíduo para realizar com sucesso as exigências de

uma tarefa ou situação de aprendizagem. O sucesso ocorre quando existe uma relação de

equilíbrio entre as competências/ aptidões dos indivíduos e as exigências das tarefas (6, 19) e

também quando o nível de competência é proporcional ao nível de exigência das tarefas (20).

Segundo Anderson, Magill e Thouvarecq (1), o conceito de prontidão é baseado numa premissa

simples: a aprendizagem e o desenvolvimento são processos construtivos e faseados, carac-

terizados pela integração e pela coordenação hierárquicas de sub-competências e processos

constituintes. Prontidão para aprender implica, deste modo, que a criança tenha adquirido os

pré-requisitos das habilidades mais simples para poder adquirir habilidades mais complexas.

PRONTIDÃO MOTORA E O PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM NA ESCOLA

Na literatura da Educação Física e das Ciências do Desporto, o conceito de prontidão foi

amplamente discutido por Magill (13), Malina (16) e Seefeldt (28). Estes autores tiveram o condão

de adaptar o conceito de prontidão escolar proposto por Brenner (5) para outro universo – o

desporto. O conceito de prontidão desportivo-motora é apresentado de um modo funcional,

pois estabelece e destaca a relação entre as competências/ aptidões do indivíduo e as exi-

gências de uma tarefa ou atividade específica (20). Para Malina (20), a competência é vista como

uma matriz biossocial onde as características de crescimento físico, a maturação biológica e

o desenvolvimento da criança se inter-relacionam e interagem de modo sistémico.

Sendo a prontidão uma relação funcional indivíduo-tarefa é importante ter em conta,

para além das características do indivíduo, as exigências das tarefas. Maia e Vicente (15)

referem que as exigências da prática desportivo-motora são complexas e de estrutura

multifatorial – na qual interagem componentes físicas, motoras, perceptivas, sociais, emo-

cionais e intelectuais. Estes autores realçam a importância de ajustar as exigências das

tarefas às capacidades evidenciadas pelas crianças e jovens. Tarefas cujas exigências

ultrapassem em muito o nível de competência das crianças provocam efeitos nefastos,

criando sentimentos negativos de competência pessoal, autoestima e autoconfiança. Ao

contrário, tarefas cujas exigências estão muito aquém das capacidades resultam em pou-

ca motivação e perda de interesse. Tarefas cujas exigências sejam ajustadas ao nível de

competência das crianças promovem o sucesso.

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05Relativamente às exigências de uma tarefa ou atividade específica, importa ainda ter em

conta que a EF na escola tem fins e propósitos diferentes dos do desporto de alto rendimento.

Para Tani e Manoel (31), no desporto de alto rendimento o objetivo é a busca da excelência

e da superação dos limites humanos e, nesse caso, o indivíduo necessita de se adaptar ao

caráter implícito da excelência na tarefa. Na EF o objetivo é utilizar o desporto para fins de

desenvolvimento humano e pessoal e, nesse caso, a tarefa deve ser adaptada ao indivíduo.

Ainda segundo estes autores, a EF é inclusiva, ocupando-se da grande população, quer sejam

sujeitos gordos ou magros, baixos ou altos, fortes ou fracos, habilidosos ou desajeitados.

Para melhor entender a relação entre aprendizagem e desenvolvimento torna-se necessário

ter em conta as mudanças que ocorrem no comportamento motor à medida que a idade avança.

Muito genericamente, o desenvolvimento motor é o processo através do qual uma crian-

ça adquire padrões de movimentos e habilidades. É um processo contínuo de modificação

e que envolve a interação de vários fatores: a maturação biológica, o crescimento físico, as

características comportamentais da criança, o ambiente físico e sociocultural dentro do

qual a criança se desenvolve, os efeitos residuais de experiências de movimento anteriores,

as novas experiências de movimento (18).

O desenvolvimento motor é um processo contínuo (em constante mudança), progressivo

(as mudanças não são apenas contínuas, mas organizadas de forma progressiva) ordenado

e sequencial (a ordem e coerência no conjunto de mudanças são ordenadas numa sequên-

cia), onde a sequência dificilmente se altera, mas a velocidade de desenvolvimento difere

de indivíduo para indivíduo (22, 32). A sequência de desenvolvimento das habilidades motoras

é variável na sua progressão, mas invariável na sua ordem (22). Tani et al. (32) consideram que

embora existam diferenças interindividuais na velocidade em que as várias etapas do desen-

volvimento são vencidas, fruto de características intrínsecas e condições ambientais, há uma

progressão normal que se observa na maioria das crianças ditas normais.

Segundo Gallahue (8) e Tani et al. (32), a sequência de desenvolvimento das habilidades mo-

toras da criança caracteriza-se pelas seguintes fases: até aos 6 ou 7 anos de idade, pela

aquisição, estabilização e diversificação de habilidades básicas ou padrões fundamentais de

movimento; até aproximadamente aos 10 ou 12 anos de idade, pelo refinamento e pela di-

versificação na combinação das habilidades básicas em padrões sequenciais de movimento

cada vez mais complexos; após os 10 a 12 anos de idade, pela aquisição de habilidades espe-

cíficas, nas quais se incluem as variadas habilidades próprias do desporto.

De acordo com Manoel (22), na sequência de desenvolvimento devem ser considerados

três aspetos: a sequência é a mesma para todas as crianças, apenas a velocidade de pro-

gressão varia; existe uma interdependência entre as mudanças, ou seja, as habilidades

básicas são essenciais para que toda aquisição posterior de habilidades específicas seja

possível e mais efetiva; a existência de uma sequência indica, não apenas a ordem daquilo

que a criança pode aprender, mas, principalmente, as suas necessidades.

Durante a adolescência as diferenças interindividuais do desempenho motor estão rela-

cionadas com a maturação biológica (2, 24, 33). Os momentos em que ocorrem os parâmetros

fundamentais do salto pubertário variam de indivíduo para indivíduo, acontecendo em di-

ferentes momentos (timing) e com diferentes ritmos (tempo). Timing e tempo, caracte-

rísticas individuais e únicas para cada criança, são independentes da idade cronológica.

Crianças do mesmo sexo e idade cronológica apresentam variações na idade biológica,

estatutos maturacionais diferenciados e variabilidade interindividual nos níveis de PM. Na

Educação Física e Ciências do Desporto a avaliação da maturação biológica tem sido uma

prática variada, sendo os sistemas de maturação esquelética, sexual e somática os mais

utilizados. É reconhecidamente aceite que a maturação esquelética é o melhor sistema

para avaliar a idade biológica e maturidade de uma criança ou jovem. No entanto, na ope-

racionalização da avaliação da maturação biológica, vários autores sugerem a utilização

de instrumentos de avaliação, não invasivos, eficientes e de fácil aplicação, associados à

maturação somática (2, 21, 24, 33).

O indicador somático mais comummente utilizado em estudos de crescimento longitu-

dinais em adolescentes é a idade em que ocorre o pico de velocidade da altura (PVA) – em

média por volta dos 12 anos nas meninas e 14 anos nos meninos (2, 3, 21). Segundo Beunen,

Rogol e Malina (3), a idade média do PVA em adolescentes europeus situa-se no intervalo

dos 11.4 aos 12.2 anos nas meninas e dos 13.8 aos 14.4 anos nos meninos. Os estudos

longitudinais com adolescentes que relacionam o desempenho motor com o PVA são re-

duzidos. Dos quatro estudos empíricos a que se teve acesso, três foram conduzidos em

adolescentes do sexo masculino (2, 7, 24) e apenas um em adolescentes de ambos os sexos (33).

O desempenho motor foi determinado com base nos resultados observados em diferentes

testes de aptidão física. Os resultados observados nas diferentes variáveis do desempenho

motor alinhadas pela idade em que ocorreu o PVA encontram-se resumidos no quadro 1.

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05QUADRO 1 - Timing e pico de velocidade no desempenho dos testes motores alinhados pelo PVA.

COMPONENTES DA APTIDÃO

TESTES MOTORES

TIMINGPICO DE VELOCIDADE

(UNIDADES/ANO)

Força explosiva

Salto horizontal

[1] a) Durante o ano do PVA a) 15 cm/ano

[3]a) Durante o ano a seguir ao PVA, com patamar (PVA/+12 meses)

b) 4 meses depois do PVA

a) 21-22 cm/ano

b) 12 cm/ano

[4]a) No momento do PVA, com patamar

(PVA +12 meses)a) 10.5 cm/ano

Salto vertical

[2] 6 meses depois do PVA a) 4.8 cm/ano

[4] a) No momento do PVA a) 5.1 cm/ano

Força do tronco

Sit-up´s (60’’)

[1] a) 12 meses antes do PVA a) 2.8 sit-ups/ano

Sit-up´s (30’’)

[3]a) 16 meses antes do PVAb) 8 meses antes do PVA

a) 5.4 sit-ups/anob) 5.8 sit-ups/ano

[4] a) No momento do PVA a) 2.7 sit-ups/ano

Leg-lifts 20’’ [2]a) No momento do PVA sem

evidências de um surtoa) 0-1 elevação/ano

Força funcional

Tempo de suspensão na barra

[1] a) Antes do PVA, sem padrão claro

[2]a) No momento do PVA, com patamar

(PVA +12 meses)a) 4.9 seg/ano

[4]a) No momento do PVA, com patamar

(PVA +6 meses)a) 7.6 seg/ano

Força estática

Tração manual

[2] a) 6 meses depois do PVA a) 12.1 kg/ano

Flexibilidade

Sentar e alcançar

[2] a) 6 meses antes do PVA? a) 1.8 cm/ano

[4] a) 12 meses depois do PVA a) 2.7 cm/ano

Flexão máximado tronco

[3]a) 8 meses depois do PVAb) 8 meses depois do PVA

a) 3.2 cm/ano b) 2.6 cm/ano

Agilidade

10 x 5 m shuttle run

[2] a) 18 meses antes do PVA? a) 0,70 seg/ano

[4] a) No momento do PVA a) 1,6 seg/ano

4 x 6 m corrida vai-vem

[3]a) 8 meses antes do PVAb) 8 meses antes do PVA

a) 0.68 seg/anob) 0.56 seg/ano

Velocidade de deslocamento

40 metros [3]a) 16 meses antes do PVAb) 8 meses antes do PVA

a) 0.60 seg/anob) 0.48 seg/ano

30 metros [4]a) No momento do PVA, com patamar

(PVA +12 meses)a) 0.4 seg/ano

Resistência cardiorespiratória

6 minutos de corrida

[3]a) 8 meses depois do PVA

b) 4 a 8 meses antes do PVAa) 140 met/anoa) 120 met/ano

Corrida vai-e-vem de duração

[4] a) No momento do PVA a) 1.5 min/ano

[1] Ellis, Carron & Bailey (7); [2] Beunen et al. (2); [3] Yagüe & De La Fuente (33); [4] Philippaerts (24).a) Meninos; b) Meninas.

Embora nem sempre coincidentes (devido à utilização de diferentes metodologias, testes mo-

tores e características da amostra), os resultados observados nos diferentes estudos sugerem

uma alta associação entre a idade em que ocorreu o PVA e picos de desempenho motor. Sendo

as exigências da prática desportivo-motora complexas e de estrutura multifatorial, o estado de

prontidão motora não pode ser determinado exclusivamente com base nos indicadores da ma-

turação biológica. Contudo, estando a maturação relacionada com as diferenças interindividuais

nos níveis de PM, torna-se importante proceder à sua avaliação. A informação resultante desta

avaliação, acrescida de dados de outros indicadores (físicos, motores, afetivos, sociais), pode fa-

cultar informação relevante para basear a determinação dos níveis de PM das crianças e jovens.

Para Malina (17), uma das responsabilidades primordiais dos professores de EF é orientar

o processo de aprendizagem das habilidades motoras, pois o desenvolvimento de profici-

ência motora é acompanhado por uma melhoria dos níveis de desempenho. Com efeito, é

necessário ter em conta que a aptidão para aprender habilidades motoras é atribuída à

combinação entre a proficiência motora prévia e uma série de experiências apropriadas

(28), e que os níveis de proficiência motora mudam à medida que a criança se desenvolve (19).

Esta mudança é tanto mais interpretável se houver informação longitudinal sobre o desen-

volvimento de habilidades e aptidões, e os dados daí decorrentes forem alinhados por um

indicador maturacional – idade em que ocorre o pico de velocidade em altura.

PRONTIDÃO MOTORA E PERÍODOS CRÍTICOS

O conceito de prontidão está relacionado com o conceito de período crítico (11, 16, 19, 26, 27). O

conceito de prontidão é prevalecente na literatura vinculada à psicologia educacional e do

desenvolvimento e o conceito de período crítico é-o na literatura pertinente à neurociên-

cia do desenvolvimento (13). Segundo Scott (27), o conceito de período crítico baseia-se em

evidências empíricas de que um processo organizacional (por exemplo, diferentes tipos de

aprendizagem) é mais facilmente modificado no período de tempo em que ele ocorre com

maior rapidez, podendo essas modificações produzir efeitos favoráveis ou desfavoráveis.

Este conceito aplica-se às mudanças desenvolvidas na organização de qualquer sistema

vivo, e, como tal, também se aplica às mudanças associadas aos processos de cresci-

mento físico, maturação biológica e desenvolvimento. Ainda segundo o mesmo autor, o

momento de maior velocidade na organização de um processo particular não é apenas um

período crítico para decisões, mas também um período ótimo para produzir as mudanças

desejadas. A mudança não pode ser produzida antes de o processo organizacional ter sido

iniciado nem depois de este ter terminado. Para Bornstein (4), a sensibilidade a certos tipos

de experiência varia ao longo do ciclo de vida de um organismo e muitos exemplos surgi-

ram em diferentes sistemas estruturais ou funcionais; ademais, a presença ou ausência

de certas experiências em momentos particulares do ciclo de vida podem influenciar esse

sistema muito para além do tempo em que ocorre essa experiência.

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111 — RPCD 15 (1)

05O período crítico é um período de tempo durante o qual um indivíduo é mais susceptível a de-

terminada influência externa (11). O conceito de período crítico implica a presença de períodos

de tempo específicos (janelas temporais) durante os quais uma pessoa é mais sensível às in-

fluências, tanto positivas como negativas, do ambiente. Assume que as mudanças associadas

ao crescimento físico, maturação biológica e desenvolvimento ocorrem mais rapidamente du-

rante um período de tempo específico e que o processo organizacional pode ser mais facilmen-

te modificado nesse período. Assim, os períodos críticos, se puderem ser estabelecidos com

precisão, podem representar os momentos de maior prontidão (19). A determinação de um perí-

odo crítico é um processo complexo. Os períodos críticos são influenciados por vários fatores

e o peso de cada fator, por sua vez, varia de habilidade para habilidade no mesmo indivíduo e

de indivíduo para indivíduo (11). Sobre a identificação de um período crítico, Scott (26) conclui que,

para qualquer tipo de aprendizagem, o período crítico é o momento em que as capacidades

máximas - sensoriais, motoras, motivacionais e psicológicas – estão presentes pela primeira

vez. Assim, nenhum fator pode ser considerado como o primeiro determinante de um período

crítico. É a interação entre a maturação biológica, o ambiente e a aprendizagem que determina

o início de um período crítico (16). Magill (16) sugere que os períodos críticos sejam vistos como

períodos de prontidão ótima para a aprendizagem. Segundo este autor, a prontidão ótima para

a aprendizagem ocorre quando o nível maturacional do indivíduo, as experiências anteriores

e a motivação são apropriadas para a habilidade a ser aprendida. Assim sendo, não existe um

período crítico para a aprendizagem de uma habilidade; existem sim muitos períodos críticos

para a aprendizagem de diferentes habilidades. Apesar da relevância de se identificar os pe-

ríodos críticos, Lopes, Maia e Mota (11) verificaram que existe na literatura uma grande falta de

estudos de caráter empírico que investiguem a existência desses períodos tanto no quadro do

desenvolvimento de aptidões como no da aprendizagem de habilidades motoras.

ESTUDOS EMPÍRICOS DA PRONTIDÃO MOTORA

Sendo a EF uma disciplina orientada predominantemente para o desenvolvimento de aptidões

e habilidades motoras, podem ser colocadas algumas questões básicas quando se pretende,

neste contexto, identificar níveis de prontidão: como avaliar o estado de PM dos alunos? Que

aptidões ou habilidades enfatizar? Que indicadores selecionar? Que procedimentos utilizar?

Embora a literatura disponível não permita identificar, com facilidade, formas e proces-

sos conducentes à operacionalização da PM, sobretudo no domínio pedagógico, vários au-

tores (25, 29, 30) fazem alusão aos estudos de referência realizados em Portugal por Lopes (12)

e Maia e Lopes (14). Foi ainda identificado outro estudo realizado em Portugal por Sousa e

Maia (29). Estes estudos debruçam-se sobre a PM de crianças do 1º ciclo do ensino básico,

com idades compreendidas entre os 6 e os 10 anos. Os principais objetivos, caracteriza-

ção da amostra, testes motores aplicados e resultados mais relevantes destes estudos

encontram-se resumidos no quadro 2.

QUADRO 2 - Estudos empíricos da PM identificados na literatura portuguesa.

AUTOR OBJETIVOS AMOSTRA TESTES MOTORES PRINCIPAIS RESULTADOS

Lope

s12

Analisar mudanças na aptidão física, coordenação motora e habilidades motoras de crianças sujeitas a diferentes programas e a diferentes frequências semanais de aulas de EF.

100 crianças, de 9 anos de idade

Aptidão física Bateria da AAHPERD Physical Best

Coordenação motoraBateria KTK (Körperkoordination Test für Kinder)

– Níveis de expressão da aptidão física, da coordenação motora e das habilidades motoras mais elevados nas crianças sujeitas a aulas de EF do que no grupo controle.

– Crianças sujeitas ao programa alternativo com ganhos superiores às crianças sujeitas ao programa oficial.

– Crianças com 3 aulas semanais melhoraram mais o seu desempenho do que as crianças com 2 aulas semanais.

– Resultados da mudança diferencial não mostraram efeitos significativos nos níveis de aptidão física, das habilidades do atletismo e da corrida vaivém em qualquer dos grupos extremos.

– Mudança significativa nos níveis de habilidades do andebol, do futebol e no lançamento em precisão em apenas alguns dos grupos extremos.

– Melhoria significativa dos níveis de coordenação motora e das habilidades da ginástica de todos os grupos extremos.

Mai

a e

Lope

s14

Identificar perfis multidimensionais da aptidão física e coordenação motora, de forma a perceberse os níveis de PM eram identificados pelos professores e ligados intimamente a toda a estrutura do planejamento e implementação das aulas de EF.

3744 crianças, dos dois sexos, dos 6 aos 10 anos

Aptidão físicaBateria Fitnessgram

Coordenação motoraBateria KTK

– Diferenças interindividuais na PM de crianças da mesma idade cronológica.

– Presença de crianças cujo perfil corresponde ao de colegas de idade mais baixa, e não ao esperado para a sua idade.

Sous

a e

Mai

a29 Identificar a PM

das crianças, a partir da inspeção do perfil multidimensional de aptidão física, e associá-la a questões de natureza pedagógica.

2534 crianças, dos dois sexos, dos 6 aos 9 anos

Aptidão física Bateria Prudencial Fitnessgram

– Não foi possível identificar com clareza níveis de PM que caracterizassem cada ano de escolaridade.

– Forte variabilidade interindividual e discrepância na PM das crianças em cada ano de escolaridade.

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113 — RPCD 15 (1)

Os estudos apresentados centram a sua atenção na construção de perfis multidimen-

sionais da aptidão física e da coordenação motora grossa. Os resultados remetem para a

necessidade de uma análise atenta por parte dos professores de EF e para a necessidade

de diagnosticar o estado de prontidão desportivo-motora de cada criança, de forma que

a estrutura didático-metodológica das aulas contemple, em cada ano de escolaridade, a

forte heterogeneidade patente dos níveis de desenvolvimento motor e aptidão física das

crianças e produza o efeito desejado (14). A variabilidade interindividual e discrepância na

PM das crianças em cada ano de escolaridade encontra alguma explicação na heteroge-

neidade etária existente. A variação da idade, em crianças do mesmo ano de escolaridade,

pode conduzir a problemas de identificação adequada do nível de prontidão de cada crian-

ça, o que coloca grandes desafios de planeamento e condução das aulas (25).

CONCLUSÕES

Face à vastidão com que esta temática pode ser abordada, o principal propósito deste trabalho foi

abordar o conceito de prontidão enquadrando-o no processo de ensino-aprendizagem na escola,

centrando a apresentação nos fatores que a influenciam, em particular na sua relação com a

atividade física, a aptidão física, a coordenação motora grossa e o desenvolvimento motor.

Apresentada como uma relação funcional indivíduo-tarefa, a prontidão resulta de um pro-

cesso de interação constante de vários fatores – crescimento físico, maturação biológica,

características comportamentais, experiências anteriores, nível de mestria das habilidades

motoras, aptidões, ambientes físico e sociocultural nos quais a criança se desenvolve.

Multidimensional e complexa, a prontidão não pode ser analisada sob a perspectiva

isolada de apenas um dos fatores que a influenciam. A sua determinação deve aparecer

associada a um conjunto variado de indicadores que, quando analisados conjuntamente,

permitam a definição de um perfil multidimensional do estado de PM de cada criança.

Conhecer os níveis de prontidão dos alunos permite ao professor criar e implementar

propostas didático-metodológicas mais adequadas às características dos alunos, em ge-

ral, e a cada aluno, em particular. Embora na literatura da Educação Física e Ciências do

Desporto não se encontrem ainda métodos objetivos que ajudem os professores a diag-

nosticar a PM dos seus alunos, foram sugeridas por alguns autores propostas de enorme

utilidade para os professores sobre procedimentos a adotar.

05REFERÊNCIAS

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06Contributos para uma cultura

da nutrição humana

PALAVRAS-CHAVE:

Nutrição. Equilíbrio. Ecologia. Bom senso.

RESUMO

A nutrição humana está impregnada por uma série de erros, omissões e preconceitos. Na

atualidade, salienta-se o fundamentalismo nutricional da Organização Mundial de Saúde

que condenou, de forma radical, o consumo de carnes vermelhas e carnes processadas.

São os excessos nutricionais que são deletérios para a saúde humana e não qualquer ali-

mento de per si. Qualquer fundamentalismo nutricional deve ser combatido com as armas

da inteligência e bom senso. Não existem alimentos salvíficos tal como não existem ali-

mentos malditos. Existe uma dieta equilibrada, desenvolvida no decurso da antropogénese

e que acompanhou o desenvolvimento da espécie humana quer na sua fase biológica quer

na fase sócio histórica. A nutrição humana tem muito de ecológico e, o que é verdade para

um dado grupo populacional, pode não ser verdade para outro. Por isso, a abordagem da

nutrição humana não pode perder de vista o tempo e o lugar da sua implantação.

AUTOR:

José Augusto Santos 1

1 CIFI2D, Faculdade de DesportoUniversidade do Porto, Portugal

Correspondência: José Augusto Rodrigues dos Santos. CIFI2D, Faculdade de Desporto. Universidade do Porto. Rua

Dr. Plácido Costa, 91. 4200-450, Porto, Portugal. ([email protected]).

SUBMISSÃO: 8 de Março de 2015ACEITAÇÃO: 30 de Abril de 2015

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06

117 — RPCD 15 (1)

Contributions to a culture of human nutrition

ABSTRACT

The human nutrition is impregnated by a series of errors, omissions, and

prejudices. Currently, it is pointed out the nutritional fundamentalism of

the World Health Organization which condemned, in a radical way, the

consumption of red meat and processed meats. Only the nutritional ex-

cesses that are harmful to human health and no food per se. Any nutritio-

nal fundamentalism should be fought with the weapons of intelligence

and common sense. There are no saving food as there are no damn food.

There is a balanced diet, developed in the course of Anthropogenesis and

followed the development of the human species or in its biological stage

and in its socio-historical stage. Human nutrition has something of eco-

logy and what is true for a given population group, may not be true for

another. Therefore, the approach of human nutrition cannot lose sight of

the time and place of their deployment.

KEYWORDS:

Nutrition. Balance. Ecology. Commom sense.

INTRODUÇÃO

A sobrevivência do Homo sapiens durante a evolução estava dependente da procura de

alimento o que determinava o grau de actividade física para o obter.

Os nossos ancestrais recolectores-caçadores tinham ciclos de fartura e de fome a que corres-

pondiam períodos de descanso e actividade física. Muito próximos de outros animais predadores,

os nossos ancestrais moviam-se para conseguir o alimento e descansavam quando o obtinham.

Para assegurar a sobrevivência nos períodos de fome, certos genes evoluíram para regu-

lar de forma eficiente a formação e utilização das reservas de energia. Quer isto significar

que os ciclos de descanso e actividade influenciaram a selecção genética. A capacidade

humana de armazenamento de energia provém do desenvolvimento de genes que foram

seleccionados no decurso da antropogénese. Esses genes denominados, em 1962, genes

da “economia” ou “frugalidade” (thrifty genes) determinaram um genoma que permaneceu

inalterado nos últimos 10.000 anos.

Embora o aporte calórico do homem moderno seja provavelmente mais baixo que o do

seu antecessor caçador-recolector, contribui para um balanço energético positivo na maio-

ria das sociedades ocidentais devido à hipocinesia que as caracteriza. Falta-nos movimen-

to para nos assemelharmos aos nossos predecessores e falta-nos também uma lógica

alimentar mais natural e fisiológica e nutricionalmente mais equilibrada.

A combinação da abundância alimentar continuada com a inatividade física elimina os ciclos

metabólicos e bioquímicos programados durante a evolução e provenientes dos ciclos fome-

-fartura e descanso-atividade, podendo eventualmente resultar em desarranjos metabólicos

que conduzem ao excesso ponderal e à obesidade que está por detrás de uma série de pato-

logias entre as quais se salientam as doenças do foro cárdiocirculatório e a diabetes Tipo 2.

Os desequilíbrios nutricionais são, nas sociedades ocidentais hodiernas, determinados

fundamentalmente pelo excesso de alimentos de grande densidade calórica e reduzida den-

sidade nutricional que redundam em balanços energéticos positivos. Quando se come mais

do que se gasta tende-se a armazenar o excesso calórico sob a forma de gordura corporal.

Em sociedades em vias de desenvolvimento, a privação crónica de alguns nutrientes pode

conduzir a populações subalimentadas que podem desenvolver várias doenças carenciais.

O défice persistente de um dado nutriente conduz a uma dada doença carencial. Exemplos:

Vitamina A (Xeroftalmia); Vitamina B1 (Beribéri); Vitamina C (Escorbuto); Iodo (Bócio), etc.

Normalmente, a administração do nutriente em défice cura a doença não evitando, por vezes,

sequelas irreversíveis como no caso do escorbuto que pode destruir irremediavelmente a dentição.

Défices nutricionais mais discretos e insuficientes para provocarem doenças carenciais

podem, quando suficientemente prolongados e importantes, provocar desequilíbrios orgâ-

nicos e constituir-se como fatores de risco para:

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061. Alterações de grandes funções orgânicas. Produção aumentada e menor neutralização de radi-

cais livres; alteração da estrutura do ADN, de sistemas enzimáticos, de proteínas, de material de

membrana, etc.

2. Alterações de importantes mecanismos vitais. Imunodeficiência, hipercoagulabilidade sanguínea,

envelhecimento senil, etc.

3. Doenças crónicas degenerativas. Cancro, doenças trombo-embólicas, doença articular crónica, etc.

No campo do desporto, em certas situações específicas, podem ser desenvolvidos défices

de alguns nutrientes, pelo que ganha importância acrescida o controlo nutricional dos atletas.

Principalmente atletas que têm definidas as suas categorias competitivas a partir do

peso corporal e mulheres desportistas competindo em desportos de "endurance" e em

desportos que têm na silhueta corporal um item de avaliação, podem desenvolver défices

nutricionais que lhes podem afetar a performance e ultimamente a saúde.

NUTRIÇÃO COMO ACTO

DE CULTURA E SOCIALIZAÇÃO

A nossa história individual está marcada pelos rituais de desenvolvimento e socialização

da infância e juventude que perduram no tempo. Normalmente, esses tempos genésicos

são o esteio estruturante da nossa personalidade.

Entre as liturgias da socialização uma das mais importantes é sem dúvida a da alimen-

tação. Os odores e sabores das comidas da mãe permanecem por vezes indeléveis e como

factor de contraste com outros sabores conhecidos mais tarde. As memórias de infância

relevam, também, dos rituais de alimentação com forte expressão no imprinting individual,

considerado este como a marca indelével que o ser sofre nos primeiros anos de vida e que

permanece como pano de fundo de toda a sua evolução ulterior.

No plano nutricional também o imprinting pode permanecer patente em muitos compor-

tamentos. Tomemos como referência o pensador Edgar Morin, que, à pergunta “Que me

ensinou a minha família”, responde:

Ensinou-me o Mediterrâneo, o gosto pelo azeite de oliveira, pela beringela, pelo arroz com feijão branco, pelas almôndegas de carneiro aromatizadas, pelos salmonetes, pelos folhados de queijo ou de espinafres. Todas estas substâncias e ingredientes incorporados pelos meus antepassados em Espanha, na Toscânia, em Salónica, tornaram-se os meus alimentos matriciais em Paris, onde nasci e cresci (8).

Em consonância com as palavras de Morin, cada um de nós pode, em recorrência apelativa

à memória da juventude, encontrar os sabores especiais (porque nossos) dos alimentos

matriciais que nos marcaram. O sabor, o cheiro, a textura e a imagem dos alimentos ge-

nésicos, têm um papel essencial na espiritualização do acto de comer, que de simples ato

biológico de subsistência, se transforma num ato humanizado de cultura.

O carácter convivial do acto de comer foi-se perdendo na turbulência das sociedades ho-

diernas o que pode ter contribuído também para a degenerescência alimentar e nutricional

que caracteriza as sociedades contemporâneas.

Parece que o Mediterrâneo é um território de excelência para uma boa alimentação e nutri-

ção equilibrada. Para já, importa diferenciar Alimentação e Nutrição. Embora estejam mutua-

mente implicadas, a alimentação é mais um processo externo e a nutrição interno. A alimenta-

ção corresponde à escolha, preparação, cocção e digestão dos alimentos, enquanto a nutrição

diz mais respeito aos processos de absorção e utilização endógena dos diversos nutrimentos.

Mas voltando ao Mediterrâneo. Friedrich Nietzsche, filósofo da cultura que preconizava

o super-homem, aponta o Mediterrâneo como espaço de eleição para uma nutrição equili-

brada, fisiologicamente saudável. “Paris, Provença, Florença, Jerusalém, Atenas – o génio

tem por condição a atmosfera seca, o céu puro, ou seja um rápido metabolismo, a possibi-

lidade de renovar sempre e dispor sempre de grande quantidade de energia” (10).

Ao elogio da dieta mediterrânea, contrapunha Nietzsche a crítica às dietas inglesa e

alemã. Ouçamo-lo:

Por seu lado, a dieta inglesa, que em comparação com a alemã, e mesmo com a francesa, é uma espécie de “regresso à natureza”, ou seja, ao canibalismo, resulta profundamente contrária aos meus instintos; parece que dá ao espírito pés pesados – pés de mulheres inglesas … A melhor cozinha é a de Piemonte (10).

E como alemão que era, o seu grau de indulgência em relação aos hábitos nutricionais dos

compatriotas era nulo, evidenciando uma capacidade crítica exacerbada:

Arruinar o estômago e alimentar-se ao mesmo tempo de forma deficiente…Quantas coi-sas, por tal estilo, não tem, entretanto, na consciência a cozinha alemã em geral. A sopa antes da refeição (ainda nos livros venezianos do século XVI se designa isso “à maneira alemã”); a carne muito cozida; a hortaliça grossa e suculenta; a degenerescência dos bolos até fazer deles pesa-papéis. Se além disso, tivermos em conta a necessidade, ver-dadeiramente animal, de beber depois da comida, necessidade que sentem os velhos ale-mães, e não só os velhos, compreender-se-á melhor a origem do espírito alemão – que provém de desarranjos intestinais… O espírito alemão é uma indigestão; nada digno dá de si. Um desarranjo intestinal, por pequeno que seja, se toma carácter crónico, basta só por si para fazer de um génio um alemão (10).

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06HISTÓRIA DA NUTRIÇÃO

NO DESPORTO

Embora os cuidados nutricionais relacionados com o exercício e desporto tenham origem

anterior, é na Grécia Antiga que se vê a nutrição como elemento de suporte importante

para a prática desportiva.

De acordo com Gardiner (5), a dieta dos antigos atletas era, como para a maioria dos Gre-

gos rurais, fundamentalmente vegetariana, à base de figos, queijo fresco, papas de aveia,

bolos de farinha com a ingestão ocasional de carne como tempero, e vinho. A afirmação

sobejamente repetida de que a dieta dos atletas era regida pela lei dos Jogos, e que lhe es-

tava vedada a ingestão de vinho, não tem fundamento. No entanto, pouco tempo depois das

guerras Pérsicas, a dieta alterou-se, tendo sido introduzida a carne por alguns treinadores.

A ingestão de carne tinha como objectivo aumentar o volume muscular e a força, princi-

palmente para os desportos que na época não tinham restrições de peso – boxe e luta. O

treino intensivo dos lutadores obrigava a cuidados nutricionais que não eram conseguidos

com uma dieta vegetariana. Tal como actualmente, ser atleta era uma ocupação exclusiva,

que obrigava a regimes duros de treino, alimentação e repouso.

Eram importantes os cuidados que os treinadores na Antiguidade tinham com o excesso

de peso dos atletas. Quando não estavam a treinar, os atletas comiam com frugalidade

como os outros cidadãos, o que nos permite ver aqui uma metodologia de treino correta

com o aporte nutricional a respeitar os ciclos de trabalho-descanso dos atletas.

A importância social da prática desportiva levava a que mesmo os filósofos se interes-

sassem por todos os aspectos relacionados com o desporto.

No plano nutricional, Pitágoras, enunciava as vantagens de uma alimentação quase ve-

getariana, recomendando para os atletas uma dieta à base de frutos e legumes, sobretudo

couves, não autorizando, senão excepcionalmente, os ovos, leite, carne e peixe.

No entanto, Hipócrates, médico da ilha de Cós, nascido em 460 a.C., demonstrando uma

superior capacidade científica e reflexiva, preconizava a necessidade de variar a alimenta-

ção quer em quantidade quer em qualidade. O patrono da medicina europeia alertava para

os riscos de regimes nutricionais muito rígidos bem como para os perigos das alterações

bruscas dos hábitos alimentares; defendia a moderação nas refeições, as necessidades de

adaptar a alimentação às modificações das estações, e, avançado no tempo, preconizava a

utilização da dieta hídrica em períodos de fadiga.

A variabilidade dos conceitos nutricionais acompanhou a par e passo a própria história

dos Jogos Olímpicos da Antiguidade. Assim, em 708 a.C. Lampis de Lacónia, 1º vencedor

do Pentatlo, elaborou uma dieta de treino fundamentalmente vegetariana, à base de cere-

ais, biscoitos de trigo, queijos, figos secos, mel e frutos em natureza.

Nos J.O. de 668 a.C., Charmis de Esparta ganhou a corrida de Estádio, depois de haver

seguido um regime dietético à base de figos secos, cujas propriedades energéticas eram

conhecidas dos antigos.

Eurymenes de Samos, lutador de Pancrácio (J.O. 532 a.C.), foi aconselhado por Pitágoras

a mudar a sua alimentação à base de figos, prática geral entre atletas, pela carne que, a

partir de verificações empíricas, parecia melhor adaptada aos desportos de força e potência.

A nutrição dos desportistas, em virtude do reduzido grau de desenvolvimento científico

da época, estava marcada por vários preconceitos que hoje nos fazem rir mas que eram

uma tentativa de adequação da dieta a cada modalidade desportiva. Assim era aconselha-

da a ingestão de carne de boi para os desportos de força, de cabra para os saltadores e de

cavalo para os velocistas. Esta diferenciação, sabemos hoje, não tem respaldo científico

mas era, para a época, uma tentativa curiosa de assimilação das qualidades físicas dos

animais que faziam parte da dieta dos atletas.

DIETA MEDITERRÂNEA

A bacia do mediterrâneo desenvolveu uma dieta específica que nos influenciou de forma

marcante. Embora nos nossos hábitos nutricionais convivam as influências continentais

atlânticas e as mediterrânicas, estas marcaram de forma indelével a nossa forma de co-

mer. Quais as características da dieta mediterrânea?

– Distribuição da comida por cerca de 5 refeições. Pequeno-almoço substancial

– Refeição congregadora. Conjunto de alimentos diferentes em pequenas porções

– Consumo elevado de cerealíferas e leguminosas secas

– Profusão de hortofrutícolas da época em natureza; alho e cebola todo o ano

– Petiscar todo o ano frutas passas; figos, uvas, alperces, ameixas, etc. e azeitonas

– Utilização predominante de azeite como gordura de adição; em algumas sub-regiões utilização

de banha de porco (ambas ricas em ácidos gordos monosaturados)

– Consumo moderado de lacticínios

– Pequenas porções de peixe seco ou fresco em detrimento das carnes; nas carnes opta-se pelas aves

e pequenos animais de terreiro e pasto

– Vinho tinto, chá e infusões de ervas

– Culinária simples e rápida

– Boa distinção entre festim e dias normais.

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06Hoje em dia, com a introdução da fast food na dieta portuguesa, os hábitos ancestrais

vão-se perdendo, o que tem contribuído para o aumento de morbilidade e mortalidade de

origem nutricional na população portuguesa.

A dieta mediterrânea está associada com a melhoria do controlo da glicemia e com a redu-

ção do risco de doença cardiovascular. A diversidade nutricional desta dieta aliada ao baixo

teor em gordura apresenta resultados muito positivos no tratamento da diabetes tipo 2. Es-

tudos epidemiológicos realizados nos Estados Unidos da América (16) comprovam que a dieta

é um fator mais relacionado com a doença que a inatividade física e elevado índice de massa

corporal. Afirmava o nutricionista Emílio Peres: “morre-se mais pelos excessos da boca que

pelos acidentes de viação”.

Dietas com baixo teor em frutas e vegetais estão, a nível mundial, em 3º lugar como fator

individual de risco de morte (3).

A dieta mediterrânea melhora o perfil lipidémico e reduz o risco de doença cardiovascu-

lar já que reduz a concentração plasmática de colesterol total e aumenta a taxa do coles-

terol acoplado às proteínas de elevada densidade (HDL).

O efeito protetor da dieta mediterrânea em relação a diversas patologias, nomeadamen-

te do foro cardiovascular e diabetes, deriva do seu conteúdo em agentes anti-inflamatórios

e antioxidantes. Esta dieta caracteriza-se pela elevada ingestão de nutrientes protetores

tais como as fibras dietéticas, vitaminas, minerais, bem como antioxidantes e polifenóis.

Acresce a reduzida ingestão de agentes pro-inflamatórios, como as gorduras saturadas

e as gorduras trans, açúcares refinados e amidos e em geral alimentos de elevado teor

calórico e de reduzido potencial nutricional.

O efeito protetor da dieta mediterrânea em relação a uma patologia largamente expan-

dida – diabetes tipo 2, é verificado numa meta-análise recente. Dois marcadores de in-

flamação, interleucina-6 e proteína C-reativa, estão significativamente associados com a

diabetes tipos 2. A dieta mediterrânea foi o primeiro padrão dietético associado com sig-

nificativas reduções de ambas as citoquinas pro-inflamatórias num ensaio clínico e poste-

riormente confirmado por uma meta-análise de 17 estudos com 2.300 pacientes (15).

DIETA ESQUIMÓ

A análise da alimentação humana permite verificar a sua diversidade. A alimentação, tal

como outros aspetos da atividade humana, tem fortes determinantes ecológicas. Por isso,

o que é verdade e plausível para um determinado grupo populacional pode ser desastroso

para outro. Uma alimentação adequada à vida nas florestas tropicais estará desajustada à

vida no ciclo glacial ártico.

Foi sugerido que a baixa taxa de doença cardíaca coronária entre os esquimós da Gronelân-

dia estava relacionada com o elevado consumo de peixe (cerca de 400 g por dia). De igual for-

ma, verificaram-se, no Japão, baixas taxas de morte por doença cardíaca coronária que esta-

vam relacionadas com um significativo consumo de peixe (100 g/ dia). Um estudo longitudinal

(20 anos) com a população holandesa verificou que a taxa de mortalidade por doença cardíaca

coronária era 50% menor na população que consumia pelo menos 30 g de peixe por dia (7).

Hoje em dia, não existem dúvidas que uma dieta rica em peixe, principalmente peixes

gordos, melhora o perfil lipidémico dos indivíduos e apresenta efeitos positivos na saúde

cardiovascular. Qual a razão que justifica o carácter protetor dos óleos de peixe? Principal-

mente o seu teor em ácidos gordos polinsaturados n-3, conhecidos vulgarmente como os

ácidos gordos ómega-3. Dois ácidos gordos, presentes em elevada quantidade nos peixes

gordos de águas frias, pertencentes à família n-3, apresentam elevado valor biológico: áci-

do eicosapentaenóico (EPA) e ácido docosahexaenóico (DHA). Estes nutrientes raramente

estão presentes em alimentos vegetais (exceção são as algas frescas). Atum, sardinha,

salmão, cavala, são boas fontes de EPA e DHA. O DHA está ainda presente no leite humano,

na mioleira, fígado e tecidos de outros órgãos animais. O DHA é fundamental para o de-

senvolvimento do cérebro e função cerebral enquanto o EPA é um importante precursor de

substâncias anti-inflamatórias e antioxidantes. Várias evidências sugerem o efeito protetor

dos ácidos gordos n-3 em relação a alguns tipos de cancro.

As características ecológicas do povo Inuit, nomeadamente o elevado teor em gordura

da dieta, determinaram traços genéticos metabólicos específicos. Atentemos nos vários

passos relacionados com o metabolismo das gorduras: (1) As reservas lipídicas do tecido

adiposo são libertadas pela lipólise durante o jejum e stresse (e.g., exercício) produzindo

ácidos gordos (AG) que circulam no sangue e são captados pelas células; (2) Oxidação dos

AG. A entrada dos AG na mitocôndria é controlada pela enzima carnitina-palmitoil-transfe-

rase-1 (CPT-1). Dentro da mitocôndria, os AG sofrem beta-oxidação e entram no processo

de produção de energia através do Ciclo de Krebs e da fosforilação oxidativa; (3) Na mi-

tocôndria hepática, a via da 3-hidroxi-3-metilglutaril-CoA produz corpos cetónicos para o

cérebro e outros órgãos. Foi verificado, no povo Inuit, uma variante da CPT-1 que permite

o aumento da taxa de oxidação das gorduras em situações de não-jejum (17). Por aqui se

verifica que todos os seres vivos aprendem a viver no nicho ecológico que lhes corresponde.

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06DIETA QUENIANA

O Quénia é um país que estimula fortemente a imaginação dos desportistas de todo o mundo. Que

segredos esconderá o êxito extraordinário dos meio-fundistas e fundistas do Atletismo queniano?

Antes de responder a esta questão, analisemos se existe um perfil nutricional específico

do Quénia. Com uma superfície territorial muito heterogénea e 42 grupos étnicos vivendo no

Quénia, os padrões dietéticos diferem consideravelmente entre comunidades dependendo

da cultura, localização geográfica e atividade económica. No Quénia, muitos grupos étnicos

dependem dos cereais, especialmente milho, sorgo e painço, como produtos básicos alimen-

tares, muitas vezes acrescidos de vegetais, tubérculos, peixe, leite e aves de capoeira (11).

Grupos étnicos dedicados à pastorícia têm no leite um alimento fundamental enquanto nas

populações vivendo perto dos lagos o peixe entra naturalmente nas suas dietas.

O Quénia, no entanto, apresenta uma elevada taxa de insegurança alimentar. Verifica-

-se uma situação de insegurança alimentar quando uma dada população não tem acesso

estabilizado a suficientes quantidades de alimentos seguros e nutritivos para um normal

crescimento e desenvolvimento e um estilo de vida ativamente saudável (4).

Num estudo realizado em 3 grupos étnicos – Luo, Kamba e Maasai, verificou-se a di-

versidade de padrões nutricionais e uma elevada incidência de insegurança alimentar. A

ingestão energética variou entre 1385 – 2054 kcal nas mulheres e 1719 – 2507 nos ho-

mens. Quanto à ingestão dos vários macronutrientes, a variabilidade também é manifesta:

carbohidratos, 55.7 – 74.2%; gorduras, 14.5 – 30.2 %. O consumo de proteínas variou entre

0.72 e 1.3 g/kg/dia. A prevalência de défice ponderal (IMC < 18.5 kg/m2) foi de 13.7%,

20.5% e 24.2% nos Luo, Kamba e Maasai, respetivamente (6). Um estudo feito com corre-

dores adolescentes da tribo Kalenjin, grupo étnico do qual provêm muitos dos campeões

do meio-fundo e fundo internacional, verificou alguns défices na ingestão de bioregulado-

res. A partir das referências sugeridas pela FAO/ WHO, verificou-se que os corredores só

ingeriam 17% das recomendações para a vitamina A, piridoxina (82%), ácido fólico (56%),

vitamina B12 (55%), vitamina C (95%), vitamina E (65%), cálcio (47%), selénio (49%) (1).

Estes dados apontam para o facto de que a performance de atletas de elite é compatível

com alguns défices nutricionais. Quanto tempo demora a que esses défices se reflitam ne-

gativamente na performance e na saúde? A resposta é difícil de dar já que o treino também

melhora a eficácia metabólica. Contudo, os corredores adultos de elite quenianos, em pe-

ríodos de treino exaustivo, tendem a melhorar o perfil da ingestão energética e nutricional

e a adequá-lo às exigências do treino, embora convivam bem com algum défice energético.

Numa semana de treino intensivo de corredores de elite do Quénia, estimou-se um gas-

to energético médio de 3695±119 kcal enquanto o aporte energético não compensou os

gastos (2987±293 kcal). Interessantemente, a redução da massa corporal, embora signi-

ficativa estatisticamente, foi ligeira em termos biológicos (58.9±2.7 kg vs. 58.3±2.6 kg) (12).

Isto poderá significar que o treino intensivo permitiu melhorar a eficácia metabólica. Deve

aceitar-se, como tese, que um balanço energético negativo, combinado com uma dieta

rica em carbohidratos, terá o potencial, no curto prazo, de melhorar a performance na

corrida de endurance, reduzindo o custo energético da corrida. Contudo, o prolongamento

de défices energéticos pode induzir uma série de patologias. Verificou-se que uma elevada

percentagem de corredoras adolescentes de elite quenianas estava em risco de défice

energético, disfunção menstrual e desordens nutricionais (9).

Exige-se, por isso, o controlo periódico quer do perfil de ingestão nutricional dos atletas

quer a análise sanguínea de vários biomarcadores relacionados com a nutrição.

REGRAS PARA UMA

ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL

A etiologia de uma grande parte das doenças na actualidade entronca na alimentação po-

bre e desequilibrada e no sedentarismo. Embora a hipocinésia seja causa preponderante

de muita da morbilidade hodierna, o Padrão Alimentar Ocidental Urbano e a Comida de

Cafetaria são objectivamente causadoras de muitas patologias nutricionais.

Eis as características do Padrão Alimentar Ocidental Urbano:

– Rico em calorias, porque excessivo em gorduras, bebidas alcoólicas, açúcar e carnes

– Pobre em hortaliças, frutos em natureza, leguminosas e cereais completos

– Refeições copiosas com grandes intervalos

– Inquinado por gorduras saturadas, hidrogenadas e degradadas pela cocção, aditivos, resíduos

químicos e sal.

Cerca de 25 a 30% dos portugueses optam por um padrão nutricional excessivo em lixo

alimentar: refrigerantes, batata-frita, salsichas, hamburguesas, bolos e pastéis, inquinado

por uma culinária gordurosa e salgada e desadaptado às necessidades diárias.

O panorama nutricional actual é agravado pela recorrência frequente à Comida de Cafe-

taria que estimula hábitos alimentares nefastos nos jovens e eventualmente indutores de

desregulações nutricionais.

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06A comida de cafetaria caracteriza-se, segundo Emílio Peres (13), por:

– Comida sempre à mão e por toda a parte (mais de 12 contactos diários com bebida e comida). A

maior parte do que se come é processado.

– Gorduras fornecem 34 a 46% do Aporte Calórico Total (ACT). Abundam as gorduras vegetais hi-

drogenadas e as gorduras saturadas. Fritos e grelhados em gordura dominam a culinária. Os ácidos

gordos trans e cis anómalos atingem 1/3 dos lípidos.

– Hidratos de Carbono fornecem 36 a 42% do ACT. Mais açúcares e semelhantes que amido.

– Proteínas, na maioria carnes, fornecem entre 11 a 16% do ACT.

– Manifesta escassez de alimentos vegetais, em particular, hortofrutícolas em natureza. Profundo

défice de flavonóides, minerais, vitaminas e complantix.

– Preferência por bebidas açucaradas e/ ou com cafeína e cerveja.

A certeza de que os bons hábitos nutricionais são condição sine qua non para uma boa

saúde e disponibilidade para o trabalho e exercício, levam-nos a salientar as regras para

uma alimentação saudável (14):

1. Tomar sempre o pequeno-almoço

2. Evitar estar mais de 3.5 horas sem comer

3. Reduzir o consumo total de gordura, principalmente a saturada

4. Aumentar o consumo de hortaliças, frutas e legumes

5. Evitar o consumo de açúcar e produtos açucarados

6. Consumir de preferência peixes gordos e carnes magras

7. Diminuir o consumo de sal

8. Evitar os fritos e adoptar métodos culinários mais saudáveis, tais como estufados, cozidos e grelhados

9. Beber água simples em abundância ao longo do dia

10. O consumo de bebidas alcoólicas, se for hábito, deve ser feito com moderação.

Utilizar o azeite como gordura de adição. O consumo exclusivo de azeite na culinária

humana está associado a um risco mais baixo de doença cardíaca coronária (2).

Em termos desportivos devemo-nos sempre lembrar que uma boa nutrição não faz um

campeão mas uma má nutrição pode-se constituir como óbice para que um campeão o

seja. A transformação das potencialidades de um campeão em capacidades funcionais

pode ter na alimentação um aliado a não negligenciar.

A utilização de suplementos ergogénicos legais para melhorar a performance desportiva

e/ ou a qualidade de vida só resulta em caso de défices energéticos ou nutricionais. Em

situações de equilíbrio energético e nutricional a utilização de suplementos pode tornar-

-se contraproducente. Uma dieta rica, diversificada e equilibrada é o segredo quer para a

saúde quer para a melhoria do rendimento desportivo.

REFERÊNCIAS

1. Christensen DL, Jakobsen J, Friis H (2005) Vitamin and mineral intake of twelve adolescent male Kalenjin run-ners in western Kenya. East Afr Med J, 82(12): 637-642.2. Dimitriou M, Rallidis LS, Theodoraki EV, Kalafati IP, Kolovou G, Dedoussis GV (2015) Exclusive olive oil consumption has a protective effect on coronary ar-tery disease; overview of the THISEAS study. Public Health Nutr, 1-7 (Epub ahead of print).3. Ezzati M, Riboli E (2013) Behavioral and dietary risk factors for noncommunicable diseases. N Engl J Med, 369(10): 954-964.4. FAO (1996) The state of food and agriculture. Food and Agriculture Organization of the United Nations. Roma.5. Gardiner EN (1930) Athletics of the Ancient World. Clarendon Press. Oxford. England.6. Hansen AW, Christensen DL, Larsson MW, Eis J, Christensen T, Friis H, Mwaniki DL, Kilonzo B, Boit MK, Borch-Johnsen K, Tetens I (2011) Dietary patterns, food and macronutrient intakes among adults in three ethnic groups in rural Kenya. Public Health Nutr, 14(9): 1671-1679.7. Kromhout D, Bosschieter EB, de Lezenne Coulander C (1985) The inverse relation between fish concump-tion and 20-year mortality from coronary heart dis-ease. N Engl J Med, 312(19): 1205-1209.8. Morin E (1996) Os meus demónios. Edições Europa América. Portugal.9. Muia EN, Wright HH, Onywera VO, Kuria EN (2015) Adolescent elite Kenyan runners are at risk for energy deficiency, menstrual dysfunction and disordered eat-ing. J Sports Sci, (Epub ahead of print).10. Nietzsche F (2014) Ecce Homo. Edições 70. Lisboa. Portugal.11. Oniang’o RK, Komokoti A (1999) Food habits in Kenya: the effects of change and attendant method-ological problems. Appetite, 32(1): 93-96.12. Onywera VO, Kiplamai FK, Boit MK, Pitsiladis YP (2004) Food and macronutrient intake of elite Kenyan distance runners. Int J Sport Nutr Exerc Metabol, 14(6): 709-71913. Peres E (1993) Comer em Portugal. Notícias Médicas: 14-19.14. Peres E (1993) Dieta Saudável. Tempo Medicina. Porto.15. Schwingshackl L, Hoffmann G (2014) Mediterranean dietary pattern, inflammation and endothelial function: a systematic review and meta-analysis of intervention tri-als. Nutr Metabol Cardiovasc Dis, 24(9): 929-939.

16. US Burden of Disease Collaborators (2013) The State of US Health, 1990-2010. Burden of Diseases, Injuries, and Risk Factors. JAMA, 310(6): 591-606.17. Wang SP, Yang H, Wu JW, Gauthier N, Fukao T, Mitchell GA (2014) Metabolism as a tool for under-standing human brain evolution: lipid energy metabo-lism as an example. J Hum Evol, 77: 41-49.

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