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REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA (Editada desde 1851) R. Marít. Bras. Rio de Janeiro v. 130 n. 07/09 p. 1-336 jul. / set. 2010 v. 130 n. 07/09 jul./set. 2010 DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMENTAÇÃO DA MARINHA FUNDADOR Sabino Elói Pessoa Tenente da Marinha – Conselheiro do Império COLABORADOR BENEMÉRITO Luiz Edmundo Brígido Bittencourt Vice-Almirante

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REVISTAMARÍTIMA

BRASILEIRA(Editada desde 1851)

R. Marít. Bras. Rio de Janeiro v. 130 n. 07/09 p. 1-336 jul. / set. 2010

v. 130 n. 07/09jul./set. 2010

DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMENTAÇÃO DA MARINHA

FUNDADOR

Sabino Elói PessoaTenente da Marinha – Conselheiro do Império

COLABORADOR BENEMÉRITO

Luiz Edmundo Brígido BittencourtVice-Almirante

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Revista Marítima Brasileira / Serviço de Documentação Geral da Marinha.–– v. 1, n. 1, 1851 — Rio de Janeiro:Ministério da Marinha, 1851 — v.: il. — Trimestral.

Editada pela Biblioteca da Marinha até 1943.Irregular: 1851-80. –– ISSN 0034-9860.

1. M A R I N H A — Periódico (Brasil). I. Brasil. Serviço de DocumentaçãoGeral da Marinha.

CDD — 359.00981 –– 359 .005

A Revista Marítima Brasileira, a partir do 2o trimes-tre de 2009, passou a adotar o Acordo Ortográfico de 1990,com base no Vocabulário Ortográfico da Língua Portugue-sa, editado pela Academia Brasileira de Letras – Decretos nos

6.583, 6.584 e 6.585, de 29 de setembro de 2008.

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COMANDO DA MARINHAAlmirante de Esquadra Julio Soares de Moura Neto

SECRETARIA-GERAL DA MARINHAAlmirante de Esquadra João Afonso Prado Maia de Faria

DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMENTAÇÃO DA MARINHAVice-Almirante (EN-Refo) Armando de Senna Bittencourt

REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRACorpo Editorial

Capitão de Mar e Guerra (Refo) Milton Sergio Silva Corrêa (Diretor)Capitão de Mar e Guerra (RM1) Carlos Marcello Ramos e Silva

Jornalista Deolinda Oliveira MonteiroJornalista Manuel Carlos Corgo Ferreira

DiagramaçãoCelso França Antunes

Assinatura/Distribuição3oSG-ES (RM1) Mário Fernando Alves Pereira

CB-PD Franklin Marinho de CastroMN (RM2) Fabiano Honório da Silva

Departamento de Publicações e DivulgaçãoCapitão de Fragata (T) Ivone Maria de Lima Camillo

Apoio Administrativo e ExpediçãoSuboficial-CN Maurício Oliveira de RezendeSuboficial-MT João Humberto de Oliveira

Segundo-Sargento-SI José Alexandre da SilvaIlda Lopes Martins

Impressão / TiragemIMOS Gráfica e Editora Ltda / 8.000

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A REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA é uma publicação oficial da MARINHA DO BRASIL desde1851. Entretanto, as opiniões emitidas em artigos são da exclusiva responsabilidade de seus autores. Nãorefletem, assim, o pensamento oficial da MARINHA. É publicada, trimestralmente, pela DIRETORIA DOPATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMENTAÇÃO DA MARINHA. As matérias publicadas nestaRevista podem ser reproduzidas, desde que citadas as fontes.

REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRARua Dom Manoel no 15 — Praça XV de Novembro — Centro — 20010-090 — Rio de Janeiro — RJ

(21) 2104-5493 / -5506 - R. 215, 2262-2754 (fax) e 2524-9460

Para remessa de matéria:E-mail: [email protected]

Intranet: dphdm-513@dphdoc

Para assinaturas e alterações de dados:E-mail: [email protected]

Intranet: dphdm-5131@dphdoc

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em anexo, comprovante de depósito na conta corrente 3003212-4 agência 0915, do Banco Real, emnome do Departamento Cultural do ABRIGO DO MARINHEIRO, no valor de R$ 36,00; se fordo exterior, por vale postal

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SUMÁRIO

9 NOSSA CAPA – AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OSPRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

Alvaro Augusto Dias Monteiro – Almirante de Esquadra (FN)Conceito doutrinário – pensamento militar. Cerceamento da iniciativa pela doutrina

prejudicando o pensar, o intuir. A arte e a ciência da guerra. Influência da tecnologia

23 O ATLÂNTICO SUL NA PERSPECTIVA BRASILEIRA DE SEGURANÇA E DEFESAFernando Manoel Fontes Diégues – Vice-Almirante (Refo)Interesses brasileiros no mar – Poder Marítimo. Tensão e instabilidade na América do

Sul. Presença de potências extrarregionais. Cenário econômico. A Estratégia Nacional deDefesa – atuação da Marinha

33 ALMIRANTE BRAZ DIAS DE AGUIAR – GIGANTE DA NACIONALIDADE!Paulo Cezar de Aguiar Adrião – Contra-Almirante (Refo)Resumo biográfico de Braz de Aguiar. Reconhecimento do Presidente da República e do

Ministro das Relações Exteriores a respeito do trabalho demarcador dos limites do Brasil. Definiçãode mais de 10 mil quilômetros de faixa de fronteira resultante de suas observações e cálculos

39 UM DESENCALHE PARA OS ANAISOscar Moreira da Silva – Contra-Almirante (Refo)Relato sobre um desencalhe empregando técnica criativa e inovadora

46 NAUFRÁGIO DO BAHIA – “TINHA QUE ACONTECER E PRONTO”Deolinda Oliveira Monteiro – JornalistaRelato de sobrevivente da tragédia do Bahia. Serenidade e lucidez. Continuidade de sua

vida na Marinha – atleta destacado em natação

57 ENCOURAÇADO TAMANDARÉ: O PRIMEIRO NAVIO-VARREDOR DA MARINHADO BRASIL

Alvanir B. de Carvalho – ProfessorInício do emprego de minas na Guerra do Paraguai. Uso de mercenários na guerra.

Interesse do Imperador D. Pedro II. A inventividade para “varrer” as minas com o Tamandaré.Choque do Encouraçado Rio de Janeiro com mina de fundeio e seu afundamento

63 O EMPREGO DE SUBMARINOS NA ESTRATÉGIA NAVAL DA CHINARoberto Koncke Fiuza de Oliveira – Capitão de Mar e GuerraO contexto geopolítico – interesses marítimos da China. Taiwan. A Marinha do Exército

Popular da China – sua formação. Força de Submarinos. A Estratégia Naval – a importânciafundamental do submarino

87 LIDERANÇA E COMANDO NA ERA DO CONHECIMENTOCláudio José D’Alberto Senna – Capitão de Mar e GuerraA nova era do conhecimento. Papel do comandante e dos subordinados. O impacto da

tecnologia – a competição – valor do talento. Realização funcional e pessoal

98 HERBERT WILLIAM RICHMOND: UM ALMIRANTE INTELECTUALFrancisco Eduardo Alves de Almeida – Capitão de Mar e Guerra (RM1)Início da série sobre o pensador britânico. Resumo biográfico sobre o marinheiro e o autor

sofisticado. Polemista e crítico à estratégia do Império. O desenvolvimento de suas ideias –os livros publicados. Hostilidade do Almirantado em relação a Richmond

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125 O ALARMISMO NUCLEARLeonam dos Santos Guimarães – Capitão de Mar e GuerraO que é alarmismo – Os seus mitos. Caso do Irã – análise – longo caminho a percorrer.

Lições do passado a observar

133 VOLTE-FACE NA PIRATARIA MARÍTIMAHenrique Peyroteo Portela Guedes – Capitão de Fragata da Marinha de PortugalSituação corrente da pirataria – forças presentes no Corno da África. Os números de 2009.

Somália – epicentro em Puntland. Atenção do mundo para se prevenir das ações de pirataria

141 A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do

Direito InternacionalCarolina Isabel Lazzari GioppoAbordagem sobre o neorrealismo e a insegurança internacional. Os estados falidos.

Resumo histórico da pirataria – fatores da proliferação – organismos internacionaisenvolvidos na costa da Somália

177 MARINHA DO BRASIL NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL – Parte 1Gerson de Macedo Soares – Capitão de Fragata (in memoriam)Início da série a respeito da participação da Marinha na Segunda Guerra conforme relato

escrito pelo chefe do Estado-Maior do Comando Naval do Nordeste durante o conflito. Osnavios empregados – obsoletos, antiquados e antigos. Esforço das tripulações, sacrifícios– as primeiras atividades, exercícios, patrulhas e transportes

183 A LIDERANÇA SOB AS ÓTICAS DO SETOR PÚBLICO E DO SETOR PRIVADOMárcio Vasconcellos – Capitão de Fragata (IM)Conceito – influência interpessoal e situacional. A liderança como processo de

comunicação – a caracterização – valores éticos e morais – ambientes públicos e privados

201 AS OPERAÇÕES DE GUERRA NÃO MILITARES À LUZ DA TEORIA DASOCIOLOGIA DOS CONFLITOS E GUERRAS

Marcos Taylor Fontes – Capitão de CorvetaA guerra como conflito – operações não militares – novas tecnologias e conceitos

207 POR QUE UM SUBMARINO DE PROPULSÃO NUCLEAR? LIÇÕES SOBRE ASMALVINAS

Nilson Augustus Gonçalves de Souza – Capitão de CorvetaRazões convincentes para sua existência – arma de guerra excepcional. Lições das

Malvinas – atuação dos ingleses e dos argentinos

213 REFLEXÕES SOBRE A MEDICALIZAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADEPriscilla Corrêa de Oliveira – Primeiro-Tenente (T)Perspectiva histórica – a oferta médica – os ideais pós-modernos. Demanda do

paciente. Medicalização e sua relação com a toxicomania. Análise a partir de Freud

219 ARTIGOS AVULSOS219 GERENCIAMENTO DA MANUTENÇÃO: IMPLANTAÇÃO E ELABORA-

ÇÃO DA PROPOSTA INICIAL DE TRABALHOThyago de Lellys Monção – Capitão-Tenente (QC-CA)Diretrizes básicas para o Departamento de Máquinas de um navio de pequeno porte,

buscando a confiança na execução de serviços

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220 O EQUÍVOCO DE ISRAELReis Friede – Desembargador FederalAnálise da decisão de Israel a respeito da questão do Irã. Atuação dos Estados Unidos

e da ONU

222 NECROLÓGIO

225 O LADO PITORESCO DA VIDA NAVALAnedotário naval – alguns exageros.Extrato do Livro de Comentário de Visitantes do Museu Naval

227 DOAÇÕES À DPHDM

230 ACONTECEU HÁ CEM ANOS

250 REVISTA DE REVISTASSinopses de matérias selecionadas em mais de meia centena de publicações recebidas e

lidas, do Brasil e do exterior

256 NOTICIÁRIO MARÍTIMOColetânea de notícias mais significativas da Marinha do Brasil, de outras Marinhas,

incluída a Mercante, e assuntos de interesse da comunidade marítimaCaderno especial sobre os 30 anos da mulher na Marinha

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Para conhecimento dosAssinantes da RMB

A) Há décadas o País não prioriza a aquavia, o trans-porte marítimo e, por consequência, o Homem do Mar. Como objetivo primordial de difundir a Mentalidade Marítima,publicamos matérias variadas, abrangentes, ideias novas eargumentações de importância em vários campos do interes-se das Marinhas de Guerra e Mercante e do Poder Nacional.

Além da distribuição aos assinantes, enviamos, há al-guns anos, a Revista Marítima Brasileira para entidades quepodem induzir à modificação de conceitos e ideias:

– Bibliotecas Públicas e Privadas Estaduais e dos Municí- pios com mais de 90 mil habitantes ........................ 383– Universidades Públicas e Privadas ......................... 83– Clubes Náuticos .................................................... 85– Sociedades dos Amigos da Marinha ....................... 49– Instituições ........................................................... 24

B) Em setembro deste ano, correspondem aos nossos6 mil assinantes os seguintes percentuais:

– Oficiais da ativa – 53% (12% são Aspirantes)– Oficiais inativos – 35%– Praças da ativa – 8%– Praças inativos – 4%

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SUMÁRIO

IntroduçãoUma ligeira digressãoAs operações de paz

AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTESE OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE

CASTORIADIS

ALVARO AUGUSTO DIAS MONTEIROAlmirante de Esquadra (FN)

INTRODUÇÃO

Este artigo é uma adaptação de uma con-ferência que proferi no encerramento do

Seminário Europe and Latin America in PeaceOperations: Comparative Perspectives andPractices, realizado na Pontifícia Universida-

de Católica do Rio de Janeiro (PUC/Rio), nosdias 14 e 15 de abril de 2010.

Como um dos propósitos do seminárioera o de estabelecer laços entre os militarese a Academia, julguei que não deveria abor-dar tema estritamente técnico, relacionado àdoutrina ou aos procedimentos do emprego

NOSSA CAPA

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AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

militar. Melhor faria se abordasse algo co-mum aos militares, executantes por excelên-cia das operações de paz, e aos civis da Aca-demia, estudiosos e intelectualmente inte-ressados nessas operações e que, por suavez, também, são executantes, na medidaem que delas participam, por intermédio dasdiversas agências e organizações civis queatuam nas operações de paz.

Assim, na busca do tema a comentar,optei por uma abordagem mais ampla, maissuperficial do que detalhada, com o intuitode, no tempo destinado à conferência, sercapaz de trazer à ponderação dos partici-pantes do seminárioalgumas influênciasque, a meu ver, as ope-rações de paz estãotrazendo ao pensa-mento militar. Por issoo tema: “As opera-ções de paz, o erro deDescartes e os pres-supostos do imaginá-rio de Castoriadis”.

Embora esse tema tenha mais pompa quecircunstância, mais título que conteúdo,decidi abordá-lo porque julgo interessantesas influências das operações de paz sobre opensamento militar, particularmente os im-pactos que as novas modalidades de opera-ções de paz, denominadas robustas, comcerteza trarão a esse pensamento1.

Uma dessas influências incide no erro deDescartes, expressão que “roubei” do títulode um dos livros de Antonio Damásio, emque este renomado neurobiólogo aborda aemoção, a razão e o cérebro humano.

Talvez, no caso militar, o erro não tenhasido propriamente de Descartes, mas daequivocada generalização que o pensamen-

to militar cometeu ao aplicar seu métododedutivo, racional, baseado no rigor daevidência e na precisão da lógica matemá-tica para encontrar soluções para quais-quer problemas militares, a despeito de suasdiferentes naturezas.

Subordinando-se incondicionalmente aoracionalismo cartesiano, o pensamento mili-tar parece ter abandonado completamentequalquer sentido de intuição, embora elemesmo, Descartes, tenha atribuído o insightque resultou no desenvolvimento de seumétodo a uma intuição, a uma revelação danatureza que cria, mas que não foi criada.

De tal forma assimi-lamos o método deDescartes que nos tor-namos talvez uma desuas maiores expres-sões. Somos, os mili-tares, por definição,cartesianos; somos re-conhecidamente dota-dos de mentalidade

cartesiana.A submissão ao rigor intelectual de Des-

cartes, que, de certo modo, privilegia ométodo em detrimento do talento, certa-mente contribuiu para as interpretações eaplicações equivocadas de suas ideias aopensamento militar, cuja total e irrestritaobediência aos ditames doutrinários cris-talizou-se com o passar do tempo, trans-formando o estamento militar em uma insti-tuição doutrinariamente dogmática, plenade verdades consideradas absolutas. Umainstituição que, como toda instituiçãodogmática, muitas vezes define ela própria,para si mesma, tanto novas maneiras deresponder às suas necessidades como no-vas necessidades, enquadrando-se no

1 Operações de paz ditas “robustas” seriam operações de paz complexas e críticas, como aquelas que sedestinariam à proteção de civis “sob ameaça iminente de violência física”, nas quais há limitado, ounenhum, consentimento dos partidos no terreno e em que o uso do armamento não estaria restritoà proteção individual do combatente e sim, também, ao efetivo cumprimento da missão.

Somos, os militares, pordefinição, cartesianos;

somos reconhecidamentedotados de mentalidade

cartesiana

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AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

modelo de sociedade, no sentido de orga-nização, tão criticado por Castoriadis.

Já me encontro, portanto, no terrenoperigoso de Castoriadis e seu imagináriosocial. Imaginário que para ele, Castoriadis,não é imagem e sim criação. Sendo que oessencial da criação não é a descoberta doque já existe, mesmo que ainda seja desco-nhecido, muito menoso mero desenvolvi-mento ou a evoluçãodo que já existe.

Para Castoriadis, cri-ação é a constituição donovo, é o rompimentocom parâmetros eparadigmas institu-cionais para alcançarum novo patamar deatuação. Processo queele viveu, não sem an-gústia, quando rompeucom o marxismo. Rom-pimento que justificoucomo uma decisão, daqual não pôde fugir,“entre a fidelidade auma doutrina que hámuito tempo já não es-timula nem uma reflexãonem uma ação e a fide-lidade ao projeto de uma transformação radi-cal da sociedade”.2

Este pensamento síntese de Castoriadisestá, de certo modo, refletido também com muitaclareza e, por que não, com idêntica angústianas já notórias palavras do Major-GeneralFuzileiro Naval James Mattis, comandante da1a Divisão de Marines (Fuzileiros Navais dosEstados Unidos), durante a invasão do Iraque

em 2003, quando, ao planejar o emprego desua Divisão na Fase IV da Guerra – Fase deEstabilização –, que estava prestes a se iniciar,inconformado com a postura de alguns co-mandantes que se escudavam inflexivelmenteem preceitos e princípios doutrinários paranortear suas ações, declarou: “A doutrina é oúltimo refúgio dos sem imaginação”.3

Ainda que paramuitos, principalmen-te para estudiosos eanalistas militares daAmérica do Sul, asoperações no Iraque eno Afeganistão nãodevam ser enquadra-das como operaçõesde paz (embora todosos palestrantes euro-peus do seminário asconsiderassem comotal), é forçoso, pelomenos, constatar queas condicionantes da-queles ambientesoperacionais não dife-rem muito das que seespera encontrar nasoperações de paz fu-turas, ditas robustaspelo menos no que

concerne à sua natureza, embora possamdiferir no grau de intensidade.

São justamente essas operações (Afe-ganistão e Iraque) que, atualmente, estão pon-do em cheque o pensamento militar e sua dou-trina de emprego, previamente estabelecidapara atuação nesses cenários, que não temconseguido responder, como se esperava, aoambiente operacional que condiciona essas

2 Castoriadis. A Instituição Imaginária da Sociedade, página 25.3 Esta frase do General James Mattis logo se tornou notória e vem sendo frequentemente citada. Uma boa

visão do contexto em que foi pronunciada pode ser obtida no paper preparado por Frank G. Hoffmanpara o Foreign Policy Research Institute, em 2006, possível de ser acessado no sítio http://www.fpri.org/books/Hoffman. Changing Tyres on the Fly. The Marines and Postconflict Stability Ops.

A doutrina não pode serconsiderada um dogma;

portanto, imutável,inflexível, rígida. Ela nãodeve cercear a iniciativa,ela não pode justificar a

inação.O racionalismo cartesianoda supremacia do pensar,

da absoluta supremacia darazão, não pode, de modo

algum, anular por completoo sentir, não pode anular o

intuir

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AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

operações. Para tanto, para fazer face adequa-damente às ameaças ali presentes, o pensa-mento militar deve não apenas evoluir, massim, como ensina Castoriadis, romper com alinearidade cartesiana para formular outrospatamares, outros modelos de atuação.

A doutrina não pode ser consideradaum dogma; portanto, imutável, inflexível,rígida. Ela não deve cercear a iniciativa, elanão pode justificar a inação.

O racionalismo cartesiano da suprema-cia do pensar, da absoluta supremacia darazão, não pode, de modo algum, anular porcompleto o sentir, não pode anular o intuir.

Não foi outro o propósito do GeneralPetraeus ao divulgar sua nova doutrina deenfrentamento. Em síntese, essa doutrina éuma tentativa de rom-per com a inflexívelaplicação do modeloconvencional de com-bate a um ambientenão convencional, emque as ameaças exis-tentes (e são terríveis!)são, ou estão, difusas.

Penso, portanto,que as novas opera-ções de paz vão levar-nos ao resgate de umaconcepção de ação militar, outrora mais co-mum, caracterizada pela supremacia da ma-nobra sobre o fogo, do combatente sobreo técnico, do existir sobre o pensar, do sen-sível sobre o inteligível.

UMA LIGEIRA DIGRESSÃO

As guerras, as ações militares, em suma,sempre foram conduzidas apoiando-se emdois pilares: a arte da guerra e a ciência (atecnologia) da guerra.

A arte da guerra clama pelo combatente,enquanto a ciência da guerra, pelo técnico. Aarte da guerra é a expressão do que é sensí-vel, a ciência da guerra do que é inteligível.

O combatente, como ser sensível, é o pro-tagonista da manobra, enquanto o técnico,com base no que é inteligível, busca o desen-volvimento do armamento, das munições, en-fim, dos sistemas de armas; busca o aprimo-ramento da acurácia do seu emprego, o au-mento letal de seus efeitos, em um conjuntode ações e medidas que neste artigo vou sin-tetizar como o fogo. Manobra e fogo com-põem, portanto, as ações militares.

Embora avanços tecnológicos, por maissimples que hoje possam parecer, tenham in-terferido na arte da guerra, introduzindo no-vos procedimentos e técnicas, a manobrasempre preponderou sobre o fogo. Semprese aplicou o fogo para facilitar a manobra.

Ninguém talvez tenha elevado tão alto aarte da guerra quantoNapoleão, que privile-giava sobremaneira amanobra. Quanto me-lhor a manobra, menoscombate. Houve situ-ações em que o sim-ples perceber da mano-bra francesa levou astropas oponentes àrendição, como ocor-reu com os austríacosem Ulm (1805); quan-

do não se renderam, foram destruídas,como aconteceu com os prussianos emJena (1806).

Após sua fragorosa derrota para Napo-leão, na Batalha de Jena, a Prússia iniciou areestruturação do seu Exército, tarefa que,inicialmente, ficou a cargo de dois gene-rais: Scharnhorst e Gneisenau.

Em meados do século XIX, Bismarck, nacondução da unificação da Alemanha, sob aliderança da Prússia, em que sobremaneira exal-tou o espírito nacionalista alemão, logo perce-beu que a consecução do seu projeto nãoseria possível sem a derrota militar da Áustria,o que demandaria um Exército poderoso.

A arte da guerra clamapelo combatente, enquantoa ciência da guerra, pelo

técnico. A arte da guerra éa expressão do que ésensível, a ciência da

guerra do que é inteligível

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AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

Todavia, como era tradição que os prínci-pes, particularmente os filhos do imperador,fossem designados para comandar os exérci-tos prussianos, foi necessário criar um staffcapaz de assessorar os príncipes em suasdecisões quanto ao emprego das tropas quecomandavam, dando origem, assim, ao Esta-do-Maior, organização consagrada posteri-ormente em todas as forças armadas do mun-do, particularmente após as retumbantes vi-tórias prussianas contra a Áustria, em 1866(Königgrätz), e a França, em 1871 (Sedan).

É interessante registrar que o Estado-Maior Geral alemão e sua respectiva Esco-la de Estado-Maior, paradigma de todos osdemais, adquiriu tantanotoriedade que umacláusula do Tratadode Versailles, assinadoao final da PrimeiraGuerra Mundial, deter-minava sua extinção.

Os estados-maiorespassaram a adotarcomo modelo para a solução dos problemasmilitares o método cartesiano, que, em sín-tese, parte do princípio que todo problemapode ser decomposto em suas partes maissimples, as quais, estudadas detalhadamen-te de per si, levam a uma solução globalpara o problema. Com a irrestrita obediênciaao princípio da evidência, o método de Des-cartes procura conferir uma abordagem pre-cisa, rigorosa, quase matemática, a todos osaspectos humanos.

Em decorrência do impacto das grandesinovações tecnológicas provenientes darevolução industrial, tais como o fuzil de

retrocarga, a artilharia de retrocarga, a me-tralhadora, os sistemas de comunicação afio e, particularmente, o trem, que passou apossibilitar o deslocamento de grandes efe-tivos, antes inimagináveis, para as frentesde combate, a matematização da guerra foi,então, questão de tempo.

Desse modo, no limiar da Primeira Guer-ra Mundial, o combatente, o ser pensantee a manobra tinham sido completamentedominados pelo inteligível, pelo técnico epelo fogo. A equação invertera-se: ao in-vés de se empregar o fogo para facilitar amanobra, manobrava-se para oferecer me-lhores condições para aplicação do fogo,

principalmente o deartilharia, chegando-se ao paradoxo dosmovimentos da infan-taria serem limitadospela extensão dos fiosde comunicação da ar-tilharia de campanha.

A guerra, ou melhor,sua percepção tornara-se uma questão mate-mática, como procuraram demonstrar as fa-mosas equações de Lanchester, publicadasem 1916. A guerra passara a ser mera questãode superioridade de efetivos, como deixatransparecer Lanchester em uma de suasequações, na qual o resultado de uma bata-lha estaria na razão direta do quadrado dosefetivos empregados (Lei dos Quadrados deLanchester).4

Nesse contexto, não causa espécie que,em 1916, o General Von Falkenhain, coman-dante do Exército alemão, apoiando-se nofato de possuir maiores efetivos mobiliza-

4 A Lei dos Quadrados de Lanchester estabelece que o poder combativo de uma força é resultante doproduto do quadrado dos efetivos empregados pelo coeficiente de eficácia da força (um coeficientedecorrente de vários aspectos, tais como: treinamento, armamento, cultura militar etc.). Assim,sempre será mais fácil incrementar-se o poder combativo de uma força pelo aumento de seu efetivo(valor que é elevado ao quadrado) do que pelo aumento de seu coeficiente de eficácia. Ainda hoje seencontram muitas aplicações das Leis de Lanchester na doutrina militar. A razão de 3 x 1 entre oatacante e o defensor talvez seja a mais famosa delas.

Ultrapassado o limiarnuclear, não havia mais

lugar para a manobra, tudoseria resolvido pelo fogo

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dos e considerando que a França defende-ria Verdun até o fim, pelo simbolismo histó-rico daquela localidade, tenha decidido“sangrar” a França em Verdun até a últimagota de sangue.

Em nove meses de luta, 770 mil mortosde ambos os lados. Perdas incomensurá-veis e inaceitáveis, só superadas por outrabestialidade humana: a Batalha do Somme,também em 1916. Em cinco meses de lutas,1 milhão e 200 mil baixas, 76.710 mortossomente no primeiro dia dos combates, ofatídico dia 1o de julho de 1916.

O ser humano, inteiramente desprovidode sua condição humana, passara a sercontabilizado como sefosse mero item do in-ventário militar.

A Segunda GuerraMundial, embora nelanão tenha havido tan-ta imobilização nasfrentes de combate,terminou sob total do-mínio do fogo, repre-sentado pelos cogu-melos atômicos deHiroshima e Nagasaki.

A própria decisão delançar as bombas atô-micas resultou, em últi-ma instância, de umarazão entre perdas. Para conquistar o Japão,previa-se um total de 10 milhões de baixasamericanas; então, que morressem uns tan-tos milhões de japoneses e, de preferência,nenhum americano.

Ultrapassado o limiar nuclear, não ha-via mais lugar para a manobra, tudo seriaresolvido pelo fogo. O técnico e o inteligí-vel passaram a dominar integralmente opensamento militar.

A estatística, a pesquisa operacional ea análise matemática substituíram a arte dogeneral – a estratégia –, como se fosse pos-

sível reduzir o intangível a uma simplesquestão matemática, como se fosse possí-vel “modelar” a alma humana.

Sob a batuta desses princípios matemá-ticos, os americanos travaram a Guerra doVietnã, na qual, em regra geral, a estatísticae a razão entre perdas passaram a guiar asoperações militares.

A derrota americana no Vietnã permitiuque pensadores militares como Boyd, Linde Friedman, posteriormente denominados“os reformadores”, tentassem romper comesse modelo de atuação militar, condicio-nado pelo rigoroso planejamento detalha-do e cuidadoso, pela tentativa de se prever

todas as ações, compouca ou nenhumamargem de erro, pelabusca do monitora-mento e controle detodas as ações, inde-pendentemente do es-calão considerado,fato que o avançotecnológico das comu-nicações passara apossibilitar.

A tentativa de rom-per com a linearidadedo pensamento militarcartesiano, com a mu-dança do paradigma de

comando, que segundo Van Creveld passa-ria a ser exercido por influência, em que asações correntes e a iniciativa dos coman-dantes de campo indicariam a linha de açãoa adotar, ao invés de ser exercido por meiode planos e ordens de operação resultantesde rigorosos planejamentos prévios que per-mitem pouca flexibilidade, esbarrou, contu-do, no avassalador avanço da tecnologiaque levou ao movimento denominado “re-volução dos assuntos militares”.

Esta é uma revolução que, no entanto,não se enquadra exatamente no tipo de que

A estatística, a pesquisaoperacional e a análise

matemática substituíram aarte do general – a

estratégia –, como se fossepossível reduzir o intangível

a uma simples questãomatemática, como se fossepossível “modelar” a alma

humana

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nos fala Castoriadis, pois se trata basica-mente de uma evolução, embora substan-cial, do pensamento militar dominante, enão efetivamente do rompimento com essepensamento, uma vez que a revolução dosassuntos militares está quase que inteira-mente focada na tecnologia e nos seus im-pactos na doutrina militar, e não nos as-pectos menos tangíveis da arte da guerra.

A revolução dos assuntos militares con-duz, em todos os níveis, ao aumento docontrole e do monitoramento sobre asações dos escalões mais inferiores, inclu-sive das ações dos próprios soldados, queassim se veem cerceados em suas iniciati-vas individuais, uma vez que, constante-mente supervisionados pelos escalõesmais elevados, habituam-se a aguardar asdecisões vindas desses escalões. Perdem,assim, a sua já limitada autonomia e habi-tuam-se à falta de iniciativa individual.

Acentua-se, portanto, e drasticamente, aseparação estabelecida por Descartes entreo “corpo pensante”, a res cogitans, que nasinstituições militares seria representada pelocorpo de oficias, do “corpo não pensante”,a res extensa, representada pelo corpo depraças, cuja formação é eminentemente téc-nica, na qual não há preocupação em ofere-cer-lhes (às praças) uma consciência de so-ciedade, uma consciência cultural, ferramen-tas que lhes possibilitariam discernir, quelhes possibilitariam agir com propriedade.

Essa situação agrava-se na medida emque, diante das possibilidades oferecidaspelos extraordinários avanços nos sistemasde comunicações, cada vez mais os altosescalões controlam as ações dos escalõesinferiores, inclusive as ações dos oficiaisque comandam esses escalões, estabelecen-do a fronteira entre a res cogitans e a resextensa, não mais entre oficias e praças esim entre os escalões de comando mais ele-vados e os escalões táticos, que são, efeti-vamente, os executores das ações militares.

Raciocinando por absurdo, poderíamoschegar à seguinte conclusão: na medida emque cada vez mais os altos escalões passama controlar as ações, o corpo pensante tendea zero, e o corpo não pensante ao infinito.

Ao analisar as instituições, Castoriadistambém se refere às divisões, às separaçõesque lhes são inerentes. Todavia, não em ter-mos de res cogitans e res extensa e sim en-tre os que ordenam e os que obedecem.

Dentre as iniciativas que integram a re-volução dos assuntos militares, penso quea concepção de guerra centrada em redestende a restringir o grupo dos que orde-nam aos altos escalões.

Como a iniciativa normalmente pertence aquem ordena, esses escalões mais elevados,por não se encontrarem fisicamente no cená-rio da ação, embora possam visualizá-lo,dissociam-se de suas condicionantes factuais.Decidem com base nas incontáveis informa-ções que chegam, e que chegam em númerostais que impossibilitam seu correto proces-samento, o que os leva a decidir com base emdados distorcidos ou equivocados.

AS OPERAÇÕES DE PAZ

É contra essas tendências que as ope-rações de paz contrapõem-se, e o fazem pordiversos fatores.

Primeiro, porque alijam grande parte datecnologia representada pelos sofisticadossistemas de armas que, em princípio, não sãoautorizadas nas operações de paz, nas quaisos capacetes azuis contam apenas com seuarmamento individual para defesa própria.

Segundo, porque normalmente as opera-ções de paz desenvolvem-se em centros urba-nos de toda ordem, os quais, por sinal, a dou-trina militar convencional considera como obs-táculos a evitar pelas dificuldades que trazemao controle das operações, em virtude da des-centralização que impõem à tropa, obrigandoà pulverização das organizações táticas bási-

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cas, que se veem forçadas a operar, na maioriadas vezes, em pequenas frações, atuando iso-ladamente. Embora as comunicações tenhamchegado ao nível individual, ao nível do sol-dado, a pulverização dessas frações sobrema-neira dificulta (em certas circunstâncias impe-de) o efetivo controle de sua atuação pelosescalões mais elevados.

Por fim, e talvez por mais importante, asoperações de paz requerem dos militares,ou porque eles são os primeiros a chegar àárea de operações ou porque, devido a ques-tões de segurança, sóeles chegam em certasáreas, a execução deum sem-número de ta-refas e atividades, tan-to no campo cívico-social como no da re-construção de infraes-trutura, que, de modoalgum, relacionam-secom o emprego militar.Essas atividades obri-gam os militares ainteragir, sem estaremconvenientementepreparados para tal,com diversos e dife-rentes atores, inclusive com agências e or-ganizações civis que atuam nos cenáriosdas operações de paz, as quais nem sempreveem com bons olhos a atuação militar. Mui-tas possuem regulamentos e normas queproíbem qualquer contato ou até mesmoqualquer ajuda do setor militar, a fim de nãoperderem sua isenção, sua imparcialidade.

Ora, em qualquer sistema a quantidadede interações é aproximadamente igual àmetade do quadrado do número de atoresenvolvidos, o que torna o ambienteoperacional de uma operação de paz emi-

nentemente incerto. Se o ambienteoperacional é incerto, os sistemas nele en-volvidos são não lineares, são sistemasadaptativos complexos, que, por definição,não podem ser controlados, embora pos-sam sofrer algum grau de interferência.

Nesses ambientes, a abordagem carte-siana, própria para sistemas lineares, nãoencontra espaço para aplicação plena.

A abordagem desses ambientes de in-certeza requer a flexibilização da rigidez deideias, das atitudes e dos comportamentos

fundamentados emmodelos tradicionais eem ensinamentos dou-trinários dogmáticos.A abordagem dessesambientes deve pau-tar-se também, e obri-gatoriamente, na auto-nomia individual, pois,nesses ambientes in-certos, a ação indivi-dual entrelaça-se comtodo o sistema.

A clássica divisãodo pensamento militarcartesiano entre os ní-veis de emprego tático,

operacional e estratégico torna-se difusa;às vezes, inexiste, pois a ação equivocadade um simples soldado pode ter implicaçõesestratégicas que comprometam não só aoperação de paz em curso, mas a própriainstituição que patrocina a operação.

Esta é uma preocupação que a própriaOrganização das Nações Unidas (ONU) jámanifestou no seu documento, denomina-do New Horizon,5 sobre as operações depaz futuras, em que identifica claramenteesses ambientes de incerteza e ressalta quetais incertezas, presentes no cumprimento

5 “A New Partnership Agenda: Charting a New Horizon For UN Peacekeeping” é um documento oficiosoda ONU, lançado em 2009, o qual, simplificadamente denominado de “New Horizon”, vem sendoconsiderado o documento norteador das futuras operações de paz.

Se o ambiente operacionalé incerto, os sistemas nele

envolvidos são nãolineares, são sistemas

adaptativos complexos,que, por definição, nãopodem ser controlados,embora possam sofrer

algum grau deinterferência

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das missões de paz, tendem a multiplicar-se quando a força de paz é constituída porestrangeiros que não falam o idioma local,que não conhecem os hábitos, a cultura eos costumes da população que pretendemproteger, ou, se os conhecem, é apenasmuito superficialmente.

As incertezas tendem a multiplicar-se tam-bém se os motivos para a presença da forçade paz não estão inteiramente claros ou per-feitamente compreendidos. Ou, o que é pior,se há desconfianças quanto à real intençãoda presença da tropa no país considerado.

Esta é uma situação que se torna aindamais crítica à medida que as operações depaz não mais signifiquem a mera interposiçãode forças entre dois partidos antagônicosque aceitam essa mediação, que concordamque a força interposta supervisione a pazou o armistício assinado, como ocorreu naprimeira operação de paz da ONU, em 1948,entre árabes e israelenses.

As operações de paz que se avizinhamserão robustas, multidimensionais, terãooutros propósitos principais, inclusive ode proteger populações civis, ameaçadasou atacadas por grupos armados.

Nessas circunstâncias, muito provavel-mente com alguma frequência, os capacetesazuis terão que recorrer ao emprego de seuarmamento não com o propósito de prote-ger-se, mas com o intuito de assegurar o cum-primento da missão para a qual forem desig-nados. Situação que poderá ensejar, inclusi-ve, o emprego de armamento mais pesado.Como ressalta o documento New Horizon:“No nível tático uma abordagem robusta sig-nifica que os contingentes podem ser obri-gados a usar força em defesa do Mandato”.6

Nesse contexto é relevante considerar queas forças de paz tudo devem fazer para asse-gurar que o armamento empregado destina-sea garantir a segurança e o bem-estar da popu-

lação do país hospedeiro e que as forças depaz são a garantia de seu bem-estar e datranquilidade da população, que não seriamalcançados sem a presença das forças de paz.

Essa é uma recomendação que leva a pro-funda reflexão, pois constitui meta de muitodifícil consecução, particularmente quandoa operação de paz dura além do previsto,sem alcançar os propósitos de estabilidadepolítica e social, de fortalecimento das insti-tuições e instâncias estatais, de melhoria dainfraestrutura para os quais foi estabelecida.

Não se pode esquecer que, com o passardo tempo, os capacetes azuis, por mais amis-tosos que sejam, assumem conotação detropa de ocupação, uma vez que tropa es-trangeira será sempre tropa estrangeira, pormais afinidade que se obtenha com a popu-lação local. Os procedimentos doutrináriosadotados pela força de paz para sua própriasegurança, o ostensivo portar do armamen-to diante da população, a prioridade paraseus deslocamentos, o deslocar de suas vi-aturas blindadas que, por si só, já conotamcerta agressividade, tudo leva à degrada-ção do seu ambiente operacional, aumen-tando significativamente a possibilidade e aprobabilidade de conflitos com a populaçãoque pretendem proteger, gerando distúrbi-os e inquietudes, facilmente manipuladas porgrupos com interesses antagônicos.

Nesses ambientes operacionais, pareceóbvio que o excessivo, desproporcional oudesnecessário emprego da força para a ma-nutenção da ordem pública claramente tra-rá consequências negativas. Mas, por ou-tro lado, pareceria tão óbvio que a inabili-dade, a excessiva aversão ao risco que im-pede a ação, mesmo que necessária ourequerida, poderá igualmente causar iguaisdanos negativos?

Ora, estamos diante de um tênue estadode equilíbrio, diante de um dilema, no qual

6 New Horizon, seção III. A Robust Approach to Peacekeeping.

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o acerto da decisão torna-se crucial para osucesso da própria operação de paz.

Mas a quem caberá tomar essa decisão?Na maioria das vezes, provavelmente, ao

cabo ou ao sargento, pois, em decorrênciado emprego descentralizado das forças depaz, normalmente são eles, os cabos e ossargentos, que lideram as frações táticasdesdobradas nas diversas patrulhas ou nospontos fortes. Sem terem tempo suficientepara submeter suas intenções aos escalõessuperiores, são obrigados a decidir, em am-bientes de extrema tensão, se devem ou não(e em que nível de vio-lência) empregar seuarmamento.

Cabe aqui umaquestão: os atuais mo-delos de treinamentodas forças de paz pre-param os graduadospara decidir com pro-priedade? Levam es-sas circunstâncias emconta? Talvez não,uma vez que não hácomo o militar decidircom propriedade semque lhe seja conferidaautonomia.

A autonomia é a condição básica paraque se possa conviver com riscos e comincertezas, para que se possa atuar em am-bientes complexos nos quais a quantidadede possíveis interações é imensa, nos quaisé impossível prever todas as circunstânciasintervenientes e muito menos controlá-las.Ensinamento que a embaixadora ReginaMaria Cordeiro Dunlop, representante per-manente do Brasil junto às Nações Unidas,com muita propriedade assinalou: “Líderesno terreno são responsáveis por sucessos

e fracassos. Ao mesmo tempo, eles devemter autonomia para implementar os manda-tos da missão de acordo com sua experiên-cia e conhecimento (grifo meu)”.7

Normalmente, o treinamento dos milita-res que se preparam para integrar contin-gentes que serão empregados em opera-ções de paz concentra-se em aspectos téc-nicos, em procedimentos de conduta indi-vidual e em noções genéricas sobre hábi-tos, tradições e cultura locais, que são, con-tudo, insuficientes para assegurar-lhes oembasamento cultural adequado.

Mesmo em relaçãoaos oficiais, durantesua formação muitopouco lhes é formal-mente apresentadosobre as instânciasparadigmáticas do ser,sobre as instânciasparadigmáticas dasensibilidade do ser.

Literatura, arte, po-esia e música, com ra-ras exceções, não in-tegram os currículosdas escolas de forma-ção de oficiais e pra-

ças, que, desta forma, não conseguem de-senvolver uma competência cultural queos permita lidar convenientemente com osaspectos humanos dos conflitos presen-tes nas operações de paz. A formação denossos oficiais e praças está excessivamen-te lastrada na tecnologia e nos seus des-dobramentos, o que nos torna autocráti-cos, críticos, controladores, excessivamen-te centralizadores e, sobremaneira, orien-tados para a execução de tarefas, portantofocados mais nos aspectos específicos doque na visão geral do conflito.

7 Discurso proferido pela embaixadora Regina Maria Cordeiro Dunlop no Debate-Geral da ComissãoEspecial de Operações de Paz, Assembleia-Geral – IV Comitê, Nova York, em 22 de fevereiro de 2010.

É necessário, pelo menos,equilibrar o conhecimento

do sensível com oconhecimento do inteligível,a fim de possibilitar que o

militar seja capaz dereconhecer e definir olimite de sua própria

autonomia

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Obviamente, refiro-me às Forças Arma-das brasileiras, embora se eu generalizartalvez não cometa um equívoco muito gran-de, uma vez que a significativa maioria dospaíses contribuintes de forças de paz se-gue semelhante padrão de adestramento.

A tomada de decisão em ambientes com-plexos, incertos e competitivos, nos quaisvontades antagônicas se fazem presentes,impõe que os militares empregados nessesambientes tenham autonomia.

Porém, como nos alerta Castoriadis, acondição fundamental para a autonomia é apossibilidade de questionar tradições; algoque, por definição, exclui todas as socieda-des fundamentadas emsistemas fechados deprincípios doutrinários,em verdades consagra-das, dentre as quais,sem dúvida, enqua-dram-se as instituiçõesmilitares.

Assim, se é absolu-tamente necessárioconferir ao soldadomais autonomia, faz-senecessário também quea instituição aceite pelo menos algum graude questionamento de seus dogmas doutri-nários. Não se trata simplesmente de descum-prir normas e preceitos doutrinários, mas simde poder debatê-los, de poder analisá-los,embora obedecendo-lhes.

Por outro lado, para que tais questio-namentos não sejam levianos ou incon-sequentes, para que o soldado possa ques-tionar com algum grau de razoabilidade, éindispensável oferecer-lhe mais cultura,mais conhecimento. É necessário, pelo me-nos, equilibrar o conhecimento do sensí-vel com o conhecimento do inteligível, afim de possibilitar que o militar seja capazde reconhecer e definir o limite de sua pró-pria autonomia.

Pois, como apontou Castoriadis, o indi-víduo não é separável de sua sociedade, aqual cria seu próprio significado, cria suaprópria estrutura. Nesse sentido, o militar,o soldado, precisa ser tanto autônomocomo capaz de conviver e integrar-se har-moniosamente na sua instituição, o que,penso, só será possível mediante uma mu-dança no enfoque de sua formação militar,que deverá deixar de ser primordialmentevoltada para a tecnologia para focar-se tam-bém nos aspectos humanos e intelectuaisda guerra.

Há necessidade, portanto, de alteraçõesna formação, no preparo e no treinamento

dos militares a seremempregados em mis-sões de paz. Altera-ções que começammuito antes de elesserem selecionadospara tais missões.

Sem dúvida, o alvoprimeiro dessa trans-formação deve ser oCorpo de Praças, cujaformação, como já res-saltei, não só é emi-

nentemente técnica como restrita aos ní-veis técnicos das funções que normalmen-te irão desempenhar, sem maiores preocu-pações com o estímulo à reflexão e ao dis-cernimento. Mudança que também, aindaque em menor grau, deve ser estendida àformação dos oficiais, cuja base acadêmi-ca terá que encontrar um equilíbrio entreas ciências exatas e as ciências humanas.

Ora, esta transformação da instituiçãomilitar, tão necessária para a adequada con-dução das operações de paz robustas quese avizinham, fascina e amedronta; talvezmais amedronte que fascine.

Fascina pela busca de novas capacida-des, fascina pelo desafio de identificar quaisnovas capacidades serão capazes de pro-

A formação militar deverádeixar de ser

primordialmente voltadapara a tecnologia parafocar-se também nosaspectos humanos e

intelectuais da guerra

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porcionar ao soldado o discernimento e aautonomia que dele seesperam.

Por outro lado,amedronta pela neces-sidade, talvez, de rom-per com as atuais es-truturas de ensino etreinamento de quetanto nos orgulha-mos. Nunca é demaislembrar que, normal-mente, nossas escolasgostam de ensinar so-mente aquilo que ob-jetivamente podemavaliar.

Amedronta por-que as Forças Armadas não existem para

realizar operações de paz; elas existem parao cumprimento de seudever constitucionalde defesa e manuten-ção da soberania ple-na da Pátria, da pre-servação e garantiados interesses nacio-nais diante de amea-ças, externas ou inter-nas, decorrentes dosdiferentes conflitosinerentes à conjuntu-ra internacional.

Uma conjuntura naqual o estado moderno,como concebido apósWestfália, tornou-se

pequeno para enfrentar as grandes questões

As Forças Armadas nãoexistem para realizar

operações de paz; elasexistem para o cumprimentode seu dever constitucionalde defesa e manutenção da

soberania plena da Pátria, dapreservação e garantia dos

interesses nacionais diante deameaças externas ou internas

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globais, o que o obriga a coligar-se ou inte-grar-se regionalmente em blocos – e não sepode perder de vista que integração traz, ne-cessariamente, conflitos de interesse. Poroutro lado, os blocos regionais assim forma-dos tornam-se grandes demais para resolveros problemas das comunidades que passama englobar, o que, por sua vez, também podegerar conflitos, embora de diferentes vieses.

Amedronta porque não sabemos se, aoprepararmos adequadamente nossas tro-pas para emprego em operações de paz, asestaremos preparando também para as ope-rações militares ditas convencionais. Ouserá que, à medida que as operações depaz se robustecem e o uso da força torna-se mais previsível, os treinamentos paraambas as operações se assemelham?

Amedronta porque teremos que corrigir opseudoerro de Descartes e eliminar, ou ate-nuar significativamente, a separação, o fos-so hoje existente entre oficiais e praças, inte-grando todos em um mesmo corpo pensante.

Amedronta porque não sabemos se nós,militares, seremos capazes de identificar e deintroduzir as alterações necessárias na formacomo os planejamentos das operações de pazdeverão ser conduzidos, de modo que aspec-tos culturais tenham peso preponderante no

cumprimento da missão e não apenas uma fun-ção acessória, pois, como ressalta Castoriadis,é necessário que se compreenda primeiro aqui-lo que se quer transformar.

Julgo que nesse aspecto reside o valormaior do encontro entre os militares e a Aca-demia. Encontro que, atualmente, vem sen-do insistentemente buscado por esses doisatores em todos os países atualmente en-volvidos com operações de paz, indepen-dentemente de suas diferentes naturezas.Encontro que enseja a perfeita compreen-são das possibilidades e limitações das ins-tituições militares e civis que participam dasoperações de paz, cujo sucesso não podeprescindir da ação coordenada e do enten-dimento mútuo desses dois vetores.

Nós – o vetor militar – e a Academia, asagências e as organizações não governamen-tais – o vetor civil – das operações de pazprecisamos identificar os pontos de contatoentre as funções militares e as funções civis,a fim de fortalecê-los, ao invés de apartá-los,pois, como nos lembra Castoriadis, o modocomo as sociedades são organizadas impedeque seus integrantes possam ver que as coi-sas podem ser diferentes.

Nós, militares, certamente não consti-tuímos a exceção dessa regra...

BIBLIOGRAFIA

Castoriadis, Cornelius. A Instituição Imaginária da Sociedade. Editora Paz e Terra.Czerwinsk, Tom. Coping With The Bounds. Speculations on Nonlinearity in Military Affairs. National

Defense University Washington, DC.Damásio, António R. O Erro de Descartes. Emoção, Razão e o Cérebro Humano. Companhia de

Letras.Van Creveld Martin. Command In War. Harvard University Press.Waldrop, M. Mitchel. Complexity – The Emerging Science at the Edge of Order and Chaos.

Thouchstone.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<ARTES MILITARES> Pensamento militar; Doutrina; Estratégia; Estudo; Arte da guerra;

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A SEGUNDA REVISTA MAIS ANTIGA DO MUNDO

A Revista Marítima Brasileira completou 159 anos em 1o de março de 2010. Fundada em 1851 pelo

Primeiro Tenente Sabino Elói Pessoa,foi a segunda revista mais antiga do mundo

a tratar de assuntos marítimos e navais.Conforme os registros obtidos, a Rússia foi o primeiro

país a lançar uma revista marítima,a Morskoii Sbornik, (1848).

Depois vieram:Brasil – Revista Marítima Brasileira (1851),

França – Revue Maritime (1866),Itália – Rivista Marittima (1868),

Portugal – Anais do Clube Militar Naval (1870),Estados Unidos – U.S Naval Institute Proceedings (1873)República Argentina – Boletín Del Centro Naval (1882).

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SUMÁRIO

IntroduçãoOs interesses brasileiros no marFocos de tensão e instabilidade na regiãoA presença de potências extrarregionais no Atlântico SulConclusão

O ATLÂNTICO SUL NA PERSPECTIVA BRASILEIRADE SEGURANÇA E DEFESA

FERNANDO MANOEL FONTES DIÉGUESVice-Almirante (Refo)

INTRODUÇÃO

Embora no mar não existam áreas de re-ferência notáveis com o significado po-

lítico-estratégico que os centros urbanos,industriais ou governamentais em terra fir-me normalmente têm, ele sempre foi, e per-manece sendo, lugar de atividades e acon-tecimentos decisivos na vida das nações.Imenso espaço comum, aberto à circula-ção de homens e mercadorias em todas asdireções, não poucas vezes deixou de sero espaço natural de intercâmbio entre os

povos para transformar-se em uma arenade competição e conflito.

À luz dessa realidade, patente no cursoda história, proponho-me a examinar nesteartigo o Atlântico Sul como cenárioinseparável das exigências de segurança edefesa do Brasil e, ao mesmo tempo, aber-to à aproximação e ao fortalecimento daconfiança entre as nações situadas às suasmargens ou que nele estão presentes.

São vários os significados que a pala-vra segurança pode sugerir. Ela é aqui en-tendida como uma condição na qual os

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Estados consideram que não correm o ris-co de uma agressão militar, não estão ex-postos a pressões políticas e a imposiçõesou coerção econômicas, de modo que po-dem livremente se dedicar ao próprio de-senvolvimento e progresso.1 A abrangênciada segurança é relativa. Ela nunca é abso-luta; é sempre alguma coisa que se perse-gue. De fato, é muito pouco provável queum Estado possa sentir-se, em qualquermomento, inteiramente livre de eventuaisconstrangimentos ou pressões, sejam po-líticos, econômicos ou mesmo militares.

Já a defesa, embora possa estar associ-ada aos aspectos da segurança acima men-cionados – e não é raro que isso aconteça–, diz respeito mais apropriadamente aoemprego do poder mi-litar. É de praxe conce-ber-se a segurançacomo um estado e adefesa, um ato.

Alerto o leitor parao fato de que o Atlân-tico Sul a que me refi-ro se estende por lati-tudes acima da linhado equador. Não é omesmo Atlântico Sul geográfico. Vale lem-brar que o extremo norte do litoral brasilei-ro e as águas jurisdicionais que lhe sãocontíguas situam-se ao norte do equador.Evita-se, assim, além disso, com esse “ajus-te” na geografia, a divisão artificial de umadas suas principais áreas estratégicas: apassagem entre os salientes nordestino, noBrasil, e o do noroeste da África.

Começo o artigo com um resumo dasatividades que representam interesses bra-sileiros no mar e são, por conseguinte, fa-tores relacionados à segurança do país no

Atlântico Sul. Examino, em seguida, os fo-cos de tensão e instabilidade e a atuaçãode potências extrarregionais nesse ocea-no. Destaco-os como argumentos da dis-cussão, como fatores essenciais de refe-rência na avaliação do panorama da segu-rança no Atlântico Sul. Dou remate ao arti-go com algumas observações sobre aseventuais implicações desse panoramapara o Brasil.

OS INTERESSES BRASILEIROS NOMAR

As atividades de interesse do Brasil noAtlântico Sul contribuem de forma consi-derável para o seu desenvolvimento eco-

nômico e social. Vale apena aqui relembrá-las, ainda que de modosucinto.

Uma dessas ativi-dades é o transportemarítimo, responsá-vel por mais de 95% denosso comércio exte-rior. Centenas de navi-os mercantes por dia

circulam no Atlântico Sul em linhas de co-municação marítimas de interesse do Bra-sil. Embora em 2009 tenha sofrido uma que-da de 24%, causada pela crise financeirainternacional, em 2008 esse comércio al-cançou a cifra de US$ 371 bilhões, corres-pondente a algo entre 15 e 20% do ProdutoInterno Bruto (PIB) do País.2 A importânciado transporte marítimo não se limita à con-sideração dos benefícios econômicos queele viabiliza diretamente. Tende a ter umefeito interativo e estimulante em outrasáreas da economia: na Marinha Mercante,

1. Esse conceito de segurança se baseia naquele proposto por um grupo de cientistas políticos reunido emTashkent, capital do Uzbequistão, sob os auspícios da ONU, em maio de 1990.

2. Do site do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Acesso em 8/5/2010.

As atividades de interessedo Brasil no Atlântico Sul

contribuem de formaconsiderável para o seu

desenvolvimentoeconômico e social

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na construção naval, no desenvolvimentodos portos.

Outra atividade relevante é a explora-ção de petróleo no mar. Em 2009, 91% daprodução de petróleo – cerca de 2 milhõesde barris diários – foram extraídos do mar.Nesse mesmo ano, as reservas provadasdo País eram de 13 bilhões de barris. Se-gundo especialistas, as reservas de óleo egás do pré-sal podem chegar a mais de 100bilhões de barris de “óleo equivalente” (uni-dade usada para expressar volumes de pe-tróleo e gás natural na mesma unidade demedida). Assumindo um valor médio porbarril durante a vida útil dos campos dopré-sal, estimam esses especialistas que aexploração de reservas desse porte poderáresultar em uma receita de US$ 11 trilhõesem 30 anos ou, em média, US$ 366 bilhõesao ano.3

Embora a pesca não tenha uma projeçãoeconômica e financeira em níveis similaresaos do comércio e da exploração de petró-leo no mar – a geração de renda por ela pro-porcionada se situa em torno dos US$ 5 bi-lhões anuais –, dá razoável contribuição, emespecial no Norte e no Nordeste, onde sedestaca a pesca artesanal, às economias lo-cais. No Sul e no Sudeste predomina a pes-ca industrial, efetuada por uma frota estima-da em cerca de 3 mil embarcações. Digno denota na exploração dos recursos vivos domar é o avanço da aquicultura. Nos últimosanos ela vem sendo responsável por umapreciável aumento anual das exportaçõesbrasileiras de pescado.4

Outro tipo de atividade é o de levanta-mentos e pesquisas no mar. A exploraçãocientífica do mar, além de facultar ao Paísmaior independência no campo das ciênci-

as e da tecnologia marítimas, reforça o po-tencial de defesa de sua soberania e, no fimde contas, sua própria segurança, ao pro-porcionar um conhecimento mais confiávele exato do ambiente e, portanto, do espaçomarítimo de sua atuação. Abre caminho parao aproveitamento racional de recursos atéentão inexplorados, como, por exemplo, osnódulos polimetálicos do fundo do mar, oua utilização da energia, que, sob a forma deondas e marés, encontra-se armazenada nosoceanos. O Brasil conta atualmente com maisde duas dezenas de instituições participan-tes de vários programas nacionais, comoLevantamento da Plataforma Continental(Leplac) e Avaliação dos Recursos Vivos daZona Econômica Exclusiva (Revizee), coor-denados pela Marinha.

Pode-se concluir, enfim – é o que pre-tendo aqui ressaltar, ainda que a partir des-sa resumida e incompleta menção às ativi-dades marítimas de interesse do País –, quea importância do mar para o Brasil derivade sua caracterização como um prolonga-mento natural e complementar do espaçocontinental. No mar se realizam atividadesque se articulam e das quais dependem, emlarga escala, as atividades em terra.

Por isso mesmo, o livre uso do mar écondição indispensável ao desenvolvimen-to e ao progresso do País. As agressõesou restrições a que as atividades marítimaspossam estar sujeitas, em caso de conflito,ou mesmo em tempos supostos de paz, afe-tariam, em maior ou menor grau, a prosperi-dade e o bem-estar social da nação. A pro-moção desses objetivos sem entraves ouantagonismos depende dos fatos e circuns-tâncias que balizam o panorama da segu-rança no Atlântico Sul.

3. Fantine, José & Alvim, Carlos Feu – Petróleo e Soberania – Scientific American – Oceanos 4 –Petróleo, Poluição e Energias Alternativas – p. 17 a 21 – s/data.

4. Vidigal, Armando Amorim Ferreira e outros – Amazônia Azul: o mar que nos pertence – Rio deJaneiro: Record, 2006 – p.149 a 152.

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FOCOS DE TENSÃO EINSTABILIDADE NA REGIÃO

Alguns dos elementos essenciais naavaliação desse panorama são os focos detensão e instabilidade na região. A instabi-lidade nos países ribeirinhos põe em riscoos interesses brasileiros. Tende a atropelaro andamento harmonioso de nossas rela-ções com esses países. A estabilidade e apaz no Atlântico Sul e a evolução dos paí-ses ribeirinhos de maneira equilibrada, semsobressaltos, são condições favoráveis àsegurança e à liberdade de manobra políti-ca do Brasil no campo internacional.

Nessa perspectiva, pode-se dizer queocorreram na margem africana, nos últimos20 e poucos anos, acon-tecimentos bastantepositivos. A Namíbiaconquistou sua inde-pendência. O apartheidruiu na África do Sul. Aguerra civil terminou emAngola. Com o fim daGuerra Fria, desvanece-ram-se os receios rela-tivos à presença de uni-dades navais e aeronaves soviéticas na mar-gem ocidental do continente.

Não se pode dizer, no entanto, que essesfatos inauguraram uma era de paz e seguran-ça na região. Os alinhamentos da Guerra Friase desfizeram, mas deixaram o campo livrepara o agravamento de tensões e a ocorrên-cia intermitente de conflitos com raízes emrivalidades ou causas locais: étnicas, religio-sas, separatistas ou, simplesmente, disputaspelo poder em âmbito nacional ou regional.Mais de uma dezena de países do continentepassaram, nos últimos dez ou 15 anos, porguerras civis ou outros tipos de conflito.Muitas dessas guerras terminaram, mas a pazpermanece frágil, muitos focos de luta conti-nuam acesos.

Voltando a atenção para o sul da mar-gem sul-americana, logo se destaca oMercosul como um polo aglutinador dacooperação entre os países da sub-região.O futuro do Mercosul é, no entanto, hojeem dia, uma incógnita. O processo deintegração entre seus membros encontra-se, há alguns anos, paralisado. A percep-ção dos países menores, Uruguai eParaguai, é a de que o Mercosul tem selimitado a beneficiar o Brasil e a Argentina.O governo argentino cria restrições alfan-degárias às importações de produtos bra-sileiros. As prováveis implicaçõesambientais da construção de duas fábricasde celulose na margem uruguaia do Rio Uru-guai levantam protestos na Argentina. Nes-

se mesmo contexto doCone Sul, as preten-sões paraguaias põemem risco a solidez doTratado de Itaipu.

É bem verdade, noentanto, que essesdesencontros não setraduzem na geraçãode níveis insuportá-veis de tensão; não se

projetam sob a forma de divergências quenão possam ou já não tenham sido mesmosuperadas. Podem até ser vistos como na-turais. O apego à precedência do interessenacional nunca está ausente das relaçõesinternacionais.

Já a conjuntura no norte da América doSul apresenta-se de forma bem mais inqui-etante. A guerrilha associada ao narcotráfi-co engolfa a Colômbia em um conflito cujosrescaldos atravessam as fronteiras do país.O ataque colombiano, em março de 2008, aum grupo de guerrilheiros em territórioequatoriano deu motivo à ocorrência deuma séria crise na região. Equador eVenezuela retiraram seus embaixadores deBogotá e mobilizaram forças na fronteira

O futuro do Mercosul é,hoje em dia, uma incógnita.O processo de integração

entre seus membrosencontra-se, há alguns

anos, paralisado

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com a Colômbia. Já em julho deste ano, oPresidente da Venezuela foi acusado detolerar a presença de guerrilheiros colom-bianos em seu país. Não é de todo impro-vável, enfim, que o antagonismo, até entãoretórico, entre os governos americano evenezuelano possa assumir um tom maisgrave e hostil, envolvendo, inclusive, ou-tros países.

A aproximação entre os governos daVenezuela e da Rússia é mais uma variávela alterar o equilíbrio geopolítico na região.Desde 2005, a Vene-zuela é o principal cli-ente da indústria béli-ca russa na AméricaLatina. Um acordo en-tre os dois países pre-vê a ajuda de Moscouà construção de umausina nuclear na Vene-zuela. Na mesma épo-ca da assinatura doacordo, as Marinhasdos dois países reali-zavam exercícios noCaribe. Em abril desteano, foi anunciado, navisita do Primeiro-Mi-nistro Vladimir Putin aCaracas, o apoio russo à implantação daindústria espacial venezuelana.

Os contenciosos territoriais reforçamo ambiente de tensão. O Lago de Mara-caibo é alvo de disputas entre a Colôm-bia e a Venezuela. A Venezuela não reco-nhece a fronteira com a Guiana e reivin-dica nada menos que três quartos do ter-ritório vizinho.

Outro desafio à estabilidade e à segu-rança no Atlântico Sul é representado pe-las organizações criminosas transnacio-

nais, atuantes no tráfico de drogas, armase pessoas, e na pirataria. Tais atividadescriminosas tendem, à medida que seus efei-tos se alastrem, a degradar os laços de con-vivência social, a solapar a confiança doscidadãos nos governantes e nas institui-ções. Um relatório da Organização das Na-ções Unidas (ONU) divulgado em junhodeste ano destaca a grave situação de áre-as da África Ocidental, transformadas nosúltimos anos em importantes centros de trá-fico de cocaína.5 Os números referentes à

pirataria também nãosão animadores. Se-gundo a Câmara Inter-nacional de Comércio,foram registrados em2009 28 ataques de pi-ratas a navios mercan-tes em águas ao largoda Nigéria.6

A PRESENÇA DEPOTÊNCIASEXTRARREGIONAISNO ATLÂNTICOSUL

Outro elemento es-sencial de referência é

a presença e atuação de potênciasextrarregionais no Atlântico Sul.

A presença do Reino Unido se manifes-ta na posse de territórios insulares, utiliza-dos como pontos de apoio e controle deáreas no Atlântico Sul: Ascensão, SantaHelena, Tristão da Cunha, Malvinas,Geórgias do Sul, Sandwich do Sul eÓrcadas do Sul. A importância estratégicada Ilha de Ascensão, situada em posiçãocentral no Atlântico Sul, ficou demonstra-da na Guerra das Malvinas, em 1982.

A conjuntura no norte daAmérica do Sul

apresenta-se de forma bemmais inquietante

A aproximação entre os

governos da Venezuela e daRússia é mais uma variável

a alterar o equilíbriogeopolítico na região

5. Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime – Relatório Mundial sobre Drogas 2010 –Divulgado em junho/2010, citado no site DefesaNet. Acesso em 26/6/2010.

6. Segundo o Escritório Marítimo Internacional, órgão da Câmara Internacional de Comércio.

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A disputa pelas Malvinas (Falklandspara os ingleses) continua. As pretensõesda Argentina em relação ao arquipélagopermanecem inalteradas. Após a guerra, oReino Unido reforçou a defesa das ilhascom a presença de navios, aeronaves e maisde mil soldados. Emfevereiro deste ano, ocontencioso experi-mentou um novo picode tensão com o anún-cio pelo governo bri-tânico do início da ex-ploração de petróleono subsolo em tornodas ilhas. Em represá-lia, o governo argenti-no adotou medidas decontrole mais rigoro-sas, dificultando o trá-fego para as ilhas apartir do continenteou passando por suaságuas jurisdicionais.

Não é muito prová-vel – pelo menos acurto ou médio prazo– uma solução políti-ca definitiva para adisputa entre os doispaíses. A relutância deLondres em negociarcom Buenos Aires pa-rece ter outro motivoalém das jazidas depetróleo das Malvi-nas. Juntamente comas ilhas vizinhas, também ocupadas peloReino Unido, elas são, de fato, uma posi-ção estratégica privilegiada, um portão deentrada e controle de amplas áreas da An-

tártica, com seus imensos recursos vivos,energéticos e minerais, e a maior reservade água doce do planeta.7

No final de fevereiro, representantes dos32 países da América Latina e do Caribe,reunidos em Cancun, respaldaram “os le-

gítimos direitos da Ar-gentina na disputa desoberania com o Rei-no Unido relativa àsIlhas Malvinas”.8 Vol-tando os olhos para ooutro lado da disputa,não é descabido sus-peitar que, no caso deuma crise mais grave,o Reino Unido tenhao apoio de seus alia-dos da Organizaçãodo Tratado do Atlân-tico Norte (Otan).9

Outra presença ex-trarregional importanteno Atlântico Sul é a dosEstados Unidos, únicapotência mundial capazde projetar e sustentaroperações em larga es-cala a grandes distânci-as. Alguns fatos suge-rem o crescimento, nosúltimos anos, do inte-resse americano noAtlântico Sul.

Um deles se mani-festa na intensificaçãodas operações de na-

vios da Marinha americana na costa oci-dental da África, em especial no Golfo daGuiné, acompanhada de ofertas de treina-mento e assistência. A criação, em 2007, do

7. Rozoff, Rick – South Atlantic: Britain may provoke new conflict with Argentina – Noticiarionaval.Acesso em 25/2/2010.

8. Apoio em bloco à Argentina – O Globo, 23/2/2010.9. Rozoff, Rick – idem.

Outro desafio àestabilidade e à segurança

no Atlântico Sul érepresentado pelas

organizações criminosastransnacionais, atuantes notráfico de drogas, armas e

pessoas, e na pirataria

A disputa pelas Malvinascontinua. As

pretensões da Argentinaem relação ao arquipélagopermanecem inalteradas

Alguns fatos sugerem o

crescimento, nos últimosanos, do interesse

americano noAtlântico Sul

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Comando África, abrangendo os países daÁfrica Ocidental, antes vinculados ao Co-mando Europeu, é mais um desses fatos aressaltar. Não estaria longe da verdade afir-mar que a importância da África Ocidentalpara os EUA vem crescendo à medida que,diante das incertezas políticas do OrienteMédio, crescem suas importações de pe-tróleo da região. Nigéria e Angola estãoentre os dez maiores fornecedores do país.

Já na margem sul-americana, a presençamilitar americana na Colômbia é outro fatoexpressivo. Fora os países do Oriente Mé-dio, a Colômbia é aquele que mais recebeajuda militar dos EUA: cerca de US$ 6 bi-lhões desde 1999. O acordo entre os doispaíses, com vistas à utilização pelos EUA,por dez anos, de setebases colombianas emoperações – conformedeclarado – de comba-te ao narcotráfico e aoterrorismo, suscitadesconfianças e reser-vas da parte dos paí-ses sul-americanos.Duas dessas bases se situam no litoral les-te da Colômbia: a Base Naval de Cartagenae a Base Aérea de Malambo, de onde ope-ram aeronaves de patrulha marítima.

A reativação, em 2008, da 4a Esquadra,subordinada ao Comando Sul dos EUA, émais uma decisão sinalizadora do foco ame-ricano no Atlântico Sul. Um contingentede 120 militares na Base Naval de Mayport,na Flórida, é responsável pelo planejamen-to, comando e controle e apoio logístico àsunidades da Esquadra. Navios serão des-tacados, quando necessário, da 2a Esqua-dra, baseada no Atlântico Norte.

A atribuição da responsabilidade peloAtlântico Sul, de forma direta e exclusiva, aum novo comando não é necessariamente– ressalto esse ponto – produto de umairredutível disposição intervencionista ou

uma medida vinculada à aplicação de umanova política de emprego da força em qual-quer situação em que os interesses ameri-canos se vejam ameaçados. Longe disso.Mas é um evidente sinal da maior atençãodo governo americano às mudanças quese processam no panorama político-estra-tégico e à salvaguarda de seus interessesno Atlântico Sul.

Várias razões – ou todas elas em con-junto – poderiam explicar a reativação da4a Esquadra: a postura desafiadora e a apro-ximação do governo venezuelano com o daRússia, cujos navios passavam a ser vis-tos em exercícios no Caribe; o monitora-mento das novas descobertas e da explo-ração de petróleo na plataforma continen-

tal de países como oBrasil, a Nigéria e An-gola; como um contra-peso à expansão dapresença econômicada China nos países ri-beirinhos, em particu-lar na África.

E, de fato, nos últi-mos anos, essa presença é cada vez maisforte e difusa. Não se vincula à posse deterritórios ou à exibição de força militar, masse revela – não creio que seja exageradousar essa palavra – avassaladora no cam-po da economia. A indústria de construçãonaval chinesa é uma das três maiores domundo. Entre os 20 maiores portos, noveestão na China, inclusive o maior, o de Xan-gai. A maior frota do mundo em número denavios transporta grande parte de seu co-mércio. O crescimento do país aguça seuapetite por energia e matérias-primas e es-timula a realização de vultosos investimen-tos no exterior.

Em 2009, a China superou os EstadosUnidos como o maior parceiro comercialdo Brasil. Segundo dados do Banco Cen-tral, os investimentos diretos chineses no

Em 2009, a China superouos Estados Unidos como omaior parceiro comercial

do Brasil

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primeiro trimestre deste ano colocaram opaís na posição de quinto maior investidorestrangeiro no Brasil. Com as aquisiçõesem andamento ou já realizadas após o pri-meiro trimestre, nos setores de petróleo emineração, deve assumir posição aindamais elevada.10

Cresce o comércio chinês com os de-mais países do Mercosul. Entre 2007 e 2009,as exportações chinesas para a Argentina,o Paraguai e o Uruguai tiveram um aumen-to de 7,3%, enquanto as vendas brasileiraspara os mesmos paísescaíram 18%.11

O comércio com aÁfrica como um todopassou de US$ 10 bi-lhões em 2000 paraUS$ 90 bilhões em2009, superando osUS$ 86 bilhões dosEUA nesse últimoano. Segundo umamatéria publicada emjulho na revista Time,com o sugestivo títu-lo “China’s new continent”, mal passa ummês sem que haja o anúncio de um novoinvestimento chinês de bilhões de dólaresna África: em refinarias na Nigéria; na ex-ploração de petróleo no mar em Angola;no sistema bancário na África do Sul.12

A presença chinesa suscita, enfim, dúvi-das quanto a seus eventuais desdobramen-tos. Dúvidas que se refletem, por exemplo,na preocupação demonstrada, ainda emmarço de 2006, pelo General Bantz J.Craddock, então chefe do Comando Sul dos

EUA, em depoimento à Comissão das For-ças Armadas da Câmara, com a crescenteparticipação em cursos e treinamentos demilitares latino-americanos na China.13

Dúvidas que também são passíveis deaflorar das palavras do contra-almirantechinês Zhang Huachen, quando associa,em entrevista à agência de notícias estatalXinhua, a estratégia naval à expansão dosinteresses econômicos de seu país: “Comas mudanças de nossa estratégia naval,passamos da defesa costeira à defesa ma-

rítima de longa distân-cia”.14 É bem verdadeque o almirante tinhaem mente, ao usar aexpressão “longa dis-tância”, a projeção dopoder naval chinêspara além de suaságuas costeiras até osportos petrolíferos doOriente Médio e linhasde navegação do Pa-cífico. Mas não seriaum absurdo suspeitar

que os interesses do país possam levar seupoder naval a frequentar, no futuro, maresainda mais distantes.

Deve-se lembrar, por fim, a presença daFrança no Atlântico Sul. Ela se manifestana América do Sul com a Guiana Francesa,Departamento Francês Ultramarino. Namargem africana, a França procuraaprofundar laços de cooperação com asantigas colônias. A “parceria estratégica”entre o Brasil e a França, centrada na cons-trução dos submarinos previstos na Estra-

10. Desembarque chinês – O Globo, 22/5/2010.11. China beats Brazil in its own backyard as BRIC summit seeks unity – Noticiarionaval – Acesso em

21/4/2010.12. China’s new continent – Time, 5/7/2010.13. A batalha pela América Latina – O Globo, 2/4/2006.14. Citado em Forças Armadas chinesas querem expandir seu poder naval – Matéria do New York Times,

transcrita em notícias.terra.com.br/mundo. Acesso em 24/4/2010.

O Brasil não se deparacom adversários ou

inimigos, com uma ameaçaconcreta, direta, muito

menos sufocante ouinexorável, a seus

interesses e segurança, noou a partir do Atlântico Sul

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tégia Nacional de Defesa (END), deve oca-sionar uma maior aproximação entre os doispaíses no campo militar naval.

CONCLUSÃO

O Brasil não se depara com adversáriosou inimigos, com uma ameaça concreta, di-reta, muito menos sufocante ou inexorável,a seus interesses e segurança, no ou a partirdo Atlântico Sul. Os focos de tensão ouinstabilidade na região potencializam riscos,podem ser vistos como incubadoras de con-flitos passíveis de se alastrarem pelo contá-gio, mas não represen-tam propriamente umaameaça. O mesmopode ser dito da atua-ção das potênciasextrarregionais. Elasintroduzem no cenário– é verdade – elemen-tos de força e poderque tendem a ter, emcertos casos mais es-pecíficos, um efeitodesestabilizador, masessa não é uma tendên-cia generalizada.

Não é nada improvável, contudo, que,na hipótese – insisto nesse ponto: apenaspor hipótese, pois só os incautos e temerá-rios se julgam capazes de prever o futuro –de um eventual agravamento das tensões,alimentadas pela instabilidade, por pres-sões voltadas à satisfação de interessesna região, a ameaça possa se concretizarsob a forma de contestações à soberanianacional sobre certas áreas marítimas, dehostilidades contra o tráfego marítimo e opatrimônio brasileiros.

Mas também não se deve esperar queas questões de segurança e defesa noAtlântico Sul se limitem a refletir a influên-cia de fatores originários exclusivamente

da região. Em um mundo plano, globaliza-do, tais questões não podem conservar-seimpermeáveis às mudanças em curso notabuleiro geopolítico mundial, ao impactodemolidor das crises financeiras, aos efei-tos econômicos e sociais dos desequi-líbrios na distribuição de alimentos ou daescassez de água e energia. Seria impru-dente supor que o Brasil possa estar sem-pre livre de riscos ou sobressaltos, quenunca possa deparar-se com iniciativasexternas mais agressivas ou hostis. É con-cebível que as sequelas de um mundo emtransição tornem esse mundo mais nervo-

so e inseguro.O livre uso do mar

pelo Brasil, diante deameaças com que,eventualmente, possavir a defrontar-se noAtlântico Sul, depen-derá em grande parte,e em primeiro lugar, dacapacidade de suasForças Armadas os-tentarem uma imagemcapaz de desencorajaragressões. Uma ima-

gem capaz de suscitar, em suma, um efeitoinibidor.

Essa capacidade de ação militar nãopode prescindir do efetivo controle de umaárea marítima que tem um significado es-tratégico mais crítico para o País, equiva-lente a mais de 50% de seu território conti-nental, na qual a soberania e a jurisdiçãonacionais devem prevalecer sem restrições:a Amazônia Azul, constituída pela ZonaEconômica Exclusiva e a Plataforma Conti-nental, que, em alguns pontos do litoral,chega a 350 milhas marítimas de distânciada costa. Um valioso instrumento dessecontrole será o Sistema de Gerenciamentoda Amazônia Azul, concebido pela Mari-nha como um projeto nacional, à semelhan-

O livre uso do mar peloBrasil, dependerá em

grande parte, e emprimeiro lugar, da

capacidade de suas ForçasArmadas ostentarem uma

imagem capaz dedesencorajar agressões

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O ATLÂNTICO SUL NA PERSPECTIVA BRASILEIRA DE SEGURANÇA E DEFESA

ça do Sistema de Vigilância da Amazônia(Sivam) e do Sistema de Proteção da Ama-zônia (Sipam).

A prioridade atribuída na END, entreoutros objetivos estratégicos, à negaçãodo uso do mar a qualquer concentração deforças hostis que se aproxime do Brasil pelomar impõe-se como decorrência lógica enatural de uma concepção estratégica vol-tada para o controle e proteção da Amazô-nia Azul. Para isso, a Marinha deverá con-tar com uma força de submarinos conven-cionais e de propulsão nuclear. Nesse con-texto, a END estabelece, ainda, como fo-cos de atuação da Marinha a defesa dasplataformas petrolíferas, dos arquipélagose das ilhas oceânicas nas águas jurisdi-cionais brasileiras; e a resposta a qualquerameaça, por Estado ou forças não conven-cionais ou criminosas, às vias marítimas decomércio do País.

Mas já dizia um velho ditado que é me-lhor prevenir do que remediar. Daí o senti-do de iniciativas, articuladas com a políticaexterna, que reforcem a confiança entre asnações e contribuam para o desenvolvi-mento e a consolidação de um clima de se-gurança no Atlântico Sul. Entre tais inicia-tivas, está o intercâmbio entre as Marinhasda região.

São exemplos desse intercâmbio: a rea-lização de exercícios em conjunto, as reu-niões bilaterais a nível de Estado-Maiorpara a discussão de temas militares de in-teresse comum, a parceria no controle deáreas marítimas, a mútua participação emcursos e estágios, em diversos tipos de trei-namento. Merece aqui especial menção oapoio dado pela Marinha à criação e à for-mação do pessoal da Ala Naval das ForçasArmadas da Namíbia. Embora não consistapropriamente em um intercâmbio, não sedeve esquecer também a participação deunidades ou militares brasileiros em opera-ções de paz das Nações Unidas no Haiti,na República Democrática do Congo, emAngola, na Costa do Marfim, na Guiné-Bissau e no Senegal.

O Atlântico Sul é, em suma, sob o pontode vista das exigências de segurança e de-fesa do País, um prolongamento espacialaberto à projeção e atuação dos protago-nistas de crises, como a da Guerra da La-gosta, ou de conflitos, como o da Guerradas Malvinas. Mas pode ser também umcenário propício à maior cooperação e aocompartilhamento de interesses entre ospaíses da região, sobretudo diante dos ris-cos e incertezas embutidos no panoramageopolítico de um mundo em transição.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<POLÍTICA> Segurança; Estratégia; Atlântico Sul; Defesa; Poder marítimo; Geopolítica;Mercosul; Relações internacionais; Economia;

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Ao longo de muitos anos de serviçosárduos – 1910 a 1947 – o Almirante Braz

de Aguiar identificou os limites do Brasil comBolívia, Peru, Colômbia, Venezuela, GuianaInglesa (Guiana), Guiana Holandesa(Suriname) e Guiana Francesa, totalizandocerca de 10.385 quilômetros demarcados. Foio árbitro designado para solucionar as diver-gências entre o Peru e o Equador surgidasno decorrer da execução do Protocolo de Li-mites, assinado no Rio de Janeiro, em 29 dejaneiro de 1942. Bem merece Braz de Aguiaros títulos de “Bandeirante das Fronteiras Lon-gínquas1” e “Cidadão da América”.

O Almirante Braz Dias de Aguiar nasceuno Rio de Janeiro, em 3 de fevereiro de 1881,e faleceu no dia 17 de dezembro de 1947.

ALMIRANTE BRAZ DIAS DE AGUIAR– GIGANTE DA NACIONALIDADE!

PAULO CEZAR DE AGUIAR ADRIÃOContra-Almirante (Refo)

Seus pais foram o Capitão-Tenente JoaquimDias de Aguiar e D. Amélia Siqueira Diasde Aguiar. Teve dois irmãos: o Guarda-Marinha Álvaro Dias de Aguiar, falecidono naufrágio do Cruzador Aquidabã, em1906; e Mário Dias de Aguiar. Casou-secom Esther Neiva Dias de Aguiar, comquem teve três filhas: Maria Amélia Neivade Aguiar Nelson, Maria Magdalena Neivade Aguiar Adrião e Maria Luiza de AguiarNeiva. Teve quatro netos: Maria Helena deAguiar Neiva, Ronaldo de Aguiar Neiva(médico), Paulo Cezar de Aguiar Adrião (al-mirante) e Roberto de Aguiar Neiva.

Entrou para a Escola Naval como aspi-rante a guarda-marinha, em 7 de abril de1899. Foi declarado guarda-marinha aluno

1 N.R.: Matéria publicada na RMB do 3o trimestre de 2001, p. 39, com o título Bandeirante dasFronteiras Remotas, de autoria do Almirante Roberto Gama e Silva.

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em 13 de janeiro de 1902 e guarda-marinhaconfirmado (segundo-tenente) em 9 de ja-neiro de 1903. Embarcado no Navio-EscolaBenjamin Constant, participou da viagemde instrução de guardas-marinha realizadade 17 de agosto de 1903 a 24 de março de1904, quando foram visitados os portos deNova York, Plymouth, Cherbourg, Ferrol,Lisboa e Las Palmas. Nessa viagem, segun-do testemunho do Capitão de Mar e Guer-ra Didio Iratym Affonso da Costa, “Brazde Aguiar era um dos que maispraticavam a contemplaçãodos astros e a observaçãoinstrumental correspon-dente, entremostrando oseu destino de astrôno-mo e demarcador defronteiras”.

Em outubro de 1904,a bordo do EncouraçadoDeodoro, viajou paraMontevidéu e BuenosAires a fim de assistir àposse do PresidenteManoel Quintana.

Entre 1904 e 1906, per-maneceu embarcado em na-vios da Esquadra, entre elesos encouraçados Deodoro eFloriano, até que, em 1907, foi de-signado para servir no ComandanteFreitas, subordinado à Repartição da Car-ta Marítima, onde ganhou destaque pelosserviços de levantamento hidrográfico queexecutou.

Ainda como reforço à sua futura voca-ção amazônica, os últimos trabalhos de Brazde Aguiar como oficial do ComandanteFreitas foram executados na Amazônia bra-sileira. Além dos levantamentos executa-dos na calha do Amazonas, até a altura deManaus, o nosso herói foi destacado paraselecionar os sítios, definidos por coorde-nadas precisas, para instalação dos faróis

projetados para o Cabo Orange, ponto maissetentrional do litoral brasileiro, e do CaboNorte, também no litoral do Amapá.

Nessa mesma comissão, embarcado noAviso Jutaí, em lanchas ou canoas, insta-lou estações termopluviométricas em diver-sos pontos, depois de determinadas as res-pectivas coordenadas geográficas, todoseles localizados no interior da região, taiscomo: Manaus, Boa Vista, São Gabriel da

Cachoeira, Benjamin Constant, FonteBoa, Coari, Canutama, Manicoré e

Parintins.Regressando ao Rio, em-

barcou no Tiradentes em 29de junho de 1909, quando

integrou a comissão queempreenderia campa-nha hidrográfica no li-toral sul, desde Iguapeaté o Chuí, incluindo aslagoas Mirim e dos Pa-tos. Vale destacar quecoube a Braz de Aguiar,

nessas comissões, esco-lher e determinar as coor-

denadas dos locais ondeseriam estabelecidos os fa-

róis do Oiapoque e do Chuí,os extremos norte e sul do nosso

litoral.Em 1910, já primeiro-tenente antigo, foi

chamado pelo Almirante José CândidoGuillobel, chefe da Comissão Brasileira deLimites com a Bolívia, para integrar a suaequipe de trabalho, inicialmente como co-missário-demarcador, mais tarde como sub-chefe, situações nas quais participou dire-tamente das operações de demarcação dasnossas fronteiras com a Bolívia.

A entrada do Brasil na Primeira GuerraMundial interrompeu por uns anos as ati-vidades de Braz de Aguiar nas nossas fron-teiras mais longínquas, eis que o capitão-tenente de então solicitou dispensa da fun-

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ção que ocupava para cumprir o dever cí-vico-militar de defender a Pátria, embarca-do nos navios da Esquadra. Permaneceuna Esquadra até o final do conflito, sendosua última comissão no período a de co-mandante da Torpedeira Goiás.

Em março de 1920, foi novamente convo-cado para trabalhar nas fronteiras setentrio-nais, desta vez pelo Almirante Antônio AlvesFerreira da Silva, chefe da ComissãoDemarcadora dos Limites com o Peru. Daí pordiante, nunca mais se afastou das fronteirasamazônicas, senão pouco antes de falecer.

Manteve-se na Comissão de Limites Bra-sil-Peru, determinando coordenadas astro-nômicas e plantando marcos de fronteira,até o dia 6 de agosto de 1929, quando, pordecreto presidencial, foi nomeado chefe daComissão de Limites do Setor Norte, com aincumbência de executar os serviços de fron-teiras com a Venezuela e as três Guianas.

Em 1928, ao completar 30 anos de servi-ço na Marinha, sem contar o “tempo decampanha”, foi transferido para a reserva,a pedido, por considerar que “não lhe fica-va bem continuar a usufruir das vantagensde oficial da ativa, sem prestar serviços àMarinha”. Que exemplo edificante para umpaís em que altas autoridades, ainda hoje,acumulam proventos de duas ou mais ori-gens, usufruindo também de todo o con-forto que o mundo moderno oferece!

Passou para a reserva no posto de capitãode mar e guerra graduado, mas continuou àfrente da Comissão de Limites do Setor Norteaté que, por outro decreto presidencial, agoracom as assinaturas do Presidente GetúlioVargas e do Chanceler Osvaldo Aranha, tevea sua nomeação retificada para chefe da Co-missão Demarcadora de Limites – Primeira Di-visão, com os mesmos encargos anteriores.

Em 1930 foi constituída a Comissão Mis-ta de Demarcação dos limites entre o Brasile a Colômbia, ainda sob a direção de Brazde Aguiar, e, em 1937, concluída a demar-

cação de toda a fronteira com o estabeleci-mento de 29 marcos.

Não cabem, num resumo, todos os fei-tos de Braz de Aguiar no decorrer da suaprolongada atuação nas fronteiras maisremotas do território nacional.

Há que se lembrar, todavia, das enormesdificuldades para se chegar a tais lugaresnaquela época. Em 1939, por exemplo, só seatingia Manaus, a partir do Rio de Janeiro, abordo dos navios do Lloyd Brasileiro (a an-tiga Costeira só chegava até Belém), consu-mindo-se perto de 20 dias de viagem, poishavia escalas no caminho. A partir de 1942,surgiram as primeiras linhas comerciais deaviação para a região, que abreviaram paratrês dias a duração do percurso Rio-Manaus,com a pernada final, entre Belém e Manaus,sendo feita em hidroaviões, os famososbaby-clippers da Pan American.

De Manaus para as regiões fronteiriças,completamente desguarnecidas à época, sómesmo embarcando nos gaiolas da AmazonRiver Steamship Company, que consumi-am uma eternidade para chegar aos pontosextremos da navegação fluvial permanen-te, e, daí por diante, “motores de linha”(lanchas que faziam viagens regulares) oucanoas. Comunicações telegráficas só nasduas capitais principais, Belém e Manaus,pois o serviço era executado por uma em-presa estrangeira, a Western Telegraph andTelephone Company.

Pois bem, mesmo diante de todas essasdificuldades, Braz de Aguiar empenhou-se,entre 1930 e 1934, nos trabalhos de demar-cação da fronteira com a Venezuela, inician-do na região de Cucuí, prosseguindo até ocanal de Maturacá e Serra da Neblina e, emseguida, pulando para a Serra de Pacaraima,do Monte Roraima para o sul. Os trabalhosforam suspensos em 1934, a pedido do go-verno venezuelano, para serem recomeça-dos apenas em 1938, ainda sob o comandode Braz de Aguiar, do lado brasileiro.

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Ainda em 1930, foi iniciada a demarca-ção dos limites com a Guiana Inglesa, hojeRepública da Guiana, trabalho que se pro-longou até 1938, com a definição completade 1.605,8 quilômetros de limites.

Em 1935 chegou a vez de demarcar afronteira com a Guiana Holandesa, hojeSuriname, cuja extensão total, 593,04 qui-lômetros, foi totalmente concluída no ins-tante da fixação do marco da Trijunção, lo-calizado entre as nascentes dos rios Jari eMapoani. A partir daí, procedeu Braz deAguiar à definição da fronteira com a GuianaFrancesa, cuja extensão total, de 655 quilô-metros, foi devidamente demarcada.

Além desses serviços de pura delimitaçãode fronteiras (sua tarefabásica), o espírito pio-neiro e a competênciaprofissional que inte-gravam o hidrógrafo, oastrônomo, o geógrafo,o topógrafo e até o na-turalista ainda o impeli-ram a colaborar de for-ma decisiva para o co-nhecimento da geogra-fia regional, numa épo-ca em que os próprios brasileiros só pensa-vam na Amazônia como “uma imensa planícierecoberta por uma floresta infinita!”

Deixou, nesse sentido amplo, diversostrabalhos publicados, que muito contribuí-ram para desvendar os segredos da Amazô-nia, dentre os quais devem ser destacados:

• o levantamento completo da bacia doRio Branco, compreendendo todos os prin-cipais afluentes, como o Uraricoera, oTacutu e o Mucajaí, bem como vários tri-butários secundários, como os rios Surumue Mau (afluentes do Tacutu), Cotingo eUailan (afluentes do Mau), e mais o Amajari,afluente do Uraricoera;

• o levantamento completo da bacia doRio Trombetas, incluindo os perfis dos seus

dois afluentes mais importantes, o Mapuerae o Erepecuru, este último também conheci-do, até hoje, como Cuminá ou Paru do Oeste;

• o levantamento completo da bacia doRio Jari, compreendendo os afluentesIpitinga, Mapari, Culari, Curapi e Cuc; e

• o mapeamento de diversos rios da ba-cia do Rio Negro, com nascentes localiza-das nas serras da Neblina, do Imeri,Taperecó, Gurupira e Urucuzeiro, serviçoexecutado no afã de identificar com preci-são os divisores de águas que delimitariamas fronteiras entre o Brasil e a Venezuela.

Todas as campanhas de Braz de Aguiarforam registradas em detalhados relatóri-os despachados para o Ministério das Re-

lações Exteriores, ór-gão ao qual a Comis-são Demarcadora erasubordinada.

Além desses relató-rios específicos, Braz deAguiar ainda publicoutrabalhos detalhadossobre determinadas áre-as, que muito contribuí-ram para o conhecimen-to da Amazônia.

Um desses trabalhos, denominado OVale do Rio Negro, classificado pelo chefeda Comissão Demarcadora de Limites – Pri-meira Divisão como um subsídio para “ageografia física e humana da Amazônia”,foi encaminhado ao Ministério das Rela-ções Exteriores no mês de janeiro de 1944.

No tocante às tribos indígenas do Vale doRio Negro, incluindo as do tributário Rio Bran-co, afirma o trabalho que “são todas perten-centes às famílias Aruaque e Caribe, sem alu-dir à existência de alguns povos cujas línguasse diferenciam profundamente das faladaspelas duas coletividades citadas”. Prossegueo autor: “Tais povos formam as chamadas tri-bos independentes, que devem ser conside-radas como restos de antigas populações cuja

Foi, sem sombra de dúvida,um dos brasileiros que

mais contribuiram para asoberania brasileira e a

integridade territorial danossa Amazônia

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liberdade foi grandemente prejudicada pelaação opressora de vizinhos poderosos”. Tam-bém os índios Tucanos constituem uma famí-lia à parte, complementa o trabalho.

A obra cita os nomes e as localizaçõesdas tribos Aruaques no Vale do Rio Negro(13 tribos) e das tribos Caribes (sete). Paracompletar o quadro, a obra elaborada porBraz de Aguiar ainda faz menção especialao grupo Tucano, composto de 15 famíli-as, divididas em três ramos: o oriental, queabrange as bacias dos rios Uaupés eCuricuriari; a ocidental, ocupando as baci-as do Napo, Putumaio e Alto Caquetá; e osetentrional, localizado nas nascentes doRio Mamacaua. Completando a listagemdos povos da bacia do Rio Negro, a obraainda faz menção auma publicação de1926, composta pelasMissões IndígenasSalesianas do Amazo-nas, que descreve to-das as tribos da baciado Rio Negro.

No decorrer dessestrabalhos de suma im-portância, Braz deAguiar acabou por lo-calizar as nascentes doRio Orinoco, do outrolado da fronteira, e de-terminar o ponto extremo do setentrião bra-sileiro, que se julgava posicionado noMonte Roraima, mas que ficou provado si-tuar-se nas nascentes do Rio Uailan, naSerra do Caburaí, “que fica 32’ mais a lestee 4’ mais ao norte” da posição anterior-mente considerada, na latitude de 05o 16’20"N e longitude de 060o 12’43" W, numa ele-vação situada a 1.456 metros acima do ní-vel do mar.

A seriedade e a serenidade, além da com-petência, é claro, de Braz de Aguiar torna-ram-no famoso nos países vizinhos, a pon-

to de ter sido ele indicado como árbitro,pelos governos do Peru e do Equador, parasolucionar as divergências entre os doispaíses, surgidas no decorrer da execuçãodo Protocolo de Limites, assinado no Riode Janeiro, em 29 de janeiro de 1942. Entre21 de junho de 1943 e 18 de março de 1945,ei-lo percorrendo toda a zona disputada,para fundamentar o acordo que logrou fir-mar entre as duas partes sobre a zona oci-dental da fronteira e para emitir o seu pare-cer final sobre o setor oriental, onde per-sistia a pendência.

A morte o surpreendeu, a 17 de dezem-bro de 1947, ainda no cargo de chefe daComissão Demarcadora de Limites – Pri-meira Divisão, quando trabalhava na fixa-

ção definitiva dos limi-tes com a Venezuela.

Foram 46 anos cor-ridos de serviços rele-vantes prestados aoPaís, sendo que dessetotal, 30 anos dedica-dos de corpo e alma àAmazônia, que ele de-marcou por inteiro.

Foi, sem sombra dedúvida, um dos brasi-leiros que mais contri-buiram para a sobera-nia brasileira e a inte-

gridade territorial da nossa Amazônia.Se, nos dias atuais, o Brasil já solucio-

nou todas as pendências que recaíam sobreos 10.948 quilômetros de faixa de fronteiraterrestre que separa a nossa maior regiãonatural, objeto constante da cobiça interna-cional, dos países vizinhos, quase tudo sedeve ao trabalho inteligente e incansáveldo “Bandeirante das Fronteiras Longín-quas”, pois de suas observações e dos seuscálculos resultaram mais de 500 pontos as-tronômicos que definem, juntamente comacidentes naturais, essa imensa divisória.

De suas observações edos seus cálculos

resultaram mais de 500pontos astronômicos quedefinem, juntamente com

acidentes naturais,10.385 quilômetros de

faixa de fronteira

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Braz Dias de Aguiar, promovido post-mortem ao posto de contra-almirante em 23de julho de 1951, em reconhecimento pelosserviços prestados à Pátria, bem merecetambém ser incluído entre os “Gigantes daNacionalidade”.

O brilhante historiador Jaime Corte-são já o via como tal, quando afirmou

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<ATIVIDADES MARINHEIRAS>; Cartografia; Hidrografia; Trabalhos geográficos; Rela-ções internacionais;

que Braz de Aguiar “não é daqueles cujonome se afoga no túmulo, com os despo-jos mortais”.

Referindo-se a Braz de Aguiar, OsvaldoAranha declarou: “...ele é um dos maioresbrasileiros vivos...”.

Foi um “Cidadão da América”, que hon-rou o nome do Brasil.

HOMENAGENS

– Avenida Braz de Aguiar, em Belém, Pará;– Centro de Instrução Almirante Braz de Aguiar (Ciaba), da Marinha do Brasil –

em Belém, Pará;– Escola Comandante Braz de Aguiar, em Cruzeiro do Sul, Acre; e– Pico Braz de Aguiar – na fronteira Brasil-Venezuela.

FONTES

1 – Caderneta de Registro Histórico de Braz Dias de Aguiar – Marinha do Brasil.2 – O Bandeirante das Fronteiras Remotas, pelo Almirante Roberto Gama e Silva.3 – “O Cidadão da América”, em Páginas Esparsas – 1948 – Thoribio Lopes, capitão-tenente,

membro do Instituto Histórico do Pará, da Academia Paraense de Letras e da Federação dasAcademias de Letras do Brasil.

4 – Vultos da Geografia do Brasil, Virgilio Correia Filho.5 – Sociedade Brasileira de Geografia – Sessão solene de 8/10/1948 no Palácio do Itamaraty, em

homenagem ao Capitão de Mar e Guerra Braz Dias de Aguiar. Oração proferida pelo Capitãode Mar e Guerra Didio I. A. da Costa.

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O cargueiro liberiano Sea Challenger,de 6.170 toneladas de deslocamento e

131 metros de comprimento, guarnecido comuma tripulação grega e afretado pelo LloydBrasileiro, depois de descarregar toda a suacarga no cais da cidade de Porto Alegre,suspendeu na tarde do dia 22 de março de1970 para atravessar a Lagoa dos Patos, RS,em demanda à cidade de Rio Grande.

Ao anoitecer, por segurança, o práticoresolveu fundear o navio logo depois doCanal da Feitoria, ainda na Lagoa dos Pa-tos, para passar a noite.

Por volta das 6 horas da manhã do diaseguinte, em plena preamar, o prático sus-pendeu com o mercante e, ao tentar girar onavio para seguir em direção a Rio Grande,cometeu um erro, levando o cargueiro aencalhar perpendicularmente ao talude daCoroa dos Patos.

UM DESENCALHE PARA OS ANAIS

OSCAR MOREIRA DA SILVAContra-Almirante (Refo)

O comandante do navio, nas tentativaspara sair, deu máquinas atrás toda força,aumentando o encalhe, pois toda a lama dofundo na região da popa foi sugada edeslocada para vante. Depois, com o auxíliode três rebocadores de porto, tentou puxaro navio de volta para o canal, mas persistiu,durante várias horas com máquinas atrás,agravando mais ainda o encalhe. Sentindoque não sairia dali, na noite do mesmo dia 23de março o comandante do cargueiro solici-tou o auxílio da Marinha do Brasil.

Naquela época, o Comando do 5o Distri-to Naval, sediado em Florianópolis, SC, nãopossuía navios. Um navio de socorro do 1o

Distrito Naval era enviado para o Sul para,em sistema de rodízio, atender aos socor-ros naquela área marítima.

Coincidentemente, na data do encalhedo Sea Challenger, a Corveta Imperial

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UM DESENCALHE PARA OS ANAIS

Marinheiro, V15, sob o comando do Capi-tão de Corveta Roberto de Queiroz Guima-rães, era o navio de socorro na área do 5o

Distrito Naval e estava atracado emPelotas, porto próximo do Canal da Feitoria.

Na madrugada do dia 24 de março, acorveta recebe uma mensagem da Capita-nia de Rio Grande determinando atenderao navio sinistrado. Após o embarque deum prático vindo de Rio Grande, a corvetasuspendeu por volta das 6h30, chegandoduas horas depois próximo ao mercanteencalhado, que marcava o farolete da Co-roa dos Patos aos 110º na distância de 600jardas.

Depois do fundeio e feitos os contatoscom o mercante, o comandante da corvetadeterminou que seu imediato, Capitão-Tenen-te Oscar Moreira da Silva, fosse ao naviocolher informação sobre os detalhes do en-calhe. Ao mesmo tempo, mandou que a lan-cha de bordo efetuasse um levantamentohidrográfico nas imediações do cargueiro.

Pelos cálculos feitos a bordo do mer-cante pelo imediato, levando em conta adiferença de calado antes e depois do en-calhe e usando os gráficos pertinentes,chegou-se à conclusão que o encalhe re-presentava cerca de 1.200 toneladas. Usan-do-se o coeficiente de atrito do fundo (ar-gila compacta) de 0,3, concluiu-se que se-riam necessárias pelo menos 360 tonela-das de tração para tirar o navio da posição.Mesmo retirando as 400 toneladas de óleoremanescente a bordo (única carga possí-vel de ser aliviada), não se conseguiria atração necessária para tirar o mercante dali.Além disso, o fato de o navio ter encalha-do na maré alta, cuja amplitude não eramaior que 15 centímetros, e a ausência decondições dinâmicas provocadas pelaságuas da lagoa nos fizeram desistir da fai-na usando-se somente rebocadores. Res-tava uma solução: remover o terreno sob onavio.

Reportando-se às observações do Co-mandante Leonhardt, mencionadas no re-latório de salvamento da CorvetaAngustura, quanto à eficiência de umadragagem, resolveu-se tentar uma draga desucção, pois sabia-se da existência de vá-rias na Lagoa dos Patos. O difícil foi con-vencer o comandante grego. Levou umpouco de tempo, mas finalmente ele con-sentiu em tentar.

Enquanto o comandante do cargueirotomava as providências para contratar umadraga para o serviço, a corveta, no final datarde, resolveu suspender da área e aguar-dar no porto de Pelotas.

Nesta mesma noite foi contratada umadraga (Antônio Pradel) que se encontravadisponível e próxima a Pelotas. Por sorte,tudo era favorável.

Na manhã do dia seguinte, 25 de março,a draga se deslocou para a área do enca-lhe. A corveta, em seguida, também deman-dou o local. Enquanto a draga não chega-va, o comandante da corveta mandou apri-morar as sondagens na área. A draga sóchegou à tarde.

O Comandante Guimarães convocou umareunião a bordo da corveta para planejar oserviço. Compareceram, além dos seus ofici-ais, o comandante do mercante, o mestre dadraga e o prático. Depois que o mestre da dragaexplanou o seu funcionamento e relatou a suautilização em outro desencalhe, ficou decidi-do que seria aberto um canal com 40 metros delargura (mínimo para operação da draga) des-de a linha de sondagem de 5 metros, na dire-ção do eixo longitudinal do encalhado, e 5,5metros de profundidade (o calado a ré do mer-cante antes do encalhe era de 4,88 m) na alturada popa, continuando por boreste com 6metros de profundidade (Gráfico 1).

A ideia de manobra seria a de tracionaro encalhado, quando possível, para den-tro do canal aberto. Durante 20 horas adraga se preparou para o serviço, inclusi-

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ve montando 150 metros de tubulação flu-tuante (canaria) para a descarga do materi-al sugado do fundo.

Enquanto isso, foi determinado ao mer-cante que lastrasse seus tanques com 300toneladas de água da lagoa.

Gráfico 1

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Na manhã do dia 29 de março, a dragachegou na popa do encalhado e iria come-çar a dragagem naquela área. Neste mesmodia, junto com o representante do armador,recém-chegado de Londres, fez-se um pla-nejamento mais apurado da operação. Con-firmou-se a tonelagem de tração calculadaanteriormente. Foi feita também a transfe-rência de 90 toneladas de óleo dos tanques

de bombordo para os de boreste para for-çar o desmoronamento do barranco sob oencalhado.

Em 31 de março, quando a draga che-gou próximo da proa do mercante, foi feitauma inspeção submarina, em todo o bordode boreste, pelos escafandristas da corveta(imediato e dois mergulhadores), represen-tada pelo Gráfico 2.

Gráfico 2

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A partir daí, passamos a fazer, três ve-zes ao dia, uma inspeção submarina sob ocasco do mercante para avaliar o desmoro-namento do fundo. Constatou-se que so-mente após o corte de 8 metros junto aocostado é que se verificou algum desgastedo fundo sob o encalhado.

O comandante do mercante, para evitara ociosidade a bordo, determinou algumastarefas aos seus tripulantes. A lancha dacorveta estava se deslocando para maisuma inspeção submarina quando um tripu-lante que pintava, pendurado numa pran-cha, a popa do cargueiro caiu e se debatiana água. O imediato determinou ao patrãoda lancha que acelerasse e rumasse para olocal onde o homem tinha caído. Ao che-gar perto o marinheiro afundou. O imediatomergulhou e, por sorte, encontrou o gregose debatendo no fundo. Deu-lhe um “abra-ço de urso” por trás (ensinado no curso demergulho) e o trouxe para a superfície. Osoutros marinheiros da lancha o ajudaram asubir. Depois soubemos que o marinheirogrego não sabia nadar.

Verificou-se que a dragagem junto à popadeveria ser mais aprofundada, mas o mestreda draga se mostrou temeroso em realizar oserviço ali, pois o navio poderia tombar so-bre a draga. Optou-se então por fazer adragagem por bombordo na altura da popa.

No dia 2 de abril, por volta das 11 horas,a draga operava próximo à popa por bom-bordo. A lancha da corveta estava junto aocostado de boreste do encalhado. O imedi-ato estava pronto para mergulhar e efetuara inspeção sob o casco, quando, naqueleexato instante, o mercante adernou paraboreste e desbarrancou para o lado, em-purrando fortemente, com a onda que pro-vocou, a lancha no seu costado. Por ques-tão de minutos e pura sorte do destino, oimediato não ficou esmagado em baixo docasco do mercante. O Comandante Guima-rães assistia, angustiado, a tudo do passa-diço da corveta. (Ver fotos 1 e 2)

Na ocasião foram feitas medidas de cala-do que serviram para o planejamento dodesencalhe definitivo. Foram contratadosmais três rebocadores de porto para ajudarna manobra e controlar o encalhado na saí-da, haja vista as peculiaridades dodesencalhe (pequena área de manobra e aforte correnteza no local). A draga continuoudragando por bombordo pela noite adentro.Foi refeita a transferência de óleo para evi-tar a banda quando o mercante flutuasse.

No dia seguinte, 3 de abril, bem cedo foiiniciada a retirada das 300 toneladas de las-tro e o canal foi todo demarcado com boiasde arinque. A draga desfez toda a amarra-ção e se afastou da área.

Foto 1 – antes Foto 2 – adernado

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Foram iniciados os posicionamentos e aspassagens dos cabos da corveta e dos rebo-cadores de porto (Ver Gráfico 3 e fotos 3 e 4).

Exatamente às 13h45, a corveta come-çou a tracionar com um cabo de 380 metroscom toda força ( 220 rpm e 18,7 toneladas

de tração). O mercante começou a virar suamáquina com toda a força a ré. Enquantoisso, os rebocadores também puxavam, e oda frente mantinha a proa da corveta. Às14h05, o mercante começou a se deslocar,agora seguro pelos outros dois rebocado-res de porto, para evitar que o mesmo en-calhasse do outro lado do canal dragado.Dentro do canal, o mercante parou as má-quinas e fundeou.

Foram largados todos os dispositivos.O Sea Challenger suspendeu em direção aRio Grande com suas próprias máquinas, eàs 16h25 a Corveta Imperial Marinheirosuspendeu altaneira e orgulhosa pelo de-ver bem cumprido, indo para Pelotas co-memorar com toda a tripulação este feitomemorável. Os ensinamentos colhidos na-quele desencalhe enriqueceram o conheci-mento sobre socorro marítimo e foram re-passados a todos os navios da Marinhaque faziam socorro nas águas jurisdicionaisbrasileiras.

Foto 4

Foto 3

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UM DESENCALHE PARA OS ANAIS

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<ATIVIDADES MARINHEIRAS>; Desencalhe;

Gráfico 3

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SUMÁRIO

IntroduçãoO Sargento MosquitoO naufrágioA epopeiaO resgateE a vida continuou...Homenagem aos mortos em guerra

NAUFRÁGIO DO BAHIA – “TINHA QUE ACONTECERE PRONTO”

DEOLINDA OLIVEIRA MONTEIROJornalista

INTRODUÇÃO

Com o propósito de manter o registroda História Marítima do Brasil, o De-

partamento de História da Diretoria dePatrimônio Histórico e Cultural da Marinha(DPHDM) desenvolve o Programa de His-

tória Oral da Marinha – Projeto Memória,para o qual tem realizado entrevistas commilitares que testemunharam eventos histó-ricos envolvendo a Força.1 A Revista Marí-tima Brasileira participou, recentemente, deuma dessas entrevistas, com o Primeiro-Te-nente2 (Ref.) Antônio Luiz dos Santos, o

1 N.R.: A fim de ampliar cada vez mais o acervo do Departamento de História da DPHDM, a equipe doProjeto Memória solicita a quem tiver conhecimento da existência de pessoas que possam contri-buir com seus depoimentos para esse trabalho que entre em contato com o Tenente Daniel, pelotelefone (21) 2104-6722 ou pelo e-mail [email protected].

2 N.R.: À época do naufrágio, Antônio Luiz dos Santos era sargento. O militar passou para a reserva em1952, no posto de primeiro-tenente.

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Mosquito, um dos sobreviventes do nau-frágio com o Cruzador Bahia, ocorrido em 4de julho de 1945, quando em missão de apoioa aviões militares no Oceano Atlântico, naSegunda Guerra Mundial3.

Em 4 de julho último, completaram-se 65anos do afundamento do navio, o que fa-zia a ocasião propícia para a publicação doartigo baseado na referida entrevista. Infe-lizmente, no dia 30 desse mesmo mês, fale-ceu nosso entrevistado. Assim, publica-mos o presente artigo também como formade homenagem ao militar, que lutou brava-mente para salvar sua vida e a de outroscompanheiros naquele infortúnio.

O SARGENTO MOSQUITO

O fluminense Antônio Luiz dos Santosnasceu na cidade de Angra dos Reis, em

de 13 de julho de 1914. Em 1928, ingressouna Marinha pela Escola de Aprendizes-Marinheiros de Angra dos Reis. Exímionadador, fez parte da equipe da Marinhade natação e foi convocado para ser umdos representantes brasileiros no Campe-onato Sul-Americano de Natação de 1935,realizado no Rio de Janeiro, então capitalfederal. De 1940 a 1941, cursou a especiali-dade de Educação Física, o que certamenteajudou a lhe proporcionar a boa forma coma qual contou até o final de sua vida e que,provavelmente, contribuiu para que sobre-vivesse ao naufrágio. “Tenho certeza deque me salvei daquele naufrágio graças àminha boa condição física, conseguidacomo desportista. Também nunca fumei enem bebi”, atestava.

O apelido Mosquito foi dado pelo jor-nalista Idalício Mendes, que assinava, sob

3 A entrevista com o Sargento Mosquito foi sugerida pelo Capitão de Mar e Guerra (RM1) Adolfo Barrosda Silva Júnior.

O Marinheiro Mosquito O nadador medalhista Mosquito

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o pseudônimo Zé Brígido, a colu-na “Para ler no bonde”, no jor-nal O Diário de Notícias.Idalício assistia a um treinode natação na Marinha eperguntou ao técnicoquem eram os atletas eseus apelidos. Como An-tônio ainda não tinhaapelido, seu técnico su-geriu Ratinho, pois eleera magrinho. Idalíciopreferiu Mosquito, pelaspernas finas e longas deAntônio, e assim o apelidopegou.

Em 1943, Mosquito serviuno Tênder Belmonte. Na épo-ca, cada navio tinha um especia-lista em Educação Física.Por troca, acabou depoisembarcando no Cruzador Bahia comomonitor de Educação Física e começou a

participar dos comboios que es-coltavam navios mercantes

norte-americanos ameaça-dos por submarinos ale-

mães no Oceano Atlânti-co, durante a SegundaGuerra Mundial.

Quando foi decretadoo armistício que pôs fimà guerra, o CruzadorBahia (o “Velhinho”,como era chamado na

Força Naval do Nordes-te) estava em comboio Rio

de Janeiro-Recife. Mosqui-to relembrou: “O coman-

dante autorizou que abrísse-mos umas garrafas de cerveja,

coisa rara nos navios da Marinhana época, para comemo-rar”. Os americanos co-

meçaram a evacuar suas tropas do teatrode operações, e foram designados navios,

O Sargento Mosquito

Uma das emocionantes chegadas com vitória de Mosquito. Prova de 400 metros, nado de peito

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entre os quais o Bahia, para fazer a cober-tura do transporte aéreo dessas tropas deregresso da Europa. Havia um navio a cada500 milhas, que era designado como “Esta-ção”. O Bahia era a Estação 13 – “Que nú-mero, hein...”, dizia,brincando.

Foi nesse navioque o então Terceiro-Sargento Antônio Luizdos Santos passariapelos momentos maisdifíceis de sua carreirana Marinha e tambémde sua vida. E ali ele vi-veria, por que não dizer, a sua epopeia.

Quatro dias após o afundamento, foramsalvos apenas 33 tripulantes pelo mercan-te inglês S/S Balfe. Entre esses tripulantesestava o Mosquito.

Com 95 anos à época da entrevista (rea-lizada em outubro do ano passado), ele eraum dos nove sobrevi-ventes do naufrágio doBahia ainda vivos.Saudável e com uma lu-cidez louvável, mostra-va-se um arquivo vivoda tragédia do navio,da qual se recordavacom detalhes precisos.“Lembro-me de tudomuito bem. Mas issonão quer dizer que fi-quei com trauma. O aci-dente tinha que acon-tecer e pronto”, disse.

O NAUFRÁGIO

O Cruzador Bahiateve seu afundamentoatribuído a um aciden-te operativo quandonavegava próximo aos

rochedos que hoje constituem o Arquipé-lago de São Pedro e São Paulo, onde seencontrava em trabalho de controle eapoio ao transporte aéreo das tropas ame-ricanas, de regresso da Europa para os Es-

tados Unidos da Amé-rica (EUA), logo apóso término da SegundaGuerra Mundial.

Mesmo com o fimdo conflito, 11 subma-rinos alemães aindanavegavam ou tinhamos seus destinos des-conhecidos. Na im-

prensa, eram constantes os relatos sobre oaparecimento dessas ameaças ao longo denossa costa, o que demonstrava o perigoque eles potencialmente representavam. Porisso a Marinha do Brasil, em conjunto comos norte-americanos, permanecia em alerta,patrulhando as águas do Atlântico.

“Lembro-me de tudo muitobem. Mas isso não quer

dizer que fiquei comtrauma. O acidente tinhaque acontecer e pronto”

O Cruzador Bahia

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Em 30 de junho de 1945, o cruzador sus-pendeu de Recife para substituir oContratorpedeiro de Escolta Bauru (hojenavio-museu), rendido em alto-mar no dia2 de julho. Iniciava-se, com isso, aquelaque seria sua última missão de patrulha.No dia 3, enviou uma mensagem de rotina,retomando o silêncio rádio4. Em 4 de julho,durante os preparativos para um exercíciocom as metralhadoras antiaéreas Oerlikonde 20 mm, conforme versão oficial, paroumomentaneamente para lançar ao mar umalvo flutuante para exercício de tiro, mas,às 9h10, foi atingido por uma violenta ex-plosão provocada por um disparo aciden-tal, que acertou as cargas de profundidadena popa.

Sem muito esforço de memória, Mos-quito detalhou o que aconteceu na manhãdaquele fatídico dia:

“Por volta de 7h30, começou a prepara-ção para o exercício de tiro. O café fora às 8horas. Comi, ainda bem, uma substanciosafarofa de carne-seca. Depois fui descansarna coberta próxima à proa e a um bailéu5.Estava lendo um romance e, em pouco tem-po, ouvi uma forte explosão. Logo ouvitambém um grito de ‘me tira daqui’ vindodo bailéu, onde havia um preso. Quando lácheguei, já haviam quebrado o cadeado eele estava sentado numa escada. Subi comcalma e, ao olhar para a popa, vi váriosmarinheiros de cueca e camiseta. A forteonda causada pela explosão rasgara suasroupas e causara-lhes hemorragias pelonariz e pela boca. Prestei socorro a um ra-paz, deixando-o confortável. Constatei quea explosão fora na popa, onde ficavam oscamarotes dos oficiais e a secretaria.”

No livro Flores ao Mar, Raul CoelhoBarreto Neto destaca a participação deMosquito no socorro prestado ao coman-dante Garcia D’Ávila, de 47 anos, feridopor estilhaço quando caminhava pelo con-vés, a bombordo, no momento da explo-são. “Garcia D’Ávila foi conduzido à en-fermaria pelo Terceiro-Sargento AntônioLuiz dos Santos. Mosquito havia sido cam-peão sul-americano de 100, 200 e 400 m denado de peito”, relata.

Mosquito confirmou a ajuda prestadaao comandante, e, prosseguindo no seurelato, extraiu de sua memória detalhes so-bre o episódio:

“Logo apareceu o Sargento Moraes como comandante nos braços. Na ocasião daexplosão, o comandante vinha da popa efoi jogado longe, daí ter tido uma fraturaexposta no braço direito. Ajudei o Moraesa conduzi-lo e fiquei com ele enquanto osargento fora pegar material para curativoe contenção do braço. Quando Moraeschegou, fui ver se havia muita gente naágua. Olhei a bombordo e nada vi, porqueas balsas estavam penduradas a boreste.A baleeira estava superlotada. Enquantoisso, o comandante perguntava o que eletinha, pois não estava sentindo nada. Res-pondi que tinha uma fratura exposta. Na-quela época usava-se só iodo, com o que otratamos. Não havia sulfa nem penicilina.Quando Moraes preparava para pôr o bra-ço do comandante na tipoia, ouvimos queo navio estava indo a pique. O enfermeirosugeriu pegarmos o material e o coman-dante e sairmos dali. Em seguida o navioemborcou. Escorregamos e vi que o enfer-meiro tinha caído com o comandante.”6

4 N.R.: Silêncio rádio – Praticado para evitar-se denunciar a posição do navio para eventuais submarinosalemães na área.

5 N.R.: prisão.6 “O Segundo-Sargento (EF) João Moraes de Lima carregou-o no colo após atendimento médico. D’Ávila

pediu para ser colocado no chão, e para que o sargento se safasse. Ambos foram sugados pelo mar.(Do livro Flores ao Mar, de Raul Coelho Barreto Neto)

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Mosquito relatou que naquele momen-to viu, ainda, que o Tenente Lúcio TorresDias7 tentava subir para se atirar na água:“Contornei o tenente, passei debaixo deum canhão 120 e caí no mar. Ainda vi ofarol vermelho do navio. Nadei e pensavana sucção, no momento em que a proa fos-se encoberta pela água. Nadei mais e ouvio barulho da sucção. Quando me virei, sóvi gente gritando”.

A EPOPEIA

Já no mar, Mosquito preocupou-se, en-tão, em procurar uma das balsas salva-vi-das8. Avistando uma delas, entrou. “A bal-sa já estava bem cheia. Seu comandante[cada uma tinha o seu comandante] era oPrimeiro-Tenente Vergueiro, dentista. Lem-bro que o sargento de Máquinas LuísSilveira Souto, de 1,95 m de altura, um ho-mem que sempre fora muito rígido com seussubordinados, pediu ao Tenente Vergueiropara entrar na balsa. Os outros ocupantes

não gostaram muito, mas naquela hora todomundo estava na mesma horrível situação.Silveira Souto estava de cuecas, camiseta ecom um par de sapatos tipo bombeiro. To-dos estavam com água até quase à cintura,e eu disse ao comandante que já havia mui-ta gente na balsa. Tinha que sair alguém,pois a superlotação aumentava o perigo deataque de tubarões. Fui eu então para outrabalsa, mais vazia, onde não havia oficial. Asbalsas estavam mais ou menos reunidas, ehouve uma redistribuição dos náufragos. Amédia por balsa era para ser de 12 pessoas,mas a maioria tinha de 19 a 24. O mar aindaestava bom. À tardinha, porém, começarama aparecer caravelas9 coloridas, trazidas pelovento. Pedi que as espantassem, mas quenão se coçassem caso fossem queimados,pois a queimadura viraria ferida, o que pio-raria com a água salgada. Um rapaz não se-guiu a instrução e acabou sofrendo uma gan-grena. Depois de resgatado, sua perna foiamputada.”

Detalhes como esses fluíam das lembran-ças de Mosquito. A voz setornava mais forte e os ges-tos aumentavam à medidaque continuava a narrar odrama dos náufragos doBahia: “O pior ainda estavapor vir. Como à noite o marfica mais bravio, os cabosque ligavam as balsas sofri-am trancos, o que poderiadanificá-las. Então soltamosos cabos. Na manhã do se-gundo dia morreu o primei-ro homem na minha balsa.Nela havia rações desidra-tadas e utensílios (talheres

7 N.R.: O primeiro-tenente de Máquinas Lúcio Torres Dias foi o único oficial que sobreviveu ao desastre.Faleceu em 23 de julho de 2007, de problemas cardíacos, no posto de contra-almirante.

8 N.R.: Dezessete balsas foram jogadas ao mar. Cada uma media 3 metros de comprimento x 1,5 m de altura.9 N.R.: Animais encontrados na superfície de mares quentes, na forma de grandes colônias. Possuem

longos tentáculos urticantes. O mesmo que caravela-portuguesa e langanho.

Balsas elancha doCruzador

Bahia

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etc.), mas não mais água de beber. Nas bal-sas superlotadas, fazia-se um rodízio parase ficar dentro delas. Como alguns ficavamna borda, aumentava o perigo de ataquesde tubarões.”

Com o agravamento da situação, começa-ram a surgir os primeiros casos de loucura.“No segundo dia, o Sargento Alcântara que-ria se atirar na água. Eu o agarrei e lutei comele. Tive que lhe dar um nocaute. Depois queele se mostrou mais calmo, lhe expliquei comdetalhes o que era um ataque de tubarões.Ele se acalmou, mas na-quele mesmo dia mor-reu sobre as minhaspernas. Fiz uma precepara ele, esperei seucorpo enrijecer o máxi-mo e procurei jogá-loonde parecia não havermuitos tubarões.”

O Suboficial Vival-do da Rocha Vaz, tam-bém sobrevivente donaufrágio, confirma,em seu livro A epo-peia do CruzadorBahia e o martiroló-gio de sua guarnição, publicado em 1951,o que nos relatou Mosquito. Vivaldo diz:“Nossas balsas se aproximavam com gran-de sacrifício, pois remávamos com um sóremo e com um sarrafo. A balsa do Sargen-to Mosquito trazia um homem morto. Mos-quito mostrava-me o cadáver (...)”. E pros-segue: “Mosquito tinha três latas de leite epacotes de vitaminas. Amarramos nossabalsa à dele, com um cabo de reboque quenos foi passado. Essa balsa, que a princí-pio estava com 20 homens, já perdera um etinha mais dois passando mal, deitados nofundo. Passamos essa noite juntos. Marforte. Frio intenso. O jogo da balsa nãonos dava um momento de descanso. Emdado momento há um grande barulho na

minha balsa e na do Mosquito. Em cadauma delas e ao mesmo tempo havia enlou-quecido um homem”.

Mosquito tornou-se naturalmente o lí-der de sua balsa, o que atribuía não só àsua reconhecida boa forma física, mas tam-bém à sua maneira realista de encarar assituações. “Logo procurei não dar falsasesperanças a ninguém. Eu dizia sempre: oobjetivo nosso aqui é vender caro a vida.Ninguém queria a ração, pois não tínha-mos saliva para dissolvê-la, o que era hor-

rível. Mas mesmo as-sim eu me obrigava acomê-la. O que maisfazia falta era a águapara beber. Além dis-so, o sol era muitoquente ao nascer, e asnoites eram muito fri-as. Presenciei outrastrês mortes na minhabalsa e joguei os cor-pos no mar.”

No terceiro dia ha-via apenas sete ho-mens na balsa deMosquito. “Um deles

se jogou, ou caiu, numa área perigosa. Con-sultei os outros cinco companheiros se eudeveria ir atrás, e todos acharam que não,pois poderia custar também a minha vida.Decidi não ir. Fiquei depois uns dois anospensando naquele momento”, lamentou,arrematando o relato com silêncio e um olharperdido no tempo então distante.

A essa altura, muitos marujos estavamenlouquecidos e as brigas eram constan-tes. “Um deles me chamava para ir com elepara Friburgo. Daí caiu na água. A sorte eraque o mar estava tranquilo, na preamar.Então o peguei de volta. Ele ainda se atirouumas duas vezes, mas voltou. De madru-gada, um marujo, com frio, pediu que otaifeiro ficasse de costas para que ele colo-

“O objetivo nosso aqui évender caro a vida.

Ninguém queria a ração,pois não tínhamos saliva

para dissolvê-la, o que erahorrível. Mas mesmo assimeu me obrigava a comê-la.

O que mais fazia falta era aágua para beber”

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casse ali suas pernas. Um outro tambémquis a mesma coisa. O primeiro deu um tapano segundo, que revidou, enlouquecido.Pensei: ‘Vai chegar a hora de ele vir para omeu lado’. Então ‘reagi’ antes. Ele caiu nomar e o pegamos de novo. Então ele come-çou a enrolar um fio e dizia que era para içara balsa quando chegássemos a bordo. Eraa volta do espírito do marinheiro...”

Algumas das balsas estavam pintadas decinza, pois o serviço de pintura estava sendofeito antes do naufrágio, e algumas não che-garam a receber a cor amarela, que facilita avisibilidade para um possível salvamento.Mas, apesar disso, este acabou vindo.

O RESGATE

Do terceiro para o quarto dia, foi avista-do o Balfe, navio que vinha de Liverpool(Inglaterra) com um só passageiro, JorgeDrummond. “Naquela época eu tinha umaótima visão e constatei que era um mercan-te. No quarto dia oBalfe pegou a primeirabalsa. Uma hora apóspegou a segunda. De-pois veio na nossa di-reção e acenamos comas madeiras do estradopara facilitar a localiza-ção. Eu fazia rodíziocom os outros dois daminha balsa porqueeles mal aguentavamsuspender as madei-ras. Eu sentia que euera o mais resistente.”

Atribuindo seu sal-vamento não só ao seupreparo físico, mas

também à força que adquiria ao pensar emsua família, Mosquito falou com entusias-mo dos primeiros momentos passados nonavio que os resgatou: “O Sr. Drummondconversou comigo e me deu um cadernopara que eu anotasse os nomes dos quetinham sido salvos. Eu, esgotado e commuitas dores nas costas, saí andando to-talmente encurvado para cumprir essa ta-refa. O primeiro nome que anotei, com enor-me satisfação, foi o meu, com o apelido dolado. Não vi o Tenente Lúcio a bordo. Achoque ele chegou na noite do outro dia”.

Mas nem tudo era alegria no Balfe. “Osmilitares estavam muito abatidos. Ficamosno porão, deitados em cobertores de lã puraque espetavam muito. Estávamos com umterrível mau cheiro de suor. Isso sem falarque alguns náufragos não resistiram e mor-reram ali.” Raul Coelho Barreto Neto com-pleta em seu livro10: “O Mosquito e oParanhos recebem calça de casimira, cami-sa de frio e chinelos; metem-se nessas rou-

10 N.R.: Os livros História Naval Brasileira, 5o volume, tomo II (SDGM) e A Marinha do Brasil naSegunda Guerra Mundial (1982), do Almirante Arthur Oscar Saldanha da Gama, são outras duasboas referências sobre o afundamento do Cruzador Bahia. O episódio também é enfocado na obra deficção Memórias do Porto, de Roberto Sobral.

Balsa do Cruzador Bahia sendo içada vazia pelo ContratorpedeiroMarcílio Dias, em julho de 1945, um dos navios que

buscou sobreviventes

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pas e vão auxiliar os que estão a ré. Voltamdepois informando que as roupas erampoucas, de modo que somente quem pu-desse andar iria vestido”.

No desastre, perderam a vida o seu co-mandante, Capitão de Fragata GarciaD’Ávila Pires de Albuquerque, e mais 342dos 376 homens que estavam a bordo (cemde imediato), inclusivequatro marinheirosamericanos, respon-sáveis pelo contatocom as aeronaves dosEUA (telegrafistas).Dos mortos, 16 eram oficiais. Os que mor-reram nos quatro dias de naufrágio foramvítimas dos seus ferimentos, do sofrimen-to causado pela ação do sol sobre seuscorpos salgados pela água do mar, da fome,da desidratação e da voracidade dos tuba-rões. Dos 33 tripulantes do Bahia salvospelo Balfe, cinco morreram em trânsito parao Recife e foram sepultados no mar.

Ao afundar, o cruzador tinha um totalde 110 mil milhas navegadas e 390 dias demar e contabilizados 728 mercantes escol-tados. Sua baixa foi oficializada pelo Avisono 1.055, de 19 de julho de 1945.

E A VIDA CONTINUOU...

Ao desembarcarem no Recife, os sobre-viventes foram levados para o HospitalCentenário. “Não podíamos tomar banhono hospital, por causa das queimaduras”,lembrava Mosquito, que, após ter alta, fi-cou quatro meses em casa. Sua mulher tam-bém se recuperava ao lado do marido, jáque se adoentara com as notícias de quecertamente não havia sobreviventes. “Elaemagreceu assustadoramente”, contou.

Após o período em casa, o militarreembarcou no Belmonte, onde passoudois meses. “Não tive receio de embarcarnovamente.” Em 1946, Mosquito fez uma

viagem com o Navio-Escola AlmiranteSaldanha. Em 1951, foi a Philadelphia bus-car o Cruzador Tamandaré, adquirido daMarinha dos Estados Unidos. “Acho quefoi um prêmio que quiseram me dar. Embar-quei com alegria e viajei sem medo.”

Paralelamente, Mosquito continuava sededicando ao esporte. No mesmo ano de

1951, participou dosJogos Pan-America-nos, realizados na Ar-gentina, integrando,como goleiro, a equi-pe de polo aquático,

que obteve a medalha de prata.O militar ficou na ativa durante 24 anos.

Servindo no Tamandaré, pediu transferên-cia para a reserva (era então suboficial epassou a primeiro-tenente), obtida em 30de dezembro de 1952. Na reserva, passou ajogar na equipe de polo do Vasco da Gamae depois foi treinador do time. Recebeu aMedalha Mérito Tamandaré em 1994.

O Tenente Mosquito recebe a MedalhaMérito Tamandaré

“Não tive receio deembarcar novamente”

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Mosquito continuou vivendo no bairrocarioca da Ilha do Governador, onde pas-sara a morar desde que ingressara na Mari-nha. Em 1942, casou-se com Dona Mariade Lourdes (falecida em 1975). Da uniãonasceram dois filhos: Maria da Conceição(falecida em 1997) e Antônio Luiz11. Tam-bém naquele bairro nasceram os seus qua-tro netos. “Ele nunca quis sair da Ilha, ondefomos criados e onde vivo até hoje. E elenão quis morar conosco depois que nossamãe morreu. Ele era muito independente”,conta Antônio Filho.

Assim, dono de invejável saúde e de boadisposição, Mosquito seguiu vida tranquilaaté os seus 96 anos, cumprindo serenamen-te sua rotina, que consistia, basicamente,

em manter-se informado por meio da leiturade jornais e assistindo a noticiários, con-versando com os vizinhos, relembrando osvelhos tempos com os amigos ou simples-mente descansando nos jardins que rodei-am o seu prédio. Nos fins de semana ia paraa casa do filho, desfrutar do convívio com afamília. “Assim era meu pai, assim ele foi atéo final: muito tranquilo, mas ao mesmo tem-po forte, otimista e guerreiro.”

HOMENAGEM AOS MORTOS EMGUERRA

Além do Cruzador Bahia, a Marinhaperdeu mais dois navios na Segunda Guer-ra Mundial: o Navio-Auxiliar Vital de Oli-

11 N.R.: Antônio Luiz dos Santos Filho muito contribuiu para a produção deste artigo, esclarecendodetalhes sobre a vida de seu pai e fornecendo fotos para ilustrar a matéria, pelo que a RMB agradece.

Da esquerda para a direita, Antônio Luiz dos Santos, Maria Conceição (filha), Maria de LourdesTrindade dos Santos (esposa), Antônio Luiz (filho)

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veira (em 19 de julho de 1944, com 99 mor-tos) e a Corveta Camaquã (em 21 de julhodo mesmo ano, com 35 mortos). No confli-to, foram atacados e afundados 32 mercan-tes, contando-se, no total, 972 perdas (mor-tos e desaparecidos).

A data do naufrágio da Corveta Camaquãfoi escolhida pela Marinha do Brasil parahomenagear a memória de todos os seusmortos em guerra. Assim, em 21 de julho últi-mo, ao presidir a cerimônia de homenagem,realizada no Rio de Janeiro, o comandante deOperações Navais, Almirante de Esquadra

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<HISTÓRIA> História da Marinha do Brasil; Segunda Guerra Mundial; Afundamento; Cruzador;

Marcus Vinicius Oliveira dos Santos, citounão só os heróis da Camaquã, mas tambémo Imperial Marinheiro Marcílio Dias e o Guar-da-Marinha João Guilherme Greenhalgh, quepereceram lutando a bordo da CorvetaParnayba na Batalha Naval do Riachuelo (11de junho de 1865), e os que perderam suasvidas no mar nas Primeira e Segunda GuerrasMundiais. Deste último conflito, foram lem-brados, além dos integrantes da MarinhaMercante, os mortos no torpedeamento doNavio-Auxiliar Vital de Oliveira e no aciden-te operativo do Cruzador Bahia.

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SUMÁRIO

Minas flutuantesAproveitando a correnteza dos riosConsultores externosAtuação de Hamilton TombContramedidas adotadasEncouraçado Tamandaré, um navio-varredor?Acidente com o Rio de Janeiro

ENCOURAÇADO TAMANDARÉ: O PRIMEIRO NAVIO-VARREDOR DA MARINHA DO BRASIL

ALVANIR B. DE CARVALHO*Professor

As guerras não se resumem aos comba-tes corpo a corpo ocorridos nos cam-

pos de batalha, os canhões troando e vo-mitando sua carga letal, as cornetas tocan-do, os soldados com suas bandeirasdesfraldadas, marchando de encontro à mu-ralha de baionetas das tropas inimigas, tale qual nos é dado ver no cinema, pois queeste é o aspecto visível da coisa.

Não é só isso, conforme será explicitadono presente artigo.

Sem querer me referir ao tema da espio-nagem, evidentemente que mantido em si-gilo pelas partes envolvidas, ouso dizer queas guerras também têm um outro lado tãodiscreto e pouco visível quanto a espiona-gem. Refiro-me aos inventores de novasarmas, cada vez mais sofisticadas, e das

* Professor de economia; modelista naval; colaborador da RMB.

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contramedidas empregadas pelos adversá-rios na tentativa de neutralizar os danososefeitos de cada nova invenção.

No presente artigo, nos limitaremos a citarapenas um exemplo marcante, relacionado coma Guerra do Paraguai, qual seja o da produçãode minas flutuantes que eram lançadas contraos navios da Esquadra Imperial.

MINAS FLUTUANTES

A história mostra que sempre que umpaís mais fraco é atacado por uma forçanaval poderosa, contra a qual não podeoferecer resistência direta, por carecer dosmeios navais adequados, a nação atacadacostuma recorrer a procedimentos de na-tureza puramente defensivos, a exemplo doemprego de minas flutuantes.

Foi isso o que fizeram os russos, no de-correr da Guerra da Crimeia (1854), assimcomo também o fizeram os rebeldes sulis-tas, no decorrer da Guerra Civil norte-ame-ricana (1861), e também os paraguaios,após a destruição de sua esquadra, no de-correr da Batalha Naval do Riachuelo(1866).

Atacados pela maior força naval do seutempo, representada pela combinação dasMarinhas de guerra da França e da Inglater-ra, pela primeira vez na história lutando ladoa lado como aliados, os defensores da pe-nínsula russa da Crimeia idealizaram cons-truir e lançar, rio abaixo, em direção à baíaem frente a Sebastopol, onde se concentra-vam os navios das esquadras atacantes, umasérie de minas flutuantes, que naquela épo-ca eram denominadas “torpedos”, tendo porobjetivo atingir e destruir os navios da es-quadra combinada, inimiga.

Comentaristas especializados no assun-to afirmam que as minas flutuantes russasatingiram e danificaram inúmeros navios,mas que não tiveram maior sucesso devidoà pouca carga de pólvora que conduziam.

APROVEITANDO A CORRENTEZADOS RIOS

Os rios correm para o mar. Daí que qual-quer objeto flutuante deixado livre, à mer-cê da correnteza de um rio, seráinexoravelmente empurrado águas abaixo.No Paraguai, quando não se encontravamem movimento, os navios da Esquadra bra-sileira se encontravam fundeados a jusantedo Rio Paraguai. Por conseguinte, nossosnavios se tornavam alvos naturais de mi-nas flutuantes que, libertadas no cursosuperior daquele rio, eram levadas pelacorrenteza em direção aos seus cascos.

Quando estourou a Guerra de Secessãoamericana, o lado que possuía uma Mari-nha de guerra organizada era dos nortistas(apelidados de yankees), que disso se apro-veitaram para impor um bloqueio aos prin-cipais portos rebeldes. Não dispondo denavios de guerra em quantidade suficientepara fazer frente aos vasos de guerra nor-tistas, os sulistas decidiram apelar para oemprego de minas flutuantes, do mesmomodo que haviam feito os russos naCrimeia, sete anos antes, um assunto am-plamente divulgado e comentado pela im-prensa que havia dado cobertura àquelaguerra.

Na Guerra do Paraguai, foi praticamentea mesma coisa. Após a derrota da Esqua-dra paraguaia na Batalha Naval doRiachuelo, o Marechal Solano López resol-veu partir para a guerra de minas.

CONSULTORES EXTERNOS

Para um melhor entendimento deste as-sunto, convém dizer que o Marechal SolanoLópez não era um tolo. Por isso, ao se pre-parar para a guerra, coisa que vinha fazendoem segredo, tratou de contratar vários con-sultores estrangeiros, dentre os quais cita-ria o engenheiro naval e projetista inglês

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William Keld Whytehead, que passou aocupar o posto de diretor do Astillero SanGeronimo, situado em Assunção, o famosoCoronel Thompson, um mercenário inglêsque, posteriormente, escreveu um livro mui-to comentado, descrevendo a Guerra doParaguai segundo a observou, e o ex-tenen-te do Exército norte-americano (nortista)Thomas H. Bell, que se encarregou da fabri-cação das minas flutuantes.

É curioso observar que o TenenteThomas Bell tinha sido oficial do Exércitonortista que combateu os rebeldes sulis-tas do seu país de origem.

Do lado brasileiro, quem nos ajudou aenfrentar a ameaça das minas foi o TenenteJames Hamilton Tomb, ex-oficial do Exérci-to Confederado (sulista).

Era, por conseguinte, uma situação as-saz curiosa: um ex-oficial nortista, cuja Ar-mada nacional havia sofrido os devastado-res efeitos das minas sulistas – cerca de 40navios yankees foram afundados ou seria-mente danificados –, agora fabricava minasflutuantes, que eram lançadas contra os na-vios da Esquadra Imperial brasileira, em cujadefesa passou a trabalhar um ex-oficial daMarinha Confederada, agora encarregadode idealizar meios que nos protegessem doperigo das minas paraguaias.

ATUAÇÃO DE HAMILTON TOMB

James Hamilton Tomb foi um dos enge-nheiros que ajudaram a transformar em rea-lidade a ideia de construir um barco-torpe-deiro, o CNS David, o qual, em outubro de1864, explodiu um torpedo (como era entãodenominado qualquer invólucro contendouma carga de pólvora) de encontro ao cas-co da fragata americana New Ironsides, quetomava parte do bloqueio do porto deCharleston, na Carolina do Norte.

O ataque à Fragata New Ironsides – en-tão considerada um dos navios mais pode-

rosos do seu tempo – foi como que umareedição da luta, narrada na Bíblia, do pe-queno David – aqui representado pelo mi-núsculo e esguio CNS David – contra onovo Golias, representado pela fragatayankee. A explosão provocou um impactotão violento que abriu um rombo no cascoda fragata, que adernou e afundou.

O pequeno David não passava de umacanoa comprida que navegava quasesubmersa – um precursor do moderno sub-marino – em cuja proa foi instalada umalança de grande comprimento, na ponta daqual havia uma potente carga de pólvora,então denominada torpedo.

Mal terminou a Guerra Civil norte-ame-ricana (1865), teve início a Guerra doParaguai. Desempregado, e praticamentesem um país para morar – pois que os esta-dos sulinos foram ocupados pelas tropasdo Norte durante uma vintena de anos –,Hamilton Tomb decidiu oferecer os seusserviços especializados à Argentina. Paratanto, deslocou-se até Nova York, ondeteve uma entrevista com o ministro pleni-

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potenciário argentino nos EUA, nada me-nos do que o General Domingos FaustinoSarmiento, que alguns anos depois iria setornar presidente da República Argentina.

Impressionado com o americano, o Ge-neral Sarmiento forneceu ao ex-oficial re-belde uma carta de apresentação, dirigidaao Presidente Bartolomé Mitre, pelo que oamericano se deslocou para Buenos Aires.

Nesse meio tempo, enquanto aguarda-va a oportunidade para um contato com oPresidente Mitre, Hamilton Tomb procurouse inteirar da situação. Foi então que per-cebeu que a Marinha argentina era bastan-te diminuta e que um cliente de maiorpotencialidade seria a Marinha do Impériodo Brasil, que naquela guerra concentravaem Buenos Aires seus depósitos de supri-mento, assim como realizava, no seu porto,a manutenção e reparo dos navios de suaesquadra.

Aproveitando o ensejo de uma das fre-quentes visitas que o Almirante Tamandarérealizava a Buenos Aires, Hamilton Tombestabeleceu contato com o referido almiran-te, o qual, por sua vez, conseguiu que oamericano fosse recebido o quanto antespelo Imperador Dom Pedro II no Rio de Ja-neiro. Dom Pedro II era, ele próprio, um de-dicado cientista, pelo que o relacionamentoentre os dois homens foi sempre cordial.

Por aquele tempo, as minas flutuantesparaguaias já se faziam notar. Fabricadasem Assunção, por uma equipe chefiadapelo ex-Tenente Thomas Bell, sua produ-ção era constante, se bem que, para nossasorte, a capacidade de produção daquelesartefatos era bastante limitada. Do contrá-rio, teria sido um desastre para a nossa es-quadra. Basta que se tenha em mente o fatode que, no Rio Paraguai, o espaço no qualestava concentrada a esquadra brasileiraera bem menor do que aquele da Baía deChesapeake, na América do Norte, ondevários navios yankees foram afundados.

Sendo assim, as chances de uma mina sechocar de encontro ao casco de um dosnossos navios era bem maior.

CONTRAMEDIDAS ADOTADAS

Havia muito pouca coisa a fazer contraa ameaça das minas flutuantes. Por suges-tão de Hamilton Tomb, os navios brasilei-ros passaram a dispor de uma rede de pro-teção externa do mesmo tipo das que, naPrimeira Guerra Mundial, eram utilizadaspara proteger o casco dos grandesencouraçados contra a ameaça dos novostipos de torpedos.

A segunda medida consistiu em estabe-lecer um patrulhamento contínuo, por meiode botes tripulados, nas áreas adiante dolocal onde estivessem ancorados os nos-sos navios, cujos tripulantes tinham porobrigação localizar e possivelmente desar-mar as minas que, quase todas as noites,os paraguaios lançavam contra nós.

Por oportuno, é importante lembrar quea manutenção de um serviço noturno debotes de vigilância contra o perigo das mi-nas flutuantes teve um benefício indireto,qual seja o encontro inesperado do primei-ro grupo de canoas paraguaias, cheias detropas, que se preparava para abordar desurpresa alguns dos nossos naviosencouraçados, todos eles de bordo livrequase rente ao nível da água do rio.

Os brados de alerta do pessoal de umdesses botes foi decisivo para que osmarinheiros dos navios em vias de se-rem atacados improvisassem uma defe-sa que resultou na expulsão da tropa deassalto paraguaia. Ainda assim, as ca-sualidades foram enormes, donde seconclui que, não fosse pelo alerta dopessoal do bote-patrulha, os paraguaiospoderiam ter se apossado de um ou maisde um dos nossos encouraçados, con-forme o plano estabelecido.

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ENCOURAÇADO TAMANDARÉ, UMNAVIO-VARREDOR?

Hamilton Tomb era uma pessoa deste-mida e cheia de iniciativas. Destacado paraservir a bordo do Encouraçado Tamandaré,convenceu o comandante daquele navio ainstalar uma rede de proteção ao redor doseu casco. Feito isso, também convenceuo comandante do Tamandaré a utilizaraquele navio como “varredor de minas”,na área conhecida por Passo da Pátria, naconfluência dos rios Paraná e Paraguai.

Desse modo, o Encouraçado Tamandaréfoi o primeiro navio-varredor da esquadrabrasileira de que se tem notícia.

Transferido para o Vapor Apa, Hamil-ton Tomb convenceu o seu comandante autilizar aquele navio na exploração de umcanal navegável no Rio Curuzu, situado nasproximidades da fortaleza de Curupaiti, umdos objetivos da esquadra brasileira.

Utilizando uma fateixa – isto é, uma pe-quena âncora dotada de inúmeras garras –, o Apa navegou pelo canal, ao mesmo tem-po em que uma equipe comandada por Ha-milton Tomb “pescava” as minasporventura localizadas, que eram entãoneutralizadas.

Só não foram removidas três minas defundeio, por se encontrarem muito próxi-mas da margem do rio, de onde uma pe-quena bateria de canhões os hostilizava.Navio desarmado, o comandante do Apanada poderia fazer contra aquela bateriade canhões.

Concluída a operação de varredura doCanal do Curuzu, o Apa retornou ao localonde se encontravam os demais navios daesquadra brasileira, oportunidade em queHamilton Tomb informou a situação, inclu-sive alertando os comandantes dos navi-os brasileiros sobre as três minas de fun-deio, não desarmadas.

Aquarela da época, representando oafundamento do Rio de Janeiro

ACIDENTE COM O RIO DEJANEIRO

Tendo por finalidade mostrar o real perigodas minas flutuantes paraguaias, basta dizerque, no dia 2 de dezembro do ano em que foilançado ao mar, o Encouraçado Rio de Ja-neiro chocou-se contra uma mina de fundeioque lhe abriu um rombo no casco, que foi

Alvanir Carvalho segurando um modelo doEncouraçado Tamandaré

Museu Naval, Rio, 10 de março de 2004

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rapidamente para o fundo, levando presa, noseu bojo, uma boa parte da tripulação, inclu-indo-se aí o Comandante Silvado.

O afundamento do Rio de Janeiro cons-tituiu o evento de maior importância daguerra de minas no Rio Paraguai.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<FORÇAS ARMADAS>; Encouraçado; Guerra do Paraguai; Navio de guerra de minas;Tomb, James; Bell, Thomas;

REFERÊNCIAS

Revista Marítima Brasileira “Experiências do Cap. Tomb na Marinha brasileira”, 1o trim./1964 - p.39-54.

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SUMÁRIO

IntroduçãoContexto geopolítico

A República Popular da China (RPC)Interesses marítimos econômicosInteresses marítimos territoriais

Mar do Sul da ChinaMar do Leste da China

Caso TaiwanA Marinha do Exército Popular de Libertação (EPL)

A formação da Marinha do EPLA Força de Submarinos da China

Estratégia naval da ChinaEstratégia naval da ChinaEmprego de submarinos na estratégia naval da China

Conclusão

O EMPREGO DE SUBMARINOS NAESTRATÉGIA NAVAL DA CHINA*

“Quando a China despertar, o mundotremerá.”

(Napoleão I)

ROBERTO KONCKE FIUZA DE OLIVEIRACapitão de Mar e Guerra

INTRODUÇÃO

No início do século XV, o almirante chi-nês Zheng He comandou expedições

marítimas conhecidas no Ocidente como as“Viagens de Tesouro”1. A China possuía

nesse período o mais eficiente Poder Navalcomparado com as demais potências daépoca, como Veneza, Portugal e Espanha.

Não se sentindo ameaçada pelo mar e ne-cessitando reforçar suas fronteiras continen-tais, a China orientou seu esforço ao Exérci-

* Monografia apresentada no CPEM 2008.1 De acordo com Fairbank (2007), foram grandes viagens realizadas pela Esquadra chinesa entre 1405 e

1433, com relatos indicando que seus navios atingiram a costa leste do continente africano.

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O EMPREGO DE SUBMARINOS NA ESTRATÉGIA NAVAL DA CHINA

to. A dinastia Qing, que sucedeu em 1644 aoúltimo imperador da dinastia Ming, proibiuqualquer tipo de comércio com o exterior,desativando estaleiros e queimando proje-tos de construção de grandes navios. Umaextensa e larga faixa de terra ao longo de seulitoral foi queimada, e sua população foitransferida para o interior (MENZIES, 2007).

Com um elevado sentimento de xenofo-bia, a China renunciou à sua tradição marí-tima, retirando-se para um longo isolamen-to do mundo exterior.

A partir da década de 1980, a RepúblicaPopular da China (RPC) passou a apresen-tar um vigoroso crescimento econômico,que a alçou à condição de influente atorestratégico no cenário internacional.

Para respaldar seus crescentes interes-ses marítimos territoriais e econômicos, aChina necessita de uma Marinha comcredibilidade. Nesse contexto, os investi-mentos realizados na área de defesa repre-sentam a preocupação do Partido Comu-nista Chinês (PCC) com a modernização desuas Forças Armadas.

A Marinha do Exército Popular de Li-bertação (MEPL) estabeleceu uma Estraté-gia Naval na década de 1980 visando aobter capacidade de exercer influência glo-bal até 2050. Para tal, os submarinos pas-saram a ter prioridade no programa dereaparelhamento, sendo incorporadas, en-tre 1995 e 2005, 31 novas unidades.

Nesse contexto, a presente monografiatem como objetivos discutir os interessesmarítimos econômicos e territoriais da RPCrelacionados ao seu atual cenáriogeopolítico; descrever a situação da Forçade Submarinos da China; e analisar a ma-neira pela qual a Marinha chinesa empre-gará seus submarinos dentro do escopode sua Estratégia Naval.

Desse modo, no Capítulo 2, o trabalhoinserirá a RPC no contexto geopolítico doLeste/Sudeste Asiático, desde a sua for-mação em 1949. Em seguida, apresentaráos interesses marítimos territoriais e eco-nômicos da China, além de examinar as re-lações da RPC com Taiwan.

No Capítulo 3, o autor discorrerá sobrea formação da Marinha e sua inclusão naestrutura militar chinesa. Examinará, ainda,a Força de Submarinos da China, bem comosua dependência em relação à ex-União dasRepúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).

Em seguida, o autor discutirá, no Capí-tulo 4, a influência da ex-URSS na Estraté-gia Naval da China, adotada pelo Almiran-te Liu Huaqing, e de que forma os submari-nos poderão ser empregados de modo atornar efetiva a referida Estratégia.

CONTEXTO GEOPOLÍTICO

“A geopolítica é a ciência das rela-ções da terra com os processos políti-cos.” Baseia-se nos amplos fundamen-tos da geografia, especialmente da ge-ografia política, que é a ciência do or-ganismo político no espaço e, ao mes-mo tempo, de sua estrutura. Ademais, ageopolítica proporciona as armas paraa ação política e diretrizes para a vidapolítica em seu conjunto.

Assim, a geopolítica se convertenuma arte, a arte de guiar a políticaprática. “A geopolítica é a consciên-cia geográfica do Estado”. (SILVA,2003, p.24)

A República Popular da China (RPC)

A tradição milenar imperial da China2 éinterrompida em 1912 pelo Partido Naciona-lista3 de Sun Yat-sen, que ascende ao poder

2 Fairbank (2007) relata indícios da existência da Dinastia Xia desde 2200 a.C. (data aproximada).3 Ou Kuomitang (KMT).

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após proclamar a República. A China esta-va, nesse período, sob forte influência cul-tural e econômica japonesa, devido à suaderrota em 1895 na Guerra Sino-Japonesa,conforme descrito por Fairbank (2007):

A inesperada e esmagadora derrota daChina em 1895 para o Japão levou oschineses a imitarem-no. A preocupaçãocondescendente do Japão com a China,embora arrogante, era expressa na dou-trina de que o sucesso na modernizaçãodo Japão deu-lhe o dever de ajudar oschineses retardatários. Sociedades se-cretas expansionistas e militares japo-neses transformaram-se em investiga-dores exaustivos da vida e das condi-ções chinesas, enquanto os eruditosinvestigavam a cultura comum aos doispaíses. (FAIRBANK, 2007, p. 228)

A primeira década que se seguiu ao iní-cio da República foi caracterizada, de acor-do com Fairbank (2007), por uma grandedesordem político-social. Buscando umaidentidade para a nova sociedade chinesa,e ao mesmo tempo tentando se libertar dainfluência japonesa, surgiram movimentossociais que acabaram levando à fundaçãodo PCC, em1921.

Após o rompimento do PCC, de MaoTsé-Tung, com o Kuomitang (KMT), a Chi-na enfrentou uma guerra civil envolvendoos dois partidos.

O ataque do Japão à Manchúria em 1931 e,posteriormente, a Xangai e à área de Pequim-Tianjin despertou na população chinesa umforte sentimento nacionalista e xenófobo, unin-

do novamente o PCC e o KMT para expulsarde seu território o inimigo comum.

O grande esforço militar na guerra con-tra os japoneses desgastou o KMT, tor-nando-o vulnerável na continuação daguerra com o PCC, após a derrota japonesana Segunda Guerra Mundial, em 1945.

Com a vitória dos seguidores de Mao, oKMT instala-se na Ilha de Formosa, hojeTaiwan, dando origem ao grave problemade disputa de soberania, que será aborda-do adiante.

Em 1o de outubro de 1949, em palanquecolocado no Portão da Paz Celestial (entra-da principal da Cidade Proibida, em Pe-quim), Mao Tsé-Tung declara fundada aRepública Popular da China.

O triunfo do PCC gerou expectativas napopulação de que a estabilização política ea redefinição do sistema econômico coloca-riam a China novamente no caminho do de-senvolvimento por meio da industrialização,possibilitando sua inserção como uma po-tência regional na Ásia (PRIMO, 2007).

Assim, aproveitando a experiência sovi-ética, o sistema econômico foi definido pormetas dos planos nacionais de desenvolvi-mento (planos quinquenais) que, inicialmen-te, previam a reconstrução da economia chi-nesa, após um longo período de lutas inter-nas e externas (FAIRBANK, 2007).

Na primeira década da RPC, o sistemabaseado na propriedade coletiva dos mei-os de produção favoreceu a recuperaçãoda economia agrícola.

O fracassado experimento do “Grande Sal-to para Frente”4 e a “Revolução Cultural”5,além de retardarem a consolidação do proces-

4 Consistiu em várias medidas econômicas, sociais e políticas adotadas pelo PCC, visando à industrializa-ção da China. Fairbank (2007) cita que cerca de 20 a 30 milhões de chineses morreram no períodode 1958 a 1960, em virtude de desnutrição e fome causadas pelo fracasso do plano, em que saláriosseriam reduzidos e substituídos por entusiasmo e autossacrifício.

5 Movimento que gerou a expressão “dez anos perdidos”, permitindo a Mao Tsé-Tung consolidar seupoder, eliminando intelectuais e críticos do PCC, na maioria das vezes por meio de grupo de jovensorganizados em comitês revolucionários (PRIMO, 2007).

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so de industrialização, impuseram desafios deordem política ao PCC (PRIMO, 2007).

Em 1972 esse quadro econômico come-çou a se reverter, principalmente após oinício da aproximação chinesa com osEUA. Após a morte de Mao, em1976, as-cenderam ao poder reformistas lideradospor Deng Xiao Ping, que abriram caminhopara a aplicação das “Quatro Moderniza-ções” (agricultura, indústria, ciência etecnologia e defesa), impulsionando a Chi-na a um processo de mudança social e eco-nômica sem precedentes para o mundo emdesenvolvimento (MARRONI, 2007).

Dentro do programa de reformas, a aber-tura de “Zonas Econômicas Especiais”(ZEE)6 e o estímulo a joint ventures estran-geiras e ao setor não estatal outorgaramgrande dinamismo à economia e ao comér-cio (FAIRBANK, 2007).

De acordo com Goldman (2006), esseprograma de reformas de Deng, intitulado“Socialismo com Características Chinesas”,aliava o direcionamento para uma economiade mercado e para a arena internacional, como PCC presente e atuante.

Com a economia se expandindo em umamédia de mais de 9% ao ano nas últimasduas décadas do século XX e nos anosiniciais do século XXI, a economia chi-nesa é a que cresce com mais rapidez nomundo. De fato, com as receitas percapita mais que quadruplicando desde1978, a China obteve um crescimentoeconômico sem precedentes na história(GOLDMAN, 2006, p.372).

Com um crescimento médio de seu PIBpróximo a 10%, enquanto a média mundialnão chegou a 3%, a economia planificadados anos 70 deu um grande salto, transfor-mando a China na primeira economia domundo em desenvolvimento, na quartapotência econômica mundial e na segundaem Paridade de Poder de Compra (PPP)7,atrás apenas dos Estados Unidos da Amé-rica, tornando-se um importante ator nocenário internacional (GOLDMAN, 2006).

Um dos exemplos da busca pela lideran-ça estratégica na Ásia, a China, por meioda Shangai Cooperation Organization(SCO)8, procura fomentar a cooperaçãoeconômica com a Rússia e países da Ásiacentral, priorizando mecanismos de defesacomuns contra o terrorismo e o suprimen-to de energia entre seus participantes. ASCO, de acordo com Marroni (2007, p. 14),“funciona como instrumento de diploma-cia, política de defesa e um fórum para co-ordenação de assuntos econômicos”.

No Leste/Sudeste Asiático, a relação daChina com os países membros da Asean9

vem se estreitando, buscando a China paze prosperidade na região, ratificando as pa-lavras do premier Wen Jiabao declaradasem 2004: “A Ásia só pode crescer de ver-dade mediante a cooperação mútua”(SILVEIRA, 2007).

Conforme previsto na sua Política deDefesa Nacional, a China busca, além deum desenvolvimento pacífico, uma convi-vência harmoniosa, promovendo a paz, aestabilidade e a prosperidade na regiãoÁsia-Pacífico (FAS, 2006).

6 Moderno conceito de zonas francas. Podem ser públicas ou privadas. De acordo com Primo (2007),existem mais de 160 ZEE na China, dos mais diferentes tipos.

7 Paridade de Poder de Compra é a taxa de troca derivada da paridade de poder de compra de uma moedaem relação a outra moeda (Goldman, 2006).

8 Dela participam, além da China, Rússia, Kazaquistão, Quirguistão, Tadjiquistão e Uzbequistão (MARRONI,2007).

9 Associação das Nações do Sudeste Asiático, composta inicialmente por Filipinas, Indonésia, Malásia,Tailândia, Cingapura, Brunei, Vietnã, Mianmar, Laos e Camboja. Tem como objetivo acelerar ocrescimento econômico e fomentar a paz e a estabilidade regional.

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Apesar de militarmente forte, como vere-mos adiante, a China também se utiliza do“Poder Brando”10, que, na definição de NyeJr. (2002), corresponde à habilidade de atrairoutros graças à legitimidade das políticas deum país e seus valores, com a concepção deuma política externa mais flexível e suave, demaneira a atrair mais países para sua órbita.

Um dos mais destacados exemplos de seu“Poder Brando” é o aprendizado mundial demandarim (língua oficial da RPC). De acordocom Arias (2005), existem cerca de 100 mi-lhões de pessoas estu-dando mandarim em2.300 universidadesdistribuídas em mais decem países.

Porém, conformeprevisto em seu LivroBranco da Defesa(FAS, 2006), alguns de-safios não podem sernegligenciados. Nessecontexto, a China man-tém o desenvolvimentode seu “Poder Bruto”11,baseado em força mili-tar, inclusive a parcela nuclear do mesmo, ten-do em vista as disputas territoriais no Mar doSul da China, interesses marítimos econômi-cos e, ainda que reduzidos nos últimos anos,os assuntos envolvendo forças separatistasem Taiwan, que poderá contar com o apoionorte-americano.

Interesses marítimos econômicos

O Livro Branco da Defesa da China (FAS,2006) relata que o mundo atual não é totalmen-te pacífico. Dentre os principais motivos paraque isso ocorra destacam-se a escassez de

recursos, a busca por fontes de energia e aameaça às rotas internacionais de comércio.

As linhas de comunicações marítimas(LCM) são de fundamental importância paraa China. Os estreitos de Málaca, Sunda eLombok interligam o comércio marítimo in-ternacional com o interior do Mar do Sul daChina. Cole (2001) relata que 85% do comér-cio chinês é transportado por navios, evi-denciando, nesse contexto, a importânciaestratégica da região.

Com uma população que ultrapassa 1,3bilhão de pessoas, aChina é a maior produ-tora mundial de pesca-dos, com 48 milhões detoneladas por ano12.Com uma frota pes-queira que ultrapassaos 160 mil barcos, tripu-lados por mais de 1 mi-lhão de pescadores13, ogoverno de Pequim temprocurado estabeleceracordos bilaterais compaíses da região, visan-do a preservar áreas

onde esses recursos vivos estejam se esgo-tando. O esforço chinês alcançou resultadossatisfatórios no Mar Amarelo e no Mar doLeste da China; porém, no Mar do Sul daChina, por falta de cooperação dos demaispaíses da região, o efeito alcançado estáaquém do desejado (COLE, 2001).

Para fiscalizar as ações acima descritas,sob a égide do Ministério da Agricultura, aChina construiu um grande número de na-vios-patrulha de pesca. Ressalta-se que aMarinha não possui responsabilidade di-reta nessas atividades.

10 Tradução de Soft Power.11 Tradução de Hard Power.12 Palestra proferida em 9/jul/08 pelo ministro da Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca da Presidên-

cia da República, na Escola de Guerra Naval.13 COLE, 2001, p. 64.

Existiam, em 2005, cercade 100 milhões depessoas estudando

mandarim (língua oficialda China) em 2.300

universidades distribuídasem mais de cem países

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É inquestionável que as necessidadesenergéticas da China seguirão aumentando,acompanhando seu crescimento econômico.Como cenário de referência, é previsto, de acor-do com a Agência Internacional de Energia,que a demanda de energia primária chinesaaumente de 1,74 bilhão de toneladas equiva-lentes de petróleo em 2005, para 3,81 bilhõesde toneladas em 2030, correspondendo a umaumento médio anual de 3,2%14. De acordocom o Departamento de Defesa dos EUA(USA, 2008), a China é o segundo maior im-portador mundial de petróleo, atrás apenasdos EUA. “Petróleo é o mais proeminente in-teresse econômico costeiro da China.” Comesta colocação, Cole (2001) corroborou a im-portância desta matéria-prima no desenvolvi-mento econômico chinês.

Companhias de petróleo estrangeiras,como Shell, British Petroleum (BP), Mobil,Exxon, além da China National Offshore OilCorporation (CNOOC), exploram o Mar doSul da China, com a expectativa de gran-des reservas nas proximidades das IlhasSpratly (COLE, 2001).

A demanda chinesa por petróleo passa-rá dos atuais 7,58 milhões de barris por dia(mbd) para 10 a 12 mbd em 2015 (USA, 2008).Com a produção nacional se estabilizando,as importações brutas equivalem (dados do3o trimestre de 2007) a mais de 53% de seuconsumo. Destaca-se que cerca de 80% desuas importações de petróleo (em 2006 seusprincipais fornecedores eram: ArábiaSaudita-16%, Angola-16% e Irã-12%) pas-sam pelo Estreito de Málaca (USA, 2008).

Uma maneira encontrada pelo governochinês de reduzir a dependência do transpor-te marítimo de petróleo importado, minimizandosua dependência das LCM, foi a ligação diretadas grandes reservas energéticas do Mar

Cáspio com a China territorial através de umgrande oleoduto unindo o Kazaquistão à Chi-na. A meta chinesa é iniciar o bombeamento,inicialmente com 0,4 mbd, em 2011. O projetoprevê a construção de oleodutos e gasodutostambém com o Uzbequistão e Turkmenistão15.Merece destaque o estudo desenvolvido con-juntamente com a Rússia, conforme expostopor USA (2008), para a construção do oleodutoEast Siberia-Pacific Ocean, com capacidadede 1,6 mbd.

No contexto acima referenciado, o gover-no chinês também está investindo em recur-sos renováveis, procurando diversificar suamatriz energética. A China, de acordo comVentura Filho (2008), possui o maior potenci-al hidrelétrico do mundo, estimado em 350 milMW. Está construindo diversas usinas hi-drelétricas, destacando-se a de Três Gargan-tas, no Rio Yang-Tsé, considerada a maiorhidrelétrica16 do mundo. Existe também a pre-visão de construção de mais 12 represas aolongo desse mesmo rio (SCOFIELD, 2008).

Na visão do autor, fica evidente nos diasatuais a dependência externa chinesa porpetróleo, transportado por via marítima, parasustentar seu grande desenvolvimento eco-nômico e industrial, em que pese o grandeesforço governamental para reverter tal si-tuação. As questões marítimas territoriaisnas quais a China está envolvida, com exce-ção de Taiwan, resumem-se prioritariamentena busca por petróleo e gás.

Interesses marítimos territoriais

Mar do Sul da China

Considerado como o maior mar do mun-do, o Mar do Sul da China possui cerca de3 milhões de km². Conforme explicitado por

14 Extraído de http://worldenergyoutlook.org/2007.asp. Acesso em 30/6/2008.15 Extraído de http://www.stratfor.com/products/premium/read article.php?id=299799. Acesso em 3/3/2008.16 Em aproveitamento do potencial hidrelétrico (VENTURA FILHO, 2008).

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Pereira (2003), sua grande importância es-tratégica e econômica deve-se aos seguin-tes principais dados:

a) As rotas marítimas que ligam o Nor-deste Asiático e a zona ocidental do Pacífi-co ao Oceano Índico e ao Oriente Médioatravessam o Mar do Sul da China.

b) Mais de 40 mil navios circulam anu-almente no Mar do Sul da China, um volu-me de tráfego três vezes superior ao doCanal do Panamá e duas vezes superior aodo Canal de Suez.

c) Aproximadamente 15% do volumetotal do comércio mundial passam pelasLCM do Sudeste Asiático.

d) Mais de 80% do petróleo com destinoao Japão, à Coréia do Sul e a Taiwan é trans-portado através do Mar do Sul da China.

Especula-se, ainda, que o Mar do Sul daChina seja rico em recursos energéticos,vitais para o desenvolvimento econômicodos países da região (SILVEIRA, 2008).

As reivindicações de China, Taiwan eVietnã nas disputas territoriais no Mar doSul da China são baseadas, de acordo comPereira (2003), nos seguintes aspectos:

a) China – Alega que seus pescado-res, desde a dinastia Han (206 a.C.-220 d.C.),já ocupavam a região. Atualmente ocupaoito ilhas e reivindica todas.

b) Taiwan – Suas pretensões se equi-valem às da RPC. Ocupa a Ilha Itu Aba, amaior das Ilhas Spratly.

c) Vietnã – Após sua independênciada França reivindica total soberania sobrea região, ocupando atualmente 25 ilhas.

Malásia, Filipinas e Brunei também as-piram à soberania de algumas ilhas na re-gião, tendo em vista a proximidade de seuterritório e a projeção de sua plataformacontinental (caso da Malásia).

De acordo com Cole17 (2001), a Chinapossui disputas territoriais em quatro áre-as do Mar do Sul da China: Ilhas Natuna,com Indonésia e Vietnã; Golfo de Tonkin,com Vietnã; Ilhas Paracel, com Taiwan eVietnã; e Ilhas Spratly, com Taiwan, Vietnã,Malásia, Filipinas e Brunei.

A Convenção das Nações Unidas sobreo Direito do Mar (CNUDM) estabelece, emseu Art. 2o da Parte II, que a soberania18 doEstado costeiro estende-se além de seu ter-ritório e de suas águas interiores e, no casode Estado arquipélago, das suas águasarquipelágicas, a uma zona de mar adjacen-te designada de Mar Territorial, possuindouma largura que não ultrapasse 12 milhasnáuticas, medidas a partir das linhas de baseestabelecidas na própria CNUDM.

Em sua Parte V, estabelece a criação de ZonaEconômica Exclusiva (ZEE), definida comouma zona situada além do Mar Territorial e aeste adjacente, que não deverá se estenderalém das 200 milhas náuticas, também medi-das a partir das mesmas linhas de base queservem de referência para o Mar Territorial. NaZEE, o Estado costeiro possui direitos de so-berania para fins de exploração e aproveita-mento, conservação e gestão dos recursosnaturais, vivos ou não vivos, das águassobrejacentes ao leito do mar e seu subsolo, eno que se refere a outras atividades com vistaà exploração e aproveitamento da zona parafins econômicos, como a produção de energiaa partir da água, das correntes e dos ventos.

Com relação à Plataforma Continental(PC), definida no Art.76 da Parte VI, pode-se estender até uma distância que não ex-ceda as 350 milhas náuticas da linha de basea partir da qual se mede a largura do MarTerritorial ou a uma distância que não ex-ceda 100 milhas náuticas da isóbata19 de

17 Inseriu a Indonésia na disputa territorial do Mar do Sul da China.18 Essa soberania estende-se, de acordo com a CNUDM, ao espaço aéreo sobrejacente ao Mar Territorial,

bem como ao leito e ao subsolo deste mar.19 Linhas de mesma profundidade.

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2.500 metros, que é uma linha que une pro-fundidades de 2.500 metros. Sobre essa PC,o Estado costeiro exerce direitos de sobe-rania para efeitos de exploração e aprovei-tamento de seus recursos naturais.

Como a China assinou e ratificou aCNUDM em 1996 (COLE, 2001), deverá cum-prir o disposto na Parte XV – Solução deControvérsias, que prevê a obrigação de so-lucionar controvérsias por meios pacíficos.

Na visão deste autor, as disputasterritoriais são grandes. Como observadoacima, e na tentativa de manter a estabili-dade regional, a China tem buscado solu-ções pacíficas nos assuntos externos, coma influência de seu “Poder Brando”, juntoaos países envolvidos, preferencialmenteem acordos bilaterais. Os foros internacio-nais são utilizados quando ela não conse-gue, de acordo com seus interesses, resol-ver o contencioso. Nesse caso, poderá tam-bém fazer uso de seu “Poder Bruto”, prin-cipalmente em relação às Ilhas Spratly eParacel, caso seja confirmada a existênciade petróleo nas proximidades das áreas emquestão.

Mar do Leste da China

Um grupo de cinco pequenas ilhas e trêsrochas que afloram à superfície do mar, lo-calizadas a 90 milhas náuticas a nordestede Taiwan e a 220 milhas náuticas a sudo-este da Ilha de Okinawa, é motivo de dis-puta territorial entre a China e o Japão(COLE, 2001).

As Ilhas Diaoyu20, de acordo com Silveira(2008), são localizadas em áreas ricas empetróleo e gás. Eram chinesas até o Tratadode Shimonoseki, celebrado em 1895 entre oJapão e a China, após a vitória do primeirona guerra entre os dois países, quando seu

controle, juntamente com Taiwan, foi pas-sado aos japoneses. Com a derrota nipônicana Segunda Guerra Mundial, as potênciasaliadas devolveram apenas Taiwan aos chi-neses, permanecendo o grupo de ilhas emdisputa até os dias atuais.

Ambos os países têm explorado gás naárea em questão, aumentando a tensão naregião. Com frequência os japoneses re-clamam da presença de navios e submari-nos chineses nas águas em disputa(SILVEIRA, 2008).

Verifica-se, neste contexto, que, acimada disputa por soberania, ambos desejamo monopólio das riquezas das jazidas sub-marinas que porventura sejam descober-tas nessa área marítima.

Caso Taiwan

Registros históricos indicam que a ocu-pação da Ilha de Taiwan por militares e ci-vis chineses remonta a mais de 1.700 anos,de acordo com o sítio da Embaixada daRepública Popular da China no Brasil21.Porém, em 1624, os holandeses a ocupa-ram, buscando estabelecer um posto de co-mércio. Zhen Chengong recuperou a ilhapara os chineses em 1662. Em 1684, a di-nastia Ming oficialmente a incorporou àprovíncia de Fujian, sendo elevada a pro-víncia de Taiwan em 1885.

Após a derrota na guerra com o Japão,em 1894, a dinastia Qing viu-se obrigada aassinar o Tratado de Shimonoseki, passan-do a ilha ao controle nipônico. De acordocom Fairbank (2007), “Taiwan era a primei-ra colônia japonesa com características deuma potência moderna”. Os novos admi-nistradores da ilha buscaram transformarTaiwan em um modelo de crescimento eco-nômico. Fomentaram a educação básica,

20 Ilhas Senkaku para os japoneses.21 www.embchina.org.br/por/ztzi/twwt/t150745.htm

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O EMPREGO DE SUBMARINOS NA ESTRATÉGIA NAVAL DA CHINA

ciência e língua japonesa, além de patroci-nar associações de agricultores paraincrementar a tecnologia agrônoma. Foramconstruídos mais de 10 mil km de estradase ferrovias unindo toda a ilha, possibilitan-do o grande desenvolvimento da agricul-tura (FAIRBANK, 2007).

Com a derrota do Japão na SegundaGuerra Mundial, Taiwan voltou ao contro-le chinês, sendo ocupada, após 1945, pe-los nacionalistas. Os insulares foram con-siderados traidores pelo KMT, tiveram seusbens confiscados e a economia da ilha en-trou em colapso, em função da grandecorrupção e da inépcia administrativa im-posta pelos nacionalistas. Entre 8 e 10 miltaiwaneses foram assassinados pelo go-verno de Chiang Kai-Chek em 1947.

Nesse contexto, com a derrota para oPCC, os nacionalistas refugiaram-se na ilhaem 1949. O líder do Partido Nacionalista,ao se instalar em Taiwan, deparou-se coma situação caótica imposta por seus repre-sentantes. Estabeleceu um regime capita-lista, apoiado pelos norte-americanos, hos-til ao recém-instalado governo comunistada RPC, liderado por Mao Tsé-Tung.

De acordo com Collazo (2005), a situaçãoinsular modificou-se com a morte de ChiangKai-Chek em 1975. Seu filho, Jiang Jingguo,assumiu o poder, dando início a uma políticamais liberal, com a legalização de partidos deoposição e a suspensão da lei marcial.

No que diz respeito ao posicionamentode Taiwan no concerto das nações, em 1971a maioria dos Estados soberanos da Orga-nização das Nações Unidas (ONU) deixoude reconhecê-la como o legítimo represen-tante do povo chinês. Com a perda de seuassento na ONU para a RPC, os EUA pas-saram a reconhecer o governo de Pequime, reiteradas vezes, participaram ser ade-

rentes à política de “uma única China” (FAS,2006). Porém os atos norte-americanos nãocorresponderam aos fatos. O fornecimen-to de apoio militar a Taiwan não foi inter-rompido, e o fato de o Estreito de Taiwanter sido considerado um objetivo estraté-gico para os EUA e o Japão em acordo fir-mado por ambos (SILVEIRA, 2008) com-prova que a situação no Leste Asiático,dentro de um contexto geopolítico, aindainspira preocupações.

Corroborando as afirmações contidasem FAS (2006) de que a China buscaincrementar suas relações com Taiwan, pro-movendo maior integração através do Es-treito, foi assinado, em 13 de junho de 2008,um acordo22 (considerado histórico pelasagências de notícias) estabelecendo voosregulares entre o continente e a ilha, permi-tindo maior fluxo de visitantes, tanto detaiwaneses ao continente, quanto de chi-neses à ilha. Nas palavras de Sun Tzu:

O comandante habilidoso submete seuinimigo sem partir para a batalha; der-rota seu reinado sem operações de cam-po muito extensas. Com as forçasintactas, disputa o domínio do império.Dessa maneira, suas armas não sofrerãodesgastes e, sem perder um soldado, suavitória será completa. Esta é a arte depreparar para o ataque. (SUN TZU)23

Na visão do autor, outro fato que apa-rentemente indica promover a estabilidadee a paz nas relações através do Estreito refe-re-se à vitória de Ma Ying-Jeou, do PartidoNacionalista, nas eleições para presidentede Taiwan, realizadas em 2008. Em sua cam-panha eleitoral, defendeu uma aproximaçãopacífica com a RPC, corroborando a mesmaposição dos eleitores insulares.

22 Disponível em www.inforpress.cv/index.php?option23 BUSHIDÔ, Nikko. A arte da guerra: Os treze capítulos originais, São Paulo: Sapienza, 2005, p. 42-43.

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O EMPREGO DE SUBMARINOS NA ESTRATÉGIA NAVAL DA CHINA

O governo chinês, que considera Taiwancomo sua 23a província, admite uma relati-va flexibilização com relação ao capitalis-mo adotado pela ilha, nos moldes ao apli-cado a Hong Kong – “uma China, dois sis-temas”. Porém, conforme evidenciado emFAS (2006), se os movimentos separatis-tas se intensificarem, incrementando umapolítica radical pela independência, falhan-do o “Poder Brando” e a diplomacia, a RPCnão descarta a possibilidade do uso de seupoder militar (já previamente autorizadopela Lei Antissecessão, de 2005), dandoinício a um conflito armado quedesestabilizaria toda a Ásia-Pacífico.

A MARINHA DO EXÉRCITOPOPULAR DE LIBERTAÇÃO (EPL)

A Marinha chinesa deve assumir suaresponsabilidade histórica e se desen-volver rapidamente para se transfor-mar na maior potência naval na áreaÁsia-Pacífico, de modo a garantir oprogresso tranquilo da modernizaçãoeconômica da China. Almirante LiuHuaqing. (COLE, 2001, p.169)

A formação da Marinha do EPL

A vitória do PCC em 1949 foi consolida-da pelo Exército24. Após a retirada das for-ças nacionalistas para Taiwan, o EPL nãoteve capacidade de projetar poder sobre ailha ocupada. Desta maneira, na tentativade recuperá-la e evitar ataques por partedo KMT, o novo governo de Pequim criouo Comando Militar do Leste da China(CMLC), sediado em Xangai.

De acordo com ONI (2007), foi criada aMarinha do CMLC em 23 de abril de 1949,com as tarefas de “defender o litoral chi-nês, continuar a luta contra as forças deChiang Kai Shek e ajudar na reconstruçãoeconômica” (COLE, 2001, p.16-17).

Os primeiros navios desta nascenteMarinha foram as unidades que, de acordocom Silveira (2008), não aderiram ao KMTna sua fuga para Taiwan.

Na primeira década do novo governo,Mao procurou apoio soviético para equipara Marinha. Ao se analisar, dentro da moldu-ra temporal alocada, verifica-se que a Mari-nha chinesa obteve um acréscimo conside-rável de meios flutuantes, principalmentesubmarinos, baseado em forte apoio sovié-tico. Foram construídos estaleiros, bases eescolas navais. Cole (2001) credita como “oponto alto desta cooperação o Acordo deNovas Tecnologias, assinado em fevereirode 1959, que previa a compra de submarinosconvencionais e de lanchas torpedeiras ar-madas com mísseis”25.

Durante o período conhecido como“Cem anos de humilhação”26, ficaram evi-denciadas as vulnerabilidades estratégicasdas fronteiras marítimas chinesas. Maopossuía a convicção que tal fato ocorreudevido à inexistência de uma Marinha comcredibilidade que pudesse se contrapor àsagressões externas (SILVEIRA, 2008).

É relevante observar que, no início dosanos 50, a ex-URSS estava engajada em ummaciço programa de construção de subma-rinos. A título de comparação, nos 40 anosque se seguiram ao término da SegundaGuerra Mundial, os EUA construíram cer-ca de 150 submarinos. No mesmo período,

24 Inicialmente com o nome de Exército Vermelho, criado em agosto de 1927, o Exército Popular deLibertação (EPL) recebeu esta denominação em 1946.

25 COLE, 2001, p. 94.26 Período compreendido entre 1842 e 1949, durante o qual a China sofreu diversas invasões, sempre pelo

mar, de países ocidentais e do Japão.

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O EMPREGO DE SUBMARINOS NA ESTRATÉGIA NAVAL DA CHINA

os soviéticos construíram mais de 600 uni-dades, de acordo com Ranft e Till (1983).

Neste contexto, a prioridade dada porMao em 1960 foi a de desenvolver e cons-truir submarinos de propulsão nuclear,mostrando, desde o início da formação desua Marinha, a importância que a Força deSubmarinos teria para a China.

A Constituição da RPC e a Lei de Defe-sa Nacional especificam as tarefas das For-ças Armadas (CHINA, 2007):

a) consolidar a defesa nacional;b) resistir a agressões externas;c) defender a Pátria;d) salvaguardar o trabalho pacífico do

povo;e) participar da construção nacional;f) servir “sinceramente” ao povo.As Forças Armadas chinesas, de acor-

do com a Constituição, a Lei de DefesaNacional e outras leis relevantes, encon-tram-se sob o comando do PCC. A Comis-são Militar Central (CMC) do PCC dirige eassume o Comando Militar unificado dasForças Armadas. Este é composto por umpresidente, três vice-presidentes, quatrodiretores dos departamentos-gerais e pe-los comandantes de Força. (FAS, 2006).

Shambaugh (2002) comenta que essaestrutura militar organizacional remontaessencialmente ao modelo importado dossoviéticos no início dos anos 50, com acentralização no CMC, departamentos-ge-rais (com o domínio do PCC e um sistemade comissariado político), regiões militarese comandos de Força.

Nesse contexto, a missão da Marinha é“defender-se contra invasões inimigas vindasdo mar, defender a soberania do Estado sobresuas águas territoriais e salvaguardar os direi-tos e interesses do Estado” (ONI, 2007).

Para o cumprimento de sua missão, a Mari-nha chinesa está dividida em cinco forças prin-

cipais, quais sejam: submarinos, superfície,aviação naval, defesa costeira e fuzileiros na-vais. Dentro dessa estrutura, Howarth (2006)destacou a importância que os submarinostêm na concepção de defesa da China:

A preponderância de submarinos na es-trutura da Marinha chinesa é o testemu-nho da importância que Pequim dá à ma-nutenção da capacidade ofensiva da armasubmarina. (HOWARTH, 2006, p. 15)

A sua estrutura administrativa é divididaem quatro departamentos de primeiro nível:Comando, Político, Logístico e Equipamento.

O Comando da Marinha possui, comosubordinados diretos, as Esquadras do Mardo Norte, do Leste e do Sul. Cada Esqua-dra tem, em sua cadeia de comando, basesnavais, centros de adestramento e organi-zações de apoio.

Ressalta-se que os comandantes dasEsquadras estão no mesmo nível hierárqui-co dos diretores dos quatro grandes De-partamentos (ONI, 2007).

A Marinha, aderente ao China’s NationalDefense in 200627, está trabalhando paraconstruir uma moderna força naval operativaconsistindo de meios convencionais e nu-cleares. Sua meta é a informatização, e seufoco estratégico no caminho da moderniza-ção considera como de alta prioridade o de-senvolvimento de sistemas de informaçãomarítimos e novas gerações de equipamen-tos e armamentos. Também se esforça paraadestrar forças navais capazes de conduziroperações sob condições de informatizaçãoe incrementando sua capacidade de operarem águas costeiras, operações conjuntas eapoio marítimo integrado.

Seu inventário atual inclui 72 fragatas econtratorpedeiros, 58 submarinos conven-cionais e nucleares e 50 navios anfíbios,

27 Livro Branco de Defesa da China (FAS, 2006).

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além de grande quantidade de navios-pa-trulha armados com mísseis, naviosvarredores e de apoio (USA, 2008).

A Força de Submarinos da China28

Os submarinos convencionais e de pro-pulsão nuclear possuem algumas caracterís-ticas que os tornam uma ameaça a qualquerForça Naval. Sua enorme capacidade deocultação, relativa independência dos fato-res ambientais e mobilidade tridimensionalfazem com que este navio de guerra projeta-do para operações abaixo da superfície domar ocupe posição de destaque no cumpri-mento das tarefas básicas de negação do usodo mar, projeção de poder sobre terra e con-tribuição para a dissuasão29.

De acordo com Vianna Filho (2007), osubmarino é elemento fundamental do Po-der Naval e, por sua capacidade ofensiva,contribuinte essencial de estratégias que“compreendam tarefas de negação do usodo mar”. Ele é essencial para a “estratégiada dissuasão” em cenários onde o uso domar pode ser primordial para ações antagô-nicas e, consequentemente, para defesa dosinteresses dependentes do Poder Marítimo.

Liberatti (2002) assim se posicionou comrelação à presença de submarinos nos mares:

A ocultação implica incerteza quanto àpresença, obrigando o adversário a in-gentes esforços para equilibrar a equa-ção. Assim, a posse de submarinos cau-sa um desequilíbrio a favor de quem o

tem. Sua existência, ou a simples supo-sição de sua presença, pode condicionaro curso dos acontecimentos na guerra.(LIBERATTI, 2002)

Após a consolidação da RPC em 1949,Mao buscou apoio na ex-URSS. Os chine-ses começaram a aprender como operar umsubmarino em 1951, por meio de uma uni-dade da Força de Submarinos soviética daEsquadra do Pacífico, atracada em um por-to chinês (ONI, 2007).

Como herança do apoio recebido porparte da ex-URSS, a Força de Submarinoschinesa era considerada por especialistasocidentais, até o inicio deste século, anti-quada. O Projeto 633 (classe Romeo)30, doinício dos anos 1950, foi iniciado em um pe-ríodo de grande ambição para a Marinhasoviética (planejava-se construir 560Romeo), porém, em 1955, o PresidenteKruschev decidiu interromper o programa31,transferindo toda a tecnologia para a China.

No período de 1960 a 1984, a China cons-truiu 72 unidades da classe Romeo, dasquais cerca de 20 ainda estavam operativasem 2005. A Marinha chinesa ainda operacom cerca de 17 Ming, Projeto 035, umaevolução dos Romeo.

Para substituir esses antigos e ruido-sos submarinos, investiram em novas clas-ses. O Projeto 039/039A, classe Song, foiconcebido e construído nos estaleiros chi-neses. O primeiro foi lançado em 1994 ecomeçou a operar em 1999.

28 Quando se fala em Força de Submarinos da China entenda-se como a Força de Submarinos da Marinhado Exército Popular de Libertação (Nota do autor).

29 No caso específico da contribuição para a dissuasão, o submarino nuclear é particularmente adequado,em função de suas características. A simples existência desse meio já acarreta uma grande açãodissuasória (LIBERATTI, 2002).

30 As principais características dos submarinos chineses e seus respectivos armamentos podem ser encon-tradas no Jane’s Figtting Ships.

31 Era intenção construir apenas submarinos nucleares. Com a interferência da Marinha soviética, arguindoque os submarinos nucleares eram caros e a necessidade dos convencionais para operar em brownwaters, o Projeto 633 foi reiniciado na ex-URSS, em 1962, com a construção de 21 unidades(MILLER, 2002).

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O EMPREGO DE SUBMARINOS NA ESTRATÉGIA NAVAL DA CHINA

Estima-se, pela falta de dados oficiais, aexistência de 20 Song32 operativos em 2008.Para exemplificar a capacidade operativadesta classe de submarinos, em outubrode 2006 ocorreu um incidente naval envol-vendo um Song e o Grupo de Batalha doUSS Kitty Hawk, nas proximidades deOkinawa, quando o submarino chinês veioà superfície sem ser detectado pelos escol-tas e dois submarinos da classe LosAngeles que compunham o Grupo de Bata-lha. De acordo comLiberatti (2007), oPentágono reconhe-ceu que nenhum deseus meios na regiãofoi capaz de percebera aproximação do refe-rido submarino.

Prosseguindo emsua modernização, em 1994 a China com-prou seus primeiros submarinos da classeKilo. Encomendados à Rússia, inicialmen-te recebeu duas unidades do Projeto paraExportação 877 e, em 1996, mais duas uni-dades do modelo 636. O programa foi tãobem aceito pela Marinha chinesa que em2002 foram encomendadas mais oito uni-dades. O último 636 foi recebido em 2006.

Desta forma, hoje possui 12 submari-nos da classe Kilo, considerados dos maissilenciosos submarinos convencionais daatualidade.

A mais nova classe de submarinos con-vencionais desenvolvida por projetistas

chineses é a Yuan, Projeto 041. O primeirodeles foi lançado em 2004 pelo estaleiroWuhan e se assemelha bastante com osKilo e os Song. Por conta dessa caracterís-tica, Murray (2007) descreve que o Yuanpode ser considerado um Kilo com carac-terísticas chinesas ou um Song com carac-terísticas russas. Ji (2006), quando descre-ve as novas capacidades adquiridas pelaMarinha chinesa a partir de 2000, relata quea classe Yuan está dotada com AIP33.

Os chineses lançaram seu primeiro SSN34

(Projeto 091), classeHan, em 1974, e o quin-to foi comissionadoem 1990. Este projetonacional refletiu a im-portância que os líde-res chineses davam àpropulsão nuclear.

Além de ser o precursor em energia nucle-ar, incorporou o design do Albacore35.Apesar de serem considerados ruidosos,de fácil detecção, em outubro de 1994 umclasse Han aproximou-se do Grupo de Ba-talha do USS Kitty Hawk, na cotaperiscópica36, no Mar Amarelo, em clarademonstração dos novos desafios que aMarinha norte-americana passaria a enfren-tar na região (MILLER, 2002).

Primeiro SSBN37, segundo Miller (2002),projetado e construído na Ásia, o classeXia (Daqingyu) foi lançado em 1981. Úni-co da classe, enfrenta uma série de proble-mas relacionados com seu sistema de lan-

32 De acordo com Fisher Junior (2007), os estaleiros chineses teriam a capacidade de construir de duas atrês unidades da classe Song por ano.

33 AIP – “Air Independent Propulsion” (propulsão independente de ar atmosférico), que permite aumen-tar o período de permanência em imersão de um submarino, sem a necessidade obrigatória de exporseus mastros para carregar suas baterias.

34 Designação dada pela Otan para submarino nuclear de ataque.35 Submarino convencional norte-americano que, na década de 1950, incorporou as vantagens de um

casco resistente menor, mais bojudo, em forma de gota, e a substituição dos dois eixos da propulsãopor apenas um. (MILLER, 2002)

36 Profundidade na qual o submarino pode realizar observações com o periscópio.37 Designação dada pela Otan para submarino nuclear lançador de mísseis balísticos.

Os chineses lançaram seuprimeiro SSN, classe Han,

em 1974, e o quinto foicomissionado em 1990

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O EMPREGO DE SUBMARINOS NA ESTRATÉGIA NAVAL DA CHINA

çamento de mísseis JL-1. Operativo desde1987, não existem relatos de nenhuma gran-de comissão realizada pelo Xia.

Encontra-se substituindo seu JL-1 pelonovo JL-2, com alcance de até 10 mil km,que equipa a nova classe de SSBN da Chi-na, a classe Jin (Projeto 094), com dois sub-marinos incorporados até 2005 (FISHERJUNIOR, 2007).

Em dezembro de 2002 foi lançada ao mara nova classe de SSN, a classe Shang (Pro-jeto 093). Em 2003 foi lançado o segundoda classe e, de acordo com diversos ana-listas, ambos encontram-se operativos(MURRAY, 2007).

Para contribuir nas operações de seussubmarinos, a Marinha chinesa possui deznavios de apoio e três navios da classeDajiang com grandes cranes38, além de doisDSRVs39 de 35 toneladas.

Seus submarinos estão divididos em seisflotilhas, com cerca de dez submarinos cada.A Esquadra do Norte possui, subordinada aela, três flotilhas; a Esquadra do Leste, duas;e a do Sul, uma. Os Kilo estão operandosob o comando da Esquadra do Leste, su-gerindo com isso que possam ser emprega-dos em tarefas no Estreito de Taiwan ou noMar do Sul da China (McDEVITT, 2000).

Subordinada à Esquadra do Norte, a Basede Jianggezhuang provê apoio aos submari-nos nucleares. Localizada nas proximidadesda cidade de Qingdao, no Mar Amarelo, dis-põe de seis píeres, diques e facilidades sub-marinas subterrâneas. De acordo comKristensen (2006), a largura na entrada destetúnel é de 13 metros. O tamanho real e suasfacilidades internas são desconhecidos, sa-bendo-se apenas que são capazes de abrigarseus submarinos balísticos. A decisão de cons-truir abrigos para os submarinos partiu de Mao,em 1966, e, dois anos após, a Marinha iniciava

as obras desse abrigo, de modo a proteger asdefesas do país contra ataques externos.

Uma nova base está sendo construída aosul da Ilha Hainan, nas proximidades da cida-de de Sanya. Localizada no Mar do Sul daChina, a base será capaz de receber um gran-de número de navios de superfície e subma-rinos, inclusive SSN e SSBN. Kristensen(2008) reporta essa possibilidade em funçãodas facilidades por ela oferecida, como, porexemplo, abrigos subterrâneos para subma-rinos similares aos da Base de Jianggezhuang.

No entendimento do autor, torna-se evi-dente a intenção chinesa de aumentar suapresença naval além do estreito de Taiwan,em consonância com o escopo pretendidopor sua nova estratégia naval.

ESTRATÉGIA NAVAL DA CHINA

“Observe calmamente; assegure a nos-sa posição; lide com os assuntos comcalma; oculte nossas capacidades eaguarde a nossa hora; seja bom em man-ter a discrição; e nunca reivindique aliderança.”Estratégia em 24 Caracteres-DengXiaoping

Estratégia naval da China

A partir de 1985, Pequim iniciou uma re-forma radical em suas Forças Armadas.Forças terrestres foram numericamente re-duzidas e, com isso, mais recursos ficaramà disposição da CMC para ser implantadaa modernização do EPL.

Esses recursos disponibilizados para amodernização do EPL incluíam o desenvol-vimento da indústria de defesa nacional, in-cremento no uso de tecnologia dual e aqui-sição de tecnologia importada. Oficialmen-

38 Guindastes (COLLINS, 2004).39 Deep Submergence Rescue Vehicle – veículo de resgate submarino.

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O EMPREGO DE SUBMARINOS NA ESTRATÉGIA NAVAL DA CHINA

te, os gastos com defesa anunciados porPequim para 2007 foram de US$ 46 bilhões.De acordo com o Departamento de Defesa(DoD) norte-americano, esses dados infor-mados não exprimem a realidade chinesa,visto que, além da falta de transparência,não foi incluída nessa conta uma grandecategoria de gastos. Para o DoD, os gastosmilitares chineses totais em 2007 oscilaramentre US$ 97 bilhões e US$ 139 bilhões.

Com suas fronteiras terrestres estabiliza-das, principalmente após a assinatura doTratado de Amizade e Boa Vizinhança Sino-Russo, a China passoua priorizar também aMarinha. O Livro Bran-co de Defesa da Chinade 2006 imputa a mes-ma ênfase, no que serefere a assuntos dedefesa, ao Exército e àMarinha. Isso porque,na visão de Erickson (2007), os principaisproblemas da RPC relacionados a soberaniae assuntos estratégicos são ligados ao marem sua essência:

a) interesses marítimos estratégicos –as disputas territoriais envolvem ilhas e,consequentemente, o uso do mar;

b) interesses marítimos econômicos –seu comércio depende basicamente de suaslinhas de comunicação marítimas, e o seucentro de gravidade econômico localiza-seem seu litoral, vulneráveis aos ataques depotências navais oriundos do mar; e

c) o caso Taiwan – sua situação insular,com o seu respectivo Estreito, envolverá ouso do mar em caso de conflito.

A influência soviética se faz notar naestratégia naval que foi adotada pelos chi-neses. O pensamento dos estrategistas daYoung School40 soviética enfatizava umaforte defesa costeira baseada em peque-nas unidades de superfície e submarinos(HOWARTH, 2006).

O conceito de defesa marítima da ex-URSS era baseado em três áreas concêntri-cas que se estendiam de suas costas parao mar, com a profundidade de cada áreadeterminada pelas capacidades militares deseus meios. De acordo com Ranft e Till

(1983), seu perímetrodefensivo começavacom cerca de 500 mi-lhas náuticas de seulitoral, sendo defendi-da externamente porsubmarinos da classeZulu.

Após a morte deMao, em 1976, despontou no cenário na-val chinês o Almirante Liu Huaqing, comsólida formação soviética, adepto das ideiasdo Almirante Sergei Gorshkov41, que de-fendeu em seu livro The Sea Power of theState a mensagem central de que nenhumanação pode aspirar a ser uma grande po-tência se não for forte no mar. Sob seu co-mando, a Marinha soviética desenvolveu-se a ponto de se tornar o único Poder Na-val capaz de desafiar a Marinha norte-ame-ricana nos anos 80 (RANFT; TILL, 1983).

O comandante-em-chefe da Marinha noperíodo de 1982 a 1988, Almirante LiuHuaqing, recebeu determinação da CMCpara preparar a Marinha para duas tarefas

40 Escola de pensamento estratégico desenvolvida na ex-União Soviética logo após o fim da PrimeiraGuerra Mundial, baseada, entre outras, nas seguintes condições particulares pós-revolucionárias:

a) o novo regime estava sob ataque político e militar por diversos países capitalistas; eb) fronteiras marítimas cercadas por esquadras inimigas. (COLE, 2001)

41 Comandante da Marinha soviética nas décadas de 60 e 70, responsável pelo crescimento e moderniza-ção da esquadra, após a demonstração de fraqueza do Poder Naval soviético na crise dos mísseis deCuba (COLE, 2001).

A influência soviética se faznotar na estratégia naval

que foi adotada peloschineses

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de alta probabilidade de ocorrência em curtoe médio prazos:

a) defesa da integridade territorial daChina; e

b) condução de um possível bloqueiocontra Taiwan.

Também recebeu duas tarefas para mé-dio e longo prazo:

a) prevenção de uma invasão, a partirdo mar, de larga escala; e

b) dissuasão contra um ataque nuclear42.Para o cumprimento das tarefas recebi-

das, era necessária uma mudança doutriná-ria no emprego da Marinha. Ela deveria ex-pandir suas linhas de defesa costeira parauma offshore defense que compreendesse“operações defensivas e ofensivas em casode ataque à China, não restritas em espaçoou tempo e concentradas nas fraquezas doinimigo” (SILVEIRA, 2008, p.183).

Liu identificou zonas marítimas (FIG.06)que a Marinha chinesa deveria ser capaz decontrolar em sua estratégia de três fases, àsemelhança da adotada por Gorshkov. A pri-meira zona, cujo controle representaria a pri-meira fase de sua estratégia, compreendia oMar Amarelo (Japão e Península da Coréia),a parte ocidental do Mar do Leste da China,incluindo Taiwan, e o Mar do Sul da China.

Os principais interesses econômicos eestratégicos de Pequim encontram-se nes-sa área geográfica. De acordo com estrate-gistas chineses, esta área, conhecida como“The First Island Chain”, é representada poruma linha norte-sul que passa pela IlhasAleutas, Kurilas, arquipélago japonês, IlhasRyukyu, Taiwan, Filipinas e Indonésia. Liuenfatizou a necessidade de a Marinha ter acapacidade de exercer o controle dessa áreaaté o ano 2000 (COLE, 2001).

A segunda zona marítima, representan-do a segunda fase da estratégia de Liu, foiidentificada como “The Second IslandChain”. Consiste igualmente numa linhanorte-sul, passando pelas Ilhas Kurilas eJapão, e se deslocando mais para o leste,através de Bonin, Ilhas Carolinas eMarianas. A Marinha deverá estar capaci-tada a exercer o controle desta área até 2020.

A terceira fase, mais ousada, estabele-cia a criação de uma Marinha com capaci-dade de exercer influência global até 2050,aderente com a posição da RPC de impor-tante ator no cenário internacional.

Dentro dessa estratégia, a primeira faseestá relacionada com as green waters e assegunda e terceira fases correspondem àsblue waters.

Ji (2006) definiu como brown waters aságuas costeiras e blue waters aquelas alémdos Mares do Sul e do Leste da China. E,entre elas, estariam as green waters.

É relevante mencionar definições con-sagradas, inseridas na British MaritimeDoctrine43, relacionadas com o domínio dosmares, utilizadas por diversas Marinhas.Buscando inspiração em teóricos históri-cos sobre estratégia naval, como o Almi-rante Alfred Thayer Mahan e Sir JulianCorbett, Comando do Mar seria a “habili-dade de projetar poder confiando em nos-sas próprias forças navais, com capacida-de de usar o mar em benefício próprio, en-quanto nega o uso desse mesmo mar a umrival potencial ou inimigo” (BR 1806, 2004,p.41). Controle de Área Marítima seria umaforma limitada de Comando do Mar, cons-tituindo-se da “condição em que se temliberdade de ação para o uso do mar paraos nossos próprios propósitos, em área es-

42 Neste caso seriam utilizados seus SSBN, com credibilidade para uma retaliação em caso de um ataquenuclear, de acordo com a política nuclear chinesa de no first use (Expressão utilizada por analistasdo Departamento de Defesa norte-americano referindo-se à política declarada por Pequim de nãoser o primeiro a fazer uso de armamento nuclear em caso de conflito (USA, 2008).

43 Doutrina marítima britânica.

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pecífica e por período limitado de tempo”(BR 1806, 2004, p.41). A Negação do Usodo Mar é “exercida quando um partido negaa outro a habilidade de controlar área marí-tima sem estar capacitado a controlar aquelaárea para ele mesmo” (BR 1806, 2004, p.42),sendo o uso de minagem e emprego de sub-marinos a forma clássica de seu emprego.

Após cerca de 25 anos desde que aMarinha chinesa iniciou a busca pela suanova estratégia naval, alguns autores afir-mam que houve um atraso de pelo menoscinco anos na consecução de sua primeirafase. Ji (2006) cita como principal causa aestagnação nas capacidades navais chine-sas no período entre 1990 e 1999. Porém, apartir de 2000, essa imobilidade foi substi-tuída pela incorporação de um grande nú-mero de unidades de superfície e submari-nos. De acordo com Erickson et al. (2007),a Marinha da China incorporou 31 novossubmarinos nos últimos dez anos, refor-çando a importância dada pelo governochinês a este tipo de meio em sua estraté-gia naval. McDevitt (2000), nesse contex-to, se expressou da seguinte maneira:

“Submarinos são o ingrediente essen-cial na Estratégia Marítima da China. Sub-marinos são centrais em qualquer tenta-tiva de bloqueio a Taiwan, e são a me-lhor chance de a Marinha chinesa retar-dar ou destruir um Grupo de Batalhanucleado em navio-aeródromo norte-americano”. (McDEVITT, 2000)

Na perspectiva acima mencionada, esteautor entende que a primeira e a segunda faseda estratégia vislumbrada por Liu são basea-das na Negação do Uso do Mar, com limitadacapacidade de Controle de Área Marítima.

A maior ameaça à estratégia pretendidapelos chineses na Ásia-Pacífico é a 7a Es-quadra norte-americana baseada no Japão.Possui, de acordo com Howarth (2006),

entre 50 a 60 navios, cinco a seis submari-nos, 350 aeronaves e mais de 60 mil mari-nheiros e fuzileiros navais, além do Porta-Aviões Kitty Hawk. Operando de basesnas cidades japonesas, suas distâncias aocontinente chinês oscilam entre 1.500 km(bases localizadas próximas a Tóquio) e 600km (Okinawa); em relação à porção nortede Taiwan, variam de 1.900 km das locali-dades nas proximidades de Tóquio a 500km de Okinawa.

Os governos de Tóquio e Seul, em casode conflito envolvendo a China e os EUA,já se posicionaram negando permissão aosnorte-americanos de conduzirem ataquesa partir de seus territórios, temendo reaçãoadversa dos chineses e de seu público in-terno. Isso corrobora uma das estratégiasde Sun Tzu (BUSHIDÔ, 2005, p. 39), ao sepreparar para o ataque: “A melhor inteli-gência militar é atacar as estratégias dosinimigos, em seguida atacar suas alianças,depois atacar seus soldados em seu pró-prio campo”.

A incorporação de novos submarinosconvencionais e nucleares ao inventárioda Marinha chinesa alterou significativa-mente a capacidade operativa da Força deSubmarinos da China, transformando-anuma real ameaça ao Poder Naval de qual-quer país.

Neste contexto, depois do atraso men-cionado e na visão deste autor, a Força deSubmarinos da China está capacitada atu-almente para cumprir a tarefa básica de ne-gação do uso do mar, contribuindo para oestabelecimento do controle previsto paraa primeira fase da Estratégia Naval vislum-brada pelo Almirante Liu Huaqing.

Emprego de submarinos na estratégia na-val da China

Os mares adjacentes ao continente chi-nês, do litoral até a borda de sua PC, são

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relativamente rasos. A predominância deseu fundo é de areia, lama e sedimentosoriundos dos muitos rios que deságuamnos mares do Sul e do Leste da China eAmarelo. A profundidade média do Mar doLeste da China é de 349 metros. As ampli-tudes das marés variam de 5 metros emTaiwan a 11 metros na Baía de Hangchow,localizada a SW de Shangai. O Mar Amare-lo possui profundidades variando entre 60e 80 metros. A porção N do Mar do Sul daChina, aí incluído o Golfo de Tonkin e aságuas adjacentes à Ilha de Hainan, não ul-trapassa os 40 metros de profundidade.Tufões e violentas tempestades ocorrementre maio e dezembro. Aliados aos inten-sos nevoeiros da primavera e ventos comforça 7 ou mais em períodos equivalentes a20% do ano, prejudicam a navegação noEstreito de Taiwan (HOWARTH, 2006).

No contexto das águas rasas da costachinesa, os submarinos convencionais,principalmente os da classe Kilo e Song,levam vantagem sobre os submarinos nu-cleares de ataque. De acordo com Liberatti(2002), devido à limitação de velocidade,devem ser posicionados em Zonas de Pa-trulha (ZP), levando-se em consideração aanálise dos fatores tempo-distância no pla-nejamento de seu emprego.

Apesar de sua baixa velocidade quan-do mergulhados, podem ser posicionadosrapidamente em ZPs situadas nas proximi-dades da First Island Chain, devido às dis-tâncias envolvidas. Como exemplo, suspen-dendo de bases da Esquadra do Mar doLeste, os submarinos estariam a cerca de100 milhas náuticas de Taiwan e desenvol-vendo uma Speed of Advance (SOA)44 de

4 nós, em 25 horas estariam numa ZP nasproximidades da ilha, prontos a cumprir, demaneira expedita, tarefas a eles impostas.

Durante a Guerra Fria, a ex-URSS em-pregava os submarinos convencionais empatrulha, próximos à costa, defendendo ocontinente de ataque de força naval opo-nente, enquanto os SSBN conduziam pa-trulhas de deterrência45 em bastiões46 comoo Mar de Barents e o Mar de Okhotsk. OsSSN, por sua vez, eram empregados emoperações contra SSN, SSBN e Grupos deBatalha nucleados em NAe inimigos(MURRAY, 2007).

O sucessor do Almirante Liu no Coman-do da Marinha da China, Almirante ZhangLianzhong, definiu o posicionamento dossubmarinos na Estratégia elaborada por seuantecessor. Tanto os convencionais comoos nucleares de ataque se posicionariampara realizar a defesa em profundidade doperímetro externo da First Island Chain elançamento de minas nas LCM inimigas(COLE, 2001).

O contexto acima reforça a posição deShambaugh (2002), que vislumbrou o blo-queio naval como a melhor opção militarchinesa caso as relações com Taiwan sedeteriorem.

Como a Marinha de Taiwan possui ape-nas quatro submarinos47 e uma reduzida for-ça de minagem e varredura, aliada à sua limi-tada capacidade na guerra anti-submarino,a China não encontraria grandes oposiçõespara tornar efetivo o bloqueio considerado.

A sua vulnerabilidade, relacionada aospoucos recursos naturais, e forte depen-dência do comércio marítimo conduziriama economia taiwanesa a um colapso em

44 Velocidade de avanço.45 De acordo com o Glossário das Forças Armadas, possui o mesmo significado que dissuasão.46 Área estratégica na qual os SSBN eram pré-posicionados, defendidos por forças de apoio, em condições

de efetuar o lançamento de seus mísseis.47 Dois antigos (da época da Segunda Guerra Mundial) classe Guppy americanos e dois classe Zvaardvis

holandeses. (SHAMBAUGH, 2002)

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poucos dias. Shambaugh (2002, p. 320-321)observou que:

O efeito sobre as necessidadesenergéticas de Taiwan seria igualmentedevastador, na medida em que é total-mente dependente da importação depetróleo. Taiwan consome 0,25 mpd, eum superpetroleiro atraca no porto deKaohsiung a cada três dias. E mais, suasreservas estratégicas em 1999 eram deapenas 18 dias.

De acordo com Howarth (2006), o pe-queno tamanho da ilha e a existência deapenas dois portos principais (Keelung eKaohsiung) em suas extremidades tornari-am essa tarefa relativamente fácil para ossubmarinos convencionais e nucleares deataque da Marinha chinesa.

Com relação aos SSBN, de acordo comLoewenthal (2007), a Marinha da China pos-sui a capacidade de emprego em bastiões.Para manter essa postura estratégica dedeterrência, operando com pelo menos umem patrulha, deverá possuir três SSBN. Deacordo com definição constante no Glossá-rio das Forças Armadas (MD-35-G-01, 2007),estratégia de deterrência (ou de dissuasão)caracteriza-se pela manutenção de forçasmilitares suficientemente poderosas e pron-tas para emprego imediato, capazes dedesencorajar qualquer agressão militar.

Seguindo a influência russa, caso Pe-quim faça a opção pelo emprego de seusSSBN em bastiões, estes não deverão es-tar localizados nos mares do Sul e do Lesteda China, se desejar ter capacidade de con-tra-ataque em autodefesa contra objetivoslocalizados, por exemplo, nos EUA, dentrodo princípio de no first use. O Xia e osnovos Jin estarão equipados com o novomíssil JL-2, cujo alcance varia entre 8 mil e10 mil km. A Tab. 1 mostra a distância dealgumas cidades da costa oeste norte-ame-ricana e Washington D.C. em relação a umponto no Oceano Pacífico localizado a 1.500milhas náuticas a leste de Taiwan. Obser-va-se que pelo menos quatro grandes ci-dades norte-americanas (Los Angeles, SanFrancisco, Seattle e San Diego) estariamdentro do alcance do JL-2.

Kristensen (2008) realizou uma pesquisapara verificar o número de grandes patru-lhas realizadas pelos submarinos chinesesa partir de 1981. Apesar de ainda incipiente,observou um aumento no número de patru-lhas realizadas em 2007 (seis) comparativa-mente com 2006 e 2005 (duas e nenhuma,respectivamente). Porém é relevante comen-tar que, de acordo com Kristensen (2008),nenhum de seus SSBN ainda realizou umapatrulha de deterrência, apesar de estaremaptos a cumprir tal tarefa.

Analistas de inteligência ocidentais re-lataram que, em 1999, submarinos conven-

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cionais e nuclear de ataque realizaram pa-trulhas de 45 a 60 dias de duração, nas pro-ximidades da costa leste de Taiwan(SHAMBAUGH, 2002). Dentre os adestra-mentos realizados, destacou-se o exercício“sub x sub”48, reforçando a preocupaçãochinesa com esse tipo de confronto.

Para que um submarino tenha a capaci-dade de efetuar patrulhas a grandes dis-tâncias de sua base, como no exemplo deseus SSBN operando a 1.500 milhas náuti-cas a leste de Taiwan, e por um longo perí-odo, é fundamentalque sua tripulação es-teja bem adestrada, nomar e nos centros deinstrução. Preocupadacom a qualidade dos“dias de mar” de seussubmarinos, a Mari-nha chinesa publicounovo guia de adestra-mento – OMTE49 –pormenorizando to-dos os tipos de exercí-cios aos quais as tri-pulações de seus sub-marinos são submeti-das, sejam em simula-dores ou a bordo.

Uma das principais alterações determi-nadas pelo documento acima referenciadofoi a substituição do conceito de comis-sões curtas, com os submarinos suspen-dendo pela manhã e atracando no final datarde, por comissões mais longas, de modoa testar a endurance de suas tripulações,principalmente em condições de tempo ad-versas (ONI, 2007).

A qualidade do fator humano envolvidonos submarinos chineses é de difícilmensuração. A eficiência em combate repre-

senta mais do que simplesmente a capaci-dade de seus sistemas de armas. Devem serlevados em consideração fatores como ex-periência, adestramento, moral e cultura mi-litar do comandante e suas tripulações.

A Marinha da China, apesar de não pos-suir experiência em operações de guerraque pudessem atestar a efetividade de seussubmarinos em combate, tem dado inequí-vocas demonstrações de seu esforço nabusca pela sua estratégia de blue waters,dependendo para tal do grande crescimen-

to econômico que opaís atravessa, quepossibilita a alocaçãode recursos necessá-rios à sua moderniza-ção/incorporação demeios navais no esta-do da arte.

CONCLUSÃO

A RPC tem proble-mas de disputa de so-berania desde o iníciode sua formação, em1949. A inexistência deuma Marinha sólida

naquele momento impediu que Taiwan fos-se reincorporada ao continente chinês.

Ficou evidenciado que Mao Tsé-Tungconsiderava que os submarinos exerceri-am um papel fundamental na Marinha chi-nesa. Para tal, buscou apoio da então URSSpara aquisição e construção desses meiosnavais, já no início dos anos 1950.

A China, a partir da aplicação das “Qua-tro Modernizações” de Deng Xiao Ping,vem obtendo um crescimento médio de seuPIB próximo a 10% desde 1980, o que atransforma na quarta maior potência eco-

48 Tipo de exercício envolvendo confronto entre submarinos.49 OMTE – Outline of Military Training and Evaluation (ONI, 2007).

Na busca pelo seudesenvolvimento pacífico, aChina prioriza o uso de seu

Poder Brando sem, noentanto, descuidar de seuPoder Bruto, para fazer

valer seus interessesmarítimos econômicos e

territoriais, caso adiplomacia falhe

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nômica mundial e na segunda em Paridadede Poder de Compra (PPP), atrás apenasdos EUA.

Na busca pelo seu desenvolvimentopacífico, a China prioriza o uso de seu Po-der Brando sem, no entanto, descuidar deseu Poder Bruto, para fazer valer seus inte-resses marítimos econômicos e territoriais,caso a diplomacia falhe.

Para respaldar esses interesses, ficou evi-denciada a importância da Marinha na defe-sa da soberania do Estado nas águasterritoriais chinesas. Nesse contexto, foi des-tacada a importância das LCM, não só para oseu comércio internacional como tambémpara o transporte do petróleo importado, re-curso natural indispensável para a manuten-ção do atual estágio decrescimento econômi-co da China.

A fim de atingirseus objetivos, a Ma-rinha chinesa vislum-brou a necessidade deefetuar uma mudançadoutrinária no seu em-prego. Foi adotadauma Estratégia Navalousada, na qual foiestabelecido que aChina deverá obter capacidade de exercerinfluência global nos mares até 2050. Paratal, essa Estratégia foi fracionada em trêsfases. Na primeira fase foi enfatizada a ne-cessidade de a Marinha exercer o controleda área conhecida como The First IslandChain até 2000. Ficou evidenciado que hou-ve atraso de, pelo menos, cinco anos nes-sa tarefa, causado pela estagnação nascapacidades navais chinesas no períodode 1990 a 1999. Na visão do autor, com aretomada do programa de reaparelhamentode seus meios navais, a Força de Submari-nos chinesa está capacitada para o cum-primento da tarefa básica de negação do

uso do mar, contribuindo para o estabele-cimento do controle previsto nessa primei-ra fase da Estratégia Naval.

Na segunda fase da Estratégia Navalchinesa, foi verificado que a Marinha de-verá obter a capacidade de controlar a árealimitada pela The Second Island Chain até2020, antes de se tornar uma efetiva Mari-nha de blue waters até 2050, ao término daterceira fase da referida Estratégia Naval.

Como os mares adjacentes ao continen-te chinês, do litoral até a borda de sua PC,são relativamente rasos, foi demonstrada aimportância dos submarinos convencionaischineses naquelas águas. Foi definido tam-bém o posicionamento de submarinos con-vencionais e nucleares de ataque no perí-

metro externo da TheFirst Island Chain, a fimde realizar sua defesaem profundidade, alémdo lançamento de mi-nas nas LCM inimigas.

A Marinha da Chi-na recebeu as tarefasde condução de umpossível bloqueiocontra Taiwan edissuasão contra ata-que nuclear. No caso

de ocorrer deterioração nas relações comTaiwan, falhando a diplomacia, a Marinhachinesa está apta a exercer bloqueio navalà ilha. Seus submarinos, conforme salien-tado, são fundamentais para que tal açãose torne efetiva, estrangulando a econo-mia taiwanesa.

Com a incorporação de novos SSBN daclasse Jin, a China está capacitada a exercera dissuasão contra ataques nucleares, comcredibilidade para uma retaliação, de acordocom sua política nuclear de no first use.

Na visão do autor, a Marinha chinesatem fornecido inequívocas demonstraçõesde seu esforço na busca pela sua estratégia

Os submarinos sãofundamentais na Estratégia

Naval chinesa,corroborando a visão de

futuro de Mao por ocasiãoda formação de sua

Marinha

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de blue waters, incorporando ao seu inven-tário, nos últimos dez anos, modernos mei-os navais, principalmente submarinos, econstruindo modernas bases para os seusSSBN, além de modificar o padrão de ades-tramento das tripulações de submarinos,priorizando maior permanência no mar.

Como foi enfatizado no decorrer do tra-balho, os submarinos são fundamentais na

Estratégia Naval chinesa, corroborando avisão de futuro de Mao por ocasião da for-mação de sua Marinha. Tais meios, empre-gados em consonância com a Estratégiaprevista e com suas tripulações bem ades-tradas, serão uma ameaça a qualquer Po-der Naval que pretenda interferir nos seusinteresses marítimos econômicos eterritoriais.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<FORÇAS ARMADAS>; Marinha da China; Submarino; China;

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SUMÁRIO

IntroduçãoQuatro diferentes modos de vidaA nova era do conhecimentoO papel do comandanteO impacto da tecnologiaO papel dos subordinadosColaboração versus competiçãoO valor dos talentosConclusão

LIDERANÇA E COMANDO NA ERA DOCONHECIMENTO

CLÁUDIO JOSÉ D’ALBERTO SENNACapitão de Mar e Guerra

INTRODUÇÃO

O comando da Fragata Bosísio, no perí-odo de dezembro de 2007 a dezembro

de 2009, foi uma experiência intensa e ex-traordinária. Nesse período de dois anos,o navio participou de inúmeras missões,algumas bastante difíceis, como o resgatedo voo 447 da Air France. Cada uma des-sas missões representou um enorme desa-

fio para mim, mas confesso que, de todasas atividades feitas a bordo, nenhuma de-las foi mais difícil ou desafiadora do queliderar uma geração de jovens com valorese características extremamente diferentesdaqueles com os quais eu fui educado eformado. É justamente esse desafio que pre-tendo abordar neste artigo.

A maioria dos tripulantes da FragataBosísio era formada por jovens, militares com

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menos de 30 anos, que entraram para a Ma-rinha a partir da segunda metade da décadade 90. Essa geração foi criada em um mundodiferente do meu. Eles foram educados emuma sociedade chamada de pós-moderna,segundo Cristofer Lach. Esses jovens mili-tares se acostumaram desde cedo com doisinstrumentos símbolos do pós-modernismo:a internet e o telefone celular. Esses dois“inventos”, por si só, já são suficientemen-te poderosos para marcar uma mudança sig-nificativa, uma quebra de paradigma. Anali-semos a Escola Naval, por exemplo. Quan-do eu era aspirante, a Ilha de Villegagnonera uma “bolha”, isolada do resto do mun-do. O único ponto de contato com o “exteri-or” era o “orelhão”, atrás da tolda, que ge-ralmente tinha uma fila enorme para que osaspirantes pudessem falar com as namora-das. O isolamento vivido por um aspirantede minha turma era muito semelhante aomesmo vivido por um aspirante50 anos antes. Se nãoconsiderarmos o ad-vento do telefonepúblico, o isolamen-to era muito pareci-do com o que umaspirante vivia 100ou 150 anos antes.Entretanto, a partir dametade da década de 90, ainternet e o celular passaram a fazerparte do cotidiano da Escola Naval. Essesdois recursos feriram de morte o isolamentosecular antes existente. Atualmente, tantoos aspirantes como os aprendizes-marinhei-ros, nas suas respectivas escolas, vivem empermanente, e instantâneo, contato com oresto do mundo. A “bolha” foi rompida enunca mais será restabelecida. O modo comoesses jovens encararam a sua formação ésensivelmente diferente da minha geração.O interessante é que o modo como minhageração viveu na Escola Naval na década

de 80 era muito mais parecido com o modocomo viveram os aspirantes de 40 ou 70 anosantes do que com os de poucos anos de-pois. Houve nesse momento uma mudançaprofunda e a instalação de um novo padrão.

Essa mudança, na verdade, não ocorreuapenas na Marinha, ela transpassou toda asociedade e estabeleceu uma nova era pós-moderna ou pós-industrial, com novos va-lores, novas relações sociais, e instaurouum novo modus vivendi, como De Masiapresenta em seus textos. É claro que mu-danças semelhantes já ocorreram anterior-mente. A humanidade, na sua longa existên-cia, conforme nos mostra De Masi, já pas-sou por quatro modos de vida distintos.

QUATRO DIFERENTES MODOS DEVIDA

Inicialmente, a partir do surgimento dosprimeiros humanos, há cerca de 2

milhões de anos, o modo devida era caracterizado

pelo que se chamoude scarvenging, emque se catavam osalimentos disponí-veis no ambiente.

Posteriormente, essacoleta passou a ser mais

seletiva e com o uso de ins-trumentos de pedra mais elaborados,

como a lança. Então passamos a contar coma caça de animais. A sociedade era essen-cialmente nômade, não enterrava seus mor-tos e o sobrenatural ainda não existia. Esseperíodo foi chamado de paleolítico.

Há cerca de 10 mil anos, na região quehoje é ocupada pelo Iraque, houve a pri-meira grande mudança. Naquela região, emum curto período de tempo houve a transi-ção de uma sociedade nômade extrativistapara a sociedade agrícola. Começamos aplantar e criar animais, ao mesmo tempo em

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que criamos as primeiras cidades, a propri-edade privada, o governo, a escrita, a de-mocracia, a filosofia, a matemática, a reli-gião e a arte. A sociedade tornou-se agrí-cola e estabeleceu um modo de vida queperdurou até o século XVIII. A era anteriordurou cerca de 2 milhões de anos, mas atransição para uma sociedade agrícola du-rou um período relativamente curto, quefoi conhecido como a Revolução Neolíticae inaugurou um novo modo de viver queperdurou por mais 10 mil anos.

Em meados do século XVIII, há cerca de200 anos, ocorreu umanova mudança. Com amaturidade das ideiassemeadas no Iluminis-mo e com os avançoscientíficos decorrentes,a humanidade experi-mentou a espetaculartransição da sociedadeagrícola para a socieda-de industrial. Passamosa viver em cidades, aproduzir em fábricas, aconsumir em massa e aeducar nossos filhos em escolas. Foram in-ventados o telefone, a linha de produção, onavio a vapor, o motor a diesel, as turbinas,os satélites, o computador, o avião e a penici-lina. Conseguimos chegar à Lua, em um eventotransmitido simultaneamente para bilhões depessoas. Na era industrial, o ser humano tor-nou-se pequeno diante da imensidão das ci-dades e da padronização que a produção emsérie determinava.

Entretanto, ainda na década de 80, teveinício uma nova transição no modo de vidada humanidade. Essa nova ordem social éfruto de excepcionais avanços tecnoló-gicos, que, de modo surpreendente, altera-ram profundamente a estrutura produtivada sociedade. Os novos avanços tecnoló-gicos permitiram que aos poucos o homem

fosse desobrigado da atividade produtiva erepetitiva. Seja nas fábricas, onde os robôsmontam os veículos, seja nos bancos, ondeos terminais substituem os caixas, as ativi-dades produtivas, especialmente asrepetitivas, rotineiras e cansativas, passama ser executadas por máquinas. Essa transi-ção retirou do homem o papel produtivoanteriormente desempenhado. Uma vez quea produção passa a ocorrer sem a participa-ção humana, o que restou foi justamente aparte da atividade que não pode ser execu-tada por máquinas, ou seja, a atividade cria-

tiva ou subjetiva. Porisso mesmo, enquantoLach chama a nova erade pós-moderna e DeMasi a chama de pós-industrial, outros tam-bém a chamam de erado conhecimento.

A NOVA ERA DOCONHECIMENTO

As alterações soci-ais decorrentes do

novo paradigma que se instalou deslocam ocentro de poder da produção de bens para acriação de serviços e produtos. Enquantona transição anterior o homem trocou o cam-po pela cidade, nesta atual o homem perma-necerá na cidade, mas está trocando a fábri-ca pelo escritório. Nas grandes cidades, atu-almente, a maioria da população não estámais empregada no setor industrial, mas nosetor terciário, prestando serviços. É umanova sociedade, na qual o papel hegemônicopassou a girar em torno do saber, da infor-mação, da estética e do lazer.

Essa realidade gera um profundo impac-to nas pessoas, que passaram a considerarnovos valores e demandar novas exigênci-as. O homem pós-moderno passa a valori-zar a criatividade, a subjetividade e o lazer,

O homem pós-modernopassa a valorizar a

criatividade, asubjetividade e o lazer,

tornando-se maisindividualista e colocando ointeresse pessoal na frente

do interesse coletivo

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tornando-se mais individualista e colocan-do o interesse pessoal na frente do inte-resse coletivo. Segundo Lach, esse homemtornou-se narcisista e egoísta.

Para os líderes militares, essa nova con-cepção de vida, com seus valores individua-listas, é um grande desafio a ser superado.Uma vez que o interesse pessoal passa a sermais relevante que o in-teresse coletivo, comoserá possível cativar emotivar jovens para oserviço militar, cuja es-sência está relacionada,justamente, com a no-ção do sacrifício pesso-al para o benefício dacoletividade. Outro de-safio está relacionadocom a rígida estruturamilitar, criada na era in-dustrial, que tende aadotar o taylorismo emtodos os níveis paranormatizar a atividadeoperacional das suasunidades. A complexaestrutura de doutrinas,normas e instruçõesempregada pelas For-ças Armadas de todo oplaneta não deixa mui-to espaço para a criati-vidade e não é mais vis-ta com simpatia pela nova geração, que en-contra na criatividade e na liberdade a ex-pressão máxima de seu tempo.

O desafio proposto aos novos coman-dantes é justamente conciliar os interes-ses dessa nova sociedade com as necessi-dades da atividade militar.

O PAPEL DO COMANDANTE

A rápida evolução tecnológica experimen-tada nas últimas décadas, por si só, já alterou

o modo operacional das unidades militares e,em especial, de nossos navios. A complexida-de dos sistemas utilizados a bordo impossibi-lita o domínio do conhecimento por uma únicapessoa. Não é mais possível que o comandan-te tenha conhecimento absoluto e superioraos subordinados que são os responsáveispelos equipamentos mais complexos. Não é

mais possível que ape-nas a vontade do co-mandante determine osucesso de uma unida-de. Para obter o suces-so, as modernas, e com-plexas, unidades milita-res necessitam de umavontade coletiva, emque o trabalho em equi-pe passou a ser a pedrafundamental.

É essencial que osnavios trabalhem emequipes com alto graude autonomia. A impor-tância e a responsabi-lidade cada vez maiordos subordinados tor-nam o papel da lideran-ça essencial para o re-sultado a ser atingido.Não é imaginável que,em um navio moderno,seja possível ao co-mandante dar todas as

ordens e orientar cada ação feita pela suatripulação. A estrutura de liderança deve serforte e inteligente o suficiente para que oslíderes não necessitem dar todas as ordenspara qualquer ação a ser executada. A auto-nomia e o treinamento intenso podem per-mitir um elevado grau de delegação e auto-nomia aos subordinados. A própria veloci-dade da guerra moderna não permite que ocomandante seja consultado para toda de-cisão a ser tomada. Decisões são tomadas

O desafio proposto aosnovos comandantes é

justamente conciliar osinteresses dessa nova

sociedade com asnecessidades da atividade

militar

Decisões são tomadas semo conhecimento do

comandante, para que asações necessárias sejam

executadas em seu devidotempo. A essência docomando continua,

entretanto, inalterada

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sem o conhecimento do comandante, paraque as ações necessárias sejam executadasem seu devido tempo.

A essência do comando continua, entre-tanto, inalterada. Somos nomeados coman-dantes e não “mandantes”. O papel do co-mando não é mandar os subordinados agi-rem em qualquer situação, mas simcomandá-los. A diferença, sutil e nem sem-pre percebida, é que, quando existe o co-mando efetivo, a unidade funciona de ma-neira coordenada com o pensamento docomandante. O papel do comandante deixade ser limitado a dar ordens o tempo todo,microgerenciando aação de seus subordi-nados, e passa a sertambém o de orientá-los a tomar decisõesapropriadas, coerentescom a ação elaboradapor ele. O comandantepassa a estabelecer osobjetivos principais aserem alcançados e omodo como serão per-seguidos, deixando aação individual para a escolha de cada um,para contribuir da melhor maneira possívelcom esses objetivos. Embora essa atuaçãoseja essencial hoje em dia, ela sempre este-ve presente nas práticas dos melhores líde-res navais, como o Almirante Nelson. Lem-bramos constantemente as vitóriasalcançadas por Nelson, mas a verdade é queseu maior mérito foi treinar uma equipe desubordinados com elevada capacidade dedecisão e autonomia. Foi de Nelson a pri-meira instrução permanente para uma es-quadra, que permitia aos seus subordina-dos agirem de forma rápida às evoluções doinimigo, sem a necessidade de sua interven-ção direta. A esquadra de Nelson era capazde surpreender seus adversários pela velo-cidade com que manobrava e alterava seu

comportamento. Isso somente era possívelcom a autonomia dada por ele aos seus su-bordinados. Em um navio todos precisamparticipar e tomar decisões apropriadas atodo momento, deixando o comandantefocado nas decisões mais importantes.

O IMPACTO DA TECNOLOGIA

Esse trabalho de equipe, dotado de ele-vada autonomia, é uma das chaves do su-cesso na liderança da nova geração. Umavez que a sociedade pós-moderna demandavalores individuais, dar autonomia e liber-

dade para os subordi-nados, compartilhan-do com eles os suces-sos, cria uma novaperspectiva da lideran-ça e concilia os interes-ses das atividades mi-litares modernas com asociedade que estásurgindo. A nova ge-ração não se contentaem cumprir ordens de-talhadas nem é simpá-

tica a seguir procedimentos e instruções semquestioná-los e aperfeiçoá-los. Essa forçacriativa, característica da nova sociedade,se utilizada com perícia por líderes compe-tentes, pode ser transformada de ameaçaem oportunidade, criando novas perspecti-vas e explorando novas ideias. A tecnologiaem constante evolução já não permite quepensemos em táticas imutáveis ou doutri-nas inquestionáveis. O próprio Comandan-te Hughes diz em seu livro Fleet Tactics que,para entender tática, é preciso entender detecnologia. Se a tecnologia está em cons-tante evolução, a tática também é constan-temente alterada.

Entretanto, a mesma tecnologia que exi-ge maior autonomia e velocidade na deci-são pode ser empregada para aumentar o

Em um navio todosprecisam participar e

tomar decisõesapropriadas a todo

momento, deixando ocomandante focado nas

decisões mais importantes

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controle sobre os subordinados. A dissemi-nação da informática e dos computadorespessoais, com as facilidades de comunica-ção atualmente disponíveis, exerce um fas-cínio perigoso, com potencial de seduziraqueles que não conseguem abrir mão docontrole absoluto sobre as ações dos su-bordinados. O e-mail, as planilhas, o celulare os sistemas interligados em rede permitemque exista o controledetalhado das açõesdos subordinados,mesmo aqueles que seencontram distantes.Entretanto, o aumentodo controle não signi-fica exatamente o au-mento da eficiência.

É sabido que as em-presas de papel nuncalucraram tanto com avenda de seu produtocomo depois que in-ventaram o computadorpessoal e a internet.Supostamente, a disse-minação de documen-tos eletrônicos deveriareduzir o consumo depapel no mundo intei-ro. Mas ocorreu exatamente o contrário. Oaumento do controle, seja na forma de relató-rios e planilhas a serem produzidas pelos su-bordinados, seja na expedição de numerosase detalhadas normas e instruções pelos su-periores, foi facilitado pela informática. O efei-to é devastador. A velocidade das decisões,exigência fundamental da nova era, e a auto-nomia individual, exigência social dos subor-dinados, são feridas de morte pelo cresci-mento dos controles informatizados.

A solução para esse paradoxo deve sera linha mestra do comando. O comandantedeve saber que a mesma tecnologia quevai impulsioná-lo adiante poderá arrastá-

lo para trás se for utilizada de maneira erra-da. O controle é como uma droga: se minis-trada na dose certa, pode salvar; se for dadaem excesso, pode matar.

No comando da Fragata Bosísio sabiaque poderia exigir de meus subordinadosum elevado nível de controle, com numero-sas planilhas e relatórios para saberdetalhadamente cada passo que era dado a

bordo na solução dosinúmeros problemasque surgissem. Massabia perfeitamenteque aumentar a buro-cracia seria fatal para odesempenho do navio,que exige agilidade ad-ministrativa para sereficaz. Junto com a tri-pulação e, em especi-al, com a colaboraçãodo imediato e dos che-fes de departamento,buscamos incansavel-mente a redução daburocracia a bordo, di-minuindo o número dee-mails e planilhas tro-cado internamente. Emcontrapartida, aumen-

tamos a delegação e mostramos que cadaum tem grande responsabilidade em atingiras metas estabelecidas para o seu setor. Aliberdade para agir foi aumentada, assimcomo a cobrança por resultados. Com me-nos burocracia e controle, as pessoas pas-saram a dedicar mais tempo àquilo que real-mente importa: manter os equipamentos epreparar a tripulação.

O PAPEL DOS SUBORDINADOS

Em uma nova ordem social, em que o co-nhecimento é o bem mais precioso, as pesso-as passaram a ter uma dimensão mais rele-

O controle é como umadroga: se ministrada nadose certa, pode salvar;se for dada em excesso,

pode matar

Em uma nova ordemsocial, em que o

conhecimento é o bem maisprecioso, as pessoaspassaram a ter uma

dimensão mais relevante

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vante. Essa nova valorização do conhecimen-to arrasta consigo a valorização do subordi-nado, que possui a expertise em determina-do equipamento ou atividade. O comandan-te passa a ter a responsabilidade de atrair osmelhores qualificados para desempenhar astarefas altamente complexas que são exigidas.Montar uma equipe que possa atuar com de-dicação, criatividade e autonomia é um outrodesafio. Para isso, o comandante deve criarum ambiente organizacional que, clara e efe-tivamente, valorize as pessoas. Buscar insta-lações confortáveis e dar equipamentos apro-priados para o trabalhodos subordinados éuma forma importantede prestigiar a tripula-ção, porém a melhor ma-neira de valorizar o pes-soal é dar a oportuni-dade de crescimentoprofissional, a oportu-nidade de realizar seupotencial plenamente.

Uma experiência queconsidero emblemáticana Fragata Bosísio foi aadoção do quadro “Eles fizeram o melhor”.Esse quadro foi elaborado em substituição aoquadro do militar padrão do trimestre. Chega-mos à conclusão de que ter apenas um militarpadrão por trimestre era pouco para o que que-ríamos fazer. Percebemos também que diaria-mente havia militares fazendo coisas extraor-dinárias a bordo, solucionando problemas ousuperando dificuldades. Havia também novasideias sendo produzidas com criatividade, paramelhorar procedimentos e práticas. Foi assimque esse quadro surgiu, para mostrar diaria-mente quem tinha feito algo que ajudasse onavio a ser melhor. Qualquer atitude relevanteera então lançada no quadro. Um militar quese saiu bem em um curso, um cozinheiro quefez um rancho elogiado por todos, uma equipede manutenção que reparou um equipamento

em tempo recorde, enfim, todos tinham a opor-tunidade de aparecer no quadro. Qualquerencarregado de divisão podia tirar uma foto,imprimi-la na secretaria e colocá-la no quadrodos “melhores”, valorizando sua equipe.

Esse quadro permitiu que cada um a bordoentendesse que o sucesso do nosso navio de-pendia do esforço de cada um em fazer o me-lhor que fosse possível, e que nenhuma tarefa,por mais simples que pudesse parecer, era me-nos importante. Foi também uma forma de mos-trar que o mais importante não era a competiçãopara eleger “o melhor” militar do trimestre, mas

a colaboração de cadaum para fazer com que onavio fosse cada diamelhor. Substituir a com-petição pela colaboraçãoé uma opção extrema-mente significativa e re-levante na nova era. Oavanço humano (princi-palmente os avanços re-centes) dependeu muitomais da colaboração doque da competição.

Depois de muito su-cesso com esse quadro, que era atualizadotoda semana, pensamos em trazer de voltanosso quadro do militar padrão. Já no final de2009, inauguramos o novo quadro do militarpadrão. A única diferença desse quadro parao anterior era que, ao invés de trazer a foto deum militar da tripulação, a moldura era preen-chida com um espelho. Cada um que olhasseo quadro na busca do militar padrão encontra-ria sua própria imagem e a ideia de que, para afragata ser “padrão”, cada um deveria ter omais alto grau de comprometimento.

COLABORAÇÃO VERSUSCOMPETIÇÃO

Na era anterior, a era industrial, a lógicada competição ajudou bastante no aumen-

Quando o talento, acriatividade, o saber e o

trabalho em equipe passama ser fundamentais para odesempenho, a lógica da

colaboração passa adominar o ambiente

organizacional

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to da eficiência. Porém, após a transiçãoque ocorreu e a instauração da era do co-nhecimento, a lógica da competição não émais dominante. Quando o talento, acriatividade, o saber e o trabalho em equi-pe passam a ser fundamentais para o de-sempenho, a lógica da colaboração passaa dominar o ambiente organizacional. Seobservarmos o projeto do mapeamento doDNA, o Projeto Genoma, percebemos queesse importante avanço não foi fruto dacompetição individual de um cientista es-pecífico, mas o resultado de um trabalhocoletivo e global, associando diversas equi-pes no mundo inteiro.

Ao valorizar o co-letivo em substituiçãoao individual, estamosassumindo uma novapostura, que, ao con-trário de buscar um“expoente” e aumentarsua importância relati-va, mostra que todossão fundamentais eque um desempenho excepcional isoladonão é suficiente para atender às necessi-dades, que dependem do resultado coleti-vo, fruto do trabalho em equipe. Nessa cir-cunstância, o valor de todos é incremen-tado, e o indivíduo anteriormente comumpassa a ser agora importante, aumentandosua relevância.

Para atender às demandas dos novosmilitares, que buscam maior relevância in-dividual, é necessário também facilitar oacesso ao comandante. Não há quebra nahierarquia em se ouvir toda a cadeia res-ponsável por algum equipamento ou áreaquando temos que tomar uma decisão im-portante. Nos problemas principais, o ime-diato, chefes de departamento, encarrega-dos de divisão, supervisores de grupo re-lacionados com o sistema envolvido emantenedores eram reunidos com o coman-

dante para buscarmos juntos a solução.Essas reuniões eram extremamente francase nelas surgiam inúmeras ideias novas, quefacilitavam a escolha da melhor linha deação a ser adotada. Todas as opiniões eramouvidas, desde a do chefe de departamen-to até a do sargento responsável pela ma-nutenção. Além disso, o fato de dar opor-tunidade a todos de expressarem suasideias em um determinado assunto direta-mente com o comandante aumentava ocomprometimento da equipe com a efetivabusca pela solução. A possibilidade deacesso direto ao comandante é uma forma

de valorizar o homeme também vai de en-contro com os anseiosdo militar da novageração.

A figura do coman-dante isolado, quenunca se conseguever ou falar, é incom-patível com a nova re-alidade e com as exi-

gências da era atual. Além disso, o benefí-cio de receber diferentes pontos de vistapermite que o comandante tome melhoresdecisões e conheça melhor sua tripulação.

O VALOR DOS TALENTOS

Um aspecto que deve ser especial notrato com a tripulação é a responsabilidadeque o comando tem de captar e reter ostalentos. Em uma era em que o conheci-mento e o saber são os ativos mais impor-tantes, em unidades militares em que atecnologia desempenha um papel cada vezmais relevante, é fundamental captar su-bordinados talentosos para desempenharas funções a bordo. Além de captar, nãopodemos permitir a evasão de talentos,perdidos muitas vezes por adoção de me-didas que inibem a realização pessoal ou

A figura do comandanteisolado, que nunca se

consegue ver ou falar, éincompatível com a nova

realidade e com asexigências da era atual

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sufocam as capacidades dos subordina-dos. É necessário criar um ambienteorganizacional saudável, que permita jun-tar no trabalho os três componentes bási-cos que permitem a frutificação talentosadas equipes: o aprender, o ensinar e o di-vertir. Esses três componentes devem exis-tir simultaneamente para germinar a semen-te do talento. O aprendizado contínuo deveser incentivado, seja com adestramentos,cursos ou práticas de transmissão de co-nhecimento. Os mais experientes devem serincentivados a ensi-nar, difundindo seuconhecimento com osdemais membros da tri-pulação. Essa é tam-bém uma forma eficazpara valorizar o conhe-cimento, além de per-mitir o crescimentodaqueles que ensi-nam. Finalmente, é ne-cessário entender queé preciso se divertircom o trabalho, fazen-do aquilo que deve serfeito com paixão e ale-gria. É claro que mui-tos momentos de nos-so dia a dia são difí-ceis e tensos, e é jus-tamente por isso que há a necessidade deum ambiente descontraído e leve para com-pensar a pressão dos exercícios e missõesdifíceis que enfrentamos.

Para ter um ambiente organizacional queatrai talentos, é necessário ter tolerânciacom erros. Buscar o erro zero, a ausênciapermanente de falhas, é o caminho maisrápido para matar a criatividade, a ousadiae o talento. Com receio de errar, nenhumsubordinado vai buscar aperfeiçoar nada,todos vão manobrar com cautela e a inova-ção vai ser reduzida drasticamente. O Al-

mirante Rickover, que na Marinha dos EUAfoi responsável pelo projeto do primeirosubmarino nuclear, teve grande dificulda-de em superar o medo do erro existente naalta administração. Foi somente após a che-gada do Almirante Spruance no cargo deCNO (Chief of Naval Operations) queRickover passou a ser efetivamente apoia-do, principalmente nos momentos em quecometeu erros, e o projeto foi para a frente,permitindo aos EUA obterem a primazia es-tratégica que a nova arma proporcionava.

Apoiar os subordi-nados quando erramnão significa, entretan-to, que podemos come-ter erros sem controlealgum. O trabalho emequipe é a chave paramitigar as falhas que in-dividualmente iremoscometer. Uma boa equi-pe deve conseguir redu-zir os erros dos seuscomponentes utilizandotécnicas consagradasna própria Marinha. Ocheck cruzado ou o du-plo check podem evitara propagação de errosem processos conside-rados críticos.

Finalmente, para promover o talento,além de lidar bem com as falhas dos subor-dinados, o comando deve resistir ao apeloda segurança. Em prol do aumento da segu-rança, seja no controle de avarias ou nosaspectos orgânicos, podemos dificultar adinfinitum a vida operacional de nossas or-ganizações e fazer com que uma determina-da unidade seja considerada ruim para seustripulantes. É difícil resistir ao apelo do au-mento da segurança, mas isso deve ser ava-liado com extremo bom senso, especialmen-te quando causa o aumento do grupo de

Buscar o erro zero, aausência permanente defalhas, é o caminho mais

rápido para matar acriatividade, a ousadia

e o talento

Apoiar os subordinadosquando erram não

significa, entretanto, quepodemos cometer erros

sem controle algum

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serviço e reduz a tabela. A adoção de medi-das para o aumento da segurança pode tra-zer consequências significativas, que a lon-go prazo podem até mesmo causar o efeitooposto, reduzindo a segurança como umtodo, ao espantar pessoas talentosas paraoutras organizações. Não se devem perdervocações e talentos para aumentar a segu-rança. Medidas alternativas, e mais inteli-gentes, podem conseguir o aumento da se-gurança sem a tradici-onal elevação do nú-mero de postos de ser-viço. Na FragataBosísio conseguimoselevar significativa-mente a segurança doCAV (Controle de Ava-rias) investindo emequipamentos, ou pelasubstituição de itensantigos ou pela adoçãode novos recursos,como o sistema demonitoração internapor TV. Ao instalarmosinúmeras câmeras liga-das em rede, passamosa monitorar diversoscompartimentos 24 ho-ras por dia, aumentan-do a vigilância sem ele-var o número de patru-lhas utilizadas.

Ao administrar a ta-bela de serviço em umpatamar aceitável, respeitando o período se-manal de descanso, podemos elevar a satisfa-ção da tripulação e incentivar a vinda de pes-soas talentosas que têm vocação para a ativi-dade operativa. Tão importante quanto os re-sultados alcançados é verificarmos o nível desatisfação de nossos subordinados. A revistaExame, anualmente, mede as 100 melhoresempresas para se trabalhar. Naturalmente, es-

sas empresas com as melhores pontuaçõesatraem os melhores profissionais, aqueles queunem talento e vocação. Na era da informa-ção, no mundo do saber, a construção de umaequipe rica em talentos é a chave para o su-cesso, seja na iniciativa privada ou na própriaatividade militar. Não podemos atrair apenasjovens que buscam um emprego provisório,um trampolim para outras atividades. A carrei-ra militar precisa muito mais que isso; necessi-

tamos de pessoas comvocação, dispostas a secomprometer e dedicarsuas habilidades naconstrução de uma car-reira de longo prazo.Mas, em contrapartida,é necessário entenderque mesmo os jovenscom vocação e talentoesperam encontrar umambiente propício querespeite a sua necessi-dade de tempo livre elazer. Pensar que resol-ver a questão salarialserá suficiente é umgrande equívoco. A re-muneração é apenasparte do critério que levaum jovem a permanecerna Marinha. A possibi-lidade de realização pes-soal, o ambiente de tra-balho e o tratamentoapropriado são fatores

mais importantes do que a remuneração em si.

CONCLUSÃO

De uma forma geral, é fácil verificar asrealizações de um navio pelas operaçõesde que participou. Entretanto, outros as-pectos passam invisíveis à apreciação, mastornam-se extremamente relevantes quan-

A carreira militar precisade pessoas com vocação,

dispostas a secomprometer e dedicar

suas habilidades naconstrução de uma

carreira de longo prazo

A remuneração é apenasparte do critério que leva

um jovem a permanecer naMarinha. A possibilidadede realização pessoal, oambiente de trabalho e o

tratamento apropriado sãofatores importantes

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do observados. Como exemplo cito doisaspectos que não foram notados externa-mente ao navio, mas que considero de ex-trema importância. No período de doisanos, nenhum oficial foi de baixa, ou se-quer buscou sair da Marinha fazendo qual-quer tipo de concurso. Nossa taxa de re-tenção foi de 100% para os oficiais. Issomostra que, de alguma forma, todos os ofi-ciais estão comprometidos e buscam suarealização pessoal naprópria Marinha. Naguarnição tivemos umúnico militar pedindobaixa, para buscar ou-tra atividade profissi-onal. A sua saída foifeita de modo tranqui-lo, com todo o apoiodo navio nas etapasde sua transferênciapara a vida civil. Algu-mas praças demons-traram interesse emsair da Marinha, parti-cipando de vários ti-pos de concurso, entretanto não deixaramde cumprir suas atividades a bordo comdedicação e motivação, demonstrando quecompreendiam perfeitamente a noção deprofissionalismo.

Esses índices de retenção demonstramque a nova geração pode ter seus interes-ses e valores conciliados com as necessi-dades e demandas da atividade militar, comtodos os sacrifícios e responsabilidadesdecorrentes.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<VALORES> Comando; Liderança; Ciência e Tecnologia na Marinha; Preparo do homem;

Acredito que a nova era que se instaloupermite a conciliação dos interesses pes-soais da nova geração com as necessida-des da atividade militar. Para isso é neces-sário dar espaço para que a criatividade e otalento possam crescer e multiplicar. Medi-das para redução da burocracia, combaten-do a propagação de controles e instruçõesdesnecessárias, permitem a obtenção dofoco nas atividades realmente relevantes

das unidades. A valo-rização da colaboraçãoem substituição à com-petição é outra medi-da coerente com anova era, que permiti-rá obter resultadosmais ambiciosos pelaprimazia do trabalhoem equipe. O combateà filosofia do erro zeropermite o nascimentode um ambiente rico ecriativo, que dará es-paço para o cresci-mento individual e o

surgimento de ideias novas para enfrentaras complexidades e nuances do mundo atu-al. Finalmente, é importante notar o aumen-to da importância da liderança para moti-var e captar talentos e vocações genuínasque permitam equipar nossas unidadescom profissionais comprometidos e satis-feitos com seu trabalho. Os lideres serãocada vez mais exigidos por essa nova gera-ção cujas exigências e conhecimentos vãoalém dos anteriormente vivenciados.

O combate à filosofia doerro zero permite o

nascimento de um ambienterico e criativo, que dará

espaço para o crescimentoindividual e o surgimento

de ideias novas paraenfrentar as complexidadese nuances do mundo atual

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SUMÁRIO

Herbert William Richmond – Um marinheiro engajado e autor sofisticadoPrimeiros tempos na Marinha RealO almirante e o intelectualUma carreira de realizações acadêmicas

HERBERT WILLIAM RICHMOND:UM ALMIRANTE INTELECTUAL

FRANCISCO EDUARDO ALVES DE ALMEIDACapitão de Mar e Guerra (RM1)

O marinheiro e erudito. Com essas duaspalavras o historiador canadense

Barry Hunt, um dos maiores especialistasna obra de Herbert Richmond, cunhou oseu livro de 1982.1 Disse Hunt que “o Almi-rante Sir Herbert Richmond foi um fenôme-no único da Marinha vitoriana e eduar-diana, um profissional competente e oficialde sucesso que era também um intelectual.Isso foi o bastante para assegurar que oseu progresso seria tormentoso”.2

Herbert William Richmond foi um histo-riador influente no período entre as duasguerras, participando ativamente das dis-cussões navais que se seguiram à GrandeGuerra de 1914 a 1918. Embora tenha sidoum historiador de prestígio na época, pou-cos historiadores no tempo presente têmse dedicado a se debruçar sobre os seusescritos. Mesmo na Inglaterra, seu paísnatal, são poucos os especialistas em seustrabalhos teóricos e históricos, quase to-

1 HUNT, Barry. Sailor-Scholar: Admiral Sir Herbert Richmond 1871-1946. Ontario: Wilfred Laurier,1982.

2 Ibidem, p. 2.

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dos ligados às escolas de altos estudosmilitares e ao King’s College da Universi-dade de Londres, onde se destacam os his-toriadores Geoffrey Till e Andrew Lambert.

No Brasil não existem trabalhos acadê-micos que analisem as suas concepções.Mesmo na Marinha de Guerra brasileira,no seu principal veículo de discussão aca-dêmica, a Revista Marítima Brasileira, sóexiste um artigo analítico específico sobreRichmond, publicado em 2006.3

Afinal, quem foi esse personagem dahistória britânica que suscitou tão poucaspesquisas? Como ele imaginava a histórianaval e como ele se diferenciou de AlfredMahan?

HERBERT WILLIAM RICHMOND –UM MARINHEIRO ENGAJADO EAUTOR SOFISTICADO

Herbert William Richmond nasceu emHammersmith, Inglaterra, em 15 de setem-bro de 1871, segundo filho homem de SirWilliam Blake Richmond e Clara JaneRichards. Seu pai foi um pintor famoso daépoca vitoriana e professor de Artes naUniversidade de Oxford entre 1879 e 1883,assim como seu avô George Richmond foratambém pintor notável. Talvez em razãodessas influências, cedo se interessou pelodesenho e pela pintura, no entanto as ar-tes não seriam o seu destino, embora de-monstrasse um talento inato para desenhoe caricaturas.

Herbert tinha, quando jovem, tempera-mento alegre e descontraído, no entanto jádemonstrava propensão para comandar

homens e o desejo de liderar. Foi, assim,criado em uma atmosfera de artistas e pes-soas ligadas às artes. Ele tinha também for-te ligação com a mãe e a irmã.

O ponto de inflexão de sua juventudeocorreu quando em 1880, com 9 anos deidade, juntamente com um amigo mais ve-lho da família, visitou a base naval dePortsmouth e ficou deslumbrado com osmarinheiros em seus vistosos uniformes ebelos navios, bem conservados e limpos.Disse a esse seu amigo que “aquilo era exa-tamente o que ele gostaria de ser”.4

Seu desempenho escolar foi sofrível,uma vez que detestava sua escola secun-dária, St Martin School, em Windsor, ten-do especial horror ao estudo de latim, gre-go e matemática. A ida para a Marinha oafastaria daquele mundo escolar que lhedesagradava.

Seu irmão Arthur Richmond disse sobreHerbert o seguinte:

Quando garoto, ele [Herbert] recebeuajuda de nosso pai para desenvolverseus talentos de pintura. [...] Sua esco-lha pela Marinha, me disse, foi aciden-tal.[...] ele sempre em sua vida estavapossuído de uma verve criativa. Mes-mo como cadete não mantinha seu livrotexto intacto. Ele tinha a necessidadede ilustrá-lo e desenhá-lo e, mesmo na-quele tempo, era um grande escritor decartas[...] Por natureza tinha que procu-rar a perfeição.5

Em 1883, em sua primeira tentativa paraentrar para a Marinha, não foi aprovado.

3 ALMEIDA, Francisco Eduardo Alves de. “A trajetória de um historiador esquecido: Sir Herbert Richmonde o Poder Naval britânico, 1905-1945”. Revista Marítima Brasileira. Rio de Janeiro: Serviço deDocumentação da Marinha, v.129, n. 04/06. p. 24-35, abr/jun, 2006.

4 MARDER, Arthur. Portrait of na Admiral. The Life and papers of Sir Herbert Richmond. London:Jonathan Cape, 1952, p. 16.

5 TREVELYAN, George. Admiral Herbert Richmond, 1871-1946. Proceedings of the British Academy.London: Geoffrey Cumberlege, v.xxxii, 1946, p. 4.

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No ano seguinte, finalmente foi admitido eem 1885 entrou oficialmente para a Mari-nha britânica como cadete no Navio-Esco-la Britannia.

Primeiros tempos na Marinha Real

O historiador naval Lisle Rose comen-tou que a vasta maioria dos oficiais da épo-ca vitoriana e eduardiana estava convencidade que tradição, arrogância e indolênciaconstituíam a melhor educação6. A entradana Escola Naval era realmente um grandedesafio. O aspirante deveria provir de umafamília abastada que pudesse pagar anual-mente 700 libras, uma verdadeira fortuna naépoca, para manter-se no Britannia7. Herbertprovinha de uma família de posses e perma-neceu no HMS Britannia8 por dois anos,sendo designado aspirante em 1887 para seagregar ao HMS Nelson9, capitânia do Es-quadrão Australiano.

Em 1892 Herbert, já capitão-tenente10, ser-viu no Serviço Hidrográfico durante doisanos; no entanto, em razão da demora naspromoções nesse serviço, solicitou sua trans-

ferência para a Escola de Torpedos. Dessaescola foi mandado servir no Mediterrâneoem três navios seguidos: os HMS Empress ofIndia, Ramillies11 e Canopus12. Seu interes-se pela história começou nesse período.

Em 1899 foi designado para o Esquadrãodo Canal a bordo do HMS Majestic13, lá per-manecendo até 1903. No início desse anofoi promovido a capitão de fragata14, com“apenas” 11 anos no posto de capitão-te-nente15, o que significava um avanço emrelação aos seus colegas, que podiam per-manecer até 20 anos nessa graduação.

No ano seguinte, foi designado imediatodo HMS Crescent16, capitânia do Contra-Almirante John Durnford, comandante doEsquadrão do Cabo da Boa Esperança, pordois anos. Nessa função Herbert se desta-cou sobremaneira, tendo um oficial sob assuas ordens dito que Richmond era “o me-lhor oficial superior que ele conhecera”.17

Em dezembro de 1906 foi designado paraservir como assistente do Almirante SirJohn Fisher, primeiro lorde do Mar e gran-de reformador da Marinha Real britânica.Para Richmond foi um período de muita

6 ROSE, Lisle. Power at Sea. The Age of Navalism, 1890-1914. Columbia: University of Missouri Press,2007, p. 28.

7 Ibidem, p. 28.8 O HMS Britannia era um navio-escola que servia como local de treinamento para jovens candidatos a

oficial na Marinha Real britânica. HMS significa Her Majesty Ship (Navio de Sua Majestade).9 O HMS Nelson era um cruzador protegido misto, vapor e vela, de 7.630 toneladas, armado com quatro

canhões de 10 polegadas. Fonte: ARCHIBALD, E.H.H. The Metal Fighting Ships in the Royal Navy1860-1970. New York: Arco Publishing, 1971, p. 48.

10 Na Marinha britânica o posto é lieutenant.11 O HMS Empress of India e o Ramillies eram encouraçados de mesma classe, lançados ao mar em 1891

e 1892, deslocando 15.585 toneladas, com quatro canhões de 13.5 polegadas e dez de 6 polegadas.Fonte: Ibidem, p. 33.

12 O HMS Canopus era um encouraçado lançado ao mar em 1897, deslocando 12.950 toneladas, armadocom quatro canhões de 4 polegadas e 12 de 6 polegadas. Fonte: Ibidem, p. 62.

13 O HMS Majestic era um encouraçado de 14.900 toneladas, armado com quatro canhões de 12 e 12 de6 polegadas. Fonte: Ibidem, p. 62.

14 Em inglês, commander. Naquela ocasião, a Marinha Real não possuía o posto de capitão de corveta,lieutenant-commander, posto intermediário entre o de lieutenant e o de commander.

15 MARDER, op.cit, p. 17.16 O HMS Crescent era um cruzador protegido de 7.700 toneladas, armado com um canhão de 9.2 e 12 de

6 polegadas. Foi incorporado em 1892. Fonte: ARCHIBALD, op.cit. p. 107.17 Tratava-se do futuro Vice-Almirante Bowden Smith. Fonte: MARDER, op.cit. p. 17.

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aprendizagem, pois participou das grandesmudanças revolucionárias efetuadas porFisher na Marinha. Ele fazia parte de umgrupo de oficiais muito estimados porFisher, que os considerava os futuros che-fes da Marinha britânica.18

Richmond viria posteriormente a se afas-tar de Fisher, quando esse almirante nãoaceitou criar um estado-maior naval, receo-so de perder o seu enorme poder na ques-tão do planejamento estratégico da força, ena previsível perda de influência de seuscolegas do Almirantado. Richmond era umfirme advogado da criação desse estado-maior. Sua opinião era que o estado-maiornaval devia assistir ao Almirantado, proven-do os planos de guerra baseados em seuspróprios estudos e coordenados com o re-centemente criado Comitê de Defesa Impe-rial. A Divisão de Inteligência Naval prove-ria as informações necessárias para a for-mulação estratégica naval. Acreditava que,com essa estrutura, não “dependeria daenergia de apenas um homem”19, conformesuas palavras, referindo-se ao centralismoexacerbado de Lorde Fisher.

No ano de 1907 Richmond casou-se comElsa Bell, filha de um magnata da indústriade aço, Sir Hugh Bell. Lady Richmond diriaanos depois: “Quando ele me cortejava, aúnica coisa que me lembro de nossa con-versa era o seu fervor na formulação de umestado-maior naval”.20 Os sete anos que seseguiram a seu casamento foram os melho-res de sua vida. Estava prestigiado na car-

reira, sua vida familiar era alegre e seusamigos, muito queridos por ele. Seu cunha-do e particular amigo, o historiador e pro-fessor da Universidade de CambridgeGeorge Trevelyan, comentando anos de-pois esse período, diria:

A casa dos Bell na Rua Sloane 95 e suacasa de verão em Yorkshire eram cen-tros de uma grande sociedade de pri-mos e amigos, na qual Herbert era o fa-vorito. Ele [Richmond] adorava a vidasocial de Londres e, em Yorkshire, sededicava a qualquer coisa que estives-se acontecendo: a caça, o tiro ao alvo, adança, a patinação no gelo, a represen-tação de peças e todas as atividadescampestres. Era um tipo da vida inglesaque não conhecera anteriormente, e eleadorou cada minuto dela.21

Herbert e Elsa tiveram cinco filhos (qua-tro mulheres e um homem). A primeira foiMary Florence, nascida em 1908, seguidade Bridget Horatia, em 1910; Valentine, em1912; William Herbert Lowthian, em 1918,e, por fim, Eleanor Faith, em 1923.

No final de 1908 Richmond foi promovi-do a capitão de mar e guerra22 e designadopara o estado-maior do Almirante WilliamMay, comandante em chefe da Home Fleet23.Alguns meses depois, foi indicado paraassumir o seu primeiro comando no mar, odo navio mais poderoso da Armada Real, océlebre HMS Dreadnought.24

18 Os oficiais que faziam parte desse círculo eram chamados de oficiais do Fish Pond, uma corruptela paraa “lagoa do peixe”, uma expressão usada na época para designar os protegidos de Fisher. Fonte:HUNT, op.cit. p. 6.

19 SCHURMAN, Donald. The Education of a Navy. London: Cassell, 1965, p. 123.20 MARDER, op.cit. p. 18.21 TREVELYAN, op.cit. p. 6.22 Na Marinha britânica, captain.23 Home Fleet era a esquadra localizada no norte do Reino Unido, a mais poderosa das esquadras britânicas.24 O HMS Dreadnought era o encouraçado mais moderno da época. Certamente Fisher teve participação

direta nessa nomeação de Richmond. Fonte: ARCHIBALD, op.cit. p. 67.

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Richmond, ao assumir o comando dessenavio, determinou que os oficiais embarcadosaprendessem alemão e lessem o periódicoMarine Rundschau, da Marinha germânica,uma vez que estava convencido de que umaguerra com a Alemanha ocorreria cedo ou tar-de. Ele não gostava da rotina administrativaexcessivamente burocrática da Marinha, pre-ferindo concentrar-se no estudo da tática e daestratégia. Era também um oficial de pontos devista firmes, o que nem sempre agradava aosalmirantes, que viam nessa atitude um despre-zo pela disciplina, hierarquia e unidade de pen-samento. Richmond, certamente, demonstra-va sua insatisfação com certas decisões ema-nadas dos altos níveis, que considerava irre-ais e com pouca fundamentação técnica. Nãoera raro ver Richmond clamar abertamente quemuitos almirantes eram amadores travestidosde chefes, com pouca imaginação, afastadosdo realismo quando abordavam a tática e aestratégia25. Além disso, afirmava que pior queser amador era não permitir que as ideias origi-nais florescessem, especialmente de oficiaismais modernos, naturalmente com grande es-pírito ofensivo, entusiasmo e originalidade.

Richmond criticava também a preocu-pação excessiva dos almirantes com o quese chamava de spit and polish26, em detri-mento dos exercícios táticos. Para corro-borar essa visão de Richmond, Lisle Roseafirmou que, nos anos 80 e 90 do séculoXIX, um almirante inglês julgava a eficiên-cia de um navio de Sua Majestade pela lim-peza de sua luva branca ao final de umainspeção27. Em 1890, a mania generalizadade limpeza e arrumação alcançava o pontoridículo e perigoso de afastar qualquer exer-cício que sujasse o navio.28 Richmond se

rebelou exatamente contra isso. Para ele, oestudo da guerra era negligenciado peloschefes, preocupados em manter os navioslimpos, com os desfiles navais e a práticapura e simples da artilharia, sem nenhumaanálise dos resultados. No Almirantadonão existia nenhuma seção preocupadacom os planos de guerra e com a educaçãodos futuros chefes navais, segundo suavisão. Pode-se imaginar a antipatia quecriou com os chefes que o viam como arro-gante e indisciplinado. Seus colegastampouco eram poupados. Disse ele, em1909: “Parece-me que todos, de capitão demar e guerra até o marinheiro mais moder-no, necessitam de aplausos, ou de umabatida nas costas, um cumprimento porqualquer coisa que façam... oficiais deveri-am fazer o seu trabalho sem aplausos”.29

Richmond se frustrou com o comandan-te em chefe da Home Fleet, Almirante SirWilliam May, seu chefe direto, durante oseu período de comando. ConsideravaMay despreparado para o exercício de tãoalta função. Disse ele o seguinte:

Eu queria que ele [May] discutisse co-migo, que destruísse meus argumentosse estivessem errados, concordasse seestivessem certos, e se correspondessecom o Almirantado, em caso dediscordância com suas opiniões. O Al-mirantado, então, poderia apontar falhasou acertos, mas, pelo amor de Deus,permita-nos clareza de pensamento epermita que a mente do comandante emchefe esteja absolutamente clara comocristal sobre tudo o que iremos fazer epor que estaremos fazendo aquilo. Sem

25 MARDER, op.cit. p. 20.26 Spit and polish era uma expressão que significa “cuspir e limpar”, isto é, uma ênfase exagerada com a

aparência, em detrimento do treinamento para a guerra.27 ROSE, op.cit. p. 2828 Ibidem, p. 29.29 Diário de Herbert Richmond de 11 de abril de 1909, em Cromarty Firth. Fonte: MARDER, op.cit. p. 48.

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discussão isso me parece impossível, esem estudo não haverá discussão, masele [May] não tem estudado nada.30

Richmond considerava May com pou-ca imaginação, afirmando que esse almi-rante passava horas discutindo aspectosmenores da tática e dos exercícios realiza-dos, criticando os navios pela incompreen-são dos sinais táticos enviados e na formacomo os navios eram manobrados31, esque-cendo, no entanto, de analisar a qualidadedos treinamentos e de que forma a esqua-dra deveria ser utilizada para enfrentar osalemães, que, ele acreditava, seriam os pró-ximos adversários.

Richmond, apesar desses atritos comoficiais mais antigos, foi muito considera-do por seus oficiais. O futuro Vice-Almi-rante Kenneth Dewar, cuja amizade com elese iniciou a bordo do Dreadnought, disseo seguinte:

Ele [Richmond] era um tipo de oficial queeu nunca tinha encontrado. Além de serum competente imediato, era um fenô-meno raro na Marinha, sendo tambémum estudante de história. Servi com bonscomandantes, mas H.W. Richmond era

mais que isso. Ele encorajava a se pensare olhar além dos limites finitos da vida debordo[...] Richmond desenvolveu um ins-tinto tático e estratégico, estudando osacontecimentos da guerra.32

Em março de 1911, ao terminar seu tempode comando, Richmond foi enviado paracomandar um antigo cruzador de segundaclasse, o HMS Furious, e depois o HMSVindictive33, quase como um castigo porsuas observações, consideradas impertinen-tes pelos superiores. Se por um lado essacomissão era desprestigiada, por outro per-mitia que aceitasse a incumbência de SirJohn Knox Laughton para editar pelo NavalRecords Society 34(NRS) o volume The Lossof the Minorca 175635, o que lhe trouxemuito gosto e alegria, tendo sido publicadoem 1913. Nessa obra, Richmond discutiu naintrodução o desastre da perda da Minorcapara os franceses na Guerra dos Sete Anos,por parte do almirante inglês Byng, o queacabou levando a seu fuzilamento posteri-or, um caso raro na Marinha Real. Richmond,comentando essa campanha, disse: “Elaenuncia alguns pontos de estratégia quesão verdadeiros hoje [em 1913], como foramquando escritos [em 1756]”.36

30 Diário de Herbert Richmond de 22 de junho de 1909, em Cromarty Firth. Fonte: Ibidem, p. 53.31 MARDER, op.cit. p. 68.32 DEWAR, Kenneth. The Navy from within. London: Gollancz, 1939, p. 115.33 Ambos os navios, o HMS Furious e o Vindictive, eram da mesma classe, incorporados em 1896 e 1897,

deslocando 5.750 toneladas e armados com dez canhões de 6 polegadas. Fonte: ARCHIBALD,op.cit. p. 101.

34 A Naval Records Society foi fundada pelo eminente professor de história naval do King’s College, SirJohn Knox Laughton, em 1893. Essa sociedade tinha a tarefa de servir à Marinha e ao Estado nocampo da história naval, publicando documentos e obras que descrevessem eventos e estudos dahistória marítima britânica. Alguns de seus membros foram o Príncipe Louis de Battenberg, ReginaldCustance, Alfred Thayer Mahan, William Clowes, o próprio Herbert Richmond, Julian Corbett,Joseph Chamberlain, o Duque de Norfolk, George Sydeham Clarke, Caspar Goodrich, Phillip Colomb,Montagu Barrows e Sir John Seeley, entre alguns intelectuais. Essa sociedade existe até hoje e temproduzido obras importantes de história, congregando os principais historiadores navais ingleses.Fonte: LAMBERT, Andrew. The Foundations of Naval History. John Knox Laughton, the RoyalNavy and the historical profession. London: Chatham Publishing, 1998, p. 142.

35 RICHMOND, Herbert William. Papers relating to the Loss of Minorca in 1756. v. XLII, London:Naval Records Society, 1913.

36 Ibidem, p. 151.

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Nos anos de 1911 e 1912, Richmond en-controu tempo para ministrar palestras naEscola de Guerra Naval Real (EGN-GB), emPortsmouth, afirmando que, apesar da mu-dança tecnológica nas armas e métodos,existiam “princípios” que derivavam dopassado que poderiam ser aplicados naguerra naval moderna, demonstrando apro-ximação com as ideias de Alfred Mahan.

Um de seus alunos ainda se lembra daspalestras ministradas por Richmond. O fu-turo Almirante Roger Bellairs disse:

Era um prazer para nós, estudantes, saber-mos que Richmond ia ministrar as aulas.Tínhamos certeza que seria apresentadoum panorama importante para a histórianaval do futuro. Depois da aula haveriauma discussão livre e aproveitaríamos deseu vasto conhecimento, baseado na gran-de quantidade de leitura histórica, combi-nada com sua grande facilidade de expres-são e a ansiedade de todos nós.37

Pouco antes de transmitir o comando doVindictive, Richmond imaginou criar uma so-ciedade que, além de estimular a criatividade einfluenciar a educação dos jovens oficiais,permitiria que eles pudessem publicar artigos,sem as peias regulamentares que restringiama livre discussão de temas de tática, estratégiae política naval. Seu propósito seria promovero avanço e a disseminação, dentro da Mari-nha Real, de conhecimentos relevantes aosmaiores aspectos da profissão naval38. Dessaforma, convidou diversos colegas para juntoscriarem a Naval Society39. Esse grupo temia a

interferência e proibição do Almirantado empublicar artigos em um periódico que circula-ria entre os membros da sociedade. Assim,imaginou-se uma sociedade privada, com umperiódico também privado, com circulação res-trita, mantendo a anonimato dos autores pormeio do uso de pseudônimos, de modo a evi-tar retaliações contra aqueles que criticassema situação vigente na Marinha.

Reuniões formais da sociedade foram logodescartadas como impraticáveis; no entan-to, para manter um periódico circulando, eranecessário estipular anuidades, inicialmentede 2 libras por membro associado.40 Para atu-ar como editor-chefe, foi escolhido um oficialgeneral de prestígio que, de uma certa forma,serviria como para- choques das críticas pro-vindas do Almirantado: o Almirante WilliamHenderson, que também seria o tesoureiroda sociedade. Seriam aceitas inscrições paramembro associado até o posto de capitão-tenente, sendo posteriormente estendidaspara todos os oficiais da Marinha Real. Entrea fundação da sociedade, em outubro de 1912,e a distribuição do número 1 do periódico,que recebeu o nome de Naval Review, noinício de 1913, o número de associados subiude oito para 60. Em janeiro de 1914 atingiu596; em setembro daquele ano, 722; e no Na-tal de 1915, 1.260 membros.41

Richmond tinha consciência de que es-tava mexendo em um vespeiro ao não sub-meter o Naval Review à crítica do Almiran-tado. Em seu diário escreveria: “O que de-sejo desenvolver é o hábito mental de com-preender os assuntos, indo a fundo na aná-

37 MARDER, op.cit. p. 21.38 Naval Review, n. 1, v. 96, fevereiro/2008, p. 1.39 Os membros fundadores da Naval Society eram os seguintes oficiais: Capitão de Mar e Guerra Herbert

Richmond; Capitães de Fragata Kenneth Dewar e Drax Plunkett; Capitães-Tenentes Ralph Bellairs,T. Fisher e H. Thursfield; Capitão dos Fuzileiros Reais E. Harding e o Almirante W. Hendersoncomo editor. Essa sociedade existe até hoje e contava com 2.464 membros em agosto de 2007. Esteautor é membro associado desde 2004. Fonte: Naval Review. N. 3, v. 95, agosto, 2007, p. 205.

40 HUNT, op.cit. p. 33.41 Ibidem, p. 34.

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lise, evoluindo para estabelecer princípiose disseminando o interesse no melhor ladode nosso trabalho. Eu imagino o que asautoridades dirão quando o periódico forlido por elas”42. Richmond certamentegostava da provocação e do embate.

Nos anos que se seguiram, o NavalReview sofreu diversas censuras, princi-palmente no período de guerra, entre 1914e 1918, por temor de se revelarem planosde campanha, possíveis operações, o esta-do de espírito e a moral das forças navaisaliadas. Richmond, em todas as ocasiões,tentou refutar essas alegações, na maioriadas vezes sem sucesso. O que mais o pre-ocupou foi a censura não especificada, semjustificativas e explicações. O artigo eracensurado e ponto final! Richmond acredi-tava, em realidade, que as censuras erammotivadas pela própria incapacidade doAlmirantado em conduzir a guerra correta-mente. Assim, aquelas esconderiam suaspróprias deficiências.43 Nesse ponto,Richmond estava certamente correto, poisdois artigos do Naval Review foram cen-surados pelo Almirantado por exporem de-ficiências marcantes na condução da guer-ra. O primeiro tratou do desastre britânicona Batalha de Coronel, em 1914, quandofoi morto em combate o almirante inglês SirChristopher Cradock44. O segundo, já em1919, foi um virulento artigo sobre a esca-pada do Goeben e Breslau no Mediterrâ-neo, fruto da incapacidade britânica de blo-

quear os dois navios. Nesse caso específi-co, o autor foi descoberto e devidamenterepreendido, apesar dos protestos veemen-tes de Richmond e dos editores.45

Seja como for, o Naval Review sobrevi-veu à guerra e continua até hoje a ser umfórum de discussão de assuntos navais,sem censuras, utilizando ainda pseudôni-mos para os autores com as mesmas moti-vações do passado. Hoje a Marinha britâ-nica convive bem com esse periódico.

O Naval Review foi também o veículode discussão de um movimento que atin-giu a Marinha britânica naquele início doséculo XX, formado por jovens oficiais atéo posto de capitão de mar e guerra. Essegrupo de oficiais foi chamado de “jovensturcos” e tinha o propósito de reformularos procedimentos ultrapassados que go-vernavam a Marinha naquele período. Es-ses jovens oficiais acreditavam que os ve-lhos almirantes impediam o desenvolvimen-to do poder naval britânico, com suas ideiasultrapassadas e antiquadas. Propugnavamuma mudança geral na organização naval ena forma como a guerra deveria serconduzida46. Richmond era um dos líderesdesse movimento renovador.

Com o desenrolar da guerra de 1914, os“jovens turcos” passaram a criticar aberta-mente a postura defensiva e cautelosa doprimeiro lorde do Mar e ex-comandante dasforças navais inglesas na Batalha daJutlândia, Almirante Lorde Jellicoe. A campa-

42 Diário de Herbert William Richmond, datado de 27 de outubro de 1912, a bordo do HMS Vindictive.Fonte: MARDER, op.cit. p. 89.

43 HUNT, op.cit. p. 38.44 O Almirante Sir Christopher Cradock tem uma forte ligação com a história naval brasileira, pois era o

comandante da Canhoneira HMS Dolphin em 1892 no Mar Vermelho, quando auxiliou os náufragosbrasileiros do Cruzador-Escola Almirante Barroso em plena viagem de instrução de guardas-mari-nha, quando afundou próximo a Rãs Zeitti, na Península Arábica. Fonte: MENDONÇA, LauroFurtado. “A Marinha Imperial”. In: História Naval Brasileira. 4.v. Rio de Janeiro: Serviço deDocumentação da Marinha, 2001.

45 ROSKILL, Stephen. The Richmond Lecture. Naval Review. London: Naval Society, v. LVII, N. 2, abr,1969, p. 138.

46 HUNT, op.cit, p. 57.

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nha que fizeram para a sua remoção, apesarde justificada e coroada de sucesso, não foibem recebida nos meios navais, que a consi-deraram virulenta demais contra um almiran-te que, apesar das limitações pessoais, aindaera um oficial-general da Armada Real e, as-sim, merecedor de todas as considerações.Ao terminar a guerra, disse o historiador BarryHunt, “os jovens turcos foram vistos comopárias... e seus métodos, e não seus motivos,é que foram mais lembrados”.47

Em fevereiro de1913, Richmond foi de-signado assistente dodiretor de Operaçõesno recentemente cria-do Estado-Maior Na-val. Esse foi um perío-do de muito desgastepara ele, pois chocou-se diretamente comseus chefes em virtu-de de “erros de prepa-ração”48, segundo ele,nos planos de guerrasendo delineados.Richmond afirmavaque a preparação paraa guerra não significa-va somente construirum grande número denavios e armá-los com munição e homens.Preparação para a guerra, de acordo com oseu pensamento, significava estudar comoesses navios deveriam ser empregados ofen-sivamente contra os inimigos e defensiva-mente para proteger o Império. Para isso apreparação dos oficiais deveria ser revista,com ênfase no estudo da guerra e não nosaspectos puramente materiais e tecnoló-gicos. Além disso, considerava que o Esta-

do-Maior Naval recém-criado não era emrealidade um estado-maior, pois não asses-sorava o Almirantado e seu trabalho era in-frutífero. Ao eclodir a guerra, Richmond seencontrava nessa função que muito lhe de-sagradava. Comentando em seu diário so-bre esse período, disse o seguinte:

Faz-me doente ver a guerra ser conduzidadessa forma. Não há o vislumbre dos bá-sicos princípios de emprego eficaz de for-

ças navais, e ninguémtem o estofo ou pelomenos o conhecimen-to para impedir essesesdrúxulos projetos deserem conduzidos[...]Leveson [o diretor deOperações] teve su-cesso em me isolarcompletamente. Elenão me consulta, nemme pergunta nada... mi-nha posição está in-sustentável[...] não hánenhum navio paraonde possa ir, assimdevo sentar aqui e acei-tar qualquer coisa queele desejar jogar sobremim[...] não há dúvida

de que nós somos os mais horríveis ama-dores que em algum tempo tentaram con-duzir a guerra[...] não treinamos os nos-sos oficiais nos princípios de guerra, nemos fazemos concentrar em como condu-zir a guerra.49

A Marinha britânica, no início da GrandeGuerra, em 1914, era dirigida por WinstonChurchill, como primeiro lorde do Almiran-

47 Ibidem, p. 81.48 MARDER, op.cit. p. 21.49 Diário de Herbert Richmond de 14 de agosto, 17 e 24 de setembro de 1914, escrito no Almirantado.

Fonte: Ibidem, p. 99, 108 e 110.

Richmond afirmava que apreparação para a guerranão significava somente

construir um grandenúmero de navios e armá-

los com munição e homens,e sim estudar como esses

navios deveriam serempregados ofensivamente

contra os inimigos edefensivamente paraproteger o Império

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tado,50 e pelo venerado e idoso almirante de73 anos de idade lorde Jack Fisher, primeirolorde do Mar, que regressava a essa funçãodepois de sua reserva em 1910. Substituía oPríncipe de Battenberg, primeiro lorde doMar em 1914, injustamente acusado de sergermanófilo por opositores51.

Churchill, de índoleautoritária, se imiscuíanos assuntos opera-cionais, tudo contro-lando e tudo decidin-do. Por característicaspessoais, era dotadode grande espíritoofensivo e excessiva-mente impulsivo, aomesmo tempo em queFisher, já abatido pelaidade, não tinha o mes-mo poder e a mesmadisposição do passa-do, tudo aceitando.

O fracasso aliadonos Dardanelos veiorealçar essas deficiên-cias. Churchill partiuinicialmente da premissa de que, com navi-os poderosos, poderia dobrar a resistênciaturca em Gallipoli. Esqueceu que navios sãoincapazes de tomar objetivos terrestres. Emseguida, quando decidiu empregar forçasterrestres, o desembarque anfíbio já esta-va comprometido, além de ter sido malcon-duzido. O desastre foi total, culminando

com grande número de baixas nos aliadose, posteriormente, a retirada das forças dapenínsula. Richmond não ficou indiferentea esse fiasco naval. Ele disse: “Winstonnão entende de estratégia naval. Ele nuncaleu nada a respeito. Imagina que pode apli-car algumas regras mnemônicas derivadas

de livros militares, to-dos traduzidos de ex-pressões navais”.52

Sobre Fisher não foimais benevolente. Dis-se o seguinte de seuex-chefe:

Ele [Fisher] está pavi-mentando o caminhopara a derrota. E este éo mestre que seus ad-miradores nos fizeramacreditar ser bem do-tado em estratégia! Emrealidade ele nada faz.Ele vai para casa e dor-me à tarde. Está velho,cansado e nervoso. Étriste colocar os desti-

nos do Império nas mãos de um velhohomem decadente, ansioso por popula-ridade, temeroso que algum acidente co-loque abaixo seus planos. É triste.53

Richmond incomodava Churchill e, as-sim, deveria sair do Almirantado. Em maiode 1915, foi designado para ser oficial de

50 Primeiro lorde do Almirantado é o mesmo que ministro da Marinha, e primeiro lorde do Mar ocomandante Militar da Marinha.

51 O Almirante Príncipe Louis de Battenberg era um brilhante oficial de Marinha, aparentado da RainhaVitória. Ao eclodir a guerra, Battenberg, por ter nascido na Alemanha, foi declarado germanófilo eafastado injustamente do cargo de primeiro lorde do Mar, embora tenha feito toda a sua carreira naMarinha britânica e se considerar um inglês. Esse fato foi um dos mais desabonadores para a ArmadaReal britânica. Battenberg foi o pai de Lord Louis de Mountbatten, tio da atual Rainha Elizabeth IIe morto pelo IRA (Exército Republicano Irlandês) no ano de 1979.

52 Diário de Herbert Richmond de 10 de setembro de 1914, escrito no Almirantado. Fonte: Ibidem, p. 107.53 Diário de Herbert Richmond de 19 de janeiro de 1915, escrito no Almirantado. Fonte: Ibidem, p. 138.

A Marinha britânica, noinício da Grande Guerra,em 1914, era dirigida por

Winston Churchill.Por características

pessoais, era dotado degrande espírito ofensivo eexcessivamente impulsivo

O fracasso aliado nos

Dardanelos veio realçaressas deficiências

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ligação junto à Armada italiana, a bordo doEncouraçado Cavour, lá permanecendo atéoutubro, quando assumiu seu quarto co-mando no mar, o HMS Commonwealth54,em Rosyth, agregado ao Terceiro Esqua-drão de Batalha.

Richmond imaginava entrar em comba-te logo contra os alemães; no entanto, oseu esquadrão permaneceu realizando pe-quenas patrulhas e ações secundárias. OCommonwealth não participou da grandeBatalha da Jutlândia, ocorrida em maio de1916, para grande desgosto de Richmond.Preocupou-se com a falta de espírito ofen-sivo que afligia a Ma-rinha Real, resultandona falha em destruir aArmada germânica noencontro da Jutlândia.Acreditava que, porser superior, a Mari-nha britânica perderauma chance única de destruir a suaadversária em um combate decisivo.

Nesse posto permaneceu até abril de1917, quando assumiu seu quinto coman-do, o Encouraçado HMS Conqueror55, su-bordinado a um almirante que ele muito ad-mirava, o Vice-Almirante Sir John de Robeck,comandante do Segundo Esquadrão de Ba-talha. Estava Richmond feliz com os doisoutros comandantes da Esquadra, o Almi-rante de Esquadra Sir David Beatty, coman-dante da Esquadra britânica, e seu chefe deestado-maior, Contra-Almirante OsmondBrock. Pela primeira vez na guerra sentia

confiança nos chefes. Beatty inclusive eraum amigo que Richmond muito admirava porseu espírito ofensivo e sua liderança emcombate. Ele considerava, ao contrário, ocomandante em chefe da Esquadra anteriora Beatty, Lorde Jellicoe, um despreparado.Citou o fato de Jellicoe nunca ter lido umlivro de estratégia antes da guerra de 1914,até ter lido The Influence of Sea Power uponHistory, de Mahan. Ao lê-lo, Jellicoe menci-onou a Beatty, com alegria, uma citação deNelson, como se fosse uma nova descober-ta no campo da estratégia naval. Beatty,muito polidamente, retrucou dizendo queaquela citação de Nelson era repetida inú-

meras vezes por Ma-han em seu livro se-guinte, The Life of Nel-son, não sendo, assim,nenhuma novidade56.Richmond ridiculariza-va a “descoberta” de

Jellicoe como infantil e primária!Nessa comissão a bordo do Conqueror

permaneceu até abril de 1918, quando foidesignado diretor da recentemente criadadivisão de treinamento no Almirantado. Suadespedida do navio foi triste e emocionan-te. Disse que ao desembarcar “estava muitotocado. A tripulação me festejou e cantoumúsicas de despedida. Foi muito tocante eeu não merecia tudo aquilo, mas adorei maisdo que as palavras podem descrever. Umexcelente grupo de companheiros”.57

Imediatamente procurou implementarmelhoramentos no treinamento de oficiais

54 O HMS Commonwealth era um encouraçado pré-dreadnought construído em 1903, deslocando 16.350toneladas e armado com quatro canhões de 12, 4 de 9.2 e 10 de 6 polegadas. Fonte: ARCHIBALD,op.cit. p. 67.

55 O HMS Conqueror era um belo encouraçado super-dreadnought construído em 1911, deslocando22.500 toneladas e armado com dez canhões de 13.5 e 16 de 4 polegadas. Fonte: Ibidem, p. 74.

56 Diário de Herbert Richmond de 15 de maio de 1917, a bordo do HMS Conqueror. Fonte: MARDER,op.cit. p. 251.

57 Diário de Herbert Richmond de 10 de abril de 1918, a bordo do HMS Conqueror. Fonte: MARDER,op.cit. p. 309.

Richmond incomodavaChurchill e, assim, deveria

sair do Almirantado

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e praças. Uma de suas ideias era permitir oacesso de alunos provenientes de escolaspúblicas ao corpo de oficiais, o que nãoera permitido à época. Suas ideias, no en-tanto, eram muito avançadas para aqueleperíodo, e a tradição falou mais alto. A mai-oria dos almirantes noAlmirantado, além denão simpatizar comRichmond como pes-soa, não tinha simpati-as por concepções nãoortodoxas.58

Uma de suas ideias,no entanto, foi aceitadepois do término daguerra. Para o caso desubtenentes59 que tive-ram a sua educação li-mitada pela guerra, po-diam ser mandados paraa Universidade deCambridge para comple-mentar os seus estudosinterrompidos.

Durante esse seuperíodo no Almiranta-do, teve alguns atritoscom o novo primeirolorde do Mar que subs-tituíra Lorde Jellicoe, o Almirante Wemyss,que, inclusive, foi contra a sua designaçãopara aquela função.

A grande preocupação da Marinha bri-tânica desde 1915 era o grande número deafundamentos de navios mercantes aliadospor submarinos alemães. Somente com oestabelecimento de comboios, escoltadospor contratorpedeiros, foi possível diminuiros torpedeamentos e aumentar a destruiçãodos submarinos inimigos. Richmond, ainda

sem compreender o alcance que a guerrasubmarina teria na conduta da campanhanaval, comentou o seguinte:

Que tipo de guerra é essa guerra naval?Não se trata mais de uma guerra de cava-

lheiros. Trata-se de umaguerra de astúcia, de en-ganos, de contrabandis-tas, de bandidos, de su-bornos, de bandeirasnacionais falsas, de na-vios travestidos, de ofi-ciais disfarçados, todosagindo sorrateiramente.Tudo o que possa exis-tir a respeito de honradesapareceu com o sub-marino. Como o subma-rino, tudo o mais naufra-gou. É repugnante.60

Richmond teve umgrande dissabor nessacomissão. Em certo almo-ço de serviço, em julhode 1918, com o primeirolorde do Almirantado,Eric Geddes, não concor-dou com a opinião des-

se político a respeito do modo como a educa-ção naval estava sendo conduzida. Imediata-mente, houve forte reação de Geddes, que le-vantou ameaçadoramente o dedo em riste con-tra Richmond. Incontinente, Richmond con-tra-argumentou, dizendo que havia muito tem-po que estava na Marinha para entender oque era disciplina, obediência e subserviên-cia, que sempre preservou seu julgamento emqualquer questão e que não mudaria a suaopinião, apesar da rudeza do primeiro lorde.

58 TREVELYAN, op.cit. p. 8.59 O posto de subtenente corresponde ao de segundo-tenente na Marinha brasileira.60 Diário de Herbert Richmond de 30 de junho de 1915, no Mar Adriático. Fonte: MARDER, op.cit. p. 178.

Almirante Herbert William Richmond

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Seguiu-se um período de silêncio e constran-gimento. Geddes imediatamente alterou o seutom de voz e mudou o assunto para o preçodos charutos na Inglaterra, desanuviando oambiente61. O mal, no entanto, estava feito.Era mais um inimigo de Richmond que surgia.Deve ser considerado, no entanto, queRichmond tinha coragem moral para discordarde qualquer pessoa, fosse ela quem fosse,mesmo se essa pessoa fosse o primeiro lordedo Almirantado. Logo que pôde, Geddes viriaa afastar Richmond dessa função, o que ele jáimaginava.

Em janeiro de 1919, já terminada a guer-ra, Richmond foi dispensado, como espe-rado, e mandado assumir seu sexto coman-do no mar, o HMS Erin62, no Segundo Es-quadrão de Batalha. Lá permaneceu aténovembro de 1919. As promoções passa-ram a ser mais lentas com o fim do conflito;além disso, não contava com a simpatia demuitos almirantes e políticos que o viamcomo um indisciplinado e prepotente, em-bora muitos o reconhecessem como umcompetente profissional.

Richmond começou a se preparar paradeixar o serviço ativo, pois tinha certeza deque seria preterido a almirante. Um dos con-tatos que teve foi com o seu amigo Sir JulianCorbett, que lhe ofereceu o cargo de pro-fessor de História na Universidade deCambridge, o qual não aceitou por razõespessoais63. Outro convite que muito o ten-tou foi para assumir uma função executivano negócio de petróleo na Companhia

Anglo-Persa, no entanto esse convite coin-cidiu com a nomeação de seu amigo LordeBeatty para ser primeiro lorde do Mar emjaneiro de 1920. Esperava ser chamado paratrabalhar com ele no Almirantado.

Ao invés de ser chamado para o Almi-rantado, foi promovido a contra-almirante,com o apoio de Beatty, que o escolheu paradirigir a Escola Naval Real (EGN-GB) emGreenwich. Iniciava Richmond uma novafase de sua carreira naval e intelectual.

O almirante e o intelectual

Logo ao assumir sua nova função,Richmond ficou encarregado de reinau-gurar o curso de Guerra Naval para oficiaissuperiores, interrompido desde o início daguerra, em 1914.

Oficialmente a Escola Naval Real (EGN-GB)64 foi estabelecida em Greenwich em 1873,no entanto os seus currículos eram volta-dos basicamente para o estudo técnico. Opropósito dessa escola era estreitar os la-ços com as universidades, e os cursos ofe-recidos para os oficiais com patentes acimade subtenente eram voltados para a técnicaem detrimento da estratégia e da história.Das 13 disciplinas oferecidas apenas umalidava com história naval e tática.65

O curso de guerra naval foi aberto ofici-almente em 1900, sob a batuta de LordeFisher66, que incluía o estudo da história ede estratégia. Antes dessa data, a Marinhabritânica não possuía um local especifica-

61 Diário de Herbert Richmond de 18 de julho de 1918, no Almirantado. Fonte: MARDER, op.cit. p. 315.62 O HMS Erin era um encouraçado super-dreadnought com 23 mil toneladas de deslocamento, armado

com dez canhões de 13.5 e 16 de 6 polegadas. Fonte: ARCHIBALD, op.cit. p. 79.63 O cargo de docente para o qual foi indicado por Corbett era para a cadeira de História Vere Harmsworth,

criado pelo Lorde Rothermere em homenagem a seu filho morto na Grande Guerra, em 1916. SegundoRoskill, Rothermere, um dos expoentes em Cambridge, acabou indicando outro nome, o do professorHolland Rose, que assumiu a função logo depois. Fonte: ROSKILL, Richmond Lecture, op.cit. p. 141.

64 Tradução de Royal Naval College.65 LAMBERT, op.cit. p. 35.66 Na ocasião, Lorde John Fisher era segundo lorde do Mar e, assim, responsável pela Instrução e Ensino

na Marinha britânica.

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do para o ensino de tática, estratégia e daconduta da guerra. Presumia-se que serpromovido a almirante já era credencialsuficiente nesses assuntos específicos pro-fissionais. Nesse ano, no entanto, um cur-so para voluntários foi criado emGreenwich. Em 1906, o curso foi transferi-do para Portsmouth com duas classes anu-ais, com duração de três ou quatro mesescada, para voluntários dos postos de almi-rantes, capitães de mar e guerra e algunscapitães de fragata. As aulas consistiamde palestras, exercícios estratégicos e jo-gos de guerra. Existiam também aulas so-bre Inteligência e de Direito Internacional;no entanto, segundo um dos instrutoresdo curso, Kenneth Dewar, depois almiran-te, “as informações transmitidas estavamtodas contidas em livros de referência etinham pouco a ver com as principais dis-ciplinas de estratégia e tática”.67 Nada eraensinado sobre métodos de comando emsituação de crise ou guerra, e o sistema deensino utilizado pouco fez para prepararos oficiais superiores para a guerra que seaproximava, segundo Dewar.68

Em 1912 Winston Churchill determinouque a EGN-GB modificasse o seu currículopara treinar oficiais de estado-maior para aguerra.69 Mudanças foram tentadas paraaumentar a carga horária de História, Geo-grafia e Operações de Guerra, além da mu-dança dos métodos, que passariam a serde tutoria e não apenas discursivos. Naprática, no entanto, ênfase foi dada a tare-

fas rotineiras dos oficiais de estado-maiore não ao estudo aprofundado de novas dis-ciplinas.70 O primeiro grupo de oficiais nes-sa nova tentativa de mudança curricularreuniu-se em março de 1912 para um cursode nove meses71; entretanto, o espírito ge-ral do curso, infelizmente, era “hostil aotrabalho criativo”, segundo Dewar72.

Richmond, nesse período, foi convida-do para proferir palestras sobre História eEstratégia na EGN-GB. Muitos anos depoisdessas aulas, um dos seus alunos,Reginald Plunkett Ernle Drax, recordaria oseguinte:

Seu julgamento [de Richmond] emassuntos de política ou estratégia nun-ca era relutante, e geralmente era bem àfrente de seus contemporâneos... NaEscola de Guerra Naval e mais tarde noColégio Imperial de Defesa, ele discutiaprincípios com uma maturidade intelec-tual que era reconhecida por todos. Es-tava sempre disposto a escutar a opi-nião dos alunos e, se discordassem doque era dito, procurava contra-argumen-tar com razões lúcidas e pertinentes.73

No período de guerra, o curso foidescontinuado. O professor AndrewLambert mencionou que “o trabalho reali-zado na EGN-GB antes de 1914 foi limitado,dominado por questões técnicas e houvepouca contribuição para o desenvolvimen-to do pensamento naval”.74 Richmond vi-

67 DEWAR, op.cit. p. 130.68 Ibidem, p. 133.69 Ibidem, p. 153.70 HUNT, op.cit. p. 31.71 DEWAR op.cit. p. 153.72 HUNT, op.cit. p. 3173 Ibidem. p. 31.74 LAMBERT, Andrew. “History is the sole foundation for the construction of a sound and living

common doctrine: the Royal Naval College, Greenwich, and Doctrine development down to BR1806”. In : DORMAN, Andrew; SMITH, Mike Lawrence; UTTLEY, Matthew. The Changing Faceof Maritime Power. London: MacMillan Press, 1999, p. 47.

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nha para mudar esse quadro. Voltava comopresidente da Escola de Guerra para reor-ganizar os cursos, segundo suas própriasideias. Sua amizade com o primeiro lordedo Mar, Earl Beatty, facilitava essa tarefa,ou pelo menos assim pensava.

Nesse ano de 1920 foi lançado no merca-do editorial o seu primeiro livro de pesquisahistórica, o The Navy in the War of 1739-174875, em três volumes. O mentor desseseu trabalho foi Sir Julian Corbett. Amigo deRichmond, Corbett era um dos mais influen-tes historiadores navais do Reino Unido epupilo de Sir John Knox Laughton. Corbettnão só o influenciou nessa empreitada,como também o ensinou a pesquisar em fon-tes primárias inéditas, o que muito o ajudouem toda a sua carreira de historiador. A apro-ximação entre os dois se dera por ocasiãode sua associação com Lorde Fisher em 1906,uma vez que Corbett era grande amigo tam-bém de Fisher, tornando-se posteriormenteo historiador naval oficial da Primeira Guer-ra Mundial. Richmond levou muitos anosescrevendo essa obra, terminando-a em1914; no entanto, devido à guerra, poster-gou o seu lançamento até 1920.

Esse livro monumental abarcou a cha-mada Guerra Espanhola de 1739 e a Guerrada Sucessão da Áustria, que se encerrouem 1748. Seu objeto foi a guerra naval en-tre as Marinhas britânica e francesa, quese estendeu por todo esse período. Essaobra, que ainda é considerada a referênciapara esses dois conflitos no mar, foi por eleescrita para lhe “autoagradar”, conformesuas próprias palavras.76 Parte desse pra-zer foi motivado pela falta de pressão doseditores e quase como um hobby.

Sua pesquisa foi detalhada e extensivanos arquivos ingleses e franceses. Utili-

zou documentos oficiais do Parlamento in-glês e do Almirantado, assim como os diá-rios de Sir John Norris e do Duque deNewcastle, ambos almirantes, além dos re-latos das ações navais retirados dos livrosdos navios, de relatórios de comandantesde esquadrão e de frotas navais. O que maissurpreendeu os historiadores profissionaisfoi o de tal livro ter sido escrito por umcapitão de mar e guerra sem maiores cre-denciais até aquele momento e em funçãode atividade, geralmente embarcado emnavios da Armada Real. O professorDonald Schurman assim se pronunciou arespeito dessa obra-prima de guerra naval:

O primeiro trabalho de Richmond nasguerras de 1739 a 1748 foi o mais detalha-do e compreensível de seus livros. O jul-gamento de Corbett quando escreveupara Richmond foi que aquela foi a “suaguerra” e não alteraria uma palavradele[...] tal produção teria sido muito bemapreciada se ela tivesse provindo dapena de um catedrático de Oxford; comoum produto de um comandante da épocado Dreadnought, foi e é um trabalho ad-mirável. Ele foi o primeiro inglês a escre-ver sobre aquelas guerras inteiramente ediscutir suas implicações estratégicas etáticas com um olho de historiador.77

Em 1921 a Marinha britânica sofreu for-te restrição orçamentária, e a EGN-GB foitambém atingida. Dos 24 alunos do curso,19 foram transferidos para a reserva, o queconfirmou, em seu juízo, que as autorida-des consideravam a escola como de valormarginal, o que acreditava ser um erro queprejudicava a preparação de futuros líde-res navais. Sua amizade com Beatty não otornava imune, como podia perceber.

75 RICHMOND, Herbert. The Navy in the War of 1739-1748. Cambridge: Cambridge University Press,1920.

76 SCHURMAN, op.cit. p. 132.77 Ibidem, p. 132.

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Esse seu período na escola foi marcadopela discussão em torno da Batalha daJutlândia. Teria a batalha sido vencida pe-los ingleses? Teria Jellicoe sido muito cau-teloso e Beatty muito ousado? Questõesque dividiram a Marinha. Richmond eraamigo de Beatty e não gostava de Jellicoe,logo sua posição era de apoiar os argu-mentos de Beatty, embora não explicitamen-te. Sua atuação nesse processo dolorosofoi apenas periférica. Ao final Jellicoe saiucom sua reputação arranhada78.

Nesse período, seu grande amigo JulianCorbett faleceu, o que foi para ele uma per-da pessoal. Fora, inclusive, Corbett quepropusera Richmond para editar outra obrado NRS. Tratavam-se dos volumes III e IV,com os papéis e a correspondência priva-da de Sir George, segundo Conde Spencer,primeiro lorde do Almirantado entre 1794 e1801. A obra levou o título de PrivatePapers of George, Second Earl Spencer79,e os volumes foram publicados em 1923 e1924. Corbett, naquela ocasião, estava en-volvido com a grandiosa obra de escrevera história da Grande Guerra e indicaraRichmond para coordenar esse trabalho.

Em fevereiro de 1923 ele deixou a presi-dência da escola e foi designado coman-dante em chefe do Esquadrão das ÍndiasOrientais. Esse comando não era dos maisprestigiosos da Marinha, no entanto era umcomando no mar, o que agradou Richmondimensamente. Seu esquadrão era compostode três cruzadores e alguns navios-auxilia-res e baseado em Cingapura. A responsabi-lidade dessa pequena força naval era gran-de. Ela deveria controlar uma vasta área queia da costa leste da África até a região de

Cingapura, incluindo todo o Mar Índico e oGolfo Pérsico, com suas linhas de comuni-cação vitais para o Império.

Richmond cumpriu suas tarefas muitoseriamente, propondo o aumento na segu-rança das linhas de comunicação no MarÍndico e maior participação do Vice-Reina-do da Índia no sistema imperial global dedefesa. Além disso, realizou inúmeros exer-cícios combinados com o Exército hindu efoi palestrante costumeiro no Colégio deEstado-Maior em Quetta, na Índia.80 Eleacreditava que o governo deveria fortificara base de Cingapura, não apenas com ar-mamento pesado em terra, mas principal-mente com o aumento de forças navais,pois acreditava que haveria uma guerra como Japão no futuro e que o eixo de ataquejaponês seria dirigido ao Sudeste Asiáticoe à Índia, ao invés da Austrália e do sul doPacífico.81 Tinha convicção de que o ata-que contra Cingapura seria combinado enão somente naval. Pode-se, assim, com-provar que estava parcialmente correto, umavez que os japoneses atacaram segundodois eixos principais. Um de acordo com aideia de Richmond, e outro em direção aoPacífico Central e Sul. Quanto a Cingapura,ele estava totalmente correto.

Em 1925 Richmond deixou o seu coman-do e foi promovido a vice-almirante, sob aproteção discreta de Beatty, que ainda con-tinuava como primeiro lorde do Mar. Emjulho de 1926, foi elevado pelo rei a cava-leiro da Ordem do Banho82 e, assim, tor-nou-se elegível para apor antes de seunome o título de sir. Nesse ano tambémrecebeu a Medalha de Ouro Chesney daRUSI, distinção previamente conferida a

78 HUNT, op.cit. p. 118.79 RICHMOND, Herbert. Private Papers of George, Second Earl Spencer. 2 vol. London: Naval Records

Society, 1923/1924, v. III / IV.80 ROSKILL, Richmond Lecture, op.cit. p. 141.81 HUNT, op.cit. p. 138.82 O título em inglês é Knight Commander of the Order of the Bath (KCB).

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apenas um oficial de Marinha, AlfredThayer Mahan, pela qualidade de sua obraThe Navy in the War of 1739-1748. Em se-tembro desse ano, foi novamente brindadopor Beatty, ao ser nomeado primeiro co-mandante do recém-inaugurado ColégioImperial de Defesa (CID)83, que iniciariasuas atividades em janeiro de 1927.

A tarefa principal dessa instituição eracongregar os oficiais de média patente, ofi-ciais superiores das três Forças Armadas(Marinha, Exército e Força Aérea), junta-mente com civis funcionários governamen-tais, aptos a disputar funções de comandoe direção, para que se aperfeiçoassem e trei-nassem em assuntos de estratégia e políti-ca concernentes à defesa do Império. Afunção primordial desse novo órgão deensino era permitir a troca de experiênciaentre oficiais e civis de diferentes matizes eincentivar a cooperação entre eles.

Richmond foi a escolha certa, uma vezque sempre defendera a cooperação e aintegração entre as Forças Armadas, como estabelecimento de uma doutrina comum,além de apreciar demasiado a função deensino. Pouco antes, Richmond defenderaa criação de um estabelecimento de ensinocom essas características.84

O colégio estava localizado em Londres,e os cursos teriam a duração de um anopara oficiais britânicos e dos domínios quejá tivessem os cursos de estado-maior desuas respectivas forças. Inicialmente, asturmas teriam 35 oficiais de cada força, 12dos domínios e três civis de cada departa-mento envolvido com assuntos de defesa,isto é, Assuntos Estrangeiros, Tesouro,Comércio, Interior e Colonial.85

A Richmond e a um grupo escolhido deoficiais recaiu a organização do primeirocurso do colégio. O curso era composto denove ou dez grandes exercícios tipo jogosde guerra, no nível político e estratégico,quando cada aluno participava como umator político distinto em situações de criseou de guerra. Em seguida, era confeccio-nado um relatório com todos os ensi-namentos colhidos, com comentários so-bre os acertos e erros. Infelizmente, essesrelatórios foram tratados pelos estados-maiores como exercícios acadêmicos e nãoforam devidamente aproveitados.86

Em complemento, existiam palestras for-mais proferidas por renomadas personali-dades da GB, como o rei, o primeiro-minis-tro, os demais ministros, comandantes deforça, almirantes, brigadeiros e generais, alémde visitas de estudo, viagens no país e noexterior. Richmond ministrava pessoalmen-te algumas palestras. Uma de suas favoritastinha o título de “Os objetos de guerra”, naqual discutia com a turma aspectos impor-tantes de estratégia e política, procurandoformular princípios e conclusões com argu-mentação bem fundamentada.

Richmond, por ser excessivamente vol-tado para assuntos navais, ofendeu algu-mas vezes oficiais de outras forças, princi-palmente da Força Aérea Real. Um dessesoficiais, o comandante de grupo PhillipJoubert de la Ferte, comentaria queRichmond dizia sempre que “a Marinha vi-nha primeiro, em último e em todas as cir-cunstâncias, e que se dane a história se eladisser outra coisa”.87 Muitos de seus acu-sadores diriam posteriormente que ele nãopercebia com clareza a importância do po-

83 O nome em inglês é Imperial Defense College.84 HUNT, op.cit. p. 150.85 Ibidem, p. 155.86 Ibidem, p. 158. Muitos desses exercícios retrataram, com grande exatidão, situações que ocorreram

posteriormente na Segunda Guerra Mundial.87 HUNT, op.cit. p. 160.

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der aéreo. Richmond certamente tinha ares-tas com oficiais da Força Aérea. Diria ele,maldosamente, que eles eram mentalmenteinferiores aos oficiais das outras forças eque “alguns dos trabalhos por eles escritoseram quase produto de crianças parcialmenteeducadas”.88 Uma maldade certamente; noentanto, Barry Hunt acreditou que todo essepreconceito era baseado na estratégia deterror defendida por muitos aviadores in-gleses de bombardear maciçamente áreasurbanas, uma distorção moral não aceita,pois não correspondia ao modo inglês deconduzir a guerra, segundo Richmond. Pros-seguiu Hunt afirmando que a filosofia depolítica imperial naval explícita comentadapor Richmond não justificaria o slogan pe-jorativo adotado pelos oficiais da ForçaAérea de “Marinha primeiro, em último e emtodas as circunstâncias”.89 Uma maldadecontra Richmond, com toda a certeza.

O novo primeiro lorde do Mar era o Al-mirante Sir Charles Madden desde julhode 1927. Ele não simpatizava comRichmond. Madden fora chefe do estado-maior e dileto amigo de Jellicoe no coman-do da Esquadra em 1916 e, assim, um ad-versário tanto de Beatty como deRichmond. Além disso, era um oficial dedifícil trato, bem mais velho e antigo queambos, já tendo sido agraciado com o títu-lo de barão pelo rei em 1919. Richmond sa-bia que, a partir daquele momento, conta-ria com um grande inimigo no Almirantado.

Nesse período Richmond lançou três li-vros. O primeiro recebeu o nome de

Command and Discipline90, uma antologiade passagens escritas por autores renomadosna história militar e naval. Essa obra foi divi-dida por Richmond em dois grupos, o primei-ro com frases relativas à “arte” de comandar,e o segundo relativo à disciplina, com umtotal de 14 capítulos. A escolha dos autorespor Richmond já indicava os seus textos mi-litares preferidos. Ele nutria forte admiraçãopor Horatio Lord Nelson, a exemplo deMahan, transcrevendo sete verbetes desseherói inglês. Admirava também intensamen-te o próprio Alfred Mahan, com 14 verbetes,o Marechal Ferdinand Foch, com dez verbe-tes, e Napoleão, com sete verbetes.

Nesse mesmo ano, Richmond lançou oNaval Warfare91, que era composto de doisgrandes capítulos, ambos retratando pa-lestras ministradas por ele no King’sCollege na primavera de 1926. O propósitodesse livro era estabelecer, de forma sim-ples e direta, em um texto enxuto, “os am-plos princípios básicos que cobrem o usodo poder marítimo na guerra”, segundosuas próprias palavras92.

Em 1928 Richmond lançou o terceiro li-vro desse período, o National Policy andNaval Strength93. Tratava-se de uma com-pilação de diversas palestras ministradaspor ele na Academia Britânica94, de artigosno Naval Review, de conferências no RUSIe no Instituto Real de Relações Internacio-nais, nas Universidades de Cambridge ede Londres e na EGN-GB, sob o título de“Políticas Nacionais e Força Naval do Sé-culo XVII ao XX”, sendo o primeiro livro

88 Carta de Herbert Richmond a William Henderson de 15 de setembro de 1928, dia de seu aniversário.Fonte: Ibidem, p. 161.

89 Idem.90 RICHMOND, Herbert. Command and Discipline. London: Edward Sanford, 1927.91 RICHMOND, Herbert. Naval Warfare. London: Ernest Benn, 1927.92 Ibidem, p. III.93 RICHMOND, Herbert. National Policy and Naval Strength. London: Longmans and Green, 1928.94 Chamadas de Palestras Raleigh de História.

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de história que pode ser chamada de histó-ria popular, segundo entendimento deHunt95. Richmond solicitou que o prefáciofosse feito por seu amigo Lorde Sydenhamof Combe, que apontou a importância doestudo da história para políticos e fez umacrítica direta à política naval britânica ado-tada na Grande Guerra. Esse livro foi volta-do para historiadores, especialistas emguerra naval, políticos e oficiais de Mari-nha, tornando-se, dessa maneira, um textobásico para se compreender o pensamentode Richmond.

Em dezembro de 1928 ele deixou o CID eem outubro do ano seguinte foi promovi-do a almirante de esquadra, apesar da opo-sição de Madden. Essa promoção não sig-nificou novas comissões de maior prestí-gio, muito pelo contrário. A única funçãoque lhe foi confiada foi a de presidente daConferência Internacional para a Seguran-ça da Vida no Mar, muito insignificante parao seu intelecto e sua preparação profissio-nal. Madden não lhe deu mais nenhumafunção a partir daí.

O que veio a complicar ainda mais a suasituação foi uma série de artigos queRichmond escreveu para o periódico TheTimes em 21 e 22 de novembro de 1929,cujos títulos foram “Menores Marinhas –um padrão para todas” e “O Navio Capi-tal”96. Neles Richmond atacou veemente-mente a política naval vigente na GB aopropor o absurdo, segundo ele, de procu-rar uma fórmula para limitar o número denavios de cada poder marítimo. Sugeria eleque cada nação deveria procurar seus pró-prios números, de acordo com seus inte-resses no mar e não em relação a seus opo-nentes. Para ele, a única forma de limitar

cientificamente o poder de uma Marinhade Guerra era controlar o tamanho de cadanavio individualmente, mas nunca a Mari-nha como um todo. Os navios a seremconstruídos deveriam estar limitados pelaautonomia em cerca de 8 mil milhas a 15nós de velocidade, velocidades entre 24 e28 nós e capacidade de combate com ca-nhões até 6 polegadas. Essas qualidadescorresponderiam a um cruzador de cercade 10 mil toneladas97.

Richmond já havia defendido esses pon-tos de vista anteriormente, e eles não agrada-ram ao Almirantado, que ainda defendia aconstrução de grandes navios encouraçados,dentro da tradicional concepção de AlfredMahan de batalha decisiva. Richmond de-fendia a construção de cruzadores menoresem detrimento dos grandes naviosencouraçados, afirmando que se perdeu naconferência do desarmamento de Washing-ton de 1922 a chance de diminuir uma futuraescalada de construção de grandes navios,sem sacrificar a segurança dos Estados en-volvidos. Em uma palestra proferida por ele,em abril de 1926, em Chatham House, defen-deu esses pontos de vista, criticando dura-mente o Almirantado. Foi então imediatamenterepreendido pelo Vice-Almirante FrederickField, vice-chefe do Estado-Maior Naval, quedeterminou que naquelas circunstânciasRichmond deveria se refrear de declaraçõespúblicas que viessem a embaraçar o Almiran-tado em questões que envolvessem projetosde força e políticas navais. Por estar aindasob a batuta de Beatty, a questão foi abafadae nada ocorreu.

Nesse novo caso que surgiu, Beatty jáestava na reserva, e o primeiro lorde do Marera Madden, seu inimigo declarado. Nova-

95 HUNT, op.cit. p. 130.96 Os títulos em inglês foram “Smaller Navies. A Standard to All” e “The Capital Ship”, publicados no The

Times, de Londres.97 Nos próximos números serão discutidas, com maior intensidade, essas ideias de Richmond.

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mente houve uma reprimenda pública, coma intenção de forçá-lo a transferir-se para areserva; no entanto, desta feita, em marçode 1930 Richmond recebeu uma carta do pri-meiro lorde do Almirantado, A. V. Alexander,informando-o de que não haveria uma novacomissão para ele naquele ano.

Logo em seguida, foi preterido novamentepara um grande comando de força naval nomar. O novo primeiro lorde do Mar era o Almi-rante Frederick Field, o mesmo que o repreen-dera quatro anos antes pelo mesmo motivo.Field insinuou, então, que precisava da vagade Richmond para acelerar as promoções dospostos abaixo.98 Era a máxima humilhação queRichmond poderia suportar. Em abril de 1931,Richmond era transferido para a reserva, sobforte emoção e frustração.

Embora não imaginasse na ocasião,Richmond começaria uma nova etapa emsua vida, etapa que muito lhe agradaria.

Uma carreira de realizações acadêmicas

Richmond afastou-se imediatamente parasua casa localizada em Great Kimble, noCondado de Buckinghamshire, a sudeste daInglaterra. Nesse período, ele continuou suaspesquisas e a escrever livros, procurandoesquecer a sua saída da Marinha. Encon-trou também na jardinagem um derivativo.Eventualmente ia a Londres ministrar pales-tras na University College, da Universidadede Londres, e no Trinity College.

Pela primeira vez sentia uma grande li-berdade em escrever o que bem entendes-se, sem as peias que o serviço ativo de-mandava de seus oficiais. Censuras nãomais existiam.

Nos próximos três anos, de 1931 a 1934,foram lançados quatro livros de sua auto-ria. O primeiro, The Navy in India 1763-1783,99 é uma densa obra histórica que foiterminada no seu período de comando noÍndico, só sendo lançada em 1931. Nesselivro Richmond tentou demonstrar como apolítica tende a se subordinar a fatoresmateriais e administrativos.100 Ele procu-rou indicar as causas que afetaram a estra-tégia e as influências que governaram atática empregada pelos comandantes nacena de ação, em especial o duelo Hughes-Suffren, e trazer à discussão as muitas cir-cunstâncias de tempo, de suprimentos, desaúde e materiais que tiveram um destaca-do papel na campanha101. Sua análise con-centrou-se nos campos político, estratégi-co e operacional, no entanto isso não im-pediu que analisasse algumas batalhas, aexemplo do que Mahan fizera em seu TheInfluence of Sea Power upon History, obrainclusive referenciada por Richmond.

O segundo livro lançado em 1931 foi oEconomy and Naval Security: a plea for theexamination of the problem of the reductionin the cost of naval armaments on the linesof strategy and policy102. Richmond, ao es-crever essa obra, tinha o propósito de discu-tir o problema da redução do custo dos arma-mentos navais em relação à estratégia e àpolítica. Logo no início de sua discussão,apontou que não existia uma concordânciageral em relação à economia nacional e aosrequisitos de segurança. De acordo com umaprimeira linha de pensamento, os armamen-tos eram a causa da guerra; logo, se reduzin-do o gasto em armas, as chances de guerradiminuiriam. Em uma segunda linha de pen-

98 Ibidem, p. 31.99 RICHMOND, Herbert. The Navy in India 1763-1783. London: Ernest Benn, 1931.100 HUNT, op.cit. p. 136.101 RICHMOND, The Navy in India, op.cit. p. 13.102 RICHMOND, Herbert. Economy and Naval Security: a plea for the examination of the reduction in

the cost of naval armaments on the lines of strategy and policy. London: Ernest Benn Ltd, 1931.

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samento, o propósito seria o inverso. Assim,a compra de armamentos teria um efeito coer-citivo, o que dissuadiria qualquer país de seaventurar em um conflito. Uma terceira linha,da qual Richmond era partidário, preconiza-va que o propósito dos armamentos era ob-ter segurança. Se gastar mais em armas signi-ficasse maior segurança, deveria-se gastarmais. Se o adversário mantivesse, segundo asua visão, o nível adequado de segurança,haveria economia. Sua discussão centrou-senesse caso específico.103

O livro seguinte por ele lançado foi Im-perial Defence and Capture at Sea inWar,104 que tratou de questões envolvendodois grupos de capítulos distintos. O pri-meiro grupo, composto de seis capítulos,abordou a questão da defesa imperial, dis-cutindo aspectos políticos envolvidos naguerra e na paz, e um tema que muito o inte-ressou foi a defesa do comércio marítimo daGB e a defesa contra invasões. No segundogrupo de capítulos, quatro no total, anali-sou a questão, sempre sensível, de captu-ras marítimas em alto-mar no caso de guerra.

Embora Richmond tenha apresentadouma reconfiguração original do sistema dedefesa do Império105 logo no início de suaapresentação, sua aceitação não foi unâni-me entre os historiadores e analistas. Mui-tos criticaram suas concepções comodissociadas da realidade, que começava ase alterar, afetando o relacionamento dasunidades políticas dentro do Império.Schurman comentou que, qualquer que fos-se sua lógica na apreciação militar naquelaoportunidade para se encaixar em situaçõesestratégicas correntes, essas situações

não mais existiam em 1932. Disse ele que,“apesar de seu conhecimento em assuntosde política naval, uma cabeça como a deRichmond não estava preparada para lidarcom a natureza das mudanças de relaçõesna Comunidade Britânica que afetavam abase das concepções estratégicas”.106

Hunt também criticou Richmond, afirman-do que sua concepção de defesa era amorfae algumas vezes ambígua em relação às suasimplicações, não tendo ele se baseado emqualquer discussão teórica de relações in-ternacionais. Além disso, acreditava queRichmond, como todos os ingleses de suageração, não era “sensível às forças nacio-nalistas que se desenvolviam no seio doImpério e à natureza mutante das conexõesque mantinham o Império coeso”107.

Por outro lado, essas críticas não foramunânimes. O historiador Robin Higham afir-mou que:

O Imperial Defence and Capture at Seain War continha uma grande quantida-de de sábias lições. Diferentemente demuitos outros autores, Richmond esta-va preocupado com as funções das For-ças Armadas em tempo de paz e de guer-ra. O combate tinha mais visibilidade einteresse para a imaginação da opiniãopública; no entanto, a sobrevivênciadependia de que preparativos fossemrealizados não só para a guerra, mas tam-bém para se evitar a guerra. Dessa ma-neira, as tarefas das Forças Armadas,em períodos entre conflitos, eram a pre-servação da ordem, a manutenção paraa guerra e o treinamento.108

103 Ibidem, p. 11.104 RICHMOND, Herbert. Imperial Defence and Capture at Sea in War. London: Hutchinson & Co, 1932.105 Ibidem, p. 11.106 SCHURMAN, op.cit. p. 129.107 HUNT, op.cit. p. 135.108 HIGHAM, Robin. The Military Intelectuals in Britain: 1918-1939. Westport: Greenwood Press

Publishers, 1966, p. 53.

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Seja como for, trata-se de um livro que,mercê todas as críticas, tem uma grandeimportância, pois discute intensamenteconceitos importantes sobre defesa.

Seu livro seguinte foi Naval Training,109

de 1933. O tema desse livro foi um de seusfavoritos: a educação e o treinamento do pes-soal da Marinha Real. Os primeiros rascu-nhos foram escritos em 1918, quando ele as-sumiu a função de chefe da Divisão de Trei-namento do Almirantado110. Desde muitocedo, Richmond se envolveu com a área deensino da Marinha. No seu tempo de assis-tente de Lorde Fisher, ele já pôde perceber asalterações conduzidas por seu chefe na áreade treinamento e ensino, que vieram modifi-car totalmente a política naval até então.Richmond, a partir daí, começou a formular asua própria concepção e procurou aproximara Marinha da academia e implementar novosmétodos de ensino, tais como estudos decaso e discussões dirigidas. Além disso, acre-ditava que se deveria aumentar a carga deestudos de história naval e estratégia noscursos de altos-estudos. Afinal Richmondfora tanto diretor da EGN-GB como do CID, oque, acreditava, lhe conferia credibilidadesuficiente para apontar os defeitos no siste-ma de ensino naval e militar.

Nesse período, Richmond aproximou-sedo crítico militar Sir Basil Liddell Hart,111 de-pois dos elogios do primeiro em relação àbiografia de William Tecumseh Sherman,escrita por Hart. Os laços se estreitaramquando Richmond contou a Hart os seusinfortúnios a respeito de suas opiniões so-

bre as dimensões dos navios, o que provo-cou como punição a sua indisponibilidade eseu posterior afastamento do serviço ativoda Marinha. Hart imediatamente se ofere-ceu para utilizar suas conexões com mem-bros do gabinete de James Ramsay MacDonald, dentre os quais se destacava LordeThompson, ministro da Aeronáutica, erediscutir aquela situação. A morte de LordeThompson em um acidente aéreo poucodepois abortou essa iniciativa; no entanto,Richmond e Liddell Hart mantiveram-se emcontato até a morte do primeiro.

Em fevereiro de 1934, a vaga de HollandRose em Cambridge foi aberta, depois dedois anos de docência. O nome deRichmond foi eleito pela congregação dauniversidade para assumir essa vaga porum período de dois anos.112 Era realmenteuma grande honra para um oficial de Mari-nha ser professor daquela prestigiosa uni-versidade, inclusive porque Richmond ti-nha duas obras fundamentais de históriaque lhe davam credenciais mais que rele-vantes, The Navy in the War of 1739-1748e The Navy in India, seus dois livros maisimportantes e conhecidos no meiohistoriográfico. O próprio professor Rosediria: “Richmond não possui somente umbelo currículo no serviço ativo naval, eletem estudado profunda e longamente a his-tória da Marinha e sua influência em nossodesenvolvimento nacional e além-mar”.113

George Trevelyan, seu cunhado e amigoíntimo, professor régio114 de História Mo-derna em Cambridge, diria posteriormente

109 RICHMOND, Herbert. Naval Training. London: Oxford University Press, 1933.110 HUNT, op.cit. p. 212.111 Autor de diversos livros de história militar e formulador da teoria de aproximação indireta em

estratégia.112 A cadeira assumida por Richmond era chamada de Vere Harmsworth de história naval e imperial. Ver

item 3.1.1.113 HUNT, op.cit. p. 217.114 Título correspondente a catedrático ou professor titular. Trevelyan posteriormente seria reitor do

Trinity College, em Cambridge. Fonte: Ibidem, p. 218.

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que a escolha do nome de Richmond foimarcada por sua “eminência como historia-dor e em razão da idade limite que afetava ocorpo docente; ele só poderia permanecerpor dois anos, porém sentimos que suasqualificações eram tão grandes que mesmoessa desvantagem poderia ser relevada. Eleera um excelente professor e palestrante”.115

Richmond dedicou-se de corpo e alma,com extrema alegria, à nova carreira docen-te. Além disso, tornou-se mais tolerantecom opiniões contrárias às suas. Toda asua agressividade e prepotência foram dei-xadas para trás. Parecia que tinha nascidopara ser professor de História, sua terceiragrande paixão, depois da família e da Mari-nha Real. Ele foi reconhecido em Cambrid-ge como um educador gentil, paciente, sen-sível e charmoso.116 Suas vitalidade e dedi-cação foram muito apreciadas por seus alu-nos e colegas professores. Além disso,desenvolveu um refinado senso de humorque fazia de suas aulas uma delícia de se-rem assistidas. Richmond também era flu-ente em francês e italiano, o que facilitavasuas pesquisas e referências em sala deaula, pois indicava as diferentes visões deoutros autores estrangeiros.

Nesse período de docência Richmondlançou novo livro: Sea Power in ModernWorld.117. Nessa obra ele retornou ao temade segurança e voltou a criticar as doutri-nas em voga nas Marinhas dos anos 30,que enfatizavam a quantidade de meios eas grandes dimensões dos navios em de-trimento de razões estratégicas e políticas.Reconheceu que um bloqueio naval só se-ria efetivo se um poder marítimo estivessealiado a um poder terrestre, aproximando-se do pensamento de seu querido amigoJulian Corbett.

Richmond, nesse livro, também, apon-tou que o poder marítimo era melhor ins-trumento político e estratégico do que onascente poder aéreo, pois o primeiro po-deria transportar grandes quantidades detropas pelo mar e manter essas tropas lu-tando em um teatro de operações afasta-do, com boa cadeia logística, ao contrárioda Força Aérea, limitada pela dimensão res-trita de seus meios. Concluía, assim, que opoder marítimo era um poder mais adequa-do à segurança coletiva que o poder aéreo,o que mais uma vez trouxe a insatisfaçãode seus colegas da Força Aérea.

Depois de dois anos de docência e aover expirar o seu período na cadeira VereHarmsworth, Richmond foi eleito pela pró-pria congregação de Cambridge para assu-mir a reitoria do Downing College, um doscolégios da universidade, onde permane-ceria até o seu falecimento.

Esse período como reitor foi um dos maisprodutivos e felizes de sua vida. Entre 1936e 1946 escreveu mais cinco livros, além deopúsculos e artigos para diversas revistas eperiódicos. Além de se realizar como admi-nistrador universitário, Richmond ainda pro-feria inúmeras palestras. Foi agraciado como título de doutorado honorário pela Uni-versidade de Oxford, como membro efetivoda Academia Britânica e membro associadoda Academia de Marinha da França.

Na revista de Cambridge, um dos editoresescreveu o seguinte sobre o reitor Richmond:

Seu charme [de Richmond] e sua afabili-dade demonstraram como ele sabia bemencorajar jovens. Ele levou a sua fun-ção muito seriamente. Sentia-se comoum comandante de navio, preocupadoprimariamente com o bem-estar de toda

115 TREVELYAN, op.cit. p. 12.116 HUNT, op. cit. p. 217.117 RICHMOND, Herbert. Sea Power in Modern World. London: G.Bell & Sons, 1934.

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a tripulação[...] a modéstia de Richmondproduziu uma boa expectativa em ter suacompanhia no campus[...] como chefedo campus acreditava na expressão ‘ban-do de irmãos’118 e provou que essa cren-ça se espalhava por todos.119

Richmond observou com preocupação,nos períodos anteriores à guerra de 1939, orearmamento da Alemanha e a doutrina queprivilegiava unicamente a batalha decisivaentre grandes esquadras, em prol de uma es-tratégia voltada para o ataque às linhas decomunicação. Temia que a Marinha Real nãotivesse cruzadores em número suficiente parase contrapor aos alemães, que iniciavam comafinco a construção de encouraçados demenores dimensões, os chamados “encoura-çados de bolso”, que tinham a missão deatacar o tráfego marítimo. Durante anosRichmond defendera a concepção de se au-mentar o número de cruzadores em detrimen-to dos grandes encouraçados, e isso lhe trou-xera o rancor do Almirantado e seu posteriorafastamento da Marinha.

Em 1937 Richmond lançou o TheNavy120, um livro destinado a compor umasérie de três obras sobre defesa nacionaldestinada a explicar em linguagem simples,para o “homem comum”, a dimensão, o al-cance e a limitação dos diversos setoresgovernamentais ligados à segurança naci-onal. Cada um dos três livros foi escritopor um especialista: o da Força Aérea peloVice-Marechal do Ar E. L. Gossage, o doExército pelo Brigadeiro R. H. Dewing e oda Marinha por Richmond. Nesse livro de

pouco mais de 125 páginas, Richmond fezum sumário da história naval britânica, de-votando uma grande parte para explicar aimportância da Marinha para a defesa doImpério na guerra moderna e na proteçãodas suas linhas de comunicação.

Ao ser deflagrado o conflito em 1939,Richmond se envolveu diretamente no es-forço de guerra, assumindo a função dechefe da junta de recrutamento universitá-rio de Cambridge, selecionando no meiouniversitário jovens que pudessem ser apro-veitados pela Marinha por suas qualifica-ções pessoais. Muitas vezes o Almiranta-do não aproveitava suas sugestões, o queo deixava frustrado, chegando a escrever aseus colegas almirantes que “o Almiranta-do imputa pouco valor ao estudante uni-versitário como um oficial de Marinha empotencial”.121 Isso não o impediu de ser umimportante consultor em assuntos de es-tratégia para esse mesmo Almirantado.Roskill chegou a dizer que, “entre 1939 e1945, Richmond agia como um consultornão oficial da Marinha e, claro, não pagona Divisão de Recrutamento”.122

Ele foi também um crítico ferrenho dobombardeio estratégico contra centros ur-banos, que ele classificava como ataquesterroristas contra a população civil. Consi-derava que nesses bombardeios não exis-tiam alvos estratégicos militares de valia epor isso eram ineficazes e produziam resul-tados políticos devastadores, além de se-rem moralmente reprováveis.123

Em 1940 Richmond sofreu um violentoataque cardíaco que quase o levou à mor-

118 Em inglês ‘band of brothers’, expressão comumente utilizada por Horatio Lord Nelson para designaros seus comandantes de navios.

119 Retirado da Cambridge Review de 25 de janeiro de 1947, escrito por W.L. Cuttle. Fonte: HUNT, op.cit.p. 218.

120 RICHMOND, Herbert. The Navy. London: William Hodge & Co Ltd, 1937.121 HUNT, op.cit. p. 223.122 ROSKILL, The Richmond Lecture. op.cit. p. 145.123 HUNT, op.cit. p. 222.

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te. Embora continuasse escrevendo, seuvigor físico ficou abalado.

Em 1941 ele lançou dois pequenos li-vros. O primeiro foi British Strategy –Military & Economic. A Historical Reviewand its Contemporary Lessons124. O pro-pósito de Richmond com essa obra era dis-cutir um problema estratégico que se apre-sentava ao poder político desde os tem-pos elizabetanos. Como conciliar o podernacional, em suas várias formas, com osarmamentos disponíveis e os esforços pro-vindo de seus aliados? Perguntava de quemaneira poderia a GB melhor empregar seusinstrumentos de combate, juntamente como seu poder econômico e sua posição geo-gráfica, em combinação com as forças mili-tares de seus aliados? Segundo ele, essepoder nacional consistia não somente emforças navais e terrestres de combate, mastambém em suas finanças, seu comércio esua situação geográfica. Dizia que isso nãoera um problema de fácil resolução e quenem sempre o poder nacional se apresen-tava da mesma forma em todos os perío-dos históricos. O tema do livro deveriagravitar, assim, em torno do que ele cha-mou de “guerra econômica”.125

O segundo livro lançado em 1941 foi oThe Invasion of Britain: an account ofplans, attempts & counter-measures from1586 to 1918126, publicado sob os auspí-cios da Associação Histórica Britânica.Nessa pequena obra de apenas 80 pági-nas, ele discutiu as tentativas de invasãodo Reino Unido desde a aventura espa-nhola de 1586 até o final de 1918 e as medi-das tomadas para frustrá-las. Trata-se, as-

sim, de um livro essencialmente de histórianaval para um público não especializado.O interessante é que Richmond utilizou,além de documentação do NRS, livros dereferência de seu grande amigo JulianCorbett, como os seus clássicos SomePrinciples of Maritime Strategy, Drakeand the Tudor Navy, Successors of Drake,England in the Mediterranean, Englandin the Seven Years War, Campaign ofTrafalgar e War of 1914-1918.

Em 1943 Richmond escreveu um livroque seria a ele associado da mesma formaque o The Influence of Sea Power uponHistory estava associado a Alfred Mahan:Statesmen and Sea Power. Essa obra foibaseada em palestras por ele proferidas naUniversidade de Oxford, sob o título dePalestras Ford127 sobre a estratégia britâni-ca desde Elizabeth I. O propósito desse li-vro era apresentar uma ampla ideia dos fun-damentos de estratégia marítima. Nessagrande obra, Richmond contou com o au-xílio inestimável de sua filha Eleonor Faith,por ele chamada de Nora. Arthur Marderafirmou que Statesmen and Seapower foio melhor de seus livros, tendo muitos his-toriadores dito, inclusive, que foi sua obra-prima, uma expansão mais aperfeiçoada desuas palestras originais em Oxford em 1943.O livro é uma investigação penetrante douso do mar pela GB do século XVI até aSegunda Guerra Mundial.128 Robin Highamdisse também:

O melhor trabalho de Richmond veio de-pois de 1940, quando ele produziu seuclássico Statesmen and Seapower, no

124RICHMOND, Herbert. British Strategy. Military & Economic. A Historical Review and its ContemporaryLessons. Cambridge: Cambridge University Press, 1941.

125 Ibidem, p. VIII.126 RICHMOND, Herbert. The Invasion of Britain an account of plans, attempts & counter-measures

from 1586 to 1918. London: Methuen & Co Ltd, 1941.127 Ford Lectures em inglês.128 MARDER, op.cit. p. 41.

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qual, em ampla varredura, procurou edu-car políticos e oficiais de Marinha na fortecorrelação entre a política e a estratégiamilitar.[...] No Statesmen and Seapower,em realidade suas Palestras Ford emOxford, em 1943, Richmond apresentoucom grande clareza o tema que mais tardedesenvolveria no seu inacabado Navy asan Instrument of Policy.129

O Statesmen and Seapower, embora fos-se a sua melhor obra analítica, não devia serlida separada de sua última obra, publicadaapós sua morte, em 1953, com edição doprofessor do Trinity College de Cambridge,E.A Hughes, The Navy as an Instrument ofPolicy, 1558-1727.130. Richmond desejavaescrever a sua principal obra de história eestratégia, conforme seu desejo, e no iníciodos anos 40 principiou a pesquisa do queviria a ser esse livro.

Após o seu falecimento, Lady Richmondchamou o professor Hughes para analisaralgumas páginas escritas por seu marido,nas quais encontrava-se uma nota datadade 1o de março de 1942 definindo o propó-sito dessa nova obra. O seguinte estavaescrito no seu frontispício:

O primeiro volume de minha história traça autilização feita pelos políticos da Marinhacomo instrumento de guerra de Elizabethaté o fim da Guerra do Norte de 1727. Pre-tendo conduzir esse projeto até a últimaguerra de 1918. Então essa guerra veio [de1939] e pelos últimos dois anos eu não te-nho sido capaz de me concentrar na guerrade 1914. Agora tudo está em jogo e se de-pois dessa guerra existir uma Marinha ouse o país se interessar e tomar medidas

para assegurar que o seu povo tenha cons-ciência da importância do poder marítimo eaprendido, não somente por nossa terrívelexperiência, a não prejudicar a Marinhanesses anos fatais desde 1918, mas tam-bém pela longa experiência do passado, eunão posso predizer. Temo que o que ocor-reu anteriormente venha a repetir-se, e quea Nação e o Império, mesmo se sobrevive-rem, repitam o erro com complacência. De-sejo que alguém termine o livro com umsegundo volume, tendo em vista o mesmoobjeto, que é explicar a estratégia de guer-ra, não a pequena estratégia nem a táticanem a explicação detalhada das campanhas,mas sim o esboço do que os ministros que-riam e como suas intenções foram trans-formadas em planos de ação.131

O desejo expresso por Richmond de queo segundo volume fosse completado poroutro historiador não foi figura de retórica.Ele compilou grande quantidade de materi-al primário para futura edição desse volu-me e declinou, com tristeza, de conduziressa empreitada por estar com a saúde aba-lada e por circunstâncias ligadas a outrasatividades, tais como a guerra de 1939. Omaterial estava disponível, e Hughes, oeditor do primeiro volume, no prefácio,concitou os historiadores a se debruçaremsobre ele.132

A documentação por ele utilizada foivasta e detalhada, com ênfase em fartasreferências primárias e ampla bibliografiade apoio. Essa obra foi a que mais lhe to-cou, e infelizmente permanece ainda semum término.

Os dois últimos anos de vida deRichmond foram de muita agonia, pois seu

129 HIGHAM, op.cit. p. 58.130 RICHMOND, Herbert. The Navy as an Instrument of Policy, 1558-1727. Cambridge: Cambridge

University Press, 1953.131 Ibidem, p. I.132 Idem.

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coração falhava constantemente. Isso nãoimpediu que publicasse diversos artigos noNaval Review, no The Times de Londres eno Fortnightly Review. Ele tinha 75 anosquando sofreu novo ataque cardíaco, vin-do a falecer em 15 de dezembro de 1946 esendo cremado em sua querida Universida-de de Cambridge. Na elegia fúnebre, seuamigo íntimo e colega de universidade, pro-fessor George Trevelyan, diria o seguinte:

Em todas as relações de vida, ele[Richmond] era tão perfeito como

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<ARTES MILITARES>; Pensamento militar; Estratégia marítima; Poder naval;

133 TREVELYAN, op.cit. p. 15.134 Nos próximos números da RMB serão discutidas a percepção de história e as concepções políticas e

estratégicas de Richmond.

pode ser um homem, e aqueles queestiveram mais perto dele conheciammelhor o que ele era. Quando a bon-dade e a beleza de caráter, muito su-perior ao que homens comuns podemdemonstrar, estão unidas ao poder damente bem disciplinada, podemosperceber qual altura o homem irmãopode alcançar.133

Morria Sir Herbert William Richmond,um dos mais importantes pensadores bri-tânicos do período entre guerras134.

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O ALARMISMO NUCLEAR*

LEONAM DOS SANTOS GUIMARÃESCapitão de Mar e Guerra (EN-RM1)

SUMÁRIO

O que é alarmismo nuclearOs mitos do alarmismo nuclearO caso do Irã

Etapa 1: DecisãoEtapa 2: Obtenção do material físsilEtapa 3: ArtefatoEtapa 4: MiniaturizaçãoEtapa 5: LançamentoEtapa 6: Alcance

Conclusões

* Este artigo foi publicado em versão resumida no jornal O Globo – 28/07 – pág. 7 – Opinião.

O QUE É ALARMISMO NUCLEAR

Todo alarmismo, seja nuclear, ambiental,político, econômico ou médico, fomenta

o medo irracional. Esta forma de medo é o maiseficaz meio de controle social: sociedades ame-drontadas reagem como manadas. Lembremo-

nos da célebre história do rato que provoca o“estouro” da manada de elefantes.

Em nome da redução de uma ameaça su-perestimada, mil vezes repetida peloalarmismo, as lideranças podem agir livre-mente em busca de outros objetivos, alhei-os à redução da própria ameaça apregoada.

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O ALARMISMO NUCLEAR

Evidentemente não se tem aqui a inten-ção de propagar uma visão cândida dasarmas nucleares. Seu potencial de causarinimaginável devastação está acima dequalquer controvérsia. Esta realidade re-quer que as comunidades técnica, políticae diplomática internacionais pensem de for-ma mais clara e sóbria sobre as causas econsequências da proliferação nuclear.

O mundo era muito mais perigoso nas dé-cadas que se seguiram ao fim da SegundaGuerra Mundial do que é hoje, e os desafioscolocados pelas armas nucleares eram maiscomplexos. Existem importantes lições a se-rem apreendidas da his-tória, principalmenteporque os desafios atu-ais possuem raízes pro-fundas no passado.Para que as políticas denão proliferação tenhamêxito, o entendimento dahistória é vital.

Entretanto, é muitodifícil encontrar umanalista da prolifera-ção nuclear que nãoseja pessimista quan-to ao futuro. Existe um“consenso” de que essa é a mais graveameaça que a comunidade internacional en-frenta, sendo hoje pior do que nunca. Seri-am, portanto, necessárias novas e mais efe-tivas políticas para enfrentar o problema.

Essa corrente considera que esse “terrí-vel mundo novo”, complexo e perigoso, poisbaseado numa ordem multipolar, é muito piorque os “velhos bons tempos” da “mútua des-truição assegurada” (MAD1) entre os Esta-dos Unidos (EUA) e a União das RepúblicasSocialistas Soviéticas (URSS). Tais avaliaçõessão superestimadas e, em alguns casos, sim-

plesmente erradas, decorrendo de um débilou tendencioso entendimento da história.

Essa visão, chamada de “alarmismo nu-clear”, transcende diferenças ideológicas,sendo praticada por todo o espectro políti-co-ideológico.

Seria razoável aceitar o alarmismo nucle-ar como “verdade incontestável” ou comofato “cientificamente comprovado”? Acre-dito que a resposta é não: a argumentaçãode seus promotores é superestimada e, emalguns casos, simplesmente errada, decor-rendo de um débil entendimento da históriada proliferação nuclear, sendo baseada em

quatro mitos.

OS MITOS DOALARMISMONUCLEAR

O primeiro mito éque as ameaças nucle-ares de hoje são novase mais perigosas queas do passado, o quenão suporta uma aná-lise simples: julgar queas crises atuais do Irãe da Coreia do Norte

seriam mais graves e ameaçadoras para ahumanidade do que crises do passado daGuerra Fria, como a dos mísseis de Cuba,do bloqueio de Berlim e a Guerra da Coreia,por exemplo, beira o surrealismo.

O segundo mito é que, diferentemente dehoje, as armas nucleares estabilizaram a polí-tica internacional durante a Guerra Fria. Aanálise histórica, neste caso, mostra contra-dições: há situações em que se poderia con-siderar que elas tiveram efeito estabilizador,mas na maioria das situações elas foram opróprio fator de desestabilização.

1 Mutual Assured Destruction, doutrina estratégica desenvolvida pelos EUA e compartilhada pela URSSdurante a Guerra Fria.

O mundo era muito maisperigoso nas décadas que

se seguiram ao fim daSegunda Guerra Mundial

do que é hoje, e os desafioscolocados pelas armasnucleares eram mais

complexos

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O ALARMISMO NUCLEAR

O terceiro mito mescla a história da corri-da armamentista nuclear com a competiçãoideológica e geopolítica entre os EUA e aURSS, criando um retrato supersimplificadoe distorcido da Guerra Fria.

O quarto mito é que a rivalidade militarbipolar durante a Guerra Fria era a únicamotivação da proliferação nuclear nas dé-cadas que se seguiram ao fim da SegundaGuerra Mundial. Aopropagar esse mito, osalarmistas nuclearesignoram ou subesti-mam outras importan-tes motivações, taiscomo a descoloniza-ção, questões sobre ostatus político da Ale-manha pós-guerra eproblemas de segu-rança regional.

Denunciar o alar-mismo nuclear certa-mente não implica ar-gumentar a favor da“bomba pacífica”, istoé, defender a bombacomo instrumentopara alcançar a paz, oque seria aceitar o se-gundo mito, menosainda não considerar anão proliferação nu-clear um importantedesafio político-diplomático.

Entretanto, pela reação desproporcionalaos perigos atuais e pela descaracterizaçãodos perigos do passado, os alarmistas nu-cleares provocam políticas ineficazes, quepodem ameaçar a estabilidade internacionalhoje e no futuro.

Caso típico desta postura pode ser ve-rificado pelos alarmes soados por diver-

sos analistas que têm repetidamente de-clarado que o Irã estaria hoje (julho de 2010)a um passo de obter armas nucleares. Naverdade, é muito mais difícil construir umaarma nuclear do que a maioria dos especia-listas supõe.

O CASO DO IRÃ

Por exemplo, em 27de junho de 2010, o di-retor da Central Intelli-gence Agency (CIA),Leon Panetta, estimouque o Irã levaria cercade dois anos paraconstruir uma bombanuclear, se tomasse adecisão de fazê-la. OWall Street Journal,com base em sua de-claração, alertou histe-ricamente em 29 de ju-nho seguinte que “oIrã está a apenas doisanos de uma bombaatômica, que poderiaatingir Israel, Europae além”2.

A estimativa dePanetta inclina-se parao pior cenário, no qualo processo de produ-ção de armas transcor-

reria de forma perfeita. As melhores avalia-ções de peritos indicam, entretanto, que se-ria realmente necessário ao Irã de três a cincoanos para desenvolver uma arma nuclear.

Veja como esse processo provavelmen-te se desdobra e as razões pelas quais nãoé provável que aconteça dentro docronograma que os alarmistas querem fa-zer crer.

2 http://online.wsj.com/article/SB10001424052748703964104575335242943136462.html

Denunciar o alarmismonuclear certamente não

implica argumentar a favorda “bomba pacífica”

Pela reação

desproporcional aosperigos atuais e pela

descaracterização dosperigos do passado, osalarmistas nuclearesprovocam políticas

ineficazes, que podemameaçar a estabilidade

internacional

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Etapa 1: Decisão

O Irã está certamente se movendo no sen-tido de adquirir a tecnologia que lhe permitafazer uma arma, mas não é claro se a decisãode produzir armas nucleares já foi tomada. Oregime islâmico deve ponderar os custos polí-ticos e de segurança para desenvolver armasnucleares antes de avançar neste sentido.

O Irã pode decidir, como o Japão e aAlemanha, que suas necessidades sãomais bem atendidas por aproximar-se dolimiar da construção de uma bomba (ad-quirir a capacidade técnica e o know-how),mas na verdade não cruzar esta linha e cor-rer o risco de uma corrida armamentistaentre os seus rivais ou um pré-ataque pre-ventivo dos Estados Unidos ou Israel.

Ninguém sabe se o Irã já tomou esta deci-são, sendo de seu interesse estratégico man-ter essa ambiguidade como fator de dissuasão.

Etapa 2: Obtenção do material físsil

Se o Irã tomar a decisão, ele deverá acu-mular uma quantidade suficiente do ele-mento indispensável para o núcleo da bom-ba: urânio altamente enriquecido (HighlyEnriched Uranium – HEU) ou plutônioweapon grade (com baixos teores deisótopos superiores ao Pu-239).

O Irã está buscando caminhos para a pro-dução de ambos, embora sua capacidade deenriquecimento de urânio esteja muito à fren-te do seu programa de reprocessamento decombustível nuclear de reatores de pesqui-sa para extração de plutônio.

Existem duas formas para o Irã produzirurânio altamente enriquecido, isto é, o urâ-nio com mais de 90% do isótopo U-235.

A primeira seria usando suas centrífugasna usina de Natanz. A partir do urânio natu-ral, composto de 0,07% de U-235, este mate-rial seria enriquecido até o nível requeridopara armas. Esta seria uma flagrante viola-ção das suas obrigações decorrentes doTratado de Não Proliferação Nuclear (TNP).

Caso o Irã opte por esse caminho, teria deretirar-se do tratado e expulsar os inspetoresinternacionais. Operando Natanz a plena car-ga, o Irã levaria cerca de um ano para enri-quecer urânio suficiente para uma bomba.

Mais provavelmente, o Irã poderia conti-nuar o seu caminho atual de aumentar seuestoque de urânio de baixo enriquecimento(até 3-5% U-235), afirmando que seria parafins pacíficos. Em algum momento, o Irã po-deria, então, abandonar o TNP, expulsar osinspetores e levar esse urânio de volta àscentrífugas para enriquecê-lo a níveis maiselevados. Por esse caminho, poderia ser pro-duzido o equivalente a uma bomba de urânioaltamente enriquecido em três a seis meses3.A estima de Panetta4 considera que, usandoeste caminho, o Irã poderia ter HEU suficien-te para construir duas bombas em um ano.

Ainda assim, dificuldades tecnológicaspodem prolongar o processo: O número decentrífugas iranianas em operação tem dimi-nuído desde meados de 20095. Embora o Irãcontinue a instalar centrífugas, quase milcentrífugas a menos do que em maio de 2009estão em operação atualmente6 (julho 2010).

Recentemente o Irã tem enriquecido urâ-nio a cerca de 20%, supostamente para serusado como combustível para seu reator depesquisas. Se o Irã acumular suficiente urânioenriquecido a 20%, sabendo-se que já haviaproduzido 11 kg ao final de maio de 20107, ouso desse material permitirá produzir urânio

3 Joint Threat Assessment http://docs.ewi.info/JTA.pdf4 http://abcnews.go.com/ThisWeek/week-transcript-panetta/story?id=11025299&page=35 Institute for Science and International Security http://isis-online.org/isis-reports/detail/irans-gas-

centrifuge-program-taking-stock/86 Institute for Science and International Security, http://isis-online.org/uploads/isis-reports/images/trends-4.jpg

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O ALARMISMO NUCLEAR

altamente enriquecido ao nível adequado parauma arma ainda mais rapidamente.

Em todo caso, seriam necessários seis me-ses adicionais para transformar o urânio alta-mente enriquecido de sua forma de hexafluoreto,usada para o enriquecimento, para a forma me-tálica, para uso em uma bomba8.

Etapa 3: Artefato

O caminho técnico para uma bomba nãotermina com a obtenção de HEU. Produzirum artefato nuclear rudimentar levaria maisum ano, assumindo que o Irã tem um proje-to de engenharia adequado e os necessári-os componentes para construí-lo. Entretan-to, o salto para uma ogiva nuclear sofisti-cada, que poderia ser usada na cabeça decombate de um míssil, poderia requerer umtempo adicional de dois a cinco anos.

Durante este período, o Irã precisaria fa-bricar os componentes não nucleares doartefato, testá-los e aperfeiçoá-los para, fi-nalmente, realizar um ou mais testes nuclea-res explosivos. As soluções dos problemastécnicos para o desenvolvimento dos com-ponentes não nucleares poderiam passardespercebidas, mas o sensoriamento globalestabelecido pela CTBTO9 seria capaz dedetectar qualquer teste de explosivo, certa-mente levando a um enorme recrudescimen-to da pressão sobre o Irã.

Isto significa que uma arma taticamenteútil tomaria outros dois ou três anos, pro-vavelmente até cinco10.

Etapa 4: Miniaturização

O Irã poderia produzir um artefato rudi-mentar muito pesado, transportável por ca-

minhão, cerca de um ano após ter produzi-do o HEU necessário. Este artefato, entre-tanto, apesar de útil como uma arma, seriademasiado grande e pesado para embarcarem aviões ou mísseis de suas forças arma-das, que não podem carregar uma arma quepese mais de 1.000 kg.

Uma arma menor, mais sofisticada, serianecessária se o Irã pretendesse desenvol-ver uma dissuasão nuclear confiável. En-tretanto, não é possível “encolher” um ar-tefato para a forma de uma ogiva nuclear,resistente às condições operacionais ad-versas, da noite para o dia.

A miniaturização e militarização de umaogiva nuclear é provavelmente o desafiomais difícil que qualquer candidato à proli-feração tem que enfrentar11. As ogivasembarcadas nos primeiros mísseis balísticosintercontinentais (ICBM) estavam na faixade 4.000-5.000 kg. Isso foi o melhor que ame-ricanos e soviéticos puderam fazer quandocomeçaram. Só depois de seis a oito anosde intensos esforços de pesquisa, desen-volvimento e engenharia foi possível redu-zir as ogivas a menos de 1.000 kg.

Etapa 5: Lançamento

O Irã também teria que desenvolver umveículo de reentrada (reentry vehicle – RV)para a sua ogiva. Um míssil balístico segueuma trajetória parabólica. Após a ascen-são propelida por motores e um curto traje-to através do espaço exterior, o RV, libera-do dos motores, deve reentrar na atmosfe-ra para atingir seu alvo.

O RV deve, portanto, ser resistente osuficiente para sobreviver a condições ex-

7 Institute for Science and International Security http://isis-online.org/isis-reports/detail/taking-stock-of-the-production-of-19.75-percent-uranium-at-the-pfep/

8 Joint Threat Assessment http://docs.ewi.info/JTA.pdf9 Comprehensive Nuclear-Test-Ban Treaty Organization http://www.ctbto.org/10 Vice chairman of the Joint Chiefs of Staff, Gen. James Cartwright http://armed-services.senate.gov/

testimony.cfm?wit_id=9319&id=450611 Gen. Eugene Habiger http://carnegieendowment.org/files/Habiger.pdf

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O ALARMISMO NUCLEAR

tremas, que ele encontra ao longo da traje-tória de voo, e desenvolver esta tecnologianão é tarefa fácil. Uma coisa é testar umaarma nuclear em condições cuidadosamen-te controladas. Outra, bem diferente, é cons-truir uma arma que possa resistir a fortesvibrações, às forças dinâmicas de acelera-ção e desaceleração (elevadas forças G) eàs altas temperaturas do lançamento e dereentrada na atmosfera. O Irã não tem de-monstrado possuir capacidade de construiresse RV até o momento.

Etapa 6: Alcance

Atualmente, osmísseis balísticos ira-nianos podem atingiralvos a não mais de1.600 km de suas fron-teiras, carregando ca-beças de combateque não pesam maisde 750 kg. Isso seriasuficiente para atingirapenas os vizinhosmais próximos.

O Irã não seria ca-paz de desenvolvermísseis de longo alcance capazes de atin-gir a Europa Ocidental, a cerca de 3.700 kmde distância, antes de 2014 ou 201512. Paradesenvolver um míssil capaz de atingir osEstados Unidos, que estão a 9.000 km dedistância, seria necessário primeiro testarum míssil de alcance intermediário. Ou seja,um míssil iraniano com alcance interconti-nental seria algo somente imaginável no

horizonte de pelo menos uma década dedesenvolvimento.

O Irã poderia acelerar este cronogramase recebesse ajuda externa. Com tal ajuda,seria possível desenvolver um míssilbalístico intercontinental capaz de atingir osEstados Unidos até 201513. No entanto, oMTCR14, os contínuos esforços para isolaro Irã15 e o trabalho diplomático junto às po-tenciais fontes de ajuda externa, incluindoRússia e China, para restringir a dissemina-ção de tecnologias relacionadas a armas nu-cleares e mísseis reduzem em muito a proba-bilidade de que essa assistência venha a se

concretizar.Com um cronogra-

ma nuclear do Irã tãofluido, é crucial nãoreagir em pânico combase numa falsa sen-sação de urgência.Uma resposta militar,em particular, poderiater graves conse-quências, ao não ofe-recer uma solução delongo prazo para oproblema, já que farianada mais do que ga-

nhar tempo. As estimativas são de que umataque às suas instalações nucleares atra-saria o Irã em um a três anos16, além de serum forte incentivo para tomar a decisão ini-cial e vencer as etapas seguintes acima des-critas, de ter um efeito incrivelmentedesestabilizador para toda a região e deaumentar o apoio político interno para o

12 International Institute for Strategic Studies http://www.iiss.org/publications/strategic-dossiers/irans-ballistic-missile-capabilities/

13 http://www.armscontrolwonk.com/2707/iranian-icbm-by-201514 Missile Technology Control Regime http://www.mtcr.info/15 http://wonkroom.thinkprogress.org/2010/06/07/isolating-iran-cannot-be-done-unilaterally/16 Secretário de Defesa americano Robert Gates, em setembro de 2009, http://edition.cnn.com/2009/

POLITICS/09/27/us.iran/index.html

O Irã tem um longo epenoso caminho a

percorrer: não se esquecerdisso é a melhor maneira

de desenvolver umaresposta comedida àsambições nucleares da

República Islâmica

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O ALARMISMO NUCLEAR

regime atual, até mesmo no seio do Movi-mento Verde, de oposição17.

Então, da próxima vez que ouvirmos umcomentarista dizendo que o Irã está à beirade conseguir armas nucleares, não entre-mos em pânico. Entretanto, como na histó-ria de “Pedro e o Lobo”, eventualmente osespecialistas poderãoum dia vir a estar cer-tos. Por enquanto, po-rém, o Irã tem um lon-go e penoso caminhoa percorrer: não se es-quecer disso é a me-lhor maneira de desen-volver uma respostacomedida às ambiçõesnucleares da Repúbli-ca Islâmica.

CONCLUSÕES

O alarmismo nuclear não é uma estraté-gia: as ameaças não são novas ou maisperigosas do que as do passado, e igno-rar a continuidade e as lições do passadoé uma postura irresponsável, ou com se-gundas intenções. Entender a história daproliferação e, em particular, como e por

que a humanidade escapou da calamida-de durante tempos muito mais perigososdiante dos implacáveis e poderosos ad-versários da Guerra Fria é mais importantedo que nunca.

A adoção de posturas alinhadas com oalarmismo nuclear por políticos de alto nível,

evidentemente bem pre-parados e bem informa-dos, induz à suspeita deque existem outros ob-jetivos e interesses“pegando carona” nanão proliferação.

A evidente e nãoexplicada contradiçãoentre a carta de Obamaa Lula antes de sua vi-agem a Teerã e a rea-ção da secretária deEstado americana

Hillary Clinton à declaração conjunta Bra-sil-Turquia-Irã são claras evidências de quea disputa entre “falcões”, militantes doalarmismo nuclear que levaram à invasãodo Iraque, e “pombos”, cuja expectativade ascensão ao poder propiciou o PrêmioNobel da paz ao presidente americano, con-tinua muito viva.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<GUERRAS> Guerra nuclear; Política nuclear; Relações internacionais;

As ameaças não são novasou mais perigosas do queas do passado, e ignorar acontinuidade e as lições do

passado é uma posturairresponsável, ou com

segundas intenções

17 Joint Chiefs of Staff, Alte. Mike Mullen. http://www.washingtonpost.com/wp-dyn/content/article/2010/06/28/AR2010062805241.html

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Informações:(0xx-21)

2233-9165

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A orquestra tocava animada. Belas mulheres desfilavam pelosalão, ostentando vestidos suntuosos. Os homens, trajando casacasou elegantes uniformes, falavam sobre política, histórias de guerra,batalhas navais. Lá fora, o som das ondas do mar complementavaos acordes dos violinos. O cenário era perfeito. A Ilha Fiscal,construída com requinte para servir como posto alfandegário, recebiacom pompa a oficialidade do encouraçado chileno AlmiranteCochrane.

Ninguém poderia imaginar que aquele seria o “Último Baile doImpério”. Alguns dias depois, era proclamada a República. Umanova era na História do Brasil se iniciava.

A Ilha Fiscal continua sendo um elo entre o presente e o passado.Em 1913 foi adquirida pela Marinha em troca do Vapor Andrada.Décadas se passaram e o castelinho, que testemunhou tantos fatoshistóricos, é hoje uma das principais atrações turísticas do Rio deJaneiro. Aberto à visitação, inclui em seu roteiro o Torreão, a Ala doCerimonial e exposições permanentes. Venha conhecer este símbolodos últimos dias do Império, e muito mais, como a participação e osprojetos da Marinha na Antártida!

O Último Baile da Ilha Fiscal

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SUMÁRIO

Forças presentes no Corno da ÁfricaA OtanA Marinha portuguesa no Corno da ÁfricaA EunavforOutras forças navais presentes

Os números de 2009A Somália. Puntland é o epicentro da piratariaA sorte dos piratas está mudando

VOLTE-FACE NA PIRATARIA MARÍTIMA*

HENRIQUE PEYROTEO PORTELA GUEDESCapitão de Fragata da Marinha de Portugal

Vivemos num planeta onde cerca de71% da sua superfície é água. Uma tão

vasta área de oceanos e mares catapultounaturalmente o comércio global para o mar,via de comunicação mais acessível, menosonerosa e sem fronteiras. Ao longo da histó-ria, o comércio marítimo tem crescido, che-gando hoje de forma contínua a todos oscantos do planeta. O mundo tornou-se, as-

sim, menor. Consequentemente, todos osgrandes operadores logísticos internacionaispassaram a utilizar o mar para as suas trocascomerciais. Este permanente aumento da in-dústria marítima, que é hoje responsável porcerca de 90% do comércio mundial, fez des-pertar, com uma nova face, uma atividade ilí-cita com séculos de existência: a piratariamarítima.

* N.R.: Título original enviado pelo autor, com o termo volte-face, de uso consagrado em Portugal, quesignifica reviravolta, meia-volta, contravolta, volta-face ou vira-face.

Autor do artigo “Pirataria marítima – Uma ameaça em escala global”, publicado na RMB do 4o

trimestre/2008, p. 159-170.

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VOLTE-FACE NA PIRATARIA MARÍTIMA

Quando nada o fazia prever, em pleno sé-culo XXI o mundo acordou para uma novarealidade: a mídia, em meados de 2008, come-çou a divulgar insistentemente um grandenúmero de ataques bem-sucedidos à nave-gação mercante perpetrados por piratassomalis no Golfo de Aden e na bacia daSomália, ou seja, na região do Corno da Áfri-ca. A comunidade internacional ficou aindamais estupefata quando começaram a serconhecidos os montantes envolvidos nosresgates dos navios sequestrados, assimcomo quando teve conhecimento da impuni-dade de que gozavam, à luz do direito internodos Estados e do Direito Internacional, to-dos aqueles que praticavam este tipo de atoilícito. Perante uma situação de contornostão complexos, distante e tão imprevisível,quer no espaço quer no tempo, os paísescom maiores interesses comerciais a defen-der viram-se obrigados a atuar de forma aminimizar esta nova ameaça ao seu comércioexterno. Optaram, assim, pela solução maissimples e exequível: a colocação dos seusnavios de guerra na região mais crítica doglobo no que diz respeito à pirataria, o Cornoda África. Surge, dessa forma, nessa área doglobo um conjunto de forças navais, cujoquantitativo de navios ronda a meia centena,apoiadas por vários aviões de patrulha marí-tima e veículos aéreos não tripulados. Infeliz-mente, e o tempo assim o tem demonstrado,esta presença naval não tem sido mais doque um mero paliativo para a atual situaçãoque se vive nesta região.

FORÇAS PRESENTES NO CORNODA ÁFRICA

A Otan

A Organização do Tratado do AtlânticoNorte (Otan) efetuou a sua primeira opera-ção, designada por Allied Provider, nestaregião do globo entre outubro e dezembro

de 2008. Foi levada a cabo pela StandingNato Maritime Group 2 (SNMG2) e permi-tiu assegurar a entrega de cerca de 30 miltoneladas de ajuda humanitária.

Na sequência desta operação, e comoforma de demonstrar o seu contributo parao esforço que a comunidade internacionalefetuava em prol do combate à pirataria noCorno da África, a Otan levou a cabo nessaregião, de março a agosto de 2009, a Opera-ção Allied Protector, da qual participaram,alternadamente, a SNMG1 e a SNMG2. Pornorma, esses dois grupos de navios da Otancostumam atuar no Oceano Atlântico e noMar Mediterrâneo, nas mais diversas mis-sões e nos mais variados cenários, quer emsituações de paz quer de crise e conflito. Asua atual presença permanente no Mar Ará-bico espelha bem a importância que a Otandá a esta ameaça ao comércio global.

Atualmente, e desde 17 de agosto de 2009,acontece a Operação Ocean Shield, sucedâ-nea da Allied Protector, que tem contado deforma alternada com a presença da SNMG1 eda SNMG2. Esta tem decorrido sob a respon-sabilidade do Joint Command Lisbon, emPortugal, e o seu controle tático do dia a diaestá atribuído ao Allied Maritime ComponentCommand, em Northwood, no Reino Unido.A Otan tem se mantido, assim, empenhadana dissuasão das atividades de pirataria, naproteção da navegação mercante contra estetipo de atos ilícitos e, ainda, na escolta denavios mercantes do Programa AlimentarMundial, que asseguram ajuda alimentar àspopulações deslocadas da Somália. Em 1o dejulho de 2010 (data em que este artigo foiescrito), a força da Otan presente nessa re-gião era a SNMG2 – o seu navio-capitânia oHNLMS De Zeven Provinciën, da Marinhaholandesa, e o comando desta era assegura-do pelo Comodoro holandês MichielHijmans, embarcado neste navio.

A Otan já assumiu publicamente que iráse manter nessa região até ao final de 2012.

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VOLTE-FACE NA PIRATARIA MARÍTIMA

A Marinha portuguesa no Corno daÁfrica

A Marinha portuguesa teve um papel derelevo na Otan durante o ano de 2009, pois,além de ter exercido o comando da SNMG1,esteve presente na luta contra a pirataria ma-rítima no Corno da África, com duas das suasmais importantes unidades navais. Primeirocom a Fragata N.R.P. Corte-Real e posterior-mente com a N.R.P. Álvares Cabral, a Mari-nha portuguesa marcou a sua presença noGolfo de Aden e na Bacia da Somália, respec-tivamente nas operações Allied Protector, de24 de março a 29 de junho de 2009, e OceanShield, de 9 de novembro de 2009 a 25 dejaneiro de 2010. Esses dois meios navais es-tiveram integrados na SNMG1, cujo coman-do esteve a cargo do Contra-Almirante por-tuguês José Domingos Pereira da Cunha, quetomou posse em El Ferrol (Espanha) em 23 dejaneiro de 2009 e que encerrou suas funçõesem 25 de janeiro de 2010, em Muscat (Oman).

As fragatas portuguesas, durante a suaestadia no Corno da África, estiveram en-volvidas nas mais diversas missões, dasquais se destacam a escolta a navios mer-cantes de elevado risco, ao longo do corre-dor de tráfego marítimo internacional reco-mendado1 (IRTC), no Golfo de Aden; a pa-trulha das águas deste golfo e da Bacia daSomália; e, ainda, a escolta a navios do Pro-grama Alimentar Mundial da Organizaçãodas Nações Unidas (ONU). No decurso des-sas missões, por diversas vezes os naviosportugueses foram chamados a atuar, querpara fazerem face a situações reais de tenta-tiva de sequestro de navios mercantes querpara salvaguardar a vida humana no mar,tendo sempre correspondido com interven-ções dignas de registro, pela forma brilhan-te como foram levadas a cabo. Realça-seaqui, no caso da Fragata Corte-Real, a sua

presença em duas ações bem-sucedidaspara evitar a tentativa de sequestro aos na-vios M/V Kition e M/V Maersk Phoenix,respectivamente nos dias 1o de maio e 22 dejunho de 2009, e, ainda, a assistência huma-nitária prestada à Dhow Vishvakalyan, em13 de junho de 2009. Por outro lado, a Fraga-ta Álvares Cabral também levou a cabo,com sucesso, as ações para evitar os possí-veis sequestros a uma dhow e ao navio depesca espanhol F/V Ortube Berria, respec-tivamente em 19 e 29 de novembro de 2009.

Equipe da Corte-Real no navio pirata,em 1o de maio (Foto: Corte-Real)

1 Do inglês International Recommended Transit Corridor (IRTC).

A Eunavfor

A European Union Naval Force (Eunavfor)está realizando, nas águas do Golfo de Adene da Bacia da Somália, a Operação Atalanta.Esta é a primeira do gênero conduzida pelaUnião Europeia, no âmbito da PolíticaEuropeia de Segurança e de Defesa. Foilançada formalmente no dia 9 de dezembrode 2008, por um período de 12 meses; contu-do, em 15 de junho de 2009, o Conselho daUnião Europeia decidiu alargar esta missãopor mais um ano, a contar de 13 de dezembrode 2009. A sua principal atividade tem sido ocombate à pirataria ao largo da costa daSomália. Esta tem tido como suporte legal ascondições fixadas pelo Direito Internacionalaplicável, nomeadamente a Convenção das

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VOLTE-FACE NA PIRATARIA MARÍTIMA

Nações Unidas sobre o Direito do Mar e asResoluções 1.814 (2008), 1.816 (2008), 1.838(2008) e 1.846 (2008) do Conselho de Segu-rança das Nações Unidas.

O seu comando operacional em terra é exer-cido pelo Major-General inglês Buster HowesObe, no Quartel-General da Otan, emNorthwood. Atualmente, o comando da for-ça no mar está entregue ao Contra-Almirantesueco Jan Thörnqvist, embarcado no HMSCarlskrona. Este comando começou por serassegurado inicialmente pelo comodoroAntonios Papaioannou, da Marinha grega;posteriormente pelo Capitão de Mar e GuerraJuan Garat Caramé, da Marinha espanhola; epor último pelo Contra-Almirante italiano Gio-vanni Gumiero.

A Eunavfor temcontado também, alémdos navios que for-mam a Combined TaskForce 465 (CTF 465),com o apoio de aero-naves de patrulha marítima de países comoa França, a Suécia, a Espanha, a Alemanha,Luxemburgo e Portugal.

Outras forças navais presentes

Nesta região, e desde 8 de janeiro de 2009,estão também presentes os navios daCombined Task Force 151 (CTF 151),estabelecida especificamente para operaçõesde luta antipirataria. Esta CTF tem sido com-posta por navios de diversas nações – EUA,Reino Unido, Turquia, Coreia do Sul eCingapura, entre outras – e tem operado nor-malmente no Golfo de Aden, no Mar Arábico,no Oceano Índico e no Mar Vermelho. Atual-mente, o comando desta força está a cargo,desde 21 de abril de 2010, do Contra-Almiran-

te Lee Beom-Rim, da Coreia do Sul. A CTF 151pertence às Combined Maritime Forces, quepatrulham mais de 2,5 milhões de milhas náuti-cas quadradas de águas internacionais, e quetêm como missão o combate ao terrorismo, aprevenção da pirataria e a redução do tráficoilegal de pessoas e de droga.

Além das forças da Otan, da Eunavfor e daCTF 151, existem ainda vários países que têmdado o seu contributo nesta árdua tarefa decombater a pirataria marítima nas costas daSomália, lá colocando forças navais e unida-des isoladas. Ainda estão, ou já estiveram, pre-sentes nesta região navios de países, comoAustrália, China, Coreia do Sul, Índia, Japão,

Malásia, Rússia e Cin-gapura, entre outros.

OS NÚMEROS DE2009

No ano passado,segundo o IMB2, regis-traram-se 406 atos depirataria em todo o

mundo. Destes, 202 (49,8%) resultaram emataques consumados, enquanto os restan-tes 204 ficaram apenas na tentativa. Apesarde o número de ilícitos do ano passado tersido o mais elevado desde 2003 (445), aindafoi inferior ao valor registrado em 2000 (469),ano em que houve o maior número de ocor-rências nas últimas duas décadas. Dos 406ilícitos registrados, 131 (32,3%) tiveram lugarno Golfo de Aden e no Mar Vermelho, 80(19,7%) na Bacia da Somália e 28 (6,9%) naNigéria; ou seja, em apenas três locais a nívelmundial ocorreram cerca de 58,9% do totaldesses atos. É de salientar o fato de todosestes lugares se situarem no continente afri-cano. Ao contrário do que muitos possampensar, os ataques de pirataria não se dão

2 O International Maritime Bureau (IMB) foi estabelecido pela International Chamber of Commerce, queé uma organização internacional fundada em 1919 e que trabalha para promover e suportar ocomércio internacional e a globalização.

No ano passado, segundoo IMB, registraram-se406 atos de pirataria em

todo o mundo

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VOLTE-FACE NA PIRATARIA MARÍTIMA

apenas com os navios que estão navegan-do: dos 202 ataques consumados, 101 (50%)tiveram lugar com os navios fundeados e 16(7,9%) com estes atracados, o que perfaz 117(57,9%) ataques consumados nestas duasúltimas condições, tendo os restantes 85 ocor-rido em navios em movimento.

É de salientar que, neste último ano, ospiratas somalis ampliaram a sua área de atua-ção, havendo já ataques destes ao largo doQuênia, Tanzânia, Seychelles e Madagascar,entre outras áreas do Oceano Índico. O ata-que mais distante de terra, até o presente mo-mento, registrou-se a cerca de 1.050 milhasnáuticas a leste de Mogadíscio, na Somália,no dia 11 de novembro de 2009, e dele resultouo sequestro do Navio Graneleiro M/V Filitsa,de bandeira das Ilhas Marshall. O IMB, nassuas recomendações à navegação no que dizrespeito à pirataria, sugere aos armadores queos seus navios naveguem para além das 600milhas náuticas da costa leste da Somália.

A SOMÁLIA. PUNTLAND É OEPICENTRO DA PIRATARIA

A Somália encontra-se geograficamen-te localizada no nordeste do continenteafricano, na região denominada Corno daÁfrica, e possui uma costa com uma exten-são de aproximadamente 3.025 km. As cos-tas norte e leste deste país são banhadas,respectivamente, pelas águas do Golfo deAden e do Oceano Índico, passando pelasprimeiras toda a navegação que vem ouvai para o Canal de Suez e pelas segundastodo o tráfego marítimo que vem ou vaipara o Cabo da Boa Esperança.

Este país tornou-se independente em 1o

de julho de 1960, tendo o seu último governoefetivo, chefiado pelo General MuhammadSiad Barre, caído em 1991. A partir daqueleano, a Somália transformou-se num Estado

falido, essencialmente devido à ausência deum governo efetivo, às instituições públicasterem cessado funções e às Forças Armadasterem sido dissolvidas. A anarquia impera emquase todo o país, com exceção para duaszonas: Somaliland, a noroeste, e Puntland, anordeste, onde ainda existem alguns resquí-cios de lei e ordem. Ultimamente, a governaçãoda Somália tem sido assegurada por um Go-verno Federal de Transição3, estabelecido emoutubro de 2004 em Mombaça, no Quênia.

A sua atual população ronda os 10 milhõesde habitantes, essencialmente agrupados emcinco grandes famílias de clãs (Hawiye, Isaak,Darod, Rahanwein e Dir), que por sua vez sesubdividem em dezenas de subclãs. Esse paísapresenta uma das maiores taxas anuais denatalidade do mundo, que se estima em 44nascimentos por cada mil habitantes; em mé-dia, cada mulher somali tem entre seis e setefilhos. A população da Somália é consideradajovem, sendo a sua média de idade de 17 anose a sua expectativa de vida de 50 anos.

Na Somália existem várias células ativas depirataria marítima, que colaboram entre si. Cadacélula é normalmente constituída por elemen-tos do mesmo clã. Considera-se que oepicentro da pirataria está localizado na regiãode Puntland e que envolve elementos das maisdiversas áreas da sociedade local, como, porexemplo, membros do governo e das forças desegurança. Os grupos mais importantes e maisprofissionais estão localizados nos distritosde Mudug e Nugaal, situados a sul dePuntland, e operam a partir de Xarardheere,Hobyo, Garacad e Eyl. Na parte norte dePuntland, no distrito de Bari, também existemalguns grupos de piratas ativos, que operam apartir de Boosaaso e Caluula; no entanto, es-ses grupos não se dedicam com exclusividadeà pirataria marítima, estando normalmente en-volvidos também no narcotráfico e tráfico de

3 O atual presidente é o Sheikh Sharif Sheikh Ahmed, desde 31 de janeiro de 2009, e o primeiro-ministroé Omar Abdirashid Ali Sharmarke, desde 13 de fevereiro de 2009.

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pessoas. Os piratas da região de Mudug per-tencem normalmente ao clã Hawiye e atuamna Bacia da Somália, partindo de Xarardheere,Hobyo e Garacad, e levam normalmente osnavios sequestrados para perto de Hobyo.Os piratas dos distritos de Nugaal e Bari per-tencem normalmente ao clã Darod e atuam pre-dominantemente na re-gião do Golfo de Aden,partindo de Eyl,Boosaaso e Caluula, etrazem também os navi-os sequestrados para acosta leste, entre Eyl eGaracad.

Com tantos gruposde piratas ativos, umaredução no número deatos de pirataria na re-gião do Corno da África só será possível se ospaíses que circundam o Golfo de Aden arran-jarem os mecanismos necessários para faze-rem exercer a sua autoridade do Estado nomar. No entanto, e como complemento a essesmecanismos, é indubitavelmente necessário

que a Somália, país de onde provêm a maioriados piratas que atuam nesta região, deixe deser um Estado falido, ou seja, que volte a terum governo efetivo e que as suas instituiçõespúblicas voltem a ser uma realidade. Estedesiderato, para ser conseguido, terá que con-tar sempre com uma conjugação de esforços anível internacional, pois de outra forma, aten-dendo aos parcos recursos atuais desse país,será sempre uma missão impossível.

A SORTE DOS PIRATAS ESTÁMUDANDO

O estado de graça, que tem sido apanágiodos piratas somalis nos últimos anos, poderáestar mudando, ainda que muito paulatinamen-te. Apesar de, no que respeita aos aspectoslegais, pouco se ter avançado nos últimos tem-pos, no mar a atitude das forças internacio-nais tem mudado ligeiramente desde o iníciodo presente ano. Até ao final do ano de 2009,a imagem passada pela mídia, e que no fundocorrespondia à realidade do que se passavano Golfo de Aden e na Bacia da Somália, era adas forças navais tratando bem demais ospresumíveis piratas. Estas confiscavam-lhes

apenas as armas e as es-cadas utilizadas por es-tes nos seus ataques,isto quando as equipesde boarding chegavamàs suas skiffs ou dhowsa tempo de o fazer, poisna maioria das vezes jáesse material tinha sidolançado ao mar, para quenão ficassem quaisquervestígios da real inten-

ção dos ocupantes dessas embarcações. Quan-do os presumíveis piratas eram apanhados, oprocedimento mais habitual era o de os enviarpara terra em liberdade e segurança, nas suaspróprias embarcações, fornecendo-lhes águae víveres, sempre que necessário, para que

Mapa da Somália

A pirataria envolveelementos das mais diversas

áreas da sociedade local,como, por exemplo,

membros do governo e dasforças de segurança

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estes pudessem regressar sãos e salvos, logocom todas as condições para poderem efetuarnovos atos de pirataria no futuro. No entanto,os últimos meses têm mostrado uma realidadebem diferente, ou seja, as forças navais, emgeral, mudaram a sua atitude no que diz res-peito ao seu comportamento para com ospresumíveis piratas. Por exemplo, no dia 28 defevereiro último, o então navio-chefe do gru-po SNMG1 da Otan, o HDMS Absalon, daDinamarca, afundou um “navio-mãe” carre-gado com equipamentos e provisões para ospiratas, após a sua saída de um conhecidoporto na costa leste da Somália. Não haviatripulação a bordo deste navio, o que antevêque os piratas o possam ter abandonado, fu-gindo numa lancha rápida, com a aproximaçãodas forças militares. Na noite do dia 1o para odia 2 de março, o HDMS Absalon localizou eafundou mais dois “navios-mãe” carregadosde equipamentos e mantimentos. No dia 17 demarço, o navio de guerra italiano ITS Scirocco,após monitorizar durante dois dias consecuti-vos o pequeno navio de carga iraniano M/V

Saad14, que havia largado do porto deGaracad, na Somália, e que estava sendo utili-zado como “navio-mãe”, com a sua própriatripulação a bordo, forçou-o a voltar para jun-to da costa. Os presumíveis piratas que seencontravam a bordo, sentindo-se ameaçados,resolveram abandonar o navio, tendo esteaproveitado a oportunidade para seguir emliberdade. No dia 1o de abril, o navio de guerraamericano USS Nicholas, quando efetuavauma patrulha a oeste das Ilhas Seicheles, noOceano Índico, foi atacado por presumíveispiratas, tendo este respondido de imediato aoataque e perseguido a skiff que o atacou. Estenavio capturou os três ocupantes da skiff eafundou-a em seguida. O USS Nicholas cap-turou, ainda, um “navio-mãe” e doispresumíveis piratas que estavam a bordo des-te. Também no início de abril, o navio gregoHS Limnos, da SNMG2, interceptou, na baciada Somália, um grupo formado por um “navio-mãe” e duas skiffs, tendo os seus tripulantesse apressado a jogar no mar as escadas, osganchos e outros equipamentos utilizados

4 Navio que se encontrava sequestrado por piratas somalis havia cinco meses.

Skiff atacada pelo USS Nicholas (Foto: US Navy)

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nos seus atos de pirataria. O navio grego, apóscertificar-se de que os piratas tinham tudo oque era necessário para regressarem a terra no“navio-mãe”, deixou-os partir e afundou asduas skiffs. Segundo a Otan, esta mesma fra-gata afundou seis skiffs no período compreen-dido entre 7 e 9 de abril. Ainda em meadosdeste mesmo mês, a 280 milhas náuticas a nor-deste das Seicheles, o navio turco TCGGelibolu, da SNMG2, também esteve envol-vido na destruição de algumas skiffs. Em 5 demaio, o M/V Moscow University, de bandeiraliberiana, de armadorrusso e com 23 tripulan-tes russos, foi seques-trado por piratas, a cer-ca de 295 milhas a nor-deste da Ilha deSocotora (Iêmen). A tri-pulação deste, após terdado o alerta, parou asmáquinas do navio eisolou-se num compar-timento seguro, passan-do esta informação às forças navais na zona.O navio de guerra russo MarshalShaposhnikov foi então incumbido de libertareste navio, o que aconteceu no dia seguinte,tendo morrido um pirata durante o ataque esido capturados dez. A 14 de maio, após umacomunicação de um avião de patrulha aéreada Eunavfor, o navio britânico HMS Chathamaproximou-se de um grupo de embarcaçõespiratas formado por um “navio-mãe” e duasskiffs, tendo os seus ocupantes rapidamentemandado ao mar todo o material que os pu-

desse incriminar em atos de pirataria. Os dezpresumíveis piratas que se encontravam abordo do “navio-mãe” regressaram neste àSomália, e as duas skiffs foram destruídas.

Todos esses relatos são bem eluci-dativos da forma como, ultimamente, asvárias forças presentes nessa região pas-saram a atuar na luta contra a pirataria.Apesar de todas elas tentarem cumprir alei e, acima de tudo, salvaguardar semprea vida humana, têm levado a cabo todasas ações possíveis para desativar o mai-

or número de grupospiratas, quer surpre-endendo-os junto aterra, fazendo-os op-tar pela fuga e aban-donando estes algu-mas das suas embar-cações, quer destru-indo-lhes todas asdhows e skiffs possí-veis quando captura-dos ao largo da

Somália, ou mesmo enfrentando-os e der-rotando-os a bordo de navios já seques-trados. Todas esta ações só têm sidopossíveis com a maior cooperação e co-ordenação de esforços entre a Otan, aEunavfor e as restantes forças navais.

Apesar de todas essas diligências parafragilizar os grupos de piratas que atuam nes-sa região, a situação ainda está muito longede estar sob controle, não passando essasações das forças navais de meros paliativosdiante deste surto de pirataria marítima.

A situação ainda está muitolonge de estar sob controle,não passando essas ações

das forças navais de merospaliativos diante deste

surto de pirataria marítima

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<PODER MARÍTIMO>; Pirataria; Segurança no mar; Somália;

BIBLIOGRAFIA

Piracy and Armed Robbery Against Ships: Annual Report 2009. United Kingdom: ICC InternationalMaritime Bureau [2010].

International Maritime Bureau. Disponível em http://www.icc-ccs.org. Acesso em 16/06/2010.

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SUMÁRIO

Considerações iniciaisMetodologia e referencial teórico

MetodologiaPesquisa exploratóriaOs métodos indutivo e históricoDados secundáriosAplicação do método

Referencial teóricoO neorrealismo e a insegurança internacionalA questão dos Estados falidos sob o prisma neorrealistaA anarquia internacional sob a ótica hobbesiana

Antecedentes históricos da pirataria no mundoFatores responsáveis pela proliferação de piratas nas águas costeiras da Somália

A crise política na Somália e a falência estatalA “indústria da pirataria”A pirataria na costa da Somália e o Direito Internacional

Principais organismos internacionais envolvidos no combate da pirataria na costa da SomáliaConsiderações finais

A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade naregião e a aplicação do Direito Internacional

CAROLINA ISABEL LAZZARI GIOPPO

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CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Desde seus primórdios, a pirataria temgerado um verdadeiro pânico nos ma-

res. Diversos navios foram saqueados aolongo da história, causando prejuízos eco-nômicos imensuráveis e pondo fim a inú-meras vidas.

Ao longo do século XX, os atos de vio-lência no mar tiveram suas atenções volta-das para as águas do Sudoeste Asiático, emespecial às redondezas do Estreito deMálaca1. No entanto, nos últimos anos, umanova área tem entrado na lista dos pontoscríticos de ataques de piratas: a região dacosta do Chifre Africano, área marítima quecosteia o Estado da Somália e suas proximi-dades, apresentando o formato de um corno.

A região começou a assumir posição dedestaque dentre as áreas de risco de ata-ques piratas após um episódio ocorrido emoutubro de 2007, quando, pela primeira vezregistrada, um navio de carga foi atacadonas águas costeiras da Somália. Até a refe-rida data, os ataques estavam restritos ape-nas a navios pesqueiros.

A ousadia dos piratas assustou a co-munidade internacional, visto que o ata-que foi contra um superpetroleiro saudita,com carregamento em petróleo estimado emUS$ 100 milhões.

Tais ataques foram se intensificando, oque tem provocado reações de um conjuntode Organismos Internacionais (OI) e Esta-dos nacionais, preocupados em restabelecera segurança do tráfego marítimo na região.

Dentro do âmbito das reações interna-cionais em combate à pirataria, merece des-taque a promulgação da Convenção dasNações Unidas sobre o Direito do Mar(CNUDM), em 1982, mediante a qual os

países signatários assumiram o compromis-so de cooperar na repressão à pirataria, quefoi assim definida:

Artigo 101: Constituem pirataria quais-quer dos seguintes atos:a) todo ato ilícito de violência ou dedetenção ou todo ato de depredação co-metidos, para fins privados, pela tripu-lação ou pelos passageiros de um navioou de uma aeronave privados, e dirigi-dos contra:I) um navio ou uma aeronave em alto-mar ou pessoas ou bens a bordo dosmesmos;II) um navio ou uma aeronave, pessoasou bens em lugar não submetido à juris-dição de um Estado;b) todo ato de participação voluntáriana utilização de um navio ou de umaaeronave, quando aquele que o praticatenha conhecimento de fatos que deema esse navio ou a essa aeronave o cará-ter de navio ou aeronave pirata;c) toda ação que tenha por fim incitarou ajudar intencionalmente a cometerum dos atos enunciados nas alíneas a)ou b).Quanto à caracterização de pirataria,

também merece destaque a divergência noque diz respeito ao seu enquadramentocomo ato de terrorismo. Ainda que sejammais variados os posicionamentos doutri-nários a respeito da matéria, para os finsdo presente estudo adota-se o posiciona-mento de Peter Lehr, não considerando apirataria como ato de terrorismo. SegundoLehr, não há provas suficientes que indi-quem que os ataques ocorridos até entãocontenham um fundamento terrorista; por-tanto, o gatilho para essas ações seria pu-ramente comercial2.

1 Localizado entre a Península Malaia e a Ilha de Sumatra, é a principal passagem entre os Oceanos Índicoe Pacífico.

2 LEHR, Peter & LEHMANN, Hendrick. Somalia — pirates’ new paradise. 2007, p.18.

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Entendendo, portanto, que pirataria é umcrime de ação privada praticado em alto-mar3

contra pessoas ou bens, sem feições terro-ristas, pode-se, então, identificá-la em plenaatividade em variadas regiões do mundo,notoriamente nas águas do Golfo de Áden4.

É notório que a pirataria vem se expan-dindo rapidamente no último século, princi-palmente nas rotas comerciais oceânicasmais importantes, devido ao intenso fluxode navios que transportam fortunas na for-ma de mercadorias. Contudo, como se expli-caria o crescente número de ataques piratasnas águas do Chifre Africano nos últimostrês anos, considerando que não houve,nesse período, mudanças significativas nastransações comerciais na região?

Nesse contexto, é de fundamental im-portância compreender quais os fatoresque conduziram a região do Chifre Africa-no a se tornar uma preocupação global noque tange à questão da pirataria, para quese possam desenvolver medidas de coibi-ção das atividades piratas na região.

É a partir desse entendimento que sepode traçar um plano de combate contra essaprática ilícita que vem prejudicando a livre esegura circulação de embarcações na região,além de poder contribuir para inibir osurgimento de novos ambientes propícios aessas atividades ao redor do mundo.

Assim afirma Peter Lehr, especialista napirataria que ocorre na Região do Golfo deÁden:

Figura 01 – Mapa de localização do Golfo de Áden, na costa da Somália(Disponível em: <http://g1.globo.com/Noticias/Mundo/0,,MUL874646-5602,00-

PIRATAS+SEQUESTRAM+NAVIO+IEMENITA+NA+COSTA+DA+SOMALIA.html>)

3 Reconhece-se que a CNUDM incluiu a tutela de aeronaves na definição de pirataria. No entanto, vistoque o foco deste estudo é a pirataria praticada contra embarcações, apenas mereceu menção o crimequando praticado em alto-mar.

4 Corredor marítimo localizada no Oceâno Índico em direção ao Mar Vermelho, mais precisamente entrea Somália e o Iêmen.

ARÁBIA SAUDITA

EGITO

SUDÃO

ETIÓPIASOMÁLIA

IÊMEN

OMÃ

Golfo de Aden

MAR V

ERM

ELHO

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Ao longo do Estreito de Málaca e doMar do Sul da China, além de um ambi-ente de possibilidades ainda existe asoma dos fatores geográficos: as cos-tas destas águas caracterizam-se por,frequentemente, apresentarem pântanosde manguezais, sendo as águas bastan-te mexidas devido aos consoles e àsilhotas – ambos fornecem lugares con-venientes para servir de esconderi-jo nas emboscadas e de abrigo, no casomuito pouco provável de as embarca-ções serem submetidas à aplicação delei marítima. No caso da Somália, suacosta pode até funcionar paralela às li-nhas de mar importantes de comunica-ções, assim estando seu valorgeoestratégico eminente, mas, ao con-trário do Sudeste Asiático, lá não temtantas ilhotas que possam fornecer abri-go para os piratas esperarem o momen-to apropriado para o ataque. Na costada Somália, o ambiente de possibilidadeé formado pela situação de Estado fali-do em que se encontra o país5.

Faz-se mister a análise da situação emque se encontra a Somália para se enten-der o porquê de a região ao seu redor ter setornado um ambiente tão atrativo aos ata-ques piratas e quais os fatores que contri-buíram para aquele país perder completa-mente sua capacidade de conter as açõesdos piratas.

Primeiramente se observará a questãoda insegurança internacional e do Estadofalido sob os preceitos da teorianeorrealista. Também será enfocado o con-ceito de “indústria da pirataria”, após umabreve análise do pensamento hobbesiano.

Num segundo momento, far-se-á uma bre-ve retrospectiva histórica, no intuito de me-

lhor explicar as origens da pirataria no mun-do e para que se possa perceber que a pirata-ria não é um fato novo, característico do finaldo século XX e início do século XXI.

Por último serão explanados os seguin-tes fatores, que contribuíram para a regiãocosteira da Somália ser considerada o mai-or foco de pirataria do mundo: a crise polí-tica na Somália e a falência estatal, odesequilíbrio ambiental nas águas costei-ras somalis e a ausência de uma autoridadeinternacional capaz de recuperar a estabili-dade na região e fiscalizar as águas do nor-deste africano.

METODOLOGIA E REFERENCIALTEÓRICO

Metodologia

Pesquisa Exploratória

A Escola de Comando e Estado-Maiorda Aeronáutica (Ecemar) ensina que a pes-quisa exploratória tem por objetivo estabe-lecer uma visão genérica acerca do temaestudado, utilizando-se de pesquisas bi-bliográficas e documentais, estudos decaso e, quando necessário, de entrevistas,desde que estas não sejam padronizadas.Essa pesquisa tem grande importância noestudo de casos pouco abordados, por-que leva à formulação de questionamentose à elaboração de hipóteses.

A pesquisa exploratória visa à aproxima-ção entre o pesquisador e o fenômeno estu-dado, auxiliando o estudioso a reformularconceitos e ideias para, posteriormente, “for-mular problemas precisos e hipótesesoperacionalizáveis” (Ecemar, 2009, 11).

É a partir de maior familiarização com otema da pirataria nos mares, tomando como

5 LEHR, Peter & LEHMANN, Hendrick. Somalia — pirates’ new paradise. Nova Iorque e Londres:Routledge 2007, p 12.

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problemática a sua concentração na regiãochamada de Chifre Africano, que se pre-tendem elaborar pesquisas bibliográficase documentais, no intuito de fomentar hi-póteses que contribuam para maior escla-recimento da questão.

Os métodos indutivo e histórico

O método indutivo “parte do particular ecoloca a generalização como um produtoposterior do trabalho de coleta de dados par-ticulares”6. Assim, ele se caracteriza por tercomo foco inicial questões particulares e res-tritas para, num segundo momento, expandirsuas conclusões ao plano generalizado.

O método indutivo de pesquisa seráaplicado no decorrer deste trabalho, inclu-indo todo o embasamento teórico e a pes-quisa dos motivos que ocasionaram a con-centração da pirataria em torno da costasomali.

Também será de fundamental importân-cia para este trabalho a utilização do méto-do histórico de pesquisa, considerando sernecessária a análise evolutiva das ativida-des piratas e dos fenômenos que competi-ram para a proliferação da pirataria no nor-deste do continente africano. SegundoAndrade, o método histórico “consiste eminvestigar os acontecimentos, processose instituições do passado para verificar suainfluência na sociedade hoje”7.

Dados secundários

São considerados dados secundáriosquaisquer fontes literárias sobre o tema pro-posto. Neste trabalho serão utilizados comodados secundários: pesquisas na internet,

livros, jornais, periódicos e artigos científi-cos, de forma a garantir o máximo de veraci-dade e respaldo científico à pesquisa.

Aplicação do método

Após serem coletados os dados, pormeio das pesquisas literárias realizadas, teráinício a fase de estudo, no intuito de escla-recer as origens da pirataria na região doChifre Africano. O próximo passo será com-preender o porquê da rápida proliferaçãodos atos de pirataria nos últimos três anosnaquela área próxima à Somália. Por fim,serão propostas linhas de ação para o con-trole e redução dessas atividades naqueleespaço marítimo.

Referencial teórico

A pirataria nos mares é um problema glo-bal, que afeta não apenas a região em quesão registradas as ocorrências, mas tam-bém inúmeros países envolvidos na rela-ção comercial cuja mercadoria é afetada e/ou aqueles Estados que tenham um de seuscidadãos feito refém ou sido morto em de-corrência desses atos.

Há uma grande preocupação com a pro-liferação da ação dos piratas na região doChifre Africano, por ser uma rota comercialimportantíssima para o mundo, pois “porali passam mais de 20 mil navios por ano e12% do comércio de petróleo”8, somando-se ao prejuízo econômico o alto risco dedesastres ambientais. Em comentários,Zago e Minillo são enfáticos ao afirmar que:

O desenvolvimento da pirataria em águassomalis é um problema complexo, que en-

6 GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1999, p. 28.7 ANDRADE, Maria Margarida de. Introdução à metodologia do trabalho científico. 7 ed. São Paulo:

Atlas, 2007.8 Reportagem da Veja – edição de 22 de abril de 2009.

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volve diversas instâncias e pode terconsequências desastrosas para a segu-rança internacional. Neste contexto, hápontos que devem ser observados poroferecerem riscos. Um deles é o perigode desastre ambiental, pois pode ocorreruma catástrofe se um petroleiro afundarou pegar fogo – fato provável, dado ouso de armas pesadas pelos piratas9.

O sucesso das operações dos piratasdo Golfo de Áden se deve, em grande par-te, segundo Pottengal Mukundan, diretordo organismo International BureauMaritime (IBM)10, à intensa violência apli-cada nas suas investidas atrelada a umadeterminada capacitação bélica e, princi-palmente, à experiência marítima do pesso-al envolvido. Tal fato é resultado da ori-gem desses piratas, que são ex-pescado-res ou antigos militares atuantes na defesado país até o momento do colapso estatal.

Segundo Roberto Godoy, em entrevistaconcedida ao jornal O Estado de S. Paulo emnovembro de 2008, muitas vezes os piratassomalis preferem atacar em grupos peque-nos e usando botes de borracha, pois assimaparecem nos radares da mesma forma queos lixos em alto-mar e as ondas grandes tam-bém aparecem, o que evita chamar a atençãoda tripulação para a ameaça. Nesses casos, asurpresa é a principal arma dos criminosos.

Nesse contexto, o principal atrativo paraos piratas são embarcações11 comerciais,com sistema de segurança fácil de burlar.

Assim, o intenso fluxo comercial em águasrestritas (como estreitos ou canais) e/ounas suas proximidades, quando desprovi-das de fiscalização ou policiamento efica-zes, como é o caso do Golfo de Áden, re-presenta um ambiente propício para umainvestida de sucesso.

Para melhor compreender o fenômenoda proliferação de piratas na costa leste donorte da África, é necessária uma análiseapropriada dos seguintes marcos teóricos.

O neorrealismo e ainsegurança internacional

A Teoria Neorrealista, como o próprionome indica, é a modernização da Teoria Re-alista, ou seja, é a adaptação do RealismoClássico, que teve origem na década de 30,ao mundo globalizado pós-Guerra Fria, mar-cado pelo incessante avanço tecnológico,intenso fluxo de informações e de comércioentre os países, facilidade e velocidade nacomunicação e deslocamento internacionais.

A escola realista tem como principal focoas questões de segurança e poder entre osEstados e defende que só se atinge a pazpor meio do equilíbrio de poder entre ospaíses, considerando a afirmação de MariaOdete Oliveira de que “apenas os Estadosteriam relevância no cenário internacional”12.

Ainda para Oliveira: “Em suma, para osrealistas, o Estado é dominante; a coope-ração, problemática; a ordem, uma imposi-ção hegemônica ou concertada entres as

9 ZAGO, Evandro Farid & MINILLO, Xaman Korai Pinheiro. Consequências da falência de um Estado:pirataria nas águas da Somália. Disponível em: <http://meridiano47.info/2008/11/23/consequencias-da-falencia-de-um-estado-pirataria-nas-aguas-da-somalia-por-evandro-farid-zago-xaman-korai-pi-nheiro-minillo/>. Acesso em: 15 mai, 2009.

10 Divisão especializada da Câmara Internacional de Comércio, que tem como objetivo combater oscrimes praticados no espaço marítimo. (site da IMB http://www.icc-ccs.org/index.php?option=com_content&view=article&id=27&Itemid=16 p 1)

11 Embarcação é a denominação técnica genérica para qualquer meio de transporte sobre e sob as águas,desde uma simples canoa até um navio de grande porte internacional, segundo a Diretoria de Portose Costas (DPC).

12 OLIVEIRA, Odete Maria de. Relações internacionais: estudos de introdução. Curitiba: Juruá, 2001, p. 85.

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

grandes potências; e a distribuição do po-der é fundamental”13.

Com o final da Guerra Fria e dabipolarização global, houve uma reorgani-zação mundial e novos atores entraram emcena na dinâmica mundial. As EmpresasTransnacionais (ETN), os Organismos In-ternacionais (OI) e as Organizações NãoGovernamentais de Alcance Transnacional(Ongat) passaram a ter sua importância re-conhecida no mundo globalizado14.

O movimento neorrealista, segundo Olivei-ra15, foi firmado no final da década de 70 com aapresentação de suas propostas em duasobras: The Anarchical Societ e The Theory ofInternacional Relations, de Hedley Bull e deKenneth Waltz, respectivamente.

Para Waltz, segundo Oliveira, o sistemapolítico internacional é marcado por aspec-tos como a ausência de um governo mun-dial (também chamado de anarquia inter-nacional) e a falta de hierarquia entre osEstados, promovendo uma relação horizon-tal entre os países, e não uma verticalizaçãode poderes, haja vista que os Estados de-sempenham a mesma função.

A ausência de um governo mundial con-corre, então, para os Estados empregaremuma forma de impor suas vontades sobreos outros, conhecida como hard power16,

por meio da desigualdade da capacidadeeconômico-militar entre grupos relativa-mente poderosos no cenário internacional.

Entendendo que um Estado é formadopor três elementos indispensáveis – popu-lação, território e governo soberano – nãosendo possível se falar em Estado quandohá população, há território, mas não hágoverno soberano. Não havendo um go-verno que a represente, a população de umdeterminado território também não possuiquem a represente e a defenda diante dacomunidade internacional.

A questão dos Estados falidos sob o prismaneorrealista

Há entre os realistas e neorrealistas umponto de intenso debate: a questão dos Es-tados fracassados (ou falidos). RobertJackson, apud Nogueira, entende por Esta-dos fracassados ou falidos “aqueles Esta-dos que não podem ou não irão salvaguar-dar domesticamente condições civis míni-mas, como paz, ordem, segurança etc.”17 Ouainda, segundo Barbosa, “aqueles Estadosem que as instituições cessaram de funcio-nar na prática. O Legislativo e o Judiciário,em muitos casos, deixaram de existir18. Ape-sar de Waltz não considerar esse tema rele-

13 Idem, p. 86.14 As mudanças ocorridas no sistema internacional, no período pós-Guerra Fria, implicaram um reordenamento

no que diz respeito à distribuição do poder mundial, mais propriamente na natureza do sistemainternacional, estruturado em bases assimétricas de poder (RACY e ONUKI, 2001, p. 4 e 5).

15 OLIVEIRA, Odete Maria de. Relações internacionais: estudos de introdução. Curitiba: Juruá, 2001, p.88.

16 Conceito criado e difundido por Joseph Nye, cientista político dos EUA: “Seria a capacidade de um paísobter o que quer por meio da força coercitiva, bruta, punitiva, mas com recompensa. Os instrumen-tos-chave seriam: a aplicação da força militar e da pressão econômica”. (João Fábio Bertonha, em“Hard, soft ou smart Power? Perspectivas para a nova política externa dos Estados Unidos”).

17 NOGUEIRA, Leandro Monteiro. O Conceito de Estado Fracassado nas Relações Internacionais: Ori-gens, Definições e Implicações Teóricas. Disponível em:<http://www.santiagodantassp.locaweb.com.br/br/arquivos/defesas/Leandro%20Nogueira%20Monteiro.pdf>. Acesso em: 07 abr,2009.

18 BARBOSA, Rubens. Notas Estratégicas: Estados Falidos. Disponível em: <http://74.125.47.132/search?q=cache:gwmwYJjB1WkJ:www.defesanet.com.br/notas/failed_states.htm+estados+falidos+e+as+organiza%C3%A7oes+internacionais&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>.Acesso em:8 abr, 2009, p. 1.

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vante, durante muitos anos os realistas de-fenderam que o fracasso estatal deveriaser encarado com bastante seriedade e pre-cisaria ser combatido o mais rápido possí-vel, por representar uma ameaça à seguran-ça internacional.

Por outro lado, para os neorrealistas,não seria o fracasso estatal por si só umaameaça à estabilidade internacional. O querealmente comprometeria a segurança ex-terna seriam os “problemas pontuais desegurança gerados por deficiências espe-cíficas desses Estados”19. Dessa forma, aspreocupações e os recursos despendidosdeveriam ser direcionados para solucionaros problemas gerados pela incapacidadeestatal, e não para a recuperação do país erestabelecimento de uma nação.

Em relação a este tema se posicionamLogan e Preble apud Nogueira:

Eles quase sempre não são. Ademais,quando Estados fracassados apresen-tam uma ameaça, é outra coisa que nãoo ‘fracasso’ que é ameaçador. Empreen-der projetos de construção de naçõesde larga escala não faria nada para eli-minar as ameaças (...)20.

O que ameaçaria a comunidade interna-cional seriam, portanto, os problemasadvindos dessa falência estatal, como epi-demias, criminalidade nas áreas internaci-onais, contrabando de armas e drogas aoutros países, atos terroristas, prática decrimes ambientais, entre outros fatoresimpactantes internacionalmente.

Francis Fukuyama, em sua obra Cons-trução dos Estados Falidos, também de-

fende, mesmo que indiretamente, que a fa-lência estatal é apenas a fonte de váriosproblemas internacionais e que esses pro-blemas sim é que afetam os demais paísese o meio ambiente:

(...) A construção de Estados é uma dasquestões mais importantes para a co-munidade mundial, porque os Estadosfracos ou fracassados constituem a fon-te de muitos dos problemas mais gravesdo mundo, da pobreza à Aids, drogas eterrorismo21.

Não haveria tamanha preocupação mun-dial em resolver o caso vivido na Somáliase os reflexos gerados pelo desmoronamen-to estatal se resumissem aos impactos cau-sados à população somali. No entanto, nãoé bem isso o que acontece. As epidemiasse alastram para além das fronteiras, os atosde pirataria têm trazido grandes prejuízosaos donos de cargas e cidadãos estrangei-ros, além de armas e drogas estarem sendocontrabandeadas por outros países paraatender à demanda da Somália.

Fukuyama acredita que é possível res-tabelecer o Estado na Somália, mas que issonão será uma tarefa fácil. Ele divide estaatividade em três etapas e conta com bas-tante apoio das potências estrangeiras.

Na primeira fase, seriam restabelecidasas estruturas básicas das quais necessitaa população: rede elétrica, policiamento,saneamento básico e sistema bancário. Éna segunda fase que seriam reconstruídasas instituições governamentais autossus-tentáveis, de forma que persistam mesmo

19 NOGUEIRA, Leandro Monteiro. O Conceito de Estado Fracassado nas Relações Internacionais:Origens, Definições e Implicações Teóricas. Disponível em:<http://www.santiagodantassp.locaweb.com.br/br/arquivos/defesas/Leandro%20Nogueira%20Monteiro.pdf>. Acesso em: 07 abr,2009.

20 NOGUEIRA, Leandro Monteiro. O conceito de Estado Fracassado nas Relações Internacionais: Ori-gens, Definições e Implicações Teóricas. Disponível em:<http://www.santiagodantassp.locaweb.com.br/br/arquivos/defesas/Leandro%20Nogueira%20Monteiro.pdf>. Acesso em: 07 abr,2009.

21 FUKUYAMA, Francis. Construção de Estados Falidos. Rio de Janeiro: Rocco, 2005, p. 9.

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após a retirada do apoio estrangeiro. A ter-ceira e última etapa seria uma fase apenasde fortalecimento e manutenção da novaestrutura já implementada22.

Por outro lado, Logan e Preble, apudNogueira, defendem que a tentativa de todoe qualquer país de restabelecer a nação numoutro Estado em que houve a falência es-tatal seria provavelmente ineficaz e, certa-mente, em vez de solucionar os problemasque estavam gerando a insegurança inter-nacional, envolveria esse país nos confli-tos civis eclodidos no Estado fracassado23.

Os neorrealistas, por sua vez, reconhe-cem a incapacidade estatal de garantir, porsi só, a segurança interna, tornando-se osEstados cada vez mais dependentes unsdos outros e buscando auxílio nos novosatores internacionais com quem estabele-cem uma relação política, por meio da qualdelegam parte de sua soberania estatal emtroca de maior segurança externa. Nessecontexto, afirma Fukuyama apud Gomesque “a fraqueza de um Estado torna-se, aomesmo tempo, uma questão nacional e in-ternacional de grande importância para asegurança global”24.

Os neorrealistas são chamados atual-mente de estruturalistas, por levarem emconsideração toda a nova estrutura mun-dial formada com o fim da Guerra Fria, reco-

nhecendo que outros atores também fazemparte do mundo globalizado. Na prática,essa nova estrutura internacional seria “alimitação da soberania (dos Estados) e aparalela redução da insegurança (interna-cional) decorrente dos compromissosinstitucionais (novos atores)”25.

Os OI e as Ongat têm demonstrado suapreocupação em relação às consequênciasdecorrentes de um fracasso estatal, em facede um Estado falido tornar-se um cenárioperfeito para a proliferação de atos crimi-nosos, como é o caso da pirataria nas águasque contornam o nordeste do continenteafricano. Assim, afirma Barbosa:

Segundo recente estudo preparado pelaONG Fund for Peace, cerca de 60 paísesse encontram hoje nesse estado de fra-casso econômico, social e político. Noscasos mais extremos, os Estados prati-camente desapareceram, como noAfeganistão, no Haiti, na Somália e noSudão. (...) Em consequência, há orga-nizações terroristas treinando em basesno Afeganistão e na Somália, redestransnacionais criminosas criando raízesem Mianmar e na Ásia Central, pobreza,doenças e emergências humanitáriasgerando problemas insuperáveis para osgovernos no Haiti e na África Central26.

22 FUKUYAMA, Francis. Construção de Estados Falidos. Rio de Janeiro: Rocco, 2005, p. 132 e 133.23 NOGUEIRA, Leandro Monteiro. O conceito de Estado Fracassado nas Relações Internacionais: Ori-

gens, Definições e Implicações Teóricas. Disponível em:<http://www.santiagodantassp.locaweb.com.br/br/arquivos/defesas/Leandro%20Nogueira%20Monteiro.pdf>. Acesso em: 07 abr,2009, p. 93.

24 GOMES, Aureo de Toledo. Do colapso à reconstrução: estados falidos e as operações de nation-buildingno pós-guerra fria. Disponível em:< http://www.geocities.com/politicausp/M9-Gomes.doc>. Acessoem: 08 abr, 2009, p. 4.

25BRESCIANI. Os paradigmas das Relações Internacionais. Disponível em; <http://74.125.47.132/search?q=cache:2eEXJ8jmJV0J:www.bresciani .com.br/ index.php%3Fcodwebsite%3D%26codpagina%3D00008739%26codnoticia%3D0000003081+o+que+%C3%A9+o+paradigma+neo-realista%3F&cd=8&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br> Acesso em: 29 mar,2009, p. 3.

26 BARBOSA, Rubens. Notas Estratégicas: Estados Falidos. Disponível em: <http://74.125.47.132/search?q=cache:gwmwYJjB1WkJ:www.defesanet.com.br/notas/ailed_states.htm+estados+falidos+e+as+organiza%C3%A7oes+internacionais&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>.Acesso em: 8 abr,2009, p. 1.

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A anarquia internacional sob a óticahobbesiana

A anarquia internacional é entendida porvários atores como sendo a ausência deum governo mundial soberano, capaz deestabelecer normas e sanções comuns atodos os países internacionalmente.

Para vários cientistas políticos, a paz in-ternacional dependeria de um ordenamentomundial, e a solução para essa vacânciagovernamental seria a instauração de umDireito Internacional que pudesse coorde-nar as relações entre os países e definir quaisseriam os atos de ilegalidade.

Para solucionar a questão da ineficáciado Direito Internacional, diversosdoutrinadores mergulharam nas ideias doparadigma realista, em especial na Teoriade Estado de Thomas Hobbes.

Segundo Castro, o que ocorre é a “cren-ça de existência de uma anarquia internaci-onal em que o Direito Internacional nãoexerce força reguladora significativa, comosalienta Hobbes, ao descrever o estado danatureza”.

Nesse contexto, a importância do Esta-do, para Hobbes, é explicada a partir daafirmação de que “o homem é o lobo dopróprio homem”. Assim, a natureza do ho-mem o leva a agir de forma livre e egoísta,de acordo com suas vontades, sem se sub-meter a um governo soberano. É o chama-do estado de natureza, em que a base das

relações humanas está no constante con-flito de interesses.

Melhor explica Sarfati acerca do estadode natureza: “Como nesse estado de natu-reza ele pode fazer o que bem entende, issosignifica que pode cobiçar algo ao mesmotempo em que outra pessoa e, como seriaimpossível ambos possuírem essa coisa aomesmo tempo, eles se tornariam inimigos”27.

Tendo em vista que a Somália é hoje umEstado falido, um Estado sem exército, semgoverno, sem lei, não há segurança dentronem fora das fronteiras, de forma que não sóos próprios somalis ajam como julgarem con-veniente, como também os demais indivídu-os dos países em sua volta, o que gera umambiente propício a toda sorte de conflitos.

É importante ressaltar que um Estadofalido não tem mais qualquer condição degarantir os serviços básicos de saúde, hi-giene, educação, paz. Não funcionam maisos órgãos do governo, não há aparato ju-diciário nem exército. Nesse cenário, asepidemias e a criminalidade se alastram naSomália e a seu redor28.

Podemos considerar, dessa forma, queo que se presencia hoje na região do ChifreAfricano é justamente um conflito de inte-resses interna e externamente, resultado deuma anarquia nacional e internacional, con-siderando também o sentido coloquial dapalavra “anarquia”.

Para Hobbes, a única solução para queos homens não se destruíssem seria a sub-

27 SARFATI, Gilberto. Teoria das relações internacionais. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 71.28 Dessa forma, a existência de Estados que não se conseguem impor de forma adequada perante seu

território desencadeia problemas não apenas para o ambiente doméstico em questão, mas tambémpara os âmbitos regional e global. Característica importante de qualquer Estado bem estruturado é aprovisão de serviços públicos básicos para sua população. Dentre tais serviços incluem-se atividadesde cunho social, tais como saúde, educação e moradias públicas, como também atividades de carátersecuritário – defesa da integridade nacional e policiamento doméstico. Se esses serviços são adequa-damente fornecidos pelo Estado, seus cidadãos tornam-se capazes de viver em sociedade de maneirasatisfatória e coletivamente benéfica. (ZAGO, Evandro Farid & MINILLO, Xaman Korai Pinheiro.Consequências da falência de um Estado: pirataria nas águas da Somália. Disponível em: <http://meridiano47.info/2008/11/23/consequencias-da-falencia-de-um-estado-pirataria-nas-aguas-da-somalia-por-evandro-farid-zago-xaman-korai-pinheiro-minillo/>. Acesso em: 15 mai, 2009, p. 1.)

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

missão deles a um poder soberano, firma-do por meio de um contrato social, que poriafim àquele estado de natureza e determina-ria normas a serem seguidas. Seria, no âm-bito internacional, o fim da anarquia e aedificação de um Direito Internacional Pú-blico soberano.

Diferentemente da pirataria praticada aolongo da história em todo o mundo, asinvestidas ocorridas na região do ChifreAfricano apresentamoutras características.Não é uma prática quevisa puramente a ob-ter lucros, por meio dosaque de navios ou dacobrança de resgatespara libertar prisionei-ros, mas é também umgrito de socorro dapopulação somali di-ante das condiçõessubumanas que se en-contram naquela re-gião, ou seja, é a for-ma desenvolvida poralguns grupos somalispara enfrentarem a si-tuação de estado denatureza instaurada no país.

A Somália é um grande exemplo de Esta-do falido. Desde a derrubada do ditadorMohamed Siad Barre do poder em 1991, apopulação e o território somalis nunca maisvoltaram a formar um Estado, pois sem go-verno soberano não há unidade estatal, o

que torna a Somália um país à margem dosistema internacional.

A situação vivida pelos piratas na Somálianão é um problema exclusivo do país, mastambém mundial. A região se tornou alvo depráticas ilegais, que não se resumem à pira-taria – onde os piratas são considerados osvilões pela comunidade internacional –, masenglobam também ações que ferem os direi-tos fundamentais e ambientais. Assim, o

caso da Somália temsua importância nãoapenas pelos prejuízoscausados pelos ata-ques, mas principal-mente por se tratar deseres humanos larga-dos ao acaso, sobrevi-vendo com os recur-sos advindos do crimee vivendo no estadode natureza tão bemdescrito pelo filósofoThomas Hobbes29.

ANTECEDENTESHISTÓRICOS DAPIRATARIA NOMUNDO

Apesar de ser um tema presente atual-mente nos noticiários mundiais, a piratarianão é uma prática recente. Ao contrário doque se imagina, as ações dos piratas aterro-rizam as embarcações desde o início da uti-lização dos mares como rotas comerciais.

29 A concepção de Hobbes (no século XVII) segundo a qual, em estado de natureza, os indivíduos vivemisolados e em luta permanente, vigorando a guerra de todos contra todos ou “o homem lobo dohomem”. Nesse estado, reina o medo e, principalmente, o grande medo: o da morte violenta. Parase protegerem uns dos outros, os humanos inventaram as armas e cercaram as terras que ocupavam.Essas duas atitudes são inúteis, pois sempre haverá alguém mais forte que vencerá o mais fraco eocupará as terras cercadas. A vida não tem garantias; a posse não tem reconhecimento e, portanto,não existe; a única lei é a força do mais forte, que pode tudo quanto tenha força para conquistar econservar. (CHAUI, Marilena. Estado de natureza, contrato social, estado civil na filosofia deHobbes, Locke e Rousseau. Disponível em: <http://www.cefetsp.br/edu/eso/filosofia/contratualistaschaui.html>. Acesso em: 10 mai, 2009, p. 1).

A pirataria não é umaprática que visa puramentea obter lucros, por meio do

saque de navios ou dacobrança de resgates paralibertar prisioneiros, mas é

também um grito desocorro da população

somali diante das condiçõessubumanas que se

encontram naquela região

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A pirataria, desde seus primórdios, temgerado um verdadeiro pânico nos mares.Diversos navios foram saqueados ao lon-go da história, causando prejuízos econô-micos e pondo fim a inúmeras vidas, tantodas vítimas dos navios pilhados quantodos próprios piratas, haja vista ser a penade morte a punição aplicada durante sécu-los aos praticantes desses delitos.

Apesar de o comércio marítimo ter tidosuas origens em meados dos anos 1500 a.C.,quando houve a expansão comercial dosfenícios (civilização habitante da costa doMar Mediterrâneo), os registros mais anti-gos da atuação dos piratas nos mares daGrécia Antiga datam apenas do século IXa.C., nos relatos de Homero, em Odisseia.Não é estranho que o termo pirata tenhaorigem na palavra grega peirates, utilizadopara designar “o indivíduo que procuravasua fortuna por meio de aventura no mar”30.

Segundo Dannemann, em 331 a.C., Ale-xandre O Grande, rei da Macedônia, tam-bém dedicou esforços para expulsar os pi-ratas das rotas comerciais frequentadaspelos comerciantes de seu reinado.

Em 67 a.C., Roma demonstrou sua preo-cupação em combater os piratas do MarMediterrâneo, pois, devido aos constantessaques aos navios carregados de alimentos,a região mediterrânea teve seu abastecimen-to prejudicado. No intuito de combater essaprática, o general militar Pompeu Magno ins-tituiu a Lex Gabinia, que lhe proporcionavapoderes para exterminar, em toda a regiãomediterrânea, quantos piratas fossem neces-sários para resolver o problema. Segundo

Jorge Almeida, em seu artigo “A Revolta deCatilina”, no total, “dez mil piratas morreramou caíram em cativeiro, 800 barcos foram cap-turados (a maioria deles navios mercantes) e120 povoações foram destruídas”31.

Segundo definição encontrada no dici-onário português Houaiss, o pirata é aque-le “indivíduo que se apossa, ilegalmente epela força, dos bens de outrem; bandido,ladrão (dos mares)”32, ou seja, sua atuaçãoestá intimamente relacionada aosurgimento da circulação de bens e rique-zas por rotas marítimas.

Segundo Olivieri, na Idade Média a pi-rataria também aconteceu, porém em me-nor escala, devido ao processo defeudalização da Europa e à redução signifi-cativa do comércio marítimo internacional.A grande concentração da pirataria nessaépoca ocorreu nas proximidades da Grã-Bretanha, e as ações desses criminososnão se restringiram aos ataques em alto-mar, mas abrangeram também ataques a al-deias e vilarejos.

Após essa relativa calmaria do períodomedieval, inicia-se a Idade Moderna e, comela, o reaquecimento do comércio interna-cional, concorrendo para a era das gran-des navegações. É um período de intensaexpansão marítima, principalmente para aregião da Península Ibérica, que iniciaraprecocemente seu processo de coloniza-ção de novas terras.

Navios carregados de ouro, prata, pe-dras preciosas e especiarias partem dascolônias para abastecerem as metrópoles,o que desperta o interesse dos piratas por

30 OLIVIERI, Antônio Carlos. Pirataria: da Grécia antiga ao Brasil contemporâneo. Disponível em:<http:/ /74.125.47.132/search?q=cache:IfEXvFI0AvwJ:educacao.uol.com.br/atualidades/pirataria.jhtm+pirataria+na+idade+media&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em: 15 mai,2009, p. 1.

31 ALMEIDA, Jorge. A revolta de Catilina. O primeiro triunvirato. Disponível em: < http://www.azpmedia.com/historia/index2.php?option=com_content&do_pdf=1&id=70>. Acesso em: 10mai, 2009, p. 1.

32 HOUAISS. Dicionário da língua portuguesa. 1ª ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 2223.

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essas rotas. A pilhagem dessas embarca-ções advindas das Américas se tornou co-mum, assim como as invasões em terra fir-me nas colônias.

Muitas vezes eram as próprias metrópo-les que financiavam esses saques e roubos,e em vez de serem chamados de piratas, ossaqueadores eram chamados de corsários,pois tinham na pilhagem de navios uma pro-fissão respaldada pelo Estado.

Segundo Guedes,existiu um período decalmaria no séculoXIX, em que houveuma redução signifi-cativa da quantidadede ataques piratas nosmares por todo o mun-do, que perdurou atéo final da Guerra Fria,devido ao intenso tra-balho de fiscalizaçãodos mares duranteesse período33.

A respeito do avanço tecnológico,obsolescência das embarcações piratas eredução das ocorrências de ataques emdiversas regiões do mundo, afirma RobertoFerreira da Silva:

A tecnologia e a máquina a vapor fize-ram com que a atividade se tornassemuito cara e arriscada. A pirataria se viuimpotente ante os avanços tecnológicose a organização defensiva. No séculoXIX, só perduraram alguns piratas em

certos locais da costa da África, GolfoPérsico, China e Polinésia34.

É importante ressaltar que outro motivocompetiu a esses anos de calmaria: odesaquecimento do comércio marítimo en-tre o período de guerras mundiais, que dei-xou boa parte da Europa em ruínas.

Os atos de violência no mar reaparece-ram na segunda metade do século XX, se

concentrando naságuas do SudoesteAsiático, em especialnas redondezas do Es-treito de Málaca, ondefunciona uma das prin-cipais rotas comerciaisdo mundo.

No entanto, nos úl-timos anos do séculoXX, uma nova áreacomeçou a se destacarno cenário internacio-

nal, sendo considerada zona de foco dasações dos piratas: é a região da costa oce-ânica do Chifre Africano, espaço marítimoque costeia o Estado da Somália e suasproximidades. Esse tema será mais bem ex-plorado nos capítulos seguintes.

FATORES RESPONSÁVEIS PELAPROLIFERAÇÃO DE PIRATAS NASÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA

De acordo com reportagem publicadano site Uol em 19 de abril de 2009, ao longo

33 “[A pirataria] foi considerada praticamente extinta no século XIX, em muito devido ao aparecimentodos navios a vapor, assim como ao patrulhamento efetivo dos oceanos por parte dos navios deguerra britânicos, franceses, alemães e americanos. Depois de mais de um século de acalmia, em queapenas há registro de alguns casos isolados, deu-se novamente um boom deste tipo de atos ilícitos,em meados da década de 1980. Este aumento está diretamente relacionado com o fim da Guerra Fria,pois a acalmia que se lhe seguiu foi propensa a que muitos países dessem mais prioridade às suas açõescomerciais, nomeadamente por mar, do que às de defesa” (GUEDES, Henrique Peyroteo Portela.“Pirataria marítima: uma ameaça em escala global”. RMB 4o t./2008, p. 1).

34 SILVA, Roberto Ferreira da. Pirataria, roubo armado em águas territoriais e a bandidagem nos portos.Clube Naval: Departamento Cultural, 2002, p. 7.

Das 239 denúncias denavios atacados feitas ao

centro de denúncia depirataria da Corte

Internacional de Comércio,111 ocorreram na costa da

Somália em 2008

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

do ano de 2008 as águas do Golfo de Ádene toda a costa da Somália concentraramcerca de 37,5% dos ataques piratas emáguas salgadas de todo o mundo. Das 239denúncias de navios atacados feitas aocentro de denúncia de pirataria da CorteInternacional de Comércio (InternationalCourt of Commerce – ICC)111 ocorreramnessa região.

Segundo a mesma fonte, de janeiro atéabril de 2009 foram registrados 74 ataquespiratas na região do Golfo de Áden e costada Somália, o que demonstra o aumentodas ocorrências, tendo em vista que emapenas quatro meses atingiu-se aproxima-damente 70% do total de ataques ocorri-dos durante todo o ano de 2008.

O crescente número de ações de piratasna região do Chifre Africano tem chamado aatenção da imprensa internacional, de go-vernos do mundo inteiro, das organizaçõesinternacionais e das empresas que direta ouindiretamente são prejudicadas pela inse-gurança dessa rota comercial marítima.

No entanto, essa conjuntura vivida naregião africana não é fruto de um único fatorisolado. Podemos listar como fatores quecontribuíram para o aumento significativodo número de piratas na região do Golfo deÁden: a falência do Estado somali, o desca-so internacional com essa nação, a ausên-cia de uma fiscalização efetiva nas águas daregião do Chifre Africano e os lucros que ospiratas obtêm por meio dessas operações.

A crise política na Somália e a falênciaestatal

Em 1960 a Somália passa a ser indepen-dente, expulsando os colonizadores italia-nos e britânicos e unificando definitiva-mente o sul ao norte do país. A partir deentão, diversas foram as batalhas firmadascom a vizinha Etiópia pela disputaterritorial, o que fez com que esses dois

países se tornassem, até os dias atuais, ini-migos mortais.

No ano seguinte, em 1961, a Somália ga-nhou sua primeira Constituição, medianteaprovação em referendo. A Carta Magnasomali foi baseada no modelo democráticoaplicado na Europa Ocidental e implantouum sistema de governo parlamentarista.

Nos sete anos seguintes, a Somália vi-veu um período de paz, findado em 1969,quando o General Muhamed Siad Barre,contando com o apoio das Forças Arma-das somalis, tomou o poder por meio deum golpe de estado.

Durante os anos de Guerra Fria, SiadBarre contou com o apoio da antiga Uniãodas Repúblicas Socialistas Soviéticas(URSS), que fornecia armas e a garantia doapoio ideológico ao seu regime ditatorial.

No entanto, quando eclodiu o conflitode Ogaden, em 1977, entre a Somália e aEtiópia pela disputa do território deOgaden, a ex-URSS passou a apoiar a vizi-nha Etiópia, o que fez com que Siad Barresolicitasse o apoio dos EUA. O apoio lhefoi concedido, mas a derrota somali fez deOgaden parte do território etíope.

Em 1982, um novo conflito eclodiu entreos mesmos dois países, e os EUA assegu-raram apoio à Somália, fornecendo-lhe ar-mamentos e garantindo o sucesso da ope-ração. No entanto, na esfera nacional, aditadura de Siad Barre não foi tão eficiente,afundando o país numa crise irreversível.

Fortemente abalada com as diversasbatalhas firmadas contra a Etiópia, a popu-lação somali se insurgiu contra o governoditatorial de Barre, que, na tentativa de re-primir os insurgentes e se manter no poder,ordenou que as forças aéreas bombarde-assem algumas cidades do país. Essa ope-ração não obteve êxito. Em 1990, as forçasarmadas somalis se desfizeram porque ossoldados se recusavam a obedecer aoautoritarismo do ditador.

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

Esses soldados voltaram para suas ci-dades se autodeterminando “senhores deguerra”, uma espécie de “chefe local degoverno”. Na prática eles eram os líderesdos clãs, pequenos vilarejos organizadospor pessoas de uma mesma região que ti-nham por objetivos garantir a segurança ea sobrevivência daqueles habitantes.

Tamanha era a pressão anti-Barre que,em 1991, a ditadura de Muhamed Siad Barrefoi deposta e o colapso estatal começou ase instaurar na Somália: não havia mais go-verno – após a queda do ditador, ninguémpreencheu seu lugar –, as Forças Armadasse desfizeram e havia uma grave crisesocioeconômica – pois o país estava dividi-do em clãs e várias cidades haviam sidobombardeadas pelo próprio governo, na ten-tativa de conter as insurgências populares.

De acordo com o estudioso em piratariaPeter Lehr, em sua obra Somalia — pirates’new paradise, nos dois anos seguintes àderrubada de Siad Barre do poder por for-ças populares, a fome se alastrou pelo país,devido à ausência de governo e àconsequente falta de um aparato estatalcapaz de suprir as necessidades básicasdos cidadãos. Cerca de 300 mil somalismorreram de fome.

Tentando conter a grave crise instaura-da na Somália, a Organização das NaçõesUnidas (ONU) decidiu intervir na região.Sob seu apoio, foi instaurado o GovernoFederal Transnacional (GFT) em 2004, quedeveria exercer sua governabilidade a lon-ga distância, a partir do Quênia, devido àforte rejeição da população ao governoimposto. O GFT contava também com oapoio da Etiópia, inimiga de longas datasda Somália.

Segundo Zago e Millino, durante osanos de ausência de governo na Somália, aUnião das Cortes Islâmicas (UCI) dominoudiversas regiões do país, aplicando os có-digos e leis contidos na Sharia – livro reli-

gioso do islamismo. Em decorrência da im-posição do GFT, a UCI armou uma frentede oposição em Mogadíscio, capital somali,impedindo que o novo governo pudessegerir o país de dentro do território somali.

A oposição persistiu até o ano de 2006,quando a UCI fora expulsa do país peloGFT, fortemente apoiado pela Etiópia. Aconsequência dessa mudança de governofora quase que imediata. A criminalidadeaumentou tremendamente, visto que o GFTnão conseguiu impor a mesma estabilida-de que havia quando o país estava sob osmandamentos da Sharia.

Foi a partir de então que a pirataria come-çou a se expandir rapidamente na região doChifre Africano, tornando-se em pouco tem-po incontrolável pelo novo governo.

O GFT não é um governo de fato. Ape-sar de possuir a expressão “governo”, oGFT não é respeitado pela populaçãosomali nem exerce sua governabilidade naSomália, ou seja, é, na verdade, uma frenteorganizada, apoiada e equipada belicamentepela ONU e pela Etiópia, que busca restau-rar a paz local e combater a ação dos pira-tas, que tanto vem afetando o comérciointernacional.

Segundo Zago e Minillo, o apoio dadopela Etiópia ao Governo Federal Transna-cional instaurado na Somália seria umaafronta à população somali, relembrandoque, desde 1960, quando da independên-cia desse país, esses vizinhos sempre esti-veram em conflitos.

A respeito da presença etíope naSomália, assim afirmam Zago e Minillo:

Além da ligação com a recorrência dapirataria, a presença de tropas da Etiópiana Somália é, por si só, problemática.Muito é discutido quanto ao desrespei-to à soberania somali que estaria ocor-rendo em decorrência do apoio etíopeao GTF. A Somália, como qualquer Esta-

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do do atual sistema internacional, presapelo soberano controle de seu territó-rio. Por isso, o fato de um governo naci-onal necessitar do apoio militar de for-ças estrangeiras para se manter no po-der gera questionamentos a respeito daplausibilidade do jugo de tal governosobre o país. Grupos nacionalistas, porconseguinte, inquietam-se com o pre-sente arranjo político somali – afinal, ogrupo governante, além de ser incapazde comandar a Somália de forma efetiva,permite que um país vizinho com tradi-ção de atritos com seu próprio povopossua tropas emseu território35.

Como consequên-cia da falência do Es-tado somali e imposi-ção do GFT, que, comose pôde perceber, é umpseudogoverno, con-clui-se pela incapacida-de de se conter acriminalidade interna ena costa da Somália.

A “indústria da pirataria”

Outros fatores colaboram para que a pi-rataria na região do Golfo de Áden atinjatamanhas proporções. E por isso é de extre-ma importância fazer uma retrospectiva po-lítica e socioeconômica da situação vividana Somália, desde o colapso estatal de 1991.

Com a ausência de um governo sobera-no capaz de garantir os serviços sociaisbásicos, impor a estabilidade interna e pro-teger a população das ameaças externas,

os somalis passaram a se agrupar em clãs,de forma a garantir a sobrevivência de seusparentes e habitantes de uma mesma re-gião dentro da Somália.

Muitos desses clãs obtinham da pescao alimento necessário para sustentar seushabitantes. Utilizando-se de precárias em-barcações e redes de pesca improvisadas,os pescadores somalis lançavam-se ao marem busca de peixes e crustáceos para ma-tar a fome de seus familiares.

No entanto, com a ausência de um go-verno e de um exército capazes de garantiro cumprimento das leis de proteção das

águas oceânicas per-tencentes à Somália,os regulamentos acer-ca da proibição dapesca predatória pas-saram a ser desrespei-tados, sobretudo pe-los navios pesqueiroseuropeus, que viramnaquela região umaoportunidade de obte-rem pescado de quali-

dade em grandes quantidades.A necessidade de uma autoridade inter-

nacional ganha espaço quando há a inca-pacidade de um Estado para garantir a se-gurança em seu território e à sua volta. Naregião do Chifre Africano, percebe-se quea falência estatal da Somália gerou umaausência governamental e, com ela, o es-vaziamento da eficácia das leis que regu-lam a exploração da pesca nas águas cos-teiras, não apenas pelos pescadores locais,mas também pelos estrangeiros, atraídospela oportunidade de explorarem ao máxi-mo a fauna oceânica sem correrem o risco

35 ZAGO, Evandro Farid & MINILLO, Xaman Korai Pinheiro. Consequências da falência de um Estado:pirataria nas águas da Somália. Disponível em: <http://meridiano47.info/2008/11/23/consequencias-da-falencia-de-um-estado-pirataria-nas-aguas-da-somalia-por-evandro-farid-zago-xaman-korai-pi-nheiro-minillo/>. Acesso em: 15 mai, 2009, p. 3).

A necessidade de umaautoridade internacional

ganha espaço quando há aincapacidade de um Estadopara garantir a segurança

em seu território e à sua volta

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36 YUUSUF, Muuse. The armada is not the solution. Disponível em:< http://www.hiiraan.com/op2/2009/apr/the_armada_is_not_the_solution.aspx>. Acesso em: 12 mai, 2009, p. 1 e 2.

37 SOUZA, Tenório R. de. Corsários v/s piratas! A história repete-se no Oceano Indico. Disponível em:<http://apostarnahistoria.blogspot.com/2009/04/corsarios-e-piratas-historia-repete-se.html>. Aces-so em: 10 mai 2009, p. 1.

de serem multados ou terem seu pescadoapreendido.

Além disso, a pesca predatória pratica-da pelos navios estrangeiros era acompa-nhada de atos de violência contra os pes-cadores somalis. Os pequenos barcos dospescadores africanos eram, devido a suagrande fragilidade e à ausência de motorespotentes, facilmente atacados, e suas re-des de pesca eram destruídas, no intuitode intimidar os somalise afastar a concorrên-cia da região.

Outro aspecto im-portante da anarquiainternacional é justa-mente a relaçãoestabelecida entre ospaíses europeus e aSomália, em que os pri-meiros utilizam aSomália como umgrande lixeiro paraseus resíduos tóxicos.Desde a queda do go-verno somali, em 1991,a Europa vende seus lixos atômicos àSomália, sem considerar as consequênciaspara a população somali.

O preço pago por tonelada despejadanas águas da Somália é de irrisórios US$2,5, enquanto seriam pagos US$ 250 portonelada caso os dejetos fossem vendidosa um país europeu36.

As toneladas de barris são abarrotadasde lixo hospitalar e metais pesados, comomercúrio e cádmio, elementos químicos res-ponsáveis por infectar diversos somalis eocasionar cerca de 300 mortes por conta-minação em 2005, quando houve os alaga-

mentos provocados pelo tsunami ocorridono Pacífico e que revelou esse terrível se-gredo à comunidade internacional.

Assim explica Souza, em seu artigo “Cor-sários v/s piratas! A história repete-se noOceano Índico”, publicado em abril de 2009:

Exatamente isso: lixo atômico. Nem bemo governo se desfez (e os ricos parti-ram), começaram a aparecer misterio-

sos navios europeusno litoral da Somália,que jogavam ao marcontêineres e barrisenormes. A populaçãodo litoral começou aadoecer. No começo,erupções de pele, ná-useas e bebêsmalformados. Então,com o tsunami de2005, centenas de bar-ris enferrujados ecom vazamentos apa-receram em diferentespontos do litoral.

Muita gente apresentou sintomas decontaminação por radiação, e houve300 mortes37.

Como consequência dessa soma de fa-tores – falência estatal, pesca predatóriaao longo da costa da Somália e venda delixo tóxico a grupos somalis –, veio a res-posta da população, que, sem um governosoberano capaz de proporcionar a defesado território e a fiscalização da zona costei-ra contra a pesca predatória, decidiu porela mesma resguardar suas águas e garan-tir seu sustento por meio da pesca. Esses

Outro aspecto importanteda anarquia internacional é

que, desde a queda dogoverno somali, em 1991, a

Europa vende seus lixosatômicos à Somália, sem

considerar asconsequências para a

população somali

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“heróis” nacionais foram os primeiros pi-ratas somalis38.

Zago e Minillo assim descrevem a evo-lução da pirataria na Somália:

O grande problema adveio do fato de queos navios pesqueiros agiam proposital-mente em detrimento dos pescadores lo-cais: destruíam os equipamentos de bar-cos menores, cortavam suas redes depesca e até mesmo atacavam naviossomalis. Além disso, surgiram problemasdecorrentes do depósito, por parte deembarcações estrangeiras, de lixo tóxicona costa do país. Consequentemente, orendimento dos pescadores da regiãodecaiu, e sua sobrevivência foi compro-metida. Como não havia um Estado quepudesse defender o interesse nacional epoliciar de forma adequada a costa daSomália, os próprios pescadores – e tam-bém outros habitantes da região não vin-culados à pesca – encarregaram-se de

fazê-lo. Destarte, navios estrangeirospassaram a ser sequestrados na região, esua libertação ocorria apenas mediantepagamento de resgate. O objetivo era,por meio dos sequestros, intimidar asgrandes companhias pesqueiras e, des-sa forma, afugentá-las, recuperando arentabilidade da pesca tradicional somali.Foi, portanto, dessa forma que surgiramos primeiros piratas da Somália39.

Após os primeiros ataques a navios depesca estrangeiros, os piratas somalis co-

Figura 02 – Barril de resíduos tóxicos trazidopelas ondas à praia da Somália

(Disponível em:<http://www.hiiraan.com/op2/2009/apr/the_armada_is_not_the_solution.aspx>.)

Figura 03 – Mapa da localização dos lixosquímicos levados ao território somali pelas

enchentes (Idem)

38 ZAGO, Evandro Farid & MINILLO, Xaman Korai Pinheiro. Consequências da falência de um Estado:pirataria nas águas da Somália. Disponível em: <http://meridiano47.info/2008/11/23/consequencias-da-falencia-de-um-estado-pirataria-nas-aguas-da-somalia-por-evandro-farid-zago-xaman-korai-pi-nheiro-minillo/>. Acesso em: 15 mai, 2009, p. 2.

39 ZAGO, Evandro Farid & MINILLO, Xaman Korai Pinheiro. Consequências da falência de um Estado:pirataria nas águas da Somália. Disponível em: <http://meridiano47.info/2008/11/23/consequencias-da-falencia-de-um-estado-pirataria-nas-aguas-da-somalia-por-evandro-farid-zago-xaman-korai-pi-nheiro-minillo/>. Acesso em: 15 mai, 2009, p. 2.

Iêmen

Etiópia Golfo de Aden

Hobyo

Tóxico

TsunamiWave

0 100 200 300 Km

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meçaram a perceber que a cobrança de res-gates para libertar os prisioneiros e o sa-que de cargas era uma atividade bastantelucrativa e que, com o lucro dessas práti-cas, era possível não apenas garantir osustento de suas famílias, mas também in-vestir na aquisição de lanchas, armamen-tos e tecnologia, como motores mais po-tentes para as embarcações e GPS40.

Assim, o que a princípio era apenas ummecanismo de defesanacional contra ospescadores estrangei-ros se tornou a princi-pal atividade econô-mica desenvolvida naSomália e, nas pala-vras de Zaga &Minillo, formou-se a“indústria da pirata-ria”. Recebeu essenome por ser uma ati-vidade que envolvegrande parte do país etem aceitação nacio-nal pelo fato de os pi-ratas somalis trazeremrecursos financeiros eproteção à populaçãodas ameaças externas.

Esses mesmos au-tores afirmam, ainda,que, ao saquearem umnavio ou receberem opagamento de um resgate, os piratas doamparte do recurso arrecadado à comunidade.Geralmente, as cidades de onde advêm ospiratas são Puntland e Harardhere, pois eramcidades que viviam basicamente da pescaantes da falência de seu país, em 1991.

Ilustrando a ideia de Zago & Minillo deque a pirataria na Somália é uma indústria,vale ressaltar que existem na região de

Puntland grupos de traficantes especializadosem fornecer armamentos da mais altatecnologia aos piratas, e há também empre-sas do ramo de alimentos encarregadas devender comida para que os piratas possamalimentar seus reféns enquanto os resgatesnão são pagos.

Acerca das etapas que envolvem a in-dústria da pirataria somali, assim afirmamZago & Minillo:

Os anos passaram-see, ao final de 2008, oque se nota nas cos-tas da Somália é umaverdadeira indústria dapirataria. Os piratassomalis já atuam naposse de armamentopesado e barcos velo-zes, além de possuíremsofisticados planos deação. Inicialmente,grupos de cerca de dezhomens interceptamembarcações maiorese, com a ajuda de cercade 50 outros piratasque se aproximam emseguida, conseguemrender a tripulação dosnavios atacados. De-pois disso, um grupode mais 50 aguarda-os

em terra para a recepção do grupo. Alucratividade das incursões piratasadvém das altas recompensas recebidasem troca das pessoas mantidas como re-féns e dos barcos retidos; a média é deUS$ 2 milhões por embarcação seques-trada.(...)A pirataria tornou-se a principal ativi-dade econômica da região de Puntland,

40 Idem, p. 4.

Ao saquearem um navio oureceberem o pagamento de

um resgate, os piratasdoam parte do recurso

arrecadado à comunidade

há também empresas doramo de alimentos

encarregadas de vendercomida para que os piratas

possam alimentar seusreféns enquanto os

resgates não são pagosZago & Minillo

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

localizada no Golfo de Aden, na costanorte da Somália. Nesse contexto, temdestaque a cidade portuária de Eyl, omais tradicional destino dos navios cap-turados em alto-mar. O município já pos-sui inclusive empresas especializadasem serviço de alimentação de reféns41.

Além de haver todo esse aparato pró-pirataria dentro da Somália, há também umarede de interessados a nível internacionalque desejam fortemente que a região doGolfo de Áden se torne cada vez mais ame-açadora ao tráfico marítimo. Esses inte-ressados são as grandes empresas de se-guro – que estão se aproveitando do pâni-co gerado para ganhar fortunas – e os pro-dutores de petróleo das regiões não afeta-das pela pirataria.

Assim, uma série de fatores se somam:o aumento do preço do seguro, a elevaçãodo custo total de transporte e, finalmente,a subida de preço do produto final que che-ga aos consumidores de vários países.

Bem descreve a situação reportagempublicada na BBC Brasil em abril de 2009:

Além dos prejuízos diretos para os en-volvidos na indústria da navegação, oprincipal resultado é o encarecimentodo frete, com consequente aumento dopreço das mercadorias transportadas.As empresas de transporte de cargapassam adiante os custos de seguran-ça, seguro, recompensa e combustívelextra. Por fim, esse aumento chega aoconsumidor comum. Estima-se que em

2008 a pirataria tenha custado entre US$60 milhões e US$ 70 milhões42.

Com o crescimento da atividade piratano Golfo de Áden, o transporte de petró-leo e gás passou a ser extremamente peri-goso. Além do aumento exagerado do pre-ço do seguro nesse trecho marítimo, o ris-co de morte da tripulação e de desastresambientais tem afastado o interesse pelopetróleo advindo dos países que fazem usodessa rota para escoar a produção. Segun-do reportagem do JB Online43, a Nigéria,membro da Organização dos Países Expor-tadores de Petróleo (Opep), teve cerca deum quinto de sua produção de petróleo egás reduzida. Considerando que não hou-ve redução no consumo de petróleo e gásno mundo, conclui-se que outros grandesprodutores têm sido beneficiados direta-mente pela insegurança na região do Chi-fre Africano.

A pirataria na costa da Somália e oDireito Internacional

Caro companheiro, você pode ser pirata(...) Não há fiscalização e, mesmo quesejamos pegos, nada pode ser pior doque a mediocridade desta vida. Você pre-cisa somente de três homens e um bar-quinho, e no próximo dia você está mili-onário (Qawden, ex-militar da extintaMarinha somali)44.

Não existe, ainda, uma autoridade marí-tima decorrente do Direito Internacional

41 Ibidem, p. 2.42 BBC Brasil. Tire suas dúvidas sobre a pirataria na costa da Somália. Disponível em:< http://www.bbc.co.uk/

portuguese/noticias/2009/04/090409_qeapiratariaml.shtml > Acesso em: 10 jun, 2009, p. 2.43 JB Online. Ação de piratas modernos leva Otan a fazer segurança na África. Disponível em:<http://

74.125.47.132/search?q=cache:QEH0ROLjt08J:jbonline. terra.com.br/extra/2008/10/30/e 3 0 1 0 1 7 3 8 5 . h t m l + p r o d u t o r e s + d e + p e t r % C 3 % B 3 l e o + 2 0 0 8 + p i r a t a s & c d = 1 & h l = p t -BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em: 11 jul, 2009.

44 PELÍCANO – Jornal da Efomm: Pirataria: a lenda está mais viva do que nunca. Disponível em: <http://pelicano.sammrj.com.br/2009/02/especial-pirataria/>. Acesso em: 15 jun, 2009, p. 2.

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

capaz de conter as ações dos piratas naregião do Chifre Africano. Cabe a cada Es-tado, individualmente, garantir a seguran-ça interna de seu território e fiscalizar suaságuas costeiras até o limite de 200 (duzen-tas) milhas45.

No entanto, há situações em que a açãodo Estado, por si só, é insuficiente para fis-calizar e combater as ilicitudes praticadasnas águas que o circundam. É o que ocorreno caso da Somália, que, devido à falênciaestatal e à extinção de suas Forças Arma-das, tornou-se incapazde impedir a prática decrimes ambientais e asações de pirataria.

O efeito da ausên-cia de um governo so-berano forte e eficaz éa formação de áreasentregues ao acaso,sem leis específicas esem policiamento.Sendo assim, boa parte das águas do Gol-fo de Áden, que antes se submetiam aoEstado somali, estão agora desprovidas detoda e qualquer forma legal de poder. Pre-domina a “lei dos mais fortes”, em que asembarcações mais velozes, mais bem arma-das e/ou com melhor estratégia exercem ocontrole da região, sejam elas simples bar-cos de piratas e de pescadores ou naviosde lazer e transportadores de cargas.

No entanto, no caso de pirataria ocorridafora da jurisdição de um Estado, segundo aConvenção das Nações Unidas sobre Direitodo Mar, é permitido que as Forças Armadas

oficiais de qualquer país exerçam seu poder depolícia, sendo autorizadas, assim, a aplicar suasleis nacionais para julgar os criminosos46.

Segundo a Carta Magna somali, os pira-tas capturados em áreas de jurisdição nacio-nal devem ser julgados pelos tribunaissomalis, com previsão de extradição median-te sua anuência. O grande problema para ocumprimento dessa norma é a ausência dosinstrumentos jurídicos necessários para ojulgamento e a condenação dos criminosos.

Diante desse quadro de impossibilidadede aplicação das leissomalis e de combate àcriminalidade em suaárea de jurisdição, aSomália enviou um co-municado à ONU re-nunciando a seu direi-to de soberania na ex-tensão de seu território.

A renúncia de seupoder de condenar e

julgar seus criminosos feita pela Somáliafoi uma forma de o país reconhecer inter-nacionalmente sua incapacidade de exer-cer seu poder de polícia e, consequente-mente, seu poder de império.

Pode-se considerar, assim, que o artigo105 da Convenção das Nações Unidas so-bre Direito do Mar deverá ser aplicado aosprisioneiros somalis, pois, apesar de todoataque ocorrido a uma distância de até 12milhas do território somali estar sujeito àsleis desse país, a ausência do aparato militare jurídico (exército e tribunais) tornaria semefeito o aprisionamento desses piratas.

45 Segundo artigo 105 da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar.46 Artigo 105 da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar: “Todo Estado pode apresar, em

alto-mar ou em qualquer outro lugar não submetido à jurisdição de qualquer Estado, um navio ouaeronave pirata, ou um navio ou aeronave capturados por atos de pirataria e em poder dos piratase prender as pessoas e apreender os bens que se encontrem a bordo desse navio ou dessa aeronave.Os tribunais do Estado que efetuou o apresamento podem decidir as penas a aplicar e as medidas atomar no que se refere aos navios, às aeronaves ou aos bens, sem prejuízo dos direitos de terceirosde boa-fé”.

A Somália enviou umcomunicado à ONU

renunciando a seu direitode soberania na extensão

de seu território

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

Segundo noticiado pela rede BBC Bra-sil de Comunicações em 9 de abril de 2009,está presente nos debates diplomáticos ointeresse de se criar uma corte internacio-nal para julgar os piratas apreendidos naságuas somalis:

Não existe uma legislação internacionalpara os acusados de pirataria, apesar demuitos terem sido julgados no Quênia,enquanto outros presos por militaresfranceses estão respondendo a julga-mento na França. Alguns diplomatas ar-gumentam que é necessária uma corteinternacional para esse tipo de crime, quetenha o apoio da ONU, além de uma pri-são internacional para os condenados47.

No entanto, enquanto não é posto emprática esse projeto, qualquer Estado pode-rá atuar fiscalizando e combatendo as práti-cas de pirataria na região, submetendo, as-sim, os prisioneiros à legislação de um paísvizinho à Somália ou de um Estado titular dabandeira do navio que os capturou.

Assim prevê trecho destacado da Re-solução 1.851 do Conselho de Segurançadas Nações Unidas:

Observando com preocupação que a fal-ta de capacidade, legislação doméstica eclaridade sobre a adoção de disposiçãosobre os piratas após sua captura temimpedido que se adotem medidas maisfirmes no plano internacional contra ospiratas fora da costa da Somália e, emalguns casos, tem conduzido os piratasà liberdade sem que tenham sido julga-dos, e reiterando a Convenção de 1988para a repressão de atos ilícitos contra asegurança da navegação marítima (“Con-

venção SUA”), prevê que as partes po-derão tipificar delitos, estabelecer suajurisdição e aceitar a entrega das pesso-as responsáveis ou suspeitas de apre-ender ou de exercer o controle sobre umnavio mediante violência ou qualqueroutra forma de intimidação48.

Isso, teoricamente, contraria o princípiolex regit actum do Direito InternacionalPúblico, em que cada fato deve ser julgadode acordo com as leis vigentes no localonde ele fora executado. Um ato de pirata-ria praticado nas águas costeiras daSomália, até o limite de 12 milhas, deveriaser submetido às leis somalis, independen-temente de quem fossem a vítima e o res-ponsável pela captura dos criminosos.

Segundo Carvalho e Araújo, no séculoXIX e início do século XX, a responsabili-dade internacional dos Estados era o focodos debates acerca dos ilícitos penais pra-ticados além das fronteiras de um país.Assim, os Estados, em todas as hipóteses,eram responsabilizados pelos crimes inter-nacionais praticados por seus indivíduos.

47 BBC, Brasil. Tire suas dúvidas sobre a pirataria na costa da Somália. Disponível em:< http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2009/04/090409_qeapiratariaml.shtml > Acesso em: 10 jun, 2009, p. 2.

48 ONU – Organização das Nações Unidas. Disponível em:<http://www.un.org>. Acesso em: 19 mai,2009.

Figura 04 – Piratas somalis atacando naviocargueiro (Disponível em:<http://movv.org/

2008/11/20/sobre-a-captura-de-33-tanques-t-72-por-piratas-somalis-um-superpetroleiro-

saudita-e-da-sua-crescente-ousadia/>)

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

Em meados do século XX, um novoenfoque foi dado aos crimes de alcanceinternacional. A responsabilidade passoua ser individualizada, de forma que o indi-víduo que cometeu o crime é que deve serpunido. Assim, para evitar a impunidade,algumas condutas passaram a ser consi-deradas crimes de responsabilidade global,ou seja, crimes que por terem atingido pro-porções que fogem ao controle do próprioEstado e por representarem uma ameaça àhumanidade deveriam ser objeto de fiscali-zação e combate por diversos países pre-judicados ou que se sentissem ameaçados.

Dessa forma, a pirataria seria um crime dejurisdição universal, ouseja, não seria de res-ponsabilidade apenasde seu país de origem,de forma que os pira-tas capturados estari-am sujeitos ao julga-mento do país que osaprisionasse ou dequalquer outro paísque desejasse julgá-los, caso o que os pren-deu não desejassefazê-lo, desde que nãofossem aplicados penade morte, tortura oumaus tratos. É o que consta no artigo 12 doato que instituiu a Operação Atalanta:

Com base, por um lado, na aceitaçãopela Somália do exercício da compe-tência jurisdicional pelos Estadosmembros ou por Estados terceiros e,por outro, no artigo 105 da Conven-ção das Nações Unidas sobre o Direi-

to do Mar, as pessoas que cometamou sejam suspeitas de ter cometidoatos de pirataria ou assaltos a mão ar-mada detidas nas águas territoriais daSomália ou em alto-mar bem como osbens que tenham servido para execu-tar esses atos são transferidos:— para as autoridades competentes doEstado membro ou do Estado terceiroque participe da operação e cujo navioque tenha efetuado a captura arvora asua bandeira, ou— se tal Estado não pode ou não desejaexercer a sua jurisdição, para um Estadomembro ou Estado terceiro que deseje

exercê-la sobre as pes-soas ou os benssupramencionados49.

A Operação Atalantaé um acordo firmado emdezembro de 2008 entreos Estados membros daUnião Europeia e cujosobjetivo são garantirque as remessas de ali-mentos entrem naSomália e fiscalizar ecombater os atos de pi-rataria na região.

Assim, os naviosdos países europeus participantes dessaoperação mudaram suas bandeiras para abandeira da União Europeia e poderão apri-sionar os piratas e aplicar a eles a legisla-ção de seu país.

Há ainda um acordo feito entre a UniãoEuropeia e o Quênia e o Djibouti que permi-te que esses países julguem os piratas cap-turados. Esse é o motivo de grande parte

49 MACHADO, Geruza de Carvalho. Âmbito Jurídico. Disponível em <http://64.233.163.132/search?q=cache:SFbzAP-JGecJ:www.ambito-juridico.com.br/site/index.php%3Fn_link%3Drevista_artigos_leitura%26artigo_id%3D6248+a+responsabilidade+internacional+da+som%C3%A1lia+frente+aos+ataques+piratas&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em: 11 nov, 2009,p. 3.

Os navios dos paíseseuropeus participantes da

Operação Atlantamudaram suas bandeiraspara a bandeira da União

Europeia e poderãoaprisionar os piratas e

aplicar a eles a legislaçãode seu país

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

dos somalis aprisionados por embarcaçõeseuropeias terem sido levados ao Quênia.

Um caso prático dessa situação pode serrelatado a partir do aprisionamento de seispiratas somalis pelo exército francês, em 2008.Segundo Bizawu50, esses piratas foram cap-turados em terra firme, dentro da Somália, elevados para a França para serem julgados econdenados pelo tribunal de Paris.

Para esse autor, esse julgamento é ilegal,pois não sujeita os acusados às leis queregiam o local onde o fato fora praticado,mas os submete a umalegislação não compe-tente para julgá-los:

Ora, tal argumenta-ção não condiz comDireito Internacio-nal, uma vez que oexercício da compe-tência universal sedaria se os crimino-sos tivessem sidocapturados pelasforças francesas emáguas internacio-nais onde a navega-ção é livre ou pre-sos em território francês ou, ainda, setivessem sido julgados e condenados naSomália e, mais tarde, extraditados para aFrança a pedido do governo francês, coma anuência da Somália em extraditar seusnacionais51.

O resultado desse julgamento foi a con-denação dos piratas à prisão perpétua,

pena não prevista pelo ordenamento jurí-dico somali.

Afrontando não apenas o princípio do Di-reito Internacional de que os fatos devem sersubmetidos às leis que o regem, mas também aprópria soberania somali, a ONU vem chaman-do a atenção internacional para o problema dapirataria na Somália, por meio de resoluçõespublicadas constantemente pelo Conselho deSegurança, sugerindo a perseguição dessescriminosos também em terra firme, conformeocorrera na investida antipirata realizada pelo

exército francês naSomália.

É importante ressal-tar o trecho da Resolu-ção 1.851 do Conselhode Segurança da ONU:

Observando as múlti-plas petições do Gover-no Federal de Transiçãopara que lhe fosse pres-tada assistência inter-nacional na luta contraa pirataria em sua costa(...) para adotar todas asmedidas necessáriaspara interceptar quem

utilizar o território e o espaço aéreo daSomália com o propósito de planejar, faci-litar ou cometer atos de pirataria e de rou-bo a mão armada no mar(...)52.

No último semestre de 2008, umasequência de incidentes mostrou claramen-te que a comunidade internacional está real-mente disposta a unir forças para combater

50 BIZAWU, Sébastien Kiwonghi. Pirataria nas águas internacionais e as novas tendências do DireitoInternacional Privado. Disponível em:< http://www.domtotal.com/direito/pagina/detalhe/23865/pirataria-nas-aguas-internacionais-e-as-novas-tendencias-do-direito-internacional-privado >. Acessoem: 24 jul, 2009, p. 1.

51 Idem.52 ONU – Organização das Nações Unidas. Disponível em:<http://www.un.org>. Acesso em: 19 mai,

2009.

A questão da pirataria naregião do Chifre Africano

tem demonstradoclaramente que não se trata

apenas de alguns fatosesporádicos cometidos poralguns criminosos isolados,

mas sim de umaorganização criminosamuito bem organizada

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

os crimes nos mares do Chifre Africano. Emsetembro, três navios de diferentes nacio-nalidades liderados pela Marinha norte-ame-ricana cercaram um navio ucraniano domi-nado por piratas. Em outubro, militares fran-ceses detiveram piratas somalis na regiãodo Golfo de Áden. Já em dezembro do mes-mo ano, a Marinha indiana conseguiu pren-der 23 piratas, em sua maioria somalis.

A questão da pirataria na região do Chi-fre Africano tem demonstrado claramenteque não se trata apenas de alguns fatosesporádicos cometidos por alguns crimi-nosos isolados, mas sim de uma organiza-ção criminosa muito bem organizada e quenão está disposta a se render facilmente.

É preciso uma união internacional nosentido de pensar em estratégias contínu-as de fiscalização da região, atuação militare punição dos infratores sem confrontaros princípios do Direito Internacional e semferir a soberania somali, considerando prin-cipalmente a crise enfrentada no país e osreais motivos dessa rápida expansão dapirataria na costa da Somália.

PRINCIPAIS ORGANISMOSINTERNACIONAIS ENVOLVIDOS NOCOMBATE DA PIRATARIA NACOSTA DA SOMÁLIA

Como demonstrado no capítulo anterior,os Estados nem sempre são eficazes na apli-cação de suas leis e da estabilidade em seupaís, o que abre espaço para a atuação deoutros atores, sejam eles Estados ou não,na tentativa de combater os perigos e asameaças desse território “abandonado”.Juntamente com os Estados, diversas orga-nizações internacionais, entre elas Organi-zação das Nações Unidas (ONU), Organiza-

ção do Tratado do Atlântico Norte (Otan),Organização Marítima Internacional (IMO)e União Europeia, por meio da OperaçãoAtalanta, estão atuando no sentido de re-cuperar a segurança do Golfo de Áden.

A ONU foi criada em 1945, final da Segun-da Guerra Mundial, com o objetivo de “man-ter a paz e a segurança internacionais, desen-volver relações amistosas entre as nações epromover o progresso social, melhores ní-veis de vida e os direitos humanos”53.

Desde sua criação, a Organização dasNações Unidas tem estado presente em gran-de parte dos conflitos internacionais, atu-ando por meio da promoção de fóruns dedebate entre os países, da publicação deresoluções, da assistência humanitária e atémesmo do envio de tropas pacificadoras54.

A operação da ONU na Somália tem ocor-rido por meio das missões Unosom I e II(United Nations Organizations I and II), con-tando com forte apoio das Forças Armadasnorte-americanas. O grande objetivo dessasmissões é o de restabelecer o poder de polí-cia e os sistemas jurídico e penal na Somália,possibilitando assim a reestruturação de umgoverno soberano no país.

Para elas, atuando contra o caos ins-taurado na Somália e organizando o paísinternamente, haverá sucesso nas opera-ções que visam a combater o sustentáculoda pirataria, e assim será mais fácil de refre-ar a prática desses crimes.

O Conselho de Segurança da ONU tempublicado diversas resoluções no sentido dechamar a atenção internacional para a pirata-ria fomentada na Somália, estabelecendo re-gras de conduta para combater essa prática.

A primeira resolução a respeito da situaçãoem que se encontra a Somália fora publicadaem 23 de janeiro de 1992, quando o país se

53 ONU – Organização das Nações Unidas. Disponível em:<http://www.un.org>. Acesso em: 19 mai, 2009.54 Diversos autores questionam esse caráter pacificador das tropas da ONU, entendendo que muitas vezes

a atuação desse organismo não passa de uma manobra política norte-americana.

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encontrava num imenso caos após a deposi-ção do ditador Siad Barre e a eclosão de umagrande guerra civil. A resolução 733 prevê que:

(...) todos os Estados, com objetivo de es-tabelecer a paz e a estabilidade na Somália,apliquem imediatamente um embargo gerale completo de todos os fornecimentos dearmas e equipamentos militares à Somáliaaté que o conselho decida o contrário.55

O embargo do fornecimento de armas àSomália perdura até hoje. No entanto, sabe-se que os piratas somalis são extremamentebem equipados de ar-mamentos, inclusivemísseis e bombas.Como explicar tal fato?

Na verdade, duassão as fontes de ondeos piratas somalis ob-têm os equipamentosmilitares: por meio daspróprias ações piratase do roubo das armasdos navios invadidose, principalmente, pormeio do contrabando.Como já mencionadoneste trabalho, existena Somália uma verda-deira indústria da pira-taria, da qual os pira-tas são apenas a “ponta do iceberg”, a fra-ção do todo percebida pelo mundo. A mai-or parte dessa indústria está em terra firme.Afirmou Dmitri Rogozin, embaixador russona Otan em 2008, numa entrevista coletivana Bélgica: “Todos sabemos que é em terraque os piratas têm seus refúgios, e deveria

ser feito um esforço comum para acabarcom eles”56.

As armas contra-bandeadas chegam aopaís pelos diversos portos somalis – LaQoray, Kismayo – de onde são distribuí-das aos chefes dos grupos piratas. A maiorparte do contrabando de armas que entrana Somália vem dos Emirados Árabes, doYêmen e de Uganda.

Nas resoluções seguintes o Conselhode Segurança das Nações Unidas manteveo embargo de armas e, por perceber quemuitos países estavam quebrando esseacordo, talvez por não conseguirem esta-

belecer um plano efi-caz de fiscalização emsuas fronteiras, o Con-selho se preocupouem estabelecer puni-ções não só aos pira-tas, mas a qualquerpessoa ou entidadeque contribuísse dealguma forma com es-sas atividades.

Em novembro de2008, foi publicada aResolução 1.851 doConselho de Seguran-ça da ONU estabele-cendo que os paísesou pessoas que prati-cassem atos de pirata-

ria ou contribuíssem com eles ou dificul-tassem a distribuição de ajuda humanitáriaestariam sujeitos a sanções.

Segundo a Resolução 1.844 do Conselho,estará sujeito a punições impostas por estequem: “a) participe de atos que ameacem apaz, a segurança ou a estabilidade da Somália

55 ONU – Organização das Nações Unidas. Disponível em:<http://www.un.org>. Acesso em:19 mai, 2009.56 Folha Online. Consumidores vão pagar por sequestro de navios, dizem especialistas. Disponível

em:<http://74.125.95.132/search?q=cache:-9lx7MKXSwkJ:www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u469038.shtml+rota+alternativa+pirataria+cabo+da+boa+esperan%C3%A7a&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em: 21 jul, 2009, p. 1.

Os argumentos utilizadospela ONU para justificar osinal verde para os paísesadentrarem na Somália

quando bem entenderem sãoconter o avanço desenfreadodos atos de pirataria e evitar

maiores prejuízoseconômicos e poupar a

exposição dos tripulantes asituações de pânico

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ou lhes preste apoio (...), c) obstrua a presta-ção de assistência humanitária à Somália, ouo acesso da assistência humanitária ou suadistribuição”57.

Outra medida tomada pelo Conselho, nointuito de evitar maiores proporções dosatos de pirataria, foi a autorização dada aosseus Estados membros de utilizarem osmeios que julgarem necessários para com-bater a ação dos piratas, permitindo inclu-sive a perseguição destes dentro do pró-prio território somali.

Os argumentos utilizados pela ONU parajustificar o sinal verde para os paísesadentrarem na Somália quando bem entende-rem são conter o avan-ço desenfreado dosatos de pirataria e evitarmaiores prejuízos eco-nômicos e poupar a ex-posição dos tripulantesa situações de pânico.

Em sua mais recenteresolução, publicadaem maio de 2009, o Con-selho de Segurança dasNações Unidas reforçao pedido de apoio financeiro para dar conti-nuidade à missão Amisom, ativada naSomália. Segundo o texto da ONU, os recur-sos seriam investidos na reconstrução dasinstituições de segurança do país e em equi-pamentos militares e treinamentos das For-ças Armadas nacionais.

O foco da ONU agora é combater a pira-taria de dentro para fora dos limites estatais.Vencendo a criminalidade que ocorre den-tro da Somália, destruir-se-ão as bases dapirataria praticada nas águas internacionais.

Dentro do país, a ONU foi fundamentalna formação do Governo Federal de Transi-

ção em 2004, que está até hoje no poder.Apesar de se encontrar há tantos anos nopoder e ser apoiado pela ONU e pela comu-nidade internacional, o GFT não conseguiuimpor sua autoridade e reorganizar o país.

O apoio dado pela ONU a esse governode transição não tem sido suficiente para queele possa se fortificar e exercer o controle docaos vivido no país. Urge a reconstrução dasinstituições nacionais para que a eficácia doGoverno somali seja garantida. Como podeum governo funcionar sem exercer seu podercoercitivo? Se não há mais polícia nem siste-ma judiciário, quem punirá os infratores?

A Organização Marítima Internacional éuma agência especi-alizada da ONU comsede no Reino Unido,que foi instituída naConvenção de Gene-bra em 1948, com o ob-jetivo de “desenvol-ver e manter uma es-trutura reguladora de-talhada para o trans-porte, e o seu manda-to inclui hoje a segu-

rança, interesses ambientais, matérias le-gais, a cooperação técnica, a segurançamarítima e a eficiência do transporte”58.

A Organização conta hoje com a partici-pação de 168 Estados membros e tem comoprincipal tarefa solucionar a questão dapirataria na costa da Somália.

Os seus trabalhos por meio do estabe-lecimento de medidas internacionais desegurança da navegação contra ataquespiratas têm sido eficazes.

Pela circular MSC no 443 do MaritimeSafety Committee (espécie de Conselho deSegurança da IMO), a IMO propõe uma sé-

57 ONU – Organização das Nações Unidas. Disponível em:<http://www.un.org>. Acesso em:19 mai, 2009.58 IMO – International Maritime Organization. About IMO. Disponível em: <http://www.imo.org>.

Acesso em: 11 mai, 2009.

Vencendo a criminalidadeque ocorre dentro da

Somália, destruir-se-ão asbases da pirataria

praticada nas águasinternacionais

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rie de medidas para reduzir os riscos de umataque pirata. Dentre elas estão a instalaçãode iluminação de segurança, alarmes e sis-temas de comunicação nas embarcações emaior segurança nas regiões portuárias.

A atuação do organismo marítimo espe-cializado da ONU está diretamente vincu-lada às denúncias feitas pelos países querelatam os casos de pirataria e convocam aOrganização a lhes prestar auxílio nas ne-gociações e na recuperação da embarca-ção dominada por piratas.

A IMO também conta com o apoio degrupos especializados para desenvolveremestratégias de combate à pirataria e para

Figura 05 – Mapa da África, com destaque para a localização do Cabo da Boa Esperança(Disponível em: <http://www.suapesquisa.com/mapas/mp-africa.jpg>)

negociarem a libertação de reféns e o pa-gamento de resgates.

Desde 1998, ela vem desenvolvendo umprojeto antipirata, que consiste em atrelaruma série de oficinas e seminários, paraalertar os governos dos perigos a que es-tão sujeitas algumas rotas marítimas inter-nacionais, ao estabelecimento de acordosentre os países, no intuito de desenvolvermedidas de combate à pirataria.

A IMO alerta que o número reduzido depessoas a bordo favorece os ataques. Ao per-ceberem que uma embarcação está compostapor poucos tripulantes, os piratas sentem-semenos intimidados e menos ameaçados de

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

Figura 06 – Marcações indicando o caminho das rotas via Golfo de Áden e em direção ao Cabo daBoa Esperança (Imagem disponível em: < http://www.estadao.com.br/noticias/internacional,india-

pode-mandar-mais-navios-para-combater-piratas-no-indico,281315,0.htm>)

invadir o navio, o que facilita o controle dasituação e propicia o sucesso da investida.

Algumas medidas propostas pela Orga-nização por meio da Circular no 1.334,publicada em 23 de junho de 2009, são: usariluminação e equipamentos de fiscalização,

controlar o acesso ao navio e às suas áre-as restritas por passageiros e pela própriatripulação, monitorar os instrumentos desegurança da embarcação, capacitar a tri-pulação para manipular os meios de segu-rança e agir em caso de ataque pirata.

ALVOS DA PIRATARIA

ROTAS TRADICIONAIS ROTA PELO CABO DA BOA ESPERANÇA,CONSIDERADA MAIS SEGURA

MARMEDITERRÂNEO

CANALDE SUEZ

ERITRÉIA

DJIBUTI

ETIÓPIA

QUÊNIA

TANZÂNIA

ARÁBIASAUDITA

IÊMEN

SOMÁLIAPorto de Eyl

OCEANOÍNDICO

GOLFOPÉRSICO

ESTREITODE ORMUZ

PETROLEIROSAUDITA

OS ÚLTIMOSATAQUES

EMBARCAÇÃO DEHONG KONG

INFOGRÁFICO/AE

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

Sabendo do alto custo de algumas medi-das de prevenção, como a instalação dosequipamentos de segurança nas embarca-ções, algumas empresas têm optado por umamedida mais drástica. Como mencionado aolongo deste trabalho, o intenso fluxo de na-vios cargueiros na rota comercial via Golfode Áden, muitas vezes repletos de barris depetróleo ou aparelhos eletrônicos, é um gran-de atrativo para os piratas. Sendo a regiãoaltamente perigosa e gerando altos prejuí-zos aos navios atacados, alguns comerci-antes preferem navegar por uma rota alter-nativa, via Cabo da Boa Esperança, extremosul da África do Sul.

Visando a poupar osrecursos despendidoscom as altas tarifas deseguros e evitar pôr emrisco o carregamento demercadorias e a vida daspessoas a bordo, algu-mas empresas têm op-tado por uma rota 30%mais distante – informa-ção publicada em repor-tagem da Folha Onlineem 18 de novembro de2008 – e, consequente-mente, mais custosa.

Nas palavras deDolnick, as vantagens da rota marítima viaGolfo de Áden:

O Golfo de Áden dá acesso ao Mar Ver-melho, que, por sua vez, encontra o MarMediterrâneo através do Canal de Suez.A rota é muitos milhares de quilômetros,e muitos dias, mais curta do que a circu-navegação do Cabo da Boa Esperança,no extremo sul da África59.

A nova rota evita a travessia via Golfo deÁden – Mar Vermelho para se chegar à Eu-ropa, utilizando-se da circunavegação aolongo da costa africana, contornando oCabo da Boa Esperança e atingindo as águasdo Oceano Atlântico, seguindo o caminhopara o país desejado.

Como citado anteriormente, a OperaçãoAtalanta é o projeto mais recente no senti-do de recuperar a estabilidade na região doGolfo de Áden. Criada em dezembro de 2008por iniciativa da União Europeia (EU) e comrespaldo da ONU, a Operação Atalantaconta com a participação de seis navios,

três aviões e 1.200 pes-soas dos diversos pa-íses membros da UE60.

O grande objetivodessa operação é o degarantir que as ajudasalimentícias cheguematé a Somália e que a pi-rataria na região sejacombatida, fiscalizan-do-se a região e pren-dendo piratas ou sus-peitos de praticarem oucolaborarem para a prá-tica de tais atos.

A missão inicial daOperação deve durar

um ano, até dezembro de 2009, quando no-vas diretrizes serão estabelecidas.*

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tema em questão guarda, entre várias, apeculiaridade de ser um assunto presente ape-nas em reportagens e em alguns poucos arti-gos científicos. Não há ainda um estudo maisaprofundado sobre a pirataria no mundo, e em

59 DOLNICK, Sam. Cresce pirataria no Golfo de Áden. Disponível em:< http://www.alide.com.br/joomla/index.php/capa/36-noticias/225-aden>. Acesso em: 23 jul, 2009, p. 1.

60 Disponível em: < http://www.acp-eucourier.info/What-role-for-the-EU-in-S.573.0.html?&L=3>.* N.R.: Este trabalho foi escrito em 2008.

Limitar-se a elencar osprejuízos trazidos pela

pirataria na costa somali éuma abordagem por

demais simplista, visto quedeixa de lado a

investigação da forçamotriz e dos fatores

associados à causa dessasempreitadas criminosas

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

especial na costa da Somália, o que tornou apesquisa e o esclarecimento dos fatos ocorri-dos trabalhosos e, muitas vezes, com informa-ções conflitantes e ideias inconsistentes.

Tomando como ponto de partida a bus-ca por informações das mais diversas fon-tes, o presente trabalho buscou compre-ender os fatores responsáveis pela prolife-ração da ação dos piratas na região doChifre Africano e o porquê de a região terse tornado, em tão pouco tempo, o princi-pal foco dos ataques piratas no mundo.

Logo de início se pôde constatar que aabordagem feita por di-versos autores e jorna-listas, ao se referir àsações dos piratas naságuas costeiras daSomália, detinha-seapenas a comentar asconsequências gera-das pelos crimes. Namaior parte das vezes,os artigos e/ou repor-tagens eram focadosem dados quantitativosdo prejuízo, como o va-lor cobrado pelo resga-te ou o valor estimadodas cargas a bordosaqueadas, colocandosempre os piratassomalis numa posiçãoestática de vilões, de criminosos cruéis e ex-tremamente perigosos.

De fato, não há como negar os prejuízoscausados pelas ações dos piratas nos últi-mos anos, um prejuízo nunca registrado an-tes na história da pirataria no mundo, consi-derando ser uma região delimitada e o gran-de número de ataques registrados. É incon-testável também o pânico que os piratassomalis têm disseminado nas águas da re-gião. Inclusive navios civis, de turismo, têmsido alvos desses crimes, e comumente inú-

meras pessoas são feitas reféns até que opagamento do resgate seja efetuado. Toda-via, limitar-se a elencar os prejuízos trazidospela pirataria na costa somali é uma aborda-gem por demais simplista, visto que deixade lado a investigação da força motriz e dosfatores associados à causa dessas emprei-tadas criminosas.

O que este trabalho teve a intenção deressaltar e trazer ao debate foi, principalmen-te, os fatores que levaram a região do ChifreAfricano a se tornar o grande foco atual deataques piratas e como o Direito Internacio-

nal tem sido aplicadopara tentar restabelecera paz na região.

Para que fosse pos-sível compreender essefato, foi essencial a aná-lise do cidadão somali eda situação política esocioeconômica de seupaís. A partir da pesqui-sa e da busca por textosque enfocassem os pi-ratas, e não a pirataria,foi possível perceberque a origem da ativida-de está num movimentode defesa dos somaliscontra a exploração so-frida pelos países cir-cunvizinhos, sobretudo

os europeus, após a queda do governo somalie a vacância governamental.

Sem autoridades e órgãos do governocapazes de garantir os serviços básicos dehigiene e condição digna de vida e a segu-rança da população, a exploração estran-geira foi inevitável.

Navios estrangeiros praticavam a pes-ca predatória na região, lixos tóxicos eramvendidos a “preço de banana” para que ossomalis se desfizessem deles (o que levouà morte cerca de 400 pessoas), e os proble-

Navios estrangeirospraticavam a pesca

predatória na região, lixostóxicos eram vendidos a“preço de banana” para

que os somalis sedesfizessem deles (o que

levou à morte cerca de 400pessoas), e os problemassociais, como a fome e a

criminalidade, só cresciamno país

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mas sociais, como a fome e a criminalidade,só cresciam no país.

Diante dessa realidade, parte da própriapopulação somali se organizou e iniciouum movimento de defesa de seu territóriocontra essas ameaças estrangeiras.

Assim, os primeiros piratas eram anti-gos pescadores que, numa ação de defesaà atividade pesqueira na região, atacavamos navios de pesca estrangeiros, que inva-diam suas águas e atiravam suas redes, semqualquer cuidado ourespeito às restriçõesambientais de preser-vação das espécies.

Ao perceberemque o saque a naviose a cobrança de resga-tes lhes proporciona-va um retorno finan-ceiro bastante rápido,esses somalis come-çaram a incrementarsuas atividades.

A pirataria foi cres-cendo dentro do paíse, atualmente, existeuma “indústria da pira-taria”, em que há cida-des e portos voltadospara essa prática, in-clusive com empresasespecializadas em for-necer comida para os saqueadores alimen-tarem os reféns, enquanto aguardam o pa-gamento do resgate.

Devido à ausência de um Direito Internaci-onal efetivo de fiscalização e combate a essasatividades, os piratas estão cada vez mais ou-sados, não se restringindo mais a atacar nasproximidades da costa da Somália, mas se ex-pandindo também para zonas de mar aberto.

Assim ressalta Choong, segundo o arti-go “Cresce pirataria no Golfo de Áden”,publicado por Dolnick: “Não existe nenhu-ma proteção efetiva, é por isso que os ata-ques dos piratas seguem ocorrendo. Asatividades criminosas estão florescendoporque os riscos são pequenos e a recom-pensa é extremamente alta” 61.

A grande preocupação da comunidadeinternacional é o combate dessa atividade,visto que a principal rota marítima comerci-

al do mundo está com-prometida. Assim, en-tendendo que a raiz dapirataria ocorrida nacosta da Somália estánuma crise interna dopaís atrelada às amea-ças externas, não háque se falar apenas emformas de contra-ata-ques e punição dos in-fratores. É mister quese restabeleça o poderestatal e que se reor-ganize um governoforte, um aparato jurí-dico eficaz e as ForçasArmadas.

A ONU está atuan-do nesse sentido, apoi-ando a instauração deum governo somali for-

te e capaz de recuperar a segurança da re-gião, combatendo a criminalidade em terra efiscalizando o mar costeiro.

Por meio de diversas resoluçõespublicadas por seu Conselho de Seguran-ça, a participação ativa da IMO, órgão es-pecializado, e do apoio dado à OperaçãoAtalanta (comandada pela União Europeia),esse organismo pretende despertar nos

61 DOLNICK, Sam. Cresce pirataria no Golfo de Aden. Disponível em:< http://www.alide.com.br/joomla/index.php/capa/36-noticias/225-aden>. Acesso em: 23 jul, 2009, p. 2.

Entendendo que a raiz dapirataria ocorrida na costada Somália está numa criseinterna do país atrelada àsameaças externas, não há

que se falar apenas emformas de contra-ataques epunição dos infratores. É

mister que se restabeleça opoder estatal e que se

reorganize um governoforte, um aparato jurídico

eficaz e as Forças Armadas

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CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<PODER MARÍTIMO>; Pirataria; Segurança no mar; Somália; Política Internacional; Direi-to de intervir; Organização internacional;

seus Estados membros e nas empresasmultinacionais o sentimento de união con-tra os ataques piratas na região do Estreitode Áden e a importância de se restabelecera segurança no local.

O combate à criminalidade nas águascosteiras da Somália tem tomado uma formabastante peculiar, afrontando, em algunscasos, princípios do Direito Internacional etambém as leis somalis, por isso a necessi-dade imediata de restauração do governosomali, para que ele próprio possa julgarseus criminosos de acordo com a forma pre-vista em seu ordenamento normativo.

Também merece destaque a importânciada estabilidade nacional e da estabilidadeinterna em todos os países do mundo.

Muitas vezes, por determinado Estado nãodesempenhar um papel político ou econô-mico de destaque, ele fica marginalizadodo cenário internacional. O que não se es-perava, portanto, é que um pobre país afri-cano, esquecido pelos entes globais, pu-desse representar tamanha ameaça às gran-des potências comerciais.

Por fim, merece destaque que o estudoda rápida expansão da pirataria na costa daSomália não teve a pretensão de esgotar otema – até porque se está diante de umaescassa fonte de materiais de pesquisa –,mas que se almeja com ele despertar a co-munidade científica para uma análise maisdetida e cuidadosa no fenômeno da pirata-ria na região.

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A PIRATARIA NAS ÁGUAS COSTEIRAS DA SOMÁLIA:Fatores responsáveis pela rápida proliferação dessa atividade na região e a aplicação do Direito Internacional

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A atitude do Brasil à eclosão da Segun-da Guerra Mundial era naturalmente a

de neutralidade, desde logo expressamentedeclarada (decretos no 4.623 e 4.624 de 5 desetembro de 1939, respectivamente quantoà guerra entre a Inglaterra e a Alemanha e aFrança e a Alemanha), por isso que as ques-tões relativas a minorias raciais germânicas,espaços vitais, esferas de influência, anexa-ções territoriais e outras em nada interessa-vam diretamente à nossa Pátria; mal, porém,a luta eclodiu no continente europeu, logose desbordou pelos mares, no afã febriantee porfiado de procurar o domínio das viasmarítimas de comunicações.

A ânsia por esse domínio avançou logo,célere, pelas águas do Oceano Atlântico,que, quase de polo a polo, em longuíssimo

MARINHA DO BRASIL NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL*

– PARTE 1

GERSON DE MACEDO SOARES**Capitão de Fragata

(in memoriam)

fuso, separa o nosso próprio país das ribaseuropeias, debruçando-se as orlas orientaisde nosso vasto território sobre a planuraaquosa onde a ação de cada um dos agigan-tados contendores queria barrar aos respec-tivos contrários ou utilizar, a despeito deles,as extensas, ilimitadas rotas pelas quais setransportassem os suprimentos de toda clas-se de que necessitavam uns e outros para oescopo final – a vitória.

O Oceano Atlântico era, deste modo, odomínio comum em que os interesses da-queles que lutavam viriam colidir, sem som-bra de dúvida, com os nossos próprios in-teresses, já se esboçando, assim, algumacoisa que implicaria a nossa coparticipação,ao menos à distância, no conflito em pro-gressão alarmante.

* N.R.: Matéria encaminhada pelo Contra-Almirante Edgard Hargreaves de Carvalho, em seis partes, queserão publicadas na RMB a partir desta edição.

** N.R.: O autor era o chefe do Estado-Maior do Comando da Força Naval do Nordeste, durante a guerra.

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MARINHA DO BRASIL NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL – PARTE 1

Desde que havia a fatalidade geográfi-ca da descontinuidade dos continentes,para que os efeitos dos entreveros brutaisnos atingissem por terra, e que, para ser-mos ainda incomodados pelos ares, seriamnecessárias bases bem próximas, pelo marnos viria, pois, de imediato, quer à superfí-cie quer insidiosamente, entre duas águas,submarinamente, alguma ação de qualquerdos partidos hostis que nos pudesse ofen-der física ou moralmente os melindres denação livre, soberana e neutra.

A essa ação, mister se faria então quese opusesse outra ação de coerção que lheanulasse os efeitos, a fim de que não nosenvolvêssemos na luta, fossem quais fos-sem os intentos a contrariar, opostos ànossa própria isenção no conflito, partin-do deste ou daquele partido.

Era isso a neutralidade que se impunhafosse mantida pelo Brasil, em posição pa-ralela e equidistante dos grupos em guer-ra. Assim, como a ameaça que era iminentevinha através dos mares, claramente inevi-tável quanto aos atritos que nos ia produ-zir, a força armada brasileira naturalmentedeterminada para exercer ação, quer pre-ventiva quer coibidora, em nome do Direi-to foi a Marinha de Guerra.

Em fins de 1939, quando a guerra foideclarada entre a Inglaterra e a França deum lado e a Alemanha do outro, esta já es-tava economicamente preparada e com su-primentos de toda es-pécie devidamente ar-mazenados para o con-flito, ao passo queaqueles outros países,mesmo em face dosacontecimentos que sevinham desenrolandona Europa central, pou-co ou nada tinham fei-to nesse sentido, demodo que, ao abrirem-

se as hostilidades, sua navegação mercan-te que devia ir buscar, à pressa e sem des-canso, as utilidades além-mar, em plagasdistantes, como nas Américas do Norte edo Sul, logo ficou sujeita aos ataques dosraiders e dos submarinos, cujos primeirosêxitos de pronto se fizeram sentir, querquanto a navios de guerra quer quanto amercantes, nos primeiros dias de guerra,com grande alarme para os Aliados.

Tinha, pois, o Brasil que mobilizar seusrecursos navais para manutenção de suaneutralidade e para defesa de suas águasterritoriais, que a qualquer momento podi-am estar sendo violadas com o ataque desubmarinos ou de raiders a navios ingle-ses ou franceses. Em dezembro do mesmoano de 1939, já o encouraçado alemão GrafSpee, derrotado, internava-se em Monte-vidéu, depois de produtiva ação comoraider, atestando de modo irretorquível aameaça que nos vinha vindo a qualquerinstante pelo mar, o perigo sempre iminen-te que, afinal, nos arrastaria ao conflito.

Para essa ação de sentinela sempre aler-ta, com os olhos fitos continuamente nãosó nos horizontes largos mas também naságuas em volta até mesmo poucos metrosde distância, dispunha apenas a Marinhade Guerra brasileira de meios materiais bemprecários. Para conjurar a ameaça, já queesta resultaria em ato de força, sem peiasdo direito, na repressão pronta e justificada

Encouraçado Minas Gerais

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de procedimentos atentatórios da neutrali-dade que havíamos proclamado, contavaapenas a Esquadra brasileira, para se opora raiders e submarinos moderníssimos, comos remanescentes de uma frota de naviosde mais de 30 anos de exis-tência e com raríssimasunidades mais modernas,porém inadequadas, as-sim especificadas: doisencouraçados obsoletos(o Minas Gerais e o SãoPaulo), não utilizáveis na-turalmente para qualqueremprego em uma campa-nha antissubmarina; doiscruzadores ligeiros nasmesmas condições (o Bahia e o Rio Gran-de do Sul); cinco contratorpedeiros da clas-se Amazonas, tão velhos quanto aqueles(Piauí, Rio Grande do Norte, Sergipe, San-ta Catarina e Mato Grosso), aos quais sepoderia juntar um sexto, o Paraíba, alque-brado, impossibilitado de enfrentar qual-

Cruzador Rio Grande do Sul

quer mar grosso; umoutro contratorpedeiroum pouco mais moder-no, o Maranhão; qua-tro submarinos (o Hu-maitá e o Tupi, o Tim-bira e o Tamoio), che-gados no ano anteriorda Itália; dois navioshidrográficos adaptá-veis para fins de guer-ra, o Rio Branco e o

Jaceguai, e uma flotilha de seis navios mi-neiros da classe Carioca, recém-construídos no Arsenal da Ilha das Cobras,dos quais o Carioca e o Cananéia foramincorporados à Esquadra a 16 de setembrode 1939, e o Camocim, o Cabedelo, o

Caravelas e o Camaquã somente a 7 dejunho de 1940. Além dessas unidades, con-tava a Esquadra ainda com alguns trans-portes, rebocadores e navios-auxiliares deemprego especializado e restrito. O lança-mento ao mar dos três contratorpedeirosMarcílio Dias, Mariz e Barros e

G r e e n h a l g h ,que depois pres-taram tão bonsserviços comoverdadeiros na-vios de guerra,só se deu, res-pectivamente, a

CT Piaui, da classe Amazonas

Submarino Timbira

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20 de julho, e 28 de dezembro de 1940 e a 8de julho de 1941. Em julho de 1940, aindaestavam sendo batidas as primeiras qui-lhas de seis contrator-pedeiros de tipo in-glês, da classe Amazo-nas, os quais não fica-riam prontos durantetoda a guerra, e as cor-vetas da classe Ma-tias de Albuquerque,queimando carvão,encomendadas origi-nalmente pelo gover-no inglês à Casa Lage& Irmão, ainda se acha-vam em fase de cons-trução e lançamentoao mar, em 1942, nosestaleiros daquela fir-ma; prestaram, entre-tanto, ainda, bons serviços no último anode guerra.

Dos navios da velha esquadra ainda naatividade então chamados a prestar servi-ços de guerra, os cruzadores Bahia e RioGrande do Sul, os contratorpedeiros Piauí,Rio Grande do Norte, Paraíba e Santa Ca-tarina, assim como o Transporte Belmontee o Rebocador de Alto-Mar LaurindoPitta, já haviam constituído a Divisão Na-val em Operações de Guerra, que, sob ocomando do Almirante Pedro Max Fernandode Frontin, mandara o Brasil às águas

europeias na PrimeiraGuerra Mundial, em1918.

Pois foi com essematerial flutuante quea Marinha de Guerrado Brasil iniciou a suaação de vigiar, pela ma-nutenção de nossaneutralidade, as águasterritoriais brasileiras,

extensas de cerca de 3 mil milhas, só na partemais vulnerável às incursões atentatórias ànossa posição de neutros, ou seja, da foz do

Rio Pará até Santa Catarina, incluindo as ilhasde Fernando de Noronha e Trindade, em ple-no oceano.

No ano de 1939, a 30 de setembro, pou-cos dias, portanto, após a declaração deguerra à Alemanha pela Grã-Bretanha e aFrança, era torpedeado, a cerca de 70 mi-lhas da costa nordeste do Brasil, o carguei-ro inglês Clement. Alguns de seus sobre-viventes, numa baleeira, foram salvos pelomercante brasileiro Itatinga, a cerca de 15milhas ao largo da costa de Pernambuco, econduzidos para o porto de Salvador.

Corveta Rio Branco

Formatura dos navios-mineiros Classe Carioca na cerimônia debatimento da quilha dos Contratorpedeiros Amazonas e Araguaia

em 20/7/1940 (Coleção Alte. Brígido)

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Era o perigo iminente de complicaçõestendentes a nos envolver no conflito alheioque chegava às nossas plagas.

O começo do ano de 1940 encontrou osnavios ligeiros de nossa Esquadra em ple-na atividade no mar.

O Navio-Mineiro Cananéia, a 11 de ja-neiro, regressava ao Rio de Janeiro de umaviagem aos portos do norte do País. A 27do mesmo mês, os cruzadores e várioscontratorpedeiros regressavam à Baía deGuanabara depois de um perí-odo de exercícios.

A 9 de fevereiro, esses mes-mos navios, capitaneadospelo Encouraçado Minas Ge-rais, saíam do Rio para o suldo país, regressando a 17, en-quanto outros contratorpedei-ros e os navios-mineiros Ca-rioca e Cananeia, assim comoos submarinos da classe Tupi,estavam sempre em atividade,ora saindo ora entrando noporto do Rio de Janeiro, emexercícios que compreendiam, deliberada-mente, um patrulhamento de observação epolícia das águas territoriais.

A 8 de março, o Cruzador Rio Grandedo Sul levava o Presidente da República eo Ministro da Marinha a Santa Catarina.Nesse mesmo mês continuava o movimen-to dos cruzadores e contratorpedeiros.

De 9 a 27 de abril, os encouraçados Mi-nas Gerais e São Paulo, com várioscontratorpedeiros, faziam exercícios nas

águas da Ilha Grande. A 7 de maio tornavaa sair, para o mesmo fim, o primeiro dessesnavios.

O Monitor Paraguaçu, de construçãonacional, era incorporado à Esquadra epartia da Baía de Guanabara a 11 de maiopara Mato Grosso, a cuja flotilha fluvialdeveria pertencer, sendo escoltado pelo Na-vio-Mineiro Carioca de porto em porto atéo de Montevidéu, aonde chegava a 30 demaio.

Até o Navio-Escola Almirante Salda-nha, arrostando perigos perfeitamenteimagináveis, partia do Rio de Janeiro a 18de maio desse mesmo ano de 1940 para umaviagem de instrução de guardas-marinhaaté Portugal.

A 7 de junho, com a incorporação dosnavios-mineiros Camocim, Cabedelo,Caravelas e Camaquã, era criada pelo mi-nistro da Marinha a Flotilha de Navios-Mineiros.

Contratorpedeiros Mariz e Barros e o Greenhalgh ao largo de Gibraltar emescolta a um dos escalões da Força Expedicionária Brasileira

ContratorpedeiroAmazonas

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CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<GUERRAS>; Segunda Guerra Mundial; História da Marinha do Brasil

A 13 desse mesmo mês, o EncouraçadoSão Paulo, com escolta de contratorpe-deiros, saía do Rio de Janeiro para novosexercícios na Baía da Ilha Grande, indo jun-tar-lhes ali, a 18, o Encouraçado Minas Ge-rais, regressando todos a 28. Outra saídadessas repetiu-se em julho. E também emagosto, com os navios-mineiros.

A 2 de julho saía de Lisboa, de regresso aoBrasil, o Navio-Escola Almirante Saldanha.

O ano de 1941 encontrou a Esquadrabrasileira na mesma atividade, inclusive comos navios transportes e auxiliares. O Na-vio-Auxiliar Vital de Oliveira desde o anoanterior andava continuamente para baixoe para cima em várias comissões.

A 28 de janeiro, o Navio-Escola Almi-rante Saldanha tornava a sair para novaviagem de instrução de guardas-marinha,devendo passar pelo Estreito de Magalhães,subir ao longo da costa pelo Pacífico e pas-sar pelo Canal do Panamá, fazendo o périploda América do Sul para regressar ao Brasil.

O Navio-Tanque Marajó saía a 8 de mar-ço para a Ilha de Aruba, a buscar óleo com-

bustível. A 10 desse mesmo mês, era o Cru-zador Rio Grande do Sul que saía para onorte do País até Belém, levando a seu bor-do o Ministro da Marinha, e regressandoao Rio a 1o de abril.

Nesse meio tempo, dera-se no Mediter-râneo o ataque ao navio mercante brasilei-ro Taubaté por um avião alemão, do queresultou um morto, além de vários feridos,dando o fato motivo a um protesto do Go-verno brasileiro junto à Embaixada alemãno Rio de Janeiro.

Continuou, no correr desse ano de 1941,a movimentar-se a Esquadra brasileira, quese encontrava em atividades no mar, emexercícios, patrulhamento e transporte,quando a Carta do Atlântico foi assinada,

a 14 de agosto, e quandose deu o ataque japonêsde surpresa a Pearl Harbor,a 7 de dezembro, ao qualse seguiram a declaraçãode guerra dos EstadosUnidos e da Inglaterra aoJapão e o anúncio da soli-dariedade do Brasil àque-le país atacado.

Era, assim, envolvidoo continente americano na guerra, e o anode 1942 se iniciava em meio aos mais ne-gros prognósticos, logo confirmados como rompimento, a 28 de janeiro, das rela-ções diplomáticas do Brasil com os trêspaíses do Eixo (Alemanha, Itália e Japão),seguindo-se a esse ato a nossa adesão àDeclaração das Nações Unidas e à Cartado Atlântico.

Corveta Matias deAlbuquerque

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SUMÁRIO

IntroduçãoO conceito de liderançaInfluência interpessoalO exercício situacional da liderançaA liderança como processo da comunicação humanaA questão do voluntariado na liderançaA importância da liderança nas organizaçõesCaracterizando a liderançaA liderança e os valores éticos e moraisA liderança como processo de aprendizadoA liderança nos ambientes público e privadoConclusão

A LIDERANÇA SOB AS ÓTICAS DO SETORPÚBLICO E DO SETOR PRIVADO

MÁRCIO VASCONCELLOSCapitão de Fragata (IM)

INTRODUÇÃO

Muito se tem escrito a respeito da im-portância da liderança nos ambientes

de trabalho. A alta frequência com que o as-sunto tem sido estudado exibe uma amplapossibilidade de abordagens. Uma delas

pode ser a comparação entre o exercício daliderança nos setores privado e público, emque as relações trabalhistas possuem dife-renças marcantes. De acordo com Kouzes ePosner, “não importa se você trabalha nosetor público ou privado, o exercício da li-derança poderá auxiliá-lo a desenvolver

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sua capacidade de conduzir os outros a lu-gares onde eles (e você) jamais estiveram”.1

Contudo, é prudente relembrar que a lide-rança continua sendo um requisito básico paraque haja eficácia em qualquer organização, sejapública ou privada, e a qualquer tempo. Emperíodos de tensão, situação corriqueira nasociedade moderna, a liderança pode ser ofator crucial de distinção entre organizaçõesque prosperam e organizações que fracassam.2

Neste trabalho, a menção ao setor públicofaz referência à Administração Pública, que,segundo Meirelles: “[...] é um conjunto de ór-gãos instituídos paraconsecução dos objeti-vos do Governo”.3

Numa visão global, étodo o aparelhamentodo Estado preordenadoà realização de seus ser-viços, visando à satis-fação das necessidadescoletivas.4

Assim, este artigo,fundamentado em pes-quisa bibliográfica, ba-seado em obras, periódicos, artigos publi-cados e trabalhos acadêmicos, tem o propó-sito de verificar os indícios da similaridadeentre as lideranças exercidas nos setorespúblico e privado, a partir do próprio con-ceito de liderança, de suas características ede sua importância nas organizações.

Primeiramente, será analisado o conceitode liderança. Em seguida, serão abordadas

as características da liderança, a importân-cia da liderança nas organizações, a lideran-ça e os valores éticos e morais, a liderançacomo processo de aprendizado e a lideran-ça nos ambientes público e privado. Por fim,apontam-se os aspectos de similaridade en-tre as lideranças nos setores público e pri-vado observados ao longo deste percurso.

O CONCEITO DE LIDERANÇA

Em termos conceituais, para Packard aliderança é vista como a arte de fazer com

que os outros desejemfazer algo que o líderestá convencido deque deve ser feito.5

Para Hogan, a lide-rança implica persuadiroutras pessoas no sen-tido que deixem de lado,por um certo período,seus interesses pesso-ais em benefício de umobjetivo comum queesteja associado às res-

ponsabilidades e ao bem-estar do grupo.6Apesar da existência de uma gama enorme

de conceitos relativos à liderança, neste tra-balho será tomada por base a definição apre-sentada por Tannenbaum: “Liderança é a in-fluência interpessoal, exercida na situação edirigida, por meio do processo da comunica-ção humana, à consecução voluntária de umou diversos objetivos específicos”.7 A defini-

1 Cf. KOUZES, James M; POSNER, Barry Z. O desafio da liderança. 3 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 3.2 BENNIS, Warren. Líderes e liderança: entrevistas com lideranças empresariais e políticas dos Estados

Unidos, Japão e Europa. Rio de Janeiro: Campus, 1997.3 Cf. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 21 ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 6.4 Idem.5 PACKARD, V. “The pyramid climbers”, In NOVO, D. V. e CHERNICHARO, E. Gestão e Liderança. Rio

de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas FGV Management, 2008.6 HOGAN In NOVO, D. V. e CHERNICHARO, op. cit.7 Cf. TANNENBAUM, Robert. WESCHELER. I; MAPARIK, F. Liderança e organização. São Paulo:

Atlas, 1970, In CHIAVENATO, Idalberto. Introdução à Teoria Geral da Administração. 7 ed. rev.Rio de Janeiro: Elsevier, 2003, p. 122.

Contudo, é prudenterelembrar que a liderança

continua sendo um requisitobásico para que hajaeficácia em qualquer

organização, seja pública ouprivada, e a qualquer tempo

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ção de Tannenbaum será analisada detalha-damente ao longo deste capítulo.

INFLUÊNCIA INTERPESSOAL

A influência interpessoal é facilmenteperceptível na liderança, pois ninguém lide-ra senão outra pessoa ou grupo de pesso-as. E essa liderança se dá por um processode influenciação que, por sua vez, ocorredentro de um contexto de relacionamentointerpessoal. De acordo com Kouzes ePosner, “não encontramos apenas líderesgrandiosos que marcaram a história. En-contramos também líderes do dia a dia,pois a liderança não é uma questão de car-go nem função. É uma questão de relacio-namento, credibilidade e do que fazemos”.8

Em última instância, influenciar signifi-ca a capacidade ou poder que uma pessoaou coisa tem de interferir no comportamen-to ou no desenvolvimento de outrem9.

Nesse sentido, a liderança necessita re-fletir um processo no qual o líder busca,sob influência e aceitação do próprio gru-po, o alcance de metas e objetivos especí-ficos por meio de mobilização, informação,comunicação, manejo, solução de confli-tos e estabelecimento de estratégias.10

Depreende-se que, numa relação des-se porte, não se pretende uma abordagemde dominância ou manipulação, mas o li-vre arbítrio para um seguimento fiel, leal eespontâneo.

Seguindo a análise do conceito de lide-rança, é importante destacar, como será vis-to a seguir, a questão do exercício da lide-rança situacional.

O EXERCÍCIO SITUACIONAL DALIDERANÇA

Autores como Kouses, Posner e Charamapontam a liderança como um processo in-serido num contexto situacional.11

Empiricamente, a própria história nos reve-la esse fato ao apontar diversas personali-dades que exerceram sua liderança sempreinseridas numa situação específica.

Em exemplo de liderança situacional é ofamoso caso de Ernest Shackleton,12 um aven-tureiro que viveu no início do século XX eteve a proeza de conseguir manter vivos esãos seus subordinados em um longo e pe-noso período em que esteve na Antártica,após um naufrágio em pleno Polo Sul.13

Shackleton tentou duas vezes chegar aoPolo Sul, em 1902 e 1908. Depois que RoaldAdmunsen chegou ao Polo em 1911, resta-va ainda um grande desafio na Antártica:cruzar o Continente Gelado. A tentativa deErnest Shackleton em 1915 terminou antesque ele chegasse ao seu destino. Seu navio,o Endurance, ficou preso no Mar deWeddell por 281 dias até ser destruído pelogelo. Aí iniciou uma jornada impressionanteque terminou com o resgate, sem a perda denenhum de seus comandados.14

8 Cf. KOUZES & POSNER, op. cit., p. 385.9 Conceito extraído do dicionário Ferreira, Aurélio Buarque de Holanda – 6ª ed. – Curitiba: Postigraf, 2004.10 KOUZES & POSNER, op. cit.11 Idem e CHARAM, RAM. O líder criador de líderes: a gestão de talentos para garantir o futuro e a

sucessão. Rio de Janeiro: Campus, 2008.12 A aventura de Shackleton foi publicada no livro Shackleton: uma lição de coragem, no qual foi chamado

de “o maior líder que jamais surgiu nesta terra”. O livro revela a grandeza do homem que conseguiutransformar sua malsucedida expedição à Antártica numa história de resistência heroica. Usando sualendária aventura como ponto de partida, as autoras analisam as estratégias do explorador e suasvitoriosas características de comando – autoridade, integridade, humor e compaixão. Sua história éum relato inspirador sobre como ajudar cada pessoa a alcançar o melhor de si mesma e realizar o quese pensava impossível.

13 MORRELL, M. E CAPPARELL, S. Shackleton: uma lição de coragem. Rio de Janeiro, Sextante, 2003.14 Idem.

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Conclui-se que a história narrada demons-trou a capacidade de Shackleton em liderarprofundamente seu pessoal. Ao conseguir,com êxito, conduzir todos os seus tripulan-tes em segurança para casa, depois de quasedois anos isolados no gelo, Shackleton setornou um ícone de liderança para os estudi-osos e praticantes desse assunto. No entan-to, não se observa esse mesmo nível de lide-rança durante outras situações em sua vida,corroborando mais uma vez com a ideia daliderança como um aspecto situacional.

Adicionalmente, a liderança também fazparte de um processo de comunicação hu-mana, como será visto a seguir.

A LIDERANÇA COMO PROCESSODA COMUNICAÇÃO HUMANA

Não é difícil compreender que a comu-nicação é uma das principais habilidadesdos líderes, envolvendo não apenas o atode falar, mas uma gama enorme de ferra-mentas, técnicas e processos que usam ro-tineiramente para obter êxito no relaciona-mento com suas equipes. Para Mehrabian,a palavra representa 7% da comunicação,o tom de voz 38%, enquanto o não verbal éresponsável por 58% da comunicação.15

Observando exemplos marcantes denossa história contemporânea, podemosidentificar alguns líderes que souberamexplorar bem esse quesito. O papa JoãoPaulo II (Karol Wojtyla, 1920-2004), queesteve à frente da Igreja Católica por maisde 25 anos, foi um exemplo nesse sentido.Por meio de suas alocuções orais, cartas,encíclicas, livros, palestras e até mesmo dacomunicação corporal, arrastou milhares de

pessoas a segui-lo. Independentemente doaspecto religioso, Wojtyla soube transmi-tir sua mensagem de forma que tanto aspessoas mais simples quanto inúmeroschefes de Governo e de Estado nutriam umgrande apreço por ele e o seguiam de for-ma voluntária. Após seu falecimento, mi-lhares de pessoas de todo o mundo estive-ram em seu velório na cidade do Vaticano,dando a maior prova de exemplo de líderque soube perfeitamente se comunicarcom o outro.16

A comunicação é algo tão importante parauma liderança eficaz que não se imagina umlíder que não saiba ir ao encontro de seussubordinados sem a devida atenção a estequesito fundamental. Ressalta-se, entretan-to, que se comunicar compreende a neces-sidade de saber falar na hora adequada, parao receptor certo e com a intensidade condi-zente. Falar aos homens cultos da mesmaforma que se fala aos incautos ignorantes éum grave erro na comunicação.17

Em adição, saber se comunicar expõe ou-tra necessidade: saber ouvir. Ouvir não é so-mente escutar, é um ato muito mais amplo. Énão ser, essencialmente, preconceituoso comos fatos e acontecimentos. Agindo dessaforma, outra característica se faz notar no lí-der: o exemplo.18

Comunicar-se bem e saber ouvir é algotão raro atualmente que, ao encontrarmospessoas com essas qualidades, elas nos atra-em sobremaneira. Gera-se naturalmente umapreço pela pessoa, e isso é condição sinequa non para que se possa transformá-lanum verdadeiro exemplo a ser seguido.19

Essa realidade é válida para todos os se-tores da sociedade e do mundo corporativo.

15 MEHRABIAN, Albert. “Communication without words”. Psychology Today, 1968.16 LECOMTE, Bernard. João Paulo II: biografia. Tradução Clóvis Marques. Rio de Janeiro: Record, 2005.17 POLI, Gian Franco. Liderança e Comunicação na Vida Consagrada. São Paulo: Paulinas, 2009.18 Idem.19 Idem.

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No entanto, ela é observada primordialmen-te no setor público, onde os processos ain-da são reconhecidos pelo excesso de buro-cracia, caracterizada, entre outros fatores,pela impessoalidade dos relacionamentos.Tal característica resiste mesmo após a mu-dança permanente para uma gestão essen-cialmente gerencial, após a reforma admi-nistrativa do Brasil.20

Ainda assim, nunca é demasiado afirmarque onde não há uma comunicação susten-tável é impossível haver uma liderança sus-tentável. Uma organização, principalmentepública, é bastante prejudicada caso não hajauma comunicação sadia e verdadeira. Issopode se refletir no cumprimento de sua mis-são, fato geralmente perceptível apenas quan-do o hiato entre teoria e prática é muito gran-de, tornando-se, assim, notória essa discre-pância. No setor privado, essa dicotomia logoaparece, seja gerencialmente, seja na cons-tante concorrência no mercado.21

Enquanto no setor privado a falta de co-municação pode causar danos irreparáveispara uma empresa, até mesmo a falência, oque requer uma atenção especial e constan-te, na Administração Pública, por diversosmotivos, essa falta de comunicação pode le-var a consequências de forma mais demora-da, o que pode perpetuar a falta de atençãopara a boa comunicação.22 Sabedores dessarealidade, conclui-se que os gestores públi-cos, em particular os seus líderes, devem teratenção para este aspecto fundamental.

Por fim, porém não menos importante,há a questão do voluntariado nas açõesdos liderados. Esse assunto será tratadono item seguinte.

A QUESTÃO DO VOLUNTARIADONA LIDERANÇA

O verdadeiro líder se faz seguir por ou-trem voluntariamente. Do contrário, nãohaveria liderança. O seguir alguém, por li-vre e espontânea vontade, é uma caracte-rística e maior marca da existência da lide-rança. Qualquer pessoa ou grupo que sigaalguém de maneira compulsória denotauma pressão que não se coaduna com oconceito aqui estudado.23

Além disso, a liderança requer que setenha ao menos um objetivo em mente, poisninguém lidera para não se chegar a lugaralgum.24

Nas empresas do setor privado, seja pelaconcorrência, pela busca de mais espaçono mercado, na redução dos custos ou noaumento das vendas, os objetivos são maisfacilmente quantificáveis, o que não ocor-re no setor público. Daí se observa umatendência em descuidar-se da liderançaquando inexistem objetivos claros equantificáveis.25

Novamente observa-se que, apesar deo conceito de liderança que está sendoanalisado ser único, a prática da mesma noambiente do setor público necessita serdiferente do setor privado, em virtude desuas características próprias. O líder preci-sa estar atento a essa realidade, pois damesma maneira que não se motivam as pes-soas da mesma forma, a motivação nessessetores também é diferente. Os objetivossão distintos, bem como as culturas. Aque-le que se descuidar dessa premissa dificil-mente obterá êxito na prática da liderança.

20 BRESSER, Luis Carlos e SPINK, Peter. Reforma do Estado e administração pública gerencial. Rio deJaneiro: Fundação Getúlio Vargas, 1998.

21 Idem.22 Idem.23 CHARAM, op. cit.24 Idem.25 BENNIS, op. cit.

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A LIDERANÇA SOB AS ÓTICAS DO SETOR PÚBLICO E DO SETOR PRIVADO

A IMPORTÂNCIA DA LIDERANÇANAS ORGANIZAÇÕES

A necessidade da existência de líderesque possam motivar e fazer com que diver-sas pessoas, equipes e organizações intei-ras reajam voluntariamente aos objetivosdo crescimento pode ser identificada coma linha de pensamento de Friedman.26 Se-gundo este autor, o conceito de mundo pla-no está cada vez mais reconhecido e acei-to, ou seja, apontam-se as característicasde os mercados não possuírem limites ge-ográficos bem definidos, deixando a con-corrência de ter um caráter localizado, pas-sando a ser totalmente global. Estão emvoga grandes mudanças no mundo con-temporâneo, à medida que os avanços dastecnologias e da comunicação conectamas pessoas como nunca antes visto. Aglobalização tem acelerado sobremaneiranossas vidas particulares e também dasorganizações públicas e privadas em todoo mundo.

Toda empresa no setor privado temcomo uma das metas principais a obtençãode lucros. Em última instância, a empresasobrevive por causa dos recursos que con-segue gerir pela diferença da receita com adespesa.

Para tal, a empresa faz uso das maismodernas e sofisticadas técnicas de ges-tão, a fim de melhor administrar seupatrimônio. Na tentativa de se auferir mai-ores lucros, inicia-se uma corrida na buscapela redução dos custos na prestação dosserviços ou produção de um determinadobem. Processos modernos, como, por exem-plo, a questão da qualidade total e a

reengenharia das empresas, entre outros,são típicos de buscas pelo melhor desem-penho gerencial.27

No ínterim dessa globalização, as em-presas que não buscarem se aperfeiçoarnas práticas gerenciais inerentes especifi-camente à realidade do mundo capitalistapoderão estar fadadas ao insucesso. E issorequer a presença constante da liderançanaqueles que estejam envolvidos com ocapital humano direta ou indiretamente.

Do ponto de vista econômico, o mundonão tem fronteiras – e as implicaçõespara a liderança estendem-se muito alémda pura economia. [...] Com uma econo-mia global vem uma força de trabalhoglobal, um fato da vida para o qual mui-tos executivos estão mal preparados.28

Os Estados Unidos, como um grandeprotagonista da economia mundial, possu-em inúmeras organizações empresariais quese preocupam diuturnamente com o temaliderança. Numa breve comparação, o Bra-sil, no ano de 2006, teve um orçamento apro-vado para o Ministério da Educação novalor de R$ 8.927,6 milhões; em 2007, R$11.206,8 milhões e em 2008, R$ 13.190,6 mi-lhões.29 Somente os cursos de liderançanaquele país têm um valor aproximado deUS$ 15.000 milhões. Existem centenas deinstituições espalhadas por todo o país quelidam apenas com esse tema específico.30

O que se observa é a importância que aliderança tem para toda e qualquer organiza-ção, seja civil ou militar, do setor público ouprivado. E não é diferente até mesmo para asnações. Infelizmente, o que se observa na

26 FRIEDMAN, Thomas L. O mundo é plano: uma breve história do século XXI. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007.27 MORAES. Marcelo Estevão. 2009: Ano Nacional da Gestão Pública. Vitória: ESAFI, 2009.28 Cf. KOUZES & POSNER, op. cit, p. 4.29 BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Orçamento Anual, 2009. Disponível em:

<http://www.planejamento.gov.br >. Acesso em: 10 de junho de 2009.30 BENNIS, op. cit.

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realidade do cotidiano é a falta de verdadei-ros líderes no sentido estrito da palavra. So-bram chefes, administradores, dominadoresou influenciadores, entretanto há um grandevácuo de líderes no mercado.31

No entanto, como já mencionado anteri-ormente, devido às particularidades do setorpúblico, a prática da liderança merece ser vis-ta sob uma ótica mais apropriada, a fim deaproveitar os talentos nas funções próprias.

A descoberta de talentos é fundamentalpara o sucesso de uma empresa e tambémno setor público, e isso compete, essenci-almente, aos líderes comprometidos.

No mundo pós-burocrático, os louroscaberão ao líder que incentiva a divergên-cia saudável e valoriza aqueles seguidoresque têm a coragem de dizer não. O líderbem-sucedido terá não a voz mais forte,mas o ouvido mais preparado. E a sua ver-dadeira engenhosidade estará não nas re-alizações pessoais, mas na descoberta dostalentos dos outros.32

Para pesquisadores como Bennis,Kouzes e Posner, a liderança é algo quepode e deve ser treinado, é um processoque deve ser encarado como qualquer ou-tro, demandando esforço constante paraseu aperfeiçoamento.

Nesse sentido, é interessante o seguintepensamento: “Não é a ausência do poten-cial de liderança que inibe o desenvolvi-mento de um número maior de líderes; é apersistência do mito de que a liderançanão é algo que possa ser aprendido”.33

O setor público tem incentivado tam-bém a prática de novas gestões, podendo-se citar o Programa Nacional de GestãoPública e Desburocratização (Gespública),adotado no âmbito do Governo Federal pormeio do Ministério do Planejamento, Orça-mento e Gestão.34

A missão deste programa é: “Promover aexcelência em gestão pública, visando con-tribuir para a melhoria da qualidade dosserviços públicos prestados ao cidadão e parao aumento da competitividade do País”.35

Esse programa enfatiza que, para o al-cance dos resultados esperados, há quese valorizar, inicialmente, a questão da li-derança. Esse é o enfoque principal de todoo processo para se chegar ao resultado.

Especificamente na Marinha do Brasil,o Programa Netuno vem se tornando umverdadeiro norte na busca de melhores re-sultados gerenciais. O programa, na ver-dade, é um processo administrativo desti-nado a aprimorar a gestão das Organiza-ções Militares e, consequentemente, pro-porcionar à Marinha as melhores condi-ções para estar pronta e adequada à esta-tura político-estratégica exigida pelo País.É composto por sete critérios interligados,que possibilitam a análise da organizaçãosegundo enfoques distintos, como: lide-rança; estratégia e planos; cidadãos e so-ciedade; informação e conhecimento; pes-soas, processos e resultados.36

Ademais, em que pese existirem posi-ções a respeito de a Administração Pública

31 SOUZA, César; ET AL. Pensamento estratégico para líderes de hoje e amanhã. São Paulo: Integrare,2008.

32 Cf. BENNIS, op. cit., p. 26.33 Cf. KOUZES e POSNER, op. cit.34 BRASIL. Decreto Federal no 5.378, de 23 de fevereiro de 2005. Institui o Programa Nacional de Gestão

Pública e Desburocratização – Gespública e o Comitê Gestor do Programa Nacional de GestãoPública e Desburocratização, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa doBrasil. Brasília, DF, 24 de fevereiro de 2005.

35 Cf. Idem.36 BRASIL. Marinha do Brasil. Diretoria de Administração da Marinha. Boletim Técnico DADMBOTEC

50-007/2007. Implantação do Programa Netuno. Rio de Janeiro, 2007.

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ser reconhecida por falta de motivação ouempreendedorismo, o que se vem obser-vando ultimamente é que esse paradigmavem sendo quebrado, e que, na realidade,o que existe hoje é uma forte tendência paraa busca de um aperfeiçoamento do serviçopúblico, gerando-se uma janela de oportu-nidade para a gestão pública.37

CARACTERIZANDO A LIDERANÇA

É pertinente ressaltar que há algumascaracterísticas notórias observadas no se-tor público, podendo estas ser facilmentevisualizadas por qualquer agente críticoque porventura se aventure em apontá-las,mesmo que empiricamente, o que demandauma particularidade para o exercício da li-derança nesse setor, quais sejam:

1 – funcionários possuem estabilidadeempregatícia;

2 – normalmente não existe concorrênciaem mercados para seus produtos/serviços;

3 – as remunerações não possuem ocaráter da meritocracia;

4 – não há a busca de obtenção de lu-cros, bem como sua repartição;

5 – culturalmente, o funcionário públiconão possui comprometimento com melhoriados processos.38

Como se observa, a liderança é únicaem termos de conceito. O que se nota, to-davia, é que sua aplicabilidade pode serinfluenciada pelo ambiente na qual estáinserida. A forma de tratamento deve ser

direcionada para as características de cadasetor, de maneira a produzir os melhoresresultados possíveis. É como se estivesseocorrendo uma customização39 para o con-ceito de liderança para cada ambiente.

Especialmente no setor privado, a preo-cupação com o assunto tem se tornadobastante relevante, merecendo destaquetodas as iniciativas no sentido de se auferirqualificações cada vez mais observáveis.De acordo com Uliana, cerca de 85% dasmais conceituadas empresas do mundo têmcomo prioridade o desenvolvimento da li-derança na organização. Ainda, mais de80% dos executivos de alto nível dessasempresas investem tempo considerável nodesenvolvimento de liderança.40

Esses dados foram obtidos do estudoda consultoria Hewitt Associates, que apon-tou as empresas que valorizam a questãoda liderança em seus ambientes.41 Assim,algumas áreas são consideradas muito im-portantes, podendo-se mencionar: estraté-gia de negócio vinculada ao desenvolvi-mento de líderes; compromisso dos altosexecutivos com o desenvolvimento de lí-deres e expectativa clara dos comportamen-tos de liderança desejados, além de outras.

Essa preocupação que se observa nolíder do setor privado não é facilmente en-contrada quando se trata do setor público,o que se faz pensar que é necessária umamudança de paradigma, a fim de influenci-ar melhor os pretensos liderados.42

37 MORAES, op. cit.38 D’ELIA, Bete. “O Chefe”, in Revista Capital Público: ESAFI. Edição de julho de 2009.39 De acordo com o dicionário de Ferreira, Aurélio Buarque de Holanda – 6 ed. – Curitiba: Postigraf, 2004,

a palavra customização é empregada no sentido de personalização, adaptação. Desta forma, customizaré adaptar algo de acordo com o gosto ou a necessidade de alguém. Customização pode ser entendidacomo sendo adequação ao gosto do cliente.

40 ULIANA, Cleverson. “Procuram-se novos líderes: conheça a peça-chave na identificação e prepara-ção de novos líderes: você!”. Revista Liderança: Quantum, 2008.

41 Empresa americana fundada em 1940, apontada pela Revista Fortune como líder no fornecimento deserviços integrados de Recursos Humanos. É uma das maiores empresas no mundo dedicadas exclu-sivamente ao gerenciamento do capital humano.

42 D’ELIA, op. cit.

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A dualidade da aplicação da liderançanos dois setores pode ser bem expressa noseguinte pensamento: capacitar os esco-lhidos versus escolher os capacitados.43

Enquanto no setor privado o presidentede uma empresa pode selecionar para deter-minada função aquele que desejar, baseadoem parâmetros diversos, no setor público aseleção é feita mediante concurso. O queocorre muitas vezes é que o selecionado,apesar de ser tecnicamente preparado oupossuir conhecimentos bem além do neces-sário em termos acadêmicos, não possui umperfil apropriado para a função. E muitasvezes não se pode simplesmente transferiro funcionário. Na ver-dade, até mesmo umatransferência pode es-tar apenas deslocandoum problema para ou-tro setor. Mas quemtomará a iniciativa detentar mudar o com-portamento do lidera-do? Aparentemente, é mais fácil “desfazer-se” de alguém que não se enquadra numafunção do que tentar ajustar as arestas, pro-curando extrair o melhor possível, de modoa permitir que determinado funcionário pos-sa ter a oportunidade real de identificaçãoconsigo mesmo e com a organização para aqual trabalha.

Assim, é observável que o líder tenha apercepção que seu liderado deve ser tratadode forma diferente, de modo a ser incentiva-do e motivado a prestar sempre o melhor ser-viço de maneira perene e sustentável.44

A valorização pessoal é a chave paraqualquer processo de melhoria profissio-

nal. A bem da verdade, incentivar o funcio-nário a participar efetivamente nas mudan-ças da organização, dando suas opiniõespessoais, é de grande valia, pois a maioriadas pessoas tem a propensão de quererdar contribuições e ter orgulho do que faz.45

É de bom tom salientar que a liderançarequer antes de tudo um total comprometi-mento no aspecto da relação interpessoal.E para que esta exista dignamente, são ne-cessários três fatores: que o líder conheçaa si próprio, que conheça seus liderados eque esteja atento à realidade em que seencontram.

Desta forma, a busca incessante doautoconhecimento écondição sine quanon para a prática ge-nuína da liderança.Conhecer aspotencialidades, asfraquezas, os medos etudo aquilo que o fazcomo pessoa permite

ao líder ir mais longe em seus objetivos.46

Segundo Sun Tzu:

Se você conhece o inimigo e conhece asi mesmo, não precisa temer o resultadode cem batalhas. Se você se conhece,mas não conhece o inimigo, para cadavitória ganha sofrerá também uma der-rota. Se você não conhece nem o inimi-go nem a si mesmo, perderá todas asbatalhas.47

Esse discurso de Sun Tzu é bastante per-tinente para a realidade da liderança. Quemquer que se aventure nessa empreitada pre-

43 CHARAM, op. cit.44 D’ELIA, op. cit.45 HASS, Robert. “Os valores fazem a empresa: uma entrevista com Robert Hass”. (Entrevista concedida

a Robert Howard), in BENNIS, op. cit.46 NEEDLEMAN, Jacob. No caminho do autoconhecimento. São Paulo: Livraria Pioneiro, 1982.47 Cf. TZU, Sun. A Arte da Guerra. Tradução de José Sanz. 23 ed. Rio de Janeiro: Record, 2000, p. 16.

A valorização pessoal é achave para qualquerprocesso de melhoria

profissional

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cisa se municiar de todo conhecimento pos-sível a seu respeito e de seus liderados.

No setor público, com todas as suasespecificidades, a ausência desse conheci-mento pode levar os funcionários a não re-conhecer qualquer tipo de liderança, levan-do uma organização, ou mesmo um setor des-sa organização, ao não cumprimento fiel desua missão, corroborando para seu fracasso.

Nota-se que é difícil desenvolver qual-quer relacionamento interpessoal sem quehaja em primeiro lugar um conhecimento pró-prio. A mente humana muitas vezes não é tãológica quanto achamos que é. Não são rarasas situações em que nos deparamos com pen-samentos notoriamente corretos e exequíveis,no entanto nossas atitudes são diametralmen-te opostas ao nosso pensamento ou inten-ções. Por que isso ocorre? O ser humano étão paradoxal que nem mesmo consegue pen-sar, falar e agir de maneira única; ou seja, nemtudo o que fala é o que realmente faz, ou nemtudo o que pensa é o que realmente fala. As-sim, essa unidade humana se faz ausente emdiversas ocasiões.

A primeira responsabilidade minha e deminha equipe é examinar de forma críti-ca nossos próprios comportamentos eestilos gerenciais em relação aos com-portamentos e valores que professamos,e trabalhar para nos tornarmos mais co-erentes com os valores que estamos ar-ticulando. É um trabalho difícil. Todosnós temos deslizes. Mas não se podefalar uma coisa e fazer outra.48

Apesar de parecer estranho, é assim quese desenrola a dinâmica dramática da vidahumana. O ser humano precisa, então, co-nhecer-se a fim de poder explorar de maneiraótima suas potencialidades, respeitando suas

fraquezas. E quais são elas? Isso depende decada um. Cada um possui o seu mosaico pró-prio, que o individualiza como pessoa.49

Nos dias atuais, em que o setor públicoé demandado por grande parte da socieda-de, supõe-se que sejam cobrados serviçosde qualidade. A organização precisa unir agestão da qualidade em seus processoscom a qualidade da gestão; ou seja, a ges-tão qualitativamente melhor é aquela queune o melhor da administração com o me-lhor da liderança. A abordagem dada porBennis é que o problema de muitas organi-zações, e especialmente das que estão fra-cassando, é que elas tendem a ser adminis-tradas demais e lideradas de menos.

Para tal, é imprescindível que a liderançase desenvolva diuturnamente nos ambien-tes de trabalho. Assim, nunca será demaisbuscar todas as formas de bem criar um exce-lente ambiente profissional, no qual as pes-soas se sintam verdadeiramente valorizadascomo seres humanos. E a valorização incluitodo e qualquer tipo de esforço no processode conhecimento próprio e do outro.50

Para Chiavenato, os líderes deverão es-tar atentos à realidade em que se encon-tram. Ou seja, os líderes deverão estar cons-cientes do ambiente em que estão exercitan-do a liderança. Conclui-se, então, que o lí-der deverá distinguir o ambiente público doprivado quando estiver atuando. Assim, operfil do líder poderá seguir uma linha deatuação distinta em ambos os setores.

A LIDERANÇA E OS VALORESÉTICOS E MORAIS

Como mencionou Nobre, vivemos hojeem uma sociedade contemporânea, pós-moderna e neoliberal, onde os principais

48 Cf. HOWARD, apud BENNIS, op. cit., p. 44.49 NEEDLEMAN, op. cit.50 BENNIS, op. cit.

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valores basilares éticos e morais estão bas-tante relativizados, perdendo a devida im-portância no contexto atual. Não é raro ob-servarmos uma tendência nada altruísta nocomportamento das pessoas, independen-temente de faixa etária ou nível social.51

Segundo Carmo, em que pese a noçãode pós-moderno só ter ganhado difusãomais ampla a partir dos anos 1970, trouxeconsigo uma lógica social baseada em rup-turas e descontinuidades, fundamentadana negação da tradição e voltada para oculto da novidade e da mudança.52

Assim, tornou-se um desafio a ser ven-cido formar líderes verdadeiramente com-prometidos com suas organizações, reafir-mando os valores e visões dessa institui-ção, aliados aos conceitos éticos e moraisindividuais do grupo como um todo.

Fator crucial e preponderante é o conheci-mento da missão da organização, bem comosua visão. Nota-se nas diversas organizaçõesque seus integrantes raramente sabem exata-mente qual a verdadeira missão institucional.Com certeza, isso dificulta o comprometimen-to com os valores orga-nizacionais, tendo emvista a própria fragilidade para se interiorizá-los. E essa realidade é ainda mais notória nasorganizações públicas.53

Com o intuito de minimizar essa proble-mática, as organizações, em especial asmilitares, procuram divulgar de forma os-tensiva qual é sua missão, seja por meio depalestras, reuniões específicas e até mes-mo com a exposição gráfica em murais, ondepode ser facilmente visualizada e, quemsabe, internalizada.

Qualquer líder que se preze tem a obri-gação de bem conhecer esses fatoresnorteadores, a fim de poder genuinamenteexercer uma liderança sustentável. Da mes-ma forma, assim como é imprescindível queo líder seja conhecedor da missão e da vi-são organizacional, também os funcionári-os que integram o corpo profissional sãochamados a essa questão.

Esse esforço de divulgação merece a de-vida atenção, pois da mesma forma que nãose pode amar aquilo que não se conhece,não se pode comprometer com algo tão abs-trato e fosfórico, evidentemente sem valor.Para que um funcionário seja leal, tenha ati-tude proativa, dê contribuições e tenha or-gulho do que faz é imperioso que se identifi-que inteiramente com sua organização, alian-do seus objetivos pessoais aos objetivosorganizacionais.54

Observa-se que importante, nesse senti-do, é a construção da cultura organizacional,em que as pessoas possam verdadeiramentese identificar com as crenças da instituição àqual pertencem, criando vínculos que as fa-çam interagir de tal forma que venham a par-ticipar proativamente para que a organizaçãocumpra sua missão de maneira eficiente.55

Ainda para Schein, a cultura organi-zacional é um conjunto de regras que to-dos os membros dessa organização devemseguir e adotar como diretrizes e premissaspara guiar seu trabalho.

No setor público, principalmente nosdias de hoje, a criatividade, a iniciativa e ocomprometimento são cada vez mais exigi-dos, em virtude da mudança radical que

51 NOBRE, Erica B. Crenças de superiores e subordinados sobre o perfil do líder militar-naval brasileironeste final de século. 1998. Dissertação de Mestrado em Psicologia Social, Cognitiva e da Persona-lidade. Instituto de Psicologia/Universidade Federal do Rio de Janeiro: Rio de Janeiro, 1998.

52 CARMO, Paulo Sérgio do. Sociologia e sociedade pós-industrial: Uma introdução. São Paulo: Paulus,2007.

53 SCOTT, Cynthia D. Visão, valores e missão organizacional. São Paulo: Qualitymark, 1998.54 Idem.55 SCHEIN, Edgar H. Cultura organizacional e liderança. São Paulo: Atlas, 2009.

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ocorreu na administração pública a partirda reforma do Estado, deixando de ter umaspecto burocrático e passando a ter comofoco o aspecto gerencial, focado na obten-ção de resultados mais tangíveis.56

O verdadeiro líder precisa ser ético emoral; ou seja, suas atitudes e ações de-vem estar voltadas de tal forma que sejamotivo de exemplo para as pessoas ao seuredor. Nos dias de hoje, em nenhuma orga-nização se aceita mais seguir pessoas semesse perfil de liderança.57

No setor público, onde vemos constante-mente nos noticiárioscasos de desvios deverbas e peculato, en-tre outras distorçõesdas regras prescritas,deduz-se que urge a ne-cessidade de uma forteliderança enquadradanos conceitos citadosacima. Não que issonão seja necessáriotambém no setor priva-do; contudo, pelas ca-racterísticas da Admi-nistração Pública, inserida num contexto nadafavorável ao seu lado, é premente e incontesteque a moral e a ética sejam fatores norteadoresdos valores importantes e requisitos funda-mentais para a liderança.

A LIDERANÇA COMO PROCESSODE APRENDIZADO

Em que pese a existência do pensamen-to leigo ainda dominante de que a lideran-ça é algo inato, os diversos estudiosos e

pesquisadores já são quase unânimes naquestão de que essa realidade já faz partede uma literatura passada.58

Segundo Nobre, foi realizado um levanta-mento piloto na Marinha do Brasil em que seobservou que os militares têm a tendência denão aceitar o inatismo para uma explicaçãológica à liderança. Também se reforçou que otreinamento nessa área necessita levar emconsideração uma abordagem situacional emultivariada do fenômeno, aspecto já levan-tado por Kurt Lewin (1890 – 1947).

Adicionalmente, a liderança tem sidoapontada como umprocesso de aprendiza-do constante por di-versos pesquisado-res.59 Uma questão éinteressante e merecedestaque: todos os lí-deres conhecidos naHistória, de uma ma-neira ou de outra, pre-cisaram de um tempode aprendizado, senãoacadêmico, como se vêna realidade atual, pelo

menos de maneira empírica, como se obser-va nos líderes do passado.

Em oposição ao pesquisador Charam,que defende a teoria de que o líder nãopode ser qualquer pessoa, observa-se quetodos possuem um potencial para lideran-ça em maior ou menor grau.60 É apenasquestão de treinamento, todos podem li-derar. Obviamente, existem aqueles que sãodotados de uma capacidade maior, e destaforma necessitarão de menores esforçospara conseguirem liderar eficazmente.

56 BRESSER e SPINK, op. cit.57 Idem.58 NOBRE, Erica B. “Treinamento em liderança na formação do oficial de Marinha – uma abordagem

psicológica”, in Revista Marítima Brasileira – v.125, n10/12 – out/dez 2005.59 Idem.60 CHARAM, op. cit.

O verdadeiro líder precisaser ético e moral; ou seja,

suas atitudes e açõesdevem estar voltadas de talforma que seja motivo deexemplo para as pessoas

ao seu redor

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A liderança não é um lugar, não é umgene e não é um código secreto que nãopossa ser decifrado por pessoas co-muns. A liderança é um conjunto de ca-pacidades e habilidades. [...] E toda ha-bilidade pode ser fortalecida, afiada eaperfeiçoada se tivermos a motivação eo desejo apropriados, juntamente com aprática e o feedback, papéis modelarese a assistência de um treinador.61

Assim sendo, nos dias de hoje, verifi-camos nas empresas um processo contí-nuo de treinamento em liderança.

No Brasil, ainda não se observa essapreocupação com tanta ênfase no setorpúblico. Se por um lado as empresas vêmdemonstrando essa crescente preocupa-ção em se treinar para a liderança, no setorpúblico isso é mais notado no âmbito mili-tar, onde são oferecidos diversos cursossobre o assunto e há um acompanhamento

mais direto. Para isso, basta observar oscurrículos das diversas escolas de forma-ção nas três Forças Armadas.

Em recente levantamento realizado poreste autor, verificou-se que tanto na Esco-la Naval, como na Academia Militar dasAgulhas Negras, na Academia da ForçaAérea, no Centro de Instrução AlmiranteWandenkolk e no Centro de Instrução Al-mirante Alexandrino, nos currículos doscursos constam disciplinas específicas deliderança para os alunos em formação eaperfeiçoamento.

Até mesmo em termos de participaçãoem cursos, a quantidade de pessoas per-tencentes ao setor público é reduzida.

Segundo breve pesquisa realizada naFundação Getúlio Vargas-RJ (FGV) e noCentro das Indústrias do Estado de SãoPaulo (Ciesp), o número de inscritos noscursos de liderança nos últimos anos foi oseguinte:

TABELA 1: QUANTITATIVO NOS CURSOS DE LIDERANÇA

ANO

2007

2007

2008

2008

2009

CURSO

Liderança de equipes - FGV

Gestão e Liderança - FGV

Liderança de equipes - FGV

Gestão e Liderança - Ciesp

Formação de Líderes - Ciesp

QUANTIDADESERVIÇO PÚBLICO

03

04

02

03

04

QUANTIDADESERVIÇO PRIVADO

15

23

12

25

48

Fonte: Secretarias da Fundação Getúlio Vargas – RJ e Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp)

61 Cf. KOUZES e POSNER, op. cit., p. 388.

Verifica-se que são poucos os profissi-onais do setor público que estão partici-pando desse tipo de curso. Conclui-se,então, que ainda não faz parte da cultura

do País a preocupação em preparar os pro-fissionais desse setor para o exercício daliderança, justamente no setor em que sãodemandadas as necessidades mais básicas

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da sociedade, como segurança, educaçãoe saúde.

Em outra pesquisa realizada na internet,somente foram identificados dois cursosde liderança para o setor público na EscolaNacional de Administração Pública –Brasília, quais sejam: Liderança eGerenciamento; e Liderança: reflexão eação. O público-alvo é de gerentes inter-mediários, gerentes operacionais esupervisores que têm equipe sob sua res-ponsabilidade e dirigentes da Administra-ção Pública. Entretanto, há cerca de doisanos consecutivos o curso não é realiza-do, simplesmente por falta de quorum sufi-ciente para a formação das turmas.62

A LIDERANÇA NOS AMBIENTESPÚBLICO E PRIVADO

Ao longo deste trabalho, foram aponta-das algumas diferenças notórias entre ascaracterísticas inerentes do setor públicoe do setor privado no que concerne à lide-rança, principalmente quanto à forma desua aplicação, tendo em vista que o con-ceito é único.

Em que pese ambos buscarem atingirobjetivos, o fazem de forma diversa, apa-rentando para os observadores incautosque se trata de formas completamentedíspares de se trabalhar. Entretanto, ape-sar das diferenças existentes, há que seressaltar a semelhança presente quando oassunto é atingir objetivos.

Se por um lado o setor privado buscaseus resultados, levando em consideração,essencialmente, a aferição de lucros e a re-dução de custos, por outro lado o setorpúblico o busca por meio de técnicasgerenciais que possibilitem uma otimizaçãode recursos, com o fim de atender ao bem

comum. Aqui não está em jogo o lucro,embora já seja uma realidade a preocupa-ção com a redução dos custos.

Assim, percebe-se que os enfoques en-volvidos são diversos, porém o fim é sin-gular: alcançar resultados.

Empregando, essencialmente, o concei-to de liderança, assim como as característi-cas e sua importância, a liderança foi ob-servada nas visões pública e privada comaspectos tanto de similaridade como dediferenciação. Como discutido ao longodeste trabalho, a similaridade faz-se pre-sente conceitualmente, sendo que naaplicabilidade encontra-se o aspectodiferenciador.

Assim, em que pese a liderança ser úni-ca, as óticas que são observadas no setorpúblico e privado são distintas.

Quanto ao conceito de liderança, tive-mos a oportunidade de aprofundar um pou-co o estudo e vimos que é válido para qual-quer que seja o ambiente: setor público,setor privado, uma igreja, uma organizaçãonão governamental, a própria família. Ouseja, em qualquer lugar é fundamental quea liderança seja aplicada. Se bem usada, sópoderá trazer benefícios.

Então, analisando a liderança sob vári-os prismas, nota-se que, qualquer que sejaa organização, ela se faz indispensável,cabendo, todavia, adequar sua aplicação.Analogamente, se a verificamos ainda sobo prisma dos valores éticos e morais comobase ou, ainda, em relação à questão dacapacitação técnica para a liderança ou atémesmo como um processo de aprendizado,encontraremos semelhanças conceituaiscom diversidade de aplicação.

Em virtude das características intrínse-cas dos setores público e privado, é salu-tar e pertinente que a liderança seja exercida

62 BRASIL. Escola Nacional de Administração Pública. Disponível em: <http://www.enap.gov.br>. Acessoem: 10 de agosto de 2009.

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sob enfoques distintos, a fim de que sechegue a bom termo ao alcance dos resul-tados desejados.

Não foi encontrada uma palavra maisprecisa que definisse essa diferença. Tal-vez possa se falar em “inculturação” da li-derança nos dois setores. SegundoMiranda, a inculturação é um método deintroduzir a cultura, aspectos culturais deum determinado povo, à sua.63

Segundo Nascimento, deve-se fazer umareflexão sobre os perfis de comportamen-tos que caracterizam uma “empresa psico-pata” e uma “empresa cidadã”.64 Isso se dápelo fato de que uma empresa é considera-da uma pessoa jurídica, logo se pode ques-tionar: que tipo de personalidade terá essa“pessoa”? Ela poderá ter um perfil de psi-copata ou cidadã.

Assim, ele estabelece uma relação entreempresas e pessoas psicopatas, traçandoalgumas características em comum e poden-do-se citar como exemplo o desinteresse pelosentimento alheio e total desconsideraçãopela segurança dos outros, além da incapa-cidade de manter relações duradouras.

Entretanto, também pode uma empresaser considerada “cidadã” se tiver outrascaracterísticas, sendo possível a ela sobre-viver num ambiente competitivo, mantendoum comportamento ético e assumindo asresponsabilidades sociais e ambientais. To-davia, para ser uma “empresa cidadã” não énecessário obter todos os certificadossocioambientais e atender a todos os indi-cadores afins. Uma “empresa cidadã” devebuscar ser um referencial de excelência nasáreas social, econômica e ambiental.65

Nota-se que no setor privado já existeuma preocupação latente nesse sentido, o

que influencia diretamente os seus colabo-radores. Dessa forma, o turn over das “em-presas psicopatas” tende a ser elevado, e ooposto para as “empresas cidadãs”, em queesse indicador tende a ser baixo. Isso se dáaté mesmo pela relativa facilidade e culturaimperante de que se pode mudar de empre-sa caso não se esteja satisfeito. Para Nasci-mento, turn over refere-se à relação entreadmissões e demissões de trabalhadoresantigos por novos de uma organização.

A influência do líder nesse sentido éfundamental. Que tipo de líder existe nes-ses tipos de empresa?

No caso do setor público, essa realida-de é um pouco diferente, tendo em vistaque a cultura é do servidor (colaborador)tender a permanecer no seu emprego, emvirtude da estabilidade empregatícia. Oque ocorre com uma frequência grande éque, ao não se sentir satisfeito, o servi-dor, quando possível, presta um concur-so público para outro cargo, permanecen-do sua estabilidade. Aqui o turn over ten-de a ser sempre baixo, independentemen-te do perfil da empresa pública ser de psi-copata ou cidadã.

Assim, observa-se que a liderança éaplicada de forma distinta para os setorespúblico e privado, em virtude das realida-des diferentes desses setores.

Por fim, é importante ressaltar que a li-derança requer primordialmente o relacio-namento pessoal. E esse relacionamentonão deve excluir as perspectivas profissio-nais que marcam diferentemente o pessoaldos setores público e privado. Cada qual,com suas tendências comportamentais ouexpectativas de trabalho, busca de formadiversa seus objetivos, demonstrando

63 MIRANDA, Mario de França. Inculturação da fé. São Paulo: Loyola, 2001.64NASCIMENTO, Luis Felipe. “Empresa psicopata versus Empresa cidadã”. Revista de Gestão Ambiental

e Social, 2009.65 Idem.

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como a liderança deve ser aplicada tam-bém sob esses enfoques diversos.

CONCLUSÃO

O autor não quis, com este trabalho,criar nenhuma teoria ou trazer novos con-ceitos à baila, até porque novos concei-tos para liderança não existem, pelo me-nos até o momento. A intenção foi apenasfazer uma averiguação sobre a possívelsimilaridade da liderança nos setores pú-blico e privado, a partir do estudo do pró-prio conceito, e sua caracterização e im-portância nas organizações do setor pri-vado, em virtude da inevitável concorrên-cia que se vê no mundo atual capitalista.Mas também quis apontar que essa mes-ma liderança é tão ou mais importante parao setor público, que, apesar de não bus-car lucros, tem como recursos o orçamen-to aprovado pelo governo, fruto de todasas arrecadações feitas dos contribuintes.O serviço é público, ou seja, para todos. Eos recursos vêm de todos os contribuin-tes que pagam impostos.

A Administração Pública, em seu esco-po, traz características que não apenas adiferencia do setor privado, mas faz comque tenhamos a necessidade premente debuscarmos melhores gestões. E para isso aliderança se faz extremamente importante.A Gespública, no âmbito do setor públicobrasileiro, vem procurando, por meio demedidas de incentivo e orientação por par-te do Ministério do Planejamento, Orça-mento e Gestão, dar condições para queseja valorizada a questão da liderança, afim de que os resultados almejados sejamalcançados a contento. Essa iniciativa, quenorteia outros ministérios a também segui-rem nesse rumo, foi e continua sendo umadireção a ser seguida pela Marinha do Bra-sil, no âmbito do Ministério da Defesa, quevem desenvolvendo o Programa Netuno.

Dessa forma, saber o motivo pelo qualé importante a liderança e saber conceituá-la com razoável exatidão fazem bastantesentido.

Adentrando um pouco mais no concei-to, o autor procurou tecer comentários so-bre os valores éticos e morais como basespara liderança, enfatizando que esses as-pectos não podem ficar desvencilhados umdo outro, pois juntos levam à unidade dosfuncionários com o grupo a que perten-cem, numa harmonização pessoal com acultura organizacional.

Ademais, a questão da liderança comoaprendizado foi levantada com o fim dedemonstrar que perseverança no aprendi-zado se faz necessária quando o inatismonão está mais presente na mentalidade dosfuncionários.

Pela pesquisa efetuada, observou-seque há iniciativas em ambos os setores,público e privado; no entanto, a presençaem cursos da Fundação Getúlio Vargas, noRio de Janeiro, e no Centro das Indústriasno Estado de São Paulo, entre os anos de2007 e 2009, aponta para um maior interes-se por parte do setor privado.

Entretanto, como já mencionado anteri-ormente, a Gespública e o Programa Netunomarcam profundamente, no setor público,um nobre exemplo de iniciativa que favore-ce o exercício da liderança.

Não existem regras para se liderar, nemtampouco se faz um líder incutindo em suacabeça definições, conceitos ou experiên-cias de outras pessoas. A liderança se cons-trói por meio do estudo e da experiênciaprópria, por vezes pautada em experiênci-as alheias, mas acima de tudo quando ohomem aprende simplesmente a se relacio-nar, independentemente do seu local de tra-balho. Aqui voltamos a enfatizar a questãoda influência interpessoal, constante doconceito de liderança e abordado no iníciodeste trabalho.

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Assim, vale salientar que o relaciona-mento interpessoal parece ser um aspectomuito importante quando se trata de lide-rança, e isso pode ser observado no ambi-ente público ou privado.

Por fim, o autor dá-se por satisfeito porchegar à conclusão de que a liderança, emque pese ser a mesma, precisa, de certa for-

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<VALORES>; Liderança; Administração; Moral; Exemplo;

ma, ser encarada sob uma diferente óticanos dois setores aqui tratados, justamentepelas próprias características inerentes aesses setores. Constatou-se, então, a realsimilaridade da liderança nos setores estu-dados, quando nos atemos ao conceito eàs diferenças e quando abordamos os as-pectos de sua aplicabilidade.

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SUMÁRIO

IntroduçãoA guerra como conflitoOperações de guerra não militaresConclusãoReferências

AS OPERAÇÕES DE GUERRA NÃO MILITARESÀ LUZ DA TEORIA DA SOCIOLOGIADOS CONFLITOS E GUERRAS

MARCOS TAYLOR FONTESCapitão de Corveta

INTRODUÇÃO

O fim do século XX e o início do séculoXXI têm sido palco de rápidas e pro-

fundas transformações. A globalização e aalta tecnologia têm conduzido o mundo alugares nunca antes navegados. Aintegração global é ampla e profunda. OEstado deixou de ser o único ator de rele-vância no cenário internacional. Surgiu umnúmero infindável de organizaçõesmultinacionais e transnacionais com tama-nho poder político, econômico e diplomá-

tico capaz de superar o poder de algunsEstados.

No ambiente da guerra não tem sido dife-rente. O pensamento e o entendimento dohomem sobre a guerra também evoluíram.Passou-se da guerra convencional, violen-ta, sangrenta e mortífera, com campo de ba-talha definido, para guerras de proporçõesnunca vistas, como a guerra de destruiçãoem massa e o pesadelo da guerra nuclear.

Segundo Liang e Xiangsui (2003), talmetamorfose da guerra tem como causaprincipal a abundância de novas tecnolo-

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gias que permitem a geração de novos mei-os e métodos de execução de uma guerranum ambiente de escala mundial. Tais au-tores designaram este novo escopo deguerra como sendo a Guerra Além dos Li-mites, em que apresentaram um novo con-ceito de guerra chamado de Operações deGuerra Não Militares.

O propósito deste trabalho é o de inter-pretar este novo conceito de guerra apre-sentado por Liang e Xiangsui (2003) à luzdo arcabouço teórico da sociologia dosconflitos e guerras.

A GUERRA COMO CONFLITO

Das inúmeras definições existentes so-bre guerra, uma das mais simples é a quediz que a guerra é um conflito armado. Aose dissecar esta definição, vê-se que a pa-lavra conflito carrega em si toda a essênciado que é a guerra. Então, para entendermelhor o conceito de guerra, é necessárioo entendimento completo do conceito deconflito. Segundo Freund:

O conflito consiste em um confronto porchoque intencional entre dois seres ougrupos da mesma espécie que manifes-tam, uns em relação a outros, uma inten-ção hostil, em geral a um propósito dedireito e que, para manter, afirmar ou res-tabelecer este direito, tratam de rompera resistência do outro, eventualmentepelo recurso da violência, que pode, senecessário, tender ao aniquilamento fí-sico do outro (Freund, 1995, p.58, tradu-ção nossa).

Com esta definição sobre o conceito deconflito, Freund (1995) pormenoriza algu-mas características para que um confrontoseja considerado um conflito. São elas:

– Confronto intencional e congênere:para este autor não há conflito se não hou-

ver uma intenção; o conflito pode ser entredois indivíduos ou dois grupos da mesmaespécie, sendo que poderá haver conflitoem grupos de diferentes tamanhos;

– Intenção hostil: a hostilidade é umsentimento de se querer prejudicar o outro(inimigo); deverá haver hostilidade em pelomenos um dos antagonistas; a hostilidadepode aparecer espontaneamente ou ser pre-viamente organizada; esta hostilidade po-derá variar desde a simples ameaça do em-prego da violência até o efetivo empregodesta;

– Disputa de um direito: o autor ressaltaque a noção de direito nesta definição estáempregada com um sentido de uma reivin-dicação de justiça, podendo manifestar-sede várias formas: disputa de limites de ter-ras entre duas pessoas, desejo de um gru-po ser reconhecido oficialmente, reivindi-cação de uma coletividade política de seudireito à independência e um território, rei-vindicações de revolucionários quanto ainjustiças nas sociedades em que vivem;

– Rompimento da resistência do outro:segundo aquele autor, o conflito é um con-fronto de vontades com o objetivo de obtera razão sobre determinada disputa por ou-tros meios que não sejam argumentos raci-onais (intimidação, ameaça, violência), cujodesenlace pode se dar pelo aniquilamentofísico do outro, pelo triunfo de um e o reco-nhecimento da derrota pelo outro ou pelorecurso da arbitragem por um terceiro;

– Emprego da violência: no conflito, oemprego da violência é um extremo de umespectro da utilização de meios de coerçãoda vontade do inimigo que vai desde a ame-aça do emprego desta até o seu efetivo em-prego, se estendendo até a aniquilação doinimigo. Segundo Freund (1995), a violênciaé a característica fundamental do conflito edá a ele toda a sua significação, consistindona relação de poderes entre vários gruposque renunciam a outros modos de se manter

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relações entre eles, com a finalidade de for-çar o oponente a atender seus interessespela utilização de meios agressivos ou re-pressivos, podendo chegar até à aniquila-ção física deste oponente.

Ainda segundo Freund (1995), o conflitoestá no centro da sociedade, e não há outraforma de suprimi-lo. O que se pode fazer émoderá-lo por meio de regulamentações e leis,de forma a reduzir a forma violenta de confli-to. Então, pode-se concluir que a adjetivaçãode inevitabilidade do conflito é correta.

Conforme Araújo (1959) explica em seulivro, há diversos autores que propuseramdefinições sobre a guerra, sendo estamultiplicidade de definições devido ao cam-po de conhecimento especializado que ti-nham seus autores sobre o tema, como, porexemplo, jurídico, diplomático, militar, psi-cológico ou sociológico. Ainda sobre estadiversidade de definições, ele cita Bouthoul(1951, apud ARAÚJO, 1959), que divide taisdefinições em três grupos: o primeiro gru-po, que apresenta características jurídicasda guerra; o segundo, que destaca a finali-dade da guerra (política, militar ou psicoló-gica); e o terceiro grupo, que destaca asmanifestações exteriores da guerra (sermortífera, caráter coletivo). Então, toman-do uma definição não exaustiva sobre ofenômeno da guerra, mas que reúne carac-terísticas exteriores que lhe sejam comuns,de forma a compreender, no mesmo estu-do, todos os fenômenos que respondem aesta definição, Araújo (1959) propõe umadefinição sobre a guerra em que ela seria adestruição dos homens por seus semelhan-tes, almejada, meditada e coletivamenteempreendida.

Analisando-se a definição de guerra deAraújo (1959), pode-se compreender queesta se encaixa na definição de conflito dadapor Freund (1995). O caráter intencional doconflito é dado quando se diz que a guerradeve ser almejada e meditada. É congênere,

já que se dá entre os homens. A hostilida-de aparece na finalidade de destruição dosseus semelhantes, que também destaca oseu caráter violento. A natureza coletivada guerra encerra o seu atributo de fenô-meno social, dado que Freund (1995) apre-senta que o conflito e, por consequênciadesta análise, a guerra são inerentes a to-das as sociedades.

Neste momento, faz-se necessário res-ponder à seguinte pergunta: Qual a carac-terística essencial do conflito e, porconsequência, da guerra? Respondendo aesta pergunta, Freund (1995) diz que é aviolência que diferencia um conflito de umacompetição. Então, sem violência ou a ame-aça de seu emprego não há conflito ouguerra. Quanto ao emprego efetivo destaviolência, é de senso comum que na guerraa violência se dá pelo emprego da forçadas armas, chegando-se até mesmo à ani-quilação física do inimigo.

Então, pode-se concluir que, para queum confronto ou oposição de dois grupos,assimétricos ou não, possa ser considera-do uma guerra, é necessário, essencialmen-te, que a violência esteja presente ou la-tente, mediante o uso da força das armas.

OPERAÇÕES DEGUERRA NAO MILITARES

Em seu livro A guerra além dos limites,Liang e Xiangsui (2003) apresentam o con-ceito de “Operações de Guerra Não Milita-res”, que são guerras executadas por ou-tros meios que não a força das armas. Se-gundo tais autores, este novo conceito ex-pande o entendimento de guerra a todos oscampos da atividade humana, acarretando amudança do conceito de guerra, de formaque o novo entendimento do propósito daguerra seja o uso de todos os meios dispo-níveis, sejam eles baseados na força das ar-mas ou não, ligados ao poder militar ou não,

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de forma a dobrar a vontade do inimigo.Decorrente deste novo conceito de guerra,o campo de batalha foi alterado para todo oglobo terrestre, transcendeu a ambiênciamilitar e fez surgir novos “soldados” (políti-cos, cientistas, banqueiros).

À luz da definição de conflito (Freund,1959) e guerra (Araújo, 1959) dada no capí-tulo anterior, cabe agora repensar se o con-ceito de “Operações de Guerra Não Milita-res” pode ser estritamente enquadradocomo sendo guerra ou não. Para isso, se-rão ressaltadas aqui características destenovo conceito que poderão tipificá-lo comosendo conflito ou guerra:

– nestes novos meios e métodos de sefazer a guerra, pode-se notar que a inten-cionalidade está presente no enfrenta-mento de seus grupos antagônicos;

– a hostilidade aparece quando a açãotem a finalidade de prejudicar a outra parteenvolvida, então fica claro que em umaguerra comercial, por exemplo, poderá ha-ver hostilidade desde que seu objetivoprincipal deixe de ser a obtenção de vanta-gens comerciais e passe a se obter ainviabilidade econômica de uma outra re-gião industrializada ou, até mesmo, o em-bargo econômico de um outro Estado;

– reivindicação da justiça sempre será opano de fundo de um confronto entre doisantagonistas, por mais absurda que possaparecer a alegação usada aos olhos dosespectadores do confronto; nestes novosmeios de guerra não acontece diferente: porexemplo, na pretensa Guerra Ecológica, umajustificativa que poderá ser usada é a deque a proteção do meio ambiente não podeser fator impeditivo do desenvolvimentoeconômico de quem a pratica;

– a finalidade de um confronto é sempredobrar a vontade do inimigo de acordo comnossos interesses. É uma característica ina-

ta a todo conflito e, portanto, pertencentetambém a estes novos meios de guerra.

Até aqui foi verificado que estes novosmeios e métodos se encaixam no conceitode guerra. Porém, no tocante ao aspectoda violência, nota-se que a mesma (violên-cia) não faz parte deste novo conceito deguerra. Reforça esta observação o fato deLiang e Xiangsui (2003) afirmarem que es-tes meios não usarão a força das armas,poderão não estar ligados ao poder militare poderão não provocar vítimas, o que osafasta definitivamente do conceito de guer-ra entendido no capítulo anterior. Conclui-se então que o conceito de “Operações deGuerra Não Militares” não pode ser estri-tamente enquadrado como sendo guerra.

Cabe aqui uma reflexão sobre o motivodo emprego do termo guerra a estes novosmeios e métodos apresentados por Liang eXiangsui (2003), seu entendimento e asimplicações deste emprego.

Em primeiro lugar, de acordo com própri-as ideias apresentadas por Liang e Xiangsui(2003), estes novos tipos de guerra nadamais seriam do que métodos operacionaisque, combinados com outras operações mi-litares, fariam parte do esforço de guerra deum Estado ou grupo, mantendo-se o esfor-ço principal e a primazia da guerra nas mãosdaqueles que empregarão as armas.

Uma outra maneira seria entender que osnovos tipos de guerra são, na verdade, acontinuação da política por outros meios,como afirmava Clauzewitz sobre a guerra¹.Este entendimento posicionaria estes méto-dos totalmente fora da ambiência de umaguerra e os colocaria no campo da política.

A terceira visão deste motivo seria enten-der que o conceito de Freund (1995) sobreviolência deveria ser mais abrangen-te. Elediz que os meios utilizados pela violência sãoagressivos ou repressivos e podem levar até

¹ “A guerra é a continuação da política por outros meios” (Clauzewitz apud Brasil, 2007, p.3-24).

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AS OPERAÇÕES DE GUERRA NÃO MILITARES À LUZ DA TEORIA DA SOCIOLOGIA DOS CONFLITOS E GUERRAS

à aniquilação física do inimigo. Quando seimaginam os meios empregados em uma guer-ra comercial, midiática ou ecológica (exem-plos deste novo conceito), não se enxergauma agressividade tal que se chegue até oponto de destruição do inimigo, mesmo quetais medidas corroborem indiretamente paraisso. Portanto, seria necessária uma altera-ção de semântica interpretativa da palavraviolência e da palavra guerra em todo o seusignificado tradicional – só então poder-se-ia acatar o entendimento de violência políti-ca, econômica ou tecnológica citado porLiang e Xiangsui (2003).

CONCLUSÃO

Como verificado, para que um confrontoou oposição de dois grupos, assimétricosou não, possa ser considerado um conflito,é necessário, essencialmente, que a violên-cia ou a ameaça de seu uso esteja presenteou latente; para que um conflito seja carac-terizado como uma guerra se faz necessárioque a violência, mediante o uso da força dasarmas, já esteja deflagrada entre os dois gru-pos oponentes. Este raciocínio empresta àviolência toda a significação do que é aguerra: a guerra é violência.

Assim, diante da definição dada anterior-mente de conflito e guerra, chegou-se à con-

clusão de que o conceito de “Operações deGuerra Não Militares” apresentado por Liange Xiangsui (2003) não pode ser estritamenteenquadrado como sendo guerra.

Tal conclusão levou a uma reflexão do mo-tivo do emprego, por esses autores, do termoguerra a estes novos meios e métodos de sefazer a guerra. Todos os motivos expostosapontaram para a confirmação de que as “Ope-rações de Guerra Não Militares” não perten-cem ao domínio da guerra e da violência. Con-tudo, as características em comum que as “Ope-rações de Guerra Não Militares” possuem coma guerra são suficientemente fortes para que oseu emprego leve a cabo a principal finalidadede uma disputa com característicasconflituosas ou não: dobrar a vontade do ini-migo aos nossos interesses. Isso também de-nota que o espectro de possíveis causas quelevam ao conflito está se expandindo, refor-çando a ideia de sua inevitabilidade.

Portanto, já que as “Operações de Guer-ra Não Militares” alcançam o mesmo resul-tado para o qual as guerras se propõem, faz-se mister o seu estudo mais aprofundado deforma que as perguntas quando, por quem econtra quem serão empregadas tais “guer-ras” possam ser respondidas e seu contor-no delineado nesta névoa do que é a guerranos dias atuais.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<FORÇAS ARMADAS>; Operações; Guerras; Sociologia;

REFERÊNCIAS

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BOUTHOUL, G. Les Guerres. Élements de Polemologie. Paris, 1951.BRASIL. Escola de Guerra Naval. EGN-304B. Guia de Estudos de Estratégia. Rio de Janeiro, 2007.

Disponível em: <http://www.egn.mar.mil.br/areaIII.htm>. Acesso em: 05 abr. 2010.FRANÇA, Júnia Lessa; VASCONCELOS, Ana Cristina de. Manual para normalização de publica-

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Neste ano se completam 28 anos do con-flito naval mais recente ocorrido no

Atlântico Sul. As causas que levaram doispaíses de realidades distintas à guerra jáforam por muitas vezes abordadas e, porisso mesmo, são conhecidas ao longo des-te tempo. Porém ensinamentos valiosos eainda atuais podem ser retirados desteexemplo, pois alguns aspectos se asseme-lham aos dos momentos que vivemos emesmo aos dos vindouros.

No dia 5 de setembro de 2008, foi ativadaa Coordenadoria-Geral do Programa de De-senvolvimento de Submarino com Propul-são Nuclear (Cogesn). Grande marco para anossa Marinha, coroa o trabalho conduzidohá 30 anos do Programa Nuclear, cuja metaera dominar o ciclo deste combustível e cons-

POR QUE UM SUBMARINO DE PROPULSÃONUCLEAR? LIÇÕES SOBRE AS MALVINAS

NILSON AUGUSTUS GONÇALVES DE SOUZACapitão de Corveta

truir o protótipo do reator para um submari-no. Pouquíssimos países no mundo sãohabilitados a construir seus próprios sub-marinos, e mais reduzido é o numero daque-les que os fazem movidos a propulsão nu-clear. China, Estados Unidos da América(EUA), França, Rússia e Inglaterra são osatores deste seletíssimo grupo. O Nautilusfoi o primeiro. Lançado ao mar em 1954 pe-los americanos, em 17 de janeiro de 1955, emsua primeira viagem, transmitiu a mensagemhistórica: “Underway on nuclear power”.*

Foi descomissionado em 3 de março de 1980.O planejamento dá conta que nosso“Nautilus” será lançado em 12 anos.

Mas a resposta à pergunta do título de-manda um caminho até certo ponto extensopara que possa ser melhor compreendido.

* N.R.: Navegando com propulsão nuclear.

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O Submarino Nautilus ficou na ativa por 25 anos

Dados indicam que 90% do comérciomundial utiliza-se do mar. No caso brasilei-ro, essa participação chega a cerca de 95%.Com toda a costa exclusivamente voltadapara o Atlântico, sendo que majoritariamen-te para o sul desse oceano, é de se regis-trar quanta preocupação a Marinha tem emdefendê-lo.

A proposta encaminhada à Organizaçãodas Nações Unidas (ONU) para que tenha-mos reconhecido nosso pleito para a deli-mitação da nossa Zona Econômica Exclu-siva (ZEE) e, consequentemente, reconhe-cidos todos os direitos que sobre ela nosreservam diz respeito a uma área de aproxi-madamente 4,5 milhões de quilômetros qua-drados, o que equivale à metade do nossotamanho terrestre, e que foi muito bem de-nominada Amazônia Azul.

Tema recorrente nos últimos anos, o Pré-Sal, dentre outras coisas, se apresentacomo uma reserva de petróleo de dimen-sões ainda desconhecidas, mas já a maissignificativa das últimas décadas. Tambémnos coloca no cenário internacional comopossível exportador desse importantíssi-mo insumo energético e reforçou interna-mente em nossa sociedade, de maneira bas-tante positiva, o papel para que nós, brasi-leiros, tenhamos o direito de explorá-lo, mas

também o dever de negar tal ensejo a quemnão nos interesse.

O submarino é uma arma de guerra excep-cional. Sua capacidade de ocultação, soma-da à problemática detecção submarina, o tor-na um verdadeiro predador que se aproveitado melhor momento para atacar usando comocamuflagem o meio em que se desloca. Adici-one-se a tudo isso uma autonomia virtual-mente ilimitada, obviamente restrita pelaendurance dos seus tripulantes, com tal ve-locidade que o permite atacar nos 360º qual-quer força no mar e, assim, teremos à nossadisposição o poder dissuasório de nos im-por conforme nossos interesses, porém res-paldados por nossa vocação pacifista e fa-vorável sempre à resolução de contenciosospelas vias diplomáticas.

Com relação ao balanço de forças entreos envolvidos no conflito das Malvinas,nota-se ser extremamente desfavorável paraos argentinos, mas o foco desta análise é ocorreto uso pelos ingleses das suas forçasnavais, com destaque para os seus subma-rinos de propulsão nuclear.

O inventário da Força de Submarinosinglesa contava com quatro submarinosnucleares da classe Resolution lançadoresde mísseis balísticos (Polaris); seis subma-rinos nucleares da classe Swiftsure, dois

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da classe Valiant e três da classe Churchill;13 submarinos convencionais (de patrulha)da classe Oberon e mais dois da classePorpoise, totalizando 30, entre nucleares econvencionais. Participaram das operaçõesnas Malvinas os submarinos HMSConqueror e HMS Courageous (classeChurchill), HMS Spartan e HMS Splendid(classe Swiftsure) e HMS Valiant (classede mesmo nome), todos de propulsão nu-clear, além do HMS Onyx (classe Oberon),único convencional inglês na região.

Já o inventário da Força de Submarinosargentina era bem mais modesto: somentequatro submarinos convencionais, sendoque dois de idade bastante avançada, dequase 40 anos – os ARA Santa Fé (S-21) eSantiago Del Estero (S-22), ambos da clas-se Guppy, comissionados em 1951 e com-prados aos americanos em 1971, e mais doistipo 1200, ARA Salta (S-31) e ARA SanLuis (S-32), construídos em Kiel ecomissionados em 1974. Havia ainda umcontrato em andamento na Alemanha paraaquisição de mais seis novos submarinostipo 1700, dos quais somente dois foramcomissionados, os ARA Santa Cruz (S41)e ARA San Juan (S42), em 1984/85.

Os classe Guppy, por razões óbvias, ope-ravam sob terríveis restrições. O ARA San-ta Fé participou do início das hostilidades,transportando um grupamento de mergu-lhadores de combate que desembarcou emPort Stanley e a tomou nas primeiras horasdo dia 2 de abril. Era o início da OperaçãoRosário. A primeira-ministra britânicaMargareth Thatcher declarou imediatamen-te que as Ilhas seriam retomadas e, para isso,anunciou a formação de uma força-tarefa.Foi o início da operação denominadaCorporate. O Conselho de Segurança daONU emitiu a Resolução No 502, que deter-minava o cessar das hostilidades e a retira-da imediata das forças argentinas e clamavaambos governos às vias diplomáticas se-

gundo a Carta das Nações Unidas. Sem dú-vida, uma vitória política inglesa.

Fragilizado por inúmeras avarias que sesucederam a partir do desembarque nasIlhas, o ARA Santa Fé regressou para oArsenal Naval de Mar Del Plata e, após umbreve período de reparos emergenciais,suspendeu, no dia 16 de abril, rumo às IlhasGeórgias do Sul. Apesar dos trabalhos noarsenal, seu comandante viu-se na difícilsituação de ter que fazer a navegação nasuperfície devido a dificuldades emrecarregar as baterias, além de ter discutí-veis condições de lançar seus torpedoseficazmente. No dia 25 de abril, o S-21, nasuperfície, foi atingido por bombas de pro-fundidade lançadas por uma aeronave daFragata HMS Antrim e, em sequência, pormetralhadoras de aeronaves Lynx e pormíssil de um helicóptero Wasp. A breve eprevisível participação do ARA Santa Fése encerrou.

O ARA Santa Fé após sofrer os engajamentos.Podem ser vistos os buracos na sua vela

O ARA Salta encontrava-se em manuten-ção, sem data para término. O ARA San Luis,cujo comandante fora surpreendido pelas no-tícias das ações desencadeadas no dia 2 deabril, encontrava-se em situação duvidosa deadestramento, com tripulação nova, e deaprestamento apenas razoável, pois eram ne-

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cessários serviços de docagem para limpezade incrustações e outros reparos que foramcumpridos em Puerto Belgrano, em regime deurgência. Somente a partir do dia 11 de abrilpôde-se contar com o S-32, que, apesar dosreparos efetuados, apresentava sensível res-trição no sistema de direção de tiro (SDT), ava-riado logo ao suspender, fato que permitia olançamento dos torpedos apenas de forma ma-nual e colocava grande variável de incertezaem qualquer engajamento a ser realizado. Se-gundo relatos do seu comandante, foram fei-tos dois lançamentos com torpedos antinavioSST-4 (que teriam sido contra o HMSInvencible) e um antissubmarino, MK-37, mal-sucedidos, em 40 dias de patrulha. O S-32retornou, no dia 19 de maio, a Puerto Belgrano,a fim de efetuar reparos no SDT de modo aregressar ao combate, porém o acordo de ces-sar-fogo firmado em 14 de julho não o permi-tiu. O ARA Santiago Del Estero foi enviado ecamuflado em Baía Blanca para que os ingle-ses não soubessem de sua indisponibilidade.

O afundamento, em 3 de maio, do Cruza-dor ARA General Belgrano pelo Submari-no Nuclear HMS Conqueror, por dois tor-pedos MK 8, após 27 horas de acompa-nhamento e cuja decisão partiu diretamen-te da chefe do Governo inglês, gerouconsequências marcantes no conflito:

– deu credibilidade ao bloqueio (Zonade Exclusão de 200 milhas de raio em tornodas Falklands) que impuseram a partir de12 de abril; e

– tornou patente a determinação pelaretomada das Ilhas.

As Ilhas Malvinas ficam a cerca de 400milhas da costa leste argentina. Suas águascaracterizam-se por grande quantidade devida marinha, inclusive baleias, camadastérmicas não bem definidas e fundo muitoirregular, fatores que, combinados, repre-sentam um cenário difícil para os operado-res sonar na Guerra Antissubmarino (GAS).

A incapacidade dos argentinos em repa-rar, ou mesmo minimamente operar, o Santa

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Fé, bem como o SDT do San Luis, impediuque a ameaça que eles poderiam representarfosse de fato aproveitada. O grande temoringlês quanto aos submarinos argentinosnão foi concretizado. Apesar da provávelprimeira avaliação de que os parcos meiossubmarinos argentinos não atingiram graude avaliação nos combates, deve-se lem-brar que os armamentos antissubmarinosdos escoltas ingleses quase foram levadosao esgotamento e que suas aeronaves ASWforam as que mais horas de voo tiveram du-rante toda a guerra.

A Argentina estava em pleno momentode reaparelhamento, que propunha dispor opaís de meios mais modernos, tendo sidocontratadas várias en-comendas ao exterior.Além disso, navios ar-gentinos pouco anteshaviam sofrido avalia-ção pelos próprios in-gleses. Melhores in-formações não poderi-am ter sido fornecidasao adversário. O mate-rial de guerra utilizadopela Argentina era, emgrande maioria, do ex-terior. Seus principaisfornecedores eram:EUA, França, Alemanha, Áustria, Israel e aprópria Inglaterra. Os aviões Skyhawk,Mirage e Super Etandard; os helicópterosLynx e Puma; os submarinos IKL e Guppy;os sistemas de mísseis Shafrir, Roland, SeaDart e Exocet; as fragatas tipo 42 e Meko,bem como praticamente todos os itens doarsenal argentino, tiveram seu fluxo de apoiologístico abruptamente cortado por suasorigens.

Já os ingleses puderam contar com osseus sistemas de armas desenvolvidos emsuas próprias indústrias; com apoio efeti-vo dos seus aliados da Organização do

Tratado do Atlântico Norte (Otan), como aajuda quase irrestrita americana que permi-tiu o uso da Base da Ilha da Ascensão cominformações por satélites das Ilhas e dasbases argentinas; e com mísseis ar-ar AIM-9L Sidewinder. Os franceses colocaram àsua disposição caças Super Etendard eMirage III para auxiliar o desenvolvimen-to, pelos pilotos da Royal Air Force (RAF),de táticas de combate mais eficazes dassuas aeronaves Harrier e Sea Harrier.

Porém, de todos os ensinamentos quepodemos extrair, o maior foi quanto à pre-sunção de que os ingleses, por estaremnum momento de redução de meios navais,para se adequarem às ações conduzidas

pela Otan, não respon-deriam como semprefoi marcante na suahistória. Pensaram osargentinos com as in-tenções do inimigo enão com suas possibi-lidades. O poder marí-timo inglês demons-trado nessa ocasiãofoi exemplar, tendo asua parcela militar, oPoder Naval, mostra-do grande flexibilida-de. As forças navais

inglesas suspenderam de suas bases ape-nas 72 horas após a invasão, para 8.000milhas de travessia. As modificaçõesefetuadas nos navios mobilizados da Ma-rinha Mercante em estaleiros britânicos nosprimeiros momentos que se seguiram à in-vasão, para que pudessem operar com ae-ronaves e realizar reabastecimentos no mar,são dignas do registro histórico.

Os ingleses decretaram bloqueio navalno dia 7, a vigorar a partir do dia 12 de abril,respaldado pela arma submarina, principal-mente após o afundamento do GeneralBelgrano, o que resultou na contenção das

O Conflito das Malvinasevidenciou que o avanço da

sofisticação tecnológicaimpõe um nível cada vez

mais alto deprofissionalização dos

militares que operarão taisequipamentos

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forças navais argentinas em suas bases e,consequentemente, no apoio logístico àstropas estacionadas nas Ilhas. Restaram-lhes uma débil ponte aérea valendo-se doaeroporto situado em Port Stanley. Num con-flito eminentemente marítimo, a capacidadede se utilizar o mar, ou negá-lo, permanececomo verdade absoluta e que não pode serrelegada a plano secundário.

Muitas outras conclusões podem serelencadas, mas vou limitar-me às que julgoserem cruciais para o nosso momento. Esteconflito evidenciou que o avanço da sofis-ticação tecnológica impõe um nível cadavez mais alto de profissionalização dos mi-litares que operarão tais equipamentos. Osubmarino nuclear se reveste de um ema-ranhado de recursos tecnológicos que le-varão, inicialmente, seus construtores e,posteriormente, seus operadores a um sem-fim de tarefas preparatórias e de adestra-mento. Torná-lo tão silencioso quanto pos-sível, dotado de torpedos antinavio eantissubmarino (e por que não de mísseisantissuperfície?), requererá eficiente e ple-namente nacional sistema de combate, de

forma que a necessidade do engajamentose processará com a acurácia esperada edevida; e com recursos de comunicaçõespor satélite, uma vez que a comunicaçãopor HF vai expô-lo de forma desnecessáriae com imenso prejuízo à sua maior qualida-de. Isso tudo partindo da premissa que100% de seus sobressalentes serão facil-mente obteníveis no mercado nacional, demodo que não venhamos a sofrer com in-terrupções intempestivas dos fabricantesem momentos delicados. Isso exigirá quese incluam como parte da própria arma asua estrutura de apoio, instalações de ma-nutenção, pessoal qualificado, suprimen-tos e documentação técnica. Demanda tam-bém que se faça frequente o emprego dasarmas para verificação, pois a constataçãoda deficiência no momento do combate é,normalmente, tardia. E sem esquecer de umaadequada base de submarinos nucleares,com as devidas facilidades que este mo-saico de fainas requer, como ser concen-trada num local próprio e imune a interfe-rências estranhas de qualquer natureza.

“Lembrai-vos da guerra”.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<GUERRAS>; Guerra das Malvinas; Submarino nuclear;

BIBLIOGRAFIA

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SUMÁRIO

IntroduçãoPerspectiva históricaA oferta médicaOs ideais pós-modernosA demanda do pacienteA medicalização e sua relação com as toxicomaniasAnálise a partir de FreudConsiderações finais

REFLEXÕES SOBRE A MEDICALIZAÇÃO NACONTEMPORANEIDADE

PRISCILLA CORRÊA DE OLIVEIRA1

Primeiro-Tenente (T)

INTRODUÇÃO

Este artigo surge na tentativa de forma-lizar algumas questões suscitadas na

escuta dos pacientes atendidos pelo Ser-viço de Assistência Psicológica do Núcleodo Serviço de Assistência Integrada ao Pes-soal da Marinha (N-SAIPM) do Centro deInstrução Almirante Milcíades PortelaAlves (Ciampa) e, posteriormente, debati-

das no Colóquio sobre a Medicalização naContemporaneidade, realizado naqueleCentro de Instrução nos dias 13 e 14 denovembro de 2008, com a presença depalestrantes convidados das áreas da psi-cologia, psiquiatria e psicanálise.

Os atendimentos psicológicos desseNúcleo evidenciaram um número crescen-te de pacientes que fazem uso regular depsicofármacos2, alguns deles sem a devida

1 Psicóloga, Mestre em Teoria Psicanalítica pela UFRJ.2 Psicofármacos podem ser definidos sucintamente como medicamentos que exercem efeitos psicológicos.

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prescrição médica. Esse fato nos impõe umareflexão mais detida sobre a situação damedicalização na contemporaneidade, a fimde melhor compreender o crescimento de-senfreado do uso dessas drogas lícitas,para repensar o lugar do psicólogo diantedesse fenômeno.

Notamos que os medicamentos têm ocu-pado um lugar privilegiado na dinâmicapsíquica dos sujeitos que nos chegam.Estes frequentemente comparecem medi-cados, às vezes quase dopados, fazendouso de psicofármacos que, eventualmen-te, sequer foram prescritos por médicoshabilitados, tendo sido indicados pelo côn-juge, por familiares, amigos, etc.

Torna-se explícito o quanto a medicaliza-ção tem se feito presente para dar conta domal-estar psíquico dos nossos pacientes.Isso nos leva a questionar se esse uso cres-cente de psicofármacos é simplesmente fru-to do avanço farmacológico ou se estamosdiante de um abuso medicamentoso porparte dos pacientes e, algumas vezes, dospróprios médicos.

O aumento desmedido da demanda eda oferta medicamentosa representa gran-de preocupação para os profissionais dapsicologia e da psicanálise, pois interferediretamente na clínica dessas especiali-dades. Esse fato reflete a especificidadedo momento em que vivemos e nos colo-ca a necessidade de investigar o seu sur-gimento, bem como de pensar sobre aspossíveis consequências desse movimen-to da atualidade.

Para tanto, partiremos de uma digressãohistórica que nos permita seguir os cami-nhos percorridos pela psicopatologia e pelapsiquiatria até chegarmos aos fenômenoscontemporâneos de medicalização. Aborda-remos a perspectiva histórica dos discur-sos psicopatológico e psiquiátrico, postoque estes, direta ou indiretamente, impõema forma como os psicofármacos são indica-

dos e prescritos, ditando a relação entre asenfermidades e a farmacologia.

PERSPECTIVA HISTÓRICA

Segundo Birman (2001), o enorme avan-ço da psicofarmacologia a partir dos anos50 ofereceu à psiquiatria a oportunidadede conquistar legitimidade médica e cientí-fica. Era a chance de a psiquiatria afirmar-se como especialidade médica e, ainda, defundamentar-se sobre o discurso da ciên-cia biológica, fator que sempre foi tomadocomo sinônimo de maior credibilidade. Masfoi na década de 70 que de fato passou avigorar o modelo biológico, que viria im-por novas bases ao discurso psicopato-lógico e à psiquiatria, distanciando-os dapsicanálise e das psicoterapias.

O autor supracitado explica que, nessemomento, a psicopatologia passa a tomarcomo base as neurociências, seguindo emdireção ao fundamento biológico que, su-postamente, viria garantir-lhe cientificidade.Ao apoiar-se nas neurociências, a psicopa-tologia parte para uma leitura biológica dosprocessos psíquicos, caminhando rumo àredução da concepção do psiquismo aomero funcionamento cerebral. Com isso,aos poucos, deparamo-nos com tentativasde compreensão do funcionamento psíqui-co e da subjetividade resumidas à bioquí-mica dos neurotransmissores.

Nada mais compreensível que esse mo-vimento, que progressivamente colocou apsicopatologia biológica no centro do dis-curso psiquiátrico, venha situar a medica-ção psicofarmacológica como modalidadeprivilegiada de intervenção psiquiátrica. Aoestabelecer a psicofarmacologia como prin-cipal referencial do tratamento psiquiátrico,deixa-se pouco ou nenhum espaço para asubjetividade, para se pensar a singularida-de de cada caso – tal como era a propostapsicanalítica. Consequentemente, as psico-

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REFLEXÕES SOBRE A MEDICALIZAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

terapias ficam relegadas a segundo planoem relação à intervenção psicofarma-cológica. Nas palavras de Birman (2001: 186):

“A ideia de história de uma subjetivi-dade, articulada com o eixo do tempo,tende ao silêncio e ao esquecimento. Ésempre a pontualidade da intervenção,centrada no psicofármaco, que está emquestão na terapêutica do dispositivopsiquiátrico da atualidade.”

O que o autor ressalta é que a preocu-pação em compreender a singularidade dosujeito, em pensar a enfermidade dentro desua história particular,tem sido desprezada.O que passa a interes-sar é a medicalizaçãodo sintoma apresenta-do pelo paciente.

A OFERTAMÉDICA

A concepção tradi-cional da enfermidadeanteriormente centra-da em sua etiologia passa a priorizar no tra-tamento a simples remissão dos sintomas,por meio do medicamento. E desde que apsiquiatria privilegia o medicamento, pode-mos dizer que já não se pretende mais a cura,uma vez que esta necessariamente está rela-cionada à etiologia da enfermidade, às suascausas. Portanto, quando o medicamento ésituado como principal meio de ação tera-pêutica, estamos diante da tentativa deregulação do mal-estar, caracterizando umaintervenção meramente paliativa.

Na medida em que não há mais interessena etiologia da enfermidade ou na singulari-dade de cada caso, a escuta do pacientepassa a ser outra. Isso explica os atendi-mentos psiquiátricos cada vez mais curtos,

em que o médico utiliza apenas o tempo ne-cessário para identificar o sintoma a ser su-primido e definir a medicação a ser prescrita.Tornam-se raros os atendimentos que nãoresultam na prescrição de psicofármacos.

O medicamento, por sua vez, acaba porextrapolar a indicação terapêutica a eleconferida por um diagnóstico e afirma-secomo forma de enganar o sujeito, fazendo-oesquecer a sua infelicidade. Isso permite sus-tentar a ilusão de que há remédio para tudo,promessa que leva a utilização dos psicofá-rmacos a ultrapassar o campo da psiquiatria,trazendo-a para a clínica médica em geral, ondesua utilização é progressivamente mais farta

e massificada. Desdeentão, muitos clínicospassam a prescrever demaneira indiscriminadaesses medicamentos ti-dos como “mágicos” –os psicofármacos –sempre que se deparamcom um caso de angús-tia, tristeza ou mal-es-tar psíquico. Esse fatoexplica a difusão ebanalização do uso de

ansiolíticos e antidepressivos na atualidade.

OS IDEAIS PÓS-MODERNOS

Outro aspecto fundamental a ser aborda-do se pretendemos elucidar o lugar damedicalização na contemporaneidade diz res-peito aos ideais deste tempo. Precisamos le-var em conta os valores exaltados pelo con-texto histórico atual e considerar os ideais quenos são oferecidos na contemporaneidade,determinando o que devemos ser.

De acordo com Birman (2001), o estilode ser demandado aos sujeitos da atuali-dade caracteriza-se pela exibição e teatrali-dade. O pós-modernismo impõe a exaltaçãodo eu e a estetização da existência, o que

A preocupação emcompreender a

singularidade do sujeito,em pensar a enfermidade

dentro de sua históriaparticular, tem sido

desprezada

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REFLEXÕES SOBRE A MEDICALIZAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

explica a preocupação excessiva com a ima-gem e com a autoestima nos dias atuais.Afinal, o sujeito está sempre tentando ade-quar-se aos ideais de seu tempo.

A pós-modernidade acabou com o glamourdos melancólicos e dos sofredores e promo-veu uma ética oposta, impondo a estetizaçãoda existência e a inflação do eu. O sujeito des-se tempo deve estar sempre no campo do pra-zer, evitando qualquer tipo de dor. A medicinacontemporânea apenas corrobora tais ideais,uma vez que oferece a todos a ilusão de que,por meio da medicalização, é possível escaparda dor e manter-se no prazer. Vende-se com ospsicofármacos a ideia deque é possível calar osofrimento psíquico ine-rente ao humano.

Por outro lado,aquele que não conse-gue realizar essa espe-rada exaltação de simesmo que a pós-modernidade tanto al-meja é discriminado. Éo que ocorre com os deprimidos e fóbicos(aqui incluídos os que sofrem da síndromedo pânico), que, incapazes de apresentarem-se com o colorido e a teatralidade que a cul-tura contemporânea pede, são impelidos àprescrição medicamentosa, oferecida comopromessa de inseri-los na sociedade atual.

A oferta de drogas eficazes contra a an-gústia e contra as depressões provoca umamudança estrutural na relação do sujeitoocidental com a dor psíquica, que até en-tão esteve fora do controle médico. A par-tir daí, demanda-se a intervenção químicados medicamentos diante de qualquertransformação negativa do humor.

A DEMANDA DO PACIENTE

Diante dessa sedutora oferta farmacoló-gica, surge uma demanda voraz por parte

dos pacientes. Deparamo-nos com sujei-tos empenhados em uma busca desespera-da por algo capaz de tamponar sua angús-tia constitutiva, passível de protegê-los dasdesilusões da vida e livrando-os de qual-quer possibilidade de desprazer. Trata-sede uma tentativa de alienação que visa aum não saber sobre as questões fundamen-tais do ser humano, da sua “dor de existir”.

Isso nos permite compreender por que,do lado do paciente, é cada vez mais fre-quente a procura pelo profissional de saúdena expectativa de que a solução para suaenfermidade venha em forma de comprimi-do, de preferência de efeito imediato. Pode-

mos dizer que essa é aresposta do paciente àoferta contemporânea.

Ao mesmo tempo,a demanda medica-mentosa desse sujeitoé a maneira que eleencontra de tentar li-vrar-se de seu mal-es-tar sem ter que se

questionar em relação a sua enfermidade.Dessa forma ele não precisa responsabili-zar-se por seu padecimento, depositandona medicina a esperança de uma soluçãoque não o inclua, que não o obrigue a pro-duzir significações para seu sofrimento.

A MEDICALIZAÇÃO E SUARELAÇÃO COM ASTOXICOMANIAS

O grande problema com que vamos nosdeparar desde que os medicamentos sãooferecidos como solução privilegiada paraos males característicos de nosso tempo,tais como a depressão e a síndrome do pâ-nico, é o risco de caminharmos rumo àstoxicomanias. Afinal, se o tratamento des-sas patologias passa a ser basicamente re-duzido à prescrição de psicofármacos, po-

Vende-se com ospsicofármacos a ideia de

que é possível calar osofrimento psíquicoinerente ao humano

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REFLEXÕES SOBRE A MEDICALIZAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

demos estar simplesmente substituindouma enfermidade por outra.

Isso nos obriga a observar que as dro-gas oferecidas pela indústria farmacêutica,lícitas e com embasamento médico-cientí-fico, prometem o mesmo que as drogas ilí-citas do narcotráfico: o evitamento de qual-quer sofrimento psíquico. E, tal como asdrogas ilícitas, os psicofármacos trazemconsigo o risco da adicção. Esse risco éainda mais alarmante se notarmos que odesamparo humano só aumenta na pós-modernidade, apontando para a tendênciaà busca por esses arti-fícios de fuga do so-frimento também con-tinuar crescendo.

Ou seja, o aumentoprogressivo das toxico-manias está intimamen-te ligado ao fato destapatologia inscrever-senos pressupostos dacontemporaneidade,uma vez que oferece ailusão de suprimir o so-frimento e a dor da so-ciedade por meio dadroga, seja ela lícita ouilícita, inserindo os su-jeitos – mesmo que por uma fração de tempo– na exaltação do eu, tal como se espera detodos na atualidade.

ANÁLISE A PARTIR DE FREUD

Além de atravessar o percurso históri-co dos discursos psiquiátrico epsicopatológico e investigar os ideais quemarcam a sociedade pós-moderna, parapensarmos a medicalização na contem-poraneidade é essencial considerar os com-ponentes psíquicos que fazem dospsicofármacos objetos tão sedutores paraos seres humanos.

Como Freud já havia alertado em O Mal-Estar na Civilização (1930 [1929]), a realida-de é árdua demais para os seres humanos.Para encará-la, precisamos lançar mão demedidas paliativas – mecanismos de esca-pe. Dentre elas, o autor destaca as substân-cias tóxicas, apontando que estas, por meioda atuação química sobre o corpo, seriamcapazes de nos tornar insensíveis ao sofri-mento ou de forjar sensações de prazer.

De acordo com o mesmo autor, o maiorpropósito de vida dos sujeitos é a felicidade.A felicidade, por sua vez, seria fruto da busca

do prazer e, ao mesmotempo, da fuga dodesprazer, do sofrimen-to. E, segundo ele, amelhor forma de evitaro sofrimento seria pormeio da influência dire-ta em nosso organismo.

Freud (1996 [1930])esclarece que o méto-do mais eficaz nessaregulação do prazer se-ria o químico, a intoxi-cação. Ressalta, porém,que esse é um mecanis-mo agressivo. Mas oque é mais incrível é quedesde 1930 o autor mos-

tra-se atento à forma como determinadassubstâncias reagem em nossos corpos, po-dendo tanto provocar sensações prazerosascomo alterar nossa sensibilidade ao pontode deixar-nos insensíveis a determinadosestímulos considerados desprazerosos.

Além disso, essa intoxicação permitiriaum afastamento da realidade externa, dis-tanciando o sujeito daquilo que o angus-tia, aliviando a pressão da realidade e ga-rantindo-lhe certo refúgio.

Isso nos ajuda a entender por que aoferta medicamentosa característica dacontemporaneidade é tão irresistível para

Se de um lado o sujeitodemanda livrar-se de sua

angústia – mesmo que sobo preço de abrir mão desua subjetividade –, de

outro lado há a oferta demedicamentos que

prometem aliviá-lo dosofrimento psíquico pormeio do entorpecimento

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REFLEXÕES SOBRE A MEDICALIZAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

os sujeitos, levando-os a comprar a ilu-são de que o consumo dessas substânci-as poderá livrá-los de sua angústiaconstitutiva. Nesse sentido, ospsicofármacos permitem a intoxicação dossujeitos, anestesiando-os em relação aosofrimento e distanciando-os da realida-de que os aflige, mostrando-se um meca-nismo extremamenteatrativo.

CONSIDERAÇÕESFINAIS

Por fim, depois deconhecer um pouco dopercurso histórico dapsiquiatria e da psico-patologia e atravessaros diversos aspectosimplicados na ofertamedicamentosa porparte dos médicos e naávida demanda dospacientes, podemosnotar que a medicali-zação que caracteriza a contemporaneidadeé um fenômeno ainda em crescimento quecoloca em risco não apenas o lugar daspsicoterapias e da psicanálise, mas, princi-palmente, a subjetividade dos sujeitos esua capacidade de lidar com a dor.

O sujeito contemporâneo mostra-secada vez mais entorpecido, anestesiado eincapacitado para encarar a angústia. Todaforma de sofrimento passa a ser incompatí-vel com as exigências da atualidade, im-pondo a medicalização como única saídapossível para lidar com os sintomas queinsistem em se apresentar. Ou seja, se de

um lado o sujeito de-manda livrar-se de suaangústia – mesmo quesob o preço de abrirmão de sua subjetivi-dade –, de outro ladohá a oferta de medica-mentos que prometemaliviá-lo do sofrimen-to psíquico por meiodo entorpecimento.

Essa é a formação decompromisso que ca-racteriza a contempora-neidade e diante daqual os profissionais desaúde devem refletir.Afinal, se inicialmente

o avanço psicofarmacológico veio em auxílioda palavra, favorecendo a fala e auxiliando apsicologia e a psicanálise no sentido da cura,na medida em que seu uso é abusivo eindiscriminado, temos o efeito inverso, fa-zendo calar o paciente, alienando-o.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASBIRMAN, J. Mal-estar a atualidade: a psicanálise e as novas formas de subjetivação. Rio de

Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.FREUD, S. (1930 [1929]). “O mal-estar na civilização” (1930 [1929]). In: Obras Psicológicas

Completas de Sigmund Freud: edição standard brasileira, Vol. XXI. Rio de Janeiro: Imago,1996.

MONTEIRO, H. R. “A Psicologia deve afirmar a vida: contra a medicalização e a patologização dosocial. In: Jornal do Conselho Regional de Psicologia, Ano 2, no 11, setembro, 2006.

OLIVEIRA, C. “Sobre a medicalização da angústia na atualidade”. In: Angústia. Salvador: AssociaçãoCientífica Campo Psicanalítico, 2006.

O avançopsicofarmacológico veio em

auxílio da palavra,favorecendo a fala e

auxiliando a psicologia e apsicanálise no sentido da

cura, na medida em que seuuso é abusivo e

indiscriminado, temos oefeito inverso, fazendo calar

o paciente, alienando-o

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSICO:<SAÚDE>; Medicamento; Doença; Orientação ao homem;

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ARTIGOS AVULSOS

Esta seção divulga os artigos que não puderam ser publicados– na íntegra – na RMB e que passarão a fazer parte do acervo daBiblioteca da Marinha.

Aqui são apresentados o título, o autor, posto ou título, númerode páginas do trabalho completo, classificação para índice remissi-vo e o resumo do artigo.

GERENCIAMENTO DA MANUTENÇÃO:IMPLANTAÇÃO E ELABORAÇÃO DA PROPOSTA

INICIAL DE TRABALHO

THYAGO DE LELLYS MONÇÃOCapitão-Tenente (QC-CA)

Número de páginas: 9Identificação: AV 034/10 – # 1835 – RMB 3o/10CIR: <APOIO>; Manutenção; Sobressalente; Máquinas;

O artigo aborda a apresentação de diretrizes básicas para o Departamento de Má-quinas de um navio, visto como uma equipe de manutenção, na gerência de suas ativida-des, e conscientizar de sua importância. É tratado o tema para reformulação do sistema degerenciamento existente, buscando garantir presteza e confiabilidade na execução dosserviços.

A metodologia proposta é adequada para navio com 50 a 100 tripulantes,aproximadamente.

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ARTIGOS AVULSOS

O EQUÍVOCO DE ISRAEL

REIS FRIEDE1

Doutor em Direito – Desembargador Federal

Número de páginas: 5Identificação: AV 036/10 – #1867 – RMB 3o/10CIR: <POLÍTICA>; Israel; Irã; Estados Unidos; Guerra Nuclear;

“Israel, muito provavelmente, cometeu um dos mais graves erros de avaliação estra-tégica no que concerne à denominada questão do Irã: confiou e, em uma decisão reconhe-cidamente pouco refletida, simplesmente delegou a solução de um problema vital para suasegurança (e para o destino do Oriente Médio) ao aliado estadunidense.

Se, por um lado, nunca houve dúvidas razoáveis sobre a evidente intenção belicistado Irã, por outro lado não há, a esta altura, qualquer dúvida, séria e isenta, que não apontea inevitabilidade do ingresso do Irã no seleto grupo de nações dotadas de armas nucleares,inclusive com capacidade estratégica, uma vez que é de amplo conhecimento o desenvolvi-mento, por esta nação, de um Míssil Balístico Intercontinental – ICBM.

O conhecido resultado (pífio) da tão propalada Cúpula de Líderes em Washingtonsobre Segurança Nuclear, ocorrida em 2010, neste sentido, não somente comprovou a inge-nuidade do Presidente Barack Obama – como, aliás, bem asseverou o próprio MahmoudAhmadinejad –, mas igualmente a reconhecida aposta equivocada de Israel em confiarincondicionalmente no aliado norte-americano e em sua (suposta e continuada) disposiçãode desempenhar a função de garantidor do status quo e, consequentemente, da paz mundiale, em particular, no Oriente Médio.

Aliás, em uma rápida análise, constata-se, com relativa facilidade, que os EUA nuncase qualificaram propriamente na condição de um aliado histórico incondicional de Israel,conforme tanto se divulga aos “quatro ventos”. Muito pelo contrário, em todas as situa-ções em que a sobrevivência do Estado judeu esteve efetivamente em jogo, foi o heroísmode seu próprio povo – e sua admirável e indeclinável determinação –, mais do que qualqueroutro motivo, que fez prevalecer os interesses hebreus.

(...)Agora – passados todos esses anos em que se operou uma relativa negligência a

respeito do tema –, parece-nos que não nos resta outra alternativa factível do que simples-mente Israel se preparar para um novo Oriente Médio, em que não somente um Irã regional-mente hegemônico emergirá, como ainda diversos outros potenciais adversários (provavel-mente, pela ordem, Turquia, Síria e Líbia – mesmo esta última tendo abdicado, no passadorecente, de suas ambições nucleares) buscarão tecnologia bélica nuclear, rivalizando com opoderio militar (nuclear e tecnologicamente mais avançado) israelense, até entãoincontrastável.

Por efeito consequente, Israel necessita, urgentemente, de um ‘choque de realida-de’, considerando que nunca é por demais lembrar, com necessária ênfase, que existe uma

1 Desembargador Federal e ex-membro do Ministério Público; Mestre e Doutor em Direito; ProfessorAdjunto da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ.

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ARTIGOS AVULSOS

grande diferença entre as percepções (e interesses) dos EUA e de Israel nesta específica esui generis parte da Ásia, porquanto o povo israelense efetivamente habita o OrienteMédio, ao passo que os EUA apenas possuem interesses estratégicos mutáveis – sobretu-do no petróleo desta região –, e, à própria medida que, no futuro próximo, o petróleo perdersua importância energética, Israel acabará por perceber que a estabilidade geopolítica emilitar no Oriente Médio é, de fato, muito mais um problema regional de seu particularinteresse (diretamente ligado a sua segurança nacional) do que propriamente um problemanorte-americano mais amplo, associado à chamada pax americana.

Sob este prisma, resta afirmar, em tom de sublime advertência, que um Irã, potêncianuclear e com efetiva capacidade estratégica (dotada de ICBMs) – e, portanto, com capaci-dade de neutralização dissuasiva em relação aos EUA –, será, a esta altura, de forma aparen-temente irreversível, o grande legado da Administração Obama, em uma indesejável repeti-ção do equívoco da Administração Kennedy, que, em 1962, permitiu o estabelecimentoderradeiro de uma área de influência soviética em Cuba, com todas as conhecidasconsequências geopolíticas (de revoluções exportadoras e instabilidades) que o regime deFidel Castro logrou conduzir nas décadas de 60, 70 e 80 na América Latina e, posteriormente,na África.”

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NECROLÓGIO

† AE Eddy Sampaio Espellet† CMG Gerson Fleischhauer† CMG Guilberto Mendes Hippert† CMG (FN) Lyrio Bravim

EDDY SAMPAIO ESPELLET 10/08/1919 † 23/06/2010

Nasceu no Rio Grande do Sul, filho dePedro Espellet Filho e de Sylvia SampaioEspellet. Promoções: a segundo-tenente em

31/01/1941, a primeiro-tenente em 06/11/1942,a capitão-tenente em 24/11/1944, a capitãode corveta em 22/03/1952, a capitão de fra-gata em 28/09/1955, a capitão de mar e guer-ra em 03/09/1962, a contra-almirante em 04/09/1968, a vice-almirante em 31/12/1971 e aalmirante de esquadra em 25/11/1974. Foitransferido para a reserva em 10/01/1979.

Em sua carreira exerceu quatro coman-dos: Contratorpedeiro Paraná; Navio-Aeródromo Ligeiro Minas Gerais; Coman-do em Chefe da Esquadra e Comando deOperações Navais. Exerceu seis direções:Delegacia da Capitania dos Portos do RioGrande do Sul, em Porto Alegre; Centro deInstrução Almirante Wandenkolk; ComissãoNaval Brasileira em Washington; Diretoriade Ensino da Marinha; Diretoria-Geral doMaterial; e Estado-Maior da Armada.

Comissões: Navio-Escola AlmiranteSaldanha; Escola Naval; Cruzador Bahia; Na-vio-Auxiliar José Bonifácio; Navio-AeródromoLigeiro Minas Gerais; Navio Hidrográfico RioBranco; Contratorpedeiro Marcílio Dias;Contratorpedeiro Bocaina; Gabinete do Mi-nistro da Marinha; Diretoria do Pessoal; Es-

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NECROLÓGIO

cola de Guerra Naval; Estado-Maior da Arma-da; Escritório do Adido Naval em Paris; Co-mando da Flotilha de Contratorpedeiros; Co-mando da Força de Cruzadores eContratorpedeiros; Centro de Informações daMarinha; e Escola Superior de Guerra.

Em reconhecimento aos seus serviços, re-cebeu inúmeras referências elogiosas e as se-guintes condecorações: Medalha Naval doMérito de Guerra – Serviços Relevantes; Me-dalha Naval do Mérito de Guerra – Serviçosde Guerra; Força Naval do Nordeste – BronzeNacional; Ordem do Mérito Naval – Grã-Cruz;

Ordem do Mérito Militar – Grande Oficial; Or-dem do Mérito Aeronáutico – Grande Oficial;Ordem Nacional do Mérito – França; Legiãodo Mérito – Estados Unidos da América; Le-gião de Honra – França; Medalha Militar epassador de platina – Quarto Decênio; Meda-lha Mérito Tamandaré; Medalha do Pacifica-dor; Medalha Mérito Santos Dumont; e Me-dalha Comemorativa do Centenário da Mortede Maria Quitéria de Jesus.

À família do Almirante Eddy SampaioEspellet, o pesar da Revista MarítimaBrasileira.

ESPELLET, MEU QUERIDO PARADIGMA

Ele nos deixou, mas, entre muitas ou-tras coisas, sua característica gargalhadafica conosco para nos lembrar que a vida épara ser vivida com alegria, exatamentecomo ele a viveu junto de sua querida Lea.

Conheci Espellet ainda na Escola Na-val, eu aspirante e ele capitão-tenente doGabinete do Diretor.

Mais tarde, na época em que a Marinhaestava empenhada na operação Unitas, to-mei conhecimento de que Espellet sabia oACP1 de cor; dominava todos os sinais e,como era bem dele, no passadiço, entre umabaforada e outra em seu enorme charuto, go-zava os tenentes com as suas dificuldades.

Mas foi como almirante que fiquei co-nhecendo mais de perto Espellet, que ime-diatamente se tornou meu paradigma.

Como chefe do Estado-Maior da Armada,era também o presidente da Comissão de Pro-moção de Oficiais (CPO), organização da qualfui membro efetivo por cinco ou seis anos,período no qual tive o privilégio de conhecerquatro presidentes, cada um com seu estilopróprio de conduzir as seções.

Mas Espellet era único, tamanha a vivaci-dade com que conduzia os trabalhos. Nós, da“arquibancada”, ficávamos em palpos de ara-nha para acompanhá-lo. Ele era formidável!

Houve um episódio que eu gostaria decontar para comprovar a limpidez com quesão conduzidas as votações e a honesti-dade sem mácula de Espellet. Votávamos aefetivação dos tenentes candidatos ao Qua-dro Complementar (QC). Entre tantos, hou-ve um com péssimas informações.

Como sempre, fosse quem fosse, o casofoi amplamente discutido, deixando preverque a votação seria unanimemente contrá-ria ao seu aproveitamento na Marinha. Dadiscussão passou-se à votação que, comonão poderia deixar de ser, foi totalmentecontrária ao tal tenente.

Quando o resultado da votação foi de-vidamente sacramentado, Espellet soltouuma daquelas inconfundíveis gargalhadase, puxando do bolso um papelucho, disseao plenário: “Tenho aqui um bilhete da Pre-sidência da República pedindo o aprovei-tamento desse rapaz”.

1 N.R.: Antiga sigla substituída pela atual ATP (Allied Command Publication), publicação com informa-ções a respeito da interação entre forças navais e marítimas (Fonte: www.nato.int)

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NECROLÓGIO

E assim era a honestidade de Espellet,que, para mim, mostrava a seriedade (comonão podia deixar de ser) da Comissão dePromoção de Oficiais (CPO).

Foi um grande exemplo para mim!Meu (e de muitos outros oficiais) queri-

do chefe Espellet, você não nos deixou,nem vou sentir saudades, pois você conti-

nuará vivendo em cada oficial que o co-nheceu, nos guiando no bom caminho, ecom a sua inconfundível gargalhada dan-do alegria à vida de todos nós.

Com respeito e admiração

Luiz Edmundo Brigido BittencourtVice-Almirante (Refo)

Primeira Confraternização de Ex-Comandantes – 5 de janeiro de 1994 – Da esq./dir. C. Alte. PauloRonaldo Daldegan Moreira; V. Alte. Francisco Aripena Leão Feitosa; C. Alte. Telmo Becker Reifschneider;Alte. Esq. Eddy Sampaio Espellet; V. Alte. Helio Leoncio Martins; Alte. Esq. Fernando Ernesto CarreiroRibeiro; Alte. Esq. Raphael de Azevedo Branco; V. Alte. Cláudio José Correa Lamego; CMG Leonildo deCarvalho Pinto, em pé o CMG Wilson Jorge Montalvão, comandante do navio na ocasião

O Almirante de Esquadra Espellet em uma das inúmeras vezes em que prestigiou eventosda Marinha já na Reserva

22/02/1925 † 29/06/201007/05/1936 † 14/05/201016/06/1935 † 24/05/2010

A RMB expressa o pesar às famílias pelo falecimento dos assinantes:

CMG 44.0062.17 – Gerson FleischhauerCMG 52.0017.17 – Guilberto Mendes HippertCMG (FN) 53.0131.15 – Lyrio Bravim

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O LADO PITORESCO DA VIDA NAVAL

As histórias aqui contadas reproduzem, com respeitoso humor, oque se conta nas conversas alegres das praças-d’armas e dos conveses.Guardadas certas liberdades, todas elas, na sua essência, são verídicase por isso caracterizam várias fases da vida na Marinha.

São válidas, também, histórias vividas em outras Marinhas.Contamos com sua colaboração. Se desejar, apenas apresente o caso

por carta, ou por e-mail ([email protected]).

O imediato do Encouraçado São Paulo,Comandante V.S., era um homem de grandeimaginação. Entre suas histórias, havia al-gumas verdadeiramente fantásticas.

Contava que, estando a sua senhora en-ferma, ele precisava urgentemente de dinhei-ro, mas tinha somente 50 mil réis no bolso.Resolvera então ir a um cassino, onde nãoperdera um só lance na roleta. Ao sair, jogouum maço de notas sobre a mesa a título degorjeta para os crupiês. O valor da espórtulaera tão alto que os empregados julgaram tersido um novo lance. Ele, contudo, foi ao bartomar uma taça de champanhe. Quando láestava, ouviu um barulho na sala de jogo epensou: “Algum maluco deve estar jogan-do”. Minutos depois, chegou o gerente car-regando cestas de dinheiro, com as descul-

ANEDOTÁRIO NAVAL

pas da casa: estavam na bancarrota, por issofecharam todas as mesas.

Nesse dia, exclamou enfático o V.S., che-gou em casa bombardeando a sua esposa,que se achava de cama, com maços de notas.

Outra do V.S.: Herdara uma fazenda nointerior da Bahia. O dono era um tio velho,um tanto esquisito, que o escolhera paraherdeiro universal.

Ocupado como um bom oficial de Marinha,o V.S. levara anos até poder ir ao sertão baiano.Lá chegando, por fim, soube que as terras esta-vam ocupadas por um terrível pistoleiro, quedissera: “Vindo aqui esse almofadinha, dou cabodele, sem mesmo falar-lhe”.

Artur Oscar Saldanha da Gama

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O LADO PITORESCO DA VIDA NAVAL

O V.S. resolveu enfrentar o homem dequalquer forma. Entrou na venda onde otipo estava e perguntou: “Quantas garrafasde pinga você tem?” O vendeiro disse: “Cer-ca de 50”. No que ele retrucou: “Ponha-asno balcão porque antes de morrer querobeber com o meu matador”. Vieram dois co-pos pequenos. O V.S. disse: “Leve esses etraga os grandes, os maiores que você temna venda.” Encheu os dois copos. Tomou ainiciativa, esvaziando o dele de um trago só.O bandido fez o mesmo. Encheu então ou-tro copo e esvaziou de uma vez. O bandidorepetiu o seu gesto. Assim foi o V.S. até a 49a

garrafa, quando o bandido caiu morto. En-tão o V.S. tomou a última garrafa e bebeupelo gargalo até o fim. Pagou, deu uma boagorjeta, saiu em passos firmes, montou emseu cavalo e foi tomar posse das terras.

Mais uma:Era uma noite de pernoite do imediato.

Os oficiais já sabiam que deviam permane-

cer à mesa (de refeições) até o amanhecer,salvo os que saíam para os quartos. O V.S.contaria os seus casos a noite toda. Eramhistórias sobre histórias, cada uma mais in-crível. Em certo momento, o V.S. falava nosteatros chineses de Londres, dizendo que apeça era longa, uma por noite, durante a qualos velhos mandarins discutem os seus ne-gócios. “Por sinal”, dizia o V.S., “na noite emque lá estive comemoravam a milionésimarepresentação, naquele mesmo local, da peçaa que assisti.” O São Paulo tinha duas me-sas grandes laterais, sendo usada uma de-las para servir o jantar. Um tenente, rápidoem cálculos mentais, disse em voz baixa: “Oprofeta Isaías, se fosse a Londres, poderiater assistido a essa peça”. O imediato nãoouviu esse comentário, mas percebeu quealguma coisa estava acontecendo, pelas gar-galhadas reprimidas dos oficiais. Era bas-tante vivo, e assim corrigiu logo: “Pareceque eu disse uma tolice. Se era uma repre-sentação por noite, tinham 365 por ano, 1milhão de representações dariam para maisde 2.500 anos. Sem dúvida, eu exagerei...”.

No Livro de Comentários e Sugestõesdos Visitantes do Museu Naval (Rio de Ja-neiro-RJ), no mês de julho último, foi regis-trado o seguinte comentário (mantivemosa grafia original):

NO MUSEU NAVAL“Eu sou de mg, de um fim de

mundo e curti D+ cara, sem noção #abraços, tipo se der sempre que virpara o RJ quero voltar. BJSS. Até apróxima. Bej: ...”

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DOAÇÕES À DPHDM – JUNHO A AGOSTO/2010DEPARTAMENTO DE BIBLIOTECA DA MARINHA

DOADORES

Almirante de Esquadra Lourenço dos SantosSra. Aletta Maria B.T. Livramento de OliveiraJuvêncio Saldanha LemosFundação Alexandre de GusmãoMuseu Histórico Nacional

Universidade Estadual de CampinasPortos e NaviosInstituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan)Instituto Histórico-Cultural da AeronáuticaSecretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação da Marinha

Museu Histórico do ExércitoInternational Maritime Organization (IMO)Ministério Público do Estado de Minas GeraisMinistério da Defensa (Espanha)Biblioteca Nacional

PERIÓDICOS RECEBIDOS – JUNHO A AGOSTO/2010

ALEMANHANaval Forces –Tecnologia Militar – v. 32 no 1, mar./2010

ARGENTINARevista de Publicaciones Navales –Boletín del Centro Naval – v. 128 no 826, jan./abr.2010

CANADÀCanadian Naval Review –v. 5 no 4, winter/2010; v. 6 no 1 spring/2010

CHILERevista de Marina – v. 125 vol. 127 no 915, mar./abr. 2010

CUBARevista Bimestre Cubana – v. 106 no 31, ago./dez. 2009

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DOAÇÕES E PERIÓDICOS RECEBIDOS

ESPANHARevista General de Marina – tomo 258 abr. 2010Revista de Historia Naval – v. 28 no 108/2010

ESTADOS UNIDOSDigesting History (livro)Surveyor – Spring 2010P&C Politics & Policy – v. 37 no 6 dez./2009; v. 38 no 1, feb./2010

FILIPINASInternational PORTfolio – jan./2010; fev./2010; abr./2010; mai./2010

HOLANDARevista Europea de Estudios Latinoamericanos y Del Caribe – no 88 abr./2010

FRANÇAArmées Hourd’Hui – no 349 abr./2010; no 350 mai./2010

INGLATERRABasic Documents IMO (livro) – v. I/2010Shipboard marine pollution emergency plans (livro) – IMO-2010Oil Spill Risk Evaluation and Assessment of Response Preparedness (livro) – IMO-2010Ballast Water Management Convention (livro) – IMO-2009Prevention of corrosion on board ships (livro) – IMO-2010

ITÁLIARivista Militare – no 4/2009 jul.ago./2009; no 5 set.out./2009; no 1 jan.fev./2010Rivista Marittima – v. 142 no 2 out./2009; Supl. v. 142 no 2 out./2009; v. 142 n. 7 jul./2009;

v. 142 no 9 set./2009; Supl. v. 142 no 9 set./2009; v. 142 no 11 nov./2009; Supl. v. 142 no 11 nov./2009 (1o); Supl. v. 142 no 11 nov./2009 (2o); v. 142 no 12 dez./2009; Supl. v. 142 no 12 dez./2009 (1o); Supl. v. 142 no 12 dez./2009 (2o); v. 143 no 1 jan./2010; Supl. v. 143 no 1 jan./2010;

PORTUGALRevista da Armada – v. 39 no 438 fev./2010; v. 39 no 439 mar/2010; v. 39 no 440 abr./2010;

v. 39 no 441 mai./2010; v. 39 no 442 jun./2010Revista de Marinha – v. 73 no 954 fev./mar. 2010; v. 73 no 955 abr./mai. 2010Sessão solene de encerramento das comemorações do centenário do nascimento do

Vice Almirante Sarmento Rodrigues

SUÍÇANature et cultures dans lês Amériques – Bulletin 69/2005Amériques noires: réflexions – Bulletin Hors-série 2009

BRASILAnais do Clube Militar Naval – abr. jun./2009Oficina de Estudos da Preservação (livro) – Coletânea II

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DOAÇÕES E PERIÓDICOS RECEBIDOS

Círculo Militar de São Paulo (CMSP) – v. 30 no 356 jan./2010Ideias em Destaque – no 33 mai./ago./2010Pesquisa Fapesp – no 172 jun./2010; no 173 jul./2010Boletim Informativo AAMH – v. 6 no 32 abr./2010Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro – a. 170 no 443 abr./jun. 2009;

a. 170 no 444 jul./set. 2009Tecnologia & Defesa – v. 26 Supl. Esp. no 20/2009; v. 27 no 120/2010; v. 27 no 121/2010Cadernos do CHDD – v. 9 no 16, 1o semestre/2010Revista da Aviação Naval – v. 41 no 71 abr./2010Revista de História da Biblioteca Nacional – v. 5 no 54 mar./2010; v. 5 no 55 abr./2010;

v. 5 no 56 mai./2010; v. 5 no 58 jul./2010New’s – v. 7 no 35 mar./2010; v. 7 no 36 jun./2010Museus e Comunicação (livro) – 2010Revista do Exército Brasileiro – v. 146 no 1o Quadrimestre 2009;

v. 146 no 2o Quadrimestre 2009; v. 146 no 3o Quadrimestre 2009

Defesa Nacional, A – v. 95 no 813 jan.fev.mar.abr/2009; v. 95 no 814 mai.jun.jul.ago./2009; v. 95 no 815 set.out.nov.dez./2009

Informativo Marítimo da DPC – v. 17 no 4 out/dez 2009; v. 18 no 1 jan./mar. 2010Prêmio de Artes Plásticas Marcantonio Vilaça 2008 (livro)Odisseia – v. 1 no 1 nov./fev. 1994-1995Base Naval de Aratu – 40 anos edição comemorativa (livro) – jun./2009Revista da Força Aérea Portuguesa Mais Alto – v. 48 no 383 jan./fev. 2010CNT Transporte Atual – v. 15 no 175 mar./2010; v. 16 no 177 mai./2010; v. 16 no 178 jun./2010Revista do Clube Militar – v. 83 no 436 fev/mar./abr/2010Revista do Clube Naval – v. 118 no 353 jan.fev.mar./2010Entre o Artifício e a Arte: pintores e entalhadores no Rio de Janeiro setecentista (livro)Notanf – jan.fev.mar./2010C & T Revista Militar de Ciência e Tecnologia – v. 26 no 1o Quadrimestre de 2009;

v. 26 no 2o Quadrimestre de 2009Portos e Navios – v. 52 no 592 mai./2010; v. 52 no 593 jun./2010; v. 52 no 594/2010Teoria & Pesquisa Revista de Ciências Sociais – v. 18 no 2 jul/dez 2009Revista Aeronáutica – no 271 jan.fev.mar.abr/2010Entre o Artifício e a Arte: pintores e entalhadores no Rio de Janeiro setecentista (livro)A Saga no Prata (livro) – 2009Arquivo Edgard Leuenroth AEL GUIA 2009 (livro)Brasil no mundo que vem aí, O (livro) – 8 e 9 dez./2008Marcas e Propriedade Industrial (livro) – 2009Revista do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro – no 3/2009Revista Pesquisa Naval – no 22 nov./2009Museu Histórico do Exército (livro) – 2009Revista Intermarket – v. 10 no 52/2010Convôo, O – v. 16 no 1/2009Biografia do Capitão-Tenente Affonso Cavalcanti do Livramento (1855-1941) – 2008MP MG jurídico – v. 5 no 19 jan./fev./mar./2010x

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ACONTECEU HÁ 100 ANOS

Esta seção tem o propósito de trazer aos leitores lembranças enotícias do que sucedia em nossa Marinha, no País e noutras partesdo mundo há um século. Serão sempre fatos devidamente reporta-dos pela nossa sesquicentenária Revista Marítima Brasileira.

Com vistas à preservação da originalidade dos artigos, observa-remos a grafia então utilizada.

O ALMIRANTE COCHRANEO ALMIRANTE COCHRANEO ALMIRANTE COCHRANEO ALMIRANTE COCHRANEO ALMIRANTE COCHRANE(RMB, jul./1910, p. 1-6)

Capitão de Corveta H. Boiteux

Nas paginas desta Revista já tivemosopportunidade de salientar os brilhantesserviços que prestou ao Brazil o arrojadoalmirante Cochrane,contratado para coman-dar a esquadra orga-nisada para compelliras forças portuguezasa abandonarem o nortedo Brazil, onde perma-neciam como senhores.

Foi sem duvida algu-ma essa incipiente es-quadra o factor primor-

dial da nossa Independencia, porque semella a nossa unidade não seria um facto.

Em ligeiros traços, procurámos então es-tudar a orientaçãoque desejava dar ánascente marinha oillustre homem demar; qual o apoio quelhe prestou o elemen-to verdadeiramentenacional chefiadopelo grande brazi-leiro José Bonifacio e,finalmente, a inutili-

Taes foram os dissaboresTaes foram os dissaboresTaes foram os dissaboresTaes foram os dissaboresTaes foram os dissaboressoffridos por aquelle illustresoffridos por aquelle illustresoffridos por aquelle illustresoffridos por aquelle illustresoffridos por aquelle illustrealmirante, tão cheio de fé noalmirante, tão cheio de fé noalmirante, tão cheio de fé noalmirante, tão cheio de fé noalmirante, tão cheio de fé nofuturo de nossa marinha, quefuturo de nossa marinha, quefuturo de nossa marinha, quefuturo de nossa marinha, quefuturo de nossa marinha, queo fizeram abandonar, cheioo fizeram abandonar, cheioo fizeram abandonar, cheioo fizeram abandonar, cheioo fizeram abandonar, cheio

de desillusão, o posto que tãode desillusão, o posto que tãode desillusão, o posto que tãode desillusão, o posto que tãode desillusão, o posto que tãogostosamente havia aceitadogostosamente havia aceitadogostosamente havia aceitadogostosamente havia aceitadogostosamente havia aceitado

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

dade de seus esforços, destruidos todospelas exigencias politicas que se seguiramá quéda daquelle eminente estadista,substituido por elemento contrario á nossanacionalidade.

Taes foram os dissabores soffridos poraquelle illustre almirante, tão cheio de féno futuro de nossa marinha, que o fizeramabandonar, cheio de desillusão, o posto quetão gostosamente havia aceitado.

Para dar uma idéa dos desejos do almi-rante, em relação ao estabelecimento, sobnovas bases, da nossa marinha militar,organisando-a de modo a allivial-a das pe-sadas e carunchosasengrenagens que en-torpeciam o seu de-senvolvimento, vamostranscrever o memo-rial por elle directa-mente remettido emjunho de 1824 ao Im-perador D. Pedro I,isto depois de cansa-do de representar aosMinistros:

“O Marquez do Maranhão, Primeiro Al-mirante, Commandante em Chefe das For-ças Navaes deste Imperio, depois de terdirigido ás respectivas repartições ministe-riaes frequentes representações sobregravissimos assumptos do serviço, julga deseu dever elevar aos pés do throno de V.M. Imperial a necessidade urgente de umaprompta decisão sobre aquelles serios e muiattendiveis negocios.

O Marquez do Maranhão deixará poresta vez de importunar a V. M. Imperialcom assumptos que lhe sejam exclusivamen-te relativos, para lembrar-se unicamentedaquelles que, grandemente, interessam

pelo bem estar da Nação e a gloria do Impe-rio e que altamente estão pedindo provi-dencias analogas ás precisões do serviço eum remedio tão prompto como efficaz con-tra a extensão e gravidade dos males queeste padece, por se não ter attendido a es-sas necessidades com a promptidão e ener-gia convenientes. Não há um só homem quese gabe de combinar suas idéas que não sejade opinião de que uma força naval respei-tavel é tão necessaria a este Imperio comoé para sua prosperidade o estado em que seconstituio – de independencia. Convêmgeralmente todos os bons politicos de que

sem o augmento e aForça assim physicacomo moral de nossaMarinha, ser-nos-áimpossível conservaressa independencia oua integridade doterritorio brazileiro.É, porém, doloroso,Soberano Senhor, oter de dizer a V. M.Imperial que, apezar

de todos os esforços de V. M. para obterum fim tão procurado, nada se tem feitorealmente que possa conduzir-nos a seme-lhante resultado ou nada mais se tem feitodesde que se pensou na organisação da nos-sa Marinha do que girar em torno de umcirculo vicioso – de expedientes e de re-cursos inconvenientemente applicados,mais capazes de perpetuar a debilidade e afraqueza em que se achava esse Ramo pre-cioso, que de eleval-o ao gráo de explendore de grandeza a que tanto direito tem depretender e que foi tão facil conseguir commuito menos despeza que aquella que dia-riamente se enpregava para o arruinar sem

Sem o augmento e a ForçaSem o augmento e a ForçaSem o augmento e a ForçaSem o augmento e a ForçaSem o augmento e a Forçaassim physica como moral deassim physica como moral deassim physica como moral deassim physica como moral deassim physica como moral de

nossa Marinha, ser-nos-ánossa Marinha, ser-nos-ánossa Marinha, ser-nos-ánossa Marinha, ser-nos-ánossa Marinha, ser-nos-áimpossível conservar essaimpossível conservar essaimpossível conservar essaimpossível conservar essaimpossível conservar essa

independencia ou aindependencia ou aindependencia ou aindependencia ou aindependencia ou aintegridade do territoriointegridade do territoriointegridade do territoriointegridade do territoriointegridade do territorio

brazileirobrazileirobrazileirobrazileirobrazileiro

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

o querermos. Chamou-me V. M. Imperialdesde o fundo da antiga America Hespa-nhola para collocar-me sem restricções esem clausulas que em cousa alguma enfer-masse a autoridade que eu desfructava noChile e no Perú para pôr as Forças Navaessobre um pé verdadeiramente respeitavel;de então a esta parte a minha presença nãotem supprido de maneira alguma a exis-tencia dessas grandes vantagens com quedeveriamos contar, pois que todos os meusesforços têm sido frustrados e todas as mi-nhas representações desprezadas.

Fizeram-se gran-des sacrificios paraque a Armada Imperi-al fosse supprida comofficiaes experimenta-dos e instruidos, quealém dos que vieram doChile, se mandarambuscar á Inglaterra, eV. M. Imperial não ig-nora os aturados pade-cimentos que lhes têmsobrevindo e que acontinuarem seme-lhantes procedimentos seria commeter amaior das imprudencias o esperar que ellesse prestem nas occasiões arriscadas com ofervor e a energia que a Inteireza e a Jus-tiça sabem promover e alimentar nosEspiritos. Não fomos tão venturosos com orecrutamento dos marinheiros estrangei-ros, amalgama assombroso do quanto haviade pior neste genero nos portos da Gran-Bretanha. A falta de promptos pagamen-tos e a que tem havido na justacondemnação das presas nos privarão dosserviços da melhor porção destes mesmoshomens, enchendo-os de descontentamen-

to ao ponto de temer que privados dos seuspremios promettidos e diretos entrem acommeter piracias como no Chile e Perúcontra aquelles que julgam a causa dellesficarem lesados. A ausencia de um bomCodigo Militar baseado sobre reconheci-dos principios do melhor systema de disci-plina e de serviço; as delongas prejudiciaese não justificadas na convocação e execu-ção dos conselhos de guerra e o modoarbitrario de procurar e de sentenciar nes-tes mesmos conselhos têm posto a confusãoe a desordem no andamento do serviço e

augmentado, não pou-co, aquelle desconten-tamento. Se as velhase viciosas instituiçõesmilitares nos temacarreado grandes ma-les por este lado; a mo-ral, a subordinação e adisciplina gemem cons-tantemente com ellas.Falta-nos o promptoexpediente na appli-cação das penas ordi-narias, e não tenho eu

mesmo, apesar do titulo com que me arreiode primeiro almirante e commandante emchefe, fixadas as attribuições e funcçõesde um tal cargo.

Não é possivel, Soberano Senhor, esta-belecer ou communicar a difficil e delicadadisciplina, crear e instruir uma Marinhaou dar aos navios armados essa attitude deperfeição em seus arranjos, fornecimentose armamentos – que presagia e assegura afelicidade dos successos e das emprezas –debaixo do mesmo Governo que causará asua decadencia e sem ordenanças claras,sabias e simplissimas como as tem a Ingla-

Não é possivel, SoberanoNão é possivel, SoberanoNão é possivel, SoberanoNão é possivel, SoberanoNão é possivel, SoberanoSenhor, estabelecer ouSenhor, estabelecer ouSenhor, estabelecer ouSenhor, estabelecer ouSenhor, estabelecer oucommunicar a difficil ecommunicar a difficil ecommunicar a difficil ecommunicar a difficil ecommunicar a difficil e

delicada disciplina, crear edelicada disciplina, crear edelicada disciplina, crear edelicada disciplina, crear edelicada disciplina, crear einstruir uma Marinha ou darinstruir uma Marinha ou darinstruir uma Marinha ou darinstruir uma Marinha ou darinstruir uma Marinha ou dar

aos navios armados essaaos navios armados essaaos navios armados essaaos navios armados essaaos navios armados essaattitude de perfeição em seusattitude de perfeição em seusattitude de perfeição em seusattitude de perfeição em seusattitude de perfeição em seus

arranjos, fornecimentos earranjos, fornecimentos earranjos, fornecimentos earranjos, fornecimentos earranjos, fornecimentos earmamentosarmamentosarmamentosarmamentosarmamentos

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terra, a França e America Ingleza a seuinstar.

Senhor, o Marquez do Maranhão já ti-nha posto á disposição de V. M. Imperialuma Armada respeitavel com officiaes emarinheiros satisfeitos e obedientes – ga-nhando o Estado grande porção da despezaque com ella tem feito; mas duas cousasforam necessarias: a adopção das Ordenan-ças e do Codigo Maritimo Militar da Gran-Bretanha que o Marquez apresentara mo-dificada ao genio e á circumstancia doBrazil – e o poder bastante ao commandoem chefe para crear, organisar e refundir aMarinha Brazileira sem opposição e semchoque de autoridade, sem a menordifficuldade da parte de quaesquerdepositos, arsenaes ou estabelecimentos deguerra maritimos na execução de suas or-dens em tudo quanto se acha conforme oRegimento da Marinha ingleza para o fim

mencionado. Este cargo de organisar a Ma-rinha já se acha extremamente arduo emrazão do descontentamento de officiaes emarinheiros, cansados pela conducta usa-da para com elles, mas ainda julgo não serde todo impossivel, comtanto que V. M.Imperial haja por bem conceder-me autori-dade necessaria para fazer esses arranjos,os quaes unicamente podem ter o effeitodesejado. Senhor, digne-se de V. M. Impe-rial tomar em sua Alta consideração estamemoria e de acreditar na pureza de senti-mentos de um militar que cousa algumadeseja tanto como assignalar o seu reco-nhecimento e a sua gratidão no serviço deV. M. Imperial, mas que tem por umimpossivel realisar estes desejos á frenteda Marinha sem o remedio indicado a seusgrandes males. Rio de Janeiro, em 3 de Ju-nho de 1824. (Assignado) Cochrane doMaranhão.”

A EDUCAÇÃO PHYSICA NA MARINHAA EDUCAÇÃO PHYSICA NA MARINHAA EDUCAÇÃO PHYSICA NA MARINHAA EDUCAÇÃO PHYSICA NA MARINHAA EDUCAÇÃO PHYSICA NA MARINHA(RMB, jul./1910, p. 7-16)

Primeiro-Tenente Alfredo Colonia

Actualmente vae passando pela mari-nha um movimento transformador, um mo-vimento regenerador dos methodos e pro-cessos até então adoptados para a culturaphysica das nossas guarnições. Movimentobem orientado e perfeitamente de accordocom os mais modernos e mais aceitosensinamentos sobre a educação physica doorganismo. Os antigos exercicios dagymnastica athletica allemã têm sidosubstituidos pelos methodos scientificos dagymnastica sueca.

Hoje, em toda parte onde se pratica ver-dadeiramente a arte de embellezar e deenrijecer o corpo os apparelhos e methodosviolentos de Friederich Jahn estão sendo,

mesmo na propria Allemanha, substituidospelos jogos ao ar livre e pela gymnasticacreada pelo anatomo-physiologista suecoPedro Henrique Ling.

A gymnastica dos apparelhos ha muitoque entrou no ultimo quartel da sua vida.Condemnada por homens como Lagrange,Demeny, Marey e Tisse na França, porMosso na Italia, sem nunca ter conseguidoentrar na Inglaterra, onde Spencer provouserem os jogos o melhor e mais natural meiode cultura physica, e mesmo na Allemanha,diante do clamor dos hygienistas levanta-do contra ella, perdeu na opinião publica oconceito de que gosava.

(...)

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

O renascimento militar do CelesteImperio e sobretudo a reorganisação do seupoder naval, abatido durante a desastrosacampanha de 1894, tem sido o principalobjectivo do principe Tchoun, desde queassumio o pesado encargo da regencia daChina.

Ainda bastante joven, intelligente eillustrado, o principe regente é um arden-te patriota e tem revelado, no curto espaçode tempo de sua administração, raras qua-lidades de homem de estado, energico eeconomico.

Com taes dotes etendo diante de si lon-go prazo de governo,attenta a tenra idadedo actual imperador,elle disporá de temposufficiente para pôrem pratica todo o seuplano de reformasnavaes.

Não será, portan-to, de surprehender, máo grado o pessimoestado financeiro da China, que sua esqua-dra, dentro de poucos annos, volte a ser oque era, antes da guerra com o Japão.

Uma commissão naval, presidida peloprincipe imperial Hsun e composta do al-mirante Sa e Chentung Liang Cheng, partioa 11 de outubro passado para a Europa,afim de estudar junto das grande potenciasum plano de reforma naval, consoante asnecessidades de momento da China.

A situação social do presidente dacommissão, irmão do regente e, portanto,

tio do soberano, dá um caracter de especialimportancia á mesma e deixa entrever bemclaramente a firme resolução do principeTchoun, de levar avante a pesada tarefa deque se incumbio.

Sem embargo do scepticismo manifesta-do por uma parte da imprensa de Pekin,quanto aos resultados praticos da commissãonaval, visto o lamentavel estado das finan-ças chinezas, são obvias as vantagens prove-nientes daquella viagem de estudos.

A China é um paiz incontestavelmente rico,mas, seja-nos licito dizer,durante largo tempo maladministrado e victimade constantes e elevadasindemnizações, pagas aoestrangeiro. Precedidade severas economias ede um programma finan-ceiro bem elaborado, areorganisação da mari-nha de guerra chinezanão será uma utopia,

como a muitos se afigura.A imprensa do paiz, reconhecendo os

meritos do principe Hsun, mostra-se, entre-tanto, receiosa de que elle se deixe influen-ciar pelas opiniões contrarias, ainda hojesubsistentes, quanto á classe de navios aadoptar-se, planos de reforma naval, etc., eprefira medidas incompativeis com as ne-cessidades politicas e naturaes do mesmo.

Na sua opinião, aliás a mais racional, o ini-cio da reorganisação naval de um paiz como aChina deve obedecer a dois fins principaes.Em primeiro logar, apresentando elle uma

Não será, portanto, deNão será, portanto, deNão será, portanto, deNão será, portanto, deNão será, portanto, desurprehender, máo grado osurprehender, máo grado osurprehender, máo grado osurprehender, máo grado osurprehender, máo grado o

pessimo estado financeiro dapessimo estado financeiro dapessimo estado financeiro dapessimo estado financeiro dapessimo estado financeiro daChina, que sua esquadra,China, que sua esquadra,China, que sua esquadra,China, que sua esquadra,China, que sua esquadra,dentro de poucos annos,dentro de poucos annos,dentro de poucos annos,dentro de poucos annos,dentro de poucos annos,

volte a ser o que era, antesvolte a ser o que era, antesvolte a ser o que era, antesvolte a ser o que era, antesvolte a ser o que era, antesda guerra com o Japãoda guerra com o Japãoda guerra com o Japãoda guerra com o Japãoda guerra com o Japão

REORGANISAÇÃO DA MARINHA CHINEZAREORGANISAÇÃO DA MARINHA CHINEZAREORGANISAÇÃO DA MARINHA CHINEZAREORGANISAÇÃO DA MARINHA CHINEZAREORGANISAÇÃO DA MARINHA CHINEZA(RMB jul./1910, p. 37-44)

Capitão-Tenente addido naval Ernesto Frederico da Cunha

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

vastissima costa, de muitas centenas de milhase cujo estado financeiro é máo, deve renunciar,pelo menos por emquanto, á pretenção de pos-suir “drednoughts” possantes, e dar preferenciaa numerosos cruzadores rapidos e destroyers,

encarregados de policiamento das costas efiscalisação das alfandegas. Em segundo logar,sua politica tem sido e provavelmente será sem-pre de simples defensiva.

(...)

AGULHA DE MAREAR ELECTRO-TRANSMISSORAAGULHA DE MAREAR ELECTRO-TRANSMISSORAAGULHA DE MAREAR ELECTRO-TRANSMISSORAAGULHA DE MAREAR ELECTRO-TRANSMISSORAAGULHA DE MAREAR ELECTRO-TRANSMISSORA(RMB, jul./1910, p. 45-51)

Em consequencia das grandes massasmetalicas modernamente empregadas nasconstrucções dos navios de guerra, a acçãodo magnetismo terrestre não só éenfraquecida, mas experimenta ainda umamudança de direcção que occasiona umsensivel e pernicioso desvio das agulhasem relação aos meridianos magneticos.

Este desvio modifica-se, não só em re-lação á orientação da prôa do navio, gi-rando sobre si mesmo, como em relação ámudança de latitudes geographicas ou aoslogares onde se installam as agulhas nomesmo navio.

O objectivo do apparelho de que vamostratar é evitar a repetição das compensa-ções para cada uma das agulhas, aprovei-tando uma unica compensação feita em umdesses instrumentos, convenientementecollocado em logar do navio onde sejamminimas as acções perturbadoras ou, pelomenos, onde ellas conservem valoresapproximadamente constantes e previa-mente conhecidos.

Em vista do exposto, ressalta a necessi-dade urgente de haver muito criterio naescolha do logar para a installação dessaagulha unica, que chamamos padrão, esco-lha esta que muito deve attender aocoefficiente provavel de perturbação.

As demais agulhas, ao contrario, pode-rão ser installadas em qualquer logar, visto

serem isentas das causas de erro de quefalamos. A estas ultimas chamaremos se-cundarias (Tochterkompas).

(...)

Agulha-padrão

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Passamos a tratar agora de uma parte dahistoria naval que até hoje, sem motivojustificavel, tem sido muito descurada e muitomenos elucidada pelos nossos historiadores.

Muita gente, e entre ella a nossa offi-cialidade naval, não lhe dá o devido apre-ço. Sentimos que isso aconteça e sentimosainda não termos á mão todos os documen-tos que por ahi andamespalhados e abando-nados nos archivospublicos e particula-res, para darmos o de-senvolvimento neces-sario á narrativa des-sa guerra contra umpovo visinho e que atéaos nossos dias temprocurado com afandisputar-nos o logarque nos compete pordireito no concerto dasnações mundiaes eprincipalmente sul-americanas.

A historia dessacampanha não tem sido abordada por mui-tos em razão, talvez, de não nos ter trazi-do a forte messe de louros que nos propor-cionou a do Paraguay.

Ha uma differença grande a notar: notempo da guerra com a Argentina a nossa

patria acabava de sahir do nascedouro e por-tanto não podia mostrar a homogeneidadede raça, de pensamento e de acção, nem amesma pujança que patenteou na guerra con-tra o tyranno do Paraguay.

E si o resultado foi glorioso nesta cam-panha, devemos assigna-lar, no que dizrespeito ás operações navaes, que os che-

fes que as dirigiramtiveram como verda-deira escola oestuario do Prata nacampanha que nospropomos descrever.Tivemos, é certo, naguerra com a Argen-tina contratemposapreciaveis, mas elleseram naturaes a umamarinha nova operan-do em paragens malconhecidas e, aindamais, não dispondo deum material apropri-ado ao theatro dalucta e de pessoal bas-

tante adestrado e capaz.Os feitos gloriosos, em muito maior nu-

mero que os revezes experimentados, sãotão bellos e de tal ordem que qualquer ma-rinha do mundo se orgulharia em graval-osnos seus annaes.

Tivemos senões e falhas naTivemos senões e falhas naTivemos senões e falhas naTivemos senões e falhas naTivemos senões e falhas nacampanha contra acampanha contra acampanha contra acampanha contra acampanha contra a

Argentina, mas essas falhas eArgentina, mas essas falhas eArgentina, mas essas falhas eArgentina, mas essas falhas eArgentina, mas essas falhas esenões, como tambem todassenões, como tambem todassenões, como tambem todassenões, como tambem todassenões, como tambem todasas scenas gloriosas, devemas scenas gloriosas, devemas scenas gloriosas, devemas scenas gloriosas, devemas scenas gloriosas, devem

ser postas em destaque paraser postas em destaque paraser postas em destaque paraser postas em destaque paraser postas em destaque paranos servir de exemplo enos servir de exemplo enos servir de exemplo enos servir de exemplo enos servir de exemplo e

ensinamento, afim de que umensinamento, afim de que umensinamento, afim de que umensinamento, afim de que umensinamento, afim de que umdia, na occasião precisa,dia, na occasião precisa,dia, na occasião precisa,dia, na occasião precisa,dia, na occasião precisa,

possamos evitar os erros epossamos evitar os erros epossamos evitar os erros epossamos evitar os erros epossamos evitar os erros eimitar as virtudes dos nossosimitar as virtudes dos nossosimitar as virtudes dos nossosimitar as virtudes dos nossosimitar as virtudes dos nossos

heroicos avós marujosheroicos avós marujosheroicos avós marujosheroicos avós marujosheroicos avós marujos

MARINHA DE GUERRA DO BRAZIL XIXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL XIXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL XIXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL XIXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL XIX(RMB, jul./1910, p. 75-93)

Primeiro-Tenente Lucas A. Boiteux

LEVANTE NA CISPLATINA – SUAS CAUSAS – PROCEDIMENTOINSOLITO DOS ARGENTINOS – TRAIÇÕES E REVEZES – A RETIRADA

DO NOSSO CONSUL DE BUENOS-AIRES – ACÇÃO DIPLOMATICA DOALMIRANTE LOBO – A NOSSA ESQUADRA NO PRATA

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

MARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XX(RMB, ago./1910, p. 367-379)

Primeiro-Tenente Lucas A. Boiteux

NOVAS RECLAMAÇÕES – OS COMBATES DE RINCON E SARANDI –DECLARAÇÃO DE GUERRA – A ESQUADRA ARGENTINA – O BLOQUEIO

DO RIO DA PRATA – CONSIDERAÇÕES E NOTICIAS A RESPEITO

(...)

A MARINHA MERCANTE DO JAPÃOA MARINHA MERCANTE DO JAPÃOA MARINHA MERCANTE DO JAPÃOA MARINHA MERCANTE DO JAPÃOA MARINHA MERCANTE DO JAPÃO(RMB, ago./1910, p. 255-294)

HISTORICO – CONSTRUCÇÃO NAVAL E PRINCIPAES ESTALEIROS PARTI-CULARES – O PESSOAL E SUA INSTRUCÇÃO – SYSTEMAS DE PROTECÇÃO

Á NAVEGAÇÃO – OBSERVAÇÕES METEOROLÓGICAS NO MAR – PORTOSABERTOS AO COMMERCIO E SEUS MELHORAMENTOS – PRINCIPAESCOMPANHIAS DE NAVEGAÇÃO – MOJI COMO PORTO COMMERCIAL

Porque, então, não são citados nos dis-cursos patrioticos, nos livros de educaçãocivica? Por que não se festejam as datasdesses feitos e não se elevam monumentosrostraes para assignalal-os ás gerações doporvir? Porque delles não se trata com omesmo carinho que os do Paraguay?

É tempo ainda.Tivemos senões e falhas na campanha

contra a Argentina, mas essas falhas esenões, como tambem todas as scenas glori-

osas, devem ser postas em destaque paranos servir de exemplo e ensinamento, afimde que um dia, na occasião precisa, possa-mos evitar os erros e imitar as virtudes dosnossos heroicos avós marujos.

E meditando com muita calma, muitaprudencia e são patriotismo sobre aspassadas faltas, sabermos intelligen-temente evital-as num futuro muitoproximo, talvez.

(...)

HISTORICO – O historico do desen-volvimento da marinha mercante japonezapode ser circumscripto nos tres seguintesperiodos bem distinctos e caracteristicos:o primeiro, da mais remota antiguidadeaté 1636; o segundo desse anno até a que-da do shogunato dos Tokugawa; o tercei-ro iniciado pela actual dynastia do Meijie que abrange todo esse prazo de 42

annos, admiravelmente empregado natransformação radical do paiz, livredaquelle governo absoluto.

Vejamos resumidamente quaes são osprincipaes factos que caracterisam as tresphases evolutivas da marinha mercante doJapão e, ao mesmo tempo, justificativasdaquella delimitação.

(...)

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

É sempre motivo do maior enthusiasmopara os povos que hão attingido o seu maiorgráo de civilisação a commemoração de to-das as datas notaveis de sua historia.

Nós, paiz novo e entregue, ha menos de umseculo, á sua propriadirecção, depois de maisde tres seculos de tutellasenhorial, já contamos,ainda assim, algumasdatas que servem deverdadeiros marcosassignaladores do movi-mento sempre ascen-cional do nosso patrio-tismo e do nosso progres-so ao lado das nossas co-irmãs americanas.

Dentre essas datasporém surge, destaca-se com maior brilho,como primacial no desenvolvimentocivilisante e autonomo de nossa patria, ade Sete de Setembro, dia de sua emancipa-ção territorial e politica e de sua conse-quente encorporação ao convivio das na-ções livres e soberanas.

A marinha de guerra brazileira, emboraembryonaria, começou desde logo a prestar aopaiz os mais valiosos serviços, empenhando-se nas lutas da independencia, de que foimagna pars, combatendo os retrogrados que

pretendiam oppôr-se aomovimento libertadoriniciado nas margens doYpiranga com o memo-ravel grito de “Inde-pendencia ou Morte”,que teve tamanha re-percussão triumphalem todos os recantos denossa terra.

Á marinha de hoje,cuja evolução é umaconsequencia naturale logica do desenvol-vimento geral da na-ção, com a qual se acha

perfeitamente identificada nos seus soffri-mentos e nas suas alegrias, não é, e nempodia ser, indifferente a commemoraçãodesse grande dia, alegremente festejadopelo povo, ao qual se associou com o maisvibrante enthusiasmo.

REJUVENESCIMENTO DOS QUADROS DA NOSSA MARINHAREJUVENESCIMENTO DOS QUADROS DA NOSSA MARINHAREJUVENESCIMENTO DOS QUADROS DA NOSSA MARINHAREJUVENESCIMENTO DOS QUADROS DA NOSSA MARINHAREJUVENESCIMENTO DOS QUADROS DA NOSSA MARINHA(RMB, set./1910, p. 439-446)

De par com o grande desenvolvimento quevae tendo a nossa marinha de guerra, umamedida se torna cada vez mais indispensavel,no intuito de o não entravar em um dos seusprincipaes factores, qual é o rejuvenescimen-to dos quadros de nossa officialidade.

Em quasi todos, si não em todos os paizesmaritimos, inclusive o nosso, é esse um dosproblemas que de ha muito tem preoccupadoos respectivos governos, que se não descura-ram de promover com esse intuito a votaçãode leis sobre reforma compulsoria.

A marinha de guerraA marinha de guerraA marinha de guerraA marinha de guerraA marinha de guerrabrazileira, emborabrazileira, emborabrazileira, emborabrazileira, emborabrazileira, embora

embryonaria, começou desdeembryonaria, começou desdeembryonaria, começou desdeembryonaria, começou desdeembryonaria, começou desdelogo a prestar ao paiz os maislogo a prestar ao paiz os maislogo a prestar ao paiz os maislogo a prestar ao paiz os maislogo a prestar ao paiz os mais

valiosos serviços, empenhando-valiosos serviços, empenhando-valiosos serviços, empenhando-valiosos serviços, empenhando-valiosos serviços, empenhando-se nas lutas da independencia,se nas lutas da independencia,se nas lutas da independencia,se nas lutas da independencia,se nas lutas da independencia,

de que foi de que foi de que foi de que foi de que foi magna parsmagna parsmagna parsmagna parsmagna pars,,,,,combatendo os retrogrados quecombatendo os retrogrados quecombatendo os retrogrados quecombatendo os retrogrados quecombatendo os retrogrados que

pretendiam oppôr-se aopretendiam oppôr-se aopretendiam oppôr-se aopretendiam oppôr-se aopretendiam oppôr-se aomovimento libertadormovimento libertadormovimento libertadormovimento libertadormovimento libertador

SETE DE SETEMBROSETE DE SETEMBROSETE DE SETEMBROSETE DE SETEMBROSETE DE SETEMBRO(RMB, set./1910, p. 435-436)

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

Comparando o que sobre o assumpto seacha estipulado nesses diversos paizes eachando por demais deficiente ainda o queentre nós vigora, o sr. vice-almirante mi-nistro da Marinha apresentou ha dias aosr. presidente da Republica uma bem fun-damentada exposição, preconisando a ne-cessidade da reducção das idades corres-pondentes aos diversos postos comoimprescindivel para uma solução efficaz aesse grande desideratum, de importanciavital para o completo ressurgimento de nos-sa marinha de guerra, que só assim se pode-rá expandir no caminho de seu naturalprogredimento; progredimento que ficaráparalysado e ella fatalmente distanciadadas demais marinhas, desde que se nãomovimente conjunta e parallelamente to-das as molas do mecanismo sobre que sua-vemente, sem atritos, nem paradas bruscasou quaesquer outras intermitencias, deveo mesmo constantemente evoluir.

A medida lembrada pelo sr. ministro vemportanto revigorar uma dessas molas reaes,afastando do quadro activo, por meio deuma reforma que ao mesmo tempo repre-sente um galardão condigno dos relevan-

tes serviços por elles prestados durantelongos annos, a diversos officiaes generaese superiores que, embora cheios de mereci-mentos e muitissimo competentes, já seacham, pelo fatal enfraquecimento physicotrazido por suas idades mais ou menos avan-çadas, impossibilitados de exercerem asfuncções de alta responsabilidade inhe-rentes a seus postos com a mesma exacção eo mesmo ardor da idade viril; e , simultane-amente, permittindo que suas vagas sejampreenchidas por officiaes moços, ainda chei-os de vida e de justas aspirações, aos quaesa simples perspectiva de um tal futuro sópoderá servir de maior estimulo para redo-brarem de zelo no cumprimento de seusdeveres profissionaes, assim melhor desem-penhados, o que – como é patente – só re-dundará em maior vantagem para esseimportantissimo ramo do serviço nacional.

Parecendo-nos já demasiados os ligeiroscommentarios que ahi ficam á patriotica inici-ativa do sr. ministro da Marinha – perfeita-mente recommendada por si mesma – passa-mos sem mais demora a reproduzir a sua clarae procedente exposição, que é a seguinte:

(...)

OS VELIVOLOS NA GUERRA NAVALOS VELIVOLOS NA GUERRA NAVALOS VELIVOLOS NA GUERRA NAVALOS VELIVOLOS NA GUERRA NAVALOS VELIVOLOS NA GUERRA NAVAL(RMB, set./1910, p.457-478)

Da Rivista Marittima de julho-agosto de 1910

O assistir á partida de um velivolo, quan-do a machina está ainda presa ao terreno, éum espectaculo grandioso e emocionante: oruido do motor, o turbinoso voltijar da helice,a nuvem de poeira levantada pelo giro, oesforço dos braços que sustentam a machinafremente, que arde por lançar-se, dão aosnossos sentidos impressões inesqueciveis,entre as quaes uma admiração sem fim pelo

audaz, que não teme sahir sobre a fragilmachina e lançar-se á conquista do céo.

Quem assiste á partida do velivolo estáhabituado a ver, em qualquer machina terres-tre, embora seja o mais veloz automovel decorrida, robustez de estructura, abundanciade material, solidos reforços, ainda ahi ondeuma economia de peso deve-se impor; então ásua mente, durante esta primeira phase da

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partida, se apresenta um estridente contras-te, do qual surge, espontaneo, o pensamentode que a solução do problema, que impõe, comocondição necessaria, tanto desenvolvimentode força em um conjunto tão fragil, como éuma armação de tela de sarrafos, não é, nãopóde ser a definitiva.

Quando, porém, o velivolo, livre dos liamesque o prendem, depois de ter percorrido, noterreno, o trato necessario ao vôo, começa aequilibrar-se no ar, primeiramente incerto eem seguida seguro, soberbo desfilar como umaflecha, através do ar e depois subir para depoisdescer e virar, descre-vendo curvas esplen-didas, sem nenhumaoscillação antiesthetica,porem docemente, comose deslisasse: então ocontraste, que antes seapresentava com insis-tencia á nossa mente,entre a fragilidade doapparelho e o poder de-senvolvido sobre elle, se attenúa; surge,espontanea, então a intuição que de um talmilagre é possivel a realisação, graças unica-mente á feliz reunião de uma grande força áuma grande leveza.

No surprehendente evoluir dos meios delocomoção, é fixa uma constante, continua eafanosa pesquiza dos meios mais rapidos, maispotentes e mais leves; dos primeiros comboioslentos e pesados, chegámos aos actuaes, velo-zes, directissimos, que são, relativamente aopoder desenvolvido, de uma grande leveza emconfronto aos primeiros comboios ferroviarios;da velha diligencia, que se arrastava pesa-damente nas estradas principaes, empregandodias inteiros para viagens que hoje se fazemem poucas horas, passámos aos vertiginosos

automoveis, milagre este, tambem, de levezareunida ao desenvolvimento de uma grandeforça.

Em tudo isto o progresso tem sido mara-vilhosamente rapido, porem gradual e con-tinuo; tem sido uma evolução a que nossamente, por assim dizer, se amoldou, habi-tuando-se a considerar sem admiração oshodiernos milagres da technica industrial.

A creação, porém, das machinas voado-ras nos colheu de surpresa e nos deixa chei-os de estupefaciente admiração.

O velivolo, tal qualé actualmente, é umamachina prodigiosa,mas ao mesmo tempoextremamente fragil;os monoplanos, osbiplanos mais perfei-tos são organismos

fraquissimos; basta pensar-se que naquellalevissima construcção de téla e sarrafos, sedesenvolvem dezenas de cavallos. Isto mos-tra que na aviação, como é hoje, ha umadesharmonia inicial, um conflicto fundamen-tal, que tem sido momentaneamente resol-vido com um compromettimento de genio ede audacia, porém que não póde ser uma so-lução definitiva do problema.

Que esta consideração, porém, não produ-za no nosso animo o esmorecimento, que seriainjusto depois de tantos esforços consagra-dos á creação da machina voadora e depois detantas victorias; sirva, sim, para moderar onosso enthusiasmo acerca de efficacia realdesta machina no campo pratico; não nosilludamos que, devido a extraordinarios e im-

Lembremo-nos antes que oLembremo-nos antes que oLembremo-nos antes que oLembremo-nos antes que oLembremo-nos antes que ovelivolo ficará sómente novelivolo ficará sómente novelivolo ficará sómente novelivolo ficará sómente novelivolo ficará sómente nodominio do desporte e dadominio do desporte e dadominio do desporte e dadominio do desporte e dadominio do desporte e da

guerra e que, especialmenteguerra e que, especialmenteguerra e que, especialmenteguerra e que, especialmenteguerra e que, especialmentenesta ultima, lhe estánesta ultima, lhe estánesta ultima, lhe estánesta ultima, lhe estánesta ultima, lhe está

reservado um grande futuroreservado um grande futuroreservado um grande futuroreservado um grande futuroreservado um grande futuro

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previstos progressos no aligeiramento dos mo-tores de aviação, possa o velivolo tornar-se deuso com-mum, não fantasiemos que os trans-portes aereos possam substituir os terrestres;lembremo-nos antes que o velivolo ficarásómente no dominio do desporte e da guerrae que, especialmente nesta ultima, lhe estáreservado um grande futuro.

Nas manifestações desportivas segue-se amoda e, da mesma maneira que agora quasi sãoesquecidos os enthusiasmos suscitados pelascorridas de bicycletas e de automoveis, assimpode dar-se que um dia cessará o enthusiasmoque hoje suscita o ver-se um monoplano que,com garboso movimento, se balouça graciosa-mente no ar ou assistir em um aerodromo a umacorrida de biplanos que, ruflando furiosamen-te, vão procurar a embriaguez do vôo excelso,procurando sempre a maior altura, como emuma corrida desesperada.

Porém isto não deve diminuir o fervor dosestudos, das pesquizas assiduas e pacientes,das experiencias intentadas para o ulterioraperfeiçoamento desta machina, cujo progres-so nos parece absolutamente maravilhoso,quando se pensa que na primeira metade de1908 poucos criam nos vôos de Wright e quecerca de dois annosmais tarde a Manchaera atravessada e osaviadores realisa-vam as proezas queteem enchido de pas-mo o mundo: basta re-cordar os vôos Lon-dres–Manchester,New-York–Phila-delphia–New-York,e os ultimos maravi-lhosos records daaltura.

Criem-se pilotos e submettam-se osvelivolos a uma experiencia constante,methodica, da qual sahirão profundas mo-dificações technicas.

Mas, ainda mesmo quando não serealisassem os maiores aperfeiçoamentos(coisa impossivel, porque a humanidade emqualquer manifestação está sempre em con-tinuo progresso) e se conservasse sempreno velivolo aquella desharmonia que temhoje, o seu defeito mais grave, e que pareceinevitavel, elle terá sempre pratico enobilissimo fim, porque sempre se encon-trará um homem, audaz, de animo forte,que não temerá embarcar na fragil machinae lançar-se ao espaço; elle voará sobre ainfinita extensão do mar e, dirigindo-separa as brumas do horisonte, avistará osnavios inimigos, ou então voará sobre a ter-ra e, passando sobre canaes, mattas e rios,elevando-se até dominar um horisonteimmenso, descobrirá os exercitos, observa-rá seus movimentos, para depois mudar derumo e desapparecer, confundindo-se coma côr das nuvens, entre as quaes viaja, le-vando noticias que podem decidir da sortede uma nação.

Fig. 3

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

Permittidas estas breves considerações,nos propomos a indicar succintamente o ca-minho por que poderiamos dirigir os estu-dos e as experiencias destinados a resolveros dois seguintes problemas:

I. Erguimento em um velivolo doconvéz de um navio.

II. Lançamento de granadas explosivassobre o convéz de um navio.

(...)

MARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXIMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXIMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXIMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXIMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXI(RMB, set./1910, p. 553-558)

Primeiro-Tenente Lucas A. Boiteux

PERDA DA ESCUNA “ARAÇATUBA” – PRESIDENCIA DE RIVADAVIA –COMBATES DE CORALES – DEMISSÃO DE COMMANDANTES ARGENTI-

NOS – RECLAMAÇÕES INGLEZAS E NORTE-AMERICANAS

(...)

REVISTA DE REVISTASREVISTA DE REVISTASREVISTA DE REVISTASREVISTA DE REVISTASREVISTA DE REVISTAS

JULHO – 1910

COMBUSTIVEL LIQUIDO – Não haduvida que o combustivel liquido apresen-ta algumas vantagens, tanto assim que emquasi todas as marinhas fazem-se delleexperiencias e observações.

Diz The Illustrated London News, tra-tando deste importante assumpto: “Todamarinha que emprega em seus navios ex-clusivamente o carvão de pedra, podendodispor de combustivel liquido, fecha osolhos a um progresso e efficiencia eviden-tes, e cedo ou tarde deixará este máo cami-nho como já o fez a marinha brittanica”.

Quando nas manobras navaes a esquadrado almirante May, que empregava o combustivelcomo auxiliar para a producção de vapor nascaldeiras, foi perseguida desde o canal da Man-cha até o Mar do Norte pela esquadra do almi-rante Wilson, cujos navios só empregavam car-vão, notou-se que três toneladas de petroleo

davam o mesmo rendimento que quatro tonela-das de carvão, e assim o couraçado King EdwardVII e mais tres outros navios conseguiram dis-tanciar-se da esquadra do almirante Wilson,cujos navios no momento culminante da corri-da deram mostra de decahimento da pressãonas caldeiras, além da grande fatiga dosfoguistas e pessoal das machinas peloexhaustivo trabalho.

Apresentemos agora succintamente asvantagens do combustivel liquido:

1a Limpeza.2a Ausencia de fumaça.3a Positivo augmento de velocidade.4a Não ha o perigo de combustão

espontanea.5a Não se estragam os depositos.6a É menor o trabalho de transporte.7a Augmento de producção de vapor.8a Maior raio de acção. Não é preciso lim-

par as caldeiras para carregal-as de novo.9a As caldeiras podem ter maior duração.

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

10a Possibilidade de reforçar as caldeiras.11a Pouca perda de calor e mais unifor-

me distribuição de temperatura na camarade combustão.

12a Potencia calorifica de 24000 uni-dades, ao passo que a do melhor carvãoWelsh é de 15000.

13a Suppressão dos foguistas.14a Economia do espaço destinado ao

combustivel, pois que tres toneladas decombustivel liquido desenvolvem a mesmapotencia calorifica de quatro de carvão.

15a Facilidadepara um navio-deposi-to supprir os navios deguerra, especialmenteem alto-mar.

Agora as desvanta-gens:

1a O combustivelliquido é mais caro,pelo menos poremquanto.

2a Perigo de umaexplosão em caso decombate, que alliás éum perigo ordinariono decorrer de umaguerra.

3a Dependencia doestrangeiro para obter a força motora dosnavios da esquadra.

Em relação a esta ultima desvantagem,diz o citado jornal, é de esperar que com otempo a Gran-Bretanha e suas coloniascheguem a produzir o sufficiente.

Segundo informações de Mr. Henry, ascolonias inglezas começam a dar animação aessa nova industria e devemos ter bem pre-sente “que o futuro pertence á potencia quepossuir espalhado pelo mundo o maior nume-

ro de ilhas povoadas, capazes de produzir earmazenar combustivel para a esquadra”.

É indispensavel, portanto, que o capitalbritanico, seu trabalho e intelligencia, váesquadrinhar nos territorios inexploradosdas differentes partes do imperio, os pontosem que o petroleo possa ser encontrado,extrahido e depositado convenientemente.

Felizmente o preconizado combustivelque, em futuro não muito remoto, terá umadilatada applicação nos navios de guerra emercantes, existe em alguns pontos do nos-

so extenso territorio.Agora mesmo a im-

prensa noticiou a des-coberta de vestigiosseguros de petroleo emterrenos de uma fa-zenda em S. Paulo.

Em Matto Grosso eSanta Catharina hatambem logares em queo petroleo parece exis-tir, dependendo apenasa sua exploração indus-trial de pesquizascriteriosamente feitascom apparelhos e pelosprocessos adequados.

O NAVIO MODERNO E O ASSAL-TO DAS VAGAS – Sob esta epigraphe en-contramos em La Nature o seguinte artigodo capitão de fragata Souvaire Jourdan,illustre escriptor naval.

“Não vae longe o tempo em que o mar nosseus accessos de colera tornava-se sempre aqualquer momento senhor do navio que elleconduzia sobre o dorso onduloso, ou pelomenos lhe impunha, sob pena de perecer, aobrigação ou de fugir diante do seu furor ou

A applicação da turbina áA applicação da turbina áA applicação da turbina áA applicação da turbina áA applicação da turbina ánavegação a vapornavegação a vapornavegação a vapornavegação a vapornavegação a vapor

assignalou o ultimoassignalou o ultimoassignalou o ultimoassignalou o ultimoassignalou o ultimoprogresso mecanico realisadoprogresso mecanico realisadoprogresso mecanico realisadoprogresso mecanico realisadoprogresso mecanico realisadopelo homem em sua longa epelo homem em sua longa epelo homem em sua longa epelo homem em sua longa epelo homem em sua longa ehomerica luta contra o mar,homerica luta contra o mar,homerica luta contra o mar,homerica luta contra o mar,homerica luta contra o mar,

o que lhe valeuo que lhe valeuo que lhe valeuo que lhe valeuo que lhe valeudefinitivamente a victoria,definitivamente a victoria,definitivamente a victoria,definitivamente a victoria,definitivamente a victoria,

permittindo aos naviospermittindo aos naviospermittindo aos naviospermittindo aos naviospermittindo aos naviostraçar, noite e dia, seutraçar, noite e dia, seutraçar, noite e dia, seutraçar, noite e dia, seutraçar, noite e dia, seu

extenso sulco, sem jamaisextenso sulco, sem jamaisextenso sulco, sem jamaisextenso sulco, sem jamaisextenso sulco, sem jamaisdiminuir a velocidadediminuir a velocidadediminuir a velocidadediminuir a velocidadediminuir a velocidade

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

de reduzir a sua velocidade a ponto de nãopoder mais avançar.

Os enormes pro-gressos realisados dedez annos a esta par-te na construcção dosnavios, a rigidez, a so-lidez que já se conse-guio dar a seu costa-do, a potencia gigan-tesca das machinasque encerram seusflancos, mudaramtudo isto.

P r a t i c a m e n t epode-se affirmar quese tornaram raros os casos em que moder-nos leviathans, que em nossos dias atraves-sam o Atlantico entre o antigo e o novomundo, podem ser for-çados a voltar atráspelo assalto das ondas,abandonando seu rumoou diminuindo sua ve-locidade em proporçõesconsideraveis.

Isto que acima ficadito refere-se somente ásparagens de que nuncase afastam esses naviose que não fazem partedas zonas varridas peloscyclones e tufões. Todaaffirmação relativamen-te aos effeitos de que écapaz de produzir aviolencia desses aterra-dores phenomenos e daresistencia que lhespode oppôr o mais possante e resistente na-vio, seria de facto singularmente duvidosa.

A applicação da turbina á navegação avapor assignalou o ultimo progresso

mecanico realisadopelo homem em sualonga e homerica lutacontra o mar, o que lhevaleu definitivamentea victoria, permi-ttindo aos navios tra-çar, noite e dia, seu ex-tenso sulco, sem jamaisdiminuir a velocidade,atravez dos encape-llados mares que de-sencadeia o Atlanticonorte.

Foi assim que em 1908 o Lusitania, emcircumstancias atmosphericas variaveis en-tre o vento fresco e a tempestade, manteve

durante 24 horas umavelocidade de 26,5 nóspor hora.

No tumulto dessaluta pavorosa, escreve oScientific American,uma ancora pesando10000 kilogrammas foideslocada, os paos de car-ga de ferro foram arran-cados e torcidos comobonecos de chumbo.

A despeito disso, onavio chegou ao portopraticamente intacto,sem que um só dosinnumeraveis rebitesde seu costado tivessecedido.

O mais commum-mente observado é fazer viagem um tran-satlantico, a despeito do máo tempo, sem

É preciso ter-se um coração daÉ preciso ter-se um coração daÉ preciso ter-se um coração daÉ preciso ter-se um coração daÉ preciso ter-se um coração datempera de um velhotempera de um velhotempera de um velhotempera de um velhotempera de um velho

marinheiro, sem que se force amarinheiro, sem que se force amarinheiro, sem que se force amarinheiro, sem que se force amarinheiro, sem que se force aexpressão, a mais seguraexpressão, a mais seguraexpressão, a mais seguraexpressão, a mais seguraexpressão, a mais segura

confiança na solidez e poder deconfiança na solidez e poder deconfiança na solidez e poder deconfiança na solidez e poder deconfiança na solidez e poder defluctuabilidade do casco sobrefluctuabilidade do casco sobrefluctuabilidade do casco sobrefluctuabilidade do casco sobrefluctuabilidade do casco sobre

o qual se está, para não seo qual se está, para não seo qual se está, para não seo qual se está, para não seo qual se está, para não sesentir alguma emoção diantesentir alguma emoção diantesentir alguma emoção diantesentir alguma emoção diantesentir alguma emoção diante

do espectaculo de tal naturezado espectaculo de tal naturezado espectaculo de tal naturezado espectaculo de tal naturezado espectaculo de tal natureza

Couraçado de esquadra debaixo de máo tempo,soffrendo o embate de enorme vaga que

o inunda pela proa

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

maiores inconvenientes para a torcidella deum ou dois pontaletes ou quebrar-se algu-mas anteparas do camarim de navegação.

Mas de tempos a tempos sobrevirão, coma altura e a extensão das vagas correspon-dendo ás dimensões donavio, circumstanciastaes que o costadosoffra o seu supremoesforço. É, por exem-plo, o que se dá quan-do o navio se vê mon-tado na crista de uma vaga com a prôa mer-gulhada n’agua, que fica desta forma ex-posta á vaga seguinte, a qual surge comouma montanha abrupta cujo cimo rebentacom fragor.

Nesse momento, o official e o pessoalde quarto, máo grado a altura donde domi-nam o mar em tempo calmo, deverão man-ter-se com firmeza e segurança, pois nãotardarão em receber a visita de um bemrespeitavel volume d’agua.

Na noite de 10 de janeiro deste anno, oLusitania navegava aos embates de uma tem-pestade de oeste e devido a esse máo tempo, os

vidros que costumamguarnecer o camarim dopassadiço tinham sidoretirados e substituidospor fortes pranchetas demadeira.

Em dado momento,quando a pôpa se le-vantava pela passagemde uma vaga e quandoa roda de prôa mergu-lhava como ficou ditoantes, uma outra vaga,mas agora de dimen-sões gigantescas, inva-

dia o castello.A grande massa d’agua compacta pas-

sou inteiramente por cima do camarim denavegação e por cima ainda da agulha deestandarte que está collocada sobre elle.

Esta vaga tinha o seumovimento proprio, onavio seguia ao seu en-contro com uma velo-cidade approximadade 12 a 15 nós, resul-tando d’ahi que a mas-

sa d’agua tinha uma inercia consideravel,o que se observou muito bem pelos estragosproduzidos.

E, depois, não é sabido queE, depois, não é sabido queE, depois, não é sabido queE, depois, não é sabido queE, depois, não é sabido quequanto maior a nau maior aquanto maior a nau maior aquanto maior a nau maior aquanto maior a nau maior aquanto maior a nau maior a

tormenta?tormenta?tormenta?tormenta?tormenta?

Recuo da vaga deixando a tolda alagada

Vaga arrebentando na proa de um vapor

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

As pranchetas de madeira das janellasdo camarim foram arrancadas com as guarni-ções de aço, que ficaram torcidas completa-mente. Os seus estilhaços foram projectadosde encontro á antepara posterior do cama-rim, despedaçando-a.

O homem do leme foi lançado contra aborda, tendo na mão a roda do leme quefôra arrancada, do seu eixo.

A torrente d’agua foi em seguidaengolphar-se no salão dos officiaes, enchen-do-o á meia altura; tudo isto, é preciso di-zer, passava-se a 23 metros acima do niveldo mar.

Um ligeiro calculopermitte-nos apreciar,tendo em conta a lar-gura do navio, que é de24 metros na parte emque está o passadiço, adistancia deste passa-diço até a prôa, que éde 46 metros, e a altu-ra a que se elevou a vagaque penetrou pelocastello, que o volumetotal d’agua era de um peso de 4000 tonela-das, pelo menos, peso este de um dos nossoscruzadores do typo Catinat.

É preciso ter-se um coração da temperade um velho marinheiro, sem que se force aexpressão, a mais segura confiança na soli-dez e poder de fluctuabilidade do cascosobre o qual se está, para não se sentir al-guma emoção diante do espectaculo de talnatureza; mas tambem um pouco de orgu-lho é bem permittido ao verificar-se avictoria do homem, tão pequeno, sobre odesencadear de forças tão gigantescas.

O choque de uma semelhante massa d’aguateria sido muito perigoso se si tivesse produ-

zido verticalmente ou approximadamentesobre a tolda do navio, que certamente nãoestava em condições de supportal-o e ter-se-ia quebrado como uma casca de ovo.

A altura que attinge a tolda do Lusitaniaafastava esse perigo, mas é certo que este sub-siste inteiramente para navios menos altosou de construcção menos cuidada. O capitãodo paquete, no relatorio em que dá conta des-te dramatico incidente, não hesita em decla-rar que na sua opinião o desapparecimentoinexplicavel de um certo numero de vaporespode ser attribuido a vagas semelhantes ás

que assaltaram o Lusi-tania e que cahindo degrande altura sobre osconvezes pouco resis-tentes os tenham abati-do, fazendo afundar osnavios cujos capitãesobstinadamente se-guem derrota contra adirecção das vagasalterosas e formidaveis,felizmente muito raras.

A muita gente seafigura que os grandes navios, os modernosmastodontes, que causam a mais justa admi-ração, não só pelo exagero das suas dimen-sões, como tambem pela complicação dos seusnumerosos mechanismos, estejam a salvo dosperigos do oceano açoitado pelo vendaval in-clemente. Puro engano! Essas ilhasfluctuantes, que abrigam no seu bojo milha-res de pessoas, em numero sufficiente parapovoar uma cidade, veem-se muitas vezes naimminencia de grandes desastres, sahindo ra-ras vezes illesas das lutas tremendas trava-das com os elementos desencadeados. E, de-pois, não é sabido que quanto maior a naumaior a tormenta?

A determinação exacta,A determinação exacta,A determinação exacta,A determinação exacta,A determinação exacta,tanto quanto possivel, dotanto quanto possivel, dotanto quanto possivel, dotanto quanto possivel, dotanto quanto possivel, dotempo de existencia dastempo de existencia dastempo de existencia dastempo de existencia dastempo de existencia das

diversas categorias de naviosdiversas categorias de naviosdiversas categorias de naviosdiversas categorias de naviosdiversas categorias de naviostorna-se, portanto,torna-se, portanto,torna-se, portanto,torna-se, portanto,torna-se, portanto,

indispensavel quando se querindispensavel quando se querindispensavel quando se querindispensavel quando se querindispensavel quando se querestabelecer um programma deestabelecer um programma deestabelecer um programma deestabelecer um programma deestabelecer um programma de

construcção de esquadraconstrucção de esquadraconstrucção de esquadraconstrucção de esquadraconstrucção de esquadra

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

quer largas e custosas reparações sobremo-do prejudiciaes á boa marcha do serviço.

Mister é ainda notar que as machinastornam-se, á proporção que envelhecem,cada vez mais consumidoras de combustivele por conseguinte de funcionamento maise mais dispendioso.

O armamento é, quiçá, a parte do navioque mais rapidamente perde a efficiencia,pois em todas as marinhas se procura comafinco dotar cada unidade do melhor ca-nhão, do melhor torpedo e dos melhoresprojectores.

O gasto é neste particular muito apreciavel,sobretudo no tocante á artilharia que consti-tue quasi a totalidade do armamento.

Como conclusão, a duração do navio deguerra depende, até certo ponto, do servi-ço a que é elle affecto; essa duração, po-rém, é em todo caso assaz curta.

A determinação exacta, tanto quantopossivel, do tempo de existencia das diver-sas categorias de navios torna-se, portan-to, indispensavel quando se quer estabele-cer um programma de construcção de es-quadra, pois esse programma deve prevernão só a construcção das unidades destina-das a formar a frota, mas tambem a substi-tuição methodica em épocas determinadas.

Os allemães, que foram os primeiros acrear uma lei de constituição da frotalogicamente estabelecida, que são, aliás,ainda os unicos a possuir uma, tiveram es-pecial cuidado de fixar a duração daexistencia de suas diversas categorias denavios de combate.

Essas durações eram, a principio, de 25annos para os couraçados, 20 annos para oscruzadores e 12 annos para os torpedeiros.

Desejosos de augmentar cada vez maiso seu programma naval, permanecendo, não

O artigo acima e as estampas intercala-das dão uma idéa do que sejam essas lutastitanicas que têm por scenario a immensavastidão dos mares.

SETEMBRO – 1910

DURAÇÃO DOS NAVIOS DEGUERRA – Quando se trata de traduzirem algarismos o custo da construcção deuma frota de guerra, salta á tona não só apreoccupação do preço de cada unidade,como tambem a sua substituição normal emcondições praticas e de antemão fixadas.

Como é sabido, o material naval deteri-ora-se e diminue em efficiencia rapida-mente; de tal modo isso acontece que bemdepressa esse material perde o valor, oque força o seu desapparecimento em tem-po relativamente curto, do inventario daesquadra.

As observações acima feitas ressaltamsi se encaram as tres partes constitutivasdo navio de guerra: o casco, o apparelhomotor e o armamento.

O casco, submettido aos esforços violentosdo mar e exposto em todas as circumstancias áoxydação interior e exterior, não cessa de seestragar, quaesquer que sejam os cuidados em-pregados na construcção e conservação. Oapparelho motor e todos os apparelhos auxi-liares que o completam, mais ainda que o cas-co, estão expostos á rapida deterioração. Áscaldeiras, principalmente, como partesessenciaes e delicadas desse conjunto, pormaiores que sejam as precauções e cuidadosem conserval-as, não lhes evita a substituiçãodurante a existencia normal do navio.

Com o tempo, o apparelho motor torna-se muito delicado; as perturbações do seufunccionamento são frequentes, o que re-

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

obstante, nos termos da lei naval, resolve-ram em 1906 que, para o futuro, a duraçãodos couraçados não iria além dos 20 annos,augmentando desse modo de cerca de 20%a actividade de suas construcções.

Em França, sob a influencia da legislação,o Conselho Superior da Marinha fixoutambem as durações para as diversas catego-rias de navios de guerra.

Essas durações não se afastam sensivel-mente das fixadas primitivamente naAllemanha. Na Inglaterra, onde não se dei-xam levar facilmente pelo predominio deprincipios sobremodo rigidos, contentaram-se em aproveitar o alvoroço que, de momen-

to, as disposições adoptadas no estrangeirodespertavam na opinião publica, para recla-mar a substituição de unidades um poucoantiquadas, levando mesmo a selecção aoponto de condemnar navios ainda relativa-mente novos.

A duração de navios de diversas catego-rias pode-se estabelecer de modo seguinte:

Navios de linha: couraçados e cruzado-res-couraçados, de 20 a 25 annos.

Navios cruzadores esclarecedores(scouts): de 15 a 20 annos.

Navios torpedeiros, contra-torpedeirose submarinos: de 10 a 15 annos.

(...)

NOTICIARIO MARITIMONOTICIARIO MARITIMONOTICIARIO MARITIMONOTICIARIO MARITIMONOTICIARIO MARITIMO

JULHO – 1910

MARINHA NACIONALMARINHA NACIONALMARINHA NACIONALMARINHA NACIONALMARINHA NACIONAL

COURAÇADO “S. PAULO” – O cou-raçado S. Paulo, que com grande exitoeffectuou as suas experiencias definitivasde artilharia e velocidade no dia 30 de maioultimo, prepara-se para partir brevementedos estaleiros inglezes de Yarrow & C.,com destino ao Brazil.

Esta noticia tem despertado no pros-pero Estado de que tirou o nome um gran-de enthusiasmo, projectando-se varios fes-tejos a realisarem-se em Santos e na capi-tal paulista do dia da chegada do grandecouraçado.

Por essa occasião ser-lhe-ão entregues abandeira nacional offerecida pela cultasociedade paulista e a rica baixela de prataque o Estado mandou confeccionar.

Esta baixela compõe-se de 739 peças,assim discriminadas: uma rica guarnição

completa para centro de mesa, dois cande-labros de cinco velas cada um, quatro jar-ros, uma bandeja, dois apparelhos, sendoum para chá e outro para café, e umapparelho completo para jantar.

A baixela, que é um apurado trabalho, ex-pressamente encommendado em Paris á casaWorms & Irmão, traz a seguinte inscripção:

Tudo pela Patria – O Estado de S. Pau-lo ao couraçado “S. Paulo”. (...)

SANATÓRIO NAVAL – Foi inaugu-rado no dia 30 de junho, com honrosaassistencia do sr. presidente da Republicao Sanatorio Naval ultimamente installadoem magnifica propriedade na cidade deNova Friburgo, Estado do Rio de Janeiro,sendo removidos para lá os doentes queestavam em tratamento na Enfermaria deBeribericos de Copacabana.

Esta medida é de grande utilidade parao tratamento das praças e officiaes que re-gressam doentes das inhospitas paragens

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

da Amazonia, onde facilmente contrahemo impaludismo e o beriberi.

Friburgo, graciosa cidade serrana, a 857m

de altitude, gosa de um clima excellente.

ESCOLA DE APRENDIZES MA-RINHEIROS DE CAMPOS – No dia

26 de junho foi inaugurada a Escola deAprendizes Marinheiros do Estado doRio de Janeiro, que funcciona em edificioexpressamente construido para tal fimpelo engenheiro militar Manoel Araripede Faria.

(...)

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REVISTA DE REVISTAS

Esta seção tem por propósito levar ao conhecimento dosleitores matérias que tratam de assuntos de interesse maríti-mo, contidas em publicações recebidas pela Revista MarítimaBrasileira e pela Biblioteca da Marinha.

As publicações, do Brasil e do exterior, são incorporadasao acervo da Biblioteca, situada na Rua Mayrink Veiga, 28 –Centro – RJ, para eventuais consultas.

SUMÁRIO(Matérias relacionadas conforme classificação para o Índice Remissivo)

ÁREASCANAL

O alargamento do Canal do Panamá (251)

PESSOALPESSOAL

As mulheres poderão servir em submarinos (252)

PODER MARÍTIMOCAPITANIA

O cargo de capitão do porto (252)GUARDA COSTEIRA

Guardas Costeiras: Importância crescente contra ameaças assimétricas (253)PORTO

Injeção para mais 100 (254)

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REVISTA DE REVISTAS

Segundo o autor, prosseguem em ritmoforte as obras de alargamento do Canal doPanamá, seguindo o planejamento de obraapresentado pela construtora portuguesaSomague, que integra o grupo espanholSacyr Vallehermoso, vencedor da concor-rência internacional contra grupos pode-rosos, como o alemão HochTief e outros.A previsão de término da obra é para 2014.

Além das firmas acima citadas, o consór-cio vencedor é integrado pelo grupo italia-no Impreglio e pelos belgas Jan de Nul eCusa. A primeira empreitada deverá custarcerca de 2,2 bilhões de euros. Os projetistassão os norte-americanos da MontgomeryWatson Harza e da Tetra Tech e os holande-ses da IV-Groep. As comportas serãofabricadas pela holandesa HeeremaFabrication Group.

As obras foram iniciadas em janeiro de2009, quando o Presidente do Panamá,Martin Torrijos, fez detonar carga de di-namite para remoção da primeira pedra deobstrução, após o governo vencer refe-rendo que aprovou a construção. Essaconsulta popular se fez necessária por mo-tivos constitucionais e por forte resistên-cia da oposição, cujos engenheiros luta-ram fervorosamente contra a obra, que eraconsiderada faraônica. Nessa luta, parti-dos da direita juntaram-se a sindicatos eorganizações da esquerda, incluindo gru-pos de ecologistas. O obra de alargamen-to do canal venceu por maioria absoluta,com 76,8% dos votos a favor, e ocuparáaté 7 mil trabalhadores.

O financiamento da obra cabe ao BancoEuropeu de Investimentos, Banco Andino,Banco Interamericano de Desenvolvimen-to e Banco do Japão, o que veio garantir aindependência do país, já que os Estados

O ALARGAMENTO DO CANAL DO PANAMÁ(Revista de Marinha, Portugal, junho 2010, pág. 29-31)

Dieter Dellinger

Unidos da América (EUA) se propunham afinanciá-la integralmente desde que pudes-sem regressar militarmente à zona do ca-nal. Segundo o autor, um dos maioresbeneficiários da obra, a China – os enor-mes porta-contêineres e graneleiros quepassarão pelo canal alargado transporta-rão, principalmente, mercadorias e cereaisde e para aquele país –, não participou comqualquer empréstimo.

Quando pronto, o canal permitirá a pas-sagem dos novos grandes navios Pana-max II, de 400 metros de comprimento, commais de 300 mil toneladas de deslocamentoe capacidade de transporte de carga de até12 mil contêineres TEU. O autor informaque as receitas do canal hoje proporcio-nam 80% do Produto Interno Bruto (PIB)do Panamá e, com o alargamento, elas de-verão aumentar, contribuindo para a dimi-nuição da pobreza no país. Atualmente,passam pelo canal 14 mil navios por ano,pagando pouco mais de 1 dólar por tonela-da, preço esse que deverá aumentar paraajudar a financiar as obras.

Prosseguindo o artigo, Dieter descreveem linhas gerais as obras que estão em an-damento e as que estão previstas. Cita que,na nova configuração do canal, as antigaslocomotivas não mais serão necessárias, jáque as eclusas permitirão a passagem dosrebocadores junto aos navios, diminuindoo custo operacional. Ressalta também queserão construídas comportas reservas parasubstituir alguma que porventura venha aser destruída por ataque terrorista com ex-plosivos. Ele ainda faz comparação entretempos e custos dos transportes via Canaldo Panamá, Canal de Suez e por terra partin-do de Los Angeles até a costa leste dosEUA para produtos egressos da China.

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REVISTA DE REVISTAS

Dieter Dellinger finaliza seu artigoapresentando um breve histórico do in-teresse e da evolução do trânsito de

navios de guerra dos EUA pelo canal ecomo isso contribuiu para a evoluçãodo projeto.

De acordo com nota publicada na Re-vista General de Marina, o pessoal femi-nino da Marinha dos Estados Unidos daAmérica (EUA) poderá servir embarcadoem submarinos a partir do final de 2011. Osecretário da Marinha daquele país, RayMabus, declarou que a Marinha está dis-posta a autorizar o embarque de mulheresem submarinos, já que os SSBN (submari-nos balísticos) e os SSGN (lançadores demísseis) estão aptos a possibilitar esseembarque.

AS MULHERES PODERÃO SERVIR EM SUBMARINOS(Revista General de Marina, Espanha, maio 2010, pág. 726)

Desde que a Marinha norte-americanamudou sua política referente ao embarquede pessoal feminino, em 1993, os submari-nos sempre foram exceção. O comandantede Operações Navais, Almirante GaryRoughead, é entusiasta da medida, basea-do em sua experiência positiva no coman-do de unidades com tripulações mistas. Oembarque nos SSN (submarinos nuclearesde ataque) será ainda postergado, já queestas unidades requerem adaptações parapossibilitar o embarque de mulheres.

“E se dúvidas houvesse sobre a bonda-de de tal enquadramento de reflexão (da exis-tência do cargo de capitão do porto), basta-ria atentar no fato de, em duas potênciaseuropeias (França e Itália), e na oitava po-tência mundial (o Brasil), se manter, igual-mente inalterável, nos dias de hoje, o res-pectivo modelo orgânico (capitan du port,capitano di porto, capitão do porto)”.

O parágrafo acima transcrito é a conclu-são a que o autor chega neste seu artigo,em que analisa a evolução histórica do exer-cício da Autoridade Marítima em Portugal,

O CARGO DE CAPITÃO DO PORTO– Mais de quatro séculos de Autoridade Marítima a serviço de Portugal

e das comunidades ribeirinhas(Revista da Armada, Portugal, agosto 2010, págs. 4-5)

Doutor Luís da Costa Diogo*

* Assessor do Diretor-Geral da Autoridade Marítima (DGAM) da Marinha de Portugal. A DGAM é oserviço central do país responsável pela direção, a coordenação e o controle das atividades noâmbito da Autoridade Marítima Nacional. Ela tem sob tutela a Proteção Civil no Mar, Busca eSalvamento Marítimo, Cruzeiros Científicos, Inspeção e Controle de Pescas, Atividades de Mergu-lho, Apoio às Regiões Autônomas no âmbito marítimo e a Prevenção e Combate à Poluição no Mar.

indicando datas, regulamentos e resolu-ções que remontam ao século XVI, o que otorna importante para pesquisadores e es-tudiosos do Brasil, cujo modelo é tambémherdeiro do português.

Ao longo de seu texto, além de apresentardados históricos, Costa Diogo analisa fatosque atestam as influências estrangeiras naevolução do poder do capitão do porto, le-vando o leitor a perceber o porquê da manu-tenção desse sistema mais do que secular deadministração e as razões que o sustentaramao longo dos séculos XIX e XX.

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“Parece evidente a necessidade de sepossuir uma força que não a Marinha – aGuarda Costeira (GC) – para a proteção dasoberania e dos interesses da nação naságuas costeiras e nas partes adjacentesdos mares, garantindo-se o funcionamen-to adequado e a segurança dos elemen-tos-chave do comércio marítimo e os re-cursos marinhos em águas nacionais.”Essa é a afirmativa com que Vego iniciaeste artigo, em que analisa atividades, mis-sões e moldura legal de operação das GCno confronto com as ameaças assimétricascontemporâneas.

Segundo ele, a Marinha deve serprioritariamente empregada no exercícioda influência naval durante os períodosde paz e no combate durante conflitos nomar, e não na execução de serviços de po-liciamento. A GC nem deve ser uma forçacivil e nem uma organização puramentemilitar, no entendimento do autor. Entre-tanto, afirma, ela deve ser organizada,equipada e treinada para executar os di-versos serviços de policiamento e tam-bém para prover apoio adequado às for-ças militares em combate.

Para Milan Vego, a GC pode serestabelecida como uma organização se-parada da Marinha, como nos EstadosUnidos da América (EUA), ou como parteintegrante da Marinha, como acontece emvários outros países, e cada solução apre-

GUARDAS COSTEIRAS: IMPORTÂNCIA CRESCENTECONTRA AMEAÇAS ASSIMÉTRICAS

(Naval Forces, no II/2010, Vol. XXXI, págs. 16-23)Milan Vego*

* Professor de Operações no Naval War College desde 1991. Autor, entre outros, dos livros Soviet NavalTactics (1992) e Naval Strategy and Operations in Narrow Seas (1999;2003). É também autor dolivro-texto Operational Warfare (2001).

senta vantagens e desvantagens. A gran-de vantagem da GC separada da Marinhaé, a seu ver, ela poder ser empregada ematividades de policiamento e de imposi-ção da lei contra cidadãos. Ele consideraque, de uma maneira geral, as GC são maisapropriadas para impor a vontade da na-ção no mar. Elas também podem ser em-pregadas em casos de conflitos de inte-resses acompanhados de tensão. Nessecaso, as abordagens e inspeções de navi-os estrangeiros realizadas por navios daMarinha podem ser altamente provocati-vas, e isso não ocorre nos casos dos na-vios da GC. O autor acrescenta ainda: aGC é menos dispendiosa para construir epara manter do que a Marinha, e ela salvavidas diariamente, na qualidade de agên-cia encarregada das atividades SAR(Search and Rescue – busca e salvamen-to) e em casos de grandes calamidades,tais como os furacões.

Após sua detalhada análise, que inclui,além dos fatores acima mencionados, a in-vestigação das deficiências das GC em suacontraposição às ameaças assimétricas, asegurança nos portos e as operaçõesantipirataria, Vego conclui que o sucessodas principais operações das Guardas Cos-teiras depende diretamente da cooperaçãocom diversos organismos governamentaise da indústria naval, e com a Marinha emespecial.

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INJEÇÃO PARA MAIS 100(Portos e Navios, julho de 2010, edição 594, ano 52, pág. 22-27)

Juliana Cariello

A vinda da família real portuguesa parao Brasil, a abertura dos portos e a elevaçãoda cidade do Rio de Janeiro a capital doReino Unido de Portugal, Brasil e Algarves,em 1808, foram os marcos iniciais para odesenvolvimento da atividade portuária eda cidade como um todo.

Inaugurado oficialmente apenas em 20de julho de 1910, o porto era composto pelocais da Gamboa e sete armazéns. Neste ar-

tigo, em que se aborda o seu centenário, énoticiado que o porto do Rio de Janeiro,apesar de seus cem anos de existência, se-gue apresentando ociosidade na movimen-tação de carga e insuficiência no acessotanto ferroviário como rodoviário.

Entretanto, o texto divulga também aperspectiva de recebimento de investimen-tos da ordem de R$ 1,409 bilhão, a ser em-pregado em melhorias diversas, dentre as

Porto do Rio de Janeiro em 1910

Porto do Rio de Janeiro em 2010

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quais destacam-se a dragagem,a construção de nova área deatracação para uso de naviosde passageiros, o reforço deimportantes seções do cais e aampliação de terminais decontêineres.

A obra de dragagem prevêo aumento da profundidadede 10 para 13 metros, supe-rando a do porto de Santosem meio metro, tornando oRio de Janeiro mais competi-tivo ao permitir a atracaçãode navios maiores. Segundoo artigo, a expectativa daCompanhia Docas do Rio deJaneiro é de que a movimen-tação anual passe das atuais9 milhões de toneladas para20 milhões até 2014.

O artigo prossegue fazen-do análise dos riscos envol-vidos nos investimentos aserem realizados e pormeno-rizando alguns deles. Abor-da também o projeto PortoMaravilha, que pretende, alémde investir em projetos diver-sificados, como os indicadosno quadro ao lado, aprovei-tar as oportunidades sur-gidas com a descoberta depetróleo na região do pré-sal,atuando no apoio às ativida-des offshore.

O projeto Porto Maravilha,que prevê investimentos daPrefeitura do Rio e do GovernoFederal da ordem de R$ 3,350bilhões, tem o propósito detransformar o porto em opçãode turismo e lazer e, ao mesmotempo, em atrativo polo de ne-gócios para empresários.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Esta seção destina-se a registrar e divulgar eventos importan-tes da Marinha do Brasil e de outras Marinhas, incluída aMercante, dar aos leitores informações sobre a atualidade e per-mitir a pesquisadores visualizarem peculiaridades da Marinha.

Colaborações serão bem-vindas, se possível ilustradas comfotografias.

SUMÁRIO(Matérias relacionadas conforme classificação para o Índice Remissivo)

ADMINISTRAÇÃOATIVAÇÃO

Ativação do Centro de Acumulação de Material na Empresa MTU (259)CERTIFICADO DE QUALIDADE

CFRP e CFPN recebem certificação ISO 9001:2008 (259)COMEMORAÇÃO

30 anos da mulher na Marinha (327)Aniversário de criação do Comando da Marinha (259)Fragata Independência presta vivas à rainha do Reino Unido (261)

HOMENAGEMHomenagem à memória dos mortos da Marinha em guerra (262)

INAUGURAÇÃOEmgepron inaugura nova sede (263)Inaugurada a nova sede da Associação de Veteranos do Corpo de Fuzileiros Navais (264)

LANÇAMENTO AO MAREisa lança o Login Jacarandá (265)

LEGISLAÇÃOLei da Nova Defesa (266)

MOSTRA DE ARMAMENTOMostra de Armamento do Aviso de Pesquisa Aspirante Moura (269)

MOSTRA DE ATIVAÇÃOMostra de Ativação da Umem (272)

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

MOSTRA DE DESARMAMENTOMostra de desativação do Centro de Armas da Marinha (273)

NOME DA OMO Centro de Instrução e Adestramento Aeronaval

Almirante José Maria do Amaral Oliveira (273)POSSE

Assunção de cargos por almirantes (274)Transmissão do cargo de Chefe do Estado-Maior da Armada (275)Transmissão do cargo de Diretor-Geral do Material da Marinha (280)Transmissão dos cargos de Comandante de Operações Navais e de

Diretor-Geral de Navegação (284)PRÊMIO

“Os 70 anos da Segunda Guerra no Brasil” de O Dia recebe prêmio internacional (288)PROMOÇÃO

Promoção de almirantes (289)

APOIOCONSTRUÇÃO NAVAL

Imprensa dos EUA visita o Queen Elizabeth (290)LOGÍSTICA

Georadar entra no mercado offshore (291)PORTO

APM Terminals firma joint venture para terminal em Santos (291)Uniduto construirá porto offshore na Praia Grande (SP) (292)

ATIVIDADES MARINHEIRASSINALIZAÇÃO NÁUTICA

Navio-Balizador Tenente Castelo realiza sondagem e balizamento naBarra Norte do Rio Amazonas (292)

CONGRESSOSCONFERÊNCIA

XXIV Conferência Naval Interamericana (293)CONGRESSO

VII Congresso Acadêmico sobre Defesa Nacional (293)ENCONTRO

II Jornada de Operações de Paz/2010 (294)X Encontro Nacional dos Escoteiros do Mar (295)Prática de pesca sustentável em encontro do setor (296)

EXPOSIÇÃOXVI Fórum Internacional de Logística (296)

FEIRA3o Festival Náutico em Balneário Camboriú (297)

REUNIÃODisputa entre terminais flutuantes é pauta de reunião entre a Marinha e a SPU (297)Marinha realiza 18a reunião do Comitê Técnico da Bacia Amazônica (298)

SIMPÓSIOComandante da Marinha participa de simpósio em Angola (298)Simpósio de Pesquisa Operacional e Logística da Marinha (299)XI Simpósio de Perícias Médicas da Marinha (300)

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EDUCAÇÃOCURSO

Excelência da formação de hidrógrafos obtém reconhecimento internacional (300)ESPORTE

Atletas olímpicos entram para a Marinha (300)Brasileiras conquistam o 31o Campeonato Mundial Militar de Voleibol Feminino (301)Resultados esportivos (302)

FORÇAS ARMADASADESTRAMENTO

EsqdVF-1 realiza missão em conjunto com a FAB (308)OPERAÇÃO

Operação conjunta Atlântico II (309)Operação Ninfa XXIII (322)

SUBMARINO NUCLEARSubmarino Nuclear (312)

PESSOALCORPO FEMININO

Mulher assume GT centrado em NAe nos EUA (318)

PODER MARÍTIMOCLASSIFICAÇÃO DE NAVIO

Almirante Graça Aranha é reclassificado como Navio Hidroceanográfico Faroleiro (323)SEGURANÇA DA NAVEGAÇÃO

CPPR monitora navios em tempo real (323)

PSICOSSOCIALAJUDA HUMANITÁRIA

Aeronaves da MB operam a partir do NAe Cavour em apoio ao Haiti (318)Esquadrão HU-2 ajuda vítimas das enchentes em Alagoas (318)

COMUNICAÇÃO SOCIALAciso na tribo Tikuna em Tabatinga (319)

LANÇAMENTO DE LIVROFérias na Antártica (325)

TEATROO Passeio Mágico (326)

RELAÇÕES INTERNACIONAISACORDO

Brasil e Itália aprofundam entendimentos na área de defesa (320)

VIAGENSVIAGEM

Raposo Tavares revisita Gurupá (320)

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A Capitania Fluvial do Rio Paraná (CFRP)e a Capitania Fluvial do Pantanal (CFPN) re-ceberam a recomendação para Certificaçãona Norma ABNT NBR ISO 9001:2008. ACFRP foi certificada na sua Divisão de Ensi-no Profissional Marítimo, enquanto a CFPN,no escopo de certificação Ensino Profissio-nal Marítimo com Foco na QualificaçãoAquaviária e Controle de HabilitaçãoAquaviária. As certificações foram concedi-das após auditorias realizadas em agosto úl-timo pela Bureau Veritas Certification Brasil.

Inseridas no Programa de Certificaçãodos Órgãos de Execução (OE) do Sistema

CFRP E CFPN RECEBEM CERTIFICAÇÃO ISO 9001:2008

Foi ativado, em 19 de agosto último, oCentro de Acumulação de Material na Em-presa MTU Ltda em São Paulo (CAM MTUSP). O espaço, localizado na empresa, seráutilizado pela Marinha do Brasil para rece-ber, armazenar, controlar e distribuir os so-bressalentes fabricados pela MTU no ex-terior, que serão obtidos pelo Sistema deAbastecimento da Marinha (SAbM).

Tais itens serão empregados nas revisõesW5 e W6 dos motores dos meios operativosconduzidas na MTU do Brasil. Dessa forma,o pacote de sobressalentes necessário a cadarevisão será enviado diretamente ao CAMMTU SP, arrecadado pelo Sistema de Infor-mações Gerenciais de Abastecimento da

ATIVAÇÃO DO CENTRO DE ACUMULAÇÃO DE MATERIALNA EMPRESA MTU

Marinha (Singra), disponibilizado no momen-to do início do reparo, e aqueles porventuranão utilizados serão devolvidos ao SAbMpara visualização e requisição dos respecti-vos usuários.

Tal providência, pioneira, é parte do pro-jeto desenvolvido conjuntamente pela Se-cretaria-Geral da Marinha, Diretoria-Geraldo Material da Marinha, Diretoria de Abas-tecimento da Marinha e Empresa MTU, coma colaboração técnica da Diretoria de Co-municações e Tecnologia de Informação daMarinha. Esta Diretoria promoverá divul-gação nos Distritos Navais e Comandosde Força quanto à utilização do CAM.

(Fonte: Bono no 595, de 26/8/2010)

do Ensino Profissional Marítimo (SEPM)na referida Norma, para atender à Regra I/8da Convenção STCW, tais conquistas afi-ançam a qualidade dos serviços prestadospelas capitanias na formação, qualificaçãoe registros de aquaviários, bem como de-monstram o aprimoramento na qualidadedo atendimento ao público, contribuindocom a consolidação da imagem positiva daMarinha do Brasil junto à sociedade, emparticular nas áreas de jurisdição daquelascapitanias.

(Fonte: Bonos nos 558 e 568, de 12/8/2010 e 17/8/2010)

Foi comemorado, em 28 de julho último,o 274o aniversário de criação do Comandoda Marinha. Para celebrar a data, o coman-dante da Marinha, Almirante de EsquadraJulio Soares de Moura Neto, expediu a se-guinte Ordem do Dia:

ANIVERSÁRIO DE CRIAÇÃO DO COMANDO DA MARINHA

“Comemoramos hoje o aniversário decriação do Comando da Marinha, que, nodecorrer dos anos, já teve outros nomessem, contudo, alterar a essência de suasatribuições básicas. Estabelecido em 28 dejulho de 1736, por alvará de D. João V, rei

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de Portugal, como Secretaria da Marinha eDomínios Ultramarinos, recebeu sua atualdenominação em consequência da criaçãodo Ministério da Defesa.

Uma instituição secular como a nossarequer continuidade sem, entretanto, abrirmão da necessária adaptação aos novostempos, o que um país em constante evo-lução exige. Do período colonial à inde-pendência, do Reinado à República, e atéos dias atuais, sempre estivemos atentos aesse fenômeno e soubemos, com dinamis-mo, extrair o que temos de melhor em proldos interesses da sociedade.

Como reflexo incondicional da situaçãoeconômica e da estabilidade política, o Po-der Naval de um Estado deve se ajustaraos anseios de sua gente, concretizando-se por meio das diretrizes emana-das de sua Alta Administração.

Muitos foram os momentos quedemonstraram objetivamente essacondição; para tal, basta que aten-temos às diversas fases de apres-tamento pelas quais passamos, des-de as embarcações a vela até a ope-ração de aeronaves a reação a bor-do de navio-aeródromo.

A Nação atravessa um perío-do de reconhecido desenvolvimento, o quea torna cada vez mais atuante no cenáriointernacional, criando um ambiente favorá-vel aos planejamentos de médio e longoprazos, extremamente necessários.

Percebe-se, ainda, com relativa clareza aimportância que as nossas águas jurisdicionaisvêm adquirindo nos últimos anos, perante umpovo ainda carente de uma mentalidade marí-tima, mas que, pouco a pouco, vai reconhe-cendo o seu valor. As riquezas lá existentes eos interesses envolvidos já servem de moti-vação para discussões, com enfoque estraté-gico, nos mais diversos fóruns.

Dessa forma, a ocasião é propícia para umsucinto balanço. Estamos vivenciando mo-

mentos promissores que tomaram impulsocom a promulgação da Estratégia Nacionalde Defesa em dezembro de 2008, e que a For-ça, em plena sintonia com as diretrizes delaemanadas, não tem medido esforços para seadequar, buscando estar à altura da relevân-cia do Brasil.

Vejamos então: o tão sonhado submari-no de propulsão nuclear caminha em pas-sos firmes para tornar-se realidade, garan-tindo um maior poder de dissuasão; a vol-ta à operação do Navio-Aeródromo SãoPaulo, prevista para em breve, é um alentoconsiderável; a renovação dos meios desuperfície e aeronavais, tanto da Esquadracomo dos Distritos Navais, dará uma novadimensão à proteção da ‘Amazônia Azul’;nossas tropas de fuzileiros navais mantêm

sua invejável capacidade expedi-cionária e integram, de maneirairretocável, as missões de paz daONU; estamos exigindo a transfe-rência de tecnologia nos novosprojetos, o que terá o efeito práti-co de garantir o crescimento daindústria de defesa, tornando-acada vez mais competitiva; e, paraatender a essas incríveis deman-das, estamos firmemente empe-

nhados no aumento quantitativo, namelhoria da qualificação e no eficienteapoio médico-hospitalar e assistencial aonosso maior patrimônio, o pessoal.

Quero ressaltar, no entanto, que nadadisso seria possível se não tivéssemos umainstituição com 274 anos, que se orgulha deenaltecer os nomes e os fatos do passado;que se articula no presente em prol dos inte-resses nacionais; que valoriza seus homense mulheres, militares e civis; que não se des-cuida de sua missão constitucional e de suastarefas subsidiárias; mas que tem os olhossempre voltados para o futuro.

Sabemos que as mudanças impostaspelo tempo são inevitáveis, cabendo-nos,

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assim, a elas nos ajustar. Para tal, minhamensagem é de otimismo. Os mais de doisséculos e meio de existência devem servirde reflexão e fator motivador para que bus-quemos legar às gerações futuras uma For-ça cada vez mais forte e respeitada, o que

exigirá de nós um misto de visão, coragem,trabalho, patriotismo e dedicação.

Parabéns aos marinheiros, fuzileiros eservidores civis pela data de 28 de julho!

Bravo Zulu!”(Fonte: Bono Especial no 514, de 28/7/2010)

De 25 de junho a 2 de julho últimos, aFragata Independência participou das come-morações do centésimo aniversário da Mari-nha do Canadá, na cidade de Halifax. Na oca-sião, navios de diversos países recordaram atradição britânica chamada Fleet Review, dotempo das românticas batalhas navais, emque os navios da esquadra se dispunham emformatura e o monarca passava em revista asbelonaves (navios de guerra).

FRAGATA INDEPENDÊNCIA PRESTA VIVAS ÀRAINHA DO REINO UNIDO

manha, Dinamarca, Estados Unidos da Amé-rica, França, Holanda e Reino Unido, alémdo Brasil, único país do Hemisfério Sul. Re-presentada pela Fragata Independência,coube à Marinha do Brasil prestar vivas àrainha do Reino Unido e da CommonwealthBritânica, Elizabeth II.

O hábito dos vivas é uma repetição da tra-dicional continência e saudação à autoridadeno mar. A guarnição, em formatura, a um sinal,

leva o boné ao peito dolado esquerdo, com amão direita, e, ao sinal desalvas do apito marinhei-ro, estende sete vezes amão com o boné para oalto, à direita, e brada osvivas correspondentes.

A bordo da Indepen-dência, encontravam-se o embaixador do Bra-sil no Canadá, PauloCordeiro de AndradePinto, e a embaixatriz,Vera Lúcia Ribeiro Es-trela de Andrade Pinto;o comandante da Quar-ta Frota da Marinha dosEstados Unidos da

América, Contra-Almirante Victor G. Guillory;e o adido naval do Brasil nos Estados Uni-dos e Canadá, Contra-Almirante DilermandoRibeiro Lima, além de outros convidados.

(Fonte: www.mar.mil.br)

Tripulação presta vivas à rainha do Reino Unido (no alto).Léo Pirata (abaixo), símbolo da Fragata Independência.

A Marinha canadense organizou, em 29de junho, a International Fleet Review, coma presença de navios de diversos paísescomponentes da Organização do Tratadodo Atlântico Norte (Otan), dentre eles Ale-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Foi realizada, em 21 de julho último, noRio de Janeiro, cerimônia de homenagem àmemória dos mortos da Marinha em guer-ra. Na data, o comandante de OperaçõesNavais, Almirante de Esquadra MarcusVinicius Oliveira dos Santos, expediu a se-guinte Ordem do Dia:

“No dia de hoje, a Marinha do Brasil fazuma pausa para homenagear e reverenciara memória daqueles homens do mar que, abordo de navios de guerra e também denavios mercantes, tombaram em honra àPátria, sacrificando-se no cumprimento dodever, nas guerras vivenciadas pelo País.

Os conflitos armados entre as naçõesacontecem quando os interesses e as aspi-rações tornam-se irreconciliáveis e as açõesno campo diplomático entre os Estados nãomais surtem o efeito desejado de busca pelapaz, culminando, como último recurso, naguerra entre os países.

Ao longo de nossa história, em determi-nados momentos, os interesses estratégi-cos da Nação foram quebrados, o que fezcom que o Brasil e, particularmente, a Ma-rinha ingressassem em conflitos bélicos.

A Marinha do Brasil, sempre vigilante,se fez presente nesses momentos críticos,atuando com determinação, bravura e deforma decisiva para enfrentar e vencer osinimigos e, assim, contribuir para a recon-quista da paz!

É neste sentido que os homens do mar,tanto da Marinha de Guerra quanto daMarinha Mercante nacional, sempre de-monstraram seu grande valor, capacidade,dedicação, coragem e amor à Nação.

No curso da história, deflagrada a Guerrada Tríplice Aliança, que se estendeu de 1865a 1870, coube à Marinha empregar a Esqua-dra, sob o comando do Chefe de DivisãoFrancisco Manoel Barroso da Silva, para

HOMENAGEM À MEMÓRIA DOS MORTOSDA MARINHA EM GUERRA

estabelecer o bloqueio naval dos rios da re-gião central do teatro de operações, que eramas principais linhas de comunicaçãologísticas empregadas pelo então inimigo.Na Batalha Naval do Riachuelo, ocorrida em11 de junho de 1865, dois insignes vultosnavais sagraram-se heróis, ao imolarem suasvidas na defesa da Nação Brasileira, aindasob a forma política do Império. Um dessesheróis foi o Imperial Marinheiro de PrimeiraClasse Marcílio Dias, que era chefe do rodí-zio raiado de ré da Corveta Parnahyba,quando este navio foi abordado pelos tri-pulantes de três navios paraguaios, tendo obravo marinheiro travado luta corpo a cor-po, armado de sabre, contra o audaz inimi-go, tombando ferido no convés de seu na-vio para falecer no dia seguinte àquele me-morável confronto naval.

Na mesma batalha naval, o Guarda-Ma-rinha João Guilherme Greenhalgh tornou-se herói, quando, também a bordo daCorveta Parnahyba, lutou com toda intre-pidez e entregou sua vida, em holocausto,contra a investida do inimigo que nos ha-via abordado, para manter içado no mastrode ré da belonave o invicto então PavilhãoNacional.

Mais adiante, no início do século XX,durante a Primeira Guerra Mundial, reagin-do à perda de navios mercantes nacionaisafundados por submarinos inimigos, a Ma-rinha foi chamada mais uma vez para, decisi-vamente, defender a Pátria no mar, após tero governo brasileiro proclamado o estadode beligerância contra o Estado alemão.Naquela campanha, a Marinha, que iniciouoperações em julho de 1918, enviou aoAtlântico Norte a Divisão Naval em Opera-ções de Guerra, sob o comando do Contra-Almirante Pedro Max Fernando de Frontin,que, não obstante as dificuldades inerentes

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às fainas de abastecimento de carvão dosnavios no mar e a incerteza de possíveisataques de um novo inimigo oculto, o sub-marino, cumpriu a missão. Foi nessa campa-nha que nossos navios foram acossadospela gripe espanhola, que se alastrou peloporto de Dacar, então usado como ponto deconcentração daquela Força Naval, tendoperecido 176 bravos marinheiros.

No desdobramento dos fatos, em meadosda década de 40 do século XX o Brasil foiforçado a engajar-se na Segunda GuerraMundial, ao lado das Potências Aliadas, rea-gindo, mais uma vez, contra o afundamentode navios mercantes nacionais ao longo dacosta brasileira, em face de torpedeamentosindiscriminados perpretados por poderosossubmarinos alemães. Atendendo novamenteao legítimo clamor da Nação, nossos homensdo mar corresponderam plenamente à confi-ança neles depositada pela sociedade brasi-leira, sobrepujando obstáculos materiais, ecorajosamente fizeram-se ao mar para o com-bate, a bordo de nossos navios.

Naquele cenário bélico, a principal tare-fa da Marinha do Brasil foi a de garantir aproteção de comboios que trafegavam en-tre Trinidad, no Caribe, e Florianópolis, nolitoral sul do País. Nessa guerra, ao longode quatro anos de intensas operações, fo-ram protegidos 574 comboios e formadospor 3.164 navios mercantes, dos quais ape-nas três foram afundados. A CorvetaCamaquã naufragou durante uma opera-

ção de escolta a um desses comboios, ten-do sido perdidas as vidas de 33 dos nos-sos bravos marinheiros, justamente em 21de julho de 1944, data que foi escolhidapela Marinha para homenagearmos nossasmortes em guerra. Perderíamos ainda, du-rante aquele conflito, o Navio-Auxiliar Vi-tal de Oliveira, torpedeado por submari-no, e o Cruzador Bahia, em decorrência deacidente operativo. Dos mais de 7 mil ho-mens que a Marinha manteve em operaçãono mar, 486 sacrificaram suas vidas a bor-do desses três navios, ressaltando-se que11 deles eram fuzileiros navais.

Na Marinha Mercante, pereceram ainda470 tripulantes e 502 passageiros, elevan-do para 1.458 o total das valorosas vidashumanas perdidas no mar.

Os nomes desses intrépidos homensencontram-se inscritos nas lápides desteMonumento Nacional, erguido em home-nagem a eles e aos companheiros do Exér-cito e da Força Aérea, que também lutarame tombaram no cumprimento do dever dedefender o Brasil.

Neste momento em que rendemos ho-menagem aos bravos homens do mar quecumpriram com seu dever, sacrificando suasvidas na defesa da Pátria, busquemos ins-piração para enfrentar e vencer quaisquerdesafios que nos sejam impostos, com ofirme propósito de mantermos bem alto osnomes da Marinha e do Brasil.”

(Fonte: Bono Especial no 491, de 20/7/2010)

Foi realizada, em 30 de julho último, acerimônia oficial de inauguração da novasede da Empresa Gerencial de Projetos Na-vais (Emgepron). Com 28 anos de existên-cia, a empresa atua na gerência de projetose na comercialização de produtos e serviçosdisponibilizados pelo setor naval da indús-

EMGEPRON INAUGURA NOVA SEDE

tria nacional de defesa, incluindo embarca-ções militares, reparos navais, sistemas decombate embarcados, munição de artilharia,serviços oceanográficos e apoio logístico.

A construção da nova sede, situada noCentro do Rio de Janeiro, dentro do Comple-xo do 1o Distrito Naval, é fruto do trabalho de

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Da esquerda para a direita: VA MarcelioCarmo de Castro Pereira, CA José Ricardo

Campos Vieira, CA Roberio da CunhaCoutinho e AE Julio Soares de Moura Neto

Visita às novas instalações da Emgepron

vários colaboradores, entre eles do Almiran-te de Esquadra Raphael de Azevedo Branco,que teve o prédio batizado com seu nome,como forma de homenagem. O projeto foiassinado pela arquiteta Sônia Pereira Alves eteve coordenação geral do diretor adminis-trativo-financeiro da empresa, o Contra-Al-mirante (IM) José Ricardo Campos Vieira.

A cerimônia de inauguração foi presidi-da pelo comandante da Marinha, Almirante

de Esquadra Julio Soares de Moura Neto.Em seu discurso, o diretor-presidente daEmgepron, Vice-Almirante (RM1) MarcelioCarmo de Castro Pereira, ressaltou a impor-tância da continuidade e a colaboração dosdiretores que antecederam a atual gestãopara a concretização do projeto. A nova sededa empresa conta com uma infraestruturamoderna, distribuída em sete andares.

(Fonte: www.mar.mil.br)

A Associação de Veteranos do Corpo deFuzileiros Navais (AVCFN) conta agora com

INAUGURADA A NOVA SEDE DA ASSOCIAÇÃO DEVETERANOS DO CORPO DE FUZILEIROS NAVAIS

Veteranos participam da cerimônia de inauguraçãoda nova sede da Associação de Veteranos do Corpo

de Fuzileiros Navais

uma nova sede, inaugurada em 1o de julhona Ilha das Cobras, Rio de Janeiro. A ceri-

mônia de inauguração foi presidida pelocomandante-geral do Corpo de FuzileirosNavais, Almirante de Esquadra (FN) Alva-ro Augusto Dias Monteiro, e contou coma presença de vários almirantes da ativa eda reserva, além dos veteranos do Corpode Fuzileiros Navais (CFN).

Criada em 4 de maio de 1972 e formali-zada em 7 de outubro de 1995, a AVCFNtem como finalidade reunir, de forma vo-luntária, fuzileiros navais da reserva oureformados. Também podem fazer parteda associação civis ou militares brasilei-ros, da ativa ou da reserva.

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Visando manter o vínculoentre os associados e a Mari-nha do Brasil, em especial como CFN, várias atividades sãodesenvolvidas com o apoioda Marinha, tais como visitaa Organizações Militares eparticipação em cerimônias,exercícios operativos e even-tos de caráter social, esporti-vo ou recreativo. Os vetera-nos podem, inclusive, realizartarefas nas Ações Cívico-So-ciais (Aciso).

(Fonte: www.mar.mil.br)Nova sede da Associação de Veteranos do Corpo de Fuzileiros Navais

O Estaleiro Ilha S/A (Eisa), localizado noRio de Janeiro (RJ), cumpriu com todas asdatas de eventos durante a construção donavio 504 Login Jacarandá, com seus 319blocos somando 7 mil toneladas, que culmi-naram com o seu lançamento, em 27 de maioúltimo, na carreira lateral do Estaleiro, com apresença de várias personalidades.

Os blocos do Jacarandá foram construí-dos desde o início nas linhas de montagemcom painéis, anteparas e peças através desoldas da mais alta tecnologia. Os proces-

EISA LANÇA O LOGIN JACARANDÁ

sos de soldagem utilizados foram Mig/Mag(Metal Inert Gás/Metal Active Gás), Eletro-do e Arco Submerso.

O Estaleiro Ilha conta com uma inovaçãona área de soldagem com o processo Mig/Mag: os tratores de solda. Como resultadofinal, o Eisa obtém uma grande qualidade nasolda, além de ótima produtividade.

O Jacarandá agora se encontra em fasede acabamento interno dos alojamentos eda sala de controle, pintura do casario, ins-talação elétrica e soldagem final.

Com 271 cavernas e um calado de proje-to de 10,60 m, o navio tem 218,45 m de com-primento e 29,80 m de boca e armazenará2.700 contêineres em seus porões de carga.

A pintura passou pela fase de tratamentode superfície, verificação de rugosidade esalinidade, aplicação de tinta, inspeção final econtrole de espessura da tinta pelo medidorde película seca. Até o final do processo, se-rão consumidos aproximadamente 90 mil litrosde tinta, incluindo os 30% de perda normal.

Seu sistema de propulsão consiste deum motor diesel principal acionando uma

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linha de eixos com hélice de passo contro-lável, com 6 cilindros de 680 mm e potênciamáxima de 19.980 BHP métrico (14.697 kW)com uma rotação de 95 RPM resultando emvelocidade média de 20 nós.

A instalação elétrica do navio chega aum total de 96 mil metros de fio de diversostipos e diâmetros.

Em breve o Estaleiro Ilha entregará maisum porta-contêiner da série de quatro daLogin. Além disso, outros projetos estãoem andamento.

(Fonte: Marcelo Sá, inspetor de UltraSom N. II do Eisa, por e-mail)

Em solenidade realizada no Palácio doPlanalto, em Brasília, o Presidente da Re-pública, Luiz Inácio Lula da Silva, sancio-nou, em 25 de agosto último, a lei que es-trutura a Nova Defesa.

A lei, resultado do Projeto de Lei daCâmara (PLC) 10/2010, é o principal ato re-sultante da Estratégia Nacional de Defesa,de dezembro de 2008, e abre espaço para areestruturação da Defesa e a execução denovas tarefas e obrigações, especialmentena coordenação das Forças Armadas e naintegração da área de defesa com o projetode desenvolvimento nacional.

Os comandantes das três Forças Arma-das estiveram presentes à cerimônia: Almi-rante Julio Soares de Moura Neto, da Ma-rinha; General Enzo Martins Peri, do Exér-cito; e Brigadeiro Juniti Saito, da Aeronáu-tica. Eles receberam do ministro da Defesa,Nelson Jobim, o agradecimento pelo apoiona definição da nova estrutura.

O novo marco legal modifica a Lei Com-plementar no 97/95, que dispõe sobre asnormas gerais para a organização, o prepa-ro e o emprego das Forças Armadas. “Tudoo que fazemos hoje faz parte do redesenhoda Defesa”, disse Jobim. A alteração da Lei

LEI DA NOVA DEFESAComplementar 97, segundo Jobim, insere oMinistério da Defesa na cadeia de coman-do das Forças. “Antes o ministro ficava nalateralidade, como chefe administrativo”,explicou.

Uma das mudanças mais imediatas seráa criação do Estado-Maior Conjunto dasForças Armadas (EMCFA), a ser ocupadopor um oficial-general do último posto (qua-tro estrelas) da ativa ou da reserva. Se forda ativa, irá automaticamente para a reser-va após a nomeação, a exemplo do que jáocorre com os comandantes de Força. Parao cargo, foi nomeado o General de ExércitoJosé Carlo De Nardi, até então comandan-te Militar do Sul.

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O chefe do EMCFA é indicado pelo mi-nistro da Defesa e nomeado pelo Presiden-te da República, da mesma forma que ocor-re com os comandantes. Ele terá o mesmonível hierárquico dos comandantes dasForças e ascendência sobre todos os de-mais militares de qualquer Força, excetosobre os comandantes das mesmas.

A criação do Estado-Maior Conjuntodas Forças Armadas altera a doutrina dasações combinadas até então em vigor: com-petirá ao chefe do EMCFA o emprego, eaos comandantes das Forças, o preparo.Outra mudança é que o ministro da Defesa,além de passar a indicar os comandantesde Força, para posterior decisão do Presi-dente, também escolherá livremente osseus secretários, inclusive os militares.

A alteração da doutrina e a criação doEstado-Maior Conjunto permitirão, segun-do o ministro Jobim, uma atuação integra-da das Forças Armadas. Hoje, em exercíci-os militares conjuntos, elas atuam sob umcomando combinado e, com a criação doEMCFA, passarão a atuar sob um coman-do conjunto, que pode ser de outra Força.

O Projeto de Lei também traz para o Mi-nistério da Defesa a formulação da propos-ta orçamentária das Forças e a definição depolíticas e diretrizes de produtos de Defesa,inclusive equipamentos, munições e

fardamento, que será executada pela futuraSecretaria de Produtos de Defesa. As com-pras continuarão sendo feitas pelas Forças.A proposta orçamentária destas será elabo-rada em conjunto com o Ministério da Defe-sa, que a consolidará, obedecendo às prio-ridades estabelecidas na Estratégia Nacio-nal de Defesa, explicitadas na Lei de Diretri-zes Orçamentárias. Até então, os orçamen-tos eram feitos separadamente pelas For-ças, e o Ministério da Defesa os compati-bilizaria e os enviaria ao Ministério do Pla-nejamento. O ministro Jobim alterou na prá-tica essa sistemática e agora consolida onovo procedimento na Lei.

A nova Lei também facilita o patrulhamentode fronteiras, ao estender à Marinha e à For-ça Aérea o mesmo poder de que o Exército jádispunha: fazer patrulhamento, revista e pri-são em flagrante, entre outros. Esse poderhavia sido outorgado ao Exército em 2004,quando houve uma primeira mudança na LeiComplementar 97.

Outra alteração feita no mesmo ano deu àForça Aérea poder de patrulhamento do es-paço aéreo brasileiro total. Mas em solo, nomar e nas águas interiores, a Marinha e aForça Aérea Brasileira continuavam impedi-das de patrulhar crimes transfronteiriços.Mas as Forças Armadas só agirão de formacomplementar ou articulada com as polícias,sem substituí-las nas fronteiras. O inquéritocontinuará sendo atribuição da polícia.

De acordo com a nova Lei, os atos pra-ticados por militares no cumprimento demissões em operações subsidiárias serãojulgados pela Justiça Militar. Essa mudan-ça dá segurança jurídica às operações sub-sidiárias e aos militares que nelas atuam. Alei anterior dava margem a interpretaçõesdistintas dos juízes.

Destacam-se, ainda, como pontos im-portantes da nova Lei:

– Os comandantes de Força ficarão res-ponsáveis pelo adestramento das tropas,

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e o emprego dessas tropas passará a serde responsabilidade do chefe do EMCFA.

– Determina ao Ministério da Defesa aimplantação do Livro Branco de DefesaNacional, documento de caráter públicoque deverá conter dados estratégicos, or-çamentários, institucionais e materiais de-talhados sobre as Forças Armadas, abor-dando os seguintes tópicos:

I – cenário estratégico para o séculoXXI;

II – política nacional de defesa;III – estratégia nacional de defesa;IV – modernização das Forças Armadas;V – racionalização e adaptação das es-

truturas de defesa;VI – suporte econômico da defesa naci-

onal;VII – as Forças Armadas: Marinha, Exér-

cito e Aeronáutica;VIII – operações de paz e ajuda

humanitária.

Também será editada Medida Provisó-ria que cria cargos para chefe do EMCFA edois novos secretários (cria cargo de che-fe do Estado-Maior Conjunto das ForçasArmadas e dois cargos DAS-6 para os doisnovos secretários, sem aumento de despe-sas, por meio da transformação e extinçãode 61 Funções Comissionadas Técnicasvagas, do nível FCT-14). Os dois cargosDAS-6 serão para os titulares das novassecretarias que serão criadas: Secretaria deProdutos de Defesa e Secretaria de Pesso-al, Ensino, Saúde e Desporto.

A Secretaria de Pessoal, Ensino, Saúdee Desporto terá a incumbência de integraras áreas de gestão de pessoal civil e militardo Ministério e dos Comandos, cumprin-do, desta forma, papel importante no pla-nejamento, avaliação, acompanhamento econtrole de considerável efetivo de servi-dores, cujo alinhamento de políticas, espe-cialmente de formação de pessoal, é cen-

tral para o bom desempenho das forças e aplena realização da END.

Já a Secretaria de Produtos de Defesaatuará, entre outras áreas, na formulação eatualização de política nacional da indústriade defesa, bem como no acompanhamentoda sua execução e, ainda, na formulação eatualização da política de compras de pro-dutos de defesa (a execução das comprascontinuará sendo feita pelas Forças, de acor-do com as diretrizes da Secretaria da Defe-sa). A atual estrutura regimental do Ministé-rio da Defesa possui quatro secretarias, emconformidade com sua estrutura básica de-finida no inciso VII, Art. 29 da Lei no 10.683,de 28 de maio de 2003, a saber: Secretaria dePolítica, Estratégia e Assuntos Internacio-nais; Secretaria de Ensino, Logística,Mobilização e Ciência e Tecnologia; Secre-taria de Aviação Civil; e Secretaria de Orga-nização Institucional. No novo desenhoorganizacional, a Secretaria de Política, Es-tratégia e Assuntos Internacionais e a deEnsino, Logística, Mobilização e Ciência eTecnologia, atualmente chefiadas por ofici-ais-generais que recebem gratificação deexercício de cargo em confiança devida aosservidores militares, passarão a integrar che-fias vinculadas ao chefe de Estado-Maiordas Forças Armadas.

Os secretários do Ministério da Defesaserão livremente escolhidos pelo Ministroda Defesa, respeitadas as peculiaridades eas funções de cada Secretaria. Desse modo,visa-se garantir o equilíbrio estrutural noMinistério da Defesa (antes, os secretári-os militares eram indicados pelas ForçasArmadas).

O Projeto de Lei que dispõe sobre a cri-ação de cargos destinados à nova estrutu-ra do Ministério da Defesa cria 227 cargose 251 gratificações, no total de 488, ao cus-to anual de R$ 18,95 milhões. São os meiosnecessários para que o Ministério da De-fesa implemente a Estratégia Nacional de

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Defesa (END) e aumente sua capacidadede coordenar a ação das Forças Armadasna execução das funções planejamento,orçamento, aquisição de produtos de de-fesa, preparação do pessoal militar, entreoutros objetivos.

Se aprovado o projeto como está, o Mi-nistério passará de 1.187 servidores (609civis e 578 militares) para 1.675 servidores(864 civis e 813 militares).

A Defesa, quando da sua criação, rece-beu uma estrutura organizacional, com umnúmero de cargos em comissão e de fun-ções compatível com o tamanho idealizadoà época. Ao longo do tempo, além de atuarcomo órgão formulador, coube ao Ministé-rio da Desfesa conduzir projetos de inte-resse governamental, tais como o ProjetoCalha Norte, o Projeto Soldado-Cidadão eo Projeto Rondon.

A estrutura, que já era insuficiente paraaquela realidade, recebeu ainda mais en-cargos com as novas diretrizes e obriga-ções estabelecidas pela Estratégia Nacio-nal de Defesa, tornando imperiosa areestruturação do Ministério.

Já o Decreto que estabelece a EstruturaMilitar de Defesa substitui a Estrutura Mi-litar de Guerra , estabelecida pelo DecretoReservado no 8, de 17 de janeiro de 1980,pela Estrutura Militar de Defesa. O minis-

tro da Defesa é inserido na cadeia de co-mando, abaixo do comandante supremo, oPresidente da República.

Embora cada força singular tenha suasparticularidades na área de ensino, faz-senecessário fixar uma política que reúnaobjetivos e preceitos comuns com a finali-dade de ampliar os aspectos atinentes àDefesa Nacional e também contribuir como processo de interação entre instituiçõesmilitares e civis.

A Política de Ensino de Defesa é uma ini-ciativa conjunta dos Ministérios da Defesa eda Educação que tem o objetivo de inserir otema Defesa na agenda nacional, como pre-conizado na Estratégia Nacional de Defesa, epromover maior engajamento da sociedade,em particular do meio acadêmico civil, comos assuntos de defesa. A iniciativa tambémtem o objetivo de promover maior aproxima-ção entre militares e civis, contribuindo parao fortalecimento da democracia brasileira.Visa, ainda, cooperar na área do ensino dedefesa com países de interesse, em conso-nância com a Política Externa Brasileira, emespecial na América do Sul.

(Fonte: Assessoria de Comunicação So-cial do Ministério da Defesa, em https://www.defesa.gov.br/mostra_materia.php?ID_MATERIA=34408, em 31 de agosto de2010)

Foi realizada, na manhã de 17 de junhoúltimo, na Base Almirante Castro e Silva(BACS), Ilha de Mocanguê (Niterói-RJ), aMostra de Armamento do Aviso de Pes-quisa (AvPq) Aspirante Moura. A cerimô-nia contou com a presença do comandanteda Marinha, Almirante de Esquadra JulioSoares de Moura Neto. A mãe do Aspiran-te José Claudio Soares de Moura, LourençaSoares de Moura, foi a madrinha do navio.

MOSTRA DE ARMAMENTO DO AVISO DE PESQUISAASPIRANTE MOURA

Na tarde do mesmo dia, aconteceu, tam-bém na BACS, a cerimônia de Transferên-cia de Subordinação do navio para a Se-cretaria de Ciência, Tecnologia e Inovaçãoda Marinha.

Transcrevemos abaixo as Ordens do Diado chefe do Estado-Maior da Armada(Cema), Almirante de Esquadra MarcosMartins Torres, e do diretor-geral do Ma-terial da Marinha, Almirante de Esquadra

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Luiz Umberto de Mendonça, relativas, res-pectivamente, à Mostra de Armamento e àTransferência de Subordinação do AvPqAspirante Moura.

ORDEM DO DIA DO CEMA

“Em cumprimento ao disposto na Porta-ria no 221 de 9 de junho de 2010, do coman-dante da Marinha, e conforme previsto noartigo 1-3-1 da Ordenança Geral para o Ser-viço da Armada, realiza-se, na presente data,a Mostra de Armamento do Aviso de Pes-quisa Aspirante Moura.

A aquisição desse aviso de pesquisa éfruto da parceria entre a Marinha do Brasile o Ministério da Ciência e Tecnologia. Seráempregado como mais um ‘LaboratórioNacional Embarcado’, contribuindo com aspesquisas de interesse da Marinha e dacomunidade científica nacional, realizadaspelo Instituto de Estudos do Mar Almiran-te Paulo Moreira (IEAPM), localizado emArraial do Cabo, na costa fluminense, ondeficará sediado. Foi preparado para abrirnovos horizontes de pesquisa das ciênci-as do mar, em especial nas áreas de Ocea-nografia Física e Química, Geologia e

Geofísica Marinhas, Oceanografia Biológi-ca e Acústica Submarina.

O navio foi construído nos EstaleirosBrodogradiliste (Croácia), em 1987, ocasiãoem que ostentou o nome de ResearchVessel R/V Finder e pertencia à empresaFind and Recover Ltd.

Foi incorporado à Marinha do Brasilcomo navio de 4a Classe, em cerimônia rea-lizada no dia 25 de janeiro do corrente ano,na cidade de Sandefjord (Noruega). Desdeentão, vem operando como navio isoladoe passa hoje a operar como navio solto –denominação empregada para navio daArmada, não pertencente a uma Força Na-val. Ficará subordinado ao IEAPM, exibin-do o indicativo de costado U-14. Incorpo-ra, em sua estrutura, uma inovação na Ma-rinha do Brasil, pois será o primeiro dosnossos navios a navegar sem o uso deleme, substituído por dois hélices azimutais,integrados a um sistema de piloto automá-tico e cartas náuticas eletrônicas.

A escolha da denominação AspiranteMoura é uma justa homenagem ao aspi-rante da Escola Naval José Cláudio Soaresde Moura, falecido na madrugada de 12 dejunho de 1966. Sua turma da Escola Naval

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passou a se chamar Turma AspiranteMoura, assim carinhosamente nomeada emhomenagem àquele que foi mais que umcompanheiro. Foi um amigo, querido portodos pela sua simpatia, jovialidade e ale-gria. O ‘Mourinha’, assim conhecido pe-rante seus pares, emprestou seu nome àturma de 155 aspirantes nomeados a guar-da-marinhas em 13 de dezembro do mesmoano de 1966. Sua mãe, Sra. Lourença Soa-res de Moura, nos honra em ser a madrinhadeste navio, e seu filho primogênito, o Al-mirante de Esquadra Júlio Soares de MouraNeto, é o atual comandante da Marinha.

Neste especial e solene momento, comorgulho e alegria, é concretizada uma anti-ga aspiração do IEAPM. Expresso ao co-mandante, à oficialidade e guarnição doAspirante Moura votos de felicidades emsuas futuras comissões e de pleno êxitoem sua nobre e relevante missão. Tenho acerteza de que serão dedicados, profissio-nais e extremamente zelosos com esse belopatrimônio que lhes é entregue pela Naçãobrasileira e, acima de tudo, concito que si-gam o exemplo de seriedade, denodo, pa-triotismo e destemor daqueles que honrame defendem o Pavilhão Nacional, que

doravante tremulará aomesmo tempo que aFlâmula de Comando e,na proa, a Bandeira doCruzeiro. Lembrem-seque os assuntos domar requerem trabalhoárduo, continuado eincansável, e a qualida-de de seus frutos refle-te o valor dos navios,dos marinheiros, dacultura e das tradiçõesnavais, assegurando odestino do Brasil comoum país livre e sobera-no, orgulhoso do pas-

sado e confiante no futuro.Aspirante Moura, que o Senhor dos

Navegantes seja integrante permanente emsuas ‘partes de saída’, para que bons ventose mares tranquilos sempre o acompanhem.”

ORDEM DO DIA DO DGMM

“Como resultado do êxito da parceria daMarinha do Brasil com o Ministério da Ciên-cia e Tecnologia, hoje realizamos a transfe-rência de subordinação do Aviso de Pesqui-sa Aspirante Moura, data de especial signifi-cado para todos aqueles que participaramdireta ou indiretamente deste projeto.

Em novembro de 2009, a Marinha deci-diu adquirir, por oportunidade, em parceriacom o Ministério da Ciência e Tecnologia,a embarcação de pesquisa Finder, perten-cente à empresa FAR Ltd., construída noEstaleiro Brodogradiliste, em Split, Croácia,em 1987.

Para melhor atender às necessidades daMarinha do Brasil, o navio recebeu peque-nas obras de adequação, como instalaçãode novos radares, integração de equipamen-tos de pesquisa científica e instalação dedois contêineres adaptados para serem uti-

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lizados como laboratórios de pesquisa secoe úmido. O Aviso de Pesquisa AspiranteMoura insere um arranjo inovador na Mari-nha, pois é o primeiro a não possuir o lemetradicional, substituído por hélicesazimutais, integrados a um sistema de pilotoautomático e cartas náuticas eletrônicas.

O Aviso de Pesquisa Aspirante Mouraserá subordinado ao Instituto de Estudosdo Mar Almirante Paulo Moreira (IEAPM)e operará como ‘Laboratório Nacional Em-barcado II’, contribuindo com as pesqui-sas de interesse da Marinha e da comuni-dade científica nacional.

Dentre as atividades a serem executa-das, destacam-se:

– apoio ao ensino, desenvolvido comalunos de graduação e pós-graduação;

– monitoramento de recifes artificiais;– apoio ao combate a agentes poluidores

do mar;– coleta de dados oceanográficos que

influenciam os sistemas de correntes mari-nhas e o clima;

– avaliação e teste de sistemas de pro-pagação da energia acústica; e

– realização de ação de presença naságuas jurisdicionais brasileiras.

Representa, assim, elemento de impor-tância fundamental para o cumprimento daPolítica Marítima Nacional, voltada a ori-entar e subsidiar o desenvolvimento das

atividades marítimas do País, com o propó-sito de assegurar a utilização efetiva, raci-onal e plena do mar.

Seu nome é uma homenagem ao Aspi-rante José Cláudio Soares de Moura, queingressou na Escola Naval em 1963 e fale-ceu em acidente no dia 12 de junho de 1966.

Na ocasião em que transfiro a subordina-ção do Aviso de Pesquisa Aspirante Mouraà Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inova-ção da Marinha, não poderia deixar de regis-trar os meus sinceros cumprimentos pelodestacado trabalho do seu comandante, oCapitão-Tenente Claudio Luis Estrella Perei-ra, e de sua valorosa tripulação, bem comodo Grupo de Recebimento, que, em um paísde língua e costumes diferentes dos nossos,formaram uma equipe unida, competente eapta a conduzir o processo de recebimentodo meio com determinação e profissionalismo.A rápida familiarização com as operações donavio permitiu que a travessia de 34,5 dias demar e 6.481,5 milhas navegadas de Sandefjordao Rio de Janeiro fosse realizada de formasegura, mostrando, desde já, o futuro de su-cesso e sorte que está reservado ao Aviso dePesquisa Aspirante Moura.

Ao navio e à sua tripulação, expressoos meus votos de bons ventos e marestranquilos! Bravo Zulu!”

(Fontes: Bono no 388, de 10/6/2010 eBonos Especiais nos 400 e 401, de 17/6/2010)

Foi realizada em 16 de junho último aMostra de Ativação da Unidade MédicaExpedicionária da Marinha (Umem).

A cerimônia aconteceu no ComplexoNaval da Ilha das Flores (Niterói-RJ) e foipresidida pelo comandante de OperaçõesNavais (CON), Almirante de EsquadraMarcus Vinicius Oliveira dos Santos.

Transcrevemos abaixo a Ordem do Diado CON.

MOSTRA DE ATIVAÇÃO DA UMEM

“Concretiza-se, no âmbito do SetorOperativo, uma antiga aspiração da Mari-nha, qual seja a de possuir uma Organiza-ção Militar especialmente destinada às li-des da medicina de combate. Com a ativa-ção da Unidade Médica Expedicionária daMarinha (Umem), na presente data, estalacuna passa a ser preenchida, em conso-nância com as diretrizes emanadas pelaEstratégia Nacional de Defesa.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Criada por meio da Portaria no 331, de 28de setembro de 2009, do Comandante daMarinha, dentro da Estrutura Organizacionaldo Comando da Marinha, a Umem, Organi-zação Militar com semiautonomia adminis-trativa, passa a ser apoiada pela Base deFuzileiros Navais da Ilha das Flores, direta-mente subordinada ao Comando da Tropade Reforço. O propósito de sua missão é ode prestar apoio de saúde às operações dosGrupamentos Operativos de Fuzileiros Na-vais; operar uma Unidade Médica NívelDois, no contexto das operações de paz ede ajuda humanitária e em outras operações,a critério da Administração Naval; e prestarapoio limitado de saúde aos militares doComplexo Naval da Ilha das Flores, em nívelprimário.

Fruto da crescente participação brasi-leira nesses tipos de operações, a nova OMpossibilitará ao Setor Operativo desenvol-ver atividades de medicina operativa, comelevado grau de aprestamento, para aten-

der às demandas na área de saúde que sefizerem presentes, e no apoio de serviço aocombate prestado aos GrupamentosOperativos de Fuzileiros Navais. Para tan-to contará, no aspecto material, inicialmen-te, com um Hospital de Campanha (HCamp).Em um segundo momento, ainda ao longode 2010, receberá um novo, maior e maiscompleto HCamp que se encontra em fasede aquisição pelo Centro de MedicinaOperativa da Marinha (CMOpM).

Ao diretor, que ora assume, e aos oficiaise praças que compõem a tripulação da Umem,ressalto a grande responsabilidade que te-rão pela frente, com a implantação e consoli-dação desta nova OM. Exorto-os a se dedi-carem inteiramente em fazê-la ser, desde seunascimento, um modelo de eficácia, com altograu de eficiência, na execução dasdesafiantes atividades da medicina operativa.

Bons ventos e mares tranquilos à Umem!Adsumus!”.

(Fonte: Bono no 396, de 15/6/2010)

Foi realizada, em 30 de julho último, acerimônia de Mostra de Desativação doCentro de Armas da Marinha (CAM), noRio de Janeiro.

As atribuições de responsabilidade doCentro passarão a ser desempenhadas pelo

MOSTRA DE DESATIVAÇÃO DO CENTRODE ARMAS DA MARINHA

Centro de Manutenção de Sistemas daMarinha (CMS), para onde, desde aqueladata, estão sendo direcionados os pedi-dos de serviço, expedientes, mensagens ecorrespondências.

(Fonte: Bono no 509, de 27/8/2010)

O Centro de Instrução e AdestramentoAeronaval (CIAAN) passou a chamar-seCentro de Instrução e AdestramentoAeronaval Almirante José Maria do AmaralOliveira, em homenagem ao oficial, faleci-do em 19 de maio deste ano. A alteração da

O CENTRO DE INSTRUÇÃO EADESTRAMENTO AERONAVAL

ALMIRANTE JOSÉ MARIA DO AMARAL OLIVEIRA

denominação se deu pela Portaria no 456/MB do comandante da Marinha.

Em 22 e 23 de agosto, foram realizadasem São Pedro da Aldeia (RJ) as cerimôniasmilitares alusivas à alteração de denomina-ção do Centro: no dia 22, aconteceu, no

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Campo de Esportes do CIAAN, a inaugu-ração do Memorial do Almirante de Esqua-dra Amaral; no dia seguinte, foi a vez dacomemoração do 94o aniversário da Avia-ção Naval, com descerramento de placa eentrega da espada do Almirante.

O Almirante José Mariado Amaral Oliveira teve umalonga carreira na Marinha doBrasil e será eternamentelembrado pela sua contribui-ção ao renascimento daAviação Naval. Em 1956, oentão Capitão de Corveta(CC) Amaral foi designadopara exercer a função de ime-diato do CIAAN e, de janei-ro a abril de 1958, foi coman-dante interino do Centro.Coube ao CC Amaral a for-mulação dos subsídios paraa criação do primeiro esqua-drão de aeronaves da Mari-nha, o 1o Esquadrão de He-licópteros de Emprego Geral (Esqd HU-1),do qual, em 1962, foi o primeiro comandan-te. Como comandante da Força Aeronaval,de 1976 a 1979, ativou a Comissão de Inspe-ção e Assessoria de Adestramento da ForçaAeronaval, que implementou as inspeções

de fase nos esquadrões. A essa época, tam-bém foram recebidos os primeiros helicóp-teros Linx e foi ativado o 1o Esquadrão deHelicópteros de Esclarecimento e Ataque(Esqd HA-1). Nesse período, a Base AéreaNaval de São Pedro da Aldeia foi ampliada,

com a construção de novoshangares, pista adicional eplataforma de treinamento decarga leve. No CIAAN, foramconstruídas as instalaçõespara adestramento de comba-te a incêndio e entraram emfuncionamento os simulado-res de voo.

O Almirante de EsquadraJosé Maria do Amaral Olivei-ra foi transferido para a reser-va da Marinha em 13 de se-tembro de 1986, após dedicar-se por mais de 44 anos ao ser-viço da Nação.

O que melhor resume suadedicação à Marinha e, espe-

cialmente, à Aviação Naval são as 2.726 ho-ras voadas desde a sua qualificação para voocomo capitão-tenente até o posto de almi-rante de esquadra, quando ele mesmo pilota-va seu Esquilo, o N-7050, nos deslocamen-tos como comandante de Operações Navais.

ASSUNÇÃO DE CARGOS POR ALMIRANTES

– Contra-Almirante Victor Cardoso Go-mes, subchefe de Organização e AssuntosMarítimos do Comando de Operações Na-vais, em 2/8;

– Almirante de Esquadra Arthur PiresRamos, diretor-geral do Material da Mari-nha, em 5/8;

– Contra-Almirante (IM) SamyMoustapha, presidente da Caixa de Cons-truções de Casas para o Pessoal da Mari-nha, em 10/8;

– Contra-Almirante Nilo Moacyr PenhaRibeiro, chefe do Estado-Maior do Coman-do do 1o Distrito Naval, em 11/8;

– Contra-Almirante Antonio FernandoMonteiro Dias, diretor do Pessoal Militarda Marinha, em 12/8;

– Contra-Almirante (IM) Walter Lucasda Silva, diretor do Centro de Controle deInventário da Marinha, em 18/8;

– Almirante de Esquadra Luiz Umbertode Mendonça, comandante de Operações

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Navais e diretor-geral de Navegação, em19/8;

– Almirante de Esquadra MarcusVinicius Oliveira dos Santos, chefe do Es-tado-Maior da Armada, em 26/8;

– Contra-Almirante Luís AntônioRodrigues Hecht, gerente do Empreendimen-to Modular de Obtenção do Submarino dePropulsão Nuclear da Coordenadoria-Geral do

Programa de Desenvolvimento de Submarinocom Propulsão Nuclear (Cogesn), em 31/8;

– Contra-Almirante (IM) José RicardoCampos Vieira, diretor de Abastecimentoda Marinha, em 9/9;

– Contra-Almirante (IM) Jamil Meron Fi-lho, diretor administrativo-financeiro daEmpresa Gerencial de Projetos Navais(Emgepron), em 16/9;

O Almirante de Esquadra MarcusVinicius Oliveira dos Santos assumiu, em26 de agosto último, o cargo de chefe doEstado-Maior da Armada, em substituiçãoao Almirante de Esquadra Marcos MartinsTorres. A cerimônia de Transmissão deCargo foi presidida pelo comandante daMarinha, Almirante de Esquadra Julio Soa-res de Moura Neto.

TRANSMISSÃO DO CARGO DE CHEFE DOESTADO-MAIOR DA ARMADA

AGRADECIMENTO DO ALMIRANTETORRES

“Talvez este seja um dos momentos maisdifíceis da minha vida pessoal e profissio-nal: deixar de viver o dia a dia na Marinha.Por mais que se prepare, psicologicamen-te, durante a carreira, ao chegar o momentoqualquer um baqueia, mesmo na minha si-

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tuação, em que tive o privilégio de ser no-meado para o cargo de ministro do Superi-or Tribunal Militar. A partir de agora, pas-sarei a ser um juiz-almirante.

Minha vida na Marinha não se resumiuaos meus 45 anos de serviço. Começou bemantes, quando ainda criança de calças cur-tas, meu pai e meu tio – oficiais de Marinha– levaram-me a conhecer os conveses dosantigos “caça-pau”, classe “M” e cruzado-res. Esse despertar para a carreira naval foise transformando em amor quando posteri-ormente, vivendo em vilas navais, pudecompartilhar com muitos a admiração pelavida marinheira. Aprendi nesta experiênciaa cultivar todos os atributos que um homemdo mar deve possuir, principalmente aque-les que considero principais para a institui-ção: lealdade, disciplina, hierarquia e res-peito aos superiores e subordinados.

E, assim, tracei minha vida e cheguei aoalmejado posto de almirante de esquadra.Tenho certeza de que sentirei muita faltado convívio diário na Marinha, mas comojá foi dito e confirmado que recordar é vi-ver, terei sempre em minha mente aquelesnavios em que embarquei, principalmenteo que comandei – o ContratorpedeiroAlagoas –, onde tive o privilégio de ter umatripulação eficiente e adestrada, responsá-vel, sem dúvida, pela outorga do título denavio mais eficiente no ano de 1990 (Tro-féu Echo), como também as operações queparticipei com a Esquadra e com as maisdiversas Marinhas estrangeiras, não po-dendo esquecer aquelas organizações emterra que tive a oportunidade de dirigir.

Hoje, ao encerrar esta longa e prazerosasingradura, iniciada em 1965 como aspiran-te da Escola Naval, pertencente à queridaTurma Almirante Cox, e que aqui terminono Estado-Maior da Armada, posso cons-tatar que a nossa instituição está mais pro-fissional, mais atualizada, mais promissorae mais bem estruturada para contornar to-

dos aqueles desafios que levarão, a médioe a longo prazo, a sua necessária projeçãono cenário mundial, compatível com as di-mensões do nosso país.

Considero-me muito feliz por ter segui-do a carreira naval. Tenho plena consciên-cia de que tudo o que sou e o que tenhodevo a minha Marinha. Sou, e sempre se-rei, um marinheiro, onde eu estiver.

Sou grato a todos que estiveram comi-go nesta jornada.

Manifesto ao Excelentíssimo Dr. NelsonJobim, ministro de Estado da Defesa, o re-conhecimento, a amizade e a admiraçãonascidos desde o momento em que fui seuchefe do Estado-Maior de Defesa até osdias de hoje. O senhor, à frente de nossoMinistério, deu a nós militares novos hori-zontes e confiança no chefe, ao lutar pelasnossas causas e iniciar o tão necessárioprocesso de reestruturação e de reapare-lhamento de nossas Forças.

Ao comandante da Marinha, Excelentís-simo Senhor Almirante de Esquadra JulioSoares de Moura Neto, expresso também omeu reconhecimento e apreço por tudo oque tem feito pela nossa Força. O senhortem de seus subordinados – do marinheiroe fuzileiro naval mais moderno ao almirantemais antigo – o respeito pela sua liderança,capacidade e conhecimento profissional,atributos esses que se desenvolveram des-de sua época de tenente. Agradeço tantoas suas palavras referentes à minha pes-soa constantes em Ordem de Serviço, comotambém a indicação do meu nome para oSuperior Tribunal Militar.

Ao comandante do Exército, General deExército Enzo Martins Peri, e ao comandan-te da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro doAr Juniti Saito, manifesto a minha amizade emeu apreço e agradeço, também, o apoio desuas Forças ao Estado-Maior da Armada.

Aos membros do Almirantado, meusagradecimentos pela cordial e estimulante

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convivência, realçando o valor inestimá-vel da amizade com que me honraram. QueDeus os protejam em suas decisões na con-dução da Marinha.

Agradeço a todos aqueles chefes na-vais cujos ensinamentos foram fundamen-tais na construção de minha carreira. Foium privilégio tê-los como chefes.

Agradeço a todos os militares e servi-dores civis aqui presentes, pela demons-tração de apreço com que fui distinguidoem diversas oportunidades.

Aos almirantes do Estado-Maior da Ar-mada, da Representação Permanente Bra-sileira Junto à Organização Marítima Inter-nacional, das Organizações Militares su-bordinadas, da Comissão de Promoções deOficiais, meus oficiais de Gabinete e res-pectivos oficiais, praças e servidores ci-vis, agradeço a leal e preciosa assessoria,colaboração e espírito de cooperação de-monstrados no período em que serviramsob minhas ordens.

Aos componentes da Turma AlmiranteCox, que comigo iniciaram a jornada quehoje concluo em parte, agradeço o incenti-vo e, sobretudo, a amizade, nascida quan-do ainda jovens, na Escola Naval.

Aos oficiais e praças do meu Gabinete,que me têm acompanhado por mais de dezanos, meu reconhecimento pela lealdade,profissionalismo e perfeito relacionamento.

A minha família, em especial a minhaesposa Helena e filhas, e àquelas pessoasque passei a ter como amigas ao longo daminha carreira, o meu eterno agradecimen-to pelo apoio, o carinho, a compreensão eo amor ao longo desta longa viagem.

A Deus, por ter me permitido realizar estasingradura e me permitir que inicie outracomo juiz-almirante. Que me ilumine emminhas futuras decisões.

Finalmente, Almirante de EsquadraMarcus Vinicius Oliveira dos Santos, esti-mado amigo e companheiro de longa jor-

nada, pertencente também à Turma Almi-rante Cox, transmito o cargo com a convic-ção de que continuará no Estado-Maior daArmada a sua trajetória de bem servir àMarinha. Seja muito feliz, votos que esten-do à sua família.

Muito obrigado.”

AGRADECIMENTO E BOAS-VINDASDO COMANDANTE DA MARINHA

“O Almirante de Esquadra MarcosMartins Torres encerra, na presente data,uma significativa fase de sua trajetória pro-fissional, em virtude de ter sido transferidopara o Quadro Suplementar e estar se pre-parando para assumir o importante cargode ministro do Superior Tribunal Militar.

Com toda certeza, em sua mente ressaltamas sensações decorrentes de uma despedi-da, ocasião em que sobressaem inúmeras re-flexões sobre tudo o que foi vivido. Normal-mente, nesses momentos são reconstruídasna memória as boas passagens experimenta-das, a camaradagem construída e as tarefascorretamente executadas.

Foram pouco mais de seis meses à fren-te do Estado-Maior da Armada, o que, en-tretanto, resultou em uma significativagama de assuntos bem conduzidos.

Marinheiro de invulgares qualidades, taiscomo educação civil e militar, sensatez, dina-mismo, segurança, bom humor e responsabi-lidade, o Almirante Torres soube, nas ocasi-ões mais difíceis, transmitir-me a necessáriatranquilidade para que fossem conduzidasas devidas correções de rumo, no intuito delevar a nossa Força a dar passos seguros,visando sempre ao seu crescimento.

Declarado guarda-marinha em 13 de de-zembro de 1968, sua exemplar carreira teveinício a bordo do Navio-Varredor Juruena,seguida de diversas outras comissõesembarcadas até chegar ao seu primeiro co-mando no mar, no Contratorpedeiro

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Alagoas. Já como almirante, foi subchefede Operações do Comando de OperaçõesNavais; comandante da 1a Divisão da Es-quadra e do Centro de Instrução AlmiranteAlexandrino; diretor do Pessoal Civil e dePortos e Costas; secretário de Logística,Mobilização, Ciência e Tecnologia e chefedo Estado-Maior de Defesa do Ministérioda Defesa; e secretário-geral da Marinha.

Cabe-me, ainda, mencionar algumas re-alizações, decorrentes de sua gestão à fren-te do Estado-Maior da Armada, que o evi-denciaram como um chefe competente econhecedor das lides navais:

– formulou as instruções básicas para aorganização da Estrutura de Guerra Ciber-nética na Marinha do Brasil;

– supervisionou a 5ª reunião do Conse-lho de Tecnologia de Informação da Mari-nha, quando foram definidas as primeirasações para a implantação do software livre edos Centros Locais de Tecnologia da Infor-mação nos Distritos Navais, a Gerência Ele-trônica de Documentos (GED) e as normaspara Preservação e Certificação Digitais;

– coordenou a organização do segundocontingente de Fuzileiros Navais, a seracrescido ao que já se encontrava operan-do no Haiti;

– estabeleceu as diretrizes para a nossaparticipação no Centro Conjunto de Ope-rações de Paz do Brasil;

– realizou gestões com o Ministério daSaúde para obtenção de um novo navio deassistência hospitalar para a Amazônia;

– promoveu os entendimentos, junto aosMinistérios da Defesa e das Relações Exte-riores, para a assinatura do Ajuste Técnicode Cooperação com a Marinha Militar italia-na para obtenção de meios de superfície;

– orientou a nossa atuação na ajuda aosdesabrigados pelas enchentes em Alagoase Pernambuco;

– assinou Termo de Cooperação com oEstado-Maior da Aeronáutica para a ma-

nutenção da qualificação de pilotos navaisem aeronaves Super-Tucano; e

– com respeito à Mobilização Marítima,aprovou a segunda revisão do respectivoManual e estabeleceu as diretrizes para oII Seminário sobre esse assunto.

Assim, não posso deixar de agradecer asua colaboração leal e desapegada, voltadapara os interesses maiores da instituição.Estou plenamente convicto de que a honro-sa indicação para o Supremo Tribunal Mili-tar, onde em breve se apresentará, é o tácitoreconhecimento por sua inquestionável fo-lha de serviços prestados à Força e ao Brasil.

Almirante Torres! Reafirmo a honra e aalegria que foi tê-lo no convívio de trabalhodiário. No instante em que o prezado amigode muitas travessias vê ser arriado o seupavilhão no mastro principal do Estado-Maior da Armada, gostaria que aceitasse osagradecimentos por uma vida inteiramentededicada à nossa querida Marinha. Façovotos de que sua nova jornada, que ora seinicia, seja repleta de realizações e coroadade êxitos, desejando-lhe muitas felicidades,extensivas a sua esposa Helena e família.

Que Deus o abençoe. Seja muito feliz!Ao Almirante de Esquadra Marcus

Vinicius Oliveira dos Santos, apresento asboas-vindas, na certeza de que seus sóli-dos conhecimentos e sua experiência, alia-dos aos seus reconhecidos atributos pro-fissionais e pessoais, garantirão a conti-nuidade dos trabalhos desenvolvidos peloEstado-Maior da Aramada, ao mesmo tem-po que formulo votos de pleno sucesso nacomissão que lhe está sendo cometida.”

PALAVRAS INICIAIS DOALMIRANTE VINICIUS

“Cônscio das minhas responsabilidades,assumo, com extremo orgulho profissional,a chefia do Estado-Maior da Armada. Possotambém assegurar que esta posse vem ma-

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terializar um projeto pessoal imaginado du-rante 47 anos da minha carreira e que hoje,com justificado entusiasmo, vejo alcança-do. É claro que neste momento passam pelaminha mente lembranças felizes de todo esseperíodo dedicado à Marinha, desde os ban-cos escolares do Colégio Naval, em 1963,com apenas 15 anos, até o dia de hoje, emque assumo este cargo após ter percorridotodos os postos do oficialato.

Ao mesmo tempo, sinto-me rejuvenesci-do por assumir este órgão de direção-geralque tem a especial missão de assessoraradequadamente o comandante da Marinhana condução da nossa querida instituição.E para esta importante tarefa, trago a certezade que poderei contar com a competência, acooperação e o entusiasmo dos almirantes,oficiais, praças e funcionários civis do Esta-do-Maior da Armada e das nossas Organi-zações Militares subordinadas. Esse apoioserá imprescindível para que possamos de-senvolver o trabalho de qualidade que ocomandante da Marinha necessita receber.

Mas, num momento tão especial comoo que agora vivencio, julgo extremamentenecessário externar alguns particularesagradecimentos:

– inicialmente ao Excelentíssimo SenhorNelson Jobim, ministro de Estado da Defe-sa, que mais uma vez nos distingue e noshonra com a sua presença;

– ao comandante da Marinha, Almiran-te de Esquadra Julio Soares de Moura Neto,agradeço a confiança ao indicar-me para ocargo e o prestígio que me confere ao pre-sidir esta cerimônia. Desde já apresento-me para o serviço manifestando a minhalealdade, consideração e particular amiza-de. Conte sempre com o melhor dos meusesforços na busca constante da corretaassessoria do Estado-Maior da Armada;

– ao Excelentíssimo Senhor General deExército Jorge Armando Felix, ministro-chefedo Gabinete de Segurança Institucional da

Presidência da República; ao ExcelentíssimoSenhor Tenente-Brigadeiro do Ar Juniti Saito,comandante da Aeronáutica; e ao Excelentís-simo Senhor General de Exército AntônioGabriel Esper, comandante interino do Exér-cito Brasileiro, o meu especial agradecimentopela honra e distinção que vossas presençasoferecem a esta cerimônia;

– aos meus antigos chefes, alguns aquipresentes, agradeço pelos ensinamentose, sobretudo, pelos exemplos de compor-tamento social e profissional do verdadei-ro oficial de Marinha;

– aos excelentíssimos senhores minis-tros do Superior Tribunal Militar, aosexcelentíssimos senhores membros do Al-mirantado, aos excelentíssimos senhoresoficiais-generais, às autoridades presentese aos parentes e amigos, especialmente osque vieram do Rio de Janeiro, o meu reco-nhecimento pela demonstração de amizadeque suas presenças transmitem e o agra-decimento por terem vindo compartilhar co-migo a alegria e emoção desta cerimônia;

– aos prezados amigos da sempre pre-sente Turma Cox, agradeço a amizade e tam-bém o esforço em se deslocarem paraBrasília a fim de prestigiarem esse evento.Suas presenças são provas de que não es-taremos sós nesta próxima jornada;

– aos meus pais, que, na minha imagina-ção, vejo sentados ali na primeira fila, omeu muito obrigado pelo que sou. Esta ce-rimônia é a minha eterna gratidão;

– aos meus filhos Guilherme, Sabrina e Mau-rício, netos e, especialmente, à minha esposaTania, o meu reconhecimento pelo apoio, cari-nho, o amor e a compreensão sempre recebi-dos. Conto com todos vocês mais uma vez; e

– ao Excelentíssimo Senhor Almirantede Esquadra Marcos Martins Torres, meucolega de turma, agradeço a fidalguia comque me recebeu e a forma profissional eamiga com que me transmitiu o cargo. Aoprezado amigo de tantos anos e experiên-

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cias e digníssima família, formulo os me-lhores votos de sucesso nesta nova faseda vida que ora se inicia. Felicidades noSuperior Tribunal Militar.

Finalmente, ao iniciar esta nova traves-sia, mais uma vez peço a Deus que me ilu-mine e que Nossa Senhora de Nazaré nosabençoe.”

Foi realizada, em 5 de agosto último, acerimônia de transmissão de cargo de dire-tor-geral do Material da Marinha. A ceri-mônia foi presidida pelo comandante daMarinha, Almirante de Esquadra Julio Soa-res de Moura Neto. Assumiu o cargo o Al-mirante de Esquadra Arthur Pires Ramos,em substituição ao Almirante de EsquadraLuiz Umberto de Mendonça.

AGRADECIMENTO DO ALMIRANTEMENDONÇA

“Há oito meses, ao assumir o cargo dediretor-geral do Material da Marinha, de-clarei, além da minha satisfação e honra em

TRANSMISSÃO DO CARGO DE DIRETOR-GERALDO MATERIAL DA MARINHA

fazê-lo, que estava consciente das respon-sabilidades que me eram atribuídas.

Naquela oportunidade, ao analisar asatividades em desenvolvimento na DGMM,estabeleci como metas de ação prioritáriasna minha gestão, considerando o horizon-te temporal que dispunha, o deslanche e aconsolidação, no ano de 2010, do Progra-ma de Desenvolvimento do Submarino comPropulsão Nuclear, o início do Programade Aquisição e Revitalização das aerona-ves S-2T e C-2T, destinadas a serem em-pregadas cumprindo tarefas de Transpor-te, Reabastecimento em Voo, Esclarecimen-to Marítimo e Alarme Aéreo Antecipado, eo irrestrito apoio ao Setor Operativo, de

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modo a contribuir para que o Navio-Aeródromo São Paulo se fizesse ao marapós longo período de paralisação.

Para a consecução de minhas metas,empenhei-me com afinco. Nesse períodotive alegrias e realizações que hoje me per-mitem ter a consciência tranquila por teralcançado meus propósitos, buscandopriorizar as determinações e orientações docomandante da Marinha e continuar o tra-balho de meu antecessor.

Tive também a oportunidade de convi-ver com uma plêiade de oficiais que, à fren-te de suas Diretorias Especializadas, Cen-tros, Arsenal e Coordenadorias, não medi-ram esforços para bem me assessoraremna busca das soluções dos problemas comos quais me deparei.

Destaco com especial ênfase a visão,que hoje tenho fundamentada, relativa aoPrograma de Construção de Submarino comPropulsão Nuclear (Prosub), de que émandatório para o seu sucesso que atue-mos voltados para o propósito maior des-se projeto, que é o da Parceria Estratégicaentre o Brasil e a França. Assim, consideroque, ainda que esta esteja formalizada porcontratos comerciais, a Marinha, a DCNS,a Construtora Norberto Odebrecht, o Con-sórcio Baía de Sepetiba e a Itaguaí Cons-trução Navais têm que estabelecer, medi-ante o desenvolvimento de confiança mú-tua, uma relação de parceiros, na buscamaior da consecução de seu objetivo co-mum, qual seja dotar o Brasil de um subma-rino nuclear. Nesse sentido, orientei todasas minhas ações e decisões quando ne-cessária minha intervenção. Seguramente,supervisionar o Prosub foi a atividade maiscomplexa com que me deparei em toda aminha carreira.

Contudo, no dia a dia da DGMM e suasOM subordinadas está em curso uma sériede outras atividades de extrema importân-cia para a Marinha do Brasil, como a cons-

trução de meios de superfície, obtençõespor oportunidade, desenvolvimento de sis-tema de monitoramento e controle de áreamarítima, mísseis, obtenção e moderniza-ções de aeronaves, além de manutenção,modernização e revitalização de toda sortede meios e sistemas, atividades estas queme permitiram avaliar a capacidade técni-ca, o espírito empreendedor e a perseve-rança dos que servem no Setor do Materialda Marinha.

As atividade da Diretoria-Geral do Ma-terial da Marinha transcendem os limitesdo Edifício Barão de Ladário e das instala-ções físicas de suas organizações subor-dinadas, estendendo-se a todos os cantosdo nosso país e no exterior, desde que lá aMarinha tenha interesses relacionados aomaterial e à tecnologia da informação. Issotudo gera um elevado volume de trabalho,conduzido no anonimato e no limite da ca-pacidade de seus integrantes.

Na execução de nossos empreendimen-tos, ficaram patentes o trabalho em equiperealizado e o apoio a mim prestado por cadaum daqueles com os quais convivi nesseperíodo, razão pela qual hoje agradeço:

– inicialmente, ao comandante da Mari-nha, Almirante de Esquadra Julio Soaresde Moura Neto, pelo diálogo franco, ami-zade e apoio constante às minhas decisões;

– aos membros do Almirantado, pelaamizade, cooperação e colaboração ofere-cidas no atendimento de nossos pleitos;

– aos meus diretores das DiretoriasEspecializadas, do Arsenal de Marinha doRio de Janeiro e dos Centros, muito agra-deço pelas atenções e disposição dispen-sadas para a superação dos óbices encon-trados. Além de tê-los como subordinados,os tenho como amigos, o que muito enri-quece minha passagem pela DGMM;

– aos meus coordenadores, assessor,chefe de Gabinete e seus subordinados, que,em síntese, constituem a tripulação da Dire-

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toria-Geral do Material da Marinha, peloprofissionalismo, lealdade e dedicação, massobretudo pelas demonstrações de apreçopara comigo e pelo que pudemos realizar emum ambiente de camaradagem e amizade;

– ao diretor-presidente da Emgepron eseus diretores, pelas atenções com que medistinguiram como presidente do Conse-lho de Administração da empresa, bemcomo pelo irrestrito apoio prestado ao Se-tor do Material;

– à DCNS e à Construtora NorbertoOdebrecht, muito agradeço pela convivên-cia franca e pelas demonstrações de queestamos juntos em busca do interesse mai-or da Marinha, a obtenção do submarinocom propulsão nuclear; e

– à minha família, em especial à minhaesposa Albertina, com quem compartilhoalegrias e tristezas, mais uma vez obrigado.

Na Diretoria-Geral do Material da Mari-nha vivenciei ricas experiências profissio-nais e pessoais; dela levo gratas recorda-ções e grandes amigos.

Finalmente desejo expressar ao Almiran-te de Esquadra Arthur Pires Ramos, velhoamigo meu, os mais sinceros votos de feli-cidades no cargo de diretor-geral do Mate-rial da Marinha, extensivos a sua esposaVera e família. Muito boa sorte!”

PALAVRAS DO COMANDANTE DAMARINHA

“Hoje o Almirante de Esquadra LuizUmberto de Mendonça deixa a Diretoria-Geral do Material da Marinha, após umperíodo de sete meses e 20 dias como seutitular, período que, mesmo tendo sido re-lativamente curto, foi repleto de intensas eprofícuas atividades.

Na atual conjuntura, em que a nossa insti-tuição assume incontáveis compromissos vi-sando ao seu reaparelhamento e à moderniza-ção de meios, o Almirante Mendonça, provi-

do de um apurado senso de responsabilidadee de incontáveis qualidades, tais como dina-mismo, seriedade, dedicação, elevadoprofissionalismo e, acima de tudo, lealdade,soube gerir de forma eficaz as suas inúmeras eimportantes atribuições, orientando de manei-ra segura e correta o trabalho de seus subordi-nados e logrando notável êxito nas várias ecomplexas tarefas que lhe foram confiadas.

Dessa forma, cabe-me apontar, com mui-ta satisfação, algumas das suas principaisrealizações.

Quanto às unidades de superfície, res-salto a prontificação de diversos serviços,que permitiram à Corveta Barroso realizarsua primeira comissão de longa duração,ao continente africano, com brilhante atu-ação, abrindo perspectivas favoráveis defuturas negociações; o início do processode compra, por oportunidade, da embarca-ção Ludovico Celani, que será convertidaem navio de assistência hospitalar a serutilizado no 9o Distrito Naval; a recenteobtenção do Aviso de Pesquisa AspiranteMoura, já transferido à subordinação doInstituto de Estudos do Mar Almirante Pau-lo Moreira; o batimento da quilha do quar-to navio-patrulha de 500 toneladas, em es-taleiro no Rio de Janeiro; assim como o iní-cio das tratativas Programa de Construçãode Navios de Superfície (Prosup), que in-cluirá cinco fragatas, um navio de apoiologístico e cinco navios-patrulha oceâni-cos. Com relação ao setor aeronaval,enfatizo a liberação de dois lotes dos equi-pamentos Flir para o projeto de atualizaçãodos helicópteros Super Linx; a entrega dasduas primeiras aeronaves AF-1/1A àEmbraer para revitalização; a ativação doGrupo de Fiscalização e Recebimento dosHelicópteros de Multiemprego Seahawk; ea aquisição das células dos futuros aviõesCarrier Onboard Delivery e Air-to-AirRefueling (COD/ARR), que operarão a par-tir do Navio-Aeródromo São Paulo.

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Com referência ao Prosub, aponto o iní-cio, na França, da fabricação do primeiro

submarino convencional S-BR; o come-ço da construção da Unidade de Fabrica-ção de Estruturas Metálicas (Ufem); a apro-vação do layout definitivo do estaleiro eda base naval em Itaguaí; a instalação doEscritório Técnico do Programa de Desen-volvimento de Submarinos na França; e oestabelecimento e implementação das no-vas estrutura e governança do Prosub.

Quanto ao nosso Programa Nuclear, re-leva mencionar que a Usina de Hexafluoretode Urânio (Usexa), localizada no Centro Ex-perimental de Aramar (CEA), já se encontraem fase de conclusão, bem como que asobras do Laboratório de Geração Núcleo-Elétrica (Labgene) estão em perfeito anda-mento, atendendo ao cronograma previsto.

Prezado Almirante Mendonça! Na oca-sião em que Vossa Excelência transmite ohonroso cargo de diretor-geral do Material,registro o meu reconhecimento pelo esfor-ço empreendido e pelos resultados alcança-dos, que foram de grande importância paraincrementar essa meta imprescindível e defundamental importância: o reaparelhamentoda Marinha do Brasil, ao mesmo tempo quereafirmo o meu agrado em poder continuar acontar com a sua imprescindível colabora-ção à frente do Comando de OperaçõesNavais/Diretoria-Geral de Navegação.

Desejo-lhe permanentes alegrias e feli-cidades, extensivas à digníssima família, eque Deus permaneça iluminando a suasingradura!

Ao Almirante Arthur Pires Ramos, douas boas-vindas e apresento meus cumpri-mentos pela recente promoção a almirantede esquadra, último posto da carreira, oque bem demonstra o conceito que desfru-ta no seio da nossa instituição. Estou cer-to de que os seus incontestes valores pro-fissionais e tirocínio são a garantia de ple-no êxito na continuidade dos trabalhos

desenvolvidos pela DGMM, formulandovotos de felicidades na missão que lhe estásendo designada.”

PALAVRAS INICIAIS DOALMIRANTE PIRES RAMOS

“Sinto-me extremamente honrado e en-vaidecido em retomar o trato das atividadesrelacionadas com o material e a tecnologiada informação na Marinha. Considero-meprivilegiado em assumir o cargo de diretor-geral do Material da Marinha, num momen-to ímpar para a nossa instituição.

Portanto, minhas primeiras palavras sãode agradecimento.

Ao comandante da Marinha, Almirantede Esquadra Julio Soares de Moura Neto,agradeço a confiança da indicação e a hon-ra que me concede ao presidir esta cerimô-nia e empossar-me no cargo. Desde já, afi-anço meu firme propósito de desempenharo cargo com dedicação e profissionalismo,até o limite das minhas possibilidades.

Aos membros do Almirantado, agradeçoa honrosa presença e manifesto meu reco-nhecimento pela inclusão do meu nome noprocesso seletivo que resultou na recentepromoção. Pertencer a tão nobre colegiadoé o coroamento feliz de minha vida dedicadaà Marinha. Meu propósito será sempre o decontribuir para a solução dos desafios quedevam ser neutralizados na trajetória de en-grandecimento da Força Naval.

Aos antigos chefes navais e aos meussuperiores, pares e subordinados, civis emilitares, que de alguma forma influencia-ram a minha carreira, tornando possível estemomento, agradeço pelo exemplo e osensinamentos transmitidos.

Aos ex-ministros da Marinha, ex-coman-dantes da Marinha, ex-diretores-gerais doMaterial da Marinha, senhores almirantes,oficiais, companheiros da Turma Viscondede Ouro Preto, amigos, senhoras e senho-

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res, agradeço pela presença que faz estacerimônia ter um brilho especial.

À minha querida família, agradeço oapoio e o estímulo sempre presentes emtodos os momentos da carreira. Manifestoespecial reconhecimento a Vera Lucia, es-posa e companheira de muitas singraduras.

Ao Almirante de Esquadra Luiz Umbertode Mendonça, meu antecessor, agradeço afidalguia e o senso profissional com queme recebeu e transmitiu o cargo. Desejo-lhe pleno êxito no desempenho das novastarefas que irá exercer no Comando de Ope-rações Navais e na Diretoria-Geral de Na-vegação, além de muitas felicidades pes-soais, extensivas à digníssima família.

A eficaz manutenção dos meios da Mari-nha do presente e a engenhosa construção daMarinha do amanhã serão tarefas do nossocotidiano a serem executadas em harmonia comtodos os setores que compõem a estrutura deorganização do Comando da Marinha.

Os grandes desafios a enfrentar na execu-ção do Programa de Desenvolvimento de Sub-

marinos (Prosub), de grande magnitude para aMarinha, são de responsabilidade de todosos seus integrantes, cujo empenho e a moti-vação são fundamentais para superá-los.Profissionalismo, criatividade, capacidade deinovação e visão prospectiva servirão de com-bustível para colocar o Brasil no seleto grupodas potências mundiais com o domínio datecnologia para projetar e construir submari-nos convencionais e de propulsão nuclear.

Para contrapor estes desafios, que sur-girão ao longo do desenvolvimento e daexecução do Prosub, conto não apenas coma proteção do meu anjo da guarda e com otalento da minha fada madrinha. Conto comuma tripulação de excelência, almirantes,oficiais, praças e servidores civis, homens emulheres, altamente qualificados e prepara-dos para cumprir a missão da nossa Direto-ria-Geral. Concito-os a não privilegiar pro-blemas. Trabalharemos com soluções!

Máquinas adiante toda força, rumo aosucesso!

Que Deus nos abençoe!”

Foi realizada, em 19 de agosto de 2010, acerimônia de transmissão dos cargos decomandante de Operações Navais e dire-tor-geral de Navegação. Tomou posse oAlmirante de Esquadra Luiz Umberto deMendonça, em substituição ao Almirantede Esquadra Marcus Vinicius Oliveira dosSantos. A cerimônia foi presidida pelo co-mandante da Marinha, Almirante de Esqua-dra Julio Soares de Moura Neto.

DESPEDIDAS E AGRADECIMENTOSDO ALMIRANTE VINICIUS

“Encerro hoje um período de quase novemeses em que tive o privilégio de exercer

TRANSMISSÃO DOS CARGOS DE COMANDANTE DEOPERAÇÕES NAVAIS E DE

DIRETOR-GERAL DE NAVEGAÇÃOos cargos de comandante de OperaçõesNavais e diretor-geral de Navegação. Foiuma fase marcante e muito feliz de toda aminha carreira na Marinha.

Marcante porque tive a ventura de re-ceber, dos cerca de 44.500 homens e mu-lheres que comandei, as ações de respos-tas que havia solicitado na minha Ordemde Serviço de assunção. Ações estas sem-pre proativas, que perseguiram continua-mente a prontidão dos Setores Operativose da Diretoria-Geral de Navegação e queme encheram de justificado orgulho. Foigratificante observar, durante as minhasvisitas e inspeções aos comandos subor-dinados, a qualidade do serviço executa-

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do, a dedicação do nosso pessoal de bor-do e de terra, a busca incessante peloaprestamento das nossas Forças e o exce-lente estado de conservação das nossasOrganizações Militares.

Muito feliz porque pude viver intensa-mente esses 267 dias e ser recompensadopor inúmeros eventos, ora de naturezaoperativa, ora administrativa, que possibili-taram tornar inesquecíveis esses dois car-gos. Certamente seria enfadonho citá-lostodos, mas, a bem da justiça, julgo impor-tante e necessário destacar de pronto a mai-or de todas as felicidades: a realização pro-fissional de supervisionar o regresso à Ama-zônia Azul do nosso capitânia da Esquadra,este aguerrido Navio-Aeródromo São Pau-lo, orgulho de toda a Marinha. Hoje tenho aenorme satisfação pessoal e profissional deconfirmar aos presentes e, em especial, aocomandante da Marinha, a completaprontificação do navio e o seu suspender,após mais de cinco anos de complexos re-paros, no próximo dia 3 de setembro. Seu

retorno às atividades operativas é, sem dú-vida, motivo de júbilo e de positivas expec-tativas por parte da Esquadra. Outros even-tos que me marcaram de modo especial du-rante esses oito meses foram: o resgate, compleno sucesso, dos tripulantes do navio-veleiro canadense Concórdia, em fevereirode 2010; a conclusão exitosa da OperaçãoAntártica XXVIII, que contou pela primeiravez com a participação conjunta do NavioPolar Almirante Maximiano e do Navio deApoio Oceanográfico Ary Rongel; a opera-ção de instalação de um hospital de campa-nha no Chile por ocasião do terremoto defevereiro de 2010; e a realização da Opera-ção Conjunta Atlântico II, mais recentemen-te. Em suma, posso afirmar que vivi plena-mente este Comando.

Entretanto, a vida segue o seu curso, eé chegada a hora da partida, a hora de arri-ar o meu pavilhão, a hora da despedida dosmeus comandados e, sem dúvida, é chega-do o momento de externar alguns agrade-cimentos especiais.

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Inicialmente, ao comandante da Mari-nha, Almirante de Esquadra Julio Soaresde Moura Neto, pelo apoio constante, pelaorientação segura e pela sensibilidade notrato dos assuntos encaminhados por esteÓrgão de Direção Setorial.

Aos meus pares do Almirantado, pelaconvivência fraterna, pelas demonstraçõesde apreço e contínua cooperação na buscadas melhores soluções para a Marinha.

Aos demais setores da Marinha pelacolaboração integral e sempre eficiente quenos permitiu levar a bom termo todos osdesafios enfrentados.

Aos meus comandantes diretamentesubordinados: comandante em chefe daEsquadra, comandantes distritais, diretorde Hidrografia e Navegação, diretor dePortos e Costas, comandante da Força deFuzileiros da Esquadra e comandante doControle Naval do Tráfego Marítimo, pelamagnífica condução dos seus comandadose excelência dos resultados obtidos. Foium imenso orgulho liderá-los.

Ao meu chefe de Estado-Maior,subchefes, chefe de Gabinete e oficiais deGabinete, o meu incondicional agradeci-mento pelas assessorias extremamentecompetentes e pela lealdade constantemen-te demonstrada.

Aos oficiais e praças do Comando deOperações Navais e Diretoria-Geral de Nave-gação, expresso o meu reconhecimento peloesforço, dedicação e resposta às exigênciaspara o cumprimento da nossa missão.

À minha família e, em particular, à minhaesposa Tania, mais uma vez o meu reco-nhecimento pelo apoio e pela permanentecompreensão.

Finalmente, ao bom Deus e a Nossa Se-nhora de Nazaré, agradeço a proteção re-cebida durante todo o período de mais essacomissão.

Ao Almirante de Esquadra Luiz Umbertode Mendonça, a quem mais uma vez tenho o

prazer de transmitir o timão, agradeço o apoioimprescindível recebido do Setor de Materiale externo os meus sinceros votos de muitasorte e muitas realizações profissionais.

Bons ventos, mares tranquilos e queseja muito feliz.”

AGRADECIMENTO E BOAS-VINDASDO COMANDANTE DA MARINHA

Despede-se, na presente data, do Co-mando de Operações Navais e da Direto-ria-Geral de Navegação o Almirante de Es-quadra Marcus Vinicius Oliveira dos San-tos, após um profícuo período à frente des-ses dois Órgãos de Direção Setorial.

Após muitos anos de convivência e di-versos trabalhos em conjunto, torna-se fá-cil identificar os principais traços da per-sonalidade do Almirante Vinicius, que lhepropiciaram um indiscutível sucesso noscargos que hoje passa, cabendo citar osseus renomados atributos morais, compe-tência, objetividade, tranquilidade, dedica-ção e lealdade.

No momento atual, quando a institui-ção dá passos concretos para o seureaparelhamento e sua modernização dosmeios, o que tem influência direta no Co-mando de Operações Navais e na Direto-ria-Geral de Navegação, suas característi-cas pessoais facultaram soluções adequa-das e oportunas aos problemas surgidos,logrando êxitos expressivos na conduçãode relevantes atividades e, consequente-mente, trazendo a desejável tranquilidadeao comandante da Marinha na sua tomadade decisão.

As conquistas obtidas em sua gestãopodem ser comprovadas por importantesrealizações, dentre as quais se destacam:

– a coordenação do evento GrandesVeleiros - Rio 2010, em janeiro e fevereiro,no Rio de Janeiro, que contou com a parti-cipação do Cisne Branco e de outros oito

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veleiros de Marinhas amigas, os quais sus-penderam, a seguir, para a Regata Interna-cional Velas Sudamérica, em comemoraçãoaos 200 anos da criação das primeiras Jun-tas Nacionais de Governo dos povos his-pânicos da América Latina;

– a ativação da Unidade Médica Expe-dicionária da Marinha (Umem);

– a realização de dois seminários, sendoum deles sobre tarefas especiais,objetivando avaliar as ações conduzidas porocasião dos recentes apoios prestados aoChile e ao Haiti; e o outro, referente ao res-gate dos tripulantes do Veleiro Concórdia,de bandeira canadense, visando identificaras dificuldades encontradas e buscar solu-ções para o aprimoramento de eventos SAR;

– a Operação África-2010, com duração de60 dias, primeira comissão operativa da CorvetaBarroso após o período de comissionamentode equipamentos e sistemas, testes no mar einspeções operativas;

– a finalização próxima do grande perío-do de reparos do Navio-Aeródromo SãoPaulo, cuja experiência de máquinas estáprevista para muito em breve; e

– a Operação Atlântico II, envolvendocerca de 10 mil militares das três Forças ena qual atuou como comandante do Teatrode Operações.

Prezado Almirante Vinicius! No momen-to em que Vossa Excelência larga a últimaespia e deixa os setores Operativo e daDGN, desejo registrar o meu apreço e a mi-nha consideração. Tenha certeza que con-quistou também o respeito e a admiraçãode todos aqueles que tiveram o privilégiode trabalhar ao seu lado na jornada queestá se encerrando.

Desejo-lhe permanentes alegrias, novasconquistas e realizações como chefe doEstado-Maior da Armada, que assumirá embreve e, posteriormente, no Superior Tri-bunal Militar, para onde já foi indicado, ex-tensivas à digníssima família.

Bons ventos, Almirante de EsquadraMarcus Vinicius Oliveira dos Santos! Sejamuito feliz e que Deus continue iluminan-do o seu caminho!

Ao Almirante de Esquadra Luiz Umbertode Mendonça, dou as boas-vindas à sua novacomissão. Estou certo de que os seusincontestes valores profissionais, sólidos co-nhecimentos e experiência, aliados aos seusmeritórios atributos, garantirão a continuida-de dos trabalhos desenvolvidos no Comandode Operações Navais e na Diretoria-Geral deNavegação, formulando votos de felicidadesna missão que lhe está sendo confiada.”

PALAVRAS INICIAIS DOALMIRANTE MENDONÇA

“Há exatos 40 anos cruzei a prancha doCruzador Barroso para ter minha primeiracomissão no Setor Operativo da Marinha.

Ainda guarda-marinha, decidi que ob-servaria em detalhes pessoas e atividadesconduzidas a bordo, pois, acreditando tra-tar-se a vida de um acúmulo de experiênci-as, entendia ser esta a única forma de tersucesso em minha profissão.

Muito tempo se passou. Foram notáveislições aprendidas de chefes e comandantes,muitos aqui presentes, belos exemplos de ami-zade e camaradagem desenvolvidas na buscado interesse comum com meus pares, visandoao cumprimento de nossa missão, e demons-trações de lealdade e profissionalismoexternados por meus subordinados.

Foram 40 anos nos quais ouvi, concor-dei, discordei, tive realizações, alegrias eaprendi, isto é, amadureci. No entanto iden-tifico uma característica que entendo nãoter mudado desde aqueles tempos: o entu-siasmo pela Marinha, que hoje sinto com amesma intensidade.

Esse sentimento me permite compreen-der, ao assumir os cargos de comandante deOperações Navais e diretor-geral de Nave-

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gação, o orgulho que sinto, razão pela qualsou muito grato ao Almirante de EsquadraJulio Soares de Moura Neto, comandanteda Marinha, pela confiança demonstrada aome indicar para o cargo.

Tenho a convicção de que comandar oSetor Operativo e dirigir o de Navegaçãosão tarefas de grande dimensão e importân-cia, em especial nos dias de hoje, em razãodas diretrizes de nossa Estratégia Nacionalde Defesa, que propugnam por um acuradoconhecimento e rigorosa vigilância de nos-sa Amazônia Azul, aos quais se somam anecessidade de garantir a navegação na ca-lha de nossas principais bacias hidrográficase seus afluentes navegáveis e estar prontopara atender aos compromissos internacio-nais assumidos pelo País.

Preparar e aplicar nossas forças navais,aeronavais e de fuzileiros navais, atenderàs atividades da Autoridade Marítima, emespecial à patrulha e a inspeção naval, dãoa dimensão das responsabilidades que mesão acometidas e me trazem à consciênciao trabalho a ser desenvolvido.

Nesse aspecto, tenho a crença de quepoderei contar com a dedicação e o profis-sionalismo de meus subordinados, que, as-sociados a um elevado espírito de equipe,nos permitirão levar a cabo nossas metascom proficiência.

Entendo que priorizar os interesses daMarinha e executar minhas tarefas comperfeição e no tempo adequado serão asúnicas formas de corresponder ao que aMarinha espera de mim.

Pelo prestígio que suas presenças em-prestam a esta cerimônia, agradeço:

– ao Excelentíssimo Senhor comandan-te da Marinha, Almirante de Esquadra Ju-lio Soares de Moura Neto, a quem renovominha lealdade e dedicação ao serviço;

– aos ex-ministros de Estado e coman-dantes da Marinha;

– ao chefe do Estado-Maior da Armada;– aos membros do Almirantado;– aos senhores almirantes, generais e

brigadeiros;– às autoridades civis e militares;– aos amigos;– aos colegas da Turma Grenfell;– às senhoras e senhores; e– à minha esposa Albertina e família,

sempre presentes.Ao Almirante de Esquadra Marcus

Vinicius Oliveira dos Santos, a quem maisuma vez sucedo, pela forma cordial, profis-sional e detalhada com que transmitiu oscargos, muito agradeço. Desejo que VossaExcelência seja muito feliz como chefe doEstado-Maior da Armada, votos estes ex-tensivos a sua esposa Tania e família.”

A série de reportagens especiais “Os 70anos da Segunda Guerra no Brasil”, do jor-nal O Dia, publicada em 2009, venceu oprêmio Excelência Jornalística 2010 da So-ciedade Interamericana de Imprensa (SIP),na categoria “Crônica”. O projeto contou,em quatro edições dominicais, a saga dossoldados brasileiros sobreviventes da Se-gunda Guerra Mundial.

“OS 70 ANOS DA SEGUNDA GUERRA NO BRASIL”DE O DIA RECEBE PRÊMIO INTERNACIONAL

No segundo volume, entre outros as-suntos, a coleção homenageou a Marinhado Brasil. O diretor do Patrimônio Históri-co e Documentação da Marinha, Vice-Al-mirante (EN-Refo) Armando de SennaBittencourt, foi um dos colaboradores daedição.

O volume que falou sobre a Marinhatrouxe depoimentos de veteranos que pro-

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tegeram a costa contra os ataques dos sub-marinos alemães e evitaram o desabas-tecimento do País. Ilustrações detalharamcomo foram os primeiros bombardeios deU-Boats a navios brasileiros. E, no relatodos entrevistados, os bastidores das mis-sões de escolta a navios que levavam su-primentos aos Estados Unidos.

Em nota, ao anunciar os ganhadores doconcurso, a SIP afirmou: “Com uma lingua-gem simples e direta, as crônicas relataram aparticipação do Brasil na Segunda GuerraMundial. Possui o mérito de ser um produto

atual, para o momentoem que foi escrito; deusar fontes qualificadase exibir um bom traba-lho de investigação aoempregar adequadomaterial de apoio, comofotografias, ilustraçõese infografias”.

O Vice-AlmiranteBittencourt destacou aimportância do projeto“Os 70 anos da Segun-da Guerra no Brasil”para a preservação damemória nacional. “OPaís necessita conhe-cer sua história e a sé-rie ajudou nessa mis-são”, afirmou.

A seleção da Sociedade Interamericanade Imprensa reuniu trabalhos publicados aolongo de 2009 em jornais de 33 países dasAméricas e do Caribe. A comissão selecio-nou ganhadores em 11 categorias. Entre elas,Relações Interamericanas, Direitos Humanos,Cobertura Noticiosa e Crônica. Os ganhado-res serão premiados na 66a Assembleia-Geralda SIP, na cidade de Mérida, no México, en-tre os dias 5 e 9 de novembro deste ano. Apremiação é considerada uma das mais im-portantes do continente.

(Fonte: www.mar.mil.br)

Vice-Almirante Bittencourt. “É preciso lembrar sacrifício de brasileirosque perderam a vida em busca da paz”

Foram promovidos por Decreto Presi-dencial, contando antiguidade a partir de31 de julho de 2010, os seguintes oficiais:

– Corpo da Armada: ao posto de Almi-rante-de-Esquadra, o Vice-Almirante ArthurPires Ramos; ao posto de Vice-Almirante,o Contra-Almirante Ilques Barbosa Junior;

PROMOÇÃO DE ALMIRANTES

e, ao posto de Contra-Almirante, os Capi-tães de Mar e Guerra Nilo Moacyr PenhaRibeiro e Victor Cardoso Gomes.

– Corpo de Intendentes da Marinha: aoposto de Contra-Almirante (IM), o Capitãode Mar e Guerra (IM) Walter Lucas da Silva.

(Fonte: Bono Especial no 522, de 30/7/2010)

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Jornalistas norte-americanos visitaramrecentemente o tão esperado navio britâ-nico Queen Elizabeth, em sua fase final deconstrução, no Estaleiro Fincantieri, emMonfalcone, Itália. A visita foi promovidapela Cunard Cruise Line. A inauguração donavio está prevista para outubro deste ano,com viagens na Europa e uma no Caribe.Em janeiro, inicia sua primeira volta aoMundo.

O Queen Elizabeth é o terceiro navio daCunard a receber o mesmo nome. O primei-ro foi lançado em 1938 e navegou até 1968.O segundo foi para alto-mar em 1969 e deubaixa em 2008. A empresa decidiu não colo-car o número 3 no final do nome porque eleserá o único Queen Elizabeth na ativa dalinha Cunard, mas vai representar a histó-ria de seus dois antecessores. “Esse naviocarrega uma grande herança”, disse PeterShanks, presidente da Cunard, sobre onovo transatlântico.

O navio tem 92 mil toneladas e mede294 metros de cumprimento e 33 metrosde largura. Seu staff terá 996 profissio-nais, incluindo os oficiais britânicos, que

IMPRENSA DOS EUA VISITA O QUEEN ELIZABETH

estarão prontospara atender a 2.092hóspedes, acomo-dados em 1.046 ca-bines, sendo maisde 700 com varan-da. O conforto eespaço a bordo sãogarantidos.

Os detalhes donovo navio remetemao passado gloriosodos Queen Eliza-beth, o que “garan-te a conexão entre oscruzeiros do passa-do e os do presen-

te”, como dito no blog Cruise Critic.Durante a visita técnica, os jornalistas

tiveram acesso às cabines, com os móveisainda cobertos de plásticos para proteção;ao The Royal Court Theatre, já tomandoforma com a decoração art déco; e ao TheGolden Lyon, tradicional pub dos naviosda Cunard, entre outras áreas.

O restaurante The Verandah reproduz omais famoso restaurante dos mares nosanos 40 e 50, de seus antecessores QueenElizabeth e Queen Mary, onde jantavamestrelas de Hollywood, magnatas e a reale-za. Também estarão funcionando mais doisrestaurantes, o Britania Grill e o GardenLounge.

O estilo art déco dos anos 30, presenteem todo o navio, inclui escadarias orna-mentadas, um grande salão de baile, forrotrabalhado e tecidos de flores. Já o jardimde inverno é inspirado no Kew Gardens deLondres. Para a publicação Travel Weekly,“o Queen Elizabeth é irmão gêmeo doQueen Victoria, mas terá design e perso-nalidade próprios a bordo”.

(Fonte: Press release da TI Comunicações)

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A partir deste semestre, entra no mercadooffshore brasileiro a Georadar, empresa degeosserviços que já atua nos segmentos deóleo e gás, mineração e monitoramento, di-agnóstico e remediação ambiental. Com uminvestimento total estimado de R$ 30 milhões,a empresa lança a subsidiária Georadar Servi-ços Offshore com o objetivo de atuar no mer-cado de serviços ambientais e oceanográfi-cos ligados à exploração de petróleo offshore.

O investimento inclui a aquisição de na-vios e equipamentos de pesquisa e traba-lhos no mar. A empresa aguarda a chegadada primeira de três embarcações oceano-gráficas adquiridas na Europa para seu in-gresso no mercado offshore. O navio estásendo modernizado com equipamentos deúltima geração, e deverá ser entregue noBrasil até novembro deste ano. Os outrosdois navios chegarão até o final de 2011.

As embarcações estarão capacitadas paracoleta de solo para estudos geoquímicos, ins-peção de dutos e equipamentos e também se-rão adaptadas para receberem ROVs (remotelyoperated vehicle). São embarcações de pes-quisa que poderão fazer coleta de materiais eserviços como medições oceanográficas por

GEORADAR ENTRA NO MERCADO OFFSHORE

satélite, imagens de fundo oceânico eamostragem e análise com Piston-core e Box-core. As pesquisas acontecerão em todos oscampos já conhecidos da costa do Brasil etambém nos novos. Eventualmente, poderãoser feitos estudos marinhos não voltados parao petróleo.

O fortalecimento da economia brasileiratorna o país um destino potencial para o mer-cado offshore, atraindo investimentos. O pre-sidente da Georadar, Roberto Ribeiro, diz queo novo mercado no qual a empresa entra for-temente é absolutamente demandante, princi-palmente com o advento do pré-sal. “A entra-da nesse segmento tem muito a ver com o pré-sal, porém a atual exploração no mar, anteriorao pré-sal, já demanda bastantes serviços. Opré-sal apresenta um efeito multiplicador.” Adescoberta de novas jazidas de petróleo nacamada do pré-sal levará o Brasil a se tornar osexto país detentor das maiores reservas mun-diais de petróleo. “O setor está em plena ebu-lição. Somente a Petrobras, nosso principalcontratante, tem um plano de investimentosde US$ 210 bilhões no Brasil para os próximosquatro anos”, avalia Ribeiro. (Fonte: Pressrelease da Interface Comunicação)

A APM Terminals Management BV (Gru-po Maersk), multinacional holandesa, fir-mou parceria com a Europe Terminal NV naformação de uma joint venture para inves-tir num terminal portuário para movimenta-ção de contêineres e tancagem de granéislíquidos no Porto Organizado de Santos.Na parceria, cada uma entrou com 50% daparticipação acionária.

APM TERMINALS FIRMA JOINT VENTUREPARA TERMINAL EM SANTOS

1 Tweenty-foot Equivalent Unit, unidade de 20 pés ou equivalente que constitui a medida padrão paradefinir o tamanho dos locais porta-contêineres.

A Brasil Terminal Portuário S/A (BTP),empresa operadora que integra o grupoEurope Terminal NV, atualmente implementao empreendimento, que deve estar operan-do plenamente em meados de 2013. As ins-talações terão 15 metros de profundidadee uma capacidade de 2,2 milhões de TEU’s1

depois de totalmente construídas.(Fonte: RMA Comunicação e Negócios)

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A Uniduto Logística S.A., empresa cria-da por um grupo que representa um terçoda produção nacional de etanol, construi-rá seu porto offshore no município de PraiaGrande (SP). O anúncio foi feito pela em-presa em 25 de agosto último.

De acordo com Sergio Van Klaveren,presidente da Uniduto, “a Praia Grande erauma das três alternativas que a empresatinha na Baixada Santista, e suas condi-ções técnicas, somadas ao interesse e àdisposição da prefeitura, viabilizaram asnegociações, o que fez com que nossa de-cisão fosse tomada a favor da cidade”.

Para o prefeito de Praia Grande, RobertoFrancisco dos Santos, “a proposta da Unidutose mostrou técnica, social e ambientalmenteadequada para a cidade, que busca investi-mentos para se desenvolver”.

Atualmente, o Projeto Uniduto encontra-se em fase de licenciamento ambiental. Em 30de julho último, a empresa protocolou, naSecretaria de Meio Ambiente do Estado deSão Paulo, o Estudo de Impacto Ambiental, oRelatório de Impacto Ambiental e o Estudode Análise de Risco do Projeto Uniduto e, em

UNIDUTO CONSTRUIRÁ PORTO OFFSHORENA PRAIA GRANDE (SP)

2 de agosto, assinou com o Governo do Es-tado de São Paulo um protocolo de inten-ções para a realização do projeto. A previsãoé que as obras sejam iniciadas em 2011.

Com um projeto baseado em dutos e naintegração multimodal, a Uniduto prevêiniciar suas atividades em 2013. Quandoem operação, terá capacidade para trans-portar até 16 bilhões de litros de etanol porano, oferecendo uma nova alternativa deescoamento e distribuição de etanol, eco-nomicamente mais viável e segura, comvantagens técnicas, ambientais e sociais.

O Projeto Uniduto terá um total de 612,4km de extensão de dutovia que passará por46 municípios do Estado de São Paulo. Se-rão implantados quatro terminais coleto-res nas regiões de Serrana, Botucatu,Anhembi e Santa Bárbara d’Oeste; doisterminais de distribuição para o mercadointerno em Paulínia e na Região Metropoli-tana de São Paulo (Caieiras), além de umterminal de exportação na Praia Grande,onde também operará um porto próprio afas-tado da costa (offshore).

(Fonte: Press release da Lead Assessoria)

O Navio-Balizador Tenente Castelo rea-lizou, de 29 de junho a 22 de julho, a Comis-são Sinal HID I, na área de jurisdição doComando do 4o Distrito Naval. Durante aComissão, dividida em duas etapas, foramexecutadas a inspeção e a manutenção dosbalizamentos fixos e flutuantes nos canaisdo Quiriri e do Espadarte, ambos a leste daIlha do Marajó; no Canal do Curuá, na Bar-

NAVIO-BALIZADOR TENENTE CASTELO REALIZASONDAGEM E BALIZAMENTO NA

BARRA NORTE DO RIO AMAZONAS

ra Norte da foz do Rio Amazonas; e no ca-nal sul do Rio Amazonas.

A primeira etapa da Comissão foi voltadapara o balizamento no Canal do Curuá, quan-do foi lançada uma nova boia luminosa es-pecial de águas seguras, em substituição àque estava desaparecida, e reposicionadaoutra de igual porte. Na segunda etapa, onavio se dedicou a atualizar a batimetria –

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medição da profundidade dosoceanos, lagos e rios – doentorno das Ilhas Pedreira, naBacia Amazônica. Ao longodos 24 dias de comissão, onavio percorreu 1.325,4 milhasnáuticas, gerou vários avisosaos navegantes e também re-alizou sondagem nas proximi-dades das Ilhas Pedreira, emobservância ao Programa deLevantamentos Hidrográficospara a Bacia Amazônica.

(Fonte: www.mar.mil.br)

Lançamento de uma nova boialuminosa especial de águasseguras no Canal de Curuá

Foi realizada na cidade do Rio de Janeiro(RJ), nas dependências do Hotel WindsorBarra, a XXIV Conferência Naval Interame-ricana (CNI). O evento aconteceu de 13 a 17 desetembro último e contou com a presença dedelegações de 17 Marinhas: Argentina, Bolí-via, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, El Salva-dor, Equador, Estados Unidos da América,Honduras, México, Nicarágua, Panamá,Paraguai, Peru, República Dominicana eVenezuela, além da Junta Interamericana deDefesa (JID) e da Rede Naval Interamericanade Telecomunicações (RNIT).

A CNI foi criada para proporcionar umforo para intercâmbio de ideias, conheci-mentos e entendimento mútuo dos proble-mas marítimos que afetam o Continente

XXIV CONFERÊNCIA NAVAL INTERAMERICANA

Americano. Seu propósito fundamental temsido estimular os contatos profissionaispermanentes entre as Marinhas dos paí-ses participantes, a fim de promover a soli-dariedade hemisférica. Sua periodicidade ébianual e, durante o transcurso da XXIVCNI, foram comemorados seus 50 anos,completados em 2009. A I Conferência ocor-reu em Balboa, Panamá, em 1959.

O tema central da XXIV CNI foi “A Se-gurança Marítima Interamericana: a cons-ciência do domínio marítimo regional e me-canismos para o seu fomento, o empregodo Poder Naval na segurança marítima e nadefesa dos recursos naturais, e as ques-tões do ordenamento jurídico”.

(Fonte: Bono no 635, de 9/9/2010)

A Escola Naval foi sede, no período de29 de agosto a 2 de setembro últimos, doVII Congresso Acadêmico sobre DefesaNacional (VII CADN). O evento foi promo-vido pela Secretaria de Ensino, Logística,Mobilização, Ciência e Tecnologia do Mi-

VII CONGRESSO ACADÊMICO SOBRE DEFESA NACIONALnistério da Defesa, tendo como objetivo apromoção do debate sobre a cultura deDefesa no Brasil.

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, abriuo Congresso apresentando o tema “A Es-tratégia Nacional de Defesa”. Em seguida, o

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ministro chefe da Secretaria de AssuntosEstratégicos, Samuel Pinheiro Guimarães, fezalocução sobre tema correlato.

Estiveram também presentes na abertu-ra o comandante da Marinha, Almirante deEsquadra Julio Soares de Moura Neto, e oda Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro do ArJuniti Saito, além de outras autoridades ci-vis e militares. O evento contou com a par-ticipação de mais de 250 congressistas,entre estudantes e professores de diver-sas instituições de ensino superior, proce-dentes de dez unida-des da Federação, alémde aspirantes e cadetesdas Academias Milita-res, alunos do Institu-to Militar de Engenha-ria, do Instituto Tecno-lógico da Aeronáuticae do Centro de Instru-ção Almirante Brás deAguiar.

Ressalta-se a impor-tância deste eventopara maior aproximação

entre a comunidade ci-vil e militar, além daoportunidade de divul-gação e reflexão sobreassuntos apresenta-dos por renomadosconferencistas civis emilitares relacionados àDefesa e à Marinha.Dentre eles, destacam-se: “A Amazônia eAmazônia Azul: Segu-rança e Defesa”; “O

Brasil em Missões de Paz: A participaçãono Haiti”; “A Matriz Energética Brasileira:Petróleo e Energia Nuclear” e, como temamotivacional, “A Liderança e Estratégia noEsporte”.

A programação do VII CADN incluiutambém atividades socioculturais, como aapresentação da Banda Sinfônica do Cor-po de Fuzileiros Navais e visita ao EspaçoCultural da Marinha e ao Comando da Di-visão Anfíbia.

(Fonte: Bono no 635, de 9/9/2010)

Organizada pela Escola de Operaçõesde Paz do Corpo de Fuzileiros Navais

II JORNADA DE OPERAÇÕES DE PAZ/2010

(Eopaz), foi realizada no Centro de Instru-ção Almirante Sylvio de Camargo (Ciasc),

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no Rio de Janeiro (RJ), em 28 de junho últi-mo, a II Jornada de Operações de Paz/2010.

A Jornada, que contou com a participa-ção de professores e alunos universitári-os, teve o propósito de disseminar conhe-cimentos e experiências recentes de milita-res sobre o assunto, permitindo o debateentre os presentes e o aprimoramento dapreparação dos militares designados paraparticipar de Operações de Paz.

Os seguintes temas foram abordados:Desminagem Humanitária; Estudo de Caso

Colômbia; Manejo de Crise em Operaçõesde Paz; e Missão da ONU no Nepal.

Além de organizar eventos como esse,a Eopaz realiza diversas tarefas na área deOperações de Paz, dentre elas o Curso deOficias de Estado-Maior e ObservadoresMilitares da Organização das Nações Uni-das (ONU) e o Curso de Desminagem Hu-manitária, além de um ciclo de palestras pre-paratórias para os contingentes de Fuzilei-ros Navais do Haiti.

(Fonte: Bono no 412, de 21/6/2010)

Foi realizado de 27 de julho a 1o de agostoúltimo, no Comando em Chefe da Esquadra,no Rio de Janeiro, o X Ajuri – Encontro Naci-onal dos Escoteiros do Mar. O evento come-morou o centenário mundial de fundação doEscotismo do Mar (1909) e sua consolidação(1910), além do centenário da chegada aoBrasil do Encouraçado Minas Gerais (1910),que trouxe o Escotismo para o País.

X ENCONTRO NACIONAL DOS ESCOTEIROS DO MAR

Visita dos escoteiros ao Comando daForça de Submarinos

Cerimônia de abertura do X EncontroNacional dos Escoteiros do Mar, no auditório

do CAAML

Visita ao CAAML

Espaço Cultural da Marinha, Escola Naval,Museu do Corpo de Fuzileiros Navais e Co-mando da Força de Submarinos.

O evento reuniu 200 escoteiros do mar, entre11 e 65 anos de idade, de ambos os sexos e dedelegações de todas as regiões do País.

A programação do evento incluiu pernoi-te a bordo do Navio de Desembarque de Car-ros de Combate Garcia D’Ávila; participa-ção diária no Cerimonial à Bandeira; pales-tras no Centro de Adestramento AlmiranteMarques de Leão (CAAML); utilização dorefeitório e instalações esportivas da BaseNaval do Rio de Janeiro (BNRJ); visitas ao

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O X Ajuri encerrou-se com umamissa celebrada no ginásio da BNRJpelo Capitão de Fragata (CN) EmanuelTeixeira Pereira da Silva, e um culto

celebrado na Capela de Mocanguê,pelo Capitão-Tenente (CN) MarcosSant’Anna da Silva.

(Fonte: www.mar.mil.br)

A organização não governamental(ONG) Friend of the Sea promoveu, em 27de julho último, um encontro para discutira evolução e os desafios das empresas bra-sileiras que pretendem aderir aos critériosda pesca sustentável. Durante o evento,que contou com a presença do secretáriode Infraestrutura e Fomento do Ministérioda Pesca e Aquicultura, José ClaudenorVermohlen, e do presidente da ONG, PaoloBray, empresas já auditadas e em processode auditoria puderam expor suas experiên-cias e os objetivos da certificação.

A empresa Gomes da Costa Alimentos(GDC), pioneira no Brasil na obtenção dacertificação da Friend of the Sea para a produ-ção do atum em Itajaí, Santa Catarina, se ante-cipou a uma tendência mundial dos consumi-dores que cada vez mais se conscientizam eexigem informações sobre a origem do pesca-do e a garantia de que a empresa produtoraatende aos requisitos de sustentabilidade erespeito ao meio ambiente, em todas as fasesdo processo. “A auditoria teve um aspectomuito positivo, de nos aproximar dos nossosfornecedores, incentivando melhorias e o com-prometimento com a responsabilidadeambiental em toda a cadeia produtiva”, afir-mou Alberto Encinas, presidente da GDC, quetambém participou do encontro.

A cadeia do pescado é uma das maiscomplexas, com grande número de pesca-

PRÁTICA DE PESCA SUSTENTÁVEL EMENCONTRO DO SETOR

dores artesanais, com métodos variados decaptura, diferentes dos barcos pesqueirosindustriais. A auditoria é minuciosa devidoà exigência de rastreabilidade do peixe, dachecagem dos dados sobre os estoquesda espécie e da verificação das condiçõesde captura e armazenamento, seja no ambi-ente selvagem, seja na criação em fazen-das de aquicultura.

No processo de aprovação da Gomesda Costa, a equipe de auditores identificoue validou a modalidade de captura do atumusada pelos fornecedores da empresa –pesca com vara e isca viva –, que é aponta-da como uma modalidade segura para asoutras espécies marinhas, como golfinhose tartarugas. Também foram certificados oprocesso de produção – que garante a es-tabilidade da matéria-prima e a não conta-minação –, as políticas de sustentabilidadeambiental da fábrica e as ações de respon-sabilidade social e segurança do trabalho.

O evento reuniu não só representantesdo governo e da cadeia produtiva de pes-cados, mas também de redes varejistas.

A Friend of the Sea (Amigo do Mar) éuma ONG que trabalha para a conservaçãodos habitats marinhos por meio decertificação e promoção de produtos dapesca sustentável e aquicultura.

(Fontes: Press release da S/A Comuni-cação e www.pongpesca.wordpress.com)

Foi realizado no Rio de Janeiro, de 13 a15 de setembro, o XVI Fórum Internacional

XVI FÓRUM INTERNACIONAL DE LOGÍSTICA

de Logística. Paralelamente, acontecerá a11a Expo.Logística. Este ano, o evento ga-

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1 N.R.: Principal associação mundial de profissionais de gestão de cadeias de abastecimento. Sem finslucrativos, fornece a liderança no desenvolvimento, na definição e aperfeiçoamento nas profissõesque lidam com logística e gestão de cadeias de abastecimento. Tem como principal objectivo estarna vanguarda dos avanços e desenvolvimentos de profissionais nessas áreas.

2 N.R.: União dos termos em inglês net, que significa “rede”; e working, “trabalhando”. O termo, em suaforma resumida, significa que quanto maior for a rede de contatos de uma pessoa maior será apossibilidade dessa pessoa conseguir uma boa colocação profissional.

nhou uma proporção ainda maior ao inte-grar mais dois fóruns: o Fórum sobreInfraestrutura Logística no Brasil e o FórumGlobal sobre Sustentabilidade na Logística.Este último foi organizado em parceria coma Council of Supply Chain ManagementProfessionals (CSCMP)1 e a AssociaçãoAlemã de Logística (BVL) e visa a uma dis-cussão em torno dos impactos de açõesno setor em uma sociedade sustentável.

O XVI Fórum Internacional de Logísticafoi promovido pelo Instituto de Logística a

Supply Chain (Ilos), enquanto a 11a

Expo.Logística foi organizada pela Fagga/GL Events. Juntos, os dois eventos apre-sentaram cases de importantes empresasdo setor e pesquisas inéditas nas áreas delogística e supply chain.

O evento é um dos principais ambien-tes de networking2 do setor no País, idealpara realização de negócios, divulgaçãode marcas e serviços, além de atualizaçãoprofissional.

(Fonte: MPF Comunicação)

Os apreciadores de barcos e esportesnáuticos encontraram-se, de 4 a 7 de se-tembro último, no 3o Festival Náutico, rea-lizado em Balneário Camboriú, SantaCatarina, promovido pela Tedesco Marina.

Todos os anos, o festival reúne cercade dez mil visitantes. Na 3a edição, foi apre-

3o FESTIVAL NÁUTICO EMBALNEÁRIO CAMBORIÚ

sentado o Salão Novos e Seminovos, emque foram negociadas embarcações de 19a 76 pés.

Também fez parte da programação doevento o Rally Náutico Tedesco Marina.

(Fonte: Presse Comunicação Em-presarial)

Representantes da Marinha e da Secre-taria do Patrimônio da União (SPU) se reu-niram, no Comando do 9o Distrito Naval(Manaus-AM), para definir critérios para acessão de uso do espelho-d’água sobrerios federais. Na reunião, realizada em 15de julho último, foi tratada a questão en-volvendo os terminais flutuantes A.T.R.

DISPUTA ENTRE TERMINAIS FLUTUANTES É PAUTA DEREUNIÃO ENTRE A MARINHA E A SPU

Logística-Chibatão e Super Terminais, noque diz respeito ao uso de águas públicaspara manobra de atracação.

A decisão da SPU, órgão com competên-cia para autorizar a cessão de uso, e da Mari-nha para estabelecer regras para oordenamento e segurança da navegação serádivulgada após os testes de manobrabilidade

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e do estabelecimento dasregras de navegaçãopara cada terminal doconjunto de instalaçõesportuárias localizadasnas proximidades:MOSS Serviços Portuá-rios e Transportes, Equa-torial, Navegação Cunha,Gelocrim, Super Termi-nais, A.T.R. Logística-Chibatão, A.N. Cajuy eCia. Ltda. e ComplexoPortuário Chibatão.

(Fonte: www.mar.mil.br)

Representantes da Marinha e da Secretaria do Patrimônio da Uniãoem reunião no Comando do 9o Distrito Naval

“Trabalhando pela Excelência da Nave-gação na Amazônia”. Este foi o tema da 18a

reunião do Comitê Técnico da Bacia Ama-zônica (CTBA), realizada, na Capitania dosPortos do Amapá (CPAP), de 28 a 30 dejulho último.

Durante a reunião, presidida pelo capi-tão dos portos da Amazônia Oriental, Ca-pitão de Mar e Guerra José Roberto BuenoJúnior, foram tratados temas afetos à segu-rança da navegação na região amazônica,incluindo esforços em padronizar os pro-cedimentos dos agentes da AutoridadeMarítima que atuam na Bacia Amazônica.

MARINHA REALIZA 18a REUNIÃO DO COMITÊ TÉCNICODA BACIA AMAZÔNICA

Participaram também do evento o supe-rintendente da Segurança do TráfegoAquaviário da Diretoria de Portos e Cos-tas, Capitão de Mar e Guerra Mauro Gui-marães Carvalho Leme Filho; o capitão dosPortos da Amazônia Ocidental, Capitão deMar e Guerra Odilon Leite de AndradeNeto; o capitão dos Portos do Amapá, Ca-pitão de Fragata Marcelo de Resende Lima;o capitão dos Portos de Tabatinga, Capi-tão de Fragata Carlos José Amorim da Sil-va; e o delegado fluvial de Santarém, Capi-tão de Corveta (T) Paulo Antônio Carlos.

(Fonte: www.mar.mil.br)

O comandante da Marinha, Almirante deEsquadra Julio Soares de Moura Neto, parti-cipou, entre os dias 28 de junho e 3 de julhoúltimos, do II Simpósio das Marinhas da Co-munidade dos Países de Língua Portuguesa(CPLP), na Base Naval de Luanda, capital da

COMANDANTE DA MARINHA PARTICIPADE SIMPÓSIO EM ANGOLA

Angola. Com o tema “As Marinhas e os De-safios do Século XXI”, o simpósio teve comopropósito aproximar as Marinhas de Guerrados países da Comunidade, promover o in-tercâmbio de informações e fortalecer os la-ços de amizade e solidariedade.

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Durante o simpósio, diversos painéisforam apresentados. Em um deles, que tevea participação dos representantes dasMarinhas da CPLP, o comandante da Mari-nha do Brasil falou sobre os “Desafios daMarinha do Brasil para o Século XXI”; oVice-Almirante Joaquim João Gouveia, daMarinha de Guerra angolana, fez uma ex-planação sobre o “Golfo da Guiné: Oportu-nidade, Desafios e o Papel das Marinhasda Região”; e o Capitão de Mar e GuerraEusébio Manuel Salumbia, da Marinha deGuerra de Moçambique, falou sobre os“Desafios da Marinha de Guerra deMoçambique rumo ao seu crescimento”.

Pela Delegação Brasileira, participaramdo simpósio, além do comandante da Ma-rinha, o Coronel Alessandro PompêuCoêlho, adido de Defesa, Naval, do Exérci-to e da Aeronáutica em Angola e São Tomée Príncipe, e o Capitão de Mar e Guerra(RM1) Emilson Paiva de Faria, assessor deEstratégia e Relacionamentos Internacio-nais do Estado-Maior da Armada. O próxi-mo simpósio das Marinhas da Comunida-de dos Países de Língua Portuguesa ocor-rerá no Brasil, em 2012.

Durante sua estada em Luanda, o Almi-rante de Esquadra Moura Neto participou,no dia 29 de junho, de uma reunião com aembaixadora do Brasil em Luanda, AnaCabral, e representantes da EmpresaGerencial de Projetos Navais (Emgepron),na Embaixada do Brasil em Angola. No mes-mo dia, visitou a Corveta Barroso, que seencontrava atracada no porto de Luanda,onde ofereceu, na noite do dia seguinte,um coquetel para a embaixadora AnaCabral, autoridades locais e delegaçõesparticipantes do simpósio. No local da re-cepção, estavam expostos produtos daEmgepron, como maquetes dos navios-pa-trulha de 200 toneladas, de 500 toneladas elanchas. Os convidados também fizeramuma visita guiada à corveta.

Em 2 de julho, encerrando a passagemda Delegação Brasileira por Angola, hou-ve uma audiência do comandante da Mari-nha do Brasil e da embaixadora do Brasilem Angola com o ministro da Defesa deAngola, Cândido Pereira dos Santos Van-Dúnem, e a ministra da Justiça de Angola,Guilhermina Prata.

(Fonte: www.mar.mil.br)

Foi realizado na Escola de Guerra Naval(EGN), Rio de Janeiro, em 12 e 13 de agostoúltimo, o XIII Simpósio de PesquisaOperacional e Logística da Marinha (XIIISPOLM).

As seguintes palestras foram apresenta-das no evento: “O Sistema de Gerenciamentoda Amazônia Azul”, pelo diretor de Siste-mas de Armas da Marinha, Vice-AlmiranteElis Treidler Öberg; “Dificuldades Logísticasna Exploração de Petróleo Offshore”, pelogerente-geral da Unidade de Serviços deTransporte e Armazenamento da Petrobras,

SIMPÓSIO DE PESQUISA OPERACIONAL ELOGÍSTICA DA MARINHA

Ricardo Albuquerque Araújo; “Aplicaçõesde Pesquisa Operacional para Defesa daAmazônia Azul: Aprendizado Ótimo – Comocoletar dados eficientemente na Era da In-formação”, pelo Professor Doutor Hugo Pas-sos Simão, da Princeton University (EUA);e “Programa de Desenvolvimento do Sub-marino com Propulsão Nuclear”, pelo coor-denador-geral do Programa de Desenvolvi-mento de Submarino com Propulsão Nucle-ar, Almirante de Esquadra (Refo) José AlbertoAccioly Fragelli.

(Fonte: Bono no 553, de 11/8/2010)

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

A discussão de casos periciais tecnica-mente considerados complexos foi o princi-pal propósito do XI Simpósio de PeríciasMédicas da Marinha, evento comemorativoao 152o Aniversário da Primeira Junta de Saú-de da Marinha. O simpósio aconteceu noCentro de Perícias Médicas da Marinha (Rio

XI SIMPÓSIO DE PERÍCIAS MÉDICAS DA MARINHA

de Janeiro), de 27 a 29 de julho último. Naocasião, foram apresentados e discutidosprocedimentos periciais complexos realizadospor várias juntas de saúde da Marinha doBrasil, contribuindo para a divulgação deconhecimentos e para a sua padronização.

(Fonte: Bono no 412, de 21/6/2010)

Após rigorosa avaliação da ComissãoInternacional de Padrão de Competênciade Cursos da Organização HidrográficaInternacional (IBSC), o currículo do Cursode Hidrografia para Oficiais (CAHO) daDiretoria de Hidrografia e Navegação(DHN) foi aprovado, sendo-lhe outorgadaa categoria “A”, o que atribui reconheci-mento internacional à excelência da forma-ção dos oficiais hidrógrafos da Marinhado Brasil.

O currículo foi submetido à apreciaçãoem reunião realizada em Trinidad & Tobago,no período de 5 a 10 de março último. AIBSC é o órgão internacional responsávelpela chancela dos cursos de hidrografiaministrados pelas repartições hidrográficasdos países membros e é constituída pelosseguintes órgãos: Federação Internacionaldos Geômetras (FIG), Organização

EXCELÊNCIA DA FORMAÇÃO DE HIDRÓGRAFOS OBTÉMRECONHECIMENTO INTERNACIONAL

Hidrográfica Internacional (IHO) e Associ-ação Cartográfica Internacional (ICA).

A DHN forma hidrógrafos desde 1933.Entretanto, o CAHO obteve sua primeiraclassificação categoria “A” somente em1993, revalidada em 2002, e novamente sub-metida em 2010, devido aos novos padrõesinternacionais e à redução do prazo de va-lidade de dez para seis anos.

Uma novidade foi a submissão do currí-culo do Curso de Aperfeiçoamento emHidrografia e Navegação (C-AP-HN), apro-vado como categoria “B”, classificação má-xima para o aperfeiçoamento de praças. Des-taca-se que, em vários países, a qualificação“B” é atribuída a cursos de nível superior.

A DHN mantém, assim, o status quo dereferência internacional na formação deoficiais e praças hidrógrafos.

(Fonte: Bono no 553, de 11/8/2010)

A Marinha do Brasil realizou, em 17 deagosto último, no Centro de Educação Fí-sica Almirante Adalberto Nunes (Cefan), acerimônia de juramento à Bandeira e de for-matura de 23 militares atletas de alto rendi-mento do esporte brasileiro. Incorporadosà instituição, esses atletas farão parte das

ATLETAS OLÍMPICOS ENTRAM PARA A MARINHA

equipes esportivas que disputarão os 5os

Jogos Mundiais Militares – Rio 2011.Os atletas militares passaram por um

período de Estágio de Aprendizagem Téc-nico no Cefan para adaptação à vida mili-tar e tiveram contato com as disciplinasde ordem unida, treinamento físico-mili-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

tar, formação militar-naval e preparaçãopara o serviço.

Nesta turma, a quin-ta formada pela Mari-nha, encontram-se no-mes já conhecidos doesporte brasileiro, entreeles, a judoca EdinanciSilva, que disse estarcompletamente adapta-da à vida militar:

“No início, acheique não aguentaria arotina imposta no cur-

so de formação, mas,agora, após quatro se-manas de treinamen-tos intensivos, estoutotalmente adaptada eenquadrada à hierar-quia e à disciplina daMarinha. Só quero sa-ber de aproveitar essaexcelente estruturapara dar sequênciaaos meus treinamen-tos e obter bons re-sultados nas competi-ções de que participa-rei, principalmente os5os Jogos MundiaisMilitares.”

(Fonte: www.mar.mil.br)

Cerimônia de formatura dos atletas incorporados à Marinha do Brasil

A Seleção Militar Brasileira de Volei-bol venceu a Alemanha por 3 x 0 e con-quistou, em 1o de junho último, o títulode Campeã Mundial Militar de Vôlei Fe-

BRASILEIRAS CONQUISTAM O 31o CAMPEONATO MUNDIALMILITAR DE VOLEIBOL FEMININO

minino. O campeonato aconteceu na Basedos Fuzileiros Navais de Cherry Point,no estado da Carolina do Norte, EstadosUnidos.

Judoca Edinanci Silva recebe os cumprimentos do diretor do CEFAN,Contra-Almirante (FN) Fernando Cesar da Silva Motta

(Foto: Futura Press)

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Seleção Brasileira Militar de Vôlei

O título tem um va-lor especial por ser aprimeira participaçãode uma equipe militarbrasileira feminina emCampeonato MundialMilitar de Voleibol.

Na cerimônia de en-cerramento, foram pre-miadas as atletas quese destacaram em cadahabilidade. A Terceiro-Sargento FernandaGaray foi eleita a me-lhor jogadora da com-petição; a Terceiro-Sar-gento Juciely, o melhorbloqueio; e a Terceiro-Sargento Ana Cristina, o melhor saque.

Na oportunidade, o adido do Exército àEmbaixada do Brasil nos Estados Unidos daAmérica e Canadá, General Cid, fez a entre-ga do troféu de campeão mundial militar paraa Terceiro-Sargento Camilla Adão, capitã da

equipe brasileira. O troféu ficará sob a guar-da da delegação do Brasil junto ao Conse-lho Internacional do Esporte Militar (Cism)até o próximo campeonato mundial, a serrealizado no Rio de Janeiro, em 2011.

(Fonte: http://montedocom.dihitt.com.br/)

RESULTADOS ESPORTIVOS

6o CAMPEONATO MUNDIAL MILI-TAR DE FUTEBOL FEMININO

A Seleção Brasileira, representada pe-las atletas da Marinha integrantes do Cen-tro de Educação Física Almirante AdalbertoNunes (Cefan) e por atletas do Clube deRegatas Vasco da Gama, sagrou-se cam-peã invicta da competição, organizada peloConselho Internacional de Esportes Mili-tares (Cism). O campeonato aconteceu emCherbourg (França), de 9 a 19 de junho.Com este resultado, o Brasil conquistou obicampeonato mundial da modalidade, quecontou ainda com a participação de Coreiado Sul, Bélgica, França, Alemanha,Holanda, Estados Unidos e Canadá.

TROFÉU RIO DE JANEIRO DEJUDÔ

Realizado em 19 de junho, na Vila Mili-tar de Deodoro, Rio de Janeiro (RJ). O Guar-da-Marinha (RM2-T) Maycon Herzorg, doCefan, obteve o 3o lugar na categoria+100kg do Circuito Master.

COPA DO MUNDO DA VENEZUELADE JUDÔ

Competição realizada em Isla Margari-da,Venezuela, em 19 e 20 de junho. As atle-tas pertencentes ao Cefan conquistaram osseguintes resultados:

– 2o lugar, Categoria 52kg – MN AndressaFernandes;

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

– 3o lugar, Categoria 52kg – MN RaquelSilva;

– 3o lugar, Categoria 48kg – MN DanielaPolzin;

– 3o lugar, Categoria 63kg – MN CamilaMinakawa.

COPA DO MUNDO DE EL SALVA-DOR DE JUDÔ

Na competição, realizada em 26 e 27 dejunho, em San Salvador, El Salvador, osatletas da Marinha, integrantes da SeleçãoBrasileira e pertencentes ao Cefan, obtive-ram os seguintes resultados:

– 1o lugar, Categoria até 52kg – MNAndressa Fernandes;

– 1o Lugar, Categoria até 63kg – MNCamila Minakawa.

OPEN EUROPEU SÊNIOR DE JUDÔA MN Laísa Santana, integrante da Se-

leção Brasileira e pertencente ao Cefan,obteve o 3o lugar na Categoria até 63kg. Acompetição foi realizada em 26 de junho,em Orenburg, Rússia.

X CIRCUITO PODER MARÍTIMOCom a participação de 494 atletas, entre

militares da Marinha e civis de clubes deRemo do Rio de Janeiro, foi organizada peloCentro de Instrução Almirante Alexandrino(CIAA) e coordenada pela Comissão deDesportos da Marinha, em 26 de junho, a XRegata a Remo Batalha Naval do Riachuelo– Data Magna da Marinha. O evento acon-teceu na Lagoa Rodrigo de Freitas, Rio deJaneiro (RJ). As equipes da Marinha obtive-ram as seguintes colocações:

– Escaler Sub-24: 2o Centro de Instru-ção Almirante Graça Aranha (Ciaga), 3o Es-cola Naval (EN);

– Prova Escaler Aspirante: 1o Ciaga, 2o

Esquadra, 3o Colégio Naval (CN);– Yole 8 A Escola: 1o EN;– Escaler Misto: 2o Ciaga, 3o Esquadra;

– Double-Skiff D: 2o Piraquê-B, 3o

Piraquê-A;– Escaler Veterano: 1o Esquadra, 2o

Ciaga, 3o Comando-Geral do Corpo de Fu-zileiros Navais (CGCFN);

– Escaler Feminino: 1o Ciaga, 2o Esqua-dra, 3o Diretoria-Geral do Material da Mari-nha (DGMM);

– 8 Aspirante: 2o EN; e– Escaler Senior: 1o CGCFN, 2o Ciaga, 3o

EN.

II ULTRAMARATONA DE 24 HO-RAS DE LEOGNAN

O Suboficial (FN) Sebastião da Guia, do2o Batalhão de Infantaria de Fuzileiros Na-vais (2oBtlInfFuzNav), obteve o 2o lugar nacompetição, com 198 km percorridos. AUltramaratona foi realizada em 19 e 20 dejunho, em Leognan, França.

CAMPEONATO ESTADUAL DENATAÇÃO

Competição realizada de 25 a 27 de ju-nho, no Parque Aquático do FluminenseFootball Club, no Rio de Janeiro (RJ). OPrimeiro-Tenente (RM2-T) Leonardo Diasda Silva, integrante da equipe de nataçãoda Marinha e pertencente ao Cefan, obte-ve os seguintes resultados: 1o lugar nos100m peito masculino (1’05'’83) e nos 200mpeito masculino (2’26'’09) e 2o lugar nos50m peito masculino (29'’90).

II ETAPA DO CIRCUITO ATHENAS– 10 MILHAS

Realizada no Aterro do Flamengo, Riode Janeiro-RJ, em 27 de junho. O Servi-dor Civil Murilo Teixeira da Cunha, daDiretoria do Patrimônio Histórico e Do-cumentação da Marinha, obteve o 1o lu-gar na colocação geral por categoria, como tempo de 1h00m33s. O atleta represen-tou a equipe Ilha Fiscal na modalidadecorrida/maratona.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

V COPA LEÃO DE KARATÊO Cabo (FN) Victor Hugo Maciel, do

Batalhão de Controle Aerotático e DefesaAntiaérea (BtlCtAetatDAAe), ficou em 1o

lugar na Categoria Kata Adulto. A compe-tição aconteceu no Cefan, em 27 de junho.

XVII CAMPEONATO BRASILEIRODE KARATÊ INTERESTILOS

A competição foi realizada de 1o a 4 dejulho, na cidade de Goiânia (GO). Os milita-res integrantes da seleção da Marinha des-tacaram-se com os seguintes resultados:

– Categoria Até Faixa Verde – Absoluto:3oSG (FN) André Góis Vieira (2oBtlInfFuzNAv),1o lugar – Kata e Kumitê.

– Categoria Faixa Roxa a Preta – até 65 Kg– Kumitê: CB (FN) Tiago Cordeiro dos San-tos, do Batalhão de Comando e Controle(BtlCmdoCt), 2o lugar; e CB (FN) Alexanderde Brito Oliveira, do Batalhão de Artilharia deFuzileiros Navais (BtlArtFuzNav), 3o lugar.

– Categoria Faixa Preta – 21 a 35 anos –Kata: CB (FN) Victor Hugo das Chagas R.Maciel, do BtlCtAetatDAAe, 1o lugar.

– Categoria Adulto – Kata Equipe: CB (FN)Victor Hugo das Chagas R. Maciel, 2o lugar;CB (FN) Tiago Cordeiro dos Santos, 2o lugar.

– Categoria Bunkai – Kata Equipe: CB (FN)Victor Hugo das Chagas R. Maciel, 3o lugar;CB (FN) Tiago Cordeiro dos Santos, 3o lugar.

– Categoria Kumitê Adulto Absoluto –Equipe: CB (FN) Victor Hugo das Chagas R.Maciel, CB (FN) Tiago Cordeiro dos Santos eCB (FN) Alexander de Brito Oliveira, 1o lugar.

76a PROVA PEDESTRE DE 9 DE JU-LHO 2010

Competição realizada em Guaratinguetá –SP. O SO (FN) Valdemir Fênix de Lima, doCefan, obteve o 4o lugar nos 10km – 50 a 54anos, entre 30 competidores em sua categoria.

CAMPEONATO CHICAS BAJO CEROAs Marinheiras Renata Decnop e

Fernanda Decnop, integrantes da Equipe

Brasileira Militar de Vela e pertencentes aoCefan, obtiveram o 2o lugar na ClasseMagic 21 Match Race. A competição foirealizada entre 9 e 11 de julho, no ClubeNáutico Mar del Plata, Argentina.

REGATA BENJAMIN SODRÉ JR.O 1o Ten Leonardo Mataruna e a MN

Juliana Senfft, integrantes da Equipe de Velada Marinha e pertencentes ao Cefan, obti-veram o 3o lugar Classe J24 – Fleet Race. Acompetição foi realizada pelo Iate Clube doRio de Janeiro em 10 de julho, na Baía deGuanabara, Rio de Janeiro (RJ), contandocom a participação de oito equipes.

VI COPA MINAS DE JUDÔNa competição, realizada em 10 e 11 de

julho, no Minas Tênis Clube, em Belo Ho-rizonte-MG, os integrantes da equipe deJudô da Marinha e pertencentes ao Cefanobtiveram os seguintes resultados:

– Categoria 57kg – 1o lugar MN KetleynLima Quadros;

– Categoria 63kg – 2o lugar MNKatherine Campos;

– Categoria 70kg – 2o lugar MN YasmimSantos Valverde;

– Categoria 63kg – 3o lugar MN CamilaMinakawa;

– Categoria 81kg – 1o lugar MN RobertoVicente Gomes; e

– Categoria 60kg – 5o lugar MN MichelMarcos Lima.

54o JOGOS REGIONAIS DO INTERI-OR DE SÃO PAULO

Realizados no Ginásio da Universidadede Ribeirão Preto (Unaerp), no Guarujá-SP,em 10 e 11 de julho. A MN AndressaFernandes obteve o 1o lugar na Categoria52kg, e a MN Daniele Yuri Barbosa ficoucom o 2o na Categoria 63 kg. Ambas perten-cem ao Cefan e integram a equipe brasileiramilitar de Judô.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

CAMPEONATO BRASILEIRO SUB-23 DE JUDÔ

Competição realizada nos dias 17 e 18de julho, em Curitiba (PR). As atletas daMarinha, integrantes da Equipe de Judô epertencentes ao Cefan, obtiveram os se-guintes resultados: MN Yasmim Valverde,1o lugar na Categoria até 70kg; MN CamilaMinakawa, 1o lugar na Categoria até 63kg;MN Giullia Penalber, 1o lugar na Categoriaaté 57kg; MN Raquel Lopes Silva, 3o lugarna Categoria até 52kg; e MN Cristiane Pe-reira, 3o lugar na Categoria até 48kg.

VIII REGATA CORPO DE FUZILEI-ROS NAVAIS DE REMO EM ESCALER– CIRCUITO PODER MARÍTIMO

Com a participação de 498 atletas, entremilitares da Marinha e civis de clubes deremo do Rio de Janeiro, foi organizada peloComando-Geral do Corpo de FuzileirosNavais e coordenada pela Comissão deDesportos da Marinha (CDM), em 18 dejulho, no Estádio de Remo da Lagoa.

O resultado final das equipes da Mari-nha foi o seguinte:

– Escaler Sub-24: 1o Ciaga, 2o CN;– Escaler Aspirante: 1o Esquadra, 2o EN-

B, 3o Ciaga;– Escaler Misto: 2o Esquadra, 3o Ciaga-A;– Single-Skiff Aspirante: 1o EN;– Escaler Veterano: 1o Esquadra, 2o

CGCFN, 3o DHN;– Yole A 8 Escola: 2o EN;– Escaler Feminino: 1o Esquadra, 2o

CGCFN, 3o DGMM;– Escaler Senior: 1o CGCFN, 2o Esqua-

dra, 3o Ciaga.

19o CAMPEONATO MUNDIAL MI-LITAR DE TAEKWONDO

Realizado em St. Jean Sur Richelieu,Quebec-Canadá, de 14 a 21 de julho. Osatletas integrantes da equipe da Marinha epertencentes ao Cefan obtiveram os se-guintes resultados:

– MN Kátia Arakaki, 1o lugar Até 46kg;MN Aparecida Santana, 1o lugar Até 62Kg;MN Hellorayne Paiva, 3o lugar Acima de73Kg; MN Michael Silva, 3o lugar Até 54Kg;e MN Douglas Marcelino, 3o lugar Até 87kg.

REGATA ELDORADO ALCATRAZESPOR BORESTE – MARINHA DO BRASIL

Entre nove equipes participantes, o MNPedro Trouche ficou em 2o lugar na classi-ficação geral da Classe ORC-Club 600. Acompetição foi realizada em 18 de julho, emIlhabela (SP), como etapa da 37a RolexIlhabela Sailing Week. O atleta da Marinhaé integrante da Equipe Brasileira Militar deVela e pertencente ao Cefan.

CAMPEONATO MUNDIAL DE VELADA CLASSE 470

Competição realizada de 11 a 18 de julho,em Hague, Holanda. As MN Martine Grael eIsabel Swan, atletas da Marinha pertencentesao Cefan e integrantes da Equipe BrasileiraMilitar de Vela obtiveram o 7o lugar na ClasseMedal Race, com 61 equipes participantes.

37a ROLEX ILHABELA SAILINGWEEK

De 18 a 25 de julho, em Ilhabela-SP. OMN Rafael Pariz obteve o 1o lugar nas Clas-ses ORC Club Internacional e Beneteau 40.Ele pertence ao Cefan e integra a EquipeBrasileira Militar de Vela.

VI REGATA “A MULHER NA MARI-NHA – 30 ANOS” DE REMO EMESCALER – 10o CIRCUITO PODERMARÍTIMO 2010

Contando com a participação de 450 atle-tas, entre militares da Marinha e civis declubes de remo do Rio de Janeiro, foi orga-nizada pelo Serviço de Seleção do Pessoalda Marinha e coordenada pela CDM. Rea-lizada em 31 de julho, no Estádio de Remoda Lagoa. O resultado final das equipes daMarinha foi o seguinte:

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306 RMB3oT/2010

NOTICIÁRIO MARÍTIMO

– Escaler Sub 24 500m: 1o Ciaga, 2o CN,3o EN;

– 2 com Aspirante 500m: 1o EN;– Escaler Aspirante 500m: 1o Esquadra,

2o Ciaga, 3o CN;– Escaler Misto 500m: 2o Ciaga, 3o Es-

quadra;– Escaler Veterano 500m: 1o Esquadra,

2o CGCFN, 3o Ciaga;– Escaler Feminino 500m: 1o Esquadra,

2o Ciaga, 3o CGCFN; e– Escaler Senior 500m: 1o CGCFN, 2o

Esquadra, 3o EN.

REGATA “A BAÍA É NOSSA DAGUANABARA”

Competição realizada em 31 de julho, noRio de Janeiro-RJ. Os seguintes atletas inte-grantes da Equipe Brasileira Militar de Velae pertencentes ao Cefan obtiveram o 3o lu-gar Classe J24, estilo Fleet Race: 1o Ten Leo-nardo Mataruna, MN Juliana Senfft, MNPedro Trouche, MN Thomas Low-Beer.

COPA DO MUNDO DE JUDÔ POREQUIPES MASCULINAS

Os MN Bruno Mendonça e Walter San-tos obtiveram o 3o lugar na competição, re-alizada em Belo Horizonte e Salvador (fasefinal), de 27 a 31 de julho.

3a MARATONA PÃO DE AÇÚCARDE REVEZAMENTO

Realizada em 1o de agosto, na Esplanadados Ministérios, Brasília–DF, com a parti-cipação de 1.181 equipes de revezamento.Entre 7 mil participantes, a equipe da Mari-nha, composta por militares do Grupamentode Fuzileiros Navais de Brasília, Centro deInstrução e Adestramento de Brasília e Es-tação Rádio da Marinha em Brasília, obte-ve o 3o lugar na categoria Equipe de OitoAtletas, com o tempo de 2:43:06. Composi-ção da equipe: CF José Benoni ValenteCarneiro (encarregado), CT (AFN) Luciano

Ferreira de Sousa, 1oSG Arnaldo LucianoPorfírio, SD (FN) Jonathan Rodrigues San-tos, SD (FN) José Isael da Silva, SD (FN)Rafael Honório Matos, SD (FN) AparecidoMoreira França, SD (FN) Alessanco Batis-ta Ferreira e SD (FN) Valdecir Venâncio.

TORNEIO REGIONAL DE PENTATLONAVAL

Realizado de 8 a 13 de agosto, emEckernförde, Alemanha. A equipe da Mari-nha do Brasil, representada por nove mili-tares atletas integrantes do Cefan, obteveos seguintes resultados: Feminino, 1o lu-gar; Masculino – 2o lugar; Individual – MNSimone, 2o lugar e SG Geisel, 3o lugar.

DESAFIO CEFAN RIO X SÃO PAU-LO DE BOXE

Realizado como sequência ao treina-mento para os 5o Jogos Mundiais MilitaresRio-2011. O Desafio aconteceu em 14 deagosto, no ginásio do Cefan, no Rio de Ja-neiro. Na competição, organizada pela Con-federação Brasileira de Boxe e disputadaem seis categorias, os atletas da Marinha,integrantes da Seleção Brasileira Militar deBoxe, obtiveram os seguintes resultados:MN Robson Conceição, 1o lugar Pena; MNDídimo Silva, 1o lugar Meio-Médio Ligei-ro; MN Ualace Arcanjo, 1o lugar Meio-Médio; MN Pedro Lima, 1o lugar Médio;MN Elber Passos, 1o lugar Meio-Pesado;CB Tarcísio Santos Neri, 2o lugar Pesado.

VII REGATA A REMO COLÉGIO NA-VAL – X CIRCUITO PODER MARÍTIMO

Com a participação de 500 atletas, entremilitares da Marinha e civis de clubes de remodo Rio de Janeiro, foi organizada pelo ColégioNaval e coordenada pela CDM, em 21 de agos-to, em Angra dos Reis. O resultado final dasequipes da Marinha foi o seguinte:

– Escaler Sub-24: 1o EN, 2o CIAA, 3o

Ciaga;

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RMB3oT/2010 307

NOTICIÁRIO MARÍTIMO

– Escaler Aspirante 500m: 1o EN, 2o

CIAA, 3o Esquadra;– Escaler Mista: 2o Ciaga, 3o CIAA;– Yole 8 A Escola 500m: 1o EN;– Escaler Veterano 500m: 1o Esquadra,

2o CGCFN, 3o Ciaga;– Escaler Feminino: 1o Ciaga, 2o CGCFN,

3o Esquadra; e– Escaler Senior:1o CGCFN, 2o Esqua-

dra, 3o EN.

REGATA 6 HORAS DA ENSEADADE SÃO FRANCISCO

O MN Pedro Henrique Trouche de Sou-za, da Equipe Brasileira Militar de Vela e per-tencente ao Cefan, conquistou o 1o lugargeral na Classe Laser. A competição foi rea-lizada pelo Iate Clube Brasileiro em 14 e 15de agosto, na cidade do Rio de Janeiro-RJ.

II GRAND PRIX PAULISTA DE JUDÔO MN Bruno Mendonça, pertencente

ao Cefan e integrante da equipe de judô daMarinha, ficou em 1o lugar na Categoria Até73kg. A competição foi realizada pela Fede-ração Paulista de Judô, em 20 de agosto,na cidade de São Paulo – SP.

CAMPEONATO ESTADUAL DEATLETISMO DO RIO DE JANEIRO

Realizado de 20 a 22 de agosto na cida-de do Rio de Janeiro – RJ. O 1oSG ArilenoMesquita de Sousa, atleta pertencente aoCefan, obteve índice para o Troféu Brasilde Atletismo com o 1o lugar no Arremessode Peso e o 2o em Lançamento de Disco.

I JOGOS IBERO-AMERICANOS DEPOLÍCIAS E BOMBEIROS

Realizados pela Confederação Brasileirade Esportes das Polícias e Bombeiros, em 21de agosto, na Cidade de Manaus – AM. Osatletas integrantes da Equipe de Judô daMarinha e pertencentes ao Cefan conquista-ram a 3a colocação geral da competição com

os seguintes resultados: MN Michel Mar-cos do Nascimento Lima – 1o lugar na Cate-goria Até 60kg; MN William Cardoso Ferreira– 1o na Categoria Até 66kg; MN RobertoVicente Gomes – 1o na Categoria Até 81kg;CB (FN) Henrique Maria da Silva – 1o na Cate-goria + 100kg; e 2oSG José Geovane BrandãoGomes – 2o na Categoria Até 73kg.

TORNEIO INTER-REGIONAL CIRCUI-TO ALTO RENDIMENTO

Competição realizada pela Federação deJudô do Estado do Rio de Janeiro em 21 e 22de agosto, no Rio de Janeiro-RJ. Os atletasintegrantes da Equipe Brasileira Militar deJudô e pertencentes ao Cefan obtiveram osseguintes resultados: 1o lugar Categoria Até57kg – MN Giullia Penalber; 1o na CategoriaAté 78kg – MN Ericka Wergles Cunha; 2o

na Categoria Até 52kg – MN Raquel LopesSilva; 2o na Categoria Até 63kg – MNKatherine Campos; e 2o na Categoria Até70kg – MN Yasmin Santos Valverde.

MATCH RACE MINAS GERAIS 2010– 7a EDIÇÃO

O MN Rafael Pariz obteve o 1o lugar geralna Classe Microtonner 19, e o MN PedroHenrique Trouche de Souza ficou com o 2o

lugar geral na mesma categoria. Ambos sãointegrantes da Equipe Brasileira Militar de Velae pertencentes ao Cefan. A competição, daFederação Internacional de Vela, foi realizadapelo Iate Clube Lagoa dos Ingleses em 21 e 22de agosto na cidade de Nova Lima – MG.

REGATA PAOLO PIRANICompetição realizada pelo Iate Clube do

Rio de Janeiro em 21 e 22 de agosto, na cida-de do Rio de Janeiro-RJ. Os atletas integran-tes da Equipe Brasileira Militar de Vela e per-tencentes ao Cefan obtiveram os seguintesresultados: 1o Ten Leonardo Mataruna, MNFernanda Decnop e MN Renata Decnop –3o lugar geral na Classe J24.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

SUPERCOPA SAMEL DE JUDÔRealizada pela Federação de Judô do

Estado do Amazonas, em 22 de agosto, emManaus – AM. Os atletas do Cefan inte-grantes da Equipe de Judô da Marinha ob-tiveram os seguintes resultados: 1o lugarCategoria Até 60kg – MN Michel Marcosdo Nascimento Lima; 1o na Categoria Até73kg – 2oSG José Geovane Brandão Go-mes, 1o na Categoria Até 81kg – MN RobertoVicente Gomes; e 1o na Categoria + 100kg –CB (FN) Henrique Maria da Silva.

MEIA MARATONA INTERNACIO-NAL DO RIO DE JANEIRO

A competição de atletismo aconteceuem 22 de agosto, com a participação de 9mil competidores. Os atletas pertencentesao Cefan obtiveram os seguintes resulta-dos: 1o lugar Faixa Etária 30-34 anos – 3oSGAlex Passos; 3o lugar Faixa Etária 40-44 anos– CB Carlos Matos Lopes; 6o lugar FaixaEtária 50-54 anos – SO (RM1-FN) ValdemirFeliz de Lima;e 8o lugar Faixa Etária 30-34anos – MN Cosme Ancelmo de Souza.

MATCH RACE BRASILCompetição de vela da classe ORC-In-

ternacional realizada pelo Iate Clube do Riode Janeiro, de 26 a 29 de agosto, no Rio deJaneiro-RJ. Os militares atletas integrantesda Equipe Brasileira Militar de Vela e per-tencentes ao Cefan obtiveram, entre dezembarcações de nível internacional, o 5o

lugar da disputa, utilizando um barco daEscola Naval e contando com a participa-

ção de cinco aspirantes na tripulação: Ma-rinheiros Rafael Pariz, Fernanda Decnop ePedro Trouche; da Escola Naval, Aspiran-tes Diego Bomfim De Souza, Mario JardimStavale, Ariel Dantas, Gabriel Selvatice eCaio Lovato.

COPA DO MUNDO DE MIAMI DEJUDÔ

Realizada pela USJudo (Federação deJudô dos Estados Unidos), em 27 e 28 deagosto, em Miami-EUA. Foram os seguin-tes os resultados obtidos pelos atletas daEquipe Brasileira Militar de Judô e perten-centes ao Cefan: 1o lugar Categoria Até52kg – MN Andressa Fernandes, 1o na Ca-tegoria Até 63kg – MN Danielli Yuri Barbo-sa, e 2o na Categoria Até 63kg – MN CamilaMinakawa.

INTERESTADUAL SP 2010 DE JUDÔCompetição realizada pela Federação

Paulista de Judô em 28 e 29 de agosto, emSanto André – SP. A MN Claudirene Cesarobteve o 1o lugar na Categoria +78kg. Aatleta integra a Equipe Brasileira Militar deJudô e pertence ao Cefan.

US OPEN DE JUDÔNa competição, realizada pela USJudo em

29 de agosto, em Miami-EUA, os militaresatletas integrantes da Equipe Brasileira Mili-tar de Judô e pertencentes ao Cefan obtive-ram os seguintes resultados: 1o lugar Cate-goria Até 48kg – MN Taciana Lima; e 2o Cate-goria Até 63kg – MN Katherine Campos.

O Esquadrão VF-1 realizou, de 15 a 19 demarço último, um feito inédito em seus onzeanos de história: Deslocou-se para a Base Aé-rea de Natal (RN) com quatro aeronaves, sendodois AF-1 e dois AF-1A. Durante o traslado de

ESQDVF-1 REALIZA MISSÃO EM CONJUNTO COM A FAB

ida, foi realizado adestramento de reabasteci-mento em voo (Revo), com o apoio da aerona-ve Hércules KC-130 da Força Aérea Brasileira(FAB), o Barão 62 do Primeiro Esquadrão doPrimeiro Grupo de Transporte 1/1 GT.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Aeronaves realizando Revo

A faina de reabastecimento foi realiza-da sobre o Oceano Atlântico, ao longoda costa dos estados da Bahia e deAlagoas, durando aproximadamente umahora, tempo necessário para reabastecertoda a esquadrilha.

Após a chegada a Natal, foram realiza-dos voos de qualificação em Navegação aBaixa Altura (NBA) e de adestramento deemprego de armamento ar-solo no estandede tiro de Maxaranguape. O estágio de NBAconsiste em voos de navegação tática a300 pés sobre o terreno, empregando a ve-locidade de 420 nós, e forma as bases paraexecução de missões de reconhecimentoarmado e ataque ao solo. Durante a estadaem Natal, o VF-1 foi apoiado pelo 1/4 GAv,Esquadrão Pacau da FAB, que colocou àdisposição as suas instalações para o apoiooperacional do VF-1.

No regresso à Base Aérea Naval de SãoPedro da Aldeia (BAeNSPA, no estado doRio de Janeiro), sede do Esquadrão, foramrealizados adestramentos de reabastecimen-to em voo, novamente com a participação doBarão 62, que, além de prover o combustívelnecessário para o retorno seguro das aero-naves, também efetuou o transporte do ma-terial e do pessoal participante da missão.Também neste voo, mais uma marca inéditafoi alcançada: a do voo mais longo realizadopor aeronaves AF-1/1A no Brasil, com a du-ração de quatro horas e 12 minutos.

A missão terminou com uma passagembaixa da esquadrilha sobre a BAeNSPA,coroando com sucesso a missão, que con-tribuiu para solidificar os laços de amizadee cooperação entre a Marinha do Brasil e aForça Aérea Brasileira.

(Fonte: A Macega no 42, jan./abr. 2010)

A Marinha, o Exército e a Força Aérea re-alizaram, de 19 a 30 de julho último, a Opera-ção Conjunta Atlântico II, o maior exercícioconjunto já realizado, desenvolvendo-se emtoda a Amazônia Azul e nos estados do Riode Janeiro, São Paulo e Espírito Santo, bemcomo nos arquipélagos Fernando de Noronhae São Pedro e São Paulo.

A coordenação foi do Ministério da De-fesa e o comando ficou a cargo do coman-

OPERAÇÃO CONJUNTA ATLÂNTICO II

dante de Operações Navais, Almirante deEsquadra Marcus Vinícius Oliveira dos San-tos, tendo como principal motivação o trei-namento das Forças Armadas para a defesados interesses do País. A Operação Atlânti-co II foi resultado de um complexo planeja-mento realizado por um Estado-Maior Con-junto, composto por oficiais e praças dastrês Forças Armadas, que visou, fundamen-talmente, à preparação para a defesa dos

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recursos do mar e das infraestruturas de altovalor estratégico do Sudeste do Brasil.

Dois cenários de ameaça foram elabora-dos: o primeiro, relacionado aos recursospetrolíferos, se desenvolveu nas áreas dasbacias de Campos, Espírito Santo e Santos eda infraestrutura de petróleo e gás da RegiãoSudeste; o segundo, relacionado à pesca,junto aos arquipélagos Fernando de Noronhae São Pedro e São Paulo. Nesse sentido, aOperação teve uma amplitude geográfica esimultaneidade de ações, inerente à defesados ricos recursos brasileiros ao longo dacosta, bem como da Região Sudeste, de ex-trema importância econômica para o Brasil.

Cerca de 10 mil militares participaram daOperação, em atividades operacionais, deapoio à população e na simulação de com-bate. Estiveram envolvidos meios da Mari-nha do Brasil, do Exército Brasileiro e daForça Aérea Brasileira.

Além das atividades essencialmentemilitares, foram realizadas Ações Cívico-Sociais (Aciso) em diversos municípios,visando integrar e assistir segmentos dasociedade residente nas regiões onde oexercício aconteceu.

Nas Aciso foram feitos atendimentos mé-dicos e odontológicos e aulas de primeirossocorros e higiene. Em uma outra vertente daOperação, buscou-se destacar a importânciada Amazônia Azul, tão relevante quanto aAmazônia Verde, em todas as suas caracte-rísticas – econômica (petróleo e gás, pesca erecursos minerais), ambiental e científica –,além de fortalecer a mentalidade marítima dasociedade brasileira.

Uma Operação Conjunta é um modernoconceito de aplicação de forças militaresde mar, terra e ar, de forma coordenada, para

atingir um objetivo que seja de interessepara o país, como, por exemplo, a defesa deáreas de grande atividade econômica.

Já o exercício simulado trata-se de umaoperação de guerra moderna, cujo cenárioenvolve a defesa dos interesses brasileirosna Amazônia Azul e de parcela da RegiãoSudeste contra a possibilidade de cobiça es-trangeira dos recursos petrolíferos e pesquei-ros da Zona Econômica Exclusiva (ZEE), comação de meios convencionais e assimétricos.

Foram realizados, entre outros, os se-guintes exercícios:

Marinha – Defesa de Ilha Oceânica,Controle de Área Marítima, Operação An-fíbia, Operações Especiais, Defesa de Por-tos e Áreas Sensíveis, Contramedidas deMinagem e Minagem Defensiva de Portos.

Exército – Defesa de InfraestruturasEnergéticas (Angra dos Reis e Macaé), De-fesa de Costa, Defesa de Indústrias de Mate-rial de Defesa, Operações Especiais, DefesaExterna de Portos e Terminais Petrolíferos.

Força Aérea - Patrulha Marítima, Missõesde Ataque, Transporte Aéreo Logístico eCoordenação e Controle do Espaço Aéreo.

Ao final da Operação, o comandante doComando Conjunto Atlântico II expediu aseguinte mensagem:

“Encerradas as atividades da OperaçãoConjunta Atlântico II, dirijo-me a todos osmilitares e civis das Forças Armadas e ins-tituições da nossa sociedade que dela par-ticiparam, para agradecer o esforço, oprofissionalismo e a dedicação demonstra-dos no desempenho de suas tarefas.

Além dos efetivos das três Forças Ar-madas, cerca de 10 mil militares, devoenfatizar a inestimável colaboração daPontifícia Universidade Católica do Rio de

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Janeiro e da Universidade Federal do Riode Janeiro, que nos apoiaram desde a fasede planejamento desta Operação. A atua-ção de seus professores e alunos contri-buiu de forma extremamente profissionalpara a obtenção de um excelente resultadonas atividades de Comunicação Social daOperação. A participação ativa do Centrode Comunicação Social da Marinha foi fun-damental para a divulgação, junto à mídia eà população brasileira, das atividades de-senvolvidas. No período da execução, de19 a 30 de julho, mais de 22 mil acessos aosite da operação foram registrados.

Cabe ainda ressaltar a importante partici-pação da Petrobras S/A, no Exercício deRetomada de Plataforma, empregando-seuma de suas mais novas plataformas de pe-tróleo, onde a coordenação entre o Coman-do Conjunto e o Centro de Operações daPetrobras ocorreu de forma coordenada eperfeita, permitindo uma excelente troca deinformações entre comandos durante o Con-trole de Área Marítima executado pela Es-quadra. Tal fato representou mais um impor-tante passo na consolidação da parceria exis-tente entre a Petrobras e as Forças Arma-das. Da mesma forma, destaca-se o apoioprestado pela Eletrobrás Termonuclear S/Ano Exercício de Proteção à Usina Nuclear deAngra dos Reis. Este apoio foi fundamentalpara que a Força Terrestre pudesse testar assuas capacidades de guarnecimento e pro-teção daquela área sensível.

A sinergia obtida nos trabalhos dos es-tados-maiores durante as fases de planeja-mento e execução e o comprometimento in-dividual e a criatividade dos homens e mu-lheres que trabalharam nessa Operação fo-ram fatores primordiais para o sucesso al-cançado e, seguramente, são indicadoresde que, em relação ao preparo do pessoal,temos condições de responder à altura àspossíveis demandas relacionadas à defesada soberania de nosso país. A complexida-

de dessas demandas se fez presente na me-dida em que a proteção do território nacio-nal, aí incluídas toda a Bacia de Campos einfraestruturas logísticas de petróleo e asregiões dos arquipélagos de Fernando deNoronha e São Pedro e São Paulo, implicoua necessidade de um eficaz controle maríti-mo e terrestre de extensas dimensões.

Dentre os aprendizados e experimenta-ções, destacam-se: o ineditismo de realizaroperações militares conjuntas emFernando de Noronha, ressaltando a im-portância militar do arquipélago na defesado Brasil; a defesa da Bacia de Campos; eo Comando Logístico do TO.

Durante a Operação, muitas foram as tare-fas executas pelas forças, tais como: a Defe-sa de Ilha Oceânica; o Controle de Área Ma-rítima; a Operação Anfíbia; as OperaçõesEspeciais; a Defesa de Portos e Áreas Sensí-veis; a Defesa de Infraestruturas Energéticas(Angra dos Reis e Macaé); Defesa de Costa;Defesa de Indústrias de Material de Defesa;Defesa de Portos e Terminais Petrolíferos; aPatrulha Marítima; as Missões de Ataque; oTransporte Aéreo Logístico; e Coordenaçãoe Controle do Espaço Aéreo.

Além das atividades essencialmente mi-litares, foram conduzidas Ações Cívico-So-ciais (Aciso) em diversos municípios, inclu-indo o arquipélago de Fernando de Noronha,visando integrar e assistir segmentos dasociedade residentes na região onde o exer-cício foi realizado. As Aciso incluíram aten-dimentos médicos e odontológicos e aulasde primeiros socorros e higiene, tendo havi-do grande reconhecimento por parte daspopulações atendidas.

Finalmente, é com satisfação que reno-vo os meus cumprimentos a todos pela ex-celente participação na Operação Atlânti-co II e apresento o meu ‘Bravo Zulu’ pelamissão bem cumprida.”

(Fontes: www.mar.mil.br e Bono Especi-al no 532, de 3/8/2010)

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ASSINATURA DO TERMO DECESSÃO DE USO DO TERRENOPARA CONSTRUÇÃO DEESTALEIRO E BASE NAVAL

Em 4 de agosto último, na Diretoria-Ge-ral do Material da Marinha (Rio de Janeiro-RJ), foi assinado o termo de cessão de usodo terreno para construção de um estaleiroe de uma base naval em Itaguaí (RJ). O do-cumento foi assinado pelo diretor-geral doMaterial da Marinha, Almirante de Esqua-dra Luiz Umberto de Mendonça, e pelo pre-sidente da Companhia Docas do Rio deJaneiro, Jorge Luiz de Mello.

O termo é fruto de um criterioso traba-lho e de ações empreendidas pela Diretoriade Administração da Marinha no processode aquisição do terreno. A assinatura dodocumento é um grande passo para aconcretização do Programa de Desenvol-vimento de Submarino com Propulsão Nu-clear (Prosub), uma vez que permite o usoimediato do terreno para as instalações daMarinha. Sob a coordenação da Diretoria-

SUBMARINO NUCLEAR

Almirante de Esquadra Mendonça (ao centro) assina o termo de cessãode uso do terreno para construção de um estaleiro e de uma base naval

Geral do Material daMarinha, o Programaabrange a construçãode um estaleiro, umabase naval, uma unida-de de fabricação de es-trutura metálica, quatrosubmarinos convenci-onais e um submarinocom propulsão nuclear.

No evento, estiverampresentes o coordena-dor-geral do Prosub, Al-mirante de Esquadra(Refo) José AlbertoAccioly Fragelli; o dire-tor de Administração daMarinha, Vice-Almirante

(IM) Indalecio Castilho Villa Alvarez; e o di-retor de Obras Civis da Marinha, Vice-Almi-rante Luiz Guilherme Sá de Gusmão.

(Fonte: www.mar.mil.br)

MARINHA RECEBE LICENÇA DOIBAMA PARA OBRAS DEESTALEIRO E BASE NAVAL

O Instituto Brasileiro do Meio Ambientee dos Recursos Naturais Renováveis(Ibama) autorizou o início das obras do es-taleiro e da base naval para construção desubmarinos convencionais e de propulsãonuclear da Marinha. O empreendimento seráimplantado na Baía de Sepetiba, Ilha Madei-ra, município de Itaguaí, no estado do Riode Janeiro. O estaleiro e a base destinam-seà fabricação, manutenção e comando desubmarinos. O empreendimento será insta-lado em aterro hidráulico protegido porenrocamento, num total de 413 mil m².

A Licença de Instalação assinada pelopresidente do Ibama, Abelardo Bayma, con-tém 12 condicionantes, dentre as quais se

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

destacam a exigência de programas demonitoramento da biota aquática, dos se-dimentos resultantes das atividades dedragagem e do gerenciamento de riscosambientais.

Por se tratar de projeto militar, olicenciamento ambiental é de competênciado Ibama, conforme determina a Resolu-ção Conama no 237/97.

(Fonte: Assessoria de ComunicaçãoSocial do Ibama)

PRIMEIRO CORTE DE CHAPA

Começaram a sair do papel os acordosfirmados entre a França e o Brasil na áreanaval. Foi realizado o primeiro corte de chapadestinada ao submarino brasileiro, em ceri-mônia que contou com a presença de cercade cem pessoas, inclusive autoridades da

Rio de Janeiro, realizada nos dias 1o, 2 e 5de julho último, pôde cadastrar currículosno banco de dados da empresa Odebrechte conhecer o Programa de Qualificação Pro-fissional Continuada – Acreditar. Esse pro-grama, implantado por solicitação da Mari-nha do Brasil (MB), tem o propósito decontratar e formar profissionais da regiãopara atuar na construção do estaleiro e dabase de submarinos da força, que farãoparte do Complexo Militar-Naval da Mari-nha, na Ilha da Madeira, Itaguaí.

Por meio do programa, 123 moradoresde Itaguaí que concluíram os cursos dequalificação já foram contratados pelaOdebrecht e estão atuando nas obras comoajudante, meio-oficial armador, meio-oficialcarpinteiro e meio-oficial pedreiro.

Marinha do Brasil, representantes do grupobrasileiro Odebrecht e vários executivos dacompanhia francesa DCNS. A cerimônia foirealizada em Cherbourg, França, e a comitivada Marinha, composta por almirantes e ou-tros oficiais, foi liderada pelo diretor-geral doMaterial da Marinha, Almirante de EsquadraLuiz Umberto de Mendonça.

(Fonte: Tecnologia & Defesa no 121)

ESTALEIRO E BASE GERANDOEMPREGOS EM ITAGUAÍ

O público presente na 2a Feira de Em-prego, Estágio e Negócios de Itaguaí, no

A MB, em conjunto com a Odebrecht,participou da feira com um estande, onde osvisitantes puderam ver a maquete de umsubmarino nuclear com 4,5 metros, se infor-mar sobre as formas de ingresso na Força etirar dúvidas sobre o novo Complexo Mili-tar-Naval, cujos projeto e construção estãosendo gerenciados pela Coordenadoria-Ge-ral do Programa de Desenvolvimento deSubmarino com Propulsão Nuclear(Cogesn), subordinada à Diretoria-Geral doMaterial da Marinha (DGMM)

(Fonte: www.mar.mil.br)

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OBRAS DO PROGRAMA DEDESENVOLVIMENTO DESUBMARINOS EM ANDAMENTO

Estão em fase adiantada as obras da Uni-dade de Fabricação de Estrutura Metálica(Ufem) do estaleiro e da base naval que serãoconstruídos em Itaguaí. Iniciadas em maiodeste ano, as obras encontram-se atualmen-te na etapa de estaqueamento das fundações.

Editora, o livro O projeto do submarino nu-clear brasileiro – uma história de ciência,tecnologia e soberania. A obra descreveos esforços brasileiros para o domínio datecnologia de enriquecimento de urânio e oprojeto de construção de um submarino depropulsão nuclear, desde o governo Geiselaté a atualidade, culminando com o acordoestratégico França-Brasil.

Trata-se, portanto, de um trabalhoesclarecedor não apenas sobre aquela im-portante conquista tecnológica nacional,como também sobre as perspectivastecnológicas oferecidas pelo projeto dosubmarino em si e pelos programas dereequipamento das Forças Armadas.

Transcrevemos abaixo a apresentaçãodo editor Lorenzo Carrasco à obra:

“A publicação deste livro atende ao pro-pósito de levar ao conhecimento do públi-co em geral a evolução de uma das maioresiniciativas tecnológicas idealizadas e em-preendidas no País, o projeto do submari-no nuclear da Marinha do Brasil. Projetoque, por sua vez, emergiu no contexto daempreitada mais ampla do pleno domíniodas tecnologias referentes à energia nu-clear, que remonta aos esforços pioneirose visionários do Almirante Álvaro Albertoda Mota e Silva, ainda na década de 1940, ese institucionalizou com o Acordo NuclearBrasil-Alemanha, assinado pelo GovernoGeisel em 1974.

Inicialmente, o projeto foi concebidosob o manto do segredo militar, em funçãodas circunstâncias desfavoráveis criadaspelo ambiente hostil contra os planos nu-cleares dos países em desenvolvimento. Noperíodo da assinatura do acordo nuclearBrasil-Alemanha, foram manifestas as pres-sões exercidas pelo governo do Presiden-te James Carter. Washington considerouque o acordo era uma afronta à ordem mun-dial estabelecida no pós-guerra e desdo-brou operações de inteligência contra os

Classificado como área industrial, o espaçotem cerca de 90 mil metros quadrados e seráresponsável pelo acabamento inicial das se-ções dos submarinos preparadas naNuclebrás Equipamentos Pesados S.A.(Nuclep), antes de irem para o estaleiro. Cal-cula-se que cerca de 800 pessoas irão traba-lhar no empreendimento quando o Programaestiver em pleno andamento. Brevemente de-vem ser iniciadas as obras marítimas.

(Fonte: www.mar.mil.br)

O PROJETO DO SUBMARINONUCLEAR BRASILEIRO – UMAHISTÓRIA DE CIÊNCIA,TECNOLOGIA E SOBERANIA

Resultante da dissertação de mestradoda historiadora Fernanda das Graças Corrêana Universidade Federal do Rio de Janeiro(UFRJ), está sendo lançado, pela Capax Dei

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

O projeto do submarinonuclear e o programa deenriquecimento de urânio

do Brasil foramdesenvolvidos dentro de um

sistema bem-sucedido desigilo, burlando as pressõesneocoloniais contra o uso

pacífico da energia nucleare o desenvolvimentotecnológico legítimo

governos do Brasil e, especialmente, daAlemanha. Foi uma campanha de pressõesque impôs sobre a nação alemã um virtualveto a toda atividade nuclear de uso pacífi-co. Durante esse mesmo período, a derro-cada do governo do Xá Mohamed RezaPahlavi no Irã levou ao cancelamento deseu enorme programa nuclear.

Outro fator predominante para aceleraro desenvolvimento nuclear autônomo dopaís foi a Guerra das Malvinas, em 1982.Na ocasião, os submarinos nucleares in-gleses foram determinantes para neutrali-zar a Armada argenti-na, especialmente de-pois do afundamentodo Cruzador GeneralBelgrano pelo Subma-rino Conqueror. Elesestabeleceram um vir-tual bloqueio navaldas Ilhas Malvinas,que foi definitivo narendição argentina(por sua vez, o únicosubmarino argentinodisponível, mesmo depropulsão convencio-nal, foi motivo de pre-ocupações para aRoyal Navy até o finaldo conflito).

Porém o ‘fator Malvinas’ não está ape-nas no aspecto militar da capacidade dossubmarinos nucleares. A verdade é que oconflito de 1982 foi um divisor de águas nasrelações hemisféricas, especialmente pelaatitude dos Estados Unidos, permitindo umaorganização extrajuridiscional da Organiza-ção do Tratado do Atlântico Norte (Otan)no Hemisfério Ocidental. Isso levou a umamudança no pensamento estratégico brasi-leiro, retirando a Argentina da antiga posi-ção de principal oponente potencial dasForças Armadas brasileiras. Vale recordar

que, como já mencionado, antes do confli-to, importantes setores do governo norte-americano já haviam colocado em marchauma campanha de desmilitarização da Amé-rica do Sul, entendendo-se como tal nãoapenas a presença dos militares na políticaregional, mas também o papel das ForçasArmadas de países como Argentina e Brasilna promoção de projetos de tecnologia avan-çada em setores de ponta, como a indústriaaeroespacial, energia nuclear e outros.

Por todas estas razões, o projeto dosubmarino nuclear e o programa de enri-

quecimento de urâniodo Brasil foram desen-volvidos dentro de umsistema bem-sucedidode sigilo, burlando aspressões neocoloniaiscontra o uso pacíficoda energia nuclear e od e s e n v o l v i m e n t otecnológico legítimo.

A propósito, o de-senvolvimento da in-dústria nuclear tem ori-gem em iniciativas mi-litares: primeiro, com oProjeto Manhattan,durante a SegundaGuerra Mundial; e, no

pós-guerra, com os esforços do AlmiranteHyman G. Rickover para dotar a Marinhados EUA de uma força de submarinos depropulsão nuclear, dos quais se originaramos reatores de urânio enriquecido e refrige-rados a água pressurizada (PWR) que foramposteriormente adaptados para a geraçãode eletricidade nas usinas nucleoelétricas.No Brasil, da mesma forma, foi a iniciativade estabelecer o chamado programa nuclearparalelo, coordenado pela Marinha e comapoio da Comissão Nacional de EnergiaNuclear (CNEN) que resultou no domínioda tecnologia de enriquecimento de urânio

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

O denodo de um punhadode obstinados – como o

físico Rex Nazaré Alves, oComandante (depois

Almirante) Othon LuizPinheiro da Silva e outros –que possibilitou o sucessode uma empreitada quepermanecerá como uma

das maiores façanhascientífico-tecnológicas dos

brasileiros* * *

Em termos estritamentemilitares, a importância

estratégica do submarinonuclear para o Brasil é

indiscutível

por ultracentrifugação, conhecimento zelo-samente preservado pelos países que o de-têm e sem o qual é inviável o estabelecimen-to de uma indústria nuclear nacional autô-noma e apta a atender plenamente aos inte-resses soberanos do país. Aqui, também foio denodo de um punhado de obstinados –como o físico Rex Nazaré Alves, o Coman-dante (depois Almirante) Othon Luiz Pinhei-ro da Silva e outros –que possibilitou o su-cesso de uma emprei-tada que permanecerácomo uma das maioresfaçanhas científico-tecnológicas dos bra-sileiros, ao lado da ex-ploração petrolífera emáguas profundas, daviabilização da explo-ração agropecuária doCerrado e da indústriaaeroespacial.

Em termos estrita-mente militares, a im-portância estratégicado submarino nuclearpara o Brasil é indis-cutível, principalmen-te considerando asresponsabilidades doPaís com a proteção doseu vasto litoral, cujaimportância econômi-ca só tende a crescercom a definição e ex-ploração dos recursosda Zona de ExploraçãoEconômica Exclusiva, que representa o equi-valente a 42% do território continental bra-sileiro (podendo chegar a 52%, caso sejaaceito o pleito de extensão feito à Comis-são de Limites da Plataforma Continentalda Organização das Nações Unidas). Entreeles, destacam-se as jazidas de petróleo e

gás natural da camada pré-sal, que deve-rão colocar o Brasil entre os dez maioresprodutores de hidrocarbonetos do mundo.

Ademais, em um cenário mundial mar-cado por uma dinâmica de rápidas eimprevisíveis transformações na ordem depoder político e econômico global, na qualo Brasil emerge como um protagonista derelevo, torna-se impostergável a aquisição

de uma capacidade dedefesa capaz de exer-cer um fator dedissuasão efetiva con-tra quaisquer tipos deameaças externas.

Por suas caracte-rísticas de velocidade,autonomia e discrição,o submarino nuclearconstitui a arma idealpara tais funções, prin-cipalmente se contarcom o apoio de um sis-tema de sensoresavançados, como sa-télites de reconheci-mento e vigilância.

Após três décadasde esforços, com avan-ços brilhantes edesacelerações frus-trantes, o submarinonuclear brasileiro deve-rá tornar-se realidade,com a histórica assina-tura da Aliança Estraté-gica França-Brasil, emsetembro de 2009, a

qual prevê a construção com transferênciade tecnologia de quatro submarinos conven-cionais da classe Scorpène e o casco para osubmarino nuclear, que será equipado comuma instalação propulsora nuclear desenvol-vida pela Marinha do Brasil. Juntamente comos demais elementos previstos no acordo

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Poucos setorestecnológicos têm a

capacidade do nuclear depromover este efeito dearraste, a aplicação dosresultados da pesquisa e

desenvolvimento (P&D) emoutras áreas

com a potência europeia, tais belonaves de-verão contribuir grandemente para proporci-onar às Forças Armadas uma capacidadeoperacional e dissuasória inusitada em suahistória, elevando-a aos patamares exigidospela dimensão que o País vem assumindo nocenário mundial. É indiscutível que a possede dez submarinos, um deles nuclear (com apossibilidade de construção de mais um oudois), dará à Marinha brasileira uma capaci-dade estratégica sem precedentes em sua his-tória, conferindo-lhe apossibilidade efetiva deinterditar o acesso àmargem ocidental doAtlântico Sul a qual-quer força aeronavalhostil. Por isso, o pro-jeto do submarino nu-clear é hoje um dos prin-cipais elementos da Es-tratégia Nacional deDefesa (END).

Apresentada no fi-nal de 2008, a END foiconcebida como umabase de discussões para o estabelecimen-to de uma política de defesa que funcionecomo um dos sustentáculos do progressonacional, atendendo tanto aos requisitosoperacionais específicos das Forças Arma-das como também às perspectivas dos múl-tiplos subprodutos dos programastecnológicos militares para a sociedade emgeral. Em especial, vale destacar a ênfaseatribuída ao desenvolvimento domésticodas tecnologias nuclear, espacial e ciber-nética. O acordo estratégico com a Françapode proporcionar um efeito multiplicadornuma escala bem maior do que a obtida,por exemplo, na parceria com a Itália no

projeto do caça AMX, que permitiu àEmbraer um salto tecnológico.

Poucos setores tecnológicos têm a ca-pacidade do nuclear de promover este efei-to de arraste, a aplicação dos resultadosda pesquisa e desenvolvimento (P&D) emoutras áreas. Neste particular, como obser-va oportunamente o comandante e enge-nheiro naval Leonam dos Santos Guima-rães1, o programa nuclear da Marinha doBrasil tem sido conduzido – embora em rit-

mos variados – com aintenção não apenasde viabilizar um saltotecnológico na capaci-dade operacional daForça Naval, mas tam-bém de assegurar aspremissas fundamen-tais para o desenvol-vimento científico-tecnológico: a forma-ção de uma massa crí-tica de cérebros e in-centivos às suaspotencialidades; a

mobilização institucional em torno de me-tas geradoras de benefícios estratégicos esociais; e o esforço nacional, canalizandorecursos adequados para a área científico-tecnológica.

Um fator imprescindível para que todasessas perspectivas se concretizem é o apoioda sociedade a tais projetos, sobre os quaisnão devem pairar dúvidas induzidas pordesconhecimento ou preconceitos ideoló-gicos. Para tanto, é fundamental que o pú-blico em geral se familiarize com os proje-tos em pauta e passe a considerá-los comoconquistas da nacionalidade, como ocorrecom outros indicadores de progresso.

1 GUIMARÃES, Leonam dos Santos . “Estratégia de implementação e efeitos de arraste dos grandesprogramas de desenvolvimento tecnológico nacionais”. Pesquisa Naval, SDM, Rio de Janeiro, v.16, p. 129-146, 2003.

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O trabalho de Fernanda das Graças Corrêase insere, precisamente, nesse contexto danecessidade de divulgação desses esfor-ços. Combinando o rigor das normas acadê-micas com um texto de leitura agradável, pro-porciona um relato vivo e instrutivo sobre atrajetória do projeto do submarino nuclear

brasileiro, desde as suas origens, no gover-no Geisel, até a assinatura do Acordo Fran-ça-Brasil. Por isso, ao mesmo tempo em quese orgulha de disponibilizá-lo aos leitores, aCapax Dei Editora oferece com ele uma con-tribuição para uma iniciativa crucial para ofuturo da nação brasileira.”

A Contra-Almirante Nora W. Tyson, daMarinha dos Estados Unidos da América(EUA), assumiu, em 29 de julho último, ocomando do Carrier Strike Group 2 (CSG 2– GT centrado em navio-aeródromo [NAe]),sendo, assim, a primeira mulher a assumirum cargo deste tipo na Marinha dos EUA.Em 1979, quando Nora W. Tyson ingres-sou na força, não era permitido às mulhe-res sequer servirem em navios-aeródromoe nem se podia conceber uma como co-mandante de grupo-tarefa.

A cerimônia de assunção de cargo pelaContra-Almirante Tyson foi realizada a bor-do do USS George H. W. Bush, passando àhistória da Marinha americana.

O CSG 2 é constituído do mais novonavio-aeródromo americano, o Bush, além

MULHER ASSUME GT CENTRADO EM NAE NOS EUAde quatro cruzadores, do 22o Esquadrão deContratorpedeiros, de duas fragatas e do8o Destacamento Aéreo de NAE, constitu-ído de oito esquadrões de aeronaves.

Contra-Almirante Nora W. Tyson, comandan-te do Grupo-Tarefa centrado em NAe 2

As aeronaves UH-12 N-7057 e UH-14 N-7070 embarcaram no Navio-AeródromoCavour, da Marinha da Itália, no período de24 a 28 de janeiro último, a fim de participarda operação conjunta com a Marinha italia-na em apoio humanitário ao Haiti. Ambas asaeronaves foram empregadas no transporte

AERONAVES DA MB OPERAM A PARTIR DO NAe CAVOUREM APOIO AO HAITI

de pessoal e material para terra e em evacu-ação aeromédica de enfermos para o navio.

As aeronaves N-7057 e N-7070 voaramum total de 13,6 e 47,9 horas, respectiva-mente, em proveito ao apoio às vítimas doterremoto ocorrido no Haiti.

(Fonte: A Macega no 42, jan./abr. 2020)

O 2o Esquadrão de Helicópteros de Em-prego Geral (HU-2) prestou auxílio às víti-mas das enchentes em Alagoas, ocorridas

ESQUADRÃO HU-2 AJUDA VÍTIMAS DASENCHENTES EM ALAGOAS

em junho último, com a aeronave UH-14Super Puma N -7071 (Pégasus 71), queatuou na região.

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A aeronave partiu da Base Aérea Na-val de São Pedro da Aldeia/RJ no dia 19de junho e, após 2,3 horas de voo, che-gou a Vitória (SBVT), onde pernoitou, eno dia seguinte rumou para Alagoas, comescalas em Porto Seguro e Salvador, parafinalmente chegar a Maceió, após setehoras de voo.

Efetivamente, os voos de ajuda huma-nitária se iniciaram no dia 21 de junho, trans-

Primeira aeronave militar a chegar na região, o Pégasus 71 transportou água potável,cestas básicas, leite e medicamentos para a população atingida, além de conduzir a

comitiva da Presidência da República e do Ministério da Defesa

portando 700 kg de mantimentos e medica-mentos para o município de Santana doMandaú, perfazendo 2,3 horas de voo.

Do dia 22 ao dia 27 de junho, foram aten-didos os municípios de Santana do Mandaúe Quebrangulo, com transporte de comiti-vas do Ministério da Defesa e da Presidên-cia da República e envio de água potável,leite e cestas básicas.

(Fonte: http://www.naval.com.br/blog/)

A Capitania Fluvial de Tabatinga, noestado do Amazonas, realizou Ação Cívi-co-Social (Aciso) em 22 de julho último, naEscola Estadual Almirante Tamandaré, nacidade de Tabatinga. A ação teve apoio dosnavios-patrulha fluvial Pedro Teixeira eAmapá, que participaram da OperaçãoBracolper (Brasil-Colômbia-Peru) 2010.

ACISO NA TRIBO TIKUNA EM TABATINGA

Palestrasobre

higienebucal

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Localizada na comunidade indígenaUmariaçu II, da tribo Tikuna, a escola rece-beu pintura e instalação de computadores.Durante a Aciso, também foram realizadosatendimentos médicos, distribuição demedicamentos e palestras sobre higienebucal.

(Fonte: www.mar.mil.br) Atendimento médico na Escola Estadual

Almirante Tamandaré

O ministro da Defesa do Brasil, NelsonJobim, e o subsecretário de Defesa da Itá-lia, Guido Crosetto, assinaram, em 24 dejunho último, um “Ajuste Complementar”ao acordo sobre cooperação em defesaexistente entre os dois países. O acordo foiassinado pelo Presidente Luiz Inácio Lulada Silva e o primeiro-ministro italiano, Sil-vio Berlusconi, em 12 de abril, quando am-bos se encontraram em Washington (EUA).

Na cerimônia de 24 de junho foi assina-do também um “Ajuste Complementar Téc-nico” ao mesmo acordo, entre os coman-dantes da Marinha do Brasil, Almirante deEsquadra Júlio Soares de Moura Neto, eda Itália, Almirante Bruno Branciforte.

Segundo Guido, o acordo será útil aosdois países, especialmente na facilitação dastrocas de tecnologia. “Este documento re-presenta a conclusão de um percurso deamizade e respeito”, afirmou. Ele lembrouque o impulso dado à Embraer deveu-se emgrande parte às parcerias com a indústria

BRASIL E ITÁLIA APROFUNDAM ENTENDIMENTOS NAÁREA DE DEFESA

aeronáutica italiana, a ponto de a empresabrasileira hoje superar suas parceiras.

O ministro Jobim explicou que o enten-dimento na área de defesa se soma aos deoutros setores, como cultura e meio ambi-ente. “Significa a intensificação das rela-ções com a Itália de entendimentos quepossam aproximar mais este país, além da-quelas relações de simpatia e amizade quejá temos há muitos anos.”

O aprofundamento dos acordos facilita,entre outras coisas, a absorção de tecnologiaitaliana na construção de navios destina-dos à proteção das riquezas do Atlântico, anossa Amazônia Azul. “É um dos elementosde concretização [da Estratégica Nacionalde Defesa – END],tendo em vista que umdos objetivos fixados na END é a dissuasãoem relação ao Atlântico e o monitoramentodeste oceano”, disse Jobim.

Fonte: Assessoria de Comunicação So-cial do Ministério da Defesa, em http://www.naval.com.br/blog/

Em 28 de agosto último, o Navio-Patru-lha Fluvial (NPaFlu) Raposo Tavares este-ve novamente na cidade de Gurupá, maisde 36 anos após sua primeira navegaçãona bacia amazônica e 359 anos do término

RAPOSO TAVARES REVISITA GURUPÁ

da extraordinária epopeia expedicionárialevada a cabo pelo bandeirante paulistaAntônio Raposo Tavares.

Na oportunidade, foram reencontradosmoradores do município que testemunha-

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1 N.R.: Cacique da tribo Tupi.2 Termo de Viagem no 005/1974 do NPaFlu Raposo Tavares, incluso no Livro do Navio. O Tuxaua, na

ocasião, pronunciou os termos: “Tianepuntuna acarina airá comgabira compuronca me buirá juruparicatatu meruá airá comgabira moiquê com combuca”. A saudação foi traduzida como “Bom dia,senhor. Seja bem-vindo, colega”.

3 Conforme histórico apresentado na página http://www.mar.mil.br/9dn/OM/NPFRTV.htm, acessado em29 de agosto de 2010.

ram a primeira visita donavio, notadamente oSr. Benedito FerreiraMarques, que, em1974, representou oTuxaua1 na cerimôniaem que índios caracte-rizados saudaram osrecém-chegados emtupi-guarani2. O Sr. Be-nedito guardava, com orgulho, o brasãoque recebera de presente naquela ocasião,igual ao que até hoje é ostentado na cha-miné do navio.

Um outro morador doou ao comandan-te do Raposo Tavares, Capitão de CorvetaRenato Ferreira Jácomo dos Santos, umafotografia do navio, que fora por ele pre-servada a partir de material alienado em umadas reformas pela qual passara o edifícioda Prefeitura. A foto mostra o navio-patru-lha fluvial em provas de mar na Baía deGuanabara, vendo-se ao fundo a ponte Pre-sidente Costa e Silva (Rio-Niterói) aindaem construção.

Acerca da passagem do bandeirante, to-davia, pouco se pôde ver além da placaencravada em um dos lados do marco inicialda cidade, no Forte de Santo Antônio deGurupá, com os dizeres: “1651 – Chega a esteforte a bandeira paulista chefiada pelo mes-tre de campo Antonio Raposo Tavares, Se-nhor de Quitaúna, depois de uma das traves-sias mais ousadas que já se emprehenderamatravéz do continente americano.”

Procuradas informações acerca da es-pada de Antônio Raposo Tavares, que es-

taria na cidade3, soube-se, junto a autori-dades municipais e conhecedores da his-tória de Gurupá, que não se encontrava ali.Um antigo habitante relatou que tal relí-quia teria existido, mas que, entre 1948 e1949, já estaria desaparecida. Acrescentouainda que, infelizmente, estavam hoje fale-cidas pessoas que poderiam prestar outrosesclarecimentos sobre o paradeiro da arma.

Com a ida do NPaFlu Raposo Tavarespara a Base Naval de Val de Cães, em Belém,a fim de cumprir Período de Modernização,encerra-se o ciclo operativo do navio no anode 2010, após realizar 20 comissões com ple-no êxito. Neste ano, semelhantemente à tra-vessia amazônica realizada por seu patronomais de três séculos atrás, o navio desceu oRio Madeira de Porto Velho até sua foz ebaixou o Rio Amazonas até Gurupá, em dife-rentes missões.

Durante a modernização que ora se ini-cia, o navio terá substituída sua planta pro-pulsora original por quatro novos motoresde combustão principais, respectivas en-grenagens redutoras-reversoras e um mo-derno sistema eletrônico de controle dapropulsão.

NPaFlu Raposo Tavares e o Forte de Santo Antônio de Gurupá

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Com a participação de navios da Flotilhade Mato Grosso e navios-patrulha fluvialdo Paraguai, foi realizada, de 9 a 20 de agos-to, a Operação Ninfa XXIII. A Operaçãosimulou uma situação em que os meios na-vais restabeleceram e mantiveram o con-trole de uma área ribeirinha, por meio dalocalização e neutralização de um grupoparamilitar.

A Força-Tarefa brasileira, subordinada ao6o Distrito Naval (Ladário-MS), foi compos-ta pelos seguintes meios: MonitorParnaíba; Navio-Transporte FluvialParaguassu; Navio de Apoio Logístico Flu-vial Potengi; Aviso de Transporte FluvialPiraim; Navios-Patrulha Piratini e Pene-do; Embarcação de Apoio Fluvial Leverger;duas embarcações de desembarque; uma ae-ronave IH-6B do 4o Esquadrão de Helicóp-teros de Emprego Geral (Esqd HU-4); desta-camentos do Grupamento de Fuzileiros Na-vais de Ladário; destacamentos do Bata-lhão de Comando e Controle; Batalhão deEngenharia; Batalhão de Infantaria; Bata-lhão de Operações Especiais de Fuzileiros

OPERAÇÃO NINFA XXIII

Navais; e uma equipede Mergulhadores deCombate. Eles atuaramem conjunto com osnavios-patrulha fluvialda Armada paraguaiaCapitán Cabral eItaipu.

O exercício, realiza-do a cada dois anos,sempre com a presen-ça de navios da Arma-da paraguaia, visaincrementar a interope-rabilidade entre asMarinhas do Brasil edo Paraguai; aplicar

procedimentos operativos na condução deoperações em ambiente ribeirinho que, de-vido às suas peculiaridades ambientais, exi-gem elevado grau de familiarização com aregião; e consolidar os laços de amizade queunem as duas Marinhas. Este ano, a Opera-ção ocorreu no Rio Paraguai, nas proximida-des da cidade de Porto Murtinho (MS).

(Fonte: www.mar.mil.br)

Aeronave IH-6B do Esquadrão HU-4 noconvoo do Monitor Parnaíba

Navios da Flotilha de Mato Grosso abarrancados em PortoMurtinho (MS), por ocasião da Operação Ninfa XXIII

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Em 24 de junho último, o Almirante Gra-ça Aranha, antes navio faroleiro, foireclassificado como navio hidroceanográficofaroleiro. A fim de executar as diversas fainashidrográficas, como coleta de dados ocea-nográficos e meteorológicos, além das ativi-dades inerentes à sinalização náutica, rece-beu diversos investimentos em termos decapacitação para realização de atividades decoleta de dados. Dentre esses investimentosdestacam-se: um moderno ecobatímetro ci-entífico; um guincho oceanográfico capaz deoperar até 2.000 metros de profundidade; umaestação lateral; reforma do seu guindaste,podendo este lançar e recolher boiasmeteoceanográficas; e instalação de cama-rotes para até 15 pesquisadores. Em breve,deverá ser concluída a instalação de seuslaboratórios de pesquisa.

O navio está realizando um Período deManutenção Geral na Base Naval do Rio

ALMIRANTE GRAÇA ARANHA É RECLASSIFICADO COMONAVIO HIDROCEANOGRÁFICO FAROLEIRO

de Janeiro, ocasião em que estão sendoprontificados diversos setores vitais, a fimde possibilitar seu retorno ao mar com se-gurança. Neste período, estão sendo reali-zadas as seguintes obras: revisão geral domotor de combustão principal e dos moto-res de combustão auxiliar; revisão nos ge-radores principais; substituição de redes;reforma na frigorífica; revisão geral dasbombas; substituição de válvulas de fun-do; tratamento e pintura de tanques; revi-são do grupo de osmose reversa; substi-tuição de chapeamento; revitalização doconvoo; reforma dos camarotes, cobertase sanitários; reparo na tampa do porão esubstituição de cabeços e buzinas.

Construído pelo estaleiro Ebin, emNiterói, RJ, e lançado ao mar em 23 de maiode 1975, o Graça Aranha foi incorporado àMarinha do Brasil em 9 de setembro de 1976,tendo sido o primeiro navio a ostentar esse

nome, em homenagem aohidrógrafo Almirante Heráclito daGraça Aranha. Ao longo dos 34anos de serviços prestados àMarinha e à hidrografia, o naviovem cumprindo sua missão deinstalar, manter e apoiar os sinaisfixos e manter e reparar osbalizamentos afetos à Marinhado Brasil, a fim de contribuir paraa segurança da navegação.

CPPR MONITORA NAVIOSEM TEMPO REAL

A Capitania dos Portos do Paraná (CPPR)dispõe, há sete meses, de um sistema capazde monitorar em tempo real os navios mer-cantes que trafegam pela Baía de Paranaguá.

O AIS (Automatic Identification System)identifica o navio, registra a velocidade, alocalização, a rota percorrida e a área de fun-deio das embarcações.

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Todos esses dados são fornecidos viasatélite e captados com precisão por umaantena confeccionada para a frequênciaVHF do sistema e que funciona tambémcomo para-raios.

Com o AIS, a Capitania reduziu a zero onúmero de denúncias falsas sobre possí-veis acidentes no mar envolvendo naviose pequenas embarcações. Também diminuiuconsideravelmente o volume de Inquéritospara Averiguação de Fatos da Navegação.Até novembro do anopassado, 30 inquéritoseram abertos a cada anona CPPR. Nos últimossete meses, apenas cin-co inquéritos foram ins-taurados, resultado daapuração antecipadadas informações.

Segundo o capitãodos Portos do Paraná,Capitão de Mar e Guer-ra Marcos AntônioNóbrega Rios, o AIS éum aliado da CPPR paraa manutenção da segu-

rança da navegação. “A antena capta o si-nal de satélite com uma eficiência surpre-endente. As informações permitem, porexemplo, termos dados suficientes para pla-nejarmos as inspeções navais e impedir-mos mobilizações desnecessárias de equi-pes”, disse.

O sistema proporciona aos militares daCapitania dos Portos a interpretação exatadas informações prestadas em situaçõesde emergência, possibilitando compará-las

Vista da Baía de Paranaguá

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com a real situação da ocorrência, median-te a visualização do monitor instalado nosaguão da CPPR. O AIS permite, ainda, quese grave e recupere todo o percurso donavio e sua velocidade, facilitando a in-vestigação caso haja a necessidade de re-aver os dados.

O acompanhamento on-line do tráfegomarítimo atende a uma necessidade da Ca-pitania dos Portos do Paraná em manter asegurança da navegação no litoral do esta-do. A CPPR está presente na segunda maiorbaía do Brasil, com 667 km² de extensão,compreendendo as baías de Paranaguá,Guaraqueçaba e Pinheiros.

“Projetada para captar apenas a área dolitoral paranaense, a antena apresenta um al-cance superior, capaz de rastrear o desloca-

mento dos navios no porto de São Franciscodo Sul, em Santa Catarina”, informou o técni-co especializado na área, Ricardo Parpineli.Os dados captados pela antena são repassa-dos pelo próprio navio, dotado de umtransponder, item obrigatório nas embarca-ções de todo o mundo, conforme determina-ção da Organização Marítima Internacional.

A instalação do sistema AIS na Capita-nia é resultado da soma de esforços dacomunidade marítima local. Essa integraçãopermitiu a aquisição do receptor e dosoftware, ambos doados pela SociedadeAmigos da Marinha do Paraná (Soamar-PR), e a confecção e instalação gratuitasda antena na sede da CPPR pelo técnicoRicardo Parpineli.

(Fonte: www.mar.mil.br)

As descobertas feitas ao longo de cin-co expedições ao continente antártico e ascuriosidades sobre a vida de espécies pou-co conhecidas são narradas em Férias na

FÉRIAS NA ANTÁRTICA

Antártica, de Laura, Tamara e MarininhaKlink (as irmãs Klink), lançado em agostoúltimo pela Grão Editora. Para mostrar a di-versidade de um ecossistema conhecidopor poucos, as autoras (filhas do navega-dor Amir Klink e da fotógrafa Marina Ban-deira Klink) se valeram das experiências edas lembranças adquiridas nas expediçõesà Antártica em companhia dos pais.

No livro, as desbravadoras mirins, que naprimeira viagem tinham 6 e 9 anos (Laura eTamara, mais velhas, são gêmeas) relatam deforma divertida as melhores aventuras e his-tórias de suas idas à Antártica. Para reunir emtexto todas as emoções, as meninas conta-ram com a ajuda da poeta e arte-educadoraSelma Maria e com o professor João Vilhena.

O relato de viagem do trio conta diversaspassagens curiosas em explicações simples eesclarecedoras a respeito das mais variadasespécies que habitam o continente gelado.Com isso, as viajantes reforçam a importânciada preservação ambiental, contribuindo para

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conscientizar crianças e adultos sobre o im-pacto que atitudes simples como jogar tampi-nhas de garrafa e sacos plásticos fora do lixopodem ter em todo o ecossistema do planeta.

Entre os animais citados no livro, es-tão a baleia-jubarte, a baleia-franca, o

albatroz, os pinguins e as focas. Para aju-dar o leitor a conhecer cada uma das es-pécies mais de perto, a mãe e fotógrafaMarina Bandeira Klink registrou as ima-gens surpreendentes e inusitadas que ilus-tram a obra.

A história dos 30 anos da mulher militarna Marinha do Brasil, suas conquistas efeitos são mostrado em “O Passeio Mági-co”, peça teatral em cartaz no Espaço Cul-tural da Marinha, Rio de Janeiro (RJ), atédezembro. Com a manipulação da bonecaAlice e com a divertida guia de turismoDona Laurinda, o público é convidado aembarcar num passeio imaginário, como seestivesse a bordo do Rebocador LaurindoPitta, único remanescente da Força NavalBrasileira que participou da Primeira Guer-ra Mundial e que em 2010 está completan-do cem anos de existência.

Nesse encontro de datas comemorati-vas e através desse passeio imaginário, opúblico participa de forma interativa comos personagens, utilizando elementos cê-nicos como âncora, sino, boias e cabos paraauxiliar as personagens na condução des-se passeio.

A peça faz parte do projeto educativo“Conhecendo e brincando no Espaço Cul-tural da Marinha”, realizado desde 2001 pelaDiretoria do Patrimônio Histórico e Docu-mentação da Marinha em parceria com aLiga dos Amigos do Museu Naval e compatrocínio da Companhia de NavegaçãoNorsul. A elaboração e coordenação sãoda museóloga Vera Lucia Finkel. O projetoconsta de peças teatrais com narração dahistória da Marinha do Brasil, seus perso-nagens e feitos.

A apresentação é aos sábados e domin-gos, às 14h30 e às 16 horas, com entrada

O PASSEIO MÁGICO

franca. O Espaço Cultural da Marinha ficana Av. Alfred Agache, s/no, Centro, próxi-mo à Praça XV. Há, ainda, oficinas de arte,às 15 horas e às 15h50.

O texto e a direção de “O Passeio Mági-co” são assinados por AlessandraCanabarro Cervieri, e a produção e coorde-nação da montagem por Raquel Brum. Noelenco estão Alessandra CanabarroCervieri e Rita J. Bogado.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Há 30 anos, a Marinha se tornaria pio-neira nas Forças Armadas brasileiras aoabrir seu quadro de militares para mulhe-res. Ao longo desses anos, elas marcaramde forma indelével sua presença na insti-tuição, em diversos postos e funções, es-tendendo sua competência a praticamen-te todas as Organizações Militares. Assim,em 7 de julho último, foi comemorado o 30o

Aniversário do Ingresso da Mulher na Ma-rinha do Brasil.

A presença feminina nas Forças Arma-das remonta à década de 1970, quando di-versos países começaram a admitir mulhe-res em seu quadro. Em 1980, o então minis-tro da Marinha, Almirante de Es-quadra Maximiano Eduardo daSilva Fonseca, posterior-mente escolhido Patronodas Mulheres Militaresda Marinha, criou, porintermédio da Lei no

6.807, de 7 de julho de1980, o Corpo AuxiliarFeminino da Reservada Marinha (CAFRM),que tinha como propó-sito atuar na área técni-ca e administrativa.

Em abril de 1981, a Ma-rinha abriu oficialmente suasportas ao primeiro contingen-te de mulheres. O ingresso foirealizado por meio de rigoroso pro-cesso de seleção, no qual, das 10.035candidatas, 514 foram selecionadas. As áre-as consideradas de interesse da Marinha paraaquele concurso foram: Medicina, Enferma-gem, Nutrição, Psicologia, Farmácia, Odon-tologia, Serviço Social, Processamento de Da-dos, Engenharia Eletrônica, Educação Físi-ca, Meteorologia, Engenharia Cartográfica eTécnicas das diversas áreas de Saúde e Ad-

30 ANOS DA MULHER MILITAR NA MARINHA

ministração. Hoje, três décadas depois, asmilitares atuam nas mais diversas áreas, com-pondo com profissionalismo os Corpos eQuadros existentes.

AS COMEMORAÇÕES

Cerimônia Comemorativa

Para celebrar este aniversário, foi celebra-da na Casa do Marinheiro, no Rio de Janeiro(RJ), a cerimônia dos 30 anos da mulher mili-tar na Marinha do Brasil. O evento aconte-ceu em 19 de julho último, presidido pelo co-mandante da Marinha, Almirante de Esqua-

dra Julio Soares de Moura Neto, econtou com a presença de auto-

ridades navais como o entãochefe do Estado-Maior da

Armada, Almirante de Es-quadra Marcos MartinsTorres; o então diretor-geral do Material da Ma-rinha, Almirante de Es-quadra Luiz Umberto deMendonça; o diretor-geral do Pessoal da Ma-rinha, Almirante de Es-

quadra Fernando EduardoStudart Wiemer; e o coman-

dante-geral do Corpo de Fu-zileiros Navais, Almirante de

Esquadra (FN) Alvaro AugustoDias Monteiro.

Após a leitura de exortação da data pelaoficial mais antiga do Serviço Ativo, Capi-tão de Mar e Guerra (MD) Cláudia Yago,foi cantado, pelas mulheres do Coral deOficiais da Marinha, o hino “Mulheres emArmas”. Ao final da cerimônia, oficiais epraças participaram de uma confraterniza-ção, quando foi feito o tradicional cortedo bolo.

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O comandante da Marinha expediu aseguinte mensagem alusiva à data:

“Ao celebrarmos o 30o Aniversário doIngresso da Mulher na Marinha, constata-mos a acertada decisão da Alta Adminis-tração Naval, considerada inovadora eempreendedora para a época e que,comprovadamente, trouxe uma contribui-ção essencial para todos aqueles que sededicavam às lides do mar.

Durante esse tempo, as marinheiras têmdemonstrado suas firmeza, segurança e res-ponsabilidade, sem abrir mão da sensibili-dade inerente à sua própria característicade ser; têm sido meticulosas, dedicadas eorganizadas, preservando sua peculiar gen-tileza, o que em muito harmonizou ehumanizou o nosso, por vezes, rígido am-biente de trabalho. Exigentes e entusias-tas, foram responsáveis por uma nova di-mensão profissional, experimentada pelasdiversas Organizações Militares. Conquis-taram, pois, com justiça, posições de pres-tígio, tornando-se, de forma inequívoca, in-dispensáveis à nossa instituição.

O Corpo Auxiliar Feminino foi criado em1980 pelo nosso então ministro, Almirantede Esquadra Maximiano Eduardo da SilvaFonseca, integrando as mulheres às fileiras

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da Força. Como resultado da reestruturaçãoadministrativa, ocorrida em 1997, foraminseridas nos diversos Corpos e Quadros, oque lhes facultou a real possibilidade de vira galgar o posto de almirante.

Numa sociedade cada vez mais equâni-me e incansável na busca pela igualdadeentre todos, a Marinha do Brasil soube, nacorreta visão progressista de seus antigoschefes, acreditar na capacidade irrefutáveldas brasileiras. Dentro desse enfoque, asmarinheiras souberam se impor num nichoaté então tipicamente masculino, angari-ando respeito e consideração.

Passadas três décadas, elas ocupam fun-ções de relevo na nos-sa estrutura organi-zacional, exercendo demaneira impecável suasatribuições, compro-vando que ainda muitofarão pelo País e dan-do exemplos inques-tionáveis de patriotis-mo e civismo.

Dessa forma, que-ro externar o meu re-conhecimento pelotrabalho realizado e o

meu otimismo para com o futuro, exortan-do-as para que se mantenham unidas, per-severantes e confiantes numa Marinhacada vez mais forte e que conta muito coma pujança feminina.

Desejo-lhes muitas felicidades e conti-nuado êxito em suas carreiras.

Bravo Zulu!”.

Exposição

Em 20 de agosto, foi inaugurada no Es-paço Cultural da Marinha (ECM), no Riode Janeiro-RJ, a exposição “30 Anos da

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Mulher Militar na Marinha”, uma realiza-ção da Diretoria do Patrimônio Histórico eDocumentação da Marinha (DPHDM). Amostra reconhece os bons resultados ob-tidos com a participação das mulheres nasdiversas tarefas exercidas pela Marinha ecomo elas contribuem significativamentepara que se alcance a eficácia e a eficiêncianecessárias à preparação e ao emprego doPoder Naval.

A mostra está dividida em seis módulos:

1o módulo – Cronologia da presença mili-tar feminina na Marinha

Expõe fotografias das formaturas dasprimeiras turmas de oficiais e praças. Naprimeira turma de oficiais, em agosto de1981, receberam a platina de segundo-te-nente 201 guardas-ma-rinha do CAFRM. Aformatura de praças foirealizada em julho domesmo ano, quando307 mulheres recebe-ram as divisas de cabo.

Um painel cronoló-gico mostra eventos de1980 a 2010, como, en-tre outros, a inaugura-ção, em 1981, do hos-pital de base da Mari-nha, o Hospital NavalMarcílio Dias (Rio de

Janeiro), para onde foram direcionadasaproximadamente 70% das militares da pri-meira turma, e o direito adquirido, em 1987,de ascender até o posto de capitão de mare guerra (até então só poderiam chegar acapitão de fragata).

2o módulo – A importância da tecnologia ea contribuição das mulheres para umaMarinha moderna

Neste módulo destaca-se a tecnologiaatual do navio de guerra, que era conside-rado, até a primeira metade do século XX,como uma plataforma para transportar ar-mamento. Hoje ele é um sistema complexo,onde hardware, software e pessoas se in-tegram. A tripulação existe para tomar deci-sões, interagindo com os subsistemas, paradetectar defeitos e realizar uma pequenaparcela de manutenção. A parte operativa,embora muito importante, é relativamentepequena se comparada com o enorme es-forço de preparação realizado na retaguar-da de uma Marinha moderna. O progressotecnológico, portanto, tornou a presençafeminina importante. Ela representa umgrande potencial de pessoas capazes e dis-poníveis, principalmente quando é neces-sário modernizar e expandir o Poder Naval.

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tornando-se semelhantes aos tradicionais– azul-marinho, branco e cinza; mantive-ram-se, porém, as características femininas.Neste módulo é mostrada esta evolução.

Em relação à reestruturação dos corpose quadros de oficiais e praças da Marinha,é relembrada a extinção do CAFRM, em1997, quando as mulheres foram integra-das em função de suas habilitações noCorpo de Engenheiros da Marinha, Corpode Saúde, Corpo de Intendentes e QuadroTécnico e passaram também a ostentar osdistintivos e insígnias já existentes.

4o módulo – Reconhecimento dos resulta-dos obtidos pelas mulheres na Marinha

Nas formaturas das turmas do CAFRM,as primeiras colocadas recebiam a medalha“Prêmio Militar Feminino da Marinha”. Foia primeira medalha das muitas que se se-

guiram. Mais tarde, mulheres re-ceberam a medalha “Mérito Ma-rinheiro”, que é concedida comoreconhecimento dos dias de marou de embarque, tendo como exi-gência mínima 500 dias de marou 3.500 dias de embarque (comum mínimo de 350 dias de mar).O primeiro embarque femininoocorreu em missão de apoio aoperações da Esquadra, nos es-tudos interativos a bordo de umaviso de pesquisa oceânico.

3o módulo – A evolução dos uniformes fe-mininos e a incorporação das mulheresaos diversos quadros e corpos já existen-tes na Marinha

Com o recrutamento de mulheres para oCAFRM, o Regulamento de Uniformes daMarinha do Brasil (Rumb) foi alterado, in-cluindo-se mais um capítulo, direcionadoaos uniformes femininos.

Os primeiros uniformes criados para asmulheres na Marinha eram elegantes, masalguns diferiam dos tradicionais. Havia umazul-claro de trabalho para as oficiais e umazul riscado de branco para marinheiros ecabos. A saia abotoada na frente, com gran-des botões, e alguns trajes para esporteslogo se mostraram pouco adequados parao ambiente e para as atividades militares.

Com o passar do tempo os uniformesdas mulheres militares foram modificados,

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

5o módulo – Mulheres em atividadesmilitares

Um novo mundo se abria para as mulhe-res na Marinha, e várias atividades, até en-tão exclusivamente de homens, passaram a

ser exercidas por elas. O módulo mostra odesempenho das mulheres em diversas ati-vidades militares e destaca as pioneiras quecontribuíram significativamente para a efi-cácia da Força. Em 1996, a pri-meira militar concluiu com êxi-to o Curso Expedito de Mer-gulho Autônomo (C-Exp-Maut), que exige elevado de-sempenho físico. Em 2002, umamulher assumiu pela primeiravez um cargo de direção naMarinha, como diretora doHospital Naval de Recife. Apósesse fato, muitas outras dirigi-ram e ainda dirigem Organiza-ções Militares. Elas exercemfunções e cargos importantese de grande responsabilidade na Marinha etêm demonstrado competência e capacida-de administrativa.

Além disso, instituições científicas,como a Academia Brasileira de MedicinaMilitar e o Instituto de Geografia e HistóriaMilitar do Brasil, admitiram mulheres mili-

tares da Marinha, reconhecendo a quali-dade de suas realizações profissionais.

6o módulo – Perspectivas de futuro

O módulo que fecha a exposição desta-ca as restrições existentes, namaioria dos países que empre-gam mulheres em suas ForçasArmadas, quanto à amplitudede atuação que lhes é permiti-da, principalmente excluindo-as de situações de combate eambientes confinados, sempossibilidade de privacidade,como nos submarinos. E com-pleta: “Elas representam umgrande potencial de pessoascapazes e disponíveis paraserem recrutadas, quando é

necessário expandir o Poder Militar. Seuemprego em operações militares, porém, re-quer cuidado e experiência para aproveitaras vantagens e evitar problemas, por se

tratar da defesa da Nação”. Entretanto, afir-ma ser o futuro promissor.

A exposição fica em cartaz até 13 demarço de 2011, de terça a domingo, das 12hàs 17h. O ECM fica na Rua Alfred Agache,s/n, Praça XV, Centro. Outras informaçõespelo telefone (21) 2104-6992.

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Sessão Solene

Em Brasília, o Plenário da Câmara dosDeputados realizou, no dia 13 de julho,Sessão Solene em comemoração ao aniver-sário da mulher militar na Marinha. Na oca-sião, a deputada Jô Moraes (PCdoB-MG)afirmou que as mulheres representam hoje6% dos integrantes da Força. De acordo

com a parlamentar, que solicitara a realiza-ção da homenagem, a Marinha possui atu-almente 1.999 oficiais e 1.734 praças do sexofeminino. Jô Moraes informou serem maisde 3.700 mulheres em um efetivo de 61.437militares. “Ainda há muito a avançar, masas mulheresmilitares jáocupam car-gos de dire-ção e vice-di-reção na Ma-rinha”, disse.

O deputa-do MauroB e n e v i d e s(PMDB-CE),que presidiuparte da ses-são, prestouespecial ho-menagem à

primeira mulher comandante da MarinhaMercante, a paraense Hildelene LobatoBahia. Em novembro de 2009, Hildeleneassumiu o comando do navio Carangola,da frota da Transpetro, empresa logísticado Sistema Petrobras.

Na sessão, o deputado Wilson Picler(PDT-PR) destacou que falta às mulheres apossibilidade de se incorporarem aos com-

batentes das Forças Armadas brasileiras.Ele colocou-se à disposição da Marinhapara lutar por essa possibilidade.

A deputada Maria Helena (PSB-RR),procuradora especial da Mulher na Câmara,lembrou que as mulheres participaram dasForças Armadas nacionais em tempos deguerras e revoluções. Ela citou os casos deMaria Quitéria, que integrou o Batalhão dePeriquitos, na Bahia, em 1823, e de Ana Vieira,que lutou clandestinamente na RevoluçãoConstitucionalista, em São Paulo, em 1932.“Destaca-se também a figura de AnitaGaribaldi, que participou da Guerra dos Far-

rapos, e de Chiquinha Gonzaga, que brilhouna Campanha pela República”, completou.

Os deputados Emanuel Fernandes(PSDB-SP), Rodrigo Rollemberg (PSB-DF),Angela Amin (PP-SC) e Luiz Carlos Hauly(PSDB-PR) também discursaram na sessão.

Almirante Moura Neto Comandante da Marinha e adeputada Jô Moraes

Mulheres na Marinha, Sessão na Câmara

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Regata

O setor de esporte também prestou suahomenagem às mulheres da Força. Em 31de julho foi realizada, no Estádio de Remoda Lagoa, Rio de Janeiro (RJ), a VI Regata“A Mulher na Marinha” de remo em escaler,como parte do 10o Circuito Poder Marítimo2010. Participaram 450 atletas, entre milita-res da Marinha e civis de clubes de Remodo Rio de Janeiro. O evento foi organizadopelo Serviço de Seleção do Pessoal da

Marinha e coordenada pela Comissão deDesportos da Marinha.

Além da competição, houve exposição re-lativa às atividades da Marinha do Brasil, comexibição de filmes de cunho naval, recreaçãoinfantil e participação de banda de música.

Outros eventos

As oficiais e praças promoveram con-fraternizações sociais para comemorar adata. As primeiras se reuniram, em 11 desetembro, num coquetel com música aovivo na Associação Atlética Banco do Bra-sil, na Lagoa. Já a comemoração social daspraças, também um coquetel dançante,aconteceu no dia 10 do mesmo mês, noSalão Nobre da Casa do Marinheiro.

Além desses eventos, também foramrealizadas celebrações em Ação de Graças,congregando oficiais e praças femininas dediversas denominações religiosas. Houve,ainda, lançamento de Selo Comemorativoe evento beneficente promovido pelas mu-

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lheres militares da Marinha em prol dos tra-balhos desenvolvidos pelas VoluntáriasCisne Branco. Também foi feita pela TVSenado uma entrevista com duas oficiaisabordando o tema.

E as comemorações continuam a aconte-cer. Em10 e 11 de novembro próximo será re-alizado, no Salão Nobre do Instituto Históri-co e Geográfico Brasileiro (IHGB), no Rio deJaneiro, o seminário “Mulheres na CarreiraMilitar: 30 anos de criação do Corpo AuxiliarFeminino da Reserva da Marinha”. O eventoé promovido pela DPHDM e pelo IHGB, como apoio do Instituto de Geografia e HistóriaMilitar do Brasil.O encontro entre historia-dores e especialistas servirá não só pararememorar este marco na História Militar bra-sileira, mas também para debater ideias base-adas em estudos e experiências sobre a parti-cipação da mulher na carreira militar.

As inscrições para o seminário sãolimitadas e podem ser feitas no sitewww.dphdm.mar.mil.br. Serão conferidos cer-tificados de participação aos presentes nosdois dias do seminário. Outras informaçõespodem ser obtidas pelo telefone (21) 2104-6722.

A MULHER – LÍDER, COMPETENTEADMINISTRADORA E CORAJOSA

Hoje, a importância crescente datecnologia para a guerra moderna exige orecrutamento de pessoas inteligentes e há-beis, qualidades que não faltam às mulhe-res. As comemorações dos 30 anos dasmulheres militares na Marinha demonstramque está aberto e consolidado o espaçopara a presença feminina nas Forças Arma-das: elas comandam Organizações Milita-res ou são vice-diretoras; lideram equipese gerenciam projetos e construções de na-vios de guerra e outras obras; chefiam de-partamentos, divisões e seções, na admi-nistração, nos hospitais e nos centros detecnologia; viajam para locais distantes, emmissões difíceis. Ou seja, mostram lideran-ça, competência, capacidade administrati-va e coragem.

Assim, é possível que a previsão mani-festa na exposição do Espaço Cultural daMarinha em breve se concretize: “Uma mu-lher atingirá o posto de almirante na Mari-nha do Brasil”.

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“VISITANDO A HISTÓRIA”Venha conhecer a história, raízes, conquistas e tradições da Marinha do Brasil,

aspectos que em conjunto criam a consciência de Nação, Pátria e Governo.

Realize visita guiada ao Museu Na-val e ao Espaço Cultural da Marinhacomo parte do projeto “Visitando a his-tória”, desenvolvido pela Diretoria dePatrimônio Histórico e Documentação daMarinha para atendimento às Organiza-ções Mili-tares daMarinha.

• No Museu Naval está aexposição principal “O Po-der Naval na formação doBrasil” que busca despertaro interesse pela história na-val, suas passagens, realiza-ções e seus líderes.

• No Espaço Cultural é ofe-recida a oportunidade de ir a

bordo do Contrator-pedeiro-Escolta Bauru,navio que operou na Se-gunda Guerra Mundial, deconhecer um modelo daNau dos Descobrimentose de visitar o Submarino-Museu Riachuelo, o Heli-

cóptero Rei do Mar e as ex-posições temporárias.

As OM interessadas po-dem agendar a visita na Se-ção de Ação Educativa, pelostelefones 8110-6851 e 2104-6851 ou pelo [email protected].