revista cbhsf no. 01

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REVISTA DO CÔMITE DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO SALVADOR - BA SETEMBRO 2007 CBHSF

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Primeira publicação oficial do Comitê do São Francisco, em 2007. Com temas atuais: transposição do São Francisco; vazões ecológicas; a construção do Plano Decenal da Bacia, entre outros.

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Page 1: Revista CBHSF no. 01

REVISTA DO

CÔMITE DA BACIA

HIDROGRÁFICA DO RIO

SÃO FRANCISCO

SALVADOR - BA

SETEMBRO 2007

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Page 2: Revista CBHSF no. 01

2ª GESTÃO2005 – 2007

PresidenteJORGE KHOURY HEDAYEJOSÉ CARLOS CARVALHO

Vice-PresidenteLUIS CARLOS DA SILVEIRAFONTES

Secretário ExecutivoANIVALDO MIRANDA PINTOYVONILDE DANTAS PINTOMEDEIROS

CCR AltoANTONIO THOMAZ GONZAGA DAMATA MACHADOGERALDO JOSÈ DOS SANTOS

CCR MédioEDISON RIBEIRO DOS SANTOS

CCR Sub-MédioROMULO LEÂO DA SILVA

CCR Baixo São FranciscoLUIS CARLOS DA SILVEIRAFONTES

Equipe SECEX:ELINEIDE SILVA DE ALMEIDAGERALDO JOSÉ DOS SNATOSHELDER BAYMAITAMAR DE OLIVEIRA JUNIORMALU FOLLADORMÁRCIA MARIA NORONHA DECARVALHORITA DE CÁSSIA PAULA SANTOSSILVANA SANDES TOSTASIVAL RIBEIRO DE SENA

3ª GESTÃO2007 - 2010

PresidenteANTONIO THOMAZ GONZAGA DAMATA MACHADO

Vice-PresidenteJULIANO SOUZA MATOS

Secretário ExecutivoANA CATARINA PIRES DEAZEVEDO LOPES

CCR AltoGERALDO JOSÈ DOS SANTOS

CCR MédioEDITE LOPES DE SOUZA

CCR Sub-MédioANTONIO VALADARES

CCR Baixo São FranciscoLUIS CARLOS DA SILVEIRAFONTES

Equipe SECEX:ELINEIDE SILVA DE ALMEIDAITAMAR DE OLIVEIRA JUNIORJOSÉ MACIEL NUNES DEOLIVEIRAJULIO CÉSAR PELLIMÁRCIAMARIA NORONHA DE CARVALHORITA DE CÁSSIA PAULA SANTOSSILVANA SANDES TOSTASIVAL RIBEIRO DE SENA

1ª GESTÃO2003 – 2005

PresidenteJOSÉ CARLOS CARVALHO

Vice-PresidenteJORGE KHOURY HEDAYE

Secretário ExecutivoLUIS CARLOS FONTES

CCR AltoAELTON MARQUES DE FARIASGERALDO JOSÈ DOS SANTOS

CCR MédioCLÁUDIO VASCONCELLOS

CCR Sub-MédioJOSÉ ALMIR CIRILO

CCR Baixo São FranciscoLUIZ CARLOS DA SILVEIRAFONTES

Equipe SECEX:ÂNGELA PATRÍCIA DEIRÓDAMASCENOISABEL CRISTINA PONDÉMALU FOLLADORMARTA CRISTINA FARIASBARRETOMIGUEL POLINOSIVAL RIBEIRO DE SENA

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O rio São Francisco continua em pauta em todosos eventos sobre meio ambiente nesse País. E não é paramenos: rio da Unidade Nacional, interestadual e importantena vida de tantos brasileiros, corre sérios riscos, ainda nãode todo avaliados e tratados pelos diferentes atores quetêm responsabilidade direta em sua conservação.

Agora, assistimos às investidas no sentido deefetivar a sua transposição, decisão equivocada e deenorme risco sócio-ambiental que só o tempo deixaráclaro para os que hoje decidem sem saber ao certo dosresultados de suas ações.

É dramático assistir a tudo isso, sabendo que portrás dessas ações, das quais discordamos, há boasintenções, desejo verdadeiro de minorar o sofrimento dossertanejos, mas absoluta falta de abertura para negociar ecaminhar por veredas adequadas e cientificamenterecomendadas para dar sentido e maior segurança aoempreendimento! Boas intenções, mal canalizadas?

Esta publicação do Comitê da Bacia Hidrográficado Rio São Francisco - que temos a honra de presidir pelasegunda vez - procura registrar para os pósteros osesforços desenvolvidos desde os primeiros momentosdessa organização e os movimentos, trabalhos, ações nosentido de preservar o grande rio dos sertões das gerais ede garantir a sobrevivência dele.

O que nos orientou - o tempo todo - sempre foi adisposição de ouvir, pesquisar, estudar, buscar mais e maisinformações, avaliações que nos permitissem formar umaconvicção segura sobre os destinos do Velho Chico e amelhor maneira de gerir suas águas em benefício do maiornúmero possível de pessoas.

Foi com base nos resultados dessa tarefa quetomamos a decisão, difícil, de nos contrapor ao projeto datransposição do rio, nas bases em que está colocado, hoje.O futuro nos dirá, com toda a segurança dos fatos, de quelado se encontra a razão que, agora, parece faltar a muitagente que detém poder em nossa terra.

De nossa parte, continuaremos lutando para queo rio São Francisco seja revigorado e recuperado, atravésda despoluição de suas águas e da recuperação de suasmatas protetoras, bem como da proteção das suasinúmeras lagoas, que os peixes típicos de suas águastransformam, a cada piracema, em imensas“maternidades”.

JOSÉ CARLOS CARVALHOPresidente do CBHSF

EDITORIAL

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Revista Nº. 01 do CBHSF Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco ( 2ª Edição)

Tiragem inicial: 2000 unidades

Organização editorial: Malu Follador - [email protected] Cristina Mascarenhas - [email protected]

Design gráfico: Itamar de Oliveira Junior - [email protected]

Fotos: Gilberto Melo (71) 8809-0000 - João Zinclair (19) 9121-8425 - Acervo do CBHSF

Autoria dos artigos: Ana Cacilda ReisAna Cristina Mascarenhas;Anivaldo Miranda;Carlos Bernardo Mascarenhas Alves;Edison Ribeiro dos Santos;Humberto Cardoso Gonçalves;Jaildo Santos Perreira;João Bosco Senra;João Lopes de Araújo;Jorge Khoury;José Carlos Carvalho;José Luiz de Souza;José Machado;Luciana Khoury;Luis Carlos da Silveira Fontes;Maria Jose Marinheiro;Paulo Lopes Varella Neto;Paulo Teodoro de Carvalho;Robson Sarmento;Rômulo Macedo;Rosana Garjulli;Wagner Soares Costa;Wilde Gontijo;Yvonilde Medeiros.

Observação: Os artigos assinados são de responsabilidade de seus autores, não traduzindo,necessariamente, a opinião do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco - CBHSF.A reprodução total ou parcial pode ser feita desde que sejam citadas as fontes.

Secretaria Executiva do CBHSFAssessoria de Comunicação Social - ASCOMAv. Professor Magalhães Neto, Nº. 1450 – Sala 1.203.Edf Millenium – Pituba – CEP: 41810 012 – Salvador/BA(71) 3176 7150 Fax: (71) 3176 7151.E-mail: [email protected]://www.cbhsaofrancisco.org.brSalvador - BA: CBHSF, setembro 2007.

EXPEDIENTE

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A gestão de recursos hídricos na bacia hidrográfica do rio São Francisco – Jose Machado.................................................................

Uma parceria para o rio São Francisco – Paulo Varella; José Luis de Souza; Humberto Cardoso Gonçalves.......................................

Mobilização e participação na bacia hidrográfica do rio São Francisco: o desafio da gestão participativa - Rosana Garjulli..................

Água e democracia: uma constante lição - José Carlos Carvalho..........................................................................................................

O processo de construção do Plano da Bacia do Rio São Francisco – Yvonilde Medeiros....................................................................

A importância da participação dos usuários no CBHSF - Wagner Soares Costa...................................................................................

O novo Velho Chico - Jorge Khoury.......................................................................................................................................................

Uma aventura democrática – Anivaldo Miranda.....................................................................................................................................

O caminho das Águas - Edison Ribeiro dos Santos..............................................................................................................................

Vazão ecológica no rio São Francisco – Robson Sarmento...................................................................................................................

Processo de definição da cobrança pelo uso dos recursos hídricos na bacia hidrográfica do rio São Francisco - Jaildo S. Pereira.....

A agência de águas da bacia hidrográfica do rio São Francisco: é preciso? Wilde Cardoso Gontijo Junior...........................................

O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco – Ana Cristina Mascarenhas............................................................................

O Velho do Rio......................................................................................................................................................................................

UAR Salvador - Cláudio Pereira............................................................................................................................................................

Declaração de princípios do CBHSF.....................................................................................................................................................

Quadro de Deliberações........................................................................................................................................................................

Revitalização avança na bacia do São Francisco – João Bosco Senra..................................................................................................

Transposição: água para todos ou água para poucos? Anatomia da maior fraude hídrica e o conflito federativo de uso da água

no Brasil - Luis Carlos Fontes...............................................................................................................................................................

A visão do governo federal sobre o Projeto de Integração de Bacias – Rômulo Macedo........................................................................

Os aspectos jurídicos do Projeto da Transposição do São Francisco e a atuação do Ministério Público em defesa da bacia

Luciana Khoury......................................................................................................................................................................................

Do Velho Chico ao Presidente Lula........................................................................................................................................................

Declaração de Penedo...........................................................................................................................................................................

Carta de Juazeiro..................................................................................................................................................................................

Carta de Salvador.................................................................................................................................................................................

SUMÁRIO

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GESTÃO DE RECURSOSna Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco

As águas do rio São Francisco representamcerca de 2/3 da disponibilidade de água doce doNordeste brasileiro. O semi-árido, que extrapola a áreada bacia hidrográfica do rio São Francisco, apresentauma rede de rios intermitentes no interior, queassumem corpo e volume próximos de seu deságüeno litoral. São limitadas as possibilidades de utilizaçãodas águas subterrâneas, bem como armazenamentoem açudes e reservatórios, neste caso pela elevadaevaporação, que supera os 2.000 mm anuais.

A exceção é o rio São Francisco - com umabacia de contribuição que corresponde a 8% doterritório nacional, tem cerca de 2,8 mil quilômetrosde extensão, atravessa toda a região e atinge umavazão da ordem de 1.850 metros cúbicos por segundoe permite múltiplos usos, como irrigação e geraçãode energia. Abrangendo 503 municípios e seteUnidades da Federação - Bahia, Minas Gerais,Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Goiás e DistritoFederal - o rio São Francisco é estratégico para aregião e para o Brasil e integra, ao longo de seupercurso, uma população de quase 13 milhões depessoas.

A bacia apresenta igualmente grandediversidade quando se trata de áreas irrigáveis,cobertura vegetal e fauna aquática. No Alto, Médio eSubmédio São Francisco, por exemplo, predominamsolos com aptidão para a agricultura irrigada, o quenão se reflete no restante da bacia. A diversidade deusos da água é uma forte característica da bacia dorio São Francisco, que torna o conceito de usosmúltiplos e concorrentes um fato concreto na gestãodos seus recursos hídricos.

Alguns aspectos relevantes devem serdestacados para o planejamento dos recursos hídricosnessa bacia, como: saneamento ambiental; airrigação que, em 2003, já beneficiava uma área de342.712 hectares e que poderá ser ampliada, segundoestudos efetuados, até o limite de 800.000 hectaressem que haja conflito dos usos múltiplos; oaproveitamento do potencial hidráulico, uma vezque as hidrelétricas em operação na bacia do rio SãoFrancisco são estratégicas e decisivas para oatendimento do subsistema Nordeste e participavam,em 2003, com cerca de 17%, no montante da

produção nacional de energia; a navegação, atividadetradicional no rio São Francisco e em alguns de seusafluentes, com potencial de desenvolvimento, noentanto dependente da garantia de um calado mínimoe da observação das regras de operação dosreservatórios; o potencial das atividades de pescae aqüicultura, que na bacia é expressivo, devendoser estimulado através de técnicas apropriadas, queobjetivem o desenvolvimento socioeconômico daregião e a conservação ambiental; a garantia devazões mínimas para a manutenção dosecossistemas e preservação da biodiversidadeaquática e as atividades de turismo e lazer ligadasaos recursos hídricos que apresentam um potencial aser explorado, com grande impacto econômico sobreas várias regiões da bacia, desde que seudesenvolvimento esteja associado ao conceito desustentabilidade ambiental.

A bacia hidrográfica do rio São Franciscopossui acentuados contrastes socioeconômicos -áreas de grande riqueza e alta densidade demográficae áreas de pobreza crítica e população bastantedispersa. A população, distribuída de formaheterogênea, é de 12.796.082 habitantes, sendo74,4% população urbana e 25,6% população rural.Do total de 503 municípios, 456 têm sede na bacia edestes, 315 são municípios claramente deprimidosdo ponto de vista econômico. Quando consideramostrês indicadores sócio-institucionais dos municípioscom sede na área da bacia (a esperança de vida ao

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nascer, o nível educacional e a qualidade político-institucional), vários desses municípios encontram-se na combinação onde os três indicadores estão,simultaneamente, abaixo das respectivas médiasbrasileiras.

A análise da organização política-administrativa da bacia aponta para uma fragilidadeinstitucional, com inúmeros organismos que tratam odesenvolvimento de forma desarticulada e setorial.Além disso, a dominialidade múltipla dos recursoshídricos (sete Unidades Federadas e a União) reforçaa necessidade de integração das açõesgovernamentais e da sociedade civil, deaperfeiçoamento do marco regulatório e decompatibilização de políticas públicas.

O arcabouço jurídico que dá suporte à açãoinstitucional é, sem dúvida, um aspecto relevante noque concerne à implementação de políticas públicas.A Lei 9.433, que instituiu a Política Nacional deRecursos Hídricos e o Sistema Nacional deGerenciamento dos Recursos Hídricos, combinadacom a Lei 9.984, que criou a Agência Nacional deÁguas, constitui o lastro da gestão dos recursoshídricos no Brasil, pautada em aspectos inovadoresque buscam efetivar a gestão integrada,descentralizada e participativa da água.

Nesse contexto, verifica-se um processocrescente de participação social que vem prosperandodesde a promulgação da Constituição de 1988, nosmunicípios e setores da bacia, com destaque para acriação do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio SãoFrancisco – CBHSF e de vários Comitês Estaduaisem sub-bacias.

Em face da dimensão da bacia, de suasvariadas características e da multiplicidade de atoresinstitucionais envolvidos, um desafio se coloca – aefetivação da gestão integrada, descentralizada dosrecursos hídricos na bacia do São Francisco, quecoloca à prova os princípios e diretrizes da Lei 9.433.Neste âmbito, destaca-se o papel de articulação quedeve ser exercido pelo Plano Decenal de RecursosHídricos da Bacia do São Francisco - PBHSF 2004 -2013, para implementação das ações necessárias.Este Plano, desenvolvido a partir da deliberação doCBHSF, elaborado por um Grupo de Trabalho

coordenado pela Agência Nacional de Águas elegitimado por inúmeras instâncias de discussão,propõe um Pacto da Água, para harmonização deprocedimentos e implementação dos instrumentosprevistos na Lei.

As estratégias institucionais conferem umefeito de alavanca sobre as estratégias econômicas,na razão direta da sua qualidade e do poder dearticulação dos atores envolvidos. Nesse contexto, éimportante destacar as ações apresentadas no PlanoDecenal com vistas à construção do Pacto para agestão da bacia, sem sobreposições e mantendo aunidade e a integração: a celebração do Convênio deGestão Integrada entre a União e Unidades Federadasda bacia, com a interveniência do CBHSF, quepermitirá o equacionamento, em bases comuns, detemas centrais para a gestão dos recursos hídricosna bacia (a alocação de água, a descentralização dagestão e a cobrança); a criação da Agência da Bacia,cujas ações podem ser estruturadas em torno defunções básicas de planejamento; a manutenção doCBHSF como entidade focal da bacia, para acoordenação das principais decisões que influem nagestão dos recursos hídricos e na implementação doPlano; e o fortalecimento dos órgãos gestores derecursos hídricos para que exerçam suas funções deforma coordenada, articulada e integrada.

GESTÃO DE RECURSOSna Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco

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(*) Diretor-presidente daAgência Nacional de Águas – ANA

[email protected]

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1. A BACIA DO RIO SÃO FRANCISCO

A bacia do rio São Francisco tem sidoestratégica para o desenvolvimento de vasta regiãodo Brasil e tem desempenhado importante papel naocupação do território brasileiro. Dada sua localizaçãoe importância, diversos esforços têm sido realizadose pelas múltiplas possibilidades de desenvolvimentosocial e econômico que, aliada a natureza complexae a situação ambiental da bacia, acabam porconformar um mosaico de interesses, na maioria dasvezes conflitantes entre si.

Consciente da importância da bacia do SãoFrancisco, das complexasmudanças ocorridas e dopotencial de conflitos nelaexistentes, esforços tem sidoempreendidos, incluindo ogoverno brasileiro e asociedade em geral, visando arecomposição ambiental dabacia, a revitalização do rio, oaproveitamento de suaspotencialidades e aimplementação de umgerenciamento integrado dosseus recursos hídricos.

O reflexo das ações dos diversos fatoresquem agem na reformatação da bacia, incluindo asatividades antrópicas, é apresentado na Figura 1 quemostra trecho do rio assoreado e com banco de areia.

Pode-se assim dizer que a bacia do SãoFrancisco constitui caso concreto de aplicação daconhecida “sabedoria do colibri” que está nos ditospopulares, consolidou-se como exemplo. Hoje, todos,cidadãos, autoridades e tomadores de decisão, estãofazendo a parte que lhes tocam e, embora possaparecer pequena e modesta, é como o beija flor que

UMA PARCERIA PARA O RIO SÃO FRANCISCO

Paulo Lopes Varella Neto1 - José Luiz de Souza2 - Humberto Cardoso Gonçalves3

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vendo a floresta em chamas se propôs ao trabalhode levar água no bico, gota a gota, para apagar oincêndio, enquanto todos os animais fugiamassustados.

2. PARCERIA ESTABELECIDA

Diante da importância da bacia do SãoFrancisco, o governo brasileiro, buscou a cooperaçãodo Fundo para o Meio Ambiente Mundial (GEF, porsua sigla em inglês), do Programa das Nações Unidas

para o Meio Ambiente(PNUMA) e da Organizaçãodos Estados Americanos(OEA) para, com aparticipação de todos osatores da bacia, instituiçõesgovernamentais e nãogovernamentais desenvolvero Projeto de GerenciamentoIntegrado das AtividadesDesenvolvidas em Terra naBacia do Rio São Francisco,conhecido como Projeto GEFSão Francisco. Iniciado em

2000, o Projeto foi executado pela Agência Nacionalde Águas.

2.1. Resultados alcançados

Entre os resultados alcançados, um marco nodesenvolvimento desse projeto foi a instalação doComitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco,aprovado pelo Conselho Nacional de RecursosHídricos – CNRH em reunião ordinária de 29 de maiode 2001 e criado por Decreto da Presidência da

Figura 1 Rio S]ao Francisco comdestaque de um banco de areia.

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República em 5 de junho de 2001. A instalação doComitê de Bacia, apoiado pela ANA através do ProjetoGEF São Francisco (Subprojeto 3.4/3.5), representouavanços decisivos tanto para a Política Nacional deRecursos Hídricos como para a própria bacia,ganhando visibilidade e espaço nas agendas dogoverno federal e governos estaduais.

O processo para instalação do Comitê daBacia teve como eixo de sustentação a adoção damobilização social e participação pública, mecanismoainda pouco utilizado na gestão dos recursos naturaise da água, embora sejam instrumentos estatuídos pelaConstituição Federal e pela Lei das Águas (Lei no.9.433/97).

Produtos de destaque e objeto deste projetoforam o Diagnostico Analítico da Bacia – DAB,publicado em 2003, o Programa de Ações Estratégicas

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para o Gerenciamento Integrado da Bacia do Rio SãoFrancisco e da sua Zona costeira - PAE, concluídoem 2004 (www.ana.gov.br/gefsf). Complementando osestudos e atendendo preceitos da Lei no 9.433/97, foielaborado, em 2005, o Plano Decenal de RecursosHídricos da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco(2004-2003) - PBHSF.

Estes documentos, mostrados nas Figuras 2e 3, contaram com a participação do Comitê da Baciado São Francisco na sua elaboração e aprovação,representam importantes instrumentos para ogerenciamento dos recursos hídricos da bacia, geracomprometimento para as ações sugeridas, avalia asnecessidades técnicas, humanas e financeiras paraimplementação das soluções concebidas com vistasa minimizar/solucionar os problemas identificados nabacia.

UMA PARCERIA PARA O RIO SÃO FRANCISCO

Figura 2Documentos norteadores das ações na bacia

do São Francisco

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2.2. Perspectivas

Como ação futura e desdobramento do PAE,encontra-se em fase final de entendimentos, mantidosentre a ANA, OEA, PNUMA e GEF a implementaçãode um projeto de porte médio que objetiva incorporaranalise ambiental nas políticas, planos e programaspara o manejo integrado da bacia e sua zona costeira;promover ações para o estabelecimento da agenciade bacia e os mecanismos operacionais para odesenvolvimento econômico e sustentabilidade dos

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UMA PARCERIA PARA O RIO SÃO FRANCISCO

Figura 3Documentos norteadores das ações na bacia

do São Francisco

1 Superintendente de Implementação de Programase Projetos da Agência Nacional de Águas – ANA

[email protected]

2 Consultor da OEA – Coordenador Técnicodo Projeto GEF São Francisco, concluído em 2005

[email protected]

3 Superintendente Adjunto de Implementação de Programase Projetos da Agência Nacional de Águas – ANA

[email protected]

recursos hídricos; implementar projetos e ações paraprevenir a degradação da bacia com sustentabilidadeeconômica, utilizando os instrumentos da PolíticaNacional de Recursos Hídricos; e, facilitar aoperacionalização do sistema integrado de manejodos recursos hídricos no rio São Francisco e sua zonacosteira. Estas ações são convergentes com oPrograma de Revitalização de Rio São Francisco, emdesenvolvimento pelo Governo Federal.

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A partir da promulgação daConstituição Federal em 1988,intensificou-se no país uma“cultura participativa”, na qual asociedade organizada não se limitaa eleger representantes para olegislativo ou executivo, masvaloriza a participação direta e ocontrole social nas políticaspúblicas.

A implantação do SistemaNacional de Gerenciamento deRecursos Hídricos - SINGREH,com seus organismos colegiados,Conselhos Estaduais e Nacional eComitês de Bacia insere-se,portanto, no contexto dademocracia participativa, previstana Constituição Federal e enfrentatodos os desafios de suaimplementação, em um país quevem gradativamente construindouma relação mais democráticaentre Estado e sociedade, emespecial, na gestão das políticaspúblicas.

A instalação e ofuncionamento do Comitê da BaciaHidrográfica do Rio São Francisco– CBHSF também é parte desteprocesso de construção dademocracia participativa no Brasil.Neste país de dimensõescontinentais, a experiência doCBHSF reveste-se de sumaimportância, quer seja peladimensão e complexidade dagestão de recursos hídricos nestabacia ou ainda pela importânciaestratégica para região e o país.

Ao ser instalado, emdezembro de 2002, o CBHSFconsiderava-se como seusprincipais desafios:

• organizar-se internamente egarantir o funcionamento de suasdiversas instâncias administrativase colegiadas (secretaria executiva,câmaras técnicas e consultivasregionais e o plenário);• superar o confronto entreinteresses e culturas locais,regionais e interestaduais e definiruma agenda unificadora;• construir uma pauta de decisõesestratégicas para bacia,reconhecida e respeitada pelosórgãos gestores de recursoshídricos e demais instituições, nasesferas municipal, estadual efederal;

• garantir a representatividade dasentidades que o compõemenquanto portadores dosdiferentes anseios da população dabacia.

À este conjunto dedesafios foram, inevitavelmente,somando-se muitos outros,decorrentes da prática do dia-a-dia,do fazer político. É fundamental,portanto, neste momento derenovação dos membros doComitê e de encerramento de doisciclos de gestão, que se faça umareflexão sobre os reais desafiosenfrentados e as possíveis

estratégias de fortalecimento doCBHSF.

Vale destacar que quantoao suporte técnico, administrativoe financeiro para o seufuncionamento, o CBHSFdependeu quase queexclusivamente, dos recursosrepassados pela ANA àSuperintendência de RecursosHídricos da Bahia – SRH - Ba,tendo sua utilização vinculada,como todo recurso publico, àsregras estabelecidas na Lei nº8.666, que define normas paralicitação e contratações naadministração publica.Legislação esta que não secoaduna com a dinâmicanecessária aos processosparticipativos, em especial emuma bacia hidrográfica com asdimensões do rio São Francisco.

Há que se observar,entretanto, que estes e outrosentraves burocráticos e legais,dificultaram, mas não impediramo funcionamento da SecretariaExecutiva, das Câmaras Técnicase Consultivas Regionais e nem deseu plenário, que se constituíramem instâncias de interlocução doComitê com a sociedade da bacia,em especial quando da construçãoe aprovação do Plano da Bacia, oque demonstra a capacidade doCBHSF de identificar e viabilizarestratégias de apoio, além dasprevistas institucionalmente.

O desafio maior doCBHSF de se constituir como ainstância de articulação dosdiversos interesses da bacia,através da construção de umapauta comum de decisões

Mobilização e Participação na Bacia Hidrográfica do Rio São FranciscoO Desafio da Gestão Participativa

Rosana Garjulli*

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estratégicas, findou por serviabilizada pela retomada por partedo Governo Federal, do Projeto deIntegração do Rio São Franciscocom Bacias Hidrográficas doNordeste Setentrional.

Ainda que este temapolêmico, com desdobramentosjudiciais e de forte viéspolítico, tenha causadoprejuízos inegáveis aodesenvolvimento de ações eprojetos do CBHSF e dealguma forma contribuídopara um certo“estremecimento” da relaçãodo Comitê com outrasinstâncias do SINGREH,dialeticamente possibilitou asuperação de outros desafios,entre os quais destacam-se: oconfronto entre interesseslocais, regionais einterestaduais dentro da baciahidrográfica; o reconhecimentopolítico do Comitê como instânciade interlocução para a gestão derecursos hídricos e contribuiuainda para mobilização social naconstrução do Plano da Bacia.

A necessidade de seconsolidar como instânciarepresentativa dos diversosinteresses de uso e preservaçãoexistentes na bacia, continuasendo um dos maiores desafios doCBHSF.

A heterogeneidade deusos, culturas e interessesexistentes é certamente uma fortemarca da peculiaridade da baciado São Francisco, em relação aoutras bacias hidrográficasbrasileiras e, garantir que toda estacomplexidade se faça representar

no plenário do CBHSF, demandacertamente o desenvolvimento deum programa permanente decomunicação e mobilização comtoda população da bacia.

A ausência de umprograma de comunicação emobilização social tem

evidenciado seus reflexos quandodo desenvolvimento dos processosde renovação eleitoral, há aindamuita desinformação sobre o queé o Comitê, quem o compõe, quaissão suas atribuições e açõesdesenvolvidas, entretanto, temsido justamente nestes momentosque ocorre um maior contato doCBHSF com os segmentos esetores por ele representados.

Os processos eleitorais,de 2002, 2005 e 2007 constituíram-se em momentos especiais decomunicação do CBHSF com asociedade da bacia, onde seevidenciou claramente anecessidade de identificar umaestratégia geral de mobilizaçãoque resguarde em si os princípiosda universalidade da divulgação eda informação, mas apontou

também a necessidade de sedesenvolver metodologiasespecíficas para sensibilizar emobilizar os diferentes segmentos,setores, comitês de bacias de riosafluentes e comunidadesindígenas em cada um dos estadosda bacia.

Para garantir um processoeleitoral representativo dadiversidade econômica, social,física, cultural e política dabacia, tem-se procuradoobservar de que forma estaheterogeneidade se reflete nasformas de organização dasociedade, assim como naforma como se relacionam como Estado.

Estas especificidades seexpressam, quer seja a partir davocação produtiva industrial,mineradora, agropecuária,

pesca, etc., ou ainda, na dinâmicapolítica que reflete a maneira comohistoricamente se estabeleceramàs relações entre Estado esociedade em cada uma dasregiões da bacia.

Contudo, independente dogrande esforço de mobilização quevem se desenvolvendo a cada doisanos, quando do processo derenovação eleitoral, muito poucotem sido realizado fora destesperíodos, em termos demobilização e comunicação. Écerto que quando o Comitê estatratando de “temas que mobilizama sociedade”, tais como discussãosobre o projeto de integração debacias, ocorre a participação ativade vários segmentos sociais.

O desafio que tem secolocado para o Comitê é garantir

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Mobilização e Participação na Bacia Hidrográfica do Rio São FranciscoO Desafio da Gestão ParticipativaC

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que nos momentos em que suapauta está mais voltada paraimplementação dos instrumentosde gestão, tais como definição eimplantação da cobrança e daagência de bacia, o CBHSF possater a capacidade de se comunicare de mobilizar interesses tãodiversos, de modo a garantir aefetiva representatividade e atransparência necessária ao plenoexercício da democraciaparticipativa, em especial, quandoda tomada de decisões que irãoafetar a população da bacia.

Sem o funcionamentosistemático das diferentesinstâncias de articulaçãoinstitucional do CBHSF, de suasCâmaras Técnicas e ConsultivasRegionais e o desenvolvimento deum programa permanente demobilização e comunicação social,fica extremamente precária ainterlocução do CBHSF com a

sociedade da bacia, correndo-se orisco das decisões tomadas pelasua plenária não serem acatadas.

Os outros desafios quevêm se colocando ao CBHSF, taiscomo: a articulação e definição depautas integradas com os comitêsde bacias de rios afluentes; aconstrução de um pacto paragestão das águas entre osdiferentes estados que compõe abacia; a conquista dasustentabilidade do CBHSF,certamente só poderão sersuperados com o seufortalecimento institucional epolítico. O caminho para estaconquista, passa necessariamentepela compreensão de que amobilização e a comunicaçãosocial não devem ocorrer apenasem momentos isolados, de acordocom os interesses do Comitê oudo sistema de gestão, mas devemse constituir no elemento

fundamental para garantir atransparência, a representação ea representatividade no CBHSF.

Entretanto, cabe salientarque como “o caminho só se fazao caminhar” é gratificanteverificar que o CBHSF, esta somainigualável de corações e mentesde tantos cantos e recantos desta“nação são franciscana” estejaconstruindo sua trajetória, que éúnica, num exercício permanentede superação de seus desafios,que certamente não são apenasseus, mas de todos que acreditamno processo democrático, comoo único capaz de concretizar umagestão eficiente e eficaz dosrecursos hídricos em nossoplaneta.

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Mobilização e Participação na Bacia Hidrográfica do Rio São FranciscoO Desafio da Gestão Participativa

(*) Socióloga / Agência Nacionalde Águas – ANA

[email protected]

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Democracia, participação ampla e respeitoàs diferenças. Estes têm sido os princípios básicosde nossa gestão, frente ao Comitê da BaciaHidrográfica do Rio São Francisco, fundados emnossa convicção de que, nada de bom se constróisem a participação irrestrita dos principaisinteressados.

Desde o primeiro momento da mobilizaçãode forças e líderes para a composição do Comitê,os ideais democráticos e a visão de conjunto dabacia têm guiado as decisões dos que vêm,dioturnamente, se empenhando no fortalecimentodas alianças para a recuperação e revitalização dorio e, agora, na divulgação e implantação dosesquemas de gestão participativa de suas águas.

Muito se caminhou nesse sentido. Mas, aprincipal vitória é, sem dúvida, a elaboração doPlano de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográficado Rio São Francisco – tão logo se aprovou a Lei9.433/97 – estabelecendo os marcos referenciais detodo o trabalho a se desenvolver nas áreasbanhadas pelo nosso Velho Chico.

Ao finalizarmos esta gestão, frente aoCBHSF, queremos destacar os principais passosdados para se concretizar, celeremente, a gestãoparticipativa das águas da bacia, e o trabalho dasnossas Câmaras Técnicas:

1- a definição dos usos externos da água dabacia, com o estabelecimento de limites,prioridades e critérios de alocação e outorga paraesses usos, como parte integrante do Plano deRecursos Hídricos;

2- a avaliação e implementação do Planode Recursos Hídricos e análise aprofundada dasconseqüências do Projeto de Transposição, tendoem vista a gestão participativa e o Pacto dasÁguas da bacia;

3- as deliberações que definiram os rumose as medidas para a revitalização da bacia;

4- o fortalecimento dos Comitês de BaciasHidrográficas da área sanfranciscana e do SistemaNacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;

5- a análise das experiências dos Comitêsde Bacias dos Rios Paraíba do Sul e Piracicaba/Capivari/Jundiaí, no que se refere à cobrança do

ÁGUAS E DEMOCRACIAUMA CONSTANTE LIÇÃO

José Carlos Carvalho*

uso da água, para adoção na bacia do rio SãoFrancisco;

6- as discussões e medidas relativas àsustentabilidade econômica e ecológica da bacia;

7- a estruturação e o funcionamento dasCâmaras Técnicas;

8- a análise dos mecanismos para a criaçãoda Agência de Água da bacia do São Francisco;

9- a análise e estudo do modelo de Agênciade Bacia proposto;

10- o fortalecimento do Comitê da BaciaHidrográfica do Rio São Francisco, bem como adefinição de sua posição diante do Projeto deTransposição de Águas do rio.

São ações que desenvolvemos graças aoespírito de luta e a efetiva disposição ao trabalhodas pessoas e organizações membros do Comitê ede seus aliados nas instâncias comunitárias, cujosresultados serão melhor apreciados no futuro. Nomomento, resta-nos agradecer a todos o empenhoem dar conta do recado, levando à frente asmedidas que os gestores e usuários dos recursosda bacia elegeram como prioritárias.

Há muito, ainda, a se fazer. Daí anecessidade, que já estamos discutindo, derenovação do CBHSF, de modo a dar-lhe maiorfôlego para as lutas que se apresentam e seimpõem – inclusive com dispensável demonstraçãode força – na defesa dos reais interesses da genteque trabalha e cuida dos sertões dos gerais, dasmatas secas e caatingas que envolvem o nosso rioSão Francisco.

(*) Presidente do CBHSF período 05/03 a 06/05 e de 04/06 a 08/2007.

[email protected]

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“Meu rio São Francisco, nessa maior turvação: vim te darum gole d’água, mas pedir sua benção...” Guimarães

Rosa (citado in GSV).

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O Plano da BaciaHidrográfica do Rio São Franciscoé a peça fundamental paraorientação dos programas e dasações do Comitê da BaciaHidrográfica do Rio São Francisco- CBHSF. Vou tentar descreverneste relato, o processo deelaboração e aprovação do PlanoDecenal da Bacia Hidrográfica doRio São Francisco - PBHSF e aexperiência a qual vivenciei e tivea oportunidade de participar comocoordenadora da Câmara Técnicade Planos, Programas e Projetosdo CBHSF. Este relato precisariaser contado por várias “vozes emãos”, que coletivamenteconstruíram o Plano. Buscarei seruma representante fiel de todosque, direta e indiretamente,influenciaram no processo, o qualconsidero um marco histórico parao gerenciamento de recursoshídricos do país. A Lei Federal dasÁguas ao definir a PolíticaNacional das Águas e criar oSistema Nacional deGerenciamento dos RecursosHídricos - SINGREH, em 8 dejaneiro de 1997, estabeleceu queo planejamento e o gerenciamentotivessem a bacia hidrográficacomo unidade territorial deplanejamento e deveria contarcom a participação do poderpúblico, usuários e sociedade civilorganizada. O comitê de bacia

hidrográfica é o ente do SINGREHque congrega, em sua estruturacolegiada, os membrosrepresentantes desses trêssegmentos da sociedade, em seuterritório de atuação. O plano debacia hidrográfica é o documentoque define e orienta as ações

relacionadas com o gerenciamentodos recursos hídricos e nele constaa indicação das alternativas deenquadramento dos corposd’água; os limites, critérios eprioridades da outorga de direitode uso da água e mecanismo decobrança. Assim como, ações derecuperação da qualidade dos rios,de aproveitamento múltiplo desuas águas e o custo dessasações. A legitimidade seráassegurada com a aprovação pelocomitê de bacia.

O processo de construçãodo Plano obedeceu a duasagendas. Uma técnica, deconstrução e acompanhamentotécnico, onde foi elaborado o

diagnóstico, diretrizes paraalocação, estratégia pararecuperação e conservaçãohidroambiental e programa deinvestimentos. E outra, de políticade consulta pública do conteúdo doPlano, quando ocorreram aprimeira rodada de discussãopública, o fórum de avaliação doPlano e a segunda rodada. AoPBHSF cabe implementar oSINGREH.Diversas foram as fontes definanciamento do Plano e doprocesso de discussão pública: aANA via convênio GEF/OEA/PNUMA, a CHESF e os órgãosgestores estaduais.

A elaboração do Plano foifeita pela ANA, em parceria comos órgãos gestores de recursoshídricos dos seis estados quecompõem a bacia (Minas Gerais,Bahia, Goiás, Pernambuco,Alagoas e Sergipe) e do DistritoFederal, que juntamente com aCODEVASF e a CHESFintegravam o Grupo Técnico deTrabalho – GTT. A supervisão doPBHSF ficou a cargo da DiretoriaColegiada e o acompanhamentotécnico, pelas CTPPP e CTOC. AsCâmaras Consultivas ficaramencarregadas de coordenar aparticipação pública, nas quatroregiões fisiográficas da bacia: Alto,Médio, Submédio e Baixo, trechosdo rio São Francisco.

Yvonilde Medeiros*

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Diagnóstico da Bacia

No módulo do Plano quese refere ao diagnóstico, o rioSão Francisco foi retratado pelasua localização, extensão ecaudabilidade e biodiversidade.Além da história, cultura e tradiçãodos povos que vivem na área desua bacia hidrográfica, e do papelgeo-estratégico importante para odesenvolvimento econômico esocial do País. No planoambiental, esse desenvolvimentonão ocorre de forma sustentável.

As diferençasfisiográficas, que se referem aoclima, geologia e hidrologia, sãoampliadas por uma enormedesigualdade no campo social eeconômico, ao longo da bacia. Ahistória de ocupação da bacia eapropriação das terras registra aexploração das populaçõestradicionais e dos recursosnaturais, que são os recursosminerais, florestas e água. Nestecenário de grande degradaçãoambiental, social e econômica, ogerenciamento dos recursoshídricos da bacia do rio SãoFrancisco depende daconcretização deste objetivo.Sendo assim, coerente com asnecessidades da população e como País, de uma forma geral, econsistente com os princípios ediretrizes da legislação em vigor.

A complexidade desta bacia podeser avaliada pela sua grandedimensão. Pois nela coexistemregiões de acentuada riqueza,elevada densidade demográfica eurbanização acelerada comregiões de pobreza extrema,população rarefeita e crescimentoeconômico inexpressivo. Nestecontexto, são intensos os conflitos

entre os diversos usos da água.Para se ter uma idéia, a área dabacia compreende 638.574 Km²,na qual vivem 12.795.631habitantes. Desta, 43% é semi-árida, com 5,3 milhões dehabitantes. No trecho do Alto SãoFrancisco, as atividadeseconômicas rurais e a mineraçãoprovocam a remoção davegetação nativa e aceleram oprocesso de erosão eassoreamento.

A urbanização intensificaa diluição de efluentes ecompromete os usos mais nobresda água, como o abastecimentohumano e a dessedentação

animal. No Médio, a expansão dairrigação causa impactos sobre osrecursos hídricos e tem comoexemplos áreas irrigadaslocalizadas nas bacias de riosafluentes: como a do VerdeGrande, entre Bahia e MinasGerais e as dos rios Preto eGrande, ambas situadas no Oestebaiano. No Submédio, cujacaracterística mais marcante é apredominância do clima semi-árido, a situação é crítica: apresença de rios intermitentesdificulta a diluição de efluentes ea ausência de fontes hídricas, comgarantia de qualidade equantidade, compromete oabastecimento da população. Porúltimo, no trecho Baixo, por sualocalização, considera-se que osimpactos sobre os recursoshídricos, nessa região,correspondem ao somatório detodos eles ao longo da extensãodo rio, e mais precisamente, aosdanos causados no ecossistemaresultantes da operação dosreservatórios de Sobradinho eXingó.

O diagnóstico evidenciouos contrastes sociais e econômicosda bacia. O saneamento ambientalé precário na maior parte dela,especialmente no Submédio eBaixo São Francisco, onde acobertura de água, em algunsmunicípios é inferior a 60%. O

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tratamento dos esgotos coletadosé incipiente, com exceção naRegião Metropolitana de BeloHorizonte. A disposição final delixo é feita de forma inadequadapor 93% dos municípios. Por outrolado, a atividade agrícola na baciaé intensa. Atualmente, a áreairrigada é de 342.712 ha., maspode ser ampliada, de acordo comestudos técnicos, até o limite de800.000 ha., sem a instalação deconflitos de usos múltiplos.Entretanto, o aumento destes usosmúltiplos implica em umadiminuição da disponibilidadehídrica para produção de energia,cujo potencial na bacia é 10.356MW, o que corresponde a 17% daenergia gerada no País.

A navegação tempotencial para tornar-se opçãoimportante de transporte degrandes volumes de carga. Ostrechos naturalmente navegáveiscompreendem a 1.370 Km noMédio São Francisco, e 208 Kmno baixo curso, a jusante dePiranhas. O potencial dasatividades de pesca e aqüiculturana bacia é expressivo, devendo serestimulado através de técnicasapropriadas, que objetivem odesenvolvimento socioeconômicoda região e a conservaçãoambiental. O turismo e o lazer,ainda inexpressivo na bacia, sãoestratégicos para o combate à

pobreza e a promoção dodesenvolvimento regional.

A oferta de água foiavaliada do ponto de vista dossuprimentos superficiais e dassubterrâneas. A vazão naturalmédia anual do rio São Franciscoé de 2.850 m3/s. A barragem deTrês Marias regulariza a vazão de513 m3/s e a de Sobradinho de1.815 m3/s. Em conseqüênciadisso, a bacia tem uma

disponibilidade hídrica de 1.849m3/s (vazão regularizada emSobradinho, mais a vazãoincremental com permanência de95%). No que se refere à ofertade água subterrânea, adisponibilidade é de 318 m3/s. Nabacia foram identificados trêsdomínios aqüíferos, sendo o maisimportante, o Urucuia-Areado,que possui área de 112.380 km2,vazão média de poços de 10 m3/h e reservas explotáveis de 135m3/s, que representam 41% dadisponibilidade hídricasubterrânea da bacia. Estesistema é intensamente

explorado no Oeste baiano parairrigação.

A avaliação da ofertahídrica também foi feita emtermos qualitativos. Ao se levarem consideração adisponibilidade e a vazão média,são atendidas nas condições deClasse 2 (CONAMA 357), comexceção do trecho em que o rioSão Francisco recebe acontribuição do rio das Velhas. Deforma geral, é possível afirmarque nas sub-bacias do Baixo,Médio e Submédio, o problemacom a carga orgânica estáassociado principalmente àsbaixas vazões dos corpos deágua. Nas sub-bacias do Alto,está relacionado à elevadadensidade populacional.

O diagnóstico apresentacomo demanda média de água ototal de 166 m3/s, sendo a vazãoconsumida de 105 m3/s, com umaparcela de retorno ao rio estimadaem 60 m3/s. O crescimento dademanda ocorrido durante asdécadas de 70 e 80, teve comoprincipal causa o aumento dairrigação. Porém, o maiorcomprometimento dadisponibilidade hídricacorresponde a sua utilização parageração de energia hidrelétrica.Inicialmente, o modelo dedesenvolvimento adotado para abacia estabelecia como usoprioritário das águas a produção

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hidroenergética.Posteriormente, o

reconhecimento do grandepotencial agrícola, principalmenteo da agricultura irrigada, e o seureflexo para o desenvolvimentoeconômico geraram anecessidade de compatibilizaçãodestes dois usos, visto que adisponibilidade hídrica nãopossibilitava o desenvolvimentosimultâneo destes dois em todo oseu potencial.

Atualmente, somam-se aestes usos, o abastecimentourbano e rural, a navegação, oturismo, a mineração, a pecuáriae a produção industrial. Eacrescenta a exportação de águapara os usos externos à bacia,além das restrições ambientaisnecessárias ao equilíbrio epreservação do sistema fluvial edo ambiente costeiro associado àfoz do rio. A eleição de prioridades,e consequentemente, a repartiçãoou alocação da água entre osdiferentes usos, constitui-se umaquestão complexa.

Alocação de Água na Bacia

O Plano buscou umasolução para esse desafio atravésde um acordo entre todos osEstados envolvidos, além doCNRH, a ANA, o CBHSF e oscomitês das bacias dos rios

afluentes, a ser consolidado nostermos de um Pacto de GestãoIntegrada. As discussões para aconstrução do Plano de RecursosHídricos apontaram a necessidadedo CBHSF e demais comitês debacias de rios afluentes,estabelecerem de imediato,diálogos internos e externos comtodos os atores envolvidos nagestão da água. O objetivo éconstruir os vários pactosnecessários para a administraçãodas águas da bacia, dentro de umambiente de harmonia de leis,normas e procedimentos para agestão dos recursos hídricos. OPacto de Gestão preservará oconceito de bacia como unidadede planejamento e gestão,incluindo o papel a ser exercido eas competências do Comitê do rioprincipal e da sua Agência deBacia. Dessa forma, contribui paraa soma e integração de esforços,mas ao mesmo tempo, evita afragmentação da gestão das águasdo rio São Francisco.

A alocação de água nabacia deverá ser um dos principaisresultados do Pacto de Gestão dasÁguas. Os critérios de repartiçãoespacial do uso da água para finsconsuntivos, fornecerão suportepara a aplicação do instrumento deoutorga de direito de uso dosrecursos hídricos pelos órgãosgestores. Neste sentido, a

prioridade do Plano é aconstituição e a implantação daAgência de Água da Bacia, paraviabilizar as ações executivaspertinentes ao Comitê, subsidiartecnicamente as tomadas dedecisão e acompanhamento dasua implementação e do Pacto dasÁguas.

As incertezas equestionamentos, surgidos duranteo processo de elaboração doPlano, eram relacionados aosparâmetros básicos dedisponibilidade hídrica e consumoefetivo, revisão e acordo em tornodos mesmos. Antes de seremadotados no processo de alocação,os parâmetros devem seraprovados pelo plenário doComitê. Diante disso, foi adotada,provisoriamente, a vazão máximaalocável na bacia, o valor de 360m3/s, estabelecido em função dadisponibilidade hídrica e da vazãomínima ecológica na foz de 1.300m3/s. Sendo esta reconhecidacomo valor de restrição mínimo,atualmente, praticado à jusante deXingó por determinação doIBAMA, até que se proceda arevisão ou confirmação deste valorna próxima edição do Plano.

Para a verificação dosatendimentos foram consideradosos consumos atualmenteoutorgados pelos Estados e União,os estimados até o ano de 2025 e

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os principais projetos deaproveitamento dos recursoshídricos na bacia. Por demanda doMinistério da Integração Nacional,levou-se em conta a possibilidadede realizar o projeto detransposição – Eixos Norte e Leste.

O Plano apresenta umconjunto de intervenções visandoa recuperação e a conservaçãohidroambiental agrupadas em 29atividades e 139 açõesestruturadas, em cincocomponentes. Neste contexto,inclui-se a revitalização do “VelhoChico”, que compreende umconjunto de medidas e ações degestão, projetos, serviços e obras.É um projeto planejado, integradoe integral, a ser desenvolvido eimplantado pelos municípios,Distrito Federal, estados, União,iniciativa privada e sociedade civilorganizada. Pretende recuperar aqualidade e quantidade de água,superficial e subterrânea, assimcomo a biodiversidade, paragarantir os usos múltiplos.

Agenda Política

Esta etapa compreendeuduas rodadas de discussãopública, nas quatro regiõesfisiograficas da bacia, sendo quena primeira ocorreram reuniõesampliadas das CâmarasConsultivas Regionais - CCR e, na

segunda, consultas públicas.Também foi realizado um fórum deavaliação do Plano, com reuniãoconjunta da Diretoria Colegiada,CT Planos e Outorga e o GTT,representantes da sociedade civildas CCR e de comitês de baciasde rios afluentes. Durante asRodadas de Discussão Pública,

mais intervenção foi acrescentadaa esse conjunto, com prioridadepara o período de 2004-2013. Verboxe.

No conjunto dasdiscussões coordenadas pelasCCR teve presença marcante derepresentantes de associaçõescomunitárias, produtores rurais, decolônias e federações depescadores e de ONG. Acontribuição desse grupo édestacada na temática darevitalização, pois se relacionadiretamente com o cotidiano e osanseios de uma vida maissaudável, seja pelo acesso à águahoje e no futuro, ou o receio dedegradação ambiental. Do outrolado, grandes usuários, podendodestacar os irrigantes; erepresentantes de Estados,entidades e órgãos gestores,discutiram com maior interesse otema Alocação de Água.Reiteradas manifestaçõesconfirmam a necessidade deabordagem mais acessível paraque, ao longo da implantação doPlano, os princípios dedescentralização, democratizaçãoe compartilhamento possam serbem operacionalizados emamplitude e essência. Issorepresentará um marco efetivo nagestão da água e uma conquistapara a consolidação do Comitê. Aconcretização do compromisso

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assumido pela coordenação doprocesso, resultou em trabalho desíntese e sistematização dosresultados oriundos dasdiscussões públicas. Nestesentido, o Grupo de SuporteTécnico ao Plano (GST) do Comitêdo São Francisco, incorporou asdemandas e propostas dasCâmaras Consultivas Regionais,do Fórum de Avaliação do Plano edas duas rodadas de ConsultasPúblicas, ocorridas nos meses demarço e maio de 2004 nas regiões,totalizando 1.280 pessoas.Osmembros da comunidade sempredeixaram claro, nas reuniões, odesejo de participar da elaboraçãodo Plano, principalmente nasquestões locais e regionais. A partirdaí, foi utilizada uma metodologiade trabalho baseada na formaçãode grupos, que debateram os maisdiversos aspectos técnicos daalocação da água e darevitalização da bacia. Nos gruposem que foram discutidos osaspectos relativos à alocação, foienfatizado o panorama dosconflitos entre usos da água eressaltados o significado daalocação de água, como um pactoentre os estados pela repartição devazões; a necessidade de umaampla negociação e definição dediretrizes.

Foram levantadasquestões como a importância de

que as ações do Plano não serestrinjam à calha principal dabacia, devendo ser estendida aosafluentes, fortalecendo, com isto,o princípio da bacia como unidadede planejamento. Além disso,houve questionamento comrelação aos critérios adotados paraa definição da disponibilidadehídrica superficial, comrecomendações para que fossemrevisados os cálculos referentes àvazão outorgada e efetivamenteconsumida. Algumaspreocupações focaram-se nanecessidade de estudos paradefinição de um regime sazonal devazões adequado à manutençãodo ecossistema fluvial e costeiroe à sustentabilidade dos múltiplosusos.

Os grupos de discussãoque se ocuparam da revitalizaçãoenfatizaram a necessidade dearticulação institucional do Comitêe o Programa Revitalização doMMA, destacando a importânciada consideração dos estudos eprogramas existentes, visando àconvergência de ações e apotencialização dos recursosaplicados e mobilização realizada.Os debates contemplaram, ainda,a preocupação permanente sobrea necessidade de investimentosem programas, projetos e ações,sobretudo em ações de prevençãoe controle de erosão (readequação

de estradas de terra, construção de“barraginhas”, plantio direto,recuperação de nascentes everedas) e preservação erecuperação de recursos naturais;estabelecimento de mecanismosde apoio à racionalização e reusoda água; destacando a importânciade conservação da água e solo noscerrados, região produtora deágua, como medida de segurançapara oferta de água, posicionando;estabelecimento de programaintegrado, incluindo zoneamento,preservação, revitalização doecossistema aquático (lagoasmarginais, etc.); pesquisa eassistência técnica e creditícia,etc. (Agenda 21 “pesqueira”).

Ainda nesse grupo, odebate envolveu preocupaçãocom projetos, obras e intervençõesde alcance social - construçãosistemas simplificados deabastecimento, como o Programa1 Milhão de Cisternas, cacimbase barragens subterrâneas e auniversalização do tratamento deágua em toda a bacia, Foramtratadas, também, aspossibilidades de se promover oreuso da águas do esgotamentosanitário na agricultura. Foramconsideradas prioridades regionaiscomo a elaboração de um planode ordenamento da pesca, noBaixo São Francisco e a realizaçãode estudos sobre os ciclos

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reprodutivos da ictiofauna. Istopara subsidiar as medidas derevitalização do ecossistema,ações de recuperaçãohidroambiental do rio SãoFrancisco e das áreas marginaisinundáveis impactadas porbarragens e implantar ummonitoramento múltiplo(qualidade, quantidade,sedimentos, erosão e faunaaquática).

Em Juazeiro, a reunião daCâmara Consultiva do Submédioocorreu de forma integrada com oEncontro Regional de Juazeiro - “ARevitalização que Queremos”,promovido conjuntamente peloFórum Permanente em Defesa doSão Francisco e MinistériosPúblicos Estaduais da Bahia ePernambuco. Com ampla agendae intensa participação popular essareunião da CCR captouposicionamentos da sociedade,órgãos públicos e usuários daágua. Estes podem ser resumidos,como o destaque da revitalizaçãoque não deve ser condiçãocompensatória para projetos detransposição de bacias e, oenvolvimento do Comitê com oPrograma de Revitalização daBacia não significa aval ao projetode transposição. São tambémvalorizados a importância dadescentralização, participação dasociedade, para captar

experiências e requerer umaabordagem prioritária para aeducação ambiental e mobilizaçãosocial; e conferir ao Plano acondição de instrumento deinclusão social (reforma agrária,acesso à água).

Uma vez firmado oconsenso sobre quais intervençõesdeverão integrar o PBHSF, emfunção do diagnóstico eprognóstico formulados, eestabelecidos os objetivos e metasassociadas, cumpre estimar os

investimentos que deverãoser feitos para que taisintervenções possam sermaterializadas. Os estudosproduzidos pela equipe da ANA,possibilitaram estabelecer o custodos investimentos preconizado noPBHSF em aproximadamente R$5,2 bilhões, divididos peloscomponentes que integram aestrutura de intervenções doPlano. Os investimentosapresentados são, na maioria, frutodo levantamento dos projetos

disponíveis nos diversosprogramas governamentais, masnão inclui muitas das demandas eações emanadas das diversasConsultas Públicas.

O programa deinvestimentos é de formaprovisória e deve ser objeto dereavaliação e revisão, a fim decontemplar o conjunto deintervenções prioritárias para arecuperação e conservaçãohidroambiental na bacia. Éimportante observar que o Comitêprecisará de um prazo longo osuficiente para estudar e avaliar oprograma completo deinvestimento para a bacia. Nesteperíodo, serão levantados todos oscustos das novas ações ainda nãoincorporadas ao presenteprograma.

Aprovação do PBHSF

O Plano apresentado emReunião Plenária, que ocorreu emJuazeiro em 2004, foi aprovado,exceto, no que se referia a outorgade uso externo das aguas. Noentanto, o governo federal pediuvistas à proposta de deliberaçãoque definia limites, prioridades ecritérios. O plenário do CBHSFcondicionou em uma lista deexigências a aprovação do pedidode vistas. As principais exigênciasse referiam a apresentação de um

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plano de desenvolvimentosustentável para o Semi-árido eum de Revitalização. Estaspropostas deveriam serapresentadas e discutidas nasCCR e submetidas ao Plenário doCBHSF, em reunião extraordináriaa ser realizada, em Salvador.

Em uma nova rodada dediscussão pública, a proposta doMinistério de Integração foiapresentada e fortementerejeitada, com o que ficou marcadoem todas as quatro regiõesfisiográficas da bacia com faixas“não rotundo à Transposição do rioSão Francisco”. Finalmente, emoutubro de 2004, a deliberação foiaprovada, com maioria absolutados membros do CBHSF. Aconcessão de outorga para usoexterno à bacia hidrográfica do rioSão Francisco fica restritaexclusivamente para consumohumano e dessedentação animal,atendidos os seguintes critérios:I - a definição dos valores a seremoutorgados deverá tomar por baseas reais necessidades hídricas das

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(*) Secretária Executiva do [email protected]

bacias hidrográficas receptoras,descontando-se os valores devazão já util izados para afinalidade de consumo humano edessedentação animal;II - clara comprovação deindisponibilidade hídrica local paraatendimento da demandaapresentada e da inviabilidadeeconômica e/ou técnica desoluções nas bacias das baciashidrográficas receptoras.

Posteriormente, oConselho Nacional de RecursosHídricos aprovou, sem discussãono âmbito das Câmaras Técnicas,o aproveitamento das águas do rioSão Francisco para o Projeto deTransposição, de acordo com aNota Técnica 192, da ANA.

Finalmente, a outorgaconcedida pela ANA autorizou autilização da vazão média de 64m3/s, para atendimento a demandade usos múltiplos. Estes fatosoriginaram uma série decontestações da sociedade contraa decisão do governo federal deaprovar o Projeto de Transposição

para o Nordeste Setentrional,ignorando o Plano da Bacia.

Existem ações junto aoSupremo Tribunal Federal - STFquestionando a legalidade daapreciação do CNRH, aoCERTOH e a outorga emitidospela ANA que ainda não possuemjulgamento definitivo. Embora oProjeto tenha licença ambientalpara implantação emitida peloIBAMA, no curso das obras,poderá ter a sua suspensão emrazão das 14 ações que tramitamno STF.

Passada esta etapa doprocesso de construção do Planode Recursos Hídricos é necessárioagora garantir a implementaçãodas ações previstas. Isto se tornaviável a partir da criação eimplantação da Agência de Águada Bacia.Na fase que se encontra agora, oCBHSF, está discutindo o modelojurídico da agência com aprovaçãoprevista na XV plenária.

CB

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Pessoalmente, participar do Comitê da BaciaHidrográfica do São Francisco – CBHSF é algoemocionante, principalmente para um sul mineiro,onde os rios são de águas barrentas.Essa emoção remonta ao ano de 1968, quando nacondição de estudante participante do ProjetoRondon, deparei-me com um rio São Francisco, emJanuária, no mês de julho, de águas claras refletindoa cor do céu. Nesse tempo, suas águas batiam naparede de pedras do cais da cidade. Hoje, águasreduzidas, ainda claras no mês de julho, não maisbatem no cais.

Poder participar das plenárias observando asacaloradas manifestações dos representantes dos

povos ribeirinhos é emocionante pela demonstração de amor ao rio.Como membro titular do Comitê, representante da Federação das Indústrias do Estado

de Minas Gerais - FIEMG, o olhar é outro. Olhar de responsabilidade ambiental pelodesenvolvimento sustentável, buscando o equilíbrio dinâmico nas relações entre o social, oambiental e o econômico.

Por tratar diretamente do chamado “Rio da Integração Nacional”, o CBHSF se revestede grande importância, ao tentar conciliar os diversos interesses existentes ao longo de seutrajeto, devido à grande diversidade cultural, econômica, social e o relacionamento com a calhado rio. Apesar de não ser um Comitê pioneiro, sua atuação é referência para os demais, sejamdas bacias de seus próprios afluentes ou de outras bacias.

Os temas em discussão são amplos e profundos: vazão ecológica; vazão mínima; vazãomáxima; consumo mínimo; conflito de uso da água; criação de agência de bacia; implementaçãoda cobrança pelo do uso da água; revitalização e transposição. Tais temáticas demonstram acomplexidade e a responsabilidade dos membros titulares e suplentes, sejam da sociedadecivil ou de usuários, representados no Comitê.

A FIEMG entende que das plenárias do CBHSF sairão as decisões sobre tais temas, alémdaquelas afetas aos valores a serem investidos para se alcançar o objetivo comum a todos, queé a melhoria da qualidade e quantidade das águas da bacia hidrográfica do rio São Francisco. Aconvivência, no Comitê, de representantes do setor de usuários, poder público e de organizaçõesdo terceiro setor poderá resultar em uma parceria cooperativa, pró-ativa, com o foco de construire fortalecer política e institucionalmente o Comitê do São Francisco.

Essa convivência ainda é marcada por um certo grau de desconfiança, por parte dosusuários, de que não possam participar efetivamente dos projetos, receio de que ao daremopiniões nos projetos sejam taxados de dominadores econômicos. Por parte da sociedade, apreocupação é de serem comandadas pelos usuários e de não participarem do processo deformulação dos projetos. Neste sentido, sua participação é fundamental nesse processo.

A esperança é de que dessa convivência madura possa resultar projetos formulados eexecutados vinculados à realidade e à necessidade da bacia.

Que o São Francisco possa cumprir reiteradas vezes a sua vocação integradora.

(*) Gerente de Meio Ambiente da FIEMG,representante dos usuários / indústria no CBHSF.

[email protected]

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A IMPORTÂNCIA DA PARTICIPAÇÃO DOS USUÁRIOS NA GESTÃO DASÁGUAS DO SÃO FRANCISCO

Wágner Soares Costa*

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Como homem público, exerci a liderança, que a mim foiconfiada, sempre voltada para a sociedade, para a gestãoreformadora do Estado e para o interesse da Nação. Sempre comum sentido de missão, de compromisso a honrar, em que asqualidades pessoais e a vontade de fazer, foram instrumentos deum objetivo maior de construção nacional, foi ai que vivencieium dos momentos mais ricos da minha trajetória.

Trata-se da experiência na prática, da constituição deprogramas que tenham por objetivo informar e gerar conhecimentosobre a gestão ambiental e dos recursos hídricos de formaparticipativa. A Lei nº 9.433/97 nos sinaliza a democratização nagestão dos recursos hídricos, entretanto lidamos com umarealidade onde a comunidade ainda não tem conhecimento

suficiente a este respeito, que proporcione a participação direta e efetiva neste processo. Emerge assim,diante de todos, a necessidade real de explicitar os fundamentos democráticos, previstos na mencionadaLei.

Esse caminho teve inicio para mim quando o então Governador do Estado da Bahia, Paulo Souto,estabeleceu novas diretrizes para a política ambiental da Bahia, período em que honrosamente fui convidadopara ser o primeiro Secretário Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, em 2003. O objetivo era o deagrupar na SEMARH - Secretaria de Meio Ambiente e Recursos hídricos todos os órgãos com ações voltadaspara o meio ambiente, apresentando uma nova face da política ambiental baiana. Foi nesta ocasião querepresentei o Estado num dos mais fascinantes e envolventes trabalhos que já experimentei: o de participarcomo membro titular do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco - CBHSF.

Ao trilhar por esses caminhos, passei a conviver com a construção direta da cidadania, em umconvívio com o que há de mais rico num país, numa região, numa bacia hidrográfica, o seu POVO. Trouxe,para tanto, a minha experiência de parlamento, como forma de contribuir para o processo de construçãocoletiva, utilizando exaustivamente a busca de consensos, nem sempre possíveis, mediante processos denegociação.

Sou filho das barrancas; as barrancas sanfranciscanas, as barrancas do Velho Chico, e no tratodiário com todos os atores envolvidos no Comitê, passei a ver e conhecer culturas, hábitos, negócios,projetos de futuro, que me levaram a perceber melhor esse povo e a mim mesmo, um filho da terra, lá deJuazeiro.

O grande desafio que surgiu foi à construção da gestão compartilhada por todos os segmentos quecompõem o Comitê: a sociedade civil, os usuários da água e os poderes públicos (Federal, Estadual eMunicipal).

Jorge Khoury*

O NOVO VELHO CHICO

DESTAQUE PARA ALGUMAS AÇÕES NO PERÍODO1- Fortalecimento e estruturação da Secretaria Executiva do CBHSF, em Salvador;2- Instalação da UAR - Unidade Administrativa Regional (da ANA), junto à Secretaria Executiva do CBHSF;3- Definição de medidas gerais a serem implantadas pelo CBHSF, suas Câmaras Consultivas Regionais e Câmaras Técnicas quanto ao Programa de Revitalização;4- Definição de atribuições, estrutura e forma de funcionamento da Câmaras Técnicas Institucional e Legal CTIL, de Outorga e Cobrança - CTOC e de Planos, Programas e Projetos - CTPPP.5- Definição de medidas gerais a serem adotadas pelo CBHSF quanto ao descumprimento do Plano de Recursos Hídricos da Bacia, face às prioridades de uso e critérios de outorga.

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DESTAQUE PARA ALGUMAS AÇÕES NO PERÍODO

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Tamanho desafio, só poderia ter êxito colocando naprática os conceitos e princípios da democracia participativa,onde todos, dos mais humildes aos mais graduados, dasinstituições mais simples às mais complexas, dos povostradicionais aos contemporâneos, participam tendo direito aomesmo tempo, ao mesmo espaço e ao mesmo voto. Assimaconteceu, iniciou-se a mais trabalhosa, mas também a maislegítima das políticas públicas do nosso País – a gestão daságuas da bacia hidrográfica do rio São Francisco pelo CBHSF.

Participei ativamente como vice-presidente da primeiraDiretoria Executiva, que tinha como presidente o ex-Ministrode Meio Ambiente e Secretário de Meio Ambiente eDesenvolvimento Sustentável do Estado de Minas Gerais – JoséCarlos Carvalho, experiente executivo do setor público, especialista na gestão ambiental do Estado e doPaís, e como secretário executivo, o especialista em temas ambientais e hídricos, o professor e pesquisador,Luiz Carlos Fontes, idealista comprometido com os princípios e conceitos ambientais, representando aUniversidade, que trouxe, no seu entusiasmo, a fibra do povo sergipano.

Após o primeiro biênio da diretoria do CBHSF (2003/2005), período bastante operoso e produtivo, fuihonrado pela generosa escolha dos meus pares e eleito, de forma unânime, presidente para o biênio seguinte(2005/2007). Assim, eleito presidente, contei com a presença do ex-presidente José Carlos Carvalho, navice-presidência, demonstrando, ao aceitar, mais uma virtude da sua personalidade – a humildade - e aindacontei para assumir a secretaria executiva, com o alagoano altivo e determinado, que deu brilho pelos seusescritos e seus pronunciamentos, à segunda gestão do CBHSF, Anivaldo Miranda.

Destaco ainda, em ambos os períodos, a participação dos coordenadores das Câmaras ConsultivasRegionais (do Alto, Médio, Sub-Médio e Baixo São Francisco) que, ao se somarem à Diretoria Executiva,formavam o órgão consultivo do Comitê – a Diretoria Colegiada. Durante as reuniões plenárias semestrais,contando com a assembléia geral (60 membros titulares e 60 suplentes), eram definidas as ações que pautaramas atividades da Diretoria Executiva e Colegiada, Câmaras Consultivas Regionais e Câmaras Técnicas.

Participar de fóruns colegiados onde frequentemente surgem as contradições, num processo amploe denso, nos deixa a lição de que não há democracia e legitimidade nas ações do Estado sem participaçãoda sociedade, em especial na gestão dos recursos hídricos de uma bacia.

No processo de fortalecimento político e institucional do CBHSF, algumas entidades foramimprescindíveis para a exitosa implantação do CBHSF, assim como o apoio do Poder Público, especialmenteo Federal, destacando-se a Agência Nacional de Águas – ANA, desde a gestão de Jerson Kelman, porocasião da criação do Comitê e, especialmente, na atual gestão de José Machado - nessa fase de implantaçãoe consolidação do mesmo.

O NOVO VELHO CHICO

DESTAQUE PARA ALGUMAS AÇÕES NO PERÍODO6- Alteração da denominação da Câmara Técnica de Minorias, para Câmara Técnica de ComunidadesTradicionais e início do processo de discução e alteração do Regimento Interno do Comitê com apliação donúmero de vagas, justa reivindicação dos Povos Indígenas da Bacia.7- Participação em diversas discussões para a aprovação da proposta da PEC 524/02, que cria o fundo deRevitalização da Bacia do Rio São Francisco, em trâmite na Câmara dos Deputados e objetiva financiar, durante20 anos, projetos para a revitalização do rio, com a participação de União, Estados e Municípios;8- Participação em diversos fóruns e eventos sobre a transposição do São Francisco defendendo sempre asdeliberaões aprovadas em plenárias do CBHSF.

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Cabe ressaltar também, os Estados da bacia que vêm dando a sua colaboração, destacando-se aBahia, por ter assumido firmar um convênio com a ANA para possibilitar a estruturação e o funcionamento daSecretaria Executiva do CBHSF e que teve na figura de Manfredo Cardoso, Diretor Geral da Superintendênciade Recursos Hídricos - SRH, grande colaborador e entusiasta do CBHSF, e Minas Gerais, também pelassuas ações estruturantes para operacionalização do referido Comitê, por meio do seu Secretário, José CarlosCarvalho.

Face à necessidade em atender às exigências da legislação eleitoral, o companheiro Anivaldo Mirandae eu precisamos nos afastar da diretoria que passou a ser dirigida, de forma exemplar, pelo trio por demaisconhecido de todos e que vem, ao longo deste tempo, dando estabilidade e consolidando as ações doCBHSF, nomeadamente: Presidente – José Carlos Carvalho; Vice-Presidente – Luis Carlos Fontes; e SecretáriaExecutiva – Yvonilde Medeiros, professora da Universidade Federal da Bahia - UFBa, destemida defensorada bacia, respeitada técnica, reconhecida nacional e internacionalmente, que vem respondendo com segurançapela sua função.

A construção da democracia requer posiçõesque valorize os princípios da participação, ressaltandoos fundamentos éticos e morais de todos os atoresenvolvidos – as práticas devem indicar os princípiosdemocráticos, a superação das desigualdades eassimetrias nos campos institucionais, sociais,políticos e econômicos – como fundamentos deconstrução de uma nova “práxis”. Assim, concluofeliz por ter dado a minha singela contribuição, maisdoando o melhor de mim para a construção de umprocesso importante na gestão da bacia do SãoFrancisco, reiterando a importância que foi ter podidoparticipar do CBHSF, como membro e comopresidente, oportunidade essa que em muitoenriqueceu a minha vida pessoal e política.

(*) Deputado Federal, foi vice-presidente da 1ª Gestão e presidentena 2ª Gestão do [email protected]

O NOVO VELHO CHICO

TRANSPOSIÇÃOApesar da agenda positiva estabelecida pelo Comitê, a insatisfação e a repulsa do mesmo ficou

conhecida em nível nacional, em face ao desrespeito do Governo Federal ao estabelecido pelo Plano de RecursosHídricos da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, aprovado pelo plenário, quanto à deliberação referente aosUSOS EXTERNOS de suas águas, tendo sido aprovado apenas para: “Abastecimento humano edessedentação animal para áreas em situação de comprovada escassez hídrica”.

“É preciso reconhecer e entender que a participação nos processos, integração da gestão e sustentabilidade sãodiretrizes sérias e não conceitos, que buscam modernizar e oferecer caráter de legitimidade às decisões e ações.O que legitima de fato uma Lei é a prática dela, com respeito”

Jorge KhouryXVI Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos da ABRH

João Pessoa / PB, 24/11/05

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Quando as pessoas se engajaram na criaçãodo Comitê do São Francisco, já sabiam que iriam atuarno cenário de uma bacia hidrográfica importantíssimapara o Brasil. Afinal, além de abrigar o rio que foiuma das portas de entrada da nossa civilização pós-descobrimento, essa bacia está incrustada no coraçãodo nosso país, articulando economias, culturas,problemáticas e realidades essenciais à nossaidentidade nacional.

O que essas pessoas não sabiam, entretanto,era do extraordinário alcance que a construção desseComitê ganharia por artes e armadilhas do destino.Foi esse destino que colocou à prova, desde o primeiromomento, a determinação, a lucidez e a coragem dosatores dessa construção.

Teoricamente, os comitês de baciashidrográficas foram criados para funcionar como abase da pirâmide que representa o Sistema Nacionalde Gerenciamento de Recursos Hídricos. O seuprincipal simbolismo e função residiria na necessidadede se converterem em “parlamentos das águas” e narepresentação plural da sociedade dentro do contextode uma política de gestão das águas e do espaçocapaz de transformar as bacias hidrográficas emunidades privilegiadas do planejamento e dodesenvolvimento.

Como é da tradição de nossa elite governantecavar abismos profundos entre a excelência doconteúdo democrático das nossas leis e a práticaautoritária da relação material entre o Estado e oconjunto da sociedade civil, logo, logo o Comitê doSão Francisco foi desafiado naquilo que constitue aessência de sua existência, ou seja, a sua autonomia,as suas prerrogativas e as suas competências legais.

O detonador desse desafio foi o Projeto daTransposição, na medida em que contrapôs. deimediato, a vigorosa energia cívica dos fundadoresdo CBHSF, à frieza burocrática das duvidosas “razõesde Estado” e de mercado que animam a megaobra

do governo, por cuja viabilização os agentes do Estadoestão dispostos a triturar o espírito das leis e dademocracia participativa.

Foi no Baixo São Francisco, precisamente naII Plenária do CBHSF, na histórica cidade de Penedo,em 2003, que esse conflito de visões e de concepçõesdo desenvolvimento veio à tona com toda a força. Efoi ali que a maioria dos membros do Comitê,embebidos do “espírito franciscano” tão vivo naquelasparagens, resolveu resistir às pressões do governo eafirmar a essência democrática da Lei 9.433.

Talvez por ser o palco dos principais impactosambientais oriundos das intervenções humanas nabacia, a situação do Baixo São Francisco tenhainspirado ainda mais aos membros do Comitê, deMinas, passando pela Bahia e Pernambuco, atéSergipe e Alagoas, a resistirem desde o começoàquela visão tecnocrática que teima em considerar oCBHSF e os outros comitês, como meros órgãoshomologatórios, passivos, restritos apenas àaprovação do universo de atos administrativos como,por exemplo, a cobrança pelos direitos de uso daságuas.

Sacrificado durante décadas peloassoreamento do São Francisco, pela erosão de suasmargens, pela morte de suas várzeas, pela redução

Anivaldo de Miranda1*

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(*) Jornalista e representante do Forum de Defesa Ambiental deAlagoas no CBHSF, ex- Secretario Executivo do CBHSF.

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da navegabilidade, pela perda dramática dabiodiversidade local, pelos impactos profundos nazona costeira e pela decadência de suas cidadesribeirinhas, o Baixo São Francisco é o retrato vivo deuma realidade geopolítica que não pode ser abordadaapenas com visões convencionais tecnocráticas ecompartimentadas

Reduzir o papel do Comitê da BaciaHidrográfica do Rio São Francisco ao cadastramentodos usuários, à implantação da agência de bacia e dosistema de cobrança pelas águas não é exatamenteo que pensa a maioria dos seus membros. O CBHSFquer muito mais. Quer ser também o porta-voz daverdadeira gestão das águas e do espaço. Quer serinstrumento de organização da sociedade. Quer serincentivador do debate do desenvolvimento. Quer serlugar de intermediação dos conflitos da água com oolhar da sustentabilidade.

Revendo a trajetória da Câmara Consultivado Baixo São Francisco, quando incluímos em suapauta temas candentes como o debate sobre as novasbarragens que a CHESF quer implantar, sobreenergias alternativas, sobre vazão ecológica, sobreenchentes artificiais, sobre biodiversidade,recuperação da vegetação ciliar e vocaçõessustentáveis de crescimento econômico, como oecoturismo, o artesanato e a piscicultura, não estamosplenamente satisfeitos com os resultados obtidos,devido às limitações materiais impostas ao Comitê,mas nem por isso deixamos de ficar felizes por terconsciência plena de que cada um de nós fez umesforço significativo para a curta mas brava históriaque estamos escrevendo.

Essa história é uma aventura política deenvergadura porque, através de sua resistência eclareza, nosso Comitê está antenado com o futuro. Enão somente com o futuro da gestão das águas e doespaço na iminência dos tempos difíceis doaquecimento planetário. Está antenado também com

UMA AVENTURA DEMOCRÁTICA

o futuro da democracia brasileira, que só ficaráà altura dos seus grandes desafios se for capazde ganhar novos conteúdos, dentre estes ocaráter participativo do qual o CBHSF é umexemplo digno de nota.

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Escrever sobre a minha participação noprocesso da gestão dos recursos hídricos da bacia dorio São Francisco remete a década de 80 que foi muitosignificativa no Brasil e na Bahia, dando início àsdiscussões em torno das preocupações ambientais. Vinascer um grupo de artistas, cantadores, ambientalistasarticulados em torno da instituição Associação PraBarca Andar, entidade com sede em Montes Claro –MG, que programaram e fizeram uma viagem que teveseu ponto de partida em Xique-Xique-Ba, com afinalidade de cantar as maravilhas do “Velho Chico”,bem como discutir com os ribeirinhos os problemasambientais da bacia do rio São Francisco. Grupo esteque saúdo, em nome de Edson Duarte e de InácioLoiola, cantador barranqueiro de Santo Inácio.

Na década de 90, o Frei Dom Luiz Flávio Cappio, missionário da Diocese de Barra, juntamente comOrlando Rosa, Adriano Martins e a Irmã Conceição, tiveram a ousadia e a coragem para fazer a Peregrinaçãodo Rio São Francisco, desde a nascente até a foz, discutindo com os ribeirinhos os problemas ambientais dabacia e passando uma mensagem de como as instituições e a população em geral deveriam se posicionarpara cuidar do Velho Chico. Foram reuniões, palestras, celebrações, caminhadas e atos públicos, semprepassando mensagens positivas e gritos de alerta, tais como: “O São Francisco está morrendo” e “Não deixeo Velho Chico morrer”. Nesses encontros foram firmados com os participantes três compromissos: 1. Planteuma árvore; 2. Não jogue lixo no rio; 3. Denuncie os crimes contra o São Francisco.

Já em 1997, a FUNDIFRAN, sediada em Ibotirama-Ba, teve a iniciativa de lançar uma campanha emdefesa do Rio São Francisco, durante a I ª Semana do Rio São Francisco, com a promoção de atividades desensibilização da população sobre impactos que a bacia hidrográfica vinha sofrendo pela exploraçãodesordenada de seus recursos naturais. As atividades envolveram principalmente as escolas e comunidadesribeirinhas, por meio de palestras, reuniões, debates, caminhadas ecológicas, dentre outras.

Vimos chegar o final da década de 90 com quase duas décadas de trabalho para mobilizar e sensibilizara população e autoridades à respeito dos problemas ambientais que atingem o rio e hoje, o Velho Chicoclama por ações mais concretas, por um amplo Programa de Revitalização para as suas margens, as nascentese as veredas. Este Programa deve incluir a despoluição de suas águas, bem como o resgate cultural e a vidacom dignidade para o seu povo ribeirinho.

Caminhos do CBHSF

Para falar dos caminhos do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco – CBHSF começopor homenagear um dos idealizadores pioneiros deste projeto, por promover um modelo diferenciado degestão para a bacia do São Francisco, Dr. Theodomiro Araújo, o “Velho do Rio” ou o “Velho Theo”, como eracarinhosamente chamado e que costumava dizer que “o sangue que corre nas minha veias deságuam noSão Francisco”.

Edison Ribeiro*

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Eu, sendo filho natural de Xique-Xique / Ba,beiradeiro, filho de Enézio Ribeiro dos Santos e MariaRodrigues dos Santos, nativos das barrancas do SãoFrancisco, entre os municípios de Remanso antigo eXique-Xique, tive o prazer de ter aprendido os ofíciosdo meu pai, pescar peixe, plantar roça e criar animaisde pequeno porte. Estudei até a 4a serie na Ilha doMeio, carregando um banquinho na cabeça, pois nãotinha carteiras da escola normal, só vim conhecer umprédio escolar no curso ginasial e hoje, sou concluintedo curso de Administração de Empresa pelaUNOPAR, Universidade do Norte do Paraná. Em1985, ingressei como voluntário em movimentossociais por meio da Pastoral da Juventude, em 1995,fui contratado pela FUNDIFRAN, entidade a qualtenho orgulho de pertencer até hoje, como assessortécnico, nas áreas de associativismo, cooperativismo,gênero, educação ambiental e gestão dos recursoshídricos.

E assim, como filho da terra e como bombeiradeiro, tive várias oportunidades de participar dedebates com o Velho Théo, no esforço de juntar osinteresses econômicos e a sustentabilidade ambientalda bacia hidrográfica do rio São Francisco. Todas asquestões em torno do rio geravam muita polêmicaentre os movimentos sócio-ambientais, técnicos daárea e autoridades do setor, sem falar nos debatessobre a transposição das águas do São Francisco,que aumentaram ainda mais as polêmicas. Assim, nomeio de todas essas questões, trilhou-se os primeiroscaminhos do Comitê da Bacia Hidrográfica do RioSão Francisco - CBHSF.

Em meu nome e em nome da FUNDIFRANsaudamos os familiares do Velho Théo e desejamosum repouso em paz no leito do Velho Chico, por maisagonizante que seja a vida do São Francisco.

Processo de Mobilização do Comitê

O processo inicial de mobilização paraformação do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São

Francisco alcançou seu objetivo com sucesso devido,em grande parte, ao empenho pessoal de Dr.Theodomiro e da capacidade técnica da equipecoordenadora, pois falar de comitê de bacia, de gestãointegrada e descentralizada, do novo modelo degestão participativa era tudo muito novo e estranhopara o povo da bacia. Por outro lado, não se tinhaconfiança na verdade da proposta apresentada,parecia tudo “enrolação” e mais discurso para fazeracontecer a transposição das águas do Velho Chico.Não só a população, como também as entidadessociais apresentavam desconfiança com relação aoprocesso, o próprio Fórum Permanente de Defesa doSão Francisco só se envolveu depois de muito debatecom a equipe do IMAN - Instituto Manuel Novaes,responsável pela coordenação da mobilização.

Um outro fator que contribuiu para o processode mobilização foi à peregrinação dos envolvidos juntoaos prefeitos da bacia, mas uma vez houve empenhodireto do Dr Theodomiro. Essa ação facilitou a logísticalocal dos encontros municipais e principalmente osregionais, foram momentos de muito debate na bacia,nesta ocasião, tornou-se conhecida da população aLei nº 9.433/97 e sua importância na gestão dosrecursos hídricos. Desta forma, vimos o inicio dasensibilização da sociedade que começou ainternalizar os princípios e os objetivos desse modelode gestão por bacia hidrográfica.

Eleição dos Membros

Na Bahia, a sociedade civil atuou fortementeatravés do Fórum Permanente de Defesa do SãoFrancisco, que decidiu participar do processo eleitoraldo Comitê orientando as instituições interessadas eajudando a definir os critérios para participação nasplenárias e na eleição dos membros por segmentos.Para a FUNDIFRAN, uma entidade com forte atuaçãona bacia do São Francisco, com uma historia de lutaem defesa das populações ribeirinhas, conservaçãodos recursos naturais e da convivência com o Semi-

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árido, este processo foi muito importante, pois foiamplamente apoiado por mais de 60 entidades naplenária setorial, realizada em Juazeiro da Bahia, em16 de setembro de 2002.

Toda esta experiência leva a crer que umprocesso de eleição como este, para uma bacia quetem a dimensão como a do rio São Francisco, tornaimprescindível uma ampla mobilização cominstituições, fóruns regionais, estaduais e até nacionalpara assegurar maior legitimidade na eleição dos seusrepresentantes.

Conquistas e Desafios do CBHSF

O reconhecimento do CBHSF como órgão degestão das águas do São Francisco, com visibilidadena mídia nacional, ocorreu durante o processo deelaboração e aprovação do Plano de RecursosHídricos da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco,que possibilitou a realização de um amplo debatesobre a Lei de Recursos Hídricos, a 9.433/97. OComitê cumpriu o seu papel fundamental depossibilitar o debate sobre as questões que diziamrespeito ao gerenciamento de suas águas, masdurante este processo ficou evidenciado a farsa datransposição.

Porém, a partir do pedido de vista do GovernoFederal, pelo representante do MMA, para adeliberação que tratava dos usos externos da águada bacia, o Governo desperdiçou a oportunidade defazer um amplo debate no São Francisco sobre oProjeto de Transposição e sobre a Revitalização,durante a Reunião Plenária, realizada em Juazeiro /BA, para aprovação do referido Plano. Aquele era ummomento único e importante, pois haviam sidomobilizadas mais de 5 mil pessoas em toda bacia,que queriam e mereciam esta discussão.

Na democracia se aprende que é nadivergência que se constrói a convergência. Na gestãodemocrática, descentralizada e participativa é nadiversidade que se constrói a unidade. É com este

espírito de uma bacia integrada que devemos unirtodos os nossos esforços para a recuperaçãohidroambiental deste patrimônio da humanidade.

“O rio que gera vida não pode morrer!”

“Vamos Salvar o Velho Chico!”

Imagens da Degradação do Rio São Francisco

(*) Coordenador da CCRMSF ePresidente do CBH-Verde Jacaré

[email protected]

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O conflito entre a proteção do habitat dosorganismos aquáticos e a crescente demanda para acaptação de água nos rios, para diferentes usos, é umproblema para a gestão dos recursos hídricos. Hoje acompetição entre as captações de água e osrequerimentos da fauna aquática é uma realidade. Osmétodos para a determinação da vazão ecológica sãousados para minimizar o impacto dessas captações deágua nos recursos aquáticos.

A complexidade dos estudos de vazão ecológicaé dependente dos objetivos e dos recursos necessitandoproteção, bem como a magnitude do projeto. A existênciade inúmeros métodos para o conhecimento dessa vazãocomplica este processo. Os métodos têm sidoclassificados em várias categorias, refletindo a variação da complexidade na sua aplicação. Em adição, háde se considerar a disparidade entre os resultados apresentados por diferentes metodologias atualmenteutilizadas, dificultando o estabelecimento da vazão ecológica.

O rio São Francisco tem recursos hídricos que sustentam ecossistemas aquáticos produtivos e muitosusos pelos humanos (p.ex. pesca, geração de energia elétrica, irrigação, abastecimento de água potável,usos industriais, recreação, navegação, etc). O conhecimento da sua vazão ecológica para a gestão dosseus recursos hídricos é um dos objetivos do CBHSF, juntamente com a ANA – Agência Nacional das Águase a UNESCO.

A Deliberação do CBHSF N.º 13, de 30 de julho de 2004, apresenta premissas básicas erecomendações para a implementação da fiscalização integrada propostas pelo Plano de Recursos Hídricosda Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, e no Art. 6 estabelece a promoção de estudos e implementaçãode uma rede básica para desenvolvimento de metodologia para determinação de critérios e valores devazão ecológica para os rios da bacia do rio São Francisco, para regime de vazões ecológicas para ostrechos regularizados por barragens e para a foz do Rio São Francisco.

A CTPPP – Câmara Técnica de Planos, Programas e Projetos do CBHSF detalhou o perfil doprofissional desejado para a execução do estudo sobre vazão ecológica e qual seria a melhor forma deexecução do trabalho. Em 12 de julho de 2006, foram consideradas a discussão detalhada e construção daversão final dos Termos de Referência sobre vazão ecológica. Aos quinze dias do mês de agosto do ano doismil e seis foi realizada a leitura dos Termos de Referência para contratação de pessoa física para a elaboraçãode estado da arte e para a contratação de empresa para apoiar a realização de oficina sobre vazão ecológica.Em 19 de outubro de 2006, tratou-se do andamento do TDR da vazão ecológica. Além disso, foram abordadosos temas para a Oficina.

Em novembro de 2006, foi realizada na cidade de Maceió pelo CBHSF a “Oficina de Vazão Ecológica:bacia hidrográfica do rio São Francisco”, abrangendo: Vazão Ecológica: 1- Base Conceitual, 2- Metodologias,definição de parâmetros e critérios, 3- Exemplos práticos (“cases”), 4- Estado de arte do tema “VazõesEcológicas” - versão preliminar; 5- Tentativa de definição da aplicabilidade prática das técnicas à bacia do rioSão Francisco.

Em função disso, foi elaborado o estudo, intitulado “Estado da arte acerca da vazão ecológica, noBrasil e no Mundo”, em atendimento contratual ao Edital N.º 05 do ano de 2006, PROJETO 704BRA2041 daOrganização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO, com a gestão conjunta

Robson Sarmento*

VAZÃO ECOLÓGICA NORIO SÃO FRANCISCO

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Características dos Principais Métodos para Determinação da Vazão Ecológica

TRANSPOSIÇÃO

da ANA e do CBHSF. Além disso, foi desenvolvido TDR - Termo de Referência para a contratação futura deserviços visando o conhecimento da vazão ecológica do baixo rio São Francisco.

Para o desenvolvimento do estudo e do TDR foi observado o que preconiza o Plano de Trabalhoapresentado à UNESCO, em conformidade com o Edital já citado. Em adição, foram utilizadas informaçõesda Oficina de Vazão Ecológica: bacia hidrográfica do rio São Francisco ocorrida em 24-25 de Novembro de2006, na cidade de Maceió realizada pelo CBHSF - Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco.

O relatório final do estudo é constituído de: I – essa apresentação, II – vazão ecológica-terminologia,III – marco legal no Brasil, IV – estado da arte da vazão ecológica no mundo e no Brasil, V- cenário atual nouso das metodologias, VI - a vazão ecológica no contexto do rio São Francisco, VII – referências.

O gerenciamento do trabalho foi feito pela Dra. Flávia Gomes de Barros responsável pela Gerênciade Gestão de Recursos Hídricos da ANA – Agência Nacional de Águas, a Dra. Yvonilde Medeiros SecretáriaExecutiva do CBHSF, e José Carlos Queiroz e Wilde Cardoso Gontijo Júnior, da ANA, que tambémcontribuíram na revisão do relatório final.

*** - The World Bank, 2003.

VAZÃO ECOLÓGICA NORIO SÃO FRANCISCO C

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a) vazão ecológica (s):- é a água fluindo num rio (IFC 2004);- é a demanda necessária de água a manter num rio deforma a assegurar a manutenção e conservação dosecossistemas aquáticos naturais, aspectos da paisagemde outros de interesse científico ou cultural ( J.M. Bernardo,1996, em J. Gondim, 2006);

b) também chamadas de ambientais, residuais, ouremanescentes– quantidade de água que permanece no leito dos riosdepois de retiradas para atender usos externos comoabastecimento público, industrial, irrigação, dessedentaçãode animais, energia elétrica, etc. (Bennetti, A.D., 2003, emJ. Gondim, 2006);

c) vazão mínima residual- é um valor de referência que deve ser mantido no trechode um rio a jusante de um barramento ou de uma retiradade água (Collischonn & Gusmão Angra, 2004, em J.Gondim, 2006);

d) vazão mínima ecológica- vazão que se deve garantir a jusante de uma estrutura dearmazenagem (barragem) ou captação (tomada de água),para que se mantenham as condições ecológicas naturaisde um rio, em J. Gondim, 2006;

e) vazão de preservação ambiental- é a vazão necessária para manter as funções dosecossistemas que compõem o rio, nos seus leitos menorese maiores. Em outras palavras, é um valor (ou valores)que preserva as condições de pulso hidrológico, transportede sedimentos e nutrientes, sincronicidade com o ciclo davida das espécies silvestres, da fauna, da flora e a taxa deperturbações necessárias à renovação e funcionamentodos ecossistemas associados ao curso de água (JussaraCruz, em J. Gondim, 2006);

f) vazões ambientais:- regime de vazões a ser mantido no rio, nas áreas úmidase nas áreas costeiras de modo a preservar os ecossistemase seus benefícios onde existir competição pelos usos daágua e onde as vazões são reguladas (Nota Técnica C1-“Concepts and Methods” do Banco Mundial, em J. Gondim,2006);

Existem várias terminologias para o conceito de vazão ecológica, como por exemplo:- a quantidade de água que deve ser mantida no rio, ouque é lançada dentro dele, para atender o objetivo o objetivoespecífico da gestão de tal ecossistema (Nota Técnica C1-“Concepts and Methods” do Banco Mundial, em J. Gondim,2006);

g) vazão de referência- “vazão do corpo hídrico utilizada como base para oprocesso de gestão, tendo em vista o uso múltiplo daságuas e a necessária articulação das instâncias do SistemaNacional de Meio Ambiente – SISNAMA e do SistemaNacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos –SINGREH” (Resolução CONAMA n. 357/2005).

h) “Instream Flow Requirements – IFRs”- vazões requeridas para a manutenção de peixes (NotaTécnica C1- “Concepts and Methods” do Banco Mundial,em J. Gondim, 2006); parte do tempo (Nota Técnica C1-“Concepts and Methods” do Banco Mundial, em J. Gondim,2006);

i) “Maintenance IFR”- regime hidrológico requerido para manter todas as funçõesdos ecossistemas fluviais, e garantir a reprodução deplantas e animais na maior parte do tempo (Nota TécnicaC1- “Concepts and Methods” do Banco Mundial, em J.Gondim, 2006);

j) “Drought IFR”- um regime hidrológico drasticamente reduzido aplicávelem anos de secas, de modo a garantir a sobrevivência deespécies, mas sem provisões para sua reprodução (NotaTécnica C1- “Concepts and Methods” do Banco Mundial,em J. Gondim, 2006);

k) “Minimum Flow”- termo genérico utilizado para descrever as vazõesrequeridas à manutenção de determinada característica deum ecossistema. Esse conceito surgiu nos EUA como umavazão remanescente para limitar as captações durante osperíodos de seca, podendo ou não ter relevância para asregiões áridas (Nota Técnica C1- “Concepts and Methods”do Banco Mundial, em J. Gondim, 2006);

VAZÃO ECOLÓGICA NORIO SÃO FRANCISCOC

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No estudo realizado, todos os termosdescritos e contidos na literatura existente consultada,são tratados de forma equivalente ao termo vazãoecológica, pois todos eles têm como objetivo centralproteger a natureza, de forma direta ou indireta.

A Deliberação CBHSF N.º 08, de 30 de julhode 2004, define a disponibilidade hídrica, vazãomáxima de consumo potável, as vazõesremanescente média e mínima ecológica na foz comoparte integrante do Plano de Recursos Hídricos daBacia Hidrográfica do Rio São Francisco, e especificaque:

Art 4º Adotar, provisoriamente, a vazão médiadiária de 1.300 m³/s, como vazão mínima ecológicana foz, até que se proceda à revisão ou confirmaçãodeste valor na próxima edição do Plano.

§ 1º A vazão mínima ecológica deve garantira manutenção dos ecossistemas e a preservação dabiodiversidade aquática e não pode ser praticada deforma contínua.

Art 5º As vazões remanescentes nos rios dabacia, após a alocação de água para usos consuntivos,devem ser superiores às vazões mínimas necessáriaspara manutenção da biota aquática em cada trechodos rios.

§ 1º Adotar, provisoriamente, a vazão médiaanual de 1.500 m³/s, como a vazão remanescente nafoz do rio São Francisco.

§ 2º Indica-se como prioridade odesenvolvimento imediato de estudos para a buscado conhecimento não só sobre a vazão mínimaecológica, mas também sobre a possibilidade doestabelecimento de um regime de vazões ecológicasque possibilite variações sazonais de vazões, ambosnecessários para a manutenção da biodiversidade edo equilíbrio da dinâmica ambiental ao longo de todaa calha do rio São Francisco e dos principais afluentesque receberem reservatórios hidrelétricos, e aindana sua foz e na zona costeira adjacente.

Estes estudos deverão ainda contemplarestratégias de manutenção do fluxo de nutrientes, demontante para jusante, afetado pelos grandesbarramentos hidrelétricos.

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Grupo de trabalho durante a oficina

(*) Eng. Espec. M.Sc. PhD, Consultor da [email protected]

VAZÃO ECOLÓGICA NORIO SÃO FRANCISCO C

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A aplicação dos instrumentos da Política deRecursos Hídricos deverá contribuir para a mudançado comportamento da sociedade, promovendo umaumento da conscientização de que a água é um bemprecioso, limitado e dotado de valor econômico. Autilização dos instrumentos promoverá a proteção domeio ambiente e do capital natural, colaborará paramitigar os conflitos pelo uso da água, criandocondições para que o desenvolvimento sustentável,no âmbito da bacia hidrográfica, seja assegurado.

Para que os objetivos da Política Nacional deRecursos Hídricos sejam alcançados é necessário, noque se refere aos usos dos instrumentos, que sejamutilizados em conjunto, pois existe uma forte ligaçãoentre eles, conforme ilustra a Figura 1.

No esquema acima, o Sistema Nacional deInformações de Recursos Hídricos – SNIRH forneceráas informações fundamentais para o desenvolvimentodos Planos de Recursos Hídricos que por sua vez, àmedida que são implementados, alimentarão oSistema de Informações.

Os Planos de Recursos Hídricos, comoestabelece a própria Lei 9.433/97, são planos diretoresque visam a fundamentar e orientar a implementaçãoda Política Nacional de Recursos Hídricos e ogerenciamento dos recursos hídricos. São planos delongo prazo, com horizonte de planejamentocompatível com o período de implantação de seusprogramas e projetos. Ou seja, o plano, como um

documento estratégico, traduzirá sob a forma demetas, quantitativas e qualitativas, os objetivos que asociedade pretende alcançar. Com base nessesobjetivos definirá como o enquadramento, a outorgae a cobrança serão aplicados.

A COBRANÇA PELO USO DA ÁGUA NA BACIADO SÃO FRANCISCO

A bacia hidrográfica do rio São Francisco jádispõe de um Plano de Recursos Hídricos e duranteseu processo de construção foi ressaltada anecessidade e a oportunidade do Comitê da BaciaHidrográfica do Rio São Francisco - CBHSF iniciarimediatamente o processo de cobrança pelo uso daágua, observando sempre que os instrumentos degestão de recursos hídricos apresentam forteinterdependência. Nesse sentido, o CBHSF aprovoualgumas deliberações tratando do tema cobrança,notadamente a Deliberação no 16, de 30 de julho de2004, que dispõe sobre as diretrizes e critérios para acobrança pelo uso dos recursos hídricos na bacia dorio São Francisco e a Deliberação no 31, de 14 dejulho de 2006, que dispõe sobre mecanismos para aimplantação da cobrança pelo uso de recursos hídricosna bacia hidrográfica do rio São Francisco.

Essas deliberações, além de estabeleceremalguns condicionantes para a aplicação da cobrança,solicitam à Agência Nacional de Águas - ANA arealização de um estudo prognóstico sobre aviabilidade econômico-financeira para a criação daAgência da Bacia e/ou entidade delegatária da baciahidrográfica do São Francisco (Art. 2º da Deliberaçãono 31, de 14 de julho de 2006).

A Deliberação no 31/2006 estabelece aindaque o estudo deverá conter elementos que subsidiema decisão do CBHSF e dos comitês de bacias de riosafluentes na proposição de valores a serem cobradospelos usos dos recursos hídricos, bem como referentesa critérios e mecanismos de cobrança pelo uso derecursos hídricos. A referida deliberação determinouque os estudos mencionados anteriormente devemser acompanhados e avaliados pela Câmara Técnicade Outorga e Cobrança – CTOC / CBHSF.

Figura 1 – Instrumentos da Política de Recursos Hídricos

Jaildo Santos Pereira*

PROCESSO DE DEFINIÇÃO DA COBRANÇA PELO USO DOSRECURSOS HÍDRICOS NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃOFRANCISCO

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Para atender parte dessas demandas a AgênciaNacional de Águas contratou, através da SDP no 1.399/2006, a realização de estudos na área de cobrançapelo uso da água com o objetivo de estabelecercritérios e condições que possibilitem a aplicaçãodesse instrumento na bacia hidrográfica do rio SãoFrancisco. Esse estudo prevê a realização dasseguintes atividades:

Avaliação dos aspectos institucionais elegais da cobrança nos Estados que compõem abacia do rio São Francisco - nessa primeira etapaserá realizado um levantamento dos aspectosinstitucionais e das normas legais relacionados àcobrança pelo uso de recursos hídricos nas Unidadesda Federação que compõem a bacia do rio SãoFrancisco, bem como na própria União, com o objetivode avaliar a existência de condições paraimplementação da cobrança nessas Unidades;

Definição dos usuários característicospara fins de simulação de cobrança - com basenas informações do Cadastro Nacional de Usuáriosde Recursos Hídricos – CNURH, do Plano Decenalde Recursos Hídricos da Bacia do Rio São Francisco- PBHSF, dos Planos de Recursos Hídricos dasUnidades da Federação que compõem a área emestudo, do Sistema Nacional de Informações sobreSaneamento – SNIS, censos do IBGE, bem como deoutros documentos pertinentes, será realizada umaampla análise dos usos da água na bacia, com oobjetivo de definir os usuários característicos ourepresentativos da bacia por setor e segundo o portedo empreendimento.

Avaliação da capacidade de pagamentopor setores usuários - nesse trabalho a avaliaçãoda capacidade de pagamento pelo uso da água serádefinida com base nos custos de produção, nasreceitas obtidas e no lucro de cada um dos usuárioscaracterísticos selecionados na etapa anterior. No casodo setor de saneamento será considerada também atarifa média de água e de esgoto praticada pelacompanhia selecionada.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:BRASIL. Lei Federal nº 9.433, de 08 de janeiro de 1997.

Instituia Política Nacional de Recursos Hídricos e cria oSistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.

Disponível em: <http://www.cnrh-srh.gov.br/>.Acesso em: 26 de maio. 2006.

(*) Consultor / Gama Engenharia de Recursos Hídricos [email protected].

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Simulação de valores a serem cobrados -as simulações serão realizadas tomando-se por baseas informações dos usuários característicos definidosna etapa anterior e os mecanismos e valores decobrança atualmente util izados nas baciashidrográficas dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí– PCJ e na bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul –CEIVAP.

O estudo está sendo realizado pela GamaEngenharia de Recursos Hídricos Ltda com oacompanhamento da CTCOC / CBHSF e deverá serconcluído no próximo mês (agosto de 2007).

XIII e XIV Plenárias - Salvador - BA

PROCESSO DE DEFINIÇÃO DA COBRANÇA PELO USO DOSRECURSOS HÍDRICOS NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO

FRANCISCO CB

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A implementação do sistema degerenciamento dos recursos hídricos do Brasil,proposto pela Política Nacional instituída pela Lei nº9.433, de 1997, consiste na criação e consolidaçãode um tripé de organismos, atuandodescentralizadamente por bacia hidrográfica. Cadaum destes organismos deve exercer suas funçõessem que haja superposição de atuação, com garantiade autonomia na parte que lhes cabem na gestão,porém, de forma integrada para que seja dadaefetividade à política de usos dos recursos hídricosem cada bacia.

Esse tripé deverá compor-se: do comitê dabacia, da agência de águas e do órgão regulador doEstado. Em bacias onde há mais de um domínio paraos cursos d’água, conforme definido pela ConstituiçãoFederal, a regulação deverá ser exercida pordiferentes organismos: um no âmbito da União – hojeatribuição da Agência Nacional de Águas - ANA – eum para cada um dos estados federados que têmcursos d’água nessa bacia hidrográfica.

Para o comitê e para a agência de águas, noentanto, a legislação define que tratam-se deorganismos com competência para exercer asfunções complementares na sua área de atuação.

Em bacias com rios de domínio da União, osistema brasileiro possibilita que haja comitês de baciae de tributários do curso principal dessa bacia, criando-se o que hoje se observa na bacia do rio São

Francisco: um comitê com abrangência para toda abacia e diversos comitês de bacias de rios afluentes.A legislação permite, ainda, que podem ser criadasagências de água que atendam às demandas de umou de mais de um destes comitês. Apesar da previsãolegal de que esses organismos atuem de formaintegrada e articulada, isso não é muito fácil de serealizar em processos políticos complexos. Disputaspolíticas podem dificultar que se implemente a gestãogarantindo os caros fundamentos das leis das águasno que se refere à descentralização do processodecisório e à participação das comunidades e usuáriosna definição dos usos das águas em cada baciahidrográfica.

Essas afirmações iniciais buscam apresentaro contexto institucional no qual se insere a discussãode uma agência de águas para a bacia do rio SãoFrancisco, que atenda ao Comitê da Bacia e que possavir a ser prestadora de serviços aos demais comitês.Essa é a tarefa que o Comitê da Bacia Hidrográficado Rio São Francisco – CBHSF tem enfrentado nosúltimos meses.

O CBHSF deliberou em 14 de julho de 2006,por intermédio da Deliberação nº 30, que deveriamser elaborados estudos para a implantação da agênciade águas para a bacia do São Francisco. Demandouà ANA a sua contratação visando avaliar a viabilidadede uma agência de águas para toda a bacia, as formasjurídicas dispostas pela legislação nacional e ascondições que deveriam ser oferecidas para que estaagência se estabelecesse.

Paralelamente, solicitou que a ANAcontratasse estudos sobre a implantação da cobrançapelo uso dos recursos hídricos na bacia, avaliandocritérios, mecanismos e valores, assim como oimpacto da implantação desse instrumento nosinsumos produtivos dos usuários das águas. Segundoa legislação, a agência de águas deverá ter suasustentabilidade financeira garantida pelos recursosarrecadados pela cobrança pelo uso, podendo utilizar,no máximo, 7,5% desses valores no custeioadministrativo e na instalação da entidade.

Os estudos para a cobrança estão sendorealizados diretamente pela ANA, com o apoio de umaempresa contratada para tal. Os seus resultados vêm

Wilde Cardoso Gontijo Júnior *

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A AGÊNCIA DE ÁGUAS DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃOFRANCISCO : É PRECISO?C

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Esse produto, no entanto, mostra que,apesar de dez anos passados da existência dalegislação nacional, não há hoje no paísnenhuma agência de águas instalada conformeprevê a lei. A figura existente em duas baciascom rios de domínio da União (Paraíba do Sule Piracicaba, Capivari e Jundiaí), que exercefunções de agência, foi criada graças à Lei n°10.881, de 2004. Por essa lei, possibilitou-seque organizações civis pudessem receber, doConselho Nacional de Recursos Hídricos, adelegação para esse exercício, chamadas apartir daí de entidades delegatárias. Essa lei,no entanto, só encontra paralela no Estado deMinas Gerais onde são chamadas de entidadesequiparadas.

A Lei n° 10.881 estabeleceu ainda quea arrecadação dos valores da cobrança nãopode ser feita pela entidade delegatária e simpelo órgão regulador competente; e que essesrecursos devem ser transferidosobrigatoriamente para a entidade que exerceas funções de agência. Foi garantido, assim, oretorno dos valores arrecadados para a baciae a sua aplicação direta pela “agência deáguas”, de acordo com o plano de aplicaçãodefinido pelo comitê da bacia.

Uma outra novidade dessa Lei foi oestabelecimento, obrigatório, de um contratode gestão a ser celebrado entre a ANA e aentidade delegatária, após manifestação docomitê da bacia e aprovação do Ministério doMeio Ambiente. Por meio desse contrato sãoestabelecidas metas para a gestão da “agência”,estas são avaliadas por indicadores dedesempenho e, de acordo com os resultadosalcançados, prorrogado ou não o contratocelebrado. Esse processo apresenta trêscaracterísticas importantes na definição deatribuições e pactos no âmbito do sistema degerenciamento da bacia:• 1º a cobrança de resultados a seremalcançados pela entidade; • 2º a eficiência,eficácia e efetividade das suas ações;

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A AGÊNCIA DE ÁGUAS DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃOFRANCISCO : É PRECISO?

sendo discutidos no âmbito do CBHSF, comacompanhamento e avaliação das suas câmarastécnicas. Um grande debate deverá fazer interagir osvalores que devem ser propostos para que se dê asustentabilidade financeira da agência, e oatendimento aos demais objetivos da cobrança:indução ao uso racional e a destinação de recursosnecessários para a gestão e recuperação dos recursoshídricos da bacia. Assim, com a realização dosestudos sobre a agência e a cobrança, poderá oComitê deliberar sobre a continuidade da implantaçãodo sistema de gestão na bacia.

Os estudos sobre a agência foram contratadosjunto à Dra. Maria Luiza Granziera, especialista notema, e foram divididos em quatro etapas:• 1ª elaboração de um Plano de Trabalho quecontemplasse avaliar as expectativas dos membrosdo Comitê, de intervenientes na gestão nas diferentesregiões da bacia, bem como analisar as experiênciasem curso no país;• 2ª estudo das disposições legais no âmbito da Uniãoe dos Estados com território na bacia, para aimplantação de agências de águas;• 3ª avaliação das distintas personalidades jurídicasprevistas no direito civil brasileiro e sua aplicação àfigura da agência de águas;• 4ª avaliação das alternativas institucionais quepoderão melhor atender às necessidades da criaçãoe instalação da Agência de Águas da Bacia do RioSão Francisco.

O CBHSF aprovou o Plano de Trabalhoapresentado, o que permitiu a elaboração de diversosprodutos a subsidiarem o processo de avaliação edeliberação pelo Plenário do Comitê. Tais produtosencontram-se, na íntegra, na página eletrônica doComitê e serão apresentados, sucintamente, a seguir.

O produto gerado na 2ª etapa dos estudosmostra uma grande convergência entre as legislaçõesnacional e estaduais: vê-se que o disposto nas leisestaduais é basicamente o mesmo que se definiu naLei federal n° 9.433 para o sistema de gerenciamento.A agência de águas é definida como organismotécnico auxiliar para as deliberações do comitê e,estas diretrizes para a regulação dos usos pelosorganismos de estado.

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A AGÊNCIA DE ÁGUAS DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃOFRANCISCO : É PRECISO?

• 3º a implantação de um relacionamento contratualcom o comitê da bacia.

Essa terceira característica, acontratualização de resultados de gestão, estabeleceum processo objetivo e eficiente na relação entre osorganismos do “tripé” de gerenciamento na bacia.Objetivo porque busca evitar tratamentos políticos oupartidários à atuação da entidade delegatária,tratamento esse que poderia estabelecer conflitospermanentes com o comitê (disputa de espaçopolítico) ou permitir julgamentos subjetivos e não-contratualizados; eficiente porque estabelece umpacto de gestão que permite à “agência” desenvolverseu programa de trabalho buscando atender às metasali estabelecidas, planejando suas ações a médio elongo prazos. Se essas metas refletirem aquelas

presentes no Plano de Recursos Hídricos da bacia,estará sendo instituído um sistema subsidiário,eminentemente técnico, para o processo decisório docomitê.

Do produto apresentado nessa etapa, pode-se concluir que uma entidade delegatária poderia serimplantada na bacia do rio São Francisco com basena legislação da União. Para que pudesse exercerfunções para as unidades estaduais de gerenciamentoe, conseqüentemente, receber recursos para suaatuação, à exceção do Estado de Minas Gerais, hánecessidade de que uma legislação complementar

seja implantada. Uma “10.881” estadualcomplementando a lacuna apresentada nas “9.433”sestaduais.

A 3ª etapa dos estudos elaborados pela Dra.Maria Luiza avalia que há, na legislação vigente, doiscaminhos a seguir: 1º implantação de uma agênciade águas; ou 2º a implantação de uma entidadedelegatária de suas funções.

Para cada uma das opções foram estudadastodas as personalidades jurídicas e seucomportamento quanto aos seguintes critérios deavaliação:

a) vinculação administrativa;b) procedimentos legais para sua criação e

funcionamento;c) vinculação patrimonial;d) estrutura orgânica; e) indicação de

dirigentes e contratação de servidores;f) procedimentos licitatórios; e) dispositivos

de controle interno e externo.Reunindo as informações das 2ª e 3ª etapas

dos estudos, na sua 4ª etapa, a análise dos diferentescritérios levou, então, à proposição de dois modelos,considerados mais adequados ao atendimento dosfundamentos das leis de recursos hídricos: o consórciopúblico de direito público como opção para a agênciade águas e a associação civil para a entidadedelegatária.

O consórcio público de direito público é umanovidade na legislação brasileira, instituída por meioda Lei nº 11.107, de 2005. Trata-se de um ente criadoexclusivamente por entes federados (municípios,estados e União), vinculado a todos os entesconsorciados, e que é formado visando,principalmente, a gestão associada de serviços, oplanejamento, a regulação e a execução de tarefasque devem envolver mais de um ente federado. Nesseaspecto é bastante adequado à gestão de recursoshídricos em uma bacia quando constituído pela Uniãoe pelos estados com território na bacia. Sua vinculaçãoadministrativa é exclusiva a organismos de estado, oque pode possibilitar pressões políticas que venhamatrapalhar a execução de suas funções. A sua atuaçãodeve ser pautada pelo que estabelece o chamadocontrato de consórcio, peça reconhecida por todos os

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A AGÊNCIA DE ÁGUAS DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃOFRANCISCO : É PRECISO?

entes por meio de lei específica e que define suasestrutura e funções.

Operacionalmente pode ter resultadoscontratualizados por meio do contrato de gestãocontando, para isso, com flexibilizações na lei federaldas licitações. O patrimônio, pessoal e sistemas decontrole são públicos, regidos pela legislaçãopertinente.

A associação civil, por sua vez, é a formamais simples de organização de uma pessoa jurídica.Tem vinculação exclusiva a seus associados, devendoter, obrigatoriamente, uma assembléia geral e umadiretoria. Pode receber a “filiação” de usuários,organizações civis e mesmo de entes da federação,estes por meio de leis autorizativas específicas. Aoreceber recursos públicos, todas as ações que realizarcom estes recursos deverão seguir os normativospúblicos para contratação de pessoal, bens e serviços,estando, conseqüentemente, sujeita ao controlepúblico.

Segundo a legislação nacional, podemreceber a delegação as organizações civis de recursoshídricos previstas no art. 47 da Lei n° 9.433, de 1997,resumidamente: consórcios intermunicipais,associações de usuários, associações técnicas ecientíficas não-públicas e organizações não-governamentais. As experiências em curso no país,da AGEVAP, na bacia do Rio Paraíba do Sul, e doConsórcio PCJ, nas bacias PCJ, seguem esse modelo.

Os resultados dos estudos estabelecem umaagenda de discussões que deverão ser realizadas peloCBHSF para a implantação da sua entidade executiva.Primeiramente, a legislação nacional impõe que oCBHSF deverá indicar como agência de águas umaúnica entidade para toda a bacia por ser esta a áreade atuação do Comitê.

Esta entidade, no entanto, poderá ser criadapara que tenha a abrangência necessária de formaque possa atender a outros comitês,preferencialmente em bacias contíguas ou de riosafluentes ao rio São Francisco, que queiram aderir àsua proposta de trabalho.

Em segundo lugar, independentemente daentidade escolhida, deve-se definir claramentefunções e ações para a agência, evitando que

discussões políticas do Comitê sejam migradas parao âmbito da entidade prejudicando sua atuaçãoexecutiva. Para que isso aconteça, parece serfundamental o fortalecimento político do Comitê e acontratualização de resultados com a entidade feitapor critérios objetivos e visando resultados efetivospara os usos das águas na bacia.

Por terceiro, há a necessidade de se construiras metas e condições de funcionamento da entidadegarantindo sua governabilidade sobre os resultadose uma estrutura funcional adequada à demanda deentidade técnica capaz de atender à complexidadeda gestão na bacia do rio São Francisco. Oestabelecimento dessas condições deverá buscar aeminência técnica e a eficiência operacional: osrecursos arrecadados pela cobrança devem garantira sua independência financeira.

Assim, à luz dos fundamentos e conceitos dalegislação de recursos hídricos, espera-se que aagência de águas ou uma entidade delegataria de suasfunções esteja vinculada por intermédio de umcontrato (de gestão) com as metas estabelecidas pelorespectivo comitê da bacia. Espera-se, assim, garantirque imposições das políticas dos governos, daspolíticas setoriais dos usuários ou de organizaçõescivis, não venham distorcer as funções técnicas daagência. Espera-se que as discussões das diferentespolíticas para o uso das águas tenham o Comitê comoo seu fórum exclusivo para definição daquela que háde ser a política pública para as águas em toda abacia e a garantia do processo democrático pleno.Espera-se que a atuação dessa entidade possa ser agarantia de resultados para a sociedade quanto aouso eficiente e democrático das águas na bacia.

(*) Especialista em recursos hidricos SAG- ANA [email protected]

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O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio SãoFrancisco - CBHSF foi criado por meio do decretopresidencial de 5 de junho de 2001, com base nosprincípios e diretrizes da Lei nº 9.433, de 1997, queinstituiu a Política e o Sistema Nacional deGerenciamento de Recursos Hídricos.

A história que precede a formação do CBHSF

Antecederam ao modelo atual de Comitê deBacia, o Comitê Especial de Estudos Integrados deBacias Hidrográficas - CEEIBH, criado em 1978 peloGoverno Federal, com a edição da PortariaInterministerial Nº 90 dos Ministérios do Interior e deMinas e Energia, e que tinha a finalidade de promovera utilização racional dos recursos hídricos das baciashidrográficas dos rios federais, por meio da integraçãodos planos e dos estudos setoriais, emdesenvolvimento pelas diversas instituições para osrios brasileiros.

Algumas bacias já apresentavam conflitos deuso e uma situação de degradação ambiental,decorrente da falta de controle das outorgas de direitode uso da água e da ausência de preocupação com apoluição dos corpos d’água.

Como não era possível centralizar aadministração em um único órgão, a soluçãovislumbrada pelo Governo Federal foi a criação decondições para que todos os órgãos envolvidosparticipassem com igual direito da administraçãodaquele recurso natural. O modelo proposto degerenciamento das águas por bacias hidrográficasmostrou ser uma solução para o impasse em que se

Ana Cristina Mascarenhas*

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O COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO

encontrava a gestão da água e caracterizou-se comoo primeiro passo para a gestão colegiada edescentralizada dos recursos hídricos no país.

O CEEIBH era composto apenas porintegrantes do Poder Público e tinha como principalatribuição classificar os cursos d’água, realizar estudose acompanhar a utilização racional dos recursoshídricos das bacias hidrográficas dos rios de domínioda União, no sentido de promover o aproveitamentomúltiplo de cada um e minimizar os impactosambientais nas bacias hidrográficas.

O CEIBH não tinha poder deliberativo, nemdispunha de recursos financeiros, no entanto realizouestudos fundamentais para o conhecimento darealidade das bacias.

No caso do rio São Francisco, foi criado oComitê Executivo de Estudos Integrados da BaciaHidrográfica do Rio São Francisco – CEEIVASF, queteve o seu regimento interno aprovado pela PortariaInterministerial n.º 599, de 20 de abril de 1982, dosMinistérios das Minas e Energia e do Interior. Faziaparte da sua composição, alem dos órgãos públicos,empresas mistas da área de geração de energia esaneamento.

Trabalhos desenvolvidos pelo CEEIVASF:

• O Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado dosRecursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do SãoFrancisco – 1982;• Projeto Gerencial 001/80 - Aspectos de Poluiçãodevido ao Uso Inadequado de Defensivos Agrícolas,Fertilizantes, Corretivos e Detritos na AgriculturaMedidos para seu Controle;• Projeto Gerencial 003/80 - Uso e Ocupação do Solo- Minas Gerais -1980;• Análise das Causas e Repercussões da Enchenteocorrida no mês de Abril de 1985 na Região do BaixoSão Francisco e Recomendações para prevenção eControle – 1985;• O Lago de Sobradinho e os Problemas decorrentesde seu Deplecionamento - CEEIVASF - Abril 1985;• Avaliação Preliminar sobre a situação dos UsosMúltiplos da Água e do Solo - Outubro 1980.

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relevantes constaram da agenda da CIPE ressaltandoa questão da transposição das águas do rio SãoFrancisco e a hidrovia do São Francisco.

Com a publicação da Lei Federal 9.433, em1997, foi possível formalizar a criação dos comitêsde bacia em rios de domínio da União, tendo sidopioneiros os Comitês de Bacia Hidrográfica dos riosParaíba do Sul, Pomba Muriaé, Doce e São Francisco.

O processo de criação do CBHSF

Antecedeu a publicação do decreto de criaçãodo CBHSF um amplo processo de mobilização socialna região do São Francisco, que contou com acoordenação do IMAN e apoio técnico da ANA e dosórgãos gestores dos estados com território na bacia.Este processo buscou envolver o poder público emsuas 3 esferas de atuação, os principais usuários daágua e as entidades da sociedade civil organizada,contabilizando ao todo cerca de 6.000 pessoas.

Após a etapa de mobilização e ematendimento aos requisitos estabelecidos naResolução nº 5, do Conselho Nacional de RecursosHídricos – CNRH, foi elaborado um documentoformalizando a intenção da sociedade da bacia paraa criação do referido Comitê. Constava do documentouma justificativa circunstanciada da importância enecessidade da sua criação, as manifestações deadesão dos segmentos atuantes na bacia e um brevediagnóstico da situação dos recursos hídricos.

Posteriormente, o documento foi submetidoà apreciação do Plenário do CNRH, que aprovou asua criação, estabeleceu prazos para sua instalaçãoe definiu uma Diretoria Provisória que tinha comoatribuição a proposição da metodologia legal einstitucional para instalação do referido Comitê.

A Diretoria Provisória foi designada porportaria ministerial, em outubro de 2001, era compostapor 19 membros, representantes do poder públicofederal, estadual e municipal, dos usuários da água,da sociedade civil organizada e pelo presidente doCEEIVASF. Essa Diretoria ficou responsável pelacondução do processo de definição do numero devagas do CBHSF, a distribuição das mesmas porsegmentos e por Unidades da Federação, buscando

Em 1989, foi elaborado um Relatório deGestão apontando que entre os problemas quelimitavam as atividades do CEEIVASF identificavam-se a ausência de poder deliberativo e, especialmente,da participação da sociedade da bacia.

Apesar das ressalvas por parte de algunsmembros do Comitê, as medidas apontadas nomencionado Relatório foram implementadas e a partirde então, as reuniões tiveram maior divulgação epassaram a ser itinerantes, abordando sempre temasrelevantes para a bacia, trazidos pela sociedade, quepassou a participar com freqüência, ainda quetimidamente.

Nessa época, foram criados 5 Comitês deBacias em afluentes do rio São Francisco: Rio VerdeGrande; Pará/Itapecirica; Borda do Lago de TrêsMarias; Verde/Mirorós e Paramirim. Tratavam-se debacias que apresentavam conflitos mais significativosou então correspondiam às regiões onde houvera amanifestação da sociedade para sua criação.

Entretanto, essas iniciativas foram frustradasem face da ausência de poder deliberativo paraimplementar as decisões colegiadas.Além dos estudos técnicos, muitas ações foramestimuladas pelo CEEIVASF:• Em 1990, ocorreu um grande movimento quemobilizou a sociedade em torno do rio São Franciscoe sua bacia, denominado “SOS São Francisco” queculminou com a criação, em 1996, do Instituto ManoelNovaes para o Desenvolvimento da Bacia do Rio SãoFrancisco – IMAN, entidade civil sem fins lucrativos,que tinha como principais objetivos a recuperação daidentidade social e a construção de um amploprograma de educação ambiental na bacia;• A mobilização para a criação da União dasPrefeituras do Vale do São Francisco – UNIVALE,cujo objetivo era congregar os municípios mediantea participação dos prefeitos nas reuniões de discussãosobre a bacia;• A criação da CIPE - São Francisco, com a finalidadede integrar as Assembléias Legislativas dos Estadosde Alagoas, Bahia, Minas Gerais, Pernambuco eSergipe, irmanadas no esforço de procurar soluçõesconjuntas para o desenvolvimento sustentável dabacia hidrográfica do rio São Francisco. Temas

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sempre equidade em relação ao tamanho de cadaporção da bacia por Unidade Federada e entre ossegmentos representados. Foi responsável peladefinição dos critérios e procedimentos eleitorais, bemcomo pela elaboração de uma minuta de regimentointerno, que versava sobre a forma de funcionamentodo CBHSF.

A Diretoria Provisória coordenou a realizaçãodas plenárias eleitorais dos membros a integrarem oComitê, por segmento, ao longo da bacia e definiçãodos procedimentos para a realização da primeirareunião plenária do CBHSF, cumprindo assim todasas suas atribuições.

O CBHSF e o desafio da gestão das águas doSão Francisco

O então criado Comitê da Bacia Hidrográficado Rio São Francisco passou a constituir uma novainstância na realidade institucional brasileira, quepossibilita, na pratica a participação da sociedade dabacia no gerenciamento dos recursos hídricos, emconjunto com representantes do poder público emsuas três esferas de atuação e dos usuários da água.

Trata-se de um organismo colegiadoresponsável pela gestão das águas da bacia, principalfórum de discussão onde as questões degerenciamento racional dos recursos hídricos devemser analisadas e consensados em prol do interessecoletivo.

Atribuições legais

· promover o debate sobre questõesrelacionadas aos recursos hídricos da bacia;· articular a atuação das varias entidades queatuam nessa área;· arbitrar, em primeira instância administrativa,os conflitos relacionados aos recursoshídricos;· aprovar e acompanhar a execução do Planode Recursos Hídricos da bacia;· estabelecer os mecanismos de cobrançapelo uso de recursos hídricos e sugerir osvalores a serem cobrados.

Forma de funcionamento

A forma de funcionamento do CBHSF édefinida pelo seu Regimento Interno, aprovadodurante a primeira reunião plenária.

O CBHSF se reúne ordinariamente duasvezes por ano, em locais previamente definidos emreuniões plenárias anteriores, e extraordinariamentesempre que for necessário. As reuniões são públicase contam com ampla divulgação antes da suarealização. São convocadas pela Secretaria Executivacom 30 dias de antecedência e constam das pautasdas mesmas assuntos demandados pelo Plenário,pelos membros do referido Comitê ou da DiretoriaColegiada.

A definição final da pauta é aprovada pelaDiretoria Colegiada e os assuntos são previamenteanalisados no âmbito das Câmaras Técnicas, queencaminham seus pareceres técnicos para analise edecisão final do Plenário.

Até a presente data, já foram realizadas 14reuniões, nas quais foram discutidas questõesrelevantes para a gestão das águas da baciahidrográfica do rio São Francisco.

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Estrutura do CBHSF

O CBHSF dispõe de uma estrutura própriapara o seu funcionamento conforme é possívelverificar no organograma acima.

Conta com o suporte das Câmaras Técnicaspara efetuar as analises sobre matérias em discussãoe subsidiar o Plenário em suas decisões colegiadas ecom a capacidade de articulação e mobilização dasCâmaras Consultivas Regionais, distribuídasconforme a divisão fisiográfica da bacia.

Além disso, a estrutura do CBHSF é compostapelo Plenário que é soberano em suas decisões, poruma Diretoria para representá-lo, sendo a DiretoriaColegiada integrada pela Diretoria Executivaacrescidas dos coordenadores das CCR e, finalmente,pela Secretaria Executiva para operacionalização dasdecisões.

Diretoria

Diretoria Colegiada do CBHSF é constituídapor sete membros, sendo três da Diretoria Executivae quatro coordenadores de Câmaras ConsultivasRegionais. Essa composição, estabelecida noregimento interno, visa resguardar arepresentatividade regional na constituição da diretoriado CBHSF.

Os integrantes da Diretoria são eleitos peloPlenário, entre os seus membros titulares e seusmandatos serão de três anos, coincidentes com o dosmembros, podendo ser reeleitos uma única vez.

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Estrutura do CBHSF

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Processo deMobilizaçãoPrecedeu aformação doComitê, envolvendoos municípios dabacia, sobcoordenação doIMAN com o apoioda ANA e dosòrgãos gestoresestaduais. Na épocaforam realizados 37encontros regionaisque contaram com apresença de cercade seis milparticipantes.

2001

2001

Criação do CBHSFpor meio do decretopresidencial em 5de junho de 2001,após aprovação peloConselho Nacionalde RecursosHidricos. Todo oprocesso inicial deconstituição,definição do númerode vagas porsegmento eUnidades daFederação,elaboração doregimento interno,eleições dosmembros eimplementação doComitê, foicoordenado pelaDiretoria Provisóriainstituída peloCNRH.

Solenidade deposse dosmembrosintegrantes doCBHSF

Realizada em 13 dedezembro de 2002,no Palácio doPlanalto, conduzidapelo presidente darepublica.

2002

1ª ReuniãoPlenária doCBHSF em SãoRoque / MG - Opapel do CBHSFRealização daOficina dePlanejamento parafacilitar oentrosamento entreos membros eidentificar asprincipaisestratégias para ofuncionamento edefinição da agendado Comitê.Eleição e posse dasDiretorias Executivae Colegiada.Aprovação doregimento internodo Comitê.

2ª ReuniãoPlenária emPenedo / AL -Projeto deTransposição doRio São Francisco1ª reunião de comitêde bacia brasileiroque contou com aparticipação do Vice-presidente daRepublica, deministros de estado,governadores,dirigentes de órgãosfederais e estaduaisatuantes na bacia.Dispôs sobre aelaboração do Planode RecursosHídricos da Baciapara dotar o Comitêde elementos parase posicionar emrelação àTransposição.

2003

3ª Reunião Plenáriaem Juazeiro / BA -Plano de RecursosHídricos da Bacia doSão FranciscoReunião historica deaprovação do Planode RecursosHídricos da bacia;Pedido de vista parauso externo à baciapelo representantedo MMA. Foi areunião com maiornúmero dedeliberaçõesaprovadas e a demaior expressão emparticipação dosmembros e de váriosoutrosinteressados.Instaloua CTIL e institui aComissão Eleitoralpara conduzir oprocesso derenovação dosmembros do Comitêpara o 2º mandato.

2003

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Até começar a funcionar plenamente, o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco – CBHSF,passou por diversas fases de estruturação que se iniciou pelo processo de mobilização social na bacia.No momento, o CBHSF discute as bases para a implementaçao da cobrança pelo uso dos recursos hídricose o modelo mais adequado para a sua Agência de Bacia. Durante esse período o CBHSF enfrentou muitosdesafios para a gestao de suas águas, entre os quais destacamos o projeto de transposição das águas do rio,que permeia ate hoje as discussões plenárias.

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Composição do CBHSF

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2005

4ª e 5ª ReuniõesPlenárias emSalvador / BA -Definição dos usosexternos das águasna bacia.Análise do pedido devista do MMA,definindo limites,prioridades ecritérios de alocaçãoe outorga para usosexternos à bacia,como parteintegrante do Planode RecursosHídricos e acatou oprocesso para aanálise do conflito deuso, apresentadopelo FórumPermanente deDefesa do Rio SãoFrancisco, emrelação ao projeto detransposição.

6ª e 7ª ReuniõesPlenárias emPirapora / MG -Avaliação daimplementação doPlano de RecursosHídricos e asconseqüências doProjeto deTransposição.Eleição e posse dadiretoria – Gestão2005-2007;dispôs sobre medidasgerais a seremimplementadas peloComitê e suasCâmaras Técnicas;sobre o Programa deRevitalização e adoçãode medidas em face aodescumprimento doPlano, quanto àsprioridades de uso ecritérios de Outorga.

8ª Reunião Plenáriaem Recife / PE - Ofortalecimento dosCBHs e doSINGREH:atribuições edesafios do CBHSFForam apresentadasas experiências decobrança pelo uso daágua eimplementação deagência pelosComitês Paraiba doSul - CEIVAP ePiracicaba, Capivaríe Jundiaí - CBHPCJe discutiu-sequestões ligadas àsatribuicões, aofuncionamento emelhor estruturaçãodas CâmarasTécnicas, para queessas pudessemmelhorar a suacontribuição técnicaàs decisões doplenário do CBHSF.

2005

2006

2007

9ª e 10ª ReuniõesPlenárias emAracaju/SE - Asustentabilidadeeconômica eambiental da baciahidrográfica do rioSão Franciscodispôs sobre aalteração no artigo6º do RegimentoInterno do CBHSF;sobre mecanismospara criação deAgência de Água daBacia Hidrográficado Rio SãoFrancisco e para aimplementação daCobrança pelo Usode RecursosHídricos.

11ª e 12ª ReuniõesPlenárias em BeloHorizonte - MGFortalecimentoInstitucional doCBHSF: estudospara criação daAgência de Baciado rio SãoFranciscoRealização da oficinade vazão ecológicaque discutiu osaspectos físicos,bióticos e sócio-econômicos da baciapara elaboração deestudos paradefinição da vazãoecológica.

13ª e 14ª ReuniõesPlenárias emSalvador - BAFortalecimentoInstitucional doCBHSFRealização da 1ªOficina de Usuáriosda Água do CBHSF– Setor Elétrico;Acompanhamentodos trabalhos deconsultoria – VazãoEcológica Aplicada aBacia do Rio SãoFrancisco e doandamento dosestudos relativos àcobrança pelo uso daágua e modelos deagência de bacia.Discussão sobre oProcesso deRenovação deMembros do CBHSFpara 3ª gestão.

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O CBHSF é composto por 62membros representantes do poderpúblico nas 3 esferas de atuação(União, estados e municípios), dosusuários da água nas suas respctivascategoria (geração hidrelétrica,indústria, uso agropecuário,abastecimento urbano, navegação epesca lazer e turismo), da sociedadecivil com atuação comprovada naárea de recursos hídricos (ONG,entidades técnicas de ensino e depesquisa e consórcios, comitês eassociações) e dos povos indígenasda bacia.

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Câmaras Consultivas Regionais

O CBHSF dispõe na sua estrutura de 4Câmaras Consultivas Regionais, instânciascolegiadas formadas com base na divisão fisiográficada bacia (Alto, Médio, Sub-médio e Baixo SãoFrancisco), constituídas por membros titulares esuplentes do Comitê e representantes de comitês debacias de rios afluentes, legalmente constituídos,entidades e instituições convidadas, na área dareferida Câmara.

Na composição de cada Câmara Consultivaprocura-se garantir a participação de membrosrepresentantes dos três segmentos integrantes doComitê, com a proporcionalidade definida peloPlenário, bem como dos povos indígenas.

As CCR são dirigidas por um coordenador eum secretário, indicados pelos membros titulares esuplentes do CBHSF que compõem cada uma dascâmaras e, no caso do coordenador, esta indicaçãoserá submetida à aprovação do Plenário, pois passama compor a Diretoria Colegiada do CBHSF.

A forma de funcionamento das CâmarasConsultivas Regionais é definida pelos seus membrose submetida à deliberação do Plenário.

Essas Câmaras Consultivas possuem umpapel essencial no âmbito da bacia do São Francisco,especialmente devido a sua grande dimensão, aopossibilitar que as ações do Comitê cheguem até àregião correspondente à sua área de atuação, assimcomo permitir que os problemas e os anseios dasociedade daquele local sejam reportados e tratadosno âmbito da estrutura do Comitê.

Compete às CCR promover a articulação doCBHSF com os comitês de bacias de rios afluentes,fortalecendo a participação desses entes colegiadose encaminhando ao CBHSF as demandasprovenientes dos mesmos; apoiar o CBHSF noprocesso de gestão compartilhada e divulgar suasações no âmbito da bacia hidrográfica; discutir eapresentar sugestões ao CBHSF; coordenar oprocesso de mobilização para a renovação dosmandatos de membros do CBHSF e realizar asconsultas e audiências públicas, determinadas peloPlenário.

Câmaras Técnicas

Na estrutura do CBHSF, o trabalho dasCâmaras Técnicas é de fundamental importância paraa resolução de desafios encontrados no dia-dia.

As reuniões de Câmaras Técnicas antecedemas reuniões plenárias e seus membros se debruçamsobre matérias previamente pautadas pelo próprioPlenário ou pela Diretoria Executiva ou Colegiada,para a analise e o aprofundamento de temas queintegram a agenda positiva do Comitê.

As CT tem por atribuição o exame de matériasespecíficas, para subsidiar a tomada de decisões doPlenário e são constituídas de, no mínimo, 7 e, nomáximo, 13 membros, titulares ou suplentes doCBHSF, ou por representantes indicados formalmentepelo membro titular à Secretaria Executiva, os quaisterão direito a voz e a voto.

Ao definir os integrantes das CâmarasTécnicas, o Comitê procura refletir aproporcionalidade entre os segmentos representadosexistente na sua própria composição.

Busca-se também trazer para esses espaços,técnicos de diversas instituições que tenhamexperiência ou notória atuação em suas respectivasáreas, para que possam colaborar com os debates eenriquecer as análises efetuadas de acordo com anatureza dos assuntos relativos à competência da CT,para assim subsidiar o Plenário em suas decisões.

Encaminhadas as manifestações deinteresses e observados os critérios previamentedefinidos, a Diretoria Colegiada define a composiçãodas CTs. Em sua primeira reunião, a coordenação éeleita entre os membros integrantes, por maioriasimples dos votos e o mandato coincide com o dosmembros do CBHSF.

As decisões das Câmaras Técnicas não sãoterminativas e o Plenário é soberano para as suasdeliberações, entretanto as analises efetuadascontribuem para clarear muitos aspectos das matériasconstantes das pautas de reuniões.

Trata-se de um exercício muito salutar e quese consolida cada vez mais com os avanços doprocesso de fortalecimento institucional do CBHSF.

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• Câmara Técnica de Planos, Programas e Projetos -CTPPP• Câmara Técnica de Outorga e Cobrança – CTOC• Câmara Técnica Institucional e Legal – CTIL• Câmara Técnica de Articulação Institucional - CTAI• Câmara Técnica de Comunidades Tradicionais -CTCT

CTILTem como principal atribuição examinar e assistir jurídica e institucionalmente o Comitê na tomada de decisões

do Plenário e da Diretoria Colegiada.Dando continuidade aos trabalhos iniciados em 2006, esta coordenação analisou as alterações do Regimento

Interno, apresentado-o na XIII Plenária do CBHSF, realizada em Salvador, sendo o novo Regimento devidamenteaprovado.

No exercício do 1º Semestre de 2007, a CTIL vivenciou mudanças significativas em sua composição e vemcontando com a participação ativa dos novos membros, garantindo quorum qualificado em suas reuniões.

O calendário anual de reuniões da Câmara para 2007 foi recentemente definido e prevê inclusive encontrosconjuntos com a Câmara Técnica de Outorga e Cobrança e com a Câmara Técnica de Articulação Institucional.

O principal desafio para a CTIL em 2007 diz respeito à criação da Agência de Água do CBHSF, uma vez quecompete a esta Câmara acompanhar e supervisionar o estudo de viabilidade para a criação da Agência, bem como aspossíveis alternativas de formato institucional e jurídico da agência e/ou entidade delegatária com abrangência nabacia, analisando e encaminhando parecer dos produtos parciais e finais apresentados pela consultora contratadapara realizar tal estudo.

Ressalte-se que, ainda este ano, a CTIL deverá revisar as Deliberações que regulamentam o funcionamentodas Câmaras Técnicas, coordenar a elaboração do Regimento Interno das Câmaras Consultivas Regionais e continuaracompanhando o processo administrativo de conflito no uso das águas do São Francisco, que se refere ao Projeto deTransposição.

Ana Cacilda Rezende ReisCoordenadora da [email protected]

O CBHSF dispõe de 6 CT previstas em suaestrutura das quais 5 se encontram implementadase em funcionamento.

CTPPPNa estrutura do CBHSF, o trabalho das câmaras

técnicas é de fundamental importância para superar osdesafios que se apresentam. E são muitos, e de toda ordem.Desde o início dos meus trabalhos na Câmara Técnica dePlanos, Programas e Projetos - CTPPP, foi possível ver arelevância dos temas apresentados para a DiretoriaColegiada.

Juntamente com colegas com formação técnica emdiversas áreas e representando vários setores da sociedade,os assuntos são debatidos em alto nível. Temas como oconflito de uso da água, assunto que reveste a discussãosobre o Projeto de Integração do Rio São Francisco comBacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional, estudos sobrevazões ecológicas no Baixo São Francisco e, maisrecentemente, a questão da revitalização de toda a bacia doSF. Mesmo diante de dificuldades relativas à liberação dostécnicos junto às empresas e de recursos para organizaçãodas reuniões, conseguimos manter os cronogramas em diae temos atendido às demandas apresentadas.

Acredito ser uma satisfação para todos contribuirpara a consolidação do CBHSF, aprimorando cada vez maiso trabalho das câmaras técnicas.

Carlos Bernardo Mascarenhas AlvesCoordenador da CTPPP

[email protected]

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CTAINum cenário de muitas

variáveis que se associam, como o dabacia hidrográfica do rio SãoFrancisco, pode-se avaliar, commeridiana clareza, o papel estratégicoda CTAI, que tem comoresponsabilidade maior a articulaçãoe a integração de todos os segmentosque participam e implementam agestão dos recursos hídricos naestratégica bacia franciscana.

Além disso, num esforçosolidário, a CTAI tem procuradosubsidiar, com fidelidade, osintegrantes do Comitê para encontraras soluções mais adequadas nogerenciamento dos conflitos deinteresse que permeiam, como é dedomínio público, as discussões edebates institucionais. É também decompetência da CTAI a condução doprocesso eleitoral para substituiçãodos membros do Comitê, bem comoa eleição da Diretoria Executiva e dasCâmaras Consultivas Regionais.Nessas ocasiões, democraticamentesaudável, desenvolve-se intensamobilização na bacia para revelar àsociedade organizada a importânciasocioeconômica, cultural e política dasações cooperativas do CBHSF.

CTOCTem por atribuição o exame de

matérias técnicas relativas à cobrançapelo uso da água e à outorga de direitode uso dos recursos hídricos,objetivando subsidiar a tomada dedecisões do Plenário e da Diretoria doCBHSF em suas reuniões. Seusmembros se reúnem com umafreqüência bimensal, apresentandoproveitosas e ricas contribuições parao grupo, o que reflete o

comprometimento de cada um com o Comitê. Nas discussões sobre anecessidade de controle do uso racional das águas da bacia do São Francisco,tem ficado evidente que muitas atividades poderão ser inviáveis para seusagentes a depender do nível de valor de cobrança a ser praticado.

A analise dos produtos recebidos, resultantes das consultoriascontratadas para definição do modelo jurídico e institucional da Agência edefinição do método de cobrança pelo uso da água, tem enriquecido asdiscussões sobre os temas importantes para o objetivo desta Câmara.

Acompanhamos com o maior interesse a evolução dos estudos e aabordagem do assunto foco, principalmente para nós representantes dosusuários de água, apreensivos com o futuro que nos aguarda com a possívelcobrança. Concordamos, apoiamos e defendemos o uso racional da água,vital para o futuro, de nossas atividades econômicas, empresarias e familiares,e principalmente, a preservação de bacias, como a do São Francisco, o que jádevíamos de há muito ter feito prioritário.

Temos sido gratificados pelo conhecimento do tema, pela conquistado espaço dentro do grupo, viabilizando o avanço da gestão pelo dialogo.No longo caminho que temos à frente até a conclusão da regulamentação dasatividades na bacia do São Francisco, haveremos de chegar a um consensode todos os atores e interessados na viabilidade das atividades preservadaspara o futuro

CTCTNa formação do CBHSF do tão valioso rio São Francisco, lembraram de incluir os

verdadeiros “donos da terra” com 01 única vaga indígena. Atualmente, o que mais se falaé de inclusão e esqueceram de lembrar os afrodescendentes “Quilombolas”, que vivem amais de 500 anos às margens do Rio São Francisco.

Devemos deixar bem presente na memória que neste país nada se ganha degraça, pelo menos é o quem vem acontecendo com os povos indígenas, ao longo dahistória, foi a custo de muitas lutas e perdas humanas que os esses povos resistiram a genocídios, etinocídios eatualmente aos grandes impactos ambientais. Com a criação da CTCT, conseguimos ampliar o número de vagasdestinadas aos povos indígenas de 01 para 02 e assegurar o direito dos quilombolas a terem assento no CBHSF com01 vaga para a renovação dos membros, que tomarão posse em 2007. Juntos, as comunidades tradicionais e outrossegmentos somaremos forças trabalhando para o fortalecimento da revitalização do São Francisco, para que possamosver outra vez o rio belo como já foi, é o sonho das comunidades tradicionais, ribeirinhos, movimentos sociais eambientalistas não corrompidos.

Contamos com uma maior atuação do CBHSF no desenvolvimento das ações de revitalização do VelhoChico, sanando as agressões que passivamente tem sofrido o rio São Francisco ao longo de 507 anos, porque derevitalização nada de concreto temos visto. Maria José Gomes Marinheiro

Coordenadora da [email protected]

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“Somos as raízes da memória, que resistem ao tempo”

Paulo Teodoro de CarvalhoCoordenador da CTAI

[email protected]

João Lopes de AraújoCoordenador da CTOC

[email protected]

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A Secretaria Executiva desempenha um papel essencial naoperacionalização das atividades do CBHSF. Trata-se de um trabalho dearticulação com os membros e instituições que compõe e interagem comCBHSF. A SECEX envolve uma equipe qualificada e comprometida comsuas funções, integrada por técnicos das áreas de sociologia,administração, secretariado, comunicação, mobilização social, gestão de recursos hídricos, finanças e apoioadministrativo.

Entre as muitas atribuições, compete a SECEX organizar as plenárias do CBHSF, as reuniões dasCâmaras Técnicas e Consultivas; propor o calendário anual dessas reuniões; assessorar as reuniões doCBHSF e das respectivas Câmaras; prestar informações solicitadas ou que julgar convenientes sobre osprocessos ou matérias em pauta.

Alem disso, a SECEX assessora a Diretoria em suas atividades; dá publicidade às deliberaçõestomadas pelo Plenário; adota as medidas técnicas e administrativas necessárias ao exercício de suacompetência; elabora o relatório anual das atividades do CBHSF e busca cumprir encargos outros que lheforem atribuídos pelo Presidente ou pelo Plenário, necessários ao desenvolvimento das atividades do Comitê.

Numa bacia com a dimensão do São Francisco, são muitas as atribuições dessa Secretaria, queatualmente conta com o apoio operacional da UAR – São Francisco, para prover o CBHSF das condiçõesnecessárias ao seu funcionamento pleno.

SECEXSECRETARIA EXECUTIVA

COMUNICANDOMalu Follador*

O Projeto desta revista inicia o processo de catalogar, organizar, divulgar e registrar a memória doCBHSF com o objetivo de preservar sua identidade e sua história de modo a garantir para as gerações futuras umconhecimento pleno dessa organização social. Preservar a história é garantir que as futuras gerações possam nãosó conhecer, mas vivenciar um determinado período, e perpetuar esse tempo como forma de embasar novasexperiências. Uma vida, um grupo social, ou mesmo uma nação sem história está fadada ao esquecimento e adominação de outras culturas por perder o elo que a fortalece que é a identidade.

A comunicação do CBHSF tem o objetivo de promover a integração entre os segmentos distintos, emtorno de temáticas e práticas comuns, visando incrementar usos e preocupações com o melhor desenvolvimentodas atividades e competências do comitê.

É possível compreender que a importância da interatividade no processo comunicacional do CBHSF étamanha que podemos associá-la à própria existência da comunicação do comitê, desta forma é imprescindível àparticipação de todos na montagem do nosso boletim on-line, do nosso site, na divulgação das nossas peças decomunicação, folder, cartazes e CDs, enviando, gerando, mandando dados, noticias, informações. CONTRIBUA- solicite material junto a SECEX do CBHSF para divulgar na sua região e mande você também matérias ousugestões para nosso informativo através do e-mail: [email protected].

Assessora de comunicação social do CBHSFCoord. o Curso de Comunicação Social / UNIME

[email protected]

Equipe de Comunicação 2005/07

(*) Consultora em recursos [email protected]

COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO

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José Theodomiro, queria te mandar mensagens novas de um velho amigo, daquelemesmo amigo que correu nas suas veias e que desaguou no mar do seu coração. Mas as

novas são as velhas notícias de sempre! Velhas notícias de um rio, amigo, que continua

vendo passar o tempo, sempre impávido, mas nem sempre sereno. Com oras de cheia,oras de seca, com gente se banhando, navegando, pescando, vivendo; com plantações,

irrigações, inundações, medos e ilusões.

O rio e sua gente bem brasileira, barranqueira, que continua lutando (porque nãodesiste nunca!) pela não-transposição e pela sim-revitalização do seu mundo. Gente que

espera ver esta serpente de água continuar sua jornada da grota nascente ao atlântico,

para que possa enfim, cruzar para muito além de outros mares e d’outros oceanos.

VELHO DO RIO

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A inexistência de personalidade jurídica, assim como emoutros comitês, impôs ao CBHSF desde sua criação em junho de 2001,dificuldades operacionais ao funcionamento da sua estrutura devido àimpossibilidade de contratação de pessoal, de pessoas jurídicas paraprestação de serviços administrativos essenciais e a impossibilidade

de assinar contratos e convênios com os governos federal e estaduais, trazendo assim instabilidade nodesempenho das suas competências legais.

Com a assinatura do convênio 003/2004, entre a ANA e a SRH-BA, que tem como objetivo fundamentalo fortalecimento da Secretaria Executiva do CBHSF, a logística dos serviços administrativos necessários àexecução das suas reuniões (plenárias, câmaras técnicas, câmaras consultivas regionais e diretoria colegiada)foram sanadas, persistindo ainda as dificuldades enfrentadas para o funcionamento habitual da sua SecretariaExecutiva, sobretudo as restrições à contratação de pessoal técnico.

Por meio do Decreto nº 3.692, de 19 de dezembro de 2000, foi permitido a ANA, instalar UnidadesAdministrativas Regionais, experiência esta, que apresentou resultados positivos com a UAR-GV, emGovernador Valadares – MG e que presta apoio técnico e operacional ao CBH-Doce. Visando apoiar ofuncionamento da SECEX, no final de 2005, foi solicitado pela Diretoria Colegiada do CBHSF e aprovadopela Diretoria da ANA, a criação de uma Unidade Administrativa Regional em Salvador (UAR-Salvador) como objetivo de prestar suporte técnico, administrativo e operacional ao Comitê e sua Secretaria Executiva,viabilizando assim o seu funcionamento, em carátertransitório e com a função de implementação das suasdeliberações, respeitando a competência do CBHSFem implementar a política de gerenciamento dosrecursos hídricos na bacia hidrográfica do Rio SãoFrancisco.

A UAR-Salvador possui 7 técnicos em seuescritório central e 1 técnico em cada um dos seus 4escritórios regionais (Belo Horizonte - MG, Ibotirama -BA, Serra Talhada - PE e Aracaju-SE).

A Unidade disponibiliza além do seu corpotécnico, toda a infra-estrutura necessária ao seufuncionamento (espaço físico, computadores,periféricos, móveis, contratos de telefonia, Internet,correios e outros) e atua na parte de planejamento e execução da logística dos eventos e projetos, planejamentoe acompanhamento técnico das atividades de mobilização, articulação e comunicação do CBHSF.

Os desafios enfrentados para o funcionamento desta UAR são proporcionais ao tamanho da bacia,citando como os principais, a burocracia e entraves da legislação, a complexidade de organização dasatividades do Comitê (que sempre extrapolam as fronteiras de mais de um estado) e sem dúvida, a dificuldadede se manter uma estrutura pertencente a um órgão gestor que fisicamente incorpore a estrutura da SecretariaExecutiva do CBHSF sem comprometer a autonomia de ambos.

Em todos os trabalhos executados pela equipe técnica da UAR, existe a preocupação na imparcialidadedas suas conduções, articulação e diálogo franco entre os entes e segmentos envolvidos, dinamismo naimplementação de soluções, utilização de tecnologias de ponta e inovação na gestão e planejamentoestratégico de funcionamento, adotando práticas que possam balizar o funcionamento da futura agência debacia do rio São Francisco, buscando sempre a maior eficácia, efetividade e eficiência nas ações.

Cláudio Pereira*

Coordenador da UAR - Salvador / [email protected]

UAR - SALVADOR

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DECLARAÇÃO DE PRINCÍPIOS DO COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DORIO SÃO FRANCISCO

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Considerando que uma das diretrizes gerais de ação da PolíticaNacional de Recursos Hídricos consiste na “adequação da gestão derecursos hídricos às diversidades físicas, bióticas, demográficas,econômicas, sociais e culturais das diversas regiões do País” (artigo3º, II da Lei nº 9.433, de 08 de Janeiro de 1997);

Considerando ainda, como uma das diretrizes gerais de ação daPolítica Nacional de Recursos Hídricos “a integração da gestão derecursos hídricos com a gestão ambiental” (artigo 3º, III da Lei nº 9.433,de 08 de Janeiro de 1997);

Considerando que um dos objetivos da Política Nacional do MeioAmbiente consiste na “compatibilização do desenvolvimentoeconômico-social com a preservação da qualidade do meio ambientee do equilíbrio ecológico” (artigo 4º, I da Lei nº 6.938, de 31 de Agosto de1981);

Considerando que compete ao Conselho Nacional de Meio Ambiente(CONAMA) “incentivar a instituição e o fortalecimento institucionaldos Conselhos Estaduais e Municipais de Meio Ambiente, de gestãode recursos ambientais e dos Comitês de Bacia Hidrográfica” (artigo7º, XII do Decreto nº 99.274, de 06 de Julho de 1990);

Considerando que “a bacia hidrográfica é a unidade territorialpara implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos eatuação do Sistema Nacional de Gerenciamento dos RecursosHídricos” (artigo 1º, V da Lei nº 9.433, de 08 de Janeiro de 1997);

Considerando que “a gestão dos recursos hídricos deve serdescentralizada e contar com a participação do Poder Público, dosusuários e das comunidades” (artigo 1º, VI da Lei nº 9.433, de 08 dejaneiro de 1997);

Considerando que “a participação pública no processo decisórioambiental deve ser promovida e o acesso à informação facilitado”(Princípio 10 da Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente eDesenvolvimento);

Considerando que “os Planos de Recursos Hídricos são planosdiretores que visam a fundamentar e orientar a implementação daPolítica Nacional de Recursos Hídricos e o gerenciamento dosrecursos hídricos” (artigo 6º da Lei nº 9.433, de 08 de Janeiro de 1997);

Considerando que compete ao Conselho Nacional de RecursosHídricos “promover a articulação do planejamento de recursos hídricoscom os planejamentos nacional, regional, estaduais e dos setores deusuários” (artigo 35, I da Lei nº 9.433, de 08 de Janeiro de 1997);

Considerando que a educação ambiental reside na “concepçãodo meio ambiente em sua totalidade, considerando a interdependênciaentre o meio natural, o sócio-econômico e o cultural, sob o enfoqueda sustentabilidade” (artigo 4º, II da Lei nº 9.795, de 27 de Abril de 1999);

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DECLARAÇÃO DE PRINCÍPIOS DO COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DORIO SÃO FRANCISCO

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PRINCIPIO IO Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São

Francisco promoverá constante e estreita relação orgânicae dialógica com os Comitês de Bacia dos tributários eoutras associações de usuários do Rio São Francisco, afim de que tais órgãos pugnem pela coerência entre suasrespectivas atividades, pela compatibil ização dosplanejamentos de gestão das águas e de forma integradacom a gestão ambiental da integralidade do território daBacia.

PRINCÍPIO IIO Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São

Francisco zelará pela efetividade do Princípio daParticipação Pública, que encontra fundamento no artigo225, caput, da Constituição da República Federativa doBrasil, propiciando amplos fóruns a permitir a participaçãodas comunidades pertencentes à Bacia nos processosdecisórios daquele órgão, quando assim solicitado por 2/3 (dois terço) de seus membros.

PRINCÍPIO IIIO Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São

Francisco priorizará, no exercício de suas atividades degestão e gerenciamento, a aprovação de um Plano deBacia, que consiste no principal elemento a orientar efundamentar a implementação dos demais instrumentosda Política Nacional de Recursos Hídricos, quais sejam,a outorga dos direitos de uso dos recursos hídricos, acobrança pelo uso da água, o enquadramento dos corposd’água, e buscará através dos demais instrumentosprevistos, resultar em sua efetiva revitalização, e na gestãoda qualidade e quantidade para seus usos múltiplos.

PRINCÍPIO IVO Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São

Francisco aprovará, com fundamento no Plano de Bacia,um programa estratégico e operacional de revitalizaçãoda Bacia, com a elucidação de conceitos afetos à gestãodas águas e a definição de prioridades tecnicamentejustificadas que promovam sua preservação, conservaçãoe recuperação, privilegiando a biodiversidade, asustentabilidade ambiental, econômica e social, aqualidade e quantidade das águas, e considerando que asatisfação das necessidades humanas encontra-se adepender da consolidação de efetivos instrumentos deeducação ambiental, que propiciem às comunidades,autonomia crítica e discursiva e demonstrem a estas afranca relação de interdependência entre os meios natural,sócio-econômico e cultural.

O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco adota, no exercício de sua missão, os princípiosapresentados a seguir:

PRINCÍPIO VO Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São

Francisco pugnará, mediante articulação com a AgênciaNacional de Águas (ANA), o IBAMA e Órgãos de Gestãode Água e do Meio Ambiente dos Estados integrantes daBacia, pela aplicação do conhecimento técnico-científico,respeitando as características do ciclo hidrológico daBacia.

PRINCÍPIO VIO Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São

Francisco comprometer-se-á com a constante adoção defirmes atitudes éticas em defesa do interesse público, dodesenvolvimento sustentável, da revitalização,preservação e conservação dos ecossistemas e dabiodiversidade da Bacia.

PRINCÍPIO VIIO Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São

Francisco zelará pela necessária integração entre gestãoambiental e gestão das águas, considerando que aqualidade e quantidade destas se encontra em relação deinterdependência com a sustentabilidade dosecossistemas da Bacia, com sua biodiversidade e o bemestar social e que a água consiste em um bem natural,social e essencial à vida, que por sua escassez e fatoresinerentes à sua gestão, adquire valor econômico.

PRINCÍPIO VIIIO Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São

Francisco promoverá constante relação de articulação coma ANA e o IBAMA , e Órgãos de Gestão de Água e do MeioAmbiente dos Estados integrantes da Bacia e com osmunicipios a fim de promover não apenas a gestão daságuas da Bacia, mas do conjunto dos ecossistemas deseu território de abrangência e a melhoria dos indicadoressociais.

PRINCÍPIO IXO Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São

Francisco, juntamente com o CNRH e o CONAMA,buscarão, quando pertinente, propor alterações nos atosnormativos relacionados ao meio ambiente, com vistasao aperfeiçoamento do sistema democrático de gestãosustentável das águas, bem como incentivarão, emparceria com os órgãos gestores estaduais, a organizaçãoe fortalecimento dos Comitês Estaduais de BaciasHidrográficas em todo o território da Bacia do SãoFrancisco.

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DELIBERAÇÃO MATÉRIA

QUADRO DE DELIBERAÇÕES

I Reunião Plenária - O papel do CBHSFSão Roque de Minas/MG, 11 de maio de 2003Deliberação Nº 1 - Dispõe sobre alterações nos Artigos 6º, 7º, 8º, 35º e 40º do Regimento Interno do CBHSF.Deliberação Nº 2 - Dispõe sobre medidas gerais aprovadas na 1ª reunião Ordinária.

II Reunião Plenária – Projeto de Transposição do Rio São FranciscoPenedo/AL, 03 de outubro de 2003Deliberação Nº 3 - Dispõe sobre a elaboração do Plano de Recursos Hídricos da bacia hidrográfica do rio SãoFrancisco.Deliberação Nº 4 - Dispõe sobre o apoio ao Programa de Ações Estratégicas para o Gerenciamento da BaciaHidrográfica do Rio São Francisco e de sua Zona Costeira – PAEDeliberação Nº 5 - Dispõe sobre parâmetros para usos de pouca expressão no Rio São Francisco.Deliberação Nº 6 - Dispõe sobre o posicionamento do CBHSF em relação ao Projeto de Transposição de Águas doRio São Francisco.

III Reunião Plenária – Plano de Recursos Hídricos da Bacia do São FranciscoJuazeiro/BA, 28 a 30 de julho de 2004Deliberação Nº 7 - Aprova o Plano de Recursos Hídricos da bacia hidrográfica do rio São Francisco.Deliberação Nº 8 - Define a disponibilidade hídrica, vazão máxima de consumo alocável, as vazões remanescentemédia e mínima ecológica na foz como parte integrante do Plano de Recursos Hídricos da bacia hidrográfica do rioSão Francisco.Deliberação Nº 9 - Propõe diretrizes e critérios para processo de revisão das outorgas, como parte integrante doPlano de Recursos Hídricos, concedidas no âmbito da bacia hidrográfica do rio São Francisco.Deliberação Nº 10 - Apresenta recomendações e define critérios integrantes do Plano de Recursos Hídricos paraconstrução do Pacto das Águas a ser materializado em Convênio de Gestão Integrada da bacia hidrográfica do rioSão Francisco.Deliberação Nº 11 - Propõe critérios, limites, prioridades para outorgas de uso de água, como parte integrante doPlano de Recursos Hídricos da bacia hidrográfica do rio São Francisco.Deliberação Nº 12 - Apresenta proposta de enquadramento dos corpos d´água estabelecidas no Plano de RecursosHídricos da bacia hidrográfica do rio São Francisco.Deliberação Nº 13 - Apresenta premissas básicas e recomendações para a implementação da fiscalização integradapropostas pelo Plano de Recursos Hídricos da bacia hidrográfica do rio São Francisco.Deliberação Nº 14 - Estabelece o conjunto de intervenções prioritárias para a recuperação e conservaçãohidroambiental na bacia hidrográfica do rio São Francisco, como parte integrante do Plano de Recursos HídricosDeliberação Nº 15 - Estabelece o conjunto de investimentos prioritários a serem realizados na bacia hidrográfica dorio São Francisco, no período 2004 a 2013, como parte integrante do Plano de Recursos Hídricos da baciahidrográfica do rio São Francisco.Deliberação Nº 16 - Dispõe sobre as diretrizes e critérios para a cobrança pelo uso dos recursos hídricos na baciahidrográfica do Rio São Francisco.Deliberação Nº 17 - Define a Câmara Técnica de Articulação Institucional e institui a Comissão Eleitoral paraconduzir o processo de renovação dos membros do CBHSF representantes dos segmentos usuários, dasorganizações civis e do poder publico municipal.

IV e V Reuniões Plenárias – Definição dos usos externos da água na bacia do rio São FranciscoSalvador/BA, 26 e 27 de outubro de 2004Deliberação Nº 18 - Define limites, prioridades e critérios de alocação e outorga para usos externos à bacia, comoparte integrante do Plano de Recursos Hídricos da bacia hidrográfica do rio São Francisco.

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DELIBERAÇÃO MATÉRIADeliberação Nº 19 - Define procedimentos para a análise do conflito de uso de águas, apresentada pelas entidadescivis que compõem o Fórum Permanente de Defesa do Rio São Francisco, em relação ao Projeto de Transposiçãoou Interligação do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional.VI e VII Reuniões Plenárias – Avaliação da implementação do Plano de Recursos Hídricos e asconseqüências do Projeto de Transposição para a gestão participativa e o Pacto das Águas da bacia.Pirapora/MG, 10 e 11 de agosto de 2005Deliberação Nº 20 - Dispõe sobre medidas gerais a serem implementadas pelo CBHSF e suas Câmaras Técnicas,na gestão 2005-2007 e dá outras providências.Deliberação Nº 21 - Dispõe sobre medidas gerais a serem implementadas pelo CBHSF e suas Câmaras Técnicas,na gestão 2005-2007 e dá outras providências.Deliberação Nº 22 - Dispõe sobre medidas a serem implementadas pelo CBHSF em relação ao Programa deRevitalização e dá outras providências.Deliberação Nº 23 - Dispõe sobre medidas a serem implementadas pelo CBHSF em relação ao descumprimento doPlano de Recursos Hídricos da bacia hidrográfica do rio São Francisco quanto às prioridades de uso e critérios deoutorga de direito pelo uso dos recursos hídricos e dá outras providências.Deliberação Nº 24 - Altera a composição da Câmara Técnica Institucional e Legal - CTIL, criada pela Deliberaçãon.º 02, de 11 de maio de 2003, e dá outras providências. (revogada)VIII Reunião Plenária – O fortalecimento dos Comitês de Bacias Hidrográficas e do Sistema Nacional deGerenciamento de Recursos Hídricos – SINGREH: atribuições e desafios do CBHSFRecife/PE, 08 e 09 de dezembro de 2005Deliberação Nº 25 - Altera a denominação da Câmara Técnica de Minorias para Câmara Técnica de ComunidadesTradicionais– CTCT e dá outras providencias.Deliberação Nº 26 - Dispõe sobre as atribuições, a estrutura e o funcionamento da Câmara Técnica Institucional eLegal – CTIL do CBHSF, revogando a Deliberação nº 24, de 17 de junho de 2005.Deliberação Nº 27 - Dispõe sobre as atribuições, a estrutura e o funcionamento da Câmara Técnica de Outorga eCobrança - CTOC do CBHSF.Deliberação Nº 28 - Dispõe sobre as atribuições, a estrutura e o funcionamento da Câmara Técnica de Planos,Programas e Projetos - CTPPP do CBHSF.IX e X Reuniões Plenárias – A sustentabilidade econômica e ambiental da bacia hidrográfica do rio SãoFranciscoAracaju/SE, 13 e 14 de julho de 2006Deliberação Nº 29 - Dispõe sobre a alteração no artigo 6º do Regimento Interno do CBHSF.Deliberação Nº 30 - Dispõe sobre mecanismos para criação de Agência de Água da bacia hidrográfica do rio SãoFrancisco.Deliberação Nº 31 - Dispõe sobre mecanismos para a implantação da cobrança pelo uso de recursos hídricos nabacia hidrográfica do rio São Francisco.

XI e XII Reuniões Plenárias - Belo Horizonte/BA – Fortalecimento Institucional do CBHSF: estudos paracriação da Agencia de Bacia do rio São Francisco06 e 07 de dezembro de 2006Não houve deliberação

XIII e XIV Reuniões Plenárias - Fortalecimento Institucional do CBHSF: estudos para criação da Agencia deBacia do rio São FranciscoSalvador/BA, 11 e 12 de abril de 2007Deliberação Nº 32 - Dispõe sobre a alteração do Regimento Interno do CBHSF e amplia o numero de vagas da suacomposição.

QUADRO DE DELIBERAÇÕES

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Monitoramento das Águas, do Cadastro dos Usuáriosde Recursos Hídricos e do Plano de Ação Estratégicopara a Fiscalização Ambiental Integrada nas quatroregiões fisiográficas da bacia do rio São Francisco.

Entre as principais ações integradas,destacam-se a implantação pioneira dos quatro“Centros de Referência de Recuperação Florestal doBrasil”, numa ação conjunta do MMA com a Codevasf,sendo que dois deles são para o Cerrado, numaparceria também com as Universidades Federais deLavras e de Brasília (UFLA e UNB). Os outros doissão para a Caatinga, com as Universidades Federaisde Sergipe e do Vale do São Francisco (UFSE eUNIVASF).

Na área de conservação do solo e da água,foram efetivados em 58municípios mineiros projetosdemonstrativos de recuperação emanejo de micro-bacias eimplementados os 15 “Viveiros deReferência”, numa parceria doMMA com a Codevasf, a Chesf, aEmater e o IEF de Minas Gerais.

Recentemente, foramelaborados os “Planos deDesenvolvimento do TurismoSustentável” para as regiões do rioSão Francisco, cuja iniciativa iránortear os futuros projetos nessa

área relacionados com a revitalização.Entre os projetos técnicos prioritários

implementados, por via de demanda induzida, foramefetivados editais específicos do Programa deRevitalização para resíduos sólidos, recuperação denascentes, fortalecimento de fundos ambientais, apoioàs comunidades tradicionais e pesquisassocioambientais na bacia, por intermédio do FNMA edo MCT/CNPQ.

Para reduzir o passivo ambiental tambémforam desenvolvidas ações integradas, como projetosde proteção de nascentes e de matas ciliares, orçadosem cerca de R$ 3 milhões, e de recuperação e degestão de conflitos em áreas degradadas pelamineração, com recursos que chegam a R$ 2,5milhões, nas regiões de Pains e dos rios Paraopeba eVelhas, em Minas Gerais, e do Araripe, emPernambuco.

Em parceria com a Codevasf, o Ministério doMeio Ambiente destinou, ainda, R$ 6 milhões paragestão de resíduos sólidos em vários municípios da

Em uma breve avaliação do Programa deRevitalização do Rio São Francisco, podemos afirmaro seu importantíssimo papel no processo dearticulação e de integração de esforços para arecuperação da bacia.

A necessidade de revitalização do rio SãoFrancisco foi acolhida pelo Governo Federal comouma prioridade, consubstanciada por meio de umprograma do Plano Plurianual - PPA/2004-2007.Visando a preservação, recuperação e conservaçãoda bacia do São Francisco, o programa tem comolema “conhecer para revitalizar”.

Assim, o programa de revitalização do VelhoChico foi construído e vem se consolidando com amplacolaboração de vários atores sociais e parceriasefetivas, em especial do Comitêda Bacia do Rio São Francisco,que possui reconhecidarepresentatividade política esocial e vem produzindo umconhecimento sistematizado emseu Plano de Bacia.

Só o governo federal jáinvestiu diretamente entre 2004e 2006 cerca de R$ 250 milhõesde reais em projetos derevitalização, principalmentepara recuperar a baciahidrográfica do rio SãoFrancisco. Em 2007, o Ministério do Meio Ambiente(MMA) dispõe de R$ 20 milhões para a revitalizaçãoe o Ministério da Integração Nacional (MIN) cerca deR$ 240 milhões.

Para o processo de revitalização da bacia dorio São Francisco o MMA definiu os principais projetosestruturantes, implementando com os principaisparceiros, iniciativas como a elaboração do Sistemade Informações do São Francisco (SISFRAN-SF) edo Macro Zoneamento Ecológico-Econômico do SãoFrancisco, a construção do Plano de DesenvolvimentoFlorestal e do Plano de Criação de Unidades deConservação, assim como iniciou a primeiraexpedição sobre a fauna e a elaboração do Plano deGestão dos Recursos Pesqueiros e do CensoEstrutural da Pesca.

Outras importantes medidas estruturantesforam a implantação do Sistema de MonitoramentoAmbiental do São Francisco (SISMAM-SF), aelaboração do Plano de Racionalização da Rede de

João Bosco Senra*

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REVITALIZAÇÃO AVANÇA NA BACIA DO SÃO FRANCISCO

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bacia. Para a área de saneamento ambiental foramdestinados a maior parte dos recursos da revitalização,com cerca de 30 projetos aprovados, destinados àimplantação de estações de tratamento de esgotos.

Estão em elaboração, ainda, novos projetosde saneamento básico para outros 21 municípios, emparceria com a Codevasf.

No que tange a mobilização e capacitaçãodos atores sociais e governamentais da bacia, estãosendo realizados cursos e oficinas, principalmente deeducação ambiental, de criação de Unidades deConservação e de elaboração de projetos derevitalização. Esses encontros envolveram, até omomento, mais de 1.500 lideranças da região.

Uma importante parceria a ser destacada, écom os Ministérios Públicos Estaduais, para aefetivação de projetos exitosos, voltadosprincipalmente para o fortalecimento institucional e omonitoramento ambiental da região, como os Projetos“S.O.S. São Francisco”, em Minas Gerais, e o de“Fiscalização Preventiva”, na Bahia.

Na região do semi-árido, o MMA e a Codevasf,em parcerias com o MDS e a ASA, implantaram 5 milcisternas e também recuperaram, em conjunto coma UFCG, 20 dessalinizadores na região Nordeste.

Além disso, estão sendo construídas“Agendas 21” por sub-bacias, como as das represasde Três Marias e de Xingó, visando fomentar odesenvolvimento sustentável na bacia do rio SãoFrancisco.

O desafio é grande, ainda há muito por fazerapós séculos de degradação mas, finalmente,chegamos a um consenso nacional de recuperarmoso Velho Chico com uma determinação clara nessesentido de todos os setores envolvidos no processo.

Apesar das dificuldades já enfrentadas e queiremos enfrentar, o programa agora situado naSecretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano(SRHU/MMA), ao lado do processo de elaboração daPolítica e do Sistema Nacional de Gerenciamento dosRecursos Hídricos (SINGREH), será, sem dúvida,cada vez mais aperfeiçoado.

Integrado ao Sistema, com o fundamentalapoio do Comitê da Bacia, temos pela frente o alentode dias melhores para as águas do São Chico.

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A necessidade de revitalização da bacia do SãoFrancisco, diante do seu grave quadro de degradaçãotalvez seja um dos poucos, quiçá o único, consenso entreo Governo Federal e a sociedade no meio das muitaspolêmicas em torno das suas questões hidro-ambientais.Mas, a definição do que deve ser esta revitalização ecomo deve ser conduzida, esbarra em visões conflitantes,muitas vezes contaminadas pela vinculação com oconflito em torno do projeto da transposição.

Quais mudanças se espera alcançar com arevitalização e quais as estratégias para chegar lá? Asprioridades e metas da revitalização devem ser definidaspelos Ministérios da Integração e do Meio Ambiente oudeveria ser definida no âmbito da bacia, com aparticipação efetiva do seu Comitê?

O resultado deste desencontro fica evidenciadoquando o governo anuncia amplamente através daimprensa que a revitalização está acontecendo, ao tempoem que a sociedade e o CBHSF não reconhecem queesteja em curso uma verdadeira REVITALIZAÇÃO, jáque o programa não tem resultados efetivos a apresentarapós 6 anos de existência e por não concordarem coma sua forma de condução.

Por outro lado, os recursos insistentementeanunciados a cada ano, dando a falsa impressão de quea bacia esta recebendo uma enxurrada de investimentos,sistematicamente não tem correspondido aoefetivamente aplicado e esta muito aquém do tamanhodo desafio que se tem pela frente.

Para complicar este quadro, a revitalização éentendida pelo Governo Federal como uma contra-partida da transposição e os seus recursos tem sidomuitas vezes utilizados para premiar os que apoiam atransposição ou diminuir a oposição à mesma, emdetrimento das reais necessidades da bacia. Isso decorreem parte do fato de que o mesmo empreendedor datransposição, o Ministério da Integração, é o mesmo quedetém a maior fatia dos recursos do programa derevitalização.

A revitalização para ser efetiva tem que ter porbase o conceito de bacia, com critérios claros paraaplicação dos recursos focados nos resultados finais enas prioridades regionais.

Necessário se faz uma mudança na gestão dochamado “Programa da Revitalização”, de forma queavance no sentido de proporcionar uma real participaçãodos entes da bacia, na definição das prioridades,estratégias, metas, indicadores e mecanismos deavaliação dos resultados do programa, alinhadas comas prioridades estabelecidas no Plano de RecursosHídricos da Bacia do São Francisco.

REVITALIZAÇÃO:A POSIÇÃO DO COMITÊ

(*) Engenheiro civil e sanitarista, Diretor de Recursos Hídricos da (SRHU/MMA) e co-presidente

da Rede Interamericana de Recursos Hídricos (RIRH)[email protected]

REVITALIZAÇÃO AVANÇA NA BACIA DO SÃO FRANCISCO

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Há mais de uma década a transposição daságuas do rio São Francisco para o semi-árido doNordeste Setentrional vem se configurando como omaior conflito de uso das águas da história do Brasil,envolvendo diretamente 10 unidades da Federaçãoentre doadores e receptores. Ao longo desse tempo,o tema transposição foi debatido em centenas deeventos e permanece ainda hoje na pauta de jornais,revistas, rádios e emissoras de TV de todo o país,inclusive do exterior, sendoproduzidas mais de 10.000noticias, artigos ereportagens, comargumentos contra e a favor.

O atual projeto detransposição nasceu comum grave defeito, nuncac o r r i g i d o , m a ssucessivamente ampliadopelos governantes: a idéiade que as necessidades ouinteresses dos Estados doNE Setentrional geram umlegitimo direito em decidirsobre a retirada de águas dorio São Francisco independe de qualquer dialogoprévio ou dos interesses ou condições da bacia“doadora” e do seu semi-árido. O mero esforço demarketing que resultou na mudança de nome para“integração de bacias” em nada mudou esta posturaequivocada na condução desta demanda.

O resultado foi que o declamado rio daintegração nacional acabou por se transformar no rioda discórdia nacional, no centro da intensa polêmicaem torno das prioridades de uso de suas águas e dacontrovérsia sobre o modelo de políticas públicas parao desenvolvimento sustentável do semi-áridobrasileiro.

A trajetória do Comitê da Bacia Hidrográficado Rio São Francisco - CBHSF vem sendo marcadapor este conflito desde as manifestações da sociedade

que culminaram na sua criação, em 05 de Junho de2001, através de Decreto Presidencial, coincidindocom a decisão de abortar o projeto de transposiçãodiante das fortes reações populares e políticas nabacia.

A retomada do projeto, elevado à categoriade prioridade absoluta desde o inicio do novo governo,frustrou a intenção inicial do Comitê em promover umamplo dialogo sobre as soluções para o semi-árido e

para a revitalização dabacia, sem estarcondicionado à priorizaçãoda transposição. A propostado CBHSF era evitar acontinuação do conflito, àpartir de uma mudança depostura do Governo Federalna condução destes temase que poderia culminar emum amplo pacto sobre osusos das águas do rio SãoFrancisco e do modelo ded e s e n v o l v i m e n t osustentável e inclusivo detodo o semi-árido. Estas

posições do CBHSF foram levadas ao GovernoFederal, logo após a posse da primeira diretoria doCBHSF e reafirmadas nas Declarações de Penedo(2003) e de Juazeiro (2004).

O CBHSF foi surpreendido, em todas astentativas de negociação, pela intransigência doGoverno Federal em só aceitar o dialogo mediante opressuposto de que envolveria a aceitação do iniciodas obras da transposição. Decidido a fazer usos desuas prerrogativas e do compromisso institucionalperante os atores da Bacia, o CBHSF tempermanecido firme em suas posições, emanadas deamplas consultas públicas e das decisões, por amplamaioria, do seu Plenário.

A agenda do conflito permanece e tende a seacirrar nos próximos anos, à medida que aumentar a

Luiz Carlos da Silveira Fontes*

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TRANSPOSIÇÃO:ÁGUA PARA TODOS OU ÁGUA PARA POUCOS?

ANATOMIA DA MAIOR FRAUDE HIDRICA E CONFLITO FEDERATIVO DE USO DA ÁGUA NO BRASIL

Entre falsas promessas e justificativas e a realidade, a transposição imposta ameaça o futuro da bacia.

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demanda social pelo uso da água em ambiente deescassez de recursos hídricos e a valorização da águacomo bem econômico. Um mega-empreendimento delonga maturação, necessariamente só deveria seriniciado com garantias de sustentabilidade, o queenvolve uma pactuação prévia entre doadores ereceptores, com benefícios mútuos.

A experiência internacional ensina quetransposições são empreendimentos complexos, queenvolvem inúmeras variáveis e que necessariamentedevem ser precedidas de etapas prévias antes deserem implementadas.

No caso de regiões semi-áridas, ondetransposições induzem aoaumento do consumo de águaonde é escassa e à fortedependência de uma fonteexterna, esta nunca deve ser oprimeiro passo, mas um dosúltimos de uma soluçãointegrada que assegure o amploacesso à água, principalmenteda população mais pobre e quesofre mais diretamente com aseca.

A análise a seguirdemonstra que o atual projetode transposição não cumpriunenhuma destas etapas e deixauma incomoda pergunta no ar:por que tanta pressa e tantoempenho para a sua realização a qualquer custo?

O DESAFIO DA VERDADE: QUAL A REALNATUREZA DA TRANSPOSIÇÃO?

Qual a verdadeira natureza e motivação doprojeto de transposição para o Nordeste Setentrional:água para todos do semi-árido, com foco na populaçãopobre que sofre com a seca, ou água para poucos,atendendo primordialmente os interesses dos grandesgrupos econômicos, latifundiários e políticos, ou seja,justamente os mesmos que historicamente vem sebeneficiando com a indústria da seca?

O desafio de responder a esta questão chegaa ser uma tarefa árdua, uma vez que este é um projetode muitas caras e as justificativas para a suanecessidade se modificam de acordo com o público ea ocasião. Há no mínimo duas versões: uma oficial(aquela que é revelada pelos documentos do próprioGoverno Federal) e outra para o grande público. Amaior dificuldade é a necessidade de dissecar aanatomia de ambas para possibilitar a discussão dasquestões subjacentes: sua real necessidade,oportunidade e beneficiários. Só depois de reveladaa verdadeira natureza do projeto é possível discutiros reais impactos sócio-economicos-ambientais nas

bacias doadora e receptoras.

O poderoso marketing do projetoimaginário

Não resta dúvida que o poderosomarketing de convencimento implementadopelo Governo Federal foi muito bemelaborado e é altamente eficiente. Criou umprojeto imaginário calcado na construçãode verdadeiros mitos, que, de tanto seremrepetidos na imprensa nacional, setransformaram em “verdades” para boaparte da população brasileira. Estabeleceuuma falsa premissa de que existe umadisputa entre um grupo bem intencionadoe solidário (os defensores da transposição)e os mesquinhos (os defensores do rio São

Francisco e por uma nova convivência com o semi-árido) e de que tudo não passa de uma disputaregional.

Este clima de polêmica, com leituras tãodistintas da mesma realidade e no qual a populaçãoem geral, fica sem saber com quem está a razão,favorece aos interesses do lobby da transposição. Éaí que entra a figura do Governo Federal, teoricamenteacima desta disputa regional, defensor de um projetohumanitário e de solidariedade e disposto a resolvero histórico problema da seca através da soluçãoproposta no reinado de D. Pedro II. Ressalte-se quenunca é levado em consideração que nesta época não

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Transposiçõesinduzem aoaumento deconsumo deágua onde é

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se tinha a menor idéia do que fosse gestão de recursoshídricos e de lá para cá se desenvolveu o maiorprograma de açudagem/estocagem de água domundo, concentrado nos Estados do Ceará e RioGrande do Norte. Mas é daí que se origina a“legitimidade” para conduzir o projeto “sob regime deexceção” como denunciou relato do TCU e ignorartodas as inúmeras críticas e ponderações contráriasao projeto.

IMPACTOS DE TRANSPOSIÇÕES NA GESTÃODAS ÁGUAS DA BACIA

Inicialmente aborda-se aqui a transposiçãosob a ótica dos impactos na bacia doadora. Com baseem uma síntese do texto do Plano de RecursosHídricos da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco- acrescida de contribuições e críticas do autor - nosaspectos diretamente relacionados à sustentabilidadeda gestão dos recursos hídricos da bacia, àincompatibilidade entre o atendimento aos seuslegítimos interesses e à imposição de umatransposição.

Quadro atual: usos múltiplos e conflitos

A bacia do rio São Francisco tem entre suasprincipais características a presença de múltiplasformas de uso dos recursos hídricos que competementre si e com as necessidades ecológicas.Apesar da disponibilidade hídrica total da baciaatender ao somatório dos diversos usos atuais, a suadistribuição é irregular entre as bacias afluentes e estáconcentrada na calha do rio São Francisco. Adegradação da qualidade da água em vários riosafluentes e o predomínio de um tipo de uso (geraçãode energia elétrica, por exemplo) sobre outros,contribui para o estabelecimento de conflitos em váriasregiões da bacia e ao longo do rio São Francisco.

Por outro lado, os usos atuais provocam ouconvivem com um quadro de degradação ambiental,em que se verifica a diminuição da biodiversidade ea alteração dos ecossistemas aquáticos decorrentesda deficiência dos serviços de saneamento, da

Utilizando-se de frases simples e de grande efeito(“não se pode negar um copo d’água a quem tem sede”,etc.) e principalmente fazendo uso do imaginário dapopulação brasileira (região sem água, etc.), a estratégiatem como pilares o apelo ao espírito de solidariedade, aminimização dos impactos sobre a bacia doadora (“sóvai retirar 1%”, “só quando Sobradinho estiver vertendo”,“vai aproveitar a água que é perdida para o mar”) e aapresentação da transposição como a única solução parao semi-árido e para o combate à seca.

A estratégia inclui ainda a apropriação de benefícios(“acabar com a cena dos carros-pipas e latas d’água nacabeça”, etc.) cujos custos não estão incorporados aos6,6 bilhões de reais previstos para execução das obras.

De forma perversa, reduz o semi-árido brasileiroapenas à sua metade setentrional, escondendo dapopulação brasileira, que quase metade deste semi-áridoestá na própria bacia do rio São Francisco. Muitas dascenas utilizadas na televisão para mostrar o drama daseca e sensibilizar para a urgência da transposição,foram gravadas à pequena distância do rio São Francisco

Esta estratégia gera uma grande vantagem para opoderoso lobby da transposição: reduz um temacomplexo a afirmativas simplórias, sem a necessidadede comprová-las e transfere o ônus da prova para oscontrários a sua implantação. E, principalmente, mantémlonge do debate as graves questões de má aplicaçãodos recursos públicos, de sustentabilidade e viabilidadeeconômica do mega-empreendimento.

No sentido inverso, um dos objetivos destamanipulação é a desqualificação dos argumentos dosopositores do projeto, que passaram a ser apresentadosà nação com “egoístas” que chegam ao ponto de negarum copo d’água a quem tem sede ou ainda comodefensores de interesses escusos ou partidários. Comesta estratégia evita-se também trazer à pauta dasdiscussões as questões relativas à sustentabilidade einteresses sócio-econômicos da bacia do rio SãoFrancisco e as necessárias compensações de umatransposição.

Da mesma forma, a população dos Estados doCeará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambucotambém vem sendo iludida. É intenso o bombardeio dediscursos e folhetos com a promessa de que atransposição transformará a vida de todos e que osproblemas da miséria, da saúde e da dificuldade deacesso a água serão solucionados com a transposição.Sob este manto, inúmeros políticos aproveitam paraatingir seus próprios interesses eleitorais.

AS ESTRATÉGIAS DO MARKETING DATRANSPOSIÇÃO

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construção de grandes barragens e das atividadesindustriais, minerais e agrícolas na bacia.

Alocação de água

À medida que cresce a demanda por recursoshídricos para atividades econômicas e estes setornarem mais escassos, a tendência será osurgimento de disputas entre os Estados quecompõem a bacia. Isso representa um grande desafioe exige uma análise do conjunto para que se possaplanejar adequadamente sua gestão e evitar conflitospelo uso da água. Uma das formas de se promoveruma justa distribuição e evitar conflitos federativos épactuar a alocação espacial da vazão outorgável parauso consuntivo, garantindo antecipadamente a “cota”que cada unidade federativa da bacia terá direito àretirar do rio São Francisco e de seus afluentes.

A definição de alocação de água em grandesbacias no Brasil constitui-se em uma tarefa complexa,mas um passo importante nestesentido foi dado com a aprovação em2004 do Plano de Recursos Hídricosda bacia do rio São Francisco.

O primeiro grande desafioalcançado na construção do Plano daBacia foi a definição da vazãomáxima que pode ser retirada do riopara os chamados usos consuntivos(chamada de vazão alocável). Estadefinição pressupõe a determinaçãode quanto da vazão deve permanecerno rio para atendimento aos usos nãoconsuntivos e às necessidadesambientais.

A fixação de um valormáximo de retirada, por sua vez,implica em auto-limitações de uso e dedesenvolvimento econômico para todas as unidadesfederativas envolvidas, mas visa atingir um objetivomaior: manter a sustentabilidade do rio e a conciliaçãoentre usos consuntivos e não consuntivos. Por exigiruma ampla negociação entre todos os atoresenvolvidos e entre e as unidades da federação que

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compõem a bacia, trata-se, na realidade, da primeiraetapa do Pacto de Gestão das Águas da Bacia.

O passo seguinte a ser alcançado em umanova edição do Plano, isto é, a fixação dos valores deentrega dos afluentes do rio São Francisco e adistribuição espacial da vazão alocável entre osEstados da Bacia, foi atropelado pela imposição daalocação antecipada de 67 m3/s (vazão média) paraEstados de outras bacias.

Definição das vazões

A disponibilidade hídrica total da bacia do rioSão Francisco foi calculada em 1.849 m3/s,correspondendo à vazão máxima que pode chegar àsua foz, após a regularização por parte das grandesbarragens. Parte desta vazão deve ser mantida nosrios para suprir usos não consuntivos e requisitosambientais - são as chamadas vazões remanescentes.A diferença entre elas é a vazão que pode ser retirada

do rio para os usos consuntivos,conhecida como vazão alocável.

O estabelecimento destelimite de retirada é uma forma degarantir a manutenção dosecossistemas fluviais e litorâneosassociados, a dinâmica ambiental nafoz e a compatibilização com os usosnão consuntivos, entre eles ocompromisso de geração de energiaelétrica para o nordeste, a pesca e anavegação.

Assim, foi estabelecido comovazão remanescente na foz do rio SãoFrancisco, a média anual de 1.500 m3/s, valor que também abre apossibilidade de se viabilizar a pratica

de um regime sazonal de vazões e não apenas umregime regularizado durante quase todos os anos. Oretorno de uma flutuação anual das vazões, à partirda produção de cheias artificiais, atenderia a umaantiga reivindicação da região visando mitigar osimpactos causados pelas grandes barragens nabiodiversidade e no equilíbrio da dinâmica ambiental.

A analise doscenários revelouque em 2035 avazão alocável

estará esgotada,não haverá águadisponível para

novosempreendimentos

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Esta vazão remanescente também significaque 80% das águas do Rio São Francisco (1.500 m3/s) ficarão reservadas para a geração de energiaelétrica, já que a água que chega cotidianamente àfoz é a mesma que passa antes pelas turbinas dasusinas hidrelétricas. De forma depreciativa, oMinistério da Integração se refere a esta vazão como“água perdida” ou “despejada” no mar, argumentandoque pretende transpor a água que hoje é“desperdiçada” para o mar. Mas é ela que tempermitido a geração de energia no submédio e baixoSão Francisco e a sua “transposição” tem possibilitadoo desenvolvimento econômico para a Nordeste,garantindo ainda hoje cerca de 90% das demandasda região.

Com base na diferença entre vazõesremanescentes e disponibilidade hídrica total, oComitê aprovou a adoção do valor de 360 m3/s comovazão máxima alocável na Bacia.

Uma vez definida a vazão alocável - eincorporada ao Plano de Recursos Hídricos da Bacia- esta passou a ser o limite para o somatório dosconsumos efetivos das outorgas concedidas no âmbitoda bacia, de acordo com a Resolução Nº 17/2001 doCNRH.

Desta forma, para se conhecer em termosrelativos quanto da água do rio São Francisco sepretende transpor, tem que se utilizar como referência360 m3/s (a disponibilidade para retirada de água nabacia). Não faz nenhum sentido a comparação entrea vazão a ser transposta e a vazão histórica/média delongo prazo (2.850 m3/s).

Mas, no esforço de marketing para convencera população brasileira que só pretende retirar umaquantidade insignificante de água, o governo federaldivulga insistentemente que só pretende retirar 2 %(calculo pela vazão média a ser transposta) ou 1%(pela vazão contínua) da vazão natural do rio SãoFrancisco. O real impacto só é revelado quando secompara com a vazão total alocável (18%considerando a vazão média da transposição) ou deforma mais evidente, com o saldo ainda existentedesta vazão ou com as projeções de demandasfuturas, conforme veremos a seguir.

Transposição vs. atendimento às demandasfuturas

Um aspecto relevante para se verificar oimpacto da transposição sobre os usos internos dabacia é considerar as projeções de demandas deconsumo nos diversos cenários de desenvolvimentofuturo.

A analise dos cenários revelou que já em 2035a vazão alocável estará esgotada, isto é não haveráágua disponível para atender novos empreendimentosnas áreas irrigáveis potencias da bacia, sem criaçãode novos e intensos conflitos.

Se nessa projeção for incluído o projeto detransposição para o Nordeste Setentrional, este quadrodeverá se verificar já em 2030. Em outras palavras,em 2030 a bacia do rio São Francisco possivelmenteestará mergulhada em um grave quadro de conflitos.

Em resposta a requerimento apresentado pordiversas entidades da sociedade civil, o Plenário doCBHSF, considerou que o projeto de transposiçãoinstituiu um quadro de conflito de usos na bacia, edeterminou em 2004 a abertura de um processoadministrativo, que conforme prevê a Lei 9.433, deveser julgado pelo Comitê em primeira instância na buscada solução do conflito.

Outorga para transposição extrapola limitealocável

Analisando-se o impacto da transposiçãosobre os consumos outorgados, verifica-se que atingiu-se o teto da vazão alocável.

Os consumos referentes às outorgas jáemitidas na bacia até 2003, com base nas vazõesmáximas de captação, totalizavam 582 m³/s nos riosperenes da bacia, que, traduzidos em consumooutorgado, foram estimados em 335 m³/s (dados de2003).

Ressalte-se que o total dos consumosoutorgados (335 m3/s) corresponde a 93% da vazãoalocável total, ou seja, considerando-se as outorgasjá concedidas tem-se um saldo de apenas 25 m3/spara o atendimento de novas outorgas.

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Com a concessão da outorga para o projetode transposição, que prevê uma retirada média de 67m3/s (e 26 m3/s de vazão mínima contínua) esgotou-se a vazão disponível para novos empreendimentosna bacia. E pior, extrapolou-se o limite estabelecidono Plano da Bacia, em flagrante violação da legislaçãode recursos hídricos.

Por entender que a outorga da transposiçãoameaça a segurança hídrica da bacia e torna irregularqualquer nova outorga concedida no âmbito da bacia,o Plenário do CBHSF decidiu em 2005 peloencaminhamento de uma representação ao MPFsolicitando providências junto ao judiciário.

Transposição vs. consumo eoutorgas atuais

Os estudos técnicos de apoioao Plano, elaborados pela ANA,demonstram que da vazão totaloutorgada efetivamente estão sendoconsumidos apenas 90,9 m3/s (dadosde 2003), ou seja, 25% da vazãoalocável.

Este fato tem sido utilizadocomo argumento de que sobra águapara atender a transposição sem afetaras necessidades da bacia.

A transposição significaráretirar entre 25% (na média) e 47%(no máximo) do saldo atual da vazãoalocável (269 m3/s), o que por si só demonstra que oimpacto não é mínimo (1%), como divulgadoinsistentemente pelo Governo Federal.

O saldo existente, apesar de ainda nãoutilizado, já foi outorgado. Analisando a questão sobo ângulo legal, verifica-se que as outorgas concedidasrepresentam direitos assegurados até o presentemomento. Portanto, os consumos outorgados e aindanão utilizados estão comprometidos legalmente e nãopodem ser considerados como disponíveis para novasoutorgas. Agir assim é como vender o mesmo terrenosucessivas vezes, enquanto o mesmo não é ocupado.A reserva de água para um novo grande projeto, comoo da transposição para o Nordeste Setentrional, fere

frontalmente os direitos dos usuários e os interessesdos Estados da bacia.

A defasagem existente entre as outorgasconcedidas e valor de consumo efetivo, pode seratribuída, principalmente, à demanda reprimida devidoàs dificuldades para a implantação ou conclusão dosprojetos existentes por falta dos investimentos públicosnecessários. Estima-se que cerca de 180 hectares deperímetros irrigados estão paralisados ou com obrasinacabadas na bacia, a maior parte deles situados nosemi-árido. Uma política de aplicação de recursospúblicos que priorizasse os investimentos em irrigaçãona bacia, certamente, levaria à utilização de grandeparte das outorgas concedidas, diminuindo

drasticamente a diferença entre ooutorgado e o efetivamenteconsumido.

Seria de se esperar que omesmo governo que decide priorizare realizar vultosos investimentos nodesenvolvimento econômico dametade setentrional do semi-áridocom base no aporte de águas do rioSão Francisco, oferecesse com amesma determinação um plano dedesenvolvimento para a metademeridional do semi-árido, ou seja, abacia do rio São Francisco.

Ao priorizar a transposiçãocom intuito de promover a irrigaçãode 200 mil hectares no semi-árido e

no litoral dos Estados do Nordeste Setentrional, ogoverno federal claramente subverte a ordem lógicade aplicação dos recursos públicos.

A DECISÃO DO COMITÊ DA BACIA SOBREUSOS EXTERNOS

A legislação brasileira de recursos hídricosestabelece que a definição das prioridades de usosdas águas de uma bacia Hidrográfica deve ser definidanos seus Planos de Recursos Hídricos e que todaconcessão de outorga estará condicionada a estasprioridades, o que inclui também aquelas destinadasaos usos externos à bacia.

Transposições sãoadmitidas apenas

para consumohumano e

dessedentaçãoanimal, em situações

de escassezcomprovada.

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As análises precedentes subsidiaram asdecisões do Comitê sobre as prioridades de usos e,especificamente, sobre as demandas detransposições, podendo ser assim sintetizadas:

• A disponibilidade de água alocável na Bacianão é suficiente para atender toda a demandarepresentada pelas terras potencialmente irrigáveis nabacia, situadas à pequena distância e altura das fontesde água. O aproveitamento deste potencial dependebasicamente da decisão do Poder Público empromover um amplo programa de investimentos.Estima-se que a vazão alocável possibilita a irrigaçãode apenas 1/3 deste potencial (pouco mais de1 milhãode hectares). Isto significa dizer que cerca de 2 milhõesde hectares não poderão ser irrigados, o querepresenta uma limitação ao desenvolvimentoeconômico da bacia em prol da conciliação entre usosconsuntivos e não consuntivos.

• Desta forma, a transposição para o NordesteSetentrional não estará se utilizando de “sobras” deágua, mas competirá com os usos internos, com oagravante de limitar as possibilidades de crescimentoeconômico da bacia baseado na água como insumoprodutivo, pois antecipará a previsão de esgotamentoda vazão alocável já para 2030.

• Legalmente a bacia só dispõe de pequenafolga de 25 m³/s do valor outorgável para atender todosos novos projetos (de acordo com levantamentorealizado no ano de 2003). Desta forma, este saldodeve ser aplicado prioritariamente em projetos internosà bacia, sendo obviamente desaconselhável aaprovação de um grande projeto de transposição quevenha a utilizar a totalidade deste saldo.

Diante dessas considerações, o CBHSF emreunião realizada em 27 de outubro de 2004, decidiuque a prioridade da utilização das águas da baciahidrográfica do Rio São Francisco são os usos internos.Transposições são admitidas apenas para consumohumano e dessedentação animal, em situações deescassez comprovada. A utilização das águas comoinsumo produtivo ficou restrita, exclusivamente, aosusos internos à bacia.

O Plano ainda especifica que a definição dosvalores a serem outorgados para transposições deverátomar por base as reais necessidades hídricas das

APÓS DECISÃO DO COMITÊ,GOVERNO DECIDE PELA IMPOSIÇÃO

Conforme demonstrado, o projeto detransposição, particularmente o seu Eixo Norte, nãoatende às prioridades de uso definidas no Planoda Bacia. De acordo com a Lei 9.433 e Lei 9.984este fato deveria significar o impedimento àconcessão da outorga para o projeto. Estas leisestabelecem que toda outorga está condicionadaàs prioridades estabelecidas nos Planos de Bacia.

O Governo Federal, entretanto, decidiu porações de imposição do Projeto de Transposição,mesmo que à custa do atropelo institucional e dalei, ao ignorar as competências legais do CBHSF,concedendo a outorga e a licença ambiental.

O enfraquecimento institucional do Comitêé um retrocesso na implantação do sistemaparticipativo e descentralizado de gestão dosrecursos hídricos definido na Lei 9.433, e,infelizmente, contou com o beneplácito daquelesa quem cabe zelar pela correta aplicação da lei, oCNRH e do Ministério do Meio Ambiente. OConselho Nacional de Recursos Hídricos, sequerconsiderou a existência do Plano de RecursosHídricos da Bacia, ao aprovar o “aproveitamentohídrico” para o projeto de transposição.

A determinação do Governo Federal emdecidir unilateralmente sobre o uso das águas dorio São Francisco colocou em xeque o novo modelode gerenciamento participativo e descentralizadode recursos hídricos preconizado pela Lei 9.433que tem a Bacia como unidade de planejamento.

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bacias hidrográficas receptoras, descontando-se osvalores de vazão já utilizados para a finalidade deconsumo humano e dessedentação animal e a claracomprovação de indisponibilidade hídrica regionalpara atendimento da demanda apresentada.

TRANSPOSIÇÃO NÃO É PARA O CONSUMOHUMANO

O atual projeto de transposição para oNordeste Setentrional não atende às exigências doPlano da Bacia, uma vez que destina a maior partedas águas do Eixo Norte para uso econômico nairrigação, em especial para fruticultura irrigada deexportação e criação de camarões no litoral do Cearáe Rio Grande do Norte.

Uma parcela secundária da vazão a sertransposta (26 m3/s) será apenas nominalmentedestinada ao consumo humano e dessedentaçãoanimal. Mas facilmente se verifica que trata-se deum valor propositadamente superdimensionado parajustificar o empreendimento perante a sociedadebrasileira.

Na realidade esta vazão corresponde àdemanda total da região em 2025, segundo consta dopróprio projeto. A manipulação fica evidente ao nãose descontar os estoques já existentes na região parasó então calcular a real necessidade de aporte de águapara este uso. É como se a região não dispusesse denenhum estoque de água para consumo da populaçãoe como fosse possível abandonar as fontes locais (emais baratas) em troca da água importada de centenasde quilômetros de distância e a um custo muito maiselevado. Pressupõe, enfim, transferir toda aresponsabilidade pelo abastecimento da população àtransposição e, assim, liberar os estoques locais parausos econômicos.

O engodo dos 12 milhões de beneficiados

Um caso emblemático demonstra que onúmero de beneficiados com a transposição é bemmenor que os 12 milhões que são insistentementeanunciados pelo Governo e divulgados quasediariamente nos jornais do país.

Nesta conta, que utiliza a projeção dapopulação na região em 2025, estão incluídos cercade 5 milhões de pessoas da região metropolitana deFortaleza e do porto de Pecem. Documentos doGoverno do Estado do Ceará e do Banco Mundialafirmam categoricamente que o Açude do Castanhãofornecerá 22 m3/s para esta região, através do Canalda Integração, garantindo água para todos os usos,inclusive irrigação, por, pelo menos, 30 anos.Investigação conduzida pelo TCU também concluiuque os possíveis beneficiados são apenas uma fraçãodos alegados 12 milhões.

OUTORGA: ARTIFICIOS DA GARANTIA DE 100%E A PROIBIÇÃO DO USO DA ÁGUA

SUBTERRÂNEA

Mesmo diante destes fatos, foi com base naalegação de que era imprescindível importar 26 m3/spara assegurar o abastecimento humano até 2025 quefoi solicitada e concedida a outorga para umempreendimento que possibilita transferir até quatrovezes mais, ou seja 114 m3/s (média de 67 m3/s).

Para se fabricar este falso déficit foi necessáriorecorrer a outros artifícios, além dos já citados: asdisponibilidades hídricas foram diminuídas ao seremcalculadas com 100% de garantia (enquanto para abacia do rio São Francisco utiliza-se 95%) e a águasubterrânea foi sumariamente retirada dos cálculos.Como? Os governos estaduais do CE, RN, PB e PEforam instados a assinar documentos no qualpassavam a considerar as águas subterrâneas comoreservas estratégicas que só poderiam ser utilizadasapós esgotadas todas as disponibilidades superficiaise, portanto, assumiam o compromisso de proibir o seuuso, em uma região em que é amplamente utilizada.

Estoques no Eixo Norte são suficientes para 30anos

Documentos oficias dos Governos Estaduaisdo CE e RN e do Banco Mundial também demonstramclaramente que no Eixo Norte os estoques de águaexistentes são suficientes para atender as demandasde água para consumo humano e dessedentação

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animal nos próximos 30 anos e para todos os demaisusos nos próximos 15 anos.

No eixo Leste, reconhece-se a existência dedéficit hídrico para abastecimento humano que poderiaser perfeitamente atendido com a construção deadutoras partindo do rio São Francisco, promovendouma distribuição espacial mais efetiva da água e comum menor custo, a exemplo da solução adotada noEstado de Sergipe.

TRANSPOSIÇÃO É SOCIALMENTE INJUSTA EATENDE MENOS DE 5% DO SEMI-ÁRIDO

Em termos de justiça social pode-se assegurarque o projeto não se destina a atender as populaçõesrurais dispersas, aquelas que realmente sofrem como drama da seca. Para estas, o projeto oferece, nomáximo, a instalação chafarizes ao longo dos canais.Significa dizer que as cenas das latas d’água nacabeça e dos carros-pipa vão continuar.

Menos de 4% (2,5 m3/s) da vazão média doscanais da transposição serão destinados ao uso aolongo das margens dos canais de acordo comdocumento enviado pelo MI à Agência Nacional deÁguas. Significa dizer que esta é a quantidade queserá efetivamente destinada ao uso da população ruraldo semi-árido e demonstra que o real destino daságuas são os açudes próximos ao litoral.

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Apesar de ser apresentado como uma soluçãopara todo o semi-árido, os canais da transposição sóatenderão uma pequena faixa de terra ao longo desuas margens – menos de 5% da área total do semi-árido - não se traduzindo em uma solução regional.

Enquanto isso, soluções de convivência coma seca, que efetivamente atendem à populaçãodispersa, como a construção de um milhão decisternas, avançam timidamente, faltando mais de90% para atingir tal meta.

O rio São Francisco é a maior prova de quetransposição não assegura acesso à água

Uma analise da realidade de acesso à águana bacia do rio São Francisco, resulta na constataçãoque a transposição é socialmente injusta também emrelação à população que vive no semi-árido da baciado rio São Francisco, à qual pouco tem sido oferecido,apesar de sofrer os mesmos problemas do semi-áridosetentrional.

É notório que a maior parte da população dabacia não faz uso das águas do rio São Franciscopara atender suas necessidades. Desde os que vivemhá poucas centenas de metros até aqueles maisafastados do rio, a grande maioria sofre os mesmosproblemas de acesso a água enfrentados no nordestesetentrional. Fazem uso de açudes, cacimbas, poçose cisternas. São comuns as cenas de mulheres

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A TRANSPOSIÇÃO NÃO É NECESSÁRIA:A RAIZ DO PROBLEMA É A DISTRIBUIÇÃO

O CBHSF solicitou por diversas vezes à ANA-AgênciaNacional de Águas a apresentação do balanço hídrico regional paraque fosse possível constatar qual o real nível de escassez paraatendimento às demandas de consumo humano e dessedentaçãoanimal. Este balanço, apesar de oficialmente prometido pelo entãopresidente da ANA, não foi providenciado durante o processo deanalise da outorga e emissão do Certificado de Avaliação deSustentabilidade de Obras Hídricas - CERTOH.

A outorga para a transposição foi concedida apenas combase nos dados fornecidos pelo empreendedor (no caso, o MI). Sóposteriormente a ANA procedeu a um amplo levantamento dasituação do abastecimento das cidades do Semi-Árido, cujosresultados constam do Atlas Nordeste - Abastecimento Urbano deÁgua (2006).

O Atlas contém as obras prioritárias para o abastecimentohumano e confirmou o que já afirmavam os estudos do BancoMundial e da SBPC: as reservas regionais de água nos Estados doCeará e Rio Grande do Norte são suficientes, pelo menos, até 2030e que a raiz do problema da falta de água que é sentida pelapopulação está na distribuição e gestão eficiente da água estocada.São inúmeras as denúncias de populações que vivem próximasaos grandes açudes plurianuais e mesmo assim não recebem águaem casa. No entanto, o Brasil é levado a acreditar que a transposição(cujo destino são estes mesmos açudes) resolverá este drama.

O traçado do Eixo Norte no Ceará não cruza nenhumadas áreas identificadas como criticas em relação ao abastecimentohumano em 2025, muito ao contrario, passa distante destas ebeneficia exatamente a bacia de maior potencial hídrico do Ceará,a bacia do rio Jaguaribe. Este fato é prova evidente dos reaisobjetivos desta obra.

O Atlas mostra um fato grave: a maior parte das áreascriticas para abastecimento urbano encontram-se justamente nabacia do rio São Francisco. Para estas não existe nenhum grandeprograma governamental. Como justificar a priorização do Eixo Nortediante desta constatação?

carregando latas d’água na cabeça e a dependênciade carros-pipas nos municípios ribeirinhos.

Só recentemente o Ministério da IntegraçãoNacional reconheceu que esta é uma demanda justa,mas isso em nada modificou a determinação dogoverno federal em priorizar a transposição para levarágua por centenas de quilômetros para usoscomerciais em detrimento dos que vêem o rio tãopróximo, sofrem com a seca e não bebem de suaságuas. O MI acenou com um projeto de distribuiçãode água, denominado de Água para Todos,apresentado justa contrapartida à transposição, masque está muito aquém das necessidades dapopulação da bacia. O projeto prevê atender até 7km em cada margem do rio, o que representa cercade 1% da distância prevista para o destino final daságuas no eixo Norte.

Além disso, os recursos previstos para 2007se referem basicamente à perfuração de poços.Assim, os ribeirinhos continuarão sem ter acesso àságuas do rio São Francisco, demonstrado claramenteo tratamento secundário que tem merecido asnecessidades da população da bacia frente aointeresse maior na transposição. Esta será uma dasconseqüências mais perversas da transposição:concentrará os recursos destinados à região,estabelecendo um clima de disputa com verbas quepoderiam ser destinadas às pequenas obras (as queefetivamente atendem de forma ampla à populaçãopobre e rural), transferindo para o futuro a “divisãodo bolo” ou seja, dos estoques de água existentes.

Pobreza na bacia do RSF: a transposição é paradiminuir as desigualdades regionais?

Um dos argumentos utilizados é de que atransposição promoverá o equilíbrio dasdesigualdades regionais. Entretanto este desequilíbrioexiste entre a região semi-arida (metade da qual estána bacia do rio São Francisco) e o sul e sudeste dopaís. Mas não entre a metade setentrional e a metademeridional do semi-árido.

O semi-árido da bacia do rio São Franciscoé caracterizado por possuir poucas ilhas dedesenvolvimento econômico - e que são alardeadas

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na mídia nacional como representativas da situaçãogeral da bacia - cercadas por um oceano de miséria ebaixo índice de desenvolvimento.

Em 2003, cerca de 21% dos quase 17 milhõesde habitantes da bacia (3,7 milhões de pessoas) eramconsideradas pobres de acordo com os padrõesbrasileiros, vivendo com até menos de 1/3 do saláriomínimo. Em alguns municípios registram-se taxas depobreza rural muito acima de 50%.

Ressalte-se que, enquanto 11% dos cempiores IDHs do País encontram-se na bacia do rio SãoFrancisco, inclusive o 4º pior IDH (Traipu, em Alagoas).

Em franco contraste com este quadro,nenhum município a ser cortado pelos canais do EixoNorte da transposição se inclui nesta lista. Para piorar,no destino final das águas transpostas, o litoral do CEe RN, concentram-se os maiores IDHs desta região.

Assim, o projeto de transposição para o NESetentrional não pode ser considerado um projeto deintegração de bacias o qual pressupõe a existênciabenefícios mútuos entre elas. Apenas os receptoressão beneficiados e, a rigor, constitui-se em umprograma de transferência de emprego e renda.

A verdade é que o governo federal estádecidido a retirar água de uma região semi-árida, depopulação em geral pobre e ainda insuficientementeatendida em termos de acesso à água, para levá-la aoutra região semi-árida, para atender interesseseconômicos de grandes grupos econômicos e políticosda região.

TRANSPOSIÇÃO PARA O CEARÁ: UMARESERVA HÍDRICA PARA O FUTURO

Apesar de todas as considerações acima emesmo que em prejuízo dos interesses da bacia, autilização das águas do rio São Francisco em outrasbacias poderia se justificar, se atendesse aos requisitosde necessidade, urgência, oportunidade e justiçasocial.

Todavia, quando se analisa especificamenteo Eixo Norte do Projeto de Transposição, constata-seque este pouco contribui para a solução dos problemasdo semi-árido e para a redução da pobreza.

CEARA E RIO GRANDE DO NORTE:OS MAIORES BENEFICIADOS DO MAIOR

PROGRAMA DE AÇUDAGEM DO MUNDO EMREGIÕES SEMI-ÁRIDAS

Mapa dos espelhos d’água: a maior concentração deaçudes do semi-árido está no Ceará e RN.

O traçado do Eixo Norte coincide com a região de maiordisponibilidade hídrica do Ceará, a bacia do rio Jaguaribe(ver mapa abaixo), passando longe das regiões maiscarentes em água. Esta realidade demonstra claramenteque o motivador da transposição para este Estado não éa escassez, mas a geração de superavit hídrico para usoem novos empreendimentos agrícolas e para a refinariano Porto de Pecem.

Bacia do Rio Jaguaribe e canaisTrabalhador e Integração

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Pelo contrário, um dos maiores motivadoresda transposição vai além dos ganhos imediatos. Aestratégia subjacente é dotar o Ceará, Estado quepossui uma maior consciência do valor econômico daágua, de uma reserva hídrica para o futuro quandopassará, inclusive, a competir com os produtosagrícolas de exportação gerados na bacia do rio SãoFrancisco, devido à maior proximidade dos portos eda Europa.

Em 2030, o Ceará contará com um superávithídrico, correspondente à sua parte na vazão do EixoNorte, enquanto na bacia do rio São Francisco já seterá atingido o limite de consumo da vazão alocável.

TRANSPOSIÇÕES IMPOSTAS AMEAÇAM OFUTURO SUSTENTÁVEL DA BACIA DO RIO SÃO

FRANCISCO

Quando a sociedade de uma baciahidrográfica abre mão de vazões que hoje sãoaparentemente superavitárias, para que seja utilizadaem outras bacias, representa se privar de potenciaispara o seu desenvolvimento econômico futuro e porisso esta decisão só deve ser tomada após a maisprofunda avaliação. Além disso, a retirada de vazõespara usos externos, se mal conduzida, poderepresentar o comprometimento de soluções para acompatibilização entre os conflitos de interesses entreos diversos segmentos usuários, Unidades daFederação e a proteção da biodiversidade,comprometendo a sustentabilidade hidroambiental dabacia. Não raro, conduz a um acirramento de conflitosdentro da bacia doadora.

Desta forma, a análise das questõesenvolvidas nas demandas por retiradas de água paraterritórios externos à bacia deve ser considerada umaquestão que diz respeito a toda à bacia e não apenasao ponto em que ocorre a captação. Além de possíveisimpactos ambientais, o valor captado pode afetar asbases de negociação e o equilíbrio que se busca noplanejamento da alocação espacial da água. Aalocação de água tem por objetivo principal a garantiade fornecimento de água aos atuais e futuros usuáriosde recursos hídricos.

Nenhuma destas relevantes questões foilevada em consideração pelo IBAMA ao conceder aslicenças ambientais, pelo CNRH ao autorizar o“aproveitamento hídrico” da transposição e pela ANAao conceder a outorga, o que motivouquestionamentos jurídicos, que atualmente aguardamjulgamento no STF, entre eles, o do Governo do Estadode Minas Gerais.

Como o valor alocável global 360 m3/s aindanão passou por um processo de repartição entre osEstados da bacia do rio São Francisco, qualquerretirada afeta todos eles, vez que diminui o valor queserá utilizado no processo de negociação da alocaçãoespacial. A retirada média de 67 m3/s para atransposição significará:

·• uma redução média de 18% na cota de cadaEstado

·• duas vezes o que Minas Gerais teria direitoa retirar do rio São Francisco (de acordo com propostade alocação espacial elaborada pela ANA nos estudosdo Plano de Bacia).

Este quadro significará acrescentar enormedificuldade ao já difícil desafio de se obter a pactuaçãoem torno da alocação espacial.

Em grandes rios do mundo onde tal pactuaçãonão foi atingida, os resultados foram desastrosos paraa região do baixo curso e da foz. No caso do rio SãoFrancisco que fornece cerca de 90% da energiaelétrica utilizada pelo Nordeste, o que também estáem jogo é a segurança energética da região.

Infelizmente, o governo se recusa a discutirqualquer uma destas graves questões, decorrentesda sua decisão de impor a transposição edesconsiderar a necessidade de qualquer transposiçãopara uso econômico ser precedida de ampla pactuaçãoem torno da alocação espacial e da gestão das águasda bacia.

O futuro da bacia depende do Pacto de Gestão

O futuro do rio São Francisco depende de umgrande pacto em torno da gestão de suas águas queassegure a conciliação entre os diversos usos, oatendimento à sua população e os comprometimentosambientais.

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No mundo inteiro não faltam exemploscatastróficos do resultado da visão extrativista e dafalta de um planejamento integrado e pactuado. Osresultados podem ser vistos em importantes rios comoo Amarelo (China), e Colorado (EUA/México) que emmuitos meses do ano não chegam mais à sua foz.

Neste quadro, o pior cenário que se podevislumbrar para o rio São Francisco será a falta deentendimento entre os diversos Estados da bacia emdecorrência da imposição dos interesses externos aosinteresses internos. As conseqüências podem sergraves diante de uma peculiaridade na formação dassuas vazões naturais: 93,9% provêm dos afluentes,a maioria de domínio dos governos estaduais. Cercade 80% das vazões são originadas em Minas Gerais.E ainda não chegamos a um acordo sobre as vazões

de entrega destes afluentes (que por sua vez implicadefinir a limitação à retirada de água em cada baciaafluente) o que significa incertezas quanto àmanutenção das vazões do rio São Francisco.

Aqui reside, talvez, a maior das ameaçaspotenciais do projeto de transposição para o NordesteSetentrional em relação à bacia doadora: ao escolhera imposição em lugar da negociação, o GovernoFederal, esta promovendo o conflito federativo econtribuindo para desconstrução do ainda incipientepacto pela gestão das águas da bacia.

EXISTE UM OUTRO CAMINHO

No entendimento do Comitê da Bacia, daSociedade Brasileira para o Progresso da Ciência –

SBPC, do Banco Mundial e de inúmeroscientistas, a transposição das águas dabacia do rio São Francisco para as baciasreceptoras do Nordeste Setentrionaljamais poderia ser o ato inicial de umasolução integrada e sustentável para osemi-árido, mas a última etapa de umconjunto de ações.

Estas ações deveriam contemplar:• A democratização do acesso à água,

através da adução e distribuição doestoque de água já existente, tanto naregião receptora como doadora. Agarantia de fornecimento de água aoscentros urbanos de todo o semi-árido,incluindo o norte de Minas Gerais, foiorçada em 3,6 bilhões pela ANA (Atlasdo Semi-árido), portanto uma fração (1/3) do custo total da solução via canais detransposição.

• A conclusão das obras de infra-estrutura hídrica paralisadas em todo osemi-arido,

• A real revitalização hidroambientalda bacia do Velho Chico e

• O investimento prioritário eamplamente distribuído em soluções deconvivência com a seca para a população

dispersa do semi-árido brasileiro.O semi-árido (linha tracejada em preto) e a bacia do rioSão Francisco (linha tracejada em laranja).

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(*) Prof. da Universidade Federal de SergipeVice-Presidente do CBHSF

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Diante de tantas dúvidas e incertezastécnicas, institucionais, ambientais e sócio-econômicas que cercam o atual projeto detransposição, é responsabilidade da sociedadebrasileira, exigir do Governo Federal uma reavaliaçãoda condução deste projeto, isenta de interessespolíticos imediatos. E necessariamente acompanhadada abertura das negociações, no âmbito do pactofederativo, entre os Estados doadores e receptoresdas águas sanfranciscanas, com a efetiva participaçãodos comitês de bacia, na busca da melhor aplicaçãodos recursos públicos em uma solução sustentável esocialmente justa.

Este momento histórico está a exigir que asociedade brasileira interfira nas decisões sobre odestino do Velho Chico, cuja vocação de rio daintegração nacional não pode transformar-se em fontepermanente de discórdia, com a perpetuação eacirramento do maior conflito de uso das águas dahistória do país.

O atual governo federal tem a oportunidadede construir um grande pacto nacional em torno dagestão das águas do rio São Francisco e dodesenvolvimento sustentável do semi-árido brasileiro.

É para que essa mensagem seja, enfim,ouvida pela Nação Brasileira, que os movimentossociais estão recorrendo ao recurso extremo daocupação do local da tomada d’água do eixo Norte,desde 26 de junho 2007, “como último gesto de plenoexercício da cidadania que resta àqueles quediscordam do projeto e cujos argumentos ereivindicações não foram, até o momento,devidamente considerados pelo Governo Federal”(Nota Pública da Diretoria do CBHSF, junho 2007).

Disponibilidade hídrica por habitante na maior parte do semi-áridoda bacia situa-se entre menos de 500 até 1.000 m3/hab/ano.

Fonte: GEF São Francisco

Gráfico comparativo entre as regiões mostra que a irrigaçãono NE Setentrional ocupa área maior do que na bacia do rio

SF e que existem quase 400 mil hectares de projetos deirrigação paralisados.

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A existência do Comitêde Bacias Hidrográficas do RioSão Francisco - CBHSF éresultado da luta de muitoscidadãos brasileiros,moradores ou não da destabacia, que aprovaram a Lei nº9.433/1997. Pois foi esta Leique permitiu o Comitê de existirao se constituir num marcolegal para a gestão, o usoracional e sustentável dosrecursos hídricos no Brasil.

Portanto, completados10 anos de existência desta Lei e de 5 anos de criação doCBHSF, devemos ficar contentes pelos caminhospercorridos e, ao apontar para o futuro sem esquecer dopassado, verificarmos os erros, os acertos e asprovidências necessárias para aperfeiçoarmos a gestãodas águas do rio denominado da Integração Nacional.

Pois integração não pressupõe termos a mesmaopinião e postura com relação às águas e, sim,promovermos o diálogo das diversidades naquele espaçopúblico do Parlamento das Águas, conforme diretrizespreceituadas pela nossa lei decenal de recursos hídricos.

Isto posto, e como membro da União no CBHSFe gestores do Projeto de Integração do Rio São Franciscocom as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional,estaremos contribuindo para a erradicação da pobreza ea marginalização e reduzindo as desigualdades sociais eregionais, atendendo desta forma o que determina a nossaConstituição Federal em seu artigo 3º - inciso III.

Queremos então, nesta oportunidade derememorização, trazer mais elementos para diálogo acercade nossa posição no CBHSF ao comentar algumas questãocom relação ao Projeto de Integração de Bacias.

A transferência de águas entre regiões, astransposições de bacias hidrográficas, é uma técnica dagestão de recursos hídricos secularmente utilizada pelahumanidade. Inúmeros projetos de transposição de águasforam e estão sendo implantados em países ricos e pobresdo mundo inteiro. Nos Estados Unidos, dois grandesprojetos de transferência de água no Estado da Califórnia,um ao norte (Central Valley Project, nos rios São Joaquime Sacramento, com 787 m³ / seg) e outro ao sul (BoulderCânion no rio Colorado, com 430 m³ / seg), construídoshá mais de 50 anos, garantiram a irrigação de 500 milhectares, através de 3.000 Km de canais revestidos. Outrosprojetos importantes naquele país são o Central ArizonaProject, concluído em 1985, com 182 m³ / seg e US$ 4bilhões de investimento e o Big Thompson, no estado do

Colorado, concluído em 1956, com 55,78 m³ / seg e 162Km de canais.

Na Europa, vale destacar o Projeto Tajo-Seguraabastecendo as populações e sistemas de irrigação nasprovíncias espanholas de Murcia, Alicante e Almeria, comvazão de 33 m³ / seg, 172 Km de canais e 58 Km de túneis.

Atualmente, dois excepcionais projetos estão emandamento na Índia e no Egito. O primeiro, denominadoSardar Sarovar, conduz 1.133 m³ / seg em 468 Km decanais, retirando águas do Rio Narmada que tem vazãomáxima de 2.000 m³ / seg; o segundo, no baixo Rio Nilo, oProjeto El Salam que passa por baixo do Canal de Suezcom um sifão constituído de quatro túneis, capacidade de160 m³ / seg e 268 km de canais. Na parte média dórioNilo, que tem características hidrológicas semelhantes ado São Francisco, existe outro projeto, o Toshca, que retiraaté 350 m³ / seg do Lago Nasser (Aswan) para irrigaçãodo deserto ocidental do Egito.

Ainda na África, vale destacar a transposição entrebacias de dois países, do rio Senq, no Lesoto, para o rioVaal, na África do Sul, pelo Lesotho Highlands WaterProject, cuja capacidade é de 30 m³ / seg.

No Brasil, temos os exemplos do Sistema Light,que abastece a cidade do Rio de Janeiro, e o Cantareira(33 m³ / seg), que garante o abastecimento de 56% dapopulação da região metropolitana de São Paulo. Outrascidades importantes, como Salvador e Aracaju, sãoabastecidas por projetos de transposição.

Embora estes e outras dezenas de projetos detransposição construídos no mundo, tenham trazidoprosperidade e bem-estar às populações beneficiadas, éimportante frisar que nem sempre foram devidamenteconsideradas questões ambientais e de inserção regional,importantes para seus dimensionamentos e redução deimpactos. O exemplo mais patente é o do Projeto Mar deAral, na Ásia Central que, de forma prevista e calculadapor técnicos da então União Soviética, mas implantado

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A VISÃO DO GOVERNO FEDERAL SOBRE O PROJETODE INTEGRAÇÃO DE BACIAS

Rômulo Macedo*

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por decisão política, resultou num grande desastreambiental, com a retirada excessiva de águas para airrigação e conseqüente desertificação da área do mar.

O Projeto de Integração do Rio São Francisco comBacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional,denominação nova e mais adequada ao conhecido “Projetoda Transposição do São Francisco”, é uma idéia secular,cuja lógica é a transferência de um pequeno volume daságuas do maior manancial hídrico do semi-árido brasileiropara uma parte da mesma região, cujas ofertas de águacarecem da necessária garantia para o atendimento às suasdemandas atuais e futuras.

A inexistência de meios tecnológicos na segundametade do século XIX, frustrou a vontade política deimplantar o projeto, fortemente existente à época. Nocomeço do século XX, com a criação do IFOCS (InspetoriaFederal do Obras Contra as Secas), hoje DNOCS, aconstrução de pequenos, médios e grandes açudes nasproximidades dos centros urbanos, possibilitaram oenfrentamento de secas anuais e inter-anuais recorrentes,garantindo a oferta de água às populações e aos pequenossistemas de irrigação, nem sempre de forma satisfatória.

Mais recentemente, os estados da região, com aajuda da União, empreenderam um esforço de aplicaçãodos seus escassos recursos financeiros, construindograndes sistemas adutores de forma a distribuir as águasdos grandes reservatórios para as cidades onde os açudesmais próximos e de menor porte, não mais atendiam ascrescentes necessidades de abastecimento.

Estudos consistentes de inserção regional,contratados pelo Ministério da Integração NacionaL,levantaram as disponibilidades hídricas da região, passíveisde serem utilizadas com a necessária garantia que, umavez confrontadas com as demandas atuais e futurasidentificadas, concluíram pela efetiva carência de água nosemi-árido dos estados de Pernambuco, Paraíba, Ceará eRio Grande do Norte.

O estudo demonstra que, mesmo contando comreservatórios de grande capacidade de acumulação deágua, somente cerca de 20% dos volumes armazenadospode, por condicionantes climáticas próprias da região, serutilizada com garantia para atendimento das demandas.

Dessa forma, mais do que um simples projeto dereforço da oferta hídrica regional, a Integração do SãoFrancisco, é um projeto garantidor dessa oferta, eproporcionador de uma melhor gestão da água já existentena região.

Com relação ao impacto no seu manancial, o RioSão Francisco, quando comparado a todos os demaisprojetos de transposição do mundo, pode-se afirmar que éinsignificante, pois vai retirar 26 m³ /seg constantemente,

por condicionamento da outorga da ANA, o quecorresponde a somente 1,4% da vazão firme do rio, ou7,2% da vazão total admitida para usos consultivos peloPlano Decenal da Bacia (360 m³/ seg).

A execução das obras dos dois eixos de aduçãode água ao Nordeste Setentrional; a implementação dos36 Programas Ambientais aprovados pelo IBAMA e doPrograma de Gestão de Recursos Hídricos na RegiãoBeneficiada desenvolvido em parceria com a ANA, açõesque compõem o Projeto de Integração do Rio SãoFrancisco, estão, neste momento, em pleno andamento.

A decisão do Governo Federal de implantar oProjeto está baseada em dados, premissas e evidênciasque, pelas suas clareza e consistência, não deixam dúvidasquanto a viabilidade e importância do empreendimento,não só para a região beneficiada como para o Nordeste eo país:

- Os estudos realizados são suficientes eadequados quanto às suas natureza e nível dedetalhamento, e demonstram com clareza e precisão aescassez de água na região e a necessidade de soluçãodos problemas para garantia da sustentabilidade da vida epromoção do desenvolvimento econômico.

- O Projeto foi exaustivamente discutido, resultadodo amplo debate, significativa contribuição ao seuaperfeiçoamento.

- Os impactos ambientais identificados são bemmais importantes e significativos no campo das vantagens,não tendo nenhum impacto negativo de relevância, tantona bacia do São Francisco quanto nas bacias beneficiadas.Nenhum dos Projetos de Transposição feitos no mundo,teve, ou tem, as condições ideais e os cuidados ambientais.

- A retirada de água é insignificante quando seconsidera o porte e as condições hidrológicas do rio SãoFrancisco (rio federal) e é fundamental para a garantia deoferta hídrica a 12 milhões de brasileiros da regiãobeneficiada. A integração das bacias hidrográficas é,portanto, uma alternativa a ser consolidada dentro doprincípio do federalismo cooperativo.

- O Projeto foi analisado e aprovado peloCNRH, pelo IBAMA e pela ANA, instituições com asdevidas atribuições institucionais e reconhecidascapacidade técnica.

- O Projeto Básico Ambiental, constituído de 36Programas, constitui uma garantia de alcance dosobjetivos e metas do empreendimento.

A VISÃO DO GOVERNO FEDERAL SOBRE O PROJETODE INTEGRAÇÃO DE BACIAS

(*) Coordenador Geral da ObraMinistério da Integração Nacional.

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OS ASPECTOS JURÍDICOS DO PROJETO DATRANSPOSIÇÃO DO SÃO FRANCISCO E A ATUAÇÃODO MINISTÉRIO PÚBLICO EM DEFESA DA BACIA.

Luciana Khoury*1

A partir da Constituição Federal de 1988, oMinistério Público passou a desempenhar novo papelna sociedade, sendo sua função zelar pela garantiados direitos sociais, coletivos e difusos. A nova missãoinstitucional trazida requereu dos Ministérios Públicosuma atuação voltada para a proteção dos direitosmetaindividuais, ou seja, aqueles que extrapolam odireito individual, podendo tutelar o direito de umacoletividade de indivíduos, a exemplo do direito àsaúde, ou mesmo devendo buscar a garantia dosdireitos de todos indistintamente, a exemplo do direitodifuso ao meio ambiente ecologicamente equilibradoe da proteção ao patrimônio público, esses direitossão os chamados difusos, pois pertencem a todosindistintamente.

Para cumprir com eficiência a missãoconstitucional, o Ministério Público precisou adotarnovas diretrizes, eleger prioridades, modificar a antigapostura dos Promotores de Justiça que apenasatuavam em seus gabinetes. Para defender os direitosda sociedade, os Promotores de Justiça precisamconhecer a realidade, atuar em parceria com osmovimentos sociais na busca de uma transformaçãoefetiva da realidade, onde os direitos não sejam meraformalidade, mas criem vida. Nesse sentido, oMinistério Público do Estado da Bahia, vem, desde2002, em parceria com os Ministérios Públicos dosdemais Estados banhados pelo rio São Francisco,atuando de maneira integrada, através daCoordenadoria Interestadual das Promotorias deDefesa do São Francisco, com projetos destinados àmelhoria das condições do ecossistema desta bacia,responsabilizando os agentes causadores de danosambientais e prevenindo a ocorrência de novos danos,sendo a revitalização da bacia uma prioridadeinstitucional. Toda atividade potencialmente poluidoraou impactante na bacia deve ser investigada pelasPromotorias do São Francisco. Por essa razão, oProjeto de Transposição, não poderia passar sem aapreciação dos Ministérios Públicos. Nesse particular,os Ministérios Públicos dos Estados que integram abacia vêm atuando juntamente com o MinistérioPúblico Federal, por intermédio dos Procuradores daRepública com atuação nos Estados e dasSubprocuradoras da República Coordenadoras da 4ª

e da 6ª Câmara da Procuradoria Geral daRepública, que atuam respectivamente nasquestões ambientais e de populaçõestradicionais, em singular integraçãoinstitucional. Nesse sentido, foram realizadasdiversas audiências conjuntas com o Ministérioda Integração, com a finalidade de melhorconhecer o empreendimento. E, como oconhecimento da matéria ambiental éessencialmente interdisciplinar, foram buscadasas Universidades, bem como a análise técnicada 4ª e 6ª Câmaras de Coordenação e Revisãodo Ministério Público Federal, para formaçãode opinião sobre o tema. Após cuidadosaavaliação dos Estudos apresentados, osMinistérios Públicos dos Estados e Federalconstataram que o Projeto viola a ConstituiçãoFederal, as normas ambientais e de recursoshídricos.

A Constituição Federal foi violada, poiso ponto de captação do Eixo Norte situa-se emTerra Indígena Truká, bem como trechos doscanais situam-se em território Truká, ainda emprocesso de demarcação na FUNAI, e,conforme previsto no art. 49, inciso XVI, écompetência exclusiva do Congresso Nacionalautorizar a utilização de recursos naturais emterra indígena, bem como o art. 231 determinaa obrigatoriedade de oitiva das comunidadesafetadas, o que não ocorreu.

As normas de recursos hídricos estão

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OS ASPECTOS JURÍDICOS DO PROJETO DATRANSPOSIÇÃO DO SÃO FRANCISCO E A ATUAÇÃO

DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM DEFESA DA BACIA.

sendo frontalmente desrespeitadas, uma vez que oComitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco -CBHSF, cumprindo com sua obrigação legal e numverdadeiro exercício de democracia eresponsabilidade com a sua missão, aprovou o Planode Bacia que prevê a possibilidade de alocaçãoexterna de água apenas para consumo humano eanimal, em casos de comprovada escassez. Ocorreque a transposição se destina à irrigação,carcinicultura, usos industriais, já outorgados pelaAgencia Nacional de Águas - ANA, em flagranteafronta ao CBHSF. Vale ressaltar que osrepresentantes do Governo Federal no Comitêbuscaram descaracterizar as competências do Comitê,o que não foi aceito pelos membros que integram oCBHSF e exercem a cidadania no curso do seumandato.

As normas ambientais foram violadas, poisos Estudos de Impacto Ambiental desconsideram osreais impactos negativos na bacia, apenas observandoas áreas dos canais, sendo omissos quanto aos reaisimpactos no meio físico, biótico e sócio-econômicona bacia do São Francisco e nas bacias receptoras.Postergaram-se os estudos que deveriam ter sidorealizados antes da emissão da primeira licença queé a Licença Prévia para a fase posterior que é aconcessão da Licença de Instalação. Quanto a esseaspecto, o TCU em Acórdão recente ao apreciar tais

questões, determinou ao IBAMA que não mais procedadessa maneira, pois deverão ser exigidos doempreendedor todos os estudos de impactos possíveisantes de decidir emitir a Licença Prévia, pois é estaquem atesta se o empreendimento é ou não viávelambientalmente. No caso do EIA/RIMA daTransposição é tamanho o desrespeito às ResoluçõesCONAMA, pois nem antes da Licença Prévia nemantes da Licença de Instalação foram realizados acontento tais estudos, deixando toda a populaçãobrasileira sem qualquer certeza sobre os prováveisimpactos do projeto. Vale dizer que pelo Princípio daPrecaução mundialmente festejado não mais seadmite omissões dessa natureza. E, maisrecentemente a 4ª Câmara da Procuradoria daRepública emitiu mais uma importante Nota Técnicaque trata das diversas alterações sofridas pelo Projetosem que tenham sequer sido objeto de qualquerestudo. Novos traçados dependeriam de novosestudos.

Diante de tamanha afronta ao ordenamentojurídico brasileiro, os Ministérios Públicos expediramRecomendações ao IBAMA, a ANA, ao ConselhoNacional de Recursos Hídricos buscando o respeitoàs decisões do Comitê, a complementação dosestudos, o respeito ao direito dos povos indígenas,mas não houve qualquer êxito nessa buscaextrajudicial de solução. Assim, foram ajuizadas AçõesCivis Públicas, sendo o MP da Bahia autor de duasdas ações em andamento, em conjunto com o MPF ecom o Fórum Permanente de Defesa do SãoFrancisco, obtendo duas liminares que suspenderamo Projeto por dois anos. Os Ministérios Públicos deMinas Gerais e de Sergipe também ajuizaram AçõesCivis Publicas questionando vícios do projeto.

Atualmente são 14 ações que tramitam noSTF sob a relatoria do Min. Sepúlveda Pertence. Em18.12.06 o Ministro decidiu permitir a continuidade dolicenciamento ambiental entendendo que não haviadano naquela fase do licenciamento, pois ainda nãohavia possibilidade de dano ambiental, uma vez queainda não tinha sido concedida a Licença deInstalação. O Procurador Geral da República recorreudessa decisão e também as ONG, pois o MinistroRelator excluiu todas as entidades da sociedade civil,

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ao fundamento de que por se tratar de um conflitofederativo somente os Estados ou o MP, através doProcurador Geral da República podem agora ser parte.

Vale ressaltar que não é esse o nossoentendimento.

Com o curso do licenciamento autorizado,teve seguimento e, em 27.03.07 foi concedida aLicença de Instalação que autoriza a obra. OProcurador Geral da República nos últimos dias levouao conhecimento do Ministro Relator essa nova etapado licenciamento ambiental e argumentou em suapetição que não foi cumprida a decisão do ilustreRelator uma vez que determinou a realização deaudiências públicas antes da Licença de Instalação,bem como o estudo de todas as condicionantesprevistas na Licença Prévia, o que não ocorreu. Opróprio IBAMA em seu parecer anterior a expediçãoda LI demonstrou que não houve atendimento totalàs condicionantes, mas mesmo assim expediu a LI.Em síntese, encontra-se agora para apreciação do Min.Relator a petição do Procurador Geral da República,pleiteando ao STF que suspenda as obras deTransposição até que se decida o mérito das ações.

A atuação durante esses anos na apreciaçãodo Projeto de Transposição possibilitou constatar queo problema do Nordeste não é a falta de água, massim a sua democratização. Aliás, como tudo nessepaís! Percebe-se claramente que as águas do projetonão se destinam à população difusa do Nordeste quepassa sede e sim, ao Porto Industrial de Pecém noCeará, aos criadores de Camarão do Rio Grande doNorte e aos grandes irrigantes dos Estados.

Uma outra conclusão que chegamos é a deque a Administração Pública não observou e nempretende perceber que o Brasil é um EstadoDemocrático de Direito, pois tanto no aspecto dademocracia, quanto na submissão do Governo àsnormas que regem o país, está longe de se exerceressa condição. Os espaços de democraciarelacionados ao Projeto foram todos desrespeitadospelo Governo Federal. Desde as Conferências de MeioAmbiente de 2003 e 2005 que deliberaram contrárias

ao Projeto, até a violação a decisão do Comitê deBacia, até as audiências públicas do licenciamentoambiental que não ocorreram. De igual modo absurdaa quebra do Pacto de Diálogo feita pelo Presidenteda República com o povo brasileiro, por intermédiode Dom Luiz Flávio Cappio após a sua greve de fomeem outubro de 2005. Ainda no mês de dezembro de2005, o Ministério Público esteve presente emaudiência com o Presidente da República quandogarantiu a realização do diálogo sobre os temas daTransposição, desenvolvimento sustentável do semi-árido e revitalização. O debate ocorreria sem qualquerinício de obras. Após debates técnicos em Brasília,seriam descentralizados para a bacia do São Franciscoe para o Semi-Árido. A abertura do Diálogo ocorreuprecisamente em 06 e 07 de julho de 2006. Ocombinado era que, após as eleições, retomássemosas discussões. Passaram as eleições, o Natal, ocarnaval, posse dos Ministros e após muitas cobrançasde Dom Luiz Cappio, do Ministério Público e dosdiversos segmentos da sociedade veio a resposta, oExército em campo. Não é possível acreditar queestamos numa democracia.

A Revitalização do São Francisco é arecuperação da bacia com a conseqüente melhoriados seus recursos ambientais e da qualidade de vidado seu povo. Medida indispensável que precisa doGoverno Federal, dos Governos Estaduais, dosGovernos Municipais, dos Ministérios Públicos e detoda a coletividade, com mudanças de práticas e decultura e com investimentos de recursos. Não se podeadmitir a proposta da Revitalização como uma moedade troca da Transposição. Da Revitalização verdadeirao Ministério Público é parceiro e já atua para que sejauma realidade concreta. Quanto à Transposição, nãopodemos admitir que tamanhas violações ao EstadoDemocrático de Direito ocorram e por essa razãoutilizaremos os instrumentos postos em nossalegislação para a Defesa do Velho Chico e esperamosque exista Justiça em nosso país!

(*) Promotora do MinistérioPublico do Estado da Bahia

[email protected]

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Senhor Presidente:

As águas crescem porque se encontram.E é em nome desse encontro marcado, naturalmente, pela natureza que nos protege e integra,

chamado Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, que nos dirigimos, publicamente, à Vossa Excelência.No entendimento do Comitê da Bacia, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC,

do Banco Mundial e de inúmeros cientistas, a transposição da Bacia do Rio São Francisco para as baciasreceptoras do Nordeste Setentrional jamais poderia ser o ato inicial de uma solução integrada e sustentávelpara o semi-árido, mas a última etapa de um conjunto de ações que deveria começar pela democratizaçãodo acesso à água, através da adução e distribuição do estoque de água já existente, tanto na região receptoracomo doadora, a conclusão das obras de infra-estrutura hídrica paralisadas, a revitalização da bacia doVelho Chico e pelo investimento prioritário em soluções de convivência com a seca para a população dispersado semi-árido, quase metade dela contida no Vale do São Francisco.

Diante desta avaliação e em virtude das dúvidas e incertezas técnicas, institucionais, ambientais esócio-econômicas que cercam o atual projeto de transposição, conclamamos Vossa Excelência a ampliar odebate do tema com a sociedade brasileira e estimular a negociação, no âmbito do pacto federativo, entre osEstados doadores e receptores das águas sanfranciscanas determinando o adiamento das obras, até queuma solução sustentável e negociada possa ser encontrada.

Mesmo assim, visando não deixar dúvida quanto a nossa irrecusável solidariedade aos irmãosnordestinos, apoiamos integralmente a decisão do Comitê de permitir a transposição de água paraabastecimento humano e dessedentação animal nos casos de comprovada escassez de recursos hídricos,quando não houver alternativa de suprimento local nas regiões receptoras, concomitantemente com aimplantação do Plano de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica.

Como rio da unidade nacional, o São Francisco constitui-se no elo físico, orgânico, cultural e sócio-econômico da integração do País, representando o corredor natural de interligação do Nordeste com o Sudestebrasileiros, do litoral com o sertão e eixo de conectividade dos biomas da caatinga e do cerrado. As suaságuas, mesmo que degradadas, ainda banham e levam vida à sete unidades da federação. Mas correm orisco de não fazê-lo mais num futuro ecologicamente previsível, porque o rio vem perdendo, progressivamente,

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DO VELHO CHICO AO PRESIDENTE LULACarta aberta de defesa do rio São Francisco ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva

em lenta agonia, sua vocação natural de ser fonte de vida e riqueza para os brasileiros, especialmente paraos nossos compatriotas do Nordeste.

Na sua área de abrangência, temos 3 milhões de hectares de terras potenciais e oficialmente aptaspara serem irrigadas. Mas as águas assim induzidas do Velho Chico só chegam hoje a apenas 340 milhectares, dos quais em torno de 150.000 há com as obras de infra-estrutura inacabadas e, conseqüentemente,sem nenhum aproveitamento sócio-econômico.

A plena utilização do potencial representado pelas atividades usuárias das águas já outorgadaslegalmente, mais o crescimento da demanda para abastecimento público, incluindo geração de energia enavegação, levarão ao esgotamento da disponibilidade correspondente à vazão que pode ser alocada paraos múltiplos usos no curto e médio prazos.Quantos mais eles serão em 2030?

Vem do rio, e não de nós, os dados da realidade que, desde D. Pedro II, a indústria da seca insiste emnegar, embaçando a visão dos nossos governantes ao longo da história. Pertencem a esta realidade, apoluição das águas, a devastação das matas ciliares e das áreas de recarga dos lençóis freáticos, a práticadas queimadas, o garimpo predatório, a erosão e o assoreamento, a cunha salina da foz, entre outros fatoresque ameaçam a vida do Rio. Do pescado que, mesmo raro, por causa da poluição e do assoreamento,resistiu até início dos anos 90, hoje só se pesca 20%. E os nossos irmãos barranqueiros ainda dão graças aDeus.

Não é essa realidade que, acreditamos, um presidente do Brasil com a sua biografia e a sua ecologiasocial quer transpor para o Nordeste Setentrional. Mas um São Francisco revitalizado. Um rio ambientalmenterecuperado, economicamente viável e socialmente mais justo, sobretudo para a população pobre que, mesmovivendo à beira do rio, permanece atrelada ao ciclo histórico de pobreza que a disponibilidade de água, porsi mesma, não é suficiente para romper e superar.

Torna-se necessário, ainda, Senhor Presidente, reconhecer o papel do Comitê da Bacia, como instâncialegítima para definir o pacto de alocação de águas porque não há outro motivo ou futuro maior para osnossos irmãos nordestinos, que pedirmos o seu apoio e reconhecimento federal na gestão colegiada edemocrática das águas do Velho Chico. A sua participação e comprometimento, como estadista de um mundonovo a nossa frente, na implantação do Plano de Recursos Hídricos proposto pelo Grupo Técnico de Trabalholiderado pela Agência Nacional de Águas e aprovado pelo Comitê da Bacia deste que é o maior riogenuinamente brasileiro e um dos mais importantes no contexto geopolítico do nosso País.

Junte-se a nós, Presidente, na tarefa inadiável de salvar o Velho Chico.REVITALIZAÇÃO, JÁ! Acompanhada dos investimentos necessários para aumentar a oferta e

democratizar o acesso à água, bem como concluir as obras de infra-estrutura hídrica inacabadas em toda aregião semi-árida brasileira, reorientando as políticas públicas para o desenvolvimento regional sustentável,como preconizam instituições isentas de inquestionável credibilidade nacional e internacional, como a SBPCe o Banco Mundial. REVITALIZAÇÃO JÁ!! TRANSPOSIÇÃO EM DEBATE.DESFRALDE ESTA BANDEIRA, PRESIDENTE!!!

Belo Horizonte, 15 de junho de 2005.Esta carta foi assinada pelos Governadores dos Estados de Minas Gerais, Aécio Neves, da Bahia, Paulo Souto e de Sergipe, João Alves Filho, pela

Diretoria Executiva e por instituições de Minas Gerais, Bahia, Sergipe, Alagoas e Pernambuco que compõem o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, por

Senadores, Deputados Federais e Prefeitos por ocasião da abertura da VI reunião Plenária do Comitê (CBHSF), realizada no dia 15 de junho, no Palácio das Artes, em

BH. As instituições, parlamentares e prefeitos que desejarem também endossar a presente carta ou enviar seu apoio deverão entrar em contato com a Secretaria do

Comitê (Tel/fax 71-33413559 ou [email protected], com a maior brevidade possível.

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O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, reunido em sua II Reunião Plenária emPenedo, Alagoas, no período de 1 a 3 de Outubro de 2003, tendo em vista a reapresentação do Projeto deTransposição de Águas do São Francisco, dirige-se à opinião pública brasileira e ao Governo Federal paraestabelecer os seguintes posicionamentos:

1. O CBH-SF, solidário com as populações sertanejas do Ceará, Rio Grande do Norte,Piauí, Paraíba e Pernambuco, dispõe -se a apoiar as iniciativas ambiental e sócioeconomicamente sustentáveis para resolver o problema do abastecimento de água pararegiões do semi-árido setentrional, para o consumo humano e dessedentação animal.

2. Pondera, que a transposição de águas não é a única alternativa para o semi-áridosetentrional, principalmente em face dos inúmeros questionamentos de ordem técnicaque continua a suscitar.

3. O CBH-SF considera que a lógica do chamado “Projeto São Francisco” continuacentrada com exclusividade na realização de grandes obras de engenharia hídrica,inteiramente desconectadas de uma visão mais ampla da problemática geral daspopulações do semi-árido brasileiro.

4. O projeto da transposição não dá respostas claras sobre a transcendência dos impactosambientais que causará ao rio São Francisco e sobre a relevância dos impactos referentesà capacidade do rio no atendimento às crescentes demandas hídricas que dele se requer,nem tampouco apresenta um cenário transparente de qual é o universo real das demandashídricas da bacia receptora, ou de como se daria à viabilização, a distribuição e o usodemocrático da água a ser transposta para o semi-árido setentrional, de forma a justificara enormidade de recursos que dispenderá.

5. O CBH-SF encara a “Revitalização da Bacia do São Francisco” como um valor em símesmo e totalmente independente das eventuais medidas compensatórias que surgiriamde uma possível viabilização das obras da transposição. Além disso pugna por um maioraclaramento do próprio conceito de “revitalização”, que deve ser entendido, acima detudo, como revitalização do ecossistema, de tal forma que a recuperação ambiental daBacia do São Francisco não seja absorvida e neutralizada no bojo de outra revitalizaçãoigualmente necessária, mas conceitualmente diferente, qual seja a revitalização sócio-econômica da bacia.

6. Da forma como está sendo reapresentado, numa pressa que não pressagia acerto erememora obras megalômanas que custaram caro ao povo brasileiro durante o períodode autoritarismo, o Projeto da Transposição requer compatibilização com uma visão maisampla do conjunto de demandas atuais e potenciais das águas do Rio São Francisco e desua bacia, para que os objetivos prioritários da Política Nacional de Recursos Hídricosnão sejam atropelados. Neste sentido, é prerrogativa e desafio urgente do Comitê doSão Francisco e dos órgãos públicos a ele afetos, como é o caso da Agência Nacional deÁguas, quantificar antecipadamente todo o universo das demandas hídricas paraabastecimento humano no contexto da bacia doadora e das bacias receptoras do semi-

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DECLARAÇÃO DE PENEDOREVITALIZAÇÃO JÁ!

árido brasileiro, antes que se tomem decisões de monta relativamente a outorgas paraprojetos de grande magnitude, como é o caso da transposição vista como possibilidadepara criação de agronegócios no seu local de destino.

7. Para superar a velha contraposição que opõe seguidamente a idéia da transposiçãoàs demandas da revitalização, criando um diálogo de surdos, o CBH-SF propõe aopresidente Lula e ao Governo Federal que convertam o projeto da transposição em umgrande Programa de Desenvolvimento Sustentável e Integrado do Semi-árido Brasileiro,incorpore a cultura de projetos de menor porte e mais rápido e melhor retorno, quantifiquee viabilize todo o grande potencial de captação das águas de chuva, explore as outrasalternativas complementares e mais baratas de aumento da oferta hídrica e articule tudoisto com as ações para gerar renda, criar pólos dinâmicos de desenvolvimento endógenoe sustentável das populações sertanejas.

8. Está mais do que provado historicamente que o simples fato de conduzir água adeterminado local da região semi-árida não resolve o problema do desenvolvimento.Exemplo mais gritante disso, é o drama que ocorre na própria área que margeia a calhado São Francisco, onde, a distâncias pequenas da água, pode-se presenciar o drama dasede e da miséria de multidões de brasileiros e brasileiras.

9. Qualquer novo projeto gigante, como é o caso da transposição das águas do SãoFrancisco, só se justificará no Brasil se obedecer, com o máximo rigor, aos critérios desua oportunidade, de sua melhor viabilidade técnica, de um desfecho positivo de suarelação custo/benefício, da efetiva democracia dos seus resultados, do seu carátersustentável, de sua transparência e, sobretudo, da possibilidade de que seja realmentediscutido com a sociedade, com as populações envolvidas, com a comunidade técnico-científica e com a estrutura da representação política do país.

Diante disso,

A – O CBH SF reivindica ao Governo Federal que nenhuma iniciativa para a transposiçãodas águas do Rio são Francisco seja adotada antes da aprovação do Plano dos RecursosHídricos da sua Bacia;

B – O CBH SF solicita ao Governo federal que todos os Projetos relativos à transposiçãosejam encaminhados ao Plenário do CBH SF para apreciação e apresentação de seuposicionamento;

C – O CBH SF decide que a análise dos Projetos de Transposição das águas do Rio SãoFrancisco deverá se dar no âmbito do Plano de Recursos Hídricos da Bacia.

Penedo, Casa de Aposentadoria, 3 de Outubro de 2003

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O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, reunido nos dias 28 a 30 de julho de 2004, na cidadede Juazeiro, na Bahia, em sua III Reunião Plenária, dirige-se à opinião pública nacional para anunciar, com grandesatisfação, que depois de meses de árduo trabalho de elaboração e discussão democrática, que contou com o apoiotécnico da Agência Nacional de Águas e Órgãos Gestores Estaduais, aprovou, finalmente, o seu PLANO DECENALDE RECURSOS HÍDRICOS.

A aprovação do Plano configura uma grande vitória do princípio da democracia participativa e se constitui noprincipal elemento de consolidação do Comitê. Este, sem sombra de dúvida e graças ao empenho dos seus membrose colaboradores, conquistou publicamente e no contexto institucional, o amplo respeito e confiança das populações daBacia do São Francisco, como espaço privilegiado de diálogo, negociação e construção responsável da gestão daságuas sanfranciscanas.

Enfrentando dificuldades de diversa ordem, superadas também pela ajuda de uma grande legião de técnicose cientistas voluntários, o Comitê conseguiu definir, em normas que agora ganham caráter oficial, os parâmetrosessenciais para gestão das águas que lhe estão afetas. Mediante os critérios de outorgas, enquadramento e cobrançapelo uso das águas, definição de prioridades de investimentos e outros instrumentos de gestão, o Comitê passará,doravante, a se constituir no grande articulador do processo de recuperação hidroambiental e desenvolvimento sustentáveldos Estados e municípios integrantes da bacia.

Investido dessa grande responsabilidade e respaldado pela seriedade e entusiasmo cidadão dos seusintegrantes, o Comitê soube resistir às pressões de setores do Governo Federal que, até o último momento tentaramcolocar no centro da agenda do Comitê, o Projeto da Transposição de Águas, em detrimento da prioridade absolutaque as ações da revitalização da bacia devem ter neste momento, como parte da discussão e construção do PlanoDecenal.

Felizmente prevaleceu a razão e o Governo Federal, através do Ministério do Meio Ambiente, reconheceu atempo o equívoco dessa posição e resolveu retomar o caminho do diálogo e da negociação, pedindo vista à propostade Resolução Deliberativa que trata da alocação e outorga para uso externo, das águas da Bacia do São Francisco.

Fiel ao seu compromisso democrático, o Comitê decidiu favoravelmente ao pedido, mas condiciona claramentea retomada do diálogo ao acatamento de condicionantes básicas, estabelecidas desde a II Plenária realizada nacidade de Penedo, Alagoas, quando conclamou o Governo Federal a priorizar a revitalização da Bacia do Rio SãoFrancisco e substituir o polêmico projeto da Transposição das Águas por um amplo e criterioso Programa deDesenvolvimento Integrado e Sustentável da Bacia do São Francisco e do Semi-Árido Brasileiro.

O Comitê reafirma sua inteira concordância com a possibilidade de alocação criteriosa de água do SãoFrancisco para abastecimento humano e dessedentação animal destinada a populações dos Estados do semi-áridosetentrional, principalmente aquelas radicadas em áreas de comprovada escassez como ocorre nos Estados da Paraíbae Pernambuco. Entretanto, reitera mais uma vez sua firme oposição aos projetos de obras hídricas faraônicas, decusto excessivo e retorno duvidoso, que se façam em detrimento das incontáveis ações e projetos que, dentro e fora dabacia, possam efetivamente provocar processos endógenos de desenvolvimento local, distribuição de renda, recuperaçãoambiental e melhoria da qualidade de vida das populações da bacia e do semi-árido.

O Comitê, finalmente, ressalta, como parte de sua luta futura, o empenho junto Conselho Nacional de RecursosHídricos para que os valores cobrados em função do uso das águas nas bacias hidrográficas, aqui incluídos os usospara geração de energia hidrelétrica, retornem a essas bacias prioritariamente, como determina a Lei Nacional dosRecursos Hídricos.

Juazeiro da Bahia, 30 de julho de 2004.

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CARTA DE JUAZEIRO

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CARTA DE SALVADORMANIFESTO AO POVO BRASILEIRO!

O Comitê do São Francisco, reunido nesta data na cidade de Salvador, no Estado daBahia, tem a grande satisfação de comunicar à Nação brasileira, que concluiu finalmente aaprovação integral do Plano de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco.Trata-se de um fato histórico, porque é o primeiro Plano deste gênero aprovado no contextode uma bacia hidrográfica federal seguindo a Lei 9433/97. E, mais importante do que tudo,constitui-se em ato da maior relevância para o avanço e aprofundamento do princípio dademocracia participativa no Brasil.

O último passo para a conclusão do Plano foi a decisão sobre os usos externos daságuas da bacia do rio São Francisco. O Comitê deliberou que as águas do São Francisco sópodem ser utilizadas para uso dentro da bacia, excetuando-se apenas os casos de escassezhídrica comprovada para consumo humano e animal. Portanto, o chamado Projeto daTransposição não se enquadra nos parâmetros constitutivos do Plano da Bacia.

Para chegar a este momento emblemático, milhares de pessoas, representativas dos7 Estados e 503 municípios desta que é uma das maiores bacias hidrográficas do Brasil,participaram de longos processos de mobilização, estudos, debates, elaboração e tomadade decisões, que são notáveis como exemplo de cidadania e de gestão compartilhada daságuas em nosso país.

A partir de agora, já podemos dizer que a Bacia do Rio São Francisco, que representa7% do território nacional e abriga 12 milhões e 800 mil pessoas, já conta com um forteinstrumento de ordenação do planejamento das atividades e gestão das águas, numa regiãoque é essencial como representação da unidade geopolítica do país e desafiadora pelacomplexidade dos problemas que apresenta.

Lamentavelmente, porém, toda esta cuidadosa construção democrática, já nasce soba ameaça de um grave retrocesso. O Governo Federal, que foi partícipe ativo e direto daformação do Comitê e da elaboração do Plano, perde-se agora na obsessiva idéia de imporao país, as obras da Transposição das Águas do São Francisco. Por conta disto, não hesitaem questionar até mesmo a legalidade do Comitê da Bacia do São Francisco e suasinequívocas prerrogativas para definir prioridades para alocação e critérios de outorga deáguas para usos externos à bacia.

Mais grave do que isso: tentar contestar, por esses meios autoritários, a competênciaque tem o Comitê do São Francisco em estabelecer as prioridades para o uso das águas dabacia, é não somente um precedente que atinge diretamente todos os comitês de baciashidrográficas do Brasil, como também um golpe que fere de morte os princípios constitucionaisque regem a Política Nacional dos Recursos Hídricos.

Intransigente na reafirmação de uma polêmica obra hídrica, como se fora a únicaalternativa para solucionar a problemática do Semi – Árido Setentrional, o governo federalrecusa-se a ouvir a voz da razão que, minimamente, recomendaria pelo menos maiorprudência, mais amadurecimento e melhor consistência técnica para emprego de tão

TRANSPOSIÇÃO NÃO É PRIORIDADE NEM PARA O NORDESTE E NEM PARA O BRASIL!

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CARTA DE SALVADORMANIFESTO AO POVO BRASILEIRO!

Salvador, Bahia, 27 de outubro de 2004.

volumosos recursos financeiros em empreendimento historicamente tão contestado por grandeparte da comunidade técnico – científica brasileira.

Entende o Comitê do São Francisco, que além de não se constituírem em prioridade nestemomento, as obras da Transposição, notadamente no que diz respeito ao denominado Eixo Nortedo projeto governamental, envolvem sérias interrogativas que, da forma mais recorrente possível,o Governo Federal não consegue responder, a não ser através de reducionismos que não resistem,entre outras, a qualquer contestação feita sob a ótica da necessária equação custo/benefício.

Além do mais, é estranha essa pressa do Governo Federal. Sobretudo se forem levadasem consideração circunstâncias extremamente sérias como, por exemplo, a necessidade de concluir-se o necessário Pacto das Águas entre os Estados da Bacia do São Francisco, antes de proceder-se ao exame de qualquer projeto de grande porte para uso externo de suas águas.

Mais estranho ainda é, por exemplo, o fato de que os Estados do Ceará e do Rio Grande doNorte, para onde são destinadas as águas do chamado Eixo Norte, são detentores, juntos, dasmaiores reservas de águas acumuladas do Semi-Árido, sem que os investimentos necessáriospara a distribuição e uso democrático dessas águas estejam sendo efetivamente encarados peloGoverno Federal.

São também insustentáveis as afirmações de porta vozes do Ministério do Meio Ambiente,quando tentam convencer a população brasileira de que apenas 1% das águas do São Franciscoserão utilizados na Transposição. Em verdade, o impacto da retirada das águas para o projeto doGoverno Federal deve ser calculado em função da água efetivamente disponível para captação eé óbvio que neste contexto os números são absolutamente mais significativos, situando-se entre25% e 48% da vazão alocável para todos os usos futuros da bacia.

Portanto, estas questões e toda uma série de outros fatores não satisfatoriamente resolvidos,como os itens relativos aos impactos ambientais, aos impactos sobre a produção de energia elétrica,às obras de irrigação inacabadas dentro da Bacia do São Francisco e muitos outros, recomendamao Governo Federal ao menos parcimônia na condução de uma problemática tão complexa e tãopolêmica.

E é nessa linha que o Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco vem trabalhando,tentando convencer o Governo Federal que a Revitalização Hidroambiental da Bacia do SãoFrancisco deveria ser estabelecida como a prioridade central dos investimentos da política derecursos hídricos, até que o mais amplo diálogo entre todas as partes interessadas possa nosindicar quais são as soluções mais sustentáveis para o desafio da escassez hídrica do Semi-Áridobrasileiro.

O Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco, à raiz de todos os fatos expostos, emnome do bom senso e da democracia, apela, portanto, a Sua Excelência o Presidente da República,Luiz Inácio Lula da Silva, para que as decisões do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Franciscosejam respeitadas, o Plano Decenal de Recursos Hídricos acatado e o diálogo entre Governo eComitê reatado para que a gestão das águas do São Francisco funcione como não como instrumentode divisão fratricida, mas sim como símbolo da união das populações do Semi-Árido brasileiro.

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