retirante do céu

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Luiza Helena Novaes

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Livro de poesias de Luiza Helena Novaes. Lançado no dia 15 de setembro em São Paulo, no Estúdio Lâmina, durante o 2º Encontro Revolucionário das Mulheres Incríveis.

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Page 1: Retirante do Céu

Luiza Helena Novaes

Page 2: Retirante do Céu

Sobradinho, em uma travessa da Rua Pelotas, em rua sem saída, vila talvez… atualmente um espaço que é ocupado por contadores e consultórios médicos.

Essa era uma casa alugada, em um belo local, lotado de bibelôs, lembranças de viagens, fotos e outros pequenos mimos.

Moravam juntos lá até conseguirem dinheiro para comprar um apartamento na Rua Rio Grande em um prédio. Na casa estava escrito Pedacinho do céu e quando se mudaram levaram a placa com o mesmo dito.

Page 3: Retirante do Céu

Dalmo Braga

Nascido sob o Império de Dom Pedro II, antes da proclamação da República. Formado na Escola Normal, o que corresponde ao Magistério, trabalhava no serviço público estadual como professor. Tornou-se diretor de um colégio em Santa Cruz das Palmeiras. Casado e duas filhas. Morre em 1968, no mesmo ano do Ato Institucional Número 5 (AI-5). Muito mulherengo. Por algum motivo desconhecido separou-se da sua primeira mulher, a qual tinha ódio mortal dele e foi renegado por ambas filhas, que não gostavam nem de ouvir seu nome. Veio para São Paulo, trabalhou até a aposentadoria, morava sozinho em um apartamento no edifício Martinelli, onde ficou doente, provavelmente de tuberculose. De 1950 a 1968, começa a doença e é cuidado por Silvia e Paulo Gigliotti Novaes (pai do narrador).

Silvia Silva Guimarães

Nasce no início do século XX, paulistana, negra, professora e conhece Dalmo em algum colégio onde ele foi diretor em São Paulo. Muito apaixonada por ele, cuidou dele durante a doença quando não havia mais pessoas para realizar tal ato. Quando ele se recuperou foram “morar juntos”. Não podiam se casar por que a ex-mulher dele ainda estava viva. Os dois aposentados passam a viver uma vida de lua-de-mel constante, viajavam, recebiam amigos em casa e estavam o tempo todo os dois pombinhos unidos.Viveram uma vida de namorados até que ela contrai câncer no abdômen e morre rapidamente, quatro meses depois da descoberta da doença. Dalmo morre seis meses depois de sua amada, por complicações pulmonares, realmente de tristeza pela falta do carinho de sua companheira.

Page 4: Retirante do Céu

PrefácioPoesia é para qualquer um. É sentimento dado em palavra. Está por aí, aos montes, em lugares onde não dá para imaginar, só vendo mesmo. Vai além do entender e pega direto no sentir. Não tem essa de não entender poesia. Poesia se sente! E por aí tem gente que sente o mundo com poesia. É o caso da Luiza que, aparentemente de corpo presente, está ligada, como uma anja, num pedacinho do céu. Este seu primeiro livro de poesias surgiu de uma ideia mambembe, num clima bem cafona e sincero à la unidos venceremos, como uma oportunidade de botar no mundo um pedacinho do céu de Luiza, simplificado em palavras. Aproveite a viagem.

Denis Diosanto

Page 5: Retirante do Céu

por Luiza Helena Novaes

Page 6: Retirante do Céu

Eram tempos de vôos

I.

Algum momento específicoNão se sabe ao certo quandoModificou a visão de alguns artistasEstes, perturbados... Redigiam,Liam, produziam arte plásticaOu sem plasticidade alguma,Por escolha pessoal...

II.

Algo efêmero por dizer do agoraE eterno pela promessa Dos mais de cinqüenta anosDe sucesso ou ironia agregadaHavia asas como se desejariaE era um sonho tão realQue chegava ao absurdo

Page 7: Retirante do Céu

III.

Alguns movimentosConsiderados radicaisNo passadoTeriam sentido invejaDessas intervençõesComunicacionais entre loucos:Palhaços, gigantes, gênios,E se tínhamos espasmosEra por falta de coragemDe assumir que éramosO nosso melhor do hojeE que talvez amanhãNegássemos tudoE ainda assim teríamos basePara o feito contraditório

IV.

Escorria sangue das asasE desse vôoEm páginas de livrosReconstruíamos tambémAs nossas faces Que apresentaríamos ao mundoÉramos tão individuaisQue chegávamos a ser coletivosE andávamos a péPor consequência divinaEm busca de um caminhoO qual ultrapassaríamosA fina barreira da geração,Da herança e do somÉramos o manifestoDe nós mesmosE nem sabíamos comoDesatar os nós!

Page 8: Retirante do Céu

Sem título

e a gente que podia falar o que quisessee nunca dizia nada que valia alguma coisa

e a gente que podia pintar a carasair na rua e vadiar e com preguiça, nada!

e a gente que podia comer bembeber e ficava preocupado com a vida dos outros...

e a gente que podia dançare fugia quando via fantasma!

e a gente que podia fazer políticamas queria fazer arte por violência,

e a gente que podia ficar sem apanharmas gostava de ver o sangue correr;

e a gente que podia atravessar a ruamas só na estática reconhecia o movimento,

e a gente que podia voarmas preferia ficar vendo televisão,

e a gente que sabia lere acabava lendo um monte de bobagem...

e a gente que nem era gentee como bicho não se reconhecia.

Page 9: Retirante do Céu

Pedido aos deuses

Orfeu jogue suas barbasPara que saibamosQue nem seu cantoEncantará Eurídice

Pergunte a RomeuComo faz para:Envolver a famíliaNos nossos negócios?

Como nem o amorDe Píramo e TisbePode ter salvaçãoNos corações ensimesmados...

Que a beleza de HelenaNunca mais cause guerrasPara que Atenas e TróiaPossa em fim viver em paz.

Ou de agora em dianteA força de Sansão Não possa mais ser retiradaPor privilégio de paixão!

Que o cego TirésiasVeja realmenteMuito mais longeE nem necessite subir no lombo.

Todos os legendáriosNasceram da simples interaçãoBanal com um meioQue sempre é ultrapassável

Criar-se em divindadeSimplesmente bastaPara as estrelasE os mágicos palhaços

Do cotidiano absurdoDe existência precáriaCom necessidades individuaisExternas concebidas!

Page 10: Retirante do Céu

Demanda pessoal

Se por um ladoEra cor,O espectro de sombrasPerseguia como pesadelo

Deixe o encantoPara as sereiasQue alheiasTomam o canto

Como formaDe pregar homensEm mastrosNada vulgar!

Cuidado com a fomePor que dela Nasce as garras...Das escamas

Tema pelo ódioPela raiva, ou rancorA cada diaLimpava mais

O esgoto do marQue havia alastradoNo peito adiamantadoPelo excesso

E o belo da relaçãoEra um pesadeloDo qual nunca acordaria?Questionava

Ainda tinhaReceio de compreenderMal, o que é amorPelo sujo filtro

Ou pela borraQue fez em meu caféMinado, descompassadoVertigem de espaço

Ainda tinha pazAinda devia explicaçõesAinda queria fugir.Nunca mais de dentro!

Nunca mais de mimDos meus valoresDo meu perdãoDa minha alegria interna

Inteira aqui...

Page 11: Retirante do Céu

Não existe milagre que opere sem o divino de nossas ações

Eu não estava lá sozinha…O coro é um aprendizado infantil,E se, subimos ou descemosEra por merecimento dentro da obra.Você já havia se entregadoTantas vezes, leve em meus braçosE no balanço, virávamos luzSua voz era música, ou melhor, hino,Você foi sempre minha pátriaEncontrava razão somenteDentro e nos fluídos do seu corpo,Sei de pouco ou quase nada, ainda,Retirante nesse mundo, ou céuA colher o pouco que semeioPeço permissão por descaramentoDe ter paz nesse andarE que de nada serve o amorSe não houver abandono-entregaOu busca de liberdade, fora da gaiolaNão há encanto ou engano,Capaz de suportar o fardo,Ainda que durma sobre o braço dormentePreciso de um ninar…

Page 12: Retirante do Céu

Day tripper

Por que rico,Faz odisséiaClasse media,JornadaNa pobreza,Se faz procissãoNa melhorDas hipótesesVirava caminhante,Errante,RetiranteE...ConscienteQue o caminhoA trilharEra compreenderA missãoPor maisVulgar, peculiarQue possa parecerNem com aAltura das árvoresAlçaríamosAo céuComo semi-deusesAspirávamosMuito maisDo que é possívelSonhadores!

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A esmo palermaLotava um caderno de sentimentosSentir era um processo internoE dentro nunca estava frioMesmo no inverno,

O clássico contexto atualizadoPara a prosa mais cotidiana...Nada como a ponta da canetaPara fazer história.

E de magia ia lotando Pouco e nada da bexiga d’aguaQue explodia em nossa faceDessa existência tão vulnerável.

Fingíamos e mentíamos deslavadamenteSem pudor ou vergonha,Pra todos aqueles que não conheciamO desespero que era ser “si mesmo”.

Vagávamos de porta em portaBatendo, implorando aceitação,Como mendigo famintoEm busca de nada mais que comida.

Mas, o corpo necessita:Roupa, abrigo e calor,E com isso, deixávamos o sexoComo ato de lazer/favor!

Esquecíamos o trabalho que dava-Produzir, reproduzir, para viverSem o comprometimento básicoQue é ser!

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Assinatura primeira do segurando a barra!

Lavro a minha insígniaNo peitoSem vergonhaOu pudorCombino o ridículoE a solidãoEm dose de humor...Até o ser humanoMais evoluídoJá se sentiuDesencaixadoDistorcido.Em possibilidadeIdeal de fazer de siUm projetoInacabadoUm esboçoResgatadoDo lixo Ou do chão.Nessas paredesTopava com o medoDo fracassoDo não avançoDa falta

De evolução de mimE ao perder Essa coragemRestava poucoOu quase nadaPara despender,Dividia as migalhasDe meu pãoE quem sabe...O afetoO afagoQue na trajetóriaFui reunindoE compreendendo Como meuPara os outrosAinda desgastadaSujava no versoA roupa rasgada,DesajustadaAo corpoE em coroOuvia:Joga pedra nela!

Page 15: Retirante do Céu

abuso o que se fez de mim?fui eu quem fizou fui feitafeita de atos seus...sobre mim?da falta de opinião,de discussões,de idéias...que facilmente compreiinfluenciadapela simples faltade noção/persuasãofeita do desgostoda vida diáriaque você caminhavafeita do gostodo álcool/ do cigarrofeita das brigasfeita dos maus hábitosfeita da obrigação,de ficar em casafeita do ir e virem seu nome,feita de tudomenos de mim,e onde se acha esse eu?

Page 16: Retirante do Céu

Nem tudo

Nem tudoQue a gente pensaÉ especialQue a gente senteÉ pessoalNem tudoQue a gente mudaÉ individualQue a gente relacionaÉ genialNem tudoO que a gente comeÉ saudávelQue a gente bebeÉ sagradoNem tudoQue a gente sofreÉ divisívelQue a gente cresceÉ visível

Nem tudoQue a gente gozaÉ contávelQue a gente choraÉ memorávelNem tudoNem tudo É dorOu alegriaNem suorOu fantasiaNem tudoDá tempoDe dizerOu sussurrarNem tudo!

Page 17: Retirante do Céu

Assuma-se giganta

Todos os tiposBizarros ou nãoSão os personagensDo circo

Se há defeitosEra irrelevantePor que o espetáculoNos fazia únicos

Permitia liberdadeDe sermosDe falarmosDe fazermos

E se assim eraPor que haveriaDe nunca assumirEssa altura

SustentarCom ambas pernasSobre os pésO tamanho atingido!

Como mulherTatuada Cheia de históriasDava sentido

Para a adaptaçãoQue issoChegaria a terPor fortuna

Que correuDos benditosInterventoresDe rua

Que alimentavamO corpo de sua artePara além da almaQue os suporta

Único motivoDessa necessidadeRepito: caridadeVem de deus!

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Cabo de açoEnsaiávamosEm busca de exatidãoNão de perfeição,Nem de precisão.

PegávamosNa barra do trapézioCom vontadeRandômica.

AgarrávamosUma idéia construídaPor acasoDo desfecho.

SonhávamosCom o passadoPersecutório,Com certeza.

MatávamosCada um dos nossosPara sobreviverNossa miséria.

AmávamosAo próximoPela salvaçãoEtérea.

Que seja eternoEnquanto estejaInteiro!

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O maior espetáculo

Alguém anunciavaPorque não haviaOutra pessoa para:Realizar o ato!

Necessitávamos voarExercitar a belezaAinda estéticaDe alçar as alturas

Na corda éramosBatidas, de formaGraciosa e bemRápida, pânico

No tecido, engatadosEstávamos para:Fazer quedasNunca Dantes vistas

Esquecíamos por pressaQue devíamos pararE esperar pelas,Palmas gloriosas!

A nossa graçaEstava em aumentarmosO que fazíamosDe forma exponencial.

Ainda que Todos fizessem.Ainda queFosse repetitivo.

Era difícilAchar-se interessanteEm si,Para os outros...

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Prerrogativa

De longa saiaUsada, “quem sabe”Rasgada mas,Cheia de históriasCosturadas em formaDe patchworkSublinhavaDe onde vinhaDe uma longa LinhagemDe quase nobres,Quase retirantes,Quase pobres,E todos;Mortos de fome!E o céu,Com suas nuvensAzuladas pomposasDavam ao soloA chuva necessáriaPara a colheitaDe cada umDesses desgraçadosBordadosComo uvasNa renda da rodadaForma de dançarEm torno do fogoPara comemorarA nossaProcissão...

Page 21: Retirante do Céu

Prerrogativa

Alheia

Hoje escutava o zunidoDe água esguichadaLá fora o sol brilhavaBom sinal para,O fim- de- semanaQue começava agoraJá nos atrasos Nos olharesPara onde se vaiE qual o contrário de amor?A paixão me consumiaAprendia a me encantarComigo mesmaIsso em plena sexta-feiraGostava tambémDe beber vinhoDe falar verdadesE acordar

Pra receber novidadesEra agoraO tempo de produzirMais tardeEstaríamos desbotadosE não caberia os sapatosNem a velha roupaQue descoloriuVamos tingir?Nada comoUm arco-írisPara comprimirO nosso ladoTão absurdamenteObscuroProcurava luzNo buracoDa fechadura,

Page 22: Retirante do Céu

Deponho Podia falar em francêsSentir o chiqueDo croissant,

Mas na pobrezaNecessitava nada maisQue misto quente.

Algo ApaixonantePara estimularO próximo amor...

Nem me escolhaNunca sei pra queServir você...

Nunca muda,Nunca musa,Nem me usa.

A alma devidaEstimula calmaBreve reprise

De um jogoDoentioVenha com peças...

Do xadrezPercoPor decência.

Page 23: Retirante do Céu

Se, do peito…

Derrama uma gota de sangueÉ por que ainda que…Não tivéssemos tintaAinda que fosse retirada de nósA possibilidade de escrita:-Por falta de papel-Ou por medoAinda assim,Teríamos peleE sangueTeríamos a tatuagemFizemos por recalquePara contarmos:De onde viemos,Quem somos,O que fazemos,De nósEra família,Era símbolo,Era tanto fato…Afago, afetoQue não haviaSeiva nessa árvoreÉramos larvaFruto e flor…Em gesso desgastadoPelo corpo sufocadoNa gaiola que o contém…O diafragma,Que prende a respiraçãoPrenhaDo próximo minutoIncerto…

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Sobre a MatériaCorpo na horizontalDe quando em quandoPendurado

Lembrava a sazonalidadeDas estaçõesIsso tinha tempo

Quando estáticoQuase dormenteReparava o movimento

Das árvores e folhasA princípioCom o vento

Mais tarde de todasAs coisasNão viventes

O poste, a pedraA luz, as casas...E pensava

Se o estáticoMexe ao ventoO que dirá

Essas grandes pernasQue mesmo quando cessamDeixam de acreditar

Que a mudança E o movimentoIndepende de estar!

E ao deixarLevar pelo ventoO cabelo em brisa

Já assim sem mistérioModificando a matériaAinda que inerte

Pobre de mimQue sonho revoluçãoE compreendo nada

Do ser moventeQue nasci sendoE vivi salpicando

Moves de tiQuando sonhasQuando deseja

Deixa o libertoPara além das cortinasDa escuridão

Que se apoderou do erroNão há hipóteseSó mágica

Aqui aindaBalançavaE saltava

Virei estrelaVirei mulherSou palhaça

Coordeno os passosSem acasoDestino de formiga!

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Êxodo imóvelI.Os móveis desse lar respiravamSentia os movimentosDiafragmáticos estalaremNo pé do meu ouvido.

Por estranheza escondiaEsse saber dos vizinhosBem no fundo, se contasse...Fingiriam descompreensão!

A vermelhidão pulsanteQue até as paredesEscorriam pelos dedosPodia ungir automaticamente.

Chamariam-me de loucaPrenderiam-me em calabouçoElaborado para os que se expressamDe forma não deliberada...

II.A experiência sensorialEra de extremo barulhoDissonante, quase visualSe Deus ouvisse...

Soubesse da beleza estéticaDo nunca estar sóPelo rugir do imaterialO que não se vê se sente...

Impuros pensamentosSobre o que as paredesPensavam de mim, julgavamEntre quatro, me espremiam.

O único lugar sem bagunçaEra lá fora, ao ar livreCom as árvores, não havia som...De tanta anarquia!

III.Na rua nada de zumbidoDe tanto exagero:A instância das estaçõesQue alternavam...fora.

Internamente os móveisTinham memória sentimentalHaviam mudado de espaçoTraçado geografia...

Sofriam, choravam,A cada mudançaE esse movimentoProvocaria maturidade!

Os móveis nada imóveisTambém envelheciam,Mofavam, esverdeavam,Como estrutura memorialista.

Page 26: Retirante do Céu

IV.Alguns eram jogados fora,Outros dados, e por isso,Acabavam criando novos contornosE às vezes novas utilidades!

Funcionalidade dava raivaA esses armários, cadeiras...Eles são entes sentimentaisE com isso, nunca máquinas!(ainda que metalizados)

Só os móveis nos salvariamDa nossa individualidadeDoentia e da falta de amorSó eles, murmurariam livres,

Por não necessitar de elesTambém nos libertaríamosAssumindo um euCaminhante como o deles,

Perseguindo não objetivosNem dos objetosDe consumo ou desejoInstável!

Page 27: Retirante do Céu

Senhoras e senhoresPrazer em encontrá-LosEspero que chutem meu nome...Por que o que estáCriando labirintos em suas cabeçasÉ a natureza do meu jogo!

E se todo policial é criminosoE todo pecador é santoO que nos resta esperar...Em essas dark eras.

Quando talvez,Precisemos nos vestirEm branco e só pintarA ponta do narizDe vermelhoPara explicar o nadaDessa existência,

Os gênios, os gigantesOutros bizarrosEncontram-se entre nósAdmitamos as diferençasOlhe para seu semelhanteAnalise não julgue.

Daqui pra frenteEstaremos condicionadosPelo amorCompletamente sedososBem amaciadosComo fios de cabelosLavados e cuidadosDiariamente!

Abrace, beije, vivaAdeus aos sentimentos de posseBrindemos a liberdadeO quintal de casa É o mundo todo,E vocês meus caros comparsas São todos meus vizinhos.

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The repetition of something.

She was immediately famous for her beauty. Strangers would stop whatever they were doing as soon as she entered any room, and this ceasing of all activity was visible to all. Everyone could see how everyone was no longer that which they were doing before. That she could speak, introduce herself and smile was an added feature, quite unnecessary, almost a nuisance, something which implicitly threatened to interrupt this newly created collective state of awe at a face, hair and body. A body which was soon to be thoroughly disregarded, as that which was going to matter was observing the eyes of others, the common joy, excitement and envy at a present imaginary object promising transcendence, absolute forgetfulness, being taken away from the now, discounting whatever to come. It was a wonderful instant. It was quite difficult to have a conversation while it lasted.Intentional conscious effort was required to say Hi back, to make eye contact, to shake

Luis Enrique Urtubey

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a hand and to kiss a cheek and then another. The ultimate disruption came as she had a genuinely interesting strange thing to say, a weird and hard to understand this is actually something comment which bore all the signs of being insightful, of requiring some kind of fast or slow thought, some wit or a previously read or learned concept to be able to encompass the different elements of a phrase of near breakneck pace, of incessant rhythm, of three pauses which interlinked disparate planes of leonine discourse.

The strangers’ panic was silent. It being at least minimally articulated would have been a better choice, but there was no choice. No possibilities. No alternative paths. This was the fate of the strangers. She was oblivious at the internal humiliation of the strangers. She laughed, she knew she was funny. She gave them a way out. The strangers could laugh uncomfortably or manipulatively. The first made her feel inadequate, abandoned, even hated, perhaps. The second made her feel appropriate, confident, vulnerable for being liked. Now she had something to lose, someone’s affection. And as it was only the manipulative stranger he who could produce this more successful laughter, the one who could cause this affect, disaster and tragedy was an inevitable outcome.

He was going to fall in something like love, and in the wrong way, and for the wrong reasons. And she was going to let him, over fear and a deep aversion to pain and disappointment. He was going to present an unsustainable self in everyday life. He was going to suppress his own will and desire to seem congruent with that perceived momentous temporary laughter.

She was going to despise him because she was going to unconsciously know he was lying with every molecule of his being, with every movement of his mind and soul. And she was never to leave him, just not to cry for a day or two, at least until he, overwhelmed with frustration and impotence, beat her in several occasions, first without leaving any marks, then making her cover the bruises with extremely high quality make-up, and finally ripping flesh and drawing blood, disfiguring her.

***

There was to be a blind, stupid, sleepless cruelty in the violence. A lack of something. A negation of something. A mourning for something. It was the action of someone who had been alone with someone else for far too long, of someone for whom the night had become a Calvary of anguish, without rebirth, or something. And she stayed, repeating

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whatever post hoc ergo propter hoc justification he gave for making her cry and undoing her skin. He was his own lawyer, and her prosecutor, and the judge always found her guilty. It was boring and obvious.

She stayed. She stayed because of her own newly created collective state of awe; she was many. She could not believe how someone could be so resourceful at making her suffer, and so unable to make her feel joy. How someone so adept at transforming anger into pleiad forms of aggression couldn’t also transform it into creation and affection.

She started to doubt if that wasn’t was he was doing; if she hadn’t misunderstood it all and fists on the cheek and gory noses and Dalmatian eyes weren’t types of love she wasn’t ready for and had to learn to feel and control. Such overabundance of love. Such overflowing of affection.

She would continue menstruating until she didn’t anymore. He went to jail until he was released and disappeared off the face of the planet never to be heard from ever again. She left somewhere. Became a trapeze artist. Went to Guatemala. Walked el Camino de Santiago. Took up Capoeira. Started a PhD in Social History and found a way of doing a lot of fieldwork. Got married and many dogs. She never enjoyed dinner parties again.

Page 31: Retirante do Céu

São PauloSetembro2012

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