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1 CAPACIDADE DE USO DOS SOLOS NO PROJETO DE ASSENTAMENTO OURO VERDE, MUNICÍPIO DE MUNIZ FREIRE, ESPÍRITO SANTO Débora Viviane Cremonez dos Santos 1 , Natália Aragão de Figueredo 2 , Eder Paulo Moreira 3 , João Luiz Lani 4 (1) Geógrafa, Neput, Universidade Federal de Viçosa. Av. Ph Rolfs, Campus UFV, Viçosa, MG, CEP 36.570-000. E-mail: [email protected] (2) Geógrafa, mestranda em Solos e Nutrição de Plantas do Departamento de Solos, Universidade Federal de Viçosa. Av. Ph Rolfs, Campus UFV, Viçosa, MG, CEP 36.570-000. E-mail: [email protected] (3) Graduando do Curso de Agronomia, Universidade Federal de Viçosa. Av. Ph Rolfs, Campus UFV, Viçosa, MG, CEP 36.570-000. E-mail: [email protected] (4) Professor Associado II do Departamento de Solos, Universidade Federal de Viçosa. Av. Ph Rolfs, Campus UFV, Viçosa, MG, CEP 36.570-000. E-mail: [email protected] . RESUMO A expansão da ocupação de terras e a intensificação das práticas agropecuárias são responsáveis por processos de deterioração e impactos no ambiente. O presente trabalho teve como objetivo avaliar os impactos ambientais do uso da terra no Projeto de Assentamento Ouro Verde município de Muniz Freire, ES. Para realização do estudo de capacidade de uso como unidade de planejamento, recorreu-se aos estudos de levantamento de solo. Foram utilizadas imagens SRTM para a criação de modelos digitais de elevação, aerofotos de 2008 analisadas na escala de 1:10.000, cartas temáticas do IBGE, além de observações e fotografias realizadas em viagens de campo, com a finalidade de gerar mapas de solos do Assentamento. Foram gerados mapas relativos à capacidade de uso, propostas e medidas de adaptação dos usos atuais em relação ao uso devido. Concluiu-se que a determinação da capacidade de uso da terra é uma importante ferramenta para seu planejamento e uso, pois, sistematiza e apresenta diversos dados de forma bastante objetiva. Mais de 50% da área do Assentamento é usada atualmente com pastagem e 63,90% dos solos pertenceram à classe III (e, s) da capacidade de uso. São áreas de Latossolo Vermelho-Amarelo e Argissolo Vermelho-Amarelo que possuem risco de erosão por ocorrerem em áreas de relevo com declives acentuados. Como ações mitigadoras, além de adubação e uso de correções no solo, podem-se inserir práticas agroecológicas a fim de favorecer uma manutenção eficiente do solo, como cobertura vegetal, adubação verde, sistemas agroflorestais. Palavras-chave: classificação de solos; uso; planejamento; uso sustentável INTRODUÇÃO O aumento da população mundial elevou a demanda por alimentos e tal fenômeno ocasionou uma expansão da ocupação de terras e uma intensificação nas práticas agropecuárias. O meio ambiente vem sofrendo com a ação antrópica em relação à capacidade máxima de uso da terra. O processo de deterioração é responsável por uma cadeia de impactos ambientais, caracterizados pela erosão do solo, assoreamento de cursos d’água, impactos na fauna e flora locais.

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CAPACIDADE DE USO DOS SOLOS NO PROJETO DE ASSENTAMENTO OURO VERDE, MUNICÍPIO DE MUNIZ FREIRE,

ESPÍRITO SANTO Débora Viviane Cremonez dos Santos 1, Natália Aragão de Figueredo2, Eder Paulo Moreira3,

João Luiz Lani4

(1) Geógrafa, Neput, Universidade Federal de Viçosa. Av. Ph Rolfs, Campus UFV, Viçosa, MG, CEP 36.570-000. E-mail: [email protected]

(2) Geógrafa, mestranda em Solos e Nutrição de Plantas do Departamento de Solos, Universidade Federal de Viçosa. Av. Ph Rolfs, Campus UFV, Viçosa, MG, CEP 36.570-000. E-mail: [email protected]

(3) Graduando do Curso de Agronomia, Universidade Federal de Viçosa. Av. Ph Rolfs, Campus UFV, Viçosa, MG, CEP 36.570-000. E-mail: [email protected]

(4) Professor Associado II do Departamento de Solos, Universidade Federal de Viçosa. Av. Ph Rolfs, Campus UFV, Viçosa, MG, CEP 36.570-000. E-mail: [email protected].

RESUMO A expansão da ocupação de terras e a intensificação das práticas agropecuárias são responsáveis por processos de deterioração e impactos no ambiente. O presente trabalho teve como objetivo avaliar os impactos ambientais do uso da terra no Projeto de Assentamento Ouro Verde município de Muniz Freire, ES. Para realização do estudo de capacidade de uso como unidade de planejamento, recorreu-se aos estudos de levantamento de solo. Foram utilizadas imagens SRTM para a criação de modelos digitais de elevação, aerofotos de 2008 analisadas na escala de 1:10.000, cartas temáticas do IBGE, além de observações e fotografias realizadas em viagens de campo, com a finalidade de gerar mapas de solos do Assentamento. Foram gerados mapas relativos à capacidade de uso, propostas e medidas de adaptação dos usos atuais em relação ao uso devido. Concluiu-se que a determinação da capacidade de uso da terra é uma importante ferramenta para seu planejamento e uso, pois, sistematiza e apresenta diversos dados de forma bastante objetiva. Mais de 50% da área do Assentamento é usada atualmente com pastagem e 63,90% dos solos pertenceram à classe III (e, s) da capacidade de uso. São áreas de Latossolo Vermelho-Amarelo e Argissolo Vermelho-Amarelo que possuem risco de erosão por ocorrerem em áreas de relevo com declives acentuados. Como ações mitigadoras, além de adubação e uso de correções no solo, podem-se inserir práticas agroecológicas a fim de favorecer uma manutenção eficiente do solo, como cobertura vegetal, adubação verde, sistemas agroflorestais. Palavras-chave: classificação de solos; uso; planejamento; uso sustentável INTRODUÇÃO

O aumento da população mundial elevou a demanda por alimentos e tal fenômeno

ocasionou uma expansão da ocupação de terras e uma intensificação nas práticas agropecuárias. O meio ambiente vem sofrendo com a ação antrópica em relação à capacidade máxima de uso da terra. O processo de deterioração é responsável por uma cadeia de impactos ambientais, caracterizados pela erosão do solo, assoreamento de cursos d’água, impactos na fauna e flora locais.

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A necessidade de minimizar e/ou mitigar os impactos ambientais decorrentes da intensificação das práticas agropecuárias indica que a inserção de ações sustentáveis em áreas produtivas torna-se cada vez mais necessária.

O sistema de capacidade de uso é uma classificação técnico-interpretativa, representando um grupo quantitativo de classes de solos sem considerar a localização ou as características econômicas da terra.

Diversas características e propriedades são sintetizadas, visando à obtenção de classes homogêneas de terras, com o propósito de definir sua máxima capacidade de uso sem risco de degradação do solo, especialmente no que diz respeito à erosão acelerada (LEPSCH et al., 1991).

As classes de capacidade de uso (I a VIII) são baseadas no grau de limitação de uso e as subclasses representam as classes qualificadas em função da natureza da limitação, tornando mais explícitas, as práticas ou grupos de práticas conservacionistas a serem adotadas.

O objetivo principal do levantamento de solos é o reconhecimento da natureza e distribuição das unidades pedológicas, procurando identificar e cartografar os solos ocorrentes em dada área, fazendo a caracterização morfológica e analítica da maneira mais completa possível, a fim de permitir o enquadramento das unidades de mapeamento em sistema natural de classificação de solos. Já as classificações técnicas ou interpretativas agrupam as unidades pedológicas em classes de terras, tomando por base características e propriedades selecionadas, mas relacionadas com o comportamento agrícola dos solos.

Neste contexto, o objetivo deste trabalho consiste em avaliar os impactos ambientais decorrentes do uso da terra no Assentamento Ouro Verde, de forma a privilegiar o uso sustentável dos solos, beneficiando a população assentada. METODOLOGIA

Para realização do estudo de capacidade de uso como unidade de planejamento, é

necessário recorrer aos estudos de levantamento de solo, que serviram de base para o planejamento da capacidade. Dessa forma, de posse dos resultados da identificação e espacialização das classes do solo em questão, foi realizado o trabalho de distribuição das unidades de capacidade de uso de acordo com os critérios para cada classe de solo.

Análises físicas e químicas de amostras retiradas de perfis no campo, com a finalidade de identificar suas características, serviram de suporte na distribuição das classes de capacidade.

Foram utilizadas como base de dados para o estudo, imagens SRTM para a criação de modelos digitais de elevação através de informações de hidrografia e relevo, aerofotos de 2008 analisadas na escala de 1:10.000, cartas temáticas do IBGE, além de observações e fotografias do Assentamento realizadas em viagens de campo.

Através de análises de geoprocessamento, foi possível gerar mapas de solos do Assentamento, criando um mosaico de classes de solo distribuídas pela propriedade. A partir desses, foram gerados mapas relativos à capacidade de uso, propostas e medidas de adaptação dos usos atuais em relação ao uso devido.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Predomina na área do Assentamento o Latossolo Vermelho – Amarelo 155,54 ha (61,13%) solos mais intemperizados e profundos localizados no terço superior das encostas juntamente ao Cambissolo Latossólico 84,49 ha (33,21%), que possui horizonte B estreito e maior risco de deslizamento. O Gleissolo Háplico 7,35 ha (2,89%) está localizado na várzea,

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apresenta caráter hidromórfico e são geralmente os mais férteis. Menos presente na área de estudo está o Argissolo Vermelho – Amarelo 7,04 ha (2,77%) ocupa o terço médio e inferior das encostas e apresenta gradiente textural, sendo mais utilizados para a agricultura (Figura 1).

O Latossolo Vermelho – Amarelo no PA Ouro Verde caracteriza-se por uma textura franco argilo arenosa, geralmente é muito poroso (chegando às vezes a ter 70% dos poros, pouco coeso, de alta friabilidade e permeabilidade. É fortemente a bem drenados. A estrutura é em blocos que se desfaz em grânulos. São solos em avançado estágio de intemperização, muito evoluídos. Os resultados analíticos evidenciam para esse solo uma acidez média a elevada, muitas das vezes são considerados tóxicos para as plantas e necessitam da utilização de corretivos. Os teores de carbono orgânico são baixos, indicando a necessidade de preservação da matéria orgânica por um manejo adequado de solo quando submetido ao uso. Predomina na área o uso com capim gordura, café arábica, milho, banana e Palmeira Real.

Os Cambissolos Latossólicos não possuem grandes problemas para penetração de raízes, tem horizonte B pouco espesso e chegam a 190 cm no horizonte C. Os conteúdos da fração areia são mais altos do que os da fração argila e silte, podendo eventualmente facilitar o processo de erosão pelas camadas superficiais, devido ao baixo conteúdo da fração argila total, que é insuficiente para formar agregados estáveis no solo. Assim, devem-se utilizar práticas de manejo e de conservação do solo para evitar riscos severos de degradação por serem solos com baixa sustentabilidade. São solos com acidez moderada, e por isso há a necessidade de correção de acidez. Na área do Assentamento está sendo utilizado para o plantio de Palmeira Real, eucalipto e banana.

O Gleissolo Háplico são solos que ocorrem normalmente no fundo dos vales a montante de cachoeiras (vales suspensos). São identificados facilmente no campo pela presença de Taboa (Typha Dominguensis). Também configuram-se como ambientes de reserva d’água para o período da seca e propício para o desenvolvimento de inúmeras espécies de fauna importantes na cadeia alimentar e no controle biológico. Por lei, são destinadas a áreas de APP, porém muitas das vezes são drenadas para pastagens. A maior produtividade dos mesmos é em razão do ambiente ser hidromórfico. Apresenta textura argilosa e baixos teores de silte.

O Argissolo Vermelho–Amarelo no PA Ouro Verde apresenta pouca profundidade efetiva sem limitações físicas para o desenvolvimento do sistema radicular. A textura é franco argilo-arenosa no horizonte superficial e argilo-arenosa no horizonte subsuperficial. A drenagem é variável podendo ser forte a imperfeitamente drenado. A consistência é friável quando o solo está úmido e não plástico a ligeiramente plástico e pegajoso quando molhado, principalmente, nos perfis de textura argilosa. A estrutura é predominantemente fraca ou moderada; pequena, média e grande granular ou grãos simples no horizonte A e pequena e média em blocos subangulares no horizonte Bt. No que diz respeito às formas de uso desses solos, são preferidos pelos agricultores em razão da maior disponibilidade de água (pedoforma côncavo-côncava) e pela sua ocorrência predominante no terço inferior. Contudo, há necessidade de serem corrigidas as suas limitações, quanto à deficiência de nutrientes, para elevar o nível de fertilidade. O uso atual no PA Ouro Verde é café arábica, Palmeira Real, milho, banana, feijão e tomate.

Em relação à fertilidade, há solos extremamente pobres como o Latossolo Vermelho-Amarelo de ocorrência em todos os Assentamentos da região e por outro lado há pequenas glebas de alta fertilidade, bem identificadas pelos assentados, que são nichos pedregosos. Um dos solos que se destaca em termos de fertilidade é o Cambissolo Háplico. Além de apresentarem boa fertilidade esta ocorre em todo o perfil e foi identificado em campo, a presença abundante de minerais primários. Estes ambientes pedregosos, no pé dos afloramentos rochosos, são uns dos mais sustentáveis para a agricultura familiar.

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Quanto à capacidade de uso, as terras do PA Ouro Verde foram enquadradas nas classes de capacidade de uso III, VII e VIII subdivididas em subclasses e unidades de capacidade de uso conforme distribuição descrita no Quadro 1 e Figura 2.

Quadro 1. Distribuição das classes de capacidade de uso do PA Ouro Verde, Muniz Freire, ES

Classe de capacidade de uso Área ha %

III e, s 162,57 63,90 VII s, a 7,35 2,89 VIII 84,49 33,21 Total 254,42 100,00

Na classe III (e, s), estão incluídos os Latossolos Vermelho-Amarelos e Argissolos

Vermelho-Amarelos com uma área aproximada de 162,57 ha (63,90%). Possuem risco severo de erosão e limitações relativas ao solo, por ocorrerem em áreas de relevo com declive acentuado. Estes solos são propícios para cultivos com práticas intensivas de controle de erosão e uso de correções e adubações que visam diminuir a toxidez por alumínio.

Na classe VII (s, a) ocorre os Gleissolos Háplicos com cerca de 7,35 ha (2,89%) da área total. Apresentam como limitações o excesso de umidade como também risco de assoreamento. São utilizados com pequenas áreas de plantação de arroz e pastagem braquiária.

O Cambissolo Latossólico foi incluído na classe VIII, distribuído em uma área de 84,49 ha (33,21%). Recomenda-se que estes solos sejam destinados a preservação da fauna e flora e a reserva legal. Os Cambissolos Latossólicos são solos rasos, declivosos e apresentam alta suscetibilidade a deslizamentos e erosões. CONCLUSÕES

A determinação da capacidade de uso da terra é uma importante ferramenta no seu planejamento e uso, pois, sistematiza e apresenta diversos dados de forma bastante objetiva. Todas as unidades de capacidade de uso definidas são formadas por classes de solo que necessitam de atenção especial quanto ao manejo das atividades propostas.

Mais de 50% da área é usada atualmente com pastagem e 63,90% dos solos pertenceram à classe III (e, s) da capacidade de uso. São áreas de Latossolo Vermelho-Amarelo e Argissolo Vermelho-Amarelo que possuem risco de erosão por ocorrerem em áreas de relevo com declives acentuados.

Além de adubação e uso de correções no solo, podem-se inserir práticas agroecológicas a fim de favorecer uma manutenção eficiente do solo, como cobertura vegetal, adubação verde, sistemas agroflorestais.

Em um ambiente detentor de enorme diversidade de solos e microclimas específicos, é fundamental o estudo de formas de planejamento do uso da terra, com o intuito de aperfeiçoar o uso dos recursos naturais, para garantir a sustentabilidade social, ambiental e econômica. Cada atividade pode estar mais bem fundamentada se existirem dados que subsidiem tomadas de decisões importantes. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS EMBRAPA. Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Sistema Brasileiro de Classificação de Solos. Brasília: Embrapa Produção de Informação; Rio de Janeiro: Embrapa Solos, 2006. 306 p.

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LEPSCH, I. F.; JR BELLINAZZI, R.; ESPINDOLA, C.R. Manual para levantamento utilitário do meio físico e classificação de terras no sistema de capacidade de uso. Sociedade Brasileira de Ciência do Solo. 4a aprox. Campinas, 1991. 175p. MÜNSELL. Soil Color Charts. Maryland, 1994. RADAMBRASIL - PROJETO RADAMBRASIL. Levantamento de recursos naturais – folha SF. 23/24. Rio de Janeiro/Vitória. Rio de Janeiro: 1983. 780 p. RESENDE, M.; CURI, N.;REZENDE, S.B. e CORRÊA, G.F. Pedologia: base para distinção de ambientes. 5. Ed. Lavras: Editora UFLA, 2007. 322 p.

Figura 1 Chave de identificação do solos no PA Ouro Verde, Muniz Freire, ES.

Figura 2. Distribuição das principais classes de solos identificadas no PA Ouro Verde, Muniz Freire, ES.