resumo do livro de robbins biopatologia 2009

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FACULDADE DE MEDICINA DE LISBOA Mestrado Integrado em Medicina 2008/2009 2º ANO MÓDULO IV.I BIOPATOLOGIA VITOR MARTINS Baseado em: Kumar V., Abbas A. K., Fausto N., “Robbins Patologia Básica”, Saunders, Tradução da 8ª Edição

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PROCESSOS PATOLÓGICOS GERAIS

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FACULDADE DE MEDICINA DE LISBOA

Mestrado Integrado em Medicina

2008/2009

2º ANO – MÓDULO IV.I

BIOPATOLOGIA

VITOR MARTINS

Baseado em:

Kumar V., Abbas A. K., Fausto N., “Robbins Patologia Básica”, Saunders, Tradução da 8ª Edição

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Robbins, Patologia Básica 2008/2009

Vitor Martins FMUL/UMa 1

Índice

Índice 1

Capítulo I: Lesão celular, morte celular e adaptações 8

Introdução à patologia 8

Visão geral das respostas celulares ao stress e aos estímulos nocivos 8

Adaptações celulares ao stress 10

Hipertrofia 10

Relações entre células miocárdicas normais, adaptadas, lesadas de modo

Reversível e mortas 10

Hiperplasia 11

Atrofia 11

Metaplasia 12

Visão geral da lesão celular e morte celular 13

Causas da lesão celular 14

Morfologia da lesão celular e da lesão tecidual 14

Lesão reversível 15

Necrose 16

Respostas subcelulares à lesão 18

Mecanismos da lesão celular 19

Depleção de ATP 19

Danos na mitocôndria 20

Influxo de cálcio 21

Acumulação de radicais livres derivados do oxigénio 21

Defeitos na permeabilidade da membrana 23

Danos no DNA e nas proteínas 23

Exemplos de lesão celular e necrose 24

Lesão isquémica e hipóxica 24

Lesão de isquémia-reperfusão 24

Lesão química 24

Apoptose 25

Causas da apoptose 25

Mecanismos da apoptose 26

Acumulação intracelular de substâncias 29

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Degeneração gordurosa 29

Colesterol e ésteres de colesterol 30

Proteínas 30

Glicogénio 30

Pigmentos 31

Calcificação patológica 32

Calcificação distrófica 32

Calcificação metastática 32

Envelhecimento celular 33

Capítulo II: Inflamação aguda e crónica 34

Visão geral da inflamação 34

Inflamação aguda 35

Alterações vasculares 35

Alterações no fluxo e calibre vasculares 35

Alterações da permeabilidade vascular 35

Resposta dos vasos linfáticos 37

Eventos celulares: recrutamento e activação dos leucócitos 38

Recrutamento dos leucócitos 38

Activação dos leucócitos 41

Lesão tecidual induzida por leucócitos 43

Resolução da inflamação aguda 44

Padrões morfológicos da inflamação aguda 46

Mediadores químicos da inflamação 47

Inflamação crónica 48

Células e mediadores da inflamação crónica 48

Inflamação granulomatosa 50

Efeitos sistémicos da inflamação 50

Capítulo III: Reparo tecidual: regeneração, cicatrização e fibrose 51

O controlo da proliferação celular 51

Ciclo celular 51

Capacidade proliferativa dos tecidos 52

Células-tronco 52

A natureza e os mecanismos de acção dos factores de crescimento 53

Mecanismos de sinalização dos receptores dos factores de crescimento 53

Matriz extracelular e interacções entre a célula e a matriz 54

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Papéis da matriz extracelular 55

Componentes da matriz extracelular 55

Célula e regeneração tecidual 55

Reparo por tecido conjuntivo 56

Angiogénese 56

Factores de crescimento envolvidos na angiogénese 57

Migração de fibroblastos e deposição da MEC 58

Factores de crescimento envolvidos na deposição da MEC

e a formação de cicatriz 58

MEC e remodelação tecidual 59

Cicatrização da ferida cutânea 59

Aspectos patológicos do reparo 59

Capítulo IV: Desordens hemodinâmicas, trombose e choque 61

Edema 61

Hiperemia e congestão 63

Hemorragia 64

Hemostasia e trombose 65

Hemostasia normal 65

Endotélio 66

Plaquetas 68

Cascata da coagulação 69

Trombose 70

Lesão endotelial 70

Alterações do fluxo sanguíneo 70

Hipercoagulabilidade 70

Morfologia 71

Destino do trombo 72

Embolia 73

Tromboembolia pulmonar 73

Tromboembolia sistémica 73

Embolia gordurosa 74

Embolia gasosa 74

Embolia de líquido amniótico 74

Enfarto 74

Choque 75

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Capítulo V: Doenças do sistema imunológico 77

Doenças de hipersensibilidade: mecanismos da lesão mediada pelo SI 77

Causas das doenças de hipersensibilidade 77

Hipersensibilidade imediata 77

Sequência de eventos nas reacções de hipersensibilidade imediata 78

Manifestações clínicas e patológicas 79

Hipersensibilidade mediada por anticorpos 79

Hipersensibilidade mediada por complexos imunes 80

Hipersensibilidade mediada pelas células T 81

Rejeição de transplantes 83

Reconhecimento imunológico dos alotransplantes 83

Mecanismos efectores da rejeição dos transplantes 84

Rejeição mediada pelas células T 84

Rejeição mediada por anticorpos 84

Métodos para melhorar a sobrevivência do órgão transplantado 85

Transplante de células hematopoiéticas 85

Doenças auto-imunes 86

Tolerância imunológica 86

Mecanismos da auto-imunidade 87

Doenças auto-imunes 88

Capítulo VI: neoplasia 89

Nomenclatura 89

Tumores benignos 89

Tumores malignos 90

Características dos neoplasmas benignos e malignos 92

Diferenciação e anaplasia 92

Taxas de crescimento 93

Invasão local 93

Metástase 94

Epidemiologia 95

Carcinogénese: as bases moleculares do cancro 95

Auto-suficiência nos sinais de crescimento 96

Insensibilidade aos sinais inibidores do crescimento 97

Gene RB e o ciclo celular 98

Gene p53: guardião do genoma 98

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Via do factor de crescimento transformante-β 99

Via da β-catenina da polipose adenomatosa do cólon 99

Evasão da apoptose 100

Potencial replicativo ilimitado 100

Desenvolvimento da angiogénese sustentada 100

Capacidade para invadir e metastatizar 101

Instabilidade genómica – capacitação para malignidade 102

MicroRNAs e cancro 103

Alterações cariotípicas nos tumores 103

Etilogia do cancro: agentes carcinogénicos 104

Carcinogénios químicos 104

Carcinogénese por radiação 104

Oncogénese viral e microbiana 105

Vírus oncogénicos de RNA 105

Vírus oncogénicos de DNA 105

Helicobacter pylori 106

Defeitos do hospedeiro contra tumores: imunidade tumoral 107

Antigénios tumorais 107

Mecanismos efectores antitumorais 108

Vigilância imune 109

Aspectos clínicos da neoplasia 109

Efeitos do tumor no hospedeiro 110

Diagnósticos laboratorial do cancro 110

Capítulo VIII: Doenças ambientais 112

Mecanismos gerais de toxicidade 112

Poluição ambiental 113

Poluição atmosférica 113

Metais como poluentes ambientais 114

Exposições industriais e na agricultura 115

Efeitos do tabaco 115

Efeitos do álcool 116

Lesões por drogas terapêuticas e drogas de abuso 116

Lesão por drogas terapêuticas 116

Lesões por agentes tóxicos não-terapêuticos 118

Lesão por agentes físicos 118

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Trauma mecânico 118

Lesão térmica 118

Queimaduras térmicas 118

Hipertermia 119

Hipotermia 119

Lesão eléctrica 120

Lesão produzida por radiação ionizante 120

Capítulo X: vasos sanguíneos 121

Vasos normais 121

Anomalias congénitas 123

Células da parede vascular e sua resposta à lesão 123

Células endoteliais 123

Células musculares lisas dos vasos 123

Espessamento da íntima: uma resposta estereotipada à lesão vascular 124

Arterioesclerose 124

Aterosclerose 125

Epidemiologia 125

Patogenia 126

Lesão endotelial 127

Proliferação de músculos liso 127

Morfologia 128

História natural da aterosclerose 129

Prevenção da doença vascular aterosclerótica 129

Doença vascular hipertensiva 130

Regulação pa pressão sanguínea 131

Patogenia da hipertensão 131

Patologia vascular da hipertensão 132

Aneurismas e dissecções 133

Aneurisma aórtico abdominal 134

Patogenia 134

Morfologia 134

Curso clínico 135

Aneurisma sifilítico 135

Dissecção aórtica 136

Patogenia 136

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Morfologia 137

Curso clínico 137

Vasculite 138

Vasculite não-infecciosa 138

Vasculite associada a complexo imune 138

Anticorpos anticitoplasma de neutrófilos 138

Anticorpos anticélulas endoteliais 139

Classificação e características de vasculites imunomediadas seleccionadas 140

Vasculite infecciosa 141

Fenómeno de Raynaud 141

Veias e linfáticos 141

Veias varicosas 141

Tromboflebite e flebotrombose 142

Síndromes das veias cavas superior e inferior 142

Linfangite e linfedema 143

Tumores 143

Classificação dos tumores vasculares e condições tumoriformes 144

Patologia das intervenções vasculares 145

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Capítulo 1

Lesão Celular, Morte Celular e Adaptações

Introdução à Patologia

Patologia – estudo do sofrimento. Abrange a ciência básica e a prática clínica e envolve a

etiologia e patogenia das doenças, que resultam em sinais e sintomas presentes no paciente;

Os patologistas usam várias técnicas moleculares, microbiológicas e imunológicas para a

compreensão das alterações bioquímicas, estruturais e funcionais que ocorrem nas células, nos

tecidos e nos órgãos;

- Para dar o diagnóstico e orientar a terapia, identificam alterações na aparência macro ou

microscópica (morfologia) das células e dos tecidos e as alterações bioquímicas nos fluidos

corporais.

Visão geral das respostas celulares ao Stress e aos estímulos nocivos

As células tendem a manter o seu meio intracelular dentro de uma faixa razoavelmente estreita

dos parâmetros fisiológicos, isto é, elas mantêm a homeostase normal;

As células ajustam constantemente a sua estrutura e função para se adaptarem à ocorrência de

alterações e de stress extracelular;

- Quando encontram um stress fisiológico ou um estímulo patológico, podem sofrer adaptação,

alcançando um novo estado constante, sendo as principais respostas adaptativas hipertrofia,

hiperplasia, atrofia e metaplasia;

- Se a capacidade adaptativa é excedida ou o stress externo é inerentemente nocivo, desenvolve-

se lesão celular (Fig. 1);

Lesão reversível – as células retornam a um estado basal estável;

Lesão irreversível – stress grave ou persistente leva à morte das células afectadas;

- A morte celular é um dos eventos cruciais na evolução da doença, assim como, um processo

essencial e normal na embriogénese, no desenvolvimento dos órgãos e na manutenção da

homeostase;

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O stress extracelular e a lesão celular não afectam apenas a morfologia, mas também o estado

funcional das células e dos tecidos;

Ex.: Miócitos lesados de modo reversível não estão mortos e podem assemelhar-se aos

miócitos morfologicamente normais. Entretanto, eles estão transitoriamente não-contráteis,

podendo levar a um impacto clínico letal.

Qualquer stress extracelular que provoque adaptação ou cause lesão reversível ou irreversível

nas células e tecidos, vai depender não apenas da natureza e gravidade do stress, mas

também de várias outras variáveis que incluem o metabolismo celular, o suprimento

sanguíneo e o estado nutricional.

Fig. 1

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Adaptações celulares ao stress

As adaptações são alterações reversíveis em número, tamanho, fenótipo, actividade

metabólica ou das funções celulares, em resposta às alterações no seu ambiente;

- Adaptações fisiológicas – representam respostas celulares à estimulação normal pelas

hormonas ou mediadores químicos endógenos (ex.: aumento do útero durante a gravidez);

- Adaptações patológicas – são respostas ao stress que permitem às células modular a sua

estrutura e função escapando, assim, à lesão.

Hipertrofia

Hipertrofia – é um aumento do tamanho das células que resulta num aumento do tamanho do

órgão;

- Não existem células novas, apenas células maiores, aumentadas devido a um aumento da

quantidade de proteínas estruturais e de organelos;

Pode ser fisiológica ou patológica e é causada pelo aumento da demanda funcional ou por

estimulação hormonal específica;

A hipertrofia e a hiperplasia podem ocorrer juntas, resultando num órgão aumentado

(hipertrófico);

Ex.: Durante a gravidez, o aumento fisiológico maciço do útero ocorre como consequência da

hipertrofia e hiperplasia do músculo liso estimulado pelo estrogénio.

Relações entre células miocárdicas normais, adaptadas, lesadas de modo reversível e

mortas

O miocárdio submetido a uma carga elevada e persistente, como a hipertensão ou com estenose

de uma valva, adapta-se sofrendo uma hipertrofia para gerar uma força contrátil maior;

Se o aumento da demanda não for atenuado ou se o miocárdio for submetido a um fluxo

sanguíneo reduzido (isquémia), em virtude de uma oclusão da artéria coronária, as células

musculares irão sofrer lesão;

O miocárdio pode ser lesado de modo reversível, se o stress for leve ou se a oclusão arterial

foi incompleta ou suficientemente breve, ou de modo irreversível (enfarte) após oclusão

completa e prolongada.

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Hiperplasia

Hiperplasia – resposta adaptativa em células capazes de replicação;

Pode ser fisiológica ou patológica;

- Os dois tipos de hiperplasia fisiológica são:

Hiperplasia hormonal, por exemplo, proliferação do epitélio glandular da mama

feminina na puberdade e durante a gravidez;

Hiperplasia compensatória, ocorre quando uma porção de um tecido é removido ou

lesado (ex.: Remoção parcial do fígado);

- A maioria das formas de hiperplasia patogénica é causada por estimulação hormonal

excessiva ou por factores de crescimento (ex.: Período menstrual anormal);

A hiperplasia é também uma resposta importante das células do tecido conjuntivo na

cicatrização de feridas, nas quais os fibroblastos e os vasos sanguíneos que proliferam

auxiliam o reparo, onde os factores de crescimento são produzidos pelos leucócitos;

A estimulação pelos factores de crescimento está envolvida também na hiperplasia

associadas a certas infecções virais (ex.: Papilomavírus causam verrugas na pele e lesões mucosas

compostas de massas de epitélio hiperplásico);

- Em qualquer uma destas situações, o processo hiperplásico permanece controlado;

A hiperplasia patológica é um solo fértil no qual a proliferação cancerosa pode surgir mais tarde.

Atrofia

Atrofia – diminuição do tamanho da célula pela perda de substância celular;

Embora as células atróficas tenham a sua função diminuída, elas não estão mortas;

As causas da atrofia incluem a diminuição da carga de trabalho (ex.: imobilização de um

membro para permitir o reparo de uma fractura), a perda da inervação, a diminuição do

suprimento sanguíneo, a nutrição inadequada, a perda da estimulação endócrina e o

envelhecimento (atrofia senil);

- Embora alguns desses estímulos sejam fisiológicos (ex.: perda da estimulação hormonal na

menopausa) e outros patológicos (ex.: desnervação), as alterações celulares fundamentais são

idênticas. Representam uma retracção da célula para um tamanho menor no qual a sobrevivência

é ainda possível;

- Um novo equilíbrio é adquirido entre o tamanho da célula e a diminuição do suprimento

sanguíneo, da nutrição ou da estimulação trófica;

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A atrofia resulta da:

- Síntese proteica diminuída (redução da actividade metabólica);

- Degradação proteica aumentada nas células (ocorre pela via ubiquitina-proteossoma);

Acredita-se que esta via seja responsável também pela proteólise acelerada observada em

várias condições catabólicas, incluindo a caquexia do cancro;

Em muitas situações, a atrofia é acompanhada também do aumento da autofagia (processo no

qual a célula privada de nutrientes digere os seus próprios componentes no intuito de encontrar

nutrição e sobreviver).

Metaplasia

Metaplasia – é uma alteração reversível na qual um tipo celular adulto (epitelial ou

mesenquimal) é substituído por outro tipo celular adulto;

Nesse tipo de adaptação celular, as células sensíveis a um determinado stress são substituídas

por outros tipos celulares mais capazes de suportar o ambiente hostil;

Acredita-se que a metaplasia surja por uma “reprogramação” genética de células-tronco e

não da transdiferenciação de células já diferenciadas;

Exemplo de metaplasia epitelial: epitélio respiratório em fumadores;

- Mudança de um epitélio pseudo-estratificado cilíndrico ciliado para um epitélio pavimentoso

estratificado, mais resistente;

- Deficiência de vitamina A pode induzir também a metaplasia escamosa;

- Embora o epitélio escamoso metaplásico possua vantagens de sobrevivência, os importantes

mecanismos de protecção são perdidos, tais como a secreção de muco e a remoção pelos cílios,

de materiais particulados;

- As influências que induzem a transformação metaplásica, se persistirem, podem predispor a

transformação maligna do epitélio .

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RESUMO – Adaptações celulares ao Stress

Hipertrofia

Aumento da célula e do órgão, sempre em resposta à elevação da carga de

trabalho;

Induzida por stress mecânico ou por factores de crescimento;

Ocorre em tecidos incapazes de divisão celular.

Hiperplasia Aumento do número de células em resposta a hormonas e outros factores

de crescimento;

Ocorre em tecidos cujas células são capazes de se dividir.

Atrofia

Diminuição da célula e do órgão, como resultado da diminuição do suprimento nutritivo ou por desuso;

Associada a diminuição de síntese e a aumento da quebra proteolítica dos

organelos celulares.

Metaplasia

Alteração do fenótipo em células diferenciadas, sempre em resposta a

irritação crónica que torna as células mais capazes de suportar o stress;

Em geral, induzida por via de diferenciação alterada das células-tronco nos

tecidos;

Pode resultar em redução das funções ou tendência aumentada para

transformação maligna.

Visão geral da lesão celular e da morte celular

Lesão celular reversível – nos estádios iniciais ou nas

formas leves de lesão, as alterações morfológicas e

funcionais são reversíveis, se o estímulo for removido;

- Embora existam anomalias estruturais e funcionais

graves, não há a progressão característica lesão para

dano significativo à membrana e dissolução nuclear;

Morte celular – com a continuação do dano, a lesão

torna-se irreversível, neste período, a célula não

recupera e morre;

- Há dois tipos de morte celular: necrose e apoptose

(Fig. 2).

Fig. 2

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Vitor Martins FMUL/UMa 14

Característica Necrose Apoptose

Tamanho da célula Aumentado (tumefacção) Reduzido (retracção)

Núcleo Picnose cariorrexe cariólise Fragmentação em fragmentos do tamanho de nucleossomas

Membrana plasmática Rompida Intacta; estrutura alterada,

especialmente a orientação dos

lípidos

Conteúdos celulares Digestão enzimática; extravasam

da célula

Intactos; podem ser libertados

nos corpos apoptóticos

Inflamação adjacente Frequente Não

Papel fisiológico ou

patológico

Invariavelmente patológica

(finalização da lesão celular

irreversível)

Sempre fisiológica, eliminação de

células não desejadas; pode ser

patológica após algumas formas

de lesão celular, sobretudo lesão

de DNA

Causas da lesão celular

Privação de oxigénio: a isquémia é a causa mais comum de hipóxia. A deficiência de oxigénio

também pode resultar da oxigenação inadequada do sangue (ex.: pneumonia) ou da redução da

capacidade do sangue em transportar oxigénio (ex.: anemia, envenenamento por CO);

Agentes químicos;

Agentes infecciosos;

Reacções imunológicas: doenças auto-imunes e reacções alérgicas;

Defeitos genéticos;

Desequilíbrios nutricionais: as deficiências nutricionais permanecem como a maior causa de

lesão celular;

Agentes físicos;

Envelhecimento.

Morfologia da lesão celular e da lesão tecidual

A função celular pode ser perdida antes de ocorrer a

morte celular e as alterações morfológicas na lesão

(ou morte) celular surgem mais tarde que ambas;

Os desarranjos celulares da lesão reversível podem

ser reparados e, se o estímulo nocivo cessa, a célula

retorna à sua normalidade;

Entretanto, a lesão persistente ou excessiva faz com

que as células passem do nebuloso “ponto de não-

retorno” para a lesão irreversível e morte celular; Fig. 3

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Robbins, Patologia Básica 2008/2009

Vitor Martins FMUL/UMa 15

Existem dois fenómenos que caracterizam de forma consistente a irreversibilidade: a

incapacidade de reverter a disfunção mitocondrial (perda da fosforilação oxidativa e

geração de ATP) mesmo depois da resolução da lesão original e os profundos distúrbios na

função da membrana.

Lesão reversível

As duas principais características morfológicas da lesão celular reversível são:

- Tumefacção celular – é resultado da falência das bombas de iões na membrana

plasmática, dependentes de energia, levando a uma incapacidade de manter a homeostase

iónica e de fluido;

É a primeira manifestação de quase todas as formas de lesão celular;

Quando afecta muitas células de um órgão, causa alguma palidez e aumento do turgor e

do peso do órgão;

Em microscopia pode revelar vacúolos pequenos e claros no citoplasma (segmentos

distendidos e separados do RE). Não é letal e designa-se por alteração hidrópica ou

degeneração vacuolar;

- Degeneração gordurosa – ocorre na lesão hipóxica e em várias formas de lesão metabólica

ou tóxica e manifesta-se pelo surgimento de vacúolos lipídicos, grandes ou pequenos, no

citoplasma;

Esta ocorre sobretudo em células envolvidas e dependentes do metabolismo de gordura

(ex.: hepatócitos e miócitos);

As células lesadas podem exibir uma coloração eosinofílica que se torna muito mais

pronunciada com a progressão para necrose;

Alterações ultra-estruturais da lesão celular reversível (Fig. 4):

1. Alterações na membrana plasmática, como bolhas, apagamento ou distorção das

microvilosidades e a perda das adesões intercelulares;

2. Alterações mitocondriais com tumefacção e a presença de densidades amorfas ricas em

fosfolípidos;

3. Dilatação do RE com destacamento dos ribossomas e a dissociação dos polissomas;

4. Alterações nucleares, com condensação da cromatina.

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Necrose

Necrose – alteração que acompanha a morte celular, que resulta da acção degradativa de

enzimas nas células lesadas letalmente;

As células necróticas exibem um aumento da eosinofilia (aumento da ligação da eosina às

proteínas citoplasmáticas desnaturadas e perda de basofilia conferida pelo RNA no citoplasma);

As células mortas são substituídas por grandes massas espiraladas compostas por fosfolípidos,

chamadas figuras de mielina, as quais são derivadas das membranas celulares danificadas;

As células mortas podem tornar-se calcificadas (precipitados fosfolipídicos posteriormente

degradados em ácidos gordos, que calcificam e originam os sabões de cálcio);

As alterações nucleares assumem um dos três padrões, todos devidos à quebra da cromatina e

do DNA:

- Cariólise: basofilia da

cromatina pode

empalidecer;

- Picnose: retracção

nuclear e aumento da

basofilia. O DNA

condensa-se;

- Cariorrexe: núcleo

picnótico sofre

fragmentação.

Fig. 4

RESUMO – Alterações morfológicas nas células lesadas

Lesão celular

reversível

Tumefacção celular, alteração gordurosa, bolhas na membrana plasmática e perda das microvilosidades, tumefacção das mitocôndrias, dilatação do RE,

eosinofilia.

Necrose Aumento da eosinofilia; retracção, fragmentação e dissolução nuclear;

rompimento da membrana plasmática e das membranas dos organelos;

extravasamento e digestão enzimática dos conteúdos celulares.

Apoptose Condensação da cromatina nuclear e formação dos corpos apoptóticos

(fragmentos de núcleo e citoplasma).

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Vitor Martins FMUL/UMa 17

Padrões de necrose tecidual

Necrose coagulativa

As células componentes estão mortas, mas a estrutura básica do

tecido é preservada (pelo menos alguns dias);

Os tecidos afectados adquirem uma textura firme;

Desnaturação das proteínas estruturais e enzimáticas,

bloqueando assim a proteólise das células mortas (anucleadas e

eosinófilas);

Por fim, as células necróticas são removidas por fagocitose;

É característica de enfartos (áreas de necrose isquémica) em todos os

órgãos sólidos, excepto o cérebro.

Necrose liquefactiva

Observada em infecções bacterianas focais ou fúngicas (estimulam a acumulação de células inflamatórias e as enzimas dos leucócitos a

digerirem o tecido);

A liquefacção digere por completo as células mortas, o que resulta

num tecido de massa viscosa, líquida;

Se o processo foi iniciado por inflamação aguda, o material é quase

sempre amarelo-cremoso – pús;

É comum a morte por hipóxia de células do SNC ocasionar este padrão

de necrose.

Necrose gangrenosa

Não é um padrão distintivo de morte celular;

É aplicado comumente à perna, que perdeu o seu suprimento sanguíneo e que sofreu necrose coagulativa;

Quando uma infecção bacteriana se sobrepõe, a necrose coagulativa é

modificada – gangrena húmida.

Necrose caseosa

Encontrada com mais frequência em focos de infecção tuberculosa;

Aparência friável branco-amarelada;

A estrutura do tecido é completamente obliterada e os

contornos celulares não podem ser distinguidos (células

fragmentadas, com aparência granular amorfa);

É quase sempre encerrada dentro de uma nítida borda inflamatória (granuloma).

Necrose gordurosa

Áreas focais de destruição gordurosa, tipicamente resultante da

libertação de lipases pancreáticas activadas na substância do pâncreas e

na cavidade peritoneal – pancreatite aguda;

Áreas brancas gredosas macroscopicamente visíveis (saponificação da gordura), provocadas pela combinação dos ácidos gordos libertados

com o cálcio.

Necrose fibrinóide

Em geral, observada nas reacções imunes que envolvem os vasos

sanguíneos;

É proeminente quando complexos antigénio-anticorpo são depositados nas paredes das artérias;

Aparência amorfa e róseo-brilhante (combinação dos imunocomplexos

com a fibrina);

Ex.: poliartrite nodular.

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O extravasamento de proteínas intracelulares através da membrana celular rompida e, por fim,

para a circulação, fornece meios de detectar a necrose tecido-específica, usando-se amostras de

sangue ou de soro.

Respostas subcelulares à lesão

Autofagia

- Refere-se à digestão lisossómica dos componentes da célula e contrasta com heterofagia, na

qual a célula ingere substâncias do meio exterior para destruição intracelular;

- Ocorre em células privadas de nutrientes, os organelos estão inseridos em vacúolos

autofágicos que se fundem com os lisossomas (autofagolisossoma);

- Os organelos são digeridos, mas em alguns casos permanecem pigmentos indigeríveis (ex.:

lipofuscina).

Indução (Hipertrofia) do REL

- As células expostas às toxinas que são metabolizadas no REL exibem hipertrofia do RE, um

mecanismo compensatório para maximizar a remoção de toxinas.

Alterações mitocôndriais

- As alterações em número, tamanho e forma das mitocôndrias são vistas em diversas

adaptações e respostas à lesão crónica (ex.: Hipertrofia celular há aumento do número de

mitocôndrias; atrofia celular há redução do número de mitocôndrias; na doença hepática

alcoólica, as mitocôndrias têm uma forma muito aumentada).

Anormalidades cito-esqueléticas

- Algumas drogas e toxinas interferem no arranjo e nas funções dos filamentos do cito-esqueleto

(ex.: Colchicina impede a polimerização dos microtúbulos e é útil no tratamento da gota) ou

resultam na acumulação anormal de filamentos (ex.: Síndrome de Kartagener, resulta do defeito

da mobilidade do cílios no epitélio respiratório).

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Mecanismos da lesão celular

Vários princípios gerais são relevantes para a maioria das formas de lesão celular:

- A resposta celular ao estímulo nocivo depende do tipo de lesão, da sua duração e da sua

gravidade;

- As consequências de um estímulo nocivo dependem do tipo, status, adaptabilidade e do

fenótipo genético da células lesada;

- A lesão celular resulta de alterações bioquímicas e funcionais num ou mais dos vários

componentes celulares essenciais (mitocôndrias, membranas celulares, síntese de proteínas, cito-

esqueleto e DNA nuclear) – Fig. 5.

Fig. 5

Depleção de ATP

As principais causas de depleção de ATP são a redução do suprimento de oxigénio e

nutrientes, o dano mitocondrial e as acções de algumas toxinas (ex.: cianeto);

Os tecidos com maior capacidade glicolítica (ex.: fígado) são capazes de sobreviver melhor à

perda de oxigénio e ao decréscimo de fosforilação oxidativa do que os tecidos com capacidade

limitada para a glicólise (ex.: cérebro)

A depleção de ATP a menos que 5% a 10% dos níveirs normais tem amplos efeitos em muitos

sistemas celulares críticos (Fig. 6):

- A actividade da bomba de sódio na membrana plasmática dependente de energia é

reduzida, resultando num acumular intracelular de sódio e o efluxo de potássio;

O ganho de soluto é acompanhado de um ganho isosmótico de água, causando

tumefacção celular e dilatação do RE;

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- Há um aumento compensatório na glicólise anaeróbica, na tentativa de manter as fontes

de energia celular;

Como consequência, o stock de

glicogénio intracelular é

rapidamente depletado e o

ácido láctico acumula-se,

levando à diminuição do pH

intracelular e da actividade de

muitas enzimas celulares;

- A falência na bomba de Ca2+ ocasiona

influxo de Ca2+, com efeitos nefastos

em vários componentes celulares;

Fig. 6

- A depleção prolongada ou crescente de ATP causa rompimento estrutural do aparelho

de síntese proteica, manifestado como desprendimento dos ribossomas do RER e

dissociação dos polissomas em monossomas, com consequente redução da síntese proteica;

- Por fim, há um dano irreversível nas membranas mitocondriais e lisossomais e a

células sofre necrose.

Danos na mitocôndria

As mitocôndrias podem ser danificadas por aumento

de CA2+ citosólico, por espécies reactivas de oxigénio

e privação de oxigénio, sendo sensíveis a virtualmente

todos os estímulos nocivos, incluindo hipóxia e

toxinas;

Há duas consequências principais aos danos

mitocondriais (Fig. 7):

- É comum a lesão mitocondrial resultar na formação

de um canal de alta condutância na membrana

mitocondrial (poro de transição de

permeabilidade mitocondrial);

Fig. 7

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A abertura desse canal determina a perda do potencial de membrana da

mitocôndria e alteração do pH, resultando numa falha na fosforilação oxidativa e

depleção progressiva do ATP, culminando na necrose da célula;

- As mitocôndrias contêm várias proteínas que activam as vias apoptóticas, incluindo o

citocromo C (principal proteína envolvida no transporte de electrões);

O aumento da permeabilidade da membrana mitocondrial pode resultar em

extravasamento dessas proteínas para o citosol e morte por apoptose.

Influxo de cálcio

A isquémia e certas toxinas causam um aumento da

concentração do cálcio citosólico, de início por

causa da libertação de Ca2+ armazenado

intracelularmente e, mais tarde, do cálcio que resulta

do influxo aumentado através da membrana

plasmática;

- O aumento do cálcio citosólico activa um

número de enzimas, com efeitos celulares

potencialmente prejudiciais (Fig. 8);

O aumento dos níveis de Ca2+ intracelular resultam,

também, na indução da apoptose; Fig. 8

A importância do Ca2+ na lesão celular foi estabelecida na descoberta de que a depleção de

Ca2+ extracelular retarda a morte celular após hipóxia e exposição a certas toxinas.

Acumulação de radicais livres derivados do oxigénio (Stress oxidativo)

Os radicais livres são espécies químicas que têm um único electrão desemparelhado numa das

órbitas externas;

- Quando são gerados nas células, atacam com intensidade os ácidos nucleicos, assim como uma

variedade de proteínas e lípidos celularas;

- Além disso, os radicais livres iniciam reacções autocatalíticas;

As espécies reactivas do oxigénio (ERO) são um tipo de radical livre derivado do oxigénio;

- São produzidas nas células durante a respiração e geração de energia mitocondrial, mas são

degradadas e removidas pelos sistemas celulares de defesa;

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- Quando a produção de ERRO aumenta ou quando os sistemas de remoção são ineficientes, o

resultado é um excesso desses radicais livres que levam a uma condição chamada de stress

oxidativo;

- Em muitas circunstâncias, a lesão celular envolve danos causados pelos radicais livres, que

incluem: lesão de isquémia-reperfusão, lesão química e por radiação, toxicidade do oxigénio e

outros gases, envelhecimento celular, destruição dos micróbios pelas células fagocíticas e lesão

tecidular causada por células inflamatórias;

Várias reacções são responsáveis pela geração de radicais livres:

- As reacções redox que ocorrem durante o metabolismo mitocondrial normal;

- Absorção de energia radiante;

- Metabolismo enzimático de substâncias químicas exógenas;

- Inflamação;

- Óxido nítrico (NO) pode actuar como radical livre ou ser convertido em espécies de nitrito

altamente reactivas.

Há vários sistemas enzimáticos e não-enzimáticos que contribuem para a inactivação das

reacções de radicais livres: superóxido dismutases, glutatião peroxidase, catalase, anti-oxidantes

endógenos e exógenos, o ferro e o cobre (Fig. 9);

Fig. 9

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Existem três reacções particularmente relevantes para a lesão celular mediada por radicais livres:

- Peroxidação lipídica das membranas;

- Ligação cruzada das proteínas: resulta no aumento na perda de actividade enzimática;

- Fragmentação do DNA.

Defeitos na permeabilidade da membrana

Vários mecanismos bioquímicos podem contribuir para os danos na membrana (Fig. 10):

- Diminuição da síntese de fosfolípidos,

devido a uma queda dos níveis de ATP;

- Aumento da degradação dos

fosfolípidos, devido à activação de

fosfolipases endógenas por elevação dos níveis

de Ca2+ citosólico;

- Espécies reactivas de oxigénio

(peroxidação lipídica das membranas);

- Alterações do cito-esqueleto, devido à

activação de proteases pelo Ca2+ citosólico

aumentado; Fig. 10

- Produtos de degradação de lípidos, em consequência da degradação fosfolipídica;

Os sítios mais importantes de membrana, durante a lesão celular, são:

- Membranas mitocondriais: decréscimo de ATP, necrose e libertação de proteínas

(apoptose);

- Membranas plasmáticas: perda do equilíbrio osmótico, influxo de fluidos e iões, perda de

conteúdos celulares e perda de metabolitos;

- Membranas lisossomais: extravasamento das suas enzimas para o citoplasma, activação de

hidrolases ácidas (em pH ácida da célula lesada), digestão enzimática dos componentes celulares

e necrose.

Danos no DNA e nas proteínas

A acumulação de DNA danificado e proteínas mal dobradas dispara a apoptose.

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Exemplos de lesão celular e necrose

Lesão isquémica e hipóxica (Fig. 4)

A isquémia ou diminuição do fluxo sanguíneo para um tecido, é a causa mais comum de

lesão celular em medicina clínica;

Ao contrário da hipóxia, na qual a produção de energia pela glicólise anaeróbia continua, a

isquémia também compromete a distribuição de substratos para a glicólise;

A isquémia lesa os tecidos com mais rapidez que a hipóxia.

Lesão de isquémia-reperfusão

A restauração do fluxo sanguíneo pode resultar em restauração das células se forem lesadas de

modo reversível;

No entanto, sob certas circunstâncias, essa restauração para tecidos isquémicos,

mas viáveis, resulta, paradoxalmente, em lesão acentuada e acelerada;

Como resultado, os tecidos continuam a perder células, além daquelas que foram lesadas de

modo irreversível no fim do episódio isquémico;

Vários mecanismos podem ser responsáveis pela exacerbação da lesão celular resultante da

reperfusão dentro dos tecidos isquémicos:

- Uma nova lesão pode ser iniciada durante a reoxigenação em virtude de uma

produção aumentada de ERO pelas células endoteliais, do parênquima e dos leucócitos

infiltrantes sobretudo porque a lesão mitocondrial leva a uma redução incompleta do oxigénio e

também por causa da acção das oxidases dos leucócitos, das células endoteliais ou do

parênquima;

- Os mecanismos de defesa anti-oxidantes celulares podem, também, ser

comprometidos pela isquémia;

- A lesão isquémica está associada a inflamação, a qual pode aumentar com a reperfusão

devido ao influxo aumentado de leucócitos e proteínas plasmáticas;

A activação do sistema complemento também contribui para a lesão isquémia-

reperfusão.

Lesão química (tóxica)

As substâncias químicas induzem lesão celular por um dos dois mecanismos gerais:

- Algumas substâncias químicas actuam directamente pela combinação com um componente

molecular crítico ou com um organelo celular (ex.: cloreto de mercúrio);

- Muitas outras substâncias químicas não são intrinsicamente activas sob o aspecto biológico, mas

devem ser primeiro convertidas a metabolitos tóxicos reactivos, que então agem sobre as

células-alvo (ex.: tetracloreto de carbono e acetoaminofeno).

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Apoptose

Apoptose – via de morte celular, induzida por um programa de suicídio rigorosamente

regulado, no qual as células destinadas a morrer activam enzimas capazes de degradar o seu

próprio DNA e as proteínas nucleares e citoplasmáticas;

A membrana plasmática da célula apoptótica permanece intacta, mas é alterada de tal maneira

que a célula e os seus fragmentos tornam-se alvo para os macrófagos;

Rapidamente a célula morta é removida, antes que o seu conteúdo extravase e, por isso, a morte

celular por essa via não induz uma reacção inflamatória.

Causas da apoptose

Apoptose em situações fisiológicas

- A morte por apoptose é um fenómeno normal que funciona para eliminar as células que não

são mais necessárias e para manter, nos tecidos, um número constante das várias populações

celulares, sendo importante nas seguintes situações fisiológicas:

Destruição programada de células durante a embriogénese;

Involução de tecidos hormono-dependentes sobr privação da hormona (ex.: células

endometriais);

Perda celular em populações celulares proliferativas (ex.: epitélio de cripta intestinal);

Morte de células que já tenham cumprido o seu papel (ex.: neutrófilos);

Eliminação de linfócitos auto-reactivos potencialmente nocivos;

Morte celular induzida por linfócitos T citotóxicos.

Apoptose em condições patológicas

- A apoptose elimina células que estão alteradas sob o aspecto genético ou lesadas de tal modo

que não podem ser reparadas, sem iniciar uma reacção acentuada no hospedeiro, mantendo,

assim, a lesão tão contida quanto possível;

- A morte por apoptose é responsável pela perda de células, em vários estados patológicos:

Lesão de DNA;

Acumulação de proteínas mal dobradas (stress do RE);

Lesão celular em certas infecções (sobretudo virais);

Atrofia patológica no parênquima de órgãos após obstrução do ducto (ex.: pâncreas,

parótida e rim).

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Mecanismos da apoptose

Morfologia

- Em tecidos corados pelo H&E, as células apoptóticas aparecem como massas ovais ou

redondas com citoplasma intensamente eosinófilo;

- Os núcleos exibem vários estágios de condensação e agregração da cromatina e, finalmente,

carriorrexe (fragmentação do DNA);

- Rapidamente as células retraem, formando brotos citoplasmáticos e fragmenta-se em corpos

apoptóticos compostos por vesículas envolvidas por membrana contendo citosol e organelos

(Fig. 2), que rapidamente são expulsos e fagocitados.

O evento fundamental na apoptose é a activação de enzimas denominadas caspases, que

activadas clivam numerosos alvos, culminando na activação de nucleases que degradam o DNA e

outras enzimas que provavelmente destroem nucleoproteínas e proteínas do cito-esqueleto;

Duas vias distintas convergem para a activação das caspases (Fig. 11):

Fig. 11

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- Via Mitocondrial (Intrínseca) da apoptose

As mitocôndrias contêm uma série de proteínas, capazes de induzir a apoptose, que

incluem o citocromo C e antagonistas de inibidores de apoptose citosólicos

endógenos;

A escolha entre a sobrevivência e a morte celular é determinada pela permeabilidade da

mitocôndria, controlada pela Bcl-2;

Quando as células são privadas de factores de crescimento e hormonas tróficas

ou são expostas a agentes que lesam DNA ou ainda acumulam quantidades

inaceitáveis de proteínas mal dobradas, um grupo de sensores é activado, sendo

que alguns desses sensores, membros da família do Bcl-2, activam, por sua vez, dois

membros pró-apoptóticos da família chamada Bax e Bak, que se dimerizam e se inserem

no interior da membrana mitocondrial, formando canais através dos quais o citocromo C

e outras proteínas mitocondriais extravasam para o citosol;

Outros sensores relacionados inibem as moléculas anti-apoptóticas Bcl-2 e Bcl-x,

com o mesmo resultado final – extravasamento de proteínas mitocondriais;

O citocromo C, em conjunto com alguns co-factores, activam a caspase-9;

O resultado final é a activação da cascata de caspases, levando, por fim, à

fragmentação nuclear;

Esta via parece ser a via responsável pela maioria das situações de apoptose.

- Via receptor de morte (Extrínseca) da apoptose

Os receptores membranares da família do TNF contêm um “domínio de morte”

conservado, sendo esses receptores do tipo TNF I e Fas (CD95);

O ligante Fas (Fas-L) é uma proteína de membrana expressa sobretudo em linfócitos T

activados;

Quando essas células T reconhecem os alvos que expressam Fas, as moléculas Fas são

ligadas em reacção cruzada pelo Fas-L e suas proteínas de ligação adaptadoras que,

por sua vez, se ligam à caspase-8;

O agrupamento de muitas moléculas de caspases leva à sua activação, iniciando, assim, a

cascata de caspases;

Em muitos tipos celulares, a caspase-8 pode clivar e activar um membro pró-apoptótico

da família Bcl-2, chamado Bid;

As proteínas celulares, notadamente um antagonista de caspase chamada FLIP, bloqueia a

activação das caspases em direcção aos receptores de morte;

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Esta via está envolvida na eliminação de linfócitos auto-reactivos e na eliminação

de células-alvo por alguns linfócitos T citotóxicos.

Remoção das células apoptóticas

- Em células normais, a fosfatidilserina está presente no folheto interno da membrana plasmática,

mas nas células apoptóticas esse fosfolípido move-se para fora e está expresso na camada

externa da membrana, onde é reconhecido pelos macrófagos;

- As células apoptóticas secretam factores solúveis que recrutam fagócitos;

- Alguns corpos apoptóticos expressam glicoproteínas adesivas que são reconhecidas pelos

fagócitos;

- Os macrófagos podem produzir proteínas que se ligam às células apoptóticas.

A necrose e a apoptose podem coexistir e estar relacionadas mecanicamente;

- Ex.: Lesão de DNA activa uma enzima chamada poli-ADP polimerase (ribose) que depleta os

suprimentos celulares do nucleótido adenina nicotinamida, levando à quade dos níveis de ATP e,

por fim, à necrose.

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Acumulação intracelular de substâncias

As células podem acumular quantidades anormais de várias substâncias;

A substância pode estar localizada no citoplasma, no interior de organelos (tipicamente os

lisossomas) ou no núcleo e pode ser sintetizada pelas células afectadas ou produzida em qualquer

outro lugar;

Existem várias vias principais de acumulações intracelulares:

1. Metabolismo anormal, como na degeneração gordurosa do fígado;

2. Mutações que causam alterações no dobramento e transporte de proteína, tal

que moléculas defeituosas acumulam-se intracelularmente;

3. Deficiência de enzimas cruciais, responsáveis pela quebra de certos compostos,

causando substratos que se acumulam nos lisossomas, como nas doenças de

armazenamento lisossómico;

4. Incapacidade de degradar partículas fagocitadas, como na acumulação do pigmento

carbono.

Degeneração gordurosa (esteatose)

Degeneração gordurosa – qualquer acumulação de triglicéridos dentro das células do

parênquima (mais observada no fígado);

A esteatose pode ser causada por toxinas (alteram a função das mitocôndrias e do REL),

desnutrição proteica (diminui a síntese de apoproteínas), diabetes melltus, obesidade e anóxia

(inibe a oxidação dos ácidos gordos);

O abuso de álcool e o diabetes associado com a obesidade são as causas mais

comuns da degeneração gordurosa do fígado nos países industrializados;

A alteração gordurosa mais acentuada pode de forma transitória prejudicar a função celular,

porém a menos que algum processo intracelular vital seja irreversivelmente danificado, a

degeneração gordurosa é reversível.

Morfologia

- A acumulação gordurosa aparece como vacúolos claros no interior das células

parenquimatosas;

- A gordura é identificada pela coloração com Sudan IV ou Oil Red O (coram a gordura

em vermelho-alaranjado);

- O glicogénio pode ser identificado pela coloração para polissacáridos, utilizando-se o

corante ácido periódico-Schiff (cora o glicogénio de vermelho-violeta).

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Colesterol e ésteres de colesterol

Os macrófagos em contacto com restos de lípidos das células necróticas ou formas anormais de

lipoproteínas (ex.: oxidadas) podem tornar-se cheios de lípido fagocitado, tornando-se

preenchidos com pequenos vacúolos de lípidos revestidos por membrana, conferindo uma

aparência espumosa no seu citoplasma (células espumosas);

Ex.: aterosclerose e xantomas.

Proteínas

Podem ocorrer acumulações de proteínas porque os excessos são apresentados às células ou

porque as células sintetizam quantidades excessivas;

Ex.:

- Síndrome nefrótica: gotículas de reabsorção de proteína nos túbulos contornados proximais de

cor hialina rósea;

- Acumulação de imunoglobulinas recentemente sintetizadas nos RER de alguns plasmócitos –

corpúsculos de Russell (redondos e eosinófilos).

Glicogénio

Excessivos depósitos intracelulares de glicogénio estão associados a anormalidades no

metabolismo da glicose ou do glicogénio;

Ex.: Diabetes mellitus: acumula-se no epitélio tubular renal, nos miócitos e nas células β dos

Ilhéus de Langerhans.

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Pigmentos

São substâncias coloridas que são exógenas, originando-se fora do corpo ou endógenas,

sintetizadas dentro do próprio corpo;

Pigmentos

Carbono

(indigerível)

Pigmento exógeno mais comum;

Quando inalado, é fagocitado pelos macrófagos alveolares e transportado através de canais linfáticos para os nódulos linfáticos tráqueo-brônquicos;

Os agregados do pigmento escurecem os nódulos e o parênquima pulmonar

(antracose).

Lipofuscina

(indigerível)

Pigmento endógeno, designado por “pigmento do desgaste”;

Produto de degradação da peroxidação lipídica;

Material intracelular granular, castanhi-amarelado, que se acumula em vários

tecidos (ex.: coração, fígado e cérebro) como consequência do

envelhecimento ou da atrofia;

Não é nociva à célula, mas é importante como marcador de lesão antiga por radical livre;

O pigmento marrom, quando presente em grandes quantidades, confere ao

tecido uma aparência que é chamada de atrofia marrom.

Melanina

Pigmento endógeno, preto-acastanhado;

Sintetizada exclusivamente pelos melanócitos localizados na epiderme e actua como protector contra a radiação UV prejudicial;

Os queratinócitos basais adjacentes da pele podem acumular o pigmento (ex.:

sardas), assim como os macrófagos da derme.

Hemossiderina

Pigmento granular derivado da hemoglobina, amarelo a castanho-dourado, que se acumula nos tecidos onde há um excesso de ferro, local ou

sistémico;

Normalmente, o ferro é armazenado no interior das células em associação

com a aproferritina, formando as micelas de ferritina;

Este pigmento representa grandes agregados dessas micelas de ferritina, facilmente visualizados em MO pela reacção histoquímica do azul-da-prússia;

Os excessos locais de ferro e, consequentemente, de hemossiderina, resultam

de hemorragia;

Ex.: Equimose comum:

- Os iões ferro da hemoglobina acumulam-se como hemossiderina amarelo-dourado;

Sempre que há uma sobrecarga sistémica de ferro, a hemossiderina é

depositada em muitos órgãos e tecidos – hemossiderose (com a progressão

da acumulação, as células parenquimatosas tornam-se “bronzeadas” (fígado,

pâncreas, coração e órgãos endócrinos, sem lesão no tecido);

- Ocorre nas condições de absorção aumentada de ferro alimentar, uso

comprometido de ferro, anemias hemolíticas e transfusões;

Acumulação de ferro mais extensa é visto na hemocromatose hereditária,

com lesão no tecido, incluindo fibrose hepática, falência cardíaca e diabetes mellitus.

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Calcificação patológica

Implica o depósito anormal de sais de cálcio, em combinação com pequenas quantidades de

ferro, magnésio e outros minerais;

Existem dois tipos de calcificação: calcificação distrófica e calcificação metastática;

Calcificação distrófica

O depósito de cálcio ocorre nos tecidos mortos ou que estão morrendo, que ocorre na

ausência de desarranjos metabólicos do cálcio (ex.: com níveis séricos normais de cálcio);

É encontrada em áreas de necrose de qualquer tipo

Ex.: Ateromas da aterosclerose avançada;

Calcificação distrófica das valvas aórticas é causa importante da estenose aórtica nos idosos;

A patogenia da calcificação distrófica envolve a iniciação (ou nucleação) e a propagação,

ambos podendo ser intra ou extracelulares, sendo o produto final a formação de fosfato de

cálcio cristalino;

- A iniciação extracelular ocorre em vesículas revestidas por membrana originadas de células

degeneradas, na calcificação patológica;

- A iniciação intracelular ocorre nas mitocôndrias de células mortas ou que estão morrendo;

- A formação dos cristais depende da concentração de Ca2+ e do PO4- nos espaços

extracelulares, da presença de inibidores do mineral e do grau de colagenização, o qual aumenta

a taxa de crescimento do cristal;

Morfologia

- Os sais de cálcio são vistos macroscopicamente como grânulos finos brancos ou

agregados, muitas vezes palpáveis como depósitos arenosos;

- Histologicamente, a calcificação aparece como depósitos basófilos intra ou

extracelulares;

- Com o tempo, pode ser formado osso heterotípico no foco da calcificação.

Calcificação metastática

Depósito de sais de cálcio em tecidos normais, reflectindo quase sempre algum distúrbio

no metabolismo do cálcio (hipercalcemia);

As quatro principais causas da hipercalcemia são: secreção aumentada da hormona da

paratiróide, destruição óssea, distúrbios relacionados com a vitamina D e insuficiência renal;

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Morfologia

- Pode ocorrer em todo o corpo, mas afecta sobretudo os tecidos intersticiais da mucosa

gástrica, rins, pulmões e da vasculariação;

- Os depósitos de cálcio lembram os descritos na calcificação distrófica;

- Não costumam causar disfunção clínica, mas calcificações maciças nos pulmões podem gerar

déficits respiratórios e nos rins (nefrocalcinose) podem causar lesão renal.

Envelhecimento celular

Envelhecimento celular – é o resultado do declínio progressivo do tempo de vida e da

capacidade proliferativa das células e dos efeitos da exposição contínua a factores exógenos que

causam acumulação de lesões moleculares e celulares;

Vários são os mecanismos conhecidos ou suspeitos de serem responsáveis pelo envelhecimento

celular (Fig. 12):

- Lesão do DNA: defeitos no mecanismo de reparo de DNA; o reparo do DNA pode ser

activado pela restrição calórica (conhecida por prolongar o envelhecimento em organismos-

modelo, mais propriamente, impõe um nível de stress que activa as proteínas Sir2, que

funcionam como uma diacetilase de histona);

- Decréscimo da replicação celular: conhecido por senescência replicativa, consiste na

capacidade reduzida de divisão celular resultante de quantidades descrescentes de telomerase e

encurtamento progressivo dos telómeros;

- Capacidade regenerativa reduzida das células-tronco nos tecidos: acumulação da

proteína p16 nas células-tronco, fazendo com que elas percam progressivamente a capacidade

de auto-renovação;

- Acumulação de lesões metabólicas: radicais livres;

- Outros factores: prováveis papéis dos factores de crescimento que promovem

envelhecimento em organismos-modelo.

Fig. 12

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Vitor Martins FMUL/UMa 34

Capítulo 1I

Inflamação Aguda e Crónica

Visão geral da inflamação

Inflamação – é uma resposta protectora do hospedeiro a invasores estranhos e tecidos

necróticos, porém ela mesma pode causar lesão tecidual;

Os principais componentes da inflamção são a reacção vascular e a resposta celular. Ambas

são activadas por mediadores derivados das proteínas plasmáticas e de várias células;

- As manifestações externas da inflamação, chamadas de sinais cardinais, que resultam da

reacção vascular e resposta celular, são: calor, rubor e tumor;

- Os dois sinais cardinais adicionais da inflamação aguda, dor e perda de função,

ocorrem como consequência da elaboração do mediador e da lesão mediada por leucócitos;

As etapas da resposta inflamatória podem ser lembradas com os cinco Rs:

1. Reconhecimento do agente lesivo;

2. Recrutamento dos leucócitos;

3. Remoção do agente;

4. Regulação (controlo) da resposta;

5. Resolução (reparo).

O resultado da inflamação aguda é a eliminação do estímulo nocivo, seguida do declínio da

reacção e o reparo do tecido lesado ou lesão persistente que resulta em inflamação crónica.

Fig.13

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Inflamação aguda

Inflamação aguda – é uma resposta rápida e de curta duração à lesão ou a micróbios e outras

substâncias estranhas, que é designada a levar leucócitos e proteínas plasmáticas para os locais da

lesão;

A inflamação aguda possui dois componentes principais: alterações vasculares e eventos

celulares.

Estímulos para a inflamação aguda: infecções, trauma, agentes químicos e físicos, necrose

tecidual, corpos estranhos e reacções imunológicas.

Alterações vasculares

Alterações vasculares: alterações do calibre vascular que resultam num aumento do fluxo

sanguíneo (vasodilatação) e alterações estruturais que permitem que as proteínas plasmáticas

deixem a circulação (aumento da permeabilidade vascular).

Alterações no fluxo e calibre vasculares

Iniciam-se rapidamente após a lesão ou infecção, mas desenvolvem-se em velocidades variáveis,

dependendo da natureza e gravidade do estímulo inflamatório original:

1. Após uma vasoconstricção transitória, ocorre vasodilatação das arteríolas,

resultando num aumento do fluxo sanguíneo e abertura dos leitos capilares (eritema e

calor);

2. Como a microcirculação torna-se mais permeável, ocorre o extravasamento e deposição de

líquido e proteínas plasmáticas (edema). A perda de líquido faz com que os eritrócitos

fiquem mais concentrados, aumentando a viscosidade do sangue e diminuindo a velocidade

da circulação (estase);

3. Quando a estase se desenvolve, os leucócitos (principalmente os neutrófilos) começam a

acumular-se ao longo da superfície endotelial vascular (marginação) que se caracteriza pela

primeira etapa da migração e acumulação dos leucócitos no local da lesão.

Alterações da permeabilidade vascular

A vasodilatação das arteríolas e o volume do fluxo sanguíneo aumentado provocam um aumento

da pressão hidrostática intravascular, resultando na saída de líquido dos capilares para os tecidos;

- Transudato: líquido que é essencialmente um ultrafiltrado do plasma sanguíneo e contém

poucas proteínas;

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- Entretanto, a transudação é logo superada pelo aumento da permeabilidade vascular, que

permite a saída de líquido rico em proteínas e células (exsudato) para o tecido intersticial –

líquido típico da inflamação;

- A perda de proteína do plasma reduz a pressão osmótica intravascular e eleva a pressão

osmótica do líquido intersticial, resultando no efluxo de água e de iões para os tecidos

extravasculares;

Fig. 14

Vários mecanismos podem contribuir para o aumento da permeabilidade vascular nas reacções

inflamatórias agudas:

- Contracção da célula endotelial, formando lacunas intercelulares nas vénulas pós-

capilares:

Causa mais comum do aumento da permeabilidade vascular, sendo um processo

reversível;

Resposta transitória imediata: contracção rápida após a ligação dos mediadores

histamina, bradicinina, leucotrienos e outros aos receptores específicos, geralmente de

curta duração;

Alterações do cito-esqueleto induzidas por citocinas (TNF e IL-1), provocam uma

contraação mais lenta e prolongada;

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Vitor Martins FMUL/UMa 37

- Lesão endotelial:

Resulta no extravasamento vascular, causado por necrose e desprendimento da célula

endotelial;

Resposta contínua imediata: o extravasamento começa imediatamente após a lesão e

persiste por várias horas (ou dias) até que os vasos danificados sejam trombosados ou

reparados;

Extravasamento prolongado tardio: começa após um certo tempo (de 2 a 12 horas),

durando várias horas ou dias, e envolve vénulas e capilares (ex.: queimadura solar que

aparece ao anoitecer, após um dia no sol);

- Lesão endotelial mediada por leucócitos:

Acumulação de leucócitos que libertam muitos mediadores tóxicos;

- Trancitose aumentada:

Ocorre via canais formados pela fusão de vesículas intracelulares, aumentando a

permeabilidade vascular após exposição a certos mediadores (ex.: VEGF);

- Extravasamento de novos vasos sanguíneos:

O reparo do tecido envolve a formação de novos vasos (angiogénese).

Respostas dos vasos linfáticos

A pequena quantidade de líquido intersticial normalmente formada é removida por

drenagem linfática;

Na inflamação, o fluxo da linfa é aumentado e auxilia a drenagem do fluido do edema do espaço

extravascular;

Além do líquido, os leucócitos e os restos celulares podem caminhar na linfa;

Nas reacções inflamatórias mais severas (ex.: micróbios), os linfáticos podem transportar o

agente lesivo, tornando-se inflamados secundariamente (linfagite), bem como os nódulos

linfáticos de drenagem (linfadenite), estes últimos estando frequentemente aumentados.

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RESUMO – Reacções vasculares na inflamação aguda

Vasodilatação É induzida por mediadores químicos como a histamina e é a causa do

eritema e estase do fluxo sanguíneo.

Aumento da

permeabilidade

vascular

É induzido pela histamina, cininas e outras mediadores que produzem

aberturas entre as células endoteliais, por lesão endotelial directa ou

induzida por leucócitos e pelo aumento da passagem de líquidos através do

endotélio;

O aumento da permeabilidade vascular permite a entrada de leucócitos e

proteínas plasmáticas nos locais da infecção ou da lesão do tecido;

O líquido que extravesa dos vasos sanguíneos resulta em edema.

Eventos celulares: recrutamento e activação dos leucócitos

Eventos celulares: emigração dos leucócitos da microcirculação e sua acumulação no foco de

lesão (recrutamento e activação celulares). Os principais leucócitos na inflamação aguda são so

neutrófilos (leucócitos polimorfonucleares).

Recrutamento dos leucócitos (Fig. 15)

1. Marginação e rolagem

- Os eritrócitos menores tendem a se mover mais rápido do que os grandes leucócitos, daí,

estes últimos serem empurrados para fora da coluna axial, possibilitando uma oportunidade

melhor de interagir com as células endoteliais de revestimento, especialmente quando

ocorre estase – marginação (acumulação de leucócitos na periferia dos vasos);

- Subsequentemente, os leucócitos rolam na superfície endotelial, aderindo transitoriamente ao

longo do caminho a um processo chamado rolagem. Estas adesões fracas são mediadas pelas

moléculas de adesão da família das selectinas;

- Normalmente, as selectinas endoteliais são expressas em níveis baixos ou não estão presentes

em todas as células normais, sendo hiper-reguladas após estimulação por mediadores específicos;

- Portanto, a ligação dos leucócitos é grandemente restrita ao endotélio, nos locais da

infecção ou lesão, onde os mediadores são produzidos.

2. Adesão e transmigração

- A adesão firme às superfícies endoteliais é mediada pelas integrinas expressas nas

superfícies celulares dos leucócitos;

Têm baixa afinidade até que haja activação dos leucócitos por quimiocinas

(citocinas quimioatraentes secretadas por várias células, nos locais de inflamação, e ligam-

se a proteoglicanos na superfície do endotélio);

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Quando os leucócitos aderentes encontram as quimiocinas, as células são activadas e as

suas integrinas sofrem mudanças conformacionais, agrupam-se e convertem-se a um

estado de alta afinidade;

- Ao mesmo tempo, outras citocinas (TNF e IL-1), activam as células endoteliais para aumentar a

sua expressão de ligantes para integrinas (ICAM-1 e VCAM-1);

- Após a aderência na superfície endotelial, os leucócitos migram pela parede do vaso

(principalmente nas vénulas da circulação sistémica), espremendo-se entre as células ao nível das

junções intercelulares (diapedese);

A migração é orientada pelas quimiocinas produzidas nos tecidos extravasculares, as quais

estimulam a movimentação dos leucócitos em direcção aos seus gradientes químicos;

Além disso, a PECAM-1 (CD31), uma molécula de adesão celular expressa em

leucócitos e células endoteliais, medeia os eventos de ligação necessários para os

leucócitos atravessarem o endotélio;

- Após a passagem pelo endotélio, os leucócitos secretam colagenases que degradam

focalmente a membrana basal dos vasos, atravessando-a.

Molécula endotelial Molécula leucocitária Principal papel

P-selectina Proteínas modificadas de Sialil-

Lewis X

Rolagem (neutrófilos, monócitos,

linfócitos)

E-selectina Proteínas modificadas de Sialil-

Lewis X

Rolagem e adesão (neutrófilos,

monócitos, linfócitos T)

GlyCam-1, CD34 L-selectina Rolagem (neutrófilos, monócitos)*

ICAM-1 (família das imunoglobulinas)

Integrinas CD11/CD18 (LFA-1, Mac-1)

Adesão, parada, transmigração (neutrófilos, monócitos, linfócitos)

VCAM-1 (família das

imunoglobulinas)

Integrina VLA-4 Adesão (eosinófilos, monócitos,

linfócitos)

CD31 (PECAM-1) CD31 Transmigração (todos os leucócitos) *As interacções CD34-L-selectina estão também envolvidas na “migração” dos linfócitos circulantes para as vénulas de

endotélio alto dos nódulos linfáticos.

3. Quimiotaxia

- Após o extravasamento, os leucócitos migram em direcção ao local da lesão ou infecção, ao

longo de um gradiente químico (quimiotaxia);

- Substâncias exógenas e endógenas podem actuar como factores quimiotáticos para os

leucócitos e incluem: produtos bacterianos (N-formilmetionina); citocinas (quimiocinas);

componentes do sistema complemento (C5a); produtos do metabolismo do ácido araquidónico

(leucotrieno B4);

- A ligação dos quimioatraentes aos receptores específicos na superfície celular resulta em

eventos de transdução de sinal mediados pela proteína G-7, alguns dos quais elevam o cálcio

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citosólico, que suscita a montagem dos elementos contrácteis do cito-esqueleto,

necessários para o movimento;

- Os leucócitos movem-se projectando pseudópodes que se ancoram na MEC e que puxam a

célula na direcção da projecção;

A direcção deste movimento é especificada pela alta densidade de interacções ligante

quimiotático-receptor, na margem dianteira da célula.

Na maioria das formas de inflamação aguda, os neutrófilos predominam no infiltrado inflamatório

durante as primeiras 6 a 24 horas, sendo substituídos por monócitos em 24 a 48 horas;

Algumas excepções: infecções por Pseudomonas (recrutamento contínuo de neutrófilos, por

vários dias); infecções virais (linfócitos são os primeiros a chegar); algumas reacções de

hipersensibilidade (granulócitos eosinófilos podem ser o principal tipo celular);

Resumindo: O recrutamento dos leucócitos é um processo de múltiplas etapas consistindo na

aderência fraca e rolagem no endotélio (mediadas por selectinas); aderência firme ao endotélio

(mediada por integrinas); e migração por entre os espaços interendoteliais.

Fig. 15

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Activação dos leucócitos

Os estímulos para a activação dos leucócitos incluem os micróbios, os produtos das células

necróticas e vários mediadores;

Os leucócitos expressam nas suas superfícies diferentes classes de receptores que percebem a

presença de micróbios e incluem: TLRs (receptor semelhante a Toll) reconhecem endotoxina

(LPS); receptores transmembranares acoplados à proteína G-7; e outras famílias de receptores;

A activação leucocitária resulta em muitas funções ampliadas: fagocitose, produção de

substâncias que destroem os micróbios fagocitados e removem tecidos mortos; e produção de

mediadores que amplificam a reacção inflamatória.

1. Fagocitose

- A fagocitose consiste em três etapas distintas, mas inter-relacionadas (Fig. 16):

1. Reconhecimento e fixação da partícula ao linfócito fagocítico;

Os leucócitos possuem receptores de superfície específicos que reconhecem os

componentes do micróbios e células mortas ou as proteínas do hospedeiro (opsoninas),

que revestem os micróbios e os torna alvos para a fagocitose (opsonização);

Principais opsoninas: IgG (ligam-se ao receptor Fc, chamado de FcγRI); fragmentos 1 e

3 do complemento (ligam-se aos receptores CR1 e 3); colectinas (ligam-se a

receptores C1q);

2. Invaginação, com subsequente formação de um vacúolo fagocítico;

A ligação de partículas opsonizadas desencadeia a invaginação e induzem a activação

celular que aumenta a degradação dos micróbios ingeridos;

Os pseudópodes estendem-se em torno do material, formando um vacúolo

fagocítico;

De seguida, a membrana do vacúolo funde-se com a membrana de um grânulo

lisossómico, formando um fagolisossoma;

3. Destruição e degradação do material ingerido;

As etapas-chave nesta reacção são a produção de substâncias microbicidas dentro

dos lisossomas e a fusão dos lisossomas com os fagossomas, expondo,

selectivamente, as partículas ingeridas aos mecanismos destruidores dos leucócitos;

As substâncias microbicidas mais importantes são as espécies reactivas do oxigénio e

as enzimas lisossómicas;

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A fagocitose estimula um surto oxidativo caracterizado por um súbito aumento do

consumo de oxigénio, do catabolismo do glicogénio (glicogenólise), do aumento da

oxidação de glicose e da produção de ERO;

Os lisossomas dos neutrófilos (grânulos azurófilos) contêm a enzima mieloperoxidase

(MPO), que na presença de um halóide como o Cl-, converte H2O2 em HOCl., que é um

potente oxidante e agente antimicrobiano que destrói bactérias por halogenação

ou por peroxidação de proteínas e lípidos;

Após o surto oxidativo, o H2O2 é degradado pela acção da catalase em água e O2 e as

outras ERO também são degradadas;

Os microrganismos mortos são então degradados pela acção de hidrolases

lisossómicas (provavelmente a mais importante é a elastase);

Vários outros componentes dos grânulos dos leucócitos são capazes de destruir

patogénios infecciosos: proteína por aumento da permeabilidade bactericida;

lisozima; proteína básica principal; e defensinas.

Fig. 16

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Lesão tecidual induzida por leucócitos

Os leucócitos podem eliminar micróbios e células mortas através de fagocitose seguida de

destruição nos fagolisossomas;

A destruição é causada por radicais livres (ERO, NO) gerados nos leucócitos activados e nas

enzimas lisossómicas;

As enzimas e as ERO podem ser libertadas para o meio extracelular, por vários mecanismos:

- Se o vacúolo fagocítico permanecer temporariamente aberto para fora, antes do fechamento

completo do fagolisossoma (regurgitação durante a alimentação);

- Se as células encontrarem materiais que não podem ser facilmente ingeridos (ex.:

imunocomplexos depositados na membrana basal glomerular), a tentativa de fagocitar estas

substâncias (fagocitose frustrada) inicia uma forte activação dos leucócitos e as enzimas são

libertadas dentro do tecido circundante ou no lúmen;

- Depois da fagocitose de susbtâncias potencialmente nocivas (ex.: cristais de urato), que lesam a

membrana do fagolisossoma.

Exemplos clínicos de lesão induzida por leucócitos: distúrbios inflamatórios

Distúrbios Células e moléculas envolvidas na lesão

Aguda

Síndrome de angústia

respiratória aguda

Neutrófilos

Rejeição aguda de transplante Linfócitos; anticorpos e complemento

Asma Eosinófilos; anticorpos IgE

Glomerulonefrite Anticorpos e complemento; neutrófilos e

monócitos Choque séptico citocinas

Vasculite Anticorpos e complemento; neutrófilos

Crónica

Artrite Linfócitos, macrófagos; anticorpos

Asma Eosinófilos, outros leucócitos; anticorpos IgE

Aterosclerose Macrófagos; linfócitos? Rejeição crónica ao

transplante

Linfócitos; citocinas

Fibrose pulmonar Macrófagos, fibroblastos

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Defeitos das funções leucoitárias

Doença Defeito

Adquiridas

Supressão da medula óssea: tumores, radiação, quimioterapia

Produção de leucócitos

Lesão térmica, diabetes, malignidade,

sépsis, imunodeficiências

Quimiotaxia

Hemodiálise, diabetes mellitus Aderência

Leucemia, anemia, sépsis, diabetes,

neonatos, desnutrição

Fagocitose e actividade microbiana

Genéticas

Deficiência da adesão leucocitária 1 Cadeia β das integrinas CD11/CD18

Deficiência da adesão leucocitária 2 Fucosil transferase necessária para a

síntese do oligossacárido sialilado

(receptor para selectinas)

Doença granulomatosa crónica

Ligada ao X

Autossómica recessiva

Diminuição do surto oxidativo

NADPH-oxidase (comp. memb.)

NADPH-oxidase (comp. citoplasm.)

Deficiência de mieloperoxidade

(MPO)

Ausência do sistema MPO-H2O2

Síndrome de Chédiak-Higashi Proteína associada à membrana

envolvida na atracção e fusão à

membrana do organelo

Resolução da inflamação aguda (Fig. 17)

Fig. 17

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RESUMO – Sequência de eventos na inflamação aguda

As alterações vasculares na inflamação aguda são caracterizadas por um fluxo

sanguíneo aumentado devido à dilatação das arteríolas e do leito capilar (eritema e

calor);

A permeabilidade vascular aumentada, através das junções celulares interendoteliais

afastadas ou por lesão directa da célula endotelial, resulta num exsudato de líquido

extravascular rico em proteínas (edema tecidual);

Os leucócitos, no início predominantemente neutrófilos, aderem ao endotélio através

de móleculas de adesão, e então deixam a microcirculação e migram para o local da

lesão sob influência dos agentes quimiotáticos;

A fagocitose, a destruição e a degradação do agente nocivo seguem-se;

Os defeitos genéticos ou adquiridos das funções dos leucócitos produzem infecções

recorrentes;

O resultado da inflamação aguda pode ser a remoção do exsudato, com restauração da arquitectura normal do tecido (resolução); transição para inflamação crónica;

ou extensa destruição do tecido, resultando na cicatrização.

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Vitor Martins FMUL/UMa 46

Padrões morfológicos da inflamação aguda

Inflamação serosa

Extravasamento de fluido aquoso, pobre em proteínas (efusão);

Dependendo do local da lesão, origina-se do soro sanguíneo ou das

secreções de células mesoteliais que revestem as cavidades peritoneal,

pleural e pericárdica;

Ex.: bolha cutânea resultante de uma queimadura ou infecção viral.

Inflamação fibrinosa

Ocorre em consequência de lesões mais graves;

Resultado de uma maior permeabilidade vascular que permite a passagem de moléculas maiores (ex.: fibrinogénio) parao meio

extravascular;

A fibrina extravascular acumulada aparece como uma rede

eosinifílica de filamentos ou, às vezes, como um coágulo amorfo;

É característica no revestimento de cavidades corporais (ex.:

meninges, pericárdio e pleura);

A organização de um exsudato fibrinoso pericárdico forma um denso tecido cicatricial fibroso que transpõe ou oblitera o espaço

pericárdico e restringe a função do miocárdio.

Inflamação supurativa

(purulenta)

Presença de grandes quantidades de exsudato purulento (pús)

consistindo em neutrófilos, células necróticas e liquído de edema;

Certos microrganismos (ex.: Estafilococos) induzem essa supuração localizada (piogénicos);

Os abscessos (colecções localizadas de pús) possuem uma região

central de células necróticas, tendo à volta uma camada de neutrófilos

preservados e circundada por vasos dilatados e fibroblastos em

proliferação, indicando o início do reparo.

Úlcera

É um defeito local ou escavação da superfície de um órgão ou tecido que é produzida por necrose das células e

desprendimento (esfacelamento) do tecido inflamatório

necrótico;

É encontrada mais comumente: na necrose inflamatória da mucosa da

boca, estômago, intestino e tracto genito-urinário; e no tecido

necrótico e inflamação subcutânea dos membros inferiores dos idosos

com distúrbios circulatórios;

Durante o estágio agudo, há infiltração polimorfonuclear intensa e dilatação vascular nas margens do defeito;

Com a cronicidade, as margens e a base da úlcera desenvolvem

cicatrização, com acumulação de linfócitos, macrófagos e plasmócitos.

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Mediadores químicos da inflamação

Os mediadores podem ser produzidos localmente pelas células, no sítio da inflamação, ou

podem estar em circulação no plasma (sintetizados pelo fígado) como precursores

inactivos que são activados no local da inflamação;

A maioria dos mediadores induz os seus efeitos através da ligação a receptores específicos nas

células-alvo;

Os mediadores podem estimular a libertação de moléculas efectoras secundárias pelas células-

alvo;

As acções da maioria dos mediadores são estreitamente reguladas.

Acções dos principais mediadores da inflamação

Deri

vad

o d

e c

élu

las

Mediador Fonte Principais acções

Histamina Mastócitos, basófilos,

plaquetas

Vasodilatação, aumento da permeabilidade

vascular, activação endotelial

Serotonina Plaquetas Vasodilatação, aumento da permeabilidade

vascular

Prostaglandinas

Prostaciclina I2

Tromboxano A2

Prostaciclinas D2, E2

Mastócitos, leucócitos

Vasodilatação, dor, febre

Vasodilatação, inibe a agregação plaquetária

Vasoconstricção, promove agregação

plaquetária

Vasodilatação, aumento da permeabilidade

vascular

Leucotrienos Mastócitos, leucócitos Aumento da permeabilidade vascular,

quimiotaxia, adesão, activação de leucócitos, broncoespasmo, vasoconstricção

Factor activador

plaquetário

Leucócitos, células

endoteliais

Vasodilatação, aumento da permeabilidade

vascular, adesão de leucócitos, quimiotaxia,

desgranulação, surto oxidativo

ERO Leucócitos Destruição de micróbios, lesão tecidual

NO Endotélio, macrófagos Relaxamento do músculo liso vascular,

destruição de micróbios

Citocinas

(ex.: TNF e IL-1)

Macrófagos, linfócitos,

células endoteliais,

mastócitos

Activação endotelial local (expressão de

moléculas de adesão), resposta sistémica da

fase aguda; em infecções graves, choque

séptico

Quimiocinas Leucócitos, macrófagos Quimiotaxia, activação de leucócitos

Der.

Pro

t. P

lasm

. Complemento Plasma (produzido no

fígado)

Activação e quimiotaxia de leucócito,

opsonização, vasodilatação (estimulação de

mastócito)

Cininas Plasma (produzido no

fígado)

Aumento da permeabilidade vascular,

contracção do músculo liso, vasodilatação,

dor

Proteases activadas

durante a coagulação

Plasma (produzido no

fígado)

Activação endotelial, recrutamento de

leucócitos

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Inflamação crónica

Inflamação crónica – é a inflamação de duração prolongada (semanas a meses ou anos) na

qual a inflamação activa, destruição tecidual e reparação ocorrem simultaneamente;

Caracteriza-se por:

- Infiltração de células mononucleares, incluindo macrófagos, linfócitos e plasmócitos;

- Destruição tecidual, francamente induzida pelos produtos das células inflamatórias;

- Reparo, envolvendo proliferação de novos vasos (angiogénese) e fibrose;

A inflamação aguda pode progredir para inflamação crónica quando a resposta aguda não pode

ser resolvida, ou devido à persistência do agente lesivo ou por causa da interferência com o

processo normal de cura;

A inflamação crónica origina-se nos seguintes contextos:

- Infecções persistentes por microrganismos difíceis de erradicar (ex.: micobactérias,

Treponema pallidum), que causam infecções persistentes e suscitam uma resposta imune mediada

por linfócitos T (hipersensibilidade tardia);

- Doenças inflamatórias imunomediadas (distúrbios de hipersensibilidade);

- Exposição prolongada a agentes potencialmente tóxicos.

Células e mediadores da inflamação crónica

Uma característica principal da inflamação crónica é a sua persistência, que resulta das

interacções complexas entre as células que são recrutadas para o local da inflamação e que são

activadas neste local;

Macrófagos (Fig. 18)

- São as células dominantes da inflamação crónica;

- Estão difusamente dispersos em muitos tecidos conjuntivos

e são encontrados também em órgãos;

- Em conjunto, estas células constituem o sistema de

fagócitos mononucleares;

- Quando os monócitos alcançam o tecido extravascular,

sofrem transformação em macrófagos maiores, os quais

possuem meia-vida mais longa e uma capacidade maior para

fagocitose do que os monócitos sanguíneos;

- Os macrófagos também podem tornar-se activados, que em

MO aparecem grandes, achatados e róseos; Fig. 18

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- Após activação, os macrófagos secretam uma grande variedade de produtos biologicamente

activos que, se desimpedidos, resulta em lesão tecidual e fibrose (proteases neutras e ácidas,

ERO, NO, eicosanóides, citocinas (TNF e IL-1) e factores de crescimento;

- Depois do estímulo inicial ser eliminado e a reacção inflamatória cessar, nos locais de

inflamação crónica, persiste a acumulação de macrófagos, os quais podem proliferar;

- O IFN-γ pode induzir a fusão dos macrófagos em células grandes, multinucleadas, chamadas

células gigantes.

Linfócitos, plasmócitos, eosinófilos e mastócitos

- Linfócitos e macrófagos interagem de modo bidireccional e essas interacções têm um papel

importante na inflamação crónica (Fig. 19);

- Em algumas reacções inflamatórias crónicas severas (ex.: artrite reumatóide de longa duração),

a acumulação de linfócitos, de células apresentadores de antigénios e plasmócitos pode assumir

as características morfológicas de órgãos linfóides com aparência de nódulos linfáticos, contendo

centros germinativos bem formados;

- Os eosinófilos são encontrados caracteristicamente nos locais inflamatórios em torno de

infecções parasitárias ou alergias e contêm a proteína básica principal;

- Os mastócitos com IgE são figuras centrais nas reacções alérgicas, incluindo o choque

anafilático;

Fig. 19

Embora os neutrófilos sejam a marca clássica da inflamação aguda, muitas formas de

inflamação crónica podem continuar a mostrar extensos infiltrados neutrofílicos,

como resultado da persistência das bactérias e células necróticas ou dos mediadores produzidos

pelos macrófagos.

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Inflamação granulomatosa

Consiste num padrão distintivo da inflamação crónica, caracterizada por agregados de

macrófagos activados que assumem uma aparência epitelial;

Ex.: tuberculose, hanseníase, sífilis, doença de Crohn;

Efectivamente, a formação de um granuloma “encerra” o agente ofensor e, portanto, é um

mecanismo útil de defesa, mas nem sempre isto acontece e em algumas doenças (ex.:

tuberculose) a inflamação granulomatosa com fibrose subsequente pode ser a principal causa da

disfunção do órgão;

Morfologia

- Nas preparações com H&E, as células epiteliais nos granulomas exibem um citoplasma

granular róseo com limites celulares indistintos;

- Os agregados de macrófagos epiteliais são circundados por um colar de linfócitos;

- Normalmente, são encontradas células gigantes multinucleadas nos granulomas;

- Nos granulomas associados com certos microrganismos infecciosos (bacilo da tuberculose), a

combinação de hipóxia e lesão por radical livre leva a uma zona central de necrose com

aparência granular caseosa macroscopicamente (necrose caseosa).

Efeitos sistémicos da inflamação

Febre: citocinas (TNF e IL-1) estimulam a produção de prostaglandinas no hipotálamo;

Produção de proteínas da fase aguda: proteína C reactiva, fibrinogénio e proteína amilóide

A sérica; síntese estimulada por citocinas (IL-6, outras) agindo nas células do fígado;

Leucocitose: as citocinas (factores estimulantes de colónias) estimulam a produção de

leucócitos dos precursores na medula óssea;

Outras manifestações da resposta da fase aguda: aumento da frequência cardíaca e da pressão

arterial; redução da sudorese; tremores, calafrios, anorexia, sonolência e mal-estar;

Em diversas infecções graves, choque séptico: queda na pressão sanguínea, coagulação

intravascular disseminada, anomalias metabólicas; induzidas por altos níveis de TNF.

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Capítulo III

Reparo tecidual: regeneração, cicatrização e fibrose

Reparo – refere-se à restauração da arquitectura tecidual e da função após uma lesão;

Envolve dois tipos de reacções:

- Regeneração – tecidos que são capazes de restituir os componentes lesados e essencialmente

retornar ao seu estado normal;

- Cicatrização – os tecidos lesados são incapazes de uma reconstituição completa, ou as

estruturas de suporte do tecido estão gravemente danificadas, sendo que o processo de reparo

ocorre por deposição de tecido conjuntivo (fibroso);

Fibrose – utilizado para descrever a deposição extensiva de colagénio que ocorre nos pulmões,

fígado, rins e outros órgãos, como uma consequência da inflamação crónica, ou no miocárdio

após necrose isquémica extensa (enfarte);

- Se a fibrose desenvolve-se numa área de tecido ocupada por um exsudato inflamatório, chama-

se organização (ex.: pneumonia organizada que afecta o pulmão).

O controlo da proliferação celular

A proliferação dos remanescentes do tecido lesado, das células endoteliais vasculares e do

fibroblastos é coordenada por proteínas que são colectivamente chamadas factores de

crescimento.

Ciclo celular

Os processos-chave na proliferação das células são a replicação do DNA e a mitose;

- A proliferação celular é regulada por ciclinas que, quando conjugadas com CDK’s, regulam a

fosforilação de proteínas envolvidas na progressão do ciclo celular, levando à replicação do

DNA e à mitose;

O ciclo celular consiste numa série de etapas nas quais a célula confere a precisão dos

processos e instrui a si mesma a prosseguir para a próxima etapa;

É rigorosamente regulado por estimuladores e inibidores e contém pontos de controlo

intrísecos para evitar a repicação de células anormais.

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Capacidade proliferativa dos tecidos

Os tecidos são divididos em:

- Tecidos lábeis

As células lábeis estão continuamente a ser perdidas e repostas pela maturação das

células-tronco e pela proliferação das células maduras;

Ex.: células hematopoiéticas da medula óssea; epitélios de superfície; epitélio cubóide dos

ductos que drenam órgãos exócrinos; epitélio colunar do TGI, útero e tubas uterinas;

epitélio de transição do tracto urinário;

- Tecidos estáveis

Possuem células quiescentes (estão na fase G0 do ciclo celular);

Possuem somente uma actividade replicativa mínima no seu estado normal;

Estas células são capazes de proliferar em resposta a uma lesão ou perda de

massa tecidual;

Ex.: parênquima da maioria dos tecidos sólidos; células endoteliais, fibroblastos e as

células musculares lisas;

Com a excepção do fígado, estes tecidos possuem uma capacidade limitada para se

regenerar após uma lesão.

- Tecidos permanentes

As células destes tecidos são consideradas terminalmente diferenciadas e não-

proliferativas na vida pós-natal;

Ex.: neurónios e miócitos;

Uma lesão no cérebro ou no coração é irreversível e resulta numa cicatriz.

Células-tronco

Os tecidos que se dividem continuamente (tecidos lábeis) contêm células-tronco que se

diferenciam para repor as células perdidas e manter a homeostasia tecidual;

As células-tronco são caracterizadas por duas propriedades importantes: capacidade de auto-

regeneração e replicação assimétrica;

As células-tronco de embriões (células estaminais) são pluripotentes; os tecidos adultos,

particularmente a medula óssea, contêm células-tronco adultas capazes de gerar múltiplas

linhagens celulares.

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A natureza e os mecanismos de acção dos factores de crescimento

Os factores de crescimento polipépticos têm como papel principal promover a

sobrevivência e a proliferação celulares, e são importantes na regeneração e na

cicatrização;

A expansão das populações de células geralmente envolve aumento do tamanho celular

(crescimento), divisão celular (mitose) e protecção da morte apoptótica (sobrevivência);

A maioria dos factores de crescimento possui efeitos pleiotrópicos, ou seja, além de

estimularem a proliferação celular, eles estimulam a migração, a diferenciação e a

contractibilidade, e intensificam a síntese de proteínas especializadas;

Induzem a proliferação celular pela ligação a receptores específicos e afectam a expressão de

genes cujos produtos caracteristicamente possuem muitas funções;

- A actividade principal dos factores de crescimento é estimular a função dos genes que

controlam o crescimento, muitos dos quais são chamados de proto-oncogenes;

Alguns factores de crescimento estimulam a proliferação de algumas células e inibem o ciclo de

outras células;

- Na verdade, um factor de crescimento pode ter efeitos opostos na mesma célula

dependendo da sua concentração.

Mecanismos de sinalização dos receptores dos factores de crescimento

A sinalização pode ocorrer directamente na mesma célula, entre células adjacentes ou a grandes

distâncias:

- Sinalização autócrina: uma substância age predominantemente (ou exclusivamente) na célula

que a secreta (ex.: resposta imune, hiperplasia epitelial compensatória);

- Sinalização parácrina: uma substância afecta as células que estão na adjacência imediata da

célula que a libertou (ex.: resposta inflamatória e cicatrização da ferida);

- Sinalização endócrina: uma substância reguladora (ex.: hormona) é libertada na corrente

sanguínea e age em células-alvo à distância;

As proteínas receptoras estão geralmente localizadas na superfície da célula, mas podem

ser intracelulares, sendo que neste último caso, os ligantes devem ser suficientemente

hidrofóbicos para entrar na célula (ex.: hormonas esteróides);

A união de um ligante ao seu receptor de superfície celular induz uma cascata de eventos

intracelulares secundários que culmina na activação ou repressão do factor de transcrição, o que

leva a respostas celulares;

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Diferentes classes de receptores de factores de crescimento incluem:

- Receptores com actividade de quinase intrínseca (ex.: EGF e HGF);

- Receptores acoplados à proteína G-7;

- Receptores sem acção enzimática intrínseca;

As citocinas geralmente ligam-se a estes receptores que por sua vez interagem com os

factores de transcrição citoplasmáticos que se dirigem para o núcleo (são lançados

directamente no núcleo);

A maioria dos factores de crescimento possui efeitos múltiplos, como a migração celular,

diferenciação celular, estimulação da angiogénese e da fibrogénese, além da proliferação celular.

Matriz extracelular (MEC) e interacções entre a célula e a matriz

O reparo do tecido não depende somente da actividade dos factores de crescimento, mas

também de interacções entre as células e os componentes da MEC;

A MEC é um complexo macromolecular dinâmico, de remodelação constante, sintetizado

localmente, que se organiza numa rede que circunda as células;

Por fornecer um substracto para a adesão celular e servir como um reservatório para factores

de crescimento, a MEC regula a proliferação, o movimento e a diferenciação das células

existentes dentro dela;

A MEC existe sob duas formas básicas (Fig. 20):

- Matriz intersticial: entras as células, constituída de colagénio e várias glicoproteínas;

- Membrana basal: subjacente ao epitélio e que circunda os vasos sanguíneos, constituída de

colagénio não-fibrilar tipo IV e laminina.

Fig. 20

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Papéis da matriz extracelular

Suporte mecânico: papel principal do colagénio e da elastina;

Controlo do crescimento celular e manutenção da diferenciação celular: os

proteoglicanos ligam-se a factores de crescimento e apresenta-os em alta concentração, e a

fibronectina e a laminina estimulam as células por meio de recepctores de integrina celulares;

Arcabouço para renovação tecidual;

Estabelecimento de micro-ambientes teciduais;

Armazenamento e apresentação de moléculas reguladoras.

Componentes da matriz extracelular

Existem três componentes básicos da MEC:

- Proteínas estruturais fibrosas (ex.: colagénio e elastina), que conferem força elástica e

capacidade de retracção;

- Géis hidratados com água (ex.: proteoglicanos e hialuronano), que permitem resiliência e

lubrificação;

- Glicoproteínas adesivas (ex.: fibronectina, laminina e integrinas), que conectam os

elementos da matriz a outros elementos ou a células;

A MEC intacta é necessária para a regeneração tecidual, e se a MEC estiver

danificada o reparo só poderá ser realizado pela formação de cicatriz.

Célula e regeneração tecidual

A renovação celular ocorre continuamente nos tecidos lábeis (ex.: medula óssea);

A renovação das células hematopoiéticas é conduzida por factores de crescimento chamados de

factores estimulantes de colónias (CSFs), que são produzidos em resposta ao consumo

aumentado ou à perda de células sanguíneas;

Não se sabe se os factores de crescimento desempenham algum papel na renovação do epitélio

lábil;

A regeneração pode ocorrer nos órgãos parenquimatosos com populações de células estáveis,

que é geralmente um processo limitado, excepto no fígado;

A regeneração extensiva ou a hiperplasia compensatória podem ocorrer somente se

o tecido residual estiver estrutural e funcionalmente intacto, como após uma ressecção

cirúrgica;

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- Do contrário, se o tecido estiver danificado por uma infecção ou inflamação, a

regeneração é incompleta e é realizada por cicatrização.

Reparo por tecido conjuntivo

O reparo ocorre pela reposição das células não-regeneráveis por tecido conjuntivo, ou por uma

combinação de regeneração de algumas células e formação de cicatriz;

O termo “tecido de granulação” (tipo especializado de tecido, característico da cicatrização)

é derivado da sua aparência granular, rosada e de consistência mole, tal como é visto sob a

crosta da ferida cutânea;

- O seu aspecto histológico é caracterizado pela proliferação de fibroblastos e capilares

neoformados, delicados, de paredes finas (angiogénese), na MEC fraca;

- Então, o tecido de granulação acumula progressivamente matriz de tecido conjuntivo,

resultando, finalmente, na formação de uma cicatriz, que se pode remodelar com o tempo;

O reparo por deposição de tecido conjuntivo consiste em quatro processos sequenciais:

formação de novos vasos sanguíneos (angiogénese); migração e proliferação de

fibroblastos; deposição de MEC (formação de cicatriz); e maturação e reorganização do

tecido fibroso (remodelação).

Angiogénese

Os vasos sanguíneos são desenvolvidos por dois processos:

- Vasculogénese: a rede vascular primitiva é estabelecida a partir dos angioblastos

(precursores de células endoteliais) durante o desenvolvimento embrionário;

- Angiogénese ou neovascularização: vasos pré-existentes emitem brotos capilares para

produzir novos vasos;

A angiogénese é um processo crítico para a cicatrização de locais lesionados, no

desenvolvimento da circulação colateral nos locais que sofreram isquémia, e permite o

crescimento de tumores, em tamanho, além do seu suprimento sanguíneo inicial;

Foi descoberto recentemente que as células precursoras endoteliais podem migrar da

medula óssea para áreas de lesão e participar da angiogénese nestes locais;

- Podem participai na reposição das células endoteliais perdidas, na reendotelização dos

implantes vasculares, na neovascularização de feridas cutâneas e tecidos isquémicos, e no

desenvolvimento tumoral;

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As principais etapas que ocorrem na angiogénese a partir de vasos pré-existentes estão listadas a

seguir:

1. Vasodilatação em resposta ao NO e aumento da permeabilidade dos vasos pré-

existentes induzido pelo VEGF;

2. Migração de células endoteliais em direcção à área de lesão tecidual;

3. Proliferação de células endoteliais logo após as células migratórias iniciais;

4. Inibição da proliferação da célula endotelial e remodelagem dos tubos capilares;

5. Recrutamento de células periendoteliais (pericitos para os pequenos capilares e células

musculares lisas para os grandes vasos) para formar o vaso maduro;

Os vasos sanguíneos neoformados durante a angiogénese são permeáveis porque:

- As junções interendoteliais não estão completamente formadas;

- O VEGF aumenta a permeabilidade do vaso;

Esta permeabilidade explica por que o tecido de granulação é muitas vezes edematoso e é

parte da causa do edema que pode persistir na ferida em cicatrização muito tempo após a

resposta inflamatória aguda ter sido resolvida;

As proteínas estruturais da MEC participam do processo de brotamento do vaso na

angiogénese, basicamente por meio de interacções com os receptores de integrinas nas células

endoteliais;

As proteínas não-estruturais da MEC contribuem para a angiogénese por

desestabilizarem as interacções MEC-célula para facilitar a migração celular

contínua (ex.: trombospondina e tenascina) ou permitir a remodelação e involução dos vasos

(ex.: activador de plasminogénio e metaloproteinases da matriz).

Factores de crescimento envolvidos na angiogénese

Vários factores induzem a angiogénese, mas o mais importantes são o VEGF e o FGF;

VEGF

- Estimula tanto a proliferação como a migração das células endoteliais (inicia o processo de

brotamento capilar);

- O VEGF-2 mobiliza as células precursoras endoteliais da medula óssea e induz a proliferação e

migração destas células para os locais de angiogénese;

- As angiopoetinas 1 e 2 e os factores de crescimento PDGF e TGF-β participam do

processo de estabilização pelo recrutamento de pericitos e células musculares lisas e pela

deposição de tecido conjuntivo;

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FGF

- FGF-2 estimula a proliferação das células endoteliais, promove a migração de macrófagos e

fibroblastos para a área danificada;

- FGF-7 (factor de crescimento dos queratinócitos) pode participar na cicatrização de feridas

por intensificar a proliferação e migração de queratinócitos e pode proteger a integridade do

epitélio da cavidade oral e do TGI.

Migração de fibroblastos e deposição da MEC (formação de cicatriz)

A formação de cicatriz desenvolve-se na rede de tecido de granulação com vasos neoformados e

MEC fraca que se desenvolve inicialmente no local de reparo;

Ocorre em duas etapas: migração e proliferação de fibroblastos para o local de lesão e

deposição de MEC por estas células;

Os macrófagos são constituintes celulares importantes do tecido de granulação e elaboram

inúmeros mediadors que induzm a proliferação dos fibroblastos e a produção de MEC;

Conforme a cicatrização progride, o número de fibroblastos proliferantes e vasos

novos diminui; no entanto, os fibroblastos assumem progressivamente um fenótipo mais

sintético e, consequentemente, há um aumento de deposição da MEC;

A acumulação da rede de colagénio depende não só do aumento da síntese, mas também da

diminuição da degradação do colagénio;

O arcabouço de tecido de granulação evolui para uma cicatriz composta de fibroblastos

fusiformes inactivos, colagénio denso, fragmentos de tecido elástico e outros componentes da

MEC;

Conforme a cicatriz amadurece, há uma regressão vascular progressiva e o tecido de

granulação altamente vascularizado transforma-se numa cicatriz pálida, basicamente

avascular.

Factores de crescimento envolvidos na deposição da MEC e a formação de cicatriz

TGF-β

- No contexto da inflamação e reparo, desempenha duas funções principais:

É um agente fibrinogénico potente (estimula a produção de colagénio, fibronectina e

proteoglicanos e inibe a degradação do colagénio);

Inibe a proliferação de linfócitos e pode ter um efeito anti-inflamatório forte;

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PDGF

- Causa migração e proliferação de fibroblastos e células musculares lisas e macrófagos.

MEC e remodelação tecidual

A deposição de MEC depende do equilíbrio entre os agentes fibrogénicos,

metaloproteinases (MMPs, ex.: colagenases intersticiais, gelatinases e estromelisinas) que

digerem a MEC e inibidores teciduais da MMPs (TIMPs).

Cicatrização da ferida cutânea

As fases principais da cicatrização cutânea são: inflamação, formação de tecido de granulação e

remodelação da MEC;

As feridas cutâneas podem cicatrizar por união primária (primeira intenção) ou união secundária

(segunda intenção);

- A cicatrização por primeira intenção consiste numa incisão cirúrgica limpa, não-infectada,

aproximada por suturas cirúrgicas;

- Na cicatrização por segunda intenção, a reacção inflamatória é mais intensa, existe um

tecido de granulação abundante e a cicatriz contrai-se pela acção dos miofibroblastos, seguido da

acumulação de MEC e a formação de uma cicatrização grande.

Aspectos patológicos do reparo

A cicatrização da ferida pode ser alterada por muitas condições, particularmente pela infecção e

pelo diabetes;

O tipo, o volume e a localização da lesão são factores importantes para a cicatrização;

A produção excessiva da MEC pode causar quelóides na pele;

A estimulação persistente da síntese do colagénio nas doenças inflamatórias crónicas leva

à fibrose do tecido.

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Fig. 21

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Capítulo IV

Desordens hemodinâmicas, trombose e choque

Edema

Edema – extravasamento de líquido dos vasos para o espaço intersticial;

- O líquido pode ser pobre em proteínas (transudato) ou rico em proteínas (exsudato);

O edema resulta de qualquer uma das seguintes desordens:

- Aumento da pressão hidrostática causada pela redução do retorno venoso (como na

insuficiência cardíaca);

- Redução da pressão osmótica do plasma (hipoproteinemia) causada por uma redução na

concentração plasmática de albumina (devido à redução da síntese, como ocorre nas doenças

hepáticas, ou aumento da perda, como ocorre nas doenças renais);

- Obstrução linfática ocasionando a redução da remoção do líquido intersticial (como ocorre

nos processos de cicatrização, tumores ou determinadas infecções);

- Retenção renal primária de sódio (na insuficiência renal);

- Aumento da permeabilidade vascular (na inflamação).

CATEGORIAS FISIOPATOLÓGICAS DE EDEMA

Aumento da pressão hidrostática

Redução do retorno venoso

Insuficiência cardíaca congestiva

Pericardite constritiva

Ascite (cirrose hepática)

Obstrução ou compressão venosa

Trombose

Pressão externa (ex.: tumor)

Inactividade dos membros inferiores, pendentes por períodos prolongados

Dilatação arteriolar

Calor

Desregulação neuro-humoral

Redução da pressão osmótica do plasma (hipoproteinemia)

Glomerulonefrite com perda de proteína (síndrome nefrótica)

Cirrose hepática (ascite)

Desnutrição

Gastroenteropatia com perda de proteínas

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CATEGORIAS FISIOPATOLÓGICAS DE EDEMA (Continuação) Obstrução linfática

Inflamatória

Neoplásica

Pós-cirúrgica

Após radiação

Retenção de sódio

Consumo excessivo de sódio com insuficiência renal

Aumento da reabsorção tubular de sódio

Hipoperfusão renal

Aumento da secreção de renina-angiotensina-aldosterona

Inflamação

Inflamação aguda

Inflamação crónica

Angiogénese

Fig. 22

O edema é mais reconhecido na visão macroscópica;

Sob o ponto de vista microscópico, o edema reflecte, basicamente, no clareamento e na

separação dos elementos da matriz extracelular com um discreto edema celular;

Apesar de qualquer órgão ou tecido ser afectado, é mais frequente no tecido

subcutâneo, pulmões e cérebro;

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- Edema subcutâneo

Na insuficiência cardíaca ou renal é importante sobretudo porque indica uma doença de

base;

Quando é significativo, pode dificultar a cicatrização de feridas ou o combate a infecções;

- Edema pulmonar

Pode causar morte por interferir na função normal de ventilação;

O líquido pode acumular-se nos septos alveolares em torno do capilares, impedindo a

difusão do oxigénio;

A presença de líquido nos alvéolos cria um ambiente favorável para infecções bacterianas;

-Edema cerebral

Pode ser rapidamente fatal;

Ser for grave, pode causar herniação (extrusão do cérebro) através do forame magno;

O suprimento sanguíneo do tronco cerebral pode ser comprimido pelo edema, causando

um aumento na pressão intracraniana.

Hiperemia e congestão (Fig. 23)

Indicam um aumento local do volume de sangue

num determinado tecido;

Hiperemia

- Processo activo resultante do fluxo sanguíneo

aumentando devido à dilatação arteriolar;

- Ex.: Locais de inflamação ou músculos

esqueléticos durante o exercício;

- O tecido afectado apresenta-se mais

avermelhado do que o normal por causa do

aumento do fluxo de sangue oxigenado;

Congestão

- Processo passivo resultante de um retorno

venoso ineficiente;

- Pode ser sistémico ou local; Fig. 23

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- O tecido apresenta uma coloração vermelho-azulada (cianose), sobretudo à medida que o

agravamento da congestão leva à acumulação de hemoglobina desoxigenada nos tecidos

afectados;

- A congestão do leito capilar está intimamente relacionada com o desenvolvimento do

edema;

- Na congestão passiva crónica, a estase de sangue pouco oxigenado causa hipóxia crónica,

que por sua vez, pode ocasionar degeneração ou morte das células parenquimatosas e,

em consequência, fibrose do tecido;

A ruptura dos capilares nos locais de congestão crónica também pode causar pequenos

focos de hemorragia;

A fagocitose e o catabolismo dos restos dos eritrócitos podem resultar na acumulação de

macrófagos repletos de hemossiderina;

A superfície de corte de tecidos com hiperemia ou congestão apresenta-se hemorrágica e

húmida;

Congestão pulmonar aguda – capilares alveolares repletos de sangue;

Congestão pulmonar crónica – septos tornam-se espessados e fibróticos e os espaços

alveolares podem conter numerosos macrófagos repletos de hemossiderina (“cirrose da

insuficiência cardíaca”);

Congestão hepática aguda – veia central e sinusóides distendidos pelo sangue;

Congestão hepática crónica

- Macroscopicamente, regiões centrais apresentam coloração vermelho-pardocenta e com

uma leve depressão (devido à perda de células), contrastando com regiões adjacentes, sem

congestão, de cor bege, algumas vezes com degeneração gordusora (“fígado em noz-moscada”);

- Microscopicamente, ocorre necrose centrolobular com destruição dos hepatócitos,

hemorragia e macrófagos repletos de hemossiderina; pode haver o desenvolvimento de fibrose

(“cirrose cardíaca”).

Hemorragia

Hemorragia – extravasamento de sangue dos vasos para o espaço extravascular;

A hemorragia pode ser externa ou restrita a uma tecido; qualquer acumulação de sangue é

chamado de hematoma;

Hemorragias diminutas na pele, mucosas ou serosas, designadas por petéquias, estão

tipicamente associadas a aumentos localizados de pressão intravascular, reduzido número de

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plaquetas (trombocitopenia), função plaquetária defeituosa ou deficiência de factores da

coagulação;

Hemorragias um pouco maiores são chamadas de púrpura;

Hematomas subcutâneos maiores são denominados equimoses;

- Nestas hemorragias localizadas, os eritrócitos são fagocitados e degradados pelos macrófagos; a

hemoglobina (vermelho-azulada) é convertida em bilirrubina (azul-esverdeada) e depois em

hemossiderina (marrom-dourado), sendo responsável pela mudança de cor nos hematomas;

Grandes colecções de sangue numa das cavidades corporais são chamadas de hemotórax,

hemopericárdio, hemoperitoneu ou hemartrose, dependendo da sua localização;

O significado clínico da hemorragia depende do volume, velocidade da perda sanguínea e do local

da hemorragia.

Hemostasia e trombose

Hemostasia normal – é uma consequência de processos rigorosamente controlados que

mantêm o sangue num estado fluido e livre de coágulos nos vasos normais e também induz a

rápida formaçao de um tampão hemostático localizado no local de lesão vascular;

Trombose – é a forma patológica de hemostasia, que envolve a formação de coágulos

sanguíneos (trombos) em vasos que não foram danificados ou a oclusão de um vaso por um

trombo após uma lesão relativamente leve;

Tanto a hemostasia quanto a trombose envolvem três componentes: a parede vascular,

plaquetas e a cascata da coagulação.

Hemostasia normal (Fig. 24)

1. Após a lesão inicial, há um período transitório de vasoconstrição arteriolar resultante,

sobretudo, de mecanismos neurogénicos reflexos, sendo aumentados pela secreção local de

factores, com a endotelina;

2. A lesão endotelial também expõe a matriz extracelular subendotelial altamente trombogénica,

permitindo a adesão e activação de plaquetas;

- Esta activação resulta numa grande alteração do seu formato (pequenos discos redondos

para placas achatadas com um aumento acentuado da sua área) e libertação de grânulos

secretores (ADP, TXA2);

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- Em poucos minutos, os produtos secretados recrutam

mais plaquetas (agregação) para formar um tampão

hemostático – hemostasia primária;

3. O factor tecidual (desencadeador mais potente da

cascata de coagulação) também é exposto no local da

lesão, chamado de factor III ou trompoplastina,

sendo uma glicoproteína pró-coagulante ligada à

membrana sintetizada pelo endotélio;

- Este actua em conjunto com o factor VII como a

principal via para a cascata de coagulação in vivo,

culminando na geração de trombina;

A trombina cliva o fibrinogénio circulante

em fibrina, que é insolúvel, levando à

deposição de uma rede de fibrina;

A trombina também induz o recrutamento de

mais plaquetas e libertação de grânulos;

- Esta sequência de hemostasia secundária dura mais

do que o tampão inicial de plaquetas;

4. Os agregados de fibrina polimerizada e plaquetas

formam um tampão permanente e sólido que evita o

sangramento adicional;

- Neste estágio, os mecanismos de contra-

regulação (ex.: activador do plasminogénio tecidual, t-

PA), são desencadeados para limitar o tampão

hemostático ao local da lesão.

Fig. 24

Endotélio (Fig. 25)

As células endoteliais intactas mantêm o fluxo do sangue líquido inibindo activamente a

adesão plaquetária, prevenindo a activação dos factores de coagulação e destruindo coágulos que

podem se formar;

Propriedades antitrombóticas

1. Efeitos antiplaquetários

a) Endotélio intacta evita interacção entre plaquetas e MEC subendotelial (altamente

trombogénica);

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b) Plaquetas não-activadas não aderam

ao endotélio;

c) Adesão de plaquetas activadas ao

endotélio adjacente não danificado é

inibida pela prostaciclina (PGI2) e NO

endoteliais (potentes vasodilatadores e

inibidores da agregação plaquetária);

- A sua síntese é estimulada por vários

factores (ex.: trombina e citocinas)

produzidos durante a coagulação;

d) Células endoteliais também elaboram

difosfatase de adenosina, que degrada o

ADP, inibindo a agregação plaquetária.

2. Efeitos anticoagulantes

a) As moléculas semelhantes à heparina

agem de forma indirecta;

- Actuam como co-factores que permitem

que a antitrombina III desative a

trombina (factor Xa);

b) A trombomodulina também actua de

forma indirecta; Fig. 25

- Liga-se à trombina, convertendo-a num factor anticoagulante capaz de activar a

proteína C (anticoagulante);

- A proteína C activada inibe a coagulação por meio da clivagem proteolítica dos factores

Va e VIIIa (requer a presença da proteína S); ambas dependentes da vitamina K.

3. Propriedades fibrinolíticas

a) Células endoteliais sintetizam o activados do t-PA, promovendo a actividade

fibrinolítica que elimina os depósitos de fibrina da superfície endotelial.

Propriedades pró-trombóticas

- As células endoteliais podem ser estimuladas pela lesão directa ou através de diversas citocinas

que são produzidas durante a inflamação;

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- Tal estimulação resulta na expressão de proteínas coagulantes (ex.: factor recidual e FvW)

que contribuem para a formação localizada do trombo;

- A perda da integridade endotelial expõe o factor de von Willebrand (FvW), sintetizado

pelo endotélio normal, e o colagénio da membrana basal, substratos para a agregação

plaquetária e formação de trombos;

- O factor tecidual activa a via extrínseca da coagulação;

- As células endoteliais também secretam inibidores do activador do plasminogénio

(PAIs), inibindo a fibrinólise.

Plaquetas

Na sua forma inactiva têm a forma de um disco, expressam diversos receptores de glicoproteína

da família das integrinas e contêm dois tipos de grânulos:

- Grânulos α: expressam a molécula de adesão P-selectina na sua membrana e contêm

fibrinogénio, fibronectina, factores V e VIII, factor plaquetário 4, PDGF e TGF-α;

- Grânulos ou corpos densos: contêm ADP e ATP, cálcio ionizado, histamina, serotonina e

epinefrina;

Após a lesão vascular, as plaquetas entram em contacto com os constituintes da MEC e

proteínas adicionais (FvW), sofrendo três reacções: adesão e alteração do seu formato;

secreção (reacção de libertação); e agregação.

1. Adesão plaquetária

- Apesar das plaquetas poderem aderir directamente à MEC, a associação FvW-GpIb é

necessária para superar as forças de separação do fluxo do sangue;

- O defeito no processamento do FvW causa a púrpura trombocitopénica trombótica

(microangiopatia trombótica).

2. Secreção (reacção de libertação)

- Após a activação, as plaquetas secretam os produtos dos seus grânulos, que incluem o cálcio

(activa proteínas da coagulação) e ADP (mediador da agregação de mais plaquetas e sua

desgranulação);

- As plaquetas activadas também sintetizam TXA2 (estimula a activação das plaquetas e causa

vasoconstricção).

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3. Agregação plaquetária

- As plaquetas activadas expõem complexos de fosfolípidos que fornecem uma superfície

importante para a activação das proteínas da coagulação;

- O ADP libertado estimula a formação de um tampão hemostático primário (reversível)

por meio da activação dos receptores GpIIb-IIIa que, por sua vez, facilitam a ligação e

reacção cruzada do fibrinogénio;

- A formação do tampão hemostático secundário definitivo (irreversível) também requer

a activação da trombina para clivar o fibrinogénio e formar fibrina polimerizada através da

cascata da coagulação.

Cascata da coagulação

A cascata da coagulação é, essencialmente, uma série amplificadora de conversões

enzimáticas;

Cada etapa no processo cliva proteoliticamente uma pró-enzima inactiva para formar uma

enzima activa, culminando na formação de trombina, a enzima mais importante na regulação

do processo de coagulação;

- A trombina converte o fibrinogénio, uma proteína plasmática solúvel, em monómetro de

fibrina que se polimerizam para formar um gel insolúvel que envolve as plaquetas e outras

células circulantes no tampão hemostático secundário definitivo;

Os polímeros de fibrina são estabilizados pela actividade de ligação cruzada de transglutaminase

do factor XIIIa;

A coagulação é normalmente restrita aos locais de lesão por:

- Limitar a activação enzimática a complexos de fosfolípidos fornecidos pelas plaquetas activadas;

- Anticoagulantes naturais elaborados no local da lesão endotelial ou durante a activação da

cascata da coagulação;

- Induzir as vias fibrinolíticas envolvendo a plasmina através da actividade de diversos PAs;

A fibrinólise deve-se principalmente à actividade enzimática da plasmina que degrada a

fibrina e interfere na sua polimerização;

Para evitar que o excesso da plasmina lise trombos de modo indiscriminado em

qualquer parte do corpo, a plasmina livre forma com rapidez complexos com a

α2-antiplasmina circulante, sendo desactivada.

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Trombose

Três influências primárias estão envolvidas na formação do trombo (chamadas de tríade de

Virchow): lesão endotelial; estase ou turbulência do fluxo sanguíneo; e

hipercoagulabilidade do sangue.

Lesão endotelial

É importante sobretudo na formação do trombo no coração ou na circulação arterial,

onde as taxas de fluxo normalmente altas podem dificultar a coagulação prevenindo a adesão

plaquetária ou diluindo os factores de coagulação;

É importante salientar que não é preciso que ocorra desnudamento ou lesão física do endotélio

para que contribua com o desenvolvimento de trombose;

- Qualquer distúrbio no equilíbrio dinâmico entre as actividades pró-trombóticas e

antitrombóticas do endotélio pode influenciar eventos locais de coagulação (ex.: toxinas e

hipertensão).

Alterações do fluxo sanguíneo

A estase e turbulência:

- Alteram o fluxo laminar permitindo que as plaquetas entrem em contacto com o endotélio;

- Evitam a diluição dos factores da coagulação activados pelo fluxo de sangue fresco;

- Retardam a chegada de inibidores da coagulação, permitindo a formação dos trombos;

- Promovem a activação das células endoteliais resultando em trombose local, adesão

leucocitária, etc;

Ex.: aneurismas, placa aterosclerótica.

Hipercoagulabilidade

É qualquer alteração nas vias de coagulação que predispõe à trombose e pode ser dividida em:

- Estados primários (hereditários)

Mais comuns: mutações no gene do factor V de Leiden e da pró-trombina;

- Muito frequente em pacientes com trombose venosa profunda recorrente;

Menos comuns: deficiência de antitrombina III, de proteína C e S;

- Típico em pacientes com trombose venosa e tromboembolismo recorrente na

adolescência ou no início da idade adulta;

- Estas mutações são importantes porque:

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o Podem ser co-herdadas e o risco resultante de uma diátese trombótica é

sinérgico;

o Indivíduos com essas mutações têm uma frequência muito elevada de trombose

venosa na presença de outros factores.

- Estados secundários (adquiridos)

Alto risco de trombose: permanência no leito ou imobilização prolongada; enfarto do

miocárdio; fibrilação atrial; dano tecidual (cirurgia, fractura, queimaduras); cancro;

substituição de valvas cardíacas; coagulação intravascular disseminada; trombocitopenia

induzida pela heparina; síndrome do anticorpo antifosfolípido (lúpus

anticoagulante);

Menor risco de trombose: cardiomiopatia; síndrome nefrótica; estados de

hiperestrogenismo (gravidez); uso de anticoncepcional oral; anemia falciforme; tabagismo

e obesidade.

Morfologia

Os trombos arteriais ou cardíacos têm início nos locais de lesão endotelial ou turbulência,

enquanto que, os trombos venosos são característicos em locais de estase;

Ambos tendem a se propagar na direcção do coração;

- A porção em propagação de um trombo tende a apresentar uma ligação fraca com o restante

do trombo e, portanto, com uma tendência e se fragmentar, gerando um êmbolo;

Os trombos apresentam laminações aparentes, denominadas linhas de Zahn que representam

camadas pálidas de plaquetas e fibrina que se alternam com camadas mais escuras ricas em

eritrócitos;

Trombos murais

- Formam-se nas câmaras cardíacas ou na luz da aorta;

- Ex.: Contracção anormal do miocárdio, lesão endomiocárdica;

- Placas aterosclecróticas ulceradas e aneurismas promovem a trombose aórtica;

Trombos arteriais

- São oclusivos, sendo produzidos por plaquetas e activação da coagulação;

- Rede friável de plaquetas, fibrina, eritrócitos e leucócitos em degeneração;

- Podem embolizar e até mesmo causar enfarto tecidual a jusante, sendo o seu papel na

obstrução vascular em locais críticos muito mais significativo do ponto de vista clínico;

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Trombos venosos (flebotrombose)

- Quase invariavelmente oclusivos, resultando sobretudo da activação da cascata da coagulação;

- Contêm mais eritrócitos (circulação lenta), sendo chamados de trombos vermelhos ou de

estase, ligados à parede do vaso;

- As veias das extremidades inferiores são mais afectadas;

- Podem causar congestão e edema nos leitos vasculares distais a uma obstrução, mas são

mais preocupantes por causa da sua capacidade para embolizar para os pulmões, levando à

morte;

Trombos post-mortem

- São gelatinosos, com uma porção dependente vermelha, onde os eritrócitos depositaram-se

pela acção da força da gravidade, um sobrenadante amarelo, semelhante à “gordura de galinha” e,

em geral, não estão ligados à parede do vaso;

Trombos nas valvas cardíacas (vegetações)

- Infecções bacterianas ou fúngicas provenientes do sangue podem danificar as válvulas causando,

posteriormente, a formação de grandes massas trombóticas;

- Vegetações estéreis também podem se desenvolver (endocardite trombótica não-

bacteriana).

Destino do trombo

Se o paciente sobrevive à trombose inicial, nos dias ou semanas que se seguem os trombos

sofrem uma combinação dos quatro eventos a seguir:

- Propagação: trombos acumulam mais plaquetas e fibrina, até causar obstrução do vaso;

- Embolização: trombos soltam-se ou fragmentam-se, sendo transportados para qualquer vaso

sanguíneo;

- Dissolução: trombos são removidos pela actividade fibrinolítica;

Nos trombos mais velhos, a extensa polimerização da fibrina torna-os muito mais

resistentes à proteólise e a lise é ineficaz;

- Organização e recanalização: trombos induzem inflamção e fibrose (organização) e, por

fim, são recanalizados ou podem ser incorporados como uma parede espessa do vaso.

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Embolia

Um êmbolo é formado por uma massa sólida, líquida ou gasosa carregada pelo sangue até um

local distante da sua origem;

A grande maioria dos êmbolos desprendeu-se de trombos;

Os êmbolos situam-se em vasos muito pequenos para permitir a sua passagem, resultando em

oclusão vascular parcial ou total.

Tromboembolia pulmonar

Os êmbolos pulmonares originam-se, basicamente, da trombose venosa profunda dos

membros inferiores;

O seu efeito depende do seu tamanho;

O paciente que desenvolve uma embolia pulmonar apresenta maior risco de apresentar outros

episódios;

A maior parte dos êmbolos pulmonares é silenciosa sob o aspecto clínico, pois são pequenos;

- Organizam-se e incorporam a parede vascular e, em alguns caos, a organização de um êmbolo

resulta numa rede fibrosa e delicada;

Pode ocorrer morte súbita, insuficiência do ventrículo direito (cor pulmonale) ou

colapso cardiovascular quando 60% ou mais da circulação pulmonar está obstruída;

A obstrução embólica das artérias de calibre médio pode causar hemorragia

pulmonar, em geral não causando enfarto em virtude da dupla circulação pulmonar, e a

circulação arterial brônquica intacta continua a fornecer sangue para a área;

- Um êmbolo semelhante na vigência de insuficiência cardíaca esquerda (resultando num fluxo

sanguíneo lento na artéria pulmonar) pode causar um enfarto de grandes dimensões;

Em geral, a obstrução de ramos arteriolares terminais da artéria pulmonar por êmbolos

geralmente leva ao enfarto pulmonar;

A ocorrência de diversos êmbolos durante um determinado período pode causar hipertensão

pulmonar com insuficiência do ventrículo direito.

Tromboembolia sistémica

Êmbolos sistémicos originam-se, sobretudo, de trombos murais cardíacos ou valvulares,

aneurismas aórticos ou placas ateroscleróticas;

O desenvolvimento do enfarte depende do local da embolia e da presença de circulação

colateral;

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Uma fracção muito pequena dos êmbolos sistémicos poarece ter origem nas veias, mas acaba

ganhando acesso à circulação arterial através de defeitos interventriculares – êmbolos

paradoxais.

Embolia gordurosa

A gordura entra na circulação devido à ruptura dos sinusóides da medula óssea ou das

vénulas do tecido traumatizado;

A síndrome de embolia gordurosa é caracterizada por insuficiência pulmonar, sintomas

neurológicos, anemia e trombocitopenia;

Os sintomas são: taquipneia súbita, dispneia, taquicardia, irritabilidade e agitação (progride para o

coma).

Embolia gasosa

Uma forma especial de embolia gasosa ocorre quando um indivíduo é exposto a mudanças

bruscas na pressão atmosférica – doença de descompressão;

Nos pulmões, as bolhas de ar (azoto) na corrente sanguínea causam edema, hemorragia e

atelectasia focal ou enfisema, ocasionando insuficiência respiratória (sufocações);

Uma forma mais crónica da doença de descompressão é denominada de doneça do caixão, em

que a persistência de êmbolos gasosos nos ossos causa múltiplos focos de necrose isquémica.

Embolia de líquido amniótico

É uma complicação grave, mas rara, do trabalho de parto e pós-parto imediato;

O quadro clássico é composto de edema pulmonar acentuado e dano alveolar difuso, com

células escamosas da pele, lanugem e cabelo do feto, gordura, da vérnix caseosa, e mucina dos

tractos respiratório e GI do feto, na microcirculação pulmonar.

Enfarto

Os enfartos são áreas de necrose isquémica, em geral de coagulação, causadas por

oclusão arterial ou, mais raramente, venosa;

Os enfartos são causados, com mais frequência, pela formação de trombos arteriais oclusivos ou

embolização de trombos arteriais ou venosos;

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Os enfartos causados por oclusão venosa ou em tecidos fracos com suprimento sanguíneo

duplo (ex.: pulmões e intestino delgado) são tipicamente hemorrágicos (vermelhos), enquanto

que, os causados pela oclusão arterial em tecidos compactos (ex.: órgãos sólidos como o

coração, baço e rins) são pálidos (brancos);

Podem ser sépticos, quando vegetações bacterianas de uma válvula cardíaca embolizam ou

quando microrganismos colonizam uma área de tecido necrótico ou estéreis;

- Nestes casos sépticos, o enfarto é convertido em abscesso, com um processo inflamatório

maior.

Choque

O choque causa hipoperfusão sistémica em virtude da redução do débito cardíaco ou do

volume de sangue circulante;

As causas mais comuns de choque são:

- Choque cardiogénico – falência da acção de bomba do coração devido, por exemplo, ao

enfarto do miocárdio;

- Choque hipovolémico – por causa de perda sanguínea;

- Choque séptico – decorrente de infecções;

Mais raramente:

- Choque neurogénico – perda de tónus vascular e acumulação de sangue na periferia;

- Choque anafilático – vasodilatação sistémica e aumento da permeabilidade vascular causadas

por uma reacção de hipersensibilidade (IgE);

O choque séptico é consequência da resposta imunológica natural do hospedeiro a maoléculas

bacterianas ou fúngicas (com mais frequência a endotoxina), com a produção sistémica de

citocinas, como o TNF e a IL-1, que actuam na activação endotelial e inflamatória;

- Hipotensão, CID e distúrbios metabólicos constituem a tríade clínica do choque séptico;

O choque de qualquer etiologia induz lesão pela hipoxemia prolongada;

O choque tende a evoluir em três estágios gerais:

- Estágio inicial, não-progressivo, durante o qual mecanismos reflexos compensatórios são

activados e a perfusão dos órgãos vitais é mantida;

O efeito final consiste em taquicardia, vasoconstricção periférica e retenção renal de

líquidos;

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- Estágio progressivo, caracterizado pela hipoperfusão tecidual e início dos desequilíbrios

circulatório e metabólico;

A acidose metabólica láctica resultante diminui o pH do tecido e reduz a resposta

vasomotora;

- Estágio irreversível, que tem início depois que o corpo sofreu lesões celulares e teciduais

tão graves que, mesmo que os defeitos hemodinâmicos sejam corrigidos, a sobrevivência não é

possível.

Os rins exibem, tipicamente, necrose tubular aguda, de forma que oligúria, anúria e distúrbios

electrolíticos dominam o quadro clínico;

O TGI pode apresentar hemorragia e necrose focal da mucosa;

Os pulmões são raramente afectados no choque puramente hipovolémico, pois têm uma certa

resistência à lesão hipóxica;

- Quando o choque é causado por septicemia bacteriana ou trauma, podem ocorrer alterações

relativas ao dano alveolar difuso, conhecido como pulmão de choque;

As manifestações clínicas dos choques cardiogénico e hipovolémico são: hipotensão; pulso

fraco e rápido; taquipneia; e pele fria, pegajosa e cianótica;

No choque séptico a pele pode estar morna e eritematosa devido a vasodilatação.

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Capítulo V

Doenças do sistema imunológico

Doenças de hipersensibilidade: mecanismos da lesão mediada pelo

sistema imunológico

Causas das doenças de hipersensibilidade

Auto-imunidade (ex.: doenças auto-imunes);

Reacções contra os microrganismos;

Exs.:

- Glomerulonefrita pós-estreptocócica: anticorpos produzidos contra antigénios microbianos,

ligam-se a estes, produzindo complexos imunes que se depositam nos tecidos e desencadeiam

inflamação;

- Hepatite Viral: o vírus infecta as células do fígado não é citopático, mas é reconhecido como

estranho pelo sistema imunológico. As células T citotóxicas tentam eliminar as células infectadas

e essa resposta imunológica normal danifica as células hepáticas;

Reacções contra antigénios ambientais (exs.: pólen, pêlo de animais ou ácaros de poeira);

Alergias – são doenças causadas por respostas imunológicas incomuns a uma variedade de

antigénios não-infecciosos e inócuos aos quais somos expostos, mas apenas alguns apresentam

reacção;

O problema nestas doenças é que a resposta é desencadeada e mantida impropriamente,

tendendo a se tornarem crónicas, denominadas doenças inflamatórias mediadas pelo

sistema imunológico.

Hipersensibilidade imediata (Tipo I)

Também chamada de reacção alérgica ou alergia;

Induzida por antigénios ambientais (alergénios) que estimulam respostas TH2 fortes e

produção de IgE em indivíduos geneticamente susceptíveis;

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Sequência de eventos nas reacções de hipersensibilidade imediata (Fig. 26)

1. Activação de células TH2 e produção de IgE

- Os alergénios podem ser introduzidos por

inalação, ingestão ou injecção;

- As células TH2 que são induzidas secretam

diversas citocinas responsáveis por,

essencialmente, todas as reacções de

hipersensibilidade imediata;

IL-4 estimula as células B específicas

para o alergénio a sofrerem mudança

de classe da cadeira pesada para IgE e

secretar este isotipo;

IL-5 activa os eosinófilos que são

recrutados para a reacção;

IL-13 actua nas células epiteliais,

estimulando a secreção de muco;

Eotaxina recruta eosinófilos;

Fig. 26

Os níveis séricos de IgE (e, em alguns casos, os números de células TH2 no sangue) estão

aumentados em indivíduos que sofrem de alergias e a sua redução traz benefícios terapêuticos;

2. Sensibilização dos mastócitos pela IgE

- Os mastócitos expressam um receptor de alta afinidade para a porção Fc da

cadeira pesada, , da IgE, chamado de FcRI;

- Os mastócitos carregando IgE estão “sensibilizados” para reagir se o antigénio se ligar a

moléculas de anticorpos;

- Basófilos e eosinófilos também expressam FcRI;

3. Activação dos mastócitos e libertação de mediadores

- Quando os indivíduos que foram sensibilizados pela exposição a uma alergénio são expostos

novamente a esse alergénio, ele liga-se a diversas moléculas de IgE nos mastócitos específicas

para ele, em geral no local de entrada ou próximo dele;

- Quando essas moléculas de IgE sofrem uma ligação cruzada, uma série de sinais

bioquímicos é desencadeada nos mastócitos;

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Aminas vasoactivas libertadas dos grânulos

- Histamina: causa vasodilatação, aumento da permeabilidade vascular, contracção

do músculo liso e elevação da secreção de muco;

- Adenosina, factores quimiotáticos, proteases neutras (ex.: triptase) e proteoglicanos

ácidos (heparina, sulfato de condroitina);

Mediadores lipídicos recém-sintetizados

- Prostaglandina D2: causa broncoespasmo intenso e aumento da secreção de

muco;

- Leucotrienos C4 e D4: agentes vasoactivos e espamogénicos mais potentes,

causando aumento da permeabilidade vascular e contracção da musculatura lisa

brônquica;

Citocinas (importantes na reacção tardia)

- TNF e quimiocinas: recrutam e activam leucócitos;

- IL-4 e IL-5: amplificam a reacção imunológica iniciada pelas células TH2;

- IL-13: estimula a secreção de muco pelas células epiteliais;

Reacções tardias

- Fase tardia que se inicia após 2 a 8 horas, podendo durar por vários dias, sendo caracterizada

por inflamação e destruição tecidual, com a lesão das células epiteliais das mucosas;

- Os leucócitos inflamatórios são responsáveis pela maior parte da lesão espitelial na

hipersensibilidade imediata.

Manifestações clínicas e patológicas

Podem ser locais ou sistémicas, variando de uma rinite discretamente irritante a anafilatoxia

fatal.

Hipersensibilidade mediada por anticorpos (Tipo II)

Opsonização e fagocitose

- Anticorpos podem cobrir (opsonizar) as células, associado ou não à activação do complemento,

marcando essas células para fagocitose pelas células fagocitárias (macrófagos) que expressam

receptores para a porção Fc da IgG e proteínas do complemento;

- O resultado é a depleção das células opsonizadas;

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Inflamação

- Anticorpos e complexos imunes podem depositar-se nos tecidos ou vasos sanguíneos,

desencadeando uma reacção inflamatória aguda pela activação do complemento e libertação

dos produtos da sua clivagem ou ligando-se aos receptores Fc dos leucócitos;

- A reacção inflamatória causa lesão tecidual;

Disfunção celular mediada por anticorpos

- Os anticorpos podem ligar-se a receptores na superfície celular, causando alterações

funcionais (pela inibição ou activação desregulada) sem causar lesão celular;

- Exs.: miastenia grave, doença de Graves.

Hipersensibilidade mediada por complexos imunes (Tipo III)

Doença sistémica causada por complexos imunes (Fig. 27)

- A patogenia da doença sistémica causada por

complexos imunes pode ser dividida em três fases:

1. Formação dos complexos antigénio-anticorpo

na circulação

Os complexos mais patogénicos são formados

durante o excesso de antigénios, são pequenos

ou de tamanho moderado, são eliminados

com menos eficiência pelos macrófagos e,

portanto, circulam por mais tempo;

A carga do complexo, valência do antigénio,

avidez do anticorpo e as características

hemodinâmicas de um determinado leito

vascular influenciam na tendência para

desenvolver doença;

Os locais de depósito favoritos são os rins, a

articulação e os pequenos vasos sanguíneos

em vários tecidos;

Fig. 27

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2. Depósito dos complexos imunes nos tecidos

Pode ocorrer aumento da permeabilidade vascular;

3. Reacção inflamatória nos locais de depósito

O paciente desenvolve febre, urticária, artralgias, linfadenopatia e proteinúria;

Activam o sistema complemento (C3 e C5a), levando ao aumento da permeabilidade

vascular e quimiotaxia para neutrófilos e monócitos;

- Morfologia

A aparência morfológica da lesão causada pelos complexos imunes é dominada pela

vasculite necrosante, microtrombos e necrose isquémica superposta, acompanhados

de inflamação dos órgaõs afectados;

A parede necrótica do vaso sanguíneo desenvolve uma aparência eosinofílica borrada

chamada de necrose fibrinóide, causada pelo depósito de proteínas.

Doença local mediada por complexos imunes

- Ex.: reacção de Arthus (experimental) – vasculite cutânea.

Hipersensibilidade mediada pelas células T (Tipo IV)

São respostas imunológicas celulares nas quais os linfócitos T causam lesão tecidual pela

produção de citocinas, que induzem inflamação e activam os macrófagos, ou pela destruição

directa das células do hospedeiro;

Hipersensibilidade retardada (HR)

- As células T CD4+ são activadas pela exposição a um antigénio proteico, diferenciando-se em

células efectoras TH1;

- A exposição subsequente ao antigénio resulta na secreção da citocinas. O IFN-γ estimulam

os macrófagos para que produzam substâncias que causam dano tecidual e promovem a fibrose,

enquanto que, o TNF promove a inflamação;

- Reacções de HR prolongadas contra microrganismos persistentes ou outros estímulos podem

resultar num padrão morfológico especial chamado de inflamação granulomatosa;

O infiltrado perivascular inicial de células T CD4+ é, progressivamente, substituído por

macrófagos;

Esses macrófagos acumulados exibem evidência morfológica de activação, tornando-se

células epitelióides (grandes, achatados e eosinófilos);

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Estas células epitelióides fundem-se sob a influência de citocinas, formando células

gigantes multinucleadas, que circundadas por um colar de linfócitos, denomina-se

granuloma.

Citotoxicidade mediada pela célula T

- Os linfócitos T citotóxicos CD8+ (CTLs) específicos para o antigénio reconhecem células que

o expressam, destruindo-as;

- As células T CD8+ também secretam IFN-γ.

Fig. 28

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Mecanismos das doenças mediadas pelo sistema imunológico

Tipo Doença prototípica Mecanismos imunológicos Lesões patológicas

Hipersensibilidade

Tipo I

Anafilaxia, alergias,

asma (formas

atópicas)

Produção de IgE libertação

imediata de aminas vasoactivas

e outros mediadores pelos

mastócitos; recrutamento de

células inflamatórias (reacção

tardia)

Dilatação vascular,

edema, contracção da

musculatura lisa,

produção de muco,

inflamação

Hipersensibilidade

Tipo II

Anemia hemolítica

auto-imune; síndrome

de Goodpasture

Produção de IgG e IgM

ligam-se a antigénios na célula

ou tecido-alvo fagocitose

ou lise da célula-alvo através

da activação do complemento ou receptores Fc;

recrutamento de leucócitos

Fagocitose e lise

celular; inflamação; em

algumas doenças,

ocorrem alterações

funcionais sem lesão celular ou tecidual

Hipersensibilidade

Tipo III

Lúpus eritematoso

sistémico; algumas

formas de glomerulonefrite;

doença do soro;

reacção de Arthus

Depósito de complexos

antigénio-anticorpo

activação do complemento recrutamento de leucócitos

por produtos do

complemento e receptores Fc

libertação de enzimas e

outras moléculas tóxicas

Inflamação, vasculite

necrosante (necrose

fibrinóide)

Hipersensibilidade

Tipo IV

Dermatite de

contacto; esclerose

múltipla; diabetes tipo

1; rejeição de

transplantes;

tuberculose

Activação de linfóticos T

libertação de citocinas e

activação dos macrófagos;

citotoxicidade celular

Infiltrados

perivasculares, edema,

destruição celular,

formação de granuloma

Rejeição de transplantes

A principal barreira para o transplante de órgãos de um indivíduo para o outro da mesma

espécie (aloenxerto) é a rejeição imunológica do tecido transplantado.

Reconhecimento imunológico dos alotransplantes

Há dois mecanismos principais pelos quais o sistema imunológico reconhece e responde às

moléculas MHC do enxerto:

- Reconhecimento directo

As células T do hospedeiro reconhecem as moléculas MHC alogénicas (estranhas)

expressas nas células do enxerto;

O reconhecimento do MHC alogénico é essencialmente uma reacção imunológica

cruzada;

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Ocorrem tanto respostas de hipersensibilidade retardada (HR) como destruição das

células do enxerto;

- Reconhecimento Indirecto

As células T CD4+ do hospedeiro reconhecem as moléculas MHC do dador depois

dessas moléculas serem capturadas, processadas e apresentadas pelas APCs do

hospedeiro;

Esta forma de reconhecimento activa, principalmente, as vias de HR, estando também

envolvida na produção de anticorpos.

Mecanismos efectores da rejeição dos transplantes

Rejeição mediada pelas células T

As CTLs destroem células no tecido transplantado, causando morte das células

parenquimatosas e, talvez o mais importante, das células endoteliais (resultando em trombose e

isquémia do enxerto);

As células T CD4+ secretoras de citocinas desencadeiam as reacções de HR com aumento

da permeabilidade vascular e acumulação local de células mononucleares;

- Os macrófagos activados podem lesionar as células e vasos do enxerto, resultando em isquémia

e, consequente, rejeição.

Rejeição mediada por anticorpos

Aloanticorpos contra as moléculas MHC do órgão transplantado e outros aloantigénios ligam-

se ao endotélio do enxerto, causando lesão (e trombose secundária) por meio da activação do

complemento e recrutamento de leucócitos;

Superpostas à lesão vascular imunológica, a agregação palquetária e a coagulação (causadas pela

activação do complemento) causam uma acentuação da lesão isquémica;

Morfologia

1. Rejeição hiperaguda

- Anticorpos antidador pré-formados ligam-se ao endotélio do enxerto logo após o

transplante, causando trombose, dano isquémico e insuficiência imediata do enxerto (ex.:

rins);

2. Rejeição celular aguda

- As células T destroem o parênquima do órgão transplantado pela citotoxicidade e reacção

de HR;

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3. Rejeição humoral aguda (vasculite de rejeição)

- Anticorpos antidador danificam os vasos do enxerto – vasculite necrosante;

- Em muitos casos, a vasculite é menos aguda, sendo caracterizada por espessamento

acentuado da íntima pela proliferação de fibroblastos, miócitos e macrófagos espumosos;

4. Rejeição crónica

- Dominada pela aterosclerose, é provável que esse tipo de rejeição seja causada pela

reacção das células T e secreção de citocinas, que induzem proliferação das células do

músculo liso vascular, associada a fibrose do parênquima.

Métodos para melhorar a sobrevivência do órgão transplantado

Uma maior compatibilidade entre o dador e o receptor melhora a sobrevida do enxerto;

Entretanto, com o aperfeiçoamento dos medicamentos imunossupressores a

compatibilidade de HLA deixa de ser importante, que o receptor necessita de um transplante de

urgência;

- Fármacos usados: ciclosporina, o seu correlato FK506, mofetil micofenolato (MMF),

rapamicina, azatioprina, corticosteróides, globulinas antilinfocitárias e anticorpos monoclonais;

No entanto, existem alguns inconvenientes: a imunossupressão global leva a um aumento da

susceptibilidade às infecções oportunistas por fungos, vírus e outras infecções;

Para superar os efeitos colaterais da imunossupressão, uma estratégia consiste em prevenir

que as células T do hospedeiro recebam sinais co-estimuladores das CDs do dador

durante a fase inicial de sensibilização.

Transplante de células hematopoiéticas

A rejeição de transplantes alogénicos de medula óssea parece ser mediado por uma

combinação das células T e NK do hospedeiro resistentes à radioterapia e quimioterapia;

Dois problemas principais complicam este tipo de transplante:

- Doença enxerto vs hospedeiro (GVHD)

Ocorre quando células T imunologicamente competentes são transplantadas num

paciente com deficiência imunológica;

Quando um paciente com imunodeficiência recebe um transplante alogénico de medula

óssea, o hospedeiro não pode rejeitar o enxerto, mas células T presentes na medula

óssea do dador reconhecem o tecido do paciente como “estranho”, reagindo

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contra ele, resultando na activação das células T CD4+ e CD8+, gerando respostas HR e

CTL;

GVHD aguda: causa necrose de células epiteliais em três órgãos principais: fígado, pele

e intestino;

- Imunodeficiências

Ocorrem em pacientes que receberam transplantes de medula óssea;

Inclui a reconstituição lenta do SI do hospedeiro, que em geral é destruído ou

suprimido, para permitir que o enxerto peque, e uma incapacidade de regenerar por

completo todas as células necessárias do SI, levando a uma maior susceptibilidade de

infecções.

Doenças auto-imunes

Tolerância imunológica

É a ausência de resposta a um antigénio induzida pela exposição de linfócitos específicos àquele

antigénio;

Autotolerância – refere-se a uma ausência de resposta aos antigénios próprios;

É uma propriedade fundamental do sistema imunológico e a sua ruptura é a base das doenças

auto-imunes;

Tolerância central

- Linfócitos imaturos que reconhecem auto-antigénios nos órgãos linfóides centrais (geradores)

sofrem apoptose;

- Na linhagem de células B, alguns dos linfócitos auto-reactivos trocam os seus receptores por

outros que não são auto-reactivos;

Tolerância periférica

- Células T auto-reactivas que escapam da selecção negativa no timo podem ser eliminadas ou

eficazmente controladas:

Anergia

- Refere-se à desactivação funcional dos linfócitos induzida pelo encontro com

antigénios em determinadas condições;

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- Se os segundos sinais co-estimuladores não forem fornecidos ou se um

receptor inibidor na célula T for ligado quando a célula encontra auto-antigénios, a célula

T torna-se anérgica, sendo incapaz de responder ao antigénio;

- As células B também podem tornar-se anérgicas se encontrarem o antigénio na ausência

de células T auxiliares específicas;

Supressão pelas células T reguladoras

- As células T reguladores expressam CD25, uma das cadeiras do receptor para o IL-2,

citocina necessária para a sua geração e sobrevivência;

- Também expressam um factor de transcrição único (FoxP3). Mutação neste gene causa

uma doença auto-imune sistémica – IPEX (síndrome de desregulação imune ligada ao X,

poliendocrinopatia e enteropatia);

- Secretam citocinas imunossupressoras (ex.: IL-10 e TGF-β), que diminuem as respostas

das células T;

Morte celular induzida pela activação

- Envolve apoptose dos linfócitos maduros resultante do reconhecimento do

antigénio;

- Morte do receptor Fas. Mutações nestes genes causam síndrome linfoproliferativa

auto-imune.

Mecanismos da auto-imunidade

As variáveis que levam à ruptura da autotolerância e ao desenvolvimento de doenças auto-

imunes incluem: herdar genes de susceptibilidade que podem interferir em diferentes vias

de tolerância e infecções e alterações teciduais que podem expor auto-antigénios ou activar

APCs e linfócitos nos tecidos.

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Doenças auto-imunes

Lúpus eritematoso

sistémico

O LES é uma doença sistémica auto-imune, causada pela produção de anticorpos contra diversos auto-antigénios e pela

formação de complexos imunes;

Os principais anticorpos, responsáveis pela formação de complexos

imunes circulantes, são direccionados contra antigénios nucleares;

Outros anticorpos reagem com eritrócitos, plaquetas e vários

complexos de fosfolípidos com proteínas;

As manifestações da doença incluem nefrite, lesões cutâneas e artrite, (causadas pelo depósito de complexos imunes) e

anormalidades hematológicas e neurológicas;

A principal causa de ruptura da autotolerância no LES é desconhecida.

Pode incluir um excesso ou persistência de antigénios nucleares,

diversos genes de susceptibilidade herdados e desencadeadores

ambientais (ex.: radiação UV, que resulta em apoptose celular e

libertação de proteínas nucleares).

Artrite reumatóide

A AR é uma doença inflamatória crónica que afecta sobretudo as articulações, especialmente as pequenas articulações, mas pode

afectar diversos tecidos;

A doença é causada pela resposta auto-imune contra auto-antigénio(s)

desconhecido(s), causando reacções das células T na articulação,

levando à produção de citocinas que activam as células fagocitárias

que danificam tecidos e estimulam a proliferação de células sinoviais

(sinovite);

O TNF desempenha um papel fundamental nesta doença e o uso de antagonistas do TNF é altamente benéfico;

Os anticorpos também podem contribuir para a doença.

Síndrome de Sjögren

É uma doença inflamatória que afecta basicamente as glândulas

salivares e lacrimais, causando secura da boca e dos olhos;

Acredita-se que a doença seja causada por uma reacção auto-imune das células T contra um, ou mais, auto-antigénio(s) desconhecido(s)

expresso nestas glândulas, ou reacções imunológicas contra os

antigénios de um vírus que infecciona os tecidos.

Esclerose sistémica

Muitas vezes chamada de esclerodermia, é caracterizada pela

fibrose progressiva da pele, do TGI e de outros tecidos;

A fibrose pode resultar da activação dos fibroblastos pelas citocinas produzidas pelas células T, mas o factor que desencadeia respostas

das células T ainda é desconhecido;

É comum a presença de lesão endotelial e doença vascular nas

lesões da esclerose sistémica, talvez causando isquémia crónica, mas a

patogenia da lesão vascular é desconhecida.

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Capítulo VI

Neoplasia

Nomenclatura

Neoplasma – massa anormal de tecido, cujo crescimento é descontrolado e ultrapassa o do

tecido normal, persistindo da mesma maneira excessiva após o término dos estímulos que

provocaram a alteração;

Alterações hereditárias (genéticas) que permitam a proliferação excessiva e

desregulada independente de estímulos fisiológicos reguladores do crescimento são

fundamentais para a origem de todos os neoplasmas;

Os neoplasmas possuem um certo grau de autonomia e um aumento de tamanho mais ou

menos constante e indiferente ao seu ambiente local e ao estado nutricional do hospedeiro;

- No entanto, esta automonia não é completa, pois alguns neoplasmas necessitam de

suporte endócrino;

- Todos os neoplasmas dependem do hospedeiro para a sua nutrição e suprimento

sanguíneo;

Na terminologia médica comum, um neoplasma é muitas vezes reportado como um tumor,

sendo o estudo dos tumores chamado de oncologia.

Tumores benignos

Um tumor é classificado como benigno quando as suas características microscópicas e

macroscópicas são consideradas relativamente inofensivas, sugerindo que permanecerá

localizado, não poderá disseminar-se para outros locais e será acessível à remoção cirúrgica

(paciente geralmente sobrevive);

No entanto, podem produzir mais que uma massa localizada, e algumas vezes são responsáveis

por doenças sérias;

Em geral, são designados pela ligação do sufixo –oma ao nome do tipo celular do qual o

tumor se origina.

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Tumores malignos

São colectivamente reportados como cancros, derivado da palavra caranguejo, pois aderem de

maneira obstinada a qualquer parte que conseguem agarrar, semelhante ao comportamento do

caranguejo;

A lesão pode invadir e destruir estruturas adjacentes e disseminar-se para locais distantes

(metástase) e causar a morte;

A nomenclatura dos tumores malignos segue essencialmente a mesma dos tumores benignos,

com algumas adições e excepções.

Todos os tumores, benignos e malignos, possuem dois componentes básicos:

- O parênquima, constituído de células transformadas ou neoplásicas;

Determina o comportamento biológico do tumor e é responsável pelo seu nome;

- O estroma de sustentação, não-neoplásico, cosntituído de tecido conjuntivo, vasos sanguíneos

e células inflamatórias derivadas do hospedeiro;

Proporciona suprimento sanguíneo e suporte para o crescimento das células

parenquimatosas;

As neoplasias são de origem monoclonal;

- Em alguns casos, as células tumorais podem sofrer uma diferenciação divergente e dar origem

aos tumores mistos (ex.: tumor misto da glândula salivar);

Os tumores mistos multifacetados não devem ser confundidos com o teratoma;

Teratoma - um tipo de tumor de células germinais derivado de células pluripotentes e

constituído por elementos de diferentes tipos de tecido de uma ou mais das três camadas

de células germinais;

- Mais frequentemente encontrado no ovário ou no testículo em adultos e na região

sacrococcígea em crianças;

- Os teratomas variam de benignos (maturo, dermóide e cístico) a maligno (imaturo e

sólido).

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NOMENCLATURA DOS TUMORES

Tecido de origem Benigno Maligno

Composto por um tipo de células parenquimatosa

Tecido conjuntivo e derivados Fibroma

Lipoma

Condroma

Osteoma

Fibrossarcoma

Lipossarcoma

Condrossarcoma

Sarcoma osteogénico

Tecido endotelial e tecidos relacionados

Vasos sanguíneos

Vasos linfáticos

Sinovial

Mesotélio

Revestimento cerebral

Hemangioma

Linfangioma

Meningioma

Angiossarcoma

Linfangiossarcoma

Sarcoma sinovial

Mesotelioma

Meningioma invasivo

Células sanguíneas e células relacionadas

Células hematopoiéticas

Tecido linfóide

Leucemias

Linfomas

Músculo Liso

Estriado

Leiomioma

Rabdomioma

Leiomiossarcoma

Rabdomiossarcoma

Tumores de origem epitelial

Escamoso estratificado

Células basais da pele ou dos

anexos

Revestimento epitelial de

glândulas ou ductos

Vias respiratórias

Epitélio renal

Células hepáticas

Epitélio do tracto urinário (de

transição)

Epitélio placentário

Epitélio testicular (células

germinativas)

Papiloma de células

escamosas

Adenoma

Papiloma

Cistadenoma Adenoma brônquico

Adenoma tubular renal

Adenoma hepatocelular

Papiloma urotelial

Mola hidatiforme

Carcinoma de células

escamosas ou epidermóide

Carcinoma basocelular

Adenocarcinoma

Carcinoma papilar

Cistadenocarcinoma Carcinoma broncogénico

Carcinoma de células renais

Carcinoma hepatocelular

Carcinoma urotelial

Coriocarcinoma

Seminoma

Carcinoma embrionário

Tumores de melanócitos Nevo Melanoma maligno

Mais de um tipo de célula neoplásica – Tumores mistos, em geral derivados de uma

camada de células germinativas

Glândula salivar Adenoma pleomórfico Tumor misto maligno de

glândula salivar

Primórdio renal Tumor de Wilms

Mais de um tipo de célula neoplásica derivado de mais de uma camada de células

germinativas - Teratogénicos

Células totipotentes nas gónadas ou

em restos embrionários

Teratoma maduro, cisto

dermóide

Teratoma imaturo,

teratocarcinoma

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Características dos neoplasmas benignos e malignos

Os tumores benignos e malignos podem ser diferenciados com base no seu grau de diferenciação

na taxa de crescimento, na capacidade de invasão local e de disseminação a distância.

Diferenciação e anaplasia

Referem-se somente às células parenquimatosas, que constituem os elementos transformados do

neoplasmas;

Os tumores benignos assemelham-se ao tecido de origem e são bem diferenciados;

- Existem evidência de diferenciação morfológica e funcional;

- Nos tumores benignos bem diferenciados, as mitoses são extremamente limitadas em

número e são de configuração normal;

Os tumores malignos são pouco diferenciados ou completamente indiferenciados

(anaplásicos, significa “formação inversa”);

- A anaplasia implica uma desdiferenciação ou perda da diferenciação funcional e

estrutural das células normais;

- As células anaplásicas apresentam:

Pleomorfismo marcante (variação de tamanho e forma);

Núcleo hipercromático (coloração muito escura) e aumentado;

- A sua proporção para o citoplasma pode aproximar-se de 1:1;

- Cromatina grosseira e aglomerada;

- Nucléolo pode estar espantosamente grande;

Células gigantes;

Mitoses frequentemente numerosas e atípicas;

As células anaplásicas não desenvolvem padrões reconhecíveis de orientação de uma para

a outra (ex.: perdem a polaridade normal);

- A anaplasia é o distúrbio mais extremo do crescimento celular encontrado no espectro das

proliferações celulares;

Displasia – termo utilizado para descrever uma proliferação desordenada, mas não-neoplásica;

- É encontrade, principalmente, no epitélio;

- Consiste na perda de uniformidade das células individuais e da sua orientação arquitectónica;

- Exibem pleomorfismo considerável e frequentemente possuem núcleos hipercromáticos

(anormalmente grandes para o tamanho da célula);

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- As mitoses frequentemente aparecem em localizações anormais dentro do epitélio;

- Quando as alterações displásicas são marcantes e envolvem toda a espessura do epitélio, a

lesão é chamada de carcinoma in situ (estágio pré-invasivo de cancro);

- O termo displasia sem qualificações não indica cancro, e as displasias não progridem

necessariamente para o cancro.

Taxas de crescimento

Os tumores benignos crescem lentamente, enquanto que, os tumores malignos

geralmente crescem mais rápido;

No entanto, existem muitas excepções para esta generalização e alguns tumores benignos

crescem mais rapidamente do que alguns cancros (ex.: velocidade do crescimento de leiomiomas

do útero é influenciada pelos níveis de estrogénio circulantes);

Em geral, a taxa de crescimento dos tumores malignos correlaciona-se com o seu nível de

diferenciação, ou seja, tumores que crescem rapidamente tendem a ser pouco

diferenciados (menor capacidade funcional especializada);

Tumores malignos que crescem rapidamente muitas vezes contêm áreas centrais

de necrose isquémica porque o suprimento sanguíneo do tumor, derivado do hospedeiro, é

incapaz de sustentá-lo com o oxigénio necesário para a expansão da massa de células.

Invasão local

Os tumores benignos são bem circunscritos e podem possuir um cápsula;

- A cápsula deriva, provavelmente, do estroma do tecido do hospedeiro à medida que as células

parenquimatosas atrofiam sob a pressão do tumor em expansão;

- Nem todas as neoplasias benignas são encapsuladas (ex.: leiomioma do útero);

Os tumores malignos são pouco circunscritos e invadem o tecido normal

circundante;

- Crescem por infiltração progressiva, invasão, destruição e penetração dos tecidos circundantes;

- Os patologistas cirúrgicos examinam cuidadosamente as margens do tumor retirado para

garantir que elas estejam isentas de células cancerosas (margens limpas);

- Depois do desenvolvimento de metástases, a invasão local constitui a característica mais

confiável que diferencia os tumores malignos dos tumores benignos.

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Metástase

Metástase – desenvolvimento de implantes secundários (metástase) separados do tumor

primário, em tecidos distantes;

Os tumores benignos permanecem localizados no seu sítio de origem, enquanto que,

os tumores malignos são invasivos localmente e metastatizam-se para locais

distantes;

Carcinomas basocelulares da pele e a maioria dos tumores primários do sistema nervoso central

são altamente invasivos no seu local prímario de origem, mas raramento metastatizam;

Os sarcomas osteogénicos (ósseos), normalmente, mestatatizam para os pulmões ao mesmo

tempo da descoberta da manifestação inicial;

Em geral, quanto maior e mais anaplásica for a neoplasia primária, mais provável é a

disseminação metastática, mas podem existem algumas excepções;

- Esta disseminação prejudica enormemente a possibilidade de cura da doença;

As neoplasias malignas disseminam-se por uma das três vias seguintes:

- Disseminação por implantação

Neoplasias invadem as cavidades corporais naturais (ex.: cancro do ovário);

- Disseminação linfática

É mais característica dos carcinomas;

- Algumas excepções de carcinomas que se disseminam por via hematogénica: carcinoma

de células renais e carcinomas hepatocelulares;

Metástase saltatória – as células cancerosas parecem atravessar os canais linfáticos

dentro dos nódulos linfáticos imediatamente próximos para serem aprisionadas nos

nódulos linfáticos subsequentes;

“Nódulo linfático sentinela” – primeiro nódulo linfático numa bacia linfática regional

que recebe o fluxo linfático a partir do tumor primário;

Embora o aumento dos nódulos linfáticos próximos da neoplasia primária possa

despertar fortes suspeitas de disseminação metastática, não significa sempre

envolvimento canceroso;

- Os produtos necróticos da neoplasia e os antigénios tumorais muitas vezes provocam

alterações reactivas nos nódulos linfáticos, tais como, aumento e hiperplasia dos folículos

(linfadenite) e proliferação de macrófagos no seio subcapsular (histiocitose sinusal);

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- Disseminação hematogénica

É a consequência mais temida de cancro;

Ela a principal via de disseminação dos sarcomas;

O fígado e os pulmões são os locais secundários mais frequentemente envolvidos na

disseminação hematogénica (invasão venosa).

Epidemiologia

A incidência do cancro varia de acordo com a idade, etnia, factores geográficos e condições

genéticas;

- Os cancros são mais comuns nos dois extremos de idade;

- As variações geográficas resultam, na maioria das vezes, de exposições ambientais diferentes;

A maioria dos cancros é esporádica, mas alguns são familiares;

- A predisposição para cancros hereditários pode ser autossómica recessiva, geralmente

associada a defeitos no reparo do DNA (ex.: xeroderma pigmentoso);

- Também pode ser autossómica dominante, comumente ligada à hereditariedade de uma

mutação na linhagem germinativa dos genes supressores de tumor (ex.: retinoblastoma da

infância, polipose adenomatosa familiar);

Os cancros familiares tendem a ser bilaterais e a aparecer mais precocemente do que a sua

contraparte esporádica.

Carcinogénese: as bases moleculares do cancro (Fig. 29)

Os tumores originam-se de um crescimento clonal de células que possuem mutações ocorridas

em quatro classes de genes: genes que regulam o crescimento celular (proto-oncogenes e

genes supressores de tumor) e aquelas que regulam a apoptose e o reparo do DNA;

A mutação num único gene não é suficiente para causar cancro;

- Normalmente, os atributos fenotípicos característicos de malignidade desenvolvem-se quando

múltiplas mutações, envolvendo múltiplos genes, acumulam-se;

- A acumulação gradual de mutações e o aumento da malignidade são reportados como

progessão tumoral.

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Fig. 29

Auto-suficiência nos sinais de crescimento

Proto-oncogenes – genes celulares normais cujos produtos promovem a proliferação celular;

Oncogenes – versões mutantes dos proto-oncogenes que funcionam autonomamente sem a

necessidade de sinais promotores do crescimento;

Os oncogenes podem promover a proliferação celular descontrolada por vários

mecanismos:

- Expressão independente do estímulo do factor de crescimento e do seu receptor,

mantendo um circuito autócrino de proliferação celular;

Receptor de PDGF-PDGF nos tumores cerebrais;

- Mutações nos genes que codificam os receptores do factor de crescimento, levando

a superexpressão ou sinalização constitutiva pelo receptor (ex.: receptores do EGF);

Membros da família do receptor de EGF, incluindo o HER2/NEU (mama, pulmão e

outros tumores);

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Vitor Martins FMUL/UMa 97

- Mutações nos genes que codificam as moléculas de sinalização;

O RAS está comumente mutado nos cancros humanos;

Normalmente saltos entre o estado de repouso ligado ao GDP e o estado activo ligado

ao GTP;

- As mutações bloqueiam a hidrólise do GTP em GDP, o que leva a uma sinalização

descontrolada;

Fusão da tirosina quinase ABL com a proteína BCR em certas leucemias gera uma

proteína híbrida com actividade quinase constitutiva;

- Superprodução ou actividade desregulada dos factores de transcrição;

Translocação t(8;14) do MYC em alguns linfomas leva a superexpressão e expressão

desregulada dos seus genes-alvo que controlam o ciclo celular e a sobrevivência;

- Mutações que activam os genes da ciclina ou inactivam os reguladores normais das

ciclinas e quinases dependentes de ciclinas;

Complexos de ciclinas com quinases dependentes de ciclina (CDKs) conduzem o ciclo

celular ao fosforilar vários substratos;

As CDK’s são controladas por inibidores;

As mutações nos genes que codificam as ciclinas, CDKs e os inibidores das CDKs

resultam na progressão descontrolada do ciclo celular;

Tais mutações são encontradas numa ampla variedade de cancros, incluindo cerebrais,

pulmonares, cancro pancreático e melanomas.

Insensibilidade aos sinais inibidores do crescimento

Os genes supressores de tumor codificam proteínas que inibem a proliferação celular por regular

o ciclo celular;

Diferentemente, nos oncogenes ambas as cópias do gene devem estar perdidas para o

desenvolvimento do tumor, levando à perda da heterozigose no locus génico;

Nos casos com predisposição familiar para desenvolver tumores, os indíviduos afectados

herdam uma cópia defeituosa (não-funcional) de um gene supressor de tumor e perdem a

segunda cópia por mutação somática;

Nos casos esporádicos, ambas as cópias estão perdidas devido a mutações somáticas;

O primeiro e prototípico gene supressor de tumor a ser descoberto foi o gene do

retinoblastoma (RB).

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Gene RB e o ciclo celular

A RB exerce efeitos antiproliferativos por controlar a transição de G1 para S no ciclo

celular;

Na sua forma activa, a RB está hipofosforilada e liga-se ao factor de transcrição E2F;

- Esta interacção evita a transcrição de genes, como o da ciclina E, que são necessários para a

replicação do DNA e, dessa forma, as células permanecem em G1;

A sinalização do factor de crescimento leva à expressão da ciclina D, activação dos complexos

ciclina D-CDK4/6, inactivação da RB por fosforilação e, assim, liberta o E2F;

A perda do controlo do ciclo celular é fundamental para a transformação maligna;

Quase todos os cancros possuem o ponto de controlo de G1 inválido, por mutação da RB ou de

genes que afectam a função da RB, como a ciclina D, CDK4 e CDKIs;

Muitos vírus de DNA oncogénicos, como o HPV, codificam proteínas (ex.: E7) que se ligam a RB

e deixam-na não-funcional.

Gene p53: guardião do genoma (Fig. 30)

Os p53 impede a transformação

neoplásica por três mecanismos

conectados: activação da interrupção

temporária do ciclo celular

(quiescência), indução da interrupção

do ciclo celular de forma permanente

(senescência), ou disparando a morte

celular programada (apoptose);

A p53 é o monitor central do stress

na célula e pode ser activada por

anoxia, sinalização inadequada de

um oncogene ou lesão do DNA;

A p53 activada controla a expressão e a

actividade dos genes envolvidos na

paragem do ciclo celular, no reparo do

DNA, o envelhecimento celular e a apoptose; Fig. 30

O DNA lesado leva à activação da p53 por fosforilação;

- A p53 activada conduz à transcrição do CDKN1A (p21) que evita a fosforilação da RB e, dessa

forma, causa o bloqueio de G1 para S no citoplasma celular;

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- Esta paragem permite que a célula repare o DNA danificado;

Dos tumores humanos, 70% possuem perda da homozigose do p53;

Os pacientes com a rara Síndrome de Li-Fraumeni herdam uma cópia defeituosa na linhagem

germinativa e perdem a segunda em tecidos somáticos, desenvolvendo uma variedade de

tumores (ex.: sarcomas, cancro da mama, leucemia, tumores cerebrais e carcinomas do córtex

supra-renal);

Como ocorre com a RB, a p53 pode ser incapacitada pela ligação a proteínas codificadas por

alguns vírus de DNA oncogénicos, com o HPV e, possivelmente, o EBV e o HBV.

Via do factor de crescimento transformante-β

O TGF-β inibe a proliferação de muitos tipos celulares pela activação de genes inibidores do

crescimento, como CDKIs, e a supressão dos genes promotores do crescimento, como o c-

MYC, VDK2, CDK4 e as ciclinas A e E;

A função do TGF-β está comprometida em muitos tumores por mutações nos seus receptores

(cólon, estômago, endométrio) ou por meio da inactivação mutacional dos genes SMAD que

traduzem a sinalização do TGF-β (pâncreas).

Via da β-catenina da polipose adenomatosa do cólon

A WNT é um factor solúvel que pode induzir a proliferação celular;

- Liga-se ao seu receptor e transmite sinais que evitam a desgradação da β-catenina, o

que permite a sua translocação para o núcleo, onde age como um activador da transcrição em

conjunto com outra molécula, chamada de TcF;

- Nas células quiescentes, que não são expostas à WNT, a β-catenina citoplasmática é

degradada por um complexo de destruição, do qual o APC é parte integral;

- Com a perda do APC (nas células malignas), a degradação da β-catenina é evitada e a resposta

sinalizadora da WNT é inadequadamente activada na ausência de WNT;

- Assim, a β-catenina transloca-se para o núcleo, onde age como um factor de transcrição de

genes promotores do crescimento (ex.: ciclina D1 e MYC);

Na Síndrome da polipose adenomatosa familiar, a herança de uma mutação na linhagem

germinativa no gene APC causa o desenvolvimento de centenas a milhares de pólipos coloniais

numa idade precoce;

- Um ou mais destes pólipos originam um cancro de cólon com a perda da heterozigose no locus

APC;

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- A perda somática de ambos os alelos do gene APC é vista, aproximadamente, em 70% dos

cancros do cólon esporádico.

Evasão da apoptose

A apoptose pode ser iniciada pelas vias intrínseca ou extrínseca;

Ambas as vias resultam na activação de uma cascata proteolítica de caspases que destrói a célula;

A permeabilidade da membrana externa mitocondrial é regulada pelo equilíbrio entre as

moléculas pró-apoptóticas (ex.: BAX, BAK) e as anti-apoptóticas (BCl-2, BCl-XL);

As células BH3-only (ex.: BAD, BID e PUMA) activam a apoptose por provocar um

desequilíbrio em favor das moléculas pró-apoptóticas;

Em 85% dos linfomas de células B foliculares, o gene anti-apoptótico BCl-2 está

activado por uma translocação t(8;14).

Potencial replicativo ilimitado

Nas células normais, que perdem a expressão da telomerase, os telómeros encurtados gerados

pela divisão celular, consequentemente, activam os pontos de controlo do ciclo celular, levando à

senescência e estabelecendo um limite no número de divisões que a célula pode sofrer;

Nas células que possuem os pontos de controlo deficientes, as vias de reparo do DNA são

activadas inadequadamente pelos telómeros encurtados, o que leva à instabilidade cromossómica

maciça e à crise mitótica;

As células tumorais reactivam a telomerase, e isso protela a catástrofe mitótica e permite a

imortalidade.

Desenvolvimento da angiogénese sustentada

A vascularização dos tumores é essencial para o seu crescimento e é controlada pelo equilíbrio

entre factores angiogénicos e anti-angiogénicos que são produzidos pelas células tumorais e

estromais;

- Esta vasculatura é anormal: vasos permeáveis, dilatados e com padrão irregular de

conexão;

A neovascularização tem um efeito duplo no crescimento tumoral:

- A perfusão fornece nutrientes necessários e oxigénio;

- As células endoteliais recém-formadas estimulam o crescimento das células tumorais

adjacentes por meio da secreção de factores de crescimento;

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A angiogénese também contribui para o acesso à vasculatura e, consequentemente, para a

metástase;

A hipoxia desencadeia a angiogénese por meio de acções do HIF1α;

- Por causa da sua capacidade de degradar o HIF1α e, dessa forma, evitar a angiogénese, a VHL

age como um gene supressor de tumor;

- A herança de mutações na linhagem germinativa deste gene causa a Síndrome de von

Hippel-Lindau (VHL), caracterizada pelo desenvolvimento de uma variedade de tumores (ex.:

cancros de células renais, feocromocitomas, hemangiomas do sistema nervoso central, angiomas

de retina e quistos renais);

Muitos outros factores regulam a angiogénese (ex.: p53 induz a síntese do inibidor de

angiogénese trombospondina-1).

Capacidade para invadir e metastatizar

A capacidade para invadir tecidos, uma indicação de malignidade, ocorre em quatro etapas

(Fig.31):

1. Enfraquecimento do contacto célula-célula;

- O contacto célula-célula é perdido pela

inactivação da E-caderina;

A função da E-caderina está perdida em

praticamente todos os cancros epiteliais;

2. Degradação da MEC;

- A degradação das membranas basais e da matriz

intersticial é mediada por enzimas proteolíticas

secretadas pelas células tumorais e células estromais,

como as MMPs e as catepsinas;

3. Fixação a novos componentes da MEC;

- As enzimas proteolíticas também libertam factores

de crescimento sequestrados na MEC e produzem

fragmentos quimiotáticos e angiogénicos a partir da

clivagem das glicoproteínas da MEC; Fig. 31

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Vitor Martins FMUL/UMa 102

4. Migração das células tumorais;

- As células tumorais são vulneráveis à destruição pelas células do sistema imune do

hospedeiro;

- Na corrente sanguínea, algumas células tumorais formam êmbolos, pois agregam-se e

aderem aos leucócitos circulantes, particularmente, às plaquetas;

- As células tumorais agregadas dispõem de certa protecção contra as células efectoras

antitumorais do hospedeiro;

- A maioria das células tumorais, no entanto, circulam sob a forma de células únicas;

- O extravasamento de células tumorais livres ou êmbolos tumorais envolve a adesão ao

endotélio vascular, seguida pelo egresso pela membrana basal até ao parênquima do órgão

por meio de mecanismos semelhantes àqueles envolvidos na invasão;

- O local metastático de muitos tumores pode ser predito pela localização do tumor

primário;

Muitos tumores ficam detidos no primeiro leito capilar que encontram (pulmão

e fígado, mais comumente);

- Alguns tumores mostram tropismo para um determinado órgão, provavelmente devido à

expressão de receptores de adesão ou de quimiocinas cujos ligantes são expressos pelo local

metastático.

Instabilidade genómica – capacitação para malignidade

Indivíduos com mutações herdadas em genes envolvidos nos sistemas de reparo do DNA

possuem um risco enormemente aumentado de desenvolver cancro;

Pacientes com a Síndrome do cancro de cólon sem polipose hereditária (HNPCC)

possuem defeitos no sistema de reparo do emparelhamento errado do DNA e

desenvolvem carcinomas de cólon (predominantemente o ceco e o cólon ascendente);

- Estes pacientes mostram instabilidade do microssatélite (IMS), na qual as repetições encurtadas

por todo o genoma estão alteradas em tamanho;

Pacientes com xeroderma pigmentoso apresentam um defeito na via de reparo por excisão

do nucleótido e um risco aumentado para desenvolver cancro de pele quando expostos à luz

UV, devido à incapacidade de reparar os dímeros de pirimidina;

As síndromes que envolvem defeitos no sistema de reparo da recombinação homóloga

do DNA compõem um grupo de distúrbios (síndrome de Bloom, ataxia-telangiectasia e anemia

de Fanconi) que é caracterizado pela hipersensibilidade aos agentes que lesam o DNA,

como a radiação ionizante;

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O BCRA1 e o BCRA2, que estão mutados nos cancros de mama familiares, estão

envolvidos no reparo do DNA;

- Apesar do BCRA1 e do BCRA2 estarem inactivos nos cancros de mama familiares, esses genes

raramente estão inactivos em casos esporádicos de cancro de mama, sendo diferentes de outros

genes supressores de tumores, que são inactivados tanto nos cancros familiares como nos

esporádicos.

MicroRNAs (miRNAs) e cancro

Os miRNAs são RNAs de fita simples não codificados, de aproximadamente 22 nucleótidos

de comprimento, que funcionam como reguladores negativos de genes;

Inibem a expressão genética pós-transcricionalmente por reprimir a tradução, ou, em alguns

casos, da clivagem do mRNA;

Controlam o crescimento, a diferenciação e a sobrevivência celulares;

A actividade reduzida de um miRNA que inibe a tradução de um oncogene origina um excesso

de oncoproteínas;

A superactividade de um miRNA que tem como alvo um gene supressor de tumor reduz a

produção da proteína supressora de tumor.

Alterações cariotípicas nos tumores

As células tumorais desenvolvem uma variedade de anormalidades cromossómicas não-aleatórias

que contribuem para a malignidade, que incluem translocações recíprocas, delecções e

manifestações citogenéticas de amplificação génica;

- As translocações recíprocas contribuem para a carcinogénese por meio da superexpressão

de oncogenes ou pela geração de novas proteínas fusionadas com a capacidade de sinalização

alterada (especialmente neoplasmas hematopoiéticos);

Ex.: leucemia mielogénica crónica (cromossomas 9 e 22);

- As delecções frequentemente afectam os genes supressores de tumor (mais comuns nos

tumores sólidos não-hematopoiéticos);

Ex.: retinoblastoma (delecção 13p faixa 14)

- A amplificação génica aumenta a expressão dos oncogenes;

Ex.: neuroblastomas e cancro da mama;

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Vitor Martins FMUL/UMa 104

Os genes supressores de tumor e os genes de reparo do DNA também podem ser silenciados

por alterações epigenéticas, as quais envolvem alterações hereditárias reversíveis na

expressão do gene que ocorrem, não por mutação, mas por metilação do promotor.

Etiologia do cancro: agentes carcinogénicos

Carcinogénios químicos

Os carcinogénios químicos possuem grupos eletrofílicos altamente reactivos que lesam

o DNA directamente, levando a mutações e frequentemente ao cancro;

Os agentes de acção directa não exigem conversão metabólica para se tornarem

carcinogénicos, enquanto que, os agentes de acção indirecta não estão activos até que sejam

convertidos num carcinogénio por vias metabólicas endógenas;

- Por essa razão, os polimorfismos de enzimas endógenas, como o citocromo P450, podem

influenciar a carcinogénese;

Depois da exposição de uma célula a um mutagénio ou um iniciador, a tumorigénese pode

ser potencializada pela exposição a promotores que estimulam a proliferação das células

mutadas;

Exemplos de carcinogénios humanos compreendem os de acção directa (ex.: agentes alquilantes

utilizados para quimioterapia), os de acção indirecta (ex.: benzopireno, corantes azo e aflatoxina)

e promotores/agentes que causam hiperplasia patológica do fígado e endométrio.

Carcinogénese por radiação

A radiação ionizante causa quebras cromossómicas, translocações e, menos frequentemente,

mutações pontuais, que levam a lesão genética e carcinogénese;

Os raios UV induzem a formação de dímeros de pirimidina no DNA, o que leva a mutações;

- Por essa razão, os raios UV podem dar origem a carcinomas de células escamosas e melanomas

da pele.

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Vitor Martins FMUL/UMa 105

Oncogénese viral e microbiana

Vírus oncogénicos de RNA

O HTLV-1 causa a leucemia de células T (células TCD4+ são o alvo principal), que é

endémica no Japão e nas Caraíbas;

O HTLV-1 codifica a proteína TAX viral, que transforma os genes de citocinas e os seus

receptores em células T infectadas (sinalização autócrina);

- Isso prepara um sistema de sinalização parácrino (aumento da produção do factor

estimulador de colónias de macrófagos-granulócitos, que estimula os macrófagos vizinhos a

produzirem outros mitogénios de células T) e autócrino que estimula a proliferação das células

T;

- Embora esta proliferação seja inicialmente policlonal, as células T proliferantes possuem um

risco aumentado de sofrer mutações secundárias, o que leva ao surgimento de uma leucemia

monoclonal.

Vírus oncogénicos de DNA

Papilomavírus humano (HPV)

- O HPV está associado a verrugas benignas, bem como ao cancro do colo do útero;

- A capacidade oncogénica do HPV está relacionada à expressão de duas oncoproteínas virais, a

E6 e a E7;

A E6 liga-se a p53 e a E7 liga-se a RB, neutralizando a sua função;

Ambas podem activar ciclinas;

- A E6 e a E7 do HPV de alto risco (que origina cancro) possuem maior afinidade pelos seus

alvos do que a E6 e a E7 do HPV de baixo risco (que origina tumores de baixo grau);

Vírus Epstein-Barr (EBV)

- O EBV está associado à patogenia do linfoma de Burkitt, de linfoma nos indivíduos

imunossuprimidos com infecção pelo HIV ou receptores de órgãos, a algumas formas de lingoma

de Hodgkin e ao carcinoma nasofaríngeo;

Todos, excepto o cancro nasofaríngeo, são tumores de células B;

- Certos produtos de genes do EBV (LMP-1) contribuem para a oncogénese porque estimulam

as vias de proliferação da célula B;

- O comprometimento do sistema imune, concomitantemente, permite a proliferação da

célula B mantida e, consequentemente, o desenvolvimento de um linfoma com a ocorrência de

mutações adicionais como a t(8;14), que levam à activação do gene MYC.

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Vírus da Hepatite B e da Hepatite C

- Entre 70% a 85% dos carcinomas hepatocelulares por todo o mundo são devidos a

infecção pelo HBV ou HCV (não é um vírus de DNA);

- Os efeitos oncogénicos do HBV e HCV são multifactoriais, mas o efeito dominante

parece ser imunologicamente mediado pela inflamação crónica, lesão hepatocelular, estimulação

da proliferação dos hepatócitos e produção de espécies reactivas de oxigénio que podem lesar o

DNA;

- A proteína HBx do HBV e a proteína central do HCV podem activar uma variedade de

vias transductoras de sinais que podem também contribuir para a carcinogénese.

Herpesvírus do sarcoma de Kaposi (KSHV)

- O sarcoma de Kaposi é um tumor vascular, sendo a neoplasia mais comum nos pacientes

com SIDA;

- Os mecanismos que ligam a infecção com este vírus às lesões vasculares são desconhecidos;

- Uma hipótese seria que o KSHV infecta células endoteliais linfáticas ou outras células e, junto

com citocinas produzidas pelas células do sistema imunológico infectadas pelo HIV, estimula a

proliferação das células vasculares;

- O genoma do KSHV contém homólogos de diversos genes humanos que sabidamente afectam

a sobrevivência e proliferação das células.

Helicobacter pylori

A infecção pelo H. pylori está envolvida no surgimento do adenocarcinoma gástrico e do

linfoma MALT;

O mecanismo de indução do cancro gástrico pelo H. pylori é multifactorial e inclui a inflamação

crónica mediada imunologicamente, a estimulação da proliferação das células gástricas e a

produção de espécies reactivas de oxigénio que danificam o DNA;

Os genes de patogenicidade do H. pylori, como o CagA, podem contribuir também por

estimular as vias do factor de crescimento;

Acredita-se que a infecção pelo H. pylori leve a proliferações policlonais de células B e que

consequentemente um tumor de células B monoclonal (linfoma MALT) surja como

resultado da acumulação de mutações.

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Defesa do hospedeiro contra tumores: imunidade tumoral

Antigénios tumorais

A classificação moderna dos antigénios tumorais é baseada na sua origem e na estrutura

molecular;

- Produtos dos oncogenes mutados e genes supressores de tumor

A transformação neoplásica resulta de alterações genéticas, algumas das quais podem

resultar na expressão de antigénios de superfície celular vistos pelo sistema imune como

não-próprios;

Os antigénios nesta categoria são derivados de oncoproteínas mutantes e de proteínas

supressoras do cancro;

Antigénios tumorais únicos originam-se dos produtos dos genes β-catenina, RAS, p53 e

CDK4, que frequentemente estão mutados nos tumores.

- Produtos de outros genes mutados

Devido à instabilidade genética das células tumorais, muitos genes estão mutados nestas

células, inclusive genes cujos produtos não são relacionados ao fenótipo transformado e

não possuem função conhecida;

Os produtos destes genes mutados são antigénios tumorais em potencial.

- Proteínas celulares superexpressas ou expressas de forma aberrante

Num subconjunto de melanomas humanos, alguns antigénios tumorais são proteínas

estruturalmente estruturalmente normais que são produzidas em níveis baixos nas células

normais e superexpressas nas células tumorais (ex.: tirosinase);

Outro grupo, chamado de antigénios do “cancro de testículos”, é codificado por genes

que estão silenciados em todos os tecidos adultos, excepto nos testículos;

- Estes antigénios são específicos do tumor, pois não são expressos na superfície celular

de forma antigénica nas células normais porque o esperma não expressa antigénios MHC

classe I;

- O protótipo deste grupo é a família MAGE de genes (embora sejam específicos de

tumores, os antigénios MAGE não são únicos para tumores individuais.

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- Antigénios tumorais produzidos por vírus oncogénicos

Os mais potentes destes antigénios são as proteínas produzidas por vírus de DNA

latente.

- Antigénios oncofetais

O antigénio carcinoembrionário (CEA) e a α-fetoproteína, são expressos durante a

embriogénese, mas não nos tecidos adultos normais;

A reactivação dos genes que codificam estes antigénios causa a sua reexpressão nos

cancros de cólon e hepático.

- Glicolípidos e glicoproteínas de superfície celular alterados

A maioria dos tumores humanos e experimentais expressa níveis mais altos que o normal

e/ou formas anormais de glicoproteínas e glicolípidos de superfície, que podem ser

marcadores diagnósticos e alvos para tratamento;

Estas moléculas alteradas incluem gangliosídeos, antigénios do grupo sanguíneo e as

mucinas (ex.: CA-125 e a CA-19-9, expressas na carcinoma de ovário, e a MUC-1,

expressa no carcinoma de mama).

- Antigénios de diferenciação específicos de tipos celulares

São moléculas expressas nos tumores que estão anormalmente presentes nas células de

origem.

Mecanismos efectores antitumorais

A imunidade mediada por células é o mecanismo antitumoral dominante in vivo;

Linfócitos T citotóxicos

- Nos seres humanos, parecem desempenhar um papel protector, principalmente contra

neoplasmas associados a vírus.

Células Natural Killer

- São linfócitos capazes de destruir as células tumorais sem sensibilização prévia;

- Podem fornecer a primeira linha de defesa contra as células tumorais.

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Macrófagos

- Os macrófagos activados podem eliminar os tumores por meio de mecanismos semelhantes

àqueles utilizados para eliminar os microrganismos.

Mecanismos humorais

- Não existe evidência dos efeitos protectores dos anticorpos antumorais contra tumores

espontâneos;

- A administração de anticorpos monoclonais contra células tumorais pode ser terapeuticamente

efectiva.

Vigilância imune

Os pacientes imunossuprimidos apresentam um risco aumentado de cancro;

Nos pacientes imunocomprometidos, os tumores podem evitar o sistema imune por meio

de vários mecanismos, inclusivé por formas variantes de antigénios negativos do crescimento

selectivas, perda ou expressão reduzida dos antigénios de histocompatibilidade e

imunossupressão mediada pela secreção de factores (ex.: TGF-β) a partir do tumor.

Aspectos clínicos da neoplasia

Tanto o tumor maligno como o benigno podem causar problemas devido:

- À localização e pressão sobre as estruturas adjacentes;

- À actividade funcional, como a síntese de hormonas ou o desenvolvimento de síndromes

paraneoplásicas;

- Ao sangramento e infecções secundárias, quando os tumores ulceram através de estruturas

adjacentes;

- Aos sintomas que resultam da sua ruptura ou enfarto;

- À caquexia ou debilitação.

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Vitor Martins FMUL/UMa 110

Efeitos do tumor no hospedeiro

A caquexia, definida pela perda progressiva de gordura e massa corporal, acompanhada

por profunda fraqueza, anorexia e anemia, é causada pela libertação de citocinas pelo tumor ou

hospedeiro;

As síndromes paraneoplásicas, definidas pelos sintomas sistémicos que não podem ser

explicados pela disseminação tumoral ou por hormonas adequadas ao tecido, são

causadas pela produção e secreção ectópica de substâncias bioactivas, como a ACTH, PTHrP ou

TGF-α;

A graduação dos tumores é determinada pela aparência citológica e é baseada na ideia de

que o comportamento e a diferenciação estão relacionados, com os tumores pouco

diferenciados apresentando comportamento mais agressivo;

O estadiamento, determinado pela exploração cirúrgica, é baseado no tamanho, local e

disseminação para nódulos linfáticos regionais e metástase a distância;

- O estadiamento aumenta o valor clínico da graduação.

Diagnóstico laboratorial do cancro

Há várias abordagens para o diagnóstico de tumores, incluindo a excisão, a biópsia, a

aspiração por agulha fina e os esfregaços

citológicos;

A imuno-histoquímica e a citometria de

fluxo auxiliam no diagnóstico e na classificação

de tumores porque padrões de expressão de

proteínas distintos definem entidades

diferentes;

As proteínas libertadas pelos tumores no

soro, tal como o PSA, podem ser utilizadas

para triar populações para o cancro e

monitorizar a recorrência após o tratamento;

As análises moleculares são utilizadas para

determinar o diagnóstico, o prognóstico, a

detecção de doença residual mínima e o

diagnóstico de predisposição hereditária

para o cancro; Fig. 32

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Vitor Martins FMUL/UMa 111

O perfil molecular dos tumores por arranjos de cDNA pode determinar a expressão de

segmentos grandes do genoma de uma só vez e pode ser útil na estratificação molecular de

diferentes tumores sob todos os outros aspectos idênticos, com o propósito de tratamento e

prognóstico.

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Robbins, Patologia Básica 2008/2009

Vitor Martins FMUL/UMa 112

Capítulo VIII

Doenças ambientais

Mecanismos gerais de toxicidade

Toxicologia – é a ciência dos venenos, ou seja, estuda a distribuição, efeitos e mecanismos de

acção de agentes tóxicos. Mais amplamente, também inclui o estudo dos efeitos de agentes

físicos como a radiação e o calor;

Princípios básicos a respeito da toxicidade das substâncias exógenas e drogas:

- Veneno – conceito quantitativo estritamente dependente da dosagem;

“Todas as substâncias são venenos; a dose certa diferencia um veneno de um remédio”;

- Xenobióticos – substâncias químicas exógenas;

Podem estar presentes no ar, água, alimento e solo e são absorvidas pelo corpo através

de inalação, ingestão e contacto com a pele;

Podem ser excretadas na urina ou fezes ou eliminadas no ar expirado ou acumular-se na

gordura, osso, cérebro e outros tecidos;

Podem actuar no local de entrada ou podem ser transportadas para outros locais;

- A maioria dos solventes e drogas é metabolizada para formar produtos hidrossolúveis

(desintoxicação) ou é activada para formar metabolitos tóxicos;

o Fase I: substâncias podem sofrer hidrólise, oxidação ou redução, catalizadas pelo

sistema citocrono P450;

o Fase II: produtos da Fase I são metabolizados para compostos hidrossolúveis por

glicosilação, sulfatação, metilação e conjugação com glutationa;

- Numerosos solventes e drogas são lipofílicas, facilitando o seu transporte no sangue pelas

lipoproteínas e a penetração através dos componentes lipídicos das membranas celulares.

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Poluição ambiental

Poluição atmosférica

Poluição atmosférica ao ar livre

- Ozono

É um dos poluentes do ar mais comuns, que em combinação com óxidos e material

particulado forma o smog;

A sua toxicidade relaciona-se com a produção de radicais livres que lesam as células

epiteliais ao longo do TR e as células alveolares tipo I;

- Dióxido de enxofre (SO2), partículas e aerossóis ácidos

Pequenas partículas permanecem na corrente aérea e alcançam os espaços aéreos,

onde são fagocitadas por macrófagos e neutrófilos, causando a libertação de mediadores

e incitando uma reacção inflamatória respiratória;

As partículas grandes são removidas no nariz ou são aprisionadas pelo muco;

- Monóxido de carbono (CO)

É um poluente importante do ar e uma causa importante de morte por acidente ou

suicídio;

Liga-se à hemoglobina com alta afinidade e causa asfixia sistémica com depressão do

SNC;

Envenenamento agudo: indivíduos de pele clara apresentam cor vermelho-cereja

generalizada da pele e membranas mucosas;

Envenenamento crónico: hipoxia desenvolve-se lentamente e pode evocar alterações

isquémicas no SNC, particularmente nos núcleos da base e lentiformes;

Ambos são recuperáveis, mas deixam marcas neurológicas.

Poluição atmosférica em interiores

- O poluente mais comum é o fumo do tabago, porém ofensores adicionais são o CO, o

dióxido de azoto (NO2) e o asbesto;

- Fumo de lenha (infecções pulmonares), radónio, bioaerossóis (doenças infecciosas), alergénios

(ex.: pêlos, ácaros, podem causar rinite, asma e irritação ocular).

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Vitor Martins FMUL/UMa 114

Metais como poluentes ambientais

Chumbo

- Crianças absorvem mais chumbo ingerido do que os adultos, sendo a principal fonte de

exposição para as primeiras da tinta contendo chumbo;

- Efeitos colaterais:

Anemia microcítica, hipocrómica, hemolítica: interfere com a biossíntese normal

do Heme; típico pontilhado basófilo nos eritrócitos;

Defeitos do SNC nas crianças: baixo QI, desenvolvimento psicomotor retardado,

cegueira, incapacidade de aprendizagem;

Neuropatia desmielinizante periférica nos adultos;

Dor abdominal grave;

Dano dos TCP dos rins: pode levar a fibrose intersticial e possivelmente a insuficiência

renal e “gota saturnina”;

Hiperpigmentação do tecido gengival adjacente aos dentes;

Mercúrio

- A principal fonte de exposição ao mercúrio é o peixe contaminado;

- O cérebro em desenvolvimento é altamente sensível ao metilmercúrio, que se acumula no

cérebro e bloqueia canais iónicos;

- A doença de Minamata resultante da exposição a altas concentrações de mercúrio pode

incluir paralisia cerebral, surdez e cegueira.

Arsénio

- É encontrado naturalmente no solo e na água e é um componente de alguns conservantes de

madeira e herbicidas;

- Excesso de arsénio interfere com a fosforilação oxidativa mitocondrial e causa efeitos

tóxicos no TGI, SNC e sistema cardiovascular;

- A exposição a longo prazo causa lesões da pele e carcinomas.

Cádmio

- Pode contaminar o solo a partir de baterias de níquel-cádmio e fertilizantes químicos;

- A principal fonte de contaminação é o alimento e, em excesso, causa doença pulmonar

obstrutiva e lesão renal;

- Doença “itai-itai” nas mulheres pós-menopáusicas (osteoporose, osteomalacia e doença renal).

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Exposições industriais e na Agricultura

Solventes orgânicos

- Benzeno é oxidado a um epóxido e este, por sua vez, interrompe a diferenciação celular na

medula óssea, causando aplasia da medula óssea e anemia mieloblástica aguda;

Hidrocarbonetos policíclicos: cancros pulmonar e vesical;

Organoclorados

- Produtos sintéticos que resistem à degradação e são lipofílicos;

- Têm actividade anti-estrogénica e anti-androgénica e causam toxicidade neurológica aguda;

- Ex.: DDT

Dioxinas, PCBs

- Podem causar distúrbios cutâneos como foliculite e dermatose acneiforme (cloracne, consiste

em acne, formação de quistos, hiperpigmentação e hiperqueratose);

Cloreto de vinil: revelou causar angiossarcoma do fígado;

Inalação de poeiras minerais causa doenças pulmonares crónicas não-neoplásicas

(pneumoconioses);

- As pneumoconioses mais comuns são causadas por exposições à poeira mineral: poeira de

carvão, sílica, amianto ou asbesto e berílio.

Efeitos do tabaco

O tabagismo é a mais evitável causa de morte humana;

O fumo do tabaco contém mais de 2 000 composto;

- Entre estes estão a nicotina, que é responsável pelo vício do fumo, e carcinogénios

potentes, principalmente hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, nitrosaminas e aminas

aromáticas;

Fumar cigarros é responsável por 90% dos cancros do pulmão;

Também causa cancros da cavidade oral, laringe e faringe, e cancros do esófago e estômago;

Associa-se com o desenvolvimento de carcinomas da bexiga e do rim e algumas leucemias;

Parar de fumar reduz o risco de cancro de pulmão;

Tabaco “sem fumo” é uma causa importante de cancro oral;

O consumo de tabaco interage com o álcool para multiplicar o risco de cancro da laringe e

aumenta o risco de cancro pulmonar por exposições ocupacionais ao asbesto, urânio e outros

agentes;

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Vitor Martins FMUL/UMa 116

Consumo de tabaco é um importante factor de risco de aterosclerose e enfarto do miocárdio,

doença vascular periférica e doença vascular cerebral;

Nos pulmões, além do cancro, o fumo causa enfisema, bronquite crónica e doença obstrutiva

crónica;

O tabagismo materno aumenta o risco de aborto, parto prematuro e retardo do crescimento

intra-uterino.

Efeitos do álcool

Abuso agudo do álcool causa sonolência a níveis sanguíneos de aproximadamente 200 mg/L;

- O coma desenvolve-se com níveis mais altos;

O álcool é oxidado a acetaldeído no fígado pela álcool desidrogenase, pelo sistema do

citocromo P-450 e pela catalase (de pequena importância);

- O acetaldeído é convertido em acetato nas mitocôndrias e utilizado na cadeira respiratória;

- Oxigenação do álcool pela álcool desidrogenase esgota NAD+, levando à acumulação de

gordura no fígado e acidose metabólica;

Os principais efeitos do consumo crónico de álcoo são: fígado gorduroso (deficiência de

NAD+), hepatite alcoólica e cirrose, a qual causa hipertensão porta e aumenta o risco de

desenvolvimento de carcinoma hepatocelular;

O consumo crónico de álcool pode causar sangramento de gastrite e úlceras gástricas,

neuropatia periférica associada com deficiência de tiamina e, cardiomiopatia alcoólica, e aumenta

o risco de pancreatite aguda e crónica;

O consumo crónico de álcool é um importante factor de risco de cancros da cavidade oral,

faringe, laringe e esófago;

- O risco é grandemente aumentado pelo fumo ou uso de tabaco sem fumo concomitantes.

Lesões por drogas terapêuticas e drogas de abuso

Lesão por drogas terapêuticas (reacções adversas a drogas)

Terapia de reposição hormonal (TRH)

- TRH aumenta o risco de cancro ovariano e de mama, e de tromboembolismo venoso, e não

parece proteger contra cardiopatia isquémica;

- Previne ou retarda a progessão de osteoporose e reduz a probabilidade de enfarte do

miocárdio;

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Vitor Martins FMUL/UMa 117

- Estrogénio e progesterona aumentam as concentrações sanguíneas de lipoproteína de alta

densidade e diminuem os níveis de lipoproteína de baixa densidade;

Anticontraceptivos orais (ACO)

- Têm um efeito protector sobre o cancro endometrial e de ovário, mas aumentam o risco de

tromboembolismo e carcinoma hepático;

Paracetamol

- O paracetamol é metabolizado em compostos inactivos por combinação com ácido glicurónico

e sulfato, sendo uma pequena parte metabolizada pelo sistema de enzimas citocromo P450

2E1. Os citocromos oxidam o paracetamol para produzir uma substância intermediária muito

reactiva, N-acetil-p-benzoquinoeimina (NAPQI). Em condições normais a NAPQI é neutralizada

pela acção do glutatião;

- Em situações de toxicidade por paracetamol, as vias metabólicas do sulfato e do ácido

glicurónico ficam saturadas e, portanto, maior quantidade de paracetamol é desviada para o

sistema do citocromo P450 2E1, onde se produz NAPQI. Consequentemente a quantidade de

glutatião é esgotada pela NAPQI, que pode reagir livremente com as membranas celulares,

causando muitos danos e morte de muitos hepatócitos, resultando em seguida a necrose

hepática aguda. Em estudos efectuados em animais, determinou-se que é necessário consumir-

se 70% do glutatião hepático antes de ocorrer a hepatotoxicidade;

Aspirina

- As principais consequências adversas são metabólicas;

De início, desenvolve-se alcalose respiratória, seguida por uma acidose metabólica

que frequentemente se comprova fatal antes que possam aparecer alterações anatómicas;

Toxicidade crónica por aspirina (salicilismo) pode desenvolver-se em pessoas que

tomam 3g ou mais diariamente;

- Manifesta-se por cefaleias, tonturas, zumbido, dificuldade auditiva, confusão mental,

sonolência, náuseas, vómitos e diarreia;

Alterações no SNC podem progredir para convulsões e coma;

Uma tendência hemorrágica pode aparecer concomitantemente com a toxicidade crónica

porque a aspirina acetila a COX das plaquetas e bloqueia a capacidade de fabricar

tromboxano A2, um activador da agregação das plaquetas.

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Vitor Martins FMUL/UMa 118

Lesão por agentes tóxicos não-terapêuticos (abuso de drogas)

As drogas mais comuns de abuso incluem estimulantes psicomotores (cocaína, anfetamina,

ecstasy), narcóticos opióides (heroína, metadona, oxicodona), alucinogénios (LSD, mescalina),

canabinóides (maconha, haxixe) e sedativo-hipnóticos (barbitúricos, etanol).

Lesão por agentes físicos

Trauma mecânico

Todos os tecidos moles reagem similarmente a forças mecânicas e os padrões de lesão podem

ser divididos em:

- Abrasão: ferida produzida por raspar ou esfregar, resultando na remoção da camada

superficial;

- Contusão (equimose): ferida produzida usualmente por um objecto rombo e é caracterizada

por lesão de vasos sanguíneos e extravasamento de sangue para dentro dos tecidos;

- Laceração: é um rasgão ou estiramento com ruptura do tecido causado pela aplicação de

força por um objecto rombo. Em contraste com uma incisão, a maioria das lacerações possui

vasos sanguíneos intactos fazendo ponte e margens irregulares, dentadas;

- Ferida incisa: ferida infligida por um instrumento afiado. Os vasos sanguíneos que fazem ponte

são seccionados;

- Ferida puntiforme: causada por um instrumento estreito, longo e é chamada de penetrante

quando o instrumento perfura o tecido, e perfurante quando atravessa um tecido até criar

também uma ferida de saída;

Uma das causas mais comuns de lesão mecânica é o acidente de viação.

Lesão térmica

Queimaduras térmicas

A importância clínica das queimaduras depende das seguintes variáveis importantes:

- Profundidade da queimadura;

- Percentagem da superfície corporal comprometida;

- Possível presença de lesões internas por inalação de fumo e vapores quentes e tóxicos;

- Prestação e eficácia da terapia, especialmente reposição hídrica e electrolítica e prevenção

ou controlo de infecções das feridas;

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Vitor Martins FMUL/UMa 119

Uma queimadura de espessura total consiste na destruição total da epiderme e derme, com

perda dos apêndices dérmicos que teriam provido células para regeneração epitelial

(queimaduras de grau 3 e grau 4);

- Macroscopicamente, são brancas ou carbonizadas, secas e anestésicas (por causa da destruição

das terminações nervosas);

Nas queimaduras de espessura parcial, pelo menos as partes mais profundas dos apêndices

dérmicos foram poupadas (queimaduras de grau 1 e grau 2);

- Macroscopicamente, são róseas ou mosqueadas com vesículas e são dolorosas;

Histologicamente, o tecido desvitalizado revela necrose coagulativa, adjacente a tecido com

vitalidade que rapidamente acumula células inflamatórias e pronunciada exsudação;

A falência de sistemas de órgãos resultante da infecção da queimadura continua a ser a

principal causa de morte em pacientes queimados (microrganismo mais comum: Pseudomonas

aeruginosa);

Outro efeito fisiopatológico muito importante das queimaduras é o desenvolvimento de um

estado hipermetabólico, com excessiva perda de calor e uma necessidade aumentada

de suporte nutricional.

Hipertermia

A exposição prolongada a temperaturas ambientes elevadas pode resultar em:

- Cãimbras de calor: resultam da perda de electrólitos pelo suor;

- Exaustão pelo calor: resulta de uma falha do sistema cardiovascular em compensar a

hipovolémia, secundária à depleção de água;

- Golpe de calor (intermação): associa-se com altas temperaturas ambientes e alta humidade.

Os mecanismos de termorregulação falham e a temperatura corporal central eleva-se.

Hipotermia

Exposição prolongada à baixa temperatura ambiente conduz à hipotermia, condição vista muito

frequentemente em pessoas sem lar;

Alta humidade, roupa molhada e dilatação dos vasos sanguíneos superficiais ocorrendo como

resultado da ingestão de álcool aceleram a queda da temperatura corporal;

A cerca de 32,2 ºC, ocorre perda de consciência, seguida por bradicardia e fibrilação atrial a

temperaturas centrais mais baixas.

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Vitor Martins FMUL/UMa 120

Lesão eléctrica

Podem originar-se de correntes de baixa voltagem ou de correntes de alta voltagem a partir de

linhas de alta voltagem ou raio;

As lesões são de dois tipos: queimaduras e fibrilação ventricular ou falha dos centros

cardíaco e respiratório, resultantes da interrupção dos impulsos eléctricos normais.

Lesão produzida por radiação ionizante

A radiação ionizante pode lesar as células directa ou indirectamente ao gerar radicais livres a

partir de água ou oxigénio molecular;

Radiações ionizantes danificam o DNA e, por essa razão, células que se dividem

rapidamente, como células germinativas, medula óssea e TGI são muito sensíveis à lesão de

radiação;

Lesão do DNA que não seja reparada adequadamente pode resultar em mutações que

predispõem as células à transformação neoplásica;

Radiação ionizante pode causar dano e esclerose vascular, resultando em necrose isquémica

das células parenquimatosas e sua substituição por tecido fibroso.

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Capítulo X

Vasos sanguíneos

A patologia vascular resulta numa doença através de dois principais mecanismos:

- Estreitamento ou obstrução total do lúmen dos vasos, tanto progressivamente (ex.:

aterosclerose) quanto abruptamente (ex.: trombose ou embolia);

- Enfraquecimento das paredes vasculares, causando a sua dilatação e/ou ruptura.

Vasos normais

As paredes arteriais são mais espessas do que as das veias correspondentes no mesmo

nível de ramificação, de forma a acomodar melhor o fluxo pulsátil e as pressões sanguíneas mais

altas;

As veias possuem maior diâmetro e lúmen do que as artérias correspondentes;

A aterosclerose afecta, principalmente, as artérias elásticas e musculares, a hipertensão afecta as

artérias musculares pequenas e arteríolas, e tipos específicos de vasculite envolvem,

caracteristicamente, somente vasos de determinado calibre;

As células endoteliais (CEs) e as células musculares lisas (CMLs) constituem a parte celular

principal da camada vascular; o restante da parede é composto por matriz extracelular

(MEC), incluindo elastina, colagénio e glicosaminoglicanos;

As paredes vasculares organizam-se em três camadas concêntricas:

- Íntima: monocamada de CEs sobrejacentes a uma delgada camada de CMLs;

Esta é separada da camada média pela lâmina elástica interna;

- Média: composta, predominantemente, por CMLs e MEC;

Esta é separada da camada adventícia pela lâmina elástica externa;

- Adventícia: tecido conjuntivo relativamente frouxo, fibras nervosas e vasos menores (vasa

vasorum);

As artérias são divididas em três tipos básicos:

- Artérias de grande calibre ou artérias elásticas

Alto conteúdo de fibras elásticas na camada média;

Ex.: aorta e seus grandes ramos;

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- Artérias de médio calibre ou artérias musculares

Elastina é limitada às lâminas elásticas interna e externa;

Ex.: ramos menores da aorta;

- Artérias de pequeno calibre e arteríolas

Localizadas no tecido conjuntival intersticial dos órgãos;

As arteríolas são o principal local de controlo da regulação da resistência fisiológica ao

fluxo sanguíneo;

Nas arteríolas, a pressão e a velocidade do fluxo sanguíneo são, ambas, abruptamente

reduzidas e o fluxo torna-se contínuo ao invés de pulsátil;

Capilares

- Representam o nível vascular de ramificação após as arteríolas;

- São constituídos apenas por endotélio;

- Têm fluxo lento, sendo ideais para que ocorra a rápida troca de substâncias difusíveis

entre o sangue e os tecidos;

O sangue flui dos leitos capilares em direcção às vénulas pós-capilares e, então,

sequencialmente, para as vénulas colectoras e, progressivamente, para as veias maiores;

- Na vigência de uma inflamação, o extravasamento vascular e a saída leucocitária ocorrem,

preferencialmente, nas vénulas pós-capilares;

As veias são mais predispostas à dilatação, compressão e penetração por processos tumorais e

inflamatórios;

A pressão venosa e a velocidade do fluxo venoso tem que fluir contra a gravidade,

sendo o retorno do fluxo evitado por válvulas;

- O sistema venoso tem uma enorme capacidade de armazenamento do sangue sistémico

(2/3);

Linfáticos

- Canais de parede delgada e delimitados por endotélio, que drenam o excesso de fluido

intersticial, eventualmente, levando-o de volta para o sangue via ducto torácico;

- O fluxo linfático também contém células inflamatórias mononucleares e proteínas;

- Estes canais também podem disseminar doenças, ao transportar microrganismos ou células

tumorais e, eventualmente, para a circulação sistémica.

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Anomalias congénitas

Entre as anomalias congénitas que são particularmente significativas, embora não

necessariamente comuns, temos:

- Aneurismas saculares ou do desenvolvimento ocorrem em vasos encefálicos, localizados

no polígono de Willis;

- Fístulas arteriovenosas são conexões anormais e directas, normalmente pequenas, entre

artérias e veias, que desviam dos capilares interpostos;

- Displasia fibromuscular é um espessamento irregular focal das paredes das artérias

musculares grandes e médias, incluindo as renais, carótidas e vertebrais.

Células da parede vascular e sua resposta à lesão

Células endoteliais (CEs)

É fundamental para a manutenção da homeostase da parede vascular e para a função

circulatória;

Contêm corpos de Weibel-Palade;

Mantêm um interface tecido-sangue não-trombogénica;

Modulam a resistência vascular, metabolizam hormonas, regulam a inflamação e afectam o

crescimento de outros tipos celulares, especialmente as CMLs;

Embora as CEs compartilhem muitos atributos em geral, também existe uma substancial variação

fenotípica dependendo da região anatómica em questão;

Ex.: endotélio que reveste os sinusóides hepáticos, enquanto que, o endotélio do SNC cria uma

importante barreira hemato-encefálica;

A disfunção endotelial é o termo usado para descrever alterações reversíveis no repertório

das CEs;

- As consequências da disfunção endotelial incluem impedimento da vasodilatação endotélio-

dependente, dos estados hipercoaguláveis e da adesão leucocitária.

Células musculares lisas dos vasos (CMLs)

Participam tanto no reparo vascular normal como dos processos patológicos como a

aterosclerose;

Têm a capacidade de proliferar quando adequadamente estimuladas;

Podem sintetizar colagénio da MEC, elastina e proteoglicanos, além de elaborar factores

de crescimento e citocinas.

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Espessamento da íntima: uma resposta estereotipada à lesão vascular (Fig. 33)

A lesão (de qualquer tipo) à parede do vaso resulta numa resposta cicatricial estereotipada,

envolvendo expansão da íntima por proliferação das CMLs e nova MEC sintetizada;

O recrutamento e a activação das CMLs neste processo envolve sinais das células (ex.: CEs,

plaquetas e macrófagos), assim como mediadores derivados da coagulação e da cascata de

complemento;

Espessamento excessivo da íntima pode resultar em estenose do lúmen que

bloqueia o fluxo vascular.

Fig. 33

Arterioesclerose

Significa “endurecimento das artérias”, ou seja, reflecte espessamento da parede arterial e

perda da elasticidade;

Três padrões são reconhecidos, com diferentes consequências clínicas e patológicas:

- Arterioesclerose: afecta pequenas artérias e arteríolas;

As duas formas anatómicas: hialina e hiperplásica, associam-se a espessamento da parede

vascular e estreitamento do lúmen, podendo causar lesão isquémica à jusante;

Associa-se mais frequentemente à hipertensão e/ou diabetes mellitus;

- Esclerose medial calcificada de Mönckeberg: caracteriza-se por depósitos calcificados nas

artérias musculares, geralmente em indivíduos com mais de 50 anos de idade (não são

clinicamente significativas);

- Aterosclerose: “endurecimento”, é o padrão mais frequente e clinicamente mais importante.

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Aterosclerose

Caracteriza-se por lesões da íntima chamadas ateromas, placas ateromatosas ou placas

ateroscleróticas que fazem protusão para o interior do lúmen vascular;

Uma placa ateromatosa (Fig. 34) consiste numa lesão sobrelevada com um centro pouco

consistente, amarelado e grumoso, cheio de lípidos, coberto por uma cápsula fibrosa, firme e

branca;

Além de obstruir o fluxo sanguíneo, as placas ateroscletóricas enfraquecem a média

subjacente e podem romper, causando uma importante trombose vascular aguda.

Fig. 34

Epidemiologia

É muito menos prevalente na América do Sul, América Central, África e Ásia;

Os factores de risco associados têm um efeito multiplicativo;

FACTORES DE RISCO PARA A ATEROSCLEROSE

Principais factores constitucionais de risco para a cardiopatia isquémica

Idade

Género

- Enfarto do miocárdio e outras complicações da aterosclerose são incomuns nas mulheres

na pré-menopausa, a menos que elas já sejam predispostas à diabetes, hiperlipidémia ou

hipertensão grave, sendo muito mais frequente nos homens;

Genética (História Familiar)

Principais factores de risco modificáveis para a cardiopatia isquémica:

Hipercolesterolemia (LDL)

Hipertensão

Tabagismo

Diabetes Mellitus

Factores de risco adicionais para cardiopatia isquémica

Inflamação e proteína C reactiva

Hiper-homocisteinemia

Lipoproteína a (forma alterada de LDL)

Factores que afectam a hemostasia

Outros factores (falta de exercício, estilo de vida stressante e obesidade)

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Vitor Martins FMUL/UMa 126

Patogenia

A visão actual da aterogénese é expressa pela hipótese da resposta à lesão;

Este modelo vê a aterosclerose como uma resposta inflamatória crónica da parede

arterial à lesão endotelial;

A progressão da lesão ocorre através de

interacções de lipoproteínas modificadas,

macrófagos derivados de monócitos, linfóticos T e

constituintes celulares normais da parede arterial;

Os seguintes aspectos são essenciais para esta

hipótese (Fig. 35):

- Lesão endotelial crónica, com disfunção

endotelial resultante, causando aumento da

permeabilidade, adesão leucocitária e trombose;

- Acumulação de lipoproteínas (principalmente

LDL e suas formas oxidadas) na parede vascular;

- Adesão de monócitos ao endotélio,

acompanhada por migração para a íntima e

transformação em macrófagos e células

espumosas;

- Adesão plaquetária;

- Libertação de factor das plaquetas activadas,

macrófagos e células da parede vascular, induzindo

recrutamento de CML, tanto da média como

dos precursores circulantes;

- Proliferação de CML e produção de MEC;

- Acumulação de lípidos tanto

extracelularmente como dentro das células

(macrófagos e CMLs); Fig. 35

A acumulação de macrófagos contendo lípidos na íntima dá origem às “estrias gordurosas”;

Com a evolução, forma-se um ateroma fibrogorduroso, consistindo de CML proliferativas,

células espumosas, lípidos extracelulares e MEC.

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Lesão endotelial

As duas causas mais importantes de disfunção endotelial são os distúrbios hemodinâmicos e a

hipercolesterolemia, sendo que a inflamação também contribui de forma significativa;

Distúrbio hemodinâmico

- As placas ateroscleróticas tendem a ocorrer nos foramens dos vasos existentes, nos pontos de

ramificação e ao longo da parede posterior da aorta abdominal, onde existem padrões alterados

de fluxo;

- Estudos in vitro demonstram que o fluxo laminar não turbulento leva à indução de genes

endoteliais cujos produtos de facto protegem contra a aterosclerose nessas zonas;

Lípidos

- Os lípidos dominantes nas placas ateromatosas são o colesterol e ésteres de colesterol;

- Defeitos genéticos na captação lipoproteica e no metabolismo que causam a

hiperlipoproteinemia associam-se à aterosclerose acelerada;

- Outras doenças genéticas ou adquiridas (ex.: Diabetes Mellitus) que causam

hipercolesterolemia levam à aterosclerose prematura;

- A hiperlipidemia crónica, particularmente, a hipercolesterolemia, pode impedir directamente a

função das CEs pelo aumento da produção local de espécies reactivas de oxigénio;

Inflamação

- Embora as células inflamatórias não se liguem aos vasos normais, as CEs arteriais disfuncionais

expressam moléculas de adesão precocemente na aterogénese, estimulnado a adesão lecucitária;

A molécula 1 de adesão vascular celular (VCAM-1) liga particularmente monócitos e

células T;

Após tais células aderirem ao endotélio, elas podem migrar para a íntima sob a influência

de quimiocinas produzidas localmente.

Proliferação de músculo liso

A proliferação de células musculares lisas da íntima e o depósito de MEC transformam uma

estria gordurosa num ateroma maduro e contribuem para o crescimento progressivo das lesões

ateroscleróticas;

As CMLs da íntima têm um fenótipo proliferativo e de síntese diferente daquele das CMLs da

média subjacente;

Factores de crescimento associados: PDGF, de fibroblastos e transformante α.

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Vitor Martins FMUL/UMa 128

Morfologia

Estrias gordurosas: são compostas por células espumosas cheias de lípidos, mas não são

significativamente sobrelevadas e, portanto, não causam qualquer distúrbio ao fluxo sanguíneo;

Placa aterosclerótica

- Os principais eventos da aterosclerose são o espessamento da íntima e a acumulação de

lípidos;

- As lesões ateroscleróticas geralmente envolvem uma única porção de uma parede arterial;

- Os vasos mais extensivamente envolvidos são a aorta abdominal inferior, as coronárias, as

artérias popliteias, as carótidas internas e os vasos do polígono de Willis;

- Os vasos das extremidades superiores geralmente são poupados, assim como as artérias

mesentéricas e as artérias renais, excepto nos seus óstios;

- Têm três componentes principais: células, incluindo CMLs, macrófagos e células T; MEC,

incluindo colagénio, fibras elásticas e proteoglicanos; e lípidos intra e extracelulares;

- Divisão da placa aterosclerótica:

Capa fibrosa: superficial, constituída por CMLs e colagénio denso;

“Ombro”: em baixo e ao lado da capa, contendo macrófagos, células T e CMLs;

Centro necrótico: profundo, contém lípidos, restos de células mortas, células

espumosas, fibrina, trombos e outras proteínas plasmáticas;

- Na periferia das lesões, geralmente, existe neovascularização;

- Os ateromas, frequentemente, sofrem calcificação;

- As placas ateroscleróticas são susceptíveis às seguintes alterações patológicas de significado

clínico:

Ruptura, ulceração ou erosão da superfície luminal das placas ateroscleróticas:

expõe à corrente sanguínea substâncias altamente trombogénicas, induzindo a formação

de trombos;

Hemorragia no interior de uma placa;

Ateroembolismo: ruptura da placa pode descarregar restos na corrente sanguínea,

produzindo microêmbolos compostos pelo conteúdo da placa;

Formação de aneurisma: a pressão induzida por aterosclerose ou por atrofia

isquémica da média subjacente, com perda de tecido elástico, causa fraqueza da parede

vascular e desenvolvimento de aneurismas que podem romper.

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História natural da aterosclerose (Fig. 36)

A aterosclerose é uma lesão de evolução lenta que geralmente requer muitas décadas para se

tornar significativa;

No entanto, as alterações agudas das placas (ex.: ruptura, trombose ou formação de hematoma)

podem rapidamente precipitar sequelas clínicas – “Horizonte Clínico”;

As principais consequências da aterosclerose são: enfarte do miocárdio (ataque cardíaco),

enfarte cerebral (AVC), aneurismas aórticos e a doença vascular periférica (gangrena das pernas).

Fig. 36

Prevenção da doença vascular aterosclerótica

Os três principais factores que contribuem para a melhoria desta doença são:

1. Prevenção da aterosclerose através do reconhecimento dos factores de risco e de mudanças

no estilo de vida (prevenção primária);

2. Métodos melhores para o tratamento do enfarte do miocárdio e outras complicações da

cardiopatia isquémica (prevenção secundária);

- Uso de aspirina, estatinas e β-bloqueadores, assim como intervenções cirúrgicas;

3. Prevenção de recidivas em pacientes que sofreram, anteriormente, graves eventos clínicos

relacionados à aterosclerose.

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RESUMO – Aterosclerose

A aterosclerose é uma lesão baseada na íntima, organizada numa capa fibrosa e um

centro ateromatoso (com consistência amolecida) composto por CMLs, MEC, células

inflamatórias, lípidos e restos necróticos;

A aterogénese desenvolve-se pela alternância entre inflamação e lesão nas células da

parede vascular;

Muitos factores de risco conhecidos influenciam a disfunção das CEs, assim como, o

recrutamento e o estímulo das CMLs;

As placas ateroscleróticas acumulam-se lentamente durante décadas, mas podem causar sintomas adugos devido à ruptura, trombose, hemorragia ou embolização;

O reconhecimento dos factores de risco e a sua redução podem reduzir a incidência

e a gravidade da doença relacionada com a aterosclerose.

Doença vascular hipertensiva

Pressões baixas resultam em perfusão inadequada dos órgãos, levando à disfunção e/ou morte

tecidual;

Ao contrário, pressões altas que levam fluxo sanguíneo em excesso das demandas metabólicas

também não fornecem benefício e resultam em lesão nos vasos sanguíneos e nos órgãos

terminais - Hipertensão;

Além de contribuir para a patogenia da doença cardíaca coronária e dos AVCs, a

hipertensão também pode causar hipertrofia e insuficiência cardíacas (doença cardíaca

hipertensiva), dissecção aórtica, insuficiência renal e acelerar a aterogénese;

Os efeitos prejudiciais da pressão arterial aumentam continuamente conforme a

pressão aumenta;

Não há um limite rígido e definido para distinguir o risco de perigo na pressão sanguínea;

- No entanto, uma pressão diastólica mantida acima de 90 mmHg ou uma pressão

sistólica mantida acima de 140 mmHg, constituem hipertensão;

- A pressão sanguínea sistólica é mais importante que a diastólica para a determinação do risco

cardiovascular;

A hipertensão é mais frequente em indivíduos afro-americanos;

A redução da pressão sanguínea diminui drasticamente os níveis de incidência e de morte por CI,

insuficiência cardíaca e AVC.

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Regulação da pressão sanguínea

A pressão sanguínea é uma via complexa que envolve a interacção entre factores genéticos

múltiplos e factores ambientais, que influenciam duas variáveis hemodinâmicas: o débito

cardíaco e a resistência vascular periférica (Fig. 37);

Fig. 37

Os rins (primariamente) e as supra-renais (secundariamente) são os principais órgãos na

regulação da pressão sanguínea, interagindo entre si para modificar o tónus vascular e o volume

sanguíneo, conforme descrito a seguir:

- A renina é um importante regulador da pressão sanguínea normal, sendo secretada pelos rins

em resposta à pressão arteriolar aferente reduzida ou à filtração glomerular de sódio;

- A renina converte o angiotensinogénio em angiotensina I, que por sua vez, é convertida em

angiotensina II;

- A angiotensina II regula a pressão sanguínea pelo aumento da contracção vascular das

CMLs e pelo aumento da secreção de aldosterona para aumentar a reabsorção renal de

sódio;

Quando a função excretora renal está impedida, o aumento da pressão arterial é um mecanismo

compensatório que pode ajudar a restaurar o equilíbrio dos líquidos e o equilíbrio electrónico;

Outros tecidos também podem influenciar o volume e a pressão sanguíneos;

- O péptido natriurético atrial, secretado pelo átrio cardíaco em resposta à expansão de

volume inibe a reabsorção de sódio nos túbulos distais e causa a vasodilatação global.

Patogenia da hipertensão

A hipertensão essencial (Fig. 38) representa 90% a 95% dos casos de hipertensão e é uma

doença complexa, multifactorial, resultando, mais provavelmente, dos efeitos combinados entre

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mutações ou polimorfismos ao nível de vários loci génicos (ex.: reabsorção de sódio, sistema

renina-angiotensina, aldosterona) em associação a várias influências ambientais;

A hipertensão secundária é causada por doenças dos rins e das glândulas endócrinas;

A maior parte do restante da “hipertensão benigna” é secundária à doença renal;

Na chamada hipertensão acelerada ou maligna, a síndrome clínica é caracterizada por

hipertensão grave, insuficiência renal, hemorragias e excusato na retina, com ou sem papiledema.

Fig. 38

Patologia vascular na hipertensão

Arterioloesclerose

hialina

Consiste num espessamento hialino róseo das paredes das

arteríolas, com perda dos detalhes estruturais subjacentes e com

estreitamento do lúmen;

É mais comum em pacientes mais velhos, hipertensos e diabéticos;

As lesões reflectem a libertação de componentes plasmáticos através do

endotélio vascular e a produção excessiva de MEC pelas CMLs;

Trata-se de uma característica morfológica importante na nefroesclerose benigna.

Arterioloesclerose

hiperplásica

É característica de (mas não limitada a) hipertensão maligna;

Está associada a espessamentos laminados concêntricos, em bulbo de

cebola, nas paredes das arteríolas, com estreitamento do lúmen;

Estas laminações consistem de CMLs e membrana basal duplicada e espessada;

Na hipertensão maligna, estas alterações hiperplásicas são acompanhadas

por depósitos fibrinóides e necrose da parede vascular (arteriolite

necrosante), particularmente graves no fígado.

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Aneurismas e dissecções (Fig. 39)

Aneurisma – dilatação anormal localizada de um vaso sanguíneo ou do coração;

Aneurisma “verdadeiro” - quando um aneurisma envolve todas as três camadas da parede

arterial (íntima, média e adventícia) ou a parede enfraqucida do coração;

Ex.: aneurismas ateroscleróticos, sifilíticos, congénitos e ventriculares (estes últimos

acompanham os enfartes miocárdicos transmurais);

Aneurisma “falso” – consiste numa fenda na parede vascular, levando a um hematoma

extravascular que frequentemente se comunica com o espaço intravascular (“hematoma

pulsátil”);

Ex.: rupturas ventriculares após enfartes miocárdicos;

Dissecção arterial – surge quando o sangue entra na parede da artéria, como um hematoma

dissecante entre as suas camadas;

- As dissecções são frequentes, mas nem sempres são aneurismáticas;

Ambos, aneurismas verdadeiro e falso, assim como as dissecções, podem romper, com

consequências catastróficas;

Os aneurismas são classificados pela forma e pelo tamanho macroscópicos;

- Aneurismas saculares:

Dilatações essencialmente esféricas (envolve somente uma porção da parede vascular);

Variam de 5 a 20 cm de diâmetro;

Frequentemente contêm trombos;

- Aneurismas fusiformes:

Dilatações circunferenciais, alongadas, num segmento vascular;

Variam em diâmetro (≤ 20 cm) e em extensão;

Podem envolver porções extensas do arco aórtico, da aorta abdominal ou mesmo das

artérias ilíacas;

As duas causas mais importantes de aneurismas aórticos são a aterosclerose e a degenereção

cística da média da parede arterial;

Os aneurismas arteriais também podem ser causados por doenças sistémicas como a vasculite;

Aneurisma micótico – infecção numa artéria principal que enfraquece a sua parede;

- A trombose e a ruptura são complicações possíveis;

- Origem: embolização de um trombo séptico, extensão de um processo supurativo adjacente ou

organismos circundantes que ifnectam directamente a parede arterial.

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Fig. 39

Aneurisma aórtico abdominal

Patogenia

Aneurismas ateroscleróticos ocorrem mais frequentemente na aorta abdominal (aneurisma

aórtico abdominal – AAA);

O AAA ocorre mais frequentemente em homens e raramente desenvolve-se antes dos 50 anos

de idade;

Na maioria dos casos, o AAA resulta de um equilíbrio alterado na degradação e na síntese

do colagénio, mediado por infiltrados inflamatórios locais, e a enzimas proteolíticas destrutivas

que eles produzem e regulam, ou seja, o colagénio anormal e o tecido elástico fornecem um

meio adequado no qual a aterosclerose ou a hipertensão enfraquecem a parede aórtica;

As metaloproteinases da matriz (MMPs) são expressas nos aneurismas aórticos, em altos

níveis, quando comparadas com as da parede vascular normal;

- A produção de MMP pelos macrófagos está especialmente aumentada;

- Têm a capacidade de degradar quase todos os componentes da MEC da parede

arterial;

Ao mesmo tempo, o nível reduzido de inibidor tecidual de metaloproteinases (TIMP)

pode contribuir para a degradação geral da MEC;

Tanto in vitro como in vivo, as citocinas TH2 estimulam os macrófagos a produzirem quantidades

aumentadas de MMPs elastolíticas.

Morfologia

Geralmente posicionado entre as artérias renais e acima da bifurcação da aorta, o AAA pode ser

sacular ou fusiforme, chegar a 15 cm de diâmetro e ter 25 cm de comprimento;

Existe aterosclerose grave complicada, com destruição e estreitamento da média subjacente;

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Frequentemente contém um trombo mural pouco organizado, laminado e de consistência

amolecida, que pode preencher uma parte ou todo o segmento dilatado;

Duas variantes do AAA merecem especial atenção:

- AAAs inflamatórios: caracterizam-se por fibrose periaórtica densa, contendo abundante

infiltrado linfoplasmocitário com muitos macrófagos e frequentes células gigantes, sendo de causa

incerta;

- AAAs micóticos: são lesões ateroscleróticas infectadas por microrganismos circulantes na

parede, particularmente na vigência de bacteriemia numa gastroenterite primária por Salmonella;

Em tais casos, a supuração destrói a média, potencializando a dilatação e a ruptura

rápidas.

Curso clínico

As consequências clínicas do AAA incluem:

- Ruptura para o interior da cavidade peritoneal ou retroperitoneal, com hemorragia

maciça e potencialmente fatal;

- Obstrução de um ramo vascular resultando numa lesão isquémica do tecido à jusante;

- Embolia a partir de ateroma ou de trombo mural;

- Compressão por uma estrutura adjacente;

- Apresentação como uma massa abdominal (palpável e pulsátil) que simula um tumor;

Os aneurismas com mais de 5 cm de diâmetro são tratados agressivamente, geralmente por

remoção cirúrgica, envolvendo implantação de próteses.

Aneurisma sifilítico

O T. pallidum tem uma predilecção por pequenos vasos sanguíneos na adventícia aórtica (vasa

vasorum), desenvolvendo endocardite obliterante;

- Os vasos afectados mostram um estreitamento e obliteração da luz, cicatrização da parede

vascular (“casca de árvore”) e um infiltrado denso de linfócitos e plasmócitos que se estende

para a média (aortite sifilítica);

O envolvimento do vasa vasorum da aorta é particularmente devastador;

- Resulta numa lesão isquémica da média da aorta, levando à dilatação aneurismática da

aorta e do anel aórtico e, eventualmente, à insuficiência valvar e hipertrofia por

sobrecarga maciça de volume no ventrículo esquerdo (cor bovinum);

A maioria dos pacientes morre por insuficiência cardíaca, devido à incompetência valvar aórtica.

Os aneurismas aórticos torácicos (independente da etiologia) causam sinais e sintomas:

1. Compressão de estruturas do mediastino;

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2. Dificuldades respiratórias (envolvimento dos pulmões e vias aéreas);

3. Dificuldade em deglutir (compressão do esófago);

4. Tosse persistente (irritação dos nervos laríngeos recorrentes);

5. Dor causada por erosão óssea;

6. Cardiopatia (insuficiência valvar ou estreitamento dos óstios coronários);

7. Ruptura aórtica.

Dissecção aórtica

A dissecção aórtica é um evento catastrófico no qual o sangue disseca os planos laminares da

média para formar um canal cheio de sangue dentro da parede aórtica;

- Esta canal, frequentemente, rompe através da adventícia para vários espaços, onde causa

hemorragia maciça ou tamponamento cardíaco;

A dissecção da aorta pode ou não estar associada à dilatação aórtica;

Ocorre, principalmente, em dois grupos epidemiológicos:

- Homens entre 40 e 60 anos de idade, com hipertensão prévia;

- Pacientes mais jovens com anomalias sistémicas ou localizadas do tecido conjuntivo afectando a

aorta;

Não é usual na presença de aterosclerose significativa, provavelmente em virtude da fibrose da

média inibir a propagação do hematoma dissecante.

Patogenia

A hipertensão é o principal factor de risco para a dissecção aórtica;

Aortas de pacientes hipertensos mostram hipertrofia da média do vasa vasorum, associada a

alterações degenerativas da MEC e perda variável de CMLs da média, sugerindo que a

lesão mecânica relacionada à pressão e/ou à lesão isquémica (devido ao fluxo diminuído no vasa

vasorum) contribui de alguma forma;

Uma vez que ocorra laceração da íntima, o fluxo sanguíneo sob a pressão sistémica disseca

através da média, permitindo a progressão do hematoma da média;

- Assim, a terapia agressiva de redução da pressão pode ser eficaz para limitar a dissecção em

evolução.

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Morfologia

Na grande maioria das dissecções espontâneas, a laceração da íntima que marca o ponto de

origem da dissecção é encontrada na aorta ascendente;

Tais lacerações são, geralmente, transversais ou oblíquas e têm 1 a 5 cm de extensão, ao

longo da aorta;

O hematoma dissecante espalha-se caracteristicamente ao longo dos planos laminares da

aorta, geralmente entre os terços médio e externo;

Em algumas situações melhores, o hematoma dissecante entra novamente no lúmen da aorta,

produzindo uma segunda laceração distal da íntima e um novo canal vascular dentro da média da

parede aórtica (resultando numa “aorta de dupla luz” com um canal falso);

- Isto impede uma hemorragia extra-aórtica fatal;

- Com o tempo, canais falsos podem endotelizar e ser reconhecidos como dissecções crónicas;

Degeneração cística da média (CMD)

- Lesão histológica mais frequentemente detectada;

- Caracteriza-se por fragmenteção do tecido elástico e separação dos elementos elásticos e

das CMLs da média por espaços císticos cheios de MEC rica em proteoglicanos amorfos;

- A inflamação está ocasionalmente ausente;

- Geralmente acompanha a Síndrome de Marfan.

Curso clínico

As dissecções aórticas são, geralmente, classificadas em dois tipos:

- Dissecção tipo A: lesões mais comuns, perigosas e proximais, envolvendo a aorta ascendente

apenas, ou ambas, ascendente e descendente (tipos I e II de DeBakey);

- Dissecção tipo B: lesões distais não envolvendo a parte ascendente e, geralmente,

começando distalmente à artéria subclávia esquerda (tipo III de DeBakey).

Sintomas clínicos: dor lancinante de início súbito, geralmente, començando na parte anterior

do tórax, irradiando para o dorso, entre as escápulas e, para baixo, conforme a dissecção

progride;

- A dor pode ser confundida com a do enfarte de miocárdio;

As manifestações clínicas incluem: tamponamento cardíaco, insuficiência aórtica e enfarte do

miocárdio ou extensão da dissecção em direcção às grandes artérias do pesçoco ou em direcção

às coronárias, renais, mesentéricas ou ilíacas;

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A causa mais comum de morte é a ruptura da dissecção em direcção a uma das três

cavidades corporais (pericárdica, pleural ou peritoneal).

Vasculite

A vasculite é uma inflamação da parede vascular;

Embora frequentemente existam manisfestações sistémicas (incluindo febre, mal-estar, mialgias e

artralgias), sintomas específicos dependem do leito vascular qu está envolvido;

A vasculite pode resultar de infecções, porém, mais comumente tem uma base imunológica

como um depósito de complexo imune, ANCAs ou anticorpos anti-CEs;

É possível prever que infecções também podem causar, indirectamente, uma vasculite não-

infecciosa, gerando, por exemplo, complexos imunes ou provocando reactividade cruzada.

Vasculite não-infecciosa

Vasculite associada a complexo imune

Depósito de complexo imune subjacente à vasculite associada à hipersensibilidade a drogas;

Na vasculite secundariamente associada a infecções virais, anticorpos contra as proteínas virais

podem formar complexos imunes detectáveis no soro e nas lesões vasculares.

Anticorpos anticitoplasma de neutrófilos

ANCAs é um grupo heterogéneo de auto-anticorpos direccionados contra os constituintes

dos grânulos primários neutrofílicos, os lisossomas dos monócitos e as células endoteliais;

Dois tipos gerais de ANCAs são reconhecidos com base nos padrões de marcação por

imunofluorescência:

- c-ANCA: localização citoplasmática, onde o principal antigénio-alvo é a proteinase 3 (PR3),

um constituinte do grânulo neutrofílico;

- p-ANCA: localização perinuclear, onde a maioria dos auto-anticorpos é específica para a

mieloperoxidase (MPO);

Um mecanismo plausível para a vasculite por ANCA é:

- A libertação neutrofílica de PR3 e MPO provoca a formação de ANCA em hospedeiro

susceptível;

- Algumas doenças subjacentes estimulam citocinas inflamatórias, como o TNF, que resulta na

expressão superficial de PR3 e MPO nos neutrófilos e outros tipos celulares;

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- ANCAs reagem com neutrófilos marcados com citocinas circulantes e, tanto causam lesão

directa (ex.: endotelial) como induzem a activação (ex.: nos neutrófilos);

- Os neutrófilos activados por ANCA desgranulam, causando lesão pela libertação de espécies

reactivas de oxigénio, o que leva à toxicidade nas CEs e a outras lesões teciduais directas.

Anticorpos anticélulas endoteliais

Anticorpos contra CEs podem predispor a certas vasculites, por exemplo, a doença de Kawasaki.

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Vitor Martins FMUL/UMa 140

Classificação e características de vasculites imunomediadas seleccionadas

Vasculite tipo Exemplos Descrição

Vasculite de

grandes vasos

(aorta e grandes

ramos para as

extremidades,

cabeça e pescoço)

Arterite

(temporal) de

células gigantes

- Os segmentos arteriais desenvolvem espessamento

nodular da íntima com redução do lúmen e trombose

ocasional;

- Inflamação granulomatosa dentro da parte mais

interna da média, centrada na membrana elástica

interna; - Existe um infiltrado linfocitário (mais CD4+ que

CD8+) e macrofágico, com células gigantes

multinucleadas, além de fragmentação da lâmina elástica

interna;

- Geralmente ocorre em pacientes com mais de 50

anos de idade e associa-se à polimialgia reumática;

- Febre, fadiga, perda de peso e sintomas oculares.

Arterite de

Takayasu

- Classicamente, envolve o arco aórtico;

- As alterações macroscópicas incluem a hiperplasia

da íntima e o espessamento irregular da parede

vascular;

- O quadro clínico inclui pressão sanguínea reduzida e

pulsos mais fracos nas extremidades superiores em

relação às extremidades inferiores, com hipotermia,

dormência nos dedos e distúrbios oculares;

- Geralmente ocorre em pacientes (mulheres) com

menos de 50 anos de idade.

Vasculite de vasos

médios (artérias

viscerais principais

e seus ramos)

Poliarterite

nodosa

- Inflamação necrosante que geralmente envolve as

artérias renais, mas que poupa os vasos pulmonares;

- Sintomas: mal-estar, febre, perda de peso, hipertensão,

dor abdominal, melena, dores musculares difusas e

neurite periférica.

Doença de

Kawasaki

- Arterite com síndrome de nódulo linfático

mucocutâneo;

- Geralmente ocorre em crianças;

- As artérias coronárias podem estar envolvidas com

formação de aneurisma e/ou trombose.

Vasculite de

pequenos vasos

(arteríolas,

vénulas, capilares

e, ocasionalmente,

pequenas artérias)

Granulomatose

de Wegener

- Inflamação granulomatosa, envolvendo o tracto

respiratório e vasculite necrosante, afectando os

pequenos vasos, incluindo glomerulonefrite;

- Associa-se a c-ANCAs.

Síndrome de

Churg-Strauss

- Inflamação granulomatosa e rica em eosinófilos,

envolvendo o tracto respiratório e vasculite necrosante,

afectando os pequenos vasos;

- Associa-se a asma, eosinofilia sanguínea e p-ANCAs.

Poliangeíte

microscópica

- Vasculite necrosante de pequenos vasos com

poucos ou sem depósitos imunes;

- Pode ocorrer arterite necrosante em artérias de

pequeno e de médio calibre;

- Glomerulonefrite necrosante e capilarite pulmonar

são comuns;

- Associa-se a p-ANCAs.

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Vitor Martins FMUL/UMa 141

Vasculite de

pequenos e médios

vasos (artérias das

extremidades,

tibiais e radiais)

Tromboangeíte

obliterante

(Doença de

Buerger)

- Vasculite aguda e crónica, acentuadamente

segmentar, acompanhada por trombose da luz;

- Geralmente, os trombos contêm pequenos

microabscessos compostos por neutrófilos

envolvidos por inflamação granulomatosa;

- O processo inflamatório estende-se para

dentro das veias e nervos contíguos;

- Ocorre quase exclusivamente em fumadores;

- Manifestações clínicas: flebite nodular

superficial, sensibilidade ao frio do tipo Raynaud

nas mãos e dor no arco do pé induzida por

exercícios.

Vasculite infecciosa

As infecções vasculares podem enfraquecer as paredes arteriais e dar origem a aneurismas

micóticos ou podem induzir a trombose e enfarte.

Fenómeno de Raynaud

Resulta de vasoconstricção exagerada das artérias e arteríolas digitais;

Induzem uma palidez paroxísdica ou cianose dos dedos das mãos ou dos pés;

Caracteristicamente, os dedos envolvidos mostram alterações da cor: vermelho-branco-azul, da

porção proximal para a mais distal, correlacionando com vasodilatação proximal, vasoconstricção

central e cianose mais distal;

O fenómeno de Raynaud primário reflecte um exagero nas respostas vasomotoras centrais

e locais, ao frio ou à emoção, sendo geralmente, benigno;

O fenómeno de Raynaud secundário refere-se à insuficiência vascular das extremidades no

contexto da doença arterial, causada por outras entidades (ex.: doença de Buerger).

Veias e linfáticos

Veias varicosas

São anormalmente dilatadas e tortuosas, produzidas por aumento prolongado da pressão

intraluminal e por perda do suporte da parede vascular;

As veias superficiais da coxa e da perna estão geralmente envolvidas;

- Quando as pernas ficam pedentes por longos períodos, as pressões venosas nestes locais

podem ficar muito elevadas e podem levar à estase venosa e a edema no pé;

A obesidade e a gravidez aumentam o risco de aparecimento de veias varicosas;

Morfologia

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Vitor Martins FMUL/UMa 142

- As veias varicosas mostram estreitamento da parede nos pontos de dilatação máxima com

hipertrofia do músculo liso e fibrose da íntima nos segmentos adjacentes;

- A degeneração do tecido elástico e as calcificações focais na média (fleboesclerose)

também ocorrem;

- A trombose intraluminal focal (devido à estase) e as deformidades valvares venosas

(enrolamente e encurtamento) são comuns;

A dilatação varicosa torna as válvulas incompetentes e leva a estase, congestão, edema,

dor e trombose, podendo, em casos extremos, tornar-se em úlceras varicosas crónicas;

A embolia a partir destas veias superficiais é muito rara;

As varicosidades também ocorrem em dois outros locais: varizes esofágicas (devido a cirrose

hepática) e hemorróidas.

Tromboflebite e flebotrombose

Afectam as veias profundas das pernas, na sua grande maioria;

Os factores clínicos predisponentes mais importantes na trombose venosa profunda (TVP)

são: insuficiência cardíaca congestiva, neoplasia, gravidez, obesidade, estados pós-operatório e

repouso acamado ou imobilização;

- Em pacientes com cancro, as tromboses aparecem de um lado, desaparecem e voltam a

reaparecer noutras veias – tromboflebite migratória (sinal de Trousseau);

Trombos nas pernas tendem a produzir poucos, quando produzem, sinais e sintomas;

- Em alguns casos, a dor pode ser percebida pela pressão exercida sobre as veias afectadas,

comprimindo os músculos da barriga da perna ou forçando a flexão dorsal dos pés (sinal de

Homan), sendo que, a ausência destes achados não exclui TVP;

Embolia pulmonar é uma sequela comum e grave da TVP.

Síndromes das veias cavas superior e inferior

Síndrome da veia cava superior

- Geralmente é causada por neoplasias que comprimem ou invadem a veia cava superior;

- A obstrução resultante produz um complexo clínico característico que inclui dilatação intensa

das veias da cabeça, pescoço e membros superiores, com cianose;

Síndrome da veia cava inferior

- Pode ser causada por neoplasias que comprimem ou invadem a veia cava inferior ou por um

trombo das veias hepáticas, renais ou das extremidades inferiores que se propagam para cima;

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- A obstrução induz um edema importante das extremidades inferiores, à distensão das veias

colaterais superficiais do abdómen inferior e, com envolvimento da veia renal, à proteinúria

maciça.

Linfangite e linfedema

As doenças primárias dos vasos linfáticos são extremamente incomuns;

Linfangite

- Inflamação aguda que ocorre quando infecções bacterianas espalham-se no interior dos

linfáticos (ex.: estreptococos β-hemolíticos do grupo A);

- Os linfáticos afectados ficam dilatados e cheios de exsudato de neutrófilos e monócitos;

- A linfangite é reconhecida por estrias vermelhas e dolorosas, subcutâneas, com aumento

doloroso dos nódulos linfáticos de drenagem;

- Se as bactérias passaram para a circulação venosa pode resultar numa bacteriémia ou sépsis;

Linfedema

- Linfedema primário: defeito congénito associado ou doença familiar de Milroy;

- Linfedema secundário: acumulação de líquido intersticial após o bloqueio de um linfático

anteriormente normal. Tal obstrução pode resultar de:

Tumores malignos, procedimentos cirúrgicos, fibrose pós-irradiação, filariose, trombose

pós-inflamatória e cicatrização;

- O linfedema aumenta a pressão hidrostática nos linfáticos anteriores à obstrução e causa

aumento do líquido intersticial;

- A persistência deste edema leva ao depósito aumentado de tecido conjuntivo intersticial, com

expansão tecidual, aparência de induração castanha ou casca de laranja na pele

sobrejacente e eventuais úlceras provocadas por perfusão tecidual inadequada;

- A acumulação de linfa em vários espaços são chamados de ascite quilosa (abdómen), quilo-

tórax e quilopericárdio.

Tumores

Neoplasias dos vasos podem derivar tanto dos vasos sanguíneos como dos linfáticos e podem

ser compostas por CEs (hemangioma, linfagioma, angiossarcoma) ou células vasculares de

sustentação (tumor glómico ou hemangiopericitoma);

Tumores vasculares são predominantemente benignos (ex.: hemangiomas), mas também podem

ser lesões intermediárias, localmente agressivas (ex.: sarcoma de Kaposi) ou, raramente,

neoplasias altamente malignas (ex.: angiossarcoma);

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Tumores benignos geralmente formam canais vasculares óbvios revestidos por CEs de

aparência normal;

Os tumores malignos são mais tipicamente sólidos e celulares, sem vasos bem organizados e

com citologia atípica.

Classificação dos tumores vasculares e condições tumoriformes Neoplasias benignas, condições do desenvolvimento e condições adquiridas

Hemangioma - Localizada, maioria é formada por lesões superficiais.

Hemangioma capilar - Ocorre na pele, tecidos subcutâneos e membranas mucosas da

cavidade oral e dos lábios, assim como no fígado, baço e rins;

- Agregados não-encapsulados de capilares intimamente unidos

e revestidos por endotélio aplanado.

Hemangioma cavernoso - Envolve estruturas profundas;

- Massa muito bem definida, mas não encapsulada, composta por

espaços vasculares cavernosos grandes e cheios de sangue;

- Trombose intravascular associada à calcificação distrófica é

comum;

- São um componente da doença de von Hippel-Lindau (cerebelo,

tronco cerebral e olhos).

Granuloma piogénico - Nódulo vermelho, pediculado, de crescimento rápido, sobre a

pele, a gengiva e a mucosa oral;

- Sangra facilmente e frequentemente é ulcerado, com edema e

infiltrado inflamatório associados.

Linfangioma - Análogos linfáticos benignos dos hemangiomas.

Linfangioma simples

(capilar)

- Canais linfáticos pequenos que ocorrem predominantemente

na cabeça, pescoço e tecidos subcutâneos axilares.

Linfangioma cavernoso

(higroma cístico)

- Encontradas no pescoço ou na axila de crianças;

- São comuns na síndrome de Turner;

- São compostos por espaços linfáticos maciçamente dilatados,

revestidos por CEs e separados por um estroma interposto de

tecido conjuntivo contendo agregados linfóides.

Tumor glómico

(glomangioma)

- São tumores muito dolorosos que surgem de CMLs modificadas

do glomo carotidiano;

- São mais frequentemente encontrados na porção distal dos dedos,

especialmente sob as unhas.

Ectasias vasculares

Nevo Flâmeo - Lesão aplanada na cabeça ou no pescoço, cuja cor varia do róseo

claro ao roxo escuro; só existe dilatação vascular;

- As lesões na distribuição do nervo trigémio são ocasionalmente

associadas à síndrome de Sturge-Weber.

Telangiectasia em aranha - É mais frequentemente associado aos estados

hiperestrogénicos, como gravidez e cirrose.

Telangiectasia hemorrágica

Hereditária (Doença de

Osler-Weber-Rendu)

- Doença autossómica dominante, com malformações

compostas por veias e capilares dilatados;

- Pele e memebranas mucosas orais, TResp., TGI e TUrinário.

Angiomatose bacilar - Proliferações vasculares;

- Peliose bacilar (lesão vascular do fígado e baço).

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Neoplasias de grau intermédio

Sarcoma de Kaposi - Relativamente comum em pacientes com o SIDA;

- Quatro formas da doença são reconhecidas: SK crónico (clássico ou Europeu), SK linfadenopático (africano ou endémico), SK

associado a transplantes e SK (epidémico) associado a SIDA;

- Herpesvírus humano 8 (HHV-8);

- No SK clássico e indolente são reconhecidos três estágios:

máculas (pequenas manchas rosadas, limitadas à região distal das

extremidades inferiores);

- Com o tempo, as lesões espalham-se em sentido proximal e

transformam-se em placas maiores e violáceas;

- Num estágio posterior, as lesões tornam-se nodulares e mais

caracteristicamente neoplásicas.

Hemangioendotelioma - O hemangioendotelioma epitelióide é um tumor vascular de

adultos que ocorre ao redor de veias de grande ou de médio calibre;

- As células neoplásicas são frequentemente cubóides e volumosas.

Neoplasias malignas

Angiossarcoma - Ocorrem em qualquer local, porém, geralmente envolvem mais a pele, os tecidos moles, a mama e o fígado;

- Angiossarcomas cutâneos podem começar como nódulos

pequenos, bem delimitados, assintomáticos, avermelhados e

frequentemente múltiplos; a maioria eventualmente aumenta de

tamanho e torna-se uma massa amolecida de tecido castanho-

avermelhado ou branoc-acinzentado;

- Áreas centrais de necrose e hemorragia são frequentes;

- A origem destes tumores a partir das CEs pode ser demonstrada

pela coloração com CD31 ou com factor de von Willebrand;

- São localmente invasivos e podem provocar metástases

rapidamente.

Hemangiopericitoma - São tumores raros derivados dos pericitos, mais comuns sobre as

extremidades inferiores e no retroperitoneu.

Patologia das intervenções vasculares

Stents coronários são tubos expansíveis e metálicos que são inseridos para preservar a

patência luminal durante a dilatação da angioplastia para as estenoses arteriais;

Fornecem um lúmen maior e mais regular e “tratam” as bordas intimais e as dissecções

vasculares que ocorrem durante a angioplastia;

No entanto, trombose precoce e espessamento intimal tardio podem ocorrer dentro dos stents

e podem levar à reestenose, muito mais do que é visto na angioplastia sem stent;

Substituição vascular

- Enxertos sintéticos com diâmetros grandes funcionam bem em locais de alto fluxo (ex.: aorta);

- Enxertos artificiais com diâmetros pequenos, geralmente falham devido à trombose aguda;

- Para cirurgia de bypass arterial coronário, os enxertos são compostos tanto por veia

safena autóloga como pela artéria mamária interna.