resumo de filosofia jurídica para v1

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RESUMO DE FILOSOFIA JURÍDICA FILOSOFIA JURÍDICA Sócrates e a sofística Parmênides exerceu uma enorme influência sobre este novo personagem que estudaremos. Sócrates foi, provavelmente, a figura mais enigmática de toda a história da filosofia. Há, inclusive quem o considere apenas um personagem literário dos diálogos de Platão. Seja como for, o que sabemos é que ele nunca escreveu uma só palavra, e apesar disso foi um dos filósofos que mais influenciaram o pensamento ocidental para não mencionar a natureza dramática de sua morte. 1. Vida Sabemos que Sócrates (469 399 a.C.) nasceu em uma família ateniense filho de uma mãe parteira e de um pai escultor. Por um certo período, serviu no Exército, mas passou a maior parte da vida nas praças da cidade e nos mercados, conversando com as pessoas que lá encontrava. Quando estava na casa dos 50 anos de idade, casou-se com Xantipa, com quem teve três filhos. As descrições que se fazem dele o pintam como alguém extremamente feio: barrigudo, com olhos esbugalhados e nariz arrebitado. Mas consta que era “agradabilíssimo”. Apesar disso, foi condenado à morte por suas atividades filosóficas. No ano de 399 a.C., Sócrates foi acusado de “introduzir novos deuses” (as “vozes interiores divinas” que ele afirmava ouvir na cabeça) e corromper os jovens, além de não acreditar nos deuses venerados. O governo de Atenas foi uma das primeiras democracias do mundo. Sócrates, por outro lado, não escondia que acreditava que seria melhor para o Estado ser governado por uma só pessoa, que ele qualificava como “aquele que sabe”. Alguns consideravam os pontos de vista de Sócrates uma ameaça à estrutura da vida em Atenas. Preocupado com a influência antidemocrática de Sócrates sobre os jovens aristocratas (entre eles Platão) envolvidos no pensamento socrático, um júri de 501 membros o declarou culpado, por pequena maioria. Ele poderia ter pedido clemência. Poderia ter salvado a vida concordando em sair de Atenas. Mas, agindo desse modo, Sócrates não teria sido coerente consigo mesmo. Para ele, a consciência e a verdade tinha mais valor do que a vida. Assegurou ao júri que agira apenas pelo melhor dos interesses do Estado, mas mesmo assim foi condenado a tomar cicuta, um veneno. Pouco depois da sentença, bebeu do veneno na presença de amigos e morreu. A democracia fracassava, ao permitir sua condenação e morte e esse era, quase com certeza, o plano de Sócrates. 2. Pensamento 2.1. Seu contexto filosófico Sócrates viveu em um período em que as teses de Heráclito estava encontrando muita aceitação. Ao afirmar que tudo está em constante mudança e que “ninguém entra duas vezes no mesmo rio”, Heráclito está afirmando que a realidade é mudança, ou seja, é um eterno devir ou vir-a-ser. O movimento, portanto, não seria apenas a aparência das coisas, mas a própria natureza das coisas. Ora, se o movimento e a mudança perpétua faz parte da natureza da realidade, nada pode ser completamente e definitivamente conhecido. Contrariando o pensamento de Heráclito surge Parmênides sustentando a perenidade da realidade. Para ele “a verdade exige a absoluta contraposição entre o ser (o que é) e o não-ser (o que não é). Mais ainda: não há, nem pode haver, o “não ser”, como é fácil perceber se levarmos a sério o significado das palavras. Sendo assim, o “o que é” é desde sempre, pois não pode haver um antes, que seria um “não ser”. É único, pois tudo que fosse diferente do ser simplesmente não existiria. É imóvel, pois nada poderia passar de “não-ser” a ser, o que implicaria que o “ser” se tornaria algo diferente, e sabemos que o que é diferente de ser simplesmente não existe” (RAMOS, F., MELO, R., FRATESCHI, Y. 2012, p. 24). A proposta de Sócrates representará quase uma síntese entre Heráclito e Parmênides. Sim, a realidade está em constante mudança. Mas a realidade também é perene. Como se pode afirmar estas duas teses sem chegar a uma

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Page 1: Resumo de Filosofia Jurídica Para v1

RESUMO DE FILOSOFIA JURÍDICA

FILOSOFIA JURÍDICA – Sócrates e a sofística

Parmênides exerceu uma enorme influência sobre este novo personagem que estudaremos. Sócrates foi,

provavelmente, a figura mais enigmática de toda a história da filosofia. Há, inclusive quem o considere apenas um

personagem literário dos diálogos de Platão. Seja como for, o que sabemos é que ele nunca escreveu uma só palavra,

e apesar disso foi um dos filósofos que mais influenciaram o pensamento ocidental – para não mencionar a natureza

dramática de sua morte.

1. Vida

Sabemos que Sócrates (469 – 399 a.C.) nasceu em uma família ateniense filho de uma mãe parteira e de um pai

escultor. Por um certo período, serviu no Exército, mas passou a maior parte da vida nas praças da cidade e nos

mercados, conversando com as pessoas que lá encontrava. Quando estava na casa dos 50 anos de idade, casou-se

com Xantipa, com quem teve três filhos. As descrições que se fazem dele o pintam como alguém extremamente

feio: barrigudo, com olhos esbugalhados e nariz arrebitado. Mas consta que era “agradabilíssimo”. Apesar disso, foi

condenado à morte por suas atividades filosóficas.

No ano de 399 a.C., Sócrates foi acusado de “introduzir novos deuses” (as “vozes interiores divinas” que ele

afirmava ouvir na cabeça) e corromper os jovens, além de não acreditar nos deuses venerados. O governo de Atenas

foi uma das primeiras democracias do mundo. Sócrates, por outro lado, não escondia que acreditava que seria

melhor para o Estado ser governado por uma só pessoa, que ele qualificava como “aquele que sabe”. Alguns

consideravam os pontos de vista de Sócrates uma ameaça à estrutura da vida em Atenas. Preocupado com a

influência antidemocrática de Sócrates sobre os jovens aristocratas (entre eles Platão) envolvidos no pensamento

socrático, um júri de 501 membros o declarou culpado, por pequena maioria.

Ele poderia ter pedido clemência. Poderia ter salvado a vida concordando em sair de Atenas. Mas, agindo desse

modo, Sócrates não teria sido coerente consigo mesmo. Para ele, a consciência – e a verdade – tinha mais valor do

que a vida. Assegurou ao júri que agira apenas pelo melhor dos interesses do Estado, mas mesmo assim foi

condenado a tomar cicuta, um veneno. Pouco depois da sentença, bebeu do veneno na presença de amigos e morreu.

A democracia fracassava, ao permitir sua condenação e morte – e esse era, quase com certeza, o plano de Sócrates.

2. Pensamento

2.1. Seu contexto filosófico

Sócrates viveu em um período em que as teses de Heráclito estava encontrando muita aceitação. Ao afirmar que

tudo está em constante mudança e que “ninguém entra duas vezes no mesmo rio”, Heráclito está afirmando que a

realidade é mudança, ou seja, é um eterno devir ou vir-a-ser. O movimento, portanto, não seria apenas a aparência

das coisas, mas a própria natureza das coisas. Ora, se o movimento e a mudança perpétua faz parte da natureza da

realidade, nada pode ser completamente e definitivamente conhecido. Contrariando o pensamento de Heráclito surge

Parmênides sustentando a perenidade da realidade. Para ele “a verdade exige a absoluta contraposição entre o ser (o

que é) e o não-ser (o que não é). Mais ainda: não há, nem pode haver, o “não ser”, como é fácil perceber se levarmos

a sério o significado das palavras. Sendo assim, o “o que é” é desde sempre, pois não pode haver um antes, que

seria um “não ser”. É único, pois tudo que fosse diferente do ser simplesmente não existiria. É imóvel, pois nada

poderia passar de “não-ser” a ser, o que implicaria que o “ser” se tornaria algo diferente, e sabemos que o que é

diferente de ser simplesmente não existe” (RAMOS, F., MELO, R., FRATESCHI, Y. 2012, p. 24).

A proposta de Sócrates representará quase uma síntese entre Heráclito e Parmênides. Sim, a realidade está em

constante mudança. Mas a realidade também é perene. Como se pode afirmar estas duas teses sem chegar a uma

Page 2: Resumo de Filosofia Jurídica Para v1

contradição? Para ele o mundo perene é o mundo das Idéias enquanto que a realidade sensível é esta realidade

mutável.

2.2. A vida que vale a pena

Quanto ao seu pensamento, destacamos que, para ele, A vida boa é a vida examinada, passada e vivida na busca da

sabedoria a todo custo: “se me dissésseis, ‘Sócrates, nós te deixamos livre, à condição de que abandones esta

pesquisa e que não filosofes mais.’, eu vos diria… que não deixarei de filosofar… a vida sem exame (anexetastos)

não é vivível” (PLATÃO, Apologia de Sócrates, 29c-d, 38a).

2.3. A virtude

A vida uma vez examinada, deveria, em conseqüência, ser vivida de forma virtuosa. Ele disse: ”Aquele que conhece

o bem faz o bem”. Com isso, queria dizer que o entendimento justo leva à ação justa. E só o justo pode ser um

“homem virtuoso”. Quando agimos erradamente é porque nada sabemos.

2.4. O auto-conhecimento

O primeiro conhecimento a ser buscado, portanto, era o auto-conhecimento. “conhece-te a te mesmo”. O auto-

conhecimento precisa partir do reconhecimento de que nos conhecemos muito pouco: “só sei que nada sei”. Sócrates

criticava os sofistas que se consideravam sábios aos seus próprios olhos.

2.5. Seu método

Para obter o conhecimento de si e da virtude, é necessário por em prática seu método, chamado de maiêutica, ou

seja, a arte de dar a luz às idéias. Para praticar a maiêutica ele se servia da ironia, ou seja, de um método

interrogativo que expunha e denunciava as contradições de seus interlocutores.

3. Seus conflitos

Sabemos que as posições filosóficas de Sócrates eram diametralmente opostas às dos sofistas. A primeira crítica

socrática consistia no fato dos sofistas cobrarem para ensinar, o que para Sócrates era um absurdo. Mas sua maior

crítica dizia respeito à natureza da verdade. Sócrates nutria com todas as suas energias a tese de que o homem

poderia alcançar a verdade ao passo que para os sofistas a verdade seria apenas uma questão de argumentação. Este

tema terá severas repercussões sobre a esfera jurídica.

FILOSOFIA JURÍDICA – Platão, a justiça e a fundação do Estado

1. A importância de Platão para tradição Filosófica

Platão (428-347 a.C.), que em grego significa “amplo”, tinha como seu verdadeiro nome Arístocles. Ele nasceu em

Atenas e lá exerceu a atividade de filósofo e fundador da Academia, que viria a ser a primeira instituição de

educação superior do Ocidente. Aluno de Sócrates e professor de Aristóteles, ele foi um dos responsáveis pela

construção dos alicerces da filosofia e da ciência conforme conhecemos hoje.

Sua influência sobre o mundo ocidental foi tamanha que chegou a servir de base, de um lado para toda a teologia

cristã e, de outro, a filosofia cartesiana, bem assim como grandes pensadores contemporâneos.

Dentre os temas que podem ser associados à ele está o dualismo e o hierarquismo. Como dualista Platão entendia

que a realidade é dual, ou seja, dividida em duas partes. Sendo hierarquista ele acreditava que uma delas ela

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superiora a outra. Ou seja, ele acreditava que o Mundo das Ideias era superior ao mundo sensível. Com estas duas

idéias em mente vejamos suas principais teses.

2. Estudar a dualidade na Alegoria da Caverna

A alegoria da Caverna de Platão vem servindo de chave hermenêtica para se compreender este pensador. Neste texto

Platão procura mostrar a necessidade e a importância de se ter um governante que seja filósofo e que, portanto, veja

além da mera sombra, ou das simples opiniões dos indoutos. Aqui encontramos um debate entre Sócrates e um dos

irmãos mais moços de Platão, Glauco. Neste debate Sócrates fala da existência de uma caverna em que as pessoas

viviam toda sua vida acorrentadas, ouvindo vozes e vendo sombras. Por certo estas pessoas entendiam que aquilo

que viam era a verde, pois era a única coisa que viam e ouviam. Eis que um deles consegue fugir da caverna e ver a

realidade existente do lado de fora. Fora da caverna estava a verdadeira realidade mas, quando ele voltou para contar

aos companheiros de prisão, ninguém acreditou. Há alguns aspectos que precisam ser destacados aqui.

(i) que as pessoas preferem permanecer em sua zona de conforto ainda que esta zona implique na crença em algo

que não se sustenta intelectualmente;

(ii) que toda tentativa de sair da caverna é tão dolorosa quanto à contração da pupila frente à luz, o que fortalece

mais a busca pelo conforto.

(iii) que somente alguns privilegiados possuem o desejo, a coragem e a força para saírem da caverna e trem acesso à

realidade como ela de fato é. Estes devem ser vistos como os verdadeiros guardiães, ou seja, como os líderes da

cidade.

3. Compreender o papel do filósofo na República e a relação entre justiça e lei

Segundo ensina Walace Ferreira “Platão foi o filósofo político do mundo ideal, aquele que concebeu nos filósofos a

sapiência do conhecimento da justiça para fins de promoção do bem-estar da pólis. Nele, a justiça, tema central do

diálogo da República, viria do plano ideal, e como seria privilégio dos sábios conhecê-la, estes seriam aqueles que

deveriam assumir o poder da cidade e distribuir as funções sociais conforme um padrão de justiça voltado para o que

entendem como ‘bem comum’” (http://jus.com.br/artigos/23037/justica-e-direito-em-platao-aristoteles-e-hobbes.

acessado em 10 de agosto de 2013). Deste pequeno texto podemos retirar algumas informações importantes.

(i) A primeira é que Platão projetava sobre a cidade também seu dualismo e, portanto, privilegiava um aspecto mais

espiritual e irreal do que era de fato uma cidade feita de pessoas humanas.

(ii) Enquanto no início de seus escritos ele mostrava a relatividade das leis humanas que mudam de acordo com as

circunstâncias, “nas Leis, consciente da impossibilidade de encontrar um dirigente capaz de harmonizar os desejos e

o Bem na escala da cidade, ele reconheceu a necessidade de uma regulamentação escrita. É preciso salvaguardar a

permanência do Estado. As leis serão precedidas de preâmbulos que explicitarão a sua justificação e terão como

tarefa pôr o legislador de acordo com os cidadãos, do mesmo modo que um bom médico se esforça para convencer o

doente” (JEANNIÈRE, A. p. 128). Em outras palavras, o Platão da República revela-se bem mais idealista do que o

das Leis. Este amadurecimento no pensamento político de Platão será claramente percebido por seus leitores.

(iii) Citando mais uma vez Jeannière (1995, p. 128), Platão entende que a melhor solução seria o esboço lógico

desenvolvido na República, mas é preciso aprender a se contentar com o possível e com a realidade e reconhecer

que são poucos os homens capazes de orientar para o Bem a totalidade de seus desejos. Por isso, é preciso obedecer

a uma constituição. Para tanto ele nos dá duas orientações: “O legislador não deve constituir autoridades absolutas,

nem, por outro lado, poderes que não se equilibrem por estarem misturados” (PLATÃO, In JEANNIÈRE, 1995, p.

128).

Page 4: Resumo de Filosofia Jurídica Para v1

A segunda orientação foge do modelo de Estado governado por um rei-filósofo. Ele prefere um esquema mais misto.

Vejamos, mais uma vez suas palavras: “Escuta: se disséssemos que a organização política comporta duas espécies-

mães, das quais se originariam toda as outras, expressaríamos uma idéia justa, e seria justo dar a uma o nome de

governo de um só, à outra o nome de governo do povo; no cume da primeira espécie, situaríamos a nação dos

persas; e nós, atenienses, no cume da segunda. Os outros, quase todos, são, como eu disse, variedades originarias

desses dois. Assim sendo, é preciso, é até forçoso que, se todavia uma organização política deve um dia acrescentar

à inteligência a liberdade e a amizade, esta tenha participado dessas duas espécies juntas” (PLATÃO, In

JEANNIÈRE, 1995, p. 129).

Em resumo, é importante alguém que tome as decisões com base na razão, mas que estas decisões esteja em

conformidade com uma constituição e que assegure a liberdade dos cidadãos.

4. Compreender a idéia de justiça retributiva apresentada no mito de Er

O mito de Er é um relato e que Platão, no Livro X da República, registra o relato oral de alguém que acaba de

retornar do Hades, ou seja, do lugar dos mortos. A essência deste mito ensina que fossem quais “fossem as injustiças

cometidas e as pessoas prejudicadas, as almas injustas pagavam a pena de quanto houvessem feito em vida, a fim de

purificarem a alma”. Este tipo de escatologia revela a existência de um logos cósmico fundamentalmente moral,

criando uma espécie de teleologia vinculativa entre os seres humanos. Platão procurou demonstrar duas verdades

com esse mito.

(i) que as riquezas, as honrarias ou o poder em si pouco valem para a felicidade terrena, Platão usa o Mito de Er para

mostrar que a virtude e a justiça são também condição para a felicidade supraterrena.

(ii) Platão, seguindo os ensinamentos de seu mestre Sócrates, dizia que o poder da virtude era tal que teria

repercussões para além da própria e limitada vida de um individuo, ou seja, depois da morte.

FILOSOFIA JURÍDICA – Aristóteles

1. Sua vida: Aristóteles, também chamado de o estagirita – porque nasceu em uma colônia grega na Trácia chamada

Estagira –nasceu em 384 a.C. Com 17 anos ele se estabeleceu na cidade de Atenas com a finalidade de se tornar

aluno de Platão. Tendo se tornado um de seus principais alunos, Aristóteles deixa Atenas em 343 para se tornar o

mestre de Alexandre da Macedônia, ofício que desenvolveria até o ano de 336. Neste ano, com a subida de

Alexandre ao trono, ele deixa Tebas e volta para Atenas. Em 335, o “Pensador” – era assim que Platão se referia a

ele – abre uma escola perto do templo dedicado a Apolo e lá passam a ser chamados de “peripatéticos” porque

costumavam discutir filosofia enquanto passeavam pelos corredores (peripatos) do Liceu. Aristóteles morre em

Celcis, uma ilha em Eubéia, em 322 a.C.

2. Quanto à lógica: A construção pó pensamento lógico de Aristóteles foi brilhante. De fato ele é visto ainda hoje

como o pai da lógica clássica. O primeiro elemento da lógica aristotélica que gostaríamos de citar é o silogismo.

Para poder deduzir conceitos novos de conceitos já conhecidos ele elaborou esta técnica extremamente simples, mas

perfeita, que chamou de silogismo. Este tipo de raciocínio era o encadeamento de um grupo de três proposições,

onde a terceira era a implicação necessária das duas primeiras. O exemplo mais conhecido de silogismo é aquele

onde se diz: “Todos os homens são mortais; Sócrates é um homem; logo, Sócrates é mortal”.

Uma outra forma de raciocínio de que fala Aristóteles é a indução. Enquanto o silogismo parte de proposições mais

gerais para as mais particulares (a dedução), a indução faz o caminho inverso. Mais tarde o método indutivo será

identificado como o método da ciência moderna. De fato, enquanto a dedução será vista como o pilar da lógica

clássica, a indução será o alicerce da metodologia científica.

Um terceiro elemento importante da construção lógica de Aristóteles é o conhecido princípio da não-contradição.

Depois de afirmar que o conhecimento humano tem valor objetivo e certo – pelo menos em relação a algumas

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verdades fundamentais, Aristóteles diz que entre todas as verdades há uma que possui prioridade absoluta: o

princípio da não-contradição. Explicando este princípio, diz o estagirita “Efetivamente, é impossível a quem quer

que seja acreditar que uma mesma coisa seja e não seja” (Métafísica, Γ3, 1005 b 22-44). Em resumo, segundo este

princípio, dada uma proposição e sua negação, não podem ser ambas verdadeiras.

Um outro elemento da lógica aristotélica é o princípio do terceiro-excluído. Por este princípio, diz ele, “Quem diz

de uma coisa que é ou que não é, ou dirá o verdadeiro ou dirá o falso. Mas se existisse um termo médio entre os dois

contraditórios nem do ser nem do não ser poder-se-ia dizer que é o que não é”. ARISTÓTELES, Métafísica, Γ7,

1011 b 28-30

finalmente, temos o chamado princípio da identidade. Segundo este princípio, “(Todo) A é A”. Na formulação de

Leibniz “Cada coisa é aquilo que é”. Embora historicamente atribuído à Aristóteles, não há referências de que este

Princípio tenha efetivamente sido desenvolvido por ele.

3. Quanto ao equilíbrio: Segundo Aristóteles a verdadeira felicidade consiste na plena realização das próprias

capacidades. Sendo o homem um ser essencialmente racional, sua felicidade será encontrada na plena realização

desta capacidade. Ora, se a perfeita atuação da razão ocorre quando contemplamos, então a felicidade do homem

consiste na contemplação.

Mas sendo o homem mais do que razão e mente e também carne e sentido, é lógico se supor que a verdadeira

felicidade contemple também estes aspectos. Já que a satisfação dos sentidos se chama prazer, a verdadeira

felicidade se encontra na harmonia entre o prazer e a contemplação.

Para adquirir a felicidade que nos leve ao equilíbrio entre o prazer e a contemplação, precisamos da virtude que é “o

hábito de escolher o justo meio”. Ou seja, para Aristóteles, a virtude seria o hábito de praticar ações que estejam no

meio entre dois excessos. É daí que vem o ditado: “a virtude está no meio” (in médio stat virtus). Em resumo, a

virtude, orientada e instruída pela razão fica a maio caminho entre dois extremos. Vejamos um exemplo da

argumentação de Aristóteles:

“As ações estão sujeitas a se tornarem imperfeitas ou por defeito ou por excesso; por exemplo, tanto os exercícios

excessivos quanto os escassos prejudicam o vigor; o beber e o comer superabundantes ou insuficientes arruínam a

saúde. O mesmo se dá com a moderação, a coragem ou as outras virtudes; de fato, quem foge ou teme todas as

coisas e não enfrenta nada, torna-se tímido; quem, ao contrário, não teme nada, enfrenta qualquer coisa e se torna

temerário; quem goza toda sorte de prazeres e não se abstém de nenhum, torna-se intemperante; mas quem evita

todos os prazeres, torna-se insensível. De modo que também a moderação e a coragem são arruinadas tanto pelo

excesso como pela deficiência, mas são preservadas pela via do meio”. (ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco, 1106b,

37 e 38)

4. As causas: Outra doutrina importante em Aristóteles é a doutrina das causas. Para Aristóteles para tudo no mundo

existem quatro causas: material, formal, eficiente e final. Estas quatro causas apontariam para a matéria, a forma, a

ação e a finalidade. Se tomarmos como exemplo um ser humano, diríamos que sua causa material é a “carne e o

osso”, sua causa formal, é a “alma”. Mas, de acordo com Reale-Antisere “se o considerarmos dinamicamente,

perguntando-nos ‘como nasceu’, ‘quem o gerou’ e ‘porque se desenvolve e cresce’, então são necessárias duas

outras razões ou causas: a causa eficiente ou motriz, isto é, o pai que o gerou, a causa final, isto é, o fim ou objetivo

para o qual tende o devir do homem. (REALE-ANTISERE, vol. 1, p. 181)”

Antes de encerrar este capítulo, uma última palavra. Conforme já vimos, este primeiro momento da História da

Filosofia está claramente caracterizado por uma mudança de paradigma na forma de explicar a origem das causas

últimas. O que encontramos aqui é a superação da forma mítica de pensar por uma outra que foi identificada como

sendo mais “racional” e mais “crítica”. Neste novo paradigma os “deuses” e a “mitologia”, enquanto explicação

satisfatória ou interpretação abrangente do sentido que envolve a realidade, a origem do mundo e dos homens,

passam a ser desconsiderados como explicações ou respostas relevantes. Em seu lugar toma corpo as explicações

que utilizam a própria natureza (Physis) e passam a valorizar a racionalidade enquanto forma de escapar das ilusões

que podem enganar nossa mente.

Page 6: Resumo de Filosofia Jurídica Para v1

5. Aristóteles e o sentido polissêmico de justiça: Um ultimo tema que precisaria ser abordado no pensamento

aristotélico tem a ver com sua visão de justiça. Quando nos referimos à noção de “polissêmico” na leitura

aristotélica de justiça, estamos, com isso tentando afirmar que, para ele justiça implicava em pelo menos quatro

coisas.

5.1. Legalidade: Aristóteles sempre se preocupou com o problema da aplicação da lei. No entanto, para o Estagirita,

a lei deve ser vista sempre como algo geral que precisa ser aplicada a casos concretos, vez que ela é incapaz de

prever todos os casos particulares.

5.2. Justa-medida: Influenciado pela visão de virtude, que se concentra no caráter e na vida do indivíduo como um

todo, fazer justiça é viver virtuosamente. Mas o que seria virtude para ele? Segundo Warburton (2008, p. 87), para

Aristóteles virtude seria “um padrão de comportamento e de sentimentos: uma tendência a agir, desejar e sentir de

modos particulares em situações apropriadas”. Sentir uma emoção apropriada era essencial à arte de viver uma vida

feliz. Para ele, continua Walburton (2008, p.88), “Uma virtude não é uma ação irrefletida, mas, ai invés disso,

envolve um julgamento inteligente sobre a reação apropriada à situação em que você se encontra”.

5.3. Equidade: Conforme já vimos, embora Aristóteles procurasse aplicar a lei ele se preocupava com o problema

de sua naplicação vez que ela só trataria de questões gerais e não particulares. É aqui que surge sua teoria da justiça

de conveniência ou adaptação, que equivaleria à equidade. Com a finalidade de ilustrá-la ele recorre à régua de

chumbo utilizada pelos construtores em Lesbos. Ela não era rígida e por isso se adaptava à forma da pedra.

Aplicando a ilustração, ele entendia que a lei, da mesma forma, deve se adaptar aos fatos. Assim sendo, o eqüitativo

seria o justo segundo um corretivo de justiça legal, e não segundo a letra da lei. Desta forma, podemos afirmar que a

equidade consiste na adaptação da regra existente à situação concreta, observando-se os critérios de justiça e

igualdade.

5.4. Proporcionalidade: Aristóteles desenvolveu um pensamento no qual ele reconhece a a igualdade como sendo

proporcional tanto geométrica quanto analógica. Segundo ele o igual é um meio entre o demais e o de menos, o

excesso e a falta. Mas da mesma forma que o igual é um meio, da mesma forma o direito também seria um meio.

Assim, porque o justo é proporcional, o direito, que deve ser justo, também é proporcional. Daí surgir o brocado que

diz ser a justiça tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade.

É importante ressaltar que na nossa Constituição Federal de 1988 podemos encontrar o princípio da

proporcionalidade. De fato, o inciso LIV do art. 5º da Constituição Federal é considerado o dispositivo que

constitucionaliza esse princípio no ordenamento brasileiro. O mesmo ocorre nos Estados Unidos por meio do due

processo of law que representa o princípio da razoabilidade, que, substancialmente se equipara-se ao nosso princípio

da proporcionalidade.

FILOSOFIA JURÍDICA – O Estoicismo

O estoicismo foi um dos diversos movimentos filosóficos que surgiram no momento conhecido como helenístico.

Ao lado dele surgiram o hedonismo, o epicurismo, etc. neste momento nos deteremos sobre o pensamento estóico,

particularmente destacando sua tendência naturalista.

1. A origem do termo: O termo “estoicismo” tem origem na palavra grega “stóa”, que significa pórtico. O que

ocorria é que havia um grupo de pensadores que se reunia nos pórticos da cidade de Atenas para discutir os grandes

temas da filosofia. Esta filosofia deve muito ao pensamento cínico de Crates e de alguns seguidores de Platão.

2. Seu principal personagem: O principal personagem da escola estóica está associado ao nome de Zenão de Cítio

(336-263 a.C.). Um resumo de seu pensamento destacaria que ele cultivava uma filosofia voltada para a mora,

buscando fazer com que o homem alcançasse a virtude e a felicidade.

3. Seu método de debate: Em geral Zenão de Cítio era chamado de cínico, mas é preciso conhecer bem esta palavra

para compreender adequadamente o seu sentido. A palavra “cínico” tem origem no grego e significa cão ou

cachorro. O cínico é, portanto, aquele que vive uma sem se preocupar com o bem estar e com o luxo, sendo irônico

Page 7: Resumo de Filosofia Jurídica Para v1

para com aqueles que valorizam estes elementos como sendo os essenciais à vida. Em função disso, ser cínico se

associou a ser irônico.

4. Suas principais teses:

4.1. Os estóicos são sensistas. Para eles, todo o conhecimento que possamos vir a ter terá origem em nossas

sensações, ou seja, em nossa percepção sensorial, que nada mais faz além do que combinar as nossas inúmeras

sensações. Ora, se tudo se resume ao que podemos sentir por via de conseqüência concluímos que os estóicos são

materialistas e que temas como a alma ou Deus não têm grande relevância vez que tudo termina com a morte.

4.2. Os estóicos estão voltados para uma vida virtuosa. No que diz respeito ao campo da ética os estóicos

entendem que a virtude deve ser vista como “o fim supremo de todas as ações humanas, a via pela qual o homem

deve buscar a felicidade. A felicidade, por sua vez, trata-se da felicidade pela quietude, resultado de uma virtude

negativa, de uma indiferença universal, e da renúncia a todos os bens mundanos” (CABRAL, 2006, p. 102). Se

nossa felicidade estivesse nos bens mundanos, caso eles nos fossem retirados, isso poderia nos trazer infelicidade.

4.3. A virtude exige a apatia. A palavra “apatia”, no grego, é composta do prefixo “a”, que significa “ausência”, e

“pathos”, que significa “dor” ou “sofrimento”. Desta forma a apatia aponta para um momento em que não existe

mais sofrimento ou dor. O estóico, porque não está preso aos prazeres mundanos não sentem a dor de perdê-los. A

postura do estóico é de quietude frente à perda dos bens ou das coisas. O estóico acredita, afirma Cabral (2006, p.

102, 103) que a indiferença e a renúncia “são as únicas formas de o homem se livrar das perturbações que possa

sofrer em conseqüência da possível carência dos bens terrenos. Desse modo, acredita que o homem, vivendo na

quietude e na indiferença, preserva a serenidade, a paz, o sossego: verdadeiro eu único bem da alma”.

4.4. A unidade do mundo. A doutrina estóica defende que o universo que vemos é semelhante a um único ser vivo.

Desta forma, dando suporte à natureza que vemos, Zenão de Cítio propugnava a existência de uma alma identificada

à razão, ou seja, ao que os gregos chamavam de logos. Como consequência desta crença nos deparamos quase com

um panteísmo no qual Deus é visto como “a razão absoluta (logos), que gera o mundo sem que este seja

radicalmente de si mesmo” (HRYNIEWICZ, 2006, p. 287). Em resumo, há no mundo uma plena racionalidade, um

Logos (Razão Universal), que age tanto na natureza quanto na conduta humana.

4.5. A racionalidade da natureza. Ora se o logos eterno a tudo engloba, incluindo as pessoas e a natureza, a própria

natureza, sendo divina, é perfeitamente lógica e coerente. O homem, ocupa no universo um lugar especial. De

acordo com Hryniewicz, “ele é superior em relação aos demais seres pelo fato de participar do logos divino em

maior grau do que qualquer outro ser vivente. Isto deve-se ao fato de possuir uma alma especial e de ser responsável

por uma conduta moral que nenhum outro ser tem acesso” (HRYNIEWICZ, 2006, p. 287). Como conclusão, deduz-

se que a natureza humana é totalmente racional e voltada para a virtude e para a justiça.

Buscar as coisas indiferentes em geral leva o homem para longe da racionalidade. É preciso “seguir a natureza”, ou

seja, conduzir seus paços exatamente conforme indica sua natureza racional. Desta forma ele produzira uma

sociedade mais virtuosa e justa.

5. Seu mais famoso seguidor: Dentre os seguidores do pensamento estóico podemos enumerar Sêneca, Epíteto e o

imperador Marco Aurélio. No entanto, embora não tenha reproduzido com absoluta perfeição o pensamento original

de Zenão de Cítio, o mais famoso seguidor desta doutrina foi o famoso senador romano Marco Túlio Cícero (106-43

a.C.). Em sua atuação como uma das figuras mais importantes da política romana ele assumiu um papel relevante

para a história do pensamento filosófico e jurídico universal sintetizando vários pensamentos filosóficos gregos e

inaugurando o vocabulário filosófico latino. Vejamos uma de suas mais conhecidas citações:

“Se Roma existe, é por seus homens e seus hábitos. A brevidade e a verdade desse verso fazem com que seja, para

mim, um verdadeiro oráculo. Com efeito: sem nossas instituições antigas, sem nossas tradições venerandas, sem

nossos singulares heróis, teria sido impossível aos mais ilustres cidadãos fundar e manter, durante tão longo tempo,

Page 8: Resumo de Filosofia Jurídica Para v1

o império de nossa República. (…) Em suma, não há felicidade sem uma boa constituição política; não há paz, não

há felicidade possível, sem uma sábia e bem organizada República (CÍCERO, M. T. Da República. In: Col. Os

Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1988, p. 175-176.)”.

FILOSOFIA JURÍDICA – Thomas Hobbes O filósofo inglês Thomas Hobbes (1588-1679) foi um dos mais importantes pensadores contratualistas da história.

Ele se associa ao contratualismo porque consta entre os pensadores políticos que acreditam ter existido um “contrato

social” que acabou por formar a sociedade que temos hoje. Escritor privilegiado, tornou-se famoso com a publicação

de Leviatã (1651) e Do cidadão (1651). Com este texto pretendemos apresentar algumas de suas principais teses,

dentre as quais destacamos:

1. O conceito de estado de natureza:

De acordo com Thomas Hobbes o “estado de natureza” passou a ser visto como o espaço ou a ambiência de

violência generalizada. Era um estado de guerra de todos contra todos (bellum omnia omnes). O que exatamente

caracteriza e marca o estado de natureza é justamente a completa ausência de qualquer ordem jurídica e, portanto, de

qualquer impedimento para ação. Muito ao revés no estado de natureza há uma completa liberdade para agir. Isto

fica explicitado na primeira lei natural: “Cada um deve esforçar-se por conseguir a paz, enquanto houver a esperança

para tal, não a podendo construir, está autorizado a procurar todos os meios e vantagens da guerra e utilizá-los”.

2. A concepção de homem:

Diferentemente de autores como Rousseau que viam o homem de uma forma mais positiva, Hobbes era o autor de

uma antropologia extremamente negativa do homem. Para ele o homem era mal por natureza e a violência seria a

expressão mais natural dessa natureza. De fato ele chamava o homem de “o lobo de outro homem”. O homem

estaria sempre pronto a agir contra seus pares a fim de retirar vantagens.

3. O Estado:

Diante da perspectiva antropológica desenhada por Hobbes, somente um Estado com poderes absolutos e apto para

utilizar a violência extrema, seria forte o suficiente para proteger o indivíduo e seus bens, sendo capaz, desta forma,

de garantir não apenas sua segurança pessoal, mas também uma segurança jurídica em todos os aspectos, inclusive

na ordem econômica.

A melhor forma de governo, ou seja, a que garantiria a segurança civil é um Estado autoritário no qual a liberdade

pessoal é entregue em troca da liberdade do medo. Desta forma, compete ao Estado Leviatã preservar a moral e o

direito. Para ele, só o Estado absoluto é capaz de conseguir a paz. O Estado é descrito por ele como “uma pessoa

cujos atos um grande número de pessoas, como autor e por pactos mútuos, realizados entre si, institui com o

objetivo de poder usar a força e os meios de todos, como julgar oportuno, para assegurar a paz e a defesa comum”.

Sendo ele inglês, inevitavelmente ele trataria da relação entre a igreja e o Estado. Segundo seu entendimento a Igreja

e o Estado cristão formavam um corpo comum que seria encabeçado pelo monarca, legítimo intérprete das

Escrituras. Como conclusão óbvia ele criticava a postura Reformada da Livre interpretação da Bíblia vez que

enfraquecia o poder do monarca.

4. Racionalidade prática:

De que forma, ou melhor, qual o estímulo para que homem abandone o estado de natureza e crie o estado? Como

resposta encontraremos o medo. Sim, o medo legitima o pacto social feito entre os homens, aceitando a submissão

na busca da segurança. Aqui está o que chamamos de racionalidade instrumental hobbesiana. Para escapar, então, do

medo das depredações alheias os seres humanos formam sociedades e governos por meio de um Contrato social. O

Contrato era inspirado pelo medo e um soberano com poderes absolutos se tornaria na melhor garantia contra a

regressão ao estado de natureza.

Diante do exposto reafirmamos a importância do pensamento de Thomas Hobbes porque ele consegue nos fazer

compreender a intima relação entre a violência e poder soberano para formar uma teoria política baseada numa

racionalidade instrumental além de nos mostrar o “bem” como relacionado com os fins do Estado, a justiça e a

segurança.

FILOSOFIA JURÍDICA – John Locke

Page 9: Resumo de Filosofia Jurídica Para v1

Filósofo e político inglês, John Locke (1632-1704) é celebrado como um dos responsáveis pelo desenvolvimento

das teses da democracia liberal. Oriundo de uma formação científica e médica, ele foi profundamente influenciado

pela filosofia e pela Revolução Científica.

Nascido em Wrington, envolveu-se na política em 1675 quando tornou-se secretário do Conselho de Plantação e

Comércio. Quando da assunção de Carlos II ao trono, Lord Ashey, então conde de Shaftesbury e protetor de Locke,

cai em desgraça e a carreira de nosso pensador entra em declínio. Ele perde a cátedra em Oxford e segue para um

exílio na Holanda (1683), retornando em 1689. Em 1704 ele falece vitima de gota em Oates.

1. Seu pensamento filosófico: Em sua obra mais importante Ensaio acerca do Entendimento Humano (1690) –

dividido em quatro livros, ele expôs todo seu empirismo afirmando que a experiência é a fonte de todo

conhecimento humano. Conforme nos lembra Chris Rohmann, “quando nascemos, o intelecto é uma tabula rasa, ou

‘lousa em branco’, na qual o mundo da experiência gradativamente grava uma série de sensações independentes –

teoria conhecida como atomismo mental”(ROHMANN, p. 247). Segundo ele, “o intelecto, preenchido e ativo

organiza a experiência de maneira lógica, por meio da associação de idéias, para chegar ao conhecimento; com a

introspecção, a pessoa adquire a consciência de si” (ROHMANN, p. 247).

Embora empiricista Locke não desconsiderava o papel da razão e de Deus vez que o verdadeiro conhecimento teria

que se adaptar à razão que também servia para reconhecer a revelação como autêntica Palavra de Deus.

2. Seu pensamento político: Registrado em seus Dois tratados acerca do governo (1690) encontramos o

desenvolvimento próprio de seu contratualismo. Conforme sabemos, este livro foi escrito em defesa da Revolução

Gloriosa de 1688 e postula a superioridade do Parlamento inglês sobre o monarca, numa clara rejeição ao

absolutismo oriundo da teoria do direito divino dos reis. Muito ao revés, suas idéias defendiam uma monarquia

constitucional com base em um contrato social.

2.1. O Estado seria o resultado da ação criadora e soberana do povo, dotado por Deus dos direitos inalienáveis de

vida, liberdade, propriedade e o direito a resistir à tirania do soberano quando este põe em risco os direitos à

propriedade, à vida e à liberdade. Em razão destes dons divinos, qualquer estado que abuse de seus poderes podem

ser modificados ou derrubados. Entre os poderes executivos e legislativos, afirmava ele, deveria existir algum tipo

de sistema de poder e contrapoder.

Uma palavra deve ser dita, aqui sobre a propriedade. Não existe uma unanimidade sobre sua definição de

propriedade. Em geral o debate gira em torno de duas teses antagônicas: ou bem ele pretende ampliar a democracia

ou bem pretendia apenas limitar a cidadania.

2.2. Assim como Hobbes, Locke também afirmava a distinção entre o estado de natureza e o estado social. Havia, no

entanto, algumas distinções que precisam ser pontuadas. Para Locke o estado de natureza diferia das teses de

Hobbes porque não era um estado ou um modo de convivência em que prevalecia a violência e a força. Muito ao

contrário, para ele o estado de natureza era um modo de convivência no qual todos eram regidos pelas leis da

natureza humana, sendo a principal delas e a que regula todas as demais, a razão.

Conforme assevera Vicente Masip, “a necessidade da criação de um estado social surge quando é preciso punir

algum comportamento irracional ou defender-se de transgressões externas. O contrato social cria a autoridade e

confia a alguém o cargo de velar pelos direitos de todos. Trata-se, portanto, de uma delegação voluntária que

aperfeiçoa o estado de natureza, não de uma imposição ou limitação” (MASIP, 2001, p. 177).

Percebe-se que a antropologia de Locke é bem mais otimista do que a apresentada por Hobbes. O homem não é

descrito como um lobo à procura de alimento. Destaca-se, ao contrário, seus aspectos mais racionais e cognitivos,

com implicações, inclusive em seu conceito sobre estado de natureza.

O homem em Locke é alguém livre que se serve de sua liberdade para o estabelecimento das leis e do estado social

que respeite os principais dons dados por Deus ao homem, quais sejam, a vida, a liberdade e a propriedade. Mais

Page 10: Resumo de Filosofia Jurídica Para v1

ainda, o homem já nasce com direitos inatos que estabelecem um estado natural. Registre-se a influência de Locke

sobre o texto da Declaração de Independência dos estados Unidos da América.

Locke também era um árduo defensor da tolerância religiosa já que ninguém poderia saber, ao certo, qual a religião

verdadeira. As únicas exceções para ele seriam os ateus, que não criam em Deus, e os católicos, já que se submetiam

a uma autoridade estrangeira.

FILOSOFIA JURÍDICA – Jean-Jacques Rousseau

Um dos mais celebrados Filósofo e político franceses, Rousseau (1712-1778) além de um dos mais destacados

contratualistas, será um dos fundadores da tradição democrática moderna em razão de sua defesa da soberania

popular o que influenciará fortemente a Revolução Francesa e o Romantismo do século XIX.

Nascido em Genebra, Jean-Jacques Rousseau, órfão de mãe, foi entregue aos cuidados de um pastor em Bossei, com

dez anos de idade. Retorna a Genebra em 1724 e, em 1728 é recomendado por um padre de Confignon à madame de

Warens em Annecy, que o encaminha a Turim onde, por força das circunstâncias se converte ao catolicismo. Depois

de perambular pela Suíça e pela França como professor de música, envolve-se com os enciclopedistas e, em 1754

elabora seu famoso Discurso sobre as ciências e as artes. Neste ano ele volta à Genebra, reconverte-se ao

calvinismo e retoma a cidadania genebrina. Depois de algum tempo retorna à Paris e, de lá, ,vai para a Inglaterra,

sob os auspícios de David Hume, onde passa pouco tempo. Marcado por uma vida extremamente difícil ele falece

em Ermenonville.

1. Sua luta contra o Iluminismo: Em dois de seus mais famosos textos (Discurso sobre as ciências e as artes,

1750, e Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens, de 1755), Rousseau

desconstrói as teses Iluministas de que a história humana seguia um progresso continuo.

Ele, pelo contrário, entendia que as artes e a ciência foram os culpados pela separação agora existente entre a

humanidade e as virtudes naturais que são as responsáveis por sermos verdadeiramente humanos. A ciência,

efetivamente nos corrompeu. Segundo Rohmann “O estado de natureza primitivo, no qual o indivíduo era um

‘nobre selvagem’ – isolado, auto-suficiente e autocontrolado – era moralmente superior à civilização” (ROHMANN,

2000, p. 354).

2. Sobre as leis: Discordando de religiosos, políticos e cientistas, Rousseau acreditava que as leis deveriam ser

criadas exclusivamente pelo povo e não por Deus, pelos monarcas ou pela razão. Em seu Contrato Social (1762)

Rousseau imaginava uma espécie de sociedade ideal onde “a ordem civil seria o produto do que ele chamava de

vontade geral, um conceito quase místico que implicava a responsabilidade cívica e a virtude na direção das quais as

pessoas se inclinam naturalmente quando levam em conta o bem de todos, e não a própria vontade particular”

(ROHMANN, 2000, p. 354).

O Contrato Social de Rousseau será importante porque nele ele revelará sua visão contratualista revelando sua

crença sobre a origem e a constituição do Estado. Segundo nosso pensador, a humanidade teria atravessado três

momentos (i) o estado de inocência, no qual inexistiam os ausos presentes em nossa sociedade; (ii) a falsa

civilização, que seria um estágio marcado por uma progressiva degeneração dos valores primitivos e (iii) o estado

social ou a verdadeira civilização. Aqui, graças à educação, à vida moral e à disciplina, seriam recuperados os

antigos valores da humanidade. Este é o estágio no qual a sociedade constrói o Contrato social.

Como efeitos deste Contrato, Rousseau enumera pelo menos dois. Em primeiro lugar, o indivíduo se transformaria

em cidadão e para tanto ele, (i) renuncia aos seus direitos pessoais em favor da comunidade e, (ii) rejeita o instinto

assumindo a lei como norma de vida. Um segundo efeito deste Contrato, e corolário do que foi exposto acima, é que

as ações humanas adquiririam uma moralidade que não existia antes. Citando Masip, “O cidadão é legislador e

súdito ao mesmo tempo. Sendo o povo a única fonte do direito, os governantes não gozam de nenhuma autoridade

definitiva sobre eles. Rousseau rejeita a idéia da democracia representativa: o povo é soberano não apenas

nominalmente: deve exercer de fato o poder mediante deliberações emanadas de todos os cidadãos. O governo é

responsável perante o povo; quando não segue a vontade do povo deve ser destituído” (MASIP, 2001, p. 207).

Page 11: Resumo de Filosofia Jurídica Para v1

A grande virtude desta tese reside no fato de que, se a vontade geral representaria a expressão direta da vontade

popular, qualquer possibilidade de discórdia seria eliminada. Em uma sociedade assim, contra-argumenta seus

opositores, estaríamos bem próximo a uma espécie de ditadura ou totalitarismo, visto que todas as pessoas estariam

“obrigadas a serem livres”.

3. Sua antropologia: Em uma de suas mais conhecidas obras, Emílio (1762), Rousseau apresentou sua crença na

possibilidade do aperfeiçoamento do homem na terra por meio de um novo sistema educacional. É neste texto que

Rousseau defende que o homem nasce bom mas que a sociedade o corrompe. Dentre os elementos que acabam por

desenvolver a corrupção na humanidade Masip (2001, p. 207) destaca três: (i) a propriedade privada, responsável

pela divisão das pessoas entre ricos e pobres; (ii) a magistratura, responsável pela manutenção da divisão entre os

poderosos e os sem poder algum, e (iii) a transforomação do poder legítimo em poder arbitrário, o que

fundamentaria a distinção dos indivíduos entre senhores e escravos.

Um outro aspecto importante de sua antropologia pode ser encontrada na sua ultima obra, Confissões (1764-1770).

Neste texto, que reflete a obra de Santo Agostinho, ele apregoa teses completamente diferentes. Primeiro porque

postula que os seres humanos não nascem no pecado original, mas nascem da sociedade e por ela são corrompidos.

Esta tese revela uma postura bem mais otimista do que a do bispo de hypona.

Antes de concluir é importante registrar que em obras como Júlia, ou A nova Heloísa (1760), nosso autor revela toda

sua oposição ao racionalismo frio estimulando a “expressão pessoal apaixonada e até o sentimentalismo (…) Nisso é

considerado precursor intelectual do romantismo e figura influente no desenvolvimento da psicologia de campo”

(ROHMANN, 2000, p. 355).

FILOSOFIA JURÍDICA – Emanuel Kant

Nascido em uma pequena cidade da Prússia oriental chamada Köningsberg, Kant (1724-1808) entrará para a história

não tanto em função de sua conhecida postura sistemática e disciplinada, mas em função de sua contribuição para o

que chamamos hoje de Iluminismo. Filho de um celeiro de ascendência escocesa, Kant recebeu de sua família uma

forte influência pietista luterana.

Ele era, de fato, uma pessoa bastante paradoxal. Ao mesmo tempo em que gostava de ler livros sobre viagens, ele

mesmo só saiu de sua cidade em um curto período de tempo; ao mesmo tempo em que gostava do convívio dos seus

amigos, ele jamais conseguiu se casar; embora de formação profundamente religiosa foi o responsável pela defesa

intransigente da “maioridade do mundo” e pela valorização da razão. Suas duas perguntas principais são: como

fundamentar filosoficamente o conhecimento? E, como fundamentar filosoficamente a moralidade?

Fundamento do conhecimento

Na busca de responder a primeira pergunta começaremos um a tese de que, a obra filosófica de Emanuel Kant já foi

comparada (BROWN, 1983) com uma espécie de “clímax” tanto do realismo quanto do empirismo, ou seja, um tipo

de síntese entre o racionalismo e o empirismo. As principais obras escritas por Kant são: Crítica da Razão Pura

(1781), Crítica da Razão Prática (1788), Crítica do Juízo (1790) e Paz Perpétua (1795). Com a primeira obra ele

procurava apresentar as bases para uma nova epistemologia que seria capaz de reconciliar Descartes e Hume; na

segunda obra ele procura apresentar seu pensamento sobre ética; na terceira sua teoria estética e na quarta sua teoria

social e política.

Na sua principal obra, Crítica da Razão Pura, ele procurava, conforme já falamos, reconciliar a filosofia racionalista

de Descartes com o empirismo de Hume. Ao tentar fazer isso ele tinha que reconciliar os conhecimentos que são

provenientes da experiência (juízos sintéticos e a posteriori) daqueles que independem da experiência (juízos

analíticos e a priori).

Sobre estas quatro palavras uma breve explicação. O conhecimento será a priori se ele vier antes da observação ou

da experiência e se for independente dela, e será a posteriori se vier após a experiência. Os juízos analíticos são

aqueles cuja verdade se ampara somente no significado dos termos (p.e. “Todos os cegos não enxergam”), e os

Page 12: Resumo de Filosofia Jurídica Para v1

sintéticos são os que exigem provas externas para estabelecer sua veracidade (p.e. “Todos os celibatários moram

sozinhos”). Como vemos, os juízos analíticos são a priori e os juízos sintéticos são a posteriori.

Concordando com Hume, Kant compreendia que nós não podemos ter um conhecimento direto do mundo material.

Contudo ele fazia a distinção entre o que era empírico (nossas percepções sensoriais) do que era transcendental, ou

seja, daquele conhecimento tornado capaz em função das categorias de entendimento, ou seja, de um conjunto de

conceitos preexistentes (por isso a priori) que organizam e que dão forma à experiência. Estas categorias do

entendimento são divididas em quatro grupos de três, baseando-se no princípio de que nós entendemos o fenômeno

segundo a quantidade, as qualidades que nele percebemos, as relações entre eles e a modalidade de juízos lógicos

que formulamos sobre eles. (ROHMANN, 2000) Vejamos um quadro com estas 12 categorias:

Quantidade Qualidade Relação Modalidade

Unidade Realidade

(Positiva)

Substância

Acidente

Possibilidade

Impossibilidade

Pluralidade Negação

(Negativa)

Causa/Efeito Existência/

Inexistência

Totalidade Limitação Reciprocidade Necessidade/

Contingência

Com este quadro Kant nos ensinava que percebemos objetos em quatro modalidades. Na primeira, ele nos ensina

que nós os percebemos em termos de unidade, pluralidade e totalidade, ou seja, que somos capazes de perceber uma

pedra, uma pilha de pedras, ou uma parede de pedras.

Com o segundo grupo ele nos ensina que nosso conhecimento das coisas também está relacionada às formas como

estas coisas nos atingem. Neste sentido, “realidade e nagatividade referem-se à nitidez das impressões que

recebemos, de absolutas (positivas) a nulas (negativas), e limitação refere-se à escala de sensações possíveis entre os

dois extremos”. (ROHMANN, p. 232)

No grupo da Relação Kant quer nos ensinar que tanto a relação Substância e Acidente (a base permanente da

realidade e a sua aparência externa) quanto a relação Causa e Efeito (o agente de mudança e o que é modificado)

devem ser vistas como Recíprocas, ou seja, complementares e interagentes.

Finalmente, no grupo da Modalidade Kant, com base no princípio do terceiro excluído, analisa se estes estados são

possíveis ou não, se eles existem ou não, e, finalmente, se são necessários (inevitáveis) ou contingentes.

Fundamento racional da moral e do direito

Na tentativa de responder ao segundo questionamento, aquela que trata da moralidade e do direito, devemos dedicar

um pouco mais de tempo.

Primeiramente é preciso registrar que a importância do pensamento de Emanuel Kant para a história do pensamento

jusfilosófico reside no fato de que ele, com seu criticismo filosófico, pretendeu ser uma espécie de reação tanto ao

dogmatismo de Wolf quanto ao ceticismo de Hume. Como bem dizem Bittar & Almeida: “De fato, entre esses

extremos procuram posicionar-se a filosofia kantiana, conciliando inclusive empirismo e idealismo, redundando

num racionalismo que acaba por re-orientar os rumos das filosofias modernas e contemporânea” (BITTAR p. 267).

Page 13: Resumo de Filosofia Jurídica Para v1

Sua exposição não deve ser confundida com o utilitarismo, teleologismo ou hedonismo. A primeira escola procura

buscar o bem-maior para o maior número de pessoas; a segunda procura fundamentar o comportamento em um

“fim” ou um “alvo” que dirija o meu comportamento hoje; o hedonismo, por sua vez – e ele não deve ser

confundido com o amor ao prazer, simplesmente – busca fundamentar a escolha ética no prazer ou na busca da

felicidade pessoal.

Devemos, também, ter em vista que ele opera sua elaboração ético/jurídica da mesma forma como trabalha sua

epistemologia. Assim como ele faz uma síntese entre a o racionalismo de Descartes e o empirismo de Hume em um

criticismo na epistemologia, da mesma forma ele também desenvolve uma ética que não se funda apenas na razão

(conhecimento a posteriori) ou na experiência (conhecimento a priori). Para fins sistemáticos dividiremos nossa

exposição em cinco pontos.

(i). A ética se funda na razão

Segundo Kant, a diferença entre o que é certo e o que é errado é inerente à razão. Esta frase só tem sentido quando

nos apercebemos que boa parte da tarefa filosófica de Kant foi refletir em torno da teoria do conhecimento e da

crítica do conhecimento e da razão. E isto significa que, a razão está na base de seu raciocínio. É por isso que ele

afirma que todas as pessoas sabem o que é o certo e o errado porque isso é dito a cada um pela razão, não porque é

imposto pela religião ou qualquer outra instância. Kant tem a preocupação de fundar a prática moral não na pura

experiência, “mas em uma lei apriorísticamente inerente à racionalidade universal humana”. (Bittar p. 271)

(ii). Há uma lei moral universal

Kant identifica uma lei moral universal que vale para todas as pessoas, sem distinção de classe social, cultura ou

lugar. Esta lei moral é uma realidade universal e fundamentada no dever serve de base para o comportamento

humano. Ouçamos as palavras do próprio Kant: “duas coisas enchem o ânimo de admiração e veneração sempre

novas e crescentes, quanto mais freqüentemente e com maior assiduidade delas se ocupa a reflexão: o céu estrelado

sobre mim e a lei moral em mim”. (Kant, Citado por BITTAR p. 269).

(iii). Há uma dupla legislação que atua sobre nós

Segundo Serra, Kant distingue uma dupla legislação. Vejamos suas palavras: “A legislação interna, ética (ethisch),

que faz do dever o próprio móbil da ação (‘age de acordo com o dever por dever!’; handle pflichtgemäss aus

Pflicht!), e a legislação externa, jurídica (juridisch), que não inclui na lei o móbil, mas admite outros móbeis além do

dever”. (Serra, citado por BITTAR p. 278).

Examinemos com mais cuidado estas leis.

(a). A Interna. Esta pode ser expressa em três frases: a) diz respeito á moral; b) obedece à lei do dever e c) é de foro

íntimo, ou seja, é autônoma. Quando falamos em autonomia, queremos dizer que envolve adesão de consciência.

(b). A Externa. Esta nos revela o direito por meio das leis que regulam nosso comportamento externo. É,

obviamente, heterônoma, ou seja, além de não envolver adesão de consciência, se conforma às regras externas.

(iv). Os homens agem de acordo com os Imperativos

Antes de mais nada temos que saber que um “imperativo” é uma ordem absolutamente inevitável. E eles existem de

duas formas. Vejamos as palavras de Kant: “Ora, todos os imperativos ordenam, seja hipotética, seja

categoricamente. Os hipotéticos representam a necessidade prática de uma ação possível, como meio de conseguir

qualquer outra coisa que se queira (o que é possível que se queira). O imperativo categórico seria o que

representasse uma ação como objetivamente necessária por si mesma, sem relação com nenhum outro fim” (KANT,

Fundamentação da metafísica dos costumes p. 45).

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(a). Imperativos categóricos

Este imperativo é único, absoluto, incondixional e não deriva da experiência. Pode ser resumido a uma única

sentença: “age só, segundo máxima tal, que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal” (Kant,

ibid, p. 51). Outra versão do imperativo universal do dever é expressa assim: “Age como se a máxima da tua ação

devesse se tornar, pela tua vontade, lei universal da natureza” (Kant, ibid, p. 52). Uma ultima versão muito

conhecida do imperativo categórico de Kant é expressa nas seguintes palavras: “Trate as pessoas como fins em si

mesmas, nunca como meios para um fim”.

(b). Imperativos Hipotéticos

São aqueles tipos de imperativos que contém, em seu enunciado, as condições para que um determinado fim seja

alcançado, mas que não possui um caráter obrigatório. Ex. “se você estudar, vai passar na prova”. Concordando com

o que se expôs acima vemos Warburton afirmar que “Deveres hipotéticos informam o que você deve ou não fazer,

se quiser alcançar ou evitar um determinado fim” (WARBURTON, 2008, p. 73). Como exemplos, Warburton (2008,

p. 73) cita: “Se você quer ser respeitado, deve dizer a verdade”. Ou ainda: “Sequer evitar ir para a cadeia não deve

matar pessoa alguma”.

(v). Os Atos Morais

Ocorrem quando o homem toma o Imperativo Categórico como seu, isto é, incorpora o este Imperativo como norma

para sua conduta. Ela passa, então, a agir de tal maneira que a vontade da lei passa a ser a sua vontade. Ela a

recepciona em sua consciência por meio de uma adesão. Afinal quando agimos moralmente, segundo Kant? Quem

responde esta pergunta é Tiago Lara, segundo quem, agimos moralmente “Quando agimos livremente, isto é,

quando a razão é que nos dita: deves fazer isto. Não porque Deus mandou, ou porque é útil, agradável, porque te

sentes inclinado a isso. Não. É porque vês racionalmente que deves; porque essa maneira de agir é a única que

salvaria uma ordem universal da convivência humana” (LARA, Tiago A. Caminhos da razão no ocidente. p. 63).

Corroborando estas palavras ouçamos o que os diz Nigel Warburton “Para Kant estava claro que uma ação moral era

uma ação executada a partir de um senso de dever em vez de simplesmente por uma inclinação, um sentimento ou

uma possibilidade de algum tipo de lucro para a pessoa que a executa” (WARBURTON, 2008, p. 70).

O agir livre é o agir moral; o agir moral é o agir de acordo com o dever; o agir de acordo com o dever é fazer de sua

lei subjetiva um princípio de legislação universal, a ser inscrita em toda a natureza (Bittar, 273)

Desta forma, não devemos confundir a legalidade com a moralidade. Um ato será legal quando estiver de acordo

com a lei, e moral quando exercido livremente, porque assim deve ser. Se eu não cometo um crime simplesmente

para não receber as sanções daquele ato e não porque não devo cometê-lo, então não ajo de forma moral ou ética,

ainda que legal. Agir de acordo com o imperativo é o resumo da ética kantiana: “A boa vontade não é boa pelo que

efetivamente realiza, não é boa pela sua adequação para alcançar determinado fim a que nos propusemos; é boa

somente pelo querer; digamos, é boa em si mesma. Considerada em si própria, é, sem comparação, muito mais

valiosa do que tudo o que por meio dela pudéssemos verificar em proveito ou referência de alguma inclinação e, se

quisermos, da suam de todas as inclinações”. (Kant fundamentos da metafísica dos costumes).

Retirado do site :http://revjorgeaquino.wordpress.com/2013/08/06/filosofia-juridica-aula-2-socrates-e-a-sofistica/

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