resistência e luta se misturam no caldeirão- a experiência de seu meraldo e don

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Resistência e luta se misturam no Caldeirão A experiência de seu Meraldo e dona Dilma na convivência com o Semiárido Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Ano 8 • nº 1788 Itinga No município de Itinga, no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, vivem cerca de 15 mil famílias, sendo este um município do Semiárido mineiro que tem nos meses de novembro a março o período chuvoso. E é na comunidade rural do Caldeirão que vive a família dos agricultores Maria Dilma Gonçalves e Meral Soares, conhecido como Meraldo, casados e pais de cinco filhos, dos quais dois moram com o casal: Carlos Alessandro, de 29 anos, e Cleiton Soares, de 14 anos. As filhas Vanderleia Soares, 28 anos, e Vanessa Soares, 20 anos, moram em São Paulo, e Valéria Soares, 24 anos, mora em Brasília. Seu Meraldo e dona Dilma sempre moraram na comunidade, antigamente conhecida como Córrego dos Veados. “Nos conhecemos criança, ficamos amigos, estudamos juntos, namoramos e depois casamos”, conta a agricultora. E lá mesmo passaram a morar, na propriedade da mãe de seu Meraldo. A vida e criação dos filhos se deu em meio a muitas adversidades, mas com muita luta e força de vontade, é assim até os dias de hoje. A família tem uma produção diversa, mas atualmente tem investido mais na produção de farinha de mandioca. A produção de farinha é uma atividade antiga na comunidade do Caldeirão, isso porque a mandioca é uma das culturas resistentes aos períodos de seca. Há alguns anos quase todas as famílias trabalhavam com farinha, mas a forma de produção era manual. Hoje, poucas pessoas continuam com a produção. Mas a família de seu Meraldo e dona Dilma tem sua própria farinheira, que ainda está em conclusão, mas já tem garantido a produção e comercialização na comunidade. Foi construído um forno para a torra da farinha e montado um motor elétrico para ralar a mandioca. Mas mesmo tendo uma farinheira própria, contam com contribuição da comunidade. “Pra raspar a mandioca a gente reúne algumas pessoas, porque é muito trabalhoso raspar tudo sozinho”, diz o agricultor. A iniciativa de fazer a farinheira trouxe mais autonomia para a família, que produz durante o período seco, geralmente de abril a setembro. Agosto/2014 Seu Meraldo e Dona Dilma Produção de farinha

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Dona Dilma e Seu Meraldo,moradores da comunidade caldeirão , município de Itinga no Vale do Jequitinhonha, preservam a tradição de fazer farinha de mandioca. E contam como as tecnologias da ASA facilitaram a vida deles.

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Page 1: Resistência e luta se misturam no Caldeirão- A experiência de seu Meraldo e don

Resistência e luta se misturam no CaldeirãoA experiência de seu Meraldo e dona Dilma na convivência com o Semiárido

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Ano 8 • nº 1788

Itinga

No município de Itinga, no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, vivem cerca de 15 mil famílias, sendo este um município do Semiárido mineiro que tem nos meses de novembro a março o período chuvoso. E é na comunidade rural do Caldeirão que vive a família dos agricultores Maria Dilma Gonçalves e Meral Soares, conhecido como Meraldo, casados e pais de cinco filhos, dos quais dois moram com o casal: Carlos Alessandro, de 29 anos, e Cleiton Soares, de 14 anos. As filhas Vanderleia Soares, 28 anos, e Vanessa Soares, 20 anos, moram em São Paulo, e

Valéria Soares, 24 anos, mora em Brasília. Seu Meraldo e dona Dilma sempre moraram na comunidade, antigamente conhecida como Córrego dos Veados. “Nos conhecemos criança, ficamos amigos, estudamos juntos, namoramos e depois casamos”, conta a agricultora. E lá mesmo passaram a morar, na propriedade da mãe de seu Meraldo. A vida e criação dos filhos se deu em meio a muitas adversidades, mas com muita luta e força de vontade, é assim até os dias de hoje.

A família tem uma produção diversa, mas atualmente tem investido mais na produção de farinha de mandioca. A produção de farinha é uma atividade antiga na comunidade do Caldeirão, isso porque a mandioca é uma das culturas resistentes aos períodos de seca. Há alguns anos quase todas as famílias trabalhavam com farinha, mas a forma de produção era manual. Hoje, poucas pessoas continuam com a produção. Mas a família de seu Meraldo e dona Dilma tem sua própria farinheira, que ainda está em conclusão, mas já tem garantido a produção e comercialização na comunidade.

Foi construído um forno para a torra da farinha e montado um motor elétrico para ralar a mandioca. Mas mesmo tendo uma farinheira própria, contam com contribuição da comunidade. “Pra raspar a mandioca a gente reúne algumas pessoas, porque é muito trabalhoso raspar tudo sozinho”, diz o agricultor. A iniciativa de fazer a farinheira trouxe mais autonomia para a família, que produz durante o período seco, geralmente de abril a setembro.

Agosto/2014

Seu Meraldo e Dona Dilma

Produção de farinha

Page 2: Resistência e luta se misturam no Caldeirão- A experiência de seu Meraldo e don

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Articulação Semiárido Brasileiro – Minas Gerais

O motor elétrico para ralar a mandioca facilitou o trabalho, mas a energia elétrica nem sempre esteve tão presente na vida da comunidade, chegou há 16 anos. O casal acredita que a energia e outras políticas que chegaram à comunidade contribuíram para a melhoria de vida, mas ainda não são suficientes para as necessidades locais. A exemplo da área da saúde, a zona rural do município só recebe médico uma vez a cada dois meses, atendendo até duas comunidades em um único dia.

Dificuldade também é encontrada ainda hoje com relação à educação. Antigamente os estudantes precisavam caminhar 5 km até a cidade para estudar, hoje já tem transporte que leva os alunos, mas durante as chuvas não funciona. Além disso, tem dias que o transporte de Caldeirão não passa e o que vem de outra comunidade não leva os alunos. Essas necessidades e a falta de incentivo do poder público na agricultura fizeram a família buscar outras formas de garantir melhor qualidade de vida ao longo dos tempos. Seu Meraldo conta que durante cerca de 20 anos migrou para outros estados trabalhando no corte de cana e garantir o sustento da família. Segundo ele “não era bom, mas era a opção que tinha”. Essa realidade é muito comum na comunidade em que eles vivem, tanto que as mulheres receberam o apelido de “viúvas de marido vivo” como conta dona Dilma: “esse apelido é porque meu marido estava vivo, mas eu estava sozinha na maior parte do tempo”. Assim, ela cuidou dos filhos e filhas, e nunca deixou de produzir no roçado e no quintal com muita dedicação e esperança. Quando os filhos cresceram também migraram em busca de trabalho e melhores condições de vida.O casal também já passou por muitas dificuldades com relação ao acesso à água. Antigamente pegavam a água em latas no açude que ficava a 1Km de distância. No ano de 2005 acessaram o Programa Um Milhão de Cisternas, e tiveram água pra beber ao lado de casa. A segunda água (caixa de 52.000 litros) foi construída em 2010 e impulsionou a produção de alimentos. Com a possibilidade de irrigação a diversidade de plantas

aumentou e muito, segundo Seu Meraldo, “a cisterna mudou nossas vidas, antes não tinha plantas aqui, porque plantávamos e morriam e agora tem ao menos um pouco de água que dá pra molhar as plantas”, agora na propriedade tem coco, laranja, tanja, manga, mamão, limão,

algodão, melancia, muranga, feijão catador, abóbora, criam galinhas e ainda tem horta com couve, coentro, cebolinha, pimenta

dedo de moça, pimenta roxinha, quiabo e alface. Como alternativa para reduzir os gastos de água, o casal utiliza sombrites e também o canteiro econômico.

e ainda tem horta com couve, coentro, cebolinha, pimenta dedo de moça, pimenta roxinha, quiabo e alface. Como alternativa para reduzir os gastos de água, o casal utiliza sombrites e também o canteiro econômico.É vivendo e aprendendo com o ambiente em que estão que dona Dilma e seu Meraldo com muita luta constroem alternativas de convivência com o Semiárido, como diz dona Dilma: “A aranha vive com o que tece e nós temos que ser assim também”.

Realização Apoio

Quintal de Seu Meraldo e Dona Dilma

Quiabos