resistência ao corte de paredes de alvenaria com blocos de...

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Encontro Nacional BETÃO ESTRUTURAL - BE2012 FEUP, 24-26 de outubro de 2012 Resistência ao corte de paredes de alvenaria com blocos de betão e com blocos cerâmicos Inês Grilo 1 Hélio Marques 2 João P. Gouveia 3 Eduardo Júlio 4 RESUMO No mercado existem diversos tipos de unidades de alvenaria para a execução de paredes. É sabido que estas podem assumir um simples papel de preenchimento de estruturas porticadas, como também podem assumir funções resistentes. Para a seleção de materiais para a execução destes tipos de paredes, considera-se necessário a realização de estudos sobre as características físicas e mecânicas. Neste trabalho apresenta-se uma campanha laboratorial desenvolvida no Laboratório de Ensaios em Estruturas do Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, em colaboração com as empresas Preceram S.A e Costa e Almeida, Lda, produtoras respectivamente de blocos de alvenaria cerâmicos e de blocos de betão. O objetivo principal deste estudo é analisar o comportamento de unidades de alvenaria, com geometria inovadora e constituídas por materiais diferentes, dando especial enfoque à resistência ao corte, avaliada através do ensaio de pequenos prismas de alvenaria. Descrevem-se os procedimentos de ensaio, apresentam-se e discutem-se os resultados e indicam- se as principais conclusões deste estudo. Palavra-chave: Caracterização mecânica; Ensaios experimentais, alvenaria, blocos cerâmicos, blocos de betão 1. INTRODUÇÃO A alvenaria estrutural é um sistema construtivo utilizado em vários países, possuindo como principal premissa a utilização de paredes como elementos resistentes. As alvenarias estruturais diferem das alvenarias correntes, não só pelo método de cálculo e planificação, mas também pelos métodos e pormenores de construção e, naturalmente, pelos materiais utilizados [1]. Em Portugal, tem-se verificado por parte da comunidade científica um interesse crescente no conhecimento desta tecnologia, na sua caracterização física e mecânica. As principais vantagens são a redução de custos e do tempo de execução, associado a uma menor diversidade de materiais utilizados, comparativamente com os sistemas em betão estrutural. Na atual conjuntura económica, social e tecnológica, enriquecer o conhecimento sobre a alvenaria estrutural e as suas aplicações é bastante pertinente. Um conhecimento do comportamento mecânico das alvenarias é indispensável, quer tenham função resistente ou não. Qualquer parede está sujeita a ações de vários tipos que a solicitam mecanicamente, pelo que a estabilidade da referida parede sob efeito dessas ações tem que estar assegurada [1][2] . Sabe-se que em termos de ações as alvenarias estão sujeitas, para além das ações verticais no seu plano, a ações horizontais no seu plano, produzidas pela ação do vento ou sismos, mobilizando a resistência ao corte da parede [1]. A alvenaria comporta-se razoavelmente bem quando sujeita a cargas de compressão [3]. No 1 Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade de Coimbra, Departamento de Engenharia Civil, Coimbra. [email protected] 2 Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, Departamento de Engenharia Civil, Coimbra. [email protected] 3 Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, Departamento de Engenharia Civil, Coimbra. [email protected] 4 ICIST, DECivil, Instituto Superior Técnico, UTL, Lisboa. [email protected]

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Encontro Nacional BETÃO ESTRUTURAL - BE2012 FEUP, 24-26 de outubro de 2012

Resistência ao corte de paredes de alvenaria com blocos de betão e com blocos cerâmicos

Inês Grilo1 Hélio Marques2 João P. Gouveia3 Eduardo Júlio4 RESUMO No mercado existem diversos tipos de unidades de alvenaria para a execução de paredes. É sabido que estas podem assumir um simples papel de preenchimento de estruturas porticadas, como também podem assumir funções resistentes. Para a seleção de materiais para a execução destes tipos de paredes, considera-se necessário a realização de estudos sobre as características físicas e mecânicas. Neste trabalho apresenta-se uma campanha laboratorial desenvolvida no Laboratório de Ensaios em Estruturas do Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, em colaboração com as empresas Preceram S.A e Costa e Almeida, Lda, produtoras respectivamente de blocos de alvenaria cerâmicos e de blocos de betão. O objetivo principal deste estudo é analisar o comportamento de unidades de alvenaria, com geometria inovadora e constituídas por materiais diferentes, dando especial enfoque à resistência ao corte, avaliada através do ensaio de pequenos prismas de alvenaria. Descrevem-se os procedimentos de ensaio, apresentam-se e discutem-se os resultados e indicam-se as principais conclusões deste estudo. Palavra-chave: Caracterização mecânica; Ensaios experimentais, alvenaria, blocos cerâmicos, blocos de betão 1. INTRODUÇÃO A alvenaria estrutural é um sistema construtivo utilizado em vários países, possuindo como principal premissa a utilização de paredes como elementos resistentes. As alvenarias estruturais diferem das alvenarias correntes, não só pelo método de cálculo e planificação, mas também pelos métodos e pormenores de construção e, naturalmente, pelos materiais utilizados [1]. Em Portugal, tem-se verificado por parte da comunidade científica um interesse crescente no conhecimento desta tecnologia, na sua caracterização física e mecânica. As principais vantagens são a redução de custos e do tempo de execução, associado a uma menor diversidade de materiais utilizados, comparativamente com os sistemas em betão estrutural. Na atual conjuntura económica, social e tecnológica, enriquecer o conhecimento sobre a alvenaria estrutural e as suas aplicações é bastante pertinente. Um conhecimento do comportamento mecânico das alvenarias é indispensável, quer tenham função resistente ou não. Qualquer parede está sujeita a ações de vários tipos que a solicitam mecanicamente, pelo que a estabilidade da referida parede sob efeito dessas ações tem que estar assegurada [1][2] . Sabe-se que em termos de ações as alvenarias estão sujeitas, para além das ações verticais no seu plano, a ações horizontais no seu plano, produzidas pela ação do vento ou sismos, mobilizando a resistência ao corte da parede [1]. A alvenaria comporta-se razoavelmente bem quando sujeita a cargas de compressão [3]. No

1 Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade de Coimbra, Departamento de Engenharia Civil, Coimbra. [email protected] 2 Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, Departamento de Engenharia Civil, Coimbra. [email protected] 3 Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, Departamento de Engenharia Civil, Coimbra. [email protected] 4 ICIST, DECivil, Instituto Superior Técnico, UTL, Lisboa. [email protected]

Resistência ao corte de paredes de alvenaria com blocos de betão e com blocos cerâmicos

entanto, estudos recentes [4] afirmam que a resistência à tração da alvenaria é muito reduzida, resultando fissuras prematuras nesta devido à existência de esforço de tração e corte. Para compreender o desempenho das paredes de alvenaria é imprescindível conhecer as propriedades dos materiais que a constituem. As alvenarias são um elemento construtivo composto, constituído no mínimo pelos blocos e pela argamassa de assentamento, podendo ainda incorporar outros constituintes para melhorar as suas características (i.e. armaduras ou caldas). Sendo a alvenaria um material anisotrópico, a sua resistência depende da interação dos vários elementos que a constituem. As juntas de assentamento das paredes de alvenaria têm como principais funções, entre outras, solidarizar os elementos, distribuir e uniformizar a tensão de contacto entre elementos e aumentar a resistência ao corte e à tração da parede. Sabe-se, no entanto, que as juntas de argamassa constituem uma fragilidade na alvenaria. O comportamento global da alvenaria é influenciado por vários fatores, tais como: (i) propriedades físicas e mecânicas do bloco e da argamassa; (ii) espessura da junta, (iii) comportamento da ligação bloco/argamassa, entre outros [5]. Estudos realizados [6][7][8] afirmam o aparecimento de trações no bloco e o esmagamento na junta de argamassa são os principais fatores pela rotura de uma parede de alvenaria. A rotura das alvenarias pode ocorrer nos blocos, na argamassa ou na interface destes, observando-se fissuração e esmagamento na unidade de alvenaria e/ou argamassa [9][10]. Como as alvenarias possuem um mau comportamento quando sujeitas a esforços de tração e corte, o conhecimento sobre as propriedades mecânicas da ligação entre os blocos e a argamassa e a aderência entre estes torna-se fundamental para a sua conceção e avaliação estrutural. Muitos investigadores já estudaram esse comportamento através de ensaios em alvenaria [11] ou pequenos provetes, contendo frações de blocos, denominados triplet [12][13][14][15]. Recentemente [16], foram realizados ensaios com objetivo de determinar a resistências ao corte em provetes prismáticos. Estes ensaios constituíram um estudo preliminar para avaliação do comportamento estrutural de paredes de alvenaria submetidas a forças de corte. Os provetes prismáticos eram constituídos por blocos de betão em escala reduzida, sendo o esquema de ensaio apresentado na Fig. 1 [16].

Figura 1 – Ensaios de corte: geometria e esquema de ensaio [16].

Com o objetivo de avaliar o comportamento ao corte de paredes de alvenaria, este trabalho apresenta a campanha de ensaios experimentais realizados. Apresenta-se o comportamento físico e mecânico de cada constituinte da alvenaria, bloco e argamassa. De seguida, apresenta-se os resultados obtidos da resistência ao corte da alvenaria utilizando pequenos provetes prismáticos constituídos por três blocos interligados com argamassa pré-doseada. Determina-se a resistência inicial ao corte no plano das juntas horizontais de assentamento. Refira-se que esta campanha de ensaios, foi executada de acordo com a norma europeia NP EN 1052-3 [17]. Após a análise do comportamento dos elementos de alvenaria cerâmicos e blocos de betão, efetua-se uma comparação de resultados obtidos com os provetes executados com os dois tipos de elementos de alvenaria.

Inês Grilo, Hélio Marques, João P. Gouveia, Eduardo Júlio

2. PROGRAMA EXPERIMENTAL A campanha de ensaios foi realizada no Laboratório de Ensaios de Estruturas do Departamento de Engenharia Civil do Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, no âmbito de dois projetos QREN. Realizaram-se ensaios para determinação de alguns parâmetros físicos e mecânicos dos materiais constituintes dos provetes prismáticos, argamassa e blocos. Os blocos utilizados para a execução dos provetes prismáticos estão apresentados na Fig. 2. Determinou-se a resistência ao corte dos provetes de acordo com a norma NP EN 1052-3. O número de provetes utilizados para cada tipo de ensaio foi adotado em função das exigências normativas.

(a) (b)

Figura 2 – Blocos utilizados (a) de betão; (b) cerâmicos. As dimensões nominais dos blocos de betão são , possuindo dimensões

na face de assentamento. As dimensões nominais dos blocos cerâmicos são , possuindo dimensões na face de assentamento.

2.1 Materiais 2.1.1 Caracterização da argamassa Para a montagem dos provetes prismáticos foi utilizada uma argamassa pré-doseada. Esta, foi caracterizada pela sua massa volúmica e pela sua consistência da argamassa, através das EN 12350-6 [18] e NBR 13276 [19], respectivamente. O processo de determinação da resistência à flexão e à compressão foi de acordo com a norma NP EN 196-1 [20]. Foram realizados ensaios em prismas de . Os resultados dos parâmetros físicos e mecânicos da argamassa apresentam-se no Quadro 1 e 2, respectivamente. A resistência à flexão e compressão foi obtida aos 28 dias após a execução dos provetes.

Quadro 1. Parâmetros físicos da argamassa pré-doseada utilizada nos provetes de alvenaria. Massa volúmica [kg/m3] Consistência [cm] Teor de ar [%]

1820 16 20

Quadro 2. Parâmetros mecânicos da argamassa pré-doseada utilizada nos provetes de alvenaria. Resistência à flexão

[MPa] Resistência à

compressão [MPa] Classificação da

argamassa, EC6 [21] 2.2 5.0 M5

2.1.2 Caracterização dos blocos Determinou-se algumas propriedades físicas dos blocos: dimensões (NP EN 772-16 [22]), massa volúmica aparente (NP EN 772-13 [23]), percentagem de furação (NP EN 772-3 [24]) e absorção de água (NP EN 772-7 [25]) pelas respectivas normas europeias. Para a determinação da resistência à compressão dos blocos utilizou-se como referência a norma europeia NP EN 772-1 [26]. A percentagem de área efetiva de aplicação de carga é 55% e 54% para blocos de betão e cerâmicos, respectivamente. Determinou-se a resistência à compressão normalizada, considerando a área bruta e a área efetiva de cada bloco, de acordo com a respectiva norma. Os valores dos parâmetros físicos e a resistência mecânica dos blocos apresentam-se no Quadro 3.

Resistência ao corte de paredes de alvenaria com blocos de betão e com blocos cerâmicos

Quadro 3. Parâmetros físicos e mecânicos dos blocos utilizados nos provetes de alvenaria.

Tipo de bloco Dimensões (mm)

Massa volúmica aparente [kg/m3]

Furação [%]

Absorção de água

[%]

Resistência à compressão (área bruta)

[MPa]

Resistência à compressão

(área efetiva) [MPa]

Betão 1670 45 8.2 5.9 12.4 Cerâmico 890 46 9.5 8.1 15.1

2.2 Execução dos provetes Os ensaios para a determinação da resistência ao corte desta alvenaria foram realizados de acordo com a norma NP EN 1052-3. Para a realização destes ensaios, foram executados provetes prismáticos de três unidades de alvenaria, de acordo com a referida norma. O esquema destes provetes apresenta-se na Fig. 3. Com estes ensaios, foi definido como objetivo obter os valores da resistência inicial de corte, o valor característico da coesão e os coeficientes de atrito.

Figura 3 – Esquema dos ensaios para a determinação da resistência ao corte de acordo com EN NP 1052-3.

A montagem dos provetes foi dividida em 2 fases. Inicialmente, foi feita a regularização das faces laterais e das extremidades inferiores e superiores dos blocos, com o objetivo de assegurar superfícies planas na área de aplicação da carga e nas zonas de reações de apoio. De seguida foi feita a montagem dos provetes prismáticos, constituídos por 3 blocos, na posição vertical. Os blocos da primeira fiada estavam assentes numa superfície limpa e nivelada. O procedimento consistiu no assentamento de um bloco em cima de outro, perfazendo na totalidade 3 blocos, na qual existem duas juntas horizontais de argamassa que liga os blocos entre si. Para as juntas foram definidas espessuras na ordem de 15 mm. Os blocos de betão possuíam junta de assentamento descontínua de de largura, definidos pela largura dos seus septos longitudinais. Relativamente aos blocos cerâmicos, foram executados provetes com dois tipos de junta de assentamento: junta contínua em toda a largura do bloco cerâmico e junta descontínua com de largura, correspondente a faixas de argamassa de 1/3 da largura dos blocos. Executaram-se 9 provetes constituídos por blocos de betão e 18 provetes constituídos por blocos cerâmicos, sendo 9 provetes para cada tipo de junta. Na Fig. 4 apresentam-se exemplos de cada tipo de provetes.

(a) (b)

Figura 4 – Provetes prismáticos constituídos por (a) blocos de betão; (b) blocos cerâmicos.

Inês Grilo, Hélio Marques, João P. Gouveia, Eduardo Júlio

2.3 Instrumentação dos provetes Com objetivo de efetuarem registos da evolução dos deslocamentos nos provetes, no decorrer dos ensaios, foram utilizados diversos transdutores de deslocamentos (LVDT´s). Utilizaram-se LVDTs com o objetivo principal de analisar o comportamento da interface bloco/argamassa sujeita a esforços de corte e com o objetivo de registar o diferencial de deslocamentos verticais entre fiadas, aplicando para isso, LVDTs em cada bloco, no centro da sua face. Esta relação de deslocamentos foi definida por uma pequena chapa, fixa ao bloco central, permitindo assim determinar os deslocamentos nos blocos da extremidade (Tv1 e Tv3) relativamente a este. Os deslocamentos deste bloco central, foram avaliados pelo Tv2. Colocou-se transdutores a medir os deslocamentos horizontais em cada junta de assentamento, permitindo avaliar a abertura destas no decorrer do ensaio (Th1 e Th2). A Fig. 5 apresenta a posição destes equipamentos.

Figura 5 – Identificação dos transdutores de deslocamento nos dois tipos de provete. A posição dos transdutores de deslocamento manteve-se em todos os ensaios. Nestes ensaios, foram igualmente utilizadas células de carga para medir as forças aplicadas. A força de compressão foi lida por uma célula de carga com capacidade para 200kN enquanto a força de corte foi medida pela célula de carga existente no próprio atuador, com capacidade máxima para 300kN. 3. ENSAIOS DE CORTE EM ALVENARIA Conforme referido, na realização dos ensaios foi seguida a norma NP EN 1052-3. A resistência inicial ao corte da alvenaria foi determinada a partir da resistência de provetes de 3 blocos, com precompressão perpendicular às juntas horizontais e com ação de corte definida por 3 pontos de aplicação de carga paralela às juntas horizontais. Os ensaios foram realizados, com o registo dos valores de carga e de deformação, identificando os valores representativos da rotura, sendo o ensaio finalizado após a confirmação da redução significativa da força de corte. O ensaio de corte consistiu na aplicação de uma força vertical no bloco central, denominada força de corte, e aplicação da força horizontal no centro geométrico do provete, denominada força de precompressão. A força de corte foi aplicada com controlo de deslocamento a uma velocidade de 0,01mm/s. A força de precompressão aplicada num provete foi definida como uma percentagem da resistência normalizada à compressão da respectiva alvenaria. A resistência à compressão da alvenaria foi estimada pela expressão Eq. (1) definida pela NP EN 1996-1[21] (Eurocódigo 6).

(1) Em que: é a resistência característica à compressão da alvenaria (N/mm2) é uma constante que depende do tipo de bloco e argamassa utilizada na alvenaria é a resistência à compressão das unidades para alvenaria, na direção da ação aplicada (N/mm2) é a resistência à compressão da argamassa (N/mm2) Relativamente às caraterísticas da argamassa e dos blocos, os valores estão apresentados nos Quadros 2 e 3. A resistência característica da alvenaria à compressão é de 4,2 MPa e 3,8MPa, constituída respectivamente, por blocos de betão e por blocos cerâmicos. Os níveis de carga de precompressão, definidos para os provetes constituídos por blocos de betão foram 0%, 10%, 20% e 30% da resistência característica da alvenaria. Os

Tv2

Tv1 Tv3

Th1 Th2

Tv1 Tv3

Tv2

Th1 Th2

Resistência ao corte de paredes de alvenaria com blocos de betão e com blocos cerâmicos

níveis de carga de precompressão utilizados nos provetes constituídos por blocos cerâmicos foram 0%, 10% e 20% para provetes com junta de assentamento contínua e 0%, 20% e 30%. Esses valores estão apresentados no Quadro 4 e 5.

Quadro 4. Valores de precompressão aplicados nos provetes constituídos por blocos de betão.

Nível de carga (%)

Provetes constituídos por blocos de betão

бd (MPa) 10% 0.4 32 20% 0.9 50 30% 1.3 95

Quadro 5. Valores de precompressão aplicados nos provetes constituídos por blocos cerâmicos.

Nível de carga (%)

Provetes constituídos por blocos cerâmicos

бd (MPa) Junta contínua Junta descontínua

10% 0.4 25 - 20% 0.8 50 35 30% 1.2 - 50

O valor de бd representa o valor de cálculo da tensão de compressão perpendicular ao plano de corte e a força de precompressão. Antes de se iniciar o ensaio, foi aplicada a força de precompressão no provete. Utilizou-se uma placa de cartão prensado de elevada densidade nas extremidades laterais do provete para evitar concentrações de tensões e permitir uma distribuição mais eficaz da força de precompressão. Monitorizou-se esta força através de uma célula de carga. A aplicação da força de precompressão provocou o confinamento do provete (Fig. 4), formando assim um sistema auto-equilibrado. No decorrer do ensaio, com o aumento da força de corte, observava-se um aumento da força de precompressão. Para assegurar o mesmo nível de força de compressão durante o ensaio, foi sendo necessário aliviar a pressão existente no atuador através de válvula de controlo, reduzindo e ajustando assim a carga de precompressão. 4. ANÁLISE DE RESULTADOS De acordo com a norma NP EN 1052-3 a resistência ao corte, , e a tensão de precompressão,

, de cada provete é definida pelas seguintes equações:

(2) (3)

Em que é a carga máxima de corte, é a força de precompressão aplicada no provete e representa a área efetiva de aplicação da força de precompressão. Para cada provete, foi determinada a resistência ao corte e a tensão de precompressão, sendo feita a relação gráfica destes valores. Através de regressão linear dos diversos pontos, foi definida uma reta que permitiu definir o ângulo de atrito interno, que corresponde a inclinação dessa reta. Determinou-se igualmente o valor característico da resistência ao corte inicial, , e o angulo de atrito interno característico, , pelas seguintes equações:

(4) (5)

Durante o ensaio, o confinamento dos provetes exercido pela força de precompressão, impedia a sua rotação na base. Observa-se que o confinamento dos provetes provoca um aumento da resistência ao corte, quando comparados com provetes ensaiados sem precompressão. Após atingir a resistência máxima, verificou-se a sua diminuição gradual. A força aplicada estabiliza ligeiramente para um valor limite de resistência, associada à existência de atrito. Esta particularidade já foi observada por outros autores que realizaram ensaiados idênticos a este trabalho [10][27]. Nos ensaios sem precompressão, após a rotura do provete, a

Inês Grilo, Hélio Marques, João P. Gouveia, Eduardo Júlio

força de corte decresce consideravelmente, para valores próximos de zero, devido a rotação dos blocos laterais do provete. No Quadro 6, apresentam-se os valores obtidos para a resistência ao corte de acordo com o nível de tensão de precompressão para ensaios em provetes constituídos por blocos de betão. O gráfico representa a resistência ao corte média obtida nos ensaios, sem contabilizar os resultados para o nível de carga a 30%. O ângulo de atrito é obtido por este gráfico.

Quadro 6. Resultados obtidos nos ensaios de corte e resistência ao corte nos provetes com blocos de betão. Nível

de carga

0% 0 9

0 0.10

12 0.14 13.5 0.15

10% 32 59

0.73 0.67

59.5 0.67 46 0.52

20% 50 107.5 1.43 1.22 98.5 1.12

30% 95 122.5 2.15 1.39

No Quadro 7, apresenta-se os valores obtidos da resistência ao corte para os níveis definidos de tensão de precompressão nos ensaios em provetes constituídos por blocos cerâmicos.

Quadro 7. Resultados obtidos nos ensaios de corte e resistência ao corte nos provetes constituídos por blocos cerâmicos com (a) junta descontínua; (b) junta contínua.

Nível

de carga

Junt

a D

esco

ntín

ua 0% 0 32 0 0.23

26 0.19

20% 35

55

0.51

0.40 70 0.51 50 0.36 57 0.41

30% 50

66

0.73

0.48 69 0.50 70 0.51 65 0.47

Junt

a C

ontín

ua 0% 0 40 0 0.29

30 0.22

10% 25 60

0.36 0.44

75 0.55 60 0.48

20% 50

80

0.73

0.58 100 0.73 73 0.53 74 0.54

(a)

(b)

Resistência ao corte de paredes de alvenaria com blocos de betão e com blocos cerâmicos

Para os provetes constituídos por blocos de betão, um único valor para 30% de força de precompressão não é suficiente para se obter com rigor um valor do ângulo de atrito. Constatou-se que ao considerar este valor o angulo de atrito reduzia, aproximadamente, 5º. Considera-se necessário realizar mais ensaios para este nível de carga numa próxima campanha de ensaios. Desta forma, nos resultados e conclusões deste trabalho não se contabiliza o valor obtido para o nível de carga 30%. Análise quanto aos modos de rotura As roturas observadas nos ensaios apresentam-se na Fig. 6. De acordo com a norma EN 1052-3, os provetes podem ter quatro modos de rotura distintos:

a) Rotura por corte na superfície de ligação entre o bloco e a argamassa numa ou nas duas faces do bloco;

b) Rotura por corte localizada na argamassa; c) Rotura por corte no bloco; d) Rotura por esmagamento ou fissuração dos blocos.

(a) (b) (c)

Figura 6 – Roturas observadas nos ensaios em provetes constituídos por blocos cerâmicos e por blocos de betão Através da análise de resultados verificou-se, que todos os provetes constituídos por blocos de betão apresentavam rotura ao nível da interface bloco/argamassa, quer ao nível de uma interface ou dividida entre as duas interfaces. Apenas no provete ensaiado para o nível de 30% de precompressão, foi verificada a situação de esmagamento e fissuração no bloco central, sem ocorrência de dano considerável nos blocos de extremidade. Nos provetes constituídos por blocos cerâmicos sem precompressão observou-se rotura por corte, na superfície de ligação entre o bloco e a argamassa (a). Quando os provetes eram submetidos a carga de precompressão verificaram-se dois tipos de rotura: esmagamento do bloco central com rotura por corte na junta (b) ou unicamente esmagamento e fissuração do bloco central (c). No quadro 8, apresentam-se os valores da resistência inicial de corte obtidas, , o valor característico da coesão, , o coeficiente de atrito médio e característico, e , respectivamente. Apresenta-se também os valores médios de angulo de atrito interno real e característico obtidos nos ensaios.

Quadro 8. Resistência inicial e ângulo de atrito nos ensaios efetuados. Provetes Junta Blocos

cerâmicos Descontínua 0.21 0.17 0.39 0.32 21.3 17.3

Contínua 0.28 0.22 0.47 0.37 25.1 20.5 Blocos de betão 0.12 0.10 0.73 0.58 36 30.1

Quando se comparam os resultados em provetes constituídos por junta contínua e descontínua, verifica-se que a alvenaria com junta contínua possui melhor comportamento a ações de corte. O ângulo de atrito e a resistência inicial ao corte são, aproximadamente, 20% e 30% mais elevados quando comparados com a junta descontínua. O coeficiente de atrito é uma variável que depende das interfaces de contacto. Como a área de contacto é diferente para cada tipo de bloco, não é possível fazer uma comparação direta deste valor. Apenas se pode verificar que os provetes constituídos por blocos de betão possuem um coeficiente de atrito característico de

Inês Grilo, Hélio Marques, João P. Gouveia, Eduardo Júlio

0,58 e para provetes constituídos por blocos cerâmicos possuem 0,39 e 0,47 para junta descontínua e contínua, respectivamente. Verifica-se que, nos ensaios sem precompressão, os provetes constituídos com blocos cerâmicos possuem um valor mais elevado de resistência ao corte, quando comparados com os provetes constituídos com blocos de betão. No entanto, com o aumento da carga de precompressão, a situação inverte-se. Para 50kN de força de precompressão, obtém-se resistência ao corte mais elevada nos provetes com blocos de betão. Este facto pode-se verificar pela sobreposição das curvas de resistência ao corte dos 3 tipos de ensaio, conforme se apresenta na Fig.7.

Figura 7 – Curvas de resistência ao corte dos 3 tipos de ensaio.

Verifica-se que, especificamente para os tipos de blocos utilizados neste trabalho e para as mesmas condições de assentamento, uma alvenaria constituída pelos blocos cerâmicos possuem uma resistência inicial ao corte mais elevada quando comparada com uma alvenaria constituída por blocos de betão. No entanto, a partir de uma tensão de precompressão de, aproximadamente, 0,4 MPa a alvenaria constituída por blocos de betão possui melhor comportamento quando sujeita a ações de corte. CONCLUSÕES Considerando os blocos de betão e cerâmicos utilizados neste trabalho, pode-se concluir que a alvenaria constituída por blocos cerâmicos quando não sujeita a qualquer tipo de compressão (apenas o seu peso próprio) possui um melhor comportamento inicial ao corte, quando comparada com alvenaria sujeita às mesmas condições mas constituída por blocos de betão. Este facto mantém-se até cargas de compressão de, aproximadamente, 50kN, instante em que se inverte o comportamento, obtendo-se um valor mais elevado de resistência ao corte em alvenaria constituída por blocos de betão. AGRADECIMENTOS Agradece-se às empresas Preceram S.A e Costa e Almeida, Lda, pela disponibilidade e apoio sempre manifestado em todas as fases contempladas nos projetos de investigação QREN 13312: Setivernano – Produção de tijolos térmica e estruturalmente mais resistentes por indução de nanomateriais e QREN 5456: Alvest – Desenvolvimento de soluções de paredes em Alvenaria Estrutural, nas quais se inserem estes estudos de avaliação do comportamento mecânico. Da mesma forma, agradece-se o apoio dado pela AdI com o financiamento concedido de âmbito QREN aos referidos projetos de investigação, bem como às instituições que apoiaram a realização do trabalho laboratorial. REFERÊNCIAS

[1] APICER - Associação Portuguesa da Industria de Cerâmica (2000). Manual de Alvenaria de Tijolo. [2] Gouveia, João P.; Marques, R; Maciel, I; Lourenço, PB. (2008). Manual de Avaliação e

dimensionamento em Alvenaria Estrutural. Relatório técnico Sinales, Universidade do Minho, Guimarães.

Resistência ao corte de paredes de alvenaria com blocos de betão e com blocos cerâmicos

[3] Gouveia, João P. (2000). Comportamento de estruturas de alvenaria por aplicação de acções de compressão. Dissertação para obtenção do grau de Mestre em Engenharia Civil na especialidade de Estruturas. DEC/FCTUC.

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