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Grupo de Trabalho pela Criação da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC Reserva Extrativista Marinha de Itacaré: Diagnóstico Socioeconômico e Ambiental da Área Proposta e das Comunidades Extrativistas Beneficiárias 2001

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Diagnóstico participativo para a criação de uma reserva extrativista marinha em Itacaré, Bahia, Brasil, realizado em 2001.

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Grupo de Trabalho pela Criação da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC

Reserva Extrativista Marinha de Itacaré: Diagnóstico Socioeconômico e Ambiental da Área Proposta e

das Comunidades Extrativistas Beneficiárias

2001

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Reserva Extrativista Marinha de Itacaré Diagnóstico Socioeconômico e Ambiental da Área Proposta e

das Comunidades Extrativistas Beneficiárias

Editores: Ronaldo Weigand Jr.

Rubens Lopes

Apoio:

Prefeitura Municipal de Itacaré Asperi

Colônia Z-18 Jupará

Restaurante Senzala Supermercado Estrela Supermercado Itacaré

Supermercado São Miguel Hortifruti Oliveira

Supermercado Mateus Supermercado Pituba

Supermercado Menor Preço Posto São Miguel

2001

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Ficha Catalográfica:

Weigand Jr., Ronaldo; Lopes, Rubens (editores). Reserva Extrativista Marinha de Itacaré: Diagnóstico Socioeconômico e Ambiental da Área Proposta e das Comunidades Extrativistas Beneficiárias. Itacaré: Grupo de Trabalho pela Criação da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré; Ilhéus: Universidade Estadual de Santa Cruz, 2001. 142p.

1. Reserva Extrativista, 2. Diagnóstico Rural Participativo, 3. Comunidades Pesqueiras, I. Título

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Reserva Extrativista Marinha de Itacaré Diagnóstico Socioeconômico e Ambiental da Área Proposta e

das Comunidades Extrativistas Beneficiárias

Elaboração

Comunidades Pesqueiras de Itacaré

Editores

Ronaldo Weigand Jr. – Doutorando de Antropologia/ University of Florida (Coordenador do Trabalho Participativo)

Dr. Rubens Lopes – Oceanógrafo/ UESC (Coordenador do Levantamento Biológico)

Contribuidores

Ronaldo Weigand Jr. – Antropologia e Métodos Participativos/ University of Florida

Dr. Rubens Lopes – Plâncton/ UESC

Ana Cláudia Mendes Malhado – Ecologia e Métodos Participativos

Viviane Menezes Hermida – Psicologia Comunitária e Métodos Participativos

M.Sc. Lúcio Figueiredo de Rezende – Oceanografia Física/ UESC

Sylvia M. M. Susini Ribeiro – Oceanógrafa/ UESC

Dra. Gecely R. A. Rocha – Nécton (Peixes)/ UESC

Dra. Mônica Y. Tsuzuki – Aquacultura/ UESC

M.Sc. Cíntia S. Coimbra – Algas/ UESC

Alexandre Oliveira de Almeida – Crustáceos de Água Doce/ UESC

Erminda C. G. Couto – Zoobentos/ UESC

Ana Maria Argôlo – Botânica

M.Sc. Luiz Alberto Mattos Silva – Botânica/UESC

M.SC. Ana Amélia Lavenère-Wanderley - Oceanografia Geológica/UESC

Daniela Maria Barreto Martins – Psicologia Comunitária e Métodos Participativos

Facilitadores

Ronaldo Weigand Jr. – Doutorando de Antropologia/ University of Florida

Miguel Carlos Costa – Grupo de Trabalho pela Criação da Resex Marinha de Itacaré

Ana Cláudia Mendes Malhado – Ecóloga

Viviane Menezes Hermida – Psicóloga

Brênio Silva dos Santos - Grupo de Trabalho pela Criação da Resex Marinha de Itacaré

Bárbara de C. Vasconcelos – Grupo de Trabalho pela Criação da Resex Marinha de Itacaré

João Batista Alves Viana – Grupo de Trabalho pela Criação da Resex Marinha de Itacaré

Gilmar Lopes Santos – Grupo de Trabalho pela Criação da Resex Marinha de Itacaré

Rubens Lopes – Oceanógrafo/ UESC

Sylvia M. M. Susini Ribeiro – Oceanógrafa/ UESC

Mônica Y. Tsuzuki – Oceanógrafa/ UESC

Lúcio Figueiredo de Rezende – Oceanógrafo/ UESC

Gecely R. A. Rocha – Oceanógrafa/ UESC

Cíntia S. Coimbra – Oceanógrafa/ UESC

Manuel dos Santos – Grupo de Trabalho pela Criação da Resex Marinha de Itacaré

Antônio Marcos Silva do Rosário - Grupo de Trabalho pela Criação da Resex Marinha de Itacaré

Gicélia Cosme dos Santos - - Grupo de Trabalho pela Criação da Resex Marinha de Itacaré

Ana Maria Argôlo - Bióloga

Valéria Cyrillo – Enga. Agrônoma

Ananda Marson Silva – Estudante de Biologia/ UESC

Clara Sampaio Dias – Estudante de Biologia/ UESC

Renato Seixas Vieira – Estudante de Biologia/ UESC

Diego Idi

Manoel de O. Pinto -Grupo de Trabalho pela Criação da Resex Marinha de Itacaré

Joildo Reis Soledade – Grupo de Trabalho pela Criação da Resex Marinha de Itacaré

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Índice Glossário................................................................................................................................ iii

Prefácio ................................................................................................................................. iv

1. Introdução ..................................................................................................................... 1

2. Área Proposta para a Reserva Extrativista Marinha de Itacaré ............................... 3

3. Métodos ......................................................................................................................... 5

4. Itacaré ........................................................................................................................... 7

5. Comunidades ............................................................................................................... 7

6. Recursos Naturais ........................................................................................................ 22

7. Utilização dos Recursos Marinhos .............................................................................. 34

8. Rios e Estuários............................................................................................................. 48

9. Potencial para Aquacultura ...................................................................................... 65

10. Potencial ecoturístico ............................................................................................. 68

11. Organizações de importância para a comunidade pesqueira ......................... 71

12. Conflitos e Direitos Tradicionais .............................................................................. 81

13. Históricos Participativos ........................................................................................... 89

14. Conclusões e Diretrizes para o Plano de Desenvolvimento da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré ......................................................................................... 92

Referências Bibliográficas ............................................................................................... 102

Anexo 1: Reservas Extrativistas Terrestres no Brasil. ........................................................ 107

Anexo 2: Calendário Geral de Atividades Desenvolvidas ........................................... 108

Anexo 3: Atividades de DRP Desenvolvidas em Cada Comunidade ........................ 110

Anexo 4: Amostragens realizadas no estuário do Rio de Contas ................................ 118

Anexo 5: Lista de organismos do zooplâncton encontrados em Abrolhos, típicos da Corrente do Brasil, possivelmente comuns na plataforma continental de Itacaré. . 120

Anexo 6: Resultados das amostragens de plâncton no estuário do Rio de Contas . 122

Anexo 7: Lista de espécies fitobênticas identificadas em Itacaré .............................. 127

Anexo 8: Fotos e lista das espécies de peixes coletadas em Itacaré ........................ 128

Anexo 9: Espécies do Rio de Contas citadas pela comunidade do Porto de Trás. .. 135

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Anexo 10: Lista parcial das espécies de zoobentos coletadas dentro da área proposta para a RESEX – Itacaré (nomenclatura e classificação segundo Brusca & Brusca, 1996) .................................................................................................................... 136

Anexo 11: Nomes comuns de espécies da fauna conhecidas no ecossistema do Rio de Contas próximo a Taboquinhas. ............................................................................... 140

Anexo 12: Dados biológicos adicionais sobre crustáceos decápodos da região de Taboquinhas, Itacaré....................................................................................................... 141

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Glossário Asperi: Associação dos Pescadores e Marisqueiras de Itacaré, entidade com 24 barcos B-18 financiados pelo Banco do Nordeste, e uma infra-estrutura para conservação do pescado, incluindo câmara frigorífica e fábrica de gelo.

Barco B-18: embarcação menor que o "guincho" (ver abaixo), equipada com motor diesel B-18, ou semelhante, que pode ser usada para a pesca de camarão, de rede, espinhel ou linha. Muitas vezes, é usada também para transporte de turistas.

CNPT/Ibama: Centro Nacional de Desenvolvimento Sustentado das Populações Tradicionais, do Instituto Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - Ibama. Responsável pela criação e gestão das reserva extrativistas.

Colônia Z-18: Entidade responsável pela organização e cadastramento dos pescadores e marisqueiras de Itacaré e região.

Diagnóstico Rural Participativo – DRP: método para envolver comunidades no diagnóstivo de seus problemas, identificação e planejamento de soluções, e na implementação das ações planejadas, visando o empoderamento comunitário.

Empoderamento: aumento do poder de uma pessoa ou grupo, que pode ser em relação a outras pessoas e outros grupos, em relação aos seus próprios objetivos, em relação à sua participação nos processos decisórios, etc.

Grupo de Trabalho pela Criação da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré - GT: grupo formado por pescadores e marisqueiras de Itacaré, que vem trabalhando voluntariamente desde 1999 na educação e organização da comunidade para a criação da Resex Marinha de Itacaré.

Guinchos: embarcação para a pesca industrial de camarão, equipada com tongones e guinchos para arrasto e levantamento da rede.

Normas da Reserva (Plano de Utilização): conjunto de normas e regras que guiam o comportamento dos extrativistas, seus direitos e deveres, e as penalidades aos infratores. Propostas pela comunidade, as Normas devem ser aprovadas pelo Ibama, e tornam-se parte do contrato de concessão do direito real de uso, firmando o compromisso da comunidade com o uso sustentável dos recursos naturais.

Plano de Desenvolvimento: O conjunto dos objetivos e estratégias de desenvolvimento da comunidade extrativista, que deve guiar e organizar as ações de implantação da resex.

Plano de Utilização: o mesmo que Normas da Reserva.

Resexs: reservas extrativistas, isto é, áreas pertencentes ao Estado, destinadas ao desenvolvimento sustentável de populações que vivem principalmente da extração sustentável de recursos do ambiente natural.

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Prefácio Muitas são as histórias de como tudo começou. Esta é apenas uma das versões. Houve o caso dos botos que morreram na praia, que motivou a criação da entidade Boto Negro, e também sua movimentação para a criação de uma área protegida, uma APA marinha. Depois, houve também um problema com os guinchos, e a motivação de algumas pessoas para a criação de uma reserva extrativista (Resex) marinha. Grem, dono de pousada em Itacaré, conhecia em Arraial do Cabo, onde uma resex marinha já existia, o funcionário do Ibama Fábio Fabian e o chamou para um encontro em Itacaré. A partir desse encontro, surgiu o primeiro movimento pela criação da Reserva, liderado por Grem e Professor Raimundo, na época, presidente da Associação dos Pescadores e Marisqueiras de Itacaré - Asperi. Um abaixo-assinado solicitando a Reserva foi encaminhado ao Centro Nacional de Desenvolvimento Sustentado das Populações Tradicionais - CNPT/Ibama, mas um requisito básico era a organização da comunidade. Em março de 1999, Professor Raimundo convidou Ronaldo Weigand Jr., consultor em desenvolvimento comunitário participativo, para desenvolver um trabalho nesse sentido na comunidade. Ronaldo conseguiu apoio da ONG de Cooperação Internacional Terra Nuova, da ONG Jupará, e do CNPT/Ibama. A Asperi e a Colônia conseguiram apoio de pousadas, da Prefeitura Municipal de Itacaré, do Programa de Educação Ambiental da APA de Itacaré/Serra Grande.

Em agosto de 1999, o trabalho de organização comunitária começou, com dois cursos, ministrados por Ronaldo, um em métodos participativos, para técnicos locais, e outro em liderança e organização comunitária, para pescadores e marisqueiras. Os cursos resultaram na formação do Grupo Resex, formado por pessoas da comunidade pesqueira, e um grupo de "assessores", formado pelos "técnicos", que logo se desarticulou, sendo que alguns dos seus membros (Cláudio Lôpo e Angélica) foram escolhidos pelo Grupo Resex para acompanhar o seu trabalho.

Esse movimento também passou a receber a orientação de Luiz Souto e Mera, da ONG Jupará, e do próprio CNPT/Ibama (Rafael Pinzón e Alexandre Cordeiro), em três visitas a Itacaré. Várias pessoas do Grupo Resex também visitaram a Resex de Arraial do Cabo, e puderam ver de perto uma resex funcionando. A viagem a Arraial do Cabo recebeu apoio da comunidade e do comércio de Itacaré, e do Jupará, entre outros. Em fevereiro, criou-se então o Grupo de Trabalho pela Criação da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré, formado por pescadores, marisqueiras e pelos assessores que já acompanhavam o Grupo Resex.

Também em fevereiro de 2000, Ronaldo contatou o Núcleo de Oceanografia da UESC e propôs o seu envolvimento no diagnóstico participativo e laudo biológico da Resex. A proposta foi recebida com entusiasmo pelos professores e pesquisadores da UESC que aos poucos foram se envolvendo com a Reserva e sua proposta participativa.

A tarefa principal do Grupo de Trabalho na época era educar a comunidade pesqueira a respeito da Resex e também aplicar os questionários que deveriam ter

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sido usados para elaborar um diagnóstico socioeconômico e ambiental. Mais de 250 questionários foram aplicados nas várias comunidades de Itacaré. Também foram promovidas várias reuniões para a discussão da Resex, inclusive com a apresentação do Grupo de Teatro Casa do Boneco, com apoio e orientação do Jupará. Além disso, o GT se envolveu na proteção ambiental da área da futura Reserva Extrativista Marinha de Itacaré.

Em setembro de 2000, Ronaldo retornou a Itacaré e começou a orientar um processo de diagnóstico participativo da Resex. Em janeiro de 2001, depois de um período de dificuldades, ficou clara a necessidade de apoio e de apressar o laudo biológico e a criação da Reserva. A credibilidade do processo junto à comunidade estava em jogo. Felizmente, uma série de apoios foi conseguida. O Núcleo de Estudos Oceanográficos da UESC conseguiu recursos junto à Reitoria da Universidade para as visitas a campo. Os professores e estagiários da UESC, sob a coordenação do Prof. Rubens Lopes, dedicaram-se ao trabalho com grande entusiasmo e sensibilidade.

Para ajudar na organização das reuniões comunitárias e elaboração de relatórios, Ronaldo colocou um aviso na Internet solicitando voluntários para ajudar no trabalho de diagnóstico participativo nas comunidades. Várias pessoas se candidataram, e foram selecionadas a ecóloga Ana Cláudia Mendes Malhado, e as psicólogas Viviane Hermida e Daniela Maria Barreto Martins, que doaram seu tempo à comunidade pesqueira de Itacaré, e cuja dedicação foi essencial ao trabalho. Apoio também foi conseguido junto ao comércio local de Itacaré. O Apoio do Restaurante Senzala foi chave para a participação das voluntárias, e importante para a participação da equipe da UESC. Para as reuniões comunitárias, os supermercados de Itacaré (Estrela, Itacaré, São Miguel, Oliveira, Mateus, Pituba, e Menor Preço) contribuíram com doações de alimentos. A Colônia Z-18 e, especialmente, a Asperi contribuíram com recursos e apoio político. Finalmente, Ronaldo contribuiu com recursos próprios, abrindo sua casa às voluntárias, doando seu trabalho à Resex, e pagando vários dos custos do trabalho.

Um aspecto essencial de todo esse trabalho tem sido a persistência e dedicação dos pescadores e marisqueiras do Grupo de Trabalho pela Criação da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré. Esse grupo tem aprendido a negociar diversos apoios, conduzir reuniões, e tomar difíceis decisões sobre os rumos da Reserva. É o GT que coordena esse trabalho, através de reuniões semanais, dedicando tempo e recursos próprios. Hoje o GT é formado por Catu, Bárbara, Breno, Batista, Gilmar, Celinha, que realizam a maior parte dos trabalhos de campo, e de outras pessoas que ajudam nas discussões sobre os rumos do trabalho, como Pedro (Asperi), "Bob Marley" e "João Doido".

Graças a esses esforços todos, temos este relatório, um retrato da comunidade pesqueira de Itacaré. Não é um retrato perfeito, pois foi feito com poucos recursos, mas é um bom retrato, que servirá tanto para a criação da Resex quanto para orientar um plano de desenvolvimento da comunidade.

Itacaré, 31 de abril de 2001

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1. Introdução A base principal de sustentação das comunidades pesqueiras da costa da Bahia é a pesca de peixes, camarões, lagostas, caranguejos e outras espécies marinhas. Pescadores e marisqueiras obtém esses recursos nos manguezais, baías e em mar aberto, ambientes que têm diferentes graus de conservação de acordo com a região. A atividade pesqueira é de grande importância para a Bahia, empregando cerca de 40 mil pescadores e mais de nove mil embarcações (MMA, 1998). Apesar disso, poucos são os estudos do potencial pesqueiro do Estado, principalmente para o litoral sul.

A pesca realizada em Itacaré, assim como em todo o litoral da Bahia, é essencialmente artesanal. A Figura 1 mostra os territórios tradicionais de pesca artesanal do sul da Bahia, segundo Cordell (1989).

Segundo os dados do MMA (1998), a produção de pescado marítimo e estuarino no Estado da Bahia, no ano de 1998, atingiu cerca de 41 mil toneladas. De acordo com a mesma fonte do MMA, a arte de pesca mais utilizada, isto é, responsável pela maior parte da captura de peixes, é a linha. A pesca do camarão, realizada com redes de arrasto, também apresenta grande importância. Não existem dados de captura por espécie, mas por categoria, isto é, espécies diferentes agrupadas pelo mesmo nome popular. As categorias de peixes mais capturadas são os cações, xaréus, badejos, cavalas, bonitos e arraias. As espécies costeiras mais valorizadas são as capturadas com linha, em substratos de cascalho ou próximas de afloramentos rochosos, tais como badejos, robalos, ciobas, dentões e vermelhos.

Na maior parte, os recursos pesqueiros da Bahia já se encontram degradados devido à superexploração e ao uso de práticas nocivas, como a pesca com explosivos. Diversas áreas de manguezais, berçários de grande parte das espécies marinhas, encontram-se ameaçados de ocupação e degradação. Em mar aberto, a pesca industrial tem sido especialmente nociva, com barcos de pesca de camarão equipados com guinchos e tongones destruindo o fundo do mar com suas redes de arrasto. A cada ano, esse processo tem destruído, mundialmente, uma

Figura 1: Territórios pesqueiros do sul da Bahia (Fonte: Cordell 1989)

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área equivalente a metade da plataforma continental no planeta, uma área 150 vezes maior que a área de florestas destruída a cada ano (Mayell 1998). A competição feita por esses barcos maiores, normalmente vindos de outras regiões, tem causado a queda da produção dos pescadores tradicionais e, conseqüentemente, a queda de sua renda e o estímulo ao uso de métodos mais predatórios. A biodiversidade e a produtividade dos ecossistemas marinhos estão ameaçadas. Em conseqüência, além da população de baixa renda que está sendo diretamente prejudicada pela degradação dos recursos pesqueiros, outros setores da economia regional, como o turismo, podem sofrer com a falta de pescado e mariscos que são a base principal da atrativa culinária regional.

A criação de reservas extrativistas marinhas na região tem sido proposta como uma estratégia para promover a conservação dos recursos naturais e a melhoria da qualidade de vida das comunidades pesqueiras. De acordo com a Lei do SNUC (lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, Art. 18),

A Reserva Extrativista é uma área utilizada por populações extrativistas tradicionais, cuja subsistência baseia-se no extrativismo e, complementarmente, na agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte, e tem como objetivos básicos proteger os meios de vida e a cultura dessas populações, e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da unidade.

Ainda, segundo o parágrafo primeiro do mesmo artigo, a reserva extrativista é de domínio público, com uso concedido às populações extrativistas tradicionais.

As reservas extrativistas mais conhecidas incluem populações e ecossistemas florestais da Amazônia, onde ultrapassam 5,6 milhões de hectares (incluindo reservas federais, estaduais e assentamentos extrativistas - ver Anexo 1). O conceito nasceu da luta das populações tradicionais da Amazônia contra a expropriação e o desmatamento de suas terras (Allegretti 1989, 1994). Nos ecossistemas marinhos/estuarinos, já existem cinco reservas extrativistas federais criadas, em Arraial do Cabo (RJ), em Pirajubaé (SC), Aquiraz (CE), e duas na Bahia, na Baía de Iguape e Corumbáu (Prado). Outras reservas extrativistas estão em processo de criação pelo Centro Nacional de Desenvolvimento Sustentado das Populações Tradicionais - CNPT, do Instituto Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - Ibama, sendo a de Itacaré uma delas (Tabela 1).

O objetivo deste diagnóstico foi subsidiar o processo de criação da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré, servindo de documento básico para a caracterização social, econômica e ecológica da área da futura Reserva. Ao involver a comunidade nessa caracterização, o diagnóstico também identificou participativamente os problemas e as oportunidades de desenvolvimento da comunidade pesqueira de Itacaré, subsidiando também a elaboração do Plano de Desenvolvimento e das Normas da Reserva (Plano de Utilização), já em andamento em Itacaré.

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Tabela 1: Reservas extrativistas marinhas em criação (fonte: adaptado de dados do CNPT/Ibama, 2000) Nome da Reserva Município Estado Número de famílias Área (ha) Estudos iniciais Alcobaça Alcobaça BA 400 Em medição Augusto Correia Augusto Correa PA 250 Em medição Bragança Bragança PA 700 Em medição Curuçá Curuçá PA 600 Em medição Maracanã Maracanã PA 300 Em medição Santarém Novo Santarém Novo PA 200 Em medição São João da Ponta São João da Ponta PA 350 Em medição Itaipu Niterói RJ 400 Em medição Mata Norte Igarassu/Goiana PE 420 Em medição Estudos em andamento

Itacaré Itacaré BA 280 Em medição Soure Soure PA 278 128.000 Decretadas nos últimos dois anos

Baía do Iguape Maragogipe BA 903 96.000 Batoque Aquiraz CE 135 6.678 Corumbau Prado BA 260 38174

2. Área Proposta para a Reserva Extrativista Marinha de Itacaré

A comunidade pesqueira de Itacaré propõe que a Reserva Extrativista seja criada abrangendo toda a costa de Itacaré e a extensão do Rio de Contas dentro do Município até a comunidade de Porto das Farinhas.

No limite norte, a Resex deverá abranger todo o estuário do Rio Piracanga, incluindo todo o trecho onde há influência das marés, isto é, todo o Riacho Chibum, o Rio Piracanga até a propriedade do Sr. Douglas e o Riacho Tiririca até a ponte da estrada que liga Itacaré a Maraú (ver mapa participativo da região de Piracanga, (Figura 5). Nas duas margens dos cursos d'água citados, a Reserva deverá abranger todas as áreas de marinha, tanto do lado de Itacaré como de Maraú. Isso se justifica, pois o estuário do Rio Piracanga é um berçário natural de espécies marinhas, além de ser uma área de grande beleza, cada vez mais cobiçada com o desenvolvimento turístico de Itacaré, e que merece a proteção da Resex. A população residente do lado de Maraú que utiliza regularmente os recursos da futura Reserva tem sido envolvida nas discussões e reuniões de diagnóstico. A área incluirá também um grande alagadiço, formado por manguezais e campos alagados, e também as áreas de marinha que margeiam o alagadiço, cobertas de mata de restinga. Somente com a inclusão dessa área, o Rio Piracanga poderá ser

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preservado para as gerações futuras. A comunidade de Piracanga está envolvida no processo de criação da Resex, e esta representará para ela também segurança frente às tentativas de expulsão da comunidade local (ver adiante neste relatório).

Na praia que vai do Pontal a Piracanga, há uma ampla área de restinga em rápida formação. A avaliação sobre o domínio da União sobre esta área deve levar em conta não apenas a distância da maré, mas também que a área está em crescimento, ou seja, avança sobre o mar.

Da mesma forma que o estuário do Rio Piracanga, todos os rios e riachos onde houver penetração da maré, formando estuários, deverão ser incluídos até o ponto de influência da maré. Isso é justificado pela importância dessas áreas para a ecologia marinha e para os extrativistas de Itacaré. Por exemplo, no Rio Jeribucaçu, há uma área considerável de manguezais pouco explorados. As áreas de marinha nesses locais deverão também ser incluídas na Reserva.

No limite sul, a reserva deverá excluir o estuário do Rio Tijuípe, alcançando somente a praia até a margem norte da foz deste rio. Isso se justifica pois, apesar do estuário do Tijuípe também ter grande importância ecológica, a sua inclusão faria necessária a articulação e organização dos pescadores e marisqueiras de Itacaré com os de Serra Grande, que também utilizam bastante este rio. Essa organização, no momento, é difícil do ponto de vista social e político e atrasaria a implementação da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré.

Em toda a extensão da Reserva, é muito importante a inclusão das áreas de marinha, para garantir os seguintes pontos:

Manutenção e/ou retomada do acesso dos pescadores e marisqueiras aos seus pesqueiros tradicionais, que têm sido fechados pelos fazendeiros, novos proprietários e empresários do setor turístico que se estabelecem no local.

Manutenção e/ou retomada dos "portos de jangadas" tradicionais, estabelecidos em Piracanga, Jeribucaçu e Itacarezinho.

Preservação da linha da costa e dos aspectos paisagísticos do litoral de Itacaré, ameaçados pelo desenvolvimento desordenado da área, e pelo projeto de lei nº 617/99, que, se aprovado, transferirá a titularidade dos terrenos de marinha ao Município, podendo permitir que esses terrenos sejam utilizados de forma eleitoreira, sem consideração com o meio ambiente ou com o direito das populações locais. O mesmo projeto de lei prevê também a redução da área de marinha de 33 para 13 metros, o que representa grande perigo para a conservação de tartarugas, restingas e da paisagem em geral.

Reversão do processo de privatização das praias, em curso no Município, em que o acesso a muitas praias tem sido cobrado pelos proprietários das terras adjacentes, mesmo quando feito por caminhos tradicionais, ferindo o estabelecido na legislação federal.

Proteção às tartarugas marinhas, que desovam principalmente nos terrenos de marinha das praias de Piracanga e Itacarezinho.

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Proteção aos estuários de pequenos rios e riachos, onde ocorrem pequenos manguezais que, por sua raridade na região, são também importantes para a manutenção da produtividade pesqueira e da biodiversidade. Na praia de Itacarezinho, especialmente, os pequenos rios e riachos deram origem a pequenas restingas e manguezais. As restingas já estão começando a ser ocupadas por casas e empreendimentos turísticos. A vegetação nativa, apesar de já ser protegida por lei, vem também sendo descaracterizada com novos plantios de côco e pelo "paisagismo" dos proprietários locais.

Manejo sustentável das áreas de marinha, com a aplicação das Normas da Reserva aos extrativistas que fizerem uso dos recursos presentes nessas áreas, como o guaiamum, por exemplo.

Assim, além dos terrenos de marinha junto às praias, a Reserva deverá abranger também os rios e riachos, e os terrenos de marinha nas suas margens, até o ponto em que há influência das marés, conforme a Legislação Brasileira. O mesmo vale para os riachos afluentes do Rio de Contas. Todas as áreas de marinha nas margens do Rio de Contas deverão ser incluídas, sendo que a maré influencia o rio até o salto do "Pé da Pancada", pouco acima de Taboquinhas. Os extrativistas cujas residências estejam localizadas nesses limites da Reserva poderão continuar no local, desde que obedeçam às Normas da Reserva (Plano de Utilização). Um levantamento detalhado é requerido para determinar quais são as áreas que efetivamente pertencem à União (terrenos de marinha), para sua inclusão na Reserva.

A partir da costa, a faixa de mar a ser incluída na Reserva compreende os seguintes limites:

Até oito milhas náuticas a leste da costa, em frente à foz do Rio Piracanga (S14°13'05,3);

Até oito milhas náuticas a leste da costa, em frente ao Cabo da Tromba (S14°17'36);

Até oito milhas náuticas a leste da costa, em frente à desembocadura do Rio Tijuípe (S14°26'20).

No Rio de Contas, a Reserva deverá abranger todo o trecho desde a sua foz no mar até a localidade de Porto das Farinhas, trecho no qual os pescadores de Itacaré predominam e onde os conflitos com pessoas de outros municípios que vierem a querer pescar na área serão menores.

3. Métodos O trabalho de diagnóstico foi baseado no Diagnóstico Rural Participativo – DRP, um método para envolver comunidades no diagnóstivo de seus problemas, identificação e planejamento de soluções, e na implementação das ações planejadas, visando o empoderamento comunitário. O DRP é definido por Robert Chambers (1994) como uma "família crescente de abordagens e métodos para capacitar pessoas locais (rurais e urbanas) para expressar, fortalecer, compartilhar, e analisar seu conhecimento de vida e condições locais, a planejar e a agir". O

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método vem sendo aplicado mundialmente, com ótimos resultados e, por isso, tem sido recomendado por diversas agências de desenvolvimento. O objetivo final do DRP é empoderar as comunidades na gestão do seu desenvolvimento.

Foram realizadas reuniões de DRP e visitas nas seguintes comunidades:

Comunidades urbanas:

Porto de Trás

Banca do Peixe

Forte

Passagem/ Marimbondo

Comunidades rurais:

Piracanga

Itacarezinho

Campo Seco

Comunidades ribeirinhas próximas a Itacaré

Comunidade urbana/rural:

Taboquinhas (inclui sub-comunidades urbanas e rurais no distrito de Taboquinhas).

O calendário das atividades realizadas encontra-se no Anexo 2. Em todas as comunidades, foram promovidos mapas participativos dos recursos naturais e dinâmicas de grupo. Em boa parte, também foram promovidos os seguintes exercícios de DRP: diagrama institucional, pirâmide social, histórico dos recursos naturais e mapa participativo da comunidade. As atividades realizadas em cada comunidade estão detalhadas no Anexo 3.

Paralelamente ao DRP nas comunidades, uma equipe de pesquisadores do Núcleo de Estudos Oceanográficos (NEO) da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), além de participar de reuniões de diagnóstico participativo em comunidades representativas do uso dos recursos naturais da área da futura Reserva Extrativista Marinha de Itacaré, desenvolveu procedimentos de campo para a coleta e identificação de material biológico. As comunidades pesqueiras da Banca, do Forte e do Porto de Trás foram envolvidas na coleta de espécimes de peixes e outros organismos para identificação. A equipe da UESC também acompanhou desembarques de peixes nessas comunidades. Os espécimes de grande porte (devido ao seu maior valor econômico) foram apenas fotografados, e os de pequeno porte foram doados pela comunidade para identificação em laboratório. Além disso, os pesquisadores da UESC fizeram visitas de campo e coletas em Piracanga, no estuário do Rio de Contas, nos costões rochosos e corais entre o Farol e a Praia da Ribeira, na Praia de São José e no trecho do Rio de Contas a montante de Taboquinhas (do Pé da Pancada à Cachoeira do Fumo). Apesar dessas coletas não terem representatividade estatística, elas forneceram uma lista inicial das espécies ocorrentes na área. O envolvimento da comunidade possibilitou a larga abrangência do levantamento em termos de área, além do conhecimento popular

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sobre as espécies e os ecossistemas de onde foram coletadas. O DRP desempenhou um papel chave no envolvimento das diferentes comunidades na coleta do material biológico.

4. Itacaré O município de Itacaré está localizado no litoral sul da Bahia, sendo a sede a 70 km ao norte de Ilhéus, e tem uma área de 730 km2. De acordo com os dados preliminares do Censo 2000, o município tem 18.105 habitantes, sendo 7.942 moradores da zona urbana, e 10.163 da zona rural. Há 60 estabelecimentos de ensino fundamental, com 4.144 matrículas, e somente um estabelecimento de ensino médio. Há também somente um hospital.

O clima úmido fez Itacaré e sua região propícios para a lavoura de cacau, sendo que Itacaré já foi um importante porto exportador. Contudo, nos anos 90, a doença vassoura-de-bruxa destruiu as roças de cacau, deixando boa parte da população desempregada. A economia do município passou então a basear-se na pesca e no turismo que, com o asfaltamento da BA-001, estrada que liga Itacaré a Ilhéus, recebeu um novo impulso. O projeto turístico de Itacaré tem forte ênfase no chamado "ecoturismo", sendo que a própria Área de Proteção Ambiental Itacaré/ Serra Grande, criada em 1993, tem um forte direcionamento para conservar as paisagens de que o turismo depende.

A implementação da APA enfrentou muita resistência por parte da população local. De um lado, veio a impedir parcialmente a atividade de madeireiros na região, e a disputar poder com os canais estabelecidos de decisão. Por outro, a APA colocou também limites às ações de pequenos produtores e da população carente, cujo uso da natureza sempre foi uma forma de vencer a sua situação de pobreza. A forma como a APA foi criada e implementada recebe muitas críticas da população local, que faz acusações de autoritarismo, hipocrisia e falta de participação. Com a Reserva Extrativista, um dos desafios foi vencer a desconfiança da população local e desenvolver um trabalho reconhecidamente participativo.

5. Comunidades Como foi dito acima, o diagnóstico participativo envolveu atividades e visitas em nove comunidades pesqueiras do Município de Itacaré (incluindo uma na divisa com Maraú). Entretanto, a divisão da população pesqueira de Itacaré como um todo nessas nove comunidades foi realizada pelo Grupo de Trabalho pela Criação da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré, em função das afinidades e da identidade percebidas entre as pessoas de diversos locais e da conveniência dessa divisão para a realização do diagnóstico participativo e para o trabalho de organização comunitária. Por exemplo, Marimbondo e Passagem são dois bairros de Itacaré, e foram tratados como sendo uma só comunidade. O próprio bairro do Marimbondo pode ser subdividio em Marimbondo, Nova Brasília, e outros. Isto é, a divisão em comunidades aqui descrita reflete uma decisão do Grupo de Trabalho, de acordo com sua vivência em Itacaré e com as possibidades de tempo e recursos

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do trabalho participativo, e não uma divisão necessariamente natural. Um outro limite deste diagnóstico foi a diferença no nível de detalhes da descrição de cada comunidade. Isso reflete tanto as características das comunidades (algumas são mais "compactas", fáceis de descrever que outras), quanto o tempo de diagnóstico, composição do grupo de facilitadores e tipos de ferramentas de pesquisa do DRP que puderam ser utilizadas. Ainda, falta fazer um trabalho mais intenso nas comunidades ribeirinhas do Rio de Contas.

5.1 - Comunidades urbanas:

5.1.1 - Porto de Trás

O Porto de Trás é a comunidade de pescadores e marisqueiras mais tradicional de Itacaré. Ela preserva seu próprio folclore, tem uma organização social marcante e continua a praticar as modalidades de pesca mais tradicionais. Contudo, é também uma das comunidades mais pobres e com maior carência de saneamento básico.

A população do Porto de Trás é composta por cerca de 99 homens, 103 mulheres, 113 meninos e 87 meninas (das 114 casas do bairro identificadas, não há dados completos para 20 casas). A maior parte dos moradores é de descendência africana e nasceu no próprio bairro, mas algumas pessoas tiveram passagem por outras regiões do país. Alguns moradores descrevem seu bairro como uma "aldeia", por ser "fechado", seus habitantes casarem-se entre si e ainda haver poucas pessoas de fora morando lá.

A maioria dos moradores do Porto de Trás vive do trabalho informal, da pesca e da mariscagem. A mariscagem não é vista como uma profissão digna por muitos, e as pessoas hesitam antes de admitir a identidade de "marisqueira/o". Um dos problemas é a irregularidade da quantidade pescada ou coletada. Das mulheres, algumas são donas-de-casa e outras são marisqueiras, empregadas e trabalhadoras do turismo (arrumadeiras, camareiras, cozinheiras, etc.). Entre os homens, boa parte é composta de pescadores. O trabalho braçal e o de segurança/vigia são ocupações comuns. Alguns meninos vendem peixes, geladinho e já trabalharam com limpeza e pintura de ruas. Existem várias pessoas idosas que vivem de pensão ou aposentadoria. Uma parte da população está desempregada, mesmo no verão, quando o maior movimento turístico abre oportunidades de emprego na cidade.

Devido à sua atividade principal no estuário do Rio de Contas, as marisqueiras e pescadores do Porto de Trás são considerados, neste relatório, especialistas em termos de conhecimento popular a respeito dos recursos naturais nessa área.

Figura 2: Rua 16 de Dezembro, principal ruado Porto de Trás, onde se concentram ascasas de alvenaria. O esgoto corre pelolado direito da rua, a céu aberto.

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Na área social, as moradoras do bairro têm orgulho de não terem problemas de "encaminhamento" (comportamento) de seus filhos, sendo que os que andam "fora da linha" (envolvidos com drogas ou criminalidade) são moradores novos ou de fora do bairro. Um morador disse que, quando isso acontece, eles "tomam conta disso" lá mesmo, ou seja, a comunidade se junta para castigar as pessoas com comportamento delinqüente, sem recorrer às autoridades. Isso tem preservado a comunidade desses problemas.

O Porto de Trás apresenta um folclore rico, representado nas danças e bandas locais, no "bicho caçador1", no maculelê

e na capoeira. Suas manifestações folclóricas têm sido valorizadas pelo turismo, como foi o caso da apresentação recente do "bicho caçador" no Ecoresort/ Vilas de São José.

O bairro do Porto de Trás tem vários problemas de infra-estrutura. O principal está relacionado com esgotamento sanitário. Não há rede de esgotos e poucas são as casas com fossas (cerca de 20, das 114 identificadas no mapa participativo). As outras têm seu esgoto despejado a céu aberto, que escorre em valas que vão se unindo até desaguar na parte mais baixa, a Baixa da Gia, onde existem várias casas novas. Os esgotos são, muitas vezes, despejados logo atrás da casa vizinha. Em muitas casas, não há banheiros. Assim, a infra-estrutura necessária para resolver o problema de esgoto não é apenas a rede coletora, mas inclui também, em boa parte das casas, o banheiro com vaso sanitário.

Aparentemente, as casas localizadas nas áreas mais altas deveriam ser as primeiras a serem envolvidas em um programa de esgotamento sanitário, pois são as de baixo que recebem os esgotos das de cima (se começar por baixo, as obras vão ter pouco efeito na qualidade de vida das pessoas). A situação do esgoto na Baixa da Gia é sem dúvida a mais grave. Lá existe um número maior de valas/córregos com esgoto. É uma área perigosa para crianças, pois o caminho é em boa parte feito de pinguelas e pontes improvisadas sobre as valas de esgoto e água de chuva.

Além disso, uma das casas que está sendo reformada na Rua 16 de Dezembro pode ameaçar soluções futuras para o esgotamento do bairro, pois a nova construção

1 O "Bicho Caçador" é uma encenação de uma caçada, com pessoas fantasiadas de animais selvagens, com caras assustadoras, e de caçador, sem cara. Um cortejo acompanha os atores, que visitam as casas das pessoas importantes da cidade, e lá encenam a luta entre o bicho e o caçador, tudo acompanhando de cântigos, batucada e samba de roda. O final da apresentação se dá no Porto de Trás, onde ou o caçador mata o bicho, ou este mata o caçador. Depois do desfecho da luta, o samba de roda continua a noite inteira.

Figura 3: Entrada para a Rua da Jamaica,mostrando a falta de calçamento e oesgoto correndo a céu aberto, na partecentral da rua

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está sendo feita sobre onde a água escoa de um lado do Bairro para a Baixa da Gia. A falta de saneamento básico no bairro representa um grande perigo à saúde pública, especialmente para as crianças, que adoecem em contato com o esgoto.

Quanto ao abastecimento de água, todas as casas do Porto de Trás estão de alguma forma conectadas à rede pública de água. Algumas estão com o abastecimento cortado por falta de pagamento, outras têm ligações irregulares na rede pública.

O Bairro recebe energia elétrica e tem iluminação pública na rua principal. As casas da Baixa da Gia não estão diretamente ligadas à rede elétrica, mas se utilizam de ligações a casas de parentes e outros na rua de cima. Falta iluminação pública na Baixa da Gia e na Rua da Jamaica, onde há postes mas não há lâmpadas.

O Bairro não possui telefones públicos. Para telefonar, os habitantes têm que ir a outros bairros e não podem receber chamadas. O telefone já foi pedido várias vezes à TeleBahia (hoje Telemar), mas a empresa teria alegado que os custos são muito elevados.

Quanto a habitação, as casas da rua principal (R. 16 de Dezembro) do Bairro são na maioria construídas parede a parede, coladas, sem qualquer espaço separando-as. Houve dois registros de falta de moradia. A Baixa da Gia é uma área nova de ocupação e há pessoas no bairro que esperam poder ter um lote lá, com "ajuda do Prefeito". Na Baixa da Gia e outras áreas novas do bairro se concentram as casas de madeira, algumas vezes mais precárias. As casas de alvenaria se concentram nas partes mais antigas (R. 16 de Dezembro).

Somente a rua principal do Porto de Trás é calçada. As outras não são propriamente ruas, mas sim caminhos precários, cheios de valas onde corre esgoto e sem condição de trafegabilidade (Figuras 2 e 3).

A coleta de lixo no Porto de Trás é feita duas vezes por dia. Mesmo assim, às vezes o lixo é jogado por moradores no porto, onde se acumula também lixo trazido pelo rio. Recentemente, porém, um grupo de moradores do Bairro fez a coleta do lixo espalhado nas margens do rio.

O Bairro tem uma área comunitária, onde são feitas reuniões, e onde há uma televisão para uso da comunidade. Segundo "Bob Marley", presidente da Associação dos Moradores do Porto de Trás (AMPT), 80% dos moradores do Bairro são associados à entidade, que tem cerca de 80 sócios, embora apenas alguns paguem a taxa de R$ 2,00 mensais. Essa estimativa é provavelmente um pouco exagerada, pois é fácil de encontrar moradores não associados. A Associação, entre outras funções, mantém e administra também as canoas utilizadas pelos moradores nas pescarias e mariscagem, que só podem ser usadas por pessoas quites com as mensalidades.

Agentes de saúde visitam o bairro, pesando e medindo as crianças, distribuindo soro, e dando orientações. Haviam opiniões discordantes a respeito da atuação dos agentes de saúde. Aparentemente, as avaliações dos agentes de saúde que caracterizam as crianças como subnutridas incomodam a comunidade, pois não há muitos meios de solução para o problema dadas as condições de vida locais.

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Alguns moradores apontaram que os agentes de saúde não visitam a Baixa da Gia com a mesma regularidade da rua principal do Bairro.

Não há igrejas ou locais de culto no Bairro. Há católicos, evangélicos e um bom número de pessoas praticantes do Candomblé.

5.1.2 - Banca do Peixe

A Banca do Peixe é uma comunidade complexa, pois é composta de pessoas que nem sempre são vizinhas e, como pescadores, não possuem uma identidade comum relacionada com o bairro onde moram, mas sim com o lugar de onde partem para o mar e onde vendem o peixe: a Banca do Peixe. Dessa forma, o detalhamento da situação de infra-estrutura da comunidade (esgotos, habitação, saúde, etc.) ficou bastante difícil, pois os membros da comunidade da Banca moram em condições bastante diversas, em bairros como o Centro, Pituba, Marimbondo e até mesmo o Porto de Trás, apesar de compartilharem esse espaço em comum: a Banca do Peixe.

É nas proximidades da Banca que também acontece boa parte das interações sociais, principalmente dos homens, que têm lá uma extensão de sua casa. É comum ficarem por lá depois da pescaria, jogando cartas, descansando, "tomando a fresca" na rampa à noite ou junto à barraca de "Seu" Osvaldo, e jogando conversa fora. Também é lá que a maioria entrega os peixes para venda aos camelôs, como "Marcapasso" e "Tonho do Bicho". Muitos também consertam lá suas redes.

São cerca de 100 os pescadores diretamente ligados à Banca do Peixe, quase todos homens, que desenvolvem suas atividades de pesca ou junto à foz do Rio de Contas, em canoas, ou no mar, em barcos motorizados, onde a pesca de peixes e, sazonalmente, lagostas, é predominante. A maior parte dos pescadores da Banca são nativos de Itacaré. Muitos são fundadores (como "Seu" Ízio) ou filhos dos fundadores da Colônia Z-18.

Assim, os pescadores da Banca são os que mais se identificam com a Colônia Z-18. Embora a Colônia devesse representar todos os pescadores de Itacaré e região, a identificação desta com os pescadores da Banca também é grande. Então, em termos de organização social, a Colônia é o principal canal para os pescadores da Banca. Ao contrário dos membros de outras comunidades, como o Forte e o Porto de Trás, os pescadores da Banca não têm uma organização de representação local. Têm somente a organização de representação regional, isto é, a Colônia. Entretanto, são inúmeras as queixas dos pescadores em relação à entidade (ver seção sobre a Colônia Z-18, abaixo). Além disso, enquanto outras comunidades se organizaram ou estão se organizando para contornar os atravessadores, como o Forte (através da Asperi) e o Porto de Trás (através da AMPT), os pescadores da Banca entregam seu pescado a atravessadores e não há planos por parte da diretoria da Colônia naquele sentido.

Uma outra particularidade da Banca é que, enquanto no Porto de Trás homens e mulheres estão envolvidos com a pesca, a Banca é mais complexa também nesse sentido. As esposas dos pescadores desenvolvem diferentes atividades, sendo funcionárias públicas, comerciantes, lavadeiras, faxineiras, etc., e até mesmo

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pescadoras e marisqueiras (um trabalho específico deve ser realizado para detalhar a situação das mulheres da Banca e outras comunidades).

Quanto a religião, da mesma forma que no Porto de Trás, há católicos, evangélicos e adeptos do Candomblé.

5.1.3 - Forte

A comunidade do Forte é complexa como a da Banca, pois os pescadores de lá também moram em diferentes bairros da cidade e muitas das mulheres também desenvolvem atividades diversificadas não relacionadas à pesca. Mas há uma série de diferenças.

No Forte, boa parte dos pescadores não são de Itacaré, mas vieram de municípios e comunidades vizinhos, como Barra de Carvalhos, Barra de Serinhaém e Valença, e se estabeleceram em Itacaré há alguns anos. Mas há também um bom número de visitantes temporários, que vêm para Itacaré na estação da lagosta, ou quando dá camarão, e pescam em barcos pequenos, como os pescadores locais. Há também os pescadores empregados nos guinchos, muitos de Ilhéus. Uma estimativa mínima do número de pescadores do Forte (locais, isto é, moradores de Itacaré) pode ser dada multiplicando-se o número de barcos da Asperi (24) por uma tripulação de três pessoas, o que dá 72. Somando-se a isso, considerando-se as pessoas que pescam a partir das margens do rio no Forte, as pessoas associadas à pesca (comercialização e beneficiamento), ao turismo, e pescadores independentes, podemos concluir que cerca de 120 famílias estão ligadas ou fazem parte dessa comunidade.

Como apontado acima, uma organização muito presente é a Asperi (ver seção específica, adiante) que representa 34 sócios, 24 deles com barcos financiados pelo Banco do Nordeste com aval da Associação. Através da Asperi, eles fazem a comercialização conjunta do pescado, apesar de no Forte estarem presentes atravessadores, como Joel, Gordo, Val e Geraldo (este último, dono de guinchos; nenhum deles é nativo de Itacaré). Um limite da Asperi é que determinou um número máximo de 50 sócios. No momento, com 34 sócios, há 16 vagas, o que é insuficiente para atender a todos.

Como muitos pescadores do Forte não são nativos, essa comunidade não domina o conhecimento sobre o mar de Itacaré da mesma forma que os pescadores da Banca, mas é especialista na pesca de arrasto e na lama onde o camarão ocorre.

Figura 4: Vista do porto na comunidadedo Forte, mostrando guinchos (àesquerda) e barcos B-18 (à esquerda).

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5.1.4 - Passagem/ Marimbondo2

O bairro do Marimbondo é uma comunidade urbana, formada por pescadores, marisqueiras, comerciantes, pousadeiros e outros. A Passagem é uma comunidade semelhante, porém, com mais problemas de urbanização e pobreza que o Marimbondo, por ser mais recente. Esses são os dois bairros mais populosos de Itacaré. A Passagem, especialmente, tem crescido muito, com pescadores e moradores de outros bairros que, com a expansão do turismo na cidade, mudaram-se do Centro em busca de moradias menos valorizadas. Isso, porém, tem valorizado os terrenos no bairro. Mas a infra-estrutura dos dois é ainda precária, especialmente a rede de esgotos, que não existe.

Os pescadores e marisqueiras do Marimbondo e da Passagem pescam tanto no rio como no mar, em canoas e barcos motorizados. Dessa forma, tanto quanto os do Porto de Trás, são especialistas nos recursos naturais do estuário, mas seu conhecimento abrange também uma área um pouco mais distante da foz que o do Porto de Trás. Isso ocorre porque há várias pessoas que são proprietárias ou posseiras de pequenas áreas rio acima. Além disso, há vários pescadores com bom conhecimento sobre o mar de Itacaré.

Recentemente, um número cada vez maior de pescadores tem se dedicado ao turismo, levando os visitantes em passeios pelo manguezal ou até a Cachoeira do Cleandro, em canoas ou barcos motorizados.

Os dois bairros têm vários problemas de saneamento básico. Todas as ruas dos bairros têm rede de água. Entretanto, não existe rede de esgoto. Em várias ruas o esgoto corre a céu aberto, na frente das casas, ameaçando a saúde dos moradores. Em outras, o esgoto corre por trás das casas, e deságua nos ribeirões e riachos que cortam os bairros. Esses cursos d’água foram, no passado, importantes para as comunidade, pois a sua água era usada para beber, lavar roupa e tomar banho. Um dos pontos em que isso acontecia, próximo ao Domingos do Boi, contava com uma organização de seu uso, pela própria comunidade, com uma parte para os homens e outra para as mulheres tomarem banho, e um local designado para lavar roupa. Hoje, o local se encontra completamente poluído e esse uso desapareceu. Um dos riachos mais problemáticos vem da Maternidade e foi polêmica a informação de que a Maternidade tem uma fossa (muitos acreditavam que não, que o esgoto hospitalar iria direto para o regato). Isso merece mais investigação, pois o riacho vai dar na Baixa da Gia (ver acima, na seção sobre o Porto de Trás) e pode representar séria ameaça à saúde das pessoas. O Ribeirão da Passagem também está poluído. Todo esse esgoto vai dar no mangue, que hoje está tão poluído que não permite nem mesmo a coleta de caranguejos. Outro problema apontado pelos moradores como resultado dos esgotos é a grande ocorrência de mosquitos, que incomodam muito.

A maior parte das casas tem banheiro mas não tem fossas. Segundo os participantes, a Prefeitura está se mobilizando para despoluir os riachos e fazer o

2 Ao descrevermos os dois bairros vizinhos ao mesmo tempo, estamos atendendo à conveniência das reuniões de diagnóstico, não a uma divisão natural das comunidades de Itacaré. Assim, este é um limite para a exatidão e detalhamento das informações a seguir.

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saneamento. Essa história, segundo alguns que estavam descrentes, é antiga. Outros se mostraram mais esperançosos.

A coleta de lixo é diária, mas os participantes se queixaram que, quando cai lixo dos sacos na hora de carregar a carreta, os garis não recolhem. Os varredores de rua varrem o lixo na Passagem, mas a coleta desse lixo varrido não tem sido feita.

Um dos problemas de saúde apontados foi a dengue, que já foi mais incidente mas que continua a atingir alguns moradores. O pessoal da Sáude vem trabalhando nos bairros, o que tem diminuído o problema.

Para os participantes da Passagem, as escolas são longe do bairro, que tem muitas crianças e também precisa de uma creche.

As drogas são um problema que preocupa as mães que participaram das reuniões. Segundo elas, depois da escola, muitos jovens ficam desocupados, levando-os ao risco de se envolver com drogas. As mães sugeriram que se faça um trabalho com os jovens, para resolver o problema.

Somente a rua principal da Passagem tem calçamento. No Marimbondo, há um maior número de ruas calçadas. Na Passagem também falta iluminação pública. Apesar disso, todas as ruas têm rede de energia elétrica. Na Passagem só tem um telefone público, mas vândalos andaram quebrando-o. Mais um telefone deveria ser instalado, mas em um lugar protegido dos vândalos.

A infra-estrutura de lazer na comunidade inclui um Campo de Futebol e uma área de voley, e os forrós e serestas no Domingos do Boi.

5.2 - Comunidades rurais:

5.2.1 - Piracanga (e Caubi)

Piracanga é uma comunidade rural em que a pesca é, principalmente, uma atividade de subsistência. As famílias locais também obtém renda a partir da pequena agricultura (ex: coco, mandioca e melancia) e beneficiamento de produtos agrícolas (óleo de coco), e de trabalhos nas terras de outros.

Uma parte da comunidade vive em ilhas no estuário do Rio Piracanga (Figura 5), que são freqüentes focos de cobiça e conflitos de terra (ver adiante na seção sobre "conflitos e direitos tradicionais"), devido à grande beleza do local (Figura 6) e ao desenvolvimento turístico de Itacaré. Outra parte vive em sítios, próprios ou de outros, onde trabalham como caseiros. Piracanga está localizada na divisa dos municípios de Itacaré e Maraú, e quase todas as famílias moram do lado de Maraú. Entretanto, como a comunidade está mais perto de Itacaré do que de Maraú, acaba tendo uma relação mais intensa com Itacaré.

O estuário de Piracanga também é bastante utilizado pela comunidade de Caubi, do município de Maraú, que pesca de linha e de mergulho, e coleta caranguejos e guaiamuns. Este diagnóstico não descreve Caubi em detalhe. Nas reuniões de diagnóstico, realizadas em Piracanga, somente um morador de Caubi participou. Assim, enfatizar-se-á Piracanga, enquanto um trabalho mais intenso de organização comunitária em Caubi está sendo planejado.

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Os solos de Piracanga são muito fracos para a agricultura, arenosos, sem capacidade de reter água, e descritos como "quentes" pela comunidade. Ainda assim, algumas culturas parecem se dar bem, como maracujá, coco e melancia.

A população de Piracanga é formada por cerca de 38 pessoas, doze homens, nove mulheres, sete meninos, e dez meninas (não temos dados sobre a população de Caubi).

Em Piracanga, dois problemas importantes são saúde e educação. As fontes de água, principalmente nas ilhas próximas ao estuário, são salobas e/ou contaminadas. Assim, verminoses são comuns. Além das transmitidos pela água, também são comum os "bichos-de-pé" e os "bichos-de-porco". Como a agricultura não é muito produtiva, a alimentação nem sempre é farta. Além disso, falta um trabalho de saúde preventiva. Não há postos de saúde nem agentes de saúde visitando a comunidade. Para assistência à saúde, a comunidade acaba procurando Itacaré.

Na área de educação, a maior parte dos moradores de Piracanga é analfabeta ou lê e escreve muito pouco. A quase totalidade das crianças está sem escola, pois não há escola local, e o estudo precisa ser em Itacaré ou Caubi, o que é difícil pela distância. Como Piracanga está na divisa dos municípios de Itacaré e Maraú, é

Figura 5: Mapaparticipativo da regiãode Piracanga(elaborado peloshomens da comunidadeem outubro de 2000)

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comum um jogo de empurra, com um município atribuindo ao outro a responsabilidade por implementar serviços de educação e saúde no local. Um dos proprietários de um sítio próximo ao estuário, do lado de Maraú, disponibilizou uma parte de sua área para a construção de uma escola e de um poço semi-artesiano para melhorar a qualidade da água, o que ainda não foi feito.

Quanto a habitação, nas ilhas, as famílias moram em barracas rústicas, cobertas de palha e com piso de areia batida. Nos sítios, há casas de madeira e taipa. Não há energia elétrica.

Piracanga está no limite norte da área proposta para a Reserva Extrativista Marinha de Itacaré. A distância de Itacaré faz a comunicação difícil, pois não há telefones e o acesso à cidade se dá pela praia, com seis quilômetros de caminhada. Para permitir uma vigilância eficaz da Reserva, é preciso instalar meios de comunicação (rádio, telefone celular) em Piracanga.

5.2.2 - Itacarezinho

A comunidade pesqueira de Itacarezinho está localizada na costa sul do município, próxima à praia de mesmo nome. É remanescente de uma comunidade tradicional e está assentada na área há gerações. As pessoas mais velhas da comunidade já nasceram no local. A grande maioria da comunidade é tradicional do local, herdeiros e parentes, o que é apontado por moradores locais e se observa pela lista de presença das reuniões comunitárias, onde a maioria dos sobrenomes se repetem. Há coqueiros, plantados pelos moradores, com mais de 45 anos de idade. Existe um forte conflito pela posse das terras com pessoas de fora que as "adquiriram", o que tem prejudicado em muito a vida e a liberdade da população local (ver adiante na seção sobre "conflitos e direitos tradicionais"). As casas são localizadas relativamente próximas umas às outras, vizinhas ou distantes alguns minutos de caminhada (ver Figura 7).

Figura 6: Rio Piracanga junto à foz, com coqueirais ao fundo.

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As mulheres trabalham como donas-de-casa, outras "na enxada" (agricultura). Além disso, as mulheres também pescam e mariscam, assumindo sem preconceito a identidade de marisqueiras. Essas últimas atividades são feitas só para o consumo. As famílias também produzem coco e óleo de coco (um aspecto interessante é que a posse dos coqueiros não é definida pela posse da terra onde cada coqueiro está localizado, mas sim por quem plantou o coqueiro, isto é, uma pessoa pode ter um coqueiro nas terras de outra).

O desenvolvimento turístico tem causado problemas e oportu-nidades para a comunidade de Itacarezinho. De um lado, a valorização das terras em função do turismo tem causado cobiça por pessoas de fora e conflitos pela posse da terra (ver adiante na seção sobre "conflitos e direitos tradicionais"). Por outro, há algumas pessoas empregadas no novo Txai Resort (Fazenda Boa Sorte). A comunidade também poderia se beneficiar em outras iniciativas ligadas ao turismo, já que está bem próxima a uma das praias mais bonitas de Itacaré.

Os solos de Itacarezinho são muito arenosos e a topografia é bastante ondulada, tornando a agricultura difícil. A dificuldade de produzir alimentos no local faz com que, quando as famílias não têm alimentos, as crianças sejam alimentadas com uma massa de farinha e água. As mulheres preferem fazer compras em Ilhéus, por ser mais barato que Itacaré. Os "meninos" ajudam em casa e trabalham na roça. Os homens pescam e trabalham na roça. Homens e mulheres fabricam óleo de coco. Na comunidade, a população é composta por cerca de nove famílias (11 homens, nove mulheres, 20 meninos e quatro meninas). Há também, não incluídas nessa conta, outras famílias que moram mais distante do mar, mas que também utilizam os recursos marinhos para subsistência.

Existe uma escola "muito boa", segundo a comunidade, que vai até o Telecurso segundo grau. "É a melhor que tem em Itacaré". A escola tem três salas, vídeo, geladeira e merenda, e atende crianças desta e de outras comunidades. Está localizada a quinze minutos da comunidade, a pé.

A comunidade não conta com assistência à saúde no local, não tendo posto nem agentes de saúde visitando. Em caso de doenças, precisam ir a Itacaré ou Ilhéus.

Figura 7: Mapaparticipativo dacomunidade de

Itacarezinho.

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Nas casas dos "proprietários" (a exemplo da área do "Coronel", hoje de Nelson, do Txai Resort) existe água encanada e energia elétrica. No local onde residem os posseiros não existe essa infraestrutura, mas o poste de energia elétrica dos proprietários passa próximo ao local. A fonte de água é distante.

As moradias dos posseiros não têm fossa ou qualquer tratamento para os dejetos. Uma das casas têm um cubículo externo, onde as pessoas defecam e urinam no chão.

As instituições ligadas à organização de pescadores, como a Colônia e a Asperi, não eram muito conhecidas. Segundo Zé Poveira, que foi presidente da Colônia, na sua época, chegou a ser montado um posto da Colônia em Itacarezinho, inclusive com uma construção no local, na época em que Itacarezinho era uma pequena vila. Aquela situação descrita contrasta bastante com o presente, com total alienação da população local da organização da Colônia.

5.2.3 - Campo Seco

O Campo Seco é uma comunidade rural, formada por pescadores e pequenos produtores rurais (Figura 8), que na maioria dos casos combinam essas atividades. O principal problema da comunidade é o fechamento de caminhos tradicionais (ver adiante na seção sobre "conflitos e direitos tradicionais"). Organização comunitária para essa comunidade é uma coisa nova. A reunião realizada para este diagnóstico foi a primeira para a maioria das pessoas.

A população local é composta por cerca de 17 famílias na comunidade, aproximadamente 90 pessoas, sendo 28 homens, 23 mulheres, 19 meninos e 20 meninas. A maioria das famílias vive da agricultura, em suas pequenas roças. A pesca e mariscagem são praticadas por todos para consumo próprio.

A maior parte das casas é de taipa, coberta com telhas de amianto. Com os anos, as paredes ficam bem esburacadas. Após dez ou quinze anos, uma nova casa é construída. Observa-se a construção de algumas casas de alvenaria e cobertas com telhas de barro. Nas casas, não há banheiro ou fossas. Elas não possuem energia elétrica nem têm água corrente. As pessoas buscam água em fontes às vezes distantes de suas casas.

Quanto à educação, parece haver um grande número de analfabetos na comunidade. A única escola que funcionava no local oferecia ensino fundamental, mas segundo os moradores ela não funcionará este ano devido à construção do novo prédio da escola, que não terminou ainda. No ano passado, a escola funcionava inicialmente na Fazenda Santo Antônio, mas o funcionário responsável, Sr. Silva, começou a criar problemas, então houve a necessidade de mudar de lá para uma outra casa.

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Não existe nenhum tipo de serviço de saúde na comunidade. Qualquer tipo de problema é encaminhado para Itacaré. Os moradores disseram que o fechamento das estradas pelos proprietários de terra pode dificultar o acesso de carros ou ambulâncias, em caso de emergência. Pela estrada do Campo Seco, os carros só têm acesso até a Fazenda Santo Antônio, o que não contempla as casas de diversos moradores. A saída para o problema seria a abertura da estrada que sai do asfalto junto ao sítio do Sucuri para tráfego de carros.

O levantamento da parte agrícola foi muito superficial, mas alguns aspectos foram discutidos. A maioria das famílias têm cerca de duas tarefas de terra (cerca de 0,8 hectares). Essas pequenas propriedades, de acordo com alguns participantes, são todas documentadas (têm escritura). As principais culturas agrícolas são o coco, a banana, e a mandioca. Antes da vassoura-de-bruxa, o cacau também tinha importância. Existem três casas de farinha por perto, mas a única que funciona é a da comunidade Marambaia, vizinha. Uma outra casa de farinha está parada por falta de motor e de bola. As famílias não recebem nenhuma forma de assistência técnica, apesar da comunidade vizinha, a Marambaia, ter assistência de um projeto do IESB, para o uso sustentável dos

Figura 7: Mapa da Região do Campo Seco

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recursos naturais na APA, que envolve a promoção de alternativas agrícolas sustentáveis. O tipo de agricultura que é praticado no local requer desmatamento de capoeiras (não há mais matas virgens na localidade). Alternativas ao desmatamento promovidas pelo projeto na Marambaia talvez pudessem ser utilizadas no Campo Seco (um motivo provável da não inclusão do Campo Seco no projeto do IESB é a falta de uma organização que represente a comunidade; as quatro comunidades envolvidas no projeto – Camboinha, Marambaia, APPRI e Serra Grande – têm associações fortes).

A comunidade tem pouca experiência com organização comunitária. Como foi dito acima, a reunião de diagnóstico foi a primeira de que os moradores participaram. As mulheres, particularmente, apesar de estarem presentes na reunião, tiveram uma participação muito irregular, prestaram pouca atenção e saíram da reunião em vários momentos. Isso pode indicar sua inexperiência e a necessidade de um trabalho de organização de mulheres, mas isso não foi discutido com a comunidade. Um dos moradores, conhecido como Chapéu Branco, foi candidato a vereador na última eleição, mas não se elegeu. Foi ele quem convidou a equipe do diagnóstico para a visita. Um vereador que atua na área é "Azul", que transporta os moradores para a feira de domingo, juntamente com sua produção, cobrando R$2,00 por pessoa.

As instituições ligadas à organização de pescadores, como a Colônia e a Asperi, não eram muito conhecidas. Um participante fez o último curso da Capitania dos Portos para obter sua carteira, mas não tinha conhecimento sobre os direitos e deveres dos pescadores e sobre as vantagens de serem colonizados. Alguns desses pontos foram esclarecidos pelos facilitadores.

5.2.4 - Comunidades ribeirinhas do Rio de Contas

Há várias comunidades ao longo do Rio de Contas, relativamente distantes umas das outras, formadas por poucas famílias cada uma, sendo que suas casas muitas vezes não ficam próximas entre si. Não foi possível a visita a todas as comunidades rurais que utilizam os recursos do Rio de Contas, mas uma comunidade mais próxima foi visitada e os resultados são descritos a seguir.

Povoação é uma pequena comunidade que fica à margem direita do rio de Contas. A sua população é composta por cerca de 11 famílias, sendo que a maioria delas não possui terras e são responsáveis por cuidar de roças de outras pessoas. Algumas das famílias não têm condição econômica para ter instrumentos de pesca como tarrafa e siripóia.

Há uma mãe-de-santo no local, que parece funcionar como uma espécie de lider comunitária, respeitada por todos. Ela é associada à Colônia como marisqueira e disse ter sido colocada como fiscal.

Não há luz elétrica na comunidade e também não há água encanada. A água de beber é tirada de uma fonte localizada no Ribeirão da Povoação.

Há uma escola, construída em sistema de mutirão, em terreno cedido por uma moradora. No ano passado, era oferecido ensino de primeira a quarta séries do ensino fundamental e ainda alfabetização para jovens e adultos, à noite, através do

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Programa Alfabetização Solidária. Atendia tanto os moradores da Povoação como de outras comunidades situadas do outro lado do rio. A escola conta apenas com uma sala de aula, sendo que ao seu lado foi construída também uma casa de taipa (assim como a escola) para a professora morar. A escola não está funcionando ainda este ano porque não há professor.

A comunidade não conta com nenhum serviço de saúde local e também não recebe visitas de agentes de saúde. Qualquer problema é encaminhado para Itacaré.

Um restaurante foi instalado por um nativo à beira do rio e é frequentado por bastante gente (turistas e veranistas) durante o verão. Há ainda um terreiro de candomblé que também recebe muita gente de outras comunidades e até de outros munícípios, principalmente aos fins de semana e nas festas do terreiro.

D. Guiomar, a mãe-de-santo colocada pela Colônia como fiscal, diz procurar controlar as práticas predatórias no mangue, mas sente dificuldades de controlar o que acontece no rio, pois não mora exatamente na beira, tem muitos afazeres e ainda muito medo de ser agredida caso tome alguma atitude. Disse que se tivesse mais condições, inclusive outras pessoas para ajudar, faria questão de fiscalizar.

5.3 - Comunidade urbana/rural:

5.3.1 - Taboquinhas (inclui sub-comunidades urbanas e rurais no distrito de Taboquinhas).

O distrito de Taboquinhas fica distante cerca de 30 quilômetros do centro de Itacaré. A maior parte do transporte é feita por uma estrada de terra que liga Itacaré a Ubaitaba (antigamente era a principal estrada de acesso a Itacaré; hoje, encontra-se "esquecida"). Taboquinhas apresenta uma infra-estrutura relativamente boa, contando com serviços como mercado (incluindo uma "Cesta do Povo", da Empresa Bahiana de Abastecimento - EBAL), escolas, clube municipal, feira e representantes da administração pública. Porém, somente o ensino fundamental é oferecido, sendo que os estudantes do ensino médio têm que freqüentar escolas em Itacaré. Também não há agências ou postos bancários locais.

O número de pessoas que praticam a pesca em Taboquinhas cresceu bastante nos últimos anos com a crise do cacau, mas a comunidade pesqueira continua distante das instituições ligadas à pesca, tanto com relação à Colônia Z-18 (regional), como aos órgãos estaduais e federais, resultando em uma grande desinformação sobre a regulamentação da profissão. Isso ocorre apesar do grande interesse da comunidade em documentar-se.

A comunidade de Taboquinhas tem de cerca de 4,5 mil moradores incluindo um núcleo urbano principal e os povoados de Pé da Pancada, Rua de Palha, "Os Acaris", Porto das Farinhas e Água Fria (entre os participantes do diagnóstico, não havia moradores de Água Fria). Nem todos os moradores são pescadores, mas estima-se há cerca de 200, ou mais. As mulheres tiveram uma participação pequena nas atividades de diagnóstico, e se denominaram pescadoras ou pescadeiras.

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Como foi dito acima, a pesca em Taboquinhas cresceu em importância com a crise do cacau, sendo uma alternativa para uma ampla parcela da população desempregada. Os pescadores trabalham todos os dias, “de segunda a segunda”, conforme a necessidade. No entanto, param por alguns dias quando não há peixes ou quando fica impossível pescar (na época de enchente, por exemplo). Alguns pescadores trabalham também na agricultura, recebendo R$ 5,00 pelo dia de trabalho na lavoura. As culturas principais são a banana, o cacau e a mandioca. Os proprietários das roças localizadas às margens do rio não interferem na passagem dos pescadores, contanto que não prejudiquem a sua lavoura.

A comunidade do Pé da Pancada é a mais próxima do núcleo urbano de Taboquinhas. Os moradores vivem em casas bem próximas umas das outras, colocadas ao longo da "pedestra" (uma trilha histórica, por onde o transporte de mercadorias e produtos tem sido feito há mais de cem anos). É no pé da Pancada que desembarcam os praticantes do rafting, sendo que a agência Ativa comprou um terreno no local. Recentemente, uma grande movimentação de terra foi feita pela Ativa na área de preservação permanente do rio, chegando até a beira d'água. A Ativa emprega vários moradores vizinhos. Além da Ativa, há um novo bar no local.

A comunidade da Rua de Palha tem escola, igreja católica e evangélica, televisão comunitária, barzinho, praça arborizada, funcionários responsáveis pela limpeza da rua e da igreja e uma casa de farinha. A casa de farinha produz a farinha de mandioca semanalmente para consumo próprio e venda, sendo que a lata de farinha custa R$ 5,00. Ela conta com todos os equipamentos para a produção: moedor, amassador, torrador e peneira. "Seu Rocho" é o administrador da Rua de Palha e tem participado nas reuniões da Reserva. A "pedestra", com seu calçamento de pedras, é uma das atrações turísticas potenciais da comunidade. Um trecho novo, calçado no mesmo estilo, dá acesso a uma praia do Rio de Contas.

Já os povoados de Porto das Farinhas e "Os Acaris", segundo os participantes, não recebem nenhum benefício por parte da administração pública.

6. Recursos Naturais 6.1 - Aspectos da Geologia do Litoral de Itacaré O litoral de Itacaré é caracterizado pelo estreitamento da planície costeira com afloramentos do embasamento cristalino atingindo diretamente a costa, formando costões rochosos. A presença da desembocadura do rio de Contas contribui com a sedimentação costeira na região. A praia da Concha é exemplo dessa contribuição, com sedimentos de origem fluvial e retrabalhados por processos marinhos (ondas e correntes), distribuídos na praia de acordo com a hidrodinâmica. Os sedimentos de granulometria grossa estão dispostos junto à zona de arrebentação, onde a energia das ondas se concentra nessa praia, os sedimentos finos se depositam na antepraia, região submersa adjacente à praia, onde a energia é menor.

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As praias do litoral sul de Itacaré, até Serra Grande, estão confinadas entre os afloramentos rochosos, formando as chamadas "praias de bolso" (pocket beaches) (Figura 8). A região ao norte da foz do Rio de Contas é caracterizada pelo desenvolvimento de extenso cordão arenoso costeiro, recoberto por vegetação de restinga, em estado praticamente inalterado até o estuário do Rio Piracanga. Nas margens deste estuário a vegetação de mangue se desenvolve sobre sedimentos lamosos com grande quantidade de areia associada. Segundo as comunidades litorâneas, a quantidade de areia no sedimento do manguezal tem se tornado

mais elevada ao longo do tempo.

6.2 - Características físicas da plataforma continental e correntes marinhas

A plataforma continental tem em Itacaré um de seus trechos mais estreitos em todo o litoral brasileiro. A plataforma continental interna é estreita, apresentando cobertura de sedimentos arenosos terrígenos. Sua orientação é aproximadamente norte-sul, com as isolinhas de profundidade apresentando-se relativamente paralelas ao litoral. O fundo do mar de Itacaré, representando os diversos ambientes marinhos da plataforma, é classificado pelos pescadores locais utilizando as faixas compostas de diferentes sedimentos, corais ou rochas (Figura 10). As faixas típicas, a partir da costa, são "areia", "laminha", "meia-lama", "baixo" ("lama dos guinchos"), "cascalho", "as trinta-e-cinco" (faixa de lama a 35 braças3 de profundidade), "as pedras" (áreas com afloramentos rochosos e corais), as "beiradas", e o "fundo". Muitas vezes, essas faixas recebem nomes complementares conforme os referenciais em terra. Por exemplo, o fundo localizado em frente ao Cabo ou Ponta da Tromba, recebe o nome de "Fundo da Tromba". O fundo localizado em frente ao Pacelete é conhecido como "Fundo do Pacelete".

A área proposta para a Reserva Extrativista Marinha de Itacaré, abrangendo toda a extensão do município, engloba praticamente toda a plataforma continental no trecho de Itacaré, protegendo assim toda a variação de ambientes marinhos desde as águas rasas junto à costa, com corais, areia e lama, até as "beiradas" (talude continental) e o "fundo", onde a plataforma termina, dando à Reserva uma representatividade ecológica importante. Isso também facilitará a fiscalização dos

3 Uma braça equivale à distância de uma mão à outra, com os braços abertos, e varia de pessoa para pessoa, de cerca de 1,6 m a 1,8 m.

Figura 9: Praia de São José, exemplo de uma "praiade bolso" (pocket beach).

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barcos de fora, pois a observação de atividade de pesca clandestina no interior da Resex será facilitada.

A costa central do Brasil, onde se localiza Itacaré, é influenciada pela Corrente do Brasil. Essa corrente marinha flui para o sul ao longo do talude continental, transportando uma massa de água quente e salina, a Água Tropical, que carrega os organismos marinhos tropicais, encontrando-se com as águas frias e subpolares da Corrente das Malvinas em torno de 38oS, formando lá a Convergência Subtropical. A Corrente do Brasil é formada na região de bifurcação da Corrente Sul Equatorial. Modelos de circulação superficial oceânica gerados a partir de bancos de dados internacionais, indicam que a bifurcação ocorre na região de Itacaré-Ilhéus, a 15°S (Stramma & England, 2000), embora esta hipótese ainda necessite de confirmação a partir de dados de campo. De todo modo, esta região é um dos setores-chave para a compreensão dos mecanismos de circulação das correntes de contorno

9 - 12 metros

20-25 metros 35 braças

Usos Redes:- Tapagem- Espera- Arrasto- Tainheira- TarrafaMarisqueiraMergulhoCanoa (caniço)Passeio turístico

Pesca de canoa,barco e mergulho

Verão: pescade linhaInverno: pescade redeAno todo:arrasto porpequenosbarcos eguinchos

Semelhante alaminhaArrasto só porguinchos

Arrasto deguinchoRede noinverno

Espinhel AnzolLinha defundo

Espi-nhel

Espécies RobaloCarapicuSiriAratuCaranguejoCarapeba

Peixes diversosSiri

CamarãoPeixes diversosLagosta

Semelhante alaminha

CamarãoPeixeSiriGoiaTartarugaLagosta

Tubarãoe peixesdiversos

VermelhoBadejoCiobaLagosta

MecaBaiacumole

Problemas DesmatamentoMangue arenosoBancos de areiaPesca de lanchasLixoEsgoto

Banana boatJet ski

Sobre-pescaArrasto

Muitos barcos dearrasto e guincho

Muitoguincho

Sobre-pescaPescacom redelagostei-ra

Diminuiçãodo pescado

Oportunidades Passeio turísticoPreservaçãoPassarela

Semelhantes aomangue

Mergulho deobservação

Figura 10: Perfil participativo do fundo do mar de Itacaré (elaborado pelo Grupo deTrabalho da Resex).

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oeste do Atlântico Sul e consequentemente para o entendimento dos processos de dispersão dos organismos marinhos.

Um estudo do Núcleo de Estudos Oceanográficos (NEO) da UESC (ver Quadro 1), que identificou dois padrões dinâmicos distintos na região: 1) a existência de uma circulação de plataforma independente da dinâmica oceânica e, 2) a predominância do transporte ao largo, naquele período, em sentido norte.

Esse padrão entretanto, não é constante ao longo do ano, como pode ser constatado com o acidente ocorrido nas proximidades da Ilha de Boipeba. Em fins de Janeiro de 2001 uma grande quantidade de parafina foi encontrada por moradores nas praias da Ilha de Boipeba, uma das 14 ilhas do arquipélago de Cairu, no sul do Estado da Bahia, a cerca de 250 km de Salvador. O material, resíduo da extração petrolífera, foi derramado pelo navio italiano Pietro Bárbaro. Em função da parafina flutuar e ter estado sólido em contato com a água do mar, foi transportada pelas correntes marítimas, chegando a atingir o litoral de Canavieiras (A Tarde, 15/02/2001). Sua sucessiva aparição, documentada pela imprensa local, oferece um indicativo do sentido e da intensidade do transporte pelas correntes marinhas. O Jornal A Tarde documenta a aparição do material em Boipeba em 26/01/2001 (A tarde, 27/01/2001). O mesmo veículo de comunicação documenta a chegada do material na baía de Camamu em 30/01/2001 (A Tarde, 01/02/2001), quatro dias depois, enquanto o jornal A Região, de Ilhéus, registra a chegada do material nas praias de Itacaré e no litoral norte de Ilhéus em 03 de fevereiro de 2001 (A Região, 11/02/2001), oito dias depois da aparição original. O padrão do transporte evidenciado é, portanto, bastante distinto daquele registrado no estudo da UESC para as garrafas de deriva lançadas ao mar em abril de 2000. Isto sugere que as correntes próximas a costa variam de direção ao longo do ano.

Quadro 1: Mensagens das garrafasO Núcleo de Estudos Oceanográficos (NEO)da UESC desenvolveu recentemente umestudo envolvendo o lançamento de garrafasde deriva contendo mensagens elaboradas porcrianças da rede pública de ensino de Ilhéus eItabuna. As garrafas levavam um questionário,que ao serem retornados, registraramposições e data de coleta, possibilitando seuuso como traçador dos processos decirculação superficial em águas de plataformae de oceano aberto.As garrafas foram marcadas externamente etiveram suas mensagens internas marcadascom quatro padrões distintos (Verde, Amarelo,Azul e Branco) e foram lançadas ao mar emquatro posições, radiais à orientação da costade Ilhéus. A posição mais próxima, distoucerca de 1,42 km da costa e recebeu asgarrafas verdes (14° 48' 13,0" S; 39° 00'50,9"W), a segunda posição, recebeu asgarrafas amarelas (14° 48' 07,7" S; 39° 59'29,8"W), a terceira posição recebeu asgarrafas azuis (14° 47' 30, " S; 38° 57'36,3"W); a quarta e mais distante posição,distou cerca de 10 km e uma hora denavegação à partir da barra do Estuário do RioCachoeira e recebeu as garrafas brancas (14°46' 52,7" S; 38° 56' 15,5"W). Todas asgarrafas foram liberadas em menos de umahora, tendo a liberação iniciado com asgarrafas brancas às 9:30 h e terminado com asgarrafas verdes às 10:45. O mar apresentava-se moderadamente agitado, com rajadaspouco intensas de vento do quadrante sul ecom pancadas periódicas de chuva.A análise preliminar das cerca de cinqüentagarrafas que retornaram apresentou umpadrão bastante interessante. As garrafaslançadas no ponto verde (ponto mais próximoà costa), derivaram para o norte, tendo amaioria sido encontrada em Salvador, cerca de10 dias após a liberação. As garrafasamarelas, liberadas a cerca de 2 km do pontoverde, sob águas da plataforma interna,apresentaram um padrão bastante singular,que tendo todas derivado para o sul, foramencontradas em praias que distam cerca de 20km do ponto inicial. As demais garrafaslançadas ao largo, também derivaram para onorte, tendo, em semelhança às garrafasverdes, sido recuperadas nas adjacências deSalvador.

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Isso é confirmado pelos pescadores de Itacaré, que identificam dois regimes de circulação oceânica distintos, um “regime de verão”, com fluxo predominante em direção ao sul, quando as águas ao largo se aproximam da costa e as correntes são relativamente mais intensas. Nesse período, desenvolve-se a chamada pescaria de coço, sendo capturados peixes oceânicos como o atum, dourado, olho-de-boi e cavala. Um segundo regime, de inverno, tem como característica uma circulação predominante para o norte, com menor intensidade de corrente (a não ser quando há tempo ruim). Nesse período, predomina a pesca de espécies de plataforma e de fundo, como o badejo, linguados, pescadas, dentre outros. É também nesse período que se dá a pesca de lagostas "de arribada", ou seja, que estão migrando para o norte nessa época, acompanhando a corrente.

O comportamento médio do campo de salinidade superficial para a costa central do Brasil, onde se localiza Itacaré, também evidencia esse padrão. Na Figura 11, a isolinha de salinidade 37 demarca os limites das águas da Corrente do Brasil. Pode-se perceber a aproximação dessa isolinha em direção à costa durante o verão e seu afastamento no período de inverno. De fato, durante as amostragens realizadas no estuário do Rio de Contas, em janeiro (Anexo 4), foram encontradas salinidades acima de 37 na estação mais externa, sugerindo uma aproximação da água oceânica nesse período.

6.3 - Praias, restingas e costões rochosos

O litoral da área a ser incluída na Reserva Extrativista Marinha de Itacaré é composto de praias intercaladas por costões rochosos. As duas maiores faixas de areia contínuas são as praias do Pontal a Piracanga (que segue para o norte) e de Itacarezinho. Nas duas é comum a desova de tartarugas.

6.3.1 - Restinga e praia do Pontal a Piracanga

A praia do Pontal a Piracanga é a continuação de uma das poucas áreas de restinga preservadas na região, e está localizada em um percurso de cerca de seis quilômetros atravessando o Rio de Contas em direção ao Rio Piracanga. Em uma observação superficial da vegetação de restinga, nota-se uma variação na fitofisionomia nos primeiros três quilômetros. Aí a vegetação halófila (de ambientes deficientes em água, por ex., cactus) ocupa uma larga faixa variando de cerca de 100 a 150 m em direção ao interior e é dominada principalmente por pinheirinho-da-

-48 -46 -44 -42 -40 -38 -36 -34

-20

-15

-48 -46 -44 -42 -40 -38 -36 -34

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Figura 11- Dados demédio superficial dosalinidade para a costa centralAcima, valores típicos para oabaixo valores típicos de

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praia (Remirea maritima Aubl. - Cyperaceae) e batata-da-praia (Ipomoea pes-caprae (L.) Sweet - Convolvulaceae). Durante a época das enchentes, grande quantidade de baronesas, ou aguapé, (Eichornia crassipes (Mart.) Solms-Laub. (Pontederiaceae)) é trazida pelo Rio de Contas e depositada pela maré na linha de maré alta. A camada densa de baronesas em decomposição acaba funcionando como uma barreira e a areia é cavada formando pequenas elevações, logo ocupadas pela vegetação pioneira (Remirea maritima, I. pes-caprae, e Canavalia rosea (Walt.) Kuntze, conhecida como feijão-da-praia, etc.). Em alguns trechos, a presença de capim-da-areia (Panicum racemosum (Beauv.) Spreng.) é também bastante abundante. Outras espécies que ocupam essa área são Ipomoea litorallis (Convolvulaceae), sendo bredo-da-praia (Blutaparon portulacoides (A.St. Hil.) Mears - Amaranthaceae) e Mollugo verticilata (Molluginaceae) pouco abundantes, ocorrendo sempre um pouco mais afastadas da praia. Em seguida, há um longo pós-praia que se alterna com faixas dominadas principalmente por Chrysobalanus sp. (icaco?) (Sapotaceae) e faixas de areia, quase que totalmente nuas ou com pouca vegetação, sempre em pequenas depressões. As faixas compostas por Chrysobalanus sp. são contínuas, sem interrupções nestas, ou seja, não há formação de moitas. Nessas faixas ocorrem ocasionalmente Clusia sp. (fluminensis?, lanceolata?, criuva?) (Clusiaceae), Cereus fernambucensis Lem. (Cactaceae), Epidendrum sp. (Orchidaceae). Coco-de-xandó (Allagoptera arenaria (Gomes) O. Kuntze - Arecaceae) quase não ocorre nas primeiras faixas do pós-praia, tornando-se mais comum à medida que se caminha para a mata.

Em seguida, numa pequena elevação, encontra-se a mata, sendo bordeada principalmente por Neoregelia cruenta (Graham) L.B. Smith. Outras espécies que foram observadas na parte mais externa da mata foram Clusia sp., Ouratea sp., Protium sp., e pau-pombo (Tapirira guianensis Aubl.). Na borda da mata ocorrem ainda alguns cajueiros (Anacardium occidentale - Anacardiaceae).

No trecho mais próximo a Piracanga, notamos verdadeiros mosaicos formados por campos secos e alagadiços, mangue, mata de restinga, e vegetação arbustiva e herbácea mais próxima à praia. Em determinado trecho, a vegetação rasteira, que sofre influência direta da água do mar, vai cedendo lugar a um grande campo alagadiço dominado principalmente por uma Juncaginaceae, campo esse cercado pela mata a um lado, pelo mangue a outro e a vegetação halófila da beira da praia. Esses alagadiços recebem influência da maré e constituem-se áreas de marinha, assim como a faixa de vegetação ao redor, de acordo com a largura prevista em lei.

Há ainda os campos secos dominados por várias ervas, em geral gramíneas. Espécie bastante freqüente é Cuphea flava (Lythraceae). Nas áreas de manguezal que cercam as margens dos rios as espécies observadas foram o mangue-manso ou mangue-branco (Laguncularia racemosa - Combretaceae), o mangue-vermelho ou mangue-verdadeiro (Rhizophora mangle – Rhizophoraceae) (mais presente à margem do rio de Contas), e Siriba ou Siriuba (Avicenia schaueriana - Avicenniaceae).

Em Piracanga, um problema principal é o lixo, principalmente plástico, trazido pelas correntes marinhas que o recebem principalmente do Rio de Contas. Uma indicação disso é que é no trecho da praia próximo ao Pontal e à foz do Rio de

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Contas que há a maior concentração de lixo, provavelmente proveniente das cidades localizadas nas margens do Rio de Contas, incluindo Itacaré.

6.3.2 - Praias e costões ao sul do Rio de Contas

A praia da Concha é uma praia média, completamente ocupada por barracas de praia, que encontra-se em processo de erosão e recuo. Tem grande influência do Rio de Contas pois está localizada na sua foz. Entre a praia da Concha e a do Resende há um costão rochoso, entulhado de lixo e baronesas. A vegetação junto aos morros adjacentes está bastante perturbada, com plantios de coco. A praia do Resende é uma praia pequena, cercada de coqueirais, onde a prática do surf é comum. Um pequeno trecho de pedras a separa da praia da Tiririca, a principal praia de surf e também a mais perturbada por construções e pousadas. Várias pousadas foram construídas em área de marinha nessa praia. Um trecho de costão rochoso a separa da praia do Costa, onde não há barracas, mas a rua passa bem próxima, a menos de 10 metros. A vegetação natural foi completamente eliminada nessa praia. Mais um trecho de costão rochoso separa essa praia da praia da Ribeira, onde há várias barracas, mas ainda há um trecho de mata atlântica encostado na praia, dentro da área de marinha. Essas são as "praias urbanas" de Itacaré.

As "praias rurais", em direção ao sul, separadas umas das outras por costões rochosos, incluem as seguintes:

Ciriaco: pequena praia, cercada de matas.

Prainha: praia média, cercada de coqueirais e de uma Reserva Particular do Patrimônio Natural, RPPN. O acesso a esta praia estava sendo limitado aos turistas, de quem se cobrava taxa na entrada da praia. Uma fiscalização do Ibama na área, resultante da mobilização pela Reserva Extrativista Marinha de Itacaré, resultou em advertência ao proprietário da área adjacente à praia (Sr. Brito), para que deixasse o acesso livre. Até onde sabe-se, a praia foi mesmo reaberta.

São José: praia onde se localiza o empreendimento Vilas de São José e o Ecoresort. O acesso a essa praia também era restrito, a não ser com pagamento de taxa. Um pescador que uma vez acessou a praia a partir do mar, disse ter sido ordenado a retirar-se pelo salva-vidas contratado pelo empreendimento. A mesma ação do Ibama, citada acima, advertiu o proprietário da área adjacente (Sr. Cleber Isac) para reabrir o acesso à praia. O proprietário criou então uma proposta de reabertura que deixaria o acesso livre a todos por uma trilha tradicional, e de membros da comunidade organizada de Itacaré pelo caminho principal (através de credenciamento). Turistas que utilizarem o transporte e os guias do Vilas de São José vão continuar a pagar taxa, pelo serviço. Não temos informação sobre a implementação dessa proposta.

Pauva e Arruda: praias pequenas, onde a areia só é exposta na maré baixa. O acesso a estas praias tem sido limitado aos extrativistas de Campo Seco, que precisam dar a volta pela praia de Jeribucaçu, e caminhar sobre o costão rochoso, por onde o acesso nem sempre é

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possível, devido à maré alta e condições do mar. A trilha tradicional passa por dentro da Fazenda Sto. Antônio (ver Figura 8, mapa da região de Campo Seco), propriedade de Karine (que segundo informação do Sr. Silva, administrador da propriedade, é viúva de Gilles, que permitia a passagem), cujo administrador não permite a passagem. Uma trilha alternativa passa por dentro da propriedade do Sr. Albert que, de acordo com as informações dos moradores, também não tem permitido a passagem.

Jeribucaçu: pequena praia cercada de coqueirais, onde deságua o Rio Jeribucaçu e por onde saem as jangadas da comunidade de Campo Seco. O acesso a esta praia é permitido aos pedestres, mas já houve conflitos com os proprietários quanto ao porto de jangadas e pesca da comunidade local no Rio Jeribucaçu e seus manguezais. O Rio Jeribucaçu tem sua foz nessa praia, desaguando pelo seu lado sul. Na margem esquerda do rio, junto à foz, em área de marinha, está localizada a casa sede da fazenda do Sr. Luciano.

Engenhoca: o acesso a essa praia também é cobrado pelo proprietário das terras ao redor, mas somente para a entrada de carros. A praia é cercada de coqueirais, a não ser nas duas pontas, onde há costões e mata atlântica. Na parte central da praia há um barranco onde o mar alcança na maré alta. Há um riacho que deságua na praia, onde a maré penetra e há um pequeno trecho de manguezal, extendendo a área de marinha ao seu interior, que deve também ser incluída na Resex. O acesso a essa praia pode se dar por duas formas: 1) uma estrada, cujo calçamento está sendo concluído em trecho em forte declive cortando a mata, liga a praia à estrada asfaltada (BA - 001); e 2) a trilha, somente para pedestres, que vem da praia do Havaizinho.

Havaizinho: praia pequena, cercada de coqueirais. O acesso a pedestres é livre, mas é cobrada a entrada e estacionamento de carros. A entrada para Havaizinho também dá acesso a pé para a praia da Engenhoca, como foi dito acima, através de uma trilha na mata.

Itacarezinho: praia longa, cercada de coqueirais, com duas entradas de acesso: 1) pela fazenda Camboinha (do Sr. Luciano), e 2) por uma estrada lateral à Fazenda Boa Sorte. Nas duas estradas, o acesso de carros é cobrado (R$5,00). Antes havia outro acesso pela Fazenda do Grupo Ásia de Águia. O acesso a esta praia é livre para pedestres. A entrada para a comunidade de Itacarezinho se dá pela estrada lateral à Fazenda Boa Sorte (Txai Resort), sendo que a comunidade não possui acesso livre para veículos através da porteira colocada a três quilômetros, junto à estrada asfaltada. Há várias cercas de proprietários na área de marinha desta praia. O Txai Resort, instalado na área, construiu sua piscina dentro da área de marinha. Parece que obteve autorização do CRA, depois de ter sido negada a autorização pelo Ibama. Na parte norte da praia (Camboinha), pequenos produtores rurais vendem produtos aos banhistas. Recentemente, porém, o administrador de uma fazenda local (Sr. João)

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teria destruído e incendiado as barracas, improvisadas na área de marinha. Nessa praia, há a desova de tartarugas marinhas.

6.4 - Base da produtividade marinha: plâncton e macroalgas

6.4.1 - Plancton

A base da teia alimentar marinha é formada por organismos geralmente microscópicos, conhecidos como plâncton. O plâncton é formado por microalgas, que realizam fotossíntese (conhecidas também como fitoplâncton, que inclui as diatomáceas e os dinoflagelados), pequenos animais (zooplâncton, como os copépodes) que consomem o fitoplâncton e outros organismos consumidores, e o chamado ictioplâncton, composto pelos ovos e larvas de peixes. Muitos animais marinhos que vivem nos sedimentos de manguezais, praias e fundos rochosos, passam uma parte do ciclo de vida no plâncton, na fase larval, sendo neste caso chamados de meroplâncton.

O fitoplâncton é geralmente o principal produtor primário nos ecossistemas marinhos, tendo um papel similar ao das plantas terrestres. O zooplâncton, por sua vez, consome proporções variáveis da produção primária fitoplanctônica, podendo controlar o crescimento das populações algais ao longo do ano (Heinle, 1966; Carlson, 1978; Nicolajsen et al., 1983; Dam & Peterson, 1993). A atividade alimentar do zooplâncton tem conseqüências importantes para a ciclagem de nutrientes inorgânicos em águas salobras e costeiras, através da excreção de diversas formas de nitrogênio e fósforo (Smith, 1978). Além disso, o zooplâncton é a parte principal da dieta de muitos animais estuarinos e marinhos, incluindo espécies de peixes, crustáceos e moluscos de interesse econômico (Turner, 1984). Assim, o metabolismo do zooplâncton tem um papel regulador nas teias alimentares marinhas, além de representar uma fonte de alimento para consumidores maiores, enquanto que o fitoplâncton é responsável por uma proporção elevada da produção de matéria orgânica, a partir da fotossíntese, nos ambientes costeiros.

A distribuição espacial e temporal do plâncton da costa central do Brasil, onde se inclui o litoral sul da Bahia e Itacaré, não é satisfatoriamente conhecida devido à baixa freqüência e abrangência de amostragens oceanográficas nesta região. Entre os estudos pioneiros sobre o fitoplâncton no Brasil encontram-se os trabalhos taxonômicos de Zimmermann (1914 - 1918) sobre as diatomáceas da Baía de Todos os Santos. Algumas expedições oceanográficas estrangeiras coletaram informações sobre o plâncton, como no caso do navio francês "Calypso", que visitou a região em 1962 e gerou a oportunidade para a publicação de alguns trabalhos descritivos (Gaudy, 1963; Fenaux, 1967; Seguin, 1965). No entanto, a maior parte dos dados disponíveis sobre o plâncton costeiro regional foi obtida através de expedições organizadas pela Marinha do Brasil, nas décadas de 1960 e 1980, embora estas tenham estado geralmente restritas ao setor sul da costa central, no litoral do Espírito Santo (Brandini et al., 1997). Utilizando material biológico coletado nestas expedições, foi possível comprovar a origem tropical dos organismos planctônicas das águas superficiais deste setor da costa brasileira.

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O ecossistema marinho da região tropical do Atlântico Sudoeste, incluindo o sul da Bahia, é caracterizado por uma alta biodiversidade e baixa biomassa do plâncton. Não existem dados disponíveis para a região costeira de Itacaré, mas a região do Banco de Abrolhos foi estudada em várias ocasiões, inclusive em cruzeiros oceanográficos recentes (Knoppers & Ekau, 1999). Os dados obtidos em Abrolhos são representativos das condições oceanográficas e biológicas do litoral sul da Bahia e servem como uma base de informações relevantes para Itacaré.

Os primeiros trabalhos sobre a composição sistemática do fitoplâncton realizados na região de Abrolhos e proximidades demonstraram uma alta diversidade de diatomáceas, apesar dos dinoflagelados terem sido quantitativamente mais abundantes, mostrando o caráter oligotrófico da região (Macedo-Saidah & Moreira-Filho, 1977). Estudos sobre excreção do fitoplâncton, produção primária e concentração de clorofila-a, realizados por Vieira (1980), Vieira e Teixeira (1981) e Bonecker et al. (1992/93), confirmaram as condições oligotróficas (baixa quantidade de nutrientes e de plâncton) da plataforma continental da região do Banco de Abrolhos. Uma maior atividade biológica foi observada na região costeira sob a influência da drenagem continental, e na região dos bancos, onde ocorre o chamado “efeito ilha” e onde as interações com a Água Central do Atlântico Sul - ACAS são mais intensas (Brandini et al., 1997).

Panouse & Susini (1987) estudaram a produção primária nesta região, confirmando baixas taxas de produção. Com base em experimentos de fotossíntese versus temperatura, os autores encontraram um ótimo de produção em torno de 25 C. Foi também sugerido que a atenuação da luz nesta região era causada principalmente pela presença de microalgas.

Mais recentemente, dentro do programa oceanográfico JOPS-II-9 (“Joint Oceanographic Projects - Germany/Brazil”), as diferentes classes de tamanho do fitoplâncton foram estudadas. O picoplâncton (microalgas menores que 20 µm) contribuiu com 64% da biomassa de carbono, enquanto o nanoplâncton (microalgas com tamanho entre 20 e 200 µm; sendo 1 mm = 1000 µm) foi responsável por 33% e o microplâncton, por somente 3% da biomassa. A biomassa sobre a plataforma continental e extensão de Abrolhos foi duas vezes mais elevada do que na região oceânica ao largo. Esta biomassa elevada foi decorrente de um “bloom” de Synechoccocus (cianobactérias) observado nestes locais, devido à presença de uma massa de água mais fria que ascendeu sobre esta região. A comunidade nano- e microplanctônica, apesar de contribuir com apenas 36% da biomassa de carbono, era altamente diversificada e composta por espécies características de regiões tropicais oligotróficas. Dentre as espécies características das camada de mistura superficial da Corrente do Brasil podemos destacar as diatomáceas Stigmaphora rostrata, S. capitata, Chaetoceros tetrastichon, Hemiaulus hauckii, as cianobactérias filamentosas Oscillatoria spp e os cocolitoforídeos, Discosphaera tubifera, Umbellosphaera irregularis, U. tenuis, Rhabdosphaera clavigera, Syracosphaera pulchra, Ceratolithus cristatus, Acanthoica quatrospina, Anoplosolenia brasiliensis, Periphyllophora mirabilis e outros. Outra característica interessante observada foi a presença de uma flora tropical de águas profundas, também denominada na literatura como “flora de sombra”. Esta população profunda é mais evidente nas regiões mais afastadas da costa, onde a estabilidade

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ambiental é maior. Podemos destacar as seguintes espécies de diatomáceas, Planktoniella sol, Gossleriella tropica, Thalassiosira punctifera, Corethron criophilum, Asteromphalus roperianus, e os cocolitoforídeos típicos da camada eufótica profunda, Florisphaera profunda, Gladiolithus flabellatus, Hayaster perplexus, Oolithotus antillarum, Algirosphaera oryza, A. robusta. Pontosphaera syracusana, Reticulofenestra sessilis, Gephyrocapsa ericsonii, G. oceanica, Calciosolenia murrayi e Ophiaster hydroideus (Susini Ribeiro, 1996).

Convém ressaltar que a maior parte dos dinoflagelados da Corrente do Brasil é típica de regiões oligotróficas oceânicas e estão representados em toda a zona eufótica (onde há penetração de luz suficiente para a fotossíntese), muitos deles sem apresentar preferências por algum estrato em especial. As seguintes espécies são típicas de mares tropicais e ocorrem nas águas quentes da Corrente do Brasil: Ceratium tripos, C. fusus, C. furca, C. massiliensis, C. trichoceros, C. carriense, C. euarcuatum, Podolampas palmipes, Gonyodoma polyedricum, Ceratocorys horrida, Oxytoxum sphaeroideum, O. scolopax, O. variabile, O. reticulatum e O. milneri. Segundo Sournia (1982) as espécies que se seguem são provavelmente típicas de flora profunda: Ceratium gravidum, C. incisum, C. longissimum, C. platycorne, C. praelongum, C. ranipes e C. vultur, além das espécies do gênero Triposolenia e Heterodinium. Entretanto, nos estudos em Abrolhos estas ocorreram tanto na camada superficial como na camada eufótica profunda.

A produção primária daquela região é relativamente baixa, o mesmo devendo ocorrer no litoral de Itacaré. A maior parte da produção é efetuada pelo nano- e picoplâncton, variando de 0,1 a 0,5 g C m-3 d-1 (Gaeta et al., 1999; Susini-Ribeiro, 1999). A produção nova é consumida pelo zooplâncton pequeno e é passada para os níveis tróficos superiores (zooplâncton carnívoro, peixes) através da alça microbiana (bactérias, protozoários e outros organismos microscópicos). A biomassa do zooplâncton na região oceânica de Abrolhos varia de 0,01 a 0,41 ml m-3 (Nonaka et al., 2000), considerando-se neste estudo uma malhagem de rede mais grossa, própria para macrozooplâncton. Os grupos de peixes dominantes nas amostras de ictioplâncton na região são os peixes-lanterna (Myctophidade) e peixes de recife de coral. Esses peixes são presas importantes dos peixes migradores, tais como atuns e afins. Um dos estoques pesqueiros mais importantes da costa brasileira é o bonito-listrado (Katsuwonus pelamis), que faz migração norte-sul. Após a desova que ocorre nas águas quentes da região nordeste, os bonitos migram para o sul para se alimentar intensivamente na região de Convergência Subtropical, na costa do Rio Grande do Sul (Matsuura & Andrade, 2000). Durante sua rota de migração, ao longo da margem continental, nutrem-se principalmente das concentrações de peixes-lanterna e eufausiáceos, estes últimos membros do zooplâncton.

A distribuição espacial e temporal do zooplâncton na costa central está relacionada com os mesmos processos oceanográficos que promovem a variabilidade do fitoplâncton. O zooplâncton é altamente diversificado e constituído por espécies típicas da Água Tropical, transportada, como vimos, pela Corrente do Brasil (Björnberg, 1963; Valentin et al., 1976). A influência de massas de águas mais profundas, como a Água Central do Atlântico Sul, sobre a plataforma da costa central ainda não é bem compreendida, mas sabe-se que a influência desta massa de água fria e rica em nutrientes atinge ao menos a área ao sul de Abrolhos, no

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vórtice de Vitória (Gaeta et al., 1999). Nesse cenário, ocorre uma injeção de altas concentrações de nutrientes (incluindo nitrato e silicato) na base da zona eufótica ou mesmo próximo à superfície, quando ocorrem ressurgências mais intensas (Valentin et al., 1987), estimulando a produção primária nova e o desenvolvimento de espécies do microfitoplâncton (Teixeira e Tundisi, 1981; Aidar et al., 1993). O zooplâncton, nesta situação, é caracterizado por espécies de ressurgência associadas com espécies costeiras (Valentin, 1989). Em Abrolhos e nos estudos realizados pela UESC até o momento, no litoral de Ilhéus, estas espécies de águas frias não foram encontradas.

Uma listagem das espécies e grupos do mesozooplâncton associados a Água Tropical e à água costeira, registrados em Abrolhos por Lopes & Dutz (1996), é apresentada no Anexo 5. Esta listagem serve como referência para a região de Itacaré, pois as mesmas espécies ocorrem em todos os setores sob o domínio da Água Tropical da Corrente do Brasil (Björnberg, 1981). Esta suposição é confirmada pelos resultados do levantamento do plâncton no estuário do Rio de Contas (Anexo 6). As espécies de fitoplâncton e zooplâncton observadas são típicas de regiões estuarinas e costeiras de áreas tropicais do Atlântico Sudoeste.

6.4.2 - Algas

Além das algas microscópicas do fitoplâncton, as macroalgas, aliadas a um pequeno grupo de angiospermas (plantas vasculares) marinhas, constituem outros grupos importantes de produtores primários que sustentam a vida nos oceanos. As macroalgas bênticas apresentam diferentes dimensões e hábitos de vida, ocorrendo, por exemplo, em costões rochosos, recifes de corais e manguezais, ambientes comuns em Itacaré.

A flora bêntica, também conhecida como fitobentos, é mais amplamente representada pelas comunidades de macroalgas, conhecidas popularmente pelos pescadores como “limo”. A diversidade das comunidades macroalgais está diretamente relacionada com a diversidade de organismos marinhos. A ocorrência destas aumenta a estabilidade dos ecossistemas bênticos, na medida em que um maior número de espécies funcionalmente equivalentes, com diferentes capacidades de tolerância a fatores ambientais, pode melhor resistir a alterações do meio marinho, inclusive aquelas causadas por atividades antrópicas (Chapin III et al., 1997). As algas calcárias são elementos importantes na formação e manutenção dos recifes de coral, podendo desempenhar um importante papel no ciclo global do carbono, com consequências sobre o clima do planeta (Oliveira, 1996).

No que tange ao aspecto econômico, as algas marinhas são utilizadas como alimento para o homem e animais, e fornecem produtos imprescindíveis para a vida do homem moderno, com valores que ultrapassam alguns bilhões de dólares por ano. Por exemplo, o comércio de "nori" (gênero Porphyra) foi responsável pela movimentação de 1,8 bilhões de dólares/ano no começo da década passada (Oliveira, 1997).

Durante o último Workshop “Avaliação e ações prioritárias para as zonas costeira e marinha”, realizado de 24 a 29 de outubro de 1999 em Porto Seguro, a região ao sul da Bahia foi designada como prioritária para estudos de levantamento da flora

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fitobêntica, tanto pelo desconhecimento a cerca da sua diversidade algal, como por sua susceptibilidade em sofrer impactos antrópicos de maior monta no curto prazo (Oliveira. et. al , 1999).

No curto período disponível para o levantamento da flora bêntica da região de Itacaré, foram realizadas amostragens em áreas de corais, manguezais e costões rochosos. A listagem das espécies identificadas encontra-se no Anexo 7 . Foram encontradas e identificadas, nos costões rochosos entre a praia da Concha e do Resende, e da praia de São José, 14 espécies da divisão Chlorophyta, 12 da Phaeophyta, e 20 da Rhodophyta. Nos manguezais de Piracanga foram encontradas e identificadas quatro espécies da divisão Chlorophyta, e cinco da Rhodophyta. No Jardim dos Corais, área entre as praias da Concha do Resende, foram encontradas e identificadas cinco espécies da divisão Chlorophyta, seis da Phaeophyta, e 13 da Rhodophyta. A identificação de gêneros e espécies foi realizada utilizando-se chaves de identificação (Joly, 1954; Joly, 1965; Nunes, 1999, Taylor, 1960, King & Puttock, 1989; Fortes, 1992) e revisão taxonômica de acordo com Wynne (1998).

7. Utilização dos Recursos Marinhos A utilização dos recursos marinhos segue a variação de ambientes determinada pelo tipo de fundo ou substrato marinho (Figura 10). Tipicamente, junto à costa, há uma faixa de areia e lama, em alguns lugares interrompida por corais (principalmente em frente à foz do Rio Piracanga, entre a foz do Rio de Contas e a praia da Ribeira, e na praia de Itacarezinho), onde se pratica a pesca de mergulho, linha, rede de espera e calão (este último principalmente na praia do Pontal). Em seguida, mais para o fundo, estão a laminha e a meia-lama, locais onde se pratica o arrasto para a pesca de camarão por barcos pequenos (muitos barcos de fora, que sazonalmente visitam Itacaré) e por guinchos (barcos de arrasto com draga, equipados com guincho e tangones na sua maioria de fora, muitos de Ilhéus). Também ali se pesca a lagosta "de arribada" ou migratória, com redes de espera. No baixo, a lama está a uma profundidade maior e somente os barcos equipados com guinchos têm capacidade para arrasto. No cascalho, há uma grande quantidade de algas. Segundo um dono de guinchos em Itacaré, quando a pesca de camarão na lama falha, os guinchos também arrastam ali. Nas trinta-e-cinco, não há pesca de arrasto devido à profundidade, excessiva mesmo para os guinchos, são usados espinhéis, ou groseiras, para a pesca de peixes como o tubarão. Nas pedras, se pratica a pesca de linha, e nas beiradas, se usa a groseira.

Cada comunidade pesqueira de Itacaré utiliza os recursos marinhos de forma diferente. Por exemplo, os pescadores da Banca do Peixe pescam, predominantemente, com linha e anzol, groseira, e rede de espera (principalmente para a lagosta). Já os pescadores do Forte praticam predominantemente a pesca de arrasto de camarão, e também pescam lagosta com redes de espera. Ainda, alguns utilizam também a groseira e as redes de espera para peixes. Os pescadores do Porto de Trás e da Banca do Peixe também praticam a pesca de calão no mar na época de verão, quando o mar está calmo e límpido, o que às vezes rende uma grande quantidade de peixes. Em Piracanga e Campo Seco, os pescadores utilizam

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tarrafas para a pesca a partir da praia, e no mar, jangadas, redes de espera e pesca de linha e anzol. Em Campo Seco também se pesca de linha a partir dos costões rochosos (conhecidos em Itacaré por "arrecifes"). Em Itacarezinho, além dos métodos utilizados em Piracanga, os pescadores também pescam lagosta de mergulho, apanhando-as com a mão. Os pescadores de Itacarezinho, que utilizam jangadas, pescam tanto junto à costa como nos pesqueiros mais distantes. Algumas vezes, os interesses de uma comunidade (ou modalidade de pesca) estão em conflito com os interesses de outra. Por exemplo, o arrasto para a pesca de camarão, praticado pelos pescadores do Forte, é considerado daninho aos peixes, prejudicando os pescadores de linha, groseira e rede de espera, da Banca do Peixe, de Piracanga, Campo Seco e de Itacarezinho. A pesca de mergulho é considerada predatório pelos pescadores de linha e anzol. As Normas da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré (Plano de Utilização) deverão tentar resolver boa parte desses conflitos, e permitir a união de todos para o manejo e conservação da área da Resex.

7.1 - Peixes, pesqueiros e artes de pesca

A pesca em Itacaré é uma das atividades econômicas de maior importância social, pois beneficia uma ampla parcela da população de baixa renda. Apesar do recente desenvolvimento turístico do Município, a sua inclusão social, isto é, a participação direta da população nativa de baixa renda na economia do turismo, ainda é

restrita. A pesca tem maior importância pois proporciona proteína para as dietas de muitas famílias envolvidas na atividade, e também renda durante os meses de baixa estação do turismo. Apesar de a maior quantidade de peixes ser pescada justamente nos meses de verão (Figura 12), na época do turismo, nos meses de inverno a safra da lagosta é economicamente importante. Na comunidade de Taboquinhas, onde o desenvolvimento turístico ainda é muito inicial, a pesca tem sido uma das principais alternativas ao cacau, depois que a doença da "vassoura-de-bruxa" arrasou com a economia cacaueira da região.

Entretanto, o município de Itacaré, com uma captura de 230 toneladas, representa apenas 0,6% do total da pesca na Bahia, apesar da opinião dos nativos de que o mar de Itacaré é um dos mais produtivos do Estado. Para os pescadores locais, a participação pequena de Itacaré na produção estadual é explicada pela competição com barcos de fora, que pescam em Itacaré mas desembarcam em outros portos, como Valença e Ilhéus. A Reserva Extrativista Marinha de Itacaré deverá fazer com que o produto pescado em Itacaré realmente circule no Município, o que representará maior benefício para as famílias pesqueiras e para o

Figura 12 – Produção depescado em Itacaré, pormês, no ano de 1998(MMA, 1999).

produção de pescado em Itacaré

020406080

J F M A M J J A S O N D

mês

prod

ução

(ton

)

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desenvolvimento da economia do Município como um todo. A renda extra obtida com a pesca vai impulsionar o comércio local nos meses de baixa estação turística, e o produto pescado deverá favorecer os estabelecimentos turísticos com pescado mais barato e de melhor qualidade.

De acordo com o MMA (1999), a arte de pesca responsável pela maior parte da captura de peixes é a linha. A pesca do camarão, realizada com redes de arrasto, também apresenta grande importância. Não existem dados de captura por espécie, mas por categoria, isto é, espécies diferentes agrupadas pelo mesmo nome popular. A importância relativa, em quantidade (kg), das espécies nas capturas do ano de 1998 encontra-se representada na Figura 13.

De acordo com o MMA (1999), as categorias de peixes mais capturadas são os cações, xaréu, badejo, cavala, bonito e arraias. As espécies costeiras mais valorizadas são as capturadas com linha, em substratos de cascalho ou próximas de afloramentos rochosos, tais como badejos, robalos, cioba, dentão e vermelho. Todas estas espécies podem atingir grande tamanho na área em questão, o que é um indicativo do potencial pesqueiro da região. Espécies de pequeno tamanho ou indivíduos jovens das espécies de importância comercial são utilizadas pelos ribeirinhos como fonte de alimento.

Através da amostragem de desembarques feita pela equipe da UESC com colaboração da comunidade, no mês de fevereiro, foram identificadas 51 espécies (ver lista de espécies e fotos no Anexo 8). Naturalmente, esse número está

Figura 13: Peixescapturados na região deItacaré durante 1998(MMA, 1999).

Espécies mais pescadas em Itacaréalbacora

ariacó

arraia

badejo

bagre

bonito

cação

cavaladentãodourado

guaiubamerorobalo

vermelho

xaréu

outros

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subestimado, pois este primeiro estudo envolve um levantamento rápido e em uma única época do ano. As famílias mais importantes foram Carangidae e Sciaenidae.

Os pescadores da Banca do Peixe são os que melhor conhecem o mar de Itacaré e seus pesqueiros, pois são na maioria originários do próprio município, muitas vezes segunda ou terceira geração de pescadores nativos. A descrição física do mapa feito pela comunidade da Banca do Peixe (Figura 14) apontou os pesqueiros listados na Tabela 2.

Apesar de os pescadores da Banca serem os que melhor conhecem o mar de Itacaré, seu conhecimento ainda assim é regionalizado. Os pesqueiros citados na Tabela 2 foram citados em uma reunião com 25 pessoas. Em Itacarezinho, porém, um só pescador citou também os seguintes pesqueiros não citados pelos pescadores da Banca: Vinte-e-Oito, Trinta-e-Cinco do Norte, Trinta-e-Cinco do Sul, Barra do Canto, Celinha, Serrinha, Morro na Estrada, Barriga do Velho, Setenta, Patizeiro, Trombone, Quando Achou, e Arraia (não se sabe se esses pesqueiros estão realmente dentro da área da Reserva, ou se são nomes diferentes para os mesmos pesqueiros).

Os participantes da Banca do Peixe disseram que os melhores pesqueiros são "Itacaré", "Pedra Nova", "Parede dos Pretos" e "Parede de Jeribucaçu". Justamente nesses há hoje o uso de pesca de compressor, por pescadores de fora (muitas vezes

Figura 14: Mapa participativo feito pelacomunidade da Banca do Peixe.

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com ajuda local) considerada danosa ao recurso. Apesar de denúncias feitas ao Ibama, inclusive através de abaixo-assinados, a única resposta do Ibama - Ilhéus é

que a pesca com compressor é permitida, a não ser nos casos de espécies em época de defeso, ou de indivíduos ovados. Mesmo assim, nem mesmo esses casos foram verificados. A pesca de compressor tem atingido principalmente os Canapus, ou Meros, de grande tamanho, que já se encontram em extinção em boa parte da costa brasileira.

Tabela 2: Pesqueiros de Itacaré identificados. As observações referem-se a práticas consideradas problemáticas pela comunidade ou sobre a abundância de peixes. Nome Observações Pedra do Cachimbo Usada por mergulhadores (C- compressor, e P – peito) Pedra Duro da Cioba Guinchos arrastam nas proximidades Pedra Duro do Agnaldo Guinchos arrastam nas proximidades Parede do Ambrósio Usada por mergulhadores (C) Pedra Canafista Guinchos arrastam nas proximidades Pedra do Galo Usada por mergulhadores (C) Parede do Cemitério Espiano Usada por mergulhadores (C) Pedra Margulão Usada por mergulhadores (C) Pedra do Alambique Beirada Olho de Boi Pedra da Prainha Usada por mergulhadores (C) Pedra Evocada Usada por mergulhadores (C) Beirada do Canto Beirada do Pacelete Serra no Campo Guinchos arrastam nas proximidades Pedra do Catueiro Guinchos arrastam nas proximidades Pedra da Mariquinha Usada por mergulhadores (C) Pedra Mata Fome Parede do Velho Usada por mergulhadores (C) Beirada do Jeribucaçu Usada por mergulhadores (C)

Rica em peixes Pedra do Pedro Usada por mergulhadores (C)

Guinchos arrastam nas proximidades Pedra da Navalha Pedra Itacaré Usada por mergulhadores (C)

Guinchos arrastam nas proximidades Rica em peixes

Pedra Quilombo Guinchos arrastam nas proximidades Pedra dos Pretos Rica em peixes

Usada por mergulhadores (C) Pedra Nova Rica em peixes

Usada por mergulhadores (C)

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Um abaixo-assinado solicitando uma portaria proibindo o uso do compressor no mar de Itacaré também foi encaminhado ao Ibama em fevereiro, mas até o momento nenhuma resposta foi dada. Enquanto isso, os poucos pescadores locais que vendem seus conhecimentos e habilidades para achar pesqueiros para os mergulhadores de compressor justificam seu comportamento com o argumento de que "ainda não é proibido" e "quando for eu paro" ou ainda "se eu não for, outro vai". Isso mostra a importância da Resex, para que as regras consideradas adequadas pela comunidade possam ser implementadas e fiscalizadas.

As espécies de peixe economicamente mais importantes para os pescadores participantes na Banca do Peixe estão enumeradas na Tabela 3.

Tabela 3: Nomes populares e científicos das espécies de peixe mais importantes economicamente para os participantes da Banca do Peixe.

Nome popular Nome científico Badejo N/D Robalo Centropomus spp Cavala Scomberomorus cavalla

Dourado Coryphaena hippurus Olho de boi Seriola sp Vermelho Rhomboplites aurorubens

Cação N/D Dentão Lutjanus sp Cioba Lutjanus sp

Se os pescadores da Banca do Peixe são os que melhor conhecem os pesqueiros marinhos de Itacaré em geral, comunidades que têm uma área menor de atuação às vezes têm um conhecimento mais detalhado de seus pesqueiros. Para a comunidade do Campo Seco, os melhores pesqueiros locais são Engenhoca, Jeribucaçu, Arruda e Pauva, principalmente nas pedras conhecidas como Catende, Água Caída e Siriíba. Na Engenhoca, pessoas de fora pescam de linha, o que não foi considerado problema pela comunidade. Mergulhadores de Itacaré também pescam na costa próxima à comunidade, o que também não foi considerado problema, pois eles só vêm com frequência no verão, quando a água está limpa, só pescam os peixes maiores, e até contribuem com alguns moradores, com "um peixe para a muqueca". Um dos participantes do Campo Seco questionou se ter gente de fora não faz com que eles tenham menos peixes, mas a maioria descartou isso na primeira reunião. Para eles, o problema principal da pesca eram os guinchos, que desprezam os peixes pequenos depois de matá-los. Na segunda reunião, porém, a questão sobre se os pescadores de outras comunidades ou que utilizam outras modalidades reduzem a quantidade de peixe para a comunidade se tornou mais importante.

Em Itacarezinho, a comunidade concorda que os guinchos são o problema principal. A área utilizada pelos pescadores de Itacarezinho corresponde principalmente ao trecho de mar ao longo da costa, desde o "Canto da Praia" de Itacarezinho até a foz do Rio Tijuípe. A pesca de jangada é mais restrita às pedras e corais próximos à costa, onde peixes e lagostas são pescados, mas pode também ir

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a pesqueiros mais distantes. Atualmente resta apenas uma jangada na comunidade e uma segunda, em fase de construção. Essas embarcações tradicionais são construídas com uma madeira muito leve, denominada "pau-de-jangada". Essa madeira está ficando escassa nas matas da região e têm-se substituído pela "muanza". Outras madeiras também são usadas. Segundo a comunidade, devido à proibição do corte de madeiras, ao processo de fechamento das matas pelos proprietários das fazendas da região, e à própria escassez do "pau-de-jangada", está difícil repor as jangadas que tinham no passado. Além disso, segundo a comunidade, Durval Lélis, um dos proprietários das terras na costa de Itacarezinho, começou a reprimir o uso do Porto de Jangadas, e chegou a comprar parte das jangadas existentes no local, somente para destruí-las com uma motosserra.

Ainda, os moradores de Itacarezinho relatam que mesmo os barcos de menor porte (com motor tipo B-18 ou similares) colocam suas redes de espera próxima à costa, entre os corais, prejudicando a pesca e, matando inúmeras tartarugas marinhas e ferinho os botos.

Na comunidade de Campo Seco, existem duas jangadas, que ficam nas praias do Arruda e Jeribucaçu. Elas duram mais ou menos cinco anos, quando construídas com muanza e três anos, quando construídas com pau-de-jangada. Não há canoas, mas os moradores se referiram às madeiras juerana, pequi e passuaré como as adequadas para sua construção. Os pescadores utilizam bastante a tarrafa, que jogam a partir das pedras, e a pesca de linha. Também fazem a pesca da lagosta, com varas apropriadas para isso, utilizando moreias como isca. Contaram que, em um dia de boa pescaria, chegam a pescar 10 a 12 lagostas, mas que está cada dia mais difícil.

Em Piracanga, existe somente uma jangada, utilizada pelos moradores para a pescaria de rede e de linha em frente à costa e junto aos corais. Um problema apontado foi um conflito com os barcos de arrasto (mesmo os pequenos, tipo B-18) que arrastam entre os corais, no "Corotó" (uma pequena área de lama em frente à foz do Rio Piracanga, entre a praia e os corais). Além de ser uma prática destrutiva para a pesca (pois captura um grande número de peixes muito pequenos), um dos pescadores de Piracanga aponta que os barcos de arrasto já passaram por cima de uma de suas redes. Quando fizemos uma reunião no Forte, onde a maioria pesca de arrasto, os pescadores de lá disseram que nunca passariam por cima de uma rede, pois isso causaria prejuízos à sua pescaria, e que era um dos pescadores de Piracanga que costumava sumir com as redes de outros pescadores da cidade que pescavam junto à costa de Piracanga. As Normas da Reserva devem tentar resolver esses conflitos.

7.1.1 - Embarcações

As embarcações mais utilizadas para a pesca no mar pelos pescadores da Banca do Peixe e do Forte são os barcos equipados com motor diesel tipo B-18, ou similar. Muitos pescadores da Banca do Peixe também utilizam canoas, para a pesca na foz do Rio de Contas. As jangadas ainda são utilizadas pelas comunidades de Itacarezinho, Jeribucaçu e Piracanga. Os guinchos são utilizados por apenas um dono de embarcação, com três embarcações, sendo os demais de fora, especialmente de Ilhéus.

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7.1.2 - Modalidades de pesca

No mar de Itacaré, são utilizadas as seguintes modalidades de pesca:

Calão: é mais usado na costa, no verão, e no rio, no inverno. A maioria dos participantes da Banca, onde mais se utiliza o calão, não consideram essa prática muito danosa aos recursos, apesar de ter a malha excessivamente fina, pois é utilizado só alguns dias por ano. O calão tem grande importância social e é uma das atividades de pesca mais tradicionais, envolvendo pescadores de várias comunidades urbanas de Itacaré e beneficiando pessoas que vêm do vilarejo de Caubi, em Maraú, ou de locais mais distantes, que aproveitam os peixes menores.

Rede de espera: há dois tipos, a de nylon seco e a de nylon mole. A pesca de rede de espera antes era feita só em setembro e no verão. Agora, ocorre durante o ano todo, o que provavelmente deve ser uma causa da diminuição da quantidade de peixes no mar. Segundo alguns pescadores, as redes de espera espantam os cardumes. Essas redes são usadas pelos pescadores de Piracanga, da Banca do Peixe, do Forte, e de outras comunidades, para a pesca de peixes e lagostas. A quantidade de redes é impressionante. Alguns pescadores chegam a possuir cinco quilômetros de redes, ou mais.

Linha e anzol: utilizados por todas as comunidades.

Tarrafa: utilizada em todas as comunidades. Pode ser problema em locais em que o rio é estreito, quando cardumes sobem para desovar, como é o caso em Piracanga e Jeribucaçu, e no Rio Tijuípe.

Groseira (ou espinhel): linha de espera com vários anzóis, utilizada para pesca de peixes maiores, como tubarões.

O uso dessas modalidades de pesca varia conforme a época do ano. As espécies capturadas e o local de uso também, como mostra o calendário sazonal na Figura 15 (este calendário inclui somente parte das artes de pesca utilizadas em Itacaré).

7.1.3 - Destino do pescado

O uso do produto pescado pode ser resumido na frase de um pescador da Banca do Peixe: "A gente vende o bom e come o ruim”. Apesar dessa colocação ser considerada humilhante por alguns pescadores, a grande maioria concorda que essa é a realidade. Os peixes de primeira são na maioria vendidos, e os de segunda e terceira são levados para casa e utilizados para alimentação da família. Às vezes, quando precisam comprar alguma coisa e falta dinheiro, até o peixe de segunda é vendido. A venda se dá em uma relação de dependência com um atravessador, que fornece combustível, gelo e mantimentos ao pescador, criando um débito que deve ser quitado com o produto da pescaria. De um lado, isso permite uma exploração excessiva por parte do atravessador. Por outro, permite que o pescador lide com as incertezas da pesca. Somente no caso da Asperi existe a venda coletiva, apesar de a Asperi ter uma relação semelhante, também fornecendo aos seus pescadores. Nas comunidades rurais, a maior parte do pescado é utilizada para o consumo local, sendo o excedente às vezes vendido.

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Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov DezArtesLinha de

fundoMero, Vermelho, Badejo, Guaiuba,Ariacó, Guaricema, Cioba, Dentão,Olho-de-boi, Aratubaia, Cavala,Beijupirá, Guaraiuba, Peroá, Boca-negra, Olho-mole, Peixe-pena,Arraia, Caramuru, Caranha, Xaréu,Guaçari, Bicuara, Sassupemba,Quatinga, Xixarro, Piranema, Gorá,Mero-batata, M.-piraroba, M.-cherne, Garopa, Jabu

Dourado, Cavala,Albacora (atum), Bonito,Marlim, Xaréu, Sororoca,Beijupirá, Dorminhoco,Pescada, Arraia,Caramuru, Dentão,Caranha, Guaçari,Corongo, Pescada-goiva

EspinhelCioba, Canapu, Badejo,Arraia, Caramuru,Dentão, Caranha

Tubarões:- Tintureira- Panã

(martelo)- Galha-preta- Sucurupóia- Lixa- Cação cavala- Baiacu- De areia- Aniquim- Gualha

branca- Raposa

Rede de

esperaBagre, Curvina, Pampo,Xaréu, Robalo, Camurim-açu (cambriaçu), Peixe-elétrico, Sororoca, Cavala,Peixe-galo, Aracanguira,Bonito, Guaricema,Drominhoco, Pescada,Pescada-branca, Boca-torta, Cangurupi,Caximbau, Agulhão,Budião

Lagosta, Goiá, Siri, Linguado, Cioba, Ariacó,Curvina, Tapa, Camarão, Tartaruga,Parucocô, Arraia, Xaréu, Sororoca, Guaçari.

Outros organismos: Argaço (algas), buzios,estrelas-do-mar

Lixo: Lata, pneu, placa, plástico, madeira

Barbeiro, Bagres,Piraboca, Sargo ouPirambu, Guaraiuba,Beijupirá

Calão de

arrastoBarbudo, Boca-torta,Bagres, Roncador, Xaréu,Pescada, Baiacu,Samucanga, Sametária,Bicuda, Chatinha,Sardinha

Carapeba, Robalo, Cambriaçu, Bicudo,Caçari, Arraia, Mirucaia, Cangauá, Tainha,Barbudo, Sardinha, Carapicu, Caratinga,Carapitanga, Peixe-sabão, Cavalo-marinho

Siri, Lula,Lagosta,Drominhoco,Guaricema,Pampo, Cavala

Preço dopeixe para opescadorPrimeira 4,00 4,00 4,00 5,00 3,50 3,50 3,50 3,00 3,00 3,50 4,00 4,00

Segunda 2,50 2,50 2,50 2,50 2,00 2,00 2,00 2,00 2,00 2,00 2,50 2,50Terceira 1,50 1,50 1,50 1,50 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,50 1,50Quantida-

de de peixe

PrimeiraCavala, Dourado,Robalo, Beijupirá,Pescada-branca

Badejo, Olho-de-boi, Vermelho,Cioba

Pampo, Cavala,Sororoca

SegundaDourado Ariocó, curvina, guaiuba Guaricema,

Albacora

TerceiraLagostaCamarãoRenda doPescadorRenda comTurismo

12/10 1/11 15/11

Seguro defeso

Nylon seco Nylon mole Nylon seco

Na costa Na costaNo rio

Defeso

Lagosta Peixe de passagem

Semana Santa

Figura 15: Calendário de atividades de pesca e espécies capturadas (elaborado pelospescadores e marisqueiras do Grupo de Trabalho da Resex).

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A Asperi tem uma fábrica de gelo, e produz o suficiente para os barcos de Itacaré. No entanto, os participantes da Banca do Peixe gostariam de garantir o processo da fabricação de gelo com mais uma máquina, na possibilidade de uma vir a quebrar. Quando o peixe chega, a conservação se dá na câmara frigorífica da Asperi ou nos freezers dos atravessadores. Artesanalmente, alguns pescadores às vezes salgam e secam o pescado para o consumo.

7.1.4 - A Competição pelos recursos naturais e a Reserva Extrativista Marinha de Itacaré

No mapeamento participativo da Banca do Peixe, ficou aparente que os pescadores competem entre si, pois ninguém queria falar sobre os pontos de melhor pesca que conhecem. O mesmo aconteceu na Passagem. A competição também se expressa em práticas adotadas pelos pescadores, como esconder o local onde o peixe foi pescado, esconder as lagostas pescadas até de tarde, etc. Essa competição reflete o receio de perder oportunidades de pescaria para outros, o que pode causar comportamentos predatórios. Uma frase comum é "se eu não pescar, outro vem e pesca". Assim, a segurança que a Reserva Extrativista representa, ao criar acesso exclusivo dos pescadores de Itacaré aos recursos naturais, é um importante passo para a conservação e o estímulo a comportamentos ecologicamente sustentáveis. É também um pré-requisito para que os usuários dos recursos pesqueiros participem de forma responsável do seu manejo sustentável.

7.2 - Fauna bêntica (organismos de fundo) e seus usos Segundo Esteves (1988), os animais que compõem a macrofauna bêntica fazem parte da comunidade de organismos que vivem na interface entre o sedimento e a água: camarões, lagostas, caranguejos, siris, moluscos, etc.

A distribuição da fauna bêntica é controlada por vários fatores como: disponibilidade e quantidade de alimento; tipo de sedimento (arenoso, orgânico, argiloso, etc.); substrato (rochoso, madeira ,etc.); temperatura do meio; concentração de oxigênio e de gás sulfídrico.

De forma geral o principal alimento da fauna bêntica são os detritos orgânicos, que podem ser de origem autóctone (local) ou alóctone (externa). A grande importância da comunidade zoobêntica no fluxo de energia e na reciclagem de nutrientes decorre do fato destes organismos participarem nos processos de decomposição da matéria orgânica, reduzindo o tamanho das partículas, além de participarem da cadeia alimentar de vários organismos aquáticos, notadamente peixes. Além disso, esses animais ajudam na liberação de nutrientes do sedimento para coluna da água através da sua atividade de revolvimento do sedimento.

Os organismos bênticos têm sido largamente empregados como indicadores biológicos de modificações ambientais, uma vez que em decorrência de sua pequena mobilidade, e devido à posição ocupada na cadeia alimentar, são sempre afetados por tais modificações. Estes organismos podem ser usados como indicadores através de análises de diferentes níveis de organização biológica, indo desde mudanças individuais (genéticas e/ou fisiológicas) até alterações no

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ecossistema (Couto, 1996). Os donacídeos (molusco bivalve) são considerados como sensíveis indicadores de impacto ambiental, devido a sua grande suscetibilidade à poluição industrial e derramamentos de óleo (Chassé & Guenole-Bouder, 1981).

Em um levantamento inicial, através das visitas de campo e com o auxílio de pescadores e marisqueiras locais, foram identificadas 78 espécies de organismos bênticos no município de Itacaré. O número real, porém, deve ser muito maior. Moluscos (40) e crustáceos (27) foram os grupos melhor representados. Isso se deve, sem dúvida alguma, a seu maior porte e a sua maior possibilidade de exploração.

7.2.1 - Utilização da fauna bêntica

Considerando o material obtido, e de acordo com os pescadores e marisqueiras locais, na região cerca de cinco espécies de moluscos sem valor de mercado (Anadara brasiliana, A. chemnitzi, Tivela mactroides, Iphigenia brasiliana e Macoma constricta) são consumidas. Essas espécies são coletadas por mulheres e crianças e complementam a dieta alimentar. Entre os crustáceos são consumidos os juvenis de Callinectes spp. (tamanho inferior ao comercial) e o caranguejo Aratus pisonii.

Das espécies de importância comercial e/ou com potencial para o cultivo na área, foram identificadas 12 espécies de crustáceos e 10 de moluscos bivalves explorados comercialmente. Algumas destas espécies apresentam potencial para incremento de produção via aquacultura. Além dessas 22 espécies de reconhecido valor econômico, foram amostradas também três espécies não identificadas de Porifera (esponjas), com potencial econômico desconhecido.

7.2.2 - Camarão

A pesca de camarões e lagostas ainda é muito importante na região de Itacaré. Os camarões encontram-se agrupados em quatro tipos:

Sete-barbas (Xiphopenaeus kroyeri), com menor valor comercial. Bastante abundante durante todo o período de águas calmas.

Branco (Litopenaeus schimitti), conhecido por "pistola", de alto valor comercial;

Rosa (Farfantepenaeus cf. notialis e Farfantepenaeus cf. subtilis), comuns em fundos lamosos na plataforma adjacente.

Rosa-pintado ou rosa grande (também conhecido por pistola) (também (F. brasiliensis), maior valor comercial. Obtido em fundos duros, próximos à costa, no período de águas mais revoltas.

Todos os tipos são explorados por frotas de arrasto. Sua distribuição envolve a faixa de mar até a profundidade de 45 metros para o sete-barbas e o rosa, e além desta para o branco e o rosa-pintado.

Os pescadores da comunidade do Forte são os que mais praticam a pesca de camarão. A quantidade de camarão disponível varia conforme o dia, e a maior abundância pode estar em qualquer parte da costa. Há variação de produção conforme o ano e a época do ano. As épocas mais produtivas são logo depois do defeso, em junho (o defeso mudou recentemente, passando a terminar em 5 de

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maio). No verão, durante o dia, o camarão só está disponível nas áreas onde a água é turva, como ao longo da costa, em frente à praia que vai do Pontal a Piracanga, e na costa sul. Um dos locais recentemente descobertos pelos pescadores de camarão é o "Corotó", uma bacia de lama em frente à foz do Rio Piracanga, cercada de corais.

A pesca de arrasto é praticada ao longo de toda a costa de Itacaré, por barcos locais e de fora, pequenos (tipo motor B-18) e guinchos. Os barcos pequenos estão mais restritos a arrastar perto da costa, enquanto os guinchos vão atrás do camarão onde estiver, lama ou cascalho, perto ou longe da costa. Os guinchos são apontados como os maiores degradadores dos recursos naturais marinhos. Um problema apontado foi o arrasto próximo à costa e em frente a Piracanga, tanto por barcos pequenos como guinchos, locais como de fora. Em Piracanga, os moradores apontaram que guinchos pequenos estão passando pelo "Corotó", bem próximo à praia. Os pescadores do Forte e alguns da Banca afirmam que o Corotó é um dos poucos lugares onde é possível pescar camarão durante o dia no verão. Outros reconhecem que a área só vem sendo explorada para esse tipo de pesca há poucos anos, e pensam que a prática,ali, é predatória.

7.2.3 - Impactos da pesca de camarão

A lama de Itacaré está bastante degradada devido à pesca de arrasto de camarão. Nas reuniões na comunidade do Forte, houve um grande debate sobre se o arrasto por barcos pequenos causa os mesmos problemas que o arrasto feito pelos guinchos. Todos reconheceram que ambos causam danos. Nas palavras de um pescador mais velho, "Quem tá acabando com o mar é nós, não é ninguém". Porém, os guinchos causam danos em maior escala, pois têm uma maior área de atuação, uma largura maior de arrasto, maior velocidade e atuam em maior número de horas, arrastando dia e noite. Além do camarão, a pesca de arrasto captura diferentes espécies e um grande número de organismos considerados como fauna acompanhante, incluindo peixes de fundo, devido à baixa seletividade do aparelho e ao pequeno tamanho de malha das redes. Por isso, a fauna acompanhante é composta principalmente por indivíduos jovens. A maior parte do pescado capturado é descartada a bordo por não possuir valor comercial, sendo devolvida ao mar morta ou com poucas chances de sobrevivência. Além disso, o descarte da pesca associada de peixes pequenos é maior com os guinchos pois, como passam vários dias no mar, e preferem usar seu gelo para conservar somente o camarão, que é economicamente mais rentável. Os barcos pequenos muitas vezes aproveitam o que seria descarte dos guinchos.

A comunidade de Itacarezinho, por exemplo, relata que sempre observa peixinhos mortos, depois de terem sido descartados pelos barcos de pesca de camarão. As maiores queixas são sobre a ação dos "guinchos", barcos de pesca de maior porte que, segundo dizem, não respeitam as embarcações menores. Por causa dos efeitos visíveis do desperdício e dos danos que a pesca de guincho ocasiona, parece que os guinchos começaram a disfarçar. A comunidade de Itacarezinho denuncia que os guincheiros, visando camuflar sua ação predatória, têm colocado peixes e camarões pequenos, de tamanho inferior ao comercial, pescados durante o arrasto para a pesca de camarão, em sacos, afundando-os a seguir com o auxílio de pesos

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e pedras. Concluíram isso depois de encontrar, na praia, alguns desses sacos. O descarte e a sobrepesca estão entre os maiores problemas na exploração dos estoques pesqueiros de regiões tropicais, e Itacaré não é exceção.

Os guinchos, além de serem na maioria de fora, não contribuem significativamente nem com a economia local nem com empregos. Apesar de o dono dos três guinchos de Itacaré dizer que emprega muita gente e faz circular dinheiro na cidade, alguns pescadores disseram que somente um nativo é contratado do empresário. Mesmo assim, uma economia marginal, de pessoas que vivem de pequenos peixes e do descarte do último lanço feito pelos guinchos, doados ou vendidos a elas, existe em Itacaré.

Um dos problemas levantados estava relacionado com o defeso. Alguns participantes das reuniões do Forte denunciaram que os guinchos pescam dias antes do fim do defeso do camarão, e que quando os barcos pequenos vão pescar, já não tem mais nada (em 2000, uma fiscalização promovida pelo Ibama a partir da iniciativa de pescadores locais autuou vários guinchos pescando no defeso, o que resultou em apreensões e multas). Para os participantes das reuniões do Forte, seria bom que o defeso do camarão fosse maior, para aumentar a quantidade disponível. Mas seria necessário também que houvesse o seguro-defeso para esse período expandido. Novamente, houve uma discussão sobre a data certa para o defeso. Para alguns, o camarão-rosa deve ditar o defeso, pois o camarão sete barbas "não cresce". Estudos deveriam ser feitos para verificar o período apropriado do defeso do camarão. Porém, no dia 15 de março de 2001, uma Portaria do Ibama já modificou o defeso do camarão, sem aviso prévio para que os pescadores pudessem se candidatar ao seguro-defeso ou se preparar, estocando camarão para isca, por exemplo. Pode-se prever vários problemas no cumprimento dessa portaria. Segundo um dos pescadores, a portaria só veio para atender os interesses dos guinchos de Ilhéus, pois poderão arrastar durante a migração da lagosta que ocorre no antigo período de defeso do camarão. Ao permitir o arrasto durante as estação da lagosta, a nova portaria também prejudicou os pescadores de lagosta porque suas redes não poderão ser colocadas na lama onde os guinchos arrastam, pois estes costumam passar por cima das redes, causando grandes prejuízos aos pescadores de lagosta.

7.2.4 - Lagosta

A espécie de lagosta mais comum é a Panulirus argus. De acordo com os participantes, a lagosta é um recurso migratório, que vem de fora (longe da costa) para a terra, do sul para o norte, e é bastante pescada na lama. A pesca da lagosta em Itacaré é feita normalmente com redes de espera, de fundo. Em Itacarezinho, os pescadores locais mergulham (têm equipamento) e pegam com as mãos, protegidas por luvas, as lagostas escondidas no coral. Mesmo assim, muitas vezes se ferem nos espinhos da lagosta. Os pescadores da cidade pescam a lagosta migratória utilizando redes de espera. De março a abril, o conserto e confecção de redes para a pesca da lagosta envolve um bom número de pessoas.

A lagosta teve seu período de maior captura no início dos anos 90, quando os pescadores locais descobriram como pescá-las e o mercado que existe para o produto. Muito dinheiro resultava da pesca da lagosta, o que causou uma

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verdadeira "corrida do ouro" na cidade. Segundo os pescadores, a lagosta é um dos poucos recursos que o preço não baixa quando se pesca muito; ao contrário, o mercado melhora. Hoje, porém, poucos anos depois, a produção de lagosta já diminuiu muito, devido à sua pesca excessiva por barcos locais e lagosteiros de fora, que vêm até do Ceará para pescar em Itacaré. Um dos problemas apontados com os lagosteiros, é que eles descartariam os manzoás no mar, que ficam no fundo aprisionando e causando a morte de lagostas e peixes, que são disperdiçados. Por outro lado, alguns pescadores usam redes de espera não permitidas.

7.2.5 - Moluscos

Nos arrastos ao largo (plataforma continental) foram obtidos juvenis de lula (Lolliguncula brevis). Essa espécie é pouco explorada localmente, mas poderia vir a tornar-se um recurso interessante para as comunidades locais, se estudos demonstrarem potencial para extração. Os polvos (Octopus vulgaris) são coletados (com fisga ou arpão) nas lajes e nos recifes de corais. Apresentam um bom valor de mercado e são bastante procurados pelos pescadores.

7.3 - Tartarugas marinhas Apesar de ser ilegal, as tartarugas marinhas são eventualmente utilizadas para a alimentação por alguns pescadores. Mas parecem ser casos isolados. A maioria dos casos relatados foi de tartarugas que já tinham morrido nas redes e, para não serem desperdiçadas, foram utilizadas como alimento.

Duas áreas em Itacaré têm grande desova de tartarugas: as praias de Piracanga e de Itacarezinho. Neste ano, houve pelo menos 34 casos de desova de tartarugas em Piracanga, onde o pescador e líder comunitário Batista faz um trabalho voluntário de proteção dos ninhos, às vezes transplantando-os para um lugar seguro, e ajudando as tartarugas recém-nascidas a chegar até o mar. Segundo Batista, em Itacaré estão presentes as seguintes espécies (nomes comuns) de tartaruga: baleia, marinha, verdadeira, suranha, de pente, e bico de papagaio (ou azul). Na praia de Itacarezinho, a cada ano, 20 ou 30 ninhos eclodem. Antigamente, eram parte da dieta da comunidade. Hoje, talvez devido ao turismo e à atuação de alguns indivíduos na área, e devido ao próprio temor da lei, a comunidade fala bastante da conservação das tartarugas. Um proprietário local faz o transplante dos ninhos, mas a comunidade critica, dizendo que poucos ovos realmente eclodem, e que ele está mais interessado em mostrar as tartaruguinhas para os turistas que em preservá-las. A região próxima ao antigo Porto de Jangadas é a região de maior concentração de tartarugas marinhas em Itacarezinho. As tartarugas são alvo de grande atenção por parte da comunidade, mas parece haver pouca orientação para a comunidade e proprietários de Itacarezinho e de Piracanga sobre a conservação das tartarugas.

As tartarugas marinhas de Piracanga e Itacarezinho estão sendo ameaçadas pelo crescente tráfego de veículos motorizados na praia, principalmente nos meses de desova e nascimento de tartarugas, alta estação do turismo em Itacaré. Os veículos compactam a areia sobre os ninhos, criam obstáculos às tartarugas recém-nascidas e, pelo menos na opinião de Batista, deixam um cheiro de óleo na praia, que

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espantaria as tartarugas que vêm desovar. Em Itacarezinho, as áreas de marinha, onde as tartarugas desovam, encontram-se privatizadas e cercadas com arame farpado. Isso pode atrapalhar esforços de conservação. Além disso, as redes de espera freqüentemente causam a morte de tartarugas; de janeiro a abril, conta-se que em Itacarezinho já apareceram pelo menos dez tartarugas mortas na praia.

7.4 - Mamíferos marinhos Apesar de haver presença de mamíferos marinhos, como baleias e golfinhos, na área, o levantamento biológico não teve condições para observá-los ou descrevê-los. Os pescadores citam a presença de baleias na área, inclusive bem próximas à costa. Botos também são comuns no mar, além de penetrarem o estuário do Rio de Contas na maré alta.

7.5 - Áreas de uso especial Quando perguntados sobre se haveria alguma área de mar que deveria ser preservada, sem arrasto, os participantes da Banca do Peixe e do Forte citaram a área do "Berçário" ou "Jardim dos Corais", que vai do Farol até a praia da Ribeira, onde só a pesca de linha deveria ser permitida. A comunidade de Itacarezinho sugeriu o trecho da praia de Havaizinho ao Rio Tijuípe, onde só pesca de linha e mergulho deveriam ser permitidos. E a comunidade de Campo Seco sugeriu o trecho da praia de Pauva até a Engenhoca.

As discussões das Normas da Reserva (Plano de Utilização) estão apontandopara a confirmação dessas áreas de preservação.

8. Rios e Estuários Estuários são ambientes nos quais os rios deságuam no mar, e onde a mistura entre a água doce e a água do mar constitui o processo físico dominante. A física da mistura estuarina é complexa e é afetada pela estrutura geológica, pela topografia, pelo fluxo de água de origem continental, e por diversos outros fatores hidrológicos como as forças gravitacionais, de marés, ou forças de circulação causadas por ventos dominantes.

São dois os estuários principais a serem incluídos na Reserva Extrativista Marinha de Itacaré: o do Rio Piracanga e o do Rio de Contas. Entretanto, há uma série de riachos e ribeirões que deságuam no mar e que formam estuários com manguezais e restingas. Apesar de Itacaré não ter manguezais extensos, essas poucas áreas são importantes para manter a produtividade no mar, e garantir o sustento de uma ampla parcela da população, grande parte mulheres, que extraem caranguejos e outros mariscos.

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8.1 - Manguezais e Apicuns Classificado como “floresta perenifólia paludosa marítima”, o manguezal é encontrado em Itacaré numa área que ocupa aproximadamente 40 km2, com fisionomia e composição florística homogêneas, contando com um número restrito de espécies. Das sete espécies arbóreas comuns aos manguezais, apenas três foram observadas no Rio de Contas: Mangue-vermelho ou Mangue-verdadeiro (Rhizophora mangle – Rhizophoraceae), Siriba ou Siriuba (Avicenia schaueriana - Avicenniaceae), esta com flor e com maior incidência próximo à bordadura, e o Mangue-manso ou Mangue-branco (Laguncularia racemosa - Combretaceae). Na bordadura foram encontradas as seguintes espécies, todas elas também frequentes em outras regiões: algodoeiro-da-praia (Hibiscus pernambucensis – Malvaceae), samambaia-do-mangue (Acrosticum aureum - Pteridophyta), feto-do-mangue (Blechnum sp. – Blechnaceae ou Pteridophyta), além de Dalbergia ecastophylla (Fabaceae), bromélias, capim-elefante (Pennisetum purpureum – Poaceae) e Byrsonima com flor.

De acordo com a amostragem obtida por Vinha et al. (1976), o volume total de madeira nos manguezais do Sul da Bahia foi de 100 m3/ha, com uma predominância significativa (92%) do mangue-vermelho em comparação com as demais espécies.

Embora os manguezais de Itacaré não sejam extensos, há uma boa área propícia ao apicum, de onde os extrativistas extraem guaiamuns. O problema é as áreas de apicum, principalmente no Rio de Contas, estão bastante degradadas, em muitos trechos substituídas por cacau, coco ou outras plantações.

Mais será descrito sobre os manguezais e apicuns nas seções específicas de cada rio.

8.2 - Rio de Contas O Rio de Contas é o maior rio na área da futura Reserva Extrativista Marinha de Itacaré, e atravessa a cidade sede do Município. Ele percorre um longo trecho desde suas nascentes na Chapada Diamantina, é um dos maiores rios da Bahia, e tem sua foz junto à cidade de Itacaré. Ao longo de seu curso são encontradas barragens, como as dos municípios de Jequié e Ubatã. Além disso, o Rio de Contas recebe a carga de esgotos de vários municípios (além de todos os tipos de lixo). O nível de água varia ao longo do ano e, em época de enchente, o rio pode ficar de seis a dez metros acima do seu nível normal. A bacia do Rio de Contas está compreendida entre os paralelos de 12º 55’ e 14º 55’ S eos meridianos 38º 58’ e 42º

Figura 17: Manguezal no Rio Piracanga.

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00” W. De acordo com Rocha Filho (1976) é a maior bacia do polígono da Região Cacaueira, com uma superfície total de 56.550 km2 e 476 km de extensão. Rocha Filho (1976) ainda apresenta informações sobre a análise química, perfil longitudinal e declividades médias, características pluviométricas e o potencial energético desta bacia.

No passado, o Rio de Contas foi um importante meio de integração regional na Bahia, escoando produtos (como diamantes e, mais tarde, cacau) até a foz do Rio em Itacaré, de onde eram exportados. No trecho dentro da área da futura Reserva Extrativista Marinha de Itacaré, o Rio de Contas é navegável entre Itacaré e Taboquinhas, maso assoreamento tem feito a navegação mais difícil. De Taboquinhas até o Porto das Farinhas, dentro da área proposta para a Reserva, o Rio de Contas tem um trecho de corredeiras e cachoeiras, de grande beleza cênica e, de acordo com o proprietário da agência Ativa, é um dos melhores rios para a prática do rafting no Brasil.

Segundo informações obtidas da comunidade do Porto de Trás, o limite interno da zona de mistura do sistema estuarino do Rio de Contas (região onde pode-se detectar um incremento na presença de sais dissolvidos nas águas do rio) está localizado na região da Volta do Poço. Ainda, segundo a comunidade de pescadores, é comum detectar uma inversão no sentido das correntes de fundo (quando comparado com as correntes de superfície). Relatam que, em certos momentos, sob condições de maré vazante, as correntes de fundo continuam a orientar-se rio adentro, enquanto as correntes superficiais já se orientam rio abaixo. Isso ocorre principalmente onde a profundidade do rio atinge valores superiores a seis metros e, particularmente próximo à foz. A maré apresenta valores extremos de altura em torno de três metros. Os resultados apresentados no Anexo 4 mostram a variabilidade espacial na distribuição da temperatura da água e da salinidade, em diferentes locais do estuário, para o mês de janeiro, comprovando uma série de informações obtidas através do diagnóstico participativo.

O estuário do Rio de Contas tem grande perturbação pois é nele que está localizada a cidade de Itacaré. Ali são despejados, sem tratamento, os esgotos de cidade. Na praia da Coroa, essa situação é mais evidente, com o mau cheiro resultante do esgoto em vários pontos da praia bastante forte na maré baixa. O esgoto deságua diretamente na praia, através da rede de coleta de águas pluviais, e também é trazido pelo riacho que recebe o esgoto dos riachos que passam pelos bairros da Pituba, Alagados, Centro, e até perto da Rodoviária. É também nessa praia que os pescadores da Banca e de outras comunidades trabalham (embarcam, desembarcam, reformam barcos, fazem e reformam redes) e se divertem (jogo de futebol - o "baba" - no fim da tarde, conversas sobre pescarias e outros assuntos, jogo de cartas, além da fresca da noite, junto à rampa perto da Banca). Um projeto de reurbanização da orla de Itacaré, a ser implementado pela Conder, começa a preocupar algumas lideranças de pescadores, pois está sendo feito sem a sua participação e estará alterando justamente esses espaços de convivência informal da comunidade pesqueira. Se privilegiar o turismo, o projeto poderá retirar dos pescadores os seus espaços tradicionais. Portanto, o projeto deve passar pela discussão e avaliação da comunidade pesqueira.

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Entretanto, também na praia da Coroa são, freqüentemente, jogados os restos dos peixes limpos na banca do peixe. Além disso, alguns moradores das proximidades eventualmente jogam seu lixo na praia, para o rio levar.

Na praia da Coroa ocorrem sedimentos areno-lodosos, sendo que a maior parte da área fica exposta durante a baixa-mar. Em alguns trechos pode ser observada a intensa deposição de sedimentos com granulometria mais grosseira (de provável origem fluvial). A fauna bêntica observada é típica destes ambientes: bivalves (Tagelus plebeius e T. divisus, Anomalocardia brasiliana, Macoma constricta e M. tenta, Lucina pectinata e Iphigenia brasiliana), siris (Callinectes spp.) e caranguejos ocipodídeos (Uca thayeri e U. leptodactyla). Não se recomenda o consumo dos organismos desta área sem estudos mais detalhados sobre os níveis de contaminação, uma vez que pelo menos parte do esgoto urbano é liberado in natura no local.

Do outro lado do rio, a praia do Pontal também é bastante utilizada para o lazer dos nativos de Itacaré. Porém, ali se acumula muito lixo trazido pelo Rio de Contas. O pontal tem tamanho variável, de acordo com as correntes marinhas. Já foi bem menor, e não protegia a praia da Coroa como o faz atualmente. Houve uma época em que a praia da Coroa tinha ondas quebrando, que permitiam até mesmo a prática do surf. Hoje, é uma praia fluvial, de águas calmas.

Outra fonte de poluição na foz do Rio de Contas são os riachos que atravessam os bairros do Marimbondo, Passagem, Porto de Trás e Baixa da Gia. O esgoto despejado nesses riachos acabou com a possibilidade de coleta de mariscos no manguezal adjacente e contamina o Rio de Contas. Tanto esses esgotos como os esgotos da Praia da Coroa podem também ameaçar a mais nova fonte de renda da cidade, o turismo, devido ao mal cheiro e à possibilidade de transmissão de doenças, risco que atinge principalmente a população local. Óleo e lixo são também despejados de diversos barcos, tanto na frente da Banca (praia da Coroa) como no Forte.

O lixo no manguezal aumentou muito nos últimos anos. Encontra-se de tudo: roupas, plástico, colchões, sandálias, etc. Todo esse lixo chega também ao mar, se enroscando nas redes, e se depositando nas praias, principalmente na praia que vai do Pontal a Piracanga.

Além do esgoto e do lixo (os quais vêm também das cidades localizadas rio acima), o estuário do Rio de Contas sofre com o desmatamento dos manguezais e o assoreamento, que tem transformado os manguezais que sobram em áreas arenosas, onde os caranguejos não podem viver, e tem dificultado a navegação no Rio (inclusive na barra, que está a cada dia mais rasa).

No Rio de Contas, o manguezal é pequeno, e vai da barra do rio até aproximadamente a Volta do Poço.Na margem esquerda do Rio de Contas, próximo à cidade, foi observada uma grande ocorrência de dendezeiros sub-espontâneos e, esparsamente, alguns cultivos perenes de côco ecacau. Em alguns trechos, nas margens e ilhas do Rio de Contas, os manguezais (áreas de preservação permanente) foram substituídos por plantações de coco e cacau, como na Ilha do Quelengue (ou Ilha Bela). Segundo os participantes do Porto de Trás, a ilha ocupada por Manoel Andrade tem sido desmatada para o plantio de

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roças. Nesses trechos desmatados, o rio começou a avançar sobre os barrancos, obrigando a construção de barreiras de contenção e causando o assoreamento do rio. Próximo à cidade, algumas áreas de mangue foram aterradas para a construção de casas e pousadas.

No manguezal da Ilha do Meio, foi possível observar que o padrão de sedimentação encontra-se bastante alterado. Aparentemente o local está sendo erodido. A malha de raízes está exposta em até 0,5 m e o sedimento é predominante arenoso. Além de uma estreita faixa de mangue vermelho (Rhizophora mangle), estão presentes mangue branco (Laguncularia racemosa) de pequeno porte. Pode ter ocorrido recolonização com propágulos originários de outra área ou rebrota de indivíduos cortados há menos de cinco anos, mas esse processo deve ser investigado posteriormente em maior detalhe.

Em alguns trechos do longo do canal que dá acesso à Cachoeira do Cleandro há áreas de manguezal cercadas por arame farpado. O manguezal está bastante alterado, com a presença massiva de uma pteridófita no estrato arbustivo. Nesse ambiente foi observada uma elevada densidade de camarões carídeos (material não identificado ao nível de espécie até o momento), que a comunidade utiliza como isca (denominada localmente de pitiguira). Os caranguejos de mangue (Ucides cordatus) e o aratu (Goniopsis cruentata) eram de maior porte e mais abundantes. Um pescador citou a ocorrência de busanos (Bivalvia: Teredinidae – material não coletado) que apodrecem as árvores do mangue e as fazem cair, além de atacarem os cascos de madeira de barcos e canoas. Na região não é costume consumir estes organismos.

Nas margens do rio, um dos problemas é o desmatamento das áreas de preservação permanente para o plantio de roças, especialmente cacau, inclusive nas áreas de marinha e de apicum. É provável que esse desmatamento esteja contribuindo para o assoreamento do rio.

Nas imediações da vila Povoação, por exemplo, a vegetação às margens do rio, encontra-se bastante destruída e os terrenos são utilizados para pastagens (embora haja poucos animais na área) e roças de cacau e banana. Segundo os moradores, a terra dos apicuns é muito mais fértil do que as outras, daí a sua utilização para roças. Apenas um proprietário deixou um bom trecho de mata nas suas terras (Chico Mineiro). Mas ele não permite que os apicuns sejam utilizados para o extrativismo.

Além do desmatamento, um outro fator que pode estar contribuindo para o assoreamento do Rio de Contas tem sido a construção de barragens rio acima, em Jequié e Ubatã. Estudos são necessários para verificar se as barragens contribuem com o assoreamento, já que as próprias barragens têm sido assoreadas, retendo os sedimentos e indicando que o assoreamento do rio estámais ligado ao desmatamento de suas margens. As barragens apresentam uma série de problemas para Itacaré: 1) podem estar aumentando o assoreamento do rio, dificultando a navegação; 2) destroem os ciclos de cheias/secas (enchentes ocorrem de repente, conforme a abertura das comportas das barragens pelos administradores das barragens e não conforme os ciclos naturais), e 3) aumentam a quantidade de baronesas (água-pés) no rio quando liberam água pelas comportas em grande

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quantidade, e a sua concentração em períodos curtos, o que causa grandes prejuízos à pesca e ao turismo em Itacaré4.

8.2.1 - Uso dos recursos naturais próximo à foz do Rio de Contas

Os caranguejos (Ucides cordatus e Goniopsis cruentata) são obtidos no manguezal. Na área de contato entre o manguezal e a mata (restinga ou mata atlântica) é coletado o guaiamun (Cardissoma ganhumi), considerado como o mais saboroso e que tem maior valor no mercado. Em vários trechos, não se encontram mais caranguejos devido à trasformação do ambiente. A produtividade também é baixa e os caranguejos não atingem grande porte. As comunidades atribuem o pequeno desenvolvimento dos caranguejos ao solo arenoso que vem se tornando característico do manguezal, à superexploração (principalmente nos manguezais próximos à cidade de Itacaré) e às enchentes anuais (que diminuem muito a salinidade da água e levam os caranguejos para o mar). Por outro lado, os guaiamuns crescem bem.

Além de caranguejos, guaiamuns e aratus, no manguezal do Rio de Contas também está presente o Aratus pisonii, utilizado como isca viva na pesca do robalo e, quando de maior porte, utilizado “quebrado” juntamente com o aratu, em moquecas e fritadas.

Os siris, pertencentes ao gênero Callinectes (três espécies identificadas para a área), são um recurso econômico importante para as populações ribeirinhas. A maior parte da produção é obtida nas gamboas ao longo do estuário do rio de Contas. A espécie mais valorizada (considerada de carne mais saborosa) é Callinectes exasperatus.

Segundo a comunidade do Porto de Trás, o guaiamum e o caranguejo ficam "moles", ou "de leite" após a muda, e nesse período não devem ser consumidos (dá diarréia, segundo a comunidade). Siris e aratus não têm esta característica. O caranguejo fica "tapado" na toca para mudar em março-abril.

Ocorrência de fêmeas ovadas (houve controvérsias na reunião do Porto de Trás):

1) Caranguejo: começa em novembro, no máximo em janeiro (a andada ocorre na maré morta de janeiro, que neste ano seria em 20/01, mas que, segundo os moradores, não houve por causa da chuva. Entretanto, houve andada na segunda quinzena de março.

2) Siri: janeiro.

3) Aratu: o ano todo.

4 As baronesas, ao chegarem no mar, morrem devido à salinidade da água, e acumulam-se nas praias, formando montes que até mesmo dificultam o acesso dos banhistas ao mar, também muito sujo de fragmentos dos vegetais em decomposição. Os montes de baronesas mortas começam a se decompor nas praias, e quando são mantidos úmidos, um cheiro podre de enxofre (ovo podre) se desprende. A Prefeitura de Itacaré, no Reveillon de 2001, teve grande trabalho limpando as praias e vários turistas deixaram a cidade com péssima impressão. Os pescadores, quando retornavam de suas pescarias, eram obrigados a passar horas limpando os fragmentos das plantas de suas redes.

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4) Guaiamum: janeiro. A fêmea do guaiamum é chamada de "pata choca". No passado, na época da desova, eram muito coletadas na região. As patas chocas costumavam andar até nas ruas da cidade, mas a captura excessiva fez isso quase acabar. Agora tem pouco.

O uso dos apicuns do Rio de Contas pelos moradores da Povoação é feito apenas para o próprio consumo, mas pessoas de fora (que moram em Itacaré) têm vindo para retirar guaiamum para comercializar, usando um método considerado pelos moradores como bastante predatório: eles fazem buracos no mangue para pegar um ou dois guaiamuns e quando a água do rio começa a bater, "descava tudo", o que acaba "destruindo a morada de mais de vinte". Os moradores da Povoação só utilizam armadilhas para a mariscagem. Porém, uma pessoa disse que os moradores estão pegando muitos guaiamuns ("três ou quatro sacos") na época de andada, quando eles estão muito magros, acabam não servindo para nada e apodrecem nos quintais das pessoas. As fêmeas ovadas ("patas chocas") são levadas escondidas para fora do povoado. Além de guaiamum, são retiradas lambretas, caranguejos e siris.

Caranguejos e guaiamuns estão cada vez mais escassos no Rio de Contas, mas ainda são abundantes em Itacarezinho e Campo Seco, provavelmente devido à menor pressão de captura. Em Piracanga, por outro lado, já não tem andada de caranguejos há dois anos.

Entre os moluscos, foram observadas a ostra verdadeira (Crassostrea rhizophorae) e a rosa (Ostrea equestris). A abundância de ambas foi muito baixa (poucas raízes escora colonizadas, poucos indivíduos presentes por raiz e de pequeno porte). Indivíduos maiores estavam sempre abertos (mortos). Um pescador levantou a possibilidade de essa baixa produção estar relacionada à entrada desordenada de água doce nos momentos de liberação de água das barragens rio acima. Notável também foi a virtual ausência de cracas. Apenas alguns exemplares de Euraphia rhizophorae foram observados.

Além das ostras, a população comercializa dez espécies de moluscos bivalves. A maioria é habitante de planícies lamosas localizadas à frente dos manguezais. Nessas áreas são obtidos o sururu (Mytella guyanensis e M. charruana), o berbigão (Anomalocardia brasiliana), a unha-de-velho (Tagelus divisus e T. plebeius), a lambreta (Lucina pectinata) e a taioba (Macoma constricta).

A comunidade do Porto de Trás envolveu-se na coleta de organismos para este diagnóstico. Em área de manguezal foram obtidos moluscos (Lucina pectinata e Tagelus plebeius) e crustáceos (Callinectes exasperatus) de interesse comercial. Foram ainda coletados caranguejos-ermitões (Clibanarius vittatus) em conchas de diferentes gastrópodes. As conchas pertenciam a espécies que são características de maiores profundidades, devendo ser provenientes da plataforma adjacente à foz do Rio de Contas. Na área mais externa do estuário, junto à linha de praia exposta, foram observados depósitos de valvas de diversas espécies de bivalves, com predomínio de Tivela mactroides, Sanguinolaria cruenta, Tellina spp e Anadara spp. Foram também observados Arenaeus cribarius e Callinectes danae juvenis. No nível mais alto foram observados inúmeros Ocypode quadrata.

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Entre os moluscos da infauna (organismos que vivem enterrados no sedimento), as espécies Mytella falcata, Mytella guyanensis (sururu), Lucina pectinata (lambreta) e Tagelus plebeius (unha-de-velho) apresentam potencial para o cultivo. A ostra também poderia ser cultivada, caso não ocorressem baixas salinidades no estuário, como registrado nos períodos mais chuvosos do ano.

A lista parcial das espécies de zoobentos coletadas neste diagnóstico encontra-se no Anexo 10.

Os recursos pesqueiros do Rio de Contas são a base da sobrevivência dos pescadores e pescadoras das comunidades urbanas do Porto de Trás, Passagem, Marimbondo e Taboquinhas. Também são utilizados por alguns pescadores da Banca do Peixe, e das comunidades rurais localizadas ao longo do Rio de Contas, mais próximas a Itacaré, como João Rodrigues e Povoação, e as próximas de Taboquinhas, como Pé da Pancada, Rua de Palha e Água Fria.

As modalidades de pesca enumeradas pelos participantes da Passagem e Marimbondo foram:

Rede de arrasto

Rede de afincar

Tarrafa

Siripóia

Mergulho

Ratoeiras para a coleta de caranguejos e guaiamuns

Linha

Molinete

Tabela 4: Espécies comumente pescadas na Passagem e Marimbondo. Nome comum Observação Robalo Comum em todo o

rio e na Volta do Poço

Carapeba Comum na volta do poço e no pontal

Tambaqui De água doce. Comum na volta do poço

Curimatã Comum na volta do poço, com cerca de cinco quilos

Carapicu Barbudo Sardinha cascuda Mirucaia Corroque Baiacu Tainha Pampo Carapitanga Moréia de mangue Siri "Maria Marta" é o

nome local da fêmea do siri pequeno

Siri bebé ou siri fumo Apimentado, vermelho com pintinhas

Caranguejo Aratu Guaiamum A área de ocorrência

de vai até as propriedades de João Pezinho, na margem direita, e de Joselito, na margem esquerda do rio.

Ostra Sururu

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As espécies mais comuns no trecho do Rio de Contas utilizado pelos moradores da Passagem e Marimbondo estão listadas na Tabela 4.

As seguintes artes de pesca foram citadas pelos participantes da comunidade do Porto de Trás:

1) Rede caçoeira: rede que eles soltam e desce com a maré, para peixes grandes.

2) Mariquita: cerco com uma canoa só (30mm malha).

3) Tainheira: idem anterior (malha maior, 35mm).

4) Rede de arrasto.

5) Rede de calão: lançada com canoa de oito pessoas; a rede é puxada com uma corda, e é usada no mar e também no rio.

6) Tarrafa: só os homens jogam, mas as mulheres conhecem a arte. É usada da boca da barra até Taboquinhas.

7) Tapasteiro: sistema em que os pescadores "fecham" o "riacho" com mourão e uma rede; na maré enchente os peixes entram e então eles "fecham" o bloqueio levantando a rede amarrada no mourão: os peixes ficam presos na vazante.

8) Cesta para coleta de camarões entre a vegetação e no riacho (água doce). Pegam também com o cesto peixinhos e camarões miúdos na areia/barranca do rio.

9) Pesca com pano de aninhagem e tela: usada para a pesca de pentiguira (um tipo de camarão) usado para pegar peixes miúdos que eles amarram como isca na siripóia (ou no caso dos peixes, usam para consumo).

10) Siripóia, para a pesca de siri, no pontal e outras partes do rio. Não pescam siri apenas na boca da barra, porque a canoa não aguenta as ondas.

11) Coleta de caranguejo, com a mão (e até o pé) no mangue, em que a pessoa tem que enfiar o braço na lama para alcançar o animal no buraco. Coleta-se dois a três quilos de caranguejo por dia.

12) Linha e anzol, usada para a pesca no Forte (linha com vara e linha de jogar).

13) Rede de mão, para a pesca no riacho.

14) Groseira, que não é mais utilizada no rio pois a "moda passou".

15) Camboa, um cercado colocado como armadilha no rio, que ficou proibida e não é mais usada. Uma oportunidade levantada foi o uso da Cambôa para fazer a engorda de peixes capturados, usando os restos dos mariscos catados.

As tarrafas são usadas em todos os estuários, mas no Rio de Contas um grande número (20-30) de pessoas de Ilhéus vêm para Itacaré pescar no período de maio e junho. Nesse mesmo rio, também há um grande número de pessoas pescando de mergulho. Muitas pessoas de fora e locais utilizam o mergulho noturno com iluminação subaquática, atividade que é considerada predatória pelos pescadores de Itacaré.

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As seguintes artes de pesca foram citadas para algumas espécies de peixe:

Robalos: caçoeira, rede-de-arrasto, anzol e mergulho. Robalo pode ser encontrado até Taboquinhas.

Carapicu, caratinga e carapitanga: anzol e tarrafa.

Dentão: anzol, tarrafa e linha.

Caranha, carapeba: rede e anzol.

Tainha: rede e tarrafa.

Pescada escamuda: rede.

Pescada goiva: rede, anzol e mergulho.

Cangauá e curimã: tarrafa.

Baiacu: anzol.

No Rio de Contas, os moradores da Povoação só pescam para subsistência, usando para isso canoas, redes e tarrafas. As mulheres pescam de caniço. As espécies mais apreciadas são o robalo, carapeba e tainha. Pessoas de fora também têm utilizado pesca de mergulho noturna com iluminação, que já foi observada pelos moradores e é considerado errado por eles. Algumas pessoas disseram ter ouvido barulho de pesca com bomba, o que também consideram totalmente errado.

A maior parte do que é pescado ou coletado pelos moradores e moradoras do Porto de Trás é destinada para consumo próprio. O pouco que sobra para venda é dado para "os meninos", que levam para vender na cidade (venda avulsa). No passado, mariscavam e pescavam só para consumo. Hoje é para consumo e venda, o que pode estar ajudando a diminuir a abundância desses recursos. O peixe é uma parte importante da dieta, que também tenta ser variada, incluindo carne, quando há dinheiro para comprar. Apesar de estar diminuindo, elas acham que tem quantidade suficiente de caranguejo. Na andada dos caranguejos, os/as marisqueiros/as acabam coletando muitos para estocar e ganhar preço, mas muitas vezes os animais acabam morrendo antes mesmo de serem vendidos. Além dos

Figura 17a: Mapa participativo do Rio de

Contas, elaborado pelas comunidades de

Marimbondo/Passagem (1a. parte).

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animais aquáticos, outros são utilizados para a subsistência, como é o caso das cobras.

8.2.2 - Afluentes do Rio de Contas no trecho próximo à foz

Os mapas participativos realizados no Porto de Trás e com as comunidades de Passagem e Marimbondo (Figuras 17a e 17b) indicaram os seguintes afluentes do Rio de Contas:

Boca de Aurino (margem esquerda do Rio),

Baiacu de Baixo (idem)

Baiacu de Cima (idem)

Rio João Amarelo (margem direita): corta o Bairro da Passagem, antes de atingir a comunidade do Porto de Trás. No Bairro da Passagem, recebe uma grande carga de esgoto doméstico de ligações irregulares. As suas águas ainda hoje são utilizadas na lavagem de roupas. Chegam ao Porto de Trás já poluídas.

Riacho Pedrosa (margem esquerda).

Rio Cachoeiro do Aderno (margem direita): tem na foz um sistema de apicum (á sua direita) e, um Manguezal à esquerda.

Riacho do Aderno (margem direita).

Riacho Santo Amaro (margem esquerda).

Rio Povoação (margem direita).

Figura 17b: Mapa participativo do Rio de

Contas, elaborado pelas comunidades de

Marimbondo/Passagem (2a. parte).

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Riacho da Mariquinha (idem).

Rio do Engenho (margem esquerda): cercado de manguezal e apicum, este riacho forma a conhecida cachoeira do Cleandro, que cobra entrada das pessoas de fora de Itacaré para aproveitar a cachoeira e não permite a coleta de mariscos na área de marinha. A maré avança pelo riacho até o pé da cachoeira. Nas margens, próxima à cachoeira (áreas de preservação permanente), a vegetação nativa foi destruída para a construção de uma cabana e para o plantio de uma roça.

Riacho do Bambu (margem esquerda).

Riacho Tucum (margem direita).

Riacho de Jaime (margem esquerda).

Riacho Lauro Grande (idem).

Riacho do Careca (margem direita).

João Rodrigues (margem esquerda).

Riacho da Imata (margem direita).

João Pezinho (idem)

Vantuí (idem): deságua junto à ilha Vantuí, em frente a Fazenda Vantuí, que utiliza a ilha como pastagem.

Riacho do Capitão (margem direita).

Pinheiro (margem esquerda).

A lista de afluentes do Rio de Contas, acima, é incompleta e refere-se somente ao trecho entre a Foz e a Volta do Poço, onde a água salgada alcança, e até onde o Rio é mais utilizado pelas comunidades da cidade de Itacaré, especialmente Porto de Trás, Passagem e Marimbondo. Em praticamente todos esses afluentes há variação da maré, manguezais e apicuns. Em boa parte, o acesso de pescadores e marisqueiras a essas áreas, apesar de serem áreas de marinha, tem sido restringido pelos proprietários das terras adjacentes.

8.2.3 - Dinâmica do Rio de Contas próximo à foz, conforme relato das comunidades

No local conhecido por Banco do Renato, ocorre um processo recente de colonização por mangue. Este processo é explicado por uma "reversa" (célula de circulação em sentido horário) que tende a acumular os propágulos das plantas. Esse manguezal é bem estreito e está se desenvolvendo sobre um substrato outrora arenoso.

Próximo à foz do Rio de Contas, em pontos onde a profundidade local do rio ultrapassa seis metros, observa-se um fluxo bidirecional (com intrusão salina junto ao fundo). Ou seja, enquanto na superfície a água doce corre em um sentido, a água salgada (mais pesada) corre mais no fundo em sentido contrário. A maré apresenta valores extremos em torno de três metros. Sob tais condições, áreas

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marginais do rio e afluentes são totalmente inundadas. Mesmo sob condições normais de maré, a Ilha da Coroa, na parte central do rio é constantemente lavada pela maré.

Quando ocorrem enchentes no Rio de Contas (mais freqüentes no verão), o rio traz baronesas (água-pés), entulho e lixo (proveniente principalmente de Ubaitaba), interrompendo as atividades de pesca até que a água volte a ficar limpa. Essas enchentes são causadas pela abertura das comportas da represa em Jequié, que ocorre sem planejamento ou consideração pelos ecossistemas rio abaixo. A represa pode também estar contribuindo para a diminuição do volume de água no rio durante o resto do ano e para o seu assoreamento.

Os trechos mais fundos do Rio de Contas perto da foz estão localizados no caminho percorrido pela balsa e na barra, junto à pedra do Xaréu (dependendo da maré).

8.2.4 - Rio de Contas próximo a Taboquinhas

O trecho do rio situado próximo à Taboquinhas é marcado pela existência de rochas e corredeiras, sendo que, em alguns pontos as duas margens situam-se separadas por poucos metros. Canhões e gargantas bastante profundos (até 20 metros) e piscosos são encontrados próximos à Taboquinhas, e são amplamente explorados pelos pescadores locais. Nos trechos em que o rio apresenta maior largura, é comum a formação de praias com areia fina.

Perto de Taboquinhas, um problema tem sido a retirada de areia ilegal por um tal Rael. Ao invés de retirar areia do leito do rio, onde beneficiaria a navegação, os infratores estão retirando areia das margens, desestabilizando-as e aumentando o problema. A areia é retirada em pelo menos dois pontos: 1) próximo à cachoeira do Fumo e 2) no Pé da Pancada. Segundo a comunidade, a areia é vendida em Taboquinhas e Itacaré, onde a demanda é crescente devido ao turismo. Assim, o problema tende a se agravar.

No Pé da Pancada também houve recentemente uma infração ambiental em área de preservação permanente por parte da Agência Ativa, que promove rafting no Rio de Contas. Grande quantidade de terra foi movimentada nas margens do rio. O trecho da "pedestra", uma estrada para pedestres histórica, cujo calçamento tem mais de 80 anos, junto à estrada que liga Taboquinhas a Ubaitaba foi aterrado. As máquinas passaram por sobre uma ponte para pedestres e animais, arriscando sua estrutura, e abriram caminho na vegetação que separava a "pedestra" de um terraço na beira do rio. Dois acessos foram construídos ligando a pedestra ao terraço. Ali, as máquinas movimentaram terra e destruíram a vegetação herbácea que estabilizava o terreno contra a ação das chuvas e do próprio rio em ocasiões de cheias. A movimentação de terra chegou a menos de um metro da água. Em conversa com o Sr. Otto no dia 31/3/01, ele afirmou que sua intenção é criar ali um parque, e um lugar para desembarque do rafting. Disse ainda que vai replantar as árvores no local. Entretanto, o Sr. Otto realizou a obra em terreno que não é seu, em área de preservação permanente e "de marinha", sem licença ou mesmo consulta à comunidade.

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O rio varia muito de nível, sem grande previsibilidade de acordo com as estações. As enchentes ocorrem tanto no verão como no inverno, causando um aumento de cerca de seis metros na profundidade do rio, e uma grande expansão lateral, atingindo terraços marginais. Durante as enchentes, a pescaria torna-se difícil, porque a água fica muito suja. Segundo os pescadores e pescadoras locais, isto acontece devido à força com que as águas são liberadas pelas duas barragens, construídas há aproximadamente 60 anos. Sempre aconteceram enchentes, mas elas tinham força para remover a sujeira de uma forma que não atrapalhava a pescaria. Ao contrário, a pescaria logo após as enchentes costumava ser muito boa. A última grande enchente ocorreu em 1964.

Na área inundável do rio, existe uma vegetação arbórea nativa de pequeno porte, com caules retorcidos, que parece estar bem conservada. Essa vegetação inclui ingauí, ingá, alecrim, angelim, bambu, dendê e cajá.

Nas curvas do rio, observa-se a formação de praias com acúmulo de areia fina e cascalho. As rochas encontradas parecem ser do tipo cristalina, em alguns trechos com metamorfização semelhante à que encontramos em Itacaré. Nesse trecho do rio de Contas, peixes de água salgada (robalo, tainha e carapeba) se misturam com peixes de água doce (tambaqui, pacu, piranha, acari, piau e carpa).

O local mais usado para jogar tarrafa é o Pé da Pancada. A área da prainha é usada para lazer e turismo. Ali, a comunidade faz churrasco, passa o dia, namora, etc.

O Anexo 11, apresenta nomes comuns de espécies da fauna conhecidas no ecossistema.

Na coleta realizada em Taboquinhas, encontraram-se quatro espécies de crustáceos decápodos: 1) o pitu (Macrobrachium carcinus), e 2) o ca1ambau (M. acanthurus), camarões carídeos pertencentes à família Palaemonidae, 3) a curuca (Atya scabra), um também carídeo, pertencente à família Atyidae, e, ainda, (4) o siri (Callinectes sapidus), pertencente à família Portunidae. Os pescadores reconhecem três diferentes siris na região de Taboquinhas, o siri-nema, o siri-de-ponta e o siri-cearense, porém coletou-se apenas C. sapidus. A ocorrência, no rio de Contas e seus tributários, de espécies previamente registradas para o estado da Bahia, como M. olfersii, M. nattereri, M. brasiliense e M. jelskii, bem como de caranguejos dulcícolas do gênero Trichodactylus, não pode ser descartada, dado o caráter pontual da amostragem. Todas as espécies coletadas apresentam importância econômica, sendo também utilizadas para fins de subsistência por parte da comunidade local. Parte do ciclo de vida das espécies coletadas é dependente de águas salobras e/ou salgadas. O Anexo 12 apresenta dados adicionais sobre a biologia das espécies de crustáceos coletadas junto a Taboquinhas.

8.2.5 - Artes de pesca e seus usos próximo a Taboquinhas

As artes de pesca mais usadas são:

manzuá, que é feito artesanalmente seguindo a tradição indígena, com samambaia e cana brava; como quase todos confeccionam seus próprios manzuás, eles apresentam pequenas diferenças que servem como

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identificação. Servem para pegar pitu e camarão, principalmente no Sequeiro. As iscas mais utilizadas para pitu são peixes pequenos, curuca e mandioca;

Jereré, para curuca;

Anzol, tarrafa (principalmente no Pé da Pancada) e espingarda de mergulho são instrumentos usados para a pesca do robalo;

Jiqui;

Siripóia, usada para capturar várias espécies de siri;

Arpão, utilizado para captura de pitu. Hoje em dia, tem sido utilizado para pitus muito pequenos, o que foi bastante criticado.

Os pescadores a montante de Taboquinhas usam apenas canoas e jangadas, porque o rio nesse trecho é muito acidentado, impossibilitando o uso de barcos e lanchas. As canoas são feitas de madeiras cada vez mais raras, como o pequi, vinhático, muanza, louro, e graveto. Estas madeiras foram substituídas pela capoeira. As jangadas ainda são usadas, mas hoje em dia quase não há mais as feitas de bambu, pois são muito pouco resistentes, ao contrário daquelas feitas com pau-de-jangada. No período de enchentes, os pescadores usam apenas a pesca de anzol.

A captura dos crustáceos é realizada com o auxílio de armadilhas artesanais, como o manzuá (covo), o jereré e o jiqui (Fig. 5), e também utiliza-se a captura manual. Acidentalmente, são apanhados com tarrafa. Os siris são ainda apanhados com a siripóia. Como iscas são utilizados mandioca, peixe e vísceras, e, no caso do pitu, utiliza-se a própria curuca, que tem um valor comercial bem menor. Como esses animais apresentam maior atividade no crepúsculo e no amanhecer, os manzuás, que são os instrumentos mais largamente utilizados, são colocados ao fim da tarde, no fundo dos rios e permanecem durante à noite, sendo recolhidos na manhã seguinte. Em épocas favoráveis, pode-se apanhar até 2 kg de pitu por noite.

Segundo relato dos pescadores, a população de camarões do rio de Contas vem sofrendo progressiva diminuição ao longo das últimas décadas. Inicialmente, tal recurso era utilizado principalmente para fins de subsistência. A pesca do pitu era farta e seu valor comercial era bem menor do que é hoje, porém, com a crise na cultura do cacau, provocada pela vassoura de bruxa, o índice de desemprego elevou-se, os trabalhadores deixaram a roça e passaram a viver principalmente da pesca. O recurso, até há pouco tempo abundante, diminuiu em quantidade e os animais capturados atualmente são de pequeno e médio porte. Além disso, até mesmo fêmeas ovadas são capturadas. A escassez de pitus provocou recente interesse pela da pesca da curuca, recurso que também já se encontra ameaçado. Tais fatores indicam que esses recursos sofrem sério risco de extinção nos próximos anos, em decorrência da sobrepesca e da captura de fêmeas ovadas.

Os pescadores pescam para o consumo e para venda aos moradores da comunidade, principalmente na feira, que acontece aos sábados, e também na casa de compradores habituais. Alguns atravessadores também compram para revenda em Ilhéus, obtendo um lucro muito maior que os próprios pescadores. O filé

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de curuca é vendido por R$ 5,00/kg. O filé de pitu, por R$ 12,00/ kg. Os pescadores deixaram de comer pitu, pois o preço de comercialização é muito alto.

8.3 - Rio Piracanga No Rio Piracanga, proporcionalmente, há mais mangue que no Rio de Contas. O Piracanga é um rio é meândrico, cheio de curvas. O trecho proposto para ser incluído na Reserva percorre uma restinga típica, com todas as gradações (ver trecho sobre a praia de Piracanga, acima). A praia de Piracanga, onde o rio deságua, é também parte dessa restinga. A partir da foz do rio, indo em direção ao sul por um bom trecho, a praia tem o mar de um lado e o manguezal do outro, sendo a faixa de areia não mais larga que 100 metros. O rio corre para o norte, acompanhando a praia, até rompê-la onde hoje é a sua foz para o mar. A barra do Rio Piracanga é móvel, às vezes está mais ao norte, outras está mais ao sul.

Em Piracanga, o rio apresenta água escura, típica de manguezais, mas corre em pequena quantidade. O maior volume de água é causado pela entrada periódica do mar com o ciclo das marés. Os principais afluentes do Piracanga são o Riacho Tiririca (na margem esquerda) e o Riacho Chibum (na margem direita) (ver Figura 5). A influência da maré (que demarca os limites propostos da futura Reserva) vai até a propriedade do Sr. Douglas, no Rio Piracanga, e a ponte sobre o Riacho Tiririca.

Relativamente à vazão do rio, os manguezais no Piracanga são extensos. Segundo os moradores de Piracanga, são várias as espécies de peixes que sobem o rio para desovar, e o fazem nas cabeceiras, próximas ao Pontal. É provável que seja bastante importante para a manutenção de várias espécies de peixes no mar.

O estuário do Piracanga tem várias ilhas, cercadas de mangue, sendo quatro delas ocupadas por famílias de pescadores. A maior parte das famílias está nas ilhas há cerca de quatro anos. Entretanto, as ilhas têm uma história de ocupação antiga, na maior parte, com coqueiros plantados há mais de 15 ou 20 anos em uma delas. O manguezal de Piracanga, apesar de belo e importante para a pesca, apresenta também problemas, como o assoreamento por areia, e o desmatamento de um trecho de mangue pelo proprietário de um dos sítios nas suas margens.

No Rio Piracanga, as modalidades de pesca mais comuns são a pesca de arpão, tarrafa e caniço, por pessoas da comunidade de Piracanga, do povoado de Caubi, e de Itacaré e Maraú. Alguns pescadores locais consideram a pesca de arpão danosa aos recursos pesqueiros do Piracanga.

8.4 - Rio Jeribucaçu O estuário do Rio Jeribucaçu é caracterizado por meandros e um trecho razoável de manguezais, onde parece predominar o mangue branco, localizados entre montanhas íngremes cobertas de mata. Os caranguejos e outros recursos naturais do mangue ainda são pouco explorados para fins comerciais.

O rio tem pouco volume de água, e a sua foz é na praia de Jeribucaçu, um trecho curto de areia. Na margem direita da foz, localiza-se a sede de uma fazenda, onde a vegetação nativa foi eliminada para a construção da casa e seus jardins. A

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influência da maré vai até a antiga barragem e entra também pelo riacho Maria Rita, afluente do jeribucaçu.

Um problema apontado pelos moradores de Campo Seco é a pesca de mergulho com fisga. O pequeno volume e a largura estreita do rio torna a pescaria de tarrafa na entrada do estuário também perigosa para a conservação dos recursos. Os moradores não mostraram uma preocupação especial com isso.

Não foram levantadas mais informações sobre os riachos da região de Jeribucaçu.

8.5 - Rios e riachos na região de Itacarezinho Dentre os rios que deságuam na região de Itacarezinho, o Rio Tijuípe é o que apresenta as águas mais claras, enquanto que o Rio Vermelho recebe sua denominação em função de substâncias em solução na água. O Rio Vermelho apresenta uma área de mangue e, aparentemente, também uma área de campos alagados, semelhantes aos de Piracanga mas menores, que foram avistados do alto de um morro, a distância, pelos facilitadores. Há um pequeno trecho de vegetação de restinga bem conservado ao longo da praia, junto à foz do Rio Vermelho.

Na praia de Itacarezinho, do norte para o sul, o Rio Vermelho é o segundo curso d'água a desaguar no mar (o primeiro é um riacho que corre em cascatas até desaguar no canto da praia). Em terceiro, vem o Riacho da Pagã, que corre ao longo da praia de Itacarezinho, contido pelas suas areias, formando um pequeno manguezal. Nas épocas de menor chuva, a Pagã fica represada pela praia, sendo invadida às vezes pela maré alta. Quando chove mais, rompe a barragem natural, desaguando no mar. A restinga entre a Pagã e a praia encontra-se plantada com coqueiros. Na foz da Pagã (área de marinha e de preservação permanente), o "proprietário" desmatou o mangue, e construiu uma pequena lagoa, uma cabana e uma estrada de terra.

Mais ao sul, um riacho que desaguava no Porto de Jangadas teve seu curso interrompido por um aterro na propriedade de Durval Lélis. Cerca de duzentos metros ao sul do Porto de Jangadas, o Riozinho tem uma boa área de mangue e apicum, e encontra-se menos perturbado junto à foz. Parece ter um volume de água maior, pois estava correndo livre para o mar na mesma ocasião em que a Pagã encontrava-se ainda represada pela praia.

Ao demarcar a Reserva Extrativista Marinha de Itacaré, atendendo à proposta de incluir nela as áreas de marinha, deve-se tomar o cuidado de verificar as áreas de influência da maré nos estuários destes riachos, pois são utilizados para o extrativismo da população local, apresentam importância para os ecossistemas marinhos locais (os corais, por exemplo, concentram-se em frente aos estuários do Rio Tijuípe e dos riachos que deságuam na praia de Itacarezinho), e têm importância paisagística. Assim, devem ser incluídos na Reserva para serem protegidos e utilizados de forma sustentável, sujeitando os usuários às regras de uso escolhidas pela comunidade.

Segundo os moradores de Itacarezinho, a ação da maré é mais sentida na boca do estuário do Rio Tijuípe, onde a profundidade média é da ordem de um metro na maré vazante e de cerca de três metros na maré cheia.

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9. Potencial para Aquacultura São encontradas na região várias espécies de crustáceos e peixes marinhos, fluviais e estuarinos, e moluscos bivalves estuarinos com potencial para aquacultura (vide lista de espécies encontradas, nos anexos):

9.1 - Peixes Os robalos (espécies da família Centropomidae) são considerados de primeira linha devido à qualidade de sua carne, e com potencial e grande interesse pela comunidade de pescadores para o cultivo. Exemplos são os robalos Centropomus undecimalis (camurim), C. parallelus (robalo de barriga mole, ou branco), e C. spp., que ocorrem na região. Centropomus undecimalis é a maior espécie da família podendo atingir até 1,3 m de comprimento e pesar 25 kg. Apresenta reprodução do meio do verão ao final do outono, época em que costumam subir rios e lagoas costeiras para desovar (Suzuki, 1986). Centropomus parallelus possui um tamanho menor que a anterior, atingindo no máximo 60 cm de comprimento e três quilos, sendo mais comum e abundante em águas doces.

De uma maneira geral, os centropomídeos apresentam potencial para aquacultura, pois aceitam o cativeiro, são resistentes ao manejo e às variações da qualidade de água (Tucker, 1987; Brugger e Freitas, 1993). Porém, trabalhos mais conclusivos até o presente momento ainda não foram desenvolvidos com as espécies acima citadas, apesar do seu grande interesse (Cerqueira, 1995; Benetti, 1993; Barbuio, 1999), e ainda pouco se conhece em relação a aspectos biológicos desses peixes. Tentativas de crescimento de C. parallelus em tanques-rede na região de Angra dos Reis (RJ) obtiveram resultados satisfatórios onde os animais atingiram tamanho comercial (160g) com 40 % de sobrevivência (Brugger e Freitas, 1993). Acredita-se que o Nordeste seja uma região altamente favorável à criação de robalos.

Algumas espécies da família Lutjanidae, denominadas de vermelho (cioba, dentão e vermelho - Lutjanus spp.) também apresentam grande potencial para cultivo. São espécies muito apreciadas pela qualidade de sua carne, ocorrendo com maior freqüência no Nordeste do Brasil e, mais raramente, no Sudeste e Sul (Menezes e Figueiredo, 1980; Godoy, 1987). Espécies desta família tem sido estudadas visando seu aproveitamento na piscultura (Menezes e Figueiredo, 1980; Gaspar e Cervigón, 1987). Em testes preliminares foram observadas a adaptação de juvenis de algumas espécies desta família a tanques-rede e à alimentação artificial, e crescimento satisfatório na região de Barra dos Carvalhos, BA (Tsuzuki, comunicação pessoal).

9.2 - Moluscos Ostras (Crassostrea rhizophorae e Ostrea equestris) foram encontradas em pequena quantidade e em áreas restritas. Em certas áreas foram observadas a ocorrência de valvas abertas, ou seja, indivíduos adultos mortos fixados em raízes de mangue (Rhizophora mangle).

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Crassostrea rhizophorae tem sido cultivada com sucesso, principalmente na região Sudeste do Brasil. Nas áreas internas dos ambientes estuarino-lagunares destas regiões, os cultivos de Crassostrea rhizophorae adaptadas a baixas salinidades dão melhores resultados, atingindo tamanho comercial em 10 meses (Absher, 1990).

Temos também com potencial para cultivo, moluscos de sedimento como o sururu (Mytella falcata, M. guyanensis), a lambreta (Lucina pectinata - Lucinidae) e unha-de-velho (Tagelus plebeius - Solecurtidae). O cultivo destas espécies pode ser realizado em planícies intermareais margeadas por manguezais.

9.3 - Crustáceos Na região de Itacaré os camarões, como o camarão-branco Litopenaeus schimitti, o camarão-rosa Farfantepenaeus brasiliensis e F. subtilis (confirmar), são abundantes. Todos são explorados por frotas de arrasto, em sedimento lamoso. Todas essas espécies apresentam potencial para cultivo, porém, o desenvolvimento de tecnologia para produção de pós-larvas em laboratório, e crescimento destes organismos em cativeiro são necessários. A introdução de outras espécies como Litopenaeus vanammei, atualmente a espécie de maior produção no estado da Bahia, poderia ser testada uma vez que se determinassem condições propícias para instalação de tanques-rede ou cercados na região.

O cultivo de camarão em gaiolas, técnica desenvolvida recentemente no Brasil, tem atraído bastante atenção de pequenos investidores em cultivos, que contam muitas vezes com a parceria de pescadores artesanais. Alguns trabalhos referentes a transferência e adaptação da tecnologia de cultivo de camarões marinhos em gaiolas flutuantes aos pescadores artesanais têm mostrado resultados positivos (Accioly, comunicação pessoal; Lemos, comunicação pessoal; IFREMER,1995).

9.4 - Crustáceos de água doce De acordo com Valenti (1985), o pitu (M. carcinus) e o calambau (M. acanthurus), juntamente com M. amazonicum (que não ocorre na região), seriam as espécies nativas do Brasil com potencial para atividades de cultivo. O pitu e o calambau são espécies de grande porte, que podem atingir comprimento total de 27 e 18 cm, respectivamente. Estas duas espécies teriam condições de repetir o êxito alcançado com o cultivo de M. rosenbergii, o “camarão gigante da Malásia”, sem os riscos inerentes à introdução de espécies exóticas. A distância do mar seria, no entanto, um fator desfavorável ao cultivo destas espécies na região de Taboquinhas, visto que, parte do seu ciclo de vida é dependente de salinidade, o que, se não inviabiliza o cultivo, o tornaria mais oneroso.

As curucas são de menor porte do que os camarões anteriormente citados. Na literatura, o maior tamanho registrado é o de um macho de 49,3 mm de comprimento de carapaça (cerca de 10 cm de comprimento total) (Hobbs e Hart, 1982), tamanho similar aos espécimes coletados em Taboquinhas. Sua biologia ainda é muito pouco conhecida, o que torna difícil seu aproveitamento imediato em atividades de cultivo.

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Figura 18: Descarga fluvial (m3/s) por período do ano, da Bacia do Rio de Contas, estação Jequié, nos períodos de 1934 à 1977. Fonte: UNH/GRDC (http://www.grdc.sr.unh.edu/html/Polygons/P3652220.html)

O cultivo de siris é uma atividade ainda pouco difundida no mundo, pois a demanda é suprida totalmente pela captura artesanal. Segundo Valenti (1995), estes animais não são cultivados no Brasil.

Atividades de cultivo devem ser incentivadas no município, pois além de gerar empregos e rendimentos com a comercialização de adultos e pós-larvas, este tipo de prática diminui a pressão sobre os estoques naturais e aumenta a possibilidade de repovoamento das águas da região.

9.5 - Algas Os gêneros com potencial para cultivo e extração de alginatos e carrageninas são Hypnea, Ulva, Porphyra entre outras. O cultivo em condições naturais requer espaço em baías protegidas, com elevada carga de nutrientes.

9.6 - Obstáculos ao cultivo: Os maiores empecilhos para aquacultura estuarina em Itacaré são:

a) A inexistência de grandes rios ou estuários com áreas protegidas, que possam suportar cultivos em maior escala, principalmente tanques-rede, que ocupam maior área.

b) As áreas de manguezais são muito pequenas e limitadas, o que pode restringir o desenvolvimento de cultivos, principalmente de moluscos bivalves, uma vez que o sucesso dos mesmos, e a sua sustentabilidade estão diretamente relacionados à quantidade de matéria orgânica e nutrientes produzidos nos mangues. Este fator, além da quantidade de água doce por períodos prolongados (vide item 3, a seguir), podem vir a ser um fator limitante para o estabelecimento de sistemas de cultivo na região.

c) Períodos prolongados de água doce em toda a extensão dos rios da região. Como anteriormente citado, observou-se uma fraca ocorrência de ostras nas áreas de manguezais, e em algumas localidades foram encontrados vários organismos adultos mortos fixados a raízes de mangue (Rizhophora mangle). Através de entrevistas com pescadores, levantou-se a hipótese de que a pouca abundância e alta mortalidade destes organismos podem ser ocasionadas por períodos prolongados de água doce (até três meses) ao longo de toda a extensão dos rios, decorrentes da abertura de uma série de barragens na bacia do Rio de Contas, em períodos de chuva (geralmente de Dezembro-Março, ver Tabela 5

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e Figura 18). Segundo entrevista com pescadores e a comunidade local, anteriormente à construção da barragem, isto é, quando a água doce proveniente das chuvas era transportada pelo rio com maior freqüência e diluição, as ostras eram encontradas em maior abundância, e em diversas localidades do estuário. Neste caso, a água doce afetaria a distribuição e abundância espaço-temporal de uma série de organismos, dependendo do grau de tolerância das espécies. Além de períodos prolongados de chuva abundante, causando grande aporte de água doce, lançada principalmente no Rio de Contas, com grande vazão e portanto, forte correnteza, há o carreamento de uma grande quantidade de aguapés ou baronesas, Eichhornia crassipe. A espécie é muitas vezes considerada como “praga”, pois

seu desenvolvimento excessivo dificulta a navegação em rios e represas e danifica as turbinas de usinas hidroelétricas em determinadas regiões. Além disso, pode propiciar o desenvolvimento de vetores de doenças e o aumento da poluição orgânica das águas pela decomposição, em larga escala, de suas folhas. Desta forma, aguapés em grande quantidade podem vir a destruir possíveis estruturas de cultivo como tanques-rede, colmatar malhas, e dificultar o trabalho de manutenção de estruturas de cultivo.

10. Potencial ecoturístico O turismo representa grandes negócios em Itacaré e uma esperança para a estagnação econômica que o município vivia desde que a vassoura-de-bruxas arrasou a lavoura de cacau. O Estado da Bahia investe pesadamente nessa alternativa, sendo que a opção pelo "ecoturismo" na região reflete-se na iniciativa do Estado de criar a Área de Proteção Ambiental Itacaré/Serra Grande. Grande parte das preocupações da APA gira em torno da preservação da natureza para sustentar o turismo. Porém, a idéia de ecoturismo em Itacaré é bastante restrita e criticada pela própria população local. Ecoturismo deveria ser um turismo que não somente tivesse a natureza como base mas que propiciasse a conservação da

Tabela 5: Monitoramento do Volume dos Reservatórios para a Bacia Rio de Contas no mês de dezembro.

Açude Município Capacidade máxima (m3) Volume em 31/12/00 (m3) Volume em 31/12/00 (%)

Pedra Jequié 640.00 1214000 74.02

Anagé Anagé 255.63 257860 100.87

Brumado Rio de Contas 105.00 79310 75.53

Funil Ubatã 53.00 46400 87.55

Tremedal Tremedal 23.75 18250 76.84

Champrão Condeúba 5.98 6320 105.69

Fonte: INPE (http://www.cptec.inpe.br/products/proclima/Acude/bahiatabela.htm)

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natureza e a melhoria de vida das populações locais. Mas a relação entre o setor turístico e a comunidade está longe de ser harmônica. Pelo contrário, os direitos tradicionais têm sido sistematicamente desrespeitados (ver na seção sobre Conflitos e Direitos Tradicionais). Além disso, boa parte da comunidade pesqueira vê o setor turístico como um grupo aproveitadores, interessados em dinheiro, e não no bem-estar de todos, apesar do envolvimento de pessoas do setor turístico em questões coletivas, como o movimento ecológico. Como apontado adiante neste relatório, isso reflete as perdas que a comunidade pesqueira vem sofrendo, mas também reflete a dificuldade de os benefícios do turismo chegarem aos mais carentes.

Apesar disso, pescadores inovadores têm começado a aproveitar o movimento turístico. Com a expansão do turismo em Itacaré, os pescadores têm aprendido a explorar essa nova economia, levando os turistas em barcos e canoas de turismo. No verão, são vários os barcos pesqueiros que transportam turistas em passeios, com ou sem licença na Capitania dos Portos.

As cachoeiras são um atrativo importante para esses passeios. Um dos destinos mais populares é a Cachoeira do Cleandro. As canoas muitas vezes levam os turistas em passeios pelo manguezal até a cachoeira, ao custo de R$10,00 por pessoa. Cleandro tem explorado a cachoeira em sua propriedade, através da cobrança de ingressos. A área é equipada com bar, cestos de lixo e placas de orientação. Porém, o proprietário também cercou uma área de mangue, proibe o acesso de canoas pelo ribeirão, e desmatou a área próxima ao riacho, em área de preservação permanente e de marinha. Em termos ecoturísticos, a exploração dessa cachoeira pelo proprietário, apresenta várias contradições. Ainda assim, o proprietário faz a manutenção da limpeza da área e a proximidade da cidade faz dessa cachoeira a mais atrativa. Porém, a sua privatização pelo proprietário também causa insegurança aos que levam passeios, pois temem que Cleandro crie regras de acesso exclusivo à cachoeira.

Além da cachoeira do Cleandro, um pouco mais distante rio acima, há também a cachoeira da Pancada Grande (a dois quilômetros do Rio de Contas), e algumas cachoeiras menos exploradas, no Rio João Rodrigues (nas terras de Joselito), com cerca de quatro metros de altura e a dois quilômetros do Rio de Contas.

Os passeios pelo manguezal tem boa popularidade. Falta, porém, aos pescadores e canoeiros independentes, uma articulação entre si para poderem competir com as agências de "ecoturismo", que transferem pouco do que arrecadam ao guia turístico.

A praia de Piracanga tem um potencial turístico importante por ser um lugar deserto e uma das poucas praias extensas o suficiente para permitir caminhadas. Entretanto, ao cruzar o Rio de Contas, o turista encontra uma grande quantidade de lixo. Agências de turismo também têm utilizado a praia como via de rodagem para passeios "ecoturísticos" de carro até as praias ao norte de Itacaré. Esse tráfego de veículos parece ser prejudicial às tartarugas marinhas e reduz a tranquilidade do turista na praia, um de seus maiores atrativos. Mais uma vez, o "ecoturismo" em Itacaré aproveita-se da natureza, sem ser realmente a favor da natureza. A muitos dos que exploram o ecoturismo, parece faltar compromisso com a comunidade e

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com a própria natureza que lhes serve de pretexto para conquistar o mercado turístico. A população pesqueira local percebe e é crítica desse problema.

A falta de respeito à natureza e às populações locais também é presente no próprio turista, e convém estabelecer um programa educativo para o visitante de Itacaré, se possível em parceria com ações mais amplas de educação do turista da natureza. Como muitas vezes o turista vem de lugares distantes, pode ser difícil obter uma mudança de comportamento nos poucos dias em que passa em Itacaré, sendo necessárias ações educativas nos locais de origem no Brasil e nas agências no exterior.

Em Piracanga, o potencial turístico é grande, sendo o manguezal um dos atrativos principais. Passeios de jangada ou canoa no manguezal, aulas práticas para os turistas no manejo dessas embarcações, observação da fauna local e outras iniciativas podem dar à população local uma nova alternativa de renda. A restinga entre Piracanga e a cidade de Itacaré apresenta inúmeros frutos comestíveis. Através da visitação controlada com guias nativos, esses frutos dariam uma experiência fascinante ao turista.

Em Taboquinhas, o turismo está começando com a Agência Ativa, que promove o rafting no Rio de Contas. Mas a localidade, que será passagem da nova estrada asfaltada que ligará Itacaré com a capital, tem também várias cachoeiras, e a trilha dos pescadores, pela beira do rio, é uma aventura bem atrativa, com inúmeras cachoeiras, corredeiras, praias e oportunidades para banho de rio. Há um trecho de canhões e gargantas, em que é possível ao turista mergulhar no rio de rochas com mais de sete metros de altura, como a pedra da Adrenalina. Também há uma estrada centenária (para pedestres e animais), calçada de pedras, por onde passavam as mulas para o transporte de mercadorias, cacau e, em tempos mais antigos, pedras preciosas (dizem que o nome "Rio de Contas" teve origem com o transporte dessas pedras). Na beira do rio, também há ruínas de casarões centenários, sedes de fazendas e senzalas, atrativos hoje em degradação. No Pé da Pancada, a ruína da casa sede de uma das fazendas mais antigas tem uma plantação de cacau dentro da sala, e o que sobrou de uma senzala. A proprietária cobra pela visitação e fotos, mas tem pouca orientação e capacidade de investimentos para fazer um uso turístico de qualidade, que também preserve as características do local.

Junto à cidade de Itacaré e à costa, o turismo é bastante explorado pelas barracas de praia, pousadas, e resorts. Mas as atividades dos pescadores ainda não são parte do roteiro. O calão, por exemplo, uma das modalidades de pesca mais tradicionais, tem forte atrativo turístico, e poderia ser aproveitado para passeios, principalmente se for associado com outras atividades. Este também é o caso de várias modalidades de pesca. A pesca de tubarão, por exemplo, já está sendo explorada de forma informal para fins turísticos. Um problema é a legalização dos papéis do barco, para que possam pescar e levar turistas ao mesmo tempo. Devem ser estudadas formas de legalização da documentação e garantia da segurança dos turistas nessas atividades.

Ainda, a trilha do telégrafo, que ligava Itacaré a Ilhéus, além de outras trilhas tradicionais que têm sido fechadas pelos empreendimentos "ecoturísticos", como o

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Ecoresort e o Txai Resort, se reabertas, poderiam dar passeios atraentes aos ecoturistas de verdade.

Além dessas atividades, um centro de visitantes, um museu marinho, e a venda de materiais promocionais da Resex (como camisetas, cartões postais e artesanato) também podem ser atrativos turísticos e fonte de renda para algumas famílias.

Todas as alternativas apontadas acima devem ser melhor discutidas com a comunidade antes de serem implementadas.

11. Organizações de importância para a comunidade pesqueira

Uma série de organizações tem influência positiva ou negativa na qualidade de vida das comunidades pesqueiras de Itacaré. Algumas são diretamente ligadas à pesca, como a Colônia Z-18 e a Asperi. Outras, são ligadas à área ambiental, como Ibama, CRA, e IESB. Outras, ainda, têm uma atuação mais geral, como a Prefeitura Municipal de Itacaré e o Banco do Nordeste.

Nesta seção, relatamos as impressões, opiniões e visões da comunidade pesqueira de Itacaré de diversas entidades e órgãos públicos, e de empresas e pessoas importantes para o contexto de Itacaré. A versão apresentada a seguir é parcial, isto é, reflete o ponto de vista e as informações da comunidade pesqueira em relação aos atores considerados importantes, positiva ou negativamente, para o seu bem-estar. Não é apresentada a versão das partes descritas, que demandaria um trabalho que estrapola as pretenções deste diagnóstico. Aqui, basta conhecer como a comunidade sente, ou percebe, as organizações e setores descritos. Embora, em alguns casos, a versão colocada possa ser ou parecer injusta para as organizações e entidades descritas, é importante que elas tomem esta discussão de forma aberta, como guia para ações futuras que possam corrigir eventuais impressões negativas deixadas na comunidade pesqueira.

11.1 - Banco do Nordeste

O Banco do Nordeste é um agente de desenvolvimento importante para a região, financiando projetos para pequenos produtores e pescadores. Na comunidade pesqueira de Itacaré, o Banco do Nordeste financiou 24 barcos para os pescadores da Asperi (comunidade do Forte). Entretanto, poucos pescadores estão em dia com

Comunidade Pesqueira de Itacaré

Banca doPeixe

Colô-nia Asperi

Mari-nha

PMI

AMPT

PousadeirosBNB

Surf

CRA

IbamaIlhéus

Sindicatopatronal

Figura 19: Diagrama institucional elaborado pela comunidade da Banca do Peixe.

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seus pagamentos. Segundo os pescadores da Banca, o problema foi que o sistema utilizado pelo Banco do Nordeste para garantir os pagamentos é falho, e não estimula as pessoas a pagarem pois, como um é fiador do outro, o individualismo faz com que os que pagam corram o risco de perder tudo. Outro problema, segundo os pescadores, foi a seleção das pessoas contempladas com o financiamento, que não priorizou pescadores locais. Muitos, nem mesmo eram pescadores. A Figura 19 mostra o diagrama institucional elaborado pelos pescadores da Banca do Peixe. Como mostra o diagrama, O BNB está ainda um pouco distante da comunidade da Banca. A posição no gráfico, marginal à comunidade pesqueira, resultou de uma discussão de que o Banco do Nordeste vem ajudando só a Asperi, na opinião dos participantes, e não toda a comunidade pesqueira. Mas os participantes consideram que o BNB tem grande potencial de ajudar a comunidade. Ainda, no Porto de Trás, foi ressaltado que o Banco do Nordeste representou esperança através do microcrédito.

11.2 - Organizações dos Pescadores: Colônia e Asperi As entidades representativas dos pescadores, Colônia e Asperi, não tem a mesma representatividade em todas as comunidades pesqueiras. Os pescadores mais profissionais e capitalizados (que pescam em barcos motorizados) são os que mais recebem atenção dessas duas entidades. Por exemplo, no diagrama institucional feito pelos participantes da Banca do Peixe, inicialmente, a Colônia foi colocada no centro, mostrando uma grande identificação das pessoas com a entidade (embora existam também muitas críticas, como pode ser visto abaixo). Isso não acontece em todas as comunidades. No Porto de Trás, os pescadores e marisqueiras apontaram que sempre estiveram esquecidos e separados da sociedade de pescadores de Itacaré, da Asperi e da Colonia Z-18. Hoje em dia, esse panorama parece estar se revertendo, mas muito lentamente. Isso é mostrado no diagrama institucional do Porto de Trás (Figura 20), pela posição do círculo representando o Porto de Trás, à margem da comunidade pesqueira. O mesmo ocorre em outras comunidades, como será discutido a seguir.

Portode Trás

Colonia Z-18

Governo

Marinha

Ibama

Banco NE

Boto Negro

C.D.L.

A.P.A.

Contur

Sementesde JAH

AFI

P.M.I

Surf

Igreja

Asperi

A.M.P.T.

Comunidade Pesqueira de Itacaré

Figura 20: Diagrama institucional elaborado pela comunidade do Porto de Trás.

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11.2.1 - Colônia Z-18

Nas reuniões realizadas na Banca do Peixe, primeiramente, os participantes disseram que a Colônia estava no centro da comunidade da Banca, por ter conseguido o seguro-defeso, aposentadoria (recolhimento do INSS) e auxílio para invalidez e doença. Quando o pescador não pode pescar por motivo de doença ou invalidez, ele recebe auxílio do INSS. No caso da invalidez temporária, o auxílio dura três meses e, após esse período, necessita-se de uma nova perícia. Entretanto, esses benefícios só estão disponíveis aos colonizados.

Para alguns, não ser colonizado mostra descaso por parte do pescador. Entretanto, em várias comunidades, como Taboquinhas, Campo Seco, Itacarezinho, Piracanga, e Porto de Trás, os pescadores e marisqueiras não conhecem seus direitos nem a importância de se documentar junto à Colônia. Em muitos casos, nem mesmo sabem o que é a Colônia. Em Taboquinhas, há um grande interesse em ser documentado. Apesar disso, a Colônia pouco faz para mudar essa situação e extender a todos os pescadores os benefícios hoje disponíveis a somente algumas dezenas de pescadores, que por sua vez são somente uma parcela dos pescadores.

De fato, falta participação de pescadores e marisqueiras não ligados ao mar e de comunidades rurais na Colônia. Por exemplo, em Taboquinhas e no Porto de Trás, poucos são colonizados. Mas um dos diretores da Colônia apontou que são feitas reuniões mensais em Ubaitaba e Aurelino Leal, onde os pescadores têm os mesmos direitos. Por que o mesmo não é feito nas outras comunidades?

O início da discussão na Banca apontou várias falhas da entidade. Por exemplo, no passado, havia um "posto médico itinerante" que visitava a Colônia quinzenal ou mensalmente, com médicos, dentistas e oftalmologistas. Eram também distribuídos remédios, sendo que alguns remédios ainda eram doados para o posto médico e a Maternidade da cidade. Alguns participantes, porém, questionaram se seria papel da Colônia distribuir remédios. Muitos medicamentos que eram doados pelo Governo através da Colônia acabavam descartados por perderem a validade. Atualmente, existe apenas um kit de primeiros socorros, de cuja existência os pescadores não sabiam. Com a reunião deste diagnóstico na Banca, esse kit foi colocado à disposição dos pescadores.

A Colônia Z-18 tem 637 cadastrados, dos quais, aproximadamente, apenas 60 estão quites. Afirmou-se que a Colônia tem grande poder, pois facilita a atuação do Ibama e da Marinha.

A falta de participação parece ser o principal problema da Colônia. Os pescadores apontam que somente uma pessoa da Diretoria (Leônidas) trabalha realmente, estando os demais diretores afastados da realidade dos pescadores. Leônidas recebia, até há pouco tempo, pagamento da Prefeitura, que o colocava à disposição da Colônia. Porém, existe uma incerteza quanto à continuidade desse apoio. O prefeito chamou Leônidas de volta ao cargo que ocupa na Prefeitura. Os pescadores percebem pouco a atuação dos outros diretores.

O mesmo problema de atuação acontece, de acordo com os participantes da Banca, com os membros do Conselho Fiscal da Colônia. Ao invés de agir pela Colônia, os fiscais parecem só estar interessados em não pagar a taxa de

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associação (direito dos fiscais). Porém, a participação dos pescadores, mesmo em eventos festivos, como as festas de São Francisco e de Iemanjá, é pequena. Falta coesão e união dos pescadores. Mesmo essas festas só têm sido organizadas com ajuda da Prefeitura. Porém, quando existe possibilidade de dinheiro para os pescadores, eles participam em massa. Reuniões que discutem crédito e seguro-defeso têm ampla presença.

Prestações de contas, como balancetes, segundo Leônidas, tiveram pouca receptividade pois, quando eram afixadas em um mural, eram arrancadas de lá. Por outro lado, um pescador relatou que as prestações de conta eram sem nexo, um monte de débitos e uma pequena arrecadação, difíceis de entender.

Na reunião da Banca, foi levantada a possibilidade (e necessidade) de o presidente da Colônia ser também pescador, como era no passado. Um dos participantes discordou, e disse que deveria ser "alguém de capacidade", que tivesse possibilidade de buscar melhorias para os pescadores. Um facilitador apontou que o presidente, mesmo sendo pescador, poderia ter assessoria de técnicos e outras organizações, que poderiam capacitá-lo. Um outro participante disse que no passado os pescadores que foram presidentes não fizeram muito. Mas ainda outro participante rebateu dizendo que isso aconteceu porque, no passado, não havia o aconselhamento que eles estão tendo hoje. Mesmo assim, não parece que os pescadores que foram presidentes da Colônia no passado foram pouco efetivos, já que a maior parte da infra-estrutura da Colônia foi construída por eles. Hoje, os cargos principais da Colônia (presidência, secretaria e tesouraria) são ocupados por não pescadores, incluindo professores e um dono de guinchos.

Sobre os pagamentos da Colônia, alguns participantes disseram que era falta de interesse, pois a taxa é pequena. Outros disseram que, mesmo sendo baixa, para quem tem pouco, acaba ainda assim sendo alta. Ficou claro também que, de um lado, existe um vício de paternalismo entre os pescadores, e de outro, que muitos consideram que os benefícios são poucos. Além disso, quando falta controle, mesmo os que não pagam recebem os benefícios. Assim, faltam incentivos para que as pessoas paguem.

Os gastos da Colônia incluem os seguintes itens: água, luz, telefone, material de papelaria, festa, cursos (exemplo: alimentação e hospedagem para palestrantes), viagens do funcionário que representa a Colônia, contribuição beneficente, limpeza dos banheiros, entre outros.

Denúncias sérias foram feitas pela comunidade da Banca, como é o caso de pescadores que acusam a Colônia de facilitar a quitação do débito de sócios que estavam dispostos a votar na chapa única da última eleição para a diretoria. No Porto de Trás, a comunidade também acusou a diretoria da Colônia de trocar documentos por votos. Reclamaram que a Colônia pouco faz pelo Porto de Trás e só procura os pescadores na época de eleição. Outros questionam o destino do dinheiro da Colônia, e insinuam que há má administração e até mesmo corrupção. Caso as acusações sejam verdadeiras, essas ações podem comprometer em muito a quantidade e qualidade da participação dos pescadores, inclusive estimulando a falta de pagamentos.

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A Colônia tem um projeto de reforma das suas instalações, com a construção de 11 boxes, um frigorífico, uma área para marisqueiras, banheiros, escritório e área para eventos. Esse projeto foi proposto à CAR, enquanto um outro, de barcos de fibra está sendo proposto ao Banco do Nordeste. O projeto dos barcos, porém, está sendo atrasado pela falta de pagamentos por parte do pessoal da Asperi. Dos 11 boxes, a Colônia terá três, dois dos quais para a comercialização de peixe e um para apetrechos de pesca. Os oito restantes serão arrendados a camelôs. O plano, segundo Leônidas, é substituir a taxa de 5% do pescado pelo dinheiro arrecadado com o arrendamento dos boxes.

Entretanto, a maioria dos participantes da Banca acha que a comercialização deve ser feita pela Colônia, sem camelôs ou atravessadores, para que o lucro fique com a Colônia. Para Leônidas, essa proposta não é realista, porque dá grande responsabilidade à Colônia e pouca ao pescador. Segundo ele, no passado, na gestão do prefeito Edgard, a Colônia já tentou isso, quando adquiriram dois freezers para fazer a comercialização. O problema foi que os pescadores não entregavam o peixe à Colônia, que ficava sem ter o que comercializar. Segundo Leônidas, sua proposta era vender um peixe a baixo preço para a comunidade. Será que o preço pago ao pescador era compensador? Segundo Leônidas, muitos pescadores não pagavam os adiantamentos recebidos da Colônia, alegando que eram sócios fundadores. De fato, pessoas mais antigas na Colônia criticam a tomada da diretoria por não-pescadores e relembram que quem construiu tudo o que tem na Colônia hoje foram os pescadores. Foi na gestão de Ízio, o primeiro presidente, que a base do que existe hoje na Colônia foi feito, com os próprios pescadores "carregando pedras nas costas", como dizem. Com razão, esses pescadores mais antigos sentem muito orgulho de suas conquistas.

É importante acentuar que os pescadores acabam ficando dependentes com os "camelôs" (atravessadores), porque esses financiam apetrechos e combustível aos pescadores. Para alguns, os camelôs só exploram o pescador, e deveriam ser tirados da Colônia, que deveria comercializar o pescado de forma cooperativa. Porém, mesmo hoje, com os camelôs, alguns pescadores desviam o pescado da Colônia, sem pagar a taxa de 5%. O pagamento é meio sem controle, às vezes as pessoas pagam, às vezes não, e pagam em peixe, o que não é muito fácil de controlar. Para alguns, o pagamento deveria ser mais fiscalizado, e ser em dinheiro. A fiscalização poderia ser feita já no desembarque. Essa idéia pode ser difícil, pois muitos pescadores se recusam. Não foi encontrada uma solução adequada.

Problemas como esse estão relacionados com os problemas de participação, apontados acima. Em geral, os pescadores esperam paternalismo e resistem às tentativas de correção. Criou-se um vício, por sucessivas práticas, como os apoios da Prefeitura para festas antes promovidas com recursos exclusivos dos pescadores, e os projetos que se tornam "a fundo perdido". Um exemplo é o dos barcos da Asperi. Uns chegaram a deixar o barco estragar para diminuir o interesse do Banco do Nordeste em retomá-lo.

Na reunião da Banca, levantou-se ainda os problemas da dívida dos membros para com a Colônia. Uma sugestão da diretoria foi promover um prazo, para acertar a dívida com um desconto. Muitos discordaram por achar isso um desrespeito a quem estava em dia, todo quitado, pois não seria justo com eles, que sempre pagaram.

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Mais preocupante foi a colocação de que alguns associados não pagam em dia, esperando que na próxima eleição os candidatos vão comprar seus votos com quitação da dívida. Essa prática, se confirmada, além de desestimular o pescador a permanecer em dia, levaria a distorções graves no processo eleitoral da Colônia, com aqueles que têm mais dinheiro tendo maior chance de ganhar a eleição. Representaria também uma forma de corrupção nociva a qualquer processo democrático. Entre os pescadores, pergunta-se, primeiro, se o dinheiro das mensalidades atrasadas realmente entra nos cofres da Colônia, e segundo, como os candidatos que se utilizam dessa prática recuperam o dinheiro investido na eleição.

A Colônia já promoveu vários cursos para os pescadores:

- Da Capitania dos Portos, para licenciamento dos pescadores e seus barcos;

- Do Ministério da Agricultura, para recadastrar os pescadores;

- Da BahiaPesca, sobre motores, matemática, carta náutica e groseira;

- Com a Asperi, sobre Liderança Comunitária e a Reserva Extrativista de Itacaré.

Para alguns, falta ainda a capacitação do pescador nos cuidados com o peixe depois de pescado, até entregá-lo ao comprador. Esse curso já foi dado na Asperi, mas um dos participantes disse que o convite não foi feito aos pescadores da Colônia. Um outro curso sugerido foi para os camelôs/ atravessadores, de como lidar com a comunidade.

11.2.2 - Asperi

A Asperi - Associação dos Pescadores e Marisqueiras de Itacaré tem hoje 34 sócios. Foi fundada em 1995 a partir de um trabalho de organização promovido pelo Professor Raimundo, e pescadores interessados. No final, a maior parte dos pescadores que foram financiados tinham origem em outros municípios, apesar de já estarem vivendo em Itacaré. Isso deu à Asperi uma identidade diferente e criou uma certa rivalidade com pescadores nativos. O financiamento do Banco do Nordeste para 24 barcos foi uma das grandes motivações de formação da Associação. A Associação tem também assistência do Governo do Estado, através da BahiaPesca. Hoje, a Asperi tem um patrimônio maior que a Colônia Z-18, mas não tem o mesmo valor de representatividade política, na opinião dos pescadores da Banca. Além dos barcos, a Asperi tem uma fábrica de gelo e câmara frigorífica, e um escritório equipado com computadores e máquina copiadora. Através da comercialização do pescado, a Asperi mantém suas próprias despesas e funcionários.

Como muitas entidades, há problemas de participação: falta união e participação ativa dos sócios, que se comportam de forma individualista e não contribuem para a Asperi. Um dos indicativos é que os associados estão vendendo para fora da Asperi, em outros locais, ou não estão contribuindo com a taxa devida à Asperi (10% do pescado para aqueles que não entregam à Asperi). Alguns, depois de terem conseguido os barcos pararam de participar. Um outro caso que ilustra os problemas de participação é que, ao tentar punir alguns associados que não

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estavam cumprindo com suas obrigações definidas em estatuto, a diretoria da Asperi não encontrou apoio da assembléia dos sócios.

11.3 - Associação dos Moradores do Porto de Trás (AMPT) A AMPT é uma associação com uma diretoria coesa e motivada, cheia de projetos e hábil negociadora. Apesar disso, vários projetos continuam sem sair do papel. A AMPT é uma associação de bairro. Assim, tem uma função mais comunitária, envolvendo-se com iniciativas ligadas à pesca e mariscagem, e também com tratamento de esgotos, educação, e recolhimento de lixo. A AMPT tem uma atuação muito localizada no bairro, e a percepção das outras comunidades de sua força é pequena. Por exemplo, participantes da Banca do Peixe acham que a AMPT tem pouco poder, apesar de a AMPT ter uma atuação comunitária mais ativa que a Colônia. Há uma falta de integração entre a AMPT e a Colônia, o que se reflete na baixa associação das marisqueiras e pescadores do Porto de Trás à Colônia e leva-os a perderem benefícios como o seguro-defeso.

A atuação localizada da AMPT reflete-se na opinião dos participantes do Porto de Trás, que consideram que é a melhor das organizações citadas, a que mais ajuda os pescadores do bairro (é preciso salientar que o presidente da AMPT e membros da diretoria estavam presentes, reduzindo as chances para uma participação sincera e qualquer reclamação, embora isso tenha acontecido em outros casos, como na Banca, em relação à Colônia). Em entrevistas individuais, pode-se perceber que a AMPT não é igualmente aceita e apreciada por todos os moradores. Alguns pensam que o grupo que hoje domina a AMPT tenta monopolizar todas as iniciativas sociais e culturais no bairro, e que boicota aqueles que escolhem promover atividades comunitárias sem passar pela AMPT. Se for verdade, isso reforçaria o poder da AMPT mas reduziria sua legitimidade perante um grupo de moradores que têm iniciativa para propor atividades independentemente.

No entanto, são vários os projetos da AMPT que beneficiam pescadores e marisqueiras. Um deles, apoiado pelo CNPT, deu à comunidade sete canoas e equipamento de pesca que têm facilitado bastante a vida dos extrativistas do bairro.

11.4 - APA de Itacaré: Centro de Recursos Ambientais - CRA, Instituto de Estudos Socioambientais do Sul da Bahia - IESB, e Instituto Boto Negro

O CRA é o órgão estadual responsável pela fiscalização ambiental e, através do pacto federativo, poderia fiscalizar infrações ambientais no mar. No entanto, apesar de ter um escritório em Itacaré, não o faz. O escritório de Itacaré é voltado especialmente para a administração da Área de Proteção Ambiental - APA de Itacaré/ Serra Grande, de que é o órgão gestor. Curiosamente, a população identifica a APA com um outro grupo, não governamental, ligado ao Instituto de Estudos Socioambientais do Sul da Bahia (IESB) e originário de uma entidade ambientalista local, o Instituto Boto Negro. Ao grupo associado ao IESB, atribuem até mesmo as ações fiscalizadoras e punitivas de que foram vítimas as comunidades

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rurais de Itacaré. O IESB tem a função de promover a educação ambiental, mas atua também de forma ativista, que resultou em fiscalizações por parte do Poder Público. Essa atuação resultou em reações locais, e antipatia da comunidade em relação à "APA" ou ao "pessoal da APA". A comunidade do Porto de Trás nutre uma grande antipatia pelo Boto Negro, em função de experiências desastradas de trabalhos comunitários no bairro no passado. Uma das coisas que irritou a comunidade foi a forma como foi caracterizada em um projeto apresentado pelo Boto Negro, que dizia que na comunidade existiam problemas de marginalidade. A comunidade diz que é pobre, mas lá não há marginais.

Finalmente, as comunidades em geral são bastante moralistas com os ambientalistas locais, e questionam, por exemplo, a arquitetura das casas dos ativistas, que muitas vezes utiliza madeira em grande quantidade, quando querem proibir a população local de extrair madeira das matas para a construção de suas casas. Questionam também a legitimidade de projetos em que os ambientalistas são remunerados. Esses questionamentos são nutridos pelo choque cultural entre nativos e não-nativos (que incluem a maior parte dos ambientalistas), e pela disputa de poder entre a elite local tradicional e uma nova elite, formada por ambientalistas e pessoas ligadas ao turismo.

11.5 - Prefeitura Municipal de Itacaré A Prefeitura de Itacaré encontra-se em um momento novo, com a posse de um novo prefeito. A gestão passada foi bastante inoperante, o que criou uma certa repulsa na comunidade. Assim, o sentimento geral dos pescadores em relação ao novo prefeito era bastante entusiasmado nos primeiros meses do ano. Atualmente, esse entusiasmo encontra-se mais moderado e observa-se já algum ceticismo e crítica.

Um ponto positivo para a comunidade pesqueira é que a nova gestão criou uma Secretaria de Agricultura, Turismo e Meio Ambiente, onde há uma Divisão de Pesca, cujo responsável é um pescador que é um dos líderes do movimento pela Reserva Extrativista Marinha de Itacaré. Ele tem se dedicado a fortalecer a Reserva Extrativista através de seu trabalho na Prefeitura, com resultados importantes como este diagnóstico.

11.6 - Sindicato Rural (patronal) Essa instituição ajuda nos eventos e cursos promovidos pela Colônia Z-18 e pela Asperi, quando empresta a sede para determinados eventos.

11.7 - Marinha (Capitania dos Portos) Os pescadores apontam que a Capitania existe para própria segurança do pescador. O problema é que suas intervenções são irregulares, o que resulta em pouco estímulo por parte dos donos de barco para estarem em ordem. A Marinha só vem a Itacaré por denúncia ou quando é chamada. Além disso, várias das exigências da Capitania (previstas em lei, que segue diretrizes internacionais),

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apesar de desejáveis, são pouco razoáveis quando se observa a realidade dos pescadores.

A comunidade considera a postura da Marinha autoritária, diz que vários pescadores têm sido mal atendidos na Capitania em Ilhéus e que, quando ela vem a Itacaré, suas ações não são de qualificação, mas só de multar.

Alguns participantes sugerem que seja instalado um posto da Marinha em Itacaré. Esta sugestão foi amplamente debatida, devido às desvantagens que o posto poderá trazer, como uma maior fiscalização e pressão em cima dos donos de barcos. Uma das desvantagens para os donos de barcos é que, com o posto da Marinha, haverá maior cobrança da questão trabalhista. Em outros locais, como Camamu, alguns participantes apontaram que os pescadores se utilizavam da legislação trabalhista para processar os donos de barco. Parece que a proteção trabalhista dada aos pescadores artesanais é inadequada ao seu próprio padrão de trabalho, que é mais irregular e independente, mas isso precisa de maior discussão.

Os participantes da Banca acreditam que a fiscalização não é nociva, já que faz as cobranças necessárias. Um exemplo de sucesso da ação da Marinha foi o aumento do número de barcos na última procissão de Iemanjá, o que indica um maior número de barcos regularizados. Parece também que a Marinha atua com mais rigor com o pessoal de fora da cidade. Contudo, as exigências da Capitania, como foi dito acima e será detalhado a seguir, são bem pouco razoáveis para o contexto da pesca artesanal praticada em Itacaré e em toda a costa da Bahia.

Segundo o Comandante Duque, a atuação da Marinha na salvaguarda da vida no mar e controle da poluição por embarcações se dá de acordo com os seguintes níveis hierárquicos: 1) Diretoria de Portos e Costas (sede no Rio de Janeiro); 2) Capitanias (Itacaré está na jurisdição de Salvador); e 3) Autoridades Locais (na Bahia, sedes em Porto Seguro, Ilhéus e Valença. A área de atuação da delegacia da Capitania dos Portos de Ilhéus vai de Canavieiras até o Rio de Contas, em Itacaré. A missão da Capitania é fazer cumprir a lei de segurança do tráfego aquaviário, que segue diretrizes internacionais. Segundo o Comandante, apesar de a lei ser exigente demais para os padrões dos países em desenvolvimento, estes foram obrigados a adotá-las para baratear o seguro dos navios. É uma norma única de segurança para todo o mundo, imposta pelos países ricos. São também unificados mundialmente a forma de habilitação (matérias, etc.) e os certificados. São treze normas, cada uma com cerca de 500 páginas!

A inspeção naval é o instrumento básico de fiscalização da Capitania, que envolve a verificação do título de inscrição e registro da embarcação, habilitação da tripulação e o seguro obrigatório. Além disso, a inspeção envolve a checagem de equipamentos obrigatórios.

Um deles, considerado de difícil aquisição, é o rádio VHF, que custa em torno de R$800,00 (Canavieiras, com um lote grande, conseguiu por apenas R$350,00 cada) . Uma vantagem de ter esse equipamento é a possibilidade de pedir socorro ao Sistema Salvamar Brasil, que possui navios e helicópteros para o salvamento de vidas no mar. No mundo inteiro, o canal de emergência no mar é o 16 de VHF, que a Marinha escuta 24 horas por dia, através de uma rede nacional. Em caso de

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emergência, navios mercantes são acionados para dar salvamento. Os pescadores de Itacaré duvidam da utilidade desse sistema para eles pois a maioria dos acidentes ocorre na barra do Rio de Contas, onde um salvamento desses, além de não poder utilizar o rádio, teria um socorro local mais imediato através da solidariedade dos pescadores.

Todos os barcos tem que ser equipados com coletes salva-vidas (o salva-vidas custa R$60,00 em Ilhéus; direto, sem atravessador, custa R$24,00). Outros equipamentos requeridos são foguetes, ração e água. Além de caros, os donos de barco reclamam que esses itens têm validade de somente um ano.

A aquisição de equipamentos pode ser feita com grande economia se for feita de forma coletiva. Financiamentos também podem ser utilizados, como foi o caso de Canavieiras, que está usando um "fundo de aval".

Segundo o Comandante, a tendência da fiscalização é ficar cada vez mais rigorosa. Recentemente, em Valença, 32 barcos foram rebocados para Salvador. O mesmo pode acontecer em Itacaré. "É a lei. Tenho que fazer cumprir," disse.

11.8 - Ibama – Ilhéus Esta discussão refere-se à atuação do escritório do Ibama em Ilhéus. Na opinião dos participantes da Banca, o Ibama não ajuda a comunidade e ainda age com autoritarismo e violência. Algumas vezes, os agentes do Ibama usaram até escopetas para abordar os pescadores além de ameaçá-los no caso de denúncias. São comuns os comentários de que o Ibama abusou de seu poder nas diligências em Itacaré. O sentimento geral é de que "o Ibama só atrapalha".

Parte dos problemas junto ao Ibama/Ilhéus são causados também pela falta de apoio da Colônia, da Asperi, do Ibama/Brasília e da sociedade em geral ao pescador. Essa falta de apoio e cobrança leva o Ibama a ter uma equipe com pouco conhecimento de como atuar em uma comunidade, o que leva a má atuação. Também permite que o Ibama faça abuso de poder e uso de violência contra os pescadores. Segundo os pescadores falta consciência à maioria dos técnicos do Ibama de Ilhéus, o que pode estar levando à pouca fiscalização, corrupção e suborno, suspeitas que são alimentadas pelo tratamento desigual observado para infratores pobres e ricos. Os aspectos como falta de infra-estrutura e técnicos do Ibama foram considerados um problema do Ibama, que com cobrança por parte das entidades e sociedade em geral teriam que ser resolvidos.

Os problemas do Ibama acabam resultando em uma comunidade pesqueira resistente ao órgão e às suas orientações. Isso aumenta os comportamentos predatórios da comunidade local, o que leva à diminuição do pescado e, conseqüentemente, da renda de pescadores e marisqueiras.

A impressão negativa que a comunidade da Banca tem do Ibama reflete sua experiência com a instituição no passado, que não foi boa. No caso de Taboquinhas, por exemplo, tem-se a impressão contrária. O Ibama é visto como um aliado, pois a comunidade teve pouco contato com o órgão e, como existe uma postura favorável à conservação da natureza, o Ibama é visto com simpatia.

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De fato, o Ibama pode ser um importante aliado. Em 2000, uma equipe do Ibama ajudou em fiscalizações promovidas por pessoas ligadas ao Grupo de Trabalho, contra pessoas de fora que estavam levando guaiamuns e contra guinchos que estavam pescando no defeso do camarão. Em 2001, recentemente, uma diligência do Ibama fez um ótimo trabalho de quatro dias, a mando do Ministério Público Federal, de Ilhéus, com recursos do CNPT/Ibama de Brasília. Essa missão, em que os fiscais do Ibama tiveram uma atuação exemplar, deu bastante apoio à proposta da Resex em Itacaré.

12. Conflitos e Direitos Tradicionais 12.1 - Acesso às praias Com o desenvolvimento turístico de Itacaré, foi iniciado um processo de "privatização" de praias. Proprietários de terras na costa de Itacaré têm fechado as estradas, trilhas e caminhos que antes eram abertos à comunidade. Em vários casos, os proprietários são pessoas de fora, que não reconhecem os direitos tradicionais de passagem por dentro de suas terras. Mais do que isso, porém, seu interesse é criar praias particulares, o que é proibido por lei, e vender essa exclusividade aos turistas de melhor renda. Os proprietários usam o argumento de que, ao fechar o acesso livre à praia, estão ajudando na conservação da natureza.

Nas praias ao sul do Rio de Contas, a privatização é facilitada pelo acesso difícil. Porém, o acesso a pedestres tem sido livre para todas as praias, com excessão da Prainha e da praia de São José (onde o acesso de pedestres era cobrado até que o Ibama fez uma diligência no local, advertiu os proprietários e ordenou a reabertura), e também das praias de Pauva e Arruda, pequenas praias entre a praia de São José e Jeribucaçu. Na praia de Itacarezinho, o acesso de pedestres é possível através de duas entradas, mas vários caminhos anteriormente livres hoje estão fechados até mesmo para pedestres. Para carros, o acesso é cobrado (R$5,00).

12.2 - Áreas de marinha Há dois tipos básicos de áreas de marinha em Itacaré: 1) aquelas ao longo da costa, e 2) aquelas nos estuários dos rios e riachos. A situação das áreas de marinha ao longo da costa é perigosa porque a valorização dada pelo turismo cria a cobiça de empresários e especuladores. Em vários trechos, como em Itacarezinho, as áreas de marinha foram cercadas pelos proprietários e sua vegetação natural (restinga) tem sido substituída por coqueirais. Na praia de Itacarezinho, um amplo trecho de área de marinha foi incorporado pelo Txai Resort para uso exclusivo de seus hóspedes. Até mesmo uma piscina foi construída na área da União. Segundo dizem, o Sr. Nelson Moraes, proprietário do Txai Resort pediu autorização para a construção da piscina ao Ibama, e após ter sido negada, recorreu ao Centro de Recursos Ambientais - CRA, órgão gestor da Área de Proteção Ambiental Itacaré/ Serra Grande, que concedeu a autorização. É necessária uma investigação sobre a razão da discrepância entre as decisões dos dois órgãos (Ibama e CRA), verificando o porquê do segundo beneficiar o empreendimento.

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O Sr. Cláudio Magalhães, também em Itacarezinho, cobra aos campistas pelo uso da área de marinha no verão. Não se sabe se esses proprietários pagam aforamento ou taxa de ocupação pela área da União.

Ainda em Itacarezinho, uma área de marinha importante é a do Porto de Jangadas, que foi fechada com cerca e teve sua vegetação e topografia alteradas pela fazenda de Durval Lélis. O aterro construído interrompeu o curso de um riacho que desaguava no Porto de Jangadas. O local era utilizado para a construção e abrigo das embarcações.

Nas praias urbanas de Itacaré, a área de marinha também encontra-se com uma série de problemas. A praia da Concha está completamente ocupada por barracas de praia, com fossas muito próximas à agua. Há um camping na área de marinha, e não se sabe se pagam aforamento ou taxa de ocupação. A praia da Tiririca é a mais perturbada por construções e pousadas. Várias pousadas foram construídas em área de marinha, irregularmente, nessa praia.

As áreas de marinha nos estuários têm grande importância para os estrativistas, pois é nelas que coletam guaiamuns, caranguejos e outros mariscos. Em boa parte, essas áreas foram fechadas pelos proprietários e foram desmatadas para plantios de coco e cacau, entre outras culturas, principalmente no Rio de Contas. Esse desmatamento é ilegal, pois foi feito em área de preservação permanente. Além das áreas de marinha no estuário do Rio de Contas, as áreas de marinha nos pequenos riachos ao longo da costa também têm sido fechadas aos extrativistas, como é o caso do mangue e do apicum na Prainha e na praia de São José. O fechamento dessas áreas é feito através de ameaças e cães ferozes. Para garantir a subsistência dos extrativistas de Itacaré, é necessário verificar a situação de cada uma dessas áreas, reabrindo o acesso dos extrativistas às áreas da União. Alguns proprietários e ocupantes das áreas de marinha dizem ter documentação, e muitos alegam que, ao fechar as áreas aos extrativistas, estão ajudando a preservar a natureza. "Eu sou ecologista", é uma declaração freqüente daqueles que estão privatizando as áreas da União. Entretanto, como o desmatamento dessas áreas demonstra, sua preocupação ambientalista é, no mínimo, contraditória.

12.3 - Caminhos tradicionais Em Itacaré, os caminhos tradicionais, trilhas por onde a passagem de pessoas e animais sempre foi permitida, têm sido fechados gradualmente. A comunidade de Campo Seco está situada no local há muitas gerações e, durante a maior parte da história da comunidade, as pessoas podiam circular por caminhos e trilhas que se tornaram tradicionais e integrados às necessidades locais, e que foram construídos pelos próprios moradores em sistema de mutirão. Por exemplo, boa parte do transporte de pessoas e mercadorias ainda é feita por animais, o que dá autonomia de deslocamento e baixa o custo do transporte. O acesso da comunidade de Campo Seco à estrada asfaltada é tranqüilo, e se dá por uma estrada de terra que termina no Km 6, depois de atravessar o assentamento Marambaia. A produção agrícola é, às vezes, escoada por caminhões. Outras vezes, usam animais de carga. Nesse caso, o caminho mais curto e mais conveniente seria pela antiga Trilha ou

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Estrada do Telégrafo (também conhecida como "Pedestra") que vinha de Ilhéus até Maraú.

Entretanto, a Trilha do Telégrafo foi fechada em vários pontos, ferindo os costumes tradicionais e aumentando os custos de transporte. Da comunidade, em direção a Itacarezinho, a trilha é aberta a pedestres mas fechada para animais, o que dificulta práticas comerciais de moradores de Campo Seco, que não podem circular com seus produtos. No sentido oposto, de Campo Seco para Itacaré, a trilha está fechada na propriedade de Arnô Bovilliard de St. Symphoqlen (um francês), e em dois pontos na Fazenda São José (Vilas de São José/ Itacaré Ecoresort), onde foi até mesmo aterrada.

A Estrada do Telégrafo sempre foi um caminho público, mantido pelo Poder Público. Por exemplo, a Prefeitura contratava a limpeza da trilha. Além disso, a trilha é histórica. Até hoje se encontram postes de ferro da linha de telégrafo, ou pelo menos a sua base, ao longo do caminho. É o caminho mais curto de Itacaré para as praias do sul e, embora só permita a passagem a pé ou de animal, é também uma excelente atração potencial para o ecoturismo, para pessoas adeptas de caminhadas, ou treking. Infelizmente, os próprios empresários do setor turístico estão impossibilitando a passagem nessa trilha, colocando seus interesses acima dos da coletividade.

A Estrada do Telégrafo deixou vestígios históricos até mesmo nas cidades de Itacaré e Ilhéus: os pontos de partida e chegada, tanto em Itacaré como em Ilhéus, têm o nome de "Rua da Linha", em referência à linha telegráfica. Em Itacarezinho, o local por onde passa a trilha também tinha o nome de Rua da Linha, quando havia mais famílias e Itacarezinho era um povoado.

O fechamento da Estrada do Telégrafo causa prejuízos à população local porque aumenta a distância das comunidades pesqueiras rurais (Itacarezinho e Campo Seco) a Itacaré. Isso impossibilita ou dificulta o uso de animais para o transporte de carga e pessoas, e torna as pessoas dependentes na estrada e no ônibus.

Para as praias, sempre houveram trilhas utilizadas pelos pescadores da comunidade de Campo Seco para chegar aos pesqueiros. Esses caminhos atravessam propriedades particulares e existem há gerações. Há alguns anos, essa situação começou a mudar. Com o crescimento turístico de Itacaré, as terras na costa passsaram a ser adquiridas por pessoas de fora, muitas vezes estrangeiros, que começaram a fechar os caminhos e trilhas tradicionais. O proprietário Arnô, por exemplo, fechou a trilha do Telégrafo com uma cerca. A comunidade abriu uma passagem na cerca ao lado, que acabou sendo aceita pelo proprietário (como indica a porteira improvisada no local pelos seus funcionários), mas o proprietário continua tentando restringir a passagem daqueles por quem não tem simpatia. O Sr. Silva, administrador da propriedade (Fazenda Sto. Antônio) do falecido Sr. Gilles Bovilliard de St. Symphoqlen (irmão do Sr. Arnô) fechou a estrada para a praia de Pauva com um "cancelão" e cadeado. A própria cancela teve sua parte superior

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cercada por arame farpado, para que a comunidade nem mesmo possa pulá-la e utilizar sua trilha tradicional para chegar ao pesqueiro5.

Um outro conflito relatado pela comunidade foi com o Sr. Albert, também proprietário, que também fechou a estrada para a praia de Arruda e Pauva, que passa em sua propriedade. De acordo com a história da comunidade, Albert já ameaçou com revólver um dos moradores na frente da filha deste, que ao tentar escapar acabou se machucando no arame farpado. Ele ainda deu queixa duas vezes na delegacia sobre moradores da comunidade. Ironicamente, o Sr. Albert, que não permite a passagem por dentro de sua propriedade, para chegar lá, passa pelas propriedades de vários dos moradores tradicionais. A única pessoa que tem a chave do cadeado e autorização para passar é o chileno Álvaro, proprietário das terras junto à praia.

Entretanto, segundo a comunidade, as disputas não se restringem aos estrangeiros. Em Jeribucaçu, o Sr. João (gerente) não quer que as jangadas sejam guardadas na beira do rio, e tem ameaçado soltar as jangadas na corrente. Segundo os moradores do Campo Seco, o Sr. João não quer que ninguém pesque na beira do rio, "na minha porta". De acordo com o relato da comunidade, o Sr. João já ameaçou com escopeta calibre 12 jovens da comunidade e, por seu próprio discuido, acabou sendo atingido no pé pela própria arma. Na praia da Engenhoca, moradores do Campo Seco denunciaram que João atira para o ar para intimidar pescadores e banhistas, quando se juntam em grandes números. O Sr. Luciano é o proprietário da área da Engenhoca, e das duas margens do Jeribucaçu (suspeitam que a margem norte tenha sido comprada com "testa de ferro"). Recentemente houve uma transação de terras na região, alterando os proprietários. Não sabemos como ficou a configuração final.

Na seção a seguir, descrevemos a questão das terras em Itacarezinho, onde também há problemas com os caminhos traducionais.

5 Uma disputa particular que ilustra o caráter de Silva e Arnô é que o Sr. Romildo "Chapéu Branco" tinha uma novilha e um garrote nas terras de Gilles quando este morreu. Ao tentar recuperar seus animais, o Sr. Silva se recusou, e chegou a ameaçar Chapéu Branco de morte. Chapéu Branco deu parte na polícia na tentativa de reaver seus bens, conforme certidão passada pelo escrivão de Polícia da 7a. Coordenadoria de Polícia em Itacaré. Os Srs. Silva e Arnô acabaram abatendo a novilha e vendendo o garrote, conforme ofício 15/00 da procuradora Flávia Cerqueira Sampaio ao delegado Eduardo Lemos Barcelos. Chapéu Branco apresentou três testemunhas mas o delegado não as ouviu. O Sr. Arnô acabou "inventando", segundo Chapéu Branco, que este o ameaçou de morte, e deu parte deste à polícia. O delegado também não garantiu a integridade dos bens de Chapéu Branco. Apesar da ordem dada pelo delegado para que Arnô e Silva não vendessem os animais, e deles terem vendido, nada foi feito para remediar a questão. Chapéu Branco está esperando pelo resultado da Justiça. Por atitudes como essa, Arnô já sofreu sanções pela comunidade, por exemplo, como no dia em que as pessoas se reuniram, impediram a sua passagem pela estrada e quiseram atear fogo no seu carro.

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12.4 - Conflitos pela posse da terra em Itacarezinho A situação da posse das terras na comunidade Itacarezinho é bastante incerta. A seguir, descrevemos esses conflitos conforme o relato e informações da própria comunidade, confirmadas com visita ao local.

Grilagem de terras é a "arte" de se aproveitar da documentação frágil ou inexistente para tomar as terras de pequenos agricultores. Um comportamento típico de grileiros é comprar terras e titulá-las em área maior, abrangendo a área de posseiros, e comprar terras em volta das posses, depois fechando o acesso dos posseiros às estradas que ligam suas áreas ao mercado e às cidades. Com o fechamento das estradas, a vida nas comunidades cercadas vai se tornando difícil. Para piorar as coisas, violência, ou ameaça de violência, é empregada para intimidar os posseiros. Então os grileiros oferecem uma pequena quantia de indenização, que os posseiros acabam aceitando.

Em Itacarezinho, uma situação típica de grilagem é descrita pela comunidade, que também tem uma documentação frágil de suas terras. As terras de Itacarezinho (200 hectares), segundo a comunidade, pertenciam ao Sr. Silvino Pinto (?), que cedeu parte da terra ao pai de Dona Ananilza e Dona Noélia. Das terras herdadas, parte foi dividida (a parte próxima às casas), outras permaneceram de "uso comum", ou coletivas, sem serem divididas.

As propriedades ao redor foram adquiridas pelos novos proprietários com posseiros no seu interior. Antes, a passagem de carros se dava por duas fazendas: a de Durval Lélis, ao sul, e a Fazenda Boa Sorte (Txai Resort). Ambas as estradas foram fechadas, sendo que a da Fazenda Boa Sorte foi adequadamente trocada por uma nova estrada de acesso. O problema é que nessa estrada foi colocada uma porteira com cadeado e que a comunidade não tem a chave. Além disso, os proprietários ao redor estão constantemente pressionando a comunidade para vender suas terras.

Esse objetivo foi, em boa parte, conseguido. Boa parte da comunidade de Itacarezinho vendeu e/ou saiu de suas terras. Os únicos que ficaram são posseiros. Foram observados em Itacarezinho conflitos extremamente delicados sobre a posse da terra. Esses conflitos são entre os pescadores e marisqueiras os proprietários Cláudio Magalhães, Nelson Moraes (Txai Resort/ Fazenda Boa Sorte, que comprou também as terras do "Coronel") e Oscar Artaza. Também existem disputas com os proprietários sobre a posse dos coqueiros (as regras tradicionais de posse dos coqueiros no local permitem que um coqueiro, apesar de plantado na terra de uma pessoa, possa pertencer a outra). Um exemplo dessa disputa sobre a posse dos coqueiros é a existente entre Oscar e um dos posseiros (João de Jesus).

A história que as pessoas contam é coerente e é sempre a mesma. Ela revela problemas sérios entre Cláudio Magalhães, Oscar Artaza, Nelson Moraes, "Coronel" (que vendeu recentemente suas terras a Nelson), e a comunidade. Os conflitos com Cláudio Magalhães são sem dúvida os mais fortes. De acordo com a comunidade, Cláudio Magalhães chegou à comunidade há sete anos, a princípio acampando e dormindo nas casas dos próprios pescadores. Aos poucos, foi ganhando a confiança das pessoas e fazendo amizade. E gradualmente, de acordo com a

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história da comunidade, Cláudio Magalhães foi convencendo as pessoas a vender suas terras. Primeiro, adquirindo as terras documentadas que, entretanto, tinham posseiros sem documentação em seu interior. A seguir, os posseiros passaram a ser pressionados para vender as posses. A comunidade acusa Cláudio Magalhães de aproveitar-se da falta de conhecimentos e da pobreza das pessoas para comprar barato, impor acordos, e intimidar. Para isso, Cláudio Magalhães teria utilizado até a polícia de Itacaré, dando queixa contra os moradores e conseguindo ordens de despejo. Em pelo menos uma ocasião, não se sabe se com ordem judicial, uma família foi expulsa de sua casa, ao anoitecer, sem ter a chance de recolher pertences ou documentos, que foram queimados juntamente com a sua casa. A família também tem sido impedida de reconstruir a casa. A família de Dona Noélia Miranda tem sido impedida de construir uma nova casa, para substituir a antiga casa de taipa em ruínas, e é ameaçada por Cláudio, que diz que derrubará a casa nova se for construída. O Sr. José de Souza, já idoso, diz que foi agredido fisicamente por Cláudio Magalhães, que teria tentato forçá-lo a assinar um documento de venda da sua terra em Itacarezinho. O Sr. José diz que Cláudio Magalhães sempre insiste na compra da terra, ligando para marcar encontros em locais suspeitos, os quais o Sr. José evita.

A comunidade também já reagiu à altura. Uma vez, Cláudio Magalhães construiu uma casa nas terras de uma das famílias, derrubando os coqueiros em volta e no local. A casa foi destruída na primeira chance. Uma cerca colocada por Cláudio Magalhães ao redor das terras da comunidade também foi derrubada.

Até há pouco, tinha-se a noção de que Nelson Moraes, do Txai Resort, era mais neutro que esses outros proprietários, já que ele tinha construído a estrada alternativa à servidão de passagem por dentro de sua fazenda. Porém, essa percepção está mudando, como será descrito a seguir.

Para acesso à comunidade de Itacarezinho, uma estrada de terra usada pela comunidade para chegar à estrada principal passava pela Fazenda Boa Sorte (Txai Resort). Segundo informações, essa estrada foi construída com dinheiro do Instituto do Cacau, para escoamento da produção. O proprietário Nelson Moraes decidiu fechá-la e trocá-la por uma estrada nova que abriu em uma faixa de terra especialmente adquirida para esse propósito. Dessa forma, ele trocou a servidão de passagem por essa faixa com a nova estrada. No início, a nova estrada tinha livre acesso a todos. Mas, com o tempo, uma porteira foi construída e, depois, um cadeado foi colocado. O acesso passou a ser controlado por um vigia, ou por quem tivesse posse da chave do cadeado. Não ficou bem claro quem colocou o cadeado na porteira (se foi Cláudio Magalhães ou Nelson Moraes), mas todos os proprietários documentados tinham uma cópia da chave, a não ser uma das famílias tradicionais, que apesar de ter uma escritura de declaração de posse, não tem uma cópia da chave. A maioria das pessoas com quem conversamos pensa que foi Cláudio Magalhães quem colocou o cadeado, mas uma pessoa, pelo menos, pensa que é Nelson Moraes, da Fazenda Boa Sorte, quem controla a passagem. Uma possível mudança na atitude de Nelson Moraes foi observada pela comunidade depois que ele adquiriu um terreno na área onde a comunidade está localizada, quase vizinho à Fazenda Boa Sorte. Recentemente, soube-se que Nelson comprou também o terreno de Coronel, que tem uma moradora tradicional em seu

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interior, e que também planeja comprar as terras de Cláudio Magalhães com os posseiros no seu interior. Parece que seus interesses se tornaram mais próximos dos dos outros proprietários. Se antes o Sr. Moraes condenou a violência contra a comunidade, hoje ele está colocando dificuldades para que a comunidade tenha acesso às chaves. Os proprietários negam às famílias cópias das chaves para garantir sua passagem livre e sem constrangimento. Isso também representa constrangimento na hora de receber parentes e amigos de fora, que podem vir de carro. A passagem a pé, por enquanto, não sofre restrições. Recentemente, soube-se que a chave agora é controlada exclusivamente por Nelson Moraes. As reações da comunidade, como a quebra de cadeados, tem resultado em intimidação por parte de um segurança do Txai Resort, do Sr. Moraes, que também é policial civil. De qualquer forma, é clara a união entre os "proprietários" para intimidar e dificultar a vida da comunidade.

Portanto, ao compararmos a situação de Itacarezinho com o procedimento típico de grileiros, descrito acima, vemos bastante semelhança. Parece um caso típico de grilagem, com o ilhamento da comunidade tradicional nos limites da propriedade oficialmente reconhecida.

Na cidade de Itacaré, a questão da abertura do acesso à estrada que leva à praia de Itacarezinho é muitas vezes definida em termos do conflito entre o direito do banhista/turista a ir à praia e a preservação da característica primitiva das praias, mantendo-as com baixa visitação e sem barracas. No caso da comunidade pesqueira de Itacarezinho, temos que redefinir a questão: trata-se agora do acesso da comunidade local à estrada asfaltada, através do caminho que veio a substituir a servidão de passagem utilizada durante décadas.

12.5 - Conflito fundiário em Piracanga Em Piracanga, o conflito fundiário envolve as ilhas do estuário, onde vivem quatro famílias de pescadores. É um local belíssimo. Uma das ilhas possui uma invejável vista para o mar, de frente para uma praia deserta onde as tartarugas desovam anualmente. As quatro famílias de pescadores estão assentadas na área em questão há três ou quatro anos, e têm vivido da pesca e mariscagem, e de plantios de côco estabelecidos nas ilhas há muitos anos pelos moradores anteriores. Alguns moradores estão replantando o manguezal e o apicum, coletando o lixo que aparece nas praias, defendendo as tartarugas e recuperando o meio ambiente local.

Entretanto, no dia 18 de fevereiro de 2001, essa paz foi ameaçada pelos senhores Vivi (vereador de Itacaré), Luís (dono da balsa que faz a travessia do Rio de Contas em Itacaré), Joselito (de Ubatã), Francisco ("Chico", sócio de Luís), e Marcos "Figura", Adroaldo, e mais três desconhecidos, estiveram em Piracanga comunicando aos moradores que eles adquiriram as terras das ilhas de mangue no Rio Piracanga e que pretendiam construir no local em breve ("o mais rápido possível", segundo eles). Disseram ainda que os moradores deveriam sair do local. Essa situação ameaçava as famílias locais, o meio ambiente (pois a construção destruiria áreas de proteção permanente formadas por manguezais) e a integridade da área da futura Reserva

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Extrativista Marinha de Itacaré. Essas ilhas são áreas pertencentes à União ("terrenos de marinha").

Segundo informações dadas por um morador local que acompanhou a negociação de ilhas entre Dona Lili (antiga "proprietária"), do povoado de Caubi, e Adroaldo, foram somente duas as ilhas "vendidas". Entretanto, Joselito, de Ubatã, que esteve presente no local, disse que tinha "comprado" todas as ilhas de Piracanga de Adroaldo, que teria feito um documento (recibo de compra e venda) incluindo todas as ilhas (cinco hectares). Trata-se de um documento de compra e venda, que não especifica quais foram as ilhas adquiridas, e que não tem qualquer validade em áreas de marinha. Joselito disse também ter "vendido" as ilhas de Piracanga ao vereador Vivi e a Luís da Balsa.

Essa ameaça resultou na mobilização da comunidade e em uma representação ao Ministério Público Federal, que ordenou ao Ibama/Ilhéus que investigasse o conflito, e também as infrações ambientais presentes na área, como o desmatamento de uma área de mangue pelo Sr. Humberto Hugo. Como resultado, o Sr. Humberto Hugo foi autuado e multado em R$1.500,00. Os planos de Vivi e Luís, até o momento, não foram colocados adiante. Apesar de essas ações terem tido bons resultados, um líder da comunidade passou a sentir-se ameaçado, pois um homem estranho passou a rondar a comunidade e todos acreditavam ser ele um pistoleiro.

O conflito descrito acima não foi a primeira vez em que a comunidade de Piracanga se sentiu ameaçada por supostos proprietários. No final de 2000, a comunidade começou a sofrer pressão por parte dos senhores Hector Eduardo Bonder (um argentino) e Leila Küntgen, proprietários de um terreno em frente ao mar, junto ao Rio Piracanga, do lado de Maraú. Os referidos proprietários vinham ameaçando retirar três famílias que ocupam ilhas do Rio Piracanga. Eles alegavam possuir título sobre uma área incluindo as ilhas ocupadas por essas três famílias, que, como foi dito acima, são terrenos de marinha (na verdade sua documentação era frágil, e consiste em uma série de documentos de transferência possessória). Eles também alegavam possuir contatos políticos, que deveriam facilitar essa violência contra a comunidade de Piracanga.

Em conversa de João Batista com Hector Eduardo, este acusou-o de estar sendo corretor de áreas da União (o que não é verdade6) e disse que o Sr. Augusto dos Santos deverá sair da ilha que ocupa "nem quem sabe no chumbo". Isso mostra o grau de intranquilidade que estavam vivendo. Esses moradores, porém, têm sido defensores da área. João Batista A. Viana, por exemplo, costuma recolher o lixo das praias e defende as tartarugas marinhas e seus ninhos. O Sr. Augusto dos Santos, outro posseiro na área, e ameaçado de expulsão, está replantando o mangue junto ao seu rancho de pesca.

6 Em visita à comunidade para averiguar a situação, vários moradores, como o Eduardo (conhecido como Dudu, recém-chegado à área, que ocupa uma das ilhas que antes pertenciam a Dona Lili), Augusto dos Santos, e "Bob" desmentiram a versão de Hector Eduardo, de que João Batista estaria corretando áreas da união.

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Recentemente, após a ação do Ibama na área, houve uma mudança de atitude por parte desse grupo de proprietários. O Sr. Chico, que também é sócio de Eduardo e Leila, tem oferecido apoio à Reserva e à comunidade, com a doação de uma área para escola, poço e vila de pescadores.

12.6 - Cemitério destruído O cemitério localizado na Fazenda Patizeiro foi destruído pelo proprietário João Paiva, deixando a comunidade de Itacarezinho sem ter onde enterrar seus mortos. O cemitério foi construído pelo Sr. Guilherme da Costa em 1940, e batizado pelo Padre Edgard em 1941. De acordo com a comunidade de Itacarezinho, a marcação das sepulturas foi destruída, e os restos mortais dos parentes da população local estão hoje sob a terra, no mesmo local, mas sem identificação ou possibilidade de visitas e homenagens.

13. Históricos Participativos Os históricos participativos elaborados com representantes das comunidades pesqueiras de Itacaré ilustram e resumem as dinâmicas sociais e ambientais gerais. Foram feitos dois históricos participativos, um na sede (Itacaré) e outro em Taboquinhas. A seguir, os resultados são descritos:

13.1 - Itacaré De acordo com o histórico elaborado pelos membros do Grupo de Trabalho e outros pescadores e marisqueiras (Figura 16), a quantidade de guinchos atuando na costa de Itacaré tem aumentado muito desde 1980. A pesca predatória, que inclui os guinchos, também tem aumentado, embora o uso de bombas, que era feito na década de 80, tenha desaparecido. O uso de compressor para pesca subaquática, uma ameaça mais séria ao pescado, na opinião dos participantes, surgiu em 1990. Uma outra prática considerada predatória é a rede de espera, que espanta os cardumes e pega os peixes de passagem. O aumento do número de guinchos em 2000 explica a representação do aumento da pesca predatória neste ano.

Em consequência, os peixes têm diminuído em quantidade e tamanho. De 80-85, havia muito peixe. Em 85, as redes de arrasto começaram a afetar os peixes. Em 90, os guinchos fizeram seus efeitos serem sentidos, juntamente com a pesca de compressor.

O camarão teve sua maior queda em 90-95, devido a fatores climáticos, aumento forte do número de guinchos e o desrespeito ao defeso por parte de alguns pescadores. As tartarugas têm diminuído ano a ano, apesar de ainda estarem presentes na praia da Engenhoca, Itacarezinho e Piracanga. As lagostas tiveram sua maior pesca no período de 90-95, quando eram pescadas com rede e deram boa renda aos pescadores. Depois, sua abundância foi diminuindo, provavelmente devido à sobrepesca por pescadores locais e de fora.

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Figura 16: Histórico participativo de Itacaré. Os números reletem uma noção de quantidade relativa.

Guinchos Asperi Pescapredatória

Peixe Camarão Tartaruga Lagosta Caranguejo Pitu Estradaasfalto

Turista Calão Dinheiro

80 2 BombaGuincho

Rede arrasto3

20 40 30 Semexploraç

ão(chan-chan)

50 5 2 (maisveranistas)

2 Cacau 80Pesca 20

Turismo 3

85 4 BombaGuincho

R.edearrasto

6

15 38 25 Pescano

guincho

40 4 4 2 Cacau 80Pesca 25

Turismo 4

90 8 GuinchoArrasto

CompressorRede deespera

10

10 30 15 50 30 4 10 4 Cacau 65Pesca 80Turismo

10

95 16 96 -Fund.98 -

Financ.

GuinchoArrasto

CompressorRede deespera

18

4 15 8 30 15 3 98 -Inaugur.

20 5(2 de

ilhéus)

Cacau 10Pesca 50Turismo

25

2000 20 Crescimento

GuinchoArrasto

CompressorRede deespera

25

2 3 1 10 5 1 Aumentode

automó-veis

50(turismo)

3 Cacau 1Pesca 20Turismo

50

O caranguejo tem diminuído em quantidade e tamanho por causa do corte do mangue, das barragens, e da exploração excessiva. Há 15 anos(?), não se coletava caranguejo para vender. Há uma maioria de mulheres na atividade, que pegam também siri, aratu e um pouco de lambreta. Todos esses produtos são afetados negativamente pelas barragens construídas no Rio de Contas, principalmente a lambreta e a ostra que não sobrevivem à imensa quantidade de água doce liberada com a abertura das comportas das represas rio acima. Sobre o pitu, o grupo sentia-se com pouca base para comentar, pois não exploram o produto. Mas pensam que está dimunindo devido à pesca excessiva, pesca com veneno e fechamento do rio com redes.

Recentemente, duas adições foram a Asperi e a estrada asfaltada. A Asperi foi fundada em 1996 e recebeu seu primeiro financiamento em 1998. A estrada também foi inaugurada em 1998, causando um aumento no número de automóveis, maior facilidade para escoar a produção pesqueira, aumento do número de turistas (e resultante aumento do preço do camarão na alta estação). O aumento do preço do produto pescado com o turismo não chega a beneficiar o pescador, pois a diferença fica muitas vezes com o atravessador. O turismo tem sido uma das grandes mudanças recentes na cidade. Antes, a maioria das casas de pessoas de fora eram de veranistas, mas que gastavam menos e contribuíam menos, por pessoa, para a economia local. Hoje, o turismo é muito forte, o ano todo, incentivando o aumento da infra-estrutura para receber os visitantes. Uma segunda mudança foi o perfil do visitante, que antes era de Salvador e hoje vem na maioria do sul, de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Com o turismo, aumentou o lixo, a necessidade de saneamento básico, a prostituição de menores, os problemas com o fechamento de praias, a poluição visual e sonora, poluição do ar (poeira e escape de veículos em alguns pontos da cidade), violência e crime (incluindo estupros e drogas) e o conflito cultural entre os visitantes e os nativos, com a imposição dos valores e comportamentos dos visitantes sobre os dos nativos.

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O histórico mostra ainda a mudança da economia regional, antes dependente do cacau, passando por um período onde a pesca foi importante, e chegando hoje a uma dominância do turismo na geração de renda para Itacaré.

13.2 - Taboquinhas Os participantes de Taboquinhas elaboraram o histórico participativo dos recursos naturais próximos à sua comunidade. Primeiro, o grupo identificou alguns elementos que interferem na vida da comunidade pesqueira de Taboquinhas: peixe, pitu, curuca, pesca com bomba, canoa, pesca de mergulho, pesca com tarrafa, rede de arrasto, vegetação e vassoura de bruxa. Em seguida, escolheram algumas datas, usando marcos históricos importantes nos últimos 40 anos, além de uma previsão para o futuro: 1960, 1970, 1985, 1994, 2001 e 2010. A seguir encontra-se um resumo das relações que os participantes traçaram a partir de cada elemento:

Peixes: a constatação de que a quantidade de pescado diminui ao longo do tempo foi uma unanimidade no grupo, sendo enumerados diversos fatores que contribuíram para isso: o aumento do número de pescadores, em grande parte devido ao declínio do cacau, o desrespeito à época de desova e ao tamanho adequado das espécies para a pesca. A tendência futura, se nada for feito, é diminuir ainda mais.

Pitus: a quantidade de pitu também diminuiu bastante em relação ao número de pescadores, fazendo o preço subir muito. No entanto, o lucro com a venda do pitu fica concentrado nas mãos de atravessadores, que compram por R$ 12,00 e revendem em Ilhéus por R$ 18,00, e nas mãos dos donos de restaurante, que vendem um ou dois pitus pelo preço de um quilo. O pitu vai se criando nas barragens, até a liberação da água duas vezes por ano. A tendência futura, se nada for feito, é diminuir ainda mais.

Curucas: a quantidade de curuca também diminuiu, mas ela ainda serve como um “socorro na hora da precisão”. O quilo de curuca custa R$ 5,00 e é consumida pelas classes intermediárias (bancários, pescadores, etc.). Os participantes lembraram épocas em que a curuca “sumiu”, mas não sabem ao certo as razões disso. A tendência futura, se nada for feito, é diminuir ainda mais.

Barcos: o número de barcos diminuiu ao longo do tempo, pois o nível médio das águas do Rio de Contas diminuiu e aumentaram os banco de areia, tornando-o de difícil navegação. Isto ocorreu devido à construção de duas barragens e à retirada da mata nas margens do rio. Além disso, no passado não havia estrada, então o rio era o principal meio de transporte de passageiros e produtos. Até 1985, o transporte era feito de canoa de Ubaitaba até o Banco, do Banco até o Pé da Pancada de burro e a pé, por uma trilha calçada, chegando finalmente a taboquinhas Taboquinhas. De Taboquinhas a Itacaré, o transporte era feito de barco. A tendência futura, se nada for feito, é diminuir ainda mais a trafegabilidade e o número de barcos.

Pesca com bombas: o uso de bombas para a pesca no rio foi diminuindo com o tempo e não existe mais hoje em dia. Não se prevê essa prática para o futuro.

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Canoas: o número de canoas diminuiu muito, pois não há mais, nas redondezas, o tipo de madeira adequada para sua construção. Só próximo à estrada de Maraú é possível encontrá-la, mas o Ibama proíbe sua extração. Além disso, canoas feitas de outros materiais, como alumínio são muito caras para os pescadores de Taboquinhas. A diminuição da importância do transporte pelo rio também explica a diminuição no número de canoas. A tendência futura, se nada for feito, é diminuir ainda mais. Pesca de mergulho: inicialmente só pescavam peixes grandes através desse método, o que não acontece mais hoje, devido à luta pela sobrevivência. Aumentou muito nos último tempos, o que deve continuar.

Pesca com tarrafa: a pesca com tarrafa aumentou muito, sendo que as malhas são cada vez mais finas para aumentar a quantidade de pescado, o que foi condenado como uma prática predatória. Essa prática vai, provavelmente, continuar nos mesmos níveis no futuro, ou aumentar.

Rede de arrasto: essa prática diminuiu muito ultimamente pois, segundo eles, há maneiras mais fáceis de conseguir o pescado.

Mata: diminuiu devido à retirada de madeira para construção de canoas e queimadas para plantio e criação de animais. As queimadas foram bastante criticadas pois impedem o crescimento da madeira nova. A tendência futura, se nada for feito, é diminuir ainda mais.

Vassoura de bruxa: surgiu mais ou menos em 1990 e acabou com toda a produção de cacau. Alguns agricultores estão fazendo a enxertia do cacaueiro, mas agora a vassoura de bruxa está aparecendo também na enxertia, quando não é bem feita (?). As pessoas mais pobres, que trabalhavam nas roças de cacau perderam seus postos e tiveram que se tornar pescadores. A tendência futura, com os novos clones resistentes ou tolerantes à doença, é diminuir o problema.

Pescadores: o aumento populacional em si fez com que aumentasse o número de pescadores, o que foi acentuado com o declínio da cultura do cacau, tornando a pesca a única alternativa de sobrevivência para a maioria da população. Além dos adultos, os jovens e crianças passaram a pescar para complementar a renda familiar. O número de pescadores vai provavelmente se manter alto no futuro próximo.

14. Conclusões e Diretrizes para o Plano de Desenvolvimento da Reserva Extrativista

Marinha de Itacaré Nesta seção, são apresentadas as conclusões do diagnóstico participativo e da proposta preliminar de Plano de Desenvolvimento elaborada por representantes das comunidades pesqueiras de Itacaré em um encontro realizado nosdias 9 e 10 de abril de 2001. A proposta apresentada a seguir será ainda discutida com as comunidades, mas já apresenta diretrizes para o desenvolvimento da Reserva que

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refletem as discussões feitas no diagnóstico participativo para as áreas de Conservação dos Recursos Naturais, Melhoria da Renda e Organização Comunitária.

14.1 - Conservação dos recursos naturais Conservação dos recursos naturais é um dos principais objetivos de uma reserva extrativista. Em Itacaré, as principais ameaças aos recursos naturais marinhos são a pesca de arrasto industrial, a pesca com equipamento de compressor, a pesca excessiva e/ou predatória por pescadores locais e de fora, a destruição dos manguezais e a degradação da bacia do Rio de Contas, incluindo as matas ciliares e nas nascentes. Em função desses problemas e dos demais problemas descritos neste relatório, a criação da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré se faz necessária.

14.1.1 - Objetivos

Recuperar e usar de forma sustentável os recursos naturais da área da futura Reserva Extrativista Marinha de Itacaré, aumentando a abundância de peixes, lagostas, camarões e outros recursos, e protegendo a natureza e a base das atividades econômicas da população extrativista de Itacaré.

14.1.2 - Estratégias

a) Obter do CNPT/Ibama a criação da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré;

b) Organizar a comunidade em uma associação para gerir a Reserva, com representantes de cada comunidade, e grande participação comunitária;

c) Educar e conscientizar extrativistas (pescadores, pescadoras e marisqueiras) e visitantes a respeito da conservação da natureza, formas não predatórias de utilizar os recursos e cuidados que devem ser tomados com o lixo e outros problemas;

d) Buscar alternativas para as práticas predatórias, como novas atividades e fontes de renda;

e) Cadastrar os pescadores e orientá-los para que recebam o seguro-defeso e possam, assim, respeitar as épocas em que a pesca de algumas espécies é proibida;

f) Promover a fiscalização ambiental, através de fiscais colaboradores e em parceria com o Ibama e outros órgãos, fiscalizando tanto as pessoas cadastradas na Reserva como as pessoas de fora, para que as Normas da Reserva (plano de utilização) sejam respeitadas.

g) Definir o tamanho mínimo das espécies e a época correta dos defesos para a situação específica de Itacaré;

h) Seguro-defeso para os extrativistas de caranguejos, guaiamuns e pitus.

i) Cobrar o tratamento dos esgotos de Itacaré e Taboquinhas;

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j) Recuperar os manguezais, apicuns e as matas das beiras de rio, riachos e nascentes.

14.1.3 - Meios necessários

Para implementar as estratégias acima, é preciso recursos para:

a) Comunicação (rádios ou celulares), para facilitar a fiscalização;

b) Placas e materiais educativos, para orientação ao turista, veículos e pessoas de fora, e para educação da população local;

c) Formação de educadores ambientais, guias turísticos e fiscais colaboradores;

d) Troca de equipamentos predatórios (por ex., redes de malha fina) por sustentáveis (por ex., redes de malha mais larga);

e) Lanchas e equipamentos (binóculos, rádio, GPS, máquina fotográfica, filmadora) para a fiscalização no mar e no rio;

f) Veículo 4x4, para deslocamento às comunidades rurais e ações de fiscalização;

g) Assistência jurídica.

Os fiscais colaboradores devem ser eleitos pelas suas comunidades, mas poderão ser destituídos pela Conselho Deliberativo da Associação ou pela Assembléia Geral. Devem ser treinados dois ou três fiscais por comunidade, o mais rápido possível.

Além dos fiscais colaboradores, para a área de conservação dos recursos naturais, é preciso ter a formalização da Associação da Reserva, com a formação do Conselho Deliberativo e da Comissão de Fiscalização (órgãos previstos nas Normas da Reserva - o plano de utilização em elaboração pela comunidade), que supervisarão os trabalhos dos fiscais. Sobretudo, a comunidade precisa estar bastante envolvida e consciente para que esta área tenha resultados.

Assim, uma ação educativa é fundamental. Os representantes das comunidades sugerem a elaboração de um jornalzinho ou boletim bimestral, a realização de trabalhos nas escolas, a produção de vídeos educativos, de placas de orientação e até mesmo a instalação de uma rádio comunitária. Essa rádio poderia, além de favorecer as ações educativas, servir de elo de comunicação com os pescadores no mar (para recados, boletins meteorológicos, etc.).

14.1.4 - Capacitação necessária

Para a implemantação das ações descritas acima, é preciso de capacitação em diversas áreas:

a) Fiscais colaboradores;

b) Organização comunitária;

c) Educação ambiental.

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14.1.5 - Apoio provável

Possíveis entidades que poderiam dar apoio à área de Conservação dos Recursos Naturais são:

a) Ibama (Ilhéus e CNPT);

b) Ministério Público Federal;

c) Ministério Público Estadual;

d) Capitania dos Portos;

e) Universidades (UESC, UEFS, UFBA, etc.);

f) Organizações Não-Governamentais (Jupará, Asperi, Colônia, etc.);

g) Iniciativa privada (patrocínios e doações);

h) Centro de Recursos Ambientais - CRA;

i) Prefeitura Municipal e Câmara dos Vereadores de Itacaré;

j) Delegacia de Polícia;

k) Congresso Nacional (através de deputados e senadores simpáticos aosextrativistas)

14.1.6 - Pesquisas necessárias

Para a implementação da Reserva Extrativista Marinha de Itacaré com melhor conservação dos recursos naturais, são necessárias pesquisas em diversas áreas, por exemplo:

a) Tamanhos mínimos das espécies para captura;

b) Épocas corretas de defeso;

c) Diversidade e ecologia dos corais;

d) Zoneamento da Resex com base técnica.

14.1.7 - Pesquisas sugeridas pelos oceanógrafos

Além das pesquisas apontadas acima pelos representantes das comunidades, os oceanógrafos que participaram do diagnóstico sugerem as seguintes temas para pesquisas, que ainda precisam ser discutidos com as comunidades:

a) Estimativas dos estoques pesqueiros, com a determinação da composição de espécies e suas variações de abundância, além de estudos de crescimento das espécies mais importantes.

b) Estudos para o manejo conjunto dos estoques de camarão e peixes de fundo.

c) Teste para o uso de redes de arrasto de camarão mais seletivas, que tem sido proposto em outros locais para diminuir o problema do descarte.

d) Estudos para a seleção de locais para o uso de diferentes equipamentos de pesca.

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e) Estudos para o manejo multiespecífico: é importante considerar o conjunto das espécies de peixes e não apenas as de interesse comercial. A obtenção de dados sobre a fauna acompanhante é necessária para o estabelecimento de medidas ordenadoras e previsões sobre o impacto da atividade pesqueira. Os resultados obtidos servirão de base para o estabelecimento de medidas de conservação das espécies e para estudos de avaliação de estoques.

f) Avaliação da capacidade suporte do sistema, primeiramente através da quantificação da produção de matéria orgânica, nutrientes, produção primária e de detritos, principalmente provenientes da produção dos manguezais. Nessa fase deverão também ser realizados os levantamentos da concentração de nutrientes e de sedimento em suspensão ao longo do estuário.

g) Influência da água doce (tolerância das espécies), principalmente devido a abertura da barragem em épocas de chuva abundante, sobre os estoques de peixes, crustáceos, e especialmente moluscos como ostras. Estudos sobre a influência dos ciclos de entrada de água doce, principalmente devido a abertura da barragem em épocas de chuvas abundantes, sobre as populações de organismos com interesse comercial; Acompanhamento da dinâmica de sedimentação nas áreas de manguezal e planícies não vegetadas adjacentes. Investigação sobre as causas da baixa produtividade de caranguejos e da mortalidade de ostras no Rio de Contas. O potencial para cultivo depende de pesquisas que monitorem a variação salinidade do rio.

h) Estudos sobre as alterações no manguezal, com o aumento de sedimento arenoso, fazendo com que os manguezais tenham seu sedimento gradualmente substituído de lodoso para areno-lodoso. Talvez esta alteração no sedimento seja refletido também na produção, abundância e diversidade de organismos dos manguezais.

i) Estudos sobre o tipo de reprodução, se contínua ou descontínua, a época do ano em que ela ocorre, e os períodos de desova mais intensa das espécies exploradas comercialmente na região de Taboquinhas, M. carcinus, M. acanthurus e A. scabra, que vêm sofrendo uma redução excessiva em seus estoques naturais, para a estipulação do período de defeso para cada espécie. A. scabra é uma espécie que merece especial atenção, visto que sua biologia é ainda pouquíssimo conhecida. Devem, também, ser realizados estudos com a finalidade de avaliar o potencial de cultivo desta espécie.

14.2 - Renda e subsistência O segundo objetivo principal da Reserva Extrativista é a melhoria da renda da população extrativista. Os principais problemas de renda e subsistência estão relacionados com a queda da produtividade pesqueira, e competição com barcos industriais e de outros municípios. Além disso, comercialização é feita por atravessadores, o que dificulta que os pescadores e marisqueiras se apropriem de uma porção maior do valor do pescado. Na zona rural, a produtividade e a renda obtida na agricultura são baixas. Para aproveitar a nova economia do turismo, falta capacitação e mecanismos de inclusão para enfrentar a competição com as pessoas de fora que vêm trabalhar na área. Em função desses problemas e dos

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demais problemas descritos neste relatório, a comunidade elaborou as seguintes diretrizes para a área de renda e subsistência:

14.2.1 - Objetivos

a) Melhoria da renda e das condições de vida dos extrativistas de Itacaré, com especial atenção à renda das mulheres, das populações rurais e dos pescadores sem embarcação.

14.2.2 - Estratégias

a) Conservação, para aumentar a quantidade de peixes, camarões e mariscos.

b) Turismo para o pequeno: organização comunitária para o favorecimento da população de baixa renda, e das comunidades pesqueiras, nas iniciativas ligadas ao desenvolvimento turístico de Itacaré.

c) Alternativas de pescaria para a época do defeso. Na zona rural, construção de tanques para a criação de peixes e camarões.

d) Na zona rural, material de pescaria, jangadas, energia elétrica e transporte para a produção.

e) Manejo dos recursos vegetais para que funcionem como alternativa de renda para homens e mulheres.

f) Preservar a natureza e respeitar as Normas da Reserva.

g) Organização comunitária, com formação de associações, e de uma cooperativa para a comercialização do pescado, agência de ecoturismo e de mergulho.

h) Aumentar o número de extrativistas que se beneficiam do seguro-defeso.

14.2.3 - Meios necessários

a) Parcerias e recursos para capacitação.

b) Apoio governamental.

c) Financiamento (preferencialmente a fundo perdido).

14.2.4 - Capacitação necessária

Os seguintes temas de capacitação foram sugeridos pelos participantes:

a) Beneficiamento do pescado e de seus subprodutos: embutidos de peixes, roupas com pele de peixe, como trabalhar com peixes e outros, e máquinas de catar camarão.

b) Organização comunitária, cooperativismo e associativismo.

c) Administração de cooperativas, pequenas e micro empresas.

d) Capacitação direcionada às necessidades das mulheres.

e) Agricultura com conservação da natureza.

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f) Turismo e ecoturismo.

14.2.5 - Apoio provável

a) Da comunidade.

b) De parceiros de fora (ex.: Sebrae).

c) Capitania dos Portos.

d) Ibama.

e) Ministério da Agricultura.

f) Ministério Público.

g) Prefeitura Municipal.

h) Sindicato dos Trabalhadores Rurais (que parece ter experiência com turismo rural).

14.2.6 - Pesquisas necessárias

Os representantes das comunidades sugeriram os seguintes temas de pesquisa:

a) Estudos necessários para o estabelecimento dos períodos de defeso para caranguejos, guaiamuns e pitus.

b) Alternativas de renda.

c) Potencial turístico de cada comunidade.

d) Outras maneiras de pescar.

e) Monitoramento socioeconômico e ambiental (acompanhamento do níveis de renda, condições de subsistência e estado dos recursos naturais com a criação da Reserva).

14.2.7 - Pesquisas sugeridas pelos oceanógrafos

Além dos temas sugeridos pelos representantes comunitários, os seguintes temas foram propostos pelos oceanógrafos, com especial atenção à possibilidade de cultivo de organismos marinhos:

a) Ostras: são necessários, para se avaliar o potencial para cultivo e/ou recuperação dos bancos naturais ostreícolas, trabalhos relativos a ocorrência, distribuição, épocas reprodutivas, épocas de captação de sementes (spats) através da análise de ocorrência de larva plantônica utilizando-se coletores, mortalidade e crescimento de ostras em diversas localidades. Além disto, estudos sobre a influência da água doce através de estudos de tolerância e crescimento são essenciais. Também podem ser realizados estudos piloto de crescimento a partir de sementes mais adaptadas a baixas salinidades, provenientes de laboratório. Cultivos em épocas de seca também podem ser testados; estima-se que em oito meses, haja tempo suficiente para o crescimento destes moluscos (Gelli, comunicação pessoal).

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b) Algas: trabalhos relativos a produção de algas com intuito de extração de ágar ou carrágenos podem ser testados, através da inserção de mudas de espécies comercialmente importantes como Hypnea spp ou Gracilaria spp em cordas amarradas suspensas em estacas ou estruturas flutuantes. Mas para que algum trabalho seja iniciado, tem que se avaliar se o investimento para o cultivo é justificado (existência de mercado).

c) Peixes e camarões: Apesar da existência de poucas áreas abrigadas observadas ao longo dos rios da região, a colocação de tanques-rede ou cercados, poderia se testar a colocação de tais estruturas em sistema intensivo ou super-intensivo de cultivo.

14.3 - Organização comunitária Os principais problemas de organização comunitária são a baixa participação das comunidades em ações coletivas, como associações e na Colônia, a sua frustração e desconfiança das ações e projetos de melhoria comunitária, a falta de integração e, às vezes rivalidade, entre os extrativistas das diversas localidades e de práticas de pesca diferentes (como [esca de arrasto e de linha). Em especial, as mulheres tem pouca participação nas ações de organização comunitária, sendo pouco presentes e pouco atuantes, na maioria dos casos, nas reuniões comunitárias. Além disso, as comunidades rurais tem sido menos atendidas pelas organizações da categoria pesqueira.

Na área de organização comunitária, os representantes das comunidades colocaram as seguintes diretrizes:

14.3.1 - Objetivos

a) Estimular o máximo de participação da comunidade, respeitando o ritmo de cada um, favorecendo a união entre os extrativistas e integrando as comunidades pesqueiras de Itacaré.

b) Permitir que os pescadores e marisqueiras controlem o poder na Reserva, e tenham mais influência na sociedade em geral.

c) Fortalecer as mulheres, estimulando sua participação e envolvimento na organização comunitária.

d) Envolver todos os extrativistas na implementação das Normas da Reserva, para que sejam obedecidas e aplicadas.

e) Promover a educação ambiental.

14.3.2 - Estratégias

As seguintes estratégias foram sugeridas pelos representantes das comunidades:

a) Estabelecer uma organização através de representantes, que possam levar as informações da Associação para as comunidades e, no caminho inverso, possam representá-las junto à Associação. Os representantes serão eleitos por suas próprias comunidades.

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b) Ter núcleos da Associação da Reserva nas comunidades, em que os representantes dos núcleos serão eleitos independentemente pelas suas comunidades.

c) Ter visitas periódicas da diretoria e do Conselho Deliberativo da Associação da Reserva às comunidades. O Conselho Deliberativo deverá ser formado por dois representantes de cada comunidade (no caso de impedimento, a comunidade poderá delegar a outras pessoas o papel de suplentes). Para a comunidade de Taboquinhas, haverá dois representantes da área urbana e dois da rural.

d) Formar "grupos de trabalho" (como o que hoje existe na sede) em Taboquinhas e em outras comunidades que se interessarem.

e) Implementar o projeto "Terra Nuova", com a geração de pequenos projetos comunitários, aprofundamento do Plano de Desenvolvimento da Reserva, fortalecimento das mulheres e amadurecimento das discussões sobre a Associação.

f) Fazer reuniões gerais, com representantes de todas as comunidades, em cada comunidade pesqueira.

g) Fortalecer as comunidades internamente, independentemente da Associação da Reserva.

h) Direcionar benefícios através da Associação.

i) Criar uma cooperativa para comercialização do pescado e promoção de outras atividades econômicas, como o ecoturismo, por exemplo.

14.3.3 - Meios necessários

a) Recursos para a realização de reuniões e atividades nas comunidades.

14.3.4 - Capacitação necessária

Os seguintes temas de capacitação foram sugeridos:

a) Gerenciamento de projetos.

b) Organização comunitária.

c) Associativismo e cooperativismo.

d) Capacitação jurídica (ambiental, direitos humanos, questões fundiárias, etc.).

14.3.5 - Apoio provável

a) Jupará.

b) CNPT/Ibama e Ibama/Ilhéus.

c) Colônia.

d) Asperi.

e) Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais (MMTR)

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f) Ministério Público Federal.

g) Ministério Público Estadual.

h) Sindicato dos Trabahadores Rurais -STR

i) Associação dos Advogados de Trabalhadores Rurais - AATR.

j) Organizações internacionais.

14.3.6 - Pesquisas necessárias

Não foram indentificadas, pelos representantes das comunidades, necessidades de pesquisa para esta área. Seria recomendável, porém, pesquisas que monitorem o avanço do processo participativo, como o aumento da participação das comunidades rurais e das mulheres.

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Anexo 1: Reservas Extrativistas Terrestres no Brasil.

Estado Categoria Nome Área (ha) Acre Resex Federal Alto Juruá 506.186 Resex Federal Chico Mendes 970.570 Resex Federal Nova Esperança 2.576 Assentamento Extrativista Porto Dias 22.145 Assentamento Extrativista Riozinho 35.896 Assentamento Extrativista Cachoeira 24.973 Assentamento Extrativista Sta. Quitéria 44.000 Assentamento Extrativista S. Luiz do Remanso 39.572 Amapá Resex Federal Rio Cajarí 481.650 Assentamento Extrativista Maracá I 75.000 Assentamento Extrativista Maracá II 22.500 Assentamento Extrativista Maracá III 226.000 Amazonas Resex Federal Rio Jutaí 250.000 Resex Federal Médio Juruá 253.226 Resex Federal Carauari 450.000 Assentamento Extrativista Antimari 260.227 Assentamento Extrativista Terruã 139.235 Maranhão Resex Federal Ciriaco 7.050 Resex Federal Mata Grande 10.450 Resex Federal Quilombo do Frexal 9.542 Mato Grosso Resex Estadual Guaribas / Roosevelt 57.600 Pará Resex Federal Tapajós-Arapiuns 640.000 Rondônia Resex Federal Rio Ouro Preto 204.583 Resex Estadual Roxinho 882 Resex Estadual Seringueiras 537 Resex Estadual Garrote 802 Resex Estadual Mogno 2.450 Resex Estadual Piquiá 1.448 Resex Estadual Angelim-Jequitibá 8.923 Resex Estadual Itaúba 1.758 Resex Estadual Ipê 815 Resex Estadual Jatobá 1.135 Resex Estadual Massaranduba 5.566 Resex Estadual Maracatiara 9.503 Resex Estadual Sucupira 3.188 Resex Estadual Castanheira 10.200 Resex Estadual Aquariquara 18.100 Resex Estadual Freijó 600 Resex Estadual Rio Preto Jacundá 115.278 Resex Estadual Rio Jaci-Paraná 191.324 Resex Estadual Cautário 144.371 Resex Estadual Curralinho 1.757 Resex Estadual Pedras Negras 124.124 Resex Estadual Rio Pacaás Novos 342.903 Tocantins Resex Federal Extremo Norte do Tocantins 9.280 TOTAL BRASIL 5.727.925

Fonte: CNPT/IBAMA, PNUD/PLANAFLORO, PNUD/PRODEAGRO, Menezes (1994)

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Anexo 2: Calendário Geral de Atividades Desenvolvidas SEG TER QUA QUI SEX SAB DOM

JANE

IRO

22 Porto de Trás 1o Dia -Diagnóstico Infra-estrutura 19h00

23 Porto de Trás Equipe UESC: Rubens, Lucio, Sylvia, Clara, Ananda, Renato

24 Porto de Trás Equipe UESC: Gecely, Monica, Lucio, Renato

25 Porto de Trás Pela manhã: desembarques – ASPERI e Colonia Equipe UESC: Gecely, Monica

26 Sistematizar dados Porto de Trás

27 Visita a Piracanga, para verificar questões de terra

28

29 Reunião do Grupo de Trabalho; Trabalho de campo da UESC Periodo da tarde: Rio de Contas Rubens, Sylvia, Luis, Monica, Erminda. Clara, Ananda, Renato

30 Banca do Peixe

31 Banca do Peixe Trabalho de campo da UESC: praias Rubens, Sylvia, Gecely, Erminda, Lucio, Luis, Julio, Monica

1 Banca do Peixe Pela manhã: desembarques – ASPERI e Colonia Equipe UESC: Gecely, Monica

2 Sistematizar Banca do Peixe

3 Itacarezinho

4 Itacarezinho Equipe UESC: Sylvia, Monica, Gecely, Lucio, Cíntia

FEVE

REIR

O

5 Reunião Grupo de Trabalho Trabalho de campo da UESC: praias/manguezal Rubens, Sylvia, Gecely, Erminda, Lucio, Monica, Ananda, Clara

6 Banca do Peixe 7 Banca do Peixe

8 Sistematização

9 Sistematização

10 Taboquinhas 11 Taboquinhas

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SEG TER QUA QUI SEX SAB DOM

FEVE

REIR

O

12 Reunião do Grupo de Trabalho

13 Forte

14 Forte

15 Forte

16 Forte 17 Campo Seco 18

19 Reunião do Grupo de Trabalho

20 Sistematização 21 Comunidades ribeirinhas

22 Sistematização 23 24 Carnaval 25 Carnaval

26 Carnaval 27 Carnaval 28 Quarta de Cinzas

1 2 3 4

MARÇ

O

5 Reunião do Grupo de Trabalho

6 Passagem/ Marimbondo

7 Passagem/ Marimbondo

8 Passagem/ Marimbondo

9 10 11 Piracanga

12 Reunião do Grupo de Trabalho

13 Preparação da reunião geral

14 Preparação da reunião geral

15 Preparação da reunião geral

16 Preparação da reunião geral

17 Reunião geral de Diagnóstico

18 Reunião geral de Diagnóstico

19 Reunião do Grupo de Trabalho

20 21

22 Banca do Peixe 23 Banca do Peixe 24 Piracanga 25 Piracanga

26 Reunião do Grupo de Trabalho

27 Porto de Trás 28 Porto de Trás 29 Forte 30 Forte 31 Taboquinhas 1 Taboquinhas

ABRI

L

2 Reunião do Grupo de Trabalho

3 Itacarezinho 4 Campo seco 5 Passagem/ Marimbondo

6 Passagem/ Marimbondo

7 Planejamento Geral – Objetivos e estratégias de desenvolvimento

8 Planejamento Geral – Normas de Utilização da Resex

9 Reunião do Grupo de Trabalho

10 Redação do Plano de Desenvolvimento e das Normas de Utilização

11 Redação do Plano de Desenvolvimento e das Normas de Utilização

12 Semana Santa 13 Semana Santa 14 Semana Santa 15 Semana Santa

16 Reunião do Grupo de Trabalho

17 18 19 Envio do Plano ao CNPT/Ibama

20 21 22

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Anexo 3: Atividades de DRP Desenvolvidas em Cada Comunidade

Porto de Trás

Dia 22/1/2001

No primeiro dia do diagnóstico, a comunidade se reuniu sob a barraca armada pela Associação dos Moradores do Porto de Trás – AMPT. Foram explicados os objetivos do trabalho, mas enfrentamos um grande problema com o barulho na rua, que desconcentrava os participantes. Para ganhar a atenção, fizemos uma dinâmica ("senta-levanta"). Depois, outra dinâmica foi realizada (colocar uma caneta dentro de uma garrafa, segura somente por uma teia de barbantes ligando todas as pessoas em uma roda). O grupo falhou várias vezes, mas acabou completando o desafio na sexta vez, o que deu bastante alegria a todos. Depois, foi pedido aos moradores que desenhassem um mapa do bairro. Primeiro, foram distribuídas casinhas de papel, onde cada um deveria colocar seu nome. Em seguida, os facilitadores pediram que cada um desenhasse as pessoas que moram com elas nas casas. Depois, solicitaram que os participantes localizassem no mapa o local de suas casas. Após a colocação das casas no mapa, alguns desenharam a rede de valas com esgoto a céu aberto e outros problemas. Outros, seguiram ajudando a localizar as casas de outras pessoas que não estavam ali. No final, os participantes discutiram os problemas e oportunidades do Bairro.

Dia 23/1/2001

Durante a introdução das atividades do dia aos participantes, a dinâmica "para quem é a carta?" foi realizada para deixar os participantes mais atentos para a discussão e, ao mesmo tempo, obter informações sobre a composição do grupo. Após uma breve revisão do dia anterior, dividiu-se os participantes em dois grupos, um grupo de mulheres e outro de homens, tendo como objetivo comum a confecção do mapa do Rio das Contas, envolvendo todos os recursos naturais e artes de pesca. Professores do Núcleo de Oceanografia da UESC acompanharam o desenvolvimento do trabalho nos dois grupos.

Dia 24/1/2001

Inicialmente, foi apresentado o Grupo de Trabalho pela Criação da Resex Marinha de Itacaré, e os membros do grupo discorreram sobre a importância e os passos da Resex, do grupo, do CNPT e do laudo biológico. Em seguida, os professores da UESC explicaram a importância da interação do conhecimento científico e local, resultando num trabalho mais completo.

Na sequência, os participantes foram divididos aleatoriamente em dois grupos, com a finalidade de aprimorar as discussões sobre os recursos naturais no mapeamento

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realizado no dia anterior. Cada grupo ficou com um dos mapas feitos no dia anterior, sendo que as mulheres explicaram o mapa elaborado em seu grupo e os homens explicaram o mapa elaborado no seu. Finalizou-se o trabalho com a apresentação das discussões dos dois grupos.

Ao final da reunião, foi explicada a importância do amor e do perdão para que o trabalho e a cooperação em uma comunidade dêem certo. Um facilitador sugeriu que os participantes rezassem o "Pai Nosso", por ser uma oração forte. Depois da oração, uma pessoa presente sugeriu que se rezasse também uma "Ave Maria". Em seguida, foi promovida uma dinâmica, o "círculo embaralhado", em que os participantes, após formarem uma roda, soltaram as mãos, caminharam entre si, pararam em qualquer lugar, e deram-se as mãos no lugar onde estavam para as mesmas pessoas da roda original. Em seguida, tiveram como tarefa voltar à posição original em roda.

Dia 25/1/2001

Realizou-se uma breve introdução do Grupo de Trabalho sobre o diagnóstico e dividiu-se ao acaso os participantes para realizar o diagrama institucional (quem-é-quem?) e a "pirâmide social". Ao final apresentou-se os trabalhos do dia e escolheu-se os representantes do bairro na reunião geral.

É importante ressaltar que durante todos os dias no Porto de Trás as crianças tiveram atividades paralelas coordenadas por voluntários do projeto Comunidades e Florestas da APA de Itacaré (principalmente Diego e Valéria).

Banca do Peixe

Dia 29/01/2001 - Primeira reunião do diagnóstico

Inicialmente, foi feita a abertura dos trabalhos por Leônidas. Depois os objetivos do trabalho foram apresentados por Ronaldo, o laudo biológico pela profa. Silvia (UESC), e o Grupo de Trabalho por Catu.

A primeira atividade desenvolvida foi a dinâmica da "teia ecológica". Com um barbante, os participantes são ligados uns aos outros, sendo que cada um representa um componente do sistema ecológico e social. Após todos estarem ligados, o desafio dos participantes foi colocar uma caneta em uma garrafa, usando apenas os barbantes para segurá-la. Foi discutido que sem equilíbrio no sistema, não seria possível cumprir a tarefa. Mostrou-se ainda que uma ação em um elemento da teia causava alterações em todos os outros.

Em seguida, os participantes passaram à confecção de um mapa dos recursos naturais, partindo de um mapa anteriormente elaborado pelos pescadores da Banca. Um dos participantes descreveu o mapa ainda incompleto da área que possivelmente contemplará os limites da reserva. Os participantes então completaram o mapa e discutiram a situação dos recursos naturais e as modalidades de pesca. Durante todo o trabalho, houve uma boa discussão sobre as possíveis normas da Resex.

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Dia 30/01/2001 – Segunda reunião de diagnóstico

A reunião foi aberta com uma discussão sobre o que é uma reserva extrativista marinha. Os participantes contribuíram com idéias. Depois, Catu, do Grupo de Trabalho, explicou o objetivo do Grupo. Em seguida, iniciamos a revisão e correção do relatório do dia anterior. Com isto, os participantes completaram as informações e usaram o mapa para discutir as Normas da Resex, um possível zoneamento, e a inclusão das áreas da Marinha na Resex.

Dia 1/02/2001 - Terceira Reunião do Diagnóstico

O início do trabalho aconteceu com um breve revisão dos trabalhos já efetuados pela comunidade. Em seguida, os facilitadores explicaram o Diagrama Institucional ("quem-é-quem?") e as instituições importantes para a comunidade da Banca foram listadas pelos participantes. A discussão sobre as organizações listadas foi bastante disputada e acirrou-se ainda mais quando os participantes começaram a falar na Colônia Z-18. A discussão manteve todos interessados e atraiu uma quantidade grande de pescadores, todos queriam dar sua opinião, sua contribuição. Devido à importância dessa avaliação na Colônia Z-18, deixou-se a finalização do Diagrama Institucional para a próxima reunião.

Dia 6/02/2001 – Quarta Reunião do Diagnóstico (Extra)

A reunião começou com a leitura de um abaixo-assinado que continha denúncias ao Ibama sobre pesca predatória de compressor, desmatamento nas margens do Rio de Contas e tráfego de veículos na praia de Itacarezinho. Foi perguntado aos participantes se eles concordavam com o conteúdo do abaixo-assinado e recolheram-se as assinaturas.

Logo após, o relatório da reunião anterior foi apresentado por um dos facilitadores, parando para discutir cada ponto. Essa atividade, gerou muita discussão sobre os dados já gerados e várias reflexões sobre o papel dos pescadores e da Colônia Z-18. Devido à excelente participação da comunidade e a pedido deles, marcou-se a segunda reunião extra, descrita abaixo.

Dia 7/02/2001 – Quinta Reunião do Diagnóstico (Extra)

O início da reunião aconteceu com os informes gerais. Esses informes abordavam os abaixo-assinados e a fiscalização e atuação do Ibama nesses casos. Em seguida, os participantes discutiram o papel da Colônia e da comunidade de pescadores. Essa discussão seguiu a seqüência do relatório do terceiro encontro na Banca.

Após o esgotamento da discussão sobre a Colônia, os participantes retomaram o diagrama institucional com uma breve revisão, finalizando-o. Ao final, os facilitadores elogiaram a empolgante participação da comunidade, e enfatizaram os papéis dos colaboradores e patrocinadores.

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Comunidade do Forte

Dia 13/2/01 – Primeiro dia de reunião

O trabalho iniciou-se com uma breve apresentação dos facilitadores e do grupo de trabalho. Em seguida, explicou-se o que é a Resex Marinha, para que ela serve; e os facilitadores procuraram esclarecer as muitas dúvidas que surgiram. Para ajudar a responder essas dúvidas, Catu utilizou o exemplo de Arraial do Cabo, onde a prefeitura não dava apoio à Resex, mas a justiça quase sempre tinha uma postura favorável. Um facilitador explicou também todo o processo de trabalho que aconteceria na comunidade. Após esse contato inicial, foi realizada a dinâmica da teia ecológica e desafio da caneta. O desafio da caneta foi cumprido após cinco tentativas. Na sequência, os participantes fizeram o mapa dos recursos naturais da área da Resex.

Dia 14/2/01 – Segundo Dia de Reunião

No segundo dia de reunião, os trabalhos foram iniciados com uma nova apresentação da equipe de facilitadores, para aqueles que não haviam participado no dia anterior. Foi feita também uma nova explicação do que é reserva extrativista. Em seguida, foi explicado aos participantes como o trabalho estava sendo feito nas comunidades. Então, foi iniciada a revisão do mapa dos recursos naturais elaborado no dia anterior. Essa revisão deu margem a uma calorosa discussão sobre se os guinchos deveriam continuar pescando na área ou não. No fim da reunião, todos participaram da dinâmica do círculo embaralhado.

Dia 15/02/01 – Terceiro Dia de Reunião

A reunião foi iniciada com uma revisão do trabalho feito nas duas reuniões anteriores, feita pelos facilitadores. Eles também fizeram um histórico do grupo de trabalho, convidando as pessoas para as reuniões semanais do grupo. Em seguida, cada participante se apresentou, colocando suas expectativas em relação à Resex Marinha. Grande parte dos depoimentos expressava o apoio dos pescadores à Resex. Também apareceram dúvidas, que foram oportunamente esclarecidas pelos facilitadores.

A partir do mapa produzido pelo grupo, foram discutidas possíveis normas para a resex e áreas de uso especial no seu interior, como o "Berçário". No final, o grupo concordou com mais um dia de reunião, pois ainda haviam assuntos para serem discutidos.

Dia 16/02/01 – Quarto Dia de Reunião

A reunião começou com algumas conversas informais sobre as repercussões que as outras reuniões haviam causado em algumas pessoas. Os participantes falaram que todos estão começando a acreditar mais na idéia da Reserva e na possibilidade de sua criação. Também disseram ter ouvido comentários de Geraldo, dono de guincho, de que se a reserva proibir a ação dos guinchos, ele venderá os seus e

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comprará 20 barcos B-18. Isso deu margem a uma discussão sobre a necessidade de incluir, entre as regras da resex, um limite para o número de barcos de cada proprietário.

Em seguida, os facilitadores propuseram a construção da pirâmide social, que foi organizada, por escolha dos participantes, primordialmente com base no poder econômico e depois pelo poder político de cada elemento.

Os facilitadores explicaram a metodologia para a continuação do trabalho, enfatizando a necessidade de voluntários para serem representantes da comunidade nas reuniões gerais. Alguns participantes se ofereceram. Os facilitadores também reforçaram o convite para as reuniões do grupo de trabalho e deram informações sobre o andamento, no Ibama, das portarias relativas aos guinchos e à pesca de mergulho. Além disso, consultaram o grupo sobre a possibilidade de escrever um artigo sobre os trabalhos para a criação da resex para ser publicado no próximo jornal da APA. Todos concordaram, pois acreditam que é importante manter a comunidade informada sobre resultados do diagnóstico feito até o momento.

Os participantes demonstraram ansiedade em relação ao tempo restante até a criação da reserva, perguntando se ela ocorrerá ainda esse ano. Os facilitadores responderam que não podem garantir, pois isso depende da organização da comunidade e também da agilidade de alguns órgãos, como o Ibama.

Para finalizar a reunião, foi feita a dinâmica dos “números em fila”, buscando uma valorização da comunicação para que os esforços coletivos obtenham resultado.

Itacarezinho

Dia 3/2/01 – Preparativos para a reunião

Os preparativos para a reunião consistiram no adiantamento do almoço que seria oferecido e em vários contatos com a comunidade local, feitos de casa em casa e na praia, após o jogo de futebol dos pescadores. Durante os contatos, algumas informações já foram levantadas.

Dia 4/2/01 – Reunião nos períodos da manhã e da tarde

Logo cedo, foram feitos contatos individuais, casa a casa, com a comunidade. A importância da questão da terra no local ficou ainda mais evidente, sendo que um dos moradores se recusou a ir na reunião se ela ocorresse no lugar marcado. Disse que não queria ir na casa de um dos proprietários que oprimem a comunidade. Assim, decidiu-se mudar o local da reunião. A comunidade, após a mudança do local para o encontro e a emergência da questão da terra durante os contatos iniciais, apresentou-se muito receptiva ao trabalho. Foi observada uma grande mobilização para arrumar a área onde iria se elaborar o mapa, tarefa na qual todos encontraram uma maneira de ajudar. Isso raramente acontece.

Houve inicialmente uma separação entre homens e mulheres no período da manhã. Isto porque as mulheres, ao chegarem, se juntavam à dona da casa e à facilitadora, que preparavam o almoço. Durante esse tempo, ambos os grupos

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tiveram uma introdução do que é e para que serve a Reserva Extrativista Marinha. Ao final desta introdução, os grupos se uniram e iniciaram a confecção do mapa fisico da área e de seus recursos naturais. Concomitantemente, fez-se um mapa da localização dos donos e moradores locais.

Por volta das 12h30 foi servido o almoço. A retomada dos trabalhos à tarde aconteceu com a dinâmica da "teia ecológica", e da "teia e caneta". Uma coisa peculiar da comunidade foi a facilidade com que o grupo, na dinâmica "teia e caneta", colocou uma caneta dentro de um coco, acertando logo na primeira tentativa. Essa facilidade para superar o desafio da teia e caneta indica um espírito de cooperação e união no local.

Em seguida, os mapas foram finalizados e apresentados. Houve boa discussão sobre os recursos, o modo de usá-los, quais as normas importantes para a reabilitação e conservação dos recursos marinhos, e principalmente sobre a posse das terras. O encerramento dos trabalhos aconteceu com a dinâmica do "círculo embaralhado".

Campo Seco

Dia 17/2/01

No dia 17/2/01, uma equipe de três facilitadores fez a visita ao Campo Seco. Pela manhã, foram feitas entrevistas individuais com algumas pessoas que apareceram no local da reunião e foi feita uma observação da trilha do telégrafo. À tarde, foi realizada a reunião, que se iniciou com a dinâmica da "teia ecológica" . Em seguida, os participantes elaboraram um mapa da comunidade. Durante a discussão sobre o mapa, os facilitadores deram informações sobre resexs, explicaram a forma como estão sendo feitos os trabalhos para criação da reserva e convidaram as pessoas a participarem do grupo de trabalho. No final, foi feita a dinâmica do círculo embaralhado.

Taboquinhas e comunidades rurais vizinhas

Dia 10/2/01 – Primeiro dia de Reunião - Tarde

A reunião foi iniciada com a distribuição de folhetos sobre a Resex. Em seguida, todos os participantes se apresentaram. Nessa apresentação, foram dados esclarecimentos sobre as reservas extrativistas, sobre o Grupo de Trabalho e sobre o papel da UESC na implantação da Resex. Alguns participantes demonstraram um bom nível de informação sobre o assunto, além de preocupações com o meio ambiente, colocando-se à disposição para todo tipo de ajuda.

Devido à presença de somente cinco participantes, a oportunidade foi aproveitada para, junto com eles, fazer uma caminhada de reconhecimento do Rio de Contas e das artes de pesca. A caminhada iniciou-se pela trilha calçada, que era usada antigamente como caminho para Ubaitaba. Ao passar pela casa de um dos pescadores presentes, o grupo discutiu as artes de pesca utilizadas: manzuá, jereré, tarrafa e espingarda de mergulho. Depois da Prainha, a caminhada seguiu subindo o Rio de Contas pela margem direita, passando pelos seguintes

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lugares identificados pelos moradores: Pé da Pancada, “os Canal” (onde há uma fonte de água usada para beber), Buraco do Inferno, Adrenalina e Fumo. Mais acima, localiza-se o Sequeiro, que não foi visitado. Durante o percurso, foram identificados os pesqueiros, métodos de pesca, principais problemas ecológicos e dificuldades enfrentadas pelos pescadores. Ao entardecer, o grupo retornou pela estrada de rodagem que liga Ubaitaba a Itacaré, passando pela comunidade de Rua de Palha.

11/02/01 – Segundo dia de reunião – manhã e tarde

No início da reunião, foram feitas algumas considerações sobre a confusão entre os grupos e as reuniões acontecidas anteriormente, o que foi constatado como uma questão recorrente na conversa do dia anterior. A principal questão estava relacionada a um grupo que esteve recolhendo dinheiro para a confecção dos documentos (Asperi, através de Prof. Raimundo, Zito e Arnóbio) há mais de quatro anos e não apareceu mais. Os facilitadores esclareceram a diferença entre a ação daquele grupo e o trabalho pela implantação da reserva extrativista marinha, enfatizando que não será necessário dinheiro neste momento, mas apenas a organização dos pescadores. Dodó também foi lembrado, pois esteve “fazendo perguntas” por lá (questionários solicitados e a serem sistematizados pelo Ibama), segundo os participantes, prometendo que traria o resultado de volta para a comunidade em um mês, o que não aconteceu, pois foi um malentendido. Esses acontecimentos geraram na comunidade sentimentos de desconfiança, desconforto e medo de serem frustrados mais uma vez.

Os facilitadores enfatizaram ainda que as regras da reserva serão feitas por todos os pescadores, sendo todos eles responsáveis pela fiscalização das práticas.

Em seguida, realizou-se a dinâmica da “teia ecológica” e o desafio da caneta, usando como mote uma fábula envolvendo um rei, sapos, mosquitos e conselheiros, objetivando mostrar que tudo está interligado; que cada ação, aparentemente isolada, tem repercussões sobre tudo o que está em volta. Após essa atividade, os participantes foram divididos aleatoriamente em dois grupos para confecção do mapa dos recursos naturais e do histórico de alguns elementos ligados a pesca. Ao finalizarem, os grupos apresentaram seu trabalho para todos os participantes.

Depois, foi feito um intervalo para o almoço coletivo, realizado na pousada onde estavam hospedados os facilitadores, por volta das 12h30.

O retorno das atividades ocorreu às 14h00, com a dinâmica “números em fila”, em que são distribuídos números para os participantes de forma que ninguém saiba qual o número dos outros e pede-se que formem uma fila respeitando a seqüência, mas sem usar palavras para se comunicar.

Depois, iniciou-se a construção do diagrama institucional (“quem é quem”). Devido ao baixo nível de informação dos participantes, essa atividade foi muito útil para esclarecer uma série de questões sobre a profissão e os direitos dos pescadores.

O encontro terminou com a realização de duas dinâmicas: “círculo ao avesso” e “jogue-se e confie”. No “círculo ao avesso”, as pessoas se colocam em roda, depois viram de costas e se dão as mãos. O desafio, que foi alcançado, é voltar à posição

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anterior, sem soltar as mãos. O objetivo é pensar estratégias coletivas para resolução de problemas. No “jogue-se e confie”, os participantes formam um círculo bem fechado, sendo que um deles fica ao meio de olhos fechados e pés fixos no centro. Este participante solta-se para os lados, confiando que os outros não o deixarão cair. Nessa dinâmica, está presente a questão da confiança no grupo quando se quer realizar alguma coisa de interesse comum. Falando da necessidade de uma organização consistente e que essa seria apenas a primeira de uma série de reuniões necessárias, alguns participantes se ofereceram para representar a comunidade nas próximas ações.

Cabe ainda ressaltar, que os participantes trouxeram amostras para o laudo biológico e ainda pediram um livro contendo informações sobre crustáceos, falando da importância de conhecer para poder respeitar os picos de reprodução.

Comunidades ribeirinhas do Rio de Contas As particularidades enontradas na localização e organização das comunidades ribeirinhas tornaram o trabalho de diagnóstico participativo mais difícil de ser feito. Somando-se a isso o fato de que não conseguimos contato com a maioria das lideranças locais, não foi possível realizar reuniões com os moradores nesta primeira fase do diagnóstico. No entanto, já foram marcadas duas reuniões a serem organizadas por líderes comunitários: uma na comunidade João Rodrigues e outra na comunidade de Povoação.

Ao invés de reuniões foram realizadas entrevistas com os moradores que estavam disponíveis no momento. Eles pediram que a data seja combinada com antecedência. Os entrevistadores garantiram isso, além de esclarecer que a participação das mulheres será possibilitada pela presença de uma pessoa para fazer um trabalho com as crianças durante a reunião e pela preparação de um almoço coletivo.

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Anexo 4: Amostragens realizadas no estuário do Rio de Contas

Em 12/11/2000 um grupo de pesquisadores vinculados ao NEO (Núcleo de Estudos Oceanográficos da UESC) realizou um conjunto de estações hidrográficas ao longo do eixo principal do sistema estuarino do Rio de Contas, visando caracterizar a estrutura vertical da coluna d’água naquele sistema. Algumas daquelas estações são discutidas a seguir. A posição e referência espacial das mesmas estão relacionadas na TABELA I.

Para facilitar a visualização da variabilidade espacial dos perfis das propriedades hidrográficas, os valores de profundidade amostral foram normalizados com o parâmetro profundidade adimensional (Z). Desta forma, Z=-1 representa o valor de fundo em todas as estações enquanto Z=0 representa o valor de superfície, independente do valor real da profundidade máxima amostrada, que é apresentada na tabela abaixo.

Tabela I – Referência e posição das estações hidrográficas efetuadas no Estuário do Rio de Contas em 12/11/2000. Estação Número

Posição Referência espacial:

Prof. Máxima Amostrada

Latitude Longitude

01 -14 16’ 20.1” -38 59’ 14.1” Boca do sistema, em frente à Praia da Concha

5,4 m

04 -14 16’ 27.3” -39 00’ 03.5” Próximo à área de atracação de embarcações

2,9 m

06 -14 16’ 33.9” -39 01’ 07.0” Região de estreitamento do curso fluvial

4,2 m

10 -14 18’ 28.2” -39 05’ 19.1” Região bastante interior, próximo ao “estaleiro do breno”

12,1 m

11

-14 16’ 34.8”

-39 00’ 52.8”

Medidas tomadas em ambos os lados de uma frente de maré vazante.

3,1 m 12

As Estações 01 e 04, realizadas nas proximidades do domínio marinho, mostraram índices termo-halinos próximos àqueles encontrados em águas oceânicas, com pouca mistura vertical, exceto nas camadas muito superficiais. A estação 06

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entretanto, realizada em uma região de confinamento do curso fluvial, apresenta estratificação típica de um sistema estuarino, que pode ser visualizado tanto no campo da temperatura quanto, principalmente, na estrutura halina. Junto ao fundo os valores de salinidade são superiores a 30 e inferiores a 33, evidenciando alguma mistura vertical enquanto que os valores superficiais são inferiores a 5.

A Estação 10, realizada em uma região bastante interior no sistema, apresenta uma estrutura halina bastante homogênea, com um gradiente inferior a 0.03 ao longo da coluna d’água. A estrutura térmica observada, também é bastante homogênea, com gradiente inferior a 0,15 ao longo da coluna d’água. Esse pequeno gradiente pode ser interpretado como resultante do aquecimento diferencial da coluna d’água ao longo do dia.

As Estações 11 e 12 foram realizadas a montante e a jusante de uma frente de maré vazante. Observa-se na estação 11 uma estrutura menos definida para os campos térmicos e halinos, possivelmente resultante de processos dinâmicos mais intensos naquela região da frente. No “lado marinho” da frente (Estação 12) é bastante intensa a estratificação no campo halino.

Deve-se considerar que os resultados obtidos são preliminares e refletem uma situação pontual em termos temporais.

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Anexo 5: Lista de organismos do zooplâncton encontrados em Abrolhos,

típicos da Corrente do Brasil, possivelmente comuns na plataforma

continental de Itacaré. Holoplâncton Copepoda

Nannocalanus minor(ª)

Undinula vulgaris(ª)

Acrocalanus longicornis(ª)

Paracalanus aculeatus(ª)

P. indicus(*)

P. parvus(ª)

P. quasimodo (*)

Paracalanus sp A

Clausocalanus furcatus(*)

C. mastigophorus(ª)

C. paululus(ª)

Ctenocalanus sp A (juv.)

Calocalanus pavo(ª)

C. contractus(ª)

Mecynocera clausi(ª)

Eucalanus pileatus (*)

Euchaeta marina(ª)

Temora stylifera(*)

Scolecithrix danae(ª)

Candacia bipinnata(ª)

Pleuromamma abdominalis(ª)

Calanopia americana(*)

Labidocera acutifrons(ª)

Pontellopsis brevis(*)

Centropages velificatus(*)

Acartia danae(ª)

Oithona nana(*)

O. plumifera(*)

O. setigera(ª)

Oncaea curta(+)

O. media(*)

O. venusta(*)

Corycaeus amazonicus(+)

C. giesbrechti(*)

C. speciosus(ª)

Farranula gracilis(ª)

Copilia miriabilis(ª)

Sapphirina ovatolanceolata

Poecilostomatoida sp A

Microsetella sp A

Macrosetella gracilis(ª)

Euterpina acutifrons(+)

Clytemnestra rostrata(ª)

Harpacticoida sp A,B and C

Monstrilloida sp A

Outros taxa:

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Acantharia

Foraminifera

Siphonophora

Bassia bassensis(ª)

Muggiea kochi(+)

Diphes bojani(*)

Agalma elegans(ª)

Hydromedusae (n. id.)

Acoela

Nematoda

Pteropoda

Creseis acicula(*)

Limacina spp(*)

Decapoda

Lucifer faxoni(*)

Amphipoda

Isopoda (Epicaridea)

Ostracoda

Conchoecia spA(*)

Cladocera

Evadne tergestina(*)

Cumacea

Chaetognatha

Sagitta enflata(*)

S. friderici(*)

S. hispida(*)

S. minima(*)

S. serratodentata(*)

Appendicularia

Oikopleura dioica(*)

O. longicauda(*)

O. rufescens(*)

Fritillaria spp(*)

Thaliacea

Thalia democratica(*)

Doliolum nationalis(*)

Meroplâncton (larvas) Polychaeta

Bivalvia

Gastropoda

Cirripedia

Decapoda

Bryozoa

Echinodermata

Fish eggs and larvae

(ª) espécies da Corrente do Brasil (AT) (*) espécies encontradas tanto na AT como em águas costeiras

(+) espécies costeiras

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Anexo 6: Resultados das amostragens de plâncton no estuário do Rio de Contas

Um total de 39 taxa fitoplanctônicos foram observados. A estação 1 apresentou uma comunidade com baixa diversidade de espécies (9 spp), dominada por espécies com afinidade por água doce (salinidade ~0). Nas estações 2 e 3, foram observadas tanto espécies de águas salobras como marinhas, e o número de espécies variou entre 13 e 18. A associação de espécies observada na estação 4 é característica de ambientes costeiros marinhos tropicais, com diversidade relativamente mais elevada. A maior parte das espécies identificadas pertence ao grupo das diatomáceas; somente duas espécies de dinoflagelados foram observadas. As cianobactérias filamentosas foram dominantes nas amostras de baixa salinidade. A tabela A apresenta a lista de espécies do fitoplâncton observadas na amostragem preliminar realizada em janeiro de 2001, no estuário do Rio de Contas. A presença (x) ou ausência (-) dos taxa nas diferentes estações de coleta estão indicadas, assim como a localização das estações e a salinidade observada em cada um dos pontos amostrados.

Tabela A: Listagem de taxa do fitoplâncton e respectivas ocorrências por estação de amostragem no Rio de Contas. Amostragem realizada em 29 de janeiro de 2001. Localização das estações 14º16'44" S 14º16'21" S 14º16'19" S 14º16'25" S

39º01'57" W 39º00'50" W 39º00'21" W 38º59'45" W

Salinidade 0 5 13 28

Taxa Estação 1 Estação 2 Estação 3 Estação 4

Actinoptychus cf. Splendens - x - - Amphrora hyalina - x - - Asterionellopsis glacialis - x x x Aulacoseira granulata var. Angustissima

x x - -

Bacillaria paxillifera - - - x Bleakeleya notata (= Asterionella Bleakeleyi var. notata)

- - - x

Biddulphia rhombus - - - x Ceratium trichoceros - - - x Coscinodiscus centralis - x - x Cosmarium amoenum var. constrictum x x x - Guinardia flaccida - - x Guinardia striata (= Rhizosolenia Stolterfothii)

- x x x

Gyrosigma balticum - x - - Hemiaulus membranaceus - - - x

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Hidrosera triquetra - - - x Leptocylindrus danicus - - - x Lithodesmium undulatum - - - x Meuniera membranacea (= Stauroneis membranacea)

- - - x

Microcystis aeruginosus x x - - Nitzschia spp - - x x Odontella mobiliensis - x - x Oscillatoria cf agardii x x x - Oscillatoria sp1 x x x - Oscillatoria sp2 x x - - Pleurosigma angulatum - - - x Pleurosira laevis (= Biddulphia laevis) x x x x Proboscia alata - - - x Protoperidinium conicum - - x - Rhizosolenia setigera - - x x Rhizosolenia styliformis - x x x Surirella striatula - x - - Surirella cf. tenera - - x - Synedra ulna - - x - Thalassionema nitzschioides - - - x Thalassiosira eccentrica - - x x Triceratium alternans - - - x Trigonium formosum - - - x Espécie não identificada 1 x x - - Espécie não identificada 2 x x - - Total de taxa identificados 9 18 13 24

A estrutura das associações de espécies do zooplâncton do estuário do Rio de Contas altera-se de acordo com o gradiente de salinidade (Tabela A), de forma similar ao observado para o fitoplâncton. Nas estações localizadas na parte superior do estuário, próximo ou acima do tributário Rio do Engenho (estações 1 e 2), predomina uma espécie de copépode típica de ambientes oligohalinos, o calanóide Pseudodiaptomus richardi, acompanhada de cladóceros de água doce (Ceriodaphnia, Diaphanosoma, entre outros), tecamebas (Arcella, Difflugia) e alguns organismos meroplanctônicos. A presença de espécies de água doce mostra que influência fluvial é significativa neste setor do estuário. A jusante, nas áreas onde a penetração da onda de maré é mais intensa (estações 3 e 4), ocorrem espécies marinhas e estuarinas com variados graus de adaptação à salinidade. Foram observadas espécies de plataforma com afinidade à AT (por exemplo, Oithona plumifera, Oncaea media, Temora stylifera, etc), assim como espécies encontradas comumente em águas costeiras do Atlântico Sudoeste tropical, como o copépode Paracalanus quasimodo, a apendiculária Oikopleura

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dioica e o cladócero Evadne tergestina. A presença do cladócero de água doce, Daphnia gessneri, associado a formas marinhas (estação 3, novembro), foi uma observação interessante e sugere que processos de mistura turbulenta devem ter um papel importante na dispersão dos organismos planctônicos do estuário do Rio de Contas.

Foi possível detectar uma expressiva variabilidade sazonal entre as coletas de novembro e janeiro. A amostragem de janeiro foi realizada logo após um período chuvoso, como se pode depreender dos valores de salinidade registrados, comparativamente muito mais baixos do que em novembro de 2000 (vide tabela B a seguir). A riqueza de espécies foi menor em janeiro do que em novembro, pois a fauna associada aos ambientes de água doce ou oligohalinos é menos diversificada e sua maior influência no estuário evidentemente provoca uma redução geral no número de espécies. Essa situação deve se repetir em outros períodos sazonais, associada a pulsos de precipitação. Deve-se ainda considerar que o Rio de Contas é represado no município de Jequié, para a geração de energia elétrica, e o manejo daquele reservatório têm contribuído para alterar as características ambientais de todo o trecho a jusante da barragem, incluindo o estuário e a região da foz. Assim, aportes adicionais de água doce, não necessariamente associados às chuvas, podem ocorrer neste estuário, devido à abertura de comportas do reservatório situado a montante. Essas variáveis devem ser consideradas e estudadas em maior detalhe em trabalhos posteriores. A única estação onde o número de taxa foi similar nos dois meses de amostragem foi a mais externa, o que se explica pela maior influência da água costeira neste local, carreando espécies marinhas para o interior do estuário.

Tabela B: Listagem de taxa do zooplâncton e respectivas ocorrências por estação de amostragem no Rio de Contas. Amostragens realizada em 12 de novembro de 2000 e 29 de janeiro de 2001. Localização das estações 14º16'44" S 14º16'21" S 14º16'19" S 14º16'25" S

39º01'57" W 39º00'50" W 39º00'21" W 38º59'45" W Salinidade (novembro de 2000) 0.2 22 35 37 Salinidade (janeiro de 2001) 0 5 13 28 Taxa Estação 1 Estação 2 Estação 3 Estação 4 Copepoda: Acartia lilljeborgi -/- x/- x/- -/- Corycaeus sp. -/- -/- x/- -/- Cyclopoida bêntico sp. 1 -/- x/- x/- -/- Ergasilidae -/- -/- x/- -/- Eucalanus pileatus -/- -/- -/- x/- Euterpina acutifrons -/- -/- -/- x/x Halicyclops sp. -/- x/- -/- -/x Harpacticoida bêntico sp. 1 x/- -/- -/- -/- Harpacticoida bêntico sp. 2 -/- -/- x/x x/x

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Harpacticoida bêntico sp. 3 -/- -/- x/x -/x Harpacticoida bêntico sp. 4 -/- -/- -/- -/x Harpacticoida bêntico sp. 5 x/- x/- -/- -/- Hemicyclops thalassius -/- -/- -/- x/- Oithona hebes -/- x/- x/- x/x Oithona nana -/- -/- x/- -/- Oithona oswaldocruzi -/- -/- -/- x/x Oithona plumifera -/- -/- -/- -/x Oithona simplex -/- -/- -/- x/x Oncaea media -/- x/- -/- -/- Oncaea venusta -/- -/- x/- -/- Paracalanus quasimodo -/- -/- x/x x/x Parvocalanus crassirostris -/- x/- x/x x/x Pseudodiaptomus acutus -/- -/- -/- x/- Pseudodiaptomus richardi x/x x/x x/x x/x Temora stylifera -/- -/- -/- x/- Temora turbinata -/- -/- x/- x/- Cladocera: Ceriodaphnia sp. x/x -/- -/- -/- Daphnia gessneri -/- -/- x/- -/- Diaphanosoma sp. -/- -/x -/- -/- Evadne tergestina -/- -/- x/- -/- Macrothricidae x/- -/- -/- -/- Amphipoda x/- -/- -/- -/- Cumacea x/- -/- -/- -/- Ostracoda -/- -/- x/- -/x Chironomidae x/- x/x -/- -/- Hydracarina x/- x/- -/- -/x Nematoda -/- -/- -/x -/- Foraminifera -/- -/- -/- -/x Rhizopoda: Arcella spp. -/x -/- x/- -/x Difflugia spp. -/- -/- -/- -/x Hydromedusae -/- -/- x/- x/- Appendicularia: Oikopleura dioica -/- -/- x/- x/x Oikopleura fusiformis -/- -/- x/- x/- Oikopleura longicauda -/- -/- -/- x/x Chaetognatha: Sagitta friderici -/- -/- -/- -/x Polychaeta (larva trocófora) x/- x/- -/- x/x Bivalvia (larva véliger) -/x x/- -/- x/x

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Gastropoda (larva véliger) x/x x/x -/x -/x Brachyura (larva zoea) x/x x/x -/- x/- Decapoda, Sergestoidea: Lucifer faxoni (protozoea) -/- -/- -/x -/- Cirripedia (larva cypris) -/- -/- -/- -/- Cirripedia (larva náuplio) -/- -/- x/x x/- Bryozoa (larva cifonauta) -/- -/- x/x -/- Echinodermata (larva pluteus) -/- -/- -/- -/- Ovos de peixes -/- -/- x/- x/- Larvas de peixes -/- -/x -/- x/- Total de taxa identificados 12 / 6 14 / 6 23 / 10 23 / 23

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Anexo 7: Lista de espécies fitobênticas identificadas em Itacaré

Costões rochosos da Praia da Concha e Praia de São José DIVISÃO CHLOROPHYTA Anadyomene stelatta Caulerpa cupressoides Caulerpa fastigiata Caulerpa mexicana Chaetomorpha anteninna Cladophora sp. Cladophora vagabunda Codium intertextum Codium taylorii Enteromorpha flexuosa Enteromorpha lingulata Halimeda discoidea Ulva fasciata Ulva lactuca DIVISÃO PHAEOPHYTA Bachelotia antillarum Chnoospora minima Dictyopteris delicatula Dictyota cervicornes Dictyota mertensii Padina boergesenii Padina gymnospora Padina tetrastomatica Sargassum cymosum var. nanum Sargassum cymosum var. cymosum Sargassum vulgare var. vulgare Spatoglossum schroederi DIVISÃO RHODOPHYTA Acanthophora spicifera Amphiroa sp.

Bryothamnium seaforthii Centroceras clavulatum Ceraminium brasiliense Coralinna oficinnales Galaxaura obtusata Gelidiella acerosa Gracilaria caudata Gracilaria cervicornis Gracilaria domingensis Gracilaria lacinulata Gracilaria sp. Gracilariopsis tenuifrons Haliptilon sublatum Hypnea musciformis Jania sp. Laurencia papilosa Porphyra acanthophora var. acanthophora Pterocladiella capillaceae Manguezais de Piracanga e próximo ao bairro do Porto de Trás (Rio de Contas) DIVISÃO CHLOROPHYTA Chaetomorpha gracilis Gayralia oxysperma Rhyzoclonium riparium Rhyzoclonium sp. DIVISÃO RHODOPHYTA Bosthychia binderi Bosthychia calliptera Bosthychia radicans forma moniliforme Bosthychia radicans forma radicans Caloglossa leprieuri Recife de Coral (Jardim dos Corais, Itacaré)

DIVISÃO CHLOROPHYTA Anadyomene stelatta Caulerpa fastigiata Codium taylorii Halimeda discoidea Ulva lactuca DIVISÃO PHAEOPHYTA Dictyopteris delicatula Dictyota mertensii Padina gymnospora Lobophora variegata Sargassum vulgare var. vulgare Colpomenia sinuosa DIVISÃO RHODOPHYTA Amphiroa sp. Botryocladia pyriformis Bryothamnium seaforthii Centroceras clavulatum Ceraminium brasiliense Coralinna oficinnales Cryptonemia seminervis Galaxaura obtusata Gelidiella acerosa Gracilaria sp. Haliptilon sublatum Hypnea musciformis Jania sp. A identificação destes gêneros e espécies foi realizada utilizando-se chaves de identificação (Joly, 1954; Joly, 1965; Nunes, 1999, Taylor, 1960, King & Puttock, 1989; Fortes, 1992) e revisão taxonômica de acordo com Wynne (1998).

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Anexo 8: Fotos e lista das espécies de peixes coletadas em Itacaré

A tabela a seguir apresenta nomes científicos e populares das espécies de peixe coletadas em Itacaré. As fotos indicadas podem ser encontradas logo após a tabela. Nome científico Nome popular foto Família Achirus sp. Linguado 14 Achiridae Bagre marinus Bagre Ariidae Bairdiella ronchus Mirucaia 06 Sciaenidae Batigobius soporatus Gobiidae Caranx hippos Coróque 12 Carangidae Caranx latus Coróque 12 Carangidae Caranx sp. Xaréu 19 Carangidae Centropomus parallelus Robalo 09 Centropomidae Centropomus undecimalis Robalo-cramurim 10 Centropomidae Cetengraulis edentulus Zóio-de-migué 03 Clupeidae Chaetodipterus faber Enxada Ephippidae Chloroscombrus chrysurus Carangidae Conodon nobilis Haemulidae Coryphaena hippurus Dourado 22 Coryphaenidae Ctenosciaena gracilicirrhus Sciaenidae Cynoscion spp. Pescada 21 Sciaenidae Epinephelus sp. Mero Serranidae Eucinostomus argenteus Carapicu 07 Gerreidae Eucinostomus melanopterus Carapicu 08 Gerreidae Euthynnus alleteratus Bonito 30 Scombridae Gymnothorax sp. Moréia Muraenidae Harengula sp. Sardinha-cascuda Clupeidae Lagocephalus laevigatus Baiacu Tetraodontidae Larimus breviceps Boca-torta Sciaenidae Lile piquitinga 15 Clupeidae Lutjanus jocu Carapitanga 04 Lutjanidae Lutjanus spp. Cioba, dentão 25, 26 Lutjanidae Lutjanus synagris Oriocó 29 Lutjanidae Lycengraulis grossidens Sardinha-gulosa Clupeidae Netuma barba Bagre Ariidae Oligoplites sp. Guaibira, moça-nua 24 Carangidae Ophioscion punctatissimus Sciaenidae Opisthonema oglinum Sardinha-massambê 02 Clupeidae

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Paralonchurus brasiliensis Maria-luisa, boca-de-rato Sciaenidae Paranthias furcifer (?) Olho-mole 18, 29 Pellona harroweri Clupeidae Polydactylus virginicus Barbudo 01 Polynemidae Pomadasys croco Cutupá 05 Haemulidae Prionotus punctatus Cabrinha Triglidae Rhyzoprionodon sp. Cação branco Carcharhinidae Rhomboplites aurorubens Vermelho Lutjanidae Scomberomorus brasiliensis Cavalinha, sororoca 27 Scombridae Scomberomorus cavalla Cavala 28 Scombridae Selar crumenophthalmus Xixarro 18 Carangidae Selene setapinnis Peixe-galo Carangidae Selene vomer Peixe-galo-de-penacho 11 Carangidae Seriola spp. Olho-de-boi 23 Carangidae Sphoeroides testudineus Baiacu 13 Tetraodontidae Sphyraena guachancho Bicuda 16 Sphyraenidae Stellifer spp. Sciaenidae Thunnus atlanticus Albacora 29 Scombridae Trachinotus sp. 17 Carangidae Trichiurus lepturus Espada Trichiuridae Trinectes sp. Linguado Achiridae

A identificação dos peixes, baseada em fotos (ver a seguir) e nos espécimes coletados, foi feita pelo Prof. Paulo Roberto Duarte Lopes, da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), que tem ampla experiência nos peixes da região, e por Gecely R. A. Rocha, oceanógrafa da UESC, que também utilizou chaves de identificação em campo, para os peixes maiores. A lista e as fotos das espécies de peixes coletadas e identificadas pela equipe da UESC inclui tanto espécies marinhas como estuarinas.

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Fotos das espécies de peixes coletadas e identificadas

(1) Polydactylus virginicus

(barbudo)

(2) Opisthonema oglinum (sardinha

massambê)

(3) Cetengraulis edentulis (zóio-de-

migué)

(4) Lutjanus jocu (carapitanga)

(5) Pomadasys croco cutupá

(6) Bairdiella ronchus mirucaia

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(7) Eucinostomus argenteus

(carapicu)

(8) Eucinostomus melanopterus

(carapicu)

(9) Centropomus parallelus (robalo)

(10) Centropomus undecimalis

(robalo-cremuri)

(11) Selene vomer (peixe-galo-de-

penacho)

(12) Caranx sp. (coróque)

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(13) Sphoeroides testudineus

(baiacu)

(14) Achirus sp (linguado)

(15) Lile piquitinga

(16) Sphyraena guachancho

(bicuda)

(17) Trachinotus sp.

(18) Selar crumenophthalmus

(xixarro) Paranthias furciper (olho-mole)

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(19) Caranx sp. (xaréu)

(20) Família Ariidae (bagre)

(21) Cynoscion sp. (pescada)

(22) Coryphaena hippurus

(dourado)

(23) Seriola sp. (olho-de-boi)

(24) Oligoplites sp. (guaibira)

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(25) Lutjanus sp. (dentão)

(26) Lutjanus sp. (cioba)

(27) Scomberomorus brasiliensis

(sororoca)

(28) Scomberomorus cavalla

(cavala)

(29) Thunnus atlanticus (albacora)

Lutjanus synagris (oriocó) Paranthias furciper (olho-mole)

(30) Euthynnus alleteratus (bonito)

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Anexo 9: Espécies do Rio de Contas citadas pela comunidade do Porto de Trás.

Peixes:

Arraia (não muito comum no rio)

Bagre

Baiacu

Barbudo

Bicudo

Caçari (tipo de bagre, apelidado de marioá)

Cangauá (curimã)

Caranha

Carapeba

Carapicu

Carapitanga (com pintas)

Caratinga

Cavalo-marinho

Corroque (vira cabeçudo, que vira xaréu)

Dentão (parecido com carapitanga, vive entocado, quando crescido vai para o mar)

Mirucaia

Pegador

Peixe elétrico (não utilizado na alimentação)

Pescada escamuda

Pescada goiva (barracuda)

Robalo barriga mole

Robalo branco (peba) ("esticadinho")

Robalo cambriaçu

Robalo côco

Robalo facaio

Moreia de mangue

Tainha

Mussum (peixe)

Mucutuca (peixe, que se enterra na areia, se pega na maré baixa e se come)

Caramuru (peixe)

Peixes exclusivos de água doce:

Traíra

Tucunaré

Tilápia

Piranha (acham que esta é responsável pelas caudas roída dos robalos)

Equinodermos:

Ouriços (na praia da Concha)

Crustáceos:

Caranguejo-do-mangue (pega-se mais na maré "morta" = quadratura)

Siri-do-mangue (azul – pega-se mais na maré "morta" = quadratura),

Siri-de-ponta

Sirinema (perna + preta, carapaça amarelada, localiza-se mais rio acima)

Aratu (ocorre ano todo)

Guaiamum (apicum)

Moluscos:

Lambreta (tem mais no verão)

Sururu (fica mais "em cima" no manguezal, não vive muito abaixo da linha d'água)

Ostras (são insuficientes para extração econômica, diminuindo no inverno, por

causa da água mais doce proveniente das chuvas)

Mapé (parece sururu), em Ilhéus conhecem como muapem (segundo Renato)

Tamaru (usado de isca)

Buzano (animal que come madeira)

Cobras:

Jibóia

Sucuiuba

Serra véia

Jararacuçu

Papa pinto

Aves

Sabacu

Piriquito

Ganso

Sanhaço

Garça

Pilação

pato dágua

Espanta boiada

Socó

Mamíferos:

Sagui

Boto

Guaxinim (come guaiamuns e caranguejos)

Guará (come guaiamuns e caranguejos)

Raposa (come guaiamuns e caranguejos)

Mico

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Anexo 10: Lista parcial das espécies de zoobentos coletadas dentro da área proposta

para a RESEX – Itacaré (nomenclatura e classificação segundo Brusca & Brusca,

1996) PORIFERA Porifera não identificado a Porifera não identificado b Porifera não identificado c CNIDARIA Renilla reniformis Muriceopsis sulphurea (Donovan, 1825) Plexaurella grandiflora Verril, 1912 Phyllogorgia dilatata (Esper, 1806) Palythoa caribeorum (Duchassaing & Michelotti, 1860) Zoanthus socialis (Ellis, 1767) Siderastrea stellata Verril, 1868 Meandrina braziliensis (Milne-Edwards & Haime, 1849) CRUSTACEA Cirripedia Euraphia rhizophorae (Oliveira, 1940) Chthamalus bisinuatus Pilsbry, 1916 Família Penaidae Sub-família Penaeinae Xiphopenaeus kroyeri (Chace & Hobbs, 1969)

Farfantapenaeus cf. notialis Farfantapenaeus cf. subtilis Farfantepenaeus cf. brasiliensis Litopenaeus schmitti Burkenroad, 1936 Família Alpheidae Synalpheus sp. Família Palinuridae Panulirus argus (Latreille, 1804) Família Diogenidae Clibanarius vittatus (Bosc, 1802) Família Geocarcinidae Cardissoma guanhumi Latreille, 1825 Família Calappidae Sub-família Matutinae Hepatus pudibundus (Herbst, 1785) Família Xanthidae Panopeus lacustris Desbonne, 1867 Xanthidae não identificado Família Grapsidae Sub-família Grapsinae Goniopsis cruentata (Latreille, 1803)

Pachygrapsus gracilis (Saussure, 1858) Pachygrapsus tranversus (Gibbes, 1850) Sub-família Sesarminae Aratus pisonii (H. Milne. Edwards, 1837) Metasesarma rubripes (Rathbun, 1897) Sesarma rectum Randall, 1840 Família Portunidae Sub-família Portuninae Arenaeus cribarius (Lamarck, 1818) Callinectes bocourti A. Milne Edwards, 1879 Callinectes danae Smith, 1869 Callinectes exasperatus (Gerstaecker, 1856) Família Ocypodidae Sub-família Ocypodinae Ocypode quadrata (Fabricius, 1787) Ucides cordatus (Linnaeus, 1763) Uca leptodactyla Rathbun, 1898 Uca thayeri Rathbun, 1900 MOLLUSCA Gastropoda

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137 Família Littorinidae Sub-família Littorininae Littorina flava King & Broderip, 1832 Neritina virginea (Linnaeus, 1758) Vasum cassiforme (Kiener, 1841) Distorsio clathrata (Lamarck, 1816) Strombus pugilis Linnaeus, 1758 Polystira cf. florencae Bartsch, 1934 Família Cassidae Sub-família Phaliinae Phalium granulatum (Born, 1778) Bivalvia Família Arcidae Sub-família Arcinae Arca imbricata Bruguière, 1789 Barbatia candida (Helbling, 1779) Sub-família Anadarinae Anadara brasiliana (Lamarck, 1819) Anadara chemnitzi (Philippi, 1851) Família Noetiidae Sub-família Striarcinae Arcopsis adamsi (Dall, 1886) Família Cardiidae Sub-família Mactrinae Mactrellona alata (Splenger, 1802)

Sub-família Trachycardiinae Papyridea semisulcata (Gray, 1825) Família Mytillidae Brachidontes solisianus (Orbigny, 1846) Mytella charruana (Orbigny, 1842) Mytella guyanensis (Lamarck, 1819) Família Veneridae Sub-família Chioninae Anomalocardia brasiliana (Gmelin, 1791) Chione cancellata Linnaeus, 1767 Sub-família Cyclininae Cyclinella tenuis (Récluz, 1852) Sub-família Pitarinae Pitar fulminatus (Menke, 1828) Sub-família Meretricinae Tivela mactroides (Born, 1778) Família Lucinidae Sub-família Divaricellinae Divaricella quadrisulcata (Orbigny, 1842) Sub-família Lucininae Lucina pectinata (Gmelin, 1791) Família Donacidae Donax striatus Linnaeus, 1767 Iphigenia brasiliana (Lamarck, 1818)

Família Tellinidae Sub-família Macominae Macoma constricta (Bruguière, 1792) Macoma tenta Sub-família Tellininae Tellina radiata Linnaeus, 1758 Tellina lineata Turton, 1819 Tellina listeri Röding, 1798 Strigilla carnaria (Linnaeus, 1758) Família Psammobiidae Sanguinolaria cruenta (lightfoot, 1786) Família Solecurtidae Tagelus divisus (Splenger, 1794) Tagelus plebeius (Lightfoot, 1786) Família Ostreidae Sub-família Ostreinae Ostrea equestris Say, 1834 Crassostrea rhizophorae (Guilding, 1828) Família Teredinidae Sub-família Teredininae Cephalopoda Família Loliginidae Lolliguncula brevis (Blainville, 1823) Família Octopodidae Sub-família octopodinae Octopus vulgaris Cuvier, 1797

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Tabela com a ocorrência das espécies bênticas por localidade amostrada. Porto de

Trás Asperi Piracang

a Costão São José

Recife de Coral

Manguezal Praia Plataforma adjacente

Porifera não identificado a X X Porifera não identificado b X X X Porifera não identificado c X X Renilla reniformis X X X Muriceopsis sulphurea X Plexaurella grandiflora X Phyllogorgia dilatata X Palythoa cariboerum X Zoanthus socialis X Siderastrea stellata X Meandrina braziliensis X Chthamalus bisinuatus X X Euraphia rhizophorae X Chthamalus bisinuatus X Xiphopenaeus kroyeri X Farfantapenaeus cf. notialis

X

F. cf. subtilis X F. cf. brasiliensis X Litopenaeus schmitti X Synalpheus sp. X Panulirus argus X Clibanarius vittatus X Cardisoma guanhumi X Hepatus pudibundus X Panopeus lacustris X Xanthidae não identificado

X

Goniopsis cruentata X Pachygrapsus gracilis X Pachygrapsus tranversus X Aratus pisonii X X Metasesarma rubripes X Sesarma rectum X Arenaeus cribarius X Callinectes bocourti X X Callinectes danae X Callinectes exasperatus X Ocypode quadrata X Ucides cordatus X Uca leptodactyla X Uca thayeri X Littorina flava X Neritina virginea X X Phalium granulatum X Vasum cassiforme X* X X

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Porto de Trás

Asperi Piracanga

Costão São José

Recife de Coral

Manguezal Praia Plataforma adjacente

Distorsio clathrata X* X Strombus pugilis X* X Polystira cf. florencae X* X Arca imbricata X Barbatia candida X Anadara brasiliana X Anadara chemnitzi X Arcopsis adamsi X Mactrellona alata X Papyridea semisulcata X Brachidontes solisianus X Mytella charruana X Mytella guyanensis X Anomalocardia brasiliana X Chione cancellata X Cyclinella tenuis X Pitar fulminatus X Tivela mactroides X Divaricella quadrisulcata X Lucina pectinata X X Donax striatus X Iphigenia brasiliana X Macoma constricta X Macoma tenta X Tellina radiata X Tellina lineata X Tellina listeri X Strigilla carnaria X Sanguinolaria cruenta X Tagelus divisus X Tagelus plebeius X X Ostrea equestris X Crassostrea rhizophorae X Teridinidae não identificado

X

Octopus vulgaris X Lolliguncula brevis X

* Gastrópodes registrados a partir de valvas ocupadas por caranguejos ermitões

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Anexo 11: Nomes comuns de espécies da fauna conhecidas no ecossistema do Rio de

Contas próximo a Taboquinhas. Curuca (cor de pele a

preto, vive junto às pedras, diminuindo de quantidade nos períodos de seca do rio)

Pitu (vermelho, vive junto às pedras, pedregulhos)

Acari Calambau (branco, vive

nas margens, junto à vegetação)

Piranha Sirinema Siri de ponta Siri cearense (preto/azul;

o mais valente) Camarão vg Camarão sete barbas Camarão rosa Camarão rosinha Camarão pistola Robalo (sobe o rio para

desovar) Carapeba Tainha (sobe em

épocas) Cambriaçu Piau (sai do fundo e vem

para o seco) Carapitu Traira Jundiá Moréia Lampréia Beré Piaba Bicudo Tilápia Tucunaré Boca torta Bagre

Tambaqui Cação Carpa Agulha Sardinha Pacu Curumatã Paravivi Cangurupi Dentão Bobó Maria velha (peixe) Garça Martim pescador Flamingo Maria velha (ave) Canário Andorinha Manció Taperoá Frango d’água Cangandá Socó Pato d’água Lavadeira Bem-te-vi Papa capim Sabiá Paca Lontra Capivara Cágado terrestre Cágado água Sucuruba Jacaré Jibóia Pico de jaca Jaracussu

Papa pinto Serra véia Coral Cobra cipó Mico Sapo Casorte (sapo) Gia (sapo) Calango Rato Teiú Cateto (porco do mato) Cotia Sarigue (parece com

gambá) Raposa Ouriço cacheiro Corsa (caça- comem) Tamanduá Preguiça Cóqui (macaco) Jupará Tatu Barbado (macaco) Coelho Preá Cobra da água Escorpião Caranguejeira Morcego

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Anexo 12: Dados biológicos adicionais sobre crustáceos decápodos da região de

Taboquinhas, Itacaré Distribuição Geográfica M. carcinus, segundo Ramos-Porto e Coelho (1990), ocorre nos E.U.A., nos estados da Flórida e do Texas, Antilhas, México, Guatemala, Nicarágua, Panamá, Colômbia, Venezuela, Guianas e Brasil, até o Rio Grande do Sul (de acordo com Bond-Buckup e Buckup, 1999). M. acanthurus distribui-se no leste dos Estados Unidos, Flórida, Texas, México, Antilhas, Nicarágua, Panamá, Venezuela, Suriname e Brasil, até o Rio Grande do Sul (Ramos-Porto e Coelho, 1990). Segundo Valenti (1985), a espécie é bastante comum nos rios brasileiros que se comunicam com o Oceano Atlântico. A. scabra distribui-se nas Índias Ocidentais, desde Cuba até Trinidad e Tobago, e do México ao Brasil (até o Rio Grande do Sul), Libéria ao norte de Angola e em ilhas pertencentes ao continente africano (Atlântico Oriental) (Bond-Buckup e Buckup, 1999). C. sapidus, de acordo com Melo (1996), distribui-se no Atlântico Ocidental, em toda costa leste dos E.U.A., até a Flórida, Golfo do México, Antilhas, América Central, Venezuela, Brasil (da Bahia ao Rio Grande do Sul) e Argentina, enquanto que no Atlântico Oriental, é encontrado no Mar do Norte, Mediterrâneo, Mar Adriático, Mar Negro e Indo-Pacífico. Sua biologia é amplamente conhecida e trata-se de uma espécie de larga importância comercial.

Habitat e Ciclos de Vida A. scabra habita rios pedregosos e com correnteza (Bond-Buckup e Buckup, 1999), apresentando morfologia externa adaptada para viver neste tipo de ambiente, visto que seu terceiro par de patas torácicas é bastante desenvolvido e utilizado para ancoragem junto ao substrato. Esse animal ocorre nos pontos mais profundos do Rio de Contas e assistiu-se a captura manual de exemplares a cerca de dois metros de profundidade. M. acanthurus e M. carcinus habitam águas lóticas, doces e salobras (Bond-Buckup e Buckup, 1999). Segundo pescadores de Taboquinhas, existe uma preferência da primeira espécie pelas margens de águas mais calmas dos rios, ocorrendo junto à vegetação, enquanto que a segunda tem preferência por regiões pedregosas, como A. scabra. C. sapidus vive em substratos arenosos e lamosos (Coelho e Ramos-Porto, 1994/95), do entre-marés até 90 metros de profundidade, em baías, estuários e lagoas (Melo, 1996), mas comumente é encontrado em águas doces a vários quilômetros de distância do mar. Trata-se, portanto, de uma espécie eurialina, isto é, que tolera uma grande variação de salinidade. As fêmeas dos camarões carídeos, caso de Atya e Macrobrachium, carregam seus ovos presos aos seus apêndices abdominais durante um certo tempo após a postura (período de incubação) (Bond-Buckup e Buckup, 1999). O ciclo de vida de A. scabra inclui uma fase larval na região estuarina. As larvas que eclodem são levadas pela correnteza do rio até o estuário onde completam o desenvolvimento larval. Posteriormente, os jovens sobem o rio e juntam-se à população de

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adultos (Sérgio Bueno, comunicação pessoal). A larva é planctotrófica. A quantidade média de ovos de uma população estudada foi próxima de 4 mil ovos (Galvão e Bueno, 1998). Entre os camarões do gênero Macrobrachium, alguns apresentam um ciclo de vida totalmente independente de salinidade (Bond e Buckup, 1982; Bueno e Rodrigues, 1995), porém M. carcinus e M. acanthurus, entre outras, tem desenvolvimento larval dependente de água salobra. O sistema de água doce deve ter, portanto, uma conexão com áreas estuarinas, como é o caso do Rio de Contas. Assim, quando em época reprodutiva, realizam movimentos migratórios em direção ao estuário, para que haja desova, eclosão e desenvolvimento larval até a fase jovem (Carvalho et al., 1979; Bond-Buckup e Buckup, 1999). O número de ovos produzido é grande, tanto em M. carcinus como em M. acanthurus. A primeira espécie pode pôr até 195 mil ovos (Lobão et al., 1985), enquanto que, a segunda espécie, pode pôr até cerca de 18 mil ovos (Valenti et al., 1989). C. sapidus pode pôr de um a três milhões de ovos em cada desova, que se dá em águas estuarinas. Os primeiros estágios larvais são planctônicos e se desenvolvem no oceano e, na fase de megalopa, os animais penetram nos estuários, onde atingem a fase juvenil. Exemplares adultos, conforme mencionado acima, podem ser encontrados em águas doces, como é o caso dos siris do rio de Contas, onde atingem grandes tamanhos, porém, para a oviposição, a fêmea desce o rio em direção aos estuários. A eclosão das larvas se dá, preferencialmente, em águas com salinidade superior a 20 ppm (Jeffrey Shields, comunicação pessoal).

Período Reprodutivo Devido à grande extensão latitudinal do território brasileiro e a consequente variedade climática, espécies de ampla distribuição, como é o caso das que aqui estão sendo abordadas, podem igualmente apresentar variações em sua biologia reprodutiva. A existência de um período reprodutivo longo, com alguns meses onde a desova é intensa (picos), é comum nos camarões do gênero Macrobrachium. Em geral, os picos reprodutivos coincidem com os meses de maior precipitação pluviométrica, que segundo Maier (1978) é a variável climática mais importante nos trópicos. De fato, alguns estudos, realizados com M. acanthurus, como os de Carvalho et al. (1979), na Ilha de Itaparica, Bahia, e Valenti et al. (1986), no Vale do Ribeira, São Paulo, demonstraram que a reprodução se dá ao longo de todo ano, com picos nos períodos de maior precipitação, entre agosto e novembro e em dezembro e janeiro, respectivamente De acordo com os pescadores locais, ocorre desova do pitu (M. carcinus) ao longo de todo ano, porém ocorrem duas desovas maiores, em novembro e março, período de enchentes no rio de Contas, o que corrobora com os fatos acima mencionados. Segundo eles, o número de ovadas cai no mês de fevereiro. No Vale do Ribeira, esta espécie tem período reprodutivo que vai de outubro a maio, com pico em fevereiro e março, que são os meses mais chuvosos na região estudada (Valenti et al., 1986). Existem poucos dados sobre a biologia reprodutiva da curuca. No rio Guaecá, estado de São Paulo, a espécie reproduz-se ao longo de todo o ano, com dois picos reprodutivos no verão (Galvão e Bueno, 1998). Segundo Hartnoll (1985), C. sapidus tem somente um instar maduro, isto é, a muda da puberdade (quando o animal atinge a maturidade sexual morfológica) é também a muda terminal (a última da vida da fêmea), tendo um longo período de desova com múltiplas posturas. Em geral a reprodução se dá ao longo de todo ano, ocorrendo meses onde a desova é mais intensa.