resenha_a justiça de toga - aleksandro clemente

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Revista Acadêmica Eletrônica Sumaré A JUSTIÇA DE TOGA: UM ENSAIO INTERPRETATIVO DA OBRA DE RONALD DWORKIN SOBRE A INFLUÊNCIA DA MORAL NO DIREITO Aleksandro Clemente PUC-SP [email protected]

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Revista Acadmica Eletrnica Sumar A JUSTIA DE TOGA: UM ENSAIO INTERPRETATIVO DA OBRA DE RONALD DWORKIN SOBRE A INFLUNCIA DA MORAL NO DIREITO Aleksandro Clemente PUC-SP [email protected] Revista Acadmica Eletrnica Sumar RESUMO: Esta resenha analisa os principais tpicos da obra A Justia de Toga de Ronald Dworkin, que tratadecomoasconvicesmoraisdosmagistradospodeminfluenciarasdecisesjudiciais proferidas pela corte. Essa uma questo controvertida que o autor tenta responder em seu livro, inclusive rebatendo argumentos de seus crticos, como os filsofos Isaiah Berlin e H. L. A. Hart. O pensamento de Ronald Dworkin atualmente muito estudado nos meios jurdico e acadmico, despertando muito interesse entre estudiosos e tambm por todos aqueles que, de uma forma ou de outra, lidam com o direito e com as questes ticas e morais de nosso tempo. PALAVRAS CHAVE: Justia; Poltica; Direito; Moral; tica. 1. Introduo:Em A Justia de Toga (DWORKIN, 2010) o autor inicia narrando um dilogo entre o Juiz da SupremaCorteAmericanaOliverWendellHolmeseojovemLeanerdHand,quemaistarde viria a se tornar Juiz na Corte Distrital de NY. No dilogo, Hand agradece a carona que lhe fora dadaporHolmese,aosedespedir,grita:FaaJustia,Juiz!.Holmespedequeocondutor retornee,paraasurpresadeHand,diz:Noesseomeutrabalho!,eparterumoaoseu trabalho, que no consistia em fazer justia (DWORKIN, 2010, pg. 03). Apartirdessanarrativa,oautorformulaaperguntacentraldolivro:Comoasconvices moraisdeumjuizdevem[sequedevem]influenciarseusjulgamentosacercadoqueo direito?(DWORKIN,2010,pg.03).Oautorreconheceque,dependendodacorrenteadotada por juristas, socilogos, polticos e filsofos do direito, a resposta a essa pergunta pode variar, de tudoanada.EessaaquestocontrovertidaqueDworkinirtentarresponder,segundoa sua viso terica de Direito, ao longo do livro. ParaDworkin,trata-se,evidentemente,deumaquestodeimportnciaprticafundamental saber se os critrios morais (...) esto entre os critrios que os juzes e outras autoridades devem usar para decidir quando essas proposies [jurdicas] so verdadeiras (DWORKIN, 2010, pg. Revista Acadmica Eletrnica Sumar 03). Isso impe outras perguntas: Um juiz pode julgar segundo critrios polticos? No funo de um juiz julgar apenas com base no direito? Em verdade, o livro ora analisado estabelece um embate entre a Teoria do Direito de Dworkin e a Teoria do Positivismo Jurdico, representado no sistema da civil Law por Hans Kelsen e no sistema da Commum Law por H.L.A. Hart.Dworkin ir dizer que na maioria dos pases, seja no sistema da Civil Law (onde o que direito representadopelaleiaprovadanolegislativo)sejanosistemadaComumLaw(ondeoque direito representado pelo que os tribunais j decidiram no passado), a veracidade ou falsidade dasproposiesjurdicasvaidependerdoquedizemtaisleisouajurisprudncia(DWORKIN, 2010, pg. 11). Mas, nem sempre a jurisprudncia ou as leis oferecem critrios seguros para que sedigaoquedefatodireitoemumcasoconcreto.SegundoDworkin,svezes,nofica claro,qualainterpretaocorretadeumasriededecisesjudiciais...equedevemos atentar para essas diferentes maneiras em que a moral pode estar presente ao tomarmos nossas decisesacercadoqueodireito(DWORKIN,2010,pg.12).Dworkinlanaentoo problema que : como deve o magistrado proceder diante das lacunas do direito, da ambigUidade oudaantinomiadasnormas?ParaDworkin,nestescasosamoralpodeserocritrioutilizado pelojulgadornointuitodesechegarverdade-valordaproposiojurdicae,assim,atingira corretaaplicaododireito.Paraexemplificarefundamentarsuaposio,Dworkincriaum casso imaginrio onde uma mulher, a Sra. Sarenson, durante muitos anos toma um medicamento chamadoInventumfabricadopordiversoslaboratrios.Omedicamentoapresentaumasriede contra-indicaesqueosfabricantesdesconheciam.Emrazodisso,aSra.Sarensonpassaa sofrer de srios problemas cardacos. Ela no tem como provar qual laboratrio, dentro os vrios que fabricavam o medicamento poca, produziu os comprimidos que ela prpria ingeriu. Mas certoqueaSra.Sarensontomoucomprimidosfabricadospormaisdeumdoslaboratrios fabricantesdoproduto.Contudo,certotambmquenotomoucomprimidosfabricadospor algum deles. Ela simplesmente no tem como se lembrar (DWORKIN, 2010, pg. 203). Comessehardcase,Dworkinpassaaanalisaraspossveissoluesdiantedaspossveisteses argUidas pelos advogados que atuam no caso. Os advogados da Sra. Sarenson processam todos oslaboratriosquefabricavamoprodutoargumentandoque,comonopossveldizercom certezaquallaboratriofabricouoscomprimidosingeridosporela,todososfabricantes deveriamserresponsveispelodano,poistodossebeneficiaramdeumafatiadomercadona exploraocomercialdoproduto.Assim,cadaumdeveriaarcarcomumaindenizao proporcionalsuaparticipaodomercadonasvendasdoinventumduranteaquelesanos.Por outrolado,osadvogadosdoslaboratriosrespondemquenenhumadasempresaspodeser Revista Acadmica Eletrnica Sumar responsabilidade por absolutamente nada, a menos que a Sra. Sarenson prove a responsabilidade individualdecadaumdeles.Ouseja,onusdeprovarincumbeaquemalega,diriamos advogados dos laboratrios.Ambasastesessepreocupamemdizeroqueodiretonocasoespecfico.Osadvogadosdo laboratriopoderiamargumentarquealeiouajurisprudncianoprevapossibilidadede algumserobrigadoaindenizarpordanosquenocausou(enestecasonohaviaprovasde quemtivesseefetivamentecausadoodano).Poroutrolado,osadvogadosdaSra.Sarenson diriam que isso se trata de um princpio geral de direito, mas que o caso da Sra. Sarenson oferece particularidadesqueotornadiferentedetodososoutroscasosnosquaistalprincpiojfoi aplicado.A partir desse exemplo Dworkin busca desenvolver sua teoria geral do direito argumentando que a moral est diretamente envolvida na concepo do que o Direito. Exemplifica Dworkin que, senoterritrioemqueocorreuocasodaSra.Sarensonaleidissessequeningumpodeser condenadoporreparaodedanosamenosqueaoutrapartecomproveasuaculpanoevento, certamenteademandadaSra.Sarensonseriaimprocedente,mas,aindaassim,essaconcluso estariafundadaemcritriosdemoralidadepoltica,aquallevouoPoderLegislativolocala elaborartalnorma.ParaDworkinseriaumerropensarqueamoral,nessecaso,noestaria desempenhandopapelalgumnessejulgamento.Elatemumpapelimportantenainterpretao dopapelconstitucionaldoPoderLegislativo.(DWORKIN,2010,pg.25).EseosJuristas divergiremacercadanaturezadessasrazesmorais,tambmvodivergirarespeitododireito queessepoderlegislativocriou.Portanto,paraDworkin,amoraldesempenhaumpapelmuito relevante na interpretao das normas jurdicas.Um positivista poderia dizer, por exemplo, que no caso da Sra. Sarenson, tendo em vista que a lei (Civil Law), ou a jurisprudncia (Comum Law) determinaqueningumpodesercondenadosemquehajaprovadesuaresponsabilidade,essa deveria ser a concluso do julgador no caso concreto. Mas essa concluso, na viso de Dworkin, nodeixadeterfundamentoemcritriosdemoralidade,squenestecasotrata-sedeuma moralidadepolticaoudemocrtica,segundoaqualasregrasimpostaspoderlegislativo, constitudo para tal fim, devem ser respeitadas.Dworkin, no entanto, indaga se no estgio da deciso judicial o magistrado no pode, em certos casos, ignorar a lei quando esta for injusta ou insensata e at mesmo usar seu poder poltico para impedirainjustiaeouineficincia.Aqui,saberseumjuizpodeignoraraleioumesmo contrari-lapara,nocasoconcreto,darasoluoqueentendeseramaisjustaoutraquesto Revista Acadmica Eletrnica Sumar moral, no mais no sentido de saber se a moral influencia a concepo do que o direito, mas se estemododeagirdojulgadorlhemoralmentepermitido.Nestepontooautorvaidivergirdo positivismojurdico.EnquantoparaopositivismoaMoraldevesertotalmenteseparadado Direitoenoinfluenciaradecisodomagistrado,paraDowrkinessaseparaoimpossvel. Respondendo a criticas de seus opositores, Dworkin afirma: amoraltemumpapeladesempenharemdoispontosdistintosdateoria jurdica:noestgioterico,quandoseatribuivalorprticajurdica;eno estgio da deciso judicial, quando os juzes so instados a fazer a justia... Mas asduasinseresdamoralsodistintas.(...)emminhaopinio,ovalorda integridadequedeveramosatribuirprticadajustiaatravessaoestgio doutrinrioechegaatoestgiodadecisojudicialporque,argumento,a integridadeexigequeos juzesconsideremamoralemalgunscasos, inclusive neste, tanto para decidirem o que o direito quanto sobre o modo de honrarem suas responsabilidades de juzes. (DWORKIN, 2010, pg. 31). E conclui: ...a diferena no se encontra entre teorias que incluem e teorias que excluem a moral, mas entre teorias que a introduzem em estgios distintos de anlise, com conseqUnciasdiferentesparaojuzopolticofinalcomquevaiseconsumar uma teoria jurdica completa. (DWORKIN, 2010, pg. 31). Portanto,segundooautor,amoralnopodeserseparadadoDireitoporque,emumounoutro estgio da teoria jurdica, seja no estgio terico, seja no estgio da deciso ela est impregnada na concepo acerca do que o direito. Em suma, essa uma rpida e insuficiente anlise interpretativa que se buscou fazer da obra A JustiadeToga(DWORKIN,2010).Longedequererdesvendaropensamentodesseautor, comapresenteresenhapretende-se,simplesmente,fazerumconviteparaqueosestudiososdo direito e de reas afins que ainda no tiveram contato com a obra possam ser nela introduzidos. AleksandroClementeadvogadoeprofessoruniversitrioemSoPaulo,MestrandoemDireitopelaPUC-SP, Ps-graduado(latosenso)emGovernoePoderLegislativopelaUNESPeemDireitoPenaleProcessualPenal pela Universidade Mackenzie. ______________________________ BIBLIOGRAFIA DWORKIN, Ronald. A Justia de Toga. Ed. Martins Fontes, 2010 - Traduo: Jefferson Luiz Camargo.