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REPRODUÇÃO DO EXPERIMENTO DA GOTA SALINA COM CARACTERIZAÇÃO DE MATERIAIS: UMA VISÃO INTERDISCIPLINAR C. V. C. Moreira 1 , J. A. Cirino 1 , J. V. S. L. Beltrão 1 , J. V. S. Pereira 1 , L. H. G. da Silva 1 , L. M. C. da Silva, R. A. Galvão 1,2 , R. R. M. Silva 1 , R. F. A. Sarinho 1,2 , T. M. F. dos Anjos 1 , T. V. C. Silva 1 , M. R. S. Vieira 1,§ 1 Departamento de Engenharia Mecânica (DEMEC), Centro de Tecnologia e Geociências (CTG), Universidade Federal de Pernambuco - UFPE, Recife-PE, Brasil. 2 Centro de Tecnologias Estratégicas do Nordeste (CETENE), Recife-PE, Brasil. § [email protected] Resumo A natureza do processo de corrosão foi comprovada pela primeira vez, em 1926, por Evans, que desenvolveu um experimento conhecido como Gota Salina, permitindo ilustrar a ocorrência de uma pilha de ação local, por meio de um experimento de baixo custo. O presente trabalho teve por objetivo reproduzir o experimento da gota salina em chapas de aço estrutural (ASTM 572 Gr50) e tampas metálicas de refrigerante, visando identificar e comprovar a natureza eletroquímica do processo corrosivo e realizar a caracterização desses materiais com estudantes do curso de engenharia de materiais da UFPE, visando uma abordagem interdisciplinar. Para a obtenção da gota salina utilizou-se uma solução de NaCl (3,5%), contendo os indicadores ferricianeto de potássio e fenolftaleína. As técnicas usadas para analisar a morfologia e a composição dos produtos de corrosão foram: microscopia óptica, microscopia eletrônica de varredura e Espectroscopia de Energia Dispersiva. Palavras-Chave: Corrosão, Gota Salina, Experimento de Evans, Engenharia de Materiais, Interdisciplinaridade. 22º CBECiMat - Congresso Brasileiro de Engenharia e Ciência dos Materiais 06 a 10 de Novembro de 2016, Natal, RN, Brasil 10253

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REPRODUÇÃO DO EXPERIMENTO DA GOTA SALINA COM

CARACTERIZAÇÃO DE MATERIAIS: UMA VISÃO INTERDISCIPLINAR

C. V. C. Moreira1, J. A. Cirino1, J. V. S. L. Beltrão1, J. V. S. Pereira1, L. H. G. da

Silva1, L. M. C. da Silva, R. A. Galvão1,2, R. R. M. Silva1, R. F. A. Sarinho1,2, T. M. F.

dos Anjos1, T. V. C. Silva1, M. R. S. Vieira1,§

1 Departamento de Engenharia Mecânica (DEMEC), Centro de Tecnologia e

Geociências (CTG), Universidade Federal de Pernambuco - UFPE, Recife-PE,

Brasil.

2 Centro de Tecnologias Estratégicas do Nordeste (CETENE), Recife-PE, Brasil.

§ [email protected]

Resumo

A natureza do processo de corrosão foi comprovada pela primeira vez, em 1926,

por Evans, que desenvolveu um experimento conhecido como Gota Salina,

permitindo ilustrar a ocorrência de uma pilha de ação local, por meio de um

experimento de baixo custo. O presente trabalho teve por objetivo reproduzir o

experimento da gota salina em chapas de aço estrutural (ASTM 572 Gr50) e tampas

metálicas de refrigerante, visando identificar e comprovar a natureza eletroquímica

do processo corrosivo e realizar a caracterização desses materiais com estudantes

do curso de engenharia de materiais da UFPE, visando uma abordagem

interdisciplinar. Para a obtenção da gota salina utilizou-se uma solução de NaCl

(3,5%), contendo os indicadores ferricianeto de potássio e fenolftaleína. As técnicas

usadas para analisar a morfologia e a composição dos produtos de corrosão foram:

microscopia óptica, microscopia eletrônica de varredura e Espectroscopia de Energia

Dispersiva.

Palavras-Chave: Corrosão, Gota Salina, Experimento de Evans, Engenharia de

Materiais, Interdisciplinaridade.

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INTRODUÇÃO

Em nosso dia a dia damos pouca atenção a fenômenos que parecem

corriqueiros, como grades e maçanetas enferrujadas, e não nos perguntamos o que

leva àquela situação. A ferrugem nada mais é do que óxido de ferro hidratado

(Fe2O3.H2O), formado pela interação entre um material ferroso e o meio ambiente ao

qual está exposto, que em nosso cotidiano está representado pela atmosfera, a qual

é rica em oxigênio e, dependendo da localização geográfica, possui maior ou menor

quantidade de vapor d’água.

Para que o processo corrosivo ocorra é necessária a presença de quatro

componentes básicos: eletrólito - meio condutor, responsável pela transferência

eletrônica; anodo - eletrodo que sofre corrosão; catodo - eletrodo no qual ocorre a

reação de redução; contato metálico - ligação entre os eletrodos. Esses são os

elementos que compõem as pilhas de corrosão, entretanto dizer que é necessária a

presença de catodo, anodo e contato metálico não é o mesmo que dizer que são

necessários três diferentes materiais, pois eles podem estar presentes em uma

mesma peça metálica pela presença de heterogeneidades na estrutura, as quais

levam à formação de áreas anódicas e catódicas em um mesmo metal - o contato

metálico, neste caso, é a própria peça(1).

O eletrólito, por outro lado, é sempre representado por uma fase a parte,

contendo espécies iônicas, as quais estão presentes como um líquido depositado

sobre o metal ou na forma de vapor. Dentre as espécies iônicas mais discutidas em

relação a meios corrosivos estão os íons cloretos (Cl-), pois estes possuem elevado

poder corrosivo, em especial nos aços, além de estarem presentes em atmosferas

comuns - litorâneas, industriais, próximas a piscinas, etc. -, constituindo-se como

potenciais agentes corrosivos.

Devido ao grande impacto do processo corrosivo no meio industrial, agravado

quando em ambientes litorâneos devido à presença dos íons cloreto, sendo esta

uma realidade do Complexo Industrial e Portuário de SUAPE (Ipojuca – PE), o qual

está situado em local próximo à Universidade onde esse estudo foi desenvolvido,

uma formação diferenciada nesta área é relevante para uma boa formação dos

estudantes de engenharia. Neste contexto, alinhar conhecimentos teóricos e práticos

atua como uma maneira de solidificar a base do estudante para desafios que irão

surgir em sua vida profissional.

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Um modo prático de acompanhar interações que ocorrem em ambientes

marítimos e que exercem influência no processo corrosivo é através do experimento

de Evans, que consiste em depositar uma gota de solução salina (NaCl) contendo

indicadores de íons ferrosos e de pH (composto por fenolftaleína e ferricianeto de

potássio) a superfície de uma chapa de aço previamente limpa. Apesar de

relativamente simples, o experimento traz a possibilidade de abordar de maneira

prática conceitos relacionados à eletroquímica e à química, como transferência de

elétrons, movimento de íons, reações redox, catodo, anodo, célula eletroquímica,

agente oxidante, agente redutor, solubilidade, indicadores ácido-base, pH, cinética

de uma reação e equilíbrio químico(2). Com isso, a experiência se torna um

importante parceiro na prática pedagógica do ensino de corrosão, permitindo aliar os

conhecimentos teóricos aos práticos.

O presente trabalho teve como objetivo reproduzir o experimento da gota salina

em chapas de aço estrutural (ASTM 572 Gr50) e tampas metálicas de refrigerante,

visando acompanhar o efeito dos íons cloreto no processo corrosivo a partir da

formação de micropilhas de concentração diferencial, realizando a caracterização

desses materiais com estudantes do curso de engenharia de materiais da UFPE,

visando uma abordagem interdisciplinar da temática corrosão.

METODOLOGIA

Na presente prática foi adotado o procedimento experimental proposto pela

professora orientadora, o qual está descrito a seguir. Foi solicitado à turma a entrega

de relatório técnico acerca das atividades realizadas.

Preparo dos Corpos de Prova

Foram utilizados como corpos de prova barras de aço carbono estrutural ASTM

572 Gr50 e tampinhas metálicas de refrigerante. Todos os corpos de prova foram

lixados em uma politriz para lixamento mecânico utilizando diferentes granulometrias

(220, 320 e 600, 800 e 1200#) como tratamento superficial.

Após lixamento, as amostras foram lavadas com água destilada, e submetidas

à lavagem em banho ultrassônico em isopropanol (5 minutos) e acetona (5 minutos)

de forma a remover oleosidades e outras sujidades presentes na superfície do

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material. Por último, os corpos de prova foram secos com jato de ar quente durante

3 minutos.

Preparo de Solução Utilizada no Experimento da Gota Salina

Para preparo da solução utilizada no experimento a gota salina, fez-se uso de

solução aquosa a 3,5% m/v (solução I) de NaCl e como indicadores foram utilizadas

uma solução de ferricianeto de potássio 1% m/V em meio aquoso e solução

etanólica de fenolftaleína 1% m/v. A solução da gota salina (solução IV) foi obtida

misturando-se 100 mL da solução I com 3,0 mL da solução II e 0,5 mL da solução III.

Ensaio da Gota Salina

Sobre a superfície dos corpos de prova previamente lixados e limpos, verteu-se

gota (cerca de 0,5 mL) da solução IV. Paralelamente uma amostra foi levada para o

microscópio ótico para registro, onde teve uma gota de aproximadamente 10 uL

vertida em sua superfície. As alterações superficiais observadas nas amostras

submetidas à gota de 1 mL foram registradas por meio de câmera fotográfica digital

e foi utilizada lupa para que pudessem ser melhor observadas durante a realização

do experimento.

Caracterização das amostras submetidas ao ensaio da gota salina

A microestrutura foi analisada por meio de microscopia óptica (MO) e

microscopia eletrônica de varredura (MEV) com Espectrômetro por Energia

Dispersiva (EDS) acoplado, em três regiões da gota (centro, borda e intermediária).

Após análise inicial, as amostras foram lixadas suavemente com lixa 1200# para

remoção dos produtos de corrosão, lavadas com etanol e secas ao ar quente, para

então serem novamente analisadas por MO e MEV. Uma amostra do metal base foi

preparada para análise comparativa aos corpos de prova ensaiados.

Elaboração e Aplicação de Questionário Avaliativo

Após entrega dos relatórios a turma foi convidada a avaliar a atividade por meio

de um questionário baseado na escala Likert (1932)(3), onde foram propostas as

categorias: discordo plenamente(1); discordo parcialmente(2); indiferente (3);

concordo parcialmente (4) e concordo plenamente(5). O questionário utilizado nessa

pesquisa é apresentado no Quadro 1.

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Quadro 1: Questionário aplicado à turma para avaliação da aceitação da atividade

proposta.

N Proposições 1 2 3 4 5

1 O experimento proposto possibilitou a consolidação da temática corrosão.

2 Os procedimentos experimentais foram de fácil execução.

3 O experimento proporcionou uma abordagem interdisciplinar com outros conteúdos do curso de engenharia de materiais.

4 A prática da gota salina é capaz de abordar a temática corrosão de forma contextualizada.

5 A associação do experimento da gota salina com técnicas de caracterização microscópicas permitiu uma melhor compreensão sobre o fenômeno de corrosão.

6 A execução da atividade em grupos proporcionou uma efetiva interatividade para discussão das observações experimentais efetuadas.

7 A proposta de execução de um relatório sobre o experimento promoveu integração entre a teoria e a prática.

8 Atividades desta natureza despertam um maior interesse pela disciplina.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Acompanhamento do experimento

Imediatamente após a deposição da gota foi observada a formação de regiões

de coloração azulada e de regiões de coloração rosada distribuídas de forma

aleatória, conforme Figura 1a. As regiões de cor azulada se devem à alteração de

cor do indicador ferricianeto de potássio em presença de íons ferrosos, enquanto as

regiões rosadas, ao indicador fenolftaleína em presença de OH-. Essa distribuição

aleatória está relacionada a uma não-uniformidade da quantidade de oxigênio no

interior da solução. Nessa etapa, o oxigênio que participa da reação redox é apenas

aquele contido na gota. O metal terá a função de redutor, cedendo elétrons para o

meio corrosivo, e o receptor de elétrons estará no mesmo ponto da superfície do

metal.

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Figura 1. Modificações na superfície observadas ao longo do ensaio da gota salina em função do tempo: (a) imediatamente após deposição da gota; (b) após 2 minutos; (c) após 5 minutos;

(d) após 8 minutos, (e) após 13 minutos e (f) após 30minutos.

Observações das superfícies nos tempos seguintes mostram a alteração de

uma distribuição primária aleatória para uma distribuição ordenada (figuras 1b-1e),

ficando a área rósea na periferia da gota e a área azul no centro (distribuição

secundária), com a formação de um anel incolor e um precipitado de coloração

marrom entre as duas áreas (Figura 1f).

A mudança do tipo de distribuição iônica, observada no experimento, ocorre

devido ao consumo de todo o oxigênio no interior da solução nos primeiros minutos

após a deposição da gota; como as regiões mais externas da gota estão em contato

direto com o meio, o qual é aerado, irá ocorrer difusão do oxigênio da superfície para

o interior da gota, levando à existência de oxigênio disponível nesta região para que

ocorra a formação de íons OH-, responsáveis pela coloração rosa observada nos

tempos posteriores, após o consumo do oxigênio dissolvido na solução. Nessa

etapa, o oxigênio atmosférico é responsável por repor o oxigênio consumido na

semirreação de redução.

Conforme dito anteriormente, o indicador ferricianeto de potássio adquire

coloração azulada pela presença de íons ferrosos, os quais seguem a reação

descrita na equação (1). Como neste caso há elétrons como produtos da reação,

temos que esta se trata de uma reação de oxidação e, consequentemente, esta será

a região anódica da pilha de corrosão formada.

Fe → Fe2+ + 2e- Eq. (1)

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Já o indicador fenolftaleína adquire coloração rósea pela formação de íons

hidroxila ocasionada pelo consumo do oxigênio dissolvido na solução, de acordo

com a reação da equação (2). Aqui há consumo de elétrons para que a reação

ocorra, logo se trata de uma reação de redução. Portanto, as regiões da solução que

adquirem esta coloração se encontram na região catódica da pilha de corrosão.

O2 + 2H2O + 4e- → 4OH- Eq. (2)

A equação 2 é conhecida também como reação de redução do oxigênio em

água. Esta reação ocorre graças aos elétrons que são gerados pela reação anódica

e que se deslocam através do metal da região azul para a região rosa, isto é, da

região anódica para a região catódica.

Assim, as duas reações acima ocorrem simultaneamente graças à passagem

de corrente elétrica através do metal, seguindo o fluxo da região em que ocorre

dissolução do metal (região anódica) para a região em que ocorre a redução do

oxigênio (região catódica). Estas reações, de natureza eletroquímica, constituem-se

em reações básicas do processo corrosivo que tem lugar dentro da gota salina.

A interação entre as espécies geradas nos eletrodos (regiões anódica e

catódica) e o oxigênio do meio leva à formação de um composto intermetálico

insolúvel (Equação 3), responsável pela formação do anel esbranquiçado visto na

Figura 1f, bem como do produto de corrosão (Equação 4), de cor marrom, melhor

observado na Figura 2.

2Fe2+ + 4OH- + ½ O2 → 2FeOOH + H2O Eq. (3)

8FeOOH + Fe2+ + 2e- → 3Fe3O4 + 4H2O Eq. (4)

Comparando as imagens da Figura 1f com a Figura 2 vemos que esse modelo

é válido, pois a região da superfície metálica que se encontrava abaixo da região da

gota que possuía coloração rósea não sofreu corrosão.

A partir da análise das imagens obtidas por MEV (Figura 3) é possível ver o

efeito corrosivo da solução salina na superfície do aço, bem como as diferenças

estruturais das regiões do centro e da borda da gota. A região central (Figura 3a) é

claramente mais porosa do que as regiões intermediárias e, em especial, periféricas

(Figuras 3b e 3c). Isso é esperado, pois a formação do óxido se dá

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preferencialmente nessa região, conforme descrito pelas equações anteriores, sendo

limitada pela região intermediária, onde a porosidade observada é uma média das

porosidades das outras regiões. A porosidade da região mais interna é maior pois

ela é a região anódica da pilha de corrosão, onde há o maior consumo de metal. As

porosidades observadas nas outras regiões podem ser devidas às micropilhas de

corrosão formadas imediatamente após a deposição da gota, visto que tanto o

diâmetro quanto a profundidade aparente da corrosão nessas regiões são menores

que os observados na região central.

Figura 2. Superfície das amostras decorridas 22 horas da realização do ensaio.

Figura 3: Imagens de Microscopia Eletrônica de Varredura – (a) região central; (b) intermediária

e (c) borda da gota salina.

Por meio da análise de EDS (Figura 4) foi possível comprovar a presença do

NaCl e a formação do óxido de ferro (ferrugem), mostrando que ocorreram as

reações descritas anteriormente. O NaCl pode ser detectado pois a gota secou na

superfície da amostra e não foi removido o reagente restante antes da realização da

análise, o que também retiraria o óxido formado(4). As diferenças nas quantidades de

NaCl observadas podem ser devidas a heterogeneidades na solubilização do sal em

solução ocorridas no processo de secagem, não estando relacionadas diretamente

com o processo corrosivo que ocorre na gota. A presença do oxigênio é devida à

adsorção deste na solução.

a) b) c)

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Figura 4: Resultados de EDS das amostras após deposição da gota na – (a) região da interface

gota meio; (b) borda; (c) intermediária e (d) centro. Os elementos estão identificados no inset

da figura (a).

As imagens de microscopia óptica (Figura 5) permitem avaliar as mudanças

que ocorreram no metal em nível microestrutural. Na Figura 5a vemos a presença de

nódulos de perlita nos contornos de grão da ferrita, microestrutura típica esperada

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para o aço utilizado(5). Já na Figura 5b não é possível identificar as fases presentes

com tanta clareza, pois o meio corrosivo no qual a peça ficou imersa provocou a

deterioração da superfície do aço, o que é demonstrado pelos diferentes perfis de

profundidade observados na imagem.

Figura 5: Imagens de Microscopia Óptica - (a) do metal base e (b) amostra após remoção

do produto de corrosão (b).

Questionário avaliativo

A Figura 6 apresenta os resultados obtidos no questionário apresentado

anteriormente na Tabela 1. Fica claro que a avaliação do experimento foi positiva

para todos os quesitos propostos, evidenciando a aceitação e o caráter motivador do

experimento pelos alunos.

Figura 6: Histograma das proposições pela quantidade de respostas.

Ressalta-se que a reprodução do experimento da gota salina associado às

técnicas de caracterização de materiais, possibilitou uma abordagem interdisciplinar

valorizando conteúdos previamente trabalhados pelos estudantes em outras

disciplinas, como por exemplo, as técnicas de caracterização, preparação

a) b)

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metalográfica e microestrutura dos materiais. Além disso, o experimento também

permitiu uma abordagem contextualizada trazendo para sala de aula, situações reais

de problemas de corrosão que o estudante poderá se deparar em sua atuação

profissional, exemplificando-se, o processo de corrosão de estruturas metálicas

expostas a atmosferas marinhas, que corresponde ao fenômeno estudado na prática

realizada nesse trabalho.

CONCLUSÕES

A associação de aspectos teóricos e práticos através de atividades

experimentais possibilita a consolidação da construção do conhecimento. O

experimento de Evans realizado em sala foi reproduzido com sucesso, permitindo-se

abordar a natureza eletroquímica do processo de corrosão por meio da realização de

um experimento simples.

A proposta do experimento da gota salina integrada a métodos de

caracterização de materiais foi importante, pois permitiu correlacionar diferentes

saberes já vivenciados pelos estudantes em outras disciplinas, ressaltando-se aqui a

importância de temáticas e intervenções de caráter interdisciplinar para o ensino de

engenharia.

Através da avaliação de aceitação da intervenção pedagógica por meio de

questionário identificou-se que a prática desenvolvida atuou como instrumento

educacional motivador e facilitador no processo ensino-aprendizagem de corrosão,

colaborando para a construção do conhecimento de forma contextualizada,

interdisciplinar, e integradora entre os aspectos teóricos e práticos.

REFERÊNCIAS

(1) GENTIL, V. Corrosão. 5.ed. Rio de Janeiro: Livros técnicos e científicos, 2011.

(2) Wartha, E.J.; Guzzi Filho, N.J.; Jesus, R.M. O experimento da gota salina e os

níveis de representação em química. Educ. quím., 23(1), 55-61, 2012. ©

Universidad Nacional Autónoma de México, ISSN 0187-893-X.

(3) Brandalise, L. T. Modelos De Medição De Percepção e Comportamento –

Uma Revisão. Disponível online em:

<http://www.academia.edu/8531931/MODELOS_DE_MEDI%C3%87%C3%83

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O_DE_PERCEP%C3%87%C3%83O_E_COMPORTAMENTO_UMA_REVIS

%C3%83O>. Acesso em Agosto de 2016.

(4) WOLYNEE, S. Técnicas Eletroquímicas em Corrosão. São Paulo: Editora da

Universidade de São Paulo, 2003.

(5) REIS, E.G. "Modelo Matemático para Previsão das Propriedades Mecânicas

na Laminação a Quente de Perfis Estruturais”. Dissertação de Mestrado

apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Engenharia Metalúrgica e de

Minas da Universidade Federal de Minas Gerais. Disponível online em

<http://www.ppgem.eng.ufmg.br/defesas/1093M.PDF>, acesso em Julho de

2016.

SALINE DROP EXPERIMENT REPRODUCTION WITH MATERIALS

CHARACTERIZATIONS: AN INTERDISCIPLINARY VISION.

Abstract

The corrosion process nature was proved the first time by Evans in 1926, that

developed an experiment known as Saline Drop, it allowing to illustrate the

occurrence of a local action cell by using a low-cost experiment. This work had as

objective to reproduce this experience on structural steel plates (ASTM 572 Gr50)

and refrigerant metal caps, aiming to identify and prove the electrochemical nature of

corrosion process and characterize these materials with materials engineering

students of UFPE, trying and interdisciplinary approach. To obtain de saline drop it

was used a NaCl (3,5%) solution with potassium ferricyanide and phenolphthalein

indicators. To analyze the morphology and corrosion products composition, there

were used Optical Microscopy, Scanning Electron Microscopy and Energy Dispersive

Spectroscopy.

Key-words: Corrosion, Saline Drop, Evans Experience, Materials Engineering,

Interdisciplinary.

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