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INAG – Março 2002 1/7 RELATÓRIO TÉCNICO SOBRE O ESTUDO DO LEITO DE CHEIA NUM TROÇO DO RIO MONDEGO Instituto da Água - Direcção de Serviços de Recursos Hídricos Sónia Fernandes, Ana Catarina Mariano, Maria Teresa Álvares, Maria Raquel Veríssimo, Brito Calrão 1. Objectivo O presente trabalho pretende avaliar quais as zonas que ficam submersas quando ocorrem cheias na zona de Coimbra. Para este estudo procedeu-se a um levantamento batimétrico entre a Ponte Europa e o Açude Ponte de Coimbra, no rio Mondego. Com base nesta informação e noutra já existente no Instituto da Água (INAG) e recorrendo às funcionalidades dos Sistemas de Informação Geográfica (SIG’s), foi possível determinar várias superfícies de cheia para esta zona. 2. Introdução Actualmente, os levantamentos batimétricos combinam, em tempo real, medidas de posicionamento e leituras de profundidade provenientes de sondas hidrográficas. O equipamento utilizado para determinar as posições exactas das profundidades na água em tempo real é o GPS (Global Position System - Sistema de Posicionamento Global). A correspondência entre as medições de posição (fornecidas pelo GPS) e as medições de profundidade (fornecidas pela sonda) permitem obter um conjunto de pontos, referenciados geograficamente, a partir dos quais se estimam as superfícies do fundo de albufeiras ou de troços de rios, podendo ser expressas em profundidades ou em cotas. Adicionalmente, a utilização de um software de navegação permite que a informação batimétrica existente e a recolher em trabalhos futuros sejam coincidentes, de acordo com o plano de navegação pré-definido. 3. Equipamento O INAG possui um sistema constituído por uma sonda hidrográfica portátil modelo EA 501P (funcionando com um transdutor de 200 kHz tipo 200-7-G), da marca SIMRAD e um sistema de posicionamento diferencial (DGPS) para funcionar em tempo real e com inicialização em movimento (dupla frequência) composto por dois receptores SR9500 e um sistema de rádio modem, da marca LEICA (Figura 3.1). O transdutor seleccionado está indicado para detectar profundidades de 0.80 m até aos 600 m em água doce com uma precisão de 1 cm. O sistema GPS adquirido, permite obter, para medições de fase, precisões na ordem dos 5 a 10 mm + 1 ppm em modo estático e em modo cinemático - tempo real, valores de 10 mm + 2 ppm, em posicionamento horizontal. A precisão altimétrica é menor aproximadamente cerca de 2 vezes a planimétrica. A sincronização entre a sonda e o GPS faz-se através do software de navegação que correlaciona e guarda os dois tipos de medições (posição e profundidade). Para a execução dos levantamentos utiliza-se o GPS em modo dinâmico (modo cinemático com inicialização em movimento – “on the fly”). As medições com este método fornecem a trajectória da unidade móvel, sem a

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INAG – Março 2002 1/7

RELATÓRIO TÉCNICO SOBRE O ESTUDO DO LEITO DE CHEIA NUM TROÇO DO RIO MONDEGO

Instituto da Água - Direcção de Serviços de Recursos Hídricos

Sónia Fernandes, Ana Catarina Mariano, Maria Teresa Álvares, Maria Raquel

Veríssimo, Brito Calrão

1. Objectivo

O presente trabalho pretende avaliar quais as zonas que ficam submersas quando ocorrem cheias na zona de

Coimbra. Para este estudo procedeu-se a um levantamento batimétrico entre a Ponte Europa e o Açude Ponte de

Coimbra, no rio Mondego. Com base nesta informação e noutra já existente no Instituto da Água (INAG) e

recorrendo às funcionalidades dos Sistemas de Informação Geográfica (SIG’s), foi possível determinar várias

superfícies de cheia para esta zona.

2. Introdução

Actualmente, os levantamentos batimétricos combinam, em tempo real, medidas de posicionamento e leituras de

profundidade provenientes de sondas hidrográficas. O equipamento utilizado para determinar as posições exactas

das profundidades na água em tempo real é o GPS (Global Position System - Sistema de Posicionamento Global). A

correspondência entre as medições de posição (fornecidas pelo GPS) e as medições de profundidade (fornecidas

pela sonda) permitem obter um conjunto de pontos, referenciados geograficamente, a partir dos quais se estimam as

superfícies do fundo de albufeiras ou de troços de rios, podendo ser expressas em profundidades ou em cotas.

Adicionalmente, a utilização de um software de navegação permite que a informação batimétrica existente e a

recolher em trabalhos futuros sejam coincidentes, de acordo com o plano de navegação pré-definido.

3. Equipamento

O INAG possui um sistema constituído por uma sonda hidrográfica portátil modelo EA 501P (funcionando com um

transdutor de 200 kHz tipo 200-7-G), da marca SIMRAD e um sistema de posicionamento diferencial (DGPS) para

funcionar em tempo real e com inicialização em movimento (dupla frequência) composto por dois receptores

SR9500 e um sistema de rádio modem, da marca LEICA (Figura 3.1). O transdutor seleccionado está indicado para

detectar profundidades de 0.80 m até aos 600 m em água doce com uma precisão de 1 cm. O sistema GPS adquirido,

permite obter, para medições de fase, precisões na ordem dos 5 a 10 mm + 1 ppm em modo estático e em modo

cinemático - tempo real, valores de 10 mm + 2 ppm, em posicionamento horizontal. A precisão altimétrica é menor

aproximadamente cerca de 2 vezes a planimétrica.

A sincronização entre a sonda e o GPS faz-se através do software de navegação que correlaciona e guarda os dois

tipos de medições (posição e profundidade).

Para a execução dos levantamentos utiliza-se o GPS em modo dinâmico (modo cinemático com inicialização em

movimento – “on the fly”). As medições com este método fornecem a trajectória da unidade móvel, sem a

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necessidade de realizar uma inicialização estática para a resolução de ambiguidades, sendo no entanto determinante

a existência de sinal de rádio entre as duas antenas (referência e móvel).

Para se obter um levantamento com posições precisas (erros de 2, 3 centímetros) é necessário:

• uma constelação de satélites com um número mínimo de 5 satélites, com uma geometria favorável, ou seja,

bem distribuídos relativamente ao utilizador, com valores de GDOP (Geometrical Dilution of Precision)

baixos;

• não ocorrerem perdas de sinal nos primeiros 4 a 5 minutos do movimento, para a resolução de ambiguidades

iniciais;

• que a distância entre receptores (referência e móvel), não seja superior a 10 km.

O software de navegação utilizado é o Hypack® Max. Este software é constituído por vários módulos utilizados nas

fases de planeamento, levantamento e processamento dos dados recolhidos:

• módulo Survey, utilizado para a preparação e execução do levantamento, com o qual se definem as linhas guia

ou fiadas de navegação e se executa o levantamento de acordo com o planeamento de navegação previamente

estabelecido;

• módulo Single Beam Processing, que permite o pós-processamento dos dados recolhidos durante o

levantamento;

• módulo Final Product utiliza os dados processados para obter perfis transversais na área de levantamento, para

determinar o volume entre perfis, para calcular superfícies e para exportar a informação processada. Este

módulo possui apenas um método para cálculo de superfícies - TIN (Triangular Irregular Network).

No levantamento utiliza-se o módulo Survey que aliado ao GPS e à sonda hidrográfica, permite a sua execução

sobre as linhas de navegação definidas durante a fase de preparação. Na fase de pós-processamento utiliza-se o

módulo Single Beam Processing para efectuar um primeiro tratamento da informação recolhida e para exportar os

dados. Neste trabalho, o módulo Final Product não é utilizado uma vez que foi feito um estudo prévio para as

albufeiras em que o cálculo do modelo batimétrico é realizado no SIG, por este dispor de maiores e melhores

capacidades de processamento. Para além disso, é necessário também estimar as superfícies do fundo das massas de

água a partir de informação já existente (cartografia ou levantamentos), não sendo isto possível no Hypack.

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Figura 3.1- Equipamento utilizado nos levantamentos batimétricos.

4. Determinação da Superfície de Cheia

4.1. Levantamento Batimétrico

O levantamento batimétrico, realizado nos dias 20 e 21 de Setembro de 2001, desenvolveu-se segundo linhas de

navegação (fiadas) paralelas às margens distanciadas de cerca de 30 metros entre elas e algumas fiadas transversais

em zonas onde era necessário mais pormenor.

Durante o levantamento batimétrico visualizam-se os perfis (ecogramas) como está ilustrado na

Figura 4.1, procendo-se posteriormente ao processamento dos dados, que tem inicio com a visualização, no Hypack,

dos perfis efectuados eliminando automaticamente os dados que não apresentam um correcto posicionamento ou que

tenham valores anómalos de profundidade. Na Figura 4.2 apresenta-se um exemplo desta fase do processamento no

Hypack. No primeiro gráfico, a azul, é representada a fiada planeada e a navegada, em planta. No segundo gráfico, a

vermelho, apresenta-se o perfil vertical da respectiva fiada navegada. No quadro inferior são listados para todos os

pontos dessa fiada, os valores dos parâmetros recolhidos como sejam: tempo, evento, profundidades obtidas, posição

entre outros.

Execução de levantamento batimétrico Unidade de referência GPS

Sonda hidrográfica e transdutor

Bastão com as antenas (rádio e unidade móvel GPS) e

transdutor

Computadores com software da sonda e navegação

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O software permite eliminar automaticamente valores nulos ou mínimos de profundidade, definidos pelo utilizador.

Como se pode ver no segundo gráfico da Figura 4.2, a detecção e eliminação de valores anómalos de profundidade

é também de fácil execução, onde com um simples “arrastar do rato” são seleccionados os pontos a apagar.

Figura 4.1 - Exemplo de um ecograma (as cores mais escuras correspondem a um sinal mais forte de detecção do

fundo).

Figura 4.2 - Processamento no Hypack.

Provável

Vegetação arbustiva Informação de navegação (hora, dia, coordenadas

Camada Fundo

Perda de sinalem profundidade

Sinal

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Como o Hypack não possui uma rotina que permita eliminar os pontos com igual posição e diferentes

profundidades, denominados por “sondas batidas”, foi desenvolvido um programa em Visual Basic (VB) que

processa os ficheiros provenientes do Hypack. A experiência adquirida após vários levantamentos permitiu

constatar que nem sempre ocorrem “sondas batidas” e que a sua frequência pode ter origem nas diferentes

velocidades de comunicação entre os equipamentos bem como da alteração da configuração dos satélites durante o

levantamento.

No Hypack o novo ficheiro, sem “sondas batidas”, é alvo de uma selecção de pontos distanciados de um raio de 5

metros a partir dos quais é estimada uma superfície batimétrica para detecção de lacunas na informação processada.

Caso estas existam é efectuado novo levantamento somente nesses locais. Seguidamente, os dados de profundidade

são convertidos em cotas considerando a cota de água em cada dia do levantamento, utilizando também um

programa em VB. A informação assim obtida é exportada para o SIG sendo então estimada a superfície batimétrica.

4.2. Modelo Numérico do Terreno

O método de interpolação utilizado para cálculo do modelo numérico do terreno foi o comando TOPOGRID do

Arc/Info e a informação de base utilizada foi a seguinte:

♦ dados do levantamento batimétrico (Figura 4.3);

♦ curvas de nível (linhas) e pontos cotados retirados de cartografia à escala 1:1 000 e 1:2 000.

Deste cálculo resultou uma matriz de cotas com uma resolução de 5 metros conforme se apresenta na Figura 4.4 e

que serve de base para o cálculo da superfície de cheia.

Figura 4.3 – Levantamento batimétrico.

Figura 4.4 – Modelo digital do terreno.

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4.3. Superfícies de cheia

Para o cálculo das superfícies de cheia é necessário conhecer o nível da água no maior número possível de pontos. A

combinação de pares de pontos define planos que constituem a superfície interpolada.

Nas simulações realizadas foram utilizados 15 pontos, deste o Açude da Raiva até ao Açude de Ponte de Coimbra,

onde são conhecidos os níveis para vários caudais. Foi calculada uma superfície de níveis de água, para cada caudal,

que ao ser interceptada com o modelo numérico do terreno revela as zonas inundadas por essa superfície. Para obter

as zonas alagadas (pela cheia) a partir do rio é necessário depois apagar as manchas de água que não são adjacentes

ao rio. Uma das superfícies de cheia calculada para um caudal de 4279 m3/s, encontra-se representada na Figura 4.5.

Figura 4.5 – Extracto da superfície de cheia.

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5. Desenvolvimentos Futuros

Pretende-se aprofundar o estudo desta zona tendo como base a informação já recolhida e processada, a informação

proveniente da estereo-restituição de um levantamento aéreo de 1974, à escala 1:15 000 existente no INAG (Figura

5.1) e a informação de um levantamento batimétrico agendado para este ano. O cruzamento destes dados permitirá

avaliar o equilíbrio dos regimes fluviais deste curso de água e a vulnerabilidade de estruturas e orgãos hidráulicos.

Figura 5.1 – Extracto de uma fotografia aérea do levantamento de 1974 (INAG).