relatÓrio final janeiro/2008 julho/2008 · 2009-09-23 · trabalho, 70% à saúde, 82% à...
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
COORDENAÇÃO DE PESQUISA
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) - CNPq/UFS
Projeto de Pesquisa: Representações sociais dos Direitos Humanos, Privação Relativa e Percepções de Justiça
Social
Área de Concentração: Ciências Humanas/Psicologia Social
Código CNPq: Ciências Humanas 7.07.00.00-1 / Psicologia Social 7.07.05.00-3
Bolsista: Gabriela Cristina Rezende de Campos
Departamento de Psicologia
Matrícula: 07140321
Orientador: Prof. Dr. Marcus Eugênio Oliveira Lima
Departamento de Psicologia
Centro de Educação e Ciências Humanas
RELATÓRIO FINAL
Janeiro/2008 – Julho/2008
Este projeto foi desenvolvido com bolsa de iniciação científica
PICVOL/COPES
São Cristóvão - SE
2008
2
RESUMO
Esta pesquisa entende os direitos humanos como princípios avaliativos ou representações
sociais normativas que permitem organizar e legitimar as relações e interações sociais, e tem
como objetivo analisar as representações sociais dos direitos humanos construídas por
sergipanos. Nosso estudo constituiu-se a partir de um roteiro de entrevista estruturado
aplicado a 381 moradores de 6 cidades representativas das micro-regiões do Estado de
Sergipe (Aracaju 127 entrevistados; Estância 60; Itabaiana 56; Lagarto 60; Nossa Senhora da
Glória 18; e Propriá 60). Quando indagados: “Considerando sua vida de um modo geral, você
considera que vive bem?”, 77% dos sergipanos consideram que vivem bem. Em relação à
percepção de acesso aos direitos humanos, verificamos que 70% consideram ter acesso ao
trabalho, 70% à saúde, 82% à educação, 86% à moradia, 71% à liberdade de expressão, 81% à
liberdade de ir e vir e 70% ao lazer. No entanto, outros 70% dos entrevistados consideram que
não tem acesso à segurança. Destarte, há uma parte da população que percebem que não tem
acesso aos direitos que deveriam ser oferecidos a toda a sociedade, o que denuncia a
necessidade de políticas públicas de ampliação do acesso aos direitos humanos. Observamos
ainda que há efeito significativo da renda familiar no sentimento de “viver bem”. Os
resultados sobre os Direitos Humanos foram discutidos com base nas teorias da representação
social e privação relativa egoística e fraterna.
PALAVRAS-CHAVE: Direitos Humanos, Representações sociais, Privação Relativa.
3
SUMÁRIO
1- INTRODUÇÃO.......................................................................................4
2- REVISÃO DA LITERATURA..................................................................5
2.1-Contexto histórico da constituição dos direitos humanos...........................5
2.2- Um breve histórico sobre as bases filosóficas nas declarações de direitos
humanos..................................................................................................6
2.3-Representação social................................................................................10
3-MÉTODO..............................................................................................................11
3.1- Participantes...................................................................................................11
3.2- Procedimentos e instrumento.........................................................................11
4- RESULTADOS E DISCUSSÃO.........................................................................12
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................18
6- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................20
7- ANEXOS.............................................................................................................22
4
1-INTRODUÇÃO
No sexagésimo aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos
(DUDH) e no contexto político e histórico em que vivemos, no qual se afirma que os Direitos
Humanos estão assegurados; a presente pesquisa vem investigar, como as pessoas se
percebem detentoras de direitos e qual a qualidade dos serviços prestados, que derivam dos
direitos humanos.
De acordo com a constituição brasileira, os Direitos Humanos estão garantidos de
forma igualitária para todos com base no principio da dignidade da pessoa humana. Dentro
dessa concepção estão previstos diversos direitos desde moradia, educação, saúde, lazer até as
conquistas mais recentes dos movimentos sociais, como direito à terra, à liberdade sexual e
de manifestação religiosa.
Nós entendemos os direitos humanos como princípios avaliativos ou
representações sociais normativas que permitem organizar e legitimar as relações e interações
sociais (Doise, 2003). O presente trabalho tem como objetivo analisar as representações
sociais dos direitos humanos dos sergipanos e a percepção de acesso a esses direitos. Analisa-
se ainda o papel que as ancoragens de cor da pele, estrato social, local de moradia, gênero e
identidade nacional têm sobre o modo como os direitos humanos são percebidos e
representados.
O presente relatório explicita, primeiramente, como se deu a constituição dos
Direitos Humanos, seguindo de um breve histórico acerca das bases filosóficas dos Direitos.
Em seguida, traz o embasamento teórico da pesquisa com a teoria das Representações Sociais;
culminando com a apresentação do método da pesquisa e discussão e apresentação dos
resultados.
5
2- REVISÃO DA LITERATURA
2.1-- CONTEXTO HISTÓRICO DA CONSTITUIÇÃO DOS DIREITOS
HUMANOS
A noção de direitos humanos (DH) perpassa várias concepções e diferentes
contextos sociais, que demonstram que os DH tiveram diferentes abordagens no decorrer da
história. Concepções que, muitas vezes, revelam a total ausência de qualquer noção de direito
dos seres humanos. Essas concepções se organizam em duas perspectivas gerais: O
jusnaturalismo e o valorativo.
O jusnaturalismo apregoa que os direitos são direitos inerentes, inatos, naturais da
pessoa humana. Que não dependem de sua classe social ou econômica, ou até mesmo da sua
nacionalidade, são direitos que acompanham o ser vivente desde a sua concepção. Já a
perspectiva valorativa afirma os direitos que as pessoas adquiriram como membros de uma
determinada sociedade nas mais variadas lutas, e constitui um conjunto de valores que
conceituam os Direitos Humanos. (Pallazo, 1998)
Neste contexto é bem verdade, que a evolução dos direitos humanos, processo
intermitente na humanidade, depende do crescimento da consciência coletiva através do
tempo. Emergem do conflito entre os que lutam por uma nova ordem e os que nada querem
mudar. No entanto, há de se constatar que a influência na proteção e promoção dos Direitos
Humanos no decurso da história, está embasada na definição do papel do governante, nos seus
limites de poder, e principalmente na preocupação em estabelecer o direito que cada um
possui. Por isso, sua história não é linear, mas contém grandes avanços e dramáticos
retrocessos. (Pallazo, 1998).
O genocídio vivido pelos judeus na segunda Guerra Mundial, inaugura um tempo
de discussão acerca da dignidade do ser humano. Discussão que culminará na Declaração
Universal dos Direitos Humanos de 1948, que já no seu primeiro artigo evoca os valores de
liberdade e igualdade que estão indissociavelmente ligados à dignidade humana.
No artigo I da DUDH se afirma: “Todas as pessoas nascem livres e iguais em
dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às
outras com espírito de fraternidade”. Como se vê, a declaração traz no seu bojo uma
adequação universal a valores que se propõem unitários, ou seja, a declaração dos direitos
humanos, se propõem a servir como um “norte” de atuação para todas as nações no trato com
os indivíduos, independente da cultura que cada ser humano está inserido. Neste sentido, pode
se dizer que os direitos humanos alcançaram, por obra da integração dos valores da
convivência coletiva, o status de valores fundamentais. Tornaram-se pois parâmetros de
conceber a vida em sociedade, a maneira pela qual os países atuam nas cooperações
internacionais. Daí, a declaração se apresentar como universal e a Assembléia Geral da ONU
proclamar que “A presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como o ideal comum
a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e
cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforcem, através do
ensino e da educação, em promover o respeito a esses direitos e liberdades...”.
Esta maneira de perceber os direitos humanos como ideal comum a ser atingido, é
de fundamental importância para o presente trabalho. Porque dessa forma, os direitos
humanos se elevam à categoria de consciência coletiva. Tornando-se assim de proeminente
relevância para compreender o modo como são representados e percebidos pelas pessoas; e
6
que mecanismos psicossociais fazem com que um grupo se ache mais merecedor de direitos
do que outro.
2.2- UM BREVE HISTÓRICO SOBRE AS BASES FILOSÓFICAS NAS
DECLARAÇÕES DE DIREITOS HUMANOS
No seu segundo e terceiro artigo a DUDH postula que: Artigo II “1.Toda pessoa
tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidas nesta Declaração, sem
distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de
outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.
Não será tampouco feita nenhuma distinção fundada na condição política, jurídica ou
internacional do país ou território a que pertença uma pessoa, quer se trate de um território
independente, sob tutela, sem governo próprio, quer sujeito a qualquer outra limitação de
soberania.”
Artigo III: “Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”. Há
de se ressaltar que aqui são utilizados os três primeiros artigos da Declaração Universal dos
Direitos Humanos, para analisá-la, porque são considerados essenciais na referida Declaração.
Tendo em vista o supracitado nos artigos segundo e terceiro da Declaração, se
torna fundamental analisar os conceitos que, mais uma vez, acompanham os artigos da
Declaração de Direitos Humanos, a saber, a liberdade e a igualdade.
Para alguns autores como Tocqueville (1987), a liberdade se manifesta aos
homens em diferentes tempos e sob diferentes formas, mas foi a igualdade que predominou
sob os diferentes momentos históricos e políticos. Para o autor, o egoísmo que se reveste de
individualismo, é um dos males que acompanha a noção de igualdade nas sociedades. De
forma que cada indivíduo busca na sociedade isolar-se, com seus amigos e familiares, da
massa de seus semelhantes; Procurando criar uma sociedade para o seu uso. De tal maneira,
que a igualdade coloca os homens uns do lado dos outros, sem laço comum que os mantenha,
fazendo com que não se preocupem com os semelhantes, através de uma indiferença que vai e
se torna na sociedade uma virtude pública.
Tocqueville considera, nestas situações, que o homem tem uma necessidade
particular de liberdade e acredita que para combater os males que a igualdade pode produzir,
só há um remédio eficaz, que é a liberdade política. Entretanto, acredito que o autor equivale à
noção de igualdade à de uniformidade, ao colocar intimamente relacionado o processo de
igualdade com o individualismo.
Pensamos que o referido autor faz uma crítica muito pertinente em relação ao fato
de que na evolução histórica da humanidade se observa uma incompatibilidade, no mínimo
desde a Revolução Francesa, entre a liberdade e a igualdade. Estes conceitos referem,
respectivamente, a possibilidade de cada indivíduo ter acesso a todos os seus direitos
igualmente e de escolhê-los segundo o seu livre arbítrio; Já aparecem na Declaração Universal
dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, Declaração que ao afirmar que cada indivíduo
nasce livre e igual, ratifica direitos humanos e ao fazê-lo, inaugura um novo conceito que terá
o seu cume na Declaração de 1948 com a ratificação jurídica da dignidade do ser humano.
Significando que o surgimento da liberdade e da igualdade em dignidade e direitos
acompanha o ser humano desde o nascimento de modo inseparável e incondicional, no
decorrer de sua vida. Não dependendo, em absoluto, de qualquer outro título ou condição.
(Bitar & Almeida, 2007).
Na Carta da ONU de 1948 são perceptíveis as idéias de liberdade, igualdade,
dignidade, e valor da pessoa humana, que visam “favorecer o progresso social e instaurar
7
melhores condições de vida dentro de uma liberdade mais ampla” (ONU, 1948). Na Carta de
1948, encontramos uma vinculação a Declaração dos direitos do Homem e do Cidadão de
1789, desse modo a declaração de 1948 também traz características trazidas do período
revolucionário francês e do iluminismo europeu (Maurice, 1979).
Ambas as declarações supracitadas, em sua construção expressam o dissabor para
com a violação contra os direitos do homem. Tais direitos seriam “inalienáveis e sagrados do
Homem” (documento online) na declaração da França Revolucionária, ou “direitos iguais e
inalienáveis” que constituem, juntamente com “o reconhecimento da dignidade inerente a
todos os membros da família humana”, “o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no
mundo” (ONU, 1948).
De acordo com Norberto Bobbio (1997) devemos defender e promover,
respectivamente, a manutenção e a aplicação dos direitos humanos, todavia devamos atentar
para a sua fundamentação. Esta afirmação é colocada por Bobbio em virtude de este ser o
momento de consolidação dos direitos humanos; ainda segundo Bobbio, devemos considerar
tais direitos contidos na história, e se adequando como todo direito às condições históricas do
tempo em que se aplicam. Isto impossibilita a alegação dos direitos humanos como direitos
naturais, tal como pregam os jusnaturalistas (Bobbio, 1997).
A Declaração de 1789 é de relevante importância porque não só inaugura o
conceito de dignidade, mas também faz surgir a figura do cidadão (aquele que tem direito a
ter direitos). Como nos mostra Bittar e Almeida (2007), baseados na obra de Hannah Arendt,
antes do surgimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH), a única condição
para o exercício da cidadania estava embasada na nacionalidade, que segundo a Corte
Internacional de Justiça “um vínculo legal que tem sua base no fato social do enraizamento,
uma conexão genuína de existência, interesses e sentimentos, junto com a existência de
direitos e deveres recíprocos”. Mas após o sistema do DIDH, a condição necessária para o ser
humano como sujeito detentor de direitos é simplesmente a sua existência como ser humano.
Por cidadania, Bottomore (1996) entende a condição de membro de um Estado
nação (cidadania formal), como também, um conjunto de leis referente ao corpo civil,
cidadania substantiva. Juntamente com Hobsbawn (2004), podemos dizer que a cidadania é
correlata ao nascimento do Estado-Nação liberal, com suas sistematizações burocráticas dos
diversos setores da sociedade (o código de leis mais abrangente e sistemático, um código
lingüístico, um estatuto de pertença ao Estado nação, etc.).
Essa cidadania é uma categoria de pensamento composta pela conjunção dos
direitos civis, políticos e sociais surgidos e apreendidos em meados do séc. XVIII a séc.XX, e
que se consagra por manter um contra-poder aos direitos do cidadão em prática e possibilitar
conquistas sociais aos diversos componentes do espaço social (Marshall apud De Carvalho,
2004).
Esta forma de conceber a cidadania na sociedade moderna traz conseqüências que
perpassam a maneira de atuação e as possibilidades de atuação das pessoas nas relações de
poder que se estabeleceram no desenrolar da história. Alguns autores nos mostram como o
processo de estabelecimento desta concepção de cidadania influencia estas relações, como por
exemplo, “Para Rousseau, a vontade geral tem de ser construída com a participação efetiva
dos cidadãos, de modo autônomo e solidário, sem delegações que retirem transparência entre
“soberania” e “governo”. Por esta razão, o contrato social assenta não numa obrigação política
vertical cidadão estado, como sucede no modelo liberal, mas antes numa obrigação política
horizontal cidadão-cidadão na base da qual é possível fundar uma associação política
participativa. “(Santos 2003).
Há de notar também, como bem coloca Boaventura Souza Santos que “ao
consistir em direitos e deveres, a cidadania enriquece a subjetividade e lhe abre novos
horizontes de auto-realização, mas, por outro lado, ao fazê-lo por via de direitos e deveres
8
gerais e abstratos que reduzem a individualidade ao que nela há de universal, transforma os
sujeitos em unidades iguais e intercambiáveis no interior de administrações públicas e
burocráticas, receptáculos passivos de estratégias de produção, enquanto força de trabalho, de
estratégias de consumo, enquanto consumidores, e de estratégias de dominação, enquanto
cidadãos da democracia de massas. A igualdade da cidadania colide, assim, com a diferença
de subjetividade, tanto mais que no marco da regulação liberal essa igualdade é
profundamente seletiva e deixa intocadas diferenças, sobretudo as da propriedade, mas
também as da raça e do sexo que mais tarde vão ser os objetos centrais das lutas igualitárias”
(Santos, 2003, pp. 240).
É importante ressaltar que, apesar do ser humano ser, como cidadão, detentor de
direitos; Não significa que ele terá acesso a eles. Essa situação é muito bem exemplificada nas
diversas situações de calamidade em que vivem várias pessoas nos diversos países. Os pactos
que se realizaram em 1966, a saber: O Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e o
Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, que junto com a Declaração
Universal dos Direitos Humanos formam o documento base do DIDH; Já demonstram a
grande dificuldade de se estabelecer acordos internacionais sobre direitos humanos. Os pactos
começaram a ser elaborados em 1949 e só entraram em vigor vinte e seis anos depois, devido
aos entraves gerados pelos países participantes. As conferências mundiais sobre direitos
humanos, Teerã (1968) e Viena (1993), são uma tentativa de reavivar e implementar o que
fora proposto na declaração de 1948.
Assim, em meio há grandes avanços e dramáticos retrocessos, se vislumbra no
cenário político atual, novas perspectivas de conciliação e execução de fatores abordados na
Declaração Universal e nas Conferências Internacionais de Direitos Humanos.
2.3- REPRESENTAÇÃO SOCIAL
Mas afinal, como os direitos são percebidos e representados pelas pessoas e que
mecanismos psicossociais fazem com que um grupo se ache mais merecedor de direitos do
que outro? Na perspectiva adotada nesta pesquisa, os direitos humanos são definidos como
princípios avaliativos ou representações sociais normativas que permitem aos seres humanos
organizarem e legitimarem suas relações sociais (Doise, 2003). “A teoria psicossocial da
Privação Relativa (TPR) ajuda a pensar o complexo emaranhado de sentimentos e práticas
sociais advindos do descompasso existente entre aquilo que achamos sermos merecedores de
receber (i.e., nossos direitos) e aquilo que de fato recebemos” (Lima, 2007). Assim, “a
Privação é uma resposta avaliativa, cognitiva e emocional de um indivíduo que acredita que
os recursos por ele (a) recebidos, não são compatíveis com o que o é percebido como justo
receber (ver Dar e Resh, 2001; Lima & Vala, 2003). A TPR tem se mostrado relevante para a
análise de fenômenos sociais, como: sentimentos de bem-estar pessoal e mobilização em
movimentos sociais. Que são de grande relevância para entendermos as representações sociais
dos sergipanos acerca de seus direitos. A PR se subdivide em duas: A Privação Relativa
Egoísta que resulta das comparações feitas entre os indivíduos do mesmo grupo e que se
referem há um nível interpessoal e a Privação Relativa Fraterna que se refere às comparações
feitas entre um grupo de pertença do indivíduo e outros grupos socialmente relevantes.
Conceitos estes, que são constructos teóricos fundamentais para análise dos dados coletados.
E a fim de verificarmos os níveis de privação relativa intragrupal ou egoísta dos inquiridos,
indagamos sobre quanto as suas famílias dão à sociedade brasileira, em termos de trabalho,
impostos, etc., e sobre o quanto recebem desta mesma sociedade em troca através de serviços,
bem-estar social, etc.
9
Já a teoria das representações sociais que embasam teoricamente a constituição
deste trabalho, é aqui tomada como o constructo teórico que se encontra presente na
psicologia social, que foi criado por Moscovici, e que no momento possui uma grande
relevância para as ciências sociais, sendo um dos conceitos mais abordados teoricamente nos
últimos tempos e que tem servido como alicerce teórico para uma gama muita variada de
trabalhos científicos.
“As representações sociais são as formas pelas quais o senso comum expressa seu
pensamento (Jodelet, 1993, Moscovici, 1976), sendo formadas a partir de dois processos, a
objetivação e a ancoragem, os quais estão ligados e não são seqüenciais. O primeiro seria o
modo como os elementos formadores das representações se organizam e também adquirem
materialidade. Este processo envolve três momentos: a construção seletiva, cujas informações
acerca do objeto são selecionadas e descontextualizadas; a esquematização, a qual seria a
organização dos elementos (esquematização estruturante); e a naturalização, etapa em que os
conceitos e as idéias adquirem materialidade e se tornam categorias sociais, vistas também
como classificações naturais. Com isso o abstrato se torna concreto e a percepção se torna
realidade. Já o conceito de ancoragem descreve os processos através dos quais o não familiar
se torna familiar e como uma representação uma vez constituída tornar-se-á um organizador
das representações sociais. A ancoragem provoca transformações nas representações já
constituídas, ou seja, ela reduz o novo ao velho e reelabora o velho para torná-lo novo. No
nível de análise psicossociológico da ancoragem são citados três tipos de sistemas de
comunicação: a propagação, modalidade de comunicação na qual as mensagens produzidas
por um grupo remetem-se ao próprio grupo tendo como finalidade adequar algo novo,
informação ou problema, ao sistema de valores do grupo; a difusão, que visa a uma
pluralidade de públicos e no qual as mensagens sobre um objeto são organizadas ignorando-se
as diferenciações sociais; a propaganda, neste sistema os objetos são representados de acordo
com as diferenciações sociais, contribuindo para afirmação da identidade de um grupo em
detrimento de outro, ao qual são atribuídas características negativas. (Moscovici 1961 apud
Vala, 2004).
As representações sociais não se tratam de respostas que um indivíduo emite em
relação a um estímulo do meio social, como afirmavam os modelos de outrora, (Farr, 1995),
baseados no esquema estímulo, organismo, resposta (S-O-R), nos quais as representações
eram apenas variáveis mediadoras entre o estímulo e a resposta; Mais sim, das maneiras como
os grupos sociais constroem e organizam os diferentes significados dos estímulos do meio
social e as possibilidades de respostas que podem acompanhar esses estímulos” (Pereira,
Torres e Almeida, 2003, p.4). Neste modelo, baseado no esquema organismo, estímulo,
organismo, resposta (O-S-O-R), proposto pela psicologia cognitiva, as representações sociais
não seriam apenas variáveis mediadoras, mas sim fatores constituintes do estímulo e
modeladores das respostas, portanto produtor da realidade. Assim, quando uma representação
social é constituída os indivíduos procuram adequar suas experiências e suas idéias às
explicações conseqüentes dessas representações (Markus e Zajonc, 1985 apud Vala, 2004).
“O conceito de representação social designa uma forma de conhecimento específico como o
saber do senso comum, cujos conteúdos manifestam a operação de processos generativos e
funcionais socialmente caracterizados. Num sentido mais amplo, designa uma forma de
pensamento social (Jodelet, 1986). Assim Jodelet proporcionou uma definição sintética do
conceito, sobre a qual parece existir hoje um amplo acordo dentro da comunidade de
estudiosos. (Souza, Roza e cols., 1998). Que consideram representações sociais como “... uma
forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada (...) modalidades de pensamento
prático orientadas para a comunicação, a compreensão e o domínio da vida social, material e
ideal (Jodelet, 1986, p.474 apud Souza, Roza e cols., 1998, p.4) ” .
10
Assim, para entendermos como as construções simbólicas interferem nos aspectos
mais concretos das relações sociais torna-se necessário analisar as ancoragens e objetivações
das representações dos direitos humanos e o papel mediador do sentimento de privação
relativa em grupos sociais com diferentes níveis de acolhimento por esses direitos. (Lima &
Vala, 2003).
3- MÉTODO
11
3.1-Participantes
Nosso estudo constituiu-se a partir de um roteiro de entrevista estruturado
aplicado a 381 moradores de 6 cidades representativas das micro-regiões do Estado de
Sergipe (Aracaju 127 entrevistados; Estância 60; Itabaiana 56; Lagarto 60; Nossa Senhora da
Glória 18; e Propriá 60). Essa amostra é representativa da população de Sergipe a uma
margem de erro de 5%. Os entrevistados são, em sua maioria, mulheres (54,6%) com idades
variando de 18 a 82 anos (média de 33 anos) e renda entre R$ 60,00 e R$ 10.000,00 (média
R$ 1.679,00, desvio padrão 1610,60).
As entrevistas foram individuais e as escolhas dos participantes foram feitas
aleatoriamente. Os entrevistados foram abordados nas ruas ou em suas casas e, após serem
apresentados à pesquisa através do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (ver anexos),
eram convidados a participar. As informações apresentadas diziam respeito ao caráter da
pesquisa e à livre escolha dos participantes no processo, assim como a garantia de anonimato
na análise dos resultados.
O roteiro da entrevista foi composto de perguntas abertas e fechadas sobre direitos
humanos e privação relativa.
3.2- Procedimentos e Instrumento
Nas entrevistas utilizamos um roteiro estruturado com blocos temáticos
envolvendo: a) conhecimento sobre direitos humanos, b) avaliações do acesso a esses direitos,
c) importância atribuída a esses direitos, d) sentimentos de privação relativa interpessoal e
intergrupal, seja no nível da distribuição dos recursos materiais e simbólicos, seja ao nível do
tratamento institucional recebido pelos cidadãos (privação relativa procedimental), e)
indicadores de identidade social, f) indicadores de participação política e inserção em redes
sociais e g) dados sociais e demográficos. Utilizando perguntas abertas e fechadas, que
envolvem questões de associação livre, indagações acerca da percepção dos direitos humanos,
sobre a privação relativa e seu ativismo político.
12
4- RESULTADOS E DISCUSSÃO
A questão acerca da percepção de acesso aos direitos humanos, revela que de
maneira geral, à população sergipana considera que tem acesso à maioria dos direitos que
devem lhes ser assegurados segundo a constituição brasileira. A questão revelou ainda, no
tocante aos direitos considerados nos questionários aplicados, que: Em torno de 70% da
população sergipana considera ter acesso à saúde, com certa variância de Lagarto e Itabaiana
(cidades representativas das micro-regiões administrativas do estado) onde aproximadamente
45% dos moradores consideram que não tem acesso à saúde. A maioria das cidades
representativas das micro-regiões do estado não apresentaram dissonância relevante quanto ao
dado geral. Em volta de 80% da população de Sergipe considera ter acesso à educação, não
distanciando significativamente nenhuma das micro-regiões do estado. Aproximadamente
84% consideram que tem acesso à moradia; 67% dos entrevistados consideram que tem
acesso ao trabalho, aqui não foi considerado trabalho simplesmente como trabalho formal,
emprego. E sim, trabalho como um meio de obtenção das condições necessárias para se viver.
Cerca de 74% consideram que tem liberdade sexual e 73% afirmam ter liberdade de
expressão. Há de se ressaltar que durante as entrevistas, em todas as regiões do estado, houve
uma confusão por parte das pessoas que muitas vezes confundiam liberdade sexual, direito a
dispor da sua sexualidade sem impedimento, com libertinagem sexual, que são posturas
“desviantes” em relação à sexualidade. Em torno de 76% dos entrevistados consideram ter
acesso ao lazer e aproximadamente 79% afirmam ter liberdade de ir e vir.
Destoam dos dados gerais as respostas sobre o direito à segurança. Nesta, cerca de
68% das pessoas consideram que não tem acesso a esse direito na referida sociedade, com
exceção de Glória, que 44% das pessoas entrevistadas consideram que não tem acesso a
segurança. Há de se contextualizar que durante o período em que os questionários estavam
sendo aplicados, a população de Sergipe vivia um momento de determinado pavor
psicológico, devido a grande repercussão midiática do “caso Pipita”, em que dois jovens
seqüestraram duas adolescentes e aterrorizavam a população aonde chegavam; E ainda a
grande repercussão, a nível nacional, do “caso Isabela Nardoni”, quando uma criança foi
atirada pela janela de um prédio, estes com ocorrência a época de aplicação dos questionários.
Há de se observar ainda, que esses “casos” que repercutiram muito na mídia local e nacional,
respectivamente, influenciaram a percepção de acesso à segurança, mas não indicam, no
nosso entendimento, que a percepção de insegurança é um fato sazonal. A todo o momento se
tem observado na mídia local e principalmente na mídia nacional, à repercussão de casos que
têm chocado a população brasileira; O que nos leva a constatar que a população da maioria
das cidades representativas das micro-regiões do estado vivenciam no momento atual uma
sensação de insegurança. Sendo este o direito acerca do qual se consideram mais excluídos.
Esclarecemos que a indagação dessa questão se referia aos direitos obtidos através
da esfera pública ou possibilitados pela mesma, só que muitas pessoas confundiam a sua
obtenção através da esfera privada. Apesar de ser esclarecido pelo entrevistador quando se
percebia ou se evocava a dúvida (ver anexos, indagação da questão quatro).
Observe na tabela abaixo, que cada item (saúde, educação, moradia, etc.) foi
analisado em relação ao total de entrevistas. À exemplo, do total de 381 entrevistados 111
afirmam não possuir, ou melhor, não ter acesso à saúde e 270 dizem possuir, ter acesso a esse
direito.
13
Tabela 1. Frequência das respostas à questão: “Da lista de direitos abaixo, identifique
aqueles que você como cidadão brasileiro tem acesso?”
Itens Frequência Percentual Válido%
Saúde Não possui 111 29,1
Possui 270 70,9
Educação Não possui 75 19,7
Possui 306 80,3
Moradia Não possui 60 15,7
Possui 320 84,0
Segurança Não possui 261 68,5
Possui 120 31,5
Trabalho Não possui 125 32,8
Possui 256 67,2
Liberdade sexual Não possui 99 26,0
Possui 282 74,0
Liberdade de expressão Não possui 103 27,0
Possui 278 73,0
Lazer Não possui 90 23,6
Possui 291 76,4
Liberdade de ir e vir Não possui 80 21,0
Possui 301 79.0
Quando as pessoas eram indagadas “Considerando sua vida de um modo geral,
você considera que vive bem?”, se observou que aproximadamente 77% da população
sergipana considera que vive bem, não se observando, de maneira geral, nenhuma diferença
significativa nas micro-regiões representativas do estado (Aracaju, Itabaiana, Estância, Nossa
Senhora da Glória, Lagarto e Propriá). Também se observou que há correlação significativa
entre a renda familiar e o sentimento de viver bem, ou seja, quanto mais se ganha
financeiramente mais as pessoas consideram que vivem bem. E observou-se também, que não
há diferença relevante entre as pessoas que se consideram brancas e pessoas que consideram
que tiveram alguma descendência afro, como: negros, mulatos, morenos,etc.
O que se constatou é que a maioria da população sergipana considera que tem
acesso aos direitos humanos, fator decisivo para a percepção da forma de viver bem; Destarte,
quando perguntados “pense na renda mensal de sua família. Essa renda é suficiente para vocês
viverem bem?”, mais de 50% das pessoas (50,3%) consideram que a renda mensal que
adquirem não é suficiente para obterem o que necessitam para viverem bem. Daí depreende-
se, que a maioria da população sergipana considera que vive bem, não pelas condições
socioeconômicas que possuem. Mas por outros fatores psicossociais que compõem a
representação do sentimento de viver bem dessa população. O que se percebe analisando a
questão seguinte, em que se perguntava “o que é viver bem na sua opinião?” é que muitas
pessoas associam o sentimento de viver bem com “viver tranquilo com a família”, “estar perto
de quem gosta”, “viver em paz consigo e com Deus”, “não ter problemas com a justiça”, etc..
Mas por outro lado, o que se leva a crer, é que muitas dessas representações são congruentes
com as formas de conformação e sobrepujadas por estas mesmas. Entende-se como forma de
conformação aqui, aquilo que apareceu na fala de muitos dos entrevistados quando
perguntados se viviam bem ou se a renda era suficiente para se viver bem, a saber: Que não
viviam muito bem, mas quando se comparavam com outras pessoas, geralmente em situação
14
pior, consideravam, sim, que viviam bem. Assim, a maioria das pessoas, geralmente, toma
como parâmetro para o sentimento de viver bem, as pessoas que há cercam; Ou seja, se
conforma, muitas vezes, comparando-se com o contexto de desigualdade social ou com a
situação de pobreza (carência econômica) em que vive a maior parte da população brasileira.
O que leva a concluir que as pessoas procuram mecanismos psicossociais que amenizam e
positivam a sua maneira de viver. (A tabela seguinte refere-se à questão 12).
Tabela 2. Frequência de respostas à questão: “Considerando sua vida de um modo
geral, você considera que vive bem?”
Cidade Sim Não Total
Aracaju 81 15 96
Estância 48 7 55
Itabaiana 43 13 56
Lagarto 37 23 60
Glória 12 4 16
Propriá 48 12 60
Total 269 74 343
Quando perguntados “Você acha que no Brasil alguns têm mais acesso aos
direitos que outros?” As repostas não apresentaram surpresas já que aproximadamente 92%
da população sergipana considera que na sociedade brasileira alguns têm mais direitos que
outros; Quando se respondia “sim”, eram indagados sobre quem tem mais acesso aos direitos
e quem tem menos. As respostas mais freqüentes daqueles que opinaram, como havia de se
esperar, é que os ricos com aproximadamente 67% e os que estão no poder ( políticos) com
aproximadamente 15% são os que tem mais direitos. Os pobres e a classe baixa com 75% são
considerados os que têm menos acesso aos direitos. Como também era de se esperar, 89%
consideram essa situação injusta. E quando questionados “você acha que essa situação pode
mudar ou se alterar?”, aproximadamente 50% das pessoas consideram que essa situação, em
que uns têm mais acesso aos direitos que outros, não vai mudar nunca. O que demonstra que
uma boa parte da população desacredita nesta mudança. E revela um dado importante sobre a
maneira das pessoas identificarem as suas expectativas a cerca do país e suas possíveis
maneiras de agir para adquirir os direitos que lhes são asseguradas pela constituição brasileira.
Tabela 3. Frequência de respostas à questão: “Você acha que no Brasil alguns têm mais
acesso aos Direitos que outros?”
Frequência Porcentagem
Sim 323 92,3
Não 26 7,4
Não respondeu 1 0,3
Total 350 100,0
15
Tabela 4. Frequência de respostas à questão: “Você acha que está situação é justa?”
Frequência Porcentagem
Sim 12 3,4
Não 310 88,6
Não respondeu 28 8,0
Total 350 100,0
Tabela 5. Frequência de respostas à questão: “Você acha que essa situação pode mudar
ou se alterar?”
Frequência Porcentagem
Sim 176 50,3
Não 138 39,4
Não responderam 36 10,3
Total 350 100,0
Ao serem interrogados sobre o que vem a ser direitos humanos, “Para você, o que
são direitos humanos”, a maioria dos entrevistados 22,5% respondeu que não sabe o que são
direitos humanos, fato interessante visto que a maioria deles diz ter acesso aos mesmos,
porém não sabem definir o que são esses direitos. Em seguida com 10,2% ficaram as
respostas cujos entrevistados definiram direitos humanos como sendo, igualdade, justiça,
democracia, dar direito a quem não tem, igualdade sócio-econômica. Também com a
mesma porcentagem de 10,2% ficaram as seguintes respostas: liberdade, viver em paz, fazer
o que gosta, direito de ir e vir, liberdade de expressão. Outra resposta interessante e que
ficou em quarto lugar com 8,6% foi: respeito ao próximo, ser respeitado, não passar por
cima dos outros, saber conviver com as diferenças, valores. Já 7,5% dos entrevistados
definem direitos humanos como ter condições sociais: saúde, assistência, estudo, emprego,
trabalho, moradia, alimentação, segurança, transporte. Cerca de 6% da população sergipana
considera que direitos humanos seriam o necessário pra viver (o essencial, que precisamos
para ter uma vida social normal). Vejamos o restante das respostas na tabela abaixo:
16
Tabela 6. Definição de direitos humanos segundo os entrevistados. Frequência Porcentagem Percentual
Válido
Direitos que devemos ter / Inerentes ao ser humano (devem ser assegurados)
8 2,1 2,1
Igualdade / Justiça (democracia, dar direito a quem não tem, igualdade sócio-econômica)
39 10,2 10,2
Condições sociais: saúde, assistência, estudo, emprego, trabalho, moradia, alimentação, segurança, transporte, etc.
28 7,3 7,3
Não sei 86 22,5 22,6
Respeito ao próximo / Ser respeitado (não passar por cima dos outros, saber conviver com as diferenças); Valores
33 8,6 8,6
Liberdade / Viver em paz (fazer o que gosta, direito de ir e vir, liberdade de expressão)
39 10,2 10,2
Bem-estar / vida boa (aquilo que é bom para o ser humano)
11 2,9 2,9
Direitos preservados pela lei/pelo governo (direitos legais)
11 2,9 2,9
Honestidade (não cometer nada de errado, ser direito); Regras sociais que as pessoas devem seguir (forma certa, deveres que temos, limitações que temos)
15 3,9 3,9
Tudo o que o ser humano tem acesso (os direitos que temos, o que cada um de nós tem, ter os direitos na prática)
14 3,7 3,7
Valores 9 2,4 2,4
Não responde / não categorizável. Tautológica 13 3,4 3,4 Direito que leva à cidadania (proteção ao cidadão, direitos que temos como cidadãos, ser reconhecido na sociedade)
17 4,5 4,5
Uma coisa que não funciona / não existe (está escasso, está escrito no papel mas não existe, utopia, ilusão, leis que não surtem efeito)
9 2,4 2,4
Direito à vida / Respeito à vida 5 1,3 1,3
Direito que favorece a malandragem (solta bandido) 1 3 3
Direito de reivindicar (de poder reclamar, saber se defender, exercer a cidadania, tudo que podemos conquistar)
12 3,1 3,1
O necessário para viver (o essencial, o que precisamos para ter uma vida social normal)
22 5,8 5,8
Dignidade (vida digna) 9 2,4 2,4
Ao serem interrogados sobre “Dentre os direitos que disse não ter acesso, quais
lhe incomoda mais não possuir ou o que queria mais ter e não tem?”, pergunta de número 7 no
questionário, a maior parte dos entrevistados respondeu que a segurança (item 4) é o direito
que mais incomoda não ter, essa resposta pode ter decorrido do fato de a mídia expor quase
todos os dias casos que envolvem violência e podem gerar medo e insegurança nas pessoas.
Lembrando que na época de aplicação dos questionários a sociedade sergipana assistia aos
dois casos, já acima citados, Pipita (a nível regional) e Isabela Nardoni (a nível nacional), que
chocaram a referida sociedade. Então a exposição sensacionalista desses dois casos por parte
da mídia, pode ter influenciado nas respostas dos entrevistados; Em segundo lugar ficou a
saúde citada por 50 (13,1%) entrevistados. Esta resposta pode ter sido citada em virtude da
carência e precariedade do atendimento em postos de saúde e hospitais, sendo que em Sergipe
só existe um único hospital público, Hospital João Alves Filho, o qual atende pacientes não só
da capital e interior do estado, mas também pessoas de outros estados como Bahia e Alagoas,
17
provocando superlotação no mesmo. Em terceiro ficou trabalho citado por 45 pessoas
(11,8%). É interessante analisar nessa questão que apesar de poucas pessoas terem reclamado
não ter acesso à moradia (2,4%) e à educação (1,8%), na prática exista ensino de qualidade
para todos ou boas condições de moradia. As respostas dadas nesta questão podem ser
compreendidas dentro do contexto das representações sociais, como afirma Vala (2004,
pag.481): “Entendendo as representações sociais como teorias práticas sobre objetos sociais
particulares, mostramos como, enquanto teorias, elas envolvem uma dimensão de explicação
e argumentação. Ora, quando os indivíduos se questionam sobre fenômenos sociais como a
pobreza, o desemprego, a saúde, a violência ou o insucesso escolar, acionam as teorias que
coletivamente construíram sobre estes mesmos fenômenos, e é no quadro dessas teorias que
procuram e estruturam as explicações.” Vejamos abaixo a tabela referente a questão 7:
Tabela 7: Frequência de respostas à questão: “Dentre os direitos que disse não ter
acesso, quais lhe incomoda mais não possuir ou o que queria mais ter e não tem?”,
Frequência Porcentagem Percentual Válido
Saúde 50 13,1 15,9
Educação 7 1,8 2,2
Moradia 9 2,4 2,9
Segurança 167 43,7 53,0
Trabalho 45 11,8 14,3
Liberdade sexual 5 1,3 1,6
Liberdade de expressão 13 3,4 4,1
Lazer 10 2,6 3,2
Liberdade de ir e vir 7 1,8 2,2
Outros 2 5 6
Não responderam 67 17,5
Total 382 100
18
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em relação ao objetivo da pesquisa de analisar as representações sociais dos
direitos humanos dos sergipanos e a percepção de acesso a esses direitos, pode-se verificar
que estes últimos são considerados acessíveis, visto que os participantes se consideram
detentores de direitos, embora outros afirmem não possuí-los. Talvez o fato de ter acesso aos
direitos, mesmo que de forma precária, já seja suficiente para os entrevistados terem alegado
possuí-los.
Os resultados mostram que, de maneira geral, a população sergipana afirma ter
acesso à maioria dos direitos, saúde, educação, moradia, trabalho entre outros, os quais
segundo a constituição brasileira lhes deveriam ser assegurados, além de afirmarem viver
bem. Porém os resultados referentes ao item segurança diferem dos demais, visto que boa
parcela dos entrevistados diz não ter acesso ao mesmo. Ao comparar o fato de as pessoas
afirmarem ter acesso aos direitos, questão acima referida, com o fato de as mesmas não
saberem definir o que são direitos humanos, resultado de outra questão da pesquisa, se
observa algo interessante, visto que os entrevistados afirmam ter acesso a algo (no caso os
direitos humanos), porém não conseguem definir os mesmos. A partir disso pode-se pensar
como eles reivindicaram esses direitos se não sabem o que são estes.
Ainda de acordo com os dados, se verifica que a população sergipana considera
injusta a situação de uns (segundo os participantes da pesquisa os ricos e os políticos) terem
mais acesso aos direitos que outros (os pobres). Aqui se observa a constante disputa de classes
na sociedade brasileira entre ricos e pobres, principalmente pelo fato de no nosso país a
concentração de renda ser alta, ou seja, uma minoria detém a maior parte das riquezas e tem
mais acesso aos direitos, enquanto que uma maioria fica com o restante das mesmas, além de
acesso aos direitos de forma precária. Sabe-se que as pessoas de condições sócio-econômicas
mais elevadas, no geral, têm acesso a bons planos de saúde e hospitais particulares bem
equipados, não enfrentando a superlotação de muitos hospitais públicos; em relação à
educação, geralmente estudam na rede particular e sabe-se que no Brasil o ensino público
encontra-se defasado; e em relação às moradias, estas são dignas. Tudo isso contrasta com a
situação dos menos favorecidos, ou melhor, pobres. As afirmações feitas pelos entrevistados,
de que os ricos e políticos têm mais acesso aos direitos que os pobres podem ser explicadas
através das comparações intergrupais. Segundo Tajfel (1983), “Um grupo só existe em
relação a outro grupo.” Apesar da maioria da população sergipana se considerar detentora dos Direitos
humanos é de grande relevância se observar que de acordo com os dados, se percebe que
muitas pessoas consideram que não tem acesso aos direitos que deveriam lhes ser
assegurados. Consideramos muitas pessoas, apesar da maioria dos direitos serem percebidos
como acessíveis a maior parte dos entrevistados, porque a percepção de acesso aos direitos
não significa exatamente a sua obtenção. O que revela uma considerável falta de acesso aos
direitos básicos por uma boa parcela da população. O que denuncia a necessidade de políticas
públicas de ampliação do acesso aos direitos humanos.
É válido ressaltar que dentre os direitos citados grande parte dos entrevistados
reclama não ter acesso a segurança. Isso pode dever-se não só a exposição de casos de
violência por parte da mídia (local e nacional), como também ao aumento no número de
crimes (assaltos, furtos, assassinatos, etc.) tanto na capital (Aracaju) quanto nos outros
municípios do estado de Sergipe onde a pesquisa foi realizada. Em relação à educação,
observa-se que a maioria dos entrevistados diz ter acesso a esse direito, sendo poucos os que
19
reclamaram não ter acesso ao mesmo, o que não significa haver ensino de qualidade para
todos. Outro exemplo é o fato de pouquíssimos entrevistados reclamarem o acesso à moradia,
ou seja, a maior parte deles afirma possuir esse direito, mas não se sabe na prática se as
moradias dos mesmos são realmente adequadas e de boa qualidade, isto é, muitos podem ter
acesso aos direitos, porém de forma precária. Em suma a pesquisa permitiu compreender
como a população sergipana entende os direitos humanos e como percebe o acesso a estes.
.
20
6- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Bobbio, N (1997). A era dos direitos. Ed. Campus, SP
Bittar, Eduardo C. B. e Almeida, Guilherme Assis (2007). Curso de Filosofia do Direito.Ed.
Atlas, SP
Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia (1998).
Psicologia, Ética e Direitos Humanos. Câmara Brasileira do Livro, SP
Declaração Universal dos Direitos Humanos. In: www.un.org
De Carvalho, J, M. (2004). A cidadania no Brasil. Ed. Civilização brasileira
Doise, W (2003). Human Rights : Common Meaning and Differences in Positioning. In:
Psicologia: Teoria e Pesquisa, vol.19 n.3, pp.201210. Disponível em:
www.scielo.com.br/scielo.php
Doise, W (2002). Da Psicologia Social à Psicologia Societal. In: Psicologia: Teoria e
Pesquisa, vol.18 n.1, pp.027035. Disponível em: www.scielo.com.br/scielo.php
Hobsbawn, E. (2004). Nações e Nacionalismo desde 1780. ed. Paz e terra. São Paulo,SP
Maurice, C (1979). O que são direitos humanos? Ed. Difel, SP
Lima, M.E.O., & Vala, J. (2003). Posições sociais e percepções de justiça In: J. Vala (Org.),
Simetrias e Identidades de Jovens Negros em Portugal, p. 51-76. Oeiras: Celta.
Ortiz, R (2007). Anotações sobre o universal e a diversidade. In: Revista Brasileira de
Educação, vol.12 n.34 pp.07016. Disponível em: www.scielo.com.br/scielo.php
Lima, M.E.O. (2007). Representações sociais dos Direitos Humanos, Privação Relativa e Percepções
de Justiça Social. Projeto financiado pelo Edital 03/2007 da FAPITEC.
Outhwaite e Bottomore (1996). Dicionário do pensamento social do séc. XX. Jorge Zahar
Editor. Rio de Janeiro
Pereira, C., Torres, A.R.R., Almeida, S.T. (2003). Um estudo do preconceito na
perspectiva das representações sociais: análise da influência de um discurso
justificador da discriminação no preconceito racial. In: Psicologia: Reflexão e
Crítica, Vol. 16 n.1, pp. 101590. Dísponível em: www.scielo.br/ scielo.php
Santos, Boaventura de Sousa (2003). Pela Mão de Alice o social e o Político na Pós
Modernidade. Ed. Cortez, SP
Souza, de L., Rosa, L. I. da.( 1998). Direitos Humanos e representação de justiça.
In: Psicologia: Reflexão e Crítica, Vol. 11 n.3, pp. 101590. Dísponível em:
www.scielo.br/ scielo.php.
Tajfel, Henri.Grupos humanos e Categorias Sociais- II. Livros Horizonte.1981.
21
Tocqueville, Alexis de. (1987), A Democracia na América. 3 ed. São Paulo, Ed. Itatiaia, Ed. da
Universidade de São Paulo.
Vala, J. e Monteiro, M.B.(2004). Psicologia social.6.ed.Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 2004.
22
7- ANEXOS:
O DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE está
fazendo um estudo sobre as representações ou percepções que os sergipanos têm sobre os
direitos humanos. Para tanto, utilizamos um roteiro de entrevista com algumas questões que
solicitamos que responda. O tempo médio da entrevista é de 15 minutos. Não existem
respostas certas ou erradas, interessa-nos apenas saber as suas avaliações e opiniões
pessoais sobre o tema. Sua colaboração é muito importante para nós.
Obrigado!
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
PROJETO DE PESQUISA
Representações Sociais dos Direitos Humanos em Sergipe
Coordenador da pesquisa: Prof. Dr. Marcus Eugênio Oliveira Lima ___________________
TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO
Pelo presente documento, declaro ter conhecimento dos objetivos da pesquisa, que me
foram apresentados pelo responsável pela aplicação do questionário, e conduzida pelo
Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Sergipe.
Estou informado(a) de que, se houver qualquer dúvida a respeito dos procedimentos
adotados durante a condução da pesquisa, terei total liberdade para questionar ou mesmo me
recusar a continuar participando da investigação.
Meu consentimento, fundamentado na garantia de que as informações apresentadas
serão respeitadas, assenta-se nas seguintes restrições:
a) Não serei obrigado a realizar nenhuma atividade para a qual não me sinta disposto
(a) e capaz;
b) Não participarei de qualquer atividade que possa vir a me trazer qualquer prejuízo;
c) O meu nome, e o dos demais participantes da pesquisa, não serão divulgados;
d) Todas as informações individuais terão o caráter estritamente confidencial;
e) Os pesquisadores estão obrigados a me fornecer, quando solicitados, as
informações coletadas;
f) Posso, a qualquer momento, solicitar aos pesquisadores, que os meus dados sejam
excluídos da pesquisa.
g)
Ao assinar este termo, passo a concordar com a utilização das informações para os fins
a que se destina, salvaguardando as diretrizes universalmente aceitas da ética na pesquisa
científica, desde que sejam respeitadas as restrições acima enumeradas.
O coordenador deste projeto de pesquisa é o Professor Marcus Eugênio Lima, que
poderá ser contatados pelo e-mail [email protected] ou telefone 3042 6500.
Sergipe, Abril de 2008
1) Quando você ouve a palavra BRASIL, que coisas lhe vêm primeiro à cabeça (imagens,
pensamentos, sentimentos) __________________, ________________, ______________
23
2) Na sua opinião, quais as coisas fundamentais para um ser humano viver?
___________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
3) Para você, o que são “direitos humanos”?
___________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
4) Da lista de direitos abaixo, identifique aqueles que você como cidadão brasileiro tem
acesso.
( ) saúde
( ) educação
( ) moradia
( ) segurança
( ) trabalho
( ) liberdade sexual
( ) liberdade de expressão
( ) lazer
( ) liberdade de ir e vir
( ) outro. Qual?_________________
5) Dentre os direitos que disse ter acesso (o entrevistador(a) deve repetir cada item marcado e
fazer a pergunta para cada um ), você está satisfeito com o modo como eles são oferecidos?
_________________________________________________________________________
Por quê?_________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
6) De todos estes direitos listados, qual o mais importante para
você?___________________Por quê? __________________________________________
_________________________________________________________________________
7) Dentre os direitos que disse não ter acesso (o entrevistador(a) deve ler em voz alta repetir
cada item não marcado), quais lhe incomoda mais não possuir ou o que queria mais ter e não
tem?
______________________, ___________________________, ______________________
8) Por que acha que não tem acesso a este direito?
_________________________________________________________________________
9) O que você pessoalmente poderia fazer para ter acesso a este
direito?__________________________________________________________________
10) Para você qual a maior falta de respeito que um cidadão ou cidadã sofre na sociedade
brasileira?_________________________________________________________________
24
11) Você acha que no Brasil alguns grupos têm mais acesso aos direitos ou são mais
beneficiados que outros? Sim ( ) Não ( )
11.1) Em caso afirmativo: Quem tem mais acesso aos direitos _____________________e do
que quem? _________________________________
11.2) Você acha que esta situação é justa? Sim ( ) Não ( )
11.3) Você acha que esta situação pode se alterar? Sim ( ) Não ( )
(Em caso afirmativo pergunte a 11.3.1 e 11.3.2)
11.3.1) Como esta situação pode se
alterar?_____________________________________________
_________________________________________________________________________
11.3.2) O que você estaria disposto a fazer para mudar esta
situação?__________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
12) Considerando sua vida de um modo geral, você considera que vive bem?
Sim ( ) Não ( )
13) O que é “viver bem” na sua opinião? _______________________________________
_________________________________________________________________________
14) Pense na renda da sua família. Essa renda é suficiente para você e sua família “viverem
bem”? Sim ( ) Não ( )
Em caso negativo pergunte a 18.1.
14.1) Quanto, então, acha que bastaria ou seria suficiente para vocês viverem bem?
_________________________________________________________________________
15) Na sua opinião, sua família colabora com o Brasil ou a sociedade através de trabalho,
impostosque paga, etc.? Sim ( ) ( ) Não (Em caso afirmativo pergunte a 14.1)
15.1) O quanto você acha que a sua família contribui com a sociedade?
( ) Muito Mais ou Menos ( ) Pouco ( )
16) Considere, agora, o que a sua família recebe em troca da sociedade brasielira (salário,
bem-estar em geral, condições de vida, etc.). Quanto é que acha que a sua família recebe da
sociedade?
( ) ( ) ( ) ( )
Muito Mais ou menos Pouco Nada
17) Fazendo um balanço entre aquilo que sua família oferece à sociedade e aquilo que ela
recebe em troca, como você se sente?
25
( ) satisfeito ( ) insatisfeito ( ) indiferente
Por que?_______ ___________________________________________________________
_________________________________________________________________________
18) Como se sente em relação a ser brasileiro?
( ) ( ) ( ) ( ) ( )
muito
satisfeito
satisfeito indiferente insatisfeito muito
insatisfeito
19) Você participa de alguma organização (grupos, associações, entidades, etc.) da sociedade?
( ) não Sim ( ) Qual(is)?_____________________________________________
20) Você já ouviu falar da declaração universal dos direitos humanos? Sim ( ) Não ( )
Dados sócio-demográficos
Sexo: Feminino ( ) Masculino ( ) Qual a sua idade?___________
Você trabalha? ________ Qual sua profissão?____________________________
Qual é aproximadamente a renda da sua família? _______________________
Quantas pessoas vivem dessa renda? __________________________
Qual a sua religião?______________________ Estado civil______________________
Você nasceu aqui nesta cidade?________Vive aqui há quanto tempo? __________
Qual o seu nível de escolaridade (anos de estudo)? ______________________
Qual a cor da sua pele? ________________ ( Escrever do modo como ela responde)
Qual a profissão dos seus pais? Pai______________, Mãe?_________________
Bairro______________________________
Obrigado pela colaboração!