relatório sobre o retorno de brasileiros

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Relatório Sobre o Retorno de Brasileiros

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  • permitida a reproduo deste texto e dos dados contidos, desde que citada fonte. Reprodues para fins comerciais so proibidas. Como citar esse texto:

    BOTEGA, Tula; CAVALCANTI, Leonardo; OLIVEIRA, Antnio Tadeu (Orgs.). Migraes Internacionais de Retorno no Brasil. Braslia: Relatrio, 2015

    URL: http://portal.mte.gov.br/obmigra/home.htm Apoio:

    Coordenao Geral de Imigrao -CGIg

  • SUMRIO

    INTRODUO ............................................................................................................. 3

    1. CONTEXTUALIZAO TERICA ....................................................................... 4

    1.1 Tipologias de retorno ........................................................................................ 11

    1.2 O retorno luz de Abdelmalek Sayad ............................................................... 15

    1.3 Preparao do retorno e reinsero na sociedade de origem ............................. 17

    2. O CASO BRASILEIRO .......................................................................................... 20

    2.1 Dados do censo 2010 ........................................................................................ 23

    2.2 Perfil dos migrantes de retorno no Brasil .......................................................... 26

    3. MIGRAO DE RETORNO DESAFIOS E PERSPECTIVAS ......................... 38

    ANEXOS PORTAL DO RETORNO ....................................................................... 40

    BIBLIOGRAFIA ......................................................................................................... 49

  • LISTA DE QUADROS E GRFICOS

    Quadro 01: As teorias da migrao de retorno .............................................................. 9

    Quadro 02: Tipologias de retorno ................................................................................ 14

    Quadro 03: Atividades do Programa de Apoio ao Retorno Voluntrio da OIM ......... 54

    Grfico 01: Distribuio etria dos migrantes de retorno ............................................ 28

    Grfico 02: Nvel de instruio dos migrantes retornados........................................... 30

    Grfico 03: Distribuio de migrantes brasileiros retornados, por condio de

    ocupao, segundo pas de residncia anterior ............................................................ 34

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 01: Fluxos migratrios para o Brasil, segundo pas de residncia anterior ...... 24

    Tabela 02: Fluxos migratrios por nacionalidade, segundo pas de residncia anterior

    Brasil, 2010 ............................................................................................................... 25

    Tabela 03: Fluxos migratrios segundo as principais Unidades da Federao .......... 25

    Tabela 04: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por sexo, segundo pas de

    residncia anterior ....................................................................................................... 27

    Tabela 05: fluxos migratrios de brasileiros retornados, por grupos de idade, segundo

    pas de residncia anterior ............................................................................................ 29

    Tabela 06: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por nvel de instruo,

    segundo pas de residncia anterior ............................................................................ 31

    Tabela 07: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por condio de atividade,

    segundo pas de residncia anterior ............................................................................ 32

    Tabela 08: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por condio de ocupao,

    segundo pas de residncia anterior ............................................................................ 33

    Tabela 09: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, segundo grupos

    ocupacionais, por pas de residncia anterior ............................................................. 35

    Tabela 10: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por rendimento mdio

    mensal domiciliar per capita, em salrios mnimos, segundo pas de residncia

    anterior ........................................................................................................................ 36

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 01: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, segundo as principais UFs de

    residncia, Brasil, 2010 ................................................................................................ 26

    Figura 02: Portal do Retorno........................................................................................ 41

    LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    APS Agncias da Previdncia Social

    ARB Autorizao de Retorno ao Brasil

    ASBRAD Associao Brasileira de Defesa da Mulher, da Infncia e da Juventude

    BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

    CBM Conferncia Brasileiros no Mundo

    CIAAT Centro de Informao e Assessoria Tcnica

    CPF Cadastro de Pessoa Fsica

    CRBE Conselho de Representantes de Brasileiros no Exterior

    EJA Educao de Jovens e Adultos

    ENCCEJA Exame Nacional de Certificao de Competncias de Jovens e Adultos

    FGTS Fundo de Garantia do Tempo de Servio

    FIES Fundo de Financiamento Estudantil

    ISEC Instituto de Solidariedade Educacional e Cultural

    LATAM Rede Europia e Latino-americana de Retorno

    MDS Ministrio de Desenvolvimento Social e Combate Fome

    MEC Ministrio da Educao

    MJ Ministrio da Justia

    MRE Ministrio das Relaes Exteriores

    NIATRE Ncleo de Informao e Apoio a Brasileiros retornados do Exterior

    OEI Organizao dos Estados Iberoamericanos

    OIM Organizao Internacional para as Migraes

    PRONATEC Programa Nacional de Acesso ao Ensino Tcnico e Emprego

    PRV Programa de Retorno Voluntrio

    PRVR Programa de Apoio ao Retorno Voluntrio e Reintegrao

  • SBPE Brasileiro de Poupana e Emprstimos

    SEBRAE Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas

    SENAC Servio Nacional de Aprendizagem Comercial

    SENAI Servio Nacional de Aprendizagem Industrial

    SINE Sistema Nacional do Emprego

    TEM Ministrio do Trabalho e Emprego

  • 3

    MIGRAES INTERNACIONAIS DE RETORNO NO BRASIL1

    Tula Botega2

    Leonardo Cavalcanti3

    Antnio Tadeu de Oliveira4

    INTRODUO

    O fenmeno da migrao internacional, no final do sculo XX, experimenta

    uma srie de mudanas a partir da globalizao, da heterogeneidade em relao aos

    pases de origem e de destino, polticas restritivas, novas formas de migrao,

    preocupao com as questes de integrao, surgimento de espaos e comunidades

    transnacionais, entre outros (MASSEY, 1999; ARANGO, 2000).

    Nesse contexto, e com a crise econmica que atingiu os Estados Unidos,

    pases da Europa e Japo, no perodo a partir de 2007, h um significativo aumento no

    nmero de migrantes retornados, o que faz com que este fenmeno ganhe relevncia

    nas agendas tanto de pesquisa quanto das autoridades pblicas.

    Segundo o Censo de 2010, 65,6% (ou 174.597 mil indivduos) dos imigrantes

    internacionais no Brasil so nacionais, ou seja, imigrantes de retorno, sendo estes,

    majoritariamente, provenientes dos Estados Unidos (43,72%), Japo (36,88%) e

    Paraguai (13,74%).

    Mais do que presena numrica dos retornados nos fluxos de imigrantes

    internacionais que adentram no Brasil, as implicaes sociais, econmicas,

    psicolgicas, familiares e laborais da reinsero desses migrantes na sociedade de

    origem se colocam como desafios que precisam ser melhor investigados.

    1 Este relatrio traz alguns captulos da dissertao de mestrado de Tula Botega, intitulada Migrao

    internacional de retorno e mobilidade social: uma anlise a partir do caso de migrantes retornados do

    estado de Gois, que est sendo desenvolvida no mbito do Programa de Ps-Graduao em Estudos Comparados sobre as Amricas do CEPPAC, sob a orientao do Prof. Dr. Leonardo Cavalcanti. 2 Pesquisadora do Observatrio das Migraes Internacionais OBMigra. Mestranda em Cincias

    Sociais no Programa de Ps-Graduao do Centro de Pesquisa e Ps-Graduao sobre Amricas CEPPAC/UnB. Integra tambm a equipe de pesquisa do Centro Scalabriniano de Estudos Migratrios CSEM/Braslia. 3 Coordenador Cientfico Observatrio das Migraes Internacionais OBMigra e Professor da

    Universidade de Braslia (UnB), CEPPAC. 4

    Coordenador Estatstico Observatrio das Migraes Internacionais OBMigra e doutor em demografia, IBGE.

  • 4

    dentro desse contexto que o presente relatrio busca abordar aspectos

    tericos da migrao internacional de retorno em geral (captulo 1) e,

    especificamente, o caso brasileiro a partir da anlise dos dados do Censo de 2010

    (captulo 2). Por fim, esto nossas consideraes finais, onde refletimos sobre os

    desafios e perspectivas que o incremento dos fluxos de migrao de retorno para o

    Brasil coloca para as pesquisas e para as aes governamentais e de organismos

    internacionais. Destacamos ainda a descrio das informaes reunidas no Portal do

    Retorno, principal poltica do Ministrio das Relaes Exteriores (MRE) no que diz

    respeito migrao de retorno, que se encontra anexada ao presente relatrio.

    1. CONTEXTUALIZAO TERICA

    Tradicionalmente, a migrao de retorno definida como o regresso de

    migrantes para a terra de origem ou de trnsito, depois de terem residido em outro

    lugar, o que pode ocorrer dentro dos limites territoriais de um pas ou fora de suas

    fronteiras. Alm disso, o retorno pode ser forado devido a uma deciso

    administrativa ou judicial ou voluntrio caso seja produto da livre escolha do

    indivduo. Temos tambm o retorno assistido quando o migrante volta para a terra de

    origem com o apoio logstico e financeiro de um Estado, Organizao no

    governamental ou organizao internacional, ou retorno espontneo, quando o

    regresso se d por conta prpria (CSEM, 2011).

    Entretanto, o carter complexo e dinmico do retorno revela que este no o

    fim do processo migratrio, mas sim uma parte dele. Em outras palavras, o retorno

    no necessariamente definitivo e permanente, mas uma fase do processo migratrio,

    que tem efeitos sobre as pessoas e os lugares, tal como a emigrao (RIVERA-

    SNCHEZ, 2013; p. 57 grifos nossos).

    Neste sentido, tendo em vista a diversidade dos fluxos migratrios

    internacionais e dos tipos de migrantes, a diminuio dos custos de transporte e as

    facilidades dos meios de comunicao, o retorno se torna um processo de mltiplas

    fases. Todos esses fatores apontam que em termos de experincias migratrias, sair ou

    permanecer, os padres de mobilizao de recursos, status legal, motivaes e

    projetos e impactos nos pases de origem, os retornados constituem, hoje, um grupo

    de atores extremamente heterogneo (CASSARINO, 2004; p. 270 grifos nossos).

  • 5

    Segundo Durand (2006), a deciso de retornar uma resoluo semelhante

    que se d no momento da partida, podendo-se afirmar que se reinicia o processo

    migratrio, porm, no sentido inverso, e que, portanto, se ingressa novamente em uma

    fase de tomada de decises. Contudo, no se pode simplesmente transportar

    mecanicamente as teorias da migrao para entender o retorno, uma vez que este tem

    suas especificidades, as quais obrigam a repensar teoricamente este fenmeno

    (DURAND, 2006; p. 168).

    Assumindo, ento, que o retorno tem uma complexidade prpria, faz-se

    necessrio revisitar as teorias de migrao internacional para entender como estas

    abordam o tema retorno (CASSARINO, 2004; DURAND, 2006; RIVERA-

    SNCHEZ, 2013).

    A explicao sobre a migrao de retorno perpassa por cinco abordagens

    tericas, basicamente. Primeiramente, na perspectiva neoclssica, o retorno

    entendido como resultado de uma migrao mal sucedida, onde os resultados

    esperados em relao ao salrio e ao emprego no foram alcanados, o que implica

    assumir uma falha no clculo de custo-benefcio que levou diminuio e/ ou

    interrupo do tempo de migrao (CASSARINO, 2004; DURAND, 2006; RIVERA-

    SNCHEZ, 2013).

    Uma das crticas teoria neoclssica que ela desconsidera um fator

    importante na tomada de deciso de retornar: o acmulo de informao e a situao

    atual do migrante, que muito diferente da inicial. A mudana de perspectiva, a partir

    do destino, permitiria ao migrante realizar o clculo de custo-benefcio com

    conhecimento de causa, isto , saber por experincia prpria o que significa viver e

    trabalhar no estrangeiro. Assim, tomar a deciso de retorno, a partir da sociedade de

    destino, significa que o custo psicolgico da ausncia, a saudade e as dificuldades de

    adaptao j foram experimentadas pelo migrante e tais elementos so fundamentais

    nesse clculo de custo-benefcio de carter econmico (DURAND, 2006).

    J a teoria da nova economia da migrao argumenta que o retorno o

    resultado de uma estratgia calculada e definida (coletivamente) pela unidade familiar

    do migrante, situando-se no mbito do projeto migratrio. Neste sentido, seria uma

    evidncia de sucesso, tendo em vista que o objetivo de buscar melhores condies de

    vida, haja vista o diferencial de salrios entre os pases, teria sido alcanado com a

    migrao. Nesta perspectiva, as remessas, o conhecimento e as habilidades adquiridas

    no exterior seriam fatores influentes sobre a probabilidade de retornar (RIVERA-

  • 6

    SNCHEZ, 2013). Tais abordagens, por no fazerem referncia ao ambiente social,

    econmico e poltico do pas de origem, acabam reduzindo os atores e suas

    motivaes para retornar aos fatores financeiros e econmicos e, consequentemente,

    tratam as experincias de migrao de retorno isoladamente (CASSARINO, 2004; p.

    257).

    O entendimento contextual da migrao de retorno trazido pela abordagem

    estruturalista. Aqui o retorno no analisado somente com referncia experincia

    individual do migrante, mas em correspondncia com a realidade econmica e social

    do pas de origem e em relao s suas prprias expectativas, o que constitui uma

    relao complexa (CASSARINO, 2004).

    A relao assimtrica entre os pases de origem e de destino pode impor-se

    tambm ao retorno e no oferecer condies suficientes para uma mobilidade social

    ascendente e talvez nem sequer para uma readaptao ou reajuste de expectativas

    sociais. Isso porque esta perspectiva parte do princpio de que no existe um processo

    de intercmbio de recursos permanente entre ambos os pases, ou seja, assume que o

    migrante se manteve desconectado do ambiente social e das informaes relativas ao

    pas de origem durante o tempo de estada em outro pas, o que implica em no

    reconhecer a circulao e a mobilizao de recursos entre estes dois contextos

    (RIVERA-SNCHEZ, 2013; p. 60). Por essa razo os migrantes so vistos como

    despreparados para o retorno devido dificuldade de ter as informaes necessrias e

    reais acerca das mudanas que aconteceram na sociedade de origem, as quais so

    fundamentais para um retorno seguro (CASSARINO, 2004).

    Alm disso, essa dicotomia estrutural entre centro e periferia delimita um

    pessimismo em relao s iniciativas dos retornados, o que se revela tambm na

    esfera do consumo, tendo em vista que os retornados tendem a orientar seus padres

    de consumo para investimentos improdutivos e ostentatrios (bens de luxo, grandes

    casas, dentre outros), sendo que este padro de consumo reproduz as relaes

    desiguais entre centro (destino) e periferia (origem) (CASSARINO, 2004). Em outras

    palavras, o impacto dos retornados no necessariamente seria visto como uma

    possibilidade de efeitos multiplicadores de desenvolvimento na medida em que est

    mediado justamente por condies diferenciadas dos contextos de destino e origem.

    Na medida em que o ato de retornar implica em uma readaptao a outro

    ambiente, pode, por outro lado, conduzir a uma re-emigrao, no caso de que tal

    ajuste no seja satisfatrio. Dessa forma, no somente as habilidades adquiridas e o

  • 7

    dinheiro acumulado pelo migrante interferem no retorno, mas os fatores contextuais

    tambm operam um papel central (RIVERA-SNCHEZ, 2013).

    A perspectiva transnacional questiona a interpretao da migrao de retorno

    como algo definitivo e unilateral e assume que este possui mltiplas dimenses, tendo

    em vista os laos que unem os migrantes com seus lugares de origem e de destino.

    Dessa forma, afirma que as concepes binrias (baseadas na dicotomia entre origem

    e destino) j no do conta de capturar toda a complexidade da migrao internacional

    contempornea, tendo em vista que os imigrantes desenvolvem redes, atividades,

    estilos de vida e ideologias que englobam a sociedade de origem e de destino, o que

    requer novas conceitualizaes para dar conta da diversidade de perfis que se

    apresentam (CAVALCANTI; PARELLA, 2013; p. 10).

    Em suma, esta corrente vai alm da concepo do retorno como o inverso da

    emigrao e pressupe uma viso dinmica e transitria sobre ele, tendo em vista a

    multiplicidade de configuraes de tempo e espao das migraes contemporneas e

    tambm a imerso em uma dinmica de circularidade e das relaes transnacionais

    que vinculam sociedades de origem e destino (CAVALCANTI; PARELLA, 2013;

    p.14).

    Neste contexto, a migrao de retorno parte do processo migratrio e se

    inscreve na rota sistmica e complexa do mesmo processo, ao qual se inclui relaes

    econmicas, sociais e culturais entre as sociedades de origem e as de destino,

    mediadas por uma constante troca de recursos, dinheiro, bens, ideias, informaes e

    valores. Para Cassarino (2004), os retornados so vistos como atores que renem os

    recursos necessrios para proteger e preparar o seu regresso, a partir da manuteno5

    de laos fortes com a origem, de visitas peridicas e regulares e do envio peridico de

    remessas para seus familiares (CASSARINO, 2004).

    Desde essa perspectiva, o retorno deve ser estudado considerando as

    caractersticas e modalidades de envolvimento tanto dos lugares de origem como dos

    de destino, mais, ainda, tomando em conta que o ambiente social e as estruturas

    institucionais de ambas as sociedades delineiam o retorno, o qual pode tratar-se,

    inclusive, de uma escala no trajeto da vida como imigrante (RIVERA-SNCHEZ,

    2013; p. 61) ou gerar uma re-emigrao para um terceiro local.

    5 preciso considerar a possibilidade de o migrante, durante o processo migratrio, diminuir ou perder

    os contatos com a origem. Isto , a dinmica da migrao pode desestruturar os laos do migrante com

    o local de origem e afetar o preparo de seu retorno, assim como a maneira com que este se efetivar e

    os processos de reinsero na sociedade de origem.

  • 8

    Por fim, est a teoria das redes sociais. Nesta perspectiva os migrantes

    retornados so vistos como atores que renem os recursos necessrios para proteger e

    preparar o seu regresso, por meio da mobilizao de recursos disponveis no nvel de

    redes sociais e econmicas transfronteirias, isto , os recursos necessrios para

    assegurar o retorno derivam dos padres de relaes interpessoais oriundos de

    experincias passadas de migrao dos retornados (CASSARINO, 2004; p. 266).

    Aqui, o capital social ganha destaque e entendido em termos de recursos providos

    pelas famlias ou parentes dos retornados, sendo importante para o sucesso das

    iniciativas e projetos dos migrantes no retorno.

    As estruturas sociais sobre as quais se assentam as redes sociais e seu

    constante intercmbio conformam certos capitais que so teis tanto para emigrar

    quanto para retornar. Segundo Durand (2006), o capital social pode servir tanto para

    empreender uma aventura migratria como para retornar, explicando tanto a

    permanncia como a factibilidade do retorno (DURAND, 2006; p. 179). No entanto,

    nem todos os migrantes tm acesso homogneo a tal capital e nem esto inseridos da

    mesma forma nas redes, logo, as possibilidades e condies do retorno tambm se

    configuram heterogneas e dependero do acesso ao capital social, em consequncia,

    das posies dos atores nos campos sociais (RIVERA-SNCHEZ, 2013; p. 60).

    Em suma, nesta perspectiva, os migrantes de retorno so atores sociais que

    esto envolvidos em uma srie de ramificaes relacionais, as quais influenciam seu

    comportamento. Nesse sentido, diferentes estruturas de rede oferecem diferentes

    oportunidades, orientaes e estratgias em dado contexto.

    Desde a perspectiva de redes resulta relevante estudar as relaes entre os

    retornados e os imigrantes que no retornam, mas tambm, de maneira paralela, dar

    conta da mobilizao de recursos que ocorre atravs das redes que atravessam as

    fronteiras (RIVERA-SNCHEZ, 2013; p. 61)

    Alm disso, preciso reconhecer o papel que as redes sociais exercem sobre

    as migraes de retorno. Tendo em vista o grande impacto que estabelecem sobre o

    processo social das migraes, contribuindo definitivamente para o fortalecimento e

    expanso dos fluxos migratrios. Dito isso, aqueles que retornam ocupam posies

    estruturais fundamentais para a organizao e sustentao dos sistemas de migrao,

    em especial, posies estruturais de intermediao dos fluxos entre origem e destino,

    utilizando seus laos fortes nas redes pessoais para recrutamento, agenciamento e

    suporte aos novos migrantes (SOARES, 2009).

  • 9

    Uma sntese da anlise das teorias sobre migrao internacional a partir do

    enfoque do retorno aparece no quadro 01.

    Quadro 01: As teorias da migrao de retorno

    Economia

    Neoclssica

    Nova

    Economia da

    Migrao

    Estruturalismo Transnacionalismo Redes

    Sociais

    Migrao de

    retorno

    Aqueles que

    ficam no pas de

    destino so os

    bem-sucedidos. O

    retorno uma

    anomalia, seno o

    fracasso da

    experincia

    migratria.

    O retorno faz

    parte do

    projeto

    migratrio

    (visto como

    uma

    estratgia calculada). Ele ocorre

    quando os

    objetivos do

    migrante so

    alcanados no

    pas de

    destino.

    Dicotomia

    centro/periferia. O

    retorno ao pas de

    origem ocorre sem

    que haja mudanas

    ou compensaes

    nas limitaes

    estruturais nos

    pases de origem

    perifricos. O

    retorno tambm se

    baseia em

    informaes

    incompletas sobre

    o pas de origem.

    O retorno no

    necessariamente

    permanente. Ele

    ocorre quando so

    reunidos recursos

    financeiros e

    benefcios

    suficientes para

    sustentar a famlia

    e quando as

    condies no pas de origem so

    favorveis. Ele

    preparado. O

    retorno tem fundo

    social e histrico.

    O retorno

    garantido e

    sustentado

    por redes

    transfrontei-

    rias de

    relaes

    sociais e

    econmicas

    que

    transmitem

    informaes.

    Voltar

    constitui

    apenas um

    primeiro

    passo para a

    concluso do

    projeto

    migratrio.

    O migrante

    retornado

    Abarca o

    migrante

    malsucedido que

    no pde

    maximizar sua

    experincia no

    exterior.

    Abarca o

    migrante bem-

    sucedido cujos

    objetivos

    foram

    alcanados no

    pas de

    destino. O

    retornado um

    intermedirio

    financeiro e

    um assalariado

    visado.

    O retornado

    (migrante que no

    bem nem

    malsucedido) leva

    de volta suas

    economias ao pas

    de origem. As

    expectativas de

    retorno so

    reajustadas e

    adaptadas ao

    contexto estrutural

    do pas de origem.

    Divergncias comportamentais

    ocorrem no

    retorno. Somente o

    retorno por doena,

    velhice,

    aposentadoria e

    falta de talento, ou

    seja, o custo do

    Pertence a um

    grupo tnico (ou

    seja, a conscincia

    de dispora)

    globalmente

    disperso.

    Experincia

    migratria bem-

    sucedida antes de

    retornar. O

    retornado define

    estratgias para

    manter a

    mobilidade

    transfronteiria e os

    vnculos embutidos

    em sistemas

    globais de relaes

    tnicas e parentais.

    Um ator

    social que

    tem valores,

    projetos e

    sua prpria

    percepo do

    ambiente de

    retorno.

    Rene

    informaes

    sobre o

    contexto e as

    oportunida-

    des nos

    pases de

    origem. Os

    recursos so

    mobilizados

    antes do

    retorno.

    Pertence a

    redes

  • 10

    retorno reduzido. transfrontei-rias que

    envolvem

    migrantes e

    no

    migrantes.

    Motivao

    dos

    retornados

    A experincia

    migratria falhou.

    Precisa retornar

    para o pas de

    destino.

    Apego ao lar e

    famlia.

    Metas so

    atingidas.

    Apego ao lar e

    famlia, nostalgia.

    As motivaes so

    reajustadas de

    acordo com as

    realidades do

    mercado e relaes

    de poder do pas de

    origem.

    Apego ao lar e

    famlia. Laos

    familiares so

    cruciais. Condies

    sociais e

    econmicas do

    retorno so

    percebidas como

    suficientemente

    favorveis para

    motivar o retorno.

    Inserido e

    moldado por

    oportunida-

    des sociais,

    econmicas e

    institucionais

    no pas de

    origem, bem

    como, pela

    relevncia

    dos seus

    prprios

    recursos.

    Capital

    financeiro

    Nenhuma renda

    ou economia

    repatriada do

    exterior.

    As remessas

    constituem em

    uma segurana

    contra eventos

    inesperados.

    Ajuda os

    membros da

    famlia.

    Economias e

    remessas no tm

    impacto real sobre

    o desenvolvimento

    do pas de origem.

    Os membros da

    famlia

    monopolizam os

    recursos

    financeiros. No h

    efeito

    multiplicador.

    Penses e

    benefcios sociais

    so partes das

    remessas. Recursos

    financeiros so

    usados de acordo

    com as condies

    institucionais do

    pas de origem.

    Transforma a

    estrutura

    econmica e

    poltica das reas

    de destino.

    Remessas e

    economias

    constituem

    apenas um

    tipo de

    recursos.

    Podem ser

    investidos

    em projetos

    produtivos

    que visam

    garantir o

    retorno.

    Capital

    humano

    As habilidades

    adquiridas no

    exterior

    dificilmente

    podem ser

    repassadas no

    pas de origem.

    Capital humano

    desperdiado.

    O desenvolvi-

    mento de

    habilidades

    varia de acordo

    com a

    probabilidade

    de retorno.

    As habilidades

    adquiridas no

    exterior so

    desperdiadas

    devido a limitaes

    estruturais dos

    pases de origem.

    Status social no

    muda.

    As habilidades so

    aperfeioadas e a

    experincia

    educacional

    adquirida no

    exterior permite

    uma mobilidade

    ascendente.

    Habilidades

    adquiridas no

    exterior,

    assim como

    conhecimen-

    to e

    experincias,

    contatos e

    valores so

    fatores que

    contribuem

    para garantir

    um retorno

    bem-

    sucedido. Fonte: CASSARINO (2004).

  • 11

    Feita essa reviso terica, importante perceber que nenhuma das teorias

    capaz de explicar isoladamente as motivaes, os contextos scio-econmicos e as

    formas de insero no pas de destino dos migrantes, o que tambm se aplica aos

    contextos de retorno. Isso porque a migrao demasiada diversa e complexa para ser

    explicada por uma nica teoria (ARANGO, 2000: 33).

    Nesse sentido, a teoria nos faz perceber que o retorno no necessariamente

    de uma estratgia calculada, mas pode ser o resultado de circunstncias desfavorveis

    e inesperadas no pas de destino que obrigam o emigrante a retornar. Em outras

    palavras, o retorno no um processo automtico, uma consequncia direta de uma

    varivel externa, mas implica em um processo complexo de tomada de decises e de

    avaliaes pessoais e familiares (DURAND, 2006; p. 176).

    1.1 Tipologias de retorno

    Alm das teorias, na literatura sobre o retorno nota-se a tentativa constante de

    categorizar o fenmeno a partir de tipologias para retratar a diversidade de

    circunstncias e motivaes que permeiam a volta do migrante para o local de origem.

    Para Cassarino (2004) os tipos de retorno so definidos a partir do grau de

    mobilizao de recursos e preparao de migrante, o que implica na seguinte

    categorizao: 1) retornados com alto nvel de preparo (preparedness): so aqueles

    que organizam o retorno de forma autnoma, mobilizando os recursos necessrios.

    Em geral, envolve os migrantes que consideram j ter acumulado recursos (tangveis e

    intangveis) suficientes para efetivar seus projetos na origem; avaliam custos e

    benefcios do retorno considerando o contexto da origem; tentam garantir a

    mobilidade entre as fronteiras a partir da documentao. 2) retornados com baixo

    nvel de preparo: houve pouco tempo de migrao para acumular os recursos

    necessrios; algo interrompeu abruptamente a migrao e os custos em voltar so

    menores do que os de permanecer; depender dos recursos disponveis na origem para

    sua reintegrao. 3) sem nvel de preparo: so aqueles que foram obrigados a retornar

    seja por deportao, seja por recusa do pedido de asilo (CASSARINO, 2004; p. 274).

    Durand (2006), por sua vez, estabelece seis modalidades diferentes: 1)

    Retorno voluntrio do migrante estabelecido: refere-se ao migrante que regressa

    voluntariamente depois de um grande perodo no estrangeiro; tem documentos e j

  • 12

    adotou outra nacionalidade; h uma mudana de residncia e um novo processo de

    estabelecimento. Incluem-se nesta categoria: migrantes econmicos que voltam

    depois de muito tempo com poupanas; migrantes que retornam porque as condies

    no pas de origem esto melhores; exilados polticos ou refugiados; e migrantes

    aposentados. 2) Retorno do migrante temporrio: refere-se a trabalhadores

    temporrios, os quais se enquadram em programas especficos em que o contrato

    exige ou obriga o retorno. 3) Retorno transgeracional: trata-se do retorno dos

    descendentes dos migrantes filhos, netos e bisnetos. Utilizam-se os laos sanguneos

    e culturais para facilitar o ingresso ou a naturalizao. 4) Retorno forado: o retorno

    se d em condies foradas por razes econmicas, polticas e raciais como no

    caso dos refugiados ou deportados. 5) Retorno do fracassado: do migrante que se v

    forado a voltar para o pas de origem pelas circunstncias no destino; o fracasso se

    d porque no conseguiu cumprir com suas expectativas. 6) Retorno programado:

    aquele de carter oficial, promovido pelos pases, onde busca-se, a partir de polticas

    migratrias, fomentar a migrao de retorno e manter vnculos formais com a

    populao que reside no exterior (DURAND, 2006; p. 170-173).

    Por fim, Siqueira (2009) considera cinco categorias de retorno para o caso

    brasileiro: 1) Retorno temporrio: aquele em que o migrante define o pas de

    destino como seu local de moradia. L tem sua famlia, seu trabalho, e seus

    investimentos. Muda seu padro de vida e consumo, pois j no tm a preocupao de

    fazer poupana para voltar e investir no Brasil. Vem ao Brasil em ocasies

    espordicas, como frias ou festas familiares. 2) Retorno continuado: durante o tempo

    de vivncia em outra sociedade o emigrante trabalha e poupa dinheiro no intuito de

    retornar sociedade de origem e investir em algum imvel. Porm, ao retornar no

    obtm sucesso em seus investimentos financeiros e nem em sua readaptao vida no

    Brasil, com isso re-emigra. 3) O Retorno permanente: aquele em que o emigrante

    retorna e consegue estabelecer-se na sua cidade ou pas de origem, no pretende

    emigrar novamente. Consegue se readaptar ao estilo de vida da sua cidade de origem

    e credita a sua condio ao seu projeto migratrio. Engloba aqueles que tornaram

    autnomos ou conseguiram se inserir no mercado de trabalho; so considerados bem

    sucedidos, pois concretizaram o projeto de ascenso social ou melhoria de vida. 4) O

    transmigrante: refere-se aqueles que vivem nos dois lugares. Em sua maioria so

    documentados, tm vida estabilizada no pas de destino e no Brasil. Possuem casa,

    fazem investimentos e trabalham nos dois lugares. Transitam, tm visibilidade e so

  • 13

    atores sociais nos dois lugares. 5) Os retornados da crise: A partir do ano de 2007, a

    crise atingiu diretamente as ocupaes situadas no mercado de trabalho secundrio6,

    onde houve reduo de trabalho e ganhos. Nessa situao o custo-benefcio da

    emigrao deixa de ser positivo e muitos optaram por retornar diante da inviabilidade

    de continuar vivendo nos EUA e em outros pases que foram tambm atingidos pela

    crise (Portugal, Itlia, Espanha, etc.). Para muitos o projeto emigratrio tornou-se um

    projeto interrompido, frustrado (SIQUEIRA, 2009).

    Dessa forma e tendo em vista que durante o perodo de migrao, dadas as

    condies sociais, econmicas e culturais, o projeto migratrio reelaborado, o

    retorno pode apresentar diferentes nuances. Como vimos, vrios autores constataram

    uma diversidade de perfis de migrantes retornados, o que encontra-se sintetizado no

    quadro 02.

    6 Refere-se existncia de setores com caractersticas diferenciadas no mercado de trabalho (PIORE,

    1979). O mercado secundrio se refere s ocupaes que os imigrantes desempenham, tendo em vista a

    vulnerabilidade reforada pela sua condio de documentao irregular (PORTES; GUARNIZO, 1991).

    Dessa forma, se inserem em atividades como o servio domstico ou na rea de construo civil, tendo

    em vista que tais atividades no exigem o conhecimento do idioma e nem a documentao formal.

  • 14

    Quadro 02: Tipologias de retorno

    Fonte: Elaborao prpria com base em Cassarino (2004); Durand (2006) e Siqueira (2009).

    Autor Tipologia

    Cassarino

    (2004) Retornados com alto nvel de preparo (preperdeness): so os que organizam o

    retorno de forma autnoma, considerando o contexto do pas de origem e

    mobilizando os recursos necessrios para l efetivar seus projetos.

    Retornados com baixo nvel de preparo: so aqueles que tm pouco tempo de migrao para acumular os recursos necessrios e dependem dos recursos disponveis

    na origem para sua reintegrao.

    Sem nvel de preparo para retornar: so aqueles que foram obrigados a retornar (deportao ou recusa do pedido de asilo).

    Durand

    (2006) Retorno voluntrio do migrante estabelecido: refere-se ao migrante que regressa

    voluntariamente depois de um grande perodo no estrangeiro, aps ter adquirido os

    documentos e outra nacionalidade.

    Retorno do migrante temporrio: refere-se a trabalhadores temporrios, os quais se enquadram em programas especficos em que o contrato exige ou obriga o retorno.

    Retorno transgeracional: trata-se do retorno dos descendentes dos migrantes filhos, netos e bisnetos. Utilizam-se os laos sanguneos e culturais para facilitar o ingresso

    ou a naturalizao.

    Retorno forado: o retorno se d em condies foradas por razes econmicas, polticas e raciais como no caso dos refugiados ou deportados.

    Retorno do fracassado: do migrante que se v forado a voltar para o pas de origem pelas circunstncias no destino; o fracasso se d porque no conseguiu cumprir com

    suas expectativas.

    Retorno programado: aquele de carter oficial, promovido pelos pases, visando fomentar a migrao de retorno e manter vnculos formais com a populao que

    reside no exterior.

    Siqueira

    (2009) Retorno temporrio: aquele em que o migrante define o pas de destino como seu

    local de moradia, fazendo visitas espordicas ao pas de origem.

    Retorno continuado: refere-se ao migrante que ao retornar no obtm sucesso em sua reinsero e em sua readaptao vida no pas de origem e com isso re-emigra.

    O Retorno permanente aquele em que o emigrante retorna e consegue estabelecer-se na sua cidade ou pas de origem, no pretende emigrar novamente.

    O transmigrante aquele que vive nos dois lugares. Em sua maioria so documentados, tm vida estabilizada no pas de destino e no Brasil. Transitam, tm

    visibilidade e so atores sociais nos dois lugares.

    Os retornados da crise: refere-se aos imigrantes que foram atingidos pela crise econmica, que se deu a partir de 2007, os quais optaram por retornar diante da

    inviabilidade de continuar vivendo nos EUA e em outros pases que foram tambm

    atingidos pela crise (Portugal, Itlia, Espanha, etc.).

  • 15

    1.2 O retorno luz de Abdelmalek Sayad

    Feita essa reviso terica, conceitual e tipolgica, e luz da anlise de

    Abdelmalek Sayad, autor clssico sobre o tema, temos o retorno como a categoria

    fundamental do fenmeno migratrio, caracterizando-se como o elemento constitutivo

    da condio do migrante.

    Cavalcanti e Boggio (2004) ajudam na reflexo quando chamam ateno sobre

    como a condio de imigrante pode ajudar a compreender a dinmica do retorno.

    Primeiramente, as diferenas presentes nas denominaes de estrangeiro e de

    imigrante implicam em diferentes estatutos sociais, diferentes tratamentos jurdicos,

    diferentes deveres e direitos no que diz respeito presena e permanncia dentro dos

    limites de um territrio nacional. Ao passo que ao estrangeiro se associa um pas

    desenvolvido e as possibilidades de enriquecimento para o pas de acolhida, o

    imigrante sempre visto como proveniente de um pas subdesenvolvido, o qual

    representa um problema para a sociedade receptora.

    Ao relembrarem a condio transitria inerente ao termo imigrante (conjugado

    no particpio do presente), os autores afirmam que esta condio provisria se observa

    tanto na sociedade de emigrao quanto na de imigrao. Na primeira, percebe-se a

    tendncia de se preservar o lugar social, com a iluso e a exigncia, explcita ou

    implicitamente, de um retorno, no qual o benefcio para o grupo supere os custos e as

    dores da emigrao, levando, em geral, a obter reconhecimento do grupo de origem e

    permite negociar o sentido de sua emigrao e de sua ausncia. J na segunda, o

    imigrante sempre classificado a partir do critrio de nacionalidade, o que, por

    definio, o coloca na condio de estranho. Isso tambm corrobora para a situao de

    transitoriedade, no se reconhecendo a possibilidade de a migrao ser algo definitivo

    (CAVALCANTI; BOGGIO, 2004).

    Para Sayad (2000), um imigrante essencialmente uma fora de trabalho

    provisria, temporria e em trnsito uma vez que o trabalho que justifica sua

    emigrao (SAYAD, 2000; p. 21). Esta condio provisria do imigrante faz com que

    ele seja um ser social ao qual se atribuiu naturalmente a possibilidade de um retorno a

    seu grupo nacional, o que contribui para que o retorno seja parte inerente do processo

    migratrio. Assim, a ideia do retorno algo central no fenmeno migratrio e se

    conforma como uma questo que perpassa as sociedades de emigrao e de imigrao

  • 16

    e, de modo transversal, o projeto migratrio (CAVALCANTI; BOGGIO, 2004; p.

    10).

    Neste sentido, o retorno acompanha o migrante durante toda sua jornada

    migratria, envolvendo o perodo pr-partida, a efetivao da migrao e os planos de

    voltar ao pas de origem. Em outras palavras, o retorno, ou pelo menos a inteno de

    retornar, encontra-se implcita ao prprio ato de emigrar, pr-existindo partida, e

    sendo programado ao longo de toda a ausncia (SAYAD, 2000).

    Assim, no fenmeno migratrio, a coeso entre os acontecimentos e os

    significados percebidos e atribudos ao longo da experincia em um pas estrangeiro,

    de indivduos e grupos sociais, possvel devido ao retorno. a noo de retorno que

    confere sentido e explica a unidade das relaes complexas entre emigrao e

    imigrao, ausncia e presena, excluso e insero, sendo a nostalgia e a saudade da

    origem que confere a uma pessoa sua condio de migrante (SAYAD, 2000).

    Sayad (2000) apresenta como o retorno remete, necessariamente, s relaes

    do migrante com o tempo, o espao fsico e com o grupo. Primeiramente, o migrante

    e seu grupo de origem concebem o tempo como uma retrospectiva emigrao, onde

    a memria est atrelada nostalgia, na qual sempre se sente falta da situao inicial

    que no pode mais voltar, constatando-se a impossibilidade de verdadeiramente

    retornar ao idntico: ao tempo de partida, de tornar-se novamente o que era ou s

    mesmas situaes. Quanto ao espao, geogrfico ou social, este sempre

    compreendido como algo nostlgico e carregado de afetividade. Por fim, sobre o

    grupo, tanto no pas de origem quanto no de destino, forma-se uma relao ambgua,

    pois o indivduo afetado pelas relaes dos dois grupos simultaneamente. Por um

    lado, deseja manter as relaes no pas de origem para assegurar que este no foi

    abandonado afetivamente e, por outro, h a necessidade de interao e insero na

    sociedade de destino buscando a adaptao (SAYAD, 2000; p. 12-13).

    Consta no imaginrio do emigrante que, em sua volta, ele ir reencontrar o

    grupo como se nada tivesse acontecido, como se nada tivesse mudado durante a sua

    ausncia e, sobretudo, como se o tempo de emigrao no houvesse mudado a si

    mesmo. Tais iluses se inscrevem no migrante e se traduzem nos sentimentos de

    nostalgia, sendo que toda essa carga de dramaticidade, compartilhada entre os que

    partem e os que ficam, faz com que a migrao seja sempre pensada como provisria,

    por mais longa que seja e mais durvel que se enuncie. por isso que o retorno no

    diz respeito ao espao fsico em si, mas principalmente ao espao social, o que

  • 17

    implica em uma grande impossibilidade prtica, pois o migrante nunca retorna

    mesma estrutura social que havia antes de migrar, apesar de estar de volta ao espao

    fsico (SAYAD, 2000; p. 14).

    Em suma, os migrantes que retornam so pessoas do entre-dois entre-dois-

    lugares, entre-dois-tempos, entre-duas-sociedades so tambm, e principalmente,

    homens-entre-duas-maneiras-de-ser ou entre-duas-culturas. Assim, o retorno une

    esses dois aspectos e ilustra simultaneamente a relao que o emigrante estabelece

    com a sociedade de origem, da qual se separou devido migrao, e tambm a

    relao que ele mantm com a sociedade de imigrao e sua condio de imigrante.

    Em outras palavras, trata-se de um emigrante-imigrante, que est aqui e est

    l, presente e ausente ou ausente e presente. Est duas vezes presente e duas vezes

    ausente: aqui, ele est presente fsica e materialmente e de maneira corporal, mas

    ausente moral e em esprito. L, ele est ausente fsica, material e corporalmente, mas

    est presente moral, mental, imaginria e espiritualmente. Tudo isso consiste em um

    dos paradoxos da imigrao: ausente onde est presente e presente onde est ausente

    (SAYAD, 2000; p. 19-20).

    1.3 Preparao do retorno e reinsero na sociedade de origem

    O entendimento do retorno como um processo, traz os temas de preparao e

    de reinsero na sociedade de origem para o debate.

    O entendimento de Cassarino (2004) sobre a relao entre retorno e

    desenvolvimento, ou seja, o impacto do retorno no local de origem, se d em termos

    de boa vontade, preparo e mobilizao de recursos. O autor supera a dicotomia

    sucesso/fracasso ao olhar para os fatores micro e macro que configuram os padres de

    retorno e a volta dos migrantes como potenciais atores de desenvolvimento local

    (CASSARINO, 2004; p. 274).

    A mobilizao de recursos tangveis (capital financeiro) e intangveis

    (contatos, relaes, habilidades) adquiridos na experincia migratria e tambm os

    recursos que o migrante leva consigo de seu pas de origem (capital social) somado ao

    ato voluntrio do migrante, que suportado pelo acmulo de recursos e informaes

    sobre as condies de ps-retorno na origem, indo alm da livre escolha, explicam o

  • 18

    porqu de alguns migrantes se tornarem atores de desenvolvimento no local de

    origem e outros no (CASSARINO, 2004).

    Tal perspectiva colabora na desconstruo da ideia de que o retorno seria um

    ato voluntrio, isto , no se trata de o migrante querer regressar, mas sim de ele estar

    preparado para tal, o que implica reunir recursos e informaes acerca das condies

    posteriores ao retorno para poder proceder ao processo de reintegrao no seu pas de

    origem. O retorno se refere a um processo atravs do qual os emigrantes valorizam os

    recursos disponveis, de acordo com as circunstncias especficas existentes no pas

    emissor e receptor, para garantir sua reintegrao (CASSARINO, 2007; p.73)

    Dessa forma, o tipo de retorno pode afetar o status ocupacional dos retornados

    no pas de origem. Ademais, a durao da experincia migratria tambm uma

    varivel explicativa da reintegrao social e profissional dos retornados. Essas duas

    variveis no podem se afastar do marco analtico que inclui as condies prvias e

    posteriores ao retorno, uma vez que tais fatores contextuais so parte integrante do

    processo de preparao do retorno (CASSARINO, 2007; p.74).

    Sobre a durao da experincia migratria, Cassarino (2007) argumenta que a

    migrao pode ter um impacto positivo sobre a capacitao profissional,

    especialmente dos emigrantes que decidiram retornar, e isto estaria relacionado a uma

    durao tima, isto , nem to curta que no d para aprender nenhuma habilidade e

    nem to longa a ponto de romper com a origem e impedir que se tenha tempo e

    energia para utilizar os conhecimentos e capacidades adquiridas (KING RUSSEL,

    1986 apud CASSARINO, 2007; p. 75).

    Sobre este tema, Durand (2006) sugere que h uma estratgia do retorno, a

    qual seria uma maneira de fixar limites, impor objetivos e de obrigar-se de algum

    modo a retornar. Alguns voltam quando tem condies financeiras de adquirir as

    metas estabelecidas, por exemplo, comprar a casa ou quitar dvidas. Outros retornam

    aps conseguirem a documentao, o que lhes permite transitar com mais facilidade

    entre os pases de origem e destino. A partir da documentao possvel que os

    migrantes experimentem a vida novamente no pas de origem, mantendo a

    possibilidade de re-emigrar, caso a reinsero no seja bem sucedida (DURAND,

    2006; p. 181).

    No mbito familiar tambm h uma relao direta entre a durao da

    migrao, o retorno e os custos que deve suportar a famlia do migrante. Em muitos

    casos o dilema se resume em optar entre o nvel e a qualidade de vida; entre um maior

  • 19

    ingresso econmico e um menor ritmo e presso de trabalho; mais tempo de descanso,

    ambiente conhecido e contato familiar (DURAND, 2006; p. 184).

    A durao da experincia migratria constitui somente um fator explicativo na

    capacidade dos emigrantes em investir em negcios empresariais em seu retorno. Esta

    varia de pas para pas e est correlacionada com a forma em que os emigrantes

    percebem as mudanas e reformas que aconteceram em seu pas de origem, e isso

    acontece porque o retorno no somente uma questo pessoal, mas tambm

    contextual. Assim, investir em uma atividade empresarial ou no varia com a durao

    da migrao, o contexto do pas de origem, as polticas governamentais, as remessas,

    o apoio familiar e a rede social na qual o migrante se insere, as habilidades

    profissionais adquiridas no estrangeiro e as visitas peridicas ao pas de origem

    (CASSARINO, 2007).

    Considerar se o retorno se d ou no por escolha prpria fundamental no

    momento de identificar os fatores adicionais que caracterizam as condies prvias e

    posteriores ao retorno. Sendo assim, a distino entre aqueles que voltaram por

    prpria iniciativa e aqueles que se viram obrigados a retornar constitui uma outra

    varivel fundamental para explicar as perspectivas de reintegrao scio-profissional

    dos retornados uma vez de volta a sua origem (CASSARINO, 2007; p.66).

    Para Rivera-Snchez (2013) o estudo sobre a reinsero social e laboral dos

    migrantes retornados em um espao urbano pode contribuir para entender os efeitos

    sobre: 1) A probabilidade de conseguir emprego no mercado de trabalho local, as

    formas como opera o capital social, a escolaridade e em geral as habilidades e

    capacidades adquiridas na estada como imigrante internacional ao regressar ao pas de

    origem; 2) As relaes familiares e pessoais, o processo de reajuste a outra dinmica

    social em um contexto que se modificou. Em outras palavras, o efeito da readaptao

    ou reincorporao, o ajuste de expectativas ou de conflitos, que geram as mobilidades

    humanas; 3) A relao mobilidade-estabelecimento (RIVERA-SNCHEZ, 2013; p.

    58).

    Se, por um lado, a vivncia no estrangeiro permite ao migrante adquirir certos

    ofcios ou habilidades que fazem com que o retorno seja factvel em melhores

    condies (DURAND, 2006), por outro, podem representar entraves integrao

    (HIRANO, 2005). Na primeira perspectiva, o capital humano idioma ou o domnio

    de ferramentas modernas adquirido durante a estada fora do pas de origem poderia

  • 20

    converter-se em estmulo ao retorno e facilitar a obteno de um melhor emprego ou a

    abertura do prprio negcio (DURAND, 2006; p. 182).

    J na segunda perspectiva, as habilidades adquiridas na migrao no seriam

    aproveitadas no retorno ao Brasil, em virtude de os migrantes terem exercido

    trabalhos de pouca qualificao. Alm disso, a sua ausncia no mercado de trabalho,

    em virtude da migrao, torna o migrante despreparado e atrasado profissionalmente

    para o contexto brasileiro.

    Desta forma, a reintegrao dos migrantes de retorno torna-se um processo

    difcil e que, em muitos casos, estimula uma nova migrao, adiando o retorno.

    Corroborando esta ideia, atender s exigncias do mercado de trabalho; conseguir um

    emprego satisfatrio e bem pago; retornar ao emprego anterior; o medo de abrir um

    pequeno negcio e perder todo o capital poupado; e no ter capital suficiente para

    abrir um negcio so dificuldades encontradas pelos migrantes dekassguis no retorno

    ao Brasil (SASAKI, 2000 apud HIRANO, 2005; p. 4), o que nos ajuda tambm a

    refletir sobre aqueles que retornam de outros pases. Alm desses fatores, as

    mudanas que ocorreram no estilo de vida e no consumo tambm podem representar

    entraves reintegrao na sociedade de origem.

    2. O CASO BRASILEIRO

    O fenmeno migratrio brasileiro algo bastante dinmico e diverso, se

    revelando como um complexo objeto de estudo. Para compreender a migrao de

    retorno, faz-se necessrio entender as fases e processos da migrao no pas.

    Sol, Cavalcanti e Parella (2011) analisam a migrao brasileira a partir de

    idades (SOL; CAVALCANTI; PARELLA, 2011; p. 25-47). Desde essa perspectiva,

    a primeira idade refere-se ao perodo de intenso recebimento de imigrantes

    europeus, no sculo XIX e XX, provenientes da Itlia, Alemanha, Portugal e Espanha.

    A segunda idade diz respeito aos fluxos de migrao interna, no incio do sculo

    XX, sendo estes tambm marcados pelos processos de urbanizao e de

    industrializao no pas. Neste contexto, os deslocamentos de xodo rural e,

    posteriormente, os interregionais para os grandes centros urbanos do Sudeste, com

    destaque para So Paulo e Rio de Janeiro, e do Sul do pas, caracterizavam-se como

    uma estratgia para alcanar mobilidade social. A terceira idade se d no contexto

    de descenso ou estabilidade do nmero de imigrantes internacionais e se caracteriza

  • 21

    pelo aumento da emigrao. Os fluxos emigratrios para os Estados Unidos, Japo,

    pases da Europa, como Reino Unidos, Portugal e Espanha, e na Amrica do Sul, para

    o Paraguai, Argentina e Uruguai, ganham destaque. Disto, pode-se inferir a

    heterogeneidade da migrao brasileira e preciso lembrar que cada um desses fluxos

    migratrios possui sua especificidade e caractersticas prprias. Por fim, a quarta

    idade marcada pela diversificao dos fluxos e pelo acontecimento simultneo de

    emigrao e imigrao. A partir de uma anlise contempornea dos fluxos migratrios

    no Brasil, a esta quarta idade, acrescentamos a migrao de retorno.

    Em suma, o histrico brasileiro acerca do fenmeno da migrao internacional

    foi tradicionalmente retratado na literatura a partir de dois perodos: primeiramente,

    no sculo XIX, no qual o pas recebia imigrantes (europeus, africanos, orientais entre

    outros); e posteriormente, ao final do sculo XX dcadas de 70 e 80 no qual os

    brasileiros se tornam emigrantes e deixam o pas em direo aos Estados Unidos,

    Canad, Europa Ocidental e Japo. Assim, o Brasil teria se incorporado, pouco a

    pouco, ao conjunto das naes que abastecem o mercado mundial com trabalhadores,

    a partir da emigrao (SALES, 1999, 2001; ASSIS, 1999; FUSCO, 2001;

    FLEISCHER, 2002; MARGOLIS, 2003; SIQUEIRA, 2009). Entretanto, a anlise

    contempornea do cenrio migratrio brasileiro deve considerar a exportao de

    emigrantes em paralelo com a entrada de imigrantes no pas, o que seria uma nova

    questo social situada no contexto da globalizao (PATARRA, 2005; p. 25). Dessa

    forma, a crise financeira, o estancamento do processo de desenvolvimento, o

    excedente de mo de obra, a pobreza, a ausncia de perspectiva de mobilidade social,

    entre outras causas, seriam os principais determinantes.

    Ainda que a produo brasileira sobre a migrao internacional seja extensa, o

    interesse terico tem se concentrado sobre trs tpicos principais: a origem de fluxos

    populacionais, os determinantes da sua estabilidade/continuidade; e a adaptao dos

    migrantes na sociedade de destino (SOARES, 2000), sendo o retorno uma lacuna nos

    estudos migratrios. No perodo a partir de 2007 h um significativo aumento no

    nmero de migrantes retornados e isso faz com que este fenmeno ganhe relevncia

    nas agendas tanto de pesquisa quanto das autoridades pblicas.

    No que diz respeito ao fluxo migratrio Brasil Estados Unidos, nos anos

    2000, dois acontecimentos so significativos e desencadeiam aes que afetam

    diretamente a populao migrante no que se refere ao direcionamento, ao volume e

    intensidade dos fluxos: os atentados terroristas de 11 de Setembro de 2001 e a crise

  • 22

    econmica desencadeada a partir de 2007-2008 (PEREIRA; SIQUEIRA, 2013;

    FERNANDES; KNUP, 2012).

    O primeiro pode ser considerado, para a histria da migrao para os Estados

    Unidos, um marco de mudana definitiva, pois, ainda que o pas j adotasse medidas

    restritivas s migraes, a partir deste momento que a questo se torna mais

    fortemente associada a uma ameaa segurana interna no pas. Vrias medidas

    foram tomadas pelas autoridades americanas, inclusive em parceria com o governo do

    Mxico, o que aumentou as dificuldades e os riscos para aceder aos Estados Unidos

    via este pas. O segundo, a crise econmica e suas consequncias sobre o emprego e a

    cotao do dlar, atua como fator de desestmulo permanncia dos brasileiros no

    pas. A crise atingiu principalmente o mercado imobilirio e, consequentemente, a

    construo civil, chegando tambm a afetar outras ocupaes como o servio

    domstico e o mercado tnico, nichos de trabalho de grande parte dos brasileiros. Para

    o trabalhador a crise se traduziu em reduo de oferta de trabalho e reduo do valor

    pago pela hora de trabalho. Alm disso, com a queda do valor do dlar em relao

    moeda brasileira houve uma reduo do dinheiro enviado para o Brasil

    (FERNANDES; KNUP, 2012).

    A significativa reduo dos ganhos e o aumento do custo de vida somado ao

    medo da deportao tornou o custo/benefcio da emigrao negativo em termos

    econmicos para o emigrante brasileiro. Por outro lado, no se pode perder de vista a

    situao da economia brasileira que, no momento de crise e em anos posteriores, teve

    respostas positivas marcadas pela criao de postos de trabalho e pela ampliao da

    renda dos trabalhadores. Em suma, por um lado, esto as dificuldades legais e a

    conjuntura da economia americana dificultando a permanncia de brasileiros nos

    EUA, funcionando como fatores de expulso, e, por outro lado, as melhorias na

    condio de trabalho no Brasil funcionando como fatores de atrao

    (FERNANDES; KNUP, 2012). No entanto, importante ressaltar que os fluxos

    migratrios vo alm das questes econmicas.

    Segundo Fernandes e Castro (2013), duas causas foram apontadas para o

    retorno de imigrantes de Portugal para o Brasil: as questes familiares e, em segundo

    lugar, a crise econmica. O mesmo se evidencia nos processos recentes de retorno de

    brasileiros vindos dos Estados Unidos estudados por Pereira e Siqueira (2013).

    Ambos os estudos demonstram que alm dos motivos estritamente econmicos, como

    aqueles relacionados com a crise econmica de 2007-2008, as circunstncias

  • 23

    familiares e a saudade so elementos importantes na constituio de projetos de

    retorno.

    Tal situao contribuiu para que vrios brasileiros resolvessem retornar ao

    Brasil, movimento que j podia ser observado em 2007, mas que toma maior

    amplitude aps 2008. Dessa forma, o grande nmero de retornados no pas revela as

    dificuldades com a readaptao na vida no Brasil, colocando para alguns um forte

    desejo de re-emigrar (FERNANDES; KNUP, 2012).

    Vejamos na seo seguinte o perfil do migrante brasileiro retornado, com base

    nos dados do Censo de 2010.

    2.1 Dados do censo 2010 (IBGE)

    Segundo dados do Censo de 2010, 65,6% dos imigrantes no Brasil so

    nacionais, ou seja, brasileiros que residiram no exterior, o que chamamos de

    imigrantes de retorno (OLIVEIRA, 2013).

    De acordo com estas estatsticas oficiais, temos um total de 455.335 migrantes

    internacionais que retornaram ao Brasil, sendo que este nmero compreende os

    estrangeiros, os brasileiros natos e as pessoas naturalizadas brasileiras.

    A Tabela 01 demonstra a predominncia dos fluxos imigratrios para o Brasil

    desde os Estados Unidos (17,42%), Japo (13,54%) e Paraguai (9,73%).

  • 24

    Tabela 01: Fluxos migratrios para o Brasil, segundo pas de residncia anterior,

    2010

    A intensidade do fluxo migratrio de retorno para o Brasil se torna ainda mais

    evidente quando as pessoas naturalizadas so consideradas. Nesta situao o

    percentual passa de 65,6% para 73%. Dito isso, a distribuio dos fluxos migratrios

    por nacionalidade, segundo pas de residncia anterior, pode ser observada na Tabela

    02.

    Tabela 02: Fluxos migratrios por nacionalidade, segundo pas de residncia

    anterior Brasil, 2010

  • 25

    Ainda de acordo com os dados do Censo de 2010, e conforme se encontra

    ilustrado na Tabela 03, dentre as principais Unidades da Federao que receberam

    fluxos de imigrantes internacionais esto: So Paulo (30,7%), Paran (14,6%), Minas

    Gerais (9,8%) e Rio de Janeiro (7,6%), o que evidencia a importncia das regies

    Sudeste e Sul no que diz respeito ao fenmeno migratrio no Brasil.

    Tabela 03: Fluxos migratrios segundo as principais Unidades da Federao

    Especificamente, no que se refere distribuio de migrantes de retorno por

    Unidades da Federao, o Mapa 01 evidencia que: So Paulo o principal Estado,

    com um fluxo de mais de 70.000 pessoas; o Paran aparece em segundo lugar com

    um fluxo que compreende de 45.000 a 70.000 pessoas, seguido de Minas Gerais, com

    um fluxo de 25.000 a 45.000 pessoas. Os Estados do Rio de Janeiro, Santa Catarina,

    Rio Grande do Sul, Gois e Mato Grosso do Sul, ocupam a mesma categoria

    recebendo at 25.000 pessoas retornadas.

  • 26

    Figura 01: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, segundo as principais

    UFs de residncia, Brasil, 2010.

    2.2 Perfil dos migrantes de retorno no Brasil

    Nesta seo ser apresentado o perfil dos migrantes de retorno no Brasil, com

    base nas anlises dos dados do Censo de 2010, segundo os critrios de: sexo, grupo de

    idade, nvel de instruo, condio de atividade, condio de ocupao, grupos

    ocupacionais e rendimento mdio mensal.

    Sexo

    Os dados sobre a distribuio dos fluxos migratrios de brasileiros retornados

    (no caso dos brasileiros natos), segundo o sexo e o pas de residncia anterior,

    aparecem na Tabela 04 e revelam que 52,5% dos migrantes que retornam ao Brasil

    so homens e 47,5% so mulheres.

  • 27

    Tabela 04: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por sexo, segundo pas

    de residncia anterior Brasil, 2010

    Analisando os dados listados na tabela acima, percebe-se que na maior parte

    dos pases o nmero de homens que retorna para o Brasil maior do que o de

    mulheres, exceto nos casos de Espanha e Itlia, onde o nmero de mulheres supera o

    de homens.

    Pode-se supor que um dos fatores que determinam este diferencial por sexo,

    no momento do retorno, o fato de a crise econmica que atingiu os Estados Unidos,

    Japo e pases da Europa tenha tido maior influncia sob as ocupaes dos migrantes

    homens, como o caso do setor da construo civil, por exemplo, e que as ocupaes

    tipicamente femininas, no trabalho domstico e no setor de cuidados, tenham se

    mantido estveis. Entretanto, tal inferncia carece de dados que permitam uma

    reflexo mais profunda e abre espao para novas pautas de pesquisa.

    Idade

    A distribuio etria dos migrantes de retorno encontra-se apresentada no

    grfico a seguir.

  • 28

    Grfico 01: Distribuio etria dos migrantes de retorno

    Fonte: IBGE, Censo Demogrfico 2010

    Em sntese, 14% dos migrantes de retorno tm menos de 15 anos de idade;

    13% esto na faixa dos 15 a 24 anos; 43% na dos 25 a 39 anos; 27% entre 40 e 64

    anos; e 3% com mais de 65 anos.

    Na Tabela 05 encontra-se a distribuio dos fluxos migratrios de brasileiros

    retornados, por grupo de idade, segundo o pas de residncia anterior. Os mais jovens,

    com menos de 15 anos de idade, retornaram predominantemente do Japo7. J a maior

    parte daqueles que tm entre 15 e 24 anos, 25 e 39 anos e 40 e 64 anos teve como

    ltimo pas de residncia os Estados Unidos. Isso tambm acontece com a maioria dos

    retornados com mais de 65 anos.

    7Para esta anlise, e as subsequentes, no consideramos os dados da categoria Demais pases e

    ignorados.

  • 29

    Tabela 05: fluxos migratrios de brasileiros retornados, por grupos de idade,

    segundo pas de residncia anterior Brasil, 2010

    As categorias de menores de 15 anos e de 15 a 24 anos, referem-se,

    provavelmente, aos filhos dos migrantes e, consequentemente, a um fluxo de retorno

    para acompanhar os pais ou por motivos de reunificao familiar.

    A faixa mais expressiva compreende a idade economicamente ativa de 25 a

    39 anos, o que revela a conexo da emigrao com motivos de trabalho. Ademais, no

    se pode desconsiderar o efeito da crise econmica que atingiu aos Estados Unidos,

    Japo e pases da Europa a partir de 2007, e tambm o momento de expanso e

    estabilidade econmica que se tem projetado sobre o Brasil no cenrio internacional.

    A segunda maior compreende a faixa etria dos 40 aos 64 anos. Uma das

    possveis explicaes para esse fenmeno, segundo a literatura, seria a busca por uma

    melhor qualidade de vida, no sentido de estar mais prximo famlia e da diminuio

    do ritmo de trabalho (se comparado ao do pas de emigrao).

    Por fim, o nmero menos expressivo diz respeito aos imigrantes que

    retornaram com mais de 65 anos, o que pode indicar um retorno com a finalidade de

    aposentadoria (para aqueles com maior idade) ou motivos de sade.

    Todas essas questes carecem de uma ateno maior e de pesquisas

    especficas para maiores generalizaes.

  • 30

    Nvel de instruo

    No que se refere ao nvel de instruo dos retornados brasileiros (brasileiros

    natos), temos o seguinte panorama:

    Grfico 02: Nvel de instruo dos migrantes retornados

    Fonte: IBGE, Censo Demogrfico 2010

    Em suma, 30% se enquadram na categoria dos sem instruo e nvel

    fundamental incompleto; 13% na de nvel fundamental completo e ensino mdio

    incompleto; 31% nvel mdio completo e superior incompleto; 25,5% em nvel

    superior e 0,4% no determinado.

  • 31

    Tabela 06: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por nvel de instruo,

    segundo pas de residncia anterior Brasil, 2010

    As informaes da Tabela 06 sugerem que, no tocante ao nvel de instruo

    dos migrantes brasileiros retornados, temos uma populao com nvel mdio de

    escolaridade abarcando o nvel mdio completo e o nvel superior incompleto.

    Porm, se consideramos tambm o percentual com nvel superior completo, possvel

    inferir que os migrantes brasileiros retornados possuem um nvel de instruo de

    mdio a alto.

    Quando comparamos a distribuio desses dados dos brasileiros retornados

    por pases de residncia anterior possvel perceber que a maioria dos pases segue

    essa tendncia (de ter a maior parte dos migrantes retornados com nvel mdio

    completo e superior incompleto), exceto para os migrantes retornados do Paraguai,

    onde a maior parte sem instruo e com nvel fundamental incompleto. Outra

    exceo o fluxo proveniente do Reino Unido, onde a maioria possui nvel superior

    completo.

    No podemos esquecer que cada fluxo emigratrio, e de retorno, possui

    caractersticas prprias e elementos histricos e scio-culturais que os particularizam

    e exigem uma anlise mais aprofundada e especfica. Por essa razo, as anlises aqui

    feitas no pretendem esgotar as possibilidades de reflexo, mas sim suscitar questes

    para novas pesquisas.

  • 32

    Condio de atividade

    Segundo o IBGE8, a populao economicamente ativa compreende o potencial

    de mo-de-obra com que se pode contar o setor produtivo. Isso envolve a populao

    ocupada empregados, os que trabalham por conta prpria, os empregadores, e os

    no remunerados, e a populao desocupada que compreende aqueles que no tm

    um emprego no momento, mas esto a procura de um no mercado de trabalho. J a

    populao no economicamente ativa, envolve aqueles que no so classificados

    como ocupados e nem como desocupados.

    Tal definio importante para analisarmos as informaes sobre as condies

    de atividades e as condies de ocupao dos migrantes brasileiros retornados que

    aparecem nas Tabelas 07 e 08, respectivamente.

    Sobre a condio de atividade dos brasileiros retornados, a Tabela 07 revela

    que 71% so economicamente ativos e 29% no so economicamente ativos.

    Tabela 07: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por condio de

    atividade, segundo pas de residncia anterior Brasil, 2010

    Tal dado corroborado quando retomamos os dados de idade, os quais

    apontam para uma predominncia de migrantes retornados na faixa etria de 25 a 39,

    o que corresponde populao em idade economicamente ativa.

    8 http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/trabalhoerendimento/pme/pmemet2.shtm

  • 33

    Isso demonstra que os migrantes quando retornam para o Brasil ainda esto

    em idade para se reinserir no mercado de trabalho. Entretanto, resta saber como so as

    condies, as facilidades e as dificuldades enfrentadas por estes migrantes ao

    retornarem ao mercado de trabalho.

    Condio de ocupao

    Alm de analisarmos as condies de atividade, faz-se pertinente entender as

    condies de ocupao destes migrantes retornados, sendo este o assunto da Tabela

    08.

    Tabela 08: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por condio de

    ocupao, segundo pas de residncia anterior, Brasil 2010

    Nota-se que 91,7% dos migrantes brasileiros retornados esto ocupados e

    8,3% encontram-se desocupados, segundo dados do Censo 2010.

    De modo geral, essa tendncia se aplica quando analisamos a distribuio por

    pases de residncia anterior, conforme podemos visualizar no grfico abaixo.

  • 34

    Grfico 03: Distribuio de migrantes brasileiros retornados, por

    condio de ocupao, segundo pas de residncia anterior

    Fonte: IBGE, Censo Demogrfico 2010

    Dos pases analisados, o Paraguai aquele que tem mais retornados ocupados

    (94,5%). Em seguida, temos os Estados Unidos e o Reino Unido (com 92,5%) e Itlia

    (92,3%) e Espanha (91,2%).

    Por outro lado, Japo e Portugal so os pases que apresentam maior nmero

    de desocupados: 11,5% e 9,1%, respectivamente.

    Este dado significativo quando aliamos a ele as informaes de idade e

    condio de atividade, pois percebemos que os retornados chegam ao Brasil, em

    geral, com uma idade que ainda lhes permite trabalhar e por isso enquadram-se na

    categoria de economicamente ativos. Apesar dos indcios e inferncias que os dados

    nos possibilitam fazer, para compreender a existncia de diferenciais para a ocupao

    aps a migrao e os motivos de estarem ou no ocupados so necessrias anlises

    mais aprofundadas.

  • 35

    Grupos ocupacionais

    A Tabela 09 apresenta a distribuio dos migrantes brasileiros retornados

    segundo grupos ocupacionais, de acordo com os dados do Censo de 2010.

    Tabela 09: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, segundo grupos

    ocupacionais, por pas de residncia anterior Brasil, 2010

    H uma predominncia dos profissionais da cincia e intelectuais (22,8%),

    especialmente os que tiveram como pas de residncia anterior os Estados Unidos. Em

    segundo lugar aparecem os trabalhadores dos servios, vendedores dos comrcios e

    mercados (14,6%), desses destacam-se os que tiveram o Japo como pas de ltima

    residncia. Os diretores e gerentes aparecem como o terceiro grupo ocupacional que

    mais abarca migrantes retornados (10,8%), com destaque para os que retornam dos

    Estados Unidos. Destacamos ainda os tcnicos e profissionais de nvel mdio, quarto

    maior grupo ocupacional (9,5%), que tambm abarca os retornados dos Estados

    Unidos.

  • 36

    Em geral, tais dados vo de encontro s caractersticas apontadas

    anteriormente sobre o nvel de instruo, sendo possvel perceber uma

    correspondncia com essas ocupaes e o nvel de escolaridade mdio dos migrantes

    brasileiros retornados, que o de nvel mdio completo e nvel superior incompleto.

    Conforme j alertamos, tais dados tambm precisam ser melhor investigados,

    especialmente, quando consideramos a particularidade de cada fluxo migratrio e de

    cada local onde esses migrantes se restabelecem (contexto local).

    Rendimento mdio mensal

    Por fim, quanto ao rendimento mdio mensal domiciliar per capita,

    apresentado na Tabela 10, temos uma predominncia entre os maiores nveis salariais:

    22% ganhando de 5 a 10 salrios mnimos; 17% de 3 a 5 salrios mnimos; e 15% e

    15% com rendimento de 10 a 20 salrios mnimos ou superior a 20 salrios mnimos,

    respectivamente.

    Tabela 10: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por rendimento mdio

    mensal domiciliar per capita, em salrios mnimos, segundo pas de residncia

    anterior Brasil, 2010

    Se olharmos esses dados segundo os pases de residncia anterior, os

    migrantes retornados dos Estados Unidos so a maioria dos que ganham entre 10 e 20

    salrios mnimos e mais de 20 salrios mnimos; os retornados do Japo so a maioria

  • 37

    dos que ganham entre 3 e 5 salrios mnimos e quase empatam com os retornados dos

    Estados Unidos na categoria de 5 a 10 salrios mnimos.

    No outro extremo, os retornados do Paraguai so a maioria dos que ganham

    at um salrio mnimo, elemento que dialoga com o fato de terem majoritariamente

    um nvel baixo de escolaridade.

    Dessa forma, quando pensamos esses dados em correspondncia aos de

    escolaridade, podemos inferir uma relao diretamente proporcional entre os

    migrantes retornados com maior nvel de escolaridade e o maior rendimento mensal.

    Em suma, o perfil do migrante de retorno brasileiro, segundo o Censo de

    2010, caracterizado por: predomnio de homens (52,5%), faixa etria de 25 a 39

    anos, o que sinaliza para a migrao por motivos de trabalho. Corroborando esta

    ideia, percebemos que a maioria dos migrantes brasileiros retornados tem como grau

    de escolaridade o nvel mdio completo e o nvel superior incompleto, so

    economicamente ativos e encontram-se ocupados no mercado de trabalho,

    especialmente nas atividades relacionadas cincia e ao setor de servios, o que gera

    um rendimento mdio que varia de 5 a 10 salrios mnimos.

    Dito isso, percebe-se que os fluxos de retorno trouxeram para o Brasil uma

    mo de obra qualificada e jovem, que, ao mesmo tempo, agregaria valor ao mercado

    de trabalho e minimizaria os custos de investimento na formao de capital humano

    (OLIVEIRA, 2013; p. 201). Entretanto, vlido ressaltar que nem todas as

    habilidades e os conhecimentos adquiridos pelos migrantes so aproveitados no

    momento de seu retorno ao pas de origem (HIRANO, 2005), sendo necessria a

    implementao de polticas pblicas voltadas aos imigrantes de retorno (vide anexo).

  • 38

    3. MIGRAO DE RETORNO DESAFIOS E PERSPECTIVAS

    O incremento dos fluxos de migrao de retorno para o Brasil que se d a

    partir de 2007 coloca importantes desafios para pesquisas e para as aes

    governamentais e de organismos internacionais.

    No mbito das pesquisas, este tema foi, por muito tempo, invisvel e quando

    retratado era feito a partir da compreenso de que se tratava de um movimento

    definitivo. Em um contexto de globalizao, dinmico e complexo, os movimentos

    populacionais tambm se dinamizam, as relaes entre origem e destino se tornam

    mais prximas e, cada vez mais, estabelecem-se relaes transnacionais, nas quais os

    migrantes mantm-se conectados aos locais de origem e de destino. necessrio

    perceber o retorno dentre desse dinamismo e considerar a circularidade na migrao e

    as possibilidades de re-emigrao para outros locais.

    J no mbito das aes governamentais, dois aspectos chamam ateno.

    Primeiramente, o predomnio da ideia de que, em geral, os emigrantes brasileiros tm

    por objetivo trabalhar e juntar dinheiro para adquirir bens ou iniciar seu prprio

    negcio ao retornar ao Brasil (SIQUEIRA, 2009). Isso faz com que muitas das

    iniciativas do governo e de instituies no-governamentais associem o migrante

    retornado s atividades de empreendedorismo. Tal fato no pode ser generalizado,

    considerando que aqueles que voltaram ao pas por algum motivo que tenha

    interrompido sua migrao (como a crise econmica, por exemplo) possivelmente

    estaro em grande situao de vulnerabilidade, a ponto de no terem recursos

    financeiros e nem estrutura psicolgica para investir em uma atividade e abrir o seu

    prprio negcio.

    Em segundo lugar, o migrante retornado no visto pelas polticas pblicas (e

    muitas vezes tambm no se percebe) como aquele que passa por uma nova migrao

    quando volta para seu local de origem. Isso faz com que eles sejam tratados pelo

    Estado como brasileiros comuns, desconsiderando sua especificidade e seus

    diferenciais por terem passado por uma experincia de migrao. Consequentemente,

    esses retornados se tornam invisveis para as polticas pblicas destinadas aos

    brasileiros em geral e tambm para aquelas destinadas aos imigrantes.

    Sayad (2000) nos explica muito bem esta contradio. Consta no imaginrio

    do emigrante que, em sua volta, ele ir reencontrar o grupo como se nada tivesse

    mudado durante a sua ausncia e, sobretudo, como se o tempo de emigrao no

  • 39

    tivesse mudado a si mesmo. por isso que o retorno no diz respeito ao espao fsico

    em si, mas principalmente ao espao social, o que implica em uma grande

    impossibilidade prtica, pois o migrante nunca retorna mesma estrutura social que

    havia antes de migrar, apesar de estar de volta ao espao fsico (SAYAD, 2000; p.

    14).

    Em suma, nas polticas migratrias falta a percepo de que o retorno uma

    nova migrao para um local ainda mais desconhecido. A invisibilidade do retornado

    dificulta o equacionamento de polticas e a falta de informao torna a sua situao

    ainda mais vulnervel (CSEM, 2014). Isso se torna ainda mais grave no caso dos

    migrantes indocumentados, que muitas vezes no se sentem seguros o suficiente para

    buscar informaes para preparar o seu retorno ainda quando esto no exterior e

    quando chegam ao Brasil no se adequam aos critrios dos programas sociais

    existentes.

    Dito isso, a migrao, e o retorno em particular, permite interpretaes de

    variadas ordens, entre elas: demogrfica, com o enfoque nos fluxos de populao, os

    pontos de origem e destino; econmica, uma vez que os movimentos populacionais

    podem ser desencadeados por motivaes ou mudanas de cunho econmico; poltica,

    na esfera das polticas migratrias, onde restries e condicionantes so aplicados

    queles que pretendem atravessar as fronteiras entre os pases; psicolgica social, no

    sentido em que considera as dimenses da personalidade do indivduo, assim como

    envolve aspectos como o da integrao dos migrantes sociedade de destino e/ou de

    origem (no caso do retorno); entre outros campos disciplinares, tambm pode ser um

    problema de ordem sociolgica, haja vista que a estrutura social e o sistema cultural,

    tanto dos lugares de origem como de destino, so afetados pela migrao e, em

    contrapartida, afetam o migrante (Botega, 2011). Desenvolver abordagens que

    extrapolem a perspectiva economicista e instrumentalista sobre o migrante em geral, e

    o migrante de retorno especificamente, permanece um desafio tanto para as pesquisas

    quanto para as iniciativas governamentais e de instituies no-governamentais.

  • 40

    ANEXOS PORTAL DO RETORNO

    A partir do final da dcada de 1980 e incio da dcada 90, a ateno

    governamental e da academia, no que diz respeito migrao, concentrava-se na

    presena de emigrantes brasileiros no exterior. Nesse sentido, a questo do retorno

    tinha pouca relevncia, no se contemplava idas e vindas e partia-se do entendimento

    de que o retorno seria um movimento definitivo.

    Entretanto, nos anos 2000, e especialmente, aps a crise de 2007 o retorno

    passa a ocupar um lugar de destaque na poltica migratria, especialmente no mbito

    do Ministrio das Relaes Exteriores (MRE), de entidades da sociedade civil e de

    organizaes internacionais.

    Dentro deste contexto, em 2007, o Ministrio das Relaes Exteriores, com o

    apoio do Ministrio do Trabalho e Emprego, do Ministrio da Previdncia Social, da

    Secretaria de Polticas para as Mulheres, da Secretaria da Receita Federal, da Caixa

    Econmica Federal e do Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas

    (SEBRAE), fez sua mais importante ao no que diz respeito ao retorno: lanou9 o

    Portal do Retorno10

    , um site destinado aos emigrantes brasileiros que desejam retornar

    em definitivo ao pas.

    Devido crise econmica houve um incremento no nmero de retornados ao

    Brasil. Segundo o MRE, estima-se que tenha havido reduo, entre 2008 e 2013, de

    cerca de 20% no nmero11

    de brasileiros residentes no exterior, passando a dispora

    brasileira de 3 milhes para aproximadamente 2,5 milhes. As principais causas de

    re-emigrao seriam a incapacidade em reinserir-se no mercado de trabalho;

    insucesso dos empreendimentos no Brasil; e queda de nvel de vida e de renda em

    relao ao perodo passado no exterior. Dessa forma, o retorno se mostrou um desafio

    no s para os migrantes, mas tambm para o governo, que passou a ser demandado a

    orientar esses brasileiros que queriam voltar ao pas.

    Dito isso, o site busca centralizar todas as informaes disponveis sobre os

    programas e os servios no Brasil que possam ser teis a nacionais que retornam ao

    9 http://www.brasileirosnomundo.itamaraty.gov.br/noticias/lancamento-do-portal-do-retorno/ ;

    http://sistemas.mre.gov.br/kitweb/datafiles/Retorno/pt-br/file/Portal%20do%20Retorno%20Release.pdf 10

    http://retorno.itamaraty.gov.br 11

    Sabe-se a dificuldade que as estatsticas oficiais tm em mensurar o nmero de brasileiros no exterior,

    devido ao fato de muitos estarem em situao irregular de documentao.

  • 41

    pas, buscando atender especialmente aos que esto em situao de maior

    vulnerabilidade. , portanto, uma das principais iniciativas governamentais no que diz

    respeito orientao e difuso de informaes sobre o retorno ao Brasil.

    Figura 03: Portal do Retorno

    Fonte: Portal do Retorno

    As informaes reunidas no Portal do Retorno, seja as iniciativas

    governamentais ou das organizaes internacionais, para orientar os migrantes

    brasileiros e para ajud-los a preparar sua volta para o pas seguem descritas a seguir:

    Providncias documentais antes de retornar 12 : informa sobre os

    documentos que o migrante precisa providenciar ainda no pas em que se

    encontra e que sero teis quando da sua entrada no Brasil, tais como:

    passaporte, certificado de residncia, legalizao consular dos documentos,

    registro de casamento e nascimento, autorizao de viagem para menor,

    documentos que o migrante deve ter consigo (e no despachar) na chegada ao

    Brasil e certificado de vacinao. Alm disso, alerta a necessidade de

    providenciar documentos do tipo: declarao de seguradora estrangeira,

    12

    http://retorno.itamaraty.gov.br/pt-br/providencias_documentais_antes_de_retornar.xml

  • 42

    declarao de quitao de servios, encerramento de conta bancria e cartes

    de crdito, a fim de evitar cobranas indevidas.

    Providncias documentais aps a chegada ao Brasil13: lista os documentos

    que o migrante deve estar atento e buscar regularizar quando da chegada ao

    Brasil, tais como: situao eleitoral, servio militar, carteira de identidade,

    carteira de habilitao, Cadastro de Pessoa Fsica CPF e revalidao de

    diplomas (link para o site do Ministrio da Educao MEC).

    Informaes sobre bagagens e mudanas14: disponibiliza informaes da

    Receita Federal a fim de orientar o migrante quanto legislao brasileira que

    regulamenta a entrada de bagagens no Brasil. O guia destinado a migrantes e

    viajantes que regressam ao Brasil em carter permanente de mudana. Alm

    disso, facilita o link de acesso s informaes do Ministrio da Agricultura,

    Pecuria e Abastecimento sobre o transporte de animais.

    Volta ao mercado de trabalho brasileiro15: rene informaes que buscam

    atualizar e preparar o migrante sobre a situao atual do mercado de trabalho

    no Brasil. As informaes da seo Como est o mercado de trabalho

    brasileiro? apontam para uma economia dinmica e um mercado de trabalho

    em expanso, com aumento no nmero de criao de empregos. Em suma,

    evidencia-se um bom momento no mercado de trabalho brasileiro, o que pode

    ser um atrativo para a volta dos imigrantes.

    Alm disso, disponibiliza informaes sobre onde o migrante poder se

    informar sobre qualificao profissional e vagas de emprego no pas e nos

    municpios brasileiros, com destaque para o Portal Mais Emprego16

    do MTE.

    Neste item divulgam-se os programas do Programa Nacional de Acesso ao

    Ensino Tcnico e Emprego (PRONATEC) do MEC, assim como as iniciativas

    do Sistema S, como Servio Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC),

    Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) e

    Servio Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI).

    13

    http://retorno.itamaraty.gov.br/pt-br/providencias_documentais_apos_a_chegada_ao_brasil.xml 14

    http://retorno.itamaraty.gov.br/pt-br/bagagens_e_mudancas.xml 15

    http://retorno.itamaraty.gov.br/pt-br/volta_ao_mercado_de_trabalho_brasileiro.xml 16

    http://maisemprego.mte.gov.br/portal/pages/home.xhtml

  • 43

    Nesta seo constam ainda informaes sobre os locais de apoio ao

    trabalhador brasileiro retornado. O objetivo destes postos atender aos

    trabalhadores retornados visando orient-los para a reintegrao ao Brasil, o

    acesso a direitos e os deveres que compem a cidadania brasileira e auxili-los

    na reinsero ao mercado de trabalho no pas. At o momento existem dois

    postos de atendimento:

    o NIATRE 17 Ncleo de Informao e Apoio a Brasileiros

    retornados do Exterior (So Paulo/SP): trata-se de uma parceria entre

    o MTE e o Instituto de Solidariedade Educacional e Cultural ISEC.

    Disponibiliza informaes sobre: trabalho e emprego,

    empreendedorismo e associativismo, assuntos ligados educao,

    sade e previdncia social, assuntos jurdicos, imposto de renda,

    documentos e outras. Alm disso, se dispe a intermediar o contato

    entre empresas e os trabalhadores retornados e a ajud-los na

    reinsero ao Brasil. A