relatÓrio final de iniciaÇÃo cientÍfica - pucsp.br · dois governos fhc e o primeiro governo...

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO, CONTABILIDADE E ATUÁRIA Departamento de Economia RELATÓRIO FINAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA Ref. Processo n. 09/201 Título: O Ajuste e a Política Fiscal no Real: os entraves ao avanço da Política Social Tipo de Pesquisa: Programa de bolsa individual de Iniciação Científica da PUC-SP – PIBIC-CEPE Aluna: Marcela de Oliveira Boscatti Professor orientador e responsável: Dra. Rosa Maria Marques

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO,

CONTABILIDADE E ATUÁRIA

Departamento de Economia

RELATÓRIO FINAL DE INICIAÇÃO

CIENTÍFICA

Ref. Processo n. 09/201

Título: O Ajuste e a Política Fiscal no Real: os entraves ao avanço da

Política Social

Tipo de Pesquisa: Programa de bolsa individual de Iniciação Científica da

PUC-SP – PIBIC-CEPE

Aluna: Marcela de Oliveira Boscatti

Professor orientador e responsável: Dra. Rosa Maria Marques

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ÍNDICE

RELATÓRIO DAS ATIVIDADES ............................................................................... 4

RESUMO ......................................................................................................................... 6

RELATÓRIO CIENTÍFICO ......................................................................................... 7

INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 7

CAPÍTULO 1 – ............................................................................................................... 9

INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 9

NOTAS SOBRE AS TENSÕES HISTÓRICO-ESTRUTURAIS NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR À ASSEMBLÉIA CONSTITUINTE ........................ 9

O EMBATE POLÍTICO E OS AVANÇOS DO SISTEMA DE PROTEÇÃO SOCIAL NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 ..................................................................................... 14

CAPÍTULO 2 ................................................................................................................ 24

INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 24

A TRAJETÓRIA DA POLÍTICA FISCAL DO BRASIL NO PERÍODO 1995-2006: O CONSERVADORISMO DO AJUSTE SOB O REGIME DE FINANÇAS GLOBALIZADAS .......................................................................................................... 25

CAPÍTULO 3 ................................................................................................................ 38

INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 38

A POLÍTICA SOCIAL E A POLÍTICA FISCAL DEPOIS DA CF DE 1988: UM DIFÍCIL CAMINHAR ................................................................................................... 39

OS EFEITOS DA POLÍTICA FISCAL SOBRE A POLÍTICA SOCIAL DO GOVERNO FHC ATÉ O SEGUNDO GOVERNO LULA ........................................... 43

O AJUSTE FISCAL: CORTE E FLEXIBILIZAÇÃO DOS GASTOS E MUDANÇAS

CONSTITUCIONAIS ........................................................................................................ 43 A EVOLUÇÃO DA POLÍTICA SOCIAL: UMA ANÁLISE DA EVOLUÇÃO DOS GASTOS SOCIAIS

..................................................................................................................................... 47

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS ........................................................................ 54

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LISTA DE GRÁFICOS E TABELAS

Tabela 1 – Indicadores econômicos selecionados (1975 – 1985). .................................. 10

Gráfico 1 – Despesas da União por categoria econômica (1980 – 2005). ...................... 26

Gráfico 2 – Evolução da dívida pública externa e da taxa de câmbio nominal (1995 – 2006). .............................................................................................................................. 29

Gráfico 3 – Evolução da dívida pública externa e da taxa de câmbio nominal (1995 – 2006). .............................................................................................................................. 30

Gráfico 4 – Necessidades de financiamento do setor público (1995 – 2006). ................ 34

Gráfico 5 – Evolução da carga tributária (1995 – 2006). ............................................... 35

Gráfico 6 – Evolução da dívida líquida do setor público (DLSP) (1995 – 2006). ......... 36

Gráfico 7 – Evolução do superávit primário do Tesouro Nacional (1995 – 2006)......... 36

Tabela 2 – Evolução do gasto social e das desvinculações do OSS (1995 – 2005). ...... 47

(R$ bilhões) ..................................................................................................................... 47

Tabela 3 – Desvinculação de Receitas da Seguridade Social (1995 – 2006). ................ 48

(R$ bilhões) ..................................................................................................................... 48

Tabela 4 – Orçamento Fiscal e da Seguridade Social. Despesas da União (1995 – 2005). ........................................................................................................................................ 49

(% PIB) ........................................................................................................................... 49

Tabela 5 – Evolução dos impostos do OSS (1995 – 2005). ........................................... 51

(R$ bilhões) ..................................................................................................................... 51

Gráfico 8 – Evolução do Saldo Previdenciário e das Desvinculações do OSS (1995 – 2005). .............................................................................................................................. 52

(R$ bilhões) ..................................................................................................................... 52

Tabela 6 – Evolução anual do Gasto Social Federal e da receita do OSS(1995 – 2005). ........................................................................................................................................ 52

(R$ bilhões) ..................................................................................................................... 52

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RELATÓRIO DAS ATIVIDADES

Este relatório tem como finalidade descrever as atividades concluídas neste

período de pesquisa científica, mostrando os resultados obtidos.

Antes de apresentar os resultados alcançados no primeiro período de pesquisa, é

fundamental recuperar o objetivo do trabalho apresentado no projeto. Definiu-se como

objetivo analisar a tensão entre os fundamentos da política social garantidas pela Carta

Constituinte de 1988 e dos novos princípios da política econômica inaugurada no Plano

Real. Busca-se, também, identificar os impactos que a política fiscal do Plano Real teve

sobre o Orçamento da Seguridade Social.

Assim, o projeto foca a análise na política fiscal no período que compreende os

dois governos FHC e o primeiro governo Lula. Já sobre a política social, buscamos

retomar origens do momento imediatamente anterior à Constituição, dando maior

possibilidade de estabelecer parâmetros de comparação com o que ocorre após o Plano

Real.

O calendário estabelecido inicialmente pelo projeto teve algumas alterações, de

forma a focar a análise de cada capítulo por vez, obtendo assim os dados com mais

precisão e conseguindo otimizar a bibliografia estudada. A estrutura do relatório

também ganhou nova seqüência, já que conforme foi sendo elaborado o trabalho

percebeu-se que realocando os capítulos, em ordem diferente da primeiramente

proposta, ganhava-se em lógica de continuidade. Assim ficou estabelecido que o

primeiro capítulo trata da Seguridade Social dentro dos padrões inscritos na

Constituição Federal, promulgada em 1988, enquanto no segundo capítulo a análise foi

voltada ao ajuste fiscal adotado juntamente com a implementação do Plano Real, em

1994. No último capítulo faz-se a junção das duas idéias, e procura defender a tese de

que a política social é preterida em relação à política econômica, em especial pela opção

de alçar seguidos superávits primários na economia.

O desenvolvimento desse trabalho contribuiu para a formação acadêmica da

bolsista. O aproveitamento da beneficiária dessa bolsa de Iniciação Científica nas

disciplinas: Economia do Setor Público, Política e Planejamento Econômico e

Economia Brasileira II foi otimizado devido seu envolvimento com essa pesquisa. A

formação da aluna, durante a vigência da bolsa, também foi favorecida com o curso de

outras matérias, como Teoria Macroeconômica I, II e III, Economia Monetária,

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Metodologia de Análise Econômica, Economia Brasileira, Economia Monetária, dentre

outras, sendo que em relação as matérias citadas, obteve média ponderada de 7.8,

apontando um aproveitamento satisfatório dentro do curso.

Ainda sobre seu andamento acadêmico é importante salientar a participação da

bolsista no Grupo de Pesquisa Políticas para o Desenvolvimento Humano, o qual é

liderado pela sua orientadora. A participação nos seminários quinzenais, e inclusive a

apresentação do projeto de Iniciação Científica e do relatório parcial em uma das

reuniões contribuiu para uma visão mais ampla sobre o assunto tratado no relatório,

trazendo novos olhares e sugestões para o desenvolvimento do trabalho. O interesse e a

presença nesse Grupo de Pesquisa propiciou, ainda, encontros freqüentes entre bolsista

e orientadora, auxiliando no desenvolvimento desse trabalho de Iniciação Científica.

Falando especificamente sobre o levantamento bibliográfico e dos dados

referentes à política fiscal e social, bem como os dados da Constituição, foram

utilizados meios como teses ou publicações de universidades como UNICAMP e PUC-

SP e artigos de diversas instituições, tais como IPEA, BACEN, CESIT, além, é claro, de

dados empíricos pesquisados no IPEADATA. Esse site foi utilizado quase

exclusivamente por reunir uma base extensa de dados de diversos organismos

brasileiros, como o BACEN e o Tesouro Nacional.

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RESUMO

A política social no Brasil esteve, desde os primórdios de sua formação, subordinada aos objetivos do desenvolvimento econômico. Mesmo que possa se constatar avanços importantes nas conquistas dos direitos sociais ao longo do tempo, de maneira geral, a política social ficou restringida aos espaços abertos pela política econômica. A restrição dos avanços da questão social requeridos pela Constituição de 1988 na década de 1990 pode ser vista como um exemplo do cenário aqui descrito. A tentativa de implementar uma política social universal e redistributiva, na Carta Constituinte, foi minada por uma política macroeconômica que paga altas taxas de juros para os detentores de títulos da dívida pública e busca incessantemente o controle dos gastos públicos através dos ajustes fiscais, principalmente a partir do Plano Real. Neste sentindo, o redirecionamento de recursos para o Orçamento da Seguridade Social (OSS) foi restringida o que dificultou os avanços no âmbito social do Brasil. Portanto, a política social neste período é, indubitavelmente, preterida vis-à-vis a política fiscal, a qual manifesta um maior enquadramento com a economia globalizada. Dessa forma, o objetivo do trabalho é mostrar como a política macroeconômica do Real e, especificamente, a política fiscal impediu a consolidação do OSS e dos princípios consagrados pela nova política social.

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RELATÓRIO CIENTÍFICO

INTRODUÇÃO

A promulgação da chamada Constituição Cidadã foi um marco no avanço da

abrangência da Política Social no Brasil. Pela primeira vez, em 1988, o país teve

assegurado por lei benefícios que hoje nos parece tão básicos, tal qual a Saúde, a

Assistência e Previdência Social para todos que delas necessitarem. Nunca antes na

história do país a população tinha alcançado tamanha abrangência e inclusão no âmbito

social.

A implementação do Plano Real, anos mais tarde, trazia a solução de um

problema que incomodava a população brasileira: o fantasma da inflação tinha seus dias

contados. Entretanto, devido ao cenário desfavorável que o Brasil se encontrava, em

1994 os governantes optaram por uma política econômica que traria implicações

desfavoráveis no tocante da Seguridade Social: o ajuste fiscal. O que de fato traria

impactos à Seguridade prevista em Constituição foram as medidas adotadas para

alcançar este ajuste. Para conseguir cumpri-lo os agentes se muniram com diversas

manobras que findavam aumentar o montante de recursos disponíveis para a União.

O objetivo principal deste ajuste fiscal era a obtenção de sucessivos superávits

primários, os quais pagariam os juros da dívida, demonstrando a preocupação sobre o

novo modelo econômico introduzido no Plano Real, que entre outros aspectos, visavam

a inserção brasileira no cenário internacional, de forma a cultivar a confiança de agentes

internacionais sobre nossa economia.

A partir desta breve descrição, é possível examinar uma subtração dos recursos

disponíveis à Seguridade Social assegurados pela Constituição Federal em prol das

receitas da União, de forma a dar liberdade para que esses recursos desviados sejam

empregados da maneira que melhor convir para as contas do governo.

Esta analise considera que os aspectos introduzidos acima possuem importância

fundamental para entender o movimento problemático de evolução no setor social do

Brasil. Assim, o objetivo deste trabalho é estudar os movimentos macroeconômicos

brasileiros, de forma a buscar possíveis explicações para a atual situação de nossa

Saúde, Assistência e Previdência Social.

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Para atingir esse objetivo, este trabalho foi dividido em três capítulos, além desta

introdução e da conclusão. O primeiro capítulo procura retomar, brevemente, os

aspectos sociais do país antes da publicação da Carta Constituinte, de forma a

possibilitar a comparação com os avanços nela alcançados. Ainda procura-se situar o

cenário em que se foi discutida a emenda constituinte, de forma a explicar algumas

peculiaridades vista na Constituição de 1988.

O segundo capítulo é dedicado ao exame de como se deu o ajuste fiscal no Brasil

a partir de 1994. Para tanto, fez-se uma rápida evolução histórica, de forma a

caracterizar o cenário vivido pela economia brasileira nos anos anteriores a essa opção

fiscal. Por fim, procura-se fazer uma análise do propósito que a política fiscal tinha,

colocando em evidência os meios usados para alcançar seus objetivos.

O terceiro e último capítulo analisa como o movimento de abrangência da

política social estabelecida na emenda constituinte foi afetada pela opção fiscal

instituída após o Plano Real. Para isso apresenta-se como ocorreram as flexibilizações

dos gastos, bem como os meios para desvinculação dos mesmos. Em relação aos

impactos que a Seguridade Social sofreu, procura-se proporcionar dados empíricos,

dando consistência ao ponto levantado.

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CAPÍTULO 1 –

INTRODUÇÃO

Neste capítulo apresentam-se os princípios da Seguridade Social no Brasil, de

forma a ilustrar o modo como o texto constituinte procurou ampliar o escopo de

proteção da população brasileira a partir de sua promulgação em 1988. Nesse

movimento, serão observados os entraves e os avanços estabelecidos a fim de, por

exemplo, conseguir os benefícios de caráter universal na Saúde e na Assistência,

parcialmente no que diz respeito à Previdência, e como processaram-se num cenário de

grandes tensões e rearranjos políticos e sociais.

Para alcançar esses objetivos, começa-se apresentando o cenário mundial e,

principalmente, o panorama brasileiro no momento imediatamente anterior a

promulgação da Carta Constituinte. A crescente dívida externa, os desequilíbrios na

balança de pagamentos e as altas taxas de inflação fizeram parte da situação econômica

do Brasil, daquele momento. Essas situações favoreceram um desequilíbrio no campo

da política, fragilizando a execução de fortes alianças entre as elites econômicas e as

políticas-regionais.

A partir daí, delineamos o contexto e as bases que, mais tarde, formaram as

lideranças do debate em torno da Constituição de 1988. Sempre que possível descreve-

se a situação e os embates políticos que ocorreram durante o processo de definição da

política social no Brasil. Ainda nesse ponto, é apresentada a descrição da Seguridade

Social, definindo as diferenças e melhoras que a Constituição Cidadã trouxe à

população a partir de sua publicação. Neste ponto detalhamos os benefícios agregados

no âmbito da Saúde, da Assistência e Previdência Social.

NOTAS SOBRE AS TENSÕES HISTÓRICO-ESTRUTURAIS NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR À ASSEMBLÉIA CONSTITUINTE

O começo da década de 1980 foi marcado por uma série de transformações na

economia internacional, comandada pela restauração conservadora dos Estados Unidos

e pelo segundo choque do preço do petróleo. Essas transformações colocaram o Brasil

numa posição de grande restrição externa, em razão do rápido aumento das importações

de petróleo, que respondeu à elevação dos preços internacionais, e da expansão da

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dívida cotada em moeda estrangeira, entendida como um resultado do choque da taxa de

juros norte-americana.

Essa restrição externa, que significou uma crise do balanço de pagamentos,

transformou-se numa expansão crônica da inflação em virtude da realização forçada de

megasuperávits comerciais, por meio da grande desvalorização cambial, que foram

utilizados para financiar aquela crise do balanço de pagamentos. Conforme lembrou

Teixeira (1992), “a raiz da aceleração inflacionária crescente estava a crise cambial

vivida pela economia brasileira”, que era compreendida:

[...] como a impossibilidade de aumentar o nível de reservas, uma vez que o montante de transferências [foi] sendo negociado ano a ano e era uma função do próprio superávit exportador. A conseqüência imediata foi a ineficácia da política econômica para estabilizar a moeda nacional e, por conseqüência, a própria moeda nacional” (Teixeira, 1992: p.88-89).

Como se observa na Tabela 1, o começo dos anos 1980 foi marcado por quedas

da taxa de crescimento e ampliação do endividamento externo que foram acompanhadas

pela desvalorização do câmbio e ampliação da inflação. Se entre 1975-1980 a economia

brasileira cresceu em média a 6,9%, partir de 1981, a taxa de expansão do Produto

Interno Bruto (PIB) caiu violentamente. Entre 1981 e 1984, a média do crescimento

passou a ser de -0,3%, sendo que em 1981 o PIB se reduziu em 4,3%. Essa oscilação do

produto se traduziu na expansão da relação dívida externa em relação ao PIB, que

aumentou de 19,3%, em 1975, para 53,8%, em 1984. Em relação à inflação, pode-se

notar um crescimento explosivo (de 29,3%, em 1975, para 223,8%, em 1984) e, quanto

ao câmbio, houve uma desvalorização da ordem de 30 pontos percentuais no mesmo

período.

Tabela 1 – Indicadores econômicos selecionados (1975 – 1985). IGP-DI (% a.a) PIB (% a.a) Dív.Externa/PIB (%) Taxa de Câmbio Real (1980=100)

1975 29,3 5,2 19,3 87,9

1976 46,3 10,3 20,9 86,6 1977 38,8 4,9 21,4 85,6 1978 40,8 5,0 25,9 86,0 1979 77,2 6,8 25,0 99,3 1980 110,2 9,2 27,0 100,0 1981 95,2 -4,3 28,6 92,7 1982 99,7 0,8 31,5 94,3 1983 211,0 -2,9 49,4 114,8 1984 223,8 5,4 53,8 111,9

Fonte: IPEADATA; IBGE; ZINI Jr. (1985). Elaboração Própria

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Essas sucessões de crises, primeiramente do balanço de pagamentos e depois da

inflação, também transformaram o campo de disputa política no Brasil. Com a

deterioração do padrão de financiamento previamente estabelecido e a conseqüente

incapacidade de sustentar as altas taxas de crescimento econômico, tornou-se cada vez

mais complexa a execução das alianças heterogêneas que envolviam as elites

econômicas e políticas-regionais, bem como, a manutenção do regime autoritário num

ambiente de reorganização das massas em prol do retorno da democracia.

Esse processo colocou claros limites à atuação do Estado, como principal

dirigente econômico e equalizador das tensões políticas, reduzindo seu poder de

administrar conflitos da sua base de sustentação. Amorim (2009: p.16) resumiu essa

situação:

A Crise da Dívida acaba por tornar insustentável o modelo de desenvolvimento anterior, guia, até então, do crescimento econômico do Brasil. Ali, quando as fontes de financiamento desapareceram, todo o arranjo vivido ruiu de uma só vez e determinou o surgimento de duas impossibilidades fundamentais por parte do moderno Estado brasileiro, nascido a partir de 1930: i. a impossibilidade de continuar administrando a aliança heterogênea entre elites com poder econômico e/ou político-regional no plano interno; ii. a impossibilidade de este Estado manter unido o tripé (capital estrangeiro, capital privado nacional e recursos estatais) que, desde os anos 1950, sustentou o país na rota da industrialização acelerada, embora desigual e socialmente injusta. A primeira impossibilidade surgiu devido ao Estado brasileiro, após o processo de estatização da dívida e a alta internacional dos juros, ter visto seu programa de intervenção econômica tornar-se inviável, impedindo a administração de conflitos em sua base de sustentação política. Se o setor público havia crescido em ação e função, administrando os conflitos pela realização de fugas para frente, não apenas abrindo novas fronteiras que permitissem a continuidade da acumulação, mas, também, tornando-se peça fundamental da valorização do capital, agora, nos anos 1980, diante dessa impossibilidade, o pacto se desfazia e a aliança se desestabilizava (FIORI, 1989). É nesse sentido que a Crise da Dívida nos anos 1980 exacerba os conflitos: o Estado estava endividado e internamente não havia nenhum canal de financiamento para continuidade do investimento e dos gastos públicos. Ou seja, sem recursos externos e internos, a fuga para frente tornara-se impraticável e o pacto político perdia a capacidade de cooptação, engendrando uma crise política que ensejou uma profunda transformação no Estado em relação à sociedade (AMORIM, 2009: p.16).

Desse modo, o início dos anos 1980, no campo político, foi caracterizado por um

reequilíbrio interno entre forças dos mais diversos setores da sociedade a fim de

substituir o arranjo político e econômico anterior, liderado pelos militares. Isto é, nesse

ínterim a conformação de novas alianças e associações entre várias camadas sociais

marcaram a busca pela formação de novas lideranças capazes de dirigir o

desenvolvimento da nação a partir daquele momento. Devido à elaboração, por parte

dos militares, de um do projeto de retirada do poder de forma “lenta, gradual e segura1”,

1 O General Golbery do Couto e Silva, mentor do plano de retirada do poder dos militares, adotou um programa de transição do regime autoritário para o democrático que ele próprio definiu como “lento, gradual e seguro” (SAMPAIO, 2009).

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imprimiu-se, ao longo do período de transição do autoritarismo para democracia, a

conformação de novos e diversificados grupos de interesses, que travaram uma disputa

política na qual os objetivos eram tentar sustentar ou reverter os privilégios

historicamente estabelecidos.

Desse modo, as diversas modificações no campo das alianças políticas iam se

redefinindo segundo os interesses e as perspectivas de cada setor da sociedade dentro

desse processo de transição. Num primeiro momento, a configuração entre os diversos

grupos sociais foi assim definida por Sampaio (2009: p.38):

No âmbito político, o grupo de Geisel teve de enfrentar com rigor as forças que pressionavam pela aceleração do processo de transição do poder em favor dos civis. Somente quando os principais líderes da campanha pela redemocratização – Ulysses Guimarães, Franco Montoro e Tancredo Neves – aceitaram a tese da transição “lenta, gradual e segura”, o governo reuniu condições de submeter os radicais da corporação militar e pautar a data da transição. A essência desse acordo – tacitamente celebrado – dizia respeito à amplitude do regime democrático a ser implantado no país depois da volta dos militares aos quartéis. Em outras palavras: que margem de liberdade se outorgaria ao povo em um regime que substituiria o autoritarismo militar? O centro político aceitou a exigência dos militares: a nova democracia seria entregue aos civis, mas deveria ser limitada, a fim de evitar qualquer risco de que o povo viesse a ameaçar o poder da burguesia. Mas nem os militares nem os políticos do centro perceberam que seria impossível abrir o sistema político sem que um terceiro personagem entrasse no processo de recomposição da ordem civil: as combativas organizações populares.

Ainda que nesse primeiro momento a aliança entre o centro político e os líderes

militares tenha guiado a transição do autoritarismo para a democracia, foi a intensa

participação das massas que motivou aquelas transformações das alianças políticas. Isso

se deve, primeiramente, ao fato das organizações populares se tornarem um importante

elemento para pulverizar o grupo militar contrário à tese de transição “lenta, gradual e

segura”, ou seja, a reorganização das massas era fundamental para dissuadir o grupo

mais radical dos militares que era contrário à redemocratização. Em segundo lugar,

estas organizações também desempenhavam uma função importante para o centro

político – liderado principalmente pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB) – já

que este setor precisava de apoio em várias camadas sociais para conseguir comandar o

regime democrático depois da transição. Aproveitando esse espaço, as manifestações

populares ganharam notoriedade e passaram influenciar diretamente os rumos do debate

da democratização, a saber: o movimento sindical, a organização de novos partidos

políticos e de oposição, a retomada da mobilização estudantil, e o revigoramento das

associações de classe e de trabalhadores.

Com efeito, a ascensão das massas populares à condição de elemento essencial

para equilibrar as disputas políticas promoveu um deslocamento de parte do centro para

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a esquerda2 deflagrando uma ofensiva contra aquela política de transição “lenta, gradual

e segura”. Esse rearranjo de caráter centro-esquerda visou acelerar o processo de

redemocratização via eleições diretas para Presidência da República já em 1984

(SAMPAIO, 2009). A partir desse rearranjo, o MDB, que se transformou em Partido

(PMDB), realizou a construção de uma agenda de transformações altamente

progressistas, que tinham como principal objetivo definir um “amplo projeto de

transformações de caráter nacionalista e igualitário” (FAGNANI, 2005).

No entanto, temendo uma radicalização desse movimento em função da grande

presença popular nas ruas e do maior espaço adquirido por certos segmentos da

esquerda, no momento crucial da campanha das Diretas-Já3, o centro retomou seu

acordo com ala direitista, apoiando novamente o cronograma de transição gradualista

que tinha como ponto chave a realização da eleição indireta. Assim, uma parcela

relevante do centro político abandonou a esquerda e resgatou àquela aliança com a

direita a favor das eleições para presidente civil por meio do Colégio Eleitoral, que era

controlado pelos militares.

Sem o apoio do centro, a esquerda se mostrou incapaz de comandar, sozinha,

esse movimento para realização das eleições diretas e aceleração do fim do regime

autoritário. Embora o Partido dos Trabalhadores (PT) fosse uma instituição plenamente

estabelecida, não possuía a composição de forças necessária para liderar o processo de

ruptura da ordem institucional vigente. Portanto, o desfecho do período de transição do

regime autoritário para o democrático acabou isolando a esquerda, sendo conduzido por

uma via de centro-direita.

2 A esquerda era caracterizada, além dos movimentos populares, por correntes socialistas, comunistas e partidos políticos progressistas engajados, desde o início do processo de redemocratização, na realização de uma rápida devolução do poder para os civis (SAMPAIO, 2009).

3 Sallum Jr (2003: p.37) explica o processo de formação das “Diretas-Já”: “Foi no empresariado privado, porém, que ocorreu a fratura mais importante da base de apoio do Estado. Parte das elites empresariais não apenas se opôs à estratégia governamental de ajuste, mas aderiu a “projetos” alternativos para enfrentar a crise econômica, indicando claramente o esvaziamento da liderança do governo. Uma porção da elite empresarial, a dissidência mais numerosa, foi magnetizada por uma versão mais nacionalista e industrialista de desenvolvimentismo e uma outra, bem menor, foi atraída por uma variante periférica de neoliberalismo. Essas reações surgidas no interior da elite empresarial e no sistema de empresas estatais favoreceram a atuação da oposição político-partidária no Congresso e seus esforços para mobilizar as classes médias e populares na luta contra a perpetuação do regime militar. Essa mobilização de massa resultou, entre janeiro e março de 1984, na mais importante demonstração pública ocorrida no Brasil em favor da democratização política – a campanha das Diretas Já”

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Os diferentes acordos fixados neste período mostraram que se o centro político

não contava com uma força política única “para imprimir uma direção clara aos embates

de recomposição do poder civil”, o movimento popular, aliado à esquerda, “não tinha

condições de radicalizar sua pressão, de modo a promover uma ampla democracia”

(SAMPAIO, 2009: p.40). Foi esse cenário que marcou os embates de instauração da

assembléia constituinte: a ausência de uma correlação de forças principal apta a guiar a

construção da nova Constituição Federal (CF), depois do restabelecimento do regime

democrático.

O EMBATE POLÍTICO E OS AVANÇOS DO SISTEMA DE PROTEÇÃO SOCIAL NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

A despeito da ausência de uma corrente política dominante, no período de

instauração da Constituição, a disputa política foi comandada basicamente por dois

grupos distintos que possuíam interesses contrários no que se refere aos avanços a

serem implementados pela emenda constituinte. Nesse sentido, Draibe (1998) lembrou

que o reformismo projetado pela nova CF, a partir da liderança dos setores

progressistas, enfrentou movimentos opostos liderados pelos setores conservadores, em

especial o grupo de empresariado e os militares.

Portanto, o debate em torno da CF foi conduzido, de um lado, por um grupo de

natureza centro-esquerda, mais progressista, encabeçado por setores do PMDB, os

partidos de esquerda e os movimentos populares, a favor da implementação de um

amplo conjunto de políticas de maior inclusão social e política das massas. Do outro

lado do debate estava o Centrão, constituído pela velha fronda conservadora, por

fragmentos dispersos do centro e lideranças empresariais, obstinado a impedir a

execução desse conjunto de políticas que claramente afetavam seus privilégios e

interesses políticos e econômicos (SAMPAIO, 2009).

Num primeiro momento, o grupo progressista saiu a frente do debate ao

conseguir aprovar um procedimento de elaboração de um novo texto constitucional

altamente favorável à participação popular. Esse procedimento permitiu a realização de

“audiências públicas, nas quais se ouviriam entidades da sociedade civil, assim como

pessoas de notório saber e experiência em relação ao tema de cada uma delas” e a

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possibilidade de aprovar emendas populares4, que “deveriam ser apreciadas pela

Assembléia e poderiam ser defendidas em plenário por oradores designados pelas

próprias entidades proponentes” (SAMPAIO, 2009: p.42-43).

A partir dessa conquista, o ambiente de configuração das emendas e leis da CF

foi marcado pela grande presença da população de todos os setores. Essa presença fez

com que o texto da CF se tornasse bastante heterogêneo, mas com uma clara tendência a

esquerda. O resultado desse primeiro movimento foi, portanto, uma ampliação do

espaço do grupo progressista na elaboração das emendas constituintes ao mesmo tempo

em que colocou o Centrão na defensiva com um menor raio de manobra.

Esse fortalecimento dos progressistas respondeu não somente a essa maior

participação popular, como também a uma rearticulação política deste com o Centrão.

Nesse sentido, conforme demonstrou o próprio Sampaio (2009: p.44), as recorrentes

crises econômicas e as eleições de 1988 possibilitaram ao grupo progressista o ganho de

novas concessões no processo de elaboração da CF:

Na década de 1980, a burguesia brasileira, endividada tanto em dólares quanto em moeda interna, dividia-se entre setores que acreditavam no prosseguimento do projeto desenvolvimentista e setores cuja única aspiração era subordinar o mais rapidamente possível a economia nacional à nova ordem neoliberal. Sem claras orientações das suas lideranças e expostos a um desgaste enorme pelas organizações populares – Central Única dos Trabalhadores (CUT) à frente –, grande parte dos constituintes da direita deixou de comparecer às sessões da Assembléia, preferindo cuidar de suas bases eleitorais, tendo em vista a eleição municipal marcada para outubro de 1988. Esse comportamento deu extraordinária vantagem para a esquerda, pois, como o funcionamento das sessões dependia da presença de um número mínimo de constituintes em plenário, a faculdade regimental que possibilitava a qualquer constituinte requerer verificação desse quorum tornou-se “moeda de troca”: ou se concedia alguma coisa à esquerda para que esta se abstivesse de usar essa faculdade ou as sessões eram suspensas e não se avançava na redação do texto constitucional.

Desse modo, os avanços obtidos pela esquerda nesse primeiro momento foram

dando ao texto constituinte contornos mais inclusivos e distributivos. No entanto, num

segundo momento, depois dessas conquistas, o Centrão, disperso até então em função

das questões econômicas e políticas mencionadas na citação acima, reorganizou-se para

impedir que esses avanços fossem, efetivamente, consagrados. A principal iniciativa

nesse sentido foi a mudança da regra de votação das emendas: anteriormente era o

Centrão que necessitava de maioria de votos para aprovar suas emendas, já com essa

4 As emendas só seriam votadas se apresentadas por entidades da sociedade civil e contendo, ao menos, trinta mil assinaturas.

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mudança seriam os progressistas que a fim de aprovar suas emendas precisavam

conseguir mais de 50% dos votos.

Ao implementar essa alteração, a CF apresentou um caráter extremamente

ambíguo, ou seja, contemplou importantes conquistas em direção à maior inclusão

social e política das massas, mas simultaneamente preservou parte dos direitos já

existentes da elite5. Essa ambigüidade se refletiu, obviamente, nas reformas que foram

sendo propostas para o setor social.

Conforme definiu Draibe (1998: p.13), os líderes progressistas projetaram, na

nova CF, um sistema de proteção social mais inclusivo que atendesse a toda população

sem diferenciação. No entanto, essas reformas foram sendo restringidas em virtude dos

“movimentos e sinais contrários emanados (...) das distorções corporativistas dos

interesses organizados”. Desse modo, estenderam-se à questão social as tensões já

existentes entre o Centrão – que temia ter de arcar com a expansão dos encargos e dos

custos que seriam necessários para financiar os programas de inclusão social – e os

progressistas – que apoiados pela massa trabalhadora procurou implementar esses

programas. Na realidade essa tensão refletia, em última instância, a discussão sobre até

que ponto deveria se abandonar ou reformar o sistema de proteção social herdado pelos

militares.

No período militar as relações entre as políticas sociais e a política econômica

não caminhavam no mesmo sentido. As altas taxas de crescimento econômico e de

investimentos não se traduziam num aumento do bem-estar de toda população, mas

apenas de alguns setores mais abastados. Desse modo, o crescimento econômico no

Brasil, do ponto de vista social, significava aumento da disparidade de renda e

incapacidade de atender às necessidades primárias (saúde e educação básica, por

exemplo) da população mais pobre. Essas características respondiam, primeiramente,

aos mecanismos de financiamento do gasto social, os quais tinham um caráter

regressivo.

5 Um exemplo dessa ambigüidade está em diversos setores de políticas públicas. Se, por um lado, a Constituição conseguiu aprovar uma lei que universalizou os direitos da seguridade social (Saúde, Previdência e Assistência Social) e estabeleceu pisos para os benefícios, por outro, mediante à “operação desmonte” realizou corte drásticos numa infinidade de outros programas, como transporte público, alimentação e reforma agrária (FAGNANI, 1997; SAMPAIO, 2009).

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As “contribuições sociais”, que eram a principal fonte de financiamento do gasto

social no período militar, incidiam sobre a folha de salários do mercado formal urbano e

eram pagos pelos empregados e pelos empregadores. No entanto, a massa trabalhadora,

além desse pagamento direto via impostos sobre o salário, tinha que arcar com os custos

oriundos dos tributos indiretos, já que, dada a política fiscal vigente, as empresas

podiam repassar o valor das suas contribuições sociais ao preço final das mercadorias.

Desse modo, grande parte da população contribuía duas vezes com o sistema social:

uma direta, mediante o recolhimento do imposto sobre a renda, e uma indireta, através

do aumento dos preços que estava ligado ao repasse dos custos da produção ao preço

final dos bens de consumo.

Além dos mecanismos regressivos, outra característica desta política era o

“vínculo contributivo”. O principio era que a proteção social só traria benefícios para

quem contribuísse com ela. “Essa regra excluía da proteção social toda a população

inseridas em atividades rurais e informais urbanas. Mesmo no caso do trabalhador do

mercado formal urbano, a proteção social dependia do vínculo ao emprego, o que a

tornava instável, em função da alta rotatividade do mercado de trabalho brasileiro.”

(FAGNANI, 2005: p.4).

Portanto, os interesses do Centrão eram de conservar a política social tal como

praticada nos anos de chumbo: limitada ao grupo contribuinte e com financiamento que

onerasse majoritariamente as classes mais pobres. Já para os progressistas, a idéia era

reestruturar esse padrão buscando equacionar as desigualdades do sistema de

financiamento e estender a proteção social para toda população.

O resultado desse embate, na Carta Constituinte promulgada em 1988, foi

favorável ao grupo progressista. Se em setores como reforma agrária e habitação, o

Centrão conseguiu acumular forças para impedir reformas mais nacionalista, na questão

da Seguridade Social – que asseguraria os direitos relativos a Saúde, Previdência e

Assistência Social – houve claramente uma vitória para os progressistas.

A primeira das conquistas obtidas foi que o assegurado não precisava mais

necessariamente contribuir para gozar dos benefícios a ele atribuído. Isso valia

plenamente no âmbito da Saúde, com a implementação do Sistema Único de Saúde

(SUS), e na Assistência Social, com programas como o Beneficio de Prestação

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Continuada e a promulgação da Lei Orgânica da Assistência Social (Loas), por

exemplo.

No âmbito da Saúde, o avanço mais significativo foi a criação do SUS que

instituía ações com finalidade de prevenir, tratar e manter a saúde de toda a população,

tornando-a um direito universal. Neste campo, a Carta Constituinte estabeleceu que “a

saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e

econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso

universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e manutenção”

(art.196, Constituição Federal de 1988).

O SUS não tinha só como jurisdição o atendimento médico clinicado. Era de

competência deste mesmo sistema acompanhar também o Movimento Sanitarista,

destacando-se neste sentido “o controle e a fiscalização dos procedimentos, produtos e

substâncias de interesse para a saúde (...); a execução das ações de vigilância sanitária,

epidemiológica e da saúde do trabalhador” entre outros pontos de abrangência

(FAGNANI, 2005: p.241).

Esse projeto descrito na Constituição dispunha como fonte de financiamento o

Orçamento da Seguridade Social que, por sua vez, tinha uma vinculação mínima de

30% dos recursos totais (excluindo os recursos do seguro-desemprego) exclusivamente

voltados para a área da Saúde. Nesse sentido, é importante destacar também que foi

implementado limites ao setor privado na atuação do campo da Saúde, estabelecendo

que tal segmento só poderia atuar de forma complementar a pública, ainda assim

respeitando as normas estabelecidas pelo SUS.

Os benefícios assistenciais também foram contemplados na nova Constituição,

deixando de ter um caráter filantrópico para se transformar num direito universal,

assegurando, portanto, a “quem dela necessitar, independente da contribuição à

seguridade social” (art.203, idem). Nesse setor, os direitos abrangiam a proteção à

família, à maternidade, à infância, ao adolescente e aos idosos. Além disso, também

englobavam o amparo às crianças e jovens carentes, bem como, a promoção e

integração ao mercado de trabalho e a reabilitação e reintegração social de pessoas

portadoras de deficiência (FAGNANI, 2005).

Um dos avanços dessa área foi a abrangência e melhora que o beneficio de

“Renda Mensal Vitalícia” (RMV) obteve na CF. O valor do beneficio, antes de meio

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salário mínimo subiu para um salário e não mais se fez necessária a contribuição de 12

meses para ser favorecido, tornando-se um benefício da Assistência Social, ao invés de

um programa da Previdência Social, acessível a quem dela necessitar, independente de

contribuição ao sistema. O objetivo dessa assistência era fornir um salário mínimo para

idosos e pessoas com deficiência que provassem não ter condições de ser provido pela

família ou de se prover. Após a regulamentação da Lei Orgânica da Assistência Social,

o RMV passou a ser nomeado como Benefício de Prestação Continuada (BPC). Ainda

dentro do âmbito da assistência social, a Constituição de 1988 promoveu um conjunto

de novos direitos à criança, ao adolescente, aos portadores de deficiência e aos idosos,

estabelecendo regras e programas de auxilio aos participantes destas categorias.

No que diz respeito à Previdência Social, a Carta Constituinte de 1988 trouxe

conquistas expressivas à parcela da população beneficiada. Segundo Fagnani (2005)

pode-se considerar que as principais desigualdades do sistema foram corrigidas, a saber:

a uniformidade e equivalência dos benefícios rurais e urbanos, ponto importantíssimo,

já que diminuía a diferença social entre a população do campo e das cidades, dando

direitos iguais a grupos que historicamente foram discriminados; a alteração das regras

de cálculo do valor do beneficio, assegurando ao contribuinte que todos os salários de

contribuições seriam corrigidos monetariamente; estabelecimento de um piso e a

vinculação ao salário mínimo, garantindo que para todos os benefícios seria

estabelecido um o valor mensal nunca menor que um salário mínimo, o qual tem como

compromisso a correção do valor dos benefícios da mesma forma que realizada com os

trabalhadores; e o abono anual do décimo terceiro salário, determinando que a

bonificação dos aposentados e pensionistas fosse de valor igual ao recebido no mês de

dezembro.

Nesse mesmo contexto, mudanças quanto às regras de habilitação foram

estabelecidas. A aposentadoria era proporcionada mediante três situações, sendo a

primeira delas por “tempo de trabalho”, cujas regras foram mantidas como

anteriormente a Constituição: após 35 anos de trabalho para os homens e 30 anos de

trabalho para a mulher, ou em tempo inferior, se provado que trabalhavam em situações

de risco ou de insalubridade. Para os professores primários o tempo de trabalho foi

reduzido em cinco anos. Nesse ponto, é importante ressaltar que a necessidade de tempo

de trabalho independe do tempo de contribuição, fazendo com que essa regra se

enquadrasse “ao conceito de seguridade social, baseada na responsabilidade

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compartilhada pelo conjunto dos indivíduos no seu financiamento”. A segunda situação

era a possibilidade de aposentadoria “proporcional por tempo de serviço’’ na qual os

homens podiam pedi-la após os 30 anos de trabalho e a mulher após 25 anos de serviço.

A última situação era a “aposentadoria por velhice” concedida à homens com mais de

65 anos de idade e para mulheres com idade superior aos 60 anos. Nesse item, houve

uma mudança que diferenciava os trabalhadores rurais dos urbanos, reduzindo em cinco

anos o tempo de idade para os rurais de ambos os sexos.

Todas as considerações acima mostraram a Constituição de 1988 propôs uma

gama relevante e importante de novos instrumentos de proteção social, visando à

universalização dos direitos sociais a partir de um financiamento menos regressivo (ao

contrário do regime militar). Em outras palavras, estipulou-se uma política claramente

redistributiva, cujo orçamento não exigiria a contribuição da população mais pobre, para

ela ter acesso aos diversos benefícios sociais (MARQUES; BATICH; MENDES, 2003).

A materialização desse processo, no entanto, não se resumiu às mudanças do

grau de inclusão dos benefícios sociais, mas também a uma reforma no financiamento

desses benefícios. Para o financiamento de todas essas políticas sociais instituídas em

1988 foi estabelecido o Orçamento da Seguridade Social (OSS), o qual conta com uma

emenda constituinte que previa novas fontes de arrecadação que seriam cedidas pelo

Estado, empregados e empregadores.

Podemos citar como financiador do OSS a Contribuição sobre o Lucro Líquido

(CSLL), que consiste na contribuição sobre os lucros das empresas, medida que visa

ampliar o volume de recursos e, ao mesmo tempo, reduzir dependências das fontes que

se sensibilizam aos ciclos econômicos. A contribuição sobre o faturamento das

empresas também faz parte da gama de contribuintes ao OSS, contando com o

Programa de Integração Social (PIS), um programa criado pelo Governo Federal que

tem como finalidade promover a integração do empregado com o desenvolvimento das

empresas e o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP) que

juntos passaram a financiar o programa de seguro-desemprego, numa de amparar

temporariamente o trabalhador. O valor do auxílio varia de acordo com a faixa salarial,

sendo pago em até cinco parcelas, conforme a situação do trabalhador. Recursos

provindos do Fundo de Integração Social, mais tarde chamado de Contribuição sobre o

Faturamento das Empresas (Cofins) também faziam parte do montante que o OSS

contava, assim como o Fundo de Ação Social (FAS) o qual determina que recursos

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decorrente de concursos prognósticos, ou seja, todo e qualquer sorteio de números,

loterias e apostas nos âmbitos federal, estadual e municipal contribuam com a receita da

Seguridade Social.

Não podemos esquecer que essas fontes citadas acima fazem parte de uma gama

muito mais ampla, que conta ainda com a contribuição dos empregados, como a

contribuição para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o qual recebe as

contribuições de forma a colaborar com a manutenção da Previdência Social. As três

esferas de governo (União, estados e municípios) também fazem parte do OSS,

destinando uma parcela do das receitas próprias brutas mensais. Marques e Mendes

(2009: p.5-6) resumem o esquema de financiamento estruturado para a Seguridade

Social na CF:

A Constituição de 1988 preocupou-se em ampliar os recursos destinados ao financiamento da Seguridade Social — saúde, previdência e assistência social. Assim, além das fontes tradicionalmente utilizadas pelo SINPAS6, foi criada a Contribuição sobre o Lucro Líquido e incorporada à receita do Finsocial (atualmente Cofins) para seu único uso. Para garantir o financiamento das despesas de proteção social, ampliadas pela adoção da Seguridade Social, os constituintes definiram que o financiamento da Seguridade Social seria realizado “mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos estados, do Distrito Federal e dos Municípios”, e das contribuições sociais dos empregadores (incidentes sobre a folha de salários, o faturamento — Cofins — e o lucro — Contribuição sobre o Lucro Líquido – CSLL), dos trabalhadores e 50% da receita de concursos e prognósticos (loteria). Dizia, ainda, a Constituição que esses recursos da Seguridade Social não integrariam o orçamento da União e sim da Seguridade Social (artigo 195). A incorporação das novas fontes Cofins e CSLL também visava tornar o financiamento menos dependente das variações cíclicas da economia. Por meio de lei complementar, dispôs-se que 30% dos recursos do OSS deveriam ser destinados ao SUS. A esses recursos, de origem federal, deveriam ser acrescidas, segundo a Constituição, receitas provenientes dos Tesouros Estaduais e Municipais, que viabilizassem a implementação desse sistema. A Constituição de 1988 não definia, entretanto, como seria a participação dos entes federados no financiamento da Seguridade Social.

A despeito dos avanços obtidos pela Seguridade Social, o Centrão continuou

exercendo uma série de pressões que findavam postergar os novos benefícios

assegurados em Constituição. Isto é, conforme lembrou Draibe (1998), no período

6 Art. 1º Fica instituído o Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social - SINPAS, sob a orientação, coordenação e controle do Ministério da Previdência e Assistência Social - MPAS, com a finalidade de Integrar as seguintes funções atribuídas às entidades referidas nesta Lei: I - concessão e manutenção de benefícios, e prestação de serviços; II - custeio de atividades e programas; III - gestão administrativa, financeira e patrimonial.

Art. 2º São mantidos, com respectivo custeio, na forma da legislação própria, os regimes de benefícios e serviços dos trabalhadores urbanos e rurais, e dos funcionários públicos civis da União, atualmente a cargo do Instituto Nacional de Previdência Social - INPS, do Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural - FUNRURAL e do Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores do Estado – IPASE (Lei n. 6439, 1977).

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imediatamente posterior à promulgação da CF a frente conservadora acumulou forças

para consolidar o movimento oposicionista à regulamentação das novas políticas

sociais, já iniciado na própria Assembléia Constituinte. Desse modo, nesse período

houve uma exacerbação daquela tensão entre os progressistas e o Centrão, cujas forças

conservadoras retomaram a dianteira do debate político. O resultado dessa nova equação

política se deu, dentre outros aspectos, com o esvaziamento da estratégia reformista e o

desmonte orçamentário e burocrático no campo social, ou seja, com uma certa

pulverização das conquistas sociais obtidas pelos progressistas. Nas palavras de Fagnani

(1997: p.220):

O inicio da contra-reforma conservadora intensifica-se a partir de 1987 – e prossegue até o final do governo José Sarney em março de 1990 – quando ocorre a fragmentação da Aliança Democrática e as lideranças históricas do PMDB são deslocadas de postos estratégicos do Executivo. Comandada pelo Presidente da República, a velha fronda conservadora recompõe suas forças, regressa ao centro do poder e assume a dianteira do processo político. (...) As principais manifestações da gestação da contra-reforma conservadora são: ampliação do escopo e da importância das ações assistencialistas e clientelistas na agenda estatal; esvaziamento da estratégia reformista em diversos setores, gerando descontinuidades e paralisia decisória; desmonte orçamentário e burocrático no campo social, imediatamente após a promulgação da nova Carta constitucional.

Em função dessa reversão do ambiente político, os conservadores conseguiram

em tempo hábil dirimir suas perdas no debate da instauração da CF. Como o texto da

Constituição somente havia distinguido preceitos gerais e marcos genéricos no campo

social, a fim de estabelecer que os direitos adquiridos ainda seria necessária a conclusão

da regulamentação da legislação constitucional complementar, na qual o Centrão

liderou o debate e começou a instaurar sua contra-reforma que, como mencionado,

visava, por exemplo, desmontar o orçamento definido para Seguridade Social.

Esse movimento se entendeu no início dos anos 1990, com a vitória do

Presidente Fernando Collor de Mello, colocando novas barreiras para a efetivação da

política de inclusão social estabelecida em 1988. Dois pontos principais dessa estratégia

de Collor para a política social podem ser destacados: a desfiguração dos direitos

sociais, que visava postergar a concretização dos direitos estabelecidos pela CF, e a

desorganização burocrática das políticas sociais, da qual se fez presente a omissão do

governo federal na coordenação do processo de descentralização das políticas sociais.

Sobre o primeiro ponto, o governo lançou mão de artefatos que contemplavam o

descumprimento das regras constitucionais, o veto a projetos de lei aprovados pelo

Congresso, o menosprezo dos prazos estabelecidos constitucionalmente para o

encaminhamento dos projetos de legislação complementar, a interpretação da forma que

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melhor lhes convinham dos dispositivos legais e a descaracterização das propostas pelo

veto presidencial a dispositivos essenciais. Já em relação ao segundo, o grupo

conservador se aproveitou da ausência de decisões que visassem organizar

minimamente o complexo processo de transição, o que resultou na formação de lacunas

no processo de definição de competências entre níveis de governo (FAGNANI, 2005).

Esse grupo que, ao longo do próprio processo de instauração da CF, foi tentando

obstruir as conquistas efetivadas na Constituição, manteve-se a frente do debate até

meados dos anos 1990. A estratégia era a mesma: protelar a implementação da

Constituição Cidadã, pelo menos no que se referia as políticas de maior inclusão social

e equidade dos direitos sociais. Com a ascensão do Plano Real, quando parte dos

conservadores ascenderam ao poder, iniciou-se um ataque intenso a fim de reverter os

avanços da Carta. Essa ascensão dos conservadores, num ambiente de alta instabilidade

econômica e de explosão do neoliberalismo na periferia capitalista, determinou um

arrefecimento daquela tensão previamente existente, isolando o grupo progressista.

Ainda que boa parte da esquerda tivesse conseguido regulamentar os avanços da política

social, o debate pós-Real foi liderado pelo grupo conservador.

Um dos pontos utilizados para impedir esses avanços foi por meio da mudança

de política fiscal. Essa política se caracterizou por priorizar o ajuste de contas do

governo, de forma a atingir a credibilidade da economia brasileira perante a economia

globalizada. No próximo capítulo vamos tentar discutir essa política a fim de

posteriormente analisar como ela afetou os avanços sociais consagrados na CF de 1988.

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CAPÍTULO 2

INTRODUÇÃO

Este capítulo tem como objetivo principal definir os marcos da política fiscal,

entre os anos de 1994 e 2006, de forma que fiquem evidente os desafios enfrentados

para execução da política social no período em questão.

A opção adotada foi, inicialmente, tentar enquadrar esse ajuste dentro de um

cenário mais geral, o da financeirização da riqueza7 global, em que a economia

brasileira esteve inserida. As mudanças da economia internacional na década de 1980,

materializadas pela ascensão dos conservadores Reagan e Thatcher nos governos dos

EUA e do Reino Unido, balizadas por grande parte dos Estados Nacionais, permitiram

que a trajetória de grande parte do globo fosse guiada sob a égide da financeirização. O

Brasil, a partir do governo Collor e definitivamente no governo FHC, também atrela a

trajetória da economia nacional a esse movimento de financeirização.

Nesse sentido, a política fiscal passa a ser refém dos movimentos das finanças

globalizadas, sob o regime do Plano Real. O objetivo deixa de ser o crescimento da

economia, através do estímulo ao gasto público, principalmente dos setores de infra-

estrutura, e passa a ser a boa gestão e a garantia de rentabilidade dos mercados

financeiros. Por isso, os títulos públicos se tornam referência de ganhos financeiros, da

mesma forma, que a elevada taxa de juros permite sua alta rentabilidade.

Nas linhas que se seguem procuramos descrever esse processo mais atentamente,

buscando relacionar a articulação das reformas econômicas internas (principalmente do

setor fiscal) com o movimento de financeirização da riqueza, bem como, entender como

a política fiscal, que passou a ser extremamente conservadora, se tornou subordinada à

política macro, principalmente a monetária. Por fim, ainda serão apresentados dados que

comprovem o padrão de ajuste fiscal adotado neste período.

7 Para uso desse termo usamos as definições de Cheisnais (2002).

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A TRAJETÓRIA DA POLÍTICA FISCAL DO BRASIL NO PERÍODO 1995-2006: O CONSERVADORISMO DO AJUSTE SOB O REGIME DE FINANÇAS GLOBALIZADAS

A década de 1990 no Brasil foi marcada por mudanças na política econômica,

como forma de resposta ao novo modelo de desenvolvimento assumido, o qual foi

estruturado sob a integração econômica do país com a economia mundial. As mudanças

que ocorreriam nesse período tiveram como base a cartilha dos órgãos multilaterais

(principalmente o FMI), conhecida como Consenso de Washington, na qual os preceitos

básicos são: a abertura comercial, financeira, a estabilidade econômica (de preços e

credibilidade) e a reforma patrimonial, com ascensão dos processos de privatizações

(BELLUZZO; ALMEIDA, 2002).

Na verdade, esse período acompanha o movimento de financeirização da riqueza

que ascende como característica principal do capitalismo global, a partir da década de

1980. Essa fase de financeirização da riqueza, em escala global, representou mudanças

importantes na forma de organização das economias, seja no papel desempenhado pelo

Estado ou na forma de articulação das finanças e do setor produtivo. Entretanto,

conforme aponta Chesnais (2002), esse processo não emerge como uma conseqüência

natural e inevitável do sistema capitalista, mas é balizado e disseminado pelas ações de

cada Estado-Nação8.

No caso do Brasil isso não foi diferente. A ascensão de FHC e do Plano Real no

ano de 1994 materializou a ascensão dessa fase de financeirização da economia

nacional. A participação do Estado como propulsor do dinamismo econômico, através

da expansão dos gastos públicos, foi reduzida significativamente por um Estado

comprometido com os interesses do mundo das finanças que, por sua vez, garantiria a

solvência da dívida pública, bem como, a rentabilidade dos ativos financeiros.

Nesse sentido, a política fiscal foi mais um dos instrumentos utilizados para

possibilitar ao Estado essa nova forma de gestão, como mostra Ferreira (2007: p.95):

8. “São o Estado-Nação e sua economia, mesmo no caso do regime financeirizado, que constituem o âmbito político-institucional da emergência e das fases de consolidação iniciais de um novo regime. A extensão ou a “difusão” internacional de qualquer novo regime pressupunha e continua pressupondo processos de transplante das relações que o constituem, enxertando os elementos originais das diferentes formações sociais nacionais em outras partes do mundo, processo cujo êxito não pode ser previamente garantido” (CHESNAIS, 2002: p.36).

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Por um lado, o uso da política fiscal deixa de ser utilizado em prol do crescimento, tendo em vista sua vinculação às responsabilidades financeiras. Por outro lado, o próprio processo de financeirização (que tem, sua fase mais explícita, no Brasil, na liberalização da conta de capital) aprisiona o país às percepções conservadoras dos financistas, que buscam os mercados que lhes provêm maiores lucros com baixo risco, difundindo a concepção de que os países emergentes devem obter a chamada credibilidade, como no caso brasileiro.

Para a própria Ferreira (2007), as mudanças no orçamento fiscal representam

essa nova forma de gestão econômica do Estado. Não é por acaso que, após meados da

década de 1990, as despesas da União passaram a privilegiar os gastos de capital9 em

detrimento dos gastos correntes10, como se observa no gráfico 1.

Gráfico 1 – Despesas da União por categoria econômica (1980 – 2005). % PIB

65,880,5

28,7

55,1 53,243,9 39,9 38,8 40,6

48,7 50,2 44,0 48,4 46,9

34,219,5

71,3

44,9 46,856,1 60,2 61,2 59,4

51,3 49,8 56,0 51,6 53,2

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

1980 1985 1990 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Despesas de Capital Despesas Correntes

Fonte: Ferreira (2007: p.103-4)

É possível observar que, se na década de 1980 os gastos correntes eram os que

predominavam, a partir da década de 1990 são os gastos de capital que assumem

destaque. Entre 1995 e 1999, o aumento da despesa de capital foi de 16 p. p., embora na

década em curso já se verifique uma queda dessa categoria de despesa. No ano de 2005

53,2% dos gastos eram de capital e 46,9% eram correntes.

Dessa forma, a política fiscal nessa década assume novos preceitos e busca

atingir novos objetivos. A prioridade era ajustar as contas do governo, visando alcançar

a credibilidade da economia brasileira, e colocar a dívida pública como um ativo de

forte rentabilidade para os agentes econômicos. Isto é, a política fiscal nesse modelo 9. Os gastos de capital são: inversões financeiras, amortizações da dívida e outras despesas.

10. Os gastos correntes são: despesas com pessoal e encargos da dívida, outras despesas correntes (dentre elas, benefícios previdenciários e transferências intragovernamentais).

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visava ampliar a confiança dos investidores estrangeiros e demonstrar a eles que era

possível ter expectativas de rentabilidade, permitindo ao país uma maior integração com

a economia globalizada. Para isso seria necessário um esforço que demonstrasse que a

dívida assumida pela União seria honrada e que as autoridades se comprometeriam com

a evolução das contas públicas.

Foi por essas razões que o governo FHC implementou uma série de medidas que

afetavam, não só a trajetória da dívida pública e dos gastos fiscais, como também a

relação entre os entes da federação.

Na verdade o início do ajuste fiscal ocorreu já no governo Itamar Franco com a

criação do PAI (Programa de Ação Inicial). Esse programa visava criar um equilíbrio

orçamentário, assim como, possibilitar um maior raio de manobra para o Governo

Federal desvinculando parte das receitas tributárias. Nesse mesmo programa foi

negociada a federalização das dívidas estaduais em troca de um cronograma de ajuste

das contas dos Governos Estaduais, que se resumia no: saneamento dos bancos

estaduais, imposição de regras de gastos e contingenciamento de recursos para o alcance

de metas fiscais. Por fim, foi criado o imposto provisório sobre movimentação

financeira (IPMF) como “medida emergencial para atender as graves dificuldades

orçamentárias na área da saúde” (CARVALHO, 2001: p.6).

Após a implementação do PAI, a União buscou impor aos estados metas de

gastos e a reestruturação patrimonial das empresas e bancos públicos como requisito

para refinanciamento de dívidas e ajuste das contas públicas. Nesse sentido surgiu, já no

governo FHC, o Programa de Ajuste Fiscal e Reestruturação Financeira dos Estados:

O Programa de Ajuste Fiscal e Reestruturação Financeira dos Estados é um marco no relacionamento entre as esferas de governo, porque, pela primeira vez, associou o auxílio financeiro federal à reforma do setor público estadual e ao ajuste patrimonial. Os Estados participantes teriam a obrigação de fixar, de forma organizada e monitorada, compromissos com metas de ajuste fiscal e saneamento financeiro, sendo forçados a adotar medidas de controle salarial e corte de pessoal, privatização, concessão de serviços públicos e a obter a aprovação da Assembléia Legislativa à implementação do programa, bem como seriam monitorados pela Secretaria do Tesouro Nacional. (LOPREATO, 2002: p.211).

Por último, foi instituído o Fundo Social de Emergência (FSE) que generalizou a

regra do PAI, dando maior autonomia de gasto para o governo federal, além de ampliar

a receita tributária, cortar gastos sociais e proibir a emissão de moeda. Esse novo

cenário atendeu aos interesses da política econômica, pois coagiu os estados a

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realizarem programas de privatizações, da mesma forma que impôs um ajuste fiscal aos

governos subnacionais e permitiu maior liberdade de gastos para o setor público.

Portanto, os programas de renegociação da dívida e de apoio financeiro aos

estados foram vistos como instrumento de reforma patrimonial e de colocação de regras

e metas coerentes com a estratégia macroeconômica. Além disso, esses programas

serviram como forma de reduzir os gastos públicos vinculados, ou seja, deu à União

maior liberdade para realização do gasto. O objetivo dessas medidas seria a geração de

superávits primários, com finalidade de pagamento dos juros e de parte da dívida, e

redução dos espaços de atuação do setor público nos setores de desenvolvimento

econômico.

No entanto, as medidas tomadas para a estabilização da inflação, baseados na

âncora cambial e na política monetária restritiva, refletiram num aumento mais que

esperado da dívida pública (e que no final da década de 1990 não pode ser controlado

somente com o contingenciamento), dado que os títulos do governo estavam atrelados à

evolução da taxa básica de juros. Isso porque o processo de ancoragem cambial, apesar

de contribuir para estabilização de preços, demandou a necessidade de elevação das

taxas juros. Em outras palavras, a junção das políticas de câmbio fixo (e valorizado)

com a abertura comercial, que resultou num aumento das importações e do déficit de

transações correntes, teve como contrapartida a expansão em elevados níveis da taxa de

juros para equilibrar o balanço de pagamentos, através da atração de recursos para conta

capital11.

Esse ajuste que pareceu viável até o final da década 1990, se rompeu de forma

abrupta no biênio 1998/99. Nesse momento a dívida pública que já apresentava uma

trajetória ascendente, atingiu patamares extremamente elevados. A desvalorização

forçada da taxa de câmbio aliada aos movimentos de ampliação da taxa de juros fez

com que a dívida pública atingisse a cifra de R$ 896 bilhões em 2002, sendo que o

11. Nesse período não foi somente a expansão da taxa de juros que explica o crescimento da dívida pública. Carvalho (2001: p.9) explica que outros fatores contribuíram para esse crescimento: “Quatro fatores têm sido apontados como responsáveis pelo forte aumento da dívida líquida do setor público nos últimos anos, além da eliminação dos superávits primários: a) os juros altos (...) que teve de ser coberto com aumento da própria dívida; b) a política de esterilização do efeito monetário da acumulação de reservas externas; (...) c) as políticas de "socorro" a agentes econômicos em crise, em especial grandes bancos privados e públicos (no caso dos bancos federais, a maior parte das perdas teve origem em políticas do governo de apoio a segmentos do setor privado atingidos pelas políticas de estabilização); d) o processo de reconhecimento de dívidas passadas”.

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componente externo da dívida representava R$ 238 bilhões. Ou seja, além da rápida

expansão do componente interno da dívida por causa dos altos juros, o movimento de

desvalorização do câmbio fez com que o componente externo também passasse a

crescer de forma descontrolada.

Como mostra o gráfico 2, a trajetória da dívida pública externa guarda relação

muito próxima com a variação do câmbio. É possível observar que nos momentos de

desvalorização do câmbio, a dívida apresenta uma evolução positiva, da mesma forma

que nos momentos de valorização, a dívida apresenta uma evolução negativa.

Vejamos o período 2000-02, por exemplo: enquanto a taxa de câmbio variou de

1,83 R$/US$ para 2,92 R$/US$ nesse triênio, a dívida pública externa saltou de R$ 111

bilhões para R$ 238 bilhões. Não é por outra razão que correlação entre a variável

dívida pública e a taxa de câmbio (para o período 1995-2006) chega a 0,72 dentro de

uma escala que vai de -1 a 1, apoiando a afirmação de que o efeito-câmbio tem forte

relação com a variação da dívida externa para mesma direção.

Gráfico 2 – Evolução da dívida pública externa e da taxa de câmbio nominal (1995 – 2006).

% PIB

0,8

1,2

1,6

2

2,4

2,8

3,2

-350000

-250000

-150000

-50000

50000

150000

250000

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Dívida pública externa Taxa de Câmbio

Fonte: IPEADATA. Elaboração Própria

Portanto, tendo em vista também os dados do gráfico 3, podemos facilmente

perceber que a dívida externa do país, que atualmente representa uma percentagem bem

menor da dívida pública total (chegando a se tornar credor externo), nos anos em que

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houve a transição do câmbio fixo e valorizado para o câmbio flutuante, a tomou uma

maior razão em relação à dívida interna12.

Entre os anos 1998 e 2002, particularmente, o salto da participação do

componente externo da dívida pública é bem relevante. Se no ano de 1998, o

componente externo da dívida representava apenas 14% do total, em 1999 esse

percentual subiu para 21% e em 2002 atingiu 26%.

Gráfico 3 – Evolução da dívida pública externa e da taxa de câmbio nominal (1995 – 2006).

% PIB

-20%

0%

20%

40%

60%

80%

100%

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Divida Externa Divida Interna

Fonte: IPEADATA. Elaboração Própria

Essa ascensão da dívida pública foi apenas um dos reflexos da fragilidade vivida

pela economia brasileira no período em discussão. A queda do crescimento econômico,

os déficits do setor externo e ameaça da volta da inflação eram outros aspectos que

causavam extrema preocupação aos dirigentes brasileiros.

Dessa forma, o país recorreu ao FMI e, como contrapartida dos recursos

disponibilizados, o Governo Federal foi obrigado a adotar novas medidas no campo da

política econômica. Essas novas mudanças fizeram com que a trajetória da economia

brasileira fosse determinada a partir de três aspectos: regime de metas de inflação,

sustentabilidade da dívida e câmbio flutuante. Logo, no setor fiscal, fica explícito o

compromisso do Estado brasileiro em recuperar as contas públicas e a necessidade da

inauguração de um novo ajuste fiscal.

12. Sobre este ponto ver Lopreato (2002) e Carvalho (2001).

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Nesse cenário, deve-se ter em mente que a política fiscal permaneceu com sua

finalidade de manter o Brasil dentro do regime de financeirização da riqueza global, só

que isso ocorreu a partir de novos determinantes. Os agentes dispuseram de um novo

regime de política econômica, adaptado aos novos tempos de crise, no qual a política

monetária contou com o sistema de câmbio flutuante e o regime de metas de inflação,

que tinha como maior ferramenta o ajuste da taxa básica de juros, definida pelo Banco

Central. Enquanto a política fiscal tinha como encargo contribuir no esforço de conter a

demanda agregada e manter o compromisso com a dívida pública, de forma que as

expectativas dos agentes internacionais não se alterassem com relação à credibilidade de

política econômica do país.

Em resumo, a nova estratégia da política fiscal deveria atender as seguintes

premissas: sustentabilidade da dívida, criação de novas regras fiscais capazes de traçar

uma expectativa sobre as contas públicas e a credibilidade das autoridades fiscais que

foram materializadas no Programa de Estabilidade Fiscal (PEF).

Segundo Goldfajn e Guardia (2003) o PEF se resumia na provisão de um ajuste

fiscal para a geração de superávits primários, de uma reforma institucional com

ampliação das cargas tributárias, de um novo refinanciamento das dívidas estaduais,

municipais e de uma reforma do processo orçamentário com novas regras fiscais. Por

sua vez, Lopreato (2006) afirma que o PEF tinha como objetivo mais geral, o

enquadramento das finanças públicas ao novo arcabouço teórico que preconizava o

aumento da transparência das contas públicas, a sustentabilidade da dívida pública e

uma maior credibilidade das autoridades fiscais. Posteriormente, a promulgação da Lei

de Responsabilidade Fiscal (LRF), que limitou ainda mais a liberdade de gastos dos

governos subnacionais, consolidou esse novo ajuste fiscal.

Esse programa trazia condicionantes que envolvia políticas tributárias e

orçamentárias, de forma que garantisse o ajuste das contas públicas, independente da

esfera e dirigentes que estivessem no poder. Ademais, houve o compromisso da

realização de superávit primário para o ano seguinte da gestão e uma expectativa para

contas públicas dos dois próximos anos. Para situações em que a meta corresse o risco

de não ser atingida, foram estipulados meios de garantir limites de gastos fixados no

orçamento anual, os quais só voltariam a contar com seus recursos livres após uma

garantia de que a meta de superávit estabelecida fosse alcançada.

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A LRF aprovada em 2001 veio para dar mais consistência a esse ajuste, impondo

maior controle das contas dos estados e municípios, definidas por severas regras de

comportamento que levassem ao objetivo de superávit primário13. Além da LRF, fez

parte do novo ajuste a expansão da carga tributária (que continuou no governo Lula) e

uma redução dos gastos públicos. Nesse contexto a formalização das Desvinculações

das Receitas da União (DRU), a antiga FSE, permitiu que essas adequações fossem

feitas, ou seja, possibilitou a desvinculação do gasto público e, consequentemente, a

geração de superávits primários e a redução das despesas.

Conforme mencionado o que se percebeu nesse período foi uma redefinição da

estratégia da política fiscal, mas ainda inserido no regime financeirizado, ou seja, num

sistema liderado pelas finanças:

O ajuste fiscal realizado no período se trata, primordialmente, da transformação na forma de atuação por parte do Estado, que funda sua atuação na concepção mínima para intervenções voltadas para o investimento e máxima na preservação dos contratos da órbita financeira – a propalada necessidade de manter “credibilidade” (FERREIRA, 2007: p.120, itálicos acrescentados).

O final do segundo mandato FHC é marcado por uma forte crise internacional

seguida de uma tensão do processo eleitoral de 2002, fazendo com que o progresso

obtido pela política fiscal fosse minado novamente em decorrência dos resultados

negativos dos juros e do câmbio, trazendo a necessidade de mais estímulos para geração

do superávit primário. Esse cenário somente reflete a herança deixada pelo governo do

PSDB no setor fiscal: um elevado índice de carga tributária, uma taxa de juros alta, uma

rápida desvalorização cambial e, consequentemente, uma explosão da relação

dívida/PIB.

Dessa forma, os desafios no campo fiscal impostos ao presidente Lula, quando

este toma posse, eram imensos e, dadas as propostas do período de campanha eleitoral,

eram esperadas mudanças significativas no bojo dessa política. No entanto, a estratégia

de crescimento e a definição dos traços gerais da política econômica no governo Lula

seguiram os mesmos parâmetros estabelecidos no governo anterior, dando continuidade

ao elevado esforço para superávit primário, de forma a reafirmar o comprometimento

com a sustentabilidade da dívida pública, ainda com a finalidade de ganhar a confiança

da economia mundial.

13. A Lei de Diretrizes Orçamentárias foi a responsável por determinar os níveis de superávits primários gerados pelas esferas do governo.

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Em outras palavras, o primeiro governo Lula, apesar de contar com um cenário

externo muito mais favorável tendo em vista a expansão da economia internacional e

dos preços das commodities internacionais, manteve o ajuste fiscal como um

instrumento de rentabilidade dos ativos financeiros e não como um mecanismo de

geração de gasto público, principalmente de investimentos em infra-estrutura. Aqui se

observa nada mais que o comprometimento do governo do PT com essa gestão

econômica financeirizada, cujos mercados de títulos e ativos financeiros têm um papel

fundamental para determinar a trajetória macroeconômica do país.

Marques e Mendes (2007: p.16), mostram como o governo Lula, ao invés de

aproveitar a maré positiva da economia internacional, aprofundou o ajuste do governo

anterior no setor fiscal:

O governo Lula manteve os juros atrelados às metas de inflação (o que provocou sua permanência em níveis extremamente elevados); aprofundou o esforço de geração de superávit primário com vista ao pagamento do serviço da dívida e comandou um crescimento pífio e errático da economia, fundado principalmente nas exportações do agribusiness.

Em linhas gerais, pode-se dizer que os traços do regime fiscal do primeiro

governo Lula foram semelhantes aos da gestão anterior, em que ela esteve

comprometida com os avanços de outras políticas e, por isso, refém de ajustes na carga

tributária e de contenção de despesas, pois, em última instância, o objetivo seria

disciplinar as contas públicas e a manutenção da sustentabilidade da dívida pública e

dos compromissos com o mercado financeiro14.

É importante lembrar aqui que a maior atenção dada a alguns programas de

cunho social – principalmente o Bolsa Família – não alterou o esforço de superávit

primário. Pelo contrário, cumpriu e ultrapassou as metas estabelecidas, permitindo ao

governo uma diminuição na relação dívida/PIB. Esse movimento de redução da dívida

deveu-se também à queda da dívida externa na relação da dívida líquida (como já visto

14. Lopreato (2006: p.197) faz uma reflexão sobre esse ponto: “o conservadorismo do debate no interior da equipe econômica transformou a questão fiscal em dogma e empobreceu o ambiente de discussão. A focalização do debate no ajuste fiscal, na presunção de que é preciso combater a dominância fiscal, não deu espaço à análise de outras possibilidades. A dimensão da política fiscal como produto dos desequilíbrios provocados pelo combate à inflação e pela subordinação da economia brasileira às finanças globais, deixou de merecer atenção. O manejo das políticas de câmbio e de juros ganhou autonomia, deixando a política fiscal como caudatária de decisões fora do seu alcance, acentuando o papel subordinado que ocupa no regime de política macroeconômica, apesar da centralidade que lhe atribuem na determinação da taxa de juros, do risco-país e das condições de retomada do crescimento”.

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no gráfico 3), percebida, em linhas gerias, por três fatores: a valorização do câmbio,

aumento nas reservas internacionais e compra de dólares no mercado.

Enquanto a dívida externa apresentava um sentido de queda, a dívida interna

pública mostrava um sentido contrário, e com situação mais sensível. Tendo em vista

que os títulos da dívida estão indexados aos juros, constata-se que esse crescimento foi

alcançado, em grande parte, pela inflexibilidade da política monetária. O gráfico 4

mostra, como nos dois governos FHC e no primeiro governo Lula, que apesar da

execução de superávits primários, as altas taxas de juros sempre fizeram com que o

resultado nominal apresentasse uma trajetória positiva, minando os esforços de

contenção de gastos realizados por todas as esferas do governo.

Gráfico 4 – Necessidades de financiamento do setor público (1995 – 2006). % PIB

-4

-2

0

2

4

6

8

10

12

14

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Resultado Nominal Resultado Primario Juros Nominais Fonte: IPEADATA. Elaboração Própria

Vemos que, com exceção do primeiro governo FHC, o setor público realizou

grandes superávits primários, situados em torno de 4% do PIB. Entretanto, os gastos

com juros nominais sempre estiveram acima de 6% do PIB, sendo que no segundo

governo FHC esse valor se situou entre 8% e 12%. Dessa forma, o resultado nominal

variou ao longo do período entre 3% e 9%.

Logo, a impressão deixada pelo primeiro governo Lula é que o ajuste fiscal,

executado dentro desse regime financeirizado, tem um futuro cada vez menos promissor

e se mostra incapaz de equacionar os principais desafios apresentados para equilibrar as

contas do setor público e também para retomar o desenvolvimento. O crescimento da

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carga tributária – meio usado para ajustar as contas enquanto aumentavam os gastos,

entre outros, com juros – chegou próximo ao limite, e não promete aumento

significativo para o futuro. O corte com investimentos mostra-se cada vez mais inviável,

levando em conta que o que se gasta com essa variável já mostra as debilitações, em

termos de crescimento econômico, que o país enfrenta. O controle com gastos de

pessoal também chegou a um limite, com algumas carreiras profissionais públicas

precisando de reestruturação e novas contratações (LOPREATO, 2006).

Os dados a seguir comprovam o padrão de ajuste fiscal que foi descrito até o

momento. O gráfico abaixo traz a evolução da carga tributária.

Gráfico 5 – Evolução da carga tributária (1995 – 2006). % PIB

26,0

27,5

29,0

30,5

32,0

33,5

35,0

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Fonte: IPEADATA. Elaboração Própria

Ao longo de todo período a carga tributária cresceu cerca de 6 p.p., já que em

1995 ela representava 28% do PIB e em 2006 cerca de 40%. Outro aspecto que chama a

atenção é que esse crescimento foi gradual: no primeiro governo FHC a carga tributária

cresceu de 28,3% do PIB para 29,3% do PIB, no segundo FHC de 29,3% para 32,3% e

no primeiro governo Lula de 32,3% para 34,1%.

Em relação à evolução da dívida líquida do setor público (DLSP), se observa

que até o segundo FHC o crescimento da dívida foi exorbitante e, apesar da queda no

governo Lula – que se justifica pela redução da dívida externa –, o nível do

endividamento público continua extremamente elevado. Entre 1995 e 2002, a DLSP

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saiu de 34% do PIB para 70% e, embora tenha diminuído para 55% em 2006, ela ao

longo do período cresceu mais de 20 p.p15 (ver gráfico 6).

Gráfico 6 – Evolução da dívida líquida do setor público (DLSP) (1995 – 2006). % PIB

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Divida total Gov. Federal e Bacen Estados e Municipios Estatais

Fonte: IPEADATA. Elaboração Própria

O gráfico 7, que mostra a evolução do superávit primário realizado pelo Tesouro

Nacional, também deixa claro o tremendo esforço realizado para contenção de despesas.

Entre 1997 e 2006 esse superávit cresceu cerca de R$ 85 bilhões, saindo de R$ 5 bilhões

e chegando a R$ 91 bilhões.

Gráfico 7 – Evolução do superávit primário do Tesouro Nacional (1995 – 2006). R$ milhões

0

10000

20000

30000

40000

50000

60000

70000

80000

90000

100000

1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Fonte: IPEADATA. Elaboração Própria

15. Em 2007 a dívida pública da China, por exemplo, era de 26% do PIB (PRADO, 2009).

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Em suma, o que se observa é que a política fiscal atingiu um padrão sob o

regime financeirizado em que a contenção dos gastos e o aumento da arrecadação para

sustentação da dívida pública e a necessidade da manutenção dos juros altos para

possibilitar a rentabilidade positiva dos ativos financeiros deram o tom. Em última

instância, a política fiscal ficou aprisionada aos rumos da política macro, seja pelas

mudanças de câmbio ou de juros.

No que se refere à questão social, o problema é que a política fiscal se tornou

uma ameaça à execução do OSS. A necessidade de realizar sucessivos ajustes fiscais

que passam pela desvinculação de recursos, geração de superávits primários, cortes nos

gastos sociais, comprometendo-o, e centralização dos recursos impede o avanço da nova

política social nos moldes acordados na Constituição de 1988. Na verdade, o novo

projeto de desenvolvimento – aquele financeirizado – e suas mudanças na área fiscal,

delimitaram os objetivos visados por esse orçamento, conforme mostra Dain (2001:

p.132):

A Seguridade Social foi assim frustrada em seu nascedouro, pelo desaparecimento da folga de receita previdenciária própria tradicionalmente dirigida à saúde, e marginalmente à assistência social. Isso porque os gastos referentes a direitos individuais cresceram rapidamente, pela correção do valor das aposentadorias, até então sistematicamente subestimadas. Nesse processo de acomodação, os programas universais, com menor capacidade de defesa, foram sendo progressivamente isolados em sua luta pelo acesso às fontes de receita vinculadas pela Constituição a seu financiamento. O governo e os meios de comunicação se encarregaram da falsa mensagem de que tais programas são deficitários e, portanto, inexeqüíveis, sem lembrar que a raiz dos problemas que hoje os assolam foram o descaso e o desvio de novas fontes de receita, destinadas à expansão prevista nesses programas.

No próximo capítulo buscou-se a relação que essa Política Fiscal explicitada ao

longo deste capítulo com os entraves aos avanços da Seguridade Social, a qual foi

promulgada na Carta Constituinte de 1988.

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CAPÍTULO 3

INTRODUÇÃO

Este capítulo tem como finalidade relacionar os dois capítulos anteriores, de

forma a mostrar como o quadro de ajuste fiscal constrangeu as políticas sociais. Para tal,

expomos todo o quadro político e econômico desde antes do Plano Real, de forma que

apresente um panorama da situação demonstrando possíveis justificativas para a escolha

de tal opção econômica.

Procura-se retomar os pontos principais dos capítulos anteriores, de maneira a

dar destaque e esclarecer em que momentos eles se cruzam, estabelecendo sempre uma

linha cronológica. Com isso, os principais tópicos da Constituição de 1988, no que diz

respeito à Seguridade Social, são revistos, assim como as medidas tomadas para

desvincular receitas que dela derivam, características vindas do ajuste fiscal.

Em seguida tentamos mostrar o quanto dessas medidas trouxeram de diminuição

das receitas da Seguridade Social findando o acumulo de superávit primário para

pagamentos de juros da dívida. Deixa-se claro também, que as críticas vindas sobre a

insustentabilidade da Seguridade Social são feitas de forma a desconsiderar a parte

desvinculada que o OSS sofre, portanto, baseando-se em fontes suspeitas.

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A POLÍTICA SOCIAL E A POLÍTICA FISCAL DEPOIS DA CF DE 1988: UM DIFÍCIL CAMINHAR

A Seguridade Social atual resultou de um processo, que como observado

envolveu um amplo debate da sociedade civil em seus mais diversos aspectos

(econômicos, sociais, políticos etc,), que culminou com a implementação da emenda

constituinte de 1988. Nesse sentido, a política social brasileira ganhou novos contornos,

em função das regras e leis estabelecidas pela nova Constituição.

Em primeiro lugar, a Seguridade assumiu um caráter universal a partir da

definição dos benefícios dos programas sociais. O lema defendido pela Constituição era

que, independente da capacidade contributiva, todo cidadão tinha direito de receber os

benefícios programados para o setor da Saúde, Assistência e Previdência Social. Desse

modo, os programas presentes no capítulo da Seguridade Social atingiram um nível de

abrangência nunca antes visto no Brasil.

Especificamente, a Saúde aderiu como lema ser “direitos de todos e dever do

Estado”, em virtude disso, para gozar de seus benefícios não mais seria necessário

nenhum tipo de contribuição. Do mesmo modo, na Assistência Social, a partir da

Constituição de 1988, permitiu-se que qualquer cidadão utilizasse os benefícios

oferecidos, independente de qualquer tipo de aporte. A Previdência Social, por sua vez,

teve suas peculiaridades já que para ter direito ao benefício, que seria proporcional ao

valor contribuído ao longo da vida, era necessário se enquadrar a algumas exigências,

por exemplo a idade mínima para aposentadoria e o tempo de contribuição. Em suma,

os três componentes da Seguridade Social assumiram um caráter distributivo, inclusivo

e igualitário.

Em segundo lugar, além de determinar os benefícios da Seguridade Social, a

Carta Constituinte de 1988 instituiu também os mecanismos de financiamento que

proveriam tais benefícios. Assim, o OSS tinha como objetivo principal assegurar as

fontes de recursos, por intermédio de um esquema tripartite de financiamento, (Estado,

empregados e empregadores), necessárias a garantir a efetivação daqueles benefícios

contidos nos novos programas sociais. Com vistas a atender esse objetivo, o Estado

realizou a vinculação desses recursos ao financiamento da Seguridade Social, fazendo

com que os tributos e as contribuições destinadas aos programas sociais não fossem

usados por outras áreas do governo.

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Nos anos seguintes à publicação da Constituição, percebeu-se um movimento

que teve como objetivo prorrogar a efetivação do capítulo da Seguridade Social, num

contexto de alteração das diretrizes da política econômica, dentre elas a política fiscal.

Desde a eleição de Fernando Collor de Mello em 1990, a política fiscal, que defendia a

Abono de permanência

Auxílio financeiro mensal concedido ao segurado que, tendo direito à aposentadoria por tempo de serviço, optasse por permanecer em atividade. Os valores eram definidos segundo os seguintes critérios:

1) 20% para quem tivesse, no mínimo, 30 anos de serviço – extinto pela Lei 8.213/91;

2) 25% para homens com mais de 35 anos de serviço e para mulheres com mais de 30 anos de trabalho – extinto pela Lei 8.870/94.

Pecúlio

Benefício de pagamento único, pago ao aposentado que tivesse optado em se manter em atividade e que continuava contribuindo para o RGPS quando de sua entrada definitiva na inatividade. Era concedido nos seguintes casos:

1) ao segurado aposentado por idade ou por tempo de serviço que permanecia ou que voltava a exercer atividade regida pelo RGPS. O benefício correspondia à soma das contribuições do segurado, cujo valor era reajustado de acordo com o índice aplicado as poupanças, com data de aniversário. Extinta pela Lei 8.870/94.

2) ao segurado incapacitado definitivamente para o trabalho antes de ter completado o período de carência para ter direito á aposentadoria. Extinto pela Lei 8.870/94.

3) Ao segurado ou seus dependentes, em caso de invalidez ou morte decorrente de acidente de trabalho. Consistia em pagamento de 75% do limite máximo do salário de contribuição, no caso de invalidez, e de 150% desse limite no caso de morte – Extinto pela Lei 9.032/95.

Auxílio-Natalidade

Pago em cota única a todas as seguradas ou esposas de segurado, por ocasião do parto – Extinto quando aprovação da Lei Orgânica de Assistência Social LOAS 8.742 de 07/12/1993.

Auxílio-Funeral

Pago em cota única a todo segurado ou dependente que comprovasse ter efetuado despesas funerárias – Extinto pelo LOAS 8.742

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necessidade de contenção dos gastos a fim de atender os preceitos do programa de

liberalização econômica, passou a restringir os avanços realizados pelas novas políticas

sociais

Dessa perspectiva, pode-se notar que a questão da Seguridade Social foi

colocada num segundo plano. O cenário econômico internacional de transformações no

início dos anos 1990, especialmente na América Latina, onde as permanentes crises

foram consideradas resultados da participação deletéria do Estado na economia, impôs

uma ruptura do antigo modelo de desenvolvimento. Nesse novo modelo, o Brasil, que

adotou aos princípios básicos a abertura comercial e financeira, a estabilidade

econômica e a reforma patrimonial, buscou redefinir a agenda fiscal.

Um dos principais alvos dessa nova agenda era rever o conjunto de gastos

realizados pelo Estado, seja com investimentos e pessoal como os sociais. Do ponto de

vista da política social, já no governo Collor diversas iniciativas foram tomadas a fim de

tentar transformar a estrutura dos programas sociais estabelecidos na Constituição16.

Todavia, as tentativas de restrição aos avanços Seguridade Social, embora tenham

obtidos êxitos (ver quadro acima), não alteraram significativamente aqueles às

inovações trazidas pelos novos programas sociais.

Após a ascensão do Plano Real, em 1994, a rápida ampliação da dívida pública,

impulsionada pela imposição de uma alta taxa de juros, e o próprio aprofundamento do

processo de abertura condicionou a política fiscal. Neste sentido, o ajuste do orçamento, 16 Marques et al (2009) mencionou um conjunto de iniciativas que buscou alterar a estrutura da previdência social. Nesse sentido, os autores lembraram de uma proposta encaminhada pelo executivo em 1992: “A proposta encaminhada pelo executivo previa uma previdência pública composta de dois planos de benefícios: um plano geral, de caráter compulsório; e outro complementar, de adesão facultativa. Alem disso, propunha a instituição de um instituto de previdência do servidor público, a extinção das aposentadorias especiais, a criação de um Seguro de Riscos Sociais e a extinção, mais no longo prazo, das contribuições calculadas sobre os salários, tanto para empregadores como empregados. No plano geral (PG), participariam todos os segurados do RGPS, ficando de fora os servidores da União, das autarquias e das fundações públicas, os quais teriam um regime próprio. Os benefícios concedidos por esse plano seriam aqueles do RGPS, com exceção da aposentadoria especial, do acidente do trabalho e enfermidades comuns e profissionais, que eram igualmente contemplados em outros projetos. Note-se que a proposta do governo Collor mantinha, portanto, a aposentadoria por tempo de serviço, que será suprimida na reforma de FHC. O acesso ao PG não teria como base contribuição individual. O valor máximo do benefício seria correspondente a cinco salários mínimos. No plano complementar (PC), a princípio, poderiam participar todos os segurados do PG que quisessem complementar os benefícios pagos por este último, mediante contribuição individual. O regime seria de capitalização e sua gestão ficaria com o Banco do Brasil. A proposta de Collor previa, ainda, uma previdência complementar privada. Essa seria coberta tanto por entidades fechadas (já existentes), como por sindicatos, associações e federações (MARQUES ET AL, 2009: p. 201).

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que buscava garantir a realização de sistemáticos superávits primários, era fundamental

para garantir a sustentabilidade da trajetória da dívida, bem como, enquadrar as finanças

das empresas públicas (denominadas de ineficientes) e dos governos subnacionais. Em

função disso, o governo adotou a estratégia de elevar a carga tributária e reduzir os

gastos públicos, por um lado, e provocar alterações na Constituição, tentando reduzir a

abrangência e/ou valor dos benefícios concedidos pela Seguridade Social, a fim de

também conter as despesas, por outro.

A efetivação desse processo, ao lado das medidas expostas no Quatro 1, como já

observado, teve seu nascedouro ainda no governo de Itamar Franco com a criação do

PAI, que tinha como objetivo alcançar um equilíbrio orçamentário. Logo em seguida,

no início do governo de Fernando Henrique Cardoso, criaram-se diversos fundos e

programas que, entre outras funções mais específicas, tinham como finalidade

desvincular os gastos sociais. Mais tarde, dentre diversas mudanças que houve no

período estudado, pode-se afirmar que a política fiscal esteve focada a conseguir a

sustentabilidade da dívida pública brasileira, a criação de novas regras fiscais de forma a

equilibrar as contas públicas e a manutenção da credibilidade das autoridades fiscais.

No primeiro governo Lula, em que o quadro não se alterou muito, a política fiscal

também foi pautada para alcançar os superávits primários e modificar a estrutura do

sistema de proteção social da Constituição, ainda que os avanços obtidos pelos

programas focalizados17 (Bolsa-Família, especialmente) tivessem cumprido um papel

importante para reduzir a miséria do Brasil.

Desse modo, o “difícil caminhar” entre a política fiscal e a política social, desde

os anos 1990, justificou-se pela necessidade simultânea de efetivar os benefícios

assegurados pela Constituição e de eliminar parte dos gastos públicos, dentre esses os

sociais. Ou seja, constatou-se que as duas políticas correram em sentidos opostos, a

primeira tentando aumentar os gastos sociais e a segunda buscando eliminar o alto

dispêndio do setor público. Tendo em vista essa complexa relação, pretende-se na

próxima seção compreender o modo pelo qual o ajuste fiscal exerceu contínuas pressões

sobre o gasto social.

17 Falar da melhora da população mais pobre da sociedade.

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OS EFEITOS DA POLÍTICA FISCAL SOBRE A POLÍTICA SOCIAL DO GOVERNO FHC ATÉ O SEGUNDO GOVERNO LULA

O AJUSTE FISCAL: CORTE E FLEXIBILIZAÇÃO DOS GASTOS E MUDANÇAS

CONSTITUCIONAIS

O ajuste fiscal do governo FHC, depois da instauração do PAI, seguiu o percurso

de, simultaneamente, flexibilizar a estrutura de gasto do governo e reduzir o volume de

recursos dirigidos para o financiamento de investimentos públicos, da administração da

máquina estatal e dos gastos sociais. Nesse sentido, como observado no Capítulo 2,

foram criados o FSE, que conseguiu desvincular parte dos recursos tributários e

expandir a receita tributária, bem como, o Programa de Ajuste Fiscal e Reestruturação

Financeira dos Estados, que condicionou o auxílio financeiro, concedidos para os

estados, ao alcance de superávits fiscais e saneamento financeiro.

Esses programas ao mesmo tempo em que permitiu ao governo maior captação

de recursos, possibilitou também um corte nos gastos públicos. Ou seja, se a expansão

da carga tributária surgiu a fim de elevar o orçamento do Estado, os programas de ajuste

impediram, não somente que essa elevação ampliasse os gastos públicos com

investimentos, pessoal e programas sociais, como também que os recursos já existentes

fossem dirigidos para esse fim.

Adicionalmente aos ajustes diretos do setor fiscal, o primeiro governo FHC

impôs reformas constitucionais para reestruturar a Seguridade Social, o que

indiretamente se conformava numa outra forma de controle dos gastos públicos. As

primeiras mudanças foram o cancelamento das concessões dos benefícios do abono por

permanência em serviço, pecúlio, auxílios-natalidades e funeral e a eliminação das

aposentadorias especiais para uma série de categorias (MARQUES ET AL, 2009).

Porém, apenas em 1999 já no segundo mandato, com a aprovação da Emenda

Constitucional 20, que o governo conseguiu alterar mais significativamente parte da

política social previamente acordada na emenda constituinte. Conforme apontam os

próprios citados anteriormente:

A reforma previdenciária de FHC está consubstanciada na EC 20 e na Lei 9.876 de 26 de novembro de 1999. Em relação ao RGPS, os dispositivos da Constituição de 1988 levados à revisão e aprovados pela Emenda Constitucional 20 foram: a eliminação do teto de dez salários mínimos para o pagamento dos benefícios das aposentadorias por tempo de serviço e das regras de cálculo desse benefício (média aritmética dos últimos 36 meses); e a criação de condições para que o sistema público de previdência siga regras que proporcionem o equilíbrio financeiro e atuarial. Em relação à aposentadoria, o novo texto determina que o segurado tenha no mínimo contribuído durante 35 anos, se homem, ou 30, se mulher (com isso o tempo de serviço foi substituído por tempo de contribuição). No caso da

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aposentadoria por idade, o homem necessita ter 65 anos e a mulher, 60 (...) A reforma de FHC também extinguiu a aposentadoria proporcional (30 anos homem / 25 mulher) que permitia entrar para a inatividade com menos tempo de serviço e receber e, consequentemente, com menor valor de benefício. Os inscritos no sistema até 16/12/1998 (data da publicação da EC 20) continuam com o direito de obtê-la, se mulheres no mínimo com 48 anos, e 53 para os homens. “[....] o valor do benefício será de 70% do salário de benefício acrescido de 5% por cada 12 contribuições adicionais, até o limite de 100%” (MPAS, 1999, p. 13). Além disso, a aposentadoria com menos tempo de contribuição (30 anos homem/25 mulher) foi restringida somente para os professores dos níveis de ensino infantil, fundamental e médio, sendo extinta para os professores universitários (MARQUES ET AL, 2009: p. 210-211).

Ao lado dessas alterações constitucionais, novos ajustes foram efetivados no

âmbito da política fiscal. Como observado anteriormente, com a instauração do PEF,

que propôs, dentre outras coisas, um ajuste fiscal para a geração de superávits primários,

de uma reforma institucional com ampliação das cargas tributárias e refinanciamento

das dívidas governo subnacionais, o gasto público do governo acabou sendo enquadrado

num processo de aumento da transparência das contas públicas, a sustentabilidade da

dívida pública e uma maior credibilidade das autoridades fiscais. Em 2001, a LRF

praticou um severo controle das contas dos estados e municípios. Ainda visando uma

maior consolidação do ajuste fiscal o FSE foi formalizado transformando-se na DRU,

que oficializou a desvinculação de parte das receitas de forma a facilitar a geração de

superávit primário. E, por fim, o governo continuou aumentando a carga tributária a fim

de expandir sua base orçamentária.

Essa estratégia da política fiscal chegou a um ponto insustentável e passou

gradualmente a defender a restrição dos gastos da Seguridade Social, considerados

extremamente onerosos para as finanças públicas, como mostrou Gentil (2006: p. 212-

213):

O arrocho fiscal não [era] mais viável com a utilização de maior crescimento da carga tributária, que já atingiu um limite muito elevado, tornando-se política e socialmente muito custosa. A opção de ampliar o corte de gastos discricionários com investimento, pessoal e outros custeios também se mostra particularmente difícil, posto que já se tornaram um resíduo no orçamento. (...) Não restaria outro caminho para reduzir a dívida pública a não ser partindo para um ajuste mais rigoroso das contas públicas não-financeiras, o que significa, principalmente, maior corte de gastos da previdência e ampliação dos graus de liberdade no manejo da política orçamentária.

“O governo do presidente Lula [começou] com o claro compromisso de

manutenção desse regime macroeconômico: elev[ou] o superávit primário, aplicando

uma severa contenção nos gastos; [deu] continuidade ao crescimento da carga

tributária” (CASTRO ET AL, 2008: p. 23). A política fiscal, num ambiente de

instabilidade econômica, viu sua gestão continuar extremamente conservadora, pautada

pela necessidade de cortar gastos. Todavia, como os ajustes possíveis em outras esferas

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– investimentos públicos e gastos com máquina estatal – já haviam sido realizados,

devido a isso os recursos da Seguridade Social passaram a ser os alvos constantes do

regime fiscal.

Desse modo, o governo recuperou as medidas de reformas tributária e da

Previdência, minorando o investimento programado nos orçamentos fiscal e da

Seguridade Social e programando um forte arrocho nos salários do funcionalismo

público. Nesse quadro, o gasto social federal observou uma queda do seu valor. No

entanto, em função do crescimento econômico e da melhora do mercado de trabalho

(mediante a ampliação dos salários médios e do crescimento do emprego formal) que

aumentou o volume de arrecadação e das contribuições sociais, o gasto social recuperou

sua trajetória ascendente18 (CASTRO ET AL, 2008). Ou seja, a recuperação da

economia não somente permitiu a manutenção dos superávits primário, como também a

ampliação dos gastos sociais19, esta última puxada tanto pela Seguridade Social quanto

pelos gastos dos programas assistenciais (Bolsa-Família, especialmente).

Contudo, se o crescimento permitiu ao governo manter os objetivos da política

fiscal (realizar superávit das contas fiscais, principalmente) e, a reboque, conseguiu

sustentar os recursos para os programas sociais constitucionais, esses programas, ao

lado dos auxílios oriundos das políticas assistencialistas, promoveram uma abrangência

da população atendida, bem como, o gasto com os benefícios sociais. Esse quadro, por

seu turno, não pode ser interpretado como alteração do eixo do embate entre a política

social e a política fiscal.

18 Nesse ponto, torna-se fundamental lembrar que, apesar do crescimento do gasto social federal, o mercado de trabalho e o crescimento da economia não retomaram a trajetória do período do auge de desenvolvimento da economia brasileira. No caso do mercado de trabalho, o nível de desemprego e de formalização da mão de obra, em 2005, ainda era inferior ao observado em 1994.

19 “Os dois anos [2005 e 2006] foram caracterizados pelo bom desempenho da economia brasileira, com crescimento do PIB, resultado, principalmente, da expansão das exportações e, também, dos investimentos e do aumento da demanda doméstica. Os indicadores do mercado de trabalho mostraram que houve ampliação do nível de ocupação de mão-de-obra e dos rendimentos médios reais do trabalhador formal. Apesar de o governo manter o compromisso com a geração de superávits primários, observa-se um forte crescimento do gasto social – cresceu 9,2%, em 2004, e 8,5%, em 2005 – que se deve, em particular, ao crescimento da assistência social, motivado pelo aumento da cobertura de proteção assistencial do Programa Bolsa Família e, principalmente, da previdência social. Esse movimento é possível porque nesse momento, conforme demonstra Biasoto Jr. (2004), ocorre nova ampliação nas receitas do governo federal – um acréscimo de pouco mais de 1% do PIB – em razão fundamentalmente das mudanças na Cofins e na recuperação econômica.” (CASTRO ET AL, 2008: p. 24)

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Primeiramente, porque, os ajustes dos gastos públicos tiveram continuidade no

governo Lula. Nesse sentido, a política fiscal continuou sendo direcionada para

economizar recursos e permitir a sustentabilidade da dívida pública (atrelada a menores

taxas de juros, diga-se de passagem). Já na política social, a despeito do avanço do

assistencialismo, novas reformas foram realizadas no âmbito da Seguridade Social.

Conforme ressaltaram Marques et al (2009: p. 214), “apesar das mobilizações realizadas

pelos servidores e por setores da esquerda brasileira, a reforma proposta por Lula foi

aprovada em tempo recorde. Assim, foram introduzidos: (a) teto para o valor da

aposentadoria do servidor público; (b) contribuição incidente sobre o valor da

aposentadoria, a partir de certo nível, de alíquota de 11%”.

Em suma, a política fiscal tornou-se um constante empecilho à política social. A

necessidade de realizar sucessivos ajustes fiscais que passaram pela desvinculação de

recursos, geração de superávits primários e centralização dos recursos dos entes

federativos impediram o avanço da nova política social nos moldes acordados na

Constituição de 1988. Na verdade, a política econômica obstruiu os objetivos visados

pelo OSS, pois “atingiu de forma negativa [por intermédio da execução de políticas

fiscal e monetária restritivas] as variáveis fundamentais que determinam parte

considerável da receita do sistema previdenciário – a taxa de crescimento do produto, o

nível de ocupação e o rendimento médio dos assalariados20”.

20 Para uma ampla discussão da forma como essas políticas afetou o mercado de crescimento e a renda da economia brasileira, ver Baltar (2003)

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A EVOLUÇÃO DA POLÍTICA SOCIAL: UMA ANÁLISE DA EVOLUÇÃO DOS GASTOS SOCIAIS

Na subseção anterior discutiu-se a relação entre política social e a política fiscal

após a ascensão do governo FHC. As leis que orientaram a Seguridade Social no Brasil,

cujos beneficiados foram desobrigados de realizar contribuições para usufruir dos novos

programas sociais, tornaram-se gradualmente um grande obstáculo da política fiscal no

interior da política econômica estabelecida pelo governo na década de 1990. A opção de

política econômica no Brasil, como explicada no segundo capítulo deste trabalho, teve

como característica principal a abertura financeira e comercial. Essa escolha feita pelos

agentes políticos e econômicos, bem como a sua permanência por entre os anos, impôs

um “preço sobre o conjunto de direitos dos trabalhadores. As desvinculações de receitas

são apenas uma dessas exigências [necessárias para o novo padrão de inserção externa

do país].” (VAZ; MARTINS, 2007). Antes mesmo da implementação do Plano Real,

como foi visto, o governo já estabelecia meios de desvincular parte dos tributos para

alcançar um equilíbrio orçamentário.

Conforme aponta a Tabela 2 abaixo, desde o início do governo FHC, as

desvinculações foram se ampliando em relação ao montante do gasto social. Enquanto

em 1995, a relação entre o gasto da Seguridade Social e a desvinculações do orçamento

somaram apenas 4%, no final da gestão FHC esse valor saltou para 21%. No primeiro

governo Lula, essa relação continuou crescendo e já no final de 2005 alcançou 27%.

Tabela 2 – Evolução do gasto social e das desvinculações do OSS (1995 – 2005). (R$ bilhões)

Desvinculação do OSS (a) Gasto da Seg. Social (b) a/b (%)

1995 4,4 109,7 4% 1996 6,7 114,1 6% 1997 8,6 121,5 7% 1998 3,4 133,3 3% 1999 10,9 140,2 8% 2000 27,4 147,8 19% 2001 28,3 158,9 18% 2002 34,8 169,1 21% 2003 36,1 178,4 20% 2004 48,2 197,0 24% 2005 58,0 213,1 27%

Fonte: Castro et al (2008); Gentil (2007). Elaboração Própria

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Esse aumento acelerado das desvinculações significou que não somente a DRU,

mas outras formas de vinculação desempenharam um papel importante para impedir que

os recursos do OSS fossem utilizados para esse fim, conforme sugere a Tabela 3.

Tabela 3 – Desvinculação de Receitas da Seguridade Social (1995 – 2006). (R$ bilhões)

Desv. de Receitas da União (20%)

(a) Desv. de Receitas acima de 20%

(b) Total (a) +

(b) 1995 4,4 0,0 4,4 1996 5,6 1,1 6,7 1997 7,4 1,2 8,6 1998 3,4 0,0 3,4 1999 10,5 0,5 10,9 2000 13,7 13,7 27,4 2001 15,9 12,4 28,3 2002 18,4 16,3 34,8 2003 21,7 14,4 36,1 2004 27,3 20,8 48,2 2005 31,6 26,5 58,0 2006 33,7 38,5 72,2

Fonte: Gentil (2007). Elaboração Própria

Até o final da década de 1990, quase que 100% das desvinculações respondiam

a DRU. Todavia, a partir do decênio seguinte, especialmente no governo Lula, as

desvinculações não ligadas a DRU ganharam forca e, já em 2005, mais de 50% (R$ 38

bilhões) de todos os recursos flexibilizados não estavam ligados à DRU.

Nesse sentido, a política social se viu afetada pela necessidade do governo de se

comprometer com a dívida pública. Dessa forma a geração de superávits primários

impôs certos estrangulamentos em alguns orçamentos. Primeiramente, os investimentos

estatais e o gasto com a administração pública foram reduzidos aos gastos que podem

ser realocados em beneficio do superávit primário. Posteriormente, após avançar

significativamente na redução desses gastos, o governo procurou mediante

flexibilizações no orçamento e transformações infraconstitucionais minorar os gastos

com a Seguridade Social

Assim, no tocante à Seguridade, pode-se perceber um movimento que permitiu a

subtração de uma parcela significativa dos tributos, os quais tinham como finalidade a

arrecadação de fundos para o financiamento da Seguridade Social. Para isso foram

feitos alguns ajustes nas leis que deram liberdade para o setor econômico de

institucionalizar as desvinculações das receitas sociais e alterar as regras dos benefícios.

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Em virtude disso, o governo conseguiu alcançar elevados superávits primário a fim de

honrar com os juros da dívida.

Tabela 4 – Orçamento Fiscal e da Seguridade Social. Despesas da União (1995 – 2005). (% PIB)

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 Despesas Correntes 20,6 19,7 19,7 21,8 23,4 22,7 24,5 25,7 25,3 24,9 26,8 27,2 Pessoal e Encargos

Sociais 5,9 5,3 5,1 5,2 5,3 5,3 5,5 5,7 5,2 5,1 4,9 4,6

Juros e encargos da divida 2,6 2,5 2,4 3,4 4,7 3,5 4,4 4,2 4,3 4,2 4,6 6,5

Transf. aos governos subnacionais 3,3 3,3 3,4 4,1 4,3 4,7 5,0 5,6 5,3 5,2 6,1 5,5

Benefícios Prev. 5,0 5,3 5,3 5,9 6,0 5,9 6,2 6,6 7,2 7,0 7,4 7,0 Demais Despesas

Correntes 3,7 3,3 3,4 3,2 3,2 3,3 3,4 3,6 3,3 3,4 3,9 3,6

Despesas de Capital 3,3 3,3 9,7 11,4 9,3 5,9 7,5 7,6 7,2 5,9 4,6 7,1 Investimentos 0,7 0,7 0,9 0,9 0,7 0,9 1,2 0,8 0,4 0,6 0,9 0,8

Inversões Financeiras 1,2 1,6 7,3 7,8 5,8 1,0 1,7 1,6 1,5 1,2 1,1 1,1 Amortizações da Dívida 1,4 1,0 1,5 2,7 2,8 4,0 4,6 5,2 5,3 4,1 2,5 5,2

Subtotal 23,9 23,0 29,4 33,2 32,7 28,6 32,0 33,3 32,5 30,8 31,4 34,3 Amortizações da Dívida

(Refinanciamento) 13,4 14,0 15,5 21,5 27,6 27,3 18,3 17,8 25,0 20,6 25,8 16,2

Total 37,3 37,0 44,9 54,7 60,3 55,9 50,3 51,1 57,5 51,4 57,2 50,5 Fonte: Gentil (2007). Elaboração Própria

A Tabela 4 acima aponta como, embora os gastos com benefícios

previdenciários tenham se ampliado entre 1995 e 2006, os gastos com amortizações da

dívida cresceram mais em relação ao PIB. Por um lado, a expansão do valor dos

benefícios previdenciários, que saiu de 5% do PIB para 7%, ao longo da série

apresentada21, conforme lembrou Gentil (2007: p. 215), foi explicada “principalmente,

[pela] dinâmica demográfica de envelhecimento da população, que fez aumentar o

número de benefícios pagos, os reajustes do salário mínimo acima da inflação e o

aumento dos filiados especiais” (que receberam benefícios independente do valor

contribuído). Ou seja, o aumento dos gastos com a previdência pode ser compreendido

como “um resgate da cidadania e com a garantia de padrões ainda muito baixos de

sobrevivência”.

Por outro lado, os gastos com amortizações viram sua participação no PIB mais

que triplicar, saindo de apenas 1,4% em 1995 para 5,2% em 2006. Esse aumento de

21 Falar do aumento dos outros orçamentos

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participação esteve ligado ao crescimento muito acelerado das taxas de juros (rever o

Gráfico 4 no Capítulo 2) que tornaram os títulos da dívida pública muito mais onerosos.

Todavia, nesse ponto parece ser importante destacar que no primeiro governo Lula,

houve uma estabilização dos gastos com amortizações da dívida (em torno de 4% e

5%). Desse modo, pode-ser dizer que o gasto público permaneceu dividido entre

desembolsos financeiros e os gastos com transferências de renda do sistema de

aposentadorias e pensões, ainda que o primeiro tivesse crescido a um ritmo mais

acelerado que o segundo (GENTIL, 2007).

Nesse ponto, vale lembrar também que, em função da queda de participação do

salário nominal do PIB da ordem de 10 pontos percentuais, entre o início da década de

1990 e o governo Lula, e por causa do crescimento dos impostos indiretos sobre o PIB,

houve uma transferência dos recursos destinados ao OSS para a realização de superávits

primários. Ou seja, a queda da capacidade de contribuição via salários se traduziu num

aumento de recursos para arcar com o aumento da dívida pública. Nesse sentido, a

própria Gentil (2007: p. 217) ressaltou a expansão da proporção de impostos ter sobre a

produção e a importação demonstrou “que a queda do salário teve como contrapartida a

transferência de parcela da remuneração dos assalariados, via impostos, para os

proprietários da dívida pública, (...) através das operações financeiras com títulos da

dívida pública realizada pelo governo”.

Adicionalmente, Vaz e Martins (2007) mostraram que, apesar do aumento na

carga tributária, entre meados da década de 1990 até anos 2000, ter se elevado menos

que a metade do que a ampliação relativa das contribuições sociais, isso não se traduziu

num aumento dos recursos para previdência. Em outras palavras, o forte aumento da

carga tributária por intermédio das receitas de contribuições sociais, e não através dos

impostos permitiu ao mesmo tempo ampliar o poder de arrecadação via impostos

indiretos (Cofins, CSLL etc.) e, em função das regras da desvinculação, transferir os

recursos para pagamento da dívida. A Tabela 5 mostra a trajetória da carga tributária do

Brasil ao longo do período estudado.

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Tabela 5 – Evolução dos impostos do OSS (1995 – 2005). (R$ bilhões)

Contribuição para prev. Social COFINS CPMF CSLL Outros Total

1995 35,1 14,7 0,0 5,6 4,1 59,5 1996 43,7 17,2 0,0 6,2 4,8 71,8 1997 44,1 18,3 6,9 7,2 4,6 81,2 1998 46,6 17,7 8,1 6,5 4,8 83,8 1999 47,4 30,9 7,9 6,8 6,7 99,7 2000 55,7 38,7 14,4 8,8 6,7 124,3 2001 61,1 45,5 17,2 9,0 7,7 140,5 2002 71,0 50,9 20,3 12,5 8,6 163,3 2003 80,7 58,2 23,0 16,2 11,3 189,4 2004 93,8 77,6 26,3 19,6 13,1 230,4 2005 108,4 87,9 29,2 26,3 14,8 266,7

Fonte: Gentil (2007). Elaboração Própria

Enquanto as contribuições para previdência social cresceram em torno de R$ 73

bilhões entre 1995 e 2005, as receitas oriundas das contribuições do Cofins e da CSLL

se expandiram quase R$ 94 bilhões, puxadas principalmente pelo primeiro item que

respondeu por quas ¾ desse crescimento. Desse modo, a contribuição da Previdência

Social se tornou inferior às contribuições do Confins e da CSLL. Em 1995, o primeiro

item representava cerca de 60% do OSS e, em 2005, esse valor caiu para 40%. Já as

outras duas contribuições saíram de 34% para atingir 43%, no mesmo período. Esses

números somente refletem que o aumento da receita do OSS esteve ligado menos aos

impostos diretos sobre a renda e mais ligados a impostos indiretos. Foi essa estrutura

tributária, altamente regressiva, que financiou o aumento dos gastos sociais. Esses, por

sua vez, além de onerar mais que proporcionalmente as classes sociais mais baixas,

permitiram o aumento real no valor desvinculado que a União tem acesso, aumentando

o poder de acumulação para o cumprimento do superávit primário.

Dessa perspectiva, uma série de analistas defendeu que a Seguridade Social,

desde a sua instauração na Constituição, tornou-se insustentável (por causa dos altos

déficits) e que por isso seria necessário uma reforma em seus preceitos, para que essa

seja “auto-sustentável”. De certo, nessa discussão do déficit da Previdência Social, não

levaram em conta a parte desvinculada pela área financeira da economia e esqueceram

também que o financiamento foi programado num sistema tripartite, portanto, composto

pelas contribuições dos segurados, dos empregadores e do Estado (LEÃO, 2008;

MARQUES ET AL, 2009). Segundo o Gráfico 8, nota-se que, caso tivesse sido levado

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em conta as desvinculações realizadas pelo governo, o saldo previdenciário seria

suficiente para arcar com a parcela da Previdência.

Gráfico 8 – Evolução do Saldo Previdenciário e das Desvinculações do OSS (1995 – 2005).

(R$ bilhões)

Fonte: Gentil (2007). Elaboração Própria

Ao longo de todo o período, o gasto social federal apresentou uma evolução

positiva constante, enquanto a receita do OSS passou por período de estagnação,

especialmente no período de retração da economia brasileira. Todavia, se contabilizados

os recursos desvinculados pela União, em todos os anos o total arrecadado superaria as

necessidades de recursos das políticas sociais. Em 2005, por exemplo, o somatório dos

recursos desvinculados com as receitas do OSS seria de R$ 267 bilhões, valor bem

superior ao gasto social federal que foi de R$ 213 bilhões.

Tabela 6 – Evolução anual do Gasto Social Federal e da receita do OSS(1995 – 2005).

(R$ bilhões) 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 Gasto Social Federal 110 114 122 133 140 148 159 169 178 197 213

Receita do OSS 130 136 146 146 166 196 205 218 212 244 267 Fonte: Castro et al (2008); Gentil (2007). Elaboração Própria

Nesse sentido, ainda vale ressaltar que, mesmo não contabilizando as

desvinculações, no período em que o Brasil alcançou taxas de crescimento econômico

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razoáveis, os recursos obtidos pelo OSS foram suficientes para arcar com os custos dos

programas. Na mesma direção, Leão (2008: p. 164) lembrou que:

Além disso, no período (...) em que o Brasil apresentou um crescimento econômico razoável (1995-97), o gasto social quase não aumentou sua participação no PIB, mesmo com a valorização do salário mínimo. Dessa forma, não há razão para crer que essa vinculação, a despeito da política de valorização do salário mínimo, torne as contas públicas incontroláveis. O problema parece estar muito mais relacionado ao baixo crescimento econômico do que à ampliação dos gastos sociais.

Em suma....

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