relatório de estágio mestrado em análises clínicas sara... · o meu muito obrigada à doutora...

95
Sara Margarida Lopes Pereira Brígido Relatório de Estágio Mestrado em Análises Clínicas Relatório de Estágio Curricular no âmbito de Mestrado em Análises Clínicas, orientado pela Dra. Maria Beatriz Tomaz e apresentado à Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra Setembro de 2014

Upload: trinhdieu

Post on 12-Dec-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Sara Margarida Lopes Pereira Brgido

Relatrio de Estgio Mestrado em Anlises Clnicas

Relatrio de Estgio Curricular no mbito de Mestrado em Anlises Clnicas, orientado pela Dra. Maria Beatriz

Tomaz e apresentado Faculdade de Farmcia da Universidade de Coimbra

Setembro de 2014

iii

"Determinao, coragem e autoconfiana so fatores decisivos para o sucesso.

No importam quais sejam os obstculos e as dificuldades. Se estamos possudos

de uma inabalvel determinao, conseguiremos super-los.

Independentemente das circunstncias, devemos ser sempre humildes,

recatados e despidos de orgulho.

Dalai Lama

v

AGRADECIMENTOS

A realizao deste estgio no teria sido possvel sem a participao e colaborao de

vrias pessoas. Na impossibilidade de as nomear todas em primeiro lugar, deixo aqui o meu

especial reconhecimento s seguintes:

administrao do Grupo Beatriz Godinho, por ter possibilitado a realizao do

estgio do Mestrado em Anlises Clnicas no Labeto Centro de Anlises Bioqumicas, S.A..

O meu muito obrigada Doutora Maria Beatriz Tomaz por ter orientado o estgio e pela

disponibilizao de informaes imprescindveis para a realizao do relatrio.

A todos os colaboradores do laboratrio, em especial Dra. Isabel Bento, Dra.

Deolinda Leiria e Dra. Dlia Siva, por terem contribudo com os seus conhecimentos

tcnicos e com a sua alargada experincia para a elaborao deste relatrio.

Professora Doutora Leonor Martins de Almeida, Professora Catedrtica da

Faculdade de Farmcia da Universidade de Coimbra, pelo apoio prestado ao longo dos trs

anos de mestrado.

Professora Doutora Gabriela Conceio Duarte Silva, pela ajuda e apoio dado na

realizao deste relatrio de estgio.

A todas as pessoas que direta ou indiretamente colaboraram para que o estgio fosse

possvel.

E por fim, um agradecimento final minha famlia que sempre demonstrou apoio

incondicional em todos os momentos.

A todos, o meu sincero Obrigada!

vii

NDICE

Capitulo I: Introduo ......................................................................................................................... 1

Capitulo II: Caraterizao do Laboratrio de Estgio ......................................................... 3

Capitulo III: Autoimunidade ............................................................................................................. 5

3.1Doenas Autoimunes ............................................................................................................... 5

3.2 Amostras na Serologia Autoimune .................................................................................. 6

3.3 Imunoensaios no Diagnstico Serolgico das Doenas Autoimunes .............. 6

3.3.1 Imunoensaio Enzimtico ............................................................................................................ 7

3.3.2 Imunofluorescncia .................................................................................................................... 8

3.3.3 Immunoblot .................................................................................................................................. 9

3.4 Testes no Diagnstico de Doenas Autoimunes Sistmicas e Especificas de

rgos ................................................................................................................................................. 10

3.4.1 Doenas Autoimunes Sistmicas: Testes ................................................................ 11

3.4.1.1 Anticorpos Anti Nucleares .................................................................................................. 11

3.4.1.2 Anticorpos Anti-dsDNA ...................................................................................................... 14

3.4.1.3 Anticorpos Anti-Peptdeo Citrulinado Cclico ................................................................ 18

3.4.2 Doenas Autoimunes Especificas de rgo: Testes ........................................... 20

3.4.2.1 Doenas Autoimunes Hepticas ......................................................................................... 20

3.4.2.1.1 Anticorpos Anti-Mitocndria ........................................................................................... 20

3.4.2.1.2 Anticorpos Anti - Msculo Liso / Anticorpos Anti - Microssomais Hepticos e

Renais ..................................................................................................................................................... 21

3.4.2.2 Doenas Autoimunes do Estmago ................................................................................... 24

3.4.2.2.1 Anticorpos Anti- Clulas Parietais Gstrica ................................................................. 24

3.4.2.3 Doenas Autoimunes do Intestino .................................................................................... 28

3.4.2.3.1 Anticorpo Anti-Endomsio, Anticorpo Anti-Transglutaminase tecidular e

Anticorpo Anti-Gliadina ..................................................................................................................... 28

3.4.2.4 Doenas Autoimunes dos Vasos Sanguneos ................................................................... 31

3.4.2.4.1 Anticorpos Anti Citoplasma dos Neutrfilos .............................................................. 31

Capitulo IV: Hematologia ................................................................................................................ 34

4.1 Amostras em Hematologia ................................................................................................ 35

4.2 Hemograma .............................................................................................................................. 35

4.2.1 Metodologia e fundamentao dos equipamentos Hematolgicos ............................... 36

4.2.1.1Contador Hematolgico:Advia 2120 .................................................................................. 36

viii

4.2.1.2 Contador Hematolgico: Sysmex XE-5000 ..................................................................... 39

4.2.2 Hemograma: Eritrograma ........................................................................................................ 42

4.2.2.2 ndices hematimtricos ......................................................................................................... 43

4.2.2.3 Reticulcitos ........................................................................................................................... 45

4.2.3 Hemograma: Plaquetas ............................................................................................................. 45

4.2.4 Hemograma: Leucograma ....................................................................................................... 45

4.2.5 Interpretao do Histograma ................................................................................................. 46

4.2.6 Esfregao do Sangue Perifrico .............................................................................................. 47

4.2.7 Morfologia do Sangue Perifrico............................................................................................ 48

4.2.8 Algumas Patologias Associadas Linhagem Eritroide ....................................................... 48

4.2.9 Algumas Patologias Associadas Linhagem Linfoide e Mieloide .................................... 50

4.2.9.1 Leucemias Agudas e crnicas .............................................................................................. 53

4.2.10 Outras patologias .................................................................................................................... 56

4. 3 Velocidade de sedimentao globular ......................................................................... 57

4.3.1 ndice de Katz ............................................................................................................................ 58

4.4 Grupo Sanguneo Sistema ABO e Rhesus ............................................................... 58

4.5 Hemoglobina Glicada e Estudo de Hemoglobinopatias ...................................... 59

4.5.1 Hemoglobina Glicada (HbA1c) .............................................................................................. 59

4.5.2 Estudo de Hemoglobinopatias ................................................................................................ 60

Capitulo 5: Controlo qualidade..................................................................................................... 65

Capitulo 6:Concluso ......................................................................................................................... 67

Capitulo 7: Bibliografia ..................................................................................................................... 69

Anexo ........................................................................................................................................................ 73

ix

NDICE DE FIGURAS

Figura 1: Esquema da reao, que ocorre em cada poo da tira da microplaca, na tcnica de

ELISA indireto .............................................................................................................................................. 7

Figura 2: Tcnica de IFI. .......................................................................................................................... 8

Figura 3: Tcnica de Imunoblot .............................................................................................................. 9

Figura 4: Padres de fluorescncia em clulas HEp2. .................................................................... 12

Figura 5: Tira Euroline ANA Profile 3. .......................................................................................... 13

Figura 6: Resultado da tira de Ana Profile 3. ............................................................................... 17

Figura 7: Padres de fluorescncia no AMA em diferentes substratos ..................................... 21

Figura 8: Padres de fluorescncia no ASMA em diferentes substratos ................................... 22

Figura 9: Pares de fluorescncia caractersticos dos anticorpos anti-LKM1 .......................... 23

Figura 10: Padro de fluorescencia dos Acs APCA em substrato estmago de rato. ........... 24

Figura 11: Tira com os diversos Ags presentes no teste EUROLINE Profile Autoimmune

Liver Diseases. ......................................................................................................................................... 25

Figura 12: ALPHADIA Biermer - Atrophic Gastrites DOT ......................................................... 25

Figura 13: Resultado da tira de Liver Profile incubada com a amostra. .................................... 26

Figura 14: Deteo de Acs Anti-EmA e Acs Anti-AGA em lminas com substrato de fgado

de primata e gliadina (GAF-3X) ............................................................................................................. 30

Figura 15: Padres de fluorescncia (IFI) do ANCA em neutrfilos fixados em etanol ....... 32

Figura 16: Citogramas e histogramas do Advia 2120: RBC e PLT.............................................. 37

Figura 17: Citograma BASO com as diferentes populaes celulares ....................................... 38

Figura 18: Citograma Perox.. .............................................................................................................. 38

Figura 19: Citograma DIFF................................................................................................................... 40

Figura 20: Citograma WBC/ BASO ................................................................................................... 40

Figura 21: Citograma NRBC ............................................................................................................... 40

Figura 22: Citograma: RET e PLT-O ................................................................................................. 41

Figura 23: Citograma IMI...................................................................................................................... 41

Figura 24: Histogramas PLT e RBC ................................................................................................... 42

Figura 25: Modo correto de efetuar um esfregao do sangue perifrico ................................. 47

Figura 26: Seco do esfregao para correta observao ............................................................ 47

Figura 27: Histograma do eritrograma de um individuo com anemia ferropnica. ................ 49

Figura 28: ESP de uma amostra de anemia ferropnica. ............................................................... 50

Figura 29: Leucograma e citogramas Perox e Baso do analisador Advia 2120 ........................ 52

file:///C:/Users/Silvia/Desktop/sara/trabalho%20completo%20final%202%20-%20at%20ao%20capitulo%203%20a%20ser%20corrigido%20(Guardado%20automaticamente).docx%23_Toc397450186file:///C:/Users/Silvia/Desktop/sara/trabalho%20completo%20final%202%20-%20at%20ao%20capitulo%203%20a%20ser%20corrigido%20(Guardado%20automaticamente).docx%23_Toc397450186file:///C:/Users/Silvia/Desktop/sara/trabalho%20completo%20final%202%20-%20at%20ao%20capitulo%203%20a%20ser%20corrigido%20(Guardado%20automaticamente).docx%23_Toc397450189file:///C:/Users/Silvia/Desktop/sara/trabalho%20completo%20final%202%20-%20at%20ao%20capitulo%203%20a%20ser%20corrigido%20(Guardado%20automaticamente).docx%23_Toc397450190file:///C:/Users/Silvia/Desktop/sara/trabalho%20completo%20final%202%20-%20at%20ao%20capitulo%203%20a%20ser%20corrigido%20(Guardado%20automaticamente).docx%23_Toc397450193file:///C:/Users/Silvia/Desktop/sara/trabalho%20completo%20final%202%20-%20at%20ao%20capitulo%203%20a%20ser%20corrigido%20(Guardado%20automaticamente).docx%23_Toc397450195file:///C:/Users/Silvia/Desktop/sara/trabalho%20completo%20final%202%20-%20at%20ao%20capitulo%203%20a%20ser%20corrigido%20(Guardado%20automaticamente).docx%23_Toc397450200

x

Figura 30: Esfregao do sangue perifrico com mononucleares atpicos ................................. 52

Figura 31: Leucograma e citogramas Perox, Baso e RBC do analisador Advia 2120. ............ 55

Figura 32: ESP de uma Leucemia Linfoctica Crnica .................................................................... 56

Figura 33: Card ScanGel Monoclonal A-B-D .................................................................................. 59

Figura 34: Cromatograma do HA-8160.60

Figura 35: Histograma do eritrograma de uma criana de 12 anos. .......................................... 62

Figura 36: ESP de uma amostra com -Talassemia. ....................................................................... 63

Figura 37: Cromatograma eletroforese da hemoglobina ............................................................. 63

file:///C:/Users/Silvia/Desktop/sara/trabalho%20completo%20final%202%20-%20at%20ao%20capitulo%203%20a%20ser%20corrigido%20(Guardado%20automaticamente).docx%23_Toc397450203file:///C:/Users/Silvia/Desktop/sara/trabalho%20completo%20final%202%20-%20at%20ao%20capitulo%203%20a%20ser%20corrigido%20(Guardado%20automaticamente).docx%23_Toc397450205file:///C:/Users/Silvia/Desktop/sara/trabalho%20completo%20final%202%20-%20at%20ao%20capitulo%203%20a%20ser%20corrigido%20(Guardado%20automaticamente).docx%23_Toc397450208file:///C:/Users/Silvia/Desktop/sara/trabalho%20completo%20final%202%20-%20at%20ao%20capitulo%203%20a%20ser%20corrigido%20(Guardado%20automaticamente).docx%23_Toc397450209

xi

NDICE DE TABELAS

Tabela I: Doenas autoimunes cuja deteo dos autoanticorpos feita no Labeto. ............. 10

Tabela II: Resultados das anlises clinicas a um doente com LES apurados intervalo de seis

meses. .......................................................................................................................................................... 15

Tabela III: Resultados das anlises prescritas pelo clnico. ........................................................... 16

Tabela IV: Resultados das anlises, da mulher de 67 anos ........................................................... 19

Tabela V: Resultados laboratoriais das anlises efetuadas a uma mulher de 23 anos. .......... 26

Tabela VI: Resultados, ao longo do tempo, de um doente com um possvel diagnstico de

HAI Tipo I. .................................................................................................................................................. 27

Tabela VII: Resultados dos Acs, da classe IgA, anti-EmA, anti-tTG e anti-AGA..................... 30

Tabela VIII: Caractersticas dos testes Granulocyte Mocaic 2 e Granulocyte Mocaic 22

...................................................................................................................................................................... 33

Tabela IX: Valores de referncia do hemograma para adultos ................................................. 46

Tabela X: Classificao genrica das anemias em trs grupos. ................................................... 49

Tabela XI: Alguns exemplos das causas de alteraes quantitativas mais comuns associadas

srie branca. ............................................................................................................................................ 51

Tabela XII: Resultados de anlises da avaliao da funo heptica e respetivos valores de

referncia. ................................................................................................................................................... 52

Tabela XIII: Classificao das leucemias .......................................................................................... 53

Tabela XIV: Classificao de LMA e LLA pela FAB. ...................................................................... 54

Tabela XV: Classificao de Leucemias Mieloides Crnicas (LMC). ........................................ 54

Tabela XVI: Classificao das Leucemias Linfoides Crnicas .................................................... 55

Tabela XVII: Resultados do leucograma de um homem de 72 anos com LLC ...................... 55

Tabela XVIII: Interpretao dos microtubos ABO1 (A), ABO2 (B) e RH1 (D) .................... 59

Tabela XIX: Vrias unidades para HbA1c e glicemias .................................................................. 60

Tabela XX: Tabela classificativa de -Talssemias ........................................................................... 62

Tabela XXI: Resultados das anlises da cintica do ferro, da eletroforese da hemoglobina e

respetivos valores de referncia. .......................................................................................................... 63

Tabela XXII: Programa de avaliao da qualidade no setor da Hematologia ......................... 65

Tabela XXIII: Programa de avaliao da qualidade no setor da Autoimunidade. .................. 66

xiii

ABREVIATURAS

AAcs - Autoanticorpos

Acs - Anticorpos

Ag - Antignio

ALP - Fosfatase Alcalina

AMA - Anticorpos Anti-Mitocndrias

AMA-M2-3E - Anticorpos Anti-Subunidades E2 das -2 Oxocido Desidrogenases

AMA-M2 - Anticorpos Anti-Complexo Piruvato Desidrogenase

ANA - Anticorpos Anti-Nucleares

ANCA - Anti-Neutrophil Cytoplasma Antibodies

Anti-AGA - Anti- Gliadina Diaminada

Anti- EmA - Anti- Endomsio

Anti-LKM - Anti-Liver Kidney Microsomes

Anti-LP - Anti-Liver Pancreas Antigen

Anti-LC1 - Anti-Liver Citosol

Anti-SLA - Anti-Soluble Liver Antigen

Anti-tTG - Anti-Transglutaminase tecidular

AP - Anemia Perniciosa

APCA - Anti-Clulas Parietais Gstricas

AR - Artrite Reumatoide

ASMA - Anticorpos-Anti-Msculo Liso

BASO - Basfilos

BPI - Bacterial Permeability-Increasing protein

c-ANCA - Padro citoplasmtico nos Anti-Neutrophil Cytoplasma Antibodies

CBP - Cirrose Biliar Primria

CCP - Peptdeo Citrulinado Cclico

CD - Corrente Direta

CSP - Colangite Esclerosante Primria

DAI - Doena Autoimune

DC - Doena Celaca

DMTC - Doena Mista do Tecido Conjuntivo

ds-DNA - Acido Desoxirribonucleico de cadeia duplas

xiv

EBV - Vrus Epstein Barr

ELISA - Enzime-Linked Immunosorbent Assay

ESP - Esfregao do Sangue Perifrico

FAB - Franco-Americano-Britnico

FI - Fator Intrnseco

FITC - Fluorescein-Labelled Anti-human Antibodies

FR - Factor Reumatide

FSC - Forward Scatter

FTA-ABS - Fluorescent Treponemal Antibody Absorption

GGT - Gama Glutamil Transpeptidase

GI - Granulcitos Imaturos

GME - Glicmia Mdia Estimada

GOT - Transaminase Glutmico Oxalactica

GPT - Transaminase Glutmico Pirvica

HAI - Hepatite Autoimune

HbA1c - Hemoglobina Glicada

HbF - Hemoglobina Fetal

HCM=MCH=HGM - Hemoglobina Corpuscular Mdia (Cell Hemoglobin Concentration

Mean)

HCT= Ht - Hematcrito

HDF - Focagem Hidrodinmica

HDW - Hemoglobin Distribution Wigth (Amplitude de Distribuio da Hemoglobina)

HEp2 - Human Epithelioma Pharynx n2

HFR - High Fluorescence Ratio

HGB=Hb - Hemoglobina

HFR - High Fluorescence Ratio

HPLC - High-Performance Liquid Chromatography

ICSH - Internacional Comitee for Standardization in Hematology

IFCC - International Federation of Clinical Chemistry and Laboratory Medicine

IFI - Imunofluorescncia Indireta

IK - ndice de Katz

IL - ndice de Lobularidade

IMI - Immature Myeloid Information

INSA - Instituto Nacional de Sade Doutor Ricardo Jorge

xv

IRF - Frao de Reticulcitos Imaturos

K3EDTA - Potassium (K3) Ethylene Diamine Tetraacetic Acid

LES - Lpus Eritematoso Sistmico

LFR - Low Fluorescence Ratio

LLA - Leucemia Linfoblstica Aguda

LLC - Leucemia Linfoctica Crnica

LMA - Leucemia Mielide Aguda

LMC - Leucemia Mielide Crnica

LUC - Large Unstained Cells

LYN - Linfcitos

MCHC=CHCM - Mdia da Concentrao de Hemoglobina Corpuscular

MCV=VCM - Volume Corpuscular Mdio

MSP - Morfologia do Sangue Perifrico

MFR - Middle Fluorescence Ratio

MONO - Moncitos

MPO - Mieloperoxidase

NCCLS - National Committee for Clinical Laboratory Standards

NGSP/DCCT - National Glycohemoglobin Standardization Program e Diabetes Control

and Complications

NRBC - Nucleated Red Blood Cells (Eritroblastos)

NEU - Neutrfilos

p-ANCA - Padro perinuclear nos Anti-Neutrophil Cytoplasma Antibodies

PCR - Protena C Reativa

PDW - Platelet Volume Distribution Wigth

Ph - Filadlfia

PLT - Plaquetas

PR3 - Proteinase 3

QC - Controlo de qualidade

RBC - Red Blood Cells (Eritrcitos)

RF- Corrente com Frequncia Radio

Rh - Rhesus

RIA - Imunoensaios Radioativos

SFL - Side Fluorescence

SLS-Hb - Surfactante Laurilsulfato de Sdio-Hemoglobina

xvi

SI - Sistema Imunitrio

SSC - Side Scatter

RET - Reticulcitos

RDW - Red Cells Distribution Wigth

RNA - Ribonucleic Acid

UK-NEQAS - United Kingdom National External Quality Assessment Service

UV - Utra Violeta

VCM=MCV=VGM - Volume Corpuscular Mdio

V/HC - Volume/ Hemoglobin Concentration

VPM= MPV - Volume Plaquetar Mdio

VS - Velocidade de Sedimentao

VSM47 - Vascular Smooth Muscle

WBC - White Blood Cells (Leuccitos)

xvii

RESUMO

Foi no Labeto, Laboratrio de Anlises Bioqumicas, S.A. (Grupo Beatriz Godinho)

que desenvolvi e consolidei os meus conhecimentos ao nvel das anlises clnicas.

Selecionei as reas de Hematologia e Autoimunidade para uma descrio mais

profunda e pormenorizada onde explico as metodologias utilizadas no laboratrio e os

critrios utilizados na interpretao e validao dos resultados analticos. Descrevo ainda de

uma forma sucinta, o processo de controlo de qualidade que permite ao Laboratrio

garantir a qualidade dos resultados fornecidos aos utentes.

Os procedimentos laboratoriais consistem fundamentalmente, na identificao,

deteo e quantificao de: substncias qumicas, clulas sanguneas, microrganismos,

anticorpos, entre outros elementos biolgicos, encontrados em amostras de produtos

orgnicos.

A partir de uma amostra biolgica, no laboratrio, podemos obter informaes

valiosas para o prognstico, diagnstico e monitorizao teraputica do utente, que so

decisivas na preveno e acompanhamento das mais variadas patologias.

ABSTRACT

Labeto, Laboratory of Biochemical Analysis, S.A. was the falicity where I developed

and consolidated my knowledge in the area of clinical analysis. The topics of Hematology and

Autoimmunity were selected for a more thorough and detailed description. In this work, we

highlighted the methodologies used in the laboratory, as well as the criteria applied in the

interpretation and validation of analytical results. Briefly, we also describe the process of

quality control that allows the lab to ensure the reliability of the results obtained and

delivered to users.

The procedures consist essentially in identifying, detecting and quantifying chemical

substances, blood cells, microorganisms, antibodies and other biological elements, performed

on samples of organic products.

We concluded that from a clinical sample worked on in the laboratory, we can gain

valuable insight that facilitates the prognosis, diagnosis and monitoring of therapy. This

information is crucial in the prevention of disease and monitoring of several pathologies.

Introduo Relatrio de Estgio

1

CAPITULO I: INTRODUO

Este estgio surgiu no mbito do Mestrado em Anlises Clnicas e teve como principal

objetivo a aplicao prtica dos conhecimentos adquiridos na formao curricular em

diversas valncias que constituem um laboratrio.

O estgio decorreu no Laboratrio Labeto Centro de Anlises Bioqumicas, S.A.,

pertencente ao Grupo Beatriz Godinho, com sede em Leiria, no qual exero atividade

profissional com a categoria de Tcnica Superior, desde 2002.

O Labeto privilegia a polivalncia dos seus profissionais, pelo que, enquanto Tcnica

Superior de Laboratrio, tenho a oportunidade de desenvolver a minha atividade em todos

os setores do laboratrio, situao que se verificou tambm durante o estgio.

Com o conhecimento de todas as valncias do laboratrio, optei por elaborar o

relatrio de estgio nas reas de Hematologia e Autoimunidade, reas pelas quais me sinto

atrada e, desta forma, posso aprofundar os temas que vou discutir.

A Hematologia a rea que coloca a descoberto o mundo das clulas sanguneas

prontas a serem observadas e analisadas. As inmeras informaes que se podem retirar de

um hemograma, atravs da interpretao dos seus resultados, faz da hematologia um campo

de trabalho extremamente interessante.

No setor da Autoimunidade, utilizam-se tcnicas manuais e automatizadas para a

pesquisa e doseamento de autoanticorpos e anticorpos em serologia. A avaliao dos

resultados obtidos efetuada tendo em conta o histrico do doente, a sua condio

fisiolgica e a funo de cada anticorpo no organismo; uma pequena mas clara demonstrao

da complexidade do sistema imunitrio.

Caraterizao do Laboratrio de Estgio Relatrio de Estgio

3

CAPITULO II: CARATERIZAO DO LABORATRIO DE ESTGIO

O grupo de Laboratrios Beatriz Godinho nasceu na localidade dos Pousos, em 1974,

com a criao do Labeto- Centro de Anlises Bioqumicas, S.A. Com o crescimento da

atividade baseado na confiana dos utentes, adquiriu novas instalaes em 1981, na cidade de

Leiria.

Numa poltica de desenvolvimento sustentado e de aproveitamento de sinergias, o

grupo adquiriu outros laboratrios que funcionam sob a gide Beatriz Godinho. Com o

mesmo objetivo, foram criadas as empresas Polidiagnstico, Polidiagnstico Empresas e

Laboratrio Tomaz. Tambm faz parte do grupo uma rede de farmcias e a Clnica Lus

Loureno.

Com uma abrangncia geogrfica significativa no centro do pas, o Laboratrio Beatriz

Godinho composto por mais de 120 unidades de colheita. Com um fluxo dirio de cerca

de 1300 utentes, possui uma equipa de colaboradores altamente qualificada, e est equipado

com aparelhos munidos de modernas tecnologias ao nvel das anlises clnicas. Tambm

dispem de excelentes programas informticos, que se tem revelado preciosas ferramentas

de trabalho, indispensveis para um desempenho com qualidade.

O Labeto possui desde 2003, a dupla certificao do Sistema de Gesto da Qualidade,

concedida pela APCER.

Em termos analticos, a fiabilidade dos resultados suportada pelo uso sistemtico de

controlos internos e externos, comprovada pelo bom desempenho obtido nos programas de

avaliao externa da qualidade.

A Diretora Tcnica - Dra. Beatriz Olinda de Oliveira Santos Godinho Tomaz e a Dra.

Maria Beatriz Tomaz - Especialistas em Anlises Clnicas, assumem a responsabilidade

mxima pelo laboratrio. Juntamente com a Dra. Isabel Bento destacam-se com funes de

validao biopatolgica e cooperao extrema, em todas as situaes dbias que possam

ocorrer. Tambm fazem parte da equipa de trabalho outros Especialistas em Anlises

Clnicas, Tcnicos Superiores de Laboratrio, Tcnicos de Anlises Clnicas, Enfermeiros,

Administrativos e Auxiliares.

As amostras que chegam ao laboratrio so, na sua maioria, efetuadas nos postos de

colheitas, onde so recebidos os utentes e registados os pedidos de anlises no sistema

informtico. A cada paciente atribudo um nmero de processo e um nmero de utente.

Estes nmeros so utilizados para gerar um cdigo de barras, nico para cada setor. No

laboratrio, as amostras j identificadas so distribudas pelo setor adequado.

Relatrio de Estgio Caraterizao do Laboratrio de Estgio

4

No Labeto, as valncias do laboratrio esto divididas nos setores de: Bioqumica

Clnica, Bioqumica Manual, Bioqumica de Urinria, Autoimunidade,

Imunologia/Endocrinologia, Coagulao, Hematologia, Biologia Molecular e Bacteriologia/

Microbiologia. Cada um destes setores tem um responsvel especialista em anlises clnicas.

Autoimunidade Relatrio de Estgio

5

CAPITULO III: AUTOIMUNIDADE

No setor da autoimunidade faz-se o estudo serolgico de doenas autoimunes e de

algumas doenas infeciosas. Aqui executei, manualmente e em diferentes aparelhos, as

tcnicas utilizadas na pesquisa e doseamento de autoanticorpos (AAcs) e anticorpos (Acs)

efetuados em amostras de soro de doentes. Os resultados obtidos so importantes para o

prognstico e diagnstico serolgico e, em alguns casos, para o seguimento da doena

autoimune (DAI). A avaliao destes resultados efetuada de acordo com o histrico do

doente e com o doseamento de outros parmetros, quer hematolgicos quer bioqumicos.

Nesta seco so processadas anlises como os Acs ANA, ANCA, AMA, ASMA, anti-

dsDNA, FTA-ABS, Chlamydia trachomatis, entre outras.

Neste captulo vou-me debruar nos testes laboratoriais executados pelas tcnicas de

Enzime-Linked Immunosorbent Assay (ELISA), Imunofluorescncia Indireta (IFI) e

Immunoblotting, relacionados com diagnstico das DAI. Apresento tambm alguns casos

clnicos que surgiram durante o estgio e que tive a oportunidade de analisar.

3.1 DOENAS AUTOIMUNES

O sistema imunitrio (SI) semelhante a uma fora de defesa, a sua funo

proteger o organismo de invasores externos, como por exemplo vrus, bactrias ou

parasitas. No entanto, podem existir invasores internos estimuladores do sistema

imunitrio ou clulas cancergenas, que conseguem fugir ao sistema de vigilncia comum. Se

o SI no for capaz de distinguir devidamente os invasores internos, o individuo pode

desenvolver uma DAI ou um cancro. (1)

Se o SI deixar de funcionar normalmente, os invasores internos atacaro os rgos do

individuo e podem ocorrer dois tipos de doenas DAIs:

Um tipo ocorre devido a uma disfuno predominante da unidade celular

(clula T). Neste caso, as clulas T atacam os tecidos do prprio, que acabam por ser

destrudos.

O outro tipo originado por alteraes especficas do sistema de clulas B e

pela produo de AAcs. Os linfcitos B no reconhecem os tecidos do prprio e

produzem Ac(s) dirigidos contra o prprio organismo. (1)

A classificao das DAIs, mediadas por clulas T e B, essencial para a etiologia e

diagnstico da patologia. A solicitao adequada de anlises laboratoriais imprescindvel

porque cada doena tem o seu perfil especfico de AAcs. Em alguns casos, a presena de

Relatrio de Estgio Autoimunidade

6

determinado(s) AAc(s) pode representar uma especificidade de aproximadamente 100% para

o diagnstico. Infelizmente, noutros casos, esta especificidade pode ser bastante reduzida, no

entanto, a deteo de AAcs uma ferramenta de diagnstico muito til. (1)

A classificao das DAIs pode ser feita de acordo com o mecanismo que est na

origem das leses e em funo do rgo (especficas de rgo) ou rgos lesados

(sistmica).

Na DAI Especfica de rgo, os Acs produzidos tm afinidade para um antignio (Ag)

alvo que s existe em determinados tipos de clulas, tecidos ou rgos e cuja destruio

lenta ou disfuno induzida pela ligao Ag-Ac. As DAI Sistmicas ocorrem quando os Acs

produzidos tm afinidade para um Ag comum a muitas clulas. Todas as clulas portadoras

desse Ag vo ser afetadas devido acumulao de complexos Ag-Ac o que provoca o

desenvolvimento de reaes inflamatrias e danos nos tecidos. (1)

A presena de AAcs por si s, no sinnima de DAI. Estes devem estar associados a

um quadro clnico compatvel e devem ser feitos estudos subsequentes assim como a sua

monitorizao. De salientar que alguns AAcs, quando presentes, podem ser preditivos de

certas patologias. (1)

As causas das DAIs so multifatoriais, como a predisposio gentica, fatores

imunolgicos, hormonais e ambientais, alguns dos quais influenciam a exacerbao ou

remisso da doena. (1)

3.2 AMOSTRAS NA SEROLOGIA AUTOIMUNE

O soro a analisar deve ser processado no prprio dia, contudo, quando tal no

possvel, as amostras podem ser conservadas por um perodo mximo de uma semana, entre

os 2C e os 8C. Para se armazenarem durante mais tempo, as amostras devem ser

acondicionadas a -20C. Neste caso, recomendada a adio de azida de sdio para

estabilizar a atividade dos Acs, que eventualmente estejam presentes na amostra. Os ciclos

de congelao e descongelao devem ser evitados, uma vez que diminuem a atividade dos

Acs. (2)

3.3 IMUNOENSAIOS NO DIAGNSTICO SEROLGICO DAS DOENAS

AUTOIMUNES

A especificidade da interao entre Ag e Ac leva ao desenvolvimento de vrios ensaios

imunolgicos, que podem ser usados na deteo de ambos.

Autoimunidade Relatrio de Estgio

7

Atualmente, encontra-se disponvel no mercado uma grande variedade de

imunoensaios baseados em diferentes princpios e cujas tcnicas variam desde reaes

cruzadas, precipitao, aglutinao, imunoensaios radioativos (RIA), enzimticos (ELISA ou

EIA), immunoblotting (Western Blotting), imunoprecipitao, imunofluorescncia, entre outros.

(3)

Neste ponto sero discutidos os imunoensaios executados no Labeto para o

diagnstico/monitorizao de DAIs.

3.3.1 IMUNOENSAIO ENZIMTICO

ELISA - Enzime-Linked Immunosorbent Assay

Existem inmeras variantes do ensaio imunoadsorvente ligado enzima (ELISA). A

tcnica de ELISA pode ser indireta, em sanduche, competitiva ou por quimiluminescncia.

Esta tcnica pode ser utilizada para detetar ou quantificar a presena de Acs ou de Ags. Para

a quantificao o mtodo usa uma curva-padro com base em concentraes conhecidas de

Acs ou Ags e, a partir desta, determinada a concentrao destes elementos na amostra. (3)

Na tcnica de ELISA indireto, a amostra adicionada ao poo da microplaca revestido

com o Ag, fase slida, e deixado a reagir. Aps a lavagem, que retira o Ac livre, a presena

do Ac ligado ao Ag detetada pela adio de um Ac secundrio anti-isotipo conjugado

enzima (peroxidase-labelled anti-human antibodies - POD) que se liga ao Ac primrio. Numa

segunda lavagem, remove-se o anticorpo secundrio livre e adiciona-se um substrato

cromogneo que se liga enzima e promove uma reo colorimtrica. A intensidade da cor

proporcional concentrao de anticorpos na amostra de soro. O produto de reao

colorido medido por espectrofotometria (Figura 1). (3)

Figura 1: Esquema da reao, que ocorre em cada poo da tira da microplaca, na tcnica de ELISA indireto.

http://www.google.pt/imgres?imgurl=http://www.euroimmun.us/euroimmunus/imgs/ELISA-Test-Principle-US1.jpg&imgrefurl=http://www.euroimmun.us/technology/elisa&h=1582&w=1500&tbnid=XyIcz_ETrV0eoM:&zoom=1&docid=ZJDbVAaz3SZlUM&ei=f8_UU5XHO4m70QXBmoCAAg&tbm=isch&ved=0CEIQMygaMBo&iact=rc&uact=3&dur=784&page=2&start=26&ndsp=24https://www.google.pt/imgres?imgurl=http://www.pla2r.com/uploads/pics/serologischernachweis_01.jpg&imgrefurl=http://www.pla2r.com/serologischer_nachweis.html&docid=qAjqKo67Kv3nZM&tbnid=0XPnEJq61156hM:&w=462&h=277&ei=Is3UU8OfKaLS0QW9w4HACA&ved=0CAIQxiAwAA&iact=c

Relatrio de Estgio Autoimunidade

8

No Labeto, as anlises processadas recorrendo tcnica de ELISA, so automatizadas

e executadas no aparelho Analyser I-2P.

3.3.2 IMUNOFLUORESCNCIA

Os anticorpos podem ser marcados com molculas com propriedades fluorescentes.

As molculas fluorescentes absorvem a luz de um determinado comprimento de onda e

emitem-na em outro. Se a molcula de Ac estiver marcada com o corante fluorescente

(fluorocromo), os imunocomplexos Ag-Ac podem ser detetados com um microscpio de

fluorescncia (equipado com uma luz UV) pela emisso de uma luz colorida, quando

excitados por uma luz com o comprimento de onda apropriado. Na tcnica de

imunofluorescncia as substncias fluorescentes mais usadas so a fluorescena e a rodamina,

e com menos frequncia, a ficoeritrina. No laboratrio usada a fluorescena que absorve a

luz azul (490 nm) e emite uma luz fluorescente amarela-verde (517 nm). (3)

Para a determinao de AAcs ou Acs so usadas, como substratos de Ag, clulas,

sees de tecidos ou substncias caracterizadas bioquimicamente. (4)

No mtodo de imunofluorescncia indireta, se a amostra for positiva, o Ac especfico

presente numa amostra de soro diludo reage com o Ag fixado numa fase slida. Numa

segunda fase, o complexo Ag-Ac corado com um conjugado de fluorescein-labelled anti-

human antibodies (FITC) e visualizada a sua fluorescncia ao microscpio (Figura 2). As

amostras positivas podem ser tituladas em vrios passos.

Figura 2: Tcnica de IFI. a) Esquema da reao que ocorre na IFI; b) Exemplo de uma lmina, usada em IFI,

com os diferentes tipos de substrato em mosaico; c) Padres de fluorescncia em tecidos, clulas e dots

visualizados no microscpio de fluorescncia.

a) b) c)

https://www.google.pt/imgres?imgurl=http://www.euroimmun.us/euroimmunus/imgs/IFT-Test-Principle-US.jpg&imgrefurl=http://www.euroimmun.us/technology/immunofluorescence&docid=ZA7y14DTOb0utM&tbnid=hp_Zk3CxacZHeM:&w=1400&h=2031&ei=kA3VU_XOHvOR0QXRyYGoBw&ved=undefined&iact=chttp://www.google.pt/url?sa=i&rct=j&q=&esrc=s&frm=1&source=images&cd=&cad=rja&uact=8&docid=Ef9QCDO5mr_p8M&tbnid=P50ZNVP-Ki5eeM:&ved=0CAUQjRw&url=http://www.immunfluoreszenz.de/index.php?id=1638&L=1&ei=ddjUU6uFCsnT0QWL14GgDg&bvm=bv.71778758,d.d2k&psig=AFQjCNEue1J8jTA_SK4-sjCQtvUHFQYwbg&ust=1406544257304368https://www.google.pt/imgres?imgurl=http://www.euroimmun.us/img/ANCA_sextett_EN_01.jpg&imgrefurl=http://www.euroimmun.us/recent-news/anca-diagnostics-at-a-glance&docid=xetjvLcYS99bkM&tbnid=ep3mKADimfYEoM:&w=320&h=364&ei=O9vUU46zIc2Y1AXU2YHgAw&ved=0CAIQxiAwAA&iact=c

Autoimunidade Relatrio de Estgio

9

O procedimento para executar as tcnicas de IFI pode ser feito manualmente ou

em aparelhos automticos. No Labeto, quando processado um grande nmero de

amostras, utiliza-se o analisador Mago Plus.

3.3.3 IMMUNOBLOT

EUROLINE: Tcnica de Identificao de um Extenso Perfil de Anticorpos

Nesta tcnica, as tiras de membrana fixadas numa folha sinttica, so revestidas com

finas linhas paralelas de vrios antignios purificados. Estes so geralmente obtidos por

cromatografia de afinidade e so utilizados em fase slida. Se a amostra for positiva, os Acs

especficos, presentes no soro diludo, ligam-se aos Ags acoplados fase slida. De seguida

adicionado o conjugado que tem Acs humanos marcados com fosfatase alcalina (alkaline

phosphatase-labelled anti-human antibodies- AP). Nesta segunda incubao, os anticorpos

ligados reagem com um segundo Ac. Num terceiro passo, os Acs ligados so corados com

uma soluo cromognica que capaz de promover uma reao colorimtrica, aparecendo

uma intensa faixa escura na linha do respetivo Ag. De acordo com o espectro de Ags

utilizados, possvel analisar vrios Acs simultaneamente, sob condies idnticas (Figura 3).

(4)

No Labeto, o protocolo para executar testes pela tcnica de Imunoblot processado

no analisador Autolipa. Pode-se optar por um procedimento semiautomtico ou automtico,

dependendo do nmero de amostras a analisar.

A avaliao quantitativa das tiras de teste Euroline feita no programa EUROLineScan

da Euroimmun. O EUROLineScan reconhece a posio das tiras, identifica as bandas e mede

a sua intensidade (Figura 3). (4)

Figura 3: Tecnica de Imunoblot. a) Esquema da reao que ocorre no Imunoblot; b) Exemplos de tiras de testes

Euroline depois de encobadas com a mostra; c) Avaliao das tiras no programa EuroLineScan da Euroimmun.

a) b) c)

https://www.google.pt/imgres?imgurl=http://www.euroimmun.us/euroimmunus/imgs/Blot-Test-Principle-US1.jpg&imgrefurl=http://www.euroimmun.us/technology/blot-techniques&docid=p7JtkP2SEPAmQM&tbnid=X1_i8_JU5KSqXM:&w=1500&h=1658&ei=zQ3VU5vsLIWc0QXGlYDYCA&ved=undefined&iact=chttps://www.google.pt/imgres?imgurl=http://www.euroimmun.com/uploads/pics/EUROLINE_01.jpg&imgrefurl=http://www.euroimmun.com/index.php?id=euroline&L=1&docid=qYyKBJfhfvbLnM&tbnid=xxlsCpoGyvT64M:&w=240&h=564&ei=C8zUU7L9CYOc0QWcloHwAg&ved=0CAIQxiAwAA&iact=c

Relatrio de Estgio Autoimunidade

10

3.4 TESTES NO DIAGNSTICO DE DOENAS AUTOIMUNES SISTMICAS E

ESPECIFICAS DE RGOS

A colaborao entre a clnica e o laboratrio importante para se chegar rapidamente

ao diagnstico correto. Envolve uma avaliao clnica do paciente em conjunto com testes

especficos para o diagnstico.

Os testes de rotina incluem o Hemograma, Velocidade de Sedimentao (VS), Protena

-C-Reativa (PCR), Eletroforese das Protenas Sricas e as Fraes dos Complementos C3 e

C4. A maioria dos doentes com DAI produz um perfil caracterstico de AAcs que pode

ajudar o mdico a estabelecer um diagnstico e prognstico correto, facilitando o

tratamento e monitorizao do doente (Tabela I). (1)

Tabela I: Doenas autoimunes cuja deteo dos autoanticorpos feita no Labeto.

Doena Autoimune Sistmica Autoanticorpos

Lpus Eritematoso Sistmico (LES)

ANA, dsDNA, Nucleossomas, Histonas,

Sm, U1-RNP, SS-A (Ro, 60kDa), SS-B (La),

Ribossomal P Protein, Ku, Ciclin I

(PCNA), NuMA

Lpus Eritematoso Medicamentoso ANA, Histonas

Sndroma de Sjgren ANA, SS-A (Ro, 60kDa), SS-B (La)

Doena Mista do Tecido Conjuntivo

(DMTC) (Sharps Syndrome) ANA, U1-RNP

Poliomiosite/Dermatomiosite

ANA, PM-Scl, U1-RNP, Jo-1, Ku,

Fibrilharina (U3-RNP), PL-7, PL-12, Mi-2

Esclerodermia Sistmica Progressiva (F.

Difusa)

ANA, PM-Scl, Scl70, Fibrilharina (U3-

RNP), RNA Polimerase I, NOR90, 7-2-

RNP (To)

Artrite Reumatoide CCP, FR

Doenas Autoimunes Hepticas Autoanticorpos

Cirrose Biliar Primria (CBP) ANA, Sp100, PML, gp210, AMA, AMA M2-

3E (BPO)

Hepatite Autoimune Tipo I ANA, ASMA, F-actina, LSA/LP

Hepatite Autoimune Tipo II LKM 1 (CY450 IID6), LC1,

Colangite Esclerosante Primria (CSP) pANCA (atpico)

Doenas Autoimunes do

Estomago Autoanticorpos

Gastrite Autoimune/ Anemia Perniciosa Clulas Parietais (APCA), Fator Intrnseco

(FI)

Continua

Autoimunidade Relatrio de Estgio

11

Continuao

Doenas Autoimunes do Intestino Autoanticorpos

Doena Celaca Transglutaminase (tTG) (IgG/IgA),

Endomisium (IgG/IgA), Gliadina (IgG/IgA),

Colite Ulcerosa p-ANCA, Lactoferrina

Vasculites Autoanticorpos

Granulomatose de Wegener cANCA tipo Antiproteinase 3 (PR3)

Sndrome de Churg-Strauss

cANCA tipo Antiproteinase 3 (PR3),

pANCA tipo Mieloperoxidase 3 (MPO),

Elastase, Catepsina G, Lactoferrina e BPI

Poliangeite Microscpica pANCA tipo Mieloperoxidase 3 (MPO),

Elastase, Catepsina G, Lactoferrina

De seguida vo ser referidos alguns testes, executados no Labeto, uteis no diagnstico

das DAIs. Em alguns casos sero apresentados casos clnicos que acompanhei durante a

realizao no meu estgio.

3.4.1 DOENAS AUTOIMUNES SISTMICAS: TESTES

3.4.1.1 ANTICORPOS ANTI NUCLEARES

A pesquisa de Anticorpos Antinucleares (ANA) deve ser feita quando h suspeita de

DAIs, e imprescindvel que os resultados obtidos sejam sempre interpretados no contexto

dos dados clnicos do doente. O ANA tm interesse no auxlio ao diagnstico de DAIs

como Lpus Eritematoso Sistmico (LES), na Doena Mista do Tecido Conjuntivo (DMTC),

Artrite Reumatoide (AR), Esclerose Sistmica Progressiva, Poliomiosites /Dermatomiosites,

Sndrome de Shgren e outras como a Cirrose Biliar Prmria (CBP) e a Hepatite

Autoimune.

ANA - IMUNOFLUORESCNCIA INDIRETA

A tcnica de IFI em substrato de clulas HEp2 (Human Epithelioma Pharynx n2)

excelente para o rastreio dos Acs dirigidos contra os Ags do ncleo e citoplasma das clulas,

pelo que considerado o mtodo de referncia. Permite detetar ao mesmo tempo um

grande nmero de AAcs com a vantagem se ser fcil de executar. uma tcnica bastante

sensvel que contrasta com uma baixa especificidade: apenas alguns padres so especficos

Relatrio de Estgio Autoimunidade

12

de alguns antignios e muitas especificidades diferentes do origem a padres semelhantes.

(2)

Os AAcs pesquisados por IFI, em substrato HEp-2, esto associados a determinados

padres de imunofluorescncia, que embora meramente indicativos, podem, tanto o ttulo

(mais sugestivo quanto mais elevado) como o padro, ser muito informativos por serem

caractersticos de determinado(s) Ac(s). O componente celular no qual se localiza o Ag

que determina o padro visual que se observa na fluorescncia. J esto descritos mais de 30

padres de imunofluorescncia sendo alguns deles muito raros. Na Figura 4 esto

representados alguns dos padres de imunofluorescncia mais frequentes em clulas HEp2.

(2)

Figura 4: Padres de fluorescncia em clulas HEp2.

Quando, ao laboratrio pedida a anlise ANA, o secreening feito pela tcnica IFI. A

determinao dos Acs feita qualitativa e quantitativamente. So utilizadas lminas com um

substrato combinado de HEp2/Fgado de primata com o qual a amostra diluda incubada.

As amostras so testadas com uma diluio de 1/160. No caso da fluorescncia da

amostra ser sugestiva de um ttulo a 1/640 so feitas diluies para aferir a intensidade da

fluorescncia. Os resultados so dados como negativos ou positivos com ttulo de 1/160,

1/320, 1/640 ou >1/640. Quando a amostra positiva reportado o padro de fluorescncia

que pode ou no ser confirmado por mtodos com maior especificidade (ELISA ou

Imunoblot).

Ttulos positivos, ainda que baixos, podem ser detetados em idosos, grvidas, doentes

com infees crnicas, neoplasias e em muitas outras patologias. (1)

ANA - SCREENING POR ELISA

O teste ANA por ELISA permite fazer uma determinao qualitativa da presena dos

AAcs da classe IgG no soro do doente, contra uma pool de vrios Ags do ncleo e

Autoimunidade Relatrio de Estgio

13

citoplasma das clulas. No Labeto, o kit usado para fazer o screen dos ANA por ELISA

permite determinar 11 Ags alvo diferentes:

Sm - uma partcula complexa e consiste em diferentes protenas especificas (B,

B`, D, E F e G) associadas ao RNA;

nRNP/Sm nRNP - o Ag alvo so 3 polipeptdeos ligados ao U1-RNA (U1-RNA,

U1-RNA-A e U1-RNA-C);

SS-A (Ro) - o Ags alvo so protenas ligantes Y1-5RNA (52kDa, 60kDa);

Ro-52 - Ag alvo apenas a ribonucleoprotena de 52kDa;

SS-B - fosfoprotena com peso molecular de 48kDa;

Scl-70 - uma enzima DNA Topoisomerase I;

Jo-1- histidil-tRNA sintetase;

PCNA-Proliferanting Cells Nuclear Antigen- protena de 36kD auxiliar da DNA

polimerase;

PM-Scl - complexo de 11 pptidos nucleolares, sendo os dois principais os PM-

Scl75 e PM-Scl100;

Protena P Ribossomal - Ags alvo so 3 fosfoprotenas da subunidade ribossomal

60S (P0 (38kDa), P1 (19kD), e P2 (17kDa));

Centrmero- Ags alvo so 4 protenas do centrmero (CENP-B (80kDa), CENP-

A (17kDa), CENP-C (140kDa) e CENP-D (50kDa)).

ANA IMUNOBLOT

No caso do resultado do ANA screen ser positivo, faz-se a determinao quantitativa

individual do(s) AAc(s) presentes na amostra de soro do doente utilizando a tcnica

Imunoblot. O kit usado o Euroline ANA Prolile 3 da Euroimmun. Este kit permite fazer a

identificao de AAcs humanos, da classe IgG, contra 14 Ags diferentes (Figura 5).

Figura 5: Tira Euroline ANA Profile 3 revestida com 14 Ags.

Sabendo o padro de imunofluorescncia, os AAcs presentes no soro do doente, o

resultado dos testes hematolgicos e bioqumicos e conhecendo o quadro clinico do

paciente, o mdico consegue orientar o diagnstico do individuo.

Relatrio de Estgio Autoimunidade

14

Em anexo, encontra-se uma descrio sinttica de alguns padres de fluorescncia

correspondentes aos diferentes AAcs do ncleo e do citoplasma, e respetivas associaes

clnicas.

3.4.1.2 ANTICORPOS ANTI-DSDNA

LPUS SISTMICO ERITEMATOSO

O Lpus Sistmico Eritematoso (LES) uma DAI sistmica em que podem ser afetados

vrios rgos, como por exemplo, pele, articulaes, rins e tecido sanguneo. uma doena

predominante em mulheres jovens, com um pico de incidncia entres o 15 e os 40 anos. A

etiologia desconhecida, no entanto, na base da doena est uma desregulao imunolgica

que pode ter como causa fatores genticos, hormonais e ambientais. (1, 5)

O termo anticorpo anti-dsDNA refere-se, habitualmente, aos Acs que se ligam

especificamente ao DNA de dupla cadeia (dsDNA). So muito especficos para o LES e fazem

parte dos critrios de diagnstico para o Lpus segundo a classificao do American College of

Rheumatology. Cerca de 85% dos indivduos saudveis em que estes Acs foram detetados,

desenvolveram LES nos 5 anos seguintes. (1)

Durante a doena, imunocomplexos de dsDNA e AAcs correspondentes, depositam-

se nos capilares subcutneos, rins, pulmes e outros rgos, causando leso. Existem

evidncias que o primeiro Ag alvo, com relevncia patolgica, a ser atingido o complexo

DNA/Nucleossomas. (6, 7)

A determinao e doseamento dos Acs humanos da classe IgG contra o dsDNA, no

Labeto, so feitos recorrendo tcnica de ELISA. A quantificao dos anti-dsDNA

importante tanto para o prognstico do LES, como para o controlo da atividade da doena.

(8)

CASO CLNICOS DE LPUS

LUPUS SISTMICO ERITEMATOSO (LES)

Homem de 22 anos fez anlises no laboratrio, (Tabela II; Resultados 1), passados 6

meses repetiu algumas das anlises (Tabela II; Resultados 2), a informao clnica do

processo refere que toma medicamento para o Lpus.

Autoimunidade Relatrio de Estgio

15

Tabela II: Resultados das anlises clinicas a um doente com LES apurados intervalo de seis meses.

Anlise Resultado 1 Resultado 2 Valor Ref.

ANA - Anticorpos

Antinucleares e Anti

Citoplasmticos

Positivo:

Titulao:1/640

Ncleo - Homogneo

Nuclolos -Negativos

Mitoses - Positivas

Citoplasma: Negativo

------------

Relatrio de Estgio Autoimunidade

16

O valor dos Complementos C3 e C4 esto baixos, devido, muito provavelmente,

ativao do sistema complemento provocada pela inflamao. So marcadores uteis na

avaliao da atividade da doena. (3)

Tambm frequente ocorrer hipergamaglobulinmia nas DAIs. No LES estes valores

podem estar normais ou muito elevados dependendo da fase da doena. (5)

O envolvimento renal frequente em doentes com LES, pelo que mais de 70% dos

doentes desenvolvem doena renal, classificada pela World Health Organisation de Nefrite

Lpica. (9)

Este doente apresenta parmetros laboratoriais indicativos de doena renal:

proteinograma com valores nas diferentes fraes caractersticos de Sndrome Nefrtico;

Depurao da Creatinina e Proteinuria com resultados elevados; a anlise Tipo II revela a

presena de protena e cilindros hialinos na urina.

LPUS INDUZIDO POR FRMACOS

Mulher de 46 anos fez anlises no laboratrio, refere estar a tomar medicamentos para

a tiroide e Plaquinol (medicamento para o tratamento do Lpus).

Entre as anlises prescritas pelo clnico esto o ANA, os Acs. anti-dsDNA, anti-

SSA/Ro, anti-SSB/La, anti-RNP e anti-Sm (Tabela III).

Tabela III: Resultados das anlises prescritas pelo clnico.

Anlise Resultado Valor Referncia

ANA Ac-Anti -

Nucleares e

Citoplasmticos

Positivo:

Titulao:1/640

Ncleo -Fino granular denso

Nuclolos -Negativos

Mitoses - Positivas

Citoplasma: Granular 1+

Autoimunidade Relatrio de Estgio

17

Em relao ao resultado do ANA de salientar: o ttulo da fluorescncia (1/640) que

tanto mais sugestivo de DAI quanto mais elevado; as mitoses positivas remetem-nos para a

existncia de Acs anti-dsDNA justificados pelo valor de 138,1 UI/mL dos Acs anti-dsDNA,

detetados por ELISA.

A deteo dos Acs anti-SS-A/Ro, anti-SSB/La, anti-RNP e Anti-Sm foi feita com o teste

ANA Profile 3, pela tcnica Imunoblot (Figura 6).

Figura 6: Resultado da tira de Ana Profile 3 incubada com a amostra de soro do doente.

O resultado do teste revela a presena no soro de AAcs contra os Ag SSA/Ro-60 e

Ro-52 os quais esto associados a vrias doenas autoimunes como Sndrome de Sjgren,

LES, Lpus Neonatal e outras. A deteo de Ac. anti-Histonas orienta-nos para um Lpus

Induzido por Frmacos, cuja prevalncia, nesta patologia, de >95%. No entanto, de

referir que DAIs como LES, Artrite Reumatoide (AR) tambm podem ter Ac. anti-Histonas

mas com uma menor prevalncia. (5)

A mulher, em causa neste caso clnico, referiu estar a tomar medicamentos para a

tiroide e alguns frmacos antitiroideanos pertencem ao grupo de medicamentos provveis

indutores de Lpus. (10)

Aquando do contacto com o clnico este confirmou trata-se de Lpus Induzido por

Frmacos, uma vez que j havia descartado a possibilidade de outras DAIs pela realizao de

testes complementares.

O Lpus Induzido por Frmacos descrito como tendo um desenvolvimento dos

sintomas semelhantes ao LES, mas est relacionado com a exposio a drogas ao longo do

tempo. A resoluo do quadro clnico ocorre com a suspenso do medicamento

desencadeante. O mecanismo considerado, de uma forma geral, para a induo de DAI

mediada por frmacos, a ativao inapropriada do SI. (10)

Relatrio de Estgio Autoimunidade

18

3.4.1.3 ANTICORPOS ANTI-PEPTDEO CITRULINADO CCLICO

ARTRITE REUMATOIDE

A Artrite Reumatoide (AR) umas das DAIs mais comuns. Pode ocorrer em qualquer

idade incidindo com maior frequncia entre os 25 e 45 anos e depois dos 60. caracterizada

pela inflamao crnica da membrana sinovial que se propaga simetricamente das pequenas

para as grandes articulaes.

Os sintomas iniciais incluem inchao doloroso das articulaes dos dedos e rigidez

matinal. Se a AR no for tratada, com o passar do tempo, h uma destruio progressiva das

articulaes devido eroso das cartilagens e do osso, o que provoca deficincia e

incapacidade do individuo. Com a evoluo da doena outros rgos como corao,

plumes e olhos podem sofrer danos severos. (9)

Um diagnstico precoce e o comeo imediato de terapia adequada necessrio para

manter a doena sobre controlo e evitar leses mais graves que ocorrem com o passar do

tempo. O diagnstico laboratorial pode ajudar a identificar casos de AR e a avaliar a

atividade da doena. Para alm dos parmetros inflamatrios em geral, o teste serolgico

mais comum, no caso de suspeita de AR era, at h pouco tempo, a determinao do Fator

Reumatoide (FR). (5, 9)

Os FR so AAcs, predominantemente da classe IgM, dirigidos contra as

imunoglobulinas e ocorrem em 60-80 % dos pacientes com AR. um marcador sensvel mas

no muito especfico para a AR, uma vez que est presente em vrias infees e em DAIs

como o LES, Sndrome de Sjgren e Esclerodermia. (9)

Presentemente, o marcador serolgico mais especfico para a AR so os Acs contra o

Peptdeo Citrulinado Cclico (CCP). Acs anti-CCP so geralmente da classe IgG e tm uma

especificidade de 98 % para a AR. Eles so um bom marcador preditivo, uma vez que podem

ser encontrados no soro de doentes numa fase inicial da doena (79 %) e muitas vezes anos

antes do aparecimento dos primeiros sintomas. O ttulo dos Acs anti-CCP, geralmente,

correlaciona-se com a atividade da doena sendo um importante marcador de prognstico,

diagnstico e evoluo da doena. (11, 12, 13)

Os Acs anti-CCP tambm podem ser usados na diferenciao entre AR e outras

doenas reumticas sistmicas. (11)

Os testes de ELISA so muito usados para detetar a presena dos Acs anti-CCP. No

Labeto, usado o kit anti-CCP IgG da Euroimmun, para a determinao quantitativa, in

vitro, dos Acs anti-CCP da classe IgG.

Autoimunidade Relatrio de Estgio

19

CASO CLNICO DE ARTRITE REUMATOIDE

Mulher de 67 anos fez no laboratrio as anlises prescritas pelo seu mdico

assistente. Na anlise dos resultados verificou-se que os valores alterados esto relacionados

com os marcadores de inflamao e com parmetros imunolgicos (Tabela IV).

Tabela IV: Resultados das anlises, da mulher de 67 anos, com valores alterados.

Anlise Resultado Valor de Referncia

Plaquetas 453 453 140 - 440 x 109/L

VS 90 90 0 - 30 mm

Fibrinognio 526 526 180 - 350 mg/dL

Protena C Reativa 6,81 6,81

Relatrio de Estgio Autoimunidade

20

Pelo que foi j foi referido acerca do FR e do Ac. anti-CCP e, tendo em conta os

resultados elevados destes marcadores serolgicos, podemos dizer que a doente tem AR.

Para reforar este diagnstico, na anlise ANCA, obteve-se um p-ANCA formol

sensvel, cuja prevalncia na AR de 45% quando associado ao Ag lactoferrina (ver ponto

3.4.2.4.1). O ANA positivo muito frequente em doentes com AR, no entanto, um teste

pouco sensvel e especfico, pelo que no deve ser usado no diagnstico desta doena. (9)

Como o ttulo dos Acs. anti-CCP est relacionado com a atividade da doena e os

valores dos parmetros relacionados com processos inflamatrios esto elevados, levam-nos

a prossupor a existncia de um processo inflamatrio em fase aguda.

3.4.2 DOENAS AUTOIMUNES ESPECIFICAS DE RGO: TESTES

3.4.2.1 DOENAS AUTOIMUNES HEPTICAS

3.4.2.1.1 ANTICORPOS ANTI-MITOCNDRIA

Cirrose Biliar Primria

A Cirrose Biliar Primria (CBP) uma doena heptica autoimune caracterizada por

uma colestase crnica. A leso morfolgica deve-se a uma inflamao e destruio dos

ductos biliares intra-hepticos que condiciona a eliminao da blis. Inicialmente os sintomas

so muitos gerais como fadiga e prurido que pode ser generalizado ou limitado palma das

mos e ps. Depois de algum tempo aparece ictercia e hiperpigmentao da pele e

posteriormente, aparecem sintomas que traduzem a existncia de colestase assim como a

acumulao de lpidos. Por fim aparece ascite e hipertenso portal. A CBP afeta

principalmente mulheres entre os 40 e os 50 anos. (5)

Anticorpos anti- Mitocndria (AMA) so um grupo heterogneo de Acs, no

especficos de rgo, que se dirigem contra diferentes componentes das mitocndrias.

Pertencem fundamentalmente classe das imunoglobulinas IgG, ainda que se detetem

tambm Acs das classes IgM e IgA. Estes AAcs so considerados os marcadores

imunolgicos mais sensveis e especficos da CBP, fazendo a sua deteo praticamente

diagnostico, mesmo na ausncia de sintomas e com Fosfatase Alcalina srica normal. Esto

descritos at ao momento nove Ags mitocondriais (M1 a M9). Na CBP podem ocorrer Acs

anti-M2, M4, M8 e M9, mas apenas os anti-M2 so especficos da doena. Os Acs AMA-M2-

3E (anticorpos anti-subunidades E2 das -2 oxocido desidrogenases) e AMA-M2 (anticorpos

anti complexo piruvato desidrogenase) esto presentes na maioria dos pacientes com CBP.

(5, 9)

Autoimunidade Relatrio de Estgio

21

possvel identificar no ANA Ags alvo com elevada prevalncia na CBP. So eles: dois

componentes do complexo poro nuclear (gp210 e p62), que esto associados ao padro

perinuclear; os Ags PML e Sp100, que geram um padro de dots nucleares na IFI.

A IFI permite observar um padro clssico de fluorescncia com a marcao intensa

das mitocndrias no citoplasma das clulas. Classicamente utilizam-se como substrato cortes

de rim, estmago e fgado de rato. Podem ainda ser utilizados outros substratos como as

VSM47 (Vascular Smooth Muscle) e HEp-2 que ajudam na identificao dos AAcs. (16)

Os padres de fluorescncia no AMA diferem em funo do substrato (Figura 7):

AMA no fgado - fluorescncia granular no citoplasma dos hepatcitos;

AMA nas clulas VSM47 - citoplasma com padro granular mdio disperso;

AMA no estmago - padro citoplasmtico granular de distribuio uniforme;

AMA no rim - fluorescncia granular no citoplasma das clulas dos tbulos renais,

que mais intensa nos tbulos distais e que contrasta com a fraca fluorescncia dos

glomrulos renais. (16)

Figura 7: Padres de fluorescncia no AMA em diferentes substratos: a) Fgado de rato; b) Clulas VSM47; c)

Estmago de rato; c) Rim de rato.

3.4.2.1.2 ANTICORPOS ANTI - MSCULO LISO / ANTICORPOS ANTI - MICROSSOMAIS

HEPTICOS E RENAIS

HEPATITE AUTOIMUNE

Hepatite Autoimune (HAI) uma doena inflamatria progressiva crnica que provoca

a necrose do fgado. Afeta predominantemente as mulheres (75 % dos casos). (5)

A HAI pode ser definida por uma infeo do fgado que se mantem por mais de seis

meses e cuja etiologia desconhecida. caracterizada pela elevao das transaminases,

hipergamaglobulinmia, elevados ttulos de Acs especficos no soro e alteraes histolgicas

no fgado. A HAI tem evoluo para cirrose se no for tratada. considerada uma DAI

devido associao a outras desordens hepticas autoimunes e eficcia da terapia

imunossupressiva que inclui remisso clnica, bioqumica e histolgica na maioria dos casos.

a) b) c) d)

Relatrio de Estgio Autoimunidade

22

A HAI pode ser classificada em HAI Tipo I, II de cordo com os AAcs associados. A

HAI Tipo I caraterizada por apresentar Acs anti-Musculo Liso (ASMA), anti-SLA (Soluble

Liver Antigen) e anti-LP (Liver Pancreas Antigen). Por sua vez, a HAI Tipo II tem como

marcadores os Acs anti-Microssomais Hepticos e Renais (anti-LKM1) e os anti-LC1(Liver

citosol). (9)

Os vrios Acs circulantes detetados por IFI, e que ocorrem na maioria dos doentes

com HAI, tm-se revelado muito importantes no diagnstico doena. (16)

ANTICORPOS ANTI- MSCULO LISO

Os Acs anti-Msculo Liso (ASMA) so Acs contra diferentes componentes do

citoesqueleto, os principais dirigem-se contra a actina, e os menos frequentes contra a

tubulina, tropomiosina e vimentina. (5)

Os ASMA com especificidade anti-F-actina so considerados marcadores da HAI tipo I.

A pesquisa destes Acs efetuada em cortes de tecidos de fgado, estmago e rim de rato, e

opcionalmente nas clulas VSM47 e HEp-2. A F-actina quando presente origina padres de

imunofluorescncia muito caractersticos (Figura 8):

Rim - fluorescncia nos vasos sanguneos e nos glomrulos renais sendo muito

caracterstica no espao peritubular (aspeto de espinhos);

VSM47 - fluorescncia nos filamentos de F-actina que so longos e retilineos.

Estendem-se de um extremo ao outro da clula e passando sobre o ncleo;

Fgado - fluorescncia intensa nos vasos do espao porta (artria, canal e veia). A

visualizao de fluorescncia na membrana dos hepatcitos depende do ttulo do

anticorpo;

Estmago - fluorescncia intensa na camada muscularis mucosae, nas projees

muscularis da mucosa e na camada muscular. (16)

Figura 8: Padres de fluorescncia no ASMA em diferentes substratos: a) Rim de rato; b) Clulas VSM47; c)

Fgado de rato; d) Estmago de rato.

a) b) c) d)

Autoimunidade Relatrio de Estgio

23

ANTICORPOS ANTI-LKM (LIVER KIDNEY MICROSOMES)

Os Acs contra os Microssomas Hepticos e Renais (anti-LKM) so um grupo

heterogneo de Acs que se ligam a estruturas do citoplasma dos hepatcitos e das clulas

dos tbulos contornados principais. De acordo com a sua natureza so considerados,

atualmente, quatro tipos de Acs anti-LKM: LKM1 (Ag alvo: citocromo P450 IID6 (CYP2

D6)), LKM2 (Ag alvo: citocromo P450 IIC9 (CYP2 C9)), LKM3 (Ag alvo: citocromo P450

IIA2 (CYP2 A2)) e um quarto tipo que tem como Ag alvo o CYP2 A2 e o CYP2 A6. (16)

Os Acs anti-LKM1 so caractersticos da HAI tipo II, no existindo correlao entre a

concentrao dos AAcs e o grau da doena. Estes AAcs esto presentes em cerca de 10%

dos doentes com Hepatite C, aparecendo tambm em outras patologias como a doena

Celaca, doena de Graves, Anemia Perniciosa e Anemia Hemoltica Autoimune. (16)

Quando so utilizados substratos com cortes de fgado e rim de rato podem deteta-

se os Acs anti-LKM1 que, quando revelados por IFI, apresentam diferentes padres de

fluorescncia (Figura 9):

Fgado - fluorescncia intensa do citoplasma dos hepatcitos. A ausncia de

fluorescncia no tecido conjuntivo e nos ncleos origina o aspeto caracterstico de

buraco negro;

Rim - fluorescncia intensa granular e homognea do citoplasma das clulas dos

tbulos contornados proximais. H ausncia de fluorescncia do citoplasma das

clulas dos tbulos distais. Contudo, em 10% dos casos, os Acs anti-LKM1

provenientes de doentes com HAI Tipo II ou com Hepatite C, podem revelar

fluorescncia de fraca intensidade nos tbulos distais.

Figura 9: Pares de fluorescncia caractersticos dos anticorpos anti-LKM1: a) Rim de rato; b) Fgado de rato.

Em aproximadamente 25% dos soros dos doentes com HAI Tipo II existe uma

associao dos Acs anti-Clulas Parietais Gstricas (APCA) com os Acs anti- LKM1, uma vez

que a HAI Tipo II est associada s gastrites (ver ponto 3.4.2.2). (16)

a) b)

Relatrio de Estgio Autoimunidade

24

3.4.2.2 DOENAS AUTOIMUNES DO ESTMAGO

3.4.2.2.1 ANTICORPOS ANTI- CLULAS PARIETAIS GSTRICAS

ANEMIA PERNICIOSA

A Anemia Perniciosa (AP) caracterizada pela absoro deficiente da vitamina B12,

secundria a uma leso autoimunitria das clulas parietais gstricas, com os sintomas de

uma anemia megaloblstica. (5)

Esta DAI desenvolve-se devida existncia de Acs anti-Fator Intrnseco (FI) e anti-

Clulas Parietais Gstricas (APCA). O FI uma protena sintetizada nas clulas parietais da

mucosa gstrica. Em condies fisiolgicas, liga-se vitamina B12, sendo fundamental para a

absoro desta no lio terminal. A destruio da mucosa gstrica que ocorre na gastrite

autoimune, origina uma diminuio da sntese de FI e, consequentemente, uma diminuio da

absoro da vitamina B12. (9)

A presena de APCA pode anteceder o aparecimento da AP e gastrite autoimune em

vrios anos, a sua pesquisa e identificao til no rastreio pr clinico. No entanto, a

presena destes Acs tambm frequente em indivduos saudveis e em outras patologias

autoimunes. Os APCA tm uma elevada sensibilidade mas baixa especificidade no

diagnstico da AP. (9)

A pesquisa e identificao de APCA so realizadas por IFI utilizando como substrato

cortes de estmago de rato. A fluorescncia granular densa, localizada exclusivamente no

citoplasma das clulas parietais gstricas, mais intensa no polo apical da clula. As clulas da

mucosa e submucosa no apresentam fluorescncia (Figura 10). (9)

Figura 10: Padro de fluorescencia dos Acs APCA em substrato estmago de rato.

Acs contra o FI so muito especficos para AP embora nem sempre estejam

presentes no soro de todos os pacientes com esta patologia (prevalncia de 70 %). (5)

De salientar que enquanto a prevalncia de APCA decrece no curso da doena,

muitos doentes desenvolvem os Acs contra o FI mais tarde.

No Labeto, quando pedida a deteo dos Acs AMA, ASMA, LKM1, e APCA

executada a IFI. So utilizadas lminas Liver Mosaic 9 da Euroimmun com os substratos de

fgado, rim e estmago de rato e as clulas VSM47.

Autoimunidade Relatrio de Estgio

25

Em caso de positividade so observados, para cada Ac, padres caractersticos na

fluorescncia nos diferentes tecidos descritos anteriormente.

A presena de cada um dos Acs confirmada no teste EUROLINE Profile

Autoimmune Liver Diseases, pela tcnica de Imunoblot. Neste teste so detetados os Acs

humanos da classe IgG para 9 diferentes Ags (AMA-M2, M2-3E, Sp100, PML, gp210, LKM1,

LC-1, SLA/LP, Ro52) (Figura 11).

Figura 11: Tira com os diversos Ags presentes no teste EUROLINE Profile Autoimmune Liver Diseases.

Este teste tambm realizado quando so pedidos, por exemplo, os Acs anti-SLA/LP e

anti-LC-1, que tambm esto associados s doenas do fgado.

Quando pedida a deteo dos Acs da classe IgG contra o FI ou pretendemos

confirmar a presena de Acs APCA visualizados na fluorescncia, faz-se o teste ALPHADIA

Biermer- Atrophic Gastrites DOT (Figura 12).

Figura 12: ALPHADIA Biermer - Atrophic Gastrites DOT.

CASOS CLNICOS DE DOENA AUTOIMUNE HEPTICA

PROVVEL CIRROSE BILIAR PRIMRIA

Uma mulher de 23 anos fez anlises no laboratrio e referiu estar a tomar

medicamento para as dores articulares. Das anlises prescritas pelo clnico apenas vou

salientar as que podem ser importantes para fazer o prognstico clinico (Tabela V).

Relatrio de Estgio Autoimunidade

26

Tabela V: Resultados laboratoriais das anlises efetuadas mulher de 23 anos.

Anlise Resultado 1 Resultados 2 Valor de Ref.

VS 39 --------- 0 -25 mm

Transaminase-GOT 18 ---------

Autoimunidade Relatrio de Estgio

27

O resultado do Liver Profile foi positivo para os Acs AMA-M2 AMA-M2-3E. Como foi

j referido, estes Acs AMA-M2 so especficos da CBP e de elevado valor preditivo, sendo o

resultado valorizvel no tratamento e/ou preveno da evoluo da doena.

PROVVEL HEPATITE AUTOIMUNE TIPO I

Um homem de 32 anos fez anlises no laboratrio (Tabela VI; Resultados 1). O seu

mdico assistente, ao verificar a existncia de alteraes nas anlises da funo heptica,

prescreve os mesmos exames e acrescenta anlises de carter imunolgico para alm dos

marcadores da Hepatite A, B e C (Tabela VI; Resultados 2). Trs semanas depois, o utente

fez novamente anlises e referiu estar a tomar medicamento para o fgado (Tabela VI;

Resultados 3).

Tabela VI: Resultados, ao longo do tempo, de um doente com um possvel diagnstico de HAI Tipo I.

Anlise Resultado 1 Resultados 2 Resultados 3 Valor de Ref.

Transaminase-GOT -------- 229 78

Relatrio de Estgio Autoimunidade

28

Os valores da Fosfatase Alcalina, GOT, GPT e GGT esto elevados o que indicia

patologia heptica.

A hepatite provoca uma elevao, embora no muito acentuada, dos valores da ALP. A

GOT aumenta quando h leso das clulas de tecidos altamente metablicos como os

hepatcitos. A GPT uma enzima predominante no fgado sendo libertada quando h leso

hepatocelular. Grandes concentraes da GGT esto presentes no fgado e pode ser usada

para detetar disfuno dos hepatcitos. (14)

Os resultados obtidos para os marcadores da hepatite viral A, B e C deram resultados

negativos o que leva a excluir uma hepatite viral, provocada por alguns destes vrus.

O resultado, por IFI em substratos de clulas VSM47, tecidos de fgado, estmago e

rim de rato, revelam um padro de fluorescncia caracterstico dos Acs anti-F-actina,

considerados marcadores da HAI tipo I.

De referir que trs semanas aps o diagnstico os resultados da funo heptica esto

prximos dos valores normais, o que revela a remisso da doena, possivelmente, devido

terapia imunossupressora.

O resultado negativo do AMA juntamente com as Bilirrubinas normais exclui uma

CBP.

3.4.2.3 DOENAS AUTOIMUNES DO INTESTINO

3.4.2.3.1 ANTICORPO ANTI-ENDOMSIO, ANTICORPO ANTI-TRANSGLUTAMINASE

TECIDULAR E ANTICORPO ANTI-GLIADINA

Doena Celaca

Doena Delaca (DC) uma enteropatia autoimune induzida pela ingesto de glten

estando subjacente uma forte predisposio gentica. Afeta, principalmente, indivduos

portadores do Ag codificado pelo HLA-DQ2/DQ8 mas outros fatores como vrus e

alteraes imunolgicas tambm podem estar envolvidas na etiopatogenia da doena. Esta

patologia caraterizada pela inflamao e atrofia das vilosidades da mucosa do intestino

delgado que prejudicam a absoro de nutrientes. As alteraes da mucosa revertem

favoravelmente quando se elimina o glten da dieta. (5, 9)

O glten um constituinte de vrios cereais como trigo, cevada e centeio. composto

por uma mistura de protenas que podem se divididas em prolaminas e glutelinas, sendo a

gliadina a prolamina mais frequente. A elevada concentrao destas protenas no glten leva

sua digesto parcial. Os resduos parcialmente digeridos so reabsorvidos na mucosa

intestinal sendo os de glutamina (presentes na gliadina) convertidos em cido glutmico pela

Autoimunidade Relatrio de Estgio

29

enzima tecidular transglutaminase (tTG), localizada no espao extracelular da mucosa

intestinal, atravs do processo de desaminao.

A converso dos resduos de glutamina em acido glutmico pela tTG facilita a ligao

dos peptdeos de gliadina aos hapltipos de HLA-DQ2 e/ou HLA-DQ8, na superfcie das

clulas de apresentao de Ags (clulas T helper). Nos indivduos com predisposio

gentica, desencadeada uma resposta imunolgica que leva sntese de Acs especficos

anti-Transglutaminase (anti-tTG), anti- Endomsio (anti-EmA) e anti- Gliadina (anti-AGA). (9,

17)

O diagnstico serolgico para a DC, de acordo com as novas guidelines da Europian

Society of Pediatric Gastroenterology, Hepatology and Nutrition (ESPGHAN), baseado no

doseamento da Imunoglobulina IgA, na deteo dos hapltipos HLA-DQ2/DQ8 e nos Acs da

classe IgA anti-EmA, anti-tTG e anti-AGA. (18)

Para fazer o diagnstico e monitorizao da DC, no Labeto, feita por rotina, a

deteo dos seguintes Acs:

Anti-tTG da classe IgA por ELISA;

Anti-AGA (GAF-3X) da classe IgA por ELISA;

Anti-AGA (GAF-3X) da classe IgA e IgG por IFI;

Anti-EmA da classe IgA e IgG por IFI.

Com cerca de 100% de sensibilidade e especificidade, os Acs anti-EmA e antitTG, da

classe IgA, tm uma elevada relevncia no diagnstico da DC. Os Acs anti-tTG tambm so

uteis para monitorizar a doena em pacientes que esto a fazer a dieta sem glten, nestes,

podem baixar at desaparecer. Em pacientes com deficincia em IgA, so detetados os Acs

da classe IgG. (9)

Sabendo que o alvo dos AAcs contra o endomsio a enzima tTG, o seu doseamento

por ELISA tem sido muito requisitado, dado que uma tima ferramenta, fcil de executar e

pouco dependente do operador, para fazer o diagnstico e monitorizao da DC.

Os Acs anti-AGA so importantes em situaes clnicas especficas, como no

diagnstico da DC em idades peditricas, dado que os Acs anti-tTG podem s aparecer a

entre os 2 e os 5 anos de idade. (9, 18)

A pesquisa de Acs anti-EmA e anti-AGA da classe IgA e IgG por IFI feita em

simultneo utilizando lminas que tm como substratos dots de Gliadina (GAF-3X) e cortes

de fgado de primata:

Os Acs Anti-EmA reagem com os filamentos das sinusoides intralobulares do fgado

que ficam fluorescentes;

Relatrio de Estgio Autoimunidade

30

Os Acs Anti-AGA (GAF-3X), quando presentes no soro, ligam-se os Ags dos dots e

so visualizados reas circulares fluorescentes que contratam com um fundo escuro

(Figura 14).

O resultado deste teste dado como positivo ou negativo. De notar que o ttulo de Acs

anti-EmA, nos doentes submetidos a dieta sem glten, diminui ao longo do tempo, pelo que

a serologia negativa no deve excluir a DC.

CASO CLNICO DE PROVVEL DOENA CELACA__________________________________

Homem de 41 anos fez anlises no laboratrio prescritas pelo seu mdico assistente, a

prescrio mdica inclua o hemograma, parmetros da funo heptica e os Acs da classe

IgA anti-EmA, anti-tTG e anti-AGA.

Os parmetros bioqumicos relacionados com a funo heptica estavam dentro dos

valores de referncia. O hemograma revelou a existncia de uma ligeira anemia hipocrmica

e os valores dos Acs marcadores de DC deram resultados positivos (Tabela VII).

Tabela VII: Resultados dos Acs, da classe IgA, anti-EmA, anti-tTG e anti-AGA.

Anlise Resultado Valor de Referncia

Ac.Anti- AGA IgA 3,8

Autoimunidade Relatrio de Estgio

31

especificidade dos Acs anti-EmA IgA e anti-tTG para a DC, podemos pressupor que o

doente portador desta patologia, no entanto, o diagnstico definitivo s feito com a

confirmao atravs de biopsia e/ou deteo dos hapltipos HLA-DQ2/DQ8.

3.4.2.4 DOENAS AUTOIMUNES DOS VASOS SANGUNEOS

3.4.2.4.1 ANTICORPOS ANTI CITOPLASMA DOS NEUTRFILOS

VASCULITES

Os ANCA (Anti-Neutrophil Cytoplasma Antibodies) so Acs dirigidos contra as enzimas

(Ags) existentes nos grnulos dos neutrfilos e moncitos, capazes de ativar as clulas e

induzir leses necrticas vasculares. So marcadores serolgicos importantes nas Vasculites

dos pequenos vasos tendo tambm um valor de diagnstico importante em outras patologias

como na Colite Ulcerosa e na Colangite Primria Esclerosante. (9)

As Vasculites compem um grupo heterogneo de doenas que se caraterizam por

uma inflamao da parede do vaso sanguneo e necrose da parede vascular. A inflamao

ocorre devido ao depsito de Acs ou imunocomplexos. Como consequncia do processo

inflamatrio h estreitamento do calibre vascular e isqumia. Podem afetar qualquer tipo de

vaso, ter qualquer localizao e aparecer de forma isolada ou associadas a outras doenas.

(16)

Na conferncia de Consenso de Chapel Hill de 1994, passou a ser reconhecida a

classificao das Vasculites em funo do tamanho dos vasos afetados: Vasculite dos

pequenos, mdios e grandes vasos. (5)

A razo mais frequente para a solicitao dos ANCA para o diagnstico das

Vasculites dos pequenos vasos.

Os ANCA so detetados de uma forma simples e rpida, pela tcnica de IFI utilizando

como substrato neutrfilos fixados em etanol e formol.

A tcnica de IFI, no caso de uma reao positiva nos granulcitos fixados com etanol,

d-nos dois padres de ANCA:

O padro citoplasmtico (c-ANCA) - caracterizado por uma fluorescncia

granular regularmente distribuda pelo citoplasma dos granulcitos com um

reforo entre os lbulos do ncleo que fica limpo. Este padro ocorre devido aos

Acs dirigidos contra a Proteinase 3 (PR3), localizada nos grnulos azuroflicos dos

neutrfilos (Figura 15 a)). (16)

O padro perinuclear (p-ANCA) - define-se pela existncia de uma fina

fluorescncia volta do ncleo do granulcito causada por vrios tipos de Acs.

Relatrio de Estgio Autoimunidade

32

Este padro ocorre porque durante a incubao, dos neutrfilos com os Acs do

soro do paciente, os Ags difundem-se dos grnulos para a membrana nuclear com

a qual tem grande afinidade (Figura 15 b)). (16)

Nos granulcitos fixados com formaldedo ocorre uma fluorescncia granular

regularmente distribuda pelo citoplasma dos granulcitos deixando o ncleo limpo. Esta

fluorescncia causada pelos Acs contra a PR3 (c-ANCA) e pelos Acs contra a

mieloperoxidase (MPO) (p-ANCA-MPO). Normalmente, os granulcitos fixados em

formaldedo no reagem com os Acs contra a elastina, lactoferrina, lisozima, -glucoronidase

e catepsina G e raramente existe reao contra os Acs nucleares. O interesse da fixao em

formol distinguir um entre um p-ANCA clssico e um p-ANCA atpico.

Podem ainda ser utilizados substratos MPO e PR3 que so revestidos por pequenas

gotculas de Ags altamente purificados. Se a amostra contiver os Acs dirigidos contra estes

Ags, os dots dos respetivos Ags ficam fluorescentes aparecendo uma rea circular verde

(Figura 15 c)). Se a amostra for negativa as reas circulares ficam escuras ou no aparecem.

Quando o soro da amostra a testar no tem ANCA, os granulcitos, quer estejam

fixados em etanol