relato de experiÊncia no estÁgio curricular …
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RELATO DE EXPERIÊNCIA NO ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO II
(REGÊNCIA NAS SÉRIES FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL) NA EDUCAÇÃO
DE JOVENS E ADULTOS (EJA).
Lucas José da Silva Tavares1
Resumo: Este trabalho consiste na análise da relação entre teoria e prática vivenciada durante
o componente de Estágio Curricular Supervisionado II: Regência nas séries finais do Ensino
Fundamental, desenvolvido no curso de Licenciatura em História da Universidade do Estado
da Bahia – UNEB/Campus X e aplicado em uma turma noturna do 7º Ano da EJA (Educação
de Jovens e Adultos) na Escola Municipal Bela Vista, localizada na cidade Teixeira de Freitas
– Bahia, no ano de 2018, do mês de Março ao mês de Junho. A pretensão é analisar o estágio
como um espaço de encontro entre a teoria e a prática educativa, e portanto fugir da redução
desse componente a instrumentalização do ensino, fugir também da rotineira redução desse
componente a uma prática instrumental, como ainda ocorre nos dias de hoje, para a partir disso
discorrer de forma subjetiva os relatos desta experiência e as implicações desta na minha
formação docente, levando em consideração o fato de o estágio ter ocorrido em uma turma de
EJA, portanto será abordado aqui reflexões relacionadas a realidade do aluno da EJA, e também
algumas reflexões sobre a cidade de Teixeira de Freitas. Utilizarei um arcabouço teórico com
os seguintes autores: Pimenta e Lima (2005/06), Freire (1996), Luckesi (2002), Hobsbawm
(1998), Caimi (2015), entre outros. A metodologia tem uma abordagem qualitativa e prevê a
apreciação de questões que vão desde às leituras, debates e orientações ocorridas no âmbito do
componente curricular até as práticas docentes supervisionadas na sala de aula, apresentando
também as impressões em relação as vivências no cotidiano escolar durante o estágio fazendo
correlação com os autores utilizados para o embasamento teórico. Por conclusão, destacarei as
formas como a experiência do estágio na EJA implicou em diferentes âmbitos da minha vida.
Palavras-Chaves:
Relato de Experiencia; Estágio Curricular; EJA; Formação Docente.
1 Graduando em Licenciatura em História na Universidade do Estado da Bahia – UNEB/CAMPUS X. E-mail:
1 Introdução
O estágio, enquanto um campo de conhecimento, dentro da área de licenciatura possui
por si só uma enorme relevância para a formação do licenciandos enquanto futuros docentes.
Através do estágio o porvindouro docente entra em contato com um campo social onde há a
possibilidade de começar a desenvolver suas práticas educativas – muitas vezes – pela primeira
vez, conforme é dito por Lima e Pimenta no trecho abaixo:
Entendemos que o estágio se constitui como um campo de conhecimento, o
que significa atribuir-lhe um estatuto epistemológico que supera sua
tradicional redução à atividade prática instrumental. Enquanto campo de conhecimento, o estágio se produz na interação dos cursos de formação com
o campo social no qual se desenvolvem as práticas educativas. (LIMA e
PIMENTA, 2006, p. 6).2
Como foi supracitado, o estágio enquanto campo de conhecimento se constitui quando
em contato com o seu campo social, que nesse caso é a escola o licenciando tem a possibilidade
de desenvolver suas práticas educativas, a partir da correlação do que aprendeu no âmbito
acadêmico.
Sem contar também que a vivência do estágio – para aqueles que ainda não entraram na
sala de aula na função de docente – é o primeiro passo para o início da constituição de uma
identidade profissional, bem como Lima (2008, p. 198) traz: “Defendemos este componente
curricular como espaço de aprendizagem da profissão docente e de construção da identidade
profissional, que permeia as outras disciplinas da formação, no projeto pedagógico dos cursos
de formação[...]”.3
Tendo isso em vista, este presente artigo pretende exercer diferentes analises frutificadas
a partir da experiência vivenciada no âmbito do componente Estágio Curricular Supervisionado
II (Regência Nas Séries Finais Do Ensino Fundamental). Aqui será abordado alguns pontos
como: a relação entre teoria e prática vivenciada no âmbito do componente de estágio; reflexões
relacionadas a modalidade de educação EJA (Educação de Jovens e Adultos), tendo em vista
as a diversas especificidades e complexidades que ela possui; reflexões sobre a cidade de
2 PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro Lucena. Estágio e Docência. Revista Poíesis, São Paulo:
2005/2006. 3 LIMA, Maria Socorro Lucena. REFLEXÕES SOBRE O ESTÁGIO/
PRÁTICA DE ENSINO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES. Curitiba: 2008.
Teixeira de Freitas - BA; por fim, como essa vivência afetou em diferentes âmbitos da minha
vida, tanto na questão da formação profissional, enquanto aspirante a docente, quanto no meu
desenvolvimento acadêmico.
O trabalho será desenvolvido a partir da apreciação de questões que vão desde leituras,
debates e orientações ocorridas no âmbito do componente curricular até as práticas docentes
supervisionadas na sala de aula, apresentando também as impressões em relação as vivências
no cotidiano escolar durante o estágio fazendo correlação com os autores utilizados para o
embasamento teórico.
2 Uma breve descrição da minha relação com o estágio
O componente de estágio foi desenvolvido no curso de Licenciatura em História da
Universidade do Estado da Bahia – UNEB/Campus X e aplicado em uma turma noturna do 7º
Ano da EJA na Escola Municipal Bela Vista, localizada na cidade Teixeira de Freitas – Bahia,
no ano de 2018, do mês de Março ao mês de Junho. Nessa época a escola possuía como oferta
a Educação Básica nas etapas de Ensino Fundamental I durante o período vespertino e matutino,
e para o EJA oferecia o primeiro segmento nos módulos I, II, III, IV, e V, e o segundo segmento
nos módulos VI, VII, VIII e IX, durante o período noturno.
O componente curricular, possuiu uma carga horária total de 105 horas. Dessas, 65 horas
foram destinadas para encontros na UNEB, já para a atuação no espaço escolar foi utilizada a
carga horária de 40 horas, sendo 10 horas para a observação/interação com a escola e 30 horas
para a regência, que foi exercida na turma da 7º Série / Módulo VIII do período noturno, essa
turma possuía 37 alunos matriculados no início do meu estágio, sendo esses das mais variadas
faixas etárias. É importante destacar o fato que no decorrer do estágio a turma perdeu grande
parte de seus membros.
A regência teve início no dia 12 de março de 2018 e se estendeu até o dia 21 de junho
de 2018, foi distribuído com 3 aulas por semanas, sendo duas na Segunda-feira e uma na Quinta-
feira, ao decorrer do estágio ele foi interrompido por 2 semanas devido a paralisação dos
caminhoneiros no dia 21 de maio de 2018 que fecharam as estradas, e devido ao fato de que
época eu não residia na cidade onde o estágio foi exercido, fui impossibilitado de ministrar
aulas, com isso o estágio acabou se prolongando um pouco mais do que devia.
3 Planejamento
O planejamento foi um dos pontos mais enfatizados pelo o professor orientador durante
o estágio. O planejamento é imprescindível para execução de qualquer atividade que se almeje
obter bons resultados, e como estamos falando de um estágio de regência, a questão do
planejamento é um ato político-social, cientifico e técnico, bem como é dito por Cipriano Carlos
Luckesi:
O planejamento não será nem exclusivamente um ato político-filosófico, nem exclusivamente um ato técnico; será, sim, um ato ao mesmo tempo político-
social, científico e técnico: político-social, na medida em que está
comprometido com as finalidades sociais e políticas; científico, na medida em
que não se pode planejar sem um conhecimento da realidade; técnico, na medida em que o planejamento exige uma definição de meios eficientes para
se obter os resultados. (LUCKESI, 2002)
O processo de planejamento começou desde a UNEB, com a assistência do professor
orientador, na qual as aulas iniciais apresentaram fundamentações teóricas para proporcionar a
nós ferramentas para planejar um projeto que não fosse puramente burocrático.
Ao desenvolver o projeto do estágio, dentre algumas das leituras indicadas pelo professor
orientador do componente do estágio me deparei com uma citação de Paulo Freire, qual acabei
escolhendo como o embasamento central do projeto.
Na verdade, a curiosidade ingênua que, “desarmada”, está associada ao saber do senso comum, é a mesma curiosidade que, criticando-se, aproximando-se
de forma cada vez mais metodicamente rigorosa do objeto cognoscível, se
torna curiosidade epistemológica. (FREIRE, 1996, p. 15).4
Portanto, o projeto foi constituído com a pretensão de trabalhar dentro da perspectiva de
uma evolução crítica dos alunos, almejando alcançar a “curiosidade epistemológica”, tendo
como embasamento o que foi proferido por Freire.
Os planos de aulas seguiram a ordem da temática proposta pela professora regente: a
revolução industrial, o processo de industrialização no Brasil, a influência do iluminismo no
Brasil, as conjurações e inconfidências no Brasil, a vinda da família real para o Brasil, a
4 FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra,
1996.
independência do Brasil, o primeiro reinado e o período regencial. E foram planejados dentro
da perspectiva proposta pelo projeto de estágio, a partir de pesquisas feitas tanto em textos e
livros quanto na internet organizei os planos de aula dentro do modelo estipulado pelo professor
orientador: objetivos, conteúdos, metodologia, recursos e avaliação.
No início do estágio, o primeiro desafio foi se alinhar à prática aconselhada pela
professora regente, fui aconselhado a evitar determinadas práticas como: pedir apresentação de
trabalhos, ou atividades orais, entre outras coisas, pois os alunos geralmente rejeitavam essas
práticas, o que acabou me causando estranhamento e me limitando. Outro motivo de
estranhamento foi fato de a professora regente não utilizar nenhum livro didático e sim textos
da internet.
Falando dos planos de aula, de forma geral, foram feitos a partir das pesquisas e
construídos no objetivo de estarem alinhados a pretensão do projeto. Já na metodologia dos
planos de aula, ao decorrer do processo do estágio de regência, as metodologias foram se
encaixando dentro da realidade da turma, seguindo os conselhos da professora regente foi
possível perceber o que a turma estava mais aberta a fazer.
4 Aulas
No tocante das aulas, os conteúdos a mim atribuídos pela professora regente para
desenvolver junto dos alunos durante o estágio foram trabalhados do mês de março de 2018 ao
mês de junho de 2018. Ao invés de relatar de forma ampla cada tema, irei me ater ao trabalho
desenvolvido com dois temas específicos: Revolução Industrial e o processo de independência
do Brasil, pois foram temas que presenciei resultados satisfatórios.
Durante o processo de planejamento dos planos de aula, o foco foi encontrar pontos
relevantes dentro do conteúdo para fazer referências e trabalhar a criticidade dos alunos com
mais consistência, embasado no que é abordado por Flávia Eloisa Caimi, ao discorrer sobre a
tarefa de ensinar:
Entendemos a tarefa de ensinar como a apropriação, pelo professor, de conhecimentos pedagógicos que lhe permita mobilizar estratégias e recursos
que transformem os conhecimentos científicos em “saberes escolares
ensináveis”, em conhecimentos válidos socialmente, pertinentes às características e finalidades da escola nas sociedades contemporâneas e que
produzam sentido àqueles/naqueles que são os aprendentes. (CAIMI, 2015, p.
115)5
Sendo assim, as aulas, de forma geral, foram trabalhadas através da mobilização de
estratégias para compartilhar com os alunos saberes escolares ensináveis, ou seja,
conhecimentos validos socialmente que de alguma forma que produzisse algum sentindo neles.
E para melhor elucidar isso, mais a frente citarei algumas reflexões desenvolvidas em sala de
aula.
Como exemplo disso cito a aula referente a Primeira Revolução Industrial na Inglaterra.
Devido as questões trabalhistas que estão intrínsecas ao tema da Primeira Revolução Industrial,
interpretei ser um tema com margem para abrir uma discursão a respeito da reforma trabalhista
ocorrida no Brasil – sancionada em 13 de julho de 2017, o que também contemplou uma das
indicações da professora Regente que me indicou sempre que possível trazer informações que
fossem pertinentes a realidade dos alunos.
A partir deste tema foi possível apontar algumas das alterações ocorridas através da
Reforma Trabalhista de 2017, como por exemplo: Salário mínimo não obrigatório para
trabalhadores que recebem remuneração por produção, mulheres gravidas trabalhando em
ambientes insalubres, possibilidade de uma jornada de trabalho maior, tempo de descanso
mínimo reduzido para 30 minutos, parcelamento de férias, entre outras coisas. A partir disso
foi possível abrir uma ampla gama de discussões junto aos alunos, muitos socializaram com a
turma o que pensavam sobre, e para outros isso foi até mesmo uma “descoberta” por não
estarem antes cientes dessas informações que implicam diretamente em suas vidas.
Outro tema que também deve ser citado foi uma das referentes a Independência do Brasil,
após tralhar propriamente o tema com os alunos foram apresentados dois quadros ilustrativos
da declaração de Independência do Brasil, e em seguida ambos foram analisados em conjunto,
em uma perspectiva crítica, buscando encontrar o que aquelas obras pretendiam transmitir. O
primeiro quadro analisado foi o A proclamação da Independência, de François-René Moreaux,
de 18446, e o segundo foi o “Independência ou Morte”, de Pedro Américo, pintado em 18887.
5 CAIMI, Flávia Eloisa. O que precisa saber um professor de História? História & Ensino, Londrina, v. 21, n. 2,
p. 105-124, jul./dez. 2015. 6Disponível em:
<http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/archive/c/cb/20110215215222!Independencia_brasil_001.jpg
> Acesso em: 19 de out. 2020. 7Disponível em: <https://2.bp.blogspot.com/-GGtBsrSDyAw/Ve7Y181wJjI/AAAAAAAABdk/XK--
AAs5APw/s1600/mi_616869955132580.jpg> Acesso em: 19 de out. 2020.
No primeiro caso o autor registrou o ato como uma festa de confraternização popular,
porém, não é possível notar a participação de índios ou negros, essa é uma a versão que as elites
tinham e difundiam sobre a emancipação do Império. Já no segundo quadro, uma série de
questionamentos sobre foram lançados aos alunos, em relação ao ambiente, o local que Dom
Pedro I está posicionado no quadro, o perfil social e a reação das pessoas presentes, se isso
correspondia à realidade brasileira do período, os interesses políticos que podem ter guiado a
feitura dessas obras, e o fato delas terem sido produzidas sob encomendas.
Muitos alunos se mostraram surpresos à medida que foram percebendo que de fato os
quadros foram montados em cima de uma ideia que buscava construir uma imagem irreal da
sociedade brasileira e da questão da declaração da independência.
A partir disso, o ambiente se tornou propicio para iniciar uma discussão sobre a um tema
que estava bem presente na época e ainda está até hoje, as Fake News. O ano de 2017 pode
facilmente ser considerado o ano das fakes, não apenas para o Brasil, mas sim para uma boa
parte do mundo. Discutir isso com os alunos foi extremamente produtivo, tendo em vista que
estávamos discutindo isso durante um momento de explosão de notícias falsas de cunho
político, que influenciaram consistentemente nas eleições de 2018 e continuam com forte
disseminação até os dias de hoje.
5 Reflexões sobre a EJA
Bem como é expresso no Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH)
de 2003 da Secretaria Especial de Direitos Humanos: “(…) a Educação Básica, como um
primeiro momento do processo educativo ao longo de toda a vida, é um direito social inalienável
da pessoa humana e dos grupos socioculturais”8. Sendo assim, a modalidade de Educação para
Jovens e Adultos, contribui na contemplação dessa garantia para aqueles que não possuíram
acesso a educação básica durante a idade regular.
Contudo, atualmente o público da EJA é constituído tanto por jovens e adultos que em
algum momento de suas vidas ficaram afastados durante um determinado tempo da escola,
como também por jovens que sofreram reprovação e ao atingir a idade requerida passaram a
frequentar a EJA, mesmo que nunca tenham deixado de estudar durante a idade regular.
8 BRASIL. Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. Plano Nacional de Educação em Direitos
Humanos. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Ministério da Educação, 2003.
É importante destacar que, na maioria das vezes, esse público tem que conciliar estudo
e trabalho, o que por si só é extremamente complicado pois uma coisa acaba afetando
criticamente a outra. O cansaço do aluno que trabalhou o dia inteiro e ainda precisa ir para a
escola durante o turno noturno somado a uma falta de uma perspectiva de melhora de vida
através dos estudos implica diretamente no desempenho dele na escola.
Durante o estágio, foi possível notar isso, sobretudo, nos alunos mais jovens que durante
o dia trabalhavam – no comércio, em supermercado, ou como borracheiro, entre outras coisas
– e ao chegar na escola, ou acabavam dormindo por cansaço ou buscavam fazer algo para se
entreter, pois estavam lá apenas para concluir sua trajetória dentro do sistema de ensino básico,
por não conceber nenhum valor prático ao conhecimento transmitido pela escola.
Já os alunos mais velhos, que por algum motivo ficaram afastados da escola –
geralmente devido a necessidade de trabalhar – acabavam sendo os mais centrados com os
estudos, mesmo que também passassem os outros dois turnos do dia trabalhando.
Outro ponto que também deve ser citado foi a questão da grande evasão desses alunos,
sendo que ao início do estágio a sala possuía 37 alunos e mais ao final possuía em torno de 12.
É importante destacar que, da maioria dos alunos que permaneceram na escola, durante o
decorrer do estágio, em geral, foram os mais velhos, o grande índice de evasão estava por parte
dos mais jovens.
Penso ser produtivo correlacionar essas reflexões com algumas outras de Luiz Paulo
Cruz Borges (2009), que a partir de algumas constatações, identifica três formas de entender o
sujeito do EJA: A primeira é dentro de um caráter sociológico, caracteriza o sujeito como um
jovem ou adulto marginalizado, que saiu da escola devido às injustiças sociais presentes nesta
instituição; A segunda é de cunho psicológico, caracterizado pela questão cognitiva, em que o
sujeito é estigmatizado como alguém que não conseguiu aprender durante sua idade regular; E
a terceira, de caráter não claramente definido, que é a autopercepção que o aluno cria de si,
nesse ponto temos a baixa autoestima – característica que grande parte dos alunos nutre por si,
e também os casos dos alunos que fogem dessa baixa autoestima se autodeterminando em busca
de sua vocação, no desejo de ser mais.9
9 BORGES, Luís Paulo Crus. Reflexões Necessárias Sobre A Educação De Jovens E Adultos: Perspectivas,
Desafios E Possibilidades. ESPAÇO DO CURRÍCULO, v.2, n.1, pp.137-155, Março-Setembro/2009.
Dentre estas, levando em consideração minha curta vivência na EJA, a questão da
autopercepção que o aluno cria de si foi a que mais pude perceber, tanto devido aos comentários
autodepreciativos que os alunos faziam sobre si, quanto o referente a busca de sua vocação e o
desejo de ser mais que alguns poucos possuíam, como querer entrar na universidade. Contudo,
a questão da baixa autoestima foi a que mais percebi dentro da sala de aula, sobretudo nos
alunos mais novos. Sendo assim é importante levar em conta que, para compreender o perfil
destes sujeitos, é necessário conhecer sua história, cultura e costumes.
Portanto, gostaria de trazer também a problematização de um ponto – que considero –
ser o mais marcante do estágio. Ao decorrer desses poucos meses dentro da escola 3 alunos
foram assassinados, sendo que destes 1 estava matriculado na turma do 7º Ano. Essas mortes
afetaram a escola de modo geral, portanto, gostaria aqui de discutir rapidamente sobre a questão
da violência na cidade.
Tendo isso em vista, os convido para uma rápida apreciação de alguns dados trazidos
por Francisco Denílson Santos De Lima (2016) sobre a cidade de Teixeira de Freitas - BA, em
sua Tese de Doutorado, acerca da questão da violência na cidade.
Em 2012, o Mapa da Violência10, apontou Teixeira de Freitas como uma das mais
violentas da Bahia e do Brasil, permanecendo na lista nos anos seguintes. O estudo, apontou
Teixeira de Freitas como a 6.ª cidade mais violenta da Bahia. Considerando as taxas de
homicídios por armas de fogo, o Mapa da Violência 2013 também apontou Teixeira de Freitas
como uma das mais violentas do país, ocupando 46ª posição. Em 2014 o Mapa da Violência
colocou o município na 11ª posição do estado e na 42ª posição do país. O Mapa da Violência
2015, que teve como foco os homicídios de adolescentes do Brasil, apontou o Brasil como o
terceiro país mais violento do mundo, a Bahia se destacou neste cenário, liderando o ranking,
com dois dos três primeiros lugares, neste cenário de violência, Teixeira de Freitas também se
destaca, ocupando a 26ª posição11.
10 O Mapa da Violência trata-se de pesquisas com dados secundários realizadas periodicamente com foco na
problemática da juventude e a violência. O primeiro mapa foi realizado em 1998 e já foram divulgados até o dia
de hoje 27 estudos. Inicialmente cada dois anos, posteriormente anual e, desde 2011, mais de um a cada ano. 11 LIMA, Francisco Denílson Santos de. A violência e o medo em Teixeira de Freitas-BA e seus reflexos nas
formas de uso e consumo dos espaços livres públicos (ELP’s) pela juventude. Tese (Doutorado em Geografia)
– Universidade Federal De Pernambuco Centro De Filosofia E Ciências Humanas Departamento De Ciências
Geográficas Programa De Pós-Graduação Em Geografia. Recife, 2016.
Compreender Teixeira de Freitas como uma das cidades mais violentas, nos possibilita
entender um pouco mais sobre a realidade teixeirense, devido as diversas problemáticas que
isso gera, sobretudo na vida das pessoas marginalizadas12 pela sociedade, devido as repletas
injustiças sociais quais o nosso país possui.
6 Conclusão
Interpreto que experenciar a vivência do estágio de regência é um dos primeiros passos
para a formação da identidade profissional do sujeito enquanto docente, infiro isso me apoiando
no que é dito por Lima (2008, p. 198), “Defendemos este componente curricular como espaço
de aprendizagem da profissão docente e de construção da identidade profissional, que permeia
as outras disciplinas da formação, no projeto pedagógico dos cursos de formação[...]”13.
Para mim, viver a experiência desse estágio foi um divisor de águas, justamente por ter
sido a minha primeira vez dentro de sala de aula, assumindo o papel de docente. E penso que
para muitos licenciandos, o primeiro estágio de regência também se constitui como um rito de
passagem. Levo em consideração também, que estagiar na EJA foi uma experiência ímpar,
tendo em vista a especificidade dessa modalidade de educação.
Estar na posição de professor pela primeira vez, me fez entender a responsabilidade
desse papel, e implicou diretamente na minha relação com meus professores dentro da
universidade, pois pude entender melhor o que é estar naquela função, e o que se espera dos
seus alunos. Portanto gostaria de trazer uma citação de Eric Hobsbawm, em seu ensaio Dentro
e Fora da História:
As pessoas em função das quais você está lá, disse meu próprio professor, não
são estudantes brilhantes como você. São estudantes comuns com opiniões maçantes, que obtêm graus medíocres na faixa inferior das notas baixas, e
cujas respostas nos exames são quase iguais. Os que obtêm as melhores notas
cuidarão de si mesmos, ainda que seja para eles que você gostará de lecionar.
Os outros são os únicos que precisam de você.14
12 Vale lembrar o que foi citado anteriormente de Borges (2019) em relação as formas de entender o sujeito do
EJA, sendo a primeira de caráter sociológico, onde caracteriza o sujeito justamente como um jovem ou adulto marginalizado. 13 LIMA, Maria Socorro Lucena. REFLEXÕES SOBRE O ESTÁGIO/
PRÁTICA DE ENSINO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES. Curitiba: 2008. 14 HOBSBAWM, Eric. Dentro e Fora da História. Sobre história: ensaios. Tradução de Cid Knipel Moreira. São
Paulo: Companhia das Letras, 1998.
É interessante destacar que, apenas possuí contato com a leitura acima um pouco após
o término do estágio, porém me identifiquei muito com ela. Desconsiderando o teor
meritocrática qual essa citação pode carregar, sempre há a existência de alguns alunos que se
colocam mais interessados do que outros sobre determinadas disciplinas.
Embora tenham esses que conseguem adquirir melhores resultados, ao decorrer do
desenvolvimento do estágio, não busquei em focar especificamente nesses, pois eles de algum
modo eu sabia que iriam “cuidar de si mesmos”. Meu foco foi buscar aqueles que “precisavam
de mim”.
A partir da reflexão consequente dessa citação correlacionada com minha experiencia
no estágio, compreendi que esses alunos que se encontram mais “afastados” devem ser
interpretados como objetivos a serem alcançados dentro da sala de aula, a cativação desses deve
ser um dos alvos principais. Obviamente, ao traçar essas metodologias não se pode – jamais –
esquecer dos outros alunos que conseguem adquirir melhores notas, afinal eles também são seu
público. Sabendo disso, isso foi um ponto que levei para dentro de todas outras salas de aula
que entrei como professor até hoje, e continuarei levando.
Referência bibliográfica
BRASIL. Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. Plano Nacional de Educação
em Direitos Humanos. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Ministério da
Educação, 2003.
BORGES, Luís Paulo Crus. Reflexões Necessárias Sobre A Educação De Jovens E Adultos:
Perspectivas, Desafios E Possibilidades. ESPAÇO DO CURRÍCULO, v.2, n.1, pp.137-155,
Março-Setembro/2009.
CAIMI, Flávia Eloisa. O que precisa saber um professor de História? História & Ensino,
Londrina, v. 21, n. 2, p. 105-124, jul./dez. 2015.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São
Paulo: Paz e Terra, 1996.
HOBSBAWM, Eric. Dentro e Fora da História. Sobre história: ensaios. Tradução de Cid
Knipel Moreira. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
LIMA, Francisco Denílson Santos de. A violência e o medo em Teixeira de Freitas-BA e seus
reflexos nas formas de uso e consumo dos espaços livres públicos (ELP’s) pela juventude.
Tese (Doutorado em Geografia) – Universidade Federal De Pernambuco Centro De Filosofia E
Ciências Humanas Departamento De Ciências Geográficas Programa De Pós-Graduação Em
Geografia. Recife, 2016.
LIMA, Maria Socorro Lucena. REFLEXÕES SOBRE O ESTÁGIO/PRÁTICA DE
ENSINO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES. Curitiba: 2008.
PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro Lucena. Estágio e Docência. Revista
Poíesis, São Paulo: 2005/2006.