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Rede São Paulo de Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da SEESP Ensino Fundamental II e Ensino Médio São Paulo 2011

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  • Rede So Paulo de

    Cursos de Especializao para o quadro do Magistrio da SEESP

    Ensino Fundamental II e Ensino Mdio

    So Paulo

    2011

  • UNESP Universidade Estadual PaulistaPr-Reitoria de Ps-GraduaoRua Quirino de Andrade, 215CEP 01049-010 So Paulo SPTel.: (11) 5627-0561www.unesp.br

    Governo do Estado de So Paulo Secretaria de Estado da EducaoCoordenadoria de Estudos e Normas PedaggicasGabinete da CoordenadoraPraa da Repblica, 53CEP 01045-903 Centro So Paulo SP

  • ficha sumrio tema

    Autores:

    Reinaldo Sampaio (Unesp-Marlia) e

    Antonio Trajano Menezes Arruda (Unesp-Marlia)

    Ficha da Disciplina:

    tica

    http://lattes.cnpq.br/5514921218009148http://lattes.cnpq.br/1820236170659059

  • ficha sumrio tema

    Reinaldo Sampaio Pereira, professor de Histria da Filosofia Antiga da UNESP de Mar-lia. Graduado em Filosofia pela Unicamp (1996); mestre em Filosofia pela Unicamp (1999); doutor em Filosofia pela Unicamp (2006); ps-doutor em Filosofia pela USP (2009). De-senvolve pesquisa em Aristteles desde a graduao, mais especificamente nas reas de Metafsica e tica

    Antonio Trajano Menezes Arruda, Doutor em Filosofia pela University of Oxford - UK. Professor das disciplinas Filosofia Geral e problemas metafsicos e Introduo leitura dos textos filosficos do Curso de Graduao em Filosofia da UNESP campus de Marlia.

    Ementa: Primeiramente o curso aborda problemas e discusses tica na filosofia antiga, sobretudo

    nas filosofias de Plato e Aristteles, filsofos que, de alguma forma, estabeleceram muitos dos conceitos ticos com os quais a filosofia trabalhou ao longo dos sculos. Num segundo momento, o curso introduz algumas questes acerca do problema da conduta moral.

    Palavras-chave: tica, moral, conduta, arbtrio, bem.

  • ficha sumrio tema

    Estrutura da Disciplina

    tica

    Tema 1 A tica na literatura grega dos trgicos e na filosofia

    socrtico-platnica

    1.1. A tica na literatura grega anterior a Scrates

    1.2. A tica nos dilogos de Plato

    1.3. tica e Teoria das Idias nos dilogos de Plato

    Tema 2 A tica em Aristteles

    2.1. Uma nova proposta de modelo tico em relao ao modelo socrtico-platnico

    2.2. A vida feliz.

    2.3. Um certo relativismo no modelo tico aristotlico

    Tema 3 Sobre a conduta Moral Parte 1

    3.1. A Dimenso Moral

    3.2. Contrato e Conduta Moral

    3.3A natureza do culpar e desculpar

    Tema 4 Sobre a conduta Moral Parte 2

    4.1 Utilidade, retribuio e atitudes morais

  • ficha sumrio tema

    SumrioEmenta: ................................................................................... 2

    Palavras-chave: ......................................................................... 2

    1. A tica na literatura grega dos trgicos e na filosofia socrtico-platnica ........................................................................................5

    1.1. A tica na literatura grega anterior a Scrates .....................................5

    1.2. A tica nos dilogos de Plato ............................................................7

    1.3. tica e Teoria das Idias nos dilogos de Plato ................................10

    Bibliografia: ............................................................................ 13

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    1. A tica na literatura grega dos trgicos e na filosofia socrtico-platnica

    O propsito dos trs tpicos que compem esse texto o de, primeiramente, buscar uma certa compreenso da educao tica do homem grego no perodo anterior a Scrates, para, ento, nos prximos dois tpicos, comear a anlise de alguns elementos componentes de um novo modelo tico, o socrtico-platnico, no qual a razo ter papel preponderante para a de-terminao das aes moralmente boas.

    1.1. A tica na literatura grega anterior a Scrates

    Tornou-se comum, no meio filosfico, a distino entre moral e tica, no sentido (em linhas gerais) que a moral diria respeito ao corpo de regras que funciona como paradigma para a de-terminao das aes moralmente boas ou ms em um grupo social, e a tica seria a disciplina terica que teria como objeto de estudo crtico a moral. A palavra moral derivada de mos, mores, termo latino para verter o termo grego ethos, de onde deriva a palavra tica. Visto que anacrnico empregar o termo moral quando se trata da tica grega do perodo dos trgicos, de Scrates, de Plato, de Aristteles, e considerando que, quando o termo empregado pe-los latinos, no recebe a distino supramencionada, quando utilizarmos a palavra moral em expresses como moralmente boa, no estaremos fazendo qualquer distino entre moral e tica, mas estaremos tomando ambos os termos como sinnimos. A tica tem ento o seu nome (assim como vrios outros tantos conceitos da Filosofia) derivado do grego, derivado de ethos, que comumente vertido para o Portugus como hbito, costume. Da no se segue que a tica tem como grande propsito mapear os costumes de um grupo social para, ento, elaborar um corpo de regras a partir de tal mapeamento. A tica tem muito menos como propsito examinar como as coisas so, como so os hbitos e costumes de uma comunidade, como os indivduos dessa comunidade agem normalmente nas inter-relaes pessoais, do que examinar como os indivduos, como agentes morais, deveriam agir. A tica, semelhana de outras disciplinas, tem como uma das suas funes propiciar uma boa organizao nas diversas sociedades para que os seus indivduos possam nela viverem bem. Para isso, no basta constatar como so as aes dos indivduos, mas tratar de como eles deveriam agir para que a sociedade

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    venha a se manter organizada e, com isso, possa promover uma boa vida para os indivduos.

    A literatura da Grcia antiga apresenta, desde os seus relatos mais antigos, importan-tes problemas ticos, ainda que eles no fossem explicitados como objetos de estudo. Entre os poetas trgicos, questes ticas de extrema relevncia foram apresentadas, como sobre a possibilidade de imputar ao agente moral a responsabilidade da sua ao, se ela foi realizada sem conscincia das circunstncias em que a ao ocorreu, como no clebre caso do dipo que mata o pai sem saber que era o seu pai. Atentemos que, ainda hoje, saber se o agente tinha conscincia das suas aes pode ser crucial para poder responsabilizar algum tanto do ponto de vista moral como at mesmo do ponto de vista jurdico.

    Vale observar que, tendo tratado de questes relevantes, a tica grega no consiste em con-juntos de regras ou teorizaes que ficaram na totalidade ou em sua maior parte circunscritas a um momento embrionrio das investigaes ticas e que esto guardadas em uma redoma aberta apenas para uma certa erudio pouco profcua para suscitar novos problemas ticos ou possveis resolues de problemas postos por novos modelos ticos. Muito mais do que isso, a tica grega antiga auxilia, em muito, a anlise tica de uma perspectiva histrica, uma vez que autores como Plato e Aristteles tiveram profunda influncia na posteridade. Os gregos tm importncia hoje no domnio tico tambm por suscitarem problemas ainda atuais e por apresentarem alternativas que contribuem, e muito, para pensar questes ticas. Nesse sentido, vale observar que a tica aristotlica tem sido consultada at mesmo para trazer para o debate tico elementos (como o resgate da discusso do acrtico, do phrnimos, de um fim a ser buscado que orientaria as discusses ticas e deve orientar as aes dos agentes morais, etc) que ajudam a fazer contraponto inclusive com o modelo tico universalista kantiano. Dito isso, faz-se necessrio examinar o que os gregos antigos nos apresentaram acerca da tica no apenas para pensar a Histria da Filosofia no concernente tica, mas tambm para ajudar a pensar questes ticas independentemente de qual autor ou escola as teriam apresentado.

    Ainda que haja uma variada gama de questionamentos ticos na literatura anterior a Aris-tteles, talvez seja exagerado querer encontrar, em tais textos, uma tica tal como ns a conhe-cemos em Aristteles, em cujos textos ticos encontramos objeto de estudo bem determinado, com modelo investigativo prprio a tal objeto e com caractersticas especficas de tal anlise (nesse sentido, o modelo investigativo na tica se distingue radicalmente do modelo investi-

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    gativo metafsico ou das matemticas). Os textos de Hesodo e sobretudo os textos atribudos a Homero faziam parte da educao do homem grego, inclusive em relao a sua formao tica. Obviamente no por trazerem pormenorizadas discusses ticas, mas por apresentarem modelos de comportamento, modelos de como o homem grego no geral deveria se portar em diversas situaes. Nesse sentido, os deuses e os heris da Ilada e da Odissia eram de certo modo apresentados como modelos de comportamento. As aes dos deuses e de heris eram tomadas como paradigmas para as aes humanas. H, portanto, nos textos dos trgicos, de Hesodo e, sobretudo, os atribudos a Homero, certas determinaes de como deve o indivduo agir para tornar-se moralmente bom. Para percebermos a importncia da educao do homem grego a partir dos textos atribudos a Homero, lembremos, por exemplo, que na Repblica, sob diversos aspectos um dos dilogos mais importantes de Plato, quando em diversos momentos Scrates pensa a educao na cidade ideal, ele o faz, em grande medida, a partir dos textos atribudos a Homero.

    Em um rpido exame geral da tica grega, talvez seja de bom tom no gastar muita tinta com os filsofos pr-socrticos, porque, de modo geral, eles no tiveram como objeto de in-vestigao questes ticas. Os pr-socrticos se notabilizaram especialmente pelas suas inves-tigaes acerca da natureza, acerca do mundo, acerca da possibilidade ou no de ter acesso ao mundo e, a partir da, poder falar sobre ele. Parece-nos conveniente, tambm, no nos determos nos sofistas (hbeis professores de retrica que ganharam fama e muito dinheiro por trabalha-rem a forma do discurso de modo tal a faz-lo forte; por trabalharem a forma do discurso com tal destreza a ponto de fazer parecer que o que no , a ponto de discorrerem sobre falsidades dando a elas aparncia de verdades). Ainda que os sofistas tivessem grande preocupao com a elaborao astuciosa (podendo ser falsa) do discurso com o intuito, em grande medida, de favorecer politicamente aqueles que participavam dos debates que determinavam os destinos da polis na gora da Atenas democrtica, essa preocupao, com grandes reflexos na poltica, no fez com que tomassem a tica como objeto investigativo.

    1.2. A tica nos dilogos de Plato

    Com Plato, a tica ganha ateno especial. comum na literatura especializada nos di-logos de Plato dividi-los em grupos. Uma dessas divises diz respeito cronologia na elabo-

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    rao dos dilogos. Uma delas comporta 3 momentos: no primeiro momento, o qual mais nos interessar aqui, corresponde aos dilogos escritos na juventude (o segundo momento o dos dilogos de maturidade e, por fim, no terceiro momento, os dilogos de velhice), denominados dilogos aporticos, isto , dilogos que acabavam em aporia, em dificuldade, sem se chegar definio do objeto investigativo motivador do dilogo. Tais dilogos chegam ao fim sem o aclaramento de certas dvidas, de certos questionamentos, no sendo obtido conhecimento seguro acerca do objeto investigado. Esses dilogos tm como protagonista Scrates que, dife-rentemente dos pr-socrticos, ir dar grande ateno ao homem enquanto objeto de estudo, sobretudo no que diz respeito tica.

    Com Scrates, o homem se torna, de modo mais acentuado, objeto de investigao. No investigao do ponto de vista biolgico, mas de um ponto de vista tico, portanto de um ponto de vista em que o homem examinado sobretudo em relao s suas aes, mas no propriamente como eles agem cotidianamente. Em relao ao modo como os homens agem cotidianamente, principalmente como agem bem, em grande medida a partir de paradigmas dados por heris e deuses em textos como a Ilada e a Odissia, esse no o modelo buscado por Scrates. Se, por um lado, Scrates, como homem grego, foi educado tambm com os textos atribudos a Homero, valendo-se de tais textos em suas conversas com os interlocutores, por outro lado, Scrates no aceita por completo o modelo educativo dos textos atribudos a Homero. Na prpria Repblica Scrates prope censura a partes de tais textos.

    No concernente tica, Scrates parece propor novidades. Ao invs de aceitar plenamente o modelo tico cujos paradigmas das aes moralmente boas seriam dados pelos textos que aju-daram a educar o homem grego, Scrates prope um novo modelo, onde as aes moralmente boas seriam determinadas no por modelos j dados, mas, de certo modo, por paradigmas a serem buscados pela razo. A razo, de certo modo, poderia direcionar o homem para as boas aes. Mas como faz-lo? Tal busca figura em vrios dilogos de Plato, mas no se encontra de modo sistemtico e concentrado em um ou outro dilogo, estando distribuda nos mesmos, sobretudo nos dilogos aporticos de juventude. A partir do conjunto de informaes dadas nos diversos dilogos possvel chegar a alguns elementos prprios discusso tica socrtica.

    Se, por um lado, Scrates no aceita por completo os paradigmas dados (sobretudo nos textos atribudos a Homero) para a determinao da ao moralmente boa, por outro, ele

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    necessita propor outros paradigmas, outros orientadores do agente, para que este possa reali-zar aes moralmente boas. No parece ser a proposta socrtica atribuir aos deuses as causas das nossas aes, como se os homens fossem marionetes dos deuses. Por outro lado, Scrates parece propor que as nossas aes e, conseqentemente, o nosso modo de vida, se bom ou ruim, no podem ser obra do acaso. Nesse sentido, em uma certa proposta socrtica, o bem do homem no determinado exclusivamente pelas contingncias externas. Pelo contrrio: ainda que Scrates no parea eliminar o peso das contingncias externas para a possibilidade ou no do agente poder agir bem e, com isso, poder viver bem, ele parece sustentar que cabe ao agente ter certo controle das nossas aes e, portanto, ter certo controle das aes moralmente boas que podemos engendrar.

    Para isso, Scrates volta a sua ateno, enquanto objeto da sua investigao, no para o corpo, o qual no o responsvel primeiro pelas aes do agente, mas para a alma, a qual seria a motivadora das aes. Nesse sentido, a investigao tica socrtica ganha certo vis psicol-gico. Scrates prope uma diviso tripartite da alma. A alma teria uma parte apetitiva, a qual inclinaria o agente a realizar aes para satisfazerem-na. Essa parte da alma seria a responsvel pelos prazeres, pelas inclinaes do agente para satisfazer as necessidades que aparentam ser prazerosas. Se, em Scrates, a boa vida do homem no parece estar sujeita ao acaso, no sendo guiado pela parte apetitiva da sua alma que o agente conseguir viver bem, conseguir uma boa vida, pois a parte apetitiva da alma pode se deixar guiar, muitas vezes, por aquilo que aparenta ser bom sem, de fato, ser bom.

    Comer chocolate e outros doces pode aparentar ser bom para uma criana na medida em que pode satisfazer a sua inclinao para a satisfao dos seus desejos, mas a criana se alimen-tando regularmente de chocolate e outros doces, sem qualquer orientao, pode, de imediato, satisfazer as suas inclinaes imediatas motivadas pela parte apetitiva da sua alma e, com isso, ter prazer, tendo a crena que est fazendo um bem a si mesmo. Mas pode ser que essa criana possa vir a ter brevemente problemas de sade por consumir exageradamente os doces. Aquilo que parece ser um bem no , necessariamente, de fato, um bem. possvel o engano em rela-o ao bem. Sem a devida orientao, a criana pode estar gerando para si, sem ter clareza dis-so, mais mal que bem. Como, ento, poder ser bem orientado segundo o bem no meramente aparente, mas o bem de fato?

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    O que parece ser o bem pode se apresentar de mltiplos modos. Nesse sentido, algo pode ser bom para Scrates e no para Glauco, ou ento uma ao pode ser justa e boa em certo momento e no em outro. E ainda: algo pode ser bom para um indivduo x em determinado momento e, para o mesmo indivduo x, ruim em outro momento. Restituir aquilo que de-vido a algum nem sempre pode ser algo justo e bom, como Scrates argumenta no livro I da Repblica. Restituir armas quando um indivduo x est so pode ser justo e bom, mas pode no ser se ele no estiver so, podendo tal restituio vir a gerar problemas para tal indivduo x. Face possibilidade de engano acerca do que o bem, a virtude, o justo, e face aparente multiplicidade de bens, do que virtuoso ou do que justo, como uma concepo mltipla e talvez meramente aparente de bem pode ser guia para as aes de um agente moral? Como detectar o que de fato o Bem para que o mesmo possa bem guiar as aes do indivduo, conduzindo-o s boas aes, aquelas que lhe possibilitam viver bem? Esses so difceis pro-blemas que Scrates necessita enfrentar na apresentao de um modelo tico novo. Ele, ento, recorrer ao que se convencionou chamar de Teoria das Formas ou Teoria das Idias para enfrentar tais problemas.

    1.3. tica e Teoria das Idias nos dilogos de Plato

    Relembrando rapidamente, de modo bastante geral, alguns pontos da Teoria das Idias concernentes discusso tica apresentada nos dilogos de Plato: Scrates prope a sepa-rao do mundo em sensvel e inteligvel. O mundo sensvel seria apreensvel pelos sentidos, apreenso essa que no oferece o conhecimento acerca do mundo, mas apenas opinies sobre ele, uma vez que os entes existentes no mundo, que so mltiplos e em transformao, so apenas cpias imperfeitas da verdadeira realidade, a das Idias, realidade essa una e imutvel, apreensveis pela razo.

    Atravs dos sentidos apreendemos, por exemplo, as mltiplas rvores existentes no mundo, que esto em processo de transformao, de vir-a-ser. As rvores do mundo (que esto em processo de transformao, em devir) no correspondem verdadeira realidade e no nos pos-sibilitam sequer conhecer o que a rvore, que uma Idia una e imutvel. Se a rvore fosse uma laranjeira e se a laranjeira correspondesse idia de rvore, ento, uma jabuticabeira, que bem diferente, ou no poderia ser rvore ou a idia de rvore teria que ser mltipla. Se fosse

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    mltipla, ela teria que ser to mltipla quantos so os tipos de rvores. Se as rvores so infini-tamente diferentes, as idias de rvores seriam infinitamente diferentes, no nos possibilitando conhecer o que rvore, pois rvore receberia infinitos significados. A proposta socrtica que se faz necessria uma Idia una das coisas, como a de rvore, para que, ao se falar de rvore, algo determinado seja compreendido. As mltiplas rvores (em devir) do mundo s so reco-nhecidas enquanto tais por participarem da idia una de rvore. As Idias asseguram o plano do conhecimento na proposta socrtica. Quanto a certo modelo tico proposto por Scrates nos dilogos de Plato, ele pressupunha o conhecimento, portanto as Idias.

    Do mesmo modo que no supramencionado exemplo da rvore: face aos mltiplos bens ditos das mltiplas coisas e situaes do mundo no seria possvel o conhecimento acerca do Bem, conhecimento esse necessrio para se poder agir bem. Em um certo modelo tico so-crtico, o conhecimento das boas aes necessariamente conduziria o agente s boas aes. S agiria mal quem desconhecesse como agir bem. Uma razo bem cultivada conduziria o agente s aes moralmente boas. Educar bem o agente, do ponto de vista tico, pressuporia faz-lo ter acesso s idias de virtude, justia, bem, etc.

    Scrates parece propor um modelo tico intelectualista (no qual a razo bem cultivada suficiente para a determinao das aes moralmente boas) segundo o qual as aes do agente: 1) no dependeriam dos desgnios dos deuses, 2) no estariam totalmente sujeitas ao acaso dado pelas contingncias do mundo, 3) nem tampouco dependeriam dos impulsos da parte apetitiva da alma, a qual pode conduzir a aes aparentemente boas que, de fato, no o so, ou at mesmo para aes que manifestamente no so boas. A vida guiada pelas paixes e no orientada por certa razo, a qual possibilita conhecer o que a virtude, o Bem, pode apenas acidentalmente conduzir o agente boa vida. preciso ao homem, ento, no se deixar guiar pelas suas paixes, semelhante a um barco deriva, em que conduzido para o lado que o vento e as ondas o levarem, sem qualquer capacidade de ser guiado. O destino de tal barco dado pelas contingncias do momento na regio do mar em que est. A vida do homem no pode, de modo semelhante, estar sujeita s contingncias do mundo. Para o barco poder ir a algum lugar determinado de modo no acidental preciso que algum tome o seu leme. De modo semelhante: preciso que algo no homem tome o leme da sua vida, das suas aes. A parte intelectiva da alma ser a responsvel por dar certo rumo s aes, vida do agente. Para isso, faz-se necessrio ascender s Idias, faz-se necessrio ao intelecto controlar os impulsos

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    do agente de modo a ele poder agir bem, poder alcanar a boa vida.

    Nesse modelo socrtico, as aes so realizadas pelos homens, aos quais pode ser imputada a responsabilidade das suas aes. Mas se, por um lado, Plato apresenta certo modelo tico intelectualista proposto por Scrates, por outro lado, no dilogo Mnon levantada a objeo que a razo no seria suficiente para conduzir o agente s aes moralmente boas ao se suspei-tar que um agente no pode se transformar em virtuoso atravs da aprendizagem meramente racional. Nesse sentido, Scrates questiona no Mnon: se a virtude pudesse ser ensinada, por que Pricles no teria feito dos seus filhos homens virtuosos? Comea-se a levantar a suspeita que o acesso s Idias no seria suficiente para tornar o agente virtuoso. Plato, ento, comea a atenuar a funo da razo que ascende s Idias como guia uno e infalvel para as boas aes, como capaz de exclusivamente engendrar as aes moralmente boas.

    Aristteles, por sua vez, no poder aceitar o intelectualismo do modelo socrtico, ate-nuado por Plato, por uma razo bastante simples: Aristteles no aceita a Teoria das Idias de Plato, rechaa a diviso do mundo em sensvel e inteligvel, negando tambm a idia de participao (a qual, na Teoria das Formas, possibilita que ambos os mundos, sensvel e inte-ligvel, no sejam intransponveis um ao outro). Negando o modelo dos dilogos de Plato, Aristteles no tem mais as Idias para, de certo modo, orientar o agente para a determinao da ao moralmente boa. No atribuindo aos deuses a responsabilidade das aes moralmen-te boas do agente moral e tambm no delegando ao acaso ou s contingncias do mundo a possibilidade da ao moralmente boa, uma vez que recusa o modelo dos dilogos de Plato, Aristteles necessitar de outro guia para orientar o agente moral para as aes moralmente boas e, conseqentemente, para a boa vida. Essas recusas de Aristteles em relao ao modelo dos dilogos de Plato far com que Aristteles apresente um modelo tico sob muitos aspec-tos bem diferente do modelo dos dilogos platnicos.

    Aristteles atribui grande importncia aos impulsos da parte da alma responsvel pelos de-sejos, os quais se convertem em mveis das aes, mesmo as que so consideradas moralmente boas. Se, no modelo apresentado nos dilogos, a parte apetitiva da alma deveria estar sujeita parte intelectiva, a qual seria a responsvel pela determinao da ao moralmente boa, em Aristteles, a parte responsvel pelos desejos assumir grande importncia para o engendra-mento das aes, mesmo as moralmente boas. O que da ordem dos apetites e dos desejos no

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    dever ser subjugado pelas determinaes da razo, mas dever ser conduzido para que, bem orientado, possa ser desejo do que bom, do que virtuoso, levando s boas e virtuosas aes. No novo modelo proposto por Aristteles, saber como agir no implica necessariamente em agir segundo o conhecimento de como agir, pois os desejos se apresentam como mveis das aes no modelo aristotlico. possvel ao agente moral saber como deveria agir para agir bem e, ainda assim, ter o desejo de realizar aes contrrias s boas aes. Vejamos, ento, a seguir, o novo modelo tico proposto por Aristteles.

    Bibliografia: BENOIT, Hector. Estudos sobre o dilogo Filebo de Plato. Ed. Uniju, Iju-RS, 2007.

    BRAGUE, Remi. Introduo ao Mundo Grego: estudos de histria da Filosofia, Loyola, 2007.

    BRUNSCHWIG, Jacques. Estudos e exerccios de Filosofia Grega, Loyola e PUC-Rio, So Paulo-SP, 2009.

    FINLEY, Moses I. O legado da Grcia: uma nova avaliao, Ed. UNB, Braslia-DF, 1981.

    GOLDSCHMIDIT, Victor. Os dilogos de Plato: estrutura e mtodo dialtico, Loyola, So Paulo-SP, 2002.

    HADOT, Pierre. O que a Filosofia Antiga? Loyola, So Paulo-SP, 2004.

    JAEGER, Werner. Paidia: a formao do homem grego, Martins Fontes, So Paulo-SP, 1989.

    KIRK, G. S. e RAVEN, J. E. Os filsofos pr-socrticos, Fundao Calouste Gulbenkian, Lisboa-Portugal, 1982.

    MAGALHES-VILHENA, VASCO. O problema de Scrates: o Scrates histrico e o Scra-tes de Plato, Fundao Calouste Gulbenkian, Lisboa-Portugal, 1984.

    NUSSBAUM, MARTHA C. A fragilidade da bondade: Fortuna e tica na tragdia e na filo-sofia grega, Martins Fontes, So Paulo-SP, 2009.

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    PAPPAS, Nickolas, A Repblica de Plato, edies 70, Lisboa, Portugal, 1995.

    PERINE, M. (Org.). Estudos Platnicos: sobre o ser e o aparecer, o belo e o bem, Loyola, So Paulo-SP, 2009.

    PIETTRE, Bernard. Plato, a Repblica: livro VII, Ed. UNB e Ed. tica, So PauloSP, 1981.

    REALE, Giovanni. Para uma nova interpretao de Plato, Loyola, So Paulo-SP, 1997.

    ROBINSON, T. M. As origens da alma: os gregos e o conceito de alma de Homero a Aristteles, Annablume editora, So Paulo-SP, 2010.

    TRABATTONI, F. Plato, Annablume editora, So Paulo-SP, 2010.

    VZQUEZ, A. S. tica, Civilizao Brasileira, Rio de Janeiro-RJ, 2008.

    VERNANT, J. P. As Origens do Pensamento Grego, Difel, Rio de Janeiro-RJ, 2009.

    ZINGANO, Marco. Virtude e saber em Scrates, in Estudos de tica Antiga, Discurso Editorial, So Paulo-SP, 2007, pp. 41-72.

  • Pr-Reitora de Ps-graduaoMarilza Vieira Cunha Rudge

    Equipe CoordenadoraCludio Jos de Frana e Silva

    Rogrio Luiz BuccelliAna Maria da Costa Santos Menin

    Coordenadores dos CursosArte: Rejane Galvo Coutinho (IA/Unesp)

    Filosofia: Lcio Loureno Prado (FFC/Marlia)Geografia: Raul Borges Guimares (FCT/Presidente Prudente)

    Ingls: Mariangela Braga Norte (FFC/Marlia)Qumica: Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

    Equipe Tcnica - Sistema de Controle AcadmicoAri Araldo Xavier de Camargo

    Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

    SecretariaMrcio Antnio Teixeira de Carvalho

    NeaD Ncleo de Educao a Distncia(equipe Redefor)

    Klaus Schlnzen Junior Coordenador Geral

    Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

    Coordenador de Grupo

    Andr Lus Rodrigues FerreiraMarcos Roberto Greiner

    Pedro Cssio BissettiRodolfo Mac Kay Martinez Parente

    Produo, veiculao e Gesto de materialElisandra Andr Maranhe

    Joo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

    Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

    Pamela GouveiaRafael Canoletti

    Valter Rodrigues da Silva

    Marcador 1Ementa: Palavras-chave:1. A tica na literatura grega dos trgicos e na filosofia socrtico-platnica1.1. A tica na literatura grega anterior a Scrates1.2. A tica nos dilogos de Plato1.3. tica e Teoria das Idias nos dilogos de Plato

    Bibliografia:

    Boto 2: Boto 3: Boto 6: Boto 7: Boto 34: Pgina 3:

    Boto 35: Pgina 3:

    Boto 36: Pgina 4: Pgina 5:

    Boto 37: Pgina 4: Pgina 5:

    Boto 38: Pgina 6:

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