rede são paulo de - · pdf fileensino da arte no brasil: uma história que vai da...

64
Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da SEESP Ensino Fundamental II e Ensino Médio Rede São Paulo de Ensino da arte no Brasil: Aspectos históricos e metodológicos d02

Upload: leanh

Post on 05-Feb-2018

217 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

  • Cursos de Especializao para o quadro do Magistrio da SEESPEnsino Fundamental II e Ensino Mdio

    Rede So Paulo de

    Ensino da arte no Brasil:

    Aspectos histricos e metodolgicos d02

  • Rede So Paulo de

    Cursos de Especializao para o quadro do Magistrio da SEESP

    Ensino Fundamental II e Ensino Mdio

    So Paulo

    2011

  • 3

    Unesp/R

    edefor Mdulo I D

    isciplina 02TEMAS

    ficha sumrio bibliografia

    1

    2

    sumrio

    Sumrio1. Ensino da Arte no Brasil: uma histria que vai da dependncia antropofagia ...................................................................................4

    1.1 - A atualidade da Misso Francesa .......................................................6

    1.2 - Os liberais e o ensino de arte anti-elitista ........................................ 11

    1.3 - O Modernismo ................................................................................ 15

    1.4 - Presses e mudanas: a ditadura de 1964 ......................................... 26

    1.5 - Os anos de 1980 e depois: o ps-modernismo ................................. 30

    2. Concepes e tendncias formativas .......................................39

    2.1 - Arte como um saber e a pedagogia tradicional ................................. 41

    2. 2 - Arte como expresso e a pedagogia renovada .................................. 43

    2.3 - Arte como linguagem ....................................................................... 46

    2.4 - Arte como cultura e a ps-modernidade .......................................... 47

    Referencias bibliogrficas ....................................................... 56

    Ficha da Disciplina: ................................................................ 60

  • 4

    Unesp/R

    edefor Mdulo I D

    isciplina 02TEMAS

    tema1ficha sumrio bibliografia

    1

    2

    1. Ensino da Arte no Brasil: uma histria que vai da dependncia antropofagia

    Vamos buscar compreender, nesta disciplina, como a histria do ensino da arte no Brasil est marcada pela dependncia cultural. Sabemos que o primeiro produto cultural brasileiro de origem erudita foi o Barroco. Trazido de Portugal, recebeu atravs da criao popular car-actersticas que podem ser consideradas de cunho nacional. Os artistas e artesos brasileiros maneira antropofgica criaram um barroco com distines formais em relao ao Barroco europeu. O ensino da arte barroca tinha lugar nas oficinas atravs do fazer sob a orientao do mestre. Estas oficinas eram a nica educao artstica popular na poca.

    Veremos inicialmente que a primeira institucionalizao do ensino de arte foi a Misso Francesa (1816) com o modelo neoclssico, um dos poucos modelos com atualidade no pas de origem no momento de sua importao para o Brasil. Quase sempre os modelos estrangeiros foram tomados de emprstimo numa forma j enfraquecida e desgastada. A Misso Francesa foi na realidade uma invaso cultural de cunho elitista.

  • 5

    Unesp/R

    edefor Mdulo I D

    isciplina 02TEMAS

    tema1ficha sumrio bibliografia

    1

    2

    Em contraposio, no final do sculo XIX, no contexto republicano, os liberais introduzi-ram o ensino do desenho na educao numa perspectiva anti-elitista como preparao de mo-de-obra para o trabalho nas indstrias, a partir do modelo norte-americano. A apropria-o deste modelo e seus desdobramentos analisada no segundo tpico, pois foi exercido de forma marcante e intensa at meados do sculo XX, deixando resqucios em livros didticos e no iderio educacional.

    No entanto, j no incio do sculo XX, o Modernismo transps para o campo educacional a idia de arte como expresso. Este o tema do terceiro tpico, onde vamos buscar com-preender as diversas interpretaes das idias de John Dewey nas reformas educacionais da Escola Nova, quando as atividades artsticas passam a ser aceitas no meio educacional. A idia de arte como expresso induziu tambm, na segunda metade do sculo XX, experincias bem sucedidas de arte para crianas e adolescentes como atividades extracurriculares. Foi neste contexto favorvel que na dcada de 1970 a Educao Artstica passou a ser obrigatria no ensino formal, carregando, entretanto, uma perspectiva conceitual e ideolgica desfavorvel configurada pelo tecnicismo e pela polivalncia.

    No final do sculo XX o movimento de arte/educao se revigora em sintonia com a ps-modernidade, resultado do amadurecimento de um campo de conhecimento que desenvolve pesquisas e busca se aproximar do campo das prticas artsticas. Chegamos a nossa contempo-raneidade que se caracteriza por mltiplas degluties e apropriaes de modelos, por trnsitos entre culturas.

    Temos aqui por razes didticas um percurso histrico que segue uma cronologia, porm precisamos compreender que esta nossa histria no apenas uma sucesso de fatos e acon-tecimentos isolados que se apresentam de forma linear e pertencem ao passado, mas uma constelao de proposies, idias e experincias sobre a arte e seu ensino que se sobrepem e co-habitam um mesmo espao e continuam ativas hoje no iderio educacional. Esperamos que ao revisitar a histria do ensino da arte possamos melhor nos entender no contexto de hoje e, sobretudo, nos ajude a construir possibilidades educacionais mais condizentes com nossos valores neste conturbado cenrio contemporneo.

  • 6

    Unesp/R

    edefor Mdulo I D

    isciplina 02TEMAS

    tema1ficha sumrio bibliografia

    1

    2

    1.1 - A atualidade da Misso Francesa

    Como sabemos, a primeira institucionalizao sistemtica do ensino de arte foi a Misso Francesa, e um dos poucos modelos com atualidade no pas de origem no momento de sua im-portao para o Brasil. Quase sempre os modelos estrangeiros foram tomados de emprstimo numa forma j enfraquecida e desgastada. A Misso francesa foi na realidade uma invaso cultural.

    Os integrantes da Misso Francesa que aqui chegaram em 1816 eram membros do Instituto de Frana que havia sido aberto em 1795 para substituir as velhas academias de arte suprimidas pela Revoluo Francesa. Sob a superviso e a influncia de Jacques Louis David1 (1748-1825), o mestre do Neoclssico, o Instituto de Frana logo alcanou reputao superior cole des Beaux-Arts e influenciou as escolas de toda a Europa por ser metodologi-camente a instituio mais moderna de seu tempo. Portanto, o Neoclssico, atravs do qual se expressavam os artistas da Misso Francesa quando para c vieram organizar a nossa primeira escola de arte, era o estilo de vanguarda naquele tempo na Europa.

    Todavia, os planos apresentados por Joachim Le Breton (1760-1819), chefe da Misso Francesa, para a Escola de Cincias Artes e Ofcios, criada por decreto de D. Joo VI em 1816, eram de cunho mais popular do que a orientao seguida no Instituto de Frana onde ele ensinava. O projeto repetia os mais atuais modelos de ensino de atividades artsticas ligadas a ofcios mecnicos empregados na Frana por Bachelier em sua cole Royale Gratuite de Des-sin, que existe at hoje com o nome de cole Nationale des Arts Dcoratifs. Bachelier, que era mestre de decorao em porcelana da fbrica de Svres, conseguiu combinar e conciliar em sua escola (1767) mtodos e objetivos de ensino de arte comuns s corporaes e s academias. Ele contornou a tradicional luta entre artistas e arteses, conseguindo apoio das academias para o seu trabalho pedaggico, exigindo, por exemplo, que os mestres de desenho de sua escola tives-sem obtido prmios da academia. A experincia de Bachelier, muito comentada e aplaudida na Europa, levou pases como a Alemanha e a ustria a introduzirem o desenho criativo no treinamento das escolas para trabalhadores manuais, e as escolas de belas artes a considerarem importante o ensino da geometria.

    1. Jacques Louis David e o Neocls-sico - para ter uma melhor compreen-

    so do estilo Neoclssico que acom-

    panhou o iderio da Misso Francesa

    sugerimos buscar na Web imagens do

    artista Jacques Louis David.

  • 7

    Unesp/R

    edefor Mdulo I D

    isciplina 02TEMAS

    tema1ficha sumrio bibliografia

    1

    2

    Era este casamento feliz entre as belas artes e as indstrias que Le Breton pretendia repetir no Brasil. Pelos planos de Le Breton nossa escola de arte seria uma entidade que no perde-ria de vista o equilbrio entre educao popular e educao da burguesia. Entretanto, quando aquela escola comeou a funcionar em 1826 sob o nome de Escola Imperial das Belas-Artes, no s o nome havia sido trocado, mas, principalmente sua perspectiva de atuao educacio-nal, tornando-se o lugar de convergncia de uma elite cultural que se formava no pas para movimentar a corte, dificultando, assim, o acesso das camadas populares produo artstica.

    A Escola Imperial das Belas-Artes inaugurou a ambigidade na qual at hoje se debate a educao brasileira, isto , o dilema entre educao de elite e educao popular. Na rea especfica de educao artstica in-corporou o dilema j instaurado na Europa entre arte como criao e como tcnica.

    Em 1855, Manuel Jos de Arajo Porto Alegre (1806-1879), baseado no iderio romntico, pretendeu revigorar a educao elitista que vinha tendo lugar na ento denominada Academia Imperial das Belas-Artes atravs do contato com o povo. Pretendia sua reforma conjugar no mesmo estabelecimento escolar duas classes de alunos, o arteso e o artista, frequentando jun-tos as mesmas disciplinas bsicas. A formao do artista era alargada com outras disciplinas de carter terico, especializando-se o artfice nas aplicaes do desenho e na prtica mecnica. Entretanto, a permanncia dos velhos mtodos e de uma linguagem sofisticada fez com que a procura popular por esses cursos fosse quase nula, assim como foi quase nula tambm a matrcula nos cursos noturnos para a formao de arteso criados em 1860 na Academia. Nestes ltimos, a simplificao curricular era quase pejorativa. Em