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  • 7/23/2019 Redae 12 Novembro 2007 Diogo de Figueiredo

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    Nmero 12 novembro/dezembro/janeiro - 2008 Salvador Bahia Brasil - ISSN 1981-1861 -

    A REGULAO SOB A PERSPECTIVA DA NOVAHERMENUTICA

    D i o g o d e F ig u e i r e d o M o r e i r a N e t o

    Doutor em Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro,Ps-graduado em Direito Administrativo pela Faculdade de

    Direito da Universidade de Lisboa,Professor de DireitoAdministrativo da Faculdade de Direito da Universidade

    Cndido Mendes.

    1 INTRODUO

    CONSIDERAES PRELIMINARES

    Com um decnio da introduo do instituto da regulao no Pas,subsiste ainda na comunidade jurdica uma grande perplexidade ante asinovaes introduzidas na ordem jurdica do Pas.

    Prova disso que se vo acumulando as dvidas e dificuldades emrelao a conceitos importados da experincia de outras ordens jurdicas,notadamente europias, nas quais essas dificuldades de harmonizao do antigocom o novo foram igualmente sentidas e aos poucos superadas, graas aotrabalho construtivo da doutrina e da jurisprudncia desses pases de vanguardana Cincia do Direito.

    Assim que temas como a natureza da regulao, como funoadministrativa; a independnciadessa funo, bem como das agncias a gentesincumbidos de desempenh-la; a deslegalizao de matrias de naturezatcnica, para possibilitar o desenvolvimento de uma nova ordem de atosadministrativos normativos; a natureza jurdica polimrfica nas normasreguladoras ; a conseqente distino entre as tradicionais normasregulamentares e advenientes normas reguladoras; a relao entre norma legal enorma reguladora; o aparecimento das autorizaes para o desempenho deservios de interesse geral e das atividades comunicadas, em lista meramenteexemplificativa, entre tantos outros que passaram a povoar o universo jurdico,causam ainda rudo e perturbao quando de sua aplicao.

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    Isso ocorre porque a essas e a outras perplexidades respondem aindamuitos dos operadores do Direito, at mesmo os que tm o nus de dissip-las,com certa relutncia em aceit-los ou, menos radicalmente, em aceit-los comorealmente o so, porque no encontram respostas fceis nem na

    Constituio de 1988 nem na doutrina tradicional . Fcil de entender, por isso,porque ainda tantos, diante do desafio que esses institutos inovam, preferem asoluo simplista de consider-los inconstitucionais.

    Como evidente, o simplismo acaba por assimilar o novo ao antigo paracontornar as dificuldades adaptativas exigidas por qualquer forma de progresso e,com isso, deixar a falsa impresso de que nada mudou. Assim, incapacidade,inrcia, m vontade ou o que quer que tolha o intrprete de avanar, acabamcontribuindo para que um certo conservadorismo tmido e retrgrado estejaatrasando o pleno eclodir das potencialidades dos novos institutos.

    Grande parte dessa dificuldades partem de um equvoco quanto ao quedeva ser a correta hermenutica para nosso tempo. Este pois, o primeiro tema aser desenvolvido neste travalho.

    A PERSPECTIVA DA INTERPRETAO POSITIVISTA DO FENMENO JURDICO DAREGULAO

    Inicie-se por afirmar que um equvoco a ser sempre apontado e evitado o de interpretar novos institutos apenas luz dos instrumentos hermenuticos dopassado.

    Isso porque, uma das confuses mais encontradias, mesmo em autores,consagrado, referida regulao, decorre da persistncia residual de umconceito de legalidade positivista, legalista, formalista e burocrtico que continuaa orientar sua exegese.

    Como eloqente exemplo, lembre-se a confuso do assemelhar aregulao regulamentao, como se ambos institutos fossem o mesmo, noobstante to diferentes e distanciados.

    Outro engano caracteristicamente anacrnico o de confundir, por umlado, o que seja o espao decisrio deslegalizado, aberto pela leipara que nelesejam tomadas decises normativas regulatrias de natureza tcnica complexas,e, por outro lado, com o tradicional espao decisrio discricionrio, igualmenteadequado para fazer escolhas de convenincia e de oportunidade, desde queestejam elas diretamente referidas ao cumprimento de determinado comandolegal incompleto para agir, ou seja: integrando-o .

    So ambas modalidades que exprimem de distintos graus na amplitudena abertura do espao decisrio administrativo, vale dizer, do mesmofenmeno jurdico da delegao. Tampouco so as essas as nicas tcnicas

    empregadas no Direito Administrativo para este mesmo efeito, pois que a elas seacrescenta ainda um terceiro tipo de espao decisrio aberto tomada de

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    decises administrativasque estejam relativamente desvinculadas a comandoslegais positivados, exaustivos de contedo.

    O terceiro tipo o do espao decisrio da indeterminao, que

    igualmente aberto pela lei para eu seja administrativamente preenchido, masno mais, como na hiptese da discricionariedade - por motivos de oportunidadee convenincia - mas por efeito de uma subsuno administrativa de fatosobservados a uma norma de contedo amplo, por conter um conceitoindeterminado, de modo que, afinal, tambm vem a ser uma espcie dedelegao ao administrador para determinar diante das circunstnciascasuisticamente apreciadas, portanto, se ocorreu ou no o pressuposto fticode aplicao da norma nela contido.

    Tudo seria apenas um dissenso entre, de um lado, os hermeneutaspositivistas, ao procurar a martelo encaixar os novos institutos em seus velhos

    esquemas, e, de outro, os hermeneutas que constroem esse novo Direitoaxiologicamente orientado, se no fora o grave prejuzo que as leiturasconservadoras sempre causam ao avano da Cincia do Direito e absoro denovos instrumentos, que se repete no caso da regulao.

    A propsito, colha-se a lio de LUIS ROBERTO BARROSO:

    Deve-se rejeitar uma das patologias crnicas da hermenuticaconstitucional brasileira, que a interpretao retrospectiva, pela qual seprocura interpretar o texto novo de maneira a que ele no inove nada,mas ao revs, fique to parecido quanto possvel com o antigo. 1

    Ao persistirem nesse vcio exegtico, sempre para nada inovar, osadeptos da velha hermenutica, como no encontram na Constituio umdispositivo que lhes seja suficientemente confortvel para fundamentar aregulao, que respeite suas caractersticas de deslegalizao tcnica setor ial,optam por desconhecer ou desdenhar a copiosa literatura jurdica existente sobreo fenmeno da deslegalizao para se conformarem em assemelhar a regulao regulamentao, pois, afinal, esta se lhes parece nitidamente presente naCarta...

    Cometem, destarte, erro maior do que aquele que pretendiam ter evitado

    ao estenderem a servidores pblicos administrativos a funo regulamentar,atribuio poltica tpica e privativa do Chefe do Poder Executivo no Estadobrasileiro...2

    Com efeito, intuitivo que a regulao, como qualquer instituto novo,deve ser tratada com especial ateno exatamente em razo de suascaractersticas inovadoras, por serem presumidamente mas aptas para atingiras finalidades que lhes so adscritas do que as instituies j existentes, e nocomo se fora mais uma hiptese de regulamentao, que instituto antigo e

    1

    LUIS ROBERTO BARROSO, Interpretao e Aplicao da Constituio, Rio de Janeiro,Saraiva, 4 ed., 2001, p. 71, n/grifo)2Art. 84, IV e VI, CRFB.

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    totalmente diverso, que, entre ns, de restrita competncia dos Chefes dePoder Executivo, exclusivamente para execuo de leis e para dispor sobreorganizao administrativa federal.

    Acresce ainda que, a deslegalizao , no obstante suscite problemas deenquadramento, o que alis sucedeu nos pases em que foi introduzida, inclusivenos Estados Unidos, onde ganhou suas caractersticas modernas, um institutoinconfundvel com a discricionariedade.

    Realmente, enquanto a discricionariedade demanda a existncia deuma prvia norma legal especfica, que abra um espao decisrio restritoespecificamente sua aplicao, limitado aopes tticas para preenchimentodas condies de execuo, a norma reguladora deslegalizada, diferentemente,dispensa a existncia de norma legal prvia e especficaa ser executada, mas,isto sim, necessita de uma abertura legislativa mais ampla de um dilatado

    espao decisrio tcnico,para que,dentro de seus limites, especificados em lei,o agente regulador possa tomar as decises tcnicas, para as quais olegislador no define quaisquer parmetros especficos, tanto por causa dacomplexidade tecnolgica como da mutabilidade envolvidas para a tomada dedeciso, ao que se avrescenta, cada vez mais, a necessidade de negociao e deponderao administrativa de um conjunto de interesses simultaneamenteprotegidos.

    Eis, em breves traos, o diferencial necessariamente a ser considerado.Por isso, insista-se, deve-se ter sempre presente que essas vertiginosasmutaes do Direito Pblico, com o aparecimento de um complexo de instituies

    que para muitos conformam at um novo direito, no nos podem surpreender,enquanto profissionais, seno que demandam o domnio de um renovado arsenalexegtico, mais sofisticado e notadamente informado pela orientao dalegitimidade, exigindo o emprego da ponderabilidade e uma permanenteateno da vinculao da ao administrativa ao resultado eficiente (boaadministrao), enfim: demandando uma nova hermenutica.

    2 - AS PERPLEXIDADES DO CONCEITO DE REGULAO

    Todavia, muitos dos surpresos hermeneutas, que se mostram atnitosante o novo Direito, no agem apenas levados pelo desalento ou pelo descasodiante do novo, mas a tanto so conduzidos porque, realmente, conceda-se, osfenmenos novos, como o caso da regulao, de que se ocupa estacomunicao, quase sempre suscitam uma imensa cpia de perplexidades, como,para mais uma vez ilustrar, ocorre com a imensa surpresa que se deparam ante aaparente quebra do velho dogma da separao de poderes, se tomado em suaverso rgida, com sua familiar e confortadora distribuio, quase moregeomtrico, das trs funesde Estado entre os respectivos Poderes, diante doque se lhes parece a ruptura rompe de uma trplice articulao que se lhesparece mais um tabu que um princpio organizativo inserto nas Constituies...

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    E a caixa de surpresas no para a, pois tambm o caso dapluralizao dos centros de poder, que multiplicam o nmero de rgosconstitucionalmente autnomos e inovam distintas articulaes entre osantigos e novos centros de poder, quase sempre visando disposio

    diversificada de controles: de legalidade, de legitimidade, de eficincia e detantos outros parmetros deju ridicidadeque se vo somando antiga e limitadaviso de controle da legalidade estrita...

    Um exemplo mais concorrer para entender esse torturante embaraoque atormenta as mentes positivistas nestas duas ltimas dcadas: considere-sea ciso, cada vez mais clara e presente nas legislaes, entre o domnio dapolticae o domnio da tcnica, ou seja, entre, de um lado, o espao decisriopoltico, que dever ser preenchido com deliberaes que de to complexas nopossam ser tomadas apenas com obedincia a parmetros cientfica etecnologicamente experimentados e assentados e tais so as decises

    polticas - e, de outro lado, o espao decisrio tcnico que dever serpreenchido com decises que necessariamente devam obedecer a regrascientfica e tecnologicamente experimentadas e assentadas, para que atinjam osresultados visados e sejam eficientes e tais so as decisestcnicas.

    Em razo dessa dicotomia, com decises referidas a diferentes cri triose escalas de valores, a tendncia do Direito Pblico est manifestamente voltadaa subtrair, cada vez mais, as decises meramente tcnicas dos rgos polticos e,para complementar, a isolar as decises dos rgos tcnicos das influncias dasesferas polticas.

    Enfim, qui no fosse necessrio, a esta altura, aditar outrasconsideraes histricas a respeito, mas parece bom que se o faa, at mesmocomo contribuio para tranqilizar os perplexos, pois que tais temas e outrosquejandos, enfim, no so novos: de h muito vm ocupando os parlamentos e ostribunais constitucionais, pois as idias que os informam, longe de nos seremautctones ou idiossincrsicas, so quase universais, de modo que os debates eas discusses a respeito, tais como os recentemente travados entre ns em tornoda Reforma do Estado, ainda se prolongaro por mais algum tempo. Mas, comotodos os grandes debates que ficaram no passado, este tambm tende a sepacificar e, enfim, a agasalhar serenamente, nos cada vez mais complexossistemas jurdicos dos Estados ou conjuntos de Estados e at na ordem mundial,esses novos fatos, pois que representam afinal o progresso, que incessantementenos provoca, de fora do Direito.3

    3Na experincia de vida do Autor, o mesmo ocorreu com o tema jusambiental: tendo publicadomo incio da dcada de setenta um livro que RAMN MARTN MATEO viria anos depois apontarcomo o pioneiro sobre o tema na Amrica Latina, e ofertado um exemplar a um importante

    Professor, dele ouviu o seguinte comentrio: bom no inventar um ramo novo como o direitoambiental, pois o direito administrativo j o bastante e a Constituio no comporta essaautonomia...

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    3 - A EVOLUO CONTEMPORNEA DE QUATRO CONCEITOS- CHAVEPARA COMPREENDER E CONTROLAR A ATIVIDADE REGULATRIA DOESTADO

    Despontam como conceitos essenciais para o que se prope estaexposio: o de setor crtico, o de finalidade, o de funcionalidade e o deadministrao por resultado.

    O CONCEITO DE SETOR CRTICO

    Como sabido, a administrao de certas atividades econmicas ousociais de interessecoletivo - tanto as desempenhadas pela sociedadecomoas cometidas a rgos do Estado - passaram a apresentar tal exacerbao crticaa ponto de no mais poderem ser eficientemente desenvolvidas sob osinstrumentos e as formas burocrticas tradicionais.

    Com efeito, algumas dessas atividades, ainda sob tratamentosadministrativos tradicionais, como o de prestao de servio pblico e o deexerccio da polcia, podem at lograr alguma eficcia, embora cada vez maisdeclinante e insuficiente em termos de resultados, na medida em que a legislaoespecfica a ser aplicada no acompanhava o incessante espoucar de problemasnesses setores, por isso mesmo denominados de crticos. Tais so o dostransportes, o da vigilncia sanitria, o das telecomunicaes, o energtico, quese mencionam entre tantos outros, que incessantemente a eles a se somam, ecada vez mais se agravam, na medida em que a adequada soluo para cada umdeles necessita de uma negociao extenua e permanente entre diferentes plos

    de interesses, que esto simultaneamente protegidos pela ordem jurdica.

    Como do passado ficara a lio de que nem uma liberalizaoexcessivadessas atividades, contando que as foras sociais viessem a corrigir asdistores, nem o emprego de um arsenal de intervenes pesadas, como aspraticadas pelo Wellfare State, at mesmo as mais radicais, do totalitarismo e daestatizao, haviam logrado resultadfos econmica e socialmente satisfatrios, e,afinal, como a necessidade a me da inveno, surgiu a soluo deinterveno estatal leve.

    A ASCENSO HISTRICA DA REGULAO

    A origem norte-americana dessa soluo interventiva, que se chama deleve, pois no se d contra o mercado, mas em seu favor, veio a ser essa aresposta necessidade, mais gravemente sentida nas duas Guerras Mundiais, decorrigir os problemas existentes nos setores crticos, por certo simultaneamentesuperando a inrcia do liberalismo clssico e o rigor asfixiante das formas radicaisestatizantes.

    Embora a experincia regulatria, procedente da antiga auto-regulaomedieval de setores, como a das guildas, tivesse chegado quele Pas ainda no

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    sculo dezenove,4 a regulao s alcanou a maturidade moderna quandopassou s agendas juseconmicas, o que se apresentou marcadamente em doismomentos crticos da histria dos Estados Unidos da Amrica.5

    Num primeiro momento, nas primeiras dcadas do sculo passado:inicialmente, a partir dos debates sobre mobilizao e da criao do WIB (WarIndustries Board) sob o acicate da I Guerra Mundial de 1914 a 1918, e depois,com o enfrentamento dos graves problemas econmicos e financeiros da GrandeCrise de 1929, que levou ao estabelecimento do New Dealrooseveltiano, sob aspesadas demandas da Segunda Guerra Mundial, ento sob a gide do clebreNRA (National Recovery Act).

    Foram perodos em que o questionamento sobre a efetividade dopostulado liberal clssico da suficincia da auto-regulao espontnea dosmercados, ante os desafios polticos e econmicos do mundo moderno, acabou

    por lanar os Estados Unidos da Amrica vanguarda das solues de economiapoltica, adotando renovadas tcnicas regulatrias, que j lhes eram familiares,e, aproveitando toda a sua secular tradio anglo-saxnica com a auto-regulaoe com entes reguladores setoriais, logrou proteger a sua economia e as dosaliados, vencendo os desafios blicos com um mnimo de interveno nomercado, graas a essa inovativa espcie de interveno econmica leve daregulao.

    Com efeito, a instituio de uma nova gerao desses entes,especialmente voltados disciplina de setores crticos especficos domercado, permitiu quele Pas graduar e minimizar, durante a Segunda Guerra

    Mundial, as intervenes reclamadas para assegurar o bom funcionamento desua indstria e de seu comrcio, superando, assim, o difcil e incerto perodo dasgrandes conflagraes com um mnimo de excees aos postulados liberais,assentados em suas tradies polticas.

    Mas, enquanto os Estados Unidos respondiam crise criando agnciasadministrativas independentes do poder poltico, dando incio prtica do quea doutrina viria posteriormente denominar de intervenes econmicas leves,predominantemente voltadas ao interesse do mercado (light intervention),distintamente, os pases europeus, na linha de ideologias estatizantes de todos osmatizes, que dominaram o cenrio poltico de quase todo o sculo XX, e quehaviam produzido os dois modelos de Estado interventivos dominantes, o Estadodo Bem Estar Social e os Estados Socialistas, preferiram criar agnciasexecutivas dependentes do poder poltico para desempenharem diretamenteessas atividades econmicas consideradas crticas, optando, desse modo, pelasintervenes radicais, via de regra justificadas pelo pervasivo conceito desegurana nacional, ento hegemnico no panorama poltico mundial.

    4Como a pioneira Interstate Commerce Commission (ICC), criada em 1887 para dirimir problemascada vez mais intricados no setor ferrovirio daquele Pas, poca em plena expanso.5

    Para aprofundamento, esse processo histrico vem narrado no livro do Autor, DireitoRegulatrio , publicado pela Editora Renovar, Rio de Janeiro, 2003, ps. 71 a 79.

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    Observe-se que, como um auspicioso subproduto da light intervention,acentuou-se o papel protagnico da sociedade, desenvolvendo-se a soluobastante criativa da participao dos setores interessados, o que passou aresguardar melhormente no s os interesses como os valores democrticos

    envolvidos. Mas no se limitaram a este, da participao, embora to importante,os subprodutos das reformas dos aparelhos pblicos efetuadas a partir de ento,e, como resultado evidente de um novo conceito de relaes entre os doisprotagonistas da poltica o Estado e a Sociedade - a esto os tambm revistosconceitos de finalidade, de funcionalidadee de administrao por resultados,como inovaes que passaram Cincia da Administrao e Cincia do Direitocontemporneas.

    O CONCEITO DE FINALIDADE

    Em breves palavras, trata-se do deslocamento da definio da atividade

    administrativa pela competncia do rgo, para a definio da atividadeadministrativa pela finalidadea ser atingida.

    Com a adoo do referencial de competncia, as atenes do DireitoAdministrativo se haviam concentrado, sob a viso positivista, sobre o conceitode ato administrativo, proliferando-se, a partir dele, uma abundante literaturasobre a legalidadeda manifestao da vontade administrativa.

    O mrito do deslocamento do referencial para a finalidade foi,primeiramente, o de ampliar essa viso limitada do ato para o processo e,depois, a partir dessa viso estendida, considerar juridicamente o resultado,

    passando a incluir a considerao do agir administrativo sob o critrio dalegitimidade, tomada assim em seu sentido mais amplo, ou seja: sob o trpliceaspecto da legitimidade originria (competncia), corrente (processo) efinalstica(resultado).

    O CONCEITO DE FUNCIONALIDADE

    O discurso do resultadoe da legitimidade, sintetizados pelos italianosno conceito vitorioso da boa administrao, como seria de se supor, levou superao do conceito de poder, como um atributoestatal, substituindo-o peloconceito de funo, apenas como um cometimento estatal.

    Alm disso, deve-se considerar que a idia de funo leva defuncionalidade, da justificando-se a evoluo que se seguiu, da eficcia,referida a um resultado conotado legalidade, para a introduo da eficincia,referida a um resultado conotado legitimidadee, finalmente efetividade, que a dimenso social expandida da eficincia.

    O CONCEITO DE ADMINISTRAO POR RESULTADO

    Finalmente, assentada a idia de efetividade, o conceito de

    funcionalidade assomou como a razo de ser da Administrao Pblica e,

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    deinde, do prprio Estado. Afinal, que outra justificao de sua existncia seno ade atingir efetivamenteos resultados que lhe so assinados pela sociedade?

    CARACTERSTICAS HBRIDAS E POLIVALENTES DA REGULAO

    Pode-se lembrar tambm que certas caractersticas da regulaoresultam de sua contempornea insero em um Estado policrtico epolicntrico , a que se referiu M. S. GIANNINI.

    Com efeito, como funo estatal, ainda que administrativamenteindependente, a cargo de entidades tambm independentes da administraodireta, normal que a regulaodisponha de uma multiplicidade de instrumentosmaterialmentenormativos, executivos e judicantes para atingir seus fins, que socomuns a essas organizaes.

    Por outro lado, tambm a demanda resultante da multiplicao de setorescrticos tambm desdobra uma grande diversidade de intervenes regulatrias, oque exige flexibilidade de instrumentos e, paralelamente, uma necessriadiversificao dos controles.

    4 - EXPRESSO SOBERANA DO PODER ESTATAL NA FUNOREGULATRIA

    No se perca de vista que, no obstante instituda para atuar em setorescrticos especficos e, por isso, em contato mais direto com os agentes da

    sociedade que neles atuam, ou deles se valham ou para eles contribuam dealgum modo, a regulao uma funo estatal.

    Assim sendo, pode-se alinhar quatro requisitos relevantes para oexerccio essa funo: o requisito de imperatividade, o requisito deimpessoalidade, o requisito da legitimidadee o requisito da formalidade.

    O REQUISITO DE IMPERATIVIDADE

    As decises, que tanto podem ser normativas como concretas, so todasdecises de Estado e se impem como atos administrativos, portanto, atosadministrativos regulatrios, com todas as suas conseqncias.

    Por outro lado, quanto negociao, a ser entabulada pelos agentesreguladores com os interessados, pode e deve fazer parte do iter decisrio,conduzida dentro de parmetros procedimentais - de modo e de tempo - de sortea levar a bom termo a deciso e no a ela se substituir.

    O REQUISITO DE IMPESSOALIDADE

    Como se pressupe a existncia de interesses complexos e, ainda

    mais, que estejam todos protegidos pela ordem jurdica sejam individuais,coletivos ou difusos, sejam pblicos ou privados - no se trata, a priori, de

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    estabelecer a supremacia em tesede qualquer deles, mas, distintamente, do queocorria com a tradicional definio legal do interesse pblico especfico, o dedefini-lo administrativamente, pela ponderao entre eles, apontando quais osque se apresentam na hiptese como os devam receber precedncia que

    contingente para atender finalidade homeostsica da regulao, ou seja, a justasoluo de equilbrio in casu.

    Como se observa, a impessoalidade, que se impe a todos os rgos eagentes da Administrao, ainda mais exigente quando de trate de agentesergos reguladores, pois que um eventual desequilbrio, que venha a ser geradoem benefcio ou detrimento de qualquer dos valores ou dos interesses emponderao, exacerba o risco da captao da atividade da agncia.

    A garantia da impessoalidade no resultado da ponderao estar,pois, primeiro, no procedimento pelo cumprimento rigoroso de todos os

    trmites procedimentais que levam tomada de deciso; segundo, naparticipaoque garantir o aporte de suas respectivas razes consideraodos agentes reguladores e, terceiro, na motivao que estabelecer aimportncia ou o peso que a deciso vier a conferir a cada argumento, a cadavalor e a cada interesse especfico considerado nas relaes reguladas.

    Distintamente da deciso discricionria, em que o agente pblico partirde um interesse definido desde logo como o determinante para a deciso - que o interesse pblico especfico legalmente posto, distintamente, na decisoregulatria,o agente pblico partir de uma situao de neutralidade em relaoaos interesses em jogo e ser a sua deciso ponderada a que dever definir o

    interesse pblico especfico regulatoriamente posto.

    O REQUISITO DA LEGITIMIDADE

    A legitimidade que se deve exigir no caso das decises reguladoras,como se exps, apresenta trs aspectos: a legitimidade originria, referida aosrgos e agentes; a legitimidade corrente, referida aos procedimentos e alegitimidade finalstica, referida aos resultados pretendidos e alcanados.

    Pois bem: a legitimidade originria atendida se o rgo ocompetente e se a investidura dos agentes reguladores tiver sido legalmentecorreta, ou seja: pelo atendimento de todas as condies, formais e materiais,prescritas em lei.

    A legitimidade corrente atendida com a observncia fiel doprocedimento regulatrio, mormente no que respeita participao dosinteressados, com a utilizao de todos os instrumentos previstos nas normaslegais e administrativas, tais como as audincias pblicas, as consultas pblicas ea audincia de conselhos consultivos institudos especialmente para veicular aparticipao multi-setorial. Enfim, com a satisfao das condies legitimatrias.

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    Alegitimidade finalstica, por fim, mas nem por isso menos importanteque as demais, satisfeita quando os resultados pretendidos pela decisoregulatria so efetivamente alcanados, integrando a legitimidade.

    O REQUISITO DA FORMALIDADEOra, como a legitimao corrente se realiza pelo processo, claro que a

    formalidade processual regulatria tem grande destaque, pois como se ver, comela se cumpre um dos requisitos que confere a necessria democraticidade regulao (assim entendida como qualidade do que democrtico).

    O processo regulatrio obedece aos princpios e regras gerais bemconhecidos, da Lei federal do processo administrativo6, a que se acrescemnormas procedimentais especficas criadas pela lei regradora atinente a cadaagncia, sendo que a sua prpria norma reguladora, de carter geral e abstrato,

    poder prever um terceiro grau, administrativo, portanto, de procedimentoscomplementares especiais, cuja observncia ser sempre devida e no poderser dispensada por norma reguladora singular, seno que da mesma natureza.

    5 - O FALSO DISCURSO DO DEFICIT DEMOCRTICO DA REGULAO

    Toda essa peculiariedade da instituio regulatria, no Brasil, como, deresto, no mundo, tem suscitado debates com relao ao que se tem denominadode dficit democrtico (1) dos rgos e agentes reguladores, agravado por umdficit democrtico (2) do processo de tomada de deciso e (3) do dficit

    democrtico de seu controle.

    No obstante, a insistncia na existncia desse suposto dficit trata-se deoutra perplexidade, a somar-se s que se examinou, em razo de uma pticaanacrnica que ainda se tem das instituies de Direito Pblico, considerandouma aparente falta de legitimidade das agncias, enquanto rgos, e de seusmembros deliberantes, enquanto agentes pbl icos, bem como de seu processodecisrioe, finalmente, do controlede suas deliberaes.

    O DEFICIT DEMOCRTICO QUANTO AOS RGOS E AGENTES

    Bem semelhana dos demais equvocos j apontados, que surgem conta dessa percepo estritamente juspositivista, acoima-se de ilegtimos asagnciase os agentesporque, primeiro, no caso daqueles rgos, a criao deentes independentes no sistema administrativo os excluiria do sistema e,portanto, os subtrairia da direo superior da administrao pblica, atribuio doChefe do Poder Executivo (art. 84, II, CRFB) e, segundo, no caso dessesagentes, para desempenharem essas funes independentes, todospadeceriam de ilegitimidade originria, usque titulum, pois que suasinvestiduras no decorrem de uma escolhaeleitoraldemocrtica.

    6Lei n 9.784, de 29 de janeiro de 1999.

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    Ora, a criao das agncias reguladoras em todo o mundo se lhes atribuiuma personalidade jurdica prpria, que, no caso do Brasil, de naturezapblica, pois que legalmente capituladas como autarquias especiais, o que asinsere na administrao pblica indi reta (art.37, capute inciso XIX, CRFB), no

    sendo o caso, portanto, pelo menos entre ns, de aludir-se a uma absurdaexcluso das agncias do sistema administrativo.

    Do mesmo modo, no direito constitucional brasileiro, os agentesadministrativos no necessitam de investidura eletivapara legitimarem-se usquetitulum, pois que reservada esta apenas aos agentes polticosdos legislativos edos executivos federal, estaduais, distrital-federal e municipais, estando excludosos que receberem provimentos efetivos ou em comisso (art.37, II, CRFB).

    Acresce que a investidura eletiva no a nica via constitucional delegitimao de agentes polticos, pois Ministros de Estado, Magistrados de

    Tribunais Superiores e de Tribunais Estaduais, bem como membros dos Tribunaise Conselhos de Contas so providos por escolha, e no por sufrgio eletivo, eprovidos por ato administrativo de nomeao, bem como, para todos os demaismagistrados e membros das funes essenciais justia tambm dispensvel aescolha eletiva, providos, que so, por atos de nomeao, aps aprovao eclassificao em concursos pblicos.

    O DEFICIT DEMOCRTICO NO PROCEDIMENTO

    Aqui se acoima o processo regulatriode ilegitimidade corrente, umavez que no atenderia suficientemente aos condicionantes de publicidade e de

    impessoalidade, o que tornaria rgos e agentes suscetveis influenciveis aponto de tornar inevitvel a captao da agncia por interesses particulares dasempresasreguladas, por interesses dos usuriosdos setores regulados ou peloprprio governo.

    Ora, o que assim se ataca no a instituio em si, mas o seufuncionamento viciado. Se h deficincia na publicidade, parcialidade nasdecises ou na captao das agncias, no ser por defeitos intrnsecos instituio, pois que tais desvios podem ocorrer, de resto, em qualquer outra, noimporta qual, mas (1) por defeitos procedimentais atinentes conduo dosprocessos e (2) por deficincias pessoais dos que neles estejam envolvidos emposio de responsabilidade.

    O antdoto para esses desvios de conduta no ser outro que propiciar amxima aberturapossvel aos processos regulatrios, bem como escolha dosagentes reguladores e ao controle de seus atos, sempre admitindo amplamente aparticipao da sociedade e, de modo especial, a dos interessados.

    Alm disso, ser tambm esta participao processual o caminho parao contnuo aperfeioamentoda instituio da regulao de setores crticos, para

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    uma paulatina substituio da deciso administrativa unilateral pela decisoadministrativa plurilateral, tomada por acordo entre as partes.7

    Este discurso sobre o deficit democrtico leva necessariamente ao tema

    do controle, como ltimo assunto de que se ocupar esta exposio, com nfaseno controle social.

    6 - AS MODALIDADES DE CONTROLE E PARTICULARMENTE AIMPORTNCIA DO CONTROLE SOCIAL NA REGULAO

    Adiante-se, por questes de mtodo, uma breve classificao docontroleda regulao, repassando-o, ainda que aligeramente, para nele situar otema do controle social.

    Tal como na Administrao Pblica em geral, comea-se por distinguir ocontrole interno exercido pela prpria Agncia, do controle externo, exercidopor outros rgos do Estado e pela Sociedade.

    CONTROLE INTERNO

    o controle mais amplo, de carter hierrquico, exercido no mbito daprpria agncia, por seus rgos internos. So de dois tipos:

    1. O CONTROLE ADMINISTRATIVO PLENO

    Exercido pelos rgos da administrao ativa da agncia.

    2. O CONTROLE JURDICO

    Exercido pela Procuradoria da agncia.

    CONTROLE EXTERNO

    o controle setorizado, exercido por rgos do Estado e pela Sociedade,com diversas naturezas e com distintas finalidades.

    1. CONTROLE POLTICO PELO CONGRESSO

    um amplssimo controle, que se exerce na forma do art. 49, X, daCRFB, por qualquer casa legislativa competente, por meio de requisies,relatrios ou outras modalidades fiscalizatrias, podendo, inclusive, adotar umamodalidade corretiva, que a suspenso da eficcia de atos reguladores de

    7Esta uma das tendncias apontadas no I Seminrio de Direito Administrativo Brasil-Espanha,registrada no livro Uma Avaliao das Tendncias Contemporneas do Direito Administrativo

    - Obra em homenagem a Eduardo Garca de Enterra, Rio de Janeiro, Editora Renovar, 2003,no artigo: Desarrollo reciente de los instrumentos de la administracin consensual emEspaa, ps 363 a 382.

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    natureza normativa de agncia que exorbitem do mbito da delegao implcitana deslegalizao tcnica setorial (art. 49, V).

    2. CONTROLE POLTICO PELO PODER EXECUTIVO

    Como as polticas pblicas so executadas pelo governo, como um todo, fora de dvida de que h um controle implcito sobre o seu cumprimento porparte das agncias reguladoras, pois, no obstante sua independncia funcional, certo que integram o ramo executivo,como entes da administrao pblicaindireta.

    3. CONTROLE ADMISTRATIVO PELO PODER EXECUTIVO

    um controle hierrquico imprprio que se impe sobre todas asautarquias, com fundamento no art. 84, II, CRFB, para verificar o cumprimento da

    Constituio e das leis bem como das metas e das diretrizes gerais, podendoadotar efeitos corretivosquando se trate de violaes constatadas.

    4. CONTROLE JURDICO DE FISCALIZAO E DE PROMOO AFETO AOMINISTRIO PBLICO

    o controle de fiscalizao que diz respeito preservao da ordemjurdica e dos interesses sociais no que toda ao reguladora, podendo valer-sedo elenco das funes institucionais prprias, previstas no art. 129 da CRFB.

    5. CONTROLE CONTBIL, FINANCEIRO, ORAMENTRIO, OPERACIONAL E

    PATRIMONIAL DE LEGALIDADE, LEGITIMIDADE, ECONOMICIDADE E DERESULTADOS EXERCIDO PELOS TRIBUNAIS DE CONTAS

    controle de fiscalizao, cometido aos tribunais e conselhos de contas,referido aos parmetros acima, que se estende aplicao de sanesindividuais aos responsveis por ilegalidade de despesa ou irregularidade decontas e com cominaes corretivas, voltadas sanao de ilegalidade (art. 71,e seus incisos).

    6. CONTROLE JURDICO PELO PODER JUDICIRIO

    A Constituio reserva ao Poder Judicirio, por clusula geral degarantia, a apreciao de qualquer leso ou ameaa a direito (art. 5, XXXV,CRFB), de modo que as autarquias reguladoras, bem como seus agentes,sempre que for o caso, respondero administrativa, civil e penalmente peranteseus rgos judicantes competentes.

    O Judicirio, tal como hoje atua com relao discricionariedade,prescrutando-lhe a juridicidade plena do mrito, pode e deve investigar tambmamplamente a juridicidade do preenchimento do espao decisriodeslegalizado por atos regulatrios, portanto, quanto sua legalidade,

    legitimidade e licitude, o que vale dizer que, dado o paralelismo do sistema dajurisdio nica, comum aos Estados Unidos da Amrica e do Brasil, pode ser

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    comodamente aplicada entre ns a chamada doutrina do hard look review,desenvolvida nas cortes norte-americanas a partir do Administrative ProcedureAct, de 1996, para assegurar a ju ridicidade do processo regulatrio,principalmente contra o arbtrio e o exerccio do voluntarismo decisional,

    mediante a abertura do exame de razoabilidade e de proporcionalidade,ponderando entre as vantagens e desvantagens de uma determinada regulaorelativamente aos direitos fundamentais, com vistas a anul-la ou a remet-la agncia para corrigi-la.

    7. CONTROLE SOCIAL

    O controle pela cidadania, tanto o exercido individualmente pelaparticipao dos cidados, quanto o exercido coletivamente pelos entes civis desua criao, em particular as associaes especificamente voltadas a essamodalidade de atuao, no apenas concorre, como se exps, para a

    legitimidade correnteda atividade da regulao, pela fiscalizao desenvolvidaem paralelo com a participao decisria, como fundamental para a sualegitimidade finalstica, pela fiscalizao dos resultados.

    Pode-se mesmo afirmar que ser o desenvolvimento dessa atividade decontrole social, descentralizando e capilarizando a atividade participativa cidad,que poder concorrer ponderavelmente para o futuro da regulao no Pas, umavez que no somente atua, como foi exposto, para a legitimao da atuao dasagncias reguladoras, como para a prpria legitimao do instituto daregulao, pela maturao da oppinio necessitas popular sobre sua eficincia,dentro do sistema da administrao pblica brasileira.

    Este passa a ser, pois, um tema relevante de nosso tempo: umaexperincia juspoltica de ponta a suscitar um grande desafio pedaggico a serenfrentado. Com efeito, tanto sob a perspectiva da lei posta quanto sob aperspectiva do direito aplicado, a participao cidad no Brasil ainda tem pelafrente um longo caminho, para alcanar-se o nvel logrado nas democracias maisavanadas.

    A PROBLEMTICA DO DIREITO REGULATRIO PARTICIPATIVO POSTO

    Quanto ao direto posto, chega a ser surpreendente a desigualdadedo tratamento da participao, em geral e do controle social, em especial, nas leisinstituidoras de setores regulados, desde a criao da pioneira Agncia Nacionalde Energia Eltrica ANEEL, pela Lei n 9.427, de 26 de dezembro de 1996, ata ltima a ser criada, a Agncia Nacional de Aviao Civil ANAC, pela Lei n11.182, de 27 de setembro de 2005.

    Nessa relao, que se vai ampliando nos quase dez anos daintroduo do instituto, encontram-se at agncias bastante defectivas napreviso de instrumentos participativos, como, por exemplo mais preocupante, aimportanteAgncia Nacional de Vigilncia Sanitria ANVISA.

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    Apenas para dar uma idia da dificuldade em prosperar a idia daparticipao e do controle social, entre as oito primeiras agncias criadas, entre1996 e 2001, apenas quatro tinham legalmente prevista a participao, ou sejadessas apenas quatro se podiam considerar, sob este critrio, como uma agncia

    reguladora legitimamente plena.

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    H, todavia, um Projeto de Lei n 3.337/2004, que torna obrigatrio para

    todas as agncias o processo decisrio participativo, com a realizao deconsulta pblica para validar qualquer deliberao sobre questes relevantes(arts. 2 a 5), prevendo ainda outros meios participativos (art. 6) e generalizandoa ouvidoria aberta, como instrumento de controle social. Lamente-se que,mesmo em regime de urgncia, este projeto to importante j espere dois anospara ser votado pelo Congresso.

    A PROBLEMTICA DO DIREITO REGULATRIO PARTICIPATIVO APLICADO

    Quanto ao direito aplicado, igualmente se mostra ainda muitoproblemtica a utilizao dos instrumentos participativos existentes,notadamente os de negociao, um instituto novo e reputado como estranho sprticas das Administraes Pblicas do Pas, acostumadas atuao unilateral eimperativa.

    Mesmo considerando as j modestas previses legais existentes,realmente muito escassa a participao efetiva: tanto a dos cidados,individualmente considerados, quanto a das entidadesprivadas. claro que essaabulia tem sua raiz nos velhos hbitos paternalistas, que distanciavam o Estado

    da sociedade, e, conseqentemente, do desinteresse oficial na educao cvicadas pessoas. Mesmo hoje, difcil a compreenso do grande pblico do quemodernamente se entende como um Estado de Servio.9

    Talvez a exceo, por certo alentadora, com vistas ao futuro dainstituio, seja a telefonia, um setor em que todo tipo de controle social tem sidoamplamente empregado e no qual se tem registrado sensveis avanos namobilizao da sociedade, o que se observa no apenas quanto aos usurios,mas quanto s empresas e entidades organizadas para a defesa de direitos.

    7 - GUISA DE CONCLUSO GERAL

    A MENTALIDADE REGULATRIA

    Parece claro que a experincia da regulao entre ns, como sucedeualhures, presta-se a passar por contestaes e at por crises, o que, afinal, previsvel, dada a modernidade do instituto, mas o certo que graas a ela seest auspiciosamente despertando uma nova viso, no s no mbito dogoverno como no de toda a sociedade, sobre temas sensveis de nosso tempo,

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    Fonte: do Autor,Direito Regulatrio, Rio de janeiro, Ed. Renovar, 2003, ps. 192 a 199.9GIANCARLO SORIANO, Diritti e partecipazione nella amministrazione di resultato ,.Napoli,Ed. Scientifica, 2003, passim.

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    tais como a desburocratizao , a impessoalidade, a negociao pblica deinteresses, a preocupao com a eficincia e com os resultados e,destacadamente, com as extraordinrias possibilidades abertas pelo controlesocial.

    Como j se adiantou, tudo tem a ver com a prpria viso que as pessoastm do Estado e de sua relao com a sociedade, tal como expressaprecisamente NGEL MANUEL MORENO MOLINA na seguinte passagem: Aatividade administrativa de regulao expressa uma determinada concepo darelao entre o Estado e a Sociedade, em especial no campo da Economia ,10pois, acrescente-se, sem conceber um Estado de Servio, quem hoje deveria sere comportar-se como um cidado... ainda continua um sdito.

    ESGOTANDO AS POSSIBILIDADES DA NEGOCIAO

    A sociedade, no como massa tutelada e mero objeto de manobrapoltica de Estados e governos, mas como senhora e beneficiria de sua atuao,passou a ser a protagonistada cena poltica.

    Com essa evoluo, a tradicional ao coercitiva desenvolvidatradicional pelo Estado cede, pouco a pouco, um espao ao consensual,tanto no campo do contrato quanto no campo da conveno, valorizando aspossibilidades da negociao pblica de interesses, desvendando um futurorico de possibilidades de coordenao de esforos e de meios aberto Administrao Pblica.

    PARA ENCERRAR, UMA CONCLUSO AUSPICIOSA NO QUE ATINE AO CONTROLESOCIAL: PRECISO CONFIAR NAS INESGOTVEIS POTENCIALIDADES DASOCIEDADE DEMOCRTICA

    Os cenrios positivos se tornam auspiciosamente mais provveis, mesmoto distanciados que nos encontramos da prtica de uma efetiva democraciasubstantiva, sempre que se leva em considerao, de um lado, as possibilidadesabertas pela era das comunicaes, de educar e de levar a mensagem cvica auma grande quantidade de pessoas, e, de outro lado, as potencialidades doprprio homem, intrnsecas ao senso comum, por ser o mais comum dossensos...

    E, com essa invocao de THOMAS PAYNE, s resta realar, paraconcluir, com confiante destaque e sempre revivida esperana, as imensaspossibilidades abertas pelo vis pedaggico da democracia e, implicitamente,com especial destaque, o papel pedaggico dos profissionais do Direito,notadamente doAdvogado de Estado .

    Deixa-se essa aluso advocacia de Estado porque a seus profissionais,em seu ministrio independente, como titulares de funo constitucionalessencial justia, cabe atuar capilarmente sobre a administrao pblica em

    10 NGEL MANUEL MORENO MOLINA, La administracin por Agencias en los EstadosUnidos de Norteamrica, Madri, Universidade Carlos III, 1995, p. 85.

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    geral, e, em especial, sobre a administrao regulatria, participando em todasas etapas administrativas - da formulao, da negociao, da ponderao, dadeciso, da fiscalizao e da sustentao judicial, se necessrio - exercendo amisso acrescida de mestre informal da convivncia cidad e de primeiro

    guardio do Direitonas relaes de poder.Valha, o professar dessa confiana, como arremate desta exposio.

    Referncia Bibliogrfica deste Trabalho:

    Conforme a NBR 6023:2002, da Associao Brasileira de Normas Tcnicas (ABNT), este textocientfico em peridico eletrnico deve ser citado da seguinte forma:

    NETO, Diogo de Figueiredo Moreira. A REGULAO SOB A PERSPECTIVA DA NOVAHERMENUTICA. Revista Eletrnica de Direito Administrativo Econmico (REDAE),Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Pblico, n. 12, novembro/dezembro/janeiro, 2008.Disponvel na Internet: . Acesso em: xx de

    xxxxxx de xxxx

    Observaes:

    1) Substituir x na referncia bibliogrfica por dados da data de efetivo acesso ao texto.

    2) A REDAE - Revista Eletrnica de Direito Administrativo Econmico - possui registro deNmero Internacional Normalizado para Publicaes Seriadas (International StandardSerial Number), indicador necessrio para referncia dos artigos em algumas bases dedados acadmicas: ISSN 1981-1861

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    Publicao Impressa:

    Revista Brasileira de Direito Pblico RBDP. Ano 4, n. 13, abr./jun. 2006. Belo Horizonte:Frum, 2006. Trimestral. ISSN: 1678-7072. 1 Direito Pblico I. Frum. CDD: 342. CDU:34.

    Conferncia de encerramento pronunciada no I I I FRUM BRAS I LEI RO SOBRE AGNC I ASREGULADORAS, realizado em Braslia, DF, sob a Coordenao Cientfica dos ProfessoresPAULO MODESTO e MARCOS JURUENA, nos dias 3 e 4 de abril de 2006.