reale, miguel. teoria do conhecimento e teoria da cultura (trecho)

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  • 7/28/2019 REALE, Miguel. Teoria Do Conhecimento e Teoria Da Cultura (Trecho)

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    p i e , c o m o o caso do va lor da pessoa human a e dos que de le decor rem: so as "invariantes axiolgicas", que podem sof re r osc i laesde sent ido ao longo do temp o, mas que , em sua essnc ia , const i tuemaquis ies his tr icas def ini t ivas , marcos inde lve is de nosso constante: caminh ar.A out ra conc luso a que chegu e i a de que h conje turas eso de essenc ia l s igni f icado em nossa exis tnc ia que jamais logra remos submeter cont ras teao da exper inc ia , e que s podemos admit i r como expresso de intuices r adica is . Ent re e las des ta cam-se as r e la t ivas exis tnc ia de Deus, imor ta l idade da a lma , ou c r iao do univer so. Mui to embo ra inexper ienc ive is , e i s a c renas (no duplo sent ido des ta pa lavra ) que se impem a nosso esp r i to ,ao nos def ronta rmos com o mis t r io , tendo o mais amplo sent ido aaf i rmao de E inste in de que "deve haver algo por trs da energia"*.So todas essas perspectivas que necessrio ter presente qu andose es tuda o problema das verdades fundamenta is , o qua l no pode

    mais se r r esolvido segundo os ant igos te rmos formais da Teor ia doConhec imento, cumpr indo s i tu- la na concreo da univer sa l idadeda cul tura .

    248 . Cfr. DENIS BRIAN, EinsteinA Cincia da Vida, c i t , p . 4 50 .

    I I IT E OR I A D O C ON HE C I ME N T O

    E TEORIA DA CULTURA

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    Os problemas fundamenta is da Fi losof ia , a maior ia dos qua isformulados na Grcia antiga, se, uma vez trazidos plenitude daconsc inc ia c r t ica , adqui rem va lor permanente , nem por i s to de i xam de adqui r i r conf iguraes dis t intas medida que se desenvol vem as r espec t ivas pesquisas e aprec iaes ter icas . Sem exageropoder - se - ia a fi rmar que cada um de les tem um sent ido espec ia l emfuno dos paradigmas que preva lecem no mundo da cul tura , tendosempre um sent ido epoca l .

    E essa colocao do tema que m e leva a pergunta r se da do odominan te consenso q uanto necess idade de s i tuar as questes f ilosf icas luz dos va lores e di re tr izes que comp em o vigente "mu ndoda cul tura" no foi ul t r apassado o c lss ico modo d e invest igar aposs ibi l idade e os l imi tes do conhec imento a par ti r exc lus ivamentede um sujeito situado in abstracto perante um obje to, de conformidade com o exemplo modela r de Immanuel Kant na Crtica da Razo Pura.

    E bvio que n unca se de ixar de indagar das condies a prioride na tureza subje t iva , ne m tamp ouco d e estudar* as "con die st ranscendenta is obje t ivas" do rea l enquanto obje to do conhec imento , mas se t r a ta de saber em que m edida a id ia de cul tura comsntese total dos objetos do sentir , do pensar e do querer da espciehuma na na t o t a l i da de do t e mpo v i v i do ve m i n f l u i r s ob r e aGnoseologia , ou, com o pre f iro dizer, a "Ontogn oseologia" .Al is , essa mudana de denominao j cor responde a novacolocao do assunto, vis to como sabido que , enquanto Kant sel imi tou a indagar das formas e ca tegor ias do conhec imento em funo do suje i to t r anscenden ta l , j Husser l se preocupou com o "obje to " para o qua l necessar iam ente se volve a consc inc ia intenc iona l ,segundo seu conhec ido enunc iado de que conhecer sempre conhece r algOj ass im como dese ja r impor ta em dese ja r a lgo. Com ta l mudana , deu-se parc ia l re torno antiga compreenso do conhec imento como "viso do ser", dizendo eu que o retorno foi parcial, por-

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    q u u n i n jamais de ixou de f ica r de p a cont r ibuio subje t iva docritici.smo kantiano, a partir do qual a Gnoseologia passou a ter es-iriiiu ra e sent ido essenc ia is como condic iona l idade prvia da Cincia. No se compreende Husserl a no ser a partir de Kant, e, maisremotamente , de Descar tes .No h dvida que ningum que admita a Teor ia do Conhec i

    mento como es tudo basi la r ou prvio 1 poder de ixar de perqui r i r ascondies t r anscendenta is , subje t ivas e obje t ivas, do a to de conhecer , pa r t indo concomitantemente dos ensinamentos de Kant e deHusserl, mas tal ordem de indagao deve situar-se, a meu ver , emum "contexto cul tura l" .Por outras palavras, se assiste razo a Ortega y Gasset quandodiz que "eu sou eu e a m inha c i r cunstnc ia" , a comear pe la c i r cuns-tanc ia l idade es t rutura l do suje i to que conhece , no h co mo n o re conhecer que o "paradigm a cul tura l" dado o seu car te r univer sa ltc imbm se pe como valor transcendental no ato de co nhecer, acrescentando algo de novo aos elementos at agora estudados.Por out ras pa lavras , a questo do conhec imento no pode sereduz i r a uma re lao puram ente lgica ent re se r cognoscente e r ea l idade cognosc ve l , porquanto um e out ra se s ituam ab initio e m umc o n t e x t o c u l t u r a l , a l a r g a n d o - s e , d e s s e m o d o , o e s p e c t r o d at ranscendenta l idade .No obstante a cr t ica de Hegel, dada a tournure conjetural prpr ia do pensamento, p arece-me qu e tem car te r pr iori t r io a indagao da poss ibi l idade do conhec im ento, no sent ido de saber - se qua l a capac idade cognosc i t iva da mente qua tale, tal como foi feito por

    1. N o s e e s q u e a , c o m e f e i t o , q u e H E G E L c o n d en a v a o e s t u d o p r v io d aGnoseo log ia p or cons ider- lo o resu l tado de um c rcu lo v ic ioso . Como l e mbro p .25 de Experincia e Cultura, e l e s e r ef er ia com iron ia a qualquer t eor ia sobre asp o s s ib i l i d a d e s do conhec imento , porquanto ta l indagao j const i tu ir ia uma formatlc c o n h ec im en t o . Co m o e s c rev e n o I O 2 da Enciclopdia das Cincias Filosficas,o mestre do ide al ismo mode rno af irma que "querer conhecer ant es de conhece r toabsurdo como o prudent e prop s ito daquel e esco ls t ico que quer ia ap render a nadar; in ies de a venturar-s e gua". MAO T S-T UNG , s em l embrar a fonte , r ep et iu essaadvertncia , o que t em dado lugar a r idcu las c i t aes por part e de a l guns marx is tas .28

    Kant que a subordinou s formas a priori da sensibi l idade (espao etempo) e s categorias a priori do inte lec to, tendo Husser l , conformej lembre i , enr iquec ido essa noo com o conce i to de consc inc iaintenc iona l das coisas mesmas.Penso que , com a considerao do que poder amos des ignarcomo sendo o a priori cultural, o problema do conhec imento adqui

    re mais concre t i tude , operando-se , por ass im dizer , a soc ia l izao doa to cognosc i t ivo. a r azo pe la qua l entendo qu e a Teor ia do Conhec im ento d eveser es tudada em conexo co m a Teor ia da Cul tura , a largando-se , ass im, as condies a priori da cognio. Parece-me, em suma, quecont inuar a s i tuar o problema gno seolgico ou, como pre f i ro d i ze r , ontognoseolgico apenas segundo as condies do suje i tocognoscente em sua abst ra ta univer sa l idade no leva em conta se re le um ente essenc ia lmente his tr ico-cul tura l .Em u m livro que, por sinal, peca pela absurda pretenso de subordinar s leis da Fsica "todos os fenmenos tangveis, do nascimento

    das estrelas s instituies sociais", o grande bilogo Edward O. Wilson chega a falar em "mente coletiva das sociedades cultas", a qual,atravs da cincia, "adquir iu o poder de mapear a realidade externabem a lm do alcance de um a men te individual, e, atravs das ar tes, osmeios de construir narrativas, imagens e r itmos, incomensuravelmen-te mais diversos do que os produtos de qualquer gnio solitr io" 2.Por out ro lado, na Psicologia e , mais par t icula rmente , na Psi quia t r ia , r conhece- se cada vez mais a necess idade do es tudo doinconsc iente do indivduo em complementar idade com o inconsc i ente cole t ivo, combin ando-se , por ass im dizer , Freud com J ung. levando em conta essas e out ras colocaes t r ansindividua isdo problema do conhec imento que me pergunto, r epi to , se no ht a mb m um a c ond i o a priori intersubjetiva, e por conseguinte cul-

    tural, na Gnoseologia , que adqui re , ass im, mais concreo.

    2. Cf r. E DW AR D O . W I L S O N, A unidade do Conhecimento Conciliiicia,trad. Ivo Korystowsh, Rio de Jane iro , 1999 , p . 11 . Quanto ao pr imado das l e i s , videp . 257 e s .29

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    Ademais , a intuio de espao e tempo, invocada por Kant , equ e de espao- tempo na viso e ins te iniana , no poss ve l , a meuver, com abstrao da posio do sujeito perante os demais sujeitos,varivel em funo d e distintos aspectos do real: a condicion ante cul-tuia pe-se, assim, transcendentalmente na raiz do ato de conhecer.Ul t r apassamos, desse modo, o ngulo individua l do processo

    gnos e o l g i c o , pa r a v - l o , de s de o i n c i o , s ob uma pe r s pe c t i vaintersubjetiva e, mais ainda, sob o ponto de vista da ao, o que corresponde admisso da soc ia l idade e da his tor ic idade como carac te r s ticos essenc ia is do se r human o.Cabe , por out ro lado, ponderar que , r econhec ida a intencionalidade da consc inc ia com o seu carac te r s tico essenc ia l , adqui re novosentido a participao do sujeito no ato de conhecer. Na viso kan tianao sujeito , de per si constitutivo, por inte i ro , do mundo fenomenal ,que e le conver te em uma plura l idade de obje tos , const i tuindo, ass im,os diver sos campos da Cinc ia . o hom em, desse mo do, apresenta do como legis lador da na tureza : a coisa , enquanto se mani festa c omofenmeno, ou seja, enquanto suscetvel de ser captada pelas formas e

    categorias subjetivas a priori, tornando-se objeto do c onhe c i me n t o , produto integral do sujeito cognoscente.Nunca ser demais realar a decisiva contr ibuio de Kant, aodemonst ra r o poder nomottico do espir ito, isto , o seu poder cr iador no dom nio da Cinc ia , graas sua faculdade norm at iva ou re gulado ra do "mun do pr-categorial", difuso e indistinto at e enquan tono ca tegor izado ou pensado pe lo suje i to cognoscente . O que d epoissobreveio, no plano f ilosfico, foi a reviso do conceito kantiano dep o d e r n o m o t t i c o , l u z d a i n t e n c i o n a l i d a d e c o m o e l e m e n t ocarac te r izador da consc inc ia .Admit ido, com efe i to , que a consc inc ia se volve necessar ia mente para algo, que tambm pressuposto a priori do ato de conhecer, no se pode mais apresentar o sujeito como constitutivo deper si do objeto, uma vez que este somente o enquanto algo se lheoferece para ser interpretado.Por outras palavras, no mais se admite que o sujeito possa, emsi e de per si , poros objetos como cr iao exc lus ivamente sua , por quanto suas f aculdades cognosc i t ivas depend em de algo objetivo qu ese ofe rece percepo da consc inc ia intenc iona l . O con hec imentode a lgo no surge ex nihilo, como mera projeo subje t iva , mas re -

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    presenta um processo de interpretao da coisa que se lhe presenta ,havendo, pois , um ato hermenutico da coisa para a qua l a consc incia intencional se dir ige. Poder-se-ia af irmar que a cognio, em suara iz , cor responde a um processo de inte rpre tao: cor responde , porconseguinte , essenc ia lmente a um ato hermenutico. c la ro que permanece a dis t ino ent re "coisa em s i" e " fen

    men o" , na medida em que aque la no possa se r conver t ida em objetode conhec imento. Mas coisa ( a lgo, aliquid) possui um s igni f icadoamplo, abrangendo tanto a "coisa em s i" , enquanto coisa incognos-c ve l , como o objeto, que cor responde ao que h de f eno menalmen tecognoscvel na coisa. Donde se conclui que, quanto mais o ser humano capaz de alargar e aprofundar o campo do conhecimento, mais serestr inge a "coisa em si", de carter residual sob o ngulo epistmico.Donde a minha afirmao de que ela o que resta do "infinitamentecognoscvel", ou melhor, o "infinitamente incognoscvel", pois restarsempre algo que escap a nossa faculdade cogrioscitiva, e o respectivoproblem a metafsico quan to ao seu ser. Estamos, portanto, perante umaviso relativa, e no mais absoluta, da "coisa em si", superando-se apredeterminao abstrata e a-histrica do crit icismo kantiano.A bem ver, a idia de intencionalidade como es t rutura fundamenta l da f enomenologia leva-nos conc luso de que , em l t imaan l i se , no h conhec imento do ser, mas s im do "sentido do ser",donde resulta a sua natureza hermenutica. fNo meu entender , embora Heidegger no se tenha proposto, oumelhor , pressuposto o problema gnoseolgico, abr iu novos cam inhos gnoseologia, ao distinguir duas esferas da realidade, a originriarea l idade da coisa (Sachfeld) e a dos objetos (Gegenstandsgebiet),sendo es ta o campo da exper inc ia e das c inc ias posi t ivas , enquan toque aque la se r ia o da fenomenologia conver t ida em Ontologia .

    No me p arece que se ja necessr io segui r Heidegger no que serefere a essa converso para reconhecer que, na linha de seu pensamento, conforme diz Constant ino Esposi to , f ica demonst rada "a insuficincia da subjetividade para explicar o r ico contedo cultural dosujeito e a sua articulao intencional" 3 .3 . Cfr. CONSTANTINO ESPOSITO, / / Fenmeno delVEssere Fenomenologia e Ontologia in Heidegger, Bari , 1984 , p . 37 .

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    Slegundo Esposi to , que rea l izou magn f ica an l i se de Sein undZeit luz das pre lees de Heidegger , em Marburgo, p ouco antes edepois da publicao de sua obra capital, para o grande f ilsofo alemo a teor ia das ca tegor ias do conhec im ento som ente pode se r ple -n a m e u t e r e a l i z a d a " n a s u a p o t e n c i a l i d a d e de sentido q u a n d oconceptualiza em categorias f ilosficas a r iqueza espir itual da histria, e, nisto a filosofia Weltanschauung", de tal modo que "a interpre tao cul tura l - f i losf ico- te leolgica da his tr ia se torne de te r minante para o s igni f icado ca tegor ia " 4 .

    Nesses te rmos, o es ta r do Dasein "no mundo" cor responde aes ta r no "mun do da cul tura" , o que impl ica o superamento da teor ialgico-abst ra ta do conhec imento para s i tu- lo no plano his tr ico-cul tura l .Por a se v como a id ia de intencionalidade, cultivada de Bren-tano a Husser l , ofe rece nov a conf igurao Teor ia do Con hec imento , superando o vazio da conscincia, caracterstica da viso de umsuje i to cog noscente abst ra to , para s i tu-la em cor respondnc ia comum sujeito concreto, "espr ito vivente, histrico por essncia".Parece-me da m aior r e levnc ia essa nova compreenso da Teor ia do Conhec imento, da qua l no tomam c inc ia os que se mantmapegados ao logic ismo abst ra to de Kant , sem perceber que nal inha de meu pensamento, coinc idente com o ac ima exposto somente se pode fa la r em "poss ibi l idade do conhec imento" como problema inser ido em um processo his tr ico-cul tura l , uma vez que adensidade his tr ico-cul tura l do suje i to abre intenc iona lmente ainte l igibi l idade dos obje tos do conhec imento e condio de suasposs ibi l idades na ordem do tempo. I s to posto, no h como re futa rc r t icas mani fes tamente exte rnas e de anacrnica conf igurao.Por falar em tempo, a f i losofia contempornea correlaciona-o

    com a teor ia do conhec imento, dis t inguindo ent re a " tempora l idade"prpr ia das c inc ias posi t ivas ; a "a - tempora l idade" das c inc ias lgicas e matemt icas ; e , por f im, a "meta temp ora l idade" das cogi ta -4 . Ib i d e m . N o d e m a i s o b s e rv a r q u e E S P O S IT O l i g a e s sa co n ce p oh e i d e g g e r i a n a d o " j u zo l g i co e m t e rm o s d e valor" inf luncia de RICKERT eLASK, bem como ao rea l i smo crt ico de KLPE.

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    es metafsicas. mais uma razo para justif icar a tese por mimsustentada em Experincia e Cultura quanto impossibi l idade dehaver exper inc ia meta f s ica , por se r o tempo da essnc ia mesm a d oconce i to de exper inc ia .Abstrao feita desse problema, o certo que o paradigma dacultura vem situar em novas bases a Teoria do Con hecime nto, am pliando a instncia de seus pressupostos transcendentais, passando-se, em

    ltima anlise, de um sujeito cogno scente abstrato a um sujeito concreto,situado por sua prpria natureza no mundo da histria e da cultura.Na realidade, o que se d uma substituio de mod elo cog nosci-t ivo . sabido que a Gnoseologia kant iana se s i tua no contextoepis tmico da Fs ica de Newton, r epresentando o propsi to de sea lcanar, em todos os domnios do con hec imento, a certeza de resultados a t ingida naque le campo, devendo ser estabelecidas as basesuniversais do conhecimento positivo, que , segundo o mest re docriticismo, s poderia f icar adstr ito ao mundo fenomenal, prpriodas c inc ias na tura is , sendo t r anscendenta lmente condic ionadas pelas condies subjetivas a priori por e le apontadas . na tura l que , a l te rada a viso da Cinc ia quer pe la novacompreenso da Fs ica , cada vez mais teor izada em te rmos lgicos ematemt icos , culminando no re la t ivismo de E inste in , margem doindut ivismo antes r e inante 5; quer em razo do advento das c inc iassociais e antropolgicas natural que ocorra tarAbm a substituio do modelo, em funo do qua l so postos os problemas do conhe c i me n t o .Nem se esquea que , no obstante a ant igidade de seus es tud o s , foi somente em nosso sculo que a Axiologia ve io se comp ondoe se af i rmando com o uma par te autnoma da Fi losof ia , independen te da Metafsica, com a conquista, entre outras, do valor intencionalda conscincia, a que j f iz referncia, o qual se situa no mago daproblemt ica ontognoseolgica . Por out ro lado, a la rgou-se a noode experincia, que deixou de ser apenas a da experincia natural,

    5 . Cfr. o que escre v i no art igo "Universa l idade da cultura", p . 407 do fasc-cuo 192 da Revista Brasileira de Filosofia ( o u t / d e z . 1 9 9 8 ) .3 3

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    maneira de Kant, para ser tambm o objeto de estudos sociais e histr icos , como pen so te r demonst rado em Experincia e Cultura, quevisou atingir uma "teoria integral da experincia". compreensve l , pois , que ao modelo subje tivis ta da Teor ia doConh ec imento, exposta por Kant , sobrevenha out ro modelo, a um stempo subjetivo e objetivo, no qual a constitutividade dos objetos doconhec imento se ja entendida em te rmos hermenut icos .C) ato hermenutico no signif ica uma cpia de algo j dado,que cump ra apenas dec i fra r ou desve la r renovand o-se de mane i raobl qua o superado entendimento da cognio como adaequatio reiac intellectus , porque conhecer, se no constituir por inteiro oobje to, cont r ibui r r ac iona l e posi t ivamente para const i tu - lo , medi ante sntese subjetivo-objetiva, na qual a imaginao criadora desempenha pape l essenc ia l . por esse mot ivo que , mui to embora revis ta , ou, por ass imdizer , mi t igada , subsis te a grande l io kant iana sobre o podernomottico do esp r i to , que Hege l , pondo en t re parntes is a proble mtica, gnoseolgica, preferiu desde logo afrontar em sua compreenso dia l t ica do se r , em uma dramat izao ontolgica que par te daNatureza para culminar na id ia de Absoluto.Quem, ao cont r r io , r econhece , desde o inc io , o condic ionamento transcendental representado pela historicidade ou culturalidadedo se r humano, no sa l ta o momento gnoseolg ico, mas o pe desdelogo com o problema o ntognoseo lgico, de ta l sorte que as poste r iores etapas existenciais do sujeito so vistas como momentos sucessivos , mas no uni l ineares , da experincia cultural integral, plural epolissemica por sua prpria natureza, e, hoje em dia, enriquecidapelas conquistas da inteligncia ar tif icial, cuja participao no podeser ignorada na Teor ia do Conhec imento. luz desse originrio enfoque subjetivo-objetivo, compreende-se que a experincia cultural deva ser objeto de uma dialtica decomplementaridade, sem olvido do que nela h de conjetural e pro-blemlico, tal como procurei explicar em duas obras de concepocomplementar , Experincia e Cultura e Verdade e Conjetura.

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    I VO A PRIORI CULTURAL

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    A Gnoseologia ou Teor ia do Conhec imento Moderna comeacom Kant, que, antes de se manifestar sobre os diversos aspectos darealidade ou da experincia, para saber quais as suas relaes e o quee la em s i mesm a, dec la rou que havia um es tudo prvio s inte t izadona pergunta : "que posso eu conhecer?" . claro que, antes de Kant, j se indagara da origem e do alcancedo conh ecimento, mas foi com o f ilsofo de K oenigsberg que se situou,com m aior f irmeza, o carter de pressuposto da pergunta em apreo.So duas ordens de es tudo que surgem concomitantemente : ada experincia e a das condies de su a cognoscibilidade. A originalidade de Kant constitui, como sabido, no em indagar das condiesdo conhec im ento a par t i r do que obje t ivamente se pe como dado deexperincia, isto , objetivamente, como realidade externa ao homem,mas antes, subjetivamente, a partir da pessoa do sujeito cognoscente.Com essa a l te rao de 180 no enfoque do problema, es tavam sendoassentadas as bases do depois denom inado idealismo subjetivo.Ora , segundo Kant , todo conhec imento depende de duas for mas essenc ia is da sensibi l idade , o espao e o temp o, Visto se r impossvel ter noo de algo, abstrao feita do lugar em que est e dotempo em que se s i tua . Espao e tempo so, ass im, as formas pr i m o r d i a i s d a sensibilidade, que , t oda v i a , nos de i xa e m p l e nainde te rminao, no jogo conf l i tante das impresses sensve is . Da anecess idade de categorias ordenadoras dos obje tos sensve is , ca te gorias essas do intelecto: o mundo da experincia r eduz-se ao dasrelaes sensveis e intelectivas, segundo os mltiplos aspectos danatureza apreendidos pelas sensaes e pela inteligncia.Assim s endo, a r ea l idade no jamais captada com o e la poderser em s i mesm a, e sem se levar em conta as duas apontadas orden s a

    priori de condies subjetivas, as quais, por isso, convertem a realidade em experincia, em a lgo que se exper ienc iou.Desse modo, desaparece o binmio suje i to cognoscente / rea l i -dade conhec ida , uma cpia da out ra , consoante ant igo entendimen-

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    to : o que se percebe a realidade vista pelo sujeito, pois ela somente tal como percebida ou captada segundo "cond ies subje t ivas".A conc luso de Kant , na Crtica da Razo Pura, a de ques ome n t e pode mos conhecer fenmenos, isto , aquilo que se subordinou s formas da sensibilidade e s categorias do intelecto, vistocom o nos impo ssvel atingir a coisa em si (noumenon), que transcende o campo do sensvel e do intelectual. no intelecto que se elaboram os conceitos, que ordenam o que se percebe , e como ta is se apre sentam ao nosso espr ito. A tais condies subjetivas, que condicio namtodo conhec imento, Kant a t r ibui a qua l idade de transcendental. Apalavra transcendental distingue-se de transcendente, porquanto es tese pe alm da experincia, enquanto que o transcendental s te msent ido em funo da exper inc ia e sem e la impensve l .A bem ver, a posio de Kant dualista, mas no do dua l i smontico prprio da Filosofia clssica ou pr-kantiana; trata-se de umdual i smo gnoseolgico ou func iona l , inseparve l da exper inc ia .Como, porm, s i tua as condies do conhec imento no plano da subjetivid ade, em razo de sensa es e conc eitos, a sua posi o f ilosfica foi considerada de um idealismo subjetivo.Se Descartes dissera qu e "penso, logo existo", para Kant s existecom certeza e clareza o que se pe no plano sensvel e categorial: oque ultrapassa esse plano perde a cientif icidade do conceito para adquir ir a dialeticidade das idias, no se tendo a respeito destas enquanto combinaes de conce i tos nenhuma segurana e ce r te za . Gera lmente , no se observa que as esferas das idias, em Kant ,por no se rem susce t ve is de exper inc ia , nem de ordenao pe lointe lec to, so por sua na tureza conje tra is , com por tando juzos v ar i veis a respeito dos quais impossvel concluir com certeza, muito

    embo ra va lham com o esquemas abst ra tos de re fe rnc ias , no menosre levantes no processo cognosc i t ivo.* * *

    Neste ponto, fao abstrao da crt ica movida a Kant pelos seuscont inuadores , como Sche l l ing e Hege l , os qua is desenvolveram oidealismo objetivo exa tamente por discordarem da na tureza mera-38

    mente subje t iva do conhec im ento, e , por via de conseqnc ia , apenas conjetural das idias, s quais conferida fora de verdade essenc ia l . As id ias passaram a pr imar sob re os conce i tos , como expresso de uma realidade no sujetiva e autnoma.Hege l , pa ra subt rai r - se s l imi taes kant ianas ent re o m undoda experincia (ou dos conceitos) e o da generalidade abstrata dasidias ou, por outras palavras, para superar a distino radicale n t r e f e nme no e noumenon , r i d i c u l a r i z ou os p r e s s upos t ost ranscendentais da Gnoseolog ia , com a a fi rmao de que e la envol ver ia um c rculo vicioso, uma vez qu e para indagar da poss ibi l idadede conhecer necessar iamente j se es ta ria desde logo conh ecendo. . .Abstrao feita, neste breve estudo, da direo tomada pelo idealismo objetivo ou da posio especial de Fichte, l imito-me ao estud o d o p r o b l e m a g n o s e o l g i c o , c o n v i c t o c o m o e s t o u d e s u aimpresc indibi l idade , uma vez que nada me parece mais adequ ado d oque previamente es tabe lecer as condies sine qua non do conhec i mento cientf ico, e, como tais, ditas transcendentais. Quanto c r ti ca de Hege l , d i ria que , na Gnoseologia , no se par te do j conhec ido

    o que imp l ica r ia c r culo vic ioso porque e le hipote t icamenteadmitido para indagar-se de sua efetiva possibilidade.t

    Ora , na l inha puramente on tognoseolgica , o pensador qu e re toma a medi tao kant iana sempre na l inha de Descar tes Edmundo Husser l , que s i tuou a questo em out ros te rmos.Husser l no discorda de Kant quanto s condies subjetivasdo conhec imento, mas formula uma indagao densa de conseqncias : Com o se pode conhecer a lgo, indagou e le , se o esp ri to ou consc i nc i a s e de f r on t a c om i n f i n i t o s a s pe c t os do r e a l , da da amul t ipl ic idade amor fa das im presses sensve is? A Gnoseologia c lssica pelo menos falava em cpia da realidade a priori t ida comocognoscvel tal como ela . Se a realidade em si, ao contrrio, comoaf irma Kant , incognosc ve l , e como ta l obscura , o conhec im ento um a to de descobr i r ou de c r ia r a lgo? o conhec imento um a tointe rpre ta tivo e hermenut ico ou ins taurador? Kant n o t i tubeara em

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    dizer que o home m legis lador da exper inc ia, outorgando sent ido eordem qui lo que cor responda a n sensaes .A resposta de Husserl, voltando dos estudos da Teoria dos Objetos de Brentano e Meinong, foi a de que nada se poder ia conhecers e m que na r e a l i da de b r u t a ( p r - c a t e go r i a l ) n o houve s s e a l go{aliquid) dotado da possibilidade de ser captado pelas sensaes epelo intelecto. H, pois , em a lgo nos obje tos em gera l condi

    es mate r ia i s de cogn osc ibi l idade , ass im di r ia eu, como a neve , que ,por sua consis tnc ia , captada a jus tando-se ao formato de nossasmos e dedos . H , em suma, condies "m ater ia i s" que condicionam,tanto objetiva como subjetivamente, o nosso ato de conhecer. O conhec imen to tem, por tanto, sent ido hermenut ico, de inte rpretao edesenvolvimento do que es t ns i to no rea l , porque conhecer conhe c e r algo, sendo de sua essnc ia essa intendo. Por out ras pa lavras ,se no houvesse um a priori mater ia l no mun do das sensaes , comopr-noo a se r esc la rec ida e de te rminada , o a to do conhec imentoser ia impossve l . Conhec imento invenire, descobrir algo que empr inc pio cognosc ve l , no sendo o conhec imento mera cpia , masantes uma sntese subjetivo-objetiva.Isto posto, a conscincia intencional se di r ige necessar iamentepara a lgo, e , como em a lgo h condies de cognoscibilidade, d-seo conhec imento, a um s tempo subjetivo-objetivo. Dessarte, assimcomo h condies t r anscendenta is no suje i to que conhece , h condies t r anscendenta is de cognosc ibi l idade na rea l idade cogno sc ve l .A essas condies obje t ivas Husser l considerou a priori m aterial,sendo es tudadas pela fenomenologia com admirve l acuidade .

    O conhec imento , em suma, uma concreo ou integrao deelementos subjetivos e objetivos, tendo o sujeito a capacidade hermenut ica de capta r o que narea l idade es t em esboo, in nuce, c omoque espera da consc inc ia intenc iona l f ecundante .No h dvida qu e , em ambos os casos , se mantm o dua l i smo,mas a subje t ividade e a obje t ividade no so de antemo dadas porinte i ro , como pensara a G noseologia c lss ica , de ta l modo qu e haver ia uma reproduo pass iva (cpia) no a to de conhecer : no fundoident i ficava- se o conhec ido e o cognosc ve l , sem sequer necess idad ede um processo hermenut ico. Tanto em Kant como em Husser l a40

    cognio sempre c r iao, pressupondo um poder c r iador , nomottico, por parte do sujeito.Desse modo, na f enomenologia de Husser l o conhec imento

    dual, subjetivo-objetivo; sustento a conc luso, em Experincia eCultura, que , em vez de Gnoseologia , se r ia mais acer tado fa la r - seem Ontognoseologia .Antes de prossegui r nes te es tudo, cabe nota r que tanto nocriticismo crtico de Kant com o na fenomenolo gia de Husse rl, a "coisaem s i" sempre queda na rbi ta do incognosc ve l , inviabi l izando aOntologia entendida , nos moldes c lss icos , como tema do se r em s i .

    * * *A esta altura vem-me a idia que preciso dar um passo frente no tocante t ranscendenta l idade do processo cogn osc i t ivo, par t indo do grande passo dado n a passagem de Kant a Husser l , is to , dot ranscendenta l i smo formal ao t r anscendenta l i smo m ater ia l .Lembro, em primeiro lugar, que em ambos os casos estamos vin

    culados ao binmio sujeito/objeto, indagando-se das condies, pertinentes a um e a outro, que condicionam o ato de conhecer com rigor.Nessa concepo o eu continua a ser o eu que pensa e o objeto algoque pensado. Nada se indaga a respeito do status do ser que pensa,de sua condio vital, sem a qua l no se compreende como possa osujeito ser dotado de poder nomottico e ordenad or capaz de con hecera realidade originria convertendo-a em experincia f enomenal .Observo, ademais , que ningu m pensa em abst ra to , e nen hum area l idade cognosc ve l com abst rao de suas c i r cunstnc ias , conforme advertncia de Ortega y Gasset de que eu sou eu e a minhac i rcunstnc ia , a comear pe la pessoa que pensa . Lemb ro, ou t ross im,

    que o homem no es t , no dizer de Bergson, num f luxo de indagaes cognoscitivas, mas orientado em funo de um lan vital. Eprec iso, em suma, r econhecer a par te de verdade que exis te nopragmat ismo quando seus adeptos r econhecem a par t ic ipao davontade no a to de conhecer .Por out ro lado, o homem sempre , e inevi tave lmente , um sercondicionado, e condic ionado a par ti r de s i mesm o e do seu pro ces-

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    so vital . Ele no pensa, em s uma, in abstracto, ma s no bojo de inevitveis circunstncias, sendo o pensamento inseparvel do querer pensar .E aqui que necessr io ver o a to do conhec imento como umato cultural, uma vez que , no ins tante mesmo e m que se pensa a lgo,a lgo se obje t iviza como um e lemento t r ansubje t ivo, que , por maise lementar que se ja , compe o mundo da cul tura .Quan do o h om em pr imi t ivo evolui do gr i to para a f a la, a pa la vra j surge como e lemento nuc lear da cul tura , como e lemento decomunicao e informao. I s to quer dizer que o pr imei ro ato deconhecer li. u m ato cultural, o resul tado de a lgo que se pe obje t i vamente , sendo, concomitantemente , pensar e quere r .E por essa r azo que me parece necessr io r econhecer que naGnoseologia , ou melhor , na Ontognoseologia , h tambm um a prioricultural, c o m o condio de objetivizao, na qual est inerente opoder nomottico, o qua l , ao mesmo tem po em que inte lec tivamenteordena o mu ndo disper so e confuso das impresses sensor ia is , o torna objetivo. Na ra iz do conhec imento h , pois , subje t ivizao,

    obje t ivizao e , como resul tado imedia to, cultura.Pode-se dizer que a cul tura tambm condio a priori transcendenta l do conhec im ento, pois , enquanto es te no se torna obje t ivo ecomunicve l , no h como se f a la r em conhec imento propr iamentedi to . Como a Fi losof ia contempornea o demonst rou, por diver sasfontes , h ent re conhec imento e com unicao um v nculo inc indve l .E graas objetivizao que aquilo que conhecido converte-se em base de novos conhec imentos , dando consis tnc ia aos conce i tos e tambm s id ias , enquanto es tas brotam da exper inc ia . Com ose v, essencial ab initio o l iame ent re conhec imento e cul tura ,ra.zo pela qual, em estudo anterior , declarei que a Teoria do Conhec imento , concomitantemente , Teor ia da Cul tura . , em suma, a obje t ivizao do conhec ido que o toma comun icve l , potenc iando-o. Desse m odo, e la d lugar a novas percepes einvento s. Estes, juntan do-s e ao j adqu ir ido, mais ainda alarga a Cincia e a aperfeioa, dando lugar a novas formas de civilizao.Julgo que essa correlao entre a Teoria da Cultura e a Teoriado Conhec imento v em esc la recer melhor um dos fa tos fundamenta is

    de nossa poca , que a interdisciplinaridade, a cuja luz aproximam -se os f a tos aparentemente mais longnquos e , pr imei ra vis ta ,insusce t ve is de qua lquer conexo: tudo, em suma, se r econduz aohomem como suje i to cognoscente .Se reconhecermos a exis tnc ia de a priori cul tura l , o prob lemada unidade do conhecimento humano su perada a va la que separa

    os problemas cientf icos positivos e os espir ituais, notadamente dena tureza t ica e r e l igiosa aparece , penso eu, sob uma nova luz ,chegando-se conc luso da unidade da Cincia, comple tando-se ascondies formais ou materiais a que se referem Kant e Husserl.Idea l i smo, r ea l i smo, so pa lavras que no fundo perdem seu ant igo s igni ficado, uma vez que se subordinam grande matr iz cul tural, na qua l o subje tivo e o obje t ivo se embr icam e se complem entamna signif icao ideal-realista da cultura.Ademais , com a noo de a priori cul tura l , no som ente se esc la rece melhor o problema da unidade da Cinc ia , como es ta apare ce na pleni tude de sua conf igurao essenc ia lmen te hum ans t ica .Recordo-m e aqui de Le ibniz e de sua id ia genia l da harmoniauniversal, a qual explicaria a correspondncia entre sujeito e objetoe ent re o que depois se denominar ia na tureza e cul tura , es ta comoatuao subje t iva sobre aque la ao longo dos tempos. E que o homem, como ta l , se mul t ipl ica a t r avs do espao e do tempo no inabstracto, ma s t a mb m in concreto, nos seus modos de pensar e deagir . Por mais diversos e variados sejam os sujeitos pensantes, e pormais imprevis ve is que se jam as descober tas do esp r i to humano, oa to de pensar vem sempre acompanhado, como j adver t imos, deuma im edia ta conseqnc ia , que a objetivizao daqui lo que per cebido, o que impor ta na p ar t ic ipao d o querer .No fundo, conhecer objetivizar, ou seja, dar status objetivo aoque mera impresso e descob er ta subjetiva, muito embora no ha japossibilidade de afirmar-se a absoluta correspondncia entre a realidade em si e o que dela se logrou pensar .Ora, esse ato de objetivizao de natureza cultural, no sent idode que o espr ito tem o poder nomottico de converter em algo deobjetivo o mundo das impresses e dos es t mulos subje t ivos senso-

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    r iais e intelectivos, o que explica a possibilidade de verif icar-se asintonia entre natureza e cultura.Poder-se-ia dizer que o ato de conhecer, longe de ser dual osubjetivo ante o objetivo , tr no, uma vez que nele est nsito opoder nomot t ico de converso do subjetivo-objetivo em uma expresso autnom a e comunicve l , que passa a va le r por s i .Conhecer , no fundo, ins taura r a lgo de novo qu e no se r eduz impresso sensor ia l , nem tamp ouco forma inte lec t iva, mas uma eou t r a , s e m, r e p i t o , pode r - s e a f i r ma r que e s s a r e a l i da de novacorresponda, sem falha, realidade original de que proveio. A ilusodo realismo clssico consistiu na crena (e de crena verdadeiramente se t r a tou) da plena coinc idnc ia da res com a sua representao intelectiva.O que sab idamente separa as duas f ases do rea l i smo o advento da Filosofia cr t ica, integrando na subjetividade as possveis dist ines da r ea l idade idea lmente t ida como ta l . Dond e se conc lui queo conhec imento sempre um ato cultural, devendo-se r econhecer

    que o a priori cultural est to presente no a to de conhecer quan to oa priori formal, visto por Kant, eoa priori material, visto por Husserl.No h dvida q ue , nessa l inha de pensame nto, subsis te a lgo dorealismo, ma s c omo realismo culturalista. Real ismo, s im, porquequem se dispe a conhecer j d com o dis t into de s i aqui lo que tenc i -ona conhecer . S que , pe la Ontognoseologia , sabemos que no conhe c e r e mos a l go s e n o na f o r ma e nos l i mi t e s da c a pa c i da decognosc i t iva da consc inc ia intenc iona l .

    * * *Como bem se percebe , meu es tudo sobre o "a priori cultural"s i tua- se no plano ontognoseolgico, no intento, ta lvez ousado, deresiponder pergunta: dada a u niversalidade da cultura, a objetivizaodo cognosc ve l no se r ia um a priori a mais , a lm dos vis tos porKaitit e Husserl? que , enquanto o "c onhec id o" no se exte rior iza , r eve lando-se"obje to cul tura l" , como ta l , no h a inda pleni tude de co nhec imentoe comun icao. Estes s exis tem enquanto adqui rem um a forma. Da

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    a indagao que fao sobre se o espr ito no seria a priori dotado dopoder nomottico e objetivizao, com o qua l comea o f enmenoda cultura.E m b o r a s a b e n d o q u e e s t o u c o r r e n d o o r i s c o d e s i t u a rpre tensamente esse problema em cont inuao a Kant e a Husser l ,aps muitas realizaes e perplexidade, ousei falar em a priori cul-tural como ca tegor ia gnoseolgica .Dessar te , conhec imen to e cul tura so atos concomitantes d esdea ra iz gnoseolgica , comple tando-se r ec iprocamen te . Da o va lor dea priori, dado no cul tura em s i , mas objetivizao com que e lacomea a existir .

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