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Rabi Yossef Yitschak Schneersohn 6º Rebe na dinastia Chabad-Lubavitch – o Rebe Anterior O homem que rompeu a cortina de ferro Narrativa detalhada da luta heróica do Rebe Anterior para a preservação do judaísmo na Rússia Por Rabino Dr. Alter Ben-Tsiyon Metzger © Editora Chabad Beit Chabad do Brasil – www.chabad.org.br

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Rabi Yossef Yitschak Schneersohn6º Rebe na dinastia Chabad-Lubavitch – o Rebe Anterior

O homem que rompeu a cortina de ferro

Narrativa detalhada da luta heróica do Rebe Anterior para a preservação do judaísmo na Rússia

Por Rabino Dr. Alter Ben-Tsiyon Metzger

© Editora ChabadBeit Chabad do Brasil – www.chabad.org.br

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O homem que rompeu a cortina de ferro

O PRESSÁGIO

No período posterior àrevolução russa, a comu-

nidade judaica religiosa foitomada de enorme temor.Cruelmente perseguida pelogoverno e, em particular pelaYevsektsia (a seção judaica dopartido comunista) numerososrabinos e educadores seabstiveram de participar detarefas comunitárias, domina-dos pelo medo das privaçõeseconômicas, encarceramento eaté morte.

Somente uma pequenaminoria se dispôs a assumir aperigosa função de liderançanesse vazio espiritual. Navanguarda de tais esforçosencontrava-se o LubavitcherRebe Anterior, Rabi YossefYitschac Schneersohn, deabençoada memória. Em 1920criou-se uma organizaçãodenominada “Vaad” - “Comi-tê” - dirigida pelo LubavitcherRebe. Algumas das atividadesdo “Vaad” eram:

1) Organização de uma juntade assessoramento jurídico.Mediante seus esforços, nume-

rosas tentativas de impedirpráticas religiosas foramafastadas. Em muitas cidades,as sinagogas haviam sidotransformadas em locais dereuniões dos trabalhadores;graças à intervenção docomitê de juristas do “Vaad”,muitas delas voltaram a seuuso original.

2) Na cidade de Homel, ocemitério judaico havia sidodesapropriado e em seu lugarfoi construido um estábulo. Játinham sido retirados duzentosataúdes. Os coveiros estavamchegando à tumba do renoma-do chassid de Chabad, RebAizic Ebstein, conhecido como“Reb Aizic Homler”, masgraças à intervenção do comi-tê de juristas, o próprioTrotsky enviou um telegramaproibindo tais atividades.

3) Em sua luta contra aproibição legal do ensinoreligioso, o “Vaad” empreen-deu uma intensa campanhaem todo o país, advogandolicença para difundir o ensinoreligioso. Apesar da forte

RABI Y.Y. SCHNEERSOHN:

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repressão religiosa, quandomuitos pais ortodoxos temiamque seus nomes fossem co-nhecidos, esse esforço culmi-nou em uma aparente conces-são: seria permitido o ensinoreligioso com a significativarestrição de que “nenhumprofessor poderia ter mais doque três alunos”.

4) O “Vaad” financiou aeducação de cinco mil crian-ças, se bem que“precisou repeliroutras dezesseis milpor falta de fundos”.

A Yevsektsia,fanaticamente anti-religiosa, começou aperceber essa crescen-te resistência. Conta-se que o notóriofuncionário da Yev-sektsia, Litvacov,queixou-se a umcompanheiro de doisincidentes diretamentevinculados aos esfor-ços do Lubavitcher Rebe. Umdos casos era o de um jovemque viajava pela Geórgia, naRússia, em muitas zonas nasquais as sinagogas, escolasreligiosas e micvaot haviamsido totalmente eliminadas, epronunciava discursos alenta-dores perante as comunidadessobre a lealdade à fé judaica. Ojovem também lia várias passa-gens da legislação russa nasquais afirmava-se que era

…HOUVE CASOSEM ZONASREMOTAS NOSQUAIS OCONSELHOESTABELECIDOPELAYEVSEKTSIA FOIDEPOSTO EOBRIGADOAAFASTAR-SE DASALDEIAS PORJOVENS QUEAFIRMAVAM TERO DIREITOJURÍDICO DEPRATICAR A FÉJUDAICA

permitida a observância religio-sa. Suas palavras tiveramprofunda repercussão e suscita-ram um ressurgimento daspráticas religiosas em muitascidades e aldeias. Em um doslugares os funcionários locaisconfundiram-no com umemissário do governo e entre-garam os fundos comunitáriospara a reconstrução do micvê.

Da mesma forma, houvecasos em zonas remo-tas nos quais o conse-lho estabelecido pelaYevsektsia foi depostoe obrigado a afastar-sedas aldeias por jovensque afirmavam ter odireito jurídico depraticar a fé judaica.

Litvacov concluiudizendo: “Após inten-sas investigações,descobrimos que oLubavitcher Rebe foi acausa desencadeantede todas essas ativida-

des, e que seus agentes parti-ciparam de todos esses inci-dentes.” Apesar dos protestosde seu companheiro de quetodas essas atividades eramlegais, Litvacov afirmou:“Estamos plenamente a par desuas ações” e concluiu irrita-do: “Nós o arrancaremos desuas raizes! Já começamos areunir as provas necessáriaspara levar a cabo essa tarefa.”

Esse evento ocorreu duas

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semanas antes de Purim.Apesar de informado, o Rebecontinuou desenvolvendoesforços que incluíram até acondenação pública de seusduros adversários, segundodescreve o seguinte relato dareunião de Purim de 5697(1927) narrado por um chas-sid, Rabino E. C. Althaus:

Aquele foi um Purimúnico, totalmente distinto dosoutros. O Rebe (Rabi YossefYitschac Schneersohn, deabençoada memória) falouabertamente, com firmeza eintensidade. Soluçando, orosto enrubecido pela emo-ção, sua voz denotava um tomde ira jamais demonstrado.Fomos testemunhas de umaautêntica “efusão da alma”.

No decorrer da noite,durante o banquete de Purim,o Rebe se pôs de pé abrupta-mente, arrancou a roupa quevestia para mostrar seu cora-ção, e golpeou violentamenteo peito despido com o punho.Chamou-me pelo nome paraque me aproximasse, e apres-sei-me em fazê-lo. Logo disse:“No ano passado pedi quevocê escrevesse com veemên-cia, mas você não me deuouvidos, e por isso ocorreramtantos sofrimentos durantetodo o ano. Agora, ordenoque escreva a todas as cidadese aldeias as seguintes palavras:‘Tínhamos um Rebe e ele

deixou seu filho para nosguiar e este ordenou queescrevamos em seu nome quetodo aquele que entregar seusfilhos à escola da Yevsektsia(escolas judaicas dirigidas pelafanática seção judaica dopartido comunista) será dura-mente castigado pelo Céu.’Você escreverá? Note bem oque lhe digo!”

O Rebe repetiu essas pala-vras algumas vezes, enquantogolpeava seu coração. Voltoua chamar-me e, com o rostoradiante e um valoroso sorri-so, afirmou: “Não tenha penaao ver o corpo consumido.Preocupe-se unicamente emproteger a cabeça.”

Os chassidim estavamextremamente atemorizadospelo aberto desafio do Rebe àYevsektsia. Um dos maisvelhos, incapaz de se conter,exclamou: “Rebe, não aguen-tamos escutar tais palavras.Necessitamos um Rebe decarne e osso”. O Rebe respon-deu: “Devemos desafiá-los aomodo de Nicolai.”

Essas palavras nos deixa-ram perplexos, e não fomoscapazes de entender a estra-nha frase. O Rebe percebeunossa confusão e explicou:“Quando jovem, Nicolai I foienviado por seu pai, o CzarPaulo, para dirigir manobras,visando provar sua capacidadede soldado. Em sua adoles-

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cência, já havia recebidotreinamento militar e desem-penhou-se de forma destacadanestes jogos bélicos, em todosos aspectos quanto ao uso dasarmas e estratégias. Após afeliz conclusão das manobrase estimulado pelo sucesso,Nicolai selou com seu anel umdecreto no qual outorgavagenerosos donativos aosoficiais e soldados que haviamparticipado dos exercícios aseu lado. Ele tomou estadecisão sem previa-mente consultar seupai nem tampouco otesoureiro real.Quando o czar intei-rou-se do sucedidosentiu-se orgulhosopelos talentos milita-res de seu filho, masenfureceu-se diantedo gasto exorbitante,muito além da capa-cidade pressuposta de suatesouraria. Ordenou a Nicolaique se apresentasse ao palácioe expressou sua satisfaçãopelo talento bélico que estehavia demonstrado durante asmanobras. Não obstante,como castigo por sua ousadiaem designar fundos sem antesconsultá-lo, o príncipe foibanido da capital por doisanos inteiros.”

Quando o Rebe concluiu,sentimo-nos ainda mais toma-dos pela apreensão e temor.

Era-nos duplamente difícilescutar tais coisas: primeira-mente em razão dos terríveisacontecimentos que predizia,e também por termos plenaconsciência de que haviaespiões entre nós. Mas o Rebeencarou-os diretamente, ecom provocadora valentiaexclamou: “Yimach shemam -que seus nomes sejam oblite-rados da face da Terra! Sei queestão aqui; não tenho medo.”Olhamos para os intrusos que

nos eram conhecidos,e seus rostos ruboriza-ram-se, o que aumen-tou mais ainda nossapreocupação pelobem-estar do Rebe.

Incapaz de reprimir-me, e temendo pela suasegurança, recorri à mãedo Rebe, a RebetsinShterna Sara, para pedir-lhe que exercesse

influência sobre seu filho.Entrei em seu quarto e conteitudo o que havia acontecido.Ela correu ao salão e os chassi-dim sentiram-se aliviados ao vê-la, pois compreenderam qualera seu propósito e rapidamen-te abriram caminho para quepudesse aproximar-se do filho.

Antes que ela falasse, o Rebevoltou-se a ela e com respeitosadeferência suplicou: “Mãe, porfavor, retorne a seu quarto.Recite Tehilim e chore quandodirigir-se a D-us, pois isto

LOGOOCORREU OTEMIDOACONTECI-MENTO E OLUBAVITCHERREBE FOIDETIDO PORCAUSA DESUASATIVIDADES

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ajudará.” Ao pronunciar estaspalavras, lágrimas correram porsua face e a Rebetsin tambémcomeçou a chorar. Permanece-ram assim, de pé, chorando,juntos um frente ao outro, emsilêncio, sem nada pronunciar.Esta cena comoveu profunda-mente os chassidim, e lágrimasjorravam de muitos olhos. Apósesses terríveis momentos, oRebe disse: “Não faço nada porminha própria vontade; tudo foime transmitido por meu pai.”

O desafio aberto implícito nahistória de Nicolai, e o confron-to direto com os agentes,despertaram grande preocupa-ção; os chassidim estavamperturbados. Viam o futuro comimensa apreensão. Tambémsentiam-se aflitos ao ouvir asobservações dirigidas pelo Rebeao chassid chamado Zalman

sobre o cuidado que devia terem proteger as crianças dasfalsidades do sistema educativoda Yevsektsia.

“Zalman” - disse o Rebe -“se fizessem uma grandefogueira e o pusessem dianteda opção de entregar seusfilhos a estas escolas oulançar-se às chamas, sabe oque deveria fazer? Lançar-se aofogo para impedir que seusfilhos fossem entregues àque-las escolas!”

O Rebe falou desse modovibrante toda a noite atédesmaiar. Foi retirado da salae voltou a si após algunsesforços. Aguardamos seuretorno para recitar a Bênçãode Graças após a Refeição…

Logo ocorreu o temido aconteci-mento e o Lubavitcher Rebe foi detidopor causa de suas atividades.

Adata: terça-feira, 14 deSivan, 5687 (14 de junho

de 1927). A hora: já passava dameia noite, logo após o Rebeter concluído suas audiênciasparticulares conhecidas como“Yechidut”. O Rebe tinha ocostume de concedê-las trêsvezes por semana: aos domin-gos, terças e quintas-feiras. Asentrevistas realizavam-se entre19h e 22h, apesar de que em

geral prolongavam-se uma ouduas horas mais, especialmentenos meses de verão, em razãodos numerosos visitantes. Essassessões estendiam-se até23h30.

A seguir, o Rebe pronuncia-va a oração de Arvit comminyan que se reunia em suacasa três vezes ao dia para asorações coletivas. O Rebeestava cansado e exausto por

A DETENÇÃO

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causa de suas tarefas, e tam-bém profundamente preocu-pado por seu recente confron-to com o Rabino-Mor deLeningrado, em virtude daoposição do Rebe quanto àreunião geral planejada pelosdirigentes comunitários daque-la cidade.

Judeus anti-religiosos quetinham a maléfica intenção deenterrar o judaísmo tradicio-nal, haviam programado essareunião e convencido o Rabi-no-Mor de Leningrado que osdefendesse, ficando do seulado, tramando falsas insinua-ções que levaram ao conflitopessoal.

Fatigado, o Rebe lavou asmãos da maneira tradicionalantes do jantar que comparti-lharia com os membros de suafamília. Uns vinte minutosdepois a campainha soouinsistentemente. A porta seabriu e dois homens invadi-ram a casa exclamando:

“Somos emissários daG.P.U. (KGB)! Quem é Schne-ersohn? Onde está?” Enquantodiziam essas palavras, umgrupo de soldados armadosentrou na habitação, aguar-dando ordens.

Sereno e resoluto, o Reberespondeu:

“Não sei qual Schneersohnvocês procuram. Quandopenetram à força na casa deuma pessoa, é de se supor

que já sabem quem vive ali;portanto, essa intenção desuscitar o temor e a ansiedadeé supérflua. Digam o que têma dizer e expressem seusdesejos concretamente. Oadministrador do edifícioconhece perfeitamente aidentidade de todas as pessoasque vivem nesta casa. Paraque causar tamanho escândaloe essa interrupção?”

“Não estou gritando” - disseo homem que servia de porta-voz. “Este é meu modo nor-mal de falar. Você pareceignorar totalmente os métodosdos representantes da G.P.U.!Mostre-nos seu apartamentopara que possamos colocaruma sentinela de acordo coma lei e, na qualidade de chefeda família, acompanhe-noscomo observador durante abusca.”

“Sim” - disse o Rebe -“estou plenamente a par deseus métodos e nada maisdesejo saber sobre eles. Ouestão totalmente equivocadosou alguém tramou uma calú-nia contra nós. Em todo caso,isto para mim não faz a menordiferença. Quanto aos emissá-rios de sua organização, nuncaos temi nem os temerei. Oencarregado do edifício pode-rá mostrar-lhes minha casa epodem revistar tudo o quequiserem de acordo com a leique promulgam.”

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Logo o Rebe acrescentouserenamente: “Estou seguro deque vocês não interromperãomeu jantar.”

As palavras do Rebe, pro-nunciadas calmamente e semdemonstrar qualquer emoção,tiveram uma poderosa reper-cussão sobre os insensíveisfuncionários e por um breveinstante hesitaram, enquantoencaravam-no surpresos. Nacasa reinava absoluto silêncio.

Entre os intrusosencontrava-se umjovem funcionáriojudeu de nomeNachmanson. Era umhomem alto, deóculos, que haviarecebido educaçãojudaica em suainfância e seu paitinha viajado aLubavitch comochassid do pai doRebe Anterior, RabiShalom DovBer Schneersohn.Sua voz autoritária rompeu osilêncio quando ordenou aoshomens armados que tomas-sem posição de guarda nasdiversas portas da casa. Todoaquele que desejasse entrarseria admitido, mas estariaproibido qualquer movimentode um quarto a outro ouqualquer comunicação verbal.Ressaltou que suas instruçõesdeviam ser seguidas estrita-mente. A seguir, voltou-se a

seu companheiro, um judeude pouca estatura e cabelosescuros de nome Lulov eafirmou que deviam começarsua missão oficial. Terminou,dirigindo-se ao Rebe paradizer-lhe que se desejavacomer tinha liberdade de fazê-lo e que não seria molestado,apesar de ter dado instruçõesa um guarda para que perma-necesse na sala com eles.

Primeiramente dirigiram-seaos dormitórios dasfilhas do Rebe, ChayaMússia e Sheina, eperguntaram a elas: “Aque organização vocêspertencem?”

Elas responderamque eram discípulas deseu pai e politicamentenão-partidárias.

“Por quê?” - pergun-tou irritadoNachmanson.

“Por quê?” - replicouSheina. “Não temos nenhumaobrigação de responder. Vocênos perguntou acerca denossas convicções políticas erespondemos. Quanto à razãode nossa posição, não temos aobrigação de responder, nemde explicar nossas preferên-cias uma vez que seu propósi-to ao entrar aqui não foiinvestigar nossas cartas, nemnossos documentos. Somoscoerentes tanto a respeito dopassado como do presente.

“SOMOSEMISSÁRIOS DAG.P.U.! QUEM ÉSCHNEERSOHN?”ENQUANTODIZIAM ESSASPALAVRAS, UMGRUPO DESOLDADOSARMADOSENTROU NAHABITAÇÃO,AGUARDANDOORDENS

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Somosdedicadas anosso pai edeclaramosisto aberta-mente,independen-te de vocêaceitar ouachar ofen-sivo.”

Nachmansonrespondeu:“Devemlevar emconsideração a autoridade e opoder da G.P.U. que represen-tamos. Ela, portanto, podeobrigar mesmo a língua silen-ciosa a falar e a confessaraquilo que está oculto dentrodo coração. Nossos interroga-dores são muito hábeis. Tudolhes é revelado voluntariamen-te ou de outras formas. Nadapode ficar oculto. Diante delestudo se dissolve e até mesmo aspedras divulgam seus segredos.”

“Toda a tragédia” - respon-deu uma das filhas do Rebe -“é que vocês pretendemconseguir tudo pela força,mediante o poder e a coação.Isso é anti-ético e repugnante,pois tem por objetivo intimi-dar as pessoas inteligentes einstruídas com o poder do punhoe o temor de uma arma.”

O Rebe sentiu-se comovidodiante da coragem de suafilha, mas temeu que

Nachmansonpensasse tambémem detê-la.

Eles permane-ceram na casadurante uma horae meia, indo dequarto em quartoe realizando umacuidadosa vistoria,mas era evidenteque esta não era asua verdadeiraintenção. A seguir,prepararam um

documento oficial e entrega-ram ao Rebe para que oassinasse. O Rebe examinou odocumento no qual afirmavamhaver realizado uma busca deconformidade com todas asregulamentações exigidas pelalei e informavam-no que serialevado como prisioneiro.

Após inteirar-se do conteú-do, o Rebe respondeu: “Nãoestou em condições de assiná-lo, já que nele afirmam que arevista fora legal, enquantoestive observando todo esteprocedimento com estupefa-ção. Quanto a deter-me, éevidente que as súplicas deminha família são inúteis, mastambém desejo que conheçamclaramente minhas opiniões.

“Para mim é claro” - conti-nuou dizendo o Rebe - “que setrata de uma entre duas possi-bilidades: ou aconteceu umgrave erro ou fui vítima de

O Rebe estudando o sagrado livro Tanya(o texto clássico fundamental de Chabad,

escrito por seu ancestral, Rabi Shneur Zalman,o fundador de Chabad-Lubavitch), logo após

sua libertação em 12 de Tamuz, 1927

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uma falsa acusação ou decalúnia que se esclarecerãoem um ou dois dias. Todosestão perfeitamente informa-dos de minha identidade e deminhas atividades. Não recorria atitudes dissimuladas. Vivoem uma das maiores cidades ehabito o centro da mesma.Tenho uma sinagoga e pro-nuncio discursos chassídicos -Maamarim - no Shabat e nasfestividades judaicas; valeressaltar que nunca me condu-zi de maneira furtiva. Creioque minha detenção seráacompanhada de publicidadealtamente desfavorável e queseria conveniente que proce-dessem com precaução atéque a verdade se esclareça, seo que desejam é realmente averdade. Todavia, se seupropósito é ocultar este erroou dissimular esta calúnia commentiras e falsidades, estoucerto que lamentarão suasações. Façam o que bementenderem, pois estou segurode que não me apanharãonuma rede de fraudes nem deimposturas. De qualquerforma não poderia concordarem assinar tal documento.”

Nachmanson interrompeubruscamente suas palavras: “AG.P.U. é responsável por suasações e não teme em absolutoas críticas. Se foi emitida aordem de detenção, acreditoque há plena autoridade para

que seja realizada. Suas pala-vras me surpreendem. Tenhaabsoluta consciência de queagora você é um prisioneiro!”

“Não compreendo” - repli-cou o Rebe - “por que vocêinterrompeu minhas palavrassem me dar a oportunidade deconcluir meu pedido.”

“O que está dizendo?!” -exclamou Nachmanson furio-so. “Se deseja pedir algo, temeste direito, que não negaria anenhum outro prisioneiro.Mas a que se devem essasfalsas acusações? Não compre-ende sua situação? Não vie-mos aqui para conversar comvocê nem para ouvir os pedi-dos de suas filhas ou dosmembros de sua família!”

Voltou-se para as filhas eordenou: “Saiam daqui! Sefalarem mais uma vez tambémvocês serão detidas”. E apon-tando o revolver, disse: “Fala-rei com este instrumento e istosilenciará suas elegantespalavras!”

Chana, a filha mais velha(casada com o RabinoShemaryáhu Gourarie) respon-deu: “Falamos na mesmalinguagem empregada portoda pessoa que se portacomo um ser humano emqualquer circunstância, e nãono idioma daqueles queacabam de surgir do lodo, quenão podem falar de formadireta e que somente são

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capazes de brandir uma armae intimidar com ameaças deencarceramento. Deixem quenosso pai permaneça aqui,pois o amamos profundamen-te e eu e minhas irmãs iremosde bom grado em seu lugar.Nosso pai está enfraquecido; omédico ordenou que nãosaísse. Traga um doutor paraexaminá-lo. Permita quepermaneça sobcustódia até quetenha alta. Afinal,vocês também sãoseres humanos;devem ter sentimen-tos e emoções e, semdúvida, o que omundo chama deética e decência”. Eirrompeu em soluços.

“Somente umailusão poderia fazer-nos crer que assúplicas e as lágrimas podemajudar” – disse o Rebe, comirônica amargura. Voltando-separa sua esposa, NechamaDina, e para as três filhas quese encontravam a seu lado,disse: “Um homem cruel erogos são dois termos contra-ditórios.”

“Por que - continuoudizendo o Rebe, dirigindo suaspalavras a Nachmanson - “nãome permite concluir? Podeprocurar atemorizar-me naprisão, ensinar-me, educar-mee racionalizar segundo sua

modalidade singular de com-portamento adequado. Porémaqui, em minha casa, é obriga-do a escutar-me. Ainda estouentre as quatro paredes domeu lar e desejo falar em suapresença, vale dizer, na pre-sença de pessoas dignas deconfiança e cujo testemunhonão pode contradizer.”

“Suas palavras estão reple-tas de veneno” - repli-cou Nachmanson. “Asleis do atual regimenão são favoráveis aseus olhos nem sãofontes de prazer paravocê. Ainda falaremosdeste assunto. Agora,diga o que quiser napresença de testemu-nhas irrefutáveis” - ecom um sorriso irônicono rosto acenou cinica-mente a seu cúmplice

Lulov e aos demais homens daG.P.U. que se encontravamnaquela sala.

“Exijo permissão paracolocar tefilin e orar” - disse oRebe - “assim como, também,que me seja enviada comidacasher de meu próprio lar.”

“Pode levar seus tefilin,livros sagrados, papel e cane-ta” - respondeu Nachmanson -“e asseguro-lhe sinceramenteque ninguém impedirá suasorações, nem suas leituras eescritos. Regressará à sua casahoje mesmo. Somente lhe serão

“EXIJOPERMISSÃOPARACOLOCARTEFILIN EORAR” – DISSEO REBE –“ASSIM COMOTAMBÉM QUEME SEJAENVIADACOMIDACASHER DEMEU PRÕPRIOLAR”

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formuladas algumasperguntas no cárceree logo terá permissãode voltar à sua casa.”

A conversachegara ao fim eagora só restavaaguardar o veículoque levaria o Rebe àtriste e notóriaprisão de Spalerna, em Lenin-grado. A estimada mãe doRebe, que se encontrava emseu quarto sem saber o queestava ocorrendo, entrourepentinamente.

O próprio Nachmanson,chefe do grupo de registro,havia dado ordens para quenão a despertassem. Mas, pelovisto, havia pressentido intuiti-vamente o que se passava elevantou-se. Ao deparar comos indesejáveis visitantes,exclamou com um toque detemor na voz:

“O que significa isto? Porque vieram? Será que farão usoda força contra pessoas ino-centes, contra meu filho quecom abnegação procura ajudaraos demais? Não!” - exclamouem voz alta - “Não permitireique o levem, meu queridofilho. Irei em seu lugar. Levem-me!” - suplicou ao chefe -“Levem-me! Não incomodemmeu filho, meu único filho,que responde pelos demais emmomentos de aflição e sofri-mento. Submeteriam uma

pessoa de tantaintegridade a umaprova tão severa? Aide mim! A prisão! Aide meu amado efalecido esposo! Estãolevando nosso filho,Yossef Yitschac, seuúnico filho que sesacrifica para fazer o

bem a outros, seu único filho,aquele que cumpre suasinstruções com verdadeiroespírito de sacrifícios… Vierambandidos… aqueles que perse-guem os inocentes. E com quefinalidade? Santos antepassa-dos! Desejam acabar com meufilho que é a chama de suasalmas! Aconteça o que aconte-cer, não permitirei que olevem.”

Nachmanson voltou-se parao Rebe e disse: “Rogo-lhe quea acalme. Leve-a a outroaposento e tranqüilize-a. Nãosou responsável por seuestado emocional. Não fize-mos ruído e não quisemoscausar-lhe comoção. Rogo-lheque a acalme.”

Naquele momento, o Rebecompreendeu que mesmo nomais profundo mal existe umafaísca do bem. Aquelas pala-vras não pareciam procederdos lábios de uma pessoadura e sanguinária. Seriapossível que esse homeminsensível também possuísseum coração e fosse capaz de

Flagrante da chegada doRebe a Riga. À direita, oRabino Mordechai Dubin.

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agir com integridade? Teriaele, também, uma ética inte-rior intuitiva que despertavadentro dele um sentimento demisericórdia? Ou, quem sabe,compreendeu de imediato queesta mulher que estava cho-rando diante dele era a reno-mada Lubavitcher RebetsinShterna Sara, conhecida porsuas obras piedosas. Talvez,por um instante, houvesse searrependido e sido tomado deremorsos pelo fato de ter-setomado um emissário da G.P.U.

O Rebe, acompanhado dosmembros de sua família,dirigiu-se com sua mãe a seuquarto e lá conversaram sobreo que não puderam falar napresença de seus futurosalgozes. O Rebe imaginavacom dificuldade a causa destefato e o responsável pelomesmo. Podia supor diversasrazões, mas aquela que lheparecia mais verossímil eraque o levavam como refém.Não podia determinar a razãoespecífica, porém esta era suaimpressão.

Sua mãe observou: “Alguémdeve ter prestado informaçõesmaldosas a seu respeito.”

O Rebe achava difícilaceitar essa explicação ereiterou que se o levavamcomo refém era por algumacausa desconhecida.

“O que devemos fazer?” -perguntou seu genro, Rabino

Gourarie.O Rebe respondeu: “Em

primeiro lugar, enviem emissá-rios aos túmulos de meu pai ede meus antepassados, osRebes anteriores de Chabad,para informar-lhes sobre asituação em que me encontro.Também peço a todos osmeus seguidores que recitemTehilim durante os primeirosdias.”

Surpresos, os membros desua família repetiram as pala-vras “durante os primeirosdias” e perguntaram-lhe o queprevia. O Rebe respondeu queisso se saberia com a ajuda deD-us. Advertiu-os para quenão se agitassem, uma vezque rapidamente correria anotícia entre todos seus segui-dores.

O Rebe continuou dizendoque os chassidim não deve-riam desviar-se de nenhumaatividade que haviam seproposto a realizar. Contudo,os membros de sua famíliadeveriam estabelecer contatosconfidenciais a fim de interce-der a seu favor, embora emprimeiro plano, o Rebe tenhaexpressado sua preocupaçãopara que fosse mantida toda arede de atividades educacio-nais. Ademais, a tarefa deangariar fundos seria tremen-damente difícil, pois todosaqueles que participavam dotrabalho de obter dinheiro,

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estariam profundamenteconsternados e atemorizadoscom a sua prisão.

“Portanto, transmitamminhas instruções pessoais nosentido de que, apesar daenorme dívida atual, devemprocurar obter mais dinheiromediante empréstimos, eenviar de imediato a ajudanecessária a cada grupoeducacional. Todos devemassumir a responsabilidade dedirigir esta atividade até queD-us me faça voltar. Estoucerto de que armaram umacomplicada rede destinada aapanhar-me, acusando-me dediversos e severos delitos.Procuraram atribuir-me assun-tos sobre os quais sou total-mente inocente e que sãocompletamente alheios a meusesforços em prol do fortaleci-mento da Torá e do judaísmo.Mas posso assegurar queestou incumbido de difundir aTorá e suas mitsvot. Vouassumir toda esta responsabili-dade e não acusarei a nin-guém, D-us não o permita. Seprenderem alguma outrapessoa e lhe disserem que issofoi resultado de denúnciaminha, previno-os desde já deque se tratará de uma mentira.Não existe poder neste mundoque me obrigue a modificarminha decisão neste sentido.

“Também parece-me evi-dente de que essa detenção

foi cuidadosamente planejada,pois jamais teriam tomadouma medida tão importantesem a suficiente preparação.Creio vislumbrar no rosto deNachmanson uma intençãoclara a respeito desta atitude.Com toda certeza pretendecausar um grande dano aopovo judeu em geral atravésde minha prisão. Todaviatenho profunda fé que o D-usde nossos santos antepassadosme libertará de suas mãos eretornarei; e prosseguirei commeus atuais esforços.

Suplico-lhes que obedeçamfielmente às minhas palavras enão cedam ao desespero. D-usnos ajudará.”

A seguir, advertiu-os,aconselhando que retirassemtoda a correspondência quehavia na casa e distribuíssemos documentos em diversoslocais seguros.

Ainda antes que o Rebeterminasse de falar entrou Lulove disse que o veículo queconduziria o Rebe aguardava eque era preciso apressar-se.

“As condições atuais destepaís determinam com seguran-ça que ninguém chegue tarde”- respondeu o Rebe. “Mesmoaqueles que hoje se ocupamdo encarceramento de outrospodem ter a certeza de quetambém a eles chegará seumomento. Não é necessárioapressar-se, já que isso não

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afetará significativamente o futurocurso dos acontecimentos.”

O Rebe pegou uma sacolacontendo numerosos artigosreligiosos e pessoais e entre-gou-a a um dos guardasarmados para que a levasse.Mas Lulov adiantou-se earrancou-a das mãos dosoldado, dizendo: “Dê-me estabolsa. Os chassidim conti-nuam sendo chassidim; meuavô carregou os pertences deseu avô (Rabi Shmuel, oquarto Lubavitcher Rebe) e eucarregarei os seus.”

O Rebe retirou abolsa das mãos deLulov e replicou: “Seuavô era um chassid,um discípulo de meuavô. Como tal, tinhao privilégio de levaros pertences até olocal que meu avôescolhesse, enquanto vocêdeseja carregar a sacola, D-usnão o permita, a um destinocontrário à minha vontade.Não posso aceitar!” Em segui-da devolveu-a ao guarda,beijou a mezuzá e saiu, segui-do pelos soldados armados.

Descendo as escadas ouviuas vozes dos membros de suafamília que pediam permissãopara acompanhá-lo até oveículo; o Rebe, então, voltou-se e viu um guarda impedin-do-lhes a passagem com seucorpo. Dirigiu-se a Lulov,

inquirindo qual a autoridadepara tal ação. Seu tom seguroobteve o efeito desejado,fazendo com que Lulov cance-lasse a ordem e permitisseque todo o grupo acompa-nhasse o Rebe.

Eram as únicas pessoas nopátio; ninguém mais estavapresente. Nachmanson procu-rou impedir que os parentessaíssem à rua, e com umamargo humor, afirmou:“Podem despedir-se aqui, deacordo com todos os rituais de

etiqueta da alta classearistocrática.” Ao que oRebe retrucou: “Écoerente que umfuncionário de catego-ria superior tão preocu-pado com as boasmaneiras, precise deum documento assina-do para comprovar que

sua visita e seu registro estãode acordo com a lei, quandoimpede que familiares acom-panhem um ente querido?”

Apesar de enfurecido,Nachmanson cedeu ao pedi-do, mas afirmou, indignado:“Aparentemente, você aindanão se adaptou à situaçãoatual. É um prisioneiro e,conseqüentemente, precisaobedecer à ordem de umfuncionário autorizado.”

“Quem é o funcionário” -perguntou o Rebe - “e qual é aordem? Você pode ver clara-

“CUIDEM-SE ESEJAM FORTES”– DISSE O REBEÀ FAMÍLIA.“D-US NOSAJUDARÁPARA QUEPOSSAMOSVOLTAR A NOSREUNIR COMSAÚDE”

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mente que, apesar de todos osseus esforços, não tenhomedo! Por favor, ceda aopedido deles.”

Nachmanson se afastou e oRebe saiu à rua, juntamentecom todos os membros de suafamília. O veículo aguardava,rodeado de soldados armados.Dentro havia um prisioneiro,evidentemente uma pessoa deprestígio, aparentando unsquarenta anos e de aspectoestrangeiro com roupas deviajante; seu rosto estavalívido e tão branco como aneve, seus olhos refletiamprofunda perplexidade e suaexpressão era de intensaansiedade e temor. Um guardaarmado o vigiava.

Ao sair para a rua, o olhardo Rebe recaiu sobre o granderelógio dependurado navitrina da relojoaria defrontesua casa. Mentalmente obser-vou que já haviam decorridoduas horas e vinte minutos

desde a meia-noite. No trans-curso deste período que haviadurado a verificação, estatinha-lhe causado dor, ansie-dade e angústia - tudo issograças a falsas acusações, emrazão de seu árduo e incansá-vel trabalho em prol do forta-lecimento do judaísmo, daTorá e suas mitsvot.

Permaneceram juntosdurante uns poucos momen-tos e logo, com a ajuda de umdos soldados, o Rebe entrouno veículo e assentou-se nolugar indicado. À sua frentesentou-se Lulov com umaarma na mão, para vigiá-lo.

“Cuidem-se e sejam fortes”- disse o Rebe à família. “D-usnos ajudará para que possa-mos voltar a nos reunir comsaúde.”

Neste momento, o veículopôs-se em movimento eempreendeu sua trajetóriarumo à tristemente lúgubreprisão de Spalerna.

Dois anos após sua libertação, o Rebe

visitou os Estados Unidos para obterapoio e fundos em benefício dos judeusrussos. Na foto vê-se seu genro maisvelho, Rabino Shemaryáhu Gourarie

(à esq. do Rebe) e outros proeminenteslíderes rabínicos na cidade de Detroit,

em abril de 1930.

A prisão de Spalerna era um mun-do estranho e irreal. O LubavitcherRebe estava perfeitamente convic-to de que era o resultado da inten-ção consciente de desmoralizar to-

talmente uma pessoa para queesta cedesse à vontade de seuscaptores. A própria arquitetura docárcere de Spalerna oprimia os pri-sioneiros pela sua solidez e o sen-

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

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tido que neles inspirava o encar-ceramento e controle absoluto.Sentinelas armados guardavamvigilância constante. Os dirigentesda prisão eram sádicos insensí-veis, sentiam-se facilmente provo-cados e eram brutais em sua ira.Entre os mais educados adminis-tradores e funcionários do cárce-re, as atividades variavam desdea formalidade impessoal até a bru-

tal crueldade aberta. Além do mais,as severas normas da prisão su-focavam os prisioneiros medianteuma rigidez compulsiva. Existia umdeliberado propósito de transmitira noção de que a vida dos presospendia por um fio. Neste mundosurrealista o Rebe abraçou a ne-cessidade de ter firmeza e enérgi-ca coragem para assegurar qual-quer esperança de sobrevivência.

Na quarta-feira 15 de Sivan(15 de junho), às seis da

manhã, o Rebe foi conduzidoà sua cela, a de número 160,na sexta divisão da prisão deSpalerna. Após uma noite deseveras torturas físicas epsicológicas, de sofrimento ede sinistras ameaças, o espíritodo Rebe permanecia sereno einquebrantável. Mostrou-sefirme e constante em reiterarseu único desejo: “Tefilin!Exijo meus tefilin!”

Em sua cela que, na realida-de, estava prevista para apenasum prisioneiro, havia outrostrês: dois judeus e um russo.Estes receberam o Rebe comgrande respeito e se encosta-ram um junto ao outro a fimde deixar-lhe mais espaço.

O vigia aproximou-se dacela, abriu a janelinha e anun-ciou: “Cento e trinta prisionei-ros foram fuzilados no sótão.”

Era impossível saber se estaafirmação era verdadeira, mastais pronunciamentos suscita-vam invariavelmente enormetemor entre os prisioneiros. Emgeral, a conduta das autorida-des da prisão tinha por objeti-vo provocar profunda ansieda-de entre os detentos, de qual-quer modo possível.

Um deles pediu água aoguarda e recebeu uma bruscaresposta: “Que necessidadevocê tem de engordar seucorpo? Faça o que fizer; seráfuzilado em um futuro próxi-mo.” Palavras desta naturezapodiam debilitar o espírito dapessoa mais heróica.

O Rebe, no entanto, pareciaalheio a tudo o que ocorria, epediu para ver um represen-tante da administração dacadeia. Após alguns minutosapareceu um dos funcionáriosde categoria superior.

A GREVE DE FOME PELOS TEFILIN

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“O que deseja?” - pergun-tou-lhe o funcionário.

“Quero meus tefilin” -respondeu o Rebe. “E tambémpeço atendimento médico. Fuiseveramente golpeado e estouferido; necessito de atendi-mento médico.”

O funcionário respondeuque um médico só estariadisponível na próxima segun-da-feira. Portanto, o Rebedeveria aguardar seis dias,apesar da dor, das equimoses edas feridas abertas,até poder receber avisita de um médico.

“E onde estãomeus tefilin?” -insistiu o Rebe.

Esqueça-se desuas preocupaçõesimaginárias. Nestaprisão você não irárecebê-los” - foi aresposta. “Nestecaso” - retrucou o Rebe “vouiniciar uma greve de fome.Não comerei nem beberei. Osprisioneiros que estão nestacela serão testemunhas domeu jejum até receber meustefilin.”

O funcionário saiu da cela eo Rebe levantou-se para rezarem voz alta e entoar a sensívelmelodia chassídica de umaprece ao estilo de Chabad.Estava de pé, sem Talit nemTefilin, no escuro cárcere deSpalerna, e entoava uma antiga

melodia de Chabad. Os doisjudeus e o russo escutavam aprece e a melodia em silencio-sa atenção.

Ao concluir sua oração, oRebe sentou-se e pronunciouum discurso chassídico deTorá (Maamar) aos prisionei-ros judeus; seus olhos, obscu-recidos diante do terror damorte, logo se iluminaramcom o esplendor da Torá.

O não-judeu também presta-va atenção. Era um homem

simples, iletrado,quase primitivo e,quando o Rebe con-cluiu, ele exclamou derepente:

“Encontrava-meem isolamento pe-nal!” Depois conti-nuou dizendo: “Erameu primeiro dia deprisão e eu desco-nhecia as normas.

Naquele momento era o únicoocupante da cela e, quandome ordenaram que fossedormir, como não estavarealmente cansado, neguei-mea fazê-lo. Sentei-me e fumeium cigarro. O guarda meobservou pelo visor e ordenouameaçadoramente que medeitasse. Neguei-me a fazê-lo,usando termos insultantes.Não havia terminado meucigarro quando repentinamen-te a porta abriu-se e o guardamandou que o seguisse.

“VOU INICIARUMA GREVE DEFOME. NÃOCOMEREI NEMBEBEREI. OSPRISIONEIROSQUE ESTÃONESTA CELASERÃOTESTEMUNHASDE MEU JEJUMATÉ RECEBERMEUS TEFILIN”

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Obedeci e descemos escadase mais escadas até chegar aocorredor do porão do edifício.O carcereiro abriu uma portae ordenou que entrasse. Entreipensando que ele viria atrás demim, mas imediatamente sentique fechava a porta da cela.

“Dei mais um passo e meencontrei num sujo e malcheiroso calabouço. O fedorera sufocante. Acendi umfósforo e pude ver que asparedes transpiravam e porelas deslizavam todo tipo decriaturas: brancas, negras,longas e grandes - todas elasde aspecto pavoroso. O lodochegava até meus calcanharese tive de permanecer de pé nacela durante toda a noite. Devez em quando tinha queespantar os imensos roedoresque me atacavam dando guin-chos horríveis, assustadores.

“Parecia-me que já haviatranscorrido um dia inteiro.Comida? Uma pessoa não temo menor desejo de comernesse lugar, nem sequer defumar; perde-se qualquervontade nessa cela pavorosa.Escutei a porta se abrindo epensei: agora vieram buscar-me para me fuzilar. Ouvi umassobio e a ordem cortante:‘Venha aqui.’ Repliquei: ‘Nãovejo nada. Como posso ir?’ Ofuncionário acendeu a luz e oque vi foi aterrador. ‘Saía’ -gritou o funcionário, e imedia-

tamente saí de lá. ‘Suba asescadas’ - foi a ordem seguin-te e pensei: ‘Graças a D-usnão morrerei fuzilado.’

“ ‘Agora’ - disse o funcioná-rio - ‘você saberá como falarcom alguém que exerce umcargo público! É proibidodirigir-se em termos insul-tantes às autoridades daprisão. Você é um prisioneiroe eu sou a autoridade. Vocêvai para a cela dormir!’ ‘Sim,Sua Excelência, dormirei’.Esbofeteou-me várias vezes,sem que pudesse compreen-der a razão. ‘Que tipo de“Excelência” sou para você?’ -perguntou-me, nervosamente.‘Você, homem vil, escravo dosrussos brancos, espião; eu odeixarei no porão por três diasseguidos, não somente as trêshoras que o prendi ali’.

“Comecei a chorar e implo-rar: ‘Você é meu pai, honradosenhor, meu amo e dono, e oobedecerei’. Golpeou-merapidamente três vezes segui-das. Os socos eram muitodolorosos; meus dentes tre-miam e o sangue borbulhavado meu nariz. Controlei-me eprocurei me manter respeitosa-mente de pé como correspon-dia fazê-lo perante uma pessoade elevado nível. Ainda recor-dava a tradição de disciplinado exército. Sou um homemvalente! Durante quatro anosprestei serviços ao meu czar.

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Lutei na guerra entre os russose os japoneses. Vi generais econheço a importância daordem e da obediência. Adisciplina é fundamental. Nãocomo os jovens atuais, tãopobremente treinados, quecantam e não fazem mais doque resmungar ‘direita-esquerda’agindo como títeres perplexos.

“ ‘Que tipo de amo sou paravocê?’ - perguntou o funcionário.‘Deve chamar-me “camarada”. Jánão há tiranos nemamos; agora somostodos camaradas.’

“ ‘Muito bem,assim será, camara-da’ - respondi; ‘jánão me dirigirei avocê daquele modo’.Voltou a acertar-meduros golpes e perguntou:‘Que tipo de “camarada” soueu para você? Esta não é aforma adequada de se dirigir aum oficial. Você deve recordarpermanentemente que é umprisioneiro e que eu sou seuoficial. Deve chamar-me“camarada-oficial”.’

“Débil e quebrado, apressei-me em seguir adiante. Queriadormir, queria fumar. Doiam-me os dentes e sentia umaprofunda dor nas costelas.Enquanto caminhava tinha umsó pensamento: a frase ‘cama-rada-oficial’. Não devia jamaisesquecê-la se não quisessesofrer mais vezes castigos

intoleráveis. ‘Que agradávelseria’ - pensei - ‘voltar a dormirno catre da minha cela…’ ”

No decorrer do interrogatórioao qual o Rebe foi submetido emSpalerna, ameaçaram-no inúme-ras vezes com o isolamentopenal. O relato do prisioneirorusso havia causado uma profun-da impressão no Rebe, mas eleprocurou obter forças, impondo-se a tarefa de redigir um discur-so chassídico de Torá (Maa-

mar). Tinha umacaneta, mas precisava depapel; utilizou-se deembalagens de cigarrospara escrever. O Rebeusou mais de cem,sobre cujos invólucrosescreveu seus pensa-mentos e impressões de

Torá.De repente a porta se abriu e,

dando um salto selvagem, oguarda dirigiu-se furiosamentecontra o Rebe, acertando-lhe umainfinidade de golpes enquanto oinsultava brutalmente em russo.

“Que tipo de trabalhoparticular está fazendo aqui? Éproibido ter uma caneta nacela”. Arrebatou-a com forçada mão do Rebe, e sem deixarde injuriá-lo, saiu da cela.

Cada vez que se distribuía acomida entre os prisioneiros, oRebe negava-se a aceitá-la, eafirmava que continuaria suagreve de fome até que lherestituíssem os tefilin. Transcor-

O REBE TINHAMAIS DE CEMCIGARROS ESOBRE OSINVÕLUCROSESCREVEU SEUSPENSAMENTOSE IMPRESSÕESDE TORÁ

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reram dois dias, a quarta e aquinta-feiras, e na quinta ànoite o Rebe foi conduzido ao

O PRIMEIRO INTERROGATÓRIO

Oprimeiro interrogatórioocorreu na quinta-feira,

às vinte e duas horas.O Rebe já cumpria dois dias

de jejum total em sinal deprotesto por haverem detidoseus tefilin. Enfermo, dolori-do, fraco e debilitado pelaviolência física que sofreu emais ainda pelo jejum quepraticava, foi conduzido aointerrogatório.

Havia três pessoas presen-tes: dois russos e o judeuLulov, de vinte e três anos deidade. O chefe dos interroga-dores era um russo com onome de Dachtriov.

O Rebe foi conduzido auma imensa sala. As paredeseram de mármore com enor-mes canos embutidos. Esteseram os célebres “muros comouvidos”, porque através delesa conversa entre o interroga-dor e o prisioneiro podia serescutada pelos agentes daG.P.U. que a transcreviam emsalas vizinhas.

Quando o Rebe entrou,voltou-se aos interrogadores eobservou: “É a primeira vezque entro em uma sala sem

que ninguém se ponha de pé!”“Sabe onde se encontra?” -

perguntaram-lhe seus interro-gadores.

“Sem dúvida” - respondeuo Rebe - “tenho plena consci-ência de que me encontro emum lugar onde não é obrigató-rio ter uma mezuzá. Há,vários lugares dessa naturezaque não requerem uma mezu-zá; por exemplo, um estábuloou um banheiro…”

Os interrogadores e, emparticular, o judeu, Lulov,trataram o Rebe de maneirarude e depreciativa. Zomba-ram e escarneceram nervosa-mente dele.

“Basta de zombarias” -disse-lhes o Rebe. “E devol-vam o que me pertence. Vocêsnão têm o direito de acusar-me.”

“Silêncio!” - exclamouLulov, irado. Estendeu suamão e disse: “Vê este braçoque está à sua frente? Desdeos meus catorze anos foidedicado à sagrada tarefa deaniquilar àqueles que seassemelham a você e que seopõem ao progresso. Destrui-

seu primeiro interrogatório, quedurou várias horas. Espancadoe debilitado retornou a cela.

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remos a todos, Você pede talite tefilin? Nós os jogaremos nolixo!”

O Rebe golpeou a mesacom o punho e exclamou: “Vilcriatura!”

Seus rostos assumiramentão um ar sombrio e ofuncionário de categoriasuperior começou a ler diver-sas acusações, e a enumerá-lasdetalhadamente:• O prisioneiro é acusado de

fomentar as forças reacionári-as na U.R.S.S.;

• É acusado de ser contra-revolucionário;

• Os judeus da U.R.S.S. consi-deram-no sua mais altaautoridade religiosa e exerceconsiderável influência sobreeles;

• Exerce também influênciasobre os judeus soviéticosintelectuais, assim comosobre a burguesia dos EUA;

• É o chefe daqueles que serebelam contra o progresso;

• Temos plena consciência deque sua influência se alastrasobre toda a Rússia atravésde sua rede educacional,assim como mediante outrasinstituições religiosas;

• Mantém correspondênciaassídua com países estrangei-ros e recebe milhares decartas de todas as partes domundo;

• Tem estabelecido comunica-ções secretas por intermédio

de mensageiros que viajam aoutros países, visando ofortalecimento da religião naRússia com vistas de suscitar,assim, conflitos contra ogoverno soviético.

Ao terminar, o funcionáriopôs sobre a mesa um grandemaço de cartas e disse: “Estepacote revela sua face verda-deira. Estas cartas têm umestranho conteúdo e suspeito-samente místico. Quais sãoseus vínculos contra-revoluci-onários com o ProfessorBartichenco?”

O Rebe, sem se sentiratemorizado nem confuso,respondeu: “Não negarei queos judeus me consideram umlíder, mas não sou culpável denenhum delito. Não imponhonem afirmo minha autoridadesobre ninguém e jamais aempreguei de modo algumcontra a União Soviética.

“A acusação no sentido deque domino e imponho minhaautoridade sobre os judeus étotalmente incorreta. A coaçãoe a força são realmente estra-nhas às tradições da Chassi-dut. O significado de lideran-ça, na perspectiva chassídica,é procurar atingir a perfeiçãoética e a espiritualidade eleva-da, a fim de que os demaispossam aprender a imitá-las eseguir as mesmas trilhas. Istonão pode ser conseguidoatravés da força ou do poder,

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mas apenas através de umavontade virtuosa e livre. OsChassidim aprendem, porvontade própria, de seu Rebee dirigente.

“Minha responsabilidade éa de ocupar-me em permitirque todo aquele que desejapermanecer fiel ao judaísmoconsiga este objetivo. Nãoobrigo nem imponho demodo algum. Tudo isso seexerce por vontade própria eem circunstâncias de plenaliberdade. Que crime hánisso?”

No curso de sua defesa, oRebe se estendeu sobre anatureza da Chassidut; osinterrogadores russos pedirama Lulov que lhes explicasse.

O ciclo da história serepetia.

Cento e trinta anos antes,seu antepassado, o Alter Rebe(Rabi Shneur Zalman de Liadi)tivera que esclarecer o concei-to de Chassidut perante oCzar Paulo. Oitenta e seteanos antes, o Tsêmach Tsêdec(Rabi Menachem Mendel,terceiro lubavitcher Rebe) vira-se obrigado a explicar aChassidut aos oficiais do CzarNicolai. E agora, seu descen-dente devia expor os pensa-mentos de Chassidut diantedos membros da G.P.U.

O Rebe continuou dizendo:“Nunca arrecadei impostos deninguém. Afirmei que os

judeus são obrigados a estudarTorá. E quando cumprem estepreceito, automaticamentecriam escolas para as criançase Yeshivot para os jovens. Nãoexiste proibição alguma,segundo a lei soviética, contraos chadarim - escolas hebrai-cas primárias tradicionais -nem contra as yeshivot.Carlinco, o fiscal-chefe-do-Estado da União Soviéticadeclarou explicitamente:‘Jamais se promulgou uma leioficial na União Soviéticacontra as instituições deensino religioso.’ Em vistadisso, a quem deve-se obede-cer: a Carlinco ou a Lulov?

“Nenhum de meus esforçose declarações públicas” -continuou dizendo o Rebe -“visam desafiar a lei soviética.Se minhas palavras em relaçãoao estudo de Torá suscitamuma dedicada reação, e senossos correligionários dosEstados Unidos que enviamdinheiro para ajudar a seusparentes destinam modestassomas para o estudo de Toráe para as necessidades educa-cionais dos filhos de seusparentes, isto não representauma ameaça à União Soviéti-ca. Ao contrário; deste modo,entra ajuda do exterior efortalece-se a economia!

“No que se refere à corres-pondência mencionada, oprofessor Bartichenco havia

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empreendido estudos sobre omisticismo judaico. Opinavaque de algum modo o símbo-lo do Maguên David expressa-va profundos conceitos caba-lísticos, e que o domíniodesses conhecimentos poderiaconstituir fonte de grandepoder.

“Há quatro anos, em Sucotde 5684 (1924), Bartichencodirigiu-se a mim por meconsiderar uma autoridade naCabalá, e pediu-me que lherevelasse o significado esotéri-co do Maguên David. Procureiconvencê-lo de que havia sidoobjeto de uma ilusão, uma vezque em Chassidut não hánada que permita supor que oMaguên David possua gran-des poderes inerentes. Apesardisso, o professor insistiu emenviar-me numerosas cartas,suplicando-me que lhe reve-lasse o significado oculto doMaguên David. Esta é aexplicação cabal de minhacorrespondência com o pro-fessor Bartichenco.

“Escute-me, Lulov” - disse oRebe com enfado - “queremme fazer objeto de uma novaacusação ao estilo do proces-so Beilis. Você se lembraquando o Czar Nicolai contra-tou professores e eruditos afim de urdir uma falsa históriade ritos sangüinários contra osjudeus, e foi desprestigiado?Você também se verá frustrado

em suas intenções. Estou a pardos métodos inescrupulososque você e seus cúmplicesempregam, quando desejamencarcerar um professorjudeu: colocam contrabandoou uísque ilegal entre seusbens, a fim de poder prendê-lo e enviá-lo a zonas desertas.Vocês se propõem também adesonrar-me mediante acusa-ções fictícias e falsas que, defato, não têm nenhum funda-mento? Querem que eu sejaobjeto de mesquinhas falsida-des? Não o conseguirão,porque as acusações sãototalmente infundadas.

“Minhas palavras e minhasações foram sempre abertas eclaras. Faz três anos, em 5684(1924), escrevi uma carta atodos os judeus dos EstadosUnidos, exortando-os energi-camente a apoiar o estabeleci-mento agrícola judaico naUnião Soviética. Vocês meprendem por considerarem-me inimigo dos judeus e doEstado. Isso é totalmenteerrôneo. Apesar de estarmosdivididos por grandes discre-pâncias, apóio todo esforçocriativo. Minha carta aosEstados Unidos respalda estaafirmação.

“Não me façam objeto defalsas acusações. Não atuode maneira encoberta, massim de forma aberta e diantedos olhos de todos. Não

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exerço atividades contra a leisoviética.”

“É verdade” - observou orusso Dichtriov, que presidia ocomitê de interrogação.“Estamos plenamente cientesde sua atitude positiva comrelação ao estabelecimentoagrícola, assim como de suacarta aos Estados Unidos, etomamos nota dessas açõescom reconhecimento.”

Fazendo pouco caso dessediálogo, Lulov prosseguiu seuinterrogatório ainda de formarude e ofensiva. Quando oRebe voltou a pedir seustefilin, Lulov não respondeu,mas voltou a utilizar termosofensivos, apoiado por seuscolegas.

“Retire seu talit catanimediatamente! Retire-o!Abandone essa sua tola obser-vância!”

“Se me obrigarem” - res-pondeu o Rebe - “a retirar meutalit catan, negar-me-ei aresponder suas perguntas. Ese vocês propõem consegui-loatravés do uso dos punhos e dasarmas, eu os desafio a fazê-lo!”

Esta resposta aplacou astentativas nesse sentido.

Naquele instante entrouNachmanson e, ao ver o Rebe,rompeu em estrondosasgargalhadas e disse: “Lulov,sabe que meus pais nãopodiam ter filhos e somentedepois que meu pai foi visitar

o Rebe de Lubavitch, nasceu-lhes um filho? Esse filho soueu, de pé na (à) sua frente.”As paredes estremeceram comas risadas ruidosas e vulgaresdos funcionários ao ouvirem aanedota.

Nesse momento, o Rebeperguntou se podia relataruma história e, sem sequeraguardar permissão para fazê-lo, começou: “Certa vez umestudioso ateu foi ver o Tsê-mach Tsêdec…”

Nachmanson interrompeupara dizer: “Provavelmente umapessoa como eu, que não crê.”

“Não” - respondeu o Rebe“tratava-se de uma pessoaversada em conhecimentosjudaicos enquanto você é umsimples ignorante…”

“…Esta pessoa” - prosse-guiu o Rebe sua narração -“perguntou por que na Megui-lá de Ester, a palavra ‘yehu-dim’ (judeus) escreve-se coma letra yud repetida, tratando-se do recado que Mordechaienviou à Ester através de ummensageiro, no qual lheinformava acerca do terríveldecreto sobre a sorte dosjudeus do império persa,enquanto no versículo posteri-or, no qual se descreve asalvação dos judeus (“Para osjudeus havia luz…”), a palavrayehudim se escreve somentecom uma letra yud.

“O Tsêmach Tsêdec respon-

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deu: ‘A repetição da letra yudcorresponde às duas tendênci-as: a virtuosae a má. Tantonas depen-dências máscomo nasvirtuosasexistem as dez(valor numéri-co da letrayud) qualida-des da alma.Há dois tiposde judeus: osjudeus nosquais predomina a tendênciavirtuosa e os que por certotempo sucumbiram à influên-cia da tendência negativa. Odecreto de Haman não estavadirigido exclusivamente contraos judeus tementes a D-us, osque seguiam a tendênciavirtuosa; Haman desejavadestruir também os que nãoeram religiosos, os quaisagiram de acordo com a mátendência. Eles também esta-vam incluídos em seu decre-to.’

“O visitante então pergun-tou: ‘Num versículo posterior(“Os judeus de Shushanreuniram-se”) voltamos aencontrar a ortografia com aletra yud repetida.’ O TsêmachTsêdec replicou: ‘Isso é por-que os judeus de Shushan, aoencontrarem-se no centro detudo o que ocorria, percebe-

ram o milagre de Purim esentiram-se profundamente

comovidos;tanto, quemesmo osjudeus nãopraticantesretornaram aocaminho daTorá e dojudaísmo.’ OTsêmachTsêdec concluiudo seguintemodo: ‘Omesmo ocorre-

rá com você; quando sofrer deuma grande enfermidade,você também mudará.’ Suce-deu que pouco depois estehomem contraiu uma febreque durou três meses. Abala-do por seu sofrimento, odescrente se arrependeu eretornou ao judaísmo.”

O Rebe concluiu sua narra-tiva e acrescentou: “Quandovocê sofrer, também mudará.”

O interrogatório terminoumuito tarde naquela noite; aofinalizar, Lulov, que era gago,exclamou raivosamente:“M-m-mas dentro de 24 horasvocê será fuzilado.” Não setratava de uma mera ameaça;a situação realmente era muitograve. Um destacado comunis-ta que participou de umatentativa de libertar o Rebe fezuma observação na sexta-feiradaquela semana, a uma das

CERTA VEZ UM ESTUDIO-SO ATEU FOI VER OTSÊMACH TSÊDEC...”NACHMANSONINTERROMPEU PARADIZER: “PROVAVELMENTEUMA PESSOA COMO EU,QUE NÃO CRÊ.” “NÃO” –RESPONDEU O REBE –“TRATAVA-SE DE UMAPESSOA VERSADA EMCONHECIMENTOSJUDAICOS; E VOCÊ É UMSIMPLES IGNORANTE...”

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filhas do Rebe: “Reze para queseu pai continue vivo.”

O Rebe regressou do inter-rogatório angustiado, comuma dor agonizante Conti-nuou com sua greve de fomeaté sexta-feira à tarde, quandolhe foram devolvidos os tefiline seus livros sagrados.

Um membro judeu daG.P.U. os trouxe. O Rebe lhedisse: “Não comerei a comidada prisão, a não ser unicamen-te aquela que me seja trazidade casa. Quanto à água, maistarde a tomarei, mesmo sendo ada prisão, mas unicamente soba condição de que seja aqueci-da em uma vasilha empregadasomente para água.”

O funcionário da G.P.U.respondeu enfurecido: “Você sepropõe a dar uma supervisão decashrut na cozinha da prisão?”

O Rebe respondeu: “Não souum rabino encarregado desupervisão de cashrut!” - eimediatamente colocou ostefilin.

A primeirarefeição deShabat do Rebena prisãoconsistiu deuma chalá eágua fria datorneira. Recitouo kidush epronunciou abênção do pão em voz alta,entoando uma melodia especial

de Chabad.A mudança de atitude por

parte do vigia manifestou-sede várias formas. Por exem-plo: não havia relógio na celae, por isso, o Rebe não sabia,com exatidão, a hora em quedevia pronunciar as oraçõesnoturnas (Arvit) que só podi-am ser iniciadas, nos dias maiscompridos do verão, aproxi-madamente às vinte e trêshoras. O Rebe pediu ao guardaque a essa hora batesse àporta, a fim de indicar que jáchegara o momento da reza,no qual foi atendido pronta-mente.

Ao término do primeiroShabat, o carcereiro deu aoRebe dois fósforos para quepudesse pronunciar a bênçãode havdalá - cerimônia quemarca o encerramento doShabat - diante da chama. Emseguida, o Rebe recitou aoração tradicional para o fimdo Shabat: “Veyiten lechá…”

(“Que D-us teconceda…”)com profundojúbilo interior.

Um enormeesforço mundialdestinado aobter a liberta-ção do Luba-vitcher Rebehavia começado

a produzir frutos. Tal atividadeviu-se inicialmente coroada

AO TÉRMINO DOPRIMEIRO SHABAT,O CARCEREIRO DEU AOREBE DOIS FÓSFOROSPARA QUE PUDESSEPRONUNCIAR A BÊNÇÃODE HAVDALÁ DIANTE DACHAMA – CERIMÔNIAQUE MARCA OENCERRAMENTO DOSHABAT

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com certa dose de êxito, pelofato de que a sentença demorte prevista foi reduzida auma pena de dez anos de

trabalhos forçados que no finaltambém se reduziu a um decretode exílio por três anos na distantecidade de Costroma.

Na tarde de domingo, 3 deTamuz de 5687 (1927),

após dezenove dias de prisãoem Spalerna, Rabi YossefYitschac Schneersohn, deabençoada memória, foichamado ao escritório daprisão e informaram-no quelhe haviam concedido permis-são para regressar à sua casa,onde poderia permanecersomente durante seis horas.Nessa mesma noite, às vintehoras, deveria tomar um tremrumo a Costroma, sobre o RioVolga, uma remota cidade dointerior da Rússia, onde per-maneceria exilado durante umperíodo de três anos. O Rebedeveria estar na estação antes

das vinte horas, e se perdesseesse trem, passaria a noite naprisão.

Em uma de suas cartas (19de Iyar de 5688, 9 de maio de1928), o Rebe relata o seguinte:

Antes de regressar à casa,um funcionário da G.P.U. meadvertiu:a) Somente poderá permane-

cer em sua residência seishoras e antes das vinte horas,deverá sair da cidade;

b) Se chegar tarde, mesmoque seja uns poucos minutos,deverá regressar à prisão;

c) Às vinte horas em pontotomará um trem rumo àcidade de exílio, Costroma;

d) No caso de chegar tarde à

O EXíLIO EM COSTROMA

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

O Rebe assumiu a postura firme de não sedeixar intimidar por seus captores. Certa

vez, ao negar-se a responder umapergunta, foi submetido ao isolamento

penal por 24 horas. O chão do calabouçoestava repleto de lama. Pelo chão e

paredes deslizavam ratazanas e outrosparasitas, vermes e insetos imundos.

Contudo, em absoluto não modificou suadeterminação. Não cedeu ao temor, nemconsiderou que seus algozes exerciam

qualquer poder sobre ele. Com o passar dotempo, começou a ocorrer uma sutil

mudança. O primeiro indício foi a melhoradas condições na própria prisão.

Pouco depois o guarda da cela lhe trouxetrês chalot - pães sabáticos inteiros para as

refeições do Shabat - enviados especial-mente de sua casa. Tratava-se de um fatopouco comum. Em circunstâncias normais,

o pão ou qualquer outro alimento que setrazia para um prisioneiro era cortado em

pequenos pedaços como medida deprecaução contra a introdução na prisão de

objetos proibidos. Entretanto, o Rebe

recebeu as chalot inteiras; este fatorepresentava uma política de condescen-

dência para com ele. A partir dessemomento, o guarda mostrou uma atitude

muito mais reverente.

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estação, deverá regressar àprisão e, em caso de nãofazê-lo por seus própriosmeios, será levado à força;

e) Deverá viajar diretamente aCostroma sem deter-se emnenhum ponto do trajeto.Sua chegada ali está previstapara amanhã à noite (segun-da-feira, 4 de Tamuz);

f) Na terça-feira de manhãdeverá apresentar-se aochefe da G.P.U. na cidade deCostroma. Ficará sob suacustódia durante um períodode três anos, até o dia 15 dejunho de 1930.

g) Deverá assinar esse docu-mento, no qual se indica queem 4 de julho de 1927 deve-rá apresentar-se diante daG.P.U. da cidade de Costro-ma.

O Rebe chegou em casanum momento em que suafamília temia que nunca maisvoltasse a vê-lo, e entrou emseu quarto para fazer umaoração em agradecimento aD-us por haver-lhe salvado avida. A prece chegou a serouvida pelos chassidim queestavam fora. Relataram quãoprofundamente comovidos sesentiram, e que até um cora-ção de pedra teria se derretidoao escutar esta comoventeoração a D-us.

Todos os recintos da casarapidamente ficaram repletos deadeptos, tanto que era pratica-

mente impossível mover-se. Àsdezenove horas o Rebe come-çou a preparar-se para sair.

A família despediu-se dele.Acompanharam-no em suaviagem a Costroma sua filha,Chaya Mússia (A Rebetsin -esposa do atual Rebe), assimcomo o chassid, Reb Elye ChayimAlthaus, de abençoada memória,fiel confidente do Rebe.

Um numeroso grupo depessoas havia se reunido naestação. Muitos desejavamcomprar passagens para poderacompanhar o Rebe no trempelo menos durante parte dotrajeto, mas a G.P.U. haviaproibido a venda de passa-gens para este trem.

O Rebe chegou à estaçãocercado por uma rígida vigi-lância: três membros daPolícia Secreta (“Tcheca”), aPolícia Civil, soldados e funci-onários do Departamento deInvestigação Civil.

Já na estação, antes desubir no trem, o Rebe voltou-se à multidão ali reunida epronunciou estas inspiradoraspalavras, irradiante de lumino-sa santidade, da eternidade dopovo de Israel.

“Elevemos nossos lábiosem preces a D-us: Yehi Ha-shem Elokênu imánu caasherhayá im avotênu, al yaazvênuveal yitshênu.

“Esta oração pode serinterpretada como um pedido:

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‘Que D-us esteja junto a nósassim como esteve junto anossos antepassados e que nãonos deixe nem nos abandone.’Mas também pode ser interpre-tada como uma enérgicaafirmação e bênção no sentidode ‘que D-us estará junto a nóspara nos prestar apoio e ajuda,assim como protegeu nossosantepassados’, mesmo quenosso mérito não seja compa-rável ao deles, que tiveram desuportar auto-sacrifícios emprol da Torá e das mitsvot. Naspalavras de um dosmeus veneradosantepassados emresposta a umdecreto governa-mental relativo aorabinato: ‘Nãosaímos da Terra deIsrael por vontadeprópria, nem retor-naremos à ela por nossaspróprias capacidades. D-us,nosso Pai e Rei, nos exilou denossa Terra e enviou-nos paraa Diáspora. Ele, bendito seja,nos redimirá, reunirá os disper-sos dos quatro cantos da Terrae nos conduzirá de volta, comfirmeza e orgulho, por intermé-dio de Mashiach, nosso justoRedentor. E que isto sucedabrevemente, em nossos dias.Não obstante, todas as naçõesdo mundo devem ficar cientesdo seguinte fato: somentenossos corpos foram enviados

para o exílio e subjugados pornações estrangeiras; porémnossas almas não foram entre-gues ao cativeiro e ao domínioalheio. Somos obrigados aproclamar abertamente eperante todos, que toda ques-tão que afete a religião judaica,Torá, mitsvot e costumesjudaicos, não está sujeita àcoerção. Ninguém pode nosimpor sua crença, nem obrigar-nos a conduzirmo-nos demodo contrário à nossa fé.Nossa solene e sagrada tarefa é

exclamar e afirmarcom plena convicção,antiga, resoluta esagrada e com aimutabilidade do povojudeu, assim comocom a profundacoragem espiritualjudaica, derivada doheróico auto-sacrifício

de nossos antepassados nosúltimos milhares de anos: “Nãotocais em Meu ungido, nemprocurais fazer mal aos Meusprofetas” (Tehilim 105:15).’

“As palavras que acabo decitar foram pronunciadas porum ativo e corajoso líderchassídico. Não possuímos aínfima coragem e firmezaautêntica para protestar peran-te o mundo todo, a fim deque sejam anulados os atosperversos de algumas cente-nas de jovens judeus, ignoran-tes e malvados, que conspiram

“ …QUE D-USESTARÁ JUNTODE NÓS, PARANOS PRESTARAPOIO E AJUDA,ASSIM COMOPROTEGEUNOSSOS ANTE-PASSADOS…”

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contra o judaísmo e a fé donosso povo.

“Sabe-se que a lei nospermite estudar Torá e cum-prir mitsvot, e unicamente porcausa dos esforços de falsosdelatores que tramam acusa-ções totalmente incorretas, osjudeus religiosos são levadosàs prisões e aos campos detrabalhos forçados.

“Esta é a nossa súplica aD-us: ‘Não nos esqueça nemnos abandone.’ Que D-us nosdê forças adequadas para quenão vacilemos nem cedamosante o sofrimento físico. Aocontrário, que Ele nos permitaaceitar esta dor com júbilo.Cada medida de angústia quenos é infligida por apoiar arede educacional de chadarimpara a aprendizagem de Toráe o cumprimento de mitsvot,deve aumentar nosso vigor nofortalecimento do judaísmo.

“Devemos recordar que aprisão e os trabalhos forçadospertencem somente a estemundo físico e são de breveduração, enquanto a Torá, asmitsvot e o povo de Israel sãoeternos, “Shalom! Que D-uslhes dê paz. Cuidem-se bem,física e espiritualmente. Espe-ro e rogo a D-us que essessofrimentos temporáriosevoquem e inspirem em nós,com a ajuda de D-us, forçasrenovadoras em vista dofortalecimento do judaísmo

eterno. E que se concretizeconosco o versículo: ‘QueD-us esteja junto a nós, assimcomo esteve junto aos nossosantepassados, e que não nosdeixe nem nos abandone’ eque haja luz nos lares de todoo povo judeu.”

O trem começou a mover-se. Após um breve trajetodeteve-se; logo pôs-se nova-mente em movimento e viajousem parar durante as 24 horasseguintes até chegar a Costro-ma. Um chassid de Lubavitchjá havia preparado alojamentopara o Rebe na casa doshochêt (abatedor ritual) dacidade.

O trem chegou tarde danoite. Segundo as instruçõesrecebidas, o Rebe devia apre-sentar-se às autoridades locaisassim que chegasse. Contudo,decidiu aguardar até o diaseguinte para fazê-lo. Na

O Rebefotografado

na suacabine donavio S.S.

Grottingholm,na chegadaao porto deNova Yorkna terça-feira, 9 de

Adar II,5700 (19 de

março de1940)

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terça-feira, 5 de Tamuz,apresentou-se diante dasautoridades daG.P.U. deCostroma. Oadministradorda “Tcheca”local (políciasecreta) rece-beu o Rebe deforma sombriae antagônica.

Após preen-cher os diver-sos formulári-os, o funcionário anunciou:

“Você é um prisioneiro noexílio. É um delinqüente aquem se castiga pelos delitoscometidos contra o governosoviético, e ordenamos quepermaneça nesta cidade. Nãopoderá sair dos limites delasem autorização especial. Sedesejar mudar de alojamento,deve informar à G.P.U. comantecedência. E pode estarseguro de que a polícia estará

a par de todos seus movimen-tos e de tudo o que ocorrer

em sua casa.Também tem aobrigação deapresentar-sesemanalmenteao funcionáriocorrespondenteda G.P.U.”

Costroma erauma cidadegrande, ondepoucos judeushabitavam,

apenas uma centena deles,simples e iletrados. Havia umaúnica sinagoga, e o Rebe diri-giu-se para lá a fim de rezar. Nahora em que fazia suas oraçõesficava repleta de judeus, muitosdeles que não transpunham oumbral de uma sinagoga hámuitos anos. Também iam ver eescutar as devotadas preces doRebe. Costroma, a remotacidade do exílio, de repenteganhou um Rebe!

“SABE-SE QUE A LEI NOSPERMITE ESTUDAR TORÁE CUMPRIR MITSVOT; E,UNICAMENTE POR CAUSADOS ESFORÇOS DE FALSOSDELATORES QUETRAMAM ACUSAÇÕESTOTALMENTEINCORRETAS, OS JUDEUSRELIGIOSOS SÃO LEVADOSÀS PRISÕES E AOS CAMPOSDE TRABALHOSFORÇADOS…”

A LIBERTACÃO FINAL

Ogrupo de Leningrado,dedicado ao objetivo de

resgatar o Rebe, decidiu conti-nuar desenvolvendo esforçosaté conseguir sua liberdadetotal. Resolveu-se apelar aofiscal-general-chefe soviético,Carlinco, a fim de obter cle-

mência para o Rebe. O grupoachava que os esforços dadestacada e influente MadamePeshcova, somados às intensaspressões políticas de outrospaíses, exerceriam grandeinfluência nesta questão. Deci-diu-se que Rabino Shemaryáhu

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Gourarie, genro do Rebe,viajaria a Moscou e discutiriasobre o caso com o grupo deresgate ali estabelecido.

Na reunião do grupo emMoscou chegou-se à conclusãode que antes de reunirem-secom Madame Peshcova e deapelar ao fiscal-general-chefe,era conveniente examinar quepossibilidades de êxito teria taliniciativa. Em resposta a essasindagações, foram aconselha-dos que aguardassem uns seismeses antes de prosseguir comtais esforços, uma vez que aG.P.U. resistiria energicamentea qualquer propósito de obterplena anistia depois de haverperdido tanto prestígio emrelação a essa questão, atéaquele momento. Seria consi-derado um desafio aberto, umverdadeiro acinte por parte dogrupo religioso, se este apre-sentasse uma petição deliberdade total apenas umasemana após o Rebe ter sidoenviado ao exílio, o que seriahumilhante para a própriaG.P.U.

Apesar deste conselho, ogrupo decidiu continuar comsuas atividades. Novamenteprocurou a ajuda de MadamePeshcova que, por sua vez,continuou desenvolvendoesforços nesse sentido. Umajudante judeu de MadamePeshcova viajou a Leningradopara entrevistar-se com

Messing, chefe da G.P.U. deLeningrado, a fim deconvencê-lo de que modificas-se sua posição e não obstruísseos esforços em prol da obten-ção da liberdade do Rebe.

Messing, que na realidadehavia sido o responsável pelaprisão do Rebe, negou-se aescutar. “Não há qualqueresperança de reduzir a senten-ça” - respondeu.

Quando lhe pediram quejustificasse sua posição, res-pondeu que se temia umaonda de anti-semitismo.“Muitos sacerdotes e clérigosde fé cristã e islâmica” - disseele - “foram presos e enviadosao exílio, e nenhum deles foilibertado. Se puserem o Rebeem liberdade, produzir-se-áum escândalo e o povo diráque todo este assunto está sobo controle dos judeus.”

Um aspecto irônico dessaposição se constituía no fatode que se sabia que Messingera um anti-semita fanático.Messing também ameaçou,dizendo que mesmo quandoMoscou desse a ordem deliberdade total, ele a revoga-ria. E se o Rebe regressasse aLeningrado, ele acharia umnovo pretexto para tornar aencarcerá-lo. O emissário deMadame Peshcova regressoucom esta resposta negativa.

O grupo de Moscou não sedeixou intimidar pela resposta

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obstinada de Messing, edecidiu continuar desenvol-vendo esforçosaté conseguir aliberdade totale incondicionaldo Rebe. Entre-tanto, eraevidente que oretorno do Rebea Leningrado seria perigoso,em razão do poder absolutode Messing. Enquanto isso,Madame Peshcova prosseguiucom intensas tentativas, empe-nhando-se em exercer influên-cia entre as mais altas esferasdos funcionários públicossoviéticos, e que finalmenteviram-se coroadas de êxito.

Na terça-feira 12 de Tamuz(data que coincidiu com a denascimento do Rebe em 5640,1880), o Rebe apresentou-se aoquartel-general da G.P.U.acompanhado de RabinoAlthaus, cumprindo sua apre-sentação semanal obrigatória.O funcionário local da G.P.U.cumprimentou-o cordialmentee informou-o que estava livre:“Você esta liberado totalmenteda necessidade de voltar aapresentar-se. Tenho ordens dedeixá-lo em plena liberdade, econsidero um privilégio pesso-al ser o primeiro a informá-losobre sua total anistia.”

Rabino Althaus se emocio-nou intensamente; seu rostopassou do vermelho escuro ao

branco mais pálido e voltou atornar-se avermelhado. O Rebe

teve que acalmá-lo, e ajudá-lo arecompor-se.

Era um dia deferiado em Cos-troma e o escritó-rio da G.P.U.estava fechado;

por isso o Rebe não recebeu ocertificado de libertação até odia seguinte.

A notícia da libertação doRebe se propagou com avelocidade de um raio. Antesmesmo de regressar à casa doshochêt, a notícia já havia seespalhado. Lá chegando, oRebe pôde observar um espe-táculo pouco comum e como-vedor: o chassid, Reb MichaelDworkin dançava ao redor dacasa, enquanto segurava emuma mão uma garrafa devinho e cantava com muitosentimento uma melodia emrusso: “Nada existe além deD-us.” O pequeno filho doshochêt dançava dando cam-balhotas pela casa e agitava ospés no ar com as mãos firme-mente apoiadas no chão.

Em 14 de Tamuz, às novehoras, o Rebe deixou a cidadede Costroma como um cida-dão livre e na sexta-feira, dia16, regressou a Leningrado,acompanhado de dois emissá-rios, especialmente escolhidospela comunidade judaica de

“TENHO ORDENS DEDEIXÁ-LO EM PLENALIBERDADE, ECONSIDERO UMPRIVILÉGIO PESSOALSER O PRIMEIRO AINFORMÁ-LO SOBRE SUATOTAL ANISTIA”

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Costroma. Levando em contao perigo mencionado anterior-mente estava previsto apenasuma breve estadia em Lenin-grado.

No mesmo dia de sualibertação, em 12 de Tamuz,um grande grupo de judeusreuniu-se em sua casa emCostroma e o Rebe pronunciouum discurso chassídico deTorá (Maamar) que começacom as palavras: “O Eternome ajudou… (Tehilim 118:7).

No dia seguinte, apósreceber o certificado de liber-tação, o Rebe pronunciou oMaamar “Bendito seja Ele,que favorece com atos debondade a quem não osmerece diante de um grandenúmero de pessoas novamen-te reunido na casa. Após seuregresso a Leningrado, o Rebefoi chamado à Torá (na leiturade Parashat Pinechas) erecitou BircatHagomel -bênção que sepronunciaapós ser salvode situaçõesperigosas. Nokidush poste-rior ao ServiçoMatinal, oRebe pronun-ciou outroMaamar quecomeçou com o mesmoversículo dito em Costroma,

desta vez detalhando e expli-cando mais extensamente osconceitos expressos no pri-meiro discurso. Na refeição deShabat, que se celebroutambém como seudat hodaá(banquete de graças) que,segundo a Lei Judaica, deveser comemorado quando seescapa de um perigo, o Rebepronunciou outro Maamar:“Elevai vossas mãos em santi-dade” (Tehilim 134:2). (Estesdiscursos foram posteriormen-te impressos.)

Em uma carta relacionadacom estes acontecimentos, oRebe escreveu: “O grandeclamor na Terra, as orações esúplicas através da recitaçãode Tehilim dia e noite emcentenas de cidades, e aproclamação de dias de jejumforam ouvidos nos maiselevados Céus e D-us influen-ciou o coração dos juizes para

que moderas-sem o veredito.Durante os dezprimeiros diasde minhaprisão, os maiselevados níveisde governodeste país,assim como osfuncionáriosmais destaca-dos de países

estrangeiros, se inteiraram deminha detenção. Pelo visto,

“O GRANDE CLAMOR NATERRA, AS ORAÇÕES ESÚPLICAS ATRAVÉS DARECITAÇÃO DE TEHILIMDIA E NOITE EMCENTENAS DE CIDADES EA PROCLAMAÇÃO DE DIASDE JEJUM FORAMOUVIDOS NOS MAISELEVADOS CÉUS, E D-USINFLUENCIOU OCORAÇÃO DOS JUÍZESPARA QUE MODERASSEM OVEREDITO”

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essa influência doexterior teveconsiderávelrepercussão sobreos dirigentes destepaís na adoção desua decisão final.”

Muitos anosdepois, em 12 deTamuz de 5705(1945), o Rebeafirmou: “Estive preso durantedezenove dias. Nesse tipo desituação, se está sujeito àcondenação de controlar osolhos, selar os ouvidos eprivar-se de falar. Naqueleperíodo de minha vida, perditotalmente o sentido de gratifi-cação que se obtém dosobjetos materiais, não apenastemporariamente, mas parasempre. Então, deixei porcompleto de pensar em mim.

O que podia pensarsobre mim mesmo,enquanto via-meenfrentando cons-tantemente a fragili-dade da vida?Ouvia as súplicasdos prisioneirosque rogavam pelavida, para seremfuzilados dez

minutos depois. Pensei, nessaocasião, que a decomposiçãoinicial de uma semente é umanecessidade preliminar paraque logo possa florescer ecrescer. Jamais me senti só;sempre estive consciente dofato que possuía veneráveisantepassados: meu pai, meuavô, meu bisavô, e todas asluminosas e santificadasfiguras cuja coragem e méritoperdurarão eternamente.”

Vista parcial do prédio (antigopalácio) no centro de Leningrado,

onde o Rebe morou nos anos1924 à 1927

A SAíDA DA RúSSIA

Em 15 de Tamuz, o Reberegressou a seu lar em

Leningrado; era evidente,porém, que a G.P.U. daquelacidade não descansaria nemdesistiria de seus esforços afim de vingar-se. Muitaspessoas se dirigiram à casa doRebe, mas este negou-se aconceder audiências.

Logo a seguir, foi publicadono jornal da Yevsektsia um

severo artigo contra o Rebe,no qual exigia-se sua detençãoe exílio mediante isolamentona região mais remota daSibéria. Lulov, Messing eNachmanson, os três membrosda Yevsektsia que haviamparticipado da detenção eenclausuramento do Rebe,empreenderam uma intensacampanha contra ele, na qualo descreviam como uma

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personalidade opositora aoprogresso e que, de certomodo, se encontrava fora dalei. Era necessário que o Rebedeixasse Leningrado; por issomudou-se para a aldeia deMalachovca, à meia hora deMoscou.

Tudo indicava a imperiosanecessidade de que o Rebesaísse da Rússia. A cadamomento parecia eminente operigo da detenção. Lulov eNachmanson estavam obceca-dos pelo ódio contra o Rebe; aúnica alternativalógica parecia serabandonar a Rússia.Como consegui-lo,suscitou uma novasérie de problemas.Concederia o gover-no permissão paraisso? Uma vez maispediu-se à MadamePeshcova que inter-cedesse, e esta assegurou quefaria todo o possível paraajudar o Rebe.

Rabino Hildesheimer e Dr.Leo Baeck de Berlim visitaramWeissman, vice-chanceleralemão que, por sua vez,falou com Carastinski, oembaixador russo em Berlim,que garantiu procurar exercerinfluência sobre os funcioná-rios governamentais emMoscou. Era evidente, porém,que este esforço não bastava,em vista da situação atual, a

menos que se encontrassealguma razão especial quejustificasse a saída do Rebe daRússia.

A comunidade religiosa deFrankfurt enviou um docu-mento que anunciava a nome-ação do Rebe como rabinodaquela cidade. Dr. OscarCohen, membro socialista doBudenstag, revelou que conta-va com muitos amigos íntimosno ministério russo. Assumiraa responsabilidade de levarpessoalmente o documento à

Rússia e de procurarexercer influênciasobre os funcionáriosgovernamentais, a fimde que permitissemao Rebe emigrar daRússia.

É sumamenteapropriado destacar aextraordinária influên-cia de Dr. Oscar

Cohen junto aos círculosgovernamentais russos. Muitosanos antes, no período anteri-or à revolução de outubro,Lenin havia sido detido noexterior e Dr. Cohen, advoga-do por profissão, não mediraesforços para libertá-lo. Agora,essa mesma pessoa seria oporta-voz em favor do Rebeperante as classes superioresdas autoridades governamen-tais russas.

Ao mesmo tempo, o chas-sid, Reb Mordechai Dubin, que

FORAMEMITIDOSVISTOS DESAÍDA PARA OREBE, SUAFAMÍLIA E SEISADEPTOSESTRITAMENTEVINCULADOS AELE, PARA QUEPUDESSEMACOMPANHÁ-LO

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descanse em paz, o qual erarepresentante do ParlamentoLetão, foi também portador deoutro documento no qual oRebe era nomeado rabino dacomunidade de Riga. RabinoDubin também trazia consigouma carta de recomendaçãodo embaixador soviético daLetônia (que também erajudeu). Rabino Dubin viajou àcusta de grande risco pessoalporque outrora já havia sidopreso durante o grande TerrorVermelho na Letônia, mas seuesforço foi propício.

Nesse ínterim, a Inglaterracortara relações com a RússiaSoviética e a Rússia estava emnegociações para assinar umtratado de amizade e comérciocom a Letônia. Tratava-se deum assunto que se revestia deprofundo interesse para ogoverno russo. Em sua quali-dade de representante doParlamento Letão, RabinoDubin foi recebido comgrande cortesia e respeito,especialmente por causa desua influência sobre o partidoagrícola da Letônia.

Dentro deste contexto,Rabino Dubin desempenhouseus esforços e foi recebidocom grandes honras pelogoverno russo. Ao mesmotempo, chegou Dr. OscarCohen e cada um deles empe-nhou-se à sua maneira a fimde conseguir a emigração do

Rebe da Rússia.Rabino Dubin dirigiu-se

primeiramente ao Escritório deRelações Exteriores e iniciounegociações com Dubronitsky,um judeu polonês encarrega-do do departamento de rela-ções com a Lituânia, a Letôniae a Estônia. Recebeu umaresposta negativa e informou-lhe que as perspectivas futurascom respeito a esta questãotambém eram sumamentedesfavoráveis.

Dr. Oscar Cohen, amigopessoal de Tchetcherin, Minis-tro das Relações Exteriores,encetou negociações com elee com Rubinstein, um destaca-do funcionário do Escritóriodas Relações Exteriores quetambém era judeu; mas aresposta foi mais uma veznegativa.

Cohen e Dubin trabalha-vam de forma independente, eà primeira vista poderia pare-cer que na realidade compe-tiam para conseguir a nomea-ção do Lubavitcher Rebe comorabino de sua própria comuni-dade religiosa.

Dr. Cohen empregou todaa energia e diligência nessaquestão, mas os obstáculoseram incrivelmente difíceis desuperar. Finalmente, em suaaflição, recorreu ao RabinoDubin e disse lhe que nãoestava em condições deconseguir qualquer resultado

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positivo.Rabino Dubin renovou seus

esforços e, fazendo valer seuprestígio como representantedo Parlamento Letão, voltou aencontrar-se com Dubronitsky,diretor da Divisão Báltica dasRelações Exteriores, e insistiuem seu pedido para que seautorizasse a saída do Rebe daRússia. Dubronitsky reiterousua recusa anterior. Desta vezDubin respondeu asperamen-te:

“Você desejaque meus colegase eu o ajudemos afacilitar a negocia-ção do pactomercantil commeu país. Nãoobstante, quandonos dirigimos avocê com umasimples solicita-ção, você nosnega. É nossa sincera aspira-ção que o Lubavitcher Rebeseja nosso dirigente espiritual.Toda a comunidade está unidaneste desejo. E agora, nesteexato momento um grupocompete conosco nas negocia-ções para sua nomeação comorabino de uma comunidadealemã. Poderia muito bemocorrer que o Rebe aceitasseesse pedido e obtivesse per-missão para sair da Rússia. Éimpossível ressaltar, em toda asua magnitude, a indignação e

o ressentimento que issodespertaria entre os judeus daLetônia. Consideram a desig-nação do Rebe ao rabinato daLetônia um assunto de grandeorgulho. Se virem frustradoeste ideal, isso poderia muitobem levar a um fracasso totalas negociações do “pactomercantil com a Letônia!”

Dubronitsky, que tambémera judeu, não se deixouintimidar por este argumento enão modificou sua posição.

Nesse ínterim oembaixador russona Letônia regressoua Moscou a fim deinformar sobre oprogresso dasnegociações relati-vas ao pacto mer-cantil. Este tambémparticularizou que oêxito da concretiza-ção deste pacto

dependia em grande escala dosentimento da populaçãojudaica e, por conseguinte, eratotalmente desaconselhávelprovocá-la, impedindo a saídado Rebe da Rússia.

O embaixador da Letôniaem Moscou ajudou o RabinoDubin através da celebraçãode um banquete especial naEmbaixada da Letônia, cujopropósito concreto era permi-tir que este estabelecessecontatos com altos funcionári-os do Escritório das Relações

Fac-símile do jornal “Detroit FreePress”, descrevendo a calorosa

recepção proporcionada ao Rebepelos judeus daquela cidade

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Exteriores daUnião Soviética.

Dubronitskyfinalmenteconcordou emdar permissãopara que o Rebesaísse da Rússia,mas somentecom a condiçãode que sua mãe,sua esposa,filhas e outros membros dafamília permanecessem naUnião Soviética. Determinoutambém que a mobília e abiblioteca não poderiam sairdo país. Assim, mediantereféns e garantias, esperavadesencorajar a participação doRebe em qualquer forma deatividade contra a UniãoSoviética.

O próprio fato de que foraoutorgada permissão ao Rebepara emigrar constituía-se porsi mesmo numa enormevitória. Porém o Rebe negou-se a partir, a menos que suafamília o acompanhasse.

Prosseguiram os esforçosem vista de sua total liberta-ção. Madame Peshcova e Dr.Cohen empreenderam enérgi-cas atividades em favor doRebe. Contudo, foi precisa-mente Rabino Dubin que,graças a sua influência nasnegociações do pacto com aLetônia, exerceu a maiorpressão. Suplicou, implorou e

finalmenteameaçou catego-ricamente aosfuncionários doDepartamentodas RelaçõesExteriores: “Nãocontem comnossa ajuda naconcretização dopacto com aLetônia”.

Os muitos e intensosesforços em favor do Rebeculminaram finalmente comuma reunião especial ocorridano Escritório das RelaçõesExteriores da União Soviéticano segundo dia de RoshHashaná de 5688 (1927), quetinha esse assunto em pautacomo único objetivo. Partici-param da reunião Tchetcherin,Litvinov, Rothstein,Dubronitsky e o embaixadorsoviético na Letônia. Comexceção de Tchetcherin, eramtodos judeus: Dubronitsky e oembaixador na Letônia eramjudeus poloneses e Litvinovera um judeu de Bialistoc.

Os participantes decidirampermitir que o Rebe saísse daRússia com sua família. Oprocedimento oficial se coor-denaria em Leningrado, já queo Rebe estava registrado alicomo residente naquelacidade e seu rabino oficial. OEscritório das Relações Exte-riores de Leningrado se encar-

O Rebe ao lado do proeminente líderRabino Eliêzer Silver de Cincinnati, de

quem recebeu grande apoio nasatividades em prol do judaísmo mundial

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regaria do processo relativo àemigração do Rebe. O chefedesta seção era um judeu denome Zelkind, neto do famo-so rabino de Dvinsk, conheci-do como o “Batlan”, e seusecretário era um judeu cha-mado Kerenkin.

Rabino Mordechai Dubinviajou a Leningrado paraacelerar os trâmites oficiais.Ao informar Zelkind de seupropósito, foi lhe respondidoque aindanão haviamrecebidoavisos neminstruçõesoficiais.RabinoDubin solici-tou aZelkind quetelefonassepara Moscoue indagassese tais ordens já haviam sidodespachadas. Zelkind agiuassim e informaram-no que asinstruções já haviam sidoenviadas. Assim, descobriu-seque um funcionário de catego-ria inferior já as havia recebi-do e, por erro ou negligêncianão transmitira a informação.

Zelkind assinou de imedia-to os documentos necessários.Foram emitidos vistos de saídapara o Rebe, sua família e seisadeptos estritamente vincula-dos a ele, para que pudessem

acompanhá-lo.* Também foi-lhe permitido levar sua mobí-lia e a biblioteca. Porém a leiestipulou que o Escritório dePublicações outorgasse umapermissão especial para oslivros que tirariam da Rússia.Foi enviado para realizar estatarefa um judeu chamadoStein, versado tanto sobre ovalor como o conteúdo dasobras judaicas. Ao ver que setratavam de obras raras e

manuscritosantigos, senegou incondi-cional e firme-mente a emitira permissãonecessária,sustentandoque tais objetospreciososdeveriampermanecer naRússia. Foram

inúteis todos os esforços paraconvencê-lo a modificar suaposição e retirou-se da casamuito irado.

Rabino Mordechai Dubincomunicou-se com o Escritó-rio das Publicações, informou-lhes sobre a situação e pediuque fosse enviado um outrofuncionário. Aceitaram suasolicitação e desta vez manda-ram um funcionário russo que,sem pestanejar, concedeu apermissão oficial necessáriapara que os livros pudessem

O REBE, APÓS SUALIBERTAÇÃO, DIRIGIU-SE ARIGA, VARSÓVIA E, PORÚLTIMO, AOS ESTADOS UNIDOS,ONDE AS SEMENTES QUE HAVIAPLANTADO DERAM FRUTOS ECONTINUAM MULTIPLICANDO-SE DE MANEIRA EXTRA-ORDINÁRIA PELA DEDICAÇÃODE SEU GENRO E SUCESSOR, OAFAMADO LUBAVITCHER REBEATUAL, RABI MENACHEM M.SCHNEERSON

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ser despachados da Rússia. Nodia seguinte à festa de Sucotde 5688 (1927), o Rebe partiuda Rússia, acompanhado portoda a sua família e seisdiscípulos de Chabad; leva-vam consigo toda a mobília eos livros religiosos em quatrovagões de trem. Na estaçãocompareceu um numerosogrupo de pessoas para sedespedir do Rebe. Ao longodo trajeto, em todas as esta-ções do trem, milhares dejudeus reuniram-se parasaudá-lo. Muitos expressaramseu tributo de forma visível,acompanhando o Rebe uma

parte do percurso como sinalde respeito.

Quando o Rebe chegou emRiga, perguntaram-lhe quaiseram suas impressões quantoàs experiências que haviavivido recentemente e elerespondeu: “Se me ofereces-sem um milhão de dólarespara experimentar novamenteum só dos momentos deminha angústia passada, eu osrecusaria. E se alguém medesse um milhão de dólarespara perder agora um sómomento do sofrimentopassado, também os recusa-ria.”

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

EPÍLOGO

*Quando o Rebe apresentou uma relaçãodetalhada dos nomes das pessoas que oacompanhariam, anotou ao lado de cadaum o parentesco. Nesta lista tambémincluiu o nome de seu futuro genro (oatual Rebe) e ao lado do nome escreveu“noivo”. Quando verificaram a lista e

perceberam a palavra “noivo” pergunta-ram ao Rebe Anterior: “Ele tambémprecisa acompanhá-lo? Um noivo pode searranjar em outro local!” O Reberespondeu: “Um noivo como este não seconsegue em lugar nenhum do mundo!” Ea permissão foi dada.

Uma pessoa menos dedicada que o Rebe se conten-

taria com os sucessos dopassado. Mas apesar dosgrandes sofrimentos que oacompanharam durante oresto de sua vida devido àstorturas sofridas na prisão, oRebe continuou desempenhan-do atividades em prol documprimento do judaísmo.Empreendeu uma campanha

mundial destinada a exercerinfluência sobre o governo daUnião Soviética para quemodificasse sua atitude e nãoproibisse a instrução nem aprática religiosa. Entre estesesforços, tentou exercerinfluência sobre as principaisorganizações judaicas, paraque intercedessem e procuras-sem manter discretos contatoscom os representantes diplo-

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máticos da União Soviética emseus respectivos países.

A insensibilidade e ignorân-cia que manifestaram comoresposta refletem as dificulda-des que tais esforços encontra-vam. Um importante grupo,temeroso de participar emuma atividade dessa natureza,anunciou que, como o gover-no permitiaque cadafamília edu-casse trêsfilhos emhorários extra-escolares, deforma total-mente utópi-ca, uma vezque haviaumas seiscen-tas mil famíli-as na Rússia,esta abertura jurídica “trariagrandes benefícios a 1.800.000crianças, o que provavelmenteexcede em medida o númerototal de crianças judias emidade escolar”. Pode-se espe-cular se isto foi escrito comingenuidade extrema, ou setrata-se de uma clara evasivacom o objetivo de não encararum problema de tal gravidade.

Em um informe correspon-dente àquele período fez-sereferência à opressão social eeconômica que se exerciasobre quem praticava a reli-gião judaica. Arbcor e Dorfcor,

respectivamente correspon-dendo à fábrica e aldeia,informavam a seus jornaiscomunistas sobre os aconteci-mentos atuais. Na realidade,tratava-se de delatores queinformavam sobre as práticasreligiosas: se um trabalhadorjudeu assistisse à cerimônia nasinagoga em Yom Kipur ou

Rosh Hashaná,seria denuncia-do no jornalcomo contra-revolucionário einimigo dopovo. E esforça-vam-se para quefosse demitidodo emprego.

Em Moscouempreendeu-seuma intensacampanha

contra o cumprimento dePêssach. Expunha-se os rabi-nos ao ridículo, ordenava-seàs crianças judias que assistis-sem às aulas e a todos osempregados judeus de escritó-rios, agências e fábricas gover-namentais que compareces-sem ao trabalho sob pena deperderem seus empregos. Emoutro local, as crianças judiasforam advertidas de que senão fossem à escola emPêssach, ser-lhes-iam retiradosos cupons de racionamento depão. Pais aflitos contaramcomo os filhos eram objeto

A última fotodo RebeAnterior,antes de

seufalecimentoem 10 deShevat,

5710 (28 dejaneiro de1950). O

Rebe estásentado ao

lado docandelabrode Chanucá

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das formas mais cruéis dedoutrinamento anti-semita, esoube-se de casos em que ascrianças, ao chegarem em suascasas, perguntavam aos paisse eram “exploradores” e“contra-revolucionários”. Nãoé de se estranhar que umativista daquele período tenhaescrito angustia-damente: “Há trêsmilhões dejudeus que vivemna Rússia aguar-dando ansiosa-mente que seusirmãos os sal-vem.”

O relatoseguinte ilustrade forma característica apermanente influência de RabiYossef Yitschac Schneersohn:

Em 12 de Tamuz de 5704um grupo de judeusbucharos encontrava-sereunido em Tashkent (naÁsia Central) com o propósi-to de comemorar a libertaçãodo Rebe. Havia entre eles umdelator e, no dia seguinte,um dos participantes foidetido e interrogado sobre anatureza da reunião.

Inocentemente respondeuque se tratava do dia em queo Lubavitcher Rebe, RabiYossef Yitschac, havia sidolibertado, e que a festividadefora celebrada em sua honra.

O interrogador perguntou:

“Como você sabe sobre oRebe? Quem lhe falou dele?Quem exerceu influênciasobre vocês para que sejamseguidores do movimentoChabad?”

Sem saber da importânciade suas palavras, o homemcontou que um tal de Reb

Simcha, especial-mente enviadopelo Rebe, haviasido seu guia.

Reb Simchanarrou o seguinte:“Fui conduzido àprisão onde jáestivera detidoduas vezes semque me submetes-

sem a julgamento. Tambémdetiveram outras quinzepessoas. Teve lugar um gran-de julgamento público contraas dezesseis pessoas, entre asquais eu me encontrava. Opromotor, ao ler o ato deacusação, assinalou que estaspessoas haviam organizadouma rebelião armada contra ogoverno. Enquanto falava,tirou de seu bolso uma cópiado Tanya, a principal obra deChassidut Chabad, e umretrato do Rebe, e exclamou:‘Estas são as suas armas. Estesobjetos foram achados noslares de cada um dos acusa-dos’.”

A década de trinta caracte-rizou-se por uma repressão

O Rebe foi confinado à cadeira derodas nos seus últimos anos,

resultado do período deencarceramento na Rússia

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ainda maior e, como ironiado destino, toda a Yevsektsiae seus seguidores forambrutalmente castigados. Aisso sucedeu-se a incrívelluta e o sofrimento da Segun-da Guerra Mundial. O Rebe,após sua libertação, dirigiu-se a Riga, Varsóvia e por

último aos Estados Unidos,onde as sementes que haviaplantado deram frutos econtinuando multiplicar-se demaneira extraordinária peladedicação de seu genro esucessor, o afamado Luba-vitcher Rebe atual, RabiMenachem M. Schneerson.

O Rabino Dr. Alter Ben Zion Metzger éprofessor de estudos judaicos em SternCollege em Nova York, onde tambémadministra um curso de FilosofiaChassídica de Chabad. O Rabinoagradece a ajuda recebida das bibliotecas

Levi Yitzchak da Lubavitch YouthOrganization, da Stern College-YeshiváUniversity e da YIVO, sem as quais seriaimpossível colher todos os dados utilizadosno presente artigo. Agradecimento especialao Dr. Abraham Duker por suas informa-ções adicionais.

APÊNDICE

Em relação ao emocionante relato de valentia eheroísmo desempenhados por Rabi Yossef YitschacSchneersohn, apresentamos a seguir uma adaptaçãolivre do pronunciamento do atual Lubavitcher Rebe,

Rabi Menachem M. Schneerson,de 13 de Tamuz de 5722

(Licutei Sichot, vol. IV pág. 1061 )

Entre as histórias narradaspelo ‘Rebe Anterior’ sobre

sua prisão e libertação, algu-mas se referem a seu períodode confinamento. Entre elas,uma relata o seguinte episó-dio:

Nem bem o Rebe foi intro-duzido na prisão, tomou afirme resolução de manter acalma e não dar mostras demedo nem temor perante os

membros da G.P.U. Resolveunão considerá-los, não somen-te no que concernia à religião,mas ignorá-los-ia completa-mente. Observava-os, utilizan-do a linguagem do Rebe,como se fossem “nulos, abso-lutamente nada”. Esta atitudemanteve-se imperturbávelmesmo quando foi severa-mente castigado por negar-sea responder às perguntas.

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Seu castigo constituiu-seem ser confinado em umcalabouço cheio de lama.Nem sequer havia no que seapoiar. Além disso, pelasparedes perambulavam todosos tipos de insetos e roedores.

Nessa cela tenebrosa, oRebe ficou aprisionado duran-te quase 24 horas. Mesmoassim, apesar desse tormento,sua firme decisão manteve-sede pé. Para ele, seus carcerei-ros continuaram sendo “nulose absolutamente nada”.

Na quinta-feira, Rosh Chô-desh Tamuz, às 11 horas (emsua narrativa o Rebe observouque na prisão costumavaestender-se mais em suasorações), guardas ingressaramem sua cela e ordenaram-lheque se levantasse. Falavam emrusso, mas o Rebe costumavaresponder sempre em yidish.

“Não me porei de pé” - foia resposta categórica.

O sistema da prisão exigiaque quando fosse necessáriotransmitir alguma informaçãoao prisioneiro, este deverialevantar-se para, assim, mos-trar sua submissão. Levandoem conta a intransigenteposição do Rebe, torna-se fácilcompreender o porquê de suanegativa.

Aparentemente um dosguardas era um judeu quesabia yidish. Ao escutarem aresposta do Rebe, replicaram:

“Se não acatar à ordem, nós ogolpearemos!”

“Nu (E daí)” - foi a respostaatrevida. Eles cumpriram suaameaça e retiraram-se.

Posteriormente, ingressouem sua cela um segundogrupo de guardas, entre osquais encontrava-se tambémLulov (que havia participadode sua detenção, seu trasladoà prisão de Spalerna e seuposterior interrogatório). Lulovera descendente de umafamília de chassidim e quandodirigiu-se ao Rebe, começousuas palavras com a expressão“Rebe”.

“Rebe! Por que precisairritá-los? A que se deve essetipo de conduta para comeles? Mais ainda, eles vêmpara notificá-lo de uma dimi-nuição em sua pena. De modoque, se ordenaram-lhe que selevante, levante-se!”

O Rebe permaneceu impas-sível, e não respondeu. Lulovdisse novamente: Mas vãosurrá-lo!” Ainda assim o Rebemantinha-se calado. Esbofe-tearam-no pela segunda vez.Um dos guardas o atingiu comum soco no queixo. (A dordesse golpe lhe causou sofri-mentos durante muito tempodepois.) Concluída a “missão”,eles se retiraram.

Quando se apresentou umterceiro grupo (entre eles umjudeu chamado Cavalov) e

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ordenaram-lhe que levantasse,o Rebe respondeu que não seergueria.

Voltaram a castigá-lo seve-ramente - o executor datortura foi Cavalov - mas emvão. Cavalov ficou furioso egritou: “Vamos dar-lhe umalição!”

“Vamos ver quem ensinaráa quem…” -respondeu o Rebe,em yidish. Poucotempo depois, unspoliciais entrarame lhe pediram quese apresentasse aoescritório daprisão. Ali infor-maram-no daimpugnação dapena à qual Lulovhavia se referido.Estava livre daprisão, mas havi-am-no sentenciadoa três anos de exílio na cidadede Costroma.

Quando o Rebe aproximou-se da mesa viu sobre ela ospapéis referentes a seu caso.Percebeu que uma linhaestava riscada. (Lá estavaescrito que ele havia sidocondenado à morte. Uma vezque o Rebe contou este fatoenquanto estava vivo, nãoquis pronunciar estas palavrase disse somente que “a linhaestava escrita e riscada”.)Abaixo desta havia outra com

o veredicto de que deveria serenviado por dez anos detrabalhos forçados a Solovski.Ao lado desta frase estavaescrita a palavra “Niet!”(“Não”). Finalmente estava aordem: “Três anos em Costro-ma.”

Quando lhe comunicaramque seria enviado por três

anos ao exílio,perguntaram aoRebe em que tremdesejava realizar aviagem. “No ‘medj-dunarodne’ (nomedos vagões destina-dos à classe gover-namental ou rica).”

“Tem com quepagar este luxuosotransporte? É ummodo muito carode viajar!”

“Se o dinheiroque está neste

escritório e que me pertence,o qual me foi tirado ao serpreso, não for suficiente, dareiuma ordem a meus familiarespara que paguem minhapassagem.”

Os oficiais concordaram.“Às duas da tarde você serálibertado da prisão. Terá seishoras para estar em compa-nhia de seus familiares. Ànoite deverá abandonar acidade e iniciar a viagem paraCostroma.”

Tendo em vista que era

O Rebe Anterior com seu futurogenro, Rabi Menachem M.Schneerson, o atual Rebe

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para lá um emissário seu paraque fundasse um chêder ereparasse ao micvê para o usopúblico.

As histórias dos aconteci-mentos ocorridos com umlíder do povo de Israel, aindamais quando narradas por elemesmo, constituem um ensi-namento em nosso modo deservir a D-us:

Uma vez mostrado o exem-plo e aberto o caminho pelolíder da geração, é dada apossibilidade de que quandoqualquer judeu decidir comuma vontade inabalável quetodo intuito de “ocultar” aalma Divina e todas as barrei-ras e obstáculos que obstruema propagação do judaísmo eda Torá sejam nulos e nadaabsolutos, consegue-se entãoque mesmo aquele judeu quemomentaneamente se encon-tra “do outro lado” tomeconsciência de que o judaísmoda Torá existe, a Chassidutexiste, e existe um tsadic - atéque ele sofra uma mudançaradical em sua vida e digacom total naturalidade: “Rebe”.

Seguindo esta conduta, ojudeu levará adiante todosseus afazeres com êxito - e senecessário for, por meio demilagres - não somente nosaspectos fundamentais, mastambém naqueles que, secomparados aos essenciais,revestem-se de um mero

quinta-feira, o Rebe perguntoude imediato: “Para quandoestá prevista a chegada emCostroma?”

“Para o sábado.”“Sábado? Shabat? Não, de

forma alguma. Eu não viajo noShabat.”

Quando o Rebe relatou esteepisódio, finalizou: “Graças aD-us, não viajei no Shabat!Permaneci na prisão atédomingo - pois não me foipermitido permanecer maistempo em casa.”

No domingo, durante o dia,esteve em sua casa e à noiteiniciou a viagem rumo aCostroma.

O Rebe acrescentou à suanarrativa que o chassid, RebMichael Dworkin chegou aCostroma antes e, nesse meiotempo, reuniu um grupo decrianças judias com as quaisfundou um “chêder” (umaescola de Torá) e tambémpreocupou-se para que omicvê local fosse reparado econdicionado a ser usado.

Isto significa que aquelasmesmas atividades que ocasio-naram a prisão e a sentençade morte do Rebe - e quegraças a gestões e de ummodo milagroso foi comutadapara três anos de exílio –foram reiniciadas nem bem oRebe abandonara as paredesda prisão; ainda antes quechegasse a Costroma, enviou

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caráter de “secundários”.Como costumava dizer RabiShalom DovBer, o quinto Rebede Lubavitch:

“Permanece íntegra nãosomente a essência, mastambém a expansão.” Somenteassim se adquire a liberdadeespiritual - com braço erguido,i.e., altivamente.

Quanto maior pode ser – erealmente deve ser – o esforçopara o êxito, se o judeu viveem uma época e lugar que lheproporcionam a oportunidadede difundir o estudo de Torá eo cumprimento das mitsvotsem obstáculos nem impedi-mentos. Recebe-se ajuda paraisso, e a recompensa vemtambém neste mundo nãosomente no Mundo Vindouro.

Com a firme e enérgicaresolução de que a missãoque nos foi designada peloCriador deve ser cumprida,que nenhum impedimentodeve ser levado em conta eque não devemos desanimardiante das dificuldades quepossam surgir, o judeu podeter a plena certeza de que “avontade de D-us terá êxito emsuas mãos” na atividade dedifundir a Torá - revelada(Niglê) e oculta (Chassidut) eo cumprimento das mitsvot,até conseguir a concretizaçãoda profecia: “A Terra ficarárepleta do conhecimento deD-us, tal como as águasencobrem o leito do oceano”,com a iminente chegada deMashiach, em nossos dias.

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