r. l. gregory - a psicologia da visão. o olho e o cérebro

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A Psicologia da Viso(O Olho e o Crebro)R. L. GregoryFellow do Colgio de Corpus Christi CambridgeBiblioteca Universitria NovaO livro de Richard Gregory , na realidade, um livro de classe. O seu contedo tem tanto de fascinante como a sua leitura de apaixonante. Nada vi que se lhe possa comparar depois que, a seguir Segunda Guerra Mundial, apareceu The Perception of the Visual World - A Percepo do Mundo Visual de J. J. Gibson. Basta passar por ele os olhos para se compreender que assim . A simples leitura de algumas das suas pginas torna difcil p-lo de lado. O autor parece to familiarizado com as teorias de Descartes, Helmholtz e Einstein como com as dos fisiologistas e psicologistas contemporneos. Os editores tiveram todos os cuidados com este livro. A disposio e a impresso so excelentes e as ilustraes a cores fora de srie. E. C. Poulton, New Society.A vigorosa introduo cincia da viso de Richard Gregory publicada em boa altura. Oferece uma oportunidade para uma nova e quase total compreenso do que sabemos acerca da viso. Jonathan Miller, Sunday Times.Seria difcil fazer melhor. O autor conseguiu explicar, com clareza exemplar, assuntos muito complexos. Este livro seria impossvel de conceber e vazio de sentido sem as numerosas e admirveis ilustraes que o enriquecem. Economist.Com 13 ilustraes a cores e 98 a preto e branco.Na capa, fotografia do olho obtida com um oftalmoscpio.Biblioteca Universitria InovaA Biblioteca Universitria Inova constitui a edio portuguesa da internacionalmente conhecida World University Library, coleco de obras escritas por cientistas e professores consagrados que, numa poca de especializao crescente, compreendem a necessidade, seno urgncia, de apresentar um panorama actualizado do seu domnio de investigao. Estas obras dirigem-se quer a um pblico informado, quer a estudantes universitrios, quer a todos aqueles que sentem a importncia de estar a par dos sectores culturais mais diversos, pois que os progressos tcnicos e cientficos surgem, cada vez mais, no terreno interdisciplinar de encontro entre especialistas.A coleco publicada em Portugal, Inglaterra, Frana, Alemanha, Espanha, Estados Unidos, Holanda, Itlia e Sucia.Biblioteca Universitria InovaVOLUMES PUBLICADOS1 O Humanismo no RenascimentoSem DresdenTraduo de Daniel Gonalves2 O Progressismo na EuropaDavid CauteTraduo de Srgio Lopes e Jos Leal de Loureiro(retirado do mercado)3 A Economia dos Pases SubdesenvolvidosJagdish BhagwatiTraduo de Armando Castro4 A Educao no Mundo ModernoJohn VazeyTraduo de Virgnia Motta5 A Biologia do TrabalhoO. G. EdholmTraduo de Ildio Sardoeira6 A Psicologia da Viso (O Olho e o Crebro)R. L. GregoryTraduo de Ildio Sardoeira e lvaro SalgadoVOLUMES A PUBLICAR7 Elementos de Fsica Nuclear (Partculas e Aceleradores)Robert GouiranTraduo de Artur Freitas da Silva8 O Amanhecer da TolernciaHenry KamenTraduo de Alexandre Pinheiro Torres9 Em demanda do Zero AbsolutoK. Mendelssohn10 Art NouveauS. Tschudi Madsen11 Planificao do DesenvolvimentoJan Tinbergen12 O Surto da Democracia GregaW. G. ForrestA Psicologia da Viso(O Olho e o Crebro)Traduzido por Ildio Sardoeira e lvaro SalgadoFigura A regio visual do crebro, a area striata. Vemos aqui, muito ampliada, uma pequena parte do mecanismo do crebro. Os grupos de clulas, com as suas ramificaes, transmitem a informao vinda dos olhos, para nos darem conhecimento do mundo.Ttulo originalEYE AND BRAIN 1968, R. L. Gregory e George Weidenfeld and Nicolson LimitedDIREITOS RESERVADOS PARA A LNGUA PORTUGUESA (PORTUGAL E BRASIL)Editorial Inova Limitada, Praa Guilherme Gomes Fernandes, 38-2, Porto, Portugalndice1 A viso2 A luz3 No princpio...4 O olho5 O crebro6 A percepo do brilho7 A viso do movimento8 A viso das cores9 Iluses10 A arte e a realidade11 Temos de aprender a ver?12 Ver e crer13 Os olhos no espaoBibliografiandice remissivoAgradecimentos1. A visoVer , para ns, um fenmeno to natural que se torna necessrio um esforo de imaginao para concebermos que tal fenmeno inclui a soluo de certos problemas. Mas vejamos o que se passa. So fornecidas aos olhos pequenas imagens distorcidas e invertidas e, contudo, vemos, no espao, objectos distintos e slidos. A partir das tramas de estimulao da retina apercebemo-nos do mundo dos objectos, o que quase constitui um milagre.O olho , muitas vezes, descrito como uma mquina fotogrfica, mas so as caractersticas no fotogrficas da percepo as mais interessantes. Como a informao dos olhos codificada em termos neuronais, na linguagem do crebro, e reconstituda no conhecimento dos objectos que nos rodeiam? O papel do olho e do crebro muitssimo diferente quer da mquina fotogrfica ou da cmara da televiso que unicamente convertem os objectos em imagens. H a tentao, que deve ser evitada, de dizer que os olhos produzem imagens no crebro. Uma imagem no crebro sugere a necessidade de qualquer espcie de olho interno para a ver, mas isto exigiria um outro olho para ver a sua imagem... e assim sucessivamente, numa cadeia interminvel de olhos e de imagens, o que seria absurdo. O que os olhos fazem alimentar o crebro com informao codificada sob a forma de actividade neuronal correntes de impulsos elctricos que, pelo seu cdigo e pelos padres da actividade cerebral, representam objectos. Podemos procurar uma analogia na linguagem escrita: as letras e palavras nesta pgina tm certos significados para aqueles que conhecem a lngua. Afectam de maneira adequada o crebro do leitor, mas no so imagens. Quando olhamos para qualquer coisa, a trama da actividade neuronal representa o objecto e, para o crebro, o objecto. Nenhuma imagem interna posta em jogo.Os escritores gestaltistas tinham certa tendncia para admitir que se formavam imagens dentro do crebro. Consideravam a percepo em termos de modificaes de campos elctricos do crebro, copiando estes campos a forma dos objectos percebidos. Esta doutrina, conhecida por isomorfismo, exerceu uma influncia perniciosa sobre as teorias da percepo. Desde ento, houve uma tendncia para considerar estes hipotticos campos cerebrais como dotados de propriedades especiais e de tal modo que distores visuais, e outros fenmenos, eram explicados. Mas estes postulados em que se admite a existncia de quanto nos convm que exista so demasiado fceis. No h qualquer prova da existncia de tais campos elctricos, nem processo de descobrir as suas propriedades. Se no h provas da sua existncia, nem processo de descobrir as suas propriedades, ento estes campos so muito duvidosos, pois que as explicaes teis so parentas das observveis.Os psicologistas gestaltistas chamaram, no entanto, a ateno para vrios fenmenos importantes. Viram tambm muito claramente que h um problema no processo pelo qual o mosaico de estimulao da retina d origem percepo dos objectos. Acentuaram particularmente a tendncia do sistema perceptual para fazer agrupamentos em unidades simples. Isto pode ver-se num arranjo de pontos (Figura 1.1 - Este conjunto de pintas espaadas de forma regular aparece-nos, umas vezes, como uma srie de filas, outras, como uma srie de quadrados. O exame da figura permite-nos apreciar o poder de organizao do sistema visual). Aqui os pontos esto igualmente espaados, mas h tendncia para ver, para organizar, as filas e fileiras como se houvesse objectos separados. Vale a pena meditar sobre isto, pois neste exemplo reside o problema essencial da percepo. Podemos verificar em ns a tendncia para s apalpadelas organizar os dados sensoriais em objectos. Se o crebro no estivesse continuamente procura de objectos, o desenhador teria uma tarefa difcil. Mas, de facto, tudo o que ele tem a fazer apresentar algumas linhas ao olho e vemos uma face, com determinada expresso. Essas poucas linhas so tudo o que o olho exige. O crebro faz o resto: procura objectos e encontra-os sempre que possvel. Lembremo-nos das caras desenhadas pelo fogo que arde na lareira a que nos sentamos ou do Homem da Lua (*) (* - Personagem do folclore ingls do sculo XVI. Vivia na Lua, era acompanhado pelo seu co, usava uma lanterna e transportava um molho de cardos. Grimn pretende que a imaginao popular criou o Homem da Lua numa tentativa de explicao das manchas e rugosidades discernveis superfcie do satlite da Terra).A figura 1.2, um simples gracejo, salienta este ponto claramente. Apenas um arranjo de linhas sem significado? No: uma mulher a esfregar o cho com um balde ao lado! Agora, olhe de novo: as linhas, dum modo subtil, tornaram-se diferentes, quase slidas so objectos (Figura 1.2 - Uma figura que um gracejo: que ser? Quando olhar para ela como para um objecto e no simplesmente como para um conjunto de linhas desprovidas de significao, a figura parecer, de repente, quase um slido um objecto e no um arabesco).A viso dos objectos compreende muitas fontes de informao alm das que atingem o olho quando olhamos para um deles. Geralmente abrange o conhecimento do objecto, derivado de experincia prvia, mas esta experincia no limitada viso, pois envolve outros sentidos: tacto, gosto, cheiro, ouvido e, talvez tambm, temperatura ou dor. Os objectos so muito mais do que tramas de estimulao: tm passado e futuro. Quando conhecemos o seu passado ou prevemos o seu futuro, um objecto transcende a experincia e transforma-se numa consubstanciao daqueles conhecimentos e previses sem os quais a mais simples forma de vida seria impossvel.Embora aquilo que nos interessa seja, como vemos, o mundo dos objectos, importante considerar os processos sensoriais que do origem percepo que so, como funcionam e quando deixam de funcionar de modo adequado. pela compreenso destes processos subjacentes que podemos entender a percepo dos objectos.So conhecidas muitas das chamadas figuras ambguas que ilustram claramente como o mesmo tipo de estimulao do olho pode dar origem a diferentes percepes e como a percepo dos objectos ultrapassa a simples sensao. As mais vulgares figuras ambguas so de duas espcies: aquelas que, alternadamente, so figuras ou fundos, e aquelas que, espontaneamente, alteram a sua orientao em profundidade. A figura 1.3 mostra uma imagem que , alternadamente, figura e fundo. Por vezes, a parte preta aparece como face, constituindo o branco o fundo neutro; outras vezes, o preto insignificante e o branco domina, parecendo representar um objecto (Figura 1.3 - Esta figura alterna espontaneamente de modo que, umas vezes, vista como um par de rostos, outras como um vaso branco limitado por reas negras sem qualquer significao. A deciso perceptual quanto ao que figura (ou objecto) e quanto ao que constitui o pano de fundo semelhante distino que o tcnico estabelece entre sinal e rudo. este um ponto de fundamental importncia para todo o sistema encarregado de utilizar a informao).O conhecido cubo de Necker (figura 1.4) mostra uma figura alternando em profundidade. Umas vezes, a face marcada com um O a anterior, outras a posterior, pois que salta repentinamente de uma posio para a outra. A percepo no determinada simplesmente pelo estmulo das tramas retinianas: , antes, uma procura dinmica da melhor interpretao dos dados disponveis. Os dados so a informao sensorial e, tambm, o conhecimento de outras caractersticas dos objectos. At que ponto a experincia afecta a percepo, at que ponto temos de aprender para ver, eis uma questo de difcil resposta. Trataremos dela neste livro (Figura 1.4 - Esta figura alterna em profundidade; a face do cubo marcado com o pequeno crculo parece umas vezes ser a face anterior, outras a posterior. legtimo considerar hipteses perceptuais as duas formas como a figura pode ser vista. O sistema perceptual inclina-se ora para uma ora para outra das hipteses e nunca chega a uma concluso. Este processo o utilizado pela percepo normal, mas, ali, geralmente s existe uma hiptese).Parece claro que a percepo mais do que o conjunto de dados obtidos de modo imediato atravs dos sentidos: estes dados so assentes em muitas bases. Habitualmente, sabemos escolher a melhor e vemos as coisas mais ou menos correctamente, mas os sentidos no nos do uma representao directa do mundo, fornecem-nos dados para a avaliao de hipteses sobre o que nos rodeia. Na realidade, podemos dizer que um objecto percepcionado uma hiptese, sugerida e testemunhada pelos dados sensoriais. O cubo de Necker um modelo que no fornece indicaes quanto correco das duas hipteses alternantes apresentadas: o sistema perceptual considera primeiro uma, depois a outra, sem chegar a qualquer concluso, porque no h possibilidade de obter uma resposta mais clara do que a outra. Por vezes, o olho e o crebro chegam a concluses erradas e, ento, sofremos alucinaes ou iluses. Quando uma hiptese perceptual uma percepo incorrecta, somos induzidos em erro, como tambm o somos em cincia, quando vemos o mundo distorcido por uma falsa teoria. A percepo e o pensamento no so independentes; estou a ver o que quer dizer, longe de ser uma frase pueril, indica uma interdependncia muito real.2. A LuzPara ver, precisamos de luz. Isto pode parecer demasiado evidente, mas nem sempre assim foi. Plato considerava a viso como sendo devida no entrada de luz, mas antes a partculas projectadas dos olhos, aspergindo os objectos que nos rodeiam. difcil conceber actualmente qual o motivo que levou Plato a no tentar solucionar a questo com algumas experincias simples. Embora para os filsofos o problema da viso tenha sido sempre um tpico favorito de especulao e teoria, s nos ltimos cem anos foi objecto de experimentao sistemtica; o que estranho, considerando que todas as observaes cientficas dependem dos sentidos humanos e, muito particularmente, da vista.Durante os ltimos 300 anos, houve duas teorias rivais acerca da natureza da luz. Isaac Newton (1642-1737) sustentava que a luz seria constituda por um fluxo de partculas, enquanto Christopher Huygens (1629-95) pretendia que seria devida a impulsos que ele considerava como pequenas esferas elsticas em contacto umas com as outras viajando atravs dum meio fundamental, o ter. Qualquer perturbao, sugeria ele, propagava-se em todas as direces, por meio das esferas, como uma onda, e esta onda seria a luz.Figura 2.1 - Retrato de Christopher Huygens (1629-95) por um artista desconhecido. Afirmou que a luz se desloca sob a forma de ondas num ter.Figura 2.2 - Sir Isaac Newton por Charles Jervas. Newton considerava a luz como sendo, de um modo geral, formada de partculas, mas no ignorava muitas das dificuldades que deparavam as suas ideias e pressentiu a moderna teoria segundo a qual a luz possui, ao mesmo tempo, propriedades de partculas e ondas. Concebeu as primeiras experincias para mostrar que a luz branca uma mistura das cores do espectro e preparou o caminho que levou ao estudo da viso cromtica, ao enunciar as caractersticas fsicas da luz.A controvrsia sobre a natureza da luz uma das mais emocionantes e interessantes na histria da cincia. Uma questo crucial, nas fases iniciais da discusso, era saber se a luz se propagava a uma velocidade finita ou instantaneamente. A resposta foi dada de modo inesperado por um astrnomo dinamarqus, Roemer (1644-1710). Este astrnomo dedicava-se ao registo dos eclipses dos quatro brilhantes satlites de Jpiter e descobriu que os tempos de durao dos eclipses que observava no eram regulares, dependendo da distncia de Jpiter Terra.Chegou concluso, em 1675, de que isto era devido ao tempo que a luz proveniente dos satlites de Jpiter levava a atingi-lo, aumentando o tempo quando a distncia aumentava, em virtude da velocidade finita da luz. De facto, a distncia de Jpiter varia em cerca de 186 000 000 de milhas (300 000 000 de quilmetros) duas vezes a distncia da Terra ao Sol e a maior diferena de tempo que observou foi de 16 minutos e 36 segundos, para mais ou para menos, em relao ao tempo calculado para os eclipses dos satlites. A partir da sua estimativa um pouco errada da distncia da Terra ao Sol, calculou a velocidade da luz em 192 000 milhas (278 000 quilmetros) por segundo. Os conhecimentos modernos sobre o dimetro da rbita terrestre permitiram corrigir esta velocidade para cerca de 186 000 milhas por segundo, ou 3 X 1010 cm por segundo. A velocidade da luz foi, desde ento, rigorosamente medida em distncias curtas sobre a Terra e agora considerada uma das constantes bsicas do Universo.Em virtude da velocidade finita da luz e da demora das mensagens nervosas a atingir o crebro, vemos sempre o passado. A nossa percepo do Sol est atrasada mais de oito minutos. Tudo o que sabemos do objecto mais distante visvel a olho nu (a nebulosa Antrmeda) est extremamente desactualizado: vemo-la como era um milho de anos antes de o homem aparecer na Terra.O valor de 3 X 1010 cm por segundo atribudo velocidade da luz s rigorosamente exacto no vcuo perfeito. Quando a luz atravessa vidro ou gua, ou qualquer outra substncia transparente, retardada para uma velocidade que depende do ndice de refraco (a densidade, grosso modo) do meio atravs do qual passa. Este retardamento da luz muito importante, pois a ele se deve o facto de os prismas desviarem a luz e as lentes produzirem imagens. O princpio da refraco (o desvio da luz por alteraes do ndice de refraco) foi primeiro compreendido por Snell, professor de Matemtica em Leyden, em 1621. Snell morreu com 35 anos, deixando os seus resultados por publicar. Descartes publicou a Lei da Refraco onze anos mais tarde. A Lei da Refraco (Lei dos Senos) a seguinte:Quando a luz passa do meio A para o meio B, a relao entre o seno do ngulo de incidncia e o seno do ngulo de refraco constante.Podemos ver o que acontece com um diagrama simples (figura 2.3). Se AB um raio de luz, passando dum meio denso para o vcuo (ou para o ar), o raio emergir segundo o trajecto BD, sob determinado ngulo i.A lei da refraco diz-nos que sen i/sen r constante. Esta constante o ndice de refraco n (Figura 2.3 - A luz desviada (refractada) por um meio denso transparente. A razo entre os senos dos ngulos dos raios que entram no meio denso e os senos dos ngulos dos raios que saem constante para um dado ndice de refraco do meio. este o princpio da formao das imagens pelas lentes (o ngulo de desvio da luz , igualmente, funo do comprimento de onda de modo que um raio luminoso dividido em cores espectrais por um prisma). A significao das letras consta do texto).Newton supunha que os seus corpsculos de luz eram atrados para a superfcie do meio mais denso, enquanto Huygens julgava que o desvio se devia ao facto de a luz se propagar mais lentamente no meio mais denso. Decorreram muitos anos antes de o fsico francs Foucault mostrar, por medio directa, que, na realidade, a luz viaja mais lentamente no meio mais denso. Durante algum tempo, pareceu que a teoria corpuscular de Newton era inteiramente falsa, ou seja, que a luz era constituda por uma srie de ondas propagando-se atravs dum meio o ter , mas, no princpio deste sculo, foi espectacularmente demonstrado que a teoria ondulatria no explica todos os fenmenos luminosos. Julga-se, agora, que a luz constituda por corpsculos e ondas.A luz formada por maos de partculas de energia os quanta combinando as caractersticas de corpsculos e ondas. A luz de pequeno comprimento de onda tem mais ondas por feixe que a luz de comprimento de onda longo. Isto exprime-se dizendo que a energia de um nico quantum funo da frequncia, de tal maneira que E=hv, em que E a energia em ergs, h uma pequena constante (constante de Planck) e v a frequncia da radiao.Quando a luz refractada por um prisma, cada frequncia desviada segundo um ngulo ligeiramente diferente, de modo que o raio emergente sai do prisma como um leque de luz, apresentando todas as cores do espectro. Newton descobriu que a luz branca composta por todas as cores espectrais, ao decompor, por este processo, um raio de luz solar num espectro, e ao recombinar seguidamente as cores em luz branca, fazendo passar o espectro atravs dum outro prisma idntico mas colocado em posio inversa.Newton atribuiu sete cores ao espectro vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, ndigo e violeta. Na realidade, no se distingue o ndigo como cor separada, e o laranja um pouco duvidoso. Mas Newton gostava do nmero sete e acrescentou o laranja e o ndigo para obter este nmero mgico!Figura 2.4 - Um esboo, da mo do prprio Newton, que representa uma das suas experincias sobre as cores. Principiou por dividir a luz num espectro (por meio de um prisma de grandes dimenses), depois fez com que a luz de uma s cor passasse por um orifcio aberto num ecr e, seguidamente, por outro prisma. No apareceram novas cores. Newton verificou ainda que fazendo incidir o espectro sobre um prisma as cores eram recombinadas e a luz branca reconstituda. Assim, ficou provado que a luz branca composta por todas as cores do espectro.Sabemos agora o que Newton ignorava, que cada cor ou tonalidade espectral luz duma frequncia diferente. Sabemos tambm que todas as chamadas radiaes electromagnticas so, essencialmente, o mesmo. A diferena fsica entre ondas de rdio, radiaes infravermelhas, luz, radiaes ultravioletas e raios X reside na sua frequncia. Apenas uma muito estreita faixa destas frequncias, duma largura inferior a um oitavo de polegada, estimula o olho e d origem viso e cor. O diagrama da figura 2.5 mostra como esta estreita janela se enquadra no mundo fsico. Considerada sob este aspecto, pode dizer-se que somos quase cegos (Figura 2.5 - A luz representa apenas uma estreita zona de todo o espectro electromagntico que abrange as ondas de rdio, os infravermelhos e os raios X. A diferena fsica est apenas no comprimento de onda da radiao, mas os efeitos so muito diversos. Dentro do oitavo (de polegada) em que o olho sensvel, comprimentos de onda diferentes do origem a cores diferentes. Alm da luz, as radiaes revelam propriedades muito diferentes quando reagem com a matria).Conhecendo a velocidade da luz e a sua frequncia, fcil calcular o seu comprimento de onda, mas, na realidade, difcil medir a frequncia directamente. mais fcil medir o comprimento de onda da luz que a sua frequncia, embora o mesmo no acontea em relao s ondas de rdio de mais baixa frequncia. Para medir o comprimento de onda da luz, decompe-se esta, no com um prisma, mas com uma grelha, constituda por linhas muito finas, que tambm produz as cores do espectro. (Pode comprovar-se este fenmeno inclinando um disco de longa durao em relao a uma fonte luminosa, at que a luz reflectida aparea sob a forma de cores brilhantes.) Numa grelha em que o espaamento das linhas foi adequado e rigorosamente calculado pode determinar-se, com grande preciso, o comprimento de onda, conhecido o ngulo sob o qual se produz luz duma cor determinada. Verifica-se que a luz azul tem um comprimento de onda de cerca de 1/70 000 de polegada (1/16 000 do centmetro) enquanto o comprimento de onda da luz vermelha de cerca de 1/40 000 de polegada (1/27 000 do centmetro). O comprimento de onda importante, porque estabelece o limite de resoluo dos instrumentos pticos.No possvel ver, vista desarmada, os quanta individuais de luz, mas os receptores da retina so to sensveis que podem ser estimulados por um nico quantum, embora sejam necessrios vivos (de cinco a oito) para dar a impresso dum relmpago luminoso. Os receptores individuais da retina tm o mximo de sensibilidade que pode ser alcanado por um detector de luz, visto que um quantum a mais pequena quantidade de energia radiante que pode existir. pena que os meios transparentes do olho no atinjam este grau de perfeio absoluta. Apenas cerca de 10 por cento da luz que incide sobre o olho chega aos receptores, perdendo-se o, resto por absoro e disperso dentro do olho. A despeito desta perda, seria possvel, em condies ideais, ver uma nica vela colocada a uma distncia de dezassete milhas (27 quilmetros).A natureza quntica da luz teve consequncias importantes no que diz respeito viso e levou a experincias brilhantes que relacionaram a fsica da luz com a sua deteco pelo olho e o crebro. A primeira experincia sobre os efeitos da luz considerada como partculas ou quanta foi efectuada por trs fisiologistas Hecht, Shlaer e Pirenne em 1942. O seu trabalho hoje considerado clssico. Compreendendo que o olho devia ser quase ou, mesmo, to sensvel quanto teoricamente possvel, conceberam uma experincia engenhosa para descobrir quantos quanta os receptores tm efectivamente de receber para que possa ser visto um claro. A avaliao baseada numa funo estatstica conhecida por distribuio de Poisson, que nos d a distribuio previsvel de balas que atingem um alvo. A ideia que, pelo menos, parte das variaes momentneas da sensibilidade efectiva do olho no so devidas a qualquer causa intrnseca do olho ou do sistema nervoso, mas s variaes momentneas de energia de fontes de luz fracas. Suponhamos uma chuva irregular de balas: a cadncia no ser constante. Haver, necessariamente, flutuaes; de modo idntico h flutuaes no nmero de quanta de luz que chegam. Um dado claro pode conter um menor ou maior nmero de quanta, e mais provvel que seja detectado se possuir mais do que o nmero mdio de quanta. Para luzes intensas, este efeito pouco importante, mas uma vez que o olho sensvel a apenas alguns quanta, a flutuao importante nas proximidades da energia mnima necessria para a deteco.A natureza quntica da luz tambm importante, se tivermos em conta a capacidade do olho para distinguir pormenores finos. Uma das razes pela qual s possvel ler, luz do luar, as letras maiores dum jornal, que o nmero de quanta que atingem a retina insuficiente para construir uma imagem completa dentro do lapso de tempo exigido pelo olho para integrar energia cerca de 1/10 de segundo. No , de modo algum, s isto o que se passa; mas o factor, puramente fsico, da natureza quntica da luz contribui para um bem conhecido fenmeno visual a perda da acuidade visual na obscuridade que, at ainda h pouco, foi considerado simplesmente como propriedade do olho. Na realidade, muitas vezes difcil esclarecer se um efeito visual deve ser includo na psicologia, na fisiologia ou na fsica.Como so produzidas as imagens? A maneira mais simples de se obter uma imagem atravs dum pequeno orifcio. A figura 2.6 mostra como isso se consegue. Um raio proveniente de uma parte do objecto (x) s pode atingir uma parte do ecr (y) ao cabo dum trajecto rectilneo que passe pelo orifcio. Cada parte do objecto ilumina uma parte correspondente do ecr e, assim, uma imagem invertida do objecto surge no ecr. A imagem ser pouco brilhante, porque o orifcio tem de ser estreito para que a imagem seja ntida (Sublinhe-se, no entanto, que o orifcio no pode ser demasiado pequeno, porque, ento, a estrutura ondulatria da luz seria perturbada e os bordos da imagem tornados indistintos.) (Figura 2.6 - Formao de uma imagem atravs de um orifcio. Um raio vindo de determinada zona de uma fonte luminosa passa atravs de um orifcio e s atinge dada parte do ecr. Uma imagem (invertida) , assim, formada pelos raios luminosos que passam pelo orifcio. A imagem no apresenta distores, mas pouco brilhante e pouco ntida. Um orifcio demasiado pequeno apaga consideravelmente a imagem devido aos efeitos de difraco derivados da natureza ondulatria da luz).Uma lente , na realidade, um par de prismas (figura 2.7). Dirige uma grande quantidade de luz de cada ponto do objecto para um ponto correspondente do ecr, originando assim uma imagem brilhante (Figura 2.7 - Uma lente pode ser considerada como um par de prismas convergentes que formam uma imagem a partir de um feixe de raios luminosos. A imagem muito mais brilhante do que a obtida fazendo a luz atravessar um pequeno orifcio, mas , geralmente, um tanto distorcida e a zona de focagem limitada).Ao contrrio dos orifcios estreitos, as lentes s funcionam bem quando so adequadas e ajustadas correctamente. A lente (cristalino) do olho pode no ser adequada ao olho a que pertence e estar mal ajustada. Pode focar a imagem frente ou atrs da retina, e no nela, dando lugar vista curta ou longa. Pode no ter uma superfcie perfeitamente esfrica provocando distores e, em certas direces, desfocando a imagem. A crnea pode ser irregular, ou escavada (talvez por abraso provocada por partculas de metal na indstria ou por gros de poeira, quando se viaja de motocicleta sem culos protectores). Estes defeitos pticos so corrigidos pelo acrescento de lentes artificiais, os culos. Os culos corrigem os erros da acomodao por alterao da potncia do cristalino; corrigem o astigmatismo, adicionando um componente no esfrico. Os culos vulgares no podem corrigir as alteraes da superfcie da crnea, mas as recentes lentes de contacto adaptadas ao prprio olho podem servir para dar uma nova superfcie crnea. Os culos prolongam a nossa vida activa. Com o seu auxlio leremos e executaremos tarefas delicadas at idades avanadas. Antes da sua inveno, sbios e artesos ficavam inutilizados por falta de vista, embora conservassem ainda toda a sua capacidade mental.3. No princpio...Quase todo o ser vivo sensvel luz. As plantas captam energia luminosa, movendo-se algumas para seguir o Sol tal como se as flores fossem olhos com que o vissem. Os animais usam a luz, as sombras e as imagens para fugirem ao perigo e procurarem a presa.Os olhos mais simples e mais primitivos apenas reagiam luz e s variaes de intensidade luminosa. A percepo da forma e da cor esperou por olhos mais complicados, capazes de formarem imagens, e por crebros suficientemente diferenciados para interpretarem os sinais neuronais enviados pelas imagens ptimas formadas nas retinas. Estes ltimos olhos, capazes de formarem, imagens, desenvolveram-se a partir de manchas sensveis luz que animais mais simples tinham superfcie do corpo. Como isto ocorreu , em grande parte, um mistrio, mas conhecemos alguns dos protagonistas da histria. Alguns podem ser vistos como fsseis, outros so reconstitudos pelo estudo comparado de espcies vivas e, ainda outros, aparecem fugidiamente durante o desenvolvimento do embrio.A questo de se saber como se desenvolveram os olhos representa uma das maiores interrogaes postas teoria darwiniana da Seleco Natural. Quando projectamos um novo instrumento, podemos construir muitos modelos experimentais completamente inteis, mas o mesmo no podia fazer a Seleco Natural, porque cada passo deveria conferir qualquer vantagem espcie para ser seleccionada e transmitida atravs das geraes. Mas qual a utilidade duma lente meio construda? Qual a utilidade duma lente dando origem a uma imagem, se no h sistema nervoso capaz de interpretar a informao? Como podia uma estrutura nervosa visual surgir antes de haver um olho para lhe dar informao? Em evoluo, no pode haver plano director, planeamento de estruturas que, embora inteis de momento, venham a ter importncia quando outras estruturas estiverem suficientemente desenvolvidas. E, contudo, o olho e o crebro humanos surgiram atravs duma sucesso de lentas e penosas tentativas e erros.A reaco luz encontra-se mesmo nos animais unicelulares. Em espcies mais evoludas, observam-se clulas especialmente adaptadas para servirem de receptores sensveis luz. Estas clulas podem estar espalhadas pela superfcie da pele (como nas minhocas) ou organizadas em grupos, a maior parte das vezes forrando uma depresso ou buraco, o que representa o incio dum verdadeiro olho gerador de imagens.Parece provvel que a localizao dos fotorreceptores em depresses haja correspondido necessidade de se protegerem da luminosidade ambiente que reduzia a sua capacidade de detectar sombras indicativas da aproximao de perigo. Pela mesma razo, milhes de anos mais tarde, os primeiros astrnomos gregos cavavam profundos poos no solo, do fundo dos quais podiam observar as estrelas durante o dia.As primitivas depresses oculares estavam sujeitas ao perigo de serem obstrudas por partculas estranhas que nelas se alojavam e interceptavam a luz. Uma membrana transparente desenvolveu-se sobre as fossetas oculares, servindo para a sua proteco. Quando, por mutaes casuais, esta membrana se tomou mais espessa no centro, transformou-se numa lente tosca. As primeiras lentes serviam apenas para aumentar a intensidade, mas, mais tarde, comeavam a formar verdadeiras imagens. Um olho arcaico do tipo depresso pode ainda ser visto na patela ou lapa. Numa espcie ainda existente, o nutilo, o olho ainda mais primitivo no tem lente e a imagem formada mediante um orifcio estreito. O interior do olho do nutilo banhado pela gua do mar onde vive, enquanto os olhos com lentes contm fluidos criados especialmente para substituir a gua do mar. As lgrimas humanas so uma reconstituio do oceano primitivo que banhou os primeiros olhos.Figura 3.1 - Diferente tipo de olhos primitivos. A organizao de todos eles a mesma: uma lente que forma uma imagem sobre um mosaico de receptores sensveis luz.O tema principal deste livro o olho humano e o modo como vemos o mundo. Os nossos olhos so olhos tpicos de vertebrados, mas no so dos mais complexos ou evoludos, embora o crebro humano seja o mais perfeito de todos os crebros. Olhos complicados esto muitas vezes associados a crebros pouco diferenciados. Encontramos em pr-vertebrados olhos duma complexidade incrvel aliados a crebros minsculos. Os olhos dos artrpodes (incluindo os insectos) so constitudos no por uma nica lente, com uma retina de muitos milhares ou, mesmo, milhes de receptores, mas por muitas lentes, cada uma com um nico elemento receptor. O mais antigo olho fssil conhecido pertence s trilobites, que viveram h mais de 500 000 000 de anos e so os mais antigos fsseis conservados nas rochas do cmbrico. Em muitas espcies de trilobites, os olhos eram altamente evoludos. A estrutura externa destes antiqussimos olhos pode ser vista em perfeito estado de conservao (figura 3.2). Nada podemos observar agora da sua estrutura interna; s a sua forma exterior subsiste para nos atormentar com os mistrios que encerra. Eram olhos compostos, bastante semelhantes aos dum insecto moderno. Alguns tinham mais de mil facetas (Figura 3.2 - O olho fssil de uma espcie de trilobite. Este gnero de olho o mais primitivo conservado sob a forma de fssil. As facetas so lentes corneanas, essencialmente as mesmas que aparecem nos insectos actuais. Algumas das trilobites podiam ver o que estava sua volta, mas nenhuma o que estava por cima).A figura 3.3 esquematiza o olho dum insecto. Por detrs de cada faceta lenticular (lente corneana) dispe-se uma segunda lente (lente cilndrica) atravs da qual a luz passa para o elemento sensvel luz, sendo este habitualmente constitudo por sete clulas agrupadas num pequeno ramalhete. Cada unidade completa dum olho composto denominada omatdio. Supunha-se que cada omatdio era um olha distinto, de modo que os insectos veriam milhares de mundos mas estranho como se pde acreditar em tal, porquanto no h retina distinta para cada omatdio e apenas uma fibra nervosa sai de cada pequeno grupo de receptores. Como poderia cada um formar uma imagem completa? Na realidade, cada omatdio assinala a presena da luz proveniente duma direco imediatamente na sua frente, e os sinais combinados representam uma nica imagem (Figura 3.3 - As diferentes partes de um olho composto. O olho primitivo da trilobite era, provavelmente, semelhante, embora a estrutura interna no tenha sido conservada. Encontramos este tipo de olho nos artrpodes, incluindo os insectos, como a abelha e a liblula. Cada lente corneana d uma imagem distinta sobre um receptor funcional nico (frequentemente constitudo por sete clulas fotossensveis), mas no se pode daqui concluir que o que o animal v um mosaico. O olho composto detecta particularmente bem o movimento).Os olhos dos insectos tm a particularidade notvel de se adaptarem a diferentes condies da luz ambiente. Os omatdios esto separados uns dos outros por cones pretos de pigmento. Com luz reduzida (ou em resposta a sinais vindos do crebro), o pigmento recua em direco aos receptores, permitindo que a luz passe pela parede de cada omatdio para os receptores vizinhos. Isto aumenta a sensibilidade do olho, embora custa da sua acuidade, soluo que permite conseguir um equilbrio que tambm se encontra nos olhos dos vertebrados muito embora por motivos um tanto diferentes.A lente cilndrica do olho composto funciona como uma lente mais pela variao do ndice de refraco que maior junto do centro que nos bordos do que, como acontece numa lente normal, em virtude da forma ptica da sua superfcie. A luz canalizada atravs dela de modo muito diferente daquele que ocorre na lente normal. Os olhos compostos so, essencialmente, detectores de movimento e podem ser duma eficincia incrvel, como se observa na liblula ao apanhar a presa em voo.Entre os mais curiosos olhos da Natureza, salientam-se os de um pequeno animal do tamanho duma cabea de alfinete um coppode pouco conhecido, o Copilia quadrata. A fmea os machos foram, a este respeito, menos favorecidos tem um par de olhos que no funcionam como os dos vertebrados ou como olhos compostos, mas, at certo ponto, como cmaras de televiso. Cada olho contm duas lentes e o sistema fotorreceptor semelhante ao do olho do insecto, mas na Coplia h uma enorme distncia entre a lente corneana e a lente cilndrica. A maior parte do olho est situada no interior do corpo do animal que extraordinariamente transparente. O segredo deste olho pode ser desvendado pela observao do animal vivo. Exner, em 1881, verificou que o receptor (e a lente cilndrica associada) tem um movimento rpido e contnuo. Oscilam atravs da linha mdia do animal e, evidentemente, esquadrinham atravs do plano focal da lente corneana frontal. Parece que a repartio da luz e sombra da imagem no dada simultaneamente por muitos receptores como em outros olhos, mas em sequncia, ao longo do nervo ptico, como no canal nico duma cmara de televiso. possvel que muitos outros minsculos olhos compostos (p. ex., na dfnia?) tambm adoptem este sistema para aumentar a resoluo e a capacidade dos seus poucos elementos. Ser o olho da Coplia um antepassado do olho composto? Ter o scanning (esquadrinhamento) sido abandonado por uma nica ligao neuronal no poder transmitir informao suficiente? Ser uma simplificao do olho composto encontrado nos fsseis mais primitivos? Ou ser talvez uma experincia aberrante, desligada das correntes principais da evoluo? Seja como for, a Coplia merece mais ateno do que a que tem recebido.Figura 3.4 - Um espcime vivo da fmea de um coppode microscpico, a Copilia quadrata. Cada olho tem duas lentes: uma lente maior, anterior, e uma segunda, menor, situada na profundidade do corpo, munida de um fotorreceptor e de uma nica fibra de nervo ptico, ligada ao crebro central. A segunda lente e o fotorreceptor esto em contnuo movimento atravs da imagem plana da primeira lente. O sistema assemelha-se ao scanning eye (esquadrinhador) da cmara de televiso.O movimento de scanning (esquadrinhamento) da lente cilndrica e do fotorreceptor associado evidenciado pelas imagens sucessivas dum filme na figura 3.5. Os receptores aproximam-se e afastam-se um do outro em movimento combinado e nunca independente. A velocidade do movimento rpido e contnuo, notado por Exner, varia de cerca de cinco movimentos simples por segundo at cerca de um em cada dois segundos. Seria muito importante saber por que existe e se uma amostra vestigial duma forma de olho primitiva. Se a Coplia uma forma de evoluo frustrada, merece um prmio de originalidade (Figura 3.5 A lente posterior da Coplia e (a vermelho) o fotorreceptor a ela associado, durante um nico movimento de scanning (esquadrinhamento). A cadncia pode chegar a cinco esquadrinhamentos por segundo).4. O olhoFigura 4.1 - O olho humano. O mais importante de todos os instrumentos pticos. Nele est o cristalino que forma uma minscula imagem invertida sobre um mosaico incrivelmente denso de fotorreceptores que traduzem as tramas de energia da luz na linguagem que o crebro capaz de ler cadeias de impulsos elctricos.Cada parte do olho apresenta uma estrutura extremamente especializada. A perfeio do olho como instrumento ptico d a medida da importncia da viso na luta pela sobrevivncia. No s so as vrias partes do olho maravilhosamente concebidas, como os prprios tecidos esto especializados. A crnea tem de particular o no ser irrigada por sangue: as substncias nutritivas so transportadas pelo humor aquoso, evitando-se assim a necessidade de vasos sanguneos. Por este motivo, a crnea est virtualmente isolada do resto do organismo. esta uma circunstncia feliz que torna possvel a sua transplantao em casos de opacidade corneana, visto que os anticorpos a no atingem nem a destroem, como acontece com outros tecidos estranhos.O facto de uma estrutura de primordial importncia como a crnea estar isolada da corrente sangunea no caso nico. Acontece o mesmo com o cristalino. Em ambos, os vasos sanguneos arruinariam as propriedades pticas. ainda o caso de uma estrutura do ouvido interno, embora aqui o significado seja completamente diferente. Na cclea, onde as vibraes so convertidas em actividade nervosa existe uma estrutura peculiar, designada rgo de Corti, que consiste em fileiras de pequenos clios. O rgo de Corti no irrigado pelo sangue, recebendo os elementos nutritivos do lquido que preenche a cclea. Se estas clulas, muito sensveis, no estivessem isoladas das pulsaes, ficaramos ensurdecidos. A extrema sensibilidade do ouvido s possvel porque as partes fundamentais esto separadas da corrente sangunea e o mesmo acontece com o olho, embora em virtude de razes diferentes.O humor aquoso continuamente segregado e absorvido, renovando-se cerca de uma vez em cada quatro horas. Manchas diante dos olhos podem ser devidas a impurezas que flutuam e lanam sombras na retina, sendo vistas a flutuar no espao.Cada globo ocular equipado com seis msculos extrnsecos que o conservam em posio na rbita e o movem de modo a seguir objectos que se deslocam, ou a dirigir o olhar para determinado objecto. Os olhos trabalham em conjunto e, assim, so dirigidos para um mesmo objecto, convergindo para os objectos prximos. Alm dos msculos extrnsecos, h tambm msculos no interior do globo ocular. A ris um anel muscular cuja abertura central a pupila, atravs da qual a luz passa para o cristalino, situado imediatamente atrs. Este msculo contrai-se para reduzir o dimetro da pupila quando a luz intensa, ou quando os olhos convergem para objectos prximos. Um outro msculo comanda a focagem do cristalino. Vejamos, com mais pormenor, o mecanismo e a funo do cristalino e da ris. Ambos nos reservam surpresas.O cristalino vulgar supor-se que o cristalino serve para flectir os raios de luz que o atravessam para formar a imagem. Isto est longe de ser verdade no caso do olho humano, embora o seja no dos peixes. A regio do olho humano onde a luz mais flectida para formar a imagem no o cristalino, mas sim a superfcie frontal da crnea. A capacidade duma lente para flectir a luz depende da diferena entre o ndice de refraco do meio ambiente e o do material da lente. O ndice de refraco do meio ambiente o ar baixo, enquanto o do humor aquoso, imediatamente atrs da crnea, quase to alto como o do cristalino. No caso dos peixes, a crnea est imersa na gua e a luz quase no desviada quando entra no olho. Os peixes tm um cristalino muito denso e rgido, de forma esfrica, que se move para trs e para diante dentro do globo ocular, fazendo a acomodao para os objectos distantes e prximos. Embora o cristalino no seja importante para formar a imagem no olho humano, importa para a acomodao. Esta faz-se no pela mudana de posio do cristalino (como nos peixes ou numa mquina fotogrfica), mas por alterao da sua forma. O raio de curvatura do cristalino reduz-se para a viso prxima, tornando-se a lente mais potente e completando, assim, a flexo primitiva efectuada pela crnea. O cristalino constitudo por camadas delgadas, como uma cebola, e est suspenso por uma membrana, a znula, que o conserva sob tenso. A acomodao faz-se duma maneira muito curiosa. Para a viso prxima, o msculo ciliar contrai-se, reduzindo a tenso na znula e permitindo que o cristalino adopte uma forma mais convexa. Torna-se mais convexo por contraco muscular e no por relaxamento, o que surpreendente.O desenvolvimento embriolgico e ulterior do cristalino de particular interesse e pode ter consequncias desagradveis, uma vez atingida a idade madura. O cristalino construdo a partir do seu centro, sendo acrescentadas clulas durante toda a vida, embora o crescimento se torne cada vez mais lento. O centro , assim, a parte mais velha e, a, as clulas esto cada vez mais separadas do tecido sanguneo que fornece o oxignio e as substncias nutritivas, acabando por morrer. Ao morrerem, endurecem e o cristalino torna-se demasiado rgido e incapaz de se acomodar s diferentes distncias. Como disse Gordon Walls no seu grande livro O Olho dos Vertebrados:O que tem de particular o cristalino, entre os rgos do corpo, que o seu desenvolvimento nunca cessa, enquanto o seu envelhecimento comea mesmo antes do nascimento.Na figura 4.2 vemos isto claramente. Esta figura mostra como a acomodao decresce com a idade, medida que as clulas no interior do cristalino morrem, e que passamos a ver atravs dos seus cadveres (Figura 4.2 - Perda, com o envelhecimento, do poder de acomodao do cristalino. A lente torna-se gradualmente mais rgida e incapaz de modificar a sua forma. So usadas lentes bifocais para deslocar de forma adequada o foco quando a acomodao deixar de ser possvel).Podem-se observar as variaes de forma do cristalino, durante a acomodao a diferentes distncias. Mantendo uma pequena fonte luminosa, em posio adequada, diante dum olho de qualquer pessoa, v-la-emos evidentemente reflectida nesse olho, mas no h apenas uma reflexo mas sim trs. A luz reflectida no s pela crnea, mas tambm pelas superfcies anterior e posterior do cristalino. Quando o cristalino altera a sua forma, estas imagens mudam de tamanho. A superfcie anterior d uma imagem directa grande e baa, enquanto a superfcie posterior d uma pequena imagem, invertida e brilhante. Este princpio pode ser demonstrado recorrendo a uma colher vulgar. As imagens reflectidas pela superfcie convexa so grandes e direitas, mas a superfcie interna, cncava, d origem a imagens pequenas e invertidas. O tamanho das imagens diferente com uma colher de sopa ou uma colher pequena (ch), correspondendo s curvaturas do cristalino para a viso distante ou prxima. (As imagens reflectidas pelo olho so designadas por imagens de Purkinje, e so muito teis para estudar experimentalmente a acomodao.)A ris pigmentada e pode apresentar cores variadas. Da a cor dos olhos duma pessoa, assunto de algum interesse para os poetas, geneticistas ou apaixonados, mas de somenos interesse para quem estuda a funo do olho. Qualquer que seja a sua cor, a ris deve ser suficientemente opaca de modo a constituir, para o cristalino, um diafragma adequado. Os olhos em que o pigmento falta (albinismo) funcionam mal num ambiente de luz intensa.Julga-se muitas vezes que as mudanas de dimetro da pupila so importantes para permitir que o olho trabalhe numa larga escala de intensidade luminosa. Contudo, no deve ser esta a funo primria, pois a sua rea s varia numa razo de cerca de 16:1, ao passo que o olho eficiente dentro duma escala de luminosidade de cerca de 100 000:1.Parece que a pupila se contrai para limitar os raios luminosos parte central e, opticamente, a melhor, do cristalino, excepto quando a abertura completa necessria para obter uma sensibilidade mxima. Tambm fecha para a viso prxima, o que aumenta a profundidade de campo em relao aos objectos prximos. Para um engenheiro, qualquer sistema que se corrija em funo duma alterao externa (neste caso, a intensidade da luz), sugere um servomecanismo. Estes so-nos familiares sob a forma de termstatos no aquecimento central. Este ligado automaticamente quando a temperatura desce abaixo dum valor preestabelecido e desligado quando a temperatura sobe. (O exemplo mais antigo do servomecanismo feito pelo homem o moinho de vento que se mantm dirigido para o vento e segue as suas mudanas de direco por meio dum leme que faz rodar o topo do moinho. Um exemplo mais evoludo fornece-o o piloto automtico que conserva um avio numa direco e altitude correctas pela deteco de erros e envio de sinais correctores s superfcies de controle da mquina.)Voltando ao termstato que detecta variaes de temperatura num sistema de aquecimento central: admitamos que a temperatura mnima preestabelecida, abaixo da qual o sistema ligado, est muito prxima da temperatura mxima, acima da qual o sistema desligado. Logo aps ter sido ligado, a temperatura sobe o suficiente para desligar o sistema, que, assim, ligado e desligado rapidamente at que haja uma avaria. Pela simples observao da frequncia com que ligado e desligado, e tambm da amplitude da variao da temperatura, um engenheiro pode deduzir muita coisa sobre o sistema. Partindo deste princpio, algumas engenhosas experincias foram efectuadas sobre o sistema de servocontrole da ris.Podem provocar-se violentas oscilaes na ris, dirigindo um feixe de luz delgado sobre o olho, de modo a passar pelo limite da ris (figura 4.4). Quando a ris se contrai ligeiramente, o feixe parcialmente interrompido e a retina recebe menos luz. Mas isto faz com que seja transmitido ris um sinal para a abrir. Logo que ela abre, a retina recebe mais luz e principia a fechar-se at receber outro sinal para abrir. Assim, a ris oscila indefinidamente. Medindo a amplitude e a frequncia da oscilao da ris, muito se pode aprender sobre o servossistema neuronal que a controla (Figura 4.4 - Como se pode fazer oscilar a pupila por meio de um raio luminoso. Quando a ris est ligeiramente aberta, a retina recebe mais luz. Em consequncia, envia um sinal que faz com que a ris se contraia, fechando a pupila. Mas, quando a pupila se fecha, chega menos luz retina que envia novo sinal, desta vez para que a ris se abra. Assim se estabelece uma oscilao. A partir da sua frequncia e amplitude de oscilao, o sistema de comando da ris pode ser descrito em termos de servoteoria).A pupila No , evidentemente, uma estrutura. a abertura formada pela ris atravs da qual a luz passa para o cristalino e, da, para a retina onde forma a imagem. Embora a pupila humana seja circular, h uma grande variedade de formas, sendo a forma circular bastante rara. Por qualquer razo desconhecida, os olhos dos animais noctvagos tm pupilas em forma de fenda, forma muito evidente no gato.A pupila parece negra e no podemos ver, atravs dela, o interior do olho de outra pessoa. Este facto exige explicao, porque a retina no preta, mas, sim, vermelha. , na verdade, curioso que, embora possamos ver, atravs da nossa pupila, o que se passa fora de ns, no somos capazes de ver o interior do olho de outra pessoa, atravs da sua pupila. A razo simples: a luz vinda de determinada posio focada pelo cristalino sobre bem definida regio da retina, de modo que o olho que observa interfere com a luz que ilumina a regio da retina que ele deveria ver (Figura 4.3 O olho a no pode ver o interior do olho b. O olho do observador interfere com o trajecto da luz evitando que a luz chegue nica parte da retina que poderia formar uma imagem). Helmholtz concebeu um aparelho simples (o oftalmoscpio) para a observao do interior do olho. O artifcio de que lanou mo consiste em fazer incidir um feixe de luz na mesma direco em que o olho est a observar (figura 4.6). Com este dispositivo a pupila j no parece negra, e a estrutura pormenorizada da retina pode ser vista com os vasos sanguneos da sua superfcie assemelhando-se a uma grande rvore vermelha e muito ramificada (Figura 4.6 - O princpio do oftalmoscpio inventado por Helmholtz. A luz atinge o olho observado por reflexo sobre um espelho semiprateado atravs do qual o observador v o interior do olho. Na prtica, o observador pode olhar por cima de um raio luminoso dirigido para dentro do olho por um pequeno prisma, o que permite evitar as perdas da luz ocasionadas pelo espelho semipratetado. Figura 4.5 - O que veramos, se nos fosse possvel olhar para dentro do olho. A fotografia foi obtida por meio de um oftalmoscpio. Mostra a mancha amarela existente sobre a fvea, os vasos sanguneos da retina, atravs dos quais vemos o mundo exterior, e a regio cega onde vasos e nervos deixam o globo ocular).Movimentos do olhoCada olho movimentado por seis msculos (figura 4.7). A notvel disposio do msculo oblquo superior v-se na ilustrao. O tendo passa atravs duma roldana colocada no crnio, frente da suspenso do globo ocular. Os olhos esto em contnuo movimento e movem-se de vrias maneiras. Quando os olhos se movem procura dum objecto, no operam da mesma maneira que quando seguem um objecto em movimento. Quando procuram, movem-se em pequenas sacudidelas rpidas, quando seguem um objecto, fazem-no com um movimento contnuo. As sacudidelas so designadas por saccades (segundo uma antiga palavra francesa que significa o adejar duma vela). Alm destes dois tipos principais de movimento, h tambm um pequeno tremor contnuo de alta frequncia. (Figura 4.7 - Os msculos motores do olho. O globo ocular mantido no seu lugar, na rbita, por meio de seis msculos que o movimentam de modo que o olhar possa ser dirigido em qualquer direco e possa fazer-se a convergncia dos dois olhos para a percepo do relevo. Os msculos motores so mantidos sob tenso contnua e constituem um sistema delicadamente equilibrado que, quando perturbado, pode causar uma iluso de movimento).Os movimentos dos olhos registam-se de vrias maneiras: podem ser filmados com uma cmara cinematogrfica, detectados por pequenas alteraes de voltagem na vizinhana dos olhos, ou, com muita preciso, adaptando um espelho a uma lente de contacto colocada sobre a crnea e fazendo incidir um feixe de luz que reflectido pelo espelho e fototografado num filme em movimento contnuo.Os movimentos de saccade dos olhos so essenciais para a viso. possvel fixar uma imagem na retina de modo que, quando o olho se move, a imagem desloca-se com ele, permanecendo fixa na retina. Quando a imagem est opticamente estabilizada (figura 4.8), a viso esbate-se em alguns segundos. (Figura 4.8 - A maneira simples de estabilizar opticamente a imagem na retina. O objecto (um pequeno filme fotogrfico) montado sobre o olho por meio de uma lente de contacto e acompanha-o, com exactido, em todos os seus movimentos. Aps alguns segundos, o olho torna-se cego em relao imagem estabilizada da qual umas partes desaparecem primeiro, outras depois. Este mtodo foi concebido por R. Prichard). Isto sugere que, em parte, a funo dos movimentos dos olhos deslocar a imagem sobre os receptores de modo que estes no se adaptem e cessem de enviar para o crebro os sinais correspondentes presena da imagem no olho. No entanto, surge um problema intrigante: quando olhamos para uma folha de papel branco, a imagem das margens do papel desloca-se na retina e, assim, a estimulao renovada. Mas consideremos o centro da imagem. Aqui, os pequenos movimentos dos olhos no podem ter efeito, porque uma zona de dada luminosidade substituda por outra de luminosidade exactamente igual e, portanto, nenhuma alterao da estimulao resulta do movimento dos olhos. Contudo, a parte mdia do papel no se esbate. Isso sugere que contornos e limites so muito importantes para a percepo os sinais dados pelas regies extensas de luminosidade constante no so muito importantes, porque o aparelho visual preenche ou faz extrapolaes entre os contornos.Supe-se muitas vezes que o pestanejar um reflexo com ponto de partida na crnea quando esta seca. Isto no acontece com o pestanejar normal, apesar de que este pode ser provocado pela irritao da crnea ou por alteraes sbitas da iluminao. O pestanejar normal ocorre sem estmulo externo: mediatizado por sinais vindos do crebro. A frequncia do pestanejar aumenta com o stress, ou na expectativa duma tarefa difcil. Desce abaixo da mdia durante os perodos de actividade mental concentrada. Pode mesmo ser usado como ndice de ateno e concentrao duma tarefa. Durante o pestanejar ficamos cegos, mas no nos apercebemos disso.A retinaA palavra retina deriva duma palavra antiga que significa rede ou teia, tendo sido adoptada por ser essa a aparncia dos seus vasos sanguneos.A retina uma delgada camada de clulas nervosas interligadas, incluindo as clulas em bastonete e em cone, que convertem a luz em impulsos elctricos a linguagem do sistema nervoso. No foi sempre evidente que na retina se passa a primeira fase da sensao visual. Os Gregos supunham que a retina fornecia elementos nutritivos ao humor vtreo. Galeno e muitos autores posteriores consideravam o cristalino como origem da sensao visual. Os rabes da Idade Mdia que eram os detentores dos conhecimentos clssicos admitiam que a retina era portadora do esprito vital, o pneuma.Foi o astrnomo Kepler, em 1604, quem primeiro se apercebeu da verdadeira funo da retina. Para ele a retina era o ecr onde se formava a imagem vinda do cristalino. Esta hiptese foi comprovada experimentalmente em 1625 por Scheiner, que retirou as camadas externas (a esclertica e a coroideia) da parte posterior dum olho de boi, revelando a retina como uma membrana semitransparente. Scheiner viu que se formavam pequenas imagens invertidas na retina desse olho.A descoberta dos fotorreceptores teve de esperar pela inveno do microscpio e o seu uso sistemtico. Foi s cerca de 1835 que Treviranus os descreveu, alis incorrectamente. Julga-se que a sua observao foi influenciada pelo que ele esperava ver, pois este autor descreve-os como fazendo face luz, o que, embora parea estranho, no acontece: nos mamferos e em quase todos os vertebrados ao contrrio do que acontece nos cefalpodes os receptores esto colocados na parte posterior da retina, por detrs dos vasos sanguneos. Isto significa que a luz tem de atravessar toda a rede de vasos sanguneos e fibras nervosas incluindo trs camadas de corpos celulares e uma multido de clulas de suporte, antes de chegar aos receptores. Opticamente, a retina est virada de fora para dentro como um filme fotografado posto ao contrrio (Figura 4.9 - A retina. A luz, passando atravs de camadas de vasos sanguneos, fibras nervosas e clulas de suporte, chega aos receptores sensveis (bastonetes e cones). Estes encontram-se situados na parte posterior da retina que est, assim, do ponto de vista funcional, ao contrrio, ou voltada de dentro para fora. Nos vertebrados, o nervo ptico no est directamente ligado aos receptores. A ligao feita por meio de trs camadas de clulas intermedirias que fazem parte do crebro, transposto para o globo ocular). Dado o erro original (que parece resultar das necessidades do desenvolvimento embriolgico da retina a partir da superfcie do crebro) a situao salva pelas fibras nervosas da periferia da retina que rodeiam e evitam a regio crucial do centro, que d melhor viso.A retina tem sido descrita como uma excrescncia do crebro. uma parte especializada da superfcie do crebro que se diferenciou e tornou sensvel luz, mantendo embora clulas cerebrais tpicas entre os receptores e o nervo ptico (situadas nas camadas anteriores da retina) que influenciam marcadamente a actividade elctrica dos prprios receptores. Parte do trabalho de seleco dos dados para a percepo faz-se no olho que , assim, uma parte integrante do crebro.H duas espcies de clulas receptoras da luz os bastonetes e os cones assim designados pela sua aparncia quando vistos ao microscpio. Nas regies perifricas da retina podem distinguir-se facilmente, mas na regio central a fvea os receptores esto apertados uns contra os outros e so vistos como bastonetes.Os cones funcionam em condies de boa luminosidade e do a viso das cores. Os bastonetes funcionam em condies de fraca luminosidade e s do a viso de tons de cimento. A viso diurna, usando os cones, diz-se fotpica, enquanto o mundo cinzento apercebido pelos bastonetes em condies precrias de luz se chama viso escotpica.Poder-se-ia perguntar como que se sabe serem os cones, e apenas eles, que do a viso das cores. Foi deduzido, em parte, do estudo dos olhos de vrios animais, relacionando a estrutura da sua retina com a sua capacidade para discriminar as cores, determinada por experincias de comportamento e, tambm, pela descoberta de que junto aos bordos da retina humana, onde no h viso das cores, os cones so em nmero muito reduzido. interessante notar que, embora a regio frontal da fvea, densamente povoada de cones, d melhor detalhe e cor, menos sensvel do que as regies mais primitivas em que abundam os bastonetes. Os astrnomos, quando pretendem detectar uma estrela mais tnue, olham numa direco que no exactamente a da estrela e conseguem assim que a imagem se forme fora da fvea, numa regio da retina rica em bastonetes. Poder-se-ia dizer que olham ao lado ou fora da fvea.Indo do centro da retina humana para a sua periferia, viajamos para trs na evoluo, desde as mais altamente organizadas estruturas at de um olho primitivo que apenas detecta simples movimentos de sombras. O bordo da retina humana no chega sequer a registar uma sensao quando estimulado por qualquer movimento: inicia apenas um reflexo tendente a dirigir os olhos para a origem desse movimento, para que seja visto com a parte mais evoluda do olho a fvea.O tamanho dos receptores e a sua densidade tornam-se importantes se considerarmos a capacidade do olho para distinguir pormenores delicados. Citaremos directamente do grande livro de Polyak, A Retina:O territrio central, onde os cones so quase uniformemente abundantes, mede aproximadamente 100 mcrones (mcrones ou milionsimos de metro) de dimetro, correspondendo a 20 minutos, ou um tero de um grau. Contm aproximadamente cinquenta cones por linha. Esta rea parece no ser exactamente circular, mas elptica, com o eixo maior horizontal, e pode conter cerca de 2 000 cones [...] o tamanho de cada uma das 2 000 unidades receptoras-condutoras , em mdia, de 24 segundos. Mesmo neste territrio, o tamanho das unidades varivel, as unidades mais centrais medindo pouco mais do que 20 segundos ou, at, menos. Destas os cones de menores dimenses e, por consequncia, as menores unidades receptoras funcionais existe um pequeno nmero, talvez no mais do que uma ou duas dzias. Nas dimenses aqui atribudas s unidades, esto includas as lamelas isoladoras intermdias que separam os cones uns dos outros.Vale a pena tentar imaginar o tamanho dos receptores. O menor, um mcron, no mede mais que cerca de dois comprimentos de onda de luz vermelha. Seria difcil exigir mais. E, todavia, a acuidade visual do falco quatro vezes maior que a do homem.O nmero de cones , aproximadamente, o da populao de toda a zona de Nova Iorque. Se toda a populao dos Estados Unidos da Amrica se mantivesse de p sobre um selo postal, estariam representados os bastonetes de uma nica retina. Quanto s clulas do crebro, se as pessoas fossem reduzidas, em escala, s suas dimenses, as nossas duas mos, quando juntas, poderiam conter toda a populao do Globo, simplesmente no haveria seres humanos em nmero suficiente para formar um s crebro.Os fotopigmentos da retina so descoloridos pela luz viva: esta descolorao que, graas a um processo completamente envolto em mistrio, estimula os nervos. Depois necessrio um certo tempo para as substncias fotoqumicas da retina voltarem ao seu estado normal. O ciclo qumico que tem lugar na retina hoje conhecido principalmente devido aos trabalhos do Dr. George Wald. Enquanto uma zona de fotopigmentos permanece descolorida, essa zona da retina menos sensvel do que as zonas vizinhas e isto cria ps-imagens. Quando o olho se adaptou a uma luz forte (por exemplo, a de uma lmpada elctrica olhada fixamente ou, melhor ainda, a de um flash fotogrfico), uma forma escura, com os mesmos contornos da luz adaptadora, vista suspensa no espao. escura quando vista sobre uma superfcie iluminada (como uma parede), mas parecer brilhante, durante alguns segundos, depois da estimulao produzida pela luz adaptadora, se estivermos na escurido. Esta ltima imagem constitui o que se costuma chamar uma ps-imagem positiva e tem origem numa descarga contnua da retina e do nervo ptico depois da estimulao. A imagem escura uma ps-imagem negativa e nasce de uma relativa diminuio da sensibilidade devida descolorao do fotopigmento de uma parte da retina.Os dois olhosMuitos dos rgos do corpo existem aos pares, mas os olhos e os ouvidos tm a este respeito algo de especial: trabalham em estreita cooperao, compartilham e comparam a informao, de modo que juntos realizam feitos que no estariam ao alcance de um nico olho ou de um nico ouvido.No olho, as imagens formam-se sobre as superfcies curvas da retina, mas o estud-las como se fossem bidimensionais no acarreta inconveniente de maior. Uma caracterstica notvel do mecanismo visual a sua capacidade de unificar as duas imagens que so um tanto diferentes numa nica percepo de objectos slidos situados num espao a trs dimenses.No homem, os olhos esto voltados para a frente e compartilham o mesmo campo visual. raro acontecer isto nos vertebrados, porque, geralmente, os olhos esto dos lados da cabea e dirigidos para o exterior em direces opostas. A mudana gradual dos olhos laterais para olhos frontais deu-se medida que uma avaliao exacta das distncias se tornou necessria, quando os mamferos desenvolveram membros anteriores capazes de segurar e manipular objectos e de agarrar os ramos das rvores. Para os animais que vivem em florestas e se deslocam saltando de ramo em ramo, a avaliao rpida e exacta das distncias a que se encontram os objectos vizinhos indispensvel e o uso de dois olhos cooperando para dar uma viso estereoscpica est neles muitssimo desenvolvido. Animais como os gatos tm olhos frontais que funcionam em conjunto, mas a densidade dos receptores sobre a retina quase constante. No existe fvea enquanto uma percepo precisa da profundidade no se torna realmente indispensvel. Nos pssaros e nos macacos que vivem nas rvores encontram-se fveas muito desenvolvidas e um comando perfeito dos movimentos dos olhos. Nos insectos a viso estereoscpica do movimento assegurada por pares de olhos compostos, o que permite liblula agarrar a sua presa em voo e a grande velocidade. Os olhos compostos esto fixos cabea e o mecanismo da sua viso estereoscpica mais simples do que o dos grandes macacos e do homem em que as fveas so obrigadas a actuar, graas convergncia dos olhos sobre objectos situados a vrias distncias.Convergncia ou telemetria, percepo da profundidadeA figura 4.10 mostra como os olhos giram para o interior, convergindo, a fim de observarem objectos prximos e como este ngulo de convergncia comunicado ao crebro por sinais (Figura 4.10 - Os olhos convergem sobre um objecto que examinmos e as imagens so deste modo trazidas para as fveas. Em a vemos os olhos a convergir sobre um objecto prximo, em b sobre um mais distante. O ngulo de convergncia transmitido ao crebro como uma informao de distncia. O crebro trabalha neste caso como um telmetro). Mas isto est muito longe de ser tudo.Uma experincia pouco complicada mostra que o ngulo de convergncia um elemento que permite conhecer directamente a distncia. A figura 4.11 representa o que acontece se um par de prismas de ngulos bem calculados introduzido para desviar a luz que entra nos olhos de modo que estes sejam obrigados a convergir para levarem imagens de objectos distantes ao centro das suas fveas. Se os prismas so colocados de modo que diminua o ngulo de convergncia (figura 4.11 b), os objectos parecem mais prximos e maiores, se so colocados aumentando a convergncia, parecem mais afastados e menores. A percepo da profundidade dada, em parte, pelos olhos. O ngulo de convergncia d a distncia, tal como num telmetro (Figura 4.11 - possvel mudar de ngulo de convergncia para uma dada distncia pela interposio de prismas. a mostra a convergncia aumentada, b diminuda. O efeito consiste na modificao do tamanho e da distncia aparentes dos objectos vistos atravs dos prismas. A modificao no de carcter ptico, representa uma correco feita pelo crebro quando o seu telmetro lhe fornece uma informao errada. A experincia permite estabelecer de forma simples a importncia da convergncia na percepo do tamanho e da distncia).Existe, todavia, nos telmetros uma limitao importante: indicam a distncia de um nico objecto de cada vez, daquele objecto cujas imagens so sobrepostas pelo ngulo de convergncia. Para calcular as distncias de muitos objectos ao mesmo tempo, torna-se necessrio um mecanismo muito diferente. O aparelho visual fornece esse mecanismo, mas o seu emprego obriga o crebro a um trabalho muito complicado.A disparidade, percepo da profundidadeOs olhos esto separados (cerca de sete centmetros) e, assim, recebem imagens ligeiramente diferentes. Pode-se verificar isto muito claramente, se abrirmos primeiro um olho e, a seguir, o fecharmos abrindo ao mesmo tempo o outro. Cada vez que um dos olhos recebe a imagem de um objecto prximo esse objecto parece deslocar-se lateralmente em relao a objectos mais distantes e girar sobre si prprio. A pequena diferena existente entre as duas imagens conhecida por disparidade. Esta d-nos a percepo da profundidade por viso estereoscpica, percepo que usada no estereoscpio, um instrumento de investigao muito til.O estereoscpio um instrumento simples e destina-se a apresentar, separadamente, duas imagens aos dois olhos. Normalmente, essas imagens so pares estereoscpicos obtidos por meio de duas mquinas fotogrficas separadas pela distncia existente entre os olhos, a fim de ser reconstituda a disparidade que o crebro utiliza para criar a iluso do relevo. (O estereoscpio foi um brinquedo favorito durante a poca vitoriana, mas, infelizmente, os temas de algumas das fotografias escolhidas, embora ideais sob o aspecto tcnico, encontraram tremenda oposio. Daqui o ter sido expulso dos sales vitorianos um golpe de que nunca mais recomps.)As imagens em relevo podem ser apresentadas invertidas recebendo o olho direito a imagem destinada ao esquerdo e vice-versa dando ento uma inverso de profundidade. Grosso modo, a inverso da profundidade acompanha a chamada viso pseudoscpica quando aquela inverso no deforma grosseiramente o aspecto daquilo que no familiar. Os rostos das pessoas no se invertem em profundidade (nunca vemos o nariz sob a forma de um buraco), mas a disposio em profundidade de objectos distintos pode muito bem sofrer uma inverso quando trocam os olhos. muito simples inverter opticamente os olhos de forma que o mundo real seja visto com os olhos trocados. O instrumento com que isso se consegue o pseudoscpio (Figura 4.12 - Modificao da viso por meio de espelhos. (Parte superior). Um pseudoscpio inverte a profundidade, mas unicamente quando a profundidade se apresenta um tanto ambgua. (Centro). Um telestereoscpio aumenta, para todos os efeitos prticos, a distncia entre os olhos. (Parte interior). Um iconoscpio reduz, para todos os efeitos prticos, a distncia entre os olhos. Todos estes dispositivos so teis quando se estuda a convergncia e a disparidade da percepo da profundidade).A estereoviso , apenas, uma das muitas formas como podemos ver a profundidade e s funciona em relao a objectos relativamente prximos. medida que a distncia aumenta, a diferena entre as imagens vai-se tornando to pequena que estas acabam por ficar praticamente iguais. Para distncias superiores a seis metros tudo se passa como se nos servssemos de um nico olho.O crebro precisa de saber qual o olho que v uma determinada imagem, de outro modo a percepo da profundidade tornar-se-ia ambgua. Tambm deixaria de produzir efeito a reverso de imagens tem lugar nos estereoscpios e pseudoscpios. Mas (facto estranho!) virtualmente impossvel dizer qual dos olhos est a funcionar. Se bem o mecanismo da sensao de profundidade identifique de forma bastante exacta um e outro olho, esta informao no fornecida conscincia.Se as imagens apresentadas aos dois olhos so muito diferentes (ou se a diferena entre os pontos de observao de um objecto to grande, que os aspectos caractersticos deste ltimo ficam muito fora do limite dentro do qual a sobreposio impossvel), nota-se um efeito curioso e muito tpico. Cada olho, por sua vez, rejeita a sua imagem, de modo que se produz uma flutuao contnua. Partes de cada uma das imagens so, sucessivamente, combinadas de vrias maneiras e rejeitadas. a chamada rivalidade da retina. A rivalidade tambm ocorre, se so apresentadas aos dois olhos cores diferentes, posto que uma sobreposio de que resultam cores mistas possa verificar-se durante breves perodos.Desconhece-se como o computador cerebral trabalha quando est a converter em profundidade as diferenas existentes entre as imagens que lhe so fornecidas. Todavia, possvel mostrar qual o tipo de informao usado por tal computador. Pode-se conseguir isto por meio de um artifcio de fotografia, colocando o negativo de uma das imagens de um par estereoscpico sobre um positivo transparente obtido a partir do negativo da outra imagem. Nas partes em que as duas imagens so idnticas no passa qualquer luz, mas a existncia de qualquer diferena permitir a sua passagem. O resultado uma fotografia em que s figuram diferenas, como aquela que constitui a figura 4.13. Ser de notar a perda quase total, durante o processo, da informao contida na fotografia original. Esta rejeio de informao poupa ao computador enorme trabalho (Figura 4.13 - Esta figura e a seguinte mostram como o crebro utiliza a disparidade para avaliar a profundidade. Na parte de baixo vemos o que se passa quando uma das fotografias de um par de fotografias estereoscpicas eliminada, por meio de um artifcio fotogrfico, da outra fotografia par. Esta diferena fotogrfica corresponde disparidade da informao a diferena existente entre as imagens dos dois olhos. Figura 4.14 e figura 4.15 - Sobrepondo ao positivo (em baixo) de uma fotografia estereoscpica o negativo ( direita) do seu par, obtm-se a diferena fotogrfica da figura 4.13. possvel que o crebro faa qualquer coisa de muito semelhante rejeitando, nesta fase, toda a informao excepto a relacionada com a profundidade).Relao entre a convergncia e a profundidade estereoscpicaChegamos agora a um aspecto notvel da percepo estereoscpica da profundidade. H um lao estreito entre os dois mecanismos muito diferentes que acabam de ser descritos: primeiro, a convergncia dos olhos actuando como um telmetro; segundo, a diferena entre as duas imagens dando a profundidade. O ngulo de convergncia ajusta a escala do sistema de disparidade. Quando os olhos fixam um objecto distante, toda e qualquer disparidade entre as imagens considerada como representando uma maior diferena de profundidade do que quando os olhos convergem para a viso prxima.Se isto no acontecesse, objectos distantes pareceriam mais juntos em profundidade do que objectos prximos igualmente intervalados, porque a disparidade correspondente a uma certa diferena de profundidade tanto maior quanto mais prximos estiverem os objectos. Os mecanismos interligados que compensam esta situao geomtrica podem ser vistos muito facilmente em aco, anulando a convergncia sem tocar na disparidade. Se depois de por meio de prismas termos feito os olhos convergir para o infinito, passarmos a observar objectos prximos, estes parecero alongados em profundidade. Poderemos ver, assim, a funcionar o nosso sistema de compensao convergncia-disparidade.Julesz realizou, recentemente, em Bell Telephone Laboratories, uma engenhosa experincia. Por meio de um computador, produziu dois desenhos tais que qualquer deles, tomado separadamente, era desprovido de significao, porque no continha nada que se parecesse com uma estrutura ou objecto, mas, logo que juntos, reproduziam uma estrutura estereoscpica. O valor da experincia est em que veio provar que os mecanismos do crebro encarregados de realizar o relevo estereoscpico podem integrar formas provenientes de cada um dos olhos, sintetizar objectos a partir de dois conjuntos de traos sem significao particular e criar, para todos os efeitos prticos, uma disparidade. Esta tcnica concebida por Julesz vir, muito provavelmente, a ser importante na investigao da percepo e um dos primeiros exemplos da aplicao dos computadores ao estudo da viso. Pela primeira vez, o computador vencido pelo crebro do homem (Figura 4.16 - Quando um destes dois conjuntos sem significao apresentado a um dos olhos e o outro conjunto ao outro olho, o crebro funde-os num s que assume o aspecto de um fundo mal definido precedido por um quadrado. Os desenhos foram executados por um computador que procedeu s correlaes cruzadas necessrias para separar o quadrado do seu fundo. Julesz, que concebeu a experincia, usou esta tcnica para estudar a aptido do crebro para a recepo da profundidade).5. O crebroO crebro mais complicado e mais misterioso que uma estrela. Se, socorrendo-nos da nossa imaginao e olhando atravs dos olhos, examinarmos os mecanismos do crebro situados por detrs dos rgos da viso, poderemos ali descobrir segredos to importantes como os daquele mundo que o olho e o crebro nos revelam.Nem sempre foi evidente a relao existente entre o crebro e o pensamento, com a memria ou a sensao. No mundo antigo que incluiu as brilhantes civilizaes do Egipto e da Mesopotmia o crebro era considerado um rgo sem importncia. O pensamento e as emoes atribuam-se ao estmago, ao fgado e vescula biliar. O eco desta crena ainda perceptvel na linguagem moderna, em palavras como fleumtico. Quando os Egpcios embalsamavam os seus mortos no se davam ao trabalho de preservar o crebro, que era retirado atravs da narina esquerda, posto que os outros rgos fossem conservados separadamente em canopos, vasos de forma caracterstica, colocados ao lado dos sarcfagos. Aps a morte, o crebro quase no contm sangue e talvez por isso parecesse pouco indicado para servir de receptculo ao Esprito Vital. O corao, activo e a pulsar, apresentava-se como a sede da vida, do calor e das sensaes o corao que no o frio, cinzento e silencioso crebro, encerrado e escondido na sua caixa ssea.Pouco a pouco, os efeitos dos acidentes em que o crebro era atingido tornaram claro o papel primordial desempenhado por este rgo no comando e domnio dos membros, da palavra, do pensamento, das sensaes e dos conhecimentos adquiridos pela observao pessoal. Mais tarde, os efeitos de pequenos tumores e de ferimentos por armas de fogo forneceram indicaes que foram estudadas em pormenor e continuamente trabalhadas. Os resultados destes estudos revestem-se da maior importncia para os neurocirurgies, pois enquanto certas zonas so relativamente pouco sensveis, outras no podem ser perturbadas sob pena de o doente morrer ou ficar seriamente diminudo.O crebro tem sido descrito como a nica poro de matria que conhecemos de dentro para fora. Visto do exterior, um objecto de um cinzento-rseo, do tamanho aproximado de dois punhos fechados. As suas partes principais esto representadas na figura 5.1. Compe-se da chamada substncia cinzenta e da substncia branca, esta ltima constituda pelas fibras que ligam entre si os corpos celulares cujo conjunto forma a substncia cinzenta (Figura 5.l - O crebro mostrando a zona visual a area striata na sua parte posterior (crtex occipital). O estmulo de reas muito pequenas faz com que se vejam clares luminosos nas partes correspondentes do campo visual. O estmulo das reas vizinhas (zonas de associao visual) origina sensaes visuais mais complexas).O crebro, na sua evoluo, tem-se desenvolvido a partir do centro que, no homem, est relacionado principalmente com a emoo. A superfcie o crtex apresenta curiosas circunvolues. Grande parte das suas funes diz respeito ao comando dos movimentos dos membros e aos rgos dos sentidos. possvel desenhar diagramas que representem a ligao existente entre certas regies do crtex e a sensao do tacto, localizado na pele: o resultado so bizarros homunculi, como os da figura 5.2. Ao sentido da viso corresponde uma zona especfica do crtex, como veremos adiante (Figura 5.2 - Um homunculus representao grfica que mostra a importncia relativa das zonas do crtex destinadas s sensaes provenientes das vrias partes do corpo. De notar as grandes dimenses do polegar. Animais diferentes tm homunculi diferentes, em correspondncia com a importncia sensorial das diferentes partes do corpo).As clulas nervosas do crebro so formadas por corpos celulares, cada um dos quais dotado de um prolongamento comprido e delgado o axnio que transmite o influxo vindo da clula. Os axnios podem ser muito compridos. Por vezes, vo do crebro medula espinal. Os corpos celulares possuem numerosas outras fibras, estas mais delgadas e mais curtas os dendritos que transmitem os sinais s clulas (figura 5.3). As clulas, com os seus dendritos ligados entre si e os seus axnios fibras nervosas parecem por vezes dispostas ao acaso, mas, em algumas zonas do crebro, especialmente na zona da viso, formam fiadas bastante regulares (Figura 5.3 - Um neurnio. O corpo celular apresenta um longo prolongamento axnio ou fibra nervosa que, isolado pela sua bainha de mielina, envia pequenos sinais de comando ao msculo. O corpo celular recebe informaes de numerosos e delgados dendritos, uns accionando a actividade do crebro, outros inibindo-a. O sistema um simples elemento de computador. Os elementos ligados entre si comandam a actividade e recebem as informaes que constituem a percepo).Os sinais neurnicos so impulsos elctricos que aparecem quando se verifica uma variao de permeabilidade inica na membrana celular (figura 5.4). Em repouso, o centro da fibra est carregado de electricidade negativa e, superfcie, de electricidade positiva, mas se tem lugar uma perturbao, como acontece no momento em que um receptor da retina estimulado pela luz, o centro da fibra torna-se positivo e d origem a um influxo que percorre o nervo como uma onda. Caminha muito mais lentamente do que a electricidade ao longo de um fio, pois nas fibras maiores a sua velocidade de cerca de cem metros por segundo, enquanto nas menores no chega a um metro. As fibras espessas, a que correspondem as velocidades mais altas, possuem um revestimento especial de gordura a bainha de mielina que as isola das suas vizinhas e serve tambm para aumentar o coeficiente de conduo da aco potencial (Figura 5.4 - O mecanismo da conduo elctrica no nervo. Hodgkin, Huxley e Katz descobriram que os ies de sdio passam para o interior da fibra e transformam a sua carga positiva em carga negativa. Os ies de potssio saem, reconstituindo o potencial de repouso. Estes fenmenos podem repetir-se at mil vezes por segundo, transmitindo diferenas de potencial que se propagam ao longo do nervo os sinais atravs dos quais conhecemos o mundo e comandamos os msculos).Os nervos esto ligados por sinapses junes onde so libertados produtos qumicos que actuam como disparadores. A maior parte, ou talvez todos os neurnios, tm sinapses que podem actuar ou como excitadores ou como inibidores, isto , que desempenham o papel de verdadeiros comutadores.Existe um grande nmero de tcnicas avanadas para o estudo do sistema nervoso. A actividade elctrica de clulas isoladas, ou de grupos de clulas, pode ser registada. Zonas h que podem ser estimuladas electricamente para se provocar no s reaces mas tambm (em doentes operados ao crebro) sensaes. possvel descobrir os efeitos da perda de uma parte do crebro relacionando as modificaes de comportamento que da resultam com as zonas atingidas. , igualmente, possvel estudar os efeitos de medicamentos, ou produtos qumicos, aplicados directamente sobre a superfcie do crebro. Este mtodo est a abrir um importante campo de investigao, tanto para verificar se novos medicamentos originam fenmenos fisiolgicos secundrios pouco desejveis como para modificar, directa e propositadamente, o estado do crebro. uma maneira de operar que tem sobre aquela que implica a destruio de zonas parciais do crebro a vantagem de as modificaes produzidas serem geralmente reversveis e facilmente regulveis, tanto em natureza como em intensidade.As tcnicas que acabmos de referir, assim como o estudo da maneira como feita, por meio de feixes de fibras, a ligao entre diversas zonas, mostraram claramente que as vrias partes do crebro esto empenhadas em funes muito diferentes. Mas quando se trata de descobrir como, em cada uma das zonas, se processam os fenmenos, mesmo as tcnicas mais evoludas parecem toscas e grosseiras.Pode pensar-se que a forma mais directa de abordar o estudo do crebro consiste em examinar a sua estrutura, estimul-lo, e registar as suas reaces. Todavia, tal como acontece com as mquinas electrnicas, no aqui nada fcil, pelo simples exame da estrutura, compreender o funcionamento. Os efeitos da estimulao, ou de ablaes de partes do crebro e os registos obtidos a partir de um crebro normal so difceis de interpretar desde que se no disponha de um esquema geral do funcionamento deste rgo. Para que as experincias de estimulao e ablao de partes do crebro possam conduzir a resultados seguros indispensvel efectuar, paralelamente, experincias sobre o seu comportamento. Os resultados de registos obtidos a partir de clulas cerebrais so igualmente do maior interesse quando se dispe de comportamentos com eles relacionados ou de experincias afins. Isto significa que a psicologia humana e a psicologia animal tm grande importncia, uma vez que essencial relacionar a actividade cerebral com o comportamento. Daqui a necessidade de se proceder a experincias psicolgicas especialmente concebidas para se obter tal correspondncia.Como bvio, o crebro um dispositivo imensamente complexo de clulas nervosas, mas, de certo modo, assemelha-se aos aparelhos electrnicos fabricados pelo homem, de sorte que consideraes tcnicas de carcter geral podem ser de utilidade. Tal como um computador, o crebro recebe informaes e toma decises de acordo com as indicaes que lhe so fornecidas, mas no muito semelhante aos actuais computadores fabricados pelos engenheiros, entre outras razes, porque j existe um grande nmero de crebros humanos de que possvel dispor a preos muito razoveis. Acresce ainda que h um mtodo fcil e muito conhecido para a produo de seres humanos. De tudo resulta serem os computadores concebidos e construdos para funcionarem de forma diferente. mais fcil construir uma mquina capaz de resolver problemas de lgica ou de matemtica (ou de aprender lnguas e fazer tradues) do que uma mquina capaz de ver. O problema da construo de mquinas capazes de reconhecerem desenhos foi resolvido por diferentes processos, mas apenas para um nmero limitado de padres. At data, ainda no foi encontrada uma soluo satisfatria e nada existe que se compare ao sistema de percepo do homem quanto gama e velocidade das percepes. , em parte, por esta razo que o estudo pormenorizado da percepo humana se torna importante. Tudo quanto sobre ela pudermos aprender poder vir a ser til quando tentarmos descobrir processos de a reproduzir em mquinas. Uma tal descoberta seria valiosssima. Poderia ser aplicada para os fins mais diversos, desde a simples leitura de livros e documentos at explorao do espao por autmatos.Uma das dificuldades com que depara quem procura compreender o funcionamento do crebro que no h nada a que este se assemelhe mais do que a uma poro de porridge (aveia fervida lentamente em gua ou leite at se transformar numa papa mais ou menos consistente). Quando se trata de sistemas mecnicos, geralmente possvel adivinhar, com razovel exactido, a funo, examinando a estrutura das partes. Isto continua a ser verdadeiro para a quase totalidade do corpo. Os ossos dos membros so vistos como alavancas e as posies de insero dos msculos determinam claramente as suas funes.Os sistemas mecnicos e pticos tm partes cujas formas exteriores esto estreitamente relacionadas com as funes que desempenham, facto que permite deduzir, ou pelo menos adivinhar, a funo a partir da forma. Assim, foi possvel a Kepler adivinhar, guiando-se pela forma, que aquela parte do olho a que chamavam, no seu tempo, o cristalino era, na realidade, uma lente. Foi tambm relativamente fcil a Scheiner descobrir a imagem, porque sabia onde a procurar. Infelizmente, o crebro apresenta um problema muito mais difcil, quanto mais no seja porque a forma e a disposio dos seus componentes so de bem pouca importncia para o desempenho das suas funes. Quando a funo no se reflecte na estrutura no , olhando para a segunda, que podemos deduzir a primeira. , ento, indispensvel recorrer a tcnicas complexas.A actividade elctrica registada pelos fisiologistas muito importante. O mal est em que dificlimo obter, ao mesmo tempo, informaes pormenorizadas de mais do que algumas clulas. Os problemas de ordem tcnica so imensos.A concepo dos aparelhos pode estar subordinada a consideraes industriais. Suponhamos que a construo de certo aparelho se afigura industrialmente possvel, mas que esse aparelho apresenta determinadas limitaes. Se experincias realizadas em seres humanos ou em animais mostrarem existir neles limitaes semelhantes pode acontecer que estas experincias venham confirmar hipteses que talvez tenham tido origem em consideraes de ordem tcnica. Em especial, certas experincias sobre as percepes podem ser instrumentos importantes para a descoberta de modelos de aparelhos que reproduzam funes cerebrais e para pr prova o valor de tais modelos. Olhando atravs dos olhos, o crebro v o mundo exterior. Olhando em sentido contrrio, mediante experincias adequadas, podemos ver o crebro, e v-lo como um sistema funcional limitado por consideraes fsicas e mecnicas.As regies visuais do crebroO sistema neurnico sobre que assenta a viso principia nas retinas. Estas, como vimos, so essencialmente excrescncias do crebro, que contm clulas cerebrais tpicas bem como detectores especializados sensveis luz. As retinas so efectivamente divididas ao meio, verticalmente, em duas partes: as fibras retinianas dos lados externos vo dar ao mesmo lado da parte posterior do crebro enquanto que as dos lados internos, nasa