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Grupo de Apoio Técnico Especializado Travessa do Ouvidor 38 Centro Rio de Janeiro RJ 22234090 [email protected] 21 2224 9910 PARECER TÉCNICO N. 072/2013 Ref.: Processo MPRJ n. 2012.00636641, MA 6886, ACP n. 042113493.2012.8.19.0001 Origem: GAEMA Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente PARECER TÉCNICO.NOVO AUTÓDROMO DO RIO DE JANEIRO. Realização de vistoria, na área pretendida para implantação do Novo Autódromo Internacional, localizada na Estrada do Camboatá, Ricardo de Albuquerque, RJ, visando verificar o cumprimento da Liminar concedida no Processo n. 0421134 93.2012.8.19.0001, para que o estado se abstenha de realizar qualquer intervenção no local. PalavraChave: Autódromo, Fragmento Florestal de Mata Atlântica, Processo de Licenciamento, Danos Ambientais, Área de Preservação Permanente, Ricardo de Albuquerque. 1. INTRODUÇÃO O presente Parecer Técnico referese à vistoria, realizada no dia 01/04/13, na área pretendida para implantação do Novo Autódromo Internacional do Rio de Janeiro, em atendimento à solicitação do Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente – GAEMA. A vistoria teve como objetivo verificar o cumprimento da liminar concedida no Processo n. 042113493.2012.8.19.0001, para que o estado se abstenha de realizar qualquer intervenção no local até a concessão da LI com observância dos requisitos legais e realização de Estudo de Impacto Ambiental. A vistoria na área foi realizada em duas etapas. No período da manhã a vistoria foi acompanhada pelo Promotor de Justiça, Dr. José Alexandre Maximino Mota, e

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Grupo  de  Apoio  Técnico  Especializado  Travessa  do  Ouvidor  38    ⎟    Centro    ⎟    Rio  de  Janeiro    ⎟    RJ    ⎟    22234-­‐090    ⎟    [email protected]    ⎟    21  2224  9910  

PARECER  TÉCNICO  N.  072/2013  Ref.:  Processo  MPRJ  n.  2012.00636641,  MA  6886,  ACP  n.  0421134-­‐93.2012.8.19.0001  

Origem:  GAEMA  -­‐  Grupo  de  Atuação  Especial  de  Defesa  do  Meio  Ambiente    

 

 

PARECER   TÉCNICO.  NOVO  AUTÓDROMO   DO  RIO  

DE   JANEIRO.   Realização   de   vistoria,   na   área  

pretendida   para   implantação   do   Novo  

Autódromo   Internacional,   localizada   na   Estrada  

do   Camboatá,   Ricardo   de   Albuquerque,   RJ,  

visando   verificar   o   cumprimento   da   Liminar  

concedida   no   Processo   n.   0421134-­‐

93.2012.8.19.0001,   para   que   o   estado   se  

abstenha   de   realizar   qualquer   intervenção   no  

local.  

Palavra-­‐Chave:   Autódromo,   Fragmento   Florestal  de   Mata   Atlântica,   Processo   de   Licenciamento,  Danos   Ambientais,   Área   de   Preservação  Permanente,  Ricardo  de  Albuquerque.      

 

 

1. INTRODUÇÃO  

O  presente  Parecer  Técnico  refere-­‐se  à  vistoria,   realizada  no  dia  01/04/13,  na  

área   pretendida   para   implantação   do   Novo   Autódromo   Internacional   do   Rio   de  

Janeiro,   em   atendimento   à   solicitação   do   Grupo   de   Atuação   Especial   de   Defesa   do  

Meio  Ambiente  –  GAEMA.  A  vistoria   teve   como  objetivo  verificar  o   cumprimento  da  

liminar   concedida   no   Processo   n.   0421134-­‐93.2012.8.19.0001,   para   que   o   estado   se  

abstenha   de   realizar   qualquer   intervenção   no   local   até   a   concessão   da   LI   com  

observância  dos  requisitos  legais  e  realização  de  Estudo  de  Impacto  Ambiental.      

A  vistoria  na  área  foi  realizada  em  duas  etapas.  No  período  da  manhã  a  vistoria  

foi   acompanhada   pelo   Promotor   de   Justiça,   Dr.   José   Alexandre   Maximino   Mota,   e  

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foram  percorridas  as  vias  de  acesso  que  cortam  a  propriedade  identificando-­‐se  corpos  

hídricos  existentes  na  propriedade,  bem  como,  as  áreas  onde  está   sendo   realizada  a  

atividade  de  descontaminação  do  terreno.  No  período  da  tarde,  os  técnicos  que  a  este  

subscrevem,  realizaram  a  caracterização  de  trecho  dos  remanescentes  florestais  onde  

estão  previstas  as   intervenções  voltadas  à   supressão  vegetação  para   implantação  do  

autódromo,   de   modo   a   obter   informações   sobre   o   estado   de   conservação   da  

vegetação  e  composição  florística  local  (Figura  01).  

 Figura   1   –   Área   percorrida   na   vistoria   realizada   em   01/04/2013.   Em   amarelo   e   vermelho  observam-­‐se   os   trechos   percorridos   durante   a   vistoria,   onde   se   realizou   a   caracterização   dos  remanescentes   florestais.   Em   rosa,   observam-­‐se   a   localização   de   ecossistemas   brejosos  constatados  durante  a  vistoria.      

2. CARACATERIZAÇÃO  FLORISTICA  DA  ÁREA  

A  vegetação  do  município  do  Rio  de  Janeiro  encontra-­‐se  inserida  no  domínio  da  

Mata  Atlântica,  que  abrange  diversas  formações  florestais  e  ecossistemas  associados  à  

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costa  atlântica  brasileira.  A  área  esta   inserida   integralmente  na  formação  classificada  

como  Floresta  Ombrófila  Densa  de   Terras  Baixas,   formações   florestais   originalmente  

presentes  na  região  do  empreendimento1.  

Constatou-­‐se,   que   atualmente,   tais   fragmentos   representam   trechos   de  

vegetação  secundária  em  variados  estágios  sucessionais  de  regeneração.    

Os   fragmentos   caracterizam-­‐se   por   apresentar   uma   fisionomia   arbórea   onde  

ocorre  a  diferenciação  em  estratos  (i)  estrato  superior,   (ii)  estrato  médio,  (iii)  estrato  

arbustivo/baixo-­‐arbóreo  e  (iv)  estrato  herbáceo/subarbustivo.  

O   estrato   superior   apresenta-­‐se   descontínuo   e   com   árvores   que   apresentam  

alturas   variando   entre   10-­‐14   metros,   ocorre   a   presença   de   árvores   emergentes  

alcançando  aproximadamente  18  m,  onde  caracteriza-­‐se  pela  presença  de  Ficus  spp.,  

Tabebuia   spp.   e   Arecastrum   sp.,   Ocotea   sp.,   Cinnamomum   sp.,   Caesalpiniea   férrea,  

entre  outras  (Figuras  02  a  05).    

 Figura  02-­‐  Vista  do  dossel  da  floresta  e  observação  da  presença  das  árvores  emergentes.      

                                                                                                               1  Sistema  fisionômico-­‐ecológico  proposto  por  Veloso  et  al.,  (1991)  e  adotado  pelo  IBGE  (1992)  

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 Figura  03-­‐  Vista  do  dossel  e  em  destaque  a  presença  da  espécie  Caesalpiniea  ferrea  (pau-­‐ferro).      

 Figura  04  –  Em  destaque  a  presença  de  espécies  emergentes  do  interior  dos  fragmentos.      

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 Figura  05-­‐  Vista  do  dossel  da  floresta.  

Foi   observado,   no   segundo   estrato   árvores   com   alturas   entre   6   e   9   metros  

apresentando  espécies  como  Alchornea    triplinervia,  Croton  sp.,  Xylopia  sp.,  Cordia  sp.,  

Piptadenia   gonoacantha,   Parapiptadenia   sp.,   Inga   sp.,   Trema   micranta,   Luehea  

divaricata,  Tabebuia  sp.  e  entre  outras  (Figura  06).    

 Figura  06-­‐  Vista  do  diâmetro  das  árvores  presente  no  estrato  médio  no   interior  do  fragmento  florestal.    

No   interior   da  mata,   o   estrato   arbustivo/baixo-­‐arbóreo   exibe   uma   densidade  

média   a   alta   que   dividem   o   espaço   com   indivíduos   jovens   de   espécies   arbóreas  

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características  dos  estratos  superiores  (Figura  07).  Trepadeiras  e  lenhosas  são  comuns  

nas  bordas  e  em  alguns  trechos  no  interior  dos  fragmentos.    

O   estrato   herbáceo/subarbustivo   mostra-­‐se   medianamente   denso,   e  

sobressaem  espécies  das  famílias  Fabaceae,  Melastomataceae,  Myrtaceae,  Piperaceae  

e   entre   outras   (Figura   08).   É   comum   ao   longo   dos   fragmentos   a   formação   de   uma  

camada  geralmente  espessa  e  contínua  de  serapilheira  em  intensa  decomposição.    

As   áreas  antropizadas     se   concentram   nas  bordas  dos   fragmentos   onde   estão  

localizadas  as  estradas  e  trilhas  

 Figura  07  -­‐  Vista  do  sub-­‐bosque  do  fragmento  florestal.  

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Figura  08  -­‐  Vista  da  sucessão  ecológica  do  fragmento  florestal.    

3.  PRESENÇA  DE  ÁREAS  BREJOSAS  E  PROVÁVEL  OCORRÊNCIA  DE  ESPÉCIES  DA  FAUNA  AMEAÇADAS  DE  EXTINÇÃO  

A   vistoria   ocorreu   em  período   chuvoso,   constatando-­‐se   a   presença  de   cursos  

d’água  e  ecossistemas  brejosos  na  área  da  vistoriada  (Figura  09  e  10).  As  vias  de  acesso  

existentes   no   interior   da   propriedade   transpassam   áreas   alagadiças   e   na   ocasião   da  

vistoria  alguns  trechos  estavam  submersos  (Figura  11).      

Esse   tipo   de   ambiente   consiste   de   habitat   típico   de   espécies   de   peixes   da  

família  Rivulidae,  conhecidos  como  peixe  anual  ou  peixe  das  nuvens.    Espécies  dessa  

família   possuem   um   ciclo   de   vida   altamente   especializado,   vivendo   unicamente   em  

brejos  temporários  regulados  pelos  ciclos  das  chuvas.  Devido  a  essa  especificidade  e  a  

crescente   destruição   de   seu   habitat,   espécies   desse   grupo   estão   ameaçadas   de  

extinção  em  âmbito  global.    

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 Figura  09-­‐  Vista  de  área  brejosa,  biótopo  de  peixe  temporários  (Rivulídeos),  inserida  no  interior  da  área  prevista  para  implantação  do  Novo  Autódromo.      

 

 Figura  10-­‐  Vista  de  outra  área  brejosa   inserida  no   interior  da  área  prevista  para   implantação  do  Novo  Autódromo.    

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 Figura  11-­‐  Vista  de  trecho  da  via  de  acesso  que  corta  áreas  alagadiças.    

Há   registro   na   literatura   científica   (Costa   20132)   da   presença   de   espécie   de  

Rivulidade,   Leptolebias   opalescens,   em   ecossistema   brejo   próximo,   localizada   no  

Campo  de  Gerencinó.   Esta   informação,   aliada   à   existência  do  Biótopo  da  espécie  na  

área,   reforçam   a   probabilidade   de   ocorrência   da  mesma   na   área   pretendida   para   a  

instalação   do   novo   autódromo.   Leptolebias   opalescens   consta   da   Lista   Nacional   de  

espécies   de   invertebrados   aquáticos   e   peixes   ameaçados   de   extinção   (Instrução  

Normativa   do   Ministério   do   Meio   Ambiente   n.   5   de   21   de   maio   de   2004)   como  

criticamente  em  perigo.      

Apesar  da  evidencia  da  presença  da  espécie  na  área  prevista  para  implantação  

do  Novo  Autódromo,   tal  questão  não   foi   considerada  no  processo  de   Licenciamento  

                                                                                                               2   Costa  W.   J.   E.  M.   Leptolebias   opalescens,   a   supposedly   extinct   seasonal   killifish   from   the  

Atlantic  Forest  of  south-­‐eastern  Brazil,  rediscovered  31  years  after   its   last  record  (Cyprinodontiformes:  Rivulidae).  Ichthyol.  Explor.  Freshwaters,  Vol.  23,  No.  4,  pp.  357-­‐358,  1  fig.,  March  2013    

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ambiental,   deixando-­‐se   de   avaliar   possível   existência   de   Área   de   Preservação  

Permanente,  referente  ao  habitat  de  espécie  ameaçada  de  extinção3.    

Informa-­‐se   ainda,   que   Leptolebias   opalescens   é   uma   das   espécies   foco   do  

“Plano   de   Ação   Nacional   para   a   Conservação   dos   Peixes   Rivulídeos   Ameaçados   de  

Extinção”  encabeçado  pelo  ICMBio  e  que  tem  entre  seus  objetivos4:    

Proteger   os   biótopos   remanescentes   na   região   de  distribuição  das  espécies  de  peixes  rivulídeos  focais  do  PAN,  impedindo   que   sejam   alterados   ou   suprimidos   em  decorrência  de  atividades  agrosilvopastoris,  da  implantação  de   empreendimentos   (como   barragens,   açudes,   rodovias,  parques  eólicos,  portos,  complexos  hoteleiros  e  outros)  e  da  urbanização.  

A   confirmação  da  presença  do  peixe  na  área  e   a  preservação  de   seu  biótopo  

são   ações   essenciais   para   a   conservação   da   espécie,   uma   vez   que   os   brejos  

representam  áreas  de  grande  sensibilidade  ambiental  e  qualquer  intervenção  na  área  

ou   proximidades   pode   vir   alterar   o   regime   hidrológico   e   levar   a   extinção   local   da  

espécie.   Informa-­‐se   que   o   projeto   considerado   no   processo   de   Licenciamento   se  

sobrepõe  a  essas  áreas  constatadas  no  trecho  vistoriado  da  propriedade  (Figura  12).      

                                                                                                               3   Os   locais   de   refúgio   e   reprodução   de   espécies   ameaçadas   de   extinção   são   Áreas   de  

Preservação  Permanente  de  acordo  com  o  art.  3º,  XIV  da  Resolução  CONAMA  303  de  20  de  março  de  2002  e  inciso  IV  do  art.  268  da  Constituição  do  Estado  do  Rio  de  Janeiro.  

4   MMA.   Sumário   Executivo   Do   Plano   De   Ação   Nacional   Para   A   Conservação   Dos   Peixes  Rivulídeos  Ameaçados  De  Extinção.  Brasília,  Janeiro  de  2013.  

http://www.icmbio.gov.br/portal/biodiversidade/fauna-­‐brasileira/plano-­‐de-­‐acao/2833-­‐plano-­‐de-­‐acao-­‐nacional-­‐para-­‐a-­‐conservacao-­‐dos-­‐rivulideos.html  

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 Figura   12-­‐   Vista   do   Projeto   do   autódromo   com   desenho   esquemático   identificando,  aproximadamente   (em   vermelho),   local   onde   há   sobreposição   do   projeto   aos   ecossistemas  brejosos  identificados  durante  a  vistoria.      

4.    DAS  INTERVENÇÕES  CONSTATADAS  DURANTE  A  VISTORIA  DO  DIA  01/04/2013  E  OS  DANOS  AMBIENTAIS  ASSOCIADOS    

Durante   a   vistoria,   constatou-­‐se   que   não   foram   iniciadas   as   obras   para  

instalação   do   empreendimento.   No   entanto,   o   exército   iniciou   o   processo   de  

descontaminação   do   terreno,   cujo   subsolo   encontra-­‐se   contaminado   por   artefatos  

militares.   Nas   áreas   de   floresta,   visando   possibilitar   o   acesso   aos   equipamentos  

inerentes   à   atividade   de   descontaminação,   esta   sendo   realizada   a   supressão  

deliberada  do  sub-­‐bosque  (Figuras  13  e  14).    

Essa   supressão   vem   sendo   executada   sem   qualquer   planejamento   ou  

acompanhamento  por  profissional  habilitado,  constatando-­‐se  que,  em  alguns  trechos,  

a   limpeza  excede  o  necessário,  atingindo,  além  da  vegetação  sub-­‐arbustiva  e  rasteira  

do  extrato  inferior  da  floresta  (sub-­‐bosque),  espécies  de  maior  porte  (Figura  15  a  18).  

 

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 Figura   13   e   14-­‐   Vista   de   trecho   onde   foi   realizada   a   supressão   de   vegetação   para   a  descontaminação.   Em   segundo   plano   observa-­‐se   a  mata   fechada   adjacente   que   não   sofreu  intervenção.    

 

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 Figura  15-­‐  Vista  de  trecho  onde  foi  realizada  a  supressão  de  vegetação,  observando-­‐se  o  tronco  com  diâmetro  de  aproximadamente  15cm.  

 

 Figura  16-­‐  Vista  de  trecho  onde  foi  realizada  a  supressão  de  vegetação,  observando-­‐  se  o  tronco  com  diâmetro  aproximado  de  20cm.  

 

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 Figura  17-­‐  Vista  de  trecho  onde  foi  realizada  a  supressão  de  vegetação,  observando-­‐se  o  tronco  com  diâmetro  12  a  15cm.  

 

   

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

     Figura  18-­‐  Vista  de  trecho  onde  foi  realizada  a  supressão  de  vegetação.    

A   supressão  deliberada  do   sub-­‐bosque  da   floresta   tem  efeito   deletério   sobre  

todo  o  ecossistema,  comprometendo  a  biodiversidade  da  flora,  assim  como,  da  fauna  

associada   à   ambientes   florestais.   Os   danos   ambientais   relacionados   com   esta  

intervenção  podem  ser  caracterizados  da  seguinte  forma:  

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(a) Supressão  de  espécies  da  flora  e  perda  de  material  genético;  

(b) Extinção   das   populações   de   espécies   da   flora   em   uma  comunidade;  

(c) Diminuição  da  capacidade  suporte  para  a  fauna  em  decorrência  da   supressão   de   áreas   de   nidificação,   abrigo   e   diminuição   de  recursos   alimentares.   É   importante   destacar   que   o   sub-­‐bosque  provê   recursos   alimentares   e   habitat   para   diversos   grupos  faunísticos,  existindo  espécies  que  dependem  exclusivamente  desse  tipo  de  ambiente.          

(d) Afugentamento  da   fauna  de  maior  mobilidade,   especialmente  da  fauna  alada;  

(e) Comprometimento  do  processo  de  polinização;  

(f) Comprometimento  do  processo  de  sucessão  ecológica;  

(g) Alteração  na  estrutura  da  população  da   fauna  em  decorrência  de   possível   aumento   de   competição   predação   e   possível   extinção  local  de  populações  de  espécies  em  uma  comunidade;  

(h) Risco   de   supressão   de   espécies   ameaçadas   de   extinção,   uma  vez  que  não  houve  estudos  prévios  e   controle   sobre  a   intervenção  realizada.  

(i) Maior  influência  dos  fatores  abióticos  como  luz  e  temperatura;  

(j) Alteração  da  composição  e  estrutura  florística;  

(k) Aumento   do   efeito   de   borda5   o   que   contribuirá   para   o  desequilíbrio   do   ecossistema   criando   condições   para   a   colonização  da   área   por   espécies   exóticas   e   agressivas   em   detrimento   da  vegetação  nativa.  

(l) Ressecamento  e  comprometimento  da  fertilização  do  solo;  

(m) Aumento   do   escoamento   superficial   e   alteração   da   hidrologia  local;  

(n) Possibilidade  de  instalação  de  processos  erosivos.    

       

 

 

                                                                                                               5  Efeito    exercido  pela  área  adjacente  sobre  o  fragmento  de  floresta  a  partir  das  bordas  que  são  

trechos  de  floresta  perturbada,  mais  quentes  e  mais  iluminadas  que  o  interior  das  matas.      

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5.  RELEVÂNCIA  DA  ÁREA  COMO  CORREDOR  ECOLÓGICO    

Como   já   destacado   no   PT   113/2012   elaborado   pelo   GATE   em   18/06/20126   a  

SMAC   incluiu   a   área   do   autódromo   no   projeto   corredores   verdes7,   integrando   o  

Corredor  Maciço  do  Mendanha-­‐Maciço  da  Pedra  Branca  (via  Vila  Militar),  que  engloba:  

área   do   Campo   de   Gericinó,   a   Vila   Militar,   o   Morro   da   Estação,   e   o   curso   do   Rio  

Marangá   (Figura   19),   como   estratégia   para   conservação   da   fauna   e   flora   em   longo  

prazo,   incentivado  pelo  Ministério  do  Meio  Ambiente  –  MMA,  no  âmbito  do  Mosaico  

Carioca  (reconhecido  formalmente  através  da  Portaria  MMA  245,  de  11  de  julho  de  2011).  

 Figura   19   -­‐   Localização   da   área   do   empreendimento,   no   âmbito   do   Corredor  Maciço   do  Mendanha-­‐Maciço  da  Pedra  Branca.  

  O  fragmento  florestal  existente  no  terreno  ora  em  análise,  assume  uma  posição  

fundamental   para   a   conexão  entre   as  Unidades  de  Conservação  e   a  manutenção  do    

fluxo   gênico   entre   populações,   uma   vez   que   representa   um   dos   poucos   fragmentos  

                                                                                                               6  Cf.  fls.  149/167  ,  Volume  I  do  Inquérito  Civil.  7  Corredores  Verdes  -­‐  Relatório  do  Grupo  de  Trabalho  (Resolução  SMAC  P  nº183  de  07.11.2011).  

Mapeamento   da   Cobertura   Vegetal   e   do   Uso   das   Terras   do   Município   do   Rio   de   Janeiro.  http://www.rio.rj.gov.br/web/smac/  

Área  do  empreendimento  

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florestais   íntegros  na  paisagem  que   integra  o  corredor  Maciço  do  Mendanha-­‐Maciço  

da  Pedra  Branca.  

  Nesse   contexto,   extrai-­‐se   a   seguinte   análise   apresentada   no   “Relatório   de  

Avaliação  da  Vegetação  do  Fragmento  Florestal  do  Morro  do  Camboatá,  no  Centro  de  

Instruções  de  Operações  Especiais,  Bairro  de  Deodoro,  Município  do  Rio  de   Janeiro”,  

elaborado   por   pesquisadores   do   Instituto   de   Pesquisa   Jardim   Botânico   do   Rio   de  

Janeiro  (fls.  335.  Vol.  I  do  Inquérito  Civil):      

O   remanescente   florestal   de   Camboatá   está  estrategicamente   localizado,   como   uma   ilha   de   vegetação  nativa   encravada   em   uma   matriz   fortemente   antropizada,  entre   os   Maciços   da   Tijuca,   Pedra   Branca   e   Gerincinó-­‐  Mendanha  (Figura  5).  Sua  localização  peculiar  e  a  existência  de  ao  menos  20ha  de  floresta  nativa  madura,  além  de  cerca  de   67ha   de   floresta   em   estágio   avançado   de   regeneração,  favorece   que   o   Campo   de   Instrução   do   Camboatá   seja  utilizado  por  animais,  especialmente  alados,  como  pássaros  e  morcegos,  no  forrageamento  entre  as  áreas  dos  diferentes  maciços.    As  florestas  do  Camboatá  devem  servir  como  área  de  descanso,  pouso,  alimentação  ou  abrigo,  permitindo  que  o  remanescente  funcione  como  um  ponto  de  parado  (“step  stone”)   para   os   animais,   enquanto   forrageiam   entre   os  maciços.        

É   importante  destacar   ainda  que  o  Morro  da  Estação,   inserido  no   terreno  do  

empreendimento,  é  considerado  Sítio  de  Relevante  Interesse  Paisagístico  e  Ambiental  

Municipal,   pelo   artigo   117,   VIII   do   Plano   Diretor   da   Cidade   do   Rio   de   Janeiro   (Lei  

Complementar  111,  de  1  de  fevereiro  de  2011).    

6.    DAS  RESTRIÇÕES  LEGAIS  A  SUPRESSÃO  DE  VEGETAÇÃO    

Em   relação   à   supressão   de   vegetação   de   Mata   Atlântica,   deve-­‐se   analisar   o  

atendimento  à  Lei  11428,  de  22  de  dezembro  de  2006,  que  no  art.  31  e  art.  31,  §1º,  

que  estabelece  critérios  para  autorização  de  vegetação  secundária  em  estágio  médio  

de  regeneração  em  áreas  urbanas.    

De   acordo   com   a   Lei   11428,   de   22   de   dezembro   de   2006,   supressão   de  

vegetação  secundária  em  estágio  médio  e/ou  avançado  de  regeneração,  para   fins  de  

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loteamento   ou   edificação,   depende   de   prévia   autorização   do   órgão   estadual  

competente   e   da   garantia   de  preservação  de   vegetação  nativa   em,   no  mínimo,   30%  

(trinta   por   cento)   e   50%   (cinquenta   por   cento)   da   área   total   coberta   por   estas  

vegetações,  respectivamente.  No  entanto,  ressalva-­‐se  o  disposto  nos  arts.  11,  12  e  17  

da  referida  lei.        

A   ressalva   relacionada   ao   art.   11   refere-­‐se   aos   seguintes   casos   em   que   a  

supressão  de  vegetação  em  estágio  médio  e  avançado  de   regeneração  não  pode  ser  

autorizada:   (i)   possuir   excepcional   valor   paisagístico,   reconhecido   pelos   órgãos  

executivos   competentes   do   Sistema  Nacional   do  Meio   Ambiente   –   SISNAMA;   (ii)   ou  

formar   corredores   entre   remanescentes   de   vegetação   primária   ou   secundária   em  

estágio  avançado  de  regeneração.  

Como  apresentado  nos  itens  anteriores  e  no  PT  do  GATE  113/2012,  o  Morro  da  

Estação,  que  se  insere  na  área  do  empreendimento,  é  considerado  Sítio  de  Relevante  

Interesse   Paisagístico   e   Ambiental   Municipal   e   o   fragmento   florestal   existente   no  

empreendimento   possui   um   posicionamento   estratégico   e   relevância   para   a  

manutenção   da   conexão   entre   os   ecossistemas   existentes   em   unidades   de  

conservação  do  entorno.  Neste  contexto,  é  o  entendimento  desse  grupo  técnico  que  

tais  requisitos  fundamentam  o  enquadramento  da  floresta  existente  na  área  destinada  

à  implantação  do  novo  autódromo  do  Rio  de  Janeiro  nas  hipóteses  em  que  a  supressão  

de   vegetação   não   pode   ser   autorizada,   destacadas   nos   itens   i   e   ii   no   parágrafo  

anterior.      

Além   das   questões   relacionadas   às   restrições   à   supressão   de   vegetação,   há  

ainda  as  restrições  relacionadas  às  Áreas  de  Preservação  Permanente  que  devem  ser  

investigadas.    

7.    CONCLUSÃO    

 Durante   a   vistoria   constatou-­‐se   que   o   exército   iniciou   o   processo   de  

descontaminação  da  propriedade  prevista  para   implantação  do  Novo  Autódromo  do  

Rio  de  Janeiro.      

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Neste  processo,  vem  sendo  realizada  a  supressão  deliberada  do  sub-­‐bosque  e,  

em   alguns   casos,   de   árvores   de   maior   porte,   sem   qualquer   planejamento,  

licenciamento  ambiental  ou  ainda,  acompanhamento  por  profissional  habilitado.  Essa  

intervenção  acarreta  danos  ambientais  à  fauna  e  flora.    

Constatou-­‐se   a  presença  de  ecossistemas  brejosos  na   área   vistoriada,   biótipo  

de  espécies  da  família  Rivulidade,  ressaltando-­‐se  a  grande  probabilidade  de  ocorrência  

de  espécies  no  local,  em  especial  Leptolebias  opalescens,  uma  vez  que  a  presença  da  

espécie   foi   registrada   em   área   próxima.   Essa   espécie   encontra-­‐se   criticamente  

ameaçada  de  extinção.    

A   investigação   da   presença   da   espécie   na   área   é   fundamental   devendo   ser  

preservado  seu  biótipo  como  Área  de  Preservação  Permanente.  

Nesse   contexto,   recomenda-­‐se   que   seja   realizada   consulta   ao   ICMBio   no  

âmbito   do   “Plano   de   Ação   Nacional   para   a   Conservação   dos   Peixes   Rivulídeos  

Ameaçados  de  Extinção”  encabeçado  pelo  referido  órgão.    

 

Rio  de  Janeiro,  10  de  abril  de  2013.  

 

 

   SIMONE  MANNHEIMER  DE  ALVARENGA  

Técnico  Pericial  Matrícula  n.  2924  

FERNANDA  FERREIRA  FONTES  Técnica  Pericial  Matrícula  n.  6129