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1 Universidade Federal Fluminense Psicanálise dos Contos de Fadas Psicologia da Educação Dayana Gomes Marques Thais Lucas Serra Luiza Menezes Gesteira Livea Monteiro Rocha Niterói Junho de 2012

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Universidade Federal Fluminense

Psicanálise dos Contos de Fadas

Psicologia da Educação

Dayana Gomes Marques

Thais Lucas Serra

Luiza Menezes Gesteira

Livea Monteiro Rocha

Niterói

Junho de 2012

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Sumário:

1-Introdução

2- Distinção entre conto de fadas e mito (otimismo e pessimismo)

3-A identificação da criança com os personagens ( ser bom ou ser Mau)

4-a necessidade de ser amado, medo do abandono

5- A mãe, a madrasta e a madrinha

6- A sexualidade

7-o desenvolvimento da criança

8- Conclusão

9- Bibliografia

Pag.3

Pag.6

Pag.7

Pag.11

Pag.12

Pag.14

Pag.16

Pag.18

Pag.24

3

1-Introdução:

Ao analisarmos, percebemos a importância que os contos de fada tem no

desenvolvimento intelectual e moral das crianças. Enquanto distraem, divertem e

prendem a atenção infantil, estes contos também levantam questões relacionadas a

própria criança e sua personalidade. Ao primeiro olhar, nos parece historias inocentes

direcionadas a crianças, mas tratam-se verdadeiramente de grandes trabalhos com

altos significados psicológicos.

Em “A psicanálise dos contos de fadas” Bruno Bettlheim nos relata que os contos

possuem temas implícitos como: decepções narcisistas, dilemas edipianos, rivalidades

fraternas, a sexualidade, o crescimento, entre outros. Através do conto de fada a

criança entendera, sem perceber, o que está se passando dentro de seu eu consciente

para que também possa enfrentar o que se passa em seu inconsciente. Isso não é

alcançado através de uma compreensão racional, mas sim através de devaneios, de

fantasias criadas pelas historias de fadas.

O conto que aparentemente tem a função de entreter cercado de pura imaginação

esta, de modo disfarçados, os sentimentos que cercam o interior da criança, como o

sentimento de raiva ao ser abandonado pelos pais ou na possibilidade de vencê-los em

esperteza, passando para a criança mensagens importantes para sua vida, como nunca

desistir perante os obstáculos por mais que no início pareçam difíceis.

Há histórias nos contos de fadas que aparentemente são bobas e sem importância

como no conto dos "Os Três Porquinhos" que mostra as vantagens e a evolução da

maturidade através dos três irmãos e suas construções; O caçula da prioridade a uma

casa de palha dando importância principal a brincadeira, e não a estrutura e a

segurança da casa, o porquinho do meio tem uma maturidade um pouco maior a do

irmão menor, porém, ainda não possui um amadurecimento maior a do irmão

construindo uma casa de madeira e também dando prioridade as brincadeiras, diferente

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dos irmãos o mais velho tem um amadurecimento adequado, tendo uma noção maior da

realidade dos perigos que podem ocorrer, e constrói uma casa de tijolos pensando na

segurança e nos perigos existentes e prevendo a invasão do Lobo mau, que se quer

fora narrado no início da história.

Os contos de fadas em algumas histórias possui vários significados mostrando os

conflitos internos aos protagonistas assim como aos leitores que podem se destruírem

por acontecimentos que não são superados podendo como consequência causar danos

destrutivos a essas pessoas, como no conto das Mil e uma noites, onde o rei Xazenã ao

ser traído por sua esposa não mais confia em ninguém casando-se e matando suas

esposas até se casar com Xerazade que estimula seus desejos internos para se salvar

da morte. Estando com isso clara manifestações de Id, Ego e o Superego dos

protagonistas, Ego sendo movido pelo Superego, que é representado no conto com a

Xerazade, o rei com seu Id incontrolado até encontrar o seu Ego.

É interessante destacar a visão de anulação dos contos de fadas pelos pais que

fecham a visão do que esta intrínseca nos contos, escondendo ou não acreditando

neles tirando muitas vezes da criança o desejo de sonhar. Todas as histórias possuem

suas características na fantasia como a visão do herói que sempre se da bem no final e

o castigo que ocorre com os maus. Elas mostram os impulsos reais e como é difícil

aceitar a imaginação que cerca os contos, e também destacam a realidade como no

conto de João e Maria que no início da história mostra as dificuldades dos pais deles

para criá-los, fato que esta visível aos olhos da humanidade que muitas vezes os

tornam amargurados e modificam sua personalidade.

Contudo da para notar a importância dos contos de fadas para a demonstração dos

sentimentos infantis para encontrarem e formarem suas identidades seu

desenvolvimento ao que se refere à maturidade, suas preocupações internas, enfim,

sua percepção do mundo e o crescimento da sua personalidade.

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Segundo Bettelheim o conto de fadas é o espelho onde podemos nos reconhecer

com problemas e propostas de soluções que só podem ser elaboradas na imaginação.

A moral dos contos de fadas é a que torna desejável o bem pela recompensa, sob a

forma da posse do objeto da busca e pune o mal com o fracasso ou com a morte

daqueles que se entregam à pulsão destruidora do id.

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2-Distinção entre conto de fadas e mito (otimismo e pessimismo)

Além dos contos de fadas e as fábulas também há os mitos, que desempenham um

papel oposto aos contos de fadas que se caracterizam pelo otimismo, enquanto o mito é

pessimista. Nos mitos como nos contos de fadas existe um ponto em comum que é a

existência de fatores internos ao pensamento, muitas vezes ocultos, são a Id, o Ego e o

Superego, que se incluem aos sonhos dos espectadores dessas histórias. O mito possui

um caráter pessimista, e na maioria das vezes acaba com um final trágico, já nos contos

de fadas os protagonistas sempre têm um final feliz. Normalmente no que diz respeito a

Id, Ego e Superego, os mitos fazem demonstrações de "solicitações do superego em

conflito com uma ação motivada pelo Id e com desejos de autopreservação do Ego" (p

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3-A identificação da criança com os personagens( ser bom ou ser Mau)

A principal característica do conto maravilhoso é que, ao desenrolar a história,

geralmente seus personagens possuem motivo e motivação comuns, além do

encantamento, que é parte fundamental, em que um ser sobrenatural interfere na

história de maneira positiva ou negativa. Na verdade, esta é a função que o faz ser tão

diferente das narrativas literárias que se tem conhecimento, pois quando parece não

haver mais saída, surge a intervenção de uma fada para salvar o herói do grande

conflito e mudar o seu destino.

O enredo envolve sempre a luta do bem contra o mal em que a solução é encontrada

através do encantamento. Desta forma, o mal age sobre o bem, na intenção de

prejudicá-lo, nasce o grande conflito, até que o bem vence, o mal é castigado e todos

serão "felizes para sempre". O enredo dos contos de fadas se baseia pela sequência

narrativa dividida em episódios.

Deste modo, se pode destacar: a situação inicial, quando a tranquilidade reina e os

personagens são apresentados, o protagonista, sua família, suas qualidades, suas

carências, suas motivações e seu destino, o espaço e o tempo; os próprios

personagens e suas características marcantes (bom ou mal); o conflito, quando parece

não haver mais saída, geralmente é uma complicação na vida do personagem principal;

solução do conflito com a intervenção da magia; e o desfecho (casamento, recompensa,

reparação), sempre satisfatório.

A estrutura dos contos de fadas trazem sempre um problema ligado à realidade, que

desequilibra a tranquilidade e a ordem dos personagens. No desenvolvimento, têm-se o

clímax, o qual vai dar prosseguimento a um conflito gerado pela rivalidade entre o bem

e o mal. A solução se dá no plano da fantástico com a intervenção da magia, quando a

vida dos personagens voltam à ordem no desfecho da narrativa e todos seguem "felizes

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para sempre". Neste momento, há um retorno à realidade, mostrando que a fantasia

tem suas funções eficazes no universo da literatura infantil, mas que não se pode viver

neste mundo para sempre.

Neste tipo de narrativa, a magia, o herói e os seres mágicos são de suma

importância. Os personagens são representados por herói, antagonista, fada, objeto

mágico, heroína de acordo com a função de cada personagem. É válido acrescentar

fatores interessantes ao enredo das narrativas fantásticas, tais como: afastamento,

proibição, transgressão, recepção do objeto mágico, partida, provação do heróis, marca,

reação do herói, deslocamento no espaço, reconhecimento do herói, transfiguração,

reconhecimento, desenlace.

Todos os conflitos humanos são resolvidos através da fantasia e o para sempre

"felizes para sempre" é uma maneira divertida e positiva de transmitir para as crianças

uma visão otimista do mundo, mostrando problemas o enfrentamento e sua solução e,

ainda, permitem participarem das aventuras, formularem suas perguntas e buscar suas

respostas.

A função de "Era uma vez, num reino muito distante..." é justamente localizar a

história fora do tempo e da localização, em um mundo sobrenatural. O tempo e a

duração dos acontecimentos não são contados por lá e talvez, por isso, não seja

cobrada fiel verossimilhança dos contos maravilhosos. Em um lugar onde tudo acontece

de repente, o tempo e o lugar são apenas meros cenários de uma fantástica história

vivida pelos personagens.

A dimensão do mundo fantástico carrega na sua narrativa um simbolismo muito

significativo e contraditório: a dor e o amor, o medo e a felicidade, a vida e a morte. A

revelação desta arte literária distancia em símbolos o bom e o mau. A dor, o medo e a

morte são condições que distanciam as pessoas dos ideais comuns da humanidade,

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que são o amor, a felicidade e a vida. Neste contexto, é observável que as narrativas

contam o relato do homem, seus desejos, suas expectativas, a superação do mal e a

permanência do bem.

Os personagens centrais são o protagonista, o antagonista e o mediador mágico da

história. Pode-se então caracterizá-los como o herói (protagonista), aquele que prova

sua força, inteligência e bondade, podendo ser reconhecido como a personificação do

bem. Já o vilão (antagonista), geralmente a bruxa, dramatizam as cenas com

suspenses, armadilhas e crueldades contra o herói.

Apresentam príncipes e princesas como protagonistas da história ,os heróis, que

vivem problemas terríveis criados por seres malévolos, para isso, contam com a ajuda

dos seres mágicos, fadas, magos, anões. Quando os protagonistas não são

representados por seres símbolos de bondade, que buscam riqueza, poder e satisfação

em geral, incluindo-se até alguns desvios de caráter, são malandros às vezes ladrões.

E importante ressaltar que nos contos de fada o mal é tão onipresente quanto o bem.

E o leitor, a criança não está “salva” de se sentir-se mais a vontade com o vilão, dele lhe

ser mais atrativo. Vai ser o medo da punição e a percepção de que o crime não

compensa que irá fazer com que ela largue o mal.

Ao se depararem com personagens dos contos de fadas, as crianças tendem a se

identificar com eles. Essa identificação, porém, é resultado não só dos sentimentos da

criança, mas também de como a história se desenvolve. Isso ocorre por que a criança,

de certa forma, fica impedida de“querer ser” o vilão, pois esse sempre sofre uma

punição no final. A identificação fica canalizada ao herói, mesmo que ele não represente

algo tão próximo ao interior da criança.

Com isso, fica evidente o tom pedagógico nos contos de fada. É preciso moldar o

pensamento daquele que ouve e lê a história, promovendo bons valores. A figura do

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vilão deve servir de exemplo daquilo que não se deve ser e o herói o exemplo a ser

seguido.

O tom de justiça ao final dos contos, como quando as crianças matam a bruxa no

final de João e Maria ou quando as madrastas são punidas em histórias de princesas,

aproxima do universo infantil a noção de que tudo que se faz gera consequências, ruins

ou boas, depende de qual caminho se resolve seguir.

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4- A necessidade de ser amado

As crianças, por serem totalmente dependentes dos pais e por terem com esses

laços extremamente fortes, não conseguem se ver sem sua presença. A questão de

sobrevivência está ligada diretamente aos pais, principalmente à mãe, que desde cedo

é vista como a fonte de alimento e proteção.

Em contos infantis, como João e Maria, esse medo é um ponto de grande

importância, pois é a partir desse medo que João e Maria tentam voltar para casa após

serem abandonados e, assim, todos os demais fatos se desenrolam. Eles sabem que

precisam dos pais e o retorno ao lar se torna o grande objetivo dos dois.

Em Peter Pan, a necessidade de ser amado está presente na figura de Peter, que vê

em Wendy uma figura materna e uma fonte de afeto. É ela quem lhe conta histórias e

em quem ele mais confia. Sua presença é importante como forma de suprir a falta de

uma e o risco de abandono, pois, afinal, Peter ainda é uma criança.

Ainda em João e Maria, esse medo é potencializado pela quebra de confiança das

crianças com a mãe e depois com a bruxa. As duas figuras femininas se mostram

enganadoras, ludibriam com as palavras mas se revelam a partir das ações.

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5- A mãe, a madrasta e a madrinha

Algo interessante sobre o surgimento das figuras dos contos de fadas e capacidade

de transformação na criança acerca do adulto, especialmente sobre a imagem da mãe,

esta quando não dá bronca ou não chama a atenção da criança, no entanto quando

esta decidi punir uma mau criação ou a castiga imediatamente ela se transforma na

madrasta má e cruel ou ao ser deixada sozinha por uns instantes se sentir maltratada

sempre pela mãe que se torna madrasta. A mãe nos contos geralmente esta morta e

seguidamente o pai se casa com outra que consequentemente finge-se de boa, mas é

totalmente má. Essa ideia da morte da mãe nos contos tem seu lado positivo, pois, ela

disfarçadamente ensina a criança a lidar com a morte da mãe.

Fantasiar é próprio do ser humano e a fantasia nos permite viajar pelo inconsciente

sem repressões, sem angústias. É mais fácil para a criança delirar de prazer com a

morte da bruxa de João e Maria ardendo no fogo, com a madrasta de Branca de Neve

sendo obrigada a dançar com os chinelos em brasa, nas versão dos irmãos Grimm, ou

caindo do penhasco, do que admitir seus desejos de vingança para com a rival

representada pela mãe, pois teria sentimentos de culpa, se esses castigos fossem reais.

Sejam como fadas, mães, madrastas, bruxas ou avós, a figura materna sempre está

presente nas histórias infantis. De início, representam literalmente o seio materno,

aquela que alimenta, acolhe, dá carinho, o seio bom. Depois, como se faz necessário ao

desenvolvimento da criança, tornam-se suficientemente más deixando seus filhos

abandonados na floresta, como assim o fez a madrasta de João e Maria, perseguindo e

demonstrando a rivalidade como a madrasta de Branca de Neve. Cinderela, embora

tenha perdido a mãe quando pequena, tem seus desejos realizados pela aveleira

plantada onde havia sido enterrada sua mãe, ou na versão mais moderna pela fada

madrinha. A mãe e avó de Chapeuzinho Vermelho, representam a mesma pessoa, do

mesmo modo que as duas casas representam o mesmo lugar, o que muda é a maneira

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como a menina os percebe. A mãe está disposta a quebrar o vínculo com a criança,

pede que ela se dirija à casa da avó, no entanto, no papel de ego da menina, que ainda

não está instalado, não se esquece de recomendar o devido cuidado com a floresta - o

inconsciente - e com o princípio do prazer, representado pelo Id, na figura o Lobo-Mau.

Sabemos da importância da figura materna na fase do espelho, na história do corpo

erógeno, onde a criança deverá estruturar seu ego e na consequente formação da

identidade.

Em muitas histórias, a figura da mãe não aparece claramente, no entanto, ao

averiguarmos o aspecto simbólico podemos encontrar essa mãe, representada por

outros personagens e até por árvores, como por exemplo a aveleira em Cinderela pois o

que importa é a função materna.

A história dos Três Porquinhos também começa com a mãe encaminhando-os para a

vida, tirando-lhes da casa materna para que construam as suas próprias.

Branca de Neve e os Sete Anões inicia-se com a mãe boa, mas ao sete anos, fase da

vida onde o amadurecimento ocorre pela sublimação com a substituição do pai como

objeto de desejo para o conhecimento, surge a maldade da madastra e a rivalidade

entre mãe e filha para serem elaboradas.

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6- A sexualidade

Os contos de fadas ao mesmo tempo que possuem uma forma lúdica e livre para

assim deixar a criança lidar com os seus desejos, fantasias, manifestações sexuais já

na infância, o conto dá a criança formas de lidar com os problemas que ela esta

enfrentando mental e fisicamente. Por outro lado os contos também possuem um

aspecto que reforça os padrões de repressão sexual vigente, uma vez que orienta a

criança para desejos apresentados como permitidos ou lícitos, o príncipe e a princesa,

narrando as punições a que estão sujeitas caso não sigam as “regras”.

A figura do pai da Branca de Neve que não pode fazer nada contra a madrasta

malvada é o pai do “complexo de Electra”, o pai pelo qual a menina é apaixonada. Este

pai e o príncipe que salvará Branca de Neve no final são a mesma pessoa.

Inconscientemente, sem perceber, a menina transfere o amor que ela sentia pelo pai,

que foi roubado pela bruxa malvada, para a figura do príncipe encantado. Quando a

madrasta oferece uma maça vermelha a Branca de Neve e esta come, ela cai naquilo, é

um símbolo da sexualidade feminina que ta despertando. Ela se sente suja, se sente

punida e se retrai por um tempo, dorme para o mundo até a chegada do príncipe

encantado, e pode dar vazão a sua sexualidade.

Em cinderela, quando a menina chega em um certo ponto da sua vida ela começa a

perceber a sua sexualidade, e ela se ente suja por isso. Este caso Cinderela se

reencontra com a figura da mãe boa do inicio do conto através da árvore ou da fada

madrinha, rompendo com a rivalidade existente, a mãe assim a ajuda.

Em a Bela Adormecida, por mais que o pai tente reprimir a sexualidade da filha,

queimando todos os fusos, que na verdade são uma metáfora para a genitália

masculina, ela acaba descobrindo um e adormece. Neste período que ela esta reclusa

para sexualidade, ela se descobriu e se fechou até a chegada do príncipe.

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Em João e o Pé de feijão, o gigante ou ogro, representa a figura do pai que morreu

no começo do conto. Outro caso de “complexo de édipo”. A arpa, que no conto serve

como uma princesa, representa a mãe que ele consegue tomar para si.

A historia da Chapeuzinho Vermelho está muito ligada a tentação, representada pela

própria cor, vermelha. O lobo é uma tentação, é uma pessoa que que desonra a garota

que está crescendo. O caçador é a figura do pai. Quando ela é devorada pelo lobo seria

quando a menina se puni, quando ela descobre a sua própria sexualidade, passando

um tempo na barriga do lobo, até que o caçador, no caso o príncipe a liberta.

Em a bela e a fera, quando o pai de Bela vai ao castelo e arranca uma rosa, esta

rosa simboliza a sexualidade despertando. Não é coincidência que o pai da Bela seja o

responsável por Bela ficar no castelo. É a passagem do amor que ela sente pelo pai

para o príncipe, que a principio é uma coisa nojenta, repugnante. Ela tem uma

sexualidade despertando, mas ela não esta preparada, tendo um asco natural ao sexo,

e a principio aquilo é um mostro para ela que vai se tornado aos poucos um príncipe

encantado.

Um fato importante a ser destacado é que a bruxa, muitas vezes sinônimo das

madrastas, na simbologia e mitologia da Europa Medieval, onde os contos orais teriam

surgido, seria uma figuras mais sexualizadas, possuídas pelo demônio da luxuria ou

tendo feito um pacto com o mesmo.

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7 -o desenvolvimento da criança: As Aventuras de Alice no País das Maravilhas

O livro “As Aventuras de Alice no País das Maravilhas” foi escrito por Lewis Carroll

em 1832 e foi dado de presente a Alice Liddell como presente de Natal. Alice tinha na

época dez anos e foi à musa inspiradora de Carroll.

O autor era matemático e fotografo amador, suas fotografias se caracterizavam pelo

nu infantil e Liddell era uma de suas modelos. O livro não pode ser considerado como

um conto de fadas no sentido literário, pois há muitos elementos que o fazem um livro

voltado tanto para crianças quanto para adultos que não são o objetivo desse trabalho.

Fugiremos um pouco dos contos de fadas marcados pela tradição oral para mergulhar

em um livro. Nomeamos alguns tópicos principais que fazem link entre a psicanálise e a

literatura de Carroll:

7.1 - A questão do tamanho

A questão do tamanho, no livro, pode simbolizar a transição psicológica da fase

infantil para a adolescência, pois o autor joga com elementos como o bolo que faz

“aumentar” de tamanho e o líquido que faz “diminuir”. Esse “crescer” pode ser visto

como a chegada psicológica da fase adolescente: responsabilidades, mudança do corpo

etc. Há inclusive uma passagem em que a Alice começa chorar por estar grande

demais, nisto temos uma “ilustração” do luto pelo corpo infantil perdido, teoria que só

surgiria anos depois da escrita da narrativa de Carroll.

7.2 - A questão da personalidade

Carroll joga o tempo todo com a personalidade de Alice que diz não saber quem é

desde que entrou no País das Maravilhas, simbolizando assim a questão da construção

da personalidade do adolescente. A menina questiona o tempo todo quem ela é, e

quando ela encontra-se com a lagarta, ela “descobre” que precisa ser alguém, pois a

lagarta não aceita que ela não saiba quem é. O processo literário utilizado por Carroll

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retoma a construção da personalidade como já foi dito acima. Essa construção deve ser

feita pelo “novo adolescente”, de maneira que ele não venha a ser uma cópia idêntica

de um modelo preestabelecido e sim um ser completamente novo, autônomo e que

possui duas próprias opiniões.

7.3 - A Educação na Era Vitoriana

A Era Vitoriana foi o período no qual a Rainha Vitória reinou sobre a Inglaterra, no

século XIX, durante 63 anos, de junho de 1837 a janeiro de 1901. Além do

enriquecimento da classe burguesa da Inglaterra, a era vitoriana se caracterizou

também pela rigidez de princípios moralistas e por uma típica solidez política. A

educação era condicionada a conhecimentos decorados, sendo assim, também era de

costume fazer as crianças decorarem tradicionais poemas ingleses.

Em seu livro Carroll faz criticas sutis a essa educação rígida, baseada em uma

“decoreba de informações”, refletindo o próprio efeito psicológico da educação nas

crianças vitorianas. Ao perceber, no livro, que Alice ficou “burra” com a queda pela toca

do coelho, a menina começa a relembrar conteúdos decorados na escola. O autor

enfatiza muito que esquecer os conteúdos ensinados na escola seria “emburricar”, pois

toda a relação de ensino aprendizagem era baseada na transferência de conhecimento

e na “decoreba” dos conteúdos.

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8- Conclusão:

Segundo Bettelheim em seu “A Psicanálise dos Contos de Fadas”, a mente de uma

criança funciona de forma desorganizada: contém um conjunto de impressões apenas

parcialmente integradas. Ou seja, as crianças fundamentam-se em alguns elementos

aleatórios fisgados da realidade, mas principalmente em elementos trazidos da fantasia.

Assim, durante alguns anos da infância, o indivíduo baseia-se, primariamente, em uma

realidade fantasiosa, criativa, parte de um mundo paralelo. Isso ocorre, em primeiro

lugar, por causa da imaturidade natural de seus pensamentos – uma vez que, a

maturidade e a capacidade de compreensão plenas só acontecem com o tempo.

Devemos considerar também, casos em que a criança é informada impertinentemente,

ou a pressões internas que levam a falsas interpretações das percepções infantis.

As crianças normais começam a fantasiar a partir de um algum segmento de

realidade. Por isso, há uma notória dificuldade de classificar seus sentimentos, e de

fazer a distinção entre realidade e fantasia, pois tudo de torna parte de um todo

indivisível na mente infantil.

Assim, os contos de fadas auxiliam a criança nesse processo: através dessas

histórias, emerge uma clareza. Percebe-se que a maioria dos contos se iniciam de

forma bastante rotineira – como na trama de João e Maria, em que os pais de um casal

se encontrar com dificuldades financeiras para alimentar seus filhos. Ou seja, a história

parte de um ponto inicial que poderia ser real. O conto de fadas, porém, nunca adentra

a realidade infantil: nenhuma criança se identifica com a realidade cruel da Cinderela,

por exemplo, que dorme entre as cinzas. Tampouco são abandonadas sozinhas na

floresta, como em João e Maria.

A criança que está habituada aos contos de fadas e que conhece as histórias

entende que se trata de uma linguagem de símbolos, e não da realidade cotidiana. A

todo momento a trama – e a própria estrutura narrativa – nos deixam claro de que não

se trata de fatos tangíveis ou de lugares reais. “Era uma vez”; “ Há muitos e muitos anos

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atrás” e etc. São formas de iniciar a narrativa que sugerem ao leitor – ou ouvinte – que

ele está prestes a deixar o mundo da realidade comum e adentrar o mundo da fantasia.

Após levar a criança a uma verdadeira excursão da mente, em um mundo de

fantasias e fábulas, o conto termina de forma sempre muito positiva, para que a criança

retorne ao seu mundo real reassegurada, confortada. É como o herói que após batalhar

em situações elaboradas e mirabolantes volta à casa, volta à sua própria vida. Ele será

feliz, mas sua realidade é destituída de mágica.

No estágio de desenvolvimento em que se encontra esta criança, esse aprendizado

propiciado pelos contos maravilhosos é extremamente benéfico. Assim ela compreende

que não faz mal deixar-se levar pela magia das histórias, mas que é necessário

aprender a dosá-la e não se enredar em um mundo fantasioso para sempre.

Além disso, os contos ajudam a criança a elaborar, na fantasia, as pressões

inconscientes. Os contos de fadas funcionam, no mundo infantil, como experiências. A

exposição a estas histórias os impulsionam a sonhar. Por isso, é necessário que a

criança saiba que a sua necessidade de engajar-se em fantasias não é um defeito; é

natural e necessário para o seu pleno desenvolvimento.

Há também, uma moralidade inerente aos contos de fadas. As histórias revelam

personagens e heróis que por serem pessoas boas, de caráter, superam as dificuldades

da vida e encontram a felicidade. Há sempre uma lição a ser aprendida; como a

humildade na história da Cinderela , ou a moral compreendida no conto da Bela e a

Fera, em que a fera é amada antes mesmo de ser digna de amor.

Por volta dos cinco anos de idade – que é quando os contos de fadas começam a

provar-se verdadeiramente significativos – as crianças já tem discernimento suficiente

para entender que tais histórias não são tão verdadeiras quanto a realidade externa.

Uma menininha pode brincar de boneca e de fato tratá-la com todo o carinho e amor de

mãe, mas ela sabe que aquele não é o seu bebê de verdade.

Assim, pode-se dizer que a fantasia é muito importante no desenvolvimento infantil.

Se uma criança cresce em um ambiente extremamente realista, pode mais tarde

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concluir que muito de sua realidade interna é incompreensível para os pais. Em

consequência – e em casos mais extremistas, é claro – pode desenvolver raiva do

mundo racional e escapar inteiramente para um mundo de fantasia, como que para

recuperar o que perdeu na infância. Isso, pode representar para um adulto, um sério

comprometimento em suas relações sociais e emocionai; fazendo até com que este

indivíduo preferisse se manter recluso dentro de si mesmo, fechado para o resto do

mundo, alienado dos processes inconscientes e nunca se sentindo plenamente

satisfeito com sua vida.

Desta forma, quando as pressões internas da criança são predominantes, a

externalização é a única forma de obter controle sobre elas. Controlar e ordenar sua

mente são tarefas complicadas, já que as experiências externas se misturam com as

internas a todo momento. E, por conta própria, as crianças ainda não são capazes de

ordenar e de dar sentido a seus processos internos.

Os contos de fadas oferecem elementos nos quais as crianças podem externalizar o

que se passa em suas mentes, da forma mais controlável possível. Eles possibilitam

que elas externalizem, por exemplo, seus desejos destrutivos em uma determinada

figura; ou que obtenham satisfações desejadas de outra, que se identifiquem ou tenham

ligações ideias com uma terceira e assim por diante, de acordo com as necessidades

momentâneas de cada um.

8.1 - Ordenando o caos

Por volta dos três anos de idade, até os seis ou sete – período edípico – a criança

começa a sentir, mais agressivamente, as ambivalências internas que florescem dentro

de si. Assim, sente-se dividida entre todos os sentimentos que convivem dentro dela de

forma caótica. Experimenta uma mistura de amor e ódio, felicidade e tristeza, desejo e

medo como um caos inexplicável e incompreensível.

A criança perde o foco, e a habilidade de orientar-se quando se sente, ao mesmo

momento, boa e má, obediente e rebelde, mesmo que o seja. Por uma questão até

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mesmo fisiológica da idade, sua maturidade ainda não a permite estágios intermediários

de grau e intensidade. Ela enxerga a vida como preto ou branco; luz ou escuridão. Os

extremos excluem o outro : a mais bela ou a mais feia; a mais feliz ou a mais miserável

– ou se ama algo, ou se odeia algo, sem intermediários.

E é também desta forma que os contos de fadas retratam o mundo. Os personagens

e figuras são a “ferocidade encarnada” ou a “benevolência altruísta”. Os animais são, ou

os melhores amigos dos homens, seres puros e prestativos, ou devoradores cruéis e

desalmados. São todos, essencialmente, unidimensionais; o que auxilia a criança a

compreender suas ações e reações da forma mais clara possível. As imagens são

simples e diretas, sem sombreados; o que torna mais fácil para eles ordenar seus

sentimentos complexos e ambivalentes. A criança aprende que cada coisa tem um lugar

específico, único. As sensações e sentimentos podem ser vistas e sentidas

independentemente de acordo com a situação.

Através do conto de fadas, a criança formula ideias sobre como ordenar o caos que é

sua vida interna. Como vimos, o conto de fadas sugere que as coisas tenham

propósitos diferentes, e por isso, sejam separadas na mente. Ele sugere, também,

projetar tais aspectos díspares e confusos da experiência infantil em diferentes figuras.

Pensando nesta necessidade da criança de organizar o caos de sua

mente, Bettelheim estabelece uma relação entre as tramas fanstasiosas e os conceitos

Freudianos de id,ego e superego em uma forma de correlacionar formas distintas de

separar, na mente, as experiências internas:

“Quando o herói de um conto de fadas é o filho mais novo, ou é especificamente chamado de "O Parvo" ou "Simplório" no começo da estória, esta é a explicação do conto de fadas sobre o estado original debilitado do ego quando começa sua luta para lidar com o mundo interno de impulsos e com os problemas difíceis que o mundo externo apresenta. O id, à semelhança da maneira como os psicanalistas o encaram,é freqüentemente retratado sob a forma de algum animal, representando nossa natureza animal. Os animais dos contos de fadas aparecem de duas formas: perigosos e destrutivos tais como o lobo no "Chapeuzinho Vermelho", ou o dragão que devasta um país inteiro, a menos que cada ano seja sacrificada uma virgem para ele (no conto "Os dois irmãos", dos Irmãos Grimm) e animais sábios e prestativos que

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guiam e salvam o herói como na mesma estória, "Os dois irmãos" onde um grupo desses animais revive o herói morto e consegue para ele ajusta recompensa: a princesa e seu reinado. Tanto os animais perigosos como os prestativos representam nossa natureza animal, nossos impulsos instintivos. Os perigosos simbolizam o indomável id, ainda não sujeito ao controle do ego e do superego, em toda sua energia perigosa. Os animais prestativos representam nossa energia natural - novamente o id - mas agora levados a servir aos interesses da personalidade total. Há também alguns animais, habitualmente pássaros brancos como pombos, que simbolizam o superego.” (BETTELHEIM, Bruno; 78)

8.2 -Fantasia, Recuperação, Escape e Consolo

Bettelheim inicia este capítulo enumerando os elementos que sustentam um conto

de fada:

“Tolkien descreve as facetas que são necessárias num bom conto de fadas, tais como fantasia, recuperação, escape, e consolo - recuperação de um desespero profundo, escape de algum grande perigo, mas, acima de tudo, consolo. Falando do final feliz, Tolkien frisa que ele deve existir em todas as estórias de fada completas. É uma reviravolta "subitamente feliz"... Por mais fantástica ou terrível que seja a aventura, quando chega a "reviravolta", ela dá ao ouvinte, uma retomada do fôlego, um compasso e alívio ao coração, que chega próximo às lágrimas".45 “ (BETTELHEIM, Bruno ; 157)

Contos de fadas modernos frequentemente terminam com um final não tão

satisfatório para as crianças, ou seja, sem o tão desejado “final feliz”. Finais tristes não

provem o escape e o consolo que todas as adversidades presentes nos contos fazem

necessários. A criança precisa sentir-se fortificada após tantas peripécias. Sem este

encorajamento, a criança sente-se despreparada e desesperançosa a enfrentar os

desesperos de sua própria vida.

Tradicionalmente, em um conto de fadas, o herói é recompensado no fim; e a bruxa

má – ou quem quer que estivesse ameaçando sua felicidade – é punida de acordo. Isso

satisfaz a enorme necessidade que a criança sente de justiça, pura e simplesmente.

Afinal, crianças sentem-se tratadas injustamente com tanta frequência; de que outra

forma poderiam esperar que a justiça fosse feita para elas também? Além disso,

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precisam converncer-se de que devem agir corretamente, mesmo que se sintam

dolorosamente tentadas a ceder aos seus desejos.

Para uma criança, a clemência não basta. Em sua inocência, elas amam a justiça.

Parece-lhes apropriado, por exemplo, que a bruxa de João e Maria sofra um final

exatamente como aquele que planejou para os dois irmãos: morrer queimada no forno.

O castigo do malfeitor significa que nada mais impede a felicidade do herói; assim

estaria livre para enfim viver feliz para sempre.

Não há ameaça mais perturbadora para uma criança do que o medo de ser

abandonada, de ficar completamente só. A psicanálise chama isto – o maior medo do

homem – de ansiedade de separação. Racionalmente, enquanto somos pequenos este

medo é ainda mais excruciante, visto que, para uma criança, ficar sozinha e

“independente de cuidados” pode significar até mesmo a morte. Assim, o consolo

fundamental é o de que nunca será abandonada.

Nos finais de histórias em que o príncipe e a princesa finalmente se casam e vivem

juntos para sempre, a criança enxerga o maior dos consolos: significa que a ansiedade

de separação foi transcendida para sempre. Apesar da forma diferente, o formato

intrínseco de João e Maria é o mesmo: sua mais elevada humanidade – como o chama

Bettelheim – é atingida apenas após a morte da feiticeira. Mas como não podem casar-

se, a relação humana que abolirá para sempre a ansiedade de separação é

simbolizado, não pelo casamento, mas pelo retorno à casa, aonde os pais os aguardam:

“Todas as preocupações terminaram, e viveram juntos na mais completa alegria.”

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9- Bibliografias:

BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas. 16ªedição. Ed. Paz e Terra.

2002

CARROLL,Lewis. As Aventuras de Alice no País das Maravilhas [S.l.]: Relógio d'Água,

2009

CHAUÍ, Marilena. Repressão sexual: essa nossa (des)conhecida, Ed. Brasiliense, 1984,

pág. 32-54

CORSO, Diana & CORSO, Mário. A psicanálise na terra do Nunca: ensaios sobre a

fantasia – Porto Alegre: ed. Penso, 2011.

CORSO, Diana & CORSO, Mário. Fadas no Divã. A psicanalise nas historias infantis.