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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA HISTÓRIA DE ESCOLARIZAÇÃO OUVINDO ALUNOS E REPENSANDO PRÁTICAS ISABELA VICENZO SGOBBI

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Práticas Pedagógicas na história de escolarizaçãoOuvindO alunOs e repensandO práticasISABELA VICENZO SGOBBI

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Práticas Pedagógicas

na História de escolarização

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CONSELHO EDITORIAL ACADÊMICO

Responsável pela publicação desta obra

Ricardo Ribeiro

Newton Duarte

Luiz Antônio Calmon Nabuco Lastória

Lígia Márcia Martins

Sebastião de Souza Lemes

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ISABELA VICENZO SGOBBI

Práticas Pedagógicas

na História de escolarização

OuVINdO ALuNOS E rEpENSANdO

prátICAS

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© 2013 Editora Unesp

Cultura AcadêmicaPraça da Sé, 10801001-900 – São Paulo – SPTel.: (0xx11) 3242-7171Fax: (0xx11) [email protected]

CIP – BraSIl. Catalogação na FonteSindicato Nacional dos Editores de livros, rJ

______________________________________________________________________S535p

Sgobbi, Isabela Vicenzo

Práticas pedagógicas na história da escolarização [recur-so eletrônico]: ouvindo alunos e repensando práticas/Isabela VicenzoSgobbi. São Paulo: Cultura acadêmica, 2013.

recurso digital Formato: ePDF requisitos do sistema: adobe acrobat reader Modo de acesso: World Wide Web Inclui bibliografia ISBN 978-85-7983-490-5 (recurso eletrônico)

1. Educação – 2. Educação - Estudo e ensino.3. Prática de ensino. 4. livros eletrônicos. I. Título.

14-08274 CDD: 370 CDU: 37

_____________________________________________________________________

Este livro é publicado pelo Programa de Publicações Di-gitais da Pró-reitoria de Pós-Graduação da Universida-de Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp)

Editora afiliada:

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Sumário

Introdução 7

1 uso de práticas autobiográficas na formação e atuação docente: uma aproximação à produção 23

2 uma breve reflexão sobre práticas pedagógicas e apresentação das fontes 65

3 práticas pedagógicas na memória de futuros professores: um recurso para pensar a formação e atuação docente 83

Considerações finais 133referências 137

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introdução

Esta pesquisa1 tem um viés autobiográfico2 tanto pelas características de suas fontes – Histórias de Es-colarização de alunos de pedagogia da Faculdade de Ciências e Letras – Campus de Araraquara/unesp – como pelo fato de eu ter também produzido minha História de Escolarização em um momento do mesmo curso. Essas duas razões imbricadas permitem, ou exi-gem, um detalhamento que dê ao leitor a compreensão do referido viés autobiográfico, que por sua vez cons-titui também a historicidade desta investigação. Essa historicidade foi se compondo pelas habilidades que desenvolvi para produzir minha História de Escolari-zação e que foram aprofundadas com o exercício ana-lítico que fiz, com fontes de mesma natureza, durante

1 Este livro derivou da dissertação de mestrado intitulada “práticas pedagógicas na história de escolarização de futuros professores: um recurso didático/metodológico para formação inicial”, defendida no programa de pós-Graduação em Educação Escolar da Faculdade de Ciências e Letras – Campus de Araraquara/unesp, sob orientação da professora doutora Marilda da Silva, em março/2013.

2 por essa razão, e por exigência do método, a Introdução deste tra-balho será redigida na primeira pessoa do singular.

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minha Iniciação Científica. O relato a seguir dará con-ta de evidenciar tudo isso.

*Estamos em 2008. Sou aluna do terceiro ano do

curso de pedagogia da Faculdade de Ciências e Letras – unesp – Campus de Araraquara e uma das discipli-nas da grade curricular é didática II, ministrada pela professora Marilda da Silva. Ouvimos dizer que ela é brava, professora temida, exige que sejam lidos vários livros, pede trabalhos e apresentação de seminários.

O semestre começa e a professora explica que a fi-nalização da disciplina se daria com a escrita de nossa História de Escolarização e que já poderíamos come-çar a pensar e a escrever, não deixando tudo para últi-ma hora. Mas, como é próprio do habitus estudantil,3 não nos preocupamos com isso no início do semestre. Assim, decorreram as aulas e estudamos Comenius e sua obra A didática magna (1985), estudamos pierre Bourdieu e seu conceito de habitus, lemos Leitura sig-nificativa (1999) de Frank Smith, e, por fim, de Elias Canetti, lemos o livro A língua absolvida (1987).

Conforme o fim do semestre se aproxima, a an-siedade começa a surgir. Como escrever uma história de escolarização? Como registrar tudo o que vivemos na escola? O que escrever? Como se lembrar dos professores de tantos anos atrás? Nem havia tantas lembranças assim!

Ledo engano! Após ler Elias Canetti, inúmeras possibilidades se abrem e parece que as lembranças co-meçam a surgir. Com muita maestria, Canetti, em A língua absolvida, nos insere em sua vida, narrando sua

3 A esse respeito, conferir as obras referenciadas ao final deste traba-lho: Silva (1997, 2002, 2003, 2005, 2009, 2011).

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infância e adolescência, descrevendo seus professores, suas características e as aulas que ministravam, ou seja, entramos em contato com uma abundância de registros memorialísticos sobre as práticas pedagógicas viven-ciadas pelo, então, aluno/autor Elias Canetti. A partir daí, a escrita começa a fluir e fica fácil descrever mo-mentos e situações vividas na fase escolar. Como, por exemplo, as características de muitos professores que marcaram, no caso, a minha trajetória de escolarização.

Nasci em 5 de agosto de 1988. Quando era peque-na, segundo relatam meus pais, ficava com meus avós maternos, que gostavam muito de cuidar de mim. An-tes dos dois anos, minha mãe tentou me colocar na es-colinha; ela achava que seria bom eu conviver mais com crianças, já que eu ficava bastante com adultos. desse primeiro contato com o meio escolar, os relatos são, ainda, de meus pais: eu chorava demais e não me adap-tei, além disso, os familiares (tias, principalmente) di-ziam que eu era muito pequena para ficar na escola, por isso voltei a ficar com meus avós por mais um tempo.

Com dois anos e meio aproximadamente, ingres-sei na escola novamente, o CCI (Centro de Convi-vência Infantil), uma creche para filhos de funcioná-rios da unesp. Não lembro muita coisa dessa época, só que eu gostava de ficar na sala da coordenadora, observando-a enquanto trabalhava ou então ficava na cozinha junto com a cozinheira d.ª Célia.4

Com 5 anos, comecei a cursar o Jardim II no pe-ríodo da manhã na escola Externato Santa terezinha, um colégio religioso. À tarde, continuei frequentando o CCI até metade da 1ª série, quando eu tinha 6 anos.

4 todos os nomes que serão registrados são fictícios. todavia, como metodologia facilitadora da memória, primeiramente escrevi a his-tória com os nomes reais e depois os troquei para publicação.

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Nesse primeiro ano, minha professora no Externato foi a Irmã Mônica, uma senhora que usava sempre uma saia cinza e blusa branca, como se fosse um uniforme social. Ela falava muito alto e, às vezes, sem querer, “cuspia” nos alunos em consequência de falar gritando.

durante a antiga 1ª série – atual 2º ano do Ensino Fundamental Ciclo I5 –, a professora tirou licença e várias substitutas assumiram a classe. Meus pais não gostaram dessa situação – um tanto desorganizada – numa série que consideravam a base para as outras e, por essa razão, mudei de escola. A partir do 3º ano do EFCI, com 8 anos, ingressei no Colégio progresso de Araraquara e praticamente estudei com os mesmos co-legas até o 9º ano, já época da adolescência.

No 3º ano EFCI, período vespertino, minha professora foi a tia Alzira; no 4º ano EFCI foi a tia Claudia, das quais só guardo boas lembranças. Ado-rava trocar recadinhos com a tia Claudia: eu e a Lívia, amiga da época, escrevíamos nas bordas dos cadernos, após as lições, e quando ela inseria vistos para quem havia cumprido as atividades, geralmente nos respon-dia com igual carinho.

No 5º ano EFCI mudei de período, fui para a ma-nhã, e as professoras foram a Ana (matemática) e dirce (português). Apeguei-me mais a tia Ana, achava a tia dirce mais brava. No final de um de meus cadernos, tia Ana escreveu um bilhete elogiando minha organização, capricho e dedicação; características que sempre me marcaram por gostar de fazer todas as coisas do melhor modo possível.

terminada essa primeira fase do EF, veio a ansieda-de de ingressar no 6º ano EFCII – antiga 5ª série –, e o

5 todas as vezes que me referir ao Ensino Fundamental Ciclo I e II, usarei a sigla EFCI e EFCII.

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que mais me animava era o fato de poder usar fichário em vez de caderno. A partir desse período entrei em contato com vários professores, cada um responsável por uma disciplina, e inclusive passei a ter professores homens.

Sempre adorei estudar matemática e tive uma faci-lidade muito grande com essa matéria, sendo uma das únicas alunas que gostava do Seu Orlando – profes-sor de matemática nos 7º e 8º anos do EFCII. Ele era um professor exigente, que mantinha a disciplina da classe, era só ele entrar na sala que todos ficavam em silêncio. Ele passava muitos exercícios valendo nota e cobrava as tarefas de casa, conferindo, com os tradicio-nais vistos, os cadernos dos alunos.

O 7º ano EFCII foi um ano de muitas aprendiza-gens. Beatriz era a professora de História. Ela propôs, desde o começo, muitas tarefas diferentes, como, por exemplo, o julgamento da Joana d’Arc, quando a es-tudamos. A classe foi dividida entre defesa e acusação, além dos jurados e do juiz, escolhidos pela professora. Outra atividade proposta pela mesma professora foi a encenação de “A Megera domada”, de Willian Sha-kespeare. Novamente a classe foi dividida e eu fiquei responsável por escrever o roteiro da peça.

No 8º ano EFCII, a professora de português pro-pôs à classe um trabalho para que investigássemos os adolescentes de diferentes épocas e apresentássemos isso na forma de um jornal escrito. Como sempre, eu e minhas amigas da época mergulhamos de cabeça no trabalho, fazendo entrevistas, buscando fotos e mon-tando o jornal, que se chamou AO, sigla para Adoles-cente de Ontem. O símbolo do jornal era uma inter-rogação, pelo fato do adolescente viver em constantes dúvidas. No dia da apresentação, nos caracterizamos como adolescentes de diferentes épocas e a classe adorou o resultado. Já o professor de Geografia, era

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jovem e muito divertido. Ele passava filmes e ativida-des extras, intercalando as aulas expositivas e a classe gostava bastante.

Quando entrei no 9º ano EFCII, houve mudança no material do Colégio, sendo adotado o sistema pi-tágoras (apostilado). Com a adoção do material pitá-goras, passamos a ter aulas de Espanhol, inicialmente com o Augusto, que me escolheu como representante de sala e costumava me chamar de “Senhorita Sgob-bi”. Logo ele foi substituído, pois houve alguns pro-blemas com alunas, e a professora Nilva assumiu a disciplina: uma senhorinha que à época eu dizia sem muita didática, o que resultava em aulas bagunçadas e quase nada proveitosas.

recordo-me das avaliações sobre livros lidos que a professora de português nos dava. A classe ia para a Biblioteca – espaço, que merece todos os meus elogios, pois era um lugar amplo, claro, gostoso e tinha muitos e muitos livros –, e sentava em grupos, nas mesas re-dondas. Ela ia passando de mesa em mesa e realizava a prova oralmente, por intermédio de perguntas.

Concluída a segunda etapa do EF, veio, por minha vontade, a decisão de mudar de escola, pois pelos meus pais eu teria continuado no progresso. Escolha feita e, então, eu cursaria o Ensino Médio6 no Colégio Master Anglo de Araraquara. para ingressar nessa escola, tive-mos que fazer uma prova de português e Matemática.

O primeiro dia de aula na escola nova pareceu o meu primeiro dia na escola, marcado pela ansiedade. A turma (1º C) era somente de alunos novos, oriundos das mais variadas escolas da cidade e quase metade da turma era de escolas públicas. A turma só recebeu elo-gios e foi uma grande surpresa para os professores, pois

6 A partir de então me referirei ao Ensino Médio como EM.

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todos eram alunos novos e que se destacavam mais do que os alunos que já eram da própria escola. Acredito que todo o 1º C quis aproveitar a oportunidade de estar em uma escola nova, considerada uma das melhores da cidade e, por isso, se esforçava, aproveitando as aula e as oportunidades de aprender.

A disciplina de português era dividida em três partes: redação, Literatura e Gramática, ministra-das por três professores diferentes. Nunca conheci al-guém mais apaixonado por literatura do que o profes-sor Arnaldo. Quanta sabedoria! Ao falar com algum aluno, costumava nos chamar de “Vossa Eminência”. por meio da entonação dada em sua fala, podia-se sentir a sua paixão pela literatura. Ao estudarmos os períodos literários, parecia que ele nos transportava até a época remota e podíamos compreender tudo mais facilmente. A parte mais pesada da aula eram os resumos feitos por ele na lousa. tínhamos que escrever folhas e folhas e ele não era muito paciente, pois já ia escrevendo e apagando a matéria. Ele quase nunca usava as apostilas e os exercícios propostos ne-las, mas com seu singular jeito de ensinar, conseguia conquistar os alunos e cativá-los para a literatura. tal professor costumava usar roupa social e no meio das aulas, no meio de tanta empolgação, sempre dobrava as mangas da camisa. Voltei a ter aula com ele no 3º ano do EM, o que foi igualmente prazeroso.

No Anglo, a Matemática também era dividida em frentes: A e B. No 1º ano do EM, as aulas eram com o Cesar e o pedro. Nas avaliações do Cesar, tínhamos que executar todos os passos para chegar ao resultado; ele dizia que queria saber como havíamos chegado a tais conclusões. Já nas avaliações do pedro, responsável pela parte de Geometria, sempre havia um desafio ma-temático no final, com pegadinhas. No 2º ano do EM, o

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professor de álgebra, com foco na trigonometria, era o Bernardo. Como descrever esse professor? Sensacio-nal, divertido, inteligente. Adorava contar piadas, dan-çar, imitar. As aulas eram descontraídas e excelentes.

por fim, no 3º ano do EM, deparei-me com o paulo e o Flávio. O primeiro acompanhou a turma nos dois anos anteriores como professor de Física. uma pes-soa com um coração enorme, muito inteligente, muito paciente e muito acessível aos alunos. Se alguém não entendia, ele explicava de novo com a maior paciên-cia. Lembro-me de uma vez apenas, ainda no 1º ano do EM, de tê-lo visto bravo com um aluno, chegando até a colocá-lo para fora da sala. Ao nos explicar Físi-ca, especialmente Mecânica, com aquela infinidade de fórmulas, ensinava musiquinhas ou contava histórias para que pudéssemos recordar com mais facilidade.

Ao relembrar de Flávio, a primeira coisa que me vem à cabeça é a lousa muito bagunçada. Chegava um momento que ninguém mais conseguia entender onde começava e onde terminava a matéria. As aulas eram muito cansativas e exigiam muita concentração, tornando-se difícil acompanhá-las. O maior medo era de suas avaliações e, por isso, tínhamos um esquema infalível montado, sentávamos sempre na mesma or-dem e um ajudava o outro naquilo que conseguia fazer: Natália, eu, Fernando e Carol.

No 1º ano do EM, as professoras Bete e Isabel eram as responsáveis pelas aulas de Biologia, ambas muito miudinhas e igualmente inteligentes e diverti-das. Apaixonadas por Biologia e pelo ato de ensinar. A matéria, por mais complexa que fosse, ficava fácil e simples com as explicações da Bete. Quanta pa-ciência para nos ensinar os processos de fotossíntese e de respiração celular. tudo que ela falava e ensinava nas aulas era cobrado nas avaliações. Isabel, profes-

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sora espetacular, me ensinou genética, reinos vegetal e animal, vermes, moluscos e muito mais. Em tudo que fazia era muito caprichosa e costumava nos dar listas de exercícios extraídos de vestibulares para nos ajudar nos estudos.

ricardo foi o outro professor de Biologia no 2º ano do EM, responsável pela parte de Botânica; tinha ca-belo comprido que usava preso em um rabinho. Sua camiseta branca e calça de tactel preta eram inconfun-díveis. Sempre de bom humor, quando chegava para a aula dizia: “Bom dia, eu sou o ricardo e pra você as-sistir aula você precisa de quatro coisas: uma boa noite de sono, material, uniforme e [...]”, a quarta coisa não me vem à memória. Não gostei disso. É ruim não con-seguir lembrar o que se quer.

Química foi uma novidade para mim, pois até o 9º ano EFCII meu contato com essa disciplina foi muito restrito. No Anglo, aprendi muitas coisas no-vas e logo no 1º ano do EM deparei-me com o dia-grama de Linus pauling, pacientemente explicado pela professora. Ela não tinha uma forma adequada para ensinar, falava muito baixinho e as aulas acaba-vam se tornando uma “zoeira” e pode-se dizer que ela perdia o controle da turma. Na outra frente de Química, o professor rafael era adorado por todos nós. Ele tinha um jeito particular de entregar as ava-liações, enrolando aquelas com nota 10.

No 2º ano do EM, os responsáveis pela disciplina de Química eram Edson e renata; dois extremos, pes-soas e profissionais bem diferentes, mas seria injusto desvalorizar um em detrimento do outro. Edson, um senhor beirando uns 45 anos, todo sério e recatado; era também pastor. tinha toda a paciência do mundo para nos ensinar e suas aulas eram marcadas pela tran-quilidade e pelo modo como todos prestavam aten-

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ção. renata, uma jovem mulher, era toda despojada e dona de uma frase característica “Coragem, galera, vamos lá!!”. posso carinhosamente descrevê-la como “louquinha”. As aulas dela eram muito descontraídas, divertidas, relaxantes. usava pouco a lousa, gostava bastante de falar e de resolver exercícios.

No 3º ano do EM, tivemos a alegria de nos depa-rarmos com o professor Miguel. uma figura, uma pes-soa extraordinária. tinha uma implicância carinhosa com as alunas gordinhas. Ele dizia que “as gordas” podiam sair da aula cinco minutos mais cedo para ficar na fila da cantina e comprar “aquela coxinha!”. Não passava uma aula sem brincar e quando fazia suas gra-ças, ria e ficava sério logo em seguida, e aí não tinha como segurar a turma, era risada na certa. Quanta ri-sada, quanta diversão e tudo isso sem prejudicar o an-damento das aulas. A meu ver são esses professores os mais admirados: aqueles que conseguem dar uma aula séria e descontraída ao mesmo tempo e que sabem o momento de brincar e de retornar ao trabalho que es-tavam realizando.

Assim como Química, a matéria de Física era uma novidade pra mim – e que novidade complicadinha! Muitas fórmulas, muitos problemas, muito estudo! Claro que tudo isso ficou mais fácil podendo contar com professores especiais como o Vitor.

Não sei se consigo descrever Vitor do jeito que ele merece, mas tentarei. um ser humano excepcional. diria iluminado. Não consigo me lembrar de um só dia em que ele se alterou, perdeu a paciência ou bri-gou com algum aluno. Se queria chamar atenção, o fazia carinhosa e calmamente. Inteligente, paciente, calmo, atencioso. Ele não sossegava até se convencer de que todos haviam entendido suas explicações e de que não restavam mais dúvidas. repetiria uma coisa

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cem vezes se assim fosse preciso. Não à toa foi escolhi-do como paraninfo da turma, na formatura. todas as homenagens e agradecimentos são poucos.

História e Geografia sempre foram áreas que me atraíram. Como gosto de escrever, saía-me bem nas avaliações, que geralmente eram dissertativas, exigin-do mais do que simplesmente saber a matéria. An-dreia foi a professora de Geografia nos dois primeiros anos do EM. Suas aulas eram boas e suas avaliações extensas. Já no 3º ano do EM, as aulas de Geografia eram com o professor toninho. por ter tido um pro-blema grave nas cordas vocais, dava aula utilizando um microfone. Ele tinha cabelo comprido e se achava o galã; suas aulas eram todas preparadas em Power-Point. Apesar desse diferencial, não apreciei muito suas aulas, porque sempre tinham brincadeiras de-mais, o que acabava se tornando chato. Além disso, a matéria ficava sempre atrasada.

Quanto aos outros dois professores de História, infelizmente não me restam muitos elogios. No 1º ano do EM, as aulas de História eram no período da tarde e esse fato já trazia certo prejuízo, pois todos já estavam cansados. Somando-se a isso, o professor “não era lá aquelas coisas”, como se diz por aí, e, en-tão, a turma aproveitava: todo o mundo conversava e bagunçava bastante. A mesma coisa aconteceu no 3º ano do EM, neste caso eu chegava a sentir pena do professor. Ele literalmente falava para as paredes; ninguém prestava atenção nas aulas, mesmo sendo, estas, as primeiras da manhã.

da professora de Inglês do 1º ano do EM recordo--me pouco: sempre sorridente, animada, talvez boa-zinha demais, acabava “abusada” pelos alunos. Nos dois anos seguintes, Erik. Só posso descrevê-lo como diversão. Sempre alto-astral e bom humor.

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No Anglo tivemos aula de Artes no 1º e 2º anos do EM. Coincidências da vida, Gorete, que já havia me dado aula de Música no progresso, agora me dava aula de Artes no Anglo. tivemos que fazer um trabalho so-bre Marketing e foi muito legal! pesquisamos, conver-samos com estudantes da uniara e gravamos até uma campanha política, para exemplificar o Marketing po-lítico. O trabalho foi um show! A professora Joana, no 2º ano do EM, bem que tentou nos despertar para os trabalhos artísticos, mas as aulas sempre acabavam em bagunça; era uma daquelas aulas que todo o mundo finge que faz alguma coisa, mas só finge, esperando o tempo passar e se entretendo com outras coisas.

O Anglo sempre teve uma mentalidade voltada para o vestibular, mas nunca me senti pressionada por isso. Meus pais também não me pressionavam e, pelo contrário, sempre me apoiaram. Na indecisão de sa-ber o que prestar, participei do projeto de Orientação Vocacional, oferecido pelo Cenpe (unidade Auxiliar da Faculdade de Ciências e Letras – Campus de Ara-raquara/unesp), um processo que foi muito valioso principalmente para meu autoconhecimento.

E eis que eu passei no vestibular e em primeiro lugar! Essa sensação nunca será esquecida! O alívio, a alegria de ver meu nome na lista, os trotes, os pedágios! Novamente surge a ansiedade frente ao desconhecido e o medo de perder meus amigos, pois estava na hora de cada um seguir seu caminho.

E quanto à universidade? Bem, essa já é outra história...

Foi com a história que acabo de relatar que concluí a disciplina didática II. Essa foi a única disciplina que me levou a refletir sistematizadamente sobre minhas vivências como aluna, descrevendo os professores que tive e as práticas que eles realizavam. O que me permi-

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tiu distanciamentos e aproximações das práticas peda-gógicas que eu vivenciei antes de ingressar no curso de pedagogia. Exatamente por isso é que já afirmei que esta pesquisa tem um viés autobiográfico que constitui seu conteúdo estrutural. por essa razão, no início da introdução me referi à sua historicidade.

Ademais, foi também durante o desenvolvimen-to da disciplina didática II que, com uma bolsa de Iniciação Científica (pIBIC)7 trabalhei, pela primeira vez, com fontes do tipo das que usei nesta investiga-ção: História de Escolarização por futuros professo-res. portanto, o presente trabalho tem suas origens na produção da minha História de Escolarização na dis-ciplina didática II e no trabalho realizado durante a Iniciação Científica,8 reitero.

O objetivo deste estudo foi mostrar os tipos de práticas pedagógicas vivenciadas por alunos do cur-so de pedagogia da Faculdade de Ciências e Letras – Campus de Araraquara/unesp, que em 2005 (perío-do diurno) e 2006 (período noturno) produziram, no âmbito da disciplina didática II, suas Histórias de Escolarização. portanto, o objeto aqui construído são as práticas pedagógicas registradas em 80 Histó-

7 Fui bolsista da professora Marilda da Silva no período que com-preende de agosto/2008 a julho/2010.

8 Foi no período de Iniciação Científica que entrei em contato com o projeto de pesquisa coordenado pela professora Marilda, denomi-nado “Modos de ser professor: identificação dos elementos básicos da organização do habitus professoral II”. Nesse período, além de relatórios elaborados como exigência institucional da bolsa pIBIC, apresentamos trabalhos derivados das leituras e sistematizações ini-ciais. Em 2009, apresentamos o trabalho “práticas que constituem um habitus professoral: a partir de representações de estudantes da Graduação em pedagogia” nos Congressos de Iniciação Cientí-fica da unesp e da uFSCar. Já em 2010, apresentamos o trabalho “As práticas que constituem um habitus professoral: a partir de re-presentações de estudantes do período diurno do curso de pedago-gia (2005 e 2007)” no Congresso de Iniciação Científica da unesp.

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rias de Escolarização produzidas pelos dois grupos de sujeitos, tendo em vista mostrá-las em síntese como um recurso, devido ao conteúdo delas, para se pensar a formação e atuação docente, especialmente no curso de pedagogia e, de modo geral, a docência.

Algumas questões ajudaram no desenvolvimen-to das reflexões aqui apresentadas: em qual nível de ensino há mais práticas descritas? Como o professor concretiza suas ideias em sala de aula? Como ele vei-cula os conceitos e conteúdos aos alunos? Quais são as ações, atitudes, gestos e outros aspectos relacionados com o professor que aparecem nas práticas descritas? Como os alunos percebem a prática pedagógica do professor? A que se referem as práticas lembradas por nossos sujeitos: à aprendizagem, ao ensino, à re-lação professor-aluno?

Esta pesquisa está na esfera da abordagem qua-litativa, caracterizando-se como um estudo de caso descritivo-analítico. Apresento a seguir a súmula das partes que a compõem.

O Capítulo 1, intitulado “O uso de práticas auto-biográficas na formação e atuação docente: uma apro-ximação à produção”, discorre a respeito da impor-tância de dados autobiográficos/história de vida para o entendimento da profissão docente. desse modo, dialogamos com autores como Nóvoa (1988; 1992; 1995), Goodson (1992), Catani (2002; 2003), Bueno (2002; 2003) e outros que defendem a utilização de práticas autobiográficas em processos de formação. Além disso, apresentamos trabalhos que se referem, de algum modo, ao dar voz a alunos, levando em conta o período de 2001 a 2010. para esse recorte consultou--se a produção realizada, no referido período, nas três universidades públicas estaduais de São paulo: unesp, unicamp e uSp.

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No Capítulo 2, “uma breve reflexão sobre práti-cas pedagógicas e apresentação das fontes”, trazemos ao leitor reflexões a respeito da prática pedagógica, tendo em vista que ela constitui o núcleo de nosso ob-jetivo, para tanto, apresentamos nossas fontes.

por fim, no Capítulo 3, “práticas pedagógicas na memória de futuros professores: um recurso para pensar a formação e atuação docente”, organizamos os dados e procedemos às respectivas análises. Cami-nhando para a finalização deste trabalho apresentamos as considerações finais, as quais sintetizam as ideias básicas construídas e indicam inquietações para futu-ros investimentos.

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aUtobiográficas na formação e atUação

docente: Uma aproximação à prodUção

Estabelecemos1 um diálogo com autores que tra-balham com a abordagem autobiográfica e com a his-tória de vida na formação de professores, como Nóvoa (1988; 1992; 1995), Goodson (1992), Bueno (2002; 2003), Catani (2002; 2003), perdigão (2002), Oliveira (2004), entre outros. tais autores defendem a utiliza-ção de práticas autobiográficas em processos de for-mação inicial e/ou continuada e também na produção de pesquisas sobre essas formações, bem como sobre a atuação docente.

Nóvoa (1992; 1995), em seus estudos, propõe prá-ticas de formação que reconheçam as experiências de

1 A partir de então assumimos a primeira pessoa do plural.

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vida dos sujeitos como fonte de aprendizagem e de sa-beres que consolidam e subsidiam o trabalho peda-gógico efetivado. Nessa perspectiva, o trabalho com histórias de vida dos professores apresenta-se como alternativa metodológica, uma vez que, para Nóvoa (1988, p.16), “[...] a formação é inevitavelmente um trabalho de reflexão sobre os percursos de vida”. Ain-da segundo o autor, a abordagem biográfica reforça o princípio de que é a própria pessoa que se forma, à medida que elabora uma compreensão sobre seu percurso de vida. Analisando sua história, o professor pode autodefinir-se e buscar transformar sua perfor-mance quando decidir e programar suas atividades em sala de aula. Nesse sentido, trabalhar com história de vida viabiliza um momento reflexivo, pois não se trata simplesmente de lembrar e recordar, tratando-se de estabelecer significações e ressignificações.

Goodson (1992), seguindo a mesma linha de re-flexão de Nóvoa, defende a importância das narrati-vas autobiográficas que, quando utilizadas, tanto em situações de pesquisa como de formação, permitem que a voz do professor seja ouvida. O autor critica as pesquisas que tomam a prática pedagógica como ob-jeto de estudo sem considerar as implicações da vida pessoal do professor no desenvolvimento dessa práti-ca, uma vez que, por sua experiência como pesquisa-dor, em situações de entrevistas com professores em formação, constatou que os docentes, ao responderem a questões relacionadas à prática pedagógica, sempre remetem a dados sobre a própria vida. tal fato, para o autor, demonstra a relevância dos estudos referentes à vida do professor como estratégia metodológica.

defendendo o uso de narrativas autobiográficas em contexto de formação, Bueno (2002) chama atenção para as possibilidades formativas do método autobio-

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gráfico, “[...] uma vez que ao voltar-se para seu passa-do e reconstituir seu percurso o indivíduo exercita sua reflexão e é levado a uma tomada de consciência tanto no plano individual como no coletivo” (2002, p.23). Seguindo tais reflexões, vamos ao encontro das hipó-teses levantadas por Catani (2003), que, ao examinar as implicações pedagógicas das práticas autobiográfi-cas na formação profissional daqueles que pretendem seguir a carreira docente ou já atuam nela, insiste nas potencialidades autoformativas que as narrativas au-tobiográficas, os relatos de formação e as histórias de vida de formação possuem. Além disso, a autora assinala que práticas autobiográficas favorecem a re-configuração das experiências de formação e escolari-zação, pois desencadeiam análises e reflexões sobre as diferentes relações dos sujeitos com os conhecimentos, com os espaços escolares e com os outros sujeitos que estão presentes no contexto escolar.

por meio das reflexões apresentadas até este mo-mento, vemos que o pressuposto que fundamenta a utilização do relato autobiográfico, oral ou escrito, tanto nos estudos sobre a prática pedagógica quan-to em espaços de formação profissional, é o de que a narrativa pode funcionar como uma das possibilida-des que o professor tem para refletir sobre o que vive, pensa e o que faz. desse modo, por meio dos relatos autobiográficos é possível repensar as imagens de professor que ficaram registradas na memória e que podem influenciar a maneira de ser professor, a qual se manifesta nas práticas pedagógicas efetivadas em sala de aula.

Salientamos que, nesse sentido, nosso trabalho será diferente, pois dará voz a alunos que cursam pe-dagogia, ou seja, se preparam para serem professores. Contudo, torna-se necessário destacar que, a nosso

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ver, trabalhar com histórias de vida desses sujeitos, enquanto alunos, carrega as mesmas potencialidades, ou seja, constitui-se em um modo de investigação dos processos formativos, permitindo que o aluno expresse suas memórias, explicitando os modelos, concepções e ideias que traz consigo, passando – já na formação ini-cial – pelo processo de enfrentar, ressignificar e recon-figurar discursos, imagens e modos de ser professor. Abre-se, desse modo, a possibilidade de reconfigura-ção das experiências de formação e escolarização, o que, acreditamos, ajuda o futuro professor na aquisição da consciência crítico-reflexiva, pensando em sua futura atuação profissional.

Analisar o próprio processo de aprendizagem, segundo perdigão (2002), constitui-se em ferra-menta poderosa para colocar em cheque concepções pessoais, percebendo o que aprendemos, o que não aprendemos e de que forma tudo isso se realizou. Oli-veira (2004, p.14), por sua vez, acrescenta:

A intenção de revisitar o passado, através do trabalho da memória, permite ao professor um exercício de descons-trução das imagens instituídas socialmente com relação à docência, possibilitando, também, a construção de um outro imaginário, a instauração de um outro proces-so de subjetivação.

A utilização de narrativas como estratégia de formação e investigação se revela como espaço e mo-mento propícios à reconstrução dos conhecimentos e da compreensão dos processos de aprendizagem da docência. Assim, os relatos sobre as experiências vivi-das constituem-se como recurso pedagógico formativo por possibilitarem ao sujeito que narra o exercício de (re)ver-se e produzir sentidos para o que foi vivido no

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passado e para o que é vivido no presente, conferindo, dessa forma, possibilidades, perspectivas e significados para a prática profissional que já é efetivada por alguns alunos que estão em formação e que será efetivada pela maioria ao término da Graduação.

pode-se dizer, assim, que a aprendizagem profis-sional da docência é um processo complexo e contínuo. Neste caso, como apontam os estudos anteriormente mencionados e outros que não foram mencionados aqui, a experiência pessoal, bem como a prática pro-fissional, são fontes importantes de aprendizagem. Em vista disso considera-se que os professores, ao longo de suas vidas, acatam, geram, formulam e elaboram cren-ças, atitudes, valores, juízos, princípios práticos etc., os quais orientam a ação docente e ajudam a configurar as práticas pedagógicas que efetivam em sala de aula e que, no conjunto, compõem a historicidade das práti-cas pedagógicas como um todo.

portanto, os saberes inerentes à profissão docente são oriundos de diversas fontes, espaços, tempos e ex-periências que, conjuntamente, configuram a base do trabalho do professor. É nesse sentido que há inúme-ros contextos formativos, que permitem o desenvolvi-mento profissional da docência, como os percursos de vida, as decisões, as experiências e as aprendizagens pessoais e profissionais.

Ao longo de sua vida acadêmica – na verdade, desde seu tempo como aluno – o professor constrói diferentes esquemas de “ser professor”, de ação didático-pedagó-gica, de “ser aluno”, de “dar aula de...” etc., ancorado, às vezes, em teorias sistematizadas aprendidas em cur-so de formação, às vezes no “ouvir dizer e ver fazer” ou no simples fazer, ou mesmo numa mistura de tudo isso. (Chakur, 2000, p. 232, grifos nossos).

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de acordo com os pressupostos que vimos apre-sentando, pode-se dizer, talvez, que a aprendizagem da docência se inicia bem antes do curso de forma-ção inicial, por meio das próprias vivências do futuro professor como aluno, permeia o curso de graduação e continua durante toda a vida do professor, consti-tuindo uma gama variada de experiências. de acor-do com reali e tancredi (2002, p.76, grifos nossos):

tais experiências auxiliam na modelagem das tendên-cias e das práticas pedagógicas dos professores. A in-fluência das experiências de escolarização como aluno é aparentemente forte na prática docente posterior, já que os professores passam por um processo de aprendizagem por observação, informal, ao longo do tempo. A aprendi-zagem profissional dos professores, nesse aspecto difere da preparação de outros profissionais, uma vez que já vi-venciaram a prática, embora sob outra ótica, antes de in-gressarem no curso de formação básica. trata-se de um desafio a vencer: ultrapassar os limites da experiência e da vivência dado que muitas dessas experiências não são as desejáveis.

Seguindo essa possibilidade interpretativa, po-demos dizer que os professores passam por uma for-mação incidental, que acontece em todo o ambiente escolar, isto é, desde a primeira vez que ingressaram em uma instituição que tinha um professor para lhes ensinar algo até quando saíram da última instituição que os certificou professores. devido ao longo tempo em que foram alunos, acabam incorporando determi-nadas ideias sobre o ensino que podem se perpetuar em sua prática profissional. São essas vivências pe-dagógicas como alunos um texto aberto da formação docente. A esse propósito, vale a pena o destaque que torres (1999) dá para a importância do tipo de bio-

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grafia escolar do docente no que diz respeito à defi-nição de suas práticas educativas e estilos de ensino.

também nesse sentido, a literatura educacional sobre o desenvolvimento profissional da docência tem mostrado que as teorias pessoais dos professo-res, que também são chamadas de teorias implícitas e práticas tácitas, têm força na configuração das prá-ticas pedagógicas. Os professores aprendem a tomar decisões instrucionais, a conduzir aulas, a escolher e avaliar estratégias de ensino, a imprimir ritmo de aprendizagem, a manter disciplina e inúmeras outras ações e atitudes, as quais caracterizam sua prática pedagógica. tal aprendizado se dá por meio de suas experiências diretas enquanto estudantes e enquanto professores. Os conhecimentos sobre o ensino são in-terpretados pelos professores a partir de seus próprios valores, experiências e conhecimentos prévios, dentre outros aspectos, que podem validar ou desconsiderar os saberes advindos da formação específica.

Estudando o ciclo de vida dos professores, Cavaco (1995) observa que o jovem professor, diante da ne-cessidade de encontrar soluções para as situações com que se depara em sala de aula, é tentado a recuperar suas experiências enquanto aluno e elaborar formas de atuação rotineiras que se afastam das propostas teóri-cas inovadoras. desse modo constata-se que as con-cepções do professor adquiridas basicamente ao longo de sua formação ambiental – de seu percurso escolar – não se modificam somente pelo processo de formação específica, ou seja, os professores tendem a basear suas ações e argumentações na própria experiência, seja ela pessoal ou profissional.

Com relação à influência de modelos de ex-pro-fessores e das experiências enquanto estudantes como elementos que influenciam a prática pedagógica, te-

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mos as seguintes pesquisas: Pinto e Miorando (2004), Monteiro (2002) e Montalvão e Mizukami (2002). De acordo com Pinto e Miorando (2004), imagens de ex--professores servem de referência para balizar a prática pedagógica – modelo e antimodelo – como observaram no trabalho docente realizado pelas professoras que fo-ram sujeitos da referida pesquisa. Afirmam as autoras:

Ao nos apropriarmos das histórias de vida das pessoas com as quais trabalhamos, deparamo-nos com um ma-terial provido de intensa subjetividade, subjetividade essa que delineia as atitudes presentes, hoje, em sua prá-tica docente. (Pinto; Miorando, 2004, p.230).

Pesquisando professoras das séries iniciais do En-sino Fundamental em exercício no Magistério Público, Monteiro (2002) analisou seis narrativas produzidas por essas professoras que englobavam os seus percur-sos pessoais e profissionais e constatou que, em início de carreira, as professoras utilizam variadas fontes de informação para tomarem decisões quanto às suas atuações pedagógicas, com destaque para a influência das experiências enquanto estudantes.

Em pesquisa com alunas que frequentavam o CEFAM – Centro Específico de Formação e Aper-feiçoamento do Magistério –, durante o ano de 1999, em início e em final de curso, as autoras Montalvão e Mizukami (2002) puderam perceber que as alunas iniciantes realizavam análises de situações de ensino tomando como referência as experiências pessoais vi-vidas enquanto alunas, reproduzindo modelos e ex-periências de seu processo de escolarização, mesmo depois de iniciado um curso de formação específica. Afirmam as autoras (2002, p.124):

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Apoiando-se na literatura recente sobre o pensamento do professor, no caso da formação inicial, não se pode desconsiderar os saberes que as futuras professoras tra-zem para o curso, saberes esses marcados por crenças, hipóteses, concepções e teorias pessoais relacionadas ao processo ensino-aprendizagem, construídos a partir de uma trajetória de vida e de escolarização particular a cada uma.

Nesse sentido, Perdigão (2002), mais uma vez, con-tribui com esta pesquisa na medida em que acredita que a experiência de muitos anos com a instituição escolar legitima um modelo sobre o que é a escola, qual seu pa-pel, qual é o papel do currículo, o que ensinar, qual o papel do professor e do estudante etc. A trajetória esco-lar de cada sujeito forja e legitima concepções a respeito de todos esses elementos constituintes e envolvidos na prática educativa desenvolvida na escola.

Tendo em vista essas considerações a respeito de autobiografias e narrativas e as características de nossas fontes – histórias de escolarização de alunos de Pedago-gia –, buscamos trabalhos que dessem voz aos alunos de qualquer nível de ensino, visando conhecer e/ou analisar sua história de escolarização, suas experiências educativas, os professores que tiveram, as práticas dos referidos profissionais etc. Portanto não selecionamos apenas trabalhos cujas fontes são semelhantes às nossas. Quando isso ocorreu, no texto a seguir, exploraremos a identificação de fontes. Contudo, consideramos “voz” estudos que como coletas de dados utilizaram questio-nários, entrevistas, relatos e assim por diante.

Optamos por pesquisar trabalhos, Mestrado e Dou-torado, produzidos nas três universidades públicas do Es-

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tado de São paulo2 – unesp, unicamp e uSp – conside-rando um período de 10 anos (2001-2010). Nosso recorte temporal considerou a última década, ou seja, o período de 2001 a 2010, tendo em vista que 10 anos de produção é bastante significativo para uma análise da natureza que estamos operacionalizando. Outrossim decidimos por tal recorte devido ao fato de que o início da produção das His-tórias de Escolarização, nossas fontes, data do ano 2003.

Nossa busca foi feita no Banco de teses disponi-bilizado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de pessoal de Nível Superior (Capes)3 valendo-nos dos seguintes descritores: “narrativas orais”, “narrativas escritas”, “histórias de vidas de alunos”, “história de vida”, “depoimentos de alunos”, “autobiografia” e “autobiografia e pedagogia”. para cada descritor, de-limitamos o ano, a instituição e o nível de pesquisa de acordo com a estrutura do site. O que encontramos por descritor foi o seguinte:4

Quadro 1 – Trabalhos encontrados por descritor e universidade

Descritor Unesp Unicamp USP

Narrativas orais(Expressão

exata)

Não selecionado

Não selecionado

Não selecionado

2 Essa decisão baseou-se apenas na possibilidade de fazer uma varre-dura bibliográfica circunscrita às universidades públicas do Estado de São paulo.

3 disponível em: <www.capes.gov.br>. 4 Explicamos ao leitor que ao digitar o descritor no campo assunto

há três opções que podemos selecionar: todas as palavras, qualquer uma das palavras e expressão exata. No quadro, explicitamos qual foi nossa opção para cada descritor.

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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA HISTÓRIA... 33

Narrativas escritas

(Expressão exata)

2007, Mestrado

Rodrigues, M.U.

Não selecionado

Não selecionado

Histórias de vidas de alunos

(Expressão exata)

Não selecionado

Não localizado

Não selecionado

História de vida(Expressão

exata)

2003, MestradoMachado,

V.M.2007,

MestradoMaitino,

L.M.

Não selecionado

Não selecionado

História de vida(Todas as palavras)

2006, Mestrado

KIMURA, N. S. S.

2003, Mestrado

Ledesma, L. V. R.2006,

MestradoSouza, F. M.

de2008,

Mestrado Oliveira, A.

C. G. de2010,

MestradoSantos, C. A.

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2003, DoutoradoKoehler, S.

M. F.2009,

MestradoNascimento,

E. P.2009,

MestradoGuaraldo, L.

M.2010,

MestradoGuimarães,

A. C.2010,

MestradoDittrich, R. V.

Depoimentos de alunos

(Expressão exata)

Não selecionado

2001, Mestrado

Araújo, M. T. de

Não selecionado

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34 ISABELA VICENZO SGOBBI

Autobiografia (Todas as palavras)

2004, Mestrado

Tuchapesk, M. 2005,

Doutorado Pereira, P. S.

2003, Mestrado

Romão, A. M. 2004, Mestrado

Marinheiro, F. B.

2006, Mestrado Sampaio,

P. S. 2007, Mestrado

Pincheira, A. E. R. 2008, Mestrado

Saffiotti, A.

Autobiografia e Pedagogia

(Todas as palavras)

Não selecionado

2009, Mestrado

Batista, V. L.

Não selecionado

Fonte: elaborado pela autora.

por meio da leitura dos resumos selecionamos as pesquisas de nosso interesse, totalizando inicial-mente 22 trabalhos, conforme se verifica no quadro anterior. Lemos os 22 trabalhos, atentando para os objetivos, as metodologias e aos sujeitos pesquisa-dos. dessa forma, descartamos 14 trabalhos, pois, apesar da leitura dos resumos ter nos feito selecioná--los, tais trabalhos, ainda que trouxessem a voz dos alunos, dedicaram-se a outros objetivos, não estando voltados à história escolar dos discentes.

Nosso corpus teórico ficou composto por 8 pes-quisas, sendo 7 de Mestrado e apenas 1 de doutora-do. do total de trabalhos, 2 são da unesp, 3 são da unicamp e 3 são da uSp. No quadro a seguir, tra-zemos ao leitor as informações principais a respeito de cada uma dessas pesquisas, o que já permite per-ceber qual tipo de investigação tem sido realizada levando-se em conta o “dar voz aos alunos”.

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O que dizem os trabalhos da Unesp

Foram dois os trabalhos selecionados da unesp: Machado (2003) e tuchapesk (2004), ambos no nível de Mestrado. Machado (2003) desenvolveu um estu-do de caso em que analisou a contribuição do curso de pedagogia da Faculdade de Ciências e tecnologia (FCt), Campus de presidente prudente/unesp, para a formação do professor crítico-reflexivo. utili-zou o seu registro de memória acerca de sua história de vida, analisou o projeto político pedagógico do referi-do curso e realizou entrevistas semiestruturadas com dois ex-alunos que frequentaram o curso no período de 1994 a 1998 e que, no momento da pesquisa, já atuavam como professores. O registro memorialístico da autora, que também foi utilizado na triangulação dos dados, dizia respeito especificamente à sua expe-riência como aluna no curso de pedagogia. Exatamen-te por isso incluímos seu trabalho neste momento de nossa investigação. A respeito de registrar sua história de vida, a autora nos conta: “[...] foi um exercício fas-cinante, recheado de lágrimas, descobertas e um sabor inexplicável” (Machado, 2003, p.18).

A autora relata com seu olhar os cinco anos do curso de pedagogia noturno da FCt/unesp, descre-vendo algumas práticas realizadas em disciplinas:

A professora apresentava diversos temas para os semi-nários. A turma formava os grupos e escolhia os temas. Cada grupo recebia um conjunto de textos sobre seu tema. Os alunos liam, discutiam e redigiam um texto básico que inicialmente apresentavam e discutiam com a professora [...] durante o desenvolvimento do seminá-rio professor e alunos faziam comentários e indagações. O professor finalizava o trabalho com as considerações

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pertinentes. (Machado, 2003, p.128 – referência à dis-ciplina Estrutura e Funcionamento do Ensino Funda-mental e Médio)

O professor que lecionava a disciplina faltava muito, suas aulas fundamentavam-se em leituras e trabalhos re-digidos individualmente ou em grupos. trabalhos que, raramente, eram devolvidos. (Machado, 2003, p.130 – referência à disciplina didática)

relata, também, as lacunas que percebeu:

Na realidade, a devolução da avaliação (trabalhos, tex-tos, seminários, relatórios e provas) raramente ocorria. demoravam a serem corrigidos, dificilmente eram co-mentados em sala de aula, ou retornavam aos alunos com comentários por escrito, ou mesmo a possibilidade de serem reelaborados. Em algumas disciplinas, apenas ao término das aulas os alunos recebiam os trabalhos, em outras, concluíam a disciplina sem saber se haviam sido aprovados ou retidos. para a pesquisadora, a falta de correção das avaliações com os alunos impediam o amadurecimento e a autonomia na escrita. (Machado, 2003, p.139).

de acordo com Machado (2003), os saberes pró-prios da especificidade do curso de pedagogia foram trabalhados pelas disciplinas, entretanto, desenvol-vidos de modo teórico e sem articulação com a reali-dade escolar, havendo ainda problemas de conteúdo nas disciplinas de Educação Física e Artes. A autora entendeu que há desvalorização dos saberes da ex-periência no curso de pedagogia, destacando que tal desvalorização precisa ser superada para garantir a formação do professor com perfil crítico-reflexivo:

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Conhecer os alunos e seus projetos de vida, perceber que cada sujeito possui uma história única, observar que o professor, também, é ser humano eram aspectos “tidos” como essenciais para o trabalho docente. No entanto, não foram priorizados no trabalho com os alunos, futuros professores no curso de pedagogia da FCt-unesp. (Ma-chado, 2003, p.137).

Observa-se que Machado (2003) mostra que as práticas pedagógicas exercidas no curso de peda-gogia investigado não são satisfatórias no que diz respeito à formação de um profissional crítico-refle-xivo, pois não considera a vida real, ou o eu pessoal do aluno, nas teorizações no âmbito das diferentes disciplinas. Nesse sentido, a autora evidencia a importância dos dados advindos da vida como um todo na formação de professores.

A outra pesquisa realizada na unesp, a de tucha-pesk (2004), adotou a História Oral como método de investigação, objetivando compreender as interações entre Escola, Família e Matemática. para tanto, uti-lizou, dentre outros procedimentos, a Autobiografia temática. A partir dessas produções ela escolheu os sujeitos de sua pesquisa: 6 alunos do 1º ano do Ensino Médio. As entrevistas semiestruturadas permitiram tomar os depoimentos dos alunos, pais, professores de Matemática e dos coordenadores da escola. A propósi-to da História Oral a autora afirma:

[...] ao darmos o direito à voz a esses sujeitos, estamos permitindo que o grupo [...] encontre sua voz e que esta possa levá-los a uma nova visão da história local e regio-nal e, ainda, que possa ajudá-los a criar um entendimen-to mais profundo das condições sociais e culturais que os afetam. (tuchapesk, 2004, p.5).

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Nesse sentido, a autora ressalta a importância de ouvir os alunos para que a escola, responsável por sua formação, tenha elementos férteis para avaliar se as práticas pedagógicas que efetiva atendem àquelas necessidades do aluno que são conhecidas somente quando se dá voz a ele, com o objetivo desse sujeito se colocar inteiramente no processo de formação ao qual está submetido. por exemplo, excertos da pes-quisa em questão esclarecem essa nossa observação:

Sempre fui bem em Matemática; uma vez só que tirei nota baixa, pois eu não ia com a cara da professora da 6ª série. Não gostava da maneira da professora ensinar, eu não entendia o que ela falava, e a professora não se en-caixava comigo. [...] ela brigava muito na aula, tinha que ficar em silêncio, e eu não entendia as palavras que ela usava [...] pessoalmente, a professora era briguenta, ela era muito irritada e brava, nossa classe era bagunceira, e ela gritava muito [...] Já na 7ª série eu entendia tudo: por causa do jeito que a professora explicava, eu conseguia entender. Ela era um amor, um anjinho, ela falava baixo, falava meigo: “por favor, gente, vamos prestar atenção em mim”. dava aula e depois brincava no meio, dava uma aula diferente, ela dava conta para os alunos ao ar livre, ela cativava a gente (tuchapesk, 2004, p.49, relato da aluna Ketilin).

Observe que por meio da voz do aluno podemos apreender tipos de práticas diferentes, sendo uma que desagrada e uma que agrada ao aluno. tais informa-ções são preciosas para uma escola, pois nem sempre, sem a voz do aluno, a escola teria informação daqui-lo que é adequado para ensinar e aquilo que não é. Outras informações a respeito da prática pedagógica permitidas pela voz do aluno no texto de tuchapesk (2004) são: uso do livro didático, passar matéria na

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lousa, explicar a matéria, passar exercícios e não per-mitir conversa na sala de aula. Nesse sentido, os rela-tos a seguir materializam nossa observação:

Na aula de Matemática, a professora ia à lousa, expli-cava, mandava a gente fazer e depois ela corrigia. Na 5ª série e 6ª, tinha livro, minha professora tinha o livro e ela passava na lousa, nós tínhamos um livro próprio que nós tínhamos que fazer, ela tirava as dúvidas, e ela ex-plicava também (tuchapesk, 2004, p.61, relato da aluna Juliana).

Mas naquela época [7ª série], eu era mais fraquinho, porque eu não gostava de Matemática aquele tempo por causa da professora, porque no começo eu não tinha muita amizade com ela, então ela era meio ruim com nós. Ela era brava, não podia nem falar na classe, se desse um suspiro, ela mandava ir para fora (tuchapesk, 2004, p.71, relato do aluno Vitor).

A aula de Matemática passa rápido, é gostosa, o profes-sor vai explicando, já vai passando exercício, eu já vou aprendendo [...] Não gosto do professor, porque, às vezes, ele pega muito no pé, ele fala muito, ele reclama muito [...] não pode conversar, não na hora que ele está explicando, mas na hora que está fazendo exercício, ele não quer que converse, ele não quer que faça nada, mas ele explica muito bem [...] (tuchapesk, 2004, p.94, rela-to da aluna Monique).

de posse de todos os dados colhidos, a pesquisado-ra procurou indicar convergências no que foi dito pelos depoentes, classificando as tendências encontradas em três categorias: tendências de Conservação, tendên-cias de Mudança e tendências em Movimento.

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Na categoria “tendências de Conservação”, a au-tora inclui o uso do uniforme escolar, a valorização do estudo como forma de conquistar uma boa profissão e a interação família-escola, esta última acontecendo geralmente quando os alunos têm problemas de de-sempenho ou de disciplina. A autora também observa a mesma tendência com relação às práticas na sala de aula, sendo que o ensino de Matemática foi descrito como tradicional e centrado no professor, o qual ex-põe o conteúdo e os exercícios na lousa. A questão do fracasso na aprendizagem de Matemática é classificada como uma “tendência em Movimento”.

Já no que diz respeito ao relacionamento entre professor e aluno, a autora observa uma “tendência de Mudança”, visto que tempos atrás o professor se apresentava como uma pessoa autoritária, imbuída de todo saber e todo poder e vista pelos alunos como auto-ridade máxima. Atualmente, porém, a autora observa que os alunos criticam abertamente o professor, tanto no modo de explicar a matéria quanto no que se refe-re à relação professor-aluno, sendo que os professores elogiados são aqueles que em sua prática se mostram amigos e que se importam com as dificuldades e os problemas dos alunos.

O que dizem os trabalhos da Unicamp

Foram 3 as pesquisas selecionadas que usaram a voz dos alunos: Araújo (2001), Ledesma (2003) e Sou-za (2006), todas desenvolvidas no nível de Mestrado.

Araújo (2001) tomou como objeto de estudo o processo de educação formal vivido por crianças e jovens na instituição escolar e por eles narrado. Os sujeitos são alunos de uma escola pública de 2º grau

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que atende em três turnos e recebe adolescentes na faixa etária de 14 a 18 anos. A autora entrevistou, no final do ano de 1996, 18 alunos, sendo 8 do período noturno, 7 do vespertino e 3 do matutino.

Os alunos-sujeitos apontam a sala de aula como local privilegiado, quase exclusivo, para a efetivação do processo ensino-aprendizagem. A autora observou que neste espaço se mantém a organização que reserva aos alunos o lugar de espectadores, mais ou menos pas-sivos, dependendo do professor e das práticas pedagó-gicas efetivadas por ele. Ao investigar o que os sujeitos estão aprendendo, a autora constatou que a maioria dos alunos, ao falar sobre os conteúdos curriculares que mais ou menos gostam, faz referência ao grau de empatia com o professor que ministra a matéria.

referindo-se às recordações da escola, um dos en-trevistados – aluno do período noturno – afirma que a lembrança mais forte é a de duas professoras que o marcaram muito em sua vida e descreve vários aspec-tos das práticas pedagógicas efetivadas por elas:

“porque essas duas professoras, na sala, elas davam uma atenção especial para o aluno, entendeu; tanto para aqueles que eram mais bagunceiros (que eu era um dos mais bagunceiros), quanto para aqueles que eram mais empenhados, entendeu. Era como um pai e uma mãe assim: dava conselho, dava dicas para gente se divertir, numa boa, saudável, ela ajudava o grêmio a participar, assim, de eventos, tipo campeonatos; foram as professo-ras que não só davam a aula mas também participavam na vida particular do aluno; davam um conselho, assim: às vezes alunos que tinham problemas com os pais, en-tendeu, ela ajudava, ou então chamava a mãe para con-versar. [...]. Então quando vem esse lance de lembrar de colégio, de escola, antepassado assim, eu lembro dessas duas professoras.” (Araújo, 2001, p. 35, grifos nossos).

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O mesmo aluno descreve a prática pedagógica de um professor de Geografia, a qual, para a autora, representa uma nova abordagem, indo além da pers-pectiva que exige que os alunos somente memorizem conteúdos:

“As aulas dele eram muito legais. Além de falar da geo-grafia, ele fala bastante politicamente, explica a situação política do país. Ele é bem político, ele fala bastante nes-se meio. Ele é, também, um professor bem didático, bem legal.” (Araújo, 2001, p.68).

E ainda refere-se à professora de História, que adota uma prática pedagógica baseada na explicação oral, o que para o aluno é uma prática positiva:

“[...] ela fala muito, ela explica muito, então não tem o que você escrever na aula dela, você escreve o que você entende. Ela não é aquela professora que faz você de-corar, preenche a lousa de matéria e é isso que eu não gosto, de ficar copiando, copiando, copiando [...].” (Araújo, 2001, p.71).

Note que, desde já, há várias informações acerca da prática pedagógica que foram apreendidas a par-tir das narrativas de alunos. Acreditamos que não somente para a escola como instituição essas infor-mações sejam imprescindíveis para a sua organização didática. Acreditamos que se professores, indepen-dentemente da disciplina que ministram, tiverem acesso a dados como esses seguramente eles consti-tuirão informações úteis para o trabalho que reali-zam, provocando até reflexão sobre as características do professor que agradam e não agradam ao aluno. Araújo (2001) afirma, por exemplo, que a maneira do

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professor conduzir as aulas constitui-se em impor-tante definidor na preferência da matéria pelo aluno, bem como na facilidade ou não em compreendê-la.

Já Ledesma (2003) teve por objetivo recuperar a experiência educacional dos alunos que ingressaram no curso de pedagogia da Faculdade de Educação da universidade Estadual de Campinas – unicamp, no ano 2000, focalizando suas vivências educativas ante-riores ao seu ingresso. A pesquisa se situa numa linha de investigação sobre as histórias de vida e os relatos de experiência como fontes de conhecimento da prática educacional. Vale ressaltar que o objetivo desse traba-lho é bastante próximo ao que estamos apresentando, uma vez que mostra a história de escolarização dos alu-nos pregressa ao ingresso no curso de pedagogia.

A autora relata-nos que um dos pontos de parti-da do curso de pedagogia da referida instituição está na recuperação da experiência discente, por meio de um relato de experiência escrito na disciplina “In-trodução à pedagogia”, cursada no primeiro semes-tre do curso. desse modo, nas primeiras semanas de aula, foi solicitado aos alunos do período diurno e noturno que elaborassem relatos de vida escritos individualmente, contendo as experiências mais sig-nificativas de sua vivência educativa, alertando para que não registrassem apenas os eventos da vida esco-lar, mas outras situações em que o fenômeno educa-tivo poderia acontecer. tais relatos foram feitos sem parâmetros rígidos, na forma de um memorial, sem limite de laudas e com a possibilidade de usar foto-grafias e documentos. Observe a aproximação das fontes do trabalho em questão às fontes do trabalho que estamos apresentando, reitera-se.

de posse desses materiais, o próximo passo foi estudar os relatos a fim de sistematizar os fatos re-

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gistrados em núcleos temáticos mais significativos para o grupo de alunos, procurando semelhanças e diferenças entre eles:

Na maioria dos casos começam fazendo referência ao pe-ríodo dos 3 anos de idade quando entraram na pré-escola, sendo esta descrita como um fato marcante e decisivo em sua vida tanto pessoal como profissional. Num total de 75 relatos fica, relativamente, claro que os alunos tiveram uma educação infantil formal sendo 90% em escolas privadas e 6 escolas de educação infantis públicas, somente 2 alunos foram diretamente para a educação básica sem ter passado antes por nenhuma instituição educacional. desta forma, seguem desenvolvendo sua história até a decisão de fazer cursinho para tentar garantir com isso chegar à universida-de. (Ledesma, 2003, p.19).

A maior porcentagem de dados relatados quan-titativamente foi referente a fatos marcantes no cursinho (66%), seguido do período do Magistério (21%). porém, de acordo com os sujeitos, o nível que apresentou fatos mais marcantes foi o primário – que hoje corresponde ao Ciclo I do Ensino Fundamen-tal –, tanto em alunos que cursaram escolas públicas como particulares.

O núcleo Educação tradicional foi encontrado em 51% dos relatos e a autora sintetiza os dados da seguin-te forma:

[...] a educação oferecida a estes alunos segundo os rela-tos obtidos é uma educação de caráter repressivo, onde o aluno não tem nenhuma possibilidade de expressar e discordar do “ser supremo”, neste caso o professor, tam-bém existe quem defina esta educação como tradicional, onde o poder estava concentrado nas mãos do professor e o aluno era simplesmente um ouvinte e o bom aluno era

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aquele que mais se parecia com o modelo padrão. (Le-desma, 2003, p.49-50).

Outro núcleo temático que apareceu com bas-tante destaque nas histórias de vida é a questão da Educação Familiar, com uma incidência de 68% nos relatos, por meio da ideia de mãe como pri-meira educadora.

Em outra etapa da pesquisa, no final do primeiro semestre, os alunos foram convidados a escreverem um novo relato, procurando identificar possíveis mu-danças na concepção de educação, levando em con-sideração os conteúdos desenvolvidos nas disciplinas Filosofia e História da Educação. A autora verificou que houve a construção de novos conceitos e/ou a re-formulação de aprendizados. Escrevendo o segundo relato, todos os depoimentos salientaram o enrique-cimento obtido ao ter uma visão mais clara e objetiva de sua experiência educativa dentro do contexto his-tórico e social em que aconteceu e a importância disso na formação profissional como educadores. O excerto a seguir mostra que o aluno conseguiu utilizar os co-nhecimentos adquiridos em uma das disciplinas para entender um tipo de prática pedagógica efetivada por uma ex-professora:

A experiência mais marcante que tive foi com uma pro-fessora de física, ela era a professora chefe da minha sala, mas no fim não fazia nada pelos alunos, para ela era tudo impossível, nada tinha solução. A sua forma de agir com os alunos, a sua maneira de dar aula, pude entendê-las através das aulas de Filosofia da Educação, e por um li-vro que o professor regis de Morais escreveu: Violência e Educação. (Ledesma, 2003, p.54).

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Como afirmamos anteriormente, dados oriun-dos da voz de alunos sobre a sua escolarização po-dem provocar reflexões por parte do professor que os conhece. O último excerto mostra, objetivamente, como produzir histórias de escolarização pode pro-vocar também nos alunos reflexões sobre as práticas pedagógicas às quais foram submetidos durante o seu percurso escolar. No caso em questão, em que o aluno será professor e portanto cursa pedagogia, a ativida-de narrativa é inflexionada pela teoria específica dessa formação, permitindo uma reflexão metadidática de práticas pedagógicas.

por fim, o trabalho de Souza (2006) procurou recuperar as trajetórias escolares de alunos negros da unicamp, buscando compreender como a cor da pele interferiu e interfere nas vivências dos entrevis-tados, especialmente nos ambientes escolares pelos quais têm passado. Nesse sentido, a autora pressu-punha que as trajetórias de estudantes negros tra-ziam referências acerca do preconceito vivenciado em ambientes escolares. Entretanto, a pesquisadora se surpreendeu, pois não encontrou somente um grupo com menores condições socioeconômicas, o que era esperado tendo em vista a bibliografia pesquisada, mas encontrou um grupo de estudantes negros cujas trajetórias sociais os aproximava de um estudante universitário brasileiro padrão: jovens, filhos de pais com alto nível de escolaridade e com renda familiar elevada. por meio dos dados obtidos nas entrevistas, a autora pôde perceber que as condições de estudo pré-universitário dos sujeitos seguiram o padrão so-cioeconômico da renda de suas famílias.

Assim, os entrevistados com melhor condição socioeco-nômica (maioria entre os entrevistados) têm um históri-

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co escolar similar ao de qualquer outro jovem das clas-ses sociais mais abastadas: colégios particulares, cursos diversos, tempo livre para estudo (sem necessidade de trabalhar), enfim contaram com todo apoio emocional e financeiro de suas famílias. (Souza, 2006, p.30).

A maior parte dos entrevistados se calou quando questionados a respeito de experiências preconcei-tuosas e discriminatórias que possivelmente teriam sofrido na escola e, para a autora, o que se eviden-ciou foi o incômodo com a questão, manifestado pela negação enfática de tais experiências nas trajetórias escolares. referindo -se às práticas pedagógicas dos professores, os alunos disseram:

“Ah, não! Os professores tratavam todo mundo igual!!!” (aluno deEngenharia Agrícola)“[...] Lá na minha escola não tinha isso não. Inclusive tinha uma professora lá que sempre falava das diferen-ças sociais em nosso país. Ela sempre falava: ‘quantos negros têm na nossa turma?’ Lá tinha essa consciência sim”. (aluno de Biologia)“Não! Os professores sempre me trataram bem!” (aluna de EngenhariaMecatrônica) (Souza, 2006, p.40).

por meio das narrativas, acerca da história de es-colarização vivida antes do ingresso na universidade, a pesquisadora observou que a maior parte dos entre-vistados só se lembrava de situações de preconceito e discriminação fora da escola, o que indica, para a auto-ra, que a associação entre escola e racismo parece não fazer sentido para seus sujeitos. Entretanto, relem-brando situações pelas quais passou em sua própria escolarização, a autora descreve:

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um dia, depois de mais um interminável intervalo sozi-nha no pátio, voltei à sala para o recomeço da aula. [...]. Naquele dia, quando voltei, meus materiais estavam no chão, no centro da sala. As mesas eram coletivas, desti-nadas a quatro crianças cada uma. tentei voltar para a mesa que estava. tentei sentar nas outras, mas todas es-tavam ocupadas. triste e com medo, sentei no chão jun-to com as minhas coisas. Quando a professora voltou, não pensou duas vezes, chamou minha atenção, gritou comigo e falou que era para eu parar de “gracinha”. Na minha timidez, medo e, sobretudo, vontade de sumir, tentei explicar, mas ela não quis ouvir. para ela, tudo estava claro: eu estivera brincando no chão na hora do intervalo e não respeitara o sinal do recomeço da aula. para aquela professora eu não passava de uma menina indisciplinada, embora o meu comportamento não des-se margem para tal interpretação. (Souza, 2006, p.41).

Note que a autora da pesquisa a que estamos nos referindo, neste momento, é negra e devido também à sua experiência em relação a preconceito em ambiente escolar acreditava que outros alunos, de outra geração, de outro momento histórico, haviam sofrido do mesmo preconceito que denuncia. Contudo, os dados advindos da história de escolarização de seus sujeitos não con-firmaram seu pressuposto. Obviamente não estamos tratando, nesta investigação, de questões relacionadas diretamente ao preconceito, mas estamos exatamente nesta etapa da pesquisa mostrando a fertilidade de es-tudos que dão voz aos alunos. No último caso, o efeito de estudos com fontes subjetivas serviu, pode-se dizer, para a autora estabelecer relação entre a história de seu tempo e a história do tempo de seus sujeitos. também não é o objetivo de nossa pesquisa refletir sobre as pos-síveis razões, ou não, dos sujeitos da investigação em questão terem dito que não sofreram preconceitos.

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Em relação às experiências na universidade, os alu-nos relataram que têm a sensação de solidão no espaço acadêmico, associada ao medo de passar por situações constrangedoras. No que diz respeito a casos de cons-trangimento racial envolvendo professores da univer-sidade, evidenciou-se, para a autora, a dificuldade de classificar tais situações como preconceituosas e dis-criminatórias. Embora alguns alunos relatassem um tratamento diferente por parte de algum professor, não conseguiram afirmar que tivessem sido vítimas de pre-conceito e de discriminação racial.

Com exceção de um depoimento – do aluno de Quími-ca – os demais entrevistados que narraram situações de constrangimento envolvendo professores, o fizeram com ressalvas. É interessante o relato de dois entrevistados, que equiparam o preconceito racial com o preconceito etário [...]. Eles colocam em suspeição a discriminação racial, pois ficaram em dúvida se o tratamento de alguns professores é fruto de discriminação por causa da raça ou porque tratam mal alguns tipos de alunos “indese-jáveis”, como os mais velhos, por exemplo. O interes-sante é que eles não se dão conta justamente disso: se o professor trata mal alguém por ser mais velho, por es-tar na categoria dos “indesejáveis” é sinal que ser negro também é estar dentro desta categoria por alguma razão. [...] Assim, podemos inferir que ser negro, para alguns professores, deve estar no rol dos alunos “indesejáveis”, justamente pela imagem que se deve ter do negro: um “fracasso” escolar; com dificuldades cognitivas. É o es-tigma da cor da pele atuando nas interações acadêmicas de forma a prejudicar o desempenho e o futuro profis-sional destes alunos. (Souza, 2006, p.65-66).

para a autora, há um silenciamento das práticas preconceituosas e discriminatórias que são efetivadas

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no ambiente acadêmico. Segundo ela, isso pode contri-buir para a reprodução do discurso conservador de que a universidade não é espaço para negros e, assim, as situações de exclusão do negro neste ambiente são rea-limentadas, mantendo-se o atual quadro de invisibi-lidade do grupo no espaço universitário. O problema transversal que este trabalho suscita é o seguinte: se os sujeitos da pesquisa não sofreram preconceito duran-te a escolarização do Ensino Fundamental e Médio, como afirmaram, de onde vem o medo do preconceito na universidade? Seria um problema da “Autoridade” que a universidade representa ou os respondentes, por alguma razão, não assumiram o preconceito durante sua escolarização pregressa? de todo modo, as narra-tivas de alunos decididamente são muito férteis como fontes de pesquisa.

O que dizem os trabalhos da USP

da uSp selecionamos três trabalhos: Koehler (2003), Saffiotti (2008) e dittrich (2010). O trabalho de Koehler (2003) é o único doutorado que foi selecio-nado na revisão bibliográfica.

para abordar questões relativas à violência psico-lógica, Koehler (2003, p.5) se propôs a ouvir o que os adolescentes têm a dizer: “trata-se especificamente de registrar as marcas que ficaram na memória do adoles-cente sobre as suas experiências de relações interpes-soais com o ‘pior professor’ enquanto eram crianças.”.

A autora utilizou como instrumentos de coleta de dados um questionário com 31 questões, além de um desenho do professor e uma frase a respeito do docente, cujo objetivo principal era conhecer as características do “pior professor” desde o dia em que o aluno ingres-

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sou na escola. O questionário se estruturou em três blocos: sobre o aluno, contendo questões sobre o tipo de escola, idade do sujeito, situação ocupacional da fa-mília; sobre o perfil do “pior professor”, com questões relativas à série, disciplina, gênero e idade do professor; sobre a vida do aluno com esse professor, com questões buscando identificar ações dos professores considera-das violentas, as suas frequências e os sentimentos dos sujeitos frente a tais ações. A nosso ver tais blocos se relacionam, direta ou indiretamente, com as práticas pedagógicas efetivadas pelos professores.

Os sujeitos da pesquisa foram 516 alunos de 8ª série do Ensino Fundamental, matriculados em escolas públicas (441 sujeitos) e particulares (75 sujeitos) do município de Guaratinguetá, no ano de 2001. A autora justifica a escolha por esta série devido ao fato de que os alunos já vivenciaram uma parte considerável de sua escolarização e que já sa-bem identificar e nomear seus próprios sentimentos, distinguindo, com clareza, o adulto que atrapalha ou auxilia seu desenvolvimento.

de posse de todos os dados, a autora pôde cons-tatar que atos de violência psicológica estiveram pre-sentes na trajetória de 488 sujeitos, o que equivale a quase 95% da amostra. Além disso, os dados mostra-ram que o fenômeno da violência psicológica atinge indiscriminadamente meninos e meninas de ambas as redes de ensino do município estudado. por or-dem de frequência, em ambas as redes, aparecem os atos de gritar (32,8%), humilhar (28,1%) e comparar depreciando (16,6%). Em percentual menor aparece-ram os atos de ameaçar alunos, atirar objetos, mentir, agredir fisicamente e quebrar objetos. Os sentimen-tos dos alunos com relação aos atos de violência fo-ram registrados como vergonha, humilhação e raiva.

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Koehler (2003, p.9) nos apresenta outros dados:

Considerando toda a amostra, a maioria dos alunos informa que os professores propensos aos AtOS de Violência psicológica lecionam Matemática (30,7%), se-guidos dos de História (23,4%) e de português (20,1%). Analisando-se, dentro das redes de Ensino, verifica-se que na pública se repete o observado em toda amostra (Matemática –31,5% e História – 22,6%). Na rede particular, foi mais citada a disciplina História (28,0%), seguida da mesma participação (24,6%) nas disciplinas de Matemática e português.

para analisar os desenhos feitos pelos alunos, a au-tora valeu-se de uma categorização temática e encon-trou o seguinte quadro:

• figura humana – atitudes desfavoráveis: professor autoritário, agressivo, punitivo, gestos que demonstram o poder, como, por exemplo, bra-ços erguidos, mãos na cintura, rosto sisudo, olhar de reprovação, régua na mão do professor em posição ameaçadora (36,2%);

• figurasmitológicasquecausammedo:bruxa,demônio com tridente e chifres, monstros (23,8%);

• figuras humanas ridicularizadas/humor:nariz enorme, corpo desproporcional, gordos, des-cabelados (14,7%);

• figurahumana–aspectosintelectuaisoucog-nitivos da aprendizagem: professor com livro, óculos destacados no desenho, quadro negro com operações matemáticas (9,8%);

• ambiente: sala de aula, mesa, carteiras comalunos (5,6%);

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• figura humana – atitudes favoráveis: sorrisono rosto do professor, professor com os braços abertos, coração na camisa (4,4%);

• objetos:caderno,garrafadepinga,lousa,tubode cola, livro, régua (3,3%);

• figura de um animal: vaca, macaco, cobra,baleia, cachorro (2,2%).

Os dados da amostra indicaram que a violência psi-cológica ocorre independente do gênero ou do tipo de escola. Quase 71% dos professores descritos pertencem ao gênero feminino, entretanto, a autora chama a atenção para o fato da predominância das mulheres na profissão docente. portanto, a autora mostrou, por meio da voz dos alunos e dos dados estatísticos, que a violência psicoló-gica ocorre nas relações professor-aluno nas escolas de Ensino Fundamental de Guaratinguetá, ou seja, é uma realidade nas práticas efetivadas em sala de aula.

Saffiotti (2008) se propôs a estudar a experiência de alunos de baixa renda em um cursinho popular de São paulo. para isso, partiu de sua própria história como aluno no curso ao qual pertencem seus sujei-tos. E aplicou entrevistas em profundidade com três ex-alunos do mesmo cursinho, procurando fomentar narrativas que possibilitassem a livre expressão a res-peito das práticas no contexto desse cursinho popular. O tempo abrangido pela entrevista incluiu a vida social pregressa – família, casa, escola, trabalho, cursinho – e encerrou-se com os resultados dos vestibulares.

Esse autor, a propósito de sua reconstrução au-tobiográfica, descreve alguns de seus professores, evidenciando algumas ações que compõem a prática pedagógica em um tipo de relato que se aproxima das Histórias de Escolarização escritas por nossos sujeitos:

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Lembro-me com carinho de um professor de matemá-tica [...] que nos fazia recortar cartolinas para entender o sentido das formas algébricas e da geometria. Fre-quentemente nos colocava para trabalhar em grupo e estimulava, dando pontos na nota final, resoluções cria-tivas para os problemas propostos. [...] [Zuza, professor de geografia] Fazia questão de nos contar vivamente sua experiência com o coronelismo [...]. Ele energicamente repetia sobre a importância do estudo na vida [...]. Mui-tos colegas não gostavam de ambos por considerá-los muito “rigorosos”, entretanto foram professores e aulas que fortemente me marcaram. (Saffiotti, 2008, p. 57).

referindo-se às aulas de Matemática, Física e Química e aos professores que as ministravam, o au-tor nos descreve um tipo de prática que não considera positivo:

[...] um amontoado de fórmulas que nos levavam do nada para lugar nenhum, resumindo-se a números e letras. [...] também me ressentia pela falta de envolvi-mento de alguns professores conosco e com o próprio conteúdo das disciplinas que ministravam, dando aulas como quem reproduz uma gravação: eles não falavam para mim, ou comigo, não havia ninguém ali. (Saffiotti, 2008, p.59).

Vale dizer que após um ano de cursinho, o autor, em seu relato, informa que foi aprovado no vestibular da uSp. Além disso, apresenta uma outra avaliação dos professores que teve no cursinho, que foi seu cam-po de pesquisa:

Foram conteúdos programáticos daquilo que deveria ter visto no Ensino Médio e não vi? Foi isso e foi mais. Eram professores com autoridade, mas não eram autoritários, e

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essa autoridade os fazia maiores, mas não superiores [...] para mim, sobretudo fez diferença eles não nos tratarem como “carentes”: éramos unicamente alunos, e o investi-mento e a dedicação destes professores, cônscios de nossas dificuldades, apontavam mais para nossas potencialidades do que para nossas dificuldades. (Saffiotti, 2008, p.89).

No que se refere aos sujeitos depoentes na pes-quisa de Saffiotti (2008), Madalena descreve suas memórias do Ensino Médio recordando-se de pro-fessores sem compromisso, que faltavam muito ou ficavam apenas sentados na sala de aula: “[...] os professores, quando eles dava aula era aquela coi-sa totalmente desinteressante de encher o quadro de lousa, copiar e pedir dez respostas sobre aque-le texto.” (Saffiotti, 2008, p.96). Ao ingressar no cursinho encontra uma nova realidade com pro-fessores comprometidos, dedicados e acolhedores e isso funciona, para ela, como um estímulo para estudar. Jonas, outro depoente, também chamou atenção para o compromisso dos professores do cursinho que, segundo ele, resultavam em aulas mais interessantes. por fim, daniel, o terceiro de-poente, exalta o fato de os professores do cursinho partilharem suas histórias de vida e, por intermédio delas, criarem uma paisagem humana no cursinho, não desenvolvendo um distanciamento hierárquico e autoritário entre professores e alunos.

Já nas considerações finais, o autor afirma que para além do objetivo de favorecer o ingresso de estudantes de baixa renda em universidades públicas, a vivência no cursinho popular possibilitou experiências de comuni-dade, que se mostraram fundamentais para a aprendiza-gem, uma vez que permitiram o resgate e a compreensão de vivências de humilhação social sofridas pelos sujeitos,

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criando, ao mesmo tempo, novos modos de relações pos-síveis entre os alunos e os demais.

O último estudo a ser apresentado neste capítulo é o de dittrich (2010). para realizar sua pesquisa a autora valeu-se do método das entrevistas recorrentes. A de-finição dos sujeitos participantes da pesquisa levou em conta dois critérios: o aluno ser considerado bom aluno em Matemática por seus professores e afirmar gostar de Matemática. Foram selecionados três alunos, estudantes do 3º ano do Ensino Médio.

referindo-se ao ensino da Matemática e a profes-sores que ministravam tal disciplina, o sujeito 1 recorda de um professor da 5ª série que utilizava desafios ma-temáticos, o que era considerado algo estimulante. O sujeito 2 destacou professores que sempre deram aulas práticas, com exemplos e utilização de materiais mani-puláveis, como o uso de barra de chocolate no ensino de frações. também deu destaque para o fato de que seus professores procuravam ensinar de uma forma que pro-porcionasse o entendimento das fórmulas matemáticas e não apenas o ato de decorar e aplicar em exercícios. Já o sujeito 3 refere-se à professora da 3ª série , afirmando gostar do método de ensino utilizado: “Normalmente ela pegava a última meia hora da aula [...] e fazia ta-buada. daí ela fazia um joguinho, quem acertasse três vezes, primeiro, três contas matemáticas de multiplica-ção, era liberado da sala” (dittrichi, 2010, p.96).

todos os sujeitos fazem referência à questão da afe-tividade na relação professor-aluno, acreditando que uma relação de amizade entre alunos e professor colabo-ra muito na aprendizagem, conforme relata o sujeito 2:

Mas tem professores que se tornam amigos, sabe, não uma questão de amizade assim, mas tem um relaciona-mento bom. dá vontade de ir pra aula, você quer apren-

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der, você quer entender o conteúdo, fica mais fácil de você aprender, do que você só estar indo lá por obriga-ção, entendeu! [...] não aquele professor piadista, mas professor que se envolve com a turma assim, a gente tem mais vontade de aprender, né. do que aquele professor sistemático que entra na matéria, faz chamada e só isso. Então, eu acho que com certeza a questão de relacionamento com o pro-fessor influencia bastante. (dittrichi, 2010, p.99).

A autora constatou que a questão do gosto pela Matemática dos pais e irmãos mais velhos de seus su-jeitos parece ter influenciado sobremaneira. Na mes-ma direção, a mediação e a afetividade em sala de aula foram pontos especialmente levantados pelos sujeitos: uma mediação com marcas afetivas, baseada na amiza-de entre professor e aluno, a proximidade e o contato, a admiração e práticas significativas são fatores que colaboram tanto para gostar da disciplina quanto para ser um aluno bem-sucedido em Matemática.

As atitudes do professor, sua forma de ensinar, a rela-ção que instaura com os alunos em sala, assim como sua capacidade de sustentar uma relação positiva diante do objeto de conhecimento, no caso a Matemática, é um ponto fundamental para alcançar o sucesso na discipli-na. Outra consideração feita foi a questão do professor conseguir manter a disciplina e a ordem em sala de aula a fim de possibilitar a concentração dos alunos. (dittrichi, 2012, p.127).

percebemos que a questão de manter a disciplina e a ordem em sala de aula é um aspecto considerado im-portante pelos alunos ao referirem-se aos seus profes-sores. A autora conclui que o professor é fundamental para o sucesso do aluno na disciplina de Matemática.

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terminamos aqui a exposição das pesquisas por nós selecionadas e apresentamos, para finalizar o ca-pítulo, uma síntese do que observamos. A primeira questão se refere à pouca quantidade de trabalhos se-lecionados. É claro que não podemos nos esquecer dos recortes adotados, mas considerando-se a produção das três universidades públicas estaduais de São paulo, é um número muito reduzido levando-se em conta da-dos coletados de caráter autobiográfico e/ou História de Escolarização de alunos no período de 2001 a 2010. Isso pode estar relacionado, a nosso ver, com o fato de as produções e pesquisas estarem mais voltadas ao pro-fessor, à sua prática e à sua formação do que ao aluno.

Além disso, nosso descarte foi grande, pois as pes-quisas que trazem a voz do aluno estão basicamente voltadas a outros objetivos que não seja conhecer, ana-lisar ou investigar o percurso escolar do aluno, os pro-fessores que tiveram e as práticas de tais professores. desse modo, selecionamos apenas oito pesquisas que atenderam aos nossos critérios de busca, explicitados no início do capítulo. do total, três pesquisas tomaram como sujeitos alunos do Ensino Superior, três pesqui-sas estudaram alunos do Ensino Médio, uma pesqui-sa investigou alunos da 8ª série (atual 9º ano EFCII) e uma pesquisa foi realizada com ex-alunos de um cur-sinho popular. Salientamos que as justificativas dos autores, ao estudarem alunos da 9ª série e do Ensino Médio, se voltam ao fato de esses sujeitos já haverem passado tempo suficiente na escola para poderem falar e julgar professores e práticas efetivadas por eles e pe-las escolas nas quais estudam. das três pesquisas reali-zadas com alunos do Ensino Superior, duas foram rea-lizadas com alunos de pedagogia e uma com alunos de diversos cursos superiores. portanto, especificamente para nossa investigação, contamos apenas com duas

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pesquisas produzidas com alunos do curso de pedago-gia, que é o nosso caso.

Entretanto, apesar de serem poucos trabalhos, trouxeram contribuições importantes no entendimen-to de nossos dados e nos ajudaram a construir a discus-são a que nos propusemos, uma vez que, por meio dos trabalhos da revisão pudemos apreender aspectos rela-cionados com a prática pedagógica de professores, com a relação professor-aluno, com aquilo que os alunos valorizam no professor e como são as marcas deixadas pelos professores, tanto os considerados bons como os ruins. Consideramos que os oito trabalhos trouxeram informações importantes e relacionadas com nosso ob-jeto/objetivo: dados advindos da voz de alunos sobre as práticas pedagógicas e informações afins.

No que diz respeito à força e/ou fertilidade de nossas fontes, podemos perguntar: ora, não é o percur-so escolar vivenciado por, no mínimo, 11 anos,5 uma fonte riquíssima de informação? Acreditamos que sim e, desse modo, nos dedicaremos a explorar o que alu-nos do curso de pedagogia oferecido pela Faculdade de Ciências e Letras – Campus de Araraquara/unesp têm a nos dizer sobre experiências vividas na sua his-tória de escolarização até seu ingresso na universida-de. É exatamente sobre a voz desses alunos que trata o próximo capítulo.

5 todos os nossos sujeitos cursaram, no mínimo, os 8 anos do En-sino Fundamental e os 3 anos do Ensino Médio, totalizando 11 anos de estudos. Salientamos que quando cursaram esses níveis de ensino, ainda valia a denominação antiga dos mesmos, qual seja: 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental, 5ª a 8ª série do Ensino Fundamental e Colegial.

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2Uma breve reflexão sobre

práticas pedagógicas e apresentação das fontes

“O vento é o mesmo, mas sua resposta é diferente em cada folha”

Cecília Meireles (1973, p. 45)

O que autores dizem sobre a prática pedagógica

primeiramente é importante apreender o signifi-cado de prática com o foco voltado para a prática pe-dagógica. Nesse sentido, primeiramente usaremos o dicionário Houaiss,1 que nos traz 13 definições para a palavra. pensando no trabalho que o professor realiza dia a dia no seu contexto de trabalho, especialmente na sala de aula, destacamos as seguintes definições:

1 Grande Dicionário Houaiss Beta da Língua Portuguesa.

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1. Ato ou efeito de praticar; 2. Ato ou efeito de fazer (algo); ação, execução, realização, exercício; 5. Exe-cução de alguma coisa que se planejou; 6. Execução rotineira de alguma atividade.

para aprofundar nossas reflexões, dialogaremos, neste capítulo, com autores que abordam elementos constitutivos da prática pedagógica propriamente dita, como Sacristán (2000), dutra et al. (2004), Ku-rek (2004), Batista (2009), pimenta (1999), Maitino (2007), Cunha (2009), entre outros. de acordo com Sacristán (2000), na prática pedagógica:

[...] se projetam todas as determinações do sistema curri-cular, onde ocorrem os processos de deliberação e onde se manifestam os espaços de decisão autônoma dos seus mais diretos destinatários: professores e alunos. [...] A estrutura da prática obedece a múltiplos determinantes, tem sua justificativa em parâmetros institucionais, orga-nizativos, tradições metodológicas, possibilidades reais dos professores, dos meios e condições físicas existentes (p.201, grifos do autor).

Nesse sentido, a prática se configura por outros determinantes que não apenas os curriculares; é algo fluido, fugaz e complexo enquanto expressão de múlti-plos determinantes, valores, ideais e usos pedagógicos. A prática pedagógica sofre influências subjetivas e de-pende de decisões individuais, mas também se guia por normas coletivas e por regras institucionais e organiza-cionais. Apesar de nosso foco estar na sala de aula, que é o contexto imediato das atividades pedagógicas e onde tem lugar a maior parte das atividades do professor e do aluno, entendemos que a prática não se reduz à ação dos professores, mas sim que o professor é responsável por moldar a prática, sendo essa a intersecção de diferentes

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contextos como a sala de aula, a escola em si, com todos os agentes que atuam nela e o espaço extraescolar.

dutra et al. (2004) destacam alguns aspectos que necessitam ser considerados na análise da prá-tica pedagógica:

• onúmerodealunosemsaladeaula,jáqueoexcessivo número de alunos dificulta o manejo de um trabalho adequado;

• a presença do formalismo pedagógico, quemuitas vezes cria um processo ensino-aprendizagem artificial, baseado exclusivamente no livro didático, com aulas ajustadas a esquemas predefinidos;

• situações de ensino-aprendizagem que nãolevam em conta a experiência dos alunos na rotina escolar, empobrecendo a prática educativa, tolhendo manifestações autônomas e originais do pensamento do aluno;

• ensino realizado exclusivamente na sala de aula, não aproveitando-se espaços sociais disponíveis, que poderiam contribuir para observação, experimenta-ção e desenvolvimento do raciocínio e crítica dos alunos;

• adisciplinacentradanapassividade,umavezque não se abre espaço para participações e interven-ções dos alunos.

Considerando-se a presença ou não dos aspectos citados anteriormente, certamente teremos práticas pedagógicas diferenciadas, bem como também será diferente a relação professor-aluno. Nesse sentido, a interação entre professor e alunos desempenha um pa-pel fundamental no processo de aprendizagem, sendo que pode marcar as histórias escolares dos alunos de forma positiva ou negativa, como mostraram pesqui-sas apresentadas no Capítulo 1.

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Acreditamos que as ações do professor em sala de aula – compreendendo desde o modo de se vestir até a forma de avaliação – compõem em conjunto seu mé-todo de ensino, logo, sua prática pedagógica. Vale cha-mar atenção para o fato de que alunos não aprendem somente por meio das ações específicas do ato de en-sinar; aprendem também por meio do modo de ser e estar de um professor. por isso, incluímos no conjunto sua vestimenta, ainda que diretamente ela não estabe-leça nenhuma relação com o ato de ensinar e aprender. Quando alunos, que serão futuros professores, passa-ram durante sua história de escolarização por ações pe-dagógicas negativas, isso pode trazer implicações para sua futura profissão, como aponta Kurek (2004).

As experiências escolares vividas por alunos que se tornaram professores podem servir de espelha-mento àquele aluno quando já se encontra no exer-cício do magistério. por exemplo, Batista (2009), ao tornar-se professora de Educação Infantil, procurou repelir, em sua prática profissional, os modelos que trazia de ex-professores pois eles estavam no grupo das experiências escolares negativas. No trecho a se-guir, mostramos a força da influência dos modelos de professores durante a escolarização de um sujeito:

Sem fundamentação teórica e sem experiência prática, vi-me diante de trinta crianças pequenas. Ali, eu era aprendiz. [...] Entretanto, algo me inquietava. Sentia--me incomodada em reproduzir as mesmas atitudes dos professores que havia tido, que tanto critiquei e que me afastaram do exercício docente por pensar que aque-le era o único modo de ser professor. podia não saber exatamente que tipo de ação pedagógica desenvolver naquele espaço escolar, mas tinha certeza do que não queria fazer: compactuar com um modelo de aprendi-

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zagem mecânico e desvinculado de significados para as crianças. (Batista, 2009, p.9, grifos nossos).

A partir do exposto, perguntamos: o que é ne-cessário para ser um bom professor? Apesar de haver certo consenso sobre os comportamentos que se espera de um aluno e de um professor – aproximando-se de uma predeterminação social – as características e os atributos que compõem o que é “bom” são frutos do julgamento individual: o aluno constrói o que é o bom professor, sendo que essa construção está localizada num contexto histórico-social. O fato de passarem na escola como alunos:

[...] lhes possibilita dizer quais foram os bons professo-res, quais eram bons em conteúdos, mas não em didáti-ca, isto é, não sabiam ensinar. Quais professores foram significativos em suas vidas, isto é, contribuíram para sua formação humana. (pimenta, 1999, p.20).

A ideia de bom professor é valorativa e também ideológica, isto é, representa a ideia socialmente cons-truída sobre o professor. por isso, a ideia de bom pro-fessor não é fixa, mas se modifica conforme as necessi-dades do ser humano localizado no tempo e no espaço. (Cunha, 2009). para ilustrar, destacamos dois trechos retirados de nossas fontes que nos ajudam a perceber que os sujeitos constroem uma representação do que é ser bom professor. No primeiro trecho, o sujeito re-fere-se aos professores do Ensino Fundamental Ciclo II e afirma que ser bonzinho e não ensinar não carac-terizam um bom professor. Já no segundo trecho, o sujeito se refere aos seus professores do Ensino Médio e afirma que saber trabalhar o conteúdo é o que dife-rencia os bons dos maus professores.

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[...] porque como, praticamente, só o que eu fazia era estudar passei a ser ainda mais criteriosa na análise de professores (o tipo “bonzinho”, mas que não ensinava, não me agradava mais). Nessa categoria se enquadra-vam a maioria dos professores dessa época. (Sujeito 15, ano 2005, diurno)

A maioria dos professores eram dinâmicos, brincavam o tempo todo, o professor de história era um verdadeiro palhaço, mas sua disciplina fluía perfeitamente. passei a entender que para ser professor não bastava saber do assunto, tinha que saber trabalhá-lo, o que diferencia-va os bons dos maus professores. (Sujeito 11, ano 2006, noturno).

Analisando as crenças de alunos do Ensino Médio de uma escola pública, acerca do que significa ser um bom professor, Maitino (2007) encontrou o seguinte quadro:

• O bom professor é aquele que ajuda os alunos.• O bom professor é aquele que explica bastante.• Obomprofessorédedicado.• O bom professor é aquele que entende os alunos.• Obomprofessoréaquelequedespertaointe-

resse do aluno.

Características como “professor dedicado” e “aquele que entende os alunos” parecem se relacio-nar, de acordo com a autora, com o fato de o profes-sor ser sensível e atento às sinalizações e necessidades dos alunos, sendo que, a partir dessa percepção, pode fazer as adaptações necessárias em sua prática, vi-sando melhorar qualitativamente o processo ensino--aprendizagem. da mesma forma, ainda de acordo com a autora, “o professor que desperta o interesse

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dos alunos” parece ser aquele capaz de fazer escolhas metodológicas adequadas ao contexto e às expectati-vas dos alunos.

para aprofundar nossas discussões sobre o bom professor, destacamos também o trabalho de Cunha (2009), que traz contribuições importantes e valiosas nesse sentido. A autora tomou como objeto de estudo, especificamente, o professor que tem êxito na sua co-munidade escolar. A partir disso, resolveu investigar professores dos então 2º e 3º graus, a fim de verificar se o grau de ensino no qual o professor atua pode in-fluenciar seu desempenho. Sua investigação procurou responder a questões que ainda hoje são inquietantes:

por que determinados docentes são considerados como “BONS prOFESSOrES” por seus pares, por seus alu-nos e mesmo por quem não tem contacto direto com o ensino? Seria ele o inovador, por excelência? Ou o ami-go de sempre, que conta piadas aos alunos, despido de qualquer formalismo? [...] Haveria alguém que tivesse tido influência direta em sua opção pelo magistério? um professor de universidade? um antigo professor primá-rio? [...] Mais importante: como são as aulas do “Bom professor”? (Cunha, 2009, p.9-10, grifos do autor).2

para delimitar o universo a ser pesquisado, a au-tora optou por fazer um levantamento junto a alunos concluintes de diversos cursos, na universidade Fe-deral de pelotas (uFpel) e em quatro escolas públi-cas, cada qual com uma realidade diferente do Ensino Médio. As justificativas que Cunha (2009) encontrou para a escolha do Bom professor foram mais dirigidas para as questões referentes à relação professor-aluno,

2 A esse respeito, consultar O bom professor e sua prática, de Maria Isabel da Cunha.

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entretanto, constatou que é difícil fracionar a imagem do Bom professor:

[...] dificilmente um aluno apontaria um professor como BOM ou MELHOr de um curso, sem que este tenha condições básicas de conhecimento de sua matéria de ensino ou habilidades para organizar suas aulas, além de manter relações positivas. Con-tudo, quando os alunos verbalizam o porquê da es-colha do professor, enfatizam os aspectos afetivos. (Cunha, 2009, p.69).

desse modo concluiu que a ideia do Bom professor, presente nos alunos que participaram da pesquisa, passa pela capacidade que o profes-sor tem de se mostrar próximo, do ponto de vista afetivo. da mesma forma, a metodologia adota-da também implica na relação professor-aluno, uma vez que um professor que acredita nas po-tencialidades do aluno efetiva práticas de sala de aula condizentes com essa posição. O professor “bonzinho” não é o desejado pelo aluno, mas sim um professor intelectualmente capaz e afetiva-mente maduro.

Observando as aulas dos Bons professores, a autora constatou, em todos os casos, a preocupa-ção do professor com o clima favorável no ambiente escolar e com a participação dos alunos. Observou ainda que o ritual escolar se organiza basicamente em cima da fala do professor e constatou que o pro-fessor é a principal fonte de conhecimento sistema-tizado. Com relação às principais influências que os Bons professores recebem sobre si, Cunha (2009) encontrou uma significativa verbalização a respeito das influências recebidas de ex-professores, tanto

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em aspectos positivos como negativos, conforme podemos observar nas citações a seguir:3

A influência de atitudes positivas de ex-professores é lembrada por 70% dos participantes. [...] Apontam como principais justificativas desta influência aspectos relacionados ao domínio do conhecimento, organiza-ção metodológica da aula e relações democráticas com os alunos. Há ainda exemplos marcantes no sentido de honestidade e amor à profissão. Alguns respondentes nomearam mais de uma experiência positiva com an-tigos professores e afirmam que procuram reunir no seu desempenho características desejáveis de cada um deles. (Cunha, 2009, p.90).

tendo constatado a existência de tal influência na prática pedagógica, a autora chama atenção para o ciclo de reproduções que se estabelece nas relações escolares, sendo esse um aspecto que precisa ser consi-derado quando se pensa em formação de professores:

[...] os atuais professores são bastante influenciados no seu comportamento pelos antigos e, certamente, poderão influenciar os que virão. Esta é uma vertente que precisa ser considerada quando se pensar na formação de pro-fessores. também vale ressaltar o quanto se aprende pela prática do cotidiano, pela convivência e o quanto o pro-fessor precisa estar consciente disso. de alguma forma, vê-se uma certa reprodução no comportamento docen-te. E, se isto tem aspectos positivos, também há o risco da repetição de práticas sem uma reflexão sobre elas. (Cunha, 2009, p.92).

3 Mesmo sendo citações longas, optamos por introduzi-las integral-mente, pois trazem resultados obtidos pela pesquisadora Maria Isabel da Cunha (2009) e que consideramos como informações muito relevantes para o nosso estudo.

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É de sua história enquanto aluno, do resultado da sua relação com ex- -professores que os BONS prOFES-SOrES reconhecem ter maior influência. Em muitos casos esta influência se manifesta na tentativa de repetir atitudes consideradas positivas. Em outras, há o esfor-ço de fazer exatamente o contrário do que faziam ex--professores, considerados negativamente. de qualquer forma, no dizer dos nossos respondentes, a maior força sobre o seu comportamento docente é a do exemplo de ex-professores. Este dado é fundamental para quem trabalha na educação de professores, pois identifica o ciclo de reprodução que se realiza nas relações escolares. (idem, ibidem, 2009. p.160).

pelos trechos destacados anteriormente podemos observar que o professor recebe influências de todos os “tipos” de professores que teve durante sua esco-larização, ou seja, tanto os considerados bons como os ruins. A influência dos professores considerados bons manifesta-se, geralmente, na tentativa de repetir as características consideradas positivas. por outro lado, quando as experiências não foram boas, geralmente há uma tentativa de se afastar daquilo que tais professo-res faziam, mas o que se constata é que experiências e práticas malsucedidas e/ou fracassadas também in-fluenciam o professor. Em ambos os casos, evidencia--se a força das experiências escolares vivenciadas na efetivação das práticas pedagógicas. Nesse sentido, salientamos que os próprios professores investigados por Cunha (2009) reconhecem a influência dos exem-plos de ex-professores sobre suas práticas e comporta-mentos. A autora chama a atenção para a importância desse aspecto quando se pensa em formação de profes-sores. Vale lembrar, neste caso, a fertilidade do traba-lho de Ledesma (2003) apresentado no Capítulo 1, que

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usa a história de escolarização de alunos – vivida antes do ingresso ao curso de pedagogia – como referência formativa do respectivo curso. A propósito, a citação a seguir é bastante pertinente:

[...] a aprendizagem dos professores não começa no pri-meiro dia de sua formação como professor. Começa na infância, no lar e quando esse futuro professor vai para a escola. O mau sistema escolar forma não só maus alunos, como maus professores, que por sua vez, reproduzirão o círculo vicioso e empobrecerão cada vez mais a educação. Hoje, começa-se enfim a reconhecer que uma profunda reforma escolar é necessária, também do ponto de vista da formação do professorado, não apenas do ponto de vista dos alunos. Assim como reforma escolar não é pos-sível sem mudança de formação docente, esta é impos-sível desacompanhada de uma reforma escolar. Ambas são interdependentes. (torres, 1998 apud Machado, 2003, p.78, grifos nossos).4

As informações que acabamos de mencionar sobre questões da prática pedagógica do professor nos auxiliarão a ler os dados de nossas fontes. Nesse sentido, apreenderemos características de práticas pedagógicas e as ofereceremos de modo a contribuir com a produção do campo educacional brasileiro, uma vez que:

É provável que o registro de práticas pedagógicas que estão dando certo contribuam para as ciências da educação, mes-

4 usamos o apud porque a informação extraída do trabalho de Ma-chado (2003) estabelece relação direta com nossa preocupação nes-te trabalho. Contudo, na bibliografia do referido trabalho não está registrada a referência. portanto, mesmo localizando o sobrenome torres em sites de busca não pudemos saber, com certeza, qual era o autor a que a fonte se referia.

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mo levando em conta as limitações objetivas das condições de trabalho e formação do professor. (Cunha, 2009, p.47).

defendemos, assim, a importância e pertinên-cia das histórias de escolarização como estratégias de conhecimento da experiência educativa, não nos esquecendo de que qualquer relato biográfico ou au-tobiográfico só pode ser compreendido no âmbito do quadro histórico em que se insere.

Produção das fontes e primeiras sistema-tizações

Nossos sujeitos são 80 alunos da Graduação em pedagogia, da Faculdade de Ciências e Letras – Cam-pus de Araraquara/unesp que, em 2005 e 2006, pro-duziram sua história de escolarização que constituem fonte nesse estudo. Essas histórias têm, em média, 10 páginas cada uma. No que diz respeito a números de alunos por ano e período, temos:

Quadro 3 – Número de sujeitos em relação ao ano e período

2005 / DIURNO 2006 / NOTURNO

38 42

TOTAL: 80

Fonte: elaborado pela autora.

Com relação ao número de alunos, no ano 2006 há 4 sujeitos a mais do que no ano de 2005. Com relação ao gênero dos sujeitos, temos 36 mulheres e 2 homens no grupo 2005/diurno e 38 mulheres e 4 homens no grupo 2006/Noturno. As mulheres correspondem a 92,5% do grupo total de sujeitos.

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No que se refere às histórias, é importante destacar que foram produzidas num espaço específico que é a disciplina didática II,5 ministrada, na seriação ideal, no primeiro semestre do terceiro ano da respectiva gra-duação. Assim, ressaltamos que as autobiografias que nos propusemos a analisar foram elaboradas em um campo específico da atividade humana, o meio acadê-mico, e carregam a peculiaridade de ser um trabalho que faz parte de uma disciplina específica da Gradua-ção. por isso foram entregues à docente responsável de duas maneiras: impresso e salvo em Cd ou disquete.6

Os alunos e alunas de pedagogia produzem sua histó-ria de escolarização referente ao período que corresponde à sua entrada na primeira instituição de caráter escolar até o ingresso na universidade. A tarefa de reconstituição da trajetória escolar, perpassando fatos, acontecimentos, da-tas e situações ocorridas durante tal período é estimulada por meio da leitura da obra de Elias Canetti, denominada A língua absolvida (1987). O autor nesse livro faz diversas menções a seus professores, como por exemplo:

A) [Eugen Muller] Quando nos falava dos gregos, seus olhos, abertos descomensuradamente, pareciam-me os de um vidente extasiado; ele nem sequer olhava para nós, mas para aquilo de que falava; sua fala não era rápida, mas inin-terrupta, ao ritmo das ondas do mar; quer a luta fosse em terra, quer fosse na água, eu sempre me sentia em meio ao oceano. (Canetti, 1987, p.172).

B) Naquele tempo, em que já começava a formar minhas próprias opiniões, eu tinha por ela uma admiração sem limites. Eu a comparava a meus professores da escola

5 Essa disciplina é ministrada pela professora Marilda da Silva. 6 para efetuarmos as leituras, utilizamos os trabalhos salvos em Cds

ou disquetes.

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cantonal, alguns dos quais eu tinha em alta consideração e até mesmo venerava. Só Eugen Muller tinha ardor e seriedade semelhantes; só ele, quando falava, mantinha os olhos bem abertos, como ela, e olhava imperturbável à sua frente para o objeto que o empolgava. (Canetti, 1987, p.184).

C) Karl Beck era um professor como todos o desejam, enérgico e brilhante. Entrava na sala de aula com a rapi-dez do vento, se colocava a nossa frente, não perdia tem-po e entrava em cheio no tema. [...] Sua matemática era clara e se dirigia a cada um de nós. Ele não fazia distinção entre os alunos, cada um existia por direito próprio. Mas se alegrava abertamente quando havia bom aproveita-mento; tinha uma maneira de demonstrá-lo que não era tomada como favoritismo, assim como suas decepções não denotavam preterição. [....] Não era daqueles que nos conquistavam por sua calidez, mas antes por uma espécie de destemor. Ele não procurava nos agradar, tampouco nos oprimia. Havia em seu rosto um leve deboche, mas nenhuma ironia; não que ele quisesse assumir ares de su-perioridade, era antes como se a zombaria lhe tivesse fica-do de seus tempos de alunos, e agora, como professor, ele tinha de esforçar-se um pouco para não mostrá-la. deve ter sido um homem de espírito crítico, o que reconheço agora, quando me lembro dele: a distância que mantinha era intelectual. (Canetti, 1987, p.258).

d) [Karl Fenner]. tão mísera era, naquela época, a nossa relação com os animais. Isso só mudou na escola, com Fenner e seu curso de historia natural, e mudou pro-fundamente. Ele nos explicava, com infinita paciência, a estrutura das plantas e dos animais. Incumbiam-nos de fazer desenhos coloridos, os quais executávamos em casa com todo esmero, ele não se satisfazia facilmente com esses desenhos, mencionando cada um de nossos erros, insistindo com suavidade, mas obstinado, em que

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os melhorássemos. [...] Ele fazia excursões conosco, e todos gostávamos disso. O ambiente, então, era alegre e descontraído; nada era omitido. [...] Ele nos mostrava, no microscópio, essa vida fantástica que havia em mi-núsculo espaço. (Canetti, 1987, p.262).

Esses fragmentos dão uma ideia da forma do relato que serve de espelho para os alunos em questão. Ao tra-balhar com memoriais, nossa intenção não é resgatar ou interpretar histórias individuais, mas constituir planos de referência, tomando como cenário as práticas peda-gógicas efetivadas em escolas brasileiras, tendo em vista que a descrição delas foi feita por alunos que frequenta-ram essa escola recentemente.

É claro que essas fontes não se furtam à natureza humana acerca dos sentimentos suscitados duran-te esse registro e, por essa razão, utilizamos a técni-ca Análise de Conteúdo, que, nesse caso, levará em conta apenas informações explicitamente registradas sobre lembranças advindas das experiências didático--pedagógicas vivenciadas, em especial, aquelas que se referem às práticas pedagógicas efetivadas pelos pro-fessores em sala de aula.

A Análise de Conteúdo é uma técnica de inves-tigação que tem por finalidade a descrição objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto da comunicação, agrupando os dados em unidades. trabalha na e pela linguagem e no caso de nossas fontes, o código é escrito. Não se limita a um alcan-ce descritivo, mas a sua função ou objetivo é a in-ferência, que se realiza com a ajuda de indicadores combinados. As fases da Análise de Conteúdo são: pré-análise, que compreende a organização, escolha dos documentos, formulação de hipóteses e dos ob-jetivos; leitura flutuante, por meio da qual surgem

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as primeiras impressões e orientações; exploração do material; tratamento dos dados; inferência, por meio da qual se pode deduzir de maneira lógica e in-terpretativa (Bardin, 1977).

Os sujeitos foram numerados para preservar a sua identificação e serão apontados da seguinte forma: su-jeito número, ano, período, disciplina a que faz refe-rência no trecho. para a apresentação dos dados, adota-mos as seguintes categorias: Educação Infantil, Ensino Fundamental (1ª a 4ª série), Ensino Fundamental (5ª a 8ª série), Ensino Médio e Cursinho.7 Optamos por expor os trechos do modo como os sujeitos escreveram, para que o leitor possa ter informações detalhadas so-bre as lembranças de práticas pedagógicas.8

Em quase todas as Histórias de Escolarização pro-duzidas por nossos sujeitos, há registros de como os professores ensinam os conteúdos de sua responsabili-dade e como isso é feito do ponto de vista da qualidade e do tipo de relação professor-aluno. Os sujeitos expli-citam as ações e atos que constituem as práticas peda-gógicas, por meio das quais os professores ensinaram os alunos – nossos sujeitos – ao longo da escolarização. Assim, ao lermos as Histórias de Escolarização fomos destacando os trechos que se referiam às práticas peda-gógicas, bem como o nível de ensino a que pertenciam e a disciplina referente.

Com relação às práticas pedagógicas relem-bradas por nossos sujeitos, quantitativamente, há o predomínio do EFCII (5ª a 8ª série), conforme se observa no gráfico:

7 Optamos por manter a classificação antiga – em séries e não em anos e ciclos – pois os sujeitos desta pesquisa estudaram enquanto ainda valia tal denominação.

8 Marcamos somente os desvios mais evidentes para facilitar a com-preensão do texto.

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Gráfico 1 – Práticas pedagógicas por nível de ensinoFonte: elaborado pela autora.

As quantidades foram extraídas contando-se os tre-chos referentes às práticas pedagógicas, pois, ao realizar-mos a leitura dos registros, fomos destacando tais trechos bem como o nível de ensino a que pertenciam. Ao final tivemos apenas que somar a totalidade dos trechos e as-sim chegamos ao gráfico anterior. Salientamos que cada sujeito explicitou vários trechos de práticas referentes a um mesmo nível de ensino.

podemos constatar que em todos os níveis de ensino há maior quantidade de lembranças de prá-ticas do grupo de sujeitos do ano 2005, apesar desse grupo ser composto por 4 sujeitos a menos que o grupo do ano 2006. Acreditamos que isso se rela-ciona com o fato de os sujeitos do ano 2005 serem mais detalhistas e descritivos em seus relatos, o que não foi observado no grupo de 2006, que es-creveu relatos mais sucintos e gerais. Em ambos os grupos, quase todos os sujeitos iniciaram suas re-dações referindo-se ao próprio nascimento e rela-tando brevemente fatos de sua infância, nomeando ou descrevendo as pessoas que faziam parte de sua família; as mães foram as principais responsáveis

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pelas lembranças referentes ao período da Educa-ção Infantil. de posse dessas primeiras informa-ções, passaremos, então, para a análise qualitativa de nossos dados, o que caracteriza o Capítulo 3.

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3práticas pedagógicas

na memória de fUtUros professores: Um recUrso

para pensar a formação e atUação docente

para a apresentação dos dados referentes às práti-cas pedagógicas relembradas por futuros professores – nossos sujeitos –, construímos três categorias, sendo a primeira intitulada “atividades realizadas”, a qual se refere aos trabalhos e atividades propostas pelo pro-fessor e aos materiais e recursos que ele utiliza no ato de ensinar. A segunda categoria é denominada “carac-terísticas pedagógicas” e se refere ao modo de ensinar bem como às ações e atitudes do professor com relação ao processo ensino-aprendizagem. por fim, a terceira categoria é chamada de “características pessoais/peda-gógicas” e nela estão incluídas características pessoais do professor que têm implicação na prática pedagógica e se relacionam com o âmbito do ensino, ou seja, in-

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fluenciam a ação de ensinar. desse modo, elaboramos quadros que sintetizam os dados encontrados levando em consideração as três categorias construídas. Salien-tamos que as categorias foram construídas por meio da técnica Análise de Conteúdo, levando em conta a homogeneidade, a exaustividade e a pertinência das informações extraídas das Histórias de Escolarização.

Na produção das Histórias de Escolarização, como já explicitamos anteriormente, os alunos tomam a obra de Canetti (1987) como referência, e, com tal aparato referencial, desenvolvem seu relato a respeito da traje-tória escolar que tiveram até chegar à universidade. No total, lemos 80 memoriais e, desse modo, foi possível adentrar, por alguns minutos, em diferentes universos, conhecer variadas histórias e, muitas vezes, relatos ín-timos de cada sujeito. Foi possível entrar em contato com 80 sujeitos que passaram por trajetórias diversas até chegarem ao terceiro ano do curso de pedagogia, momento em que escrevem a História de Escolarização.

três sujeitos do período diurno, ano de 2005, rela-taram a importância de escrever o memorial como um trabalho que pode auxiliar na prática docente futura:

“É por isso que fiz esse trabalho com muito carinho, pois entendi que os frutos obtidos em decorrência des-se relato não são determinantes apenas para a conclusão da disciplina de didática II, mas principalmente para o meu caminhar rumo ao exercício docente [...]” (Sujeito 31, ano 2005, diurno).

“É um trabalho importante para nós, futuros professo-res, relembrarmos dos nossos, e ter como base, exemplos de como devemos, ou não, agir diante de problemas, ou mesmo na rotina normal” (Sujeito 32, ano2005, diurno).

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“Este trabalho, além de um exercício de memória, pos-sibilitou-me pensar nas influências na escolha da profis-são de docente, ou seja, o comportamento de cada pro-fessor, a convivência com cada um deles, bem como as lembranças boas e ruins que ficaram em nossa memória, provavelmente, podem nos levar à escolha de sermos ou não professores. [...] O tipo de professor que seremos no futuro dependerá de cada um de nós individualmente, pois bons e maus exemplos é que não faltaram durante a trajetória escolar da grande maioria das pessoas” (Sujeito 35, ano 2005, diurno).

de um modo geral, observamos que sujeitos dos dois grupos descreveram mudanças de escola, asso-ciadas principalmente às mudanças de emprego dos pais devido a transferências para outras cidades e até mesmo estados. Além disso, apareceram alguns casos de mudança de escola particular para pública em de-corrência de dificuldades financeiras enfrentadas pelas famílias. Entretanto, principalmente nos memoriais de 2006, os sujeitos relataram que estudaram um lon-go período na mesma escola, considerando tal espaço como um segundo lar, havendo, portanto, uma relação de proximidade do aluno com funcionários e professo-res. Houve também menções a colégios de freiras e/ou religiosos e a escolha por escolas próximas às residên-cias. para concluir o Ensino Médio, um sujeito-aluno do ano 2006 estudou por meio do telecurso e um alu-no do mesmo ano relatou que estudou em escola rural.

Foi comum também a citação da divisão que ocor-reu nas escolas, separando-as em primário, Ginásio e Colegial, momento em que cada instituição escolar ficou responsável por oferecer apenas um nível de en-sino e, assim, em alguns casos, foi necessário mudar de escola, passando a estudar longe de casa.

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No que se refere à divisão dos alunos em classes, apareceram critérios variados: classes de A a E, sendo A, a classe melhor, e E, a classe bagunceira, bem como uma divisão por ordem alfabética e pela data do ani-versário. Embora essa pesquisa não esteja diretamente tratando de questões específicas da cultura escolar,1 vale questionar a respeito da continuidade de algumas práticas que ainda hoje se fazem presente no cotidiano escolar, como, por exemplo, a divisão dos alunos nas escolas brasileiras. uma pesquisa não é apenas elabo-rada para explicar um fenômeno, uma ideia, a realida-de. Nela se faz tudo isso, mas há algo que é indelével a qualquer pesquisa: é o fato dela apontar para outras questões, que nesse caso, são as questões referentes à cultura escolar. Essas outras questões, pode-se dizer, fazem parte, sem dúvida nenhuma, do aprofunda-mento que a pesquisa em questão exige por si só.

Alguns sujeitos descreveram o uso de salas am-biente, sendo que os alunos mudavam de classe e não os professores. Essa prática, sempre que apareceu, foi relatada como má sucedida, pois, de acordo com os su-jeitos-alunos, tal deslocamento gerava muita bagunça e perda de tempo. O excerto abaixo serve de exemplo:

“No início da 7ª série fomos apresentados à proposta da Sala Ambiente. Cada disciplina teria uma sala específica, com a promessa de muitos recursos pedagógicos capazes de enriquecerem as aulas e melhorarem a qualidade do ensino público. Aconteceu que essa tentativa não deu certo. Não havia recursos pedagógicos, apenas cartazes confeccionados pelos alunos. Não foram comprados no-vos materiais para o laboratório. para os alunos, o mais interessante era locomoverem-se, desfilarem pela escola.

1 A esse respeito ver Forquin (1993, 2000).

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perdíamos muito tempo com isso. Como não atingiu o sucesso esperado, após o período experimental, as ativi-dades voltaram a ficar concentradas em uma única sala. Novamente, eram os professores que mudavam de sala” (Sujeito 18, ano 2005, diurno).

Encontramos, ainda, situações em que os sujeitos ti-veram que enfrentar um sorteio de vagas para conseguir ingressar no Ensino Médio:

“[...] ela entrou numa fila de espera por vagas e o próxi-mo passo era um sorteio, acredite se quiser, entrei na Es-cola Estadual de 1º e 2º grau [...] por meio de um sorteio, até então conhecia este tipo de ingresso em instituições de ensino pela tevê ou em creches, mas consegui” (Sujei-to 7, ano 2005, diurno).

“Sofri para conseguir uma vaga nessa fase do ensino. Lembro-me que passei por um sorteio {sic} que eu achei um absurdo sortear vagas para estudar sendo que o ensino deveria ser para todos em qualquer idade, pois bem pas-sei por este sorteio em que as primeiras pessoas escolhiam aonde iam estudar e as que ficassem por último iam estu-dar na escola que sobrasse independente da forma como iam se localizar para chegar até a {sic} escola e se era longe do centro da cidade” (Sujeito 34, ano 2005, diurno).

dois memoriais citaram a morte de Ayrton Senna e as homenagens que foram feitas na escola por oca-sião de sua morte, e três relatos descreveram a mor-te de professores por acidente de carro, fato esse que chocou os alunos.

Com relação aos sujeitos do ano 2005, que cursa-ram pedagogia no período diurno, pudemos perceber uma riqueza de descrições e detalhes sobre as escolas pelas quais passaram e também sobre os professores

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que tiveram. Os alunos do período noturno de 2006 escreveram relatos mais sucintos e gerais. A maioria dos sujeitos do ano de 2006 começou a trabalhar ain-da no Ensino Médio, tendo que frequentar as aulas no período noturno e, assim, ao término dele, optou por continuar trabalhando e não prestar Vestibular neste primeiro momento, retomando os estudos em cursi-nhos e até mesmo por conta própria após dois ou três anos do término do Ensino Médio.

Os memoriais de 2005 deram bastante desta-que para a formatura, em todos os níveis de ensino, descrevendo a preparação para tal evento e as sen-sações boas que experimentavam quando chegava o dia de sua concretização. Isso não ocorreu com os sujeitos de 2006, que citaram poucas vezes o even-to. Apesar de termos notado tais diferenças entre os grupos de sujeitos, não observamos diferenças significativas no que se refere às práticas pedagó-gicas citadas pelos sujeitos dos grupos de 2005 e de 2006 e, desse modo, o que foi registrado nos qua-dros se refere às práticas pedagógicas relembradas pelos dois grupos de sujeitos.

Alguns sujeitos explicitaram em seus relatos a influência de determinado professor na escolha da carreira docente, exaltando características destes pro-fessores. Além disso, destacaram que pretendem recu-perar tais modelos em sua futura prática profissional, bem como recuperar atividades que fizeram com os referidos profissionais:

“O ritmo dessas professoras persistiam {sic} em pon-tualidade e seriedade no trabalho da docência. Me sentia segura em ser aluna delas, pois me passava confiança na minha escolarização. Era uma aluna pontual, e penso que é no exemplo delas que se inicia a minha vontade

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em exercer a docência: o trabalho delas eram sempre dia-logados, não eram individualistas” (Sujeito 1, ano 2005, diurno, 4ª série).

“[...] era muito séria e todos ficamos com medo dela, pois parecia ser muito brava. Mas que grande engano! Aquela mulher miúda, de óculos, cabelos grisalhos, foi a professora que mais marcou em minha vida. Muito amável, dedicada, carinhosa, sensível e experiente (sa-bia até mesmo como nos dar “bronca”, sem que ficásse-mos magoados). Foi com ela que aprendi a ver as horas, fazer as contas de dividir e multiplicar e principalmente a gostar de leitura. todas as semanas ela nos dava algum texto para ler. A classe elegia o melhor de cada fileira, que ia à frente da sala concorrer com os cinco ou seis alunos das outras fileiras. O vencedor, ela fazia questão de escolher e premiar com material escolar (hoje sei que não é o modo certo para motivar a criança), incentivo e muitos elogios. E em nenhum momento ela desprezava os que não liam muito bem. Simplesmente pedia para que treinassem em casa, para a nossa próxima leitura. [...] Foi com ela também, que eu comecei a querer ser professora. [...] Se eu conseguir realizar um trabalho como o dela, estou certa que também só deixarei boas lembranças” (Sujeito 2, ano 2005, diurno, 3ª série). “[...] ela fazia um teatrinho para nos explicar os tempos verbais, para que soubéssemos diferenciar um do ou-tro e entender o porquê daquelas terminações. Assim, através de suas ações e criatividade, como {sic} por exemplo, inventava músicas para que gravássemos na memória todas as preposições existentes, conseguíamos compreender e aprender todo o conteúdo corretamente. Certamente esta será uma professora que eu nunca es-quecerei, e que vou procurar me espelhar bastante, pois teve grande influência e importância no meu aprendiza-do” (Sujeito 4, ano 2005, diurno, 5ª série, português).

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“dos professores da sexta série lembro da professora de ciências, não por sua aula, mas pelas atividades extra-classe que ela nos proporcionava; como a feira de ciên-cias onde eu e a minha turma fizemos um vulcão que saia a {sic} fogo e uma célula com massa de modelar, tive-mos muito trabalho para construí-la, mas lembro como se fosse hoje e caso algum dia tenha que ministrar uma aula sobre este tema vou construir com os alunos estas duas atividades. Outra atividade que ela realizou foi à visita a um museu de fotografia, naquele dia ganhamos uma foto com todos os alunos da classe que tenho até hoje e lembro o nome de quase todos meus colegas, é uma grande recordação com certeza utilizarei este re-curso no ensino” (Sujeito 7, ano 2005, diurno, 6ª série, Ciências).

“uma pessoa inteligente, aberta, ela nos deu liberdade desde o começo do ano para tirarmos todas nossas duvi-das {sic}, sobre qualquer coisa. [...] Era uma professora que amava o que fazia. Explicava com vontade, tirava todas as dúvidas dos alunos, e dava pra perceber a sua sa-tisfação quando sentia que tínhamos entendido. Ela era amiga também além de professora. Estava sempre inte-ressada na vida dos seus alunos, se estava tudo bem. Isso na minha classe, talvez porque um de seus filhos estar {sic} nela. Enfim foi uma professora que eu vou tentar levar como exemplo nas minhas aulas” (Sujeito 32, ano 2005, diurno, 6ª série, Ciências).

“[...] era baixinha {sic} mas mantinha sua postura sempre ereta, nunca transmitia a matéria da aula sen-tada, tinha uma voz imponente e lecionava como al-guém que tem o pleno conhecimento sobre o assunto, e tinha mesmo; era uma mulher forte, altamente dis-ciplinada, que nunca se ausentava nem mesmo quan-do estava doente [...] mantinha a classe sobre pleno

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domínio disciplinar e transmitia conhecimentos de forma clara e objetiva, aliás ela era objetiva em tudo o que realizava, para mim uma professora modelo, al-guém em quem vou sempre me inspirar na prática da minha profissão” (Sujeito 15, ano 2006, noturno, 5ª a 8ª série, Ciências).

“[...] um professor que me marcou e influenciou minha escolha docente [...] era professor de literatura, era fan-tástico, tinha uma vontade de dar aula, uma paixão que parecia vencer todos os desafios” (Sujeito 5, ano 2005, diurno, Cursinho).

“Meus professores tiveram grande influência sobre a formação da pessoa que me transformei, foi através da transmissão sistemática do conhecimento deles que unidas as minhas experiências sociais formaram mi-nhas concepções de mundo. Foram através das ima-gens dos professores competentes que conheci que formei minha concepção do professor competente no qual eu quero me tornar, e com os exemplos dos pro-fessores incompetentes o que não quero me tornar a ser” (Sujeito 15, ano 2006, noturno).

Já nos excertos a seguir, vemos que os sujeitos enfa-tizam que não pretendem se espelhar nos professores que tiveram e nem repetir ações que eles executaram. Obser-ve que as experiências fracassadas/malsucedidas tam-bém contribuem para o processo formativo do professor:

“Nunca {sic} esqueço daquela professora autoritária, séria, que chegava até a bater com a régua em alguns alunos e a chamar outros de “burro”. tudo o que aque-la professora nos despertou foi medo, terror e hoje, ao lembrar-me dela e ao analisar seu comportamento, pos-so dizer que ela é tudo aquilo que eu não desejo ser como professora” (Sujeito 35, ano 2005, diurno, 1ª série).

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“A professora, uma senhora, perto dos seus 60 anos de idade, era um pouco esquisita. Ela dava croque na ca-beça dos alunos, jogava o giz e o apagador quando fi-cava irritada ou ainda balançava os peitos com as mãos quando ficava muito nervosa. Ela dizia a seguinte frase: — “Aqui para vocês, ó”. Ela foi o modelo de professora em que sempre vou me inspirar para não repetir nem um “A” que saia de sua boca” (Sujeito, 16, ano 2005, diurno, 4ª série).

“[...] uma professora muito rígida [...] e todos os alunos tinham medo dela, inclusive eu. um dia ela nos mandou fazer uma atividade no caderno, copiar um texto do livro e depois passou olhando de carteira em carteira. Quan-do chegou na minha ela começou a gritar pergun-tando se aquilo era uma letra, que estava completamente ilegível pois era muito pequena, levantou o meu caderno para a sala inteira e disse que era um exemplo de como eles não deviam fazer. Nessa época eu era muito tímida e comecei a chorar nesse dia. depois disso eu não queria voltar à escola, só voltei por muita insistência da minha mãe. A atitude dessa professora é uma das coisas que eu nunca vou me esquecer, ela fez exatamente o contrário do que devia fazer. pretendo nunca repetir ou fazer pa-recido com meus alunos, pois ao invés de isso servir para eu melhorar, serviu para ficar muito tempo sem gostar da escola, ou melhor, odiando” (Sujeito 32, ano 2005 diurno, 1ª série).

“[...] essa me marcou negativamente, uma pessoa pela qual eu nunca irei me espelhar, pois nunca dava uma aula realmente interessante, todos esses anos suas aulas nunca mudavam, ela entrava na sala, mandava a gente se reunir em grupo, ou às vezes individualmente, ou em duplas, para resumir um capítulo do livro, ou fazer al-gum trabalho, que a gente entrava na internet, imprimia um monte de folhas a respeito do tema, entregava e tira-

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va dez, era a professora da quantidade, não visava a {sic} qualidade das informações e do conteúdo que apresen-távamos a ela” (Sujeito 4, ano 2005, diurno, 5ª a 8ª série, História).

“[...] tenho nela a imagem do professor que eu nunca quero ser. Ela tinha um jeito diferente, para não dizer “esquisito”, ninguém a escutava nem a deixavam falar, ela não tinha controle sobre a classe e vivia aos berros” (Sujeito 27, ano 2006, noturno, sem referência à série, Ciências).

Em ambos os períodos, as mães foram as princi-pais responsáveis pelas lembranças referentes ao pe-ríodo da Educação Infantil, sendo que muitos sujeitos descreveram a dificuldade em adaptar-se ao ambiente da escola, associada com o medo que sentiam de ficar longe da mãe:

“Nada me motivava ir na escola, tinha medo, e preferia fazer atividades em casa. [...] Era tudo estranho, tinha receio e muita falta da minha mãe; me sentia muito inse-gura” (Sujeito 1, ano 2005, diurno).

“O choro foi meu grande companheiro por um bom tempo na minha infância. principalmente quando me afastavam do meu porto seguro, mais conhecido como mãe. difícil foi o momento de ir para a escola” (Sujeito 10, ano 2006, noturno).

“Foi uma cena inesquecível! Quando cheguei à escola e vi aquele monte de criança reunida me apavorei. Nun-ca tinha me visto diante de uma situação como aquela e nunca pensei que um dia iria ficar longe da minha mãe. O sinal tocou às 7 horas da manhã. Quando vi as crianças se dirigindo à sala de aula e se despedindo de suas mães, eu comecei a chorar. Minha mãe estava me conduzindo

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até a sala onde iria estudar, mas quando vi a professora, uma mulher alta, branca, com mais ou menos uns 90 kg, chorei mais e mais. dizia: mãe, eu não quero ficar aqui!” (Sujeito 14, ano 2006, noturno).

As comemorações e festas, bem como a elabo-ração de lembranças em dias marcantes como dia das Mães, dia dos pais, páscoa, dia do Índio etc. foram práticas recorrentes principalmente no pe-ríodo da Educação Infantil, conforme se verifica nos trechos abaixo:

“As atividades que fazíamos eram com números, com o alfabeto, desenhos, pinturas, confecção de alguns objetos para uso na sala, lembrancinhas para os pais e atividades nas datas comemorativas. Era {sic} realizados eventos nas datas comemorativas como na páscoa, dia do Ín-dio, Festa Junina, dias das Mães, dos pais, Aniversário da Cidade, Independência do Brasil, dia das Crianças e Natal” (Sujeito 3, ano 2005, diurno). “Quando aproximávamos de uma data especial como “dias das Mães”, “dias dos pais” e “Natal”, ensaiá-vamos uma dança para apresentar em comemoração à data e, no final entregávamos algum trabalho manual confeccionado pelos alunos especialmente para o dia” (Sujeito 18, ano 2005, diurno).

Além disso, muitos alunos disseram-se apegados à primeira professora, guardando boas lembranças e, até mesmo, mantendo contato ao longo dos anos pos-teriores. Alguns sujeitos do período noturno, que já trabalhavam como professores, disseram inclusive que são colegas de profissão de antigas professoras. Houve destaque para o papel da escola na promoção da socia-lização, principalmente na infância. Com relação às

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atividades realizadas na Educação Infantil, temos os seguintes dados:2

Quadro 4 – Principais atividades – Educação Infantil

atividades com música/danças

atividades com números

atividades de escrita; ditado relâmpago

atividades de leitura; hora do conto

brincadeiras; atividades lúdicas

confecção de objetos/lembranças para datas comemorativa

desenhos, pintura, recorte, colagem, massinha

escovar os dentes

oração no início da aula

passeios e visitas

treino de coordenação motora

podemos observar que há uma diversidade de ativi-dades executadas pelas professoras3 que procuram tra-balhar diferentes habilidades. As atividades de escrita e de leitura estão basicamente relacionadas ao início da alfabetização, pois nossos sujeitos-alunos frequentaram a pré-Escola e este nível de ensino objetivava preparar as crianças para a alfabetização, sendo que muitas já in-gressavam na então 1ª série sabendo ler e escrever. Mui-tos sujeitos relataram que foi na pré-Escola que tiveram o primeiro contato com o alfabeto e com as letras.

A brincadeira e a leitura são atividades que nossos sujeitos-alunos relembraram como parte das práticas pedagógicas efetivadas pelas professoras que tiveram

2 Adotamos o critério alfabético para a apresentação dos dados con-tidos nos quadros.

3 Os alunos se referiram somente a professoras do gênero feminino ao citarem a Educação Infantil.

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na Educação Infantil. Nesse sentido, nossos dados apontam na mesma direção de Silva (2003),4 que ao pesquisar seis professoras da Educação Infantil, veri-ficou que o espaço para brincadeiras e jogos é propor-cionado tanto em sala de aula como fora desta. Além disso, todas as professoras, sujeitos da pesquisa de Sil-va (2003), têm o hábito de ler e contar histórias para seus alunos. Verificamos, assim como Silva (2003), que a área de Língua portuguesa é a mais trabalhada pe-las professoras, tendo em vista que são desenvolvidas muitas atividades voltadas à leitura e à escrita.

também se referindo às atividades, a pesquisa realizada por Schöffel (2003) identificou as seguintes tarefas propostas pela professora de uma classe pré--escolar: comentar sobre a lição de casa ou outros as-suntos; oração em coro; canções infantis acompanha-das de palmas e outros gestos; atividades em folhas mimeografadas voltadas ao processo de alfabetização e brincadeiras na sala de aula e no parque da escola. podemos perceber que tais atividades se aproximam muito das que encontramos em nossos dados e que fo-ram apresentadas no quadro 4. portanto esta investi-gação traz elementos importantes para pesquisas sobre cultura escolar.

Analisando registros escritos produzidos por qua-tro professoras da Educação Infantil da rede municipal de São paulo, Zurawski (2009) percebeu que quase to-dos os dias as professoras relataram atividades relacio-nadas à leitura de histórias, com destaque para a roda de conversa e roda de leitura. As professoras também

4 Nesta análise trabalharemos com autores que ainda não foram uti-lizados até aqui neste estudo. O fizemos porque neste momento da análise não pudemos nos furtar de reflexões sobre a prática docente propriamente dita. Assim, optamos por incluí-los, pois os dados exigiram este procedimento.

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relataram atividades de canto em grupo, participação em rodas de música e audição de Cd. Brincadeiras na área externa tiveram um grande destaque nos regis-tros. Novamente podemos perceber que nossos dados incidem na mesma direção, com a realização de ativi-dades voltadas à higiene, leitura de histórias, escrita, música e dança, brincadeiras, desenho e atividades de artes (pintura e colagem), conforme se observa nos tre-chos de nossos sujeitos, que seguem:

“tínhamos atividades de escrita, de leitura, desenháva-mos situações relacionados {sic} ao nosso cotidiano. [...] A tia ficava ali, sempre perto, nos auxiliando nas nossa {sic} dificuldades. [...]. A tia aplicava o ditado relâm-pago, uma atividade que escrevíamos a palavra que ela ditasse de maneira rápida” (Sujeito 1, ano 2005, diurno).

“Havia também a hora do conto, momento este que nos proporcionava viajar entre fadas, bruxas e princesas. para que a história começasse, o silêncio devia ser total. Senão... a professora fechava o livro e “só na próxima aula...” (Sujeito 6, ano 2005, diurno).

“Na pré-Escola a professora sempre iniciava a aula per-guntando quem tinha alguma novidade para expor na sala de aula. Era um momento de integração da turma. [...] para incentivar o bom comportamento a professo-ra começou integrar {sic} medalhas para aqueles que se comportassem e executassem as atividades” (Sujeito 25, ano 2005, diurno).

“Era uma professora muito atenciosa com todos, falava sempre no mesmo tom, calma e doce, mas sabia quando devia nos chamar a atenção e até colocava alguns alunos de castigo atrás da porta, mas por pouco tempo. [...] de-senvolvia atividades como colorir, pintar com guache, fazer figuras com massinha, além de brincar no parqui-

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nho que havia dentro do pré. [...] Aos poucos a profes-sora nos ensinava as letras do alfabeto e alguns números, através de exercícios de repetição dos mesmos em folhas mimeografadas [...] era dedicada, não apenas em suas aulas, mas também com relação à vida de cada um de seus alunos” (Sujeito 5, ano 2006, noturno).

Com relação às atitudes e ações das professoras, pudemos constatar as seguintes características:

Quadro 5 – Principais características pedagógicas – Educação Infantil

agradar ao aluno/recompensar por bom comportamento

auxiliar nas dificuldades dos alunos

ensinar regras da escola

exigir silêncio para começar as atividades

integrar a turma

Quadro 6 – Características pessoais/pedagógicas – Educação Infantil

animada

atenciosa

brava

calma

carinhosa

paciente

rígida

tratar com respeito

Acreditamos que a maioria das características pre-sentes nos quadros 5 e 6, citadas por nossos sujeitos--alunos, são importantes para desenvolver relações de confiança e interação com os alunos e, dessa forma,

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favorecer o processo de ensino-aprendizagem. Nesse sentido, Silva (2003) ao pesquisar o ensino de Ciên-cias na Educação Infantil, concluiu que a atuação do professor deve ser revestida de aceitação e aconche-go, importando-se concretamente com o aluno e seus questionamentos. Os próprios sujeitos-alunos destaca-ram algumas características como fundamentais para o trabalho com crianças:

“Era uma boa professora, atenciosa, doce, tinha uma certa paciência que é algo fundamental, quando o assun-to é crianças” (Sujeito 5, ano 2005, diurno, Maternal).

“[...] era uma excelente professora: meiga, carinhosa e animada; tudo que uma criança da pré-escola deseja de sua professora” (Sujeito 12, ano 2005, diurno, pré).

Observe que quando aparecem características pessoais/pedagógicas positivas as lembranças são boas e as professoras são caracterizadas como exce-lente, boa, dedicada. por outro lado, quando estão au-sentes, não ficam boas lembranças, como verificamos no trecho a seguir:

“A professora não me deixou boas lembranças, pois todos os dias ela reclamava porque não gostava de dar aulas para a pré-escola, ela era professora de português e gostava de dar aulas para o “ginásio”, estava lá porque passara em um concurso público. Na sala ela era um pouco intolerante e impaciente, dizia que era o primeiro e último ano que lecionaria na pré-escola. A professora era muito mal-humorada e não escondia seu desgosto pela instituição” (Sujeito 3, ano 2005, diurno).

A entrada na antiga 1ª série foi relatada pela maio-ria de nossos sujeitos como algo tranquilo, já que não

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há mais o medo de ficar sem a mãe. todavia, os sujei-tos sentem-se ansiosos frente ao novo, principalmente com relação à figura do professor.

Ao identificar práticas de leitura desenvolvidas por uma docente alfabetizadora na 1ª série do Ensino Fundamental, Biodere (2009) constatou que a leitura é trabalhada em sala de aula por meio da leitura oral, num canto da sala, onde o aluno lê individualmente para a professora, ou seja, a professora “toma a leitura” do aluno, utilizando trechos de cartilha, com ênfase na soletração e com pouco trabalho voltado à interpre-tação. Encontramos essa prática em nossos dados no seguinte relato:

“[...] cada semana a professora chamava a sua mesa e tomava a leitura dos textos da cartilha dos alunos, após a leitura era atribuídos {sic} menções [...]” (Sujeito 37, ano 2006, noturno).

Observando as atividades realizadas na 1ª série de então, conforme se verifica no quadro a seguir, podemos notar que o foco está voltado para o apren-dizado da escrita e que predominam atividades de Língua portuguesa. Assim, parece-nos que as prá-ticas descritas por nossos sujeitos-alunos caminham na mesma direção encontrada por Biodere (2009): a preocupação maior está no aprendizado da escrita, sendo adotados diferentes tipos de atividades para atingir tal finalidade.

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Quadro 7 – Principais atividades realizadas – 1ª série Ensino Fundamental

atividades apostiladas/uso da cartilha

atividades com música

atividades de leitura

brincadeiras

ditado de frases e palavras; separação de sílabas; atividades de escrever

exercícios de caligrafia

oração

pintar, desenhar

Com relação às características pedagógicas e pes-soais/pedagógicas, temos os seguintes quadros:

Quadro 8 – Principais características pedagógicas – 1ª série Ensino Fundamental

agradar ao aluno/recompensar por bom comportamento

auxiliar os alunos com dificuldades

ceder um tempo ao fim da aula para brincadeiras ou jogos

elogiar os alunos

ensinar a todos sem distinção

escutar os alunos

exigir capricho no caderno

exigir silêncio/não admitir conversas

integrar a turma

não permitir empréstimos de material

punir/castigar os alunos

vistar as tarefas de casa

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Quadro 9 – Principais características pessoais/pedagógicas – 1ª série Ensino Fundamental

atenciosa/compreensiva

brava

carinhosa/afetuosa/amorosa

dedicada

enérgica

exigente/firme

paciente

podemos constatar que três características pedagó-gicas vivenciadas na Educação Infantil aparecem tam-bém na 1ª série: agradar ao aluno/recompensar por bom comportamento, auxiliar os alunos com dificuldades e integrar a turma. Além disso, nas descrições que os su-jeitos fazem da professoras da 1ª série, são marcantes ca-racterísticas pessoais como amorosa, atenciosa e carinho-sa e podemos perceber que há uma proximidade grande entre professora e alunos, ou seja, há marcas afetivas na relação professor-aluno. A seguir, inserimos trechos re-ferentes à 1ª série, que ilustram as três categorias, quais sejam atividades, características pedagógicas e caracte-rísticas pessoais/pedagógicas.

“Naquela época, antes de aprendermos a ler e escrever, fazíamos muitos exercícios de caligrafia. Não dá para esquecer a professora na lousa, com o giz na mão fa-lando: “Serra, serra, serrador... Serra o papo do vovô!”. depois aprendemos a escrever as vogais. tudo era en-sinado sem pressa, nós éramos muito disciplinados. Na classe só ouvíamos a voz da professora. Muitas crianças tremiam de medo quando ela passava para olhar os ca-dernos, pois ficava nervosa se via que o caderno não era caprichado [...]” (Sujeito 2, ano 2005, diurno).

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“[...] a professora da 1ª série era compreensiva, escu-tava os alunos e tentava adaptar as atividades respei-tando os limites dos alunos. Animava os alunos para realizarem as atividades e todo final de aula ela cedia um tempo para que os alunos pudessem brincar na lou-sa ou com alguma outra brincadeira ou jogo” (Sujeito 3, ano 2005, diurno).

“[...] os conteúdos de sala eram muito bem trabalha-dos. Jogos, dinâmicas, teatro, mágica, lousa... tudo era utilizado como recurso para que aprendêssemos. A professora era muito boazinha. Falava baixo para não assustar os alunos e tinha muita paciência. [...] Estava sempre a {sic} disposição dos alunos para dúvidas (era realmente atenciosa); elogios não faltavam e broncas só de vez em quando, quando de fato a sala “passava dos limites...” (Sujeito 6, ano 2005, diurno).

“[...] não sorria e nem sequer mostrava algum traço de simpatia. Ela veio logo nos dizendo autoritariamente o que pretendia nos ensinar e que tínhamos a obrigação de aprender. dizia que não admitiria conversas paralelas e que poderíamos levantar de nossas carteiras somente se ela assim nos permitisse” (Sujeito 35, ano 2005, diurno).

“Era muito amorosa e paciente, sempre elogiava nossos esforços e não fazia distinção entre os seus alunos. Fui alfa-betizada com cartilha [...]” (Sujeito 3, ano 2006, noturno).

Com relação às demais séries do Ensino Funda-mental, um fato que chamou nossa atenção foi a pre-sença de professores do gênero masculino nas séries iniciais: 2ª série, em uma cidade da Bahia, e um profes-sor substituto da 3ª série. tal fato não é muito comum considerando-se o Ensino Fundamental Ciclo I.

depois dessas considerações extraídas das fon-tes relativas à 1ª série, passamos, então, a mostrar

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o conteúdo constitutivo de nossas categorias en-contrado sobre as demais séries do Ensino Funda-mental Ciclo I. Na categoria “atividades”, temos os seguintes dados:

Quadro 10 – Principais atividades realizadas – 2ª série Ensino Fundamental

atividades com música

atividades de leitura

atividades de Matemática

atividades de pesquisa

cópia no caderno

ir à biblioteca

oração antes de iniciar a aula

tabuada decorada

trabalho em grupo

uso de livros didáticos

Quadro 11 – Principais atividades realizadas – 3ª série Ensino Fundamental

apresentar notícias de jornal

atividades de matemática

chamada oral

competição de tabuada entre os alunos

oferecer um texto para ler toda semana

realizar experimentos

escrever redações

ler um livro inteiro para fazer prova

questionário

tomar tabuada

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Quadro 12 – Principais atividades – 4ª série Ensino Fundamental

atividades de leitura

ditado e cópia de texto

oração antes de iniciar a aula

questionário

uso de livro de Gramática

visto no caderno

Observe que nessas três séries as atividades de lei-tura foram recorrentes e assim, de modo geral, podemos notar que as atividades referentes à Língua portuguesa aparecem com maior incidência em todas as séries do Ensino Fundamental I por meio de atividades de leitura, leitura de livros, cópias, ditados, exercícios de caligrafia, separação de sílabas, entre outras. A Matemática apa-rece principalmente a partir da 2ª série e está associada com a tabuada e a necessidade de decorá-la.

Investigando práticas pedagógicas de leitura de professores que atuam nas séries iniciais do Ensino Fundamental, Monico (2002) identificou duas situa-ções referentes às propostas de leitura: uma em que os professores abriam espaço para os alunos lerem livros de literatura e paradidáticos, durante o período da aula, e outra situação na qual os professores escolhiam deter-minado tipo de texto e sobre ele desenvolviam procedi-mentos didáticos para dar conta do ensino-aprendiza-gem da leitura. Nesse sentido, pudemos observar, em nossos dados, que os professores do Ciclo I citados por nossos sujeitos efetivaram práticas de leitura aproxi-mando-se principalmente da segunda situação encon-trada por Monico (2002), ou seja, a preocupação maior está em que os alunos dominem as técnicas de leitura, sendo a interpretação deixada para segundo plano.

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Em sua carreira profissional como supervisora es-colar, atuando em duas escolas públicas da periferia de Belém, Murta (2006) notou o caráter repetitivo de cer-tas práticas de ensino e a naturalidade com que eram reproduzidas no trabalho das professoras, parecendo haver uma ordem natural das coisas acontecerem. Ba-sicamente a configuração das aulas era a mesma todos os dias: a professora escrevia no quadro negro e os alu-nos copiavam; as professoras davam algumas instru-ções e os alunos realizavam as atividades no caderno ou no livro e as professoras depois corrigiam.

Sempre havia ditados, cópias, leituras e contas a serem resolvidas. Já em outro contexto de trabalho – como professora universitária pesquisando profes-soras ribeirinhas que lecionavam em escolas multis-seriadas –, percebeu que tais escolas e suas práticas se diferenciavam em algumas particularidades, mas se mantinha o caráter universal de certas práticas mesmo em um contexto tão diferenciado.

Assistindo às aulas de uma professora ribeirinha, observando o caderno de alunos e conversando com eles, a autora percebeu como as práticas nesse espaço tão diferenciado se assemelhavam com as escolas de “terra firme”, expressão, essa, utilizada pela autora: a forma como a professora ensinava, os exercícios co-piados nos cadernos, a utilização dos livros didáticos. Muito do que foi descrito por Murta (2006) aproxi-ma-se do que nos disseram nossos dados, conforme apresentamos nos quadros referentes às séries iniciais do Ensino Fundamental, e parece-nos que podemos constatar o caráter universal de práticas como: uso de livros didáticos, cópias, ditados, questionário e cha-mada oral, além de atividades de leitura. Observe os seguintes trechos, que são ilustrativos:

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“[...] ela era muito ríspida conosco e todos tinham medo dela, além de sua habitual impaciência, ela gritava muito e por qualquer motivo. [...] Nossa professora sempre pe-dia para lermos o texto do livro em casa e em classe pedia para um após o outro ler um trecho do texto” (Sujeito 24, ano 2005, diurno, 2ª série).

“[...] os matérias {sic} não eram diversificados, utilizá-vamos apenas as cartilhas nas aulas, copiávamos e me-morizávamos as lições. tenho lembranças terríveis da segunda série, pois a professora nas aulas de português nos obrigava a ler em voz alta e em pé, quando erráva-mos ficávamos de castigo (éramos obrigados a ficar em pé até o término da aula) era horrível, eu em particular fiquei umas três vezes de castigo. Nas aulas de matemá-tica tínhamos que decorar as tabuadas, pois a professora nos fins das aulas fazia chamada oral e quem errasse ou não soubesse ficava de castigo [...]” (Sujeito 1, ano 2006, noturno, 2ª série).

“Havia um dia da semana, quarta-feira em que era des-tinado {sic} a “tomada” da tabuada, nos sentávamos à frente dele e ele ia perguntando, e quando errávamos, levávamos uma palma na mão” (Sujeito 14, ano 2006, noturno. 2ª série).

“A professora de matemática também era boa. Só não gostávamos quando nos obrigava a decorar a tabuada – e pior – fazia competição entre os alunos para ver quem fa-lava determinada tabuada mais rápido. Ficava lá... crono-metrando o tempo (blagh!)” (Sujeito 6, ano 2005, diurno, 3ª série).

“A minha professora de português era muito exigente e muito rígida. Ela não gostava de barulho e não queria

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que os alunos ficassem saindo do lugar. Ela era uma pro-fessora que ensinava muito bem a disciplina. Lembro que na quarta serie {sic}, ela utilizou além do livro de Gramática, quatro livros para leitura” (Sujeito 10, ano 2005, diurno, 4ª série)

[...] escrevia textos na lousa que eu achava que eram enormes [...] depois ela explicava muito bem os textos, de vários jeitos, o que melhor é que nos era permitido {sic} fazer quantas perguntas quiséssemos, e também fazer comentários sobre o que estava sendo ensinado que a professora sempre respondia, e ela até se entusiasmava ainda mais nas explicações que fazia para a classe (Sujei-to 6, ano 2006, noturno, 4ª série)

Já com relação às características pedagógicas, os dados que obtivemos são:

Quadro 13 – Principais características pedagógicas – 2ª série Ensino Fundamental

agradar ao aluno/recompensar por bom comportamento

auxiliar os alunos com dificuldades

exigir capricho no caderno

não admitir conversas

punir/castigar os alunos

Quadro 14 – Principais características pedagógicas – 3ª série Ensino Fundamental

agradar ao aluno/recompensar por bom comportamento ou bom desempenho

aproximar o conteúdo do dia a dia

auxiliar os alunos com dificuldades

incentivar/ elogiar o aluno

não aceitar erros ortográficos

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não admitir conversas/não suportar bagunça

preocupada com os alunos

punir/castigar os alunos

rígida nas avaliações

tratar todos os alunos igualmente

Quadro 15 – Principais características pedagógicas – 4ª série Ensino Fundamental

diálogo

não permitir conversas

pontualidade/seriedade

punir/castigar os alunos

podemos observar que a característica “punir/castigar os alunos” se fez presente em todas as séries do Ensino Fundamental Ciclo I. Encontramos pelo menos um relato de prática punitiva e/ou castigadora em cada série desse ciclo, conforme se observa a seguir:

“A minha experiência de alfabetização com ela foi pés-sima, lembro que ela colocava as crianças que não con-seguiam ler atrás da porta até o fim da aula [...]” (Sujeito 19, ano 2006, noturno, 1ª série).

“Ela também costumava gritar muito com a sala para chamarmos a atenção quando estávamos conversando. Guardo na lembrança que, quando íamos iniciar o re-cesso letivo de meio de ano, essa professora, deu como castigo de férias para a sala, muitas tarefas, entretanto, há uma em especial que eu nunca esqueci. Ela mandou nos {sic} fazermos 200 vezes a tabuada de cada número e entregar para ela no reinício da aula, no mês de agosto. Lembro que passei as férias todas fazendo os deveres que ela nos pediu” (Sujeito 4, ano 2006, noturno, 2ª série).

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“[...] uma professora muito brava, ela gritava muito e dava castigos para os que não a obedeciam [...]” (Sujeito 16, ano 2006, noturno, 3ª série).

“[...] era tão exigente [...] não aceitava erros, muito me-nos indisciplina, o seu sistema de punição se baseava em muitas cópias, sejam elas das lições ou mesmo de frases do tipo: devemos {sic} respeitar a professora e não ba-gunçar na sala de aula, eram cerca de cem cópias. Ela sempre chamava alguns alunos para resolver as contas na lousa e quando alguém não sabia fazer se utilizava {sic} de um régua grande de madeira, com a qual ela fazia as linhas na lousa, para acertar a cabeça do aluno, puxões de orelha então era rotina” (Sujeito 28, ano 2006, noturno, 2ª e 3ª série).

“[...] era bem mais rígida, nos ensinava de tudo um pou-co, e cobrava depois para saber como tinha sido o resulta-do, ainda me recordo que quando fazíamos algo que não estava dentro das normas, ou seja, quando aprontávamos alguma bagunça, por exemplo, ela mandava que copiás-semos o Hino Nacional várias vezes e assinássemos o ‘ca-derninho’” (Sujeito 4, ano 2005, diurno, 4ª série).

“dizia-nos, as outras professoras, que seríamos pe-nalizados e ficaríamos sem aula de Educação Física caso a classe não se acalmasse. Outra “técnica” utilizada para controlar-nos {sic} era a escolha de um aluno muito quieto para que ele anotasse durante todo o mês o nome dos alunos que conversassem em sua ausência. Assim, no final do bimestre, a professora anotava o comporta-mento de cada um atrás do boletim para entregar aos responsáveis” (Sujeito 18, ano 2005, diurno, 4ª série, referindo-se às professoras de português e Matemática).

Observamos também que, desde a Educação In-fantil, a questão de ajudar/auxiliar os alunos com difi-

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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA HISTÓRIA... 111

culdade se faz presente na prática pedagógica efetivada pelos professores do Ciclo I, conforme mostram os tre-chos a seguir:

“Esta era muito simpática, sorridente, já chegou nos di-zendo que trabalharíamos todos em conjunto e que se tivéssemos dificuldades, ela nos ajudaria e também os alunos que soubessem mais ajudariam os que soubes-sem menos [...]” (Sujeito 35, ano 2005, diurno, 2ª série).

“A professora era muito paciente e quando não enten-díamos, chamava em sua mesa e explicava para quem não tinha entendido a explicação feita na lousa. passava então uma lista de exercícios para serem resolvidos em casa. Na classe corrigia todos os exercícios, pedindo para que fossemos fazer na lousa com isso entendermos e fixar melhor a matéria” (Sujeito 24, ano 2005, diurno, 3ª série).

Araújo (2010) investigou práticas pedagógicas de professoras dos anos iniciais do Ensino Fundamental, em dois contextos distintos: classes multisseriadas e clas-ses cicladas a partir da implantação da proposta do Ciclo Básico de Alfabetização Cidadã. por meio das observa-ções realizadas na classe ciclada, a autora observou uma metodologia de trabalho nos moldes mais comuns de ensino, onde o professor está à frente da sala e os alunos sentados em fileiras, realizando uma atividade de cada vez. As professoras procuram explicar as dúvidas em frente à lousa e têm a voz mais estressada, muitas vezes dirigindo-se às crianças para corrigi-las, em tom de iro-nia e deboche. “Sempre se dirigindo aos alunos em tom de imposição, a professora conduzia a sua aula sem pos-sibilidade de os alunos conversarem entre si, nem levan-tarem para qualquer coisa [...]” (Araújo, 2010, p.108).

desse modo, a autora concluiu que as estratégias pedagógicas das classes cicladas permaneceram inal-

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teradas, pautadas na lógica do modelo seriado. Ora, nossos sujeitos-alunos estudaram quando ainda valia a divisão em séries e nas histórias de escolarização en-contramos características que se aproximam das des-critas por Araújo (2010), tais como: os alunos não po-dem conversar; realizam uma atividade de cada vez; há uma certa rigidez das atividades; centralidade na figura do professor. parece-nos que o ensino efetivado pelos professores pauta-se em uma perspectiva pedagógica transmissiva, com alguns momentos em que se efetiva uma pedagogia da participação.

Com relação à prática de agradar ao aluno, pre-miá-lo por bom comportamento ou desempenho, des-tacamos os seguintes trechos:

“[...] ao término de cada caderno tínhamos que levá-lo para que ela o averiguasse, se lhe agradasse então nos presenteava com uma simples lembrança [...]” (Sujeito 36, ano 2006, noturno, 1ª série).

“[...] as crianças eram recompensadas pelas atividades que faziam, mesmo que essa recompensa era um parabéns escrito em vermelho e as melhores tarefas também o desenho de um coração” (Sujeito 16, ano 2005, diurno,1ª série).

“[...] no final da aula quem se comportava era esco-lhido para ir no banheiro dos professores, que por sinal era muito diferente do banheiro dos alunos, ele era bonito, com uma pintura suave, um lindo quadro e tinha sabonete e papel higiênico, utensílios que não tinham no banheiro dos alunos. todo dia ela escolhia dois meninos e duas meninas” (Sujeito 30, ano 2005, diurno, 2ª série).

por fim, a categoria “características pessoais/pe-dagógicas” ficou composta da seguinte maneira:

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Quadro 16 – Principais características pessoais/pedagógicas – 2ª série Ensino Fundamental

atenciosa

brava

calma

carinhosa

exigente

paciente

receber bem os alunos/acolhedora

rígida

sensível

Quadro 17 – Principais características pessoais/pedagógicas – 3ª série Ensino Fundamental

amável

brava

carinhosa

dedicada

exigente

paciente

receptiva/conversar com os alunos

sensível

séria

Quadro 18 – Principais características pessoais/pedagógicas – 4ª série Ensino Fundamental

exigente

rígida

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pelas características descritas, podemos obser-var que, conforme se avança nas séries escolares, parece-nos que vai ocorrendo um distanciamento na relação professor-aluno, no sentido de se tornar mais formal e menos afetiva, o que alcançará o auge na 5ª série, de acordo com nossos sujeitos.

O ingresso na 5ª série – hoje 6º ano do EFCII – foi apontado como um marco,5 trazendo ansiedade, receio e surpresas e foi sentido como uma grande mudança: os alunos-sujeitos não são mais crianças, há mais responsabilidades, são muitos professores e estes são mais exigentes. Além disso, os alunos po-dem escrever a caneta e usar caderno universitário e isso representa, para eles, uma grande mudança. para a grande maioria dos sujeitos, é na 5ª série que acon-tece o primeiro contato com professores homens. Os alunos-sujeitos relataram também mudanças na re-lação professor-aluno: os professores são menos pró-ximos dos alunos, é uma relação mais distante e fria. Observe o relato seguinte:

“[...] os professores: a maioria deles tratavam-nos de uma forma diferente, mais séria e dura, cobrando re-sultados imediatos daquilo que estavam ensinando por meio de testes surpresas ou mesmo provas com data marcada. Em geral, não tinham muita paciência para fi-car explicando repetidas vezes o conteúdo [...]” (Sujeito 5, ano 2006, noturno).

O quadro a seguir sintetiza as principais atividades realizadas na 5ª série, recordadas por nossos sujeitos:

5 A esse respeito, consultar Passagem sem rito: as 5as séries e seus pro-fessores, de Maria Helena G. Frem dias da Silva.

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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA HISTÓRIA... 115

Quadro 19 – Principais atividades realizadas – 5ª série Ensino Fundamental

atividade com música

atividade de leitura de livros

atividades extracurriculares/práticas

chamada oral

interpretação de textos

leitura em voz alta

pesquisas em livros e jornais

prova surpresa

questionário para a prova

resumo de textos/cópias

trabalho em grupo/apresentação de trabalhos

passar questões de vestibulares

Observamos que ainda permanecem atividades com músicas e atividades de leitura como acontecia no Ensino Fundamental Ciclo I. Entretanto, podemos perceber que já há mais destaque para atividades ava-liativas – as provas – e para trabalhos em grupo. Nas demais séries do Ensino Fundamental Ciclo II, a cate-goria “atividades” ficou composta da seguinte maneira:

Quadro 20 – Principais atividades realizadas – 6ª série Ensino Fundamental

atividade de leitura de livros

atividade de produção de livro literário

atividades extraclasse/práticas/laboratório

chamada oral

cópias

leia, copie e responda

questionário

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repetir o hino nacional

trabalhar com a Gramática

trabalho em grupo/apresentação de trabalhos

Quadro 21 – Principais atividades realizadas – 7ª série Ensino Fundamental

atividades extraclasse

aulas expositivas

aulas práticas/laboratório

cópia de textos

questionário para a prova

Quadro 22 – Principais atividades realizadas – 8ª série Ensino Fundamental

atividades diversificadas

jogos didáticos

trabalho em grupo

Os alunos deram destaque para a realização de atividades extraclasse, atividades práticas e idas ao la-boratório. tais práticas foram apontadas como bem--sucedidas, trazendo contribuições importantes para a aprendizagem, além do fato de tornarem a aprendiza-gem mais agradável, conforme se constata nos trechos a seguir:

“[...] era muito rigorosa, exigente, com provas enormes, trabalhosas, e bem difíceis, tínhamos que estudar bastan-te. Apesar disso, ela nos levava com bastante frequência ao laboratório da escola, para fazermos experiências, me-xermos com aqueles objetos de laboratório, que ela exigia que todos soubessem o nome de cada um desses objetos, isso nos ajudava muito para entender o conteúdo da apos-tila” (Sujeito 4, ano 2005, diurno, 6ª série, Ciências).

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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA HISTÓRIA... 117

“Ela era muito boa para explicar, posso até dizer que conseguia deixar a Química menos pesada. Nos levava a laboratórios, fazíamos experiências, chegamos até a ana-lisar um rato uma vez, isso fazia com que a aula se tornas-se mais agradável” (Sujeito 5, ano 2005, diurno, 7ª série).

“O professor de história era revolucionário, suas aulas era sempre dada {sic} ao ar livre. Ele explicava a ma-téria para depois toda a sala discutir. por seu método diferente de ensino, era muito criticado na escola, mas ele conseguia prender a nossa atenção e passar seu con-teúdo talvez ate melhor do que qualquer outro profes-sor” (Sujeito 20, ano 2005, diurno, 8ª série).

Com relação às atividades e aos materiais usados pelos professores, pudemos perceber em todo o Ensino Fundamental Ciclo II a incidência de questionários, atividades de leitura de livros, chamada oral, questio-nários, cópias, trabalhos em grupos, apresentação de trabalhos e atividades práticas.

Como professora de Ciências do nível Ginasial, rocha (2001) procurava desenvolver sua prática pe-dagógica apoiada em atividades práticas, deixando que os alunos realizassem as atividades após uma introdução sobre o assunto, geralmente procuran-do envolvê-los em perguntas e relações com a vida diária. A professora propunha trabalhos em grupos, individuais, atividades experimentais, pesquisas bibliográficas e entrevistas. Como vimos nos qua-dros que expuseram os dados referentes ao Ensino Fundamental Ciclo II, as atividades propostas ca-minham na mesma direção, com destaque para tra-balhos em grupos e atividades práticas. reiteramos que quando os alunos citaram atividades práticas e extraclasse julgaram-nas como positivas e enrique-cedoras do processo ensino-aprendizagem.

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Ao estudar professores que lecionavam Ciências nas séries finais do Ensino Fundamental, Moreira (2008) encontrou um ensino que preserva os pres-supostos da denominada pedagogia tradicional em detrimento de um ensino mais ativo. Nesse sentido, o autor constatou que a maioria das aulas ocorreu de modo expositivo, com pouca participação dos alu-nos e sendo o professor o sujeito principal do proces-so ensino-aprendizagem na maior parte do tempo, seja expondo um assunto, anotando na lousa ou len-do um texto. Além disso, na maioria das aulas obser-vadas o autor constatou que a organização dos alu-nos se dá em fileiras e as aulas acontecem no espaço tradicional da sala de aula. Os professores sujeitos no estudo de Moreira (2008) estão de comum acordo que o ensino tende a ser pautado na memória, com a valorização dos conteúdos a serem transmitidos aos alunos. parece-nos que as aulas que nossos sujeitos--alunos tiveram seguem os moldes encontrados por Moreira (2008) nas diversas disciplinas que com-põem o currículo escolar do Ensino Fundamental Ciclo II, estando a centralidade na figura do profes-sor: iniciam a aula com uma explicação e aplicam exercícios ou trabalhos para os alunos resolverem e depois há um momento de avaliação. Além disso, parece-nos que há um direcionamento à valoriza-ção da memorização, já que vários alunos citaram a necessidade de decorar questionários para a prova. Observe os trechos a seguir:

“[...] ela era rigorosa na sala e o meio que ela utilizava para manter a classe em silêncio era gritando e amea-çando chamar a diretora. Suas aulas eram dadas em cima dos livros didáticos cedidos pelo governo. Nas aulas dela não tínhamos atividades extracurriculares e

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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA HISTÓRIA... 119

ela não dava aulas diferentes, era bem tradicional” (Su-jeito 3, ano 2005, diurno, 5ª série, português).

“Apenas com sua presença impunha respeito, não pre-cisava gritar ou falar alto para obter silêncio. Era uma professora muito séria, não admitia brincadeiras na sala de aula e não dava liberdade para os alunos conversarem com ela, porém transmitia o conteúdo de forma clara e precisa, quantas vezes fosse necessário até a compreen-são dos alunos. tratava os alunos com muito respeito e por isso também era respeitada” (Sujeito 19, ano 2005, diurno, 5ª série, português).

“Era bem tradicional e nada estimulante suas aulas, era sempre a mesma coisa. Fazíamos trabalhos em grupo e apresentávamos para a sala, ela dava nota de participa-ção e cobrava dos alunos o bom cuidado com o material didático, ela ficava muito brava se sujasse, fizesse orelha ou não encapasse o livro” (Sujeito 28, ano 2005, diurno, 6ª série, português).

“[...] era bastante exigente e tinha uma postura que lem-brava a de um general (como os alunos a chamavam), mas conseguia se expressar com clareza e esclarecia com paciência as dúvidas daqueles que ela achava que mere-ciam. A relação que ela mantinha com os alunos sempre foi estritamente “profissional”, nunca soubemos nada de sua vida particular nem ela da nossa [...]” (Sujeito 27, ano 2006, noturno, 7ª série, Matemática).

recuperamos, também, os dados obtidos por tor-quato (2003) ao investigar professores que lecionavam para os anos finais do Ensino Fundamental no estado do paraná. O autor percebeu que, de maneira geral, quando há utilização do livro didático, os professores se baseiam nas perguntas do livro e pedem que os alunos respondam oralmente, procurando fazer com que vários

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alunos participem. Fazem também leitura em voz alta, com cada aluno lendo um trecho do texto ou com leitu-ra jogralizada. Os professores também fazem os alunos voltarem à leitura quando há palavras não pronuncia-das, pronunciadas incorretamente ou erros de entona-ção. Observou-se também, em algumas aulas, o estudo do vocabulário com palavras isoladas depois da leitura do texto. À autora parece que a mecânica é um dos fo-cos centrais do ensino de leitura, baseando-se princi-palmente na localização e cópia de informações, sendo que os aspectos da interpretação tornam-se secundários. Nas aulas nas quais os professores não seguem o livro didático, a autora observou, entretanto, que o encami-nhamento das atividades segue a perspectiva do livro di-dático. Apesar de nossos alunos não citarem a utilização de livros didáticos como uma prática recorrente, perce-bemos que, nas diversas atividades, a lógica que coloca a ênfase na mecânica da leitura se faz presente.

Ainda no Ensino Fundamental Ciclo II, a cate-goria “características pedagógicas” compôs-se do se-guinte modo:

Quadro 23 – Principais características pedagógicas – 5ª série Ensino Fundamental

auxiliar nas dificuldades dos alunos/tirar dúvidas

dar nota por comportamento

ensinar com diversão

ensinar com entusiasmo

estimular o raciocínio lógico dos alunos

gritos e ameaças

integrar professor e aluno

não admitir brincadeiras/não admitir conversas

premiar os alunos

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trabalho com situações do dia a dia

transmitir valores

vistar cadernos/vistar tarefas

Quadro 24 – Principais características pedagógicas – 6ª série Ensino Fundamental

auxiliar nas dificuldades dos alunos

citar exemplos

dar nota de participação

distinção entre os alunos

ensinar com entusiasmo

exigir cuidado com o material

gritos e humilhação

integrar professor e aluno

não permitir conversas paralelas

nota de participação

preocupação com os alunos

trabalho com situações do dia a dia

troca de experiências entre professor e aluno

uso de gibis, revistas e jornais

Quadro 25 – Principais características pedagógicas – 7ª série Ensino Fundamental

esclarecer dúvidas com paciência

exibir vídeos sobre os temas trabalhados/exibir filmes

integrar professor e alunos

resolução de exercícios na lousa pelos alunos

utilizar mapas

vistar cadernos

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Quadro 26 – Principais características pedagógicas – 8ª série Ensino Fundamental

aulas ao ar livre

auxiliar nas dificuldades dos alunos

exibir filmes

ignorar as dúvidas dos alunos

incentivar a leitura

selecionar alunos monitores para ajudar colegas

trabalhar com situações do dia a dia

Observamos que a característica “auxiliar nas difi-culdades dos alunos”, que apareceu desde a Educação Infantil e em todo o Ciclo I, também se faz presente no Ciclo II e é apontada pelos alunos como algo positivo:

“[...] se alguém não entendia ela vinha com a maior pa-ciência e explicava tudo quantas vezes fosse preciso até a pessoa entender” (Sujeito 24, ano 2006, noturno, 6ª série, Geometria).

“Eu tinha um pouco de dificuldade em alguns conteú-dos e ela sempre trabalhou de forma significativa com estas dificuldades. Este ano comecei até a ter um gosto maior pela matemática, pois conseguia entendê-la me-lhor” (Sujeito 3, ano 2005, diurno, 8ª série, Matemática).

Investigando o uso de imagens por professores de Geografia do Ensino Fundamental da rede pública estadual de ponta Grossa, pimentel (2002) constatou que os professores afirmam que independentemente da frequência de utilização de imagens e do tipo de ca-tegoria utilizada, sejam elas fotografias convencionais, fotos aéreas ou imagens de satélites, há uma motivação que desperta o interesse e favorece a compreensão dos

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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA HISTÓRIA... 123

alunos, havendo mais interesse dos alunos quando as imagens estão presentes no ensino de Geografia, ou seja, a característica visual da foto é tida como fator positivo. percebemos, em nossos dados, que quando o professor utiliza algum tipo de material diferencia-do contribui para aumentar o interesse dos alunos, entretanto, em nossos dados, poucos foram os relatos de professores que utilizavam recursos diferenciados nas aulas, sendo que foram citados o uso de jornais e revistas, uso de mapas, exibição de filmes e exibição de vídeos sobre o tema.

por fim, a categoria “características pessoais/pe-dagógicas” ficou composta do seguinte modo:

Quadro 27 – Principais características pessoais/pedagógicas – 5ª série Ensino Fundamental

atencioso(a)

disponível

exigente

rígida/rigorosa

séria

Quadro 28 – Principais características pessoais/pedagógicas – 6ª série Ensino Fundamental

animada

atualizada

exigente

rigorosa

Quadro 29 – Principais características pessoais/pedagógicas – 7ª série Ensino Fundamental

atenciosa

autoritária

exigente

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Quadro 30 – Principais características pessoais/pedagógicas – 8ª série Ensino Fundamental

autoritária

exigente

Em comparação com as descrições do Ciclo I, po-demos constatar que os sujeitos apontam poucas ca-racterísticas pessoais/pedagógicas dos professores. As descrições dos professores do Ciclo II se voltam mais para as atividades realizadas e características pedagó-gicas. talvez isso esteja associado, como já apontamos anteriormente, ao fato de que os sujeitos percebem uma mudança na relação professor-aluno, que se torna mais profissional, diferente do que acontecia na Edu-cação Infantil e no Ciclo I, onde as relações carregavam muitas marcas afetivas.

Na maioria dos relatos referentes ao Ciclo II, o bom professor foi associado ao professor rígido, que consegue controlar a classe, que promove aulas prá-ticas e passeios, que explica bem, que mescla a expli-cação séria com brincadeiras e, principalmente, que ensina com entusiasmo, fazendo os alunos se empol-garem com aquilo que estão aprendendo.

para encerrar nossa análise apresentaremos os dados referentes ao Ensino Médio, começando com as atividades:

Quadro 31 – Principais atividades realizadas – Ensino Médio

análise de obras literárias

apreciação sobre reportagens e notícias

atividades com música em inglês

atividades desafiadoras

atividades em grupo

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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA HISTÓRIA... 125

aulas expositivas

aulas práticas

copiar conceitos do livro didático

oferecer exercícios de vestibular

debates

ditar o conteúdo

encenar os livros lidos/teatros

realizar experiências

leituras de livros

lista de exercícios/exercícios extras

pintar mapas

premiar os alunos por bom desempenho

provas

redações

resolver exercícios da apostila/do livro

resolver exercícios em conjunto

responder questionário

revisão para a prova

seminários

sortear ou chamar alunos para responder questões na lousa

trabalhos individuais

traduzir músicas e textos (inglês)

visitas e passeios

Observe que, mesmo no Ensino Médio, ainda foram citadas atividades de cópia e ditado, embora, é claro, neste nível de ensino tais atividades tenham uma ênfase totalmente diferente do Ensino Fundamental Ciclo I, quando por meio do ditado procurava averi-guar-se o aprendizado da escrita. Aqui o professor rea-liza ditado dos conteúdos da aula ou então os alunos

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precisam copiar os conteúdos da lousa. Nesse sentido, retomamos a pesquisa de Araújo (2001) – apresenta-da no Capítulo 1 – que constatou que os professores investigados adotam como metodologia de trabalho: passar matéria na lousa, explicar oralmente, além de exigir cópias.

As atividades em grupo, bem como a apresentação de trabalhos e seminários são atividades que se destacam no Ensino Médio, assim como atividades de resolução de exercícios. Os alunos também descrevem positiva-mente aulas práticas e atividades de visitas e passeios:

“Era uma pessoa calma, falava devagar e quando al-guém estava conversando na aula, ela parava de expli-car, ficava olhando para o aluno dando uma risadinha um pouco irônica até que o aluno voltasse a prestar atenção em sua aula. Ela sempre levava os alunos ao laboratório de química, também organizou passeios a uma usina de cana-de-açúcar, a um museu arqueoló-gico, e fizemos várias visitas na própria cidade. Foram aulas em que pude conhecer na prática vários experi-mentos que se estudado {sic} apenas na teoria ficariam muito vagos e desinteressantes” (Sujeito 3, ano 2005, diurno, Ensino Médio, Química).

“[...] ela sabia transmitir muito bem o conteúdo, era muito amiga dos alunos, o que fazia dela uma pessoa particularmente especial. Ela sabia o nome de todos os alunos, o que nos dava uma sensação de importância, ela se preocupava com nossa aprendizagem, além de querer ser mais do que professora dos alunos. Essa professora promovia passeios, e atrativos para sua aula, a aula não se baseava apenas em conteúdos, a professora mostrava através de fotos e paisagens o que dava valor e ilustravam a realidade que ela ensinava” (Sujeito 5, ano 2005, diur-no, 1º ano do Ensino Médio, Geografia).

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“As aulas de Química [...] eram na maioria práticas e isso motivou e melhorou a compreensão dos alunos. Seus tra-balhos escritos e provas exigiam muito dos alunos, mas todos faziam e obtinham notas boas. Já a professora de História era despreocupada com o ensino e apenas ditava os textos e pedia para que formulássemos perguntas sobre eles. um verdadeiro descaso” (Sujeito 12, ano 2005, diur-no, 2º ano do Ensino Médio, Química).

A seguir, apresentamos os dados referentes às ca-racterísticas pedagógicas:

Quadro 32 – Principais características pedagógicas – Ensino Médio

controlar a disciplina

ensinar com entusiasmo

esclarecer dúvidas/explicar quantas vezes for necessário/auxiliar nas dificuldades dos alunos

exigir a participação de todos os alunos

exigir participação nas atividades

exigir silêncio

explicar de forma simples

fazer uma apostila ilustrada/fazer cartazes sobre a matéria

incentivar a leitura

movimentar-se entre os alunos

não permitir conversas/não permitir brincadeiras

passar conteúdo na lousa

pontual nas explicações

punição/humilhação

tratar os alunos sem distinção

usar materiais complementares: quadros, figuras, vídeos, documentários, filmes

usar músicas/fazer músicas

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usar retroprojetor

valorizar a participação dos alunos

verificar cadernos

Ainda no Ensino Médio, os alunos deram des-taque para a característica “auxiliar nas dificuldades dos alunos”, novamente apontada como algo positivo como notamos no trecho a seguir:

“Ela era calma e falava bem baixinho, não me lembro dela ter se exaltado. Ela conseguia controlar a classe sem precisar ficar gritando. Suas aulas eram interessantes, valorizava a participação dos alunos nas aulas, ela dava várias atividades em grupo e trabalhava bastante a reda-ção dos alunos. Atendia os alunos, que quisessem tirar dúvidas, em outros horários e era muito companheira de todos os alunos” (Sujeito 3, ano 2005, diurno, Ensino Médio, português).

Ensinar com entusiasmo, ensinar com música e usar senso de humor no trato com os alunos foram ca-racterísticas recorrentes apontadas por nossos sujeitos:

“[...] uma ótima professora, que nos ensinava história não lendo livros ou mandando a gente fazer trabalhos, mas, como se tivesse realmente contando a história acontecida; fazia-nos viajar no tempo, com sua ma-neira de narrar os fatos, assim, eu nunca esquecia, e realmente entendia o porque {sic} do acontecer dos fatos – tudo tinha sentido. O outro professor era um ótimo professor também, que se utilizava {sic} muitos materiais complementares, como quadros, figuras, para facilitar nosso entendimento sobre o assunto, suas aulas eram também bem interessante {sic}, pois também narrava os fatos de maneira a prender nossa concentração” (Sujeito 4, ano 2005, diurno, Ensino

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Médio, História).“[...] era muito extrovertido, vivia contando piadas, in-ventando músicas para que compreendêssemos melhor uns nomes difíceis de plantas e musgos, por exemplo, que havia em sua matéria e também o conteúdo” (Sujeito 4, ano 2005, diurno, Ensino Médio, Biologia).

para encerrar, temos os dados relativos à categoria “características pessoais/pedagógicas”:

Quadro 33 – Principais características pessoais/pedagógicas – Ensino Médio

alegre/entusiasmado/animado

amiga

atenciosa

brincalhão

calma

companheira

desanimado/cansado

dinâmica

divertido/engraçado

exigente

falar baixinho/falar devagar

gentil

paciente

rígida

sério(a)

É claro que há diferenças na atuação do professor dependendo do nível de ensino em que leciona, entre-tanto, apesar das diferenças entre as séries e os níveis

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de ensino, pudemos perceber que há permanência de características dos professores, bem como permanên-cia de tipos de atividades realizadas. Como já desta-camos anteriormente, em todos os níveis de ensino, a característica “auxiliar nas dificuldades dos alunos” foi citada e sempre apareceu como algo positivo e valori-zado pelos alunos.

Cunha (2009) constatou entre os bons professores estudados que o gosto e o estudo faziam o professor valorizar seu campo de conhecimento, entusiasmar-se com ele e isso influenciava os alunos. tal constatação se aproxima da característica pedagógica que denomi-namos “ensinar com entusiasmo” e que se fez presente em inúmeros relatos dos nossos sujeitos, principal-mente entre os professores do Ensino Fundamental Ciclo II e Ensino Médio.

A mesma autora identificou 39 diferentes evi-dências relacionadas com as habilidades de ensino e as reuniu em categorias. tendo em vista nossos da-dos, apresentados em todos os quadros anteriores e partindo da identificação feita por Cunha (2009), pu-demos encontrar as seguintes habilidades, que com-põem, de um modo geral, as práticas pedagógicas dos professores relembrados por nossos sujeitos:

• usodepalavrasdereforçopositivo;elogiarosalunos;

• auscultar as experiências cotidianasdos alu-nos; partir das experiências do aluno para ancorar o conhecimento organizado;

• usodeexemplosparaexplicitarproposições;• variaçãodeestímulos:filmes,músicas,slides;• movimentar-sepelasaladeaulacomoforma

de estimular a participação dos alunos e como forma de o professor verificar o nível de atenção dos alunos;

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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA HISTÓRIA... 131

• chegarpertodoaluno;chamá-lopelonome;• sensodehumornotratocomosalunos;• esforçoparatornaraaprendizagemprazerosa

e interessante;• tornar-sepróximodosalunosealiviaroclima

da sala de aula.

Ora, em nossos dados, pudemos constatar a pre-sença das habilidades citadas acima, por meio das características pedagógicas, pessoais/pedagógicas e atividades realizadas pelos professores, ou seja, mos-tramos quais são as lembranças de práticas pedagógi-cas que nossos sujeitos trazem de seu processo ensino--aprendizagem, sendo que exploramos um grupo que se prepara para ser professor, como uma tentativa de contribuir para questões que dizem respeito à forma-ção inicial e à atuação docente.

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ConSideraçõeS finaiS

tendo em vista as reflexões que fizemos e os dados que apresentamos no presente trabalho, po-demos afirmar que ser considerado um “bom pro-fessor” dependerá do contexto histórico, do que está sendo valorizado e por quem. É uma argumentação subjetiva e marcada pelo que está instituído social-mente naquele momento (pinto; Miorando, 2004). O que nos diz o sujeito sobre tais lembranças mostra o que foi significativo para ele, de acordo com os va-lores que o constituíram. tanto o bom quanto o mau desempenho de professores lembrados e citados pe-los sujeitos foram descritos com intensidade.

Na pesquisa realizada por Mizukami (2002) com estudantes de pós-Graduação (Mestrado e doutorado), tendo em vista analisar contribuições da utilização e da elaboração de casos de ensino, os sujeitos pesquisados afirmam que os modelos com os quais tiveram contato, ao longo do processo de escolarização e de profissionalização, são fontes de aprendizagem. desse modo, pensamos que as His-tórias de Escolarização – enquanto relatos que con-

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têm uma riqueza de práticas profissionais efetivadas em escolas e salas de aula –, como pudemos mostrar no Capítulo 3 por meio dos quadros, podem servir como casos a serem discutidos e analisados na busca de respostas, de caminhos e na elaboração de planos e intervenções necessárias, tendo em vista o traba-lho docente de boa qualidade.

Acreditamos que o conhecimento e a análise de situações pedagógicas não precisam ficar restritos aos estágios, como é comum ocorrer nos cursos de forma-ção de professor. As Histórias de Escolarização, como as que foram produzidas por nossos sujeitos, podem se constituir em instrumentos importantes de aprendiza-gem, caminho esse que pode facilitar a reflexão sobre a prática profissional ainda não exercida pela maioria dos sujeitos que está em fase de formação.

A história de vida construída a partir de um coti-diano, quando é refletida e assumida pelos educandos, constitui uma base sólida para suas ações. Conside-rar-se a experiência de vida como ponto de partida para a elaboração de conhecimentos sobre a Educação parece-nos ser um caminho fértil para trazermos mais qualidade e eficiência à formação dos professores. Os educadores não podem ignorar os erros e os acertos, as limitações, as condições e os percursos que os fizeram “homens educados”.

Os registros de vivências educacionais, as expe-riências e as concepções dos alunos podem ser traba-lhadas como material básico para articulação entre teoria e prática e, dessa forma, os relatos de experiên-cia devem ganhar novos significados na constituição dos currículos dos cursos de formação de professores. Essas informações, quando sistematizadas, podem se constituir em fonte de referência para o desenvolvi-mento dos conteúdos curriculares.

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Assim, pensamos que o uso de práticas autobio-gráficas aparece como uma alternativa benéfica sobre-tudo em se tratando de alunos que se preparam para o magistério, ao serem utilizadas como um recurso didático/metodológico para contribuir com a quali-dade da formação. Os exercícios autobiográficos são de extrema importância ao se pensar na formação do professor, pois são neles que residem o maior núme-ro de informações sobre experiências e modelos que o futuro professor carrega consigo e é nesse sentido que as questões autobiográficas aparecem como um recur-so didático. Ao explicitarmos o que os alunos de pe-dagogia relembraram e relataram, isso se constitui em uma contribuição, ainda que indireta, para a aprendi-zagem da docência.

Levando em consideração o levantamento reali-zado durante nossa pesquisa, pudemos constatar que o número de trabalhos com Histórias de Escolarização é pequeno. Sabemos, também, que a maior parte das pesquisas que vem sendo realizadas está centrada no professor, no modo como este pensa, na sua formação e na sua prática. parece-nos que sempre se dá atenção a um dos agentes do processo de ensinar e aprender em detrimento do outro, como se ambos não fizessem parte de um mesmo processo, que não pode existir sem a participação dos dois agentes, concomitante-mente, ainda que cada qual tenha um tipo específico de participação no processo ensino-aprendizagem.

desse modo, consideramos importante saber o que pensam as duas partes diretamente envolvidas no processo ensino-aprendizagem: professores e alunos, sendo, estes últimos, alunos do Ensino Básico ou da universidade, especialmente os que se preparam para o exercício do professorado. Sobretudo, pensamos que tal investimento é necessário ao considerarmos a qua-

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lidade das práticas de ensino, tendo em vista a prática profissional futura.

Ademais, os dados apresentados aqui mostram di-reta e indiretamente elementos para se pensar a cultura escolar brasileira, apontando regularidades que foram, por parte dos sujeitos, consideradas apropriadas para a promoção de um ensino e de uma aprendizagem de boa qualidade, dentre elas: espaço para brincadeiras, atividades de música e dança, realização de aulas práti-cas e atividades práticas, uso do senso de humor e en-sino com música. A característica “auxiliar os alunos com dificuldades” perpassa todos os níveis de ensino, sendo considerada uma característica positiva da prá-tica pedagógica em todos os momentos que aparece.

Neste momento é o que temos para apresentar. Contudo, nossas fontes e nossos dados propriamen-te ditos podem ainda serem aproveitados para ou-tros objetivos que não o nosso. Esperamos que este trabalho seja útil para se compreender regularidades positivas e negativas da prática docente realizada na escola básica e para pesquisas sobre diferentes temas do âmbito do processo ensino-aprendizagem, tendo em vista repensar práticas consideradas malsucedi-das por alunos e/ou legitimar práticas bem-sucedidas também segundo alunos.

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SOBRE O LIVRO

Formato: 12 x 21 cm

Mancha: 23,7 x 42,5 paicas

Tipologia: Horley Old Style 10,5/14

EQUIPE DE REALIZAÇÃO

Coordenação Geral

Arlete Quaresma

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Práticas Pedagógicas na história de escolarizaçãoOuvindO alunOs e repensandO práticasISABELA VICENZO SGOBBI

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