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Tese de Doutorado “Proximidade territorial, aprendizado e inovação: Um estudo sobre a dimensão local dos processos de capacitação inovativa em arranjos e sistemas produtivos no Brasil” Esse texto esta disponível em: http://www.sinal.redesist.ie.ufrj.br/dados/nt_count.php?projeto=ts1&cod=2 Autores: Marco Vargas (IE-UFRJ) http://www.redesist.ie.uf

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Page 1: “Proximidade territorial, aprendizado e inovação: Um ... · meu crescimento intelectual durante o doutorado. Em particular, agradeço aos ... Resumo Esta tese discute o papel

Tese de Doutorado

“Proximidade territorial, aprendizado e inovação: Um

estudo sobre a dimensão local dos processos de capacitação inovativa em arranjos e sistemas produtivos

no Brasil”

Esse texto esta disponível em:

http://www.sinal.redesist.ie.ufrj.br/dados/nt_count.php?projeto=ts1&cod=2

Autores: Marco Vargas (IE-UFRJ)

http://www.redesist.ie.uf

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA

Proximidade territorial, aprendizado e inovação: Um estudo sobre a dimensão local dos processos de capacitação inovativa em arranjos e

sistemas produtivos no Brasil

Marco Antonio Vargas

Tese de Doutorado apresentada ao Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial para a obtenção do Grau de Doutor em Economia

Orientador: Prof. Dr. José Eduardo Cassiolato

Rio de Janeiro

2002

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA

Proximidade territorial, aprendizado e inovação: Um estudo sobre a dimensão local dos processos de capacitação inovativa em arranjos e

sistemas produtivos no Brasil

Marco Antonio Vargas

Tese de Doutorado apresentada ao Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial para a obtenção do Grau de Doutor em Economia

BANCA EXAMINADORA Prof. José Eduardo Cassiolato (orientador) Prof. Fábio Stefano Erber Prof. Paulo Bastos Tigre Prof. Renato Ramos Campos Prof. Wilson Suzigan Prof. Jorge Nogueira de Paiva Britto (suplente)

Rio de Janeiro, 2002

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Agradecimentos

Mais do que meras categorias de análise, a interação e a cooperação

representaram princípios fundamentais na realização desta tese. Nada mais oportuno,

portanto, do que resgatar neste momento a importância que assumiram as contribuições

de diversas pessoas e instituições no sentido de concretizar este trabalho.

Ao professor José Eduardo Cassiolato, meu orientador e com quem tenho tido o

privilégio de conviver nos últimos anos, devo um agradecimento especial. Tanto no

plano profissional como pessoal, sua postura fraternal, séria e competente constituiu um

incentivo permanente e foi decisiva para finalização da tese.

A oportunidade de integrar a rede de pesquisa sobre arranjos e sistemas

produtivos, permitiu o acesso a um ambiente muito especial de debate acadêmico. A

tese incorpora importantes aportes conceituais e metodológicos que se originaram a

partir das discussões no escopo deste grupo e, particularmente, com amigos com quem

tive a oportunidade de manter um convívio mais próximo nos últimos anos como

Helena Lastres, Cristina Lemos, Renato Campos, Arlindo Villaschi e Jorge Britto. No

Rio Grande do Sul, nas diferentes fases da pesquisa pude contar com o apoio e amizade

de Rejane Alievi e Nery dos Santos Filho que, juntamente comigo, integraram a equipe

de coordenação do estudos sobre arranjos e sistemas locais no Estado.

No Instituto de Economia da UFRJ tive a oportunidade de conviver num

ambiente acadêmico intenso e de permanente debate que contribui decisivamente para

meu crescimento intelectual durante o doutorado. Em particular, agradeço aos

professores Fábio Erber e Paulo Bastos Tigre pelas valiosas críticas e sugestões feitas

durante a etapa de avaliação do projeto de Tese.

Minha permanência no IDS - Institute of Development Studies - da Universidade

de Sussex, entre 1999 e 2000, representou uma oportunidade única de compartilhar de

um ambiente acadêmico intenso e avançar em diversos elementos do referencial

analítico da tese. Neste aspecto, gostaria de agradecer a Hubert Schmitz e aos demais

membros do grupo de Globalização pelas inúmeras oportunidades que tive de apresentar

e debater meu trabalho de pesquisa, incorporando assim importantes sugestões às

versões preliminares de capítulos. Da mesma forma, das salas de seminário aos

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encontros de sexta-feira no PUB do IDS, o apoio e amizade de diversos colegas no IDS

e SPRU foram fundamentais para o sucesso deste meu período de permanência em

Sussex. Em especial gostaria de agradecer a Eva Dantas, Eduardo, Keyju, Lizbeth

Navas Aleman, Luis Paulo Bresciani Maite Irurzun, Milasoa Cherel, Nicolas, Rosane

Marques e Sérgio Queiroz., entre outros tantos.

Em todos os estágios do doutorado, o apoio financeiro da CAPES foi

fundamental, seja através da concessão de bolsa no programa PICDT ou na concessão

de bolsa para realização do doutorado sanduíche na Inglaterra.

O apoio da Universidade de Santa Cruz do Sul através do seu programa

qualificação de professores, assim como o apoio dos meus colegas também foi

fundamental para viabilizar o meu afastamento das atividades docentes durante o

período de realização do programa de Doutorado no IE/UFRJ. Além disso, durante a

realização das pesquisas de campo no Rio Grande do Sul contei com o importante

respaldo institucional da universidade através de diferentes articulações e convênios.

Toda esta empreitada não teria sido possível sem o apoio emocional que tive de

minha família no decorrer de todo o período do doutorado. Sob os mais diversos

aspectos, sempre contei com a compreensão e o carinho de todos.

Ao meu amor maior, Marina, devo muito mais do que os dias e noites de

ausência, conselhos sábios e revisões incansáveis. Devo a ela todo o amor e carinho do

mundo e a certeza de que, parafraseando Benedetti, juntos somos muito mais do que

dois.

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Resumo

Esta tese discute o papel da proximidade territorial no processo de capacitação

produtiva e inovativa de empresas inseridas em aglomerações produtivas, no contexto

dos países em desenvolvimento. A principal hipótese utilizada é de que os processos de

aprendizado tecnológico e capacitação produtiva não podem ser explicados unicamente

a partir de fatores internos a uma firma ou setor. Tais processos emergem também das

formas de interação que são estabelecidas entre os diferentes atores e instituições que

integram os sistemas produtivos em âmbito local.

Do ponto de vista teórico e conceitual, tal análise baseia-se, em particular, no conceito

de sistema de inovação desenvolvido no escopo da abordagem neo-schumpeteriana,

bem como em elementos analíticos oriundos de contribuições da literatura em Ciência

Regional e Clusters Industriais nos países em desenvolvimento, entre outras.

Em termos de evidências empíricas, a tese está fundamentada num conjunto de estudos

que abrange a experiência de quatro aglomerações produtivas situadas no Estado do Rio

Grande do Sul: O arranjo agro-industrial fumageiro localizado na região do Vale do Rio

Pardo; os arranjos vitivinícola e moveleiro localizados na Serra Gaúcha; e o arranjo

coureiro-calçadista localizado na região do Vale dos Sinos. Com base nos estudos de

caso a tese discute as características e funcionalidade de diferentes formatos de

aglomerações produtivas a partir da noção de arranjo produtivo local. A noção de

arranjo produtivo local refere-se genericamente aos diferentes tipos de aglomerações

produtivas mencionadas na literatura e serve de base para discussão de um referencial

analítico que abarca aspectos relativos à forma de organização dos sistemas de

produção, estruturas de governança e estratégias de capacitação inovativa e produtiva

presentes nestas aglomerações.

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Abstract

The aim of this thesis is to discuss the role of territorial proximity in the productive and

innovative capability strategies of firms comprising local productive clusters in

developing countries. The main hypothesis is that technological and productive learning

processes cannot be explained entirely by sectoral or individual firm analysis. Instead,

such processes arise from the interaction relationships established between different set

of actors and institutions comprising local productive systems.

In order to explore these issues, the thesis draws together those strands of literature

concerned with the relationship between territorial proximity, learning and innovation.

Besides the literature on systems of innovation the thesis has also drawn on the

literature concerned with industrial cluster in developing countries and the main

contributions emerging from the regional science literature, among others.

The empirical material on which the thesis is based comprises four local productive

arrangements in the State of Rio Grande do Sul: the tobacco agro- industrial productive

arrangement in Rio Pardo Valley; the wine and furniture local productive arrangements

located in the Serra Gaúcha region; and the leather- footwear arrangement in the Sinos

Valley. These four empirical studies are useful to discuss some major dimensions

associated to the concept of local productive arrangement. The concept of Local

Productive Arrangement encompasses the different types of productive agglomerations

described in the literature and is used to build an alternative analytical framework that

comprises three main analytical dimensions. The first is concerned with the productive

system’s organization and territorialisation forms. The second is related to the

governance forms within the local productive arrangement. The third is concerned with

innovative strategies and interactive learning mechanisms adopted by local actors.

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Proximidade territorial, aprendizado e inovação: Um estudo sobre a dimensão local dos processos de capacitação inovativa em arranjos e sistemas produtivos no

Brasil

Sumário

INTRODUÇÃO..................................................................................................................................................................1 PARTE I: REFERENCIAL TEÓRICO...................... .......................................................................................................09 1 - A DIMENSÃO LOCAL DO APRENDIZADO E DA INOVAÇÃO..........................................................................09 1.1 -Introdução........ ...........................................................................................................................................................09 1.2 - O conhecimento e o aprendizado sob as novas condições de desenvolvimento sócio-econômico...........................14 1.3 - Da informação como conhecimento ao aprendizado pela interação: uma análise da visão neoclássica e neo-schumpeteriana sobre conhecimento e inovação.............................................................................. ..................................19 1.4 - Dimensão tácita e os limites da codificação do conhecimento .................................................................................31 1.5 - Conclusão: a dimensão localizada do aprendizado....................................................................................................35 2 – PROXIMIDADE ESPACIAL, INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE......................................................................37 2.1 – Introdução..................................................................................................................................................................37 2.2 – Convergência e diversidade: os limites da globalização produtiva e tecnológica.....................................................40 2.3 –Proximidade espacial, inovação e competitividade: principais enfoques...................................................................46 2.3.1 – As contribuições da literatura sobre clusters industriais nos países em desenvolvimento....................................51 2.3.2 - Millieu Inovativo e sistemas locais de inovação.....................................................................................................57 2.3.3 - A literatura sobre sistemas de inovação .................................................................................................................62 2.3.4 - Novos espaços industriais e sistemas locais de produção.......................................................................................68 2.4 – Conclusões.................................................................................................................................................................73 PARTE II: EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS DA EXPERIÊNCIA DE ARRANJOS PRODUTIVOS LOCAIS SELECIONADOS: ELEMENTOS PARA ELABORAÇÃO DE UM REFERENCIAL ANALÍTICO............................78 Introdução geral..................................................................................................................................................................78 Reformas estruturais e reestruturação produtiva na década de 90......................................................................................80

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3 – CARACTERIZAÇÃO DOS ARRANJOS PRODUTIVOS LOCAIS SELECIONADOS........ ..................................87 3.1 – Introdução..................................................................................................................................................................87 3.2 – Origem, consolidação e estágios de desenvolvimento...............................................................................................90 3.3 – Organização territorial e padrões de concorrência..................................................................................... ..............100 3.4 – Estrutura e organização dos sistemas de produção: atores e mercados...................................................................110 3.4.1 – Aglomerações produtivas locais voltadas ao mercado externo: o caso dos arranjos fumageiro e coureiro-calçadista...........................................................................................................................................................................110 3.4.2 – Aglomerações produtivas com foco em mercados locais e nacionais: o complexo agro-industrial vitivinícola e o pólo moveleiro na Serra Gaúcha...............................................................................................................................120 3.5 - Conclusões................................................................................................................................................................126 4 – FORMAS DE COORDENAÇÃO E DESENHOS INSTITUCIONAIS....................................................................131 4.1 – Introdução................................................................................................................................................................131 4.2 – Arranjos produtivos articulados com instâncias globais de coordenação................................................................133 4.3 – Arranjos produtivos articulados com instâncias locais de coordenação..................................................................144 4.4 - Conclusões................................................................................................................................................................152 5 – MECANISMOS DE APRENDIZADO E ESTRATÉGIAS INOVATIVAS.............................................................157 5.1 – Introdução................................................................................................................................................................157 5.2 – Características gerais do processo de capacitação produtiva e inovativa................................................................159 5.3 – Fontes de informações e formas de cooperação......................................................................................................177 5.3.1 – Arranjos produtivos articulados com instâncias globais de coordenação: a experiência dos arranjos fumageiro e coureiro-calçadista...................................................................................................................................... .177 5.3.2 – Arranjos produtivos articulados com instâncias locais de coordenação: a experiência do arranjo moveleiro e vitivinícola............................................................................................................................ ............................................192 5.4 - Conclusões................................................................................................................................................................199 CONCLUSÃO..................................................................................................................................................................205

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BIBLIOGRAFIA. ............................................................................................................................................................212 ANEXOS..........................................................................................................................................................................226

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Lista de Tabelas, Quadros, Gráficos e Figuras

Tabelas

TABELA 2.1 - Categorias de governança pública-privada e local-global ..........................57

TABELA 3.1 - Participação da Indústria e do setor Elétrico e de Comunicações no PIB – 1949-1999............................................................................................................. 83 TABELA 3.2 - Produção e Exportação mundial de fumo em folha: Principais Países - 1995 - 1999 (em toneladas) ................................................................................. 102 TABELA 3.3 - Principais Países Produtores de Calçados - 1994/96 ............................... 103 TABELA 3.4 – Móveis Principais Países Exportadores de móveis –1996/1997 (%) ...... 105 TABELA 3.5 – Produção e Consumo Mundial de Vinho ................................................ 109 TABELA 3.6 - Estrutura da indústria calçadista gaúcha, 1994......................................... 116 TABELA 3.7 - Arranjo coureiro-calçadista do Vale do Sinos – principais atores no segmento produtivo- 1991;1996 .................................................................................. 118 TABELA 3.8 - Comercialização da produção de móveis do RS, segundo a participação percentual de cada mercado .......................................................................... 124

TABELA 5.1 - Inovações de produto e processo adotadas no arranjo fumageiro ............ 162 TABELA 5.2 - Investimento em P&D e pessoal vinculado às atividades de Assistência Técnica ........................................................................................................... 164 TABELA 5.3 - Inovações de produto e processo adotadas no arranjo vitivinícola .......... 167 TABELA 5.4 - Arranjo Moveleiro: Importância associada às inovações de produto e processo de acordo com o porte da empresa - 1995-1999 ............................................. 172 TABELA 5.5 - Perfil de qualificação da mão-de-obra (%) .............................................. 174

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TABELA 5.6 - Arranjo coureiro-calçadista: Importância associada às inovações de produto e processo de acordo com o porte da empresa - 1995-1999 .......................... 175 TABELA 5.7 - Arranjo fumageiro: Principais fontes de informação para adoção de inovações ..................................................................................................................... 178 TABELA 5.8 - Arranjo coureiro-calçadista: Principais fontes de informação utilizadas pelas empresas calçadistas para promover inovações de produto ou processo, de acordo com o porte das empresas ................................................................. 184 TABELA 5.9 – Arranjo Vitivinícola: Principais fontes de informação para adoção de inovações .......................................................................................................... 193

Quadros

QUADRO 3.1 - Características da estrutura produtiva dos arranjos analisados ................. 87 QUADRO 3.2 - Origem e consolidação dos arranjos .......................................................... 92 QUADRO 3.3 - Desnacionalização das Empresas do Setor Fumageiro em Santa Cruz do Sul .......................................................................................................................... 96 QUADRO 3.4 - Empresas fumageiras: filiais fora da região do Vale do Rio Pardo – 1998.......................................................................................................................103 QUADRO 4.1 - Principais características do Sistema Integrado de Produção no arranjo fumageiro ...............................................................................................................135 QUADRO 4.2 - Principais organizações voltadas à coordenação das relações inter empresariais no arranjo fumageiro .....................................................................................136 QUADRO 4.3 – Organizações de Representação instaladas no Vale dos Sinos ...............141 QUADRO 4.4 - Principais organizações de coordenação das relações inter empresariais no arranjo vitivinícola.................................................................................. 149 QUADRO 4.5 - Estruturas de governança e desenhos institucionais nos arranjos............ 153

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QUADRO 5.1 - Arranjo fumageiro: Fontes de informação e conhecimento usadas para adoção de inovações ......................................................................................182 QUADRO 5.2 – Arranjo coureiro-calçadista: Fontes de informação e conhecimento usadas para adoção de inovações ....................................................................................... 190 QUADRO 5.3 – Arranjo vitivinícola: Fontes de informação e conhecimento usadas para adoção de inovações ................................................................................................... 195 QUADRO 5.4 - Arranjo moveleiro: Fontes de informação e conhecimento usadas para adoção de inovações .................................................................................................. 199 QUADRO 5.5 - Características associadas aos sistemas de conhecimento e estratégias inovativas nos arranjos produtivos ................................................................ 201 QUADRO 6.1 – Canais de comercialização e estratégias de capacitação: Inserção em cadeias globais x atuação em nichos próprios .............................................................. 209

Gráficos GRÁFICO 3.1 - Arranjo Moveleiro: Vantagens Relacionadas à Localização da Empresa na Região ............................................................................................................ 125 GRÁFICO 5.1 - Importância associada aos diferentes tipos de inovações adotadas pelas empresas do arranjo moveleiro - 1995-1999 ........................................................... 173 GRÁFICO 5.2 - Arranjo coureiro-calçadista: Vantagens associadas ao perfil da mão- de-obra no Vale dos Sinos ..................................................................................................176 GRÁFICO 5.3 - Empresas Calçadistas: mudanças nas relações de cooperação com os demais atores do arranjo 1995-1999 ..................................................................... 186 GRÁFICO 5.4 – Empresas calçadistas: mudanças nas relações de cooperação horizontal – 1995-1999...................................................................................................... 187 GRÁFICO 5.5 - Arranjo moveleiro: Fontes de informação para adoção de inovações

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nas grandes e médias empresas ......................................................................................... 197 GRÁFICO 5.6 - Arranjo moveleiro: Principais Fontes de Informação para adoção de inovações nas Pequenas Empresas.................................................................................198

Figuras FIGURA 3.1 - Mapa do Arranjo Fumageiro ...................................................................... 115

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INTRODUÇÃO

A percepção de que o conhecimento e a inovação representam fatores cruciais

para o sucesso competitivo e o desenvolvimento de indivíduos, firmas, regiões e países

não se constitui num fato novo na literatura. Entretanto, no decorrer das últimas

décadas, a emergência de um novo paradigma tecnológico1 aliada ao debate em torno do

fenômeno da globalização contribuíram consideravelmente para reforçar o interesse em

torno da importância que assume o processo de geração, distribuição e uso do

conhecimento no estágio atual de desenvolvimento do sistema capitalista.

Diante deste quadro, marcado por profundas mudanças técnicas e

organizacionais que surgem juntamente com o que alguns autores convencionaram

chamar de Nova Economia Baseada no Conhecimento, a inovação, seja ela tecnológica

ou organizacional, está cada vez mais associada ao tema do aprendizado2. Sem

desconsiderar os diferentes enfoques que integram a literatura sobre aprendizado, uma

das abordagens que encontra-se diretamente relacionada ao debate atual é a do

aprendizado pela interação (learning-by-interacting) (Lundvall, 1988; 1995), que

destaca a natureza interativa e cumulativa do processo de aprendizado e sua importância

crítica para o desempenho competitivo 3.

A importância do aprendizado pela interação está vinculada à visão sistêmica do

processo de inovação. Neste, a capacidade de geração, difusão e utilização de novos

conhecimentos consolida-se como um processo que transcende a esfera da firma

individual e passa a depender da contínua interação entre firmas e destas com as

1 A concepção relativa a mudança de paradigma tecno-econômico foi originalmente proposta por Chris Freeman e Carlota Perez (1988) para descrever o conjunto de transformações radicais que se processam na economia mundial a partir da década de 70. Esses autores enfatizam que as inovações institucionais constituem um fator tão importante neste processo de transformação quanto as mudanças de natureza técnico- produtivas induzidas pelo surgimento das novas tecnologias de base microeletrônica. 2 O acelerado processo de difusão das novas tecnologias de informação e comunicação e sua profunda influência sobre diferentes aspectos da organização sócio-econômica, política, cultural, etc constituem-se na base das mudanças paradigmáticas que têm sido descritas por diferentes autores como Nova Economia Baseada no Conhecimento (Lundval e Foray, 1996); Nova Sociedade da Informação (Castells, 1997); Economia do Aprendizado (Lundvall e Bórras, 1997); entre outras denominações. 3 No âmbito da teoria Econômica é possível identificar alguns enfoques que analisam diferentes aspectos sobre a questão do aprendizado tais como: learning-by-doing (Arrow, 1962); learning-by-using (Rosenberg, 1982); learning-by-interacting (Lundvall, 1992); e learning-by-searching (Boulding, 1985).

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diferentes instituições que constituem sistemas de inovação em diferentes âmbitos4. Em

particular, esse modelo interativo de inovação ressalta a relevância da cooperação entre

firmas e demais instituições e, portanto, o papel dos vínculos e redes envolvendo

diferentes organizações.

A partir da década de 80, diversas contribuições passaram a enfatizar que os

processos de aprendizado interativo evoluem a partir de bases de conhecimento e

padrões de comunicação que, muitas vezes, são moldados por configurações

institucionais cuja origem e evolução se traduzem na proximidade geográfica entre

firmas em aglomerações produtivas. Inspirados numa concepção que remonta ao

trabalho pioneiro de Marshall5, tais estudos estiveram pautados, em grande parte, pelo

desenvolvimento induzido a partir do dinamismo tecnológico de determinadas

aglomerações produtivas. Como exemplos mais clássicos deste tipo de estudo

encontram-se os Distritos Industriais na chamada Terceira Itália, o Vale do Silício na

Califórnia, ou a região de Baden-Wurttemberg na Alemanha, entre outros. Experiências

cujo sucesso logrou resgatar o papel ativo desempenhado pelo ambiente local enquanto

instância de organização da produção e locus de importantes elementos relacionados ao

aprendizado tecnológico6.

Da mesma forma, o interesse crescente em torno da dinâmica econômica e

tecnológica de sistemas produtivos operando em regiões específicas resultou na criação

de múltiplas definições e conceitos voltados à análise sobre a importância da dimensão

territorial na coordenação e organização de atividades produtivas e tecnológicas.

Distritos industriais (Brusco, 1990; Becattini, 1990; Piore e Sabel, 1984), clusters

industriais (Schmitz, 1989; 1995; Nadvi e Schmitz, 1994), millieu inovativo (Aydalot,

1986; Maillat, 1996), sistemas nacionais e regionais de inovação (Freeman, 1987;

Lundvall, 1992; Braczik et al.,1998), entre outros, são alguns dos conceitos que

4 Neste aspecto, assume uma importância crucial as relações de cooperação horizontais e verticais, entre firmas, bem como com seu universo de clientes, fornecedores e demais organizações como centros de pesquisa, escolas técnicas, atores públicos e privados, que desempenham um papel relevante no processo de capacitação de arranjos produtivos. 5 Em seus 'Princípios de Economia' (1890), Marshall foi o primeiro autor a utilizar o conceito de 'Distritos Industriais', para descrição de um padrão de organização comum à Inglaterra dos fins do século XIX, onde pequenas firmas concentradas na manufatura de produtos específicos de setores como o têxtil se localizavam geograficamente em grupamentos, em geral na periferia dos centros produtores . 6 Como um elemento comum à maior parte desses enfoques, esteve o debate em torno do crescente esgotamento dos ganhos de produtividade oriundos do modelo fordista de produção em massa e a transição para um novo paradigma tecno-econômico baseado nos avanços advindos de ramos ligados às novas tecnologias como a microeletrônica e a biotecnologia.

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procuram captar a diversidade dessas experiências empíricas. Em particular, tais

contribuições logram resgatar a importância da diversidade em termos de formatos

institucionais e padrões de organização produtiva e tecnológica que refletem a dimensão

localizada do aprendizado tecnológico, numa clara contraposição aos argumentos sobre

a crescente desterritorialização da economia contemporânea induzida pelo fenômeno da

globalização (Amin, 1993).

Esta tese visa contribuir na discussão sobre o papel da proximidade territorial no

processo de capacitação produtiva e inovativa de empresas inseridas em aglomerações

produtivas. Em particular, objetiva-se analisar as especificidades que assume a dinâmica

competitiva e inovativa em diferentes formatos de arranjos produtivos no contexto dos

países em desenvolvimento.

Num plano mais geral, a análise parte da hipótese de que os processos de

aprendizado tecnológico e capacitação produtiva não podem ser explicados unicamente

a partir de fatores internos a uma firma ou setor. Tais processos emergem também das

formas de interação que são estabelecidas entre os diferentes atores e instituições que

integram os sistemas produtivos em âmbito local. Esta percepção encontra-se

fundamentada na premissa de que o ambiente local não consiste numa mera delimitação

geográfica, mas antes constitui uma unidade própria de análise, que condiciona o

desempenho competitivo e inovativo de empresas articuladas em torno de arranjos e

sistemas produtivos.

Com relação à análise das limitações que caracterizam o ambiente industrial e

inovativo dos países em desenvolvimento, e em particular da América Latina, a análise

parte daquelas contribuições que, desde a década de 70, têm explorado a natureza

específica das trajetórias de aprendizado tecnológico nestes países. De uma maneira

geral, a experiência destes países demonstra que, aliado ao investimento reduzido nas

atividades de C&T e a importância de fontes externas na capacitação tecnológica do

setor produtivo, existem limitações igualmente importantes relacionadas à inexistência

ou ineficácia de configurações institucionais que compõem seus sistemas de inovação e

à ausência de vínculos de interação entre os principais atores que integram tais sistemas.

Entretanto, um dos principais focos de atenção da tese recai sobre o impacto do

processo de reformas estruturais sobre os arranjos que, desde a década de 90, tem

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acarretado importantes mudanças nas estratégias inovativas e competitivas em

diferentes segmentos de empresas no Brasil.

Diante desses dois eixos principais de análise, relativos à dimensão localizada do

processo inovativo e suas especificidades no contexto dos países em desenvolvimento,

esta tese discute as características e funcionalidade de diferentes formatos de

aglomerações produtivas a partir da noção de arranjo produtivo local. A noção de

arranjo produtivo local refere-se genericamente aos diferentes tipos de aglomerações

produtivas mencionadas na literatura e serve de base para discussão de um referencial

analítico que abarca aspectos relativos à forma de organização dos sistemas de

produção, estruturas de governança e estratégias de capacitação inovativa e produtiva

presentes nestas aglomerações.

Do ponto de vista teórico, a análise baseia-se no referencial evolucionista sobre

o processo de mudança tecnológica e explora o conceito de sistema de inovação

desenvolvido no escopo da abordagem neo-schumpeteriana. Neste contexto, a inovação

é colocada como um fenômeno sistêmico que tem lugar através da interação entre

diferentes atores e instituições e onde o conceito de aprendizado torna-se fundamental

para compreensão das trajetórias de capacitação inovativa das firmas (Freeman, 1987;

Lundvall, 1988 e 1992). Da mesma forma, o processo inovativo ocorre através do

compartilhamento de bases de conhecimento e padrões de aprendizado que são

sustentados por arcabouços institucionais específicos (Johnson, 1992).

Em termos de evidências empíricas, a tese está fundamentada num conjunto de

estudos que abrange a experiência de quatro aglomerações produtivas situadas no

Estado do Rio Grande do Sul: O arranjo agro-industrial fumageiro localizado na região

do Vale do Rio Pardo; os arranjos vitivinícola e moveleiro localizados na Serra Gaúcha;

e o arranjo coureiro-calçadista localizado na região do Vale dos Sinos7. Estes estudos

foram realizados entre o segundo semestre de 1997 e o segundo semestre de 1999, no

escopo da Rede de Pesquisa em Arranjos e Sistemas Produtivos e Inovativos Locais,

sediada no Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro8.

7 Os critérios que nortearam a seleção destes quatro estudos de caso são discutidos na introdução geral da segunda parte da tese e no anexo metodológico. 8 No conjunto de publicações que resultaram destes estudos destacam-se: Vargas (2001); Vargas (2000); Vargas e Alievi (2002); Vargas e Alievi (2000); Vargas, Santos e Alievi (2000); Vargas, Santos e Alievi (1999a e 1999b); Alievi e Vargas (2001).

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Assim, a análise comparativa apresentada nesta tese se insere, em parte, num

esforço coletivo de constituição de um referencial conceitual e metodológico voltado

para o estudo das especificidades que cercam o processo de capacitação em

aglomerações produtivas no Brasil e no Mercosul. Da mesma forma, a apresentação e

debate dos resultados destes estudos em diferentes fóruns, inclusive juntos aos atores

dos próprios arranjos, contribuiu sobremaneira para o desenvolvimento e

enriquecimento do referencial de análise utilizado nesta tese.

É importante assinalar algumas limitações intrínsecas ao tipo de análise proposta

nesta tese. No plano metodológico, a realização de um estudo comparativo com base na

experiência dos quatro arranjos produtivos restringe a profundidade da análise em torno

das principais características estruturais de cada um dos arranjos. No entanto, tal

limitação reflete uma escolha consciente no sentido de privilegiar alguns parâmetros de

comparação entre os diferentes arranjos, em detrimento de uma análise mais detalhada

dos mesmos.

Outra limitação refere-se ao fato de que todos os arranjos analisados operam em

setores chamados tradicionais (móveis e calçados) ou agro- industriais (fumo e vinho).

Apesar de oferecer aportes importantes para discussão sobre os mecanismos que afetam

o dinamismo competitivo e inovativo de aglomerações produtivas, o referencial

analítico desenvolvido a partir destes estudos apresenta uma limitação referente ao seu

grau de generalização.

Finalmente, um terceiro tipo de limitação reside na utilização de um referencial

analítico que se vale de uma tipologia preliminar visando identificar diferentes formatos

de aglomerações produtivas. A constituição deste referencial implicou na escolha de

alguns critérios simplificadores que, mesmo envolvendo um certo grau de

arbitrariedade, refletem certas dimensões-chave do processo de capacitação do conjunto

de aglomerações estudadas.

A tese está estruturada em torno de duas partes que totalizam seis capítulos. A

primeira parte, composta pelos dois primeiros capítulos, é de natureza teórico-conceitual

e, em linhas gerais, discute questões relativas à dimensão local do aprendizado

inovativo e às principais contribuições na literatura sobre aglomerações produtivas. A

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segunda parte, apresenta a análise dos estudos empíricos organizada em torno dos

quatro capítulos restantes, onde se inclui a conclusão do trabalho.

O primeiro capítulo discute a relação entre aprend izado e inovação tendo como

pano de fundo o arcabouço teórico neo-schumpeteriano. O debate apresentado neste

capítulo abarca dois eixos de análise. O primeiro, de cunho mais geral, destaca as

principais implicações associadas às mudanças na forma de produção e distribuição de

conhecimento que emergem juntamente com o processo de transição para um novo

paradigma tecno-econômico, no decorrer das últimas décadas. Em particular, discute-se

a crescente polarização entre as economias avançadas e os países em desenvolvimento

decorrente do hiato em termos de competências e da capacitação para inovação. O

segundo eixo de análise procura explorar a relação entre conhecimento, aprendizado e

inovação a partir de uma perspectiva que enfatiza a dimensão tácita do conhecimento e

a natureza interativa e localizada do aprendizado. Tal caracterização permite destacar a

importância da proximidade no processo de capacitação inovativa de sistemas

produtivos na medida em que se concebe o ambiente local como um conjunto de

configurações institucionais e organizacionais inseridas num rol de interações com

diferentes atores econômicos.

O segundo capítulo apresenta uma sistematização das diferentes abordagens

teóricas que, de alguma forma, incorporam a proximidade espacial como uma dimensão

analítica relevante no estudo da capacitação inovativa e competitiva de arranjos e

sistemas produtivos. O capítulo encontra-se focalizado em torno de quatro enfoques

principais que abarcam: a) a literatura sobre clusters industriais nos países em

desenvolvimento, com ênfase na discussão sobre as implicações da interação entre

instâncias globais e locais de coordenação no processo de upgrading de aglomerações

produtivas nos países em desenvolvimento; b) a abordagem sobre Milleu inovativo e,

em particular, seus desdobramentos recentes em termos de modelos sobre sistemas

locais de inovação que destacam o espaço meso econômico enquanto principal instância

para o desenvolvimento de processos de aprendizado e inovação; c) as contribuições

sobre novos espaços industriais que emergem a partir da literatura sobre ciência

regional, com ênfase na discussão sobre diferentes formas de territorialização das

atividades econômicas e na caracterização de sistemas produtivos locais; d) as

abordagens sobre sistemas de inovação associadas a teoria evolucionária neo-

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schumpeteriana, com ênfase na discussão sobre sistemas regionais de inovação que

destaca a noção de ordem coletiva baseada em formas de regulação micro institucionais

e condicionada por elementos como confiança, intercâmbio e integração coletiva. Esse

conjunto de contribuições incorpora elementos de maior interesse para as questões

teóricas e metodológicas apresentadas na tese e fornece subsídios para construção do

referencial analítico que serve de base para discussão dos estudos empíricos.

A partir do terceiro capítulo discute-se a relação entre diferentes formatos de

arranjos produtivos e sua dinâmica inovativa e competitiva, através dos resultados

obtidos nos estudos empíricos. Tal análise comparativa é desenvo lvida através de um

referencial que abarca aspectos relacionados às formas de organização de estruturas

produtivas, sua dimensão territorial, padrões de concorrência, estruturas de governança,

desenhos institucionais e mecanismos interativos de aprendizado. No terceiro capítulo,

apresenta-se uma caracterização inicial dos arranjos produtivos estudados a partir de um

conjunto de elementos associados à evolução da estrutura produtiva e desempenho

competitivo destas aglomerações até a década de 90. Da mesma fo rma, procura-se

avaliar o impacto do processo de reformas estruturais na economia brasileira no

decorrer da década de 90, sobre a trajetória recente dos arranjos estudados. Tal

caracterização visa, em particular, analisar os principais pontos de inflexão associados à

trajetória de desenvolvimento dos arranjos e destacar a forma de inserção de diferentes

segmentos de atores na estrutura produtiva dos mesmos.

O quarto capítulo discute a influência das estruturas de governança e desenhos

institucionais sobre as formas de organização da estrutura produtiva e dos sistemas de

conhecimento associados aos quatro estudos de caso. Tal análise remete, em particular,

a um debate sobre as diferentes estruturas de poder subjacentes aos diversos formatos de

arranjos produtivos e ao papel desempenhado pelos desenhos institucionais e

organizacionais, na promoção de vínculos cooperativos entre diferentes segmentos de

atores locais.

O quinto capítulo avança na sistematização de um referencial analítico para

caracterização de diferentes formatos de arranjos produtivos através da discussão sobre

os mecanismos de aprendizado tecnológico e estratégias inovativas associadas a cada

um dos estudos de caso. A natureza dos mecanismos interativos de aprendizado

encontra-se focalizada sobre o esforço de capacitação tecnológica e o padrão de

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incorporação de inovações nas firmas que integram o segmento produtivo principal da

cadeia produtiva em âmbito local. Em particular, a análise procura identificar em que

medida os processos de aprendizado nos arranjos emergem e são sustentados através de

vínculos de interação e cooperação entre atores locais e estão baseados em fontes de

conhecimento locais ou externas a estas aglomerações.

O sexto capítulo apresenta as principais conclusões relativas à análise da

dinâmica inovativa e competitiva nos diferentes formatos de arranjos e sistemas

produtivos locais estudados. Em particular, sugere-se que a importância da proximidade

territorial para o desenvolvimento de processos interativos de aprendizado tende a variar

de acordo com especificidades associadas a fatores tais como: estruturas de governança,

desenhos institucionais, canais de comercialização de diversos tipos de arranjos

produtivos, entre outros. Neste aspecto, este capítulo final analisa o impacto dessas

dimensões-chave sobre os mecanismos de aprendizado e as estratégias inovativas em

diferentes arranjos produtivos, bem como os possíveis desdobramentos desta análise em

termos da proposição de políticas industriais e de competitividade voltadas para

capacitação inovativa e produtiva de empresas articuladas em arranjos e sistemas

produtivos locais.

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100

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

1. - A DIMENSÃO LOCAL DO APRENDIZADO E DA INOVAÇÃO

1.1 - Introdução.

Uma das características mais marcantes das últimas décadas tem sido o ritmo

acelerado de mudança tecnológica motivado, em grande parte, pela intensificação da

competição nos mais diversos mercados em âmbito mundial. Diante da crescente

complexidade associada atualmente ao processo de geração, difusão e uso de novos

conhecimentos e da própria incerteza decorrente da globalização, a capacidade de

manter processos de aprendizado tornou-se um fator crucial para sobrevivência

competitiva de empresas e regiões. Entretanto, no âmbito da teoria econômica, ainda

que o conhecimento e a competência humana sejam reconhecidos como elementos

centrais no processo de desenvolvimento, verifica-se ainda uma dificuldade intrínseca

da maior parte dos enfoques teórico-conceituais em lidar com o conhecimento e o

aprendizado enquanto variáveis endógenas em seus modelos analíticos.

Este capítulo apresenta uma análise crítica em relação à percepção sobre

conhecimento e inovação característica da abordagem ortodoxa neoclássica e os

principais elementos relativos à abordagem evolucionária e neo-schumpeteriana. Tal

contraposição serve como pano de fundo para discutir o papel do conhecimento e do

aprendizado no atual contexto do desenvolvimento, e destacar a importância crescente

que assume a dimensão localizada do processo de aprendizado e da inovação enquanto

fonte de vantagem competitiva de firmas, regiões e países.

A discussão apresentada no capítulo articula-se em torno de duas linhas

principais de análise. Na primeira, de cunho mais geral, consideram-se as principais

implicações das mudanças na forma de produção e distribuição de novos conhecimentos

que vêm sendo associadas ao advento de um novo paradigma tecno-econômico. Este

novo modelo, rotulado por alguns autores de “Economia do Conhecimento e do

Aprendizado”, guarda uma relação direta com o uso crescente das tecnologias de

informação e comunicação (TIC) e abarca também um intenso debate tendo em vista

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101

sua relação com o fenômeno da globalização9. A segunda linha de análise busca

explorar a relação entre conhecimento, aprendizado e inovação a partir de uma

perspectiva que contempla a dimensão tácita e codificada do conhecimento, e o caráter

interativo e localizado que assumem os processos de aprendizado voltados para

inovação. A partir desta caracterização, discute-se o papel e a importância da

proximidade territorial na promoção de processos de aprendizado interativo.

Na medida em que este capítulo explora a dimensão tácita e localizada do

conhecimento e do aprendizado interativo no processo de inovação, é importante

destacar dois conjuntos de contribuições que, no decorrer das décadas de 70 e 80,

desempenharam um papel fundamental na discussão sobre a natureza específica e

limitada do processo de aprendizado tecnológico nos países em desenvolvimento.

Uma das primeiras contribuições sistemáticas sobre a natureza limitada do

processo de capacitação tecnológica nos países em desenvolvimento surgiu ainda na

década de 70, através da literatura ligada à escola da dependência. Dentre as principais

contribuições associadas a este enfoque destacam-se, os trabalhos de Cooper e

Sercovitch (1971), Vaitsos (1974) e Cardoso (1977), entre outros10. De um ponto de

vista histórico, a escola da dependência consistiu numa importante reação aos enfoques

teóricos que preconizavam que a industrialização de países periféricos consistiria num

processo gradual, ocorrendo em etapas sucessivas até atingir patamares semelhantes ao

dos países industrializados.

Esse enfoque do ‘desenvolvimento por estágios’ ganhou força no período do

pós-guerra e baseava-se, em parte, no papel modernizador do investimento externo.

Neste aspecto, o principal questionamento da escola da dependência - relativo à

especificidade do padrão de desenvolvimento em países periféricos - permaneceu válido

e influenciou significativamente o esforço de pesquisa sobre mudança tecnológica nos

países em desenvolvimento11. Uma das principais constatações da literatura sobre

9 Existe um relativo consenso de que a conjugação de dois fenômenos – o crescente movimento de liberalização e desregulação dos mercados e o advento deste novo paradigma pautado pelas tecnologias de informação e comunicação – é considerada como um elemento catalisador do processo de globalização nas últimas décadas. (Lastres, Cassiolato, Lemos, Maldonado e Vargas, 1999: 43) 10 Para uma revisão da literatura da dependência em comparação com a literatura sobre aprendizado endógeno incremental ver especialmente Erber (1983) e Viotti (1997). 11 Também é importante destacar a influência das idéias desenvolvidas por teóricos da CEPAL em defesa do processo de industrialização específico da América Latina e que representaram um dos principais pontos de interlocução para a escola da dependência (Erber, 1983).

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dependência aponta para a heterogeneidade considerável da estrutura industrial e, em

particular, para o tamanho e papel limitado desempenhado pelos setores fornecedores de

tecnologia e bens de capital nos países periféricos (Erber, 1983).

Um segundo conjunto de contribuições remete à literatura sobre aprendizado

endógeno incremental, que surge no final década de 70, e que esteve particularmente

representada através de dois grupos. Um deles consiste numa série de estudos sobre

mudança tecnológica em empresas nos países em desenvolvimento onde se destacam os

trabalhos de Katz (1978), Maxwell (1977) e Dahlman e Fonseca (1978). O segundo

conjunto de estudos, que avalia a capacitação tecnológica dos países em

desenvolvimento através das exportações de bens de capital e serviços tecnológicos,

esteve representado pelos trabalhos de Katz e Ablin (1979) e Lall (1980).

Dentre as principais características da literatura sobre aprendizado endógeno

incremental destaca-se, em primeiro lugar, uma visão da mudança tecnológica como um

processo contínuo (em oposição à ênfase na descontinuidade e ruptura característica da

visão schumpeteriana de destruição criadora). Em segundo lugar, os estudos também

apontaram para evidências importantes relativas ao domínio de tecnologias de

manufatura por parte dos países em desenvolvimento, bem como para sua capacidade de

introdução de melhorias em produtos e processos importados através de esforços de

aprendizado incremental. Finalmente, tais processos de aprendizado estariam refletindo

o sucesso destes países na exportação de tecnologia, em particular com relação ao

conhecimento tecnológico incorporado em produtos e processos complexos (Erber,

1983: 9).

Sob vários aspectos, a literatura sobre aprendizado incremental endógeno

representou uma contribuição significativa para compreensão do processo de mudança

tecnológica nos países em desenvolvimento e apontou para existência de importantes

formas de adaptação local de técnicas importadas nestes países. Entretanto, a análise a

partir deste enfoque reflete uma visão parcial sobre o processo de mudança tecnológica

nos países em desenvolvimento.

Em primeiro lugar, de acordo com este enfoque, as trajetórias de aprendizado

tecnológico apresentam uma natureza similar tanto nos países industrializados como nos

países em desenvolvimento. Em segundo lugar, tais trajetórias sofreriam reduzida

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103

influência decorrente de mudanças radicais em paradigmas tecnológicos (Dosi, 1988).

Diante desta percepção, a mudança tecnológica nos países em desenvolvimento acaba

por se reduzir a um processo contínuo de aprendizado ao longo de um paradigma

determinado. Dessa forma, a principal diferença entre o processo de mudança

tecnológica nos países desenvolvidos e em desenvolvimento estaria reduzida a

idiossincrasias em termos de trajetórias de aprendizado tecnológico de uma mesma

natureza que apenas seriam diferenciadas em função dos estímulos característicos do

ambiente de cada país (Viotti, 1997: 53).

De acordo com Erber (1983: 10), as limitações presentes na literatura sobre

aprendizado endógeno incremental decorrem, em grande parte, da sua vinculação com a

abordagem neoclássica. Neste aspecto, Clark (1985) lembra que o ponto de partida para

a literatura sobre aprendizado incremental endógeno reside no conceito de learning-by-

doing formalizado por Arrow.

Apesar da ênfase na natureza incremental do processo de capacitação

tecnológica dos países menos desenvolvidos ser, em parte, consistente com a visão

presente na escola da dependência, ela enfatiza que países periféricos apresentam

condições limitadas para promover processos de desenvolvimento tecnológico

espontâneos. Neste aspecto, por um lado, as evidências oriundas da literatura sobre

aprendizado incremental demonstram que a abordagem da dependência tende a

subestimar a crescente inserção de países em desenvolvimento em novos nichos de

mercado, abertos pela expansão do comércio mundial, mesmo tendo em vista seu grau

limitado de capacitação tecnológica. Por outro lado, a visão otimista da literatura sobre

aprendizado incremental em relação à evolução dos países em desenvolvimento na

divisão internacional do trabalho repousa, de acordo com Erber (1983), em duas

premissas errôneas. A primeira estaria baseada na suposição de que o investimento e o

comércio mundial tendem a apresentar um crescimento estável de modo a permitir a

crescente inserção de países menos desenvolvidos em novos nichos para exportação de

tecnologias de produto e processo. A segunda e principal crítica refere-se à limitação da

literatura sobre aprendizado incremental no sentido de compreender o impacto do

processo de transição em direção a um novo paradigma tecno-produtivo, que vem se

delineando nas últimas décadas, sobre o processo de capacitação tecnológica dos países

em desenvolvimento.

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O desenvolvimento subsequente de estudos centrados nas especificidades

inerentes ao processo de aprendizado tecnológico nos países em desenvolvimento

logrou ampliar consideravelmente a compreensão sobre as limitações que cercam o

processo de mudança tecnológica nestes países. Destacam-se, em particular,

contribuições mais recentes voltadas para análise das implicações da abordagem sobre

sistemas de inovação no âmbito dos países em desenvolvimento12. Partindo, em alguns

casos, de estudos comparativos sobre sistemas de inovação em diferentes países, tais

contribuições logram demonstrar que a literatura sobre sistemas de inovação

desconsidera importantes problemas relacionados à instabilidade e vulnerabilidade do

ambiente macroeconômico, institucional, político e financeiro dos países em

desenvolvimento (Cassiolato e Lastres, 1998: 33). Da mesma forma, essas contribuições

enfatizam a importância relativa ao papel de políticas ativas de aprendizado tecnológico,

tanto em âmbito nacional como no âmbito das empresas (Bell e Cassiolato, 1993).

Verifica-se, portanto, uma convergência entre essas contribuições mais recentes e as

análise que, desde a década de 70, têm enfatizado a importância do ambiente

macroeconômico e institucional no sentido de moldar o processo de mudança

tecnológica nos países em desenvolvimento.

Essa discussão será retomada na segunda parte da tese que discute a trajetória

recente de desenvolvimento dos arranjos estudados à luz do impacto das reformas

estruturais que tem lugar no Brasil no decorrer da década de 90. O foco sobre o

processo de reformas estruturais, liberalização e abertura comercial no Brasil justifica-

se pelo grande impacto que essas mudanças ocasionaram nas trajetórias recentes de

desenvolvimento da estrutura industrial brasileira.

Da mesma forma, na medida em que o conhecimento é colocado como principal

insumo e o aprendizado como principal processo no contexto atual de reestruturação

tecno-econômica, o reconhecimento de tais particularidades é fundamental para

compreensão dos processos de aprendizado inovativo que têm lugar no conjunto de

aglomerações produtivas analisadas na segunda parte da tese.

O capítulo encontra-se dividido em quatro seções além desta introdução. A

próxima seção aborda as transformações associadas à chamada Economia do

12 Dentre as principais contribuições destacam-se Cassiolato (1992); Villaschi (1992); Bell e Cassiolato. (1993); Albuquerque (1998) e Viotti (1997).

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Conhecimento e do Aprendizado e suas implicações sobre as novas condições de

desenvolvimento sócio-econômico. Em particular, esta segunda seção aponta para o

risco de polarização que se origina no hiato relacionado às condições de geração e

apropriação de conhecimentos entre diferentes países e regiões. A terceira seção traz

uma análise crítica sobre a noção de inovação e conhecimento característica da

abordagem neoclássica tradicional e procura contrapor a visão ortodoxa com os

principais elementos presentes na abordagem evolucionária e neo-schumpeteriana. A

quarta seção apresenta uma análise sobre a relação entre conhecimento tácito e

codificado e os limites associados ao processo de codificação do conhecimento. As

conclusões do capítulo, na quinta seção, destacam a importância crescente do

conhecimento tácito como um dos principais elementos que explicam a dimensão

localizada do aprendizado frente ao processo de globalização.

1.2 - O conhecimento e o aprendizado sob as novas condições de

desenvolvimento sócio-econômico

A ênfase sobre a importância do aprendizado associada ao debate atual sobre o

novo paradigma tecno-econômico justifica-se a partir de duas perspectivas distintas

(Foray e Lundvall, 1996; Lundvall, 1996). Por um lado, na medida em que a

competência humana encontra-se no centro do processo de desenvolvimento de

qualquer sociedade, a constituição de uma visão que focaliza o aprendizado e o

conhecimento em qualquer processo histórico de formação sócio-econômico constitui-

se num elemento analítico relevante. Por outro lado, partindo-se de uma perspectiva

histórica específica que remete às condições atuais de desenvolvimento, na qual a

economia encontra-se profundamente enraizada na produção, distribuição e uso de

conhecimentos, justifica-se a ênfase no surgimento de uma nova era caracterizada como

Economia do Conhecimento e do Aprendizado.

A ‘Economia do Conhecimento’ caracteriza-se por três elementos principais

(Carter, 1994)

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• a crescente importância de transações econômicas focalizadas no

conhecimento;

• a acelerada mudança qualitativa em produtos e serviços;

• a própria incorporação da criação e implementação de mudanças como um

objetivo dos agentes econômicos.

Estes e outros elementos que caracterizam a economia do conhecimento - tais

como a nova dinâmica de formação de conhecimentos tácitos e codificados; a crescente

importância das redes de conhecimento; e o ritmo acelerado dos processos de

aprendizado – tem sua origem associada ao uso crescente das tecnologias de informação

e comunicação (Freeman e Soete, 1993).

Entretanto, ao mesmo tempo em que as tecnologias de informação e

comunicação (TIC) representam, no longo prazo, uma nova base para ganhos potenciais

de produtividade no processo de geração, distribuição e uso do conhecimento, existe um

relativo consenso de que suas implicações imediatas ainda refletem limitações de ordem

institucional. Esta questão é enfatizada por Foray e Lundvall (1996:14) que distinguem

o impacto das tecnologias de informação e comunicação sobre o desenvolvimento da

economia do conhecimento tendo em vista suas implicações a médio e longo prazos. No

que se refere aos seus efeitos de longo prazo, o uso crescente das novas TIC tende a

contribuir direta e indiretamente nos processo de aquisição de conhecimento através de

três formas principais: i) no desenvolvimento de instrumentos e ferramentas para

pesquisa básica e P&D (tais como protótipos e técnicas de simulação); ii) na crescente

capacidade de geração de alternativas tecnológicas e; iii) no amplo impacto das redes

eletrônicas enquanto ferramentas de pesquisa.

Porém, dentre os impactos mais imediatos associados ao uso das novas TIC, a

existência de atritos decorrentes do descompasso entre as mudanças técnicas e a ordem

institucional vigente constitui-se, sem dúvida, numa das principais limitações ao pleno

desenvolvimento e consolidação do novo paradigma tecno-econômico das tecnologias

da informação.

O uso da infra-estrutura técnica viabilizada a partir das TIC demanda, tanto de

indivíduos como de organizações, novos hábitos e formas de organização que nem

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107

sempre se desenvolvem no mesmo ritmo das mudanças técnicas13. Dessa forma, as

transformações que vêm sendo engendradas a partir das novas tecnologias da

informação e comunicação não podem ser explicadas unicamente através de seus

recursos físicos ou palpáveis (como equipamentos). Tais transformações envolvem uma

dimensão incorpórea que é moldada, em grande parte, pelas necessidades dos agentes

no manuseio dessas informações (Aksoy, 1990). Neste aspecto, existe uma percepção de

que as limitações de ordem institucional associadas à difusão das novas tecnologias de

informação e comunicação são importantes e devem ser contornadas através de uma

intensificação dos processos de aprendizado em todos os níveis da sociedade mediante o

envolvimento de empresas, dos sistemas educacional e tecnológico e demais instituições

formais tais como mecanismos de proteção à propriedade intelectual.

A importância crucial do aprendizado, não somente na busca de acesso a

informação, mas principalmente na construção de novas competências e qualificações

se traduz na própria conceitualização da ‘Economia do Conhecimento’ sob o sinônimo

de ‘Economia do Aprendizado’. Mais do que uma mera questão semântica, o uso deste

rótulo como um conceito chave na definição do novo paradigma se justifica pela sua

ênfase no ritmo acelerado de mudança em variáveis econômicas, sociais e tecnológicas

associadas a aquisição de conhecimentos especializados (e codificados). Em outras

palavras, a noção de ‘Economia do Aprendizado” logra deixar claro que o que

realmente importa para o desempenho competitivo é a habilidade para o aprendizado (e

para o esquecimento) dos agentes econômicos e não o estoque de conhecimentos

(Ludvall, 1995: 29-30).

Entretanto, na medida em que as transformações técnicas e institucionais

engendradas a partir da economia do conhecimento e do aprendizado são discutidas a

luz do processo de globalização, percebe-se um outro tipo de impacto ligado a crescente

polarização entre indivíduos, setores, regiões e países no tocante ao desenvolvimento de

processos de aprendizado e no acesso ao conhecimento. Ainda que esta polarização seja,

em parte, apontada como uma decorrência transitória do processo de consolidação deste

novo paradigma, alguns autores consideram que ela reflete características estruturais do

13 Conforme destacado na introdução, essa noção de descompasso entre o ritmo de mudanças técnicas e a ordem institucional remete à discussão sobre o processo de transição associado à revoluções tecnológicas proposta por Carlota Perez e Chris Freeman (Freeman e Perez, 1988).

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novo modelo de desenvolvimento centrado no papel da inovação e do aprendizado

(Castells, 1999, Vol.1: 66; 1997; Chesnais, 1992: 291)

Assim, se nas economias industrializadas o hiato em termos da capacidade de

construção de competências e qualificações constitui-se, atualmente, num dos principais

fatores de polarização social e regional, no âmbito dos países em desenvolvimento os

efeitos nefastos de tal polarização se mostram ainda mais evidentes.

A noção de “sociedade do aprendizado” associada ao conceito de economia do

conhecimento reflete um padrão de desenvolvimento industrial e tecnológico presente

em algumas partes do mundo que, todavia, passa a ser extrapolado como uma realidade

global. Porém, ainda que a maior parte das economias periféricas (em particular no caso

dos países latino americanos) não apresente sinais de convergência em direção aos

padrões da sociedade do aprendizado, tais economias são profundamente afetadas pelas

tendências impostas por esta nova ordem global.

Alguns autores têm enfatizado que este novo hiato entre os países em

desenvolvimento e as economias industria is avançadas se reflete, em particular, no

acesso à infra-estrutura física das novas tecnologias de informação e comunicação,

configurando um tipo de exclusão digital (digital divide). Entretanto, a noção de

exclusão digital apresenta um alcance limitado no sentido de traduzir a real dimensão do

hiato que vem sendo estabelecido entre países desenvolvidos e em desenvolvimento,

como resultado do uso crescente das novas tecnologias de informação e conhecimento.

Em particular, a noção de exclusão digital se preocupa apenas em quantificar o hiato em

termos das diferenças na infra-estrutura física desconsiderando, portanto, problemas

estruturais nos países em desenvolvimento que implicam em limitações para a criação

de condições de uso para as novas tecnologias.

Tendo em vista essas limitações, outros autores afirmam que o hiato estabelecido

entre países ou regiões que apresentam condições para uma inserção dinâmica na

economia do conhecimento e aqueles que se encontram fora deste novo padrão reflete

implicações ainda mais sérias que se traduzem numa exclusão em termos de capacidade

de aprendizado (learning divide). Assim, os fatores que condicionam a assimetria e

polarização entre regiões desenvolvidas e não desenvolvidas (ou mesmo entre

indivíduos e grupos sociais nos países) apresentaram variações ao longo da história.

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Diante do contexto atual caracterizado por uma economia globalizada, baseada no

conhecimento e voltada para a inovação, é o aprendizado, sem dúvida, que assume o

papel de principal fator de assimetria ou exclusão14.

A permanência deste processo de exclusão do aprendizado (learning divide)

resulta, por sua vez, no aumento do ‘hiato inovativo’ presente nos países periféricos e

que se reflete na incapacidade de alguns países ampliarem seu nível de capacitação

frente aos demais, tendo em vista suas deficiências no desenvolvimento de processos de

aprendizado formais e informais. Da mesma forma, é importante ressaltar a distinção

entre o conceito de hiato inovativo e o de hiato tecnológico. Ambos apresentam uma

natureza diferenciada na medida em que o hiato tecnológico tende a refletir diferenças

no acesso a tecnologia enquanto que o hiato inovativo reflete diferenças em termos de

capacitações e aprendizado, que consistem em limitações mais difíceis de serem

superadas. Em particular, a constituição de capacitações relevantes em termos de

aprendizado envolve o mapeamento e a identificação de lacunas das bases de

conhecimento disponíveis; a organização de processos de busca para aquisição de

conhecimento; a integração de novas parcelas de conhecimento nas bases existentes;

bem como a aplicação destas bases de conhecimento nas práticas correntes.

Entretanto, a criação de condições adequadas ao pleno desenvolvimento de

processos de aprendizado constitui uma pré-condição básica para superação de ‘hiatos

inovativos’ e para própria dinâmica de crescimento econômico. Neste aspecto, a criação

e manutenção dos chamados espaços de aprendizado interativo representa uma condição

essencial para superação deste processo de exclusão. Estes espaços podem estar

representados por diferentes tipos de organizações formais (tais como universidade,

centros de pesquisa, departamentos de empresas, etc.) ou através de redes de pesquisa

formadas com objetivos específicos. Assim, tais espaços representam oportunidades

para resolução de problemas que envolvem a geração de conhecimentos em diferentes

estágios que vão desde a pesquisa básica até o desenvolvimento experimental de novos

produtos e processos (Sutz e Arocena, 2000: 7).

As especificidades que marcam o ambiente de aprendizado e de inovação nos

países em desenvolvimento também são discutidas por Cassiolato e Lastres (2000: 35)

14 “The divide is indeed centred around learning, because what is paramount to be and to stay in the "good side" is to master uncertainty and destabilisation with creativity plus ability to make the most of

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110

que enfatizam, em particular, a limitação da maior parte dos enfoques conceituais sobre

sistemas nacionais de inovação em lidar com a instabilidade institucional e

macroeconômica característica destes países:

The environment of developing countries, however, has always

been characterized by macroeconomic instability. Despite of that,

important differences in national economic performance are expected to

remain, particularly between richer and poorer countries. At least two

structural differences, identifiable at national level are important for

variances in NSI. One is institutional and the other technological. Both

interrelated, suffer strong influences from macroeconomic instability and

are partially responsible for the greater diversity that is found in NSI in

developing countries (Cassiolato e Lastres, 2000: 35)

Em síntese, as transformações associadas ao surgimento e difusão do novo

paradigma tecno-econômico, fundado na crescente complexidade e importância que

assume a relação entre conhecimento, aprendizado e inovação, têm suscitado

implicações de diferentes ordens. Em primeiro lugar, aliado ao descompasso entre o

ritmo de mudanças técnicas e a ordem institucional que decorre do uso intensivo das

novas tecnologias da informação e comunicação, percebe-se que o novo contexto que

marca a produção e difusão de conhecimentos tem levado a uma polarização crescente

entre países e regiões. Em segundo lugar, diante da intensificação do processo de

globalização no decorrer da década de 80 - que apresenta uma relação direta com a

difusão do novo padrão de desenvolvimento baseado no uso das TIC - percebe-se, com

preocupação, que tal polarização não se reflete somente nos padrões de renda,

produtividade e emprego, mas tem abarcado principalmente um hiato em termos de

capacitações para o aprendizado e para inovação. Em terceiro lugar, cabe enfatizar as

limitações enfrentadas pela maior parte das abordagens teórico-conceituais no sentido

de adaptar seus modelos a essa nova realidade que coloca a relação entre conhecimento,

aprendizado e inovação no centro da análise sobre o processo de desenvolvimento

sócio-econômico.

knowledge, including the ability to search for new knowledge. (Arocena e Sutz, 2000: 12).

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111

1.3 - Da informação como conhecimento ao aprendizado pela interação: uma

análise da visão neoclássica e neo-schumpeteriana sobre conhecimento e inovação

A percepção de que o conhecimento representa um fator crucial no

desenvolvimento econômico não se constitui num fato novo. Mesmo quando remete-se

essa discussão aos primórdios da teoria econômica é possível apontar o interesse de

autores como Adam Smith e Karl Marx no papel desempenhado pelo conhecimento, sob

a forma de progresso técnico, na organização das atividades produtivas15. Entretanto,

percebe-se igualmente que tal interesse esteve historicamente acompanhado de uma

dificuldade intrínseca dos modelos econômicos em analisar o processo de acumulação e

geração de novos conhecimentos enquanto um componente endógeno do processo de

desenvolvimento. Neste aspecto, ainda que a incorporação do conceito de conhecimento

na teoria econômica, bem como sua relação com diferentes formas de aprendizado

represente um tema complexo, também constitui-se num ponto essencial para

compreensão da dinâmica competitiva e do próprio processo de mudança qualitativa do

sistema econômico (Dosi, 1996).

Do ponto de vista epistemológico, a discussão em torno do conceito de

aprendizado vincula-se à compreensão sobre a origem e evolução dos hábitos cognitivos

e estruturas de compreensão nos indivíduos. Em outras palavras, envolve uma tentativa

de desvendar os mecanismos de funcionamento da mente humana com relação ao

processo pelo qual indivíduos formam suas opiniões e utilizam seus conhecimentos

como base para suas ações e tomada de decisão (Hodgson, 1997: 663).

No campo da Ciência Econômica, de um modo geral, a busca de explicações

sobre a forma pela qual indivíduos e firmas acumulam e modificam suas bases de

conhecimento com vistas a atuar em mercados e organizações deu origem a diferentes

abordagens teóricas fundamentadas em perspectivas distintas sobre a natureza do

conhecimento. Por um lado, a abordagem neoclássica demonstra uma visão empiricista

que limita a noção de aprendizado ao acúmulo de informações através da observação e

15 O reconhecimento sobre a importância da informação e do conhecimento na economia ocupou efetivamente a atenção de diversos autores como Friedrick List, Joseph Schumpeter, entre tantos outros. Entretanto, o resgate deste conjunto de contribuições encontra-se fora do escopo de análise desta tese. Uma revisão sobre tais contribuições pode ser encontrada em Foray e Lundvall (1996); Dosi (1996); e Albuquerque (1998).

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112

da experiência (Hodgson,1998). Por outro, no decorrer das últimas décadas, as

transformações radicais nas relações sócio-econômicas, engendradas pelas novas

tecnologias da informação e comunicação, contribuíram para o surgimento de novos

enfoques - baseados no referencial teórico evolucionário e neo-schumpeteriano - que

destacam a importância do conhecimento enquanto principal insumo do atual padrão de

desenvolvimento sócio-econômico e apontam a natureza social e interativa do processo

de aprendizado (Lundvall, 1995; Dosi 1996: 84).

De acordo com este enfoque não ortodoxo, o processo de aprendizado reflete o

uso de informações e a geração e difusão de conhecimentos (tácitos ou codificados),

constituindo-se numa atividade coletiva que integra a experiência de indivíduos e

organizações. Seu desenvolvimento efetivo encontra-se, portanto, vinculado à natureza

das interações entre diferentes atores sociais e ao estabelecimento de canais eficientes

de comunicação que, por sua vez, refletem as condições do ambiente social, cultural e

institucional (Amin e Wilkinson, 1999: 121).

Em linhas gerais, a concepção sobre conhecimento tecnológico presente no

escopo da abordagem neoclássica tradicional reflete integralmente as limitações

inerentes a um conjunto de pressupostos teóricos que se traduzem na existência de

agentes operando com informação perfeita, racionalidade maximizadora e em condições

de equilíbrio pleno. O principal foco de análise recai sobre o conhecimento incorporado

à função de produção na forma de equipamentos ou técnicas, onde as eventuais

mudanças no estoque de conhecimento são traduzidas na alteração de parâmetros

exógenos ao modelo. A questão da produção se resume a um problema de escolha de

técnicas, onde é assumido que as firmas têm competência para operar qualquer tipo de

tecnologia. A tecnologia, neste contexto, é encarada como um tipo de conhecimento ao

qual todas as firmas têm acesso imediato a um custo nulo (Dosi, 1988; Dosi e Egidi,

1991; Possas, 1988)

Tais limitações presentes no tratamento neoclássico para o processo de

transformação do conhecimento e sua relação com a inovação decorrem da própria

definição do modelo conceitual neoclássico marcado desde o início pela metáfora

mecanicista absorvida a partir dos princípios da física clássica. Não obstante as

transformações mais recentes no próprio referencial teórico da física, que passa a

incorporar linhas de pensamento semelhantes as do aparato conceitual evolucionário em

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113

biologia, a teoria neoclássica logrou manter o referencial herdado da metáfora

mecanicista, mesmo tendo em conta as limitações relacionadas à incorporação de

elementos mais realísticos da vida econômica (Hodgson, 1998).

Diante de um contexto de análise permeado pelas premissas de racionalidade,

equilíbrio e agentes representativos, a análise neoclássica tradicional passa a assumir

que os agentes mantêm sua estrutura de preferências e regras de comportamento ao

longo do tempo. Na medida em que a garantia de um estado de equilíbrio elimina

qualquer necessidade ou incentivo para o aprendizado, a adoção de novas regras de

comportamento e qualificações fica restrita a simples processos de adaptação baseados

no resultado de ações passadas e a forma mais próxima de aprendizado se resume a um

processo de aquisição de informações.

A distinção entre informação e conhecimento representa um ponto essencial que

marca a oposição entre a perspectiva neoclássica tradicional e a abordagem neo-

schumpeteriana. Por um lado, a informação pode estar intimamente relacionada com

eventos empíricos, porém a informação como tal é constituída apenas através da

observação humana e da interpretação através de esquemas cognitivos. Dessa forma, a

criação de informação enquanto sinais depende fundamentalmente do conhecimento já

existente tendo em vista que este conhecimento pré-existente funciona como um

esquema cognitivo que viabiliza a compreensão e utilização dessa informação. Na

medida em que a informação é criada, entendida e utilizada passa a ser agregada à base

de conhecimento existente no decorrer de um processo complexo que pode depender de

uma prática contínua (Hodgson, 1996: 665). O conhecimento, por outro lado, constitui-

se numa forma de representação da informação que é mais agregada, mais estável (no

sentido institucional) e dependente de contextos específicos. O processo de aprendizado,

por sua vez, envolve o manuseio e processamento de informações e sua agregação na

forma de conhecimento.

A ênfase do arcabouço teórico-conceitual neoclássico na existência de processos

de otimização condicionados por estruturas estáveis de preferência contribuiu para o

desenvolvimento de uma perspectiva na qual a noção de aprendizado vincula-se à mera

aquisição e acumulação de informação16. Na abordagem neo-schumpeteriana, ao

16 Em sua crítica a visão neoclássica sobre aprendizado Hodgson coloca que: “Learning is thus treated as the mere acquisition and accumulation of information, as if it were a transferable substance 'out there'. On

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contrário, o fenômeno do aprendizado envolve um processo permanente de reconstrução

do conhecimento e uma mudança constante nas relações que se estabelecem entre o

agente e o ambiente externo. Dessa forma, a abordagem neo-schumpeteriana destaca a

importância que assumem os esforços explícitos para geração de novos conhecimentos e

sua posterior difusão no sistema produtivo (Hodgson, 1996).

Em particular, a premissa sobre otimização presente no enfoque ortodoxo torna-

se extremamente problemática num contexto onde o processo de inovação encontra-se

permeado pela incerteza com relação ao futuro. Este tipo de incerteza, de natureza

substantiva, inviabiliza qualquer tipo de previsão por parte da firma, seja com relação ao

potencial de mercado ou mesmo quanto as características técnicas da inovação17. Neste

aspecto, Kwásnicki (1996) enfatiza que a premissa neoclássica de que os agentes

econômicos fazem escolhas ótimas demanda uma representação teórica particular sobre

a situação cognitiva destes agentes. Na maior parte dos casos, o indivíduo ou agente

econômico caracteriza-se por ter não somente informação completa sobre todas as

alternativas possíveis relacionadas aos estados do mundo, como também uma boa

compreensão sobre as conseqüências.

Da mesma forma, a premissa de racionalidade que reside no cerne da análise

econômica ortodoxa ainda desafia a compreensão sobre a real dimensão do

conhecimento e do aprendizado no funcionamento do sistema econômico. A premissa

de racionalidade "ilimitada" para todos os agentes econômicos presente na teoria

neoclássica assume que tanto as formas de conhecimento codificadas como tácitas são

perfeitamente dominadas por todos os indivíduos no sistema econômico. Neste aspecto,

mesmo os modelos neoclássicos mais elaborados como o das expectativas racionais

(Lucas, 1972; 1986) acabam, ainda que inadvertidamente, por comprometer o postulado

da racionalidade na medida em que suscitam questões sobre a natureza do processo de

aprendizado no sistema econômico. Nesta teoria, os agentes econômicos apreendem o

"modelo de funcionamento do mundo" através da observação e acúmulo de

informações, ou seja, a informação é descoberta e acumulada ao invés de ser gerada

the contrary, learning involves the continuous reconstruction and reformation of knowledge, involving a changing relationship between the agent and the external environment. It involves cognitive framing and selection of information. It is a process of problem-formulation and problem-solving, rather than the acquisition and accumulation of given, objective 'bits' of information." (Hodgson, 1998:676) 17 Esse tipo de incerteza no sentido proposto por Frank Knight é imprevisível e, portanto, não pode ser contornada através de escolhas racionais. Sobre este tema ver Knight, F. (1933), Risk, Uncertainty and Profit, 2nd edn, London, London School of Economics.

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cognitivamente ou reformulada. Entretanto, conforme é colocado por Hodgson (1996:

4): “How can agents be said to be rational at a given point in time when they are in the

process of learning and acquiring relevant information? The very act of learning means

that not all information is possessed and global rationality is ruled out”

A permanência dessas premissas irrealistas no “núcleo duro” da abordagem

neoclássica se reflete diretamente na falta de relevância de seus modelos. Esse tipo de

limitação foi ilustrado em particular pelo exemplo do chamado resíduo de Solow

(1957)18. Somente a partir desta constatação acerca das limitações associadas aos

modelos de crescimento que a questão do aprendizado e da inovação começou a ser

considerada como uma questão relevante no escopo da abordagem neoclássica. Neste

aspecto, o conceito de "learning-by-doing", proposto por Arrow (1962) representa uma

das contribuições mais importantes no escopo da abordagem neoclássica sobre a relação

entre aprendizado e inovação, justamente pelo fato de reconhecer a natureza cumulativa

e interativa que assume o processo de aprendizado. Originalmente, o conceito de

learning-by-doing remete ao surgimento de diversos estudos empíricos sobre

crescimento econômico, que buscavam demonstrar que o aumento na produção per

capita não poderia ser atribuído somente ao crescimento da relação capital-trabalho.

Tendo em vista essa percepção, autores como Arrow, Abramovitz e Solow passam a

explorar a hipótese de que os indivíduos e empresas desenvolvem processos de

aprendizado através da experiência adquirida no decorrer do processo produtivo.

Com vistas a incorporar adequadamente o conceito de conhecimento na

abordagem neoclássica, Arrow (1962) analisa as particularidades que assume o

conhecimento enquanto mercadoria. Incialmente, Arrow identifica a noção de

conhecimento com a de tecnologia, num sentido mais amplo ligado ao know-how e

passa a interpretar a invenção como um processo de produção de conhecimento. Assim,

ao enfocar o papel da informação, este autor passa a enfatizar a questão da incerteza

relacionada a escassez, ausência e distribuição assimétrica que a informação apresenta

enquanto insumo no processo de pesquisa e invenção. Em particular, Arrow destaca três

18 Durante muito tempo, a economia neoclássica negligenciou a natureza endógena do processo de mudança tecnológica tratando o conhecimento tecnológico como uma variável exógena cuja aquisição, a exemplo de outros insumos, estaria condicionada à relações de mercado. Foi somente a partir trabalho de Solow que a tecnologia passou a ser considerada como uma variável explicativa fundamental nos modelos de crescimento neoclássicos, na medida em que verificou-se que entre 80% e 90% do crescimento da produtividade nas economias industrializadas avançadas seria explicado pelos efeitos da inovação.

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problemas inter-relacionados que dão margem à existência de falhas no tocante à

alocação do fator conhecimento pelo mercado:

• Falta de apropriabilidade por parte daqueles que seriam os produtores do

conhecimento;

• Incerteza relacionada ao processo de produção do conhecimento;

• Indivisibilidade aliada à existência de economias de escala na sua produção.

A existência de incerteza implica em que a produção de conhecimento não possa

ser prevista a priori e que mesmo os mecanismos tradicionais utilizados no mercado

com vistas a compatibilizar riscos não possam ser aplicados no caso das atividades de

pesquisa. Já os problemas relacionados a falta de apropriabilidade envolvem a

impossibilidade de criar um mercado específico onde os produtores do conhecimento

possam internalizar adequadamente os benefícios advindos das atividades de pesquisa.

A questão da indivisibilidade, por fim, refere-se às economias de escala que se aplicam

ao conhecimento tecnológico e que envolvem a existência de um patamar mínimo de

escala independente da taxa de produção. Tais características contribuíram para o

desenvolvimento de uma discussão, no âmbito da abordagem neoclássica, sobre a

existência de falhas de mercado que justificariam a atuação do Estado no sentido de

prover investimentos relacionados à criação de conhecimento dado que as firmas não

encontrariam incentivo para investimentos desta natureza.

Valendo-se, em parte, destas contribuições sobre as características diferenciadas

do conhecimento desenvolvidas a partir da conceito de learning-by-doing, modelos

mais recentes construídos a partir da nova teoria do crescimento passaram a procurar

explicações sobre o processo de crescimento econômico a partir da noção de retornos

crescentes de escala ligados a produção de conhecimentos (Romer, 1986; Lucas, 1988).

Neste novo enfoque, o conhecimento é visto como um elemento parcialmente

apropriado pelas firmas, que envolve externalidades positivas na medida em que flui

através de uma firma para as demais do setor. Ou seja, as firmas contam com alguns

incentivos para produzir conhecimentos, mas o estoque de conhecimento utilizado

resulta também dos spillovers inter- firmas (Smith, 1997: 19). Da mesma forma, em

alguns casos, esses modelos procuram enfatizar o processo de learning-by-doing,

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enquanto em outros passam a analisar o efeito de investimentos em educação e capital

humano.

Entretanto, mesmo tendo em vista tais avanços, a abordagem neoclássica ainda

apresenta limitações relativas à utilização de pressupostos extremamente restritivos, tais

como os padrões de otimização presentes nos comportamentos ou o foco sobre

trajetórias de equilíbrio. Conforme é enfatizado por Freeman (1993), o foco principal de

análise dos modelos mais recentes na abordagem neoclássica recai sobre a tecnologia e

não sobre a inovação, ignorando, portanto, a dimensão organizacional da inovação.

Uma questão-chave colocada por Smith (1997) refere-se ao fato de que apesar da

análise neoclássica lidar com as características econômicas do conhecimento enquanto

uma mercadoria, não apresenta uma diferenciação clara deste conceito. Mesmo assim,

este autor aponta para atributos do conhecimento que encontram-se implícitos neste tipo

de abordagem:

1. Em primeiro lugar, o conhecimento apresenta um caráter genérico no

sentido de que qualquer avanço oriundo de um campo particular do conhecimento

pode ser amplamente utilizado em diferentes firmas e indústrias;

2. Em segundo lugar, é codificado na medida em que um elevado grau de

transmissibilidade garante que o conhecimento possa ser complemente descrito em

diferentes formatos;

3. Em terceiro lugar, é acessível a um custo nulo, o que implica tanto no

fato de que possui um custo de transmissão irrelevante, como também que as firmas

não enfrentam barreiras em termos do custo de acesso e incorporação;

4. Em quarto lugar, é independente de contextos específicos, o que

garante a todas as firmas a mesma capacidade de incorporar conhecimentos

codificados no processo produtivo.

A partir destas premissas sobre o conceito de conhecimento, implícitas na

abordagem neoclássica, o processo de maximização por parte das firmas torna-se uma

mera questão de cálculo e escolha de alternativas em vez de um problema de

capacitação tecnológica e organização. Assim, em primeiro lugar, na medida em que o

conhecimento tecnológico relevante encontra-se livremente disponível, as decisões

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sobre a adoção de inovações tornam-se totalmente independentes de uma firma a outra,

e a questão da interação entre firmas torna-se um fator irrelevante. Em segundo lugar,

considerando que o mercado passa a excluir aquelas firmas que não logram maximizar

suas escolhas, as diferenças entre firmas também passam a ser irrelevantes na medida

em que passa a predominar apenas uma forma de otimização da produção e das

técnicas. Da mesma forma, ainda que tais premissas tornem a aquisição e uso de

tecnologias uma questão resolvida no âmbito de teorias baseadas no equilíbrio, elas

representam uma séria limitação para a análise do processo de desenvolvimento

tecnológico e no estabelecimento de novos princípios tecnológicos.

Em síntese, o principal problema da indefinição do conceito de conhecimento na

abordagem neoclássica tradicional não se limita a sua incapacidade de lidar com as

especificidades do investimento na produção de conhecimentos e seu impacto no

processo produtivo, mas envolve, principalmente, a constituição de uma visão de mundo

que limita a compreensão sobre a importância do processo de aprendizado no sistema

econômico.

A busca de uma explicação endógena para o processo de transformação do

conhecimento aplicado em sistemas econômicos representa o principal desafio do

esforço de teorização evolucionário. Sob vários aspectos, o desenvolvimento da

explicação evolucionária para o processo de mudança tecnológica reflete o desconforto

com relação ao referencial ortodoxo onde, tradicionalmente, o processo de criação e

acumulação de conhecimento se encontra fora do escopo de análise dos modelos.

Assim, um dos maiores avanços da abordagem evolucionária em relação ao enfoque

neoclássico consiste, justamente, no reconhecimento da importância desempenhada pelo

aprendizado no processo de mudança tecnológica. Neste novo contexto, o aprendizado

passa a ser descrito como a forma pela qual as firmas constróem, suplementam e

organizam conhecimentos e rotinas em torno de competências e cultura inerentes, ao

mesmo tempo em que adaptam e desenvolvem sua eficiência organizacional através da

melhoria destas competências (Dodgson, 1996: 55)

Os elementos chave que compõem a abordagem evolucionária são destacados

por Malerba (1996:2)19: Inicialmente, o conhecimento encontra-se na base do processo

19 Também cabe destacar que a constituição do arcabouço teórico evolucionário acaba por refletir contribuições oriundas de diferentes disciplinas científicas: i) da teoria dos sistemas e termodinâmica

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inovativo, e a sua criação e difusão são a fonte básica na mudança econômica e

tecnológica. O aprendizado é o mecanismo chave no processo de acumulação do

conhecimento, ocorrendo através de formas que apresentam diferentes graus de inércia,

contextualidade e complementaridade. O surgimento de alternativas em termos de

inovações em produtos, processos, tecnologias, instituições, etc. possibilita o aumento

da diversidade ou variedade no sistema e a ocorrência de um processo de mudança

qualitativa. O mecanismo de seleção, por sua vez, reduz a variedade da economia e

afeta a difusão comparativa dos tipos de atores e comportamentos no sistema

econômico. Além disso, as instituições, na medida em que ajudam a moldar o processo

de aprendizado, desempenham um papel fundamental na inovação e na evolução

industrial, tendendo a evo luir conjuntamente no tempo com a tecnologia, formas

organizacionais, estruturas de mercado e com as estratégias das firmas.

Johnson e Gregersen (1997) destacam que na perspectiva evolucionária a

importância das instituições e a própria relação entre instituições e mudança econômica

torna-se evidente. As configurações institucionais afetam a geração, acumulação,

distribuição, uso e destruição do conhecimento na medida em que moldam a percepção

e as decisões dos agentes econômicos. Da mesma forma, as instituições também

condicionam o processo de geração de variedade e seleção tendo em vista seu papel

com relação às transformações técnicas e organizacionais. Assim, a evolução dos

padrões de aprendizado constitui-se numa decorrência do contexto institucional e do

grau de interação estabelecido entre os diferentes atores no sistema (Thomson, 1993).

Em contraposição à visão neoclássica, no âmbito da abordagem evolucionária

tanto a hipótese de equilíbrio como a de racionalidade dos agentes econômicos passam a

ser refutadas. O comportamento maximizador que determina o processo de decisão na

concepção ortodoxa tradicional é substituído por regras ou rotinas que passam a

direcionar o processo de decisão nas firmas. Assim, na medida em que as firmas se

defrontam com situações novas para as quais suas regras diárias não oferecem

referências, passam a valer-se de novas estratégias, incorporando-as a sua experiência e

diferenciado-se das demais. A adoção de rotinas reflete a existência de um elevado grau

deriva-se a diferença fundamental entre sistemas abertos e fechados, a concepção de mudança qualitativa, indeterminação, irreversibilidade, path dependency e multi estabilidade; ii) da biologia, resgata-se a discussão sobre o conceito de variação que dá origem às novas espécies e de abordagem populacional em oposição à abordagem tipológica proposta pela teoria neoclássica tradicional; iii) da teoria das organizações, introduz-se explicitamente a noção de estrutura organizacional e mediação de conflitos

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de incerteza no ambiente de decisão das firmas. Assim, não existe nenhum mecanismo

que assegure uma posição de equilíbrio de longo prazo para a indústria no decorrer do

processo que leva à busca de inovações pela firma e à seleção pelo mercado dessas

estratégias inovativas (Dosi e Cimoli, 1994). Em outras palavras, a incerteza inerente às

atividades de criação de novos conhecimentos induz a adoção de procedimentos e

rotinas que refletem a interpretação das firmas sobre o sucesso de seus padrões de

decisão no passado e que são continuamente reproduzidos e reforçados enquanto se

mostrarem eficazes.

O processo de aprendizado, neste contexto, não pode ser analisado

separadamente do processo de seleção. Ao mesmo tempo em que as firmas e

organizações ampliam sua base de conhecimento e incorporam novas rotinas, elas

também passam a avaliar o quanto a sua estratégia, estrutura e competências operam no

sentido de garantir a sua sobrevivência num determinado ambiente (Nelson e Winter,

1982). Além disso, a adoção de procedimentos e rotinas encontra-se influenciada

sobremaneira pela experiência passada da firma, denotando o elevado grau de

dependência de trajetória (path-dependency) associado ao processo de criação de

conhecimento.

Na medida em que é a geração de alternativas, aliada aos mecanismos de

seleção, que viabiliza o processo de evolução econômica, a noção de diversidade passa

a ser incorporada na análise evolucionária como um conceito chave para compreensão

do processo de mudança qualitativa do sistema econômico20. A diversidade, seja ela

técnica, institucional ou organizacional, consiste num elo fundamental para análise do

processo inovativo na medida em que se reflete na base de conhecimento e afeta o

processo de aprendizado interativo. Por um lado, a redução na diversidade implica na

redução de opções e no decréscimo nas possibilidades de comunicação e interação entre

diferentes tipos de qualificações, de conhecimentos e competências (Cohendet e

Llerena, 1997; Johnson e Gregersen, 1997). Por outro lado, a heterogeneidade de

recursos e qualificações representa o melhor fundamento para construção de

internos (Saviotti, 1997). 20 A utilização do conceito de diversidade na teoria econômica remonta a tentativa pioneira de Thorstein Veblen de incorporar os princípios evolucionários darwinianos da biologia na discussão sobre o desenvolvimento de sistemas econômicos. Veblen considerava a metáfora evolucionária - importada da biologia - mais adequada para compreensão do processo de desenvolvimento econômico e tecnológico, num claro contraste com os princípios estáticos de equilíbrio incorporados à ciência econômica pela abordagem neoclássica (Hodgson, 1996).

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competências específicas às firmas e variações entre firmas quanto à sua

competitividade. Neste contexto, o aprendizado surge como um elemento importante

para manutenção da diversidade no sistema econômico, através da implementação de

novas rotinas que constituem a unidade básica de análise do processo de inovação nas

empresas e organizações.

Com vistas a explicar essa interdependência entre aprendizado e diversidade

David e Foray (1995) propõem uma diferenciação que remete a dois mecanismos

fundamentais no processo de aprendizado. O primeiro, remete ao aprendizado

“extensivo” – ou aprendizado pela diversidade – e envolve o processo de

experimentação que tem lugar por intermédio de uma grande variedade de opções e

permite a eliminação de certas trajetórias de desenvolvimento. O segundo tipo é

denominado de aprendizado “intensivo” – aprendizado pela padronização – que envolve

um foco claro sobre uma única variante tecnológica e permite identificar irregularidades

e problemas que demandam maior investigação, correção e elaboração. Neste sentido, o

aumento da diversidade do sistema torna-se viável através da implementação de novas

rotinas ou através da explotação de rotinas já existentes, que são moldadas a partir das

propriedades do processo de aprendizado dentre as quais destaca-se a sua natureza

interativa.

Além da diversidade, a natureza interativa do processo de geração de

conhecimento representa um elemento central no escopo da visão evolucionária.

Conforme é colocado por Gregersen e Johnson (1997: 15), quase todos os processos de

aprendizado são sociais e interativos, sendo o conhecimento afetado e transformado

através de processos permeados pela interação social e onde as próprias instituições

mudam como resultado dessa interação voltada para criação de novos conhecimentos.

Dessa forma, as instituições são apresentadas como um elemento básico no processo de

evolução social na medida em que propiciam, através do mercado, um ambiente de

seleção para as inovações e cumprem um papel relevante na acumulação e transmissão

de conhecimentos de um período a outro.

Tendo em vista esse conjunto de elementos que definem o papel e a importância

do conhecimento e do aprendizado, os desdobramento da análise evolucionária em torno

da relação entre aprendizado e inovação remetem à discussão sobre os principais

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122

mecanismos e contextos que moldam os processos de aprendizado tecnológico e

organizacional.

Lundvall (1988) por exemplo, aponta para cinco características principais

relacionadas aos processos de aprendizado por interação. Em primeiro lugar, este

processo pressupõe a existência de um fluxo sistemático de informações entre os

agentes econômicos. Adicionalmente, a existência deste fluxo de informações impõe a

necessidade da constituição de canais de comunicação e do estabelecimento de códigos

comuns que viabilizam a troca de informações. Uma segunda característica remete ao

estabelecimento de relações de confiança mútua que são consolidadas através do

aprofundamento do processo de aprendizado entre os atores econômicos. Em terceiro

lugar, o aprofundamento das interações também requer a existência de um sistema de

incentivos que evite o rompimento dos vínculos entre os atores tendo em vista os

benefícios relacionados aos novos relacionamentos. Em quarto lugar, o aprofundamento

das relações de confiança e cooperação entre os atores que participam dos processo de

aprendizado interativo, requer um horizonte de tempo mínimo para se consolidar.

Entretanto, na medida em que um patamar mínimo de interação é atingido esse processo

tende a se auto-reforçar. Por fim, uma última característica refere-se ao fato de que a

consolidação desses processos de interação e cooperação, através do tempo, leva à

constituição de um espaço econômico próprio.

Johnson e Gregersen (1997), por sua vez, destacam as diferenças associadas ao

caráter direto ou indireto que assume o processo de aprendizado na abordagem

evolucionária. Neste caso, a forma direta envolve as atividades de aprendizado que são

desenvolvidas em universidades, centros de pesquisa e nos departamentos de P&D das

empresas de forma deliberada. Já os processos indiretos referem-se ao aprendizado

desenvolvido através de atividades econômicas comuns ou cotidianas relacionadas, por

exemplo, ao processo de produção das empresas. Ao mesmo tempo em que essas

atividades de aprendizado, diretas e indiretas, aumentam o estoque de conhecimento, os

autores destacam também a importância que assume a capacidade de "esquecimento"

das firmas e organizações na medida em que ele diminui o risco de lock-in das

trajetórias de aprendizado tecnológico e viabiliza o surgimento de novos processos de

aprendizado. Lundvall (1995: 29) destaca que o papel desempenhado pelo

“esquecimento” no processo de criação de novos conhecimentos costuma ser

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subestimado. Neste sentido, considera que a influência de hábitos de pensamentos na

economia constitui-se num risco permanente relacionado ao bloqueio de processos

criativos de aprendizado na medida em que processos de “destruição criadora do

conhecimento” tornam-se necessários a fim de viabilizar a difusão de inovações radicais

no tecido econômico.

A partir da visão evolucionária, portanto, a inovação deixa de ser encarada como

um fenômeno isolado no tempo e no espaço e passa a ser considerada como o resultado

de trajetórias que são cumulativas e construídas historicamente, de acordo com as

especificidades institucionais e padrões de especialização econômica inerentes a um

determinado contexto tecnológico, territorial ou setorial. A firma inova através da

interação com outras instituições com vista à criação, desenvolvimento e troca de

diferentes tipos de conhecimento. Por um lado, do ponto de vista da firma a noção de

aprendizado encontra-se associada a um processo permanente de (re)construção de

competências que expressam as bases de conhecimento sobre as quais as empresas

operam. Por outro lado, no âmbito de aglomerações produtivas a noção de aprendizado

localizado reflete a importância que assume a proximidade e a interação entre diferentes

conjuntos de firmas e outros atores institucionais no sentido de potencializar a criação,

difusão e uso de novos conhecimentos, em especial do tipo tácito (Maskell e Malmberg,

1999: 167)

1.4 - Dimensão tácita e os limites da codificação do conhecimento

Originalmente, a distinção entre conhecimento tácito e codificado remonta ao

trabalho de Michael Polanyi (1958) que ilustra esta noção ao colocar que o que sabemos

é mais do que conseguimos falar ou descrever. Por um lado, formas codificadas incluem

o conjunto de conhecimentos de tipo tecnológico (incorporados em máquinas,

componentes e produtos finais) e organizacional que podem ser transmitidos através da

comunicação formal entre os agentes e aos quais se tem acesso no mercado. As formas

tácitas, por outro lado, envolvem: i) saberes sobre o processo produtivo que não estão

disponíveis em manuais e blue-prints; ii)saberes gerais e comportamentais; iii)

capacidade para resolucão de problemas não codificados; iv) capacidade para

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124

estabelecer vínculos entre situações e interagir com outros recursos humanos (Novick,

apud Youguel, 1998: i).

Na medida em que o conhecimento apresenta uma natureza mais padronizada,

codificada, simplificada e independente, torna-se mais fácil a sua transmissão através de

meios ou mecanismos formais como publicações, licenças, patentes, etc. Porém, quanto

mais mutável, tácito, complexo e interdependente de outras estruturas de conhecimento,

tanto mais relevância assumem os mecanismos informais de transmissão de

conhecimento como treinamentos, mobilidade de pessoal, etc. (Breschi e Malerba,

1997)21.

A percepção de que o conhecimento incorpora tanto elementos tácitos como

codificados contrapõe-se à visão neoclássica tradicional que o coloca como um ativo

que pode ser livremente transferido ou adquirido no mercado pelos agentes econômicos

como mera informação. Por um lado, a noção de conhecimento codificado constitui a

melhor aproximação com a definição de informação adotada na perspectiva neoclássica,

tendo em vista sua transferibilidade através de canais formais de comunicação. Por

outro lado, a disponibilidade de conhecimentos codificados não é capaz de garantir, por

si só, o acesso à informação relevante por parte dos agentes econômicos na medida em

que mesmo o uso de informações codificadas requer algum tipo de conhecimento para

seu uso eficiente (David e Foray, 1995). Em outras palavras, o processo de aprendizado

interativo não tem lugar em mercados perfeitos onde agentes racionais otimizam suas

escolhas segundo a lógica de um modelo de equilíbrio geral. Em particular, o que se

verifica a partir da abordagem evolucionária é que a habilidade para apreender encontra-

se assimetricamente distribuída entre indivíduos e organizações22. Dessa forma, os

agentes econômicos ampliam sua base de conhecimento através de distintos processos

de aprendizado, em nível individual e coletivo, que envolvem diferentes arranjos

institucionais e exigem o manuseio de formas tácitas e contextos específicos.

21 Ainda que, em geral, esse acréscimo à base de conhecimento ocorra em torno das linhas de pesquisa já existentes, não está excluída a possibilidade de ocorrerem mutações radicais que levam à tra jetórias totalmente novas. Conforme é colocado por Metcalfe e Saviotti (1989: 16): "Economic and technological evolution seem to be remarkably fast by comparison with their biological analogue. Here we may also note that Schumpeter was a saltationist, believing that economic change ocurred by discrete, pontuated changes. By contrast, Marshall was a gradualist and built his entire theoretical edifice around the concept of incremental change, one thing leading imperceptibly to another." 22 Conforme foi colocado anteriormente, ainda que esta percepção também se encontre presente na análise de autores como Arrow, não foi incorporada no escopo na abordagem neoclássica tradicional.

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O processo de codificação do conhecimento implica na sua transformação em

um tipo de "informação" que viabiliza sua transmissão através de determinados canais

de comunicação formais. Dessa forma, o conhecimento codificado passa a ser

transferível em forma compacta e padronizada, a um custo baixo e através de longas

distâncias e fronteiras organizacionais. A codificação do conhecimento permite,

portanto, uma redução nos custos do processo de aquisição de conhecimento e da

própria difusão tecnológica. Também acentua certas características que tendem a fazer

do conhecimento uma mercadoria transacionável e, por esse motivo, facilita a

externalização do conhecimento e amplia a capacidade de aquisição de conhecimento

por parte das firmas.

Entretanto, Lundvall e Bórras (1998: 33) apontam para duas importantes

limitações ao processo de codificação do conhecimento. Em primeiro lugar, a própria

complementaridade existente entre conhecimentos tácitos e codificados impõe limites

naturais ao processo de codificação. Em outras palavras, o processo de codificação do

conhecimento nunca está completo. Em segundo lugar, o mesmo ritmo acelerado de

mudança tecnológica que amplia a possibilidade de codificação e amplia o valor

econômico do conhecimento codificado, também contribui para manter a importância

relativa do conhecimento tácito na medida em aumenta o seu grau de complexidade.

Neste aspecto, o conhecimento tácito permanece sendo um elemento chave no processo

de apropriação e uso de conhecimentos.

Ao contrário do que ocorre com o conhecimento codificado, o conhecimento do

tipo tácito não pode ser facilmente comprado e vendido no mercado dado que sua

transferência se encontra condicionada pelo contexto social e institucional onde ocorre a

interação entre indivíduos, firmas e organizações. Neste caso, mesmo a

operacionalização de formas codificadas de conhecimento – como na interpretação de

manuais de engenharia e desenho – requer conhecimentos do tipo tácito que se

manifestam nas rotinas organizacionais e na experiência coletiva de grupos específicos

em diferentes áreas das empresas (Ernst e Lundvall, 1997). Além disso, as trajetórias de

aprendizado que são constituídas nas firmas a partir do desenvolvimento de

competências tácitas constituem um elemento diferenciador do desempenho competitivo

na medida em que representam ativos intangíveis que são difíceis de transferir.

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A distinção entre a dimensão tácita e codificada do conhecimento nem sempre

apresenta um linha divisória tão clara. Na realidade, formas tácitas e codificadas de

conhecimento são complementares e coexistem em diferentes momentos. Essa questão é

ilustrada por MacKelvey (1998), que enfatiza que os aspectos tácitos de uma atividade

podem ser esquecidos mesmo quando os aspectos codificados são lembrados. Portanto,

em alguns casos, o uso eficiente do aprendizado implica em transformar conhecimento

codificado em prática, o que leva à transferência de conhecimento compartilhado em

aprendizado específico. É através da prática que os indivíduos passam a converter o

conhecimento do tipo compartilhado num aprendizado pessoal, transformando o

conhecimento codificado em tácito e/ou utilizando-o para incrementar o seu

conhecimento tácito.

Entretanto, apesar do elevado grau de complementaridade entre o conhecimento

tácito e codificado, ambos são produzidos de maneira distinta, possuem graus diferentes

de rigidez e desempenham papéis diferentes no processo de aprendizado. Neste aspecto,

Lundvall e Johnson (1994: 46) propõem algumas distinções relacionadas às formas do

conhecimento que envolvem apenas uma dimensão informacional (com maior ou menor

grau de complexidade) ou como um conjunto de qualificações e competências. Essas

distinções abrangem quatro categorias distintas de conhecimento, que se inserem na

percepção das dimensões tácitas e codificadas do conhecimento:

1. know-what refere-se ao conhecimento sobre fatos e pode ser chamado de

informação no sentido de que é facilmente divisível e armazenável;

2. know-why refere-se ao conhecimento científico sobre princípios e leis naturais,

sociais ou morais e pode ser organizado, produzido e reproduzido por instituições

como universidades;

3. know-how refere-se às capacitações que permitem fazer algo e pode ou não estar

vinculado com um processo de produção e tende a se desenvolver e manter

internamente nas empresas;

4. know-who refere-se a um conjunto de diferentes qualificações, inclusive aquelas de

natureza social, e envolve um tipo de informação sobre ‘quem sabe o que’ e ‘quem

sabe como fazer o que’, permitindo um uso eficiente do conhecimento na sociedade.

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Os mecanismos de aquisição desses quatro tipos de conhecimento ocorrem

através de diferentes canais. Conhecimentos do tipo know-what e know-why são

facilmente transferíveis através de livros, aulas e acesso à bases de dados, já os

conhecimentos do tipo know-how e know-who estão vinculados à experiência prática e

dependem de certas qualificações básicas.

1.5 - Conclusão: a dimensão localizada do aprendizado

Uma das implicações da intensificação da globalização econômica que tem se

tornado mais evidente reside, contraditoriamente, na importância crescente que assume

o conhecimento tácito enquanto fator de vantagem competitiva de empresas e regiões.

Neste aspecto, quanto mais fácil torna-se o acesso ao conhecimento do tipo codificado,

tanto mais crucial torna-se o domínio sobre formas tácitas de conhecimento. (Maskell,

1996, Maskell e Malmberg, 1999: 172). Por um lado, a intensificação do processo de

globalização e o desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação têm

levado a uma aceleração considerável no ritmo de codificação do conhecimento e,

consequentemente, na sua capacidade de transmissão a longa distância de forma rápida

e eficiente. Por outro lado, mesmo diante desta tendência de transformação, percebe-se

a permanência de formas tácitas de conhecimento que somente podem ser trocadas

através da proximidade e interação face a face entre diferentes atores. Na medida em

que não se encontra estabelecido de forma explícita, o conhecimento tácito não pode ser

facilmente transmitido. A dificuldade de transmissão do conhecimento tácito, por sua

vez, contribui para que ele geralmente encontre-se associado a contextos

organizacionais ou geográficos específicos o que, apesar de contribuir para sua

circulação localizada, dificulta ou mesmo impede o seu acesso por atores externos a tais

contextos.

Assim, dentre os principais elementos que caracterizam o processo de

aprendizado na abordagem evolucionária, dois em particular assumem uma importância

crucial na análise da sua dimensão localizada. O primeiro destes elementos diz respeito

ao caráter “path-dependent” das trajetórias de aprendizado que tende a perpetuar rotinas

e procedimentos ao longo do tempo. O segundo elemento, refere-se à sua natureza

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interativa que, por sua vez, introduz o espaço geográfico como uma dimensão de análise

a ser considerada (Maskell et al, 1998: 9; Cooke e Morgan, 1998; Maskell e Malmberg,

1999: 180). Neste aspecto, na medida em que se concebe o ambiente local como um

conjunto de configurações institucionais e organizacionais inseridas num rol de

interações com diferentes atores econômicos, percebe-se a importância que assume a

dimensão localizada dos processos de aprendizado e capacitação inovativa das firmas.

Em especial, a aglomeração territorial ou os sistemas produtivos localizados

traduzem os benefícios relacionados ao engajamento de empresas em processos de

aprendizado interativo. Neste tipo de ambiente o conhecimento tende a se tornar

incorporado não somente nas qualificações individuais e nos procedimentos e rotinas

das organizações, como também no próprio ambiente local ou nos vínculos de interação

entre os diferentes atores e desenhos institucionais. A habilidade das empresas de criar

conhecimento vai capacitá-las a interagir com os demais atores locais num processo de

aprendizado coletivo no qual conhecimentos que são em parte codificados e em parte

tácitos são trocados e utilizados em cada firma. Neste aspecto, capacitações localizadas

se refletem no conhecimento incorporado em indivíduos, empresas e na própria

estrutura institucional presentes em sistemas produtivos territoriais.

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2 – PROXIMIDADE ESPACIAL, INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE

2.1 – Introdução

A intensificação do processo de globalização produtiva e financeira, no decorrer

das duas últimas décadas, deu início a um intenso debate sobre a dicotomia entre o

espaço global e o espaço local enquanto esferas de organização e condução das

atividades produtivas e tecnológicas. Em meio a esta controvérsia situam-se, de um

lado, argumentos que apontam para o crescente processo de internacionalização de

mercados e integração econômica extra-fronteira como o principal fator de

esvaziamento dos espaços de atuação de países e regiões. Tal visão esteve

fundamentada na crescente expansão de mercados financeiros e de produtos, no

crescimento das grandes corporações transnacionais, numa nova divisão internacional

do trabalho, na crescente mobilidade do capital financeiro através de fronteiras

internacionais, entre outros aspectos que levaram alguns autores a afirmar que a

economia contemporânea estaria transcendendo a própria noção de “lugar” (Ohmae,

1990; 1993).

Atualmente, essa percepção sobre o fenômeno da globalização permanece

amplamente ilustrada pela imagem dos grandes conglomerados multinacionais que,

supostamente, não encontram-se ligados a nenhum território ou região em particular e

são reconhecidos por alguns como a principal instância de organização de processos

produtivos e inovativos (Ernst e Lundvall, 1997). Da mesma forma, encontra-se

implícita neste tipo de enfoque a premissa de que a disseminação do processo inovativo

estaria, cada vez mais, centrada no dinamismo tecnológico das grandes corporações

transnacionais (Ostry e Nelson, 1995). Neste aspecto, regiões e localidades seriam nada

mais do que hóspedes passivas de empreend imentos inovativos e móveis tendo em vista

vantagens geográficas e dotações de fatores específicos, descartando-se assim a

existência de processos de aprendizado tecnológico localizados.

A despeito do aparente consenso oriundo deste tipo de enfoque que enfatiza a

crescente ‘desterritorialização’ da economia contemporânea (Amin, 1993), diversos

autores questionam esta visão dominante ao afirmar que a globalização constitui-se num

processo assimétrico e incapaz, portanto, de diminuir tanto a desigualdade como a

incerteza e a entropia do sistema mundial. Dentre os argumentos utilizados neste

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enfoque alternativo sobre a globalização destacam-se, em primeiro lugar, estudos

recentes que apontam para diferenças persistentes nos padrões de especialização

comercial e tecnológica entre países no decorrer das últimas décadas (Dosi; Freeman e

Fabiani, 1994; Boyer, 1996; Cooke e Morgan, 1998). Em segundo lugar, com relação à

dimensão tecnológica da globalização, já são bastante conhecidas as evidências sobre o

escopo da globalização tecnológica apresentadas em trabalhos de autores como Pavitt e

Patel (1991) e Archibugi e Michie (1995; 1997) demonstrando que as atividades

tecnológicas das grandes empresas permanecem em grande medida circunscritas às

matrizes nos seus países de origem23. Da mesma forma, conforme destacado no

primeiro capítulo, outros autores como Lundvall e Bórras (1997) enfatizam que a

mobilidade espacial do conhecimento constitui-se num dos limites mais importantes da

globalização, que subestima o papel desempenhado pela proximidade geográfica no

processo de transmissão de formas tácitas de conhecimento e no desenvolvimento de

processos de aprendizado interativo.

Este conjunto antagônico de argumentos, que tem como pano de fundo as

implicações decorrentes da globalização produtiva e tecnológica, permite a identificação

de dois eixos de análise com elevado grau de interdependência, mas que remetem a

questionamentos de natureza diversa.

Num plano mais geral, a análise sobre os limites da globalização produtiva e

tecnológica contribuiu para a retomada de um antigo debate em torno de hipóteses sobre

a convergência ou divergência associada aos padrões de desenvolvimento e

produtividade da economia mundial. Neste aspecto, os principais argumentos que

refutam as teses sobre convergência e apontam para os limites da globalização

produtivas e tecnológica são apresentados de maneira sintética a seguir, sem qualquer

pretensão de aprofundar a discussão sobre o conceito de globalização. Apesar de

extremamente relevante para a compreensão de diferentes aspectos relacionados as

transformações recentes na economia capitalista, a discussão sobre o conceito e

implicações mais amplas da globalização foge ao escopo de análise desta tese24.

23 Archibugi e Michie (1995), por exemplo, enfatizam que a categoria mais usual de globalização tecnológica refere-se, na realidade, à exploração em âmbito global de tecnologias geradas em matrizes de grandes conglomerados multinacionais nos seus países de origem. Entretanto, as atividades tecnológicas desenvolvidas por subsidiárias de multinacionais fora de seus países de origem ainda são reduzidas. 24 Para uma discussão detalhada sobre as principais implicações associadas ao fenômeno da globalização ver, entre outros, Fiori (1995), Tavares e Fiori (1997), Ianni (1995 e 1996).

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O principal foco da tese (e deste capítulo em particular) recai sobre um segundo

eixo de análise que destaca a importância crescente da proximidade territorial enquanto

fonte de vantagem competitiva e de dinamismo inovativo diante do fenômeno da

globalização. O objetivo deste capítulo consiste, portanto, em apresentar uma

sistematização das principais contribuições teóricas que destacam a importância da

proximidade territorial no estudo de processos de capacitação inovativa e competitiva

de aglomerações produtivas.

O capítulo encontra-se organizado em três seções além desta introdução. A

segunda seção apresenta uma breve análise sobre os principais elementos que marcam o

debate sobre a dicotomia entre convergência e diversidade associada aos padrões atuais

de produtividade e inovação. Em seguida, a partir da identificação das principais linhas

de trabalho que têm explorado a relação entre proximidade territorial, inovação e

competitividade, a terceira seção discute quatro enfoques principais que incorporam

elementos de maior interesse para as questões teóricas e metodológicas propostas nesta

tese. Esse detalhamento da discussão envolve: a) a literatura sobre clusters industriais

nos países em desenvolvimento; b) as abordagens sobre millieu inovativo e seus

desdobramentos em termos de modelos de sistemas locais de inovação; c) a literatura

sobre novos espaços industriais que emergem a partir da Nova Ciência Regional e; d) os

estudos sobre sistemas de inovação – particularmente em nível local e regional -

associados às abordagens de cunho neo-schumpeteriano e evolucionárias. Mais do que

discutir exaustivamente as diferenças existentes entre cada uma dessas abordagens, esta

seção se propõe a explorar as principais categorias analíticas usadas em cada uma delas

para explicar as relações entre proximidade e formas de capacitação competitiva e

inovativa em aglomerações produtivas. Finalmente, a quarta seção traz as principais

conclusões do capítulo e apresenta as principais dimensões do referencial analítico que

serve de base para a discussão do bloco de estudos empíricos da segunda parte da tese.

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2.2 – Convergência e diversidade: os limites da globalização produtiva e

tecnológica

Um dos aspectos mais controversos no debate sobre as características do

chamado processo de globalização refere-se à idéia de que todos os países

industrializados, e em particular as economias avançadas, estariam convergindo em

direção a um mesmo padrão de desenvolvimento industrial e tecnológico. Da mesma

forma, essa convergência nas estruturas de produção e mesmo as relações entre

economia, Estado e sociedade, estariam sendo promovidas pela intensificação nos

fluxos de comércio internacional, imitação e difusão de best practices ou pela crescente

mobilidade do capital, entre outros fatores.

De acordo com Berger (1996: 2), o debate sobre convergência se originou a

partir da literatura sobre sociedades industriais no pós-guerra que colocava a tecnologia

como o principal mecanismo de indução do processo de convergência entre países.

Entretanto, desde a década de 70, essa literatura sofreu pesadas críticas em razão do seu

elevado grau de determinismo tecnológico25. Dessa forma, até a década de 90, a

percepção de que todos países estariam convergindo em direção a um conjunto comum

em termos de instituições econômicas e práticas, cuja forma de organização seria

condicionada pela variável tecnológica, praticamente desaparece de cena. Entretanto, a

expectativa de que a maior parte da estrutura produtiva e econômica dos países

industrializados estaria convergindo permanece presente até os dias de hoje no debate

econômico. Na década de 90, a retomada da hipótese de convergência esteve ligada

principalmente ao questionamento sobre a capacidade de preservação das identidades

sociais, culturais e econômicas em regiões e países diante da crescente interdependência

econômica resultante do processo de globalização.

Esta questão é analisada por Boyer (1996: 30) que aponta para três definições

distintas da convergência as quais são utilizadas indiscriminadamente no atual debate

sobre globalização. A primeira, envolve a noção de convergência econômica que surge

como resultado da globalização financeira, produtiva, tecnológica e do trabalho.

25 Para uma apresentação e críticas dessa literatura ver: Suzanne Berger e Michael J. Piore, Dualism and Discontinuity in Industrial Societies (New York: Cambridge University Press, 1980).

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Entretanto, apesar de plausível tanto do ponto de vista teórico como através de

evidências empíricas, verifica-se que a tendência à convergência nos padrões de

produtividade, crescimento e qualidade de vida encontra-se atualmente restrita a um

grupo reduzido de países que historicamente lograram atingir um patamar mínimo de

investimentos em educação e infra-estrutura produtiva e tecnológica.

Um segundo significado da convergência remete, mais do que ao desempenho

econômico, ao surgimento de uma nova ordem constitucional associada à organização

das relações políticas e econômicas. Este tipo de enfoque reflete fundamentalmente a

idéia de uma ampla difusão das forças de mercado enquanto mecanismo capaz de

garantir não somente a eficiência econômica mas também a ordem democrática. Dessa

forma, a convergência entre países estaria sendo demonstrada pela crescente

substituição de regimes autoritários por instituições democráticas.

No entanto, este tipo de enfoque apresenta um alcance muito limitado sob

diferentes aspectos. Em primeiro lugar, não é possível estabelecer uma vinculação única

e inequívoca entre a implementação de regimes democráticos e a constituição de

mercado e desempenho econômico pois, como é destacado pelo autor: “The success of

some NICs such as South Korea has been obtained by authoritarian regimes, not to

speak of Chile under the Pinochet regime, Brazil during the miracle, or Mexico ruled by

the PRI.” (Boyer,1996: 32). Em segundo lugar, na medida em que se analisa o grau de

generalização desta tendência à convergência baseada em democracia e mercados,

verifica-se que a transição de diversos países para regimes democráticos também foi

acompanhada pelo surgimento de novos modelos totalitários (como, por exemplo, no

mundo Islâmico ou em diversos países do continente africano). Além disso, mesmo a

existência de diferentes configurações políticas democráticas acaba gerando diferenças

institucionais que têm grande influência nos padrões de reforma econômica. Neste

aspecto, a diversidade associada a tais configurações políticas e suas implicações em

termos de eficiência econômica também reflete as limitações deste enfoque sobre a

convergência.

Finalmente, uma terceira definição sobre convergência reside nas características

do arcabouço institucional que sustenta as interações entre economia e política.

Diferentemente da definição anterior onde a convergência estaria se refletindo em

similaridades nos estilos de desenvolvimento baseados no equilíbrio entre democracia e

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134

mercados, esta terceira definição enfatiza o papel das configurações institucionais no

sentido de gerar padrões dinâmicos de ajustamento. Neste caso, a convergência nos

padrões de crescimento de economias nacionais estaria necessariamente condicionada

pela similaridade de suas formas institucionais e pela uniformidade da sua reação diante

de fatores como competição externa ou instabilidade de natureza política ou econômica.

Entretanto, verifica-se que trajetórias de crescimento econômico semelhantes, ou pelo

menos, sustentáveis no longo-prazo, podem ocorrer a partir de formatos institucionais

distintos. Alternativamente, tais formatos institucionais e trajetórias de crescimento

podem divergir do modelo dominante de desenvolvimento.

Do ponto de vista da abordagem evolucionária, a globalização constitui um

processo inacabado onde as especificidades nacionais ainda são fundamentais e se

refletem sobre a organização dos sistemas de relações industriais, sistema educacional,

mecanismos financeiros e formas de intervenção governamental. Tendo em vista a

diversidade em termos de formatos institucionais e demais mecanismos geralmente

associados a hipótese de convergência, parece mais plausível aceitar a possibilidade de

que a convergência seja apenas uma das situações de equilíbrio possíveis do atual

processo de evolução do sistema econômico mundial.

O ceticismo em torno do caráter convergente da globalização também é

compartilhado por Wade (1996:60), que por um lado, aponta para diversas evidências

que induzem a uma interpretação favorável das teses que colocam a globalização como

um fenômeno dominante e homogeneizador. Por outro lado, enfatiza que uma análise

mais detalhada destas evidências revela que a economia mundial tornou-se, na verdade,

mais internacional do que global.

Dentre as evidências que dão suporte às teses sobre a globalização produtiva e

financeira, destaca-se o elevado crescimento do comércio internacional. De acordo com

Wade (1996: 62), entre 1965 e 1990, o comércio internacional de mercadorias cresceu

em média cerca de uma vez e meia mais do que a taxa de crescimento do PNB

mundial26. Deste modo, uma proporção crescente da produção das economias nacionais

passou a ser destinada para mercados externos. Assim, de uma maneira geral, o aumento

26 Os dados estatísticos que fundamentam estas evidências estão apresentados em: OECD National Accounts (Main Aggregates), 1960-1990, vol.1 (Paris; OECD, 1992) e World Bank, World Development Report, 1992 (Washington, DC.: World Bank, 1992), World Tables, tabelas 2 e 14; ambos citados por Wade (1996).

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na importância relativa do mercado externo para economias nacionais tornou a renda

relativa destas economias cada vez mais dependente da sua capacidade de competir

contra importações no mercado doméstico e contra outros produtores no mercado

externo. Os fluxos de investimento direto estrangeiro (IDE), por sua vez, apresentaram

um crescimento cerca de três vezes mais rápido do que o dos fluxos de comércio e

quase quatro vezes mais rápido do que o da produção mundial. O ritmo mais intenso de

internacionalização, entretanto, ocorreu efetivamente no âmbito financeiro. O estoque

de empréstimos bancários internacionais aumentou cerca de dez vezes num período de

dez anos, passando de cerca de 4% do PNB dos países da OCDE em 1980, para 44% em

1990.

No entanto, apesar das evidências em favor da globalização, as fronteiras

econômicas nacionais ainda definem os limites do sistema de acumulação de capital.

Este argumento é reforçado através de uma série de fatos estilizados (Dosi; Freeman e

Fabiani, 1994; Wade, 1996: 86; Cooke e Morgan, 1998: 24)

• nas principais economias industrializadas, cerca de 90% da produção ainda

se destina ao mercado doméstico;

• os investimentos domésticos promovidos através de capital nacional ainda

excedem consideravelmente o conjunto de investimentos diretos no exterior e de

investimentos estrangeiros nos países;

• o mercado de ações em nível mundial ainda encontra-se longe de uma total

integração na medida em que apenas um número reduzido de corporações são

suficientemente conhecidas mundialmente a ponto de poderem transacionar suas

ações fora de seus mercados domésticos de capitais;

• as companhias multinacionais são mais adequadamente definidas como

empresas nacionais com operações internacionais, tendo em vista que o grosso das

suas atividades de agregação de valor são desenvolvidas em suas matrizes;

• os países da OCDE têm demonstrado diferenças persistentes em seus

padrões de atividades tecnológicas desde a década de 60, o que sugere uma forte

influência de seus sistemas nacionais de inovação no escopo de atividades

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136

tecnológicas desenvolvidas pelas grandes empresas, ao contrário do que argumenta

a visão dominante sobre a globalização;

• na década de 60, quando surgem as primeiras análises sobre o fenômeno da

globalização na literatura, as economias nacionais ainda consistiam em entidades

consideravelmente fechadas. Assim, o aumento dramático na internacionalização

desde então ocorre a partir de uma base bastante reduzida. Por exemplo, numa

perspectiva histórica mais ampla, percebe-se que alguns mercados financeiros ainda

são, em aspectos importantes, qualitativamente menos internacionalizados em

comparação com o período anterior à Primeira Guerra Mundial.

• a noção de ‘sistema nacional’ repousa no pressuposto de que a tecnologia,

mesmo diante do avanço crescente da capacidade de codificação do conhecimento,

permanece dependente de uma parcela considerável de conhecimentos que são

tácitos e, portanto, difíceis de adquirir, cumulativos e dependentes de trajetória no

seu desenvolvimento.

• As fronteiras nacionais segue sendo uma proxy importante para

proximidade cultural, física, política e lingüística que, por sua vez, condicionam a

transferência de conhecimentos do tipo tácito entre atores e organizações.

Mesmo no caso dos fluxos financeiros internacionais, que refletem um dos mais

importantes aspectos da globalização induzida pelo ritmo acelerado de mudanças

tecnológicas, percebe-se uma reação voltada para retomada de mecanismos de controle

em âmbito nacional e internacional. Tal reação reflete a percepção sobre as

conseqüências decorrentes do processo de liberalização financeira para diversas

economias.

Em síntese, na medida em que os principais argumentos relacionados ao debate

sobre convergência e diversidade são analisados, percebe-se um quadro paradoxal onde

a existência de diversas evidências que apóiam a hipótese de convergência não refletem

uma tendência histórica, geral e inequívoca em direção a um padrão comum nos níveis

de produtividade e padrões de vida em âmbito mundial. O silogismo que procura

equiparar a hipótese de convergência com o processo de globalização demonstra-se

logicamente inconsistente e não reflete adequadamente o quadro atual marcado pela

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137

elevada diversidade em termos de formatos institucionais e padrões de capacitação

tecnológica.

Em particular, conforme é destacado por Storper (1997: 177), percebe-se que as

principais categorias que são usualmente utilizadas para definir a globalização – tais

como investimento direto estrangeiro, estrutura global de comércio de commodities,

conhecimento, tecnologia, etc. – parecem apontar para um processo estável de

desterritorialização do poder econômico. Entretanto, tais categorias se revelam

claramente inadequadas para avaliar um conceito que remete a um processo

eminentemente geográfico: “It is indeed, quite curious that a fundamentally

geographical process labeled with a geographical term – ‘globalization’- is analyzed as

a set of resource flows largely without considering their interactions with the

territoriality of economic development”.

Neste aspecto, a dimensão geográfica da globalização constitui o foco central da

análise de Santos (1997) que define o espaço como um conjunto indissociável de

sistemas de objetos e sistemas de ações, cuja dinâmica atual encontra-se marcada pela

emergência das redes e do processo de globalização. Por um lado, tais redes são globais

na medida em que, através do avanço tecnológico, ‘transportam o universal ao local’,

unindo pontos distantes numa mesma lógica produtiva. Tal movimento é definido como

o funcionamento vertical do espaço geográfico contemporâneo. Por outro lado, as redes

também são locais e refletem localmente as condições técnicas de trabalho que são

determinadas a partir de uma divisão do trabalho em nível global.

Como decorrência, Santos argumenta que: “Não existe um espaço global, mas

apenas, espaços da globalização. O mundo se dá sobretudo como norma, ensejando a

espacialização, em diversos pontos, dos seus vetores técnicos, informacionais,

econômicos, sociais, políticos e culturais. São ações “desterritorializadas”, no sentido de

teleagidas, separando, geograficamente, a causa eficiente e o efeito final.” (Santos,

1997: 271)

Neste embate entre uma ordem global e outra local, o mundo é colocado como

um conjunto de possibilidades cuja efetivação depende das oportunidades oferecidas

pelos lugares. É o território que termina por operar como a grande instância de

mediação entre o mundo e a sociedade nacional e local. Em outras palavras, ao mesmo

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138

tempo em que uma ordem global busca impor uma única racionalidade em todos os

lugares, estes respondem segundo sua própria racionalidade: “A ordem global é

‘desterritorializada’, no sentido de que separa o centro da ação e a sede da ação. Seu

‘espaço movediço e inconstante, é formado de pontos, cuja existência funcional é

dependente de fatores externos. A ordem local, que ‘reterritorializa’, é a do espaço

banal, espaço irredutível (…) porque reúne numa mesma lógica interna todos os seus

elementos: homens, empresas, instituições, formas sociais e jurídicas e formas

geográficas” (Santos, 1997: 273).

2.3 –Proximidade espacial, inovação e competitividade: principais enfoques.

Sob vários aspectos, a década de 80 representou um importante ponto de

inflexão no estudo da influência da proximidade espacial no desempenho competitivo e

inovativo de aglomerações produtivas. Antes da década de 80, pouco ou nenhum

interesse esteve reservado à discussão do papel da dimensão territorial na organização

das atividades sócio-econômicas. A região era vista fundamentalmente como resultado

de diferentes processos sócio-econômicos, e não como uma unidade de análise em si no

estudo da dinâmica de mudança de tais processos.

No momento em que a euforia resultante do esforço de reconstrução do Pós-

Guerra deu lugar à percepção sobre a fragilidade econômica estrutural de diversas

regiões industriais tradicionais na Europa, modelos inspirados nos pólos de crescimento

de Perroux (1950) ainda serviam de base teórica para promoção de políticas de

investimentos em infra-estrutura física e incentivos para instalação de grandes empresas

nessas regiões. Entretanto, ainda que esse tipo de política tenha encorajado o aumento

de emprego em nível local e atraído investimentos externos para diferentes regiões, em

muitos casos, o abismo existente entre a tradição econômica regional e os investimentos

realizados acarretou a derrocada dessas economias regionais diante da crise que se inicia

a partir dos anos 70.

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139

A limitação das abordagens tradicionais de política regional somada ao processo

de profundas transformações na própria forma de organização do sistema capitalista em

nível mundial no decorrer das décadas de 70 e 80, contribuiu para o surgimento de

diversas abordagens centradas na importância da dimensão local na coordenação das

atividades econômicas e tecnológicas. Tais abordagens representaram uma

contraposição à visão tradicional desenvolvida a partir de estudos de economia regional,

onde a análise sobre o papel da proximidade geográfica no desempenho de

aglomerações se resumia a uma contabilização de transações econômicas envolvendo a

troca de bens, informações e recursos humanos (Storper, 1997).

Em particular, a origem de grande parte destas abordagens esteve relacionada ao

esgotamento do modelo Fordista de produção em massa e ao surgimento de novas

formas de organização pós-fordistas baseadas em relações de subcontratação

envolvendo grandes empresas e núcleos de fornecedores compostos de pequenas e

médias empresas com elevado grau de dinamismo econômico e tecnológico (Piore e

Sabel, 1984; Scott, 1988). Em termos empíricos, o ressurgimento da região ou

localidade como foco central de vantagens competitivas e inovativas foi largamente

ilustrado pelo sucesso de algumas experiências de economias regionais e distritos

industriais cujo dinamismo encontrava-se fundamentado extensivamente em ativos

locais27.

Na medida em que esse conjunto de contribuições tem sua origem relacionada a

diferentes disciplinas e enfoques teóricos (como geografia econômica, ciência regional,

organização industrial, economia evolucionária, entre outros) percebe-se sua elevada

diversidade em termos conceituais e metodológicos. Por um lado, esta diversidade

contribuiu significativamente para ampliar a perspectiva de análise referente ao

fenômeno da inovação e sua dimensão territorial. Conceitos antes restritos a disciplinas

específicas passaram, gradativamente, a compor um pano de fundo comum para

diferentes modelos permitindo integrar elementos analíticos ligados à noção de

aprendizado, inovação, instituições e território.

27 Algumas experiências de aglomerações industriais em particular chamaram a atenção de pesquisadores: os distritos industriais na região Nordeste-Central da Itália, o Vale do Silício na Califórnia, Baden-Wurttemberg, na Alemanha, Toyota City no Japão, entre outras.

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140

Por outro lado, a incorporação de tais elementos nos esquemas de análise

também tem levado o estudo da dimensão territorial da inovação e da competitividade a

um grau crescente de complexidade sem a devida contrapartida em termos de evidências

empíricas. Desde os aportes teóricos associados à Nova Ciência Regional onde a região

é vista como um espaço de aprendizado (Storper, 1997; Cooke e Morgan, 1998) até as

incursões mais recentes da nova geografia econômica que propõe a existência de

retornos crescentes de escala associados à aglomeração espacial de empresas (Krugman,

1995), percebe-se um risco crescente de que a discussão sobre a dimensão localizada da

inovação e da competitividade acabe por incorrer em conclusões tautológicas. Em

outras palavras, a mera alocação de atores num mesmo espaço passa a ser tomada como

evidência da existência de vínculos de cooperação e de processos de aprendizado

interativo entre os mesmos.

Dentre as proposições que procuram sistematizar os diferentes modelos e

correntes teóricas que analisam a relação entre proximidade e inovação Schmitz (1999),

por exemplo, considera que o debate referente à importância da proximidade geográfica

nos relacionamentos inter- firmas apresenta quatro linhas de trabalho principais. A

primeira, estaria incorporada nos modelos da chamada nova teoria do crescimento e

comércio internacional desenvolvidos no escopo da mainstream economics onde

destaca-se, particularmente, o trabalho de autores como Krugman (1991; 1995).

Uma segunda linha de trabalho estaria representada na contribuição de autores

como Porter (1990), que enfatizam a importância dos vínculos e fluxos de

conhecimentos que emergem das relações entre agentes locais na conquista de

vantagens competitivas. Os estudos de distritos industriais e outras formas de

aglomerações industriais ligadas às novas abordagens em Ciência Regional são

apontados como uma terceira linha de trabalho. Neste conjunto de contribuições,

destaca-se o trabalho de autores como Storper (1995; 1997), Becattini (1990), Brusco

(1990), Markussen (1996), entre outros. Finalmente, as diferentes contribuições no

campo da literatura da inovação, e em especial os estudos relacionados a sistemas de

inovação em nível regional e local (Braczik et al. 1998; Cooke e Morgan, 1998;

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141

Edquist, 1997; Cassiolato e Lastres, 1999a), compõem uma quarta linha de trabalho

relacionada ao estudo das relações entre proximidade e inovação28.

Não obstante o tipo de recorte utilizado para classificar estas contribuições, de

uma maneira geral todas procuram explicar o processo de capacitação inovativa e/ou

competitiva de aglomerações produtivas a partir da importância do ambiente local, em

função de elementos como a qualidade dos fatores de produção, infra-estrutura

tecnológica e educacional, formas de interação ou cultura empresarial. Em particular,

percebe-se na maior parte destes modelos a importância atribuída ao papel dos formatos

institucionais na articulação desses diferentes fatores. No modelo que serve de base para

a abordagem sobre millieu inovativo, por exemplo, o papel do potencial institucional

endógeno em nível local é utilizado para explicar a dinâmica inovativa das empresas

(Camagni, 1991). Esse mesmo tipo de percepção encontra-se presente no enfoque sobre

clusters industriais, que destacam o equilíbrio entre concorrência e cooperação no

processo de capacitação competitiva das empresas. No caso dos modelos de inovação

territorial inspirados na abordagem sobre sistemas de inovação essa ênfase nas bases de

coordenação institucional são ainda mais claras e refletem uma tradução dos princípios

presentes na concepção sobre sistemas de inovação nacionais e tecnológicos para o

âmbito regional (Smith, 1997).

Na análise crítica que é apresentada a seguir, a literatura que aborda a dimensão

territorial da inovação e da competitividade é discutida através de três abordagens que

constituem a base de construção teórica da maior parte dos modelos de inovação

territorial.

28 Um recorte alternativo é proposto por Larsson e Malmberg (1999) que identificam três grupos diferenciados ligados ao debate em torno do processo de regionalização de sistemas industriais e tecnológicos. No primeiro, encontram-se tanto as contribuições de autores como Brusco (1990), Becattini (1990) e Piore e Sabel (1984) ligadas à abordagem sobre distritos industriais e centrada na noção de especialização flexível e no papel das micro, pequenas e médias empresas (MPMEs), bem como as contribuições da escola de geografia econômica da Califórnia. Esta última representada por autores como Scott (1988), que tratam do relacionamento entre inovação tecnológica, organização industrial e espaço através do conceito de novos espaços industriais. Num segundo grupo, encontra-se a extensa literatura sobre millieu inovativo e distritos tecnológicos associada, em sua vertente mais recente, à contribuição de autores como Aydalot (1986) e Maillat (1996). Um terceiro agrupa a literatura sobre economia evolucionária e da inovação - representada por autores como Nelson e Winter (1982), Freeman (1987), Dosi (1988) e Lundvall (1995) – juntamente com o conceito de aglomeração industrial desenvolvido por Porter (1990), na medida em que seriam modelos que discutem a capacidade inovativa de sistemas industriais e tecnológicos de países e regiões.

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142

A primeira remete à literatura sobre clusters industriais nos países em

desenvolvimento que tem sua origem ligada à discussão do modelo de especialização

flexível em distritos industriais nos países industrializados. Não obstante essa origem

comum, este enfoque sobre clusters logrou incorporar elementos inéditos na literatura,

relativos às especificidades que cercam o processo de desenvolvimento de aglomerações

industriais nos países em desenvolvimento e à importância da ação conjunta na busca de

vantagens competitivas. O segundo grupo de contribuições inclui a análise tradicional

sobre millieu inovativo - que representa uma das abordagens pioneiras no estudo de

processos endógenos de desenvolvimento regional - e seus desdobramentos recentes em

termos dos modelos de sistemas locais de inovação. Em particular, este tipo de enfoque

destaca a importância de processos de aprendizado interativo e bases de conhecimento

que são moldadas a partir das especificidades do ambiente local. Finalmente, o terceiro

grupo, abarca a literatura neo-schumpeteriana sobre sistemas de inovação e,

particularmente, os seus desdobramentos em termos de modelos que analisam tais

sistemas a partir da sua dimensão local ou regional. Esse enfoque engloba elementos

importantes na análise das relações entre proximidade e inovação na medida em que

destaca o papel da infra-estrutura institucional e organizacional na articulação de atores

locais.

Da mesma forma, a análise destas abordagens é feita de modo a destacar alguns

aspectos específicos que abarcam:

a) os principais conceitos e hipóteses adotados em cada enfoque para

descrever a relação entre proximidade, inovação e competitividade;

b) a ênfase atribuída aos diferentes elementos analíticos que caracterizam

a dinâmica de desenvolvimento de aglomerações produtivas, tais como as formas de

organização e coordenação dos fluxos de bens e serviços, desenhos institucionais e a

natureza dos vínculos entre atores locais.

2.3.1 – As contribuições da literatura sobre clusters industriais nos países

em desenvolvimento

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O ponto de referência inicial da literatura sobre aglomerações industriais nos

países em desenvolvimento reside nos estudos sobre distritos industriais europeus e, em

particular, no debate sobre a experiência dos distritos industriais da Terceira Itália que

deu margem a um extenso conjunto de estudos no decorrer da década de 80 (Schmitz,

1995). Tais estudos estiveram fundamentados no conceito de especialização-flexível

(Piore e Sabel, 1984) e a notabilização destas experiências aumentou o interesse em

torno da dinâmica competitiva de pequenas empresas no contexto de países em

desenvolvimento. No decorrer da década de 90, as contribuições mais significativas

sobre aglomerações industriais nos países em desenvolvimento, tanto em termos

empíricos como conceituais, estiveram associadas ao trabalho de um grupo de

pesquisadores do Institute of Development Studies na Universidade de Sussex (IDS-

UK).

Não obstante sua vinculação com a literatura sobre distritos industriais nos

países industrializados, a abordagem sobre clusters logrou desenvolver um referencial

teórico próprio, a fim de discutir as especificidades que marcam o crescimento e

inserção competitiva de aglomerações nos países em desenvolvimento. Assim, os

mecanismos que explicam o desempenho competitivo dessas aglomerações são

traduzidos através do conceito de eficiência coletiva (Schmitz, 1989; 1992) que

descreve os ganhos competitivos associados à interação entre empresas em nível local.

A idéia principal que emerge com o conceito de eficiência coletiva é a de que

externalidades locais, no sentido marshaliano tradicional, não são suficientes para

explicar o desenvolvimento de aglomerações de micros e pequenas empresas (MPEs).

De acordo com Schmitz (1995: 3), apesar do conceito de economias externas constituir-

se num elemento essencial para compreensão das vantagens derivadas da aglomeração

de empresas, ele tem um alcance limitado na medida em que abarca somente aqueles

ganhos (ou perdas) resultantes da facilidade de acesso à insumos especializados, mão-

de-obra e outros fatores incidentais. Dessa forma, o conceito de eficiência coletiva

associa os efeitos decorrentes de economias externas (incidentais) com aqueles que

emergem a partir da ação deliberada de cooperação entre atores locais29.

29 A diferenciação entre esses dois componentes associados à eficiência coletiva levou à denominação de eficiência coletiva passiva aquelas vantagens que emergem de efeitos incidentais de aglomeração e à de eficiência coletiva ativa aquela ligada a ação conjunta deliberada de atores locais (Nadvi, 1996 e Schmitz, 1995).

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144

A partir desta base conceitual, os estudos desenvolvidos no escopo dessa

abordagem lograram demonstrar que:

a) Aglomerações industriais apresentam uma importância crescente para

os países em desenvolvimento e constituem-se num fenômeno comum numa ampla

gama de países e setores;

b) A participação em aglomerações assume particular importância no

segmento de micro, pequenas e médias empresas (MPMEs) na medida em contribui

para superação das dificuldades que são usualmente impostas às empresas neste

segmento e viabiliza sua inserção em mercados distantes;

c) A noção de eficiência coletiva constitui-se num referencial analítico

importante para explicar as diferenças associadas ao desempenho de aglomerações,

sustentada pela existência de canais de comercialização e confiança mútua nas

relações inter-firmas;

d) O esforço de ação conjunta promovido por atores locais condiciona a

sua habilidade em enfrentar os desafios impostos pela crescente competição global.

Com vistas a explicar as trajetórias recentes de desenvolvimento de

aglomerações nos países em desenvolvimento face ao fenômeno da globalização, a

abordagem sobre clusters passou a ampliar o seu escopo de análise. Um dos pontos

principais dessa nova agenda de pesquisa remete à busca de um referencial dinâmico

que permita analisar os processos que levam ao sucesso ou ao fracasso de aglomerações

através do tempo. De acordo com Schmitz (1999) tal discussão implica,

necessariamente, na distinção entre clusters que se encontram em fases incipientes ou

avançadas de industrialização. Neste aspecto, diversos estudos têm demonstrado que a

aglomeração consiste num estímulo importante principalmente nos estágios iniciais de

crescimento de empresas por facilitar seu desenvolvimento em etapas de maior risco. O

principal argumento é o de que a aglomeração de empresas facilita a mobilização de

recursos financeiros e humanos, permite reduzir as necessidades de investimento inicial

focalizando-os em estágios específicos, estabelece padrões de empreendimento que

servem de base para o surgimento de novas empresas e contribui para constituição de

estruturas de apoio que viabilizam o desenvolvimento de MPMEs (Schmitz, e Nadvi,

1999:1507).

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Apesar dos avanços significativos dessa literatura, particularmente mediante a

incorporação de um enfoque dinâmico voltado para análise das trajetórias evolutivas de

aglomerações industriais na década de 9030, ainda são apontadas algumas áreas de

deficiência. A principal delas remete à necessidade de incorporar a influência de

vínculos externos no processo de capacitação de produtores locais em aglomerações. O

foco tradicional de análise da literatura sobre clusters esteve, durante muito tempo,

centrado na natureza dos vínculos de cooperação horizontal e vertical inter- firmas.

Entretanto, estudos recentes passaram a apontar para a importância crescente da

relações com atores externos - como compradores internacionais - na definição das

estratégias das aglomerações (Humphrey e Schmitz, 2000; Schmitz, 1999; Dolan, C. e

Humphrey, 1999). Neste aspecto, as mudanças na abordagem sobre clusters industriais

e a busca de novos elementos conceituais capazes de complementar a análise sobre

ganhos de eficiência coletiva foram em grande parte pautadas pela constatação de que

as pressões competitivas advindas da globalização estariam acarretando a crescente

integração de produtores locais nos países em desenvolvimento a cadeias globais de

produção.

Diante da intensificação do processo de globalização, mesmo levando em conta

os benefícios da aglomeração para a inserção das empresas no mercado externo, a

integração em cadeias produtivas globais passou a exercer grande influência sobre o

equilíbrio entre forças locais e globais na definição das estratégias de desenvolvimento

de aglomerações. A questão sobre quais atores – globais ou locais – estariam detendo

maior poder sobre os sistemas de produção de determinadas aglomerações torna-se,

portanto, um ponto central na compreensão das estratégias inovativas e competitivas

dessas aglomerações (Schmitz e Knorringa, 1999).

As limitações no sentido de avaliar a importância de vínculos externos nas

estratégias de desenvolvimento de produtores locais contribuiu para incorporação de

alguns dos elementos presentes na análise sobre cadeias globais de produção (Gereffi,

1994) na abordagem sobre clusters.

A análise sobre cadeias globais de produção (Gereffi, 1994; Gereffi, 1999)

procura discutir as implicações que emergem da interação entre forças locais e globais

30 Um panorama geral sobre as contribuições recentes associadas dessa abordagem pode ser encontrada na edição especial da World Development de setembro de 1999 (v.27, n.9), que é dedicada integralmente à

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no processo de capacitação produtiva de aglomerações locais. Estas cadeias podem ser

consideradas como redes inter-organizacionais agrupadas em torno de uma mercadoria

ou produto, capazes de articular empresas em diferentes regiões e países. Neste aspecto,

a análise sobre cadeias globais resgata a dimensão internacional de cadeias produtivas e

os modos de coordenação ao longo destas cadeias como um elemento chave na busca de

vantagens competitivas. Gereffi (1999: 3), considera que a inserção em uma cadeia

global oferece aos produtores locais a possibilidade de embarcar numa trajetória

progressiva de capacitação (upgrading) através dos processos de aprendizado e novos

conhecimentos adquiridos a partir da interação com compradores globais.

Entretanto, na medida em que a literatura sobre clusters industriais passou a

avançar na discussão sobre o impacto de vínculos externos no processo de upgrading de

produtores locais nos países em desenvolvimento, seus pontos de divergência com

relação à abordagem sobre cadeias globais de produção foram igualmente explicitados.

Humphrey e Oeter (1999), por exemplo, destacam que o enfoque sobre cadeias globais

de Gereffi ainda apresenta um alcance limitado na análise sobre o papel de atores locais

nas estruturas de coordenação e estratégias de capacitação de aglomerações. Assim, a

ênfase nas formas de coordenação que operam ao longo da cadeia produtiva global

tende a subestimar o papel de outros mecanismos de coordenação tais como vínculos

locais de cooperação e formas de regulação governamental em âmbito nacional ou

internacional.

Da mesma forma, Schmitz (1999) destaca que apesar da inserção em cadeias

globais haver facilitado a capacitação de produtores locais nos países em

desenvolvimento em esferas associadas à produção, o mesmo não pode ser afirmado

quanto à capacitação desses produtores em esferas que se estendem além da produção.

Em outras palavras, a inserção em cadeias globais pode dificultar o acesso de produtores

locais a etapas da cadeia produtiva que incorporam maior valor agregado, tais como as

atividades relacionadas à comercialização e design (Schmitz e Knorringa, 1999).

Finalmente, Humphrey e Schmitz (2000: 14), procuram esclarecer as divergências entre

as duas abordagens da seguinte forma:

“Both emphasise the importance of upgrading in order to sustain incomes in the face of increasing competition in global markets, but the

discussão sobre clusters industriais nos países em desenvolvimento.

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routes to this same end are different. (…) The cluster literature emphasises the need to improve co-operation and local governance. Even the resources for product and functional upgrading are seen mainly to come from within the locality. Links with the wider world are frequently acknowledged, but they are weakly theorised. (…). In contrast, the value chain literature emphasises links with the external world, leaving the locality largely untheorised. The value chain literature pays little attention to the role of business associations and local inter-firm co-operation in competitiveness and upgrading.”

A percepção sobre os limites inerentes ao processo de upgrading de

aglomerações por intermédio da inserção de produtores locais em cadeias globais levou

igualmente a abordagem sobre clusters industriais a aprofundar sua discussão sobre a

influência das formas de governança. Em particular, o foco de análise volta-se para a

interação entre a coordenação global de cadeias produtivas e a coordenação local de

clusters no sentido de promover ou restringir as estratégias de capacitação de produtores

locais.

Essa questão requer a elaboração e detalhamento de dois conceitos importantes.

O primeiro remete à noção de “upgrading” entendida enquanto o processo de

capacitação produtiva e inovativa das empresas que integram aglomerações locais e que

resulta da necessidade de enfrentar pressões competitivas. Esse processo pode implicar

tanto na busca de maior eficiência no desempenho de suas atividade produtivas

tradicionais, na busca de novos nichos de produção ou mesmo no desempenho de

atividades em outros estágios da cadeia produtiva. Essas formas de capacitação são

denominadas respectivamente: “upgrading de processo”; “upgrading de produto; e

“upgrading” funcional.

É importante ressaltar que a ênfase no processo de capacitação de produtores

locais – definida através do conceito de upgrading- reflete, em grande parte, a

preocupação atual da literatura sobre clusters industriais com os aspectos tecnológicos

do dinamismo de aglomerações nos países em desenvolvimento. Porém, percebe-se que

a análise sobre as fontes de dinamismo inovativo e aprendizado tecnológico ainda

carecem de elementos analíticos adequados na abordagem sobre clusters. A maior parte

dos estudos sobre clusters nos países em desenvolvimento demonstra uma preocupação

com questões relativas ao processo de mudança tecnológica em aglomerações

produtivas. Entretanto, tais estudos não lidam de fato com a natureza dos fluxos de

conhecimento e processos de aprendizado tecnológico que têm lugar nessas

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aglomerações (Bell e Albu, 1999). Geralmente, quando a questão sobre o processo de

capacitação tecnológica é focalizada diretamente, acaba por remeter à incorporação de

inovações incrementais e aquisição de equipamentos

A segunda definição envolve o conceito de “governança” e implica na

coordenação de atividades econômicas através de relações extra-mercado, e que são

diferenciadas através três categorias que refletem o grau de simetria associado às

relações entre atores locais e globais: network; quasi-hierarchy e hierarchy. Assim,

“network governance” representa formas de coordenação onde a relação de poder entre

empresas é relativamente simétrica enquanto a “quasi-hierarchy governance” envolve a

subordinação de uma empresa à outra como geralmente acontece no caso das relações

de subcontratação.

Ao mesmo tempo em que destacam a importância que assumem as estruturas

locais de governança na organização dos sistemas de produção em aglomerações, estes

autores também apontam para a necessidade de compreender o impacto da interação

entre instâncias locais e globais de coordenação no processo de upgrading de produtores

locais.

Da mesma forma, ao mesmo tempo em que distinguem a interação entre formas

locais e globais de governança, Schmitz e Humphrey enfatizam que o termo governança

também pode ser utilizado tanto para descrever estruturas de coordenação associadas à

esfera privada como à esfera pública, permitindo a interação entre diferentes tipos de

atores, conforme é ilustrado na tabela abaixo:

TABELA 2.1 - Categorias de governança pública-privada e local-global ÂMBITO LOCAL ÂMBITO GLOBAL GOVERNANÇA PRIVADA • Associações empresarias

locais • Cluster do tipo “hub-and-

spoke”

• Cadeias globais coordenadas pelo comprador

• Cadeias globa is coordenadas pelos produtores

GOVERNANÇA PÚBLICA • Agências governamentais locais e regionais

• Regras da OMC • Regras nacionais e supranacionais com referência global

GOVERNANÇA PÚBLICA-PRIVADA

• Redes de políticas locais e regionais

• Padrões internacionais • Campanhas internacionais

de organizações não governamentais

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149

Fonte: Humphrey e Shmitz (2000: 5)

Neste aspecto, o foco principal da análise recente sobre clusters industrias recai

sobre a interação entre as formas globais de coordenação associadas às cadeias globais

de valor e as formas locais de governança, em particular aquelas que envolvem a

interação entre formas públicas e privadas de governança.

2.3.2 - Millieu Inovativo e sistemas locais de inovação

Em comparação com a literatura sobre clusters industriais, a abordagem sobre

millieu inovativo apresenta um nível menor de preocupação com a natureza dos fluxos

produtivos que emergem das relações inter- firmas, bem como com as economias de

escala associadas à existência de aglomerações produtivas. O principal foco da maior

parte das contribuições que integram esta abordagem recai na natureza dos processos de

aprendizado interativo que dão origem às inovações no âmbito de aglomerações

produtivas. Tais processos de aprendizado capacitam os diferentes atores a perceberem

mudanças no ambiente e assim adaptar seus padrões e estratégias de capacitação.

Desenvolvida pelo grupo de acadêmicos do GREMI (Groupement de Reserche

Européen sur les Milieux Innovateurs) no decorrer da década de 80 (Camagni, 1991;

Maillat, 1996; Aydalot, 1986), a noção de millieu inovativo enfatiza a importância do

ambiente local no dinamismo tecnológico de aglomerações produtivas.

O millieu inovativo é descrito como um conjunto de elementos materiais (firmas,

infra-estrutura), imateriais (conhecimento) e institucionais (regras e arcabouço legal)

que compõem uma complexa rede de relações voltada para a inovação. A firma não é

considerada um agente isolado no processo de inovação, mas parte de um ambiente com

capacidade inovativa. Este conjunto de elementos e relacionamentos é representado por

vínculos entre firmas, clientes, instituições de pesquisa, sistema educacional e demais

autoridades locais que interagem de forma cooperativa. Neste contexto, o millieu pode

ser compreendido tanto como uma rede concreta de atores que interagem dentro de um

sistema produtivo local como enquanto o próprio ambiente que provê as condições que

viabilizam e facilitam a existência de interações entre os diferentes segmentos de atores

nas aglomerações (Maillat, 1996).

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150

Assim, o principal foco dos estudos teóricos e empíricos desenvolvidos no

escopo dos trabalhos do GREMI recai sobre os relacionamentos entre as firmas e seu

ambiente e, particularmente, sobre as formas de organização dessas relações. Tais

relações são estruturadas em torno de três espaços funcionais distintos que incluem: o

espaço de produção, espaço do mercado e o espaço de apoio. É o espaço de apoio que

habilita as firmas a enfrentarem as incertezas inerentes ao ambiente de competição na

medida em que ele determina as relações entre a inovatividade das firmas e o

desenvolvimento territorial. Este espaço, por sua vez, encontra-se constituído em torno

de três tipos diferentes de relações: a) relações relativas à organização dos fatores de

produção; b) relações estratégicas entre a firma e seus parceiros, fornecedores e clientes;

e c) relações estratégicas com atores que pertencem ao ambiente territorial. Da mesma

forma, a dimensão local ou territorial deixa de ser vista como uma mera moldura dentro

da qual diferentes elementos de sistemas produtivos locais passam a interagir

(condicionados por vantagens locacionais estáticas), mas antes como um ambiente para

aprendizado coletivo.

Baseada neste mesmo enfoque teórico, um conjunto mais recente de

contribuições têm discutido a importância da dinâmica de aprendizado e de organização

cooperativa de atores em aglomerações produtivas a partir do conceito de sistema local

de inovação (De la Mothe e Paquet, 1998). Um dos pontos de partida deste modelo

reside justamente na crítica dos estudos que analisam a dinâmica competitiva e

inovativa de aglomerações a partir de elementos que contemplam unicamente a infra-

estrutura física e educacional dessas aglomerações. Assim, ainda que a descrição da

infra-estrutura local consis ta num aspecto importante da maior parte dos estudos sobre

sistemas industriais locais, a ênfase exagerada que costuma ser dada a essas infra-

estruturas torna-se também uma das maiores fraquezas de tais estudos. Neste sentido,

uma análise meramente descrit iva da infra-estrutura de sistemas industriais apresenta

um alcance limitado para explicar a natureza dinâmica de sistemas de inovação

localizados.

Tendo em vista essas limitações, o modelo de sistema local de inovação

associado à abordagem sobre millieu inovativo procura estabelecer um esquema

alternativo de análise centrado na relação entre a inovação e processos de aprendizado.

Tal esquema é descrito como uma abordagem de ‘processo mais do que de estrutura’

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151

(process rather than structure - PRTS) que enfatiza a interação entre três dimensões

analíticas denominadas respectivamente, de i) espaço cognitivo; ii) capacidade de

absorção das empresas; e iii) coordenação de práticas comunitárias. O referencial

analítico baseado nessas três dimensões serve de base para desvendar o papel dos

processos de aprendizado na geração de inovações que são consideradas

primordialmente enquanto novas formas de conhecimento prático.

Em primeiro lugar, a noção de espaço cognitivo baseia-se na contribuição de

Zysman (1991) e constitui-se numa representação dos padrões de aprendizado que

emergem a partir do relacionamento entre áreas transversais de conhecimento que

apresentam um padrão cognitivo comum muito semelhante às redes neurais. Em outras

palavras, algo que externamente parece ser somente uma série de vínculos aleatórios

mas que - do ponto de vista do sistema em si - representa um padrão neural que

viabiliza o aprendizado. Esses padrões e conexões não são necessariamente iguais de

um sistema a outro na medida em os mecanismos de aprendizado recaem tanto sobre

configurações particulares de idéias, técnicas e mercadorias como nas parcelas de

conhecimento especializado que lhes servem de vínculo. Assim, por um lado, torna-se

evidente que a complexidade assumida por esses padrões e configurações que moldam

processos de aprendizado nos chamados espaços cognitivos, dificulta o

desenvolvimento de categorias de análise mais precisas. Por outro lado, a noção de

espaço cognitivo permite destacar a natureza coletiva do processo de aprend izado. Neste

aspecto, o aprendizado de organizações é considerado como sendo um processo que

resulta das interações entre diferentes atores.

Em segundo lugar, a capacidade de absorção ou de capacitação, procura

descrever como as diferentes formas de conhecimento prático – que constituem a

inovação - são geradas por organizações dentro do espaço cognitivo. Assim, a principal

ênfase recai tanto sobre a habilidade de organizações em explorar as bases de

conhecimento existentes, como na sua habilidade em explorar novas trajetórias de

aprendizado. Este equilíbrio entre a ‘explotação’ de bases de conhecimento existentes e

a ‘exploração’ de novas trajetórias tecnológicas surge, geralmente, a partir de regras não

escritas, procedimentos e demais aspectos que não são capturados pelas características

formais de organizações. Em alguns casos, a natureza incerta e altamente volátil de

certos contextos institucionais impõe às organizações estratégias de aprendizado mais

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152

voltadas para a exploração de novas oportunidades e possibilidades, ao invés de

otimizar o uso das bases de conhecimento existentes. O principal argumento remete

justamente ao fato de que as organizações representam o locus onde ocorre o processo

de transformação, que permite a criação de novos conhecimentos através dos vínculos

estabelecidos com os diferentes elos do sistema. O desafio, neste caso, consiste em

determinar a melhor forma de organização da produção de conhecimento tendo em vista

o objetivo de gerar processos de aprendizado e inovação.

Em terceiro lugar, a coordenação de práticas comunitárias abarca o conjunto de

valores comuns que marcam o desenvolvimento de processos de aprendizado e geração

de conhecimentos em sistemas locais de inovação: “Actual practice in the workplace

has a communal base. Learning has also a communal base. It is not about transmission

of abstract knowledge from someone’s head to another. It is about learning to ‘function

in a community’, about the ‘embodied ability to behave as community members’, about

‘becoming a practioner’ (De la Mothe e Paquet, 1998: 4)

Finalmente, o enfoque sobre sistema local de inovação enfatiza que os processos

de inovação e descoberta são percebidos mais claramente em níveis meso-econômicos

de análise. Tais níveis de análise são, por um lado, mais abrangentes que níveis micro-

econômicos – que levam em consideração somente inovações no âmbito de firmas – e,

por outro lado, menos abrangentes que análises de âmbito nacional (nível macro). Além

disso, considerando a existência de um ambiente de seleção que molda os processos de

descoberta e inovação, é a noção de millieu que passa a definir o espaço no qual as

inovações são geradas através da inter-relação entre as três dimensões analíticas

mencionadas acima.

A ênfase atribuída ao espaço meso econômico como sendo um locus

privilegiado para o surgimento de sistemas dinâmicos de inovação emerge a partir de

três argumentos. O primeiro envolve o fato da inovação estar vinculada a contextos

sociais e institucionais específicos que encontram-se geralmente circunscritos a espaços

locais ou regionais onde as identidades sócio-culturais são mais claramente definidas. O

segundo argumento baseia-se no fato das aglomerações produtivas territoriais

representarem um formato que facilita a promoção de redes cooperativas e o

gerenciamento eficiente de ‘trade-offs’ entre flexibilidade tecnológica, ‘lock-in’ e

minimização de custos. Finalmente, a própria desarticulação atual das economias

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153

nacionais e o surgimento de regiões-estado estaria contribuindo para potencializar o

dinamismo de sistemas de inovação em âmbitos meso-econômicos. Assim, no núcleo de

sistemas de inovação meso-econômicos encontram-se representados três processos que

apresentam elevada inter-relação: i) um processo de aprendizagem cumulativo e

adaptativo; ii) um sistema de interações entre atores e grupos; e iii) um processo de

coordenação dinâmica baseado nos dois primeiros (Maillat, 1995: 159).

Neste aspecto, os sistemas locais de inovação associados ao conceito de millieu

refletem uma elevada fragilidade na medida em que não estão baseados em estruturas

administrativas mas em representações comuns ou num mapa cognitivo coletivo que

pode não ser adequadamente transferido de uma geração para outra. O espaço meso-

econômico, enquanto principal instância para o desenvolvimento de processos de

aprendizado e inovação, não representa unicamente uma dimensão espacial ou

territorial. O território não se torna automaticamente um espaço para o aprendizado

coletivo a menos que seja capaz de conter uma representação de idéias e valores

compartilhados.

Em síntese, do ponto de vista conceitual, abordagem sobre millieu inovativo

coloca a relação entre proximidade, aprendizado e inovação no centro do seu referencial

e explora a importância da dimensão organizacional e institucional na mediação dessas

relações. Entretanto, uma importante limitação deste enfoque refere-se à ausência de

critérios objetivos que permitam explicar adequadamente a natureza dos processos de

inovação que emergem a partir do dinamismo de determinadas aglomerações

territoriais. Ainda que este tipo de crítica seja aplicável à maior parte das abordagens

atuais sobre aglomerações produtivas, ela apresenta particular relevância na abordagem

sobre millieu inovativo, na medida em que se encontra associada ao risco de

circularidade nos argumentos utilizados.

Em particular, uma das principais críticas ao enfoque sobre millieu e seus

desdobramentos recai na incapacidade de identificar a lógica econômica através da qual

aglomerações produtivas promovem processos de inovação. Tais limitações na análise

das fontes de dinâmica inovativa associadas ao millieu acabam por conduzir à

formulação de argumentos tautológicos do tipo: a inovação ocorre em

regiões/aglomerações onde existe um millieu inovativo enquanto que o millieu inovativo

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passa a ser caracterizado como aquele ambiente onde ocorrem inovações (Larsson e

Malmberg, 1999:1).

2.3.3 - A literatura sobre sistemas de inovação

Ainda que a origem das primeiras abordagens sobre sistemas de inovação esteja

relacionada à análise da capacidade inovativa de sistemas tecnológicos e industriais no

âmbito de economias nacionais, desenvolvidas por autores como Freeman (1987),

Lundvall (1992) e Nelson (1993), a perspectiva da inovação a partir dessa visão

sistêmica constitui-se num referencial suficientemente abrangente para permitir a

análise desses sistemas a partir de diferentes dimensões. Dessa forma, sistemas de

inovação podem apresentar alcance supranacional, nacional, mas também podem ser

analisados a partir de sua dimensão setorial, regional ou local (Edquist, 1997). Esses

diferentes recortes apresentam um caráter complementar e a escolha de uma dimensão

específica de análise reflete basicamente o tipo de enfoque e objeto de estudo. Em

alguns casos as relações entre diferentes atores que integram um sistema podem

apresentar maior nexo quando analisadas a partir da sua dimensão setorial, em outros

casos tais relações são mais claramente explicadas a partir da sua dimensão territorial ou

local.

Um dos aspectos chave da abordagem sobre sistemas de inovação reside na

constatação de que a inovação consiste num fenômeno sistêmico no sentido de que os

processos de inovação que têm lugar no nível da firma são, em geral, gerados e

sustentados por relações inter- firma e por uma complexa rede de relações inter-

institucionais (Smith, 1997). Neste contexto, a firma passa a ser redefinida como uma

organização voltada para o aprendizado e inserida num contexto institucional mais

amplo (Nelson e Winter, 1982; Freeman, 1987; Freeman e Perez, 1988; Lundvall, 1992;

Edquist, 1997) 31.

A percepção sobre a natureza sistêmica e complexa da inovação contrapõe-se à

noção tradicional característica do chamado "modelo linear" que estabelece uma

seqüência bem definida que inicia com as atividades de pesquisa básica e desemboca na

adoção de novos produtos e processos nas empresas. Assim, a partir da abordagem

31 É possível destacar também a contribuição de Porter (1990) que, mesmo sem apresentar explicitamente o conceito de sistema nacional de inovação, aponta para diferentes estratégias que afetam a competitividade da indústria nacional.

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sistêmica, a inovação deixa de ser encarada como um fenômeno isolado no tempo e no

espaço e passa a ser considerada como o resultado de trajetórias que são cumulativas e

construídas historicamente, de acordo com as especificidades institucionais e padrões de

especialização econômica inerentes a um determinado contexto espacial ou setorial. A

firma inova através da interação com outras instituições visando a criação,

desenvolvimento e troca de diferentes tipos de conhecimento. Enquanto o modelo linear

extrapola o papel da ciência básica e negligencia a necessidade de interação entre os

diferentes atores no processo de inovação, o modelo sistêmico destaca a importância de

elementos como a interação e a cooperação em tal processo.

O desenvolvimento da abordagem sobre sistemas de inovação pode ser

explicado a partir de três grandes vertentes que abarcam o estudo sobre sistemas

nacionais, tecnológicos e regionais de inovação (Edquist,1997). Na análise da dimensão

nacional dos sistemas de inovação, cabe ressaltar o contraste existente entre as

contribuições de autores como Freeman (1987) e Lundvall (1992) de um lado, e Nelson

(1993), de outro. O enfoque proposto por Nelson, apresenta uma visão mais restrita,

relacionada ao alcance dado pelo autor ao conceito de sistema nacional de inovação, na

medida em que este abarca somente aquelas instituições mais diretamente envolvidas no

processo de pesquisa e exploração tecnológica, como universidades, departamentos de

P&D nas empresas, cientistas e engenheiros. Adicionalmente, sua análise reflete uma

percepção de que tais sistemas evoluem naturalmente e que portanto sua configuração e

desenvolvimento não podem ser concebidos conscientemente pelos seus principais

atores.

De maneira diversa, a visão de Freeman e Lundvall - mesmo com algumas

diferenças no enfoque - apresenta uma concepção mais ampla sobre o conjunto de

instituições que compõem o sistema nacional de inovação, além de enfatizar que as

diferenças relacionadas à experiência histórica, linguagem e cultura, implicam em

características idiossincráticas que se refletem na organização interna das firmas, no

papel do setor público, na configuração institucional do setor financeiro e na intensidade

e organização das atividades de P&D.

Sob vários aspectos, a discussão sobre o escopo e limites da abordagem sobre

sistemas nacionais de inovação proposta por autores como Freeman e Lundvall,

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156

apresenta uma clara contraposição aos argumentos que apontam para a crescente

globalização dos processos de inovação tecnológica. Ao contrário da visão de Nelson,

eles consideram que o elementos e relacionamentos que compõem os sistemas nacionais

de inovação podem ser moldados a partir da ação de policy-makers e demais atores e

instituições que compõem tais sistemas. Desta forma, destacam a importância da

constituição de arranjos institucionais, públicos e privados, que possam contribuir para a

criação de competências tecnológicas específicas e para o processo de aprendizagem

interativa.

No âmbito dos estudos relativos à dimensão tecnológica dos sistemas de

inovação, uma das principais contribuições se originou a partir de estudos empíricos

sobre sistemas tecnológicos na Suécia coordenados por Bo Carlsson que apresentam

diversos elementos comuns com a abordagem sobre sistemas de inovação. Carlsson e

Jacobsson (1997: 268), descrevem estes sistemas a partir de redes de agentes que

interagem numa área tecnológica e sob uma infra-estrutura institucional específica, na

geração difusão e utilização de tecnologias. Esses sistemas são definidos em termos de

fluxos de conhecimento e competência ao invés de fluxos de produtos e serviços.

Entretanto, ainda que destaquem a dimensão tecnológica que caracteriza os fluxos de

conhecimento entre agentes como uma unidade básica de análise dos sistemas de

inovação, esses autores também reconhecem a importância que assume a dimensão local

na configuração das redes.

A importância atribuída às especificidades locais na constituição de sistemas de

inovação também é destacada por Ehrnberg e Jacobsson (1997), que afirmam que um

sistema tecnológico local e funcional pode dar à firma um conjuntos de vantagens no

processo de superação das descontinuidades tecnológicas. De acordo com esses autores,

evidências empíricas demonstram que as firmas e inovações tendem a agrupar-se

espacialmente e que as regiões geográficas freqüentemente se especializam em certas

áreas industriais ou tecnológicas. O chamado "conhecimento coletivo" relacionado a

proximidade territorial tende a conduzir o comportamento de uma região em relação a

"como fazer a coisas" significando que o desenvolvimento regional tende a convergir

para uma trajetória path dependent. Entretanto, isso pode tornar-se uma desvantagem na

medida em que acentua a inércia da região como um todo, sugerindo que os

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157

ajustamentos decorrentes de processos de mudança tecnológica podem ocorrer de forma

muito lenta.

Ainda que os enfoques centrados na dimensão nacional e tecnológica dos

sistemas de inovação não descartem a importância da dimensão localizada destes

sistemas, a noção de sistemas regionais de inovação somente passa a ganhar destaque a

partir da contribuição de autores como Saxenian (1994); Cooke e Morgan (1994); e

Scott (1994).

Em linhas gerais, este tipo de enfoque sobre sistema regional de inovação (RIS)

encontra-se fundamentado, em parte, na visão evolucionária sobre sistemas de inovação

e incorpora ainda elementos teóricos oriundos das novas abordagens sobre a nova

ciência regional. Neste sentido, o RIS é definido por alguns autores em termos de uma

ordem coletiva baseada em formas de regulação microinstitucionais e condicionada por

elementos como confiança, intercâmbio e integração cooperativa (Braczik et al, 1998:

1580). A região, por sua vez, é apresentada como um tipo de organização coletiva

voltada para o aprendizado onde a dimensão sistêmica da inovação é sustentada por

uma combinação de dotações que incluem uma infra-estrutura organizacional e uma

superestrutura associativa. Da mesma forma, encontra-se implícita nesta análise a noção

de ‘embeddedness’ representando uma ordem social coletiva que evolui de acordo com

os hábitos, rotinas e regras do jogo que integram as convenções institucionais em

âmbito local (Grabher, 1993).

Um dos modelos que discute a relação entre diferentes graus de

institucionalização de sistemas regionais de inovação bem como sua capacidade de

gerar e sustentar processos de transferência tecnológica é apresentado por autores como

Cooke e Morgan (1994 e 1998). Tal modelo, abrange aspectos da estrutura produtiva e

da infra-estrutura institucional e de coordenação de aglomerações produtivas.

O modelo baseia-se em duas categorias principais. A primeira, envolve a infra-

estrutura de coordenação e remete particularmente às modalidades de transferência

tecnológica nessas aglomerações. O processo de transferência tecnológica é analisado

tendo em vista o âmbito no qual tal processo tem início, suas fontes de financiamento,

nível de especialização técnica e grau de coordenação supra local.

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158

De acordo com essas características, os SRI podem ser agrupados em três

modalidades distintas com relação à infra-estrutura de coordenação. Na primeira

modalidade, ‘grassroots’, os principais elementos envolvendo processos de

transferência tecnológica encontram-se sob a responsabilidade de atores locais ou

regionais; os esquemas de financiamento tendem a apresentar origem difusa; o nível de

especialização técnica é baixo bem como o grau de coordenação supra local; enquanto

as bases de conhecimento se refletem na pesquisa aplicada ou voltada para o mercado.

Na segunda modalidade, ‘networks’, tanto a inicialização de processos de transferência

tecnológica, como suas fontes de financiamento, bases de conhecimento e demais

elementos são definidos a partir de diferentes níveis territoriais (local, regional, nacional

e supra nacional). Já na terceira modalidade, ‘dirigiste’, a maior parte dos elementos

relacionados ao processo de transferência tecnológica são definidos a partir de

instâncias e atores que se encontram fora ou acima do local ou região focalizados.

Uma segunda categoria analítica – a da inovação empresarial – é proposta com

vistas a complementar a dimensão relacionada à infra-estrutura de coordenação. A

exemplo da primeira, esta dimensão também envolve três modalidades que visam

descrever a postura das empresas que integram economias regionais, tanto em termos

das suas relações horizontais, como nas suas relações verticais com fornecedores e

consumidores (Braczik et al, 1998). Neste contexto, na primeira modalidade, ‘localist

RIS’, os sistemas regionais são caracterizados pela ausência ou número reduzido de

grandes empresas locais e/ou ramos de grandes conglomerados controlados

externamente. Da mesma forma, tais sistemas apresentam um elevado grau de

associativismo entre atores locais, ainda que as atividades de pesquisa das empresas não

apresentem grande alcance. Na segunda modalidade, ‘interactive’ RIS, os sistemas são

caracterizados pela existência de equilíbrio no número de pequenas e grandes empresas

e manutenção de esquemas associativos entre atores locais que são expressos através de

redes industriais, fóruns empresariais, etc. Finalmente, na terceira modalidade,

‘globalized’ RIS, existe um claro predomínio de corporações globais que são

geralmente apoiadas por cadeias de fornecedores locais.

Além de estabelecer um referencial que discute a natureza dos processos

inovativos de sistemas regionais a partir de elementos que envolvem sua infra-estrutura

e modos de coordenação, este enfoque logra avançar na caracterização da dimensão

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regional de tais sistemas. Este ponto é discutido por Cooke, Uranga e Etxebarria (1998:

1573) que apresentam alguns critérios para definição da dimensão regional:

“First, rather as with states, we would not advocate setting any size limit, such as population, to the designation. Second, the designation should, nevertheless, display homogeneity and identity with respect to certain limited criteria. Third, the designation should enable the region to be distinguishable from other regions by reason of certain kinds of specificity. Fourth, it should display some features of internal integration and cohesion, for example in administrative terms. Thus a region is a territory less than its sovereign state possessing distinctive supralocal administrative, cultural, political, or economic power and cohesiveness, differentiating it from its state and other regions”

Neste aspecto, Cooke e Morgan (1998), apontam para uma diferenciação

importante sobre o grau de coesão de um determinado território e sua própria trajetória

de evolução. Por um lado, a evolução de uma região ou território pode ocorrer através

de um processo de regionalização onde sua delimitação e coesão são definidas a partir

de forças supralocais, seja através do Estado ou de outras instâncias administrativas. A

criação de regras e convenções, neste caso, ocorre independentemente da existência de

identidades socio-culturais regionais que são fundamentadas em processos históricos.

Por outro lado, o regionalismo envolve uma forma distinta de evolução territorial

caracterizada pela existência de uma forte coesão ligada à existência de identidades

sócio-culturais ou econômicas. Assim, enquanto o processo de regionalização envolve a

imposição de formatos organizacionais com vistas a estimular o desenvolvimento de

instituições regionais, o processo de regionalismo envolve a consolidação de

organizações pré-existentes que permitam dar expressão às instituições regionais

(Cooke, Uranga e Etxebarria, 1998: 1574).

2.3.4 - Novos espaços industriais e sistemas locais de produção

A noção de novos espaços industriais foi proposta inicialmente por autores como

Storper (1982 e 1995) e Scott (1988 e1995) e combina elementos da literatura sobre

distritos industriais, da discussão sobre sistemas flexíveis de produção e da abordagem

evolucionária. O principal foco de discussão recai sobre a relação entre territórios,

tecnologias e organizações.

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Um dos principais argumentos desta literatura reside na percepção de que

economias territoriais não são criadas unicamente pela proximidade nas estruturas de

insumo-produto, mas principalmente pela proximidade na chamada dimensão relacional

de organizações e tecnologias. Assim, a importância da proximidade territorial para a

organização das atividades produtivas e inovativas em sistemas produtivos locais

somente pode ser traduzida através de ‘ativos relacionais’ ou ‘dependências não

comerciais’32

Kirat e Lung (1999: 29-30), por exemplo, enfatizam os diferentes significados

que assume a noção de proximidade na análise de processos de aprendizado interativo.

Inicialmente, a proximidade pode ser concebida através da sua dimensão meramente

geográfica, como uma configuração de atores econômicos que integram um mesmo

sistema produtivo territorial, independentemente da existência de processos de

aprendizado coletivo. Alternativamente, a proximidade pode estar relacionada à

existência de interdependências tecnológicas ou industriais associadas às relações de

complementaridade e similaridade na produção que caracterizam os distritos industriais.

Contudo, na medida em que procura-se explorar em que grau esses

relacionamentos entre atores econômicos abarcam processos de aprendizado coletivo,

torna-se crucial compreender a dimensão organizacional e institucional da proximidade.

Tendo em vista que o aprendizado consiste num processo que é eminentemente social,

as organizações constituem um espaço onde são definidas as estratégias e práticas de

atores que compartilham um conjunto de regras e valores comuns que, por sua vez,

emergem da matriz institucional na qual estas organizações se inserem. Em outras

palavras, enquanto a proximidade organizacional cumpre uma função de interligar um

conjunto de atores que integram empresas e outras entidades concretas em torno de um

modelo cognitivo comum, a proximidade institucional denota modelos, regras e outros

tipos de estrutura de representação coletivas que servem de base para formulação das

estratégias e práticas desses atores.

Do ponto de vista evo lucionário, a importância da proximidade entre diferentes

atores no âmbito de uma região pode ser analisada a partir das relações de

32 “These assets are claimed to have a direct impact on a region’s competitive potential insofar as they constitute part of the learning environment for firms. They provide the daily access to the relevant resources (information, knowledge, technology, ideas, training and skills) that are activated trough the networks of interdependency and common understanding that surrounds individual firms” (Amin, 1999).

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interdependência que se refletem, fundamentalmente, sobre as condições de criação e

difusão de conhecimentos. Neste sentido, uma dada região torna-se fundamental para o

processo de capacitação tecnológica na medida em que se constitui num espaço onde a

diversidade tecnológica é criada e, posteriormente, limitada no sentido de definir

trajetórias específicas (Storper, 1996).

Em particular, Storper apresenta a noção de territorialização do desenvolvimento

econômico como um fenômeno distinto da mera localização de atividades econômicas

num mesmo espaço territorial. A territorialização é definida como um conjunto de

atividade econômicas que é dependente de recursos específicos do ponto de vista

territorial. Tais recursos, tanto podem assumir a forma de ativos territoriais específicos

(no sentido material), como podem traduzir também ativos relacionais que encontram-se

disponíveis a partir de relacionamentos e arranjos inter-organizacionais que envolvem

necessariamente a proximidade entre os atores envolvidos. Apesar de ampla, essa

definição sobre territorialização destaca claramente a importância da proximidade

geográfica na constituição de externalidades positivas (spillover effects) em um sistema

de atividades econômicas. Dessa forma: “An activity is fully territorialized when its

economic viability is rooted in assets (including practices and relations) that are not

available in many other places and cannot easily or rapidly be created or imitated in

places that lack them” (Storper: 1997:170).

Num linha de argumentação semelhante, Maillat (1996) enfatiza que a dinâmica

de construção da identidade regional de sistemas produtivos não pode ser definida a

priori na medida em que decorre das estratégias adotadas pelos agentes econômicos em

âmbito local, das suas formas de interação e dos mecanismos de aprendizado. Neste

contexto, o sistema produtivo local é visto como um conjunto de unidades

interdependentes e atores econômicos que estão sujeitos à influência de duas lógicas

distintas em termos de organização geográfica: a lógica funcional e a lógica territorial.

A lógica funcional reflete um tipo de organização industrial baseada na

hierarquia33 e independe de uma localização específica para operar dando lugar a uma

33 Em termos conceituais a noção de hierarquia contrapõe-se à noção de ‘mercado’ e reflete formas de organização do processo produtivo baseadas na centralização das decisões características das grandes corporações e de formas extensivas de integração vertical e horizontal. Uma abordagem alternativa, propõe a organização do processo produtivo a partir de um espaço meso-econômico, característico das formações de redes de empresas e constitui-se numa espécie de meio termo entre as duas formas

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162

divisão de tarefas e à dispersão da produção no espaço. A organização funcional da

produção encontra-se centralizada em uma grande empresa (ou num pequeno número de

grandes empresas) que distribui as funções produtivas no espaço na medida em que os

mercados se expandem visando uma otimização de custos. Em termos inovativos, a

lógica funcional assume que o dinamismo do processo de criação e desenvolvimento de

novas tecnologias reside na grande empresa e que a única forma da periferia

acompanhar esse desenvolvimento é através dos spin-offs gerados a partir do centro. Tal

situação gera uma assimetria nas relações que se estabelecem entre as regiões - que

servem de base para esse tipo de atividade - e o centro, representado pela grande

empresa, que tira vantagens decorrentes da distribuição de diferentes funções de

produção em regiões separadas.

A lógica territorial, situada no outro extremo da análise, coloca em discussão as

interdependências entre os atores econômicos que são engendradas a partir da dinâmica

local onde, ao contrário do que ocorre na lógica funcional, os empreendimentos

estabelecem localmente as redes de cooperação e troca. Na mesma medida em que as

especificidades regionais dão suporte ao desenvolvimento desses empreendimentos, são

construídos vínculos e interações que não se restringem às trocas entre empresas, mas

envolvem também outros agentes e instituições como centros de pesquisa, instituições

de ensino ou entidades governamentais locais. A compreensão do processo que leva ao

desenvolvimento da capacidade de inovação de uma região em relação a outra, tendo

em vista a influência da lógica territorial ou funcional, passa a depender, então, do

ambiente inovativo inerente a cada região.

A discussão sobre os diferentes tipos de lógica que moldam a organização

territorial de empresas reflete, em particular, a noção de estruturas de governança que

são inerentes às relações entre diferentes segmentos de atores no âmbito de

aglomerações produtivas. Neste aspecto, Storper e Harrison (1991), discutem a

influência das estruturas de governança na organização territorial de sistemas de

produção a partir de um modelo que engloba três dimensões de análise: i) a estrutura

dos sistemas de insumo-produto; ii) as formas de coordenação desses sistemas; e iii) os

formatos territoriais das atividades industriais.

anteriores. Para uma discussão detalhada ver Williamson (1975).

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163

O primeiro elemento, a estrutura dos sistemas de insumo-produto, reflete um

conjunto de atividades que leva à produção de um bem ou serviço comercializável

específico, e possibilita uma análise do grau de flexibilidade destes sistemas, segundo o

grau de economias de escala e escopo que são geradas tanto em nível da empresa como

da indústria 34. O segundo elemento refere-se às formas de coordenação ou estrutura de

poder inerente ao sistema de produção e, portanto, reflete o grau de poder que

apresentam os agentes econômicos no sentido de afetar o desenvolvimento do sistema.

O terceiro elemento é justamente aquele que possibilita analisar a dimensão espacial do

processo de inovação nos sistemas produtivos na medida em que determina o grau de

aglomeração ou dispersão das atividades industriais nos sistemas produtivos.

Em primeiro lugar, a análise das estruturas de insumo-produto permite

identificar desde pequenas unidades produtivas isoladas (onde economias de escala e

escopo são reduzidas), até redes de produção com grandes unidades produtivas (onde

tais economias são elevadas). Além do grau de aglomeração espacial de diferentes

configurações produtivas, este modelo também analisa o impacto de diferentes formas

de coordenação na forma pela qual atividades produtivas são organizadas no espaço

territorial. Tais formas de coordenação são vistas como refletindo a estrutura de poder

inerente ao sistema de produção e, portanto, o grau de poder que apresentam os agentes

econômicos no sentido de afetar o desenvolvimento do sistema.

Em segundo lugar, as estruturas de governança e as formas de coordenação do

sistema de produção são classificadas de acordo com o número de agentes potenciais

que participam na cadeia de fornecimento e com a natureza qualitativa destes vínculos.

De acordo com esses condicionantes, as estruturas de poder são representadas através de

duas situações extremas. Num extremo, tais relações podem ser totalmente assimétricas

(core), de modo que algumas firmas apresentam a possibilidade de determinar a

existência de outras. No outro extremo, estão relações marcadas pela simetria no poder

34 Enquanto as economias internas de escala e escopo são utilizadas para explicar o tamanho das firmas ou unidades produtivas presentes nesses sistemas, as economias externas de escala e escopo encontram-se associadas com o grau de flexibilidade da produção e de divisão social do trabalho na indústria. Assim, economias externas de escopo existem quando o processo de produção é fragmentado de modo que o escopo do sistema como um todo é amplo, mas o das unidades individuais é restrito. Da mesma forma, economias externas de escala e escopo são associadas com a flexibilidade na produção. A formação de redes constitui-se numa forma particularmente importante para obtenção de flexibilidade na produção, dadas as possibilidades que oferece no ajustamento das relações inter-unidades permitindo mudanças nas quantidades e na qualidade da produção e viabilizando a adaptabilidade de um sistema insumo -produto

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entre diferentes segmentos de agentes (ring), onde a existência de firmas não depende

necessariamente do poder de decisão de outras empresas. Diferentes combinações

associadas ao grau de especificidade dos ativos e níveis de especialização em cada

configuração produtiva podem resultar numa ampla variedade de situações de equilíbrio

associados às relações de poder e formas de coordenação dos sistemas produtivos.

(Stoper e Harrison, 1991: 412).

A noção de sistema de produção reflete, portanto, a idéia de que qualquer

sistema de insumo-produto está necessariamente inserido numa estrutura de

coordenação específica. Assim, as relações de poder e estruturas de decisão inerentes ao

conjunto das atividades que compõe o processo produtivo passam a definir o formato do

sistema de produção. Do ponto de vista territorial, a posição que a região ocupa em

relação aos sistemas que abriga e nos quais as empresas estão vinculadas, constitui-se

num fator importante pois reflete o poder de barganha da região e seu poder de interferir

no desenvolvimento desse sistema.

O quadro final definido a partir deste modelo é bastante interessante. Mais do

que um esquema classificatório para identificação de formatos diversos de sistemas

produtivos, este modelo permite explorar algumas hipóteses importantes relativas aos

caminhos evolutivos destes sistemas. Em particular, a noção de sistema de produção

apresentada pelos autores, apresenta uma visão dinâmica que permite analisar as

trajetórias evolutivas de diferentes formatos de aglomerações de acordo com elementos

que refletem mudanças tanto na estrutura produtiva como nas relações de poder

inerentes a essas aglomerações.

Da mesma forma, ainda que este tipo de modelo ofereça uma representação

esquemática que permite analisar o funcionamento de diferentes sistemas de produção

tendo em vista sua relação com a dimensão territorial, o que se verifica, na realidade,

são padrões mais complexos de relacionamento dadas as possibilidades de interação

entre diferentes sistemas produtivos. Uma mesma empresa, por exemplo, pode,

participar de mais de uma rede, cuja configuração tanto pode refletir uma estrutura

centralizada e hierarquizada com vínculos territoriais fracos, como uma estrutura

descentralizada, baseada em vínculos de cooperação e com forte aglomeração territorial.

em relação a choques externos e encorajando impulsos internos de mudança, como na inovação de produtos (Storper e Harrison, 1991: 409).

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165

2.4 - Conclusões

Apesar da diversidade em termos de suas matrizes teóricas, o conjunto de

abordagens discutidas ao longo do capítulo apresenta uma visão convergente sobre a

importância que assume a proximidade territorial na busca de vantagens competitivas e

inovativas. Ta l percepção se reflete num conjunto relativamente consensual de

argumentos que engloba, em primeiro lugar, a importância crescente atribuída às

aglomerações produtivas locais enquanto elemento central na competitividade

econômica e no dinamismo tecnológico das firmas.

Em segundo lugar, a região é encarada como um espaço cognitivo onde valores

comuns e outros ativos intangíveis contribuem para o sucesso dos processos de

aprendizado interativo e tendem a minimizar os custos de transação entre firmas. Assim,

ao mesmo tempo em que o aprendizado interativo é apontado como principal

mecanismo para o desenvolvimento econômico e tecnológico, a proximidade territorial

é considerada como o melhor contexto para troca de conhecimentos tácitos.

Em terceiro lugar, ainda que a firma permaneça como a unidade central de

análise do processo de inovação, as firmas são reconhecidas como organizações cuja

dinâmica de aprendizado encontra-se associada à contextos institucionais mais amplos.

Dessa forma, a dimensão institucional, considerada como o conjunto de normas sob as

quais sistemas locais de produção são organizados, torna-se um aspecto crítico para

compreensão da inovação e da competitividade local e regional. Da mesma maneira, a

análise sobre o papel desempenhado por desenhos institucionais não pode ser dissociada

das estruturas de governança que delimitam o escopo de ação de atores locais e externos

nas aglomerações produtivas.

Em quarto lugar, um outro importante ponto de convergência entre essas

contribuições refere-se ao esforço de analisar os processos de inovação em âmbito local

e regional a partir de um arcabouço dinâmico. Em outras palavras, percebe-se nas

diferentes abordagens o interesse em focalizar trajetórias de desenvolvimento ao invés

de se restringir ao estudo dos elementos estruturais de aglomerações produtivas. Neste

aspecto, existe um amplo reconhecimento de que estes elementos e suas relações

tendem a mudar na medida em as aglomerações produtivas evoluem.

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166

A noção de proximidade territorial apresenta um alcance e uma delimitação

diferenciada de acordo com o tipo de abordagem utilizado. Na maior parte dos modelos

inspirados na abordagem sobre millieu inovativo, a proximidade é representada através

da noção mais genérica de espaço mesoeconômico que denota a existência de sistemas

produtivos territoriais, mas também abarca sua dimensão organizacional e institucional.

Na abordagem sobre clusters industriais a noção de proximidade assume uma clara

identificação com a idéia de aglomerações que se originam a partir da concentração

espacial e setorial de empresas. Essa visão é compartilhada, em parte, pelos modelos

oriundos da abordagem sobre sistemas de inovação que também destacam a articulação

entre elementos espaciais e setoriais na definição de sistemas regiona is e locais de

inovação. Não obstante estas pequenas divergências, existe um consenso entre os

diferentes enfoques de que a proximidade territorial representa uma condição necessária

para existência de aglomerações produtivas, mas não constitui-se em condição

suficiente para a promoção do dinamismo competitivo e inovativo de empresas. O

desenvolvimento de processos de aprendizado voltados para a inovação no âmbito de

aglomerações produtivas implica não somente na proximidade geográfica, mas na

existência de outras formas de proximidade relacionadas a fatores institucionais,

culturais e tecnológicos, com vistas à troca efetiva de conhecimentos tácitos e

codificados entre agentes.

Assim, com base nos elementos analíticos que integram as abordagens teóricas

discutidas ao longo do capítulo, é possível destacar o conjunto de critérios a serem

considerados na constituição do referencial de análise dos estudos de caso apresentados

na segunda parte da tese.

Inicialmente, a fim de incorporar a dimensão territorial como uma unidade

própria de análise que define o espaço onde processos produtivos e inovativos têm

lugar, o referencial que serve de base para discussão dos estudos empíricos apresentados

na segunda parte da tese baseia-se no conceito de arranjo ou sistema produtivo local.

Este conceito refere-se genericamente aos diferentes tipos de aglomerações produtivas

(tais como clusters, redes, distritos industriais, etc.) que apresentam fortes vínculos

envolvendo diferentes segmentos de atores localizados num mesmo território. Da

mesma forma, na medida em que se baseia numa concepção mais ampla de sistema de

inovação, este conceito inclui não apenas empresas (produtoras, fornecedoras,

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167

prestadoras de serviços, comercializadoras, etc.) e suas diversas formas de

representação e associação (particularmente cooperativas), mas também diversas outras

instituições públicas e privadas (voltadas à: formação e treinamento de recursos

humanos; pesquisa, desenvolvimento e engenharia; consultoria; promoção e

financiamento, etc.) (Lastres e Cassiolato, 1999; Lastres, Cassiolato, Lemos; Maldonado

e Vargas, 1999; e Cassiolato e Szapiro, 2002).

É importante enfatizar que apesar de partir de um recorte setorial, a

caracterização dos arranjos e sistemas produtivos envolve um referencial de análise

mais amplo que inclui elementos relacionados à estrutura setorial dos arranjos, mas

abarca também outros aspectos relativos ao sistema local de inovação e seu contexto

institucional. Por um lado, a percepção de que processos de inovação transcendem a

esfera da firma individual e assumem uma dimensão claramente sistêmica contribuiu,

em parte, para identificação de aglomerações produtivas a partir de um recorte

tradicional de setores industriais. Por outro lado, a adoção de um enfoque unicamente

setorial apresenta limitações, seja no sentido de negligenciar a diversidade associada aos

elementos institucionais e históricos que integram sistemas produtivos territoriais, seja

pela sua incapacidade de captar a volatilidade de tecnologias ligadas às fronteiras de

setores industriais. Essa articulação pode assumir um papel complementar importante na

análise da dinâmica inovativa e competitiva de aglomerações produtivas, na medida em

que as implicações tecnológicas de cunho setorial sejam consideradas a partir da sua

interação com configurações institucionais e organizacionais específicas associadas a

sistemas produtivos territoriais.

A partir desta noção ampla de aglomeração produtiva territorial refletida no

conceito de arranjo produtivo local, a constituição do referencial analítico procura

abarcar também três importantes tipos de diferenciação mencionadas nas abordagens

discutidas anteriormente.

A primeira, refere-se à distinção entre sistemas de produção e sistemas de

conhecimento, tendo em vista os atores e vínculos relacionados a cada um desses tipos

de sistema. Neste aspecto, as relações entre atores que integram aglomerações

produtivas são geralmente definidas em termos de fluxos de insumos e produtos através

dos vínculos verticais (entre empresas e fornecedores) ou horizontais (entre empresas de

um mesmo segmento). Porém, são os fluxos de informação e conhecimento entre atores

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locais que determinam a incorporação de novos produtos e processos nas empresas.

Apesar da clara interação existente entre os sistemas de produção e de conhecimento em

arranjos produtivos, a natureza desta interação é variável e geralmente envolve

conjuntos diferenciados de atores (Carlsson e Stankiewicz, 1991; Bell e Cassiolato,

1993; Bell e Albu, 1999). A adoção desta diferenciação no escopo do referencial de

análise permite explorar a influência de segmentos diversos de atores na organização

dos sistemas de produção e na adoção de inovações em produtos e processos produtivos

nos arranjos.

Um segundo tipo diferenciação, envolve a influência das estruturas de

governança e refere-se ao impacto da interação entre instâncias locais e globais de

coordenação na organização das atividades produtivas e inovativas dos arranjos. Esta

questão é enfatizada em particular na literatura recente sobre clusters nos países em

desenvolvimento, tendo em vista a crescente internacionalização de mercados que

amplia a inserção de produtores locais em cadeias produtivas globais (Humphrey e

Schmitz, 2000). Na análise dos estudos empíricos apresentada nos capítulos

subsequentes, as assimetrias de poder que emergem da interação entre instâncias locais

e globais de coordenação nos arranjos são discutidas tendo em vista a natureza da

inserção dos arranjos no mercado doméstico e externo.

Uma terceira diferenciação refere-se à origem das fontes de informações e

conhecimentos que servem de base para adoção de inovações nos arranjos e que podem

estar vinculadas a fontes locais ou externas às aglomerações. Da mesma forma,

conforme enfatizado tanto na literatura sobre millieu inovativo como nas abordagens

sobre sistemas de inovação, a capacitação inovativa de aglomerações produtivas não se

baseia unicamente na exploração de bases de conhecimento existentes, mas também na

habilidade de explorar novas bases de conhecimento através da promoção de processos

de aprendizado interativo. Neste aspecto, o referencial que serve de base para análise

dos estudos de caso apresentados a seguir, também avalia a importância relativa de

fontes internas e externas de informação e conhecimento, associadas ao processo de

aprendizado inovativo de atores locais.

Em particular, a aquisição de informações e conhecimentos por parte das

empresas pode ocorrer através de diferentes canais que envolvem tanto o uso de fontes

internas às aglomerações (tais como infra-estrutura tecnológica e educacional local,

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atividades de P&D nas empresas, etc), como também o uso de fontes externas (clientes,

fornecedores localizados fora do entorno geográfico do arranjo, feiras internacionais,

etc). Em muitos casos, fontes de informação e conhecimento situadas fora do entorno

territorial de aglomerações podem desempenhar um papel importante na dinâmica de

mudança tecnológica de atores locais. Em outros casos, são os centros de pesquisa,

associações empresariais e outras organizações locais que apresentam maior

participação no processo de criação de novos conhecimentos no arranjo.

Finalmente, outro aspecto a ser considerado na constituição do referencial

analítico refere-se ao fato de que a existência de processos de aprendizado interativo e

localizado não garante, necessariamente, a sustentabilidade do dinamismo competitivo e

inovativo de aglomerações produtivas. Por um lado, a proximidade entre os atores que

integram arranjos e sistemas produtivos pode promover as condições necessárias para

promoção de processos de aprendizado que garantem trajetórias inovativas estáveis

baseadas em inovações incrementais. Por outro lado, com vistas a evitar os riscos de

lock-in nas trajetórias de aprendizado, os arranjos produtivos também devem mostrar a

capacidade de romper trajetórias através de inovações radicais, onde a capacidade de

incorporação de conhecimentos a partir de fontes externas assume uma importância

crucial (Cooke e Morgan, 1998:74-75; Maskell e Malmberg, 1999). Um ponto crucial,

portanto, refere-se à capacidade de atores locais, tais como empresas, universidades ou

centros tecnológicos, atuarem na articulação de bases de conhecimento internas e

externas aos arranjos, desempenhando assim a função de “porteiros tecnológicos” nos

sistemas de conhecimento de aglomerações (Bell e Albu, 1999).

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PARTE II - EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS DA EXPERIÊNCIA DE ARRANJOS PRODUTIVOS LOCAIS SELECIONADOS: ELEMENTOS PARA

ELABORAÇÃO DE UM REFERENCIAL ANALÍTICO

Introdução Geral

Nos capítulos subsequentes, discute-se a relação entre diferentes formatos de

arranjos produtivos locais e sua dinâmica inovativa e competitiva, através de um

referencial que abarca aspectos associados às formas de organização dos sistemas de

produção, estruturas de governança e mecanismos de aprendizado. Tal análise

comparativa é desenvolvida com base na experiência de quatro aglomerações produtivas

situadas no Estado do Rio Grande do Sul: o arranjo agro- industrial fumageiro localizado

na região do Vale do Rio Pardo; os arranjos vitivinícola e moveleiro localizados na

região da Serra Gaúcha; e o arranjo coureiro-calçadista da região do Vale dos Sinos.

Os estudos empíricos que servem de base para esta análise foram desenvolvidos

no escopo de uma rede de pesquisa que, desde 1997, tem se dedicado a analisar a

experiência de arranjos e sistemas produtivos locais nos países do Mercosul35. A

incorporação destes estudos foi baseada em alguns critérios objetivos de seleção que

levaram em conta fatores como a relevância econômica dos arranjos no contexto local e

regional; a sua relação com processos históricos de desenvolvimento regional e a sua

dimensão territorial, em termos do grau de concentração geográfica dos diferentes

segmentos de atores integrantes da cadeia produtiva em âmbito local e regional. O

conjunto de diretrizes que nortearam a composição da amostra em cada estudo de caso

bem como os instrumentos de coleta de dados utilizados nas pesquisa de campo são

apresentados no anexo metodológico no final deste trabalho.

Além de discut ir os resultados dos estudos empíricos, esta segunda parte da tese

abarca também a construção de um referencial analítico que procura resgatar as

proposições e diferenciações oriundas das abordagens teóricas discutidas na primeira

parte da tese, ao mesmo tempo em que incorpora novos elementos de análise que

35 A Rede de Pesquisa em Arranjos e Sistemas Produtivos e Inovativos Locais, envolve um conjunto de instituições e pesquisadores de diferentes Estados no Brasil e no exterior e conta com a participação e apoio financeiro de diversas instituições tais como Ministério de Ciência e Tecnologia, FINEP, BNDES, IPEA, CNPq, Organização dos Estados Americanos, entre outras. A coordenação geral desta rede de pesquisadores e instituições está estabelecida no Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - IE/UFRJ sob responsabilidade do Profs. José Eduardo Cassiolato e Helena Lastres. Maiores

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171

emergem a partir da discussão das evidências empíricas. Neste aspecto, procura-se

conciliar a diversidade conceitual que marca as abordagens que exploram a relação

entre espaço, competitividade e inovação apresentadas no capítulo anterior, com a

riqueza empírica que emerge a partir dos estudos de caso que são apresentados.

O principal objetivo deste referencial analítico consiste, portanto, em relacionar

a dinâmica competitiva e inovativa das aglomerações produtivas estudadas com

elementos que englobam três dimensões complementares:

• as características relativas à sua estrutura produtiva, principais mercados e

padrões de territorialização;

• as estruturas de governança e formatos institucionais que fornecem a base

de sustentação tanto para fluxos produtivos como para os fluxos de conhecimento e

informação;

• as principais características dos fluxos de conhecimento e mecanismos de

aprendizado associados a adoção e difusão de inovações em âmbito local.

A proposição deste referencial tem duas motivações principais. Em primeiro

lugar, ele reflete a necessidade de contar com um conjunto de critérios objetivos que

permita desenvolver uma análise comparativa entre os diferentes formatos de arranjos

produtivos que emergem dos estudos de caso apresentados a seguir. Em segundo lugar,

coloca-se uma motivação de cunho mais geral que remete ao desenvolvimento de

instrumentos de análise que auxiliem na discussão das especificidades que cercam a

trajetória de capacitação inovativa de aglomerações produtivas no contexto de países em

desenvolvimento, diante de um ambiente econômico crescentemente globalizado.

Neste aspecto, além das especificidades inerentes à dinâmica de aprendizado

tecnológico nos países em desenvolvimento mencionadas anteriormente, verifica-se

que, no decorrer da década de 90, as reformas estruturais (liberalização econômica,

abertura comercial e privatizações) acarretaram mudanças consideráveis nos padrões de

desenvolvimento industrial e tecnológico dos países em desenvolvimento. Tais

mudanças tiveram um impacto significativo sobre as estratégias inovativas e

detalhes sobre os objetivos e alcance do esforço desta rede podem ser encontrados em: http://www.ie.ufrj.br/redesist.

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competitivas do conjunto de arranjos analisados e representam, portanto, um recorte

importante na análise da sua trajetória recentes de evolução.

A seguir apresenta-se um panorama geral sobre o impacto deste processo de

reformas estruturais no Brasil tendo em vista suas principais implicações em termos da

evolução da estrutura industrial brasileira na década de 90. O detalhamento sobre o

impacto destas reformas estruturais sobre as trajetórias recentes, formas de organização

e estratégias inovativas dos arranjos produtivos analisados é apresentado ao longo dos

próximos capítulos.

Reformas estruturais e reestruturação produtiva na década de 90

Até a década de 80, a estrutura industrial brasileira havia atingido um elevado

grau de diversificação da produção e integração intersetorial. Neste período, a

participação de setores de maior valor agregado na estrutura industrial brasileira (tais

como os complexos químico e metal-mecânico), equivalente a 58,8% do produto total

da indústria, aproximava-se daquela verificada nas três principais economias

desenvolvidas em âmbito mundial (EUA, Japão e Alemanha)36.

Entretanto, com o esgotamento do modelo de crescimento econômico baseado

na substituição de importações e no financiamento externo, o país passa a enfrentar um

processo de estagnação. Por um lado, já no início da década de 80, fatores como a

debilidade do mercado interno brasileiro, deficiente integração com o comércio

internacional e a limitada dinâmica inovativa do setor produtivo contribuíam

significativamente para a instabilidade do processo de industrialização brasileiro. Por

outro lado, nesse mesmo período, a indústria mundial passava por um processo de

transformação marcado pelo aumento da concorrência internacional e pelo ritmo mais

intenso de incorporação de inovações tecnológicas associadas a um novo paradigma

tecno-econômico, colaborando assim para um persistente atraso relativo da indústria

brasileira que dura até os dias de hoje.

Dessa forma, a incapacidade da indústria brasileira de manter um ritmo

sustentado de crescimento ao longo da década de 80, aliada à crescente instabilidade

36 Em 1980 os EUA, Japão e Alemanha Ocidental tinham aproximadamente dois terços de sua produção industrial originada dos setores de bens de capital, bens de consumo durável e automobilístico. A proporção de tais setores no total da indústria era de 64,4% no caso dos EUA, 64,5% no caso do Japão e 69,8% no caso da Alemanha Ocidental (Cassiolato, 1992; Bell e Cassiolato, 1993; Ferraz et al., 1995:55;

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173

macroeconômica e à crise de financiamento do setor público trouxeram efeitos

extremamente danosos sobre os determinantes sistêmicos da competitividade37. Do

ponto de vista do papel do Estado, a crise financeira do setor público representou apenas

mais um aspecto importante de um movimento amplo de desmantelamento institucional

do Estado desenvolvimentista brasileiro. Esse processo de desarticulação e perda da

capacidade de gestão de políticas públicas trouxe reflexos tanto sobre a capacidade

regulatória do Estado como sobre aquelas políticas de intervenção ativa nos campos de

comércio exterior, tributária, industrial e científica e tecnológica (Ferraz et ali, 1995:

61).

O quadro de perda do dinamismo industrial, instabilidade macroeconômica e

estagnação da produção trouxe mudanças qualitativas importantes sobre o perfil das

estratégias empresariais. De uma maneira geral, o processo de ajuste produtivo que foi

empreendido pela maioria das empresas industriais consistiu numa estratégia defensiva

de racionalização da produção. Os principais objetivos deste ajuste foram a redução de

custos, aumento de eficiência e qualidade e maior flexibilidade frente ao acirramento da

concorrência (Tigre et al., 2000)

O processo de ajuste defensivo das empresas envolveu três etapas distintas.

Inicialmente, na primeira metade da década de 80, a conjunção de fatores como uma

grave crise cambial, mercado interno deprimido e aceleração inflacionária, se refletiram

em dois tipos de movimento. No plano patrimonial, as empresas adotaram um profundo

ajuste financeiro com redução do endividamento e aumento de receitas não operacionais

através de aplicações financeiras. No plano produtivo, as empresas mais dinâmicas

buscaram ampliar sua inserção externa e promoveram a modernização de plantas

industriais através da incorporação de novos equipamentos de base microeletrônica.

A segunda fase, que teve início em meados da década de 80, foi marcada pela

adoção de novas formas de organização da produção com vistas ao aumento da

produtividade. Esta fase representou uma reorientação das empresas para o mercado

Tigre et al. 2000). 37 Os determinantes sis têmicos da competitividade são aqueles que constituem externalidades sobre as quais as empresas produtivas detêm escassa ou nenhuma possibilidade de intervenção constituindo, portanto, parâmetros do processo decisório. Tais determinantes podem ser: macroeconômicos, político-institucionais, legais -regulatórios, infra-estruturais, sociais ou internacionais. Para uma discussão detalhada sobre tais fatores ver Ferraz et ali (1995: 1-53).

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interno, na medida em que o processo de abertura comercial e liberalização começava a

ser sinalizado através de reduções tarifárias38. A estratégia de reestruturação voltada

para adoção de novas técnicas organizacionais atingiu um amplo espectro de empresas

nos mais diversos setores industriais.

Apesar dos efetivos avanços em termos do aumento da produtividade que foram

conquistados pelas empresas até o final da década de 80, o prolongamento da recessão

de 1990 a 1992 e a consolidação do processo de liberalização comercial implicaram

numa nova etapa de ajuste. Até então, a racionalização de custos havia abarcado

atividades administrativas não essenciais como limpeza e segurança, bem como o

enxugamento de níveis hierárquicos, entre outras medidas. Porém, nesta terceira etapa o

esforço de redução de custos teve como foco principal os processos produtivos das

empresas e incluíram desde a redução no número de linhas de produto até a

desverticalização da produção com aumento do conteúdo importado de componentes e

partes (Ferraz et al., 1995: 73-75)

Do ponto de vista da estrutura industrial, o resultado da multiplicidade de

reformas efetuadas no Brasil nos anos 90, aponta para realização de um processo parcial

de reestruturação baseado principalmente numa maior incorporação de insumos e bens

de capital importados, redução de custos, introdução de novas técnicas organizacionais

e especialização produtiva. Em particular, a maior parte dos investimentos realizados

estiveram voltados para modernização da estrutura produtiva e aumento da

produtividade através da reposição de equipamentos, redução de custos e eliminação de

gargalos na estrutura produtiva. Entretanto, a ausência de maiores investimentos em

novas plantas produtivas e em setores de maior valor agregado e tecnologicamente

sofisticados, constituem ainda uma importante limitação para inserção competitiva da

indústria brasileira em mercados internacionais dinâmicos (Tigre et al., 2000:220).

Neste aspecto, a análise do novo modelo de investimento na economia brasileira a partir

dos anos 90, revela o melhor desempenho daqueles setores que, de algum modo,

retiveram maiores níveis de proteção contra a concorrência externa (como no caso dos

bens duráveis de consumo, por exemplo), com maior produtividade e onde a presença

de empresas transnacionais é mais intensa (Baumann, 2000:45).

38 Conforme enfatizado por Baumann (2000: 20) “A liberalização comercial teve início em 1987, com a primeira mudança ocorrida em trinta anos da estrutura de tarifas nominais, e um redução progressiva das alíquotas tarifárias, que foi acelerada desde 1990. As alíquotas tarifárias simples (não ponderadas) foram

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175

É importante ressaltar que, considerando-se as transformações no ambiente

industrial e tecnológico desde a década de 80, a evolução da estrutura industrial

brasileira apresenta um padrão diverso daqueles países que tiveram sucesso na

internalização dos setores associados ao novo paradigma tecno-econômico (como

microeletrônica e biotecnologia) na sua estrutura econômica. Conforme é destacado por

Cassiolato (2001: 23), nos principais países da OCDE a diminuição da importância do

setor industrial no produto, entre 1980 e 1995, esteve acompanhada pelo aumento

significativo na participação de setores de alta tecnologia, em particular o complexo

eletrônico e biotecnologia, no valor adicionado. No Brasil, a redução da participação da

indústria de transformação no PIB no decorrer da década de 80 foi ainda mais intensa

do que aquela observada nos países da OCDE. Entretanto, tal retração foi acompanhada

pela estagnação ou mesmo retrocesso da participação daqueles setores industriais mais

dinâmicos na estrutura industrial brasileira.

TABELA 3.1 - Participação da Indústria e do setor Elétrico e de Comunicações no PIB – 1949-1999

SETORES 1949 1959 1970 1980 1990 1992 1995 1999 Indústria 25,4 33,9 38,3 44,11 42,1 38,3 36,29 30,59 Transformação 19,3 26,7 29,3 33,7 29,1 25,4 22,98 16,75 Mat. Elétrico e Comunicações

0,3 1,1 1,6 2,4 2,5 1,8 1,99 1,10

Mat. Elétrico e Comunicações/ Indústria (%)

1,11 3,24 4,18 5,44 5,94 4,70 5,48 3,60

Mat. Elétrico e Comunicações/ Indústria de Transformação(%)

1,55 4,11 5,16 7,12 8,59 7,08 8,66 6,56

Fonte: Cassiolato (2001) apud Bonelli e Pinheiro (2001)

Conforme pode ser observado na tabela acima, a participação do setor de

material elétrico e de comunicações que chegou a representar 7,12% da indústria de

transformação em 1980, e 8,59% em 1990, passou a representar apenas 6,56% em 1999.

Tal quadro contrasta, por exemplo, com a participação de quase 16% que este setor

apresenta atualmente na estrutura industrial dos Tigres Asiáticos (Bonelli e Pinheiro,

2001: 121).

as seguintes: 1988-1990: 33,4%; 1991-1993: 17,8%; 1994-1996: 12,9%; 1997-1998: 13,9%”.

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176

Além da reduzida participação de setores mais dinâmicos na estrutura industrial

brasileira, a abertura comercial e a presença significativa de empresas transnacionais

nestes setores têm sido associadas com desequilíbrios na balança comercial. De acordo

com Erber (2001), com a crescente abertura comercial a penetração das importações foi

especialmente significativa nos produtos baseados em ciência e de fornecedores

especializados que chegaram a representar 39% do consumo aparente em 1998. Da

mesma forma, nos produtos de alta tecnologia a participação das importações no

consumo aparente passou de 9% para 34% no período 1989/1998. Em alguns setores,

ainda que num primeiro momento a pressão competitiva internacional tenha induzido à

incorporação de tecnologias de produto e processo importadas, finalmente acarretou na

simples substituição da produção local por bens importados, contribuindo para redução

da demanda de atividades tecnológicas no país. Essa percepção é compartilhada por

diferentes análises sobre o padrão de desenvolvimento industrial e tecnológico na

década de 90 (Cassiolato e Lastres, 2000; Gonçalves, 2001; Tigre et al., 2000).

Gonçalves (2001: 21), por exemplo, destaca a regressão no padrão de inserção

brasileira no sistema mundial de comércio que estaria refletida no processo de

“reprimarização” da economia, traduzida na perda de competitividade internacional de

produtos manufaturados e ganho dos produtos agrícolas exportados. Tal fenômeno

reflete, em parte, uma mudança na estrutura de produção industrial brasileira com um

aumento expressivo da participação de setores baseados em recursos naturais, em

detrimento de setores intensivos em atividades tecnológicas mais complexas (Erber,

2001: 184).

O aumento na entrada de investimento direto estrangeiro e a privatização de

empresas estatais, por sua vez, provocaram profundas alterações na estrutura de capital

das empresas, em particular naqueles setores mais dinâmicos em termos da sua

capacidade de geração e difusão de inovações para o tecido industrial. Assim, em vários

casos, a desnacionalização de empresas nacionais com considerável dinâmica inovativa

representou uma redução no conteúdo tecnológico das atividades desenvolvidas

localmente (Cassiolato e Lastres, 2000).

É interessante observar que, do ponto de vista dos formuladores de políticas, o

processo de abertura, liberalização e privatizações também estaria criando as condições

necessárias para a integração da economia brasileira no mundo globalizado através da

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atração de empresas estrangeiras consideradas como um importante canal de

incorporação de tecnologia e modernização da estrutura industrial. Entretanto, o maior

questionamento com relação a este tipo de estratégia reside na forma que assumiu a

atração de capital estrangeiro no decorrer da década de 90. Cassiolato (2001: 41)

ressalta que este processo resultou num elevado déficit estrutural na conta corrente do

Brasil através do aumento nos fluxos de importação. Neste aspecto, o aumento do

investimento externo tem sido realizado fundamentalmente dentro de uma estratégia que

visa o acesso e controle de mercados locais e regionais e através da aquisição de

empresas locais (Laplane e Sarti, 1998). Da mesma forma, Erber (2001: 190), questiona

o impacto deste processo de internacionalização sobre a dinâmica tecnológica da

indústria brasileira. Erber concorda, em parte, com o argumento de que empresas

controladas por capital estrangeiro têm apresentado maior propensão à introdução de

novos produtos e processos, bem como uma intensidade de gastos em P&D maior do

que a de empresas nacionais. Ressalva porém que, em primeiro lugar, a maior

propensão inovadora de empresas sob controle estrangeiro é consistente com sua

orientação setorial tendo em vista sua participação elevada em alguns dos segmentos

industriais mais dinâmicos na indústria brasileira atualmente.

Em segundo lugar, a divisão de trabalho em termos das atividades tecnológicas

desenvolvidas pelas matrizes no exterior e pelas filiais brasileiras, ainda que justificável

do ponto de vista das economias de escala e escopo associadas a localização das

principais atividades de P&D nos países centrais, acaba por orientar o desenvolvimento

de capacitação tecnológica destas empresas no Brasil para atividades com alcance

inovativo limitado. Assim, a análise da transformação da estrutura de controle de capital

na indústria brasileira sugere, por um lado, uma aceleração na introdução de produtos e

processos mas, por outro, demonstra uma crescente orientação das atividades

tecnológicas em projetos de adaptação com finalidades mais simples.

Em síntese, diante da importância estratégica que assume o domínio das

tecnologias intensivas em informação, flexíveis e computadorizadas no novo contexto

competitivo que marca a chamada Economia do Conhecimento, a análise do processo

de reformas estruturais na economia brasileira revela sérias limitações. Em particular, a

experiência internacional demonstra que o uso eficiente de tais tecnologias não se

encontra dissociado da capacidade de geração e difusão das mesmas. Porém, verifica-se

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que as mudanças na estrutura industrial brasileira na década de 90 acentuaram os

problemas relativos à internalização de setores dinâmicos limitando, portanto, a

incorporação das novas tecnologias na estrutura produtiva da economia.

Tendo em vista a profusão de estudos que têm se ocupado do tema relativo às

mudanças na estrutura industrial brasileira, considera-se que não há necessidade de

aprofundar aqui tal discussão39. Alternativamente, a análise apresentada nos capítulos

subsequentes desta tese busca enfatizar as especificidades relativas ao impacto do

processo de reformas estruturais no Brasil no decorrer da década de 90 (liberalização da

economia, abertura comercial e privatização), sobre as estratégias competitivas e

inovativas adotadas pelo conjunto de empresas que integram os arranjos estudados.

39 Para um panorama detalhado sobre as implicações do processo de reformas estruturais a partir de diferentes óticas ver as diversas contribuições em Baumann (2000) e na edição especial da Revista de Economia Contemporânea do Instituto de Economia da UFRJ (vol.5 Edição especial 2001).

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179

3 - CARACTERIZAÇÃO DOS ARRANJOS PRODUTIVOS LOCAIS SELECIONADOS

3.1 – Introdução

Este capítulo incorpora a análise das evidências empíricas que emergem da

experiência das quatro aglomerações estudadas. O principal objetivo do capítulo é

apresentar uma caracterização inicial destes arranjos produtivos a partir de um conjunto

de elementos que abarca a discussão sobre sua origem e trajetória de desenvolvimento

até a década de 90, formas de organização territorial da produção, padrões de

concorrência e regime tecnológico, entre outros elementos associados a evolução da

estrutura produtiva e desempenho competitivo destes arranjos.

A diversidade nos padrões de organização territorial destes arranjos, bem como a

forma de articulação entre diferentes segmentos de atores que integram sua estrutura

produtiva regional permite destacar alguns critérios iniciais de classificação segundo seu

grau de territorialização e forma de inserção no mercado local e/ou externo. O quadro

3.1 abaixo apresenta um perfil inicial dos arranjos através de suas principais

características estruturais. Algumas destas características estruturais merecem um

destaque preliminar.

QUADRO 3.1 - Características da estrutura produtiva dos arranjos analisados Aglomeração Empresas* Perfil Produto Principais

Mercados Densidade da

estrutura produtiva

local Fumo 16 Predomínio de

grandes subsidiárias empresas

multinacionais (EMN)

Fumo processado e

cigarros

Exportações: subsidiárias de

EMN e agentes de exportação

Baixa

Calçados 500 Grandes e médias empresas

Calçados femininos de

couro

Exportações: cadeias

globais e mercado

doméstico

Alta

Móveis 350 Predomínio de Micro e

Pequenas Empresas

(MPEs) e poucas grandes e médias

empresas

Móveis residenciais de

madeira

Mercado doméstico: nacional

Baixa mas crescente

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180

Vinho 200 Predomínio de MPEs e

cooperativas

Vinhos comuns e

vinhos finos

Mercado doméstico: regional e nacional

Média

OBS: * corresponde ao número aproximado de empresas que integram o segmento produtivo principal do arranjo.

A relação com diferentes nichos de mercado representa um primeiro critério

importante de caracterização dos arranjos na medida em que reflete o alcance dos fluxos

de produção e as estruturas de governança implícitas ao longo dos diferentes estágios da

cadeia de valor nas quais os diferentes arranjos estão integrados. Neste aspecto, tanto o

arranjo agro- industrial fumageiro como o coureiro-calçadista têm no mercado externo o

seu principal canal de comercialização. No caso do arranjo fumageiro, cerca de 60% do

total de fumo produzido destina-se ao mercado externo enquanto que os 40% restantes

são destinados à produção de cigarros no mercado nacional. No Rio Grande do Sul, o

setor fumageiro responde por mais de 10% do total das exportações estaduais e é um

dos setores que mais contribui para o crescimento do PIB no Estado. Já o arranjo

coureiro-calçadista no Vale dos Sinos responde atualmente por cerca de 40% da

produção e quase 80% das exportações brasileiras de calçados, especialmente na linha

de sapatos femininos de couro. Da mesma forma, a produção de calçados continua

sendo um dos principais itens da pauta gaúcha de exportações juntamente com as

exportações de fumo em folha e processado.

Nos arranjos ligados à produção de vinho e móveis, apesar da sua crescente

inserção no mercado externo no decorrer da década de 90, os principais canais de

comercialização ainda encontram-se ligados ao mercado nacional e regional. Cerca de

83% da produção de móveis destina-se ao mercado nacional enquanto 17% é destinada

ao mercado externo. Entretanto, o crescimento acelerado das exportações na última

década coloca atualmente o arranjo moveleiro na posição de segundo pólo exportador

de móveis em nível nacional. No caso do arranjo vitivinícola, as exportações

representam um canal de comercialização ainda incipiente que se limita ao nicho de

mercado de vinhos finos e corresponde, por sua vez, a menos de 20% da produção total

de vinhos do arranjo. Porém, ainda que a exportação de vinhos finos responda

atualmente por cerca de 5% do total de vinhos comercializados pela indústria vinícola

brasileira, observa-se também um crescimento significativo das exportações deste

arranjo ao longo da década de 90.

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181

A densidade dos arranjos, definida em termos da concentração territorial dos

diferentes segmentos que integram uma determinada cadeia produtiva, representa um

segundo critério de caracterização. O arranjo produtivo coureiro-calçadista é, sem

dúvida, aquele que apresenta a estrutura produtiva regional mais completa em termos da

presença dos diferentes segmentos de atores que compõem a sua cadeia de valor em

âmbito regional. Além de um universo de cerca de 500 empresas calçadistas – grande

parte das quais MPEs – a região do Vale dos Sinos congrega um contingente

considerável de curtumes, fabricantes de máquinas, equipamentos e componentes,

agentes de exportação, prestadores de serviço, fabricantes de borrachas e plásticos, entre

outros atores que integram a cadeia produtiva local. A presença destes diferentes

segmentos de atores num raio de cerca de 50 km faz deste arranjo uma das mais densas

aglomerações produtivas do setor em nível mundial.

O arranjo fumageiro, por outro lado, apresenta uma estrutura produtiva com

poucos elos locais. O núcleo produtivo central deste arranjo é composto por cerca de 16

empresas – grande parte das quais subsidiárias de grandes conglomerados

transnacionais - que atuam na produção, processamento e comercialização de fumo,

além de um extenso contingente de pequenos produtores rurais (cerca de 70.000 no RS).

Entretanto, a maior parte dos fornecedores especializados do arranjo fumageiro,

incluindo os fabricantes de equipamento para o setor, encontram-se fora da estrutura

produtiva regional, instalados em outras regiões ou fora do país.

Já os arranjos vitivinícola e moveleiro, localizados na região da Serra Gaúcha,

constituem-se em casos intermediários em termos da densidade de sua estrutura

produtiva regional. No arranjo moveleiro, existem atualmente cerca de 350 produtores

de móveis e um universo considerável de fabricantes de máquinas e equipamentos para

o setor. Porém, apesar da Serra Gaúcha contar com um núcleo incipiente de

fornecedores de insumos especializados, os principais fornecedores do arranjo

encontram-se localizados no Paraná e nos Estados da região Sudeste do Brasil.

Finalmente, no caso do arranjo vitivinícola, a Serra Gaúcha conta atualmente com cerca

de 200 vinícolas, que se dividem entre pequenas cooperativas, cantinas familiares e

algumas poucas vinícolas com elevada capacidade de processamento (acima de 10

milhões de litros). Além das vinícolas, a região também abriga um extenso contigente

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182

de produtores rurais, fabricantes de equipamentos e máquinas, e fornecedores

especializados de insumos para a indústria vinícola.

Em termos da propriedade de capital, o arranjo fumageiro é o único que

apresenta um claro predomínio de subsidiárias de empresas transnacionais no controle

da estrutura produtiva local. No arranjo vitivinícola, a existência de algumas vinícolas

pertencentes a grupos transnacionais no arranjo não trouxe um impacto significativo

sobre as formas de organização da estrutura produtiva regional. Nos arranjos coureiro-

calçadista e moveleiro predominam MPEs, porém, a principal instância de controle da

cadeia-produtiva local encontra-se no segmento das grandes e médias empresas de

capital nacional.

A análise das seções subsequentes apresenta um detalhamento sobre as

características estruturais dos diferentes arranjos, ao mesmo tempo em que relaciona tais

características com sua trajetória evolutiva. A segunda seção discute o processo

histórico de formação dos arranjos e procura identificar os principais pontos de inflexão

no decorrer de suas trajetórias de desenvolvimento. A seguir, na terceir a seção, destaca-

se a relação entre a organização territorial destes sistemas produtivos e suas

características mais gerais em termos de padrões de concorrência e estrutura industrial.

A quarta seção discute a divisão de trabalho entre diferentes segmentos de atores que

integram os arranjos. A quinta seção conclui o capítulo destacando as especificidades

que marcam o impacto das reformas estruturais sobre a trajetória recente de

desenvolvimento de cada um dos arranjos.

3.2 –Origem, consolidação e estágios de desenvolvimento

A análise apresentada nesta seção identifica os principais pontos de inflexão que

marcam o processo de desenvolvimento dos arranjos estudados e estabelece alguns

paralelos entre suas diferentes trajetórias evolutivas, desde sua origem até a década de

90. A trajetória recente de desenvolvimento dos arranjos e sua relação com os impactos

advindos do processo de reformas estruturais na década de 90, são discutidos na seção

final deste capítulo e constituem também o pano de fundo da análise sobre as estruturas

de governança e estratégias inovativas que é apresentada nos capítulos subsequentes.

Conforme destacado no segundo capítulo, o processo de formação e

consolidação de aglomerações produtivas territoriais encontra-se associado a contextos

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históricos e culturais que geralmente se confundem com a própria trajetória de

construção de identidades regionais (Cooke et al., 1997). Essa construção institucional

de regiões pode tanto resultar de uma delimitação político-administrativa, como emergir

a partir de valores comuns associados a uma mesma base social, cultural, política e

econômica. Não obstante a clara interdependência existente entre estes dois tipos de

construção institucional de regiões, do ponto de vista da estruturação de aglomerações

produtivas locais e regionais, elas representam um critério útil na diferenciação entre

aglomerações produtivas que surgem a partir de processos de regionalização marcados

por contextos culturais e históricos específicos e experiências induzidas para criação de

aglomerações produtivas regionais.

Todas as aglomerações produtivas analisadas nesta tese tiveram sua formação e

consolidação associadas a processos de regionalização marcados por contextos

históricos e culturais muito próximos. Tanto na região do Vale do Rio Pardo como na

Serra Gaúcha, o núcleo inicial das aglomerações produtivas associadas,

respectivamente, ao plantio e beneficiamento de fumo em folha e ao plantio e

vinificação da uva, estão relacionadas com as atividades agrícolas familiares

desenvolvidas a partir do estabelecimento das primeiras colônias alemãs e italianas

nestas regiões. Da mesma forma, a produção de calçados no Vale dos Sinos e a de

móveis na Serra Gaúcha, também têm sua gênese ligada a oficinas artesanais criadas no

final do século XIX, a partir de um mesmo movimento de imigração no sul do Brasil

(Vargas et al, 1998; 1999; 2001; e 2002).

De uma maneira geral, a análise do processo histórico de formação deste

conjunto de arranjos produtivos demonstra a importância de externalidades associadas a

infra-estrutura produtiva regional, física e humana, nos seus estágios iniciais de

desenvolvimento. Em alguns casos, como no arranjo vitivinícola e fumageiro, tais

externalidades não somente tiveram uma grande importância nos estágios iniciais de

desenvolvimento destas aglomerações, como ainda desempenham um papel

fundamental enquanto fator de vantagem competitiva.

A década de 70 representou um importante ponto de inflexão na trajetória de

desenvolvimento de todas as aglomerações ainda que com reflexos diversos sobre a

organização da estrutura produtiva regional. Em alguns casos como no de tabaco e

calçados, esse período marcou uma importante etapa de inserção das empresas no

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mercado externo ao mesmo tempo em que ocasionou mudanças significativas na forma

de organização do sistema produtivo e no papel de atores locais. Nos demais casos,

envolvendo o arranjo vitivinícola e moveleiro, a década de 70 também representou um

período importante em termos da modernização da estrutura produtiva local, ainda que

não tenha alterado significativamente o foco destes arranjos em torno de mercados

regionais e nacional.

O quadro abaixo procura sintetizar as principais características e pontos de

inflexão que marcam a trajetória de evolução dos quatro arranjos analisados:

QUADRO 3.2 - Origem e consolidação dos arranjos

Origem

Desenvolvimento e consolidação

Tabaco-Vale do Rio Pardo Agricultura familiar associada à imigração alemã na região a partir de 1824

Década de 20: estabelecimento do núcleo de empresas locais de processamento de fumo. Década de 70: modernização e inserção no mercado externo acompanhada da desnacionalização das empresas locais.

Calçados-Vale dos Sinos Produção artesanal de calçados associada à imigração alemã a partir de 1824

Década de 20: expansão significativa da produção industrial e adensamento da cadeia coureiro-calçadista. Década de 70: consolidação como pólo de exportação atrelado à grandes compradores internacionais.

Vinho-Serra Gaúcha Agricultura familiar associada à imigração italiana na região a partir de 1870

Entre 1910 e 1926: primeiro ciclo de industrialização e estabelecimento de cooperativas vinícolas. Década de 70: expansão e melhoria significativa da produção com instalação de grandes empresas de capital nacional e estrangeiro.

Móveis -Serra Gaúcha Pequenas marcenarias estabelecidas por imigrantes italianos e alemães no final do século 19

Década de 50: aumento significativo da produção em escala industrial. Década de 70: modernização produtiva fomentada por políticas explícitas de proteção tarifária e financiamento para importação de equipamentos.

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A cultura do fumo no Rio Grande do Sul teve início com a vinda dos primeiros

imigrantes alemães para a região do Vale do Rio Pardo, em 1824, que passaram a se

instalar em pequenas propriedades com o uso intensivo de mão-de-obra familiar. A

partir de 1877 o município de Santa Cruz do Sul emancipa-se de Rio Pardo num

processo que resultou na expansão significativa da população e num aumento gradativo

das atividades agrícolas definindo o fumo, que inicialmente era destinado ao consumo

local, como o produto de maior valor econômico que passa a ser comercializado em

outros mercados. Com a crescente integração da agricultura local à economia nacional

ocorre um aumento da dependência das condições econômicas externas ao mesmo

tempo em que consolida-se o processo de industrialização do município de Santa Cruz

do Sul, principal locus das empresas fumageiras. O desempenho favorável da cultura do

fumo, que passou a ser destinada à exportação, serviu de estímulo ao desenvolvimento

de atividades relacionadas ao beneficiamento de produtos primários e levou também a

uma série de melhorias no processo produtivo das empresas locais (Vargas et al, 1998)

No caso do arranjo vitivinícola, apesar da tradição do cultivo da uva e

elaboração de vinho no sul do país remontar aos primórdios do povoamento do Rio

Grande do Sul pelos portugueses, foi com a chegada dos primeiros imigrantes italianos

que a atividade vitivinícola passou a ganhar maior impulso e evoluir de uma produção

voltada para o consumo próprio para uma estrutura de comercialização com abrangência

estadual e nacional. Até o ano de 1880, a história da vitivinicultura gaúcha apresentou

duas origens e localizações distintas. A primeira vinculada à colonização espanhola na

região das Missões e adjacências que se desenvolveu a partir de 1726 e a segunda ligada

a colonização portuguesa na região litorânea - a partir de Rio Grande, Pelotas e Porto

Alegre – que se desenvolveu entre os anos de 1732 e 1773. Entretanto, o grande marco

da vitivinicultura gaúcha do ponto de vista social e econômico ocorre por volta de 1875,

quando da implantação pelos imigrantes italianos dos primeiros vinhedos no sistema de

latadas que se mantém até os dias de hoje. Na medida em que a produção de vinho foi

crescendo, o mercado local e regional se tornou insuficiente para absorver a totalidade

da oferta levando o arranjo à busca de novas estruturas de comercialização, de produção

e de uma nova dinâmica empresarial em torno desta atividade (Vargas, 2000).

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Conforme destacado anteriormente, o desenvolvimento inicial dos arranjos agro-

industriais associados à produção de vinho e fumo foi respaldado pela existência de

importantes externalidades regionais tais como:

• a existência de uma estrutura fundiária baseada em pequenas

propriedades e no trabalho familiar;

• a existência de mão-de-obra especializada no manuseio de ambas as

culturas agrícolas; e

• a infra-estrutura incipiente de produção e comercialização estabelecida

pelo núcleo de empresas nacionais nessas regiões no período anterior à década

de 70.

No caso do arranjo fumageiro, outros dois fatores também foram fundamentais

para sua consolidação na medida em que impulsionaram a instalação das empresas de

processamento e exportação de fumo na região do Vale do Rio Pardo. Em primeiro

lugar, não havia necessidade de investimentos de capital relacionados à aquisição de

terras e contratação de mão-de-obra na medida em que a estrutura de produção agrícola

baseada em pequenas propriedades e mão-de-obra familiar garantia um custo menor de

produção para as empresas.

Em segundo lugar, na década de 70 ocorre o bloqueio comercial declarado à

Rodésia (Zimbawe) que era o maior fornecedor do fumo destinado ao mercado europeu.

Este fato possibilitou um aumento significativo no volume de exportações do Brasil.

Assim, o grande impulso para consolidação do arranjo fumageiro no Vale do Rio Pardo

ocorre a partir da década de 70, quando as condições excepcionais de demanda de fumo

em folha no mercado internacional levaram à instalação das principais multinacionais

do setor no município de Santa Cruz do Sul40. Este fenômeno deu início a um processo

de desnacionalização das empresas que também foi acompanhado pelo aumento

substancial da produção e pela adoção de inovações relacionadas tanto ao

processamento industrial do fumo como à organização do sistema de produção

agrícola41. Paralelamente ao processo de modernização do setor, ocorreram profundas

40 Liedke (1997); Montali (1979). 41 Conforme é colocado por Vogt (1994: 105) o processo de transnacionalização da indústria fumageira na região ocorreu: “Via de regra, através de um processo gradual de compra: inicialmente o consórcio multinacional injetava recursos em determinada empresa local, ao adquirir parte das ações desta; posteriormente assumia o controle acionário total ou majoritário do empreendimento, quase sempre

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transformações no ambiente regional a partir da criação de uma infra-estrutura física e

institucional articulada com o desenvolvimento do arranjo.

No arranjo vitivinícola, o primeiro ciclo de industrialização ocorreu ainda em

1910 quando fatores como o incremento do cooperativismo na região e a chegada da via

férrea até o município de Caxias do Sul possibilitaram a ampliação dos mercados e a

maior integração da cadeia produtiva vitivinícola no Estado. Em 1926, ocorre a criação

do Instituto Rio-grandense do Vinho, órgão responsável pela fiscalização e tabelamento

dos preços da uva. Entre a década de 30 e a década de 60 não ocorreram alterações

significativas nos aspectos técnicos da produção. No decorrer deste período, o arranjo

vitivinícola manteve um padrão tecnológico relativamente baixo em termos de

processamento industrial, juntamente com uma produção vitícola proveniente de cepas

híbridas e americanas. Foi na década de 70 que ocorreu o primeiro grande salto de

qualidade do arranjo vitivinícola da Região da Serra Gaúcha a partir da modernização

do parque industrial local e da melhoria significativa da produção vitícola através da

importação de mudas para formação de novos vinhedos mais adaptados às condições

climáticas da região.

É importante observar que tanto no arranjo fumageiro como no arranjo

vitivinícola o processo inicial de modernização da cadeia produtiva esteve relacionado à

entrada de grupos transnacionais de origem européia e norte americana nos arranjos, no

decorrer da década de 70. Entretanto, as diferenças que se verificaram na forma de

inserção das transnacionais em cada um dos casos permitiram o surgimento de

trajetórias de evolução distintas em cada arranjo.

O ingresso de empresas transnacionais na indústria vinícola gaúcha esteve em

grande parte ligado ao crescimento do mercado interno brasileiro nos anos 70. Tal

crescimento se deu através da ampliação do poder aquisitivo das camadas médias

urbanas e possibilitou a criação de um mercado consumidor de vinhos finos nacionais

em substituição aos produtos importados. Além disso, as empresas locais de maior porte

foram capazes de absorver as mudanças tecnológicas necessárias no decorrer do

processo de reorganização e modernização da produção vinícola. Neste contexto, a

mantendo os antigos proprietários ou seus descendentes nas funções administrativas e gerenciais do estabelecimento”

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entrada de capital externo no arranjo ocorreu principalmente através de alianças de

empresas nacionais com grupos externos42.

No caso do tabaco, onde as principais empresas do arranjo detêm uma presença

significativa em mercados mundiais, a entrada das multinacionais levou a uma redução

da importância de atores locais na organização das atividades relacionadas à produção e

à inovação. Entre 1971 e 1995, o número de firmas operando no processamento e

comercialização de fumo e cigarros no município de Santa Cruz do Sul sofreu uma

redução de cerca de 62% passando de 16, em 1971, para 6, em 1995 (Silveira, 1997:

139).

O quadro abaixo ilustra esse movimento de desnacionalização de empresas

locais.

QUADRO 3.3 - Desnacionalização das Empresas do Setor Fumageiro em Santa

Cruz do Sul

EMPRESAS INSTALADAS ATÉ 1965 (POR ORIGEM DO CAPITAL)

ALTERAÇÕES NO CONTROLE ENTRE 1966 e 1974 (POR ORIGEM DO CAPITAL)

Fábrica de Cigarros Sudan S/A - (Nacional) Cia. de Fumos Santa Cruz – 1918 (Nacional) Cia. de Cigarros Souza Cruz - 1917 (Anglo-americano) Cia. de Cigarros Sinimbu – 1948 (Nacional) Exportadora Hennig S/A - 1890 (Nacional) Tabacos Tatsch S/A - 1932 (Nacional) Kliemann & Cia. - 1915 - (Nacional) Boettcher e Wartchow - 1932 (Nacional)

Fábrica de Cigarros Sudan S/A - (Nacional) Grupo Remtsmann - 1970 (Alemão) Cia. de Cigarros Souza Cruz - (Anglo-americano) Grupo Brinkmann - 1970/72 - (Alemão) Grupo Brinkmann - 1970/72 - (Alemão) Tabacos Tatsch S/A - (Nacional) Kliemann & Cia. - (Nacional) Boettcher e Wartchow - (Nacional) Armada S/A - Ind. e Com. - 1968 - (Alemão)43 Tabra - Exp. de Tabacos do Brasil Ltd -1970 (Americano)44 Cia. Meridional de Tabacos - 1974 - (Francês)45

PROPRIEDADE DAS EMPRESAS - 1975/77 (POR ORIGEM DO CAPITAL)

PERFIL ATUAL DO CONTROLE ACIONÁRIO DAS EMPRESAS – década de 90

42 A dinâmica que assume este processo de alianças é bem ilustrada pelas estratégias adotadas pela principal empresa do arranjo, a Cooperativa Vinícola Aurora, no decorrer da década de 60 e 70. Em 1962, esta empresa inicia o processo de engarrafamento de vinho de vinífera para a Bernard Taillan Importadora (de origem francesa), que atuava na intermediação de vinhos na França, no Brasil e na América do Norte. Esta associação ampliou consideravelmente a capacidade técnica da Cooperativa Vinícola Aurora e permitiu a sua vinculação ao mercado de vinhos finos. Já no início da década de 70, a Vinícola Aurora associou-se com a Seagrans, ampliando ainda mais sua inserção no mercado de vinhos finos com o lançamento da marca Forestier (Vargas, 2000). 43 Controlada pelo Grupo Gebrüder Kuhlenkampf. 44 Controlada pelo Grupo The Monk Austin Co. Inc. 45 Criada a partir da união de parte do capital da Boettccher Wartchow com a estatal francesa S.E.I.T.A, onde esta última tem o controle majoritário.

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Fábrica de Cigarros Sudan S/A - (Nacional)46 Phillip Morris Inc. - 1975 - (Americano) Cia. de Cigarros Souza Cruz - (Anglo-americano) R.J. Reynolds Tab. do Brasi l- 1975 - (Americano)47 R.J. Reynolds Tab. do Brasi l- 197 5- (Americano) Tabacos Brasileiros Ltda. - 1976 - (Americano) Kliemann & Cia. - (Nacional) Boettcher e Wartchow - (Nacional) Armada S/A- Ind. e Com. (Alemão) Tabra- Exp. De Tabacos do Brasil Ltda (Americano) Cia.Meridional de Tabacos - Francês

Phillip Morris Inc. - (Americano) Cia. de Cigarros Souza Cruz - (Anglo-americano) Universal Leaf Tobacco Ltda.- 1991 - (Americano)48 Cia Meridional de Tabacos - (Americano)49 Dimon Incorporated - (Americano)50 Kanneneberg e Cia. Ltda. - 1953 (Nacional)51

Fonte: Atualizado a partir de Silveira (1997) e Vogt (1994), com base nos dados da pesquisa de campo.

Da mesma forma que no arranjo fumageiro, a inserção do arranjo coureiro-

calçadista no mercado externo ocorre a partir da década de 70. Porém, tal inserção não

implicou num processo de desnacionalização de empresas locais.

A origem do arranjo calçadista no Vale dos Sinos também remonta ao final do

século XIX, mais precisamente ao ano de 1824, quando as primeiras colônias alemãs

são instaladas nesta região52. Inicialmente, as atividades associadas à produção de

calçados foram desenvolvidas numa base artesanal visando eminentemente o consumo

local (Costa, 1978). Estas atividades evoluíram rapidamente na região, principalmente

na localidade que se tornou o município de Novo Hamburgo, tendo em vista a

existência de vários estabelecimentos fabricantes de arreios que originavam muitas

aparas de couro e passaram a ser utilizadas na fabricação caseira de chinelos

comercializados localmente.

Na medida em que as atividades relacionadas à indústria calçadista adquiriram

maior importância econômica na região, ocorreu a consolidação de um núcleo de

empresas controladas localmente e a criação de uma infra-estrutura física e institucional

46 Essa empresa de capital nacional foi a que mais resistiu à pressão do capital internacional, mas em 1991 acabou sendo incorporada pela norte-americana Dibrell Brothers Inc. 47 A R.J.Reynolds, em 1991, repassou sua fábrica de cigarros para a Phillip Morris e o seu Departamento de Fumo para a Dobra Tabacos. Essa depois foi adquirida pela Souza Cruz e posteriormente repassada para Dibrell. 48 A Universal Leaf surgiu a partir da fusão das empresas Tabacos Brasileiros Ltda, Armada S.A Ind. Com., Kliemann & Cia. e a Fumossul de Venâncio Aires. 49 Recentemente, a G.F. Vaughan, de origem americana, assumiu o controle acionário da Meridional. 50 A Dimon Incorporated surgiu em 1994 a partir da fusão da Monk Austin Inc. com a Dibrell Brothers Inc. Em 1991 essa empresa já havia incorporado a Tabasa Tabacos S.A; Verafumos Ltda e a Sudan, com sede em Venâncio Aires, Vera Cruz e Santa Cruz do Sul respectivamente. Em 1997 a Dimon incorporou a Intabex Worldwide S.A. 51 Apesar de existir desde 1953, a Kannenberg iniciou recentemente um processo de expansão que a levou a transferir a sede da empresa do município de Sinimbu para o Distrito Industrial de Santa Cruz do Sul. 52 A primeira colônia alemã fundada no Rio Grande do Sul foi em São Leopoldo em 25 de julho de 1824. Várias colônias foram fundadas no estado até 1830 e após este período. Até o ano de 1844 o fluxo migratório diminuiu significativamente.

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de suporte à produção e ao comércio. Em 1920, Novo Hamburgo já contava com 66

fábricas, empregando um total de 1.180 operários (Fensterseifer et al., 1995: 266). Ao

longo das duas décadas seguintes, ocorreu a consolidação da atual configuração da

indústria de calçados no Estado, favorecida pela integração dos mercados regionais, o

que deu oportunidade ao desenvolvimento de empreendimentos com maiores escalas de

produção. Em 1955 a indústria calçadista gaúcha era responsável por 29,1% da

produção nacional e ao final da década de 60 por 32,9%. Do mesmo modo, outros

fatores também tiveram uma contribuição fundamental para o desenvolvimento do

arranjo produtivo calçadista no Vale do Rio dos Sinos:

• a ampliação de mercado proveniente da formação de núcleos comerciais,

devido ao adensamento populacional em determinadas localidades;

• a introdução da fabricação de sandálias que, por serem um tipo de calçado

leve, cômodo e barato, tiveram larga aceitação em todo o Brasil, de forma que em

1929 a produção total já atingia 2,7 milhões de pares;

• a facilidade de comunicação no espaço geográfico proporcionada pela

implantação de ferrovias, como a que ligou Porto Alegre a São Leopoldo em 1874,

estendida a Novo Hamburgo em 1876; e a instalação da usina hidroelétrica da

Cascata do Herval em 1927, que abastecia a região de Novo Hamburgo

(Fensterseifer et al., 1995. p.266).

Entre as décadas de 30 e 50, as atividades relacionadas à indústria calçadista em

Novo Hamburgo passaram a se expandir para outras localidades na região. No início da

década de 60 o setor calçadista gaúcho já respondia por mais de 30% da produção

nacional de calçados. No entanto, o grande impulso para consolidação do arranjo

coureiro-calçadista no Vale dos Sinos ocorreu durante a década de 70. Entre o final dos

anos 60 e o final da década de 80 esse arranjo tornou-se um dos principais centros

exportadores de calçados do mundo em decorrência da abertura de novos canais de

comercialização, particularmente relacionados à sua inserção no mercado norte-

americano. No decorrer do período que vai da década de 60 à década de 80, as

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exportações do arranjo evoluíram de menos de 20.000 pares para mais de 150.000

milhões de pares ao ano 53.

No caso do arranjo moveleiro da Serra Gaúcha, a própria trajetória de evolução

da indústria brasileira de móveis reflete a existência de algumas descontinuidades

relacionadas ao processo histórico de formação da cultura industrial deste setor no país.

Juntamente com São Bento do Sul e São Paulo, o arranjo produtivo de móveis

localizado na Serra Gaúcha foi um dos pólos pioneiros da indústria de móveis no Brasil.

No Rio Grande do Sul, a exemplo do que ocorreu em São Paulo e Santa Catarina, a

atividade moveleira desenvolveu-se inserida num contexto industrial embrionário de

formação do mercado interno baseado no trabalho assalariado e no incremento do

movimento imigratório que se delineava (Santos et al.,1999).

A origem das atividades no arranjo moveleiro da Serra Gaúcha remonta ao final

do século XIX quando o surgimento de pequenas marcenarias instaladas por imigrantes

italianos e alemães deu origem a uma produção de móveis artesanais voltada para um

mercado interno ainda em formação. Neste aspecto, o processo de formação e

consolidação do arranjo moveleiro da Serra Gaúcha contrasta com a experiência de

outros pólos moveleiros como Mirassol, Votuporanga, Ubá e Arapongas – cuja origem

remonta a uma experiência histórica mais recente relacionada ao cic lo de substituição de

importações que caracteriza o processo de desenvolvimento industrial brasileiro no pós-

guerra (Santos et al., 1998, Gorini, 1999).

A partir da década de 20, já encontravam-se estabelecidas na região da Serra

Gaúcha pequenas empresas moveleiras que produziam seus produtos sob encomenda,

ainda em pequena escala pois a demanda no período era muito incipiente. A produção

em escala industrial apresenta significativo incremento a partir da década de 50 onde se

verifica a ampliação da produção e a implantação de novas empresas que já

comercializavam seus produtos no mercado estadual. O auge do crescimento deste

arranjo é verificado no decorrer das décadas de 60 e 70, com a implantação de um

número significativo de novas empresas na região da Serra Gaúcha.

53 Schmitz (1999) descreve o período que vai da década de 70 até o final da década de 80 como a “etapa fácil” de globalização do arranjo no Vale dos Sinos, na medida em que esta etapa contrasta com as dificuldades que passam a ser enfrentadas pelo arranjo a partir do final da década de 80.

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A exemplo do que ocorreu nos demais pólos moveleiros do Brasil no decorrer da

década de 70, a consolidação do arranjo moveleiro da Serra Gaúcha se deu

principalmente através de uma política explícita de fomento oficial ao setor promovida

pelo governo, envolvendo tanto a criação de linhas para financiamento da importação de

máquinas como a própria proteção tarifária contra a concorrência externa. De uma

maneira geral, a trajetória de evolução das empresas de móveis na Serra Gaúcha a partir

da década 70 reflete o processo histórico de desenvolvimento da própria indústria

brasileira de móveis de madeira. Na primeira metade da década de 70, esse segmento da

indústria brasileira de móveis conheceu um importante ciclo de modernização

impulsionada pelo crescimento acelerado do mercado interno. Com a dinâmica de

crescimento da demanda interna, as vendas no mercado externo somente passaram a ser

incorporadas às estratégias comerciais das empresas do setor uma década mais tarde.

Já na década de 80, a contração no mercado interno passou a comprometer a

capacidade de investimento e atualização tecnológica das empresas moveleiras ao

mesmo tempo em a revolução na microeletrônica fomentava a introdução de novos

equipamentos com comandos de controle numérico54. Entretanto, a dificuldade

enfrentada pela maior parte das empresas do setor em absorver as inovações adotadas

pelo setor em nível mundial acentuou ainda mais o grau de heterogeneidade entre o

universo de empresas do arranjo55. Deste modo, os ciclos de crescimento e recessão que

caracterizaram a trajetória de evolução da economia brasileira no decorrer da década de

80 tiveram um reflexo bastante negativo sobre a indústria brasileira de móveis 56. Por

outro lado, a busca de novos canais de comercialização no mercado externo, aliada ao

processo de abertura da economia brasileira no decorrer da década de 90 foram fatores

que induziram ao processo de modernização do setor moveleiro no Brasil.

54 Entre o início da década de 70 e o final da década de 80, a trajetória de crescimento do setor moveleiro nacional apresentou uma sistemática perda de importância em relação à sua participação no valor adicionado total gerado pela indústria no país. Em 1970, a participação da indústria de móveis no valor adicionado total gerado pela indústria nacional era de 2%, tendo declinado para 1,7% em 1980 e para 1,1% em 1990 (ECIB,1993). 55 Conforme destacado por Gorini (1999), esse processo de modernização, quando ocorreu, esteve limitado a algumas empresas líderes que procuraram introduzir equipamentos de última geração apenas em algumas etapas do processo produtivo. 56 Com exceção do período imediatamente posterior ao Plano Cruzado, em 1986, quando o crescimento da demanda interna permitiu um aumento significativo da produção, nos demais anos da década de 80 o nível de produção esteve abaixo daquele verificado em 1980, demonstrando as dificuldades enfrentadas pelo setor ao longo da década de 80.

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3.3. Organização territorial e padrões de concorrência

Esta seção apresenta um panorama sobre os padrões de competição e divisão

internacional do trabalho característicos dos setores industriais onde os diferentes

arranjos produtivos se inserem. Em particular, a discussão apresentada na seção se

limita a servir de balizamento para análise das características estruturais dos arranjos

sem aprofundar-se sobre as especificidades relativas aos padrões de concorrência e de

incorporação de inovações em cada um dos arranjos. Tal detalhamento é apresentado

nos dois próximos capítulos.

O foco inicial na dimensão setorial dos arranjos permite apontar um conjunto de

elementos comuns que condicionam as características estruturais destes sistemas

produtivos em âmbito local e refletem, em particular, sua vinculação com indústrias

tradicionais ou produtoras de commodities. Entretanto, a utilização deste recorte

baseado unicamente numa divisão de setores industriais apresenta limitações para

análise de aglomerações onde as fronteiras entre setores e tecnologias encontram-se

muitas vezes sobrepostas e apresentam uma natureza fluída. Neste aspecto, ainda que a

dimensão setorial represente o ponto de partida para discussão dos padrões de

competição dos arranjos nesta seção, as seções subsequentes procuram ampliar o escopo

de análise para outros elementos estruturais que caracterizam os sistemas produtivos e

sua relação com contextos institucionais específicos.

Uma questão fundamental está ligada ao cenário atual de competição

internacional, que tem gerado um novo conjunto de desafios em termos dos novos

padrões de competição enfrentados por produtores locais nos países em

desenvolvimento. Tanto no caso de aglomerações voltadas para o mercado doméstico

como naquelas que destinam grande parte da sua produção para o mercado externo,

percebe-se um aumento significativo das pressões competitivas que emergem com a

crescente internacionalização de mercado. A análise dos estudos empíricos permite

ilustrar as especificidades que assumem as pressões competitivas enfrentadas em ambos

os casos. Da mesma forma, a dimensão territorial representa um importante espaço de

mediação entre as formas de organização destes sistemas produtivos em âmbito local e

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as condições de competição e divisão internacional do trabalho que prevalecem em

âmbito global.

No caso dos arranjos fumageiro e coureiro-calçadista, apesar das especificidades

que marcam a organização destes sistemas produtivos em âmbito local, a inserção no

mercado externo se reflete, em grande parte, através da integração em cadeias

produtivas globais que controlam estágios estratégicos do processo de agregação de

valor na produção.

A indústria fumageira constitui-se num dos mais expressivos oligopólios

internacionais onde um número restrito de grandes conglomerados controlam uma

extensa rede de empresas que se estende por diferentes localidades. A maior parte da

produção de fumo em folha encontra-se concentrada em poucos países como China,

Estados Unidos, Índia, Brasil, Turquia e Zimbabwe. O Brasil constitui hoje um

importante espaço no oligopólio mundial do fumo tendo em vista sua posição como o

quarto país produtor de fumo em folha e maior exportador em nível mundial57 conforme

pode ser observado na tabela abaixo:

57 No Brasil, a produção de fumo em folha encontra-se localizada em duas regiões do país. Em primeiro lugar, encontram-se os três Estados da região Sul - onde são produzidos os fumos claros para fabricação de cigarros - que já respondem por mais de 90% da produção nacional. Do restante da produção nacional de fumo, a maior parte ainda corresponde aos Estados do Nordeste que atendem, principalmente, à demanda de fumos escuros para charuto.

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TABELA 3.2 - Produção e Exportação mundial de fumo em folha: Principais Países - 1995 - 1999 (em toneladas) 1995 1996 1997 1998 1999 Produção Total mundial 5,541,950 6,564,732 7,721,377 5,928,336 6,048,295 China 2,082,600 2,910,600 3,613,350 2,010,250 2,108,000 India 528,390 506,475 561,330 572,200 587,600 Estados Unidos 513,247 619,432 729,139 626,504 571,526 Brasil 323,500 365,900 485,100 373,150 498,400 Turquia 170,070 190,391 250,836 217,570 215,640 Indonesia 145,650 150,450 148,775 175,825 185,005 Exportações Total mundial 1,759,121 1,982,098 2,005,138 1,914,456 1,948,185 Brasil 256,300 282,500 319,000 300,500 318,000 Zimbabwe 174,289 195,958 159,941 168,804 205,500 Estados Unidos 209,482 222,316 221,512 211,917 189,379 Turquia 136,392 170,098 160,360 128,808 125,500 China 68,413 60,156 77,796 92,173 108,000 Malásia 99,057 95,555 111,449 135,300 107,600

Fonte: USDA/FAS/COTS, Março 2000.

Ainda que as atividades relacionadas à produção e exportação de fumo

encontrem-se circunscritas a este grupo reduzido de países, as atividades que envolvem

a distribuição e comercialização de fumo e de cigarros se estendem por mais de 50

países.

Apesar dos principais conglomerados deste setor atuarem numa escala mundial,

suas atividades envolvem a articulação de uma extensa rede de fornecedores de fumo

em folha e outros atores institucionais concentrados em torno de municípios como Santa

Cruz do Sul, Venâncio Aires e Vera Cruz, que integram a região do Vale do Rio Pardo

situado no Oeste do Rio Grande do Sul. Neste aspecto, a organização da produção de

fumo em folha na região apresenta, de fato, uma dimensão territorial considerável na

medida em que emerge de externalidades ligadas à infra-estrutura regional. Da mesma

forma, verifica-se que as principais empresas do arranjo controlam e organizam redes de

fornecedores de fumo em folha produzido em outras localidades da região Sul,

conforme é demonstrado no quadro abaixo:

QUADRO 3.4 - Empresas fumageiras: filiais fora da região do Vale do Rio Pardo - 1998 Empresa Estabelecimentos fora da região Souza Cruz Rio negro (PR); Blumenau (SC) Dimon Rio do Sul (SC); Araranguá (SC); Palmitos (SC); União da Vitória (PR) CTA Araranguá (SC); Ituporanga (SC) Meridional São Miguel do Oeste (SC); Sombrio (SC); Agronômica (SC); Rio Azul (PR) Kannenberg Apiúna (SC); Palmitos (SC)

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Fonte: Pesquisa de campo.

Entretanto, ao mesmo tempo em que a análise sobre a forma de inserção do

arranjo fumageiro do Vale do Rio Pardo na cadeia de valor da indústria fumageira

revela a sua importância nas atividades relacionadas à produção e beneficiamento de

fumo em folha, também deixa claro sua reduzida participação em estágios como a

distribuição e comercialização de fumo e de cigarros. Tais atividades são organizadas

fora da região através dos grandes conglomerados internacionais.

No caso da indústria calçadista, o processo de reestruturação mundial deste

setor, em particular no decorrer da década de 80, implicou numa redução gradual na

participação dos países industrializados na produção de calçados que foi absorvida pela

maior inserção dos países em desenvolvimento. Este movimento reflete, principalmente,

a natureza “nômade” desta indústria cujo ajuste competitivo baseia-se principalmente

em reduções no custo de mão-de-obra empregada na produção. Neste aspecto, verifica-

se um aumento significativo na produção e participação no mercado mundial por parte

de países onde o custo da mão-de-obra é mais baixo. Destacam-se neste caso países

como a China, a Indonésia, o Brasil e a Índia que, juntos com a Itália, são os maiores

produtores mundiais de calçados, conforme os dados da tabela abaixo.

TABELA 3.3 - Principais Países Produtores de Calçados - 1994/96 Países 1994 1995 1996 China 3.750 4.270 4.500 Brasil 541 544 554

Indonésia 500,3 499,5 635 Itália 471,3 476,2 586 Índia 440 462 487,2

Fonte: Satra/Abicalçados In Gorini e Siqueira (1999:110) Nota: valores em milhões de pares

O Vale dos Sinos é hoje o maior pólo produtor de calçados no Brasil e também

um dos maiores do mundo. Além de contar com algumas das maiores empresas

fabricantes de calçados do Brasil, este arranjo concentra também cerca de 80% dos

produtores de máquinas para fabricação de calçados, 60% dos fornecedores de

componentes e diversos outros segmentos de empresas ligadas à cadeia produtiva

coureiro-calçadista. Este extenso segmento de atores que atuam em diferentes estágios

da cadeia produtiva coureiro-calçadista encontra-se organizado num raio de cerca de 50

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km, em torno de aproximadamente 35 municípios que integram a região do Vale do Rio

dos Sinos (Costa, 1997)58.

A elevada densidade do arranjo e complexidade das relações entre diferentes

segmentos de atores em âmbito local revela o elevado grau de territorialização das

atividades relacionadas à produção de calçados. Entretanto, a articulação das principais

empresas exportadoras com seus canais de comercialização no mercado externo revela

um reduzido controle sobre determinados estágios da cadeia de valor relacionados

especialmente com as atividades de design e marketing.

Neste aspecto, no âmbito da indústria mundial de móveis, ainda que alguns

produtores, particularmente em determinados segmentos específicos como cozinhas e

móveis de escritório, operem com a comercialização direta da sua produção ao

consumidor final, percebe-se, no decorrer da última década, uma integração crescente

de fabricantes de móveis com distribuidores especializados organizados em torno de

cadeias globais59. Esse é o caso, por exemplo da IKEA que constitui uma das maiores

cadeias de distribuição de móveis em nível mundial e controla atualmente grande parte

do mercado europeu de móveis residenciais. Esse tipo de tendência acaba por reforçar o

poder de barganha dos grandes distribuidores internacionais ao mesmo tempo em que

limita o escopo de ação dos produtores locais (Maskell,1996: 100).

No arranjo calçadista, essa articulação entre pequenos produtores locais e as

grandes redes de distribuição internacionais apresenta um grande impacto sobre a

organização da cadeia produtiva local, tendo em vista a orientação da maior parte das

empresas para o mercado externo. Entretanto, no caso do arranjo moveleiro da Serra

Gaúcha, a integração com cadeias globais de produção não representa o principal canal

de comercialização dos fabricantes locais de móveis. Adicionalmente, em termos dos

padrões de competição internacional, percebe-se que enquanto a produção da indústria

calçadista mundial apresenta uma clara concentração nos países em desenvolvimento, a

produção mundial da indústria de móveis ainda envolve uma participação elevada de

países industrializados. Neste aspecto, no caso da indústria de móveis, observa-se que

58 Dentre os principais municípios ligados à produção de calçados no Vale dos Sinos encontram-se: Alvorada, Campo Bom, Estância Velha, Glorinha, Gramado, Igrejinha, Novo Hamburgo, Parobé, São Leopoldo, Sapucaia do Sul. 59 Dentre as grandes empresas de móveis que atuam em nível mundial encontram-se: Natuzzi (de Santeramo, Itália); DMF (de Illinois, EUA); Panda Furniture (da Bélgica); Poliform (de Brianza, Itália). Dentre as grandes redes de distribuição e venda encontram-se IKEA (da Suécia) e HABITAT.

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países como Itália, Estados Unidos e Alemanha encontram-se atualmente entre os

principais produtores e exportadores no mercado internacional. De acordo com Gorini

(1998), juntos estes três países concentram mais de 40% das exportações mundiais de

móveis. Da mesma forma, somente cinco países (Estados Unidos, Alemanha, Japão,

França e Reino Unido) respondem por mais de 60% das importações. A tabela abaixo

apresenta os dados sobre a participação de diferentes países na exportação de móveis.

TABELA 3.4 – Móveis Principais Países Exportadores de móveis –1996/1997 (%)

País 1996 1997 Itália 31 28 EUA e Canadá 17 19 Alemanha 13 12 China 0,6 0,8 Dinamarca 0,6 0,6 Polônia 0,5 0,6 México 0,4 0,6 França 0,6 0,5 Taiwan 0,6 0,5 Outros 35,7 37,4

Fonte: Abimóvel (2000).

A Itália responde atualmente por cerca de 30% das exportações internacionais de

móveis e conta com algumas das empresas líderes do setor que investem fortemente no

aperfeiçoamento do design. As principais aglomerações moveleiras estão localizados

em distritos como Brianza, Cerea-Bovolone e Pesaro no norte do país, ainda que

também existam outras aglomerações menores ao sul em distritos como Poggibonsi e

Toscana (Maskell, 1996). No caso da Alemanha as principais aglomerações move leiras

estão localizadas nas regiões de North-Rhine Westphalia, Bavaria and Baden-

Württemberg. Apesar de constituir-se no maior produtor de móveis na Europa, a

indústria de móveis alemã ainda apresenta uma forte orientação para o mercado interno

de modo que a sua proporção de exportações sobre a produção não difere muito da

média da União Européia. Nos Estados Unidos, o maior pólo moveleiro encontra-se na

Carolina do Norte onde estão localizadas cerca de 1/3 das fábricas produtoras de móveis

para residência. Ao todo, este setor congrega cerca de 4.000 empresas em todo o país e,

no segmento de móveis residenciais, a indústria americana emprega aproximadamente

260 mil funcionários (Gorini, 1998).

No Brasil, a indústria de móveis é composta por cerca de 13.500 empresas

distribuídas em torno de mais de dez pólos produtivos. Apesar desta aparente dispersão

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199

geográfica, 90% da produção e cerca de 70% do emprego neste setor estão concentrados

nas regiões Sul e Sudeste do país (Abimóvel, 2000). Os Estados de São Paulo, Paraná,

Santa Catarina e Rio Grande do Sul respondem por cerca de 80% da produção nacional

de móveis, sendo que o Rio Grande do Sul representa cerca de 18% deste total.

No Rio Grande do Sul a indústria moveleira congrega cerca de 3.200 empresas

sendo que destas, 3.074 são micro e pequenas empresas; 122 são empresas de médio

porte e apenas 04 delas são empresas de grande porte (Movergs, 2000). A existência

deste extenso segmento de MPEs também coloca este setor como uma importante fonte

geradora de empregos no Estado totalizando, entre diretos e indiretos, cerca de 181.000

postos de trabalho.

A principal concentração de empresas do setor moveleiro no Rio Grande do Sul

encontra-se na região da Serra Gaúcha, em torno de municípios como Bento Gonçalves,

Antonio Prado, Flores da Cunha, Garibaldi, São Marcos e Caxias do Sul. A região da

Serra Gaúcha responde por 40% da produção do Estado, quase 10% do total da

produção nacional, cerca de 7.500 empregos diretos e quase 30.000 indiretos. Dentre os

municípios da Serra Gaúcha, Bento Gonçalves representa o principal núcleo de

produção do arranjo moveleiro e responde por cerca de 9% da produção nacional

(Gorini, 1999).

Além do arranjo moveleiro, a região da Serra Gaúcha abriga também o principal

pólo de produção vitivinícola no Estado. O Rio Grande do Sul produz 70% da área

vitícola do Brasil e é responsável por 90% da produção de vinhos no Brasil que se situa

em torno de 300 milhões de litros/ano. Esta representação é ainda maior quando se

considera exclusivamente o cultivo de espécies vitis vinífera. O principal núcleo da

produção de uva e vinho no Estado localiza-se na Serra Gaúcha abrangendo uma área de

800 km2 e envolvendo cerca de 40 municípios, onde se destacam os municípios de

Bento Gonçalves, Garibaldi e Caxias do Sul, Flores da Cunha, Farroupilha e Canela.

Dos 35.000 hectares de parreiras que são cultivados no Estado, cerca de 5.000 ha são

destinados ao cultivo de variedades nobres. Em termos estaduais, as atividades ligadas a

este setor são desenvolvidas em mais de 400 cantinas e 24 cooperativas vinícolas

envolvendo cerca de 14 mil famílias numa estrutura fundiária marcada pela

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200

predominância de pequenas propriedades e pelo elevado número de variedades

produzidas60.

O arranjo vitivinícola na Serra Gaúcha responde atualmente por cerca de 88% da

produção de uvas e 96% da produção de vinhos e mosto no Estado. Cerca de 65% da

produção de uvas é destinada à elaboração de vinhos enquanto que os 35% restantes são

direcionados para consumo in natura. (UVIBRA,1999). A produção de vinhos, por sua

vez, abarca tanto a vinificação de variedades de uvas comuns com baixo valor de

mercado, como a produção de vinhos finos a partir de variedades vitiviníferas.

Entretanto, a produção de vinhos finos corresponde hoje a menos de 20% do volume

total produzido pelo arranjo e envolve um percentual ainda menor quando se considera

o seleto grupo de empresas com capacitação tecnológica para este tipo de produção.

Neste aspecto, a parcela de vinhos finos destinados à exportação corresponde

atualmente a cerca de 5% do total de vinhos comercializados pelo arranjo vitivinícola.

Em termos do padrão de organização da indústria vinícola em âmbito mundial,

tradicionalmente os principais países produtores de vinho sempre foram também os seus

principais consumidores. Consequentemente, até a década de 70, menos de um décimo

da produção mundial de vinhos estava voltada para canais de comercialização fora das

fronteiras nacionais destes países. Essa proporção aumentou significativamente na

década de 80 e 90 e, atualmente, cerca de um quarto da produção mundial de vinho é

comercializada no mercado internacional. A maior parte desta produção e

comercialização envolve variedades de vinho fino, em detrimento de variedades de

vinho comum que tem apresentado uma redução gradual nas suas vendas61.

Até a década de 70, existia um claro predomínio dos países Europeus na

produção e consumo de vinho no mercado mundial e, sob vários aspectos, esse

predomínio ainda existe. Mais de três quartos da produção, consumo e comercialização

mundial de vinhos ainda envolve países da Europa enquanto que o restante desta

60 Fora do arranjo vitivinícola da Serra existem algumas pequenas regiões vinícolas, entre as quais o grande destaque é a região de Santana do Livramento, no extremo sul do Estado. No quadro vinícola descrito para as regiões fora do Rio Grande do Sul, o Nordeste brasileiro representa um espaço de produção promissor no Vale do rio São Francisco, especialmente na cidade de Santa Maria da Boa Vista, próxima de Petrolina e Juazeiro, na fronteira de Pernambuco e Bahia (Chaddad, 1997). 61 Apesar das principais castas vitiviníferas terem sido difundidas através do mundo juntamente com o know-how da produção vinícola, as particularidades associadas a fatores como solo e clima ainda garantem a impossibilidade de transformar o vinho numa commoditie agrícola global, nos moldes do que

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201

participação remete a um pequeno grupo de países do Novo Mundo onde o núcleo

inicial de produção foi estabelecido por imigrantes europeus. Entretanto, o predomínio

da Europa no comércio internacional de vinhos foi reduzido significativamente no

decorrer da última década.

Entre 1987 e 1997, a participação de países não europeus 62 no valor das

exportações mundiais de vinho aumentou em cerca de 10 pontos percentuais. Do

mesmo modo, na medida em que se exclui o comércio entre países da União Européia

deste percentual, a participação da Europa nas exportações globais é ainda maior,

reduzindo-se de 88% para 70% (Anderson, 2001: 5). Assim, o surgimento de novas

áreas de produção vinícola representou uma nova fase de desenvolvimento para a

indústria vinícola. Uma das regiões pioneiras desta nova fase foi a Califórnia, que

conheceu uma revolução nos seus métodos de vinificação, ainda no final da década de

30, que veio posteriormente a abrir caminho para sua inserção qualificada no mercado

mundial de vinhos63 (Economist, 1999).

Em países como Austrália e Nova Zelândia o ingresso da indústria vinícola no

mercado mundial passa a ocorrer na década de 80. Da mesma forma, outros países como

África do Sul, Chile e, mais recentemente, Argentina vêm ganhando a condição de

exportadores emergentes para vários países. No Leste Europeu, onde se destaca em

particular países como a Hungria, o atraso na agroindústria vitivinícola vem sendo

resgatado através de investimentos estrangeiros

Em termos da concentração da indústria vinícola mundial, pode-se afirmar que

este é o segmento que apresenta menor nível de concentração no setor de bebidas e

fumo. A participação das quatro maiores empresas vinícolas no mercado mundial é de

cerca de 7%, enquanto que esse mesmo percentual chega a 20% entre as empresas

produtoras de cerveja, 44% no segmento de destilados e 60% no segmento de tabaco

(Anderson, 2001: 4). Mais significativo do que o grau de concentração da indústria

vinícola mundial é o crescente processo de internacionalização que pode ser constatado

ocorre na indústria fumageira, resguardando assim a importância da regionalização para a indústria vinícola. 62 Incluem-se neste grupo, além dos EUA (Califórnia), seis países do Hemisfério Sul 63 É interessante observar que a qualidade da produção vinícola dos países do Novo Mundo foi comprovada pela primeira vez em 1976 quando num teste de degustação “às cegas”, os vinhos da Califórnia superaram algumas das mais conceituadas marcas francesas. Este teste, que ficou conhecido como “Julgamento de Paris”, abriu um espaço importante para a comercialização de vinhos do Novo Mundo.

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202

entre as empresas do setor, seja através do investimento direto em outros países ou

através do estabelecimento de alianças com outras vinícolas no exterior. Enquanto

vinícolas da Europa Ocidental têm investido em países do Leste Europeu, América do

Sul e China, outros produtores, como os australianos, têm optado por investimentos na

América do Norte e Europa64.

A participação da indústria vinícola brasileira no mercado internacional ainda é

reduzida, particularmente quando comparada com outros países no continente latino

americano como Argentina e Chile. De acordo com dados da Organização Internacional

da Uva e do Vinho, em 1996, o Brasil ocupava a posição de 17o produtor e 29o

consumidor de vinho no mercado mundial, conforme demonstra a tabela abaixo:

TABELA 3.5 – Produção e Consumo Mundial de Vinho PRODUÇÃO (bilhões de litros / ano) CONSUMO (litros per capita / ano)

1oFrança (5,96) 1oFrança (60,00) 2oItália (5,87) 2oItália (59,37)

3oEspanha (3,26) 3oPortugal (58,46) 4oEstados Unidos (1,86) 4oLuxemburgo (50,40)

5oArgentina (1,26) 5oArgentina (42,32) 6oÁfrica do Sul (1,00) 6oSuíça (41,17)

7oPortugal (0,95) 7oEspanha (37,71) 8oAlemanha (0,83) 8oÁustria (32,00) 9oRomênia (0,76) 9oRomênia (31,50)

10oAustrália (0.67) 10o Grécia (30,93) 11o China (0,43) 11oUruguai (30,70) 14o Chile (0,38) 15o Chile (15,8) 17ºBrasil (0,23) 23o Estados Unidos (7,70)

27ºUruguai (0,09) 29o Brasil (1.85) Fonte: OIV, 1996.

3.4 – Estrutura e organização dos sistemas de produção: atores e mercados

Esta seção focaliza as formas de organização das atividades produtivas dos

arranjos através de uma caracterização do papel dos principais segmentos de atores que

atuam em diferentes estágios da cadeia produtiva local. O principal objetivo da seção

consiste em descrever a forma de organização específica de cada um dos arranjos

analisados através da identificação da divisão de trabalho característica da relação entre

os principais segmentos de atores que participam da cadeia produtiva em âmbito local.

64 Ainda que este movimento de internacionalização não represente um fenômeno recente, ele sempre desempenhou um papel considerável no processo de capacitação tecnológica das empresas do setor, inclusive através do aumento no fluxo de informações tecnológicas oriundas do intercâmbio entre os produtores estabelecidos nos países que já contam com tradição na produção vitivinícola e produtores de regiões que vêm empreendendo um esforço de qualificação da sua produção vinícola.

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Da mesma forma, a seção adota um recorte analítico que explora a relação entre

os canais de comercialização adotados e o grau de territorialização da estrutura

produtiva dos arranjos. A adoção deste tipo de recorte permite distinguir os estudos de

caso em dois grupos. De um lado, destacam-se aglomerações como as de fumo e

calçados, cujos principais canais de comercialização encontram-se no mercado externo

e a organização das atividades produtivas envolve instâncias que extrapolam o âmbito

local ou regional. Num outro extremo, estão aglomerações como as de vinho e de

móveis, focalizadas em mercados regionais e nacionais e cujo principal locus de

organização das atividades produtivas encontra-se circunscrito aos limites da própria

aglomeração.

3.4.1.Aglomerações produtivas locais voltadas ao mercado externo: o caso dos

arranjos fumageiro e coureiro-calçadista

Conforme destacado anteriormente, a inserção no mercado externo a partir da

década de 70 representou um importante ponto de inflexão na trajetória de

desenvolvimento dos arranjos fumageiro e coureiro-calçadista. Entretanto, a inserção

destes arranjos em cadeias globais de produção se refletiu de forma diferenciada na

organização das atividades produtivas em âmbito local, tendo em vista as características

estruturais de cada uma das aglomerações.

Assim, no arranjo fumageiro do Vale do Rio Pardo a inserção no mercado

externo se reflete no controle direto dos grandes conglomerados multinacionais sobre os

diferentes estágios da cadeia produtiva local, desde a produção do fumo em folha até a

sua exportação. No arranjo coureiro-calçadista, a inserção no mercado externo acarretou

uma redução na participação dos produtores locais em determinados estágios da cadeia

de valor, particularmente em atividades como design e comercialização. Porém, ao

contrário do arranjo fumageiro, a estrutura produtiva regional do arranjo coureiro-

calçadista revela uma complexidade muito maior e se reflete na participação de

diferentes segmentos de atores na organização da cadeia produtiva local.

A organização do arranjo fumageiro se dá em torno de um conjunto de empresas

que operam com a produção, processamento e comercialização de fumo e de cigarros.

Neste universo de empresas, destaca-se a presença de três grandes conglomerados

ligados ao processamento de fumo em folha e um ligado a fabricação de cigarros.

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Operando na região com o beneficiamento de fumo estão a Souza Cruz, ligada

ao grupo British American Tobacco - BTA de capital anglo-americano; a Universal

Leaf Tobacco e a Dimon Incorporated, ambas de capital americano. Já a Phillip Morris,

também de capital americano, atua na região exclusivamente na fabricação de cigarros.

Ao todo, o arranjo fumageiro congrega cerca de 16 empresas na região, num universo

onde, além dos grandes conglomerados citados, operam também empresas de médio e

pequeno porte que se integram, total ou parcialmente, ao processo produtivo das

maiores mediante o fornecimento de fumo em folha ou beneficiado65.

O início dessa cadeia produtiva, entretanto, tem lugar ainda na etapa de produção

agrícola do fumo em nível de propriedade rural. Neste sentido, compreender a natureza

dos vínculos que emergem entre os atores deste arranjo implica em conhecer os laços de

interdependência que se estabelecem entre a etapa de produção agrícola do fumo e a

etapa subsequente ligada ao beneficiamento industrial do mesmo. Essa relação

institucional, que será analisada detalhadamente no próximo capítulo, assume

características particulares no caso do complexo agro-industrial fumageiro devido à

existência de um eficiente sistema integrado de produção que regula as relações entre os

pequenos produtores rurais e a agroindústria fumageira.

A análise do universo de empresas que integram o arranjo fumageiro permite

diferenciar dois segmentos de acordo com o tamanho, propriedade do capital e alcance

das suas atividades. Num primeiro extrato, percebe-se a existência de um núcleo de

empresas de pequeno porte de capital nacional que opera nas franjas do mercado

mediante a produção de fumo em folha. Pelo fato de não disporem de linhas próprias

para processamento de fumo, operarem numa escala de produção reduzida e não

contarem com uma estrutura de comercialização que permita o acesso ao mercado

externo, estas empresas encontram-se, em geral, vinculadas funcionalmente às grandes

usinas de beneficiamento instaladas na região. Tal vinculação se dá através de contratos

de fornecimento que condicionam o tipo de fumo produzido e o volume de produção a

ser repassado para a compradora em regime de exclusividade. Este segmento de

empresas, a exemplo do que ocorre nos grandes conglomerados, trabalham com o

sistema de produção integrada contando em média com cerca de 900 produtores aos

quais repassam insumos e assistência técnica. Entretanto, o volume de fumo

65 Estas informações foram obtidas com base em dados do Sindifumo.

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205

comercializado por este grupo de empresas representa um percentual reduzido da

produção regional de fumo em folha.

O segundo segmento é constituído por empresas de médio e grande porte que

representam ramos dos grandes conglomerados da indústria mundial de tabaco. A maior

parte destas empresas possui mais de 500 empregados efetivos e mantém filiais nos

Estados de Santa Catarina e Paraná de onde provêm cerca de 50% da produção de fumo

em folha que é processada na região do Vale do Rio Pardo.

A Phillip Morris é a única empresa que opera com a fabricação de cigarros na

região e não mantém linhas de processamento primário de fumo, adquirindo fumo

processado de diferentes fornecedores na região e no exterior. Com uma capacidade de

produção de cerca de 42 bilhões de cigarros por ano, a unidade de Santa Cruz do Sul

emprega 4600 funcionários efetivos. Em nível nacional a empresa detém 15% do

mercado brasileiro de cigarros com marcas como Marlboro, L&M, Galaxy e Parliament

e ainda exporta para América Latina, Europa e Ásia66.

Na área de processamento de fumo em folha, Souza Cruz, Universal Leaf e

Dimon são as principais empresas do arranjo na medida em que respondem por uma

capacidade de processamento de mais de 400 milhões de quilos de fumo e mantêm mais

de 110 mil produtores integrados nos três Estados do Sul. A Souza Cruz é a principal

empresa beneficiadora de fumo do complexo fumageiro local. Apesar de também contar

com unidades de beneficiamento industrial de fumo no Estado de Santa Catarina, nas

cidades de Blumenau e Tubarão, a empresa tem investido pesadamente nos últimos anos

no aumento da sua capacidade de armazenagem e beneficiamento de fumo no município

de Santa Cruz do Sul.

Tal processo se iniciou, ainda no final da década de 80, com a construção de

uma área de 24.000 m2 de armazéns refrigerados destinados à estocagem de fumo in

natura comprado dos produtores no período de safra, evitando a deterioração da sua

principal matéria-prima e permitindo uma flexibilização considerável no período de

processamento. No final da década de 90, a empresa concluiu a construção do maior

centro de beneficiamento de fumo do mundo no município de Santa Cruz do Sul, com

66 Em 1998, com o impacto da crise russa, a empresa acabou por desativar sua unidade de produção em Curitiba, que destinava mais de 90% da sua produção à exportação para Rússia e demais países do Leste Europeu e Ásia (Jornal do Brasil, 20/02/98).

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capacidade de processamento de 120 mil toneladas por ano, que representou um

investimento de US$ 81 milhões. Do total de volume de fumo processado pela empresa,

cerca de 60% é utilizado para alimentar suas fábricas de cigarros no país e o restante é

exportado. A Souza Cruz detém hoje mais de 80% do mercado nacional de cigarros e

iniciou recentemente a construção de uma nova fábrica de cigarros no Rio Grande do

Sul, no município de Cachoeirinha. Tanto a Souza Cruz como as demais grandes

empresas do arranjo mantêm filiais de compra de fumo em outros municípios como

forma de controlar e organizar sua rede de fornecedores distribuídas nos Estados do Sul.

A existência destes segmentos diferenciados de acordo com tamanho e dimensão

de mercado levou ao estabelecimento de uma divisão de trabalho implícita entre as

empresas do arranjo. Conforme destacado acima, as empresas de pequeno e médio porte

encontram-se atreladas ao processo produtivo das duas principais processadoras da

região (Souza Cruz e Phillip Morris) enquanto fornecedoras de fumo em folha (no caso

das pequenas) ou processado (no caso das médias). Segundo as empresas, o volume de

fumo adquirido e a identificação de seus fornecedores na região são mantidos em sigilo

por questões estratégicas, o que torna difícil a tarefa de construir um esquema confiável

de representação dos fluxos de produção entre empresas, seja em âmbito local ou

internacional.

Um esboço sobre a intensidade e natureza dos fluxos de produção entre

empresas fumageiras que atuam em âmbito local é apresentado na figura 1 a seguir67.

Esta representação procura identificar os diferentes segmentos de empresas que atuam

na produção, processamento e comercialização do fumo produzido no arranjo, as formas

de interação entre estes diferentes segmentos de empresas e os principais canais de

comercialização da produção local.

Conforme pode ser observado na figura, as fases relacionadas ao plantio,

armazenagem, processamento primário e exportações abarca o núcleo principal de

atividades do arranjo produtivo. Uma rede de mais de 70.0000 produtores rurais

desempenha as atividades de plantio do fumo em folha na região sul. Esta extensa rede

de produtores rurais integra o primeiro estágio da cadeia produtiva no arranjo e

67 Esta figura foi produzida a partir de um modelo sobre sub setores, definidos como uma rede de firmas que provê matéria-prima, opera no seu processamento e distribui produtos acabados para um nicho de mercado específico (Haggblade and Gamser, 1991). Esta representação do arranjo fumageiro abarca três diferentes canais de comercialização.

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desempenha um papel crucial na medida em que garante o fornecimento da matéria-

prima principal. Entretanto, a maior parte dos insumos e outros bens intermediários

utilizados na produção e processamento do fumo são fornecidos por empresas que se

encontram fora do arranjo em outras regiões do Estado, no país ou no exterior. No caso

de insumos como fertilizantes, defensivos, herbicidas, pesticidas, entre outros, que são

utilizados na produção do fumo, o fornecimento é geralmente feito pelas próprias

empresas fumageiras através de fornecedores externos ao arranjo. Da mesma forma, as

atividades relacionadas a marketing, exportações distribuição e P&D encontram-se sob

o controle e coordenação das matrizes das subsidiárias de empresas transnacionais que

operam no arranjo ou sob responsabilidade de agentes de exportação especializados.

Neste aspecto, a análise da estrutura produtiva do arranjo fumageiro demonstra uma

elevada diversidade na natureza dos vínculos e atores envolvidos nas diferentes etapas

de produção e comercialização bem como no alcance geográfico destas atividades.

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EXPORTAÇÕES (PROCESSAMENTO SECUNDÁRIO) VENDAS/DISTRIBUIÇÃO ARMAZENAGEM PROCESSAMENTO PRIMÁRIO EMPACOTAMENTO SECAGEM CORTE ARMAZENAGEM PLANTIO

PLANTAS DE

PROCESSAMENTO DE FUMO EM FOLHA

VERTICALMENTE INTEGRADAS

N= 3

MPEs, PEQUENOS DISTRIBUIDORES DE

FUMO EM FOLHA N=10

PLANTAS DE PROCESSAMENTO DE TABACO OPERANDO COM FORNECIMENTO EXTERNO DE

FUMO EM FOLHA N= 3

AGENTES DE EXPORTAÇÃO N=10

FÁBRICA DE CIGARROS N=1

PEQUENOS PRODUTORES RURAIS INTEGRADOS OU NÃO ÀS EMPRESAS FUMAGEIRAS

N= 70.000 (RS)

CANAL 1 MERCADO EXTERNO PARA FUMO PROCESSADO E IN

NATURA

CANAL 2 EXPORTAÇÃO DE CIGARROS

CANAL 3 MERCADO

DOMÉSTICO DE CIGARROS

US$ 939.7 milhões US$ 619.1 milhões US$ 518,4 milhões

FIGURA 3.1: MAPA DO ARRANJO

FUMAGEIRO

Legenda: Vendas de bens no varejo: Relações de subc ontratação Delimitação das firmas : OBS: Os valores no alto da figura, são estimativas para o ano de 1998 fornecidas pela ABIFUMO para os diferentes canais de comercialização da indústria de fumo no Brasil e podem estar superestimados.

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Em comparação com os demais arranjos produtivos analisados, e em partic ular com o

arranjo fumageiro, a estrutura produtiva do arranjo coureiro-calçadista revela uma elevada

complexidade na densidade e formas de organização do sistema produtivo local. Atualmente, a

região conta com cerca de 500 empresas produtoras de calçados, que constituem o principal núcleo

de atividades do arranjo e que atuam principalmente no nicho de mercado de calçados femininos de

couro. A especialização das empresas da região na produção de calçados femininos trouxe algumas

vantagens do ponto de vista produtivo e competitivo, tais como: a) um mercado mais amplo em

função das mudanças constantes de estilo presentes no segmento de calçados femininos; b) o fato de

que o calçado feminino exige materiais menos resistentes e mais fáceis de trabalhar que o

masculino; e c) a tradição importadora do mercado internacional é de calçados femininos (Costa,

1993; Fensterseifer et al., 1995).

A tabela abaixo, que apresenta o perfil do arranjo em termos do porte das empresas

calçadistas, demonstra o predomínio de MPEs que representa mais de 70% das empresas do arranjo.

TABELA 3.6 - Estrutura da indústria calçadista gaúcha, 1994

No de funcionários 0 a 19 20 a 99 100 a 499 500 e + Total No de empresas 253 113 87 56 509 Fonte: SEBRAE/RS e Cadastro FIERGS/CIERGS – 94/95 (da Costa et al. 1997)

Além da elevada densidade da cadeia-produtiva local e do predomínio de MPEs, o perfil do

arranjo coureiro-calçadista contrasta com o do arranjo fumageiro pela clara predominância de

empresas de capital nacional. Neste aspecto, a inserção do arranjo no mercado externo a partir da

década de 70 não implicou na desnacionalização das empresas calçadistas, mas trouxe impactos

significativos sobre a forma de organização do arranjo. Ainda que o capital das empresas calçadistas

tenha se mantido sob o controle de produtores locais, o acesso destas empresas ao mercado externo

ocorreu em grande parte através da intermediação de agentes de exportação e grandes redes

internacionais de compra que passaram a deter um controle crescente de estágios estratégicos da

cadeia de valor associados a atividades de design e comercialização.

Assim, a inserção no mercado externo implicou numa redução significativa do escopo de

ação dos produtores locais nos estágios de distribuição e comercialização de calçados. Tais

atividades passaram a ser organizadas e controladas através dos agentes de exportação ou

representantes das grandes redes internacionais de compra instalados na região. Esta estratégia foi

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adotada pela maior parte das grandes empresas calçadistas exportadoras do arranjo, que passaram a

desempenhar um papel importante na organização de redes de subcontratação envolvendo o

segmento de prestadores de serviço (ateliês de costura e pesponto) e o segmento de empresas

calçadistas de micro, pequeno e médio porte do arranjo. Entretanto, apesar da importância que

assumem estas grandes empresas calçadistas na organização dos fluxos de produção, a análise do

perfil atual do arranjo permite destacar um outro segmento de empresas calçadistas que apresenta

uma forma de inserção diferenciada no mercado interno e externo. Ainda que constitua um conjunto

relativamente restrito de empresas, esse segmento de empresas calçadistas tem buscado avançar em

estágios mais nobres da cadeia de valor relacionados à criação de desenhos e marcas próprias, e a

conquista de canais próprios de comercialização. A diferenciação destes dois grupos de empresas

calçadistas se reflete também na análise sobre as estratégias inovativas e mecanismos de

aprendizado coletivo apresentada nos próximos capítulos.

Além de um universo considerável de empresas calçadistas, o arranjo conta atualmente com

empresas que operam em diferentes etapas da cadeia produtiva de calçados como prestadores de

serviços especializados, curtumes, fornecedores de máquinas e equipamentos, fabricantes de

componentes e agentes de exportações, entre outros. Desse modo, no início dos anos 1990

constatava-se a existência de cerca de 130 empresas dedicadas às atividades de curtimento, 43

produzindo máquinas para couro e calçados, 219 fabricantes de componentes, 26 na indústria de

borracha, 722 empresas prestadoras de serviços (os chamados ateliês), 84 agentes de exportação e

carga, dentre outras ocupações (Costa, 1997). Apesar da dificuldade de mensurar a extensão exata

do arranjo dada a ausência de dados estatísticos oficiais sobre número e tamanho das empresas nos

diferentes segmentos da cadeia produtiva calçadista, a tabela a seguir procura apresentar um perfil

dos principais atores que integram a estrutura produtiva do arranjo nos anos 1991 e 199668.

68 Cabe destacar que esses dados não foram originalmente produzidos para fins comparativos, devendo, portanto, serem tratados com cautela

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TABELA 3.7 - Arranjo coureiro-calçadista do Vale do Sinos – principais atores no segmento produtivo- 1991;1996

1991 1996 Atividade N° de Empresas N° de Empresas

223 191 135 92 45 38 70 47 710 759 52 41 26 26

Fabricantes de Componentes Curtumes Fabricantes de Máquinas e Equipamentos Agentes de Exportação Empresas Prestadoras de Serviço Fabricantes de Artigos de Couro Fabricantes de Borracha Outros 80 88 TOTAL 1.821 1.673

Fonte: ABAEX e Schmitz (1994; 1999)

A análise da tabela revela a diversidade que assumem as atividades produtivas do arranjo e a

importância relativa que assumem segmentos de atores em diferentes estágios da cadeia-produtiva

local. A redução significativa de empresas em quase todos os segmentos do arranjo, entre 1991 e

1996, por sua vez, demonstra o impacto decorrente do processo de reestruturação produtiva no

decorrer da década de 90.

De uma maneira geral, a análise das formas de organização do arranjo produtivo coureiro-

calçadista demonstra que, apesar de estarem funcionalmente atrelados aos fabricantes de calçados,

os diferentes segmentos de atores que integram o arranjo tendem a apresentar graus diversos de

autonomia e formas de articulação em relação às empresas calçadistas. Ainda que todos segmentos

de empresas do arranjo tenham sofrido com maior ou menor intensidade os impactos decorrentes da

crise na indústria calçadista desde o final da década de 80, cada um deles tem buscado desenvolver

mecanismos e estratégias próprias. Da mesma forma, verifica-se que a articulação entre as empresas

calçadistas e os demais segmentos que integram o arranjo representa um espaço onde a mediação de

conflitos – potenc iais ou concretos – sempre esteve presente. Em particular, nos segmentos de

curtumes e fabricantes de máquinas e equipamentos a divergência de interesses com relação às

empresas calçadistas tem se mostrado mais intensa no decorrer da trajetória de evolução do arranjo.

O segmento de curtumes é um dos que agrega o maior número de empresas no arranjo. Além

de constituir-se no segmento responsável pelo fornecimento da principal matéria-prima para

fabricação de calçados, as atividades relacionadas ao curtimento de couro são anteriores ao

surgimento do núcleo de empresas calçadistas na região. Neste sentido, a produção e exportação de

couros (particularmente o “wet-blue” de maior qualidade) foi, durante os primeiros estágios de

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crescimento do arranjo, uma atividade que competia diretamente com o desempenho da indústria

calçadista. Com a consolidação do arranjo calçadista na região e com o crescimento acelerado das

exportações de calçados no decorrer da década de 70, foram criadas diversas restrições às

exportações de couro que ocasionaram uma redução drástica no poder de barganha dos curtumes

junto às empresas calçadistas do arranjo que passaram a contar com um núcleo cativo de

fornecedores da sua principal matéria-prima. Este fato resultou num declínio considerável no ritmo

de modernização do segmento de curtumes e ainda hoje tem repercussão nas suas relações com o

segmento das empresas calçadistas.

No caso dos fabricantes de máquinas e equipamentos, a origem das primeiras empresas

esteve ligada às oficinas de manutenção de equipamentos na região ainda na década de 40. Na

medida em que estas empresas lograram adquirir a competência necessária para fabricação das

máquinas para a indústria calçadista na década de 60 e 70, passaram a desfrutar de proteção contra a

competição de fabricantes externos incorporando assim um grupo cativo de consumidores no

arranjo. O declínio do segmento – e a intensificação dos conflitos com as empresas calçadistas –

ocorre especialmente a partir da década de 90 com a crescente liberalização das importações que

levou a uma intensificação da importação de máquinas (particularmente da Itália) por parte dos

calçadistas locais69.

O segmento de prestadores de serviços congrega um universo bastante heterogêneo de atores

no interior do arranjo calçadista. Além dos ateliês ou bancas que empregam mão-de-obra local e

desempenham algumas tarefas para as empresas calçadistas, existem empresas calçadistas que

contratam esses serviços diretamente com seus trabalhadores, e intermediários que operam na

distribuição de serviços junto a domicílios na região. Assim, na maioria dos casos, essas atividades

de prestação de serviços envolvem a utilização de mão-de-obra familiar e assumem o caráter de

complementação de renda. Da mesma forma, a expansão deste segmento de atores no decorrer da

década de 90 pode ser explicada pela busca de flexibilidade produtiva por parte das empresas

calçadistas que resultou no aumento da subcontratação em algumas atividades como costura, corte e

modelagem.

69 Neste caso, o acirramento dos conflitos com as empresas calçadistas, esteve em grande parte vinculado ao fato de que muitas das grandes empresas passaram a contornar a chamada ‘lei do similar nacional’ que restringia e sobretaxava a importação de equipamentos que contassem com equivalente nacional. Para maiores detalhes ver Costa (1993) ou Schmitz (1999).

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No segmento dos fabricantes de componentes, o maior número de empresas concentra-se na

fabricação de Solados e Formas70. Existe um esforço crescente dos fabricantes de componentes no

sentido de diversificar produtos e buscar novos nichos de mercado como forma de diminuir os

impactos decorrentes da dependência do segmento em relação às empresas calçadistas. Atualmente,

este grau de dependência varia consideravelmente de acordo com o tipo de componente. No caso

dos fabricantes de Solados e Formas, 99% da produção ainda está direcionada ao setor calçadista

enquanto que no setor de embalagens esse percentual é de aproximadamente 50%.

3.4.2 Aglomerações produtivas com foco em mercados locais e nacionais : o

complexo agro-industrial vitivinícola e o pólo moveleiro na Serra Gaúcha

Conforme foi destacado anteriormente, a análise dos padrões de concorrência internacional

na indústria de móveis e de vinhos demonstra uma tendência crescente à organização de produtores

em torno de cadeias globais de compra (no caso da indústria de móveis) e à internacionalização de

empresas (no caso da indústria vinícola). Entretanto, apesar do crescimento significativo que tem

sido verificado nas exportações dos arranjos moveleiro e vitivinícola da Serra Gaúcha nos últimos

anos, o estudo dos principais canais de comercialização destes arranjos ainda demonstra a

importância do mercado doméstico (regional e nacional) no seu desempenho competitivo.

Em termos da densidade de sua estrutura produtiva, o arranjo vitivinícola engloba segmentos

de empresas que atuam em diferentes estágios desta cadeia agro- industrial. Além das atividades

ligadas à produção vitícola e ao beneficiamento de vinhos finos e comuns, o arranjo conta também

com um importante núcleo de fornecedores de equipamentos e de grande parte dos demais insumos

utilizados pela indústria vinícola local.

A forma de organização da estrutura produtiva local reflete a diversidade em termos dos

diferentes segmentos de vinícolas presentes no arranjo que atuam em nichos de mercado

diferenciados. Da mesma forma, a relação entre os estágios de produção agrícola e processamento

industrial da uva apresenta uma natureza totalmente diversa daquela presente no arranjo fumageiro,

tendo em vista a existência de um número elevado de cooperativas de pequenos produtores rurais

que também operam na produção de vinhos comuns.

70 Da mesma forma, de acordo com dados recentes da Assintecal, a maior concentração de empresas ainda permanece na região Sul, com 52,86% das empresas, seguida pela Região Sudeste, com 31,12%, Centro-Oeste com 13,50%, Nordeste com 2,44% e Norte, com 0,08%.

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Atualmente, é possível identificar três segmentos distintos de empresas vinícolas no arranjo.

Em primeiro lugar, destaca-se o segmento das vinícolas com capacidade de processamento superior

a seis milhões de litros/ano e que atuam principalmente na produção de vinhos finos e espumantes.

Neste segmento encontram-se tanto empresas de capital nacional, como a Cooperativa Vinícola

Aurora que é a maior no setor, como divisões de grupos transnacionais como a Vinícola De Lantier,

ligada ao Grupo Bacardi-Martini, que é a segunda maior vinícola em termos de comercialização no

país. Dentre as principais empresas transnacionais que atuam no arranjo vitivinícola da Serra

Gaúcha atualmente encontram-se: Domeck do Brasil (Espanha); Chandon do Brasil (França) e a

Seagram do Brasil (Canadá). Apesar de representarem menos de 2% do universo de empresas

vinícolas, as empresas deste segmento respondem por quase um terço do total da produção de

vinhos no arranjo 71.

Em segundo lugar, situado no extremo oposto, encontra-se o segmento de pequenas

vinícolas e cooperativas que produzem menos de três milhões de litros/ano, mas respondem por

mais de 50% da produção total de vinho na região. Em geral, a maior parte das vinícolas deste

segmento dedica-se à produção de vinhos comuns. Entretanto, no decorrer da década de 90, um

terceiro e importante segmento de vinícolas composto de pequenas cantinas familiares tem se

destacado na produção de vinhos finos e conquistado um importante nicho de mercado

anteriormente ocupado apenas pelas maiores vinícolas do arranjo.

A produção de vinhos finos demanda um elevado nível de capacitação por parte das

vinícolas que se reflete não somente no nível tecnológico dos equipamentos utilizados, mas também

no conhecimento técnico das melhores práticas enológicas. Neste aspecto, esse grupo de pequenas

cantinas rurais familiares dedicadas à produção de vinhos finos representa um elo importante no

movimento de reestruturação e modernização do arranjo vitivinícola na Serra Gaúcha no decorrer

da década de 90. Originalmente, a inserção deste segmento de empresas familiares no arranjo se

refletia através do seu papel de abastecedoras primárias de uva ou de vinho a granel para o

segmento das grandes empresas. Gradativamente, entretanto, uma parcela destas cantinas logrou

atingir um elevado padrão de qualidade na produção de vinhos finos através da modernização de

equipamentos e da qualificação técnica dos filhos dos proprietários enviados para cursos de

formação superior em enologia em países como Argentina e França.

71 Esta informação foi obtida a partir dos dados disponibilizados pela União Brasileira do Vinho (UVIBRA) para o

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A importância associada atualmente ao segmento das pequenas cantinas familiares se deve,

em grande parte, ao acúmulo de premiações e à sua inserção qualificada na comercialização de

vinhos finos no mercado regional e nacional. Segundo dados da União Brasileira do Vinho

(UVIBRA), estima-se que entre as quase 200 pequenas cantinas localizadas na Serra Gaúcha, não

chega a 15 o número das que estão conquistando novos mercados com uma produção de qualidade.

Os parreirais são cultivados em áreas pequenas, quando comparadas com as centenas de hectares de

onde provêm as uvas para a industrialização nas grandes vinícolas. Apesar de operarem com uma

escala de produção reduzida, estas cantinas respondem hoje por mais de 90% da oferta de vinhos

finos no mercado nacional.

Situado no mesmo entorno geográfico, o arranjo produtivo de móveis na Serra Gaúcha conta

hoje com cerca de 350 empresas que atuam na produção e comercialização de móveis,

particularmente no segmento de móveis residenciais de madeira. Apesar da clara predominância de

micro e pequenas empresas entre os produtores de móveis na região, o arranjo abriga também

algumas das maiores e mais modernas empresas produtoras de móveis do país. Dentre as principais

empresas que estão instaladas nesta região destacam-se: Todeschini, Carraro, Pozza, Madem,

Dellano, Florense e Madesa. A presença deste conjunto de empresas de médio e grande porte, com

forte inserção no mercado nacional e internacional contribui para a consolidação de um elevado

nível de atualização tecnológica entre as principais empresas que integram o arranjo.

Entretanto, apesar de representarem menos de 5% do universo de produtores que atuam no

Estado, o núcleo de grandes e médias empresas do arranjo moveleiro na região da Serra Gaúcha é

responsável por cerca de um terço do faturamento da indústria moveleira no Estado. Da mesma

forma, este conjunto de empresas desempenha um papel fundamental na organização dos fluxos de

produção no arranjo através da formação de redes de subcontratação que integram grande parte do

segmento de MPEs que atuam na região.

O elevado grau de articulação entre as grandes e médias empresas e o segmento de MPEs no

arranjo moveleiro da Serra Gaúcha contribuiu para o fato deste pólo ser um dos que apresenta o

menor grau de verticalização da produção quando comparado com os demais pólos moveleiros no

Brasil. Cerca de 52% das empresas que atuam na produção de móveis na região de Bento Gonçalves

transferem para terceiros alguma etapa do seu processo produtivo. Neste aspecto, a presença de um

início da década de 90.

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número elevado de pequenas e médias empresas neste arranjo costuma ser apontada como uma das

principais razões para a existência de um grau menor de verticalização na produção de móveis

desta região.

O espaço para subcontratação ou terceirização de atividades ocorre na compra de

componentes e acessórios ou montagem de partes, como gavetas por exemplo, que por demandarem

muita mão-de-obra, são repassadas para terceiros. Entretanto, essas relações de subcontratação não

apresentam, em geral, uma natureza estável e duradoura e tampouco refletem relações de

cooperação e aprendizado importantes. Em geral, essas atividades não envolvem exclusividade no

fornecimento, contratos formais, cessão de equipamentos ou formas de capacitação específicas entre

as empresas e seus fornecedores locais. Em alguns casos a inexistência de relações estáveis

envolvendo exclusividade reflete uma precaução das empresas em não configurar vínculos

permanentes de trabalho com as pequenas oficinas artesanais com as quais operam.

Um exemplo bastante ilustrativo sobre o formato que assumem as relações de subcontratação

no arranjo moveleiro da Serra Gaúcha refere-se à compra dos acessórios utilizados na montagem

dos móveis. Este sistema de fornecimento é utilizado tanto pelas grandes empresas como por

algumas empresas de médio e pequeno porte e envolve um grande contigente de pequenas oficinas

que fornecem os kits de acessórios de acordo com a especificação em embalagens plásticas.

Com relação aos demais segmentos de empresas que integram a cadeia produtiva local,

verifica-se que apesar da região de Bento Gonçalves contar com um núcleo de fornecedores de

insumos e equipamentos para as empresas locais, a maior parte dos insumos são provenientes de

outros Estados ou do exterior, enquanto que os equipamentos costumam ser importados da Itália e

Alemanha. No caso de matérias-primas como chapas aglomeradas e MDF, os principais

fornecedores, como Eucatex, Cetipel e Placas do Paraná, encontram-se em São Paulo ou no Paraná.

O mesmo ocorre com os principais fornecedores de acessórios plásticos e metais, como puxadores e

corrediças. Neste sentido, a localização das empresas na região não pode ser explicada pela

proximidade de fornecedores de insumos. O mesmo se aplica com relação ao principal mercado

consumidor para as empresas da região, na medida em que a comercialização da produção também

ocorre em outros Estados e no exterior conforme demonstra a tabela abaixo:

TABELA 3.8 - Comercialização da produção de móveis do RS, segundo a participação percentual de cada mercado

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Destino/canal de comercialização 1998 1999 2000 Para outros Estados 75 70 70 Comercializados no RS 16 16 13 Destinados à exportação 9 14 17

Fonte: Movergs (2001)

Assim, a justificativa para a lo calização e permanência das empresas na região não parece

residir em fatores tradicionais relacionados à proximidade de fornecedores e consumidores.

O gráfico abaixo, baseado nos resultados da pesquisa de campo, confirma a reduzida

importância relacionada à proximidade de fornecedores e clientes enquanto fator determinante da

localização das empresas na região. Por outro lado, verifica-se também a importância de outras

formas de externalidades relacionadas com a disponibilidade e com o perfil de qualificação da

mão-de-obra local, bem como com a proximidade com centros de pesquisa e universidades. Na

realidade, este tipo de externalidade relacionada à disponibilidade e ao padrão de qualificação da

mão-de-obra representa uma vantagem presente nos demais arranjos (Vargas, Santos e Alievi, 1999;

Vargas e Alievi, 2002).

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GRÁFICO 3.1 - Arranjo Moveleiro: Vantagens Relacionadas à Localização da Empresa na Região

0% 20% 40% 60% 80% 100%

Infra-esturutra diposnível

Disponibilidade de mão-de-obra

Qualidade de mão-de-obra

Custo da mão-de-obra

Existência de proramas governamentais

Proximidade com Univ./ Cent. Pesq.

Proximidade com fornecedores de insumos

Proximidades com clientes/consumidores

Sem importância Pouco importante Importante Muito Importante

3.5. Conclusões

A análise da trajetória recente de desenvolvimento dos arranjos produtivos reflete tanto os

efeitos que emergem de mudanças no ambiente de concorrência em âmbito mundial, como as

implicações decorrentes das reformas estruturais no decorrer da década de 90. Esse conjunto de

mudanças teve um impacto profundo sobre as estratégias produtivas e inovativas adotadas em todos

os arranjos, ainda que tenha se manifestado de forma mais intensa naquelas aglomerações com

maior inserção externa como as de fumo e de calçados.

No arranjo fumageiro, um dos impactos mais claros do processo de reformas estruturais no

decorrer da década de 90, esteve ligado à intensificação na concentração da propriedade do capital

das subsidiárias de empresas transnacionais que operam no arranjo, motivada pelas sucessivas

operações de fusões, incorporações e associações entre os grandes conglomerados que operam na

região. Se na década de 70 a constituição deste arranjo se deu através de um processo de

desnacionalização das empresas locais, a partir das décadas de 80 e 90 a nova dinâmica do mercado

internacional de tabaco significou uma redução significativa no número de empresas que passam a

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atuar na região. Adicionalmente, a observação da evolução do emprego no setor desde a década de

70 mostra que o nível de ocupação da mão-de-obra nessa indústria atingiu o seu limite no início da

década de 80, passando a declinar continuamente no decorrer da década de 90 (Vargas et al, 1998).

As transformações recentes no arranjo fumageiro contrastam, em grande parte, com a

experiência de reestruturação que vem sendo enfrentada pelo arranjo vitivinícola da Serra Gaúcha.

No primeiro caso, o impacto das reformas estruturais no arranjo fumageiro esteve relacionado

principalmente ao acirramento dos laços de subordinação dos atores locais às necessidades dos

grandes conglomerados da indústria de fumo em nível mundial. No segundo caso, o processo de

abertura comercial aliado a crescente integração econômica com os países do Mercosul representou

um enorme desafio para o arranjo vitivinícola que passou a buscar novas formas de capacitação

produtiva e inovativa para enfrentar a concorrência externa e buscar novos mercados. Neste aspecto,

a trajetória recente de evolução do arranjo vitivinícola demonstra algumas mudanças importantes

relacionadas ao papel que vem sendo desempenhado pelo segmento de pequenas cantinas familiares

produtoras de vinhos finos. Conforme enfatizado anteriormente, apesar de constituírem um grupo

reduzido, essas cantinas encontram-se hoje no centro do processo de reestruturação produtiva do

arranjo vitivinícola. Da mesma forma, é preciso considerar que antes do surgimento deste pequeno

segmento qualificado no arranjo, a produção de vinhos finos constituía-se num espaço em grande

parte restrito às grandes empresas vinícolas tendo em vista o nível requerido de investimentos e

qualificação técnica. Até os anos 60, mesmo a produção da principal vinícola do arranjo, a Aurora,

esteve restrita à produção de vinhos comuns72.

No decorrer da década de 70, o segmento mais dinâmico do arranjo vitivinícola foi o das

vinícolas transnacionais de origem européia e norte-americana aliadas a grandes vinícolas de

propriedade nacional, particularmente a Cooperativa Vinícola Aurora. Entretanto, a partir de

meados da década de 80, certos fatores como o excedente de produção, entrada de vinhos

importados, queda de preços e falta de estímulo ao produtor, ocasionaram uma forte crise no

segmento vinícola e o endividamento das principais cooperativas. A retomada do crescimento do

setor, que ocorre a partir de um novo ciclo de modernização na década de 90, abriu espaço para o

novo segmento de cantinas familiares que passaram a investir na qualificação de sua produção,

72 A produção de vinhos finos da Aurora só começaria em 1962 com a marca Bernard Taillan e mediante a orientação técnica de um enólogo estrangeiro (Guy Gérard de Cara) trazido através da Bernard Taillan com quem a Aurora mantinha uma parceria no engarrafamento de vinhos de viníferas

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mudando o papel desempenhado anteriormente enquanto abastecedoras primárias de uva para as

grandes vinícolas e cooperativas.

Da mesma forma, no arranjo coureiro-calçadista, o processo de reformas estruturais também

representou um importante ponto de inflexão nas estratégias adotadas pelas principais empresas do

arranjo. A partir do início da década de 90, o aumento da concorrência internacional decorrente da

competição com os países exportadores asiáticos, aliado à grande instabilidade no ambiente

macroeconômico brasileiro, trouxe uma crise sem precedentes para a maior parte das empresas do

arranjo calçadista no Vale do Sinos. O processo de ajuste competitivo do arranjo nesta fase implicou

em algumas mudanças drásticas na forma de organização dos processos produtivos intra e inter

firmas.

Com a entrada da China no mercado mundial de calçados ainda no final da década de 80, o

Brasil verificou uma redução em sua participação nas vendas de calçados femininos de couro de

baixo preço no mercado americano, seu principal nicho de comercialização. Ainda que algumas

empresas do arranjo tenham logrado redirecionar sua produção para novos nichos de mercado

associados com calçados de maior qualidade e preço, as mudanças no ambiente de mercado e no

ambiente macroeconômico brasileiro contribuíram para agravar ainda mais a crise no setor. No

mercado calçadista mundial, a busca de reduções no custo de inventário por parte dos compradores

internacionais levou a uma redução considerável tanto no intervalo entre os pedidos como

principalmente no volume dos pedidos individuais (Schmitz, 1999). No ambiente macroeconômico,

durante a década de 80 e início da década de 90, o país enfrentou um período de grande

instabilidade associado com a aceleração inflacionária, acompanhado de um quadro de recessão

econômica. Com a adoção do Plano Real a partir de 1994, o processo de apreciação cambial que

elevou o valor da moeda brasileira em relação ao dólar levou a uma perda substancial da

competitividade dos calçados brasileiros e a uma forte retração das vendas no mercado externo.

O desempenho do arranjo no final da década de 90 sugere um processo de retomada do

crescimento do setor que vendo sendo sustentado tanto pela melhora no cenário internacional como

também por uma recuperação no mercado doméstico73. Entretanto, percebe-se que a forma de

73 Em 1993, a participação do consumo interno na produção era de cerca de 66% enquanto que em 1999 esse percentual aumentou para cerca de 73% (Assintecal, 2000). Da mesma forma, ao mesmo tempo em que o setor coureiro -calçadista trava uma batalha pela desoneração de impostos nas exportações, o volume exportado tem apresentado um crescimento significativo nos últimos dois anos e percebe-se também uma tendência de maior participação do mercado interno na

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inserção das empresas no mercado externo ainda se encontra baseada sobremaneira na articulação

com compradores internacionais ligados a cadeias globais de produção. As implicações associadas a

este tipo de inserção externa são detalhadas no próximo capítulo que aborda as formas de

coordenação presentes em cada arranjo.

Finalmente, no caso do arranjo moveleiro, o processo de reformas estruturais na economia

brasileira na década de 90 trouxe alguns efeitos positivos na medida em que acarretou uma redução

significativa nos custos de importação de bens de capital e incentivou a gradativa substituição da

produção doméstica de máquinas e equipamentos. O barateamento de equipamentos e insumos

importados foi um fator determinante no processo de modernização tecnológica das principais

empresas do arranjo que passaram a investir fortemente na renovação do parque de máquinas,

principalmente em equipamentos importados provenientes, em sua maior parte, da Itália e da

Alemanha.

O processo de reestruturação produtiva e modernização da indústria de móveis no Brasil no

decorrer da década de 90 reflete, em grande medida, as transformações no arranjo moveleiro da

Serra Gaúcha. Em primeiro lugar, esse processo de modernização não abarcou todas as empresas do

setor, na medida em que esteve ligado a um circuito relativamente restrito das empresas de grande e

médio porte, com forte vinculação ao mercado externo. A maior parte das pequenas e micro

empresas do setor permaneceram tecnologicamente desatualizadas, com níveis reduzidos de

produtividade. Tais limitações contribuíram, também, para a manutenção de um elevado grau de

verticalização da produção. Ao contrário do que ocorre em outros países como a Itália, as maiores

empresas deste setor no Brasil ainda possuem grandes plantas verticalizadas, onde convivem

inúmeros processos tecnológicos. Em muitos casos, numa mesma planta industrial são reunidas

etapas de secagem, processamento secundário, usinagem, acabamento, pintura e embalagem. Na

fabricação de móveis de madeira maciça como pínus, por exemplo, é comum que as empresas

mantenham divisões específicas dedicadas ao plantio e beneficiamento da madeira utilizada na

produção. Neste aspecto em particular, o arranjo moveleiro da Serra Gaúcha logrou manter um grau

reduzido de verticalização da produção em função da existência de uma forte articulação entre as

grandes empresas e o segmento de MPEs no arranjo.

realização da produção brasileira de calçados.

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Em segundo lugar, apesar do processo de modernização, o setor continuou a apresentar um

elevado grau de fragmentação. Em outras palavras, verificou-se uma incidência muito pequena de

operações envolvendo fusões e outras formas de associações entre empresas, que consiste numa

característica geral do processo de desenvolvimento industrial na década de 90. Essa fragmentação,

mais do que uma característica da cultura existente neste setor industrial, reflete as marcantes

peculiaridades que emergem a partir dos diferentes pólos regionais (Santos et al., 1999). Em terceiro

lugar, ainda que o processo de modernização tenha sido fundamental para a capacitação produtiva,

tanto em termos dos níveis de atualização tecnoló gica dos equipamentos como na adoção de

modernas técnicas de gestão da produção nas empresas, a indústria não logrou o desenvolvimento

de capacitações em áreas como design e marketing. Neste aspecto, ainda que o arranjo moveleiro da

Serra Gaúcha represente um dos pólos mais atuantes no esforço em qualificação em design, a maior

parte das empresas ainda carece de espaço para operar no mercado externo com design e marcas

próprias já que, em geral, os projetos são determinados pelos importadores e as empresas brasileiras

são apenas subcontratadas para executar a produção dos mesmos.

Em síntese, a análise dos estudos de caso permite destacar algumas especificidades associadas

a um novo padrão de organização de atividades produtivas e inovativas nos arranjos, ao mesmo

tempo em que aponta para as limitações comuns que passam a ser enfrentadas por atores locais na

busca de um novo padrão de inserção competitiva baseada na dinâmica inovativa. Tais limitações

não somente condicionam a forma de inserção dos arranjos no mercado externo, como afetam as

condições de concorrência no mercado doméstico.

Da mesma forma, as reformas estruturais (principalmente a liberalização comercial) acarretou

um processo intenso de ajustamento nos arranjos que, em linhas gerais, se refletiu num aumento

considerável da exposição à concorrência externa e na modernização produtiva com maior enfoque

em mudanças organizacionais, entre outros fatores comuns.

Entretanto, o estudo das especificidades que marcam a dinâmica competitiva e inovativa

destes arranjos se insere num contexto mais amplo e deve ser complementado pela análise dos

desenhos institucionais e estruturas de governança, que servem de base para organização de

diferentes segmentos de atores em âmbito local. Neste aspecto, o próximo capítulo analisa a

influência das estruturas de governança sobre as formas de organização e articulação entre atores

locais e com instâncias externas aos arranjos.

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4 – FORMAS DE COORDENAÇÃO E DESENHOS INSTITUCIONAIS

4.1 – Introdução

Com base nos argumentos presentes no referencial teórico, este capítulo analisa as estruturas

de governança e desenhos institucionais presentes nos arranjos produtivos estudados. A importância

associada ao papel das instituições na organização de atividades produtivas e inovativas se apoia na

concepção evolucionária sobre sistemas de inovação, a qual assume que os formatos institucionais

contribuem para estabelecer um plano comum para regras cognitivas e padrões de comportamento

associados a contextos territoriais específicos.

Da mesma forma, a questão da governança, na medida em que reflete o poder que

determinados atores detêm no sentido de influenciar o desenvolvimento de aglomerações

produtivas, representa um elemento fundamental na discussão dos estudos de caso74. Neste aspecto,

o principal objetivo do capítulo consiste em analisar a influência de atores locais e externos na

coordenação dos sistemas de produção e na própria trajetória de desenvolvimento e capacitação

produtiva e inovativa das empresas nos arranjos estudados.

A fim de explorar as principais implicações das diferentes formas de coordenação e

desenhos institucionais presentes nos arranjos, o capítulo contempla três níveis de análise. O

primeiro, busca identificar aqueles agentes econômicos, locais ou externos, que exercem maior

influência na organização e desenvolvimento dos sistemas de produção. Tal análise complementa e

amplia a caracterização apresentada no capítulo precedente sobre a organização da estrutura

produtiva dos arranjos. O segundo, discute o papel dos desenhos institucionais no sentido de mediar

as relações de poder entre diferentes segmentos de atores locais, ou mesmo entre atores locais e

externos aos arranjos. A caracterização dos desenhos institucionais parte de uma concepção ampla

que abarca tanto o papel de organizações formais (tais como associações de classe), como o

conjunto de regras, práticas e rotinas que estão fundadas no próprio contexto cultural e histórico

regional ou local. Um terceiro nível de análise contempla a importância e papel da infra-estrutura

educacional e tecnológica presente nas aglomerações no sentido de organizar e coordenar os fluxos

74 A noção de estruturas de governança refere -se aos diferentes modos de coordenação que envolvem atividades interdependentes associadas tanto à organização de fluxos de produção como ao processo de geração, disseminação e uso de conhecimentos. Para uma discussão sobre os diferentes significados e usos do termo ver Williamson (1979); (Jessop, 1998); Schmitz e Humphrey (2000).

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de informação e conhecimento relevantes para o processo de capacitação produtiva e inovativa de

atores locais. Da mesma forma, a avaliação sobre o papel e importância da infra-estrutura

educacional e tecnológica dos arranjos baseia-se em dois aspectos principais. O primeiro considera

a existência de universidades, centros de pesquisa, escolas técnicas, entre outras organizações

ligadas ao processo de geração de conhecimento e disseminação de informações nos arranjos. O

segundo procura avaliar em que medida tais organizações participam efetivamente na capacitação

de atores locais.

Adicionalmente, a fim de destacar o impacto da interação entre ins tâncias locais e globais de

governança, procura-se contrapor a experiência de dois grupos distintos de arranjos de acordo com a

natureza da sua inserção no mercado externo. No primeiro grupo estão os arranjos de fumo e

calçados, cujos sistemas de produção encontram-se de alguma forma integrados a cadeias globais de

valor. No segundo grupo, situam-se os arranjos de vinho e móveis onde a coordenação e

organização dos sistemas de produção ainda estão associadas ao escopo de ação de atores locais.

Na medida em que se busca estabelecer um referencial analítico que incorpora a influência

das estruturas de governança em diferentes formatos de arranjos produtivos, torna-se ilustrativa a

caracterização de dois pólos extremos em termos do grau de simetria nas relações entre atores nos

arranjos. Num primeiro pólo, estão arranjos onde as formas de coordenação e desenhos

institucionais refletem um considerável grau de simetria nas relações de poder entre diferentes

atores no segmento produtivo e onde os principais estágios da cadeia produtiva local encontram-se

integrados e/ou são controlados por atores locais. Num outro pólo, estão arranjos onde estas formas

de coordenação e desenhos institucionais apresentam uma natureza claramente hierárquica com

elevado grau de assimetria nas relações de poder entre diferentes segmentos de atores e onde os

principais estágios da cadeia de valor são, em grande parte, controlados por atores externos.

Conforme será visto a seguir, os arranjos analisados representam casos intermediários situados entre

estes dois pólos que representam, portanto, um intervalo contínuo de situações possíveis.

O capítulo encontra-se estruturado em torno de três seções além desta introdução. Na

segunda seção apresenta-se o perfil das estruturas de governança e desenhos institucionais presentes

nos arranjos de fumo e calçados, que apresentam elevado grau de articulação com instâncias globais

na coordenação. Na terceira seção, discute-se o caso dos arranjos vitivinícola e moveleiro que ainda

apresentam um perfil de governança marcado pela importância de atores locais. A quarta seção

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conclui o capítulo com uma sistematização sobre os principais aspectos relacionados às estruturas

de governança nos diferentes formatos de arranjos.

4.2 – Arranjos produtivos articulados com instâncias globais de coordenação

Não obstante a existência de diferenças significativas no tipo de propriedade do capital das

empresas ou na densidade da cadeia produtiva local, um importante elemento comum no perfil dos

arranjos calçadista e fumageiro reside nas assimetrias nas relações de poder que emergem da

articulação de produtores locais com mercados globais. Em ambos arranjos, a inserção de

produtores locais no mercado externo envolve uma complexa interação entre instâncias locais e

globais na organização e coordenação de atividades produtivas e tecnológicas.

As assimetrias presentes nas relações entre produtores locais e instâncias globais de

coordenação se refletem de forma diversa em cada caso. No arranjo coureiro-calçadista, o acesso de

produtores locais ao mercado externo, na maior parte dos casos, é condicionado à inserção em

cadeias globais de produção controladas por grandes redes de compra internacionais. No arranjo

fumageiro, o reduzido escopo de ação de atores locais na organização do sistema de produção e a

assimetria nas relações de poder no arranjo apresentam uma relação direta com a influência das

subsidiárias das multinacionais de tabaco na organização dos diferentes estágios da cadeia produtiva

em nível local e mundial. Neste aspecto, o impacto da interação entre formas locais e globais de

coordenação apresenta um caráter mais complexo no arranjo coureiro-calçadista na medida em que

os produtores locais detêm o poder sobre a organização das atividades produtivas em nível local,

porém apresentam um escopo reduzido de influência em determinados estágios da cadeia como nas

atividades de design e marketing.

No arranjo fumageiro, a organização da produção de fumo em folha na região do Vale do

Rio Pardo apresenta, conforme foi visto, uma dimensão territorial considerável na medida em que

depende de importantes especificidades locais. No entanto, muitas das etapas referentes à

distribuição e comercialização de fumo e de cigarros são organizadas e coordenadas de fora da

Região do Vale do Rio Pardo, em âmbito mundial. Assim, a articulação entre estas instâncias

globais e locais na organização do sistema de produção fumageiro resultou no estabelecimento de

relações hierárquicas entre os conglomerados multinacionais e os demais atores locais. Em

particular, as condições de competição enfrentadas pelos grandes conglomerados no mercado

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internacional condicionam o papel desempenhado pelo arranjo local fumageiro na divisão

internacional de trabalho deste setor, bem como na organização e formas de interação entre atores.

Neste aspecto, a fim de compreender as relações de poder e o papel dos desenhos institucionais que

moldam a organização do sistema produtivo do arranjo fumageiro, é necessário explorar a natureza

das interações entre atores durante as fases de cultivo e processamento do fumo no arranjo.

As relações entre os pequenos produtores rurais e as principais empresas fumageiras que

atuam no arranjo são coordenadas através do chamado sistema integrado de produção. Neste

sistema, as empresas fornecem as sementes, a assistência técnica e determinam o uso de insumos e

defensivos agrícolas ao mesmo tempo em que garantem a compra do fumo em folha produzido

pelos seus produtores integrados75. As principais características do sistema integrado de produção

no arranjo fumageiro são explicadas no quadro 4.1, abaixo:

75 De acordo com Associação dos Fumicultores do Brasil (AFUBRA, 1998), cerca de 160 mil famílias de pequenos proprietários rurais estão envolvidas com o plantio de tabaco no Brasil. Atualmente, mais de 45% destes pequenos produtores estão localizados na região do Vale do Rio Pardo. O trabalho de orientação aos produtores é feito através de equipes de assistência técnica que difundem e fiscalizam a utilização de novas tecnologias relacionadas às técnicas de plantio e uso de novas variedades de sementes (cultivares) desenvolvidas nos centros de pesquisa das empresas.

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QUADRO 4.1 - Principais características do Sistema Integrado de Produção no arranjo

fumageiro

O sistema integrado de produção envolve o estabelecimento de obrigações contratuais entre os produtores de fumo em folha e as empresas que operam na compra e beneficiamento de fumo. Uma vez inseridos neste tipo de acordo, os produtores de fumo se comprometem a fornecer toda a sua produção e a seguir as orientações técnicas e esquemas de classificação de preços estabelecidos pelas empresas. Assim, por um lado, as empresas se responsabilizam pelo fornecimento de sementes, pela intermediação da compra dos principais insumos utilizados na cultura do fumo (como fertilizantes, defensivos e implementos), pelo fornecimento de assistência técnica através de suas equipes de supervisores de campo, pela intermediação de financiamentos junto a bancos oficiais, pelo transporte da safra e pela compra da produção destes pequenos produtores rurais integrados (Afubra, 1998). Por outro lado, os produtores de fumo em folha integrados devem se comprometer com o volume de produção, padrões de qualidade e custos definidos pelas empresas. Dessa forma, através do estabelecimento destes vínculos com seus produtores de fumo em fo lha, as empresas logram obter um controle bastante eficiente sobre os custos, qualidade volume e variedades produzidas de fumo em folha na região. Esse controle constitui-se num diferencial importante para as empresas atingirem os padrões de competição que são definidos no mercado internacional de tabaco.

Ainda que o sistema integrado de produção tenha sido adotado no arranjo a partir da instalação da Souza Cruz na região (na década de 20), foi somente a partir da década de 70 que este sistema tornou-se fundamental no processo de reorganização e modernização do arranjo fumageiro. Antes da consolidação do sistema integrado na década de 70, a produção agrícola do fumo era baseada principalmente no uso de fertilizantes orgânicos, a quantidade produzida era estipulada pelos próprios produtores que tampouco estavam condicionados pela assistência técnica das empresas fumageiras. Porém, na medida em que as grandes companhias multinacionais passaram a estabelecer suas subsidiárias no arranjo, esta autonomia dos produtores de fumo foi sendo gradativamente abolida através do estabelecimento de novas práticas de cultivo. (Vogt, 1994).

A manutenção deste modelo impõe uma série de custos para as empresas relacionados à

manutenção de departamentos ligados a compra de insumos ou intermediação de crédito agrícola

junto às instituições financeiras oficiais e, principalmente, na formação de quadros de técnicos

agrícolas e agrônomos para acompanhamento da safra. Entretanto, as empresas que atuam na

compra e beneficiamento de fumo não somente passam a manter um controle total sobre a qualidade

e custo de seu principal insumo como também tendem a condicionar o volume de produção através

da sinalização da sua estimativa de compra para os produtores.

Além da importância que assume o sistema integrado de produção na determinação das

relações entre atores no arranjo fumageiro, um outro fator importante que caracteriza os desenhos

institucionais e organizacionais no arranjo reside no predomínio de associações de classe e outras

organizações voltadas para coordenação das relações de trabalho e mediação entre pequenos

produtores agrícolas de fumo em folha e as empresas que operam na compra e beneficiamento.

As principais instituições voltadas para coordenação das relações entre os atores do arranjo

são a Associação dos Fumicultores do Brasil, o Sindicato das Indústrias de Fumo, A Associação

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Brasileira de Fumo e o Sindicato dos Trabalhadores Rurais. Cada uma destas associações responde

pelos interesses específicos de determinados segmentos de atores presentes no arranjo e regula as

relações de trabalho, a formação dos preços pagos aos produtores de fumo em folha e sinalizam os

volumes e variedades a serem produzidos a cada safra, conforme ilustra o quadro abaixo.

QUADRO 4.2 - Principais organizações voltadas à coordenação das relações inter empresariais no arranjo fumageiro

Associação dos Fumicultores do Brasil (AFUBRA): A Afubra foi criada em 1955 e conta hoje com cerca de 150 mil produtores associados nos três Estados do Sul. O surgimento da Afubra esteve ligado justamente à necessidade de intermediação na definição dos preços pagos pela indústria aos produtores através da consolidação do sistema de produção integrada

Sindicato das Industrias do Fumo (Sindifumo): O Sindifumo foi criado em 1942, ainda que sua base de representação tenha ganho maior importância somente a partir de 1980 quando o setor teve um crescimento substancial. O Sindifumo conta, atualmente, com cerca de 20 associados que correspondem à totalidade das empresas ligadas a compra, processamento e comercialização de fumo na região

Associação Brasileira de Fumo (Abifumo): A Abifumo conta com 26 empresas associadas em todo o Brasil, mas representa os interesses específicos das grandes empresas do setor, especialmente nas questões relacionadas a legislação tributária.

Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR’s): O Sindicato dos Trabalhos Rurais possui uma participação ativa no processo de negociação relativo aos custos de produção e preços pagos aos agricultores pelo fumo em folha. Apesar do processo de negociação dos preços pagos aos produtores rurais contar com a participação conjunta da Afubra, Sindifumo e STR’s, historicamente ele sempre envolveu um poder de barganha assimétrico pesando a favor das empresas.

Assim, as assimetrias nas relações de poder entre atores locais e globais no arranjo

fumageiro se originam no controle direto do sistema produtivo local pelas subsidiárias de empresas

transnacionais e são reforçadas, em grande medida, pelos desenhos institucionais presentes no

arranjo.

Em termos da infra-estrutura educacional e tecnológica, a região do Vale do Rio Pardo conta

com duas Universidades - uma das quais abriga um dos Pólos de Modernização Tecnológica

existentes no Estado - Centros Tecnológicos da Embrapa, Emater, além de uma escola técnica do

Senai que oferece cursos em diferentes áreas de formação. Entretanto, apesar da existência deste

conjunto não desprezível de recursos humanos e materiais, com forte potencial para

desenvolvimento de pesquisas na área agrícola, verifica-se a existência de vínculos muito fracos de

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interação entre as principais empresas ligadas ao plantio e processamento de fumo e demais atores

ligados à infra-estrutura educacional e tecnológica na região. Neste aspecto, as formas de interação

entre a indústria fumageira e as universidades e centros tecnológicos na região encontram-se, na

maioria dos casos, restritas a análises laboratoriais e de certificação. No caso das organizações

governamentais ligadas a pesquisa agrícola como Emater e Embrapa, ao contrário do que ocorre na

região da Serra Gaúcha com o arranjo vitivinícola, as atividades de pesquisa e extensão rural não

apresentam nenhum foco específico no fumo que representa a principal cultura agrícola da região. O

principal foco de atuação destas instituições encontra-se voltado para difusão de programas de

diversificação da produção em nível de propriedade rural.

A Universidade de Santa Cruz do Sul é a principal instituição de pesquisa e formação de

recursos humanos da região. Esta universidade sedia o Pólo de Modernização Tecnológica do Vale

do Rio Pardo que foi constituído na década de 90. Originalmente, a criação deste pólo tecnológico

esteve articulada com um programa coordenado pela Secretaria de Ciência e Tecnologia do Estado

numa iniciativa que visava a descentralização das ações em C&T no Rio Grande do Sul, através da

constituição de infra-estrutura física e humana voltada para a pesquisa em diferentes regiões do

Estado. Atualmente, o Pólo de Modernização Tecnológica do Vale do Rio Pardo atua nas áreas de

meio-ambiente, alimentos e materiais através da prestação de serviços técnicos de análise e

certificação ou através do desenvolvimento conjunto de produtos e processos com empresas da

região. Apesar da sua infra-estrutura física e humana estar vinculada a Universidade de Santa Cruz

do Sul, a gestão das suas atividades também se encontra subordinada às demandas estabelecidas

pelo Conselho Regional de Desenvolvimento do Vale do Rio Pardo (COREDES) que constitui hoje

uma instância intermediária entre o poder público municipal e o governo do Estado, mas que ainda

possui pouca autonomia na gestão de políticas públicas regionais76.

Outra instituição que apresenta grande importância para o Vale do Rio Pardo, ainda que não

pertença ao entorno político administrativo desta região, é a Universidade Federal de Santa Maria

(UFSM). A importância desta instituição se reflete também na sua forma de interação com as

empresas da região, seja na formação de pessoal como na realização de testes e certificação de

produtos para empresas fumageiras do arranjo. Neste aspecto, a criação de leis cada vez mais

rigorosas com relação a questões ambientais nos países desenvolvidos e o próprio fato dos

76 Uma análise detalhada sobre a origem e funcionalidade dos Coredes e do Programa de Pólos no RS encontra-se no trabalho desenvolvido na primeira etapa desta pesquisa Vargas, Santos e Alievi (1998).

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principais compradores internacionais já estarem realizando testes de resíduos de agrotóxicos no

fumo, resultou na criação de um importante nicho para a interação entre a UFSM e as empresas de

fumo do arranjo. Tal interação resultou, no final da década de 90, no estabelecimento de um

convênio com a UFSM para o repasse de US$ 250 mil para construção de um laboratório especial

para a elaboração de testes e análises visando detectar resíduos de agrotóxicos do fumo. O principal

objetivo das empresas a partir deste convênio foi o de garantir a exportação do fumo brasileiro com

um selo de qualidade ambiental certificado por uma instituição oficial de pesquisa.

No campo da capacitação de recursos humanos, ambas as universidades cumprem um papel

importante na região ainda que não exista nenhuma demanda concreta das empresas do setor

fumageiro com referência a formação de quadros técnicos de nível superior. Neste aspecto, o Centro

de Treinamento do Senai, instituição federal de formação técnica, localizado no município de Santa

Cruz do Sul, mantinha até a década de 90, alguns cursos fechados para as empresas fumageiras na

área de manutenção de máquinas e instalações industriais, segurança em operação de caldeiras,

entre outros.

Em contraste com o arranjo fumageiro, o arranjo coureiro-calçadista apresenta, além de um

extenso conjunto de atores que atuam em diferentes estágios da cadeia produtiva, um complexo

arcabouço institucional voltado tanto para coordenação de relações inter-empresariais como para a

capacitação tecnológica das empresas do arranjo.

Da mesma forma, conforme mencionado anteriormente, no arranjo coureiro-calçadista, as

assimetrias de poder na coordenação do sistema de produção, não residem no controle direto do

sistema de produção pelas empresas transnacionais, mas encontram-se focalizadas nas relações

entre produtores locais de calçados e compradores internacionais. Tais assimetrias se refletem no

controle de estágios específicos da cadeia produtiva - como as atividades relacionadas ao desenho,

comercialização e distribuição - por parte dos grandes compradores internacionais. Neste aspecto, a

crescente inserção do arranjo coureiro-calçadista no mercado externo, a partir da década de 70,

acarretou uma mudança gradual mas significativa no escopo de ação de produtores locais com

relação ao controle de seus principais canais de comercialização e, por consequência, no papel e

importância de diferentes segmentos de atores locais na coordenação do arranjo.

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A predominância de uma cultura associativa na região do Vale dos Sinos consistiu um

elemento importante para consolidação de um expressivo arcabouço institucional no arranjo que, no

decorrer da década de 70, desempenhou um papel relevante na criação de novos canais de

comercialização no mercado externo para as empresas locais. Um dos exemplos mais emblemáticos

da importância desse aparato institucional na coordenação e articulação de atores locais se refletiu

na criação da FENAC (Feira Nacional do Calçado). Juntamente com a Associação Comercial e

Industrial de Novo Hamburgo(ACI-NH), a FENAC, criada da década de 70, foi crucial para a

integração inicial entre produtores locais e compradores internacionais num momento crítico para a

inserção das empresas do arranjo no mercado externo.

Entretanto, na medida em que estes canais de comercialização foram abertos para as

principais empresas do arranjo, as relações de cooperação entre atores locais foram se tornando cada

vez mais tênues, enfraquecendo o papel de organizações locais na coordenação de iniciativas

conjuntas. Por um lado, a existência de empresas que atuam em diferentes estágio s da cadeia

produtiva no arranjo contribuiu para a criação de diversas associações ligadas aos interesses e

necessidades específicas a cada um desses segmentos. Por outro lado, com a crescente inserção das

principais empresas do arranjo no mercado externo, aumentou consideravelmente a importância

associada ao papel desempenhado pelos agentes de exportação no arranjo coureiro-calçadista, que

atuam na intermediação de contratos entre produtores locais e as grandes redes de compra

internacionais, em especial no mercado norte-americano77.

Atualmente, a existência dessa considerável infra-estrutura institucional não constituiu uma

garantia para a existência de esquemas efetivos de interação e cooperação entre os diferentes atores

e/ou segmentos presentes no arranjo. A maior parte das associações empresariais no arranjo foram

estabelecidas no final da década de 80 e no decorrer da década 90, mais como instâncias de

representação dos interesses específicos de cada segmento do que de representação dos interesses

do arranjo produtivo como um todo. Dessa forma, a análise da natureza dos vínculos existentes

entre os atores locais indica que os desenhos institucionais apresentam um alcance limitado no

sentido de engajar atores locais em esquemas de cooperação mútua voltados para a capacitação

produtiva ou em processos de aprendizado interativo.

77 Essa questão também é enfatizada por Schmitz (1999) em sua análise sobre as dificuldades enfrentadas pelas empresas calçadistas do Vale dos Sinos no decorrer da década de 90.

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As principais organizações que atuam na coordenação das relações inter-empresariais no

arranjo coureiro-calçadista são apresentadas no quadro 4.3 abaixo:

QUADRO 4.3 – Organizações de Representação instaladas no Vale dos Sinos Organização Segmento Representado Ano de

Fundação Associação Comercial e Industrial de Novo Hamburgo - ACI

Todo o Arranjo Produtivo Calçadista 1920

Associação Brasileira das Indústrias de Calçados – ABICALÇADOS

Empresas calçadistas 1983

Associação Brasileira dos Exportadores de Calçados e Afins – ABAEX

Basicamente empresas calçadistas exportadoras

1986

Associação das Indústrias de Curtumes do Rio Grande do Sul – AICSUL

Empresas de curtimento e acabamento

1978/9

Sindicato Interestadual da Indústria de Máquinas – SINDIMAQ (atualmente seus membros estão associados a ABRAMEQ)

Empresas fabricantes de máquinas e equipamentos para o complexo

coureiro-calçadista

1978/9 Associação das Indústrias de Componentes para Calçados – ASSINTECAL

Empresas fabricantes de componentes para a Indústria de

calçados

1983 Associação Brasileira de Técnicos em Calçados – ABTC

Representação trabalhista 1985

Associação Brasileira dos Estilistas de Calçados e Afins – ABECA

Representação trabalhista 1990

Fonte: Pesquisa de Campo

Se no decorrer dos anos 70 a cooperação horizontal e multilateral promovida por

organizações locais de apoio ao setor foi crucial para a abertura de novos canais de comercialização

no mercado externo, a partir dos anos 80 foram os agentes exportadores que passaram a assumir

uma importância fundamental na organização das atividades produtivas e inovativas do arranjo.

Desta forma, os esquemas de cooperação entre atores no interior do arranjo tiveram um decréscimo

constante na medida em que as maiores empresas de calçados passaram a buscar uma maior

interação com compradores externos em detrimento das relações de cooperação com seus pares

locais78. Mesmo a Feira Nacional do Calçado (FENAC) que desempenhou um papel histórico

importante na integração dos produtores locais com compradores externos, perdeu gradualmente seu

poder de coesão dos diferentes segmentos do arranjo 79.

78 Schmitz (1999: 1642), enfatiza o impacto decorrente desta diminuição gradual, ainda que contínua, das relações de cooperação entre os diferentes segmentos no arranjo durante os anos 80: “With the rise in shoe exports conflicts of interest became unavoidable: for example, shoe manufacturers wanted easier access to inputs and equipment from abroad while local suppliers fought against it; the needs of large shoe exporters differed from those producing from internal market”. 79 Não obstante esse fato, em sua edição mais recente - a Fenac 2000 - a Feira Internacional do Calçado passou a incorporar uma parceria como a Couromoda e logrou resgatar a participação de algumas das grandes empresas calçadistas do arranjo, como a Azaléia que há 3 anos não participava da feira. Tal fato reflete uma nova estratégia da

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Além deste complexo desenho institucional em termos de organizações vo ltadas para

relações inter-empresariais, o arranjo coureiro-calçadista também apresenta uma invejável infra-

estrutura em termos de organizações ligadas a atividades de pesquisa, desenvolvimento e

treinamento de recursos humanos. No âmbito do treinamento e formação técnica de mão-de-obra, a

região do Vale dos Sinos conta com diversas escolas de calçados e curtimento vinculadas ao

Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial-SENAI que preparam a mão-de-obra técnica para

atuar nas áreas da produção de calçados (como modelagem, corte, costura ou supervisão de linha de

produção) e de curtumes (no curtimento do couro propriamente dito).

Entre tais estabelecimentos de ensino e treinamento encontram-se a Escola do Calçado

Ildefonso Simões Lopes, localizada em Novo Hamburgo, e a Escola de Curtimento Senai no

município de Estância Velha80. Adicionalmente, essas escolas prestam serviços tecnológicos às

empresas, mediante a realização de análises químicas em materiais e testes físico-mecânicos para

couro e calçados81. Nesse âmbito de ensino técnico, a Fundação Escola Técnica Liberato Salzano

Vieira da Cunha, em Novo Hamburgo, forma profissionais dirigidos às áreas de química e

mecânica. Além das escolas de formação técnica, a região conta também com duas universidades. A

Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS) que está localizada em São Leopoldo e a

Fundação de Estabelecimentos de Ensino Superior (FEEVALE) em Novo Hamburgo.

Uma das instituições pioneiras que integra a infra-estrutura tecnológica do arranjo é o Centro

Tecnológico do Couro, Calçados e Afins – CTCCA, fundado em 1972, que se constitui numa

entidade civil sem fins lucrativos, cuja manutenção é feita por um conjunto de empresas associadas,

das áreas de calçados e artefatos, curtumes, máquinas e equipamentos, serviços e componentes. O

CTCCA edita uma das principais publicações técnicas dirigida ao complexo coureiro-calçadista, a

Tecnicouro82, presta assessoria técnica aos associados, treina recursos humanos, realiza análises e

testes, emite laudos técnicos e, em anos recentes, tem auxiliado as empresas com serviços de CAD

(Costa,1993)

feira no sentido de avaliar as mudanças necessárias para ampliar a importância do evento e promover a participação das entidades ligadas ao arranjo (Gazeta Mercantil, 04 de junho de 2000).

80 Existe também outra escola de calçado do SENAI em Franca no estado de São Paulo.

81 O Centro Tecnológico do Calçado - SENAI é credenciado pelo INMETRO (Instituto nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial). A escola já tem disponível equipamento de CAD (Computer Aided Design) em 2 e 3 dimensões, capacitando-a a prestar serviços nessa área. 82 Existem outras publicações dirigidas ao setor como, por exemplo, a revista Lançamentos do Grupo Editorial Sinos.

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O escopo e importância das atividades de pesquisa desenvolvidas através do CTCCA no

arranjo calçadista podem ser ilustradas através de diferentes exemplos. Com relação à solução de

problemas técnicos, recentemente o centro desenvolveu uma nova técnica de colagem de solados

com água num projeto que envolveu a parceria com uma empresa fabricante de máquinas no

arranjo. Essa nova técnica implica na implantação de um novo tipo de equipamento para secagem

acelerada de calçados, já que a colagem aquosa necessita de um maior tempo para secagem. O

equipamento, que já está sendo produzido por um dos fabricantes de máquinas no arranjo, tem

capacidade para 2.000 pares/dia sendo possível acoplar mais módulos e duplicar a capacidade

(Gazeta mercantil, 29/06/2000). Outro exemplo das atividades do CTCCA refere-se a realização de

levantamento de informações sobre tendências de uso de matérias-primas e componentes no

mercado europeu. Essas informações são repassadas à Associação das Indústrias de Componentes

para Calçados (Assintecal), com vistas a auxiliar a antecipação de tendências de mercado.

Entretanto, apesar da importância que assumem as atividades desenvolvidas através da infra-

estrutura tecnológica existente no arranjo, conforme será destacado no próximo capítulo, verifica-se

que ainda existe um reduzido nível de interação entre os atores do segmento produtivo e os centros

de pesquisa e formação de recursos humanos na região. Tal situação reflete, em grande parte, a crise

que tem assolado a indústria calçadista gaúcha desde a década de 90, e se traduz, por exemplo, na

difícil situação financeira do CTCCA nos últimos anos. O centro apresenta um elevado grau de

endividamento com bancos oficiais e enfrenta atualmente o risco de encerrar suas atividades na

medida em o governo e as empresas associadas não logrem definir um projeto para reestruturação

do Centro.

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4.3 – arranjos produtivos articulados com instâncias locais de coordenação

A análise das estruturas de governança dos arranjos produtivos vitivinícola e moveleiro na

Serra Gaúcha oferece um contraponto importante para discussão sobre o impacto da interação entre

instâncias globais e locais de coordenação na dinâmica competitiva e inovativa de aglomerações nos

países em desenvolvimento. Além de atuarem predominantemente no mercado doméstico (regional

e nacional), ambos arranjos apresentam uma elevada autonomia na organização e controle das suas

atividades produtivas e inovativas, o que os diferencia tanto do arranjo coureiro-calçadista como do

arranjo fumageiro.

As estruturas de governança local se manifestam de forma diferenciada em cada um dos

arranjos. No arranjo moveleiro, apesar do predomínio de micro e pequenas empresas na região,

verifica-se que a principal instância de coordenação do arranjo reside num núcleo reduzido de

grandes e médias empresas que congrega alguns dos principais fabricantes de móveis no país. Tais

empresas desempenham um papel fundamental na organização de redes de subcontratação

envolvendo o segmento de MPEs na região e são responsáveis por mais de 90% das exportações de

móveis do arranjo. Neste aspecto, é importante observar que apesar de existirem alguns produtores

locais articulados com redes internacionais de compra, a grande maioria das grandes e médias

empresas de móveis do arranjo apresenta uma inserção qualificada no mercado externo que envolve

a comercialização de móveis com desenhos e marcas próprias.

Em termos de desenhos institucionais, o arranjo moveleiro conta com associações de classe

que têm uma participação ativa na promoção de iniciativas conjuntas e programas de apoio ao

desenvolvimento de empresas locais. Duas associações de classe, respondem pelas principais ações

de coordenação das relações inter-empresasariais no arranjo. A Associação das Indústrias de

Móveis do Estado do Rio Grande do Sul – MOVERGS, foi fundada em 1987 no município de

Bento Gonçalves e agrega cerca de 230 empresas associadas que atuam em 51 municípios da Serra

Gaúcha. Criada com o objetivo de desenvolver e representar o setor moveleiro da região, esta

associação tem uma expressiva representatividade na promoção de diversas iniciativas conjuntas no

arranjo e na participação em diferentes fóruns para discussão de políticas para o setor moveleiro.

Além de representar o arranjo em diferentes comissões e programas (SEBRAE/Export,

Programa Brasileiro de Design, Programa Gaúcho de Design e junto a Secretaria Estadual de

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Desenvolvimento e Assuntos Internacionais através da Câmara Setorial Moveleira), a MOVERGS é

também a entidade promotora da Feira Internacional de Máquinas Matérias-primas e Acessórios

para a Indústria Moveleira –FIMMA Brasil, que é realizada a cada dois anos e que se encontra na

sua quinta edição. De acordo com as informações da própria associação, atualmente, esta feira é

considerada o maior evento do gênero na América Latina e um dos maiores do mundo, agregando

mais de 700 expositores, nacionais e internacionais, entre fabricantes de móveis locais, fabricantes

de máquinas e equipamentos e diversos segmentos de fornecedores especializados e prestadores de

serviço para a indústria moveleira.

Juntamente com a MOVERGS, o Sindicato das Indústrias do Mobiliário de Bento Gonçalves

- Sindimóveis, fundado em 1977, também apresenta uma participação ativa na coordenação das

relações inter-empresariais e na interface entre atores do arranjo e instâncias externas. O

Sindimóveis conta com cerca de 130 empresas associadas e tem cumprido um papel importante no

estabelecimento de contatos e convênios com organizações e entidades de vários países como

Estados Unidos, Alemanha, Itália, França e México no sentido de abrir novos canais de

comercialização para as empresas do arranjo. Da mesma forma, o sindicato também é responsável

pela organização da MOVELSUL, uma Feira de Móveis –que tem o objetivo de incentivar a criação

de novos canais de comercialização para produtores locais.

Cabe ressaltar que a importância destas duas entidades na organização da maior parte das

iniciativas conjuntas no ar ranjo reflete o fato de que a aglomeração industrial de móveis na Serra

Gaúcha apresenta ainda uma densidade baixa em termos da presença na região dos diferentes

segmentos de empresas que integram a cadeia produtiva de móveis. Assim, a predominância que

assume o segmento de fabricantes de móveis no arranjo facilita o estabelecimento de ações

conjuntas entre atores locais tendo em vista a convergência de interesses. Tal situação difere, por

exemplo, daquela verificada no arranjo coureiro-calçadista, onde a existência de interesses

conflitantes entre os diferentes segmentos de empresas no arranjo (como por exemplo entre

calçadistas e curtumes) tornou-se, na década de 90, uma barreira quase intransponível para

promoção de ações cooperativas envolvendo os diferentes segmentos de atores no arranjo.

Do ponto de vista da infra-estrutura educacional e tecnológica, a existência de um núcleo de

instituições específicas de apoio tecnológico e formação de recursos humanos, também constitui-se

numa das principais externalidades do arranjo moveleiro da Serra Gaúcha. Neste aspecto, a região

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conta com um dos principais centros destinados à formação de mão-de-obra e capacitação

tecnológica da indústria moveleira no Brasil, o CETEMO – Centro Tecnológico do Mobiliário,

também vinculado ao Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI). O CETEMO foi

criado em 1983, a partir de uma iniciativa que envolveu uma ampla articulação entre as empresas

moveleiras na região, com o objetivo de fornecer cursos de aprendizado e treinamento para

qualificação da mão-de-obra local, além de servir como núcleo de informações tecnológicas para o

setor. Atualmente, o CETEMO é considerado um Centro Nacional de Tecnologia que serve de

referência para toda a indústria de móveis no país 83.

Na área de educação tecnológica, o CETEMO atende a cerca de 2000 alunos/ano que

participam de cursos de qualificação, aprendizagem e treinamento na área de mobiliário e madeira.

Em 1994, um convênio com a Universidade de Caxias de Sul e com o Sindicato das Indústrias da

Construção e do Mobiliário (Sindimóveis) possibilitou a criação de um curso superior de Tecnólogo

em Móveis.

Desde 1997, o CETEMO conta com o Núcleo de Apoio ao Design – NAD, com o objetivo

de fortalecer a capacitação das empresas no desenvolvimento de novos produtos através da

formação de um banco de designers e da realização de treinamentos e ações envolvendo o uso do

design no desenvolvimento de produtos. Esta iniciativa resultou de uma articulação com o

Ministério de Ciência e Tecnologia no âmbito de um programa mais amplo - denominado Programa

Brasileiro de Design - voltado para o desenvolvimento de capacitação em design em setores

estratégicos da indústria brasileira.

Além disso, o processo de reestruturação que vem sendo promovido pelo CETEMO desde

1998, permitiu também a expansão das atividades relacionadas à prestação de serviços de

assistência técnica e tecnológica. Esse processo envolveu a alocação de recursos para ampliação de

laboratórios de ensaios e outros departamentos ligados a produção de protótipos de móveis de

madeira e móveis tubulares. A realização destes investimentos foi viabilizada através da articulação

de um conjunto de instituições ligadas ao setor como sindicatos e demais entidades de classe. O

processo de qualificação do centro envolve também um projeto de cooperação técnica com o

83 Além do CETEMO, destacam-se também outros dois centros tecnológicos ligados ao setor moveleiro no Brasil atualmente: A Fundação de Ensino, Tecnologia e Pesquisa (Fetep), de São Bento do Sul (Santa Catarina) e o Centro Tecnológico da Madeira e do Mobiliário (Cetmam), de São José dos Pinhais, na região metropolitana de Curitiba (Paraná), ambos ligados ao SENAI.

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Canadá, onde diversos técnicos do CETEMO são enviados para treinamento. Periodicamente, o

centro recebe técnicos canadenses para desenvolvimento de ações conjuntas de apoio tecnológico às

industrias do setor. Atualmente, o corpo técnico do centro atua numa ampla gama de áreas de apoio

às empresas tais como: Engenharia Florestal, Secagem de Madeira, Desenvolvimento de Produto,

Pré-Corte e Usinagem de Madeira, Preparação e Colagem de Lâminas, Pinturas, Lay-Out Industrial

e Melhoramento de Processos de Produção, entre outras.

Uma terceira linha de atuação do CETEMO envolve a criação do núcleo de informação

tecnológica em mobiliário e madeira – NIT/MM, que tem como função divulgar informações

tecnológicas, normas técnicas, patentes industriais, além de produzir publicações tais como manuais

técnicos e boletins de divulgação sobre o setor. Este núcleo integra a Rede Nacional de Informação

Tecnológica e conta atualmente com mais de 10 mil informações sobre equipamentos, máquinas e

produtos para a área moveleira.

O Centro mantém ainda convênios com empresas para o desenvolvimento conjunto de

produtos, envolvendo pesquisa aplicada em novos materiais, com o objetivo de utilizar madeiras

alternativas e reflorestáveis na produção de móveis, como, por exemplo, o eucalipto, o cinamomo, a

grevilha e a uva-japão. Cabe destacar os convênios com a empresa chilena Masisa na utilização do

MDF e com a Flosul, do Grupo Renner, na utilização de eucalipto, este último envolvendo o

desenvolvimento de secagem da madeira, colagem dos painéis, usinagem e acabamento dos móveis.

Desse projeto participaram 10 empresas moveleiras do Rio Grande do Sul, entre as quais a

Artesano, a Politorno, a Tremorim, a Luneli, entre outras. Há ainda convênios internacionais com o

Canadá (há nove anos), que possui um grande centro tecnológico de processamento da madeira, e

com a Espanha (em perspectiva) (Santos, 1998).

Finalmente, a Universidade de Caxias do Sul- UCS também desempenha um papel

importante no processo de capacitação de atores locais através do Campus localizado no município

de Bento Gonçalves que conta com o Centro de Tecnologia em Produção Moveleira. O Centro

possui cerca de 35 profissionais entre técnicos, mestres e doutores que atuam na formação de

recurso humanos, pesquisa básica, assistência técnica e análise de materiais e produtos. O Campus

Universitário oferece curso de graduação em Tecnologia Moveleira e Curso de Pós-graduação em

Design Industrial. Os cursos foram elaborados em parceria com as demais instituições do arranjo

com o objetivo de obter uma formação adequada às necessidades do setor moveleiro. A demanda

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pelos cursos provém principalmente dos principais pólos moveleiros do Brasil como Rio Grande do

Sul, Santa Catarina, Paraná, Minas Gerais e São Paulo.

A estrutura de governança no arranjo vitivinícola, por sua vez, apresenta um caráter mais

difuso na medida em que não está atrelada somente ao papel das grandes vinícolas que atuam no

arranjo. Neste aspecto, apesar de compartilhar algumas características estruturais em comum com o

arranjo fumageiro, tais como a presença de vinícola transnacionais e a própria natureza agro-

industrial das sua atividades produtivas, o arranjo vitivinícola apresenta formas de coordenação de

desenhos institucionais diferenciados.

Em primeiro lugar, as relações entre produtores rurais e as vinícolas da região da Serra

apresentam um perfil consideravelmente distinto daquele presente no complexo agro- industrial

fumageiro onde predominam vínculos de dependência e subordinação através do sistemas

integrados de produção. Tais diferenças são explicadas inicialmente pelo elevado grau de

associativismo nas relações entre produtores rurais e a indústria vinícola na região. Atualmente, este

arranjo conta com cerca de 23 cooperativas vinícolas que respondem por aproximadamente 35% de

toda a produção brasileira de vinho. Da mesma forma, essa integração de produtores através de

cooperativas vinícolas apresenta formas de coordenação diversas daquelas verificadas no arranjo

fumageiro, onde um número reduzido de grandes empresas domina os canais de comercialização do

fumo processado no mercado internacional. Adicionalmente, cerca da metade de toda a produção de

uvas no arranjo vitivinícola ainda é oriunda de vinhedos próprios mantidos pelas principais

empresas do arranjo ou pelas cantinas familiares que se dedicam à produção de vinhos finos.

Em segundo lugar, no âmbito das relações entre as empresas vinícolas, a existência de

segmentos diferenciados operando em canais de comercialização diversos contribuiu para a

constituição de um arcabouço institucional bastante rico e que se reflete no conjunto de associações

empresariais presentes no arranjo. Não obstante o fato destas associações atuarem na representação

dos interesses específicos dos diferentes segmentos, percebe-se um elevado grau de articulação

entre elas na promoção de ações conjuntas ligadas, em particular, ao projeto de reconversão

produtiva do setor vitícola na região e iniciativas voltadas à abertura de novos nichos de mercado.

Da mesma forma, essas instituições , descritas no quadro abaixo, desempenham um papel

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importante na disseminação de informações e no processo de capacitação inovativa de atores locais,

conforme será visto mais adiante nesta tese84.

QUADRO 4.4 - Principais organizações de coordenação das relações inter empresariais no arranjo vitivinícola

- União Brasileira de Vitivinicultura (UVIBRA), fundada em 1967: conta com cerca de 150 associados em nível nacional além de concentrar a maioria das empresas que atuam na produção de vinhos finos na região.

- Associação Gaúcha de Vinicultores (AGAVI): representa os interesses de cerca de 60 pequenos e médios produtores dedicados a produção de vinhos comuns no Rio Grande do Sul.

- Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (APROVALE): criada em 1997, congrega 11 adegas de vinho finos que possuem vinhedos próprios e constituem o seleto grupo de pequenas cantinas familiares agrupadas em torno do objetivo comum de viabilizar a criação de um selo de origem controlada no Brasil.

- Organização das Cooperativas do Estado do Rio Grande do Sul e Federação das Cooperativas Vinícolas (OCERGS/FECOVINHO): fundada em 1952, representa hoje cerca de 22 cooperativas vinícolas.

- Instituto Brasileiro do Vinho (IBRAVIN), criado no início da década de 90 com o intuito de coordenar o processo de reconversão do setor vitivinícola brasileiro através do Fundo de Apoio ao Setor Vitivinícola – Fundovitis, criado pelo governo do Estado.

A constituição do Instituto Brasileiro do Vinho – IBRAVIN no decorrer da década de 90,

constitui-se no exemplo mais expressivo do esforço conjunto empreendido pelos diferentes

segmentos de vinícolas locais na reestruturação produtiva do arranjo. O IBRAVIN foi criado

originalmente com a proposta de gerir e executar uma série de projetos aprovados através do

chamado Fundo de Apoio ao Setor Vitivinícola (Fundovitis) constituído com recursos oriundos da

renúncia fiscal do governo do Estado. Inicialmente, o instituto logrou aglutinar o interesse das

principais associações do setor em torno de um amplo esforço de reconversão de toda a cadeia

produtiva vitivinícola. Esse processo seria alavancado pelo desenvolvimento de projetos que

abarcavam aspectos como o estudo do mercado brasileiro de vinho, a realização de um cadastro

vitivinícola na região, o zoneamento agroclimático, uma nova proposta de legislação para o setor,

entre outros. O Instituto passou a ser visto como uma instância potencial para regulação e controle

do setor emulando, em parte, um modelo que foi aplicado com sucesso no processo de reconversão

do setor vitivinícola no vizinho Uruguai no decorrer da década de 80 85. Da mesma forma, a sua

84 A participação das associações empresariais no processo de desenvolvimento do arranjo vitivinícola ocorre através de diferentes formas, tais como: promoção de contatos e troca de experiências entre as empresas na região, organização de viagens de estudos ao exterior ou organização das empresas para participação em feiras e concursos internacionais. 85 Para uma discussão detalhada sobre o processo de reconversão do arranjo vitivinícola uruguaio ver Snoeck (1999).

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estrutura refletia o interesse crescente em aproximar as demandas da cadeia produtiva do esforço de

pesquisa desenvolvido nos centros de pesquisa e universidades da região86.

Os grandes desafios que se colocam para o arranjo vitivinícola da Serra Gaúcha, atualmente,

encontram-se justamente nos dois extremos da cadeia produtiva. Em primeiro lugar, o arranjo ainda

tem um longo caminho a trilhar em termos da qualificação da etapa de produção agrícola, em

termos do aumento do percentual de produção de variedades nobres destinadas a produção de

vinhos, na maior seleção das variedades plantadas pelos produtores ou na melhoria dos sistemas de

produção com vistas ao aumento da produtividade 87. Um segundo grande desafio que se coloca

para o arranjo vitivinícola, intimamente ligado ao primeiro, reside na ampliação do mercado para a

indústria vinícola brasileira. A participação do arranjo vitivinícola da Serra gaúcha, que representa

grande parte da indústria vinícola brasileira ainda é reduzida tanto no mercado internacional como

no mercado interno que apresenta um grande potencial consumidor88. Esta discussão será detalhada

na análise apresentada no próximo capítulo.

Finalmente, em termos da infra-estrutura educacional e tecnológica, o Centro Nacional de

Pesquisa de Uva e Vinho da EMBRAPA - CNPUV e a Escola Agrotécnica Federal Juscelino

Kubitschek, ambos localizados no município de Bento Gonçalves, constituem-se nos principais

centros de pesquisa e de formação de recursos humanos do arranjo vitivinícola na região da Serra

Gaúcha. Neste aspecto, cabe ressaltar que apesar dos arranjos vitivinícola e moveleiro

compartilharem de um mesmo entorno territorial, ambos apresentam tanto um arcabouço

institucional próprio que opera na coordenação das relações entre atores no arranjo, como também

uma infra-estrutura educacional e tecnológica específica e bastante completa.

O CNPUV da Embrapa, é um centro de referência nacional para pesquisa vitivinícola. O

centro foi criado em 1975, durante o ciclo de modernização do setor vitivinícola na região, e tem

como função principal o desenvolvimento de tecnologias de produto e de processo relacionadas ao

86 O exemplo mais claro desse objetivo se traduziu na escolha de um pesquisador da Embrapa ligado ao Centro Nacional de Pesquisa da Uva e do Vinho – CNPVU para a presidência do instituto. 87 O Uruguai consiste na melhor e mais próxima referência em termos deste tipo de mudança. Num período de menos de 20 anos, o complexo vitivinícola uruguaio logrou empreender um processo de reconversão produtiva que levou a uma mudança radical no perfil da sua produção vitícola, aumentando a competitividade do setor em nível internacional. 88 O consumo per capita de vinho no Brasil encontra-se hoje em torno de 2 litros/ano enquanto que é de 48 litros/ano na Argentina e 33 litros/ano no Uruguai. Adicionalmente, cerca de 20% do consumo brasileiro ainda corresponde a importações de países como Argentina, Chile, Alemanha e França.

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complexo agro-industrial vitivinícola. A Escola Agrotécnica Federal Juscelino Kubitschek, por sua

vez, foi constituída ainda em 1959 sendo a única instituição de ensino do Brasil que oferece a

habilitação de técnico em Enologia em nível de segundo grau e técnico. Desde 1995 a escola

agrotécnica passou a oferecer também um curso superior de tecnologia em Vitivinicultura e

Enologia. Neste sentido, a escola constitui-se num importante núcleo de formação de recursos

humanos em nível local e regional que, no decorrer das ultimas décadas, já formou cerca de 1500

técnicos. O curso superior em vitivinicultura e enologia conta atualmente com 44 alunos, a grande

maioria dos quais oriundos da própria região. A fim de viabilizar a criação deste curso, a escola

contou com a participação da ENFA – (Escola Nacional de Formação Agronômica) de Toulouse na

França e com o apoio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Da mesma forma, a

escola mantém convênios de cooperação com diversas organizações ligadas ao setor no Brasil e no

Exterior

4.4 – Conclusões

A variedade em termos de formas de coordenação e desenhos institucionais nos diferentes

formatos de arranjos produtivos estudados constitui-se num aporte analítico importante para avaliar

o escopo de ação de atores locais nas estratégias de capacitação produtiva e inovativa dessas

aglomerações. Por um lado, na medida em que se focaliza a interação entre instâncias locais e

globais de coordenação, verifica-se as limitações e assimetrias nas relações de poder que resultam

da inserção no mercado externo através de cadeias globais de valor, sejam estas controladas por

compradores ou por produtores. Por outro lado, o predomínio de estruturas locais de governança

demonstra que estratégias de capacitação produtiva e inovativas em âmbito local podem estar

associadas à diferentes formas de governança pública e privada que implicam em graus variados de

simetria nas relações de poder entre atores locais.

O quadro abaixo, procura sistematizar as características das estruturas de governança e

desenhos institucionais presentes em cada um dos arranjos estudados. Conforme destacado

inicialmente, tal sistematização tem como ponto de partida a diferenciação dos arranjos de acordo

com o seu grau de articulação com instâncias globais ou locais. Com base nesta diferenciação

busca-se identificar as principais instâncias de coordenação dos arranjos, locais ou externas; o papel

dos desenhos institucionais; e a importância associada à infra-estrutura educacional e tecnológica no

processo de capacitação de atores locais.

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QUADRO 4.5 - Estruturas de governança e desenhos institucionais nos arranjos

Arranjos \ fatores Principal instância de coordenação

Papel dos desenhos institucionais

Papel da infra-estrutura educacional e tecnológica

Arranjos articulados com instâncias globais de coordenação

Fumo Externa: baseada no controle direto das subsidiárias de EMNs na propriedade do capital de empresas ligadas à compra e beneficiamento de fumo em folha

Inexistente : limitado a reforçar relações de subordinação entre produtores locais e grandes conglomerados internacionais

limitado a realização de análises laboratoriais e certificação

Calçados Local: na organização do sistema de produção pelos grandes fabricantes de calçados Externa: nas atividades de desenho, distribuição e comercialização através da relação entre empresas calçadistas e compradores internacionais

Restrito : Conflitos de interesses entre diferentes segmentos do arranjo dificultam a promoção de ações cooperativas

Abarcam principalmente atividades de formação de recursos humanos; realização de testes e análises, com poucas atividades de desenvolvimento conjunto especialmente nas atividades de design:

Arranjos articulados com instâncias locais de coordenação Vinho Local: Não existe uma

estrutura de governança definida. O arranjo abarca vinícolas que atuam com diferentes canais de comercialização no segmento de vinhos comuns e vinhos finos

Ativo : cumprem papel importante tanto na representação de diferentes segmentos de vinícolas como na organização de ações conjuntas

Maior importância e inserção no estágio de produção vitícola e na formação de recursos humanos (enólogos)

Móveis Local: Elevada influência das grandes e médias empresas na organização do sistema de produção através das redes de subcontratação envolvendo o segmento de MPEs

Ativo : particularmente em ações cooperativas horizontais ligadas ao adensamento da cadeia produtiva local e abertura de novos nichos de mercado

Maior participação em atividades de formação de recursos humanos.

Conforme é ilustrado pelo quadro, nos arranjos articulados com instâncias globais de

coordenação (fumageiro e coureiro-calçadista) o papel dos desenhos institucionais, no sentido de

promover ações cooperativas voltadas à capacitação de atores locais, se mostra restrito ou mesmo

inexistente.

Além disso, conforme destacado anteriormente, a reduzida influência de atores locais na

dinâmica de desenvolvimento do arranjo se manifesta de forma diversa. No arranjo fumageiro, a

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assimetria nas relações entre atores locais e instâncias externas de coordenação se deve ao controle

direto do capital das principais empresas que operam na compra e beneficiamento de fumo em folha

por parte de subsidiárias de empresas transnacionais. Esse núcleo reduzido de grandes empresas

exerce a governança privada do arranjo através da coordenação do sistema local de produção e do

controle direto dos principais canais de comercialização no mercado externo. Neste aspecto, os

desenhos institucionais do arranjo se limitam a reforçar as relações de subordinação entre um

extenso contingente de produtores rurais concentrados na região e as empresas que atuam na

compra e beneficiamento do fumo em folha.

No arranjo coureiro-calçadista, a coordenação externa se reflete em particular através da

inserção de algumas das principais empresas calçadistas da região em cadeias globais dominadas

por compradores. Esse núcleo de empresas exerce elevada influência nas estratégias de

desenvolvimento do arranjo, porém, na medida em que encontra-se subordinado a cadeias de

produção coordenadas por compradores internacionais, seu escopo de ação encontra-se, em grande

parte, limitado à esfera da produção.

Assim, por um lado, a articulação com compradores internacionais contribui para o processo

de capacitação das empresas em atividades relacionadas ao processo produtivo, tais como o

atendimento de especificações em termos de qualidade, custos e prazos. Por outro, tal articulação

também dificulta ou mesmo impede a capacitação das empresas em atividades de ma ior valor

agregado como desenho e comercialização, na medida em que essas atividades se sobrepõe ao

domínio de competências dos compradores internacionais que exercem o controle sobre a cadeia

produtiva.

Cabe ressaltar, entretanto, que apesar da clara influência exercida pelos compradores

internacionais nas estruturas de governança do arranjo coureiro-calçadista do Vale dos Sinos,

verifica-se também a existência de um importante segmento de empresas calçadistas no arranjo que

tem adotado formas alternativas de inserção no mercado externo e doméstico. Na medida em que

não se encontram subordinadas a cadeias internacionais de compra, tais empresas apresentam maior

capacidade de coordenação sobre estágios avançados da cadeia produtiva de calçados, atuam com

marcas próprias e apresentam maior capacitação em atividades de desenho, comercialização e

distribuição.

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No caso dos arranjos moveleiro e vitivinícola na Serra Gaúcha, a predominância de

instâncias locais de coordenação do sistema de produção se traduz em termos de diferentes formas

de governança pública e privada. Em ambos os casos, tais estruturas estão associadas ao papel ativo

dos desenhos institucionais em âmbito local no sentido de promover ações coletiva voltadas para a

reestruturação produtiva e a capacitação inovativa das empresas.

No arranjo vitivinícola, as associações empresariais ligadas aos diferentes segmentos de

vinícolas da região desempenham um papel fundamental na governança privada do arranjo, através

da organização de iniciativas conjuntas voltadas para qualificação da produção vitícola, e na

abertura de novos canais de comercialização. Tais iniciativas envolvem também formas públicas de

governança, seja através de programas estaduais de apoio ao desenvolvimento do setor vitivinícola,

como o Fundovitis, ou através da participação de instituições públicas de pesquisa como o CNPUV-

Embrapa. Da mesma forma, é interessante observar que os diferentes segmentos de vinícolas

exercem uma governança difusa na organização do sistema de produção do arranjo. Por um lado,

conforme destacado no capítulo anterior, as grandes vinícolas representam menos de 2% do

universo de empresas, mas respondem por mais de 30% da produção do arranjo. Tais empresas

apresentam alguma importância na organização do sistema de produção, mas não respondem pela

liderança em termos de inovações ou na abertura de novos canais de comercialização. Por outro

lado, o segmento de pequenas cantinas familiares produtoras de vinhos finos apresenta reduzida

influência na organização do sistema de produção do arranjo, mas detém atualmente o maior

dinamismo inovativo no arranjo.

Tal situação contrasta, em parte, com a do arranjo moveleiro onde, além do papel

desempenhado pelas associações empresariais locais na promoção de iniciativas conjuntas, percebe-

se também a importância que assume o núcleo de grandes e médias empresas na governança local

do sistema de produção. Da mesma forma, ao contrário do que ocorre no arranjo coureiro-

calçadista, esse núcleo de grandes e médios fabricantes de móveis não se encontra atrelado com

cadeias globais de produção e apresenta uma inserção qualificada no mercado doméstico e externo

através de marcas e canais próprios de distribuição. Da mesma forma, conforme enfatizado

anteriormente, estas empresas desempenha m um papel importante na governança do arranjo através

da organização de redes de subcontratação envolvendo PMEs locais, na qualificação da mão-de-

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obra e no estabelecimento de padrões de inovação que são incorporados pelas demais empresas do

arranjo.

Finalmente, a análise sobre o papel da infra-estrutura educacional e tecnológica local, aponta

para limitações importantes em todos os arranjos. No arranjo fumageiro, as organizações ligadas à

infra-estrutura educacional e tecnológica na região não apresentam nenhuma relevância na

organização e coordenação dos fluxos de conhecimento e informação que servem de base para

capacitação de atores locais. Neste aspecto, dentre as aglomerações estudadas, apenas a de fumo no

Vale do Rio Pardo não conta com uma infra-estrutura educacional e tecnológica voltada

exclusivamente para as necessidades de P&D do arranjo. Nos arranjos moveleiro e coureiro-

calçadista, verifica-se, por um lado, uma densidade considerável de centros de pesquisa, escolas

técnicas e outras organizações que atuam na pesquisa tecnológica aplicada e na formação de

recursos humanos ligados a área específica de atuação das empresas do arranjo. Por outro lado,

essas organizações ainda enfrentam dificuldades no sentido de estabelecer canais de comunicação

sistemáticos e eficientes voltados para troca de informações e conhecimentos.

A exceção, neste caso fica por conta do arranjo vitivinícola onde a análise da infra-estrutura

educacional e tecnológica revela que, além da existência de um conjunto de organizações que atuam

na geração e disseminação de informações e conhecimentos no arranjo, existe também um grau de

interação maior desta infra-estrutura com atores do segmento produtivo.

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5 - MECANISMOS DE APRENDIZADO E ESTRATÉGIAS INOVATIVAS

5.1 - Introdução

A análise desenvolvida neste capítulo considera a relação entre o processo de capacitação

produtiva e inovativa dos arranjos estudados e a existência de mecanismos formais e informais de

aprendizado envolvendo empresas e demais segmentos de atores locais e/ou externos aos arranjos.

Em particular, busca-se identificar em que medida as estratégias inovativas de empresas que

integram o segmento produtivo principal dos arranjos são baseadas em vínculos de cooperação com

atores locais ou estão subordinadas ao papel de atores externos aos arranjos.

Conforme destacado anteriormente, os sistemas de conhecimento que servem de base para a

capacitação produtiva e inovativa de empresas que integram arranjos locais não se limitam,

necessariamente, ao uso de fontes locais de conhecimento e informação. Entretanto, a natureza da

articulação entre fontes locais e externas de conhecimento e informação assume uma importância

decisiva na dinâmica competitiva e inovativa dos arranjos.

Assim, os mecanismos de aprendizado e estratégias inovativas adotadas nos diferentes

formatos de arranjos são discutidos a partir de três aspectos principais. O primeiro envolve as

características gerais do processo de capacitação produtiva e inovativa em cada um dos arranjos. O

segundo refere-se à natureza dos vínculos de interação e cooperação envolvendo empresas e

diferentes segmentos de atores em âmbito local. O terceiro está relacionado à origem das principais

fontes de informação e conhecimento usadas para a adoção de inovações nas empresas e investiga

em que medida tais fluxos têm origem predominantemente local ou estão baseados, total ou

parcialmente, em fontes externas.

O desenvolvimento desta análise envolve algumas opções metodológicas. Em primeiro

lugar, a discussão encontra-se focalizada principalmente no conjunto de empresas que integra o

segmento produtivo principal da cadeia produtiva a qual cada arranjo está associado. Tal abordagem

apresenta limitações no caso de arranjos como o coureiro-calçadista, onde a elevada densidade da

cadeia-produtiva local implica na existência de padrões de incorporação de inovações bastante

diversos entre os diferentes segmentos de atores locais. Essa limitação é parcialmente contornada na

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medida em que se destaca, quando possível, as especificidades associadas aos mecanismos de

aprendizado e estratégias inovativas de segmentos diferenciados de atores nos arranjos.

Em segundo lugar, como foi salientado anteriormente, considera-se que o processo de

mudanças no ambiente econômico e institucional da economia brasileira no decorrer da década de

90 teve um impacto profundo sobre as formas de organização de atividades produtivas e inovativas

em todos os arranjos analisados. Neste aspecto, o estudo das transformações nos mecanismos de

aprendizado e estratégias inovativas dos arranjos é feito a luz do impacto das reformas estruturais na

economia brasileira a partir da segunda metade da década de 90.

O capítulo inicia com uma caracterização geral do processo de capacitação tecnológica nos

diferentes arranjos. Tal análise baseia-se nas informações obtidas através da pesquisa de campo e

reflete as principais modificações em produtos e processos produtivos adotadas pelas empresas no

segmento produtivo principal dos arranjos, no decorrer da segunda metade da década de 90. Com

base nesta caracterização inicial, a terceira seção discute a natureza dos mecanismos de aprendizado

presentes nos arranjos a partir de elementos que abarcam: a origem das principais fontes de

informação e conhecimento que servem de base para adoção de inovações; e a natureza e

intensidade das formas de interação e cooperação entre atores locais. Tal análise baseia-se no

mesmo tipo de recorte utilizado nos capítulos anteriores e distingue os arranjos de acordo com seus

principais canais de comercialização e formas de articulação com instâncias globais ou locais de

coordenação. Finalmente, a quarta seção apresenta uma sistematização sobre os mecanismos de

aprendizado e discute a natureza das estratégias inovativas adotadas em cada arranjo.

5.2. Características gerais do processo de capacitação produtiva e inovativa

A observação das evidências empíricas sobre as formas de capacitação produtiva e inovativa

nos arranjos permite destacar a natureza das atividades que levam à incorporação de novos produtos

e processos nas empresas que integram o segmento produtivo principal dos arranjos. Cabe destacar

que todos os arranjos produtivos apresentam um elevado grau de heterogeneidade em termos do

nível de capacitação produtiva e inovativa nos diferentes segmentos de empresas que participam da

cadeia produtiva local. Tal heterogeneidade se mostra ainda mais evidente nos arranjos de calçados

e móveis onde o grau de atualização tecnológica das maiores empresas contrasta sobremaneira com

a reduzida dinâmica inovativa do segmento de micro e pequenas empresas.

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Adicionalmente, na medida em que se analisa o perfil das atividades relacionadas à

incorporação de novos produtos e processos nos diferentes segmentos de empresas dos arranjos,

percebe-se um elevado dinamismo inovativo que se contrapõe à visão geralmente difundida sobre

os chamados “setores tradicionais”. Por um lado, verifica-se nos diferentes arranjos a existência um

fluxo considerável de inovações em produtos e processos que se originam a partir de relações com

fabricantes de equipamentos e de insumos especializados. Este é o caso, por exemplo, do arranjo

fumageiro onde grande parte das inovações incorporadas no estágio de beneficiamento industrial

está relacionada com relações do tipo usuário -produtor estabelecidas com fabricantes de

equipamentos. Por outro lado, verifica-se também que em arranjos como os de móveis e calçados,

inovações relacionadas com atividades como design e marketing, entre outras, têm assumido uma

importância crescente no processo de capacitação inovativa e competitiva das empresas. Além,

disso, mesmo nos arranjos agro- industriais vitivinícola e fumageiro, é possível apontar um conjunto

não desprezível de inovações de produto e processo que emergem a partir de bases de conhecimento

extremamente comp lexas relacionadas a avanços científicos oriundos de campos como

biotecnologia e bioquímica.

Tais evidências remetem a duas questões relevantes para o escopo da análise sobre os

mecanismos de aprendizado e estratégias inovativas nos arranjos produtivos, apresentados neste

capítulo. A primeira refere-se às limitações inerentes ao estudo de aglomerações produtivas a partir

de um recorte unicamente setorial. Conforme destacado no segundo capítulo, tal visão tende a

negligenciar o caráter cada vez mais mutável das fronteiras entre diferentes bases de conhecimento

que podem ser associadas a determinados setores industriais. A segunda questão remete à noção de

inovação discutida no referencial teórico desta tese. Neste sentido, a inovação é considerada como o

resultado de processos de aprendizado que são interativos e localizados na medida em que emergem

de trajetórias cumulativas e construídas historicamente, de acordo com especificidades

institucionais e padrões de especialização associados a um determinado cont exto territorial.

No escopo de análise deste capítulo, considera-se uma noção mais ampla de inovação como

um processo no qual “as empresas dominam e implementam o desenvolvimento e a produção de

bens e serviços que sejam novos para elas, independentemente do fato de serem novos para seus

concorrentes – domésticos ou internacionais” (Ernst, Mytelka e Ganiatsos, 1998:12-13 apud

Cassiolato, 2000).

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A discussão sobre os padrões de incorporação de inovações nos diversos arranjos baseia-se,

portanto, nessa noção mais ampla sobre o processo de inovação, ao mesmo tempo em que procura

identificar pontos em comum associados ao perfil de capacitação entre os estudos de casos. Em

particular, no caso dos arranjos fumageiro e vitivinícola, destaca-se a distinção entre o conjunto de

inovações relacionadas, alternativamente, ao estágio de produção agrícola e aos estágios de

processamento industrial. Já nos arranjos moveleiro e coureiro-calçadista, a discussão sobre o perfil

de capacitação do arranjo enfatiza a existência de padrões diferenciados de incorporação de

inovações associados ao porte das empresas.

A análise sobre o perfil dos mecanismos de aprendizado nos arranjos fumageiro e

vitivinícola permite ressaltar a importância da incorporação de inovações no estágio de produção

agrícola. Evidentemente, também é possível estabelecer a importância dessas ligações para trás nos

demais arranjos analisados. No arranjo moveleiro, tais ligações remetem ao manejo de florestas e ao

beneficiamento da madeira. No arranjo coureiro-calçadista, tais ligações abarcam desde as

atividades pecuárias até o processo de curtimento do couro. Entretanto, verifica-se que no caso do

arranjo fumageiro e vitivinícola a incorporação de inovações no estágio de produção agrícola não

somente constitui um fator crítico para competitividade como ocupa um espaço central na

organização do sistema de produção e conhecimento de ambos os arranjos.

No arranjo fumageiro, a incorporação de inovações no estágio de produção agrícola envolve

o desenvolvimento de novas variedades e a melhoria permanente nas técnicas de produção em nível

de propriedade rural. Estas ocorrem a partir da utilização de bases de conhecimento que abarcam

desde a adaptação de novos cultivares híbridos às condições climáticas locais, até as atividades de

P&D associadas a experimentos com variedades transgênicas de fumo. Aliado ao esforço nas

atividades de P&D dos laboratórios das grandes empresas fumageiras voltadas à melhoria das

variedades produzidas, percebe-se uma preocupação igualmente importante no sentido de introduzir

mudanças nas técnicas de cultivo e no sistema de produção, voltadas para a ampliação dos ganhos

de produtividade na produção agrícola do fumo. A substituição do plantio de mudas em canteiros

pelo sistema de float (onde as mudas são cultivadas em bandejas), o plantio direto, as colheitas

zoneadas, o escalonamento do plantio e a adoção de estufas mais baixas e automatizadas para

secagem do fumo são alguns exemplos das modificações que vêm sendo adotadas nos últimos anos

para melhoria do sistema de produção.

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Neste aspecto, o estágio de produção agrícola do fumo reflete um elevado dinamismo

tecnológico associado principalmente ao perfil das atividades de pesquisa e desenvolvimento em

áreas como biotecnologia e química. Por um lado, uma parte importante do esforço de P&D das

empresas fumageiras no estágio de produção agrícola tem sido direcionado para a geração de

variedades transgênicas de fumo com maior resistência e capacidade de adaptação em diferentes

condições climáticas. Por outro, a necessidade de lidar com uma legislação ambiental cada vez mais

rígida também tem levado as empresas a buscar alternativas no manejo da cultura do fumo,

mediante o desenvolvimento de novos fungicidas que permitem uma redução significativa na

quantidade de agrotóxicos utilizados.

A tabela 5.1 descreve o impacto das principais inovações adotadas no decorrer da segunda

metade da década de 90, pelas empresas pesquisadas no arranjo fumageiro:

TABELA 5.1 - Inovações de produto e processo adotadas no arranjo fumageiro

Impacto da inovação Tamanho da empresa

Inovação adotada Tipo de Inovação AC

P RC RNE RE MQ

Mudanças no lay-out da fábrica Processo X X “A” Grande Novo sistema de armazenamento do fumo

in natura Processo X X

Introdução de novos cultivares de fumo Produto X X “B” Grande Mudanças no sistema de produção de

mudas Produto

Não informou Produto X X X “C” Grande Não informou Processo X X

Introdução de melhoria nas variedades de fumo

Produto X X

Introdução de melhoria nas técnicas de produção

Processo X X X

“D” Grande

Alterações nos equipamentos industriais Processo X X X X Modificações nos separadores de fumo Processo X Modificações nos secadores de fumo Processo X

“E” Média

Melhorias nas prensas Processo X Aquisição de novos equipamentos X X X Informatização de rotinas X X

“F” Média

Controle da matéria-prima X X X Modificações no sistema de Assistência Técnica

Processo X X X X “G” Pequena

Modificações no sistema de recebimento do fumo

Processo X X X X

LEGENDA: ACP= aumento na capacidade de produção; RC= redução de custos; RNE= redução no número de empregados; RE= redução nos estoques de matéria-prima; MQ= melhoria na qualidade do produto Fonte: Pesquisa de Campo; n= 7

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A amostra de empresas considerada na tabela abarca tanto o segmento de subsidiárias de

empresas transnacionais que operam com a compra e beneficiamento de fumo em folha, como o

segmento de pequenas empresas nacionais que atuam apenas na intermediação da compra e venda

de fumo em folha. Conforme é verificado na tabela, as principais inovações adotadas na segunda

metade da década de 90 estiveram associadas tanto a melhorias na etapa de produção agrícola do

fumo como à etapa de processamento industrial.

A etapa de beneficiamento industrial do fumo apresenta um ritmo de desenvolvimento

tecnológico estável no decorrer das últimas décadas, com uma série de inovações incrementais ao

longo do processo produtivo. O processo de beneficiamento do fumo em folha envolve,

basicamente, processos de umidificação, corte, secagem e prensagem. O início deste processo tem

lugar quando o fumo em folha, após passar por uma classificação prévia, é selecionado para

composição dos blends (mistura de diferentes variedades de fumo) e colocado na linha de

processamento primário onde um tratamento a base de vapor restitui a umidade da folha. As etapas

subseqüentes envolvem o corte e separação de elementos como folha, talo e resíduos; a secagem

destes elementos em estufas; a prensagem; e o acondicionamento do fumo processado. No decorrer

de todo este processo, que é contínuo, o fumo é transportado de uma etapa a outra através de

esteiras e o monitoramento do processo é feito tanto através de sensores eletrônicos (como na etapa

de secagem) como por controle manual (como em parte da etapa de separação). Entretanto, observa-

se que apesar de operar com uma tecnologia de processo madura, bastante difundida e com baixas

condições de apropriabilidade, o setor apresenta um elevado grau de concentração industrial na

medida em que opera com economias de escala elevadas tanto na etapa de produção como de

distribuição e comercialização.

Assim, na etapa de beneficiamento industrial do fumo em folha, a maior parte das inovações

de produto e processo estão associadas à incorporação de novos equipamentos nas linhas de

processamento primário e secundário e de melhorias incrementais em determinadas fases do

processo produtivo como a secagem, prensagem e seleção. Dentre as principais inovações adotadas

no estágio de processamento industrial no arranjo fumageiro, encontram-se a introdução de

alterações no lay-out das plantas, geralmente relacionadas à utilização de linhas de processamento

compactas que ocupam um espaço físico menor, além de melhorias nos equipamentos utilizados nas

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etapas de separação, secagem e prensagem do fumo processado. O impacto dessas inovações, além

da melhoria na qualidade do produto citada por todas as empresas da amostra, se reflete também na

redução no número de empregados – através da informatização e automatização de algumas rotinas

e etapas produtivas – e na redução dos custos de produção. Da mesma forma, desde o início da

década de 90, a maioria das empresas do arranjo, particularmente as de grande porte, vem adotando

diversas formas de inovação organizacional (como Total Quality Control, Just- in-time, Grupos de

Melhoria, etc.) (Vargas et al., 1998).

A análise dos investimentos voltados para capacitação tecnológica nas empresas do arranjo

fumageiro demonstra que cerca de 70% das empresas analisadas investem um percentual do seu

faturamento em atividades de pesquisa e desenvolvimento. Tais investimentos representam em

média, 0,60% do faturamento bruto sendo que este percentual não sofreu variações significativas na

segunda metade da década de 90.

As empresas mantêm nos seus quadros funcionários dedicados às atividades de P&D e

assistência técnica aos produtores integrados. Em média, cerca de 3,6% do total de funcionários nas

empresas encontram-se envolvidos com atividades de P&D que abarcam tanto o desenvolvimento

de novos cultivares e produção de mudas, como o controle de qualidade no decorrer do processo de

beneficiamento industrial do fumo. Entretanto, conforme demonstra a tabela 5.2, a maior parte do

pessoal com qualificação técnica e nível superior empregado nas empresas fumageiras encontra-se

vinculada aos departamentos de assistência técnica a produtores. Esses departamentos comportam,

em média, cerca de 40% do total de funcionários efetivos nas empresas e desempenham um papel

fundamental na organização do sistema integrado de produção. O perfil dos investimentos em P&D

por parte das empresas do arranjo é apresentado na tabela 5.2 abaixo:

TABELA 5.2: Investimento em P&D e pessoal vinculado às atividades de Assistência Técnica

% pessoal vinculado às atividades de P&D e assistência técnica (∗)

Empresa % P&D sobre faturamento

P&D A.T Empresa A n.i 1% -x- Empresa B n.i 2% 50% Empresa C 0,25% 2% 30% Empresa D 1,0% 4% 34% Empresa E 0,1% 1,5% 38% Empresa F 0,55% 5% 53% Emp resa G 1% 10% 37%

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Fonte: Pesquisa de campo OBS: (∗ ) Em relação ao total de funcionários em cada empresa

Apesar da proximidade relacionada aos tipos de competências e bases de conhecimento

associadas ao processo de capacitação do arranjo fumageiro e vitivinícola na etapa de produção

agrícola, existem diferenças significativas entre os dois arranjos, relacionadas ao conjunto de atores

relevantes e ao perfil dos mecanismos de aprendizado que servem de base para a incorporação de

inovações. Em particular, percebe-se que no arranjo vitivinícola, o processo de capacitação

tecnológica no estágio de produção agrícola envolve um esforço de ação coletiva que abrange não

somente as vinícolas do arranjo, mas os diferentes segmentos de atores que integram a infra-

estrutura educacional e tecnológica do arranjo.

Dessa forma, no caso dos principais centros de pesquisa ligados ao arranjo vitivinícola,

como o CNPUV da Embrapa, o esforço de capacitação da produção agrícola envolve ações como a

distribuição de porta-enxertos, desenvolvimento de novos cultivares de uva destinados à

vinificação, zoneamento vitícola e a difusão de orientação técnica no manejo da cultura e no

controle de doenças. No caso das empresas vinícolas esse esforço tem se refletido num aumento

substancial da importação de mudas de espécies vitiviníferas destinadas à ampliação da produção de

vinhos finos.

Grande parte das atividades de P&D relacionadas ao melhoramento genético de cultivares e

sistemas agrícolas são desenvolvidas através do CNPUV da Embrapa. O próprio perfil do arranjo,

onde predominam pequenas vinícolas familiares, contribui para a ausência de atividades de P&D

organizadas em torno de departamentos ou setores específicos como ocorre no caso do arranjo

fumageiro. Essas atividades, quando existem, assumem um caráter experimental e estão

relacionadas às atividades de controle de processos e aprimoramento dos processos de vinificação.

Contudo, a produção vitícola na Serra Gaúcha ainda enfrenta diversas limitações associadas

ao volume e à qualidade da produção de uvas vitiviníferas na região. Apesar dos saltos de qualidade

verificados na produção vitícola no Estado na década de 90, ainda predomina na região da Serra

Gaúcha a produção de variedades comuns de uva.

De acordo com dados fornecidos pela AGAVI e UVIBRA para o Estado do Rio Grande do

Sul, em 1989 do total de 380 mil toneladas produzidas por 16 mil famílias de pequenos agricultores,

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26% correspondiam a variedades nobres e 74% a variedades comuns, híbridas ou americanas,

utilizadas somente para produção de vinhos comuns e sucos. Na safra de 1999, por outro lado, das

430 mil toneladas produzidas, apenas 13,5% corresponderam a uvas nobres. Neste aspecto, a

preocupação com relação à melhora no perfil da produção vitícola constitui um consenso entre os

diferentes atores do arranjo e tem levado muitas vinícolas a ampliarem seus investimentos em áreas

próprias e a importarem uma maior quantidade de mudas dos principais países produtores.

A reconversão dos vinhedos e o aumento na produção de variedades vitiviníferas representa,

conforme enfatizado anteriormente, um dos maiores desafios em termos da capacitação produtiva e

inovativa das vinícolas do arranjo e um fator fundamental para ampliar a inserção competitiva do

arranjo no mercado de vinhos finos. Além da ampliação da produção de novas variedades de uvas

viníferas utilizadas na produção de vinhos finos, a incorporação de inovações no estágio de

produção agrícola do arranjo vitivinícola envolve diversas ações voltadas à melhoria nos sistemas

de produção da uva, tais como o controle de doenças da videira, uso de material isento de vírus ou

uso de porta-enxertos adequados.

Da mesma forma, não obstante as limitações enfrentadas na qualificação da sua produção

vitícola, verifica-se que as vinícolas apresentam um elevado dinamismo com relação a introdução

de inovações associadas aos processos de vinificação. A tabela abaixo relaciona as principais

inovações adotadas pelas empresas vinícolas da amostra na segunda metade da década de 90, bem

como o impacto de tais inovações de acordo com a percepção das próprias empresas.

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TABELA 5.3 - Inovações de produto e processo adotadas no arranjo vitivinícola

Impacto da inovação Inovação adotada Tipo de

Inovação ACP RC RNE RE MQ Mudanças no design de rótulos e garrafas Produto X Modernização de equipamentos Processo X X X X X

Bacardi

Programas de treinamento Processo Cordelier Aquisição de novos equipamentos Produto X

Lançamento de um novo produto Produto X Aurora Mudanças no design de rótulos e garrafas produto X X Terceirização Processo X X X X Rossini Automatização de processos Processo X X X X

Livramento Lançamento de novo produto Produto X Monte Lemos

Linha de engarrafamento processo X

Manosso Alterações na organização do processo produtivo X X X X Sandi Alterações na organização do processo produtivo processo X X X X X

Mioranza Novo sistema de recebimento de matéria prima processo X X X Lançamento de novo produto Produto X X Muraro Aquisição de novos equipamentos processo X X

Moranza Lançamento de um novo produto processo X Novo lay out da cantina processo X Panizon Lançamento de um novo produto (destilados) produto Mudanças no design de rótulos e garrafas Produto X Fante Aquis ição de novos equipamentos Processo X X Novos tratamentos enzimáticos Processo X X Vani Dal B Tratamento para maturação mais curta processo X X

LEGENDA: ACP= aumento na capacidade de produção; RC= redução de custos; RNE= redução no número de empregados; RE= redução nos estoques de matéria-prima; MQ= melhoria na qualidade do produto. Fonte: Pesquisa de Campo; n= 14

Desde o primeiro grande ciclo de modernização do arranjo vitivinícola na década de 70, as

principais vinícolas da região da Serra Gaúcha passaram a introduzir importantes inovações no

processo produtivo que resultaram tanto na realização de investimentos em equipamentos como

também em novas técnicas de controle do processo de vinificação. Atualmente, a utilização de

tanques de aço inoxidável para armazenamento do vinho constitui uma prática amplamente

difundida no arranjo mesmo entre as empresas de menor porte. Do mesmo modo, esse tipo de

equipamento conta hoje com um importante núcleo de fornecedores locais. Outros tipos de

equipamentos como filtros especiais a vácuo ou equipamentos de frio encontram-se restritos a um

número menor de cantinas. Os equipamentos de frio, por exemplo, são utilizados no controle do

processo de fermentação, clarificação e estocagem de vinhos e mostos e são indispensáveis para a

produção de vinhos finos. Esses equipamentos mais complexos, bem como alguns dos principais

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insumos como cortiça e barris de carvalho ainda são importados de países como Itália, Argentina e

Espanha.

Além do investimento em novos equipamentos, importantes avanços têm sido feitos na parte

de controle dos processos de vinificação mediante o uso crescente de enzimas coadjuvantes na

maceração, maceração pelicular, e novas técnicas que variam o período de maceração. Na

fermentação alcoólica estão sendo usadas leveduras biotecnologicamente melhoradas, praticando-se

também a fermentação malolática em todos os tintos e técnicas de remontagens diferenciadas. A

utilização de barricas de carvalho no amadurecimento dos vinhos tintos tem aumentado

consideravelmente entre os produtores locais.

Dentre os principais aspectos que aproximam o padrão de incorporação de inovações nos

arranjos moveleiro e calçadista, destaca-se a natureza fragmentada da sua produção e a elevada

heterogeneidade tecnológica entre diferentes segmentos de empresas. Neste caso, a própria

existência de nichos de mercado com elevado grau de diferenciação juntamente com a ausência de

economias de escala significativas na produção justificam, em grande parte, a manutenção de um

elevado grau de heterogeneidade tecnológica89. Assim, dentre os principais fatores que influenciam

tais características estruturais dos arranjos pode-se destacar:

• O predomínio de empresas de pequeno e médio porte operando em diferentes nichos de

mercado;

• O nível reduzido de barreiras à entrada devido a mínima proteção de patentes e

ausência de elevadas economias de escala na produção; e

• O fato de que estes arranjos ainda integram indústrias intensivas em mão-de-obra,

apesar da crescente automatização da produção em alguns segmentos específicos de

produção.

Ambos os arranjos podem ser caracterizados pelo uso intensivo de mão-de-obra e por uma

tecnologia de produção que ainda guarda acentuado conteúdo artesanal. No caso do arranjo

89 Na indústria moveleira, a existência destes nichos diferenciados garante um espaço de comercialização tanto para um tipo de produção mais exclusiva de salas de jantar em madeiras nobres até a produção de cadeiras plásticas em larga escala. Já no caso da indústria calçadista, essa diferenciação abarca desde a produção de calçados em couro com refinado design até a produção de calçados esportivos com elevado conteúdo tecnológico, ou mesmo sandálias plásticas

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coureiro-calçadista, as etapas da organização do trabalho são compostas basicamente por

modelagem, corte, costura, montagem e acabamento. Na produção de calçados femininos de couro,

principal produto do Vale dos Sinos, as operações básicas para sua fabricação não sofreram

praticamente nenhuma modificação, na medida em que são operações simples e independentes que

não requerem muita qualificação da mão-de-obra (Costa, 1993). Apesar da incorporação de

inovações tecnológicas nas fases de desenho e corte, as limitações associadas à automação nas fases

de costura têm implicado, particularmente nos países industrializados, na adoção de formas flexíveis

de organização da produção (Ferraz et ali, 1996).

Neste sentido, a introdução de tecnologias de base microeletrônica nos equipamentos desta

indústria permitiram uma redução significativa no tempo de criação de novos modelos, maior

flexibilidade nas alterações de feitios e reduções de custo de produção em diferentes estágios do

processo de produção. Em particular, o uso de ferramentas do tipo CAD/CAM na modelagem de

calçados teve uma rápida difusão entre as empresas de maior porte permitindo aumento da

capacitação no desenvolvimento do produto e maior versatilidade de ajustes no design. Entretanto, a

complexidade das fases de costura e montagem, que concentram cerca de 80% da mão-de-obra,

ainda limitam as possibilidades de automação na produção de calçados (Costa, 1993)90.

Já na indústria de móveis, a elevada segmentação em termos de mercados e produtos se

reflete tanto no uso de diferentes matérias-primas (madeira, metal, plástico, etc), como no tipo de

uso aos quais os produtos são destinados (móveis de escritório, móveis para residência, etc). No

caso do arranjo moveleiro da Serra Gaúcha, verifica-se uma especialização das empresas em alguns

segmentos tais como produção de móveis retilíneos, móveis de pinus e móveis tubulares de metal

(com elevada participação da produção de dormitórios e móveis de cozinha). No segmento de

móveis de madeira retilíneos, um dos principais do arranjo, o processo produtivo apresenta um

maior grau de especialização e envolve um número menor de etapas como o corte de painéis,

usinagem e embalagem. Em alguns casos, os painéis de madeira aglomerada podem ser adquiridos

com acabamento, enquanto que a montagem final do móvel é repassada aos representantes ou

de baixo custo. 90 Da mesma forma, o autor enfatiza que: “A reestruturação produtiva empreendida pelas empresas para o aumento da produtividade e da qualidade, reduções de custos e na maior agilidade em atender um mercado cambiante não se restringe apenas à introdução de tecnologia de base microeletrônica. As transformações ocorridas no ambiente produtivo têm estabelecido uma nova cultura de produção” (Costa, 1993: 29).

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varejistas. Entretanto, apesar do maior grau de especialização produtiva associada a este segmento,

verifica-se ainda um nível elevado de verticalização entre empresas do setor.

Tanto no caso do arranjo moveleiro como no caso do arranjo coureiro-calçadista, o

dinamismo tecnológico das empresas costuma ser relacionado ao papel de fornecedores

especializados de equipamentos ou outros insumos-chave. Na indústria moveleira, por exemplo,

destaca-se em particular a crescente utilização do MDF e de novos componentes metálicos e

plásticos como uma importante forma de inovação na fabricação de móveis. Ao mesmo tempo,

verifica-se a importância crescente que tem assumido aquelas atividades ligadas ao desenho,

comercialização e distribuição no contexto de capacitação inovativa e no desempenho competitivo

de empresas em ambos os arranjos.

Em termos do processo de difusão de inovações, no arranjo moveleiro da Serra Gaúcha o

núcleo de grandes e médias empresas desempenha um papel fundamental no processo de difusão de

inovações no arranjo através de diferentes mecanismos que abarcam:

• a organização de redes de subcontratação que incorporam o segmento de MPEs da

região;

• a participação na qualificação da mão-de-obra local e na transmissão de uma cultura

empresarial; e

• o estabelecimento de padrões de inovação em design que são incorporados pelas

demais empresas do arranjo.

No segmento das grandes e médias empresas do arranjo, o nível de atualização tecnológica

de produtos e processos é similar ao padrão tecnológico internacional com elevado grau de

automatização nas linhas de móveis seriados. No segmento de micro e pequenas empresas os

processos de produção ainda são intensivos em mão-de-obra e apresentam uma dinâmica inovativa

menor, seja em termos da modernização de práticas administrativas ou da atualização tecnológica

dos equipamentos. Assim, ao contemplar a distinção existente nos padrões de incorporação de

inovações nestes dois segmentos de empresas no arranjo moveleiro, busca-se avaliar o impacto da

diversidade associada ao processo de capacitação tecnológica do arranjo sobre diferentes tipos de

estratégias inovativas.

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A tabela e o gráfico abaixo ilustram as principais diferenças associadas ao padrão de

incorporação de inovações nas maiores empresas e no segmento de MPEs do arranjo moveleiro.

Com relação às grandes e médias empresas, percebe-se a elevada importância que assumem fatores

como a incorporação de novos equipamentos, alterações de desenho e estilo, alterações técnicas nos

produtos e novas configurações das plantas industriais, enquanto principais formas de inovação

adotadas pelas empresas. No segmento de micro e pequenas empresas, as formas de inovação

consideradas muito importantes pelas empresas também estão associadas com o lançamento de

novos produtos, incorporação de equipamentos e alterações de características técnicas de produtos,

porém com uma incidência significativamente menor.

A incorporação de novos equipamentos, por exemplo, foi considerada como um fator muito

importante de inovação por cerca de 91% das grandes e médias empresas e por cerca de 63% das

micro e pequenas empresas. Neste aspecto, é importante destacar que a incorporação de

equipamentos enquanto fator de inovação assume características diversas em cada um destes

segmentos de empresas. No caso das grandes e médias empresas de móveis a incorporação de

equipamentos refere-se à aquisição de máquinas novas, com elevada complexidade tecnológica e

oriundas, em geral, de fornecedores internacionais. Já no segmento de micro e pequenas empresas a

inovação através da incorporação de equipamentos envolve geralmente a compra de máquinas

usadas fornecidas em nível local ou nacional.

Outra diferença significativa no padrão de incorporação de inovações nos dois segmentos de

empresas remete à importância atribuída às alterações no desenho e estilo. Enquanto este tipo de

inovação representa um fator muito importante para cerca de 73% das grandes e médias empresas,

no segmento de micro e pequenas esse percentual é de menos de 38%.

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TABELA 5.4 - Arranjo Moveleiro: Importância associada às inovações de produto e processo de acordo com o porte da empresa - 1995-1999

Inovações Sem importância Pouco importante Importante Muito importante

Segmento de empresas Grandes e médias

Pequenas e micro

Grandes e médias

Pequenas e micro

Grandes e médias

Pequenas e micro

Grandes e médias

Pequenas e micro

Alterações no desenho/estilo 9,09 50 9,09 0 9,09 12,5 72,73 37,5 Alterações de características

técnicas 9,09 50 18,2 0 9,09 0 63,6 50

Novo produt o 27,27 25 0 0 18,18 12,5 54,55 62,5 Incorporação de novos

equipamentos 9,09 25 0 0 0 12,5 90,91 62,5

Nova configuração da planta industrial

9,09 37,5 9,09 0 18,18 25 63,64 37,5

Construção de nova planta 54,55 75 9,09 0 18,18 12,5 18,18 12,5 Introdução de novas técnicas

organizacionais 27,27 50 9,09 0 36,37 12,5 27,27 37,5

Introdução de novas matérias-primas

18,18 50 9,09 0 36,36 12,5 36,37 37,5

Fonte: pesquisa de campo. N=19

A introdução de novas técnicas organizacionais (tais como just- in-time, células de produção,

etc) foram apontadas como inovações muito importantes adotadas no período por 27% das grandes

e médias empresas e por 37,5% das micro e pequenas empresas. No decorrer das entrevistas foi

possível verificar que, apesar da adoção deste tipo de inovação ter sido particularmente importante

para as grandes e médias empresas no contexto de reestruturação competitiva da primeira metade da

década de 90, ela representa também uma forma de inovação importante no segmento de micro e

pequenas empresas do arranjo. O gráfico 5.1 ilustra as diferenças na importância associada às

inovações adotadas em ambos os segmentos de empresas. Cada linha do gráfico reflete o percentual

de empresas em cada segmento que considera muito importante as inovações descritas nos eixos.

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GRÁFICO 5.1 - Importância associada aos diferentes tipos de inovações adotadas pelas

empresas do arranjo moveleiro - 1995-1999

01 02 03 04 05 06 07 08 09 0

1 0 0D e s e n h o / e s t i l o

Carac te r ís t i cas técn icas

N o v o P r o d u t o

N o v o s e q u i p a m e n t o s

N o v a c o n f i g u r a ç ã o d a p l a n t a

Nova p lan ta

N o v a s t é c n i c a s o r g .

N o v a s m a t é r i a s - p r i m a s

G r a n d e s e m é d i a s Pequenas e M ic ro

Fonte: Pesquisa de campo

Com relação ao perfil de qualificação da mão-de-obra das empresas no arranjo moveleiro,

conforme demonstra a tabela 5.5, na grande maioria das empresas da amostra, os funcionários

possuem somente o 1º grau completo. Das quinze empresas que responderam a questão, oito delas

apresentam um perfil de mão-de-obra acima de 80% formada com escolaridade até o primeiro grau.

Da mesma forma, o percentual de pessoal com cursos de pós-graduação é muito baixo. Apenas sete

das empresas possuem funcionários com pós-graduação.

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TABELA 5.5 - Perfil de qualificação da mão-de-obra (%)

Até 1° grau 2° grau Nível superior Pós-Graduados Empresa A 76 15 9 0 Empresa B 98,38 1,08 0,54 0 Empresa C 62,61 22 15 0,39 Empresa D 98,32 1,68 0 0 Empresa F 98,22 1,78 0 0 Empresa G 77,66 14,72 5,08 2,54 Empresa J 88 10 2 0 Empresa L 94 4 2 0 Empresa M 90 5 5 0 Empresa N 77 12 9 2 Empresa O 74 16 9 1 Empresa P 60 10 30 0 Empresa Q 85 5 5 5 Empresa R 79 18 2 1 Empresa S 80 14,98 4,62 0,4

Fonte: Pesquisa de campo, n=15

Da mesma forma que no arranjo moveleiro, a análise do processo de incorporação de

inovações no arranjo coureiro-calçadista revela a importância associada a fatores como a adoção de

novas técnicas organizacionais, no caso das pequenas e médias empresas do arranjo e da compra de

novos equipamentos, no caso das grandes empresas. De uma maneira geral, com exceção da

construção de novas plantas, todas as demais formas de inovação foram consideradas importantes

ou muito importantes pelas empresas da amostra. No caso das grandes empresas calçadistas, o

lançamento de novos produtos é considerado como uma importante forma de incorporação de

inovações por 50% das empresas, enquanto a introdução de alterações técnicas em produtos foi

considerada como uma forma de inovação muito importante por cerca de 38% da amostra. No

segmento das pequenas e médias empresas, é interessante observar que a incorporação de novos

equipamentos foi considerada como um fator muito importante por cerca de 33% das empresas,

refletindo um grau de importância muito semelhante ao atribuído pelo segmento de grandes

empresas a este mesmo fator.

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TABELA 5.6 - Arranjo coureiro-calçadista: Importância associada às inovações de produto e

processo de acordo com o porte da empresa - 1995-1999

Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Não responderam Segmento de empresas Grandes PMEs Grandes PMEs Grandes PMEs Grandes PMEs Grandes PMEs

Alterações no desenho/estilo 0 0 25 16,67 50 50 12,5 33,33 12,5 0 Alterações de características

Técnicas 0 0 25 0 25 83,33 37,5 16,67 12,5 0

Novo Produto 12,5 0 12,5 33,33 12,5 50 50 0 12,5 16,67 Incorporação de novos

equipamentos 0 0 12,5 33,34 37,5 33,33 37,5 33,33 12,5 0

Nova configuração da planta industrial

0 0 25 16,67 50 66,66 12,5 16,66 12,5 0

Construção de nova planta 0 33,33 37,5 16,67 37,5 33,33 12,5 0 12,5 16,66 Intr. de novas técnicas.

Organizacionais 0 0 12,5 0 37,5 66,67 37,54 33,33 12,5 0

Introdução de novas matérias primas e ou componentes

0 0 25 16,67 50 50 12,5 33,33 12,5 0

Fonte: Pesquisa de campo.

Número de empresas que responderam o questionário: 8 grandes; 6 pequenas e médias

A avaliação das empresas calçadistas quanto ao perfil de qualificação da mão-de-obra local é

apresentada no gráfico 5.2 a seguir. O conhecimento prático e/ou técnico na produção, grau de

escolaridade formal em nível superior ou técnico e a capacidade de aprendizagem são considerados

pelas empresas do arranjo como as principais vantagens que diferenciam a mão-de-obra local. Neste

aspecto, ao mesmo tempo em que a infra-estrutura física, educacional e tecnológica presente no

arranjo representa um importante conjunto de externalidades estáticas da região, fatores intangíveis

como o perfil de qualificação da mão-de-obra local e a própria cultura calçadista da região

representam externalidades dinâmicas, na medida em que são reforçadas pela permanência das

empresas no arranjo local.

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GRÁFICO 5.2 - Arranjo coureiro-calçadista: Vantagens associadas ao perfil da mão-de-obra

no Vale dos Sinos

Fonte: Pesquisa de campo.

0% 20% 40% 60% 80% 100%

Escolaridade 1º e 2º Graus

Escolaridade em nível superior e técnico

Conhecimento prático e/ou técnico na prod.

Disciplina

Iniciativa na resolução de problemas

Capacidade p/ aprender novas qualificações

Concentração

Sem importância Pouco importante Importante Muito importante

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5.3. Fontes de informação e formas de cooperação

A análise desenvolvida nesta seção procura avaliar a natureza dos mecanismos de

aprendizado presentes nos arranjos a partir de elementos que abarcam tanto a origem das principais

fontes de informação e conhecimento utilizadas pelas empresas para incorporação de novos

produtos e processos, como os vínculos de cooperação entre diferentes segmentos de atores locais

Em particular, procura-se distinguir o tipo de estratégia inovativa adotada por empresas nos

arranjos que apresentam um elevado grau de articulação com instâncias globais de coordenação,

vis-à-vis o perfil destas estratégias nos arranjos cuja principal instância de coordenação é local.

Inicialmente, discute-se a importância das diferentes fontes de informação e conhecimento na

adoção de inovações em cada arranjo. A seguir, discute-se a influência dos diferentes contextos

institucionais e das formas de coordenação sobre a natureza e intensidade dos vínculos de interação

e cooperação estabelecidos entre os diferentes segmentos de atores locais e externos aos arranjos.

Finalmente, discute-se o reflexo destes fatores sobre as estratégias inovativas que emergem nos

diferentes arranjos.

5.3.1. Arranjos produtivos articulados com instâncias globais de coordenação: a experiência

dos arranjos fumageiro e coureiro-calçadista

A análise das principais fontes de informação e conhecimento utilizadas pelas empresas do

arranjo fumageiro para a adoção de inovações apresentada na tabela 5.7, reforça a percepção sobre o

circuito restrito de atores que participam do processo de capacitação produtiva e inovativa no

arranjo. As informações oriundas dos departamentos de P&D das maiores empresas localizadas na

região são consideradas como uma fonte de elevada importância para 70% da amostra, enquanto

que o fluxo de informações oriundo de departamentos de P&D situados em outras regiões

representam uma fonte importante para cerca de 62% da amostra. Esse percentual é ainda maior

(75%) para o fluxo de informações que se origina a partir dos clientes, na sua maior parte composto

de compradores internacionais, que possuem um papel importante no estabelecimento das

especificações em termos de blends e dos parâmetros de qualidade do fumo exportado pelas

empresas fumageiras do arranjo.

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TABELA 5.7 - Arranjo fumageiro: Principais fontes de informação para adoção de inovações

Grau de Importância (%) Ranking Fontes de informação

alta média Nenhuma Departamentos de P&D da empresa na região 71 29 0 1 Departamentos de P&D da empresa situados em outras regiões

62,5 25 12,5 3

Consultorias especializadas contratadas localmente 0 62,5 37,5 7 Universidades e Centros Tecnológicos na região 11 66 23 7 Universidades e Centros Tecnológicos de outras regiões

12,5 25 50

Aquisição de novos equipamentos fornecidos localmente

25 25 50 6

Aquisição de novos equipamentos oriundos de fornecedores externos

50 0 50 4

Clientes 75 12,5 12,5 2 Publicações especializadas 34 45 21 5 Troca de informações com outras empresas do setor na região

22 78 0 6

Fonte: Pesquisa de campo; n= 7

Universidades e centros de pesquisa localizados na região do Vale do Rio Pardo apresentam

um grau elevado de importância apenas para 11% das empresas da amostra, enquanto as demais

atribuem apenas uma importância média ao papel destes atores no fornecimento de informações e

conhecimentos tecnológicos.

Ainda que todas as empresas entrevistadas afirmem manter algum tipo de vínculo com

instituições de pesquisa na região, a análise sobre a natureza e intensidade desses vínculos

demonstra um nível reduzido de interação entre esses atores no arranjo. Em geral, essas interações

não transcendem a mera contratação de serviços técnicos relacionados à detecção de fungos em

partidas de fumo destinadas ao mercado externo, análises de solo e outros serviços de certificação

envolvendo a utilização dos laboratórios de universidades como a UNISC e UFSM. Apesar das

formas de interação entre as empresas e instituições de pesquisa na região apontarem para escassos

vínculos que possam levar ao desenvolvimento de processos de aprendizagem tecnológica conjunta,

as empresas da amostra enfatizaram que existe uma tendência de aumento na freqüência de

interações relacionadas à utilização da infra-estrutura tecnológica local para realização de testes e

certificação.

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A importância associada pelas empresas ao papel dos fornecedores de máquinas e

equipamentos enquanto fonte de informação para adoção de inovações reflete, por sua vez, as

inovações incrementais incorporadas no estágio de processamento industrial do fumo, através de

relações do tipo usuário-produtor. Neste aspecto, de acordo com as empresas, uma vez consolidado

o investimento numa planta de processamento, reduz-se a necessidade de troca de informações e

busca de conhecimentos junto aos fabricantes dos equipamentos. Assim, as empresas passam a

manter contatos esporádicos com seus fornecedores de equipamentos, seja através do envio de

funcionários para treinamento ou da troca de informações técnicas. A incorporação de inovações

tecnológicas no processamento industrial ocorre, principalmente, através de melhorias incrementais

em determinadas fases do processo produtivo como a secagem e prensagem do fumo beneficiado. A

adoção de linhas de processamento compactas também foi apontada como uma inovação importante

na medida em que permite uma redução substancial na área destinada ao processamento.

Apesar da maior parte dos equipamentos utilizados no processamento industrial do fumo

contar com fornecedores na região e no país, todos os produtores nacionais operam com tecnologias

licenciadas no exterior. Este é o caso, por exemplo, de empresas como a Thor, em Santa Maria,

licenciada da Evans (EUA), ou da Bernanuer licenciada da Mac Tavish (EUA) e da JG Engenharia

licenciada da Cardwell (EUA), ambas de Santa Cruz do Sul. Entretanto, as subsidiárias de empresas

multinacionais também importam equipamentos diretamente de fornecedores externos, sendo

Estados Unidos, Alemanha e Inglaterra os países onde se encontram os principais produtores de

equipamentos para processamento industrial de tabaco. Alguns componentes contam com

fornecedores especializados, como no caso dos painéis eletrônicos de controle produzidos pela

Siemens. Apesar da relativa facilidade existente para compra de equipamentos nacionais ou

importados, as empresas do arranjo fumageiro reconhecem existir uma diferença significativa com

relação ao nível tecnológico de plantas de processamento em relação a países como os Estados

Unidos, que se encontram num patamar avançado de utilização de tecnologia robótica na automação

do processo produtivo.

No estágio de produção agrícola, o desenvolvimento de novos cultivares, mais adaptados às

condições climáticas locais, e a produção de sementes híbridas encontra-se restrito aos laboratórios

de P&D de empresas como a Universal Leaf, Dimon e Souza Cruz e, mais recentemente, a um

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fornecedor especializado, a Profigen, que opera na produção de sementes híbridas e vem investido

no desenvolvimento de variedades transgênicas de fumo91.

A presença deste fornecedor especializado no arranjo chama inicialmente a atenção pela sua

atuação num nicho que ainda é considerado estratégico por algumas das principais empresas do

arranjo. Ainda assim, a Profigen tem ampliado sua participação no fornecimento de sementes

híbridas para as empresas fumageiras na região e, desde 1998, também opera com uma pequena

planta para peletização de sementes de fumo 92.

A Profigen iniciou suas atividades em meados de 1995, constituída por técnicos oriundos da

área de pesquisa e desenvolvimento de uma das maiores empresas do arranjo, a Universal Lea f, e

tornou-se a principal fornecedora de sementes para a quase totalidade das empresas da região.

Porém, o processo de capacitação tecnológica desta empresa não resultou de um spillover gerado a

partir de processos de aprendizagem desenvolvidos originalmente na Universal Leaf. Na realidade,

esta empresa constitui-se num ramo do grupo americano Profigen Inc93 sendo que a filial instalada

em Santa Cruz do Sul opera através de licenciamento de tecnologia no exterior, ao mesmo tempo

em que o desenvolvimento de novos cultivares feitos pela filial brasileira são registrados fora do

país 94.

De acordo com as informações obtidas através de entrevistas, a empresa já se encontra

registrada junto à CTN Bio (Comissão Técnica Nacional de Biotecnologia) e possui condições

técnicas para obter a autorização para produção de sementes transgênicas de fumo no país, apesar

das restrições que ainda são impostas pela legislação atual. Atualmente a produção deste tipo de

variedade de fumo é aceita apenas na China e na Argentina. Entretanto, apesar da resistência no

91 O desenvolvimento de variedades transgênicas envolve a criação de plantas modificadas geneticamente de modo a aumentar a sua resistência ao ataque de pragas e sua capacidade de adaptação a diferentes condições climáticas. 92 No processo de peletização a semente é envolvida em uma camada de material inerte e aumenta o seu tamanho em cerca de 20 vezes. Atualmente, este procedimento implica no envio da semente in natura para a Holanda, onde o processo de peletização é feito pela Incotec. Entretanto, o transporte em containers envolve problemas relacionados à possibilidade de variações bruscas de temperatura que afetam a capacidade de germinação das sementes. No Brasil, o processo de peletização é feito pela TopSeed sementes Ltda., cuja matriz está localizada em Itaipava no Estado do Rio de Janeiro, que opera através do licenciamento de tecnologia do exterior. De acordo com informações fornecidas pela empresa, o Brasil consome anualmente cerca de 2000 quilos de sementes de fumo, sendo que cerca de 60% desse volume corresponde a sementes que passam por um processo de peletização a fim de otimizar o plantio. No caso da Profigen, a iniciativa para constituição de infra -estrutura própria para peletização de sementes origina-se mais da necessidade de ampliar o seu controle sobre a qualidade das sementes que fornece do que do interesse na diversificação de suas atividades. 93 Este grupo, por sua vez, encontra-se ligado ao conglomerado da U.S. Tobacco, nos Estados Unidos. 94 Informação obtida em entrevista realizada com o Sr. Sérgio Brem, Diretor da Profigem, em agosto de 1998.

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mercado mundial para adoção do fumo transgênico, a empresa mantém uma plataforma de pesquisa

tendo em vista a possibilidade de abertura e consolidação do mercado para este tipo de variedade

nos próximos anos, período no qual espera concluir o desenvolvimento de uma variedade padrão de

fumo transgênico que tenha condições de adaptação em qualquer condição climática. Da mesma

forma, é interessante observar que, apesar de as empresas fumageiras manterem a sua infra-estrutura

própria voltada para a produção de sementes em termos de laboratórios e técnicos, o

desenvolvimento de experimentos ainda se limita às variedades híbridas, não tendo sido apontado

nenhum experimento com variedades transgênicas

O quadro 5.1 apresenta uma tentativa de sistematização das fontes de informação e

conhecimento adotadas por diferentes segmentos de atores que integram o sistema produtivo no

arranjo fumageiro.

QUADRO 5.1 - Arranjo fumageiro: Fontes de informação e conhecimento usadas para adoção

de inovações

Ator/segmento Fontes locais de informação e

conhecimento Fontes externas de informação e

conhecimento Pequenos produtores rurais

Conhecimento tácito no manuseio da cultura do fumo Equipes de assistência técnica das empresas fumageiras

-X-

Estágio de produção agrícola: -Laboratórios próprios de P&D -Infra -estrutura local de P&D - testes e certificação

-Fornecedor especializado

Estágio de produção agrícola: -Laboratórios de P&D das matrizes no exterior

EMNs (*) ligadas a produção, beneficiamento e exportação de fumo Estágio de processamento industrial:

-fornecedores locais de máquinas e equipamentos

Estágio de processamento industrial: -fornecedores internacionais de máquinas e equipamentos

PMEs que atuam na intermediação da compra de fumo em folha

-Formação de quadros próprios de agrônomos -Fornecedor local de sementes -Clientes (subsidiárias de EMNs)

-X-

Fornecedor especializado de sementes

- Infra-estrutura própria de P&D -Licenciamento tecnológico (cultivares) (USA)

Fabricantes de máquinas e equipamentos

- Fornecedores especializados no país (componentes eletrônicos)

-Licenciamento tecnológico com empresas no exterior (EUA, Reino Unido, Alemanha)

Fonte: Pesquisa de campo (*) Empresas Multinacionais

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Em síntese, a análise do padrão de incorporação de inovações no arranjo fumageiro revela

mecanismos de aprendizado desenvolvidos através de um circuito restrito de atores, com reduzido

grau de participação da infra-estrutura educacional e tecnológica local e forte influência de

instâncias externas de coordenação através do papel desempenhado pelas subsidiárias de

multinacionais.

Conforme destacado anteriormente, a análise das estruturas de governança no arranjo

fumageiro demonstra que um núcleo restrito de subsidiárias de empresas transnacionais

desempenha um papel central na coordenação do arranjo, tanto através do controle sobre o capital

das empresas que atuam no beneficiamento primário do fumo, como também na organização de

uma extensa rede de produtores rurais. Apesar do arranjo envolver diferentes segmentos de atores

articulados em torno do sistema de produção em âmbito local, as fases de maior agregação de valor

na cadeia produtiva, como as atividades de P&D, marketing e comercialização, são organizadas fora

da região em nível internacional. Desta forma, as condições de concorrência enfrentadas pelas

grandes empresas de fumo no mercado mundial determinam o papel desempenhado pelos

produtores locais na divisão internacional do trabalho.

Em decorrência desta forma de organização dos sistemas de produção e conhecimento do

arranjo, a incorporação de inovações, tanto na etapa de produção agrícola como na etapa de

processamento industrial, ocorre eminentemente através de um padrão tecnológico imposto pelas

subsidiárias de empresas transnacionais que operam na região. Não existe nesta etapa um maior

envolvimento, seja dos produtores rurais - que seguem a risca a orientação fornecida pelos

departamentos de assistência técnica das empresas - ou das organizações ligadas a infra-estrutura

educacional e tecnológica na região do Vale do Rio Pardo, que desempenham um papel marginal na

geração e difusão de informações e conhecimentos.

A comparação entre as evidências que emergem a partir da experiência do arranjo fumageiro

e coureiro-calçadista demonstra que a articulação entre instâncias locais e globais de coordenação se

reflete através de diferentes níveis de subordinação, com conseqüências distintas sobre o

desenvolvimento de mecanismos de aprendizado em âmbito local.

Conforme destacado no terceiro capítulo desta tese, apesar da abertura de novos canais de

comercialização no mercado externo não haver implicado na desnacionalização de empresas

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calçadistas, tal inserção trouxe mudanças significativas nos mecanismos de aprendizado interativo

no arranjo. Em particular, as mudanças tiveram um reflexo negativo sobre as formas de interação e

cooperação entre atores locais e acentuaram a subordinação dos grandes fabricantes locais de

calçados aos grandes compradores internacionais. Assim, ainda que no decorrer dos anos 70 e 80

este modelo de inserção no mercado externo tenha contribuído para o processo de capacitação

produtiva das empresas calçadistas, ele também demonstrou suas limitações no sentido de capacitar

estas empresas em estágios mais nobres da cadeia de valor.

Os reflexos dessa articulação sobre os mecanismos de aprendizado no arranjo são

percebidos, inicialmente, através da análise sobre as principais fontes de informação e

conhecimento utilizadas pelas empresas locais para adoção de inovações. A fim de explicitar a

influência da heterogeneidade tecnológica existente no arranjo sobre os padrões de incorporação de

inovações, apresenta-se uma análise diferenciada da amostra de acordo com o porte das empresas.

A análise da tabela 5.8, aponta, em primeiro lugar, para a importância que assume o fluxo de

informações provenientes de clientes externos para as grandes empresas do arranjo. No caso das

PMEs, a importância associada aos fluxos de informações oriundos de clientes nacionais reflete, em

grande parte, relações de subcontratação que este segmento de empresas mantém com as grandes

empresas exportadoras do arranjo.

TABELA 5.8 - Arranjo coureiro-calçadista: Principais fontes de informação utilizadas pelas empresas calçadistas para promover inovações de produto ou processo, de acordo com o porte das empresas

Sem importância

Pouco importante

Importante Muito importante

Não responderam

Grandes PMEs Grandes PMEs Grandes PMEs Grandes PMEs Grandes PMEs

Troca de informações com clientes no exterior

0 50 0 33,33 50 0 37,5 16,67 12,5 0

Troca de informações com clientes nacionais

12,5 0 37,5 0 0 33,33 37,5 50 12,5 16,67

Publicações especializadas 0 0 75 16,67 0 66,66 0 0 25 16,66

Congressos e feiras do setor realizadas no país

0 0 0 33,33 75 50 12,5 16,67 12,5 0

Congressos e feiras do setor no exterior 0 33,33 0 66,67 50 0 37,5 0 12,5 0

Fabricantes locais de equipamentos 0 0 25 50 E 50 0 0 12,5 0

Fabricantes internacionais de equipamentos

12,5 50 25 33,33 37,5 16,67 12,5 0 12,5 0

Consultoria especializada contratada localmente

25 16,67 50 16,66 12,5 50 0 0 12,5 16,66

Universidades e Centros Tecnológicos locais

12,5 16,67 12,5 33,33 62,5 33,33 0 0 12,5 16,66

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Universidades e Centros Tecnológicos no exterior

62,5 50 25 16,67 0 0 0 0 12,5 33,33

Troca de informações com fornecedores de matérias-primas ou componentes

0 0 0 0 50 83,33 37,5 0 12,5 16,67

Troca de informações com concorrentes locais

0 0 50 66,67 25 33,33 12,5 0 12,5 0

Troca de informações com empresas calçadistas localizadas fora da região

0 16,67 62,5 66,66 25 16,66 0 0 12,5 0

Departamento de P&D da empresa 0 33,33 50 16,67 37,5 50 0 0 12,5 0

Fonte: Pesquisa de campo.

N= 8 grandes e 6 micro, pequenas e médias.

Os fornecedores de componentes e matérias-primas também são considerados como uma

fonte de informação importante ou muito importante por mais de 87% das grandes empresas, e por

mais de 83% das PMEs da amostra. Já os fabricantes locais de equipamentos representam uma fonte

importante de informação para a adoção de inovações para cerca de 60% das grandes empresas e

por 50% das PMEs.

A participação em congressos e feiras comerciais no exterior representa uma fonte de

informação importante ou muito importante para cerca de 88% das grandes empresas, ao mesmo

tempo em que é considerada pouco importante por 67% das pequenas e médias empresas do arranjo.

Já a participação em feiras nacionais é considerada igualmente importante para ambos os segmentos

de empresas e remete em particular ao papel desempenhado pela Fenac, a principal feira do setor

coureiro-calçadista em nível nacional.

A reduzida importância atribuída ao papel das Universidades e Centros Tecnológicos locais

por empresas calçadistas de diferentes portes chama a atenção em função da dimensão da infra-

estrutura educacional e tecnológica existente no arranjo coureiro-calçadista. No segmento de

pequenas e médias empresas, 50% da amostra atribuiu pouca ou nenhuma importância ao papel

destes atores no arranjo enquanto fonte relevante de informação tecnológica. No segmento das

grandes empresas cerca de 62% da amostra considera as universidades e centros tecnológicos locais

como uma fonte de informação importante para a adoção de inovações, enquanto cerca de 25% das

empresas atribui uma importância reduzida ou nula a este segmento de atores no arranjo.

A importância associada a diferentes fontes de informação no processo de capacitação

inovativa das empresas calçadistas reflete, em grande parte, o perfil das relações de cooperação

entre atores locais. Neste aspecto, a evolução das relações de cooperação entre os diferentes atores

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no arranjo calçadista no decorrer dos últimos cinco anos, permite destacar duas situações distintas.

Por um lado, verificou-se um aumento significativo nas relações de cooperação vertical entre as

empresas ca lçadistas e os demais atores ao longo da cadeia produtiva em nível local. Por outro lado,

no que diz respeito à evolução das relações de cooperação horizontal, ou seja, aquelas que se

desenvolvem entre empresas de um mesmo segmento, não se verificou nenhum progresso

considerável no decorrer dos últimos cinco anos. De acordo com os resultados do estudo, o aumento

na cooperação das empresas calçadistas com os demais atores do arranjo foi mais intenso nas

relações estabelecidas com clientes, fornecedores de insumos e fornecedores de equipamentos,

conforme ilustrado pelo gráfico abaixo:

GRÁFICO 5.3 - Empresas Calçadistas: mudanças nas relações de cooperação com os demais atores do arranjo 1995-1999

Fonte: Pesquisa de campo.

Essa intensificação nas relações de cooperação entre as empresas calçadistas e um conjunto

específico de atores - clientes e fornecedores – se justifica, em parte, pela própria natureza do

processo de reestruturação produtiva promovido pelas empresas do setor no decorrer da década de

90. Diante da crescente perda de competitividade no mercado externo, as empresas calçadistas

buscaram o estreitamento dos vínculos com seus subcontratados, fornecedores e clientes com vistas

0% 20% 40% 60% 80% 100%

Clientes

Concorrentes

Fornecedores de insumos

Fornecedores de equipamentos

centros tecnológicos

Universidades

Sindicatos e Associações

Órgãos públicos

Forte dimuniuição Diminuição Estável Aumento Forte aumento

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a promover um aumento da eficiência produtiva, através de melhorias incrementais em

equipamentos e mudanças na organização de processos produtivos.

O aumento nas formas de interação das empresas com seus fornecedores de insumos e

equipamentos esteve ligado principalmente a: troca de informações, assistência técnica no processo

produtivo e ações conjuntas em desenho e estilo. Todas as empresas calçadistas entrevistadas

apontaram para um aumento ou forte aumento nessas formas de interação. Em particular, nas

relações de subcontratação, verifica-se que cerca de 73% das empresas calçadistas pesquisadas

operam com alguma forma de subcontratação na região. Destas, 50% trabalham através de contratos

formais, enquanto a outra metade utiliza mecanismos informais para a subcontratação de serviços

no arranjo. Nenhuma das empresas da amostra oferece exclusividade para os seus subcontratados e

a maioria (87,5%) considera que o nível de capacitação de seus subcontratados é inferior ao da

própria empresa. Da mesma forma, todas as empresas operam com a cessão de equipamentos para

os seus subcontratados.

Ainda que os desafios competitivos enfrentados pelo arranjo tenham induzido as empresas

calçadistas a uma aproximação crescente com clientes, fornecedores e subcontratados, o mesmo não

ocorreu em relação aos demais atores presentes no arranjo como as universidades, centros de

pesquisa, órgãos públicos e associações de classe. Conforme pode ser observado no gráfico 5.4,

cerca de 67% das empresas considera que as relações de cooperação com centros tecnológicos na

região permaneceram estáveis ou diminuíram. Esse percentual é ainda maior para as relações com

sindicatos e associações (78%), universidades (87,5%) e órgãos públicos (89%). A interação das

empresas com centros de pesquisa e universidades, quando ocorreu, foi mais intensa na realização

de testes e certificação e na realização de treinamento de pessoal.

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GRÁFICO 5.4 – Empresas calçadistas: mudanças nas relações de cooperação horizontal – 1995-1999 Fonte: Pesquisa de campo.

A evolução das relações de cooperação horizontal entre empresas do segmento calçadista é

mostrada no gráfico 5.4. Na maior parte dos casos as relações de cooperação com concorrentes se

manteve estável no decorrer dos últimos cinco anos. Durante o processo de entrevistas, entretanto,

ficou claro que essa estabilidade reflete, na realidade, a ausência de relações de cooperação

perceptíveis entre estes atores. Apenas 22% das empresas sinalizaram um aumento na troca de

informações com seus concorrentes. Cerca de 44% delas sinalizaram um aumento nos ensaios

cooperativos para desenvolvimento e melhoria de produtos e nas ações conjuntas para capacitação

de recursos humanos. Também é interessante observar que, enquanto 33% das empresas apontaram

para um aumento nas ações conjuntas em desenho e estilo, um mesmo percentual de empresas

apontou para a diminuição neste tipo de iniciativa no decorrer dos últimos anos.

Assim, em linhas gerais, a análise do conjunto de informações sobre o processo de

capacitação do arranjo coureiro-calçadista, aponta para um elevado grau de competência das

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

Troca de informações

Ensaios p/ desenv. E melhoriade produtos

Ações conjuntas p/capacitação de RH

Ações conjuntas de marketing

Ações conjuntas em desenhoestilo

Forte diminuição Diminuição Estável Aumento Forte Aumento

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empresas calçadistas nas atividades associadas a esfera da produção. Porém, verifica-se também que

um contingente considerável de empresas no arranjo ainda enfrenta dificuldades no sentido de

ampliar o escopo desta capacitação em direção a estágios estratégicos da cadeia produtiva, em

particular, aqueles ligados às atividades de comercialização e design.

Além das evidências que apontam para as especificidades associadas à importância de

diferentes fontes de informação e formas de cooperação, a análise dos mecanismos de aprendizado

presentes neste arranjo permite diferenciar dois grupos de empresas calçadistas, de acordo com a

natureza de suas estratégias inovativas e competitivas. Tal dicotomia encontra-se diretamente ligada

aos canais de comercialização nos quais cada grupo de empresas opera.

Desta forma, num extremo, percebe-se a existência de um grupo considerável de empresas

calçadistas, que apresentam reduzida capacitação inovativa e baixa propensão ao desenvolvimento

de processos de aprendizagem interativa com os demais atores do arranjo em nível local – seja ao

longo da cadeia produtiva ou com outras organizações de apoio que integram o arcabouço

institucional do arranjo. Este grupo de empresas concorre no mercado internacional através de

nichos assoc iados a calçados de baixo preço, com uma estratégia baseada na redução de custos e no

uso intensivo da subcontratação de serviços. Na medida em que se encontram fortemente atreladas

aos agentes de exportação presentes no arranjo, as empresas deste grupo acabam por reproduzir o

mesmo tipo de estratégia de desenvolvimento que permitiu consolidar o arranjo no decorrer da

década de 70, mas que atualmente se encontra comprometida diante de um novo contexto de

competição internacional.

Num outro extremo, percebe-se a existência de um conjunto pequeno mas crescente de

empresas calçadistas que vêm buscando integrar sua participação em nichos de mercado mais

nobres através de uma estratégia que visa ampliar sua capacitação produtiva sem deixar de lado

investimentos em design e na busca de novos canais de comercialização. A dinâmica inovativa

dessas empresas é maior e encontra-se relacionada ao estabelecimento de mecanismos de

aprendizagem que envolvem tanto fontes de informação e conhecimento internas ao arranjo como

externas ao mesmo, conforme será discutido a seguir. Esse segundo grupo de empresas tem logrado

obter uma inserção mais qualificada no mercado externo através da comercialização direta de

calçados com marcas próprias e design. Esse fenômeno não se restringe unicamente ao segmento

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das grandes empresas, mas envolve também uma parcela de empresas de pequeno e médio portes e

reflete uma nova concepção sobre a própria trajetória de desenvolvimento do arranjo.

O quadro 5.2 abaixo procura sistematizar as principais fontes de informação e conhecimento

adotadas por diferentes segmentos de atores que integram o arranjo coureiro-calçadista:

QUADRO 5.2 – Arranjo coureiro-calçadista: Fontes de informação e conhecimento usadas para adoção de inovações

Ator/segmento Fontes locais de informação e conhecimento

Fontes externas de informação e conhecimento

Empresas calçadistas operando em nichos

de mercado com maior qualidade e

preço

Capacitação própria em desenho e comercialização, fabricantes locais de máquinas e componentes, feiras

comerciais no país

Concorrentes internacionais, fabricantes de máquinas no exterior e feiras comerciais internacionais

Empresas calçadistas operando em

mercados de baixo preço

Grandes empresas calçadistas do arranjo

Agentes de exportação e clie ntes internacionais

Fornecedores de máquinas e

equipamentos

Institutos de P&D e treinamento locais, feiras comerciais no país

Concorrentes internacionais, feiras de equipamentos internacionais

Curtumes

Institutos de P&D e de treinamento locais

Joint ventures com concorrentes internacionais

Fonte: Pesquisa de campo

Ações conjuntas envolvendo as associações de fabricantes de componentes e máquinas do

arranjo têm buscado ampliar a inserção externa das empresas através da criação de uma marca

brasileira. No âmbito dos fabricantes de componentes, a preocupação de aumentar as vendas no

mercado externo se reflete num projeto recente da Assintecal, voltado para promoção de consórcios

de exportação. O projeto pretende agrupar empresas que atuam nos setores de matrizaria e

componentes para calçados de segurança, voltados para os mercados mexicano, latino-americano e

asiático.

No segmento dos fabricantes de máquinas e equipamentos para o setor coureiro-calçadista,

que sofreu o maior impacto com a retração das vendas no mercado americano, muitas empresas

passaram a buscar parcerias com empresas estrangeiras do mesmo setor visando a fabricação de

máquinas com tecnologia importada no Brasil. Da mesma forma, ocorreu um aumento significativo

na subcontratação em algumas etapas do processo produtivo, particularmente nas atividades de

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usinagem e nos painéis de comando eletrônico onde a subcontratação já atinge cerca de 50% das

empresas.

O estabelecimento de parcerias com empresas no exterior constitui-se numa estratégia de

atualização tecnológica que vem sendo utilizada desde o início da década de 90 por algumas

empresas no segmento de máquinas e equipamentos para couro e calçados. Uma das empresas da

amostra firmou recentemente uma parceria com uma empresa italiana, afim de incluir em sua linha

de produção a máquina automática de aplicar botões de pressão, utilizados em calçados e

confecções gerais de tecidos. Esta mesma empresa também vende e distribui sistema de cad-cam

produzido por uma firma estrangeira do exterior, utilizado para criação e modelagem de calçados.

Esse tipo de estratégia é ilustrado por diversos outros exemplos como a parceria entre a

Master Equipamentos Industriais Ltda, de Novo Hamburgo e a Eurocomat, da Itália, que envolve o

licenciamento da tecnologia e a produção e venda de máquinas pela empresa gaúcha. Já a Indústria

Metal de Máquinas Ltda é uma representante da empresa portuguesa, Zipor S.ª, para a venda no

Brasil de máquinas para corte de cabedais à jato d’água.

Com a queda na produção da indústria calçadista no início da década de 90, o segmento de

curtimento de couro também buscou ampliar sua inserção no mercado externo como estratégia de

sobrevivência à crise enfrentada pelo arranjo. Entretanto, conforme destacado anteriormente, a

orientação crescente do segmento das empresas de curtimento para o mercado externo ainda

enfrenta uma oposição acirrada das empresas calçadistas que apontam para a escassez de sua

principal matéria-prima como um dos principais gargalos para o desenvolvimento do arranjo

coureiro-calçadista na região.

A transformação gradativa nas estratégias de aprendizado e capacitação das empresas do

Vale dos Sinos é exemplificada, em particular, pela mudança no perfil e papel dos agentes de

exportação com relação à promoção de mecanismos de aprendizado no arranjo. A importância deste

conjunto de atores – que foi crucial para a inserção inicial das empresas no mercado externo nas

décadas de 70 e 80 – foi reduzida na medida em que algumas empresas calçadistas passaram a

adotar novas estratégias de inserção no mercado externo. Um fenômeno relativamente recente no

arranjo está relacionado à existência de agentes de exportação que operam exclusivamente como

escritórios de compra de grandes cadeias globais de mercadorias, como a Wal-Mart e Pay-Less.

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Esses escritórios respondem atualmente pela colocação dos pedidos de maior volume individual no

arranjo – em média de 100 mil pares – e refletem uma tendência com relação ao predomínio das

grandes redes de distribuição no cenário internacional.

5.3.2. Arranjos produtivos articulados com instâncias locais de coordenação: a

experiência do arranjo moveleiro e vitivinícola

Conforme enfatizado anteriormente, uma das principais características dos mecanismos de

aprendizado presentes no arranjo vitivinícola refere-se à participação expressiva de diferentes

segmentos de atores locais no processo de capacitação do arranjo, tanto no estágio de produção

vitícola como no estágio de vinificação. Neste sentido, o processo de geração e difusão de novos

conhecimentos neste arranjo envolve tanto a participação dos diferentes segmentos de empresas

vinícolas da região – das grandes vinícolas até as pequenas cantinas familiares- como também os

centros de pesquisa e de transferência tecnológica ligados a: Embrapa, Emater, Universidades locais

e as principais associações que atuam na coordenação das relações entre empresas tais como

Uvibra, Agavi e Aprovale.

A tabela 5.9 apresenta a importância associada às diferentes fontes de informação e

conhecimento utilizadas pelas vinícolas da amostra para adoção de inovações. A análise da tabela

aponta, em particular, ao elevado grau de importância associado pelas vinícolas ao papel dos

clientes (80%), à troca de informações com outras empresas vinícolas na região (66,7%), às

publicações especializadas (53%) e à participação em congressos e feiras do setor (40%).

Universidades e centros tecnológicos associados à infra-estrutura tecnológica local foram

consideradas como uma fonte de informação com importância média ou elevada para cerca de 60%

das empresas da amostra., um percentual elevado em comparação com aquele verificado nos

arranjos fumageiro e coureiro-calçadista. Fontes de informação e conhecimento externas ao arranjo

tais como universidades e centros tecnológicos situados fora da região, foram consideradas como

uma fonte de pouca ou nenhuma relevância para 53% das empresas da amostra.

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TABELA 5.9 – Arranjo Vitivinícola: Principais fontes de informação para adoção de inovações

Grau de Importância (%) Não respondeu

Fontes de informação

Alta média nenhuma Departamentos de P&D da empresa na região 26,7 40 20 13,3 Departamentos de P&D da empresa situados em outras regiões

6,7 40 40 13,3

Consultorias especializadas contratadas localmente

20 40 26,7 13,3

Universidades e Centros Tecnológicos na região 13,3 46,7 26,7 13,3 Universidades e Centros de Tecnológicos de outras regiões

6,7 20 53,3 20

Aquisição de novos equipamentos fornecidos localmente

26,7 46,7 20 6,7

Aquisição de novos equipamentos oriundos de fornecedores ext ernos

33.3 40 20 6,7

Clientes 80 13,3 0 6,7 Publicações especializadas 53,3 33,3 6,7 6,7 Troca de informações com outras empresas do setor na região

66,7 20 6,7 6,7

Congressos e feiras do setor 40 13,3 46,7 Fonte: Pesquisa de campo; n= 19

Com relação ao papel da infra-estrutura educacional e tecnológica no arranjo vitivinícola,

cabe enfatizar que, pelo menos 30% das empresas analisadas, apontou para a existência de

intercâmbio com instituições de pesquisa na região visando não somente a elaboração de análises

químicas e testes, mas também melhorias no processo e desenvolvimento de novos produtos, o que

revela algum grau de colaboração tecnológica entre esses atores em âmbito local. Da mesma forma,

a análise das principais inovações adotadas pelas empresas vinícolas nos últimos anos revela que a

maior parte das inovações estiveram vinculadas às melhorias na etapa de vinificação onde a gestão

de centros de pesquisa como a Embrapa tem sido menor. Outro fator relevante remete ao papel

importante das instituições locais, como a Escola Agrotécnica e a Universidade de Caxias dos Sul,

na formação de pessoal qualificado para o arranjo, que tende a passar desapercebida pelas empresas

que assumem a qualidade da mão-de-obra local como uma externalidade estática da região.

A adoção de inovações tanto na etapa de produção vitícola como na etapa de vinificação

reflete a capacitação do arranjo em termos da qualificação dos técnicos e enólogos que atuam nas

cantinas. Além do papel desempenhado pela Escola de Enologia e pela Universidade de Caxias do

Sul na região, existe um esforço de empresas e organizações de apoio no sentido de ampliar o

intercâmbio com os principais países produtores como França, Itália e Argentina. Entre as principais

vinícolas do arranjo esse fluxo de conhecimento ocorre de forma sistemática através da contratação

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da assessoria de enólogos estrangeiros para acompanhamento e melhoria nos processos. No caso das

pequenas cantinas familiares que se especializaram na produção de vinhos finos, a capacitação de

recursos humanos ocorre fundamentalmente através da formação técnica dos filhos dos

proprietários nas melhores escolas de enologia de países como França e Argentina. Além disso, a

participação em feiras internacionais e a organização de viagens de estudo aos principais países

produtores, promovidas através da parceiras entre associações como Uvibra, Agavi e o Sebrae têm

contribuído para a disseminação de novas práticas entre empresas dos diversos segmentos do

arranjo.

O processo de busca de qualidade na produção vitícola com vistas ao aumento da produção

de vinhos finos reflete, em particular, as estratégias inovativas de dois segmentos distintos de

vinícolas no arranjo: de um lado, abarca um extrato de vinícolas com maior tamanho relativo e

capacidade de processamento acima de 1 milhão de litros ao ano; e, de outro, o extrato de pequenas

cantinas familiares ligadas à produção de vinhos finos. No decorrer dos últimos anos, as maiores

vinícolas do arranjo como Aurora, Chandon, Salton ou Bacardi ampliaram significativamente seus

investimentos em importação de mudas de variedades vitiviníferas como Chardonay, Pinot Noir,

Cabernet Sauvignon e Merlot, de países como França, Itália, África do Sul e Austrália95.

A análise das especificidades que marcam o processo de capacitação inovativa dos

diferentes segmentos de empresas vinícolas do arranjo demonstra que o esforço de reconversão na

produção vitícola tem se mostrado particularmente importante para a crescente inserção das

pequenas cantinas familiares no mercado de vinhos finos. Conforme destacado anteriormente, este

segmento de pequenas vinícolas representa um fenômeno relativamente recente no arranjo, na

medida em que agrega um seleto contigente de pequenos produtores de uvas finas que atuavam

inicialmente como fornecedores das grandes vinícolas e cooperativas da região. Gradativamente,

estes pequenos produtores passaram a adaptar suas cantinas para a produção de vinhos finos e a

conquistar um nicho próprio de mercado.

A vinícola Miolo, que conta com 14 anos de existência, foi uma das pioneiras neste

segmento de pequenas cantinas familiares a se estabelecer com uma marca própria de vinhos finos.

Atualmente, esta vinícola produz cerca de quatro milhões de garrafas e possui uma marca conhecida

nacionalmente. A manutenção e o manejo de vinhedos próprios constitui o maior diferencial destas

95 Em 1998, por exemplo, a Chandon, importou 100 mil mudas, das quais cerca de 60%, foram distribuídas para seus produtores conveniados.

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pequenas cantinas que optaram pela comercialização de vinhos finos com um valor de mercado até

dez vezes superior ao do vinho comum.

Uma sistematização sobre a origem das principais fontes de informação adotadas pelos

diferentes segmentos de vinícolas é apresentada no quadro 5.3:

QUADRO 5.3 – Arranjo vitivinícola: Fontes de informação e conhecimento usadas para

adoção de inovações

Ator/segmento Fontes locais de informação e conhecimento

Fontes externas de informação e conhecimento

Grandes Vinícolas (capacidade de

processamento acima de 1 milhão de litros)

- Quadros técnicos próprios (agrônomos, enólogos, bioquímicos, etc)

- Fabricantes locais de equipamentos - Infra -estrutura educacional e

tecnológica local (UCS, CNPVU-Embrapa, Escola de Enologia)

-

- Consultorias internacionais de enólogos

- Clientes - Fornecedores de equipamentos

nacionais e internacionais - Joint ventures

Pequenas cantinas

familiares produtoras de vinhos finos

- Quadros técnicos próprios (agrônomos, enólogos, bioquímicos, etc)

- Troca de informações com concorrentes locais

- - Infra-estrutura educacional e tecnológica local (UCS, CNPVU-Embrapa, Escola de Enologia)

- Fabricantes locais de equipamentos

- Clientes - Visitação a cantinas no exterior - Participação em concursos

internacionais - Consultorias internacionais de

enólogos - Intercâmbios com escolas de

enologia no exterior

Cooperativas vinícolas produtoras de vinhos

comuns

- Infra -estrutura educacional e tecnológica local (UCS, CNPVU-Embrapa, Escola de Enologia)

- Troca de informações com concorrentes locais

- Fabricantes locais de equipamentos

- Clientes - Visitação a cantinas no exterior

Fonte: Pesquisa de campo.

O relativo grau de autonomia existente entre os diferentes segmentos de vinícolas na Serra

Gaúcha contrasta com as relações de interdependência existentes entre as grandes e médias e o

segmento das empresas de menor porte do arranjo moveleiro. No caso do arranjo vitivinícola, as

estratégias de capacitação inovativa adotadas pelo segmento de pequenas cantinas familiares

levaram a um gradativo rompimento da sua articulação com as grandes vinícolas da região enquanto

fornecedoras de uva. Já no arranjo moveleiro, as formas de articulação entre as empresas líderes, de

grande e médio porte e o segmento de MPEs no arranjo moveleiro exerce uma influência marcante

sobre os mecanismos de aprendizado adotados no arranjo.

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As principais fontes de informações para a adoção de inovações nas grandes e médias

empresas do arranjo movele iro são apresentadas no gráfico 5.5. Como fontes de informações

consideradas muito importantes destacam-se os clientes e a aquisição de novos equipamentos

oriundos de fornecedores externos, ambos com 63% das indicações. A seguir, com 57% ressalta-se

a participação em congressos e feiras comerciais e industriais realizadas no exterior. Outras fontes

de informações consideradas importantes são a troca de informações com empresas do setor na

região, com 47% das indicações e os congressos e feiras comerciais e industriais realizadas no país,

com 44%.

As Universidades e centros tecnológicos na região, associados com a infra-estrutura

educacional e tecnológica local foram consideradas como um fator importante por cerca de 36% da

amostra e muito importante para cerca de 9% das empresas. Entretanto, cerca de 55% desta amostra

também atribuiu pouca ou nenhuma importância ao papel deste segmento de atores no arranjo

enquanto fonte de informações e conhecimento para a adoção de inovações. Este fato demonstra um

padrão de avaliação semelhante ao verificado nos demais arranjos e reflete a baixa importância que

é geralmente associada pelas empresas ao papel desempenhado pelas instituições de pesquisa.

Assim, de uma maneira geral, as grandes e médias empresas do arranjo associam um maior

grau de importância a determinadas fontes de informação e conhecimento que têm origem externa

ao arranjo, em particular, decorrentes da interação com clientes nacionais e internacionais, da

aquisição de equipamentos importados e da participação em feiras e eventos internacionais do setor.

Tais fontes permitem o contato com tendências recentes em design que passam a ser incorporadas

nas linhas de produtos deste segmento de empresas.

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GRÁFICO 5.5 - Arranjo moveleiro: Fontes de informação para adoção de inovações nas

grandes e médias empresas

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

Departamentos de P&D da empresa na região

Consultorias especializadas contratadas localmente

Universidades e Centros Tecnológicos na região

Universidades e Centros Tecnológicos de outras regiões

Aquisição de novos equipamentos fornecidos localmente

Aquisição de novos equipamentos oriundos de fornecedores externos

Clientes

Publicações especializadas

Troca de informações com empresas do setor na região

Troca de informações com empresas do setor localizadas fora da região

Congressos e feiras comerciais e industriais do setor realizadas no país

Congressos e feiras comerciais e industriais do setor realizadas no exterior

Sem importância Pouco importante Importante Muito importante

Fonte: Pesquisa de campo

No segmento das MPEs do arranjo moveleiro, verifica-se que também os clientes são

considerados como uma fonte importante de informação com 87% das indicações da amostra.

Congressos e feiras realizados no país representam um segundo fator importante ou muito

importante para cerca de 87% da amostra, enquanto a participação em feiras no exterior é

considerada como um fator igualmente importante para cerca de 62% das empresas. Outras fontes

consideradas importantes neste segmento são a troca de informações com empresas do setor na

região (com 48% das indicações), e a aquisição de novos equipamentos de produtores nacionais

(com 46% das indicações). Finalmente, universidades, centros tecnológicos e consultorias

especializadas localizados no exterior ou em outras regiões, bem como departamentos de P&D

foram considerados como fontes sem importância pela maior parte da amostra.

Todos os segmentos (grandes, médias e micro empresas) atribuem uma importância

fundamental aos clientes enquanto fonte de informação para a adoção de inovações. A diferença,

neste caso, reside no fato de que, para o segmento das MPEs, os principais clientes encontram-se

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entre as grandes e médias empresas da região que subcontratam serviços de montagem ou

fabricação das empresas menores.

GRÁFICO 5.6 - Arranjo moveleiro: Principais Fontes de Informação para adoção de

inovações nas Pequenas Empresas

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

Departamentos de P&D da empresa na região

Consultorias especializadas contratadas localmente

Consultorias especializadas localizadas fora da região

Universidades e Centros Tecnológicos na região

Universidades e Centros Tecnológicos de outras regiões

Aquisição de novos equipamentos fornecidos localmente

Aquisição de novos equipamentos de produtores nacionais

Aquisição de novos equipamentos oriundos de fornecedores externos

Clientes

Publicações especializadas

Troca de informações com empresas do setor na região

Troca de informações com empresas do setor localizadas no exterior

Feiras comerciais e industriais do setor realizadas no país

Feiras comerciais e industriais do setor realizadas no exterior

Sem importância Pouco importante Importante Muito importante

Fonte: pesquisa de campo

A articulação entre grandes e médias empresas e o segmento de MPEs contribui para

manutenção de padrões diferenciados de incorporação de inovações tecnológicas, onde as grandes e

médias empresas exercem uma influência significativa no processo de capacitação do segmento de

MPEs. No decorrer da década de 90, o segmento constituído pelas maiores empresas do arranjo

adotou uma estratégia de modernização que envolveu, em linhas gerais, a intensificação no fluxo de

investimentos através da aquisição de equipamentos mais sofisticados e da adoção de mudanças

organizacionais e novas técnicas de organização da produção. No caso das pequenas empresas, a

estratégia de atualização tecnológica foi fomentada pela cópia de modelos lançados pelas empresas

maiores, através de um mecanismo que combina a elevada participação da mão-de-obra no processo

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produtivo com uma alta flexibilidade e rápida capacidade de introdução de modificações nas linhas

de produtos.

Neste aspecto, a influência das empresas moveleiras de grande e médio sobre os processos

de aprendizado e estratégias inovativas das MPEs do arranjo se reflete em: i) organização de redes

de subcontratação; ii) qualificação da mão-de-obra local; iii) estabelecimento de inovações em

termos de design que passam a ser incorporadas pelas demais empresas do arranjo; e iv) transmissão

de atitudes empresariais através do estabelecimento de novas firmas por trabalhadores qualificados

oriundos dos quadros funcionais dessas empresas.

QUADRO 5.4: Arranjo moveleiro: Fontes de informação e conhecimento usadas para adoção

de inovações

Ator/segmento Fontes locais de informação e conhecimento

Fontes externas de informação e conhecimento

Empresas líderes (fabricantes de grande e

médio porte)

Capacitações próprias em marketing e design

Troca de informações com concorrentes locais

Feiras comerciais no país

Clientes nacionais e internacionais Importação de equipamentos Concorrentes internacionais Feiras comerciais no exterior

MPEs moveleiras

Clientes locais: subcontratação dos grandes fabricantes do arranjo

Fabricantes locais de máquinas e equipamentos

Troca de informações com concorrentes locais

Infra-estrutura educacional e tecnológica local

Feiras comerciais no exterior (via associações)

Publicações especializadas Consultorias fora da região

Fabricantes nacionais de equipamentos

Fonte: Pesquisa de campo

5.4.- Conclusão

A análise sobre fontes e modalidades de incorporação de informações e conhecimentos nos

arranjos evidencia diferenças significativas relativas à forma de organização dos sistemas de

conhecimento, que servem de base para a capacitação produtiva e inovativa das firmas em âmbito

local. Tais diferenças se refletem, em particular, na importância relativa de fontes locais ou externas

de informação e conhecimento; no papel de empresas e demais segmentos de atores locais na

aquisição e difusão de inovações; e nos vínculos de interação e cooperação entre segmentos de

atores locais.

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A discussão sobre a importância relativa de fontes locais ou externas de informação e

conhecimentos no processo de capacitação dos arranjos não pode estar dissociada da análise sobre a

natureza e intensidade dos canais de comunicação utilizados. Por um lado, o uso de informações e

conhecimentos através de fontes externas tanto pode estar relacionado à existência de canais

limitados e informais de comunicação, como pode resultar do estabelecimento de mecanismos

formais de transmissão de conhecimentos organizados e coordenados através de atores locais. O uso

de fontes locais de informação e conhecimento, por sua vez, tanto pode estar associado a processos

de aprendizado interativo envolvendo diferentes segmentos de atores locais, como pode envolver

um conjunto restrito de atores e níveis reduzidos de interação e cooperação.

Neste aspecto, a natureza e intensidade dos canais de comunicação que sustentam a

incorporação de inovações no arranjo, seja a partir de fontes locais ou de fontes externas, permite

evidenciar importantes especificidades relativas ao caráter ativo ou passivo das estratégias

inovativas adotadas nos diferentes arranjos.

O quadro 5.5 procura sistematizar as principais características dos sistemas de conhecimento

nos arranjos e seu reflexo sobre as estratégias inovativas adotadas por atores locais. A ocorrência de

estratégias inovativas passivas pressupõe a existência de canais limitados e informais para aquisição

e difusão de conhecimentos entre atores locais. Tais limitações podem estar associadas à ausência

de esquemas de cooperação vertical ou horizontal entre atores locais, à elevada dependência de

fontes de informação e conhecimento externas ao arranjo ou à reduzida capacidade de geração de

novos conhecimentos a partir de fontes locais. Por outro lado, o caráter ativo das estratégias

inovativas pressupõe um esforço deliberado de atores locais no sentido de consolidar tanto canais

informais de comunicação como fluxos sistemáticos de troca de informações e conhecimentos entre

atores locais. Da mesma forma, estratégias ativas de inovação geralmente estão associadas à

existência de esquemas efetivos de cooperação vertical e horizontal entre atores locais; à menor

dependência de fontes externas de informação e conhecimento; e à elevada capacidade endógena de

geração e aquisição de novos conhecimentos.

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QUADRO 5.5 - Características associadas aos sistemas de conhecimento e estratégias inovativas nos arranjos produtivos Arranjo Fumageiro Coureiro-

calçadista Vitivinícola Moveleiro

Papel da infra -estrutura educacional e tecnológica local

Inexistente ou pouco relevante

Limitado: condicionado pela

demanda local

Ativo especialmente no estágio agrícola

Limitado: condicionado pela

demanda local Origem das principais fontes de informação e conhecimento

Predomínio de fontes externas

Predomínio de fontes externas

Uso extensivo de fontes locais e

externas

Uso extensivo de fontes locais e

externas Níveis de cooperação vertical Elevados nas

relações com fornecedores de equipamentos

Elevados ao longo de toda cadeia

produtiva

Elevados ao longo de toda cadeia

produtiva

Elevados ao longo de toda cadeia

produtiva

Níveis de cooperação horizontal Reduzido Reduzido Alto Médio Estratégia inovativa Passiva e

condicionada pelos grandes

conglomerados transnacionais de

fumo

Passiva: subordinada à interação com compradores internacionais

Ativa e envolve diferentes

segmentos de atores locais

Ativa e coordenada pelas empresas líderes e associações locais

Fonte: Pesquisa de campo

Inicialmente, a existência de fontes internas ou locais de informação e conhecimento refere-

se tanto ao papel da infra-estrutura educacional e tecnológica existente em âmbito local, como à

importância dos demais atores e instituições locais (empresas, fornecedores especializados,

associações de classe), na difusão de conhecimentos ou na geração ou aquisição de conhecimentos

novos para as empresas do arranjo.

Com relação ao papel da infra-estrutura educacional e tecnológica, ainda que todos os

arranjos contem com um conjunto considerável de organizações voltadas para qualificação de

recursos humanos e atividades de P&D, a participação destas organizações no processo de

capacitação produtiva e inovativa de atores locais apresenta um alcance limitado na maior parte dos

casos.

No arranjo fumageiro, universidades, centros tecnológicos e demais organizações voltadas

para a capacitação e desenvolvimento tecnológico na região do Vale do Rio Pardo, desempenham

um papel marginal no processo de capacitação inovativa de empresas locais. As principais

inovações incorporadas tanto no estágio de produção agrícola como no de processamento industrial

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têm sua origem ligada ao esforço interno de P&D das subsidiárias locais dos grandes

conglomerados de tabaco ou, alternativamente, à fontes externas de informação e conhecimento.

O arranjo coureiro-calçadista é o que apresenta a maior densidade em termos de

organizações voltadas para treinamento e desenvolvimento tecnológico da cadeia produtiva local.

Entretanto, verifica-se o alcance limitado do papel deste conjunto de atores no processo de

capacitação produtiva e inovativa das empresas do arranjo. Tais organizações participam mais

ativamente na qualificação da mão-de-obra local do que no desenvolvimento conjunto de novos

produtos e processos com empresas calçadistas locais.

Da mesma forma, no arranjo moveleiro, a infra-estrutura educacional e tecnológica local

também apresenta uma inserção limitada no processo de capacitação dos fabricantes locais de

móveis, ainda que desempenhe um papel mais ativo na geração de novos conhecimentos ligados às

atividades de design e uso de novos materiais. No arranjo vitivinícola, a participação da infra-

estrutura tecnológica e educacional em âmbito local se mostra mais ativa na incorporação de

inovações associadas ao estágio de produção vitícola e na qualificação de recursos humanos no

estágio de vinificação.

Entretanto, as limitações relativas ao papel da infra-estrutura educacional e tecnológica no

processo de capacitação dos arranjos não se deve à inexistência de organizações voltadas para

qualificação e desenvolvimento tecnológico, mas à ausência de canais estáveis e eficientes de

comunicação entre tais organizações e as empresas locais.

A análise sobre a origem das principais fontes de informação e conhecimento utilizadas para

a adoção de inovações também revela que todos os arranjos contam com fluxos sistemáticos de

informações e conhecimentos ligados a fontes externas (cuja origem encontra-se fora do escopo

territorial do arranjo). Assim, no caso do arranjo fumageiro, esses fluxos de origem externa estão

associados especialmente ao esforço de P&D das matrizes dos grandes conglomerados de tabaco,

fornecedores de equipamentos e às especificações de clientes internacionais. No arranjo coureiro-

calçadista, destaca-se a importância de especificações técnicas e design fornecidos por compradores

internacionais na produção voltada para o mercado externo. Da mesma forma, no arranjo moveleiro

importantes inovações incorporadas pelos grandes fabricantes de móveis na região em termos de

design e aquisição de novos equipamentos se originam a partir de fontes externas ao arranjo, seja

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através da participação em feiras internacionais ou através do acompanhamento das tendências

estabelecidas por concorrentes internacionais. Finalmente, no arranjo vitivinícola as principais

fontes externas de informação e conhecimento estão relacionadas à participação em feiras e

concursos internacionais, consultorias especializadas de enólogos de países como França e Chile,

intercâmbios com escolas de enologia no exterior ou à importação de mudas de vitiviníferas.

O papel limitado da infra-estrutura educacional e tecnológica e a importância associada a

fontes externas de informação e conhecimento representam, portanto, pontos em comum na

organização dos sistemas de conhecimento nos diferentes arranjos. Entretanto, os canais de

comunicação que sustentam os fluxos de informação e conhecimento oriundos de fontes externas

aos arranjos, bem como o papel de atores locais no processo de aquisição e difusão de inovações,

demonstram diferenças significativas nas estratégias inovativas adotadas nos arranjos.

No arranjo fumageiro, inovações são incorporadas através de processos passivos de

aprendizado que envolve um reduzido nível de interação e cooperação e um circuito restrito de

atores ligados à geração de novos conhecimentos em âmbito local. Da mesma forma, no arranjo

coureiro-calçadista uma parte considerável das alterações técnicas e de design nos calçados

destinados à exportação envolve estratégias passivas de aprendizado, já que as especificações são

fornecidas pelos clientes internacionais. Adicionalmente, apesar do arranjo contar com um núcleo

de empresas calçadistas que apresenta uma considerável dinâmica inovativa baseada em

capacitações próprias, verifica-se que a ausência de vínculos efetivos de cooperação no arranjo

dificulta a difusão eficiente de inovações para as demais empresas e, em particular, para o segmento

de PMEs.

Em contraposição, as estratégias inovativas presentes nos arranjos moveleiro e vitivinícola,

demonstram a importância de atores locais na organização dos sistemas de conhecimento do

arranjo. No caso do arranjo moveleiro, as grandes empresas locais desempenham um papel

fundamental tanto na geração de novos conhecimentos a partir de capacitações próprias, como na

difusão de inovações entre os demais fabricantes de móveis no arranjo. Ao papel desempenhado

pelas empresas na difusão de inovações no arranjo, somam-se as ações conjuntas coordenadas

através do núcleo de associações locais. Neste aspecto, tanto as grandes e médias empresas como as

associações de classe implementam ações deliberadas que visam tanto ampliar a capacidade de

geração e difusão de novos conhecimentos a partir de fontes locais, como adquirir novos

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conhecimentos a partir de fontes externas ao arranjo. Da mesma forma, no arranjo vitivinícola, a

incorporação de inovações na produção vitícola e no processo de vinificação também reflete um

esforço deliberado que envolve diferentes segmentos de atores locais.

Dessa forma, em ambos os arranjos, a existência de estratégias inovativas ativas reflete tanto

a geração de novos conhecimentos a partir de fontes locais como uma elevada capacidade de

articulação com fontes externas de informação e conhecimentos. Por um lado, no arranjo

vitivinícola, a participação de vinícolas locais em feiras e concursos internacionais representa uma

forma importante de incorporação de conhecimentos que envolve formas ativas de aprendizado

interativo. Por outro lado, no caso do arranjo moveleiro, a articulação com fontes externas de

conhecimento envolve em geral formas passivas de aprendizado, na medida em que se limitam a

cópia de projetos e desenhos de concorrentes internacionais ou a aquisição de equipamentos de

fornecedores internacionais.

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Capítulo 6 – Conclusão

Esta tese teve como principal objetivo contribuir para o estudo sobre a dimensão localizada e

interativa do processo de capacitação produtiva e inovativa em aglomerações nos países em

desenvolvimento. A análise esteve fundada no conceito de arranjo ou sistema produtivo local que

refere-se genericamente aos diversos tipos de aglomerações produtivas que apresentam fortes

vínculos envolvendo empresas e demais atores institucionais localizados num mesmo território.

Da mesma forma, esta análise envolveu a proposição de um referencial capaz de explorar as

características e funcionalidade de diferentes formatos de arranjos produtivos a partir de três

dimensões complementares. A primeira, centrada nas principais características da estrutura

produtiva e padrões de territorialização dos arranjos. A segunda, relativa às estruturas de

governança e desenhos institucionais que moldam as relações entre diferentes segmentos de atores

locais e afetam tanto a organização da estrutura produtiva como os processo de aprendizado

inovativo em âmbito local. A terceira dimensão, relacionada com a forma de organização dos

sistemas de conhecimento, mecanismos de aprendizado e estratégias inovativas adotadas. Esta

conclusão retoma a discussão sobre o impacto destas dimensões-chave sobre a dinâmica

competitiva e inovativa das aglomerações estudadas a fim de analisar alguns dos desdobramentos

possíveis em termos da proposição de políticas industriais e tecnológicas para empresas articuladas

em arranjos e sistemas produtivos.

Com base nos argumentos utilizados nas diferentes abordagens teóricas, a seleção de

critérios para elaboração do referencial procurou estruturar-se em torno de dois eixos principais de

análise: i) a dimensão localizada e interativa do processo de inovação e; ii) as especificidades que

assume este processo no contexto de aglomerações nos países em desenvolvimento.

Assim, partindo da questão referente à dimensão localizada e interativa do processo

inovativo, alguns aspectos merecem destaque. Em primeiro lugar, o conceito de arranjo produtivo

local, na medida em que se baseia numa concepção ampla de sistema de inovação, permite destacar

a importância da proximidade e da interação entre empresas e demais atores institucionais em

âmbito local, no sentido de potencializar a criação, difusão e uso de novos conhecimentos, em

especial do tipo tácito. Em segundo lugar, os processos de aprendizado que emergem a partir de tais

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interações são sustentados por arcabouços institucionais específicos que contribuem para

estabelecer um plano comum para regras cognitivas e padrões de comportamento. Neste sentido, a

existência de capacitações localizadas reflete o conhecimento incorporado nas bases de

conhecimento das empresas e na própria estrutura institucional presente nos arranjos produtivos

locais. Em terceiro lugar, diante de um quadro que coloca o processo de aprendizado inovativo

como principal fonte de vantagem competitiva, a própria questão da competitividade dos arranjos

estudados, passa ser compreendida a partir de um referencial sistêmico que contempla não somente

a firma individual, mas também as interações entre conjuntos articulados de empresas e demais

atores institucionais que integram tais aglomerações.

Com relação às especificidades que assumem os processos de aprendizado nos países em

desenvolvimento, duas questões principais devem ser destacadas. A primeira refere-se às limitações

enfrentadas pela maior parte dos enfoques conceituais analisados, no sentido de lidar com aspectos

ligados à instabilidade institucional e macroeconômica características dos países em

desenvolvimento. Neste caso, a análise desenvolvida ao longo da tese teve como pano de fundo o

impacto do processo de reformas estruturais no Brasil, no decorrer da década de 90, sobre as

estratégias inovativas e competitivas do conjunto de arranjos analisados. Uma segunda questão, de

cunho ainda mais geral, refere-se à crescente dificuldade enfrentada pelos países em

desenvolvimento no sentido de ampliar seu nível de capacitação frente aos demais, tendo em vista

as deficiências no desenvolvimento de processos de aprendizado formais e informais. Assim, mais

importante do que a exclusão digital (digital divide) que corresponde ao hiato entre países em

termos da infra-estrutura física de informação e comunicação, verifica-se um hiato crescente entre

países relacionado à capacidade de aprendizado que os habilita na busca de novos conhecimentos.

A comparação entre os estudos de caso logrou evidenciar pontos importantes relativos à

influência do ambiente local na dinâmica competitiva e inovativa de arranjos produtivos. Em

particular, as evidências empíricas sugerem que a importância do ambiente local para o

desenvolvimento de processos interativos de aprendizado sofre elevada influência de aspectos

relacionados aos canais de comercialização, grau de territorialização das atividades produtivas e

estruturas de governança e desenhos institucionais presentes nos diferentes formatos de arranjos.

Um ponto central da análise reside, precisamente, no impacto das estruturas de governança e

desenhos institucionais sobre as formas de organização das atividades produtivas e inovativas nos

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arranjos. As evidências dos quatro estudos de caso ilustram as assimetrias que resultam da interação

entre instâncias locais e globais de coordenação a partir de dois pólos.

Num primeiro pólo, encontram-se os arranjos fumageiro e coureiro-calçadista onde as

estruturas de governança são hierárquicas, as relações de poder são assimétricas ao longo da cadeia

produtiva e os principais estágios da cadeia de valor das quais os arranjos participam são

controladas por atores externos. Essas assimetrias nas relações entre atores locais e instâncias

externas de coordenação se manifestam tanto através do controle direto do arranjo por subsidiárias

de empresas transnacionais (como é caso do arranjo fumageiro), como pela inserção das empresas

com sede local em cadeias globais de produção (como no caso do arranjo coureiro-calçadista). Em

ambos os casos, o mercado externo consiste no principal canal de comercialização.

As evidências sobre a natureza dos mecanismos de aprendizado e estratégias inovativas

presentes neste grupo de arranjos, demonstra o papel restrito ou virtualmente inexistente dos

desenhos institucionais e organizacionais no sentido de apoiar o desenvolvimento de processos

interativos de aprendizado voltados para a inovação em âmbito local. Além disso, verifica-se a

elevada importância que assumem fontes externas de informação e conhecimento na incorporação

de inovações em produtos e processos.

Geralmente, tais inovações são incorporadas pelas empresas nos arranjos através de

estratégias passivas de aprendizado que envolvem circuitos restritos e apresentam reduzida

participação de atores locais. Assim, no arranjo coureiro-calçadista uma parte considerável das

alterações técnicas e de design nos calçados destinados à exportação são estabelecidas por

compradores internacionais. No arranjo fumageiro, este papel de organização dos sistemas locais de

conhecimento é desempenhado pelas subsidiárias de empresas transnacionais que operam no

arranjo.

Situados num pólo oposto, estão os arranjos de móveis e vinho onde as estruturas de

governança apresentam formato de redes, existe um grau maior de simetria nas relações de poder ao

longo da cadeia produtiva e os principais estágios da cadeia de valor encontram-se integrados e/ou

são controlados no âmbito do arranjo por atores locais. Neste caso, as evidências apontam duas

formas distintas de governança local. No arranjo vitivinícola, por exemplo, a coordenação do

sistema de produção e do sistema de conhecimento envolve uma rede composta por diferentes

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segmentos de atores locais, com formas de liderança difusas. Já no arranjo moveleiro, as grandes

empresas com sede local desempenham papel de principal instância de coordenação através da

organização de redes de subcontratação e da promoção de spillovers tecnológicos. Ainda que

apresentem forte inserção em mercados regionais e no mercado nacional, estes arranjos contam com

canais diversificados de comercialização no mercado externo.

A análise deste grupo de arranjos demonstra o elevado escopo de ação local nas atividades

relacionadas à incorporação de inovações em produtos e processos. Esses processos inovativos

envolvem estratégias ativas de aprendizado baseadas no uso de fontes locais e externas de

informação e conhecimento. Da mesma forma, em ambos arranjos, os desenhos institucionais

desempenham um papel importante no sentido de promover esquemas de cooperação e processos de

aprendizado interativo envolvendo diferentes segmentos de atores locais.

O quadro abaixo ilustra essa relação entre canais de comercialização e estratégias de

capacitação, tendo em vista a dicotomia existente entre a busca de nichos próprios de

comercialização vis-a-vis a inserção em cadeias globais. Tal dicotomia reflete respectivamente, o

tipo de estratégia predominante no arranjo moveleiro e coureiro-calçadista.

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QUADRO 6.1 – Canais de comercialização e estratégias de capacitação: Inserção em cadeias globais x atuação em nichos próprios

Inserção em cadeias globais (arranjo calçadista)

Venda direta (nichos próprios)

Arranjo moveleiro Principal instância de

capacitação Capacidade de manufatura

(eficiência produtiva) Eficiência produtiva com

dinâmica inovativa

Fator de competitividade Baixos custos de produção Qualidade e diferenciação em design

Estratégia de aprendizado

tecnológico Passiva e limitada à esfera da

produção Ativa e associada às esferas de

design e marketing

Formas de coordenação da cadeia produtiva

Geralmente assimétricas e baseadas no poder de barganha

dos importadores

Geralmente simétricas e com maior espaço para ação de

atores em nível local

Desenhos, amostras ou projetos pré-definidos pelos

importadores

Desenvolvimento próprio de desenhos e projetos

Por um lado, a análise das estratégias de capacitação produtiva e inovativa presentes nos

arranjos com elevado grau de articulação com instâncias globais de coordenação corrobora, em

grande parte, os argumentos oriundos da literatura sobre clusters industriais nos países em

desenvolvimento que enfatizam as limitações da integração de produtores locais às cadeias globais

de produção. Estas limitações ficam particularmente evidentes no caso do arranjo coureiro-

calçadista onde os principais exportadores de calçados enfrentam dificuldades na busca de

capacitações que transcendam a esfera da produção, como as atividades relacionadas ao design de

calçados ou a busca de nichos próprios de comercialização.

Por outro lado, apesar de pouco considerada na literatura sobre aglomerações industriais nos

países em desenvolvimento, a análise de arranjos produtivos onde predominam estruturas de

governança locais revela o elevado dinamismo nas estratégias de capacitação produtiva e inovativa

de atores locais. Tais estratégias envolvem tanto a geração de novos conhecimentos a partir de

fontes locais, como uma elevada capacidade de articulação com fontes externas de informação e

conhecimentos.

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Ainda que transcenda o escopo de análise desta tese, considera-se que a diversidade relativa

aos formatos, estruturas de governança e estratégias inovativas nos arranjos estudados apresenta

desdobramentos importantes do ponto de vista normativo.

Em primeiro lugar, percebe-se que o escopo para a adoção de políticas industriais e

tecnológicas direcionadas para estimular o processo de capacitação produtiva e inovativa de atores

locais, tende a variar consideravelmente de acordo com as características estruturais e tipo de

governança dos arranjos.

No caso dos arranjos que apresentam alguma forma de inserção em cadeias globais, sejam

estas controladas por compradores ou por produtores, a própria literatura sobre aglomerações

industriais nos países em desenvolvimento reconhece o escopo reduzido para adoção de políticas

públicas destinadas a ampliar a inserção competitiva de produtores locais. Conforme destacado

anteriormente, o processo de upgrading de aglomerações produtivas articuladas com cadeias globais

pode ocorrer através de três possibilidades: a) na busca de maior eficiência no desempenho de suas

atividades produtivas tradicionais (upgrading de processo); b) na busca de novos nichos de

produção (upgrading de produto); e c) no desempenho de atividades em estágios superiores da

cadeia produtiva, como design e marketing (upgrading funcional). Porém, este reposicionamento de

aglomerações em cadeias produtivas globais geralmente encontra limites que são dados pela

sobreposição com competências que são dominadas pelos atores que controlam essas cadeias.

Tendo em vista estes limites, na ausência de esforços deliberados de cooperação entre atores locais,

a adoção de políticas industriais e tecnológicas para arranjos articulados com cadeias globais acaba

por se restringir ao fortalecimento de instituições de apoio e à modernização da infra-estrutura

produtiva local.

Entretanto, a análise da experiência de arranjos articulados com instâncias locais de

coordenação revela que o dinamismo competitivo e inovativo de aglomerações produtivas nos

países em desenvolvimento não se encontra, necessariamente, vinculado à inserção no mercado

externo através de cadeias globais. Neste aspecto, a existência de estruturas de governança local em

arranjos produtivos possibilita a adoção de um amplo leque de políticas de apoio à capacitação

produtiva e inovativa de atores locais. Assim, além das políticas tradicionais voltadas ao

adensamento da cadeia-produtiva local e ao fortalecimento de instituições locais de apoio, existe um

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espaço potencial para adoção de políticas que visem o fortalecimento dos vínculos de cooperação

entre atores locais, particularmente daqueles que envolvem processos de aprendizado interativo.

A experiência dos arranjos moveleiro e vitivinícola demonstra a importância relacionada à

formação de redes locais e regionais envolvendo atores que integram as estruturas de governança

local, pública e privada, no desenvolvimento de capacitações locais. Tais redes podem estar

associadas, por exemplo, à criação de consórcios de compra e exportação e à realização pesquisa de

novos nichos de mercado, entre outras iniciativas. Num plano geral, destaca-se o papel das políticas

industriais e tecnológicas em diferentes âmbitos no sentido de criar condições favoráveis no

ambiente inovativo, local ou regional, de modo a consolidar competências tecnológicas.

Finalmente, cabe observar que as limitações enfrentadas por arranjos articulados com

instância globais de coordenação demonstram limites para inserção dos países em desenvolvimento

na divisão internacional do trabalho que, em última análise, têm sido identificados e discutidos pela

literatura cepalina desde a década de 50.

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VARGAS, M.A, SANTOS FILHO, N.; ALIEVI, R. (1999b) Análise da dinâmica inovativa em arranjos produtivos Locais no RS: complexo agro- industrial fumageiro. GEI/NT 30/99, IE/UFRJ, projeto Arranjos e Sistemas Produtivos Locais e as Novas Políticas de Desenvolvimento Industrial e Tecnológico, Rio de Janeiro, (disponível em http://www.ie.ufrj.br/rede)

VARGAS, M.A. et al.(1994) Diagnóstico Industrial de Santa Cruz do Sul, Relatório de pesquisa, mimeo, Universidade de Santa Cruz do Sul, UNISC, Santa Cruz do Sul

VILLASHI, A. F (1993) The Brazilian national system of innovation: opportunities and constrains for transforming technological dependency. Tese de Doutorado, Universidade de Londres, Londres.

VILLASCHI, A. e CAMPOS, R. (2001) From local to national systems of innovation: empirical evidences from the Brazilian case. In: DRUID International Conference, Aalborg University, Aalborg, Dinamarca

VIOTTI, E. B. (1997) Passive and active national learning systems. Tese de Doutorado, New School, Nova York.

VOGT. O. (1994) A produção de fumo em Santa Cruz do Sul-RS (1849-1993).Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Paraná, Curitiba.

YOGUEL, G. (1998). Desarrollo del proceso de aprendizaje de las firmas: los espacios localies y las tramas productivas. In: Seminário Globa lização e Inovação Localizada, Magaratiba - RJ, dez.

WADE, R. (1996) Globalization and its limits: Reports on the death of the national economy are greatly exaggerated. In: BERGER, S.; DORE, R. (eds) National diversity and Global Capitalism. Ithaca, London: Cornell University Press, p.60-88.

WILLIAMSON, O. E. (1975) Markets and Hierarchies, New York: Free Press.

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ANEXOS

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Anexo A

QUADRO 1 - Organização dos sistemas de produção, formas de governança e estratégias

inovativas: principais evidências dos arranjos estudados

Arranjo Fumageiro Coureiro-

calçadista Vitivinícola Moveleiro

Densidade da estrutura produtiva local

Baixa Alta Média Baixa mas crescente

Principais canais de comercialização

Mercado externos

Mercado externo

Mercado regional e nacional

Mercado nacional e

externo Grau de territorialização do arranjo

Médio: baseada em

externalidades estáticas

Elevado: baseado tanto

em externalidades estáticas como

em capacitações locais

Elevado: Baseado tanto

em externalidades estáticas como

em capacitações locais

Médio:

Estruturas de governança Hierárquicas Hierárquicas Em redes Em redes Papel da infra-estrutura educacional e tecnológica local

Inexistente ou pouco relevante

Limitado: condicionado pela demanda

local

Ativo: especialmente no estágio agrícola

Limitado: condicionado pela demanda

local Papel das associações de classe, sindicatos e outras organizações de relações inter-empresariais

Limitado a reforçar relações de subordinação entre produtores locais e EMNs

Limitado: conflitos de interesses

restringem a promoção de

ações conjuntas

Importante na organização de ações conjuntas para abertura de novos nichos de

mercado

Importante nas ações conjuntas

para adensamento da cadeia produtiva local e abertura de novos nichos

de mercado Fontes de informação e conhecimento

Predomínio de fontes externas

Predomínio de fontes externas

Uso extensivo de fontes locais e

externas

Uso extensivo de fontes locais e

externas Estratégia inovativa Passiva:

condicionada pelos grandes

conglomerados transnacionais de

fumo

Passiva: subordinada à interação com compradores internacionais

Ativa: com elevada

participação de atores locais

Ativa: coordenada pelas empresas líderes

e associações locais

Fonte: Vargas (2002).

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Anexo B

Metodologia da pesquisa

Aspectos Gerais

O processo de coleta dos dados que serviram de base para realização dos estudos empíricos envolveu além da

aplicação de questionários e entrevistas com diferentes segmentos de atores que integram os arranjos locais estudados, a

utilização de uma ampla gama de informações oriundas de fontes secundárias.

O questionário utilizado (anexo C) incluiu, além de perguntas relacionadas às características

gerais das empresas (como número de funcionários, propriedade do capital, faturamento, principais

mercados, etc.); questões referentes à natureza e intensidade dos vínculos entre os atores do arranjo,

as principais fontes de informação para a inovação e sua origem, e o impacto decorrente do

processo de reformas estruturais sobre as trajetórias de aprendizado das empresas, entre outras. A

relevância destes e outros fatores em cada um dos arranjos foi avaliada a partir da utilização de uma

escala ordinal de importância. Além da aplicação de questionários e da realização de entrevistas

junto às empresas no segmento produtivo principal dos arranjos, foram utilizados roteiros de

questões endereçadas, respectivamente, às principais associações de classe/sindicatos e centros de

pesquisa/universidades que integram os arranjos.

Relação da amostra de empresas pesquisadas nos arranjos

1. Arranjo Fumageiro

A pesquisa de campo no arranjo fumageiro foi realizada entre os meses de outubro de 1997 e

julho de 1998, envolveu a realização de entrevistas e a aplicação de questionários junto a uma

amostra selecionada de empresas, associações de classe e institutos de pesquisa vinculados ao

arranjo produtivo. De um universo de 16 empresas que atuam diretamente na produção e

beneficiamento de fumo na região do Vale do Rio Pardo, a pesquisa de campo abarcou uma amostra

de 10 segmentada por extratos de acordo com tamanho e propriedade do capital. Do conjunto de

empresas contempladas na amostra, seis constituem braços de grandes conglomerados

transnacionais e respondem por quase 90% de todo o mercado de fumo beneficiado na região sul.

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As quatro restantes correspondem ao segmento de micro e pequenas empresas (até 99 empregados)

de capital nacional e que atuam apenas na produção de fumo em folha fornecendo a quase totalidade

da sua produção para as grandes usinas que operam com a exportação do fumo beneficiado. Este

tipo de segmentação da amostra possibilitou que fossem ressaltadas importantes diferenças no que

se refere ao formato, estruturas de competências, formas de interação e características dos mercados

onde cada segmento atua.

TABELA 1- Perfil da amostra de empresas analisadas no arranjo fumageiro

No. empregados Produtores integrados

Capacidade de processamento

Empresa

Ano de Fundação

Origem do capital

Principal produto

Efetivos Sazonais

E

mpresa

A

1973 Americano Cigarros 4.600 não se aplica 42 bilhões

Empresa B 1903 Anglo-americano

Fumo beneficiado 1.916 1.800 55.000 220 mil ton.

Empresa C 1993 Americano Fumo beneficiado 850 4.200 35.000 91,15 mil ton Empresa D 1996 Americano Fumo beneficiado 680 3.500 6.825 124 mil ton Empresa E 1974 Americano (3) Fumo beneficiado 216 1.100 7.800 25 mil ton Empresa F 1994 Americano Fumo beneficiado 185 1.430 33.500 30 mil ton Empresa G 1953 Nacional Fumo beneficiado 96 - - 25.3 mil ton Empresa H 1987 Nacional Fumo in natura 32 10 920 1.300 ton Empresa I 1967 Nacional Fumo in natura 18 10 700 3.000 ton Empresa J 1995 Nacional Fumo in natura 16 - 900 2.400 ton TOTAL: 8.609 12.200 144.609 522015 ton

Fonte: pesquisa de campo 2. Arranjo Coureiro-calçadista

A pesquisa de campo no arranjo coureiro-calçadista foi realizada entre Junho e Julho de

2000. Inicialmente, foram aplicados questionários junto aos diferentes segmentos de empresas que

integram a cadeia produtiva coureiro-calçadista em nível local e junto às diversas organizações que

integram o arcabouço institucional do arranjo tais como sindicatos, associações de classe,

universidades, instituições de pesquisa, etc. Além disso, também foram utilizadas diversas outras

fontes de informações tais como jornais, diretórios e relatórios setoriais e demais publicações

especializadas.

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A amostra de empresas foi selecionada a partir de listagens obtidas junto a Associação

Comercial e Industrial de Novo Hamburgo (ACI-NH) e a Associação Brasileira de Empresas

Produtoras de Calçados (ABICALÇADOS). Ao todo, a amostra abarcou um conjunto de 14

empresas calçadistas (segmentadas por porte de acordo com o número de funcionários), 4 curtumes,

2 empresas fabricantes de equipamentos, 1 fornecedores de componentes e dois agentes de

exportação. A aplicação dos questionários foi seguida pela realização de entrevistas com dirigentes

e/ou técnicos das empresas com vistas a incrementar a qualidade das informações coletadas através

dos questionários. A realização de entrevistas abrangeu também algumas das principais associações

de classe e centros de pesquisa vinculados ao arranjo na região tais como Assintecal, Abicalçados,

CTCCA, entre outras.

TABELA 2 - Perfil da amostra de empresas analisadas no arranjo coureiro-calçadista

Porte da empres a

Ano de Fundação

Localização Principal produto Nº Empregados Capacidade Instalada

Grande 1962 Dois Irmãos Calçados femininos 2.400 462.500 pares/mês Grande 1962 Rolante Calçados femininos 1.123 200.000 pares/mês Grande 1989 Sapiranga Calçados femininos 1.195 11.500 Grande 1976 Nova Petrópolis Calçados femininos 602 - Grande 1948 Dois Irmãos Calçados femininos 542 52.800 Grande 1968 Sapiranga Calçados femininos 540 90.000 pares/mês Grande 1965 Teutônia Calçados 1.100 180.000 pares/mês Média - Novo Hamburgo Calçados femininos 270 40.000 pares/mês Média 1987 Ivoti Calçados masculinos 210 2.500 - 1949 Parobé Calçados infantis - 5 milhões/pares Média 1969 Três Coroas Calçados 223 - Pequena 1997 Novo Hamburgo Calçados 15 7.500 pares/mês Pequena 1991 Igrejinha Calçados 10 7.400 pares/mês Pequena 1993 Dois Irmãos Calçados 95 -

Fonte: Pesquisa de Campo Obs: “-“ indica que a informação não foi fornecida pela empresa 3. Arranjo vitivinícola

No arranjo vitivinícola, foram selecionadas 18 empresas de um universo de cerca de 400

estabelecimentos entre vinícolas industriais, cantinas rurais e cooperativas, concentradas

geograficamente na região da Serra Gaúcha em torno de municípios como Bento Gonçalves, Caxias

do Sul e Garibaldi. A amostra foi extratificada de acordo com a capacidade de processamento das

empresas. Assim, das 18 empresas analisadas, sete pertencem ao extrato de menor tamanho relativo

e apresentam capacidade de processamento inferior a três milhões de litros, cinco empresas

apresentam uma capacidade de produção entre três e seis milhões de litros e as seis empresas de

maior porte apresentam uma capacidade de produção superior a seis milhões de litros. Todas as

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vinícolas analisadas são de propriedade de capital nacional e a grande maioria da amostra (16

empresas) e constituída por empresas familiares de pequeno porte, com menos de 50 empregados.

Com relação à representatividade da amostra, é importante ressaltar que apesar de constituírem

menos de 5% do universo do arranjo em termos do número de estabelecimentos, essas empresas

representavam, em 1997, cerca de um terço da produção brasileira de vinhos e derivados96.

TABELA 3 - Perfil da amostra de empresas analisadas no arranjo vitivinícola

Empresa Fundação Origem

do capital Principal produto Empregados Engenheiros

/técnicos Capacidade de produção (lt)

Faturamento (R$ milhões)

Empresa D* 1931 Nacional Vinho fino 336 24 36.000.000 58.706.510,00 Empresa O* 1953 Nacional Bebidas alcólicas 22 2 n.i 7.475.994,00 Empresa E 1965 Nacional Vinho comum 50 4 6.523.000 6.961.896,00 Empresa M* 1960 Nacional Vinhos comuns 55 3 7.330.000 4.938.000,00 Empresa N* - Nacional Bebidas alcólicas 26 1 n.i 4.655.859,19 Empresa F - Nacional Vinho comum 17 4 7.688.300 4.019.722,63 Empresa H 1951 Nacional Vinagres e sidras 31 4 n.i 2.520.000,00 Empresa B 1987 Nacional Vinho fino 24 1 n.i 2.504.393,00 Empresa L* 1964 Nacional Vinhos comuns 12 1 3.950.000 2.477.000,00 Empresa A 1973 Nacional Vinho fino 29 8 3.700.000 2.200.000,00 Empresa C 1974 Nacional Vinho comum 9 4 4.225.000 1.891.959,50 Empresa P* 1966 Nacional Vinhos comuns 02 1 2.300.000 1.000.000,00 Empresa J 1974 Nacional Vinhos finos 9 8 105.000 790.327,28 Empresa I 1983 Nacional Vinhos finos 41 02 350.000 650.000,00 Empresa Q* 1988 Nacional Vinhos comuns 11 - 628.968 400.000,00 Empresa R* 1968 Nacional Vinhos comuns 04 1 802.500 322.806,00 Empresa S* 1963 Nacional Vinhos comuns 03 3 310.000 90.000,00 Empresa G 1959 Nacional Vinho fino 6 13 150.000

Fonte: pesquisa de campo

96 Considerando-se o volume total da producao brasileira de vinhos e derivados de 267 milhoes de litros, em 1997, e a capacidade de producao das empresas da amostra que totalizava 73.892 mil litros no mesmo período.

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4. Arranjo Moveleiro

Na amostra de 19 empresas analisadas no arranjo moveleiro, quatro correspondem a empresas de grande porte

que possuem entre 500 e 800 empregados. Estas empresas atuam, principalmente, na produção de móveis de cozinha,

móveis de aço e móveis em geral. Sete delas correspondem a empresas de médio porte que empregam, em média, entre

100 a 499 empregados e atuam principalmente na produção de móveis para cozinha, estofados e estantes. As oito

empresas restantes pertencem ao segmento de micro e pequenas do arranjo que atuam em ramos diversos como móveis

para escritório, estofados, móveis para cozinhas, móveis escolares, cadeiras, estantes e móveis em geral. Além disso,

cabe ressaltar que todas as empresas da amostra são formadas por capital nacional e, de uma maneira geral,

desenvolvem suas atividades no arranjo desde a década de 50. Das 19 empresas, apenas 01 foi criada na década de 30.

A maioria delas, 06, foram instaladas na década de 60. Pode-se observar, que 13 empresas iniciaram suas atividades

entre a década de 30 e 70.

TABELA 4 - Perfil da amostra de empresas analisadas no arranjo moveleiro

Porte da empresa

Ano de Fundação

Localização Principal Produto Nº Empregados Capacidade Instalada

Grande 1953 Flores da Cunha Cozinha 793 n.r Grande 1961 Bento Gonçalves Móveis em geral 525 24.411,20 m² Grande 1950 Flores da Cunha Móveis em geral 520 1.000 m³ móv. mês Grande 1969 Bento Gonçalves Móveis de aço 516 2500 ton. móv. mad. Média 1939 Bento Gonçalves Cozinhas 300 125.000 móv./mês Média 1963 Bento Gonçalves Móveis em geral 246 n.r Média 1960 Gramado Móveis Country 200 6000 m² Média 1964 Bento Gonçalves Cozinhas 197 3.500 volume/dia Média 1976 Bento Gonçalves Cozinhas 169 15.000 m² Média 1980 Antônio Prado Móveis em geral 119 n.r Média 1978 São Marcos Estantes 115 32.099 m²

Pequena 1979 Flores da Cunha Móveis em geral 55 1.200 m²/ mês Pequena 1990 Bento Gonçalves Estofados, estantes e

cozinha 50 20.000 peças/mês

Pequena 1985 Bento Gonçalves Roupeiros 45 10.000 peças/mês Pequena 1988 Bento Go nçalves Cadeiras e estofados 36 1670 unid./mês Pequena 1975 Antônio Prado Estantes 32 2.500 m² Pequena 1961 Garibaldi Móveis de escritório 30 n.r Pequena - Caxias do Sul Estofados 22 2.000 m² Pequena 1995 Bento Gonçalves Móveis escolares 20 2.000 m²

Total 3.990 Fonte: Pesquisa de Campo

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Anexo C Modelo geral de questionário usado na pesquisa de campo

Este anexo apresenta um modelo do questionário aplicado junto as empresas nos arranjos.

Este modelo geral de questionário serviu como referência para coleta de informações, tanto nas

empresas que constituem o núcleo produtivo do arranjo local, como nos seus fornecedores

especializados.

QUESTIONÁRIO PARA EMPRESAS DO ARRANJO LOCAL:__________________________________ DATA: QUESTIONÁRIO N0:

I) Identificação Razão Social Sigla

CGC Data Constituição N.Reg.Junta Comercial Foro da Empresa Endereço (Rua, Av. Praça, etc) Complemento

Bairro Município UF CEP Caixa Postal

Telefones FAX URL Natureza Jurídica (Receita Federal) Atividade Econômica Predominante (IBGE)

CONTATO 1. Nome Cargo Departamento Função

Telefones FAX E-mail

Dirigente da Empresa Cargo Representantes Legais Cargo CIC

FILIAIS Endereço (Rua, Av. Praça, etc) Nº Complemento

Bairro Município UF CEP Caixa Postal

Telefones FAX URL

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ORIGEM DO CAPITAL SOCIAL: ( )% Nacional ( )% Externo II) Características dos Produtos e Processos produtivos: 1. Plantas industriais denominação capacidade instalada N. empregados principal produto ano localização 1 2 3 4 2. Evolução da capacidade de produção da empresa ano capacidade instalada n.de empregados forma de ampliação (1) 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 (1) a -novo equipamento b- reforma de equipamento c - nova planta d- aquisição de planta ja existente 3. Evolução do volume de produção e do faturamento bruto ano volume de produção Faturamento % impostos s/ Faturamento 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 4. Grau de verticalização do processo produtivo da empresa % produção: INT = integrada; SUB = subcontratada Localização do subcontratado: LOC = local; NAC = nacional; EXT = exterior Etapas do processo % da produção Localização do terceirizado (%) INT SUB Total LOC NAC EXT Total Matéria-prima: 2 100 100 3 100 100 Processo produtivo: 1 100 100 3 100 100 Outros. Especificar

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5. Características das relações de sub-contratação Características Tipo de contrato ( ) informal ( ) escrito Prazo do contrato ( ) por tempo indeterminado ( ) por operação/lote produtos Exclusividade do subcontratado ( ) atende apenas a firma ( ) atende outras firmas Capacitação tecnológica do subcontratado

( ) igual ou superior à firma ( ) inferior à firma

Treinamento de pessoal pela firma ( ) realiza teinamento dos subcontrados

( ) não realiza

Cessão de equipamentos para o subcontratado

( ) há cessão ( ) não há cessão

6. Origem dos principais equipamentos utilizados no processo de produção: 1)da própria região onde a empresa está localizada; 2)de outros Estados do país; 3)do exterior. Equipamentos Origem * 1-( )% 2-( )% 3-( )% 1-( )% 2-( )% 3-( )% 1-( )% 2-( )% 3-( )% 1-( )% 2-( )% 3-( )% 7. Origem dos principais insumos/matérias-primas utilizados no processo de produção: 1)da própria região onde a empresa está localizada; 2)de outros Estados do país; 3)do exterior. Matérias-primas/ Insumos Origem * 1-( )% 2-( )% 3-( )% 1-( )% 2-( )% 3-( )% 1-( )% 2-( )% 3-( )% 1-( )% 2-( )% 3-( )% 1-( )% 2-( )% 3-( )% 1-( )% 2-( )% 3-( )% 8. Para as matérias-primas/insumos cuja principal origem é o local do aranjo, identifique as vantagens da empresa neste procedimento: 1- sem importância 2- pouco importante 3 - importante 4- muito importante

Vantagens 1 2 3 4 Rapidez na entrega Custos de transportes Assistência técnica oferecida Condições de financiamento Vantagens de preço Atributos de qualidade outras (especifique)

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9. Para os equipamentos cuja principal origem é o local do aranjo, identifique as vantagens da empresa neste procedimento: 1- sem importância 2- pouco importante 3 - importante 4- muito imp ortante

Vantagens 1 2 3 4 Garantia de prazo de entrega Informação sobre os equipamentos disponíveis Assistência técnica oferecida Condições de financiamento Vantagens de preço Atributos de qualidade outras (especifique) 10. Quais são as principais vantagens que podem ser associadas a localização da empresa na região? 1)sem importância; 2)pouco importante; 3)importante; 4),muito importante Externalidades Importância 1 2 3 4 Infra-estrutura disponível Disponibilidade de mão-de-obra Qualidade da mão-de -obra Custo da mão-de-obra Existência de programas governamentais Proximidade com universidades e centros de pesquisa Proximidade com os fornecedores de insumos Proximidade com os clientes/consumidores Outros; especificar: 11.Quais são as principais vantagens/desvantagens relacionadas ao perfil de qualificação da mão-de-obra existente na região? 1)sem importância; 2)pouco importante; 3)importante; 4),muito importante Vantagens/desvantagens Importância 1 2 3 4 escolaridade formal de 1o. e 2o. graus escolaridade em nível superior e técnico conhecimento prático e/ou técnico na produção disciplina iniciativa na resolução de problemas capacidade para aprender novas qualificações concentração outros, especificar: 12. Como a empresa avalia a provisão de infra-estrutura física e serviços públicos na região com relação aos seguintes fatores: 1)insuficiente; 2)satisfatória; 3)excepcional 1 2 3 área para instalação de empreendimentos industriais energia elétrica estradas telecomunicações outros:

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13. Identifique a perspectiva dos investimentos da empresa para os próximos cinco anos: a) forma de investimento sim/não aquisição de plantas já existentes implantação de nova fábrica modernização da planta já existentes outras : especificar b) objetivo do investimento melhoria na qualidade do produto para o mercado interno adequação às exigências do mercado internacional diversificação da produção ampliação da produção controle ambiental outros : especificar 14. Identifique por ordem de importância as principais fontes de financiamento: 1)sem importância; 2)pouco importante; 3)importante; 4),muito importante Fonte 1 2 3 4 recursos próprios bancos oficiais bancos privados recursos externos outros: especificar 15. Identifique os produtos (ou linhas de produto) com maior participação no faturamento Produto/linha de prod. % no faturamento principal característica que identifica o

produto/linha de produto 16. Identifique para os principais produtos/linhas de produtos: Característica Produto/linha de produto a b c d

Tecnologia de produção estável e difundida passando por grandes alterações

Situação da demanda començando a crescer cresce a uma taxa significativa está estabilizada

Estratégia da empresa Pioneira(fez o primeiro lançamento no mercado) seguiu seus concorrentes nacionais seguiu seus concorrentes internacionais

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17. Quais fatores são determinantes para manter a capacidade competitiva na principal linha de produto? 1)sem importância; 2)pouco importante; 3)importante; 4),muito importante 1 2 3 4 Qualidade da matéria -prima Qualidade da mão-de -obra Custo da mão-de-obra Nível tecnológico dos equipamentos Inovações de desenho e estilo nos produtos Novas estratégias d e comercialização Capacidade de atendimento (volume e prazo) Outros: especificar III - Introdução de Inovações e esforço de capacitação tecnológica 1.No decorrer da década de 90, quais foram as principais inovações adotadas pela emp resa em seus produtos e/ou processo produtivo: 1)sem importância; 2)pouco importante; 3)importante; 4),muito importante Inovações adotadas importância

Inovações de Produto 1 2 3 4 Alterações no desenho/estilo Alterações de características técnicas Novo produto

Inovações no processo produtivo 1 2 3 4 Incorporação de novos equipamentos na planta industrial

Nova configuração da planta industrial Construção de uma nova planta Introdução de novas técnicas organizacionais - Células de produção - Just-in-time externo - CAD/CAM - outras (especificar): Introdução de novas matérias-primas Outros (especificar): 2. Quais são as principais fontes de informação que a empresa utiliza para promover inovações de produto ou de processo? 1)sem importância; 2)pouco importante; 3)importante; 4),muito importante Fonte 1 2 3 4 Departamentos de P&D da empresa na região Departamentos de P&D da empresa situados em outras regiões Departamento de P&D da empresa localizada fora do país Consultorias especializadas contratadas localmente Consultorias especializadas localizadas fora da região Consultorias especializadas localizada no exterior Universidades e Centros Tecnológicos na região Universidades e Centros Tecnológicos de outras regiões Universidades e Centros Tecnológicos localizados no exterior Aquisição de novos equipamentos fornecidos localmente Aquisição de novos equipamentos de produtores nacionais

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Aquisição de novos equipamentos oriundos de fornecedores externos Clientes Publicações especializadas Troca de informações com empresas do setor na região Troca de informações com empresas do setor localizadas fora da região Troca de informações com empresas do setor localizadas no exterior Congressos e feiras comerciais e industriais do setor realizadas no país Congressos e feiras comerciais e industriais do setor realizadas no exterior Outros: especificar 3.Como se dá o desenvolvimento ou incorporação de novas tecnologias? 1)sem importância; 2)pouco importante; 3)importante; 4),muito importante Forma de incorporação de inovações tecnológicas 1 2 3 4 Aquisição de máquinas compradas no mercado nacional Aquisição de máquinas compradas no mercado internacional Em cooperação com fornecedores de equipamentos Nas unidades de produção da empresa Em laboratórios de P&D da empresa Em cooperação com outras empresas concorrentes Em cooperação com outras organizações (de ensino e pesquisa, entidades de apoio setoriais, etc.)

Via licenciamento Em cooperação com fornecedores de insumos Outros. especificar: 4. Indique os gastos atuais em P&D, sua evolução e perspectivas futuras. situação a) % do gasto em P&D em relação ao faturamento em 1999 b) variação do gasto em P&D em relação a 1990 - aumentou significativamente - houve um pequeno aumento - não aumentou c) Perspectivas para gastos em P&D nos próximos cinco anos - permanecer nos níveis atuais - ampliar moderadamente - ampliar significativamente 5. Indique o grau de qualificação da mão de obra:

Níveis de formação % de empregados primeiro grau incompleto primeiro grau completo segundo grau completo superior completo superior incompleto pós-graduados total 100 6. Indique o grau de qualificação e origem do pessoal técnico (lotados em laboratórios, departamento de P&D, equipes de desenvolvimento de produtos e processos, etc)

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Para o local da formação considere: (1) local (2) nacional (3) exterior

Níveis de formação local da formação número de empregados Técnicos de Nível Médio Nível superior pós-graduados total 7. Avalie a qualificação da mão de obra e indique as perspectivas para os próximos cinco anos e local de treinamento já utilizados avaliação e perspectivas sim/não a) a qualificação atual é: - adequada - parcialmente adequada b) pretende-se: sim/não - manter o nível de qualificação atual - intensificar a qualificação nos seguintes setores (especificar)

c) principais locais de treinamento indique os já utilizados em ordem crescente de importância

- na empresa - em instituições do local - em instituições nacionais - em instituições localizadas no exterior d) % de empregados atualmente frequentando cursos de treinamento

IV) Vendas 1. Quais são os principais canais de comercialização adotados pela empresa ? 1)sem importância; 2)pouco importante; 3)importante; 4),muito importante

Forma de comercialização importância 1 2 3 4 Sob encomenda Lojas Próprias Grandes Varejistas Escritórios de Exportação Outros (especificar):

2. Evolução do faturamento e destino das vendas ano Faturamento % mercado interno % exportações 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

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1999 3. Destino das exportações país % das exportações 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 Total 100 100 100 100 100 100 100 100 1001 100 V) Formas de cooperação e interação entre os atores do arranjo 1.Nos últimos cinco anos, como evoluíram as relações de cooperação da empresa com os demais atores do arranjo produtivo? 1) forte diminuição; 2)diminuição; 3)estável; 4)aumento; 5)forte aumento Empresas e instituições Locais Externos ao arranjo 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 Clientes Concorrentes Fornecedores de insumos Fornecedores de equipamentos Centros tecnológicos Universidades Sindicatos e Associações Órgãos públicos Outros (especificar): 2.Nos últimos cinco anos, como evoluíram as relações de cooperação com as demais empresas do segmento na região com relação às seguintes atividades? 1) forte diminuição; 2)diminuição; 3)estável; 4)aumento; 5)forte aumento Atividades cooperativas Tendência 1 2 3 4 5 Troca de informações Ensaios para desenvolvimento e melhoria de produtos Ações conjuntas para capacitação de RH Ações conjuntas de marketing Ações conjuntas em desenho e estilo Outras: especificar 3.Nos últimos cinco anos, como evoluíram as relações de cooperação com seus fornecedores em nível local em relação às seguintes atividades:

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1) forte diminuição; 2)diminuição; 3)estável; 4)aumento; 5)forte aumento Atividades cooperativas Tendência 1 2 3 4 5 Troca de informações Ensaios para desenvolvimento e melhoria de produtos Assistência Técnica no processo produtivo Ações conjuntas para capacitação de RH Ações conjuntas em desenho e estilo Outras (especificar) 4.Quais as formas de intercâmbio que a empresa costuma manter com Centros de Pesquisa, Universidades e instituições afins: Origem: a) local; b)no país; c)no exterior Freqüência: 1)inexistente; 2)rara; 3)anual; 4)mensal Forma de Interação Instituição (sigla) origem freqüência a b c 1 2 3 4 Desenvolvimento de novos produtos Desenvolvimento de novos processos Testes e Certificação Treinamento de Pessoal Aproveitamento de resíduos industriais Caracterização e seleção de matérias -primas Outros (especificar)

5.Caso a empresa não mantenha nenhuma forma de interação com universidades e centros de pesquisa, em nível local ou regional, quais os motivos? 1)sem importância; 2)pouco importante; 3)importante; 4),muito importante motivos importância as instituições locais não possuem a infra-estrutura e qualificação necessárias para atender as necessidades de P&D da e mpresa.

a empresa possui uma infra -estrutura própria voltada para as atividades de P&D.

a empresa conta com fornecimento externo de informações tecnológicas:

através da matriz e/ou outras unidades do mesmo grupo. através dos fornecedores de insumos e equipamentos através de outras consultorias tecnológicas no país através de outras consultorias tecnológicas fora do país 6. Quais as formas de interação que a empresa mantém com associações de classe, sindicatos e outros tipos de organizações de representação coletiva na região: Para importância: (1) sem importância; (2) pouco importante (3) importante; (4) muito importante

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Para freqüência: IN= inexistente; RA= rara; AN = anual; ME = mensal Forma de interação Importância Freqüência Associação 1 2 3 4 IN RA AN ME Realização de eventos/feiras Cursos e seminários Negociações coletivas Apoio na aquisição de insumos Contatos e troca de informações Outros: especificar VI) Políticas Públicas e Impacto das mudanças estruturais na década de 90 1. A empresa participa ou participou de algum tipo de programa específico para o segmento, promovido por diferentes âmbitos de governo? ( ) sim ( ) não Em caso afirmativo, especifique quais: _______________________________________________________ _______________________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________________ 2. Quais políticas governamentais poderiam contribuir para o aumento da eficiência competitiva das empresas do arranjo? Para importância: (1) sem importância; (2) pouco importante (3) importante; (4) muito importante Para âmbito de governo: L) local; E) estadual; F) federal Ações de Política importância âmbito 1 2 3 4 L E F Programas de capacitação profissional e treinamento técnico

Melhorias na educação básica Programas de apoio a consultoria técnica Linhas de crédito Incentivos fiscais maior estabilidade macroeconômica Outras (especifique): 3. Qual a sua avaliação sobre o papel do governo federal, estadual e municipal no processo de promoção de inovações? Governo Positiva Negativa Por que? Federal

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Estadual Municipal 4. Como a empresa se adequou ao processo de abertura de mercado nos anos 90?

(Numerar por ordem de importância, onde o n.º 1 é o mais importante).

( ) promoveu importantes melhorias nos equipamentos e processos produtivos ( ) promoveu apenas mudança organizacional ( ) introduziu inovação de produto ( ) introduziu inovação de processo ( ) fez arranjos cooperativos com empresas e instituições de pesquisa ( ) capacitou internamente os recursos humanos ( ) empenhou-se no aprendizado tecnológico ( ) buscou outras formas de financiamento ( )outros

5. Como a empresa tem reagido aos novos fluxos de investimento direto externo que tem entrado no país?

(Numerar por ordem de importância, onde o n.º 1 é o mais importante).

( ) fez associações com empresas nacionais ( ) fez associações com empresas multinacionais ( ) concentrou investimentos em áreas de maior competência produtiva ( ) buscou estruturas de fomento (financiamento, incentivos) à indústria ( ) realizou projetos voltados a alianças tecnológicas com outras empresas ( ) outras

6. Em que medida a formação do MERCOSUL vem influenciando a estratégia da empresa?

(Numerar por ordem de importância, onde o n.º 1 é o mais importante).

( ) levou à formação de alianças cooperativas com empresas dos países do MERCOSUL, voltadas para melhorias na produção

( ) conduziu a um maior acirramento concorrencial com empresas dos países do MERCOSUL ( ) levou a empresa a realizar investimentos nos países do MERCOSUL ( ) levou a empresa a maior integração com empresas locais na busca de maior especialização produtiva ( ) levou a empresa a realizar esforços junto a governos em favor de tratamento mais eqüitativo

às empresas locais

( ) levou a empresa a ampliar sua estrutura de vendas para os países do MERCOSUL ( ) outros impactos. Citar

7. Indique os principais obstáculos que impedem maior integração entre a sua empresa e as empresas dos países do MERCOSUL. Assinale em ordem de importância: 1 - sem importância; 2 - pouco importante; 3 - importante 4 - muito importante.

Itens 1 2 3 4 Ausência de interesses comuns de negócios Dimensão limitada do mercado Dificuldades de acesso as informações de negócios Dificuldade de maior aproximação com empresários de outros países Desarmonia entre as políticas macroeconômicas dos países Entraves fiscais Dificuldade na realização de acordos cooperativos com empresas de outros países Outras. Especifique

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8. Que políticas governamentais poderiam contribuir para o aumento da eficiência e inovação da empresa? (Numerar por ordem de importância, onde o n.º 1 é o mais importante).

( ) estabelecimento de mais e melhores atividades de treinamento técnico ( ) melhorias em educação básica ( ) programas de apoio a consultoria técnica ( )linhas de crédito; em caso afirmativo especifique______________________ ( ) incentivos; em caso afirmativo especifique ( ) maior estabilidade macroeconômica ( )outras. Especifique: ( ) não devem haver políticas governamentais para estímulo à inovação.