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PROPOSTA DE COMPARTIMENTAÇÃO GEOMORFOLÓGICA PRELIMINAR DO ALTO CURSO DO RIO DAS VELHAS (MG) Gisele Barbosa dos Santos, Mestre em Geografia, UFMG – [email protected] Antônio Pereira Magalhães Jr, Depto de Geografia, UFMG – [email protected] Resumo O alto vale do Rio das Velhas insere-se no domínio do Quadrilátero Ferrífero, cuja expressividade geomorfológica reflete a complexidade geológica regional. No entanto, a área ainda apresenta lacunas de estudos geomorfológicos para o conhecimento das feições e processos fluviais pretéritos e atuais. Visando contribuir para o conhecimento deste quadro, este trabalho apresenta uma proposta de compartimentação geomorfológica preliminar do alto curso do Rio das Velhas com base em aspectos morfológicos e de dinâmica fluvial. Foram considerados como critérios a caracterização e espacialização de níveis deposicionais e seqüências estratigráficas, vazões, tipos de sedimentos de margens e carga suspensa. Mesmo não fazendo parte do contexto fluvial atual de calha, os níveis de terraços são importantes como ambientes marginais á calha na área. Suas propriedades contribuem para a estabilidade das margens e para as características morfológicas do canal. As variáveis hidrossedimentológicas foram monitoradas durante um ano. O vale foi compartimentado em quatro trechos de acordo com sua morfologia e dinâmica predominante, sendo o trecho mais à montante marcado por uma seqüência de poços e corredeiras, seguido por um trecho com dinâmica tendendo ao entrelaçamento devido à variação na capacidade de transporte de carga suspensa e à elevada carga arenosa de fundo. Para jusante segue um trecho marcado por vale extremamente encaixado e leito rochoso, denotando forte controle estrutural. O trecho mais à jusante apresenta padrão tipicamente meandrante. O alto curso do Rio das Velhas revelou-se como um complexo mosaico de ambientes erosivos e deposicionais, condicionados pela tectônica regional e pelas variações nos processos hidrossedimentológicos locais. Palavras-chave: compartimentação geomorfológica; geomorfologia fluvial; Rio das Velhas, Quadrilátero Ferrífero. 1 - Introdução A caracterização geomorfológica de sistemas fluviais interiores, com dinâmica típica de ambientes montanhosos, é ainda escassa no Brasil. Grande parte do alto Rio das Velhas reflete estas condições, apresentando variações morfológicas e morfodinâmicas que refletem o quadro geológico e geomorfológico regional. Cortando diferentes litologias e submetido a um comportamento tectônico que alia o soerguimento regional a uma movimentação diferencial de blocos, o alto Rio das Velhas vem, há séculos, sofrendo fortes pressões antrópicas associadas a diferentes atividades como a mineração (ouro e ferro, principalmente), agropecuária e expansão urbana. Na expansão destas atividades, a remoção da cobertura vegetal é uma das conseqüências mais clássicas, intensificando e potencializando os focos de erosão acelerada na área.

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PROPOSTA DE COMPARTIMENTAÇÃO GEOMORFOLÓGICA PRELIMINAR DO

ALTO CURSO DO RIO DAS VELHAS (MG)

Gisele Barbosa dos Santos, Mestre em Geografia, UFMG – [email protected] Antônio Pereira Magalhães Jr, Depto de Geografia, UFMG – [email protected]

Resumo O alto vale do Rio das Velhas insere-se no domínio do Quadrilátero Ferrífero, cuja expressividade geomorfológica reflete a complexidade geológica regional. No entanto, a área ainda apresenta lacunas de estudos geomorfológicos para o conhecimento das feições e processos fluviais pretéritos e atuais. Visando contribuir para o conhecimento deste quadro, este trabalho apresenta uma proposta de compartimentação geomorfológica preliminar do alto curso do Rio das Velhas com base em aspectos morfológicos e de dinâmica fluvial. Foram considerados como critérios a caracterização e espacialização de níveis deposicionais e seqüências estratigráficas, vazões, tipos de sedimentos de margens e carga suspensa. Mesmo não fazendo parte do contexto fluvial atual de calha, os níveis de terraços são importantes como ambientes marginais á calha na área. Suas propriedades contribuem para a estabilidade das margens e para as características morfológicas do canal. As variáveis hidrossedimentológicas foram monitoradas durante um ano. O vale foi compartimentado em quatro trechos de acordo com sua morfologia e dinâmica predominante, sendo o trecho mais à montante marcado por uma seqüência de poços e corredeiras, seguido por um trecho com dinâmica tendendo ao entrelaçamento devido à variação na capacidade de transporte de carga suspensa e à elevada carga arenosa de fundo. Para jusante segue um trecho marcado por vale extremamente encaixado e leito rochoso, denotando forte controle estrutural. O trecho mais à jusante apresenta padrão tipicamente meandrante. O alto curso do Rio das Velhas revelou-se como um complexo mosaico de ambientes erosivos e deposicionais, condicionados pela tectônica regional e pelas variações nos processos hidrossedimentológicos locais. Palavras-chave: compartimentação geomorfológica; geomorfologia fluvial; Rio das Velhas, Quadrilátero Ferrífero.

1 - Introdução

A caracterização geomorfológica de sistemas fluviais interiores, com dinâmica típica

de ambientes montanhosos, é ainda escassa no Brasil. Grande parte do alto Rio das Velhas

reflete estas condições, apresentando variações morfológicas e morfodinâmicas que refletem o

quadro geológico e geomorfológico regional. Cortando diferentes litologias e submetido a um

comportamento tectônico que alia o soerguimento regional a uma movimentação diferencial

de blocos, o alto Rio das Velhas vem, há séculos, sofrendo fortes pressões antrópicas

associadas a diferentes atividades como a mineração (ouro e ferro, principalmente),

agropecuária e expansão urbana. Na expansão destas atividades, a remoção da cobertura

vegetal é uma das conseqüências mais clássicas, intensificando e potencializando os focos de

erosão acelerada na área.

Pesquisas desenvolvidas no Instituto de Geociências da UFMG vêm tentando reduzir as

lacunas de conhecimento sobre a geomorfologia fluvial da bacia do alto Rio das Velhas. Este

trabalho tem por objetivo, apresentar uma proposta de compartimentação geomorfológica do

alto curso do Rio das Velhas com base em critérios morfológicos e morfodinâmicos atuais e

pretéritos. Foram consideradas variáveis quantitativas e qualitativas: distribuição e

características dos níveis deposicionais fluviais e respectivas seqüências sedimentares;

aspectos morfológicos do vale; características das margens; vazões e carga em suspensão. As

variáveis hidrossedimentológicas foram monitoradas durante um ano hidrológico (dezembro

de 2006 a dezembro de 2007) em sete pontos ao longo do vale (Figura 1).

2 – Materiais e métodos

Os níveis deposicionais foram analisados em campo, com auxílio de interpretação de um

mosaico de ortofotos (1:8000, 1989). Foram levantadas as tipologias e o arranjo espacial dos

níveis, bem como as características das fácies (textura, cor, arranjo, litologia dos seixos).

Mesmo não fazendo parte do contexto fluvial atual de calha, os níveis de terraços são

importantes como ambientes marginais á calha na área. Suas propriedades podem contribuir

para a estabilidade das margens e para as características morfológicas do canal, por exemplo.

Em termos da dinâmica fluvial atual, foram monitoradas as seguintes variáveis:

- erosão marginal: aplicação da técnica de pinos e estacas, perfilagens sucessivas e

levantamento fotográfico. Foram utilizados pinos de ferro com 1 m de comprimento e 5 mm

de diâmetro, inseridos horizontalmente na face das margens, posicionados em seqüência

vertical em cada ponto monitorado. As estacas têm 1 m de comprimento e 8 cm de lado,

sendo inseridas verticalmente na planície de inundação próximo aos pinos. O recuo (erosão)

ou o acréscimo (deposição) nas margens foram medidos com auxílio de trena.

- composição dos materiais das margens. As análises granulométricas foram realizadas no

Laboratório de Geomorfologia do Instituto de Geociências da UFMG;

- carga sedimentar atual: foram coletadas amostras de água para análises laboratoriais de

carga suspensa e também foram coletadas amostras de carga de fundo. As medições de vazões

visaram complementar os resultados e permitir a análise das variações de carga suspensa e da

erosão das margens entre as estações seca e úmida.

Figura 1. Localização da bacia do alto Rio das Velhas e dos pontos de monitoramento

3 - Área de estudo

A bacia do Alto Rio das Velhas situa-se no Quadrilátero Ferrífero, próximo a Belo

Horizonte - MG, borda sul do Cráton do São Francisco (Figura 1). Abrange os municípios de

Ouro Preto, Caeté, Nova Lima, Sabará e Belo Horizonte, dentre outros, somando cerca de 3

milhões de habitantes.

O Quadrilátero Ferrífero é uma das mais significativas províncias minerais do

Brasil, além de ser considerado um importante domínio geomorfológico. São encontradas as

seguintes unidades geológicas principais (Alkmin & Marshak, 1998): (i) Supergrupo Minas,

proterozóico, constituído por um pacote metassedimentar de quartzitos, xistos, filitos e

itabiritos; sua ocorrência é utilizada como critério de delimitação do Quadrilátero; (ii)

embasamento cristalino arqueano, composto por granitos, gnaisses e migmatitos.

Correspondem, em sua maioria, às rochas do Complexo do Bação, que aflora na porção

central do Quadrilátero em uma zona rebaixada devido à erosão nas rochas cristalinas mais

friáveis. A fragilidade destas rochas condiciona o desenvolvimento de inúmeros

voçorocamentos cuja origem antrópica é contestada por alguns autores; (iii) Supergrupo Rio

das Velhas, arqueano, composto basicamente por quartzitos, xistos e filitos que constituem

uma seqüência tipo greenstone belt, corresponde à zona de contato entre as bordas serranas do

Supergrupo Minas e a zona mais rebaixada no Complexo do Bação; (iv) Grupo Itacolomi, de

idade proterozóica, constituído basicamente por quartzitos. Também ocorre nas zonas

serranas que limitam o Quadrilátero, mas com representatividade espacial bem inferior ao

Supergrupo Minas. A Figura 1 ilustra o quadro geológico da área.

O clima da área é Quente de Inverno Seco (CAMARGOS, 2005). As médias

anuais de temperatura giram em torno dos 18ºC na área serrana das cabeceiras do Rio das

Velhas, enquanto as médias de precipitação chegam a atingir 2.000 mm. Distinguem-se de 4 a

5 meses secos (maio a setembro). As menores médias ocorrem no trimestre de julho a

setembro, enquanto as maiores ocorrem entre os meses de novembro e abril, com maiores

incidências nos meses de dezembro e janeiro.

4 – Parâmetros hidrogeomorfológicos

Foram identificados quatro níveis deposicionais aluviais ao longo do vale, sendo um

Nível de Várzea e três níveis de terraços (Terraço Superior, Terraço Intermediário e Terraço

Inferior). Os níveis de Terraços Superior e Intermediário apresentam-se escalonados e o nível

de Terraço Inferior apresentou variação tipológica em relação ao Nível de Várzea:

escalonado, recoberto pela várzea (terraço de recobrimento) e com várzea embutida.

O escalonamento dos níveis de terraços reflete o contínuo soerguimento epirogenético

regional enquanto a variação nas tipologias do T1 e da Várzea resultam da associação entre a

movimentação diferencial de blocos ao longo do vale (processo anteriormente verificado por

Magalhães Jr e Saadi, 1994) e a influência do processo de encouraçamento da calha fluvial

por um paleopavimento detrítico concrecionado que forma a base do Nível de Terraço Inferior

(Magalhães e Santos., 2008). O trecho onde o Terraço Inferior encontra-se escalonado em

relação à Várzea deve coincidir com blocos tectonicamente mais ativos, provocando maior

encaixamento da calha. Por sua vez, onde o Terraço é recoberto pela várzea, além da

dinâmica tectônica mais estável, ocorre influência do processo de encouraçamento da calha

que oferece resistência ao encaixamento e provoca o recobrimento. Finalmente o trecho onde

a Várzea está embutida no Nível de Terraço Inferior deve sofrer a influência da proximidade

da Serra do Curral que representa uma importante barreira estrutural à dinâmica sedimentar da

rede de drenagem ao longo do Cenozóico (Magalhães Jr. e Saadi, 1994).

Os dados referentes ao monitoramento hidrossedimentológico e a distribuição espacial

do Terraço Inferior ao longo do vale, podem ser observados na Figura 2. A análise dos dados

permite concluir que o monitoramento da dinâmica das margens revelou maior estabilidade

dos pontos situados mais próximos às cabeceiras do Rio das Velhas (SB04, SB05, SB06,

SB07). Neste trecho o leito apresenta uma sucessão de poços (ambientes de menor energia) e

corredeiras (maior energia) típica de sistemas fluviais montanhosos. O Nível de Terraço

Inferior é, neste trecho, recoberto pela várzea e a calha apresenta o paleopavimento detrítico

concrecionado que protege as margens da erosão. Ou escalonado em relação à várzea (silto-

arenosa), onde foram registradas taxas erosivas nas margens, relativamente maiores. O que

permite dizer que a erosão das margens foi condicionada, principalmente, pela resistência dos

materiais das margens em relação à ação do fluxo, especialmente, nos trechos em corredeira.

A carga suspensa apresentou valores muito baixos, denotando a maior resistência ao desgaste

das rochas do Supergrupo Minas (xistos, quartzitos, itabiritos).

Os pontos situados no trecho do vale onde ocorrem as rochas do Complexo do Bação

(GL031 e IT02), apresentaram uma grande variação de carga suspensa, principalmente no

período de cheia, devido aos aportes sedimentares provenientes principalmente do afluente

mais importante neste trecho: o rio Maracujá. As vazões não aumentaram na mesma

proporção que a carga sedimentar e parte do material foi depositado no leito dando origem a

barras de canal principalmente arenosas. Sua sub-bacia apresenta uma concentração

importante de voçorocamentos que fornecem elevada carga sedimentar arenosa às calhas

fluviais. A elevada susceptibilidade natural derivada das frágeis rochas cristalinas do

Complexo do Bação é agravada pela intensificação à erosão acelerada que as atividades

humanas provocam (BACELLAR et al.,2005). Nestes pontos, foram registradas as maiores

taxas de recuo de margens a partir de processos de erosão fluvial e deslizamentos rápidos. A

saturação das fácies finas (areia fina, silte e argila) nos períodos de cheia provoca estes

deslizamentos, enquanto as quedas são geradas por cisalhamento do fluxo na base das

margens e perda de sustentação do material superior. No trecho do ponto IT02 o Terraço

Inferior é do tipo escalonado em relação à várzea, estando em contexto de encosta. Portanto,

não exerceu nenhuma influência sobre os processos dinâmicos atuais. 1 Neste trecho o Terraço Inferior é do tipo recoberto e possui pavimento detrítico. Portanto, as taxas erosivas são

quase tão baixas como as dos pontos à montante, enquanto surgem, neste trecho, barras arenosas que denotam a

ocorrência de ambientes deposicionais.

A taxa de erosão marginal do ponto RA01 também foi elevada. Neste trecho a várzea

se encontra embutida no Terraço Inferior, refletindo a constante migração lateral e a

dificuldade de entalhe vertical do canal. O canal tem padrão tipicamente meandrante, com

fluxos mais agressivos e taxas de recuo mais elevadas nas margens côncavas. Além disso, as

margens são compostas, basicamente, por areia grossa pouco coesa, facilitando a queda por

cisalhamento. A carga suspensa permaneceu alta, por se tratar de um ponto do Rio das Velhas

à jusante de seus dois principais afluentes na região: rio Maracujá e rio Itabirito. No entanto,

seus valores apresentaram uma queda significativa em relação ao trecho imediatamente à

montante (IT02), o que pode ser explicado pelo represamento de parte dos sedimentos,

proveniente do rio Maracujá, no lago da Represa Rio de Pedras.

Figura 2. Taxas das variáveis hidrossedimentológicas.

4 – Compartimentação do vale do alto Rio das Velhas: morfologia e dinâmica

A proposta de compartimentação geomorfológica do alto vale do Rio das Velhas

resultou do cruzamento das variáveis morfológicas e morfodinâmicas consideradas (Figura 3). TERRAÇOS

Tipo Terraço Recoberto Terraço Escalonado Terraço com Várzea Embutida

PLANÍCIE

a) Feições meandro abandonado

lagoas de cheia permanentemente inundada

planície recobrindo terraço

b) Largura inexistente canal muito encaixado canal pouco encaixado

c) Uso Urbano pastagem mineração agricultura

MARGEM

a) Composição Granulométrica

silte-argila areia cascalho rocha

b) Forma íngreme côncava convexa degraus plana

c) Processo de recuo predominante

erosão fluvial queda escorregamento

d) Estabilidade estável moderadamente estável

moderadamente instável

instável

LEITO a) Forma Fundo chato em U assimétrico b) Tipo argila silte areia cascalho blocos de rocha

c) Presença de barras

Silto-argilosa arenosa cascalho

CARGA SUSPENSA a) Capacidade baixa moderada elevada

FLUXO a) Velocidade lento moderado rápido

Figura 3. Critérios utilizados para compartimentação.

A partir dos resultados foram criadas classes de taxas de recuo das margens, de carga

de leito e suspensa, e das velocidades de fluxo e vazão. Além das tipologias dos níveis de

terraços identificadas visualmente a partir do arranjo espacial, o Nível de várzea pôde ser

classificado segundo tipologias resultantes do cruzamento das variáveis estudadas. Foram

identificados 8 tipos de planícies, 8 tipos de margens fluviais e 7 tipos de calha fluvial. A

análise da distribuição espacial de cada unidade fluvial permitiu a compartimentação de

trechos fluviais homogêneos (Figura 4) que apresentam as seguintes características:

Trecho A: canal encaixado com seqüências de poços-corredeira típicas de sistemas fluviais

montanhosos; paleopavimento detrítico concrecionado encouraçando a calha fluvial; margens

com fácies atuais (planície) e pretéritas (Terraço Inferior de recobrimento). A planície

apresenta-se extensa. As margens evoluem principalmente por erosão e quedas nas cheias.

Trecho B: canal encaixado e planície fluvial com feições e depósitos típicos de canais

meandrantes (lagoas de cheia, meandros abandonados, depósitos orgânicos) e dinâmica de

calha com características de canais entrelaçados (barras arenosas, canais secundários, variação

na descarga e carga sedimentar arenosa). Presença menos freqüente de poços e corredeiras,

assim como do paleopavimento detrítico na calha. Margens evoluindo principalmente por

escorregamentos nas cheias.

Trecho C: canal muito encaixado (à semelhança de um pseudo-canyon) com margens

íngremes e substrato rochoso; forte controle estrutural; presença de barras (de seixos e

arenosas) e ilhas. Planície inexistente e leito em substrato rochoso. Margens rochosas

evoluem lentamente por erosão. Calha com corredeiras freqüentes (soleiras geológicas).

Trecho D: canal encaixado com padrão e dinâmica tipicamente meandrantes; depósitos

predominantemente arenosos com estruturas plano-paralelas e matéria orgânica abundante;

grande parte da planície encontra-se ocupada por zona urbana. Margens evoluem

principalmente por erosão e quedas. Presença de barras de canal arenosas e de cascalho.

Percebeu-se que o curso fluvial do alto Rio das Velhas apresenta variações

importantes quanto à dinâmica erosiva e deposicional. A alternância de trechos com

predomínio de erosão ou sedimentação já havia sido detectada e cartografada por Lana

(2004). A seqüência de poços e corredeiras foi apontada pelo autor como conseqüência da

variação de níveis de base locais, relacionados à justaposição de litologias com resistências

diferentes. Além dos fatores litológicos, a dinâmica tectônica e as influências antropogênicas

devem ser levadas em conta na interpretação da diferenciação entre os trechos.

Figura 4. Compartimentação do vale do Rio das Velhas.

5 - Considerações finais

Os quatro trechos fluviais resultantes da classificação do curso do alto Rio das Velhas

demonstram que a dinâmica fluvial apresenta variações importantes em termos de

morfodinâmica atual. Enquanto o trecho A ilustra a complexidade dos ambientes fluviais

interiores de regiões montanhosas (seqüência poços-corredeiras), conforme já verificado por

Castro et al. (2005), os demais trechos possuem características diferenciadas que refletem o

forte controle estrutural e que se aproximam, à jusante, de um sistema fluvial mais

tipicamente meandrante. Porém, a elevada carga sedimentar fornecida pelos voçorocamentos

presentes na sub-bacia do rio Maracujá contribui para a origem de características

morfodinâmicas que tendem para o padrão entrelaçado à jusante da confluência.

A classificação aqui proposta é de cunho apenas preliminar, já que outras variáveis

podem ser incorporadas e as análises devem ser verticalizadas.

Agradecimentos: Á FAPEMIG e ao CNPq pela viabilização financeira das pesquisas.

6 - Referências bibliográficas

ALKMIM, F. F.; MARSHAK, S. (1991). Transamazonian Orogeny in the Southern São Francisco Craton Region, Minas Gerais, Brazil: evidence for Paleoproterozoic collision and collapse in the Quadrilátero Ferrífero. Precambrian Research, 90: 29–58. AYOADE, J. O. Introdução a climatologia para os trópicos. 5 ed. Bertrand Brasil. São Paulo: 1998. 332p. BACELLAR, Luis de Almeida Prado; LACERDA, Willy Alvarenga; COELHO NETO, Ana Luiza; Controlling factors of gullying in the Maracujá Catchment, Southeastern Brazil; Earth Surf. Process. Landforms 30, 1369–1385 (2005) Published online in Wiley InterScience (www.interscience.wiley.com). DOI: 10.1002/esp.1193 CASTRO, P. T. A.; ALVES, J. M.; FERREIRA, H. L.; LANA, C.E. (2005). A Influência dos Níveis de Base Locais nas Características Físicas dos Ecossistemas Fluviais: Os Rios Periféricos à Serra do Espinhaço Meridional, MG. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE LIMNOLOGIA, 10., Ilhéus, Anais em CD-Rom. LANA, C. E. (2004). Cartografia Integrada de Ecossistemas Lóticos (Fluviais) no Alto Curso do Rio das Velhas, MG. Ouro Preto, Departamento de Geologia, Escola de Minas, Universidade Federal de Ouro Preto, Dissertação de Mestrado, 175 p. MAGALHÃES JR, A. P. & SANTOS, G. B. (2008). Processos de Encouraçamento da Calha do Alto Rio das Velhas e seus Reflexos na Dinâmica Fluvial Moderna, Quadrilátero Ferrífero, MG. In: SINAGEO, VIII, Belo Horizonte, anais em CD Rom.

MAGALHÃES JR, A. P. & SAADI, A. (1994). Ritmos da dinâmica fluvial neo-cenozôica controlados por soerguimentos regionais e falhamento: o vale do Rio das Velhas na região de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Geonomos. Belo Horizonte, 2 (1):42-54. MAGALHÃES JR. A. P. (1993). Evolução da dinâmica fluvial cenozóica do Alto-médio Rio das Velhas na região de Belo Horizonte - MG. Belo Horizonte, Departamento de Geografia, Instituto de Geociências, Universidade Federal de Minas Gerais, Dissertação de Mestrado, 175 p.