projetos e prÁticas de formaÇÃo de professores viii cepfe/linksarquivos... · esta síntese...

181
Projetos e práticas de formação de professores VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 1 PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES RELATOS DE EXPERIÊNCIAS

Upload: trinhhuong

Post on 09-Nov-2018

223 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

1

PROJETOS EPRÁTICAS DE FORMAÇÃO

DE PROFESSORES

RELATOS DE EXPERIÊNCIAS

Page 2: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

2

SUMÁRIO

Page 3: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

3

Page 4: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

4

Page 5: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

5

APRESENTAÇÃO

Este relato se propõe a apresentar o trabalho desenvolvido na disciplina de Gestão:Articulação do Projeto Político Pedagógico, realizado com o grupo de alunos do oitavo semestredo curso de Pedagogia da FIZO – Faculdade Integração Zona Oeste, sob minha orientação noperíodo de Fevereiro à Junho/2005, cuja sistematização e registro foram realizados por uma dasalunas, co-autora deste texto.

Objetivos da disciplina neste semestre:· Articular os saberes construídos e os acumulados ao longo do curso

pensando nesses saberes como orientadores de nossa prática como educadores (comfoco no curso de Gestão).

· Pensar na memória e nas possibilidades futuras, não apenas nosentido intelectual. Mas também com a emoção, com o sentido da transformação, damudança e da busca interior.

Importante destacar que foram significativamente enfatizadas a dimensãopolítica da gestão participativa bem como a fundamental articulação entre todos os atoresda equipe gestora da escola na condução do cotidiano escolar.

Foi nesta perspectiva que iniciamos o trabalho que resultou na elaboração de umProjeto Político Pedagógico utilizando como recurso a metáfora da construção coletiva de umpainel que teve por objetivo representar todo o processo do grupo bem como os princípios que ofundamentaram.

INÍCIO DO TRABALHO: NOSSAS APRENDIZAGENS

A primeira atividade proposta aos alunos foi escrever individualmente sobre suasaprendizagens (durante todo o curso e mais pontualmente em relação às disciplinas voltadas paraa área de gestão: Direção, Coordenação e Orientação Educacional).

Em seguida os alunos deveriam trocar em duplas de forma que na apresentaçãopara o grupo-classe, cada um falasse sobre o seu par.

Assim, surgiram as seguintes falas:

A ELABORAÇÃO DE UM PROJETO DE FORMAÇÃOCONTINUADA: RELATO DO PROCESSO DE

APRENDIZAGEM E CONSTRUÇÃO COLETIVA

BRUNO, Eliane Bambini Gorgueira; ABREU, Luci Castor de(FIZO – Faculdade Integração Zona Oeste)

Page 6: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

6

- Mudar é um processo que pode ser doloroso. Mas é preciso mudar. É precisoquerer mudar.

- Qualquer coisa que se deseja fazer, começa mesmo é no desejo e nadisponibilidade pessoal.

- Fui aprendendo sobre a arrogância de pensar que já sabia tudo...- Agora é que eu entendo o quer dizer formação continuada para toda a vida.- É fundamental rever a forma com que olhamos as diferenças entre as

pessoas.- Às vezes, falamos o que não queremos. É preciso tomar mais cuidado com isso.- Estamos aprendendo mais sobre o “olhar” e sobre o “ouvir”- Relações são fundamentais para o auto-conhecimento e para a auto-estima.- Precisamos olhar para o que é micro e para o que é macro.- Estou me esforçando para “olhar o olhar do outro”.- Percebi que acontecem retrocessos em coisas que já havíamos aprendido.- Não só os conteúdos são importantes. As relações e as vivências também são.- Os alunos é que me ensinam como devo ensina-los.- Mesmo que algo pareça eterno, precisamos sempre questionar, propor, querer.- O conhecimento nos torna mais fortes para argumentar sobre o que

pensamos.- Agora eu entendo que a formação não pára. É para a vida inteira.- Aprendi a argumentar com as pessoas da minha escola.- Aprendi a respeitar os saberes dos outros e aceitá-los com serenidade.- Eu aprendi a aceitar e me sinto grata e segura com o afeto de vocês.- Quando a gente erra é porque está querendo acertar.- Aprendi a ouvir mais e julgar menos.- Conviver é mais difícil do que parece.- Só o sonho não é suficiente. É preciso lutar.- Aprendi a me sentir mais do que um simples número de matrícula.- Já estou pensando no que vou fazer para preencher o espaço que hoje a

escola ocupa.- Sinto-me orgulhosa pelo exemplo que sou para os meus filhos.- Eu buscava uma coisa que nem sabia o que era.- Nós podemos construir juntos a nossa história.- Aprendi que sou capaz de superar obstáculos.- Nesta escola, tudo é muito importante e tudo faz sentido.- Aqui eu estou inteira. Este é o meu momento.- Estou aprendendo a me colocar no lugar do outro.- Sinto que fiz a escolha certa.- Aprendi como aluna e como pessoa.

Page 7: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

7

- Descobri como é importante dividir as dificuldades com os outros.A professora comenta que gostaria que os demais professores do curso estivessem conosco paraouvir todas essas coisas que estamos discutindo... Daí surgiu a proposta do registro paraconfeccionar um caderno que contasse sobre todas essas aprendizagens.Após aprofundamento nessas discussões, a idéia agora era fazer um levantamento sobre o quefaltou (no curso de gestão) e as questões apresentadas pela turma foram:

- Faltou falar um pouco mais sobre o Orientador Educacional.- Eu queria saber mais sobre a função do Supervisor de Ensino- Senti falta de ver Estatística.- Queria ver mais sobre o Projeto Político Pedagógico.- Queria saber como a equipe gestora cuida do fracasso escolar.- Queria saber como a Direção trata a questão da alfabetização.

Algumas dessas questões foram tratadas em aulas expositivas (por exemplo,Orientação Educacional e Supervisão de Ensino). Outras foram discutidas e sintetizadas numquadro no qual retomamos (em grupo) nossos registros de aula, trabalhos e estágios realizados.Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendoos papéis de cada ator, as culturas diferentes de cada escola e o que diziam os teóricos sobretodas essas coisas. Foi interessante discutir com os alunos sobre a forma com que cada umelabora sua própria vivência, além de favorecer a reflexão sobre o que é a unidade de princípios,autonomia, a diferença entre unidade e uniformidade, e o exercício de uma crítica sobre o quevemos hoje e as mudanças que gostaríamos de propor como educadores.

COMPARECEM AS QUESTÕES SUBJETIVAS E AS RELAÇÕES INTER-PESSOAIS:

É importante observar que o grupo vivenciava um período bastante tenso porconta da proximidade das qualificações, ajustes e apresentações dos TCCs e estavam tambémenvolvidos com algumas outras questões como o final do curso, a separação das pessoas, alacuna que já estavam vislumbrando...

Desta forma, o investimento nos fazeres se misturava com a dificuldade de lidarcom esses sentimentos.

A oportunidade de explicitar e refletir sobre a vivência desse momento motivou ogrupo a rever a finalização do curso e aceitar o desafio de reconstruí-lo coletivamente de forma avalorizar tanto o momento imediato em que compúnhamos questões práticas e objetivas ao mesmotempo em que lidávamos com os aspectos mais subjetivos.

Nesta fase já estava em andamento um trabalho de reflexão e análise do texto“Projeto Político Pedagógico: Considerações sobre sua elaboração e concretização (Vasconcelos,2002), no qual foram destacadas e discutidas questões como:

- Conceito e finalidade,- Características e dimensões

Page 8: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

8

- Perspectivas de mudança,- Processo de construção coletiva,- Construção da identidade da escola,- Princípios e valores privilegiados,- Relações interpessoais.

Compondo esse estudo, inserimos a discussão acerca da identidade do grupo esuas perspectivas para o futuro.

O resultado dessas discussões foi a elaboração de duas propostas por parte daprofessora.

A primeira foi constituir o que decidimos chamar de “Grupo de Referência” queconsiste num grupo formado por todos os alunos e a professora que inicialmente atuará comocoordenadora do trabalho - e que terá como características:

- A mudança de vínculo. A relação professor-aluno passa a ser agorauma relação entre pares.

- Deve ser um grupo no qual nós todos – em parceria – possamostrocar e refletir juntos.

- O elo a nos unir pode ser um estudo sobre as implicações dasrelações interpessoais num processo de construção coletiva.

A professora pede aos alunos que pensem em sua disponibilidade interna e externatentando viver esta fase final do nosso curso com alegria.

Todo o grupo foi bastante receptivo a esta proposta.A segunda proposta era fazer o fechamento acerca do Projeto Político Pedagógico

através de uma metáfora, na qual fossem contemplados todos os aspectos discutidos anteriormentee que além disso fosse um símbolo que refletisse nosso processo e a nossa elaboração sobre ele.

Iniciamos o trabalho com alguns combinados:- Todo o processo deve ser registrado.- Deve haver controle e acompanhamento do tempo e das atividades

a que nos propusermos a cada dia.Discutimos e registramos:

- Objetivo: Aprender a construir o Projeto Político Pedagógico, fazendo.- Vamos vivenciar esta construção fazendo sempre uma ponte com a

teoria.As primeiras propostas para a metáfora foram a construção de uma colcha de

retalhos e a pintura coletiva de um quadro que representasse o grupo.Como se poderá observar, nosso processo a cada aula apresentou idas e vindas,

escolhas, ganhos e perdas.COMEÇANDO A PENSAR NOS PRINCÍPIOS E NAS REGRASRetomamos o trabalho iniciado reforçando alguns combinados e já pensando em

como encaminharíamos daquele momento em diante.

Page 9: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

9

A professora comenta que o primeiro passo é o desejo. Na concretização do trabalho,ela terá o papel de dirigir, de direcionar da mesma forma como acontece nas escolas mas épreciso lembrar que este projeto não é dela. É nosso.

Iniciamos então a reflexão sobre as escolhas que vamos fazendo...e sobre aidentidade que vamos construindo...

Quais são os princípios? O quê vai fundamentar nossa construção?Além do desejo, precisamos partir da nossa realidade: “Dia 30/06 vocês vão embora

– já não serão mais alunos”.Aquela realidade mobilizou no grupo o desejo de continuidade e projetou o que

queríamos alcançar.O grupo não deseja se separar mas constituir-se como um grupo de referência em

Educação, podendo eleger como eixo as relações interpessoais. No início professora vai conduziro grupo até que ele seja autônomo. Então seremos parceiros.

A professora comentou que embora ela é quem estivesse falando sobre os princípios,a proposta estava aberta. Era importante que todos participassem, que fosse valorizado o jeito decada um participar. Isso iria ajudando o grupo a se reconhecer. É essa a relevância social.

Sobre os nossos desafios, discutimos:- Como vamos construir esse grupo?- Como vamos construir essa tela? Ou será um painel? Ou uma

colcha de retalhos?Decidimos que a metáfora a nos representar seria um painel a ser pintado

coletivamente a partir de quadrinhos individuais.Algumas regras que identificamos:

- Todos deveríamos socializar o material.- Precisaríamos nos planejar para organizar o ambiente, o material, e

identificar as duplas que fariam o registro de cada encontro...Existiam várias questões em discussão e a cada momento apareciam outras mais...

Assim é que o grupo foi se reconhecendo e escolhendo o seu caminho.Para aquele momento, o grupo decidiu pensar sobre o painel e uma das alunas

propôs que cada um desse sua sugestão sobre a imagem que pintaríamos.Propostas que apareceram:

- Flores- Vitral- Mosaico- Bandeirinhas (como as do Volpi)- Um grande aquário cheio de peixes.- Um oceano- Arco-íris.

Page 10: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

10

Sobre essas primeiras propostas, surgiram comentários beminteressantes:

- Se vamos mesmo trabalhar as relações interpessoais, o oceano ámais interessante pois não teremos a limitação do aquário.

- Esse oceano pode representar características do nosso grupo: Serforte, agitado, imenso, brilhante, um turbilhão, tem movimento, tem muitas correntes comoo conhecimento.

Era preciso então decidir algumas coisas práticas que viabilizassem a construçãodesse painel. Relativamente ao tempo, estávamos pensando em pedir algumas aulas de outrosprofessores na medida em que eles fossem fechando o semestre conosco.

Quanto à imagem, alguns alunos propuseram que esse oceano tivesse uma basecom algas no fundo. Outros diziam que cada quadrinho deveria ser livre (dentro do tema), paraque cada um pudesse se identificar com sua contribuição individual.

Pensamos ainda sobre se iríamos fazer um esboço do painel ou de cada quadrinho.Definimos que cada um faria conforme suas possibilidades.

A professora sugeriu que o painel representasse o grupo e que cada quadrinho individualtivesse algo que fosse do coletivo também. Ficamos pensando em várias possibilidades e vimos queescolhas sempre implicam ganhos e perdas. Por outro lado, percebemos que o bom é que estávamosdiscutindo, argumentando e com isso, construindo o quadro e construindo o grupo.

Ao final da aula, retomamos as regras e os princípios para ver se faltava algumacoisa. Nesse dia não identificamos nada que precisasse ser acrescentado.

Avaliamos, combinamos de trazer o material para a próxima aula (tintas, pincéis etelas) e a professora pediu para pensarmos:

É possível articular a estética da produção com o prazer de fazer e ainda garantir aunidade dos princípios?

SOBRE AS ESCOLHAS – OS DESEJOS INDIVIDUAIS E O DESEJO DO GRUPO

Iniciando, retomamos alguns combinados e discutimos sobre a questão que finalizoua aula anterior e o foco da discussão acabou sendo mesmo a questão das escolhas.

Relembramos que o nosso eixo era trabalhar a mudança de vínculo (de professor-aluno para parceiros).

Apareceu um elemento novo que deve ser representado no painel: esse movimentode mudança.

Como proposta para o encaminhamento, a professora sugeriu que o grupo tentasserelacionar durante todo o fazer daquele dia, os seguintes aspectos (simultaneamente):

- A construção do painel,- A construção do Projeto Político Pedagógico,- A construção do nosso grupo de referência.

Page 11: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

11

Estávamos discutindo ainda sobre o formato do painel:- Vertical ou horizontal?- Quadrado ou retangular?- Com base ou sem base?- Pode repetir o mesmo desenho?- O fundo deverá ter a mesma tonalidade?- Qual será a imagem que dará a unidade ao painel?- Só teremos peixes ou pode ter outros animais e elementos do mar?- Podemos combinar que o Nilson nos ajudará a dar a unidade quando

todos os quadrinhos estiverem prontos?Começamos o trabalho com os quadrinhos, discutindo, decidindo, registrando e

construindo juntos...A professora pediu que não perdêssemos de vista o nosso produto e nem o processo.

Precisávamos nos organizar e pensar em cada passo, no tempo, na forma, em que ordem ascoisas deveriam acontecer... Ela ainda explicitou sua preocupação em relação a algumas alunasque estavam muito quietinhas, lembrando que combinamos que todos deveriam se manifestarem relação ao seu próprio desejo e ao desejo do outro. Discutimos ainda sobre como poderíamostratar as dificuldades de cada um e surgiram as falas:

· É bom perceber a possibilidade de que cada um de nós escolha umcaminho diferente para pintar seu quadrinho e ao mesmo tempo, algo nele represente onosso ponto de referência, a nossa “toca”, a nossa luz;

· Podemos combinar que a cada encontro, depois que o painel estiverpronto, vamos fotografa-lo e, a cada encontro faremos troca de quadrinhos;

· É muito interessante olhar o quadro a partir de vários lugares. Hámesmo diferentes visões a depender do ponto de que partimos.

Conversamos sobre que nesse início, a professora vai nos conduzir, assim como oDiretor faz na escola. Ao longo do processo o grupo vai se construindo e se tornando mais autônomo.

Outro assunto que apareceu foi que no total somávamos 29 pessoas e o painelteria 30 quadrinhos. Desta forma um deles poderia ser “rodiziado” entre nós.

Refletimos, pintamos, decidimos, registramos e construimos juntos...Em certo momento uma aluna observou e alertou sobre que deveríamos nos apressar

para que o tempo fosse suficiente para terminarmos...Estávamos “fervendo em idéias” e a professora nos lembrou que – ainda que

existisse um produto a ser construído - era preciso “ouvir” o outro.A professora propôs fechar a aula com uma breve avaliação, mas não deu muito

certo. O grupo estava “a mil” e não conseguiu interromper a pintura para avaliar a aula.Esta situação imediata mostrou-se como uma questão importante para reflexão

que se seguiu: tínhamos um produto a concluir e tínhamos uma restrição de tempo. Como garantira efetividade do trabalho, sem perder de vista seu caráter coletivo, dialógico e de troca?

Page 12: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

12

É SEMPRE IMPORTANTE RETOMAR, SEM PERDER A POSSIBILIDADE DEACOLHER O “NOVO”

Retomamos os nossos desafios e os princípios que nortearam nosso trabalho.Relembramos que o painel como um todo, deveria estar representado em cada

parte (cada quadrinho), garantindo as diferenças individuais e a unidade que é coletiva.Surgiram novas questões que pediam novas decisões.

- Como vamos juntar os quadrinhos para compor o painel? Qual seráo critério?

- O que faremos com o produto final?- Quem cuidará do tempo e quem cuidará do registro?- Qual recurso ou imagem utilizaremos para representar a unidade

do grupo?- Como fazer para que essa imagem represente também as diferenças,

os vínculos e interesses de cada um?Decidimos que:

- A unidade seria representada por uma luz que partiria do alto doquadro e iluminaria todos os quadrinhos.

- Um dos alunos – bastante habilidoso com os pincéis - nos ajudariaa operacionalizar essa idéia.

- Quanto à forma de composição do painel, decidimos fazer algunstestes, fotografar e escolher depois.

Estávamos muito felizes com os resultados de cada contribuição individual e como processo através do qual estávamos compondo no coletivo.

O painel – o nosso oceano - estava muito bonito.Enquanto fazíamos esses testes, conversamos sobre questões que atravessaram

o curso de gestão nos quatro últimos semestres:- Cada elemento modifica o grupo e é modificado por ele.- É preciso ter clareza sobre a diferença entre regras e princípios.

Regras são recursos temporários, transitórios e adequados para um determinado momento.Já os princípios são os fundamentos que garantem a sustentação de nossas ações. Sãoos nossos pilares.

- Quem dirige o processo precisa estar atento aos ritmos diferentesde cada um e aprender a lidar com sua própria frustração de forma que possa ajudar acondução e a construção do grupo.

- Às vezes é mais fácil trabalhar com grupos pequenos mas é precisolembrar que, quem fica de fora das decisões, acaba não se comprometendo com elas.

Page 13: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

13

Decidimos como seria a composição final do painel e começamos a dar a ele aunidade de que já falamos. Além do que já havíamos combinado, foi proposto e aceito pelo grupo,a inserção de plantinhas, algas e ajustes na tonalidade de fundo de alguns quadrinhos, desde quefosse mantida a identidade do quadro e do autor.

Decidimos ainda que cada aluno teria uma foto do painel. Ele seria montado no diada nossa festa de formatura e projetado em telão.

Uma surpresa:Uma professora de outra disciplina entrou na sala e nós a convidamos a participar

do trabalho. Ela aceitou e ganhamos a autora e a autoria do nosso trigésimo quadrinho.Este foi mais um dos movimentos interessantes vivenciados por nós na medida

em que revela o acolhimento afetuoso de um elemento novo ao mesmo tempo em que mostra adisponibilidade daquela professora – o elemento novo – em ser acolhida por nós e participar dotrabalho.

Estávamos novamente aprendendo...Enquanto concluíamos a composição do painel, conversamos sobre os nossos

próximos encontros, já na perspectiva do que estávamos chamando de Grupo de Referência.Propostas:Periodicidade: Mensal.1a. reunião: 20/08/2005, na FIZO, das 09:00 às 12:00hsCombinamos de trazer nossos quadrinhos para fazer a primeira troca.Local de encontro: Pracinha de alimentação.2a. reunião: 17/09/2005 – mesmo esquema.3a. reunião: 22/10/2005 – idem.CONCLUINDO O TRABALHO – RETOMANDO APRENDIZAGENSMontamos o painel de acordo com a composição definida na aula anterior e

retomamos os combinados a respeito dos encontros do grupo. Após esses primeiros combinados,a professora propôs que avaliássemos o resultado do trabalho até aquele momento, pensandonas nossas expectativas.

Propôs que mergulhássemos um pouco no painel (que já estava quase pronto,faltando apenas últimos retoques) para contar sobre as nossas aprendizagens, pensando semprenas seguintes questões:

- A construção coletiva do painel,- A constituição do Grupo de Referência,- A construção do Projeto Político Pedagógico,- As dimensões envolvidas neste trabalho.

As falas que surgiram:- Estamos pacientemente esperando os últimos retoques e ainda

curtindo...

Page 14: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

14

- O trabalho revela o que é o nosso grupo: comprometido, muitasdivergências, mas todo mundo muito apaixonado.

- Mesmo sem saber, todo mundo participou e todos foram se ajudando.- As pessoas se ajudaram e não foi só neste trabalho, mas em outros

também.- O painel está alegre, forte mas está leve e tem vida.- A arte é uma janela para o mundo. A gente abre uma outra dimensão

na nossa relação com o mundo.- Pensando no PPP, como é difícil que todas as pessoas se envolvam

e participem principalmente aquelas que se sentem incapazes.- Essas diferenças características de cada pessoa mobilizam-nos

também de formas diferentes.- A professora apostou em nós e nós topamos.- Pensei que meu quadro não iria se encaixar em lugar nenhum mas

no final deu tudo certo.- É complicado mexer na obra de arte do outra pessoa. É mexer numa

coisa que vem lá de dentro...- Ficou mais fácil pedir e oferecer ajuda.

Como resultado do trabalho, considero que houve aprendizagem acerca daconstrução do Projeto Político Pedagógico e que concretamente o grupo se revestiu de um caráterdiferente em relação a esse marco que é a formatura, na perspectiva da continuidade, da reflexão,da mudança de vínculo e com a disponibilidade para se constituir de fato como um grupo dereferência com vistas a investir em sua formação continuada.

Foi desta forma que encerramos o semestre...e preparamos o início de uma novafase de nosso aprendizado. Agora como pares...

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

ALMEIDA, Laurinda Ramalho; PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza (Orgs). O CoordenadorPedagógico e o cotidiano da escola. São Paulo, Loyola, 2003.

ÁLVAREZ, Manuel [et all.]; O projeto educatico da escola. Trad. Daniel Angel Etcheverry Burguño.Porto Alegre. Artmed,2004

VASCONCELOS, Celso dos Santos. Coordenação do trabalho pedagógico. São Paulo, Libertad,2002.

Page 15: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

15

A educação infantil brasileira passa por um momento de grandes transformaçõesseja no campo da legislação, seja no campo das práticas educativas. O debate a respeito dopapel da educação infantil na contemporaneidade ocupa lugar nas universidades e nas diferentesinstituições que atendem a criança pequena, na busca da construção de uma Pedagogia daInfância, que trate das especificidades da educação da criança de 0 a 6 anos. A produção depesquisas na área tem crescido e contribuído muito para essa sistematização, no entanto, hápoucos trabalhos que versam sobre a gestão na educação infantil, o papel do diretor e tampoucoa respeito da formação dos mesmos, seja ela inicial ou continuada. Grande parte das produçõesdiscute a formação do educador, o que consideramos de extrema importância, no entanto, emborao Diretor exerça um papel fundamental nas instituições e, especificamente, na formação da equipede trabalho, pouco se discute a esse respeito.

A relevância da temática gestão da educação infantil está pautada na compreensãode que existe a necessidade da formação inicial e continuada do gestor, uma vez que estesprofissionais precisam dominar conhecimentos específicos sobre o funcionamento das instituiçõesde educação infantil, bem como as peculiaridades do trabalho com as crianças de 0 a 6 anos deidade.

Pode-se, inferir que a tendência assistencialista, presente na trajetória da educaçãoinfantil brasileira, legitima a contratação de gestores que, em sua maioria, nunca tiveram umcontato direto ou teórico com as temáticas da área. Neste cenário depara-se com um quadro deprofissionais leigos que, sem formação específica, coordenam outros profissionais para trabalharcom a criança pequena, revelando um traço perverso do assistencialismo. Por outro lado, dianteas transformações ocorridas na área, em função da incorporação das creches e pré-escolas nosistema de ensino, assiste-se também a chegada de muitos gestores com experiência no ensinofundamental que, de forma intencional ou não, constroem um trabalho pautado numa visão escolar,transpondo propostas e normas inerentes ao segmento do ensino fundamental e médio.

Esta realidade revela a urgência de ampliar o debate sobre a identidade e formaçãodo gestor em educação infantil, tal como tem sido feito em relação aos professores de crianças de0 a 6 anos, área que contou com um maior desenvolvimento nos últimos anos, pois, emboracompreendamos que o gestor é um educador, a sua formação comporta peculiaridades, nãocontempladas na formação do professor.

Segundo Tronnolone “(...) poucas são as produções específicas sobre gestão emeducação infantil, creche ou pré-escola, em geral, existe um número maior de publicações sobre

A FORMAÇÃO INICIAL DO DIRETOR DE EDUCAÇÃOINFANTIL: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA

MONÇÃO, Maria Aparecida Guedes (Faculdade Integração Zona Oeste - FIZO)

Page 16: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

16

a gestão nos demais níveis de ensino“ (2003, p. 90). Além disso, pode-se também perceber aescassez do debate sobre o tema quando se analisa as pautas dos seminários e congressos naárea de educação infantil, pois as reflexões sobre gestão, aparecem timidamente, ou mesmoinexistem.

A concepção de educação infantil adotada no presente trabalho compreende ainstituição de educação infantil como a primeira etapa da educação básica que integra cuidado eeducação numa ação compartilhada com a família. Cabe salientar que a compreensão sobrecuidado pauta-se numa abordagem ampla:

A base do cuidado humano é compreender como ajudar o outro ase desenvolver como ser humano. Cuidar significa valorizar e ajudara desenvolver capacidades. O cuidado é um ato em relação ao outroe a si próprio que possui uma dimensão expressiva e implica emprocedimentos específicos. O desenvolvimento integral dependetanto dos cuidados relacionais, que envolvem a dimensão afetiva edos cuidados com os aspectos biológicos do corpo, com a qualidadeda alimentação e dos cuidados com a saúde, quanto da forma comoesses cuidados são oferecidos e das oportunidades de acesso aconhecimentos variados (BRASIL/MEC,1999, p. 24).

A partir desta visão ampla de cuidado, considera-se que, na educação infantil, ocuidado relaciona-se às crianças, aos profissionais, às famílias, ao ambiente físico e relacional daescola.

No âmbito da gestão, o cuidado se desvela na formação contínua da equipe embusca da construção de uma gestão democrática e participativa que garanta a voz de todos ossujeitos que compõem o cenário da instituição, ou seja, crianças, profissionais e famílias.

O reconhecimento do papel fundamental da afetividade na relação entre adultos ecrianças na instituição de educação infantil, aponta a necessidade do trato com as questõesrelacionais, sem perder de vista o significado do contexto social, político e econômico na formaçãodos diferentes atores da instituição. Compreendendo, assim, o contexto escolar como lócus deeducação de todos, de encontros permanentes em que o aprendizado para conviver com asdiferenças é um desafio constante.

A gestão na educação infantil tem que tomar como referência principal o sujeitocriança, considerando suas capacidades e cultura na busca da construção da gestão social queintegra as dimensões políticas, culturais e educacionais.

Neste sentido, adota-se o conceito de gestão social, explicitado por Ghedini (1994),como norte para a reflexão sobre a especificidade da gestão na educação infantil brasileira:

(...) É preciso explicar o significado da gestão social, porque vai muitoalém de uma simples relação entre trabalhadores de creche e ospais: tem um sentido político, cultural e educativo (...) o significadopolítico implica a vontade de governar de forma descentralizada,oferecendo aos cidadãos (neste caso, aos pais) mais poder edemocracia nas decisões.

Page 17: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

17

O significado cultural corresponde à oportunidade de trocas entre os trabalhadoresde creche, pais e comunidade local, através das quais os trabalhadores de creche e pais não sósocializam e compartilham seus problemas, recursos e estratégias, como também contribuempara a disseminação de concepções culturais relativas à educação e às necessidades sociais dasfamílias. Os serviços tornam-se assim um instrumento de conscientização, promoção e crescimentocultural, em questões gerais relevantes para as crianças.

O significado pedagógico implica a necessidade de um plano educacional bemelaborado, que seja voltado não para uma criança abstrata, mas para crianças que são uma complexacombinação de suas características psicológicas e do contexto social e cultural onde seudesenvolvimento ocorre (Ghedini, 1994, p.205-6).

Assim, tendo explicitado os conceitos básicos que embasam a reflexão sobreeducação infantil, o presente texto tem por objetivo discutir a importância do processo de formaçãoinicial de gestores (ou diretores) que atuam na educação infantil, tendo como eixo a socializaçãode minha experiência como docente na disciplina de Princípios e Métodos da Educação Básica I,ministrada na Faculdade Integração Zona Oeste, a qual tem como tema central à discussão dagestão na educação infantil. O presente trabalho pretende dar visibilidade e incentivar o debatesobre a especificidade da gestão na primeira etapa da Educação Básica.

APRESENTANDO O CURSO DE PEDAGOGIA DA FIZO

A proposta de formação construída no Curso de Pedagogia da Faculdade IntegraçãoZona Oeste (FIZO), tem como eixo central à formação do educador reflexivo e pesquisador. Nestaperspectiva, é de fundamental importância o exercício do pensamento a partir da dúvida, da reflexãodiante de uma realidade educacional dinâmica e complexa que exige tanto dos educadores quantodos educandos uma abertura constante para o novo, para a construção de novas estratégias,novos percursos na busca de novas possibilidades, que favoreçam o rompimento com a perspectivadeterminista que situa a prática pedagógica de maneira racional e única.

Pensar um curso de Graduação em Pedagogia, nesta perspectiva complexa einteracionista, suscita a necessidade do diálogo constante entre teoria, prática, pesquisa e reflexão,na busca da formação do educador pesquisador e reflexivo.

Manter uma boa relação com teorias e com a reflexão teórica é fun-damental para a formação do educador reflexivo e para se cultivaruma boa relação com o conhecimento. Estimular no educador ogosto pelo estudo é tarefa do formador, que por sua vez devedesenvolver em si próprio este gostar. Uma condição para se culti-var uma boa relação com o ato de estudar está, sem dúvida, napossibilidade de se encarar o conhecimento como espaço de criaçãode hipóteses, de manifestação de dúvidas, de erros e tentativas deacertos. A impossibilidade de errar ou de se criar hipóteses podeprovocar silêncios no processo de aprendizagem que conduzirãoaquele que aprende para longe do conhecimento e das situaçõesde reflexão (Bambini, Monção e Tronnolone, 2000, p. 5).

Page 18: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

18

Assim, o curso de Pedagogia da FIZO contempla em sua grade disciplinas queprivilegiam a prática e a pesquisa, com o intuito de favorecer ao educando um olhar reflexivo arespeito do campo da educação e a construção de sua identidade profissional. Neste sentido,reconhecendo a relevância e a especificidade da educação infantil, o curso possui a disciplina dePrincípios e Métodos em Gestão da Educação Básica I, com a finalidade de inserir o aluno naárea, contribuindo para a sua formação enquanto gestor desta etapa da educação.

A disciplina, oferecida no 2o semestre do curso, tem como preocupação centralinserir os alunos nas discussões contemporâneas sobre a educação da criança pequena, seusdesafios e perspectivas, integrando a reflexão sobre a importância da construção de práticas degestão democrática na educação infantil.

Os objetivos da disciplina podem ser sintetizados em cinco eixos:1. Construir com os alunos uma visão sobre educação infantil alicerçada numa

concepção integral de cuidado e educação, bem como o papel social das instituições que atendemcrianças pequenas.

2. Possibilitar aos alunos conhecer o histórico da educação infantil, inserindo-os nas discussões contemporâneas da área, a fim de favorecer a reflexão sobre os conceitoschaves para a construção de uma educação infantil de qualidade, compreendo a criança como ofoco do trabalho desenvolvido.

3. Favorecer a construção de uma visão de criança como sujeito de direitos efoco principal das preocupações da instituição de educação infantil.

4. Realizar a conexão entre teoria e prática, através das análises dos estágiose das palestras com diretores e coordenadores pedagógicos, à luz da fundamentação teóricaadotada ao longo do semestre e das reflexões realizadas em sala de aula.

5. Analisar os diferentes tipos de gestão em educação infantil, refletindo, apartir das pesquisas realizadas no estágio, sobre o papel do diretor e do coordenador pedagógico,tendo em vista a especificidade da educação infantil.

COMPARTILHANDO O PERCURSO DA DISCIPLINA

Três anos se passaram desde a primeira turma que cursou a disciplina princípios emétodos de gestão na educação básica I. Nesse período a sala de aula foi palco de muitasreflexões envolvendo os alunos, os diretores e coordenadores pedagógicos de educação infantil ea professora responsável.

A disciplina tem como foco a formação do gestor de educação infantil, numaperspectiva democrática que ouve e envolve todos os atores que compõem a instituição, ou seja,crianças, profissionais e famílias. Esse envolvimento se dá desde o conhecimento do trabalhorealizado, até a participação efetiva nas decisões. Desde sua concepção, a disciplina foi pensadade maneira global, compreendendo a necessidade de articulação entre teoria-prática-pesquisa ereflexão.

Page 19: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

19

A sensibilização inicial no inicio do semestre versa sobre a visão de criança einfância buscando favorecer a reflexão dos alunos sobre a criança como sujeito de direitos e aimportância desta etapa do desenvolvimento na formação da pessoa. Esse processo muitas vezes,remete a imagens e vivências da infância dos próprios alunos, configurando um momento demuitas lembranças e reflexões sobre esta fase.

É neste momento que é realizada a discussão sobre a concepção de educaçãoinfantil, como primeira etapa da educação básica, que integra cuidado e educação numa açãocompartilhada com as famílias. Tal perspectiva favorece introduzir a idéia de que o cuidado nainstituição de educação infantil deve ser entendido com relação aos diferentes atores que acompõem: crianças, profissionais e famílias. Tal temática é desenvolvida, também, por meio dascontribuições de Campos (1994) e Cerisara (1999).

A reflexão aprofundada sobre o cuidado, desvela, também, a dimensão da afetividadeno espaço educativo, buscando entendê-la como fruto das relações interpessoais estabelecidasno contexto da instituição, pois aqui a escola é compreendida como o lócus de educação de todosos segmentos que a constituem.

O histórico da educação infantil é introduzido situando as diferentes concepções erepresentações sobre a educação infantil e os diferentes lugares que as crianças, profissionais efamílias ocuparam nesta trajetória. Neste momento, as obras de Haddad (1987); Kishimoto (1988);Kuhlmann Jr. (1998) e Kramer (1987); e o documento BRASIL (1999) servem como referênciascentrais ao desenvolvimento do trabalho. É um momento de muitas descobertas, com vistas adesenvolver um novo olhar para a educação infantil, mas também é momento em que afloram osconflitos e tensões explicitando as concepções assistencialistas e escolarizadas que reforçam apolarização entre cuidar e educar nas práticas educativas.

Neste cenário de muitas inquietações e descobertas, os alunos participam em salade aula de encontros com diretores e coordenadores pedagógicos de educação infantil. Os gestoresrelatam suas experiências, concepções, questionamentos sobre sua atuação na gestão. Apóscada encontro, é realizada, em sala de aula, a reflexão sobre o mesmo, buscando identificar norelato dos profissionais os princípios e concepções que sustentam a sua gestão. A diversidadedos relatos dos profissionais possibilita visualizar a heterogeneidade existente e aprofundar a reflexãoa respeito das diferentes concepções de gestão. Aqui Mello (1987,2000); Ghedini (1994); Campos(1995) garantem o aprofundamento da reflexão.

O contato com a literatura de educação infantil acontece ao longo de todo o semestre,em sala de aula é construído um debate permanente buscando articular a fundamentação teóricaexplicitada nos textos e os relatos das profissionais e dos estágios, reforçando a concepção degestão democrática.

Esse processo é enriquecido pelo fato de existir, dentre os alunos do curso depedagogia, uma diversidade entre aqueles que ainda não atuam na área de educação e aquelesque já atuam na educação infantil, seja no papel de educador seja no papel de diretor. Esta

Page 20: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

20

multiplicidade de experiências garante a riqueza nas discussões em sala de aula, favorecendo aaproximação entre a fundamentação teórica e a realidade cotidiana.

A conclusão da disciplina acontece com a produção de uma sistematização daspalestras e sua articulação com os textos estudados. Assim, os alunos dividem-se em pequenosgrupos e a partir dos registros de aula, constroem um quadro com as idéias das palestrantes e umtexto reflexivo que discute, ainda que de maneira preliminar, as convergências e divergênciasentre os relatos e sua aproximação ou distanciamento dos textos estudados. É um exercício deanálise e discussão dos alunos sobre o conteúdo trabalhado. A conclusão desta sistematização éfeita com a elaboração de um texto com o título “A gestão na escola de educação infantil dosnossos sonhos”.

O ESTÁGIO E SEUS DESAFIOS

Concomitantemente, ao longo do semestre os alunos realizam o estágio eminstituições de educação infantil, o qual está organizado em torno da pesquisa e daobservação. Os alunos realizam durante a atividade quatro entrevistas, duas com diretorese duas com Coordenadores Pedagógicos na rede pública e particular, além de observaremreuniões de pais e professores e a realizarem a leitura dos documentos da escola, talcomo o Projeto Político-Pedagógico e o Regimento Interno.

A sistematização dos dados ocorre mediante a gravação e transcrição dasentrevistas, os registros de observação do funcionamento da instituição e a síntese dos documentosda mesma. Quando os alunos terminam a etapa de campo, é iniciada a construção do relatório deestágio que compreende, primeiramente, os relatos das entrevistas e observações, juntamentecom as reflexões dos estagiários. O próximo passo é a categorização e a análise comparativa dasentrevistas, que é realizada a partir da escolha de algumas questões que servem como guias paraa análise. Monta-se um quadro com os depoimentos dos diretores e coordenadores o que favorecea construção de um texto analítico com os dados coletados, à luz dos textos discutidos em sala.A conclusão do relatório se dá com uma reflexão do aluno sobre seu aprendizado ao longo doestágio.

Os momentos de supervisão de estágio, que ocorrem fora do horário das aulas,possibilitam refletir sobre as observações dos alunos, aprofundando o olhar sobre os dados obtidose também favorecendo a troca de informações entre os discentes, tendo em vista que a socializaçãodos mesmos evidencia um repertório amplo de relatos de trabalhos realizados em diferentesinstituições de educação infantil, evidenciando a pluralidade de formas de atendimento à criançapequena.

Esse momento é rico, pois favorece retomar os conceitos trabalhados em sala deaula e também, acrescentar novos, a partir dos depoimentos dos diretores e coordenadoresentrevistados e das observações realizadas.

Page 21: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

21

É importante destacar que se reconhece as limitações que um estágio de pesquisae observação se coloca na formação dos educadores, mas considerando as dificuldades encontradasno âmbito institucional para financiamento e apoio de pesquisas e trabalhos de intervenções nasinstituições, além das dificuldades que os alunos apresentam em conciliar estudos e trabalho,acredita-se que tal proposta tem alcançado, seus objetivos e favorecido a construção de um novoolhar para a educação infantil e para a especificidade da gestão neste segmento de ensino.

CONCLUSÕES PROVISÓRIAS

A riqueza da experiência desenvolvida na disciplina Princípios e Métodos em Gestãoda Educação Básica I, permite que os alunos, principalmente aqueles que não têm contato cominstituições de educação infantil, tenham a dimensão do desafio imposto para o gestor da educaçãoinfantil. Da mesma forma, para os alunos que já têm contato com essa realidade, seja comoprofessores ou gestores, possam compreender a especificidade da gestão nas instituições queatendem crianças pequenas. O início da disciplina permite acesso a depoimentos de alunos que jásão gestores evidenciando a falta de preparo quando assumiram a gestão da creche ou pré-escola, conforme exposto a seguir:

“Meu primeiro dia na creche foi assustador, pois foi a primeira vez naminha vida que entrei em uma creche, tendo como incumbênciaseu gerenciamento” (M.L.).

“A minha chegada foi, num primeiro momento, tudo novo, tive pouca orientação,quanto ao trabalho burocrático, embora já sabia algumas coisas. A parte mais difícil foi em comoadministrar um grupo, pois tinha que conduzi-los e ao mesmo tempo me adaptar” (C.L.).

Estes depoimentos revelam a chegada de profissionais nas creches e pré-escolasem formação anterior, pautando-se unicamente na experiência como processo de apropriação eaprendizado, o que muitas vezes constituem-se em práticas espontaneístas que reforçam a visãoassistencialista de atendimento à criança pequena.

Conforme já foi apontado em outra pesquisa realizada (Monção, 1999) muitosprofissionais deparam-se com um cotidiano permeado de sentimentos ambivalentes com relaçãoao significado da creche, traduzidos em diferentes concepções e expectativas. Tal pluralidadeaflora, muitas vezes, focos de tensão entre profissionais e famílias, revelando as influências tantoda vertente assistencialista quanto da educacional.

Gerenciar os conflitos inerentes a um contexto marcado por diferentes interesses enecessidades é uma tarefa difícil e até mesmo árdua, que exige do gestor conhecimentos sobre aárea de educação infantil, reflexão a respeito das diferentes formas de coordenar estas instituições,e flexibilidade para lidar com uma rotina de trabalho dinâmica e complexa, permeada por emoções.

Se, por um lado, tais dificuldades encontradas no cotidiano podem interferirdiretamente na qualidade do atendimento à criança, impossibilitando, em muitos casos, a construção

Page 22: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

22

de um ambiente que favoreça o desenvolvimento integral da criança, por outro, a superação e oenfrentamento das mesmas pode favorecer a consolidação das creches e pré-escolas como umambiente educativo favorecendo a re-significação das representações sobre a educação infantil.

O trabalho realizado tem sido constantemente repensado, a partir das questõessuscitadas no estágio e nas avaliações dos alunos, entretanto, podemos visualizar alguns objetivosque estão sendo alcançados no próprio depoimento dos alunos:

“A matéria prática pedagógica e pesquisa despertou meu olhar paraa necessidade de ser conversar mais sobre as nossas atitudes erever a nossa postura perante problemas muitas vezes ditos semsolução e com um tom fatalista (...) Sem contar com a ampliação dehorizontes através dos textos, livros e discussões feitos em sala deaula onde confrontamos o parecer de pessoas que trabalham naárea da educação com pessoas que nunca estiveram ligadasdiretamente a educação” (M.G.).

Assim, a intenção de ampliar o repertório de referências na área tem sido o grandedestaque do trabalho, fator considerado pelos alunos bastante positivamente:

“(...) as visitas realizadas foram muito proveitosas, pois me colocarampróxima a outras realidades, as quais nunca tinha tido oportunidadede me aproximar que revelaram práticas tão diferentes, as quais apartir de então pude ter parâmetros para minha atuação” (M.L).

Muitos são os desafios deste trabalho, pois os alunos sentem muitas dificuldadespara a realização do estágio seja em função do tempo, pois na sua maioria, é composta porestudantes que trabalham, seja na elaboração e construção dos registros e reflexões que o estágiosolicita.

Considerando o percurso realizado ao longo desses anos, os resultados são positivos,favorecendo à construção de um novo olhar sobre a educação infantil, e sobre a especificidade dagestão nesta área. Pode-se perceber também, o interesse em aprofundar essa temática,especialmente nos Trabalhos de Conclusão de Curso, já que há um grande número de trabalhosque versam sobre a gestão na educação infantil.

A meta é favorecer, através da formação inicial, um processo no qual o diretorassuma sempre como busca a “outra margem” e que as “pedras” encontradas pelo caminho,sejam visualizadas como desafios a transpor, a fim de construir uma educação infantil brasileira dequalidade social e que realmente favoreça a construção de uma sociedade mais justa, com pessoasautônomas e felizes.

(...) Terás então de ler doutra maneira, Como, não serve a mesmapara todos, cada um inventa a sua, a que lhe for própria, há quemleve a vida inteira a ler sem nunca Ter conseguido ir mais além daleitura, ficam pegadas à página, não percebem que as palavras sãoapenas pedras postas a atravessar a corrente de um rio, se estão alié para que possamos chegar a outra margem, a outra margem éque importa...” (José Saramago, A caverna, p. 77).

Page 23: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

23

BIBLIOGRAFIA

BRASIL.Ministério da Educação e Desporto.Referenciais Curriculares para a EducaçãoInfantil.Brasília: MEC/SEF/ DPE/COEDI 1999.

BRUNO, E.G.; MONÇÃO, M.A.G.;TRONNOLONE, M. A Formação do diretor de creche –Relato de uma experiência com diretores das creches diretas da região Itaquera -Guaianazes/SP. In: Congresso Paulista de Educação Infantil, 2o.,1998, Águas deLindóia.

CAMPOS, M. M. Educar e cuidar: questões sobre o perfil do profissional de educação infantil. In:BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Por uma política de formação profissional deeducação infantil. Brasília: MEC/SEF/DPE/COEDI, 1994, p.32-42.

CAMPOS, M. M., ROSEMBERG, F. Critérios para um atendimento em creches que respeite osdireitos fundamentais das crianças. Brasília: MEC/SEF/COEDI, 1995.

CERISARA, A. B. Educar e cuidar: por onde anda a educação infantil? In: Perspectiva: Revistado Centro de Ciências da Educação.UFSC/CED. No. Especial, Florianópolis, 1999, 11-21.

GHEDINI, P. O. Entre a experiência e os novos projetos: a situação da creche na Itália. In:ROSEMBERG, F., CAMPOS, M. M. (Orgs.). Creches e pré-escolas no Hemisfério Norte. SãoPaulo: Cortez, FCC, 1994.

HADDAD. L. A relação creche-família: relato de uma experiência. Cadernos de Pesquisa, SãoPaulo, n.70, p.70-78, 1987.

KHULMANN JR., M. Infância e educação infantil: uma abordagem histórica. Porto Alegre: Mediação,1998.

KISHIMOTO, T. M. A Pré-escola em São Paulo.São Paulo: Loyola, 1998.

KRAMER, S. A política do pré-escolar no Brasil: a arte do disfarce. Rio de Janeiro: Dois Pontos,1987.

MELO, A. Tempo de mudança na creche Vila Praia: relato de uma experiência. Cadernosde Pesquisa, São Paulo, n.70, p.80-84 , 1987.

______.Um diálogo com os diretores de creche e pré-escola. In: ROSSETTI-FERREIRA, M. C.MELLO, A. M.,VITÓRIA, T.,GOSSUEN, A.,CHAGURI,A.C. Os fazeres na educação infantil. SãoPaulo: Cortez, 1998, p.15-18.

MONÇÃO, M.A. G. Subalternidade ou Parceria? Um estudo das representações sociaissobre a participação das famílias nas creches. 1999. Dissertação (Mestrado empsicologia da Educação). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.ROSSETTI-FERREIRA,M.C.,MELLO, A. M.,VITÓRIA, T.,GOSSUEN, A.,CHAGURI, A.C.Osfazeres na educação infantil. São Paulo: Cortez, 1998.

ROSEMBERG, F., CAMPOS, M.M. Creches e pré-escolas no Hemisfério Norte. São Paulo: Cortez,FCC, 1994.

TRONNOLONE, M. A gestão de creche no município de São Paulo: Diretores emcontexto. 2003. Dissertação (Mestrado em Educação). Pontifícia UniversidadeCatólica de São Paulo.

Page 24: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

24

Na formação de professores um tema freqüentemente relegado a segundo plano éa construção de materiais didáticos. Ao participar de cursos de formação contínua, os professoresem serviço revelam a expectativa de que a utilização de materiais manipuláveis no processo deensino pode amenizar as dificuldades de aprendizagem pelo suporte da materialidade. Essaexpectativa nem sempre é atendida, sendo identificada, algumas vezes, como uma busca desoluções prontas, padronizadas que não consideram o contexto e as individualidades. A construçãode materiais didáticos tem sido considerada como menor no campo da didática. Essa área tem-se configurado como ciência, abrangendo as diferentes dimensões do processo de ensino eaprendizagem. Observa-se nas disciplinas de didática grande ênfase nos fundamentos histórico-filosófico-sociológicos do processo educativo e menor espaço para a elaboração, aplicação eavaliação de materiais didáticos, por exemplo. Isso não implica em uma dicotomia entre essasdimensões do processo de ensino e aprendizagem, o que significaria esquizofrenia pedagógica.

A construção e o uso de materiais didáticos passa primeiramente pela concepçãosobre o papel dos docentes. Esse tema está vinculado a dois aspectos interligados: a formação deprofessores e as suas concepções pedagógicas. Fiorentini e Miorim (1990) destacam esse fatoquando analisam esta temática, lembrando que a escolha de um material, pelo professor, nemsempre é realizada com a devida clareza quanto a sua fundamentação teórica. De modo geral,enfatizam os autores, sempre que um congresso ou encontro de professor de matemática promoveoficinas, conferências a respeito dessa temática, as salas ficam lotadas, evidenciando o grandeinteresse pelos materiais e jogos. Entretanto, essas discussões, muitas vezes, ficam restritas àutilização de um recurso que se mostrou favorável para a abordagem de um determinado tópicoda matemática, não ocorrendo, naquele momento, reflexões de caráter epistemológico.

Precisamos superar a expectativa que muitos professores têm, quando justificam aopção pela utilização de materiais concretos, como um fator de motivação tornando as aulas maisalegres, para que os alunos passem a gostar da matéria.

Ao falar sobre a importância dos materiais concretos na aula de matemática,Fiorentini e Miorim (1990) salientam que “por trás de cada material se esconde uma visão deeducação, de matemática, do homem e de mundo; ou seja, existe, subjacente ao material, umaproposta pedagógica que o justifica”. Os autores enfatizam ainda que os professores não podem“subjugar sua metodologia de ensino a algum tipo de material porque ele é atraente ou lúdico (...)nenhum material é válido por si só”.

A PRODUÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO E ODESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DE

PROFESSORES: UMA APROXIMAÇÃO ENTRELITERATURA INFANTIL E MATEMÁTICA

OLIVEIRA, Rosa Maria Moraes Anunciato de;PASSOS, Cármen Lúcia Brancaglion (DME-UFSCar)

Page 25: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

25

Esse contraponto apresentado pelos autores indica para a formação de professoresa busca de um equilíbrio entre a teorização da área e a ênfase nos recursos. As concepções deCastelnuovo (1970) podem ser extendidas para a formação de futuros professores ao enfatizarque a idéia fundamental da ação deve ser a reflexão:

que o interesse da criança não seja atraído pelo objeto material emsi ou pelo ente matemático, senão pelas operações sobre o objetoe seus entes. Operações que, naturalmente, serão primeiro decaráter manipulável para depois interiorizar-se e posteriormentepassar do concreto ao abstrato. Recorrer à ação, diz Piaget, nãoconduz de todo a um simples empirismo, ao contrário, prepara adedução formal ulterior, desde que tenha presente que a ação, bemconduzida, pode ser operatória, e que a formalização mais adiantadao é também (p. 25).

Na formação de professores a questão do domínio do conteúdo é tratada quandoos estudos focam as concepções de estudantes sob a forma de base do conhecimento para oensino.

Sem dúvida uma questão fundamental refere-se aos professores iniciantes, quenão tiveram ainda oportunidade de criar sua forma pessoal de lidar com o conteúdo advinda daaprendizagem do conteúdo em situações de exercício da docência.

Tendo em vista a superação dos dilemas aqui levantados investimos em açõesformativas que procuram aliar literatura infantil, leituras, narrativas e conteúdos matemáticos naformação de professores.

LÍNGUA ESCRITA E CONTEÚDO MATEMÁTICO: ARTICULAÇÃO POR MEIODE NARRATIVAS

A produção de textos nas aulas de matemática cumpre um papel importante paraa aprendizagem do aluno. Diversos estudos envolvendo questões da linguagem e da matemáticavêm sendo realizados. Lopes (2003) tem investigado, desde 1993, a escrita como um instrumentode avaliação no processo de ensino e aprendizagem da Matemática. O autor ressalta que estudoscom foco em atividades de comunicação, escrita e uso de instrumentos de registros tais comocadernos, diários, portfólios e outras modalidades de textos têm sido considerados na elaboraçãode documentos curriculares.

Utilizar a narrativa aliada ao processo educativo em geral é um meio bastantedifundido desde as tradicionais fábulas e os apólogos aos livros paradidáticos da atualidade. Tratandode conteúdos matemáticos, ainda na primeira metade do século XX, Monteiro Lobato escreve asua Aritmética da Emília, fazendo referência a outra obra bastante conhecida: O homem quecalculava de Malba Tahan, pseudônimo de Júlio César de Mello e Souza. Dalcin (2002) pesquisoua importância dos livros paradidáticos para o ensino da Matemática no 3o. e 4o. ciclo do EnsinoFundamental e ao se referir às obras de Lobato e Malba Tahan afirma que “através de suas obras

Page 26: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

26

mostraram-nos que a matemática pode ser ensinada por meio de nossa capacidade imaginativae criativa de contar histórias” (p.15).

Smole e Diniz (2001), Smole et al. (2004) estudam as conexões da literatura infantile da produção de textos na aula de Matemática. Outros autores como Bicudo e Garnica (2001),Gómez-Granel (1996), e Teberosky e Tolchinsky (1996), também mostram a importância do trabalhointegrado, bem como a aproximação da área da matemática e da língua materna.

A literatura é por excelência um espaço de síntese da experiência humana, dasemoções e, por isso, seu uso tem sido destacado em diversos estudos como privilegiado para otrabalho interdisciplinar. O texto nas aulas de matemática contribui para a formação de alunosleitores, possibilitando a autonomia de pensamento e também o estabelecimento de relações einferências, com as quais o aluno pode fazer conjecturas, expor e contrapor pontos de vista. Pois,como afirma Smole et al. (2004:2):

Interrogado pelo texto o leitor volta a ele muitas vezes paraacrescentar outras expectativas, percepções e experiências, destaforma, a história contribui para que os alunos aprendam e façammatemática, assim como exploram lugares, características eacontecimentos na história, o que permite que habilidadesmatemáticas e de linguagem desenvolvam-se juntas, enquanto osalunos lêem, escrevem e conversam sobre as idéias matemáticasque vão aparecendo ao longo da leitura. É neste contexto que aconexão da matemática com a literatura infantil aparece.

Dalcin (2002:60) referindo-se à importância da ficção na infância, afirma que

as narrativas ficcionais mais conhecidas como “histórias” exercemforte influência tanto na formação cognitiva como na afetiva e socialda criança. Sejam na forma de antigas lendas, contos de fadas,histórias infantis ou parábolas bíblicas, independentemente dogênero, as narrativas de ficção valorizam e ampliam nossacapacidade imaginativa, desenvolvem várias habilidades e estruturasdo pensamento, além de auxiliarem na construção de significados.

A referida autora enfatiza ainda que, relativamente à Matemática pode-se dizer quea imaginação tem um importante papel nos processos de compreensão, reflexão e abstração,pela possibilidade de criação de situações particulares vinculadas a outras conhecidas.

Na mesma direção, os estudos de Alton-Lee, Nuthall e Patrick (1999) indicam queas experiências das crianças na construção de conhecimentos caracterizam-se como um processoúnico envolvendo três fatores concorrentes: a resposta aos tópicos do currículo, o gerenciamentoda cultura da classe e a participação nos processos socioculturais.

O termo “construção de conhecimento” é usado para referir-se a uma unidade doconhecimento que é construída na memória quando a criança interpreta a experiência escolar emrelação a um conhecimento anterior. Essa construção envolve a criança em uma série de processoscognitivos: obter informações, criar associações, elaborar o conteúdo, avaliar a veracidade e aconsistência da informação e desenvolver conhecimentos metacognitivos (ALTON-LEE, NUTHALLe PATRICK, 1999). O ato de ler e entender a história favorece e potencializa esses processos

Page 27: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

27

cognitivos importantes para capacitar a criança a penetrar no estudo da matemática como umaárea de conhecimento que exige a compreensão da sua linguagem específica e de raciocíniospróprios para a solução de problemas.

Dalcin (2002:62) salienta que

Por intermédio de histórias infantis, as crianças tomam contato comdiferentes situações e realidades. Os personagens, sejam elehumanos, animais, duendes, fadas, bruxas..., vivenciam conflitos etomam decisões. Habitam num universo situado em um contextoparticular que é regido por regras e normas próprias. Nesse universo,os personagens estabelecem relações entre si e com o seu meio,relações essas que precisam ser conhecidas e compreendidas porquem ouve ou lê a história.

Dessa forma, entender como a narrativa opera ou qual sua função na vida cotidianaajuda a entender seu potencial educativo em sentido amplo ou em sentido estrito: sua utilizaçãonas aulas de matemática e seu poder formativo no desenvolvimento profissional de futurosprofessores.

Inicialmente, é preciso considerar que uma narrativa envolve elementos comopersonagens, enredo, espaço, tempo e, principalmente, a configuração de um conflito relacionadoa mudanças na situação que obrigam à reflexão e/ou ação dos personagens. É a resposta a esseconflito que leva ao desfecho do enredo. A seqüencialidade é uma característica essencial, aocontrário, é indiferente que ela seja “real” ou “imaginária”, assim, tanto o historiador como oromancista partilham a forma narrativa.

Essa estrutura da narrativa advém em grande parte da tradição, mas comoacrescenta Bruner (1997:47-48) é razoável supor que há uma “aptidão” humana para a narrativacapaz de conservar e elaborar tal tradição: “... eu me refiro a uma aptidão ou predisposição paraorganizar a experiência em uma forma narrativa, em estruturas de enredo e assim por diante.”

O autor acrescenta que a essa predisposição para a organização narrativa,

“a cultura logo nos equipa com novos poderes de narração, atravésde seu kit de ferramentas e através das tradições de contar históriase interpretá-las, das quais nós logo nos tornamos participantes”(BRUNER 1997:74).

Uma característica crucial da narrativa, segundo Bruner, é que ela se especializaem forjar ligações entre o excepcional e o comum. Toda cultura assenta-se no canônico, numconjunto de normas, crenças e comportamentos partilhados. A função da narrativa numa culturaestá relacionada à interpretação do excepcional, do incomum e permite ao narrador lidarsimultaneamente com canonicidade e excepcionalidade. Nas palavras do autor: “As históriasatingem seus significados explicando desvios do comum de uma forma compreensível...” (BRUNER1997:49)

Page 28: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

28

Essa característica é valiosa para pensarmos sobre o material narrativo presentenas histórias com conteúdo matemático. Cabe-nos indagar: Qual sua utilidade? Parece que aresposta a essa questão está relacionada de alguma forma ao não canônico, pois esse tipo denarrativa aborda uma temática disciplinar de uma área do conhecimento e integra-a ao discursonarrativo. Permite matematizar o mundo no sentido de tematizar o conteúdo matemático e deslocaa prática docente com esse conteúdo da atitude de passar o ponto, ensinar um conjunto de regraspreviamente formulado, para a atitude inquieta da pergunta, do conflito narrativo que leva à reflexão,à aposta na postura de descobrir a matemática mais que na postura de ensinar a matemática quese conhece.

Dalcin (2002:50-51) afirma que a Educação Matemática começa a buscar umdiscurso próprio aliado à compreensão de que a construção de significados próprios dos alunosna relação com os significados histórica e culturalmente negociados passa pela leitura de novostextos relacionados ao conteúdo matemático. Segundo ela:

Sem dúvida, a busca por esse novo discurso da EducaçãoMatemática passa pela necessidade de procurar formas diferentesde relacionar os vários elementos que, de uma forma ou de outra,sempre nele (discurso) estiveram presentes: os símbolosmatemáticos, as palavras e as imagens.

O papel das imagens (...) parece fundamental, principalmente no atual momentohistórico, no qual as possibilidades tecnológicas ampliaram consideravelmente as suas funçõesnos mais variados setores da sociedade moderna.

O material didático, seja ele de qualquer natureza, para ter efetivo sucesso nautilização no processo de ensino e aprendizagem deve possuir algumas característicasfundamentais para permitir:

a expansão da experiência do aluno e do professor;a problematização dos conceitos ou idéias a seremexploradas;o esclarecimento de algum conteúdo ou oferecer pistas;novas estratégias, revelar heurísticas de resolução.

Enfim, a construção e a utilização de materiais deve permitir tanto ao professorcomo ao aluno a possibilidade de dar uma significação pessoal ao tema estudado, ao conteúdotrabalhado em qualquer nível ou modalidade de ensino, seja um conhecimento conceitual, umconhecimento procedimental ou atitudinal.

Page 29: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

29

A PESQUISA

A área de formação de professores no Brasil possui uma produção consolidadaque pode ser comprovada, por exemplo, pela vasta e rica produção apresentada em congressosnacionais como na Reunião Anual da ANPEd, no ENDIPE e no Congresso Estadual Paulista deFormação de Educadores. No entanto, são raras as pesquisas envolvendo a análise de materiaisdidáticos ou a análise de processos de construção desses materiais por professores ou por futurosprofessores. Este trabalho tem como finalidade analisar as contribuições da construção de livrosinfantis com conteúdo matemático na perspectiva dos participantes dessa experiência.

O CONTEXTO

O trabalho interdisciplinar relacionando literatura e matemática pode resultar emum processo de ensino e aprendizagem extremamente rico, dinâmico e significativo,contribuindo tanto para a aquisição de conceitos matemáticos como para a prática de bonsleitores. A partir da proposta de conectar a literatura infantil com conteúdos matemáticos, em2004 e 2005 foram oferecidas a ACIEPE (Atividade Curricular de Integração Ensino Pesquisa eExtensão) “Histórias Infantis e Matemática nas Séries Iniciais” aos cursos de Pedagogia eLicenciatura em Matemática. Essa ACIEPE possui como objetivos: identificar e analisar obrasde literatura infantil que abordam conceitos e noções matemáticas; produzir livros infantis comconteúdo matemático integrado a outras áreas do conhecimento; utilizar essas produções emcontextos escolares; analisar a pertinência e adequação das produções nas séries iniciais doEnsino Fundamental.

Os participantes da pesquisa foram alunos do curso de Matemática e do cursode Pedagogia. Além de alunos regulares dos cursos da universidade, participaram professoresque atuam em diferentes níveis de ensino cujo contato com a matemática se dá de diferentesmaneiras. Assim, em 2005, tivemos duas professoras de educação infantil, uma professora dematemática que atua no Ensino Fundamental e Médio e uma psicopedagoga. No total foram 15alunos.

Os procedimentos para elaboração do livro incluíram levantamento bibliográficode produções literárias infantis com conteúdo matemático; análises sobre diferentes conteúdosmatemáticos passíveis de serem temas para narrativas; análises dos contextos, característicasde linguagem, adequação à faixa etária e nível de escolaridade necessários para oplanejamento de uma história infantil com conteúdo matemático; discussão junto ao grupo departicipantes das propostas elaboradas; elaboração individual ou em duplas de histórias,seguida de ilustração e encadernação.

Os depoimentos dos participantes (individualmente ou nos grupos) que ocorriamnos momentos de reflexão conjunta durante o processo foram registrados. No final da atividadefoi solicitada uma produção de texto avaliando a própria aprendizagem e as possíveis

Page 30: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

30

contribuições para a prática docente. Esses registros e o livro produzido constituíram-se emfonte de dados da investigação com a finalidade de analisar as contribuições dessa experiênciapara a formação desses professores.

A CONSTRUÇÃO DE HISTÓRIAS INFANTIS COMO INSTRUMENTO DEFORMAÇÃO DE PROFESSORES

A análise dos depoimentos mostra que os professores iniciantes indicam não possuiruma forma pessoal de lidar com o conteúdo matemático advinda da ausência de experiência emsituações reais de docência. Dessa forma, consideraram o levantamento bibliográfico realizado ea catalogação dos livros que pressupunha uma análise de forma e conteúdo dos mesmos comouma oportunidade para suprir essa defasagem.

O levantamento bibliográfico auxiliou na formulação e na escolha do tema do livroelaborado (V. I.)

As catalogações foram importantes para a elaboração do livro, pois forneceramconhecimento sobre: ilustração; linguagem; contexto histórico; conteúdos matemáticos; (T. H.)

Não me senti segura para trabalhar com um tema referente às séries iniciais, pornão ter contato com criança. Assim escolhi o tema “matrizes”. O modo de trabalhar com o temafoi com o jogo de queimada (J. O.)

No contato diário com estudantes de Pedagogia, observamos a dificuldades demuitos deles para lidar com o conteúdo da área de matemática. Essa dificuldade é expressa pelapsicopedagoga ao afirmar:

Não conseguia ver muitos conteúdos matemáticos que não estivessem explícitos.Isso durante o curso mudou muito, pois ao ler livros infantis, procurava qualquer conteúdomatemático. Tive um olhar mais curioso. (G. I)

Esse “olhar mais curioso” de que fala a participante parece ser o resultado maisimportante da experiência vivida, pois implica em uma atitude de pesquisa que passa tanto pelabusca de conhecimentos, pela experimentação, como pelo sentimento de autoconfiança pelapossibilidade de enfim poder aprender e ensinar esse conteúdo de uma maneira nova, criativa.Outra participante, professora de matemática destaca as possibilidades de descoberta da leitura:

Uma experiência nova, que possibilita perceber a importância destes livros para odesenvolvimento do aluno, tendo em vista que sua imaginação e criatividade fluem. Por ter algumasexperiências com material didático–pedagógico (por exemplo, Blocos Lógicos), tive o interessede elaborar o texto sobre as formas e conectá-las com a poesia. (L.E.)

Outra possibilidade apresentada pela elaboração do material foi a de permitir aexpansão da experiência seja em quanto aluno ou enquanto futuro professor.

Para a elaboração dos livros procurei ler sobre o tema, visitar sites infantis, pesquiseitemas sobre fração e numerais decimais.(P. A.)

Page 31: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

31

O tema de meu livro foi retirado de uma aula simulada que apresentei junto comuma amiga. A elaboração do texto foi relativamente simples, já com o titulo do texto tive dificuldades.(N. A.)

Os textos ampliaram meu conhecimento sobre o ensino da matemática. Acatalogação foi importante para a criação de uma visão critica sobre os livros, pois analisando oslivros percebe-se o que seria interessante abordar ou não (V.I)

Uma importante contribuição dada pelo material didático é possibilitar oesclarecimento de algum conteúdo, oferecer pistas tanto ao aluno como ao professor.

O tema foi escolhido devido à dificuldade que algumas crianças apresentam naidentificação de problemas matemáticos e de raciocínio lógico. (T.H.)

A licencianda, assim se expressa tendo como referência sua experiência nosestágios. Percebe-se que se trata de uma observação mais genérica. Outra participante,psicopedagoga, acostumada a lidar com as chamadas dificuldades de aprendizagem, retira dasua experiência o tema para a elaboração do livro e espera que ele preencha uma importantelacuna e que venha a favorecer a aprendizagem desse conteúdo:

A escolha do tema se deu pela observação fixa da minha clientela. A confusão queeles fazem com os valores posicionais. (G.I)

Outra professora participante assim se expressa:Sempre tive dificuldades em trabalhar com os conteúdos voltados para a pré-escola,

e no decorrer do curso através do estudo teórico sobre a temática e com as minhas experiênciaspude elaborar um livro com um tema de interesse das crianças, contendo os conceitos maisutilizados na pré-escola. (R. O.)

Possivelmente, o maior defeito que um material didático pode possuir seja atendência à padronização que abafa a individualidade. Essa experiência de construção de ummaterial a partir da experiência de cada participante, ao contrário, abre a possibilidade para aatribuição de uma significação pessoal ao tema, aos conteúdos de diferentes naturezas trabalhadosno livro, não importando se trata de um conhecimento conceitual, procedimental ou atitudinal.

Uma participante assim analisa suas opções com relação ao conteúdo matemáticoa ser desenvolvido no livro:

Houve modificações na escolha do tema, que acabou sendo limitado aos númerosnaturais de 1 a 12, para que o livro se voltasse para a 1ª série do Ensino Fundamental, série coma qual nunca trabalhei, mas tenho curiosidade em trabalhar. (A.L.)

Outra participante destaca as opções relativas ao tratamento do tema:Os textos estudados foram de grande importância para a elaboração de meu livro,

pois me fizeram compreender que a narrativa deveria ser contextualizada e que muitas vezes oconteúdo que faz sentido ou parece fácil para o adulto não é para a criança (PA.)

Durante este estudo e a realização da primeira versão do livro, percebi que o melhorcaminho era propor o conteúdo na narrativa e propor várias atividades para não se tornar um livro

Page 32: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

32

didático. Também utilizei palavras diferentes, adjetivos, diálogo e em apresentar elementos dacultura oriental pelas ilustrações. (P. A.)

Outra participante ao analisar o percurso para a elaboração do livro nos oferecepistas sobre a maneira como os futuros professores vão construindo sua maneira pessoal de serelacionar com o ensino:

Não conseguia idéias para os temas. Apenas os personagens estavam definidos.Houve muitas mudanças até a elaboração final do livro. No início quis fazer um livro com atividadesque envolvessem as crianças, mas encontrei dificuldades. Conversando com a professora, estasugeriu a análise dos livros “Atividades Matemáticas” e foi a partir disso que começou a surgir aidéia de trabalhar com “quadriláteros”, uma vez que a geometria é uma área pouco abordada emerece atenção (A.S.)

Finalmente, uma participante, aluna do curso de matemática, faz uma síntese dasdificuldades encontradas no processo de construção de um livro de história infantil com conteúdomatemático:

Houve dificuldades, pois apesar de saber da diferença entre incógnita e variável,não conseguia explicar no livro. Para mim foram importantes os textos lidos para “entrar no mundoda criança”, ver o mundo com os olhos delas, para fazer algo para ela. A troca do livro com umaaluna da Pedagogia foi importante, pois ela mostrou que o livro não estava claro para uma criançacompreendê-lo, fato que eu não havia percebido (L. I.)

Dessa maneira, a construção do material didático na formação de professorespossibilita uma reconstrução desse conteúdo na perspectiva do seu ensino. Um elemento importantenessa reconstrução é a percepção dos destinatários desse material, a compreensão de quem sãoos alunos aos quais eles devem auxiliar para que se possa interagir com eles.

A pesquisa revelou ainda que a elaboração de histórias infantisenvolvendo conteúdo matemático por alunos de cursos diferenciados da universidadeconstituiu-se em uma importante experiência formativa teórico-metodológica e reveloudados relativos aos saberes matemáticos manifestos pelos participantes sobre suasconcepções a respeito dos processos formativos vividos ainda enquanto estudantes daeducação básica. Durante essas atividades foi possível verificar que o debateenvolvendo os futuros professores e os professores em exercício provocaram reflexõesque iam além da elaboração do material evidenciando a construção pessoal de saberespróprios à docência.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALTON-LEE, Adrienne, NUTHALL, Graham e PATRICK, John. Reframing Classroom Research:A Lesson from the Private World of Children. In MINTZ, E. e YUN, J. T. The Complex World ofTeaching - Perspectives from Theory and Pratice. Harvard Educational Review. Reprint Series. No

31, pp. 43-75, 1999.

Page 33: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

33

ALTON-LEE, Adrienne, NUTHALL, Graham e PATRICK, John. Reframing Classroom Research:A Lesson from the Private World of Children. In MINTZ, E. e YUN, J. T. The Complex World ofTeaching - Perspectives from Theory and Pratice. Harvard Educational Review. Reprint Series. No

31, pp. 43-75, 1999.

BICUDO, Maria Aparecida e GARNICA, Antonio Vicente. M. Filosofia da Educação Matemática.Belo Horizonte: Autêntica, 2001

BRUNER, Jerome. Atos de Significação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

CASTELNUOVO, Emma. Didática de la Matemática Moderna. México: Trillas, 1970.

DALCIN, Andréia. Um olhar sobre o paradidático de matemática. Dissertação (Mestrado emEducação: Educação Matemática). Campinas,SP: Faculdade de Educação, UNICAMP, 2002,162p.

FIORENTINI, Dario e MIORIM, Maria Angela. Uma reflexão sobre o uso de materiais concretos ejogos no Ensino da Matemática. Boletim da SBEM-SP. São Paulo: SBM/SP, Ano 4, n. 7, 1990, p.GÓMEZ-GRANELL, Carmen. A aquisição da linguagem matemática: símbolo e significado. InTEBEROSKY, A. e TOLCHINSKY, L. (org.) Além da Alfabetização – Aprendizagem fonológica,ortográfica, textual e matemática. (Trad. Stela Oliveira). São Paulo: Ática, 1996, pp. 257-282.

LOPES, Antonio José. A escrita no ensino-aprendizagem da matemática como instrumento deavaliação. In Anais do II Seminário Internacional de Educação Matemática. Santos/SP: SBEM,2003. (CD-ROM).

SMOLE, Kátia Cristina S. et al. Era uma vez na matemática: uma conexão com a literaturainfantil. São Paulo: CAEM/IME/USP. 2004.(3ª.ed).

SMOLE, Kátia e DINIZ, Maria Inez (org.) Ler, escrever e resolver problemas: habilidades básicaspara aprender matemática. Porto Alegre: Artmed, 2001.

TEBEROSKY, Ana. & TOLCHINSKY, L. (org.) Além da Alfabetização – Aprendizagem fonológica,ortográfica, textual e matemática. (Trad. Stela Oliveira). São Paulo: Ática, 1996.

Page 34: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

34

Voltado para a formação de professores, este projeto, Experiências de leitura:caminhos possíveis do ensinar e do aprender, enfoca a leitura como formação e propõe como seuobjetivo geral criar um espaço social para compartilhá-la. Aprovado pelo Núcleo de Ensino/RioClaro e financiado pela Fundunesp, foi desenvolvido nos meses de março a dezembro de 2004,em parceria com a Secretaria de Educação do Município de Rio Claro, para professores doEnsino Fundamental I. Integra um projeto maior, Quem conta um conto ... aumenta um ponto,com início em 1999, no Departamento de Educação da UNESP/ Campus de Rio Claro e ao qualvêm sendo acoplados outros projetos, diversificados em alguns pontos, mas percorrendo todos omesmo caminho investigativo - o do ensino/aprendizagem da leitura - e com a mesma baseteórica.

Preocupadas com essa questão, porque nossos alunos liam apenas para obterinformações, na contra-mão do que pensávamos sobre esse ato, abrimos um caminho investigativopara refletirmos sobre o que se nos colocava como um problema. Neste caminho encontramosalguns teóricos dos quais citaremos dois - Jorge Larrosa - que entende a leitura como formação“(...) para que a leitura se resolva em formação é necessário que haja uma relação íntima entre otexto e a subjetividade. E se poderia pensar essa relação como uma experiência ...” (LARROSA,2002, p. 136) - e Paulo Freire - que a concebe como leitura de mundo “Refiro-me que a leitura domundo precede sempre a leitura da palavra e a leitura desta implica a continuidade da leituradaquele.” (FREIRE, 2003, p. 20)

Com base nestes dois teóricos formulamos o projeto aplicado em 2004, com oobjetivo geral de fornecer um curso, aos professores, para estudo de textos teóricos sobre aaprendizagem da leitura. Do primeiro, selecionamos A Lição (Larrosa, 2003); de Freire (2003), Aimportância do ato de ler. Acrescentamos, ainda, de Marisa Lajolo (1993), o texto Tecendo aleitura, no qual a autora complementa as idéias anteriores, entrelaçando esse conceitos numavisão coletiva do ato de ler: o texto lido por mim, leitor, é por sua vez produto da leitura /ou dasleituras do autor que leu outros textos lidos por outros autores:

Como a manhã, que no poema de João Cabral se perfazia pelo entrelaçamento docanto de muitos galos, também a leitura, principalmente a literária, parece constituir-se um tecidoao mesmo tempo individual e coletivo. Cada leitor, na individualidade de sua vida, vai entrelaçando

CAMINHOS POSSÍVEIS DO ENSINAR E DOAPRENDER: EXPERIÊNCIAS DE LEITURA

RIBEIRO, Maria Augusta H. W.1 ; GONÇALVES, Carolina2 - UNESP/Rio Claro

Page 35: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

35

o significado pessoal de suas leituras com os vários significados que, ao longo da história de umtexto, este foi acumulando. Cada leitor tem a história de suas leituras, cada texto, a história dassuas. Leitor maduro é aquele que, em contato com o texto novo, faz convergir para o significadodeste o significado de todos os textos que leu. E, conhecedor das interpretações que um texto járecebeu, é livre para aceitá-las ou recusá-las, e capaz de sobrepor a elas a interpretação quenasce de seu diálogo com o texto. (LAJOLO, 2004, p. 106).

Várias intenções permearam a elaboração deste projeto de intervenção na realidadedas escolas, todas elas, no entanto, voltadas para a questão da leitura como Freire a viu: “uminstrumento para o que Gramsci chamaria de ação contra-hegemônica” (FREIRE, 2004, p. 21).Compartilhando deste sentido revolucionário proposto por Freire, temos Larrosa, que discorresobre o ato da leitura como parte do processo formador dos sujeitos, pois “a leitura [...] tem a vercom aquilo que nos faz ser o que somos” (LARROSA, 2002, p. 134), alertando que a pensarcomo formação é pensá-la “como algo que nos forma (ou nos de-forma e nos trans-forma)” (idem,p. 133). A formação, para Lajolo (2004), amplia-se do individual para o coletivo, pois a autoracoloca que “a história da literatura de um povo é a história das leituras de que foram objeto oslivros que integram o corpus dessa literatura” (LAJOLO, 2004, p. 107).

Com base no pensamento desses três estudiosos do assunto foi, então, elaboradoo projeto em forma de curso sobre leitura para professores das escolas da rede municipal deEnsino Fundamental I (1ª a 4ª séries), com carga horária de 70 horas, com a finalidade específicade discutirmos a leitura como formação do professor.

Dividido em três blocos, o curso teve o primeiro dedicado à figura do professor,com o texto básico A lição; o segundo, dedicado ao ato de ler, com o texto básico de Paulo Freire,A importância do ato de ler e o último, dedicado à tessitura da leitura, baseou-se no texto deLajolo, Tecendo a leitura.

Historicamente, a leitura foi tomando outras proporções, principalmente com odesenvolvimento da tecnologia, que nos impõe outros tipos de leitura, e não só a tradicional(papel/leitor). A partir de Gutenberg, tornou-se possível

a massificação da leitura, trazendo para o horizonte dela o risco de alienação, defracionamento e esgarçamento do significado do texto e do ato de ler. A atividade de leitura, que,em suas origens, era individual e reflexiva (em oposição ao caráter coletivo, volátil e irrecuperávelda oralidade de poetas e contadores de histórias), transformou-se hoje em consumo rápido dotexto, em leitura dinâmica que, para ser lucrativa, tem de envelhecer depressa, gerandoconstantemente a necessidade de novos textos (LAJOLO, 2004, p. 105).

O contato do leitor com os livros passa, então, a tornar-se relativamente frio, distante;o que era instrumento principal para a aquisição de outros conhecimentos tem-se tornado exercícioremoto e até mesmo objeto estranho da realidade escolar. Objeto estranho, pois, sendo alto ocusto dos livros, não é considerado um bem para todos. Torna-se freqüente a utilização de cópiasreprográficas, dissimulando a idéia de livro, portanto, dissimulando também a idéia de leitor. Oleitor presente hoje é aquele que não lê as obras em sua totalidade; um leitor econômico que, às

Page 36: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

36

portas da tecnologia e da difusão rápida da informação, não consegue estabelecer relação nenhumaentre o que lê e sua subjetividade.

Atualmente, é dada à leitura uma conotação própria, formando-nos justamentepara a efemeridade. Na rapidez da circulação das informações, os sujeitos nem vislumbram maisa possibilidade da existência de um ócio no qual possam contemplar os fatos ocorridos e ter umacerta inconformidade: “uma nova forma de miséria surgiu com esse monstruoso desenvolvimentoda técnica, sobrepondo-se ao homem [...]. Porque não é uma renovação autêntica que está emjogo, e sim uma galvanização” (BENJAMIN, 1987, p. 115).

Concebemos, então, uma proposta de leitura em que os textos, não reproduzidosem cópias reprográficas, se ofereciam “à nossa inquieta procura” nas páginas dos livros, numareal possibilidade de resgate de experiências, tornando significativas essas leituras.

Para tanto, foi requisitado no orçamento do projeto verba para a compra de vinteexemplares de cada um dos livros para ser fornecido um exemplar de cada uma das obras aosparticipantes, durante a realização do curso. Foram feitos Termos de Compromisso – individuais- assinados por cada participante no recebimento das obras. Ao final eles foram entregues àcoordenadora que os mantém, em sua sala do Departamento, para uso coletivo dos professores,em aulas ou reuniões com alunos ou bolsistas.

Despontava, assim, a importância do ato público da leitura, derrubando as paredesdo individualismo exacerbado e possibilitando trocas por meio da leitura - para que houvessereconhecimento e um primeiro processo de significação interna, por parte do leitor – da escuta -para que o leitor, ao ouvir a leitura – em voz alta – de outrem, “ouvisse” aquilo que o texto dizia –e da discussão - para que o texto inicial fosse injetado de outras leituras/escutas. Era preciso ouviro que os outros tinham a dizer para, então, considerar esses textos como múltiplos de sentidos,portanto, de experiências.

Dessa forma, a realização desse projeto atendeu à necessidade de criação de umespaço social para compartilhar textos que enfocassem a questão da leitura, pela sua importânciana formação do professor, de diferentes formas – dadas as várias “leituras/escutas” de textos(geradores e gerados) – possibilitando aos professores-leitores andar pelos vários caminhos “doensinar e do aprender” oferecidos.

Cabe aqui, também, reconhecer a importância da leitura emplazada, segundoLarrosa (2003), aquela que, num ato público, tem a chave magna para a experiência de leitura, eque utilizamos como metodologia, uma vez que os textos foram lidos “em público” tal como a“lição”: “a lição é convocação em torno do texto: congregação de leitores” (LARROSA, 2003, p.143).

Pensando na formação desses professores, na articulação universidade-escola, tãonecessária atualmente e na urgência conclamada por vários órgãos de soluções para as questões daleitura, estabelecemos uma parceria com a Secretaria Municipal da Educação de Rio Claro.

Foi elaborado um folder com informações básicas para a divulgação do curso,contendo uma pequena introdução ao tema da leitura e especificando os objetivos, o público-alvo,

Page 37: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

37

o número de vagas, a carga-horária, o programa, a forma de avaliação, a ficha de inscrição, operíodo e local das inscrições, a questão dos certificados, o local de realização e telefones paracontato. Além de todas essas informações pertinentes ao curso, também elaboramos uma questão(“A leitura, para você, é...”), constante da ficha de inscrição, e que implicitamente continha umade nossas primeiras inquietações: qual seria, inicialmente, a visão de leitura desses professores?

Recebemos um total de vinte inscrições. As respostas à questão constante daficha de inscrição apresentaram diferentes enfoques. Nós os agrupamos em quatro.

Nove pessoas tomaram a leitura como forma de conhecimento. Neste caso, aleitura assumia conotação informativa: “a base do conhecimento, sem ela não há um aprendizadocompleto”; “a chave que abre as portas do saber”; “uma possibilidade de conhecer, aprender eaprofundar conhecimentos”; “um prazer, uma eterna busca de conhecimentos”; etc. Mas, paraLarrosa,

...não se reduz, tampouco, a um meio de se conseguir conhecimentos [...] Nosegundo caso, a leitura tampouco nos afeta dado que aquilo que sabemos se mantém exterior anós. Se lemos para adquirir conhecimento, depois da leitura sabemos algo que antes não sabíamos,temos algo que antes não tínhamos, mas nós somos os mesmos que antes, nada nos modificou.E isso não tem a ver com conhecimento, senão o modo pelo qual o definimos. (LARROSA, 2002,p. 133-134).

Paulo Freire também trata sobre esta forma de leitura:Em minha andarilhagem pelo mundo, não foram poucas as vezes em que jovens

estudantes me falaram de sua luta às voltas com extensas bibliografias a serem muito mais‘devoradas’ do que realmente lidas ou estudadas. Verdadeiras ‘lições de leitura’ no sentido maistradicional desta expressão, a que se achavam submetidos em nome de sua formação científicae de que deviam prestar contas através do famoso controle de leitura. Em algumas vezes chegueimesmo a ler, em relações bibliográficas, indicações em torno de que páginas deste ou daquelecapítulo de tal ou qual livro deveriam ser lidas: ‘Da página 15 à 37’”. (FREIRE, 2003, p. 17).

Duas pessoas tomaram a leitura como forma de comunicação. As respostas foram:“um meio de comunicação onde posso obter informações e divertimento, possibilitando meudesenvolvimento pessoal e profissional” e “uma forma de comunicação com o mundo”. ParaLajolo, “a própria sociedade de consumo faz muitos de seus apelos através da linguagem escritae chega por vezes a transformar em consumo o ato de ler, os rituais da leitura e o acesso a ela”(LAJOLO, 2004, p. 106).

Uma pessoa tomou a leitura como diálogo: “uma maneira de interagir entre o real eo imaginário – ler é ser capaz de extrair de cada história uma lição, de cada ato um ensinamento,de cada acontecimento um aprendizado”. Para Zumthor, a recepção decorre do ouvinte (leitor)receber a mensagem e recriá-la de acordo com as suas expectativas. “A componente fundamentalda ‘recepção’ é assim a ação do ouvinte, recriando, de acordo com seu próprio uso e suas própriasconfigurações interiores, o universo significante que lhe é transmitido” (ZUMTHOR, 1997, p. 241-242). Ou, como para Larrosa,

Page 38: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

38

...o comunicar do texto não é a elaboração do comum, mas o estabelecimento deum “entre” no que os leitores se separam e se dispersam de um modo não totalizável, numarelação pluralizadora. O comunicar do texto, seu ser-em-comum, é o espaçamento que tornapossível o heterogêneo. O texto comum é o texto no qual os leitores participam, é o texto com-partilhado entre os leitores, o que os leitores com-partem, o que os parte em comum, o que não secom-parte a não ser como partição e re-partição (LARROSA, 2003, p. 144).

Oito pessoas tomaram a leitura de diferentes maneiras, sem estar nenhuma delasrelacionada a uma concepção de leitura bem definida: “fundamental”; “tudo”; “tudo!!!”; “essencialpara a qualificação profissional e um momento de lazer no dia-a-dia”; “entretenimento, prazer,viagem, enfim voar alto sem sair do chão”; “prazerosa”; “uma porta para a vida, quem tem um livronunca está sozinho” e “fundamental, promove o indivíduo em todos os sentidos, oferece recursoscríticos, lúdicos, cognitivos e pessoais”.

No primeiro encontro, foi apresentada a proposta e o programa aos professores. Comometodologia, a experiência de leitura como travessia (caminho), ou seja, “propor a experiência daleitura em comum como um dos jogos possíveis do ensinar e do aprender” (LARROSA, 2003, p.139). Para o desenvolvimento do projeto, foram planejados encontros quinzenais, com duração médiade duas horas, durante os quais foram lidos os diversos tipos de texto. Os comentários surgidosdurante esses encontros foram anotados pelas estagiárias do projeto num diário de campo, paraposterior análise, além do recolhimento das assinaturas dos participantes num livro-ata.

Como forma de avaliação, os professores elaboraram projetos de leitura com basenos referenciais teóricos com os quais tomaram contato ao longo do curso.

Com o decorrer das atividades, alguns professores deixaram o curso por motivosdiversos.

As reuniões eram sempre permeadas por algo em “comunidade”. Privilegiando osdiversos tipos de textos (teórico, filme, etc), prevalecia no começo da leitura/discussão o silêncionão tão silencioso, em virtude dos olhares que se entrecruzavam. “Mas uma conversação quetem também sua face silenciosa, reflexiva, solitária” (LARROSA, 2003, p. 143).

A maior parte dos comentários era sobre a fala de um dos participantes, que seencorajava para comentar algo no texto que o despertou. Assim, os comentários (textos) surgiamsobre um outro comentário (texto) dito anteriormente, constatando assim a presença marcante daoralidade na formação dos professores.

Para melhor entendimento, procuraremos aqui fazer uma descrição da primeiraetapa. Nela, tratamos sobre posturas do professor. Colocamos os participantes em contato comum referencial teórico quanto a um novo tipo de postura do professor frente a atividades de leitura(dentro e fora da sala de aula): o texto Sobre a lição, de Jorge Larrosa, que propõe a experiênciade leitura como um jogo.

Primeiramente, fizemos um estudo sobre a capa do livro Pedagogia profana: danças,piruetas e mascaradas, no qual está contido o texto acima citado. Pedimos aos alunos quedescrevessem as sensações que eram despertadas ao tocarem neste livro. Vários comentáriossurgiram, seguidos ainda da análise da capa. A arte da mesma não passa desapercebida. Feita

Page 39: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

39

por Jairo Alvarenga Fonseca traz aos nossos sentidos a imagem de uma tapeçaria datada de1703 – El majo de la guitarra, Ramón Bayeu, Espanha; a imagem de um homem tratando seuviolão nos levava a pensar qual seria a relação dessa displicência – contida na imagem – e aquestão da leitura, que nos remete sempre a uma postura séria e regrada.

A capa era um convite para entrar no texto Sobre a Lição, condição que Larrosapropõe para uma real leitura, imbricando-nos a ele. Essa é uma demonstração de amizade doleitor para com o texto escrito.

Larrosa ainda toca em dois outros pontos-chave para que a experiência da leituraproponha-se como jogo: o da liberdade - para que a experiência da leitura resulte em formação énecessário que o leitor também fale junto com o texto, pois “somente a ruptura do já dito e do dizercomo está mandado faz com que a linguagem fale, deixa-nos falar, deixa-nos pronunciar nossaprópria palavra” (p. 145) - e o da experiência - ou melhor, da experiência como mudança. E aexperiência da leitura, por sua vez, é facilitada por aquilo que “o texto leva a pensar” (p. 142).

Sobre esses três pontos repousa o ato público da leitura. Porque só pelo ato públicodela é que há a possibilidade de diálogo entre as pessoas.

De um diálogo que pressupõe a escuta. A questão da escuta implica em um ato deler, do qual é decorrente o de ouvir, de ouvir-se e de fazer-se ouvido, tal como o professor:

O professor lê escutando o texto como algo em comum, comunicado ecompartilhado. E lê também escutando a si mesmo e aos outros. O professor lê escutando otexto, escutando-se a si mesmo enquanto lê, e escutando o silêncio daqueles com os quais seencontra lendo. A qualidade da sua leitura dependerá da qualidade dessas três escutas. Porque oprofessor empresta sua voz ao texto, e essa voz que ele empresta é também sua própria voz, eessa voz, agora definitivamente dupla, ressoa como uma voz comum nos silêncios que a devolvemao mesmo tempo comunicada, multiplicada e transformada (LARROSA, 2003, p. 141).

Os espaços em branco entre a leitura e a escuta são múltiplos de sentidos: nelesse pode falar, dialogar “com o texto, ou contra o texto ou a partir do texto (idem, p. 142).

A comunidade em torno do texto acima proposta, como uma plaza, traz a idéia deconversação, pois é na unidade (reunião) das diferenças (pessoas) que ressoa a multiplicidade(diálogo) do único (texto).

Após a leitura do texto em comum, para que os professores elaborassem os seusprojetos de leitura ao final do curso, previmos no cronograma a apresentação de alguns, já finalizadose/ou em andamento. Referente a este bloco tivemos aquele a que nos referimos no início desteartigo -Quem conta um conto... aumenta um ponto3, - desenvolvido no Departamento de Educaçãoda UNESP/Rio Claro desde 1999, com o objetivo geral de levar a diferentes públicos a propostada leitura compartilhada de diversos textos, criando um espaço social, no qual possivelmentepossam ocorrer experiências de leitura.

Em seguida, houve uma palestra sobre o autor e o texto estudado – A leitura naproposta de Larrosa4.

A última atividade deste bloco foi assistir ao documentário Ser e ter5, de NicholasPhilibert. O filme discorre sobre a relação professor-aluno e algumas tensões vividas nessa relação.

Page 40: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

40

Na seqüência, com o Bloco II, o foco foi o ato de ler. Inicialmente, lemos o texto Aimportância do ato de ler, de Paulo Freire. Este texto, de importância já amplamente conhecida,começa com uma explanação do que seria a leitura de mundo de Freire, em sua infância. Discorresobre a sua “descoberta do mundo” pela palavra, atentando para vários aspectos: a politização doato de ler; a importância do contexto (quando criança, da linguagem dos mais velhos); a relaçãomedo/conhecimento; a compreensão errônea do ato de ler, como se a quantidade de textos lidoscorrespondesse à qualidade dessas leituras. Nesses sentidos, a leitura da palavra não é apenasprecedida pela leitura do mundo, mas por uma certa forma de “escrevê-lo” ou de “reescrevê-lo”,quer dizer, de transformá-lo por meio de nossa prática consciente.

A próxima atividade foi a apresentação do Projeto Guia de Leitura de Reinações deNarizinho de Monteiro Lobato6, um guia de leitura em forma de CD-Rom que privilegia umaarticulação entre obras universais citadas na referente obra de Lobato, criando, dessa maneira,uma rede de intertextos.

Este bloco foi finalizado com o filme Fahrenheit 4517, escrito por Ray Bradbury edirigido por François Truffaut, que expõe a falta de liberdade do leitor na escolha dos seus próprioslivros. Lembra muito a Inquisição, pelo fato dos livros serem queimados em praça pública.

O último bloco, III, teve como eixo principal a tessitura da leitura. Para tanto,lemos o texto Tecendo a leitura, de Marisa Lajolo. Partindo da imagem de artesanato que a leituraexige, para Lajolo, entrelaçá-las como fios transformando-as em tecidos constitui-se numa “matrizmetafórica da leitura”. A leitura precisa ocorrer num espaço de liberdade. Escola e professor são,talvez, os únicos pontos de ruptura dessa alienação. É preciso fazer frente ao paternalismo dosórgãos governamentais e empresariais em suas campanhas de provimento de livros em bibliotecas,escolares ou não, que ocorrem esporadicamente.

Após a atividade de leitura, houve uma palestra sobre a autora e o texto estudado,O leitor e o texto8. Em seguida, houve outra palestra – A elaboração de projetos como metodologiapara o trabalho intelectual9 – na qual os professores receberam orientações mais técnicas para aelaboração de seus projetos de leitura. A elaboração desses projetos foi supervisionada pela equiperesponsável do curso. Os professores tiveram vinte horas como atividades extra-classe para essaconstrução. Entregues, eles foram avaliados segundo o aporte teórico utilizado no curso e acoerência das idéias.

Tomamos os projetos de leitura elaborados pelas professoras como reveladores doprocesso de escuta, movimentado nas reuniões com o grupo.

O Projeto O despertar para a leitura é um projeto simples, coeso, abrangendotodas as propostas de leitura discutidas durante o curso. Centra-se na leitura do livro de RuthRocha, O menino que aprendeu a ver (1998). Propõe uma atividade de leitura com alunos,compartilhada, a qual se desdobra em outras, tendo como objetivo geral a “formação de leitorespara o mundo”. A metodologia apresentada propõe ações de leitura, além do texto convencional.Embora aparentemente o projeto contemple os teóricos estudados na elaboração das atividadespercebemos que a professora retoma às antigas práticas de leitura. Como exemplo, temos aindicação da leitura compartilhada, que foi feita em todas as sessões de leitura do curso. No

Page 41: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

41

entanto, ao colocá-la como uma das atividades de seu projeto, ela assim se expressa: “fazer aleitura compartilhada levantando questões de interpretação e entendimento”. No curso nós nãodirigíamos as questões, elas brotavam de cada participante, indicando os diferentes diálogosproduzidos em cada um. Na proposta da professora esse diálogo é conduzido, não se pondo “àescuta” da voz dos alunos. Esta postura inviabiliza a própria proposta feita inicialmente por ela. Oque percebemos é a manutenção do antigo discurso, incorporado, entranhado, que reaparece nascolocações quando há qualquer movimento de desatenção.

O Projeto Poesia, um convite à leitura com... Cecília Meireles é extenso, commuitas informações sobre esta poetisa, mas não contém explícito o aporte teórico e a metodologiaproposta não está ligada ao objetivo, que é o de “criar oportunidades para que o educando se torneum leitor competente da linguagem poética”. Em seu todo, traz uma proposta de leitura, mas quenão contempla os temas abordados nas reuniões com o grupo. Este projeto, possivelmente, já seencontrava pronto e foi adequado ao curso. O fato de os teóricos estudados não estaremcontemplados indica a separação entre o que foi escutado e a elaboração do projeto. Esta é umapostura comum nos professores que não permitem que a leitura seja vista como um instrumentode “ação contra-hegemônica”.

Dois outros projetos, um simplesmente denominado “de leitura” e outro, Diálogocom a palavra escrita não apresentaram nenhuma relação com a proposta do curso, indicandoque as autoras não expressaram na elaboração dos mesmos o aporte teórico estudado.

Embora tivéssemos pedido que os projetos fossem individuais, duas alunas o fizeramem dupla: Poesia... um dos caminhos possíveis do ensinar e do aprender. O projeto enfoca, comoo título diz, a leitura de poesias. Na metodologia, por exemplo, encontramos: “o objetivo é sugerirque as atividades de leitura propostas aos alunos devam levá-los a observação mais de perto deprocedimentos relevantes para o significado geral do texto, não apenas no que diz e sim no modocomo diz o que diz...” Essa fala nos informa que as autoras não foram capazes de interiorizar asidéias propostas por Freire, Larrosa e Lajolo.

Esse descompasso entre o discurso e a prática é constante nos projetoseducacionais, nos quais a teoria encanta, mas a prática nem sempre.

Por último, um projeto que atendeu as nossas expectativas: Leitores em formação,no qual a primeira ação proposta é a aquisição de livros (Reinações de Narizinho, de MonteiroLobato) para os alunos da classe. Esta relação aluno/livro precisa ser recuperada para que ospequenos leitores valorizem este suporte. As relações estabelecidas entre a proposta da autora eos aportes teóricos indicam, para nós, a qualidade da sua escuta: tomou o lugar de ouvinte(porque levou em conta todas as discussões) e tomou o lugar de intérprete (porque foi capaz decriar, na escrita, um novo texto). São exemplos dessa escuta dois trechos que selecionamos deseu projeto. O primeiro diz respeito ao enfoque dado ao ato de ler:

Em outros momentos os alunos farão a leitura ou a motivação inicial, oferecendoassim autonomia de escolha aos mesmos, pois os textos desse livro são variados, existem contos,fábulas, mitologia. É preciso somente despertar, mostrar o caminho, segundo Larrosa... o começoda lição é abrir o livro, num abrir que é ao mesmo tempo, um convocar. E o que se pede aos que,

Page 42: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

42

no abrir-se o livro, são chamados à leitura não é senão a disposição de entrar no que foi aberto.Os leitores, agora dispostos à leitura, acolhem o livro na medida em que esperam e ficam atentos...(2003, p. 139)” (grifo nosso).

O segundo revela uma leitura crítica da forma como a escola trata a leitura:É comum vermos nos planejamentos anuais das escolas de ensino fundamental

objetivos destinados à leitura; porém a metodologia para o desenvolvimento desses objetivosquase sempre não passa da leitura de textos de livros didáticos ou até mesmo preparados pelosprofessores para uma posterior cobrança. Não se valoriza a leitura pelo prazer, pelo simples contatocom o livro e as reflexões que se estabelecem a partir da leitura. Partindo dessa concepção deLarrosa, este projeto pretende avançar para além desse paradigma”.

Em um momento em que há um interesse, até governamental, voltado para asquestões da leitura, este interesse não parece mover tanto as pessoas, pois no início do cursocontávamos com vinte professores e até com outras pessoas interessadas em freqüentá-lo. Noentanto, ao final do curso, contamos apenas com sete professoras. Das sete, como podemos verna análise feita, apenas uma conseguiu estabelecer uma co-relação entre a teoria e a prática,entre o que foi lido e as possibilidades de atuação. Esses resultados nos levam a cogitar se asbandeiras desfraldadas em prol da leitura são realmente para torná-la crítica ou apenas uma novaforma de alienação?

REFERÊNCIAS

BENJAMIN, W. Experiência e pobreza. In: Obras escolhidas – Magia e técnica, arte e política. 3ªed. São Paulo: Brasiliense, 1987, p. 114-119.

FREIRE, P. A importância do ato de ler. In: A importância do ato de ler: em três artigos que secompletam. 44. ed. São Paulo: Cortez, 2003, p. 11-21.

LAJOLO, M. Tecendo a leitura. In: Do mundo da leitura para a leitura do mundo. 2. ed. São Paulo:Ática, 1993, p. 104-109.

LARROSA, J. Aprender de ouvido. In: Linguagem e educação depois de Babel (trad. FARINA,C.). Belo Horizonte: Autêntica, 2004, p. 33-46.

______. Literatura, experiência e formação. In: COSTA, M. V. (org.) Caminhos investigativos:novos olhares na pesquisa em educação. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2002, p. 133-160.

______. Sobre a lição. In: Pedagogia profana: danças, piruetas e mascaradas. 4. ed. Belo Horizonte:Autêntica, 2003, p. 139-146.

ZUMTHOR, P. Introdução à poesia oral. São Paulo: Hucitec, 1997.Notas

1 Coordenadora do Projeto e Professora Doutora do Departamento de Educação da UNESP/Rio Claro. 2 Estagiária do Projeto ealuna do Curso de Pedagogia da UNESP/Rio Claro. 3 Exposto por Jessé C. Reis, aluno do Curso de Pedagogia da UNESP/Rio Claro.4 Proferida pela Profª Drª Maria Rosa R. M. de Camargo, docente do Departamento de Educação da UNESP/Rio Claro. 5 Em cartaz,na época, no Espaço Unibanco Arteplex, em São Paulo – SP. 6 Apresentado por Augustinho Ap. Martins, ex-aluno do Curso dePedagogia e por Daniel M. D. Entorno, aluno do Curso de Ecologia, ambos da UNESP/Rio Claro. 7 Com comentários do Prof. Dr.Jorge L. Mialhe, docente do Departamento de Educação da UNESP/Rio Claro. 8 Proferida pelo Prof. Antonio C. D. Chagas, CoordenadorPedagógico do Ensino Médio da Escola Puríssimo Coração de Maria, em Rio Claro – SP. 9 Proferida pelo Prof. Dr. Osvaldo Aulino daSilva, na época, Secretário Geral da UNESP.

Page 43: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

43

Muitas vezes, ouvimos falar e falamos nas nossas conversas rotineiras sobre asdificuldades enfrentadas no relacionamento entre as gerações. Os conceitos mudaram, os costumesjá não são mais os mesmos, tudo está mesmo de pernas para o ar...

Nossos avós, pais e nós mesmos sentimos as transformações sofridas no convíviocom nossos filhos, sobrinhos, netos e mais ainda aqueles que têm a felicidade de ver seus bisnetos,mas devemos ressaltar que algo continua como há muito: o gosto infantil por ouvir histórias. Acriança se desprende da realidade e assume o papel de Emília, chapeuzinho, Rapunzel, Porquinho,Patinho Feio e tantos outros personagens.

Ao contarmos uma história, estamos buscando no imaginário da nossa culturarepertório para tanto, ou em outras vezes, estamos conhecendo a cultura de outros povos, poisessas narrativas estão baseadas no discurso que se encontra no imaginário de um povo. Elaspodem ser fábulas, contos, lendas que são organizados de acordo com o repertório de mitos quea sociedade produz. Quando são lidas ou contadas por um adulto para uma criança, abre-se umaoportunidade para a construção de sua identidade social e cultural.

As crianças gostam muito de ouvir histórias, mesmo porque essa é uma parteimportante da infância. Ao brincar ou ao fantasiar, a criança tenta entender o mundo do adultocheio de regras, que podem, por vezes, serem mudadas, e ela tem dificuldade em entender taisregras as quais têm que se submeter. Assim, a história infantil pode ser comparada ao jogosimbólico “[...] o jogo simbólico pode servir ainda para liquidar os conflitos, mas também para acompensação de necessidades não satisfeitas, para a inversão de papéis (obediência e autoridade),para a liberação e extensão do eu etc.” (PIAGET, INHELDER, 1994, p. 54)

Nas histórias da carochinha (contos tradicionais para crianças), tenta-se passarpara a criança um pouco das mazelas do mundo adulto, de forma abrandada: o ChapeuzinhoVermelho e o lobo, João e Maria e a bruxa, Jeca Tatu e as suas dificuldades, a Tartaruga e aLebre... As fábulas, que são narrativas curtas sobre bichos, que transmitem conceitos morais,como no caso da formiga e da cigarra, exprimem uma versão maniqueísta de olhar uma situação,passando uma versão única e de um tempo, que pode não ser mais o nosso.

Para Cashdan (2000), os contos de fadas auxiliam as crianças a lidar com seusconflitos psicológicos, ao projetarem nos personagens das histórias seus próprios conflitos. Assim,figuras como a do porquinho preguiçoso, do “João Ratão que cai na panela de feijão” por sua gula,do Pinóquio com sua preguiça e a luxúria da Pequena Sereia apresentam situações pelas quaisas crianças podem lidar com os “pecados capitais”,.

CONTAR HISTÓRIAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL:UMA APROXIMAÇÃO ENTRE GERAÇÕES

KOBAYASHI, Maria do Carmo Monteiro(UNESP-Bauru, USC – Universidade do Sagrado Coração -Bauru)

Page 44: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

44

Hoje, com a correria dos pais, o contato com a família está reduzido por força dassuas atividades profissionais e, portanto, de estarem mais livres para atividades de lazer e por quenão, de contar histórias. Desse modo, contar histórias deixou de ser um momento entre pais efilhos, ficando restritas às atividades escolares e às vezes em espaços públicos como em livrarias,shopping center ou esporádicas feiras de livros. Os pais não têm mais tempo ou interesse emcontar histórias. É mais fácil comprar um brinquedo eletrônico que entreter a criança, deixandopais e avôs mais sossegados.

Pude acompanhar a infância dos meus filhos, pois esse foi um tempo que elegipara estar com eles e, mesmo sem saber, pois ainda não havia estudado o desenvolvimentoinfantil, contava histórias ao pô-los para dormir, pois essa era uma forma de levá-los semreclamações e para deixá-los um pouco mais tranqüilos. Esses momentos eram apropriadospara falar dos mitos, do folclore, dos contos de fadas e do dia que havia findado.

Somente pude perceber a riqueza de tais momentos, quando um dia, ao assistiremum episódio de um seriado infantil, vieram me chamar para que visse “Pandora”, a qual, anosmais tarde, pude constatar que muitos dos meus alunos da universidade não conheciam.

Deixando de lado as narrativas e as fábulas, as histórias de vida da formação denossas famílias devem, também, fazer parte da vida dos nossos filhos. O que eles conhecemdos seus antepassados? Como foi a vida daqueles que construíram sua história?

Muitas vezes ouvimos que os brasileiros se esquecem facilmente dos fatos. Devoafirmar que somos um jovem país, que está construindo sua história e sua cultura, mas queaceita todos os filhos de outras terras de braços abertos. Por outro lado, aqueles que vieram deterras distantes, como os ancestrais dos meus filhos, muito têm a ensinar para nós, que somosfilhos deste jovem país, para que possamos conhecer e valorizar suas tradições.

Assim, contar histórias é uma forma de conhecer outras culturas, de saber as suasraízes, de reviver um pouco do passado, de entender e prever o futuro, e quem sabe, essa nãoseja uma maneira de minimizarmos as dificuldades, os conflitos das gerações, pois assim nossascrianças aprendem um pouco e o porquê de seus pais e avôs acharem que tudo está tão diferente.Falamos que tudo está de pernas para o ar... mas nos esquecemos, muitas vezes, de contarcomo era antes e como tudo se foi transformando..

PARA QUE CONTAR HISTÓRIAS?

Se contar histórias é algo espontâneo e que as pessoas precisam somente ter algode interessante a contar ou a ler, por que são necessários estudos e oficinas para se aprendercontar a histórias? A razão para isso é que contar histórias também pode ser uma arte, quepossui seus segredos e técnicas, quando conhecemos (narrador), o que contar (história escolhida),como contar (técnicas e os recursos) e, principalmente, quais as características de quem vaiouvir (ouvinte). Estaremos mais seguros e poderemos usar essas ações de maneira mais adequadapara o crescimento dos ouvintes.

Page 45: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

45

Sendo uma arte que lida com matéria prima especialíssima, a palavra, prerrogativadas criaturas humanas, depende, naturalmente de certa tendência inata, mas pode ser desenvolvidae cultivada, desde que se goste de crianças e se conheça a importância da história para elas.(COELHO, 2002, p. 9)

A escolha da história a ser contada é a chave mágica e será decisiva para o agradodos ouvintes, por isso devemos considerar suas características, pois há publicações direcionadassobre assuntos diversos e como a história é algo que mexe com o imaginário infantil, quandochegado o momento de contar a história, nossa preocupação principal estará voltada ao que lheinteressa, ao que ela possa entender, ao tempo que ela consegue estar atenta ao narrador, ao seurepertório lingüístico e outras características que o contador vai poder levantar em ação.

Segundo Aguiar (2001), para que possamos conhecer o leitor que temos à nossafrente, podemos propor a eles um desenho a partir do tema: Eu sou assim ... Nos desenhos,podemos conhecer as características dos nossos alunos, pois teremos um quadro revelador, emque eles mostram como percebem o mundo e como nele se inserem.

Para Coelho (2002), o enredo da história infantil tem três momentos cruciais: aintrodução, clímax e o desfecho. A introdução é parte fundamental para a compreensão da história,pois é o momento em que se apresentam as características dos personagens e se estabelece umprimeiro contato entre o narrador, a história e os ouvintes, quando e onde ocorre o fato narrado.

À apresentação da história – introdução que possibilitou aos ouvintes entendê-lasucede-se o clímax, ou seja, o ponto crucial, fruto do encaminhamento anterior das mazelas davida dos personagens, e que poderá ter vários momentos culminantes, como no caso dos trêsporquinhos e as investidas do lobo, despertando o ouvinte para os embates entre os perigosvividos e as estratégias do lobo.

Após os perigos vividos e superados pelos personagens, os ouvintes esperam pelodesfecho da história, no qual se restabelece a vida dos personagens que podem ser, diferentes denós, felizes para sempre...

No que se refere aos recursos que podemos utilizar para contar histórias, muitosdeles são dos dotes do narrador. Outros são livros com figuras maravilhosas, os fantoches,dedoches, os cd’s, dvd’s e tantos outros que vão depender da imaginação de quem conta.

Ao narrador é importante: conhecer bem a história, planejá-la antes de contá-la,evitar ênfase em detalhes simples, contar com naturalidade, mostrar entusiasmo ao contá-la,evitar o uso de muitos “e” “ou” “então”, encarar seus ouvintes, olhando-os e procurando suareceptividade. Outros itens que podem aumentar essas sugestões virão das experiências noscontadores no decorrer das suas vivências.

Não podemos esquecer que aos detalhes anteriores, somam-se o local e a situaçãomais adequada ao contar uma história. Ponto a ser sublinhado é o preparo a ser feito quando ascrianças são muito novas – sanar a curiosidade delas. Se vou falar dos três porquinhos, contarcomo são esses animais. Caso sejam conhecidos, perguntar quem já os viu, o que sabem...

Page 46: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

46

Esse cuidado evita que a toda hora sejamos interrompidos pelas crianças que contam que viramno sítio do tio... .

Faria (2004, p. 35) aponta que:

[...] um bom criador (ou contador) de histórias sabe estabelecercom competências os cortes da narrativa, ou seja, deixar bem claro,no desenrolar da história, o início o fim das seqüências e suas cenas.Esses cortes têm função importante para compreensão dos fatosnarrados.

Contar história pode ser muito mais envolvente ao se colocar uma toalha no chãosob uma árvore, ou um fundo musical, ou ainda usar o perfume que anuncia a chegada de umalinda menina, coisas que aguçam os sentidos e mexem com as emoções de adultos e crianças.

A escolha da história, os recursos necessários, as técnicas empregadas não teriamrazão senão em função de quem vai ouvir as histórias. Conhecer as suas características é condiçãopara o sucesso do “contar histórias”, para tanto, devemos recorrer à psicologia e aos trabalhos dePiaget, que mostram as fases do desenvolvimento infantil e as características da criança em cadafase.

Além de contar histórias como uma forma de conhecer o passado, aproximargerações e recreação, é contando histórias que podemos enriquecer as experiências infantis,propiciando situações nas quais as crianças falem sobre seus desejos, medos e fantasias eprincipalmente desenvolver diversas formas de linguagem, ampliando o vocabulário, desenvolvendoa confiança na força do bem, proporcionando a ela viver o imaginário.

O PROJETO FORMANDO CONTADORES DE HISTÓRIA UNINDO GERAÇÕES

O projeto teve início no primeiro semestre de 2004, pela solicitação da diretora daEscola Municipal de Educação Infantil, que participa do GEIEI – Grupo de Estudos da Infância eEducação Infantil, o qual coordenamos. A partir dessa solicitação, passamos a levantar junto aosprofessores a viabilidade e interesse em um projeto que estivesse ligado a contar histórias eliteratura infantil. A receptividade foi grande quando sugerimos a possível participação das famíliasno projeto para o resgate da cultura local e da aproximação entre avós e netos.

As características da EMEI “Stélio Machado Loureiro”, na cidade de Bauru – SPsão: atende a crianças de 3 a 6 anos, totalizando 14 professores, 320 alunos distribuídos em 11turmas, nos períodos manhã e tarde. totalizando 320 alunos, em 11 turmas, nos períodos manhãe tarde. Os alunos são advindos de diversos bairros da cidade, pois a escola está localizada nocentro comercial, e assim muitos deles permanecem na escola durante o horário em que os paisse encontram no trabalho. A escola, uma das primeiras EMEI s da cidade, conta com pais e avósque participam ativamente, pois muitos dos alunos são filhos e netos de ex-alunos, o que facilitoua implantação do projeto.

Page 47: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

47

A partir do encontro inicial, levantamos junto aos professores os conteúdos a seremestudados para a viabilidade do projeto pelo grupo:

· As características dos alunos de educação infantil;· Literatura infantil: origens;· Classificação da literatura infantil: faixa etária, espécies e gêneros literários;· Estudo das diversas modalidades dos textos infantis;· A importância do maravilhoso na literatura infantil;· Autores nacionais da literatura infantil;· Monteiro Lobato e as suas contribuições para a literatura infantil brasileira;· Elaboração de projetos para o trabalho com a literatura infantil;· A literatura infantil hoje.

Os conteúdos pedidos podem ser expressos em um objetivo:· Estudar os conteúdos necessários para o trabalho da literatura infantil com

crianças de 3 a 6 anos.

Contar história, à primeira vista, pode parecer uma atividade na qual o contadorprecisa somente saber o teor do que se vai contar, mas como expusemos anteriormente, essasimplificação é errônea. Com tal preocupação, numa primeira (1o e 2o semestres de 2004) etapa,em que realizamos um estudo com os professores sobre o que seria necessário para um grupoformado de professores e pessoas da comunidade em geral que quisessem contar histórias,apontaram:

· Identificar os tipos de história: contos de fadas, fábulas, gibis, livros infantis, etc;· Identificar as características necessárias ao contador de história;· Selecionar adequadamente os recursos para os diferentes tipos de história;· Descrever técnicas de expressão corporal e vocal, relação com o espaço,

expressão do olhar, vocabulário etc;· Conhecer as características cognitivas e afetivas das crianças, segundo as

teorias piagetiana e psicanalítica dos ouvintes.

O contato com os professores era uma oportunidade sem precedentes para investigarjunto ao público participante, se gostavam de história na infância, quem lhes contava, qual eramas histórias, como contava (recursos e técnicas), com que freqüência e sua preferência atual deleitura. Assim, os professores passaram a relatar as suas preferências e quais as alteraçõescomeçaram a ocorrer após os estudos que eles realizavam sob nossa orientação, ao que passamosa pedir que eles relatassem por escrito as contribuições que os estudos traziam à sua práticacotidiana, o que os fez refletir sobre o seu trabalho, bem como nas formas de aprimorá-lo, que seencontra em fase de categorização.

O trabalho dos professores com as “histórias” apontou que a “biblioteca escolar”,nos moldes em que estavam, não atendiam mais aos interesses de alunos e professores.Assim,

Page 48: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

48

pedimos a colaboração de uma bibliotecária que está montando as orientações para a organizaçãoda biblioteca pelos professores, momento crucial do desenvolvimento do projeto, pois serão elesque irão organizá-la, bem como mantê-la, o que aponta o quanto os professores já avançaram emrelação ao período anterior dos seus estudos.

Nesse momento (2o semestre de 2005), estamos iniciamos o trabalho junto àsfamílias (pais e avós). Para tanto foi enviado um questionário, que tem por objetivo esclarecersobre o projeto “Contar histórias e aproximar gerações” e obter algumas informações sobre:

· Se ouviu histórias quando criança;· Se gostava de ouvir histórias;· Quais eram as de sua preferência;· Quem as contava;· Se conta histórias para os parentes mais jovens;· E se gostaria de participar do projeto.

A partir desses dados, vamos conhecer as experiências e preferências das famíliasno que se refere às histórias infantis, o que nos permitirá resgatar características de gerações,bem como que parentes (pais e avós) gostariam de transmitir suas histórias, sua visão sobre omundo e a vida a partir delas.

Fato merecedor de nossa atenção é que a maior parte das crianças brasileiras temna escola o contato inicial com os livros, sendo a literatura infantil o convite para o gosto da leitura.Para muitas crianças, essa a oportunidade é única. Assim, promover ações para que o professorusufrua o encanto mágico das histórias e contos é fundamental, mas para tanto é preciso que elegoste de ler, conheça a importância da leitura, saiba como trabalhar, e não fazer como temos visto– a literatura infanto-juvenil tem se tornado um recurso artificial e desprazeroso de leitura, que setorna uma “obrigação”.

Com o projeto que apresentamos, possibilitamos: o estudo dos professores sobre ovalor da literatura infantil e de se conhecer a criança, bem como a aproximação a partir dashistórias das gerações, sensibilizando a criança para a valorização das diferentes fases dodesenvolvimento da vida, para as diferenças culturais, sociais e étnicas.

REFERÊNCIAS

AGUIAR, V. T. Era uma vez... na escola. Formando educadores para forma leitores. Belo Horizonte:Formato, 2001.

BETTHELHEIM, B. A psicanálise dos contos de fadas. São Paulo: Paz e Terra, 1998.

CASHDDAN, S. Os sete pecados capitais nos contos de fadas. Como os contos de fadasinfluenciam nossas vidas. Rio de Janeiro: Campus, 2000.

COELHO, B. Contar histórias - uma arte sem idade. São Paulo: Ática, 2002.

COELHO, N, N. Literatura infantil. Teoria, análise e didática. SP: Moderna, 2000.

Page 49: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

49

FARIA, M. A. Como usar a literatura infantil na sala de aula. SP: Contexto, 2004.

PIAGET, J. A formação do símbolo na criança: imitação, jogo e sonho, imagem e representação.Rio de janeiro, 1975.

PIAGET, J. INHELDER, B. A psicologia da criança. São Paulo: Bertrand Brasil, 1994.

Page 50: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

50

APRESENTAÇÃO

Apresentar o Projeto “Dançando na Escola” (2004) significa em primeiro lugarresgatar a história do projeto piloto “Desenvolvendo a Dança no Magistério” (2003), pois foi pormeio da implantação do piloto que conseguimos a estruturação deste último. Ambos foramdesenvolvidos pelo Núcleo de Ensino do Instituto de Artes da Unesp em parceria com a EscolaEstadual Alexandre de Gusmão.

O projeto piloto “Desenvolvendo a Dança no Magistério” foi gestado a partir daconstatação de que a linguagem da dança faz parte do cotidiano das pessoas como umamanifestação sociocultural, mas não é trabalhada no universo escolar como uma possibilidade dereflexão sobre aspectos relacionados ao corpo e ao movimento expressivo. Por outro lado oportunizara descoberta da motricidade e de novas aprendizagens de maneira criativa poderia instrumentalizarfuturos educadores da rede pública.

Por isso o projeto piloto preocupou-se em desenvolver um curso específico para osalunos do magistério. Portanto para que o projeto piloto fosse implantado foi estabelecida umaparceria entre o Instituto de Artes da Unesp e a Escola Estadual Alexandre de Gusmão.

Essa escola localiza-se em uma região carente da cidade de São Paulo, a caminhoda favela Heliópolis, caracterizando-se como uma escola de passagem que atende moradoresestudantes dessa região.

Para que o projeto piloto fosse implantado, inicialmente pesquisamos a região,conversamos com os alunos da escola e com o corpo escolar a fim de que essa parceria acontecessede fato. Posteriormente conversamos com a professora responsável pela disciplina de Prática deEnsino do Instituto de Artes para que pudéssemos aliar o projeto a essa disciplina, possibilitandoaos alunos do Instituto de Artes o cumprimento do estágio obrigatório.

Assim implantamos o projeto piloto em 2003, com a participação de várias pessoas:a coordenadora do projeto, a professora de Prática de Ensino, duas alunas do curso de licenciaturaem Educação Artística com habilitação em Artes Cênicas do Instituto de Artes, doze alunas docurso de magistério da Escola Estadual Alexandre de Gusmão, vinte professores da escola, direçãoe vice-direção que mostraram um imenso compromisso com essa parceria.

“DANÇANDO NA ESCOLA”: UM PROJETODESENVOLVIDO PELO NÚCLEO DE ENSINO DO

INSTITUTO DE ARTES DA UNESP

GODOY, Kathya Maria Ayres de(Universidade Estadual Paulista, Instituto de Artes, Departamento de Artes

Cênicas, Educação e Fundamentos da Comunicação)

Page 51: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

51

Os resultados foram positivos, pois as alunas estagiárias relataram que houve umdesenvolvimento pessoal e profissional, que revelou que o projeto aliado à prática de ensino podeser uma alternativa interessante de cumprimento de estágio. As alunas do magistério em seusdepoimentos relataram que o curso forneceu a elas o instrumental necessário para o trabalho naescola. O corpo escolar se integrou ao projeto e trouxe a comunidade para participar dos eventosque foram feitos na escola como as apresentações das alunas do magistério e dos gruposconvidados.

O PROJETO “DANÇANDO NA ESCOLA”

A partir dessa primeira experiência e após a avaliação feita entre os participantesdo projeto piloto “Desenvolvendo a Dança no Magistério”, resolvemos ampliar o projeto incorporandoalgumas sugestões e assim iniciamos o projeto “Dançando na Escola”.

Fez parte desta ampliação o realinhamento dos objetivos do projeto. Dessa maneira,o objetivo principal: levar a cultura da dança para a escola se desdobrou na reflexão sobre essamanifestação sociocultural, na possibilidade de aquisição de repertório motriz, no exercício e nadescoberta do potencial criativo por meio de novas aprendizagens e na apreciação estética dessalinguagem artística.

Para que esses objetivos fossem contemplados também foi preciso selecionar umnúmero maior de alunos estagiários. Portanto participaram desse projeto quatro alunas estagiáriasdo curso de licenciatura em Educação Artística com Habilitação em Artes Cênicas do Instituto deArtes da Unesp.

A parceria entre as instituições públicas se manteve, mas por sugestão da direçãoe vice-direção da escola, definimos quatro ações distintas e integradas que foram desenvolvidasno decorrer do ano de 2004.

Procuramos oferecer essas ações a todos os alunos do Ensino Médio, não somenteaos alunos do magistério, aos professores, coordenadores, direção, à comunidade, para quetodos pudessem participar em diferentes esferas de atuação. Dessa forma trabalhamos com trintaprofessores, dois coordenadores, o vice-diretor, o diretor, vinte e cinco alunos participantes dasoficinas e cerca de quatrocentos presentes na apresentação e o registro de quarenta e cincopessoas da comunidade que viram a exposição.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

As ações

Definimos como ações artístico-pedagógicas um processo de capacitação docentepara os professores da escola; o oferecimento de duas oficinas de dança para os alunos da escola,

Page 52: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

52

uma exposição de fotos sobre dança aberta à comunidade e a apresentação de um espetáculo dedança na quadra da escola para todo corpo escolar.

A capacitação dos professores ocorreu no horário das reuniões de HTPC (horáriode trabalho pedagógico coletivo) da escola. Nesses momentos a coordenadora do projeto dirigiuas reuniões junto com as alunas estagiárias apresentando textos e propondo dinâmicas a fim deproporcionar discussões sobre a importância da introdução da linguagem da dança no espaçoescolar. Dessa forma foi possível estabelecer uma articulação entre a proposta do projeto e ocorpo escolar, o que facilitou o trânsito das alunas estagiárias na escola e o acontecimento dasoutras ações.

Como segunda ação oferecemos duas oficinas de dança. A primeira foi uma oficinade dança-teatro: “Você tem fome do que?” que ocorreu no início do ano. Essa oficina foi idealizadapelas quatro alunas estagiárias e objetivou apresentar aos alunos da escola a dança como umalinguagem expressiva e comunicativa, por isso a junção da dança ao teatro e a provocação “Vocêtem fome do que?”. A outra oficina “Dance senão estamos perdidos” ocorreu no segundo semestree procuramos trabalhar com aquisição de repertório motriz por meio de improvisações criativas eexercícios sistematizados. Como ambas foram oferecidas a todos alunos do Ensino Médio, odesafio esteve presente na preparação dessas oficinas levando em consideração não só os objetivosdefinidos para a aprendizagem, mas também a motivação e o interesse dos adolescentes.

A apreciação estética foi o foco das duas ações que se seguiram.A exposição de fotos de dança foi aberta à comunidade. Essas fotos foram

selecionadas pelos alunos da escola e pelas alunas estagiárias. Adicionamos depoimentos, poesiase imagens de manifestações da cultura popular brasileira à exposição que foi montada no saguãoprincipal da escola, por onde todos passam diariamente. Deixamos também um livro de registrospara que as pessoas pudessem escrever sobre o que estavam visualizando. A exposição se mantevepor três semanas e os depoimentos registrados revelaram diferentes olhares sobre a dança. Issofoi discutido posteriormente com os alunos da escola e com as pessoas da comunidade.

A quarta ação envolveu toda a escola no período matutino. Cerca de quatrocentaspessoas assistiram a apresentação de dança “Das flores, não mais falam os jardineiros” exibidapelo do Núcleo de Pesquisa do Centro de Dança de Santo André. A apresentação ocorreu naquadra da escola e apesar da quantidade de alunos presentes nas arquibancadas, o silêncio foigeral. Todos estiveram atentos em uma manifestação de respeito e apreciação à obra artística.

CONCLUSÃO

Vivemos em uma sociedade que contribui para a formação de pessoas fragmentadas,as quais se especializam em determinadas atividades, em um tipo de raciocínio, hipertrofiamalgumas funções cerebrais e partes do corpo em detrimento de outras. Pessoas condicionadaspelo bombardeio diário de informações provenientes dos meios de comunicação e da cultura demassa, as quais impõem modelos prontos e influenciam diretamente na capacidade de percepçãoe atuação na sociedade (Godoy, 2004).

Page 53: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

53

Neste sentido, a prática da dança é uma forma de resgatar e ampliar a percepçãodas pessoas, a partir da ampliação da consciência corporal, buscando favorecer a integração docorpo, mente e emoções por meio do contato com essa manifestação artística. Por isso, achamosde capital importância que a linguagem da dança entre nas escolas públicas. O que nos parece amelhor alternativa para democratizar uma linguagem tão elitizada dentro da realidade sócio-econômica brasileira.

Com o intuito de ampliar o repertório cultural e potencialidades criativas e expressivasdos participantes, o projeto esforçou-se não só por favorecer a prática da dança, mas também,por promover debates, com todos que pertencem à escola, nos âmbitos da arte, estética, cultura,filosofia, realidades históricas e sociais dos participantes por meio da apreciação estética dasmanifestações artísticas presentes na sociedade. Nessa medida, procuramos o envolvimento dacomunidade nas atividades propostas pelo projeto que também se manifestou por meio dos registrosdeixados na exposição de fotos e pelas conversas dentro e na porta da escola.

Mas o que nos pareceu relevante foi o amadurecimento profissional das alunasestagiárias, pois relataram ao passar pelas quatro ações propostas pelo projeto que esteproporcionou um olhar diferenciado para a realidade da escola pública e da docência. Elas disseramque não imaginavam como seria a resposta do corpo docente da escola em relação à capacitaçãoe que tinham uma idéia pré-concebida de que esses professores talvez não se interessassem porprojetos artísticos: “ainda bem que nos enganamos”.

Um outro aspecto foi o fato de ter que elaborar e ministrar aulas para alunos doEnsino Médio: “puxa, eles são exigentes, temos que alterar a estratégia a todo o momento, pois aconcentração é pequena”; “eles perguntam sobre o objetivo de cada atividade, temos que ter umasuper clareza do que vamos propor”; “dependendo do que falamos ou propomos, eles travam”.

Outro aprendizado para as estagiárias se deu em função da percepção dasimplicações de se trabalhar em grupo e estabelecer relações interpessoais que são importantesno exercício da docência: “precisamos tomar cuidado na condução das aulas, acho que porestarmos em quatro é necessário que a gente estabeleça quem conduz a aula e em que momentoisso deve acontecer”.

Talvez o que tenha sido mais significativo para todos os envolvidos com o projetofoi a manifestação dos alunos no dia da apresentação do grupo convidado. Eram mais dequatrocentas pessoas em absoluto silêncio, dentre as quais algumas estavam visivelmenteemocionadas. O depoimento do diretor do grupo, professor Ferron traduz o que aconteceu: “eupercebi enquanto estava dançando o olhar desses meninos, eles me pegaram, foi sutil, o ar setornou denso e ao mesmo tempo leve”; “eu vi, eu senti que eles compreenderam a proposta dotrabalho, temos que ocupar esse espaço porque ele existe...”

BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, Laurinda Ramalho de & PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza (orgs.). As relaçõesinterpessoais na formação de professores. São Paulo. Edições Loyola, 2002.

Page 54: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

54

BARBOSA, Ana Mae (org.). Inquietações e mudanças no ensino da arte. São Paulo. CortezEditora, 2002.

BRASIL. Secretaria da Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: Arte. Brasília:MEC/SEF, 2000.

DE CAMILLIS, Maria de Lourdes. Criação e docência em arte. São Paulo. PUC-SP. Tese dedoutorado, 1997.

FERRAZ, Maria Heloísa Corrêa de Toledo e FUSARI, Maria F. de Rezende e. Metodologia doensino de arte. São Paulo. Cortez Editora, 1993.

GODOY, Kathya Maria Ayres. “Dançando na Escola”: o movimento da formação do professor dearte. São Paulo. PUC-SP. Tese de Doutorado, 2003.

HERNANDEZ, Fernando. Cultura visual, mudança educativa e projeto de trabalho. Porto Alegre.Artes Médicas, 2000.

MARQUES, Isabel A. Ensino de dança hoje, textos e contextos. São Paulo. Cortez, 1999.

MARTINS, Mirian Celeste Ferreira Dias. Revelações pedagógicas: ensaios, projetos e situaçõesdidáticas. São Paulo. Espaço Pedagógico, 2000.

MARTINS, Mirian Celeste Ferreira Dias, PICOSQUE, Gisa e GUERRA, Maria Terezinha Telles.Didática do ensino de arte: a língua do mundo: poetizar, fruir e conhecer arte. São Paulo. FTD,1998.

SCHÖN, Donald A. Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e aprendizagem.Porto Alegre. Artes Médicas Sul, 2000.

Page 55: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

55

INTRODUÇÃO

O propósito deste artigo é discutir como tem se constituído a relação entre osseguintes aspectos: formação inicial do professor/pedagogo, a prática pedagógica e o estágiosupervisionado no curso de Pedagogia da Universidade Ibirapuera; procurando mostrar que épossível um diálogo harmônico entre estes três elementos indissociáveis para o exercício dadocência.

No exercício das respectivas funções da docência no ensino superior e da assistênciana Coordenação do curso de Pedagogia da UNIb, foi possível a experiência no campo da formaçãode professores, observando-se o ingresso no ensino superior, a formação inicial do pedagogo e ainstrumentalização do mesmo, pautada nas vivências de prática pedagógica e estágiosupervisionado. Para tanto, essa experiência foi implementada a partir do redimensionamentocurricular pelo o qual o curso de Pedagogia da UNIb atravessou no decorrer dos últimos dois anos.

A preocupação com o redimensionamento, a organização e a implementação docurrículo passou por fortes mudanças desde o ano de 2003, a partir da Resolução n° 2/2002 queinstitui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores da Educação Básica.Com base nas orientações previstas nessa Resolução foi possível estruturar um currículo queapresentasse a possibilidade de proporcionar uma formação do educador voltada para os elementosconstitutivos da aprendizagem escolar propriamente dita, bem como, voltada para elementosconstitutivos do papel do professor na instituição escolar enquanto agente propulsor de mudançase transformações sociais.

A intencionalidade do currículo foi evidenciada em situações de estudo, observaçãoe atuação do aluno do curso de Pedagogia durante as propostas de projetos e realizações dasquatrocentas horas destinadas a Prática Pedagógica e ao Estágio Supervisionado. Na verdade, alinha mestra que alinhavou esse trabalho fundamentou-se na interlocução entre a docência e oestágio, promovendo uma experiência com inferências qualitativas na formação dos futuroseducadores.

O grande desafio foi verificar a existência de um diálogo possível entre docência,estágio e prática pedagógica em três eixos temáticos de pesquisa, com o objetivo de formar oprofessor pesquisador. Ou seja, o propósito final da observação do trabalho foi verificar se nodecorrer do percurso realizado pelo aluno do curso de Pedagogia durante a sua formação inicial, omesmo encontraria condições de potencializar sua prática profissional, o entendimento doselementos constituintes da profissão professor e das implicações sociais, culturais e políticas em

DOCÊNCIA, ESTÁGIO E PRÁTICA:O DIÁLOGO POSSÍVEL

ROSA, Ana Cristina Silva da; SILVEIRA ,Sérgio Roberto da (Universidade Ibirapuera)

Page 56: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

56

que estaria envolvido.

O CURSO DE PEDAGOGIA

O curso de Pedagogia da Universidade Ibirapuera foi o primeiro curso a ser oferecidonessa Instituição. Historicamente, configurou-se como características de atendimento asnecessidades de administração escolar. Paulatinamente, foi ganhando novas características,atreladas ao exercício da docência e gestão. Hoje, o foco central está voltado, principalmente, paraa formação de professores e posterior formação para as gestões educacionais.

O curso tem como missão formar profissionais em Pedagogia capacitados paraatuar nas atividades de ensino formal e não formal, relacionadas as áreas de docência, técnico-administrativa-pedagógica e de pesquisa, caracterizando–se como estudiosos da educação queinvestem na formação continuada como condição para se instrumentalizarem para agir num mundoem mudanças.

A meta do referido curso releva-se a capacitar os profissionais específicos paraserem capazes de entender como o objeto de estudo da área, as implicações e as relações datarefa educativa, inseridas numa formação voltada para a autonomia, a participação e a consciênciacrítica

O Curso é estruturado com a firme intenção de contribuir, meritoriamente, para aformação acadêmica e a potencialização de instrumentos, habilidades e competências quepossibilitem o exercício dos novos profissionais.

Ressalta-se que o foco do Curso de Pedagogia é propiciar a formação de profissionaiscompetentes para atuarem com o ato educativo nas instâncias do ensino formal, como atividadesdocentes, administrativas pedagógicas e pesquisa em educação, bem como nas instâncias doensino não formal, e atividades de consultoria, orientação, pesquisa, recursos humanos e outrasque não as especificamente escolares.

O DIÁLOGO ENTRE A DOCÊNCIA, A PRÁTICA E O ESTÁGIO

As relações entre pesquisa e ensino tem sido muito discutidas nos últimos anos,principalmente, pela consolidação dos cursos de pós-graduação das Universidades. Estapreocupação também tem se estendido aos cursos de graduação, pois ao se propor a formaçãodocente na perspectiva do “professor pesquisador” esta relação não pode ser esquecida.

Mesmo tendo controvérsias quanto a necessidade ou não de se formar o profes-sor como um investigador como traz Santos (2001) em que mostra que há grupos que afirmamque a trajetória profissional de ambos (professor/pesquisador) são distintas, o curso de Pedagogiada Universidade Ibirapuera tem investido nestes últimos anos na formação do docente com talcompetência. Não vamos aqui discutir o papel do professor como um profissional da pesquisaenquanto construtor de conhecimentos, mas procurar articular o que André (2001, p.59) explica:

“É extremamente importante que ele (professor) aprenda a observar,

Page 57: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

57

a formular questões e hipóteses e a selecionar instrumentos e dadosque o ajudem a elucidar seus problemas e a encontrar caminhosalternativos na sua prática docente.”

O curso tem por objetivo formar o futuro professor/pedagogo com competênciapara proposição de ações transformadoras no meio em que está inserido a partir da análise de seucampo de atuação e das necessidades nele encontradas. Para isto o curso está organizado emtrês bases de formação teórico-prático: a formação do educador social; do professor/pedagogo; edo gestor educacional.

O currículo do curso de formação inicial do professor foi estruturado pensando-sena possibilidade de otimização do mesmo para o pleno exercício profissional. Ou seja, não adiantase falar em mudanças organizacionais no ensino das instituições escolares da Educação Básicasem se pensar em mudanças organizacionais nos cursos de ensino superior. Segundo Barroso(2003, p.140)

...”Não há ‘mudança curricular’ no ensino básico e secundário senão houver mudança curricular na formação de professores, noensino superior. A formação de professores tem de ser isomórficadas mudanças que os professores devem introduzir nas suas práticasprofissionais, na gestão do currículo, nos métodos pedagógicos ena relação com os alunos”.

Há a necessidade de se rever a formação de professores pensando na proposiçãode situações de estudo, pesquisa e atuação que favoreçam ao futuro professor/pedagogo aintervenção nos processos de ensino aprendizagem, nas situações de gestões e nos momentosde interlocução com a comunidade escolar enquanto agente social, cultural e político de mudançase transformações. Ainda para Barroso (2003, p.140)

...”A solução está em adotar práticas de formação inicial deprofessores que sejam em si mesmas a expressão de modos deorganização pedagógica que se espera que os futuros professoresvenham a aplicar com os alunos na sala de aula”.

Assim sendo, ao longo do curso tem-se oferecido aos alunos oportunidades dearticulação teórico-prática a partir da disciplina Prática Pedagógica e Estágio (PPE/ESU) e ainterdisciplinaridade entre as demais disciplinas. Especificamente esta disciplina – PPE/ESU -também tem atendido as exigência da Resolução nº 2/2002 que institui as Diretrizes Curricularespara a formação de professores da educação básica que diz em seu artigo 1º inciso I e II que énecessário oferecer 400 (quatrocentas) horas de prática como componente curricular, vivenciadaao longo do curso e 400 (quatrocentas) horas de estágio curricular supervisionado a partir do inícioda segunda metade do curso.

A organização curricular tem oferecido não só a articulação teoria e prática entre asdiversas disciplinas, mas tem extrapolado o espaço físico universitário como possibilidade deaprendizado, pois o futuro professor/pedagogo tem a oportunidade de realizar seus estudos edesenvolver ações práticas a partir do 3º semestre do curso por meio de estudos, pesquisa de

Page 58: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

58

campo e prática, possibilitando um diálogo entre estas três vertentes.A disciplina PPE/ESU, a cada semestre, proporciona aos alunos um eixo temático

de investigação e prática. No PPE/ESU I o objetivo é conhecer e compreender as diferentesinstituições de educação formal e não formal e suas interfaces, possibilitando ao futuro professor/pedagogo o desenvolvimento de um plano de ação junto a estas instituições frente aos desafioseducacionais encontrados. Os estudos sobre estes desafios, nos últimos semestres, se centraramnos temas: educação sexual, rotulação de “alunos problemas”, a indisciplina e a violência na salade aula, a relação família e escola entre outros. No PPE/ESU II, o objetivo é compreender ocotidiano da escola formal e suas ações em seu entorno, possibilitando aos universitários práticasrelacionadas à inter-relação família e escola, além de compreender os aspectos éticos e estéticosda educação. No PPE/ESU III e IV, proporciona ao futuro professor/pedagogo a articulação teórico-prática com as disciplinas metodológicas, oportunizando momentos de atuação prática em salade aula, atuando nas diversas áreas do conhecimento.

Nesta perspectiva o estágio não é apenas uma exigência para a formação profissionale nem mais um componente ou “apêndice” curricular. O estágio faz parte do corpus do curso eenvolve estudos, análise, problematização, reflexão e proposição de solução à situações de ensinoe aprendizagem. Com este caráter formador, o estágio e a prática pedagógica inter-relacionam-secom as demais disciplinas, fazendo com que os futuros professores/pedagogos ampliem seu universode conhecimentos através das práticas sociais e coletivas, possibilitando-o a desenvolver ascompetências e habilidades de: capacidade de formular e encaminhar soluções de problemaseducacionais, tendo como parâmetro a Educação como direito universal do homem; capacidadede estabelecer diálogo entre a área educacional e as demais áreas do conhecimento; capacidadepara identificar, selecionar e desenvolver metodologias adequadas ao atendimento das necessidadesdos educandos; entre outras competências e habilidades que são essenciais segundo Perrenoud(2001).

A atuação do professor orientador da PPE/ESU se dá por meio de encontros naUniversidade, com o grupo de alunos, que orienta os estudos e discussões teóricas (semináriostemáticos) e na supervisão da elaboração dos projetos de prática e estágios desenvolvidos pelosalunos. A supervisão se dá desde a concepção do projeto até a realização do mesmo, pois oprofessor orientador acompanha as atividades práticas dos alunos/grupo nas escolas parceiras.

Estas escolas, em sua maioria, estão entorno da universidade o que facilita asupervisão, além de garantir a atuação da universidade em sua comunidade. Mas sabendo-se doslimites de atuação do professor orientador da PPE/ESU, as reflexões críticas no desenvolvimentoda disciplina tem se centrado nos elementos:

a) Qual a concepção de homem se pretende contribuir para formar?b) Qual a concepção epistemológica de conhecimento e de saber escolar

estamos assumindo ao desenvolvermos nossa prática?c) Que postura política estamos exercendo e assumindo ao realizarmos nossa

prática educacional?Por conseqüência, tais questionamentos, remete aos futuros professores/pedagogos

Page 59: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

59

a análise crítica sobre sua ação “in lócus” educacional.Colocar em prática a idéia do professor pesquisador e reflexivo tem sido um grande

desafio. Em primeiro momento, porque confronta-se com a concepção pré-concebida do alunoque o professor universitário lhe dará as respostas prontas e acabadas, que basta ler, decorar eregistrar aquilo que está nos livros acadêmicos. No segundo momento, porque o aluno não se vê,em primeira instância, como ser autônomo e capaz de investigar, refletir e atuar. E terceiro, porqueexige do professor orientador uma prática flexível, acolhedora, mas problematizadora. Este últimodesafio exige que o professor compreenda que o “o papel da teoria é oferecer aos professoresperspectivas de análise para compreender os contextos históricos, sociais, culturais, organizacionaise de si mesmos como profissionais, nos quais se dá sua atividade docente, para eles intervir,transformando-os”(Pimenta, 2004, p. 49).

No decorrer do semestre o professor orientador discute com os alunos as práticasdesenvolvidas, os desafios encontrados e as conquistas, além de assuntos pertinentes ao eixoinvestigativo para cada semestre. Ao longo da disciplina, os alunos devem ir a campo paradesenvolverem seu projeto de pesquisa e prática, retornando constantemente à Universidade. Asocialização do trabalho de pesquisa e prática tornar-se essencial na formação do professor/pedagogo, pois é na troca de vivências e de conhecimentos entre os envolvidos na PPE/ESU quea aprendizagem se consolida. As discussões são norteadas pelos estudos teóricos desenvolvidostambém em sala de aula, com leitura de textos já solicitadas pelo professor.

No último estágio do PPE/ESU, é garantido ao futuro professor/pedagogo aconstrução de sua autobiografia (Nóvoa, 1988) como instrumento auto-formador. A autobiografiatambém

“exerce uma função retroactiva – ela ordena o passado. Por outrolado, aquele texto, de índole primeiramente íntima, na sua vigilânciaa curto prazo, permite uma influência prospectiva, no sentido deresolução, de decisão, para enfrentar o acontecimento em funçãode impulsos do passado recente.” (Ramos e Gonçalves, 1996, p.129)

Neste contexto, na elaboração da autobiografia, o futuro professor/pedagogo trazduas características fundamentais: a retrospectiva e a prospectiva. É possibilitado a ele compreendero seu percurso formativo e tomar decisões baseadas em fundamentações teóricas de maneira acompreender o cotidiano escolar e romper com algumas práticas consolidadas.

Por isso as idéias de Nóvoa (1988), Alarcão (1996), Josso (1988), Tardif (1991) eRamos e Gonçalves(1996) orientam este trabalho.

“Temos vindo a abordar mais ou menos explicitamente, aspectossem os quais o conceito/realidade de professor reflexivo nãopoderia existir. Assim, ao triplo estatuto de professor/narrador/personagem empenhada subjazem conceitos como Aprender eEnsinar, Contar, Refletir, Agir, Criar, Existir (numa dialética sócio-individual). Consciencializar, julgar, transformar, enfim, toda uma

Page 60: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

60

imensidão de conceitos que fazem do professor actual um ser cadavez mais ávido de, em primeira instância, se autoconhecer para seauto-desenvolver.” (Ramos e Gonçalves, 1996, p.130)

O conteúdo do texto da história de vida dos alunos é pessoal e muitas vezes,esbarra-se na seleção de lembranças que muitas vezes não querem que sejam trazidas a tona.Os sentimentos e lembranças desagradáveis muitas vezes são esquecidos, mas não inteiramente,principalmente os de infância, sendo assim devem ser respeitados e aceitos pelo professororientador.

A produção da história de vida pelos futuros professores/pedagogos segue asorientação de Josso (1988) que sugere o desenvolvimento da “atenção interior” para a leitura dopróprio itinerário formativo, procurando responder as questões fundamentais: “Como me tornei noque sou?” e “Como tenho as idéias que tenho?”, para então, a partir de tais questionamentosorganizar sua produção reflexiva. Durante esta produção o professor orientador pode intervirsolicitando maior aprofundamento sobre determinadas passagens do percurso formativo, permitindoque o autor reflita ainda mais sobre os intervenientes participantes deste processo e suas influências;as práticas pedagógicas vividas enquanto aluno; os meios sociais e culturais e outros fatossignificativos.

Com a construção deste tipo texto, vários futuros professores/pedagogosquestionaram qual seria o percurso formativo de alguns professores formados que já estãoatuando nas redes públicas ou particulares, principalmente quando não conseguem romper comos moldes arraigados de professor autoritário e bancário (Freire, 1997). Eles passam a compreenderque muito dos moldes educativos são construídos pelo professor enquanto aluno, e que a rupturacom tais modelos nem sempre é fácil, pois significa muitas vezes “abrir mão” de conhecimentosque até então eram considerados absolutos e inquestionáveis.

Durante a realização da PPE/ESU, nestes dois últimos anos, pudemos constatarque os futuros professores/pedagogos tem conseguido compreender e realizar atividades práticascom maior inter-relação teórico-prática, o que facilita aos futuros professores perspectivas de análisepara compreender os contextos histórico-sociais, culturais, organizacionais e de si mesmo comoagentes atuantes e transformadores, não esquecendo-se do princípio reflexivo que segundo Dewey(1938) é

“Uma forma especializada de pensar, implica uma prescrutaçãoactiva, voluntária, persistente e rigoroso daquilo em que se julgaacreditar ou daquilo que habitualmente se pratica, evidencia osmotivos que justificam as nossas acções ou convicções e ilumina asconseqüências a que elas conduzem. Eu diria que ser reflexivo é tera capacidade de utilizar o pensamento como atribuidor de sentido.”(apud, Alarcão, 1996, p. 175)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Page 61: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

61

É claro, que no presente momento, ainda há possibilidade de reorganização naproposta de articulação entre docência, prática pedagógica e estágio supervisionado, uma vezque estamos num percurso formativo com a preocupação de respeito a interioridade humana dosalunos, sem se desvincular dos aspectos políticos da ação educativa, que é inerente a práticadocente e os aspectos profissionais da própria docência. No entanto, esta experiência tem trazidoganhos significativos na formação do futuro professor/pedagogo.

Com as análises feitas até aqui, podemos constatar e afirmar que o caminho para aformação inicial do professor sempre deve apresentar a preocupação sobre o diálogo possívelentre: docência, estágio e prática. Não é fácil, mas é um desafio possível de se realizar.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

ANDRÉ, M. (org.), O papel da Pesquisa na formação e na prática dos professores, Campinas, SãoPaulo: Papirus, 2001.

ANDRÉ, M. e OLIVEIRA, M. R.N.S (orgs.), Alternativas do ensino de didática, Campinas, SãoPaulo: Papirus, 1997.

ALARCÃO, I. , Formação reflexiva de professores, Portugal: Porto Editora, 1996.

BARBOSA, R.L.L., Formação de educadores: desafios e perspectivas, São Paulo: UNESP, 2003.

BARROSO, J., A formação dos professores e a mudança organizacional das escolas, in FERREIRA,N.S.C. (org.), Formação continuada, São Paulo: Cortez, 2003

BRASIL, Resolução 01/2002, do Conselho Federal de Educação, Ministério da Educação, 2002.

______. Resolução 02/2002, do Conselho Federal de Educação, Ministério da Educação, 2002.

FREIRE, P., Pedagogia da autonomia, São Paulo: Paz e Terra, 1997.

JOSSO, C., Da formação do sujeito...a ao sujeito da formação, in NÓVOA, A., O método(auto)biográfico e a formação, Lisboa: Ministério da Saúde, 1988.

NÓVOA, A., A formação tem que passar por aqui, in NÓVOA, A.(org.), O método (auto)biográficoe a formação, Lisboa: Ministério da Saúde, 1988.

PIMENTA, S.G e LIMA, M.S.L. Estágio e Docência, São Paulo: Cortez, 2004.

PAQUAY, L.; PERRENOUD; P.; ALTET, M.; CHARLEIR, E.(org.); Formando Professores: Quaisestratégias? Quais Competências?, Porto Alegre: ArtMed, 2001.

RAMOS, M.A. e GONÇALCES, R.E., As narrativas autobiográfica do professor como estratégiade desenvolvimento e a prática da supervisão, in ALARCÃO, I. , Formação reflexiva de professores,Portugal: Porto Editora, 1996.

SANTOS, L.L.C.P., Dilemas e perspectiva na relação entre ensino e pesquisa, in ANDRÉ, M.

Page 62: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

62

(org.), O papel da Pesquisa na formação e na prática dos professores, Campinas, São Paulo:Papirus, 2001.

SEVERINO, A. (Org.), Formação docente: rupturas e possibilidades, Campinas, São Paulo: Papirus,2002.

Page 63: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

63

INTRODUÇÃO

O Núcleo de Ensino da UNESP - Presidente Prudente (SP) tem por objetivopromover a educação ambiental, no âmbito da formação de professores (inicial e em serviço), apartir da compreensão de problemas de degradação e de ações de preservação, conservação erecuperação ambiental, especificamente relacionadas à questão da água e do resíduo/lixo.

Atualmente, participam do projeto alunos dos cursos de Geografia e Pedagogia edocentes de diferentes áreas do conhecimento. O enfoque globalizador é o referencial teórico-metodológico adotado no trabalho pedagógico interdisciplinar que envolve pesquisa, ensino eextensão.

Com o objetivo de somar esforços para reverter o quadro de degradação ambiental,promover melhoria na qualidade de vida e a justiça social, o projeto busca alcançar parceiros doensino fundamental.

Para tanto, este texto é endereçado aos profissionais com interesses neste âmbitoe apresenta proposta teórico-metodológica embasada no enfoque globalizador sobre a educaçãoambiental em resíduos, a ser desenvolvida com alunos do primeiro ciclo.

O papel da educação no enfrentamento da crise ambientalA crise ambiental da atualidade é caracterizada pelos impactos de toda ordem:

poluição, aquecimento global, destruição da camada de ozônio, esgotamento de recursos naturaise extinção das espécies. Somam-se a estes problemas a desigualdade social, a pobreza e aviolência, sintomas de uma sociedade que clama pela revisão dos seus valores éticos e morais epor ações para enfrentar estes problemas.

Os impactos ambientais anunciam a fragilidade do planeta em suportar asinterferências humanas. A natureza tem sido apropriada como fonte de recursos para a satisfaçãodas necessidades, considerando-a como uma mercadoria. Este processo não tem respeitado osciclos naturais, a restauração dos ecossistemas e o desenvolvimento humano. Os pilares desteempreendimento se baseiam na competição, na dominação e no lucro. O crescimento econômiconem sempre está atrelado ao desenvolvimento humano, à melhoria da qualidade de vida e ajustiça social. Maturana (1998, p.35) ressalta que:

O progresso não está na contínua complicação ou mudança

EDUCAÇÃO AMBIENTAL: FORMAÇÃO DOCENTEE PRÁTICAS EDUCATIVAS VOLTADAS PARA ACONQUISTA DE UM AMBIENTE SAUDÁVEL E A

JUSTIÇA SOCIAL

MARIN, Fátima Aparecida Dias Gomes (Faculdade de Ciências e Tecnologia – FCT/UNESP)

Page 64: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

64

tecnológica, mas na compreensão do mundo natural (...) com baseno seu conhecimento e no respeito por ele. Mas para ver o mundonatural e aceitá-lo sem pretender dominá-lo ou negá-lo devemosaprender a aceitar-nos e a respeitar-nos como indivíduos [...].

A degradação ambiental traz conseqüências para toda sociedade ao interferir, porexemplo, na redução da qualidade de vida, mas afeta principalmente as pessoas de baixo poderaquisitivo que são excluídas do acesso digno a moradia e a serviços de saúde e de educação. Emvirtude da especulação imobiliária, a população de baixa renda constrói as suas moradias emáreas de risco estando sujeitas ao deslizamento das encostas, aos prejuízos materiais, ao convíviocom o lixo, o esgoto, as doenças.

A visão antropocêntrica atribui ao homem o poder de dominação e exploração danatureza sem precedentes, contrariando a concepção de que como ser vivo integra a teia da vidae, portanto, não está apartado da natureza. Neste sentido, são oportunas as considerações deCapra (1996, p.231):

Todos os membros de uma comunidade ecológica estão interligados numa vasta eintrincada rede de relações, a teia da vida [...] A interdependência – a dependência mútua detodos os processos vitais dos organismos – é a natureza de todas as relações ecológicas. Ocomportamento de cada membro vivo do ecossistema depende do comportamento de muitosoutros [...]

À revelia desta premissa a relação homem-natureza vem se dando de maneiraarbitrária e predatória provocando a crise ambiental que anuncia a possibilidade de um colapsodos ecossistemas.

As discussões sobre a crise ambiental ganharam relevância nos últimos anostornando uma preocupação para diversos setores da sociedade. O aumento populacional, oshábitos consumistas e os desperdícios agravam a degradação ambiental. Os avanços científicose tecnológicos não são suficientes para conter a degradação e restaurar o equilíbrio naturalcolocando em risco a sobrevivência.

As conseqüências de desastres ambientais localizados se fazem sentir do outrolado do planeta. Há um consenso sobre a gravidade da degradação ambiental. Entretanto, ogerenciamento adequado do meio ambiente, a adoção de medidas de conservação e preservação,a efetivação de políticas e leis ambientais esbarram em interesses contraditórios.

Embora sejam efetivos os ganhos promovidos por segmentos da sociedade quetêm se organizado e promovido ações com relação à gestão eficiente dos recursos naturais, nemtodos estão comprometidos com a instauração de uma aliança global para estes fins.

Proporcionar situações para que os alunos possam identificar os conflitos, osinteresses privados e coletivos, os agentes sociais, os valores, os poderes em jogo e as diferentesresponsabilidades diante da crise ambiental é o primeiro passo para compreender a complexidadeque envolve as questões ambientais. São relevantes as considerações de Guimarães (2004,p.75) quanto à educação ambiental crítica:

Page 65: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

65

A educação ambiental crítica das desigualdades sociais e dos desequilíbrios nasrelações entre sociedade e natureza percebe os problemas ambientais como decorrentes do conflitoentre interesses privados e coletivos, mediados por relações desiguais de poder que estruturam asociedade contemporânea em suas múltiplas determinações e seu modo de produção.

A concepção de sustentabilidade fundamenta-se no equilíbrio entre odesenvolvimento do sistema socioeconômico e os ecossistemas. A ciência e a tecnologiacontribuem para promover a manutenção do capital natural com a finalidade de não comprometeras gerações futuras. Sinaliza-se para medidas de preservação da diversidade das espécies paramanter a complexidade das relações de vida. Um dos princípios da sustentabilidade é a substituiçãodo uso de recursos naturais não renováveis pelos renováveis. São oportunas políticas de reciclageme reuso dos materiais. Estas medidas poupam matéria-prima, energia e amenizam o impactoambiental causado pela disposição irregular dos resíduos.

Neste contexto, é importante destacar a exploração desenfreada dos recursosnaturais, o aumento da geração e o descarte dos resíduos/lixos, bem como os impactos negativoscausados ao ambiente. Cabe ao docente problematizar o modo de produção, as relações homem-natureza e homem-homem, o consumismo, os diferentes interesses em jogo, bem como valorizarações quanto à redução do consumo, o descarte seletivo, o reuso de materiais e produtos queestão sendo descartados como lixo e a reciclagem. Segundo Logarezzi (2004, p.236):

[...] educação ambiental implica em discutir integralmente conhecimentos, valorese participação política, a abordagem da questão dos resíduos deve incluir com destaque a atividadede consumo de produtos e serviços, em análises que busquem distinguir necessidades básicasdo ser humano, voltadas para objetivos essenciais, de necessidades criadas pelo ser humano,voltadas para objetivos artificiais, tendo sempre como parâmetros as referências socioambientaisque condicionam a realidade contemporânea e suas implicações para com as gerações futuras.

A qualidade de vida e ambiental pressupõe transformações profundas na sociedadede caráter cultural e político-ideológico coadunadas com princípios éticos e morais, a fim deassegurar a democracia, a cidadania, o respeito às diferenças, amenizar as desigualdades sociaise garantir para todos o acesso à alimentação, à saúde, à escola, à habitação e a um ambientesaudável.

De acordo com a Lei Nacional de Educação Ambiental n° 9.795/99, no seu capítuloI - artigo primeiro, a Educação Ambiental refere-se aos: [...] processos por meio dos quais oindivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes ecompetências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo,essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade. (BRASIL, 1999).

Nesta lei estabelece-se que a dimensão ambiental deve fazer parte dos currículosde formação de professores. A primeira vista esta normatização não oferece obstáculos, uma vezque é comum o professor reconhecer a sua importância, sentir-se capaz de compartilhar vivênciasdo seu cotidiano, ser tocado por sentimentos nobres e engajar-se na luta pela melhoria do ambiente.Todavia, embora estas intenções sejam legítimas, requerem a construção de saberes e

Page 66: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

66

competências para que a atuação deste professor não se caracterize por um pragmatismoexacerbado, um vale tudo, sob o risco de banalizar a prática e inviabilizar o sonho da cidadaniaambiental.

Entre os princípios básicos estabelecidos pela Política Nacional de EducaçãoAmbiental estão a sua continuidade e a permanência no processo educativo. Para tanto, faz-senecessário o empenho do professor para identificar diferentes perspectivas que estão diluídas sobo rótulo ambiental, dominar conhecimentos específicos no trato do ambiente, identificar conteúdosrelevantes, proceder à transposição didática em adequação às características da criança e aocaráter formativo, na intenção de estabelecer as contribuições específicas da educação noenfrentamento da crise ambiental.

O empenho em sensibilizar e instrumentalizar as crianças para este enfrentamentonão se reduz à realização de atividades pontuais como, por exemplo, o plantio de árvores em diascomemorativos. Estas atividades possuem uma função socializadora, mas pouco contribuempara a cidadania ambiental. Geralmente, caracterizam-se pela superficialidade, não ultrapassamas concepções ingênuas e não possibilitam a construção de conhecimentos para uma leituracrítica da realidade.

Não é raro encontrar em materiais didáticos a menção de atitudes corretas eincorretas no trato do ambiente apenas de caráter informativo. A razão de agir de maneira adequadanão é compreendida e sequer interiorizada pela sua importância intrínseca. A criança pode respeitarestas indicações para não ser advertida pelo professor ou para ser “politicamente correta” peranteos colegas. Estas menções, talvez tenham uma razão nobre na sua proposição, mas carecem decontextualização, de problematização sobre o porquê agir de determinada maneira e estão longede alcançar a conscientização e a cidadania ambiental.

O processo de conscientização crítica é mais complexo e baseia-se numa percepçãoecológica profunda. Capra (1996, p.25) defende este percepção ao admitir que:

Uma visão holística [...] de uma bicicleta significa ver a bicicleta como um todofuncional e compreender, em conformidade com isso, as interdependências das suas partes.Uma visão ecológica da bicicleta inclui isso, mas acrescenta-lhe a percepção de como a bicicletaestá encaixada no seu ambiente natural e social – de onde vêm as matérias-primas que entramnela, como foi fabricada, como seu uso afeta o meio ambiente natural e a comunidade pela qualela é usada, e assim por diante.

O pensamento sistêmico tem como pressuposto esta complexidade e aponta paraa necessidade de articular diferentes campos do conhecimento numa tentativa de compreender aquestão ambiental. A profundidade no tratamento dos temas ambientais condiz com o processopaulatino de (re)construção de conhecimentos, sem perder de vista a globalidade.

O termo meio ambiente engloba aspectos naturais e sociais. A conquista de umacomunidade ecologicamente equilibrada envolve aspectos econômicos, políticos, sociais, éticos,culturais. O trabalho pedagógico que tenha como foco a educação para a cidadania ambientaltem por princípio resgatar as discussões sobre meio ambiente e adotar uma proposta teórico-metodológica em adequação ao público infantil.

Page 67: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

67

Proposta teórico-metodológica de educação ambiental em resíduos para o ensinofundamental

Para que o saber possa ser inteligível, além de adaptações dos conteúdos àlinguagem apropriada são necessários investimentos em metodologias de ensino que respeitema estrutura lógica do material de aprendizagem e a estrutura psicológica dos alunos e ofereçaoportunidades para facilitar a aprendizagem significativa. A transposição didática exige cuidadopara que a simplificação e a maneira de apresentar os conteúdos não comprometam a compreensãoda realidade.

Especialmente com relação a discussões sobre o meio ambiente, a mídia (televisão,filme, jornal, revista) tem sido uma fonte de pesquisa paralela do professor assumindo o papel desocializar conhecimentos. Entretanto, nem sempre há um compromisso com o rigor teórico econceitual o que requer a vigilância crítica das informações veiculadas.

Por outro lado, os saberes escolares são organizados de forma a obedecer aslógicas internas das disciplinas, cuja prioridade se justifica como um fim em si mesmo. Justifica-se o estudo de um assunto, por exemplo, porque faz parte do currículo proposto para série e nãopela sua relevância social.

Este fato se agrava ao se considerar a fragilidade da fragmentação do conhecimentoem disciplinas escolares. Esta compartimentação contraria a maneira global com que nosdeparamos e atribuímos significados aos problemas da realidade (ao observarmos um fenômenobuscamos compreendê-lo na sua totalidade sem o atrelamento a Geografia, a Matemática,... ),ainda que se justifique a importância da especialização para assegurar o aprofundamento necessáriodos estudos.

Como amenizar esta problemática e oferecer um outro parâmetro para a definiçãodo que e como ensinar em consonância com a função social da escola?

Na perspectiva do enfoque globalizador (ZABALA, 2002) são identificados problemasda realidade e os conteúdos escolares tornam-se relevantes ao se constituírem em conhecimentosque possibilitem a resolução dos mesmos. De acordo com o enfoque globalizador a escolha dosconteúdos se dá em função da necessidade de compreender e intervir na realidade complexa,valendo-se das ciências como instrumento para a melhoria das condições de vida. Neste contexto,a interdisciplinaridade se sustenta ao promover a intercomunicação dos saberes, através de umamplo processo de negociação entre os professores que culmine na colaboração de diferentesprofissionais no estudo de um tema ou problema.

É importante que a escolha do tema possibilite a ampliação do repertório deconhecimentos a respeito do mundo social e natural, a partir de uma problemática vivenciada nomeio onde a criança se insere. Contextualizar o objeto de estudo, em consideração às relaçõesestabelecidas no cotidiano da criança pode torná-lo mais significativo, porém é necessário nãoperder de vista as possibilidades de generalização para outros contextos.

O estudo do tema resíduo/lixo, por exemplo, pode ser reconhecido pela comunidadeda instituição como instigador e de relevante significado social. Discutir o resíduo/lixo (da escola,

Page 68: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

68

da casa) estimula a construção de valores, hábitos e atitudes de cidadania ambiental, em favor demedidas de diminuição do consumismo e de conservação e preservação ambiental.

Cabe ressaltar que, nesse processo educativo, a construção de conhecimentosdeve incluir a discussão de conceitos, incorporando novas propostas conceituais, a exemplo deLogarezzi (2004, p.222), cujos conceitos para resíduo e lixo são mostrados neste trabalho:

resíduo – Aquilo que sobra de uma atividade qualquer, natural ou cultural. Nasatividades humanas em geral, geramos resíduo (e não lixo); (...) ao ser descartado um resíduopode ter seu “status” de resíduo (que contém valores sociais, econômicos e ambientais) preservado,ao longo do que pode ser chamada de rota dos resíduos, a qual geralmente envolve descarte ecoleta seletivos – terceiro R- reciclagem; caso contrário, um resíduo pode, por meio do descartecomum, virar lixo – nenhum dos 3R. [...]. lixo – Aquilo que sobrou de uma atividade qualquer e édescartado sem que seus valores (sociais, econômicos e ambientais) potenciais sejam preservados,incluindo não somente resíduos inservíveis, mas também, incorretamente do ponto de vistaambiental, resíduos reutilizáveis e recicláveis. Resíduos assim descartados geralmente adquiremaspectos de inutilidade, sujidade, imundície, estorvo, risco etc.,

Ao professor cabe proporcionar situações que mobilizem as crianças paraconstruírem conhecimentos sobre a temática, diagnosticarem problemas no seu contexto esugerirem soluções para os problemas que envolvam ações individuais e coletivas.

É preciso querer aprender, estar motivado positivamente para aprender. Esta éuma das condições fundamentais para a ocorrência da aprendizagem significativa. Em educaçãoambiental destaca-se a importância da sensibilização como uma primeira aproximação para atingiros objetivos da cidadania ambiental.

A criança tem uma dimensão diferente quanto à relevância social da aprendizagemdos conteúdos. Para suscitar este interesse é preciso observar as vivências das crianças, a fim deinstigá-las na busca do significado para o estudo de um determinado tema. Com relação ao temaresíduo/lixo é possível aproveitar as vivências e/ou criar oportunidades que mereçam atenção.Um forte odor, um bueiro entupido, fotos de lixão, catadores ou de uma pessoa alimentando-se derestos coletados no lixo, o acúmulo de resíduo/lixo na sala ao ponto de incomodar podem serobjetos de atenção e ativar o interesse em aprender.

A valorização das conquistas, das experiências idiossincráticas, da auto-estima, aadministração adequada dos conflitos e das diferentes expectativas, a proposta de novos desafios,através de um acompanhamento constante do docente, colaboram para a manutenção do interessee criam um clima favorável à aprendizagem.

De acordo com o enfoque globalizador, em um primeiro momento, a apresentaçãoda realidade caracteriza-se por uma perspectiva metadisciplinar evitando-se o atrelamento aosconteúdos das diferentes disciplinas. Um dos problemas da educação é centrar a atenção nasdisciplinas o que empobrece a leitura de mundo. Romper com esta estrutura significa ampliar aspossibilidades de entendimento.

Mesmo ciente da complexidade da realidade e de todas as limitações das criançasem compreendê-la, é fundamental instigar a sua leitura. Neste sentido, são oportunas situações

Page 69: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

69

em que as crianças verbalizem os porquês (do forte odor, do bueiro entupido, do acúmulo deresíduo/lixo na sala, de pessoas sobreviverem catando resíduos ou alimentando-se de restos) eproponham hipóteses. Ao explicitar as suas indagações as crianças evidenciam os seusconhecimentos prévios a respeito do assunto a ser estudado. Este é o momento adequado paraavaliar o que sabem, as limitações deste saber, os obstáculos diante da compreensão e intervençãona realidade.

A criança pode expressar os seus conhecimentos, através da fala, da escrita, dedesenhos, de dramatizações. Os critérios estabelecidos para estas tarefas precisam ser clarospara que a criança sinta-se encorajada para representar o que sabe. A troca dos materiais produzidos,a apresentação dos desenhos para o coletivo, a argumentação sobre o porquê dos desenhos têmo potencial de desencadear a ampliação dos saberes, a negociação dos diferentes pontos devista.

Em relação ao tema resíduo/lixo o levantamento inicial pode ser realizado, atravésde desenhos e de uma roda de conversa a respeito dos conceitos de resíduo e lixo, da identificaçãode problemas causados pelo lixo, das sensações, etc. O levantamento dos conhecimentos prévios,a formulação de hipóteses pelas crianças e o questionamento intencional do professor (ex. Quaisos resíduos/lixos da sala de aula? Quem utilizou os produtos? Para que usou? Eles ainda servempara algo? Para onde vão parar? Eles causam problemas para o meio ambiente? Por quê algumaspessoas sobrevivem catando resíduos? Como resolver estes problemas?) auxiliam na mobilizaçãode esquemas de pensamento para interpretar a realidade e têm por princípio focalizar e potencializaras observações da criança sobre acontecimentos relevantes do seu entorno.

Ativar os conhecimentos prévios, evidenciar as suas limitações causamdesequilíbrios que fazem parte do processo de aprender e merecem a intervenção do professorpara providenciar materiais e os recursos necessários para que a criança possa relacionar os seusconhecimentos prévios ao novo material de aprendizagem e reorganizar e ampliar os seus saberes,o que caracteriza a aprendizagem significativa.

Diante das hipóteses levantadas pelas crianças cabe ao professor delimitar o objetode estudos. Não é possível responder a todas as questões em função da disponibilidade de tempoe das condições efetivas de aprendizagem. Adequações quanto à profundidade e amplitude dotrabalho a ser desenvolvido de acordo com as possibilidades remetem a diferentes fontes deinformação, a seleção de materiais de aprendizagem, ao julgamento dos conteúdos relevantes, aorganização e a apresentação lógica destes saberes em atendimento aos objetivos pretendidos.Por outro lado, não há uma seqüência rígida dos conteúdos. O que ensinar vai sendo reavaliadoa cada momento diante das necessidades de compreensão do grupo.

Num segundo momento, busca-se assegurar a interdisciplinaridade. A delimitaçãodos conteúdos requer esclarecer qual a função de cada disciplina específica para a compreensãoe intervenção na realidade. A delimitação de situações problemas, a consideração das experiênciase a definição de áreas curriculares que lançam mão da interdisciplinaridade e a intercomunicaçãodos saberes são atitudes que favorecem o pensamento complexo. Este procedimento respeita os

Page 70: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

70

instrumentos conceituais e metodológicos específicos das disciplinas e é enriquecido pelamultiplicidade de abordagens e contribuições de diferentes áreas do conhecimento o quepotencializa os resultados da aprendizagem.

O estudo do tema resíduo/lixo pode suscitar conexões com uma infinidade deassuntos de acordo com o caminho do grupo caracterizado por experiências, expectativas,subjetividades e contextos sociais e culturais singulares. O grupo é quem decide quais serão ostemas que serão abordados, as fontes de informação e as estratégias utilizadas, a fim de favorecera interpretação crítica da realidade. Oportunamente, o agendamento de visitas, palestras ouatividades desenvolvidas por outros profissionais se faz necessário, assim como a participaçãodos pais.

Em educação ambiental é imprescindível acompanhar, refletir e valorizar asmanifestações cotidianas em prol da transformação social, da conquista de um ambiente saudável.Com este objetivo é indicado reservar um espaço para arquivar os registros da caminhada eresgatar a memória coletiva.

A título de sugestão seguem algumas atividades que podem fazer parte do estudosobre o tema resíduo/lixo para crianças do primeiro ciclo com a contribuição de diferentes áreasdo conhecimento. Ressalta-se a importância da valorização das várias linguagens (musical,corporal, plástica, pictórica, oral...) e dos aspetos lúdicos no processo de construção deconhecimentos.

1) Resíduo/Lixo• Objetivos: Abordar o tema resíduo/lixo em consideração às características

de construção do conhecimento pela criança; Identificar e confrontar hipóteses dos alunos, nosentido de aproximá-las das explicações científicas.

• Procedimentos: Observação e descrição da sala com resíduo/lixo; Registroe discussão sobre as percepções e as sensações de ocupar uma sala com muito lixo; Fotografia(ou desenhos) da sala para documentação; Investigação coletiva dos materiais que compõem oresíduo/lixo da sala e agrupamento destes materiais por categorias; Observações e registros depesquisa (Ex. formulários simples para levantamento de dados sobre tipos e quantidades deresíduo/lixo produzido durante um período na sala); Elaboração de gráficos, apresentação oraldos resultados e debate sobre os resultados.

2) Você sabe o que é resíduo/lixo?• Objetivo: Conceituar resíduo/lixo, identificar os resíduos/lixos produzidos

no local e os seus diferentes tipos: domiciliar, comercial, público, saúde, industrial, portos,aeroportos, terminais rodoviários, agrícola e entulhos.

• Procedimento: Montagem de painel coletivo com imagens ou objetos dediferentes tipos de resíduo/lixo.

Page 71: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

71

3) Do que e como são feitos os produtos? Processo de produção (recursos naturais,matéria-prima, energia, técnica/tecnologia, trabalhadores).

• Objetivos: Compreender o processo de produção de objetos utilizados pelascrianças (Ex.papel); Avaliar a necessidade de reposição do recurso natural utilizado como matériaprima (Ex. árvores e reflorestamento) e discutir sobre a importância da manutenção dabiodiversidade.

• Procedimentos: Montagem de cartazes de produtos e suas respectivasmatérias-primas; Escolha de alguns produtos utilizados (Ex. papel, lápis) para o estudo do seuprocesso de produção; Painéis com fotografias de desmatamento/ reflorestamento – plantas nativas- monocultura/ biodiversidade.

4) O lixo de antigamente e de hoje• Objetivos: Reconhecer o valor de resíduos e materiais que são jogados

fora; Contribuir para construção de noções espaciais, temporais (transformações e permanênciasno espaço); Problematizar sobre o avanço tecnológico e o aumento da geração de lixo nãodegradável.

• Procedimentos: Contador de estórias; Desenhos coletivos sobre os resíduos/lixos de antigamente e de hoje; Montagem de painel com desenhos e imagens de resíduos/lixosgerados no decorrer do tempo (cronologia); Montagem da casa de antigamente (remédios naturais,horta, transformação do lixo orgânico em adubo, reuso de produtos, pouca geração de lixo) e dacasa de hoje (excesso de produtos industrializados, de embalagens descartáveis, geração demuito resíduo/lixo); Entrevistas com familiares ou pessoas da comunidade sobre a coleta doresíduo/lixo e papel dos catadores no decorrer do tempo (construir o instrumento de entrevistajunto com as crianças).

5) O ciclo da natureza• Objetivo: Evidenciar o ciclo da natureza.• Procedimentos: Experiência de decomposição do lixo orgânico - relatório

semanal das alterações percebidas e convite para um especialista para tratar da decomposiçãodo lixo na natureza/ Horta comunitária na escola cuidada pelos alunos.

6) Para onde vai o lixo? A rota do lixo (lixão, aterro controlado, aterro sanitário,incineração)

• Objetivos: Estabelecer as diferenças entre as rotas do lixo e do resíduo eidentificar os problemas causados pelo lixo ao meio ambiente.

• Procedimentos: Questionamento sobre qual a forma de descarte (comumou seletivo) da casa de cada um; Apresentação de história em quadrinhos sobre o descartecomum realizado por uma família e o caminho do lixo produzido com ênfase nos impactosambientais; Apresentação e leitura de imagens e maquetes de lixão, aterro controlado, aterrosanitário, incinerador (favorecer a manipulação das maquetes e a dedução dos processos dinâmicos

Page 72: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

72

envolvidos em cada etapa) - levantamento das observações e hipóteses dos alunos - identificaçãode semelhanças e diferenças entre os diferentes destinos do lixo; Apresentação e análise deimagens de impactos ambientais.

7) Quais os problemas causados pela disposição irregular do lixo? (poluição daágua, do solo, do ar, proliferação de insetos e risco da disseminação de doenças)

• Objetivo: Identificar os problemas causados pelo lixo ao meio natural e aspessoas; Procedimentos: Leitura de história em quadrinhos sobre os problemas causados pelolixo e convite para profissional da área de saúde para falar sobre os riscos da disseminação dedoenças no lixão.

8) Lixão: poluição, qualidade de vida dos catadores, exclusão social, desemprego,trabalho infantil, doenças

• Objetivo: Perceber as desigualdades sociais, sensibilizar-se com a situaçãode vida dos catadores e empenhar-se para o bem estar do semelhante.

• Procedimentos: Interpretação de fotografia de lixão e roda de conversa:compartilhar opiniões.

9) Para onde vai o resíduo? A rota do resíduo (descarte seletivo, coleta seletiva,triagem, pré-processamento, reciclagem/ usina de triagem e compostagem)

• Objetivo: Estabelecer as diferenças entre as rotas do lixo e do resíduo.• Procedimentos: Apresentação de história em quadrinhos sobre o descarte

seletivo realizado por uma família e o caminho do resíduo; Apresentação e leitura de imagens emaquetes de descarte seletivo, coleta seletiva, triagem, pré-processamento, reciclagem, usina detriagem e compostagem (favorecer a manipulação das maquetes e a dedução dos processosdinâmicos) - levantamento das observações e hipóteses dos alunos; Identificação de semelhançase diferenças entre as rotas do lixo e do resíduo com destaque para os impactos socioambientaispositivos e negativos; Apresentação e problematização da realidade local quanto ao destino doresíduo/lixo (existência de lixão, aterro controlado, aterro sanitário, incinerador, cooperativa de –coleta seletiva, pré-processamento, reciclagem - usina de compostagem).

10) Produtos que entram na nossa casa e Preciso de tudo isto? (Hábitos de consumox desperdício)

• Objetivos: Identificar os diferentes modos de vida e de consumo;Problematizar os desperdícios e os hábitos de consumo priorizando a redução do consumo;Potencializar as capacidades analíticas, críticas e interpretativas frente às mensagens recebidaspelos meios de comunicação de incentivo ao consumismo.

• Procedimentos: Debate sobre o resíduo/lixo produzido nas casas dos alunos;Apresentação de dados de pesquisas sobre as diferenças de consumo das classes sociais comdestaque para a exclusão social e identificação das diferenças entre os padrões culturais de

Page 73: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

73

consumo; Investigação sobre a quantidade de produtos consumidos pelas crianças e o que édesperdício; Excesso de embalagens.

11) Os resíduos servem para alguma coisa?• Objetivo: Reconhecer o valor de materiais que são jogados fora.• Procedimentos: Solicitação para que as crianças tragam resíduos que podem

ser reutilizados ou recicláveis de casa para que sejam separados (plásticos, metais, papel, vidro);Construção com caixas de papelão encapadas (vermelho, azul, amarelo, verde) de coletoresseletivos; Visita à cooperativa/associação de resíduos e doação do material recolhido. (Elaboraçãoem conjunto com os alunos de um roteiro de entrevista sobre as condições de trabalho, renda,resíduos e materiais recicláveis, história de vida -reconstrução da trajetória de um catador); Registro,sistematização e divulgação da experiência para a comunidade escolar.

12) Redução , reuso e reciclagem• Objetivo: Compreender, promover e valorizar práticas de redução do

consumo e reuso de materiais e produtos (papel, brinquedos, roupas) para poupar os recursosnaturais envolvidos no processo de produção e diminuir a poluição./ Compreender processos dereciclagem.

• Procedimentos: Sugestões (alunos e professor) de como diminuir o consumoe reaproveitar os materiais antes jogados na lixeira (Ex. aproveitamento dos dois lados do papel);Substituição de copos descartáveis por canecas duráveis trazidas de casa; Um dia na cozinha:receita com o aproveitamento de alimentos que, geralmente, são desprezados (ex. talos de agrião,folhas de beterrabas); Organização de palestra – nutricionista; Estabelecimento coletivo de regrase cuidados com a conservação das mesas, carteiras e outros objetos para que tenham um maiortempo de vida útil; Promoção de campanha de doação de brinquedos usados para crianças carentes/ Reciclagem: Exposição de produtos reciclados e dos materiais recicláveis que lhes deram origem;Técnica artesanal de reciclagem do papel; Transformação de materiais usados em matéria-primapara brinquedos.

13) Poder Público (federal, estadual, municipal), indústria, comércio e comunidadeObjetivo: Compreender as responsabilidades com relação ao descarte, coleta,

acondicionamento, triagem, processamento, reciclagem, transporte, disposição e tratamento doresíduo/lixo

Procedimentos: Palestras, visitas.

14) Cidadania Ambiental• Objetivo: Avaliar a experiência de aprender sobre o tema resíduo/lixo e o

significado da cidadania ambiental; Problematizar o co mpromisso para com a preservaçãoe conservação do meio ambiente; Promover a generalização da experiência com destaque para

Page 74: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

74

outras realidades; Mobilizar ações políticas locais envolvendo a escola e a comunidade noenfrentamento dos impactos sociambientais relacionados a questão do resíduo/lixo.

• Procedimentos: Debate sobre os resultados do trabalho e do conceito decidadania ambiental; Instalação de coletores seletivos na escola e doação dos resíduos recolhidos;Dramatização: o papel individual e coletivo diante das ações que podem ser realizadas em diferentesespaços para a conservação e preservação do meio ambiente.

CONCLUSÕES

As atividades propostas são condizentes com a cidadania ambiental na medida emque privilegiam a aquisição de conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais voltados paraa conservação do meio ambiente. A instituição escolar tem um papel “limitado” diante do contextoglobal da tomada de decisões pertinentes à transformação da política econômica vigente. Nãoobstante, contribui para efetivar a construção de um outro paradigma para nortear osrelacionamentos do homem com a natureza e homem-homem em que valores éticos e moraisfundamentem projetos de vida sensíveis à problemática ambiental e solidários com o bem estar ea justiça social.

A cidadania ambiental é um processo moroso fundamentado na mudança deparadigma. Não basta apenas informar as atitudes corretas e incorretas com relação ao meioambiente. Este compromisso envolve a todos que pertencem à instituição e necessita da conquistade parceiros além dos muros da escola. Neste sentido, é primordial conquistar parceiros dasociedade civil (ONGs, Associação de moradores, igrejas...) e representantes do poder públicocom o objetivo de efetivar ações coletivas de preservação, conservação e recuperação ambiental.

Na universidade são realizadas pesquisas interdisciplinares sobre a realidade dePresidente Prudente (SP) com relação ao resíduo/lixo. A extensão tem por propósito socializar osconhecimentos com a comunidade. São confeccionados materiais didáticos, acervo fotográfico,realizadas exposições, estágios de regência na rede de ensino e oficinas voltadas à formaçãodocente em serviço. O objetivo do Projeto é realizar pesquisas, investir na formação docenteinicial e em serviço e realizar parcerias com o poder público e a comunidade na busca doenfrentamento da crise ambiental.

Promover a educação ambiental requer estudo, o rompimento com algumas crençaspara reconstruir o caminho, viver o coletivo, negociar as diferenças. Para avançar é inevitávelabalar a segurança, acreditar na utopia, abrir-se para o novo e refletir sobre a própria prática nabusca constante de realizar o sonho da cidadania ambiental.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999. Diário Oficial [da] República do Brasil, DF, PoderLegislativo, Brasília, DF, 28 abr. 1999.

CAPRA, Fritjof. A teia da vida.Tradução de Newton Roberval Eichemberg. São Paulo: Cultrix,1996.

Page 75: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

75

GUIMARÃES, Mauro. A formação de educadores ambientais. Campinas: Papirus, 2004.

LOGAREZZI, Amadeu J. M. Contribuições conceituais para o gerenciamento de resíduos sólidose ações de educação ambiental. In: LEAL, Antonio Cezar et al. Resíduos sólidos no Pontal doParanapanema. Presidente Prudente: Antonio Thomaz Junior, 2004. p.221-244.

MATURANA, Humberto. Emoções e linguagem na educação e na política. Tradução de JoséFernando Campos Fortes. Belo Horizonte: UFMG, 1998.

SÃO PAULO (Estado). Secretaria do Meio Ambiente. Coordenadoria de Educação Ambiental.Guia pedagógico do lixo. São Paulo: SMA, 2002.

ZABALA, Antoni. Enfoque globalizador e pensamento complexo: uma proposta para o currículoescolar. Tradução de Ernani Rosa. Porto Alegre: Artmed, 2002.

Page 76: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

76

Constitucionalmente vêem-se hoje garantidos muitos direitos às pessoas portadorasde necessidades especiais no sentido da inclusão social. No campo da educação, o paradigma dainclusão social veio para garantir às crianças com necessidades educacionais especiais sua inserçãona rede regular de ensino, invertendo a lógica da exclusão de grupos minoritários historicamenteconstruída a partir de um modelo de referência segregacionista. Encontra-se esta nova forma deconceber a educação em documentos como a LDB n. 9.394/96 no Plano Nacional de Educação(Minto, 2000), na Declaração de Salamanca e o Referencial Curricular Nacional para a EducaçãoInfantil, este que propõe diretrizes para a educação desta população, contemplando as áreas deEducação Infantil e Especial.

A escola inclusiva se baseia no princípio de igualdade social, que preza oreconhecimento e a legitimação da diferença; que a diversidade deve ser incorporada e nãomarginalizada e segregada da convivência social. A inclusão incorpora uma filosofia que aceita adiversidade, na vida em sociedade; reconhece que todas as pessoas são diferentes, têmnecessidades diversas e que deve ser contemplada, constitucionalmente a garantia das mesmascondições de desenvolvimento e oportunidades na vida social para todos seus membros.

Segundo Abramowicz, Rocha e Cunha (2002) constatam-se entre os fatores quedificultam a inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais a formação do professorde ensino regular: “Poucos têm conhecimento nessa área e sentem-se inseguros ao saber queem sua turma haverá um aluno com estas características” (p.245). Aranha (2000) concorda aopontuar a necessidade de prover os professores de ensino regular de suporte técnico, didático epedagógico, possibilitando o ajuste refinado entre fazer e saber, na construção do conhecimentoe na prática pedagógica.

Mendes (2004), ao analisar pesquisas sobre escola inclusiva realizadas no Brasil,conclui que a função da pesquisa na área seria a de produzir conhecimento para a construção desistemas educacionais inclusivos, e destaca três vertentes que considera relevantes para a produçãocientífica: a primeira delas é relacionada à formação de professores; a segunda à implantação eavaliação de políticas de inclusão em sistemas públicos de ensino; a terceira trata de estudosrelacionados à família e educandos com necessidades educacionais especiais. Destaca-se nassuas considerações finais, o seguinte: “uma política de formação de professores é um dos pilarespara a construção da inclusão escolar, pois a mudança requer um potencial instalado, em termosde recursos humanos, em condições de trabalho para que ela possa ser posta em prática” (p.228).

Com base em estudos, que revelaram haver demanda, por parte do sistema deensino, na formação dos professores na compreensão do paradigma da inclusão social (ARANHA,

EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO CONTEXTO DAEDUCAÇÃO INFANTIL E A UTILIZAÇÃO

DO BRINCAR: RELATO DE EXPERIÊNCIA

ALVES, Heliana Castro (UFSCar)

Page 77: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

77

2000, PEREIRA, 2002; MENDES, 2004), e na capacitação para lidarem com a criança portadorade necessidades especiais, a experiência aqui relatada utiliza o “brincar” da criança para convidaro professor a um olhar reflexivo sobre a sua prática. A escolha do brincar parte do fato de este sero comportamento típico da fase da infância, presente nas crianças com necessidades especiais ecrianças com desenvolvimento típico, fazendo parte do cotidiano escolar e do conjunto de recursosde que o professor se utiliza na sua prática.

Existem várias linhas desenvolvimentistas e pensadores que enfatizam a importânciado brincar no desenvolvimento infantil. Abramowicz, Rocha e Cunha (2002) apontam a atividadelúdica enquanto um importante instrumento na ação educativa, e Mrech (2003) percebe osbrinquedos e jogos assumindo um papel nuclear no estabelecimento de intervenções que visam aatender às necessidades especiais das crianças que apresentam alguma disfunção nodesenvolvimento.

Kishimoto (2003) discorre sobre como se dão as relações entre o jogo infantil e aeducação ao longo da história, discernindo diferentes concepções para cada época, desde aantiguidade, o renascimento, até aos dias atuais. O brinquedo assume um papel importante parao desenvolvimento infantil e para a aprendizagem. De forma intuitiva a criança pode adquirirnoções espontâneas, envolvendo aspectos da cognição, afetividade, físico e social. O jogo,permitindo a ação intencional, a construção de representações mentais, a manipulação de objetose o desempenho de ações sensório-motoras, contribui para seu desenvolvimento. A dimensãoeducativa surge a partir do momento que existe a intenção do adulto no estímulo de certos aspectosda aprendizagem.

Desta forma, a autora chama a atenção para o significado do jogo na educação,diferenciando duas funções: a lúdica, envolvendo o prazer e a escolha voluntária e a educativa,envolvendo a apreensão do mundo, a complementação do saber. Estas funções parecem entrarem contradição, já que a natureza livre do jogo incompatibiliza-se com a busca de resultados,típica de processos educativos. Pontua em seus estudos que duas das características do jogoinfantil é a livre escolha e o controle interno sendo que em ambas percebe-se a criançaprotagonizando a situação da brincadeira, quanto à sua escolha e quanto ao desenvolvimento dosacontecimentos. Desta forma a autora levanta o questionamento em relação à forma de reunir namesma situação de brincar, a função lúdica e educativa. Quanto a isso, exemplifica:

“Se a criança está diferenciando cores, ao manipular livre e prazerosamente umquebra-cabeça disponível na sala de aula, a função educativa e lúdica estão presentes. No entantose a criança prefere empilhar peças do quebra-cabeça, fazendo de conta que está construindo umcastelo, certamente estão contemplados o lúdico, a situação imaginária, a habilidade para aconstrução do castelo, a criatividade na disposição das cartas, mas não se garante a diferenciaçãodas cores” (p. 37)

Kishimoto (2003) acrescenta que a despeito da diversidade de situações deaprendizagem propiciadas na situação lúdica, não existe a garantia de que a intenção pedagógicado professor tenha sido contemplada na construção do conhecimento efetuado pela criança. Essaé a especificidade do brinquedo educativo.

Page 78: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

78

Estas características e funções dos jogos infantis são importantes já que a concepçãoe percepção do professor sobre o brincar da criança com necessidades educacionais especiaispassa, antes de tudo pela sua forma de conceber o jogo na educação e na sua prática educativa.Kishimoto (2003) destaca a liberdade como atributo principal do jogo devendo ser respeitadaconciliando-se com a orientação própria dos processos educativos. “Desde que não entre emconflito com a ação voluntária da criança, a ação pedagógica intencional do professor deve serefletir na organização do espaço, na seleção de brinquedos e na interação com as crianças (...)Qualquer jogo empregado pela escola aparece sempre como um recurso para a realização dasfinalidades educativas e, ao mesmo tempo, um elemento indispensável ao desenvolvimento infantil”(KISHIMOTO, 2003 p.19 e 22).

Victor (2004) aponta que muitas vezes o jogo, quando presente enquanto um recursopedagógico para crianças com necessidades especiais, especialmente a deficiência mental, servegeralmente como suporte às atividades didáticas, perdendo-se sua especificidade. Apresenta,neste sentido, a noção trazida por Kishimoto (2003) em relação à necessidade de se integrar asduas funções do jogo, o lúdico e o educativo, ao dizer que “o brincar, além de proporcionar alegriae divertimento, desenvolve a criatividade, a competência intelectual (...) atuando como fatorsignificativo para a aprendizagem”(p. 92). As pesquisas descritas pela autora visam contribuir nadiscussão sobre o papel do brincar no currículo da Educação infantil e na educação de criançascom necessidades educacionais especiais.

Em uma das pesquisas a autora se propunha a analisar o jogo, a mediaçãopedagógica e a interação entre a criança com deficiência mental e a criança com desenvolvimentotípico. Sua meta neste trabalho foi contribuir para a formação do professor promovendo a reflexãosobre a mediação pedagógica, tendo por referência a brincadeira de faz-de-conta de criançascom deficiência mental e crianças com desenvolvimento típico. Assim, além do interesse nasinterações entre as crianças com necessidade educacionais especiais, a autora também escolheucomo objeto de estudo na sua pesquisa a mediação pedagógica de alunos de iniciação científica,ou seja, futuros profissionais da área da educação em formação inicial. A pesquisa se deu emuma brinquedoteca.

No resultado de sua pesquisa sobre as contribuições do brincar na inclusão dacriança com necessidades educacionais especiais, a autora também chama a atenção para aineficiente mediação do professor na condução do aluno ao conhecimento através da brincadeirae na promoção de situações de inter-relacionamento entre as crianças com necessidades especiaise as que apresentam desenvolvimento típico. Para a autora, esta “lacuna” na formação do professorquanto às possibilidades do brincar na ação educativa e nas trocas sociais, permite sentimentose atitudes de exclusão na escola, portanto, contrários à perspectiva de inclusão.

Emmel (2004) discorre sobre o papel do adulto para o brincar da criança, uma vezque, através da interação entre adulto e criança, pode ser criado um ambiente propício aodesenvolvimento global do indivíduo. Esta interação possibilita, além do contato afetivo, um apoiopara a atividade cognitiva fornecendo bases novas para a aprendizagem. Segundo esta mesmaautora o papel do adulto também está no estabelecimento de uma interação entre as crianças, ao

Page 79: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

79

organizar o espaço e as experiências da criança, estabelecendo regras, condições para odesenvolvimento das atividades e estimulando modalidades específicas de comportamento socialentre elas. Destaca, porém, que em alguns momentos a presença do adulto na brincadeira tambémpode restringir iniciativas de interação dentro do grupo, resultando na redução do número decontatos entre as crianças e seus pares. Por outro lado, Emmel (2000) diz que a presença doadulto possibilita à criança a oportunidade de representar e simbolizar, além de atribui relevânciasocial a suas ações e aos objetos. Victor (2004) também realça a função do educador noacompanhamento do movimento lúdico da criança e na realização de mediações pedagógicasque favoreçam o seu desenvolvimento, estimulando a criatividade, a operatividade, o equilíbrioemocional, a sociabilidade, entre outros fatores.

Mrech (2003) ao falar sobre o uso de brinquedos, jogos e materiais pedagógicos naprática do professor junto à criança com necessidades especiais, adiciona o conceito de modalidadede aprendizagem que revela a forma e o conteúdo de estruturação da aprendizagem do sujeito.Diferentemente do modelo de aprendizagem geral e universalista, a modalidade de aprendizagemé sempre singular e específica (FERNANDÉZ, 1991). É através da modalidade de aprendizagemdo sujeito que realmente poderemos conhecer como o material introduzido pelo professor foicaptado e quais são as necessidades específicas do aluno.

Neste sentido se o olhar for direcionado para o fato de que a inclusão de criançascom necessidades especiais inseridas na rede regular de ensino desestrutura de certa forma osistema de ensino tal como ele é concebido, admite-se a necessidade de uma mudança significativanas configurações físicas e pedagógicas da escola, investindo-se na formação do professor nosentido de colaborar para que este possa perceber quê tipo de recurso de instrumentos o alunoprecisa receber (Victor, 2004). Isso significa que não há uma metodologia única para a multiplicidadedas diferenças (Abramowicz, Cunha e Rocha, 2002) e que devemos aderir a um sistema deensino que habilite o professor para olhar a singularidade de cada aluno, adaptando assim suasestratégias pedagógicas.

Abramowics, Cunha e Rocha (2002) discutem que o educador, preocupado emavaliar a capacidade intelectual da criança, acaba não priorizando a criação de um ambiente quefavoreça o aprendizado daquela criança, conforme sua necessidade. Para as autoras, a falta decompreensão acerca dos problemas dos portadores de deficiência leva à adoção decomportamentos que provocam impacto negativo no desenvolvimento da criança. Por exemplo, aatitude de superproteção do educador, ou cuidador, ao se depararem com a criança comnecessidades especiais realizando alguma atividade. Geralmente, acabam por realizar a tarefapor ela, já que não aceitam a velocidade com que ela realiza a sua ação, não dando condiçõespara o exercício da autonomia. Neste sentido, Miura, Profeta e Toledo (2000) alertam que o professore os familiares podem desempenhar um papel importante no processo de estigmatização dacriança com necessidades educacionais especiais dependendo da forma com este se relacionacom ela, e que, havendo uma mudança de atitudes destes atores em relação à deficiência,possibilitando ao aluno “uma melhor interação dele com meio, é possível que ele seja visto como

Page 80: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

80

uma pessoa que participa afetivamente, socialmente, economicamente, etc, de uma vida comuma todos.” (p.174).

Partindo destes pressupostos, acredita-se que é preciso criar na escola espaços dereflexão que poderão levar a modificações importantes no pensar e no fazer pedagógico, conformeaponta Oliveira (2002).

Assim, adaptar os recursos pedagógicos e ampliar a área de conhecimento doprofessor, passa, antes de tudo, pela concepção do professor acerca da deficiência em si. Acredita-se que este pensar interfere na prática do professor e também na forma como ele interage com acriança ao brincar, na forma como ele a observa ao brincar, na forma como ele estabelece seupapel de mediador pedagógico e no favorecimento da relação com as crianças que apresentamdesenvolvimento típico.

Projeto Criando Asas:estrutura de funcionamento e reflexão sobre a práticaAtravés de um espaço de “brinquedos e brincadeiras” a experiência desenvolvida

no Projeto Criando Asas se propõe a oferecer suporte para estes educadores, favorecendo oprocesso de inclusão, além de prestar atendimento às crianças com necessidades educacionais.

O projeto Criando Asas era um programa do estado, passando a ser municipalizadoa partir de 2003/ 2004 foi realizado através da secretaria de educação e cultura em parceria coma secretaria da cidadania.

Funcionava dentro das brinquedotecas nas creches de São Carlos e CentrosComunitários.

O Criando Asas apesar de ter nascido com a proposta de funcionar dentro dasbrinquedotecas que era um espaço diferenciado do cotidiano educacional, teve desde o início umcaráter formativo. Os educadores que atuavam neste projeto passaram a criar um espaço dereflexão e atuação com estas crianças com necessidades especiais. A partir do brincar estabeleceu-se uma nova interação e uma nova compreensão a respeito da deficiência sendo que muitasvezes estas novas formas de contato favoreciam o processo de inclusão destas crianças. Alémdisso, estes educadores começavam a cumprir a função de multiplicadores no momento em quedividiam suas experiências com outros profissionais.

Os professores recebiam as crianças com necessidades educacionais especiaisnestas brinquedotecas, desenvolvendo um trabalho de estimulação e estabelecimento de contatoeducador-criança através do brincar, do lúdico. Para tanto recebiam orientações de uma terapeutaocupacional e de uma fonoaudióloga. A terapeuta ocupacional orientava as educadoras em relaçãoaos brinquedos, brincadeiras e atividades apropriadas para cada criança inclusa no projeto, tendoem vista seu desenvolvimento e o favorecimento do processo de inclusão. No entanto, as orientaçõeseram realizadas a partir, principalmente das reflexões das educadoras e o relato de sua rotina coma criança, favorecendo o processo de mudança na sua mediação pedagógica e possibilitando umimportante diálogo entre profissionais em relação ao atendimento das necessidades daquelascrianças.

Dentro das creches, a princípio, as crianças eram retiradas da sua sala para serematendidas separadamente na brinquedoteca. Ao perceber que isso poderia favorecer atitudes

Page 81: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

81

discriminatórias dentro da creche, começou-se a incluir no projeto crianças com desenvolvimentotípico, criando um espaço propício não só para o desenvolvimento de habilidades mas um espaçode integração e configuração de novas formas de relação entre professor e aluno, entre as criançascom necessidades educacionais e crianças com desenvolvimento típico, favorecendo atitudes esituações mais coerentes com a concepção e os princípios da educação inclusiva.

A brinquedoteca é um espaço diferenciado e diferenciado no sentido de propiciarum maior leque de possibilidades de contato desta criança com o lúdico. O papel do educadortambém se modifica, pautando sua ação mais no brincar do que no desenvolvimento de açõescom finalidades puramente pedagógicas.

Foi possível observar uma mudança na forma dos professores perceberem ascrianças que estavam sendo acompanhadas, levando em consideração as potencialidades e nãoapenas o déficit. A concepção de deficiência foi criando novos contornos a partir da atmosferalúdica, permitindo que se ressaltasse os aspectos positivos de cada criança atendida.

A partir de um novo olhar sobre estas crianças, foi possível uma melhor qualidadena relação educador-criança, favorecendo o processo de inclusão destas crianças na rede regularde ensino.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABRAMOWICZ, A.; ROCHA, M.J.S; CUNHA, I,A,M. O desenvolvimento das Crianças de três aSeis anos. In: PALHARES, M.S; MARINS, S. (Org.). Escola inclusiva. São Carlos: Edufscar,2002.

ARANHA, M.S.F. Inclusão sócia e municipalização. In: MANZINI, E.J. Educação Especial: temasatuais.Marília. Unesp-Marilia-Publicações, 2000.

EMMEL, M.L.G. Proposições sobre o significado e a função do brincar no desenvolvimento infantil.In: MENDES, E. G; ALMEIDA, M. A; WILIAMS, L.C. (Org.).Temas em educação especial- avançosrecentes. São Carlos: Edufscar, 2004

FERNÁNDEZ, A. A inteligência aprisionada. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991

MENDES, E. G. Construindo um “locus” de pesquisas sobre inclusão escolar. In: MENDES, E. G;ALMEIDA, M. A; WILIAMS, L.C. (Org.).Temas em educação especial- avanços recentes. SãoCarlos: Edufscar, 2004

MINTO, C. A. Educação Especial: Da LDB aos planos Nacionais de Educação-MEC e Propostada Sociedade Brasileira. In: PALHARES, M.S; MARINS, S. (Org.). Escola inclusiva. São Carlos:Edufscar, 2002.

MRECH, L.M. O uso de brinquedos e jogos na intervenção psicopedagógica de crianças comnecessidades especiais. In: KISHIMOTO, T.M. (Org). Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação.São Paulo: Cortez, 2003.

OLIVEIRA, A.A.S. Representações sociais sobre Educação Especial e deficiência: o ponto devista de alunos deficientes e professores especializados. 2002. Tese (doutoramento em Educação)-Faculdade de Filosofia e Ciências. Universidade Estadual Paulista, Marília.

Page 82: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

82

PEREIRA, E. G. Avaliação de uma experiência de formadores de professores de magistériossobre educação inclusiva. 2002. Dissertação (Mestrado)- Universidade Federal de São Carlos.KISHIMOTO, T.M. O jogo e a educação infantil. São Paulo. Editora Pioneira, 2003

VICTOR, S. L. O Brincar na educação infantil e suas contribuições na inclusão da criança comnecessidades educacionais especiais. In: MENDES, E. G; ALMEIDA, M. A; WILIAMS, L.C.(Org.).Temas em educação especial- avanços recentes. São Carlos: Edufscar, 2004

Page 83: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

83

INTRODUÇÃO

A Rede Nacional de Formação Continuada, um programa vinculado ao MEC/SEB,tem por objetivo a constituição de centros de pesquisa e desenvolvimento, visando promover aformação permanente de professores e a implantação de novas tecnologias de ensino, onde osmateriais didáticos estarão acessíveis para Estados e Municípios interessados, abarcando atividadespresenciais, semi-presenciais ou a distância.

O Centro de Educação Continuada em Educação Matemática, Científica e Ambiental(CECEMCA) – Unesp iniciou suas atividades no ano de 2004 e resulta de um Convênio entre aUnesp e o MEC.

Faz parte da Rede Nacional de Formação Continuada de Professores da Secretariade Educação Básica do MEC e tem como objetivo produzir material didático e oferecer cursos deeducação continuada para professores das escolas públicas municipais e estaduais de todo oBrasil.

A experiência aqui apresentada faz parte do projeto piloto do CECEMCA/Unesp –Núcleo Rio Claro, realizada na escola estadual Marcello Schmidt, na cidade de Rio Claro/SP, noperíodo de Abril e Maio de 2005. O Curso teve como objetivo a apresentação de conceitos relativosàs ciências cartográficas e educação matemática aplicados aos estudos ambientais e foi ministradopara 20 professoras, num total de 40 horas. Objetivou também aprimorar o conteúdo dos cadernosdidáticos elaborados para a formação continuada de professores do ensino fundamental, no formatosemi-presencial. O curso se desenvolveu através de encontros presenciais, atividades monitoradasusando ferramentas de educação a distância e atividades desenvolvidas em classe pelos professorescom seus alunos do ensino fundamental.

CARTOGRAFIA E MEIO AMBIENTE NO ENSINO FUNDAMENTAL

O CECEMCA – Núcleo Rio Claro, adotou como estratégia centralizar na EducaçãoAmbiental e nos estudos voltados para os aspectos ambientais a realização de seus cursos, quepodem ser presenciais, semi-presenciais e à distância, bem como do material didático a elesrelacionados, como livros, vídeos e diferentes mídias eletrônicas.

EXPERIÊNCIA DO CECEMCA – UNESP NO PROJETOPILOTO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM

CARTOGRAFIA E MEIO AMBIENTE

FREITAS, Maria Isabel Castreglhini de (DEPLAN-IGCE/UNESP);ALMEIDA, Rosangela Doin de (IGCE/UNESP); RAMOS, Eugênio Maria de França

(IB/UNESP); CABRAL, Márcia Pereira (IGCE/UNESP)

Page 84: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

84

O Meio Ambiente, considerado nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) comotema transversal, é abordado aqui de forma a integrar as disciplinas e temáticas referentes àCartografia sendo que, para tal, é alimentado de exemplos, divulgando o conhecimento científicogerado pelas diferentes áreas. Pela sua complexidade, a questão ambiental não é exclusividadede uma ou outra área de conhecimento ou disciplina, mas resulta da combinação de inúmerasvariáveis, envolvendo a natureza física da Terra e a ação do homem como principal ator de suatransformação e humanização.

O curso Cartografia, Matemática e Meio Ambiente foi preparado para professoresdo Ensino Fundamental que atuam nas séries iniciais e tem o objetivo de apresentar conceitoselementares de cartografia, assim como possibilitar um aprofundamento em temas das ciênciascartográficas que normalmente não se encontram acessíveis no cotidiano do professor. Objetivandotornar menos árdua a tarefa de transitar por definições e conceitos técnicos, inserções são feitasem Cartografia Ambiental bem como em Educação Ambiental, trazendo situações do dia-a-diavisando estimular a sua reflexão sobre a vida, a sociedade e o ambiente nos quais o professor seinsere. Desta forma, pretende-se contribuir para uma visão mais abrangente da Cartografia, quegeralmente é associada exclusivamente aos estudos Geográficos, sendo assim pouco exploradapor professores de Matemática e Ciências, dentre outros, nas suas atividades didáticas.

A Cartografia aqui é encarada para além de ciência que se ocupa de conceitos eclassificações dos produtos cartográficos, bem como de aplicações metodológicas incluindo coletade dados, processamento de informações e representação sob a forma de mapas, gráficos emodelos, dos aspectos humanos e dos relativos à superfície física da Terra. A cartografia tambémordena e representa o ambiente, aprimorando aquilo que sempre foi intuitivo no homem, e oacompanha desde os primórdios de sua vida no planeta, que é representar a paisagem a suavolta, desenhar e descrever suas rotas, seus caminhos e os aspectos que refletem sua organizaçãoem sociedades.

A cartografia ambiental parte do princípio de que os problemas ambientais atuaissão, em sua maioria, desencadeados prioritariamente por problemas sociais e não por açõesnaturais, sendo que essas últimas também têm sua importância. Eles emergem principalmenteda sociedade e não da natureza (MARTINELI, 2001).

E é na paisagem que esses problemas se materializam. Assim, valendo-se deestudos em escala temporal e espacial, a cartografia ambiental, busca detectar e representar taisproblemas de caráter sócio-ambiental, dando suporte à tomada de decisão dos administradoresem nível local e regional.

Abordar os conteúdos da cartografia para o ensino, considerando o meio ambientecomo elemento de ligação entre as diversas áreas do conhecimento, permite ao professorflexibilidade no estudo e na representação cartográfica de temas que vão desde a percepçãoambiental do caminho percorrido para chegar à sua escola até, por exemplo, as mais complexasinterações que envolvem representação espacial e o estudo dos impactos ambientais.

Page 85: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

85

Torna-se importante incluir nas atividades didáticas no ensino fundamental atividadesque explorem as relações espaciais topológicas elementares e de orientação, que permitem aosalunos o domínio do seu espaço cotidiano e dos aspectos relativos a sua posição em relação aosobjetos que o cercam. Aspectos relativos à classificação de mapas, às normas cartográficas e aoexercício de observação da paisagem e de sua representação através de mapas são algumas dasferramentas tratadas no curso que permitem o aprofundamento do conhecimento de diferentesconteúdos como os relativos a história, geografia, matemática, dentre outros. A questão de escalae generalização cartográfica, representação dos elementos que compõem objetos do cotidiano napaisagem urbana e rural, através de croquis e de maquetes são temas cartográficos que podemser explorados em diferentes disciplinas, fortalecendo os conceitos e dinamizando as aulas.

O CURSO PILOTO

A EE Marcello Schmidt, escolhida para a aplicação do curso piloto, está localizadano centro da cidade de Rio Claro, a maioria dos seus professores atua como efetivo na escola,mantendo assim sua participação ativa nos projetos da escola, que são vários. Os alunos quefreqüentam a escola pertencem predominantemente à classe média. Observa-se o empenho e aliderança da direção e coordenação da escola para abrigar novos projetos que dêem melhorescondições de atualização para os professores e formação para os alunos. A escola estadual emquestão foi contemplada com um laboratório com computadores e internet rápida, que deveria tersido instalado no início de 2005. Atrasos nessa instalação, que até o final do curso piloto não haviaocorrido, levaram ao uso de computadores particulares dos professores cursistas e os daadministração da escola (3 computadores) para o desenvolvimento das aulas à distância.

O Curso teve como objetivo a apresentação de conceitos relativos às ciênciascartográficas e educação matemática aplicados aos estudos ambientais, para 20 professoras doEnsino Fundamental da Escola Marcello Schmidt, dentro do piloto do Projeto Unesp - MEC relativoa Rede de Formação Continuada do MEC. A experiência de aplicação do curso para o grupo deprofessores de uma escola visou aprimorar o material didático gerado em termos de conteúdo,profundidade e viabilização de sua aplicação na formação de professores das séries iniciais. e asmetodologias didáticas adotadas pelo CECEMCA.

Adotou-se para a aplicação do Curso a metodologia de Ensino Semi-Presencial,tendo sido realizadas aulas presenciais e à distância fazendo uso da plataforma gerenciadora deconteúdo – o TelEduc. Na etapa presencial do curso foram ministradas aulas teóricas e práticasna própria escola, num total de 20 horas.

As 20h restantes do curso foram utilizadas para as atividades à distância, atravésda internet, nas quais o acesso ao curso pôde se dar de acordo com sua disponibilidade dehorário.

Page 86: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

86

O acompanhamento do trabalho das professoras cursistas foi feito através do agenteTutor, que acompanhou as atividades ao longo do curso, e do agente Instrutor, que as acompanhouconduzindo discussões, fomentando a pesquisa e novas fontes de informação.

A avaliação dos cursistas na etapa à distância foi realizada através de tarefasrelacionadas com os conteúdos trabalhados, bem como pela sua participação no mural dediscussões, expondo dúvidas e sugestões, além das salas de bate-papo.

Além dessas atividades os participantes tiveram o compromisso de aplicar emclasse, com seus alunos regulares, um dos temas abordados no curso. Esta atividade foiacompanhada pelos estagiários tutores que assistiam às aulas e elaboravam relatos das mesmas.

Os registros das aulas, realizados por observadores de campo (bolsistas doCECEMCA) em diários de campo, foram transformados em relatos ampliados (com o auxílio degravação em cassete) e apresentados aos professores como notas para escrita da narrativa, suprindoa impossibilidade do professor, ao mesmo tempo, realizar e registrar a sua aula.

Ao final do curso os professores participantes tiveram como tarefa final a redaçãode uma narrativa na qual descreviam a sua percepção dos aspectos abordados no curso relativosaos conteúdos e a reflexão sobre os mesmos, assim como a experiência realizada com seusalunos em sala de aula.

RESULTADOS OBTIDOS

Algumas dificuldades foram encontradas no transcorrer do curso, principalmentecom relação aos professores que trabalhavam por três períodos (exerciam função tanto na redemunicipal, quanto estadual e particular), visto que possuíam pouco tempo para acessar o curso,resultando assim na desistência dos mesmos.

O curso transcorreu conforme as expectativas destacando-se o empenho e dedicaçãopor parte das participantes. Algumas dificuldades foram observadas no que se refere ao volumede conteúdo trabalhado no curso, que foi super dimensionado para o período previsto. Em funçãodo ritmo das professoras cursistas, observou-se que uma redução no conteúdo era fundamentalpara o sucesso das atividades práticas previstas. A equipe redimensionou o curso, visando atendera demanda das participantes.

Os resultados positivos da experiência estão relatados nas atividades da açãocolaborativa que foi desenvolvida pelas participantes. As narrativas elaboradas indicam ocomprometimento coletivo das professoras com o curso proposto, e sua dedicação para que aconclusão dos trabalhos fosse feita com êxito. Observou-se ainda que foi possível para a maioriado grupo integrar cartografia e matemática com os aspectos ambientais em suas práticaspedagógicas.

Page 87: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

87

AÇÃO COLABORATIVA E AVALIAÇÃO POR MEIO DE NARRATIVAS

Como ação colaborativa, os cursos realizados pelo CECEMCA foram avaliadospela inserção de saberes trazidos pelos professores participantes a partir de conexões queestabeleceram com suas práticas. A escrita, sob a forma de registros em diários de campo etambém sob a forma de narrativa, consistiu no meio fundamental para tanto, o que deu maiorabrangência à avaliação a respeito dos desdobramentos dos cursos nas práticas dos professores.Há uma bibliografia já bem conhecida dos pesquisadores da área da educação que dá fundamentoteórico-metodológico para esta abordagem, designada por alguns como pesquisa colaborativa, aqual associamos à proposta da pesquisa narrativa apresentada por D. Jean Clandinin e F. MichaelConnelly1. Por se tratar de uma ação formativa, as produções escritas podem ser tomadas comotestemunhos indicativos do que se busca observar (a transformação das práticas docentes comoresultados de conexões, entre o que era usual e o que se colocou como inovação, realizadasdurante os cursos), além disso, o que foi narrado torna-se um enunciado para interlocução futuraentre os professores narradores e outros (participantes ou não do curso).

As narrativas apresentam a experiência de uma unidade de ensino, que pode tertomado diversas aulas, sobre um tema relacionado com um dos itens do programa apresentadono curso. Consistiram, portanto, na forma sob a qual cada um dos participantes apresentou-seaos demais, narrando a experiência de suas práticas a partir dos registros.

Nesse sentido, a avaliação por meio de narrativas, nesta fase inicial, estabeleceuelos de ligação entre o cotidiano das salas de aula e o lugar onde se encontram os organizadoresdos cursos - alguns deles bem remotos, pois vários autores dos módulos não precisaram chegaraté as escolas. O conhecimento de repercussões dos cursos à distância, por meio de narrativasdos professores, servirá como referência para as adequações a serem feitas nos próximos cursos.Notamos que 70 % dos participantes realizaram a narrativa, o que é um resultado muito bom, seconsiderarmos as condições objetivas de trabalho dos participantes.

Destacamos, a seguir, aspectos que iluminam a qualidade das narrativas. Primeiro,a narrativa como relato de uma aula, colada na seqüência do que foi realizado, de modo impessoal.Esse tipo de texto não permite saber como as pessoas experienciaram a aula, suas dúvidas,dilemas etc, apresenta ocorrências que poderão ser objeto de reflexão por parte do leitor, emboranão o convide a estabelecer conexões com suas próprias experiências. Este é um exemplo:

“A atividade aplicada está relacionada ao conteúdo de Geografia e Ciências da 4asérie. Portanto, procurei dar seqüência, trabalhando a planta da parte superior e pátio da escola.De imediato, os alunos deslocaram-se da sala de aula, acompanhados por mim e Rafaela, ondeiniciaram a pesquisa, que surgiu a partir do conteúdo que foi desenvolvido na 1a aula de alfabetizaçãocartográfica. Circularam por toda parte superior, alguns entrevistaram os professores, outrosvisitaram cada repartição (salas), anotaram o nome do profissional que ali ocupa, número dealunos que estuda em cada série etc. (...)” (Professora J.M.J.S.)

Page 88: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

88

As narrativas, geralmente, deixam entradas para que o leitor possa, se for o caso,fazer ligações com suas próprias experiências. Destacamos este trecho de narrativa como exemplo:

“Desde que ingressei no magistério, dar aulas de Geografia nunca me agradou,talvez seja pelo trauma que sofri quando estava no ginásio, pois não me sentia segura, nunca foime passado como uma matéria prazerosa, portanto nunca gostei. Toda vez que tinha que daressa aula aos meus alunos sentia medo de passar essa insegurança. Então, dava aquelas aulasmaçantes, seguindo apenas o livro didático. Fazendo o PEC, aprendi que Geografia não é decorar,decorar e decorar, mas sim observar, comparar, refletir, etc, sobre os fatos reais. (...) Senti que osalunos ficaram motivados, porque me pediram que nossas aulas de Geografia sempre seguissemessa dinâmica.” (Professora C.S.G.B.).

A prática de produção de narrativas permitirá ainda que se crie nos cursos umambiente colaborativo de fato, pois elas convertem-se em uma construção e re-construçãocompartilhadas, “uma mesma pessoa está ocupada, ao mesmo tempo, em viver, em explicar, emre-explicar e em re-viver histórias” (Connely e Clandinin, 1995, p. 22).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A aplicação do curso piloto de formação continuada abordando o tema Cartografiae Meio Ambiente foi uma oportunidade ímpar de realizarmos, na prática, a ação de formaçãoproposta pelo CECEMCA – Núcleo Rio Claro, envolvendo professores de 1º a 4º anos do EnsinoFundamental. Embora a maioria dos professores possuísse computador em casa, com acesso àinternet, muitos deles não os utilizam no seu dia a dia. Alguns professores deram depoimento deque o curso piloto oferecido permitiu pela primeira vez seu acesso a correio eletrônico e navegaçãona internet.

A experiência adquirida no curso piloto permitiu a readequação dos assuntostrabalhados em classe, ou através das aulas à distância, para que o rendimento dos professoresseja adequado. Desta forma, através da interação com as professoras participantes dos cursos,foi possível a construção do conhecimento do grupo todo, professores da universidade, estagiáriose professores cursistas, o que leva a uma formação contínua e integrada de todos os participantesdo processo.

Os cursos ministrados tiveram a vantagem de aprofundar alguns dos conteúdos jáde domínio dos professores, levando-os a refletir sobre suas práticas e ampliando as possibilidadesde exploração dos recursos da internet. Conteúdos como Sensoriamento Remoto e CartografiaTátil, no curso de Cartografia e MeioAmbiente, foram inovadores e atraentes, faltando aos cursosmaior tempo para que os professores pudessem se dedicar ao aprofundamento dos mesmos.Deve-se destacar que a maioria dos professores justifica o seu maior domínio de um conteúdo,em detrimento de outro, devido à sua formação inicial, inclusive no que se refere ao uso demateriais didáticos.

Page 89: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

89

Os resultados obtidos apontam para a importância e a necessidade de atividadesde formação continuada que permitam aos professores em exercício terem acesso ao conhecimentopara se manterem atualizados frente ao desenvolvimento da cultura e das ciências.

Observou-se ainda que o trabalho pautado na ação-reflexão-ação é um determinantena mudança de conduta do professor em sala de aula. O exercício de pensar as suas práticas eredigir narrativas sobre suas atividades cotidianas permitirá ainda que se crie nos cursos umambiente colaborativo de fato, pois elas se convertem em uma construção e re-construçãocompartilhadas.

BIBLIOGRAFIA

BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL. Parâmetros Curriculares Nacionais:Meio Ambiente. Brasília: MEC/SEF, 1998.

CLANDININ, D.J. & CONNELY, E.M. Relatos de experiência e investigación narrativa. In: Déjameque te cuente: ensayos sobre narrativa y educación. Barcelona: Editorial Laertes. Pp. 11-59.1995.

MARTINELI, M., PEDROTTI, F. A Cartografia das Unidades de Paisagem: Questões Metodológicas.Revista do Departamento de Geografia, 14 (2001): 39-46.

NOTAS

1 CLANDININ, D.J. & CONNELY, E.M. Relatos de experiência e investigación narrativa. In: Déjame que te cuente: ensayos sobrenarrativa y educación. Barcelona: Editorial Laertes. Pp. 11-59. 1995.

Page 90: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

90

Os assuntos ligados a formação de professores em cursos a distância semprecausam polêmicas, especialmente porque as propostas deste tipo de educação surgiram hádécadas atrás, com bases behavioristas, elaboradas em modelos de instrução programada, etambém organizadas para cursos, em sua grande maioria, essencialmente técnicos. Os alunosde tais cursos recebiam um material para estudo individual (auto-estudo) e depois comprovavam,por meio de testes, enviados aos “formadores distanciados”, a aquisição satisfatória (ou não) deconhecimentos.

Atualmente, um grande número de pesquisadores da área educacional condenaas propostas de formação docente nos moldes de EAD (Educação a distância), pois entendem asustentação das mesmas nesses moldes iniciais (décadas de 40 e 50) - condutivistas/objetivistas-que implicam em conceitos inapropriados sobre a educação como a transmissão, instrução,mecanização e mera transferência de informação. Temos adotado para a formação docente doséculo XXI, de forma oposta, um paradigma onde a interação humana é que garante a educação,e isto, de certa forma, justifica o elevado número de profissionais contrários a EAD:

Em algumas instituições, os docentes questionavam a legitimidade de tais propostaspor considera-las, acima de tudo, uma manifestação dos enfoques tecnocráticos do ensino de daaprendizagem. Os projetos de educação a distância eram caracterizados como uma metodologiado tipo processo-produto, a qual respondia aos critérios de uma eficácia instrumental. Argumentava-se, além disso, que todas as propostas consideradas nessa modalidade apoiavam-se em técnicascondutivas de estímulo-resposta, desconhecendo a interação das dimensões psicológicas, sociaise políticas que perpassam todo processo educacional. Não obstante essas generalizações, tambémé certo que muitos projetos com os quais se deu origem a essa forma de estudo em diferenteslugares do mundo tinham uma forte marca tecnicista, tanto em sua concepção pedagógica globalcomo no desenho de seus materiais. (Coiçaud, 2001, p.55)

A justificativa da negação desta forma de educação aos olhares julgadores, partedo entendimento dos termos, pois educação e ensino para alguns são coisas distintas, comintenções e resultados diferentes. Sob a ótica das críticas, não podemos chamar de educação a

FORMAÇÃO DOCENTE A DISTÂNCIA: DISTANTE DEQUEM? A TUTORIA COMO DIFERENCIAL EM EAD NO

CURSO NORMAL SUPERIOR DO CENTROUNIVERSITÁRIO HERMÍNIO OMETTO – UNIARARAS –

UMA PROPOSTA PRESENCIAL

MUSSI, Amali de Angelis; GUILHERME, Claudia Cristina Fiorio; MONTEIRO, AneridisAparecida; PACHECO, Márcia Maria Reis Dias; CARVALHO, Lúcia Helena de Carvalho;

SANO, Midori (Centro Universitário Hermínio Ometto- UNIARARAS)

Page 91: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

91

distância o que se propõe atualmente, mas de ensino a distância (Cascino, 2001). Contra-argumentando estes estudiosos que condenam por completo a formação de professores a distância,nossa proposta é indicar a EAD para a formação docente em nossos moldes, como um amploprocesso de mudança de paradigmas, ou seja, para além de modismos, a formação docente forada sede, ou a distância, é entendida por nosso grupo de pesquisadoras como uma crescentedemocratização de saberes em nível superior e também como a crença na formação de professorespara a autonomia, para o constante aprender a aprender, sendo assim, sob a nossa ótica, umaexcelente oportunidade de construir o conhecimento, desenvolver competências e habilidades,além de dominar a tecnologia atual pelo contato direto com os mídias.

Esta problematização com relação a nomenclatura e crítica aos formatos e materiaisdos cursos de EAD (tecnofilia) enfocam a necessidade da presencialidade como condição sinequa non na promoção do conhecimento humano, subentendendo o conceito de educação queexprime a idéia de que é na interação que ocorre a construção de conceitos e que o compromissoético exige a fisicidade dos sujeitos:

Em complemento, a educação não é apenas um somatório de experiênciaspresenciadas, vividas, mas um sem-número de informações refletidas, acumuladas, articuladas.É tentativa e erro, carinho e raiva, conquistas e derrotas. Não está afeita a um lugar ou ummomento específico...A educação é multiforme, polifônica, inacabável.

Daí decorre a afirmação de que o componente importante ao ato educativo é suafisicidade, sua presencialidade. Contudo, se a distância que possibilita a realização da diferençatorna-se afastamento, separação entre os indivíduos, passa a ser solo fértil onde o poder podeplantar sua lógica: o “indivíduo só e nu”. (Cascino, 2001, p.55)

Ao empregar no meio acadêmico o termo educação a distância para a formaçãodocente tem-se a impressão de que estamos lesando a Pedagogia. É como se estivéssemoscometendo um grande pecado educacional por algumas razões apontadas anteriormente.Pretendemos neste estudo, construir um outro discurso em EAD com uma figura que altera suacondição de vilã e a transforma em possibilidade real de ampliação da formação docente pelaausência da separação física e formação de um grupo de alunos: o tutor.

No Brasil a Educação a Distância foi normatizada pela LDB 9394/96, pelos Decretosnº 2.494, de 10 de fevereiro de 1998 e nº 2.561, de 27 de abril de 1998. A nova LDB desencadeouum processo de oferta desta forma de educação, especialmente para atender o que estavasocialmente visível: a alta demanda pelo ensino superior.

A partir da legalização (LDB 9394/96) houve uma preocupação com o cadastramento(MEC) de instituições públicas e privadas que ofereceriam educação superior aos brasileiros, nocaso das licenciaturas, através dos Institutos Superiores de Educação (ISEs). Nesse direção éque surge o Normal Superior visando atender esta alta demanda e também a indicação legal queenfatizava a necessidade da formação dos professores da Educação Infantil e do EnsinoFundamental (primeiras séries) em nível superior.

As preocupações legais com os profissionais da educação estão em completaconsonância com a sociedade atual, ansiosa pela democratização do ensino e pela qualidade da

Page 92: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

92

educação, assim como pela caracterização de um mundo pleno de mudanças instantâneas queexigem um novo professor: dotado de competências, autonomia e criatividade.

Assim, a educação a distância para a formação de professores objetiva levar oensino superior aos brasileiros que não dispõem de meios para buscarem o ensino superior, oumesmo, terem acesso a este nível de ensino, o que, de certa forma, estaria centrado na concepçãoampla de escola e educação inclusivas.

Modelos e experiências surgiram nesses últimos anos voltados para a formação deprofessores e dentre eles destacamos: PEC-Formação Universitária (SEE/SP), Pedagogia Cidadã(UNESP), Curso Normal Superior Fora de Sede (UNIARARAS), PCN em ação (FormaçãoContinuada- MEC/SEE/SME), PROFA – programa de formação do professor alfabetizador(Formação Continuada (MEC/SEE/SME). Cada um destes dotado de identidade singular, commúltiplas combinações de linguagens e recursos.

Enfocaremos um destes, o Curso Normal Superior Fora de Sede, do CentroUniversitário Hermínio Ometto – Uniararas. Este curso foi estudado por nossa equipe de pesquisadurante dois anos (2003 e 2004), e, toda a equipe de pesquisadoras (teve) tem contato comalunos, tutores e supervisores do Curso, além de também compor a equipe pedagógica desde2003.

O Curso Normal Superior Fora de Sede da Uniararas nasceu com uma propostaespecial de dois anos com um modelo diferenciado de EAD, pois além de oferecer os mídia,comuns aos programas de EAD, tem a presença de um tutor para encurtar distâncias e tornarpossível o caráter de grupo de alunos, com a presencialidade e fisicidade diárias necessárias àeducação problematizadora e interativa:

O modelo didático do Curso Normal Superior é um modelo que usa multimídias ea presença de um professor-facilitador (tutor) para encurtar distâncias e alcançar um grandecontingente de alunos. Traz, um novo conceito de ensinar a distância, valorizando a comunidadede aprendizagem. Por isso, é considerado presencial, pois os alunos devem freqüentar, diariamente,as aulas sob orientação de um facilitador (tutor) utilizando-se dos recursos tecnológicos de educaçãoa distância.

(...)A metodologia de ensino a distância revoluciona a própria aula presencial, porquea torna replicável tanto em seu conteúdo quanto no que se refere às estratégias e etapas deensino-aprendizagem adotadas. Isso ocorre sem que o docente e os alunos deixem de serprotagonistas nesse processo, pois ambos, a partir do estabelecimento de novas conexões erelações entre os conteúdos abordados e fatos mais próximos no tempo e no espaço, ressignificame atribuem novos sentidos às propostas e atividades. Esta possibilidade deve-se, prioritariamente,ao processo de interação entre alunos e tutor, em tempo real e ao vivo na sala de aula local onde,inclusive os demais componentes didáticos estarão presentes, à disposição dos alunos. Temcomo objetivos:

Page 93: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

93

· Construir, compartilhar, sistematizar conhecimentos significativos, ou seja,conhecimentos que façam sentido para a vida dos alunos nas dimensões pessoal e profissional;

· Compreender e aplicar conceitos em situações de prática de aula, seja emestágios supervisionados ou no exercício docente dos alunos que já trabalham, seja em simulaçõesou casos construídos com base em situações educativas reais;

· Sistematizar e socializar a reflexão sobre a prática docente;· Avaliar a própria aprendizagem. (Proposta Pedagógica CNSFS, 2003)

Este curso estruturou-se a partir das demandas de melhoria da educação escolarde crianças e das discussões recentes sobre as especificidades do trabalho profissional do professor.O objetivo geral é promover transformações efetivas nas práticas curriculares da formação deprofessores, procurando superar a insatisfação generalizada com os modelos vigentes. O seumaior desafio é preparar professores para a escola básica contemporânea que, como diz aResolução CNE nº 1, de 18 de fevereiro de 2002, é uma novidade social e cultural. Portanto, ameta prioritária do Instituto Superior de Educação – UNIARARAS é o desenvolvimento do professor,de modo a favorecer o exercício autônomo e responsável das funções profissionais.

Prevê, nesse sentido, a construção de uma escola comprometida com o aprendizadodo aluno, exigindo uma formação profissional de alto nível para seus professores, de modo aatender todas as demandas pertinentes à docência.

Caracteriza-se como EAD na questão de dar-se fora de sua sede, por usar recursostecnológicos, mas o Curso Normal Superior Fora da Sede não se encaixa nas concepçõestradicionais de EAD (conceitos de estudiosos das décadas de 60 e 70), pois estavam pautadasem métodos de instrução que secundarizavam o papel do aluno e estavam voltadas à transmissãoeficiente de informações na tentativa de superar a relação face a face presencial determinadas emum tempo e espaço.

Por outro lado, nosso modelo não se dá na Sede e nem há contato presencial comos professores do curso, mas apresenta-se como “semi-presencial”, especialmente pela mediaçãoocorrer através de um tutor, mas ainda sem um termo específico para a singularidade da proposta.Este nosso tipo de modelo de EAD, relativizado pelo diferencial do tutor e do grupo presencial forada sede, estaria voltado a uma concepção interacionista de ensino e o “facilitador” pedagógico, nonosso caso, o tutor, seria a figura responsável pela relação dialógica imprescindível ao aprendizadodos alunos.

ANALISANDO O PERFIL E O PAPEL DO TUTOR NO CURSO NORMALSUPERIOR FORA DE SEDE DA UNIARARAS: A PRESENÇA QUE ENCURTA DISTÂNCIAS

Baseados nos pressupostos de Educação a Distância do Centro UniversitárioHermínio Ometto – autonomia, aprendizagem contínua, espaços colaborativos de aprendizagem- o Curso Normal Superior surge integrado ao Programa Especial de Formação Pedagógica

Page 94: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

94

Superior, inicialmente, destinado a oferecer a graduação para professores em exercício nas redespúblicas, conforme Deliberação CEE nº 12/2001.

O CNSFS (Curso Normal Superior Fora de Sede) é descentralizado, oferecido nasede de municípios e exige a presença diária dos alunos. Foi credenciado pelo MEC através daPortaria nº 1500 de 26/05/2004 e atualmente tem duas modalidades:

Ï% CNSFS 02 anos - destinado a professores da rede pública e privada que jápossuem o curso Normal ou Magistério em nível Médio;

Ï% CNSFS 03 anos – destinado a alunos provenientes do ensino Médio.A Uniararas, neste ano de 2005, conta com 180 pólos no Estado de São Paulo,

perfazendo um total de 9.562 alunos e 2.435 concluintes.O CNSFS conta também com recursos e materiais que são disponibilizados em

cada um dos pólos, há uma preocupação com relação ao espaço físico das aulas e para isso háuma equipe na Uniararas que se encarrega de visitar e autorizar os locais e ainda uma seleção deTutor para acompanhamento do grupo.

Além de criteriosa seleção (o que inclui a preocupação da formação superior naárea da Educação), o grande requisito, e que reconhecemos a sólida base do trabalho do tutor, éa sua experiência na educação básica, mediante os seus conhecimentos práticos e seusconhecimentos científicos, assim ele personifica os requisitos para conduzir o Curso Normal SuperiorFora da Sede, com sua proposta pedagógica a qual comentamos objetivamente acima. A tutoriapresencial visa atender às necessidades socioculturais dos alunos e garantir a interação,humanizando o processo de aprendizagem fora da Sede.

Há também capacitações na sede para esclarecimento e discussões de questõesconceituais, metodológicas e estruturais (desde a discussão teórica do material, função do tutor,funcionamento dos equipamentos, etc.). O dia-a-dia da tutoria e de segunda a sexta-feira, cumprindouma carga horária de quatro horas e meia por dia. Ele tem capacitações mensais realizadas pelaequipe pedagógica ou pelo supervisor de sua área, um roteiro de aula, onde são sugeridas atividadese leitura de textos que ele pode enriquecer a aula do dia, que tem como base o material escrito ea aula televisiva e que preparada e gravada pelo professor especialista da sede. Este trabalhoconjunto gera uma harmonia, porque o tutor sente amparado pela equipe e pelo professor.

Com as capacitações e a liberdade para o tutor sanar qualquer dúvida por telefoneou via e-mail a sua atuação pedagógica é eficiente, gerando nos alunos uma tranqüilidade e umaaprendizagem dinâmica e reflexiva do aprender a aprender.

Outra face que não poderíamos deixar de evidenciar são os elos afetivos que essaproposta nos tem revelado, temos relatos que demonstram que alem da formação profissional aformação pessoal destaca em nossos alunos e tutores, onde o regaste da auto-estima, daconvivência social e os valores aprimorados, estão na convivência do cotidiano em nossas salasde aulas. Entendemos que a educação tendo este aporte complementar o humano fica sustentadoe o profissional alicerçado nas bases do conhecimento necessário para gerar profissionais autênticose capacitados para formar cidadãos competentes para atuarem no mundo globalizado.

Page 95: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

95

Alguns dados obtidos através de pesquisas realizadas pelos tutores em exercício eformação contínua (Monografias apresentadas ao Curso de Pós Graduação Stricto Sensu Formaçãode Formadores – Centro Universitário Hermínio Ometto – 2004/2005) nos acenam positivamentea este tipo de proposta, principalmente pela figura do tutor presencial. Traçamos, pelos dados dostutores, um cenário de nossos alunos do CNSFS: 99% da clientela são do sexo feminino; agrande maioria procurou o curso (2 anos) para não “perder” o emprego ou para nova oportunidadede trabalho (3 anos); as idades variam de 25 a 40 anos. Nas monografias são apontados osdepoimentos de alunos que evidenciam o CNSFS como a realização do sonho de “cursar umaFaculdade”, a oportunidade de reconhecer e utilizar os novos recursos tecnológicos para umaeducação do futuro (uso das TIC’s) e essencialmente a importância da presença do Tutor, quetoma o lugar de um “aprendente”, o que os aproxima mais (alunos e tutor) e possibilita um processode comunicação que ultrapassa o entendimento do tutor como alguém que controla os alunos e otorna o CNSFS um novo espaço de construção e reconstrução de saberes, dentro de uma dimensãocolaborativa na sala de aula possibilitada pela presença e atuação do tutor.

.Assim, o tutor, um profissional que ainda não é reconhecido no meio acadêmico,

que tem seu papel questionado, ganha uma nova dimensão: um misto de mediador “interacionista”,pois tutores e alunos, em suas cidades, vão descobrindo aos poucos as novas dimensões doensinar e aprender. O tutor para nós tem se configurado como um profissional que passa a ser umgestor de ensino e de aprendizados em espaços e tempos diferenciados.

Dizemos, assim, que encurtar distâncias é a possibilidade de recriar uma sala deaula com as dimensões de uma instituição que desempenha o seu papel de oferecer cursos edesenvolver a sua missão de gerar profissionais competentes, e, na percepção dos alunos doCNSFS é:

- tornar o aprendiz sujeito de seu aprendizado;- redimensionar possibilidades metodológicas;- aprender com o trabalho coletivo e com as relações interpessoais;- ter a presença do tutor na sala de aula.Em síntese, a nossa proposta com esta análise do CNSFS é discutir como tornar

possível novos processos de ensinar e aprender na formação docente e continuar pesquisandosobre esses novos tempos e espaços no ensino superior. Sem esgotar o assunto, apresentamosaqui parte dos dados que temos em mãos e que, num segundo momento pretendemos cruzarcom outros dados de avaliação do CNSFS da Uniararas que foram coletados pela FundaçãoCarlos Chagas.

BIBLIOGRAFIA

ARAÚJO, Inês Olinda Botelho. Educação a Distância: gestão, desafios e perspectivas. Araras,2005. Monografia (Pós Graduação- Formação de formadores para educação infantil e ensinofundamental) UNIARARAS, Araras, SP.

Page 96: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

96

AZZARINI, Ana Maria Gimenes. O perfil do tutor na educação a distância – experiência no cursonormal superior fora da sede. Araras, 2005. Monografia (Pós Graduação- Formação de formadorespara educação infantil e ensino fundamental) UNIARARAS, Araras, SP.

BRASIL/MEC/ Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, MEC, 23/12/ 1996.______ Educação a distância. Decreto nº 2.494, de 10 de fevereiro de 1998.

______Decreto nº 2.561 de 27 de abril de 1988. Altera a redação dos artigos 11 e 12 doDecreto2.494, de 10 de fevereiro de 1998, que regulamenta o disposto no artigo. 80 da LDB9394/96, de 20 de dezembro de 1996.

______Portaria Ministerial MEC 301/98, normatiza os procedimentos de credenciamento deinstituições para a oferta de cursos de graduação e educação profissional tecnológica a distância.

______ Resolução CNE/CES nº 01 de 3 de abril de 2001. Estabelece normas para a pós graduaçãolato e stricto sensu.

CAMPOS, Adriana Cristina Agnelli Corte. Educação a Distância: o desafio de profissionais daeducação. Araras, 2005. Monografia (Pós Graduação- Formação de formadores para educaçãoinfantil e ensino fundamental) UNIARARAS, Araras, SP.

CASCINO, Fábio. Ensino a distância e presencialidade: uma discussão necessária. Pátio revistapedagógica, Porto Alegre: Artmed, ano V, p. 54-57, agosto/outubro 2001.

COIÇAUD, Silvia. A Colaboração Institucional na Educação a Distância. In: LITWYIN, Edith.(org).Educação a Distância, Porto Alegre: Artmed, 2001, cap.5. p. 53-72.

COLETTA, Luciana de Paula. A essência da tutoria nos cursos de formação de professores adistância. Araras, 2005. Monografia (Pós Graduação- Formação de formadores para educaçãoinfantil e ensino fundamental) UNIARARAS, Araras, SP.

GONÇALVES, Darlene Stocco Colonese. Educação a distância: tecnologias para o atendimentoda perspectiva de eficiência, eficácia e qualidade de ensino. Araras, 2005. Monografia (PósGraduação- Formação de formadores para educação infantil e ensino fundamental) UNIARARAS,Araras, SP.

LAGO, Maria Inês Dias Carvalho Lago. Tutoria no curso Normal Superior Fora de Sede: dificuldades,desafios e aprendizagens. Araras, 2005. Monografia (Pós Graduação- Formação de formadorespara educação infantil e ensino fundamental) UNIARARAS, Araras, SP.

ODONI, Neusa Maria. O papel do tutor no ensino superior a distância. Araras, 2005. Monografia(Pós Graduação- Formação de formadores para educação infantil e ensino fundamental)UNIARARAS, Araras, SP.

PAGIORO, Neuza Maria Doretto. Tutoria: a importância da formação continuada nos programasde educação a distância, Araras, 2005. Monografia (Pós Graduação- Formação de formadorespara educação infantil e ensino fundamental) UNIARARAS, Araras, SP.

PEREIRA, Sandra Maria Gonçalves da Fonseca. Educação a distância e o tutor. Araras, 2005.Monografia (Pós Graduação- Formação de formadores para educação infantil e ensino fundamental)UNIARARAS, Araras, SP.

ROSSETTI, Marilene. Formação de professores. Araras, 2005. Monografia (Pós Graduação-Formação de formadores para educação infantil e ensino fundamental) UNIARARAS, Araras, SP.

Page 97: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

97

ROSSINI, Antonio Otávio. Educação a distância: características e objetivos de um ensino futurista.Araras, 2005. Monografia (Pós Graduação- Formação de formadores para educação infantil eensino fundamental) UNIARARAS, Araras, SP.

SIQUEIRA, Cidalia Maria Cepeda. Educação a distância e as redes colaborativas de aprendizagemno contexto atual. Araras, 2005. Monografia (Pós Graduação- Formação de formadores paraeducação infantil e ensino fundamental) UNIARARAS, Araras, SP.VIGOTSKY, L.S. A Formação Social da Mente: desenvolvimento dos processos psicológicossuperiores.6ª.ed. São Paulo, Martins Fontes, 1998

Page 98: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

98

O Núcleo de Ensino (NE) da FFC/UNESP tem desenvolvido, entre outras pesquisas,desde o início de seus trabalhos, pesquisas sobre a formação inicial e continuada de professoresem Sociologia, bem como sobre a presença da disciplina Sociologia nas escolas, na região deMarília. Além desses temas, também tem investigado o cotidiano escolar das escolas parceiras,visando a apreender elementos da realidade escolar que possibilitassem a elaboração de diagnósticoe propostas de soluções para os principais problemas existentes nessas instituições.

A pesquisa pioneira de CHAMMÉ e MOTT “A realidade do ensino da sociologia no2º grau: inovações e continuidades”, desenvolvida junto ao Núcleo de Ensino, na região de Marília,buscou identificar a realidade do ensino da Sociologia nas escolas de 2º grau. Analisando o períodode 1984 a 1993, os pesquisadores, embora constatando a quase duplicação de escolas com areferida disciplina, encontraram, também, condições desfavoráveis à consolidação da Sociologiana grade curricular. As razões que explicam tal fato são diversas e perpassam desde a falta decondições estruturais até a resistência ideológica de parte significativa da comunidade escolarfrente à Sociologia.

A realidade do ensino de Sociologia para o 2º grau revela-se, pois,delicada e preocupante se considerarmos que a pulverização dacarga horária, em várias disciplinas distintas, representa apossibilidade que os professores das disciplinas da área deHumanas têm de complementar suas cargas horárias e, então,poderem perceber os parcos rendimentos que o Governo do Estadooferece aos professores da Rede. Com salários aviltados, que mallhes permite a assinatura de um único jornal que seja, o que dizersobre a compra de livros? Além disso, estando eles responsáveispor diferentes disciplinas, múltiplos programas específicos e iguaisPropostas Curriculares, mal lhes sobra tempo para correção detrabalhos e provas de seus alunos... (CHAMMÉ, MOTT, 1996, p.127).

As dificuldades detectadas para a disciplina de Sociologia, como também para osseus professores, são muito próximas, pois ambos, além dos problemas característicos da educaçãobrasileira, encontram um elemento adicional a sua situação específica na Rede Pública de Ensino,qual seja, a desvalorização dessa disciplina e também do seu profissional, conseqüência direta dedécadas da sua inconstante presença no currículo da escola. Esse processo de ”entra e sai” docurrículo, ao longo da história da educação brasileira, não permitiu a consolidação da disciplinaSociologia e, conseqüentemente, o reconhecimento e o “status” das outras disciplinas já

NÚCLEO DE ENSINO NA FORMAÇÃO DEPROFESSORES DE SOCIOLOGIA: TEORIA E

PRÁTICA NO FAZER PEDAGÓGICO

MENDONÇA, Sueli Guadelupe de Lima - UNESP

Page 99: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

99

consolidadas na grade curricular como Português e Matemática. As razões que justificam talprocesso ainda precisam ser melhor investigadas pelos pesquisadores da área.

Além disso, a concepção de sociedade e de educação dominante no Brasil contribuiusignificativamente para a maior marginalização da Sociologia na escola.

Diante do quadro já desolador de marginalidade em que se encontraa população brasileira em relação ao processo educativo excludentee expulsivo, no qual apenas pequena parcela que se manteve noprocesso de escolaridade ou que a ele retornou chega a freqüentaro 2º grau, pudemos observar – no tocante ao desinteresse ou àdesinformação sobre os reais objetivos da Sociologia no 2º grau – apresença de uma situação de tal sorte reprodutivista e nãointerpretativa, capaz de contribuir para a geração do desinteresse eo conseqüente distanciamento do papel que o Ensino e 2º grau,por meio das inter-relações estabelecidas a partir da discussão críticapor disciplinas como a sociologia, poderia desempenhar na formaçãodo indivíduo. (idem, p.123-124).

O diagnóstico elaborado pela primeira pesquisa do NE sobre a realidade da disciplinaSociologia na Rede Pública de Ensino só veio a se agravar, como também toda a problemática daescola. Tivemos, objetivamente, um decréscimo das aulas de Sociologia nas escolas e o surgimentoe consolidação de um novo fenômeno: indisciplina e violência na escola.

Sabemos que a escola expressa, em muito, em seu micro espaço social, osproblemas maiores da sociedade. Se há o aprofundamento do nível de exclusão social manifestopelo desemprego, fome, falta de perspectiva de futuro, etc., também encontraremos na escolanão só reflexos dessa exclusão social maior. A própria instituição desencadeia o seu processo deexclusão interno ao discriminar seus agentes sociais frente à ausência de respostas aos problemasque enfrenta no seu dia a dia.

Neste sentido, as políticas educacionais dos últimos Governos Federal e Estadualcorroboram para o acirramento da crise estrutural da educação. A política de avaliação “ProgressãoContinuada”, desvirtuando a proposta original de ciclos, ao não dar as condições necessárias àescola a sua implementação (diminuição de número de aluno por sala, qualificação profissional,infra-estrutura, etc.) criou o fenômeno da exclusão dentro do processo de inclusão. Hoje, háalunos formalmente aprovados, que não dominam os conhecimentos mais elementares do ler eescrever, que conseguem chegar ao ensino médio. Assim, temos na escola, cada vez mais, umgrande número de alunos discriminados por não ter conseguido se apropriar dos conteúdoscurriculares, mas aos olhos da estatística oficial do Governo estão aptos na sua escolaridade. Aindisciplina é uma das conseqüências desse processo, que se não enfrentada adequadamentepode chegar a níveis de violência não desejados na escola.

Nos últimos anos, o NE tem sido muito procurado pelas escolas públicas de Maríliae região exatamente para assessorá-las na busca de soluções para dois problemas centrais: asdificuldades de aprendizagem dos alunos e a indisciplina. Esses problemas estão presentes desdeas escolas das séries iniciais do ensino fundamental até ao ensino médio, transformando-se em

Page 100: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

100

sério desafio para aqueles que atuam na educação. Neste sentido, alunos e docentes do curso deCiências Sociais assumiram esse desafio e se envolveram, via NE, nessa nova frente de atuação:as séries iniciais do ensino fundamental.

O NE tem atuado em uma escola, em especial, de 1ª a 4ª séries com trabalhointerdisciplinar (Português, Matemática, Filosofia e Ciências Sociais). O trabalho foi realizadocom três turmas, com cerca de 60 alunos no total, com cada turma tendo duas horas e meia deaula de Reforço por semana, em horário diferente das aulas regulares. A primeira etapa do trabalhodo NE foi conhecer as professoras responsáveis, bem como delinear o perfil e as dificuldades dosalunos do reforço, tendo chegado nas seguintes questões:

a)Sérias dificuldades de aprendizagem: os alunos não dominam o ler e o escrever,comprometendo profundamente os conteúdos das áreas específicas, especialmente os das CiênciasHumanas (História/Geografia), ficando a parte conceitual extremamente prejudicada, gerandograves distorções na 5ª série, quando, na verdade, o aluno se defrontará, de fato pela primeiravez, com os conteúdos dessa área do conhecimento.

b) Frágil formação dos professores na área de Ciências Humanas: os docentes daescola, nas reuniões periódicas dos projetos anteriores de Ciências Humanas, declararam, pordiversas vezes, não dominar os conteúdos de História e Geografia, pois simplesmente não tiveramesses conteúdos na sua formação específica. Logo, optavam por não ensiná-los, para não ensiná-los errados. Esse fato já explicitava a forte resistência ao conteúdo desconhecido, principalmentepela sua ausência na formação desses professores. O trabalho de sensibilização junto aosprofessores foi um dos investimentos de destaque do NE.

c) Difíceis relações entre os agentes sociais da escola: o motivo que levou aescola procurar a UNESP foi exatamente a dificuldade que enfrentava frente aos problemas deindisciplina e de violência. Por sua presença constante na escola, os vários projetos do NE puderamconstatar que a indisciplina tinha pelo menos duas matrizes centrais: uma se centrava na própriadificuldade do aluno em aprender, derivada muitas vezes pela limitação do professor em ensinar;outra gerada nas relações extremamente desequilibradas entre os agentes sociais da escola,como, por exemplo, professor/aluno, aluno/aluno, professor/direção/coordenação, escola/comunidade. Esta escola é do distrito de Marília, sendo seus alunos, em sua maioria, de baixarenda, de famílias desestruturadas, com graves problemas de sociabilidade (alcoolismo,desemprego, fome, etc.). Essa combinação de fatores se transforma numa “bomba social”, quandoos agentes sociais não se conscientizam da necessidade de mudança dessa situação. Apesar deser um processo extremamente lento e difícil, a escola já deu um primeiro passo ao reconhecer aexistência de problema e ao buscar auxílio.

Diante do quadro, o NE atuou interdisciplinarmente através de basicamente doisprojetos pedagógicos: “Identidade”, que buscava resgatar as raízes e a cultura dos alunos; e“Igualdade e Diferenças”, que trabalhava a discriminação econômica e racial, explicitando muitosconflitos e preconceitos dos agentes sociais da escola. Concomitantemente, foram realizadas

Page 101: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

101

entrevistas com os próprios alunos, seus professores e pais, visando traçar o perfil sócio-econômico-cultural desse aluno. Esse trabalho articulado do NE foi, lentamente, resgatando a auto-estimados alunos e professores, favorecendo o desenvolvimento de atividades pedagógicas, organizadasa partir da realidade adversa desses alunos.

Gradativamente, os alunos foram apresentando avanços significativos, em termosconceituais nas diversas áreas, bem como melhor domínios no ler, escrever e contar. Essesresultados parciais só foram possíveis porque houve, na prática, um trabalho interdisciplinar dosdiversos projetos através de atividades criativas que passavam desde jogos lúdicos de matemáticaà recriação de historinhas infantis, em especial do Patinho Feio, com conteúdos voltados à temáticada cidadania e discriminação social.

Assim, os alunos foram recuperando, aos poucos, o interesse pelos estudos, bemcomo hábitos de estudar, que não existiam anteriormente, dispondo-se à realização das atividadescom uma vontade de “conhecer o desconhecido e desvendar o conhecido” reconquistada nesseprocesso. Os alunos do reforço, aptos para participar da avaliação do SARESP de 2002, tiveramum desempenho muito bom, chamando a atenção da escola. Mesmo com os importantes avançosdestacados acima, se faz necessário ainda um acompanhamento mais de perto e diferenciadojunto a esses alunos.

Assim, para os alunos do curso de Ciências Sociais a experiência concreta comeducação, através do NE, tem permitido uma formação diferenciada para a docência, mudandosua perspectiva como futuro profissional. O trabalho apresentado dá pistas concretas de como aárea de Ciências Humanas pode estar contribuindo efetivamente para mudar esse quadro caóticoda educação pública. A estratégia de atividades que privilegiem o processo de resgate de identidadedos alunos como sujeito histórico, como aluno, como cidadão dentro do mundo contemporâneo,se mostrou extremamente eficaz. Em decorrência, se apresentou uma demanda efetiva deelaboração de material didático-pedagógico voltado a situação específica. Esses desafios devemse constituir em eixos permanentes na formação de professores na área de Ciências Humanas,em especial, de Sociologia.

Vale lembrar que a licenciatura de Ciências Sociais, desde 2002, vem trabalhandonas disciplinas de Prática de Ensino e Didática a produção de material didático-pedagógico parao ensino fundamental e médio, abordando temáticas como: a questão racial na escola; cidadania;história do Brasil contada a partir da participação da juventude nos movimentos sociais; questãoindígena, questão ambiental; questão do trabalho, do tempo e participação política; história doBrasil a partir de charges de época; etc. Toda a produção foi incorporada ao acervo do NE, quebusca constituir um Laboratório de Ciências Humanas, construído a partir de experiênciassignificativas na formação dos alunos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As Ciências Sociais têm um papel fundamental no resgate da identidade dainstituição escolar, passando por um amplo processo de reflexão e transformação de seus agentes,

Page 102: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

102

isto é, alunos, professores, funcionários e a comunidade local. Isso implica uma nova perspectivade atuação da universidade, trazendo para si a necessidade de redefinir o seu trabalho acadêmico,principalmente no que se refere à formação de professores e pesquisa educacional. Neste sentido,a Sociologia tem uma contribuição valiosa a fazer nesse processo de busca de novas relaçõessociais no âmbito da escola, bem como no estabelecimento das diretrizes e conteúdo dosParâmetros Curriculares Nacionais (PCN) na área de Ciências Humanas, que venham a colaborarna construção de alternativas pedagógicas, que possam estar subsidiando, de modo mais efetivo,os desafios do fazer pedagógico no cotidiano escolar.

Para darmos conta de tal tarefa, ou seja, do fazer pedagógico, temos como fiocondutor a indissociabilidade entre a teoria e a prática. Para tanto se faz uma ferramenta vitaldesse processo a formação dos agentes sociais envolvidos. O planejamento de várias atividadesque articulam a relação teoria/prática busca criar novos caminhos que consigam construir processoseducativos mais consistentes, aliando a necessária reflexão sobre ação, com os indispensáveisfundamentos teóricos para começar a compreendê-la, numa relação dialética onde os pólosinteragem. Por isso, a necessidade de seminários de estudos sobre os problemas encontrados nocotidiano escolar, visando a elaboração de subsídios para avançar na superação desses problemas.

Na perspectiva da formação docente, defendemos a concepção que a práxispedagógica só é possível com pesquisa, com uma permanente reflexão do professor sobre a suaação, o que o leva a produção de conhecimentos, de sabres pedagógicos. Sem dúvida, issorequer uma articulação cada vez mais complexa no interior da escola e nos projetos que sedisponham a contribuir nessa direção. Neste sentido, as Ciências Sociais têm um grande desafioà frente no trabalho da (re) significação das relações sociais no interior da escola e dos seusconteúdos curriculares, buscando recuperar o distanciamento histórico e teórico das últimasdécadas, em especial a Sociologia, que pouco se dedicou à educação, trazendo sérios prejuízosà escola e à pesquisa científica.

Os PCN e a própria Lei de Diretrizes da Educação Nacional (LDB) ressaltam aimportância dos conteúdos das Ciências Humanas na formação do aluno desde a escolarizaçãoinicial, apesar da quase inexistência das disciplinas de Sociologia e Filosofia na educação básica.Porém, contraditoriamente, verificamos a desvalorização das Ciências Humanas na vida da escola,que ultrapassa a questão curricular, explicitando-se como um problema maior de crise de valoreséticos e morais da própria sociedade.

O acúmulo de pesquisa e atuação do NE junto à Rede Pública de Ensino possibilitouo delineamento de novas diretrizes à licenciatura de Ciências Sociais, que vem, aos poucos,repensando o seu processo de formação de professores. A articulação entre a licenciatura e otrabalho do NE vem se constituindo no novo caminho a ser trilhado no processo de formação deprofessores de Sociologia. Atualmente, com a Resolução CNE/CP 2, de 19/02/2002, juntamentecom o Parecer CNE/CP 28/2001 - que define as novas diretrizes para os cursos de formação deprofessores, instituindo 400h de prática vivenciada ao longo do curso, 400h de estágio curricular

Page 103: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

103

supervisionado - iniciativas como dos projetos do NE precisarão ser incentivadas e ampliadas, sea universidade pública quiser garantir a qualidade da formação docente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CHAMMÉ, S.J., MOTT, Y.T..”A realidade do ensino da sociologia no 2º grau: inovações econtinuidades”. In BICUDO, M. A . V., BERNARDO, M. V.C. (orgs.). Núcleos de Ensino: umprojeto de educação continuada. São Paulo: Editora da Unesp, 1996.

COLL, C.C. Aprendizagem escolar e construção do conhecimento. Porto Alegre: Artes Médicas,1994.

GENTILI, P. (org.). Pedagogia da Exclusão. Petrópolis, Vozes, 1995.

MENDONÇA, S.G.L. Núcleo de Ensino da Unesp: estratégia de interação universidade e sociedade– O caso Unesp. Tese de doutorado. Faculdade de Educação da USP. São Paulo, 1998.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Enfrentar e vencer desafios. Brasília: abril de 2000.

NIDELCOLFF, M.T. A escola e a compreensão da realidade: ensaios sobre a metodologia dasciências sociais. São Paulo: Brasiliense, 1981.

______. As ciências sociais na escola. São Paulo: Brasiliense, 1987.

WORLD BANK. La enseñanza superior: las lecciones derivadas de la experiencia. Washington,World Bank, 1995.

Page 104: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

104

A FAMOSP – Faculdade Mozarteum de São Paulo, tendo como missão a formaçãode professores, estende sua responsabilidade social para além da dimensão da educação escolar.Fundamentada em sua história e experiência, as ações que desenvolve têm como eixo a arte e aeducação.

A arte sempre esteve presente, desde o início da história da humanidade, em todasas formações culturais: o homem sempre comunicou suas idéias, pensamentos e sentimentosatravés da arte. A arte de cada cultura revela o modo de perceber, sentir e articular valores esignificados às relações entre os indivíduos numa sociedade.

Hoje, arte constitui-se numa forma de comunicação rápida e eficiente, estimulandoa visão, a escuta e os demais sentidos, tornando-se uma porta de entrada para uma compreensãomais significativa das questões sociais.

Usualmente, a formação inicial do professor, fica restrita às questões da escola eda regência de classe não tratando das demais dimensões do processo social.

Uma formação voltada à construção da cidadania deve incorporar o tratamento dequestões sociais urgentes, o que requer, dos educadores, uma sólida e ampla formação cultural,razão pela qual privilegiamos o trato da dimensão social.

A reflexão sobre o universo cultural e as questões sociais é, uma necessidade nocurrículo de formação de professores.

Na reorganização dos cursos de licenciatura a FAMOSP privilegia a formaçãopedagógica com disciplinas voltadas para a sensibilização referente às questões sociais incluindo-se um projeto de Prática de Ensino visando a inclusão social.

A proposta desta ação está relacionada ao estágio, mas não se restringe a ele.Tem como finalidade promover a articulação dos diferentes conteúdos da formação geral, artísticae pedagógica numa abordagem interdisciplinar, pautada nos referenciais teóricos e em experiênciasque conduzam a uma educação inclusiva.

O exercício da reflexão sobre a prática é sistemático permitindo compreender arealidade e atuar em situações contextualizadas.

Fundamentado em Delors, o trabalho com arte, neste projeto, apoia-se nas quatroaprendizagens fundamentais: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos eaprender a ser.

- aprender a conhecer – oferece os instrumentos para explorar, atualizar,aprofundar e enriquecer os conhecimentos possibilitando se adaptar às constantes mudanças e

O ESTÁGIO NA FORMAÇÃO DOCENTE:UM OLHAR PARA A INCLUSÃO ATRAVÉS DA ARTE

SARTORI, Janete de Andrade (Faculdade Mozarteum de São Paulo)

Page 105: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

105

inovações que o progresso oferece, significa uma oportunidade de continuar aprendendo aolongo de toda a vida.

- aprender a fazer – adquirindo competências que, possibilitem oenfrentamento de situações diversas, preparando, para o mundo do trabalho, colocando em práticaos conhecimentos e exercitando as capacidades de inovação e criação para atuar no contextolocal.

- aprender a viver juntos – constitui-se no grande desafio para os educadores,exercitar a convivência, conhecer o outro, lidar com os conflitos.

- aprender a ser – a síntese das aprendizagens anteriores, desenvolvendo acapacidade de autonomia, de discernimento e de responsabilidade social.

São saberes que vão além da mera aquisição de informações para uma formaçãohumana e social do indivíduo. Adquirindo os instrumentos de compreensão, propiciam agir sobreo meio, participando e cooperando com os outros na convivência humana.

Um projeto de Educação através da Arte contempla os princípios éticos daautonomia, estéticos da sensibilidade e políticas dos direitos e deveres, portanto, o aprender aser, aprender a fazer, aprender a conhecer e aprender a conviver.

As práticas artísticas favorecem a interação entre os participantes através dasestratégias de classe, da organização da sala, da aprendizagem cooperativa, dos círculoscomunitários e trabalhos compartilhados.

As oportunidades de fazer arte contribuem de maneira significativa para a autoestima, os processos estéticos e artísticos constituem-se em desafios para o aprender a aprender.

Os registros das observações realizadas, os conhecimentos prévios e a resoluçãode situações-problemas embasam as atividades significativas, presentes na teoria de Ausubell.

É na ação/reflexão/ação que a prática é construída permitindo conhecer melhor arealidade e as contradições nela presentes.

Pensar a inclusão é compreender a diversidade, buscando diferentes formas deagir favorecendo a construção da cidadania.

Hoje, uma educação voltada aos grupos minoritários é uma necessidade e temcomo finalidade levar esses grupos a tomar na mão o seu próprio destino.

Nesse sentido segundo Delors (2001), para haver reconhecimento social, é bom,sempre que possível, diversificar os sistemas de ensino e envolver nas parcerias (...) os diversosatores sociais.

O projeto constitui-se dos momentos de planejamento, execução e avaliação.Tendo como ponto de partida a formação dos formadores, em relação às linguagens

que estão sendo estudadas, pensar como podem contribuir para que as comunidades menosfavorecidas experimentem as emoções de fazer arte e construam saberes e competências quepossam propiciar sua inserção na sociedade. Nesse sentido foram estabelecidos os objetivos e asações.

Page 106: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

106

I - Objetivos na formação:- Refletir a realidade social e as oportunidades reais ao acesso aos bens culturais.- Limitar um campo para atuação e observação, escolhendo o local de atuação.- Conhecer a realidade e estabelecer prioridades.- Propor e desenvolver um plano de atividades que tem a Arte, como eixo dessa

intervenção.- Observar, acompanhar e registrar o processo, as expressões espontâneas com

vistas à avaliação qualitativa.- Colher elementos de avaliação externa, das comunidades que indiretamente

acompanham e observam o projeto.- Ao final, estabelecer pistas para a inclusão social e construção de uma cidadania

efetiva.Para os participantes:- Vivenciar momentos e emoções com os prazeres da arte.- Desenvolver habilidades e competências nas diferentes linguagens.- Melhorar a comunicação e a expressão individual.- Favorecer a convivência.- Propiciar, gradativamente, a inclusão escolar e social.

II - Escolha dos espaços, para atuação:- Restringem-se às instituições que abrigam parcela da população mais

desfavorecida.-São de caráter assistencial e constituem-se de igrejas, creches, asilos, lares de

crianças, idosos, portadores de deficiências, etc. localizados nos bairros periféricos da cidade.A maioria não dispõe de recursos próprios, contando com a colaboração da

comunidade. Algumas são conveniadas com a prefeitura, mas os recursos nunca são suficientes,contando com a participação de voluntários.

III - Conhecimento do local, contato com as pessoas que atuam nas diferentesfunções, diagnóstico das necessidades e possibilidades de atuação, levantamento de materiaisdisponíveis.

IV - Propostas de ações:- Estabelecimento de cronograma com o desenvolvimento das atividades, que devem

ocorrer regularmente e sistematicamente, com escolha do dia da semana e horário definido.- Definição de prazo. Um encontro semanal de duas horas durante dois semestres.- Levantamento, com fundamento no diagnóstico, do tema transversal que servirá

de eixo para as atividades artísticas.

Page 107: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

107

- Indicação dos conteúdos das linguagens artísticas com o estabelecimento dasatividades.

- Previsão de recursos humanos e materiais que darão suporte às atividades, comaproveitamento de materiais recicláveis, cujas experiências têm demonstrado bons resultados.

V - O acompanhamento e o desenvolvimento das atividades, com olhar reflexivo,propiciam elementos que redirecionam as ações dos projetos.

VI - Da avaliação:-A avaliação quantitativa fornece os dados que apontam a constância, o interesse e

a dimensão do projeto.-A avaliação qualitativa, através das expressões espontâneas e relatos sinalizam o

desenvolvimento e o grau de satisfação das atividades.- A avaliação do projeto, envolve também a dimensão da instituição, à medida em

que os coordenadores/direção manifestam-se, através de documento à IES, avaliando o projeto.

VII - O envolvimento da comunidade através dos momentos de apreciação estéticacomo: apresentações musicais, exposições e encenações de pequenas peças, constitui-se tambémem instrumento de avaliação.

Apresentamos alguns projetos realizados em 2003 e 2004 com registro fotográficoe especificação do tema, local, participantes, faixa etária e depoimentos, nas diferentes áreas:

- Área de Artes Cênicas- Área de Artes Plásticas- Área de Música- Área de Desenho

1 - ÁREA DE ARTES CÊNICAS:

Propostas desenvolvidas:

· Projeto: O Artista Vai à Escola.Local: Escola pública da periferia da zona norte da cidade.Participantes : alunos do Ensino Médio (período noturno)Faixa etária: 15 a 20 anos.Considerando-se que no corpo discente da IES encontramos artistas que atuam

profissionalmente na área, estes levaram sua contribuição aos jovens, que viveram a experiênciade conhecer e sentir o artista. Através de atividades com os jogos dramáticos e improvisações, osalunos experimentaram uma vivência cênica.

Page 108: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

108

São expressões dos alunos:- Quero fazer teatro...- Gostaria de conversar com o meu professor...

- Projeto: Encenação: Aí, vai encarar?Local: Espetáculo desenvolvido em Escola Municipal de Ensino Fundamental.Participantes: 200 crianças .Faixa etária: 11 a 15 anos.Depoimento da escola: Agradecemos o belíssimo espetáculo de teatro e que vocês

continuem fazendo este trabalho nas escolas.

· Projeto: Arte e Inclusão Social: textos teatraisLocal: Instituto de Arte e SaúdeParticipantes: 11 crianças excepcionais do tipo síndrome de down, lesão cerebral e

adolescentes autistas.Faixa etária: de 14 a 35 anos.Depoimentos:...esta atuação propiciou um apoio no desenvolvimento dos alunos

nas oficinas profissionalizantes, auxiliando diretamente para suas desenvolturas sociais e culturais,apoiando suas inserções naturais na sociedade.

- Projeto: A Descoberta da Linguagem Teatral.Local: Espaço Gente Jovem.Participantes: 40 alunos.Faixa etária: de 8 a 14 anos.Depoimento da dirigente da Instituição: .... Nossas crianças precisam muito de

iniciativas como estas, de alunos que vêm, e se dispõe a trabalhar as habilidades artísticas...sempre traz surpresas e novas emoções. Os alunos aguardam ansiosos a chegada das“bonequinhas”, como carinhosamente foram apelidadas...

2 - ÁREA DE ARTES PLÁSTICAS:

Propostas desenvolvidas:

· Projeto: Dobradura e Modelagem.Local: Instituição de obras sociais.Participantes: 15 alunos.Faixa etária: de 3 a 5 anos.

Page 109: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

109

Depoimentos: A instituição agradece a Faculdade por nos favorecer com alunascompetentes e com uma excelente formação.

· Projeto: Tecelagem e CestariaLocal: Comunidade AssistencialParticipantes: 20 alunosFaixa etária: de 10 a 15 anos.

-Projeto: uma cestaria de jornal.Local: Escola Municipal – EJA – Educação de Jovens e Adultos.Participantes: 28 alunos.Faixa etária: de 17 a 33 anos.Depoimentos:...a proposta muito colaborou para o conhecimento artístico dos alunos,

levando-os a um aperfeiçoamento de suas habilidades, e também, a um processo de criação.Sendo assim, os resultados foram gratificantes para todos nós.

-Projeto: Técnicas utilizando papel cartão e vegetal.Local: Escola Municipal de Educação Especial – Município de Cajamar.Participantes: 19 alunosFaixa etária: de 13 a 21 anos.

· Projeto: Criações em Papel Vegetal.Local: Comunidade Assistencial de Bairro.Participantes:12Faixa etária: de 35 a 58 anos.

- Projeto: Integração Escola- ComunidadeLocal: Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais- Município de Cajamar.Participantes: 24 crianças.Faixa etária: de 5 a 14 anos.

-Projeto: Desenhando Uma Nova Criança.Local: Lar de Crianças.Participantes: 27 crianças.Faixa etária: de 5 a 6 anos.Depoimentos: ... o projeto cumpriu com um papel muito importante no processo de

desenvolvimento das capacidades de criação, imaginação, coordenação motora e expressiva dafaixa etária pré escolar.

Page 110: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

110

2 - ÁREA DE MÚSICA:

Propostas desenvolvidas:

- Projeto: Quem canta, encanta.Local: Igreja Batista.Participantes: 20.Faixa etária: de 19 a 35 anos (sem conhecimento musical).

- Projeto: Canto Coral.Local: Igreja Basílica Nossa Senhora da Conceição de Santa Ifigênia.Participantes: 40.Faixa etária: adultos, envolvendo a 3ª idade – aposentados, donas de casa e

comunidade.

- Projeto: Musicalização Infantil.Local: Centro de Convivência Comunitária.Participantes: 22.Faixa etária: de 09 a 14 anos.

· Projeto: Brinquedos Cantados.Local: Lar de crianças.Participantes: 68.Faixa etária: 07 anos.

4 - ÁREA DE DESENHO:

Propostas desenvolvidas:

- Projeto: Cartões Arquitetônicos.Local: Colméia.Participantes: 30.Faixa etária: 14 e 15 anos.

Page 111: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

111

Comentários:

Das crianças: - A professora chegou!- Oba! Que bom!- Tia, que dia você volta?

Dos professores - Eles nunca tiveram esta oportunidade...- Que danadinho, nunca imaginei que ele fosse tocar tão bem...

Dos estagiários - Valeu, foi uma experiência rica em todos ossentidos, pois pudemos contribuir para o desenvolvimento de crianças maravilhosas,

porém carentes.... até de carinho!

Avaliação qualitativaAs expressões espontâneas dos participantes e os depoimentos dos funcionários e

estagiários indicam o grau de satisfação e interesse dos envolvidos constituindo-se em indicadorespara avaliar os objetivos propostos.

Assim se expressaram:Os participantes ...T (06 anos)“ Gosto de mexer na argila. Nunca ninguém falou sobre artistas de pintura. Na

minha escola a professora não fala dessas coisas que vocês falam. Dá pra vocês ficarem maistempo aqui? Posso ir com vocês na escola de vocês? Não vão embora está gostoso”.

E (07 anos)“ Gosto de pintar. O que vamos fazer hoje? Posso usar a cor que eu quiser? Fazer

sucata é fácil. Que legal vamos pintar. Papel machê, que que é isso? Vocês vão voltar outra vez?Não vão embora”.

K (08 anos)“Posso ser o ajudante? Papel reciclado é esquisito mas fica legal! Argila é mole

demais mas é legal. Por que Picasso pintava assim? Todo mundo pode pintar que nem ele? Nãovão embora. Vocês vão voltar algum dia novamente?

J (09 anos)“ A professora da escola falou que eu melhorei bastante nos meus desenhos. Ela

quer que eu pinte do jeito dela e eu falei que não pode ser assim. Gosto quando vocês falam do

Page 112: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

112

pintor Picasso, ele é muito interessante. Olha a minha pintura! Que pena que vocês vão embora.Será que vocês voltam um dia?”

E (10 anos)“ Acho que não vou conseguir fazer é nada. Não tenho coordenação, é o que todo

mundo fala de mim. Nem acredito que consegui fazer tudo isso sozinho. Agora sei que sou capaz,mas não muito direito, mas consigo...”

P (12 anos)“ Arte é difícil. Minha professroa só dá desenho pronto pra pintar. Tenho que pintar

do jeito que a professora quer. Posso usar a cor que eu quiser? É difícil fazer tela? Que legal, vouusar tinta de verdade. Não quero parar essa atividade. Não gosto muito de desenho pronto. Gostode desenhar árvores.

T (13 anos)“Sabe que eu estava fazendo quando vocês estavam para chegar? Desenhando

uma figura de animal. Ficou legal? Que bom vamos trabalhar com argila, é geladinha e mole”.

D (14 anos)“ Na minha escola a professora fala que eu não sei fazer e não tenho habilidade.

Hoje vocês mostraram que sou capaz! Como é bonita a obra de Picasso. Será que um dia possoser parecido com Picasso?”

E (16 anos)“ Que utilidade tem tudo isso que vocês fazem? Hoje gostei de fazer essa atividade

de sucata e papel machê. É mais legal ! Espero que vocês voltem mais vezes”.

O Coordenador administrativo da Instituição PROHACC... o projeto possibilitou às crianças envolvidas, a vivência da Arte em sua

especialidade e como meio de formação e valorização da auto estima.Enfatizando o trabalho de pintura, a importância de materiais recicláveis, como

forma de expressão e comunicação, o projeto cumpriu com um papel muito importante no processode desenvolvimento das capacidades de criação, imaginação, expressiva e motora da faixa etária– 6 à 13 anos.

BIBLIOGRAFIA

BRASIL, Parâmetros Curriculares Nacionais : Arte, vol. 06, Brasília: MEC, 1998.

BRASIL, Parecer CNE/CP 09/2001e 27/2001. Diretrizes para a formação inicial de professoresda educação básica, Brasília, 2001.

Page 113: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

113

BRASIL, Resolução CNE/CP nº 1 de 2002. Diretrizes Curriculares nacionais para a formação deprofessores da educação básica, Brasília, 2002.

DELORS, Jaques. Educação: Um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez, 2001.

IAVELBERG, Rosa. Para gostar de aprender arte: sala de aula e formação de professores, PortoAlegre, Artmed, 2003.

IMBERNÓN, Francisco. Formação docente e profissional, São Paulo, Cortez, 2000.

MACEDO, Lino de. Ensaios pedagógicos: como construir uma escola para todos? Porto Alegre,Artmed, 2005.

NOVOA, Antonio. Os professores e sua formação. Lisboa: Publicações Dom Quixote Ltda,1992.

PATTO, Maria Helena Souza. Introdução à psicologia escolar, São Paulo, T. A. Queiroz, 1981.

PERRENOUD, Phillipe. Dez novas competências para ensinar, Porto Alegre, Artmed, 2000.

Page 114: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

114

Esta pesquisa-ação em desenvolvimento desde o ano 2000 originou-se dapreocupação em investigar e implementar práticas de formação inicial articuladas às necessidadese ao contexto das IEI – Instituições de Educação Infantil e às exigências da legislação brasileira.O problema da pesquisa se constitui da crise de identidade das IEI brasileiras e de seus profissionais,da necessidade de definir a função educativa dos profissionais perante a necessidade de articulara educação da criança aos seus cuidados, de rever a inadequação da metodologia dos estágioscurriculares praticados na disciplina de Pratica de Ensino, de superação da histórica dificuldadede conferir intencionalidade às ações desenvolvidas com crianças pequenas, e da expectativa deelaboração dos saberes e conhecimentos específicos para educação infantil e qualificaçãoprofissional daqueles que trabalham na IEI.

É objeto desta pesquisa a formação inicial do profissional de educação infantilcapaz de considerar a singularidade deste nível da educação básica.

Desde o ano 2000, participam do estudo as alunas da Habilitação para o Magistérioem Educação Infantil do curso de Pedagogia da FCT/UNESP - Campus de Pres. Prudente-sp,matriculadas na disciplina: “Prática de Ensino da Educação Infantil”. Com base no art. 65 da LDB(Lei 9394/96), o parecer CES/CNE no. 744/97, orienta o cumprimento das 300 horas de Praticade Ensino desdobradas em no máximo 75 horas em sala de aula para contemplar a parte teóricae o mínimo de 225 horas para estágio supervisionado para desenvolver a parte prática. O cursode Pedagogia acima segue esta orientação e as 300 horas mencionadas são utilizadas paradesenvolver o estudo em questão.

Os objetivos que têm orientado a pesquisa são:· Pesquisar práticas de formação teórico-prática no âmbito do estágio

curricular capazes de superar os erros metodológicos cometidos nos estágios durante a formaçãoinicial em nível superior de ensino – graduação e,

· avaliar quais práticas de formação teórico-prática melhor se adequam aelaboração dos saberes e conhecimentos específicos durante a formação inicial em nível superior.

A Metodologia é qualitativa. A partir da pesquisa-ação, há um movimento constanteentre ação-reflexão-ação que dá sentido a relação teoria e prática e vice-versa. O aluno tem comonúcleo da sua formação a intervenção pedagógica adotando metodologias globalizadoras (ZABALA,2002, 1998) em ÍEIS durante o ano letivo onde planeja, executa e avalia suas ações sob a formade projetos de trabalho (FERNANDO HERNÁNDEZ ,1998).

PRÁTICA DE ENSINO E PROJETOS DETRABALHO NA FORMAÇÃO INICIAL DOPROFESSOR DE EDUCAÇÃO INFANTIL

GUIMARAES, Célia Maria - FCT/UNESP

Page 115: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

115

A teoria das representações sociais segundo Moscovici, por sua vez, balizaprocedimentos escolhidos para a pesquisa: oferece os elementos teóricos para o conhecimento ea compreensão dos sistemas de referências e o que move as opções e as práticas dos gruposestudados. São utilizadas para este fim as técnicas: verbais, não-verbais, projetivas de associaçõeslivres de palavras e observações. Para analise dos dados é usada a técnica de análise de conteúdo

· o pesquisador e os alunos são levados a avaliar suas representaçõespreexistentes e se tornarem sujeitos do processo de mudança de representações e açõesinadequados aos objetivos de articular os cuidados da criança a sua educação.

· As representações sociais são investigadas antes de iniciar as ações comos participantes e estas norteiam as intervenções junto a eles, assim como a escolha de conteúdose estratégias para os encontros onde utilizo o grupo focal.

· Os alunos são levados a avaliar e comunicar resultados das ações eintervenções desenvolvidas na IEI.

· É constante a prática de apreciar (avaliar o antes/durante e depois) resultadosobtidos com as ações e intervenções com intenção de reconduzir, melhorar, mudar e/ou introduzirnovos elementos na pratica pedagógica com a intenção de estabelecer a relação teoria e práticae vice-versa.

O professor de infantil precisa compreender que atua numa sociedade de classesdistintas, que existe uma diversidade de culturas, entender o sujeito-criança e compreender comoconstrói conhecimento, como organiza sua afetividade etc. É necessário construir instrumentosque lhe permitam enfrentar o imprevisível, o novo trazido pelo cotidiano. Por isso, a formaçãoinicial do aluno num contexto de formação em contexto (OLIVEIRA-FORMOSINHO E KISHIMOTO,2002) poderá proporcionar a vivencia de uma sala de pré-escola, aprendendo visceralmente comoé ser professor, junto com as crianças e voltando ao que é teórico para repensar, refletir e, voltarao cotidiano com novas idéias, com novas dimensões (SÁ, 1993). Segundo Sousa (1996), paraformar o professor de educação infantil competente do ponto de vista do conhecimento (competênciatécnica), da atitude e do compromisso (competências humana e político-social) os formadores deeducadores precisam capacitá-lo a desempenhar sua função competentemente e a refletir sobreos pressupostos que subjazem à sua prática educativa.

“Porque os ”tempos estão mudando” (HERNÀNDEZ, 1998, p.65) a instituiçãoeducacional deve responder à mudança em relação à informação que hoje se produz. De acordocom Hernàndez (1998), vivenciamos algumas diferenças de contexto: interdependência entrepaíses e culturas; um desenvolvimento tecnológico que permite trabalhar com múltiplas fontes esistemas de informação; as concepções psicopedagógicas sobre a aprendizagem e o ensino; arelação entre o saber das disciplinas e o conhecimento escolar; a função social da Escola.

A propósito deste contexto diferenciado, Hernández (1998, p.12-13) apresenta umaproposta transgressora, cujo objetivo é transgredir:

1) “...a visão da educação escolar baseada nos “conteúdos, apresentados como‘objetos” estáveis e universais e não como realidades socialmente construídas que, por sua vez,reconstroem-se nos intercâmbios de culturas e biografias que têm lugar na sala de aula...

Page 116: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

116

2) a visão de aprendizagem vinculada ao desenvolvimento (conhecido comoconstrutivismo). Enfoque que, sozinho, não dá conta de explicitar alguns aspectos da aprendizagemna escola: intercâmbios simbólicos que se representam na sala de aula, construções sociais queo ensino intermedia, valores que o professor promove ou exclui, construção de identidades quefavorece, relações de poder que a organização escolar veicula e o papel dos afetos na (des)aprender.

3) a visão de currículo escolar centrada nas disciplinas, entendidas como fragmentosempacotados em como compartimentos fechados, que oferecem ao aluno algumas formas deconhecimentos sem vínculo com os problemas dos saberes fora da Escola e estão afastados dasdemandas que diferentes setores sociais propõem a instituição escolar.

4) A visão da Escola que impede que alunos se construam como sujeitos em cadaépoca de sua vida, deslocando as necessidades do aluno à etapa seguinte da escolaridade.

5) a perda da autonomia dos docentes: “...as inovações ou são realizadas pelosprofessores ou acabam não acontecendo.

6) a incapacidade da Escola para repensar-se permanentemente, dialogar com astransformações sociais, dos alunos e da educação.

7) as amarras que impedem de pensar por si mesmo, de construir uma nova relaçãoeducativa baseada na colaboração na sala de aula, na Escola e com a comunidade, na valorizaçãodo saber dos excluídos, na construção da cidadania que favoreça a solidariedade, o valor dadiversidade, o sincretismo cultural e a discrepância.”

As mudanças desejadas nas práticas dos adultos que se responsabilizam pelocotidiano das crianças de 0 a 6 anos no âmbito daquelas instituições impõem a necessidade deque as instituições norteiem seu trabalho por meio de uma proposta pedagógica fundamentadaem uma concepção de criança e de educação infantil claramente definida e nos conhecimentosacumulados sobre os processos de desenvolvimento e aprendizagem na primeira etapa da vidahumana. A relevância do papel social da Educação Infantil está em prestar serviços às crianças eàs mulheres trabalhadoras, em dar atendimento assistencial ou médico, porém, não se limita aessas questões, precisando ser organizada para o trabalho pedagógico, ‘’...Valorizar osconhecimentos que as crianças possuem e garantir a aquisição de novos conhecimentos, exercendo(...) função pedagógica...” (Kramer, l989, p. 22-3). A função educativa, por sua vez, seriaconcretizada pela concepção de criança como sujeito de sua ação, percebida em sua diversidadee pelo espaço físico propiciador de interações entre iguais, com os adultos e com os objetos,considerando a particularidade desta etapa da vida. A concepção de aprendizagem se caracterizariapela certeza de que a criança constrói e apropria-se do conhecimento desde o momento em queinterage pela primeira vez com o mundo, as coisas e as pessoas, num longo processo de construçãodo saber. Sendo assim, sobretudo o brincar e os jogos lúdicos seriam as formas privilegiadas deinteração, capazes de promover a capacidade de representar, de simbolizar, fator este de essencialimportância para que a criança se aproprie da realidade externa assimilando-a à sua realidadeinterna. A capacidade de criar representações e símbolos, nesta fase, é fundamental para a criançaregistrar, pensar e ler o mundo. O jogo, a brincadeira, o faz-de-conta têm papel preponderante na

Page 117: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

117

vida cognitiva, afetiva e social da criança pequena. O papel do profissional de Educação Infantilcaracterizar-se-ia como o de mediador, de dinamizador do processo de desenvolvimento e deaquisição de conhecimentos e das oportunidades da vivência de experiências enriquecedoras,iniciando ou propondo atividades, lançando desafios, etc.. A ele caberia o papel de planejar eexecutar atividades caracterizadas pela intenção educativa, além de cooperar no planejamento darotina geral, dos eventos, do trabalho com as famílias, de avaliar sua ação e prática, de diagnosticare avaliar o desenvolvimento do seu grupo de crianças, de organizar o espaço-físico e materiaispara as atividades, de incentivar a criança a colaborar em sua reorganização, de buscaraperfeiçoamento e atualização constante. A formação e a qualificação deste profissional é essencialpara o sucesso da intenção de que a Educação Infantil (0 a 6 anos) possa articular as funções decuidar e educar no contexto das exigências sociais e educacionais do terceiro milênio. Todaexpectativa posta no profissional de educação infantil exige práticas de formação inicial que criemcontextos significativos para aprender a pensar criticamente. Esta capacidade requer ações quepermitam ao profissional em processo de formação dar significado à informação, analisá-la, sintetizá-la, planejar ações, resolver problemas, criar novos materiais ou idéias, e envolver -se mais natarefa de aprendizagem escolar. (Hernández, 1998).

Por outro lado, para que estes profissionais possam dedicar-se ao trabalho com ascrianças, precisam ter garantidas condições adequadas de suas funções aos direitos trabalhistas(contrato, horário, férias, licenças); salário, instalações; incentivos e estímulos para aperfeiçoamentode seus conhecimentos; clareza quanto às funções que exercerão no espaço educativo da Instituiçãode Educação Infantil, etc.

A escolha dos projetos de trabalho para realização de estágio curricular no processode formação inicial se justifica porque

“... Pretende desenvolver no estudante um senso, uma atitude, uma forma derelacionar-se com a nova informação a partir da aquisição de estratégias procedimentais, quefaça com que sua aprendizagem vá adquirindo um valor relacional e compreensível. Tal intençãoparece a mais adequada se o que se pretende é aproximar-se à complexidade do conhecimento eda realidade e adaptar-se com um certo grau de flexibilidade às mudanças sociais ecultuais.”(Hernández e Ventura, 1998, p. 59)

Segundo Moss (2002), nos últimos anos tem se delineado uma idéia de criançaque supera concepções equivocadas sobre a criança pequena. Outra visão seria a criançaconcebida como membro de um grupo social, agentes de suas vidas, embora ainda não o sejamtotalmente agentes livres, co-construtores do conhecimento, de identidade e cultura. Se Aceitahoje que a infância se relaciona com a fase adulta, mas não hierarquicamente. É uma etapaimportante da vida em si mesma que deixa traços nas fases posteriores, e a preocupação é como adulto que a criança vai se tornar e com a infância que está vivendo. Essa idéia de infânciacorresponde a uma série de imagens de criança: forte; competente; inteligente; pedagogo, capazde teorias interessantes e desafiadoras, capaz de compreensões e perguntas desde o nascimento;criança com voz para ser ouvida (nas suas muitas formas). Esta concepção de criança e suasimagens correspondentes desafiam a ficarmos atentos as escolhas que faremos, pois ta construção

Page 118: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

118

de criança “rica” produz um tipo de Instituição de Educação Infantil (IEI) e gera programas paraas IEI que enfatizam (MOSS, 2002):

- Serviços para primeira infância como espaços para o enriquecimento da criançaaqui e agora e que reconhecem o valor da infância:- Programas que promovem uma cultura da própria criança, especialmentebrincadeiras, e políticas democráticas;- À criança é permitido participar de um mundo de relações e atividades;- Não há um programa que serve a um propósito - produzir um produtoespecifico;- As IEI- Instituições de Educação Infantil são locais para provocação,

confrontação, discordâncias, complexidade e diversidade, incerteza, ambivalência, manutençãodo pensamento crítico, deslumbramento, assombro, curiosidade, diversão, de aprender com adultose outras crianças respostas para as quais não há tarefas pré-estabelecidas.

Moss (2002), afirma que essa conceitualização de criança e de IEI requeroutra conceitualização dos profissionais para a Educação Infantil: nem substituo da mãee nem “professor” escolar. A imagem de criança “rica” exige novo entendimento sobreprogramas e escolas e é preciso construir o profissional que:

- Reflete sobre sua prática- aja como um pesquisador- aja como co-construtor do conhecimento - das crianças e dele próprio- seja criador de ambientes e situações desafiadoras- seja questionador de suas imagens de criança e de seu entendimento deaprendizagem infantil e outras atividades- seja capaz de apoiar a aprendizagem da criança e de aprender com ela- seja capaz de sustentar as relações com a criança- seja capaz de lidar com a cultura própria da infância.A construção do profissional com esta identidade exige métodos de trabalho que

enfatizem e possibilitem análise crítica constante da prática – o que acontece, como concebem eentendem a criança. Os aspectos propostos antes delineiam escolhas políticas e éticas e umafunção para as IEI, uma função para o profissional, opções por princípios e pressupostos teóricosque fundamentarão as propostas pedagógicas e programas curriculares das IEI.

Por estas razões a metodologia que temos adotado no estudo (2000-2005) temsido interessante porque a transformação das práticas da Educação Infantil consideradasinadequadas as necessidades da criança dos tempos atuais carece iniciar pela transformação daforma de proceder a formação inicial dos profissionais responsáveis pelo cotidiano das Instituiçõesde Educação Infantil. A tarefa de articular as funções de cuidar e educar precisa ser consubstanciadanuma concepção de Educação Infantil suficientemente explicitada, fundamentada num corpoteórico/prático capaz de subsidiar práticas propiciadoras do desenvolvimento infantil, daemancipação dos conhecimentos prévios da criança, da construção de novos conhecimentos, dacidadania e da construção de uma educação e de uma sociedade mais democrática.

Page 119: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

119

Trabalhar por projetos hoje guarda diferenças dos projetos de outras épocas. O quese pretende com os projetos de trabalho é a mudança na educação e na função da escola:

“Os projetos de trabalho supõem, do meu ponto de vista, um enfoque do ensinoque trata de ressituar a concepção e práticas educativas na escola, para dar resposta (não “A”resposta’) às mudanças sociais, que se produzem nos meninos, meninas e adolescentes e nafunção da educação, e não simplesmente readaptar uma proposta passada e atualizá-la.”(Hernández, 1998, p. 64)

Os resultados obtidos entre 200 e 2005 vem demonstrando que os futurosprofessores de educação infantil precisam construir a intenção educativa desde suas ações durantedo processo de formação inicial, por meio de práticas que relacionem a função de educar e a decuidar. Em geral, os estágios obrigatórios durante a formação inicial em ÍEI e as poucas práticaspedagógicas que desenvolvem raramente têm favorecido a formação didática e metodológica defuturos profissionais de educação infantil, tampouco favorecem a sua competência técnica, humanae político-social e a constituição da articulação da educação da criança aos seus cuidados. Estaproposta tem pretendido gerar informações e conhecimentos capazes de fomentar a construçãoda mudança das práticas de formação e a metodologia de ensino adotada na disciplina “Práticade Ensino” dos cursos responsáveis pela formação inicial de professores para as Instituições deEducação Infantil.

Um aspecto importante foi descobrir que no momento em que alunos em formaçãoinicial são colocados a realizar intervenções com crianças nas ÍEIS é preciso oferecer ao menosuma alternativa de organização de suas práticas. Por isso, em coerência com o enfoque globalizadoradotado na disciplina, a organização dos conhecimentos e atividades que alunos desenvolvemnas ÍEIS têm sido feitos sob a forma de projetos de trabalho segundo a concepção de FernandoHernández (1998, 1998a). As ações e conhecimentos são definidos após avaliação diagnóstica(inicial) , seguida da elaboração das propostas de intervenção pedagógica baseada no diagnóstico.Este procedimento tem permitido conhecer a realidade das ÍEIS e provoca a compreensão darazão de estudar para propor situações e intervenções para crianças, desarticula práticaspedagógicas escolarizantes em salas de pré-escolares, gera conflitos acerca da metodologia quevem sendo adotada com crianças pequenas, provoca professores em exercício e alunas a voltaremo foco de sua ação para a criança concreta com a qual trabalham, oferece norte e sistematicidadefrente a constante dúvida sobre o que, como e quando ensinar / avaliar na educação infantil. Estaforma de promover a organização do conhecimento escolar favoreceu o acompanhamento dogrupo a respeito de sua dinâmica de funcionamento ao se defrontar com a contradição entre ovelho e o novo, a ruptura e a continuidade entre o conhecimento baseado no senso comum e oconhecimento científico e a relação que as alunas foram podendo estabelecer entre a teoria e aprática profissional. A articulação entre educação e avaliação ficou mais significativa. A atitude deinvestigar as representações sociais sobre a função da educação, papel do professor pré-escolare visão da criança em idade pré-escolar e concepções individuais das alunas antes de iniciar o

Page 120: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

120

ano letivo orientou a seleção dos conteúdos de ensino, as técnicas de ensino adotadas, os aspectosa serem destacados durante os grupos focais e as discussões, orientações e reflexões. As mudançasocorridas na prática pedagógica foram verificadas por meio do acompanhamento das ações naescola no decorrer do ano. Os avanços e aspectos positivos se devem a metodologia escolhidaque intencionalmente provoca gradativamente no aluno a interação com a escola, com a sala deaula e as crianças e suas individualidades, as famílias, a comunidade, o profissional em exercício.Todas estas facetas da interação fazem emergir as exigências, sucessos, limitações, decepçõese vicissitudes que esta relação provoca. O aluno se vê crescentemente sendo exigido num graude envolvimento e compromisso pessoal necessário para qualquer processo de mudança equalificação em se tratando de educação. Até o momento alguns aspectos foram detectadoscomo fundamentais nas ações propostas: definição prévia do número de horas/aula de estágioem cada semestre; agendamento e regularidade das orientações individuais presenciais; supervisãodas ações realizadas com crianças e posterior discussão individual ou coletiva; alguns dos conteúdosque darão os fundamentos necessários às ações na escola deverão ser estudados no inicio doano letivo; a organização do programa de ensino: fazê-lo em blocos mais definidos de conteúdos;a forma de registro e controle das horas /aula de estágio não podem ter caráter de mero cumprimentodas mesmas. O relato parcial das ações desenvolvidas tem sido realizado no final de junho comobjetivo de avaliar o desenvolvimento da proposta de intervenção pedagógica, trocar experiências,acatar sugestões e propor as revisões necessárias. O relato oral com base na apresentação doprocesso desenvolvido na sala onde estagiou, com demonstração dos resultados obtidos, o usode fotos, produções infantis etc. se revelou momento de síntese e avaliação. À medida que o anoletivo se desenrola, os alunos vão revisitando suas representações sociais iniciais e podem reformularsuas visões, crenças, conhecimentos. Ao avaliar suas representações sociais ao término do anoletivo constata-se processos de mudança em andamento, especialmente em relação a alteraçãodos conhecimentos baseados apenas na experiência prática e senso-comum.

À maioria dos cursos formadores e, em especial, à disciplina de “Prática de Ensino”falta a necessária fundamentação teórica às suas práticas de ensino, falta reflexão crítica acercado que o aluno observa nos estágios e há ausência de situações reais, contextuais, através dasquais o aluno experiencie a necessidade de relacionar teoria e prática para dar respostas e/oualternativas a problemas concretos gerados na/pela Instituição de Educação infantil e salas deaula de educação pré-escolar. Os estágios obrigatórios em salas de aula, pouco têm favorecido aformação didática e metodológica dos futuros profissionais e sua competência técnica, humana epolítico-social, devido à descaracterização de sua finalidade na formação inicial de educadores.

O estudo, ao fazer opção pelas práticas adotadas, pretende que a formação doeducador ocorra com base na formação das competências técnica, político-social e humana,visto que são fundamentais para a constituição de uma prática pedagógica contextualizada,democrática, formadora do homem e do cidadão e capaz de promover situações de ensinopossibilitadoras da aquisição dos conhecimentos acumulados pela humanidade e produtoras denovos conhecimentos e do desenvolvimento infantil, segundo suas peculiaridades e singularidade.

Page 121: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

121

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

HERNÁNDEZ, FERNANDO. Transgressão e mudança na educação: os projetos de trabalho.Porto Alegre: Art Med, 1998. Trad. Jussara H. Rodrigues.

HERNÁNDEZ, FERNANDO, VENTURA, MONTSERRAT. A organização do conhecimento porprojetos de trabalho – o conhecimento é um caleidoscópio. 5ª. Ed. Porto Alegre: Art Med, 1998a.Trad. Jussara H. Rodrigues

KRAMER, SONIA. Melhoria da qualidade do ensino: o desafio da formação de professores emserviço. Revista Brasileira de Est. Pedagógicos. Brasília, n.70, p. 189-207, maio/ago. 1989.

MOSS, PETER. Para além do problema com qualidade. Maria Lucia de A. Machado (org.).Encontros e desencontros em educação infantil. São Paulo: Editora Cortez, 2002.

OLIVEIRA-FORMOSINHO, JÙLIA e KISHIMOTO, Morchida Tizuko. Formação em contexto:uma estratégia de integração. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002.

SÁ, MÁRCIA S. M. MOURÃO. A formação do educador para a pré escola - a chave do tamanho.Revista Criança. Brasília, n.25, p.15-27, 1993.

SOUSA, ANA M. C. Educação Infantil: uma proposta de gestão municipal. São Paulo:Papirus,1996.

ZABALA, ANTONI. Enfoque globalizador e pensamento complexo –uma proposta para o currículoescolar. Porto Alegre: ARTMED Editora, 2002.

ZABALA, ANTONI. A prática educativa: como ensinar. Porto Alegre: ARTMED Editora, 1998.

Page 122: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

122

INTRODUÇÃO

O presente trabalho é síntese de um projeto que vem sendo realizado no InstitutoEducacional de Assis (IEDA), especificamente junto ao curso de Pedagogia. Preocupados com aformação do professor, futuro profissional das séries iniciais do ensino fundamental, os docentese a coordenação pedagógica do curso, envolveram-se num processo de estudos, reflexões ediscussões que encaminharam para o estabelecimento de novas proposições para a formaçãodos professores. Esse processo propiciou a reestruturação curricular do curso e, por conseqüência,a reestruturação da Prática de Ensino e Estágio Supervisionado.

Assim, procuramos centrar nesse trabalho, como vem sendo concebida essaformação docente e como tem sido deflagrada a Prática de Ensino e o Estágio Supervisionado.Apresentamos as concepções teóricas e legais que respaldam o projeto de estágio, bem como asua caracterização geral, as ações docentes e discentes, a sua operacionalização, apontando aofinal, alguns indicativos iniciais de avaliação do mesmo.

REFLETINDO SOBRE A FORMAÇÃO DO PROFESSOR

A formação do educador tem sido pauta obrigatória nas discussões que visam abusca de melhorias para o processo ensino-aprendizagem. É certo que o professor surge comopeça chave nesse processo e o seu papel assume proporções importantes quando pensamos nasua atuação em sala de aula e na escola como um todo. Além do importante papel de auxiliar ascrianças no seu desenvolvimento cognitivo, afetivo e social, o professor deve ter ainda formaçãopolítica para entender, criticar e buscar soluções para os diferentes problemas vivenciados nosistema educacional.

Nesse sentido, o preparo do professor nos cursos de formação, deve contemplarelementos que orientem e façam a mediação entre o ensino e a aprendizagem dos alunos e quefavoreçam uma ação pedagógica significativa, propiciando compromisso com o sucesso daaprendizagem, desenvolvimento de práticas investigativas, elaboração e execução de projetospara trabalhar com os diferentes conteúdos curriculares, utilização de novas metodologias deensino e de avaliação e desenvolvimento de trabalhos em equipe.

O ESTÁGIO SUPERVISIONADO NUMA PERSPECTIVAINTERDISCIPLINAR – PROPOSTA PARA UMA

FORMAÇÃO REFLEXIVA

GEBRAN, Raimunda Abou; LEPRE, Rita Melissa; BASÍLIO, Valéria Cristina (IEDA/Assis).

Page 123: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

123

Em uma palavra, o professor deve ter autonomia intelectual, ter o direito e aresponsabilidade para tomada de decisões profissionais, ou seja, além de saber e saber fazer,deve compreender o que faz e por que faz. Para tanto, é necessário que ele tenha uma formaçãointegral, onde possa conhecer as várias faces da educação e da sua gestão, pois a escola é maisdo que salas de aula, é mais do que regras de linguagem e matemática, é mais do que muros egrades. Escola é vida em processo e, como tal, precisa ser conhecida na sua integridade para quepossa ser entendida.

É sabido que a Universidade, e em especial os cursos de formação docente, tempapel importante na formação dos professores, e é dentro dela que o mapa para o conhecimentoda realidade educacional pode e deve ser traçado. Este mapa precisa, necessariamente, inscrever-se no binômio teoria-prática. Educadores necessitam de formação teórica e da concretização dateoria na prática, a partir de situações didáticas que permitam que os conhecimentos apreendidos,de diferentes naturezas e experiências, possam ser vivenciados em tempos e espaços diferenciados,de maneira crítica e reflexiva, pois como aponta Freire (1998)

...na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexãocrítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se podemelhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de serde tal modo concreto que quase se confunda com a prática. (p. 44)

O professor, enquanto sujeito que não reproduz apenas, por ser também sujeito doconhecimento, pode, por meio de uma reflexão crítica, fazer do seu trabalho em sala de aula umespaço de transformação. É na ação refletida e no redimensionamento de sua prática que oprofessor pode ser agente de mudanças, na escola e na sociedade. Nessa perspectiva, a formaçãodo docente se faz pelo repensar sobre a prática, sobre a realidade, bem como pela construção daidentidade pessoal, ética e política.

Considerando que a teoria e a prática constituem o núcleo articulador do currículo,permeando todas as disciplinas e tendo por base uma concepção sócio-histórica da educação,alguns princípios devem nortear o projeto de estágio supervisionado:

a) a docência é a base da identidade dos cursos de formaçãob) o estágio é um momento da integração entre teoria e prática;c) o estágio não se resume à aplicação imediata, mecânica e instrumental de

técnicas, rituais, princípios e normas aprendidas na teoria;Assim, o estágio supervisionado é o lugar por excelência para que o futuro professor

faça a reflexão sobre sua formação e ação, possa aprofundar conhecimentos e compreender oseu verdadeiro papel e o papel da escola na sociedade.

Page 124: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

124

A PRÁTICA DE ENSINO E O ESTÁGIO SUPERVISIONADO NA LEGISLAÇÃOATUAL

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) nº 9394, aprovada emdezembro de 1996, ao introduzir novos indicadores para a formação de profissionais para aEducação Básica, suscitou novas discussões e encaminhamentos.

Ressalte-se que as proposições estabelecidas pela LDB, para a formação deprofissionais da educação (artigos 61 a 65), implicaram em uma série de regulamentações que seseguiram, a saber: a Resolução CP/CNE 1 de 30 de setembro de 1999, que dispõe sobre osInstitutos Superiores de Educação, o Decreto nº 3276/99, que dispõe sobre a formação deprofessores em nível superior para atuar na Educação Básica, alterado pelo Decreto 3554/2000,o Parecer CES 970/99 que trata sobre a formação de professores nos Cursos Normais Superiorese o Parecer CNE/CP 9/2001 que trata das Diretrizes Curriculares para a Formação de Professoresda Educação Básica, em nível superior, dentre outras.

O Parecer 9/2001 ao apresentar as diretrizes Curriculares Nacionais para a Formaçãode Professores da Educação Básica, em nível superior, destaca a importância da articulação dateoria com a prática e indica que a prática na matriz curricular não pode ficar reduzida a umespaço isolado, que a reduza ao estágio como algo fechado em si mesmo e desarticulado dorestante do curso. Propõe que ela deve permear todo o curso, desde o seu início, inserida emtodas as áreas ou disciplinas, mobilizando e articulando diferentes conhecimentos e experiências.O Parecer reforça ainda a idéia da prática como componente curricular e define:

Uma concepção de prática mais como componente curricular implica vê-la comouma dimensão do conhecimento, que tanto está presente nos cursos de formação nos momentosem que se trabalha na reflexão sobre a atividade profissional, como durante o estágio nos momentosem que se exercita a atividade profissional. (p.22)

Com relação aos estágios, a proposição inicial do Parecer 9/2001, foi alterada peloParecer 27/2001, estabelecendo os seguintes termos:

No estágio curricular supervisionado a ser feito nas escolas de educação básica. Oestágio obrigatório definido por lei deve ser vivenciado durante o curso de formação e com temposuficiente para abordar as diferentes dimensões da atuação profissional. Deve, de acordo com oprojeto próprio, se desenvolver a partir do início da Segunda metade do curso, reservando-se umperíodo final para a docência compartilhada, sob a supervisão da escola de formação,preferencialmente na condição de assistente de professores experientes. Para tanto, é precisoque exista um projeto de estágio planejado e avaliado conjuntamente pela escola de formaçãoinicial e as escolas campos de estágio, com objetivos e tarefas claras e que as duas instituiçõesassumam responsabilidades e se auxiliem mutuamente, o que pressupõe relações formais entreinstituições de ensino e unidades dos sistemas de ensino. Esses “tempos na escola” devem serdiferentes segundo os objetivos de cada momento da formação. Sendo assim, o estágio não podeficar sob a responsabilidade de um único professor da escola de formação, mas envolvenecessariamente uma atuação coletiva dos formadores.

Page 125: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

125

O Parecer 28/2001 enfatiza o estágio curricular supervisionado de ensino, comooutro componente curricular obrigatório integrado à proposta pedagógica do curso, efetivando-sea partir da segunda metade do curso, como coroamento formativo da relação teoria-prática. Deverá,portanto, ser uma atividade intrinsecamente articulada com a prática e com as atividades detrabalho acadêmico. Deve ainda ser considerado “o momento de efetivar, sob a supervisão de umprofissional experiente, um processo de ensino-aprendizagem que tornar-se-á concreto e autônomoquando da profissionalização deste estagiário”. (p.10).

A Resolução CNE/CP 1 de 18 de fevereiro de 2002, com base nos Pareceres 9/2002 e 27/2001, estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professoresda Educação Básica, em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, definindoos princípios, fundamentos e procedimentos a serem observados na organização institucional ecurricular de cada estabelecimento de ensino e a Resolução CNP/CP 2, de 19 de fevereiro de2002, respaldada no Parecer CNE/CP 28/2001, institui a duração e a carga horária dos cursos delicenciatura, a saber estabelecendo 400 (quatrocentas) horas de prática como componentecurricular, vivenciadas ao longo do curso e 400 (quatrocentas) horas de estágio curricularsupervisionado a partir do início da segunda metade do curso.

Essas regulamentações definiram novas concepções, organização e estruturaçãodos cursos de formação de professores tendo exigido reformulações significativas nos projetospedagógicos dos cursos, em especial, nas licenciaturas.

DESENVOLVIMENTO DO PROJETO

A preocupação em estar acompanhando e atendendo as orientações propostaspelas diretrizes para a formação dos professores e tendo como suporte a concepção de umaformação crítica e reflexiva, instigou os docentes do curso de Pedagogia, do Instituto Educacionalde Assis (IEDA) a elaborarem um projeto interdisciplinar para atender ao estágio supervisionadode prática de ensino. A proposta de um projeto interdisciplinar constituiu-se a tônica desse processo,ou seja, um trabalho que propiciasse a articulação e o envolvimento das diferentes áreas doconhecimento. Um real trabalho de cooperação e troca, aberto ao diálogo e ao planejamento,onde estivessem envolvidas diversas disciplinas do curso de Pedagogia.

O Projeto de Estágio Supervisionado numa perspectiva redimensionada tem comoobjetivo central efetivar a articulação do curso de Licenciatura em Pedagogia com a EducaçãoBásica da rede pública e privada, aprimorando a formação do profissional da educação de formaa garantir uma ação mais comprometida com o processo educativo. O Projeto de Estágioredimensionado ganha contornos diferenciados porque pressupõe que a aquisição dos saberespedagógicos (científicos e docentes) não ocorre de forma estanque, mas ao contrário, se dá pelainteração entre as várias áreas de conhecimento.

Entendendo que a missão do Curso Superior de Pedagogia seja a de formar umprofissional adequado ao seu tempo, propõe-se uma forma de Estágio que contemple a formaçãode um pedagogo capaz de atender às demandas de uma realidade, que se faz nova e diferente a

Page 126: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

126

cada dia. Buscou-se então um trabalho interdisciplinar, em que a maioria dos docentes do cursopudesse trazer a sua contribuição para o projeto, oferecendo subsídios e participando efetivamenteda sua orientação, acompanhamento, execução e avaliação. A Prática de Ensino e o EstágioSupervisionado passaram a se configurar como eixo articulador da formação dos professores,envolvendo diferentes disciplinas. A partir de observações, relatórios, investigações e análise doespaço escolar e da sala de aula, esse processo ultrapassa a situação do processo ensino-aprendizagem favorecendo espaços de reflexão e o desenvolvimento de ações coletivas eintegradoras,

Apesar de entender que a formação de um pedagogo está ligada a situações maisamplas, tanto na área da educação formal quanto informal, neste primeiro momento o grupo dedocentes orientadores, optou por centralizar o seu olhar no Ensino Fundamental. Esta opçãodeveu-se à necessidade de uma organização operacional, que se mostrasse viável. Desta forma,as escolas municipais, estaduais e privadas, de Assis e região, que mantêm o Ensino Fundamental,são alvos desse projeto de trabalho.

Como estagiários atuam os alunos do 3º, 4º, 5º e 6º termos do Curso de Pedagogiado Instituto Educacional de Assis – IEDA. No 3º termo os alunos iniciam o estágio com a observaçãoda escola como um todo. Essa observação tem como objetivo analisar e compreender ascaracterísticas do espaço escolar, na sua singularidade, inteirando-se de seu funcionamento,suas deficiências, suas possibilidades e a forma como a escola se organiza para resolver seusconflitos, dificuldades e enfrentamentos. O contato com todos os sujeitos inseridos no contextoescolar permite que, a partir de suas falas e de suas ações, o aluno estagiário visualize aspossibilidades de sua inserção na busca de resolução de determinadas situações-problema.

No 4º termo o estagiário elabora e inicia o desenvolvimento de um projeto deatuação, em qualquer setor da escola que exista uma necessidade real de intervenção – biblioteca,secretaria, eventos esportivos, culturais e de lazer, produção de materiais didáticos, entre outros.Essa intervenção tem propiciado intensa participação dos alunos estagiários na escola como nasreuniões do horário de trabalho pedagógico, nas atividades e eventos programados pela escola,nas atividades relacionadas à biblioteca e, principalmente, o desenvolvimento de projetos de açãoque envolvem: atividades lúdicas na escola, recreação no espaço escolar, projetos de leitura juntoà biblioteca, mini-cursos sobre sexualidade, ética, meio-ambiente, produção e organização dematerial didático-pedagógico, produção e organização de jornal escolar, dentre outros.

Nos 5º e 6º termos o aluno estagiário desenvolve um trabalho, também voltadopara suprir necessidades da escola, mas agora diretamente ligado à sala de aula, analisando osaspectos estruturais da sala de aula (disposição física), as relações em sala de aula, aspectosorganizacionais da sala de aula e os aspectos didáticos pedagógicos. Essa análise dá suporte aosalunos para projetarem suas propostas junto às salas, envolvendo, dentre outras, atividadesregulares de docência, aulas de reforço e recuperação de alunos com dificuldades de aprendizagem,orientação sexual, seminários sobre os temas transversais (ética, pluralidade cultural, trabalho econsumo, ecologia,).

Page 127: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

127

Em geral, os projetos de intervenção dos alunos estagiários são propostos edesenvolvidos em grupos de até três elementos, levando em consideração a experiência anteriordos alunos, seu repertório cultural e suas habilidades. Esta opção foi feita pelo entendimento deque a interação entre os alunos é tão importante quanto a integração dos diferentes componentescurriculares do Curso de Pedagogia, na elaboração deste Projeto de Estágio Supervisionado.

Em todos os momentos do estágio, os alunos têm a supervisão direta de seuorientador, escolhido pelo próprio aluno estagiário, no início do 3º e 5º termos, levando emconsideração a afinidade existente entre a sua proposta de intervenção e a área de atuação dodocente orientador, com acompanhamento e orientação dos professores de Didática, Estrutura eFuncionamento do Ensino, Filosofia da Educação, Psicologia da Educação, História da Educaçãoe Sociologia da Educação. É importante ressaltar que os encontros entre o supervisor de estágioe seus alunos, constituem-se essenciais para a reflexão sobre as observações e/ou investigaçõesrealizadas e os encaminhamentos possíveis e necessários em cada unidade educativa.

A avaliação do Projeto de Estágio acontece de forma processual, com ênfase nosaspectos qualitativos sobre os quantitativos, mas sempre levando em consideração os resultadosalcançados. Os estabelecimentos de ensino que recebem os alunos estagiários são envolvidosnesse processo de avaliação, por meio da socialização dos relatórios elaborados pelos estagiários,enquanto desenvolvem as suas propostas de trabalho.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao término de um semestre letivo, julgamos necessário uma avaliação do projetoacima apresentado. Em atividade conjunta, chegou-se às seguintes conclusões:

1) Houve um real envolvimento no trabalho, tanto por parte do corpo docentecomo dos estagiários;

2) Foi possível notar mudanças nas relações internas, entre os professores,que passaram a conversar mais e a “trocar idéias” continuamente. Dessa maneira, o Curso dePedagogia, como um todo, pôde sentir os benefícios da ação interdisciplinar;

3) Os alunos puderam observar a escola participando dela e assim reconheceros seus vários aspectos. Normalmente, os olhares sobre a escola procuram captar o que ela “nãotem”, ou seja, têm a tendência de descrevê-la em termos negativos, de comunicar o que nela nãoexiste para elencar suas carências e deficiências. Pode-se verificar que “olhares” puderam ir aléme ver, também, aquilo que a escola “tem” e que a faz singular, como sua cultura, sua história, seusmedos, suas dúvidas, suas vitórias, ou seja, a sua vida cotidiana;

4) A supervisão se mostrou, antes de tudo, um espaço de socialização, ondeos alunos estagiários puderam falar de suas experiências e escutar a dos outros, promovendodiscussões e buscando possíveis soluções para os problemas, quando encontrados. Constituiu-se num espaço singular de reflexão sobre a ação pedagógica

Enfim, na sua totalidade, julgamos o trabalho realizado de forma positiva.Entendemos, também, que houveram aspectos que passaram desapercebidos e que,

Page 128: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

128

provavelmente, ressurgirão em outros momentos. Como toda prática que se inicia, não possuímosrespostas para todas as questões que surgiram e que hão de surgir, mas possuímos, sem dúvida,a vontade e a disposição para continuar pesquisando e buscando caminhos que possam auxiliara formação de docentes críticos e atuantes. Buscar melhorias para os aspectos injustos de nossarealidade educacional será, sempre, o objetivo último de nosso trabalho e, para tanto, precisamosde profissionais que tenham condições para possibilitar a transformação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASSOCIAÇÃO NACIONAL PELA FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO -ANFOPE. XII Encontro Nacional: Documento Final. Brasília: ANFOPE, 2004.

BRZEZINSKI. I. Pedagogia, Pedagogos e Formação de Professores: a busca e movimento.Campinas, São Paulo: Papirus, 1996. (Coleção Magistério: Formação e trabalho Pedagógico)FAZENDA, I. Metodologia da pesquisa educacional. São Paulo: Cortez, 1997.

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz eTerra, 1998.

LIBÂNEO. J. C. Pedagogia e Pedagogos, para quê? .São Paulo: Cortez, 1998.

LIBÂNEO, J. C. Adeus Professor, adeus professora? : novas exigências educacionais e profissãodocente. São Paulo: Cortez, 1998 (Coleção Questões da nossa época: vol. 67)

LIMA. M. S. L. A hora da prática: reflexões sobre o estágio supervisionado e a ação docente. 3ªed. Fortaleza: Edições Demócrito rocha, 2003

OLIVEIRA, A. C. B. de Qual a sua formação, professor? Campinas, São Paulo: Papirus, 1994.

PIMENTA, S. G. O estágio na formação de professores: unidade, teoria e prática. 3ª ed. SãoPaulo Cortez, 1997.

SILVA, C. S. B. da. O curso de Pedagogia no Brasil: história e identidade. 2ª ed. revisada eatualizada. Campinas, SP: Autores Associados, 2003. (Coleção Polêmicas do nosso tempo; 66).

Documentos LegaisBRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394, de 20 de dezembro de 1996.

________. Conselho Nacional de Educação. Parecer CP 09 de 08 de maio de 2001. DiretrizesCurriculares Nacionais para a Formação de Professores da educação básica, em nível superior,curso de licenciatura, de graduação plena. Mimeografado.

________. Conselho Nacional de Educação. Parecer CP 28 de 02 de outubro de 2001. Dá novaredação ao Parecer CNE/CP 21/2001, que estabelece a duração e a carga horária dos cursos delicenciatura, de graduação plena, de formação de professores da educação básica em nível superior.

________. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CP 1 de 18 de fevereiro de 2002.Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da educação básica,em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena. Mimeografado.

________. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CP 1 de 19 de fevereiro de 2002.Institui a duração e a carga horária dos cursos de licenciatura, de graduação plena, de formaçãode professores da educação básica em nível superior.

Page 129: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

129

Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver o Universo...Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer.Porque sou do tamanho do que vejoE não do tamanho da minha altura...Fernando Pessoa

Este trabalho se propõe a tratar de aspectos que consideramos fundamentais paraampliarmos nosso olhar para o aluno do Ensino Médio. Os dados abordados foram coletadosatravés de textos produzidos por 98 alunos ingressantes nesta etapa escolar de uma escola públicade periferia em 2004. A produção destes textos fez parte de um projeto1 maior desenvolvido naescola desde 2003, que consistia em valorizar o aluno enquanto sujeito de sua aprendizagem.Faremos, inicialmente, algumas considerações sobre a função social da escola, o Ensino Médio ea adolescência, para, então, adentrarmos às considerações e análise dos dados coletados.

Várias instituições são responsáveis pela formação do jovem, a família, ascomunidades, os meios de comunicação e a escola, e esta é, sem dúvida, o principal espaço paraorganizar, sistematizar, transmitir e proporcionar a construção do conhecimento. É através doconhecimento, do domínio das ciências e das tecnologias que o homem adquire meios detransformar o meio natural e a sociedade em que vive. Esse caráter transformador da escola édeterminado pelo grau com que instrumentaliza seus alunos no campo da ciência, da técnica, dacrítica e da criatividade. Ao estimular e desenvolver nos educandos as capacidades intelectuais,as atitudes e o comportamento crítico em relação à sociedade, na qual estão inseridos, a escolacolabora de forma determinante com a transformação social. Mas o que qualquer pessoa ligada àescola, seja professor, aluno ou comunidade percebe com clareza é o que toda a sociedade já sehabituou a chamar de “crise da educação”. Todos a reconhecemos, embora não se saiba exatamentequal sua extensão e nem quando começou, mas ela se torna evidente quando concretamenteuma enorme parcela de crianças ingressantes na escola não consegue concluir satisfatoriamenteos oito anos mínimos e obrigatórios. Esse é, certamente, um dos maiores problemas enfrentadospela escola brasileira na atualidade.

Por conta disso, vários esforços foram e estão sendo articulados numa tentativa deredirecionar a educação brasileira. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, Leinº 9.394/97, ao estabelecer como sendo dever do Estado a progressiva extensão da obrigatoriedadedo Ensino Médio, pretende corrigir uma das razões que provocam a distorção idade/série e aelevada exclusão dos jovens e adolescentes desta etapa escolar.

O Plano Nacional de Educação estabeleceu metas para a educação no Brasil comduração de dez anos que garantam, entre muitos outros avanços, a elevação global do nível de

O PAPEL DO PROFESSOR NA FORMAÇÃO DOJOVEM: A VOZ DO ALUNO DO ENSINO MÉDIO

MENDES, Maria Celeste de Jesus (Universidade Católica de Santos)

Page 130: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

130

escolaridade da população, a melhoria da qualidade do ensino em todos os níveis, a redução dasdesigualdades sociais. E uma das mais importantes metas do Plano Nacional de Educação, noque tange o Ensino Médio, é a garantia do acesso a todos aqueles que concluam o EnsinoFundamental.

Com o aumento da demanda, o Ensino Médio vem gradativamente passando poralgumas mudanças, engendradas, em grande parte pelas políticas públicas. É cada vez maisforte a idéia de que esta etapa escolar deva ter uma estreita relação entre o Ensino Fundamentale o Superior e não se reduzir a uma série de conteúdos que visem à aprovação em provasvestibulares. Ou seja, o aluno deve, neste período, ser levado a perceber as articulações entreciência, diversidade cultural e trabalho, como também desenvolver atitudes e valores éticos, ter oconvívio social estimulado e ser conscientizado a rejeitar qualquer tipo de preconceito. E, ainda,desenvolver o educando, assegurando-lhe a preparação para o trabalho e a cidadania.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais/PCNs do Ensino Médio (Brasil, 1999),propõem que, no nível do Ensino Médio, a formação geral, em oposição à formação específica,deve orientar “o desenvolvimento de capacidades de pesquisar, buscar informações, analisá-las eselecioná-las; a capacidade de aprender, criar, formular, ao invés do simples exercício dememorização”.

Aqueles que de alguma forma estão ligados a escolas de Ensino Médio verificamque a realidade apresentada está muito distante do que propõem os Parâmetros. Essa etapaescolar encontra-se, atualmente, sem identidade e os professores carentes de formação maisadequada a essa etapa. Preparar os educandos, para o mundo do trabalho, para o acesso aoensino superior, para o exercício da cidadania, tudo isso é um discurso do qual, em teoria, nãopodemos discordar, mas o que percebemos na prática é a impossibilidade de concretizar essespropósitos, principalmente, porque a escola e o professor não estavam preparados para o aumentoda demanda desse público específico do Ensino Médio: adolescentes e jovens.

Percebe-se um descompasso entre o que a escola oferece ao adolescente do EnsinoMédio, aquilo que se pretende que ela deva oferecer e ao que o aluno espera que ela ofereça.Percebe-se inclusive um “mal-estar” com relação ao trabalho dos professores. A crise da escolaevidencia-se de tal maneira que os profissionais da educação são acometidos de uma série deconflitos que perpassam pela falta de credibilidade profissional que, por sua vez, é produto da faltade credibilidade da escola. Se a imagem da escola como instituição está ameaçada, a idéia decidadania também está, pois a escola ainda é o meio de o cidadão ter de fato acesso aos seusdireitos com vistas não somente ao direito de voto, mas também a uma vida com dignidade.

Quando se investiga o insucesso escolar, principalmente no Ensino Médio, as razõesque constantemente surgem é a falta de interesse do aluno, não têm perspectivas, não queremestudar etc., ou seja, esse insucesso é produto de outras fontes que não a escola, o professor oua ação pedagógica.

Page 131: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

131

Para Aquino (1998:182):

(...) ao eleger o aluno-problema como um empecilho ou obstáculopara o trabalho pedagógico, a categoria docente corre abertamenteo risco de cometer um sério equívoco ético, que é o seguinte: nãose pode atribuir à clientela escolar a responsabilidade pelasdificuldades e contratempos de nosso trabalho, nossos ‘acidentesde percurso’. Seria o mesmo que o médico supor que o grandeobstáculo da medicina atual são as novas doenças, ou o advogadoadmitir que as pessoas que a ele recorrem apresentam-se comoum empecilho para o exercício ‘puro’ de sua profissão.

Quem é esse aluno que chega ao ensino médio? O que quer? Quais são seusprojetos? Que vivências ele já possui? Quais são seus anseios e dúvidas? A escola e o professoresperam um aluno ideal e desconsideram ou rotulam o aluno real com o qual se deparam. Ignoram-se as suas múltiplas experiências de vida fora do espaço escolar. A expectativa pelo aluno idealtorna-se mais problemática se desconsiderarmos a diversidade do público atual do ensino médio.O que nos parece claro é que a escola, os professores e a sociedade em geral olham para aconduta do adolescente sempre de forma reducionista, simplista e como problemática. O alunoadolescente, ou o “aborrecente” é apontado sempre como um problema, criam-se estereótipos e,ao mesmo tempo, em que lhe são impostas novas regras do mundo adulto lhe é negada participaçãoefetiva nesse espaço, principalmente, no que diz respeito ao direito à expressão. Esse espaço detempo, em que as características infantis são abandonadas, mas ainda não se assumiram asobrigações e responsabilidades da vida adulta, torna-se cheio de contradições.

Sobre essas contradições, Melman (1999) afirma que a forma pela qual aadolescência é tratada revela uma discordância que nossa cultura mantém entre os estatutosbiológico, subjetivo e social. O adolescente, por um lado, é tomado por uma exigência interna e,de outro, por uma norma social que o subestima e o declara ainda incapaz.

Com o alongamento da permanência na escola, propiciado pelo aumento progressivodo acesso à escola de ensino médio, há a necessidade de novas propostas de trabalho para essepúblico específico, prioritariamente, adolescentes e jovens.

Para Calligaris (2000: 8-9), os adolescentes:

(...) amam, estudam, brigam, trabalham. Batalham com seuscorpos, que se esticam e se transformam. Lidam com as dificuldadesde crescer no quadro complicado das famílias modernas (...) elesprecisam lutar com a adolescência, que é uma criatura um poucomonstruosa, sustentada pela imaginação de todos, adolescentes epais. (...) A adolescência é o prisma pelo qual os adolescentes secontemplam. Ela é uma das formações culturais mais poderosasde nossa época.

A adolescência não é um fenômeno universal. A antropologia já constatou que ospovos primitivos não passam por esse estágio, pois o mundo adulto encontra-se nitidamentedividido pelo “ritos de passagem”. Esses rituais introduzem o indivíduo no mundo adulto com

Page 132: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

132

valores e regras bem definidas, não havendo ambigüidades a respeito dos direitos e deveres queestado de “adulto” lhe acarreta.

Já, nas sociedades modernas, há a segregação do jovem através de uma espéciede segmentação no período de transição de uma faixa etária para outra. A escola, na modernidade,passou a ter papel fundamental nesse período de espera enquanto espaço separado, apropriado ede grande importância para a preparação para a vida adulta. Mas como já observamosanteriormente, a escola vê esse adolescente de modo reducionista e estereotipado, nãoproporcionando momentos de vivências adequadas para que os educandos se desenvolvamenquanto sujeitos dessa preparação para adentrar na vida adulta.

Faz-se necessário, então, que a escola perceba, como nos diz Dayrell (1996: 140), que:

(...) os alunos chegam à escola marcados pela diversidade, reflexosdos desenvolvimentos cognitivo, afetivo e social, evidentementedesiguais, em virtude da qualidade de suas experiências e relaçõessociais prévias e paralelas à escola. O tratamento uniforme dadopela escola só vem consagrar a desigualdade e as injustiças dasorigens sócias dos alunos.

É preciso, assim, que a escola propicie espaços para que seus alunos tenham voz,para que se expressem, opinem, sugiram, analisem, critiquem, enfim, participem, desenvolvendoassim competências fundamentais para o mundo do trabalho, característica primeira do mundoadulto. Compreender esse aluno que chega à escola é apreendê-lo como sujeito sócio-cultural.Para isso, é preciso superar a visão homogeneizante e estereotipada da noção de aluno. Ou seja:

Trata-se de compreendê-lo na sua diferença, enquanto indivíduo que possui umahistoricidade, com visões de mundo, escala de valores, sentimentos, emoções, desejos, projetos,com lógicas de comportamentos e hábitos que lhe são próprios. (Dayrell, 1996:140)

Ao participarmos por alguns minutos de qualquer reunião de conselho de classe esérie, veremos que essa necessária mudança de visão está bem distante da realidade, pois nosdeparamos com vários rótulos e estereótipos dados aos alunos: o desinteressado, o indisciplinado,o desrespeitoso, o que não tem pré-requisitos, o que não tem limites, o agressivo, o tímido, obagunceiro, ou ainda, uma expressão que de tão ampla é vazia de significado: “esse aluno temproblemas”. Esses esteriótipos acabam por cristalizar modelos de comportamento com os quaisos alunos passam a se identificar.

De acordo com Spósito (2001), o estereótipo atribui a priori características ao sujeito,neste caso, o adolescente, e nega o direito à fala. Ou seja, nos negamos a escutar o que ele teriaa dizer sobre si mesmo e lhe são impostas definições externas que toma como suas, que, aindasegundo a mesma autora, essas definições tornam-se representações incorporadas pelo jovem,podendo gerar estigmas que deformam a identidade. Desta forma, torna-se claro que o olhar quelançamos ao adolescente tem grande importância na constituição de sua identidade.

A responsabilidade de escola com relação à formação do jovem é enorme e devenão reproduzir o olhar que a sociedade em geral tem do adolescente e, sim, caminhar no sentidode reconhecer esse adolescente como um ser único, respeitando democraticamente seu direito a

Page 133: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

133

ser ouvido e estimulado à livre expressão responsável, crítica e consciente, que precisa, conformeAquino (2003: 61), ser incessantemente cultivado.

Tendo por base que a escola é um espaço polissêmico, é necessário articular aexperiência que a escola oferece de acordo com o seu projeto político-pedagógico, com o projetodos alunos. Não seria a escola o espaço privilegiado para desenvolver a formação humana deforma ampla, ampliando o universo dos alunos?

E, como nos diz Velho (1987, apud Dayrell, 1996: 145):

(...) quanto mais exposto estiver o ator a experiências diversificadas,quanto mais tiver de dar conta de ethos e visões de mundocontrastantes, quanto menos fechada for a sua rede de relações aonível do seu cotidiano, mais marcada será a sua percepção deindividualidade singular. Por sua vez, a essa consciência daindividualidade, fabricada dentro de uma experiência culturalespecífica, corresponderá uma maior elaboração de um projeto.

Pensando dessa forma, iniciamos, em 2003, um projeto que tinha como objetivodesenvolver a livre expressão, a análise, a crítica, e a solidariedade através da empatia e dorespeito ao outro. Um dos momentos desse projeto caracterizou-se pela proposta de uma produçãotextual que tinha como tema o papel do professor na formação do jovem. A princípio, o que sepercebeu foi a enorme dificuldade de elaborar, selecionar e organizar a idéias, ou seja, a maiorianão sabia exatamente qual era o papel do professor na sua própria formação. O que pode parecerestranho, afinal, a maioria está na escola pelo menos há nove anos e não conseguia definir qual éo papel do professor. Questionados sobre isso, os alunos se surpreenderam por nunca terempensado que os professores têm um papel em sua formação e passaram a refletir sobre ele.

Nos textos produzidos, que passaram a ser tratados, na análise de dados comoquestionários abertos, o que se percebe é que apesar de a maioria nunca ter refletido sobre otema, quando o fez, conseguiu levantar aspectos sobre o papel do professor extremamentepertinentes. Ou seja, os alunos quando estimulados a participar, a refletir e a expressar-se mostram-se competentes e demonstram ser muito diferentes dos esteriótipos e rótulos que normalmentelhe são impostos.

Segundo Rios (2003:93): “Em toda a ação docente, encontram-se uma dimensãotécnica, uma dimensão política, uma dimensão estética e uma dimensão ética”. Em seus textos,os educandos abordaram pontos que englobam justamente essas quatro dimensões. Sendo assim,os dados coletados foram organizados no que tange à dimensão da competência técnica, dimensãoético-política e dimensão estética. Além desses dados elencados com relação ao papel do professorenquanto formador, pode-se constatar, também, que muitos alunos conseguiram perceber asdificuldades e deficiências que alguns professores têm em desempenhar esse papel e, ainda,indicaram o que seria necessário para que a sua formação, enquanto alunos, fosse mais eficaz.

Na dimensão da competência técnica, o que se espera de um professor é o domíniodos conteúdos de sua disciplina e que consiga transmiti-los, ou seja, domínio do conteúdoespecífico e de métodos pedagógicos.

Page 134: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

134

De acordo com Cunha (1982, apud Rios, 2003:94), o termo “técnica” é usado paraindicar o “conjunto dos processos de uma arte” ou a “maneira ou habilidade especial de executarou fazer algo”. Temos, então, a competência técnica ligada à capacidade de lidar com os conteúdose conceitos e das atitudes. Essa dimensão foi claramente citada na maioria dos textos:

O docente tem o dever de conhecer a matéria que ele leciona edeve expressar esse conhecimento com clareza...O papel do professor é transmitir conhecimento, é tirar qualquertipo de dúvida que apareça sobre sua matéria...Ensinar de forma que o aluno entenda faz parte do papel doprofessor; deve também tentar compreender a dificuldade do alunoe tentar tirar suas dúvidas...(...) os professores devem se empenhar em ensinar de uma formainterativa e dinâmica, fazendo com que os alunos aprendam deuma forma divertida e interessante... (...) deve ensinar seu conteúdo com clareza, preparar para ovestibular e nos sentirmos seguros para entrar no mercado detrabalho...

A competência ético-política está presente naquele professor que, além de ensinar,sente a responsabilidade de formar integralmente o seu aluno, parafraseando Freire (1997), tercompromisso ético político é aquele que ensina a ler o mundo e não apenas se restringe a ensinara leitura das palavras.

Rios (2003:106) reivindica, para a profissão docente, a dimensão da competênciaética, esclarecendo que competência guarda o conceito de algo de boa qualidade – algo que seexercita como deve ser, na direção não apenas do bem (...), mas do bem comum.

Inseparável da ética está a competência política que tem como finalidade a vidajusta e feliz, ou seja, a vida propriamente humana digna de seres livres (Chauí 1994:384). Iniciaros alunos no que diz respeito a sua participação na sociedade, cientes de seus direitos e deveres,é parte desta competência. Nos textos analisados, essa competência é a citada como maisimportante na formação do jovem. Vejamos alguns trechos:

O papel do professor é um marco na vida de qualquer pessoa. Éele quem ensina, auxilia nas dificuldades e prepara-nos para omundo.(...) é necessário que exista respeito para que o docente exerça suafunção de ensinar, mas não apenas uma simples lição dedeterminada matéria, mas sim um aprendizado de vida que o jovemirá levar com ele pela vida toda.O professor tem uma grande importância na educação dos jovens,pois ele passa um terço de nossa vida conosco...é necessário queele seja o guia do jovem... um amigo e não só um simples professor...e também deve servir de inspiração para o jovem...(...) além disso, é ele que te ajuda a ter respeito ao próximo, a sersolidário... o docente sempre tem algo novo e surpreendente parate ensinar, é ele que vai te mostrar que o mundo pode ter maisbrilho e te transformar numa pessoa preparada para o futuro...O professor não é só importante para o ensino de Português,Matemática, mas também para orientá-lo no dia-a-dia, é ele umdos responsáveis junto com a família, pelo desenvolvimento dointelecto e do futuro do jovem.

Page 135: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

135

(...) em suas aulas deve exigir de nós sempre o melhor, fazendo-nos ter responsabilidade com datas de entregas de trabalho, emostrando sempre que isso é para o nosso bem... (...) outro fator importantíssimo na educação de um jovem é oprofessor servir de espelho para seus alunos, ou seja, se o educadorse mostra uma pessoa bem educada, com princípios, o jovemreceberá isso como uma lição que será exercida diariamente...(...) deve valorizar o aluno na sua capacidade... levantar sua auto-estima para que ele se sinta forte para lutar por seus interesses...ensinar que para ser um cidadão não precisa passar por cima dosoutros e, sim, ter respeito por todos que o cercam sendo uma pessoadigna de caráter...

A origem etimológica da palavra estética vem do grego aisthesis com o significadode “faculdade de sentir”, “compreensão pelos sentidos”, “percepção totalizante”, portanto, tomandoesses significados não aprofundaremos, aqui, uma reflexão sobre a arte ou o belo, mas, sim,relacionar os significados originais da palavra à necessidade de sensibilidade no ato educativo.

Rios (2003), citando Ostrower (1986:12-13), refere-se à sensibilidade como algoque vai além do sensorial e que diz respeito a uma ordenação das sensações, uma apreensãoconsciente da realidade, ligada estreitamente à intelectualidade. Segundo ela (id.: 96): “(...) asensibilidade guia o indivíduo nas considerações do que para ele seria importante ou necessáriopara alcançar certas metas de vida.(...)”. A sensibilidade se converte em criatividade ao ligar-seestreitamente a uma atividade social significativa para o indivíduo. Sendo assim, a estética é umadimensão da existência, do agir humano. É o que podemos perceber das falas de alguns dosnossos alunos:

(...) o professor deve agir com carinho, demonstrando interesse emque todos alcancem o objetivo final que é ser aprovado, eleconseguirá a confiança e o respeito de todos (...), propor trabalhose atividades que exijam a aproximação do aluno e do professor...(...) deve haver entre o professor e o aluno um vínculo de amizade,confiança e respeito, para que haja um melhor rendimento e paraque todos os objetivos sejam alcançados...(...) deve ser um conselheiro sincero, é o nosso amigo que muitasvezes nos dá um conselho, um apoio quando precisamos... O professor deve demonstrar interesse pelo aluno e ter paciênciaquando explicar.(...) o professor não é só um amigo ele é muito mais que isso, elevai estar com o aluno boa parte da vida, mostrando coisas que elenem sonhava que existiam...Outro item muito importante na relação entre o professor e o alunoé o companheirismo, pois a partir do momento que os dois sejamcompanheiros, facilitarão os dois lados, o ensino do professor e oaprendizado do aluno...

Percebe-se, na análise dos textos produzidos pelos alunos, que suas percepçõessobre o papel do professor são aprofundadas no sentido de demonstrarem claramente que umadimensão apenas não é suficiente, mas que uma complementa a outra.

Page 136: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

136

Para Rios (2003:108):

a dimensão ética é a dimensão fundante da competência porque atécnica, a estética e a política ganharão seu significado plenoquando, além de apoiarem em fundamentos próprios de suanatureza, se guiarem por princípios éticos. Assim vale reafirmar que,para um professor competente, não basta dominar bem os conceitosde sua área – é preciso pensar criticamente no valor efetivo dessesconceitos para a inserção criativa dos sujeitos na sociedade. Nãobasta ser criativo – é preciso exercer sua criatividade na construçãodo bem-estar coletivo. Não basta ser comprometido politicamente –é preciso verificar o alcance desse compromisso, verificar se eleefetivamente dirige a ação no sentido de uma vida digna e solidária.

E, neste sentido, afirma um de nossos alunos:

(...) existem professores que só se preocupam em ensinar suamatéria deixando de lado coisas muito importantes: a virtude, que éensinar como conviver bem com seus colegas e na sua comunidade,a ser um cidadão de verdade.

Além de terem elencado, em seus textos, as quatro dimensões da competência,alguns fizeram referências às dificuldades e deficiências apresentadas no ambiente da sala deaula, abordando aspectos como a falta de conhecimento teórico sobre matéria lecionada, o climade desordem, a falta de didática, a falta de comprometimento. Alguns conseguiram identificar ocomportamento de professores que, provavelmente, se mostram na fase de desinvestimento dacarreira. Vejamos alguns trechos para melhor ilustrar:

A desordem dentro da sala de aula atrapalha o desenvolvimentodos alunos, pois se a bagunça não é contida, logo ela se tornagradual e, mais tarde, foge do controle do professor, que, muitasvezes, não dá importância, mostra um certo desinteresse emmelhorar, em inverter a situação e, com isso, acaba permitindo osexcessos de indisciplina, pois sua autoridade não é mais respeitada.Alguns professores tentam dar aula. Quando eles percebem quenão vão conseguir, alguns deles desistem, deixando apenas umconteúdo incompreendido na lousa e quem ficam prejudicados sãoos alunos que estão interessados em aprender.Existem professores que conseguiram ter conhecimento suficientepara exercer sua profissão que é de muita responsabilidade, masnão conseguem ensinar os alunos.Há professores que não conseguem preparar suas aulas e chegamna escola com algumas coisas improvisadas e não conseguempassar o conhecimento suficiente para os alunos.O professor tem um papel fundamental na vida do jovem, mas algunsentram nessa profissão não sei por que, pois não sabem explicardireito, só sabem gritar e brigar com os alunos.Já é da natureza do aluno não gostar da escola e quando percebemque o professor está com falta de interesse, não estudam, não fazemnada, se tornando alunos rebeldes...O professor precisa compreender que os alunos não têm o mesmograu de conhecimento que ele e, por isso, não deve se irritar, masensinar quantas vezes for necessário para que o aluno aprenda omáximo.

Page 137: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

137

Como toda a profissão, existem os que fazem seu dever por amor evocação e os que fazem só pelo dinheiro e a diferença se vêem emsala de aula, há professores que só se preocupam em “passar” amatéria e acham que fazendo isso sua missão está cumprida”.

Parece-nos claro que o aluno está muito além daquilo que normalmente o rotulam.A ampliação do olhar sobre ele, percebendo-o de maneira mais complexa, no sentido de conhecerseus saberes, vivências, suas idéias, suas críticas, suas propostas, poderia ser um caminho nosentido de dar contornos possíveis para uma formação integral desse jovem. Ao ouvir o aluno, oque se recebe de volta é uma profusão de opiniões, observações, propostas etc., que sãosurpreendentes e que em nada sugerem a imagem de superficialidade que normalmente lhe éimpingida. A escola precisa abrir-se para o novo, e o adolescente precisa de um espaço em quepossa ser ouvido, reconhecido. Ao propor que o aluno precisa ser ouvido, não estamos sugerindoque ele passe a ditar suas regras e sugerir propostas que devam ser aceitas prontamente pelaescola, obviamente que não, o que se propõe é oportunizar o diálogo, construir uma relação derespeito mútuo. Nos dados coletados, os alunos sinalizam claramente que precisam de um adulto,no caso, o professor como portador de valores, de regras e que lhe sirva de exemplo:

(...) outro fator importantíssimo na educação de um jovem é oprofessor servir de espelho para seus alunos, ou seja, se o educadorse mostra uma pessoa bem educada, com princípios, o jovemreceberá isso como uma lição que será exercida diariamente...

A vontade dos alunos é ter voz, é ter oportunidade de propor, de criticar, de participarde um processo no qual são os principais interessados, assim, como transformar nosso aluno emsujeito de seu próprio conhecimento sem dar oportunidade para que se expresse? Nosso objetivo,no presente trabalho, foi o de discutir a importância de se ouvir o aluno para podermos ampliarnosso olhar sobre ele e mostrar que durante o desenvolvimento do projeto, no qual os textos foramproduzidos, isso foi possível. Ou seja, os alunos foram ouvidos, reconhecidos como sujeitos capazesde observar, avaliar, propor mudanças, questionar, enfim, participar de um processo dialético.

Estamos cientes de que não exploramos a totalidade dos dados recolhidos, muitomais poderíamos aprofundar tanto no que diz respeito às informações presentes nos textos, comoem relação a uma mais completa fundamentação teórica.

Acreditamos que a relevância dos aspectos abordados pelos alunos e a dimensãocom que participaram das atividades nos dão indícios sobre a necessidade e a importância de seouvir o aluno e olhá-lo com um olhar ativo, sem pressa, percebendo as mudanças, as semelhançase as diferenças, enfim, olhá-lo com “olhos de ver”.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AQUINO, Julio Groppa de. Indisciplina: o contraponto das escolas democráticas. São Paulo:Editora Moderna, 2003.

Page 138: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

138

__________. A indisciplina e a escola atual. Revista da Faculdade de Educação da USP. SãoPaulo, v. 24, n. 2, p. 181-204, 1997.

BRASIL.Ministério da Educação, Secretaria de Educação Média e Tecnológica. ParâmetrosCurriculares Nacionais: ensino médio – Brasília: Ministério da Educação, 1999.

CALLIGARIS, Contardo. A adolescência. São Paulo: Publifolha, 2000.

CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Editora Ática, 1994.

DAYRELL, Juarez. A escola como espaço sócio-cultural. In: Dayrell, J. (org.) Múltiplos olharessobre educação e cultura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1996, p.137-161.

RIOS, Terezinha Azeredo. Compreender e ensinar: por uma docência da melhor qualidade. SãoPaulo: Cortez, 2003.

MELMAN, Charles. Os adolescentes estão sempre confrontados ao Minotauro. In: Jerusalinsky,A. et al (orgs). Adolescência entre o Passado e o Futuro. 2ªed. Porto Alegre: Associação Psicanalíticade Porto Alegre/Artes e Ofícios, 1999, p.29-40.

SPÓSITO, Marilia P. Crise, Identidade e Escola. In: Dayrell, J.(org). Múltiplos olhares sobreeducação e cultura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001, p.96-104.

NOTAS

1 O projeto Vivências Comunicativas integrava as aulas de Língua Portuguesa da E.E. Profª Gracinda Maria

Ferreira.

Page 139: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

139

O Governo do Estado de São Paulo, através da Secretaria da Educação e daCoordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas ,elabora um programa de Formação Continuadade Professores denominado ‘TEIA DO SABER’. É um projeto de Capacitação DescentralizadaMediante Contratação de Instituições de Ensino Superior.

A Secretaria da Educação parte, portanto, de alguns princípios básicos: primeiro ,ode que há a necessidade da atualização do conhecimento e da capacidade profissional do professorde ensino fundamental e médio; segundo, de que esta Formação Continuada deve ser dada pelasInstituições de Ensino Superior, especificamente daquelas habilitadas nos cursos de Licenciatura.

Esse projeto tem como objeto a “Contratação de Instituições de Ensino Superior,públicas ou privadas, devidamente autorizadas/reconhecidas para implementar as açõesdescentralizadas do Programa de Formação Continuada de Professores – Teia do Saber – daSecretaria de Estado da Educação do Estado de São Paulo, visando a capacitação de professoresdo ciclo II do ensino fundamental e do ensino médio, que estejam atuando em sala de aula nasescolas estaduais jurisdicionadas à Diretoria de Ensino.”

Como terceiro princípio, destaca-se o direito e a habilitação das Instituições deEnsino Superior , públicas ou privadas, a desenvolverem estes cursos.

Pergunta-se : Por que o Estado de São Paulo mantém três Universidades Públicase para qualificar o corpo docente do ensino fundamental e médio recorre às instituições deEnsino Superior Privadas?

A justificativa do programa é de que “ A Secretaria da Educação está concentrandoseus esforços para oferecer à população uma escola pública de qualidade, que receba e mantenhasob seus cuidados todas as crianças e jovens, que favoreça o acesso à cultura, à arte, à ciência,ao mundo do trabalho, que eduque para o convívio social e solidário, para o comportamentoético, para o desenvolvimento do sentido da justiça, o aprimoramento pessoal e a valorização davida. O êxito desse empreendimento requer o preparo intelectual, emocional e afetivo dosprofissionais nele envolvidos. Por essa razão, está priorizando, entre suas ações, a formação doseducadores que atuam nas escolas. Para tanto, o presente projeto prevê a participação deinstituições de ensino superior, contratadas para realização de cursos de capacitação eaprimoramento dos professores da rede pública estadual.”

Como quarto princípio destacamos o papel essencial da escola, sem desmereceras outras funções que ela assume ,socialmente , na atualidade, que é o de favorecer e permitir oacesso do aluno à ciência, à arte, à cultura e sua relação com o mundo do trabalho e com omundo social e solidário. Ao papel histórico da escola como espaço para fazer a iniciação científica

PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA –TEIA DO SABER – UMA ANÁLISE CRÍTICA.

CUSINATO, Ricardo; CUSINATO, Maria Nazareth Cardoso (FCL-UNESP/CAR)

Page 140: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

140

da criança ,a escola do século XXI acrescenta a preocupação da sua relação com a vida nasociedade. Quando menciona a sua preocupação com o mundo do trabalho, entendo que seopõe a uma educação alienada que prepara o jovem para o nada. Se hoje a Secretaria da Educaçãomanifesta sua preocupação com o projeto pedagógico da escola e insere nele questões relativasao mundo social, a sobrevivência da classe trabalhadora, que é o mundo do trabalho, significaque ela busca superar o projeto da escola alienada que só prepara para o vestibular, para um ritualmacabro onde centenas de jovens concorrem a uma vaga nas universidades públicas. Fica assima maioria dos jovens sem a formação acadêmica e científica de uma universidade pública porfalta de vagas e por outro lado ficou também sem a formação acadêmica que poderia ter sidodesenvolvido no ensino médio e não foi.

Este empreendimento, argumenta a Secretaria da Educação, requer o preparpintelectual, emocional e afetivo dos profissionais nele envolvidos. Profissionais, esta é uma palavraque expressa uma concepção realista sobre a atividade educar: mais ainda, revela a existência depessoas preparadas e habilitadas e comprometidas com a ação de ensino e que são e serãotratadas pela Secretaria como “profissionais”. Mas tem uma recaída no parágrafo seguinte quandoargumenta que em suas ações está priorizando a formação de “educadores”, que atuem nasescolas. Não há contrato, nem concursos , nem leis para educadores e sim para professores. Otermo que expressa respeito, dignidade, respeito pelo profissional é o de ‘PROFESSOR’. Educadoré o avô quando conta histórias para o seu neto; o pai quando ensina ao filho como conviver comos outros e nesses atos está de certo modo imbricado uma dose de história, de moral, de afetividade,de controle, de família. Mas se perde com certeza, neste ato o princípio da ciência. Não hánaquele momento, na relação do avô com o neto, do pai com o filho, nenhum objetivo com osprocedimentos acadêmicos e científicos, e sim uma visão de transferência de experiências devida , no sentido mais largo do termo. São dois momentos distintos, dois momentosimprescindíveis, mas distintos. Educador, é um momento, uma expressão que revela mais doque tudo afetividade, romantismo. Professor é um termo, e porque não dizer um conceito, queenuncia procedimentos, atitudes, comportamentos , que passa por avaliações, por exames delaboratório. Ser professor significa um compromisso com o PROCESSO DE ENSINO, umcompromisso com a ciência.

O quinto princípio ocorre ao tratar dos objetivos do projeto: o uso de novasmetodologias voltadas para as práticas inovadoras e para o uso de materiais didáticos. Parte dopressuposto de que o objeto de ação de formação continuada dos professores devem ser osprocedimentos, as novas metodologias, o uso de novos equipamentos, de novas linguagens queatendam às necessidades de aprendizagem das crianças e jovens. No segundo objetivo acrescenta:o desenvolvimento de competências para a utilização de novas tecnologias a serviço daaprendizagem. Em nenhum momento ,o Projeto TEIA DO SABER põe em questão a formaçãode conteúdos do professor. Para a Secretaria da Educação, a questão da educação, a ação dasFaculdades e dos cursos de formação continuada para os professores devem incidir nosprocedimentos, no método e nas novas tecnologias. Parte do pressuposto de que o PROFESSORSABE e que só precisa SABER ENSINAR. Já ouvimos diversas vezes, em nossas experiências

Page 141: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

141

de vida, alunos que não entendem a aula de um professor e dizem, “ ele sabe para ele, mas nãosabe ensinar.”. Pergunto, será que um aluno sabe avaliar se um professor sabe? O fato de ficar nalousa, enchendo de números ou de conceitos e palavras pode significar o contrário, de que elenão tem claro os conceitos básicos de sua matéria, de sua especialidade científica. Não hánenhum indício deste dado: o de que o professor sabe o CONTEÚDO de sua disciplina. O fato deter feito um curso de licenciatura é um indício da formação do professor. No entanto, a diversificaçãodas instituições de ensino que oferecem cursos de formação de professores é bastante significativa,o que torna difícil poder afirmar que existe um grau de aprendizado conceitual , acadêmico ecientífico assegurado. Por um lado, temos as Universidades Públicas com uma tradição deensino e pesquisa de alto nível, de centros de excelência, mas que podem ter o resultado doscursos de formação de professores, dos seus cursos de licenciatura, comprometido com o maiorou menor envolvimento de seu quadro docente com a temática da formação dos professor e comas questões relativas ao ensino fundamental e médio. Mesmo como centros de excelência, osprofessores que forma para o magistério do ensino fundamental e médio podem ter uma margemrelativa de conhecimento de conteúdos. O próprio rol de disciplinas oferecidas, assim como asdisciplinas optativas realizadas pelos alunos demonstram um maior ou menor comprometimentocom o ensino fundamental e médio.

A análise do processo de contratação das Instituições de ensinoSuperior para ministrar os cursos para o Programa Teia do Saber demonstra que ,entre outros, ocritério determinante na realização do pregão, cumpridas as formalidades legais, é o custo financeirodo curso, é o preço. O preço do curso surge de forma independente da qualificação dos professoresque prestarão os serviços. Este procedimento de remuneração é incompatível com a forma deremuneração do profissional ,do professor no ensino superior: tanto no ensino superior públicoquanto no particular, o valor do trabalho, da hora -aula do professor é variável e compatível deacordo com sua titulação: graduação, mestre, doutor e livre docente.

No PREGÃO, edital de concorrência para os cursos de qualificaçãoprofissional no Programa Teia do Saber, a Secretaria da Educação desconsidera a titulação dosprofessores, o curriculum lates dos professores que representarão a Instituição que ministrará oscursos de formação de professores, ou seja, na contratação de instituições de ensino superior,públicas ou privadas, a Secretaria da Educação desconsidera a titulação, o curriculum e aexperiência profissional dos professores que trabalham nos projetos de Formação de Professores.Esta omissão da Secretaria da Educação tem como conseqüência a própria desvalorização doprofessor, provocada por ela mesma. Como ela elabora um projeto de Formação de Professoresquando a própria Secretaria da Educação nega a qualificação profissional.

Este critério da Secretaria da Educação acaba por privilegiar as Instituiçõesde Ensino Superior Privadas em detrimento das Universidades Públicas, na medida em que atitulação e a experiência docente dos professores das instituições de ensino são ignoradas. Opeso de um curso oferecido por um professor Doutor, que trabalha a dez anos nos cursos delicenciatura, que ministra cursos e orienta trabalhos de pesquisa no curso de pós graduação emEducação, tem exatamente o mesmo valor de um curso de um professor, pós-graduando com o

Page 142: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

142

título de mestre, com pouca ou nenhuma experiência profissional, com pouca ou nenhumaexperiência de ensino. Para efeito do pregão dos cursos do Programa Teia do Saber da Secretariada Educação, ambos têm o mesmo peso, o mesmo valor. Pode haver maior desvalorização daqualificação profissional do Professor ?

O critério de contratação é única e exclusivamente o preço.O critério para a contratação do corpo docente ou mais precisamente, a

falta de critério , não exigindo qualificação do corpo docente responsável por estes cursos , nãoexigindo qualificação do corpo docente compatível com a formação dos professores do ensinobásico da rede pública no Ensino Fundamental e Médio. Os professores do Ensino Fundamentale do Ensino Médio são docentes graduados em licenciatura plena, com diversos anos de experiênciaprofissional em ensino e muitos deles efetivos,o que significa dizer que foram aprovados em umconcurso público de títulos e provas promovidos pelo Estado, em um prova que lhes exigiuconhecimentos de sua matéria específica e conhecimentos sobre a Educação Brasileira. Cumpreacrescentar que conhecimentos semelhantes não são exigidos dos professores que vão ministraros cursos na Teia do Saber.

As Universidades Públicas têm grande experiência em ensino e pesquisae contam hoje com um corpo docente com uma qualificação profissional e uma titulação, na suaimensa maioria de doutores, com experiência em formação de professores, lecionando nos cursosde licenciatura. Mas como a qualificação profissional é ignorada pelo projeto Teia do Saber, asUniversidades Públicas têm sido prejudicadas na concorrência pública de prestação de serviçospara a Secretaria da Educação – nos pregões.

No entanto,como o critério para a contratação dos cursos é única eexclusivamente o preço, ignorando a qualificação profissional dos professores, as FaculdadesPrivadas têm levado vantagem de maneira expressiva nestes pregões. É sabido que graduandose mestres fazem parte do corpo docente destas Faculdades e receio que esteja havendo umainversão de valores neste processo. Sabemos as condições em que são feitos os cursos de pós-graduação e, sem ter experiência expressiva de sala de aula no ensino fundamental e médio sãocontratados para dar os cursos para um professor, concursado e com experiência profissional nomagistério. Argumenta-se nos bastidores que em muitos casos, os professores do ensinofundamental e médio têm uma qualificação profissional superior aos professores envolvidos noprojeto.

A presença dos professores do Ensino Fundamental e Médio se tornaobrigatória nestes cursos pela pontuação e premiação imposta pela Secretaria da Educação, oque não significa necessariamente tradução em ganho científico e educacional.

As Universidades Públicas e a própria Secretaria da Educação têmprofissionais qualificados e capacitados atuando nos seus quadros, nas Oficinas Pedagógicas ena Supervisão de Ensino, com formação acadêmica de graduação, de pós- graduação e comexperiência profissional de Ensino Fundamental e Ensino Médio que lhes dão um estatuto

Page 143: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

143

profissional que, com certeza, poderiam estar desenvolvendo esse trabalho de formação docentee de qualificação profissional com competência e comprometimento.

Estes cursos, da maneira como estão sendo desenvolvidos, representampara o professor do magistério público mais um elemento de sobrecarga de trabalho. As aulasdestes cursos são desenvolvidas aos sábados, ao longo de todo o ano, sobrecarregando aindamais de trabalho a jornada do professor. Para fazer estes cursos, muitas vezes os professoresprecisam viajar, uma vez que cada Diretoria de Ensino organiza um curso na cidade em que estáinstalada a Faculdade, fazendo com que todos os professores se desloquem para determinadacidade.

Estes cursos representam um grande custo para a Secretaria da EducaçãoEstadual que vai argumentar que investiu milhões de reais na formação do professor e no ensinofundamental e médio. No entanto, a forma de organização e de realização dos cursos representammais uma medida de desqualificação e de perda da identidade do professor. O texto abaixocitado, reforça esta idéia:

“As ações descentralizadas do Programa de Formação Continuada – Teia do Saber– visam proporcionar ao professor ambientes de aprendizagem que assegurem: desenvolvimentode competências que qualifiquem para o enfrentamento das contradições do cotidiano, favorecendoo processo de socialização dos alunos, a edificação de valores éticos, solidários e de respeito aooutro, que auxiliam o aluno na construção de seu projeto de vida.”

BIBLIOGRAFIA:

IMBERNÓN,F. Formação docente e profissional .São Paulo: Cortez, 2002.

TEDESCO, J.C- O novo pacto educativo. São Paulo: Ática, 1998.

MACIEL,L.S.B, NETO,S. (orgs.). Formação de professores. São Paulo: Cortez, 2004.

ANDRADE,E.R. O perfil dos professores brasileiros: o que fazem, o que pensam, o que almejam/Pesquisa Nacional Unesco- São Paulo: Moderna, 2004.

RIBEIRO,M.L. A formação política do professor de 1º e 2º graus. São Paulo: Cortez, 1984.

Page 144: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

144

Este relato de experiência propõe-se a analisar teoricamente, um projeto construídona interação de professores e alunos, junto ao Laboratório de Informática - LI - de uma escola daRede Municipal de Educação - RME - de Porto Alegre. Para tal fim, utilizaremos a teoria daabstração reflexionante de Piaget.

Vale pontuar, que a experiência utilizou-se da metodologia de Projetos deAprendizagem como descrita por Fagundes et all (1999). Nessa proposta, professores e alunosaprendem em conjunto, pois em alguns momentos o professor ensina o aluno e em outro, o alunoé professor de seu professor. A aprendizagem também se deu entre professores e pesquisadoras,pois, a análise utilizando a teoria piagetiana foi discutida conjuntamente com os professores.

A experiência concretizou-se a partir da proposta dos professores e pesquisadorasaos alunos, na elaboração de projetos de estudos em parceria com o LI da escola em quefrequentam. Os adolescentes interagiram no Laboratório de Informática durante dois meses, comfreqüência de duas vezes por semana. A proposta de trabalho, a eles sugerida, foi que a partir deum projeto de estudos na internet, construíssem páginas sobre algum local de seu interesse oucuriosidade (país, cidades, etc). Alguns locais escolhidos: China, Alemanha, Estados Unidos,Veneza, Gramado (RS - Brasil) e Porto Alegre. Em cada computador trabalharam dois ou trêsalunos com seus projetos de estudo em comum. Era desafio ao grupo a construção de umapágina na internet, contendo informações necessárias para que se algum colega fosse visitar olocal, soubesse o que iria encontrar (alimentação, moeda, vestimenta, língua, comidas, pontosturísticos, etc.)

Nesse princípio de reflexão, é relevante destacar a idéia de que entre os váriosprocessos envolvidos na trajetória da construção do conhecimento no ser humano temos o deabstração, o qual Piaget, pesquisador desses processos, chamava a atenção desde 1950. Paraesse autor há necessidade de distinguirmos uma abstração que seria reflexionante de outra,apoiada sobre os observáveis dos objetos e das ações nas suas características materiais. Buscandopreencher essa lacuna, Piaget realizou vários experimentos que deram subsídios para explorarteoricamente essa questão e produzir a obra “Abstração Reflexionante: relações lógico-aritméticase ordem das relações espaciais” (a primeira publicação dessa obra foi em 1977, mas para essetrabalho estamos utilizando um livro com edição de 1995).

A reflexão teórica sobre esse relato de experiência abordará o conceito de abstraçãoestudado por Piaget, seus diferentes tipos, o processo de reflexionamento com seus dez patamarese a criação de novidades, relacionando com as construções dos adolescentes no LI.

RELATO DE EXPERIÊNCIA: PROFESSORES E ALUNOSAPRENDENDO JUNTO AO LABORATÓRIO DE

INFORMÁTICA E O PROCESSO DE ABSTRAÇÃO

REAL, Luciane Magalhães Corte – FACED/UFRGS;PICETTI, Jaqueline Santos – UNIRRITER/UFRGS

Page 145: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

145

Conceito de Abstração: empírica, reflexionante, pseudo-empírica e refletidae a interação dos adolescentes no LI

Para iniciarmos a discussão sobre o conceito de abstração recorremos a umdicionário de filosofia que nos possibilitou a construção da seguinte definição: abstração é aoperação que isola um elemento de uma representação para considerá-lo à parte, não seencontrando separado da realidade, bem como é o processo pelo qual o espírito se desvinculadas significações familiares do vivido e do mundo das percepções para constituir conceitos(JAPIASSÚ, 2001). O termo abstração (abs + trahere) significa retirar alguma coisa de algumacoisa.

Piaget trabalhou com a abstração construtiva diferentemente da metodologia usualque utilizava a abstração indutiva. Para ele, a teoria da abstração tenta trazer para o mundo dastrocas simbólicas a teoria da equilibração. “Entendemos por isso (...) um processo (de onde otermo equilibração) que conduz de certos estados de equilíbrio aproximado a outros qualitativamentediferentes, passando por múltiplos desequilíbrios e reequilibrações” (PIAGET, 1975, p. 9, apudMONTANGERO, 1998, p. 151).

Para Piaget (1995), há dois tipos de abstração: a empírica e a reflexionante, sendoque esta envolve a abstração pseudo-empírica e a refletida.

A abstração empírica apoia-se sobre as informações dos objetos ou das açõesem suas características materiais. É a retirada das qualidades que os objetos ou as ações emsuas características materiais têm antes do sujeito agir sobre ele, isto é, os observáveis (PIAGET,1995).

A abstração reflexionante funda-se na coordenação das ações do sujeito que sãointeriores. É o processo que se apoia nos não-observáveis. Ela pode permanecer inconsciente oudar lugar a tomadas de consciência - “... significa apropriar-se dos mecanismos da própria ação,ou seja, o avanço do sujeito na direção do objeto, a possibilidade de o sujeito avançar no sentidode apreender o mundo, de construir o mundo, de transformar o mundo que está aí, se dá naprecisa medida que ele apreende a si mesmo como sujeito, que ele apreende a sua prática, a suaação” (BECKER, 2001, p. 42). Se dá primeiro pelo resultado e posteriormente pelo procedimento,isto, é, parte dos resultados para ir ao processo. A compreensão, que envolve a tomada deconsciência, se dá tardiamente em relação à ação. A ação tem êxito precoce em relação àcompreensão. A teoria da meta-cognição é a tomada de consciência, sendo a operação sobre aoperação. Cada abstração reflexionante é meta-cognição. - e conceituações variadas. Permiteconstruir estruturas novas a partir da reorganização de elementos tirados das estruturas anteriores,criar e recriar novas coordenações e acarreta mais construções de formas - “...consiste em reunirobjetos em um todo, apoiando-se sobre relações de equivalência, em função de suas qualidadescomuns, supõe a intervenção de uma abstração reflexionante...” (PIAGET, 1995, p. 276). Osujeito se apropria da forma, transformando-a em conteúdo. É a coordenação das ações comvistas a descobrir as leis dessa coordenação. - em relação aos conteúdos - consiste inicialmentenos observáveis, destacando a abstração empírica. Posteriormente, é constituído pelas formas

Page 146: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

146

tematizadas, sendo a coordenação das ações com vista a descobrir as propriedades dos objetos.“... a abstração reflexionante consiste em introduzir, em novos objetos, propriedades que eles nãopossuíam, seja porque sua reorganização consegue construir novas formas que engendram, então,novos conteúdos” (p. 286). No processo de construção das páginas para a internet, no momentoem que os adolescentes procuravam o local pesquisado na rede, liam os textos referentes a ele,capturavam as imagens e elaboravam o seu projeto, construindo novidades. Um exemplo é ogrupo que pesquisou Porto Alegre: mesmo os alunos morando nessa cidade, descobriram quehavia alguns locais históricos desconhecidos, como a Estátua do Laçador, símbolo da cidade.

Durante a experiência observamos que no momento em que os adolescentesconseguiam imaginar as conseqüências de suas ações na máquina (computador) melhoresresultados e menos equívocos obtinham na construção de suas páginas. Quanto mais a abstraçãoreflexionante conseguir prever a empiria, maior será a segurança e o sucesso do sujeito.

Foram observadas as coordenações e diferenciações (que são partes importantesda abstração reflexionante, são processos complementares e simultâneos) ao longo do trabalho,sendo possível constatar as diferenciações que os adolescentes fizeram entre continentes, países,estados e cidades. No início do processo não havia uma relação de inclusão.

A abstração reflexionante conduz a generalizações construtivas - apoia-se sobreas operações do sujeito ou seus produtos. É de natureza compreensiva e extensiva e produznovas formas e por vezes novos conteúdos, ou seja, novas organizações estruturais. Pode conduzirà elaboração de estruturas mais ricas, mas de extensão restrita, podendo-se falar em “generalizaçãoespecializante”. O ponte de partida é a dificuldade de uma assimilação particular e o ponto dechegada é o que era obstáculo à assimilação se torna uma transformação interna do esquemaampliado, mas com diferenciação do esquema inicial em sub-sistemas e com integração destesnum sistema total que os coordena. Elabora uma enorme riqueza de sistemas, manifestando-seem compreensão, pois as estruturas de ordem superior apresentarão propriedades novas (PIAGET,1978). Já, a abstração empírica, apresenta generalizações indutivas - parte dos observáveis dosobjetos e se detém nesses para verificar a validade de relações observadas, para estabelecer seugrau de generalidade e tirar daí previsões ulteriores. É de natureza extensiva e generaliza de“alguns” para “todos” os fatos ou relações constatados, ou melhor, os observáveis a títulos deconteúdos destas constatações. Limita-se a assimilação dos conteúdos sem engendrá-los (PIAGET,1978). Essas duas abstrações existem em todos os níveis de desenvolvimento. A abstraçãoreflexionante participa da coordenação das ações, por isso, da assimilação recíproca dos esquemas“Assimilação não reduz (...) a uma simples identificação, mas é construção de estruturas aomesmo tempo que incorporação de coisas a essas estruturas” (PIAGET, 1936, p. 364, apudMONTANGERO, 1998, p. 115). “Um esquema é a estrutura ou a organização das ações, taiscomo elas se transferem ou se generalizam por ocasião da repetição dessa ação e dascircunstâncias semelhantes ou análogas” (PIAGET, 1966, p. 11, apud MONTANGERO, 1998, p.166). Ao incorporarmos elementos novos nos esquemas anteriores, há uma modificação dessesúltimos para ajustá-los aos novos dados.

Page 147: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

147

A abstração pseudo-empírica é a que ocorre quando o objeto é modificado pelasações do sujeito e enriquecido por propriedades tiradas de suas coordenações.

Podemos dizer que: “...ao agir sobre o objeto e sobre seus observáveis atuais,como na abstração empírica, as constatações atingem, de fato os produtos da coordenação dasações do sujeito: trata-se, pois, de um caso particular de abstração reflexionante e, de nenhummodo, de uma decorrência da abstração empírica” (PIAGET, 1995, p. 274).

Esse falso empírico é reflexionante, pois retira do objeto o que não está lá. Essaabstração “...serve (...) de suporte e de auxiliar essenciais às abstrações reflexionante” (PIAGET,1995, p. 277).

A abstração refletida é uma forma superior de abstração que procede de umprocesso de abstração reflexionante a partir da reflexão sobre as reflexões particulares. É o processode tornar consciente o resultado de uma abstração reflexionante. No decorrer do trabalho, inúmerasvezes os alunos foram questionados sobre a construção dos projetos de estudo, bem como desuas páginas e no final foram indagados sobre o sentido de tudo o que foi realizado para o seuprocesso de desenvolvimento. De alguma forma, os desafiamos na direção da abstração refletida,pois eram maneiras de tornar consciente a coordenação das ações que eles haviam realizado.Alguns exemplos nas falas dos alunos “Tive que organizar tudo e pensar o que ia fazer. Aprendisobre tudo, tanto da liberdade de escolha quanto sobre meu país (Rússia)”. “Foi bom paraaprendermos a ter nossas próprias idéias...”.

Prosseguindo o estudo sobre o tema, podemos dizer que a abstração refletidapermanece em retardo em relação à abstração reflexionante, mas há um momento em que ela setorna o instrumento necessário das reflexões. É um ato mental de reconstrução e reorganizaçãosobre o patamar superior daquilo que foi assim transferido do inferior, permite a formação de umameta-reflexão - reflexão da reflexão - e torna possível a constituição de sistemas lógico-matemáticosde cunho científico. Assim, essa abstração localiza-se nos diferentes patamares de reflexionamento- projeção para um patamar superior do que foi tirado do inferior - e esses dão lugar a possibilidadede novas reflexões (PIAGET, 1995).

PROCESSO DE REFLEXIONAMENTO

Cada reflexão supõe a formação de um patamar superior de reflexionamento nosujeito. O que estava no patamar inferior torna-se objeto de pensamento e é tematizado. Novospatamares de “reflexionamento” constroem-se para permitir novas “reflexões”. A reflexão conduz ojogo em relação aos reflexionamentos e se reduz as tematizações (operações que se tornamobjetos de pensamento), sendo que nos níveis inferiores, são os reflexionamentos que constituemo motor essencial. A união da reflexão e do reflexionamento é formadora de patamares sucessivose cada patamar novo comporta uma diferença de grau e qualitativa (PIAGET, 1995). Podemosrealcionar essas questões com as falas dos adolescentes na avaliação da proposta: “As coisasque eu não conhecia sobre o Rio Grande do Sul eu conheci.” “Fazendo alguma coisa que se tem

Page 148: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

148

curiosidade a gente acaba aprendendo e também vendo que há coisas que pensamos sabertudo e acabamos mudando nosso jeito de pensar.”

O processo de reflexionamento consiste em tirar algo de um patamar e mandarpara um patamar superior. Esse processo apresenta cinco patamares, os quais presenciamosalguns nessa experiência com adolescentes: o primeiro deles é o mais elementar e conduz dasações sucessivas à sua representação atual. O segundo é o da reconstituição, com ou semnarrativa, da seqüência das ações, do início até o término. É o processo de reunir as representaçõesnum todo coordenado. O terceiro é o das comparações, em que a ação, reconstituída, é comparadaa outras que são análogas ou diferentes. Esse patamar foi observado na construção das páginaspara serem linkadas, pois a cada nova construção, comparações eram estabelecidas com a anterior.As comparações, na vida comum, podem ser espontâneas, e muitas pessoas as fazem por sipróprias. A partir do momento que essas comparações passam a ser destacadas, começa opróximo patamar. No quarto, surgem novos patamares de reflexionamento, caracterizados porreflexões sobre as reflexões precedentes e chegando a vários graus de meta-reflexão, permitindoà pessoa encontrar as razões da conexão. Acreditamos que os adolescentes, no decorrer dotrabalho, chegaram a esse patamar, pois podemos observar um aprimoramento das suascomparações e reflexões, assim como trabalharam mais de uma variável. Por último encontramoso patamar em que as reflexões são elevadas à Segunda e à enésima potência, tornando essenciala própria reflexão por oposição ao reflexionamento (PIAGET, 1995).

Quanto à narrativa, mencionada no segundo patamar, é importante destacarmosque ela constitui o fazer em pensamento e implica a abstração reflexionante, supondo uma ordemreconstituída.

A Criação e a Fonte de Novidades: os dez patamares do reflexionamentoO processo de abstração reflexionante gera um movimento de criação de novidades

que é próprio da reflexão: “...todo novo reflexionamento exige uma reconstrução sobre o patamarsuperior daquilo que fora dado no precedente” (PIAGET, 1995, p. 278). Este enriquecimentoprogressivo e a criação de novidades podem ser organizados a partir de dez patamares dereflexionamento que também foram constatados no trabalho com os adolescentes em questão:

1. O primeiro resultado da abstração reflexionante ocorre por diferenciação deum esquema de coordenação e sua aplicação de maneira nova.

2. O reflexionamento pode produzir um novo morfismo ou uma correspondênciaentre a coordenação conceptualizada e as situações práticas (PIAGET, 1995). A ordem da narraçãonão corresponde automaticamente à das ações descritas. A reconstituição que a narração exigeacarreta um esforço, uma construção, em parte nova. Observamos essa reconstituição no momentoem que cada grupo apresentava, ao final de cada aula, aos demais o seu trabalho realizado. Talfato possibilitou, algumas vezes, que os alunos tomassem consciência de suas construções: -Nossa eu não tinha percebido como o meu grupo evoluiu no trabalho hoje! (fala de um aluno).

3. As estruturas desse nível, assim como dos outros, são retiradas de umpatamar superior aos anteriores. Há o estabelecimento de implicações significantes entre doisesquemas.

Page 149: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

149

4. “...a conceitualização consciente das coordenações em jogo provocacomparações com outras coordenações análogas...” (PIAGET, 1995, p. 280). As narrações,primeiramente, ocorrem em relação às diferenças de conteúdo, depois, estabelece correspondênciaentre as ações e, mais tardiamente, centra-se nas analogias de estrutura. A multiplicidade e alentidão de sucessão dessas etapas nos mostra a realidade operativa e a construtividade daabstração reflexionante o que ocasiona a chegada tardia às abstrações refletidas, necessárias atais comparações (PIAGET, 1995).

5. As comparações conduzem, em certos casos, à abstração de estruturasqualitativas comuns, bastante gerais, servindo à solução de uma variedade de problemas.

6. É a etapa que assinala a generalização da negações ou inversões. A negaçãorequer uma construção nova, extraída por abstração reflexionante das relações qualitativas dasdiferenças.

7. A construção, por abstração, da negação, conduz a uma nova etapa deconstrutividade que é a quantificação das extensões e a reversibilidade.

8. Nesse momento, a abstração refletida que encontrava-se em atraso emrelação à ação dos processos reflexionantes, passa a se juntar a eles e a servir de ponto de partidaou de trampolim para novas construções (PIAGET, 1995).

9. Uma vez formadas as estruturas operatórias, tornam possíveis reflexõessobre as reflexões anteriores, começando uma meta-reflexão.

10. Nesse momento, há a capacidade de depreender as “razões” dascoordenações e da criação de teorias.

A fonte de novidades encontra-se na necessidade de um equilíbrio entre os processosde assimilação e acomodação, exigindo, assim, o conhecimento, uma alimentação renovada dosesquemas. Consiste num estado de constantes trocas, preservando a conservação do sistema,enquanto ciclo de ações ou de operações interdependentes (PIAGET, 1995).

São necessárias três condições para que a equilibração aconteça:“1) Uma capacidade durável de acomodação dos esquemas aos objetos (...) que

conduz a uma diferenciação progressiva desses esquemas, diferenciação que enriquece, e,simultaneamente, conserva, seu estado anterior, sem perdas, nem produção de esquemasradicalmente novos. 2) Uma assimilação recíproca dos esquemas em subsistemas, e destesentre si, que atinge coordenações tais, que se conservam, enriquecendo-se mutuamente. 3) Umaintegração de subsistemas em totalidades caracterizadas por suas leis de composição, comconservação destes subsistemas, à medida que suas propriedades diferenciadas podem serreconstruídas, a partir do sistema total” (PIAGET, 1995, p. 283).

As estruturas, equilibradas, comportam uma compensação entre afirmações enegações. A transposição de uma estrutura de um patamar inferior a um superior de reflexionamentoé fonte de múltiplos desequilíbrios, decorrendo daí necessidade de novas acomodações eassimilações (PIAGET, 1995).

Percebemos a partir dessa experiência que a própria tecnologia provoca inúmerosdesequilíbrios nos alunos e professores, um exemplo foi com a utilização do Open Office Writter

Page 150: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

150

(LINUX) e sua relação na construção da escrita. Para os alunos, ao escreverem nesse programapara guardarem algumas informações que seriam futuramente colocadas em suas páginas, tinhamsua escrita questionada através da marcação das palavras escritas com erros ortográficos,desafiando-os a corrigí-las. Aos professores, este novo recurso da informática juntamente com osProjetos de Aprendizagem, abriu possibilidades para pensar um outro tipo de aula, mais dinâmicae que venha ao encontro das necessidades e desejos dos alunos.

Os processos de desequilíbrio envolvem três principais características: “1) conflitosentre o sujeito e os objetos (...); 2) conflitos entre subsistemas (...); 3) desequilíbrio entre adiferenciação e a integração...” (PIAGET, 1995, p. 283).

As novidades, provindas da abstração reflexionante, possuem sua origem noprocesso de desequilíbrio. As novidades consistem na realização de possibilidades abertas pelasconstruções do nível precedente (PIAGET, 1995).

Ao finalizarmos esse trabalho, percebemos o quanto são importantes os estudosde Piaget relativos ao processo de abstração para refletirmos teoricamente sobre a interação dosalunos com tecnologias da informação e comunicação e quanto a metodologia de Projetos deAprendizagem possibilita uma melhor relação entre professores e alunos (propondo aprendizagementre ambos). Essa teoria nos possibilita sairmos de um paradigma de repetição (copia e cola),para um de construção e criação de novidades. Consideramos essa experiência como formaçãode professores em serviço, uma formação que incluiu uma nova relação professor-aluno, umametodologia diferente de trabalho (Projetos de Aprendizagem) e novos recursos a serem utilizados(informática e internet).

BIBLIOGRAFIA

BECKER, Fernando. Educação e Construção do Conhecimento. Porto Alegre: Artmed, 2001.

FAGUNDES, Lea et all. Aprendizes do futuro: as inovações começaram. MEC, 1999.

JAPIASSÚ, Hilton & MARCONDES, Danilo. Dicionário Básico de Filosofia. Rio de Janeiro: JorgeZahar Editor, 2001.

MONTANGERO, Jacques & NAVILLE, Danielle. Piaget ou a Inteligência em Evolução. PortoAlegre: Artmed, 1998.

PIAGET, Jean. Abstração Reflexionante: relações lógico-aritméticas e ordem das relações espaciais.Porto Alegre: Artmed, 1995.

______. Recherches sur la Généralisation. Paris: Presses Universitaries de France, 1978. (Traduçãode Fernando Becker e revisão de Rosângela de Almeida: Porto Alegre, maio de 1991).

Page 151: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

151

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE A PESQUISA

A atual Lei de Diretrizes e Bases Nacionais – LDB 9394/96 (Brasil, 1996), trazmudanças significativas quanto à educação básica. Integra a Educação Infantil, o EnsinoFundamental e o Ensino Médio e apresenta um conjunto de definições políticas que orienta oatual sistema educacional brasileiro, buscando relacionar a educação com as necessidadesprofissionais e sociais do homem no mundo moderno.

A referida LDB trata a educação de forma abrangente tanto no que se refere àsconcepções, quanto às alternativas organizacionais. O foco educacional está centrado emcompetências a serem construídas durante a escolaridade básica, modificando o paradigmacurricular existente que se funda numa educação descontextualizada e compartimentada valorizandoo acúmulo de informações.

Esta LDB demonstra preocupações no sentido de que a educação não seja somenteum processo de ensino e nem uma justa posição de etapas fragmentadas, mas dirigida à formaçãohumana numa perspectiva de continuidade articulada entre os diferentes níveis de educação,possibilitando um conjunto de aprendizagens e desenvolvimento de capacidades que todo cidadãotem direito de ter ao longo da sua vida, com intervenção escolar (BRASIL, 2001).

Um dos seus principais objetivos é a vinculação da educação ao trabalho e à práticasocial, pois ambos fazem parte da vida de qualquer indivíduo. Este novo cenário exige odesenvolvimento de um novo perfil de conhecimento e de modelo profissional. Neste sentido, dosnoventa e dois artigos da LDB, seis deles destinam-se à formação profissional dos professores edentre eles, o artigo 61 trata da formação dos professores baseada nos fundamentos da “associaçãoentre a teoria e a prática”, pois só se aprende realmente quando os conceitos aprendidos naescola estão relacionados com os da sua vida real.

Atendendo os pressupostos básicos desta LDB, o Ministério da Educaçãojuntamente com os importantes membros da área educacional do país, elaboram propostascurriculares educacionais e novas diretrizes curriculares para a formação dos profissionais daeducação.

Os princípios orientadores das propostas educacionais para a escolarização básicaencontram-se nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN’s – para o Ensino Fundamental(1997) e para o Ensino Médio (1999). Tais propostas têm como meta oferecer aos nossos jovensum ensino de qualidade, buscando desenvolvimento cognitivo, afetivo e social.

TEMAS TRANSVERSAIS X CONCEITOSMATEMÁTICOS: RESULTADOS DE UM

EXPERIMENTO EM SALA DE AULA

BRIGHENTI, Maria José Lourenção; ROMANINI, Greici Elem B. Rodrigues (USC - Bauru)

Page 152: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

152

O termo “parâmetro” indica a possibilidade de se construir referências comuns naeducação, respeitando as diferenças regionais, culturais, políticas existentes no país. Este termo,segundo Aurélio (1995, p. 482), representa “todo elemento cuja variação de valor modifica asolução de um problema sem lhe modificar a natureza”.

O termo “curriculares” vem de currículo que, pedagogicamente, possui diferentessignificados, mas a concepção aqui adotada, será a de análise curricular como uma expressão deprincípios e metas do projeto educativo que necessita ser flexível, promovendo discussões e re-elaborações dos procedimentos realizados em sala de aula.

Quanto à abrangência “nacional”, a intenção é a de criar condições na escola paraque se discutam formas de garantir, a toda criança ou jovem brasileiro, o acesso ao conjunto deconhecimentos socialmente elaborados e necessários para o exercício da cidadania.

As áreas contempladas pelos PCN’s são: Português, Matemática, Ciências Naturais,História, Geografia, Língua Estrangeira, Educação Física e Arte. Especificamente no que se refereà Matemática, na primeira parte dos PCN’s (1997), além de trazer seus princípios norteadores; atrajetória e a análise das características da Matemática e do papel que ela desempenha no currículoescolar discutem a necessidade de refletir sobre o papel desta área de conhecimento na formaçãodo cidadão brasileiro e a sua relação com os temas transversais.

A inclusão dos chamados Temas Transversais, na escola poderá orientar seusalunos para viver melhor em sociedade, discutindo e resgatando a dignidade da pessoa humana,a igualdade de direitos, a participação ativa do indivíduo na sociedade e a sua co-responsabilidadepela vida social.

Os temas transversais podem ser trabalhados de forma interdisciplinar, não comoassunto específico, mas permeando o tema que está sendo o desenvolvimento. Devem serincluídos no processo de aprendizagem com o objetivo de construir a cidadania a partir de conteúdose ações vinculadas com o cotidiano do aluno e aos interesses da maioria da população.

Para o Ensino Fundamental, os PCN’s (1997) almejam que o aprendiz saiba exercitara cidadania, preservando e transformando o meio ambiente; valorizar o patrimônio sócio-culturalbrasileiro; desenvolver capacidades cognitivas, físicas e afetivas; cuidar do próprio corpo valorizandoe adotando hábitos saudáveis para ter qualidade de vida, agindo com responsabilidade com suasaúde e com a saúde da comunidade onde vive.

Essa almejada formação geral dos indivíduos, somente será alcançada se asinstituições formadoras de professores estiverem proporcionando aos licenciandos reflexões sobreos anseios educacionais; proporcionarem comparações com as práticas que vêm sendo realizadasem nossas salas de aula; inserirem os futuros professores em reais situações do cotidiano escolare proporcionarem conhecimento tecnológico e científico atual.

O quadro educacional atual, esboçado acima, tem trazido angústias aos professoresem exercício e, também, tem provocado alterações nas aulas de Prática de Ensino nos cursos deformação de professores. Os professores sentem-se despreparados para desenvolver ações,segundo as propostas apresentadas nos PCN’s, e até dificuldades de realizarem atividadesinterdisciplinares utilizando os Temas Transversais. Surgem dúvidas como:

Page 153: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

153

- Qual a importância dos temas transversais para a formação do aluno doEnsino Fundamental e do futuro professor?

- Quais os verdadeiros objetivos dos PCN’s?- Como integrar conteúdos matemáticos com os temas transversais?- Como a Matemática poderá interferir para o desenvolvimento da cidadania?Pensando nessas situações, desenvolveu-se a pesquisa aqui descrita que além de

incentivar o licenciando a pesquisar sobre a literatura pertinente às mudanças do paradigmaeducacional vigente, planejando e vivenciando ações pedagógicas diferenciadas, teve como metadesenvolver atividades que propiciasse ao aluno de 5ª série do Ensino Fundamental de umaescola pública de Itápolis, o aprendizado de conceitos matemáticos, enquanto trabalhava com osTemas Transversais.

2. Temas transversais e o uso da transversalidadeOs educadores não podem mais ver a escola como um ambiente isolado da

sociedade. É preciso adaptar à realidade, trabalhando com questões que interferem na vida doseducandos e da própria sociedade onde a escola está inserida.

... a escola não é uma ilha de ensino e está inserida em determinada comunidade,com seus conflitos, aflições e alegrias, o professor deve criar espaços para que as crianças eadolescentes discutam e opinem sobre tais fatos. É essa, justamente, a proposta dos temastransversais (Revista Nova Escola, p. 4).

Pensando nessa questão, foram integrados às propostas dos PCN’s os temas como:ética, saúde, meio ambiente, pluralidade cultural, orientação sexual e trabalho e consumo, quenão constituem uma nova área de conhecimento, mas um conjunto de temas atuais que envolvemproblemáticas sociais e que podem permear a concepção de diferentes áreas, seus objetivos,conteúdos e orientações didáticas.

Os Temas Transversais não são novos conteúdos para serem desenvolvidos emsala de aula aumentando ainda mais os conceitos já existentes, sobrecarregando os programas edificultando a tarefa do corpo docente. Devem ser trabalhados perpassando, transversalmente,outros conceitos mais específicos, girando em torno da temática das áreas curriculares, atingindoas finalidades educacionais.

A inclusão dos Temas Transversais no processo educativo tem provocado diferentesconcepções por parte dos educadores. Monteiro e Pompeu (2003) vêem as disciplinas tradicionaiscomo o eixo vertebral do sistema educacional e os temas transversais devem ser articulados àsdisciplinas.

Antagonicamente, para a pedagoga Montserrat Moreno (2000) o eixo vertebral doprocesso educativo deve ser a temática social, enquanto que as disciplinas tradicionais devemperpassar as questões mais abrangentes, transversalmente. Acredita que ao trabalhar com osaspectos sociais, cria-se um ambiente pedagógico muito mais rico para capacitar os estudantes aentender e a participar criticamente do mundo onde vive e da sociedade à qual pertence, afirma:

Page 154: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

154

...”as matérias curriculares são instrumentos através dos quais pretende-sedesenvolver a capacidade de pensar e de compreender e manejar adequadamente o mundo quenos rodeia [...] Sem um contexto para situá-los, para grande parte dos estudantes, os conteúdoscurriculares transformam-se em algo absolutamente carente de interesse ou totalmenteincompreensível.” (IN: BUSQUETS, 2000, p. 36).

Para Busquets (2000), introduzir no ensino preocupações direcionadas aosproblemas da sociedade atual não significa manejar matérias curriculares para antes ou depois dealguns tópicos estipulados, mas possibilitar ao aluno o contato com os temas transversais enquantose aprende ou discute outros conteúdos mais específicos.

A sociedade contemporânea enquanto valoriza a ciência clássica, também necessitaformar pessoas autônomas e críticas, capazes de respeitar a opinião dos demais e de defender osseus direitos.

Dessa forma, os Temas Transversais destinam-se a superar alguns conceitostradicionais da nossa educação, facilitando ao aluno os primeiros contatos com questões atuaisque aproximam os conteúdos curriculares da realidade do aluno.

Saber utilizar tais temas enquanto desenvolve conteúdos programáticos na escola,não tem sido fácil para os educadores. Pensando nisso, as atividades aqui descritas tiveram porobjetivo sugerir ações que possibilitassem trabalhar com esses temas, enfatizando o Meio Ambiente,com a finalidade de possibilitar aos alunos, não apenas no aprendizado de operações matemáticas,mas de utilizá-las em situações cotidianas, estimulando e facilitando a sua criatividade e reflexão,desenvolvendo a consciência individual e coletiva. Falar do Meio Ambiente resulta,conseqüentemente, no resgate de outros valores, como: ética e a tomada da consciência sociallidando com o consumo desenfreado e com o desrespeito à natureza e ao próprio ser humano.

3. METODOLOGIA E MÉTODOS

Atentando os objetivos relacionados aos conceitos matemáticos para o EnsinoFundamental, procuramos relacionar as ações realizadas nesta pesquisa com as questõesambientais, promovendo discussões e despertando o senso crítico e criativo dos alunos.

Este estudo foi de caráter qualitativo, pois teve o pesquisador como seu principalinstrumento; seus dados foram descritivos; preocupou-se com o processo e não com o produto. Aanálise dos dados realizou-se por um processo indutivo, fundamentado em dados obtidos nasobservações realizadas pelo pesquisador no seu trabalho de campo (LUDKE & ANDRÉ, 1986).

Segundo D’Ambrosio (1997), trabalhando com a pesquisa qualitativa, o professorse atualiza, aprimora seus métodos de pesquisas, pois se preocupa com a coleta de dados emdiferentes situações utilizando-se de entrevistas, de observações ou de questionários e com adescrição do processo e com a reconstrução de cenários culturais.

As ações em sala de aula iniciaram pela leitura e reflexão do texto “Consumodoméstico no Brasil”, que tratava do consumo/ desperdício, seguidas da exibição do filme “Ilha

Page 155: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

155

das Flores”, que expressa a realidade brasileira (a miséria gerada pela desigualdade social, pelamá distribuição de renda e pelo descaso dos governantes).

As discussões levaram aos alunos refletirem sobre as possíveis intervenções daescola para modificar situações parecidas do nosso cotidiano.São elas: ações para a preservar anatureza; reflexões sobre o consumo e o desperdício, controle de gastos.

Numa das etapas, os alunos realizaram uma pesquisa sobre a história da cidadede Itápolis, com a intenção comparar as condições do local com as condições do filme Ilha dasFlores. Durante leituras de textos, as discussões e as ações realizadas, os alunos trabalhavam, aomesmo tempo, com algum dos Temas Transversais, também utilizavam com conceitosmatemáticos: números decimais, transformações de unidades, leituras e construções de tabelase gráficos de barras.

Após todo esse trabalho metodológico em sala de aula, a pesquisa foi finalizadacom uma visita ao Aterro Sanitário da cidade de Itápolis, atividade esta que permitiu que apesquisadora colher depoimentos significativos dos alunos sobre as impressões do local e sobreas suas expectativas quanto à futura preservação do meio ambiente. Esta visita possibilitou ainda,um rico material confeccionado pelos alunos em forma de cartazes, sobre problemas do lixodoméstico e sobre os cuidados necessários para o meio ambiente.

1.1 ATIVIDADES DESENVOLVIDAS

1ª Trabalhar com o texto “Consumo doméstico no Brasil”, retirado do jornal Folhade São Paulo, iniciando a discussão entre consumo/ desperdício e o conceito de números decimais(leitura, escrita, comparações).

2ª Exibição do filme “Ilha das Flores”: discussões e reflexões sobre o tema.3ª Dividir a classe em 5 grupos e programar um debate, para que cada grupo

relacione o filme com o tema proposto na primeira atividade. Incentivar os alunos a organizar umacampanha contra o lixo, alertando e informando os outros alunos da escola.

4ª Promover uma campanha de coleta de lixo na escola. Para isso cada grupo seencarregará de:Divulgação: divulgar e incentivar a campanha, utilizando-se de cartazes, panfletos,etc.Organização: organizar os cestos para coletar o lixo na escola. Fiscalização: fiscalizar a adesãoe o empenho de todos os alunos em relação à campanha.

5ª Propor aos grupos fazer um levantamento dos alunos que freqüentam a cantinada escola, organizando uma tabela e construindo um gráfico de colunas com os dados. Emseguida, construir um segundo gráfico de colunas envolvendo o número de alunos e o valor gasto.

6ª Cada grupo pesquisará quantos alunos consomem a merenda diariamente;qual é o dia em que o consumo é maior; a existência de desperdício de comida; que fim tem acomida desperdiçada.

7ª Visita ao aterro sanitário da cidade registrando as ações vivenciadas (fazendoredações, fotografando a experiência), para realizar uma exposição em murais.

Page 156: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

156

8ª Para cada texto trabalhado em sala de aula envolvendo a questão do lixo nomeio ambiente, propor atividades matemáticas que desenvolvam o conceito de números decimais.

No final de cada atividade, a pesquisadora realizou um relatório detalhado contendoas ações desenvolvidas, o registro das reações, as dificuldades, as facilidades dos alunos durantetodo o processo. O relato foi fiscalizado com uma análise qualitativa dos resultados dessaintervenção.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

A investigação histórica do município de Itápolis, realizada pelos alunos, possibilitou-lhes o contato com conceitos de diferentes áreas, além dos aspectos relacionados com o meioambiente que pretendiam investigar. Conheceram dados sobre a fundação da cidade; sua áreaterritorial; sua população; produção agrícola; suas indústrias e, ainda, as preocupações dosgovernantes quanto à preservação do meio ambiente.

Os alunos constataram que, o lixo, é um problema crônico e já acarretou problemasà população e ao meio ambiente como: a poluição do Rio São Lourenço e a pelo fato do aterrosanitário estar próximo à cidade, o aumentando a presença de insetos e animais roedores, que aadministração municipal vem tomando algumas precauções como: dedetizar o local onde o lixo édepositado e, posteriormente, enterrado; a pretensão de ampliar a usina de compostagem do lixo;a existência de estudos e entendimentos com lideranças políticas dos municípios vizinhos etambém com a iniciativa privada, para se estabelecer um consórcio que viabilize o projeto.

Esta pesquisa realizada pelos alunos, acrescida das discussões sobre o filme “Ilhadas flores”, possibilitou conclusões importantes sobre as condições sociais e de aprendizagem,pois apontaram dois conceitos que interferem na melhoria da vida em sociedade: a desigualdadesocial e a poluição. Paralelamente, os conceitos matemáticos estiveram sempre presentes, comalguns cálculos e comparações, ao estimar: populações futuras; o aumento do lixo na cidade.

Surpresos com os cálculos, os alunos chegaram a conclusão de que enquanto nãoforem tomadas decisões políticas, cabe a cada um de nós, a preservação do meio ambiente.Neste sentido, chegaram a discutir o quanto a população poderia poupar com o re-aproveitamentode materiais como: papel, plásticos, metais e vidros.

A discussão sobre esses materiais levaram à conceitos como: fabricação,industrialização, matéria prima, reciclagem, produção de embalagens, poluição, matérias-primasameaçadas de esgotamento, economia de energia elétrica, extração mineral, além de trabalharemcom conceitos matemáticos como: transformação de unidades (quilogramas em tonelada ou comoutras unidades), porcentagem escritas em fração ou em número decimal, etc.

Para reforçar ainda mais os conceitos relacionados ao meio ambiente, sempreutilizando conceitos matemáticos, os alunos ainda realizaram:

· Campanha do Lixo – intitulada “Mandamentos do consumidor ecológico”,que serviu como modelo informativo para ser entregue aos outros estudantes e professores;

Page 157: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

157

· Estudo da freqüência dos seus alunos à cantina da escola e em relação aoconsumo de merenda, organizando os dados em tabelas e gráficos de colunas;

· Visita ao aterro sanitário, com o acompanhamento de todo o processorealizado com o lixo;

· Confecção de cartazes sobre o meio ambiente, realizando uma exposiçãono pátio da escola com a intenção de chamar a tenção dos seus colegas para o problema.

Após a visita realizada ao aterro sanitário, os alunos bastante preocupados comquantidade de lixo e com a falta de conscientização e responsabilidade da sociedade, resolveramtrabalhar com a conscientização das pessoas sobre o problema e sobre a importância dapreservação da natureza. Sugeriram conversas familiares ou com amigos, pedindo a separaçãodo lixo doméstico.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

No desenvolvimento desta pesquisa, a pesquisadora sempre teve o objetivo aconhecer, na teoria e na prática, os novos anseios educacionais relacionados à Matemática e aosTemas Transversais, e vivenciar ações metodológicas diferenciadas, com o intuito de colaborarcom a sua formação, enquanto pesquisadora, e com os alunos da escola pública, como cidadãos.

Com este objetivo, conseguiu-se realizar atividades envolvendo vários conceitosmatemáticos como: números decimais, porcentagens, transformações de unidades, bem comoconstrução de tabelas e gráficos de barras, contextualizados em diferentes questões referentes aomeio ambiente.

As ações realizadas possibilitaram aos alunos expressar suas idéias de váriasmaneiras: nos debates e reflexões; nas confecções de cartazes; nas realizações de exercícios;fatos estes que colaboraram para aumentar a auto-estima.

Foi possível perceber que trabalhar com conceitos matemáticos relacionados aosTemas Transversais contribui para que os conteúdos matemáticos deixem de ser limitados a umaexploração simplesmente acadêmica, de forma isolada, sem qualquer conexão entre seus próprioscampos ou com outras áreas do conhecimento.

Acompanhar as novas propostas e mudanças educacionais requer que o professorseja um pesquisador. Não é tarefa fácil, porém, necessária para que a escola possa preparar asua clientela para a cidadania.

Sem dúvida, esta pesquisa permitiu o amadurecimento da pesquisadora e dosalunos da 5ª série. Da pesquisadora, por conseguir desenvolver ações que relacionassem conceitosmatemáticos, temas transversais e o cotidiano do aluno, atendendo um dos princípios dos PCN’spara a área da Matemática: a atividade matemática escolar não é “olhar para coisas prontas edefinitivas”, mas a construção e a apropriação de um conhecimento pelo aluno, que o ajudarácompreender e transformar sua realidade.

Page 158: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

158

Dos alunos, pois as ações realizadas permitiram a construção de conceitos,desenvolver a auto-estima e a perseverança na busca de soluções, interagir de forma coletiva nadiscussão de um assunto, respeitando o modo de pensar dos colegas e aprendendo com eles.

Como educadores não podemos parar no tempo. É preciso buscar conhecimentosadequados aos procedimentos de sala de aula ao mundo real. Esta é uma tarefa árdua, porém,necessária para que a educação não fique estagnada e nem ultrapassada. Neste sentido, Monteiroe Pompeu (2003, p.15), destacando as palavras de D’Ambrósio reforçam essa idéia: “Os professoresatuais têm pela frente um grande desafio: educados num processo fragmentado, terão de superaros limites que essa formação lhes impõe e extrapolar as fronteiras de conteúdos vistos de formaparcial e a-histórica”.

6. REFERÊNCIAS

BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais. Secretariade Educação Fundamental - Brasília: MEC/SEF, 1997.

______. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. ParâmetrosCurriculares Nacionais Ensino Médio: Bases Legais/ Ministério da Educação, vol. 1 Brasília:Ministério da Educação/ Secretaria da Educação Média e Tecnológica, 1999.

______. Ministério da Educação. Proposta de Diretrizes para a formação inicial de professores daEducação Básica, em Cursos de nível Superior. Brasília: MEC, maio de 2001.

BUSQUETS, Maria Dolors et al. Temas transversais em educação: bases para uma formaçãointegral. São Paulo: Ática, 2000.

CANDAU, Vera Maria e outros. Sou criança tenho direitos. Rio de Janeiro: Vozes, 1999.

CUBA, Thaís. Pode protestar, o direito é seu. O Estado de São Paulo, 15 de novembro de1997. Estadinho.

D’AMBROSIO, U. Educação Matemática: da teoria à pratica. Campinas: Papirus, 1997.

DANTE, Luiz Roberto. Matemática. São Paulo: Ática, 2002. Volume 5.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. 2. ed. Rio deJaneiro: Fronteira, 1986.

FERRÉS, Joan. Vídeo e educação. São Paulo: Artes Médicas, 1996.

Ilha das Flores. Roteiro de Jorge Furtado. Casa de Cinema de Porto Alegre. Porto Alegre, RS,1989.

JAGGI, Marlene. A culpa também é da gente. O Estado de São Paulo, 26 de maio de 1991.Estadinho.

LUDKE &ANDRÉ. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.

MONTEIRO, Alexandrina e POMPEU, Geraldo Jr. A Matemática e os temas transversais. EditoraModerna. São Paulo, 2003.

Page 159: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

159

MOREIRA, Roberto et al. Estrutura e funcionamento da educação básica. Cap. 7: a estruturadidática da educação básica. São Paulo: Pioneira, 1998.

PIRES, C.M.C. Currículos de matemática: da organização linear à idéia de rede. São Paulo:FTD, 2000.

Revista Nova Escola. PCNs fáceis de entender. Edição Especial de 1ª a 4ª séries e edição de 5ªa 8ª séries. Editora Abril.

RESOLUÇÃO CNE/CP 1.– Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores daEducação Básica, em nível superior, curso de Licenciatura de graduação plena, 18/02/2002.

Page 160: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

160

INTRODUÇÃO

A Rede Nacional de Formação Continuada, um programa vinculado ao MEC/SEB,tem por objetivo a constituição de centros de pesquisa e desenvolvimento, visando promover aformação permanente de professores e a implantação de novas tecnologias de ensino, onde osmateriais didáticos estarão acessíveis para Estados e Municípios interessados, abarcando atividadespresenciais, semi-presenciais ou a distância.

Essa Rede é formada por Universidades de todo o país (14 Estados ao todo,totalizando 20 centros), distribuídas em cinco áreas: Alfabetização e Linguagem; EducaçãoMatemática e Científica; Ensino de Ciências Humanas e Sociais; Arte e Educação Física e,Gestão e Avaliação da Educação.

A UNESP vê-se inserida na área de educação matemática e científica, onde seformou então, o CECEMCA – Centro de Educação Continuada em Educação Matemática, Científicae Ambiental, que conta com a atuação de vários campus, entre docentes, alunos de graduação epós-graduação.

Em Rio Claro, existem 7 módulos que contemplam a temática científica e ambiental- A Entomologia e a Óptica aplicada à Educação Ambiental; A terra em que vivemos; ÁreasVerdes; Cartografia Aplicada aos Estudos do Meio Ambiente; Fauna; O Conhecimento Indígena eo Respeito à Natureza: Bases para a Educação Ambiental.

Além, há o Módulo Consumo Sustentável/ Consumo Responsável: desenvolvimento,cidadania e meio ambiente, coordenado pela Profª Drª Silvia Aparecida Guarnieri Ortigoza, queteve a tarefa de transformar o material já editado para o formato não presencial, ou seja, para aeducação à distância, numa forma de aplicação inicial – um projeto piloto, solicitado pelo MEC.

Dessa forma, todo o material anteriormente preparado foi devidamente transformadopara atuar aos moldes da rede mundial de computadores – a Internet. Assim, atuamos junto aplataforma TelEduc, um ambiente de ensino-aprendizagem à distância, desenvolvido e monitoradopela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

A transformação do material para o formato EaD, nesse projeto piloto proposto peloMEC, buscou consolidar essa nova forma de ensino-aprendizagem e quais suas vantagens edesvantagens de efetivação

TRABALHANDO COM A FORMAÇÃOCONTINUADA DE PROFESSORES:

PROJETO CONSUMO SUSTENTÁVELORTIGOZA, Silvia Ap Guarnieri (Departamento de Geografia); MOTA, Renata; Cristina da

(Pós-Graduação); NATIVIO, Priscila Maria (Graduação); MIGUEL, Yaisa D. Carvalho(Graduação); BRESIGHELLO, Maria Luísa M. (UNAMOS) - UNESP

Page 161: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

161

Nosso trabalho inicial consistiu em unir comunidade e universidade, isto é, para aaplicação desse projeto piloto, contamos com a parceria de professores da rede municipal deensino, sendo estes atuantes nas séries iniciais do ensino fundamental, da escola “ArmandoGrizzi”, localizada na periferia do município de Rio Claro – SP.

Aos professores cabia o papel de participar do curso como alunos, tendo sempreaulas às quintas-feiras e aos sábados e algumas tarefas para serem solucionadas entre uma aulae outra. Além disso, os professores também teriam que receber em sua aula alguma tutora docurso para a observação de alguma atividade referente ao conteúdo do mesmo. E a nós, domódulo, coube o papel de tutoria, isto é, além de termos transformado o material para o formatoEaD, também auxiliaríamos os professores em toda e qualquer dificuldade encontrada no transcorrerdo curso, desde o auxílio através de e-mail, telefone, contato presencial, até a solução de problemasvinculados á própria Internet.

Com certeza, encontramos muitos percalços pelo caminho: desistências, professoresinsatisfeitos, confusos ou até mesmo irritados com o curso. E talvez fossem essas as reaçõesesperadas pela equipe. Afinal, por ser um projeto piloto nada poderia sair tão perfeito assim.

Os objetivos do curso que propomos foi refletir sobre as dinâmicas próprias darealidade sócio-ambiental brasileira procurando conhecer os impactos do consumo na atualidadetendo como propósito principal levar o professor a repensar sua prática e construir junto com aUniversidade e com seus alunos novas estratégias de ensino-aprendizagem; criar condições paraque o professor reconheça seu papel social como agente de mudança na problemática do consumo;e, estimular a produção de conhecimentos por parte do professor articulando ensino e pesquisaem sua prática docente.

Durante o desenvolvimento deste curso esperava-se alcançar: a incorporação dostemas transversais (Consumo e Meio Ambiente) na formação continuada de professores econseqüentemente nas salas de aulas; elaboração de novas formas e novas abordagens no ensinode Ciências e Matemática; mudanças nas práticas educativas por meio da adoção da pesquisa-ação e da pesquisa colaborativa; criação de um canal permanente de integração entre aUniversidade e os Professores do Ensino Fundamental; e, conscientização por parte do professorde seu papel como um agente fundamental nas mudanças de comportamento no que tange asproblemáticas sócio-ambientais na atualidade.

REFERENCIAIS TEÓRICOS

O desenvolvimento do capitalismo, no estágio atual, tende a estruturar e normatizar,cada vez mais o consumo invadindo o cotidiano da população e, assim subjugando a vida emtodos os seus momentos. Nesta dinâmica, o cidadão é reduzido a consumidor, e o sujeito perdea sua identidade. Nesse complexo e contraditório processo ocorre uma metamorfose dos valores,e fica cada vez mais difícil entendermos o que é, ou não, necessidade.

Page 162: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

162

No Brasil as relações de consumo são ainda mais complexas devido a uma enormedesigualdade de renda, existindo, de um lado, uma elite com alto poder de consumo e, de outro,um enorme contingente populacional na linha de pobreza, os conflitos aumentam quando contamoscom aqueles totalmente marginalizados do mundo do consumo e também com a grande massada classe média brasileira. Com todas estas diferenças de renda e, portanto de poder de compra,nossas reflexões sobre o consumo devem contemplar uma análise mais global dos problemasbrasileiros. Neste sentido, é necessária uma reflexão do consumo que contemple não só a suacomplexidade social, mas também a sua complexidade ambiental, ou seja, um enfoque das relaçõessócio-ambientais.

A educação é um processo que propicia o desenvolvimento pessoal podendocontribuir para a construção de um mundo melhor ao oferecer condições para que seus sujeitosse tornem conscientes de sua responsabilidade social e global, habilitando-os para que exerçamo protagonismo de seus papéis sociais.

A educação ambiental pretende renovar a maneira de se encarar o papel exercidopelo homem no mundo, entendendo como qualidade de vida a convivência harmoniosa entre oser humano e meio ambiente, a esperança é que essa relação de forma integrada e sustentávelpode dar condições para que os indivíduos criem mecanismos de avanços na qualidade de seusconhecimentos. O grande desafio é despertar uma consciência crítica quanto à problemáticaambiental atingindo todos os cidadãos num processo pedagógico que seja participativo epermanente. Esta forma abrangente de educação deve relacionar as alterações sociais, políticase econômicas e ambientais, buscando a compreensão da complexidade do meio ambiente, tantonatural quanto artificial, suscitando sentimentos de responsabilidade, numa consciência sócio-ambiental.

Neste contexto, o consumo e suas formas produzidas na história do capitalismotêm conseqüências para o meio ambiente e, portanto, é um tema transversal de grande importânciana atualidade para toda a sociedade.

O IMPACTO SÓCIO-AMBIENTAL DO CONSUMO

O impacto sócio-ambiental do consumo está intimamente ligado ao modo e aoritmo com que o consumismo veio contagiando cada vez mais as populações do mundo. Nestesentido, há necessidade de se abordar juntamente com a histórica da concretização da sociedadede consumo os danos ambientais decorrentes desta.

Acredita-se que um melhor entendimento do assunto “impacto sócio-ambiental doconsumo” pode despertar uma consciência geral a este respeito; e levar a identificação de possíveissoluções para o tratamento dos problemas advindos do consumismo e, ainda gerar mudançascomportamentais de todos os setores, em escala mundial.

Ao entrar em contato com estas idéias que este tema abarca, a população perceberáque o meio ambiente não é uma fonte inesgotável de recursos e já apresenta sinais de esgotamento.

Page 163: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

163

O maior impacto sócio-ambiental do consumo se deve ao atendimento sistemático das demandascrescentes por novos-novos produtos o que faz com que ocorra um intenso uso do patrimônionatural.

Muitas vezes a degradação do meio ambiente pode não ser percebida pelas pessoas,pois ocorre em diferentes escalas. Há problemas globais, como as mudanças climáticas e ocrescimento populacional; há também problemas regionais, como a poluição do ar, a chuva ácidae a destruição de ecossistemas; e há problemas locais, como o lixo municipal. É preciso que seencontre um equilíbrio na distribuição dos frutos do progresso material, científico e tecnológicoentre os povos do mundo. Estudos revelam que alguns recursos sofrem mais este impacto doconsumo, entre eles destacamos a água, alimentos, florestas.

Um grande problema atual é o volume crescente de resíduos e sua destinaçãofinal. Com a industrialização e a concentração da população nas grandes cidades, o lixo foi setornando um grande problema, tornando-se uma fonte de doenças e contaminação para o meioambiente. É preciso conter a geração de resíduos e dar-lhe um tratamento adequado, para isso épreciso brecar o consumo desenfreado e investir em conscientização e em tecnologias que permitamreaproveitar e reciclar os materiais em desuso. Muito lixo que poderia ser reaproveitado é depositadoem aterros ou lixões espalhados pelo país, como podemos ver na fotografia abaixo, devemosbuscar soluções para o destino final dos resíduos baseadas na política dos 3Rs – Reduzir, Reutilizare Reciclar.

São diversas as questões que se colocam para que se possa refletir sobre o temado consumo sustentável e assim promover ações no seu cotidiano.

TRAÇANDO NOVOS RUMOS EM DIREÇÃO AO CONSUMO SUSTENTÁVEL

Todos nós sabemos que a maior causa da degradação contínua da qualidade devida da população e do meio ambiente global é o padrão de insustentabilidade e consumoapresentado em todo o mundo, principalmente nos países industrializados.

Faz-se necessário a conscientização dos indivíduos a respeito da importância detornarem-se consumidores responsáveis. Deve-se estabelecer um trabalho de formação de umconsumidor - cidadão, que implique a tomada de consciência do consumidor como importanteator de transformação do modelo econômico em vigor, já que tem em suas mãos o poder de exigirum padrão de desenvolvimento socialmente justo e ambientalmente equilibrado. Essa não é umatarefa simples, pois requer uma mudança de posturas e atitudes individuais e coletivas no cotidiano.O desafio que se coloca é o abandono da sociedade do descarte e do consumo excessivos, alémda recusa do sonho americano (american dream) como sinônimo de bem-estar e de felicidade.

Por Consumo Responsável entende-se a capacidade de cada pessoa ou instituição,pública ou privada, escolher e/ou produzir serviços e produtos que contribuam, de forma ética ede fato, para a melhoria de vida de cada um, da sociedade e do ambiente.

O Consumo Responsável nos possibilitaria a chegada ao Consumo Sustentável e,conseqüentemente, Desenvolvimento Sustentável, onde as necessidades e aspirações da geração

Page 164: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

164

atual seriam satisfeitas sem o comprometimento da capacidade das gerações futuras satisfazeremas suas. Por isso, podemos afirmar que o conceito de Consumo Sustentável está relacionado aofornecimento de serviços e de produtos, que preencham as necessidades básicas e dêem umamelhor qualidade de vida, paralelamente pensando na minimização do uso de recursos naturais ede substâncias tóxicas, assim como nas emissões de resíduos e de poluentes, com a idéia deproteger as necessidades das gerações futuras.

Uma sociedade mundial sustentável só será possível se atendida uma distribuiçãoeqüitativa, entre as nações, das matérias-primas, de energia e dos bens e serviços; além demantido o respeito a Terra e a seus ecossistemas, manifestado na adoção de métodos de produçãoque preservam a oportunidade das gerações futuras usufruírem dos mesmos padrões de vida dasatuais. Para que isso seja realmente possível temos que transformar nossos hábitos e fazê-lossustentáveis, transformando o ato de consumir em algo mais que uma satisfação de necessidades,visando incorporar um elemento reflexivo com relação às suas conseqüências.

Assim, torna-se clara a importância do nosso papel como cidadãos. Um dosprimeiros passos é a informação, devemos nos informar sobre as várias características dos produtosque consumimos, sobre sua composição e efeitos à nossa saúde, segurança e ao ambiente.Outro passo é desperdiçar menos, comprando menos descartáveis e embalagens bonitas, e,conseqüentemente, evitando a geração de resíduos e o problema de seu descarte final. Exigirdurabilidade de um produto e comprar produtos reciclados de boa qualidade, estes são tambémpassos importantes.

Relacionados com estas questões aparecem dois termos, que também possuemligação direta com o desenvolvimento humano: a qualidade ambiental e a qualidade de vida. Nasúltimas décadas, estes termos vêm sendo fortemente discutidos, tanto no meio intelectual quantona mídia em geral.

Definir o que vem a ser qualidade não é fácil, pois depende de posições filosóficas,políticas e ideológicas assumidas pelos indivíduos, sempre carregadas de interesses enecessidades. Mas tanto a qualidade ambiental quanto à de vida podem ser determinadas porindicadores básicos, como emprego, moradia, renda, educação, saúde, entre outros. Nessecontexto, é importante o IDH – Índice de Desenvolvimento Humano, proposto pelo Programa dasNações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD (órgão vinculado à Organização das NaçõesUnidas – ONU), para se avaliar a qualidade de vida dos países, segundo saúde, conhecimento eacesso aos bens materiais – qualidade essa que terá íntima relação com a qualidade ambiental.Além disso, hoje também existe o IDH – M (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal) que,embora visando os mesmos fenômenos, os indicadores considerados nesse são mais adequadospara avaliar as condições de núcleos sociais menores.

Apesar desses indicadores, a qualidade ambiental e de vida também podem seravaliadas subjetivamente, ou seja, dependerá da percepção de cada indivíduo quanto ao meioambiente e ao que considera essencial para sua existência – para uns pode ser ter comida nageladeira; para outros, ter o carro do ano. E nisso, temos uma relação com o papel exercido pelosimpactos ambientais, como poluição e o desmatamento; e o das desigualdades sociais, que no

Page 165: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

165

Brasil, cabe lembrarmos da desigual distribuição de renda, onde muitos têm tão pouco e umaminoria tem demais – são esses papéis que farão com que os indivíduos vejam e sintam o queocorre no meio em que estão inseridos e, mudar, então, torna-se um ato coletivo envolvendo aadministração pública e, concomitantemente, um ato individual – o de cada indivíduo determinaro que é qualidade em sua vida.

O CURSO PILOTO CONSUMO SUSTENTÁVEL

O curso piloto teve como número inicial de beneficiários 14 professores da EscolaMunicipal de Ensino Fundamental Armando Grizzi, aguardando conclusão de atividades deavaliação por parte dos professores:

Para realização do curso foi feito uso da metodologia de Ensino a Distância (EaD)da UNESP em convênio com o MEC, e da plataforma gerenciadora de conteúdo – o TelEduc.

O acesso ao curso pelo aluno pode se dar de acordo com sua disponibilidade nãosó de tempo, mas também quanto ao uso de um computador ligado a rede mundial decomputadores – a Internet.

Quanto às mídias, essas foram: o site do CECEMCA para o conhecimento doprojeto < http://ns.rc.unesp.br/ib/cecemca >; e a Plataforma – TelEduc - onde está disponível asala de aula junto ao material didático de cada aula.

Além disso, contou com a comunicação de forma síncrona – no mesmo horário –como a sala de bate-papo, ou de forma assíncrona – em horários diferenciados segundo adisponibilidade do(s) aluno(s) – através de um mural de discussões, uma agenda e e-mail.

O acompanhamento do trabalho dos alunos foi feito através do agente Tutor, queacompanhou as atividades dos mesmos ao longo do curso. O aluno foi avaliado durante todo ocurso - através da realização de tarefas que terão total relação com os conteúdos trabalhados epela participação no mural de discussões, expondo suas dúvidas e sugestões, além das salas debate-papo.

O conteúdo programático do curso desenvolveu-se em torno dos temas transversaise da relação entre Educação Ambiental e Educação Matemática. Foram os seguintes itensrelacionados à temática ambiental: A sociedade de consumo; O prejuízo ambiental do consumo;Consumo responsável – Consumo Sustentável; Qualidade ambiental e de vida: a ilusão danecessidade; IDH, questões ambientais e sociais; Geração, Deposição e Impacto dos Resíduosnas Cidades; A política dos 3Rs em questão: Reduzir, Reutilizar e Reciclar; e, Resíduos e Saúde.Já em relação ao conteúdo matemático, os itens abordados foram: Medidas e Comparações;Parte, todo e comparações; Classificações, Relações e Conclusões; e aulas de criação de novasatividades matemáticas.

Por tratar-se de um curso em formato EaD buscou-se ter o menor contato presencialcom os professores, mas foram realizadas reuniões, visando esclarecer a dinâmica do curso.

Page 166: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

166

O curso teve um total de 10 aulas, que eram liberadas via internet através daplataforma TelEduc, às quintas-feiras e aos sábados. Dessa forma, o aluno contava com o materialde apoio, que englobava o conteúdo proposto; leituras complementares, que visavam subsidiar oconteúdo e suas práticas pedagógicas; e atividades relacionadas às temáticas ambiental ematemática.

Em relação às tarefas, os professores participantes tinham o prazo de 5 dias paraenviar as mesmas. Os professores enviam-nas para seu devido tutor pela ferramenta “Correio” daplataforma TelEduc. Depois de corrigidas pelo tutor, estas tarefas eram reenviadas aos professores,que tinham a liberdade de reformulá-las quando julgasse necessário.

Os professores eram avaliados por sua freqüência ao curso, assim como pelarealização das tarefas e interação com os demais participantes do curso e tutores.

Foi feito o acompanhamento das atividades aplicadas em sala de aula por umaprofessora que leciona na 2ª série da Escola “Armando Grizzi”. Tal atividade estava relacionadacom o conteúdo “reciclagem”, que foi tratado durante o curso EaD. Esse acompanhamento visava,além da observação da aula, oferecer à professora uma descrição de sua aula, que subsidiaria asua narrativa como atividade final do curso.

Essa descrição e narrativa é parte da metodologia de pesquisa colaborativa, quetem por objetivo fazer com que o professor repense suas atividades em sala e suas práticaspedagógicas.

RESULTADOS OBTIDOS

Algumas dificuldades foram encontradas no transcorrer do curso, principalmentecom relação aos professores que trabalhavam por três períodos (exerciam função tanto na redemunicipal, quanto estadual e particular), visto que possuíam pouco tempo para acessar o curso,resultando assim na desistência dos mesmos.

Como ponto positivo do curso, destacamos a participação da professora RosemeireColin, que se mostrou bastante participativa durante a ocorrência do mesmo, realizando todas asatividades propostas e mantendo contato constante com a tutora.

Todo o empenho demonstrado durante o curso e todo o conteúdo assimilado pelaprofessora foi muito bem trabalhado durante a atividade sobre reciclagem que desenvolveu comseus alunos. Isto demonstra que a professora soube integrar a temática ambiental e matemáticaem suas práticas pedagógicas.

Além disso, a própria professora argumentou que, através da realização deste curso,incorporou em duas práticas pedagógicas cotidianas o “hábito” de planejar suas aulas. E isto temíntima relação com as atividades que eram solicitadas no curso: a elaboração de planos de aula.

Dessa forma, a professora Rosemeire, devido seu desempenho, poderia ser umadas futuras tutoras quanto ao curso para o município de Rio Claro, pois conscientizou-se de seupapel como agente nas mudanças de comportamento em relação à temática sócio-ambiental.

Page 167: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

167

BIBLIOGRAFIA

BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL. Parâmetros Curriculares Nacionais:Geografia. Brasília: MEC/SEF, 1998.

CARVALHO, M. B. S. da S. Meio Ambiente e Cidadania: a Interface Educacional. 2004. 224p.Tese (Doutorado em Geografia) - Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade EstadualPaulista, Rio Claro.

CASCINO, F.; JACOBI, P.; OLIVEIRA, J. F. de (Org) Educação, Meio Ambiente e Cidadania.Reflexões e Experiências. São Paulo: SMA/CEAM, 1998.

CONSUMERS INTERNATIONAL. Consumo Sustentável. Programa das Nações Unidas para oDesenvolvimento. Tradução de Admond Ben Meir. São Paulo: SMA/IDEC/CI, 1998.

CONSUMO Sustentável: Manual de Educação. Brasília: Consumers International/MMA/IDEC,2002.

DEMONTE, A.; INFORSATO, E.do C.; GATTÁS,E.A.L.; ROMANATTO,M.C.(orgs.) PedagogiaCidadã. Cadernos de Formação: Ciências e Saúde. São Paulo: Unesp, Pró-Reitoria de Graduação,2004.

ECOAMBIENTAL. Consumo Sustentável. Disponível em: <http://www.ecoambiental.com.br/mbody/cons_sust_.htm> Acesso em: 01 dez 2004.

EDUCAÇÃO AMBIENTAL. Conceitos. Disponível em: <http://www.ambientebrasil.com.br/composer.php3?base+./educacao/index.php3?&conteudo+.educacao/educacao.html> Acesso em:04 dez. 2004.

MORIMOTO, I. K. Educação Ambiental e Coleta Seletiva de Resíduos Sólidos Urbanos: umestudo de caso – Bairro Parque Universitário – Rio Claro/SP. 1999. 47p. Trabalho de Conclusãode Curso (Graduação em Biologia) – Instituto de Biociências, Universidade Estadual Paulista, RioClaro.

PITOLLI, A M. S. Proposta de um Plano de Educação Ambiental com Ênfase na Questão dosResíduos Sólidos para a Comunidade Caiçara de Camburi, Ubatuba/SP. 2002. 173p. Trabalho deConclusão de Curso (Graduação em Biologia) - Instituto de Biociências, Universidade EstadualPaulista, Rio Claro.

SANTOS, M. O Espaço do Cidadão. 6ª ed. São Paulo: Nobel, 2002.

SÃO PAULO (Estado). Secretaria do Meio Ambiente. Coordenadoria de Educação Ambiental.Guia Pedagógico do Lixo. São Paulo: SMA,1998.

TROPPMAIR, H. Biogeografia e Meio Ambiente. 5ª ed. Rio Claro, 2002.

UNESCO. Educação para um Futuro Sustentável: uma visão transdisciplinar para açõescompartilhadas. Brasília: Ed. Ibama, 1999.

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA. 1º Curso do Programa de Capacitação em EducaçãoAmbiental e Gerenciamento de Resíduos (30/03 – 03/04/2003). 1 CD-ROM.

Page 168: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

168

“Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Fala-se hoje, com insistência,no professor pesquisador. No meu entender o que há de pesquisador no professor não é umaqualidade ou uma forma de ser ou de atuar que se acrescente à de ensinar. Faz parte da naturezada prática docente a indagação, a busca, a pesquisa. O de que se precisa é que, em sua formaçãopermanente, o professor se perceba e se assuma, porque professor, como pesquisador”.

Paulo Freire

A SUPERVISÃO NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO: UM POUCO DA HISTÓRIA

Estar supervisora é a condição em que me encontro, apesar de não ter almejadoessa posição. Na rede municipal não existe o cargo de supervisora de ensino, porém a função quedesempenho dentro da Secretaria Municipal de Educação (SME), mais especificamente noDepartamento de Ensino Fundamental, assume essa nomenclatura para fins administrativos eburocráticos.

Como não há plano de carreira do magistério, somos todos professores, apenasdiferenciados pelo concurso público que possibilitou o acesso. Dependendo do edital de concurso,o professor pode ser regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) ou pelo regimeEstatutário, com diferentes jornadas de trabalho, podendo ser de vinte, vinte e cinco, trinta ouquarenta horas semanais.

Para preencher as vagas criadas para as funções de diretor de escola ou professor-coordenador ocorre concurso interno, com a apresentação de um projeto contendo a proposta detrabalho, que é defendida pelos candidatos em uma banca composta por membros internos (daSME) e externos (com representantes de classes convidados e nomeados pelo prefeito). Quantoao preenchimento das vagas de supervisão, historicamente na rede este tem acontecido porindicação de alguém que já ocupa ou ocupou a função ou pela indicação da própria chefia dodepartamento.

No mês de agosto de 1997, eu e mais duas amigas, professoras, fomos convidadaspela administração municipal a compor uma equipe com a finalidade de implantar o EnsinoFundamental na Rede Municipal. Era a municipalização. Três professoras da rede, que então sereduzia ao ensino infantil, e que também atuavam em escolas particulares no ensino fundamental.O convite foi justificado pelo fato de que tínhamos um fazer pedagógico diferenciado, assim comodeveria ser a proposta para o nascimento do ensino de 1a a 4a série no município. Foi assim quese deu a minha inserção no Departamento de Ensino Fundamental, sem pretensão de ocupar um

UMA ENTRE AS AÇÕES: O SUPERVISOR FORMADOR

PERINA, Sandra Helena (Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP)

Page 169: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

169

lugar de destaque ou posição. O desafio que tínhamos era de trilhar o caminho das pedras, algonovo, tanto para nós quanto para própria SME.

Nesta ocasião, para tudo era necessário produzir uma legislação, um decreto, umato de criação. Foi fazendo, refazendo tais decretos, atos, regimentos que o departamento começaa se estruturar e, diferentemente do ensino infantil, a ter tudo legalizado, uma vez que o ensinofundamental tem uma exigência burocrática maior, devida à própria organização institucional dequem assume a “zeladoria” da vida escolar de cada um dos seus alunos, em sua dimensão legal,tal como emissão de conceitos e pareceres para aprovação ou não. Enfim, era necessária umaestrutura legislativo-burocrática.

Mesmo neste contexto, o que mais nos movia - e me movia, no entanto, era podertransformar o sonho, que um dia esteve tão distante, em realidade: criar o ensino público de“qualidade”. Para isso era necessário investir na formação dos profissionais da educação, nosprofessores e essa era a nossa bandeira – a formação continuada.

Cada uma de nós trazia as experiências das escolas públicas e privadas. Da redeparticular trazíamos uma carga enorme de horas em formação (congressos, seminários, workshop,palestras e até mesmo o modelo das reuniões pedagógicas, as quais são assumidas como Horade Trabalho Coletivo –HTPC).

No início, como eram poucas escolas e, portanto, poucos professores, acabamosassumindo a coordenação dos HTPCs. Cada uma dava conta de uma determinada área doconhecimento, eu com a Matemática e as Ciências, as outras com Língua Portuguesa, História eGeografia.

Porém a rede cresce, cresce muito em dois anos e, apesar de ainda insistirmos emcontinuar atuando como formadoras, propondo cursos para os professores fora do horário deserviço, já não era mais possível continuar daquela forma e se fazia necessário um número maiorde funcionários no próprio departamento.

Houve a necessidade da criação de um concurso próprio para o ensino fundamentale a partir desse concurso que dá acesso aos professores, por concurso interno, são escolhidos osdiretores e professores-coordenadores. Com a indicação de alguns nomes, foram escolhidostambém supervisores. Até então nós três éramos e não éramos supervisoras. Embora tivéssemosaté “um carimbo” para os documentos, como supervisoras, a nossa preocupação estava voltadapara “o fazer pedagógico”, longe de modelos já estabelecidos para a supervisão escolar.

Com a ampliação da rede e a entrada de novos profissionais no quadro desupervisores, surge o primeiro embate entre ser supervisor formador e ser supervisor fiscalizador.A supervisão escolar, nomenclatura dada para designar a Função Gratificada (FG) de Supervisornasce talvez sem que haja uma reflexão. Aos supervisores de escola, nos serviços administrativos,de funcionamento geral, como também nos pedagógicos vão sendo dadas atribuições que não osdiferenciam dos gestores das escolas (diretores) e sua função se distancia do ensino, assim comoa sua própria identidade fica abalada.

O modelo de supervisão fiscalizador foi ganhando espaço na SME e, apesar da lutapela formação continuada dos professores e da garantia de um número maior de horas para

Page 170: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

170

estudos e planejamento, já não tínhamos a maioria preocupada com o processo de ensino-aprendizagem.

Para tratar da formação em serviço são contratados profissionais, de fora da rede,com referência na prática educativa. Foram muitas as tentativas em busca de se obter melhorespropostas quanto ao investimento na formação continuada. Nesta situação, a minha indagação sedava no sentido de que ninguém melhor do que aqueles que já atuam e conhecem a rede paratrabalhar junto aos seus profissionais. Para tanto se fazia necessário tratar também da formaçãodos supervisores e dos demais especialistas que se dedicam ao processo ensino-aprendizagem.

O NÚCLEO DE ESTUDO E PESQUISA NA ÁREA DE MATEMÁTICA

Desde o final de 2002, no entanto, na Secretaria Municipal de Educação dePiracicaba (S.M.E.), mais especificamente no Departamento de Ensino Fundamental, as funçõesdo supervisor passam a ser objeto de estudos, com a finalidade de revê-las. Nesses estudos,chega-se ao perfil do supervisor como formador, e este é gradativamente levado a assumir acondição de formador e, desta forma a dedicar-se mais aos estudos e à sua própria formação paraque possa assumir a coordenação de um “Núcleo”1

Atuando como supervisora apresentei ao Departamento de Ensino Fundamental,no final de 2003, uma proposta para coordenar um “Núcleo na área de Matemática”, na qualidadede professora polivalente e com experiência na área de matemática nas séries iniciais do ensinofundamental.

Justifiquei a proposição deste grupo, considerando que, na condição de supervisoraescolar, no Ensino Fundamental municipal, desde a sua implantação, no ano de 1998, tenho medeparado com a seguinte situação:

Uma grande preocupação com a alfabetização em Língua Portuguesa e poucapreocupação com a alfabetização em Matemática, com a numeralização como é também chamadanas séries iniciais, assim como o raciocínio lógico, resolução de problemas, etc.

Dizer que as crianças não estão alfabetizadas, para a maioria dos professores, é omesmo que dizer que não sabem ler e escrever e está implícita aí uma área específica doconhecimento – Língua Portuguesa. Ler e escrever também é importante nas demais áreas doconhecimento; em matemática também se lê e se escreve, para organizar o pensamento,representar, interpretar, buscar soluções, etc.

O ensino de matemática, a alfabetização matemática ou numeralização nos ciclosiniciais (1a e 2a etapas do I Ciclo) ou séries iniciais é tão importante quanto a alfabetização emLíngua Portuguesa. Ambas vão trabalhar com a linguagem com o objetivo de levar o aluno aconseguir fazer leitura, interpretação e explicação do mundo. Na linguagem matemática, essecaminhar para conseguir conquistar tais objetivos terá que atingir uma dupla abstração do signo,uma em sua essência enquanto palavra e a outra enquanto signos matemáticos.

Tanto na condição de professora de ensino infantil e fundamental, quanto atuandocomo coordenadora de um Núcleo de Estudos e Pesquisas, na formação continuada, na área dematemática, tenho sido confrontada com um enorme número de professores que dizem não

Page 171: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

171

gostar dessa área do conhecimento e que, portanto, dispensam um número menor de horas ededicação para o ensino, apesar de haver um quadro curricular que normatiza o número de horasde estudo por área do conhecimento.

Relacionado a isto, tenho observado um número crescente de alunos que tambémnão gostam da “matemática”, ou melhor, do ensino que vem sendo oferecido, e que, quandomuito, conseguem mecanicamente operar, através do algoritmo, as quatro operações.

É importante também considerar, para melhor compreensão de meu interesse depesquisa, que outros momentos de formação, anteriores aos Núcleos e com outra formatação, jáse fizeram presentes na rede municipal, também na área de matemática, com objetivo de melhorara qualidade de ensino. Compreendo que pensar na qualidade de ensino, é pensar nodesenvolvimento profissional/pessoal e coletivo que se dá nos grupos de estudos e formação emque o professor está inserido. É no coletivo, é no social que nos constituímos enquanto profissionaise também enquanto grupo. Posso dizer então que nesta Rede há uma história de formação deprofessores, bem como de discussões (acerca do) e de alterações no papel do supervisor emrelação a esta formação.

O OBJETIVO DA PESQUISA

Estamos assumindo o grupo de professores do “núcleo” como um lugar de discussãodo ensino de matemática. No entanto, quem propõe essa coordenação não é um especialista naárea, mas uma educadora. Assumindo, ainda, que não há nem primeira nem última palavra, eque também não existe a primeira e nem última verdade, mas verdades que se constituem nalinguagem e por meio dela, no seio de práticas sociais determinadas continuamente ao longo dahistória, o objetivo da minha pesquisa é de entender o papel do supervisor formador, aspossibilidades e os limites de sua atuação na formação em serviço, a partir de uma experiência deformação em ensino de matemática.

Considerando a situação em que se encontra o ensino de matemática nos ciclosiniciais / séries iniciais, esta pesquisa pretende conhecer, explicar e verificar as possibilidades eos limites do supervisor atuando em um processo de formação. Da elaboração do plano de ensinoà elaboração do plano de aula até a produção da própria aula, há momentos no planejamentoonde as escolhas que o professor faz são da maior importância e fazem a diferença no ato deensinar e aprender.

Qual a contribuição do supervisor na formação de professores? Como se articulaesse lugar ocupado pela supervisora com a formação de professores e com a sua própria formação?

Analisar as possibilidades de um processo de formação continuada de professores,os saberes produzidos por esses professores, assim como as suas influências na qualidade deensino são os objetivos desta pesquisa. Pretende-se, assim, relatar uma experiência de formaçãoem serviço e analisar essa experiência, contextualizando-a também em relação ao histórico dosdiferentes momentos de formação vividos na rede municipal. Ao considerar esses movimentos,também estaremos buscando entendimento de como acontecem as buscas pelos espaços de

Page 172: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

172

formação, e dessa forma contemplando a atuação do supervisor nas questões que vão se produzindobem como nas possíveis lacunas deixadas nesse cenário de formação.

A ABORDAGEM TEÓRICO-METODOLÓGICA

Atualmente, pensar em formação continuada é pensar, principalmente, nos saberesda experiência que se desenvolvem em um contexto de múltiplas interações. Diante dessa visão,temos que analisar o que se vive, o que se pratica e para isso se faz necessário compreender quea gênese de nossa constituição profissional está nas relações sociais e eu, indivíduo, me faço nasrelações sociais e nas práticas sociais.

Ao analisar as práticas desse grupo de formação e o contexto em que eu, supervisora,também vou me constituindo enquanto formadora, estarei elucidando o papel do supervisor, assuas possibilidades e os seus limites em serviço. Esses estudos nos remetem a uma abordagemhistórica cultural e, portanto, nos apontam o movimento da história e os processos detransformações ocorridos.

Ao olhar para a experiência em foco, as questões da matemática, como áreaespecífica do conhecimento, estarão presentes, como do mesmo modo que a análise dos encontrosenvolverá a literatura sobre os modelos de formação em serviço. Já ao tratar das questões daprática e do perfil do supervisor teremos que recorrer à literatura específica, pensando-a e discutindo-a em uma perspectiva histórico-cultural.

A constituição do material de análise se dá a partir de observações e registrosquinzenais em áudio-gravação, seguida de transcrição literal dos encontros, bem como deanotações contendo detalhes que a áudio-gravação não possa revelar e relatos escritos pelasprofessoras. Um total de oito encontros, durante o segundo semestre de 2004, comaproximadamente vinte e quatro horas de áudio-gravação, constitui o material básico para oprocesso de investigação sobre o movimento discursivo e as instâncias de enunciação nascondições reais de trabalho e formação, com vistas a compreender o papel do supervisor, suaspossibilidades e limites nos processos de formação de professores em serviço.

FASE ATUAL DA PESQUISA

A pesquisa encontra-se na fase final das transcrições das áudio-gravações e dasprimeiras aproximações ao material empírico, num processo de pré-análise com vistas à construçãodos dados. Nesta aproximação inicial do material empírico, temos encontrado durante todo opercurso do grupo, no tempo mencionado, discussões sobre o ensino da matemática, sobrequestões metodológicas e de aprendizagem dos alunos e sobre o currículo, bem como discussõesacerca das condições de trabalho dos professores. Tal aproximação também nos dá indícios deque seja necessária a realização de uma entrevista com os professores que fizeram parte dessegrupo de estudo sobre o que pensam a respeito do “supervisor”, do “supervisor formador”.

Page 173: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

173

Esperamos, com esta pesquisa, poder contribuir com e para a prática do supervisorque está inserido no processo ensino-aprendizagem, com atuação direta junto aos professoresdas unidades em que atuam.

BIBLIOGRAFIA

CONTRERAS, J.La investigación en la acción. Cuadernos de Pedagogia, 224,7-19, 1994.

BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo, Hucitec, 1999.

FERREIRA, N. S. (org) Supervisão Educacional Para Uma Escola de Qualidade. São Paulo,Cortez Editora, 2002.

FONTANA,R. Como nos tornamos professoras ? Belo Horizonte: Autêntica, 2003.

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 4a ed., São Paulo:Paz e Terá, 1997.

MOYSÉS, Lúcia. Aplicações de Vygotsky à educação matemática. Campinas, Papirus, 2003.

PIMENTA, S.G. E GHEDIN, E. (orgs) Professor Reflexivo no Brasil: gênese e crítica de umconceito. São Paulo, Cortez, 2002.

SILVA, C.A. (orgs) Nove olhares sobre a supervisão. Campinas, Papirus, 1997.

VYGOTSKY, L.S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1987.

ZEICHNER, M K. M. A Formação Reflexiva de Professores: idéias e práticas. Lisboa, Educa,1993.

Nota

1 “Núcleo” é o nome dado aos grupos de estudos e pesquisas em que o supervisor da rede municipal está vinculado na condição de

coordenador/formador.

Page 174: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

174

A preocupação com a intervenção pedagógica junto à equipe de educadores sempreesteve presente em minha prática, tentando de alguma forma melhorar a atuação frente àcomunidade escolar, às famílias e, especialmente, no relacionamento com as crianças.

Após refletir sobre a necessidade de investir na formação do educador infantil ecomo poderia enriquecer a formação continuada em serviço, numa história que se constrói dia-a-dia, na ação e na reflexão sobre a ação, bem como acreditando na hipótese que a posturapedagógica do especialista tem efeito sobre o perfil profissional do Educador e sobre a consciênciada comunidade escolar a respeito das relações sociais das quais os processos pedagógicos fazemparte, tratei de, numa perspectiva em que o especialista esteja mais próximo da prática escolar,intervir diretamente na formação continuada em serviço, de modo que ela consista na construçãode um pensamento reflexivo e produtivo de um discurso comprometido.

A linguagem escrita da Educadora Infantil que expressa seus anseios junto aoaluno e comunidade escolar, pergunta e busca respostas, intermedeia o processo de sua formaçãocontinuada? Esta primeira questão produz outras, tanto pelo tema como pela ação educativa:Como a construção da autoria dessa Educadora Infantil pode influenciar na construção da autoriada produção escrita de seus alunos, nessa interação que se dá na Escola de Educação Infantilcom profissionais letrados? Como é proporcionada e valorizada esta posição crítica e criativa daprodução escrita da Educadora Infantil? Que fins terão a leitura posterior desses escritos? Apenasrelatos de um segmento de tempo numa instituição, material de estudos e reflexões para outroseducadores em sua formação, registro histórico de uma escola, memórias, releitura de material,para reavaliação e planejamento, publicações, divulgação da Educação Infantil? Como seestabelece uma relação, pessoal ou profissional, entre Educadoras Infantis e Direção ouCoordenação, mediada pela oralidade e pela escrita? Qual a importância da formação inicial naprodução escrita da Educadora Infantil?

A prática que apresento se dá na direção de uma creche municipal – CEI-59“Eugênio Leite”, Centro de Educação Infantil que atende em período integral crianças de zero a 6anos, filhos de trabalhadoras num bairro periférico –Brigadeiro Tobias, da cidade de Sorocaba/SP.A instituição conta com uma equipe de educadoras infantis formada por Professoras de Educaçãoinfantil, Regentes Maternais, Agente Infantil, Auxiliares de Educação, Serventes e Merendeiras.

Focalizar como objeto de estudo esta produção diária ou semanal chamadaRelatórios ou Registros diz respeito sobre a própria atuação como Educadora Infantil nas atividadespropostas e suas realizações, suas reflexões e intermediações com a realidade, sobre algumasituação ou aluno em especial, como vê o mundo e a si mesma ao estudar, refletir, agir, refletir

UMA PRÁTICA DE FORMAÇÃOCONTINUADA MEDIADA PELA ESCRITA

GARCIA, Roseli Gonçalves Ribeiro Martins; BRITTO, Luiz Percival Leme (Uniso)

Page 175: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

175

sobre a ação, transformar-se e transformar o mundo, ou seja, as idas e vindas dos profissionais daEducação Infantil entre o cuidar e o educar na importante construção da sociedade e dos indivíduos.

Propor à escola que delineie um Projeto Político Pedagógico, que a equipe toda semobilize como caracterizam vários autores, enfatizando a pesquisa-ação, entre eles Elliott (inGeraldi, Florentini e Pereira, 1998) num

processo que se modifica continuamente em espirais de reflexão e ação, ondecada espiral inclui:

- aclarar e diagnosticar uma situação prática ou um problema prático que sequer melhorar ou resolver;

- formular estratégias de ação;- desenvolver essas estratégias e avaliar sua eficiência;- ampliar a compreensão da nova situação (situação resultante);- proceder os mesmos passos para a nova situação prática.”As atividades não se repetem, porque as situações são distintas e os indivíduos

também ao longo do processo e do tempo vivido social e histórico. Diante desta constante mutação,a reflexão é imprescindível. A reflexão intrínseca do ser humano, a reflexão que leve a ação demodificar situações e não de ser conduzidos pelas situações. Trata-se de, a partir de leituras e deestudos, buscar a identidade do educador e demonstrar na prática, construir novos conhecimentos;de ver, interpretar, sensibilizar-se pela realidade e intervir nela como sujeito inserido na relaçãosocial onde desempenha seu papel de educador.

A proposta é de atuação da Diretora para formar o educador autônomo, atuante,reflexivo, crítico, que veja seu aluno e a si mesmo possíveis de transformação e emancipação,como produtos da sociedade, membros da comunidade, pessoas que têm uma história dentro dainstituição escolar e da vida. Não estamos isentos nessa interação social que acontece na escola,podemos modificar e sair modificados desse processo.

Com o objetivo de que o diálogo evolua, com foco na formação continuada emserviço e na intervenção e transformação da atuação, através da constante reflexão sobre a açãoe o mundo que os cerca, a produção escrita é um dos instrumentos de que dispõe o especialistapara contribuir com o Educador Infantil em sua formação continuada, de modo que pergunte ebusque respostas e produza textos reflexivos, bem elaborados, que expressem seus anseios naatuação junto ao aluno e comunidade escolar.

Num primeiro momento, com o objetivo de localizar o CEI-59 no contexto sócio-econômico brasileiro foi proposta a leitura de dois textos, levando em consideração as questões,enquanto educadoras do CEI-59: Quem somos? O que fazemos aqui, agora, em 2005? O quepretendemos? Quais são nossas intenções?

Cada um dos dois textos tem enfoques bem diferentes, mas o que interessou emsua seleção para esta leitura foi trazerem estatísticas sócio-econômicas mundial e brasileira quelevam a olhar para as dimensões numéricas de nossos problemas sociais e apontam soluções,sejam governamentais “caberá à nação decidir o futuro de seus novos filhos (...) 2,7 milhões debrasileiros que virão à luz em 2005.” (Skaf), sejam de participação cidadã “transformação do

Page 176: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

176

indivíduo em sujeito, e não objeto, da política” (Dutra).As leituras se deram em dois grupos heterogêneos. Foi percebida a desenvoltura

dos que tem mais familiaridade com este tipo de texto e a preocupação de tornar a leituracompreensível a todos. Na discussão, a impressão sobre as estatísticas levou a olhar para adimensão dos problemas, principalmente brasileiros, e indignar-se, refletir sobre o papel dessaequipe de educadores no contexto em que atua. Um sentimento de conexão com uma sociedadeviva, da qual faz parte.

Nesse dia, foi construído coletivamente o texto renovado da Missão da Escola:Somos um Centro de Educação Infantil que através do cuidar, educar e brincar

atende crianças de famílias trabalhadoras em período integral. Visamos a inclusão, a transformaçãosocial e o pleno desenvolvimento do educando, das famílias e dos educadores, proporcionandoacesso aos bens culturais.

Foi proposto e aceito pelo grupo o projeto “8 jeitos de mudar o mundo” (ONU) –sem patrocínio. Cada tema, escolhido conforme afinidade por duplas de educadores, será tratadodentro da possibilidade de abrangência do tema com as crianças, com os pais e a comunidade:

1. Acabar com a fome e a miséria2. Educação básica de qualidade para todos3. Igualdade entre sexos e valorização da mulher4. Reduzir a mortalidade infantil5. Melhorar a saúde das gestantes6. Combater a AIDS, a malária e outras doenças7. Qualidade de vida e respeito ao meio ambiente8. Todo mundo trabalhando pelo desenvolvimentoNum segundo momento, com a justificativa de um processo diagnóstico, tendo

como objetivo ampliar o olhar, partindo da visão que os participantes já tem sobre o contexto foiproposto um percurso pelo bairro e adjacências. Cada grupo pesquisa no arquivo da escola osendereços de seus alunos; leva papel e caneta para desenhar o percurso e se possível localiza oendereço dos alunos; fotografa os pontos estratégicos. Ao retornar, cada educador do CEI-59produzirá um texto com o título proposto: “Olhar, sentir, pensar. Agir?” Em seguida a socializaçãodos textos.

Foi solicitada uma van, porém veio um ônibus enorme. O percurso previsto teveque ser modificado, pois o ônibus parecia um transatlântico dentro do bairro. Houve paradas edescidas em pontos estratégicos. Houve mobilização diferenciada entre os educadores que moramno bairro e os que não moram. Uma rememoração dos que moram no bairro, mas não circulamconstantemente por todos os pontos, também se preocuparam em contar o contexto histórico egeográfico dos locais visitados e ouvir as impressões dos colegas educadores não moradores.Todos sentiram na pele, cabelos, músculos, no olhos, nos ouvidos, no nariz e até na boca, oslugares onde vivem os alunos.

Na parada em uma das vilas, foi muito interessante o encontro de uma professoracom sua aluninha acompanhada de sua mãe, pai e vizinhança, que estavam surpresos com a

Page 177: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

177

presença do grupo de educadores, e pediram para registrar com foto. Um ônibus de viagem nobairro “Só pra enterro” (funeral) disse uma vizinha. “É bom saberem onde a gente mora, seprecisar de alguma coisa” disseram os pais.

Olhar o bairro de vários ângulos trás novas perspectivas ao sentir ao mesmo tempoas proximidades e as distâncias, as subidas, as descidas, as estreitezas das vielas, a largueza daestrada, o urbano, o rural, o progresso, a pobreza, as riquezas, as misérias. Se a cidade é escrita,hoje ela foi lida de outras maneiras por educadores do CEI-59.

Pela Rodovia Raposo Tavares, visitando o Jardim Novo Eldorado, se enxerga aofundo a cúpula da Biblioteca da UNISO. Não estava no percurso previsto, pois seriam visitadosendereços dos alunos, mas por insistência dos educadores, foi acrescentada no percurso umavolta dentro da cidade universitária.

Desceram do ônibus e pediram para conhecer pelo menos a biblioteca. Pareciamcrianças em excursão diante da suntuosidade do prédio e do suposto saber que abriga. A. Auxiliarde Educação, se expressou naquele momento como a “realização de um sonho, poder visitar aUNISO”. K., Auxiliar de Educação, sendo aluno de direito da UNISO, tinha familiaridade com abiblioteca e levou os colegas visitar todas dependências.

Pôde-se perceber a proximidade geográfica entre a cidade universitária e o bairroBrigadeiro Tobias, porém outra distância precisa ser superada, a distância entre a academia e arealidade cotidiana, a distância entre o ensino superior privado, mesmo que comunitário, e opoder aquisitivo do profissional da educação infantil, entre quem pode pagar para estudar e quemnão pode nem colocar em pauta tal investimento. O conhecimento produzido na Universidadepode emanar do cotidiano, mas deve voltar pra ele.

Voltando ao CEI-59, no fervor do retorno, agitados, pernas cansadas, cabelos durosde poeira, mas muito animadas, foram à produção do texto cujo título proposto foi o já citado“Olhar, sentir, pensar. Agir?” Transparece a distância geográfica, mas um sentimento de ser todosparte deste mesmo lugar – o bairro, mas também o “nós” separado “dessa gente”, o lugar sócio-geográfico do CEI-59 e sua importância como Centro onde se busca educação e cultura, qualidadede vida. Trechos selecionados:

“Através desse passeio visualizamos e constatamos a imensidão da área deabrangência desta unidade de ensino (Cei-59), onde tivemos uma pequena idéia das dificuldadese dos obstáculos que algumas famílias encontram para se deslocar até a escola, enfrentandoterra, pó, falta de transporte gratuito, barro, lama em dias de chuva, enfim, uma série de dificuldadesque as crianças enfrentam para chegar e retornar para casa no final do dia. (...) verificando ospontos positivos e negativos, podemos fazer um plano de ação e trabalharmos mais dentro darealidade que esta comunidade vivencia no seu dia-a-dia.” (K. - Auxiliar de Educação da 2ª fase)

“Sair para vivenciar um pouco a moradia de nossos alunos foi uma experiênciamuito rica... no dia-a-dia, tiramos conclusões das pessoas sem realmente conhecer suas raízes.Eu senti alegria em ver algumas crianças, até onde moram, mas também senti admiração pelaforça de necessidade de caminharem tanto em busca da tão almejada “Educação”, deu paraperceber que realmente somos um Centro, pelo qual é responsável por um dia melhor dessa

Page 178: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

178

gente, apesar do conforto do ônibus, pude sentir as minhas pernas cansadas, imagine a perninhadelas (crianças) que é tão curtinha! (...) além de abrir as portas da creche precisamos abrir ocoração e os olhos principalmente para essa gente que quer viver tão bem quanto nós.” (R. -Professora da 3ª fase)

“Através do nosso “passeio” pelo bairro pude observar a realidade em que nossosalunos vivem, sua vida cotidiana, suas dificuldades, o nível sócio-econômico de suas famílias eas condições nas quais eles vivem.

Partindo dessa “visão” ficou mais claro perceber seus anseios quanto ao nossotrabalho e da nossa instituição, e acima de tudo, da importância que este espaço representa.

Acredito que para muitos, este espaço é o único ao qual eles podem ter acesso aosbens culturais, à diversões, à socialização; e cabe a nós “educadores” valorizarmos este acesso efazer com que cada vez mais encurtem as distâncias, não só geográficas, mas também deoportunidades de vislumbrar um futuro melhor, com igualdade de condições. (...) Para participaremdessa sociedade e [que] sejam capazes de modificá-la e assim construírem um mundo maisjusto, digno e igualitário.” (R. - Professora da 1ª fase)

“Olhar – As belas paisagens e as reais condições do bairro (dificuldades e desafios)Sentir – saudades da minha infância.Pensar – como era o bairro quando era criança, as mudanças que ocorreram, o

que melhorou, o que precisa mudar, as dificuldades que as crianças enfrentam para chegar aescola.

Agir – O que nós podemos fazer para melhorar as condições de vida de nossosalunos, como transformar essa realidade.”

(A. - Auxiliar de Educação do Maternal 2)“É complicado andar, às vezes debaixo de chuva, ou mesmo sol escaldante,

quilômetros e quilômetros para ter a segurança de deixar os filhos em um local onde serão cuidados,alimentados e principalmente “educado”, para uma vida que ainda não conhecem. Para eles (ascrianças) tudo não passa de uma brincadeira, mas o que esperam do futuro? O que seus paispodem fazer? Como mudar às vezes uma vida dura, quase miserável tanto de bens materiaiscomo de amor? (M. - Auxiliar de Educação da 3ª fase)

“A distância de muitos percorrida, as dificuldades do trajeto. Muitos deles devemchegar cansados, acordam cedo e depois a maioria permanecer doze horas na creche. Então euacho que seja necessário ter um ambiente acolhedor, aconchegante, fazendo com que as criançasse sintam bem recebidas. ” (E. - Auxiliar de Educação do Maternal 1)

“Sinto que vivem com dificuldades, como qualquer um sem recursos de que quemvive com baixa renda. Pensar de fazer as crianças felizes, ouvindo-os dando amor ofereceroportunidades de participar de eventos dentro de nossas condições.” (J. - Regente Maternal doBerçário)

Page 179: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

179

“Durante o passeio senti o cheiro da natureza, vi algumas crianças que são alunosdo CEI e consegui entender as dificuldades que tem para chegar a escola devido a distância desuas casas. (...) Percebi quanto o nosso bairro está esquecido pelos órgãos públicos e que isso sóiria melhorar se a população se unir em torno de um objetivo. (P. – Auxiliar de Educação doMaternal 1)

“Podemos fazer alguma coisa para mudar isso. Temos que nos sensibilizar e tambéma comunidade em geral começando dos nossos alunos e pais. Realizando algum projeto queenvolva a todos.

Esse passeio deu oportunidade de sentirmos a necessidade que “todos”, não só ascrianças, temos em procurar a melhoria de nosso bairro. (R. – Auxiliar de Educação do Berçário)

“Senti o quanto eu gosto desse bairro, também senti o quanto é difícil para algumascrianças chegarem até a unidade, senti um prazer enorme de mostrar o nosso bairro para osoutros.

(...) Temos que fazer projetos para conhecer melhor o nosso bairro e mostrar paracrianças o quanto é importante e bonito o lugar onde moramos.” (V. – Professora do Maternal 2)

O primeiro leitor é o próprio autor e o segundo é este interlocutor, intermediando oupersonificando a instituição escolar. No compartilhamento destas produções escritas há grandepossibilidade de enriquecimento também entre pares.

Diante da problemática foi escolhido um foco de trabalho: cidadania e meio ambiente,conscientização de que Brigadeiro Tobias é (pertence) a Sorocaba e não se justifica o abandonodos bens públicos e históricos.

Aquele que educa, ensina a escrever, ou que trabalha sobre um conhecimentoescrito, muitas vezes não exercita a escrita como participação social autônoma, além de formuláriose outros produtos que não exigem reflexão, talvez influenciados pelos condicionamentos históricosde sua formação e atuação profissional. Participando desse processo através da escrita, organizaseu pensamento; no distanciamento do seu cotidiano proporcionado por essa reflexão, pode ver-se, ver a realidade, indagar-se e agir sobre ela.

A Educadora Infantil é muito ligada à ação e a oralidade, no sentido de a palavradita ter muito valor e facilidade em relatar oralmente sua atuação: a transformação dessa reflexãoem autoria escrita construída para outro leitor – comunidade escolar, público em geral, acadêmicotalvez –, num registro mais elaborado, contribui para o desenvolvimento de uma ação educativareflexiva e comprometida com a realidade dos educandos.

Uma avaliação subjetiva em que o profissional se revela enfrenta muitas resistênciasnos estilos de vínculos estabelecidos entre estas condições hierárquicas ou de confiança atravésdos suportes e o formato do texto, respeito às normas convencionais, organização, organogramaou relatórios em prosa, que revele uma visão geral ou detalhada, numa narrativa e reflexão.Buscar a conquista de espaço físico no tempo para parar e escrever, ou melhor, para parar a açãoe refletir escrevendo: há que se buscar um espaço psicológico desse ato, de modo que sejapercebido como algo valorizado pelo grupo e que tenha sentido para a Educadora Infantil para semanter numa “atitude reflexiva constante” (Scarpa,1998).

Page 180: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

180

Os textos escritos são carregados de muita afetividade, revelam o que vai dentrodo autor, e o vínculo estabelecido com o interlocutor traz uma marca transferencial, em querepetem relações significativas anteriores.Pode-se inferir em Olson (1997) que a produção escritanão é só uma transcrição da fala, mas que serve de modelo à fala mais consciente. Quando aEducadora Infantil escreve, ela destaca, separa a palavra do ato em si, refletindo sobre o significadoda palavra, tornando consciente o que motivou a ação, a decisão, a dúvida, o receio, a crença quelhe é mais valorizada, originados esses processos na mente como a idéia em si, o pensamentoexpresso e peculiar de cada sujeito – o que constitui sua subjetividade.

A Diretora, ao ler a produção escrita semanal, reconhece a autora, e sua perspectivade mundo, por trás do texto. Reconhece também o que imagina (esta autora) do interlocutor e oque espera dele. Essa leitora com sua mente e perspectiva de mundo coordenará essas perspectivas– da autora, do interlocutor imaginado, e a sua própria – no estabelecimento de um diálogo, queno caso de haver intencionalidade, evoluirá com um sentido, um foco gerador de transformaçõesnos sujeitos, nas relações, nas ações propriamente, ou seja, na intervenção e transformação daatuação, através da constante reflexão sobre a ação e o mundo que os cerca.

Por haver indícios de revelações da mente, apesar de a educadora Infantil-autoradecidir sobre o que coloca ou oculta no texto, esta prática se estabelece num clima de confiançaentre as parceiras, ainda que hierárquicas, em que o interlocutor intermedeia ou personifica ainstituição escolar.

Na Educação Infantil, especificamente em creches onde se atende crianças dezero a 6 anos, a distinção de Aristóteles (in Geraldi, Florentini e Pereira, 1998) entre poesis epraxis cria uma tensão. Poesis se refere a um conjunto de procedimentos operativos para produzirconseqüências quantificadas e especificadas previamente enquanto “práxis”, sendo uma formade atualizar nossos ideais e valores em uma forma adequada de ação e constituindo-se, por issomesmo, uma forma sempre inacabada que requer uma contínua reflexão. Nossa práxis alimentanossa poesis, que não é assim tão fechada, nem tão aberta, visto os riscos e comprometimentosa que as crianças pequenas estão expostas. Há uma demanda de mobilidade, mas ela precisaestar assegurada pelo senso comum, as transformações imediatas se dão pela intuição, e asreflexões sobre elas levam à cristalização dos procedimentos e segurança na postura.

Aqui estou falando de cuidar e educar. “O caráter pedagógico da Educação Infantilnão está na atividade em si, mas na postura do adulto frente ao trabalho que realiza” (Machado,2004). É preciso que a equipe esteja envolvida, integrada, disposta a melhorar sua atuação.Durante o processo, a auto-avaliação também se faz necessária, o educador se transforma também,apesar de ser um processo secundário, depende toda a espiral: “não há desenvolvimento curric-ular sem desenvolvimento de professores” (Stenhouse,1975 in Geraldi, Florentini e Pereira, 1998).

REFERÊNCIAS

CASTELLO-PEREIRA, L.T. Leitura de Estudo. Campinas,SP:Editora Alínea, 2003.

Page 181: PROJETOS E PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES viii cepfe/LinksArquivos... · Esta síntese propiciou ao grupo a oportunidade de olhar para o curso como um todo, percebendo os

Projetos e práticas de formação de professores

VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

181

GERALDI, C.M.G.; FIORENTINI, D.; PEREIRA, E.M. de A. Cartografias do Trabalho Docente.Campinas,SP: Mercado de Letras: Associação de Leitura do Brasil – ALB, 1998. (Coleção Leiturasno Brasil)

OLSON, D. R. O Mundo no Papel – as implicações conceituais e cognitivas da leitura e daescrita. São Paulo: Ática, 1997.

SCARPA, Regina. Era assim, agora não...uma proposta de formação de professores leigos. SãoPaulo: casa do Psicólogo, 1998.

MACHADO M.L.de A. Por uma Pedagogia da Educação Infantil. Pátio Educação Infantil, PortoAlegre, RS: Artes Médicas, Ano II, Nº 5, p.6-8, Ago/Nov, 2004.