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Relatório final do Projeto Salt Mambembe. Apresentado aos parceiros e apoiadores: Sesi e Almagis.

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INTRODUÇÃO

O PROJETO SALT MAMBEMBE, fora concebido em 2007 pelos fundadores do Instituto Sal da Terra, uma Organização não governamental, que atua em diversas áreas, promovendo ações que fomentem uma maior participação do povo na construção de um mundo melhor. O projeto teve o patrocínio do Serviço Social da Indústria (SESI-AL), e da Associação dos Magistrados Alagoanos (ALMAGIS).

Outras entidades também se envolveram direta ou indiretamente no projeto, apoiando a iniciativa e colaborando em sua execução, a exemplo da Escola Judiciária do Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas (TRE-AL), Associação dos Municípios Alagoanos (AMA) e da Comissão de Formação Política da Província Eclesiástica de Alagoas.

Segundo dados estatísticos oficiais do perfil do eleitorado do Estado de Alagoas, fornecidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nestas eleições de 2010, o percentual de analfabetos e analfabetos funcionais atinge aproximadamente 75% do eleitorado. O número de eleitores sem escolaridade compromete a qualidade do voto, pois os que nunca frequentaram a escola são mais vulneráveis a propostas clientelistas de compra de votos, ao fisiologismo ou ao populismo.

As campanhas de educação para a cidadania e conscientização da importância do voto, em sua maioria, tiveram o formato impresso de textos e cartilhas. Diante de um quadro social em que a população é analfabeta, tais campanhas são inexpressivas, para não dizer inúteis.

Utilizando-se a metodologia do Teatro de Rua (Mambembe), com a peça Democracia, as populações interioranas, nos dias de feiras livres, receberam uma mensagem acerca do funcionamento do processo eleitoral e a importância da participação do eleitor e do ato de votar na consolidação da Democracia. Destacou-se a liberdade na escolha dos candidatos. Informou-se da segurança da urna eletrônica, além de repulsar a corrupção eleitoral, principalmente a prática de compra/venda de votos.

De autoria de João Luiz Valente, do Instituto Sal da Terra, em colaboração com os atores do Sesi, a peça é inspirada na obra de Bertold Brecht “O Analfabeto Político”. No texto, nada de palavras complicadas e termos inacessíveis. Temas como democracia, voto, cidadania, corrupção e a Lei da Ficha Limpa são tratados com leveza e bom humor, sem deixar de criticar de forma ácida a cultura de corrupção que ainda é visível na maior parte da classe política. Mais além, o projeto quer trazer um pouco de leveza à vida dessas pessoas, permitindo que elas parem por alguns minutos e participem da peça e possam rir, e condenar, emocionar-se e apreciar a arte. Confiamos que desta forma o eleitor sinta-se dono de seu voto, de sua vontade e o político seja visto como mera discricionariedade do eleitor e não o contrário, como hoje ocorre.

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Eleitor ativo, crítico, digno, afinal, sem tais valores, a própria democracia teria pouco sentido.

Neste primeiro ano de execução o projeto percorreu 14 Municípios do Estado de Alagoas, no período de 18 a 27 de setembro de 2010.

OBJETIVOS ALCANÇADOS

A seguir elencam-se os objetivos alcançados com o projeto, evidenciados na execução do mesmo, quais sejam:

1. Informar sobre a importância do voto livre e consciente.

2. Levar noções básicas de democracia e cidadania às populações do interior de Alagoas.

3. Fomentar a noção de que uma sociedade mais justa é possível desde que a população participe desta construção.

4. Promover o teatro mambembe e os espetáculos de rua como expoentes da cultura nordestina e como forma de crítica de domínio popular.

5. Estruturar e desenvolver a sensibilidade e o pensamento, a análise crítica e a exposição das relações inter-humanas.

6. Revitalizar as manifestações típicas do panorama rítmico da região como o Coco de roda e a Embolada, o Guerreiro, Reisado, Romance, Cancioneiro, Boi, Frevo, Maracatus, Caboclinho, Tambor de Crioula, Xote e Baião, compondo uma ambientação musical que, provocando intersecções com a música popular atual possibilite o surgimento de elementos novos e atrativos para a juventude, assegurando assim o vigor da cultura popular nordestina.

7. Levar arte às feiras livres. Amenizar as feiras livres do interior, proporcionando um ambiente agradável e atrativo como forma de viabilizar a continuidade do comércio direto entre produtor e consumidor final, especialmente do artesanato e da produção agropecuária.

8. Difundir a Literatura de Cordel.

9. Fazer sorrir, divertir, animar, brincar, cantar sem mais objetivo que ser feliz durante alguns minutos, as eleições podem ser a festa da democracia.

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MÉTODO UTILIZADO

O teatro é instrumento de humanidade e este é o seu papel fundamental: restituir ao homem os valores éticos propositadamente esquecidos e desprezados na nossa sociedade.

O teatro de rua teve grande importância na Idade Média na Europa, além de divertir o público era um instrumento democrático e recorrente para criticar os desmandos dos poderes constituídos. Por volta do século 12, apareceram na Europa companhias de teatro que iam de cidade em cidade. Seus atores e atrizes, chamados de saltimbancos, literalmente carregavam a casa nas costas. E não só a casa: os cenários das peças, seus figurinos (as roupas usadas), maquiagem, etc. Eles andavam em carroças, sempre em bandos, chamados trupes, e não tinham morada certa. Eles também representavam peças engraçadas ou dramáticas, como os gregos.

Hoje, esse teatro itinerante também é conhecido como teatro mambembe.

Também no Brasil e principalmente na região nordeste a arte mambembe teve sua importância e hoje se encontra ofuscada pelos meios de comunicação em massa, comunicação “globalizada” que vem destruindo paulatinamente as diversidades culturais e implantando uma homogeneização baseada em modelos exógenos, principalmente saxões, que nada tem a ver com os fundamentos da cultura brasileira.

Questionando-se a eficácia das campanhas veiculadas pelos métodos tradicionais junto aos interioranos já que o quadro deficitário se repete a cada novo período eleitoral. A abordagem utilizada fora acessível, lúdica, familiar, valendo-se de técnicas simples como o Mateus das manifestações folclóricas natalinas da região, para deixar claro, por exemplo, que com a urna eletrônica usado na atualidade é impossível rastrear a voto de cada eleitor, O VOTO É LIVRE. Essa abordagem encontra fundamento na consagrada teoria da Educação Popular de Paulo Freire. Chega-se ao coração do povo usando uma linguagem despretensiosa, quase inocente, como aquela utilizada pelos espectadores alvo em seu dia a dia.

A literatura sobre o tema, representada por Alexandre Santiago da Costa (2004), nos informa que a arte necessita resgatar sua função social mostrando que o mundo precisa ser transformado e ajudar na transformação, pois, segundo Fischer (1987), a arte é propriamente uma realidade social, e a sociedade precisa desse artista, este supremo feiticeiro, e tem o direito de pedir-lhe que ele seja consciente de sua função.

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A ludicidade nos traz importantes elementos que nos fazem pensar sobre nossa realidade, nossa sociedade, a relação do “eu-social” com o “eu-individual” (Luckesi, 2002). Se a ludicidade nos faz perceber e atentar para nosso contexto, o que fazer quando nos percebemos inseridos em uma realidade injusta socialmente?

A ludicidade, além dessa conscientização do ser, também congrega elementos como a práxis dentro desse pressuposto dialético.

Segundo Marcuse (1970), a ludicidade e a arte não são fundantes dessa transformação social, mas são esclarecedoras e conscientizadoras dessa práxis revolucionária; a consciência social é o primeiro passo na busca dessa conquista por melhores condições de vida. É chegada a hora de unirmos nossas ferramentas, o artista com sua arte, o educador com a educação, o escritor com suas palavras, o agricultor com sua enxada, na busca dessa conscientização e dessa transformação, pois, segundo Bertolt Brecht, só existe um aliado contra o barbarismo crescente; são as pessoas que sob ele sofrem. Só dessas pessoas podemos esperar alguma coisa, por isso o educador, o artista, o agricultor, o escritor, devem virar-se para o povo, um povo que faz a história, que transforma o mundo e se transforma a si mesmo, e é mais necessário do que nunca falar a sua linguagem, a linguagem do povo, a linguagem da transformação (inspiração backhtiniana).

Como podem ver o teatro mambembe, que num primeiro momento pode haver parecido uma opção rara, não tem novidade alguma. Tampouco é inovadora a escolha da feira livre como cenário, isso veremos adiante. A grande novidade que este projeto traz é o que está dando-se por chamar “Justiça Preventiva”. Digo bem, “dando-se por chamar”, pois trata-se de um conceito tão inovador que ainda não foi catalogado. No ano de 2008 passamos a procurar apoio dos diversos órgãos do Poder Judiciário em Alagoas, pois entendíamos que somente aqueles que conheciam a problemática da disputa pelo poder e as dificuldades em combater as práticas truculentas e desonestas nas campanhas eleitorais, podiam compreender nossos métodos e objetivos, não estávamos equivocados. Doutora Ana Florinda, Juíza do TRE-AL e Presidente da Escola Judiciária, sensibilizou-se com a abordagem que propúnhamos. Foi a primeira que, quando solicitou que fizéssemos algumas apresentações, nos motivou em seguir adiante. Passados dois anos, foi na pessoa do Presidente da Almagis, Doutor Maurílio Ferraz que o projeto finalmente ganhou corpo com a aprovação daquele que representa a quase totalidade dos Juízes de Alagoas.

Eureka! A magistratura alagoana posiciona-se na vanguarda mundial ao atacar o conflito antes mesmo que ele aconteça, afinal é muito menos desgastante conscientizar a população a não votar em político de moral e vida pregressa incompatível com o exercício da vida pública do que cassar um mandato via ação judicial.

As pernas quem nos deu foi o SESI.

Dr. José Carlos Lyra de Andrade, entendeu que nosso projeto, por seu caráter didático e de defesa da ética e da cidadania, compartilha com a instituição por ele presidida seus objetivos e decidiu disponibilizar os atores, o transporte e demais gastos de alimentação alojamento e combustível para a equipe artística.

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DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES

Para realização do projeto elegeu-se a feira livre do interior alagoano. Este espaço é na realidade, uma mistura de trabalho, lazer e entretenimento para muitas pessoas que para ela se dirigem e dela participam. A liberdade e a autonomia constituintes da Educação Popular podem ser visualizadas claramente neste espaço.

O dia de feira é sempre de intenso movimento e agitação de transeuntes que, de um lado para outro, procuram comprar e vender mercadorias, expor seus produtos e chamar a atenção de sua clientela. Nos quatro cantos da feira, o que ecoam são frases de efeito para atrair as pessoas que por lá circulam. São vendedores que mostram seus produtos, considerados por eles os melhores e mais baratos como forma de atrair seu público. Mas a feira não tem sido desde seu surgimento apenas o local de venda e compra de mercadorias, constituindo-se também num local de educação e de cultura.

Historicamente, as feiras adquiriram uma importância muito grande que ultrapassa seu papel comercial, transformando-se, em muitas sociedades, num entreposto de trocas culturais e de aprendizado, onde pessoas de várias localidades congregavam-se estabelecendo laços de sociabilidade.

A feira se apresenta enquanto um mosaico complexo de interpretações de acordo com a percepção dos sujeitos sociais que nela transitam. Estes podem fazer uma leitura por inúmeros prismas, expressando visões diferenciadas tanto do ponto de vista social e econômico, como nos aspectos cultural e educacional (BARBOSA; ARAÚJO, 2005).

Neste sentido, o trabalho abordou a feira a partir de uma perspectiva freireana de educação como cultura, situando-a como um lugar propício para a cultura e Educação populares de 14 Municípios:

18 de setembro (sábado): Cacimbinhas, Santana do Ipanema e Batalha

19 de setembro (domingo) Piranhas, Pariconha e Carneiros

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20 de setembro (segunda) : Pão de Açúcar, Olho d´agua das Flores, Major Isidoro

25 de setembro (sábado): Palmeira dos Índios e Viçosa

26 de setembro (domingo): Maribondo

27 de setembro (segunda): Arapiraca e São Miguel dos Campos

Antes da apresentação, membros do Instituto Sal da Terra, contatavam os Cartórios Eleitorais para que representantes da Justiça Eleitoral estivessem presentes nas apresentações, assegurando a total isenção e segurança do espetáculo.

Durante o teatro eram distribuídas cartilhas e folhetos elaborados pela Província Eclesiástica de Alagoas, acerca da compra de votos, bem como a “colinha” da própria Justiça Eleitoral.

A princípio, a proposta era a visitação de 17 Municípios, porém, pelo fato de que algumas feiras livres acabarem antes do meio dia, em três deles (Cajueiro, Atalaia, Boca da Mata) a performance não fora possível.

Como a proposta pauta-se pela informalidade e improviso das apresentações, nas primeiras apresentações, os atores realizaram a performance sem auxílio de nenhum equipamento de som. Porém, constatando-se a sua necessidade para maior difusão da mensagem, a Almagis, patrocinadora da iniciativa, dotou de microfones e caixa acústica a equipe.

“O papel fundamental dos que estão comprometidos numa ação cultural para a conscientização não é propriamente falar sobre como construir a idéia libertadora, mas convidar os homens a captar com seu espírito a verdade de sua própria realidade. ” PAULO FREIRE

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ANÁLISE E PERSPECTIVAS

Em 1988 optou-se pelo regime político brasileiro fundamentado no princípio democrático, democracia representativa. Um regime democrático em cuja base se encontra a soberania popular, segundo o qual todo poder emana do povo (CF art. 1º, parágrafo único).

Aceita como forma ideal de governo em todo o mundo ocidental, é inegável a crise da democracia representativa. E especificamente no Brasil esta constatação torna-se mais visível, quando os anseios da sociedade nunca são correspondidos pelos representantes eleitos e os interesses individuais e econômicos se sobrepujam ao interesse da coletividade, dando margem para uma corrupção que está arraigada nas estruturas de poder brasileiro. As instituições, como os Órgãos da Administração Pública, o Poder Judiciário e Congresso Nacional, perderam há muito tempo a credibilidade popular, talvez até a própria legitimidade.

Marilena Chauí se posicionando quanto à questão, afirma que, no Brasil, há uma verdadeira redução da democracia a um regime político eficaz, cujo alicerce é a concepção de uma cidadania estabelecida em partidos políticos, cuja manifestação precípua se dá durante o processo eleitoral, no rodízio dos governantes e na saída tecnicista e não política dos problemas sociais (2003, p. 404).

A participação da maioria, manifestando verdadeiramente sua vontade no sentido da democracia grega ateniense1 é mitigada, pois na democracia brasileira

1 “Se é exato, como muitos supõem, que a liberdade e a igualdade formam, em essência, a democracia, elas, contudo, apenas podem achar-se aí em toda a sua pureza, enquanto os cidadãos desfrutarem da mais perfeita igualdade política. Como, porém, o povo constitui sempre a parcela mais numerosa do Estado, e é a opinião da maior parte que faz a autoridade, é natural que esse constitua a característica primordial da democracia. ’ (ARISTÓTELES, 2004, pp. 180-181).

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A indústria política – isto é, a criação da imagem dos políticos pelos meios de comunicação de massa para a venda do político aos eleitores-consumidores –, aliada à estrutura social do país, alimenta um imaginário político autoritário. As lideranças políticas são sempre imaginadas como chefes salvadores da nação, verdadeiros messias escolhidos por Deus e referendados pelo voto dos eleitores. “Na verdade, não somos realmente eleitores (os que escolhem), mas meros votantes (os que dão o voto para alguém).” (IBDEM, p. 408).

Diante da crise da democracia representativa, alternativas para contorná-la vão surgindo no fito de permitir aos cidadãos o exercício dos seus direitos constitucionais. Dos problemas experimentados pela representação a possibilidade sugerida para saná-los seria a sua substituição pela democracia direta, mas com muitas dificuldades para tanto, como comumente se critica ao se falar neste tipo de democracia. No entanto, as próprias dificuldades postas para resolução podem ser colocadas como meio para se recolocar a via alternativa: aquela que diz respeito, não à superação, mas à possibilidade de articulação entre os dois modelos como meio de enfrentar não só os problemas do modelo representativo, mas a demanda societária por mais participação (MOISÉS, 1990, p. 51).

O conceito de Sociedade Civil, na perspectiva gramsciana em que a sociedade civil é, antes de tudo, o extenso e complexo espaço público não estatal onde se estabelecem as iniciativas dos sujeitos modernos que com sua cultura, com seus valores ético-políticos e suas dinâmicas associativas chegam a formar as variáveis das identidades coletivas. É lugar, portanto, de grande importância política onde as classes subalternas são chamadas a desenvolver suas convicções e a lutar para um novo projeto hegemônico enraizado na gestão democrática e popular do poder. (BOBBIO, 1994, pp. 32-60).

O fortalecimento da Sociedade Civil é uma forma de retirar o poder de uma elite burocrática e repassá-lo para a sociedade, criando uma esfera pública que tem condições de organizar-se e exercitar os seus direitos para a construção da Democracia.

A proposta do Projeto Salt Mambembe tem justamente esta perspectiva, ou seja, levando noções básicas de Direito Constitucional à lugares de aglomeração de população espera-se fomentar a consciência do cidadão enquanto indivíduo, pertencente inserido em uma comunidade política, em termos aristotélicos.

A consciência pela informação, com a justificativa da abordagem já exposta acima, tem o condão de instigar à população a ser Sociedade Civil, participante ativa do processo democrático não mais de forma alienada, mas revestida de capacidade crítica e legitimada a reivindicar, porque não dizer pugnar por seus interesses.

O primeiro passo para a construção da Democracia, ainda que representativa, se dá pela participação. O projeto quer levar o público alvo a este primeiro passo, sair da sua apatia quando provocado por um veículo jocoso a questionar, neste caso, a realidade política numa época crítica como a de eleição.

Em suma, constatamos a eficácia do método utilizado. A expressão na face do povo que nos assistiu não deixa dúvidas. Seria impossível buscar nos resultados das

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urnas uma resposta imediata, longe disso. Nosso objetivo nunca foi esse. Tampouco traremos à baila o efeito multiplicador que deve reverberar muito ainda, mas sim gostaríamos de esclarecer que, impactando na população iletrada nossa mensagem salpica até os estratos mais favorecidos da sociedade.

Análise da repercussão midiática

A análise da repercussão midiática do projeto se impõe como uma necessidade veemente face à própria conformação do cenário político atual, uma vez que a própria noção de democracia encontra vínculo estreito com a da liberdade de manifestação de pensamento e de expressão. Mais ainda, se considerarmos o efetivo papel que os meios de comunicação de massa exercem sobre as eleições, sobretudo nas democracias ocidentais.

Vivemos numa época sui generis, dominada, em todos os campos, pela midiatização. Assim como a própria política assume novos contornos com o avanço tecnológico dos meios de comunicação de massa, sendo os mesmos decisivos na legitimação das democracias correntes. Não é novidade o fato de que, na nação hegemônica atual, os Estados Unidos da América, o novo presidente seja aclamado pelas principais redes de televisão norte-americanas, e com peso oficial. De Estado.

Isso não garante, por si só, a pluralidade esperada de um sistema democrático. É o que defende o jornalista e professor universitário, Igor Fuser, ao criticar Bernand Manin, que utiliza a analogia com o espetáculo teatral para delimitar o cenário político. Segundo Manin (1995, p. 27), o espaço midiático é o palco da representação teatral da política, cabendo ao eleitor na representação teatral, na qual os agentes políticos exercem a função de atores e ou autores cabendo aos eleitores cidadão o lugar da platéia. Os meios de comunicação proporcionam, nos termos dessa analogia, o palco onde se desenvolve o “espetáculo” da política..

No argumento de Fuser (2007, p. 21), a própria mídia é um ator, com interesses particulares envolvidos na disputa democrática:

A mídia participa ativamente desse jogo, não como um palco – um ente inanimado e, portanto, indiferente aos interesses envolvidos nem disputa – e sim como um ator que tem seus próprios interesses a defender. Os agentes de mídia interagem o tempo todo com os demais atores. Em alguns momentos, compartilham interesses com alguns deles, e em outros demarcam sua autonomia. Nas democracias modernas, os agentes que determinam o papel político dos meios de comunicação se regem por uma lógica própria, que não se confunde com a lógica dos agentes políticos e nem mesmo com a lógica da esfera puramente econômica do mercado. Ao mesmo tempo a mídia sofre intensamente influencia dessas duas lógicas e, influi, por sua vez nos resultados do jogo político.

Consciente dessa importância fundamental, no desenrolar da democracia representativa, o Instituto Salt tem em conta a preocupação em garantir também seu espaço nos meios de comunicação. Não por mera catalogação de espaço obtido via espontânea, ou provocada, dos meios de comunicação, como se pauta a maioria das assessorias de imprensa.

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No caso do Salt Mambembe, o papel da veiculação do projeto nos meios de comunicação é tão crucial quanto o próprio projeto, uma vez que com amplo alcance na sociedade, o projeto se permite ser avaliado, entendido e mesmo criticado. Em outras palavras, expor-se para ser comprovado. E mais: para atingir um universo ainda maior do que os cidadãos “pegos de surpresa” na feira-livre.

Nesse aspecto, a avaliação, ora mensurada pela publicação de notícias em sites, jornais, rádio, tv e internet deixam pouca dúvida quanto à efetividade alcançada pelo projeto nos meios de comunicação, como se pode observar nas imagens em anexo, que falam por si só.

Também mereceu destaque na TV, veículo de massa, tanto em âmbito estadual, por meio de reportagem produzida pela TV Gazeta de Alagoas, quanto nacional. Neste caso, a veiculação do vídeo “Democracia- segundo ato”, produzido pelo Instituto Salt, teve inclusive a honra de abrir, na semana que antecedeu o primeiro turno das eleições, a semana especial das Eleições 2010 do quadro “Outro Olhar”, do Repórter Brasil, telejornal nacional da TV Brasil.

O quadro, por sinal, é uma iniciativa que mostra um segmento dos meios de comunicação em franca ascensão: o da participação do cidadão na produção de conteúdo. Recurso do qual o Instituto Salt, como Organização Não-Governamental, não pode nem deve abrir mão. E os resultados, nesse aspecto específico, são ainda mais animadores. Além de ter o material divulgado em rede nacional de TV, também garantiu a sua reprodução na internet, via canal do Outro Olhar no You Tube, bem como em seu canal próprio Saltviews, e, por conseqüência natural do fenômeno midiático da web, a replicação de conteúdo em diversos sites dispostos a divulgar iniciativas semelhantes.

Tal movimento de inclusão dos atores até então afastados do processo de produção midiática é garantido, por uma lado, pelas novas tecnologias de comunicação e informação. Elas proporcionam, de forma inédita, uma possibilidade de maior e mais efetiva participação da sociedade civil organizada, ou mesmo do cidadão. Sobretudo com a ampliação da internet e o surgimento das redes sociais, a própria comunicação vive o limiar de um novo paradigma, no qual produtores e consumidores de conteúdo se confundem e se retroalimentam.

No tocando ao projeto em análise, interessa-nos principalmente destacar a possibilidade dos chamados grupos “excluídos” ou “minoritários” dentro do esquema da rede hegemônica de comunicação de se manifestarem, agirem e se organizarem para, além de produzir conteúdo, dar vazão às idéias que, de outra forma, estariam relegadas ao anonimato

A apropriação da mídia pelos socialmente excluídos, os chamados invisibilizados socialmente, é a abertura que a pós-modernidade proporcionou para que estas pessoas tenham vez e voz. É no gancho da invisibilidade que surgem duas novas ondas no panorama da produção midiática brasileira. Dizem respeito ao movimento de tomar e dar voz aos invisibilizados, dos excluídos e marginalizados, através de recursos midiáticos – tanto em mídias alternativas como na grande mídia. Para o caso das mídias alternativas, surge no bojo dos movimentos e ações que encontram nos recursos e suportes midiáticos importantes suportes para desenvolvimento de novas expressões e alianças político-sociais entre Estado, democracia, terceiro

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setor, sociedade civil e grupos ideologicamente minoritários. Elaboram, assim, novos modos de representação contra-hegemônicos, acenando para a promoção de políticas públicas para inclusão social. (FREITAS, 2007).

Dessa forma, a produção de conteúdo midiáticos cujo objetivo seja o da sensibilização da comunidade, enfocado nas características peculiares de cada local, seus costumes e tradições, para tratar de questões relativas à cidadania, ética, direitos humanos, numa linguagem clara, acessível e de fácil assimilação parece demonstrar que estamos diante da possibilidade de uma nova educação para a mídia, inclusive, ao incluir os aspectos regionais - e mais especificamente, de cada comunidade, como centro de interesse e identificação.

Investir nas reais e manifestas expressões da cultura popular, em oposição a costumes e valores artificialmente sedimentado ao longo dos anos pelos grandes meios de comunicação, é a saída cada vez mais urgente e eficiente para tratar com igualdade os que, por sua natureza, são desiguais: os mais pobres, os que menos têm acesso à informação.

Dessa forma, o projeto Salt Mambembe extrapola os limites das feiras livres, onde travou contato direto com o público, para também virar um produto midiático por meio audiovisual, trazendo consigo a interpretação mais fiel possível ao que o espetáculo nas ruas quer transmitir. Tanto é que se pode considerar parte indissociável do projeto o registro, por meio de som e imagem, dos efeitos, da dinâmica e da efetividade da encenação.

CONCLUSÃO

A experiência demonstrou que o método utilizado alcançou os objetivos propostos. A metodologia aplicada é uma importante ferramenta de comunicação hábil a levar as mais diversas mensagens. Os grandes meios de comunicação sabem que o espetáculo comunica. Neste caso preferimos difundir noções básicas de Direito Constitucional no desiderato de convocar a população a arregaçar as mangas e construir juntos um mundo melhor.

A proposta fora tão bem recepcionada, que membros da Almagis acenaram a possibilidade de utilização do Projeto Salt Mambembe como de necessidade permanente, visando a aproximação da comunidade à Instituições Democráticas, a exemplo do Judiciário, sendo um canal comunicativo educacional de laivos de cidadania.

Enfim, a experiência constatou a atualidade e o imperativo da proposta para outras ações harmônicas com esta concepção de trabalho.

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REFERÊNCIAS

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