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Programa Joaquim Nabuco 1

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Programa Joaquim Nabuco 3

PROGRAMA JOAQUIM NABUCO

- SERVIDORES 1º/2011 -

1 SUPERVISOR:

Nayse Hillesheim

Assessoria de Assuntos Internacionais

E-mail: [email protected]

Telefone: + 55 XX (61) 3217-4012

2 COORDENADOR:

Erismar Souza Freitas Filho

Assessoria de Assuntos Internacionais

E-mail: [email protected]

Telefone: + 55 XX (61) 3217-6505

3 SERVIDOR INTERCAMBISTA

Nome: Agnaldo José Martins

Nacionalidade: brasileiro

Tribunal de origem: Supremo Tribunal Federal do Brasil

Período: 6/6/2011 a 16/6/2011

E-mail: [email protected]

Alocação: Corte Suprema de Justicia del Paraguay

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ÍNDICE

A Corte Suprema de Justiça Paraguaia .............................................................................................................................................................. 5

Sistema Nacional de Facilitadores Judiciais e a Corte Suprema de Justiça ......................................................................................... 6

Atual Sistema Penal Paraguaio – Parte 1 ........................................................................................................................................................... 8

Atual Sistema Penal Paraguaio – Parte 2 .........................................................................................................................................................10

Juízo Oral no Tribunal Penal de Assunção .......................................................................................................................................................11

Visita à Área de Controle de Gestão ..................................................................................................................................................................13

Visita à Direção de Direitos Humanos e ao Centro Internacional de Estudos Judiciais ................................................................16

Visita à Direção de Comunicação e ao Palácio da Justiça ........................................................................................................................19

Visita à Direção de Assuntos Internacionais e Integridade Institucional e à Oficina de Mediação ..........................................21

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A CORTE SUPREMA DE JUSTIÇA PARAGUAIA

Assunção, 6 de junho de 2011 Agnaldo José Martins

Supremo Tribunal Federal Brasília - Brasil

O primeiro dia de atividades na visita institucional à Corte Suprema de Justiça (CSJ) paraguaia teve início com as palavras de boas-vindas do Ministro Víctor Nuñez. O membro da mais alta Corte do país ressaltou a importância do programa na busca da meta comum dos membros dos países do MERCOSUL, que é a excelência na prestação dos serviços jurisdicionais aos seus cidadãos. O Ministro assinalou também que, por meio de tal projeto, a troca de experiências positivas entre os países possibilita o desenvolvimento conjunto do sistema judicial da região. De maneira bastante solícita, Doutor Nuñez colocou-se à disposição ainda para ouvir nossas observações, críticas e sugestões ao longo do nosso período de atividades nas dependências da Corte.

Posteriormente, o servidor Christian Díaz Acosta, Coordenador de Assuntos Internacionais e Integridade Institucional da Corte, fez um pequeno apanhado histórico do órgão máximo do sistema judicial paraguaio e explicou sua estrutura e funcionamento, tanto na área técnico-administrativa como judicial.

Com a presença da Doutora Monica Paredes, Diretora de Assuntos Internacionais da CSJ, seguiu-se com a apresentação de um panorama dos sistemas penal, civil e trabalhista do país. No que tange à área criminal, foi destacada a mudança de paradigma trazida pela nova constituição do país, com regulamentação dada pelo novo código processual penal pátrio. De um sistema inquisitivo do passado, a justiça paraguaia tem se balizado agora pelo modelo acusatório, em que ganha ênfase o princípio da inocência do acusado e da humanização das penas. Nesse contexto, também foi destacada a função do Ministério Público, que deixou a posição meramente consultiva, passando à titularidade da ação penal e à fiscalização da correta aplicação da lei. Destacou-se ainda o surgimento do juiz de garantia como mais um instituto dessa nova conformação processual-penal.

Diferentemente do sistema judicial brasileiro, a Corte Suprema do Paraguai exerce a superintendência sobre todos os organismos do Poder Judiciário daquele país e resolve, em instância única, todos os conflitos de jurisdição e competência. Cada um de seus nove ministros, além de compor as salas civil, penal e constitucional, também tem atribuições administrativas no âmbito das quinze circunscrições departamentais. Como conseqüência de o Paraguai ser um Estado Unitário, não há divisão de sua Justiça comum em âmbitos federal e estadual, como no caso brasileiro.

Outro fato que chama a atenção é o de o Presidente, além das funções administrativas, comuns aos seus pares, também julgar processos judiciais. Ele é, por exemplo, um dos três membros da Sala Penal e seu presidente. Também é superintendente de circunscrições departamentais do interior do país.

O panorama do sistema de administração da Justiça do país anfitrião de nosso intercâmbio, apresentado no primeiro dia juntamente com a programação, nos pareceu bastante promissor quanto a uma estada em Assunção com ótimo aproveitamento e com possibilidade de aquisição de muitos conhecimentos acerca da cultura jurídica do país. A calorosa recepção e a gentileza dos servidores e autoridades, sempre disponíveis para ouvir as dúvidas, prestar esclarecimentos e fornecer o suporte necessário às nossas atividades, trouxeram, igualmente, expectativas auspiciosas quanto ao contato humano e a experiência pessoal da viagem.

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SISTEMA NACIONAL DE FACILITADORES JUDICIAIS E A CORTE SUPREMA DE

JUSTIÇA

Assunção, 7 de junho de 2011 Agnaldo José Martins

Supremo tribunal Federal Brasília - Brasil

No segundo dia de intercâmbio na Corte Suprema de Justiça, conhecemos o Sistema Nacional de Facilitadores Judiciales. Com a presença do Ministro Miguel Bajac, que nos apresentou o projeto e de demais coordenadores, ouvimos que se trata de uma experiência que teve início na Nicarágua e que, por meio de acordo técnico com a Organização dos Estados Americanos (OEA) em 2007, foi possível implementá-lo no Paraguai. Com tal medida, a CSJ passou a integrar a Rede Interamericana de Facilitadores Judiciais Rurais. Essa é a segunda experiência do programa na América Latina.

Tal programa, que se insere no marco de um conjunto de políticas públicas de acesso à Justiça para grupos em situação de vulnerabilidade, tem por objetivo a formação de facilitadores em todo o país e visa a franquear à população, principalmente de áreas isoladas, que não conta a presença do Estado, uma Justiça rápida e eficiente. O intuito é levar cidadania a todos, reduzir os conflitos sociais e descongestionar o sistema judicial.

A população alvo do programa, como nos explicou o Ministro Bajac, vive em estado de grande fragilidade social, em áreas rurais ou suburbanas. Ademais, sofrem com altos níveis de violência e impunidade. A regra nessas comunidades é o desconhecimento dos mecanismos, processos e funções dos órgãos jurisdicionais do Estado.

Os facilitadores, em que pese cumprirem funções com respaldo do Poder Judiciário, não formam parte do corpo de servidores do Estado. São pessoas que exercem liderança natural em suas comunidades e que gozam de confiança e respeitabilidade entre seus pares. Eleitos em assembleias comunitárias, atuam como ponte entre os operadores do direito e os cidadãos. Eles canalizam os casos que podem ser resolvidos por meio de métodos alternativos de resolução de conflitos e difundem uma cultura jurídico-cidadã, tendo com ferramenta tanto a autocomposição, como o uso do Direito e das instituições do Estado como possibilidades de pacificação social.

Uma vez eleitos, prestam juramento ante o juiz de paz da localidade, aos quais se vinculam, e são capacitados pela CSJ sobre noções básicas de desenvolvimento pessoal, além de noções de direito civil, penal, constitucional e de família. Seu papel é difundir uma cultura cívica na comunidade em que residem e atuam, por meio do acompanhamento da solução de diferentes tipos de conflitos. Presentes hoje em nove departamentos do país e em sessenta e sete cidades, os mais de mil facilitadores colaboram ainda com as campanhas de emissão de documentos, inclusive certidões de nascimento.

Chamou particularmente atenção no programa a ênfase dada à presença da mulher facilitadora, que representa cerca de quarenta por cento do grupo. Esse componente de gênero tem refletido, segundo os responsáveis pelo projeto, na prevenção e mesmo na resolução de muitos casos de violência doméstica, antes permanecidos ocultos, tanto pelo temor de represália sexista, quanto pela falta de conscientização de que tal problema não deve ser tratado só no âmbito da esfera privada.

O foco de tal iniciativa é relevante, pois na medida em que a mulher se capacita e toma consciência de seus direitos e dos meios legais de que pode se valer para vê-los respeitados, ela pode refletir sobre as assimetrias das relações de gênero no âmbito da comunidade em que vive e no seio de sua própria família. O favorecimento dessa representação subjetiva da violência atua no seu apoderamento e na mudança das relações intrafamiliares, com superação da situação de

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desigualdade e alcance de status de respeitabilidade no seu meio social. Além do fato de a presença da mulher facilitadora ter um profundo efeito educativo sobre o conjunto das mulheres da sua comunidade, ela altera a própria dinâmica de uma casa e de uma família, o que favorece a redução da escalada de violência e gera coesão social.

O grande mérito de tal projeto, para além dos efeitos práticos de se reduzir os custos materiais e humanos dos Tribunais, está, assim, na possibilidade de participação direta da sociedade civil na resolução de seus próprios conflitos. Esse mecanismo de participação cidadã vai ao encontro do compromisso assumido pela CSJ de fortalecer sua missão institucional, aproximando-se das pessoas que mais necessitam da atenção do Estado, com oferecimento de uma Justiça mais acessível e satisfatória aos cidadãos.

Num momento em que a nação paraguaia comemora seu bicentenário de independência política, tais iniciativas, ao levarem cidadania a grupos socialmente mais vulneráveis e historicamente desassistidos, ajudam a consolidar o Estado de Direito e o sistema democrático, trazendo expectativas mais promissoras rumo a um futuro de desenvolvimento e de justiça social para o país.

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ATUAL SISTEMA PENAL PARAGUAIO – PARTE 1

Assunção, 8 de junho de 2011 Agnaldo José Martins

Supremo Tribunal Federal Brasília - Brasil

No terceiro dia de nossa jornada, tivemos uma manhã de atividades com o Dr. Emiliano Rolón, membro de uma das salas criminais do Tribunal de Apelação de Assunção e juiz da Corte Suprema de Justiça. O magistrado nos falou sobre a atual estrutura do sistema penal paraguaio. Foi-nos explicado que a nova Constituição do país, que data do ano de 1992, foi a primeira que vigeu num sistema democrático e de repartição de poderes de forma harmônica. O magistrado ressaltou que a Lei Máxima do país, sob a qual se elaborou o código penal (1997) e de processo penal (1998), propiciou uma renovação ideológica desse ramo do ordenamento jurídico, estabelecendo-se um modelo de garantias individuais até então ausente. Tal sistema, voltado à dignificação do ser humano, ao sair de um posicionamento vertical e se horizontalizar, põe um freio à arbitrariedade estatal e à proeminência do Poder Executivo e coloca a defesa da vida em primeiro plano.

Nesse âmbito de renovação de conceitos e práticas no trato do sistema penal e processual penal e de aproximação aos anseios da sociedade, apontaram-se como os desafios mais urgentes na administração da justiça a necessidade de imposição de uma autocrítica no que tange ao maior acesso à justiça, à razoabilidade na duração dos processos e de maior demanda pela sua oralidade. Questionado sobre o sistema de execução da pena e sobre eventuais programas existentes que se relacionassem com a ressocialização dos condenados, o magistrado lamentou ser esse um desafio ainda pendente, pois não há nenhuma iniciativa governamental em tal direção.

Diferentemente do Paraguai, a legislação penal e processual penal brasileira é anterior à Constituição vigente, a qual, assim como no país vizinho, é a primeira a estabelecer marcos verdadeiramente democráticos, no que diz respeito ao sistema criminal. Assim, aqui temos que interpretar tal legislação à luz dos princípios constitucionais que regem essa nova perspectiva de dignidade da pessoa humana, lá já absorvidas pelas normas infraconstitucionais.

Os dois países dispõem de um sistema penal de garantias individuais. Percebe-se, no entanto, que os desafios na sua implementação são comuns e igualmente gigantescos. Mas certas iniciativas aqui existentes, como o Programa Começar de novo, do Conselho Nacional de Justiça, que atua na sensibilização da sociedade para o oferecimento de oportunidades de trabalho aos presos e egressos do sistema carcerário, são um indicativo de que boas práticas governamentais podem ser conhecidas e compartilhadas.

No fim da manhã, fizemos uma visita guiada à sede do Ministério Público Paraguaio. Na instituição, conhecemos o centro de capacitação de seus membros e servidores, o laboratório forense e também um dos projetos de sua área estratégica de motivação organizacional. Acompanhados da Diretora de Comunicação e Imprensa da instituição, Senhora Elida Fragole, assistimos a parte de uma simulação da pratica dos promotores no julgamento de uma causa de lavagem de dinheiro e, ainda no centro de treinamento, assistimos a uma capacitação de servidores para o recebimento de denúncias de cidadão.

No laboratório forense, fomos recebidos pelo promotor de justiça, Dr. Edgar Sanchez, que nos explicou que tal unidade é dividida em Departamento técnico, operativo e científico. Sua construção, que se insere num contexto de fortalecimento do Ministério Público na luta contra a corrupção e em prol do Estado de Direito, foi financiada pelo programa Umbral, administrado pela Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID).

Como parte desse projeto, conhecemos uma das duas unidades móveis da área operativa, às quais se deslocam às cenas dos crimes. Servem à cidade de Assunção e a localidades próximas. O veículo é

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equipado com gerador de energia e equipamentos que permitem coletar evidências, inclusive amostras biológicas. No Departamento Científico, tivemos a oportunidade de assistir a uma demonstração do trabalho dos peritos da área de papiloscopia e identificação. Também vimos a operacionalização do trabalho investigativo de análise balística e de autenticidade de documentos.

A servidora da área química e biológica informou que o Ministério Público é responsável por um banco de dados que armazena informações genéticas de crianças abandonadas para que essas informações sejam cotejadas com as de pais que procuram seus filhos. A instituição conta ainda com uma área de informática forense, apta a investigar crimes cibernéticos, como os financeiros e os relacionados à pedofilia. Atua ainda na recuperação de dados de correio eletrônico e internet. Por fim, conhecemos a Central de Dados, que interconecta informações das 89 unidades do Ministério Público espalhadas pelo país. O recinto também abriga o comando de defesa cibernética do país, no âmbito de toda a rede governamental.

Em decorrência do fato de o Estado paraguaio ser unitário e de não haver uma Justiça institucionalmente estruturada em várias especializações, seu Ministério Público não possui uma divisão de ramos de atuação, como no Brasil. Em ambos os países, no entanto, a Constituição Nacional de 1992 ampliou bastante seu rol de atribuições e lhe franqueou autonomia funcional e administrativa. Cabe ao Ministério Público paraguaio a defesa da sociedade diante dos órgãos jurisdicionais do Estado, a titularidade da ação penal pública, a defesa do patrimônio público, do meio ambiente, dos povos indígenas e de outros interesses difusos.

Conforme expressa determinação do código de processo penal do país (art. 52), cabe ao Ministério Público o comando das investigações de fatos puníveis segundo a legislação do país. No Brasil, diferentemente, a direção do inquérito policial é atribuição da polícia judiciária dos Estados ou da Polícia Federal, sendo que até há pouco havia certa celeuma acerca dos limites de atuação investigativa do Ministério Público. Recentemente, no entanto, o STF pacificou essa questão no HC 91.661/PE, julgado pela Segunda Turma em 2009, o qual dá respaldo constitucional a essa prerrogativa do Parquet.

A visita proporcionou-nos uma boa impressão acerca da atuação do Ministério Público Paraguaio. Contando com boas instalações e equipamentos modernos, chamou particularmente atenção a preocupação da instituição em proporcionar aos membros e servidores boas condições de trabalho e atualização profissional constante, como pôde ser percebido no acompanhamento das oficinas de capacitação.

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ATUAL SISTEMA PENAL PARAGUAIO – PARTE 2

Assunção, 9 de junho de 2011 Agnaldo José Martins

Supremo Tribunal Federal Brasília – Brasil

No quarto dia, tivemos a oportunidade de conhecer mais um pouco do sistema penal paraguaio e sua evolução, sendo uma delas a implantação dos juicios orales e os princípios que os embasam. Para tanto, visitamos o Juzgado Penal de Garantía de Assunção, onde fomos recebidos pelo Juiz Pedro Mayor Martínez, em seu Gabinete.

O magistrado abordou o paradigma inaugurado pela Constituição Nacional de 1992, que representa um redirecionamento da política e do sistema judicial do país no que tange ao sistema penal. De um modelo inquisitivo, em que tudo se resolvia a portas fechadas, passou-se ao desenho de um modelo constitucional de direitos, com fortalecimento da posição do imputado e das garantias individuais. Segundo o magistrado, persiste, no entanto, um grande desafio, que é o de mudar os esquemas mentais dos juízes, formados em sua grande parte na vigência de um sistema autoritário, que além de concentrar numa só autoridade o papel de investigar e julgar o fato delituoso, não era submetido a nenhum controle fiscalizatório.

Ao entrar numa fase final de transição, o novo sistema penal paraguaio passa, assim, por um processo de adaptação estrutural, que inclui desde a construção de salas de audiência, dispensável no antigo desenho institucional, até a figura do investigador independente e a imputação escrita. Ganha relevo nesse contexto o papel do Ministério Público. Essa divisão de atribuições poderia parecer, numa primeira análise, uma perda de poder do magistrado. Mas, segundo entendimento do Dr. Martínez, ocorre justamente o contrário: seu papel se amplia, já que, além de decidir as causas, procura garantir a todos um livre julgamento, no sentido de que sobre o indivíduo não sejam exercidas pressões ilegais e inconstitucionais.

É nesse contexto que a oralidade se estabelece como mecanismo de garantia do indivíduo, pois permite o direito de enfrentamento das partes em litígio e o controle das audiências por parte da comunidade. Enquanto no processo meramente escrito, existiam prazos estanques e peremptórios para manifestação, no sistema oral a discussão é pública e se dá de forma rápida e transparente, abreviando o processo.

No modelo apresentado, a oralidade é utilizada na instrução do processo não só no julgamento de mérito, mas em todo tipo de incidente, inclusive na fase de execução. O código de processo penal exige audiências orais, com presença das partes, por exemplo, para concessão de medidas cautelares, decisão sobre questões interlocutórias e para quaisquer fatos que digam respeito à análise probatória.

A consolidação de tal modelo encontra algumas resistências. Como ressaltado pelo magistrado, o membro do Ministério Público ainda não se adaptou plenamente a essa dinâmica e o juiz ainda acaba se apegando demasiadamente à formalidade dos documentos escritos. De forma geral, falta preparo aos operadores do direito, incluindo os advogados, para uma intervenção oral adequada na própria audiência e, no que tange ao juiz, sentenciar oralmente ao fim dos trabalhos de instrução do processo, sem interrupções.

Outro desafio imposto pela oralidade é a capacitação dos profissionais que atuam no fórum para utilização do idioma guarani, segunda língua oficial do país, conforme determinação constitucional. Falada principalmente pela população de origem rural e de ancestralidade indígena, o pleno manejo desse signo lingüístico pelos operadores do direito é um imperativo do sistema jurídico paraguaio, pois só assim as partes poderão ser plenamente ouvidas e compreendidas, condição imprescindível para exercício pleno de seu direito à tutela jurisdicional do Estado.

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JUÍZO ORAL NO TRIBUNAL PENAL DE ASSUNÇÃO

Assunção, 10 de junho de 2011 Agnaldo José Martins

Supremo Tribunal Federal Brasília - Brasil

Como parte das atividades de apresentação do panorama do sistema penal paraguaio, assistimos, no quinto dia, a um juízo oral - como é chamada, no sistema judicial paraguaio, a audiência de instrução e julgamento, realizado no Tribunal Penal de Assunção, que se localiza no prédio da Corte Suprema de Justiça do País. Tratava-se do julgamento de um caso de tráfico de drogas, em que a ré era uma cidadã boliviana presa em flagrante por, supostamente, trazer consigo pouco mais de um quilo de cocaína escondidos num recipiente que armazena tererê, bebida a base de ervas muito consumida no país.

A audiência foi presidida pelos juízes Daniel Ferro, Maria Fleitas e Maria Gonzalez. Com a ré presente, acompanhamos a oitiva das testemunhas. A atividade foi bastante interessante, pois permitiu conferir, na prática, a aplicação do modelo de oralidade e do sistema de garantias que embasa a nova ordem jurídico-constitucional do país. Além disso, foi possível marcar sensíveis diferenças com o nosso modelo.

No sistema processual penal paraguaio, o julgamento, desde a primeira instância, é feito por um colegiado de três juízes. Prevalece o decidido pela maioria, inclusive nas questões incidentais. Essa é uma determinação que abrange todos os feitos criminais, mesmo os crimes dolosos contra a vida. O instituto do Tribunal do Júri não tem previsão constitucional no país.

Chamou atenção ainda a disposição física das pessoas presentes na sala de audiência. Para além da cancela, que separa o público dos profissionais envolvidos no julgamento, o representante do Ministério Público se posiciona à direita do advogado de defesa e do réu. Ambos as partes do processo ficam de frente para a mesa na qual se sentam os três juízes do processo. As testemunhas se posicionam entre as duas partes, também de frente para os magistrados.

Não há intermediação do juiz para o registro da fala das testemunhas, como ocorre no nosso sistema. Mesmo com a recente reforma do código de processo penal brasileiro, em que se permite aos advogados e ao representante do Ministério Público a interpelação direta do réu e das testemunhas, percebemos que no sistema processual paraguaio a ênfase que se dá ao instituto da oralidade deixa a testemunha muito mais livre para se expressar, sem muito controle e maiores interrupções de suas falas.

Conforme estabelece o modelo de oralidade, a sentença deve ser dada ao término da audiência. No julgamento em questão, no entanto, não foi possível acompanhar seu desfecho, pois o Ministério Público não providenciou a notificação do perito para falar em juízo acerca do material apreendido. A audiência foi remarcada para a segunda-feira seguinte, data em que a ré seria ouvida e a sentença, finalmente, prolatada.

Ao fim dos trabalhos, o advogado da ré, o defensor público Garcia Aquino Fidel veio conversar conosco e nos deu mais detalhes do caso, nos explicando que foi designado recentemente para o processo e que o julgamento se dava na Capital, em que pese os fatos terem ocorrido na região do Chaco paraguaio, ao norte do país, pois aquela região ainda não contava com órgão jurisdicional instalado. Também nos falou sobre o grave problema das drogas no país e de ser a região onde houve a interceptação policial uma rota do tráfico internacional de entorpecentes que parte da Bolívia.

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Quando já nos preparávamos para deixar a sala de julgamento, fomos gentilmente convidados por um dos juízes do processo, Dr. Daniel Ferro, para uma conversa em seu Gabinete. O magistrado deu-nos maiores detalhes do processo, enfatizou as recentes mudanças no sistema processual do país, em conformidade com a explanação das autoridades em atividades anteriores, e colocou-se à disposição para que pudéssemos dirimir eventuais dúvidas.

Ficamos muito bem impressionados, ao longo dessa primeira semana, com os esforços da CSJ, que gere todo o sistema judicial do país, em implementar o modelo de garantias delineado pelo legislador. Tivemos a oportunidade de conhecer algumas iniciativas que criam condições para sua efetividade, tanto no que tange as instalações físicas das circunscrições judiciais, quanto no que diz respeito à capacitação de seus membros e servidores segundo a nova perspectiva constitucional.

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VISITA À ÁREA DE CONTROLE DE GESTÃO

Assunção, 13 de junho de 2011 Agnaldo José Martins

Supremo Tribunal Federal Brasília - Brasil

Iniciamos a segunda semana de intercâmbio na Corte Suprema de Justiça do Paraguai com uma visita a sua Área de Controle da Gestão. Inicialmente conhecemos a Oficina de Quejas y Denúncias. Os servidores Ovidio Villalba e María Gímenez de Barrios, assessor e chefe da unidade, respectivamente, nos disseram que tal unidade faz parte de uma política de transparência e participação do cidadão na Administração do sistema de justiça do país. Os procedimentos envolvem a recepção, o registro e a análise preliminar de queixas e denúncias apresentadas contra a atuação de magistrados, servidores e auxiliares de justiça

Segundo os responsáveis por esse núcleo, o cidadão pode denunciar casos de mal atendimento, corrupção, extravio ou morosidade dos processos, além da ausência de funcionários no serviço. As queixas podem se referir ao mau funcionamento ou falta de um serviço no âmbito do Poder Judiciário. O denunciante deve se identificar, mas seus dados são mantidos em sigilo. Deve relatar o fato e as circunstâncias que o caracterizam e apresentar provas, se as possui.

As linhas gerais para a criação desse modelo de transparência advieram, segundo os expositores, das diretrizes delineadas pela Constituição de 1992, fonte do marco democrático da vida institucional do país. Até então, a Corte Suprema não dispunha de estruturação em termos de controle da gestão. O grande desafio das autoridades consiste, no entanto, em superar caldo de cultura autoritário, ainda recente na memória institucional do país, o que ainda causa um certo temor ou mesmo descrença por parte do cidadão comum em se manifestar sobre os desvios de conduta dos servidores e agentes do Estado.

Os principais casos que chegam à Oficina de Quejas y Denúncias dizem respeito à falta ou ausência dos servidores em seu local de trabalho durante o expediente. Só em 2010, houve, segundo os expositores, mais de 700 denúncias por tal motivo, quase metade do total. A razão de tal estatística estaria em certo costume ancestral permissivo, fruto justamente da falta de profissionalização e controle das atribuições dos servidores do Estado.

As sanções disciplinares previstas incluem desde a advertência (a juízes e a servidores) à destituição do servidor cargo. No caso dos auxiliares de justiça, pode haver o cancelamento da matrícula e a vedação permanente da profissão. O órgão responsável por aplicar as sanções é o Conselho de Superintendência da Corte, composto por seu presidente e os dois vice-presidentes da instituição.

Em seguida a essa explanação, passamos à Diretoria Geral de Auditoria de Gestão Judicial, a cujo respeito nos falou o servidor Mario Elizeche. Sua função é colaborar com o Conselho de Superintendência, a título de recomendação, para assegurar uma tramitação eficiente dos julgamentos. As várias unidades de tal Diretoria têm como foco o controle do trabalho judicial nas diversas Varas espalhadas pelo país (339 no total) - denominadas despachos judiciales, com o propósito de assegurar um bom funcionamento do sistema de administração de justiça.

Para alcançar tal propósito, tais unidades exercem as atividades de compilação de informação estatística das diversas varas, alimentação e administração de uma base de dados, administração de um sistema de riscos e elaboração de um plano anual de auditorias. No que tange à auditoria de campo, faz-se uma revisão dos procedimentos, avalia-se os elementos de controle interno da gestão e investiga-se a origem das deficiências encontradas. Também compete a tal Diretoria exercer o controle reativo, com investigação do alcance das denúncias feitas.

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A terceira Diretoria à qual fomos apresentados, e que também atua na referida área de controle da gestão, foi a de Auditoria Interna, responsável pelo controle da gestão administrativa e financeira da CSJ. Sua missão, segundo o Diretor Miguel Fornells, é aperfeiçoar o processo de transparência e eficiência da gestão administrativa e resguardo do patrimônio da Corte.

O setor é uma das unidades da Corte contempladas pelo programa UMBRAL, administrado pela Agência Norte-americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID), cujo apoio, no âmbito do Poder Judiciário, se dá por meio de investimentos que contemplem a consolidação dos sistemas de controle da gestão judicial e disciplinar e o fortalecimento dos sistemas de controle interno administrativo e financeiro e do Tribunal de Contas. Estando já na segunda fase do programa, a ênfase está no controle estratégico, de gestão e de avaliação. As atividades incluem participação em reuniões de trabalho, cursos de capacitação, atualização de manuais, adequação de espaço físico e adoção de equipamentos tecnológicos de ultima geração, de maneira a agilitar os trabalhos.

Suas principais funções são a avaliação, a detecção e a recomendação a partir dos dados coletados nas auditorias de gestão administrativa, financeira, registral e da verificação das denúncias. Não há participação nos processos operativos. Para tanto, goza de independência, vinculando-se a normas internacionais de Auditoria, em harmonia com as Exigências da CSJ.

Também é de sua alçada a verificação das denúncias de natureza administrativo-financeira provenientes da Oficina de Quejas y Denúncias, da Superintendência Geral de Justiça, ou do próprio do Conselho de Superintendência da CSJ, como marco do novo sistema de controle disciplinar da instituição.

Em consonância com tal propósito, a maioria das recomendações feitas ao Conselho de Superintendência se traduziram, segundo o responsável pela Unidade, em disposições para implementá-las. Isso tem proporcionado a melhora da gestão administrativo-financeira das diferentes dependências que compõem a administração da Corte, além de fortalecer a imagem institucional. A Diretoria Geral de Auditoria Interna tem logrado, segundo relato do responsável pela unidade, ser um referente institucional nos procedimentos de controle interno, o que contribui para a melhora da imagem da Corte Suprema de Justiça ante os diferentes grupos de interesse da sociedade.

A última atividade do dia foi uma visita à Oficina de Ética Judicial. Como nos explicou o servidor Esteban Kriskovich, diretor da unidade, a Oficina é o órgão encarregado de implementar o Código de Ética Judicial. Tal documento, promovido pela própria CSJ, é resultado de um processo de elaboração participativo, que incluiu magistrados, consultores, representantes de organizações civis, além de pesquisas feitas com os cidadãos e usuários do sistema judicial.

Datado de 2006, trata-se do primeiro código de ética judicial do Paraguai e tem o propósito de buscar a excelência no serviço de Justiça, com indicação dos valores da função judicial no Paraguai e regulação dos deveres éticos do juiz, protegendo os bens morais da sociedade.

O Escritório de Ética Judicial tem a seu cargo a tramitação de denúncias e consultas éticas, assim como a promoção e difusão geral do código de ética judicial. Entre suas atividades se incluem, igualmente, o suporte e a coordenação das atividades do Tribunal de Ética Judicial (cuja medida sancionatória é a responsabilização ética) e do Conselho Consultivo do Código de Ética Judicial (que responde a questões éticas formuladas por membros do Poder Judiciário e entidades representativas da sociedade civil).

As medidas éticas se aplicam aos juízes paraguaios de qualquer instância, inclusive aos membros da Corte Suprema. Entre tais medidas estão a recomendação, a advertência e censura. Segundo o servidor responsável pelo núcleo de Ética Judicial da CSJ, o ponto forte desse sistema está justamente na ausência de caráter sancionador, de cunho jurisdicional. Em que pese não haver aplicação de sanções penais, administrativas ou civis, seus juízos e conclusões têm eficácia moral, de forte valor simbólico, e depende principalmente do reconhecimento de sua legitimidade, advindo de

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diferentes atores sociais. Sua eficácia também radicaria no elevado nível de correção moral e formação intelectual de seus artífices, assim como no modelo destacado de eleição de seus membros, que se realiza de forma independente do Poder Judiciário.

Como a Corte Suprema de Justiça do Paraguai é responsável pela supervisão administrativa, funcional e financeira de todo o sistema judicial do país, suas atribuições não encontram correspondentes exatos no modelo brasileiro. Considerando essa peculiaridade, pode-se dizer que a área de Controle da Gestão engloba as atribuições que aqui, corresponderiam à Corregedoria no âmbito dos Tribunais de Segunda instancia e, no caso do STF, de sua Secretaria de Controle Interno.

Dentre as unidades da área de controle da gestão da CSJ, chamou particularmente atenção a Oficina de Quejas y Denúncias, núcleo voltado à participação do cidadão para a correção de rumos do sistema judicial. Tal iniciativa é um exercício de autocrítica e demonstra a preocupação da Corte em ouvir a sociedade sobre a atuação tanto de seus juízes, quanto de servidores. Trata-se de uma política comunicacional louvável, pois ao garantir o acesso à informação sobre o Poder Judiciário, caminha na direção de uma Justiça democrática, transparente e inclusiva, colocada a serviço da pessoa. Essa deve ser a essência de um Estado de Direito democrático.

No âmbito do STF, com atuação mais ampla, temos a Central do Cidadão, que igualmente estabelece uma via de comunicação direta com o jurisdicionado e tem como propósito melhorar a prestação jurisdicional. No caso do órgão de cúpula do Poder Judiciário brasileiro, são recebidos e processados, além de respondidos, pedidos de informação, providência jurisdicionais relativas à tutela da liberdade, sugestões, solicitações, reclamações acerca da morosidade judicial, além de críticas relacionadas com a atuação do STF. Seu objetivo é elevar os padres de transparência, presteza e segurança das atividades do Supremo.

No que diz respeito à Diretoria Geral de Auditoria de Gestão Judicial e à Controladoria Interna, ambas também subordinadas à Área de Controle da Gestão da CSJ, seus equivalentes aproximados no âmbito do Poder Judiciário brasileiro, são as corregedorias no âmbito dos tribunais de justiça estaduais e regionais federais e as unidades de Controle Interno de cada um desses órgãos, respectivamente.

Considerando as características de repartição de competências próprias de um Estado Federado, não é atribuição constitucional do STF exercer auditoria da gestão judicial de processos que não sejam aqueles afeitos à sua alçada. Igualmente, como consequência lógica desse desenho institucional, cabe a ele, tão somente, o exercício de auditoria e controle relacionados às suas funções administrativas e financeiras. Os padrões a serem observados seguem, obviamente, as mesmas linhas mestras.

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VISITA À DIREÇÃO DE DIREITOS HUMANOS E AO CENTRO INTERNACIONAL DE

ESTUDOS JUDICIAIS

Assunção, 14 de junho de 2011 Agnaldo José Martins

Supremo Tribunal Federal Brasília - Brasil

No nosso sétimo dia de atividades na Corte Suprema de Justiça, conhecemos a Dirección de Derechos Humanos e o Centro Internacional de Estudios Judiciales.. Também tivemos a oportunidade de conhecer o Centro de Documentação e Arquivo (Museu da Justiça). Tais unidades estão vinculadas à Área de Estratégia e Apoio Institucional da Corte.

A Dirección de Derechos Humanos, conforme apresentação dos servidores Julia Fernandez e Ramón Cervín, foi criada como organismo técnico administrativo especializado da CSJ, com funções de monitoramento, informação, investigação, análise e difusão. Em 2006 teve suas funções ampliadas, passando às tarefas de assessoria técnica, articulação e promoção em capacitação. Não se trata, pois, segundo ressaltaram os expositores, de um órgão para recebimento de denúncias. Para tais demandas, há outros foros adequados, como o Ministério Público.

Suas áreas temáticas prioritárias são a infância e a adolescência, gênero, questões indígenas e casos internacionais ante o sistema americano de Direitos Humanos. Suas linhas de ação estratégicas são a elaboração e o estímulo de programas e projetos de intervenção focados de acordo com as áreas temáticas. Também fornece assessoria técnica aos operadores judiciais acerca da doutrina de Direitos Humanos e sua aplicabilidade na administração da justiça. Além disso, realiza ações de investigação e monitoramento a respeito de denúncias contra o Estado paraguaio ante o Sistema Internacional de Proteção dos Direitos Humanos.

O objetivo da Oficina é o desenvolvimento de uma ação institucional de promoção e proteção dos direitos humanos na rede estatal, enfocada essencialmente na administração da justiça. Essa perspectiva de ação é levada adiante por meio de um trabalho conjunto com diversas instâncias governamentais e não-governamentais, combinado com o desenvolvimento de uma capacidade para brindar soluções a problemas imediatos que os operadores de Justiça enfrentam diariamente, por meio do assessoramento técnico multidisciplinar e de um trabalho de investigação e análise em matéria doutrinária.

A Corte Suprema de Justiça do Paraguai concentra várias iniciativas e serviços que não encontram correspondência em uma Corte constitucional, no sentido mais estrito do termo. A conformação da Dirección de Derechos Humanos, por exemplo, está mais próxima das atividades de um órgão do Poder Executivo brasileiro, já que se destina a consultas técnicas e a formulação de políticas públicas na área de direitos humanos. No caso brasileiro, tanto o Ministério da Justiça, no âmbito federal, quanto, mais recentemente, o Conselho Nacional de Justiça, são alguns dos órgãos responsáveis por tais programas.

Mas essa unidade também é responsável pelo suporte técnico em decisões judiciais que envolvam conhecimento multidisciplinar nas áreas de saúde, psicologia e serviço social, principalmente no âmbito de direito de família, da infância e da juventude. Assim, exerce papel similar aos dos núcleos de assistência psicossocial forense existente na Justiça comum estadual, que atuam no apoio técnico às Varas correlatas.

A segunda atividade do dia foi a apresentação da Divisão de Investigação, Legislação e Publicações, pertencente ao Centro Internacional de Estudos Judiciais, também integrante da Área de Estratégia e Apoio Institucional da Corte. Fomos recebidos pelas servidoras Carmen Montanía, Rosa Di Martino e

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Mirian Santos. Além de nos apresentarem as instalações da unidade, foram nos explicadas as linhas gerais de seu trabalho.

O Centro Internacional de Estudos Judiciais da Corte Suprema de Justiça foi criado em 1996 e tem como principais atribuições a publicação de obras jurídicas com a finalidade de prestar serviços à magistratura e à comunidade jurídica nacional; elaborar compilações normativas; difundir a jurisprudência da Corte, além de sistematizar suas resoluções; e também organizar cursos e jornadas de estudos em diversas matérias.

São quatro as áreas em que atua essa unidade: base de dados de jurisprudência, publicações, biblioteca virtual e serviço de assessoria técnica e informação documental. A base de dados, disponível ao público em geral pelo endereço http:// www.csj.gov.py/jurisprudencia, é um sistema de informação que contém acórdãos e sentenças das Salas Civil, Penal e Constitucional da CSJ.

No que tange às publicações, são elaboradas obras jurídicas, resultado de pesquisas de membros de tal unidade e também de magistrados e juristas convidados. São disponibilizadas em formato papel e em DVD. Também é publicada uma revista trimestral de doutrina e jurisprudência relevante produzida pela CSJ.

A Biblioteca Virtual é um website no qual são publicados, no formato “livro digital”, obras jurídicas acerca de assuntos variados nas áreas constitucional, civil, processual civil, penal, processual penal, infância, adolescência e temas correlatos. Esse material está disponível para download gratuito por meio do link: www.pj.gov.py/ebook. Há a opção de aquisição impressa de tais obras, franqueada aos interessados a preço de custo. Acerca do serviço de assessoria técnica, a Unidade provê as demandas dos membros do Poder Judiciário de informações jurídicas relativas a legislação e jurisprudência da Corte.

No STF, a área responsável pelas atividades que são correlatas às desenvolvidas pela Divisão de Investigação, Legislação e Publicações é a Secretaria de Documentação, que igualmente conta com uma Coordenadoria de Biblioteca e de Divulgação de Jurisprudência. Nossa Biblioteca Digital disponibiliza, em meio digital, documentos de diversas áreas do Supremo de interesse da sociedade. As informações são apresentadas em diferentes suportes, como livros, fotografias e outros. Igualmente contamos com um serviço de pesquisa de jurisprudência, franqueado tanto ao público externo quanto aos Ministros da Corte.

A última atividade do dia incluiu uma visita ao Centro de Documentación y Archivo para La Defensa de los Derechos Humanos, onde se localiza o “Museu da Justiça”. Nesse espaço, se encontra uma mostra permanente de 17 vitrines, contendo maquetes, desenhos e fotografias. Ali tivemos a oportunidade, por meio da explanação do servidor Santiago Riera, de conhecer a história das instituições judiciais paraguaias, desde a “Justiça” tribal do povo guarani, passando pela época colonial, consolidação da independência, até a época atual. Chama particularmente a atenção o período marcado pelos últimos governos ditatoriais do país, nos quais a violação dos direitos humanos, por meio da repressão policial às manifestações, mesmo pacíficas, de pessoas ideologicamente não identificadas com o regime, era a regra.

Há no museu réplica de aparatos de tortura, fotografias, além de registro de relatos de vítimas desse longo período de exceção institucional no país. Importante registro de uma época nada auspiciosa, esses fatos históricos somente podem ser contados hoje, pois o povo paraguaio vive um regime democrático e tem lutado pelo fortalecimento de suas instituições.

É importante ressaltar que o “Museu da Justiça”, que constitui uma memória viva tanto do passado pré-colonial, quanto da recente história institucional do país, é um espaço de visitação de crianças e demais estudantes de diferentes níveis de ensino de todo o país, que podem, de forma simples e didática, se interar da evolução histórica da administração da justiça paraguaia. Nesse sentido,

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cumpre sua função de custodiar um grande patrimônio documental, fortalecendo o acesso dos cidadãos à informação histórica, o que contribui para a não repetição de tais acontecimentos.

Posteriormente, fomos conhecer a sala que guarda os “arquivos do terror” paraguaio. Trata-se de documentos que faziam parte do acervo do Departamento de Investigações e que foram resgatados e submetidos a custodia judicial no fim do ano de 1992. Compõem-se de fichas policiais das pessoas presas durante o regime militar daquele país.

Tais documentos, cerca de dez mil fichas, foram inventariados e classificados e estão à disposição dos familiares das vítimas desaparecidas, de estudiosos, dos governos e da sociedade em geral. Seu conteúdo, catalogado em cerca de 200 pastas, contém informações sobre o papel repressor da polícia durante o último Regime ditatorial do país. Abrange desde prontuários de presos, livros apreendidos pela polícia, de áudio e fotografias também apreendidas pela repressão estatal. Além dos originais impressos, a documentação se encontra microfilmada e digitalizada, totalizando cerca de um milhão de imagens, o que permite a consulta e impressão de tais documentos, preservando-os.

Segundo os responsáveis pelo acervo, recentemente o referido arquivo foi incluído no Registro do Programa Memória do Mundo como “Patrimônio Intangível da Humanidade”. E, conforme nos informou a servidora Rosa Palau, diferentemente de outros Arquivos similares na América Latina, há algumas características que o fazem único, entre elas o fato de franquear acesso irrestrito ao público e sua custódia pelo Poder Judiciário.

O que particularmente mais chamou a atenção na visita foi a ficha policial, que incluía fotografia de identificação e digitais, de uma menina de 12 anos, presa e imputada criminalmente como adulta, no não tão distante ano de 1982. Depois que seus pais, agricultores, terem sido detidos após irem à Capital para protestarem contra a expropriação de suas terras, a jovem acabou nas mãos da polícia do Regime e ficou presa por vários meses para averiguações. Esse documento, reproduzido e exposto numa das paredes do Museu, além de representar o ápice da derrocada das instituições, é o símbolo máximo da loucura totalitária, sempre usurpadora dos direitos básicos da cidadania.

Tais arquivos encerram quase meio século da história oculta do Paraguai e da América Latina. Constituem fonte inesgotável para estudos e investigações, não só de cunho histórico, mas também no âmbito das reparações cíveis e de retribuição penal. Além disso, corrobora para manter viva a memória recente do país e para impedir que se permita o relaxamento da vigilância contra a repetição de processos que levem à deterioração do Estado democrático de Direito e, por conseguinte, ao retorno de tal estado de coisas. A iniciativa deveria seguir de exemplo para os demais países da região, que têm uma história institucional comum. A manutenção do sigilo dos documentos que registram os fatos dessa época mascara um período de graves violações dos direitos humanos por parte do Estado.

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VISITA À DIREÇÃO DE COMUNICAÇÃO E AO PALÁCIO DA JUSTIÇA

Assunção, 15 de junho de 2011 Agnaldo José Martins

Supremo Tribunal Federal Brasília - Brasil

No penúltimo dia de atividades, conhecemos o trabalho da Dirección de Comunicaciones, unidade integrante da Área de Estratégia e Apoio Institucional da Corte Suprema de Justiça. Segundo o coordenador da unidade, servidor Luis Gimenez, com sua criação a Corte pretendeu fortalecer sua imagem perante a opinião pública. O foco é tanto a comunicação externa, quanto interna. Além disso, tem especial destaque o trabalho de interface com os meios de comunicação do país.

No que tange à comunicação externa, chamou especialmente atenção o servicio de comunicación ciudadana y marketing social. Mediante um programa denominado Educando en Justicia, a CSJ promove o acesso às crianças em idade escolar, assim como a jovens e adultos interessados, a informações sobre o funcionamento do Poder Judiciário paraguaio.

A Visita Educativa al Palacio de Justicia inclui um passeio guiado às principais repartições da Corte em Assunção, às salas de julgamento, além de um bate-papo com os próprios juízes e ministros. Outro módulo do programa particularmente interessante é o Juez que yo quiero y que necesitamos. Essa atividade, também a cargo da Dirección de Comunicaciones, consiste em visitas às escolas, onde se desenvolvem oficinas para professores e alunos sobre a administração da Justiça, da qual participam defensores públicos e juízes locais.

Em tal espaço são abordados temas sobre os direitos e deveres das crianças, além das atribuições e responsabilidades dos magistrados. Ademais, as crianças têm a oportunidade de se manifestarem, de forma lúdica, sobre a representação social que têm do Poder Judiciário. Os materiais produzidos são recolhidos e passam a formar parte do mural da campanha.

Segundo nos informou o coordenador do programa, além de instruir professores e alunos acerca dos canais de acesso à cidadania, tal projeto é importante pois, além de fornecer um panorama sobre a percepção do homem comum sobre o sistema de administração da Justiça, pode colher in loco as principais demandas da comunidade e receber denúncias sobre potenciais violações de direitos de crianças e adolescentes.

Quaisquer iniciativas que promovam a aproximação do cidadão comum com os meios de defesa de seus direitos devem ser valorizadas e multiplicadas. Tais políticas são precipuamente importantes em sociedades carentes da presença do Estado e onde as instituições ainda são frágeis e desprovidas de credibilidade perante os cidadãos. Nesse sentido, percebe-se o esforço da CSJ de não só mudar a imagem de desconfiança e desalento do povo paraguaio em relação as suas instituições, profundamente associadas à corrupção de seus membros e à ineficiência de seus serviços, como também de melhorar a prestação jurisdicional do Estado, particularmente aos mais pobres e menos assistidos, mesmo nas regiões mais isoladas do país.

Ao se traçar um paralelo com as atribuições da área de comunicação do STF, verifica-se que as atividades da Dirección de Comunicaciones da CSJ são mais e diversificadas. Além das iniciativas já mencionadas, há as atividades de comunicação interna, por meio de noticias disponibilizadas pela

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página web da instituição e informes impressos sobre o dia a dia da CSJ. E também abarca a comunicação institucional com a “ruidosa” mídia do país.

Nesse último ponto, o trabalho parece ser particularmente intenso já que, assim como no STF, a Corte disponibiliza aos diferentes meios de comunicação do país uma sala de imprensa nas próprias dependências da instituição. E como a constituição do país garante o livre trabalho da imprensa, são comuns as denúncias de desvios éticos e legais por parte dos magistrados e as polêmicas acerca de certas decisões judiciais. Em todos esses casos, a Dirección de Comunicaciones é chamada a se manifestar sobre o posicionamento institucional da CSJ sobre tais fatos.

A impressão sobre o trabalho da área de comunicação da CSJ foi, em geral, bastante positiva. Elevada ao status de área estratégica e engajada na missão institucional de se construir a imagem de um Poder Judiciário transparente, eficiente e atento às demandas do cidadão comum, os programas implementados indicam, para que o caminho em tal direção está sendo construído com êxitos visíveis.

Impressão parecida, no que diz respeito à transparência e profissionalização do corpo funcional da CSJ, foi deixada na visita que fizemos à Dirección de Recursos Humanos. A diretora de Administração de Pessoal da Unidade gentilmente nos recebeu em seu gabinete de trabalho. Interessada acerca do funcionamento da área no STF, fez um apanhado do seu trabalho à frente do desafio de administrar o dia a dia funcional de mais de quatro mil servidores judiciais de todo o país. Em que pese haver certa descentralização administrativa no âmbito das quinze circunscrições no interior do país, a administração burocrática da área, assim como as decisões estratégicas, ficam em Assunção.

Foi ressaltada na visita a implementação de uma política de meritocracia no que diz respeito à ocupação dos cargos técnico-administrativos da CSJ e o estabelecimento de maior rigor no âmbito disciplinar, dado o histórico de clientelismo na Administração Pública e pouca afeição dos servidores ao cumprimento de seus deveres funcionais. Para tanto, a ocupação dos cargos, em seus diferentes níveis de complexidade, tem sido feita por meio de provas de conhecimento e exames psicotécnicos. Segundo a Diretora, essa é uma política recente da instituição, o que a coloca na vanguarda frente aos outros poderes do Estado, cujas políticas de admissão de pessoal são menos transparentes.

O estabelecimento de critérios objetivos de admissão de pessoal, baseados na competência técnica dos candidatos, é um avanço no caminho da profissionalização do corpo funcional da instituição. Feita a ponderação de que, mesmo compartilhando o ambiente democrático, a realidade institucional dos países é distinta, pois são sujeitas às peculiaridades político-culturais dos seus povos, o que deve ser respeitado em qualquer exercício comparativo, percebe-se que a ausência de concurso público para o preenchimento de cargos efetivos da CSJ - e de publicidade e isonomia a ele inerentes no nosso sistema -, são fatores de entrave ao seu intento de melhor profissionalizar seus quadros e de fragilização da própria imagem da instituição.

Tal sistemática vai de encontro a várias iniciativas exitosas da CSJ de combate à corrupção judicial, de dar transparência ao seu sistema de Administração da Justiça e de se aproximar do jurisdicionado por meio de programas de facilitação de acesso à Justiça.

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VISITA À DIREÇÃO DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS E INTEGRIDADE

INSTITUCIONAL E À OFICINA DE MEDIAÇÃO

Assunção, 16 de junho de 2011 Agnaldo José Martins

Supremo Tribunal Federal Brasília - Brasil

No último dia de visita institucional à Corte Suprema de Justiça, conhecemos o trabalho da Dirección de Asuntos Internacionales e Integridad Institucional e da Oficina de Mediación.

A primeira unidade faz parte da Área de Estratégia e Apoio Institucional da Corte. É a autoridade central do país no que tange à tramitação de Cartas Rogatórias. Conforme nos relatou o servidor Christian Acosta, coordenador da unidade, a Dirección de Asuntos Internacionales, depois de estabelecido o canal diplomático entre o Poder Judiciário Estrangeiro e a Chancelaria respectiva com o Ministério de Relações Exteriores do Paraguai, é a responsável por fornecer as informações judiciais - de competência dos distintos julgados do interior ou da capital e em qualquer instância, requeridas pelo Estado estrangeiro.

Chama atenção o fato de, em que pese haver um Ministro supervisor da atividade, o fato de uma Unidade administrativa ter autonomia para tal atribuição, o que diminui sensivelmente os prazos de tramitação dos processos dessa natureza, corroborando no propósito de desburocratizar o sistema e desafogar os Ministros do vasto leque de suas atribuições administrativas. Além dessa atividade, que no Brasil desde a Emenda Constitucional de Reforma do Judiciário é de competência do Superior Tribunal de Justiça, a Dirección de Asuntos Internacionales e Integridad Institucional é também responsável pela assistência aos magistrados e ministros da CSJ no âmbito das atribuições de sua alçada.

Em tal incumbência, atua no fortalecimento da presença da Corte perante organismos e eventos internacionais de caráter judicial, na propositura e análise de projetos de colaboração bilateral ou multilateral e como fonte de consulta permanente para magistrados no que tange ao direito internacional comparado. Ocupa o dia a dia dos servidores dessa unidade também toda a logística de idealização, de propositura e de viabilização da participação dos integrantes do Poder Judiciário local em congressos, seminários e cursos de caráter internacional;

Oportuno considerar que a Unidade é uma das poucas da CSJ que tem autonomia orçamentária para gerir tais atribuições, o que revela sua importância estratégica para a instituição, assim como o alto grande de comprometimento de seu corpo técnico ante tão vastas e complexas atividades. Com pequena estrutura, poucos profissionais e recursos modestos, a Dirección de Assuntos Internacionales realiza um trabalho excepcional no âmbito da Corte, o que, no que tange ao presente intercâmbio, pôde ser constatado tanto na idealização das atividades, quanto no cumprimento da programação e no suporte que nos foi dado nesse período de visita institucional à CSJ.

A última atividade de nosso intercâmbio consistiu numa visita à Oficina de Mediación, em que tivemos a oportunidade de, além de conversar com os mediadores acerca dos aspectos teóricos do programa, assistir a uma simulação de atendimento com os próprios profissionais e discutir as

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questões afeitas às principais dificuldades e desafios no atendimento aos cidadãos que procuram o serviço.

A mediação é um procedimento no qual um terceiro imparcial ajuda as partes a resolver seus conflitos. Diferencia-se da conciliação porque não se realiza diante de um juiz e ao mediador não lhe é dado propor soluções às partes. Na mediação, as partes conservam a responsabilidade e o controle a respeito da controvérsia e não transferem ao mediador o poder da tomada de decisões

Diante do aumento progressivo dos conflitos e da tendência de judicialização de grande número de fenômenos sociais, desde os mais prosaicos, as iniciativas de resolução alternativa de disputas, que favorecem o diálogo e a busca de acordo entre as partes, num processo menos custoso, mais rápido e participativo, se afirmam como parte importante do sistema de Administração de Justiça de uma sociedade.

Em tal contexto, busca-se, com a mediação, “desafogar” os tribunais, além de reduzir o custo e a demora na resolução dos conflitos; incrementar a participação da comunidade; facilitar o acesso à Justiça e oferecer à sociedade uma fórmula mais efetiva de resolução de disputas. Foi no âmbito dessa filosofia, conforme nos foi relatado pelas mediadoras, que a CSJ criou a Oficina de Mediación del Poder Judicial em 2000. A Oficina tem como objetivo ser um serviço efetivo de acesso à Justiça, que permita aos cidadãos que judicializaram seus conflitos, resolvê-los cooperativamente, por meio de acordos mutuamente aceitáveis.

Ressalte-se que é possível a transferência de uma lide para a oficina de mediación em qualquer fase do processo, até o momento que antecede a sentença definitiva. E o juiz deve orientar as partes da existência do programa e da vantagem da mediação para a autocomposição do litígio. Existe também a possibilidade de ao menos uma das partes em conflito procurar voluntariamente o serviço de mediação antes de darem início a um processo judicial. O caminho extrajudicial da mediação é estimulado quando o cidadão procura o Ministério Público, a Defensoria Pública ou qualquer outro órgão do Estado para relatar seu problema e pedir ajuda. Para tanto, há um trabalho coordenado de divulgação do programa em diferentes instituições e setores da sociedade.

Além dos casos extrajudiciais, as causas que podem ser submetidas à Oficina de Mediación, são procedentes das varas cível e comercial, e família, da infância e juventude, trabalhista, justiça de paz e, desde 2006, abre a possibilidade de atuação no âmbito penal, no que tange aos casos de ação penal privada. Os resultados têm sido considerados bastante satisfatórios já que das audiências que se realizam, o índice de acordos tem superado 60% dos casos ao longo da implementação do programa.

Ao lado do Sistema Nacional de Facilitadores Judiciales, o programa de mediação judicial, levado a cabo pelas Oficinas de Mediaciones, é uma das ações da CSJ que mais trouxe impressões positivas acerca do sistema de administração de justiça paraguaio. Elaboradas em consonância com as peculiaridades políticas, sociais e étnicas do país, que ainda padece de baixo nível de institucionalização e escassa participação da sociedade civil nas instâncias de controle, tais iniciativas revigoram um dos Poderes do Estado.

Paralelamente à missão constitucional do Poder Judiciário de prestar a jurisdição a quem a ele recorra, vislumbra-se com tais políticas, uma ação positiva de apoderamento, de promoção da

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cidadania por meio da conscientização das pessoas acerca de seus direitos e da reestruturação das relações sociais - com valoração da responsabilidade individual, o que culmina em maiores êxitos na prevenção de novos conflitos.

Em cotejo com o Estado brasileiro, os nossos juizados especiais cíveis e criminais, tanto no âmbito estadual quanto federal, apresentam pontos de contato com o sistema de mediação do país vizinho. O incentivo à oralidade, celeridade e informalidade dos procedimentos judiciais tiveram o escopo de aproximar a Justiça do cidadão comum e, por meio das audiências preliminares de conciliação, afastar os também elevados índices de judiciliazação dos fenômenos sociais, também comuns por aqui.

A legislação brasileira não prevê, no entanto, a possibilidade de mediação extrajudicial de conflitos sociais nos moldes experimentados pelo país guarani. Igualmente, as possibilidades de conciliação por aqui se circunscrevem a direitos patrimoniais. Causas envolvendo direito de família, infância e juventude e de direito penal estão fora do alcance de meios alternativos à atuação de juiz investido de jurisdição e competência específica na matéria.

Em que pese a ausência de similitude legislativa e a peculiaridade dos desenhos institucionais de cada país, o intercâmbio de experiências, que permita o debate acerca das estruturas próprias dos sistemas de administração de justiça e das políticas públicas de promoção de direitos e de livre acesso à Justiça são sempre enriquecedores. Se bem compreendidos e difundidos, culminam no fortalecimento das relações bilaterais e das próprias instituições dos países parceiros.

Outra decorrência necessária de programas de intercâmbio profissional como o ora vivido, é o amadurecimento de um espírito de respeito às diferenças culturais e de estreitamento das relações de amizade entre nossos países. Isso se torna mais premente se considerarmos os laços históricos que nos une e os desafios comuns de superação da pobreza e de consolidação de nossa jovem democracia. E é só numa sociedade que tenha um Poder Judiciário austero, íntegro e transparente, com compromissos firmados com o cidadão, que tais metas podem ser alcançadas.

Nesse sentido mais abrangente, o programa cumpriu satisfatoriamente seus objetivos.