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2009 Profissão Docente Luiz Fernando Rankel Rosângela Maria Stahlschmidt

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2009

Profissão

Docente

Luiz Fernando RankelRosângela Maria Stahlschmidt

IESDE Brasil S.A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br

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© 2009 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais.

R198 Rankel, Luiz Fernando; Stahlschmidt, Rosângela Maria. / Pro-fissão Docente. / Luiz Fernando Rankel; Rosângela Maria

Stahlschmidt. — Curitiba : IESDE Brasil S.A., 2009.156 p.

ISBN: 978-85-387-0191-0

1. Professores – Formação. 2. Professores – Treinamento. 3. Di-dática. 4. Prática de ensino. I. Título. II. Stahlschmidt, Rosângela Maria.

CDD 370.71

Capa: IESDE Brasil S.A.

Imagem da capa: Jupiter Images/DPI Images

Mestre em História pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Gradua-do em História pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Palmas. Professor de Ensino Superior. Tem experiência na área de História, com ênfase em Teoria e Filosofia da História. Atuando principalmente nos seguintes temas: Exposição Antropológica Brasileira, Museu Paranaense, Antropologia e Arqueologia, Brasil Império.

Luiz Fernando Rankel

Mestre em Educação pelo Centro Universitário Diocesano do Sudoeste do Paraná. Especializada em Metodologia para o Ensino da Matemática pelo Centro Universitário Diocesano do Sudoeste do Paraná. Graduada em Pedagogia pela Fa-culdade de Filosofia Ciências e Letras de Palmas, com habilitação em Orientação Educacional e Administração Escolar. Graduada em Ciências com habilitação em Matemática pelas Faculdades Reunidas de Admin. Ciências Contábeis e Econô-micas de Palmas. Professora de Educação Básica da rede estadual de ensino do Paraná e do Ensino Superior.

Rosângela Maria Stahlschmidt

Sumário

A (des)construção da identidade docente ...................... 13

Identidade da profissão docente ......................................................................................... 15

Crise da profissão docente ..................................................................................................... 17

História da profissão docente .............................................. 27

Contexto sócio-histórico do surgimento da profissão docente ............................... 27

A reforma pombalina dos estudos secundários ............................................................ 28

A formação de professores no Brasil .................................................................................. 29

Trajetória da profissão docente durante o século XX ................................................... 33

Ser professor: angústias e dilemas ..................................... 41

Retórica e precarização do trabalho docente ................................................................. 42

Diretrizes e enfrentamentos na formação dos professores ....................................... 46

Profissão docente, ciência interdisciplinar e representações sociais ............................................................ 57

As representações coletivas em Durkheim ...................................................................... 58

Moscovici e as representações sociais ............................................................................... 60

Imaginário social e representações .................................................................................... 62

Representações sociais e educação .................................................................................... 63

Formação inicial e formação continuada ........................ 71

A formação clássica do professor ........................................................................................ 71

A necessidade da formação continuada ........................................................................... 76

Educação e tecnologias da informação ............................................................................ 79

O professor reflexivo ............................................................... 91

A educação como arte ............................................................................................................. 91

Autonomia para aprender e para ensinar ........................................................................ 94

Gerenciando e refletindo o exercício da profissão ........................................................ 97

Professor pesquisador e professor reflexivo .................................................................... 98

O professor iniciante .............................................................109

Choque de realidade ..............................................................................................................109

Estratégias de socialização ...................................................................................................114

Competências para ensinar ................................................123

A universidade como centro de excelência ...................................................................123

Os saberes didáticos e a ciência da educação ..............................................................124

A pesquisa como competência fundamental ...............................................................127

Gabarito .....................................................................................139

Referências ................................................................................145

Apresentação

Este livro aborda saberes necessários para os profissionais da educação, pois apresenta temáticas atuais destacando os principais desafios na tarefa de ser pro-fessor. Sendo assim, aspectos como a formação da identidade do professor, o pro-fessor iniciante, pesquisador e reflexivo são alguns temas abordados nesta obra, destacando também a importância em desenvolver competências para ensinar.

Para explorar melhor os assuntos, dividimos o livro em oito capítulos. O primeiro capítulo apresenta como ocorre a construção da identidade docente, citando os fatores que interferem nessa construção. Assim o professor desenvolve sua identidade profissional conforme suas experiências pessoais (de formação) e sociais (sentimento de pertencimento, aceitação e reconhecimento profissional).

Já o segundo capítulo faz um resgate histórico sobre como surgiu e como se constituiu a profissão docente ao longo dos anos. No texto destacam-se os principais fatores que influenciaram na transformação e na evolução tanto edu-cacional quanto na formação docente no Brasil.

O neoliberalismo é apresentado no terceiro capítulo, que destaca os fatores que interferem sobre a educação e a profissão docente, apontando os principais desafios que o professor precisa vencer para conquistar a autonomia profissional.

No capítulo seguinte são expostos os conceitos de ciência interdisciplinar, apontando os benefícios caso haja um diálogo entre as ciências. O texto fornece uma ampla explicação sobre as representações sociais, abordando as concepções de diferentes teóricos; desta forma pode-se observar como as representações so-ciais estão presentes e interferem significativamente na prática educativa e na formação docente.

O quinto capítulo aborda as concepções da formação profissional, sendo importante estabelecer uma formação inicial sólida para servir de base para o professor implementar com a formação continuada. Com isso o professor estará se qualificando profissionalmente, melhorando sua prática e desenvolvendo competências para a docência.

O sexto capítulo traz características do professor enquanto pesquisador e professor reflexivo, destacando a importância da reflexão sobre a prática pedagó-gica e da condição do professor estar sempre receptivo para “aprender a apren-der”. O sétimo capítulo destaca as dificuldades que o professor iniciante enfren-ta ao se deparar com a realidade configurando um “choque de realidade”. Neste capítulo relata-se ainda que para o professor iniciante superar essas dificuldades de início de carreira, ele precisa pôr em prática estratégias de socialização com professores mais experientes, assim ele se tornará mais seguro em sua profissão e conquistará confiança em si mesmo.

Finalizando, o oitavo capítulo traz a universidade enquanto centro de ex-celência para universalizar o conhecimento, transformando saber em sabedo-ria, contribuindo para a formação do aluno, desenvolvendo competências para ensinar, tendo a pesquisa como a competência fundamental para a atividade educativa.

Sendo assim, refletimos acerca da formação docente e reconhecemos as dificuldades da formação e atuação dos professores no exercício e na busca do reconhecimento profissional. Mas ainda temos um longo caminho pela frente, para transpormos os obstáculos, de forma a imprimir novos rumos para a história da profissão docente.

A (des)construção da identidade docente

Luiz Fernando RankelFalar sobre identidade remete a muitos significados. Desde os mais

simples e cotidianos como é o caso da carteira de identidade, documento responsável pela identificação dos indivíduos e indispensável em várias situações de exigência legal, até àquilo que ultimamente vem sendo de-batido pelas ciências sociais em geral, como conceito científico. É sobre este último que nossos esforços estarão direcionados a partir de agora. Assim, identificar o desenvolvimento da identidade como conceito será de grande valia para desenvolver a problemática da identidade do profis-sional da educação. Para Pereira e Martins (2002, p. 113) é de suma impor-tância discutir o conceito de profissional docente do Ensino Superior no Brasil, “sobretudo, porque a pós-modernidade reduziu o sistema de ensino a um atendimento de segunda categoria para a sociedade marginalizada”. Poder-se-ia estender esta “necessidade” aos vários níveis a que está ligado o professorado brasileiro, não deixando de lado, é claro, as especificidades que, por exemplo, o Ensino Fundamental e Médio exigiria em caso de uma análise mais profunda. Também a citação deixa claro a particularidade da chamada pós-modernidade, enquanto uma situação com características singulares, principalmente no que tange às transformações ocorridas na sociedade em função das tecnologias de informação, e por conseguinte o impacto que vem acarretando no ensino como um todo.

Como sujeito social, histórico e político, o indivíduo membro de uma sociedade constrói sua identidade no processo de socialização primária e secundária, sendo a primeira mais direta e importante porque se refere aos contatos pessoais, que possuem forte conotação emocional, como a famí-lia, por exemplo. Os contatos secundários vão ocorrer ao longo da vida e são de caráter impessoal, não necessitam muito além das obrigações que as ocasiões do nosso dia-a-dia nos impõem. As deficiências que porven-tura possam ter existido na socialização do indivíduo, principalmente na socialização primária, podem levar a casos de anomia1, ou seja, sentimen-

1 Termo cunhado por Durkheim na sua obra O Suicídio de 1897. Segundo o autor, na modernidade o racionalismo levou a uma perda dos laços que uniam as pessoas, ocasionando o sentimento de perda de valores, indispensáveis à coesão social e construção das identi-dades coletivas. Para Durkheim o comportamento suicida estaria intimamente ligado a este processo.

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Profissão Docente

to de vazio existencial e consequente perda de identidade coletiva. Para Michael Pollak, identidades coletivas são “todos os investimentos que um grupo deve fazer ao longo do tempo, todo o trabalho necessário para dar a cada membro do grupo – quer se trate de família ou de nação – o sentimento de unidade, de continuidade e de coerência” (POLLAK, 1992, p. 207).

Percebe-se que a ênfase nesse sentido recai sobre a questão coletiva, isto é, são os aspectos (o sentimento de pertencimento a um determinado grupo social, identificando-se com ele, suas características etc.) que “determinam” o compor-tamento do indivíduo na sociedade. Apesar de serem de suma importância, ul-timamente tem-se dado muita atenção ao processo de construção individual, aquele que diz respeito à forma como o indivíduo recebe, reelabora e transmite as representações que constroem sua identidade. A análise das experiências pes-soais surgem então como um ramo profícuo na tentativa de apreender a forma pela qual os professores dão significado às suas práticas docentes. Nóvoa2 apud Pereira e Martins (2002, p. 120) “adverte que a identidade (ser e sentir-se profes-sor) não é um dado, não é uma propriedade, não é um produto: identidade é um lugar de lutas e conflitos, é um espaço de construção de maneiras de ser e de estar na profissão”. Esta autopercepção, e a maneira como é expressa, através da linguagem, é o fundamento da identidade pessoal, exatamente na construção simbólica de si como membro de um grupo.

Assim, quando falamos em identidade docente estamos caracterizando-a como identidade construída, por um lado, externamente, atribuída pela socieda-de e pelo Estado sobre o professor, por outro lado tem-se a identidade pessoal, ou interna, construída e elaborada pelo professor através da sua trajetória como profissional da educação. O objetivo seria o de provocar uma ruptura em relação à visão externa, aquele conjunto de representações criadas em sua maioria a partir de imagens estereotipadas, rebaixando a atuação do professor como um mero técnico reprodutor de conteúdos e esquemas de aprendizado. No entan-to, esta ruptura precisa acontecer a partir de dentro, da identidade interna, na busca pelo profissionalismo e ética da profissão.

No âmbito da profissão, embora não de forma unívoca, temos que ter uma luta consistente, nesse sentido é possível construir uma prática social de uma intenção de ruptura, procurando superar a identidade atribuída e fazendo desse atributo a possibilidade de ruptura, o que significa exatamente essa possibilidade de produção de práticas que estejam sintonizadas com as demandas postas pela realidade. Não há práticas prontas e acabadas, mas práticas construídas de acordo com as demandas, carências e necessidades que são postas socialmente. (PEREIRA; MARTINS, 2002, p. 121)

2 NÓVOA, António (Org.). Os Professores e sua Formação. 2. ed. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1995a.

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O pensamento dos autores citados, apresenta a necessidade do professorado refletir sobre o processo de construção da identidade profissional em suas múlti-plas dimensões, ou seja, é necessário fazer uma ampla reflexão sobre suas práti-cas. Bourdieu se referiu à dificuldade que o etnólogo tem para referenciar como objeto de estudo – enquanto sujeito social e em uma relação de familiaridade com sua cultura – os esquemas que organizam seu próprio pensamento: “quanto mais tais esquemas encontram-se interiorizados e dominados, tanto mais esca-pam quase que totalmente às tomadas de consciência parecendo-lhe assim co-extensivos e consubstanciais a sua consciência” (BOURDIEU, 1992, p. 204). Com algumas diferenças, Bourdieu segue interrogando se a escola não cumpriria a mesma função de organização dos esquemas de pensamento nas sociedades es-colarizadas, semelhante à que os ritos e mitos cumprem nas sociedades que não possuem instituições escolares (BOURDIEU, 1992). São problemáticas que devem ser levadas a sério quando se trata de investigar a construção da identidade do-cente. Será que os professores possuem as ferramentas teóricas e metodológicas necessárias para poder fazer um mergulho de grande profundidade justamente naquilo que nos escapa a todo o momento, que são os nossos “esquemas que organizam nosso pensamento”? Falar em professor reflexivo é justamente ter a capacidade de perceber a escola e a própria prática docente nas suas “funções” sociais. A construção da identidade da profissão docente está muito ligada a esta reflexão que é de caráter histórico, social e político. Dessa forma pode-se efeti-vamente almejar o objetivo maior de ruptura em relação à identidade externa construída sobre falsos argumentos, a partir da tomada de consciência do pro-fessor como sujeito histórico e profissional destacado na sociedade.

Identidade da profissão docenteComo ressaltamos, a identidade docente possui vários aspectos, várias dimen-

sões que devem ser levadas em consideração quando se quer problematizá-la. Por ser de caráter histórico é, portanto, mutável, modificando-se interna e exter-namente de acordo com as transformações que ocorrem na sociedade ao longo do tempo. Aliás, muitos problemas e desafios na educação podem ser avaliados através da defasagem que esta possui em relação às transformações do meio social. Para Pereira e Martins (2002, p. 123) “os avanços no campo do conheci-mento centram-se na tecnologia. Assim, cabe ao docente assumir uma postura esclarecedora e crítica do papel da informática e dos mass media3 no processo

3 O termo mass media (2008) é formado pela palavra latina media (meios), plural de medium (meio), e pela palavra inglesa mass (massa). Em sentido literal, os mass media seriam os meios de comunicação de massa (televisão, rádio, imprensa etc.).

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de aprendizagem, analisando sua função social”. Percebe-se que a tarefa do edu-cador é dupla, pois precisa entender como se dá e quais as consequências das novas tecnologias de informação na sua profissão e ainda, em uma perspectiva mais ampla, agir como mediador no entendimento da sociedade como um todo e identificar qual é o impacto dessas tecnologias sobre ela. Outro fator indispen-sável é a capacidade de avaliação crítica da realidade por parte do educador.

Partindo dessas constatações, a construção da identidade docente pressu-põe por parte do educador algumas atitudes:

� verificar qual a “significação social da profissão” e fazer sua constante revisão;

� fazer uma revisão das tradições, reafirmando as práticas culturalmente adotadas e tidas como significativas no atendimento das necessidades da realidade;

� confrontar teorias e práticas, e, também, a análise das práticas à luz das teorias existentes e a construção das novas teorias (PIMENTA4, apud PEREIRA; MARTINS, 2002, p. 123).

Tais atitudes são perpassadas pela ação primordial e necessária: a pesquisa. O profissional docente, para estar preparado para os níveis de exigência que a pro-fissão apresenta hoje em dia, precisa demonstrar esta competência. O processo de formação deve ser contínuo, visando sempre o profissionalismo intelectual.

Uma vez que o professor trabalha essencialmente com o saber, com o co-nhecimento que foi e é produzido pela humanidade, o domínio da informação e da comunicação são elementos-chave na sua profissão. Discutir a identidade docente faz-se necessário para atentar para as transformações que vêm ocor-rendo, na forma como a sociedade conduz a produção e a circulação do conhe-cimento, pois inegavelmente há relações de poderes que permeiam as formas institucionalizadas de educação. Essas relações, frequentemente assimétricas, demonstram como a educação pode ser um dos fatores fundamentais na manu-tenção das desigualdades sociais, mas, igualmente, possui a capacidade intrín-seca da intervenção transformadora. O trecho a seguir, retirado de Pereira e Mar-tins (2002), apresenta como o professorado tem um desafio a enfrentar quando se pensa no domínio da informação e da comunicação como características do profissional docente atualizado, mostrando como isso possui uma importância na modificação da realidade.

Há de se considerar que, por tradição, a escola sempre trabalhou com o conhecimento através de seus atores-autores produzindo-o, reelaborando-o ou reproduzindo-o. Com o advento da

4 PIMENTA, Selma Garrido (Org.). Saberes Pedagógicos e Atividade Docente. São Paulo: Cortez, 1999, p. 18-9.

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Terceira Revolução Industrial, trazendo em seu bojo a revolução dos meios de comunicação de massa que passam a veicular a informação com uma velocidade instantânea e num curto espaço de tempo, houve um descompasso entre escola e a informação, ou seja, professores e instituições de ensino não conseguiram acompanhar o ritmo frenético da transmissão de conhecimento dos mass media que deixou ambos inoperantes. Conclui-se que, no geral, os profissionais de ensino e as escolas não conseguiram atualizar suas informações no cotidiano e muito menos o material didático utilizado. Perante esta dificuldade, a tarefa do professor consiste em trabalhar as informações para que sirvam de ligação entre a sociedade de informação e os alunos, possibilitando-lhes o desenvolvimento da capacidade reflexiva e a aquisição da sabedoria, bem como torná-los conhecedores nos elementos de sua situação para que tenham meios de intervenção na realidade, transformando-a com o intuito de ampliação da liberdade da comunicação e de colaboração mútua ente os seres humanos. (PEREIRA; MARTINS, 2002, p. 124-125)

Insistimos, portanto, no processo de tomada de consciência do professor como sujeito histórico que possui responsabilidades diferenciadas das outras profissões, porque envolve a tarefa indispensável de provir os instrumentos ne-cessários para que as pessoas possam interpretar a realidade de modo a trans-formá-la. E é justamente a realidade dos professores brasileiros que impede muitas vezes que se tenha possibilidade de atingir o grau de profissionalismo tão exigido pela sociedade globalizada. Segundo Tardif e Lessard (2008, p. 10) “a partir do começo dos anos 1980 e ainda mais fortemente no início dos anos 1990, as ondas de restrições orçamentárias para a educação atingiram duramen-te os professores”; a isso se acresce o aumento da demanda escolar, salas com mais alunos e a necessidade do professor trabalhar muitas horas por semana, em vários estabelecimentos, não criando o vínculo necessário em relação à ins-tituição escolar, o que seria fundamental para sua participação mais ativa na re-elaboração das políticas organizacionais escolares. Decorrente disso, os autores afirmam “que a carga de trabalho dos professores é mais pesada do que antes, e sobretudo mais absorvente, mais exclusivista e mais exigente, enquanto os meios e os financiamentos encolhem” (TARDIF; LESSARD, 2008, p. 10).

É, portanto, considerando a realidade mais imediata da sala de aula, com toda a capacidade que o professor possui para resolver os problemas do cotidiano, bem como a dimensão macrossocial, que envolve as transformações pelas quais passa a educação na sociedade contemporânea, que se instala a perspectiva da problematização da identidade docente.

Crise da profissão docenteA profissão docente passa atualmente por uma situação de crise de identida-

de. Abordar tal questão envolve, como já dissemos, aspectos de ordem interna e externa, que são importantíssimos para que se avalie com mais profundidade o

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problema. A visão que se tem do professor na sociedade de hoje passa pela des-confiança sobre seu profissionalismo, uma vez que há muita confusão quanto a sua função na sociedade, chegando a alguns extremos, como o próprio questiona-mento sobre a necessidade deste tipo de profissional em uma sociedade informa-tizada. É o que nos diz Libâneo (1998, p. 13): “muitos pais já admitem que melhor escola é a que ensina por meio de computadores, porque prepararia melhor para a sociedade informacional. [...] Desse modo, não haveria mais lugar para a escola e para os professores”. Será que o questionamento do autor procede? É uma real perspectiva que a educação seja feita por “Centros de Informação” totalmente au-tossuficientes, sem a mínima intervenção de um profissional mediador de conhe-cimento? Estas são questões que seguramente fazem todo sentido, basta que se atente para os rumos que a Educação Superior toma nos dias de hoje. Mas será que tecnologia e professorado são coisas excludentes? Achamos, ao contrário, que a figura do professor é inapelavelmente indispensável, pois é muito ques-tionável que tudo aquilo que faz parte das constituições dos estados democráti-cos – principalmente no Brasil, com seus casos de trabalho semiescravo, falta de saneamento básico e profundas desigualdades sociais – esteja realmente sendo respeitado no que tange, principalmente, aos direitos da criança e do adolescente e na educação como um todo. Nesse sentido, há muito que fazer para que se fale em uma pós-modernidade, pois as benesses do capitalismo e do estado de direito democrático não foram devidamente asseguradas a todos os cidadãos.

Ainda assim, para se referir às mudanças econômicas, sociais, políticas e cul-turais que ocorreram durante a segunda metade do século XX e neste início de século XXI, muitos autores se referem a uma dita pós-modernidade, ou socieda-de pós-industrial. Deixando de lado esta discussão sobre o termo mais apropria-do para designar o momento histórico em que vivemos e, baseado em Libâneo (1998, p. 15-17), apresentaremos algumas das principais transformações que vêm ocorrendo na sociedade contemporânea.

Talvez a mudança mais significativa tenha ocorrido na esfera econômica, em função do processo de mundialização da economia de mercado. A globalização é a marca registrada deste panorama de competição acirrada que modifica os padrões de produção e consumo. O perfil da mão-de-obra se alterou, profissões foram substituídas pela mecanização e informatização do processo produtivo. Das novas profissões e dos novos profissionais se exigem conhecimentos de tecnologias de comunicação, habilidades cognitivas para poder ter flexibilidade para enfrentar cenários de rápida transformação.

A questão política, pensando na forma como se subordina à econômica, apa-rece, segundo Libâneo (1998), na forma de um comprometimento das soberanias

A (des)construção da identidade docente

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dos países. Basta que recuemos um pouco para a geopolítica mundial do século XX, especialmente as políticas levadas a cabo pelos estadunidenses5 em relação à “ajuda” na reconstrução dos países envolvidos na Segunda Guerra Mundial, e também as ações intervencionistas na América Latina, para compreendermos como países passam a ser subordinados economicamente a superpotências mundiais. Fica muito difícil para os países cumprirem as exigências das agências financeiras internacionais e ao mesmo tempo proverem, aos cidadãos de seus países, qualidade de vida, entendida como acesso à educação, saúde, emprego e tudo aquilo que depende de investimentos e boa administração.

Preocupam também as mudanças que ocorrem no campo ético. Há uma pa-dronização dos hábitos e costumes, o que torna também os valores e princí-pios éticos pragmaticamente adequados às situações em que o lucro individual impera. O que dizer dos escândalos que temos visto quase que diariamente nas notícias dos telejornais? A situação se torna cada dia mais grave se levarmos em consideração que as pessoas que deveriam trabalhar pelo coletivo, responsáveis pela correta destinação do dinheiro público, assumindo cargos representativos, são os que dão os piores exemplos de conduta. Resta-nos lutar e fazer com que nossos direitos, que foram conquistados e não doados, sejam respeitados em toda sua plenitude.

Com Libâneo (1998, p. 17-18) citando Frigotto6, destacamos finalmente os impactos na sociedade das transformações do mundo globalizado:

No plano socioeconômico, o ajustamento de nossas sociedades à globalização significa dois terços da humanidade excluídos dos direitos básicos de sobrevivência, emprego, saúde, educação. No plano cultural e ético-político, a ideologia neoliberal prega o individualismo e a naturalização da exclusão social, considerando-se esta como sacrifício inevitável no processo de modernização e globalização da sociedade. No plano educacional, a educação deixa de ser um direito e transforma-se em serviço, em mercadoria, ao mesmo tempo que se acentua o dualismo educacional: diferentes qualidades de educação para ricos e pobres7. (LIBÂNEO, 1998, p. 17-18)

Diante de tais circunstâncias, as condições de trabalho do professor se alte-raram profundamente nas últimas décadas. Segundo Brzezinski (2002, p. 12) o Estado vem agindo no sentido de desestimular a participação do professorado nas tomadas de decisão justamente sobre as políticas voltadas para a educação no Brasil. Há, ainda segundo a autora, um total descompasso entre o que esta-belece os planos de governo, direcionados para a supervalorização da educa-ção como arma do desenvolvimento, progresso social e expansão do emprego, e a real condição do estatuto social e econômico dos professores, causando o

5 Relativo às pessoas de nacionalidade norte-americana (EUA) (HOUAISS, 2008).6 FRIGOTTO, Gaudêncio. Educação e a Crise do Capitalismo Real. São Paulo, Cortez: 1996.7 Grifo nosso.

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aviltamento da classe e sua degradação social. Baseada em Enguita8, Brzezinski comenta que a atual situação dos professores é uma situação de proletarização, pela total falta de profissionalismo: “o professorado, nas sociedades capitalistas, passou por um processo sucessivo, prolongado, desigual e conflitado de perda de controle sobre seus meios de produção, do objeto de trabalho e da organiza-ção de sua atividade, portanto, proletarizou-se”.

Por outro lado, tal proletarização tem gerado, por parte dos professores, uma maior consciência do fato de que para mudar esta situação é imprescindível a busca pelo profissionalismo como base para a construção de uma identidade consubs-tanciada pela leitura crítica do mundo atual. De forma mais precisa, Pereira e Mar-tins (2002, p. 115-116) identificam, a partir de Villa9, vários problemas da situação em que se encontra o professor, dos quais reproduzimos os mais significativos:

preocupação, por parte do professor, mais com o “como” ensinar do que �com “o que” ensinar, isto é, substituindo o fundamental (os conteúdos) pe-los acessórios (os procedimentos e as técnicas);

falta de fortalecimento da construção do conhecimento, na medida em �que nossa sociedade não leva a sério a necessidade de formação e o nível cognoscitivo do professorado – caberia aos docentes valorizar as prerro-gativas de sua própria formação didático-pedagógica;

alto índice de doenças físicas ou incapacidades psicológicas do professo- �rado geradas pela insatisfação do fazer profissional;

recrutamento dos professores já não ocorre entre as camadas superiores �da escala social da população em virtude de não ser mais considerado uma promoção social o exercício do magistério, além da sua falta de atra-tividade para as gerações mais jovens de quaisquer classes;

súbita necessidade de aumento do número do professorado em virtude �da maior demanda de mão-de-obra que reduz o nível de exigências na seleção e na formação dos profissionais;

meio escolar não evolui com a mesma rapidez das mentalidades e dos �costumes do meio social;

falta de clareza do papel da escola no projeto da sociedade deixando va- �gos os objetivos, os programas e os métodos de ensino;

8 ENGUITA, Mariano Fernández. A ambiguidade da docência entre o profissionalismo e a proletarização. In: Teoria e Educação. Porto Alegre: Pannonica, n. 4, 1991, p. 41-61.9 VILLA, Fernando Gil. Crise do Professorado: uma análise crítica. Tradução de: BUGEL, Tália. Campinas: Papirus, 1998.

A (des)construção da identidade docente

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insistência no recurso à inteligência e à autonomia dos alunos, que mo- �difica a noção de respeito devido ao professor, à disciplina, ao trabalho, à influência educacional e à autoridade.

Resta dizer e reafirmar a importância da conscientização por parte dos profes-sores de como se está construindo a identidade do profissional docente, ou seja, quais as representações e discursos que estão sendo atribuídos aos professores, o que se está fazendo da imagem dos professores na sociedade. Esta atitude proporcionará ao profissional docente desconstruir a possível imagem negativa e/ou estereotipada que o discurso educacional oficial insiste em veicular, uma imagem que precisa ser negada e substituída por aquela construída a partir do envolvimento do professorado nesse movimento emancipatório. É o que Garcia, Hypolito e Vieira (2005, p. 47) afirmam, pois:

Tratar da identidade docente é estar atento para a política de representação que instituem os discursos veiculados por grupos e indivíduos que disputam o espaço acadêmico ou que estão na gestão do Estado. É considerar também os efeitos práticos e as políticas de verdade que discursos veiculados pela mídia impressa, televisiva e cinematográfica estão ajudando a configurar. A identidade docente é negociada entre essas múltiplas representações, entre as quais, e de modo relevante, as políticas de identidade estabelecidas pelo discurso educacional oficial. Esse discurso fala da gestão dos docentes e da organização dos sistemas escolares, dos objetivos e das metas do trabalho de ensino e dos docentes; fala também dos modos pelos quais são vistos ou falados, dos discursos que os veem e através dos quais eles se veem, produzindo uma ética e uma determinada relação com eles mesmos, que constituem, a experiência que podem ter de si próprios.

Texto complementar

A identidade do professor na perspectiva social

(CEIA, 2008)

[...] Se visitarmos alguns fóruns na internet frequentados por professores e lermos as discussões que convergem para o problema da identidade do professor, invariavelmente as respostas que aparecem trazem sempre um problema administrativo como argumento principal, do tipo: “sou professora contratada, a concorrer pelo segundo ano e com muito pouca esperança de conseguir vir a fazer, a tempo inteiro, o que mais gosto”; “sou PROFESSORA, com muito gosto! Sou professora de Português, profissionalizada, dou aulas há cinco anos e ainda sou apenas contratada, mas... mesmo assim sou feliz”.

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Profissão Docente

Há hoje um tipo único de resistência que faz com que o professor, mesmo em condições adversas de trabalho, ainda sinta motivação para o magisté-rio ou tenha uma vontade legítima de sair de vez da caverna para onde foi condenado. Em um tempo de enormes pressões psicológicas sobre o pro-fessor, fala-se de um fenômeno que atinge a classe docente com grande im-pacto: numa primeira fase, todo o professor sofre de estresse e, numa fase mais problemática, pode sofrer de burnout, isto é, de uma hemorragia do self (aquilo que em psicanálise chama o Eu intrapessoal), e que mais facilmente se diagnostica quando o professor se vê confrontado na questão ontológica: quem sou eu? A esta questão essencial do ser do professor são então dadas respostas como “não sei já quem sou”, “não sou ninguém”, “não me (re)vejo mais como professor”. É aquele tipo de disposição mental autodestrutiva que encontramos na literatura quando Bocage diz: “já Bocage não sou” ou quando Fernando Pessoa abre uma longa elegia com um verso terrível: “nada sou” (“Tabacaria”). O professor sente muitas vezes como o poeta. A síndrome é entendida por Codo como um conceito multidimensional, que pode ser defi-nido como “Síndrome da Desistência do Educador. Um homem, uma mulher, cansados, abatidos, sem mais vontade de ensinar, um professor que desistiu. (...) Será que este profissional não percebe a importância do seu trabalho na formação de nossos filhos? Não, muitas vezes não percebe mesmo. Será que não é capaz de envolver-se, emocionar-se por seu trabalho? Não, muitas vezes não é capaz mesmo”. O desgaste emocional da síndrome de burnout que atinge o professor das sociedades pós-industriais contribuiu para o crescimento de um elevado número de vocábulos do mesmo campo semântico: todos pare-cemos sofrer, em qualquer momento, de fadiga, frustração, desgaste, estresse, depressão, depleção, desajustamento, desesperança, drenagem emocional, exaustão emocional, angústia, desencorajamento etc. Há hoje uma certa para-noia do sofrimento intelectual que leva o professor a só encontrar conforto em alguém que sofre exatamente como ele. Por isso, ser professor hoje é também sofrer em comunidade, dentro de uma mesma caverna, e nunca um professor precisou tanto da solidariedade dos outros que são como ele professores para poder suportar as suas contrariedades mais profundas.

A sociedade pós-industrial, pós-moderna e pós-realista não tem nenhu-ma ética para oferecer ao professor, mas, por não estranha contradição, abundam manuais de conduta do professor, códigos mais ou menos avulsos, que circulam pelas paredes das escolas, mas que raramente entram na sala de aula propriamente dita. Um código minimalista anônimo, que encontrei numa sala de professores de uma escola pública, contém as seguintes premissas: PARA

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SER PROFESSOR – sê presente; sê pontual; sê cordial; sê educado; sê pruden-te e prepara as aulas com antecedência; sê ativo; sê profissional. O efeito que estes códigos éticos têm sobre nós é o mesmo que aqueles outros códigos que normalmente as secretárias de qualquer repartição ou instituição têm bem à vista de todos os que se lhes dirigem, do tipo: “para ser respeitado é preciso respeitar”, e que normalmente produzem um efeito contrário ao pre-tendido. Não é a esta sociedade que vamos buscar a essência do que somos. [...]

A identidade do professor de hoje revela-se muito pelo seu discurso en-quanto profissional da educação: somos cada vez mais aquilo que dizemos que somos. O logocentrismo do professor deve ser reconhecido tanto no dis-curso pedagógico interior (Será que expliquei bem este assunto? Será que podia ter feito melhor? Será que quero mesmo continuar a ensinar? Será que me revejo nesta escola? etc. — eis algumas questões do professor para si pró-prio que se resumem à questão central da identidade: ensinamos realmente o que somos?) como no discurso cívico para a comunidade. Ninguém estranha-rá se concluirmos que o discurso interior é muitas vezes mais crítico e severo do que o discurso para os outros com quem convivemos. A autorreflexividade que caracteriza a profissão tem uma atividade muito forte que raramente é compreendida pela sociedade civil. Aqui reside um dos grandes problemas do sofrimento profissional do professor: como é que a sociedade pode com-preender que eu me esforço por ser melhor professor todos os dias? O pro-fessor de hoje acaba por ter que negociar consigo próprio diferentes formas de motivação para ser capaz de acreditar que o que faz é socialmente válido. Contudo, nada mais devia ser exigido a quem chega a um estado de graça único que nos leva a ouvir dentro de nós a voz que comanda a nossa vida. O professor é o Deus e o Diabo de si próprio e nessa condição não se deve condenar o professor a beber da mesma cicuta a que Sócrates foi obrigado só por pensar mais do que o poder constituído. O professor é tão insepará-vel das coisas como é inseparável de si próprio; o professor e o mundo são postos conjuntamente, como esferas distintas entre si, mas inseparáveis uma da outra, tão inseparáveis como a consciência da nobreza da sua condição.

O discurso solitário do professor para convencer-se a si próprio a agir po-sitivamente tem também que lutar por vencer o imobilismo e a ineficácia da pedagogia pós-moderna que o inunda de cursos de autoajuda sempre à volta de um grande paradigma: a pedagogia da compaixão, a pedagogia da diferença, a pedagogia dos afetos, a pedagogia da tolerância etc., isto é,

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o professor tem que aprender a libertar-se das próprias definições da sua personalidade profissional para poder afirmar a sua identidade. Finalmente, em poucas profissões se exige tanto de um profissional em termos éticos e talvez em nenhuma outra ocupação existam tantos objetivos decretados para o registro da identidade do professor. Talvez nenhum de nós fosse real-mente professor se nos obrigassem a cumprir a ser tudo aquilo que a socie-dade espera de nós (o inverso não interessa a nenhum tecnocrata ou político ou programador de ensino). [...]

Atividades1. Descreva quais são as características do conceito de identidade para que

possa servir de base metodológica para a avaliação da situação docente nos dias de hoje.

2. Individualmente destaque um dos problemas mais significativos que o professor enfrenta atualmente e que foram apontados no texto. Justifique sua resposta.

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Dicas de estudoTARDIF, Maurice; LESSARD, Claude (Orgs.). O Ofício de Professor: história, pers-pectivas e desafios internacionais. Tradução de: MAGALHÃES, Lucy. Petrópolis: Vozes, 2008.

Como indicação de estudos complementares temos o recente livro organiza-do por Maurice Tardif e Claude Lessard que trata do ofício de professor a partir da visão de vários pesquisadores de diferentes sociedades. A obra constitui um excelente aporte teórico para se pensar a crise da profissão docente ocidental, e para que se compare as semelhanças e diferenças que existem em relação a como se dá o mesmo processo no Brasil.

NOGUEIRA, Cláudio Marques Martins; NOGUEIRA; Maria Alice. A sociologia da Educação de Pierre Bourdieu: limites e contribuições, Educação & Socieda-de, ano XXIII, n. 78, p. 15-36, abr. 2002. Disponível em: <www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302002000200003>.

O texto trata de forma clara e objetiva de uma das maiores contribuições da sociologia para os estudos da educação; também apresenta os limites desta in-terpretação, frente à complexidade e diversidade das realidades escolares.