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07 FÍSICA Ciências da Natureza e suas Tecnologias Professor Paulo Lemos ABAIXO DO ZERO ABSOLUTO Estudos de átomos ultrafrios abrem caminhos para novos materiais e para descobertas em cosmologia Shutterstock. Isso pode soar mais improvável que o inferno congelando, mas físicos criaram um gás atômico com temperatura abaixo do zero absoluto pela primeira vez. A técnica abre a porta para a produção de materiais Kelvin-negativos e novos dispositivos quânticos, e poderia até mesmo ajudar a solucionar um mistério cosmológico. Lorde Kelvin definiu a escala de temperatura absoluta em meados do século XIX, de maneira que nada poderia ser mais frio que o zero absoluto. Mais tarde, físicos perceberam que a temperatura absoluta de um gás está associada à energia média de suas partículas. O zero absoluto corresponde ao estado teórico em que partículas não têm energia nenhuma, e temperaturas mais altas correspondem a energias médias mais altas. Por volta de 1950, porém, físicos que trabalhavam com sistemas mais exóticos começaram a perceber que isso nem sempre era verdade: tecnicamente, você lê a temperatura de um sistema a partir de um gráfico que mostra as probabilidades de suas partículas serem encontradas em certas energias. Normalmente, a maioria das partículas têm energias próximas da média, com apenas algumas partículas zunindo em energias mais altas. Em teoria, se a situação for revertida, com mais partículas tendo energias mais altas, em vez de mais baixas, o gráfico viraria de cabeça para baixo e o sinal de temperatura mudaria de uma temperatura positiva absoluta para uma negativa, explica Ulrich Schneider, físico da Universidade Ludwig Maximilian em Munique, na Alemanha. Picos e Vales Schneider e seus colegas atingiram temperaturas abaixo do zero absoluto com um gás quântico ultrafrio composto por átomos de potássio. Usando lasers e campos magnéticos, eles mantiveram os átomos individuais em um arranjo trançado. Em temperaturas positivas, os átomos se repelem, tornando a configuração estável. A equipe então ajustou rapidamente os campos magnéticos, fazendo com que os átomos se atraíssem em vez de se repelirem. “Isso muda repentinamente os átomos de seu estado mais estável, de baixa energia, para o estado de mais alta energia possível, antes que eles possam reagir”, explica Schneider. “É como estar caminhando por um vale e instantaneamente aparecer no topo da montanha”. Em temperaturas positivas, essa reversão seria instável e provocaria o colapso dos átomos. Para evitar o colapso, a equipe também ajustou o campo de captura laser para torná-lo mais favorável do ponto de vista energético para que os átomos ficassem em suas posições. Esse resultado, descrito em 2 de janeiro na Science, marca a transição do gás logo acima do zero absoluto para poucos bilionésimos de Kelvin abaixo do zero absoluto. Wolfgang Ketterle, físico e Prêmio Nobel do Massachusetts Institute of Technology em Cambridge, que anteriormente demonstrou temperaturas negativas absolutas em um sistema magnético, chama o último trabalho de “um tour de force experimental”. Estados exóticos de alta energia que são difíceis de gerar em laboratório a temperaturas positivas se tornam estáveis em temperaturas absolutas negativas – “como se você pudesse virar uma pirâmide de ponta cabeça e não se preocupar com ela caindo”, compara ele – e assim técnicas desse tipo podem permitir que estados de alta energia assim sejam estudados em detalhes. “Essa pode ser uma maneira de criar novos materiais em laboratório”, adiciona Ketterle. Se construídos, esses sistemas se comportariam de maneiras estranhas, observa Achim Rosch, físico teórico da Universidade de Cologne, na Alemanha, que propôs a técnica usada por Schneider e sua equipe. Rosch e seus colegas, por exemplo, calcularam que enquanto nuvens de átomos seriam normalmente puxadas para baixo pela gravidade, se parte da nuvem estiver em uma temperatura absoluta negativa, alguns átomos se moverão para cima, aparentemente desafiando a gravidade. Outra peculiaridade do gás a temperaturas abaixo do zero absoluto é que ele imita a ‘energia escura’, a misteriosa força que fazem o Universo se expandir a uma velocidade cada vez maior contra o arrasto gravitacional. Schneider aponta que os átomos atrativos no gás produzido pela equipe também tendem ao colapso, mas não o fazem porque a temperatura negativa absoluta os estabiliza. “É interessante ver que essa característica exótica está presente no Universo e também no laboratório”, declara ele. “Os cosmólogos deveriam olhar [o fenômeno registrado pelo experimento] mais de perto”. Este artigo foi reproduzido com permissão da revista Nature. O artigo foi publicado pela primeira vez em 3 de janeiro de 2013. Após esses estudos de cientistas alemães, teoricamente não existe uma escala efetivamente absoluta, no entanto, podemos ainda considerar, com as devidas aproximações, a escala Kelvin como sendo absoluta. Zeeya Merali e Revista Nature.

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Page 1: Professor Paulo Lemos Ciências da Natureza e suas ... · gás nitrogênio, onde os fluidos endurecem em vez de congelar. Assim que atinge a temperatura de –321º, o corpo é levado

nº07física

Ciências da Natureza e suas Tecnologias

Professor Paulo Lemos

AbAixo do zero Absolutoestudos de átomos ultrafrios abrem caminhos para novos

materiais e para descobertas em cosmologia

Shutterstock.

Isso pode soar mais improvável que o inferno congelando, mas físicos criaram um gás atômico com temperatura abaixo do zero absoluto pela primeira vez. A técnica abre a porta para a produção de materiais Kelvin-negativos e novos dispositivos quânticos, e poderia até mesmo ajudar a solucionar um mistério cosmológico.

Lorde Kelvin definiu a escala de temperatura absoluta em meados do século XIX, de maneira que nada poderia ser mais frio que o zero absoluto.

Mais tarde, físicos perceberam que a temperatura absoluta de um gás está associada à energia média de suas partículas. O zero absoluto corresponde ao estado teórico em que partículas não têm energia nenhuma, e temperaturas mais altas correspondem a energias médias mais altas.

Por volta de 1950, porém, físicos que trabalhavam com sistemas mais exóticos começaram a perceber que isso nem sempre era verdade: tecnicamente, você lê a temperatura de um sistema a partir de um gráfico que mostra as probabilidades de suas partículas serem encontradas em certas energias.

Normalmente, a maioria das partículas têm energias próximas da média, com apenas algumas partículas zunindo em energias mais altas. Em teoria, se a situação for revertida, com mais partículas tendo energias mais altas, em vez de mais baixas, o gráfico viraria de cabeça para baixo e o sinal de temperatura mudaria de uma temperatura positiva absoluta para uma negativa, explica Ulrich Schneider, físico da Universidade Ludwig Maximilian em Munique, na Alemanha.

Picos e ValesSchneider e seus colegas atingiram temperaturas abaixo do zero

absoluto com um gás quântico ultrafrio composto por átomos de potássio.

Usando lasers e campos magnéticos, eles mantiveram os átomos individuais em um arranjo trançado. Em temperaturas positivas, os átomos se repelem, tornando a configuração estável.

A equipe então ajustou rapidamente os campos magnéticos, fazendo com que os átomos se atraíssem em vez de se repelirem. “Isso muda repentinamente os átomos de seu estado mais estável, de baixa energia, para o estado de mais alta energia possível, antes que eles possam reagir”, explica Schneider. “É como estar caminhando por um vale e instantaneamente aparecer no topo da montanha”.

Em temperaturas positivas, essa reversão seria instável e provocaria o colapso dos átomos. Para evitar o colapso, a equipe também ajustou o campo de captura laser para torná-lo mais favorável do ponto de vista energético para que os átomos ficassem em suas posições.

Esse resultado, descrito em 2 de janeiro na Science, marca a transição do gás logo acima do zero absoluto para poucos bilionésimos de Kelvin abaixo do zero absoluto.

Wolfgang Ketterle, físico e Prêmio Nobel do Massachusetts Institute of Technology em Cambridge, que anteriormente demonstrou temperaturas negativas absolutas em um sistema magnético, chama o último trabalho de “um tour de force experimental”.

Estados exóticos de alta energia que são difíceis de gerar em laboratório a temperaturas positivas se tornam estáveis em temperaturas absolutas negativas – “como se você pudesse virar uma pirâmide de ponta cabeça e não se preocupar com ela caindo”, compara ele – e assim técnicas desse tipo podem permitir que estados de alta energia assim sejam estudados em detalhes. “Essa pode ser uma maneira de criar novos materiais em laboratório”, adiciona Ketterle.

Se construídos, esses sistemas se comportariam de maneiras estranhas, observa Achim Rosch, físico teórico da Universidade de Cologne, na Alemanha, que propôs a técnica usada por Schneider e sua equipe.

Rosch e seus colegas, por exemplo, calcularam que enquanto nuvens de átomos seriam normalmente puxadas para baixo pela gravidade, se parte da nuvem estiver em uma temperatura absoluta negativa, alguns átomos se moverão para cima, aparentemente desafiando a gravidade.

Outra peculiaridade do gás a temperaturas abaixo do zero absoluto é que ele imita a ‘energia escura’, a misteriosa força que fazem o Universo se expandir a uma velocidade cada vez maior contra o arrasto gravitacional.

Schneider aponta que os átomos atrativos no gás produzido pela equipe também tendem ao colapso, mas não o fazem porque a temperatura negativa absoluta os estabiliza. “É interessante ver que essa característica exótica está presente no Universo e também no laboratório”, declara ele. “Os cosmólogos deveriam olhar [o fenômeno registrado pelo experimento] mais de perto”.

Este artigo foi reproduzido com permissão da revista Nature. O artigo foi publicado pela primeira vez em 3 de janeiro de 2013.

Após esses estudos de cientistas alemães, teoricamente não existe uma escala efetivamente absoluta, no entanto, podemos ainda considerar, com as devidas aproximações, a escala Kelvin como sendo absoluta.

Zeeya Merali e Revista Nature.

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Ciências da Natureza e suas Tecnologias

• Resolvas as questões abaixo sobre escalas termométricas.

Exercícios

1. lorde Kelvin (título de nobreza dado ao célebre físico William thompson, 1824-1907) estabeleceu uma associação entre a energia de agitação das moléculas de um sistema e a sua temperatura. Admitindo ainda a escala Kelvin como sendo absoluta, Kelvin deduziu que a uma temperatura de –273,15 ºC, também chamada de zero absoluto, a agitação térmica das moléculas deveria cessar. Considere um recipiente com gás, fechado e de variação de volume desprezível nas condições do problema e, por comodidade, que o zero absoluto corresponde a –273 ºC.

É correto afirmar:A) O estado de agitação é o mesmo para as temperaturas de 100 ºC e

100 K.B) À temperatura de 0 ºC, o estado de agitação das moléculas é o

mesmo que a 273 K.C) As moléculas estão mais agitadas a –173 °C do que a –127 ºC.D) A –32 ºC, as moléculas estão menos agitadas que a 241 K.E) A 273 K, as moléculas estão mais agitadas que a 100 ºC.

2. sabendo-se que, com as novas descobertas de cientistas alemães, a escala Kelvin teoricamente não é mais considerada absoluta, podemos caracterizar uma escala absoluta de temperatura quando:A) dividimos a escala em 100 partes iguais.B) associamos o zero da escala ao estado de energia cinética

mínima das partículas de um sistema.C) associamos o zero da escala ao estado de energia cinética

máxima das partículas de um sistema.D) associamos o zero da escala ao ponto de fusão do gelo.E) associamos o valor 100 da escala ao ponto de ebulição da água.

3. Quando se mede a temperatura do corpo humano com um termômetro clínico de mercúrio em vidro, procura-se colocar o bulbo do termômetro em contato direto com regiões mais próximas do interior do corpo e manter o termômetro assim durante algum tempo, antes de fazer a leitura. esses dois procedimentos são necessários porque:

A) o equilíbrio térmico só é possível quando há contato direto entre dois corpos e porque demanda sempre algum tempo para que a troca de calor entre o corpo humano e o termômetro se efetive.

B) é preciso reduzir a interferência da pele, órgão que regula a temperatura interna do corpo, e porque demanda sempre algum tempo para que a troca de calor entre o corpo humano e o termômetro se efetive.

C) o equilíbrio térmico só é possível quando há contato direto entre dois corpos e porque é preciso evitar a interferência do calor específico médio do corpo humano.

D) é preciso reduzir a interferência da pele, órgão que regula a temperatura interna do corpo, e porque o calor específico médio do corpo humano é muito menor que o do mercúrio e do vidro.

E) o equilíbrio térmico só é possível quando há contato direto entre dois corpos e porque é preciso reduzir a interferência da pele, órgão que regula a temperatura interna do corpo.

4. o texto a seguir foi extraído de uma matéria sobre congelamento de cadáveres para sua preservação por muitos anos, publicada no jornal O Estado de S. Paulo de 21/07/2002.

Após a morte clínica, o corpo é resfriado com gelo. uma injeção de anticoagulantes é aplicada e um fluido especial é bombeado para o coração, espalhando-se pelo corpo e empurrando para fora os fluidos naturais. O corpo é colocado numa câmara com gás nitrogênio, onde os fluidos endurecem em vez de congelar. Assim que atinge a temperatura de –321º, o corpo é levado para um tanque de nitrogênio líquido, onde fica de cabeça para baixo.

Na matéria, não consta a unidade de temperatura usada. Considerando que o valor indicado de –321º esteja correto e que pertença a uma das escalas (Kelvin, Celsius ou Fahrenheit), pode-se concluir que foi usada a escala:A) Kelvin, pois trata-se de um trabalho científico e esta é a unidade

adotada pelo Sistema Internacional.B) Fahrenheit, por ser um valor inferior ao zero absoluto e, portanto,

só pode ser medido nessa escala.C) Fahrenheit, pois as escalas Celsius e Kelvin não admitem esse

valor numérico de temperatura.D) Celsius, pois só ela tem valores numéricos negativos para a

indicação de temperaturas.E) Celsius, por tratar-se de uma matéria publicada em língua

portuguesa e essa ser a unidade adotada oficialmente no Brasil.

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Linguagens, Códigos e Suas Tecnologias

FB NO ENEM 3

Ciências da Natureza e suas Tecnologias

Anotações

5. Através de experimentos, biólogos observaram que a taxa de canto de grilos de uma determinada espécie estava relacionada com a temperatura ambiente de uma maneira que poderia ser considerada linear.

experiências mostraram que, a uma temperatura de 21º C, os grilos cantavam, em média, 120 vezes por minuto; e, a uma temperatura de 26º C, os grilos cantavam, em média, 180 vezes por minuto. Conside t a temperatura em graus Celsius e n o número de vezes que os grilos cantavam por minuto.

T

2621

120 180 n

supondo que os grilos estivessem cantando, em média, 156 vezes por minuto, de acordo com o modelo sugerido nesta questão, estima-se que a temperatura deveria ser igual a:A) 21,5 ºCB) 22 ºC C) 23 ºCD) 24 ºC E) 25,5 ºC

FB no Enem – Nº 06 – Professor: Fábio Coelho1 2 3 4 5 6E A A B C D

Erbínio: 21/03/2013 - Rev.: AM