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REVISTA CIENTÍFICA DA ACADEMIA MILITAR Série VII, n.º 2 (2012) Ficha Técnica Proprietário e Editora: Academia Militar Rua Gomes Freire 1169-203 Lisboa Tel.: 213186907 Fax: 213186911 URL: www.academiamilitar.pt E-mail: [email protected] Local: Lisboa Ano: 2012 Periodicidade: Semestral Depósito Legal: 209905/04 ISSN: 1645-8826 Capa: Sandra Veloso e Pedro Trindade Paginação, Impressão e Acabamentos: CENTRO DE AUDIOVISUAIS DO EXÉRCITO/SECÇÃO DE ARTES GRÁFICAS Tiragem: 700 Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida por qualquer processo electrónico, mecânico ou fotográfico, incluindo fotocópias, xerocópias ou gravação, sem autorização prévia da Academia Militar.

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REVISTA CIENTÍFICA DA ACADEMIA MILITAR SérieVII, n.º 2 (2012)

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Editorial

REVISTA CIENTÍFICA DA ACADEMIA MILITARSérie VII, n.º 2 (2012)

Ficha Técnica

Proprietário e Editora: Academia Militar Rua Gomes Freire 1169-203 Lisboa Tel.: 213186907 Fax: 213186911 URL: www.academiamilitar.pt E-mail: [email protected] Local: Lisboa Ano: 2012 Periodicidade: Semestral Depósito Legal: 209905/04 ISSN: 1645-8826 Capa: Sandra Veloso e Pedro Trindade Paginação, Impressão e Acabamentos: Centro de AudiovisuAis do exérCito/seCção de Artes GráfiCAs Tiragem: 700

Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida por qualquer processo electrónico, mecânico ou fotográfico, incluindo fotocópias, xerocópias ou gravação, sem autorização prévia da Academia Militar.

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ProElium – rEvista CiEntífiCa da aCadEmia militar

Órgãos da PROELIUM

Director: Major-General António José Pacheco Dias Coimbra Editor: Tenente-Coronel (Mestre) José Carlos Dias Rouco Co-Editor: Professora Doutora Maria Manuela Martins Saraiva Sarmento Coelho Conselho Editorial: Major-General António José Pacheco Dias Coimbra, Academia Militar Professor Doutor Salvatore Messina, European University for Tourism (Albânia) Professor Doutor Carlos Alberto Silva Melo Santos, Universidade dos Açores Professor Doutor Neven Duic, Universidade de Zagreb (Croácia) Professor Doutor Pedro Telhado Pereira, Universidade da Madeira Professor Doutor Henrique Manuel Dinis Santos, Universidade do Minho Professor Doutor João Joanaz de Melo, Universidade Nova de Lisboa Professora Doutora Maria Manuela M. S. Sarmento Coelho, Academia Militar Professor Doutor Vítor Manuel S. da Silva Ferreira, Universidade Técnica de Lisboa Tenente-Coronel (Doutor) Carlos Manuel Mendes Dias, Academia Militar Tenente-Coronel (Doutor) António Palma Esteves Rosinha, Academia Militar Major (Doutor) Pedro Luís R. R. Ferreira da Silva, Academia Militar Major (Doutor) David Pascoal Rosado, Academia Militar Tenente-Coronel (Mestre) José Carlos Dias Rouco, Academia Militar Conselho Consultivo Nacional: Major-General José António Henriques Dinis Professor Doutor Diamantino Freitas Gomes Durão, Universidade Lusíada Professora Doutora Ana Bela Ribeiro da Costa Santos Bravo, Academia Militar Professor Doutor António José Barreiros Telo, Academia Militar Professor Doutor Mário Lino Barata Raposo, Universidade da Beira Interior Professor Doutor António Fernando Boleto Rosado, Universidade Técnica de Lisboa Professor Doutor Carlos José Bernardo da Silva Barracho, Universidade Lusíada Professor Doutor João Torres de Quinhones Levy, Universidade Técnica de Lisboa Professora Doutora Lúcia Maria Portela Lima Rodrigues, Universidade do Minho Professor Doutor João Paulo de Freitas Sousa, Academia Militar Professora Doutora Ana Maria Carapelho Romão, Academia Militar Professora Doutora Paula Manuela dos Santos L. R. Figueiredo, Academia Militar Professor Doutor António Joaquim dos Santos Serralheiro, Academia Militar Professor Doutor Fernando José Gautier Luso Soares, Academia Militar Professor Doutor César Rodrigo Fernández, Academia Militar Professor Doutor Jorge da Silva Macaísta Malheiros, Universidade de Lisboa Professora Doutora Maria da Saudade Baltazar, Universidade de Évora Professora Doutora Sandra Maria Rodrigues Balão, Universidade Técnica de Lisboa Professor Doutor Thomas Peter Gasche, Academia Militar Coronel (Doutor) João Pedro da Cruz Fernandes Thomaz, Academia Militar Tenente-Coronel (Doutor) Francisco Miguel Proença Garcia, Academia Militar Tenente-Coronel (Doutor) Paulo Fernando Viegas Nunes, Academia Militar Professora Doutora Maria Francisca Saraiva, Universidade Nova de Lisboa Tenente-Coronel (Mestre) Jorge Manuel Dias Sequeira, Academia Militar Tenente-Coronel (Mestre) Pedro Marcelino Marquês de Sousa, Academia Militar Dra. (Mestre) Sofia de Freitas e Menezes, Academia Militar Dra. (Mestre) Teresa Almeida, Academia Militar Conselho Consultivo Internacional: Professora Doutora María Jesús Hernández Ortiz, Universidade de Jaén (Espanha) Professor Doutor Sven Biscop, Egmont Institute (Bélgica) Professor Doutor Gary N. McLean, Texas University (EUA) Professor Doutor Hermano Perrelli de Moura, Universidade Federal de Pernambuco (Brasil) Professor Doutor Michael F. Cassidy, Marymount Unversity (EUA) Professora Doutora Patrícia M. Salgado, Universidade Autónoma do Estado do México (México)

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Editorial

EDITORIAL ................................................................................................................................................. 5Tenente-General Amaral Vieira

DIFERENTES ABORDAGENS SOBRE O CONCEITO COMPETÊNCIA ............................................ 7Tenente-Coronel de Infantaria Carlos Rouco e Professora Doutora Manuela Sarmento

MODELO DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO PARA ORGANIZAÇÕES MILITARES EM AM-BIENTE DE GUERRA DE INFORMAÇÃO ............................................................................................. 31Tenente-Coronel de Infantaria José Martins, Professor Doutor Henriques dos Santos, Tenente-Coronel de Transmissões Paulo Nunes

A INOVAÇÃO COMO ALAVANCA DA SUSTENTABILIDADE E VALORIZAÇÃO DAS FORÇAS ARMADAS .................................................................................................................................................... 67Coronel de Engenharia Tirocinado Jorge Côrte-Real Andrade

O CONTRIBUTO DO E-GOVERNMENT PARA A PROMOÇÃO DA PAZ E ESTABILIDADE .......... 125Major de Artilharia Ferreira da Silva

O RECRUTAMENTO DE RECURSOS HUMANOS PARA O SERVIÇO DE ADMINISTRAÇÃO DAGNR ............................................................................................................................................................... 139Alferes de Administração da GNR Sónia Torres, Professora Doutora Manuela Sarmento, Tenente-Coronel Paulo Oliveira

A ACÇÃO DO EXÉRCITO NO APOIO À PROTECÇÃO CIVIL: MADEIRA, FEVEREIRO 2010 ....... 159Coronel de Infantaria Batalha da Silva

CARACTERIZAÇÃO E PREVENÇÃO DE LESÕES DECORRENTES DE ACTIVIDADE FÍSICA NAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR MILITAR ...................................................................... 189Alferes de Artilharia Carina Carvalho

OS MINISTROS DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS: DO ESTADO NOVO E DA DEMOCRACIA (1974-2005) .............................................................................................................................................. 213Capitão de Infantaria da GNR Reinaldo Hermenegildo

CARACTERIZAÇÃO DE SOLOS CONTAMINDADOS COM MATERIAIS EXPLOSIVOS .................. 261Professor Doutor João Sousa

A PROBLEMÁTICA DA INSTITUIÇÃO MILITAR A PARTIR DE VÁRIAS PERSPECTIVAS – ÚLTIMA AULA NA ACADEMIA MILITAR .............................................................................................................. 271Coronel de Cavalaria Nuno Vaz

DA ARTE DA GUERRA À GESTÃO ESTRATÉGICA – A LIÇÃO INAUGURAL NA ACADEMIA MILITAR 2011-2012 ..................................................................................................................................... 279Major de Administração Militar Pascoal Rosado

RISCOS E GOVERNANÇA ......................................................................................................................... 295Professora Doutora Anabela Bravo e Professor Doutor José Rodrigues dos Santos

COMEMORAÇÕES DO DIA DO EXÉRCITO 2011 – CONCLUSÕES DAS JORNADAS ACADÉMICAS .............................................................................................................................................. 313Coronel de Infantaria Batalha da Silva

NORMAS PARA PUBLICAÇÃO NA REVISTA PROELIUM ................................................................... 323Tenente-Coronel de Infantaria Carlos Rouco

TODOS OS TEXTOS SÃO DA RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DOS RESPECTIVOS AUTORES

sumário

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Editorial

Vítor Manuel Amaral Vieira (*)

Tenente-General

Na qualidade de Comandante da Academia Militar, quero começar por realçar a importância das revistas científicas no contexto universitário, pois representam um meio fundamental para difundir o conhecimento, e consequen-temente levar às organizações processos eficientes e eficazes de modo a criar riqueza e a torná-las mais competitivas.

Na dinâmica da disseminação do conhecimento, as tecnologias de informação e comunicação oferecem vantagens incomparáveis, ao possibilitarem o acesso e a partilha de informação, sem restrições dos limites geográficos e temporais. Atenta a estas realidades, a Revista Proelium disponibiliza através do seu sítio na Internet o acesso livre aos números anteriormente editados em suporte pa-pel. Apesar da actual situação financeira, é intenção do Comando da Academia Militar continuar a apoiar o projecto editorial Proelium e, ainda, incentivar a sua Direcção e os autores a produzirem conhecimento que se aproxime cada vez mais das reais necessidades das pessoas e organizações.

Com efeito, a criação de conhecimento e a sua partilha, ou melhor, a gestão do conhecimento, constitui um valioso recurso estratégico, que sempre desempenhou um papel fundamental na história da Humanidade. No entanto, apenas “saber pensar”, por si só, não proporciona maior poder de competição para uma organização. Hoje, a capacidade para criar e implementar esses pro-cessos capazes de gerir este conhecimento e transformá-lo numa mais-valia, representa o desafio para as organizações.

Nestes processos e através da sua capacidade de investigação, também a universidade pode representar um factor fundamental para converter em in-formação o conhecimento implícito e, assim poder auxiliar as organizações a

(*) Comandante da Academia Militar.

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completar o ciclo do conhecimento organizacional. Considerando-se essencial que o “saber pensar” esteja sempre ao serviço do “saber fazer”, sendo para isso necessário que o investigador esteja em estreita ligação com as organizações.

O presente número da Revista Proelium segue o seu espectro de “banda larga” nos “saberes”, que vão desde as ciências exactas às ciências sociais. As contribuições organizam-se em duas partes. Versando temáticas diferentes, a primeira parte reúne os seguintes artigos: “Diferentes abordagens sobre o con-ceito de competência”; “Modelo de segurança da informação para organizações militares em ambiente de guerra”; “A Inovação como alavanca da sustentabili-dade e valorização das Forças Armadas”; “O Contributo do E-government para a promoção da paz e estabilidade”; “O Recrutamento de recursos humanos para o serviço de administração da GNR”; “A Acção do Exército no apoio à pro-tecção civil: Madeira, Fevereiro 2010”; “Caracterização e prevenção de lesões decorrentes de actividade física nas instituições de ensino superior militar”; “Os Ministros dos Negócios Estrangeiros: do Estado Novo e da Democracia (1974-2005)”; e por fim “Caracterização de solos contaminados com materiais explosivos”.

A segunda parte dedica-se aos eventos de carácter científico ocorridos na Academia Militar, designadamente: a Última Lição do Coronel (Doutor) Mira Vaz; a Lição de Abertura Solene do Ano académico 2011-2012; as conclusões da Conferência “Riscos e Governança”, organizada pela AM e pelo CINAMIL, em Junho de 2011 e por fim as conclusões das Jornadas Académicas promo-vidas pelo Exército (Academia Militar) e pela Câmara Municipal de Bragança – Comemorações dia do Exército 2011, organizadas em 21 de Outubro.

Um triste acontecimento marcou a comunidade da AM em 2011. As mi-nhas últimas palavras são pois para expressar uma sentida homenagem a um camarada que já não se encontra entre nós, ao Homem detentor de grande frontalidade e transparência que sempre granjeou a estima de todos os que com ele privaram e ao Oficial que sempre encarou a carreira das “Armas” com grande profissionalismo e que sempre teve uma acção colaborativa quanto à Revista Proelium. O nosso camarada Tenente-Coronel Matos Luís ficará sempre guardado no coração de todos nós como um Oficial de referência.

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difErEntEs abordagEns sobrE o ConCEito dE ComPEtênCia

José Carlos Dias Rouco (*)

Tenente-Coronel de Infantaria

Manuela Martins Saraiva Sarmento Coelho (**)

Professora Doutora

ABSTRACT

The term competence and all processes associated with it have an important role in the enhancement of human resources as a strategic factor for organizational success. However, despite of the effort among academics, professionals and human resources managers to find a common understan-ding for competence, its concept and approaches have been very different.

This research seeks to analyze the different approaches to confron-ting the term competency and indicates a clue to his concept, domain and classification that satisfies all parties involved in Human Resources Management.

From the study it was found that the concept of competence is not universally accepted. Skills can be arranged according to different areas: (a) about ourselves, (b) in relation to others, (c) function, (d) engaging, and (e) management. Regarding the type of skills can be classified into personal or cognitive, functional, social and organizational.

Keywords: Competence; Concept; Approaches; Domains; Classification.

(*) Professor Regente da Unidade Curricular - Ética e Liderança (Academia Militar) e Docente (Convénio) da Unidade Curricular de Competência Transversal I (Instituto Superior Técnico). Director do 3.º Ano Escolar “Armas”. Director e Docente dos Cursos de Liderança na Academia Militar. Editor da Revista Proelium. Membro do CINAMIL. Doutorando em Ciências da Gestão (Universidade Lusíada).

(**) Professora Associada com Agregação da Academia Militar. Regente da Unidade Curricular – Gestão de Recursos Humanos. Coordenadora Científica da Pós-Graduação em Liderança: Pessoas e Organizações. Co-editora da Revista Proelium. Membro do CINAMIL.

difErEntEs abordagEns sobrE o ConCEito dE ComPEtênCia

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RESUMO

O termo competência tem vindo a assumir uma ampla e acentuada expressão na valorização dos Recursos Humanos como um factor estra-tégico para o sucesso organizacional. Nas últimas décadas e, apesar das tentativas para encontrar uma plataforma de entendimento face á globali-zação, o cenceito de competencia tem sido tão diversificado e aplicado em vários domínios que hoje se torna difícil perceber-se quais as conotações que lhe estão associadas.

Com esta investigação procura-se a partir da análise documental confrontar as diferentes abordagens sobre o termo competência e indicar uma pista quanto ao seu conceito, domínio e classificação que satisfaça todos os intervenientes na Gestão dos Recursos Humanos.

Do estudo verificou-se que não existe um conceito de competência aceite universalmente. As competências podem ser organizadas segundo diferentes domínios, como, (a) de si próprio, (b) da relação com os outros, (c) da função, (d) da envolvente e (e) da gestão. Quanto ao tipo de competências, podem classificar-se em pessoais ou cognitivas, funcionais, sociais e organizacionais.

Palavras-chave: Competência; Conceito; Abordagens; Domínios; Classificação.

1. INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas e apesar das tentativas para encontrar uma plataforma de entendimento face à globalização, e à mobilidade, o conceito de compe-tência tem sido tão diversificado e aplicado em vários domínios que hoje torna-se cada vez mais difícil de perceber quais são as conotações que lhe estão associadas. Com este estudo procuram-se obter os seguintes objectivos: • encontrar a perspectiva da competência que seja mais consensual nas

diferentes áreas académicas e profissionais;• identificar a organização e a natureza das competências;• tipificar e classificar as competências.

Para o presente estudo foram levantadas as seguintes hipóteses teóricas:H1: Existe um conceito de competência aceite pelos académicos e profissionais.H2: As competências organizam-se de forma diferente.H3: As competências classificam-se de forma diferente.

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difErEntEs abordagEns sobrE o ConCEito dE ComPEtênCia

Os resultados desta investigação procuram contribuir para um enquadramen-to teórico que sirva para esclarecer o conceito e permitir a elaboração de modelos de gestão nas áreas das competências e da formação.

2. CONCEITO DE COMPETÊNCIA

De acordo com a literatura, o conceito de competência não é uma abor-dagem recente. A aproximação das competências à gestão dos Recursos Humanos (R H) já era praticada pelos romanos para seleccionar o “bom soldado” (Mayoral, Palacios, Gómez, & Crespo, 2007). Também, no império Chinês reconheciam a diferença entre as qualidades pessoais e a educação formal ao adaptar os exames aos requisitos do serviço civil nos empregos do império (Hoge, Tondora, & Marreli, 2005). Na época medieval, os aprendizes, através da imitação, procuravam aprender as habilidades que precisavam para desempenhar uma tarefa específica, como o artesão - mestre (Mclagan, 1997). Durante milhares de anos, os educadores definiram o conhecimento, as aptidões e as atitudes para formar os seus curricula.Mcclelland (1973) definiu as variáveis das competências que podiam ser usadas como preditores do desempenho de uma tarefa e que não eram baseados em indicadores como a etnia, o género ou factores socioeconó-micos, entre outros. As suas investigações ajudaram a identificar capaci-dades no desempenho do trabalho em que não eram apenas considerados os atributos dos colaboradores. O artigo de McClelland foi a chave para o desenvolvimento da abordagem às competências em alternativa aos testes de inteligência na área da selecção. O modelo de competências de McClelland pode ser resumido por dois factores – o uso de amostras de critérios (que comparam sistematicamente pessoas com execuções superiores relativamente a outras) e identificar conhecimentos, aptidões, atitudes e comportamentos que estão causalmente relacionados com os resultados de sucesso. O facto das competências serem uma ferramenta importante para os vários campos de aplicação, a comunidade científica não está de acordo, na sua generalidade, pelo facto do termo resultar de muitas interpretações (Le Deist, & Winterton, 2005; Winterton, Le Deist, & Stringfellow, 2005). A origem da palavra competência aparece do latim “competere” que significa ser apropriado. O seu conceito desenvolvido pela psicologia referindo-se aos traços da personalidade e aptidões para responder a certas solicitações colocadas pelo ambiente. Embora a sua definição pareça variar bastante na

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sua interpretação (Schippmann, Ash, Battista, Carr, Eyde, & Hesketh, 2000), esta é tipicamente definida como uma combinação de conhecimento, capa-cidades, aptidões e outras características individuais (muitas vezes chamada de KSAO, incluindo mas não limitando, os motivos, traços da personalidade, auto-conceito, atitudes, crenças, valores e interesses) que podem ser medi-das fialvelmente e mostrar a sua diferenciação no desempenho (Spencer, McClelland, & Spencer, 1994; Schippmann et al., 2000).Na área dos RH e segundo diferentes autores, as competências são definidas como:• Um conjunto de conhecimento, capacidades, atitudes, auto-conceito, va-

lores e motivos que estão directamente relacionados com o desempenho no trabalho ou resultados importantes do dia a dia e, que mostram ser diferentes entre os desempenhos médios e superiores (McClelland, 1973).

• As características base individuais que estão casualmente relacionadas com critérios de referência eficazes ou desempenhos superiores no trabalho ou numa dada situação (Spencer & Spencer, 1993).

• O conhecimento, aptidões e comportamentos que um indivíduo utiliza para executar o seu trabalho e que são as alavancas chave para alcançar os resultados que são relevantes às estratégias da organização (Treasury Board of Canada Secretary, 1999).

• Um conjunto de capacidades, relacionadas com o conhecimento e atributos que permitem um indivíduo executar uma tarefa ou uma actividade numa função específica (United Nations Industrial Development Organization, 2002, p. 8).

• As características de um indivíduo que contribuem para o desempenho de sucesso no trabalho. Isto inclui conhecimento, capacidades, aptidões e outras características, tais como valores, motivações, iniciativas e auto-controlo (Sinnott, Madison, & Pataki, 2002).

• O desempenho eficaz dentro de uma ocupação, do qual podem variar os níveis básicos de proficiência aos níveis mais elevados de excelência (Cheetham & Chievers, 2005).

• O cognitivo (i.e., conhecimento e aptidões), eficácia (i.e., atitudes e valores), comportamentos e motivações (i.e., motivos) que representam as características ou disposições de um indivíduo que o leva a ter um desempenho superior numa situação específica (Tobias, 2006).

Na área da formação, segundo diferentes autores, as competências são de-finidas como:• O conhecimento, aptidões e atitudes que podem ser entendidas como o

saber “em acção ou em uso”. Deste modo, não se trata de adicionar a

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um conjunto de conhecimentos, aptidões e atitudes, mas promover o de-senvolvimento integrado das capacidades que viabilizam a utilização dos conhecimentos em situações diversas, mais familiares ou menos familiares ao aluno (Ministério da Educação, 2001, p. 9).

• Capacidade para usar um conjunto organizado de saberes sobre o quê e como, e atitudes de forma ordenada para realizar um determinado número de tarefas (Eurydice, 2002, p.43).

• A combinação dinâmica do conhecimento, compreensão, aptidões e capa-cidades (Sanchez-Ruiz, Edwards, & Sarrias, 2006).

Para Ceitil (2007) e conforme ilustra o Quadro 1, as competências agrupam-se como se segue:

Quadro 1 – Categorias das competências.

Fonte: Adaptado de Ceitil (2007, p.24).

Ao analisar os diferentes conceitos das competências, verificamos que quase tudo serve para a sua definição, i.e. a competência tem um largo espec-tro. Muitas definições ignoram a de McClelland em que as competências devem diferenciar entre o desempenho superior e médio (o que diferencia as competências) e que tem uma ligação empírica ao factor aceitável da palavra desempenho (as competências do ponto inicial).A segunda área de confusão coloca-se na incapacidade entre distinguir o que melhor pode ser denominado por áreas de competência versus competências pessoais relacionadas. As áreas de competência são as actividades em que cada pessoa é competente e as competências pessoais relacionadas são os atributos ou qualidades que permitem a um indivíduo um determinado desempenho. A forma mais fácil para distinguir estes dois aspectos que frequentemente são confundidos, é que a área da competência é tipicamente baseada na função

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e as competências pessoais, em sentido original, são baseadas na pessoa. Por isso, não faz sentido separar os dois, usando o primeiro para descrever o trabalho ou o papel esperado, e o último para avaliar os indivíduos de acordo com as exigências do trabalho ou do papel. Face às diferentes perspectivas, e de acordo com a revisão de literatura, parece não haver nenhum fim à vista. Para cada definição de competência proposta, um outro investigador, consultor ou gestor trará uma nova definição que contraria a última.Em última análise, é provavelmente pouco importante, ou nem sequer provável, que os técnicos de RH adoptem uma definição de competência aceite universal-mente. Não existe nenhuma resposta correcta para a definição. O mais importante é que cada organização adopte uma definição que faça sentido, encontre as suas necessidades, e que seja aplicada consistentemente nos seus RH. É crítico que os membros da organização partilhem e percebem uma definição, sejam capazes de a reconhecer e explicar, como e porquê a definição adoptada é diferente das outras que possam encontrar. Se este pressuposto for conse-guido haverá menos confusão sobre as competências em cada organização. O que aliás, na última década, no âmbito da União Europeia e das Nações Unidas há um esforço para envolver os diferentes países a encontrar uma plataforma comum de conceitos que possa permitir a mobilidade e a trans-missibilidade em torno da globalização.

3. COMPONENTES DA COMPETÊNCIA

Tradicionalmente, o acrónimo de KSA ou KSAO foi conectado como a estenografia para os atributos do indivíduo relativos ao desempenho no trabalho. Originalmente, o acrónimo aparecia como KSA – que significava conhecimento, capacidade 1 e atitudes. Ao longo dos anos e dependente das fontes, o acrónimo foi evoluindo para tomar outros significados. O K (knowlegde) e S (skill) permaneceram sempre como conhecimento e capacidade respectivamente. O A (ability) e O (other) variaram, o A representa uma ou outra aptidão, que por vezes são si-nónimos atributos ou atitudes. O O representa “outras características” e aparece frequentemente quando o A representa aptidões.

1 Muitos dos autores também designam o S por habilidade.

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De acordo com Harvey (1991, 2008) os vários componentes de KSAO (Knowledge, Skill, Ability and Other) representam os seguintes significados:

• knowledge (conhecimento) é a informação necessária e específica para realizar as tarefas de uma função;

• skill (capacidade) é a proficiência no uso de instrumentos e equipamentos na função. Esta capacidade deve ser adquirida num ambiente educacional ou aprendido na função de forma informal;

• ability (aptidão) resulta de conceitos tais como a inteligência, orientação espacial e tempo de reacção, as capacidades são medidas frequentemente por testes que fornecem estimativas acerca da capacidade específica que uma pessoa tem para realizar uma tarefa;

• other (outras características) são as características adicionais necessárias para fazer bem um trabalho, como, por exemplo, a atitude e a personalidade.

A revisão quanto ao conceito de competências ajuda os gestores e os cola-boradores a fazer avaliações de forma continuada sobre os conhecimentos, aptidões e outras características necessárias para um desempenho eficaz. No entanto, as competências, apenas providenciam a fundação destes propósitos, sendo necessário construir grupos de competências e serem testadas numa grande variedade de combinações e circunstâncias para determinar as com-ponentes necessárias numa função ou campo de perícia. Conforme ilustra a Figura 1 e, fica claro que a definição de competência contem frequentemente, explícita ou implicitamente, ele-mentos que pertencem ao KSAO. As competências podem descrever melhor a representação em níveis de análise – que estejam acima do KSAO. Quando se confronta o conceito de competência com KSAO verifica-se que são diferentes nas suas aplicações, mas não necessariamente diferen-tes no conteúdo ou no significado em relação ao

Fonte: Adaptado de Punnitamai (2002,p.119).

Figura 1 – Modelo conceptual de desenvolvimento de competências.

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KSAO. As competências diferem do KSAO na medida em que estas definem claramente o nível de análise a partir da função e estão associada ao que as pessoas são capazes de executar.Esta mudança é extremamente importante nos modernos espaços de trabalho, onde o ambiente organizacional exige que a estrutura seja feita em torno dos projectos de trabalho, em vez de um trabalho claramente delineados e definido detalhadamente. As competências focalizaram a importância dos RH nas organizações e o valor que estes trazem para o local de trabalho representando um factor fundamental para o sucesso organizacional.

4. ABORDAGENS DA COMPETÊNCIA

Na revisão de literatura sobre o conceito competência, conclui-se que existem diferentes abordagens, considerando-se assim pertinente caracterizar de uma forma muito breve as diferentes abordagens e as suas implicações para a criação de modelos de gestão.

4.1 Abordagem Americana

Na abordagem comportamental, para White (1959) é habitualmente associado á introducção do termo a competência que é definida como um conjunto de características da personalidade que estão associadas a desempenhos superiores e a alta motivação, colocando ênfase na relação entre as competências cognitivas e a tendência para uma acção motivada.O mesmo autor, define a competência como uma interacção eficaz en-tre o indivíduo e o ambiente, e argumenta que existe uma componente motivadora que adiciona a esta competência algo mais do que a própria capacidade de um indivíduo conseguiria.McClelland (1973) seguiu esta abordagem e desenvolveu testes em opo-sição aos tradicionais sobre a inteligência, e acabou por descrever estas como “características subjacentes” preditoras de desempenhos superiores.Segundo esta abordagem, a competência acaba por integrar as aptidões cognitivas (tal como a auto-consciência e a auto-regulação) e as apti-dões sociais. Talvez alguns destes elementos possam ser encontrados em taxonomias da personalidade e as competências são fundamentalmente comportamentos, e ao contrário da personalidade e inteligência, podem ser aprendidas através da formação (McClelland, 1998). Boyatzis (1982) também propôs um modelo integrado de competências para os gestores e explica a inter-relação entre estas “características

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subjacentes”, a função de gestão e o ambiente interno organizacional. Por sua vez, Spencer e Spencer (1993) demonstraram o uso desta me-todologia com a análise de funções para propor um modelo.A Figura 2 e segundo Spencer e Spencer (1993, p.9,10,11) nas “carac-terísticas subjacentes”, as competências incluem motivos e traços de personalidade, auto-conceito, atitudes e valores, conhecimento e aptidões ou comportamentos.

Fonte: Spencer e Spencer (1993, p. 11).Figura 2 – Modelo do iceberg.

Esta abordagem teve uma grande influência nos Estados Unidos da América do Norte, em que a sua definição representa “as característi-cas subjacentes dos indivíduos” que é “casualmente relacionada com desempenhos superiores no trabalho e generalizada ao longo das várias situações, e com uma duração por longos períodos” e “com um crité-rio de referência” (Spencer & Spencer, 1993, p. 9). Para os autores, o “critério de referência” de uma competência é um factor crítico, em que os critérios mais usados são os desempenhos superiores e eficazes.

4.2 Abordagem Inglesa

O reconhecimento de algumas deficiências endémicas no desenvolvimento das capacidades dos RH no Reino Unido, levou os seus Governos na década de 80, do século passado, a introduzir uma aproximação base-adas em competências na formação vocacional e treino para estabilizar um sistema de âmbito nacional unificado para o trabalho baseado em qualificações. A reforma, na formação vocacional e treino, adoptou um modelo de qualificações baseado nas competências, que por sua vez também influenciou o seu desenvolvimento noutros países da Com-monwealth e da União Europeia (UE). A nova Qualificação Nacional Vocacional, criou uma estrutura de competências que foi baseada no padrão ocupacional, tendo em conta

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a observação da análise funcional das ocupações dos colaboradores em diversos contextos (Mansfield & Mitchell, 1996). Através, dos padrões ocupacionais identificaram-se papeis chave, que foram divididos em unidades de competências, por sua vez são subdivididos em elementos de competências e, por cada elemento de competência, é definido um critério de desempenho que forma a base da avaliação, com indicadores de escala que prevêem a orientação para o desempenho.Neste contexto, a competência ocupacional é fortemente enraizada no trabalho onde os colaboradores desempenham um papel com uma escala de medição (Mansfield, 1993, 2004). Com uma abordagem baseadas nas competências para a formação vocacional e treino, a ênfase está nas competências funcionais e na habilidade para demonstrar os desem-penhos padrão requeridos no local de trabalho (Knasel & Meed, 1994). A definição de competência ocupacional vem da Manpower Services Commission (1986) e adoptada pelos técnicos de RH em cada organiza-ção e que representava a habilidade para desempenhar uma actividades durante uma ocupação no trabalho de acordo com os padrões esperados, em que também incluía os domínios das aptidões, da compreensão e dos traços da personalidade. Cheetham e Chivers (1998) reivindicaram ter desenvolvido um modelo holístico sobre competências profissionais, incluindo ter cinco dimensões e competências inter-relacionadas, conforme ilustra o Quadro 2.

Quadro 2 – Dimensões das competências segundo a abordagem inglesa.

Fonte: Adaptado de Cheetham e Chivers (1998).

Este modelo foi aplicado no Reino Unido numa versão modificada, em que as competências éticas foram incorporadas nas competências pesso-

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ais (Winterton & Winterton, 2002). Mais tarde a investigação observou que poucas organizações usavam as competências comportamentais na introdução de modelos híbridos.

4.3 Abordagem Francesa, Alemã e Austriaca

Em França, o conceito da competência foi aplicado ao desenvolvimento dos RH desde 1990, mas a investigação e a sua prática está associada a diferentes modelos normativos e práticas variadas. Para Haddadj e Besson (2000) a lógica da competência estava centrada nos comporta-mentos individuais e nas exigências organizacionais.Conforme ilustra o Quadro 3, muitos autores franceses compararam a abordagem francesa com a abordagem anglo-saxónica (apenas a dos EUA) e verificaram que a aproximação francesa é na sua generalidade mais compreensiva, onde consideram a competência teórica (saber), a competência prática (saber-fazer) e a competência social e a comporta-mental (saber-ser) (Tremblay & Sire, 1999).

Quadro 3 – Comparação das dimensões das competências entre a abordagem Anglo-saxónica e Francesa.

Fonte: Adaptado de Tremblay & Sire (1999).

Tremblay e Sire (1999) observaram uma forte concordância entre as competências funcionais usadas no Reino Unido e as competências “saber-fazer” em França, assim como as “soft competences” usadas nos EUA e as competências “saber-ser” usadas em França. Para Dejoux (1999) enquanto a noção de competências individuais não forem generalizadas e validada pelas teorias empíricas, não existirá uma definição consensual baseada no mínimo pelas dimensões já mencionadas. As três dimensões assentam nos conceitos de conhecimento (“savoir” e “connaissance”), na componente baseada na experiência (“savoir-faire”

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ou “savoir-agir”) e na componente comportamental (“savoir-être” ou ca-pacidade para se adaptar).Na Alemanha, a competência esteve sempre implícita no sistema de formação vocacional e treino alemão, a ênfase principal estava mais nas especificidades necessárias da aprendizagem do que nos resultados. A competência ocupacional é enraizada no conceito de Beruf (usualmente traduzida como ocupação, mas abrangendo as tradições do comércio e do ofício), que define a formação vocacional e a pedagogia associada. Desde 1980, surgiu o conceito de qualificações chave, incorporando as competências pessoais, como “a capacidade para actuar de forma autónoma, resolver problemas, ter flexibilidade, cooperar, práticas éticas e maturidade moral” (p. 176). Enquanto, as qualificações significam as habilidades para dominar o concreto (profissional) e as exigências da si-tuação (a orientação da aplicação), por outro lado a competência refere-se à capacidade para uma pessoa actuar (Arnold, Nolda, & Nuissl, 2001).Em 1996, o sistema de educação alemão adoptou a competência como um acto, movido do assunto (conhecimento) e os curricula especificam os campos de aprendizagem (Straka, 2004). A tipologia padrão da competência aparece agora no começo dos novos curricula da formação vocacional e treino, e são elaboradas conforme ilustra o Quadro 4.

Quadro 4 – Tipologia padrão da competência segundo a abordagem alemã.

Fonte: Adaptado de Straka (2004).

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O método da competência é a extensão das competências-chave e compe-tências cognitivas, e aparecem na implementação de estratégias transversais, no processo de inovação e de resolução de problemas, enquanto aprender a competência assemelha-se às meta-competências (aprender a aprender). A Áustria também adoptou uma abordagem semelhante à da Alemanha no que respeita à concepção das qualificações chave, em que são definidas como funcionais, transversais e profissionais, incluindo as dimensões que não são especificas da capacidade e os aspectos da formação da personalidade (Archan & Tutschek, 2002). Por sua vez, as qualificações estão agrupadas em competências cognitivas, sociais e pessoais, em que:• As competências cognitivas são definidas como o conhecimento, ap-

tidões e capacidades que podem ser usadas numa ocupação específica, para os domínios das tarefas e para o desenvolvimento apropriado de estratégias de resolução de problemas. O pensamento teórico, método das competências (inclui técnicas de aprendizagem) e vocação geral orientada para as capacidades, segurança no local de trabalho e gestão do trabalho são incluídos nas competências cognitivas.

• As competências sociais estão amplamente associadas com as relações interpessoais e são definidas como uma capacidade e vontade de cooperar, de interagir com responsabilidade com os outros e comportar-se em grupo.

• As competências pessoais compreendem as qualificações chave para lidar com ele próprio e são definidas no termos das capacidades e vontade para desenvolver a personalidade, tal como desenvolver ap-tidões, motivações, atitudes de trabalho e alargar os seus horizontes.

4.4 Abordagem Portuguesa

Em Portugal todo o sistema do Ensino Secundário foi revisto pelo Ministério da Educação e os curricula foram elaborados para obter re-sultados de aprendizagem de acordo com as competências cognitivas, funcionais e sociais. Estes perfis ocupacionais são baseados em compe-tências, e que vão ao encontro da aproximação francesa. Actualmente, ao nível governamental, a competência é definida como a “capacidade reconhecida para mobilizar o conhecimento, as aptidões e as atitudes em contextos de trabalho, de desenvolvimento profissional, de educação e de desenvolvimento pessoal” 2.

2 Decreto-Lei n.º 396, de 31 Dezembro de 2007.

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No sentido da convergência e tendo como referência as recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Abril de 2008, rela-tiva à instituição do Quadro Europeu de Qualificações (QEQ) para a aprendizagem ao longo da vida 3, Portugal cria o Sistema Nacional de Qualificações 4 (SNQ) e o Catálogo Nacional de Qualificações (CNQ) como instrumentos de gestão estratégica das qualificações de nível “não superior” e “superior”, para assegurar uma maior articulação entre as competências necessárias ao desenvolvimento socioeconómico do País e as qualificações promovidas no âmbito do sistema de educação e formação. O SNQ prossegue no sentido do reconhecimento dos resultados de aprendizagem, o que reflecte uma mudança importante na forma de conceptualização e descrição das qualificações, ao permitir compará-las de acordo com as competências a que correspondem e não com os métodos ou vias de ensino e formação pelos quais foram adquiridas. Valorizam-se por igual as competências obtidas por vias formais (educação e ensino), não formais (formação) e informais (experiência no trabalho), é necessário estabelecer um quadro comparativo, independentemente do modo como foram adquiridas. O QNQ 5 adopta os princípios do QEQ no que diz respeito à descrição das qualificações 6 nacionais em termos de resultados de aprendizagem, de acordo com os descritores associados a cada nível de qualificação. O QNQ, contempla oito níveis de qualificação, definidos por um conjunto de descritores que especificam os resultados de aprendizagem correspon-dentes às qualificações dos diferentes níveis e que estão de acordo com a Recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Abril de 2008, relativa à instituição do QEQ para a aprendizagem ao longo da vida 7. Este quadro permite que os indivíduos e os empregadores tenham uma percepção mais exacta do valor relativo das qualificações, o que contribui para o melhor funcionamento do mercado de trabalho. O QNQ abrange o ensino básico, secundário e superior, a formação profissional e os processos de reconhecimento, validação e certificação de competências obtidas por vias não formais e informais desenvolvidos no âmbito do Sistema Nacional de Qualificações.

3 JO, n.º C 111, de 6 de Maio de 2008. 4 Aprovado pela Portaria n.º 781, de 23 Julho de 2009. 5 Aprovado pela Portaria n.º 782, de 23 Julho de 2009. 6 Resultado formal de um processso de avaliação e validação, obtido quando um órgão competente decide

que uma pessoa alcançou resultados de aprendizagem de acordo com determinadas exigências (DL nº 396, de 31 de Dezembro de 2007).

7 Jornal Oficial das Comunidades Europeias, n.º C 111, de 6 de Maio de 2008.

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O diploma que regula o SNQ cria o CNQ como instrumento de gestão estratégica das qualificações, as orientações legislativas estabelecem a estrutura e organização do CNQ, bem como o respectivo modelo de evolução para qualificações baseadas em competências. A organização da formação de dupla certificação desenvolve-se a partir dos referen-ciais existentes no CNQ que identificam as competências associadas a cada perfil profissional. No quadro da sua actualização, o CNQ passa a estar organizado com base em competências, em função de resultados de aprendizagem descritos como conhecimentos, aptidões e atitudes 9.Os referenciais do CNQ aplicam-se também ao reconhecimento e certi-ficação de competências adquiridas por vias não formais e informais ao longo da vida. O Catálogo visa, igualmente, facilitar a transparência entre qualificações a nível nacional e internacional, promovendo, deste modo, a mobilidade, a transferência, a capitalização e o reconhecimento dos resulta-dos das aprendizagens, permitindo, ainda, que os utilizadores tenham acesso facilitado à informação sobre as qualificações e modalidades de formação.O referencial de competências consiste no conjunto de competências exigidas para a obtenção de uma qualificação, organizadas em unidades coerentes e com valor económico e social para o mercado de trabalho, designando estas últimas por unidades de competência. O desenho de formação define os conteúdos e outros elementos relevantes para o desenvolvimento da formação, devendo adequar-se ao referencial de competências definido para a respectiva qualificação.O CNQ identifica, para cada qualificação, o respectivo perfil profissional, o referencial de formação e o referencial para reconhecimento, validação e certificação de competências. As qualificações são, também, definidas em função de critérios que permitam a transferência de competências entre sectores de actividade e entre as áreas de educação e formação. Os perfis profissionais integram o conjunto das actividades associadas às qualificações, bem como os conhecimentos, aptidões e atitudes ne-cessários para exercer essas actividades.Para o efeito, foi criada a Agência Nacional para a Qualificação, I. P., é designada como ponto de coordenação nacional do QEQ, nos termos da Recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Abril de 2008, relativa à instituição do Quadro Europeu de Qualificações para a aprendizagem ao longo da vida 10.

9 Portaria n.º 78211, de 23 Julho de 2009. 10 JO, n.º C 111, de 6 de Maio de 2008.

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4.5 Abordagem da União Europeia

A perspectiva para os resultados ou para a aproximação baseadas nas competências na educação vocacional e treino pode ser verificado na maioria dos países europeus (Mansfield, 2004, p. 300), e a importância de adoptar o treino baseado na aprendizagem do trabalho (Winterton, 2000; Winterton & Winterton, 1997).O Sistema de Transferências de Créditos Europeus (ECTS) no Ensino Superior, introduzido em 1989, demonstrou o potencial do sistema de créditos para realçar a transferibilidade e mobilidade, tendo a Decla-ração de Bolonha em Junho de 1999 dado um ímpeto adicional a este sistema. A necessidade de criar um processo paralelo para a educação vocacional tornou-se crucial desde a declaração de Copenhaga em Novembro de 2002.Desde muito cedo que a Europa, em sentido lato, preocupou e teve várias acções pendentes para o reconhecimento e correspondência de qualificações de formação profissional entre os Estados-membros da Comunidade Euro-peia 11. O objectivo, entre outros, foi dar aos trabalhadores a possibilidade de melhor utilizar as suas qualificações, tendo em vista, o seu acesso a um emprego adequado noutro Estado-membro, como a criação de um quadro de referência comum que funcione como dispositivo de tradução entre os sistemas de qualificação dos Estados-membros 12.O desenvolvimento e o reconhecimento dos cidadãos nas áreas do conhecimento, capacidades e competências que são cruciais para o desenvolvimento individual, competitividade, emprego e coesão social na comunidade. Tal desenvolvimento e reconhecimento deve facilitar a mobilidade transnacional para o trabalho e contribuir para encontrar os requisitos necessários para o mercado Europeu. Uma das virtudes chave para a focagem no conhecimento, aptidões e competências, é a relação para aprender resultados, independentemen-te das orientações de aquisição envolvidas. O desenvolvimento para uma tipologia apropriada do “KSC” é importante para a promoção da mobilidade em três sentidos: vertical como a progressão na carreira; horizontal como o movimento entre sectores; e espacial nos termos da mobilidade alargada dentro da UE.

11 Conforme estabelecido na Decisão n.º 85/368/CEE, do Conselho de 16 de Julho, publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias, n.º L 199, de 31 de Julho de 1985.

12 JO, n.º C 111, de 6 de Maio de 2008.

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5. TIPOLOGIA DA COMPETÊNCIA

Durante esta revisão discutiu-se e verificou-se que os quadros sobre a competência estão a levar a estruturas multi-dimensionais e divergentes, mesmo após os esforços de convergência no âmbito da União Europeia. As competências funcionais e cognitivas nos EUA estão a ser adicionadas às competências comportamentais, enquanto as competências cognitivas e comportamentais, no Reino Unido, estão a ser adicionadas ao modelo de competências funcionais ocupacional.Em França, Alemanha e Áustria, parece adoptar-se uma estrutura mais ho-lística, considerando o conhecimento, as aptidões e as atitudes como uma dimensão da competência, como existe noutros países que adoptaram a formação baseado nas competências. A partir desta análise, verifica-se que uma tipologia holística é útil para compreender a combinação do conhecimento, aptidões e atitudes que são necessárias para uma ocupação particular. As competências requeridas para uma ocupação incluem, as conceptuais (cognitivas, conhecimento e compre-ensão) e as operacionais (funcional, psico-motor e capacidades aplicadas).As competências mais associadas com a eficácia pessoal são também con-ceptuais (meta-competências, incluindo aprender a aprender) e operacionais (competências sociais, incluindo atitudes e comportamentos). A relação entre estas quatro dimensões da competência está ilustrada na Figura 3. As primeiras três di-mensões, competências cognitivas, funcionais e sociais, são aceites de uma forma geral e estão claramente consistentes com a aproximação fran-cesa (saber, saber-fazer, saber-ser) tal como o KSA (conhecimento, capacidade e atitudes) no treino para a profissão. O conhecimento e a compreensão são associado às competências cognitivas, as capacidades com as competências funcionais e, aos comportamentos e as atitudes com as competências sociais. Segundo Le Deist e Winterton (2005) um modelo holístico de competências talvez seja melhor representado através de uma pirâmide, representando cada vértice as dimensões das competências e assim verificar a dificuldade para separar, na prática, as dimensões cognitiva,

Fonte: Traduzido e adaptado de Le Deist & Winterton (2005, p.39).

Figura 3 – Tipologia das competências.

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funcional e social. Na Figura 4, conforme já foi referido no modelo holístico de competências é representado por uma pirâmide. A meta-competências é apresentada no cume para facilitar a aquisição da base do triângulo. A meta-competências é apresentada no cume para facilitar a aquisição da base do triângulo. As competências práticas podem ser pensadas, combinando os elementos das dimensões da competência em proporções de variação. Para Le Deist e Winterton (2005) a aproximação holística multi-dimensional da competência está a tornar-se cada vez mais difundida e oferece a oportu-nidade para elaborar eficazmente. O programa educacional e o seu alinha-mento no local de trabalho, assim como explorar as sinergias entre o ensino convencional e a aprendizagem com base na experiência para desenvolver as competências profissionais adequadas.

Fonte: Adaptado de Le Deist & Winterton (2005, p.40).

Figura 4 – Modelo holístico de competências.

O desafio é desenvolver uma tipologia de competência consistente e coerente num contexto onde a divergência entre vários países se possa aproximar. A abordagem tradicional dos EUA demonstrou a importância das caracterís-ticas individuais e usa as competências comportamentais como um meio para desenvolver os desempenhos superiores. No Reino Unido ficou claro o valor ocupacional definido por padrões das competências funcionais e as suas aplicações no local de trabalho. A aproximação adoptada em França e na Alemanha demonstraram o potencial das multi-dimensões e um conceito mais analítico da competência. Contudo, verifica-se que existem sinais de convergência nas aproximações dos diferentes países, não apenas entre os países da Europa como os modelos dos EUA, em que estes sugerem que é no valor da aproximação das multi-dimensões que está o desenvolvimento para uma compreensão global do termo.

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6. VERIFICAÇÃO DAS HIPÓTESES

Como foi mencionado na introdução, foram consideradas três hipóteses te-óricas e que a partir da análise documental dos trabalhos de investigação e obras publicadas recentemente, são analisadas a sua verificação ou infirmação.

H1: Existe um conceito de competência aceite pelos académicos e profissionais.

Da revisão de literatura podemos concluir que existem diferentes perspec-tivas, e nem é provável que nos próximos anos, os técnicos de Recursos Humanos adoptem uma definição de competência aceite universalmente. Conforme sugerido pelos diferentes autores, o mais importante é que cada organização adopte uma definição que faça sentido e encontre as suas ne-cessidades, bem como os membros da organização partilhem e percebam as definições adoptadas.

H2: As competências organizam-se de forma diferente.

A hipótese verifica-se. Segundo as diferentes abordagens apresentadas sobre as competências, verifica-se que estas se organizam segundo diferentes domínios em que os indivíduos para obter desempenhos superiores no exercício de uma função, têm que ter: (a) um conjunto de traços de personalidade, qualidades ou atributos – de si próprio; (b) capacidades para se inserir num grupo, estabelecer redes sociais e desenvolver relações interpessoais – da relação com os outros; (c) conhecimentos, aptidões e habilidades técnicas para obter desempenhos – da função; (d) capacidade se adaptar ao ambiente interno e externo – da envolvente; (e) e capacidade para promover a mudança para atingir os objectivos organizacionais de forma eficiente e eficaz – da gestão.

H3: As competências classificam-se de forma diferente.

A hipótese verifica-se. Face às diferentes abordagens, verifica-se que as competências podem-se classificar em pessoais ou cognitivas, funcionais e sociais, e que são aceites de uma forma geral pela comunidade científica (Winterton, 2000; Straka, 2004; Le Deist e Winterton, 2005). Esta classifi-cação também se encontra consistentes com a aproximação francesa (saber, saber-fazer, saber-ser), e que é muito utilizada em modelos de competências de diversas organizações internacionais apenas com a designação de “BE”, “KNOW” e “DO”. Na área da gestão, devem-se ainda considerar as com-petências organizacionais.

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7. CONCLUSÕES

De acordo com as várias definições de competência apresentadas pelos di-ferentes autores podemos concluir que não existe uma definição consensual, e que por isso entende-se oportuno seguir a indicada pela abordagem Portu-guesa, em que esta é definida como a capacidade reconhecida para mobilizar o conhecimento, as aptidões e as atitudes em contextos de trabalho, de desenvolvimento profissional, de educação e de desenvolvimento pessoal. Apesar desta definição ser ampla, não contempla de forma explicita as áreas sociais e interpessoais (apenas aparece nos diferentes níveis de qualificação da educação e formação, no que respeita aos resultados de aprendizagem das atitudes), assim como o padrão de desempenho, apesar deste último estar presente na metodologia de levantamento de competências prescrito pela Agência Nacional de Qualidade, através dos critérios de desempenho. As competências podem ser organizadas segundo diferentes domínios: (a) de si próprio; (b) da relação com os outros; (c) da função; (d) da en-volvente; (e) e da gestão. Quanto ao tipo de competências, podem ser enquadradas em competências pessoais ou cognitivas, funcionais, sociais e organizacionais.

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modElo dE sEgurança da informação Para organizaçõEs militarEs Em ambiEntE dE guErra dE informação

José Martins (*)

Tenente-Coronel de Infantaria (Mestre)

Henriques dos Santos (**)

Professor Doutor

Paulo Nunes (***)

Tenente-Coronel de Transmissões (Doutor)

ABSTRACT

This article includes the proposal of a model to maximize the information secury within military organisations, inserted in Information Warfare environ-ment. In order to protect the information and Information Systems of possible incidents related to information security that may affect confidentiality, integrity and availability of information. This model has the purpose of answering to three main questions, what to do, why to do it and how to do it?

The main variables to be considered are defined and their possible values are proposed. These variables are obtained by means of an interpretative epistemological approach, through a Literature Revision, the use of the research methods of Con-tents Analysis, Focus Group 2 and the method of General Morphologic Analysis.

In order to integrally answer to the referred three questions, the model considers the possible incidents related to information security within Informa-

1 Um agradecimento especial ao Instituto de Defesa Nacional e à Academia Militar pelo apoio logístico dado ao estudo realizado, ao Sr. Coronel Freire e aos participantes nos Focus Group pela sua disponibi-lidade e espírito altruísta na partilha do conhecimento, um sincero obrigado ao António Galindro, Carlos Alexandre, Carlos Pimentel, Lino Santos, Nuno Góis, Paulo Coelho, Paulo Saraiva, Paulo Zarcos, Pessoa Dinis, Rafael Teixeira, Rogério Bravo, e ao Valente Agostinho.

(*) Docente na Academia Militar (AM) e no Instituto Superior Politécnico do Oeste. Investigador no CINAMIL, no Centro Algoritmi da Universidade do Minho (UM) e no laboratório UbiNET do Instituto Politécnico de Beja. Doutorando em Tecnologias e Sistemas de Informação e Mestre em Sistemas de Informação pela UM. Possui uma pós-graduação em Tratamento Estatístico de Dados (ISCTE) e em Guerra de Informação (AM). É licenciado em Ciências Militares (AM) e em Engenharia Informática (FCT/UNL).

(**) Professor Associado na área das Tecnologias de Informação e Comunicação do Departamento de Sistemas de Informação, da Universidade do Minho. É presidente da Comissão Técnica Nacional CT-136 (Segurança em Sistemas de Informação). Director do Centro de Investigação Algoritmi da Universidade do Minho. Doutorado em Engenharia de Computadores pela Universidade do Minho. Possui mestrado e licenciatura em Engenharia Electrotécnica (opção em Informática) pela Universidade de Coimbra.

(***) Chefe da Repartição de Sistemas e Tecnologias de Informação da DivCSI/EME. Coordenador científico e docente do mestrado em Guerra de Informação / Competitive Intelligence da AM. Doutorado em Ciências da Informação pela Universidade Complutense de Madrid. Mestre e licenciado em Engenharia Electrotécnica e de Computadores pelo Instituto Superior Técnico. Licenciado em Ciências Militares (Ramo Transmissões) pela AM.

modelo de seGurAnçA dA informAção pArA orGAnizAções militAres em Ambiente de GuerrA de informAção 1

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tion Systems, having particularly in consideration the main security risks of the components of Information Systems that collect, gather, transmit and diffuse information. The operational slope is guided by the military concepts of Informa-tion Warfare, Information Assurance, the most relevant principles of war applied to Defensive Operations and by the military doctrine of Information Operations.

On the other hand, we may find associated to this model the main dimen-sions and control types of information security which result from the analysis of some of the most significant international and national rules (e.g. ISO 27001, NIST 800-53) and from military models (e.g. North Atlantic Treaty Organiza-tion), used for the information security management.

Considering the type of problem identified in the study, mainly focused in the analysis of scenarios of incidents related to the information security and interconnection with the planning and selection of security control, the method used is the General Morphological Analysis.

This method enables to develop the possible scenarios of incidents related to the information security at the organisational level that make possible to select the most efficient solution of security control in order to maximize intelligence security.

Information security must guarantee confidentiality, integrity and avai-lability of information and seeks to contribute, by means of the operational implementation of the military concept of Information Assurance, to achieve the information superiority.

Key words: Information Security Management., Information Assurance, Infor-mation Security Model, General Morphological Analysis and Information Warfare

RESUMO

Neste artigo, propõe-se um modelo para maximizar a segurança da infor-mação nas organizações militares, inseridas num ambiente de Guerra de Infor-mação. Para proteger a informação e os Sistemas de Informação dos possíveis incidentes de segurança da informação que podem afectar a confidencialidade, a integridade e disponibilidade da informação. Modelo esse, que procura dar resposta a três questões fundamentais: o que fazer, porquê fazer e como fazer?

Definem-se as principais variáveis a considerar e propõem-se os seus possíveis valores. Sendo estas obtidas, numa abordagem epistemológica interpretativista, através de uma Revisão de Literatura, da utilização dos métodos de investigação Análise de Conteúdo, do Focus Group e do método de Análise Morfológica Geral.

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Para responder de forma integrada às três questões referidas, o modelo considera os possíveis incidentes de segurança da informação em Sistemas de Informação, tendo em consideração fundamentalmente os principais riscos de segurança dos componentes dos Sistemas de Informação, que recolhem, armaze-nam, processam, transmitem e disseminam a informação. A sua operacionalização é orientada pelos conceitos militares de Guerra de Informação, de Information Assurance, pelos princípios da guerra mais relevantes aplicados nas Operações Defensivas e pela doutrina militar das Operações de Informação.

Por outro lado, associam-se neste modelo as principais dimensões e tipos de controlos da segurança da informação, que resultam da análise de algumas das mais relevantes normas internacionais e nacionais (e.g. ISO 27001, NIST 800-53) e de modelos militares (e.g. North Atlantic Treaty Organization), uti-lizadas na gestão de segurança da informação.

Face ao tipo de problema identificado no estudo, centrado fundamentalmente na análise de cenários de incidentes de segurança da informação e interligação com o planeamento e selecção de controlos de segurança, utiliza-se o método de Análise Morfológica Geral. Este método permite desenvolver os possíveis cenários de incidentes de segurança da informação ao nível organizacional, que possibilitam escolher a mais eficiente solução de controlos de segurança para maximizar a segurança da informação.

A segurança da informação deve garantir a confidencialidade, a integri-dade e a disponibilidade da informação, procurando através da implementação operacional do conceito militar de Information Assurance contribuir para obter a superioridade de informação.

Palavras Chave: Gestão da Segurança da Informação, Information As-surance, Modelo de Segurança da Informação, Análise Morfológica Geral e Guerra de Informação.

INTRODUÇÃO

A maioria das organizações deve considerar como um dos desafios mais sig-nificativos a vencer, o crescente nível de competição pela obtenção de informação dos concorrentes, fornecedores e clientes de forma ética e legal, i.e. através da Competitive Intelligence (McCrohan, 1998). No entanto muitas organizações ainda não têm implementado um método formal de gestão de segurança da informação que lhes permita garantir a segurança da sua própria informação ou da que está à sua responsabilidade (Barlette & Fomin 2009; Fomin, Vries, & Barlette, 2008).

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Sem segurança da informação, a organização sujeita-se à probabilidade de ter impactos negativos em caso de ocorrência de incidentes de segurança da informação. Como sejam a perda de reputação com consequente perda da quota de mercado, perdas financeiras ou roubo do seu capital intelectual e em algumas situações, incapacidade de cumprir com leis e regulamentos do sector (e.g. banca, saúde).

Diversos relatórios internacionais (Deloitte, 2010; Richardson, 2011) têm sustentado a relevância deste assunto e uma crescente preocupação com esta temática no seio das organizações civis e militares. Preocupação essa actual-mente acrescida pelos inúmeros métodos de ataque que podem ser realizados através do ciberespaço ou seja mais especificamente através da Internet (CSO, CERT, & Deloitte, 2010; ENISA, 2011; GTISC, 2010) e que são ampliados na sua importância pelas noticias que constantemente são publicadas nos media nacionais e internacionais.

Esta utilização “bélica” do Ciberespaço permite explorar as vulnerabilidades das infra-estruturas críticas de um Estado (Cavelty & Suter, 2008; Nickolov, 2006; Rinaldi, Peerenboom, & Kelly, 2001; Sharma & Gupta, 2002; Theohari-dou, Xidara, & Gritzalis, 2008), podendo por em causa a sua própria Segurança. Consequentemente, a segurança dos Sistemas de Informação (SI) e da informação, é cada vez mais fonte de preocupação e de investigação em algumas organiza-ções militares, como seja a North Atlantic Treaty Organization (NATO) ou o Departamento de Defesa (DoD) dos Estados Unidos da América (EUA) (DoD, 2011; NATO, 2010). Um dos motivos é a possibilidade de alguns países estarem a desenvolver e a utilizar as Tecnologias de Informação (TI) como uma arma ofensiva de um moderno campo de batalha i.e. o ciberespaço, podendo resultar futuramente numa Cyber Warfare (Alford, 2000; Andress & Winterfeld, 2011; Boyd, 2009; Fritz, 2008; Hildreth, 2001; Knapp & Boulton, 2006; Krekel, 2009; Kumar, 2009; Libicki, 2007; Nunes, 2010; Parks & Duggan, 2001).

Podemos observar alguns dos seus possíveis efeitos na Estónia em 2007 (Tikk, 2008), no conflito da Geórgia em 2008 (Tikk, et al., 2008) e através da detecção de redes fantasmas de espionagem na Internet (Deibert, Manchanda, Rohozinski, Villeneuve, & Walton, 2009). Mais recentemente, em 2010, o caso WikiLeaks (Leigh & Harding, 2011) demonstrou também a necessidade urgente da gestão da segurança da informação ao nível das organizações.

2 De acordo com a doutrina da NATO, a informação pode ser classificada como: top secret, secret ou confidential (AAP-6, 2009).

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O elemento central nesta temática é a informação, como activo de negó-cio fundamental para a organização e que consequentemente necessita de ser adequadamente protegida (ISO/IEC 27001, 2005). Considera-se neste estudo, a informação, como os dados existentes em qualquer meio e forma, aos quais é atribuído um significado (JP 3–13, 1998), após terem sido organizados numa forma útil de modo a transmitir uma mensagem com significado para os des-tinatários da sua utilização (Laudon & Laudon, 2006).

É fundamental garantir a confidencialidade, a integridade e a disponibilidade da informação, como propriedades principais da segurança da informação. Estas propriedades, conjuntamente com a classificação da informação 2, são duas das principais orientações para uma eficiente gestão da segurança da informação na organização militar.

A gestão da segurança da Informação é um processo de gestão estruturado e implementado na organização, para garantir os principais requisitos da segurança da informação, especialmente para a informação que é crítica para suportar os processos de negócio da organização (Vermeulen & Von Solms, 2002). Neste contexto, é fundamental que para além da protecção da informação, propria-mente dita, seja garantida simultaneamente a protecção dos SI que permitem a recolha, o processamento, a armazenagem e a transmissão da informação.

Também a norma Internacional ISO/IEC 27001 (2005) considera a segurança da informação, como um processo de gestão estruturado que permite garantir os principais requisitos de segurança da informação, fornecendo um modelo para estabelecer, implementar, operar, monitorizar, rever, manter e melhorar um Sistema de Gestão de Segurança da Informação (SGSI).

Apesar dos esforços na construção de ferramentas que suportem a melhor aplicação destes conceitos a casos reais não se pode afirmar que existe um modelo universal, devido fundamentalmente à especificidade das organizações.

Neste artigo, propõe-se um modelo para maximizar a segurança da in-formação nas organizações militares, inseridas num ambiente de Guerra de Informação (GI). Para proteger a informação e os SI dos possíveis incidentes de segurança da informação que podem afectar a confidencialidade, a integridade e disponibilidade da informação. Modelo esse, que procura dar resposta a três questões fundamentais: o que fazer, porquê fazer e como fazer?

O segurança da informação organizacional pode ser considerado um Wi-cked Problem, de acordo com os critérios da aceitação de um Wicked Problem, dos quais se salientam os seguintes cinco critérios: não há uma formulação definitiva do problema; as soluções para o problema não são verdade ou falso, mas melhor ou pior; não há um teste imediato e final à solução encontrada

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para o problema; cada problema é único e as causas do problema podem ser explicadas de várias maneiras, consequentemente a escolha da explicação do problema determina a natureza da resolução do mesmo (Ritchey, 2011).

Face ao tipo de problema identificado no estudo, centrado fundamentalmente na análise de cenários de incidentes de segurança da informação e interligação com o planeamento e selecção de controlos de segurança, utiliza-se o método de Análise Morfológica Geral (AMG) para obter, validar e interligar as variáveis identificadas no modelo de segurança da informação nas organizações militares, para além da revisão de literatura e da Análise de Conteúdo. Este método per-mite desenvolver os possíveis cenários de incidentes de segurança da informação ao nível organizacional, que possibilitam escolher a mais eficiente solução de controlos de segurança para maximizar a segurança da informação. A AMG per-mite estruturar e investigar o conjunto total de relações contidas em problemas complexos multidimensionais, normalmente não quantificáveis (Ritchey, 2011).

O termo Morphology, i.e. Morfologia, tem origem na palavra grega Morphê, que significa em termos gerais o estudo da forma de um objecto, onde existe uma preocupação fundamental com a estrutura e o arranjo entre as diferentes partes de um objecto. De modo a criar um todo integrado e coerente, onde o objecto analisado pode ser um sistema físico (e.g. um organismo) ou um objecto mental (e.g. um modelo). A sua aplicação esta associada a algumas disciplinas científicas (e.g. biologia), onde na resolução de alguns problemas, o assunto central é a estrutura formal de um objecto e não a sua quantificação ou a função (Ritchey, 2006).

A “Análise morfológica geral é um método para estruturar e investigar o conjunto total de relações contidas em problemas complexos multi-dimensionais, normalmente não quantificáveis” (Ritchey, 2006, p. 1). Procura-se através do método científico de Análise e Síntese (Ritchey, 1991) identificar e investigar a totalidade das possíveis relações contidas num dado problema multidimensional e que pode ser parametrizado (Ritchey, 2004).

A construção do modelo de segurança da informação, dada a especificidade da organização militar e do seu possível ambiente de actuação, é centrada nos conceitos de GI e de Information Assurance. Este modelo, tem também em consideração os princípios da guerra mais relevantes aplicados nas operações defensivas militares e em doutrina militar de Operações de Informação (OI) da NATO, EUA e Portugal, para desta forma planear e implementar com eficiência os controlos de segurança, numa abordagem focada na análise dos possíveis cenários de incidentes à segurança da informação nas organizações militares. Este modelo permite apoiar a tomada de decisão para a construção de políticas

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de segurança e no planeamento, implementação e monitorização dos controlos de segurança da informação.

Para apresentar o modelo, este artigo encontra-se dividido em seis secções. Na introdução, efectua-se o enquadramento da problemática, justifica-se a re-levância do tema, enunciam-se as principais motivações e os objectivos para a sua realização. Na sessão um analisa-se o ambiente geral em que se inserem as organizações militares, definindo fundamentalmente os conceitos de Guerra de Informação e das Operações de Informação. Na secção dois apresenta-se a revisão de literatura dos modelos e métodos de segurança da informação actualmente existentes para realizar a gestão da segurança da informação ao nível organizacional, após o que na secção três, se descreve sumariamente a metodologia de investigação utilizada no estudo, com foco na utilização do método de investigação Focus Group. Na secção quatro descreve-se o modelo de segurança da informação, efectuando a análise das suas variáveis. De segui-da na secção cinco, procede-se à descrição do método de análise morfológica geral e da sua formalização matemática aplicada ao modelo da segurança da informação organizacional proposto. Por fim, apresentam-se na secção seis as conclusões do estudo, indicando as suas limitações e alguns dos possíveis estudos em aberto.

1. GUERRA DE INFORMAÇÃO E OPERAÇÕES DE INFORMAÇÃO

Para operacionalizar a segurança da informação na organização militar, devi-do à sua especificidade é necessário ter em consideração a doutrina militar. Neste âmbito, um dos conceitos fundamentais a considerar é o conceito de Guerra de Informação, o qual têm sido estudado e referenciado por diversos autores (Alberts, 1996; Alberts, Garstka, Hayes, & Signori, 2001; Cronin & Crawford, 1999; Denning, 2000; Jajodia, Ammann, & McCollum, 1999; Libicki, 1995; Stein, 1995; Waltz, 1998). Estes autores têm diferentes interpretações do conceito de GI, cuja análise sai fora do âmbito deste artigo. Na sua essência, o conceito de GI pode ser definido, tal como referido na doutrina militar dos Estados Unidos da Amé-rica (EUA), como “as acções desenvolvidas para obter a superioridade de informação afectando a informação do adversário, os processos baseados em informação, os Sistemas de Informação e as redes baseadas em compu-tadores de um adversário enquanto se defende a nossa própria informação, os processos baseados em informação, os Sistemas de Informação e as redes baseadas em computadores.” (FM 100-06, 1996, p. 224).

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Num ambiente de GI, essas acções podem ser conduzidas através das OI, que consistem principalmente segundo a doutrina dos EUA num conjunto de actividades e capacidades utilizadas para afectar a informação do adver-sário e dos seus SI, enquanto se defende a nossa (FM 3-13, 2003; JP 3–13, 1998), as quais podem ser planeadas e utilizadas para obter a superioridade de informação face a um adversário. Para garantir a capacidade operacional de “recolher, processar e disseminar um fluxo ininterrupto de informação, enquanto se explora ou nega a capa-cidade de um adversário fazer o mesmo” (DoD, 2010, p. 225), que permite obter a superioridade de informação, é necessário fundamentalmente opera-cionalizar o conceito militar de Information Assurance, como conjunto de “medidas que protegem e defendem a informação e os SI, garantindo a sua disponibilidade, integridade, autenticação, confidencialidade e não-repúdio. Isso inclui a capacidade para restaurar o funcionamento dos SI, incorpo-rando capacidades de protecção, detecção e reacção” (DoD, 2010, p. 224). Na NATO, as OI consistem em actividades de informação, as quais “ […] são acções destinadas a afectar a informação e/ou os sistemas de informa-ção. Elas podem ser realizadas por qualquer actor e incluem medidas de protecção.” (AJP-3.10, 2009, p. 1.3), ou seja, mais uma vez o foco principal é o garantir a protecção da informação e dos SI das nossas forças, enquanto se procura afectar a informação e os SI do adversário.Existem estudos, que apresentam revisões de literatura sobre as OI, uns procurando um entendimento conceptual das OI de acordo com diferentes doutrinas militares aplicadas por diferentes Estados e organizações (SAS-057, 2006), outros centrados na visão dos EUA e da NATO (Nunes, 2006). Estes estudos apresentam uma visão geral sobre algumas das possíveis acções que podem ser executadas sobre a informação e os SI.As acções ofensivas desenvolvidas no âmbito da GI e das OI podem ser realizadas e ter efeitos fundamentalmente a três níveis ou dimensões de ac-tuação, que são predominantemente: um nível físico, um nível da informação e um nível cognitivo (Alberts, et al., 2001; Andress & Winterfeld, 2011; Cronin & Crawford, 1999; Martins, Santos, & Nunes, 2009; Waltz, 1998).O aparecimento destes conceitos (i.e. a GI, as OI e a Information Assu-rance), desenvolvidos especialmente nesta última década e referenciados predominantemente no meio militar, onde a informação é vista simultanea-mente como arma e como alvo (Hutchinson, 2003), leva à necessidade de equacionar novas abordagens à segurança da informação, podendo esta ser vista como uma Defensive Battle (Chesla, 2004). Nesta abordagem, para além

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de controlos de segurança passivos poderá ser necessário aplicar controlos activos na segurança da informação. Os estudos identificados na revisão de literatura realizada de GI e de doutrina militar das OI não apresentam linhas de operacionalização, orientações ou ligações com a segurança da informação ao nível organizacional de modo sistemático e racional, mas no entanto estes conceitos são fundamentais para definir o âmbito da aplicação do modelo desenvolvido neste estudo.

2. REVISÃO DE LITERATURA

Da revisão de literatura realizada 4 no âmbito da segurança da informação ao nível organizacional, encontram-se fundamentalmente métodos e normas orientados para a gestão do risco da segurança da informação (e.g. ISO/IEC 27005, OCTAVE). Identificam-se também normas de certificação e boas práticas de segurança da informação (e.g. ISO/IEC 27001, ISO/IEC 27002), normas e orientações de segurança da informação de foco mais tecnológico (e.g. NIST 800-53, ISO/IEC 13335-4). Existem simultaneamente normas orientadas à certificação do produto ou do sistema (e.g. ISO/IEC 15408) e normas para a avaliação da maturidade de uma organização, que permite às organizações que a apliquem evoluir na organização e eficiência do seu processo de engenharia de segurança (e.g. ISO/IEC 21827). Por fim referenciam-se algumas normas da indústria mais orientadas a interligar os requisitos de negócio com os processos das TI (e.g. CobiT) ou à gestão das TI (e.g. ITIL) e nas quais também se reflecte a preocupação com a segurança da informação. Existem estudos com propostas de Frameworks que sugerem a integração de diferentes aproximações (Farn, Lin, & Fung, 2004), com base em normas focadas em tecnologias, em processos e tendo em consideração o ambiente organizacional e humano das organizações. Podem-se também obter orientações para garantir a segurança da infor-mação nas organizações, através do corpo de conhecimentos de uma das certificações para os profissionais da segurança de sistemas de informação mais reconhecidas pela indústria, a CISSP - Certified Information Systems Security Professional (Harris, 2008). Para além da certificação CISSP, existem outras menos focadas nos aspectos tecnológicos e operacionais da segurança da informação, das quais se salienta

4 Esta revisão de literatura embora com ligeiras alterações foi publicada na 6th International Conference On Global Security, Safety and Sustainability (Martins & Santos, 2010).

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a Certified Information Security Manager (CISM), mais orientada para os profissionais da gestão da segurança da informação e cujo objectivo principal consiste em certificar especialistas para projectar, construir e gerir projectos de gestão de segurança da informação nas organizações (Peltier & Peltier, 2006).Existem recomendações de organizações independentes (e.g. CERT, ENISA, Information Security Forum) que podem e devem ser consideradas para apoiar o planeamento das medidas de segurança a implementar nas organizações militares.A nível militar, identifica-se o modelo de segurança da NATO 5, como prin-cipal orientação para a segurança da informação ou INFOSEC (Information Security). Este modelo de acordo com as principais directivas, separa as diferentes dimensões da segurança (e.g. a segurança física, a pessoal, a da informação). Define superiormente, ao mesmo nível da segurança da infor-mação, mas em eixos separados, a segurança física, a segurança pessoal, a segurança das matérias classificadas ou seja a segurança dos documentos e a segurança processual. A segurança da informação tem preocupações rela-cionadas com a segurança das comunicações (i.e. COMSEC – Comunications Security) e com a dos computadores (i.e. COMPUSEC – Computer Security), embora referenciadas em dimensões da segurança separadas.Nos EUA, país de referência nas orientações estratégicas e operacionais da NATO, pode-se também referenciar documentação não classificada do departamento de defesa (e.g. DoD 5200.1-R, DoD-8500.2, CJCSIE_6510) e de doutrina do Exército (e.g. Army Regulation 25–2), a qual permite ter a percepção da abordagem de segurança da informação seguida pelas suas organizações militares. No caso particular das Forças Armadas Portuguesas, e em especial o Exército, segue a doutrina de segurança da informação produzida na NATO. Embora existam alguns documentos desenvolvidos pelo Exército Português (e.g. RAD280-1), os quais no entanto, também se centram na doutrina produzida pela NATO. Devido à existência de documentação classificada inacessivel para o estudo, é compreensível que a revisão de literatura esteja incompleta. No entanto, pensa-se que a análise dos documentos identificados, permite obter uma visão aproximada da abor-dagem e das orientações seguidas quer pela NATO, quer pelos EUA e, consequentemente, pelas organizações militares Portuguesas.Face aos diversos estudos académicos identificados e analisados na revisão de literatura, com o foco na gestão da segurança da informação ao nível

5 Site restrito da NATO, versão 1.6 de 8 de Outubro de 2007.

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organizacional, constata-se que existem algumas dificuldades na aplicação dos actuais métodos e consequentemente na gestão da segurança da infor-mação, dos quais se salientam:

• em primeiro lugar, considerando uma abordagem pela análise do risco, existe a dificuldade em calcular a probabilidade de uma ameaça explorar a vulnerabilidade de um activo (Baskerville, 1993), em avaliar o valor de um activo e consequentemente em provar que um investimento em segurança da informação tem um retorno adequado (Finne, 1998);

• também a multidimensionalidade do problema da segurança dos SI (e.g. ameaças, vulnerabilidades, activos e impacto) (Baskerville, 1993) aumentam a dificuldade do problema e da sua possível solução;

• a inexistência de uma teoria que cubra toda a gestão da segurança da informação, através da integração de diversas teorias de suporte (Hong, Chi, Chao, & Tang, 2003);

• por fim, a gestão da segurança da informação nas organizações, parece não ter ainda atingido um nível de maturidade que possa torná-lo um processo de gestão repetível (Nnolim & Steenkamp, 2008).

Na aplicação das normas internacionais de gestão de segurança da informação, nomeadamente a ISO 27001 existem também algumas dificuldades que tem levado a sua baixa adopção nas organizações. Destas, podem-se referir como nucleares: o custo elevado (i.e. o tempo, os recursos e o valor monetário) associado à obtenção de uma certificação em gestão de segurança da infor-mação; a dificuldade de ser entendida por todos os colaboradores de uma organização devido a sua complexidade; o contributo da certificação para um aumento da quota de mercado, ser apenas de curta duração, em relação a outras empresas do sector e por fim as orientações muito genéricas das normas em oposição à especificidade das organizações (Fomin, et al., 2008). Podem-se também identificar algumas barreiras a ultrapassar que limitam a adopção desta norma internacional de segurança da informação, complemen-tares ao estudo realizado por Fomin et al. (2008). Das quais se salientam fundamentalmente, a necessidade dos gestores estarem suficientemente pre-ocupados e elucidados sobre a eficiência da segurança da informação para a sua organização numa perspectiva de custo / benefício; os gestores devem ter conhecimentos sobre os controlos de segurança aplicados na organização, na perspectiva, “do quê? porquê?” da sua adopção; a necessidade de reduzir os custos de implementação das normas e a necessidade de pessoas com elevadas qualificações; a estratégia e o modelo de segurança aplicado numa organização

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devem ter em atenção a especificidade da organização, os aspectos culturais e finalmente o factor humano e as ameaças internas (Barlette & Fomin, 2009). Estudos recentes, apresentam como principais factores de sucesso para uma efi-ciente gestão da segurança da informação, a necessidade de um compromisso da gestão de topo da organização, a gestão da segurança não ser considerada apenas um aspecto de TI, o seu modelo de gestão ser adaptado à cultura organizacional e possuir mecanismos que permitam a actualização em tempo útil das políticas de segurança, bem como a partilha de conhecimento (Barlette & Fomin., 2009). Estas dificuldades, barreiras e factores de sucesso, sugerem algumas das principais orientações ou pistas a ter em consideração no desenvolvimento de um modelo da segurança da informação para organizações militares.Deste modo, os actuais modelos identificados na revisão de literatura devido às dificuldades anteriormente apresentadas, à não resposta de forma integrada às questões “o quê? o porquê? e o como?”, dificultam a operacionalização de forma integrada e coordenada, das diversas dimensões de segurança da informação. No modelo proposto considera-se, a dimensão Organizacional, a Física, a Humana e a Tecnológica (Martins, et al., 2009). Estas dimensões são necessárias para proteger a informação da organização dos incidentes de segurança que podem ocorrer principalmente a três níveis ou dimensões de actuação dos métodos de ataque e que são predominantemente o nível físico, o nível da informação e o nível cognitivo.O modelo proposto procura ter em consideração as limitações das actuais normas internacionais referenciadas nos estudos académicos e as principais orientações da metodologia de planeamento táctico das operações, na com-ponente de gestão do risco do Exército Português. Onde o planear “é um processo pelo qual o comandante visualiza um resultado final, transmite um método eficaz para o atingir e comunica a sua visão, intenção e decisão” (PDE 5-00, 2007, p. 2.1).A perspectiva das organizações militares, na qual, o planeamento e a tomada de decisão militar é centrado na análise das possíveis modalidades de acção (e.g. a mais provável, a mais perigosa ou outras opções) do adversário, jus-tifica o modelo proposto centrar-se numa abordagem orientada por cenários.

3. METODOLOGIA DE INVESTIGAÇÃO

Para a construção do modelo de segurança da informação, a abordagem de investigação seguida foi mais próxima da orientação epistemológica inter-pretativista. Isso reflecte-se consequentemente, nos métodos de investigação

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utilizados, os quais consistiram numa primeira fase na revisão de literatura e na Análise de Conteúdo, e numa segunda fase na utilização do método de investigação Focus Group em combinação com o método de Análise e Síntese, utilizado na Análise Morfológica Geral.Neste artigo, tem-se consciência de que o estudo do fenómeno da segurança da informação nas organizações, especificamente na militar, depende funda-mentalmente da interpretação das fontes de dados a que o investigador tem acesso, como sejam neste caso particular as normas internacionais, os rela-tórios de incidentes ocorridos em organizações, a doutrina militar e também os dados verbais obtidos através do método de investigação Focus Group. Para além dos métodos de investigação indicados, duas outras dimensões são importantes para o correcto racional desta investigação, que são as teorias e as disciplinas científicas de referência utilizadas no estudo. As teorias re-levantes utilizadas são a Teoria Baseada no Risco, numa primeira fase e a Análise Topológica com o método de Análise Morfológica 6, numa segunda fase. Como disciplinas de referência utilizam-se alguns dos conhecimentos associados à Ciência dos Computadores, à Ciência da Gestão e às Ciências Sociais e do Comportamento.Este artigo apresenta um modelo que propõe as principais variáveis a consi-derar e seus possíveis valores no apoio à tomada de decisão para maximizar a segurança da informação ao nível organizacional. Sendo estas variáveis obtidas através da revisão de literatura, da utilização dos métodos de inves-tigação análise de conteúdo e do Focus Group. Na primeira fase do estudo, centrada na revisão de literatura e na análise de conteúdo (Quadro 1) procura-se através da técnica de triangulação de diversas fontes de materiais empíricos (e.g. normas internacionais, doutrina militar, recomendações da indústria, livros e artigos académicos), obter as principais variáveis e seus possíveis valores ou condições. No entanto, devido à possível subjectividade dos resultados obtidos, que resultam da interpretação do investigador, utilizou-se numa segunda fase o método de investigação Focus Group, o qual está inserido na aplicação do método de Análise Morfológica Geral. Procura-se desta forma garantir, para além da triangulação das fontes, a triangulação dos métodos de investigação e consequente rigor na abordagem de investigação seguida.Em relação à revisão de literatura, embora não se apresente extensivamente a

6 Site: http://www.swemorph.com/ (consultado em 30 de Setembro de 2011).

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estratégia de revisão de literatura seguida, procura-se de modo sumário através do Quadro 1, apresentar uma visão geral sobre a origem das fontes de dados, as quais se encontram reflectidas nas referências bibliográficas do artigo.Na segunda fase do estudo, utiliza-se o método de investigação Focus Group (Liamputtong, 2011) inserido na aplicação do método de Análise Morfológica Geral. Um dos Focus Group é constituído por especialistas na aplicação de normas de gestão da segurança da informação (e.g. ISO/IEC 27001) na indústria Portuguesa e o outro por militares ligados a diversas dimensões da gestão da segurança da informação militar.A escolha do método de investigação Focus Group deve-se ao facto de este permitir ter controlo sobre quais são os aspectos críticos do estudo, não serem necessárias projecções estatísticas, o assunto ser dominado tecnicamente por todos os participantes e o objectivo não ser medir, mas entender o fenómeno de modo a interpretar as interdependências entre as diversas variáveis que intervêm no problema (Giovanazzo, 2001).Garantiu-se na aplicação do Focus Group a homogeneidade dos dois gru-pos. A segmentação dos grupos teve em consideração a sua experiência profissional na temática da gestão da segurança da informação e o tipo de organizações onde exercem a sua actividade profissional (i.e. civil ou militar). Esta segmentação, teve como objectivo principal, poder entender se os conhecimentos específicos individuais (i.e. focados por um lado na utilização de normas internacionais ISO e por outro suportado em doutrina militar ou segurança da informação militar) afectam a sua interpretação do problema da segurança da informação ao nível organizacional.Foram realizadas neste estudo duas reuniões, com grupos de seis elementos

Quadro 1 – Fontes principais da revisão de literatura

Ontologia de

Segurança de SI

Frameworkde

Modelação da

Gestão do Risco

de Segurança

de SI

Taxonomiade

Incidentes na

Segurança de

Computa-dores

Livros

Académicos

de

Referência

de

Segurança

de

Informação

Artigos

Académicos

de

Relevância

- Modelos e

Métodos de

Segurança

da

Informação

Certificação

CISSP

e E t h i c a l

Hacker

Normas e

Relatórios

Internacionais

de

Segu rança

da

Informação

Doutrina

Militar

dos EUA, da

NATO e de

Portugal

ACADÉMICOS INDÚSTRIA MILITAR

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e de aproximadamente duas horas cada reunião (Grudens-Schuck, 2004; Kind, 2004; Liamputtong, 2011). A discussão em cada grupo, obedeceu a um guião previamente definido, conduzido pelo moderador / investigador, tendo por referência para o debate, os resultados da revisão de literatura e da análise de conteúdo realizada na fase um do estudo. Os Focus Group tiveram como objectivo principal confirmar, acrescentar ou rejeitar as vari-áveis obtidas na fase um do estudo.A aplicação do método Focus Group teve um observador como elemento fundamental na validação da correcta aplicação do método. As reuniões seguiram as etapas previstas para a aplicação do Focus Group, i.e. a aber-tura da reunião ou seja a introdução, a preparação da reunião, o debate, o encerramento, a discussão e a acção posterior (Kind, 2004). Foram gravadas em vídeo as reuniões e após a transcrição, análise e redacção dos relatórios chegou-se ao modelo final apresentado na Figura 1.O objectivo final da aplicação deste método de investigação é definir um modelo de segurança da informação para as organizações militares, que permita posteriormente (i.e. num segundo estudo) gerar o conjunto dos pos-síveis cenários de incidentes de segurança da informação nas organizações militares e identificar os possíveis controlos de segurança a implementar para maximizar a segurança da informação, face a cada possível cenário. É no entanto fundamental para o sucesso da criação dos cenários, a quali-dade da modelação do problema, ou seja o rigor da definição das variáveis e dos valores ou condições das mesmas, as quais se identificam e analisam na próxima secção.

4. MODELO DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO

O modelo de segurança da informação organizacional propõe as variáveis ou os parâmetros principais do problema, seguido da identificação do espectro de valores ou condições que cada parâmetro expressa nas possíveis solu-ções para o problema da segurança da informação (e num futuro estudo as possíveis relações entre as variáveis identificadas). As variáveis e condições do modelo resultam de dados empíricos obtidos da análise de conteúdos efectuada numa primeira fase sobre documentos académicos, militares e normas de relevância da indústria (e.g. ISO 27001, NIST 800-53, certifica-ção CISSP) e numa segunda fase com os dados empíricos produzidos pelos Focus Group realizados.

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4.1 Descrição Geral do ModeloO modelo pretende apoiar na tomada de decisão, para responder de forma integrada às questões: o Quê, o Porquê? e Como? proteger de modo integrado a informação e os SI dos possíveis incidentes de segurança da informação que podem vir a afectar a confidencialidade, a integridade e a disponibilidade da informação.O modelo possibilita analisar todos os possíveis incidentes de segurança da informação e de SI, tendo em consideração os principais riscos dos compo-nentes principais dos SI, que recolhem, armazenam, processam, transmitem e disseminam a informação. O modelo é orientado pelos conceitos de GI e Information Assurance, pelos princípios da guerra mais relevantes apli-cados nas Operações Defensivas e pela doutrina militar associada às OI. Para além de integrar uma taxonomia usada pelos CERT´s para descrição dos incidentes de segurança de computadores (Howard & Longstaff, 1998).Associam-se também neste modelo as principais dimensões e tipos de controlo da segurança da informação, que resultam da análise da norma Internacional ISO/IEC 27001 (2005) da International Organization for Standardization, da publicação especial 800-53 (2007) do National Insti-tute of Standards and technology dos Estados Unidos da América e dos controlos de segurança aplicados na segurança da informação e dos SI da NATO, de acordo com o seu modelo de referência de domínio público. São também consideradas algumas das indicações das principais discipli-nas académicas de referência (e.g. segurança de redes de computadores, segurança no software e engenharia de software) de suporte à segurança da informação com foco tecnológico (Correia & Sousa, 2010; Kurose & Ross, 2010; Monteiro & Boavida, 2011; Sommerville, 2007; Stallings, 2011; Zúquete, 2010), as recomendações de alguns dos principais especialistas nesta temática (Bosworth, Kabay, & Whyne, 2009; Dhillon, 2007; Pfleeger & Pfleeger, 2007; Tipton & Krause, 2006), o corpo de conhecimentos da certificação dos profissionais da segurança de SI mais reconhecida pela indústria, a Certified Information Systems Security Professional (Harris, 2008) e a certificação Ethical Hacker (Gregg, 2006). Por fim, foram considerados os principais métodos de ataque suporta-dos em ataques de Engenharia Social (Hogben, 2007; Mann, 2008), e os que levam à destruição física das infra-estruturas que suportam o funcionamento da organização (Erbschloe, 2005).As variáveis deste modelo identificam os possíveis atacantes, as ameaças e os métodos de ataque (i.e. as acções, as ferramentas / armas) e os alvos, que

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podem ser atingidos para afectar as propriedades fundamentais da segurança da informação (i.e. a confidencialidade, a integridade e a disponibilidade) directamente ou indirectamente através da exploração das vulnerabilidades dos componentes principais dos SI. Tem também em consideração devido à especificidade da organização militar os activos críticos que suportam os sistemas de Comando e Controlo (C2) 7, responsáveis por recolher, arma-zenar, processar, transmitir e disseminar toda a informação necessária ao processo de decisão militar nos vários níveis da organização.O modelo permite identificar os alvos principais que possibilitam atingir directa ou indirectamente as propriedades fundamentais da segurança da informação e consequentemente alcançar os objectivos principais da acção ou do conjunto de acções realizadas. Logo, só conhecendo com rigor a forma de actuação i.e. os possíveis métodos de ataque do adversário e as vulnerabilidades dos alvos, é possível planear com efi-ciência a segurança da informação. O planeamento, a implementação e a monitorização dos controlos de segurança da informação, agrupados segundo as dimensões de segurança propostas, permite consequentemente retirar ao adversário a oportunidade de executar os métodos de ataque que podem causar impacto na organização.

4.2 Doutrina Militar de EnquadramentoNa análise das variáveis do modelo, procura-se integrar um dos princí-pios fundamentais da doutrina militar e que é o de conhecer o adversário (i.e. o inimigo), o que já SunTzu no livro “A Arte da Guerra” 400 a.c referenciava como fundamental para o planeamento de uma operação militar. No modelo, as variáveis que permitem caracterizar o adversário são fundamentalmente o atacante, a ameaça, a acção e as ferramentas. No entanto, a sua caracterização rigorosa só é possível de ser realizada de modo integrado, tendo em considera as variáveis vulnerabilidades e alvos.

7 “Os termos Comando e Controlo estão intimamente relacionados e são regularmente usados em conjunto; no entanto não sinónimos. Comando define-se como a autoridade investida num militar para dirigir, coordenar e controlar uma força militar. Pode ser descrito como o processo pelo qual um comandante impõe a sua vontade e intenções, sobre os seus subordinados, tendo em vista o desencadear de uma qualquer acção. Compreende, a autoridade e a responsabilidade de projecção e atribuição de forças, no cumprimento das suas missões. O Controlo é a autoridade exercida por/processo pelo qual, um coman-dante, assistido pelo seu Estado-Maior, de organizar, dirigir e coordenar as actividades de organizações suas subordinadas, ou outras organizações que não estejam normalmente sob o seu comando e que engloba a responsabilidade de implementar ordens e directivas. Toda ou parte desta autoridade pode ser transferida ou delegada.” (RCO-1, 2005, pp. 2.1 - Parte I - Capitulo II).

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O modelo obtido, tem em consideração os prováveis vectores de ataque do adversário ou seja os seus possíveis níveis de actuação (i.e. o físico, o da informação e o cognitivo). Procura-se consequentemente minimizar o impacto das acções do atacante ou das ameaças, através da implemen-tação de um adequado conjunto de controlos de segurança agrupados de acordo com as principais dimensões da segurança da informação (e.g. a dimensão Organizacional, a Física, a Humana e a Tecnológica). Estes controlos procuram mitigar as vulnerabilidades existentes nos principais componentes dos SI prováveis de serem exploradas. A aplicação destes controlos é orientada com as devidas adaptações pelos Princípios da Guerra identificados como mais relevantes para o planeamento e condução das operações defensivas . Estas leis de âmbito militar, foram durante séculos e são actualmente consideradas na doutrina militar o elemento chave no planeamento operacional das operações militares (Couto, 1988), sendo um elemento fundamental na caracterização da especificidade da organização militar.Consequentemente, o planeamento da segurança da informação nas orga-nizações militares pode ter em consideração, com as devidas adaptações ao problema concreto, os seguintes Princípios da Guerra: o princípio da Economia de Forças (e.g., aproveitamento do terreno, aproveitamento do tempo disponível), o princípio da Segurança (e.g. obtenção de informações do adversário), o princípio da Manobra (e.g., defesa em profundidade, apoio mútuo e flexibilidade), a Unidade de Comando (e.g., a coesão) e o princípio da Ofensiva (e.g., a acção ofensiva) (Couto, 1988; RC 80-5, 1991; RCO, 2005), de forma a maximizar a segurança da informação.A aplicação destes Princípios da Guerra visa fundamentalmente obter informações precisas sobre o adversário de forma a retirar-lhe a iniciativa, a criar condições para provocar o insucesso do seu ataque, induzindo-o sempre que possível em erro e no criar condições para eventualmente lançar contra-ataques de modo a neutralizar ou desorganizar as posições que suportam as suas acções (RC 80-5, 1991). A integração num único modelo de segurança da informação, dos possíveis métodos de ataque do adversário orientados pelos vectores de ataque, com os tipos de controlos de segurança (e.g. prevenir, detectar, deter, desviar, recuperar e reagir) vai permitir ao decisor militar, ter uma visão holística da segurança da informação da organização e responder de forma integra-da e coordenada aos incidentes de segurança da informação nos diversos níveis da organização (i.e. nível estratégico, operacional e nível táctico).

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Este modelo, pode futuramente possibilitar atribuir diferentes missões (e.g. defender, retardar ou vigiar) no âmbito da segurança da informação, às organizações militares de acordo com “Regras de Empenhamento” 8

definidas superiormente pela hierarquia militar.

4.3 Descrição das Variáveis do Modelo de SegurançaDescrevem-se sumariamente as variáveis do modelo apresentado na Figura 1, as quais definem o espaço de soluções para o problema da segurança da informação para as organizações militares em Ambiente de GI. O modelo apresentado identifica as principais variáveis (e.g. Ameaça) e os seus possíveis valores ou condições (e.g. Intercepção, Interrupção), nos quais se assinalam a cinzento alguns dos possíveis valores já considerados na taxonomia de incidentes de segurança nos computadores desenvolvida pelo Sandia Laboratories e pelo CERT/CC (Howard & Longstaff, 1998).Neste modelo, o Atacante é fundamentalmente o indivíduo ou grupo de indivíduos que tenta com a execução de um ou mais métodos de ataque atingir as propriedades fundamentais da segurança da informação (i.e. a confidencialidade, a integridade e a disponibilidade) de modo a alcançar um determinado objectivo (Howard & Longstaff, 1998; Mayer, 2009). No âmbito da doutrina militar dos EUA e da NATO, o conceito de ameaça está de acordo com o conceito de atacante que se apresenta neste artigo.A fim de clarificar o conceito de atacante deste modelo, o conceito atacante contém o conceito militar de ameaça. Englobamos também no conceito de atacante as catástrofes naturais, as quais pressupõem um conjunto de riscos naturais sobre um determinado componente ou componentes dos SI organizacionais, que podem ter impacto na estrutura física da organização e consequentemente nos processos de negócio.O atacante orienta as suas possíveis acções pelas possíveis Ameaças, as quais não são mais do que as causas potenciais de um incidente de segurança da informação, do qual pode resultar prejuízo no sistema ou na organização (Dhillon, 2007; ISO/IEC 13335-1, 2004; NIST-SP 800-53, 2007; Pfleeger & Pfleeger, 2007). Para isso, o atacante vai utilizar métodos de ataque, ou seja uma sé-rie de acções destinadas a resultar em algo que não está autorizado a

8 “ As Regras de Empenhamento (ROE) proporcionam orientações e instruções aos Comandantes e tropas no terreno, no âmbito do quadro dos objectivos políticos e militares, durante a execução de uma operação. Simultaneamente, definem o grau e a forma como a força deve ser aplicada e são laboradas de forma a garantir que a sua aplicação é cuidadosamente controlada. “ (RCO, 2005, pp. p. 2-15 - Parte I – Capitulo 2).

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ProElium – rEvista CiEntífiCa da aCadEmia militarFigura 1 – M

odelo de Segurança da Informação para O

rganizações Militares.

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acontecer (FM 3-13, 2003; Howard & Longstaff, 1998; Martins, et al., 2009; Mayer, 2009; Pereira & Santos, 2010).Estes métodos de ataque vão consistir numa Acção ou conjunto de acções, que não são mais que um passo ou conjunto de passos com suporte em determinadas Ferramentas (i.e. armas, meios ou recursos). Estas acções vão procurar explorar as vulnerabilidades (i.e. as fraquezas) dos com-ponentes principais dos SI que suportam a recolha, o armazenamento, o processamento e a disseminação da informação. A informação está exposta fundamentalmente a três elementos: a tecnolo-gia (e.g. Hardware, Software, Bases de Dados, Redes de Computadores), como componentes que permitem armazenar, processar e transmitir a informação; as pessoas, ou seja todos os stakeholders, que podem aceder à informação, através de redes privadas e da Internet e os processos de negócio utilizados na manipulação da informação (Laudon & Laudon, 2006; Posthumus & Von Solms, 2004; Turban, Rainer, & Potter, 2003). Estas acções são orientadas fundamentalmente nas organizações militares pelas possíveis OI (AJP-3.10, 2009; FM 3-13, 2003), pelas actividades de Intelligence e de contra-informação (AJP2.0, 2003; FM 2.0, 2010; JP 2.0, 2007), e centradas nos componentes principais dos SI que suportam o sistema de C2 da organização.Nas OI, têm-se em consideração fundamentalmente os métodos de ata-que utilizados pelos adversários, para atacarem as infra-estruturas e os sistemas de Comando e Controlo (ou seja os seus SI), que de acordo com doutrina militar referenciada no (FM 3-13, 2003, p. 13), se clas-sificam da seguinte forma: • Forçar o acesso não autorizado: com o intuito de obter informação,

alterar, modificar ou mesmo apagar informação de SI e dos sistemas de C2. As redes militares, por usarem muitas das infra-estruturas públicas, podem ser acedidas a partir da Internet.

• Projecção de software malicioso: tem em vista fazer com que o computador funcione de forma diferente da esperada, e pode incluir vírus, worms, ou seja “armas digitais” em sentido lato. O acesso à Internet, sobretudo pelo download de software, pode abrir as portas a software malicioso que pode, por sua vez destruir informação ou mesmo permitir o acesso aos sistemas amigos.

• Decepção electrónica: consiste na emissão de energia electromagné-tica com vista a manipular, simular ou imitar comportamentos que enganem o adversário.

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• Ataque electrónico: consiste no uso de energia electromagnética com vista a degradar, neutralizar ou destruir a capacidade de combate adversária. É considerada uma forma de fogos. Inclui lasers, armas de radiofrequência e feixes de partículas.

• O Ataque a Redes de Computadores: é uma outra forma de ataque que pode ser também levado a cabo. As redes de computadores são particu-larmente vulneráveis a ataques de negação de serviço (DoS), os quais, mesmo sem que se chegue a ganhar acesso à rede a tornam inoperacional.

• Destruição física: Como o próprio nome indica, consiste na destruição física, por meios físicos ou electrónicos do alvo.

• Gestão das Percepções: acções que visam influenciar audiências espe-cíficas, nas quais são usadas combinações das outras capacidades de forma coordenada (e.g. operações psicológicas, propaganda, decepção), que visam minar a vontade do adversário.

São fundamentais também as actividades de intelligence, as quais, permi-tem mais do que uma forma de recolha de informação. A triangulação das fontes de informação é essencial para garantir a validação da informação recolhida e simultaneamente permitir obter uma visão de conjunto para apoiar na tomada de decisão militar. As acções de intelligence têm como objectivos principais a protecção ou seja mais especificamente a prevenção numa postura defensiva e numa postura ofensiva permitem o estudo do adversário e dos possíveis alvos do campo de batalha (e.g. a organização, os seus SI e as vulnerabilidades dos componentes principais). As acções de intelligence podem ter as seguintes formas: OSINT (open source intelligence), que consiste na recolha de informação em fontes disponíveis publicamente; HUMINT (human intelligence) que permite a recolha de informação através do elemento humano; IMINT (imagery intelligence), pela exploração de imagens recolhidas através de diversas tecnologias (e.g. fotografia, radar); SIGINT (signals intelligence) compre-ende a utilização individual ou combinada de intelligence de comunicações (COMINT) e intelligence electrónica (ELINT) independentemente do meio de transmissão; MASINT (measurement and signatures intelligence) a qual permite detectar, localizar, rastrear, identificar as características específicas de alvos e fontes de informação; TECHINT (technical intelligence), consiste na recolha e análise de equipamento e materiais diversos e por fim a CI (counter intelligence), a qual contraria ou neutraliza esforços de recolha de informação do adversário (AJP 2.0, 2003; FM 2.0, 2010; JP 2.0, 2007).

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As acções propostas no modelo procuram atingir os Alvos, que podem ser entidades lógicas (e.g. conta, processo, dados), entidades físicas (e.g. componente, computador, rede) (Howard & Longstaff, 1998), os recursos humanos da organização (e.g. decisores, gestores de processos críticos da organização, especialistas), os meios de transmissão da informação (e.g. a cablagem, a radiação electromagnética, as ondas sonoras), as infra-estruturas físicas (e.g. instalações, datacenter, salas de reuniões) ou seja todos os componentes que permitem atingir directa ou indirectamente as propriedades fundamentais da segurança da informação. Consideram-se consequentemente como alvos fundamentalmente os objectos associados às principais classes de activos da organização. Estes objectos podem ser agrupados, para efeitos de simplificação de identificação e avaliação de riscos, em classes de objectos, as quais permitem agrupar os objectos com estados e comportamentos semelhantes. Nestas classes podemos identificar fundamentalmente o software, o hardware, as redes de computadores, as bases de dados, os utilizadores e os processos de negócio suportados pelos SI (Laudon & Laudon, 2006; Turban, et al., 2003). Acrescido, nas organizações militares, pelos activos críticos que integram o sistema de C2. Estes activos permitem a manipulação da informação, ao longo de toda a cadeia de valor da organização. As acções realizadas por um atacante procuram explorar as Vulnera-bilidades dos alvos. Estas consistem em determinadas fraquezas que permitem ser exploradas por uma acção ou acções não autorizadas na política de segurança da organização. Estas vulnerabilidades podem ter origem nos stakeholders da organização, em objectos físicos (e.g. hardware, cablagem, centro de dados, instalações), na forma com os processos da organização estão implementados e a funcionar ou seja nas principais classes de activos da organização. Em relação à tecnologia, podem-se considerar vulnerabilidades de projecto, introduzidas na fase de análise e desenho (e.g. software), de implementação, a quando da instalação na organização e por fim vulne-rabilidades operacionais, centradas fundamentalmente nas configurações do sistema e relação com outros (Correia & Sousa, 2010; Howard & Longstaff, 1998).A exploração de vulnerabilidades, permite directa ou indirectamente provocar Efeitos i.e. alterar o estado de uma ou mais das propriedades fundamentais da segurança da informação. Estes efeitos podem ser al-cançados através de acções não autorizadas pela política de segurança da

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organização. As acções podem ser realizadas directamente na informação ou indirectamente sobre os objectos que interagem com a informação (e.g. aplicações, pessoas).De modo sumário, pode-se definir a confidencialidade da informação, como a propriedade que indica em que medida existe protecção dos dados da organização (e.g. os residentes nos computadores, nas pessoas e os trans-mitidos através redes de computadores), evitando que estes sejam acedidos, disponibilizados e divulgados por pessoas, processos ou entidades não au-torizadas, de acordo com a política de segurança da organização (Dhillon, 2007; ISO/IEC 13335-1, 2004; ISO/IEC 27001, 2005; Mayer, 2009; NIST-SP 800-53, 2007; NP 3003-8, 2003; Pfleeger & Pfleeger, 2007). A integridade, é um conceito mais difícil de definir e pode ter signi-ficados diferentes de acordo com o contexto (Dhillon, 2007; Pfleeger & Pfleeger, 2007). Neste estudo, considera-se que é a propriedade que indica em que medida a protecção dos dados salvaguarda a sua exac-tidão e coerência, independentemente das acções realizadas, evitando a modificação ou destruição não autorizada dos dados, de acordo com a política de segurança da organização (Dhillon, 2007; ISO/IEC 13335-1, 2004; ISO/IEC 27001, 2005; Mayer, 2009; NIST-SP 800-53, 2007; NP 3003-8, 2003; Pfleeger & Pfleeger, 2007). Finalmente, temos a disponibilidade, como propriedade que indica em que medida a protecção dos dados permite que estes sejam acedidos pelos utilizadores autorizados, através de determinados sistemas, evitando a negação de serviço, desde que autorizado na política de segurança da organização (Dhillon, 2007; ISO/IEC 13335-1, 2004; ISO/IEC 27001, 2005; Mayer, 2009; NIST-SP 800-53, 2007; NP 3003-8, 2003; Pfleeger & Pfleeger, 2007). Sendo necessário, garantir o bom funcionamento de todos os sistemas que permitem recolher, processar, armazenar, transmitir e disseminar a informação em tempo útil (i.e. de acordo com a politica de segurança). É fundamental na organização militar considerar os seus sistemas de C2, os quais apoiam os decisores mi-litares na tomada de decisão.Pode ser necessário em condições específicas, garantir a autenticação e o não repúdio dos dados, através de mecanismos de segurança (e.g. assinatura digital). No entanto, considera-se neste estudo que a autenticação e não repúdio não são propriedades fundamentais da segurança da informação.Os efeitos produzidos sobre as propriedades da informação permitem desta forma atingir directamente os Objectivos ou contribuir para os alcançar. Os

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objectivos dos métodos de ataque podem ser centrados fundamentalmente na recolha de informação (i.e. através de actividades de Intelligence), na protecção da informação e dos sistemas que interagem com a mesma (e.g. pelo uso de actividades de Counter Intelligence, INFOSEC, Segurança Física, Segurança Humana), na intrusão ou na destruição da informação ou dos meios que a suportam (e.g. pelo uso de actividades de Computer Network Operations, de Operações Psicológicas ou Engenharia Social e Ataques de Destruição Física). Também se podem considerar o objectivo de que obter ganhos financeiros e eventualmente o objectivo da acção ou conjunto de acções pode passar apenas por uma questão de desafio pessoal e de reconhecimento das competências profissionais do atacante. Após se analisarem todos os possíveis incidentes de segurança da in-formação que podem ocorrer ao nível organizacional (i.e. os prováveis cenários) pode-se então procurar maximizar a segurança da informa-ção de acordo com o planeamento e a implementação de Baselines de segurança. Neste modelo, tem-se em consideração o conjunto de controlos de segurança sugeridos pelas normas da indústria, como sejam a norma ISO 27001 e NIST 800-53, por disciplinas académicas de referência, fundamentalmente pela segurança das redes de compu-tadores e a segurança no software e pelo modelo militar da NATO de segurança da informação.Os controlos de segurança, procuram reduzir ou remover as vulnerabilidades dos activos (Pfleeger & Pfleeger, 2007) e deste modo reduzir / evitar os efeitos de um incidente (Pereira & Santos, 2010) ou seja reduzir o risco na segurança da informação e dos SI (Mayer, 2009). Os controlos de se-gurança podem ser de vários tipos, de acordo com a sua finalidade. Podem ser utilizados para prevenir, detectar, deter, desviar, recuperar e reagir a um incidente de segurança (Dhillon, 2007; Pfleeger & Pfleeger, 2007). Estes controlos consistem fundamentalmente em processos, politicas, boas práticas, dispositivos e tecnologia (ISO/IEC 27001, 2005; Mayer, 2009; NIST-SP 800-53, 2007). Os quais segundo Dhillon (2007), podem ter uma caracterização mais técnica (e.g. firewall), mais formal (e.g. politicas de segurança) ou informal (e.g. formação e sensibilização dos colaboradores).Na identificação e selecção dos controlos neste modelo, consideram-se principalmente os seguintes critérios de aceitação:

• O controlo é necessário para garantir a protecção de uma ou mais dimensões de segurança da informação, face aos níveis de actuação dos atacantes e das ameaças.

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• Os controlos referenciados tem a finalidade de prevenir, detectar, de-ter, desviar, recuperar ou reagir aos métodos de ataque que procuram atingir as vulnerabilidades dos principais activos da organização, de modo a mitigar ao máximo os riscos da segurança da informação.

• O controlo é específico (i.e. é único) e é mensurável qualitativamente ou quantitativamente.

• É alcançável a sua implementação dentro de um período de tempo aceitável pela organização.

• É realista a sua implementação, através de um ou mais critérios de-finidos pela organização. A título meramente exemplificativo pode-se referir o critério do custo / benefício da implementação do controlo, o impacto negativo da sua inexistência em termos de vidas humanas na execução de uma operação militar, o risco para a segurança nacional da fuga de informação classificada devido à inexistência da aplicação de controlos de segurança eficientes.

O planeamento e a selecção dos controlos de segurança definidos no modelo proposto, são realizados segundo dimensões de segurança. Estas dimensões de segurança (i.e. Organizacional, Física, Humana e Tecno-lógica) têm neste modelo em consideração os níveis de actuação do atacante i.e. os possíveis vectores de ataque e os princípios da guerra mais relevantes aplicados nas operações defensivas militares.Pode-se consequentemente verificar no Quadro 2, que o modelo pro-põe um conjunto de variáveis que integram os principais conceitos de doutrina militar referenciados ao longo do artigo.No modelo proposto, através da análise dos possíveis cenários, prevê-se as acções de um adversário que podem causar incidentes de segurança da informação. Possibilita consequentemente que a organização militar possa reagir e adaptar-se rapidamente a essas possíveis acções e conti-nuar a funcionar mesmo após sofrer um incidente.Este modelo de apoio à decisão para a segurança da informação, está adaptado à especificidade da organização militar, especialmente por ter em consideração os conceitos de doutrina militar analisados no Quadro 2. Apresenta também uma visão integrada e única da segurança da infor-mação para os vários níveis da organização (i.e. estratégico, operacional e táctico), o que facilita a coordenação e a tomada de decisão para maximizar a segurança da informação ou seja minimizar o risco de segurança da informação.

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Quadro 2 – Doutrina militar e variáveis do modelo de segurança da informação.

Orientações Variáveis do Modelo

Guerra de

Informação

Operações de Informação

Vectores de Ataque

Information Assurance

Princípios da

Guerra

As acções (i.e. as variáveis ameaça, acção e ferramentas) desenvolvidas para obter a superioridade de informação (i.e. variável objectivos) afectando a informação do ad-versário (i.e. variável efeitos na informação), os processos baseados em informação, os Sistemas de Informação e as redes baseadas em computadores de um adversário (i.e. variáveis alvos e vulnerabilidades) enquanto se defende a nossa própria informação, os processos baseados em informação, os Sistemas de Informação e as redes baseadas em computadores (i.e. variáveis dimensões de segurança e tipos de controlos de segurança). As OI consistem principalmente segundo a doutrina dos EUA num conjunto de actividades e capacidades utilizadas para afectar a informação do adversário e dos seus SI, enquanto se defende a nossa (FM 3-13, 2003; JP 3–13, 1998), as quais podem ser planeadas e utilizadas para obter a superioridade de informação face a um adversário. As condições ou valores da variável atacante são suportadas fundamentalmente na classificação da capacidade das ameaças adoptada pelo Exército dos Estados Unidos da América (FM 3-13, 2003) e tem simultaneamente em consideração a classificação das ameaças adoptada pela NATO.As variáveis acção e ferramentas que se propõem, são uma especialização fundamentalmente das actividades das OI e de Intelligence, de acordo com doutrina militar dos EUA e da NATO. Realizou-se também a triangulação das fontes de dados com os métodos de ataque, referenciados em disciplinas de referência académicas e com dados empíricos obtidos da experiência da indústria com base em relatórios internacionais de segurança da informação. Procurou-se desta forma validar as condições das variáveis, embora de forma ainda limitada.Foram tidos em consideração nas variáveis acção e ferramentas do modelo proposto, os níveis de actuação dos atacantes, de acordo com as possíveis actividades executadas nas OI. As acções orientam-se fundamentalmente pela dimensão física, humana e pela dimen-são informação. A dimensão informação é essencialmente suportada nas tecnologias de informação e comunicação que constituem os SI da organização e de C2. Estes vectores de ataque orientam as dimensões de segurança de informação, que integram os diversos controlos de segurança da informação.Conjunto de medidas que protegem e defendem a informação (i.e. variável: efeitos na informação) e os SI (i.e. através das variáveis alvos e vulnerabilidades), garantindo a sua disponibilidade, integridade, autenticação, confidencialidade e não-repúdio (i.e. variáveis: efeitos na informação, dimensões de segurança e tipos de controlos). Isso inclui a capacidade para restaurar o funcionamento dos SI, incorporando capacidades de protecção, detecção e reacção. Na variável efeitos na informação, consideramos apenas as propriedades fundamen-tais da segurança da informação i.e. a confidencialidade, a integridade e a disponibilidade. Considerou-se o princípio da Economia de Forças, procurando uma optimização dos con-trolos de segurança da informação a aplicar, tendo em consideração o máximo possível de incidentes e de activos da organização protegidos; o princípio da Segurança, procurando a protecção da informação directa ou indirectamente e a obtenção de informações do adversário, não limitando a segurança da informação a medidas passivas de protecção; o princípio da Manobra, através da defesa em profundidade, pela utilização de diferentes tipos de controlos de segurança, o apoio mútuo pela proposta de integração das diversas dimensões da segurança da informação e a flexibilidade, através da possibilidade de di-ferentes opções na tomada de decisão; o princípio da Unidade de Comando, é garantida através de uma visão comum e rigorosa do modelo aos vários níveis da hierarquia militar, garantindo desta forma a coesão das medidas de segurança a aplicar e o princípio da Ofensiva pela utilização das actividades de intelligence, de modo a procurar mais do que reagir, antecipar e anular possíveis incidentes de segurança da informação.

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No entanto, falta neste estudo interligar as variáveis identificadas no mo-delo, de modo a possibilitar a identificação de todos os possíveis cenários e controlos de segurança da informação a aplicar na organização militar. É fundamental ter também em consideração, no planeamento, selecção e implementação dos controlos de segurança, as principais teorias com-portamentais, de aceitação das tecnologias e as ligadas a questões de moral e de ética (Figura 2), bem como, a permanente monitorização dos controlos de segurança implementados e a retro alimentação do modelo proposto, assuntos que no entanto saem fora do âmbito deste estudo.

Figura 2 – Teorias possíveis de ser aplicadas à segurança da informação.

Fonte: Adaptado de (Barlette & Fomin, 2009).

Em conclusão, o estudo apresentado teve em consideração alguns dos principais critérios de qualidade na investigação interpretativista. Permite compreender o significado das partes (i.e. as variáveis) com o todo que formam (principio do círculo hermenêutico), de acordo com os dados empíricos recolhidos e contextualizados (principio da contextualização). Este modelo obedece também ao princípio das múltiplas interpretações, na medida em que se tem em consideração diversas fontes de dados empíricos e narrativas obtidas da interacção entre o investigador e os participantes nos Focus Group.

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por base a qualidade dos inputs inseridos no modelo do problema (Ritchey, 2006). A aplicação do método “ […] é realizada num número iterativo de passos, em que um grupo de agentes especializados passa por uma série de ciclos de Análise - Síntese.” (Ritchey, 2002, p. 7). A totalidade dos parâmetros (i.e. variáveis do modelo) e seus valores ou condições é um campo morfológico, que pode ser reduzido a um número de configurações em que somente aquelas que satisfazem determinados critérios permanecem no final, ou seja no modelo de representação do problema.Na formalização matemática do problema 10 de análise morfológica, podem-se identificar de acordo com o modelo de segurança da informação proposto, as seguintes propriedades formais, como discrimina o Quadro 3:O método de análise morfológica aplicado ao problema da segurança da informação ao nível organizacional, tem como principal vantagem a obtenção das possíveis combinações de controlos de segurança da informação (outputs) a aplicar na organização militar, face à escolha de determinadas entradas

10 A formalização matemática do modelo apresentado, tem por suporte as principais propriedades formais dos modelos morfológicos apresentadas e analisadas por (Ritchey, 2011).

Quadro 3 – Propriedades formais do modelo de análise morfológica.

Tsc, representa o número total de simples configurações no campo morfo-lógico do modelo e Vi representa o número de condições ou valores dados pelo parâmetro Px (i.e. { Px Vi }x,i ).No modelo apresentado, podemos identificar 10 parâmetros (i.e. variáveis), com valores distintos de condições.Resultando o valor máximo de Tsc = V1 * V2 * V3 * V5 * V6 * V7 * V8 * V9 * V10 ↔ Tsc = 6 * 6 * 23 * 12 * 14 * 6 * 3 * 5 * 4 * 6 ↔ Tsc = 287 400 960 configurações possíveis.

nCk é o total de combinações possíveis entre pares de parâmetros (i.e. vari-áveis). No modelo apresentado nCk = 45 combinações para N = 10 e K = 2.

No entanto nem todas as possíveis combinações de valores dos parâmetros do campo morfológico são válidas, sendo necessário do número total identificar as combinações inválidas. Permite-se desde modo identificar a Cross – Con-sistence Matrix. No modelo apresentado, é necessário verificar a consistência do cruzamento de Ct = 3060 células i.e. pares de condições.

5. ANÁLISE MORFOLÓGICA GERAL

Uma das possíveis e adequadas aplicações do método de análise morfoló-gica é na identificação e desenvolvimento de cenários, sendo fundamental a qualidade da modelação do problema, na qual os outputs obtidos terão

nCk =

Ct =

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nos parâmetros do modelo i.e. os possíveis métodos de ataque (inputs), ou também permite através da indicação dos outputs obter os possíveis inputs.A utilização do método de AMG aplicado à problemática da segurança da informação permite a identificação do conjunto dos possíveis cenários de métodos de ataque e dos controlos de segurança para a sua defesa interligados e operacionalizados na perspectiva de um campo de batalha real. Responde desta forma às questões: o Quê? Porquê? Como? proteger a informação e os SI dos possíveis incidentes de segurança da informação que podem afectar a confidencialidade, a integridade e disponibilidade da informação.Permite também antecipar possíveis acções do adversário através da análise de cenários e da instanciação das variáveis do modelo. Em conclusão, é possível com este modelo, planear e monitorizar as políticas de segurança da informação comuns para as organizações militares.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo propõe um modelo para maximizar a segurança da informação nas organizações militares, inseridas num ambiente de Guerra de Informação. Para proteger a informação e os Sistemas de Informação dos possíveis incidentes de segurança da informação que podem afectar a confidencialidade, a integridade e disponibilidade da informação. Modelo esse, que procura dar resposta a três questões fundamentais: o que fazer? porquê fazer? e como fazer?Identificam-se as principais variáveis ou parâmetros do problema, seguido da identificação do espectro de valores ou condições que cada variável expressa nas possíveis soluções para o problema. Com o modelo de segurança da informação apresentado, propõe-se também a integração de duas visões, a das normas interna-cionais de gestão de segurança da informação (i.e. ISO/IEC 27001, NIST 800-53) e a da doutrina militar (i.e. modelo NATO). Pensa-se deste modo, maximizar a mitigação do risco de segurança da informação com base na experiência de am-bas as abordagens na selecção e implementação de controlos de segurança. Mas, operacionalizando o modelo de acordo com a doutrina específica da organização militar, mais orientada para o planeamento e a tomada de decisão baseada na análise de cenários e na realização de jogos de guerra.Este modelo apresenta uma visão da segurança da informação adaptado à especificidade da organização militar, a qual facilita a coordenação e a tomada de decisão nos vários níveis de planeamento e execução militar.No entanto, o artigo apenas propõe e descreve as principais variáveis do modelo de segurança da informação, sendo necessário em trabalhos futuros

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identificar as relações entre as condições das variáveis identificadas no mo-delo proposto. No qual, nem todas as possíveis combinações de valores dos parâmetros do campo morfológico são válidas, sendo necessário do número total de combinações possiveis, identificar as combinações inválidas i.e. obter a Cross – Consistence Matrix do método de análise morfológica geral.Em conclusão, esta abordagem da segurança da informação para uma orga-nização militar, através da análise de cenários, permite suportar a criação de um modelo descritivo i.e. um método de segurança de informação ajustado à especificidade da organização militar e ao seu processo de tomada de decisão.

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a inovação Como alavanCa da sustEntabilidadE E valorização das forças armadas

Jorge Filipe Marques Moniz Côrte-Real Andrade (*)

Coronel de Engenharia Tirocinado

ABSTRACT

This study aims to demonstrate: (i) how can innovation contribute to the Armed Forces sustainability and their enhancement, (ii) and how to foster innovation within the military organization.

Based on examples of contemporary history and of selected countries we identify an innovation model, which may address the high uncertainty of military environment and of its context, as well as the factors that block or enhance innovation in the military organization.

Likewise, founded on lessons of contemporary history and guidance of those selected countries we define the concepts of Armed Forces sustainability and of their enhancement, as well as we identify some opportunities to improve them through innovation.

Additionally, an analysis of supporting documentation, R&D projects and activities, as well as of twelve interviews, demonstrates that innovation exists in the national Armed Forces but its level of achievement can and should be increased, given the existing potential.

Moreover, we identify current innovation weaknesses, taking into account an analysis of supporting documentation, a survey to a population of 182 officers and twelve interviews to experts working in the Armed Forces.

To address those weaknesses, we propose an innovation development model.

Keywords: Armed Forces; Innovation; Research and Development; Enhancement.

a inovação Como alavanCa da sustEntabilidadE E valorização das forças armadas

(*) Presidente da Direção do Centro de Investigação da Academia Militar e Chefe do Gabinete de Estudos e Planeamento, Avaliação e Qualidade da Academia Militar ([email protected] ). Doutor em Engenharia de Sistemas – Apoio à Decisão (2000) –, Mestre em Construção – Sistemas Periciais (1995) –, ambos pelo Instituto Superior Técnico, e Licenciado em Engenharia Militar (1986), pela Academia Militar.

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RESUMO

O presente estudo pretende demonstrar: (i) como pode a inovação nas Forças Armadas contribuir para a sua sustentabilidade e valorização; (ii) e como fomentar a aplicação do potencial de inovação existente na instituição militar.

Neste sentido, é identificado um modelo de inovação que se pode adequar à elevada incerteza do ambiente militar e da sua envolvente, assim como os fatores, tangíveis e intangíveis, que bloqueiam ou que fomentam a inovação neste meio, tendo por base exemplos da história contemporânea e de países selecionados.

Adicionalmente, é caracterizada a sustentabilidade e valorização das Forças Armadas, assim como são identificadas as oportunidades de as melhorar através da inovação, a partir de lições da história contemporânea e de orientações de países selecionados.

Em resultado da análise da documentação estruturante, dos projetos e das atividades de I&D em curso, assim como de doze entrevistas efetuadas, é com-provado que vai ocorrendo inovação relevante nas Forças Armadas nacionais, e que o seu nível de concretização poderá e deverá ser aumentado, atendendo às potencialidades existentes no seu seio.

São identificadas as atuais vulnerabilidades das Forças Armadas na imple-mentação da inovação, tendo em conta uma análise à documentação estruturante, ao inquérito realizado a um universo de 182 Oficiais dos três Ramos e a doze entrevistas efetuadas a especialistas ou a personalidades que desempenham funções com ligação à inovação nas Forças Armadas.

Para fazer face àquelas vulnerabilidades, tirando partido das potencialidades existentes, é proposto um modelo de desenvolvimento da inovação.

Palavras-Chave: Forças Armadas; Inovação; Investigação e Desenvolvi-mento; Valorização.

INTRODUÇÃO

«The ability to innovate is the ability to adapt to an altered environment, to learn, to evolve» (Eggers & Singh, 2009: 6)

As Forças Armadas (FFAA) têm que se adaptar continuamente, tanto aos mutáveis contextos em que se inserem, como às expectativas da comunidade que com elas interage, para que possam cumprir integralmente a sua missão. A alternativa a esta indispensável evolução não é a manutenção da atual condição, mas antes uma inevitável deterioração de capacidades e qualidade das FFAA.

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a inovação Como alavanCa da sustEntabilidadE E valorização das forças armadas

A história universal em geral, e a nacional em particular, demonstra que, em diversas situações, a inovação foi a razão da vantagem diferenciadora que proporcionou o sucesso, mesmo quando o potencial de combate inicial era desfavorável.

Muitas vezes fizeram-no pela adoção e adaptação de processos e tecnolo-gias já existentes, outras através da sua criação, desenvolvimento e posterior integração. Mas em ambos os casos, essas inovações proporcionaram as evolu-ções necessárias nos processos e recursos das FFAA para aumentarem as suas capacidades e eficácia e, assim, alcançarem vantagens competitivas. Propor-cionaram ainda um aumento da sua legitimidade, tanto pela renovação do seu potencial e consequente desempenho, como pelos benefícios dessa renovação na modernização da sociedade.

Contudo, se outrora as FFAA lideravam o conhecimento e a inovação, que eram posteriormente adotados pelo domínio civil, hoje, é este que impulsiona a mudança, tornando-as cada vez mais dependentes dos produtos comerciais e das tecnologias disponíveis.

Por outro lado, o atual ambiente estratégico, caracterizado pelo ritmo e dimensão da mudança, assim como por novas ameaças e desafios, tem um impacto sem precedentes nas organizações, particularmente nas FFAA 1, o que incrementa a necessidade de se encontrarem alternativas inovadoras.

Os períodos mais férteis de inovação nas FFAA ocorreram quando o país estava na expectativa de enfrentar, ou se envolveu, num conflito de anormal intensidade (Telo, 2005). Noutros momentos, a inovação geralmente «aconte-ce» apesar, e não como resultado, do ambiente estabelecido. A inovação não é sistemática, nem é continuamente sustentada, pelo que os seus efeitos são limitados e efémeros: «Typically, innovation in government happens in one of two ways. Either innovation intrudes itself on a public sector organization in response to a crisis, or some individual (or small group of individuals) cham-pions a specific innovation. In either instance, the benefits of the innovation are limited. Once the crisis has passed or certain individuals responsible for the innovation have moved on, the organization is left with no lasting capacity for ongoing innovation» (Eggers et al., 2009: 5).

1 «Os crescentes custos do material de Defesa colocam um risco particularmente sério para a futura gestão das organizações de Defesa. Estudos científicos no Reino Unido e indicações fornecidas pela Agência Europeia de Defesa (EDA), demonstram que os custos em material militar cresceram entre dois a sete por cento, por ano, acima do nível de inflação» (NL MOD, 2010: 26).

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O presente estudo pretende demonstrar: (i) como pode a inovação nas FFAA contribuir para a sua sustentabilidade e valorização; (ii) e como fomentar a aplicação do potencial de inovação existente na instituição militar.

O trabalho tem por referência: a literatura relevante relacionada com a inovação e a sua importância na sustentabilidade de organizações sem fins lucrativos, com especial incidência no domínio militar; a análise da documen-tação estruturante e dos projetos e atividades de I&D em curso; entrevistas a especialistas ou a personalidades que desempenham funções com ligação à inovação nas FFAA; um inquérito a Oficiais dos três Ramos; as lições da his-tória contemporânea; e as orientações de países selecionados – a Dinamarca, a Holanda e a Noruega – obtidas, quer de bibliografia, quer de sites oficiais, quer ainda de informação disponibilizada por Adidos de Defesa.

Estes países, apesar de possuírem Produtos Internos Brutos (PIB) superiores ao de Portugal, e de nem todos partilharem a mesma abordagem à Política de Defesa e de Segurança Comum (PSDC) 2 da União Europeia (UE), têm esforços na Defesa semelhantes (a Noruega é o que apresenta a maior percentagem do PIB, e esta tem vindo a aumentar) e apresentam FFAA de dimensão idêntica às de Portugal.

1. Factores associados às Forças Armadas que influenciam a inovação

1.1 A inovação

No essencial, a inovação é a geração e a aplicação de novas ideias. É a utilização de ideias na criação de Valor Público 3. Para tal, as ideias têm de ser novas, num dado contexto – em vez de apenas aperfeiçoadas – ou aplicadas de forma diferente nesse contexto, têm de ser implementadas e têm de ser úteis. A inovação é deliberada e planeada e implica benefícios significativos. A tradução de uma ideia num resultado é essencial para que a inovação ocorra.

Assim, a inovação, neste trabalho, é considerada um processo iterativo de invenção, desenvolvimento e/ou de implementação de novos – inovação baseada na invenção –, ou de novas formas de aplicar – inovação baseada na difusão (NESTA, 2008) – processos, produtos, estruturas organizacionais (IPQ, 2007),

2 A Dinamarca não aderiu à PSDC e por isso não está ligada à EDA; a Holanda participa na PSDC e na EDA; a Noruega, apesar de não ser membro da UE, está ligada à EDA por acordo específico.

3 Valor Público - É o valor criado pelas entidades públicas através das suas actividades. Para que determi-nada acção ou serviço público tenha valor não basta que o mesmo seja desejável. Só existe valor se os cidadãos estiverem dispostos a dar ou abdicar de algo – custo de oportunidade – em troca do benefício recebido (PINTO, 2009).

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conceitos, serviços, ou sistemas (MAC, 2010), que resultam em significativas 4 melhorias de eficiência, eficácia, ou qualidade dos resultados (ANAO, 2009), com a finalidade de criar mais valor, quer às organizações, quer aos interessados e/ou envolvidos nessas organizações.

No domínio militar, a inovação manifesta-se pelo desenvolvimento de novas formas de combater e/ou de novos meios de integração de tecnologias, tais como novas doutrinas, táticas, formas de treino ou de apoio (Isaacson et al., 1999).

Sendo um processo, a inovação precisa de ser gerida, assim como devem ser controladas as influências sobre este processo.

1.1.1 Modelos do processo de inovação

A sequência linear tradicional da I&D – atividades de pesquisa, seguidas das de desenvolvimento e de produção – deve ser considerada apenas como um dos caminhos da inovação 5.

De simples modelos lineares 6, o processo de inovação tem evoluído para modelos interativos crescentemente complexos, como o modelo de Caraça (2006) – modificado do modelo interativo de Kline et al. de 1986 – que envolve um conjunto de ligações e de interações em cadeia entre o conhecimento científico e tecnológico, o conhecimento sobre a organização e o seu funcionamento, e a sociedade em geral (incluindo o mercado).

Nestes modelos de «inovação aberta», as ligações e as interações tornam-se tão importantes como a produção e a acumulação de conhecimento (Tidd, 2006: 9).

Nestes modelos, as instituições de serviços públicos devem atuar como agregadoras, gestoras e compradoras de serviços, e utilizarem as competências 7 internas, tanto para identificar ideias promissoras oriundas de qualquer fonte – interna ou externa – como para adaptar essas ideias às suas necessidades (Eggers et al., 2009) (Figura 1).

4 «Significativas» para distinguir dos resultados decorrentes do simples aperfeiçoamento do status quo. 5 «O Painel Europeu da Inovação atribuiu maior peso […] à inovação não-tecnológica. […]. A atenção dos

responsáveis políticos tem incidido sobretudo na área de I&D como principal impulsionador da inovação, mas essa por si só não é suficiente para explicar a inovação» (Sustentare, 2009: 6).

6 Nos modelos lineares as inovações resultam de uma das vias: (i) a investigação cria ideias, que são desen-volvidas e dão origem a aplicações, que acabam por ser integradas nas organizações – «technology push»; (ii) ou então, as organizações identificam necessidades para as quais é necessário criar novas soluções – «need pull», ou seja «a necessidade aguça o engenho». Todavia, a inovação requer uma interacção entre o «push» e o «pull», mesmo que um deles prevaleça (Tidd, 2006).

7 Neste trabalho considera-se competência de uma pessoa como o conjunto de conhecimentos, capacidades de acção e comportamentos necessários para o desempenho eficiente e eficaz de uma determinada função.

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8 Essencial no sector público, dado que este não possui, como no sector privado, o factor lucro como prin-cipal impulsionador da inovação (Osborne et al. (2009) apud MAC (2010: 7)).

Fonte: Adaptado de: (Eggers et al., 2009: 114)

Figura 1 – Os serviços públicos e os modelos de inovação.

Diversos autores – e.g. Mulgan et al. (2003), Cormican et al. (2004), Tidd et al. (2005), Jacobs et al. (2008), citados por Eveleens (2010), assim como MAC (2010) – consideram que a inovação não se processa no vácuo, antes depende de fatores de contexto, como: as estratégias que influenciam a organização; a sua cultura; a liderança; a estrutura organizacional; os recursos/competências; as ligações ao exterior.

De igual modo, é consensual que a inovação envolve diferentes fases. Fundado em Eveleens (2010: 7) – que analisou 12 modelos de inovação – em Eggers et al. (2009) e em MAC (2010), é possível identificar as seguintes fases: (i) geração/procura de ideias; (ii) seleção de ideias; (iii) desenvol-vimento/implementação das ideias, onde se inclui a sua experimentação; (iv) sustentação das ideias 8; (v) difusão/integração, onde se pode incluir a aprendizagem, quer da utilização da inovação, quer das lições do processo, de modo a melhorar projetos futuros. Daí se considerar que estas fases se desenrolam num ciclo.

1.1.2 Aplicação dos conceitos: «rotinas» e «instrumentos»/«medidas»

Se os modelos, os fatores de contexto e as fases da inovação são importantes para a sua conceptualização, não menos o são as práticas que a implementam.

Modelo de inovação tradicional: Modelo intermédio: organização Novo modelo de inovação organização fechada parcialmente colaborativa para aberta: organização aberta, reduzir custos ligada em rede ● A organização é que detém e ● Inclui alguns elementos de ● A organização agrega, gere e fornece as soluções. colaboração, mas a organização adquire serviços. ● A resolução de problemas é feita continua a ser a principal detentora ● Utiliza competências internas apenas com a adição de recursos e fornecedora de soluções. para: internos. ● Existe uma colaboração melhorada – Identificar ideias promissoras ● A organização cria por si própria: entre os seus departamentos. de qualquer origem; abordagem centralizada. – Adaptar as ideias às suas necessidades. ● Redução de custos de colaboração. ● Necessidade de resposta colabo- Factores Influenciadores rativa ao crescente número de problemas.

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Johnson (1996), citado por Lundvall et al. (1997: 70), salienta que, mui-tas vezes, as práticas de inovação adotadas são empíricas, impulsionadas pela intuição e senso comum economicista e estão mais orientadas para a criação de conhecimento do que para a sua aplicação.

Efetivamente, se as práticas de inovação forem limitadas, então os resul-tados serão inevitavelmente limitados, como se sintetiza na Tabela 1.

Como tal, autores como Tidd (2006) e Jacobs et al. (2008) apud Eveleens (2010) consideram essencial introduzir «rotinas» para a inovação, que devem ser específicas de cada organização e fazer parte da sua cultura, para que o processo de inovação seja integrado como um hábito. Todavia, porque essas «rotinas» ainda envolvem alguma abstração (e.g. «estimular o empreendedo-rismo e a capacidade de assumir riscos, sem penalizar os fracassos» (COTEC, 2007)), alguns autores (e.g. (MAC, 2010)) advogam que estas sejam apoiadas por «instrumentos»/«medidas», como os da Tabela 2.

Fonte: Adaptado de (Tidd, 2006: 4)

Tabela 1 – Práticas de inovação e suas consequências.

Se a inovação for perspectivada As consequências apenas como... podem ser....

Forte ênfase na I&D, com poucos contributos dos utilizadores. Resposta aos requisitos dos utilizadores.

Um domínio de especialistas ou de pessoas específicas.

O domínio exclusivo de grandes organizações.

Desenvolvimento de tecnologia de ponta.

Exclusivamente sobre mudanças transformacionais. Exclusivamente associada a projectos específicos. Apenas gerada internamente. Apenas gerada externamente.

Restrita à organização.

Tecnologia que não responde aos requisitos dos utilizadores e está sujeita a ser rejeitada.

A incapacidade de aquisição de vantagens competitivas.

A falta de envolvimento de outros elementos da organização e a consequente não utilização da sua criatividade e dos seus contributos para a melhoria da inovação.Pequenas organizações fragilizadas, altamente dependentes de grandes fornecedores e sujeitas aos impactos da inovação disruptiva.A produção de produtos ou serviços que as organizações não querem ou não estão preparadas para receber, ou a concepção de processos que não respondem aos requisitos dos utilizadores, os quais oferecem resistência à sua integração.A perda do pontencial da inovação incremental, com a inerente incapaci-dade de se consolidarem e reforcarem os ganhos das mudanças radicais.A perda de potenciais oportunidades resultantes de descobertas acidentais.

A rejeição ou a oposição às boas ideias do exterior.A inovação tornar-se num mero processo de definição de requisitos, sem aprendizagem interna ou desenvolvimento de competências.Exclusão das sinergias resultantes das interacções inter-organizações.

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9 «Unlike other organizations, military forces in peacetime must innovate and prepare for a war 1) that will occur at some indeterminate point in the future, 2) against an opponent who may not yet be identified, 3) in political conditions which cannot accurately predict, and 4) in an arena of brutality and violence which one cannot replicate» (Murray et al, 1998: 301).

Fonte: Adaptado de (MAC, 2010: 93) e de (Eveleens, 2010: 11)

1.2 A inovação e a especificidade das Forças Armadas

O ambiente militar e a sua envolvente apresentam especificidades 9 que influenciam – promovem ou condicionam – a inovação e, consequentemente, o seu potencial contributo para a sustentabilidade e valorização das FFAA.

1.2.1 O ambiente estratégico

Os requisitos de capacidades decorrentes do ambiente estratégico têm impulsionado as organizações militares para novas ideias e formas de as con-cretizar, como a utilização do porta-aviões (projeção), do combate mecanizado (velocidade da manobra), dos mísseis de cruzeiro e dos veículos aéreos não-tripulados (UAV) (autonomia, alcance e precisão).

Por outro lado, as expectativas de afirmação e de desenvolvimento nacio-nais podem igualmente determinar o nível das capacidades de inovação. Por exemplo a Noruega, que procura afirmar a sua soberania e a sua indústria de Defesa, possui uma significativa estrutura de I&D de Defesa (I&DD) – com

Tabela 2 – «Instrumentos»/«medidas» para a implementação da inovação, em função das suas fases.

Geração Selecção Implementação/Teste Sustentação Difusão

Estratégia X X X X XPessoas\competências e formação X X X X XFunções de suporte à inovação X X X X XMonitorização da envolvente externa X X X X XEquipas de Apoio à Inovação X X X XRecursos X X X XEvolvimento e colaboração interna e X X X X externaEspaços de experimentação X X X XConcursos/Desafios/Sugestões X XSistemas de gestão de ideias X X XAquisição de serviços ao exterior X XInteracção Inter- e Intra-departamental X X XEquipas multidisciplinaresAnálises do Risco X XPromoção da inovação X XValorização/Recompensa X XAvaliação/Medição do impacto X

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715 pessoas, sendo 515 da estrutura científica, e um orçamento de 95,8 M€, que representa mais de 2% do orçamento da Defesa. Esta estrutura está na dependência do Ministério da Defesa (FFI, 2010).

No outro extremo está a Dinamarca, que confia muita da sua Defesa à NATO e não tem pretensões de desenvolver uma indústria de Defesa. Como tal, deixou de ter estruturas de I&DD e mantém apenas competências internas – menos de vinte cientistas (DCD, 2011), que estão na dependência do Ministério da Defesa.

A Holanda, por seu lado, que está a avançar para o modelo de «inovação aberta», baseia-se nas capacidades internas, quando é necessário conhecimento específico ou para a adaptação dos desenvolvimentos que são atribuídos ao exterior (NL MOD DRD, 2011). Para além de dois laboratórios de Tecnologias de Informação e Comunicação, um na Marinha e outro no Exército, o cerne da I&DD reside num departamento específico da Organização de Pesquisa Apli-cada da Holanda (TNO), uma instituição pública que depende do Ministério da Ciência (Rademaker, 2009).

1.2.2 Perceções sobre o ambiente Estratégico e sobre a inovação

A perceção das ameaças e das oportunidades do ambiente estratégico tem sido outro fator influenciador da inovação militar: «as avaliações políticas e militares do quadro estratégico, são essenciais para o sucesso da inovação» (Murray et al., 1998: 305).

Os casos contemporâneos das munições de precisão-guiada, dos UAVs e do Sistema de Posicionamento Global (GPS), que passaram por lentos e sinuosos processos de aceitação e integração nas FFAA 10, são exemplos do impacto da perceção da inovação. Ou seja, para além do valor da própria inovação, a per-ceção desse valor é fundamental para que esta possa ser difundida nas FFAA. Daí a importância de se demonstrar o valor das inovações em exercícios, tão próximos da realidade quanto possível, e de o comparar com o status quo.

Por outro lado, as ambições nacionais quanto ao nível de atualização tec-nológica e conceptual das suas FFAA também influenciam a inovação. Quanto maiores forem – como no caso da Noruega 11 – maiores serão os recursos disponibilizados e a aceitação do risco no desenvolvimento ou difusão de tec-nologias ou conceitos pioneiros.

10 O projecto do GPS, que foi iniciado em 1973, sofreu diversos cortes no orçamento proposto, sobreviveu a várias tentativas para o cancelar e teve um atraso significativo relativamente ao previsto. Sem o apoio das FFAA am ericanas, o projecto acabou por ser recuperado, em 1980, ao nível político. Todavia, em 1991, ainda se questionava a sua aplicação às FFAA (Tomes, 2004: 378).

11 Vide discurso do Ministro da Defesa da Noruega (MOD Norway, 2010).

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Os conceitos de Networked-Enabled Capability da NATO (NNEC) e de defesa do ciberespaço são um exemplo de como as mudanças de paradigma na ciência e nos assuntos militares criam tais expectativas, que levam países como a Noruega, a Holanda e a Dinamarca a orientarem as suas estratégias de inovação para a aquisição dessa capacidade.

No entanto, enquanto os EUA, porque possuem os recursos e têm a ini-ciativa, podem optar por uma abordagem de inovação disruptiva, transversal às organizações de Segurança e Defesa, os membros europeus da NATO têm adotado um processo de inovação incremental, traduzido, na generalidade, numa transição para capacidades «nicho» (Hamilton citado por Vicente (2007: 132)).

1.2.3 Visão, Estratégia e Liderança

A visão de uma organização deverá estimular a inovação e orientar a definição dos objetivos e a estratégia para a inovação. Esta, por seu lado, cons-titui um forte determinante da vontade e capacidade de inovar da organização (Cunha et al., 2006: 756). A liderança, a começar no topo da organização, tem a responsabilidade de impulsionar as atividades de inovação, implementando políticas e procedimentos que facilitem o seu desenvolvimento, e demonstrar, através das suas práticas e ações quotidianas, o seu empenhamento na inovação (COTEC, 2007: 30). A liderança é essencial na inovação, já que esta não surge por imposição, mas antes por envolvimento voluntário.

Muitas das inovações militares são o resultado da visão, das estratégias adotadas e da atuação determinada de líderes, que só se tornaram evidentes no longo prazo. Por exemplo, as mudanças de estratégia operadas no início da década de 1970 (i.e. da defesa baseada apenas na estratégia nuclear de dissu-asão, para a baseada em meios convencionais de grande precisão, letalidade e alcance) conduziram à adoção de tecnologias (e.g. armas de precisão-guiada, sensores, sistemas de comando e controlo (C2) móveis e por satélite), doutrinas e estruturas organizacionais, que foram amadurecendo na década de 1980 e que estão na base da atual Transformação 12 das FFAA americanas e da NATO (Tomes, 2004).

1.2.4 Ativo organizacional

O atual ritmo de mudança é superior ao da capacidade de aceitação cultural de uma organização. Esta situação acentua-se com o grau de hierarquização

12 Processo que modela a natureza evolutiva da competição e da cooperação militar através de novas com-binações de conceitos, recursos, pessoas e organizações (DoD dos EUA apud (Garstka, 2005)).

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das instituições (NESTA, 2008: 13). «Em instituições tradicionalmente conser-vadoras, como as da Defesa, as novas abordagens raramente são rapidamente consideradas, precisamente porque os processos que estão a ser usados foram concebidos e aperfeiçoados para a sua “ótima” performance no ambiente pre-visto. […] No entanto, em diversas ocasiões, foi com abordagens inovadoras que os “génios” militares tiveram sucesso, quando tomaram decisões que sur-preenderam os adversários» (Alberts et al., 2003: 152).

Segundo Huntington citado por Murray et al. (1998: 313), a cultura mi-litar pode ser descrita como a soma dos valores intelectuais, profissionais e tradicionais de um corpo de oficiais, a qual desempenha um papel central no modo como esse corpo avalia o ambiente externo e como concebe e analisa a possível resposta a uma ameaça.

A formação nos valores que promovem a adaptabilidade, a experimenta-ção, a aprendizagem e a melhoria contínua (COTEC, 2010) são fundamentais para o desenvolvimento de uma cultura orientada para a inovação nas FFAA, dado que esta não se alcança pela burocratização, criação de departamentos ou especialidades em inovação (Murray et al., 1998: 326).

Para que a inovação desponte, é necessário promover o envolvimento e o alinhamento das lideranças e subordinados, estimulando e recompensando a iniciativa e a capacidade de assumir riscos, sem penalizar os inerentes insu-cessos ligados à experimentação.

1.2.5 Ativo humano e informacional e colaborações externas

A inovação pode surgir de qualquer nível no interior da organização ou de uma fonte exterior.

A investigação tem identificado um conjunto de pessoas que, pelas suas características, desempenham funções especiais, por vezes cruciais, no processo de inovação, quer na organização, quer em projetos ou programas, que são os designados 13: (i) «campeões» (Peters e al. (1982) apud Cunha et al. (2006)); (ii) «sponsors» ou «patrocionadores»; (iii) «coaches» ou «orientadores»; e (iv) «desafiadores» (MAC, 2010). Entre estes, os «campeões» são verdadeiros «impulsionadores» das inovações, pois defendem-nas, limitam os seus riscos e removem os obstáculos à sua implementação.

A própria base de conhecimento existente nas FFAA influencia o tipo e o grau de inovação a implementar. Importa, pois, atrair, desenvolver e reter um elevado nível e diversidade de competências, tanto para aumentar o potencial

13 No Capítulo 5 serão detalhadas estas funções, aplicadas às FFAA.

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de inovação interno, como para perceber e integrar inovações que surjam na envolvente externa.

No caso dos três países em análise, é reconhecido que a diminuição de competências nas FFAA em ciências tecnológicas – a maior parte dos militares têm formação em ciências sociais e humanas – tem reduzido a definição de re-quisitos de inovação, assim como a utilização dos seus resultados (Jermalavičius, 2009: 13). No entanto a inovação, tecnológica ou não, envolve comportamentos sociais – particularmente nas fases de geração e de difusão – ligados à cultura da organização e à comunicação.

De igual modo, a inovação está associada à conectividade e colaboração. Um ambiente de ampla partilha de informação e conhecimento é propício à inovação (MAC, 2010: 12), uma vez que cada um aprende com aquilo que a rede de contactos – formais e informais – dissemina, que por sua vez é também alimentada pelas próprias aprendizagens. Como tal, interessa apoiar a inova-ção em processos de gestão da informação e do conhecimento, bem como em sistemas de informação e comunicação (SIC) e no networking.

Além disso, nos vários estágios do ciclo de inovação são necessárias com-petências e soluções, que muitas vezes não existem numa única organização. Daí ser necessário promover a colaboração com o exterior. Esta perspetiva é muito acentuada na Holanda, desde o nível de planeamento estratégico inter-ministerial (NL MOD, 2010), às iniciativas de I&D entre entidades militares e civis, públicas e privadas, e à cooperação internacional.

Estas colaborações também podem atenuar os condicionamentos em recur-sos, humanos e financeiros, que reduzem a capacidade de inovação das FFAA. É o caso da Dinamarca, que procura suplantar a sua muito pequena capacidade interna com a ligação a universidades e institutos tecnológicos (DCD, 2011).

Todavia, para que possa ser aplicável às FFAA e as potenciais vantagens competitivas resultantes da inovação não sejam alienadas, é essencial que a colaboração com o exterior se faça em condições de segurança de partilha de informação (e.g. através da credenciação de pessoas e organizações), bem como de proteção da propriedade intelectual/industrial.

1.2.6 Grau tolerável de flexibilidade

A perspetiva de aprendizagem e crescimento (A&C) 14 é essencial para adaptação à mudança (Pinto, 2009: 172), particularmente nas FFAA. Por mais

14 No Balanced Scorecard (Kaplan et al., 1996) aplicado às instituições de serviços públicos é possível identificar cinco perspectivas (Pinto, 2009: 154): Missão; Stakeholders; Processos internos; A&C; Recursos.

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bem sucedidas que sejam as tarefas ou as missões, as mudanças inovadoras serão sempre necessárias, nomeadamente nas operações, para explorar as oportunidades, evitar a previsibilidade, manter o adversário em desvantagem e inseguro, e diminuir a eficácia das suas capacidades (Alberts et al., 2003: 148).

As organizações que têm uma cultura de abertura, ou seja, que são fle-xíveis à adoção de novas ideias e que impulsionam o seu desenvolvimento e experimentação, têm tendência a ser inovadoras. Pelo contrário, a existência de restrições à inovação ou de processos rígidos, multi-diferenciados de apro-vação, não só desmotivam a inovação, como incapacitam uma organização de suplantar desafios e de evoluírem.

O desastre das FFAA francesas na II Grande Guerra (GG) é indissociável da rigidez da sua doutrina – baseada numa defesa estática –, da sua perceção relativamente às capacidades e intenções do seu oponente, da sua cultura orga-nizacional – contrária a sugestões que contradissessem a doutrina e os conceitos – e da inexistência de aprendizagem com as lições aprendidas em combate ou em exercícios (estes visavam apenas demonstrar a pretensa validade da doutrina existente) (Murray et al., 1998: 323).

Todavia, a investigação vem demonstrando que o contexto mais adequado à inovação não é o de total adocracia, mas sim é aquele onde se combina fle-xibilidade para a mudança com objetivos e prioridades (Kamoche (2001) apud Cunha et al. (2006): 753).

Importa pois que as FFAA monitorizem, sistematicamente, os sinais – internos e externos – que apelam à mudança, designadamente ineficiências e tendências recorrentes para erros, assim como pressões externas, e estabeleçam objetivos e áreas prioritárias de inovação em função dessas necessidades de mudança.

Interessa igualmente selecionar as ideias com maior potencial de sucesso e gerir os riscos que lhes estão associados. As análises de risco, a simulação, o desenvolvimento de experiências e de protótipos, bem como a implementa-ção de inovações em espaços de experimentação, nos quais os insucessos são esperados, contribuem para minimizar e controlar o risco inerente às inovações. De igual modo, a implementação faseada da inovação contribui igualmente para este fim (ANAO, 2009: 28).

Convém ainda sincronizar o desenvolvimento e a difusão das ideias se-lecionadas com a satisfação dos requisitos das FFAA e não ceder a pressões de respostas de curto prazo ou de apresentação de resultados imediatos, que normalmente conduzem à dependência de «modas» ou a soluções do tipo commercial-off-the-shelf (COTS).

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1.3 Síntese

Os atuais modelos de «inovação aberta» e de interação em cadeia, que abrangem as múltiplas vias da inovação e a complexidade deste processo so-cial, político, cognitivo, organizacional e tecnológico, assim como a elevada incerteza própria do ambiente militar e da sua envolvente, têm potencial de aplicação às FFAA. Para tal, o processo de inovação deve fazer parte da sua cultura, ser liderado, gerido (inclusivamente na salvaguarda da segurança da informação e da propriedade intelectual/industrial) e perspetivado como con-tínuo e indispensável.

A Tabela 3 identifica as ameaças à inovação nas FFAA e a Figura 2 resume os fatores e os processos que influenciam a inovação de sucesso no meio militar.

Tabela 3 – Ameaças à inovação nas FFAA.

Fonte: Autor

AmeaçasOrganização fechada ou parcialmente colaborativa com o exterior.Adopção de abordagens de inovações limitadas.Capacidades de inovação incompatíveis com as expectativas ou muito dependentes do exterior.Percepções baixas do valor da inovação ou baixas ambições do nível de actualização das FFAA.Visão de curto prazo e falta de estratégia e de liderança para a inovação.Falta de alinhamento para a inovação e resistência à mudança.Ausência de iniciativa e de capacidade para assumir riscos.Pouca interacção interna.Baixo nível ou baixa diversidade de competências internas.Adocracia ou burocracia.Ausência de gestão da inovação, nomeadamente de gestão do risco que lhe está associado.Falta de sincronização da inovação com a satisfação dos requisitos de capacidades das FFAA.

Figura 2 – A inovação e os factores das FFAA que a influenciam 15.

15 Nesta figura a inovação, que é um processo, aparece individualizada no topo da perspectiva A&C, de modo a representar a sua dependência dos activos intangíveis – Organizacional, Humano e Informacional –, assim como dos factores de contexto interno que aí se inserem.

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2. A inovação e a Sustentabilidade e Valorização das FFAANuma perspetiva abrangente, o conceito de sustentabilidade é multidi-

mensional (Sachs, 2002). Os contextos em que se inserem as FFAA, que estão em constante mudança, têm uma dimensão política e estratégica, nacional e internacional, social, económica e ambiental. Nestas dimensões, igualmente se encontram os intervenientes ou interessados, que se relacionam com as FFAA – os designados stakeholders (Freeman, 1984) –, que passaremos a designar por comunidade (Pinto, 2009).

Interessa pois dar resposta às suas expectativas, sempre em evolução, correspondendo com um aumento de performance, que se pode traduzir em metas de eficácia, eficiência, qualidade e de gestão de recursos (Finland, 2006).

2.1 A comunidade e as suas expectativas relativamente às FFAA

A comunidade espera que as FFAA, no cumprimento integral da sua missão (AR, 2009: 4): (i) contribuam para as funções coletivas do Estado, inclusiva-mente na proteção e desenvolvimento da cidadania (e.g. proteção do ambiente e melhoria das condições de vida das populações); (ii) correspondam aos com-promissos de parceria e colaboração estabelecidos – tanto com indivíduos, como com organizações, nacionais ou internacionais; (iii) e que façam a gestão dos recursos que lhes são disponibilizados com responsabilidade (accountability) e transparência 16 (Figura 3).

Figura 3 – A comunidade e suas expectativas em relação às FFAA

16 De acordo com (Pinto, 2009: 185), numa abordagem da gestão da performance aplicada à administração pública, o orçamento é assumido como o principal mecanismo de controlo da responsabilidade (accounta-bility) e transparência dos serviços públicos, não só perante os órgãos de controlo e fiscalização internos, mas também perante os cidadãos, a opinião pública e os media.

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2.2 Sustentabilidade e Valorização das FFAA

Neste trabalho, o conceito de sustentabilidade das FFAA será assumido como a capacidade institucional de interagir com os seus contextos mutáveis e de corresponder às expectativas, sempre em evolução, da comunidade com a qual se relaciona, cumprindo a sua missão com eficácia e gerindo os recursos disponibilizados com responsabilidade (accountability) e transparência.

A contínua valorização das FFAA é também um fator da sua sustentabi-lidade, sobretudo em períodos de situações económicas difíceis e de falta de perceção de ameaças e riscos concretos à Segurança e Defesa Nacional, para que a comunidade não as considere um encargo desnecessário. Assim, neste trabalho a valorização será entendida como a capacidade das FFAA aumentarem a eficiência dos seus processos e a qualidade dos seus resultados.

Neste sentido, foram deduzidos os objectivos e os indicadores da susten-tabilidade e da valorização das FFAA, que se apresentam na Tabela 4.

Tabela 4 – Objectivos e Indicadores de Sustentabilidade e Valorização das FFAA

(continua)

Perspectiva Objectivos IndicadoresValor para a Integral cumprimento de Missões. Relatórios das missões e das inspecções.comunidadeValor para Aumentar Produto e Prontidão Operacional. Taxa de incremento com base em avaliações.as FFAA Assegurar a confiança e legitimidade da Avaliações positivas nos relatórios das inspecções. comunidade. % de redução de inconformidades. Melhorar a imagem externa. # referências elogiosas e outras distinções. Satisfazer requisitos de capacidades. % satisfação dos requisitos de capacidades. % da LPM na aquisição de equipamentos com incorporação de inovação das FFAA. Ser referência nacional nos domínios # de produtos ou serviços utilizados pela específicos das FFAA. comunidade. # de inovações que contribuíram para o objectivo.Recursos Atrair e reter pessoal adequado. Nível de adesão e de retenção. Nível e diversidade de competências do pessoal. Disponibilidade e fiabilidade da informação. # de inovações que contribuíram para o objectivo. Aumentar os recursos financeiros. Grau de execução orçamental. Disponibilidade e fiabilidade da informação financeira e orçamental. # inovações que contribuíram para o objectivo. Obter e manter material e infra-estruturas % material que contribui para o objectivo. necessários para a satisfação dos requisitos Disponibilidade e fiabilidade da informação de capacidades. sobre material e infra-estruturas. # inovações que contribuíram para o objectivo. Aumentar a cooperação com o exterior. % aumento de: parcerias; protocolos; projectos; formação; redes estruturadas. % aumento em resultado da inovação.

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Perspectiva Objectivos IndicadoresProcessos Melhorar a eficácia, eficiência e qualidade Taxa de sucesso entre o planeado e o realizado. do planeamento. # decréscimo de tempo e de pessoas envolvidas. % decréscimo de erros. # inovações que contribuíram para o objectivo. Melhorar a accountability, eficiência e % decréscimo de inconformidades. qualidade das aquisições. # decréscimo de tempo e de pessoas envolvidas. % decréscimo de erros. # inovações que contribuíram para o objectivo. Melhorar a accountability, eficiência e % decréscimo de inconformidades. qualidade da Gestão. % decréscimo de tempo e de pessoas para a actualização de orçamentos e de relações de pessoal, material e infra-estruturas. % decréscimo de erros. # inovações que contribuíram para o objectivo. Melhorar a eficiência organizacional. # alterações estruturais ou de processos. % decréscimo de tempo e de pessoas. Actualizar a Doutrina. Grau de adequação doutrinária às operações. Grau de interoperabilidade com a NATO. Melhorar a eficiência e qualidade do % incremento treino conjunto e inter-armas. Treino. % decréscimo de tempo e de pessoas de apoio. # inovações que contribuíram para o objectivo.A&C Melhorar a produção e difusão de saberes. # projectos com financiamento externo. # artigos publicados em fora de referência. Aumentar nível e diversidade de % acréscimo de tempo de formação. competências. % incremento de competências. Obter alinhamento. # comunicações internas, acções de difusão. Questionário para avaliação: da compreensão dos objectivos, prioridades e motivação. Melhorar o activo informacional. % satisfação dos utilizadores através de inquéritos. % incremento de SIC que facilitem o trabalho colaborativo, a análise ou a partilha de informação. Melhorar integração de sistemas intra- e # entidades com sistemas integrados. inter-organizações.

Fonte: Autor

2.3 A relação entre a inovação e a sustentabilidade e a valorização

As FFAA necessitam dos seus valores intangíveis e de processos adequados para transformar os recursos disponíveis – humanos, materiais, financeiros – em capacidades 17, que lhes permitam cumprir a missão.

Carapeto et al. (2006) consideram que a inovação contribui para uma organização melhorar o seu desempenho, aumentar a eficácia e eficiência, mi-nimizar custos e para se adaptar às expectativas da comunidade.

17 Neste trabalho será adoptado o conceito da (NATO, 2010: 1), segundo o qual capacidade é a «aptidão para produzir um efeito […]. Consiste num ou mais componentes funcionais: doutrina; organização; treino; material; liderança; pessoal; infra-estruturas; interoperabilidade».

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Nestas se incluem as expectativas individuais de quem integra uma or-ganização, nomeadamente a de participação no processo de inovação. E esta oportunidade atrai pessoas para as organizações públicas (MAC, 2010).

O próprio ambiente da organização pode contribuir para atrair pessoas mais qualificadas, dado estas serem mais criativas, quando motivadas principalmente pelo interesse, satisfação e desafio do seu próprio trabalho (Cunha et al., 2006).

2.3.1. O impacto dos tipos de inovação

A inovação tecnológica tem sido um elemento essencial na estruturação das FFAA, na sua organização, táticas, doutrinas e estratégias, ou seja, nas suas capacidades. Para além da sua intrínseca vantagem competitiva, uma tecnologia induz uma outra forma organizativa adaptada e exige uma alteração dos métodos de treino e formação e, consequentemente, de mentalidades (Telo, 2005: 103).

No entanto, é importante reconhecer que a inovação militar e a inovação tecnológica não são sinónimos (Isaacson et al., 1999: 9). Nem todas as FFAA (e os respetivos países) têm recursos para investir em qualquer aquisição ou dominar o uso de tecnologias de ponta, mas esta vulnerabilidade não é impe-ditiva de que atinjam um grau de eficácia militar 18 e agilidade 19 superiores ao dos seus adversários dotados de melhores tecnologias, como eram os alemães na II GG e os americanos na guerra do Vietname.

Com inovações não-tecnológicas é possível construir organizações militares flexíveis e adaptáveis, assim como desenvolver processos mais eficientes, que proporcionam um aumento do produto operacional, com os mesmos recursos.

É na combinação de inovações, que envolvem tecnologia, processos, organi-zação e pessoas, que se alcançam novas capacidades de combater (Garstka, 2005).

A nível nacional, os impactos desta combinação foram bem visíveis em diversos exemplos contemporâneos. Destacam-se as significativas transforma-ções organizacionais, de procedimentos, de táticas e a integração de novos equipamentos – como os blindados, os radares, os aviões a jacto, os helicóp-teros, a espingarda automática e as lanchas de desembarque – que emergiram, sucessivamente, da integração na NATO e do ambiente estratégico da Guerra Fria (na década de 1950), da guerra em África (nas décadas de 1960 e 1970), da envolvente de segurança das operações de Apoio à Paz, iniciadas na década de 1990, e da recente participação nas Forças de Resposta da NATO (NRF) e nos Grupos de Batalha da UE (BG).

18 Desenvolvimento do máximo poder de combate a partir dos recursos disponíveis (Isaacson et al., 1999).19 Capacidade de ser eficaz num ambiente de mudança, não-linear e imprevisível (Alberts et al., 2003).

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2.3.2 O impacto da inovação na Transformação em curso

Segundo (Tomes, 2004), a Transformação em curso nas organizações militares tem conduzido à mudança de modelos (e.g. de plataformas isoladas para a integração entre plataformas de sistemas armas); à criação de novos paradigmas, como o trabalho em rede; ao reconhecimento de que as capacida-des militares devem ser consideradas como sistemas abertos, não-lineares; e à maior aceitação da complexidade no pensamento militar.

A Transformação na NATO está fundada num processo contínuo de inovação de capacidades, para aumentar a eficácia, interoperabilidade e a adequação das forças a um ambiente em constante mudança (ACT/NATO, 2004). Por exemplo, as operações na Bósnia passaram das Nações Unidas para a NATO e de mis-sões de imposição de paz para missões de reconstrução, num curto período. No Afeganistão, a coligação de forças militares está envolvida, simultaneamente, em missões de segurança, humanitárias e de reconstrução (Alberts et al., 2003: 131).

Para tal, prevê alterações de equipamento, doutrina, processos e treino, validadas por experimentação e exercícios, acompanhadas por uma mudança organizacional e pela integração de sistemas que melhoram a gestão da informa-ção (ACT/NATO, 2004: 12). Conjuga, pois, inovação tecnológica (e.g. sensores, estrutura de informação e sistemas de combate) com inovação não-tecnológica (e.g. doutrina; organização), para transformar informação complexa em eficácia militar (ACT/NATO, 2004) e agilidade (Alberts et al., 2003), potenciando o apoio à decisão, o conhecimento situacional e a colaboração em rede.

As recentes operações no Iraque e no Afeganistão confirmaram a importân-cia desta inovação, uma vez que o seu sucesso se deveu mais à integração das entidades envolvidas e à gestão e partilha da informação, do que à quantidade de sistemas de armas, do poder de fogo ou da quantidade dos militares empregues (Vicente, 2007: 110). De igual modo, estas operações também demonstraram que o não acompanhamento deste processo de inovação pode inviabilizar a participação em coligações internacionais, e, sobretudo, nas forças que são o atual paradigma de excelência – NRF/NATO e BG/EU.

Neste contexto, a inovação é ainda utilizada na análise prospetiva de ca-pacidades futuras, explorando aspetos tecnológicos, doutrinários e operacionais, assim como do ambiente estratégico, com a finalidade de se identificarem re-quisitos. Estes são analisados através de processos de CD&E 20 tendo em vista converter ideias em capacidades (Alberts, 2002).

20 Processo análogo ao método científico, que permite determinar, através da experimentação, se conceitos ou sistemas desenvolvidos satisfazem os requisitos de capacidades estabelecidos pelo processo de Trans-formação da NATO (BWB, 2010).

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2.3.3 O impacto da inovação nas FFAA dos países em estudo

Na Holanda e na Noruega é dada relevância à ligação da I&D com as atividades de CD&E – análise de cenários, desenvolvimento de conceitos, ex-perimentação (FFI, 2010) – para interligar novas ou aperfeiçoadas tecnologias com mudanças doutrinárias ou organizacionais e de as testar de forma integrada.

Na Holanda, a inovação 21 é considerada como um multiplicador da força, dado que contribui nas diversas componentes – Operacional, Pessoal, Material e Logística – para a geração do produto operacional (Figura 4) (NL MOD DRD, 2011: 1).

Fonte: Adaptado de (NL MOD DRD, 2011)

Figura 4 – A inovação e o produto operacional na Holanda

21 Materializada em: (i) pesquisa básica – exploratória e /ou pesquisa aplicada para demonstrar a viabilidade de uma solução; (ii) desenvolvimento e/ou demonstração de tecnologia; (iii) pesquisa nos domínios do pessoal, doutrinários e organizativos.

Por outro lado, verifica-se uma tendência crescente para a satisfação dos requisitos de capacidade militares, através da aquisição de sistemas e tecnologias civis (NL MOD, 2010), sobretudo do tipo COTS – que é a opção preferencial da Dinamarca (DCD, 2011). Para além da vulnerabilidade rela-cionada com a transferência de conhecimento e de tecnologia para eventuais adversários – Estados e atores não estatais – esta opção, se for aplicada sem se atender a critérios de especificidade, segurança, autonomia e flexibilidade,

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torna as FFAA dependentes de soluções padronizadas, de cadeias de abaste-cimento cada vez mais globais e da vontade do sector comercial em investir em novas aplicações militares.

Nos três países em estudo, foi identificada a importância das competên-cias internas ligadas à inovação na definição dos requisitos de capacidades das FFAA, na avaliação do que está disponível no mercado, do que está a ser adquirido e de como fazer o melhor uso da tecnologia e dos conhecimentos provenientes do exterior.

Através da análise prospetiva do ambiente estratégico e da evolução tecnológica, as competências internas de I&D destes países também são utili-zadas: (i) para diminuir a incerteza no planeamento de defesa de médio-longo prazo; (ii) e na redução dos riscos associados a aquisições e desenvolvimentos de soluções, dado que se podem tornar obsoletas perante mudanças, quer do ambiente estratégico, quer científicas e tecnológicas.

Nos três países em estudo é igualmente dada relevância ao âmbito inter-institucional da Segurança e da Defesa, procurando, sempre que aplicável, desenvolver projetos que sejam financiados por ambos os domínios. Como salienta Trajtenberg (2006) apud Jermalavičius (2009) a I&DD tem deixado os grandes sistemas de armas para se concentrar no combate ao terrorismo, designadamente através da obtenção de informações – intelligence – da análise de dados e da proteção de sistemas de informação.

Finalmente, as capacidades internas de I&D também são utilizadas para ganhar acesso a conhecimentos, soluções disponíveis e sinergias nos fora bila-terais ou multinacionais, uma vez que essa participação está condicionada pelo princípio implícito da reciprocidade. Para esses fins, no caso da Dinamarca, as suas capacidades internas estão muito moldadas às áreas de desenvolvimento da Research and Technology Organization (RTO)/NATO. No entanto, a Holanda e a Noruega, apesar de não serem tão dependentes, também atribuem importância ao alargamento das respetivas bases de conhecimento com a cooperação inter-nacional, particularmente com a RTO e com a Europen Defence Agency (EDA)/EU. A Holanda procura ainda estabelecer o seu «nicho» de conhecimento e de tecnologias na NATO (Jermalavičius, 2009: 15).

2.4 Síntese

A inovação pode contribuir para a sustentabilidade e valorização das FFAA, materializando-se o respetivo contributo nas oportunidades resumidas na Tabela 5.

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3. O impacto actual das actividades da Defesa nacional, no domínio da inovação, na sustentabilidade e valorização das FFAA

Gomes et al. (2010) analisaram o impacto da I&DD, entre 1999 e 2008, e concluíram que os resultados tinham sido muito pouco significativos na edi-ficação de capacidades da Defesa, não só porque os recursos disponibilizados tinham decrescido de forma consistente, mas também porque uma parte deles tinha sido canalizado para projetos pouco relacionados com I&DD.

3.1 Ministério da Defesa Nacional

Incumbe à Direcção-Geral de Armamento e Infra-Estruturas de Defesa (DGAIED) contribuir para a definição, planeamento, coordenação e acom-panhamento da execução das políticas de I&DD, convergindo nela a visão, coordenação, implementação e satisfação das necessidades de desenvolvimento das novas capacidades de Defesa (MDN/DGAIED, 2010: 15).

As FFAA são entendidas como «parceiro de I&D e utilizador final», cabendo-lhes a intervenção na definição das necessidades e requisitos das capa-cidades, bem como o acompanhamento do desenvolvimento dos equipamentos, nomeadamente no procedimento de teste e avaliação em ambiente operacional.

Por outro lado, no âmbito da Estratégia Nacional para o Mar (PCM, 2006) foi criada a Estrutura de Missão para os Assuntos do Mar (EMAM), que tem como uma das atribuições a articulação de competências nacionais ligadas ao oceano, nomeadamente na ciência, tecnologia e inovação.

Não existem, ao nível do Ministério da Defesa Nacional (MDN), estruturas permanentes que desenvolvam atividades de I&D.

Oportunidades

Adaptação às expectativas da comunidade: maior eficácia, eficiência, qualidade e responsabilidade (accountability).Definição e satisfação dos requisitos de capacidades, designadamente ao nível da Doutrina, Organização, Treino, Material, Liderança (i.e. no apoio à decisão), Pessoal (i.e. na medida em que pode aumentar a atracção de pessoas mais qualificadas para as FFAA); Infra-estruturas e Interoperabilidade (i.e. através de processos de CD&E).Ampliação da eficácia e agilidade das forças militares.Diminuição da incerteza no planeamento, nas aquisições e nos desenvolvimentos de soluções.Cooperação inter-instituicional entre a Segurança e a Defesa, com o inerente alargamento de recursos disponibilizados.Cooperação multinacional, possibilitando um aumento de conhecimento, soluções e de sinergias.

Tabela 5 – Oportunidades para as FFAA em resultado da inovação

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3.1.1 Estratégia de I&D da Defesa

Atualmente, não existe uma estratégia de inovação ao nível da Defesa. Em 2008, foi estabelecida uma Estratégia de I&D da Defesa (EI&DD), que visa «constituir-se como referência para o investimento público, inscrito em sede de Lei de Programação Militar (LPM), orientando o desenvolvimento e sustentação dos projetos de I&DD, enquanto vetor determinante, a médio e longo prazos, no desen-volvimento e sustentação de capacidades militares […]» (MDN/DGAIED, 2010).

Esta estratégia apenas privilegia as áreas tecnológicas associadas ao desen-volvimento/sustentação de armamento/equipamento de Defesa e fá-lo somente por uma das vias da inovação: a da I&D. Na Tabela 6 apresentam-se as áreas tecnológicas incluídas na EI&DD, em paralelo com as dos países selecionados, podendo-se observar que Portugal apresenta uma das listas mais completas, denotando grande ambição.

Tabela 6 – Comparação de áreas tecnológica.

Fontes: (DCD, 2011); (NL MOD DRD, 2011); (FFI, 2010); (Jermalavičius, 2009); (MDN/DGAIED, 2010).

Áreas de I&D Dinamarca Holanda Noruega PortugalMaterias: Avançados e Energéticos X X XOpto-Electrónica XTecnologias de Informação e Comunicações X X X XSensores e Tecnologias Radar X X XTecnologias de Defesa NBQR X X XBiotecnologias XNanotecnologias XTecnologias energéticas X XMísseis e Tecnologias de propulsão X X XVigilância Satélite e Tecnologia Militar Espacial XRobôs e Veículos não-tripulados X XSistemas de C2 X X X XAmbiente Operacional X X XModelação e Simulação X XGuerra Electrónica e Sistemas de Energia Dirigida X XFactores Humanos e Medicina X XProtecção da Força X X X XTecnologia Marítima XAnálise do Terrorismo X

Se, por um lado, a diversificação de áreas tecnológicas e o seu total ali-nhamento com a EDA e RTO possibilitam um mais amplo espectro de opor-tunidades de projetos cooperativos e uma maior perceção das tendências de evolução, por outro podem conduzir a uma exagerada dispersão de recursos 22

22 A actual participação na EDA e na RTO está a constituir um desafio, por escassez de recursos. No sentido de o superar e para que os resultados sejam mais efectivos, a DGAIED está a exigir que essa participação se faça associada a projectos concretos (Monteiro, 2010).

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com resultados pouco significativos, que inviabilizem o desenvolvimento de «nichos» de excelência nacionais. Considera-se que, após o período inicial de implementação da EI&DD, com a experiência acumulada, será possível priorizar mais as áreas de interesse nacionais.

Da análise dos projetos de I&D com financiamento LPM, sob coordenação da DGAIED, constata-se que a cooperação com a EDA, em 2009, ainda só incluía dois projetos, que no conjunto envolviam uma reduzida verba (325m€), e que não existia nenhum projeto de I&D no âmbito da RTO. Contudo, em 2010 e 2011, verifica-se uma tendência positiva de evolução, com os projetos a triplicarem. É de salientar, por ainda ser uma exceção, que num destes pro-gramas – no Network Enabled Cooperation System of Autonomous Vehicles (NECSAVE) – participam dois Ramos das FFAA.

Verifica-se uma predominância de projetos ligados aos veículos autónomos (que poderão ter emprego dual – militar e civil), à proteção individual (que poderá ter uma participação benéfica na BTID, com o desenvolvimento de novos mate-riais), e à Defesa NBQR, que é essencial perante as novas ameaças do terrorismo transnacional (MDN, 2003). No entanto, neste âmbito, são escassos os projetos na área dos explosivos e não existem projetos ligados à defesa do ciberespaço.

3.1.2 Perceção do impacto

Da entrevista efetuada na DGAED (Monteiro, 2010) infere-se que, pelo facto das medidas tomadas no âmbito da EI&DD serem muito recentes, os seus resultados ainda são pouco visíveis 23. No entanto, é possível concluir que a I&DD contribui para que as FFAA não estejam a comprar «caixas negras», permitindo efetuar a gestão do ciclo de vida dos componentes dos sistemas e até melhorá-los, com o envolvimento da BTID. Contribui para melhorar a definição dos requisitos de capacidades e a identificação das soluções que as podem satisfazer. E ainda, para aumentar sinergias que podem resultar em be-nefício da sociedade (e.g. deteção de agentes biológicos), com o consequente maior envolvimento da comunidade.

Da mesma entrevista, é possível apurar que a ligação à EDA e à RTO tem proporcionado: (i) alinhamento com as estratégias de desenvolvimento de capacidades; (ii) não duplicação de esforços; (iii) maiores possibilidades de colaboração, que podem contribuir para o desenvolvimento e a modernização das capacidades do Sistema de Forças Nacional (SFN), no médio/longo prazo.

23 Ao nível do MDN, as primeiras iniciativas remontam a 2007 e a EI&DD é apenas de 2008, faltando ainda formalizar o respectivo plano de implementação.

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3.1.3 Modernização da Gestão no âmbito da Defesa Nacional

Em linha com o Conceito Estratégico de Defesa Nacional (CEDN), que aponta para a necessidade de interoperabilidade e capacidade de atuação em rede (MDN, 2003), tem-se procedido à modernização de processos nas FFAA, com a introdução do Sistema Integrado de Gestão (SIG). Apesar de ainda não abranger todas as áreas (e.g. a dos recursos humanos está em desenvolvi-mento), a introdução do SIG aumentou a eficiência operacional, a qualidade dos serviços, o trabalho colaborativo e a responsabilidade (accountability), transparência e informação aos vários níveis de decisão. No entanto, o sistema necessita de ser complementado com capacidades de análise da informação e de partilha de conhecimento.

3.2 Estado-Maior General das Forças Armadas

O Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA) participa na avaliação das propostas de projeto e na identificação de temas de interesse da RTO e da EDA.

No EMGFA não existem estruturas dedicadas à inovação, na sua globa-lidade, designadamente na vertente da coordenação e promoção de atividades de inovação. Como refere Magalhães (2011), o EMGFA continua a não ter o conhecimento total de todas as atividades desenvolvidas no âmbito da I&D, uma vez que os Ramos mantêm uma estreita ligação com o MDN/DGAIED – que é a entidade financiadora – não informando o EMGFA de muitos dos projetos ou interesses nesta área. No entanto, têm a noção de que são poucos os projetos que cumprem os requisitos, as metas e os prazos propostos.

A atividade de investigação está centralizada no Centro de Investigação de Segurança e Defesa (CISDI), criado em 2009, que tem por missão «pesquisar, refletir e difundir novos conhecimentos em domínios de interesse para as For-ças Armadas, a Guarda Nacional Republicana e para o País em geral» (IESM, 2009). A investigação está orientada para a formulação doutrinária e para a visão prospetiva sobre a Segurança Nacional, a Defesa Nacional, o País, e os relacionamentos bilaterais, regionais e globais onde Portugal está envolvido 24. Dada a sua muito recente criação, ainda não é possível avaliar o impacto das suas atividades (R. Gomes, 2011).

3.3 Marinha

Na Marinha as atividades de IDI estão centradas no Centro de Investigação Naval (CINAV) e no Instituto Hidrográfico (IH).

24 Ou seja, o CISDI abrange a vertente não-tecnológica da investigação.

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O CINAV, criado em 2010, tem como principais objetivos: promover a IDI em áreas de interesse da Marinha; promover e apoiar as atividades de IDI da Escola Naval (EN); coordenar e supervisionar as atividades de IDI desen-volvidas na Marinha, sem prejuízo das competências do IH (CEMA, 2010).

O Instituto Hidrográfico (IH), criado em 1960, assegura atividades de IDI relacionadas com as ciências e as tecnologias do mar, tanto em apoio às operações militares navais, como à sociedade em geral (com resultados muito profícuos, como no apoio à extensão da plataforma continental e no apoio à Proteção Civil no desastre de Entre-os-Rios). As suas responsabilidades têm vindo a evoluir, tendo assumido, em 2002, a qualidade de Laboratório do Estado (LdE) (IH, 2010), o único ao nível das FFAA. Atualmente possui um quadro de mais de 350 pessoas e um orçamento superior a 12M€.

A atual capacidade do IH e os resultados que apresenta são a demonstração inequívoca do impacto, tanto das expectativas da Defesa, como da estratégia definida relativamente ao mar (PCM, 2006), no estímulo à inovação num do-mínio das FFAA.

Da análise da I&D da Marinha constata-se que, pela sua natureza de LdE, a maioria dos projetos e das verbas (cerca de 90%) estão ligados ao IH. Em 2009, apenas um dos seis projetos que não estavam no âmbito do IH – o pro-jeto sobre o Sistema de Treino, Demonstração e Desenvolvimento de Conceitos de Operação com Múltiplos Veículos Submarinos (SEACON) – assumia algum significado 25 (380m€), com verbas que foram atribuídas pela DGAIED e pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. De igual modo, era redu-zido o número de pessoas envolvido em atividades de I&D (inferior a trinta).

Contudo, em 2010, era notório o significativo incremento de projetos em que o CINAV se estava a envolver, tanto de índole nacional (sete com finan-ciamento externo, sete com financiamento interno), como internacional (dois aprovados, quatro propostos e um em fase de aprovação – o NECSAVE), a maior parte deles ligados ao desenvolvimento de capacidades da Marinha.

Perceção do impactoExiste a perceção de que a Marinha é inovadora (Oliveira, 2010). As

grandes inovações só têm sido possíveis em períodos em que a conjuntura foi propícia, no entanto a pequena inovação vai ocorrendo. Os seus resultados têm sido mais visíveis ao nível da estratégia estrutural (e.g. a junção da informática com as comunicações traduziu-se numa substancial melhoria de eficácia e de

25 Para um projecto de índole tecnológica.

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qualidade) e ao nível da estratégia operacional (e.g. a entrada ao serviço das fragatas da classe Vasco da Gama, que implicaram grandes mudanças qualita-tivas de processos, ritmos de trabalho e de eficácia).

Um bom exemplo de inovação é o Sistema Integrado para a Gestão de Prioridades de Reparação e Afetação de Recursos (SINGRAR), baseado em métodos de Inteligência Artificial, que tem contribuído para um aumento signi-ficativo da eficácia e da qualidade do apoio à decisão, na componente logística dos navios da Marinha (Marques et al., 2003).

Foi ainda identificado que a I&D pode contribuir para: (i) a definição de requisitos para a atualização dos equipamentos; (ii) a integração de novas tecnologias, nomeadamente através de projetos com o Sistema Científico e Tecnológico Nacional (SCTN), que proporcionam o conhecimento científico necessário; (iii) alcançar os objetivos de investigação dos EESPUM; (iv) o CD&E (e.g. na Marinha foi desenvolvido um protótipo de um UAV para provar que a sua utilização seria viável e mais eficiente, em situações específicas, do que a utilização de navios); (v) a inovação nos processos (e.g. como forma de colmatar a redução de pessoal).

3.4 Exército

No Exército, o Centro de Investigação da Academia Militar (CINAMIL) pro-move e coordena a I&D nas áreas de interesse do Exército e da Academia Militar.

Através das Normas de I&D do Exército (NIDEx) (EME, 2005) estão ainda constituídos Núcleos de I&D nos Órgãos Centrais de Administração e Direção (OCAD), Direções e nos estabelecimentos de excelência do Exército (e.g. Instituto Geográfico do Exército (IGeoE) e Laboratório de Bromatologia e Defesa Biológica do Exército (LBDB), que têm como responsabilidades, entre outras: promover a investigação no seio do seu núcleo, criando as condições essenciais para esse efeito; acompanhar o desenvolvimento dos projetos propos-tos; participar, no processo de auto-avaliação às estruturas de I&D do Exército.

Da análise à I&D no Exército constata-se a reduzida dimensão dos mon-tantes envolvidos, quer em termos de projetos individuais (o de maior monta é da ordem de 85m€), quer em termos globais (175m€), assim como a escassa quantidade de pessoal empregue.

Destaca-se, no entanto, o significado para a atividade militar dos projetos ligados à Cartografia, à Defesa NBQR e às demolições de emergência pelo uso controlado de explosivos. Este último, onde apenas se investiram 14m€ – por não implicar desenvolvimento de componentes tecnológicos – possibilitou a

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adaptação de metodologias e técnicas existentes no meio civil e a sua difusão no meio militar, as quais visam um aumento de eficácia em «demolições de emergência», nomeadamente no âmbito das designadas «Outras Missões de Interesse Público» (G. Gomes, 2010).

Perceção do impactoSubsiste a perceção de que existe inovação no Exército e de que esta é

uma condição essencial para a sustentabilidade e valorização do Exército (Gil, 2010) (Serafino, 2010), como demonstram as transformações operadas recen-temente. O Exército teve de se adaptar, em tempo e por sua iniciativa, aos novos paradigmas de emprego, o que lhe permitiu responder às novas missões com os recursos disponíveis. O Exército passou a definir os seus projetos de reequipamento em função de um planeamento de médio-longo prazo, que se tem traduzido em maior eficácia.

A introdução de novos equipamentos e sistemas também têm sido fatores de inovação (e.g. os Carros de Combate Leopard 2A6; o Sistema de Informa-ções e Comunicações Tático (SIC-T)), tendo levado à adoção de formas de sustentação logística e de formação de pessoal mais eficazes e eficientes.

Os sistemas de Visualização Gráfica e Estudo do Terreno 26(VIGRESTE) e de Informação para o Comando e Controlo do Exército (SICCE) são dois bons exemplos de inovação, desde a sua fase de conceção até à sua difusão, cuja utilização proporcionou ganhos de eficiência e qualidade no treino e igualmente de eficácia nas operações (Melo, 2009).

No Instituto Geográfico do Exército (IGeoE), a inovação de produtos, como o Sistema de Estações GPS de Referências Virtuais (SERVIR), tem tido um impacto relevante no aumento de produtividade, na diminuição dos custos, na melhoria da imagem externa da instituição militar e no contributo para o desenvolvimento da sociedade em geral (Soares, 2010).

No LBDB a criação das equipas de defesa biológica do Exército introduziu inovação na área dos conceitos, dos equipamentos de proteção e das tecnologias de deteção, assim como reforçou a motivação dos militares envolvidos, o que se tem repercutido no ciclo de inovação, dado que os mesmos se têm tornado em agentes de inovação. Por outro lado, a participação num projeto cooperativo internacional, financiado pela EDA, possibilitou a aquisição de tecnologias avançadas e o contacto com outras que têm potencial de aplicação nas FFAA (Gonçalves, 2010).

26 Conjunto de aplicações informáticas, que utilizando um modelo digital do terreno, simula e providencia situações tácticas realistas e dinâmicas do campo de batalha.

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3.5 Força Aérea Portuguesa

Na Força Aérea Portuguesa (FAP), o recentemente criado Centro de Investigação da Academia da Força Aérea (CIAFA) assegura o planeamento, execução e controlo de projetos de IDI, orientados para responder a necessi-dades específicas da FAP e da Academia da Força Aérea.

Da análise à I&D na Força Aérea constata-se que, em 2009, dos oito projetos em curso, apenas o de Investigação e Tecnologia em Veículos Aéreos Não-Tripulados (PITVANT) tinham uma verba significativa 27 (2M€), atribuída pela DGAIED, e dois deles diziam respeito à participação em eventos. Todavia, verifica-se uma tendência para uma evolução relevante a partir de 2010, não só no número de projetos e nas verbas envolvidas, que ascendem a cerca de 5M€ de financiamento externo (Costa, 2011), mas também no nível de participação nacional e internacional (e.g. o projeto NECSAVE).

Para além destes projetos e fora do âmbito da I&T, decorrem no Centro de Formação Militar e Técnica da Força Aérea (CFMTFA) um conjunto de atividades de inovação inseridas nalguns cursos, como condição de aprovação, com resultados de desenvolvimento de produtos, que têm potencial ou já estão a ser utilizados na atividade da FAP.

Nestas atividades, são os formandos que propõem o seu trabalho, o qual tem de procurar responder a uma lacuna de capacidade ou à necessidade da sua otimização, seja em termos de eficácia, eficiência ou qualidade. Existe um orientador do Centro e outro externo ligado à área de desenvolvimento, que poderá ser de uma Unidade ou de uma Direção Técnica. Para além do apoio do Centro, são as Direções Técnicas que financiam estes projetos, proporcio-nam orientações, desde o início da sua execução, e aprovam o produto final, caso se confirme a sua adequabilidade e benefício. Estão também definidos procedimentos para o registo de patentes (Lopes, 2010).

De uma forma implícita, é possível identificar neste exemplo do CFMTFA as seguintes funções ligadas à inovação 28: os representantes das Direções Técnicas, das Unidades e do Centro, estão a atuar como uma Equipa de Apoio à Inovação; o representante do Centro desempenha as funções de «orientador» e de «impulsionador»; a Direção Técnica está a atuar como «patrocinadora» e o seu representante ou o da Unidade, ainda exerce a função de «desafiador».

27 Para um projecto de cariz tecnológico.28 Vide descrição destas funções em 5.4.

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Perceção da inovaçãoDa entrevista a Rolo (2010) foi percetível que a FAP iniciou, em 2009, um

processo de mudança visando a inovação, nas áreas de Consciência Organizacional e de planeamento estratégico, tendo já sido possível definir um novo modelo or-ganizacional e de gestão, com indicadores de apoio à decisão aos diversos níveis.

A inovação tem ocorrido, sobretudo ao nível de processos, com a introdução de novos aviões (e.g. os F-16 e os C-295) e helicópteros (e.g. os EH-101), e com a evolução de novas armas, como os Sistemas Aéreos Não Tripulados (SANT).

Existe a perceção (Costa, 2011) de que o CIAFA, e por extrapolação, a FAP são inovadores. Dos fatores que mais têm contribuído para essa inovação são o planeamento, a gestão do risco nos processos inovadores, a qualificação profissional dos recursos humanos e as parcerias, principalmente com univer-sidades e empresas.

3.6. Síntese

Existe inovação nas FFAA e esta tem contribuído para a sustentabilidade e valorização das FFAA. No entanto a inovação não é sistemática, na gene-ralidade tem sido induzida pela introdução de novos equipamentos ou tem-se centrado na vertente organizacional.

A EI&DD e os Centros de Investigação dos EESPUM conferiram a credibili-dade e o enquadramento necessários às atividades de I&D. Contudo, estas inicia-tivas são muito recentes, pelo que os resultados são, inevitavelmente, limitados.

Assim, com exceção de exemplos pontuais e de situações específicas – como é o caso do IH, do IGeOE, do LBDB e do CFMTFA – o contributo da inovação nas FFAA tem sido limitado em termos de resultados, relativamente às suas necessidades e potencialidades.

Na Tabela 7 encontram-se resumidas as potencialidades identificadas nas FFAA para o desenvolvimento da inovação.

Tabela 7 – Potencialidades das FFAA relativamente à inovação.

PotencialidadesExiste EI&DD.Está definido uma ampla lista de áreas de interesse, alinhadas com a EDA e com a RTO.A actividade de I&D está estruturada.Existe historial de inovação com ganhos de eficácia, eficiência, qualidade e responsabilidade (accountability) e transparência.A estrutura hierarquizada das FFAA pode facilitar a implementação e o alinhamento das decisões.Diversidade de competências, de actividades e de equipamentos tecnologicamente avançados.SIG assegura transparência, interligação e partilha da informação.Existem actividades de cooperação com o exterior.IH, IGeOE, LBDB e CFMTFA são embriões da inovação.Existe formação conjunta.

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4. As lacunas na inovação das FFAA que condicionam a sua utilização e o seu efeito na sustentabilidade e valorização das FFAA

Para além da Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável (PCM, 2007) e do Simplex (UCMA, 2010), que são de aplicação genérica à função pública, o Plano Tecnológico apenas menciona que «as Forças Armadas pos-suem valências de investigação que podem 29 ser valorizadas» (UCPT, 2005: 18) e o CEDN apenas faz alusão à necessidade de se melhorarem os níveis de exigência e eficiência da política de I&DD, para que esta contribua para o desenvolvimento económico nacional (MDN, 2003: 9.6).

4.1 Na EI&DD

Analisando a EI&DD à luz do ciclo de inovação, constatam-se algumas limitações que, à partida, condicionam os seus potenciais resultados em termos de inovação. A EI&DD apenas assegura a geração e a seleção da ideia – no en-tanto unicamente pela vertente de «need pull» – e parte do seu desenvolvimento e sustentação – dado que está centrada no nível de I&T 30. Assim, constituem-se como desafios, assumidos na EI&DD: (i) a evolução da I&D para níveis que possibilitem a Transferência Tecnológica em capacidades militares; (ii) a acomodação do conceito de «technology push» (MDN/DGAIED, 2010: 33).

Por outro lado, seria desejável incrementar o envolvimento de potenciais parceiros externos de desenvolvimento (indústria/empresas), logo desde as fases iniciais dos projetos (e não apenas quando a investigação está avançada), de modo a aumentar o seu interesse e participação em domínios pouco conhecidos 31.

4.2 No processo de inovação, a partir de um inquérito

O inquérito efetuado teve por finalidade a avaliação das vulnerabilidades do processo de inovação existente nas FFAA. É constituído por vinte cinco perguntas, subdivididas em grupos de cinco, cada um associado a uma das fases da inovação.

O inquérito foi realizado, on-line, ao universo dos Oficiais discentes e que prestam serviço no IESM. A amostra obtida envolve 182 respostas (26,8% da

29 Sublinhado do autor.30 Admite-se que, em «determinadas condições de relevância para as capacidades militares […]» (MDN/

DGAIED, 2010: 8), poderão interessar projectos que envolvam Transferência Tecnológica. 31 Monteiro (2010) e Gonçalves (2010) descreveram, cada um, uma situação de aproximação a empresas na-

cionais que desconheciam que os seus produtos poderiam ter potencial de aplicação em domínios da defesa (e.g. a aplicação de fibras na protecção individual contra projécteis e na detecção de agentes biológicos).

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Marinha, 53,1% do Exército e 20,2% da Força Aérea), assim distribuídas: 49 Oficiais da Marinha (8 Capitães-de-Mar-e-Guerra (CMG), 13 Oficiais Superiores (OfSup), 28 Primeiros-Tenentes), 96 do Exército (14 Coronéis (Cor), 26 OfSup e 56 Capitães) e 37 da Força Aérea (6 Cor, 9 OfSup e 22 Capitães).

No Gráfico 1 encontra-se a distribuição do valor médio das respostas. Observa-se que todas se afastam da concordância total, não chegando mesmo ao nível 3 de concordância parcial, e que a maior parte (14 em 25) não atinge um nível superior a 2.5, correspondente à concordância mínima.

Fonte: Autor

Gráfico 1 – Distribuição do valor médio das respostas.

No Gráfico 2 é visível a agregação das cinco respostas associadas a cada fase da inovação, através da média: (i) por Ramos; (ii) por Postos. Apesar de uma pequena variação (no máximo inferior a 0,4) nas respostas dos Ramos e dos Postos – as da Marinha e dos CMG e Cor num nível superior de con-cordância e as do Exército e dos OfSup, Cap e Primeiros-Tenentes num nível inferior – verifica-se unanimidade relativamente ao seguinte: a fase de geração de ideias é a que reúne a melhor apreciação, enquanto as de seleção e difusão das ideias são as piores avaliadas.

Fonte: Autor

Gráfico 2 – Médias por fase da inovação, por Ramos e por postos.

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Através da agregação global – tanto em termos de média, como de mediana (Gráfico 3) – constata-se que, com exceção da fase de geração de ideias, todas as outras não alcançam o nível mínimo de concordância.

Na seleção de ideias, as piores avaliações relacionam-se com limitações: de comunicação (P6); nos critérios e nos processos existentes (P8 e P9); e na aceitação do risco (P10).

Gráfico 3 – Média e mediana por fase de inovação.

Fonte: Autor

Na implementação das ideias, as maiores vulnerabilidades ocorrem: no apoio necessário para o desenvolvimento de novas ideias (P12), particularmente quando estas envolvem risco (P13); e igualmente na comunicação dos potenciais riscos e benefícios dessas ideias (P15).

Ao nível da sustentação, os piores condicionamentos residem: na formação necessária para integrar inovações (P17), assim como na aprendizagem com os erros e na celebração dos sucessos (P20).

Ao nível da difusão, as maiores limitações centram-se: na partilha de lições aprendidas (P23) e nos processos existentes para promover a difusão do conhecimento (P25).

4.3 No processo de inovação, a partir das entrevistas

4.3.1 DGAIED

Da entrevista à DGAIED (Monteiro, 2010) foram identificados outros de-safios à implementação da EI&DD. Faltam recursos humanos e financeiros – a LPM tem disponibilizado menos de 1% para a I&D, quando o recomendável deveria ser de 2% (EU, 2008).

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Por outro lado, a visão de curto prazo, normalmente ligada à obtenção de capacidades, é incompatível com o período necessário para o seu desenvolvi-mento através da I&D. E a falta de alinhamento que, na generalidade, existe entre o planeamento de I&D e o da obtenção de capacidades, reduz o potencial de utilização da I&DD.

Verifica-se uma elevada compartimentação de domínios ao nível dos Ministérios, que torna difícil a obtenção de financiamentos fora da Defesa. Constata-se algum desconhecimento, mas também alguma indiferença, do SCTN e da indústria relativamente às necessidades da Defesa, explicável, em parte, pela especificidade e reduzida dimensão do potencial mercado de aquisições nacionais. Como tal, alguns projetos de I&D não são sustentados até às fases finais, por não haver quem as financie.

Finalmente, é reduzida a capacidade de cada uma das entidades que de-senvolvem investigação nas FFAA e, sobretudo, não existe articulação entre elas, o que diminui o impacto dos seus resultados – os projetos dos centros de investigação dos EESPUM, na generalidade, envolvem pesquisa básica, uma pequena parte inclui pesquisa aplicada e somente uma parte ainda mais restrita alcança a fase de demonstração, em cooperação com entidades do SCTN ou da BTID.

4.3.2 EMAM

Abreu (2011) considera que, apesar de inovadoras, as FFAA podiam inovar mais. Não está implementado um processo sistemático de inovação, pelo que esta ocorre esporadicamente.

Até há poucos anos, as FFAA ainda eram as impulsionadoras em domínios como a Liderança, a Estratégia e a Organização. Hoje o mundo civil começa a assumir o protagonismo nestas áreas, o mesmo se passando com a inovação, que ainda não alcançou o mesmo nível no meio militar.

Esta tendência pode traduzir uma perda de competências internas. To-davia, estas terão sempre de existir, tanto pelos conhecimentos específicos requeridos, como pelos requisitos únicos de qualidade, fiabilidade e segurança do meio militar.

As FFAA devem continuar a liderar em áreas que lhe são específicas, mesmo através de colaborações com a sociedade civil. 32

32 Nota do autor: na Academia Militar o mestrado em Guerra da Informação é um destes exemplos.

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Para tal, falta promover uma cultura de inovação, onde esta seja reco-nhecida e onde seja garantida uma melhor sustentação às suas atividades e ao pessoal nela envolvido.

Por outro lado, é essencial melhorar a formação, nalguns casos logo a partir das EN/Academias (e.g. no apoio à decisão) e abrir estes cursos à sociedade civil . As próprias EN/Academias deviam interagir mais entre si, sobretudo ao nível da fase dos mestrados, de modo a potenciar os escassos recursos de cada Ramo.

Por último, seria importante que a I&DD fosse acolhida no âmbito da Fundação para a Ciência e Tecnologia. Tal representaria o reconhecimento de que a investigação de natureza militar tem interesse para a sociedade civil.

4.3.3 EMGFANo EMGFA existe a perceção de que a inovação nas FFAA está normal-

mente ligada à capacidade dos EESPUM terem potencial humano para criar, desenvolver e propor projetos I&D, e que muitos dos projetos com origem nas FFAA são pontuais e ligados a indivíduos específicos, que depois são desconti-nuados porque os seus «criadores» deixaram de lhes estar associados. Por outro lado, os projetos estão dependentes do desenvolvimento tecnológico externo, ou seja dependentes de terceiros, o que põe em risco a sua sustentabilidade (Magalhães, 2011).

4.3.4 MarinhaDe acordo com (Oliveira, 2010), surge resistência à mudança quando não

é difundido o racional que lhe está subjacente ou por apego à tradição. Geralmente, não é assegurada a completa sustentação da inovação até à sua

integração na organização, isto é, até que o utilizador a adote de forma irreversível. Outros fatores condicionantes residem na falta de autonomia administra-

tiva e financeira e na reduzida estrutura tecnológica do CINAV, bem como nos diversos impedimentos legais para a obtenção de recursos para I&D (e.g. não é possível contratar bolseiros, adquirir equipamentos e obter receitas em resultado das atividades de investigação).

A pequena abrangência da EI&DD, relativamente à amplitude da I&D nas FFAA, e o subaproveitamento da participação na EDA e na RTO não potenciam o desenvolvimento da inovação nas FFAA.

4.3.5 ExércitoGil (2010) considera que os resultados de I&D têm sido reduzidos e di-

ficilmente poderão ser melhores no futuro, dados os escassos investimentos e a pequena capacidade das estruturas existentes.

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É necessário aumentar as sinergias entre Ramos, desenvolvendo projetos conjuntos, como os de simuladores, os de C2 e os de comunicações. A inte-gração ou uniformização de sistemas, como é o caso do SIG, é desejável, não só porque aumenta a eficiência, mas também porque facilita a colaboração. É necessário evoluir neste sentido noutras áreas, designadamente na gestão da informação e no apoio ao planeamento.

Ainda segundo Gil (2010), para se catalisar a inovação é necessário me-lhorar a estrutura organizacional que lhe está associada, a atitude perante a inovação, a formação e a utilização das pessoas, bem como a identificação das vulnerabilidades para se poder orientar o que precisa ser inovado.

Os maiores obstáculos à inovação residem: (i) na falta de suporte político, que perdure no médio/longo prazo, para que o planeamento possa ser consequente; (ii) na dificuldade em se encontrarem parceiros credíveis que permitam ampliar os resultados – a indústria nacional é limitada e a estrangeira é dispendiosa; (iii) na dificuldade das empresas corresponderem aos requisitos de capacidades das FFAA, por apresentarem soluções pouco flexíveis e adaptáveis (e.g. quando se pretende um simulador adaptável aos vários sistemas de armas por mudança de software, as empresas apenas apresentam soluções com capacidade de simular um único sistema de armas); (iv) nas limitadas capacidades de desenvolvimento de projetos, como no caso do «Soldado do Futuro – Soldier Portapower Pack (SPP)» ou do SIC-T, cujas necessidades de I&D ou de financiamento impos-sibilitaram a sua prossecução ao nível do Ramo.

Serafino (2010) considera que, apesar de haver abertura para a inovação, é necessário aumentar a auto-consciência relativamente à importância de se inovar, medir, planear e de se perspetivar a mais longo prazo.

O planeamento necessita ser feito com abordagens que reduzam a incerteza (e.g. com base em cenários de atuação, em vez de prioridades de reequipamento), com metodologias que aumentem a sua eficácia (e.g. através da sincronização de vetores de desenvolvimento como a Doutrina, a Organização, o Treino e o Material), utilizando ferramentas que aumentem a sua eficiência e o nível de coordenação e de colaboração (e.g. o Enterprise Project Management).

De acordo com Gonçalves (2010), a morosidade e a rigidez de procedi-mentos administrativos existentes ligados à I&D reduzem a disponibilidade para a inovação, pelo que é necessário melhorar a eficiência organizacional. Soares (2010) confirma esta vulnerabilidade.

Importa, pois, racionalizar os fluxos de informação e introduzir instru-mentos de monitorização destes fluxos, que melhorem a eficiência e agilizem os procedimentos.

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Por outro lado, Gonçalves (2010) considera que, apesar de a inovação em si ser bem-vinda, as perplexidades e a falta de auto-confiança nas capacidades das FFAA para inovar condicionam a sua efetiva implementação. Existe ainda a perceção de que o esforço na inovação é inconsequente ou de pouco retorno.

Para se promover um maior envolvimento das FFAA, seria vantajoso enquadrar os seus recursos de I&D num programa que privilegiasse mais o desenvolvimento de capacidades, do que apenas a investigação. O programa deveria considerar potenciais «nichos» de desenvolvimento, menos cobertos pelas agências internacionais, de modo a contribuir para um outro nível de inovação. E nos concursos, deveria ser incluído um critério de seleção que ponderasse o seu impacto na promoção da inovação nas FFAA.

O acesso efetivo a formação avançada, nomeadamente em centros estran-geiros especializados em áreas de interesse para as FFAA, devia constar do programa de I&D do MDN.

É necessária uma maior comunicação entre os Ramos sobre a inovação nas FFAA. A comunicação e o conhecimento mútuo entre os agentes de inovação das FFAA proporcionarão oportunidades de geração de sinergias.

Seria ainda vantajoso haver uma maior interação com o SCTN, pelo que o networking deveria ser mais promovido.

Por último, existe uma limitação na transposição das ideias e resultados da inovação para o plano do desenvolvimento tecnológico. Numa primeira fase, este problema poderia ser resolvido se os objetivos dos projetos de inovação incorporassem a criação de patentes. No entanto, o processo de registo de pa-tentes é complexo, pelo que deveria receber o apoio do MDN.

4.3.6 FAP

A cultura organizacional e os processos de comunicação foram igualmen-te considerados como obstáculos à inovação, assim como foi identificada a necessidade de melhorar as sinergias entre Ramos, entre Ramos e o EMGFA, entre as FFAA e o MDN e entre as FFAA e entidades externas (Rolo, 2010).

Costa (2011) considera que a inovação será realidade quando existir uma política para a sua gestão. É igualmente necessário estabelecer um ambiente favorável à produção criativa, o que envolve valores e atitudes que precisam ser comunicados, tanto às chefias intermédias, como aos seus subordinados. Envolve ainda sinais claros de liderança, bem como formação contínua e atu-alizada, potenciada pela participação em missões e estruturas internacionais, e pela interação com o SCTN e com a BTID. Por fim, é necessária a promoção de uma cultura organizacional onde a inovação seja premiada.

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4.4 Na Avaliação

Nas FFAA, a avaliação do impacto da inovação na sua sustentabilidade e valorização, na generalidade, não tem sido feita ou só tem sido efetuada nos seus resultados mais evidentes (e.g. número de teses ou de artigos realizados).

A natureza subjetiva e ampla do processo de inovação torna difícil a moni-torização das atividades de inovação nas organizações públicas (NESTA, 2008: 8). Contudo, já existem sistemas de avaliação do desempenho e do potencial de inovação que, com alguma adaptação, se podem aplicar às FFAA (e.g. CO-TEC, 2007), e começam a surgir sistemas vocacionados para as organizações governamentais, incluindo as de Defesa (e.g NESTA, 2008). 33

Para além de indicadores de resultados diretos, estes sistemas utilizam indicadores apriorísticos, ligados aos fatores que influenciam a inovação (e.g. competências e recursos existentes; cooperação com entidades externas), que permitem perspetivar a provável performance futura, sem que tenha que de-correr um período de tempo entre a aplicação de uma estratégia de inovação e a obtenção dos correspondentes resultados 34. Do ponto de vista da gestão interna, os indicadores a priori permitem introduzir correções que minimizam o risco de uma inovação. De uma perspetiva externa, reforçam a responsabili-zação (accountability) e transparência do previsível impacto da difusão dessa inovação (ANAO, 2009).

Neste sentido, a medição anual de indicadores apriorísticos, como os que se apresentam na Tabela 11 – que permitem avaliar a evolução do potencial de inovação nas FFAA – conjugada com a de indicadores de resultados, como os que constam na Tabela 4, permitiria efetuar uma avaliação contínua do impacto da inovação na sustentabilidade e valorização das FFAA.

4.5 Na articulação e nas estruturas

Recentemente, a DGAIED tomou a iniciativa de criar fora conjuntos das FFAA, do SCTN e da BTID, com a finalidade de promover o desenvolvimento de projetos de I&D. Para além de ser uma iniciativa que necessita de maior consolidação e continuidade, não enquadra todas as atividades de inovação.

Todavia, esta função da DGAIED não substitui a necessidade de articula-ção das atividades de inovação entre os Ramos e entre os Ramos e o EMGFA,

33 As NIDEx (EME, 2005: 77) incluem alguns indicadores que permitem avaliar parte do impacto da ino-vação nas FFAA.

34 Como acontece com os indicadores que descrevem a performance relativa a um período de tempo anterior, ou seja, com os indicadores a posteriori.

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que proporcione o desenvolvimento de sinergias, a partilha de resultados e de lições e evite a duplicação inútil de iniciativas.

Por outro lado, as estruturas existentes no EMGFA e nos Ramos não só não asseguram esta articulação, como estão focalizadas na I&D (a maior parte apenas na I&T), o que é insuficiente para se atingir a inovação, quer em termos de vias, quer em termos de integração de resultados. E, para além disso, estas estruturas não alcançam o grau de multifuncionalidade, supervisão, ligação e apoio próximo, necessários para que não se percam oportunidades de inovação e para que estas estejam coordenadas com o planeamento de capacidades.

Finalmente, a DGAIED, o EMGFA e os Ramos não estão interligados por nenhum SIC que contribua para a gestão da inovação e para a sua conjugação com o planeamento de capacidades. A criação de um módulo específico no SIG poderia resolver esta lacuna.

4.6 Síntese

Na Tabela 8 encontram-se resumidas as atuais vulnerabilidades das FFAA para o desenvolvimento da inovação.

Tabela 8 – Vulnerabilidades das FFAA relativamente à inovação.

Vulnerabilidades1 EI&DD limitada.2 Falta de priorização de áreas de interesse. 3 Cultura organizacional pouco orientada para a inovação. 4 Resistência à mudança e dúvida quanto aos benefícios. 5 Atitude perante o risco. 6 Comunicação interna insuficiente. 7 Inexistência de um plano de inovação articulado com a obtenção de capacidades. 8 Liderança pouco envolvida e orientada para a inovação. 9 Falta de alinhamento da organização para a inovação. 10 Reduzida formação para a inovação. 11 Avaliação incompleta das competências. 12 SICs que pouco potenciam a inovação. 13 Cooperação reduzida e não sistemática com entidades exteriores. 14 Formas limitadas de networking. 15 Lacunas na estrutura organizacional para a inovação. 16 Lacunas na gestão da inovação. 17 Pouca partilha de conhecimentos, experiências e lições aprendidas. 18 Incorporação não sistemática de lições aprendidas nas actividades. 19 Falta de articulação e colaboração entre Ramos. 20 Avaliação incompleta do processo de inovação e do seu impacto. 21 Limitada valorização dos resultados da inovação.

5. Modelo estratégico de desenvolvimento da inovação nas FFAA

A definição do modelo estratégico de desenvolvimento da inovação das FFAA decorre da análise aos fatores que influenciam positivamente ou ameaçam

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a inovação (Capítulo 1), das oportunidades da inovação para a sustentabilidade e valorização das FFAA (Capítulo 2), bem como das atuais potencialidades (Capítulo 3) e vulnerabilidades (Capítulo 4) das FFAA na implementação da inovação. Ou seja, este modelo tem por base e visa complementar o que já existe – a EI&DD e as estruturas de I&D.

Para a definição do modelo foi utilizado o Balanced Scorecard (Kaplan et al., 1996) 35 e foram estabelecidos os seguintes elementos caracterizadores: Missão, Visão, Valores, Objetivos Estratégicos para a Inovação (OEI), «Rotinas» de suporte aos OEI e Medidas para as alcançar.

5.1 Missão, Valores, Visão e OEI

No âmbito da Missão foi considerada a seguinte atribuição: «Desenvolver a inovação nas FFAA para aumentar a sua Sustentabilidade e Valorização».

Os Valores que lhe estão associados são: «Valor Público, Iniciativa, Capa-cidade de assumir Riscos, Criatividade, Experimentação, Adaptabilidade, Apren-dizagem, Melhoria Contínua, Trabalho em Equipa, Colaboração, Comunicação».

A Visão adotada é a seguinte: «Aumentar a capacidade das FFAA inte-ragirem com os seus contextos mutáveis e de corresponderem às expectativas da comunidade com a qual se relaciona, cumprindo a sua missão com eficácia, gerindo os recursos disponibilizados com responsabilidade e transparência e melhorando a eficiência dos seus processos e a qualidade dos seus resultados».

Assim, os vetores que orientam a estratégia são: (i) «Cumprir a missão com eficácia»; (ii) «Aumentar a qualidade dos resultados»; (iii) «Gerir os recursos disponibilizados com responsabilidade (accountability) e transparência»; (iv) «Aumentar a eficiência dos processos internos».

Neste sentido, para a redução das vulnerabilidades (V) identificadas estabeleceram-se 12 OEI, que se inserem nas perspetivas A&C, Inovação (I) e Recursos (R), como se apresenta na Tabela 9.

5.2 Mapa estratégico

O Mapa Estratégico da Figura 5 traduz a estratégia de desenvolvimento da inovação nas FFAA, materializada nos OEI, na sua relação causa-efeito e no seu impacto nos objetivos de sustentabilidade e valorização das FFAA (vide Capítulo 2 e Tabela 4).

36 Dada a sua eficácia e simplicidade de traduzir a estratégia em termos operacionais e de avaliar a sua concretização, bem como de alinhar a organização com essa estratégia.

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a inovação Como alavanCa da sustEntabilidadE E valorização das forças armadas

Tabela 9 – Objectivos estratégicos para a inovação

Fonte: Autor

Perspectiva ObjectivoEstratégico para a inovação V* a eliminar

A&C 1. Desenvolver uma cultura de inovação 3, 4, 5, 6,7 A&C 2. Desenvolver a liderança orientada para a inovação 8 A&C 3. Alinhar a organização para a inovação 9 A&C 4. Desenvolver o trabalho em equipa e a partilha de conhecimento 17, 19 A&C 5. Desenvolver estruturas e funções orientadas para a inovação 15 A&C e R 6. Atrair, envolver, avaliar, formar e reter pessoal orientado para a inovação 10 A&C 7. Desenvolver competências para a inovação 11 A&C 8. Desenvolver o activo informação 12 A&C e R 9. Desenvolver a cooperação externa 13, 14 I 10. Aumentar a gestão do conhecimento 17 I 11. Implementar processos de gestão da inovação e do risco que lhe está associado 2, 5, 16, 20, 21 I 12. Desenvolver os processos de aprendizagem e de melhoria contínua 18

* O modelo estratégico que se propõe, em si mesmo, visa eliminar a vulnerabilidade 1.Fonte: Autor

Figura 5 – Desenvolvimento da inovação e o seu impacto na sustentabilidade e valorização das FFAA.

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A perspetiva «Valor para a Comunidade» situa-se no topo, dado que o principal objetivo das FFAA é a criação de Valor Público, traduzido no integral cumprimento das missões que lhe estão atribuídas.

Na perspetiva seguinte incluem-se os objetivos que conferem valor às FFAA, como o «aumentar o produto e a prontidão operacional» e «ser refe-rência nacional nos domínios específicos» (e.g. Apoio à Decisão, Liderança, Estratégia, Cartografia, Defesa NBQR, utilização de Engenhos Explosivos). Note-se, através da figura, que é nesta perspetiva e na anterior que os vetores da eficácia e da qualidade (aqui materializada no valor e utilidade dos resul-tados) têm um maior impacto.

A perspetiva Recursos engloba os objetivos que contribuem para a criação de valor, nomeadamente para a satisfação dos requisitos de capacidades das FFAA através: (i) da atração e retenção de pessoal com o nível e diversidade de competências requeridos; (ii) do incremento dos recursos financeiros disponíveis para esse fim; (iii) da obtenção e da manutenção de infra-estruturas e materiais adequados a essa finalidade. A «cooperação com o exterior» é considerado um recurso, dado que complementa as competências e capacidades das FFAA.

Os recursos disponíveis serão tanto maiores quanto maior for a otimiza-ção dos Processos Internos. Observe-se na figura que, nesta perspetiva e na anterior, os vetores eficiência e accountability têm um maior impacto, apesar de os de eficácia e qualidade (aqui mais centrada na redução de erros) também contribuírem para esses objetivos.

O posicionamento na base, quer da Inovação, quer da A&C, reflete que uma melhoria nos respetivos indicadores implicará melhorias na performance das restantes perspetivas. É ainda possível observar-se o grau de desenvolvi-mento dos objetivos que se inserem nestas perspetivas, avaliado com base na análise efetuada no Capítulo 4.

5.3 «Rotinas», Medidas e Indicadores

Para se alcançarem os OEI foram desenvolvidas as seguintes «Rotinas»:

OEI «Rotinas» para a implementação da inovação nas FFAA

1 1.1. Estimular a iniciativa e a capacidade de assumir riscos, sem penalizar os insucessos. 1.2. Promover a adaptabilidade, a experimentação, a aprendizagem e a melhoria contínua através dos Valores da Instituição. 1.3. Promover a comunicação interna e a integração de perspectivas diversas. 1.4. Monitorizar a envolvente externa na definição e execução da estratégia. 1.5. Estabelecer um plano de acção para a inovação, articulado com as aquisições da LPM.

Tabela 10 – «Rotinas» para a implementação da inovação nas FFAA.

(continua)

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Estas «Rotinas» requerem a implementação das seguintes Medidas: Tabela 11 – Medidas para a concretização das «rotinas» para inovação.

2 2.1. Promover a Liderança para a inovação. 2.2. Promover, sistematicamente, a adaptação das estruturas de liderança, de modo a lidar com a mudança. 2.3. Criar condições para que surjam líderes no desenvolvimento de actividades inovadoras, através da responsabilização e autonomia das pessoas. 2.4. Envolver a Liderança aos, diversos níveis, na gestão da inovação. 3 3.1. Estimular e apoiar a iniciativa inovadora. 4 4.1. Desenvolver o Trabalho em Equipa orientado para a inovação. 4.2. Promover a partilha de conhecimento. 5 5.1. Implementar uma estrutura organizacional que facilite e promova a inovação. 6 6.1. Implementar uma política de Pessoal que: (1) atraia, seleccione e recrute pessoal orientado para a inovação; (2) estimule o envolvimento do pessoal na inovação; (4) avalie o desempenho na inovação; (5) retenha o pessoal com melhor desempenho no plano da inovação. 7 7.1. Proceder, de forma sistemática, à identificação, avaliação e planeamento da evolução das competências organizacionais. 7.2. Desenvolver competências específicas na gestão das actividades de inovação. 7.3. Desenvolver competências técnicas adequadas ao desempenho de actividades de inovação. 8 8.1. Desenvolver Sistemas de Informação e Comunicação que potenciem a inovação. 9 9.1. Desenvolver acções de cooperação sistemática em inovação com entidades externas. 9.2. Dinamizar múltiplas formas de networking. 10 10.1. Incrementar processos de gestão do conhecimento. 11 11.1. Desenvolver processos sistemáticos de acompanhamento e controlo dos projectos de inovação. 11.2. Desenvolver processos sistemáticos de geração, selecção, desenvolvimento, sustentação e difusão de ideias. 11.3. Adicionar regras para a constituição das equipas de projecto. 11.4. Desenvolver processos de avaliação sistemática das actividades de inovação. 11.5. Assegurar a segurança da informação na sua partilha com entidades externas, bem como a protecção e valorização do capital intelectual e dos resultados das actividades de inovação. 12 12.1. Incorporar nas actividades as aprendizagens obtidas. 12.2. Desenvolver mecanismos sistemáticos de adopção de boas práticas.

Medidas para a concretização das «rotinas» para inovação Indicador 1.1 Não penalizar o insucesso nas iniciativas de inovação. Inquérito sobre admissi- bilidade do erro. Seleccionar as ideias em função do seu potencial e disponibilizar # actividades apoiadas tempo e recursos para actividades não programadas. não programadas. Valorizar a iniciativa e a capacidade de empreender na Peso da iniciativa nas avaliação de desempenho. avaliações 1.2 Promover e difundir os Valores associados à inovação. Inquérito para avaliar o impacto.

(continua)

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1.3 Efectuar diagnósticos internos para melhorar a partilha de informação. # Diagnósticos internos. Aumentar o número de instrumentos de comunicação interna # Instrumentos ligados à inovação: caixas de sugestões; reuniões e eventos de # Sugestões de novas divulgação; newsletters; folhetos e notas de serviço; ideias placards informativos. % Eventos e notícias. 1.4 Aumentar: o acompanhamento de reuniões de sociedades # de actividades de científicas e tecnológicas; a participação em feiras internacionais; prospecção; a análise de literatura ou de pesquisa de patentes; o envolvimento # ideias identificadas. em comunidades de boas práticas. 1.5 Estabelecer um plano, articulado com as aquisições da LPM, Efectuado ou não? para a actividade global de inovação, em particular do portfolio de projectos, que inclua: a correspondente afectação orçamental; marcos cronológicos para obtenção de resultados; a medição da performance relativamente ao planeado; a identificação dos desvios e das suas causas, assim como a sua correcção. 2.1 Difundir a Visão para a inovação. Inquérito sobre o impacto Mobilizar contribuições internas para implementar a inovação. # de oferecimentos 2.2 Aumentar a formação dos Comandantes/Directores/Chefes em % que recebeu formação gestão da mudança e gestão da inovação. 2.3 Facultar aos proponentes de ideias a possibilidade de gerir um % projectos em que os conjunto de recursos e de mobilizar outros colaboradores para o proponentes lideraram desenvolvimento dessas ideias. os projectos. 2.4 Aumentar o envolvimento dos Comandantes/Directores/Chefes % de tempo com inovação na gestão da inovação, designadamente na definição de objectivos vs tarefas de rotina. específicos e na monitorização da execução das medidas para a sua concretização. 3.1 Implementar concursos e desafios de ideias. # concursos e desafios. # de proponentes Disponibilizar tempo e recursos para o desenvolvimento de ideias. % tempo e recursos. Valorizar a inovação na avaliação de desempenho. % pessoal valorizado. 4.1 Aumentar o número de projectos transversais às Unidades dos Rácio face ao número Ramos e transversais aos Ramos. total de projectos. 4.2 Aumentar a interacção intra- e inter-Ramos na partilha de # eventos e interacções conhecimentos, experiências e lições aprendidas. on-line. Criar comunidades de prática intra- e inter-Ramos. # comunidades de prática. Instalar SIC que facilitem a difusão da informação e a partilha # Ferramentas. do conhecimento do tipo Web 2.0. Taxa de utilização Criar uma página dedicada à inovação, com informação Taxa de utilização. relacionada e acesso à base de dados (e.g. às lições aprendidas). Criar um espaço na intranet de diálogo e partilha de Taxa de utilização. conhecimentos e ideias. 5.1 Implementar as funções definidas na Tabela 12. Efectuado ou não? Aumentar a capacidade das estruturas existentes, inclusivamente # protocolos. através de protocolos, de modo a disponibilizar: equipamentos # estruturas melhoradas. para o desenvolvimento e experimentação de ideias; bibliotecas técnicas, incluindo acesso on-line; sistemas.

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6.1 Na atracção, selecção, recrutamento e retenção de pessoal % pessoal recrutado pela contemplar competências para a inovação (e.g. em liderança e inovação. trabalho em equipa; gestão do conhecimento; gestão do risco; % pessoal mantido pela engenharia organizacional; investigação científica e tecnológica; inovação. áreas tecnológicas relevantes para as FFAA). % pessoal avaliado e Incluir na avaliação e no desenvolvimento do desempenho o auto-avaliado. critério da inovação. Na atribuição de funções e na rotação de pessoal contemplar a Critério considerado difusão de conhecimentos e de competências para a inovação. (Sim/Não)? 7.1 Estabelecer um catálogo de competências e associá-las a áreas # competências funcionais. identificadas Estabelecer um plano de desenvolvimento de competências. Efectuado ou não? Incluir na base de dados de pessoal as respectivas Efectuado ou não? competências para a inovação. 7.2 Aumentar a formação em áreas afins à inovação como: % pessoal que recebeu comportamentais (e.g. liderança e trabalho em equipa;); gestão do formação específica. conhecimento; gestão do risco; engenharia organizacional; em investigação científica e tecnológica; gestão da propriedade intelectual; em tecnologias relevantes para as FFAA. 7.3 Associar pessoal interno a projectos de inovação contratados % projectos no exterior no exterior, de modo a integrar aprendizagens e resultados. com pessoal interno. Sustentar os órgãos de I&D existentes com recursos humanos % preenchimento do QO. adequados e assegurar a sua permanência durante um período Tempo médio de mínimo. permanência. 8.1 Instalar sistemas que facilitam o trabalho colaborativo, a # número, compatibilidade interpretação, a análise e a partilha de informação e de e grau de utilização. conhecimento (e.g. implementação do BSC; Enterprise Project Management; Data Mining). 9.1 Aumentar o número de parcerias com outras entidades nacionais ou % aumento. estrangeiras, procurando envolvê-las desde as fases iniciais dos projectos. Aumentar o número de projectos cooperativos nacionais ou % incremento. internacionais. Incrementar o número de formações externas nacionais ou % incremento. internacionais em áreas inovadoras. 9.2 Incentivar as redes informais de cooperação com entidades do # de contactos informais. SCTN, com associações profissionais e com ex-colaboradores. Incentivar a participação em associações científicas, % pessoal ligado. tecnológicas e profissionais. 10.1 Associar áreas de conhecimentos a grupos de especialistas, # grupos constituídos. para que façam a gestão e actualização desses conhecimentos. % informação actualizada. Aumentar os repositórios de conhecimento, de modo a reduzir % de incremento. a dependência de pessoas específicas, através de: base de % pessoas que transferiram dados (e.g. com ideias, boas práticas, lições aprendidas, conhecimento. conhecimentos adquiridos na envolvente externa); publicações; seminários e sessões de divulgação de experiências e resultados; comunidades de boas práticas.

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11.1 Aumentar o acompanhamento activo dos projectos de inovação, Rácio entre projectos de modo a assegurar a sua adequação aos objectivos. iniciados e concluídos. 11.2 Incrementar os processos de geração de ideias: caixas de # de inovações resultantes sugestões (físicas ou virtuais); concursos; desafios; sessões de de processos internos brainstorming; disponibilizar espaços experimentais. de captação de ideias. Melhorar a selecção de ideias: (i) priorizar as áreas de interesse; Rácio entre ideias (ii) associar a necessidades reais; (iii) incluir processos de data seleccionadas e difundidas. mining (e.g. de exploração de bases de dados sobre inovações); (iv) incluir análises de risco, simulação/experimentação. Melhorar os processos de desenvolvimento, sustentação e difusão Rácio entre ideias das ideias através: (i) do acompanhamento de Equipas de iniciadas e difundidas. Apoio à Inovação; (ii) da atribuição dos recursos necessários até à integração das ideias; (iii) disponibilizar espaços de experimentação; (iv) redução do risco através da utilização de espaços de experimentação ou do faseamento da difusão. Aumentar o portfolio de projectos de inovação. % incremento. Aumentar o orçamento para as actividades de inovação. % acréscimo. Implementar no SIG um módulo para a gestão da inovação. Efectuado ou não? 11.3 Incluir uma regra para a designação dos líderes das equipas de Efectuado ou não? projecto em função das suas competências específicas, técnicas e comportamentais (capacidade de liderança, experiência em projectos semelhantes, capacidade de mobilizar recursos externos) e do seu comprometimento com o projecto. Incluir uma regra que associe a cada projecto um Impulsionador Efectuado ou não? e um Desafiador, com as funções indicadas na Tabela 12. 11.4 Efectuar avaliações anuais da evolução do potencial de inovação Efectuado ou não? nas FFAA (com base nestes indicadores) e do seu impacto na sustentabilidade e valorização das FFAA (indicadores da Tabela 4). Divulgar os resultados. 11.5 Salvaguardar a segurança da informação e intensificar a valori- Partilha de informação zação dos resultados da inovação através da protecção da proprie- segura? dade intelectual e industrial, nomeadamente através do estabe- # direitos de autor. lecimento de direitos de autor e do registo de patentes. # de patentes registadas. 12.1 Efectuar a revisão contínua de processos em função da medição % processos revistos. de indicadores de performance. Incrementar a identificação de lições aprendidas (e.g em resulta- % acréscimo. do de erros, não conformidades, desvios ou reclamações) e assegurar a sua divulgação. 12.2 Proceder à oportuna difusão dos conhecimentos provenientes da Tempo decorrido. aprendizagem individual ou colectiva. Aumentar a participação sistemática em grupos de boas práticas. % de incremento. Incrementar as funções de identificação de boas práticas na % incremento. envolvente externa.

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5.4 Estrutura organizacional para a inovação

Para se desenvolver a inovação nas FFAA e alcançar uma cultura na or-ganização que a sustente, o processo de inovação deve ser assumido por toda a organização e integrado nas diversas atividades realizadas.

No entanto, é necessário que existam agentes (Tabela 12) que promovam, facili-tem, suportem, e, até questionem, de uma forma próxima, as iniciativas de inovação.

Agente Função Posicionamento O Orientador: Orientar: Recebeu formação sobre o Apoiar as pessoas quando surgem com uma ideia, Distribuídos pelas FFAA (dese- processo de inovação e de indicando o que é necessário para que a mesma javelmente, um por Unidade). como o promover, e conhece possa ser aceite. Estabelecer a ligação aos Impul- os contactos que podem apoiar sionadores, no sentido de se encontrar um Sponsor. o proponente de uma ideia. O Impulsionador: Impulsionar: Apoia a inovação. Disponibi- Assumir a causa da ideia. Reduzir os riscos. Na Unidade ou no Ramo de liza tempo, tem capacidade Apoiar a ultrapassar obstáculos à sua implemen- onde surgiu a ideia ou no para defender a ideia e para tação. EMGFA. reduzir riscos e ultrapassar obstáculos. O Sponsor: Suportar: Tem um nível de autoridade Sustentar o desenvolvimento da ideia. MDN, EMGFA, Ramos, adequado e pode disponibilizar Comandantes/Directores / recursos que permitem que Chefes das Unidades. a ideia possa ser desenvolvida. O Desafiador: Contraditório: Opõem-se à adopção da ide- Identificar os inconvenientes e os desafios à Na Unidade ou no Ramo de ia e exerce o contraditório. implementação da ideia, procurando bloquear onde surgiu a ideia ou no a sua adopção, quando se perspectivem impactos EMGFA. negativos. As Equipas de Apoio à Ino- Coordenar e Supervisionar: vação são constituídas: • Apoiar os proponentes das ideias, assim como Uma no EMGFA e uma em (i) Ao nível dos Ramos, por os restantes responsáveis ligados à inovação; cada Ramo. um representante do planea- • Canalizar as ideias, em função do tipo de ino- mento do respectivo Estado- vação envolvida: baseada na invenção, para os -Maior (EM), por um do centros de Investigação; baseada na difusão, Centro de Investigação para as Unidades com maior afinidade para as respectivo e por um de cada desenvolver; OCAD (incluindo o da • Contribuir para a selecção e sustentação de componente operacional); ideias; (ii) Ao nível do EMGFA, • Monitorizar o desenvolvimento e a difusão de por um representante do ideias; planeamento do EM e por • Adequar as ideias aos requisitos das FFAA; um do CISDI. • Estabelecer ligações entre as entidades Os membros da equipa podem envolvidas; desempenhar ou não outras • Constituir-se como ponto de ligação com Equi- funções nas FFAA. pas análogas, quer dos Ramos, quer do EMGFA, nomeadamente em projectos transversais; • No seu âmbito, constituir-se como elo de coordenação de lições aprendidas, necessidades de inovação e de ideias; • No seu âmbito, administrar o sistema de gestão de ideias e de necessidades de inovação.

Tabela 12 - Agentes e funções relacionadas com a inovação nas FFAA.

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Estas funções, que vão para além das desempenhadas pelas estruturas de I&D existentes – os centros de investigação dos EESPUM, o IH, o IGeoE e o LBDB – deverão pois ser assumidas nas FFAA, assim como deverão ser cons-tituídas as Equipas de Apoio à Inovação. Contudo, importa salientar que, não sendo as funções mutuamente exclusivas, a mesma pessoa poderá desempenhar mais do que uma destas funções.

6. Conclusões

Existem fatores, tangíveis e intangíveis, que bloqueiam ou que fomentam a inovação no meio militar, que foram identificados no Capítulo 1, tendo por base exemplos da história contemporânea e dos países selecionados.

Concluiu-se que o contributo individual, por si só, é insuficiente para que as ideias geradas sejam aplicadas e transformadas em valor, para a comunidade e para as FFAA, e para que os seus efeitos perdurem, sobretudo após os seus criadores deixarem de estar envolvidos. Muito do potencial de inovação será perdido se não for adotado um modelo de «inovação aberta» e de interação em cadeia, adequado à especificidade e à elevada incerteza do ambiente militar e da sua envolvente, que inclua as múltiplas vias de inovação e os fatores e os processos que a fomentam.

No Capítulo 2 foi caracterizada a sustentabilidade e valorização das FFAA. A partir de lições da história contemporânea e de orientações de países selecionados, concluiu-se que a inovação assume uma importância crescente na capacidade das FFAA se adaptarem ao atual ambiente estratégico de rápida mudança, de corresponderem às expectativas que sobre elas imperam e de evoluírem. A condição intrinsecamente prospetiva da inovação contribui para uma visão além do imediato ou do curto prazo, que absorve a maior parte dos elementos das organizações, inclusivamente das FFAA, permitindo reduzir a incerteza e antecipar e preparar a mudança.

Isto é, foi confirmado que as oportunidades associadas à inovação podem melhorar a sustentabilidade e valorização das FFAA.

Todavia, embora ocorra inovação relevante nas FFAA nacionais, que contribui para a sua sustentabilidade e valorização, o nível de concretização poderá e deverá ser aumentado, atendendo às potencialidades existentes no seu seio. Estas foram identificadas no Capítulo 3, em resultado da análise da documentação estruturante, dos projetos e das atividades de I&D em curso, assim como das entrevistas efetuadas.

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Neste contexto prosseguiu-se, no Capítulo 4, com a identificação das atuais vulnerabilidades das FFAA na implementação da inovação, tendo por base a análise da documentação estruturante, bem como do inquérito realizado a um universo de 182 Oficiais dos três Ramos e das entrevistas efetuadas.

Procurou-se, deste modo, contribuir para uma maior consciência quanto à importância de se inovar, assim como para uma maior confiança no potencial de inovação das FFAA no seu todo.

Contudo, para fazer face àquelas vulnerabilidades, tirando partido das potencialidades existentes, ficou patente ser necessário atuar ao nível interno das FFAA e, simultaneamente, receber do nível enquadrante das FFAA uma mais explícita orientação.

Com esse intuito foi definido (Capítulo 5), para o nível interno, um modelo de desenvolvimento da inovação, que visa uma melhor utilização do potencial existente nas FFAA no contributo para a sua sustentabilidade e valorização.

Finalmente, ao nível enquadrante das FFAA, importa considerar que o sucesso da inovação nas FFAA será muito influenciado pelas estratégias nacio-nais, de âmbito geral e particular, que sejam adotadas, como tem acontecido com a Estratégia Nacional para o Mar. Quanto mais integrado for o papel das FFAA na abordagem holística de emprego dos instrumentos do Estado, maiores serão as oportunidades e maior será a vontade de desenvolver e utilizar a sua capacidade de inovação.

RecomendaçõesFace ao exposto, recomenda-se o seguinte:

• Nas FFAA, assumir o processo de inovação de forma sistemática, asso-ciando-o às suas atividades e integrando-o na sua estratégia, planeamento e cultura. Para tal, é essencial: (i) liderar o processo a todos os níveis; (ii) gerir a totalidade do processo de inovação, assegurando uma contínua avaliação do seu impacto na sustentabilidade e valorização das FFAA; (iii) criar Equipas de Apoio à Inovação, ao nível do EMGFA e de cada Ramo, e adotar as funções relacionadas com a inovação (definidas na Tabela 12).

• Aumentar a colaboração intra- e inter-Ramos (inclusivamente ao nível das EN/Academias), bem como entre os Ramos e o EMGFA, designa-damente no desenvolvimento de projetos transversais e na partilha de conhecimentos, experiências e lições aprendidas.

• Utilizar a inovação na satisfação dos requisitos de capacidades. Para tal: (i) interligar a inovação com o planeamento de capacidades; (ii) orientar os

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investimentos em inovação, preferencialmente 36, para a pesquisa aplicada e para o desenvolvimento de capacidades; (iii) abranger o espectro total da inovação, tecnológica e não-tecnológica, de uma forma integrada (IDI e CD&E); (iv) continuar a promover a cooperação externa no sentido de aumentar sinergias; (v) incrementar o envolvimento de potenciais parceiros de desenvolvimento (indústria/empresas), desde as fases iniciais dos projetos.

• Equilibrar a aquisição de produtos COTS e o desenvolvimento de projetos externos com capacidades internas, que limitem a dependência do exterior e que também permitam: (i) identificar ideias promissoras provenientes de qualquer origem e adaptá-las aos requisitos de capacidades das FFAA; (ii) efetuar a análise prospetiva da evolução do conhecimento, da tecno-logia e do ambiente estratégico, de modo a aproveitar oportunidades e minimizar vulnerabilidades disruptivas de capacidades.

• Priorizar as áreas de interesse, com a finalidade de: (i) alcançar uma equili-brada combinação de amplitude – que permita acompanhar e lidar com a sua evolução – com profundidade em áreas «nicho» selecionadas; (ii) sustentar a cooperação multinacional, assegurando o adequado nível de reciprocidade e de participação em projetos de desenvolvimento de capacidades comuns, sem comprometer o desenvolvimento de capacidades nacionais.

• Promover a cooperação interinstitucional entre a Segurança e a Defesa, de modo a alargar o potencial âmbito de aplicação e, consequentemente, a aumentar os recursos disponíveis para a inovação.

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37 Não eliminar a pesquisa básica, de modo a possibilitar a aquisição de conhecimentos específicos e a exploração de oportunidades inesperadas.

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ProElium – rEvista CiEntífiCa da aCadEmia militar

LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E ACRÓNIMOS

A&C Aprendizagem e Crescimento BG Grupos de Batalha da UE / EU Battle GroupsBTID Base Tecnológica e Industrial de DefesaC2 Comando e ControloCD&E Concept Development and ExperimentationCEDN Conceito Estratégico de Defesa NacionalCEM Conceito Estratégico MilitarCFMTFA Centro de Formação Militar e Técnica da Força Aérea CIAFA Centro de Investigação da Academia da Força AéreaCINAMIL Centro de Investigação da Academia Militar CINAV Centro de Investigação NavalCISDI Centro de Investigação de Segurança e DefesaCMG Capitão-de-Mar-e-GuerraCor CoronéisCOTS Commercial-off-the-shelf CPOG Curso de Promoção a Oficial GeneralDGAIED Direcção-Geral de Armamento e Infra-Estruturas de DefesaEDA Agência Europeia de Defesa / European Defense AgencyEESPUM Estabelecimentos de Ensino Superior Público Universitário Militar EI&DD Estratégia de investigação e desenvolvimento de defesa EMAM Estrutura de Missão para os Assuntos do MarEM Estado-MaiorEMGFA Estado-Maior General das Forças ArmadasEN Escola NavalEUA Estados Unidos da AméricaFAP Força Aérea PortuguesaFCS Factores Críticos de Sucesso FFAA Forças ArmadasGG Grande GuerraGPS Sistema de Posicionamento Global / Global Positioning SystemH HipóteseI InovaçãoI&D Investigação e DesenvolvimentoI&DD Investigação e Desenvolvimento de DefesaI&T Investigação e Tecnologia

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a inovação Como alavanCa da sustEntabilidadE E valorização das forças armadas

IDI Investigação, Desenvolvimento e InovaçãoIESM Instituto de Estudos Superiores MilitaresIGeoE Instituto Geográfico do Exército IH Instituto HidrográficoLBDB Laboratório de Bromatologia e Defesa Biológica do ExércitoLdE Laboratório do EstadoLPM Lei de Programação MilitarMAE Modos de Acção EstratégicaMDN Ministério da Defesa NacionalNATO Organização do Tratado do Atlântico Norte / North Atlantic Treaty OrganisationNBQR Nuclear, Bacteriológica, Química e Radiológica NNEC NATO Networked-Enabled CapabilityNECSAVE Network Enabled Cooperation System of Autonomous VehiclesNIDEx Normas de I&D do Exército NRF Forças de Resposta da NATO / NATO Response ForcesOCAD Órgãos Centrais de Administração e DirecçãoOEI Objectivos Estratégicos para a InovaçãoOfSup Oficiais SuperioresPIB Produto Interno BrutoPITVANT Projecto de Investigação e Tecnologia em Veículos Aéreos Não-TripuladosPSDC Política de Defesa e de Segurança Comum QC Questão CentralQD Questão Derivada / Questões DerivadasR RecursosRCM Resolução do Conselho de MinistrosRTO Research and Technology OrganizationSANT Sistemas Aéreos Não TripuladosSCTN Sistema Científico e Tecnológico NacionalSEACON Sistema de Treino, Demonstração e Desenvolvimento de Conceitos de Operação com Múltiplos Veículos SubmarinosSERVIR Sistema de Estações GPS de Referências Virtuais SFN Sistema de Forças NacionalSICCE Sistema de Informação para o Comando e Controlo do ExércitoSIC Sistema de Informação e Comunicação

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SIC-T Sistema de Informações e Comunicações TácticoSIG Sistema Integrado de GestãoSIMOC Sistema de Monitorização Operacional de Correntes CosteirasSINGRAR Sistema Integrado para a Gestão de Prioridades de Reparação e Afectação de Recursos SPP Soldier Portapower PackTNO Organização de Pesquisa Aplicada da HolandaUAV Veículo aéreo não-tripulado / Unmanned Air Vehicle UE União Europeia / European UnionV VulnerabilidadesVIGRESTE Visualização Gráfica e Estudo do Terreno

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o Contributo do E-govErnmEnt Para a Promoção da Paz E EstabilidadE

Pedro Ferreira da Silva (*)

Major de Artilharia

ABSTRACT

We argue that e-Government can significantly contribute to international peace and security, since it is a tool that has an impact on the empowerment of States. In fact, initial studies on the importance of e-Government were focused OECD states, and didn’t address its use in developing countries, and particularly in conflit states. With this article we intend to contribute to the debate about the benefits e-Government to fragile states, and consequently, to international peace and security.

We started out paper by analysing failed states, and its implications for international peace and security. Then we focused on the ways to empower the role of the state. After this analysis, we addressed e-Government, observing it’s objectives and capabilities. We then defined the dimensions to present our argument, using the multidimensional analysis model typologies, and we also used a tool for the demonstration of causal relationships.

We conclude that e-government contributes to the increase of state capa-city, either at central level, whether at the local level. We also argued that the implementation of e-Government in failed states directly contributes to good government of public assets and public finance, increases the investment in human capital, as well as improves the administrative control of the territory by increasing transparency, while establishing the rule of law.

(*) Major de Artilharia do Exército Português. Licenciado em Ciências Militares pela Academia Militar, Li-cenciado em Relações Internacionais, Pós-Graduado e Mestre em Gestão Avançada de Recursos Humanos, e Doutor em Ciências Sociais, na especialidade de Relações Internacionais pelo ISCSP/UTL. Para além das funções militares, atualmente é também Investigador no CINAMIL e no CAPP, e Professor Convidado no ISCSP/UTL e no ISLA.

o Contributo do E-govErnmEnt Para a Promoção da Paz E EstabilidadE

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By impact State capacities, e-Government acts on the causes of state’s weakness, contributing to state’ functioning and empowerment. Thus, by dealing with the causes, it reduces the sovereignty gap that characterizes failing states. This is why we argue that e-Government has a significant a role in international peace and security.

Keywords: International Security, Sovereignty, Failed States, E-Government.

RESUMO

Com o presente trabalho pretendemos defender que o e-Government pode contribuir significativamente para a paz e segurança internacionais, uma vez que se constitui numa ferramenta que aumenta a capacidade dos Estados. De facto, os estudos iniciais sobre a importância do e-Government cedo se centraram nos estados mais ricos, esquecendo a sua possível utilização em países em vias de desenvolvimento, e em particular, em Estados vitimas de conflitos. Assim, com o presente trabalho pretendemos então contribuir para o debate sobre os benefícios do e-Government para o aumento de capacidades dos Estados, e consequentemente, para a paz e segurança internacionais.

Para abordar o nosso problema começamos por analisar os Estados fa-lhados, bem como as suas implicações para a paz e segurança internacionais. Seguidamente, debruçamo-nos sobre as formas como se pode contribuir para o aumento de capacidades dos Estados, abordando brevemente os modelos de desenvolvimento propostos. Tendo efectuado esta análise, centramo-nos no e-Government, verificando os seus objectivos e capacidades. Tendo definido as varias dimensões, para o teste do nosso argumento usamos um modelo de análise de tipologias multidimensionais, o qual pode ser descrito através do uso de vários indicadores, usando também uma ferramenta para a demonstração das relações causais.

Com este trabalho concluímos que o e-Government contribui para o aumento da capacidade do Estado, seja ao nível central, seja ao nível local. Verificamos também que a implementação do e-Government em estados falhados contribui directamente para uma boa gestão dos bens públicos e das finanças públicas, para o investimento no capital humano, bem como uma melhoria ao nível do controlo administrativo do território, através do aumento da transparência, para o estabelecimento do Estado de direito. Ao ter impacto este modelo de desen-volvimento das capacidades do Estado, o e-Government actua nas causas da sua fragilidade, contribuindo para a funcionalidade e empowerment do Estado.

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Deste modo, por actuar nas causas, reduz o hiato de soberania que caracteriza os Estados falhados. É por esta via que afirmamos que o e-Government pode tem um papel significativo na paz e segurança internacional.

Palavras-Chave: Segurança Internacional, Soberania, Estados Falhados, E-Government.

1. INTRODUÇÃO

Com o presente trabalho pretendemos defender que o e-Government pode contribuir significativamente para a paz e segurança internacionais, uma vez que se constitui numa ferramenta que aumenta a capacidade dos Estados. O argumento parte do principio que uma das causas da insegurança reside na fragilidade dos Estados, levando a uma desassociação entre a soberania de facto e a soberania de jure. Este gap de soberania é multidimensional, requerendo também uma resposta multinível. Com este trabalho pretendemos analisar o contributo de uma ferramenta – o e-Government – para capacitar os Estados. As ciências sociais e as ciências exactas viveram durante muito tempo de costas voltadas. Os cientistas sociais, e neste caso em particular os cientistas políticos, sempre se dedicaram a analisar os fenómenos sociais que contribuem para o falhanço dos Estados, apresentando também respostas sociais para estes problemas. Por outro lado, as ciências exactas sempre se debruçaram na componente tecnológica, em algo que possa ser mensurado e reproduzido em laboratório. Para a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico [OCDE] (2003, 2005) A utilização de tecnologia para aumen-tar rentabilidade, seja das empresas, seja mais tarde dos próprios Estados, esteve sempre associada a Estados com algum nível de desenvolvimento tecnológico. Consequentemente, os estudos iniciais sobre a importância – e mesmo sobre o imperativo – do e-Government cedo se centraram nos estados mais ricos, em particular, nos estados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). Entre estes trabalhos salientamos a extensa publicação da OECD E-Government Studies, como a obra “The e-Government Imperative” (OECD, The e-Government Imperative , 2003) ou “E-Government for Better Government” (OECD, E-Government for Better Government, 2005).Com a crescente disseminação das tecnologias da informação, um número crescente de pessoas começou a ter acesso a um bem – a internet – que até

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então apenas se encontrava disponível nos países desenvolvidos. A generali-zação do acesso a estas tecnologias permitiu efectuar avanços significativos, contornando as barreiras, que até então se colocavam ao desenvolvimento (Sealy, 2003, p. 339). Assim, um conjunto de investigadores começou a estudar a forma de ultrapassar o fosso do desenvolvimento através do uso das tecnologias emergentes. Em simultâneo, começaram a aparecer correntes que defendiam o apro-fundamento das tecnologias de informação, usando-as para contribuir para a aproximação entre os Estados e os Cidadãos. De facto, existe hoje uma pressão generalizada para que os governos e a administração pública em geral facultem um serviço público mais rápido e de melhor qualidade (PWC Consulting, 2001, p. 5). É neste contexto que aparecem estudos sobre e-citizenship, e-democracy, e-legislatures e mesmo sobre a ciberpolítica nas relações internacionais (Holliday, 2002, p. 324). Desta forma, começa a ser aprofundada uma linha de investigação sobre o impacto do uso das tec-nologias de informação no desenvolvimento das capacidades dos Estados, em particular dos mais frágeis. Esta corrente foi ganhando uma importância cada vez maior, uma vez que estes se constituíam como uma fonte de ins-tabilidade que – fruto dos processos da globalização – começava a afectar toda a comunidade internacional. Na perspectiva metodológica, para a demonstração das relações causais procu-ramos seguir o modelo proposto por Castro (2009), uma vez que a utilização de uma ferramenta clara e demonstrativa destas relações constitui-se como um elemento de orientação essencial, o qual permite destrinçar estruturas internas dos vários conceitos e respectivas dimensões. No que concerne à avaliação do nosso argumento, pretendemos usar o modelo de análise de tipologias multidimensionais proposto por Collier, Laport e Seawright (2010), o qual pode ser descrito através do uso de vários indicadores. Com o presente trabalho pretendemos então contribuir para o debate sobre os benefícios do e-Government para o aumento de capacidades dos Esta-dos, e consequentemente, para a paz e segurança internacionais. Para tal, no capítulo um abordamos a problemática dos Estados falhados, bem como as suas implicações para a paz e segurança internacionais. No segundo capítulo, debruçamo-nos sobre as formas como se pode contribuir para o aumento de capacidades dos Estados, abordando brevemente os modelos de desenvolvimento propostos. No terceiro capítulo aprofundamos o conceito de e-Government, verificando os seus objectivos e capacidades. Por fim, no

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capítulo das conclusões, pretendemos demonstrar que o e-Government ajuda a construir capacidades, as quais se enquadram numa estratégia geral de re-dução do iato entre a soberania de jure e a soberania de facto, contribuindo assim para o fortalecimento de Estados falhados, o que tem repercussões na paz e segurança internacionais.

2. ESTADOS FALHADOS

Neste capitulo pretendemos abordar os Estados falhados, mostrando como eles se podem constituir como uma ameaça à paz e segurança internacionais. O falhanço destes Estados tem normalmente como origem a má governação, a corrupção, o abuso do poder, a debilidade das instituições e a ausência de responsabilização, conjugados e potenciados pela existência de conflitos regionais, os quais corroem as instituições estatais, levando muitas vezes ao seu desmoronamento (Conselho Europeu, 2003, p. 4). Outras circunstâncias contribuem também para esta situação, como a falta de autoridade ou legiti-midade do governo para ver aceites as decisões que tomou; a incapacidade de assegurar serviços básicos como saúde ou educação; a incapacidade de evitar um clima generalizado de desobediência ou de insurgência; a existên-cia de uma forte economia paralela que priva o Estado de recursos fiscais, entre outras (Rodrigues, 2005). Nestes Estados verificamos que existe uma lacuna entre a soberania reco-nhecida de jure pela comunidade internacional, e a capacidade de servir e proteger os seus cidadãos, ou seja, a soberania exercida de facto. A este diferencial denominamos hiato de soberania 2. A existência deste hiato, para além de não permitir a manutenção da ordem e providenciar os normais serviços do Estado aos seus habitantes, permite que um grupo reduzido de elementos actue impunemente dentro das fronteiras desse Estado “soberano”, dedicando-se a actividades criminosas e terroristas, sendo por isso o local ideal para a gestação e crescimento de movimentos ligados ao crime e ao terrorismo internacional (Ghani & Lockhart, 2008, p. 3-4). Quando pensamos em Estados falhados, vem-nos à memória situações como a Somália, Iraque ou Afeganistão e, automaticamente, somos levados a pensar que estes Estados representam uma clara excepção no sistema internacional.

2 No original, a expressão usada é “Sovereignty Gap”.

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No entanto, cerca de quarenta a sessenta Estados do mundo, onde vivem actualmente cerca de dois biliões de pessoas, registam sinais de regressão no poder do Estado, e estão perto da implosão ou já colapsaram (Ghani & Lockhart, 2008, p. 3). Para uma análise mais cuidada deste fenómeno, desde 2005 que a revista Foreign Policy 3, em cooperação com o The Fund for Peace 4, publica um índice dos Estados falhados. Na sua publicação de 2010, encontramos na lista sessenta países, dos quais vinte se encontram em estado crítico, vinte em risco, e os restantes vinte no limite, com possibilidade de se tornarem falhados. Em 2010, esta lista é encabeçada pela Somália, Chade e Sudão, por esta ordem. No entanto, parece-nos importante comparar esta lista de Estados falhados com a lista de países nucleares. Deste cruzamento de informação ressalta o Paquistão em 10º lugar, a Coreia do Norte em 19º lugar, ambos na categoria crítica (Foreign Policy, 2010). Percebemos, deste modo, a importância e impacto destes Estados na segurança internacional, não só por serem centros de gestão e operação de redes criminosas e ter-roristas, mas também porque nesta lista encontramos Estados detentores de armas nucleares que se encontram em risco de colapsar.

3. MODELOS DE DESENVOLVIMENTO

No presente capítulo pretendemos abordar as estratégias e modelos de de-senvolvimento de capacidades, que levem estes Estados a sair da situação onde se encontram. No entanto, e antes de ensaiarmos qualquer solução, urge primeiro dedicar algumas linhas às causas e origens deste fenómeno. Ghani e Lockhart identificam os padrões que conduzem um Estado para esta situação. Primeiro, a existência de um conflito prolongado, o qual produz uma disfuncionalidade do Estado, gerando implicações importantes na eco-nomia e na política, que se prolongam muito para além do fim do conflito armado. Com o conflito emergem grupos armados, os quais consolidam redes não estatais de administração do território que, conjugado com uma falta de transparência nas decisões tomadas pela elite governativa, minam a confiança das populações na actuação do próprio Estado. Quando a comunidade internacional intervém num conflito, em regra, essa intervenção centra-se em terminar o conflito armado tout court, encetando

3 Website: http://www.foreignpolicy.com. 4 Website: http://www.fundforpeace.org.

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negociações entre as partes com vista ao fim do conflito, e não nos mecanis-mos de funcionalidade do Estado. O enfoque não se situa no empowerment das populações, nem na compreensão da importância do funcionamento ins-titucional do Estado. Como resultado dos dois condicionalismos anteriores, a disfuncionalidade do Estado prolonga-se – e por vezes agrava-se – para além do fim do conflito. Deste modo, agrava-se a crise de confiança dos cidadãos no Estado, a qual muitas vezes é capitalizada para reincendiar o conflito.Mesmo quando não nos encontramos perante um conflito, e que por força disso não haja necessidade de negociação de um acordo de paz, o custo de uma governação perniciosa é imenso, levando à não identificação da popu-lação com o Estado. O enfoque encontra-se de facto na governação e não na falta de dinheiro, uma vez que este não é o motor que leva à redução da pobreza e consequente criação de riqueza. Por absurdo que pareça, o dinheiro abunda nestes países, como é prova os milhões de dólares em notas que saem semanalmente do Afeganistão para os bancos no Dubai, sendo similar a situ-ação no Líbano. Em alguns destes países, fruto da posse de matérias-primas essenciais, somas importantes são pagas pelas companhias exploradoras. O Sudão, o Congo e o Chade são exemplos destes países, onde existem recur-sos, dos quais são pagos dividendos aos Estados. O enfoque não se encontra na falta ou excesso de dinheiro, mas antes na forma como ele é aplicado. A globalização tira pois partido desta situação, uma vez que a potencia, pelos piores motivos. O síndroma da disfuncionalidade do Estado potencia o sur-gimento de uma rede criminal, paralela ao Estado, que opera com facilidade desde o narcotráfico, o tráfico de armas e de seres humanos, entre outras áreas preferenciais. Estas redes minam ainda mais o já fraco poder do Estado, levando ao aprofundamento da situação (Ghani & Lockhart, 2008, p. 81-82). Quando falamos em Estados falhados, somos sistematicamente arrastados para a questão da ajuda pública ao desenvolvimento, sendo postos perante a questão de aumento da ajuda, diminuição da ajuda ou o simples corte na ajuda internacional. Este debate volta a retirar o enfoque do real problema do Estado falhado, ou seja, do funcionamento do Estado. A questão funda-mental é – no nosso entender – a análise centrada não na ajuda, mas no seu impacto no funcionamento do Estado, mesmo porque, defende Costa Deus, o balanço de mais de três décadas de Cooperação não pode ser considerado como positivo, uma vez que existem bastantes casos onde o nível de desen-volvimento se mantém e, nalguns casos, regrediu (Costa Deus, 2008, p. 438-440). Assim, o não funcionamento do Estado, conjugado com as prementes necessidades das populações, leva as agências ocidentais a financiar e apoiar

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organizações não governamentais que, tendo como objectivo a satisfação imediata das necessidades do Estado, se substituem a este, minando ainda mais as instituições oficiais (Ghani & Lockhart, 2008, p. 85-98). Face a esta situação, os autores propõem uma visão multifuncional do Estado, abrindo assim o caminho para uma intervenção coordenada. Deste modo, são propostas dez funções essenciais, nas quais devem ser focadas as atenções das estratégias de construção. Nesse sentido, o caminho apresentado passa (i) pelo estabelecimento do Estado de direito; (ii) pela detenção do monopó-lio da violência; (iii) pela capacidade de exercício de um efectivo controlo administrativo; (iv) por uma boa gestão das finanças publicas; (v) pelo investimento no capital humano; (vi) pela criação de direitos de cidadania, através de uma política social; (vii) pela disponibilização de infra-estruturas de serviços; (viii) pela criação de uma economia de mercado; (ix) por uma boa gestão dos bens públicos; e (x) por um endividamento externo racional (Ghani & Lockhart, 2008, p. 124-139).Estas funções são atingidas através de um desenvolvimento de capacidades dos Estados. Este processo pode ser entendido como a capacidade das populações, das organizações e das sociedades de exercerem o seu governo de forma eficaz e eficiente. No entanto, temos assistido a um declínio de capacidades – em particular em África – o qual se deve essencialmente à (in)capacidade dos Estados (Nelson & Tejasvi, 2009, p. 2-5). É exactamente neste ponto que a teoria de Nelson e Tejasvi (2009) converge com Ghani e Lockhart (2008). No capítulo seguinte, observamos como o e-Government pode contribuir para o reforço do Estado, e deste modo para um aumento de capacidades, o qual reduz o hiato de soberania que caracteriza os Estados falhados.

4. O E-GOVERNMENT

No actual capítulo pretendemos caracterizar o e-Government, tentando perceber as eventuais possibilidades da sua aplicação em Estados menos desenvolvidos, centrando a nossa atenção nos Estados falhados. Naturalmente, começamos por definir o conceito de e-Government, sendo actualmente a literatura bastante fértil na sua definição. Podemos entender e-Government como o uso intensivo e generalizado de tecnologias da in-formação em governos, com o objectivo de melhorar a eficácia da máquina burocrática do Estado, promovendo ao mesmo tempo valores democráticos (Gil-García & Pardo, 2005, p. 187-188). Já Sinawong define e-Government

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como o uso de tecnologias de informação, em particular a internet, para conseguir um melhor governo. Posteriormente, o autor define governo como a capacidade de proporcionar serviços públicos e processos internos de uma forma mais eficaz (Sinawong, 2008, p. 973). Nengomasha por seu turno defende que o e-Government, por contribuir para uma cultura de eficácia do Estado, contribui também para uma maior transparência nos processos, aumentando assim a responsabilização dos Estados perante os seus cidadãos (Nengomasha, 2007, p. 1).Das definições apresentadas, podemos inferir que o e-Government se con-substancia pela utilização de tecnologias de informação, em particular da internet, com o objectivo de melhorar a eficácia do aparelho de um Estado, aumentando deste modo a transparência e a responsabilização. Sendo trans-versal, podemos dividir o uso da tecnologia em duas grandes áreas, (i) nas relações entre entidades do Estado, e (ii) nas relações entre o Estado e os seus cidadãos. De facto, é esta a visão de Shirin Madon, ao defender que a implementação do e-Government numa determinada sociedade se efectua em duas fases. Numa primeira fase, a implementação de sistemas tecnoló-gicos deve centrar-se nas redes intragovernamentais, ligando deste modo os vários serviços do Estado, e permitindo assim uma melhor articulação e estruturação da máquina burocrática. Numa segunda fase, a qual tem sempre de ser posterior à primeira, são desenvolvidas ferramentas e interfaces de conexão entre a sociedade e o Estado (Madon, 2005, p. 1). Na primeira fase de implementação do e-Government os Estados melhoram o seu nível de automação, aumentando também a quantidade de informação disponível aos utilizadores estatais. Esta fase ocorre naturalmente antes da disponibilização da ligação entre o Estado e os seus cidadãos, pois é aqui que são construídas as plataformas de comunicação entre os vários depar-tamentos do Estado. Ao mesmo tempo, e focando-nos em Estados menos desenvolvidos, percebemos que nesta primeira fase normalmente não existe uma infra-estrutura tecnológica que ligue todo o território, limitando-se muitas vezes às capitais. Deste modo, esta primeira fase compreende dentro de si mesma dois períodos de desenvolvimento. No primeiro são ligadas as instituições da administração central do Estado. Num segundo período, são ligadas as instituições da administração local, sendo desta forma que a rede tecnológica se vai, paulatinamente, implementado no território. Ao mesmo tempo que ocorre esta implementação, vai sendo dada a necessária forma-ção aos utilizadores, começando este processo pelo órgão de administração central e, posteriormente, aos órgãos de administração local. Deste modo, a

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implementação da primeira fase do e-Government traz já por si vantagens ao nível do investimento em infra-estruturas tecnológicas e no investimento na formação de pessoas.Neste quadro de referência, não nos podemos esquecer do cidadão comum, o qual tem prioridades bem diferentes do e-Government. Uma vez mais, Madon oferece-nos uma clara imagem das prioridades do cidadão comum indiano, as quais se centram no acesso a água potável, acesso a uma fonte estável de electricidade, ter um emprego, ser capaz de sustentar a sua família e, ter acesso a cuidados de saúde (Madon, 2005, p. 2). Estas prioridades de um cidadão comum são facilmente exportáveis para qualquer cidadão de um Estado falhado, bastando talvez acrescentar ao topo das suas prioridades a segurança. Assim, a implementação do e-Government está seguramente lon-ge das suas prioridades, tanto pela capacidade de aquisição de um terminal informático, como pela disponibilidade de um serviço de internet, tanto pelo conhecimento necessário para o operar. Para além destas barreiras, existem ainda obstáculos culturais, tanto na óptica da utilização das ferramentas, como também na consciencialização dos direitos de responsabilização do Estado (Loo, 2003, p. 5).Deste modo, a implementação de um projecto de e-Government deve ser sensível às realidades das populações, em particular das populações que residem em zonas de interior. Antes da implementação de qualquer projecto deve ser efectuado um estudo sobre os valores, crenças, estruturas sociais, e infra-estruturas disponíveis, permitindo assim desenhar uma arquitectura de implementação e do sistema que sejam compatíveis com a sociedade (Sealy, 2003, p. 352). Um exemplo de implementação da segunda fase, seguido em muitos países em vias de desenvolvimento, passa pela disponibilização de quiosques digitais, onde um conjunto de serviços básicos, como o acesso a comunicações telefónicas, internet, correio electrónico, pagamento de serviços e contribuições ao Estado, entre outras, são disponibilizados às populações. Vários estudos apontam que esta disponibilização leva a uma mudança de atitude dos cidadãos em relação ao Estado, sendo notado o aumento de confiança no aparelho administrativo, o qual funciona nos dois sentidos (Madon, 2005, p. 8).A implementação deste sistema implica também um conjunto de desafios, os quais podem ser sistematizados em quatro grandes áreas. Em primeiro lugar, destacamos a necessidade de capturar, gerir usar, disseminar e partilhar informação em rede. Um dos principais desafios desta área centra-se na qua-lidade e exactidão dos dados recolhidos, bem como na estrutura como estes

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dados são partilhados na rede. Uma segunda área prende-se naturalmente com as tecnologias de informação. Nesta área, existe uma grande preocupação com a compatibilidade dos sistemas. De facto, muitos dos países em vias de desenvolvimento são alvos de um conjunto de projectos provenientes de um conjunto diferente de países doadores, os quais têm também aproxima-ções diferentes ao e-Government. Assim, quando estes vários subsistemas são colocados em rede, muitas vezes existe um problema de interligação. Este problema ocorre também devido ao grande hiato temporal existente na implementação do projecto, levando a que sistemas mais recentes deixem de conseguir comunicar com sistemas mais rudimentares. Uma terceira área centra-se no modelo organizacional e de gestão. Aqui existe uma grande preocupação com o alinhamento dos objectivos organizacionais com os projectos de tecnologias de informação, por um lado, e na existência de objectivos concorrentes – e muitas vezes incompatíveis – entre os vários stakeholders do próprio Estado, por outro. O aumento da transparência e da responsabilização da estrutura administrativa vai também, certamente, diminuir os privilégios de um número reduzido de pessoas que beneficiam do statu quo, sendo estes interesses também muitas vezes identificados como obstáculos. Numa quarta área encontramos as questões legais, onde um dos principais desafios se prende com os normativos enquadrantes destes proces-sos. De entre eles, destacamos a adaptação do edifício legal dos Estados à utilização de ferramentas tecnológicas, adaptando também os equilíbrios e as responsabilidades de cada actor no edifício organizacional da administração (Gil-García & Pardo, 2005, p. 190-193). Deste modo, afirmam as Nações Unidas, e devido à grande complexidade dos projectos, existe uma maior probabilidade de sucesso de implementação de projectos quando é aplicada uma estratégia bottom-up (United Nations, 2008, p. 166-167).Como vimos, a implementação do e-Government deve ser alvo de um estudo aprofundado, sem o qual a implementação do projecto está, com elevado grau de probabilidade, vaticinada ao fracasso. De facto, cerca de 60% de todos os projectos de e-Government falham, ou não atingem a totalidade dos seus objectivos. Esta proporção é maior se analisarmos apenas os países em vias de desenvolvimento, onde apenas 15% dos projectos são considerados como sucesso. Entre as causas do insucesso, destacamos a falta de consciência dos custos associados à falha na implementação, os quais podem ser agrupados em seis categorias. A primeira relaciona-se com os custos financeiros directos, ou seja, dinheiro investido em equipamento, consultores, infra-estruturas e formação. Uma segunda categoria prende-se com custos financeiros indirectos,

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contabilizados pelo tempo gasto pelos funcionários públicos envolvidos no projecto e que, desta forma, não contribuem para as suas normais funções. Devemos também contabilizar os custos de oportunidade, uma vez que os fundos poderiam ter sido aplicados em outros domínios, contribuindo assim para as populações. Os custos políticos são também importantes, uma vez que, pelo fracasso, afastam ainda mais a classe política dos seus cidadãos, aumentando assim a desconfiança no Estado. Podemos identificar os custos dos beneficiários, os quais não vão ter o acesso aos bens que teriam, caso o projecto fosse implementado. Por fim, devemos ainda ter em atenção os custos futuros, pois um projecto de e-Government mal sucedido constitui seguramente uma barreira a futuros projectos, aumentando assim o hiato de tempo dos custos dos beneficiários (Sinawong, 2008, p. 974). Neste capítulo, percebemos assim as vantagens no reforço das competências do Estado proporcionadas pelo e-Government. No entanto, percebemos também que esta não é uma solução simples, requerendo um estudo aprofundado, o qual só pode ter sucesso com a integração de equipas multidisciplinares e transversais.

5. CONCLUSÕES

Neste capítulo pretendemos contribuir para a demonstração do nosso argu-mento. Para tal, construímos um modelo multidimensional tendo por base o pensamento de (Collier, Laport & Seawright, 2010). Assim, podemos afirmar que o e-Government contribui para o aumento da capacidade do Estado, seja ao nível central, seja ao nível local. A implantação de um projecto contribui transversalmente para que exista um esforço na disponibilização de infra-estruturas, bem como na formação dos utilizadores. Durante a fase inicial, e à medida que o projecto é implementado, um conjunto de funções do Estado vão sendo automatizadas. Este processo contribui para uma melhor eficácia e eficiência de toda a máquina burocrática, gerindo melhor os dinheiros públicos, aumentando a transparência, contribuindo assim de forma decisi-va para a boa governação. Já durante a implementação da segunda fase do projecto, um conjunto destes serviços são progressivamente disponibilizados às populações. Com esta disponibilização assistimos à mudança de atitude dos cidadãos, uma vez que é crescente a confiança que estes depositam na máquina administrativa.Deste modo, somos levados a concluir que a implementação do e-Government em estados falhados contribui directamente para uma boa gestão dos bens

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públicos e das finanças públicas, para o investimento no capital humano, bem como uma melhoria ao nível do controlo administrativo do território, através do aumento da transparência, para o estabelecimento do Estado de direito. Assim, verificamos que concorre para cinco das dez funções essen-ciais do Estado apresentadas por (Ghani & Lockhart, 2008). Ao ter impacto este modelo de desenvolvimento das capacidades do Estado, o e-Government actua nas causas da sua fragilidade, contribuindo para a funcionalidade e empowerment do Estado. Deste modo, por actuar nas causas, reduz o hiato de soberania que caracteriza os Estados falhados. É por esta via que afirmamos que o e-Government pode tem um papel significativo na paz e segurança internacional.Gostaríamos por fim de realçar que e-Government, sendo uma ferramenta importante, não se constitui por si só como uma panaceia. Devido à própria complexidade que o caracteriza, seja ao nível tecnológico dos processos, seja ao nível cultural dos utilizadores, qualquer projecto necessita de um estudo aprofundado de implementação, bem com um desenho específico, adaptado à realidade concreta de cada sociedade. Como vimos, o e-Government apresenta vários desafios na fase de implementação, os quais, se não forem tidos em consideração, acarretarão custos para todos os stakeholders.

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Sónia Torres (*)

Alferes de Administração da GNR (Mestre)

Manuela SarmentoProfessora Doutora

Paulo OliveiraTenente-Coronel

ABSTRACT

The present scientific work falls within the field of Economics, Manage-ment and Administration and its theme is “The Recruitment for the Human Resources Administration Service of the GNR”. The main objective of this work is mainly to contribute to the improvement for the recruitment process for the Service of Military Administration of the Guarda Nacional Republicana.

The purpose that led to this research was to analyze the recruitment and selection model used by the Guarda Nacional Republicana for its Corps of Military Administration and compare it with the model used by its counter-part, the Gendarmerie Nationale Française. The main subject of this work will then be all categories of military personnel belonging to the Corps of Military Administration (Corporals, Sergeants and Officers).

As far as scientific methodology is concerned, we used the analysis of docu-ments and works of authors of reference on the theme. We used also the internal legislation of the organization, comparing it with French law. The field investiga-tion was based on data collection through surveys, interviews and questionnaires.

During the investigation we concluded that there are some gaps in the recruit-ment and selection model, which could be overcome by changing the conditions of admission of the Caporal Training Course and the Sergeants’ Promotion Course.

Keywords: Portuguese Republican National Guard (Guarda Nacional Re-publicana); French National Guard (Gendarmerie Nationale Française); Military Administration Service; Recruitment; Selection.

1 O artigo apresentado constitui uma adaptação do Trabalho de Investigação Aplicada, realizado no ãmbito do Mestrado Integrado em Ciências Militares - Especialidade de Administração (GNR).

(*) Mestre em Ciências Militares na Especialidades de Administração da GNR, pela Academia Militar.

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RESUMO

Este trabalho científico enquadra-se no domínio da Economia, Gestão e Administração e subordina-se ao tema “O Recrutamento de Recursos Humanos para o Serviço de Administração da GNR”. Com a elaboração deste trabalho objectiva-se, principalmente, contribuir para a melhoria do processo de recruta-mento para o Serviço de Administração Militar da Guarda Nacional Republicana.

O propósito que presidiu a sua realização foi analisar o modelo de recru-tamento e selecção utilizado pela Guarda Nacional Republicana para prover o seu Quadro do Serviço de Administração Militar e compará-lo com o modelo utilizado pela sua congénere, a Gendarmerie Nationale Française. Os principais sujeitos deste trabalho serão então todas as categorias de militares pertencentes ao Quadro do Serviço de Administração Militar (Cabos, Sargentos e Oficiais).

No que toca à metodologia científica, utilizou-se a análise de documentos e de obras de autores de referência sobre o tema. Recorreu-se, ainda, à legislação interna da organização, comparando-a com a legislação francesa. A investigação de campo baseou-se na recolha de dados através de inquéritos por entrevistas e por questionários.

No decorrer da investigação concluiu-se que existem algumas lacunas no modelo de recrutamento e selecção, que poderiam ser ultrapassadas ao mudar as condições de admissão ao Curso de Promoção a Cabos e ao Curso de Formação de Sargentos.

Palavras Chave: Guarda Nacional Republicana; Gendarmerie Nationale Française; Serviço de Administração Militar; Recrutamento; Selecção.

1. RECRUTAMENTO

Hoje em dia, os recursos humanos são considerados como um dos principais factores de qualidade e de sucesso nas organizações. A globalização tem levado as organizações a preocuparem-se com a gestão das pessoas e, consequente-mente, com os diferentes métodos a utilizar a fim de atrair o maior número possível de candidatos competentes para os cargos vagos e seleccioná-los eficazmente para conseguir colocar a pessoa mais indicada no lugar certo.Para Taylor & Collins in Gomes et. al (2008, p. 194) o recrutamento é “... o conjunto de actividades levadas a cabo por uma organização com o objectivo fundamental de identificar um grupo considerável de candidatos, atraindo-os para a empresa e retendo-os pelo menos no curto prazo”. De facto, é insustentável concordar com um recrutamento sem ter em conta a

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questão tempo pois este tem de ser feito para um período de pelo menos um ano. Daí a decisão de preenchimento do cargo ser de grande relevância para a gestão da organização, na medida em que, no contexto da nossa legislação laboral, conduz à criação de um custo fixo adicional na estrutura de custos da organização. O recrutamento tem por objectivos: “ determinar as necessidades presentes e futuras de recrutamento em conjunção com o planeamento de recursos humanos e a análise do trabalho a efectuar; aumentar o número de candidatos qualificados com um custo mínimo para a organização; aumentar a taxa de sucesso do subsequente processo de selecção reduzindo o número de candidatos subqualificados; diminuir a probabilidade dos seleccionados virem a deixar a organização, por não terem recebido informação suficiente sobre esta bem como ir ao encontro das responsabilidades legais e sociais da organização” (Reis, 2010, p.5).

1.1 Recrutamento interno

O recrutamento interno é limitado ao quadro de pessoal da empresa, considerando apenas como candidatos potenciais os colaboradores que possui no momento” (Reis, 2010, p. 8). Segundo Reis (2010), ao optar por este tipo de recrutamento a organização poderá promover os seus recursos humanos (movimentação vertical), transferi-los (movimentação horizontal), ou transferi-los com promoção (movimentação diagonal). O recrutamento interno pode ser subdividido em três tipos: “ a escolha directa, o concurso interno e o “recomendar um amigo” (refer a friend)” (Camara et al., 2007, p. 389). A escolha directa consiste em nomear di-rectamente a pessoa para o cargo vago, “ … por ser considerada a que tem perfil mais adequado. É normalmente adoptado para os cargos de maior importância ou maior responsabilidade dentro da organização” (Reis, 2010, p. 11), dando assim um voto de confiança à pessoa escolhida mas podendo provocar conflitos no seio da organização entre os colaboradores e a organização. O concurso interno permite convidar qualquer pessoa interessada a candidatar-se ao anúncio do lugar em aberto nos painéis informativos da organização (Camara et al., 2007). O “recomendar um amigo” “ … consiste em convidar os Colaboradores a indicar o nome de um amigo ou conhecido que, em sua opinião, tenha as condições neces-sárias para preencher o cargo em aberto” (Camara et al., 2007, p. 389). Torna-se menos dispendioso que o recrutamento externo e mais célere que o recrutamento interno (Camara et al., 2007).

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1.2 Recrutamento Externo

Enquanto o recrutamento interno diz respeito apenas a um leque muito restrito de candidatos, o recrutamento externo abrange uma amostra vasta de candidatos existentes no mercado do trabalho ou noutras organizações. De facto, o recrutamento externo ocorre quando as organizações não en-contram, entre os seus colaboradores, pessoal qualificado para a vaga a ser preenchida, ou quando ele constitui uma opção política da organização.A organização dispõe então de diferentes estratégias para informar e atrair os candidatos. Essas variam em função do tipo de função que está por preencher e da vantagem ou inconveniente da organização se identificar no mercado como estando à procura de novos empregados (Camara et al., 2007). As organizações podem então optar pelo recrutamento directo ou pelos serviços de empresas especializadas. Segundo Camara et al. (2007) o recrutamento directo é utilizado pela própria organização que procede a uma consulta do mercado utilizando maioritariamente os media (televisão, rádio, jornais ou sites na Internet). No tocante aos serviços de empresas especializadas, é de salientar os “caçadores de cabeças” (headhunters), consultores de pesquisa directa (search) ou consultores de recrutamento. A escolha do tipo de serviços varia em função do público-alvo. Assim, de acordo com Camara et al. (2007, pp. 391 - 392) as organizações esco-lhem os headhunters para “ … candidatos a lugares de top management, (…), os consultores de search para gestores seniores, mas que ainda não atingiram o topo de carreira (…) e os consultores de recrutamento (…) quando a organização deseja recorrer ao outsourcing para efectuar o seu processo de recrutamento e selecção”.

1.3 Processo de Recrutamento

A essência de um recrutamento eficiente é o planeamento do mesmo. De facto, antes de tomar a decisão da necessidade de contratar novos recursos humanos, geralmente por abandono de um cargo ou por ter sido criado um novo, é preciso ponderar as “ … alternativas que permitam, quer eliminar tarefas, quer reagrupá-las noutros cargos existentes, evitando a criação ou manutenção de custos fixos” (Camara et al., 2007, p. 402) e estabelecer um planeamento detalhado acerca da quantidade e qualidade dos recursos humanos necessários. Assim, a organização deve fazer uma pesquisa interna dos recursos humanos, levantando as necessidades, uma pesquisa externa, segmentando o mercado em classes de candidatos e diag-

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nosticando as fontes de recursos humanos que têm interesse no mercado e por fim definir a técnica de recrutamento a pôr em prática (Reis, 2010). O processo de recrutamento abrange todos os passos que a organização se propõe seguir para encontrar o candidato certo para o lugar certo. Inicia com a análise de funções (competências, qualidades, aptidões e qualificações necessárias), permitindo traçar o perfil adequado para a função a desem-penhar. No perfil da função deve estar esclarecido o que a empresa tem para oferecer ao candidato, como por exemplo o salário, as possibilidades de formação, o local e horário de trabalho e outras condições específicas (Camara et al., 2007). Determinadas as pontuações mínimas que o candidato deverá obter em cada parâmetro, escolhem-se os métodos de recrutamento que a empresa vai utilizar. Esses deverão ser adequados a cada caso, tendo em conta o mercado de trabalho, os custos, a estrutura organizacional, entre outros (Gomes et al., 2008). O processo acaba quando o Departamento de Recursos Humanos tiver recebido todas as candidaturas (Sekiou et al., 2001). De salientar que o processo de recrutamento varia em função dos objectivos da organização, das suas possibilidades financeiras, do meio em que ela se insere e do tipo de função a preencher.

2. SELECÇÃO

Se todas as pessoas fossem iguais e tivessem as mesmas capacidades para aprender e trabalhar, certamente a selecção de pessoal poderia ser dispen-sada. No entanto, a variabilidade humana é enorme, sendo necessário um processo de selecção, que contribua para escolher o melhor indivíduo para ocupar o posto de trabalho (Chiavenato, 2009).De acordo com Gomes et al. (2008, p. 226), “a selecção é o processo através do qual as organizações escolhem as pessoas mais adequadas ao exercício de funções específicas, depois de recrutadas”. Na medida em que as pes-soas e as funções são elementos variáveis, torna-se indispensável adaptar a selecção às tarefas e às pessoas. Consoante o número de vagas que estão por preencher, as organizações escolhem os seguintes métodos de selecção: por colocação, quando existe um único candidato para uma única vaga, por selecção clássica, quando existem inúmeros candidatos para uma só vaga, e por classificação, quando existem inúmeros candidatos para inúmeras vagas. Um dos meios conside-rados mais eficiente para determinar qual o candidato certo é a selecção por competências pois permite reduzir os custos da organização com a formação

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contínua dos seus colaboradores. Esta técnica, que se baseia em factos reais e mensuráveis como as capacidades e os atributos, pela sua objectividade, garante uma maior facilidade na avaliação do futuro desempenho e uma maior adequação do profissional à organização.Segundo Sarmento (2007) a selecção tem como objectivos: “ determinar as características e exigências necessárias para o desempenho eficaz de um dado posto de trabalho, ou seja, conhecer concretamente o desenho do cargo; iden-tificar e avaliar as características actuais e potenciais dos candidatos bem como escolher, após comparação entre as características do indivíduo com as do posto de trabalho, os candidatos mais capazes de desempenharem as funções do lugar, com o maior grau possível de satisfação para o candidato e da empresa”.

2.1 Técnicas de Selecção

Tal como o recrutamento, “a selecção pode ser feita com recurso a várias técnicas e métodos, dependendo das características do cargo a preencher, do perfil do candidato ideal, dos meios disponíveis para o fazer e dos objectivos organizacionais” (Reis, 2010, p. 32). No entanto, para con-seguir uma avaliação equitativa de todos os candidatos, convém decidir sobre as técnicas que serão utilizadas. Estes instrumentos devem ajudar a estabelecer uma comparação entre as características de cada candidato e as exigências do posto de trabalho a preencher. Uma vez escolhidos os instrumentos, os responsáveis pela selecção devem aplicar a avaliação de modo imparcial a todos os candidatos (Sekiou et al., 2001).Existem cinco grupos de técnicas de selecção, das quais se destacam: a entrevista de selecção, as provas de conhecimento ou de capacidade, os testes psicológicos, os testes de personalidade e algumas técnicas de simulação (Chiavenato, 2009).

2.1.1 Entrevistas de selecção

Mesmo que não sejam utilizados questionários ou efectuados testes, dificilmente a decisão final sobre a escolha do melhor candidato é tomada sem que seja feita uma entrevista presencial entre o candidato e o responsável do Serviço recrutador.A entrevista de selecção permite ao entrevistador, através da análise de comportamentos, fazer uma escolha criteriosa da pessoa que possui o perfil de competências que corresponda às exigências do lugar a preencher. É o momento oportuno para o candidato

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defender os seus pontos de vista e experiências. Tem como objec-tivos contribuir para a escolha final durante a avaliação, facilitar a recolha de dados rigorosos sobre o candidato e informar o candidato sobre a organização (Sekiou et al., 2001). Consoante o objectivo da entrevista e o perfil da função existem vários tipos de entrevistas de selecção: estruturada, o entrevistado responde a um conjunto de perguntas que fazem parte de um guião; semi-estruturadas, o entrevistado responde às perguntas do guião mas também pode falar sobre outros assuntos; e não estruturadas (sem guião), o entrevistado fala sobre vários assuntos relacionados com as perguntas do entrevistador (Sarmento, 2007).

2.1.2 Testes de Selecção

Os testes designam um conjunto de provas aplicadas a pessoas para apreciar o seu desenvolvimento mental, as suas aptidões, as suas habilidades, os seus conhecimentos, entre outros (Sarmento, 2007). Esta técnica de selecção procura medir o grau de conhecimentos profissionais ou técnicos do candidato exigidos pelo cargo, através de: Testes psicológicos:

• Testes de personalidade: procuram “avaliar as capacidades intelectuais, emocionais e sociais (…) com vista a antecipar as suas capacidades de integração na organização, a adaptação ao lugar vago e o seu grau de colaboração com os colegas de trabalho” (Sekiou et al., 2001, pp. 347, 348).

• Testes de aptidões: permitem “avaliar a qualidade de funcio-namento da inteligência (…), a capacidade de entendimento, raciocínio, memória, análise, síntese, interesse, concentração (…).” (Sekiou et al., 2001, p. 348).

• Testes de comportamento: visam avaliar as atitudes e os comportamentos (Sarmento, 2007).

• Testes de interesses e motivações: avaliam o inventário de interesses, de motivações, de frustrações, de atenção e de concentração (Sarmento, 2007).

• Testes profissionais ou técnicos ou provas de conhecimentos: “ instrumentos para avaliar objectivamente os conhecimentos e as habilidades adquiridos através do estudo, da prática ou do exercício” (Chiavenato, 2009, p. 184).

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2.2 Processo de Selecção

É importante prestar especial atenção ao processo de selecção pois, quando feito de forma incorrecta, poderá originar perda de produtividade ou levar a situações negativas, mas menos evidentes, como sejam, por exemplo, a perda de clientes, danificação de equipamentos, constante tendência para a doença, entre outros (Caetano & Vala, 2002). Esse pro-cesso consiste em avaliar os candidatos, reduzindo-os progressivamente, mantendo apenas os necessários para o lugar vago (Sekiou et al., 2001). Para tal as organizações devem seguir as seguintes fases:– Estabelecimento do perfil funcional a recrutar: primeira triagem dos

candidatos.– Triagem e pré-selecção das potenciais candidaturas: estabelecer uma

estratégia de avaliação do potencial psicossocial de cada candidato, em função do perfil acordado, através de entrevistas pessoais, avaliações psicológicas e de competências, provas de grupo, simulação de tarefas ou provas de avaliação de competências específicas.

– Selecção final documentada: apresentação justificada dos resultados finais do processo em relatório com quadros e gráficos comparativos.

– Acompanhamento do processo de integração dos candidatos garantindo o seu sucesso (Reis, 2010, p. 36).

Esse processo varia em termos de duração consoante o lugar a preencher e a fonte de recrutamento utilizada, que pode ser interna ou externa (Sekiou et al., 2001). Após ter decidido qual o primeiro candidato a quem vai ser proposto o lugar, existe uma série de pontos a clarificar novamente entre o chefe funcional e o Departamento de Recursos Hu-manos, designadamente: o título interno da função, a categoria sindical que vai ser atribuída, o nível interno da função, o local e horário de trabalho, o salário inicial e prazo de revisão, os benefícios a que tem direito, entre outros. O candidato escolhido apenas deve ser contactado para receber a proposta de emprego após o Departamento de Recursos Humanos ter decidido definitivamente estes aspectos (Camara et al., 2007).Após escolher o candidato, esse deve ser submetido a um exame médico de admissão, tendo carácter eliminatório. Caso o resultado seja positivo, é feita a contratação. Depois da proposta ser feita, negociada e aceite pelo candidato e o processo de integração na empresa ter resultado podemos afirmar que o acto de selecção foi concluído com êxito. Os

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candidatos que foram afastados do processo de selecção por não cumprir os requisitos devem ser avisados e a organização pode integrá-los na sua base de dados para um recrutamento futuro.Não existem técnicas de recrutamento e selecção óptimas, por isso as organizações devem estar constantemente preocupadas com esta área para promover a sua melhoria de uma forma continuada.Além disso, o mercado actual exige cada vez mais que as organizações tenham uma grande capacidade de reacção e adaptação às mudanças. O seu sucesso ou insucesso passa, em grande medida, pela forma como elas gerem os seus recursos humanos.Assim, o recrutamento e a selecção são o verso e o reverso da mesma medalha. Só da conjugação perfeita destes dois elementos resultará uma força de trabalho qualificada e motivada.

3. RECRUTAMENTO E SELECÇÃO PARA O SERVIÇO DE ADMINIS-TRAÇÃO MILITAR DA GNR

3.1 Recrutamento na GNR

Sendo o recrutamento uma das áreas mais importantes em qualquer organização,“ela assume uma relevância especial quando a organização em causa é um Corpo Militar de segurança, que conta com um efectivo de cerca de 26 mil homens e mulheres, tem uma história de quase 200 anos, uma cultura organizacional própria e desempenha um papel determinante ao nível das próprias funções essenciais do Estado” (Branco, 2000, p. 10).

De acordo com as al. d) e g), do art.º 22, do Despacho n.º 32021/2008 3 , de 16 de Dezembro, a responsabilidade do recrutamento e selecção para ingressar nos Quadros da GNR e para prover os lugares e funções é da Divisão de Planeamento e Obtenção de Recursos Humanos (DPORH).O procedimento apenas se inicia se o mesmo estiver previsto no Plano Anual de Formação 4 e, nessa situação, subdivide-se em cinco fases. Primeiramente deve ser feita a publicitação do procedimento, ou seja a

3 O artigo apresentado constitui uma adaptação do Trabalho de Investigação Aplicada, realizado no ãmbito do Mestrado Integrado em Ciências Militares - Especialidade de Administração (GNR).

4 Mestre em Ciências Militares na Especialidades de Administração da GNR, pela Academia Militar.

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divulgação do concurso através de uma mensagem de aviso de abertura com as indicações de acordo com o n.º 3, do art.º 19, da Portaria 83-A/2009, de 22 de Janeiro. A seguir devem ser convocados os candidatos para cada um dos métodos de selecção. Depois a lista provisória de classificação é difundida, possibilitando os candidatos a recorrer durante um determinado prazo. Após esse prazo é divulgada a lista ordenada de classificação final, homologada pelo Excelentíssimo General Coman-dante Geral (GCG), e por fim é entregue a lista dos seleccionados para o destinatário adequado (n.º 4 a 9, do Memorando n.º 2/11, Repartição de Recrutamento e Concursos). Pode-se então considerar o Plano Anual de Formação como o planeamento do recrutamento, pois reporta as ne-cessidades de formação identificadas pelas várias Unidades e Órgãos de Comando e Direcção e validadas pela Direcção de Recursos Humanos (DRH). Apenas após a aprovação pelo GCG é que se pode dar início ao processo de recrutamento.

3.1.1 Curso de Formação de Oficiais

Os Cursos de Formação de Oficiais (CFO) são ministrados na Academia Militar (AM), estabelecimento de ensino superior público universitário militar. O curso que permite ingressar no Quadro do Serviço de Administração Militar (SAM) confere o grau de Mestrado em Administração da Guarda Nacional Republicana, cuja disciplina específica é Matemática e tem uma duração de cinco anos lectivos. As condições de admissão ao CFO variam em função do candidato ser civil ou militar. Neste ano lectivo, 2010/2011, a AM está a formar os seguintes militares de SAM: cinco Aspirantes, quatro cadetes de quarto ano e cinco cadetes de primeiro ano, não tendo sido abertas vagas para o SAM da GNR nos anos lectivos 2008/2009 e 2009/2010.A GNR recorre então ao recrutamento externo directo para prover as vagas do Quadro Permanente (QP) de Oficiais, sendo publicado um aviso em Diário da República, pelo Gabinete do Chefe de Estado Maior do Exército, onde constam as regras de admissão.

3.1.2 Curso de Formação de Sargentos

O Curso de Formação de Sargentos (CFS) é ministrado na Escola da Guarda (EG), estabelecimento de ensino da GNR, e tem uma

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o rECrutamEnto dE rECursos Humanos Para o sErviço dE administração da gnr

duração de dois anos lectivos. De acordo com o Plano Anual de Formação (2010) e com o regulamento do próprio curso, o primeiro ano é leccionado na EG enquanto o segundo ano consiste numa formação específica no Comando da Administração dos Recursos Internos (CARI) e nos restantes Órgãos logístico-financeiros. Na medida em que podem candidatar-se ao CFS os Guardas, Guardas principais e Cabos habilitados com curso, a GNR garante aos candidatos, em caso de sucesso, uma promoção (movimentação vertical), característica do recrutamento interno.

3.1.2.1 Disparidades no Processo de Recrutamento

De acordo com o EMGNR, aprovado em 2009, os Guardas podem candidatar-se ao CFS sem passar pelo Curso de Promoção a Cabo (CPCb), sendo suficiente três anos de serviço. No entanto, para poder concorrer ao CFS/SAM, é obrigatório ser Cabo do SAM, uma vez que o concurso é feito por Quadros. Esta situação está a levar a uma di-minuição drástica do número de candidatos ao CPCb e ao CFS, especialidade SAM, sendo que os Guardas estão a optar por concorrer directamente ao CFS e, nessa situação, apenas podem ingressar no Quadro de Infantaria (Inf) ou Cavalaria (Cav). Na Figura 1 pode observar-se o modelo actual de recrutamento para concorrer ao Quadro do SAM.

Figura 1: Modelo actual de recrutamento para o Quadro do Serviço de Administração Militar.

Para colmatar esta falha, seria necessário leccionar no Curso de Formação de Guardas (CFG) uma unidade curricular que trate das áreas do SAM (recursos financeiros, logísticos e

Civil e Militar GNR (Armas ou Serviço Honorífico)

CPCb (SAM)

CFS (SAM)

CPCb ou CFS

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humanos) para que os Guardas Provisórios (GProv), no final do curso, possam escolher o respectivo Quadro. Assim, os militares do SAM estariam em pé de igualdade com os que pertencem às Armas (Inf e Cav), podendo concorrer ao CFS após três anos de serviço. A Figura 2 ilustra o modelo proposto para fazer face a esta disparidade.

Figura 2: Modelo proposto de recrutamento para o Quadro do Serviço de Administração Militar.

3.1.3 Curso de Promoção a Cabo

O CPCb “tem a duração aproximada de cinco meses e decorre em regime misto, iniciando-se com um período de cerca de seis semanas de formação presencial, complementada com um período de três me-ses de auto-formação, sob a responsabilidade e com o apoio da EG” (Plano Anual de Formação, 2010, p. 53). De acordo com o art.º 2, do Despacho nº 25-A /10- OG 5, de 29 de Março, podem candidatar-se à frequência do CPCb os Guardas que satisfaçam as condições previstas no art.º 273 do EMGNR e as condições específicas exigidas para o ingresso no respectivo Quadro (caso existam e concorram para as va-gas fixadas para o Quadro, Ramo ou Especialidade a que pertencem).

3.2 Selecção na GNR

A GNR, para decidir quais os candidatos que têm maior perfil para desempenhar as funções incumbidas à Guarda, utiliza diversas técnicas. Assim, a selecção na GNR é feita através de entrevistas de selecção, testes técnicos (provas de conhecimentos) e testes de aptidões (provas físicas). O grau de dificuldade destas técnicas varia em função do curso a ministrar.

5 O Despanho nº 25-A /10 – OG, de 29 de Março, aprova as Normas para a admissão ao Curso de Promoção a Cabo da Guarda Nacional Republicana.

Civil e Militar GNR (Armas, Serviço Honorífico ou SAM)

CPCb e/ou CFS

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o rECrutamEnto dE rECursos Humanos Para o sErviço dE administração da gnr

3.2.1 Curso de Formação de Oficiais

De acordo com a al. a), do n.º 1, do ponto III, do Aviso n.º 9144/2011, de 18 de Abril, o concurso de admissão na AM é composto por duas fases: a prova documental (Fase Preliminar e Fase Complementar) e os pré-requisitos (Inspecção Médica; Avaliação Psicológica; Prova de Aptidão Física [PAF] e Prova de Aptidão Militar [PAM]). A pro-va documental consiste na entrega dos documentos indispensáveis para concorrer à AM (registo criminal, comprovativo da realização dos exames nacionais do ensino superior…). A Inspecção Médica “destina-se a averiguar a existência de qualquer doença ou deficiência física susceptível de impedir o desempenho da profissão de Oficial do Quadro Permanente” (al. a), n.º 3, ponto III, Aviso n.º 9144/2011). A Avaliação Psicológica permite determinar as aptidões e competências psicológicas dos sujeitos através de provas psicomotoras, provas de aptidão intelectual, avaliação cognitiva, avaliação da personalidade, provas de liderança e chefia e uma entrevista psicológica de selecção (al. a), n.º 4, ponto III, Aviso n.º 9144/2011). A PAF permite verifi-car, através de exercícios, se os candidatos possuem as capacidades motoras indispensáveis a um Oficial do QP (al. a), n.º 5, ponto III, Aviso n.º 9144/2011). Por fim, a PAM permite “esclarecer o candidato sobre a natureza, principais características e vivência da Instituição a que pretende a aceder” (al. a), n.º 6, ponto III, Aviso n.º 9144/2011).Somente os candidatos aprovados na prova documental serão convocados para a realização dos pré-requisitos (n.º 1, ponto IV, Aviso n.º 9144/2011). Os candidatos considerados aptos nas PAF e Inspecção Médica passarão à PAM, por ordem decrescente de classificação de candidatura, de acordo com as vagas existentes, acrescido de uma percentagem de até 50%, dentro dos grupos a que concorrem (n.º 2, ponto IV, Aviso n.º 9144/2011).Por fim, os candidatos considerados aptos na PAM ficam na situação de aprovados no Concurso de Admissão e ingressam no primeiro ano, por ordem decrescente de classificação de candidatura, consoante o número de vagas (n.º 1 e 2, ponto V, Aviso n.º 9144/2011). De acordo com a al. a), n.º 1, do art.º 57, do EMGNR, o aproveitamento nos cursos da AM é condição sine qua non para poder ingressar nos QP de Oficiais.

3.2.2 Curso de Formação de Sargentos

Segundo o n.º 1 do art.º 246 do EMGNR, as provas de admissão ao CFS constam de uma prova técnico profissional, uma inspecção

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médica, uma PAF e uma prova psicotécnica, a qual pode integrar uma entrevista psicológica.A prova técnica – profissional tem a duração de 90 minutos e é dividida em duas áreas: uma parte comum e uma parte especí-fica que engloba, para os candidatos ao SAM, as três áreas dos recursos internos (financeiros, logísticos e humanos). A inspecção médica visa verificar o estado físico e psíquico dos candidatos.A PAF pretende avaliar as capacidades físicas dos candidatos através da realização de vários exercícios. “A prova psicotécnica tem por objectivo prever a capacidade de desempenho dos can-didatos através da avaliação dos aspectos de personalidade e de aptidões cognitivas e situacionais” (n.º 1, art.º 8, Despacho do 26 de Março de 2010 6) e é realizada pelo Centro de Psicologia e Intervenção Social (CPIS).“ São admitidos à frequência do CFS os candidatos aprovados nas Provas de Admissão, por ordem decrescente da classifica-ção obtida, até ao limite das vagas fixadas para cada Quadro” (n.º 1, art.º 13, RCACFS). No caso de empate, a ordenação é feita tendo em consideração as seguintes prioridades: maior antiguidade no posto, mais tempo de serviço ou maior idade (n.º 2, art.º 13, RCACFS).

3.2.3 Curso de Promoção a Cabo

A fim de poder frequentar o CPCb é necessário realizar as seguintes provas de admissão: uma PAF, uma prova técnica – profissional e uma inspecção médica (art.º 274, EMGNR). A PAF e a inspecção médica são idênticas às do CFS.A prova técnico-profissional também é dividida numa parte co-mum e numa parte específica. No entanto, na medida em que os candidatos ao Quadro do SAM ainda pertencem às Armas, não têm de realizar nenhuma prova específica de Administração Militar (AdMil). Esta prova visa avaliar os conhecimentos dos militares no que concerne ao funcionamento interno da Instituição, tanto a nível disciplinar (Regulamento de Disciplina da GNR), como a nível institucional (EMGNR, Lei Orgânica da GNR, Regulamento Geral de Serviço da GNR) ou ainda no que respeita ao armamento.

5 O Despanho, de 26 de Março de 2010, aprova Regulamento do Concurso de Admissão ao Curso de Formação de Sargentos (RCACFS).

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4. RECRUTAMENTO E SELECÇÃO NA GENDARMERIE NATIONALE FRANÇAISE

A GN faz parte das Forças Armadas Francesas e é dividida em dois Quadros: o Quadro de Gendarmerie 7 e o Quadro de Apoio Técnico e Administrativo 8. De salientar que na GN não existe a categoria de Guardas. Os Guardas e Cabos pertencem à categoria de Sargentos. O órgão responsável pelo recrutamento na GN é a Direcção do Pessoal Militar, mais propriamente a Divisão das Competências. Esse órgão, ao supervisionar os vários modelos de recrutamento na GN, garante o cabal cumprimento das três formas de concursos para pertencer ao Quadro Técnico e Administrativo, confor-me se mostra na Figura 3: directo, semi-directo e com diploma (de acordo com as especialidades que a GN necessita para cada ano e que saem em Despacho). As provas de admissão são sempre divididas em duas fases: uma fase de elegi-bilidade e uma fase de admissão. No entanto, essas variam em função do curso, como é demonstrado no Quadro 1. Para os Oficiais, a fase de elegibilidade ga-rante que os candidatos preenchem todas as condições de admissão, enquanto a fase de admissão visa verificar as capacidades intelectuais, morais e físicas dos candidatos. Para os cursos de Sargentos, a fase de elegibilidade é composta por provas escritas e a fase de admissão por provas orais. De acordo com o art.º 7 do Despacho do 20 de Novembro de 2010 9, a lista dos candidatos autorizados a concorrer sai em Despacho do Comandante Geral da GN.

Figura 3: Formação dos Oficiais do Quadro Técnico e Administrativo da Gendarmerie Nationale.

Fonte: Gendarmerie Nationale (sd).

7 O Quadro da Gendarmerie equivale na GNR aos Quadros de Infantaria e Cavalaria.8 O Quadro de Apoio Técnico e Administrativo Equivale aos nossos Serviços.3 O Despacho de 20 de Novembro de 2010, do Ministério da Administração Interna francesa, autoriza a

abertura do concurso para Oficiais da NG (sem número).

Recrutamento através de concurso

INTERNOS

(Sargentos)

12º Ano e 2 anos

de serviço no mínimo

EXTERNOS

Licenciatura

ou grau

superior

2 anos de formação

Recrutamento através de diploma

EXTERNOS

Mestrado

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4.1 Oficiais

De acordo com o site da GN, a formação dos Oficiais alunos do Quadro Técnico e Administrativo da Gendarmerie Nationale 10 (OQTA) decorre durante dois anos na Escola dos Oficiais da Gendarmerie Nationale (EOGN) e na Universidade Paris-Est Créteil. O primeiro ano é destinado à formação militar e profissional, mas também à formação universitária (cerca de um trimestre). O segundo ano é maioritariamente dedicado à formação uni-versitária com vista a obter um Mestrado II, especialidade “Management e Apoio”. Este Mestrado apenas é conseguido por terem um modelo de aulas aceleradas, o que lhes permite obter em pouco mais de um ano o que normalmente se faz em dois. O objectivo desta formação é tornar os OQTA administradores militares, daí a obtenção deste diploma lhes permitir ficar a pertencer aos Quadros A da Função Pública Francesa. Pode então concluir-se que a GN utiliza o recrutamento interno e externo directo para recrutar os seus futuros Oficiais, método diferente do aplicado pela GNR.

4.2 Sargentos

Tendo em conta o site da GN, o curso de Sargentos do Quadro de Apoio Técnico e Administrativo11 (QATA) tem uma duração de vinte e seis semanas e é dividido em duas fases: as primeiras dez semanas visam a formação militar e as dezasseis seguintes a formação da especialidade

Quadro 1: Modelo de recrutamento e selecção para os Oficiais da Gendarmerie Nationale.

10 Os OCTA correspondem aos Oficiais do Quadro do SAM.11 O QATA corresponde ao Quadro do SAM, apesar de ter designações distintas consoante sejam Oficiais

ou Sargentos.

Fase de elegibilidade Fase de admissão

Concurso directo

Concurso semi-directo

Concurso com diploma

Prova de cultura geral, prova de uma língua estrangeira e uma prova á escolha

(direito, matemática ou economia).

Testes de personalidade, entrevista com um psicólogo, prova de aptidão geral e

provas fisicas.

Prova de cultura geral, prova de direito constituicional e redacção sobre um tema

da actualidade ou profissional

Prova de aptidão geral, prova de conheci-mentos profissionais, prova facultativa de

lingua estrangeira e provas fisicas.

Carta de motivação, curriculo vitae e cópia dos diplomas obtidos.

Testes de personalidade, entrevista com um psicólogo e apresentação oral sobre

um tema á escolha.

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o rECrutamEnto dE rECursos Humanos Para o sErviço dE administração da gnr

escolhida, a fim de adquirir as competências técnicas necessárias ao de-sempenho das suas futuras funções. O término da formação é assinalado pela entrega de um certificado de especialista.

5. INVESTIGAÇÃO DE CAMPO

Com o intuito de verificar os conceitos teóricos e responder às perguntas de investigação utilizaram-se dois métodos de investigação: as entrevistas semi-estruturadas e o inquérito por questionário.

5.1 Entrevistas

Através das entrevistas foram recolhidos os contributos de seis Oficiais da GNR que desempenham funções na área dos recursos humanos ou que pertencem ao Quadro do SAM. Questionada a necessidade de abrir vagas para o Quadro do SAM no CFG, pode-se concluir que a maioria (66,7%) discorda de tal medida justificando a necessidade de haver, em primeira instância, uma formação genérica e só depois uma especialização. Relativamente à disparidade no processo de recrutamento da GNR, essa é considerada uma desvantagem na medida em que os militares que querem seguir a carreira do SAM têm de ir ao CPCb e só depois ao CFS, acabando por ter pelo menos um ano de formação suplementar em relação aos militares das Armas. De acordo com 83,3% dos entrevistados esta situação não prejudica a qualidade dos Sargentos, no entanto é sinónimo de uma diminuição drástica de vagas sendo que o Quadro não é apelativo. Quanto à aplicação de um modelo idêntico ao da GN, a maioria dos entrevistados (66,7%) concordam salientando os motivos económicos, poupando recursos financeiros na formação.

5.2 Inquéritos

No que diz respeito aos inquéritos, a amostra é do tipo estratificada e a população alvo é de 38 militares, o que corresponde a 10% do Quadro do SAM a 31 de Maio de 2011. O inquérito utiliza uma escala de Likert, permitindo aos inquiridos classificarem o seu nível de concordância com as afirmações. Foram usados cinco níveis de resposta: discordo totalmente, discordo, não discordo nem concordo, concordo e concordo totalmente.

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Através das respostas obtidas à segunda parte dos inquéritos, o valor médio encontra-se abaixo do valor 3, pode-se então afirmar que os inquiridos não concordam com o actual modelo de recrutamento e selecção utilizado actualmente na GNR. De facto estes defendem a aplicação de novas me-didas tais como: o aumento de efectivos no Quadro (86,7%), a abertura de vagas para o Quadro do SAM no CFG (66,6%) e uma mudança nas condições de admissão ao CFS/SAM (43,3%), permitindo que os Cabos do Quadro do SAM não sejam os únicos possíveis candidatos ao CFS/SAM.

6. CONCLUSÕES

É de salientar que o modelo de recrutamento para o SAM pode ser alterado em três patamares diferentes, consoante a categoria profissional. Assim, para a classe de Oficiais seria necessário reestruturar os cinco anos de formação, aplicando um modelo semelhante ao utilizado com os cursos de Medicina (um ano de formação na AM e o restante na Universidade) ou então apenas o quinto ano de formação, permitindo aos Aspirantes ter uma visão do que é feito no Sector Empresarial do Estado sendo que a gestão dos recursos da GNR caminha para o modelo integrado da Administração Pública (Gestão partilhada de Recursos da Administração Pública). No caso de se decidir alterar o modelo de recrutamento sugere-se que seja implementado um modelo idêntico ao da GN, permitindo reduzir custos na formação. Para a classe de Sargentos seria motivador alterar as condições de admissão ao CFS, passando a ter a possibilidade de concorrer sem ter que ser previamente Cabo do SAM, bem como ao ser portador de uma Licenciatura (ou grau superior) na área de Administração. No que diz respeito à classe de Guardas poderia ser equacionada a hipótese de abrir vagas para o SAM no CFG, solucionando a obrigatoriedade de ir ao CPCb e só depois ao CFS, na medida em que os Guardas pertenceriam logo ao respectivo Quadro. Caso contrário seria interessante leccionar uma unidade curricular no CFG que permita aos GProv terem uma noção da gestão dos recursos internos, a fim de abrir novos horizontes e ajudá-los na escolha do futuro Quadro.

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a aCção do ExérCito no aPoio à ProtECção Civil: madEira, fEvErEiro 2010

Carlos Manuel Alves Batalha da Silva (*)

Coronel de Infantaria

ABSTRACT

It is the Armed Forces’ responsibility, as civil protection agents, to colla-borate in civil protection missions and tasks regarding the basic needs and improvement of the life quality standards of the populations.

Their collaboration takes place depending on the availability and priority of employment of military means, at the request of the competent bodies of the structure of civil protection and authorization or sanction of the competent military authority.

Therefore, the army, which also collaborates in those missions and tasks, has developed adequate plans that organize their actions and establish the mo-bilizing means and resources depending on the nature of the risks.

On the 20th February 2010, following the second largest flood on record occurred on the Madeira island, the Armed Forces were called to intervene, with particular regard to the actions of the Army soldiers who, from the very first mo-ment provided the support needed and maintained it continuously for several weeks.

The response to the terrible disaster by the military Army, of great efficiency and speed, was the result of experience on several exercises on these issues as well as of the synergies created by the interaction with several regional, local and social organizations, with the volunteers and the massive wave of solidarity that was generated around the affected populations.

Keywords: Civil Protection, Armed Forces, Army, Madeira – 20th February 2010.

1 Artigo elaborado com base nas comunicações apresentadas na Conferência “Riscos e Governaça”, ocurrida em 22 de Junho de 2010, na Academia Militar, e na VI conferência “Dia Internacional para a Redução de Desastres Naturais”, em 12 de Outubro de 2011, também na Academia Militar.

(*) Director do Departamento de Ciências e Tecnologias Militares da Direcção de Ensino da Academia Militar. Professor Regente da Unidade Curricular de Táctica Geral e Operações Militares I. Comandante do Regimento de Guarnição N.º 3, no Funchal, Madeira, no período de 07 de Outubro de 2008 a 07 de Outubro de 2010.

A ACção do exérCito no Apoio à proteCção Civil: mAdeirA, fevereiro 2010 (1)

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RESUMO

Incumbe às Forças Armadas, enquanto agentes de protecção civil, colaborar em missões de protecção civil e em tarefas relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações.

A sua colaboração faz-se em função da disponibilidade e prioridade do emprego dos meios militares, após solicitação dos organismos competentes da estrutura de protecção civil e a autorização ou sancionamento da entidade militar competente.

Consequentemente, o Exército, a que também compete colaborar naquelas missões e tarefas, desenvolveu os adequados planos que sistematizam a sua actu-ação e estabelecem os meios e recursos mobilizáveis face à natureza dos riscos.

A 20 de Fevereiro de 2010, na sequência da segunda maior aluvião de que há registo que tenha ocorrido na Ilha da Madeira, as Forças Armadas foram chamadas a intervir, com particular relevo para a actuação dos militares do Exército que, desde o primeiro momento, prestaram apoio aos mais necessitados e o mantiveram ininterruptamente durante várias semanas.

A resposta ao terrível desastre por parte dos militares do Exército, de enorme eficácia e rapidez, foi o resultado da experiência de diversos exercícios sobre esta temática e das sinergias criadas pela interacção com várias organi-zações regionais, locais, de cariz social, dos voluntários e da enorme onda de solidariedade que se gerou à volta das populações afectadas.

Palavras-chave: Protecção Civil, Forças Armadas, Exército, Madeira – 20 de Fevereiro de 2010.

1. INTRODUÇÃO

“A protecção civil é a actividade desenvolvida pelo Estado, Regiões Autóno-mas e autarquias locais, pelos cidadãos e por todas as entidades públicas e privadas com a finalidade de prevenir riscos colectivos inerentes a situações de acidente grave ou catástrofe, de atenuar os seus efeitos e proteger e socorrer as pessoas e bens em perigo quando aquelas situações ocorram” 2.A protecção civil é uma actividade permanente, com carácter multidisciplinar e plurissectorial, quanto mais não seja, porque todos nós somos agentes de protecção civil. Um papel importante está reservado, nesta área de actividade, às Forças Armadas e consequentemente ao Exército, como um dos seus ramos.A participação das Forças Armadas no âmbito da protecção civil faz-se no quadro da legislação em vigor, dos programas e planos de envolvimento

2 Lei de Bases da Protecção Civil, Lei n.º 27/2006, de 03 de Julho, art.º 1º.

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aprovados e de acordo com solicitações por parte dos organismos competentes.Com este artigo, pretendemos transmitir o papel das Forças Armadas, no-meadamente o do Exército, no âmbito da protecção civil, com base nas acções e ensinamentos resultantes da sua intervenção aquando da intempérie ocorrida na Ilha da Madeira em 20 de Fevereiro de 2010.Assim, começaremos por apresentar o enquadramento da participação das Forças Armadas em acções de protecção civil, para depois darmos a conhecer o papel desempenhado pelos militares do Exército na Região Autónoma da Madeira (RAM), enquanto agentes de protecção civil, através de um trabalho cooperativo, franco e leal, com os organismos regionais e locais de protecção civil, de cariz social, voluntários e outras entidades, na ajuda, acompanhamento e apoio às vítimas do “20 de Fevereiro de 2010”. Finalizaremos com umas conclusões e reflexões sobre a temática da colaboração das Forças Armadas em acções de protecção civil à luz da sua intervenção na Madeira.A participação do Exército no “20 de Fevereiro de 2010” expõe a neces-sidade de uma reflexão suficiente abrangente e aprofundada, podendo ser enquadrada no “estudo de caso” de Ponte (2006:2), que diz ser: “uma investigação que se assume como particularística, isto é, que se de-bruça deliberadamente sobre uma situação específica que se supõe ser única ou especial, pelo menos em certos aspectos, procurando descobrir a que há nela de mais essencial e característico e, desse modo, contribuir para a compreensão global de um certo fenómeno de interesse”.

Consideramos assim, que a temática em questão possui matéria suficiente para ser entendida como um “estudo de caso”.

2. AS FORÇAS ARMADAS

De acordo com a Lei de Bases da Protecção Civil, Lei n.º 27/2006, de 03 de Julho, “são agentes de protecção civil, de acordo com as suas atribuições próprias:a) Os corpos de Bombeiros;b) As forças de segurança;c) As Forças Armadas;d) As autoridades marítima e aeronáutica;e) O INEM e demais serviços de saúde;f) Os sapadores florestais.”

Consequentemente, nos termos da Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas (LOBOFA), Lei n.º1-A/2009, de 07 de Julho, incumbe

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às Forças Armadas colaborar em missões de protecção civil e em tarefas relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações.A Doutrina Nacional Conjunta das Forças Armadas para a actuação destas, enquanto agentes de protecção civil, está vertida na Directiva Operacional N.º006/CEMGFA/2010, de 18 de Janeiro, que faz a compilação de toda a legislação enquadrante da forma de colaboração das Forças Armadas no âm-bito da protecção civil. Nesta Directiva são definidas as áreas preferenciais de apoio, a articulação com as estruturas do sistema de protecção civil e identi-fica ainda as tarefas e procedimentos a adoptar pela estrutura de comandos a nível de planeamento, coordenação e execução de acções de protecção civil. A articulação entre a estrutura de protecção civil e a estrutura militar é feita através dos representantes das Forças Armadas que participam na estrutura de protecção civil (de forma permanente ou em função da situação), Figura 1. No Território Continental, as Forças Armadas fazem-se representar junto das seguintes estruturas de protecção civil:– Junto dos diversos órgãos de Direcção, Coordenação e Execução da Politica

de Protecção Civil aos níveis Nacional e Distrital 3, a saber:• Um representante do Chefe do Estado-Maior General das Forças Ar-

madas (CEMGFA) na Comissão Nacional de Protecção Civil (CNPC);• Representantes nas Comissões Distritais de Protecção Civil (CDPC),

que acumulam com a representação nas Comissões Distritais de De-fesa da Floresta (CDDF), que se articulam com o Centro de Situação e Operações Conjunto do Comando Operacional Conjunto do Estado-Maior-General das Forças Armadas (CSOC/COC/EMGFA).

– Junto dos órgãos de Coordenação Institucional do Sistema Integrado de Operações de Protecção e Socorro (SIOPS), também aos níveis Nacional e Distrital, a saber:• Um Representante no Centro de Coordenação Operacional Nacional

(CCON), que acumula com a representação no Comando Nacional de Operações de Socorro (CNOS), que se articula com o CSOC/COC/EMGFA;

• Representantes nos Centros de Coordenação Operacional Distritais (CCOD). Estes elementos (oficiais de ligação) articulam-se com os

3 O XIX Governo Constitucional extinguiu os Governos Civis em 8 de Setembro de 2011, passando as suas competências, em matéria de protecção civil, para os Comandos Distritais de Operações de Socor-ro (CDOS). Aguarda-se publicação de legislação correspondente em Diário da República.

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comandos que executam as operações e com os comandantes das forças militares no teatro de operações, mantendo informado o CSOC/COC/EMGFA. O Exército assegura a representação das Forças Armadas em 17 dos 18 CCOD, cabendo a outra representação à Marinha.

Figura 1 – Representação das Forças Armadas na estrutura da Protecção Civil.

O envolvimento das Forças Armadas no âmbito da protecção civil faz-se no quadro da legislação em vigor, mediante seguintes as formas de Apoio:– Programado: de acordo com os programas e planos de emergência pre-

viamente aprovados; – Não programado: de acordo com os recursos mobilizáveis identificados,

em função da disponibilidade e prioridade de emprego dos meios milita-res, competindo à entidade militar competente (CEMGFA ou o respectivo Comandante Operacional se nas Regiões Autónomas), a determinação das possibilidades de apoio e a coordenação das acções a desenvolver em resposta às solicitações apresentadas.

A colaboração das Forças Armadas pode concretizar-se, em termos genéri-cos, no seguinte:– Patrulhamento, vigilância e vigilância pós-incêndio florestal;

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– Reforço do pessoal civil nos campos da salubridade e da saúde, nomea-damente na triagem, cuidados médicos de emergência e na hospitalização e evacuação de feridos e doentes;

– Acções de busca e salvamento;– Disponibilização de equipamentos e de apoio logístico, quer para as

operações, quer para a população afectada. Pode incluir fornecimento de alimentação (eventualmente confecção) e distribuição de abastecimentos, nomeadamente medicamentos, água e combustíveis;

– Fornecimento temporário de alojamento, na sua capacidade sobrante, ou com possibilidade de recurso a tendas;

– Trabalho indiferenciado com pessoal não especializado, incluindo rescaldo de incêndios, montagem de acampamentos de emergência e acções de salubridade nas áreas de catástrofe;

– Reabilitação de infra-estruturas;– Prestação de apoio em comunicações;– Contribuir na preparação e implementação dos planos de emergência, ela-

borados aos diferentes níveis (Nacional, Regional, Distrital e Municipal), nos termos da legislação em vigor;

– Participar na realização de exercícios de simulação e treino, para opera-ções de emergência.

Os Planos que materializam a colaboração das Forças Armadas no âmbito da protecção civil, são elaborados pelos Ramos e Comandos de Zona nas Regiões Autónomas, em coordenação com os respectivos Comandos Operacionais (Co-mando Operacional Conjunto - COC, Comando Operacional dos Açores - COA e Comando Operacional da Madeira - COM), e aprovados pelo CEMGFA.A solicitação e respectiva autorização da colaboração das Forças Armadas seguem os trâmites legalmente estabelecidos, Figura 2.No Continente a colaboração das Forças Armadas é solicitada ao EMGFA, através do CSOC/COC/EMGFA, pela Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC).Em caso de manifesta urgência, os Comandantes Operacionais Distritais (COD)4 e os Presidentes das Câmaras Municipais podem solicitar a colaboração das Forças Armadas directamente aos Comandantes das Unidades implantadas na respectiva área, devendo estes dar imediato conhecimento da sua decisão ao CEMGFA. A autorização de actuação compete ao CEMGFA. Contudo, em caso de manifesta urgência, os Chefes de Estado-Maior dos Ramos e o Comandante da Unidade implantada na área afectada, são competentes para no seu âmbito autorizar a

4 São os Comandantes dos Comandos Distritais de Operações de Socorro. Anteriormente eram os Gover-nadores Civis que tinham esta competência. Ver nota 3.

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actuação, sempre com informação e pedido de sancionamento ao CEMGFA.As forças e elementos militares são empregues sob a cadeia de comando das Forças Armadas, sem prejuízo da necessária articulação com os comandos operacionais da estrutura de protecção civil.

3. O EXÉRCITO

O Exército, para além da sua missão principal de participar, de forma integra-da, na defesa militar da República, tem também a incumbência de colaborar em missões de protecção civil e em tarefas relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações 5. Assim, além das acções genéricas enunciadas para as Forças Armadas no âmbito da protecção civil, o Exército pode desenvolver, entre outras, as seguintes 6:– Reconhecimento terrestre nas áreas florestais para a prevenção de incêndios,

podendo tomar a forma de patrulhamento, vigilância, prevenção, ataque inicial, rescaldo e vigilância pós incêndio, de acordo com a legislação específica em vigor;

Figura 2 – Circuito de Solicitação e Autorização da colaboração das Forças Armadas.

5 Decreto-Lei n.º 231/2019, de 15 de Setembro.6 Directiva Operacional N.º 006/CEMGFA/2010, de 18 de Janeiro.

COC

CEMGFA

CN CFT CA

Fo rças e Meio s

Fo rças e Meios

Fo rças e Me io s

ZONASINISTRO

ANPC

COD

PCM

SOLICITAÇÃO E AUTORIZAÇÃO

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– Busca e salvamento terrestre;– Evacuação terrestre de sinistrados e de populações afectadas;– Apoio médico-sanitário com a Unidade de Saúde Operacional (USO);– Transporte terrestre para apoio a populações afectadas;– Operações de rescaldo, combate indirecto a incêndios ou de reabilitação

de infra-estruturas com equipamentos pesados de engenharia militar;– Apoio em material e serviços diversos (material de aquartelamento, gera-

dores, depósitos de água, desempenagem/reboque de viaturas);– Detecção, identificação, monitorização, protecção, descontaminação e gestão

de perigos e riscos de agentes Biológicos, Químicos e Radiológicos (BQR).

Por forma a sistematizar a sua colaboração de acordo com a tipificação dos riscos, estabelecer as medidas a adoptar e identificar os meios e recursos mobilizáveis, o Exército elaborou os Planos Vulcano, Lira, Aluvião e Célula, que passamos a discriminar.O Plano Vulcano, contempla o apoio à prevenção, vigilância, detecção e com-bate em primeira intervenção aos incêndios florestais, no sentido de responder às solicitações da Autoridade Florestal Nacional (AFN) na dependência do Ministério da Agricultura, do Mar, Ambiente e Ordenamento do Território. O apoio objectivo à AFN visa uma acção rápida e incisiva nos primeiros momentos do incêndio, desenvolvida por equipas de Sapadores do Exército para a Defesa da Floresta Contra Incêndios (SEDFCI), as quais são possuido-ras de formação específica para o desempenho desta actividade. Estas acções materializaram-se fundamentalmente em Matas Nacionais, Perímetros Flores-tais 7 ou Áreas Protegidas. O Exército apoia ainda a AFN na beneficiação de infra-estruturas, nomeadamente reparação de caminhos florestais e limpeza de aceiros, através do empenhamento de meios de Engenharia Militar.No âmbito do Plano Vulcano foram mobilizados, em 2010, 168 militares, dis-tribuídos por 12 equipas de SEDFCI (14 militares por equipa), empregues em missões de patrulhamento espalhados do Norte ao Sul do País (CFT, 2011a). O Plano Lira, permite ao Exército colaborar com a estrutura de protecção civil através de acções tendentes a minimizar os efeitos dos incêndios florestais e ainda noutras acções relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e melhoria da qualidade de vida das populações, para as quais tenha capacidade dentro dos parâmetros definidos pela legislação em vigor. No âmbito do Plano Lira, o Exército emprega as suas Unidades preferencialmente nas respectivas

7 Os denominados Perímetros Florestais são constituídas por terrenos baldios, autárquicos ou particulares e estão submetidos ao Regime Florestal Parcial por força dos Decretos dos anos de 1901 e 1903, e demais legislação complementar. Informação disponível em: http://www.afn.min-agricultura.pt/portal/gestao-florestal/regime-florestal/perimetros-florestais, consultada em 26/08/2011.

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áreas de responsabilidade de apoio, colaborando com as corporações de bom-beiros em operações de rescaldo e fornecendo-lhes apoio logístico, bem como aos serviços florestais, serviços de protecção civil e a outros elementos ou en-tidades empenhados nas acções de combate aos incêndios. Esse apoio logístico materializa-se através do fornecimento de alimentação, transporte, apoio sanitário de emergência (incluindo evacuação terrestre de sinistrados), abastecimento de água às populações carenciadas ou a unidades empenhadas no combate a incên-dios, disponibilização de infra-estruturas e apoio em material diverso. Acresce ainda o emprego de meios de Engenharia Militar em operações de rescaldo ou de combate indirecto a incêndios e defesa de aglomerados populacionais e na cooperação na reabilitação de infra-estruturas danificadas pelos incêndios.O Plano comporta dois Estados de Alerta – Normal e Especial – e cinco Níveis de Alerta – Verde, Azul, Amarelo, Laranja e Vermelho (os quatro últimos são níveis de alerta especiais). Estes níveis de alerta resultam da avaliação, por parte da ANPC, do grau de risco e do rácio entre necessidades e capacidades de resposta distrital e/ou nacional. Em 2010, no âmbito deste Plano, o Exército mobilizou 29 Unidades e cinco Destacamentos de Engenharia, num total de aproximadamente 700 militares, espalhados geograficamente pelo território continental, com graus de prontidão em função do nível de alerta estabelecido, ao que acresce diferentes tipos de viaturas de que se relevam plataformas, auto-tanques de água, tractores de lagartas, pronto-socorros, entre outros.Se aos 700 militares empenhados no Plano Lira somarmos os 168 militares em-pregues no âmbito do Plano Vulcano, veremos que em 2010 o Exército mobilizou para a defesa da floresta contra incêndios cerca de 870 efectivos (CFT, 2011a).Com o Plano Aluvião, o Exército, através dos seus diferentes Órgãos de Comando Administração e Direcção (OCAD) e das Unidades na sua de-pendência, em coordenação com as entidades competentes, colabora com a estrutura de protecção civil através de acções tendentes a evitar e/ou minimizar os efeitos das cheias e ainda noutras acções relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e melhoria da qualidade de vida das populações, para as quais tenha capacidade, dentro dos parâmetros definidos pela legislação em vigor. Para tal poderá, consoante a situação, desenvolver as seguintes acções:– Busca e salvamento terrestre de pessoas e bens; – Disponibilização de meios de transporte; – Disponibilização de meios de transposição e de esgotamento de águas; – Disponibilização de instalações para alojamento de emergência; – Distribuição de alimentação e/ou géneros alimentares e abastecimento

de água;

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– Disponibilização de material diverso (material de aquartelamento, tendas de campanha, geradores, depósitos de água, entre outros),

– Reforço do pessoal civil nos campos da salubridade e da saúde; – Apoio sanitário de emergência (incluindo evacuação terrestre de sinistrados), – Cooperação na manutenção de itinerários essenciais; – Cooperação na reabilitação de infra-estruturas danificadas pelas cheias.

No que se refere aos meios disponíveis, o Exército tem permanentemente de prevenção, cerca de 240 militares, 40 viaturas, quatro tractores de rastos, dois botes tipo Zebro, e diverso material de apoio (motosserras, motobombas, etc.). Estes meios têm um grau de prontidão variável consoante o estado de alerta decretado pela ANPC, e que pode ser de 72, 12, seis ou duas horas ou, numa situação extrema, essa prontidão poderá ser imediata. Nas situações mais gravosas os meios de prevenção podem ser reforçados com efectivos que poderão chegar aos cerca de 750 militares (CFT, 2011b).No inverno de 2010/2011 não se registou qualquer actuação do Exército no âmbito deste Plano.Com o Plano Célula, o Exército, enquanto agente de protecção civil, dispo-nibiliza capacidades na área da Defesa Biológica e Química à ANPC. Essas capacidades foram integradas através do Elemento de Defesa Biológica e Química (ElemDefBQ) criado em 2008 pelo Exército e que junta, em caso de emprego operacional, numa só entidade, valências que existem no dia a dia em OCADs diferentes. O ElemDefBQ possui um grau de prontidão que varia entre duas e 12 horas, conforme a tipologia da força. Na sua constituição possui para além do Comando (cedido pelo Comando das Forças Terrestres - CFT), uma Equipa de Defesa Biológica (proveniente do Laboratório de Bromatologia e Defesa Biológica), uma Equipa de Defesa Biológica e Química (gerada pela Companhia de Defesa NBQ da Escola Prática de Engenharia), um Módulo Sanitário (do Hospital Militar Principal - HMP), um módulo de Segurança (do Regimento de Lanceiros n.º 2 - RL2), meios de Engenharia (Regimento de Engenharia n.º 1 - RE1) e Pelotões de Apoio (um por Brigada). Desde 2010, integra o Sistema Nacional de Defesa BQR, da ANPC 8. A colaboração do Exército é feita a pedido da ANPC, através do EMGFA, po-dendo em casos de manifesta urgência, os Comandantes Operacionais Distritais9 e os Presidentes das Câmaras Municipais solicitar a colaboração do Exército

8 A Directiva Operacional Nacional Nº3/10, da ANPC materializa este desiderato. Informação prestada pelo CFT em 15/06/2011.

9 Ver notas 3 e 4.

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directamente aos Comandantes das Unidades e /ou OCAD da respectiva área.O Exército coloca assim os seus meios da Componente Operacional ao serviço dos Portugueses, atendendo à sua versatilidade e flexibilidade de emprego, quer no âmbito das missões de interesse público como em situações de emergência ou calamidade, reflectindo assim a capacidade dual dos seus meios.

4. O CASO DA REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA

a. A Acção das Forças Armadas no Âmbito da Protecção Civil

Ao nível das Regiões Autónomas, quer o tipo de representação junto das estruturas de protecção civil, quer a forma de solicitação e autorização dos meios, sofrem as necessárias adaptações às estruturas regionais e às forças em presença. Consequentemente, as Forças Armadas fazem-se representar em órgãos equivalentes ao nível Regional, Figura 3.

Figura 3 – Representação das Forças Armadas na estrutura da Protecção Civil na RAM.

Assim, na RAM, as Forças Armadas têm um Representante junto do órgão de Direcção da Politica de Protecção Civil, na Comissão Regional de Pro-tecção Civil (CRPC) e um Representante junto do órgão de Coordenação Institucional do SIOPS, no Centro de Coordenação Operacional Regional (CCOR), que se articula com o comando da força que executa a operação e com o comandante da força militar no teatro, mantendo informado o Centro de Operações do Comando Operacional da Madeira (COM).Na Região Autónoma da Madeira é o COM que assume as responsabi-lidades de Coordenação Operacional das acções das Forças Armadas e

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depende hierarquicamente do Comando Operacional Conjunto/EMGFA.A colaboração das Forças Armadas é solicitada pelo membro do Governo Regional que tutela a protecção civil, em coordenação com o Serviço Regional de Protecção Civil, Instituto Público - Região Autónoma da Madeira (SRPC, IP-RAM), ao Comandante Operacional, devendo este dar conhecimento ao CEMGFA, através do canal operacional, Figura 4.

Figura 4 – Circuito de Solicitação e Autorização da colaboração das Forças Armadas nas Regiões Autónomas.

Em caso de manifesta urgência, os Presidentes do SRPC e das Câmaras Municipais podem solicitar a colaboração das Forças Armadas directamente aos Comandantes das Unidades implantadas na respectiva área, devendo estes dar imediato conhecimento da sua decisão ao Comandante Operacional. A autorização de actuação compete aos respectivos Comandantes Opera-cionais. Contudo, em caso de manifesta urgência, os Comandantes de Zona (marítima, terrestre ou aérea) e o Comandante da Unidade implantada na área afectada, são competentes para, no seu âmbito, autorizar a actuação, sempre com informação e pedido de sancionamento à respectiva cadeia hierárquica e ao Comandante Operacional.Por sua vez, na RAM, a Zona Militar da Madeira (ZMM), que representa o Exército na região, criou o “Plano de Operações Auxilio” que mate-rializa as formas de colaboração no âmbito da Protecção Civil, definindo competências, atribuições e estabelecendo procedimentos.O Comandante da ZMM, através deste Plano de Operações, delega no Comandante do Regimento de Guarnição N.º 3 (RG3), o Controlo Ope-

REG

IÕES

AU

TÓN

OM

AS

SOLICITAÇÃO E AUTORIZAÇÃO

COM

CZMA RM CZMM CZAM

For ça s e Meios

For ças e Me ios

For ças e Me ios

SRPCGRM COC

CEMGFA

PSRPC

PCM

ZONASINISTRO

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racional dos elementos e meios da Zona, incluindo os disponibilizados pela Unidade de Apoio do Comando da Zona Militar da Madeira (UnAp/CmdZMM) ou outros que venham a ser indicados.Os elementos e meios a empregar estão organizados por capacidades ar-ticuladas em equipas, orientadas para a realização de tarefas específicas, no âmbito das acções a executar.Este Plano estabelece ainda a necessidade de assegurar a instrução e for-mação dos militares para as missões específicas no âmbito da protecção civil, orientada ao longo do ano pelo grau de risco, recorrendo ao apoio, quando se justifique, do SRPC, IP-RAM. Nestes termos, a ZMM, através do seu Comando e do RG3, tem vindo a participar nos exercícios que o COM executa em conjunto com o SRPC, IP-RAM, no âmbito da colaboração das Forças Armadas em missões de protecção civil, de forma a desenvolver e aperfeiçoar a interoperabilidade entre o dispositivo e meios das Forças Armadas, sedeados na Região, como resposta a solicitações do Serviço Regional de Protecção Civil, e que permite testar o “Plano de Operações Auxílio”.Os cenários levantados têm representado situações de acidentes graves na RAM, com relevância para as provocadas por condições atmosféri-cas muito adversas, com vista a testar a resposta dos meios militares disponíveis às previsíveis solicitações da protecção civil e treinar a coordenação entre entidades aos vários níveis (entre órgãos de comando e controlo e as acções no terreno), no sentido de se agilizar processos, procedimentos e técnicas, que se revelaram decisivos durante a execução das operações na sequência da catástrofe ocorrida na Ilha da Madeira, em 20 de Fevereiro de 2010.O ElemDefBQ do Exército tem também participado nos exercícios e ou-tras iniciativas conjuntas da ZMM ou COM e do SRPC, a convite destas entidades. As duas últimas participações ocorreram nos exercícios ZARCO (Nov2010) e Golfinho (Maio 2011) onde, entre outros apoios, forneceu palestrantes para dois seminários e técnicos para apoio ao SRPC e aos Bombeiros do Funchal na resolução de acidentes de origem tecnológica simulados (fugas de químicos perigosos).

b. As Aluviões na Madeira

O Arquipélago da Madeira, conhecido pelas suas maravilhosas paisagens e pelo seu excelente e moderado clima tem, embora excepcionalmente, sido varrido por fortes chuvadas que, face à sua orografia, caracteri-zada pela extrema inclinação das encostas, têm causado aluviões que provocam grande pânico, destruição e perdas de vidas.

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Dos vários fenómenos desta natureza, de que há registo que aconteceram na Ilha da Madeira nos últimos 400 anos, releva-se:– Em 1611, no Funchal, onde houve uma grande enchente que provocou

notáveis estragos, tendo destruído em grande parte a igreja paroquial da freguesia de Santa Maria Maior;

– Em 18 de Novembro de 1724, em Machico, tendo ali morrido 26 pessoas e destruindo mais de 80 habitações;

– Em 9 de Outubro de 1803, com particularidade para o Funchal, tendo provocado a morte de 200 pessoas só na baixa da cidade, calculando-se um total de 600 mortes em toda a Madeira;

– Em 26 de Outubro de 1815, tendo provocado prejuízos consideráveis e morrido várias pessoas em toda a ilha, em particular no Funchal, onde a água que transbordou da ribeira de S. João arrastou cerca de vinte casas;

– Em 25 e 26 de Fevereiro de 1920, em toda a ilha, embora com maio-res repercussões no Funchal, tendo provocado algumas mortes e feito mais de 500 desalojados;

– Em 3 de Novembro de 1956, que atingiu as freguesias de Machico, Santa Cruz, Porto da Cruz, Água de Pena e Santo da Serra, provocando prejuízos incalculáveis, que levou à solicitação da “colaboração de tropas de guarni-ção desta ilha nos trabalhos de remoção de terras e pedregulhos arrastados pela enxurrada”;

– Em 9 de Janeiro de 1970, que alagou du-rante três semanas a parte sul da Ilha, provocando enormes estragos e mortes, em particular no concelho da Ribeira Brava;

– Em 29 de Outubro de 1993, em particular no Funchal, causando cinco mortos, quatro desaparecidos e cerca de 400 desalojados, além de elevados prejuízos em infra-estruturas, tendo o Exército prestado apoio na remoção dos escombros, Figura 5.

c. As Aluviões de 20 de Fevereiro de 2010

Durante as primeiras semanas de Fevereiro de 2010 choveu muito e os solos apresentavam-se com elevados índices de saturação, tendo origi-

Figura 5 – Aluvião de 1993, Funchal, Praça da Autonomia.

Fonte: Arquivo RG3

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nado alguns aluimentos de terras que provocaram danos em habitações. Consequentemente, por solicitação do SRPC, IP-RAM, o RG3 empenhou duas equipas para ajudar nas limpezas de detritos em habitações. Face às condições climatéricas, o Comandante do RG3 manteve desde essa data duas Equipas de Remoção de Escombros de prevenção.Por altura do Carnaval nevou nos picos mais altos da Ilha, no Pico Ruivo e no Pico do Areeiro.

As chuvas do dia 20 de Fevereiro de 2010, um sábado, vieram agravar a situação. Nesse dia, no espaço de uma hora houve valores exageradamente elevados de precipitação, que também provocaram o degelo da neve nos pontos mais altos e precipitou o fenómeno, Figura 6. Nas es-tações Funchal-Observatório e Pico do Areeiro foram

registados respectivamente 58,3mm (entre as 09:00 e as 10:00) e 105mm (entre as 10:00 e as 11:30) (RG3, 2010).Esta precipitação excepcional originou diversos deslizamentos de terras e fortes caudais nas ribeiras, cujos leitos não os conseguiram reter, ar-rastaram grandes volumes de inertes e outros materiais, casas, carros e pessoas, deixando um imenso rasto de destruição. A tempestade provocou 42 mortos, seis desaparecidos, 120 feridos e cerca de 900 desalojados (RG3, 2010), além de avultados danos materiais nos conce-lhos do Funchal (Figura 7), Ribeira Brava, Câmara de Lobos e Santa Cruz.Na sequência deste tem-poral que se abateu sobre a Ilha da Madeira, em 20 de Fevereiro de 2010, provocando aluviões em vários locais da Ilha, o Go-verno Regional da Madeira Figura 7 – Destruição no Funchal.

Figura 6 – Os fortes caudais transbordaram os leitos das ribeiras.

Fonte: Arquivo RG3

Fonte: Arquivo RG3

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solicitou, por volta das 11H30, o apoio das Forças Armadas ao Comandante Operacional da Madeira

d. A Resposta dos Militares do Exército

O COM procedeu ao accionamento dos meios informando o EMGFA. Consequentemente foi pedida a colaboração do Exército, tendo a ZMM10 procedido à activação do Plano de Operações Auxílio. Conforme es-tabelecido nesse Plano, o Comandante do RG3 11, por delegação do Comandante da ZMM, assumiu o controlo das operações correntes, recebendo de reforço outros elementos e meios da ZMM.Particularmente, o RG3 desencadeia o seu “Plano de Recolha”, mandando apresentar na Unidade os seus militares. Esta acção foi inicialmente difi-cultada pelas deficientes comunicações (as redes de telefone e telemóveis ficaram afectadas) e pela obstrução de algumas vias de comunicação. Grande parte dos soldados compareceu no Regimento por iniciativa própria.Face à gravidade da situação, ao grande número de infra-estruturas afectadas, incluindo pontes, cerca das 12H00, o Presidente do Governo Regional da Madeira, solicitou o apoio específico da Engenharia Militar.O pedido, feito ao Comandante Operacional da Madeira, foi de imediato encaminhado para o EMGFA. A missão foi atribuída ao Exército, que mobilizou, numa primeira fase, uma Equipa de Reconhecimento de Pontes da Escola Prática de Engenharia.Após coordenação com o SRPC, IP-RAM, as primeiras equipas do RG3 (os meios terrestres) começaram a actuar cerca das 14H00, resgatando pessoas na baixa do Funchal, Figuras 8 e 9.

10 Na RAM, o Comandante Operacional da Madeira, na dependência do EMGFA, acumula com o cargo de Comandante da ZMM.

11 Em 20 de Fevereiro de 2010, por o Comandante do RG3 se encontrar no Continente, o Comandante em Exercício de Funções era o 2º Comandante do Regimento. O Comandante regressou no dia seguinte.

Figura 8 e 9 – Actuação dos militares so Rg3 na baixa do Funchal.Fonte: RG3, 2010

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Durante esse dia e noite começaram a chegar desalojados ao RG3.Para a operacionalizar o comando e controlo, o Comandante da ZMM, rearticulou a sua estrutura organizativa em dois comandos:– Um para as operações futuras e controlo das operações correntes, assegurado

pelo 2º Comandante da ZMM com o apoio do Estado-Maior da ZMM;– Um para as operações correntes, a cargo do Comandante do RG3,

centrado no RG3.

No dia seguinte, dia 21 de Fevereiro, por volta das 13H30, chegaram os pri-meiros reforços da Protecção Civil e da Polícia de Segurança Pública (PSP) vindos do Continente 12, em voo militar 13. Foram os militares e as viaturas do Exército (concretamente do RG3) que foram ao aeroporto buscar estes elementos.Na tarde desse dia, o Presidente do Governo Regional dirigiu-se ao RG3 a fim de visitar os desalojados e transmitir-lhes mensagens de conforto e de esperança. Efectivamente, verificou-se que com esta visita o moral dos desalojados melhorou consideravelmente.Face à multiplicidade de tarefas a desempenhar e à complexidade da situação, para operacionalizar o comando e controlo das operações, o Comandante do RG3 procedeu a uma organização específica para a missão (Figura 10).

12 Chegaram neste voo 32 elementos da PSP. Em 25 de Fevereiro chegaram mais 4. Ficaram todos alojados no RG3.13 O Comandante do RG3, na altura no Continente, regressou ao Funchal neste voo.

Figura 10 – Organização para a missão.

CMDT

Cmdt BI

Sala de Op

Oficiais de Ligação

Transportes(Viat e cond)

EstruturaBase

Recepção e triagem

Apoio Social e Sanitário

Equipas(1gr e 6 praças)

Informação Pública

Sec Log 2. Cmdt

Apoio Externo Apoio Interno

Assim, sob o comando do Comandante do RG3, foi constituído:– Um Grupo para o Apoio Interno, sob o comando do 2º Comandante do

RG3, para garantir o funcionamento do Centro de Acolhimento Tempo-rário de Desalojados e de um pólo do Centro de Recepção e Entrega de Donativos em espécie que foi estabelecido no Quartel de RG3;

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– Um Grupo para o Apoio Externo, sob o comando do Comandante do Batalhão de Infantaria, para coordenar e controlar as operações exter-nas, de forma a dar uma resposta pronta às inúmeras solicitações de apoio às missões de protecção civil e ás tarefas relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações.

– Uma Célula Logística, para garantir o apoio logístico às actividades internas e às operações no exterior;

– Uma Célula de Informação Pública, para garantir a ligação aos Órgãos de Comunicação Social.

Desde o primeiro momento que o Exército esteve em permanente auxílio da população Madeirense, essencialmente através dos militares do RG3, reforçados por outros elementos da ZMM, que directa ou indirectamente, trabalharam 24 horas por dia no apoio e acompanhamento dos mais carenciados. Durante esta operação, conforme estipulado no Plano de Operações Auxílio, foram desencadeadas diversas missões e executadas várias tarefas específicas através do empenho de Equipas-Tarefa organizadas face ao tipo de emprego.Foram solicitados centenas de pedidos de apoio, quer do Serviço Regional de Protecção Civil e do Comando Operacional da Madeira, quer por parte da Cáritas Diocesana do Funchal durante a fase de realojamento das vítimas. Foi fornecido transporte (para pessoas, água, bens e combustíveis), empregues equipas de remoção de escombros (Figura 11), busca e salvamento, de reconhe-cimento, de recuperação de viaturas e de evacuação sanitária, prestado apoio na distribuição de água e na garantia de energia eléctri-ca em locais específicos e carenciados da Ilha. Estas acções (Quadro 1), que se caracterizaram em missões de protecção civil e em tarefas relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das po-pulações, envolveu, entre 20 de Fevereiro e 30 de Março de 2010, um total Figura 11 – As Equipas de Remoção de Escombros.

Fonte: RG3, 2010

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de 462 equipas, empenhando 1866 militares e 463 viaturas 14 e percorreram-se cerca de 20.000 Km.

O RG3 constituiu-se como um dos principais núcleos de apoio às vítimas. Ali foi montado um Centro de Acolhimento Temporário de Desalojados e um pólo do Centro de Recepção e Entrega de Donativos em espécie.O Centro de Acolhimento Temporário de Desalojados prestou apoio a mais de 236 pessoas desalojadas e a 36 elementos da PSP. Para além do alojamento, o apoio contemplou o fornecimento de alimentação (Figura 12), transportes diver-sos de pessoas e materiais na fase de acolhimento e de realojamento, bem como de cuidados de saúde.Criaram-se Equipas de recepção/triagem/encami-nhamento de desalojados e um espaço para reencontro de famílias.A confecção e distri-buição de alimentação decorreu ininterruptamente desde 20 de Fevereiro, tendo sido distri-

ACÇÃO EQUIPAS MILITARES VIATURAS

Transporte de Pessoal 104 224 105 Transporte Geral 177 730 178 Transporte de Água 18 37 18 Electricidade/Iluminação 19 95 19 Remoção de Escombros, Busca 74 635 74 e Salvamento Reconhecimento 13 29 13 Recuperação de Viaturas 5 13 5 Evacuação Sanitária 8 13 8 Oficial De Ligação 28 56 28 Transporte De Combustível 16 34 16

TOTAL 462 1.866 463

Quadro 1 – Capacidades empregues no exterior entre 20 de Fevereiro e 30 de Março de 2010.

Fonte: RG3, 2010

14 Houve militares e viaturas que foram empenhados mais do que uma vez.

Fonte: Arquivo RG3Figura 12 – Os desalojados no Refeitório do RG3.

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buídas um total de 12.253 refeições a desalojados, elementos da PSP e voluntários. As refeições foram confeccionadas nas cozinhas do RG3, com a colaboração dos militares da Secção de Alimentação da Unidade, de alunos e professores da Escola Profissional de Hotelaria e Turismo da Madeira e de outros voluntários.As pessoas desalojadas tiveram acompanhamento psicológico, tendo sido efectuada uma triagem à medida que iam chegando à Unidade, e foram divididas de acordo com o grau de sensibilidade, o tipo de situação fa-miliar e idade (idosos, crianças ou bebés). O apoio médico-sanitário foi concentrado no RG3. Para além do efec-tivo do Serviço de Saúde da ZMM (dois médicos, quatro enfermeiros e nove socorristas), operaram voluntariamente na Enfermaria do Regimento oito médicos (um dos quais Canadiano, que se encontrava de férias na Madeira), 14 enfermeiros, sete psicólogos e 19 outros voluntários. Este reforço de pessoal teve a colaboração do Centro de Segurança Social da Madeira e da Cáritas Diocesana do Funchal.No período de 20 de Fevereiro a 8 de Março foram registados um total de 1435 atendimentos, dos quais 82% dizem respeito à população desa-lojada, correspondendo a uma média diária de 84 atendimentos.Em boa hora se procedeu à reabilitação de quatro quartos com casa de banho na Enfermaria, que permitiu alojar pessoas com debilidades físicas motoras, acompanhados por um familiar.Entre os desalojados contavam-se mais de três dezenas de crianças de diferentes idades, incluindo uma bebé com 15 dias.Surgiu assim a necessidade, e consequentemente a ideia, de criar um espaço próprio, para actividades lúdicas e de animação que permitisse às crianças estarem ocupadas e de alguma forma mitigar as suas recordações dos trágicos acontecimentos por que haviam passado, Figura 13.Numa sala da Casa de Sargentos criou-se um espaço próprio para as crianças. Arranjaram-se materiais de pintura, alguns brinquedos e jogos com teor didáctico. Foram também criadas actividades dentro e fora do quartel para ocupar as crianças.Com ajuda dos voluntários, alguns deles especializados, no-meadamente um militar formado Figura 13 – As crianças no RG3.

Fonte: RG3, 2010

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em Educação de Infância, foi criada a “Sala de Amiguinhos do RG3”, improvisando um Jardim-de-infância.Para as crianças em idade escolar foi criada a “Escola Básica do RG3”, com o apoio de professoras do 1º Ciclo.Quando as escolas abriram, com o apoio da Câmara Municipal do Funchal iniciou-se o processo de transporte das crianças para as escolas.Foi ainda disponibilizado um espaço multimédia, computadores com jogos, acesso à Internet e ecrãs de TV, com o apoio de uma empresa do ramo instalada na Madeira.Como pólo do Centro de Recepção e Entrega de Donativos em espécie recebeu medicamentos, várias toneladas de géneros alimentares e centenas de metros cúbicos de roupa, doados por cidadãos anónimos e por muitas empresas. O seu manuseamento, para além do armazenamento, contemplou a triagem (separação por tipo de viveres, tamanhos e género de vestuário) e encaminhamento/distribuição para o exterior. Para o armazenamento, além das áreas cobertas disponíveis, foram mon-tadas tendas (Figura 14) e instalados sete contentores. No Quartel da UnAp/CmdZMM, no Pico do Buxo, em S. Martinho, funcionou também um pólo do Centro de Re-cepção e Entrega de Donativos em espécie.O apoio do RG3 aos desalojados, foi reali-zado em coordenação e cooperação com as entidades regionais e locais competentes, no-meadamente a Câmara Municipal do Funchal, a Investimentos Habitacionais da Madeira, o Centro de Segurança Social da Madeira (estas três entidades estabeleceram células de resposta no RG3 durante cerca de um mês), a Caritas Diocesana do Funchal e de centenas de voluntários, transmitindo um louvável altruísmo. Na fase de realojamento, face aos inúmeros pedidos que existiam foi criado e estabelec do um circuito de pedidos/auxilio, que definiu res-ponsabilidades e estabeleceu procedimentos para a gestão da situação específica dos desalojados (Figura 15).

Figura 14 – O armazenamento e triagem.Fonte: Arquivo RG3

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Elaborou-se um Memorando de Entendimento que foi assumido por todos os intervenientes.

e. Os Reforços Militares do Continente

Para além do trabalho efectuado pelos militares do Exército sedeados na ilha da Madeira, a pedido do Presidente do Governo Regional, o Exército também forneceu apoio em Engenharia Militar que teve de projectar do Continente.Após a realização dos reconhecimentos por parte de uma equipa militar, em coordenação com o Laboratório Regional de Engenharia Civil, entidade designada como ponto de contacto para a análise das necessidades e defini-ções de prioridades, decidiu-se pela instalação de uma ponte na localidade isolada de Fajã da Ribeira, concelho da Ribeira Brava.Em 26 de Fevereiro o Secretário Regional do Equipamento Social efectuou o pedido formal ao Comandante Operacional da Madeira, que o remeteu para o COC/ EMGFA.Entre 1 e 4 de Março, após as coordenações necessárias, procedeu-se à projecção da ponte militar 15 por meios aéreos militares (C-130) para a Madeira e respectiva montagem. Às 11 horas do dia 5 de Março a ponte foi aberta à circulação, encon-trando-se ainda a servir a população da Fajã da Ribeira (Figura 16).

15 Trata-se de uma ponte militar Treadway, com um vão de 18m, 4,2 m de largura e 22 Ton de capacidade.

Figura 15 – Circuito de Pedidos/Apoios na fase do realojamento.

S. SOCIAL

CMFUNCHAL

IHM

RG3

CARITAS

COM

ZMM

Nece

ssida

des

Bens

Neces

sidad

es

Habita

ção

Nece

ssid

ades

Hab

itaçã

o

Necessidades

Habitação

Necessidades Bens

Informa do Pessoal a realojar

Pedidos Missão

Info

Com

unic

a Ex

istê

ncia

s

Info Existências

Pedidos Missão

SRPC – IP RAM

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f. As Visitas

Foram várias as entidades que visitaram o RG3 após os acontecimentos do dia 20 de Fevereiro de 2010, para de uma forma mais directa se inteirarem das acções que estavam a ser conduzidas e prestarem também o seu apoio moral às vítimas do temporal. Assim, das entidades mais ilustres destacam-se, pela ordem cronológica das visitas: Bispo do Funchal, Presidente do Governo Regional, Presidente da República, Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, Bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Comandante das Forças Terrestres, Presidente da Cáritas Portuguesa, Comissário Europeu da Politica Regional e o Minis-tro da Defesa Nacional (Figura 17).Para além da compreen-são da dor e do conforto moral que transmitem às vítimas, as visitas institu-cionais têm o mérito de colocarem a ocorrência na agenda nacional, uma vez que normalmente se fazem acompanhar por representantes dos vários órgãos de comunicação social.

Figura 16 – Ponte militar na Fajã da Ribeira.Fonte: Arquivo RG3

Figura 17 – As visitas.Fonte: RG3, 2010

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5. CONCLUSÕES E REFLEXÕES

A pronta resposta por parte das Forças Armadas, com relevância para o Exército, aos acontecimentos que ocorreram na Ilha da Madeira, em 20 de Fevereiro de 2010, foi de enorme eficácia e rapidez.Destaca-se, nesse contexto, o alojamento fornecido aos 236 desalojados que estiveram em instalações militares, a alimentação, o apoio médico prestado, o fornecimento de transporte, as equipas de busca e salvamento e as de re-moção de escombros e limpeza, que desde os primeiros instantes prestaram apoio aos mais necessitados e o mantiveram ininterruptamente durante várias semanas, até ao último desalojado ter deixado o RG3; revelando a dinâmica de um Exército empenhado, solidário e abnegado.A adequada intervenção da Forças Armadas, e do Exército em particular, foi resultante:

– De um dispositivo racionalizado do Exército, ajustado, do ponto de vista dos meios humanos e materiais, ao ambiente operacional em que se insere, permitindo uma presença adequada no terreno, garantindo a oportunidade e a permanência do apoio. A sua presença efectiva junto da sociedade cons-titui um importante valor estrutural, quer através do cumprimento da sua missão constitucional de defesa militar da República, como na satisfação dos compromissos internacionais ou ainda de colaborar em missões de protecção civil, em tarefas relacionadas com a satisfação de necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações 16, sempre com uma postura discreta mas de grande abertura e proximidade. A perfeita comunhão de instalações militares por civis e o carinho e apreço que a população demonstrou para com os militares do Exército são disso um bom exemplo. O claro reconhecimento dos desalojados e demais vítimas, é assim corolário do trabalho desenvolvido pelos militares no terreno, e da forma como foram montados e sustentados os Centros de Acolhimento Temporário de Desalojados e de Entrega de Donativos em espécie, com destaque para o operado no RG3;

– Da colocação dos meios da Componente Operacional do Exército ao serviço das missões de interesse público, reflectindo assim a capacidade dual desses meios;

– Da existência de Planos adequados para intervir em caso de emergência, em que os elementos e meios a empregar estão organizados por capacidades e articulados por equipas para a realização de tarefas específicas;

16 Constituição da Républica Portuguesa,VII Revisão Constitucional, 2005, art.º 275º.

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– Da experiência dos diversos exercícios efectuados sobre esta temática, que permitiram treinar procedimentos e adequar os Planos às necessidades da Sociedade Civil;

– Da correcta articulação dos meios, através do estabelecimento de uma organi-zação própria, para a operação;

– Das sinergias criadas pela interacção com várias organizações 17 e voluntários, e da enorme onda de solidariedade (Regional, Nacional e até Internacional) que se gerou à volta das populações afectadas.

A colaboração dos militares no apoio às vítimas do temporal que ocorreu na Ilha da Madeira, em 20 de Fevereiro de 2010, demonstra claramente as capacidades que as Forças Armadas possuem para colaborarem em missões de protecção civil em apoio das populações afectadas por desastres naturais, para além de, importa salientar, a confiança que existe entre a população civil e as Unidades militares, contribuindo para um sentimento de segurança no seio da comunidade.Desta forma, quando ocorrem calamidades naturais ou acontecimentos que impliquem a mobilização de vários meios, nos quais se inserem as capacidades das Forças Armadas, é desejável que as Unidades militares participem nesse esforço. Se na Região Autónoma da Madeira isso ocorre de forma natural, no Continente por vezes isso não acontece. Veja-se por exemplo, o caso do tornado que assolou os concelhos de Tomar, Sertã e Ferreira do Zêzere, em 7 de Dezembro de 2010 (Subtil, 2010; Freitas, 2010; Cidade de Tomar, 2010 18). Contudo, conforme referimos, a intervenção dos militares nestas circunstâncias está dependente da solicitação das entidades competentes da estrutura de protecção civil, não por iniciativa própria.As estruturas superiores de protecção civil, nomeadamente a ANPC no Continente e os Secretários Regionais que tutelam os respectivos SRPC nas Regiões Autónomas, são conhecedores das capacidades das Forças Ar-madas nesta matéria (recorde-se que possuem representantes militares nas suas estruturas), e são as entidades que devem solicitar a colaboração das Forças Armadas. Em caso de manifesta urgência, os Comandantes Opera-cionais Distritais e os Presidentes das Câmaras Municipais podem fazê-lo directamente às Unidades implantadas no terreno.

17 Designadamente: SRPC, IP-RAM, Centro de Segurança Social da Madeira, Investimentos Habitacionais da Ma-deira, Caritas Diocesana do Funchal e Câmaras Municipais representativas dos respectivos cidadãos desalojados.

18 No Jornal da Cidade de Tomar de 24 de Dezembro de 2010, pág. 13, é referido que “os Independentes por Tomar” sublinham “que teria sido bastante positivo convocar os operacionais do Regimento de Infantaria 15 para ajudar na prevenção de actos de pilhagem, que acabaram por acontecer” e “que os militares não se podem sobrepor ás autoridades em matéria de segurança e esclareceu que o RI15 esteve disponível para acolher desalojados”.

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ProElium – rEvista CiEntífiCa da aCadEmia militar

Entendemos que num país de recursos limitados, é desejável e racional que as Forças Armadas cooperem, complementem e reforcem as Forças e os Serviços de Segurança e outros agentes de protecção civil, rentabilizando estruturas e evitando a sobreposição e consequente dispersão de recursos.Por outro lado, a experiência da Madeira demonstra a necessidade de as Forças Armadas colaborarem com as Forças e Serviços de Segurança durante as missões de protecção civil, nomeadamente durante as acções de busca, salvamento e patrulhamento. O que fazer, por exemplo, quando uma Equipa de militares na actividade de Reconhecimento e Busca de vítimas assiste a pilhagens de estabeleci-mentos comerciais ou quando as pessoas não querem abandonar as casas em risco de ruir?Todavia, refira-se, que por imperativos legais, a cooperação e a colaboração que se espera que as Forças Armadas facultem às Forças e aos Serviços de Segurança encontram-se limitadas em termos de intervenção. São disso exemplo a inexistência dos instrumentos necessários para a execução, nomea-damente, de medidas de polícia, detenções em flagrante delito e legitimidade para o exercício da autoridade (COM, 2010).Por último, conforme referimos no início, parafraseando Ponte (2006:2), somos de opinião que a colaboração das Forças Armadas com o SRPC, IP-RAM em apoio das vítimas do temporal que se abateu sobre a Ilha da Madeira em 20 de Fevereiro de 2010, permite “contribuir para a compreensão global de um certo fenómeno de interesse”.

BIBLIOGRAFIA

RG 3 (2010). Madeira, 20Fev10 – A Dimensão Solidária, Regimento de Guar-nição N.º 3, Funchal.

CFT (2011a). Comando das Forças Terrestres, Website do Exército, http://www.exercito.pt/sites/ CFT/Actividades/Paginas/4363.aspx, acedido em 30 de Maio de 2011.

CFT (2011b). Comando das Forças Terrestres, Website do Exército, http://www.exercito.pt/sites/ CFT/Actividades/Paginas/4362.aspx, acedido em 30 de Maio de 2011.

CIDADE DE TOMAR (2010). Jornal Cidade de Tomar, 24 de Dezembro de 2010, pág. 13.

COM (2010). Súmula da Workshop “Bases para um Conceito Operacional Cooperativo de Actuação na RAM”, 27 e 28 de Setembro de 2010, Co-mando Operacional da Madeira, Funchal.

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a aCção do ExérCito no aPoio à ProtECção Civil: madEira, fEvErEiro 2010

FREITAS, António (2010). E Tudo o Vento Levou, Jornal Cidade de Tomar, 24 de Dezembro de 2010, pág. 30.

PONTE, João Pedro (2006). Estudos de caso em educação matemática, Bolema, Vol. 19, N.º 25 (2006), disponível em http://www.periodicos.rc.biblioteca.unesp.br/index.php/bolema/ article/viewArticle/1880, acedido em 12 de Agosto de 2011.

SUBTIL, Manuel (2010). Críticas à Protecção Civil, Jornal Cidade de Tomar, 17 de Dezembro de 2010, pág. 7.

LEGISLAÇÃO / DIRECTIVAS / PLANOS

Constituição da República, VII Revisão Constitucional, 2005.

Decreto-Lei da Organização do Exército, Decreto-Lei n.º 231/2009, de 15 de Setembro.

Directiva Operacional N.º006/CEMGFA/2010, Participação das Forças Armadas em Acções de Protecção Civil, de 18 de Janeiro.

Lei de Bases da Protecção Civil, Lei n.º 27/2006, de 03 de Julho.

Lei de Defesa Nacional, Lei n.º 31-A/2009, de 7 de Julho.

Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas (LOBOFA), Lei n.º1-A/2009, de 07 de Julho.

Lei de Segurança Interna, Lei n.º 53/2008, de 29 de Agosto.

Plano de Operações Auxílio, Participação da Zona Militar da Madeira em Ac-ções de Protecção Civil, Fevereiro de 2010.

Regime jurídico do Sistema de Protecção Civil da Região Autónoma da Madeira, Decreto Legislativo Regional n.º 16/2009/M, de 30 de Junho

LISTA DE SIGLAS E ACRÓNIMOS

A

ANPC Autoridade Nacional de Protecção Civil AR Assembleia da República

B

BQR Biológica, Química e Radiológica

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C

CA Comando Aéreo CCOD Centro de Coordenação Operacional Distrital CCON Centro de Coordenação Operacional Nacional CCOR Centro de Coordenação Operacional Regional CDDF Comissões Distritais de Defesa da Floresta CDOS Comando Distrital de Operações de Socorro CDPC Comissões Distritais de Protecção Civil CEMGFA Chefe de Estado-Maior-General das Forças Armadas CFT Comando das Forças Terrestres CmdCB Comandante da Corporação de Bombeiros CMFUNCHAL Câmara Municipal do Funchal CMPC Comissão Municipal de Protecção Civil CN Comando Naval CNOS Comando Nacional de Operações de Socorro CNPC Comissão Nacional de Protecção Civil COA Comando Operacional dos Açores COC Comando Operacional Conjunto COD Comando Operacional Distrital COM Comando Operacional da Madeira CONS MINIS Conselho de Ministros CROS Comando Regional de Operações e Socorro CRPC Comissão Regional de Protecção Civil CSOC/COC/EMGFA Centro de Situação de Operações Conjunto do Comando de Ope-

rações Conjunto do Estado-Maior-General das Forças ArmadasCZAM Comando da Zona Aérea da Madeira CZMARM Comando da Zona Marítima da Madeira CZMM Comando da Zona Militar da Madeira

EElemDefBG Elemento de Defesa Biológica e Química EMGFA Estado-Maior-General das Forças Armadas

G

GRM Governo Regional da Madeira

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a aCção do ExérCito no aPoio à ProtECção Civil: madEira, fEvErEiro 2010

I

IHM Investimentos Habitacionais da Madeira

M

MAI Ministério da Administração Interna

N

NBQ Nuclear Biológico e Químico

P

PCM Presidente da Câmara Municipal PSRPC Presidente do Serviço Regional de Protecção Civil

R

RAM Região Autónoma da Madeira RG3 Regimento de Guarnição N.º 3

S

S. SOCIAL Centro de Segurança Social da Madeira SIOPS Sistema Integrado de Operações de Protecção e Socorro SIOPS-RAM Sistema Integrado de Operações de Protecção e Socorro da

Região Autónoma da MadeiraSMPC Serviço Municipal de Protecção Civil SREG Secretário Regional SRPC,IP-RAM Serviço Regional de Protecção Civil, Instituto Público - Re-

gião Autónoma da Madeira

U

UnAp/CmdZMM Unidade de Apoio do Comando da Zona Militar da Madeira

Z

ZMM Zona Militar da Madeira

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CaraCtErização E PrEvEnção dE lEsõEs dECorrEntEs dE aCtividadE físiCa nas instituiçõEs dE Ensino suPErior militar

Carina Sofia Rodrigues Carvalho (*)

Alferes de Artilharia

ABSTRACT

Physical activity is a cornerstone for the training of military students who attend the Military Institutions of Higher Education. This provides the continued well-being, health and physical condition of the student and encourages the development of technical skills, tactical, psychological and sociological, indispensable for the performance of their duties. However, during physical activity, the student is prone and susceptible to the oc-currence of physical injuries.

This study aims are the characterization of physical injuries from physical activity in the Military Institutions as well as identify the pre-ventive measures taken by the students.

This investigation is divided in two parts. The theoretical part that is resumed to a literature revision that establishes a conceptual guideli-ne of theme, related to Physical Activity and physical injuries, finishing with some preventive measures analysis. The practical part consists in an application of questionnaires with the objective to collect data about the injuries in physical activity, for later, analyze the data collected to establish some conclusions.

It was concluded that from the nature of the injuries resulting from physical activity, the most frequent are sprains at level of the lower limbs.

1 Artigo Adaptado do Trabalho de Investigação Aplicada, realizado no âmbito do Mestrado Integrado em Ciências Militares. Orientado pelo Major de Infantaria Lopes Marques.

* Mestre em Ciências Militares na Especialidade de Artilharia, pela Academia Militar.

CaraCtErização E PrEvEnção dE lEsõEs dECorrEntEs dE aCtivi-dadE físiCa nas instituiçõEs dE Ensino suPErior militar 1

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ProElium – rEvista CiEntífiCa da aCadEmia militar

As for preventive care, students have attention to equipment, but neglect the training program. Following the injury, most students turn to medical care for the treatment, however, most students have not fully recovered from the injury or the injury reappeared.

Keywords: Physical activity, Physical injuries, Prevention, Military Ins-titutions.

RESUMO

A actividade física constitui um dos pilares para a formação militar dos alunos que frequentam as Instituições de Ensino Superior Militar. Esta proporciona a manutenção do bem-estar, saúde e condição física do aluno e estimula o desenvolvimento de qualidades técnicas, tácticas, psicológicas e sociológicas, indispensáveis para o desempenho das suas funções. Porém, durante a prática de actividade física, o aluno encontra-se predisposto e susceptível à ocorrência de lesões físicas.

Este estudo tem como objectivos caracterizar as lesões físicas de-correntes de actividade física nas Instituições de Ensino Superior Militar e identificar as medidas preventivas tomadas pelos alunos.

Esta investigação encontra-se dividida em duas partes. A parte teórica constituída pela revisão de literatura que visa estabelecer um en-quadramento conceptual do tema, relacionado com a actividade física e as lesões físicas. A parte prática teve por base a aplicação de questionários para retirar dados relativos à caracterização das lesões e às medidas pre-ventivas, para posteriormente analisar os dados recolhidos e estabelecer algumas conclusões.

Concluiu-se que de entre a natureza das lesões decorrentes da prática de actividade física, as mais frequentes são os entorses ao nível dos membros inferiores. Quanto aos cuidados preventivos, os alunos têm atenção ao equipamento, mas descuram a programação do treino. No segui-mento da lesão, a maioria dos alunos recorre ao acompanhamento médico para o tratamento da mesma, no entanto, a maioria dos alunos ainda não recuperou totalmente da lesão ou a lesão reapareceu.

Palavras-Chave: Actividade física, Lesões físicas, Prevenção, Instituições de Ensino Superior Militar.

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CaraCtErização E PrEvEnção dE lEsõEs dECorrEntEs dE aCtividadE físiCa nas instituiçõEs dE Ensino suPErior militar

INTRODUÇÃO“We expect highly paid athletes to be in outstanding

physical shape and to have the best sports medical care possible when they step onto the field of “battle”, but

what about our country’s true soldiers? How are we hel-ping military “athletes” achieve optimal physical fitness

levels and prevent injuries while keeping them in the most important “game” of all – protecting our country!”

(Onate, 2004)

Segundo o Regulamento de Educação Física do Exército (REFE) (2002), o valor de um Exército está assente no valor dos seus soldados. O valor dos sol-dados é determinado por um conjunto de capacidades e qualidades psicomotoras, éticas, culturais e sociais adquiridas e cimentadas ao longo da sua “Formação Militar”. A formação engloba três grandes componentes, a saber, a componente técnico-táctica, a componente moral/cívica, e a componente física. O Exército moderno, caracterizado pelos progressos a nível tecnológico e de armamento, requer cada vez mais pessoal especializado. A exigência de uma especialização técnico-táctica do militar tende a sobrevalorizar o valor da componente física, mas apesar dos inúmeros progressos a nível tecnológico dos materiais, a peça essencial da doutrina de um Exército continuará a ser a componente humana (Ro-drigues, 2007). Perante o combate isolado, em situações de stress e inquietação, é fulcral o empenhamento moral, físico e psíquico do combatente (REFE, 2002).

A vertente física é particularmente importante não só para o desenvolvimento das capacidades físicas, mas contribui valiosamente para o carácter e valor moral do indivíduo (REFE, 2002). No entanto, a capacidade física é constantemente ameaçada pela inevitabilidade de lesões, “…o exercício deve ser aplicado como um fármaco, ou seja, devemos procurar a dose mínima capaz de estimular a resposta óptima e administrá-la em períodos tais que permitam a recuperação do organismo e a minimização dos efeitos laterais” (Carneiro, Lopes & Moreira, 2002, p.8)

A ocorrência de lesões durante a actividade física (AF) é uma realidade. Apesar da AF envolver princípios que assentam num desenvolvimento saudável do indivíduo, deparamo-nos com uma realidade em que os princípios são colocados à margem quando se atingem limites perigosos para o bem-estar do indivíduo (Ferreira de Castro, 2005).

1. CONCEITO DE ACTIVIDADE FÍSICA

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) (2011), a AF é definida como qualquer movimento corporal produzido pelo sistema músculo-esquelético que implica dispêndio de energia. No entanto, o conceito de AF é multidimensional

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pois envolve características como a intensidade, a duração, a frequência, a circunstâncias, e pode englobar qualquer tipo de movimento (Basset, 2000).De acordo com Aires (2009), a AF abrange três vertentes:

a) a AF voluntária (engloba a AF planeada e estruturada com uma determinada duração e realizada para promover um ou mais atributos da condição física);

b) a AF quotidiana (inclui o andar, as tarefas domésticas e ocupacionais) e a actividade espontânea;

c) involuntária (inclui todos os movimentos do corpo desde um simples piscar de olhos às contracções musculares).

O exercício e o desporto (AF voluntária) são subdivisões da AF e representam dois conceitos distintos (Caspersen et al., 1985). Os mesmos autores definem o exercício como uma AF planeada, estruturada e repetitiva cujo objectivo é manter ou melhorar um ou mais componentes da aptidão física. Porém, o desporto é uma forma ainda mais específica de AF, caracterizada por ser estruturada, planeada, competitiva e sujeita a regras (Kaplan et al., 1993). Porém, a definição de AF adoptada para a investigação insere-se no contexto militar, a qual “…tem sido frequentemente entendida como o conjunto das ac-tividades físicas praticadas no seio do Exército, as quais, associadas à instrução técnica e táctica, visam a preparação para o combate” (REFE, 2002, p.1-2).

2. A ACTIVIDADE FÍSICA NAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPE-RIOR MILITAR

2.1 A Actividade Física na Academia Militar

De acordo com o Plano de Formação Militar (PlFM) do ano lectivo de 2010/2011, a formação de Educação Física a ministrar aos alunos da AM, tem como objectivos gerais:

• desenvolver as componentes condicionais e coordenativas;• aplicar um conjunto de exercícios como meio prioritário e operacional de

preparação dos alunos, consubstanciando as adaptações físicas, técnicas, tácticas, psicológicas e sociológicas, fundamentais para a consecução de um elevado desempenho das tarefas e funções militares;

• criar hábitos saudáveis e estilos de vida activa, desenvolvendo o gosto pela prática física e desportiva.

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Na AM distinguem-se as actividades:

• preparação Física Geral (PFG – corrida contínua, “fartlek”, treino intervalado, treino em circuito);

• treino Físico de Aplicação Militar (TFAM – Ginástica de Aplicação Militar, Esgrima, Judo, Boxe, Combate Corpo a Corpo, Natação Mi-litar);

• desportos (Ginástica, Equitação, Natação, Natação Militar).

2.2 A Actividade Física na Academia da Força Aérea

De acordo com o Planeamento e Avaliação da Disciplina de Educação Física para o ano lectivo 2010/2011, a disciplina de Educação Física e Desportos a ministrar aos alunos da AFA tem como objectivos:

• desenvolver as capacidades condicionais e coordenativas para níveis consentâneos com um desempenho motor eficiente e eficaz adaptado às necessidades da missão;

• desenvolver nos alunos capacidades e competências psicomotoras preparatórias das situações reais de combate;

• corrigir posturas e atitudes e contribuir para o desenvolvimento da disciplina, espírito de corpo e camaradagem;

• reforçar o gosto pela prática regular da actividade física e aprofundar a compreensão da sua importância como factor potenciador de saúde e de qualidade de vida.

Na AFA, distinguem-se as actividades:

• treino Físico Militar (TFM);• desportos Colectivos (DCL – Andebol, Basquetebol, Corfebol,

Futebol, Voleibol);• técnicas de Transposição de Obstáculos (TTO);• desportos individuais/Desportos de Confrontação Directa (DICD);• desportos de combate e Defesa pessoal (Judo/ Krav Maga);• ginástica Desportiva (GIN 1, GIN 2, GIN 3);• pentatlo Aeronáutico (PAIM);• treino Específico da Força (TF).

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3. DEFINIÇÃO DE LESÃO

Para Massada (2003) refere a dificuldade do estudo da traumatologia 2 des-portiva pela existência de um número diversificado de definições de lesão. Para Massada (2003) definição de lesão compreende duas ideias-chave: a) lesão será todo e qualquer traumatismo referido pelo atleta durante um

período específico da prática desportiva;b) lesão será toda a patologia traumática que determina uma paragem da

actividade desportiva

“O Conselho da Europa define lesão desportiva como uma patologia traumática adquirida durante um jogo ou prática desportiva, causando uma ou mais das seguintes condições: redução da actividade, necessidade de tratamento ou aconselhamento médico e/ou consequências negativas do ponto de vista económico e social” (Ferreira de Castro, 2005, p. 17).

O National Collegiate Athletic Association (NCAA) dos EUA desenvolveu um sistema denominado Injury Surveillance System (ISS), em 1982, com o intuito de estabelecer um conjunto comum de lesões e seus respectivos factores de risco para analisar as lesões desportivas que ocorrem a nível universitário (Pheiffer et al., 1998). Segundo este sistema, uma lesão para ser considerada como tal deve respeitar três critérios: a) a lesão ocorre como resultado da participação de treinos ou competições; b) exige cuidados médicos e implica a paragem da prática de exercício

físico durante um ou mais dias excluindo o dia de ocorrência da lesão (Pheiffer et al., 1998).

Apesar da diversidade de definições, Ferreira de Castro (2005) refere que os estudos atribuem importância a três critérios: • a implicação de paragem na AF;• a necessidade de tratamento/observação;• a alteração da performance do indivíduo.

Para Massada (2003) de modo a quantificar a ocorrência de lesões, torna-se necessário distinguir dois conceitos, a incidência e a prevalência. A incidência representa uma medida descritiva de novas ocorrências durante um período específico de tempo, enquanto a prevalência representa uma avaliação da presença de lesão num período ou ponto específico de tempo.

2 Estudo que envolve as lesões produzidas por uma acção violenta de um agente exterior (Proença, 2008)

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4. CLASSIFICAÇÃO DE LESÃO

As lesões podem ser classificadas segundo diferentes critérios tais como: a gravidade, localização, tipo, lado do corpo e inclusive pela possibilidade de ser reincidente ou não (Ferreira de Castro, 2005). Podemos caracterizar as lesões em macrotraumáticas e microtraumáticas. As lesões macrotraumáticas são originadas por um movimento repentino directo (Kjaer et al., 2003) que provoca lesão, pois a sua energia é superior à capacidade de resistência do tecido lesado (Barata et al., 1997). O macrotraumatismo é característico de actividades que envolvem contacto físico e gestos explosivos, como um desporto de contacto (e.g. luta ou futebol) ou um desporto de alta velocidade (e.g. esqui downhill 3 ) (Kjaer et al., 2003). As lesões microtraumáticas são provocadas pela actividade repetitiva (i.e. que exigem um gesto desportivo repetitivo) de baixo impacto, e.g. nadar, andar de bicicleta ou correr (Kjaer et al., 2003). O microtraumatismo envolve o con-tacto com agentes agressores (e.g. solo duro, contacto da bola de ténis com a raquete) (Barata et al., 1997). Este tipo de lesões resulta da incapacidade dos tecidos (tendão e músculo) se adaptarem à carga repetitiva (Kjaer et al., 2003). As lesões microtraumáticas também são chamadas de lesões de sobrecarga (Barata et al., 1997) ou lesões crónicas, enquanto os macrotraumatismos tam-bém podem ser denominados de lesões agudas (Kjaer et al., 2003).Para Massada (1989), as lesões podem receber uma outra designação, como por exemplo: lesões de overstress (agudas ou macrotraumáticas) e lesões de overuse ou de sobrecarga (ou microtraumáticas). O mesmo autor classifica as lesões de overuse em tendinites, fracturas de fadiga, musculopatias e artroses 4.O Quadro 1 sintetiza a classificação das lesões.

3 Especialidade de esqui alpino (desporto de Inverno) baseada numa corrida com curvas e saltos perigosos e na qual se atingem as velocidades máximas de todas as especialidades de esqui (Internet: http://www.fdiportugal.pt/)

4 A artrose é uma doença que afecta as articulações importantes como as das mãos, pés, joelhos e coluna vertebral (Viana de Queiroz, 2005).

Quadro 1 – Qualificação das lesões.

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5. FACTORES DE RISCO

É possível evitar a ocorrência da lesão se os factores que conduzem ao seu apa-recimento forem identificados antecipadamente (Pascoal, 2003). Para Ganhão et al. (1998) as lesões têm a sua origem em quatro agrupamentos: a) factores relacionados com o treino;b) factores pessoais;c) factores organizativos; d) factores ambientais;

Os primeiros, referem-se à planificação do treino que pode conduzir a lesões caso seja executado de forma incorrecta (e.g. a falta de um período de retorno à calma no final do treino) e aos alongamentos e estiramentos, que devem ser incluídos na fase de aquecimento e retorno à calma.Os factores pessoais incluem a aptidão física para a modalidade, alterações posturais e a alimentação; os factores organizativos englobam a assistência clínica, o material desportivo a as normas de segurança e por último os fac-tores ambientais, dentro dos quais as condições climatéricas desempenham um papel importante na AF (Ganhão et al., 1998).De acordo com Massada (1989), os factores de risco que tornam o atleta predisposto e susceptível a lesões dividem-se em factores determinantes e factores favorecedores:

a) os factores determinantes correspondem a relações neuromusculares5 defi-cientes que originam um esforço tal que ultrapassa a resistência elástica da fibra muscular dando origem a lesões;

b) os factores favorecedores dizem respeito a um conjunto de situações que po-dem conduzir a lesões tais como o treino desportivo, o aquecimento, o perfil morfológico e psicológico do atleta, a fadiga, os solos, o calçado desportivo e as condições ambientais (Massada, 1989).

Os factores de risco podem ainda ser classificados em factores de risco in-trínsecos e extrínsecos (Horta, 1995; Pfeiffer et al., 1998; Carazzato, 2011; Ferreira de Castro, 2005). Os primeiros estão relacionados com as carac-terísticas do próprio indivíduo, enquanto os factores de risco extrínsecos relacionam-se com a existência de agentes externos correspondentes ao treino do indivíduo (Ferreira de Castro, 2005). Portanto, de acordo com o mesmo autor, a lesão resulta da união de ambos os factores num dado momento.

6 Relativo aos nervos e aos músculos” (Manuila, 2004, p.340)

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Seguidamente vamos analisar, em detalhe, os factores de risco de lesão, recor-rendo à classificação utilizada por Horta (1995) que decompõe os factores de risco em factores de risco intrínsecos e extrínsecos como mostra o Quadro 2.

6 “Relativo aos ossos e às articulações” (Manuila, 2004, p.441).7 O joelho valgo, também designado de “perna em X”, resulta de uma deformação do membro inferior na

qual o joelho sofre um desvio para dentro, segundo a linha média do corpo (Baptista, 1924).

Quadro 2 – Factores de risco.

5.1 Factores Intrínsecos

5.1.1 Idade e Género

Ferreira de Castro (2005) refere que os atletas de maior idade são mais susceptíveis a lesões musculares, enquanto os mais jo-vens estão mais vulneráveis a fracturas. Segundo Horta (1995), os atletas mais velhos estão mais sujeitos a lesões articulares e tendinosas e, os atletas mais jovens dada uma maior exigência de rendimento a uma maior incidência de lesões.Para alguns autores, a mulher apresenta maior vulnerabilidade a determinadas lesões quando comparativamente ao homem (Horta, 1995; Ireland, 2005; Hirst, 2007).Horta (1995) considera que a razão para a discrepância de in-cidência de lesões entre géneros está na diferença da anatomia corporal da mulher e do homem. O mesmo autor refere que a menor massa muscular da mulher, quando comparada com a dos homens, favorece a ocorrência de lesões osteoarticulares 6.Ireland (2005) e Hirst et al. (2007) consideram que as lesões que afectam o membro inferior da mulher relacionam-se com a sua anatomia e com níveis hormonais. Ireland (2005) esclarece que as mulheres estão mais predispostas do que os homens a lesões do ligamento cruzado anterior (LCA). A mesma autora, menciona que as diferenças anatómicas dos membros inferiores da mulher comparativamente ao homem como o alargamento da pélvis, condiciona a que os joelhos adoptem uma posição em valgo 7 o que favorece o aparecimento de lesões no joelho.

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Os níveis hormonais da mulher, principalmente durante o ciclo mens-trual, podem potenciar a laxidez 8 das articulações que conduzem à ocorrência de lesões (Hirst et al., 2007).

5.1.2 Factores Psicológicos e Sociológicos

Os factores psicológicos desempenham um papel importante na ocorrência de lesões e na sua recuperação (Horta, 1995). Todos os atletas possuem um nível ideal de ansiedade específico de cada um, no entanto, este pode ser prejudicial para a atenção e concentração do atleta conduzindo a um aumento da probabilidade de se lesionarem. Níveis baixos de ansiedade provocam a disper-são de atenção, levando o indivíduo a preocupar-se com factores externos à AF. Por outro lado, o excesso de ansiedade provoca a diminuição da coordenação neuromuscular e um aumento exces-sivo do tónus muscular. A experiência de um indivíduo na prática de AF constitui-se como um factor importante. Um praticante experiente terá mais facilidade na resolução de determinadas situações (Horta, 1995).O stress é considerado igualmente como um factor psicológico im-portante (Prieto, 2007). Carvalho (2009) destaca um estudo realizado no futebol americano que concluiu que os atletas que tinham vivido acontecimentos de vida stressantes estavam mais predispostos à ocorrência de lesões do que aqueles que não tinham vivido. A personalidade do indivíduo é um factor que poderá predispor à lesão (Massada, 1989). Os desportistas mais reservados e indife-rentes são os que sofrem um maior número de lesões (Massada, 1989), enquanto os indivíduos mais extrovertidos lesionam-se menos (Palmeira, 1998). A relação do indivíduo com o meio envolvente (pais, instrutor e dirigentes), adquire uma enorme importância para o equilíbrio psí-quico do mesmo (Horta, 1995). Para Horta, as pressões exercidas por agentes deste meio podem ter consequências negativas para o bem-estar psíquico do indivíduo, provocando elevados níveis de ansiedade, o que propicia o aparecimento de lesões.

8 Laxidez refere-se ao aumento de mobilidade generalizada ou específica de uma articulação (Gonçalves, 2005).

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5.2 Factores Extrínsecos

5.2.1 Equipamento

Os cuidados com o equipamento utilizado na prática de AF, nome-adamente o calçado, assumem um papel de grande importância na prevenção de lesões (Horta, 1995). O calçado é “…a mais importante peça do equipamento do desportista” (Nigg, 1986, p.6). Este deve ser adequado a fim de evitar possíveis deformações do pé (Nunes, 1998), obter o melhor desempenho possível, prevenir a sobrecarga do membro inferior e coluna lombar (Massada, 1987). Nunes (1998) refere que o calçado não deve permitir grandes au-mentos de temperatura, de forma a facilitar a saída do suor do pé, contribuindo para diminuir o desenvolvimento de micro organismos. Segundo Massada (1987), a escolha do calçado deve ser ponde-rada e com base em critérios como a forma do sapato, costuras, sola, palmilhas, entre outros. O calçado além de se adaptar ao indivíduo, deve ser apropriado ao tipo de AF (Horta, 1995) e ao tipo de terreno onde se desenvolvem as respectivas actividades, oferecendo ao praticante as condições necessárias ao seu melhor desempenho, tais como, velocidade, agilidade, estabilidade e conforto (Massada, 1987). O mesmo autor faz referência a um estudo realizado nas quatro melhores equipas portuguesas de vo-leibol e constatou que cerca de 67% dos atletas usavam calçado inapropriado para o tipo de piso onde realizavam as competições. Horta (1995) realça a importância do calçado com o exemplo dos fundistas 9 e marchadores, que se tornam susceptíveis a lesões microtraumáticas nos membros inferiores, pois o calçado é inapro-priado ao tipo de solo mais duro, amortecendo pouco o choque do pé contra o solo. Nigg (1986) faz referência a um estudo de 1977 realizado com atletas de diferentes nacionalidades onde se concluiu que dois em cada três jogadores sofreram lesões todos os anos, sendo 58% destas lesões com incidência nos membros inferiores. Relativamente à indumentária, esta deve ser a mais adequada às especificações da actividade (Horta, 1995).

9 As corridas de fundo correspondem às corridas de maiores distâncias, nomeadamente os 5000m, 10000m e a maratona cuja distância é de 42195m..

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5.2.2 Local de Treino e Material

De acordo com Massada (1987), as superfícies de treino estão direc-tamente relacionadas com a carga suportada pelos membros inferiores. De acordo com o mesmo autor, a carga será tanto maior quanto mais duras e irregulares forem as superfícies onde se desenvolve a actividade.Segundo Massada (1987, 1989) os solos não oferecem iguais condições à prática de AF. Por exemplo os solos sintéticos, permitem ao prati-cante obter maiores velocidades de deslocamento e oferecem melhores condições de conservação. Contudo, devido à sua dureza não possuem grande poder de amortecimento de choque do pé contra o solo, pro-piciando a ocorrência de lesões de sobrecarga, enquanto, são os solos naturais, relva e terra batida, que possuem melhores condições no que respeita às características de absorção do poder de impacto (Massada, 1989). Segundo Horta (1995), os pisos florestais, normalmente em terra batida, apresentam as melhores condições para a prática de corrida, apesar de algumas irregularidades (buracos, pedras salientes) poderem ser prejudiciais no Inverno, pois as chuvas tornam o piso enlameado. Horta (1995) refere que a relva oculta irregularidades no terreno e que a areia promove uma técnica de corrida deficiente. O mesmo autor exemplifica com a areia junto ao mar, que por se constituir como um plano inclinado, origina um apoio assimétrico e conduz a lesões de sobrecarga sobre as estruturas mais solicitadas. Más condições para a prática de AF, tais como, uma pista de tartan com reduzida aderência e amortecimento, caixas de saltos com areia insuficiente ou colchões que se apresentem em mau estado de conservação, propiciam a ocorrência de lesões (Horta, 1995).

5.2.3 Planeamento do Treino

O treino deve ser planeado de forma ponderada com base em alguns critérios como a carga de treino, a recuperação (Horta, 1995), o aque-cimento e o retorno à calma (Ganhão et al., 1998). Segundo Nunes (1998), o aquecimento visa preparar o organismo para os esforços decorrentes da AF. Ganhão et al. (1998) refere que um aquecimento incorrecto revela uma planificação errada do treino. Quando o aque-cimento é mal direccionado e inadequado às condições climatéricas ou mesmo às características da AF a desenvolver, pode conduzir à ocorrência de lesões (Horta, 1995). Gonçalves & Mendes, (1991) afirmam que não existe qualquer prova de que o aquecimento reduza a ocorrência de acidentes e lesões.

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Além do aquecimento, o retorno à calma surge como uma compo-nente importante do treino de qualquer praticante, pois contribui para recuperação muscular e cardiovascular (Ganhão et al., 1998).

6. CUIDADOS PREVENTIVOS

Quando identificados os factores que propiciam o aparecimento de lesões, torna-se possível determinar medidas de prevenção (Simões, 2005) a fim de reduzir o risco de lesão e a sua severidade (Ferreira de Castro, 2005). Estas medidas preventivas podem dividir-se em dois níveis, o primeiro que procuram evitar a incidência de lesão - prevenção primária e segundo que após a ocorrência da lesão, procuram minimizar as suas consequências, contribuindo para uma rápida recuperação do indivíduo lesionado - prevenção secundária (Ferreira de Castro, 2005; Horta, 1995; Simões, 2005; Pascoal, 2003). No entanto, é possível identificar um terceiro nível de prevenção. Segundo Horta (1995) e Pinheiro (1998), a prevenção terciária classifica-se pela prevenção na fase crónica 10 da lesão e da sua recidiva 11 assim como a reinserção do indivíduo na AF. Adoptámos para este efeito, a classificação de cuidados preventivos segundo Horta (1995) e Pinheiro (1998), que distinguem três níveis de prevenção, o primeiro pre-venção primária, o segundo prevenção secundária e por último prevenção terciária.

6.1. Prevenção Primária

Neste nível de prevenção, Horta (1995) considera duas vertentes: uma primeira constituída pelas medidas cujo objectivo é promover, a saúde en-volvendo a “nutrição”, o desenvolvimento da personalidade” e a “educação para a saúde”, entre outras; a segunda vertente abrange os cuidados que contribuem para reduzir a incidência de lesões ou acidentes (esta vertente compreende a selecção do equipamento, as condições e programação dos treinos, a higiene física e mental e ainda a alimentação). Para Pinheiro (1998), este nível de prevenção envolve a realização de um exame mé-dico e a implementação de programas técnicos que actuem a nível da flexibilidade, do fortalecimento muscular e do treino proprioceptivo 12.

10 Fase de evolução lenta ou de longa duração (Manuila, 2004).11 Reaparecimento de uma doença, depoi de um período mais ou menos longo após a sua cura ou silencia-

mento” (Manuila, 2004, p.516).12 “A propriocepção resulta de um processo através do qual o sistema nervoso central cerebe input de diversas

fontes de estímulo que integra para definir o movimento ou a posição articular”.(Ribeiro & Oliveira, 2008, p. 17).

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6.2. Prevenção Secundária

A prevenção secundária visa o diagnóstico precoce e a intervenção terapêutica mais correcta de forma a minimizar as consequências da lesão, evitar futuras complicações e sequelas, para que o indivíduo possa retornar à AF o mais rápido possível (Horta, 1995). A procura da orientação de um médico ou de um fisioterapeuta contribuem para prevenir futuros desconfortos cardiorespiratórios e músculo-esqueléticos aquando do retorno à prática de AF (Simões, 2005).

Caracterização do Sistema de Resposta MédicoNo seguimento da ocorrência de uma lesão os alunos das IESM têm à sua disposição um conjunto de serviços médicos nas próprias IESM ou nos Hos-pitais Militares (serviços médicos militares), ou em Clínicas e Hospitais civis.A nível das próprias IESM, os alunos podem recorrer a cuidados de saúde prestados nas respectivas enfermarias, onde periodicamente se realizam con-sultas médicas de clínica geral e consultas de especialidade como ortopedia. É aqui que se procede a um rastreio da lesão, se define a sua gravidade e, caso necessário, se encaminha o aluno para o respectivo Hospital Militar. Na fase de recuperação da lesão, o aluno tem à sua disponibilidade um fisioterapeuta nas IESM que trabalha com os alunos para que estes retomem a AF totalmente recuperados e o mais rapidamente possível. Existe ainda a possibilidade dos alunos recorrerem a cuidados de saúde prestados em Clínicas e Hospitais civis. No entanto, os alunos sujeitam-se a suportar possíveis encargos monetários e estão limitados a horários de consultas que não se coadunam com os horários escolares e actividades extra curriculares.A Figura 1 mostra a tipologia de serviços médicos a que os alunos podem recorrer no seguimento de uma lesão.

Figura 1 – Factores de risco.

6.3. Prevenção Terciária

A prevenção terciária envolve a prevenção na fase crónica da lesão, a reincidência da lesão e a reintegração do indivíduo na prática da AF após a ocorrência de lesão (Horta, 1995). A fim de evitar a reincidência da lesão sob forma crónica é necessária uma avaliação e reabilitação das alterações que ocorrem no corpo e que são originadas pela AF (Simões, 2005).

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7. TRABALHO DE CAMPO

7.1. Caracterização da amostra e recolha de dados

Para a recolha de dados optou-se pela aplicação de inquéritos por questionários.A população deste inquérito é constituída pela totalidade dos alunos de 4ºano das IESM, ou seja, 115 cadetes da AM e 34 cadetes da AFA, com-pletando um total de 149 alunos.A amostra é constituída por alunos do 4.ºano de ensino da AM e da AFA. Como alunos finalistas, possuem um maior historial no que diz respeito a lesões físicas. Deste modo, foram inquiridos 111 alunos da AM e 20 alunos da AFA, perfazendo um total de 131 alunos. Caracterizando a amostra, quanto ao género, distinguem-se 120 alunos masculinos (91,6%) e 11 alunas femininas (8,4%). As idades dos inquiridos estão compreendidas entre os 21 e os 30 anos.

7.2. Apresentação e discussão de resultados

Devido à extensão dos grupos, foram seleccionadas as questões mais pertinentes ao estudo. Iniciando pelo grupo B, questão n.º2, “Antes de iniciar o treino/aula realiza/realizava algum aquecimento?”, verifica-se que 79 alunos (60,3%) realizam esporadicamente exercícios de aquecimento enquanto os restantes 52 (39,7%) realizam sempre. Não se registou nenhum aluno que nunca realizasse exercícios de aquecimento antes da prática de AF. O tempo médio de aquecimento dos alunos, segundo a resposta de 70 alunos (53,4%), é entre 6 a 10 minutos.Quanto à questão n.º 4, “Realiza/realizava exercícios de alongamento ou outros exercícios de retorno à calma no final do treino/aula?”, 94 alunos (71,8%) realiza exercícios de alongamento e retorno à calma apenas esporadicamente e os restantes 34 (26,0%) responderam que realizam este tipo de exercícios sempre que terminam o treino/aula. Apenas 3 alunos (2,3%), responderam que nunca realizam estes exercícios.Na questão n.º5, “Em que tipo de piso mais frequentemente realiza/realizava o treino/aula?”, verifica-se que 91 alunos (69,5%) praticam AF em piso de alcatrão, enquanto 29 alunos (22,1%) responderam que utilizam habitualmente a terra batida. Apenas 2 alunos (1,5%) praticam AF em relva e 8 alunos (6,1%) utilizam outro tipo de pisos (e.g. tartan, piso sintético). O facto da existência de circuitos maiores em alcatrão nas IESM pode explicar

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o facto da maior parte dos alunos o utilizar para a prática de AF.Em relação à questão n.º6, “Muda de calçado com que frequência?”, 63 alunos (48,1%) responderam “todos os anos”, 21 alunos (16,0%) res-ponderam “nunca”. Apenas 2 alunos (1.5%) responderam que mudam de calçado segundo uma frequência de “menos de 3 meses”.Relativamente à questão n.º7, “Utiliza/utilizava regularmente algum aparelho ortopédico na prática de actividade física?”, 110 alunos (84,0%) responderam que “Não” e os restantes 21 (16,0%) responde-ram que “Sim”. Os aparelhos mais utilizados entre os 21 alunos são as palmilhas com um total de 14 respostas (10,7%) e as joelheiras com 9 respostas (6,9%). De notar que alguns alunos afirmaram utilizar mais do que um aparelho ortopédico.No grupo C, questão n.º1, “Sofreu lesões desde a sua entrada no en-sino superior militar até à data?”, verifica-se que 109 alunos (83,2%) sofreram lesões desde a sua entrada nas IESM até à data de realização do questionário e os restantes 22 alunos (16,8%) não sofreram quaisquer lesões durante o mesmo período.Relativamente à questão nº1.1, “Se sim, indique o número de lesões que sofreu”, 33 alunos (25,2%) sofreram 1 única lesão durante o perí-odo respectivo, 26 alunos (19,8%) sofreram 2 lesões, 26 alunos (19,8%) sofreram 3 lesões, 16 alunos (12,2%) responderam ter sofrido 4 lesões e 7 alunos (5,3%) responderam ter sofrido 5 lesões. Apenas um aluno (0,8%) respondeu ter sofrido mais de 5 lesões.Em relação à questão n.º 1.2, “Se sim indique os anos de ensino em que sofreu a lesão”, distingue-se o 3ºano como o ano lectivo no qual ocorreu um maior número de lesões com 74 casos (56,5%) registados. O 2ªano obteve 56 casos (42,7%), o 1ºano e 4ºano com 50 (38,2%) e 49 casos (37,4%) respectivamente.Relativamente à questão n.º2, “Indique o tipo de lesões que teve”, verifica-se que 42 alunos (32,1%) contraíram tendinites, 39 alunos (29,8%) sofreram entorses no tornozelo e 25 alunos (19,1%) sofreram lombalgias. Em relação a outras lesões que não se encontravam descritas no questionário, de referir que 8 alunos (6,1%) sofreram luxação e 6 alunos (4,6%) contraíram hérnias.Relativamente à questão n.º 3, “Assinale exactamente, o local do corpo em que teve a lesão ou as lesões” e em relação aos alunos que sofreram lesões, verifica-se que as zonas mais afectadas são o tornozelo/pé com um total de 65 respostas (49,6%), os joelhos com 53 respostas (40,4%) e a zona lombar com 29 respostas assinaladas (22,1%). A zona das canelas e a zona dos ombros obtiveram 20 (15,2%) e 19 (14,5%) respostas respectivamente.

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Relativamente à questão n.º4, afirmações a, b, c, d, e, retira-se a seguinte questão geral, “Em que situação contraiu a lesão?”. De acordo com os alunos que contraíram lesões, o treino/aula obteve a maioria das respostas com 87 alunos (66,4%) que responderam afirmativamente. As actividades extra-curriculares (como o râguebi, basquetebol, prova challenger) obtiveram um total de 34 respostas (26,0%) e as lesões ocorridas fora de serviço sucederam a 9 alunos (6,9%). As outras actividades (i.e. actividades que não envolvem directamente a AF como tropeçar nas escadas) acumularam 5 respostas (3,8%). 13 Alunos (9,9%) não sabem como contraíram as lesões.Quanto ao tipo de aula em que ocorreu a lesão, dos alunos que sofre-ram lesões durante as aulas, 42 alunos (32,1%) responderam que a lesão ocorreu durante a Instrução Militar e 23 alunos (17,6%) referiram que a lesão foi contraída durante uma corrida. Não responderam a esta questão 21 alunos (16,0%).Relativamente às afirmações f, g, h, a questão que se coloca é: “O que fez no momento da lesão?”, dos alunos que sofreram lesões, 53 alunos (40,5%) responderam que no momento da lesão interromperam de imediato a AF que estavam a realizar e 40 alunos (30,5%) pararam a AF só no final do treino/aula. Apenas 16 alunos (12.2%) continuaram a treinar sem restrições.Relativamente às afirmações i, j, l, n, o, coloca-se a seguinte questão: “A que serviços médicos recorreu após ter sofrido a lesão?”, 71 alunos (54,2%) recorreram à enfermaria da Instituição, 64 (48,9%) recorreram ao médico da Instituição e o mesmo número de alunos recorreu a hospitais e clínicas civis. Ao fisioterapeuta da Instituição recorreram 44 alunos (33,6%) e 10 alunos (7,6%) não procuraram qualquer ajuda especializada no seguimento da lesão. De notar que a maior parte dos alunos recorreu a mais do que um serviço médico e apenas 7 alunos (5,3%) recorreram somente a serviços de saúde civis.Relativamente às afirmações p, q, a questão que se coloca é “Efectuou tratamento da lesão?”. No seguimento da lesão, 89 alunos (67,9%) efectuaram tratamento e 7 alunos (5,3%) afirmaram não terem efectuado qualquer tipo de tratamento. De notar que os 13 alunos restantes não responderam a esta questão.Em relação às afirmações r, s, t, coloca-se a questão: “Recuperou totalmen-te da lesão?”. 60 Alunos (45,8%) afirmaram ainda não terem recuperado totalmente da lesão e a lesão voltou a aparecer para 33 alunos (25,2%). No entanto 41 alunos (31,3%) afirmam estar totalmente recuperados da lesão contraída. De notar que alguns alunos deram mais que uma resposta. Na questão n.º 5, “Considera que a lesão/lesões que sofreu ficou a dever-

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se a quê?”, verifica-se que dos alunos que sofreram lesões e segundo a percepção dos mesmos, 39 (29,8%) responderam que a lesão ficou a dever-se a sobrecarga do treino/aula, 38 (29,0%) responderam que a lesão deveu-se a um movimento brusco e 31 alunos (23,7%) apontaram a queda como causa da lesão. O mau aquecimento obteve 16 respostas (16,0%). Entre as outras causas verificam-se respostas como, a descontinuidade no treino e o tempo de repouso insuficiente. De notar que nesta questão, a maior parte dos alunos apontou mais do que uma causa da lesão.Em relação à questão n.º 6, “Considera que a lesão/lesões que sofreu poderá ter implicações futuras na sua vida?”, verifica-se que dos 109 alunos (83,2%) que contraíram lesões, 74 (56,5%) afirmaram que a lesão contraída pode ter implicações futuras nas suas vidas e 35 (26,7%) res-ponderam que a lesão não terá implicações futuras.Relativamente à questão n.º 7, “No período anterior ao seu ingresso no ensino superior militar tinha tido alguma lesão?”, 83 alunos (63,4%) responderam que não sofreram quaisquer lesões antes do ingresso nas IESM enquanto 48 alunos (36,6%) responderam que contraíram lesões antes do seu ingresso. Os entorses e as fracturas são as lesões que se destacam do conjunto de lesões contraídas pelos alunos antes da entrada para a IESM. Os entorses obtiveram 19 respostas (14,5%) e as fracturas afectaram 9 alunos (6.9%). De entre a natureza das lesões decorrentes da prática de AF nas IESM, os resultados indicam que os entorses ao nível do tornozelo e outras ar-ticulações (nomeadamente o joelho) são as mais frequentes. Quanto à percepção dos alunos em relação às causas das lesões e segundo uma categorização das mesmas, as causas mais apontadas como estando na génese da lesão foram o movimento brusco e a queda. Ambas repre-sentam um movimento repentino directo que, segundo os alunos, esteve na origem das lesões contraídas. Sendo assim, é possível classificar as mesmas como lesões macrotraumáticas. Relativamente aos factores de risco de lesão, é possível identificar factores intrínsecos e extrínsecos. Quanto aos primeiros, foi verificada através da análise documental, a existência de discrepâncias na incidência de lesões consoante a idade e o género. No entanto, devido a uma amostra cujas idades correspondem a uma faixa etária mais restrita e tendo em conta a presença em maioria do género masculino, não é possível retirar quais-quer conclusões quanto a esta questão. Os factores psicológicos assumem um papel importante, pois verifica-se que a maior parte dos alunos que sofreram lesões, afirmam que estas terão possíveis implicações futuras

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nas suas vidas. Presume-se que este facto possa conduzir a determinados factores psicológicos como o stress e níveis baixos de confiança perante a possibilidade de as lesões se repercutirem em situações futuras.Quanto aos factores extrínsecos, nomeadamente o planeamento de treino, constata-se que os alunos realizam esporadicamente exercícios de aquecimento antes da prática de AF com uma duração média entre os 6 e os 10 minutos. De igual forma, os exercícios de alongamento ou retorno à calma também são realizados apenas em certas ocasiões. Quanto ao local de treino, o piso mais utilizado para a prática de AF é o alcatrão. Apesar de nas IESM os percursos com diferentes níveis de intensidade (percurso plano e inclinado) serem de alcatrão, segundo a análise documental, os pisos duros não são considerados ideais para a prática de AF. No que respeita ao equipamento, regista-se a mudança de calçado de forma frequente pelos alunos. Quando se trata de cuidados preventivos, verifica-se que esta não é uma prática recorrente em algumas das suas vertentes. Quanto à prevenção primária, os alunos em geral têm atenção ao equipamento, mas descu-ram a programação do treino, como o aquecimento e os alongamentos e optam pela utilização de um só piso para a maior parte dos treinos. No que respeita à prevenção secundária, verifica-se que a maior parte dos alunos recorre, no seguimento das lesões, ao acompanhamento médico da Instituição e efectua o tratamento das mesmas. Por último, na prevenção terciária, os resultados dos questionários reflectem que a maioria dos alu-nos ainda não recuperou totalmente de lesões ou as lesões reapareceram.

8. CONCLUSÕES

A actividade física deve ser praticada com satisfação e não com sofrimento, pois ficou claro que um dos seus objectivos é efectivamente usufruir dos seus benefícios. Existe, portanto, uma necessidade de compreender a importância destes mesmos benefícios como um factor que potencia a qualidade de vida. Se cada aluno re-conhecesse a importância de determinados cuidados preventivos como medidas que reduzem o risco de lesão, e o assumisse como conduta auto-disciplinadora, resultaria muito provavelmente, num decréscimo do valor de incidência de lesão. De igual relevância é o papel da restante equipa multidisciplinar, nomeadamente dos serviços médicos das respectivas Instituições. Estas desempenham a tarefa crucial de diagnosticar convenientemente o aluno, atribuir o método terapêutico adequado à lesão e acompanhar o aluno durante o processo de recuperação da mesma. Lacunas nas fases acima referidas, condicionam o próprio aluno no de-

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sempenho futuro das suas funções, devido a um tratamento inadequado de uma lesão contraída que reincidiu ou se tornou crónica. Estas lesões acompanham o militar ao longo da sua carreira, ao longo da sua vida. As entorses representam a maior parte das lesões contraídas pelos alunos nas IESM. É necessário entender o conjunto de acções de carácter geral a serem tomadas a fim de lidar com um caso de ocorrência deste tipo de lesão. • Numa primeira fase, o aluno que contrai a lesão deve ter acesso imedia-

to aos primeiros cuidados de tratamento na enfermaria, esta última que deve reencaminhar de seguida o aluno para o hospital para um correcto diagnóstico da lesão e atribuição do tratamento secundário da mesma.

• Numa fase posterior, é essencial o acesso, com frequência, a um fisioterapeuta para uma rápida recuperação do aluno de forma a reduzir o risco de futuras sequelas. Acima de tudo, é indispensável respeitar as indicações médicas e os períodos para a recuperação da lesão. Um retorno em tempo inadequado à prática de actividade física pode agravar a lesão contraída, o que conse-quentemente corresponde a maiores períodos de paragem de exercício físico.

Para que este ciclo decorra com perfeita normalidade, a exigência do rendi-mento físico requerido ao aluno deve ser acompanhada pela existência dos serviços adequados à manutenção da condição física do mesmo. Seria importante desenvolver acções de consciencialização segundo uma vertente preventiva. Esta caracterizar-se-ia pela sensibilização para aspectos que condicionam os factores precursores de lesões, como a divulgação de cuidados preventivos, meios alternativos de prevenção e reabilitação, como a difusão de informação acerca das potencialidades das ligaduras funcionais e acções activas no âmbito da identificação e intervenção imediata face a uma lesão, como a divulgação de medidas de primeiros-socorros.Face à carga a que os alunos estão sujeitos durante a sua vida académica e à exigência da obtenção de resultados para ter aproveitamento escolar, e após a contracção de uma lesão, torna-se imperativo a avaliação do siste-ma de resposta, através da análise da existência dos principais pilares para uma intervenção terapêutica conveniente, como o caso do acesso célere à orientação de médicos da especialidade e fisioterapeutas. De igual forma, o valor de reincidência de lesões, presumivelmente devido ao retorno precoce à actividade física, justifica a presença de um programa de avaliação funcional que permita o regresso, em tempo adequado, do aluno à prática de actividade física após um período de recuperação. Para o efeito, um programa de testes físicos funcionais auxiliariam na carac-terização do estado do aluno antes do seu retorno à prática de actividade

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física, com o intuito de reduzir o risco de reincidência de lesão e aumentar os níveis de confiança do aluno.

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os ministros dos nEgóCios EstrangEiros: do Estado novo E da dEmoCraCia (1974-2005)

Reinaldo Saraiva Hermenegildo (*)

Capitão de Infantaria da GNR

ABSTRACT

This article examines some key features of the Ministers of Foreign Affairs of the New State and democracy by 2005, through a comparative study of the characteristics of Ministers. However, since democracy has some significant differences, we divided the democratic period (1974-2005) in three periods. Despite having lived a short phase, there were significant differences from period to period, forcing the MNE to have a different form of action. Once the situation was different, also the procedures and how to define, coordinate and run the foreign policy would be different, and this may or may not be a reason for the differences in the characteristics of national foreign policy makers.

Keywords: Minister of Foreign Affairs, Foreign Policy, New State, De-mocracy; profile.

RESUMO

O presente artigo estuda algumas das principais características dos Ministros dos Negócios estrangeiros do Estado Novo e da democracia, até 2005, através

1 Trabalho desenvolvido no âmbito do Seminário de Política Externa Portuguesa I, do Mestrado em Ciência Política e Relações Internacionais na FCSH-UNL em 2005.

(*) Capitão de Infantaria da GNR. Docente da Academia Militar da Unidade Curricular de Teoria das Re-lações Internacionais e de Organização das Forças e Serviços de Segurança. Doutorando em Relações Internacionais, pela FCSH-UNL.

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de um estudo comparativo das características dos Ministros. Contudo, uma vez que a democracia apresenta algumas diferenças significativas, dividimos o período democrático (1974-2005) em três períodos. Apesar de termos vivido uma fase curta, existiram diferenças significativas de período para período, obrigando os MNE a terem uma forma diferente de actuação. Uma vez que a conjuntura era diferente, também os procedimentos e a forma de definir, co-ordenar e executar a politica externa teria de ser diferente, e esta poderá ser ou não uma das razões para as diferenças nas características dos responsáveis pela política externa nacional.

Palavras-chave: Ministro dos Estrangeiros; Política Externa, Estado Novo, Democracia; perfil.

INTRODUÇÃO

A parte substancial de um governo reside toda na organização da classe política porque se uma classificação verdadeiramente cientifica dos governos se pudesse fazer, deveria ser baseada em características mais importantes, pelas quais os vários tipos de classes políticas se diferenciam.

(Gaetano Mosca) 2

Conhecer as características dos MNE, torna-se um factor crucial para uma melhor compreensão da política externa portuguesa 3, do Estado Novo e da democracia. A importância da política externa portuguesa, não se resume ao plano político, ela vai também para o plano constitucional, uma vez que «própria Constituição da República define princípios-guias, porque dificilmente pode deixar de considera-se esta área como uma das componentes fundamen-tais do conceito estratégico nacional de um país» 4. Dada a importância que a política externa portuguesa tem nos vários planos nacionais, e sendo os MNE

2 Gaetano Mosca, Ciò che la Storia Potrebbe Insegnare, In, António Marques Bessa & Jaime Nogueira Pinto, Introdução à Ciência Politica, Vol. II, Verbo, 2003, p. 139.

3 Ver, a titulo de exemplo, para uma visão geral da política externa portuguesa, Nuno Severiano Teixeira, “Entre a África e a Europa: A Política Externa Portuguesa, 1890-2000”, In, António Costa Pinto, (Coord), Portugal Contemporâneo, Dom Quixote, 1ª Ed., Lisboa, 2005, pp. 87-116.Ver também, AAVV, Visões de Política Externa Portuguesa, Instituto Diplomático/Sociedade de Geografia de Lisboa, Lisboa, 2005. Fernando Martins (ed.), Diplomacia e Guerra, Política Externa e Política de Defesa em Portugal do final da monarquia ao marcelismo, Edições Colibri – CIDEHUES-UE, Lisboa, 2001.

4 Ver, Adriano Moreira, “O Papel da Política Externa Portuguesa no Mundo Contemporâneo”, In, AAVV, Visões de Política Externa Portuguesa, Instituto Diplomático/Sociedade de Geografia de Lisboa, Lisboa, 2005, p. 13.

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os ministros dos nEgóCios EstrangEiros: do Estado novo E da dEmoCraCia (1974-2005)

os primeiros responsáveis pela política externa, torna-se impreterível o estudo das características dos MNE.

As características dos responsáveis da pasta dos Negócios Estrangeiros não foram sempre as mesmas, variando de período para período. Estas mudanças depen-deram impreterivelmente de um conjunto diversificado de condições. A importância que os MNE tiveram ao longo dos tempos, varia conforme a conjuntura nacional e internacional, a organização política do Estado, as tradições históricas do país. Os MNE fazem parte de uma classe politica restrita, ou seja, dadas as suas peculiares características formam e fazem parte cumulativamente de uma elite 5.

O MNE é o elemento do governo directamente responsável pela formula-ção, coordenação e execução da política externa portuguesa.

O MNE é o representante de Portugal e do interesse nacional no exterior, é a ele a quem cabe defender os objectivos estratégicos e a politica externa de Portugal no mundo.

A política externa dos Estados desde sempre foi uma das matérias do núcleo duro dos Estados, geralmente tratada como assuntos de high politic 6. E por isso, uma pasta das mais importantes, considerada por alguns autores como uma pasta de «elevada confiança política» 7.

Com a chegada de Oliveira Salazar à chefia do Governo, entra-se num novo ciclo político. Este período iria ser um período estável, em vários domínios, espe-cialmente em termos ministeriais. Os ministros de Salazar, ficariam no governo por períodos de tempo bastante prolongados 8. Uma vez que a estabilidade pretendida e necessária que Salazar desejava, passava também, pela estabilidade ministerial.

Com a queda da ditadura, encontrando-se na altura já Marcello Caetano a chefiar o governo, entra-se em mais um novo ciclo político a nível nacional. A democracia acabada de implantar, levou impreterivelmente a uma mudança da elite ministerial 9. Contudo, essa mudança nos primeiros anos da democracia

5 Não cabe no cômputo deste trabalho um estudo teórico das elites. Ver a titulo de exemplo, António Mar-ques Bessa, Quem Governa?, ISCSP, Lisboa, 1993. Norberto Bobbio & Nicola Matteuci, & Gianfranco Pasquino, Dicionário de Ciência Politica, 2 Vol, Dinalivro, 12ªed, Brasilia, 2004, pp. 385-391. Gaetano Mosca, A Classe Política, Edições Tenacitas, Coimbra, 2003.

6 Ver, Fernando Sousa (Dir.), Dicionário de Relações Internacionais, Edições Afrontamento/CEPESE, Santa Maria da Feira, 2005, pp. 144 -145.

7 «O Minsitério dos Negócios Estrangeiros, da Administração Interna, da Defesa Nacional e da Justiça, são considerados ministérios políticos», Ver, Filipe Nunes, “Os Directores Gerais – A Elite Administrativa portuguesa durante o XIV Governo Constitucional”, In, António Costa Pinto e André Freire, Elite, Socie-dade e Mudança Política, Celta, Oeiras, 2003, pp. 97-98.

8 Ver, Pedro Tavares de Almeida, António Costa Pinto, Portuguese Ministers, 1951-199: Social Background and paths to Power, Cambridge, Mass., 2003.

9 Ibidem.

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operou-se a um ritmo extremamente rápido, e em parte indesejável, porque não permitia a estabilidade política que Portugal necessitava.

Paulatinamente, e à medida que o regime democrático foi amadurecen-do, permitiu uma maior estabilização da classe política nacional. Os MNE ao longo da democracia foram sendo substituídos, de uma forma genérica devido ás mudanças de governos.

Em Portugal na democracia, o MNE não teve sempre a mesma importân-cia, esse facto deveu-se ao processo político em curso que em cada momento, determinou uma maior ou menor ênfase do ministro. Contudo, se durante a democracia, a importância do MNE variou em função, principalmente, da conjuntura internacional. Durante o Estado Novo, Salazar avocou a si essa importância, uma vez que em dois dos momentos mais importantes da acção da política externa portuguesa desse período, passou a chefiar do ministério dos negócios estrangeiros. Salazar durante a guerra civil de Espanha 10 e durante a II Guerra Mundial 11 centraliza na sua pessoa a condução da política externa, e todas as pastas que considera de importância central.

Sendo a política externa uma das áreas nucleares de um Estado, e um dos atributos fundamentais da soberania externa. Apesar de na actualidade a definição da política externa ter de ser definida, tendo em conta os objectivos da política externa de outras organizações internacionais como a EU. Contudo, esse facto não implica sintomaticamente uma perda de importância do MNE, mas sim uma diferença qualitativa relativamente à sua acção no plano exter-no. Já que ele terá de possuir uma grande flexibilidade de forma a conjugar a política externa portuguesa e os interesses nacionais, com a política externa e com os interesses europeus.

Através deste estudo pretende-se saber se os responsáveis nacionais pela política externa portuguesa, do Estado Novo e da democracia, são políticos de carreira, funcionários públicos ou diplomatas de carreira e que características possuem os mesmos. Para saber quais as características que têm os MNE, foi necessário estudar um conjunto diversificado de variáveis. Este artigo está es-truturado da seguinte forma: Introdução, Caracterização sociológica (o género, a idade, a naturalidade), Caracterização da formação académica (Licenciatura, Instituições Universitárias, Pós-Graduação e Instituições Universitárias), Carac-terização da actividade profissional (origem da actividade profissional, filiação

10 Ver, a titulo de exemplo, César Oliveira, Salazar e a Guerra Civil de Espanha, 1.ª ed., s.l. Iva Delgado, A Guerra Civil de Espanha e Salazar, s.e., s.l., Publicações Europa-América, 1982.

11 Ver, a titulo de exemplo, António José Telo, Portugal na Segunda Guerra, II Volumes, Vega, Lisboa, 1991.

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partidária, tempo no cargo, Actividades Civico-politicas e funções Pós-MNE), Publicações editadas pelos MNE e Conclusões.

O presente trabalho, tem por objectivo o estudo comparativo dos MNE do Estado Novo e da democracia (até 2005). Contudo, uma vez que a democracia apresenta algumas diferenças significativas, dividi o período democrático (1974-2005) em três períodos. Apesar de termos vivido uma fase curta, existiram diferenças significativas de período para período, obrigando os MNE a terem uma forma diferente de actuação. Uma vez que a conjuntura era diferente, também os procedimentos e a forma de definir, coordenar e executar a politica externa teria de ser diferente.

Contudo, se a conjuntura varia no tempo, isso também vai implicar uma forma de selecção e recrutamento diferente. Os ministros teriam de ter um conjunto de valências peculiares conforme a conjuntura e aquilo que se pre-tende de uma politica externa num dado momento. Durante o Estado Novo a regra foi praticamente a da estabilidade ministerial, de 1933 a 1974, apenas houve nove MNE, designadamente, César de S. M. Amaral e Abranches, José Caeiro da Mata Armindo Rodrigues de Stau Monteiro, Oliveira Salazar, Paulo Arsénio Veríssimo Cunha, Marcello Caetano, Marcello Duarte Matias, Alberto M. Gorjão Franco Nogueira e Rui Patrício.

No período de 1974 a 1976, depois da Revolução do 25 de Abril, viveu-se uma fase de incerteza e instabilidade política, marcado por quedas sucessivas de Governos. Neste período existiram seis Governos Provisórios. Contudo, a pasta da diplomacia apenas conheceu três responsáveis (Mário Soares, MAJ Melo Antunes e Mário Ruivo).

O período subsequente, de 1976 a 1986, é marcado pela institucionalização da primeira CRP da democracia e dos respectivos Governos Constitucionais. Neste período existiram dez Governos Constitucionais. Este período é igualmente assinalado pela preparação da candidatura portuguesa à CEE. Neste período foram MNE Medeiros Ferreira, Mário Soares (interino), Sá Machado, Corrêa Gago, Freitas da Cruz, Freitas do Amaral, Gonçalves Pereira, Futscher Pereira, Jaime Gama e Pires de Miranda.

No período posterior a 1986, entra-se numa novo ciclo político a nível nacional e internacional, Portugal é membro de pleno direito da CEE 12. Neste

12 Ver, a titulo de exemplo, para uma compreensão das questões que estiviram em torno da adesão de Por-tugal à CEE, António Costa Pinto & Nuno Severiano Teixeira, “From Africa to Europe: Portugal and European Integration”, In, António Costa Pinto & Nuno Severiano Teixeira, Southern Europe and Making of European of he European Union, SSM, New York, 2002. Helena Costa Nunes (Coord.), Adesão de Portugal às Comunidades Europeias, AR/Divisão de Edições, Lisboa, 2001.

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período o modus operandi dos MNE, dificilmente poderia ser o mesmo como até 1986. Portugal fazia parte de uma OI sui generis, onde a Soberania Nacio-nal passou a ser partilhada. Portugal passou a desempenhar mais um papel de relevo numa OI. Neste período foi MNE Deus Pinheiro, Durão Barroso, Jaime Gama, Martins da Cruz, Teresa Gouveia, António Monteiro e Freitas do Amaral.

1. CARACTERIZAÇÃO SOCIOLÓGICA

1.2 Género (Ver, Gráfico/Quadro n.º 1)

O cargo de MNE foi praticamente monopolizado pelo género masculi-no. Durante o período do Estado Novo não houve nenhuma mulher a assumir a pasta dos negócios estrangeiros, este cargo coube sempre ao género masculino. Já durante a democracia, apenas houve uma mulher a assumir o cargo de MNE. Contudo, não se pode dizer que tivesse existido uma discriminação em função do sexo, para o cargo de MNE, já que a pasta dos negócios es-trangeiros, acaba por ser o espelho do recrutamento ministerial de ambos os períodos, do Estado Novo e da democracia. «A fraca participação da mulher na vida política portuguesa, assenta sobretudo na desigual capacidade dos sexos para aceder aos centros de poder» 13.Durante a democracia 95 % dos MNE eram do género masculino. Como já referi anteriormente, do género feminino apenas existiu uma MNE, Teresa Gouveia, representando 5 % dos MNE da democracia. Teresa Gouveia foi a primeira e única MNE de Portugal, tendo assumido o cargo durante o XV Governo Constitucional, liderado por Durão Barroso.É de destacar o facto que relativamente aos Secretários de Estado do MNE, o panorama também não é muito diferente, apesar de o número ser mais elevado do que o dos MNE. Apenas existiram, durante o Estado Novo e a democracia, três Secretárias de Estado, Maria Dias Moreira, que integrou mais do que um Governo Constitucional (VI, VII, VII, IX, X) como Secretária de Estado do MNE. Sendo aliás colaboradora, de MNE de mais do que um quadrante politico e em períodos históricos diferentes. Dias Moreira foi Secretária de Estado dos seguintes MNE: Freitas do Amaral (VI Governo Constitucional), Gonçalves Pereira (VII, VIII Governo Constitucional), Jaime Gama (IX Governo Constitucio-

13 Ver, José Manuel Leite Viegas & Sérgio Faria, As mulheres na política, Celta Editora, Oeiras, 2001, p.19.

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nal) e Pires de Miranda (X Governo Constitucional), com quem faz a integração à CEE. O período que Maria Dias Moreira esteve como Secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros é em parte peculiar, já que coincide com a criação pela primeira vez de uma Secretaria de Estado da Emigração e das Comunidades Portuguesas em 10-01-1980. À excepção do VIII Governo Constitucional, do Primeiro-Ministro Pinto Balsemão e do MNE Futscher Pereira, Dias Moreira vai ficar sempre com esta pasta desde a sua criação até à sua reestruturação, com o MNE Deus Pinheiro, fican-do a designar-se unicamente de Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, com a extinção da pasta da Emigração. Acompanhou como Secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros o período anterior à adesão à CEE, fez a transição e, foi Secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros após a adesão. Dia Moreira foi a mulher que esteve mais tempo com uma pasta no MNE (Secretária de Estado da Emigração e das Comunidades Portuguesas).Após a adesão à CEE, temos o período em que as mulheres tiveram uma maior representatividade na diplomacia portuguesa, em 2001 Teresa Moura assume o cargo de Secretária de Estado dos Assuntos Europeus, do XIV Governo Constitucional. Em 2003, a pasta da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros volta a ser entregue a uma mulher, Maria Manuela Franco assume a pasta da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, no segundo período do XV Governo Constitucional de Durão Barroso. Após a saída do MNE Martins da Cruz, a pasta do Negócios Estran-geiros é entregue pela primeira vez em toda a história nacional a uma mulher, Teresa Gouveia, e conjuntamente com ela é nomeada também uma Secretária de Estado também do sexo feminino (Maria Franco). Este caso é paradigmático, já que só dezasseis anos depois é que uma pasta do MNE volta a ser ocupada por uma mulher, cumulativamente, com uma MNE mulher. Foi até ao momento o período da história do MNE em que teve uma maior percentagem de mulheres responsáveis pela Politica Externa, apesar de ser por um período curto de tempo (09-10-2003 a 17-07-2004).Em todo o período democrático existiram cerca de quarenta Secretários de Estado dos Negócios Estrangeiros, apesar de vários deles serem mais do que uma vez. Dentro destes quarenta Secretários de Estado dos Negó-cios Estrangeiros, trinta e oito são do sexo masculino, e só dois são do

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sexo feminino, ou seja, temos uma representação de apenas 5% do sexo feminino e 95% do sexo masculino, percentagens idênticas à dos MNE.

1.2 Idade (Ver, Gráfico/Quadro n.º 1 e 2)

A maioria dos MNE quando assumiram o cargo, quer durante o período do Estado Novo quer durante a Democracia, tinham na sua maioria idades compreendidas entre os 40 e os 49 anos de idade. Esta variável, da idade, não se alterou com a mudança de regime po-lítico, da ditadura para a democracia, nem nas várias mudanças politi-cas ocorridas durante a democracia. Pode-se afirmar que esta variável permaneceu incólume à alternância política operada em Portugal, e sintomaticamente às mudanças de ministros. A variação da percentagem de MNE, com idades compreendidas entre os 40 e os 49 anos quando assumiram o cargo é praticamente a mesma. Du-rante o Estado Novo, quatro MNE tinham idades compreendidas entre os 40 e os 49 anos de idade, representando 45 % do total dos MNE do Estado Novo. Assumiram a chefia do MNE com idades compreendidas entre os 40 e os 49 anos de idade os seguintes ministros: César Amaral e Abranches, Oliveira Salazar, Paulo Arsénio Veríssimo Cunha e Franco Nogueira.No período democrático, oito MNE, quando assumiram o cargo tinham idades compreendidas entre os 40 e os 49 anos de idade (40 %). É de realçar o facto de que durante o período democrático, quatro dos minis-tros com idades compreendidas entres os 40 e os 49 anos, pertenciam ao período anterior a 1986.O segundo grupo etário mais representativo, em ambos os períodos, com-preende o período entre os 50 e os 59 anos de idade. Durante o Estado Novo, três ministros (33 %) assumiram o cargo com idades entendidas entre os 50 e os 59 anos de idade, designadamente Caeiro da Mata, Marcello Caetano e Marcello Duarte Matias. Na democracia, o número de MNE a assumir o cargo com idades compreendidas entre os 50 e os 59 anos, foi superior (5), mas a percentagem foi inferior 25 % 14. Na democracia, assumiram o cargo da chefia da diplomacia nacional com idades compreendidas entre os 50 e os 59 anos os seguintes ministros: Pires Miranda, Mário Soares 15, Martins da Cruz e Teresa Gouveia.

14 Esta variação, poderá parecer um paradoxo, mas não é, uma vez que o número total de MNE é bastante assimétrica entre os dois períodos.

15 Mário Soares é contabilizado duas vezes, uma vez que foi MNE mais do que uma vez durante a democracia.

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Os ministros que assumiram o cargo com idade inferior a 40 anos, foi superior durante a democracia, apesar de em termos percentuais ser pra-ticamente igual. Durante a ditadura, dois MNE assumiram o cargo com idades inferiores a 40 anos (22 %), nomeadamente, Armindo Monteiro e Rui Patrício. Na democracia, quatro MNE assumiram o cargo com idades inferiores a 40 anos de idade, designadamente Medeiros Ferreira, Freitas do Amaral, Jaime Gama 16 e Durão Barroso. Destaca-se o facto de durante o período democrático, três dos ministros que assumiram o cargo de MNE, pertenciam ao período anterior a 1986. Para além, de ser igualmente neste período, que um MNE assumiu o cargo com idade mais baixa, dos períodos em análise, Medeiros Ferreira foi MNE com 34 anos, no I Governo constitucional chefiado por Mário Soares. Durante o Estado Novo o MNE a assumir o cargo com uma idade mais baixa foi Rui Patrício, com 38 anos de idade, último MNE do Estado Novo.O grupo etário menos representativo ao nível dos MNE compreende os ministros que assumiram o cargo com idades superiores a 59 anos de idade. Contudo, neste grupo etário, existem diferenças significativas entre os períodos da ditadura e o da democracia. Durante a ditadura não houve nenhum MNE a assumir o cargo com idade superior a 59 anos. Já na democracia, três dos MNE tinham idades superiores a 59 anos quando iniciaram as funções de ministros. Para além, de dois desses ministros (António Monteiro e Freitas do Amaral), serem dos ministros que assumiram o cargo com idades mais avançadas, foram também os dois últimos MNE de Portugal. Freitas do Amaral, é actualmente o MNE do XVII Governo Constitucional, e o MNE que iniciou o exercício de funções de MNE com idade mais avançada (64 anos), no período em análise. No período antecedente, do Estado Novo, o MNE que assumiu com o cargo com uma idade mais avançada foi Marcello Duarte Matias com 55 anos de idade.Apesar de a maioria dos MNE de ambos os períodos ter uma idade compreendida entre os 40 e os 49 anos de idade, existe ainda em re-lação à média de idades entre os dois períodos uma ligeira diferença, uma vez que a idade média dos MNE do Estado Novo é de 45,8 anos de idade, e na democracia a média de idades situa-se nos 47,9 anos de idade. Podemos então concluir que apesar de a idade média dos MNE

14 Refiro-me à primeira vez que os MNE Freitas do Amaral e Jaime Gama assumiram o cargo na democracia.

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dos dois períodos ser muito parecida, verifica-se um ligeiro envelheci-mento dos MNE da democracia, já que na democracia os MNE passaram a ter mais dois anos e um mês de idade, quando assumiram o cargo, relativamente ao Estado Novo.

1.3 Naturalidade (Ver, Gráfico/Quadro n.º 3)

A dispersão dos MNE não se coaduna com um estudo exacto da distri-buição dos MNE pelas várias regiões do país. Sendo assim, apenas serão tidas em conta as regiões mais representativas, Lisboa, Antigas Colónias, Regiões Autónomas, quanto à origem geográfica dos MNE. Os restantes MNE oriundos de outras regiões que não as referenciadas anteriormente, são inseridas nos restantes distritos.Diferentemente de outras das variáveis, a naturalidade dos MNE, caracteriza-se por uma diferença significativa entre o período do Estado Novo e a democracia. Enquanto no período do Estado Novo, um número significativo dos MNE (6), eram naturais dos mais diversificados distri-tos, cerca 66 % dos MNE do Estado Novo eram naturais dos restantes distritos, designadamente, César Amaral e Abranches, Caeiro da Mata, Armindo Monteiro, Oliveira Salazar, Marcello Duarte Matias e Franco Nogueira. É de destacar o facto de que durante o Estado Novo, todos os MNE eram naturais, de Lisboa ou dos restantes distritos, não existindo nenhum MNE natural das Regiões Autónomas e/ou das Antigas Colónias.Durante a democracia, a região com maior representatividade era Lisboa, uma vez que 11 dos MNE eram naturais de Lisboa (55 %). Ou seja, verifica-se assim, uma mudança significativa no que concerne à origem geográfica dos MNE, durante o Estado Novo e a democracia.Relativamente à região de Lisboa, durante o Estado Novo, três MNE eram naturais de Lisboa, representando 34 %, sendo a segunda região mais representativa. Eram naturais de Lisboa os seguintes MNE do Estado Novo: Paulo Veríssimo da Cunha, Marcello Caetano e Rui Patrício. Já no período democrático, 11 dos MNE eram naturais de Lisboa, repre-sentando 55 %. Destaca-se do período democrático, o período anterior a 1986, uma vez que só deste período 5 MNE eram oriundos de Lisboa, sendo os restantes dos outros subperiodos, 2 do período anterior a 1976, e 4 do período posterior a 1986.Os restantes distritos, durante o período do Estado Novo, foram a re-gião mais representada, uma vez que 6 MNE eram naturais dos mais diversificados distritos, representando 66 %. Durante a democracia, esta

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região deixou de ser a mais representativa, uma vez que tinha apenas 4 MNE oriundos destes distritos, contudo, continuou a ser a segunda região mais representativa com 20 % dos MNE da democracia oriundos dos restantes distritos. Verifica-se assim uma alternância do local de ori-gem dos MNE, se no Estado Novo eram recrutados essencialmente nos restantes distritos, durante a democracia esse ónus passou para Lisboa. As Regiões Autónomas são a terceira região mais representativa no que toca à origem geográfica dos MNE. Contudo, esta só tem repre-sentatividade durante a democracia, já que durante o Estado Novo, não existiram MNE oriundos desta região. No período democrático existiram três MNE naturais das Regiões Autónomas (15 %).As Antigas Colónias, tiveram praticamente a mesma representatividade das Regiões Autónomas, com apenas uma pequena diferença, o número de MNE recrutados nesta região foi inferior ao das Regiões Autónomas, apenas dois MNE são oriundos das Antigas Colónias.

2. CARACTERIZAÇÃO DA FORMAÇÃO ACADÉMICA

2.1 Licenciatura de base (Ver, Gráfico/Quadro n.º 4)

Quando se realiza um estudo com o objectivo de conhecer as carac-terísticas de um universo, saber qual a licenciatura de base, que esse universo possui é extremamente importante e crucial. Quando se estuda um universo particular de uma elite, como os MNE, mais importante é estudar esta variável, uma vez que os MNE, vão chefiar um dos ministérios que envolve matérias pertencentes ao núcleo duro da sobe-rania dos Estados. Não querendo assumir, nem defender qualquer tipo de determinismo, no que concerne à licenciatura de base dos MNE, esta é extremamente importante e poderá influenciar muito o MNE na condução, e prossecução da política externa portuguesa.Durante o período do Estado Novo todos os MNE eram licenciados em direito 17. Oliveira Salazar, colocou sempre à frente da pasta dos negócios estrangeiros, ministros licenciados em direito (100 %). Na democracia, a licenciatura em direito continua a ser a principal licenciatura que os MNE possuem, mas não a única, como no período

17 O MNE Caeiro da Mata era também licenciado em economia.

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do Estado Novo. Durante a democracia, oito dos MNE são licenciados em direito, representando 40 %.Durante este período, existem ainda duas licenciaturas, com uma re-presentatividade de 15 % cada uma. Existiram neste período três MNE licenciados em engenharias, e três em ciências históricas e filosóficas. Ainda, durante a democracia, dois MNE eram licenciados em filosofia, e um MNE era licenciado em ciências militares. Para além, de outros três MNE serem licenciados em outras áreas que não as supracitadas (15 %).

2.2 Instituições Universitárias – Licenciatura de base (Ver, Gráfico/Quadro n.º 5)

Durante o Estado Novo assiste-se a uma bipolarização das instituições universitárias, frequentadas pelos MNE durante a licenciatura. Os MNE deste período todos eles licenciados em direitos, frequentaram seis deles a Faculdade de Direito de Lisboa (FDL) e três a Universidade de Coimbra, representando cada estabelecimento de ensino 67 % e 33 %, respectivamente. A FDL é a instituição de ensino que formou mais MNE durante o Estado Novo. O período democrático, sintomaticamente, com a perda de monopólio do direito, no que toca à licenciatura de base dos MNE, essa perda acarretou indubitavelmente uma diminuição do número de MNE que frequentaram a FDL. Facto que se percebe de forma imediata e directa, já que se diminui a percentagem de MNE licenciados em direito, seria natural que diminuísse igualmente, o número de MNE oriundos nos estabelecimentos que leccionam direito, como a FDL.Durante o período democrático, o principal estabelecimento de ensino frequentado pelos MNE foi a FDL. A FDL foi frequentada por sete MNE, representando 35 %. O segundo estabelecimento de ensino, mais frequentado pelos MNE foi a Faculdade de Letras de Lisboa, frequenta-da por cinco ministros (25 %). O Instituto Superior Técnico (IST), foi a instituição universitária frequentada por três MNE, sendo o terceiro estabelecimento de ensino mais representativo (15 %).Os restantes MNE frequentaram outros estabelecimentos de ensino, dois dos MNE realizam os seus estudos ao nível da licenciatura na Universidade de Coimbra (10 %). Os restantes três MNE frequentaram, respectivamente, um a Escola do Exército, um a Faculdade de Ciências de Lisboa e outro na Universidade de Genebra.

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Contudo, não podemos deixar de lembrar, que o facto de os estabeleci-mentos de ensino superior mais frequentados pelos MNE serem da região de Lisboa, não se deve exclusivamente às opções dos MNE em termos de estabelecimentos de ensino, mas também, ao facto de a maioria dos MNE serem naturais de Lisboa.Paralelamente, no período democrático, a dispersão dos MNE por diver-sas licenciaturas, diferentemente do período do Estado Novo, em que a totalidade dos MNE eram licenciados em direito. Essa dispersão dos MNE por diferentes licenciaturas e estabelecimentos de ensino, deve-se em parte a um aumento das alternativas em termos de ensino superior.

2.3 Formação complementar (Pós-Graduação) 18 (Ver, Gráfico/Quadro n.º 6)

Esta variável engloba todos os estudos que os MNE realizaram após a licenciatura, nomeadamente, Pós-Graduação, Mestrado e Doutoramento. Os MNE do período do Estado Novo, realizaram os seus estudos de pós-graduação (doutoramento), na área do direito. Dos nove MNE deste período, cinco são doutorados em direito (55,55 %). Os MNE do Estado Novo que obtiveram o grau de doutor foram os seguintes: Caeiro da Mata, Armindo Monteiro, Oliveira Salazar, Paulo Veríssimo da Cunha, Marcello Caetano.Os MNE da democracia, apenas metade obtiveram um grau académico superior à licenciatura.O Direito é aqui mais uma vez a ciência do conhecimento que serviu de estudos de Pós-Graduação aos MNE, de entre os dez que tem estudos pós-graduados, quatro realizaram estudos de pós-graduação em Direito, representando um total de 40 %. Relativamente, ao cômputo global de todos MNE, temos 20 % dos MNE com estudos pós-graduados em Direito. Dos períodos em análise, foi no período anterior a 1986 que houve mais MNE com Pós-Graduações, Cinco, enquanto no período anterior a 1976 apenas houve um e no período posterior a 1986 houve quatro.No período anterior a 1976, só Mário Ruivo alcançou um grau académico superior à Licenciatura (Doutoramento) na área de Biologia 19.

18 Não compreende as Pós-graduações alcançadas após o fim do exercício das funções de MNE.19 Existem fontes na qual o ministro Mário Ruivo surge como Doutorado, mas só depois de ter sido MNE.

No entanto, obteve vários graus de especialização na Universidade Sorbonne em França. Mário Soares, foi Doutor Honnoris Causa, por várias Universidades, mas por questões metodológicas não se consideram os Doutoramentos Honnoris Causa.

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No período anterior a 1986, foi o período de maior predomínio de MNE com estudos pós-graduados em Direito, neste período três dos ministros tinham estudos de Pós-Graduação em Direito, nomeadamen-te, Sá Machado (Pós-Graduação), Freitas do Amaral (Doutoramento) e Gonçalves Pereira (Doutoramento). Nas outras áreas, Medeiros Ferreira era Doutorado em História Institucional e Politica 20 e Corrêa Gago Pós-Graduado em Administração Industrial.No período posterior a 1986, verifica-se uma queda das Pós-Graduações na área do Direito, e passasse para uma distribuição equitativa dos MNE pelas diferentes áreas do saber. Sendo assim, temos um MNE Doutorado em Direito (Freitas do Amaral), um Doutorado em Engenharia Química (Deus Pinheiro), um com Mestrado em Ciência Política (Durão Barro-so) 21 um com uma Pós-Graduação (Martins da Cruz).É de salientar o facto de que 10% dos MNE, após o exercício das suas funções de ministro, lhe ter sido atribuído o Doutoramento Honnoris Causa, designadamente Sá Machado e Mário Soares. Como se pode verificar pela descrição feita anteriormente, durante o Estado Novo, o número de MNE doutorados é maior que durante a democracia. Contudo, na democracia existiram MNE com formações mais diversificadas, quer a nível de doutoramento, quer mesmo a nível dos outros graus académicos.

2.4 Instituições Universitárias – Formação complementar (Pós-Graduação (Ver, Gráfico/Quadro n.º 7)

As instituições universitárias onde os MNE do Estado Novo realizaram os estudos de doutoramento, variaram entre a Universidade de Coimbra e a FDL. Sendo assim, realizaram os estudos de doutoramento na Uni-versidade de Coimbra os seguintes MNE: Caeiro da Mata e Oliveira Salazar. Na FDL obtiveram o grau de doutor os seguintes MNE: Armindo Monteiro, Paulo Veríssimo Cunha, Marcello Caetano.Os estabelecimentos de ensino onde os MNE da democracia alcançaram os diferentes graus de Pós-Graduação, nas diversas áreas distribuíssem por quatro Universidades. Uma vez que a grande percentagem de estu-

20 Não existem dados concretos que nos permitem saber se era Doutorado no período em que foi MNE, ou se só posteriormente obteve o grau de Doutor.

21 Este Mestrado teve equivalência em Portugal ao Mestrado em Direito.

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dos são desenvolvidos na área do direito, cumulativamente com o facto de 55 % dos MNE serem de Lisboa e ser Lisboa o principal centro empregador nacional para quem tem estudos mais avançados. A FDL, foi o estabelecimento em que três MNE realizaram os seus estudos de Pós-Graduação, tendo uma representatividade geral de 30 %. A Univer-sidade de Coimbra e a Universidade Nova de Lisboa, apenas tem uma representatividade de 10 %, respectivamente, só dois MNE optaram por estes estabelecimentos. A grande maioria de MNE optou por realizar os seus estudos em universidades estrangeiras, cinco ministros foram realizar os seus estudos após a licenciatura no estrangeiro (50 %). No período anterior a 1976, o único ministro que realizou estudos de Pós-Graduação optou por uma universidade estrangeira em França na Sarbonne (Mário Ruivo).No período anterior a 1986, dois ministros realizaram os seus estudos de Doutoramento na FDL (Freitas do Amaral e Gonçalves Pereira), um realizou os estudos de Pós-Graduação na Universidade de Coimbra (Sá Machado), um efectuou na UNL o Doutoramento (Medeiros Ferreira 22), e um efectuou os seus estudos de Pós-Graduação no estrangeiro, Uni-versidade de Londres (Corrêa Gago).No período posterior a 1986, só um MNE obteve o seu grau de Doutor na FDL (Freitas do Amaral).23 Os restantes três MNE que realizaram estudos de Pós-Graduação neste período, estudaram todos em univer-sidades estrangeiras, nomeadamente, Durão Barroso obteve o grau de Mestre e Martins da Cruz a Pós-Graduação na Universidade de Genebra. Deus Pinheiro obteve o grau de Doutor na Universidade de Birmingham. Assistimos assim, a uma mudança nas preferências quanto à universidade onde os MNE desenvolveram os seus estudos de Pós-Graduação, um maior domínio por parte das universidades estrangeiras.

3. CARACTERIZAÇÃO DA ACTIVIDADE PROFISSIONAL

3.1 Actividade Profissional de Origem (Ver, Gráfico/Quadro n.º 8, 8.1, 8.2 e 16)

O estudo da actividade profissional de origem dos ministros permite-nos saber qual a função que o MNE tinha antes do exercício das suas

23 Ver nota nº 8.24 Ter em atenção que o MNE Freitas do Amaral, já é MNE pela segunda vez. Se não se tivesse optado,

por questões metodológicas, de o inserir, não haveria nenhum MNE, após 1986 com estudos de Pós-Graduação na FDL.

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funções e a carreira que os mesmos desenvolviam, cumulativamente, permite-nos saber onde são recrutados os responsáveis máximos pela diplomacia nacional.Como iremos verificar de seguida, a actividade profissional de origem dos MNE não foi a mesma, no Estado Novo e na democracia. Ou seja, enquanto no Estado Novo o leque das actividades profissionais de origem era reduzido, a cerca de três actividades. Na democracia, mantêm-se as mesmas actividades profissionais de origem dos MNE do Estado Novo, apesar de com pesos diferentes, mais uma série de actividades profis-sionais que surgem como campo de recrutamento dos MNE. Certamente, que muito contribui para esta mudança de recrutamento, a mudança de regime em Portugal. Ao contrário da mudança representativa que também se verificou noutras variáveis, nesta (variável), a mudança de regime político em 1974 teve indubitavelmente uma influência impar.A mudança de fundo no que concerne à actividade profissional de origem dos MNE, do Estado Novo para a democracia, esteve essencialmente, ligada a dois aspectos: a troca do primado, e o surgimento de outras actividades profissionais de origem dos MNE.Enquanto, no Estado Novo o primado da actividade profissional de ori-gem dos MNE pertencia aos diplomatas, uma vez que quatro MNE 24, antes de assumir o cargo eram diplomatas no Ministério dos Negócios Estrangeiros, representando 44,4 %. A segunda actividade mais represen-tada neste período eram os políticos de carreira, três dos MNE 25 eram políticos de carreiras antes de serem MNE (33,3 %). Os restantes dois MNE 26 deste período eram oriundos de outras actividades profissionais (22,2 %), que não as estudadas no presente trabalho.Já durante a democracia, os papéis alteraram-se, o primado das activi-dades profissionais de origem dos MNE deixou de ser os diplomatas e passou a ser os políticos de carreira. Na prática, a mudança de regime em 1974 provocou uma troca directa do primado. No Estado Novo o primado pertencia aos diplomatas, na democracia aos políticos de carreira.Neste período, nove dos MNE eram políticos de carreira, representando 45 % do total dos MNE. A segunda actividade com maior representati-

24 César Amaral Abranches, Marcello Duarte Matias, Franco Nogueira, Rui Patrício. 25 Armindo Monteiro, Oliveira Salazar, Marcello Caetano.26 Caeiro da Mata (Comissário da Direcção Marítima Interna), Paulo Veríssimo da Cunha (Procurador e

mais tarde Presidente da Câmara Corporativa).

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vidade (20 %), neste período eram os diplomatas, apenas quatro MNE eram diplomatas antes de assumir o cargo. Apesar da mudança percentual em relação à actividade profissional de origem dos MNE, relativamente aos diplomatas, o número de MNE oriundo de diplomatas permaneceu idêntico. Ainda no que concerne aos diplomatas é de referir que todos eles, quer durante o Estado Novo quer durante a democracia, foram embaixadores nas grandes capitais europeias ou americanas. Durante a democracia, é de assinalar o surgimento de uma nova acti-vidade com representatividade, como actividade profissional de origem dos MNE – os professores universitários. Três dos MNE deste período antes de serem chamados a exercer o cargo de MNE eram professores universitários, representando 15 % do total dos MNE. Para além de ter existido durante a democracia um MNE militar (5 %), os restantes três MNE eram oriundos de outras actividades profissionais, que não as estudadas no presente trabalho. Em função das diferenças que existem dentro da democracia, efectuarei de seguida uma análise mais pormenorizada. No período anterior a 1976, ne-nhum sector tem uma representação relativamente superior comparativamente com os outros. Houve neste período um MNE que era Politico de Carreira (Mário Soares), um era Militar (Melo Antunes) e outro desempenhava cargos de direcção e investigação em Institutos Públicos (Mário Ruivo).No período anterior a 1986, temos MNE oriundos de diferentes profissões. Contudo, o predomínio vai para os Políticos de Carreira, existindo neste período quatro (Mário Soares, Medeiros Ferreira, Sá Machado, Jaime Gama). Diplomatas são dois (Freitas Cruz e Futscher Pereira). É neste período que os Professores Universitários têm uma representação maior, ha-vendo neste período dois ministros que eram professores (Freitas do Amaral 27 e Gonçalves Pereira). Existem, ainda dois MNE que não desempenhavam nenhuma profissão das supracitadas, designadamente Corrêa Gago (Assistente no Instituto Nacional de Investigação e Presidente do Conselho de Gerência da Petrogal) e o Eng.º Pires de Miranda (Presidente do Conselho de Gerência de algumas empresas Públicas, nomeadamente a Petrogal).No período a seguir a 1986, continuamos com um predomínio dos Políticos de Carreira, quatro dos ministros realizaram a sua carreira na vida política, nomeadamente (Deus Pinheiro, Durão Barroso, Jaime

27 Freitas do Amaral também era político, mas por questões metodológicas optou-se por inseri-lo nesta categoria.

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Gama e Teresa Gouveia). O segundo grupo mais representativo, é o dos Diplomatas, neste período dois MNE foram embaixadores (Martins da Cruz e António Monteiro).

3.2 Funções exercidas pós-MNE 28 (Ver, Gráfico/Quadro n.º 9, 9,1 e 9,2 e 17)

Quando os MNE cessam as suas funções de MNE, posteriormente vão de-sempenhar outro tipo de funções. Contudo, entre os MNE do Estado Novo e da democracia existem diferenças nas funções que estes vieram a desem-penhar, após terminarem as suas funções de chefia dos negócios estrangeiros. Após o terminus da função de MNE, estes tem desenvolvido uma pa-nóplia variada de funções, contudo, a quase sua totalidade continua a desempenhar um cargo no sector público nacional, ou em OI. A grande maioria dos MNE, concomitantemente com o exercício de outras funções, dedicam-se também à docência no Ensino Superior.Os MNE, do Estado Novo e da democracia, após cessarem as suas fun-ções, tiveram percursos profissionais diferentes. Em primeiro lugar, os MNE dos dois períodos em análise, distinguem-se pelo facto, de dentro do próprio período, terem seguido vias diferentes. Os MNE do Estado Novo, tem um percurso posterior ao de MNE mais homogéneo do que os MNE da democracia, uma vez que durante o Estado Novo, estes seguiram praticamente três percursos, num primeiro plano (Deputado, Cargos políticos nacionais de chefia, Cargos políticos internacionais), e num segundo plano, mas igualmente de forma parcimoniosa dois percursos (participação em Organizações Internacionais e Docência).Em segundo lugar, de uma forma mais específica, os MNE desenvol-veram após terminarem as suas funções, um conjunto de actividades diferenciadas, e concomitantemente diferentes entre períodos. Os MNE do Estado Novo, após terminarem as funções de ministro, foram dois para deputado, dois para cargos políticos nacionais de chefia, dois para cargos políticos internacionais de chefia, representando respectivamente cada sector 22 %. Os restantes três MNE, foram desempenhar as seguintes funções: um foi para uma Organização Internacional, e um dedicou-se à docência, e outro foi desempenhar funções no sector privado, repre-sentando respectivamente cada actividade 11,1 %.

28 Por questões de ordem metodológica só é referenciada uma função. Aquela que considero de maior rele-vo. Por falta de informação credível, na data da realização deste trabalho, não são incluídos os ex-MNE Teresa Gouveia e António Monteiro, e o actual MNE Freitas do Amaral.

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Diferentemente, dos MNE do Estado Novo, os MNE da democracia seguiram percursos diferentes em termos representativos/percentuais. Neste período, oito dos MNE após cessarem as suas funções, foram par cargos em organizações internacionais (40 %). Cinco foram para deputados da Assembleia da República (25 %), cinco para cargos de chefia a nível nacional (25 %). Dois dos MNE foram exercer cargos de chefia em organizações internacionais (10 %), os restantes dois foram, uma para o sector privado e outro dedicou-se à docência, representando respectivamente cada actividade 5 %.Independentemente, das diferenças que distingue os MNE de ambos os períodos, existem partes em comum ou muito idênticas, no que toca às funções desempenhadas pelos MNE após cessarem as suas funções. Ambos os MNE após deixarem a pasta dos negócios estrangeiros, foram desenvolver duas actividades de forma praticamente idêntica, uma vez que, cerca de 22,2 % dos MNE do Estado Novo foram para deputados e outros 22,2 % para cargos políticos de chefia nacionais. Os MNE da democracia seguiram percursos praticamente idênticos em termos percentuais, os MNE depois de serem os responsáveis pela diplomacia nacional, foram 25 % deputados na Assembleia da República e 25 % para cargos políticos internacionais de chefia. Como se pode verificar, apesar de haver divergência no número de funções que os MNE de-sempenharam, existe também algo de comum.É de referir que em ambos os períodos, os MNE depois de terminarem as suas funções de MNE, foram desempenhar, principalmente a nível nacional, dos mais elevados cargos políticos nacionais e internacionais, designadamente, Presidente da República, presidente da Assembleia da República, Primeiro-ministro/Presidente do Conselho, Presidente da As-sembleia Geral das Nações Unidas e Presidente da Comissão Europeia. Durante o Estado Novo, destaca-se indubitavelmente Oliveira Salazar, que assumiu a pasta mais do que uma vez, e de forma cumulativa com outras pastas ministeriais. Marcelo Caetano veio depois de ter sido MNE, substituir Oliveira Salazar, como Presidente do Concelho.Na democracia, Mário Soares, foi o único MNE da democracia que chegou mais tarde a Presidente da República. Apenas 5 % dos MNE no período em análise, alcançaram o cargo máximo político a nível nacional.No entanto, dois dos MNE da democracia conseguiram ser Primeiro-Ministro, nomeadamente, Mário Soares e Durão Barroso, isto é, 10 % dos MNEs depois do final do exercício das suas funções chegam a Primeiro-Ministro.

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Depois de serem MNE, Freitas do Amaral e Jaime Gama foram ocupar mais tarde a pasta do MDN cumulativamente com o cargo de Vice Primeiro-Ministro ou Ministro de Estado, respectivamente. O que corres-ponde a 10 % dos MNE que após o terminus das suas funções vieram posteriormente a ser MDN.A pasta dos Negócios Estrangeiros, conheceu na democracia mais de uma vez o mesmo titular, uma vez que foram três os MNE que repetiram a função, designadamente Mário Soares (como Interino), Jaime Gama e Freitas do Amaral, ou seja, 15 % dos MNE depois de cessarem o seu cargo regressam a MNE.Jaime Gama, depois de ter sido MAI, MNE por duas vezes, MDN e Ministro de Estado, foi o único MNE que chegou a Presidente da AR, o que representa 5 % dos MNE que após cessarem as suas funções chegaram a Presidentes da AR.

4. CARACTERIZAÇÃO POLÍTICA

4.1 Filiação Partidária (Ver, Gráfico/Quadro n.º 10)

Esta variável permite-nos saber a que partidos pertencem os MNE quando assumem o cargo de ministro. Os MNE durante o Estado Novo não tinham, nem podiam, ter filiação partidária. Contudo, se visto noutra perspectiva, os MNE pertenciam todos eles ao partido único existente na época – a União Nacional 29.Na democracia, os dois maiores partidos nacionais, dividem de forma equitativa entre si o número de MNE ao longo da democracia, cada partido teve como responsável máximo pela diplomacia sete MNE, representando um total de 35 % dos MNE por partido. Os restantes MNE, foram eleitos dois pelo CDS, tendo uma representatividade de 10 %. Como independentes foram eleitos, igualmente dois MNE, tendo um peso geral de 10 % 30.No período anterior a 1976, todos os MNE eram do PS ou estavam mais ligados a esse partido, com Mário Soares, Melo Antunes e Mário Ruivo, estamos perante uma hegemonia do PS, no tocante aos MNE.

29 A União nacional foi crida em 1930 por Oliveira Salazar, e em 1969 mudou de designação, passando a designar-se de Acção Nacional Popular.

30 Pode-se considerar o número de Independentes como quatro e uma representação de 20 %, caso se inclua dois MNE (Corrêa Gago e Futscher Pereira) como independentes. Contudo, por escassez de informação, a sua inclusão não pode ser automática.

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No período anterior a 1986, o PS mantêm o mesmo número de MNE, contudo, neste período, o número de ministros é muito maior. Foram MNEs pelo PS Medeiros Ferreira, Mário Soares e Jaime Gama. Por seu lado, o PSD, tem neste período dois ministros à frente do MNE, o primeiro MNE do PSD, durante a democracia foi Gonçalves Pereira, no VII Governo Constitucional de Pinto Balsemão e, Pires de Miranda foi MNE de Cavaco Silva no X Governo Constitucional. Foi igualmente, neste período que o CDS teve à frente da pasta dos Negócios Estrangeiros, um militante seu, Sá Machado foi MNE no II Governo Constitucional de Mário Soares e Freitas do Amaral foi MNE no VI Governo Constitu-cional de Sá Carneiro. Freitas Cruz foi eleito MNE, como Independente, no IV e V Governos Constitucionais, não apresentando qualquer tipo de filiação. Existem ainda, nesta fase, dois MNE que podem ser incluídos nos eleitos por Independentes, designadamente, Corrêa Gago, MNE no III Governo Constitucional do Eng.º Nobre da Costa e Futscher Pereira, MNE no VIII Governo Constitucional de Pinto Balsemão.No período mais recente de 1986 a 2005, o PSD tem a grande maioria de MNE, no entanto, esse facto é devido a várias mudanças nos Go-vernos do PSD, principalmente a partir de 2002. Neste período foram MNE pelo PSD, Deus Pinheiro, nos XI e XII Governos Constitucionais de Cavaco Silva e Durão Barroso no XII Governo Constitucional de Cavaco Silva. Posteriormente, no XV Governo Constitucional de Durão Barroso, foi MNE pelo PSD Martins da Cruz, que foi substituído cerca de um ano e oito meses depois por Teresa Gouveia, também do PSD. Em 2004 com a ida de Durão Barroso para Presidente da Comissão Europeia, Santana Lopes assume as funções de Primeiro-Ministro, formando o XVI Governo Constitucional, chamando para MNE António Monteiro do PSD.Por fim, o actual MNE do XVII Governo Constitucional de José Só-crates, Freitas do Amaral, já antes MNE pelo CDS, assume desta vez o cargo como Independente.O MNE Freitas do Amaral é um caso paradigmático, na política por-tuguesa, pelos vários cargos políticos que ocupou, mas também pela participação em elencos governativos de diferentes espectros político-partidários, como refere José Adelino Maltez,

Diogo Freitas do Amaral quase fez o pleno da democracia portuguesa. Aquele que chegou a ser convidado para Ministro de Marcello Caetano, começou, depois de Abril, como “rigorosamente ao centro”, mas acabou por ser o líder mais à direita do parlamento admitido pelo MFA, para, depois de se aliar episodicamente ao

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governo PS, ser o número dois da Aliança Democrática, antes de se assumir como candidato presencial do cavaquismo contra o soarismo, para regressar à liderança equidistante do CDS, antes de se desfilar deste partido e de apoiar publicamente o PSD de Durão Barroso, que lhe deu acesso a presidente da Assembleia-Geral da ONU 31.

4.2. Tempo no Cargo (Ver, Gráfico/Quadro n.º 11 e 12)O tempo que os MNE estiveram no cargo permite-nos saber, se é uma função ministerial estável, em função do tempo de permanência do ministro. Sem contudo, esquecer que esta estabilidade ministerial está sempre dependente, entre outros factores, do regime político e da alternância política, operada dentro do mesmo. O tempo no cargo dos MNE tem de ser compreendido e enquadrado, de acordo com o regime político vigente em cada período. O tempo que os ministros exercem o cargo é indissociável da situação politica nacional. No período do Estado Novo, em parte devido ao tipo de regime exis-tente, o cargo de MNE permaneceu estável durante períodos mais pro-longados do que na democracia. É fundamental salientar o facto que Oliveira Salazar, nos principais momentos de crise internacional, passava a assumir o cargo de MNE cumulativamente com outras pastas. Salazar nestes períodos, da Guerra Civil de Espanha e da II Guerra Mundial, avocava a si as pastas que ele considerava fundamentais, como foi por exemplo o caso dos negócios estrangeiros. Assim, durante o Estado Novo, três MNE 32 estiveram a exercer o cargo por um período de tempo inferior a um ano (33,3 %). Em sentido quase contrário em termos de tempo no cargo, três MNE 33 ocuparam por um período compreendido entre 3 e 4,9 anos o cargo de responsável pela diplomacia nacional (33,3 %). Por fim, houve ainda três MNE 34 que ocuparam o cargo por um período superior a cinco anos (33,3 %).

31 Ver, José Adelino Maltez, Tradição e Revolução – Uma biografia do Portugal Político do século XIX ao XXI, (1910-2005), Vol. II, Tribuna, Lisboa, 2005, p. 766.

32 César Amaral Abranches foi MNE de 05/07/1932 a 11/04/1933. Armindo Monteiro foi MNE de 11/05/1935 a 18/01/1936; 18/01/1936 a 24/11/1936. Marcello Caetano foi MNE interino de 26/12/19256 a 11/02/1957 e de 06/10/1969 a 15/01/1970, e MNE de 29/05/1957 a 27/06/1957.AAVV, Os Ministros dos Negócios Estrangeiros de Portugal. Base de Dados dos Alunos de Mestrado em Ciência Politica e Relações Inter-nacionais 2004-2005,FCSH-UNL, Lisboa, 2005.

33 «Caeiro da Mata foi MNE de 11/04/1933 a 23/10/1934; 23/10/1934 a 27/03/1935 e de 04/02/1947 a 02/08/1950. Marcello Duarte Matias foi MNE de 14/08/1958 a 04/05/1961. Rui Patrício foi MNE de 15/01/1970 a 25/04/1974.» In, AAVV, Os Ministros dos Negócios Estrangeiros de Portugal. Base de Dados dos Alunos …, op. cit..

34 «Oliveira Salazar foi MNE interino de 06/11/1936 a 04/02/1947. Paulo Veríssimo da Cunha foi MNE de 02/08/1950 a 13/08/1958. Franco Nogueira foi MNE de 04/05/1961 a 27/09/1968; 27/09/1968 a 06/10/1969». In, AAVV, Os Ministros dos Negócios Estrangeiros de Portugal. Base de Dados dos Alunos …, op. cit..

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Durante a democracia os MNE não permaneceram no cargo por pe-ríodos muito prolongados. A maioria dos MNE esteve à frente do ministério dos negócios estrangeiros por períodos curtos de tempo, em parte devido ao florescer da democracia, principalmente no período subsequente à sua instauração.Neste período, nove dos MNE estiveram a exercer o cargo por um período de tempo inferior a um ano (47,3 %). Tivemos ainda, seis MNE que che-fiaram o ministério por um período de tempo compreendido entre um ano e um ano e nove meses (31,5 %). Dois MNE estiveram a exercer as suas funções por um período de tempo compreendido entre os dois anos e os dois anos e nove meses (10,5 %). Por fim, dois MNE foram responsáveis pela diplomacia nacional por um período de tempo superior a cinco anos.O período da democracia, pela sua singularidade, mas também pelas suas diferenças dentro do próprio período, justifica uma análise mais minuciosa. Na democracia, após uma análise do tempo que cada ministro esteve à frente dos Negócios Estrangeiros, constata-se que seis dos MNE em toda democracia estiveram menos de dois anos a exercer funções de MNE, ou seja, 31,6 % dos MNE esteve a dirigir o MNE por um período inferior a dois anos. Por outro lado, três dos MNE apenas estiveram a exercer funções de ministro por um período inferior a um ano, cerca de 15,8 % dos MNE foram ministros por um período inferior a um ano. Situação análoga aplica-se também a três ministros, que apenas foram MNE por menos de três meses, ou seja, 15,8 % dos MNE em toda a democracia apenas estiveram a exercer o cargo menos de três meses. Depois, dois dos ministros foram MNE por um período inferior a oito meses, representando 10,5 % do total. No entanto, também temos dois MNE que foram ministros por mais de cinco anos, sendo assim 10,5 % dos MNE estiveram à frente dos Negócios Estrangeiros mais de cinco anos, o que poderá representar uma certa estabilidade na política externa portuguesa. Por fim, estiveram ainda a exercer o cargo por um período inferior a seis meses apenas um ministro (5,3%) e outro esteve por um período inferior a três anos (5,3%). Fazendo agora uma análise por períodos, verifica-se que antes de 1976, um MNE foi ministro menos de três meses, Mário Ruivo apenas foi ministro cerca de um mês, um foi menos de um ano (Melo Antunes) 35 outro foi menos de dois anos (Mário Soares).

35 Apesar de haver uma interrupção, já que o MAJ Melo Antunes foi MNE no IV e VI Governos Constitucionais, sendo substituído por um curto período (cerca de um mês) por Mário Ruivo no V Governo Constitucional.

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No período anterior a 1986, dois MNE estiverem em efectividade de serviço por um período inferior a três meses (Corrêa Gago e Mário Soares 36. Sá Machado 37, apenas esteve como responsável pela diplo-macia nacional num período inferior a seis meses. Porém, o MNE Futscher Pereira 38 também não esteve por um período de tempo muito mais longo, sendo MNE menos de oito meses. Por um período mais longo, esteve à frente da pasta dos Negócios Estrangeiros Freitas do Amaral 39, cerca de um ano. No entanto, quatro dos MNE deste período, chefiaram os Negócios Estrangeiros por um período inferior a dois anos, designadamente Medeiros Ferreira, Freitas Cruz, Gonçalves Pereira e Pires de Miranda 40. Neste período, o ministro que esteve mais tempo à frente do MNE, apesar de ser por um período inferior a três anos foi Jaime Gama 41. Após 1986, os MNE estiveram com a pasta da diplomacia, por períodos de tempo diversos. Contudo, só um MNE esteve à frente da diplomacia menos de oito meses. António Monteiro 42, foi o único MNE que após a adesão de Portugal à CEE esteve menos tempo com a pasta dos Negócios Estrangeiros, foi ministro menos de oito meses. Teresa Gouveia 43, também não foi mi-nistra por um período muito maior em relação ao seu substituto, já que esteve à frente do MNE menos de um ano. Por seu lado, já Martins da Cruz foi MNE menos de dois anos. O período subsequente à adesão de Portugal à CEE, foi o início de uma fase em que os MNE permaneceram à frente da diplomacia por períodos mais longos, durante a democracia. Sendo assim, Durão Barroso foi MNE por um período de tempo inferior a três anos. No entanto, Deus Pinheiro e Jaime Gama 44, foram MNE

36 Corrêa Gago foi MNE de 29/08/1979 a 15/09/1978 e Mário Soares que foi MNE interino de 12/10/1977 a 07/12/19777.

37 Sá Machado foi MNE de 31/01/1978 a 28/07/1978.38 Futscher Pereira foi MNE de 09/06/1982 a 23/12/1982.39 Freitas do Amaral foi MNE, pela primeira vez, de 03/01/1980 a 09/12/1980. 40 Medeiros Ferreira foi MNE de 29/07/1976 a 10/10/1977, Freitas Cruz de 22/11/1978 a 11/06/1979 e

01/08/1979 a 27/12/1979, Gonçalves Pereira de 09/01/1980 a 14/08/1981 e de 04/09/1981 a 09/06/1982 e Pires de Miranda de 06/11/1985 a 17/08/1987.

41 Jaime Gama foi MNE, pela primeira vez, de 09/06/1983 a 06/11/1985. Jaime Gama foi o MNE que esteve mais tempo à frente do MNE, antes e depois da adesão de Portugal à CEE, como também foi o MNE que em termos globais, na democracia, chefiou o MNE por mais tempo.

42 António Monteiro foi MNE de 17/08/2004 a 12/03/2005.43 Teresa Gouveia foi MNE de 9/10/2003 a 17/7/2004.44 Deus Pinheiro foi MNE de 17/08/1987 a 12/11/1992 e Jaime Gama foi MNE, pela segunda vez, de

28/10/1995 a 06/04/2002.

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mais de cinco anos. Jaime Gama foi durante a democracia quem esteve mais tempo com o cargo de MNE, apesar de ter sido ministro em dois períodos diferentes, antes da adesão de Portugal à CEE e depois da adesão. Jaime Gama foi MNE cerca de dez anos e três meses, ou seja, Portugal teve durante mais de um terço do período democrático o cargo de MNE entregue à mesma pessoa, a Jaime Gama.

4.3 Actividades Cívico-politicas (Ver, Gráfico/Quadro n.º 13 e 13.1)

Durante o Estado Novo a participação dos MNE em actividades de na-tureza cívico-politicas, é nula. 45 A falta de participação dos MNE neste tipo de actividades compreende-se de forma imediata, em virtude do regime político existente neste período e da liderança política desenca-deada pelo Presidente do Conselho, Oliveira Salazar. A maior participação de MNE em actividades Cívico-Politicas deu-se logo a seguir à implantação da democracia, os ministros dos Governos Provisórios eram essencialmente constituídos por elementos que tinham actuado contra a ditadura e participado em movimentos de resistência ao poder ditatorial. À medida que nos afastamos da data de implantação da democracia, os MNE participaram cada vez menos em movimentos Cívico-Politicos. Na totalidade dos MNE doze participaram movimentos Cívico-Politicos (60 %).No período anterior a 1976, todos os MNE participaram em movimentos de carácter cívico e/ou politico. Mário Soares pertenceu ao MUNAF, MUD, Resistência Republicana Socialista, foi fundador do MUD juve-nil e da Acção Socialista Portuguesa transformada posteriormente em Partido Socialista, da qual foi eleito Secretário-Geral. O MAJ Melo Antunes, participou no Movimento dos Capitães de Abril, na Comissão Coordenadora do MFA e Conselho dos Vinte. O ministro Mário Ruivo foi fundador do MUD juvenil.No período anterior a 1986, Mário Soares (actividades supracitadas). Medeiro Ferreira fundou o Movimento Sindical Estudantil. Sá Machado (Membro, fundador e Presidente do Movimento Humanismo e Democracia e do CDS). Freitas do Amaral foi Presidente da Assembleia-Geral da Associação de Estudantes da sua Faculdade (1961-1962), foi fundador e Presidente do CDS. Jaime Gama foi membro da Acção Socialista Portuguesa e do PS desde a sua fundação em 1973.

45 Em função do tipo de regime político existente, se eventualmente existiu algum MNE que participou neste tipo de actividades, não existe informação quanto à sua participação.

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No período posterior a 1986, Durão Barroso foi Presidente do PSD (1999). Teresa Gouveia foi membro dos corpos sociais de várias asso-ciações cívicas. Jaime Gama e Freitas do Amaral, desde que assumiram o cargo de MNE pela primeira vez, não participaram em actividades Cívico-Politicas relevantes.

5. Publicações editadas pelos MNE 46 (Ver, Gráfico/Quadro n.º 14)

No período do Estado Novo, sete dos MNE escreveram várias obras (77,8 %), apesar de diferentemente da democracia, os MNE terem escri-to sobre temas que não estão directamente relacionados com a função. Publicaram obras as seguintes MNE do Estado Novo: Caeiro da Mata 47, Armindo Monteiro 48, Oliveira Salazar 49, Paulo Veríssimo da Cunha 50, Marcello Caetano 51, Marcello Duarte Matias 52, Franco Nogueira 53.Durante a democracia a grande maioria dos MNE publicou várias obras ou escreveu artigos em diversas revistas, uns ligados à Politica Externa e Diplomacia, outros mais relacionados com a formação académica e actividade profissional dos ministros. O MNE que publicou mais obras (livros e artigos em revistas) relacionadas com a Politica Externa e/ou Diplomacia, estando directamente ligado com o cargo ou com o exercí-cio das funções foi o ministro Jaime Gama. O MNE que publicou mais obras, mas não estando directamente relacionadas com o exercício das funções de MNE, mas sim com a sua formação académica e actividade profissional (extra-MNE) foi o ministro Freitas do Amaral.

46 Relativamente a quatro MNE (20 %) não existem dados que nos permitam47 Ver, AAVV, Os Ministros dos Negócios Estrangeiros de Portugal. Base de Dados dos Alunos de Mestrado

em Ciência Politica e Relações Internacionais 2004-2005,FCSH-UNL, Lisboa, 2005. Publicações – “O direito de prosperidade e a utilidade pública, Monopólios Fiscais, Furto”.

48 Ibidem, “Carta Orgânica do Império; Reforma Administrativa Ultra marina;Do Orçamento Português; Tratado de Economia Política; Do Equilíbrio Orçamental 1926; O Problema dasTransferências de Angola; Finanças Coloniais; Para uma Política Imperial”

49 Ibidem, “O Ágio do Ouro e Outros Textos Económicos (1916-1918); Discursos e Notas Políticas (6 Volumes)”50 Ibidem, “Simulação Processual e anulação do caso julgado; Curso de Processo Civil; Curso de Direito

das Obrigações; Do problema da intervenção do Estado na vida económica 1927; A regulação judiciária dos”differenda interpopulos”1928; O recrutamento dos magistrados judiciais 1929; A legitimidade dos réus nas acções do Estado 1934; Princípios gerais de Direito Processual Civil e Comercial; Processo Comum de Declaração; A garantia das Obrigações”

51 Ibidem, “Manual de Direito Administrativo (1937); O Concelho de Lisboa na crise de 1383-1385 (1951); Manual de Ciência Política e Direito Constitucional (1952); Minhas memórias de Salazar (1977); Cons-tituições Portuguesas (1978); História do Direito Português 1140-1495 (1981); A Crise Nacional de 1383-1385. Subsídios para o seu Estudo (1985).”

52 Ibidem, “Doze sonetos e uma canção, em 1963; “Lusco-Fusco”, em 1973 e “Correspondência Marcelo Matias/Salazar””

53 Ibidem, “Diálogos Interditos (1918- 1993), Um Politico Confessa-se; e Diário 1960-1968, Salazar-biografia.”

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Durante a democracia seis dos MNE publicaram obras de carácter ministerial, ou seja, 30 % dos MNE publicaram obras do MNE enquanto ministros. Dez dos MNE publicaram obras extra-ministerial, representando 50 %. Mas 75 % dos MNE na democracia editaram artigos seus de Politica Externa e/ou Diplomacia em revistas, quinze MNE escreveram em revistas. No período anterior a 1976, o único que publicou uma obra de Política Externa enquanto MNE foi Mário Soares 54. No período anterior a 1986, Jaime Gama 55 e Pires de Miranda 56 publicaram, no exercício das suas funções, obras de Politica Externa. No período posterior a 1986, três MNE, enquanto ministros publica-ram obras de Politica Externa, nomeadamente, Deus Pinheiro 57, Durão Barroso 58 e Jaime Gama 59.

CONCLUSÃO 60

Durante o período do Estado Novo, o peso que o MNE tinha, dependia do Presidente do Conselho, principalmente com Oliveira Salazar, ou seja, o MNE tinha o peso que Salazar queria que tivesse. Nos períodos mais críticos da políti-ca externa portuguesa, durante o Estado Novo, a Guerra Civil de Espanha e a II Guerra Mundial, Salazar passa a chefia também os negócios estrangeiros. Fruto da importância dos acontecimentos, Salazar assume a pasta dos negócios estrangeiros, o que é revelador do facto que quando havia de tomar decisões importantes, em momentos cruciais, quem as tomava e geria os processos era Oliveira Salazar.

Contudo, na democracia, o peso dos MNE foi variando de governo para governo, de ministro para ministro, de partido para partido, uma vez que a

54 Ver, Mário Soares, Nova Politica Externa Portuguesa, MNE, Lisboa, 1974. 55 Ver, Jaime José Matos Gama, Politica Externa Portuguesa (1983-1985), Biblioteca Diplomática – Série

C/MNE. Lisboa, 1985. 56 Ver, Pedro Pires de Miranda, Politica Externa Portuguesa (1985-1987), MNE. Lisboa, 1987.57 Ver, João de Deus Pinheiro, Grandes Eixos da Politica Externa no Portugal de Hoje, MNE, Lisboa, 1988. Ver, João de Deus Pinheiro, Notas sobre questões actuais de Politica Externa, MNE-IDN, Lisboa, 1988. 58 Ver, José Manuel Durão Barroso, Politica Externa Portuguesa (1994-1995 e 1995), Biblioteca Diplomá-

tica – Série C/MNE. Lisboa, 1995. Ver, José Manuel Durão Barroso. Dez anos de Cooperação (1995), Biblioteca Diplomática – Série C/

MNE. Lisboa, 1995. 59 Ver, Jaime Gama, Politica Externa Portuguesa (1995-1999), Biblioteca Diplomática – Série C/MNE.

Lisboa, 1999. Ver, Jaime José Matos Gama, Politica Externa Portuguesa (1999-2002), Biblioteca Diplomática – Série

C/MNE. Lisboa, 2002.60 Ver também: Quadro Sinóptico dos Responsáveis pela Politica Externa Portuguesa (1974-2005), Gráficos

n.º 15 e 18.

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sua posição na hierarquia do governo teve diferentes variações. Este aspecto é bastante importante, na medida em que um MNE pode influenciar a política externa, porque se tiver um peso influencia de uma maneira, e caso não o tenha influencia de outra, podendo alterar significativamente a política externa portuguesa.

Em ambos os períodos, a pasta dos negócios estrangeiros, foi entregue a um grupo restrito de pessoas, e no entender de José Adelino Maltez, «a classe política transformou-se, portanto, numa elite não aberta, num grupo restrito que nem corresponde aos melhores (a aristocracia) nem aos mais ricos (a oligarquia), conforme as classificações clássicas das formas de governo. Por falta de elites competitivas, ela tende a não constituir o elemento dinâmico da chamada poliarquia» 61.

A análise dos diferentes ministros permite-nos fazer uma caracterização genérica dos MNE durante o Estado Novo e a democracia, com as respectivas diferenças entre períodos.

Sendo assim, o arquétipo de um MNE em Portugal durante o Estado Novo e a democracia pode ser caracterizado da seguinte forma:

• É um ministério monopolizado pelo género masculino, 100 % dos MNE no Estado Novo, e 95 % dos MNE da democracia são do sexo masculino;

• Quando assumem o cargo, 45 % dos MNE do Estado Novo e 40 % dos MNE da democracia têm entre 40 a 49 anos de idade, e uma média de idades de 45,8 anos os MNE do Estado Novo 47,9 anos os MNE da democracia;

• A maioria dos ministros do Estado Novo é natural dos restantes distritos do país (66 %), enquanto que na democracia, 55 % dos MNE nasceram em Lisboa;

• A ciência do saber que tem maior predomínio é o Direito. No Estado Novo domina completamente, 100 % dos MNE são licenciados em direito. Na democracia, 40 % dos MNE são Licenciados em Direito;

• A FDL foi o Estabelecimento de Ensino Superior que mais MNE frequentou em ambos os períodos. No Estado Novo 67 % dos MNE frequentaram a FDL, e na democracia 30 % dos MNE realizaram os seus estudos de Licenciatura nesta faculdade;

• Cerca de 50 % dos MNE obtiveram um grau académico superior à Licenciatura;

61 Ver, José Adelino Maltez, Tradição e Revolução – Uma biografia do Portugal Político do século XIX ao XXI, (1910-2005), Vol. II, Tribuna, Lisboa, 2005, p. 113.

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• Na totalidade dos MNE, do Estado Novo 55 % são doutorados em direito. Na democracia, 20 % são Pós-Graduados em Direito 62;

• No Estado Novo 60 % dos MNE doutorados realizaram os estudos de doutoramento na FDL. Na democracia, a maioria dos MNE realizaram os estudos de Pós-Graduação em Universidades estrangeiras, cerca de 50%. A nível nacional, 30 % dos MNE frequentaram a FDL durante os estudos de Pós-graduação;

• A actividade profissional de origem dos MNE, foi no Estado Novo os diplomatas (44,4 %), e na democracia os Políticos de carreira represen-tam 45 % das diversas actividades profissionais de origem dos MNE;

• Os Diplomatas quando chegam a MNE, no passado foram embaixadores em grandes capitais europeias e americanas;

• Na democracia, só com Governos do PSD é que houve Diplomatas com a pasta dos Negócios Estrangeiros;

• No que concerne à filiação partidária, no Estado Novo os MNE eram todos do único partido existente (União Nacional). Na democracia, quando iniciaram o exercício de funções de MNE, 35 % dos ministros eram do PS e outros 35 % do PSD;

• A participação em movimentos Cívico-Politicos, dos MNE do Estado Novo foi nula, mas ao longo da democracia 60% dos MNE participaram em movimentos Cívico-Políticos;

• Da totalidade dos MNE, 77,8 % do Estado Novo e 30 % da democracia, publicaram obras;

• Jaime Gama foi o MNE, de ambos os períodos, que esteve mais tempo com a pasta da diplomacia, aproximadamente 10 anos;

• Após cessarem as funções, 40 % dos MNE participam em OI, 20 % vão para Deputados e outros 20 % vão desempenhar cargos de chefia em órgãos políticos nacionais;

• A grande maioria dos MNE, após cessarem as funções, dedicam-se à do-cência no Ensino Superior, apesar de não a exercerem em exclusividade;

• Depois de serem MNE do Estado Novo, 22 % foram para deputados, 22 % para cargos políticos nacionais de chefia, e outros 22 % para cargos políticos internacionais de chefia;

• Depois de serem MNE na democracia, nove deles vieram a desempenhar outros cargos políticos nacionais, 5 % dos MNE chegaram a PR, 5 %

62 Compreende as pós-graduações, mestrados e doutoramentos.

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a Presidente da AR, 10 % a Primeiro-Ministro, 10 % a MDN e 15 % a MNE (pela segunda vez).

O grau de influência do MNE na política externa portuguesa depende de um conjunto complexo e variado de factores, designadamente:

• Que tipo de regime político, e que poderes tem os vários órgãos de soberania;

• Quem é o Primeiro-Ministro e o PR. Os conhecimentos que estes tive-rem de politica externa e o grau de importância que atribuem à política externa, vai determinar, em parte, o papel do MNE, que pode ser mais activo e relevante, ou pelo contrário, mais passivo e discreto;

• A sua posição na hierarquia do governo, o grau de influência de um ministro, não é a mesma se ele for um Ministro de Estado, e/ou se for um dos primeiros na hierarquia governativa. Não tem o mesmo peso político e influência numa politica pública o segundo ministro da hierarquia e o oitavo na hierarquia, por ex;

• A conjuntura, pode exigir num determinado momento um certo MNE específico, que tenha peso politico nacional e internacional, que tenha experiência política ou diplomática, ou que tinha uma determinada for-mação específica. No entanto, a conjuntura, também, pode despoletar a importância e o papel de um MNE, conforme o cenário internacional num preciso momento e o papel que este assuma.

Independentemente do MNE que esteve com a pasta, as características que possui, o partido a que pertencia, o que se mantém constante em toda a democracia são os grandes eixos da política externa portuguesa. A política externa portuguesa desenvolveu-se, essencialmente, em toda a democracia em volta da integração europeia, do diálogo atlântico e dos países lusófonos.

O êxito prolongado da diplomacia em preservar a paz depende, como já verificamos, de extraordinárias qualidades morais e intelectuais que devem possuir todos os principais participantes do processo 63.

Neste mundo em constante mutação, o papel dos MNE portugueses tem tido um papel de variada importância. O quadro institucional da União Europeia, após o Tratado de Lisboa criou o Alto Representante para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança 64. Com a criação desta figura, implicou (ou devia implicar)

63 Hans J. Morgenthau, A Política entre as Nações, São Paulo, 2003, p.1021.64 O Presidente da Comissão Europeia e o Presidente Permanente do Conselho Europeu, figura criada igual-

mente pelo Tratado de Lisboa, também têm competências no âmbito externo da União.

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uma coordenação da política externa nacional e europeia, bem como das tarefas dos MNE nacional e do Alto Representante da União Europeia.

Porém no futuro, independentemente das características dos MNE, mais importante será saber qual o seu papel e a sua importância na formulação, coordenação e execução da política externa portuguesa e o alinhamento desta com a acção externa da União Europeia.

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Abreviaturas

AR – Assembleia da RepúblicaBID – Banco de Investimento e DesenvolvimentoCECA – Comunidade Económica do Carvão e do AçoCEE – Comunidade Económica EuropeiaCPLP – Comunidade de Países de Língua PortuguesaCRP – Constituição da República Portuguesa

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CSNU – Conselho de Segurança das Nações UnidasEUA – Estados Unidos da AméricaFA – Forças ArmadasFAO – Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a AlimentaçãoFCSH – Faculdade de Ciências Sociais e HumanasFDL – Faculdade de Direito de LisboaFNLA – Frente Nacional de Libertação de Angola MAI – Ministro da Administração InternaMDN – Ministro da Defesa Nacional MPLA – Movimento Popular de Libertação de AngolaMNE – Ministro dos Negócios EstrangeirosMUD – Movimento de Unidade Democrática MUNAF – Movimento de Unidade Nacional Antifascista NATO – Organização do Tratado do Atlântico NorteOI – Organizações InternacionaisOSCE – Organização para a Segurança e Cooperação na EuropaONU – Organização das Nações UnidasPALOP – Países Africanos de Língua Oficial PortuguesaPE – Parlamento EuropeuPR – Presidente da RepúblicaU.E – União EuropeiaUEO – União da Europa Ocidental UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultural UNITA – União Nacional para a Independência Total de AngolaUNL – Universidade Nova de Lisboa

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Quadro Sinóptico dos Responsáveis pela Politica Externa Portuguesa (1974-2005)

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Quadro/Gráfico 1GÉNERO

Quadro/Gráfico 2IDADE

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Quadro/Gráfico 4LICENCIATURA

Quadro/Gráfico 3NATURALIDADE

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Quadro/Gráfico 5INSTITUIÇÕES UNIVERSITÁRIAS (LICENCIATURA)

Quadro/Gráfico 6FORMAÇÃO COMPLEMENTAR (PÓS-GRADUAÇÃO)

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Quadro/Gráfico 8ACTIVIDADE PROFISSIONAL DE ORIGEM

Quadro/Gráfico 7INSTITUIÇÃO UNIVERSITÁRIA (PÓS-GRADUAÇÃO)

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Quadro/Gráfico 8.1PESO DAS CARREIRAS

Quadro/Gráfico 8.2RECRUTAMENTO

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Quadro/Gráfico 9DOCÊNCIA

Quadro/Gráfico 9.1DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA

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Quadro/Gráfico 9.2FUNÇÃO PÓS-MNE

Quadro/Gráfico 10FILIAÇÃO PARTIDÁRIA

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Quadro/Gráfico 11TEMPO NO CARGO

Quadro/Gráfico 12TEMPO NO CARGO

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Quadro/Gráfico 13INDICADORES DE POLITIZAÇÃO

Quadro/Gráfico 13.1ACTIVIDADE CÍVICO-POLÍTICO

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Quadro/Gráfico 14PUBLICAÇÕES

Gráfico 15

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Quadro/Gráfico 16FUNÇÕES GOVERNAMENTAIS PRÉ-MNE

Quadro/Gráfico 17CARGO GOVERNATIVO PÓS-MNE

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Gráfico 18POSIÇÃO HIERÁRQUICA

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CaraCtErização dE solos Contaminados Com matEriais ExPlosivos

João Paulo Sousa (*)

Professor Doutor

ABSTRACT

The contamination of the environment by explosives is a worldwide pro-blem resulting in part from TNT, RDX and HMX production and utilization for military purposes. Huge amounts of these high explosives were produced, packed and stored which led to the contamination of soil and groundwater in many countries. Unfortunately, the Decree-Law n.º 178/2006, which rules over residual waste disposal, doesn´t consider the military explosives or at the end of life time as toxic residues. It is also made a brief outline of the development of bioremediation technologies sketching the major features and limitations of the process. As far as phytotoxicity is concerned only a short brief is undertaken, due to the lack of literature to support a better understand of the process.

Key Words: TNT, RDX, HMX, Bioremediation, Phytotoxicity

RESUMO

A contaminação ambiental devido à produção de explosivos de alta potência (e.g. TNT, RDX e HMX) é um problema a nível mundial devido às respectivas utilizações para fins militares. Grandes quantidades de explosivos de elevada potência foram produzidas, embaladas, armazenadas o que contribuiu para a con-taminação dos solos e lençóis freáticos. Infelizmente, o Decreto-lei n.º 178/2006, que regula os resíduos tóxicos não é aplicável a “explosivos à carga ou em fim

(*) Regente das disciplinas de Química (N221) e de Química de Explosivos (N222). Investigador do CINAMIL

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de vida”. É efectuado um pequeno levantamento do estado-da-arte dos processos de bioremediação existentes para tratar os explosivos de elevada potência. No que concerne ao processo de fitotoxicidade, apenas é efectuada uma síntese sumária, dado não existir muita bibliografia disponível sobre o processo.

Palavras Chave: TNT, RDX, HMX, Bioremediação, Fitotoxicidade

1. INTRODUÇÃO

A contaminação de solos e lençóis freáticos devidos à utilização de mate-riais explosivos de alta potência é uma realidade em todos os campos onde ocorre a utilização de materiais bélicos. Os explosivos de elevada potencia mais comumente utilizados são o 2,4,6 – trinitrotolueno (TNT), o hexaidr-1,3,5-trinitro-1,3,5-triazina (RDX) e o octoidro-1,3,5,7-trtranitro-1,3,5,7-tetrazocine (HMX), cujas estruturas químicas estao ilustradas na Figura 1. Estes materiais explosivos, e.g., designados de explosivos de alta potência têm sido usados para fins militares, nomeadamente no campo da Artilharia e no desarmamento de minas e explosivos após ultrapassada a sua validade. O TNT é um dos explosivos mais utilizados em compostos explosivos. O RDX é um explosivo químico, que possuí um vasto leque de aplicações em detonadores, granadas e bombas bem como em outros explosivos militares. O HMX é um explosivo mais potente que o TNT e, é utilizado em bombas atómicas, em explosivos plásticos e em rockets.

Figura 1 – Estruturas químicas do TNT, RDX e HMX.

A importância destes compostos explosivos como contaminantes ambientais está relacionada com a sua vasta aplicação para fins militares e potenciais efeitos adversos ao ser humano e outros receptores ecológicos. Alguns in-vestigadores que estudam a toxicidade crónica destes compostos afirmam a sua toxicidade oral em mamíferos, pássaros, anfíbios e repteis (Nam et al.

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CaraCtErização dE solos Contaminados Com matEriais ExPlosivos

2007). Não obstante do seu perigo, a nível nacional não existe legislação aplicável a estes poluentes, o que torna a avaliação de riscos dos compos-tos explosivos e metais pesados muito crucial nas trincheiras e armamento militar. O Decreto-lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro, sobre a aplicação das operações de gestão de resíduos, compreendendo toda e qualquer operação de recolha, transporte, armazenagem, triagem, tratamento, valorização e eli-minação de resíduos, bem como às operações de descontaminação de solos e à monitorização dos locais de deposição após o encerramento das respectivas instalações. Este Decreto-Lei não é aplicável aos explosivos abatidos à carga ou em fim de vida. Para os explosivos químicos deveria existir legislação específica no que concerne à toxicidade dos seus componentes bem como aos respectivos derivados.Juntamente com os materiais explosivos de alta potencia, também se verifica alguma contaminação dos solos (quer a superfície como abaixo) devido à presença de metais pesados, nomeadamente cobre (Cu), ferro (Fe), cádmio (Cd), chumbo (Pb), manganês (Mn) de acordo com Nam et al. 2007. Estas espécies metálicas estão presentes à superfície dos solos e, são provenientes dos canhões, armas de fogo e materiais de armazenamento.O risco destes explosivos de alta potência e dos metais pesados refere-se a um perigo realístico de um composto químico de interesse, num determi-nado ambiente, sendo considerado como função do tempo de exposição e a viabilidade aos aceitantes (Alexander 1995). Devido ao facto da avaliação de riscos focar a avaliação quantitativa dos efeitos adversos aos potenciais receptores, o resultado indica uma evidência efectiva e científica na tomada de decisão da gestão do ambiente. Portanto, efectuar uma avaliação de riscos dos poluentes em solos contaminados tornou-se um procedimento essencial para a manipulação de substâncias perigosas e desenvolvimento de estratégias de remediação de solos (Kim et al. 2006 e Baden et al. 1999). À semelhança com as áreas poluídas pelas actividades industriais, nos lo-cais das trincheiras, compostos explosivos de elevada potência, tais como o TNT, RDX, HMX e metais pesados são espécies que contaminam os solos e águas superficiais e que podem migrar até os lençóis freáticos (Holdworth et al. 2001). Estes compostos podem migrar da superfície para o sub-solo ou lençóis freáticos por acção das águas pluviais, as quais funcionam como agentes lixiviantes. No que concerne à caracterização dos solos, os poluentes químicos são extraídos com acetonitrilo ou solução aquosa, para análise em HPLC (High Performance Liquid Cromathography) para os componentes orgânicos e por EAA (Espectrofotometria de Aborção Atómica) para os poluentes de metais pesados (EPA8830B, 1980).

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De acordo com Wahlgren et al. (2001), recentemente as preocupações têm aumentado no que concerne sobre os potenciais efeitos ambientais, por causa dos testes e actividades de formação na zona das fileiras dentro dos campos das Forças Armadas. Investigação prévia no Canadian Force Base Valcartier (Jekins e tal. 2000), demonstraram que os resíduos dos compostos explosivos são depositados na superfície dos solos nas zonas de rebenta-mento das granadas. Concentrações de HMX acumuladas junto às fileiras de rebentamento na ordem dos 1.640,00 ppm/Kg na superfície dos solos. Contudo o TNT foi determinado em cerca de 100 ppm/Kg na superfície dos solos das mesmas fileiras.Outras investigações conduzidas no Canada nas zonas de impacto (ou áreas de contaminação) com materiais explosivos encontraram valores relativamente elevados para o HMX à superfície e concentrações mais baixas para o TNT (Thiboutot et tal. 1998). As concentrações mais elevadas de HMX detectadas foram de 3.700.000 ppm/Kg enquanto para o TNT os valores foram muito inferiores. Mais recentemente, estudos elaborados pela U.S. Army CHPPM no campo de treino de Shelby, demonstraram que a existência de explosivos de alta potência nos solos era inferior a 250 ppm/kg. Estes ensaios foram realizados utilizando a técnica de RH-HPLC.Para além dos explosivos químicos de alta potência (e.g. TNT, RDX e HMX) também são detectáveis no solo outros derivados daqueles compostos como é o caso do 2,4 DNT, 2,6DNT, 4ADNT, 2ADNT, 1,3,5TNB e 3,5-DNA (Thi-boutot et al. 1998). Estes derivados também são altamente tóxicos, pelo que urge a necessidade de estipular valores limite de exposição dos humanos, bem como valores aceitáveis nos subsolos e lençóis freáticos. Os autores contactaram a Agência Portuguesa do Ambiente, sobre a existência de Valores biológicos de exposição (BEI) ou valores limite de exposição (VLE) a estes compostos químicos, mas até a presente data ainda não obtiveram resposta.Estes mesmos autores, efectuaram investigação em três campos de treino no Fort Lewis, Washington, nomeadamente numa zona de impacto com granadas manuais, um ponto de fogo de um obuse 105 mm e uma porção de solo de uma zona de impacto de artilharia pesada. Nestes locais foram recolhidas amostras quer do solo quer dos lençóis freáticos. As quantidades de RDX à superfície variaram entre 1.560 ppm/kg e 51.200 ppm/kg. Con-centrações de TNT e HMX foram também detectadas nos solos, mas em níveis mais aceitáveis. Os autores concluíram que com base nestes ensaios preliminares, os resíduos provenientes de detonações de alta potência e a frequência de detonações de baixa potência, conduziram ao facto que as detonações de ordem mais baixa produzem uma elevada porção de resíduos

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depositados à superfície das zonas de impacto de Artilharia. Estes ensaios experimentais continuam a merecer a atenção dos investigadores de forma a obter melhores estimativas dos resíduos produzidos por detonação das várias munições militares.Durante a I e a II Guerra Mundial grandes quantidades de materiais explo-sivos foram utilizados. A produção, embalagem e armazenamento conduzi-ram à contaminação de solos e águas subterrâneas em muitos países (Vila et al., 2008). A questão que se coloca é: qual o melhor processo a utilizar para descontaminar os solos? Processos como a escavação, a incineração e a condução de águas residuais para sistemas de drenagem foram utilizados durante vários anos, mas são processos extremamente caros e que conduzem à destruição da estrutura dos solos.

1.1 Processo de Bioremadiação

O processo de bioremediação é considerado como a utilização de processos biológicos para degradar, partir, transformar e/ou remover contaminantes dos solos e das águas subterrâneas. Bioremediação é um processo natural que utiliza bactérias, fungos e plantas para alterar os contaminantes porque estes organismos continuam com as suas funções normais. Os processos metabólicos destes organismos são capazes de utilizar os contaminantes como uma fonte de energia, fazendo com que os contaminantes se tornem inofensivos ou produtos menos tóxicos na maioria dos casos (Dana et al., 2007). Os processos de bioremediação têm demonstrado uma extraordinária performance na mitigação de hi-drocarbonetos, solventes orgânicos halógenados, compostos orgânicos halógenados, pesticidas e herbicidas, compostos nitroaromáticos (e.g. TNT, RDX e HMX), metais pesados (e.g. Pb, Hg, Cr, Cu, Fe, Cd e Zn).Durante o processo de bioremediação, os micróbios utilizam contaminantes químicos existentes nos solos como fonte de energia, através de reacções de oxidação-redução, metabolizando um determinado contaminante em energia útil aos micróbios. Os sub-produtos (metabolítos) libertados para o meio ambiente são, geralmente, menos tóxicos do que os poluentes progenitores.Os primeiros ingredientes para ocorrer o processo de bioremediação são: i) presença de um contaminante; ii) um aceitante de electrões e iii) presença de um microorganismo que seja capaz de degradar um contaminante específico. Os microorganismos possuem limites de to-lerância para determinadas condições ambientais bem como condições óptimas para uma boa performance. Os factores que afectam o sucesso

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e a velocidade de biodegradação microbiológica são disponibilidade de nutriente, composição da mistura, pH e temperatura da matriz do solo. Nutrientes inorgânicos (e.g. azoto e fósforo) são necessários para a actividade microbiológica e crescimento de células. Todos os microorganismos requerem uma mistura adequada ao crescimento das células e sua funcionalidade. A disponibilidade de água afecta a sua difusão e os nutrientes solúveis para dentro e para fora das células dos mi-croorganismos. Contudo, um excesso de mistura, como em solos saturados é indesejável porque conduz à redução da quantidade de oxigénio disponível para a respiração aeróbica. A respiração anaeróbica, a qual produz menos energia para os microorganismos e tem uma velocidade de biodegradação inferior, começa a ser o processo determinante (US EPA, 2006).Os explosivos de elevada potência que contaminam os solos são remanes-cências do passado ou de fabrico de explosivos, testes e treino conven-cional com armas nucleares (Rainwater et al. 2002). Sobre determinadas condições ambientais, os explosivos de alta potência são muito persistentes nos solos e nos aquíferos e, exibem resistência a uma natural volatilização e biodegradação. A maioria dos explosivos de alta potência possuem baixa solubilidade, o que contribui para uma significante concentração residual nos solos e nos lençóis freáticos. Eficientes e baixo custo técnicas para remediação dos explosivos de elevada potência estão a ser desenvolvidas e implementadas nos locais afectados. Infelizmente, devido às diferentes condições dos solos e diferentes missões, não existe um processo de remediação apropriado para todas as localizações.Estes autores encontraram resultados muito apropriados na diminuição do RDX e TNB (trinitrobenzeno) nos locais de ensaio. A identificação qualitativa do aumento da produção de dióxido de carbono trata-se do sítio de interesse indica a presença de actividade biológica.O controlo e optimização dos processos de bioremediação é um sistema muito complexo com muitas variáveis (Vidali, 2001). Estas viáveis incluem a existência de populações microbilógicas capazes de degradar os poluentes; a capacidade de existir uma quantidade apropriada para a população micro-biógica e, finalmente, os factores ambientais (tipos de solos, temperatura, pH, a presença de oxigénio ou outros aceitantes de electrões e nutrientes.

1.2 Processos de Fitoxicidade

Numerosos estudos têm avaliado a fitoxicidade do TNT, os quais permitem determinar o nível limite deste composto que deve rondar os mg/L (Vila

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et al., 2008). Esta gama de valores é muito útil para a fitoremediação dos lençóis freáticos, mas no caso de contaminação de solos ou sedi-mentos, valores mais representativos são necessários. Contudo, muitos estudos têm determinado o limite de ecotoxicidade do TNT em solos naturais ou solos artificiais com plantas de várias espécies (Price et al., 2002). Plantas com um baixo teor de tolerância ao TNT demonstraram efeitos adversos tais como cloroses e ausência de folhas ou flores. O grau de fitotoxicidade não depende apenas das espécies das plantas, tamanho das plantas, biomassa e densidade das plantas, mas também da disponibilidade dos poluentes e outros factores ambientais como o tipo de solo ou actividade microbiológica.Alguns estudos têm demonstrado que o TNT é principalmente reduzido a hidroxilamino-dinitrotolueno (HADNT) anda mino-dinitrotolueno (ADNT) (Vila et al., 2008). Mais investigação é necessária para compreender o papel do TNT nas plantas. Estes autores determinaram o fitotoxicidade do TNT na planta do arroz e, concluíram ser capaz de diminuir o teor de TNT, em processos de lagonagem. Quanto ao RDX, concluíram que possuí uma menor capa-cidade de ser absorvido pelas plantas de arroz.Também foram efectuados testes de fitotoxicidade utilizando sementes (feijões) de soja. Os resultados obtidos demonstraram que o TNT é mais absorvido pelas plantas do que o HMX e RDX.

2. CONCLUSÕES

A contaminação de solos por materiais explosivos é um processo muito complexo devido à heterogeneciadade da composição química dos compostos utilizados, quer para a contaminação dos solos quer para os lençóis friáticos. Contudo, apesar de não existirem nem valores limite de exposição (VLE´s) ou indíces biológicos de exposição (BEI´s), a grande maioria dos compostos explosivos apresenta toxicidade para o ser humano e para o ambiente. A grande maioria dos materiais explosivos possuem na sua constituição os elementos carbono (C), oxigénio (O), hidrogénio (H), azoto (N) e compostos voláteis (VOC´s) que apresentam toxicidade para o ser humano e natureza circundante,O processo de bioremediação de solos contaminados com compostos quí-micos tem sido intensivamente estudado por diversos grupos científicos, com particular enfoque para os terrenos circundantes às instalações fabris, locais de armazenamento e destruição dos explosivos. Contudo, tratam-se

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de processos muito onorosos e que até a data apenas existem a funcionar em laboratórios em escala piloto, não obstante de nos Estados Unidos da América (EUA) e Canadá já estarem a ser implementados para desconta-minação de solos de instalações fabris.No que concerne ao processo da fitoremediação, este é mais recente e ape-nas tem sido desenvolvido a nível laboratorial, utilizando plantas (e.g. trigo, rabanetes e arroz) que fixam os tóxicos químicos ao nível da raiz e depois transportados para as folhas através do processo de fotosíntese.

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Nuno António Bravo Mira Vaz Coronel de Cavalaria

ÚLTIMA AULA

A Sociologia Militar é um ramo da Sociologia que se ocupa da Ins-tituição Militar. E o objectivo da UC H 241 – Sociologia Militar é o de mostrar aos cadetes o miolo da Instituição Militar, através duma reflexão sobre a sua ligação com o poder político e com os restantes sectores da sociedade, bem como sobre os comportamentos dominantes dos diferentes grupos no seu interior, procurando na medida do possível formular leis ou verificar tendências.

Ponderei um sem número de alternativas para esta aula, começando por tentar encontrar um tema inédito. Não encontrei. Voltei-me noutra direcção: havia alguma coisa, nas minhas aulas, que eu gostaria que os cadetes não esquecessem? Sim, havia algumas, e, entre todas, a de que são os únicos especialistas da gestão da violência armada legítima. É para isso que são formados nesta casa e é por isso que, por muitas missões de apoio à paz em que participem, a sua missão principal será sempre a de fazer a guerra – uma competência que não se aprende em nenhuma Universidade civil e que tem que os acompanhar em permanência ao longo da vida profissional, porque nunca se sabe quando virá a ser necessária. Mas essa mensagem já eu lhes fizera passar inúmeras vezes, não havendo qualquer interesse em repeti-la. Tentei então lembrar-me de alguma matéria que não tivesse sido suficientemente aprofundada nas aulas e que justificasse, pela sua impor-tância, um derradeiro comentário. Algo que servisse de fio condutor a uma reflexão sobre a Instituição Militar, o oficial do Quadro Permanente – visto que falo a alunos da Academia Militar - e o lugar que ele ocupa numa sociedade moderna. Acho que encontrei.

a ProblEmátiCa da instituição militar a Partir dE várias PErsPECtivas, no sEntido dE ProCurar uma rEsPosta à

PErgunta: até QuE Ponto o ofiCial do Q.P. sErá uma PEssoa difErEntE dum Civil?

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Uma das ideias centrais da Sociologia Militar é a de averiguar se hoje, numa época de indesmentível convergência civil-militar, subsistem na Instituição Militar características que permitam diferenciá-la das ou-tras organizações de serviço público. Se isso se verificar, interessa então saber se o militar também se distingue do civil e em que medida. Em especial - uma vez que os meus interlocutores são alunos da Academia Militar – importa perceber se um oficial do Quadro Permanente é uma pessoa diferente dum civil. Procurar uma resposta para esta questão vai ser o objectivo da aula de hoje.

Se a pergunta for feita de chofre e não houver uma reflexão prévia, as respostas cobrirão muito provavelmente um vasto leque de perspectivas, podendo mesmo representar pontos de vista opostos entre si. Penso que, es-tando presentes oficiais com muitos anos de serviço, estes já terão formulado a si mesmos esta pergunta e terão, para ela, uma resposta suficientemente sustentada, de tal forma que não têm de se preocupar com o assunto. Entre os mais novos, alguns hesitarão, por não se sentirem suficientemente esclare-cidos, mas estou em crer que haverá quem diga: “evidentemente que sim!”, outros dirão: “evidentemente que não!” e outros ainda: “que interessa isso?”

O meu propósito é o de abordar em simultâneo a Instituição Militar e o oficial do Quadro Permanente a partir de vários ângulos, tendo sempre em mente iluminar os caminhos que possam conduzir à resposta mais completa e informada. Tal como acontecia nas aulas, cabe aos cadetes encontrar as pistas que lhes permitam formular uma resposta pessoal, porque eu não vou dá-la. Para tanto, utilizarei cinco critérios de análise: características da profissão militar; restrições/ compensações; expectativas; valores cultivados

1. CARACTERÍSTICAS DA PROFISSÃO MILITAR.

Todos os especialistas sustentam que ela está a aproximar-se das restantes profissões e mesmo uma pessoa menos informada pode detectar com facilidade essa tendência. De facto, a profissão militar está em rota de aproximação às restantes profissões, e os sinais abundam. Vejamos alguns, e apenas alguns, dos mais significativos:

• No contexto da profissionalização e da consequente redução dos efectivos militares, as Forças Armadas vêm incorporando um número crescente de civis; em França desempenham mesmo, de acordo com estatutos especí-

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ficos, funções tradicionalmente a cargo de militares. Este segmento civil traz consigo comportamentos e hábitos diferentes dos que caracterizam os militares, de alguma maneira «civilinizando» a cultura castrense.

• Para além disso, a “profissionalização” trouxe também a necessidade de aprender a lidar com praças socialmente estruturadas, homens e mulheres com níveis de instrução superiores aos dos conscritos e que, diferentemente destes, já não vêm à tropa «para aprender a ser homens».

• Através de uma panóplia de missões ditas secundárias - desde as pa-cíficas missões de apoio às populações até às eventualmente perigosas missões de apoio à paz -, as Forças Armadas empenham-se, em nome das sociedades modernas, em evitar a eclosão da guerra. A missão primária continua, formalmente, a ser a de fazer a guerra em nome dos superiores interesses da Pátria, constituindo, por isso, legítimo motivo de orgulho para os profissionais das armas. Mas, fruto de décadas continuadas de paz na Europa, desvalorizou-se aos olhos de muitos cidadãos. E com ela desvalorizou-se a utilidade social da Instituição Militar.

• Poderíamos continuar a apontar aspectos que marcam a aproximação da profissão militar às restantes profissões. Mas prefiro contar-vos uma história que ilustra até que ponto se concretizou a abertura, impensável no passado recente, das Forças Armadas à multiculturalidade: em 1979, um Destaca-mento A de Forças Especiais americanas foi ao Regimento de Caçadores Pára-quedistas, em Tancos, fazer uma apresentação dos seus materiais. Dos doze elementos, onze ostentavam a bem conhecida bóina verde; o décimo segundo, usava um turbante de tecido camuflado. Surpreendido e intrigado, perguntei ao comandante do grupo, um Capitão, a razão daquela curiosa excepção. Respondeu-me que, tratando-se de um muçulmano, tinha sido autorizado a trocar a bóina por uma peça de vestuário que o identificasse como tal. Mostrei-me admirado com a ligação ao mundo muçulmano daquele homem alto, louro e com a cara coberta por barba dourada. Estava capaz de jurar, disse ao Capitão, que este homem é descendente dos vikings. E é - respondeu-me - Mas adoptou a religião muçulmana.

Embora esta aproximação seja bastante nítida, a verdade é que subsistem, nas modernas Forças Armadas, muitas marcas da Instituição Militar clássica. Vejamos também algumas, e só algumas, dessas características:

• O Juramento de Sangue é algo que só os militares fazem. Podem não o honrar, mas aqueles que o não honram, desonram-se.

• A disponibilidade do militar para o serviço não tem equivalente na vida

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civil. Cobre as 24 horas do dia, aplica-se em todas as regiões do mundo e não vacila perante as mais duras ameaças contra a vida dos combatentes.

• As patentes militares são também algo de único. Eu, coronel, posso participar num grupo de trabalho coordenado por um major, mas essa circunstância nunca desaparecerá do nosso relacionamento. Além disso, as patentes mais baixas têm sempre, para com as mais altas, uma deferência sem paralelo na vida civil.

• A vida militar apela à polivalência dos seus elementos, enquanto que, nas profissões civis, a tendência dominante é para a especialização. No decurso da carreira, o oficial do Quadro Permanente pode exercer funções de comando operacional, de apoio logístico, de gestão de pessoal, de docência, de Estado-Maior, e outras. É certo que, na vida civil, também existem profissionais com actividade em sectores diferenciados, mas isso acontece sobretudo nos níveis mais elevados de responsabilidade e não constitui, ao contrário do que acontece com os militares, uma regra.

• Na profissão militar só se entra por baixo: como soldado para a classe de praças, como furriel para a de sargentos e como alferes para a de oficial.

• A vida militar é caracterizada por um conjunto de códigos de conduta que, para além de serem rígidos, cobrem aspectos da vida privada dos militares.

2. RESTRIÇÕES/COMPENSAÇÕES.

Numa apreciação global, resulta claro que o novo quadro de restrições/com-pensações aproxima o militar do civil. As restrições mais gravosas da Lei n.º 19/82, Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas, as quais constituíam uma intolerável situação de menoridade cívica, foram eliminadas na revisão constitucional de 2001, podendo afirmar-se que hoje se vive em Portugal, no que respeita aos deveres e direitos dos militares, uma situação muito semelhante à que vigora nos outros países do nosso espaço geoestratégico. Em todo o caso, há neste domínio claras diferenças entre a profissão militar e as restantes profissões.

3. EXPECTATIVAS.

No passado recente, a ligação entre as Forças Armadas e a sociedade renovava-se anualmente, através da conscrição. Em tempo de “profissionalização”, esta ligação depende fortemente da imagem criada na Opinião Pública, seja pela

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observação directa dos cidadãos, seja pela intermediação da Comunicação Social. O problema é que estas percepções nem sempre são justas e realistas. Assisti há cerca de dois anos a uma situação que traduz de forma exemplar a falibilidade dos juízos assim feitos. Deslocava-me de autocarro para a Amadora. Nos bancos à minha frente seguiam quatro funcionárias duma firma de lim-pezas. Na zona de Monsanto, ao cruzarmo-nos com um pelotão de Cavalaria da GNR, uma delas fez um comentário que provocou uma enorme chacota das suas companheiras: “lá estão eles a trabalhar”. Ora, o que pode esperar-se de uma subunidade daquela natureza é que trabalhe adequadamente os seus cavalos. É verdade que pode considerar-se uma tarefa agradável, enquanto que a de limpar soalhos é bastante desagradável; mas pensar que aqueles soldados estavam apenas a divertir-se é profundamente injusto. Por outro lado, será que o cidadão comum espera do militar uma reacção mais empenhada quando ocorrem actos de violência contra pessoas, na via pública? E espera-se que, em combate, seja mais corajoso que o civil? Pe-rante uma manifestação de militares na via pública, as pessoas reagem mal a certas atitudes e palavras de ordem, justamente porque esperam dos militares uma conduta mais digna da sua profissão? Face a um crime, espera-se que o militar aja de forma diferente do civil?

4. VALORES CULTIVADOS

É certo que os valores nem sempre são virtudes, mas alguns podem consi-derar-se emblemáticos da Instituição Militar. Mais uma vez, vamos abordar apenas uma pequena parte deles:

• A disciplina, que sempre foi considerada um traço distintivo da vida militar, tem hoje um carácter muito mais flexível do que no passado, mesmo do re-lativamente recente. Quando eu para aqui entrei, em 1957, ainda a Instituição era dominada pelos militares ditos institucionais, profissionais austeros que se limitavam a cumprir ordens, sem questionar a sua legitimidade ou pertinên-cia. Hoje, tendo passado pelos campos de batalha africanos e asiáticos, onde os modernos exércitos europeus foram incapazes de vencer os guerrilheiros que lutavam para conquistar a independência, aperceberam-se da dimensão política das guerras e converteram-se no militar de modelo ocupacional, um profissional capaz de valorizar a crítica construtiva e para quem o carácter absolutamente imperativo da disciplina está circunscrito ao campo de batalha.

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• A coragem, tanto a física como a moral, é um valor indiscutível da profissão militar, e não apenas em cenário de guerra. Mas a História tem mostrado à saciedade que a coragem não é exclusivo de ninguém, nem depende das características físicas, nem da origem social, nem da raça, nem sequer do género. Uma das minhas histórias favoritas passa-se em 1949, quando a França combatia os vietminh que reclamavam a independência da Indochina. Correndo quase paralelamente à linha de fronteira entre a Indochina e a China, a route nationnale n.º 4 era um dos sectores mais perigosos do teatro de operações e, como tal, estava confiado a unidades da Legião Estrangeira. Quando se organizavam colunas logísticas – em média uma vez por mês -, integravam-se nelas os elementos femininos do bordel orgânico. Certo dia, uma dessas colunas foi tão violentamente atacada pelos guerrilheiros que, num curto espaço de tempo, sofreu elevado número de mortos e feridos graves. Então, as mulheres pegaram nas armas dos que estavam incapazes de combater e colaboraram bravamente na defesa da coluna. Tão bravamente que muitas morreram durante a acção. Alguns dias mais tarde, aquelas que demonstraram possuir coragem fora do comum foram condecoradas pelo Comandante-Chefe, General de Lattre, em formatura de armas.

• O espírito de corpo é um elemento chave para a apreciação do moral das unidades e da sua vontade de cumprir as missões designadas, por muito difíceis que nos se apresentem. É parecido com a camaradagem, mas bebe a sua inspiração nas tradições das unidades militares e traduz a vontade inquebrantável de não desmerecer dos restantes componentes do grupo. É um valor típico das unidades de tropas especiais, onde a tradição é fo-mentada através de apelos constantes ao dever e ao sacrifício, sentimentos que não se encontram facilmente no mundo das profissões civis.

5. PERTENÇA

Uma Instituição como esta modifica as pessoas, ou as pessoas que para lá vão, já são diferentes das outras? Aqui estamos em terreno minado, sendo quase certo que haverá tendências cruzadas. Por um lado, vem-me à memória um grande filme de guerra de Stanley Kubrik que tem como protagonista um natural born killer - e aí está o psicopata que procura a vida militar para dar vazão aos seus impulsos – e por outro temos o conhecido chavão dos Marines americanos, que se orgulham de transformar os voluntários em “assassinos treinados”. O mais provável é que haja um pouco de tudo isto na IM.

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Receio ter-vos conduzido a uma nebulosa de sensações desencontradas. Aqui há semelhanças e aproximações, além distanciamento e diferenciação. Para meu grande desgosto, haverá porventura quem esteja agora mais baralhado do que no início. Outros ainda permanecerão fiéis às convicções com que aqui entraram. Tal como fiz em todas as aulas, também hoje não vou dizer-vos o que está certo e o que está errado. O caminho é vosso, e vossos são os passos que hão-de percorrê-lo. Mas para que não marchem sozinhos, deixo-vos com as histórias de dois jovens oficiais que passaram por este aquartelamento, onde aprenderam a ser fiéis à palavra dada. Talvez – é essa a minha esperança - estas histórias ajudem a destacar aspectos menos óbvios da questão inicial.

• 2.º Tenente Jorge Manuel Catalão de Oliveira e Carmo

Em 18 de Dezembro de 1961, pelas 06H15, a Lancha Vega, de que era Comandante, levantou ferro do porto de Diu, na Índia Portuguesa, a fim de identificar um navio inimigo que tinha sido captado pelos radares. Tendo confirmado que se tratava de um cruzador com bandeira da União Indiana, Oliveira e Carmo ordena o regresso a Diu, onde a Vega fundeia pelas 06H30. Dirige-se então à câmara para se fardar de branco, porque assim, conforme confidenciou aos militares da guarnição, “morreria com mais honra”. Pelas 07H00, leu aos seus subordinados uma mensagem do Comando Naval que o intimava a combater até ao último cartucho. Pelas 07H30 a embarcação levanta ferro. Poucos minutos mais tarde, Oliveira e Carmo é morto pelo fogo inimigo.

• Alferes Pára-quedista Manuel Jorge Mota da Costa

Mota da Costa encontra-se com o seu pelotão no Bungo, pequena lo-calidade do norte de Angola, cercada pelos insurrectos da UPA. Nos primeiros dias de Maio de 1961, face ao ambiente de desânimo que se apoderou da comunidade branca, manda afixar a seguinte proclamação: “... A situação é de guerra e ninguém o ignora. Medo, todos nós sentimos o que precisamos é saber dominá-lo no devido momento. (...) Aqui não há lugar para cobardes. (...) Se tivermos que cair, caiamos de pé, pois nas nossas veias corre sangue português, o mesmo de há oito séculos...”.

No dia 8, acompanhado por um reduzido grupo de soldados e civis, sai da povoação para reparar uma ponte no itinerário que conduz ao Negage.

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Mal haviam iniciado os trabalhos, são atacados por um numeroso grupo de insurrectos. Consciente de que a sua missão principal é a defesa do Bungo, e que esta fica seriamente comprometida pela divisão das forças, manda regressar à povoação todos os seus homens, reservando para si a tarefa de lhes proteger o movimento. Resiste até que se lhe esgotam as munições. Morre no local, crivado de balas.

Para concluir, faço-o em jeito de duas perguntas:

Serão o Juramento de Sangue e a forma como ele é cumprido os ele-mentos diferenciadores definitivos?

Mota da Costa e Oliveira e Carmo serão a resposta à pergunta que dá o mote para a aula de hoje?

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David Miguel Pascoal Rosado (*)

Major de Administração Militar

ABSTRACT

This text derives from the Inaugural Lecture held at the Solemn Opening of the academic year 2011/2012, on November 8, 2011. This lesson is designed to materialize a short but timely journey through some of the classics of Mili-tary Science, Political Science and Management, the antechamber of scientific knowledge as regards the Strategic Management, as well as make an allusion to the challenges, more plural, of modern society in its different domains. Re-call that the Strategic Management and its field of scientific knowledge, more comprehensive and multifaceted, learned much with the teachings of ancient military strategy. From the writings of ancient China, materialized, among other sources, in the famous Art of War by Sun Tzu, the writings of Clausewitz and Liddell Hart, have many of those who have been leaning in the understanding of War and Military Science in the broadest sense. Niccolo Machiavelli also came to address these issues, but his greatest achievement literary - The Prince - to his misfortune, it would be published posthumously. In this masterpiece

1 Lição Inaugural proferida aquando da Abertura Solene do ano lectivo 2011/2012, em 09 de Novembro de 2011.(*) Doutor em Sociologia (2008), Mestre em Ciência Política – Cidadania e Governação (2001) e Licenciado

em Ciências Militares, na especialidade de Administração Militar (1998). Entre outros cursos, está habili-tado com o Curso Avançado de Gestão Pública (CAGEP). Integra o Centro de Investigação da Academia Militar (CINAMIL), sendo docente no âmbito das seguintes Unidades Curriculares: H122/Cálculo e Ins-trumentos Financeiros, H124/Contabilidade de Gestão, H131/Introdução à Gestão, H132/Gestão, H134/Gestão Estratégica, H141/Sistemas de Informação de Gestão, M139/Táctica de Administração Militar I e M140/Táctica de Administração Militar II.

dA Arte dA GuerrA à Gestão estrAtéGiCA: ComportAmento orGAnizACionAl, Análise ConCorrenCiAl e empreendedorismo 1

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of political science, one brighter than the treaties were elaborated by human thought until today, would the author even suggested that “the ends justify the means”, and in that pursuit, was read and reread by huge government leaders and military, which has, among others, Napoleon Bonaparte, who noted with sharp detail in the pages of his copy, many personal opinions on the ideas ad-vocated by Machiavelli. The purpose of the considerable evolution of thought in management that occurred in the twentieth century, which features, among many others, the works of Peter Drucker, the Strategic Management has evolved and adapted itself continuously. Today, the Strategic Management receives input from various social and human sciences such as sociology and psychology, but is inseparable from other areas of knowledge, as, for example, Organizational Behavior. Dedicated primarily to competitive analysis and development of individual and collective entrepreneurship, Strategic Management continues to demonstrate, in this modern world where change is the only permanent factor, what really remains the most important element in any organization, whether the civilian or military nature: the human element.

Keywords: Behavior, Competition, Entrepreneurship, Strategy, Management, War, Organization, Politics.

RESUMO

Este texto decorre da Lição Inaugural realizada aquando da Abertura Solene do ano lectivo 2011/2012, em 08 de Novembro de 2011. Essa lição pretendeu materializar uma curta, mas oportuna, viagem por alguns dos clás-sicos da Ciência Militar, da Ciência Política e da Gestão, como antecâmara do conhecimento científico atinente à Gestão Estratégica, bem assim como realizar uma alusão aos desafios, cada vez mais plurais, da sociedade actual nos seus diferentes domínios. Recordemos que a Gestão Estratégica e o seu campo de conhecimento científico, cada vez mais abrangente e plurifacetado, muito deve aos ensinamentos milenares sobre estratégia militar. Desde os escritos da antiga China, materializados, entre outras fontes, no famoso Arte da Guerra de Sun Tzu, aos escritos de Clausewitz e Liddell Hart, muitos têm sido aqueles que se têm debruçado na compreensão da Guerra e da Ciência Militar, em sentido lato. Nicolau Maquiavel também chegou a abordar estas temáticas, mas o seu maior feito literário - O Príncipe -, para seu infortúnio, já seria publicado postuma-mente. Nessa obra magistral da Ciência Política, um dos tratados mais brilhantes

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que foram elaborados pelo pensamento humano até hoje, o autor viria mesmo a sugerir que “os fins justificam os meios”, tendo, nesse encalço, sido lido e relido por imensos governantes e líderes, onde se conta, entre tantos outros, Napoleão Bonaparte, que anotou com aguçado pormenor nas páginas do seu exemplar, vários pareceres pessoais sobre as ideias defendidas por Maquiavel. A propósito da considerável evolução do pensamento em Gestão que ocorreu no século XX, onde se destacam, entre muitíssimos outros, os trabalhos de Peter Drucker, a Gestão Estratégica evoluiu e adaptou-se de forma continuada. Hoje, a Gestão Estratégica recebe contributos de várias Ciências Sociais e Humanas, como a Sociologia e a Psicologia, mas é indissociável de outras áreas do conhecimento, como é, por exemplo, o Comportamento Organizacional. Dedicada sobretudo à análise concorrencial e ao desenvolvimento do empreendedorismo individual e colectivo, a Gestão Estratégica continua a demonstrar, neste mundo actual onde a mudança é o único factor permanente, aquilo que realmente continua a ser o elemento mais importante em qualquer organização, seja esta de cariz civil ou militar: o elemento humano.

Palavras-Chave: Comportamento, Concorrência, Empreendedorismo, Es-tratégia, Gestão, Guerra, Organização, Política.

LIÇÃO INAUGURAL 2011/2012

“Combater e vencer todas as batalhas não é a excelência suprema.A excelência suprema é vencer sem combater.”

Sun Tzu, A Arte da Guerra

Começo por agradecer o amável convite que o Comando da Academia Militar me dirigiu para proferir esta Lição Inaugural. É uma honra cumprir esta tradição académica e esta tradição de Escola. E vai ser exactamente por aí, pela Escola, que eu vou iniciar esta Lição Inaugural. Entre outras coisas, existem duas que se pagam literalmente até ao fim das nossas vidas. Uma delas é não ir à Escola, seja por opção própria ou seja por opção de terceiros. A outra coisa, talvez tão grave ou até mais grave que a primeira que referi, é escolher a Escola errada. Sobretudo quando falamos de Gestão, erros como estes, pagam-se muito caro. E a verdade, a mais crua verdade, é que a vida é curta demais para estarmos no emprego errado.

Parece que nunca se falou tanto em Economia, em Gestão e em Contabili-dade. Em todo o lado e a toda a hora, deparamos com notícias que nos remetem

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para uma crise económico-financeira, dentro e fora de fronteiras. Trata-se de uma situação grave e preocupante, com certeza, mas é importante que se diga que “os colapsos são naturais no sistema económico, tal como são naturais a doença, a violência, a traição, o ciúme, o crime” e, não menos importante, a falta de bom senso. Notemos que a vida económica contemporânea é um fe-nómeno plurifacetado e complexo. A razão mais profunda da instabilidade que a caracteriza é, afinal, a mesma de sempre: “a própria natureza humana”. E a expressão, é recorrente: “Não há almoços grátis”. Baseado “na mais instável e volátil, mas também na mais valiosa e gratificante das qualidades humanas” - a confiança - podemos dizer que o capitalismo é, em grande medida, aquilo que a sociedade quiser fazer dele. E muitas vezes, bem sabemos, faz muito mal. No fundo, o problema central do capitalismo é a natureza humana. O capitalismo, “como aliás todos os sistemas, só funcionaria na perfeição com anjos ou, pelo menos, santos” (Neves, 2011, pp. 13, 78, 79 e 87).

Jack Welch, antigo CEO da General Electric, autor de vários livros e pres-tigiado consultor de um grupo de 500 empresários da revista Fortune, salientou uma vez a ideia de enfrentarmos a realidade tal como ela é, e não como essa realidade foi ou como nós gostaríamos que ela fosse (Phillips, 2009, p. 2). É evidente que não se tratava de uma ideia nova. Muitos outros autores a tinham defendido antes, e alguns desses notáveis viriam mesmo a tornar-se clássicos intemporais. Nesse domínio, conta-se de forma indelével Nicolau Maquiavel e o seu maior feito literário - O Príncipe -, que para seu infortúnio, já seria publi-cado postumamente. Nessa obra magistral da Ciência Política, um dos tratados mais brilhantes que foram elaborados pelo pensamento humano até hoje, o autor viria mesmo a sugerir que os fins justificavam os meios, tendo, nesse encalço, sido lido e relido por imensos governantes, onde se inclui, entre tantos outros, Napoleão Bonaparte, que anotou com aguçado pormenor nas páginas do seu exemplar de O Príncipe, vários pareceres pessoais sobre as ideias defendidas por Nicolau Maquiavel; uns a favor e outros contra, tendo em linha de conta os seus próprios sucessos e insucessos políticos, estratégicos, tácticos e operacionais.

A Gestão moderna muito deve à Ciência Política. E nessa esteira, pode-mos dizer que a Gestão também muito deve ao pai do pensamento político moderno. De facto, os conselhos de Nicolau Maquiavel, frontais e, por vezes, escandalosamente amorais, não deixam nenhum leitor indiferente. Em qualquer boa livraria encontramos essa obra escrita em 1513, num momento em que o autor se encontrava sem trabalho e exilado na sua quinta de família em San Casciano, a cerca de 15km de Florença, onde manteve uma activa correspon-dência e se entregou à literatura.

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Aliás, é em resultado de uma das suas famosas cartas endereçadas ao seu estimado amigo Francesco Vettori, datada de 10 de Dezembro desse ano, que podemos conhecer hoje aquele que era o quotidiano de Maquiavel nesse período particular da sua vida. Era ao cair da noite que Maquiavel voltava a casa, e limpo da lama e da poeira das suas perambulações diurnas, “envergava ‘vestes reais e cortesãs’ para assim, ‘devidamente vestido’, entrar em convívio com os antigos”. Vestia então “os seus luxuosos trajes de corte real para se passear ‘honradamente ataviado’ pelo seu estúdio e ali redigir os seus escritos”. Escre-via o Florentino: “‘(…) afectuosamente recebido (…), [não me envergonho ao falar com eles e] pergunto-lhes os motivos das suas acções. Eles respondem-me com bondade e durante quatro horas a fio não sinto tédio, esqueço todas as desgraças, não receio a pobreza, nem temo a morte. E porque Dante diz que ouvir e não lembrar não produz saber, anoto tudo o que na conversação com eles me foi proveitoso (…)’”. Nessa mesma carta, Maquiavel alude a um pequeno livro que compôs, um livro sobre os tipos de principado, e de como estes poderiam ser conquistados, mantidos e, eventualmente, perdidos. Esse livro, como hoje sabemos, viria a intitular-se O Príncipe, uma das obras mais referenciadas de sempre (Câmara, 1997, pp. 17 e 18 e Hesse, 2011, p. 85).

Na Itália daquele tempo, um verdadeiro mosaico de cidades-estado, Ma-quiavel, que antes havia sido uma figura influente, com uma vasta experiên-cia em relações diplomáticas internacionais, preocupou-se então, não com as vantagens e as desvantagens “das formas concorrentes de governo, mas antes com o modo como os governantes poderiam garantir estabilidade e sucesso à sua pátria”. De estilo rápido e conciso, e na posse de um tom audaz e lúcido de narração, Maquiavel não teve inclusivamente receio de mencionar nomes em O Príncipe (cfr. “Nota biobibliográfica sobre o autor” in Maquiavel, [s.d.; Ed. Original 1532], pp. 12 e 13), utilizando-os para melhor ilustrar, de forma concorrente com a realidade, aquilo que defendia ao longo do seu texto.

É óbvio que é impossível adaptar integralmente o pensamento do autor ao mundo contemporâneo. Quase tudo mudou. As sociedades evoluíram e a globalização ocorre hoje em cenários de proximidade que todos os dias são ultrapassados por tecnologias cada vez mais modernas. Mas, ao mesmo tempo, a natureza humana manteve-se quase inalterável. Sim, a natureza humana, a tal que vem sempre complicar as contas dos economistas, dos gestores e dos contabilistas. Aliás, a mesma natureza humana que, paradoxalmente, também é a grande responsável por todos eles terem trabalho. Dois lados de uma mesma moeda que, tal como na moeda, têm dificuldade em verem-se mutuamente. Com isso, não raras vezes, desafios não são vencidos e oportunidades de ouro se

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perdem. Pode-se trabalhar imenso numa empresa, mas vai uma grande distância entre aquilo que é trabalhar muito, e aquilo que é trabalhar muito e bem. Efi-ciência e eficácia não têm o mesmo significado. Como Peter Drucker afirmou, “não há nada mais inútil como fazer eficientemente aquilo que nunca deveria ter sido feito”. Reuniões inconsequentes, por exemplo, encaixam perfeitamente nesta alusão. Dizia o autor que as “reuniões são, por definição, uma concessão à organização deficiente. (...) As reuniões precisam de ser a exceção, não a regra.” (Drucker, 2001, p. 101).

Sobretudo no que diz respeito à Gestão Estratégica dos tempos moder-nos, certamente que Nicolau Maquiavel reconheceria aquilo que permaneceu imutável da sua época para a nossa, como seja “o mundo do mercado global, das OPA hostis e das finanças internacionais”. Contudo, estaremos de acordo em afirmar que as suas recomendações aproximam-se hoje, em natureza, mais daquilo que são as funções de um director executivo do que são as funções de um Primeiro-Ministro. Para liderar uma organização, qualquer que ela seja, como é por exemplo uma empresa, é preciso Poder. Maquiavel apenas argumentou sobre qual a melhor forma de como esse Poder podia ser alcançado e, muito importante, de como esse Poder podia e devia ser mantido. Aproximadamente um século após a sua morte, Francis Bacon, um dos mais reconhecidos pensadores políticos britânicos e, certamente, um dos pilares fundadores da ciência moderna (como foram, entre outros, Galileu e Descartes), reconheceu o vanguardismo da visão do Florentino. Nas suas palavras, “Devemos agradecer a Maquiavel e a outros, que escrevem o que os homens fazem e não o que devem fazer” (Phillips, 2009, p. 9).

Quase por ironia, esta acaba por ser afinal a melhor explicação para uma evidência histórica muito simples, e que é a seguinte: embora, enquanto ciên-cia, a Gestão muito deva à Ciência Política, a verdade é que ainda mais deve às Ciências Militares. Com efeito, as Ciências Militares, pluridisciplinares por natureza, mas de cariz pragmático e funcional, tendem a ajudar-nos a encon-trar respostas fundamentadas e lógicas, ainda que nem sempre simples, para problemas que acabam afinal por ser recorrentes em quase todas as sociedades. A História explica-nos bem isto, e ainda que, na qualidade de sociólogo, reco-nheça que historiadores e sociólogos nem sempre são bons vizinhos, às vezes agarrados mesmo a um verdadeiro “diálogo de surdos”, contudo, tenho para meu consolo a satisfação de que, resignados, historiadores e sociólogos acabam quase sempre por se entenderem, nem que seja por manifesta necessidade, e isto acontece exatamente porque a “mudança é estruturada e as estruturas mudam” (Burke, 1980, p. 9).

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As coisas não acontecem por acaso. Em grande medida, o nosso destino é traçado por nós, resulta do nosso empreendedorismo, da nossa vontade de vencer, do nosso ímpeto e da nossa determinação. Tal como num verdadeiro Teatro de Guerra ou Teatro de Operações, os gestores e os economistas apren-deram a utilizar uma panóplia imensa de saberes e técnicas militares que hoje são aplicados, entre outros domínios, nas bolsas, nas empresas, nas políticas de marketing e na concorrência. O espectro de obras literárias que contribuíram para essa partilha de saberes é muitíssimo vasto, mas, como sempre, há obras e obras. Umas perderam-se nas areias do tempo, mas outras são hoje tão atuais como o foram nas épocas em que foram escritas.

Uma dessas obras, um desses clássicos incontornáveis, é A Arte da Guerra, de Sun Tzu, que remontando há mais de 2500 anos, constitui-se como um dos mais famosos tratados militares escrito até hoje. Aliás, é oportuno dizer-se que A Arte da Guerra, de Sun Tzu, é também uma daquelas obras que, a par de O Príncipe, de Nicolau Maquiavel, está em qualquer estante de Estratégia, Gestão ou de Economia. Percebe-se bem a razão maior dessa circunstância, até porque, dispensados os pormenores académicos mais elementares, reconheceremos - sem grande esforço - que tanto na Estratégia Militar, como na Gestão Estratégica, é essencial “orientar recursos, dirigir homens”, conquistar territórios ou, no caso da Gestão e da Economia, conquistar mercados. Sun Tzu defendeu a ideia de que combater e vencer todas as batalhas não era a excelência suprema; a excelência suprema era exatamente vencer sem combater. Para o autor, a vi-tória inteligente não se conseguia com a destruição gratuita de um objectivo remunerador, mas, ao contrário, conseguia-se capturando-o tão intacto quanto possível. E tinha perfeita consciência de que uma guerra (e aqui entenda-se guerra em sentido lato, seja que de que natureza for, militar ou comercial), envolve sempre boatos falsos, dissimulações, informações enganosas, falsas aparências, corrupção, subversão dos líderes e colaboradores, criação e exacerbação da discórdia interna e até mesmo a formação de quintas colunas. Sun Tzu sabia a importância de uma organização em, internamente, concentrar-se nos seus pontos fortes e reconhecer os seus pontos fracos, e externamente, aproveitar as oportunidades e proteger-se contra as ameaças, cumprindo, já naquele tempo, aquilo que hoje se conhece no mundo da Gestão como a Análise SWOT. De facto, os ensinamentos de Sun Tzu chegam a ter uma tal aplicabilidade no atual mundo empresarial, que por vezes é intrigante que um texto assim já tenha sido escrito há mais de dois mil e quinhentos anos (Tzu, 2000, p. 9).

Para o autor, em batalha os números não garantiam, necessariamente, a superioridade das forças em confronto. A diferença entre antagonistas podia

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muito bem resultar de factores morais e circunstanciais. Mais do que tudo, a superioridade entre forças oponentes poderia resultar das diferenças entre as duas lideranças em confronto, onde os respectivos comandantes militares teriam um papel da maior importância, pois, do seu desempenho, dependeria, em boa medida, o destino dos seus subordinados no campo de batalha. E isto, ao pon-to de uma força de menor dimensão vir a poder vencer uma outra força com um maior número de efetivos. Como sabemos, são variadíssimos os exemplos históricos que suportam este conceito. Não despiciendo, esta noção, adstrita à redução de efectivos e à diminuição dos recursos disponíveis, não poderia vir mais a propósito nesta época de economicismo e de crise financeira em que vivemos (Idem, p. 10).

Crise, crises e os vários tipos de crise. Das crises de valores, aos desastres naturais, às epidemias e às crises económicas, muitos são os tipos de crise possíveis de identificar. Mas “as piores, de longe, são as guerras”, porque em todas as dimensões são crises muito mais graves que os outros tipos de crise existentes (Neves, p. 18). Carl von Clausewitz, no seu Da Guerra, um outro clássico da Ciência Política, das Ciências Militares e da Estratégia, defendeu que a guerra era uma mera continuação da Política por outros meios (Clausewitz, [s.d.; Ed. Original 1832], p. 46). Tendo trabalhado nesse texto desde 1816 a 1830, sabe-se que o livro só seria publicado em 1832. Tal como O Príncipe de Nicolau Maquiavel, Da Guerra também foi publicado a título póstumo. O prólogo da edição original, escrito numa prosa clara, bela e comovente, foi redigido por Marie von Clausewitz, a viúva do autor, que também publicou o livro, exactamente como o seu marido sempre tinha previsto: “Serás tu que terás de publicá-lo”, dizia-lhe Carl, ciente de que já não teria oportunidade de ver o seu trabalho no prelo (Hesse, 2011, p. 160).

Infelizmente, nos primeiros anos, Da Guerra não teve grande êxito. De facto, “só passadas quatro décadas, na sequência das vitórias de Helmuth von Moltke, admirador de Clausewitz, nas batalhas de Königgrätz (…) e Sedan (…), [é que o Da Guerra] se tornou famoso e conheceu um grande êxito sobretudo no estrangeiro. As reflexões de Clausewitz impressionaram não só os militares, mas também os políticos e os filósofos.” No século XX, a sua influência chegaria a outras áreas do conhecimento, como a Sociologia, a Psicologia e a Gestão. E mais uma vez, tal como O Príncipe de Nicolau Maquiavel, que influenciou, entre outros, Frederico, o Grande, Luís XIV, Napoleão Bonaparte, Bismarck e Adolf Hitler (o que levou a obra a ser considerada, algumas vezes e de forma errada, como um manual para tiranos), também o Da Guerra, de Carl von Clausewitz, teve vários seguidores de relevo, como foram os casos de Lenine e

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Mao Tsé-Tung. Para Clausewitz, “a sorte de uma guerra não dependia apenas da força de um exército, mas também da perícia do seu comandante, e para tal remeteu-se sobretudo ao génio estratégico de Napoleão e de Frederico, o Grande. Considerava que a planificação e a formação tinham uma importância decisiva no êxito”. Nós, que estamos numa Academia Militar, devemos sempre recordar uma das frases de Clausewitz: “O saber deve converter-se em capa-cidade” (Idem, pp. 160 a 163).

Tudo isto faz sentido. Tudo isto faz sentido porque ignorar os clássicos é ignorar esse saber acumulado, é ignorar esse saber que pode ser convertido em capacidade. Sobretudo quando falamos de Gestão Estratégica, de Comportamento Organizacional, de Análise Concorrencial e de Empreendedorismo, ignorar o saber adquirido ao longo dos séculos, é ignorar conhecimento valioso, é ignorar que há noções e conceitos intemporais, é ignorar que embora estejamos hoje rodeados de recursos tecnológicos que eram impensáveis até há bem poucas décadas, ainda assim, muito temos a aprender com os antigos. Especialmente sobre Liderança. Não tenhamos dúvidas. Sun Tzu, Nicolau Maquiavel e Carl von Clausewitz, entre muitos outros autores, alertaram muito bem para a diferença entre chefiar, comandar e liderar. A liderança não é uma coisa dos novos tempos, a liderança não é um produto de laboratório, a liderança não se compra. Não confundamos nós, aquilo que não pode ser confundido. Um líder destaca-se dos demais na medida em que consegue influenciar terceiros, num processo que transforma um determinado grupo de pessoas numa verdadeira equipa, numa equipa que gera resultados. A verdadeira liderança traduz-se nessa habilidade de motivar e influenciar os demais, de forma ética e positiva, para que estes contribuam voluntariamente e com entusiasmo para alcançarem os objetivos da sua equipa e, em última instância, da organização. Liderar é muitíssimo mais do que chefiar ou comandar pela autoridade de mandar e de exigir obediência. Os modernos gestores, cientes daquilo que são as competências de chefia, reconhecem hoje, que num mundo onde impera a concorrência e o empreendedorismo, é afinal das competências de liderança que precisam mais para vencerem os sucessivos desafios que lhes são colocados. Como sempre, nada acontece por acaso.

A Gestão emergiu definitivamente como ciência. E isto é tanto mais inte-ressante porque, bem entendido, a Gestão, enquanto ciência, até é uma ciência recente. É claro que podemos apontar inúmeros casos históricos onde a Gestão esteve presente e sem a qual não teriam sido alcançados os resultados que se vieram a obter. Entre muitíssimos outros grandes empreendimentos, podemos recordar “a Muralha da China ou as Pirâmides do Egipto” que “não teriam sido

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possíveis sem que houvesse uma grande capacidade de gestão, designadamente ao nível do planeamento da construção, organização dos recursos disponíveis (pessoas, materiais, etc.), direcção e liderança dos trabalhadores e controlo do seu desempenho”. Aliás, a mesma alusão pode ser feita à administração pública e para ambos os casos: nos “papiros egípcios, datados de 1300 a.C., onde se constata a importância atribuída, já naquele tempo, à organização e admi-nistração da burocracia pública no Antigo Egipto; (...) [e também na] leitura das famosas parábolas de Confúcio, na China Antiga, as quais já sugeriam a adopção de uma série de práticas para a boa administração da coisa pública” (Santos, 2008, p. 51 e Chiavenato, 1983).

Mas uma coisa é Gestão, assim, entendida de forma ampla, outra coisa, mais específica, é falarmos de Gestão científica. Para que se tenha uma ideia, recordemos um episódio não muito longínquo. Na década de 40 do século pas-sado, Peter Drucker, para preparar o seu trabalho de consultadoria na General Motors (que daria depois origem ao best seller Concept of the Corporation), foi à biblioteca municipal de New York para procurar livros sobre gestão. A tarefa não era despicienda, pois para Drucker, então professor de Filosofia, a Gestão era uma área completamente desconhecida. Embora hoje pareça inacreditável, a verdade é que à época apenas encontrou uma escassa dúzia de livros adstritos ao domínio da Gestão: uns sobre contabilidade, outros sobre gestão financeira e ainda um livro sobre gestão de produção. Mas, pasme-se, nenhum livro sobre management. E muito menos, sobre Estratégia. Algumas décadas passaram desde esse momento e muitos livros e artigos científicos sobre Gestão foram então escritos, decorrentes da ampla investigação desenvolvida, onde inclusivamente se aprofundaram sub-áreas do conhecimento e outras se criaram, promovendo qualitativa e quantitativamente esta ciência. (Santos, 2008, p. xxxi).

A forte ligação entre estratégia militar e estratégia empresarial também tem uma explicação, que agora melhor se compreende. E a própria Estratégia Empresarial, científica claro está, resulta da Gestão. Sabe-se que a Estratégia Empresarial era inicialmente ministrada como unidade curricular em Harvard, sob o nome de “Política de Gestão”, tendo sido depois renomeada na década de 80 para a actual denominação de Estratégia. Os fundamentos da estratégia empresarial estão intimamente associados aos ensinamentos de vários estrategas militares, como T’ai Kung, Sun Tzu, Alexandre o Grande, Amílcar Barca, Cipião Africano, Aníbal Barca, Júlio César, Átila, Frederico II da Prússia, Napoleão Bonaparte, Carl von Clausewitz, George S. Patton, Liddell Hart, Mao Tse-Tung e Vo Nguyen Giap. Mas, entre outras diferenças notórias, existe uma outra, de grande relevo, entre o conflito militar e a competitividade empresarial: nos

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negócios não existe espaço para armistícios; existe sim um cenário de perma-nente antagonismo de interesses, onde a vantagem competitiva, razão de ser de qualquer estratégia organizacional, é permanentemente colocada à prova. Não é sem razão que Donald Trump sublinha que um executivo deve ser “obcecado por soluções, não problemas” (ver Business 2.0, 2007). Aliás, é por isso que a compreensão do comportamento individual e dos grupos em situação de traba-lho se constitui como o campo de estudo do Comportamento Organizacional, porque nos ajuda a prever, a explicar e a compreender os comportamentos nas mais diversas organizações (Quadros e Trevisan, 2002, pp. 1 e 2).

Em pleno século XXI, torna-se hoje para nós difícil percepcionar os desa-fios de gestão que, na década de 40 do século passado, eram endereçados aos gestores. Muitas variáveis se alteraram e a emergência das novas tecnologias - associadas a outros factores - potenciou, de forma incomensurável, essas mudanças nos mercados, nos gestores e na Gestão. Alterou-se completamente a forma de gerir, dando inteira justificação ao entendimento de Tom Cannon, quando este referiu que “a forma certa de gerir muda de acordo com as con-dições económicas, tecnológicas, sociais e de mercado” (Cannon, 1999, p. 8).

Coisas tão simples como seja a facilidade de estabelecer uma ligação por telemóvel, ou seja a praticabilidade de enviar e receber dados prementes através de correio electrónico, ou seja ainda, para não irmos mais longe, a incomensu-rável rapidez atinente à movimentação e à transferência de capitais, tudo isto é uma realidade completamente nova perante o anterior quadro de situação, que agora nos remete, inevitavelmente, para desafios de gestão completamente novos, onde as organizações e as empresas procuram novas formas de fun-cionamento e, não raras vezes, de estruturas organizacionais, repensando “os fluxos de trabalho, de autoridade, de informação” e de decisão que as irrigam (Mintzberg, 2004, p. 35).

Como é evidente, as crises contemporâneas nada vieram ajudar a um cenário de Gestão já de si complicado. Não se trata aqui apenas de problemas económicos, orçamentais, financeiros e contabilísticos. Assiste-se, de uma for-ma geral, a uma crise de valores. Sobretudo na última década, sobretudo após os ataques do 11 de Setembro de 2001, tudo ficou diferente. Ainda que para alguns, tudo pareça que ficou na mesma, a verdade é que essa ilusão não podia ser maior. Distraídas e aturdidas pela constante mudança, as sociedades de hoje procuram o equilíbrio possível, mesmo que amiúde avisadas de que nada voltará a ser como antes. A Sociologia e outras Ciências Sociais têm oferecido várias explicações para estes novos fenómenos, mas a crua e fria realidade é a de que as sociedades de hoje são manifestamente diferentes daquelas que

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existiam em 1839, quando Auguste Comte forjou o termo Sociologia no volume IV do seu Curso de Filosofia Positiva (Ferreira, 1995, p. xiii).

Para os gestores, o repto está lançado: é indispensável formularem estraté-gias diferenciadas, em ordem a desenvolverem vantagens competitivas distintas num ambiente de crescente incerteza (Serra, 2010, p. 13). Daí a importância da análise concorrencial, porque cada vez mais somos confrontados com a necessi-dade de tomar decisões urgentes e por antecipação. Sendo verdade que isto se aplica a cada um de nós, então, com maior acuidade se aplica no âmbito dos negócios e no domínio da gestão das organizações, porque aí o desafio cresce exponencialmente, e sem pejo, os cenários de concorrência e risco aumentam significativamente. Nestes tempos em que vivemos, talvez a unidade de tempo mais coerente seja provavelmente o “instante”. É preciso refletirmos, repensar-mos e reescrevermos conceitos, noções e paradigmas, porque impregnados de imprevisibilidade, tanto nas nossas vidas pessoais, como nos negócios e nas organizações, urge assumirmos novas atitudes (Madelino, 2011, p. 2). Utilizemos os saberes dos antigos, aprendamos com as lições do passado recente, mas não fiquemos reféns do passado. O futuro constrói-se agora.

E não compliquemos aquilo que é simples. É o próprio conceito de alte-ridade que nos remete para o pressuposto básico de que todo o homem social interage e depende de outros indivíduos. Isto quer dizer que, de uma forma ou de outra, este é um mundo de organizações, sejam estas políticas, empresariais, religiosas, militares, universitárias ou caritativas, entre tantas outras. O futuro constrói-se agora, porque independentemente da perspectiva do papel que sejamos chamados a desempenhar numa organização, a verdade é que “estas organiza-ções, independentemente do seu fim, precisam de ser planeadas, organizadas, dirigidas e controladas. Numa palavra: geridas” (Santos, 2008, p. 32). E essa gestão, em sentido lato, é tanto mais eficiente e eficaz quanto cada um de nós contribuir, naquilo que está ao seu alcance, para o sucesso dessa instituição.

Existe uma grande diferença entre navegar em águas calmas ou em mar revolto. O mesmo acontece nas organizações e nas empresas. A modernidade não se compadece com modelos de gestão obsoletos, porque lutar apenas pela satis-fação de necessidades e pelo respeito dos critérios de qualidade dos serviços ou dos produtos, nos dias de hoje, é muito pouco. Se um produto é fraco, é preciso reformulá-lo. Se o nosso modelo de negócio é pouco ou nada competitivo, se está esgotado, então a decisão mais sensata será a de criar um novo modelo de negócio. Tempo, sobretudo neste caso, é dinheiro (útil ver Cannon, 1999, p. 10).

O cliente já não compra a marca pela marca. Compra também o concei-to, a imagem associada, um slogan forte. A informação é o minério de ferro

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para esta nova economia. Aquilo que foi o minério de ferro para a Revolução Industrial, é agora a informação para a Era do Conhecimento. E conhecimento é Poder. O problema é que o conhecimento, por si só, não basta. Não é sufi-ciente. É cada vez mais necessário inovar na maneira de gerir e de administrar recursos. No fundo, é necessário liderar. Sim, voltamos ao mesmo. Voltamos ao mesmo problema de sempre. É que a inovação não vem da máquina, vem do ser humano. Não é por acaso que os Departamentos de Pessoal deram lugar aos Departamentos de Recursos Humanos. A terminologia “RH” conquistou definitivamente o novo mundo organizacional, exatamente porque elege o recurso humano como aquele que é o mais importante em qualquer organiza-ção. Nas empresas, onde a análise concorrencial e o empreendedorismo são fundamentais, e nas organizações de uma forma geral, as pessoas devem ser convidadas a participar na solução dos problemas e na conquista dos objecti-vos estratégicos, como verdadeiros elementos-chave, que com as suas próprias valências individuais, podem fazer a diferença. 2 E a grande verdade é que, não raras vezes, esses colaboradores fazem mesmo a diferença, pelo empenhamento, pela criatividade, pela inovação e também pela motivação que transmitem aos demais. Na procura de vantagens competitivas, as organizações não se podem dar ao luxo de desperdiçar recursos humanos diferenciadores (entre outros, ver Porter, 1991, p. 53).

É claro que as questões relativas ao desempenho dos trabalhadores e das organizações, não são de agora. Muitos autores se debruçaram sobre estas matérias. As respostas que, ao tempo da Revolução Industrial, foram propostas para “a resolução dos problemas com que os empresários de então se debatiam, vieram constituir-se como a base sobre a qual os teóricos que lhes sucederam vieram a desenvolver princípios mais abrangentes, posteriormente integrados em teorias, abordagens ou escolas de pensamento – comummente designadas de teorias (ou abordagens) tradicionais da Gestão”. Contemporaneamente, surgiram desenvol-vimentos importantes a todos estes contributos teóricos, podendo destacar-se a Teoria dos Sistemas e a Teoria da Contingência, sobretudo por serem teorias que inferiram modelos de análise mais amplos, dinâmicos, fundamentados e atentos aos novos reptos dos gestores, das empresas e das organizações (Santos, 2008, pp. 54 e 55, bem assim como Bartol e Martin, 1998, p. 38).

2 Para uma abordagem mais ampla neste domínio, consultar por exemplo algumas das conferências e palestras realizadas por Waldez Luiz Ludwig, onde o autor disserta sobre este e outros tópicos de interesse relativos a cenários e tendências da gestão das organizações, especialmente em temas ligados com as estratégias competitivas, o mercado de trabalho, o perfil profissional, a criatividade e a inovação, a melhoria da qualidade e o desenvolvimento do capital intelectual.

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Este é um tempo de alteridade. Gestores, empresários e demais interessados pela Gestão, redescobrem, todos os dias, a alteridade. Redescobrem-na pela diferença, pela diversidade, pelo contrário. O que é diferente, o que é inovador, é afinal mais do que necessário: é imprescindível. Encontram essa alteridade em exemplos pessoais e colectivos “de independência e de inconformismo”, de não resignação, de vontade de vencer (Reimão, 2005, p. 339). O mundo actual exige essa postura, porque não existe uma única teoria de Gestão que tudo explique e que tudo solucione. Não existe uma melhor, e muito menos uma única, forma de gerir. Mais importante de tudo, exige-se empreendedorismo, determinação e coragem. Não só dos gestores, mas de todos nós.

Porque existem riscos que não podemos jamais correr, e existem outros que não podemos deixar de correr: “A melhor maneira de prever o futuro, é criá-lo”. Tal como na última frase da Ética, “vamos, portanto, começar”.

A toda a assistência, muito agradeço a gentileza da vossa atenção. Disse.

CONCLUSÕES

Esta Lição Inaugural pretendeu oferecer uma exposição sobre os princípios elementares atinentes à Gestão Estratégica, sobretudo naquilo que estes devem às Ciências Militares e à Ciência Política. Concorrendo para esse objectivo, ilustrou-se o percurso histórico da Gestão, em sentido lato, desde as suas origens até aos dias de hoje, em ordem a possibilitar um melhor entendimento e uma mais clara visualização da aplicabilidade desses saberes milenares à realidade organizacional e empresarial do século XXI. Aproveitou-se esta oportunidade para revisitar alguns dos clássicos literários mais relevantes neste domínio e teceram-se considerações sobre as novidades que trouxeram na sua época e a profunda actualidade que os seus textos continuam a gozar na modernidade.

Percebeu-se que, ainda que existam inevitáveis diferenças – mesmo que ténues – de orientação e inclinação científica no domínio da Gestão Estratégica, a verdade é que esta área do conhecimento não está dissociada de disciplinas como o Comportamento Organizacional e a Análise Concorrencial. Hoje, em plena Era do Conhecimento e vivendo as oportunidades e as vulnerabilidades adstritas à globalização, reconhece-se que um dos factores diferenciadores de maior relevo no alcance de uma maior eficiência e na prossecução da eficácia numa organização, é o empreendedorismo, a título individual e colectivo.

Em qualquer organização, o recurso mais valioso é o recurso humano. Dele depende a inovação, e, no fundo, dele depende tudo. Os gestores da

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contemporânes percebem que não se podem dar ao luxo de desperdiçar recursos humanos diferenciadores, porque a diferença, a vantagem estratégica e a vanta-gem competitiva, não raras vezes, têm origem em colaboradores intermédios e até mesmo em colaboradores de 1.ª linha. Nesse sentido, a Liderança emerge como um dos maiores trunfos do mundo moderno. Cientes daquilo que são as competências de chefia, os gestores contemporâneos tomam consciência de que são das competências de liderança que mais precisam, porque importa trans-formar grupos de trabalho em verdadeiras equipas que lutem empenhadamente por um mesmo objectivo central. Inevitavelmente ambicioso, mas realista.

Porque não existe uma única, nem uma melhor, forma de gerir. Tudo depende.

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Ana Bela Santos Bravo (*)

Professora Catedrática

José Rodrigues dos Santos (**)

Professor Associado com Agregação

A Finalidade desta conferência consistiu essencialmente na análise de riscos em diferentes cenários, concretamente, no âmbito da crise financeira, da segurança e do ambiente. Teve lugar na Academia Militar no dia 22 de Junho de 2011 e foi uma iniciativa da Direcção do Centro de Investigação da Academia Militar que foi, desde a sua preparação, apoiada pelo comandante deste estabelecimento de ensino superior militar.

(*) Professora Catedratica em “Economia e Administração Militar”. Pentence à Comissão Executiva do Dep C. Soc e Hum. (**) Prof Associado com Agregação em “Ciências Sociais” da AM. Investigador do CIDEHUS - Univ. de Évora e

Coordenador do GDCSC

“risCos E govErnança” - ConfErênCia do CEntro dE invEstigação da aCadEmia militar

Fonte: Centro de Audiovisuais do Exército

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Foram apresentadas sete comunicações em três sessões temáticas. As comunicações primaram pela qualidade e pela facilidade dos oradores, reco-nhecidos especialistas nessas matérias, em captar o interesse da audiência, que contou com alunos e docentes da Academia, assim como militares e académicos de outras entidades. O debate contribuiu para o esclarecimento de assuntos relacionados com realidades que muito recentemente estiveram no centro da agenda mediática internacional, como por exemplo, as suscitadas pela crise da dívida soberana da Grécia, Irlanda e Portugal, pela Wikileaks, pelas catástrofes naturais na Madeira em 2010 e no Japão em 2011, com o consequente risco nuclear. Quase todos podem ser considerados riscos globais.

Como constava do programa da conferência, os objectivos que se procu-raram atingir foram os seguintes:

• Contribuir para criar uma cultura de administração atenta à compreensão dos riscos, em que a gestão de riscos e/ou de crises, não se limita a prevenir ou minimizar perdas, mas também a potenciar as oportunidades que um contexto incerto e em mudança pode oferecer.

• Apresentar e debater várias abordagens dos riscos e das formas de go-vernança para os enfrentar: a perspectiva económica e sociológica na análise dos riscos associados à crise social e financeira; a perspectiva da segurança e defesa em termos de governança transnacional, ilustrada por duas temáticas muito actuais: a análise do conceito estratégico da NATO e da segurança da informação.

• Apresentar aspectos concretos de gestão de riscos, nomeadamente aque-les associados a catástrofes naturais, analisando exemplos de boa e má governança de riscos e crises. As comunicações foram organizadas em três sessões e focaram a análise dos riscos em áreas concretas.

SOBRE O TEMA

Desde o início deste século tem vindo a popularizar-se as metodologias de planeamento e gestão de riscos, sendo a sua utilização transversal a diferentes sectores de actividade, quer privados quer públicos. Atualmente, a velocidade das mudanças tecnológicas nos mais diferentes setores e a importância da informação e do conhecimento, possibilitam uma partilha e o trabalho em rede, que ajuda a integrar os papeis dos diversos atores que intervêm, direta ou indiretamente na vida das organizações, ou que dela dependem. Pelo fac-to de bastantes riscos terem uma dimensão global, a sua mitigação implica

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a cooperação e articulação entre actores e entidades aos níveis nacional e internacional. Esta tem sido uma das razões para se conceder uma maior importância aos sistemas de governança que assentam na decisão e gestão democrática e participativa, na transparência dos processos e procedimentos e na prestação de resultados.

O termo governança distingue-se de governação, embora estejam mui-tas vezes relacionados. Este último aplica-se tradicionalmente à atuação de entidades dotadas de poder político. Utiliza-se no sentido de execução da acção do governo que se traduz nas iniciativas jurídico-legais consubstancia-das numa política concreta. Por seu lado, a governança não se circunscreve à actuação apenas dos órgãos políticos. Refere-se, no campo das políticas públicas, ao modo como as condições gerais do processo de governação se desenrolam, aos processos através dos quais se identificam, negoceiam, adoptam e avaliam as regras do jogo num determinado sistema, por exemplo, no sistema de saúde ou no do ensino. Consequentemente, tem que integrar as relações reais entre o Estado, os interesses económicos e os mercados, grupos representativos da “sociedade civil” e o comportamento dos indivíduos que atuam nesse sistema. À semelhança da governança empresarial, a negociação entre os stakeholders, ou parceiros, e a sua interação através da utilização de redes, são factores de sucesso na implementação das políticas. Daí que a governança seja denominada, também, de gestão democrático-participativa e tenha sido divulgada pelas organizações internacionais, nomeadamente a OCDE 1 e a ONU 2, como sendo um dos pilares de um desenvolvimento sustentável e um factor necessário à implementação eficaz das estratégias organizacionais e das políticas públicas.

Assim, também a eficácia da gestão e planeamento de riscos depende, regra geral, do funcionamento adequado de um sistema de governança, Com efeito, tal sistema proporciona as estruturas, os valores, as normas e as práti-cas que vão reger a fixação dos objetivos da organização, a mobilização dos meios necessários à sua implementação e também a supervisão do desempenho geral dessa organização, nomeadamente, da sua eficácia em fazer face aos riscos globais. Logo, justifica-se que sejam analisadas conjuntamente as duas realidades – riscos e governança em vários cenários.

1 O sítio oficial partilha estatísticas sobre indicadores de governança em vários países e promove textos sobre este tópico, quer ao nível do sector público quer ao nível do privado (corporate governance).

2 O programa da ONU “LLM Program on Democratic Governance and the Rule of Law” consta do Face-book e o survey publicado em 2008 sobre o E-government considera-o estreitamente ligado à governança pública, sendo esta a etapa seguinte para a implementação eficaz do primeiro.

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SESSÃO DE ABERTURA

O Comandante da Academia Militar, Tenente General Fernando Paiva Monteiro, fez uma introdução ao tema geral da conferência e à sua relevância e atualidade. Congratulou-se pela presença de oradores convidados que são reputados especialistas nas matérias sobre as quais versaram as respectivas comunicações. Realçando a importância da associação temática dos riscos e da governança, importa não apenas identificar e analisar os riscos inerentes a uma determinada actividade como também planear os meios necessários à sua prevenção e mitigação dos efeitos. Os valores de qualquer organização devem incorporar os princípios internacionais de boas práticas de governança que, tal como divulgados pela OCDE, se centram na transparência, na equidade, na prestação de contas, no cumprimento dos princípios éticos. Assim, a governança coloca o acento tónico na transparência da decisão e da gestão, nas boas prá-ticas e na prestação de contas em relação aos vários atores que apostam numa organização. Pressupõe a identificação e o respeito por princípios éticos, pois, o conceito da governança foi desenvolvido em consequência das crises por que passaram algumas grandes corporações mundiais e dos grandes escândalos financeiros nos Estados Unidos e Reino Unido desde os anos 90. A actual crise financeira veio, com maior acutilância, exigir sistemas de governança interna e de supervisão externa das instituições financeiras, num contexto de grande incerteza e risco. Por isso, face a um contexto caracterizado por vários outros tipos de risco, mormente ao nível da segurança e do ambiente, não estranha que os modelos e as estruturas de governança participativa se tenham vindo a desenvolver em vários sectores e que procurem incorporar a análise e a gestão do risco.

Também ao nível da segurança e Defesa, incluindo no ensino Superior militar universitário onde a Academia Militar se insere, o funcionamento das organizações assenta cada vez mais em parcerias, em partilha de informação e no trabalho em rede. O aumento do número de intervenientes e do volume de informação, a necessidade de implementar novos enquadramentos legislati-vos, a maior proatividade na ligação com a sociedade civil e na resposta aos desafios e ameaças, torna importante a consideração de um adequado sistema de governança que integre a análise do risco e a sua mitigação.

Sessão I – Análise socioeconómica dos riscos A sessão foi moderada pela Doutora Ana Bela Santos Bravo, Professora

Catedrática da Academia Militar e Presidente da Direcção do CINAMIL. Numa breve apresentação do Centro, fez uma referência à actividade que desenvolve

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há dez anos, desde a sua criação em 2001. O Centro de Investigação da Aca-demia Militar tem por finalidade essencial a promoção do desenvolvimento da investigação científica e da inovação na vertente de “Segurança e Defesa” e em outras áreas científicas, contribuindo ainda para o debate de ideias, a valorização profissional dos seus membros e para apoiar o ensino pós-graduado na AM. Atualmente estão em desenvolvimento oito projectos de investigação apoiados financeiramente pelo Estado-Maior do Exército, com temáticas diversas mas todos com uma aplicação a questões militares ou de segurança, tais como a história militar, a cartografia, a liderança, a robótica e a defesa contra agentes biológicos. Entre os objectivos da Direção contam-se os de fortalecer as estru-turas de governança do centro através de uma maior participação dos membros e parceiros e de maior transparência na actuação da Direcção, nomeadamente através da publicação regular de newsletters.

O primeiro orador, com o tema “Gestão de riscos e a crise financeira”, foi o Professor Doutor João Duque que é Professor Catedrático de Gestão, Presidente do ISEG e membro do Conselho Consultivo do Instituto de Gestão do Crédito Público, além de conhecido comentador no canal televisivo SIC. Distinguiu os diferentes tipos de riscos financeiros e mostrou como a maioria deles se registaram na actual crise financeira desde 2008. Assim, realçou que podemos considerar os seguintes tipos de riscos na actividade financeira e dos investimentos em geral:

(a) Risco de crédito, ou seja, de incumprimento da contraparte; (b) Risco de mercado, resultante de variabilidade dos preços; (c) Risco sistémico, o que resulta da instabilidade de todo o mercado; (d) Risco jurídico, concretizado na incapacidade de forçar o cumprimento

de contratos por via legal; (e) Risco de regulação, ou seja, de regulação defeituosa ou enviesada por

parte dos órgãos ou entidades supervisoras; (f) Risco operacional, resultante de erros humanos ou técnicos; (g) Risco de liquidez, em resultado de falta de liquidez dos mercados; (h) Risco de liquidação, resultado da dilatação dos prazos ou erros de

liquidação; (i) Risco de financiamento, resultado do desencontro entre os prazos ou

rendimentos activos e passivos. (j) Risco de modelização, resultado de erros de modelos contabilísticos

ou de valorização.

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Podem ainda ser: risco sistemático (não Diversificável), risco de preço não eliminável por diversificação ou risco especifico ou diversificável, risco de preço eliminável por diversificação.

Analisando quadros sobre a evolução da variabilidade dos Índices men-sais de valores médios industriais desde 1928, mostrou que se caracterizam por volatilidade, em que os as maiores quedas para taxas de variação negativa acompanham as crises nos mercado de valores mobiliários, registando-se as quedas mais acentuadas nos anos da crise 1929/33, em 1937, em 2001 e em 2008. A maioria dos riscos acima identificados andou de par com a crise finan-ceira actual, incluindo os riscos operacionais que resultaram de uma avaliação deficiente do risco, o que conduziu a investimentos de carteira demasiado arriscados. Como se referiu, o risco é uma característica inerente aos activos financeiros que resulta da incerteza mas é quantificável, logo deveria existir uma avaliação e planeamento dos riscos mais eficaz. No debate, questionado sobre os efeitos da crise financeira o orador realçou que um dos efeitos foi a perda acentuada do valor dos activos dos bancos e de outras organizações, e dos valores bolsistas, o que se reflectiu na falta de liquidez generalizada dos sistemas financeiros nacionais e no aumento da incerteza sobre a sustentabi-lidade das instituições privadas e dos Estados, a maioria destes com elevados níveis de endividamento e com o encargo de apoiar, inclusive de nacionalizar alguns bancos. A solução de Portugal abandonar o euro, defendida por repu-tados economistas, como por exemplo, o Professor João Ferreira do Amaral, também não é muito animadora a curto prazo, pois, conduziria a uma taxa de câmbio do escudo altamente desvalorizada no início, eventualmente em torno dos 30% ou mais. Conclui que a crise esteve, de facto, associada à difusão de instrumentos de engenharia financeira, nomeadamente a titularização das dívidas resultantes de crédito imobiliário consideradas de maior risco (subprime) e à sua transação nos mercados internacionais, assim como a falhas de supervisão interna aos intermediários financeiros (área de auditoria e controle) e do sistema, com dificuldades aumentadas pela maior utilização de off-shores, ampliadas pelo fracasso da regulação ou governança dos sistemas financeiros nacionais e à desconfiança, factores que estão no cerne da crise do sistema internacional.

Seguiu-se a apresentação do Professor Doutor José Manuel Mendes que é Doutorado em Sociologia, na especialidade de Sociologia da Cultura, do Conhecimento e da Comunicação, pela Faculdade de Economia da Univer-sidade de Coimbra. Tem trabalhado nas áreas das desigualdades, mobilidade social, movimentos sociais e acção colectiva e, mais recentemente, nas ques-tões relacionadas com o risco e a vulnerabilidade social. É coordenador, com

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Pedro Hespanha, da Área Temática “Novas Solidariedades: Locais, Nacionais, Globais” e do Núcleo de Cidadania e Políticas Sociais. É ainda coordenador do Observatório do Risco - OSIRIS, sedeado no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Centrou a sua comunicação na temática das “Socie-dade, Risco e Respostas Sociais”. A abordagem tradicional dos acontecimentos extremos e das situações de catástrofe dá ênfase à intervenção institucional e ao processo de apoio na recuperação individual, familiar e colectiva. Os para-digmas mais recentes acentuam a importância da cartografia da vulnerabilidade social e do levantamento rigoroso da capacidade de resposta e de resiliência dos indivíduos, das famílias e das comunidades. As novas propostas baseiam-se em estudos pós-evento que revelaram a existência de diferentes tipos de resposta comunitária perante situações de catástrofe e de trauma, sendo de salientar a distinção entre comunidades terapêuticas ou virtuosas e comunidades corrosivas. Nesta perspectiva podemos afirmar que o estudo aponta para que as respostas comunitárias são complementares da intervenção das entidades públicas e devem ser previstas e incorporadas nas políticas de gestão de crises. Logo, devem enquadrar-se num sistema de governança a nível local ancorado no objectivo de segurança estrutural das populações e numa visão de longo prazo.

Na parte final da comunicação foram apresentados com entusiasmo os resultados de um inquérito aplicado pelo orador a uma amostra representativa da população de Portugal continental versando sobre as seguintes dimensões: as percepções das populações sobre riscos naturais; as experiências pessoais e familiares de acontecimentos extremos; as práticas de auto-proteção, as redes sociais informais activadas; e a confiança nas instituições de protecção civil e de emergência e socorro. Os resultados do estudo fundamentaram a proposta de um novo índice de vulnerabilidade social aos perigos naturais e tecnológicos à escala nacional (resultados para todos os concelhos de Portugal continental) e para uma amostra de sete concelhos da Região Centro. Este novo índice baseia--se na análise da criticidade e da capacidade de suporte e inclui, para além da análise da exposição ou da vulnerabilidade biofísica, a resiliência social e a capacidade de suporte infraestrutural.

Sessão II – Riscos na Segurança e na Defesa

A segunda sessão foi moderada pelo General Loureiro dos Santos que apresentou, com a proficiência que lhe é habitual, um breve enquadramento da temática do contexto internacional e das ameaças à Defesa, matéria que foi retomada também pelas duas comunicações que se seguiram. O Capitão

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de Mar e Guerra Carlos Manuel Oliveira e Lemos, Doutorado em Ciências do Mar pela Universidade Politécnica da Catalunha (Barcelona, Espanha) e, atualmente, Coordenador da Área de Ensino de Estratégia do Instituto de Estudos Superiores Militares, abordou, de forma muito clara e interessante, o tema “O Novo Conceito Estratégico da OTAN – Considerações sobre Risco e Governance”. Apresentou uma breve leitura crítica do novo conceito estratégico (CE) da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), tomando em con-sideração a estrutura, os conteúdos e as características distintivas do novo CE, e os conceitos de risco e governance. Por fim, foi feita uma breve referência aos desafios que se colocam a Portugal no contexto actual e na sequência da aprovação do novo CE da OTAN. O conceito estratégico da OTAN aprovado na Cimeira de Chefes de Estado e de Governo em Novembro de 2010 em Lisboa é o sétimo na história da Aliança e o terceiro após o fim da Guerra Fria. Tem o título sugestivo Active Engagement, Modern Defence e é um documento sim-ples, com mensagens directas, pensado como um instrumento de comunicação estratégica e de diplomacia pública. O documento é constituído por um curto prefácio, seguido por um enunciado de tarefas e princípios gerais, e por uma secção onde são caracterizados o ambiente de segurança e as novas ameaças. Seguidamente, são desenvolvidas as três tarefas principais da Aliança – defesa colectiva, gestão de crises e segurança cooperativa – e os aspectos relativos à reforma e transformação. O documento termina com uma secção de conclusões. O actual CE da OTAN enuncia alguns pontos de continuidade relativamente aos anteriores CE, como sejam a missão primária (defesa colectiva), a expansão (geográfica e conceptual) e a reforma/reorganização, bem como um conjunto de novos temas – a cooperação aprofundada com a Rússia, a defesa anti-míssil, a defesa contra ciber-ataques e o Comprehensive Approach. Outro aspecto impor-tante é a referência explícita à relação custo-benefício e à preocupação com a percepção da opinião pública. Importa ainda referir que este novo CE resultou de um processo de elaboração diferente dos anteriores, que poderá estabelecer um modelo para geração de consensos numa OTAN alargada, sendo por isso um exemplo interessante de governance numa grande organização multinacional. Talvez a necessidade de procurar consensos tenha justificado que o documento não teça considerações acerca da guerra do Iraque.

O Tenente Coronel José Carlos Martins, docente da AM no Mestrado de Guerra da Informação/ Competitive Inteligence e Doutorando nessa área, apresentou a comunicação com o título “Segurança da Informação, Espaço e Gestão do Risco”. Começou por realçar que nas organizações, a informação é um dos activos mais importantes, suportando todos os seus processos de

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negócio, devendo garantir-se permanentemente as propriedades fundamentais da segurança da informação. Após definir a segurança da informação como a protecção da informação armazenada, processada ou transmitida contra a perda da confidencialidade, integridade e disponibilidade, através da implementação de um variado conjunto de controlos técnicos e administrativos, resumiu as fases por que tem que passar a análise da segurança. Assim, para uma eficaz segurança da informação é necessário proceder a uma análise dos sistemas que interagem com as organizações, dos diversos actores e suas relações, de forma a identificar e perspectivar as ameaças a que está sujeita. A identificação dos sistemas externos que interagem com a organização, permite enquadrá-la no ambiente envolvente e obter uma visão real das ameaças à sua sobrevivência. Após a análise externa da organização, é necessário integrar a análise interna, o que passa principalmente por referenciar as possíveis ameaças e vulnerabili-dades dos componentes dos sistemas de informação (SI). Uma análise exaustiva dos SI, vai permitir detalhar as vulnerabilidades a que estão sujeitos os activos críticos organizacionais e as medidas que estão implementadas ou planeadas para fazer face às vulnerabilidades da organização. Os estudos actuais sugerem fundamentalmente quatro dimensões para garantir a segurança da informação: a dimensão organizacional, a física, a humana e a tecnológica, para, deste modo, garantir as propriedades fundamentais da segurança da informação, a confiden-cialidade, a integridade e a disponibilidade da informação. Podem-se identificar normas de certificação e boas práticas de segurança da informação, métodos e normas orientadas para a gestão do risco, normas orientadas à certificação do

Fonte: Centro de Audiovisuais do Exército

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produto ou sistema, orientações de segurança da informação e uma norma para a avaliação da maturidade de uma organização, que permite às organizações que a apliquem, evoluir na organização e eficiência do seu processo de enge-nharia de segurança. Por fim referenciam-se algumas normas da indústria mais orientadas aos processos de negócio e à gestão das Tecnologias de Informação, nas quais se reflecte a preocupação com a segurança da informação. Existem também estudos com propostas de Frameworks que sugerem a integração de diferentes aproximações, com base em normas focadas em tecnologias, nos processos e tendo em consideração o ambiente organizacional e humano das organizações. A nível militar considera-se principalmente o modelo de segu-rança da North Atlantic Treaty Organization. No entanto, para a aplicação de um modelo ou método de segurança da informação ao nível organizacional é necessário inicialmente identificar os riscos em segurança da informação, sendo o risco a possibilidade de uma ameaça explorar vulnerabilidades de um activo ou conjunto de activos, do qual pode resultar prejuízo no sistema. É dever das organizações efectuar consequentemente a gestão do risco, de modo a identificar, controlar ou eliminar os riscos de segurança que podem afectar os SI.

Sessão III – Aplicações da gestão de riscos

Esta sessão foi moderada pela Professora Doutora Ana Romão, Doutorada na área de Sociologia pela Universidade do Algarve e Professora Associada da AM, que apresentou os oradores e os temas das respectivas comunicações, todas elas relacionadas com os riscos de catástrofe natural, umas focando mais a prevenção e o planeamento, outras o processo de gestão de uma crise particular. A Professora Doutora Maria José Roxo, Professora Associada da Universidade Nova de Lisboa apresentou a sua interessante comunicação sobre “O conhecimento das condições ambientais na gestão do risco”. Considerou a gestão do risco um tema bastante complexo em virtude do número de factores intervenientes no processo e identificou as fases de um plano de riscos. De-fendeu que, a prevenção do risco a que as sociedades estão sujeitas em função da ocorrência de fenómenos naturais extremos, depende em grande parte do conhecimento e respeito pelas condições ambientais específicas de cada local, área ou região. Assim, é fundamental ter em conta o grau de susceptibilidade que cada área apresenta a diferentes escalas, bem como, a capacidade que a sociedade tem para conviver e lidar com a existência de fenómenos naturais ou de natureza antrópica (tecnológicos) que podem ter efeitos catastróficos. Demonstrou, recorrendo a diversos exemplos de “boas” e “más” práticas, que

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um bom conhecimento das condições ambientais, através de uma constante monitorização e de uma cartografia elaborada com informação fiável e actua-lizada, pode contribuir para a minimização do risco, favorecendo a formulação de estratégias de prevenção e protecção.

A comunicação do Coronel de Infantaria Carlos Batalha da Silva, Chefe do Departamento de Ciências e Tecnologias Militares da AM e Regente da UC de Táctica geral e Operações Militares I, abordou um caso prático de gestão de crise gerado por inundações sob o tema “A acção do Exército na protecção civil: Madeira Fev2010”, situação que ele próprio participou. Começou por definir conceitos e clarificar o papel do Exército em casos de gestão de crise no âmbito da protecção civil. Segundo a respectiva lei de bases, Lei n.º 27/2006 de 03 de Julho, Protecção Civil, é a actividade desenvolvida pelo Estado, Re-giões Autónomas e autarquias locais, pelos cidadãos e por todas as entidades públicas e privadas com a finalidade de prevenir riscos colectivos inerentes a situações de acidente grave ou catástrofe, de atenuar os seus efeitos e proteger e socorrer as pessoas e bens em perigo quando aquelas situações ocorram. Nos termos da Lei, incumbe às Forças Armadas “colaborar em missões de protecção civil e em tarefas relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações”.

A colaboração das Forças Armadas nas missões de protecção civil pode revestir, de acordo com a lei, em termos genéricos, diversas formas nas seguintes áreas: prevenção, auxílio no combate e rescaldo em incêndios; Salubridade e saúde, em especial na hospitalização e evacuação de feridos e doentes; Acções de busca e salvamento; logística na Reabilitação de infra-estruturas; reconheci-mentos terrestres, aéreos e marítimos e prestação de apoio em comunicações.

Na sequência do temporal que se abateu sobre a ilha da Madeira em 20 de Fevereiro de 2010, provocando aluviões em vários locais da ilha, o Presi-dente do Governo Regional solicitou ao Comandante Operacional da Madeira que as Forças Armadas colaborassem com o Serviço Regional de Protecção Civil da Madeira. Accionada a colaboração do Exército, a ZMM procedeu à activação do Plano Auxílio. Consequentemente, conforme estabelecido nesse Plano, o Comandante do Regimento de Guarnição n.º 3 (RG3), por delegação do Comandante da ZMM, assumiu o controlo das operações correntes, rece-bendo o reforço de outros elementos e meios da ZMM. Durante esse período, foram solicitados centenas de pedidos de apoio, quer do Serviço Regional de Protecção Civil e do Comando Operacional da Madeira, quer por parte da Cá-ritas Diocesana do Funchal durante a fase de realojamento das pessoas. Estas operações, que se caracterizaram em missões de protecção civil e em tarefas

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relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da quali-dade de vida das populações, envolveu, entre 20 de Fevereiro e 30 de Março de 2010, um total de 462 equipas, empenhando cerca de 1900 militares e 540 viaturas que percorreram perto de 20.000 Km. O RG 3 constituiu-se como um dos principais núcleos de apoio às vítimas em coordenação e cooperação com as entidades regionais e locais de cariz social, como da incorporação de outros agentes locais e de grupos da população que, informalmente entram no que podemos chamar de um esquema alargado de governança, nomeadamente o Serviço Regional de Protecção Civil, a Câmara Municipal do Funchal, a Investimentos Habitacionais da Madeira, o Centro de Segurança Social da Madeira, a Caritas Diocesana do Funchal e de centenas de voluntários. Esta actuação conjunta mostra que, mesmo que a lei já tenha definido um modelo determinado de gestão institucional de crise, a sua eficácia depende grandemente da liderança das chefias das entidades que conduzem essa gestão, neste caso sobressai o comandante do RG3.

A última comunicação, “ A Energia Nuclear: Mitos, Realidades e Riscos”, foi proferida pelo Doutor José Joaquim Delgado Domingos, Professor Catedrá-tico em Engenharia do I.S.T. desde 1965, e Jubilado em 2005, que tem uma extensa actividade científica e reconhecida carreira profissional, quer a nível nacional como internacional nas áreas de Energia, Ambiente, termodinâmica, Desenvolvimento Sustentável e Previsão Numérica do Tempo. Actualmente é investigador no Centro de Estudos em Inovação, Tecnologia e Politicas de Desenvolvimento da FCT. Desde Dezembro de 2008 preside ao Conselho de Administração da Lisboa E-Nova, Agência Municipal de Energia e Ambiente.

O Professor Delgado Domingos começou por afirmar que, no que res-peita a catástrofes naturais ou ambientais, a maior parte das vezes os riscos podem ser previstos e quantificados com a ajuda de modelos, por exemplo, na metereologia. No caso da tempestade de dia 20 na Madeira, lembrou que uns dias antes tinha alertado para a previsão de chuvas intensas durante vários dias na ilha. Já em 1999 tinha alertado o MCTES, para a existência de falhas na actuação do Instituto de Meteorologia relativa à probabilidade de situações climáticas com poder catastrófico. As consequências dos aluviões na Madeira e do mini-tornado que provocou estragos na zona de Tomar em 2011 mostraram deficiente previsão. Tratando-se dos riscos associados à energia nuclear, a per-cepção do risco e a sua avaliação confrontam-se com dificuldades maiores, tanto ideológicas como científicas. O acidente recentemente ocorrido em Fukushima, cujos danos estão longe de poder ser desde já avaliados, não deveria, segundo o Professor Delgado Domingos, fazer esquecer que os danos produzidos desde

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há vinte e cinco anos pelo próprio acidente de Chernobyl estão longe de ter sido completamente avaliados. O debate permitiu esclarecer alguns dos pro-blemas concretos na gestão do desastre da central Japonesa. Reafirmou a sua conhecida posição anti-nuclear, concluindo que, actualmente, a energia nuclear não deveria ser uma opção a tomar por nenhum governo.

CONCLUSÕES

O Professor Doutor José Rodrigues dos Santos, Professor Associado com Agregação em Sociologia da AM, membro da Direção do CINAMIL e, portanto também responsável pela organização da conferência, fez uma comunicação final acerca das conclusões da conferência, na qual realçou o contributo de cada comunicação e alguns tópicos levantados no debate. Começou por agradecer aos conferencistas pela qualidade dos contributos que nos deixaram, distinguindo-os a dois níveis: o dos contributos substantivos para a análise de aspectos concretos dos problemas, e o das questões que as reflexões dos conferencistas permitem identificar para o trabalho futuro. Passamos a resumir a síntese que apresentou.

O que sobressai das análises apresentadas foi, por um lado, a extraordinária diversidade das situações e até da natureza dos “riscos”, consoante as estruturas sociais e domínios de actividade em causa. Por outro, é de realçar a diversidade das metodologias de cálculo dos riscos potenciais, das estratégias de remediação, e das consequências sociais, a curto e longo prazo da acção, tanto quando há sucesso como quando a acção falha. A diversidade das situações tem como consequências, em primeiro lugar, a dificuldade de definir um conceito comum de “risco” que consiga abarcar ao mesmo tempo, o “risco financeiro” de que tratou o Professor João Duque, os riscos ambientais evocados pela Professora Maria José Roxo e pelo Coronel Batalha da Silva, o “risco tecnológico” estudado pelo Professor Delgado Domingos, e os “riscos militares” – as ameaças, a que se referiu a apresentação do CMG Carlos Oliveira e Lemos a propósito do conceito estratégico da OTAN. Diversidade à qual se acrescenta a nova problemática da segurança da informação que emerge da difusão maciça das tecnologias de numerização e de comunicação.

E apesar dessa dificuldade, é certo que uma conceptualização comum, homogénea, dos problemas ligados à definição dos tipos de risco e à sua ela-boração (previsão, cálculo) deve permanecer como horizonte comum a todos os intervenientes nas situações de risco. Do sucesso desse programa teórico depende a capacidade para injectar nestas questões o máximo de teor científico que justifica essa exigência. E depende também a capacidade para comunicar

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eficazmente com as populações, integrando a experiência de todos os cidadãos na prevenção dos riscos e na minimização dos efeitos das catástrofes. Em segundo lugar, vimos de que modo o cálculo do “risco” a partir dos perigos eventuais (cálculo que visa estabelecer a probabilidade do evento e a gravi-dade dos danos que dele podem decorrer) releva, como não podia deixar de ser, de técnicas diferentes consoante os domínios, e esbarra com dificuldades também diferentes. Sabemos que no domínio da Defesa, e vimo-lo a propósito do conceito estratégico, uma sólida tradição de avaliação das ameaças permite delinear orientações de preparação para a acção e realizá-la, apesar da realidade acabar por ser sempre surpreendente e tornar em parte inadequados os disposi-tivos, tão cuidadosamente pensados. “A guerra”, escrevia em suma Clausewitz, “tem uma vida própria”, e como tal, uma vez lançada, desenvolve-se sempre de maneira diferente da prevista e até da previsível. É o que revela mais uma vez a análise dos impasses recorrentes em tantas intervenções militares, toda elas alvo de cuidada preparação estratégica e de sólidos planeamentos, desde, para citar apenas dois marcos históricos, o já aparentemente longínquo Viet-name até ao presente Afeganistão. Por isso também, a ausência deste conflito no conceito estratégico da OTAN, com as complexas interrogações que suscita, foi sublinhada pelo CMG Oliveira e Lemos como uma lacuna que talvez deixe demasiada margem para especulações.

No que respeita ao domínio das estruturas e actividades financeiras regis-támos na apresentação do Professor João Duque, de que modo a multiplicidade dos níveis de decisão e de intervenção, a diversidade dos tipos de risco e a volatilidade dos dados pertinentes para a decisão, por outro, associadas ao facto que a “tomada de riscos” faz parte integrante do esquema de acção dos actores e torna o universo da actividade financeira “turbulento”, isto é, em larga medida estritamente imprevisível porque incalculável. O próprio facto da confluência de vários tipos de risco em cada situação multiplica a incerteza, como o terá demonstrado a crise das “subprimes” que, de crise da dívida privada se tornou crise financeira e logo crise das dívidas soberanas, e de crise americana de início, se tornou mundial a um ritmo vertiginoso.

O primeiro parâmetro, o da multiplicidade dos níveis, das escalas, e das lógi-cas de decisão e de acção, é acentuado de modo inteiramente novo, inimaginável há poucas décadas atrás, pela emergência de estruturas de aquisição, tratamento e comunicação da informação mundiais e instantâneas. Não só a natureza da informação económica e financeira, (cada vez mais virtual), mas a velocidade de circulação, são os novos parâmetros duma realidade que se tornou, insistamos, virtual. Num meio que “resiste” cada vez menos à circulação da informação,

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torna-se cada vez mais provável que surjam movimentos de propagação das consequências de decisões “locais” e de agregação dos tipos de risco, como os que o Professor João Duque expôs, com efeitos propriamente incalculáveis.

Co-relativo a esse ensinamento foi também o que nos trouxe o Tenente-coronel Martins a propósito da segurança da informação em termos de preser-vação dos “activos” das organizações. É preciso não esquecer, sublinhou, que a própria transparência, que temos hábito de considerar como um bem, acarreta novos problemas. Se a questão parece relativamente pacífica ao nível das or-ganizações privadas (empresas), que podem reivindicar a propriedade dos seus “activos” informacionais, já o será muito menos ao nível dos Estados, quando a informação pertence à colectividade (que a paga e produz) e pode exigir um acesso a essa informação cuja reserva perdeu, em numerosos domínios sensíveis, uma boa parte da sua legitimidade.

Como o demonstrou o episódio da Wikileaks, ao passarmos duma sociedade que se organiza na base da rareza e do estrito controlo da informação, para uma sociedade de superabundância da informação onde aumentam a transparência e a interligação, defrontamos novas turbulências, cujas causas estão identificadas.

Com efeito, a ligação de todos a todos, adicionando-se à velocidade de circulação da informação, como demonstrou Manuel Castells há já quinze anos atrás, produziram um mundo imprevisto, a “sociedade rede” (Castells 1996), no qual previsão e cálculo se tornam incertos. E com eles, uma situação na qual a origem e a dimensão dos riscos, com o contágio e a propagação alargada dos acontecimentos disruptivos deixam de obedecer aos cânones da probabilidade e nos mergulham na incerteza. Por outro lado, a mutação que a “sociedade-rede” introduz nas democracias ocidentais (livres e plurais), nas quais a cidadania evolui para uma maior exigência de transparência implica sob múltiplas formas a revisão do equilíbrio anterior entre Direito(s) e Razão de Estado.

Resulta também, do estudo de riscos “tecnológicos” e das catástrofes que estão documentadas, que a questão essencial permanece a do estabelecimen-to dum balanço custos/benefícios em relação à tomada de risco que acarreta qualquer opção tecnológica. Foi o que demonstrou o Professor José Delgado Domingos. Com efeito, não parece ter sido possível até ao presente proceder a uma avaliação aceitável da totalidade dos custos (e riscos) envolvidos pela fileira nuclear (da mina à central e desta ao tratamento e armazenamento dos resíduos cuja duração de vida se mede em milénios), por um lado, nem dos danos causados pelas catástrofes que se produziram, por outro. Prolongando a sua reflexão e citando algumas das fontes que evocou, podemos recordar que avaliações provisórias (referentes apenas aos primeiros 30 anos após o acidente)

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situam os danos materiais (industriais, económicos, ecológicos, sanitários, etc.) entre várias centenas de biliões de dólares (relatórios da IAEA, ou AIEA) e mil biliões de dólares (Greenpeace). Números que, vista a escala a que nos situamos, nem sequer são muito divergentes (1/2). Emerge do estudo dessas situações um facto irrecusável e inquietante: é impossível calcular os custos totais, a curto e médio prazo, e mais ainda e longo prazo (centenas de anos) mesmo que seja só em termos económicos, desses acidentes. Quanto ao cálculo da probabilidade de novos acidentes de grande gravidade, reconhece-se que todas as conjecturas são extremamente frágeis. A prova dessa impossibilidade é o facto que todos os riscos derivados de actividades humanas (nomeadamente industriais em minas, transportes, fábricas, etc.) conseguem encontrar empresas seguradoras que aceitam contratar apólices de seguro contra os riscos. Mas nenhuma seguradora, até hoje, e é de prever que no futuro a situação se man-terá, nenhuma, dizíamos, aceitou ou aceita contratar um seguro completo para as actividades nucleares.

Tanto nos primeiros domínios (financeiros), como nos segundos (tecnoló-gicos ligados ao nuclear), o risco contemporâneo surge pois, não sob a figura da probabilidade, mas sob o rosto da incerteza, o que o torna, em rigor, incal-culável, ou seja, em rigor, ingovernável. A distinção entre as duas situações epistemológicas torna-se um dos pontos adquiridos nesta conferência e nos dados que nela foram evocados.

Passando para o plano da acção exigida pelas catástrofes, que, note-se, acontecem sempre como “por surpresa” mesmo quando as circunstâncias tornam previsível (ou até certo, o que confirma a intuição de J.-P. Dupuy) que aconteçam (embora imprevisíveis quanto a saber quando (Dupuy 2002), registámos o teste-munho do Coronel Batalha da Silva sobre a acção do Regimento de Guarnição 3 (RG3), na Madeira, em Fevereiro de 2010. Foi-nos exposto um envolvimento na acção que inclui inevitavelmente o diagnóstico dos problemas práticos, e a intervenção em contacto com as populações atingidas por uma catástrofe “natural”, por parte do Exército. E se o seu “core business” continua a ser a defesa contra as ameaças externas, a intervenção armada e no limite a guerra, vimos como se adapta a novas missões que lhe são confiadas por lei. A intervenção no contexto pós-catástrofe confronta-se, como a apresentação bem demonstrou, com um vasto leque de tarefas que associam os aspectos mais estritamente técnicos (meios de busca, salvamento, reconstrução de infra-estruturas), e as tarefas especificamente sociais (organização dos meios, relações com a hierarquia, as populações, as autoridades aos diversos escalões, os media, etc.). E os dados apresentados de-monstram sobejamente o papel decisivo duma liderança esclarecida.

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Uma das lições que convém retirar da comunicação do Coronel Batalha da Silva, a par com as análises do Professor José Manuel Mendes e da Pro-fessora Maria José Roxo, é que a acção junto de populações atingidas por catástrofes tem que ter em conta não só o modo como as populações reagem ao acontecimento traumático (e elas reagem consoante a sua estrutura e a sua cultura), como a capacidade de auto-remediação, de auto-organização, que são elementos decisivos da saída da crise.

Ora, a intervenção depois das catástrofes, quando elas se apresentam já como factos consumados e libertas por assim dizer tanto da probabilidade como da incerteza, não deve fazer esquecer o papel da previsão e da prevenção. Dois conceitos são, neste contexto, cruciais: o conceito de “grau de susceptibilidade dos territórios”e o de “grau de vulnerabilidade das populações”. O primeiro, exposto pela Professora Maria José Roxo, é uma ferramenta de avaliação da distribuição desigual dos riscos potenciais num território. Ao evocar as diferenças radicais entre espaços claramente inundáveis e os que o não são, por exemplo, a conferencista percorreu um caminho que vai do espaço (sistema abstracto de coordenadas) para o território enquanto porção de espaço apropriada por uma colectividade para os diferentes usos. E estes usos são eminentemente sociais, como é o caso da construção de edifícios e vias de comunicação. A discussão não deixou escapar a relação entre a noção de “susceptibilidade” do território e a catástrofe da Madeira, onde numerosas construções se encontravam no próprio leito de escoamento das águas torrenciais, fenómeno frequente e portanto… previsível.

Por seu turno, o conceito de “vulnerabilidade das populações” proposto pelo Professor J.M. Mendes, percorre o caminho complementar, indo das populações para a distribuição espacial desigual da sua vulnerabilidade face a acontecimentos catastróficos. Neste caso, são características próprias das estruturas sociais locais que representam as variáveis críticas: isolamento ou rede densa de relações, relação com o ambiente imediato (víveres, meios de subsistência), entre outras.

Associados numa perspectiva de acção comum, os dois conceitos (do ter-ritório para a população e das sociedades para o espaço) completam-se admira-velmente e ficamos na expectativa duma convergência teórica que tudo sugere.

Nas três conferências (Batalha da Silva, J.M. Mendes, M.J. Roxo), surge a evidência de que a intervenção externa (organizada, pesada, rígida por natureza), deveria possuir a priori as melhores ferramentas de diagnóstico, e tem que ser capaz, quando chega o momento da acção, de ter em conta a estrutura das so-ciedades locais, a fim de não inibir nem desestruturar a organização espontânea de entreajuda das populações. Para tal tem que percepcionar claramente que as populações não são matéria inerte, mesmo quando, atingidas pela catástrofe,

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sofrem danos que parecem totais. Ora, a cultura da intervenção, no plano civil e a mais alto grau ainda no plano militar, assenta por natureza, no planeamento, na organização pesada que, mesmo quando é perfeita se torna rígida. Este facto resulta da concepção molar do relacionamento com as situações, concepção antiga que encontra dificuldades, ao defrontar situações desestruturadas, sem actores bem visíveis nem interlocutores institucionais fiáveis, e onde a acção deve ser pensada, para utilizar o conceito de Deleuze, em termos moleculares, isto é, pequena escala, adaptação fina, flexibilidade máxima. Com as limitações de tempo, inevitáveis numa Conferência que se limitou a uma única jornada, terão ficado em espera as questões específicas dos riscos tecnológicos e industriais (outros que os nucleares), biológicos e sanitários, cuja incidência tem assumido uma gravidade crescente. As catástrofes de Bhopal (explosão na fábrica química da Union Carbide na Índia), de Seveso na Itália, da fábrica AZF em Toulouse, etc., vêm constantemente lembrar a iminência do risco. Por outro lado, desde a crise das “vacas loucas” (propagação da doença de Kreutzfeld-Jacob pela carne de bovinos alimentados com subprodutos animais, através dum agente pato-génico antes desconhecido), da epidemia de gripe “aviária”, e da nova estirpe de gripe H1N1, até à recente contaminação pela bactéria Escherichia Coli, os riscos biológicos entraram no horizonte quotidiano dos cidadãos.

Para o futuro, fica pois um programa verdadeiramente urgente: em primeiro lugar, trabalhar sobre os conceitos de risco, distinguindo claramente calcula-bilidade e incerteza, Para estas novas situações e para enfrentar a acumulação destes riscos, o trabalho de investigação está pela frente: trata-se de passar do paradigma do cálculo ao paradigma da avaliação qualitativa, e de levar a sério as questões levantadas por Ulrich Beck, que foram evocadas desde a apresen-tação introdutória da Conferência “Riscos e Governança” (Beck 2001). Em segundo lugar, desenvolver as novas ferramentas que exige a “governança” dos riscos em sociedades-rede nas quais a propagação dos efeitos torna os riscos verdadeiramente globais: ferramentas de avaliação prévia dos riscos potenciais, associando o conceito de “susceptibilidade dos territórios” ao de “vulnerabilidade das populações”. É sem dúvida oportuno, por fim, inserir as questões que a conferência abordou nos currículos de formação, teórica e prática, em particular na AM, mas não só, e pensar as modalidades de acção em termos específicos, para cada tipo de riscos e não como adaptações menos bem conceptualizadas de modos de acção concebidos para outros tipos de situações.

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BIBLIOGRAFIA

Beck, U. (2001). La société du risque. Sur la voie d’une autre modernité. Paris, Aubier.

Castells, M. (1996). La era de la información. Economia, sociedad y cultura. . Madrid, Alianza Editorial.

Dupuy, J.-P. (2002). Pour un catastrophisme éclairé. Quand l’impossible est certain. Paris, Seuil.

OCDE, (2011) Public Governance, www.oecd.org/statistics/../topics (consultado em 27/9/2011).

ONU (2008) UN E-Government Survey: Leveraging E-government at a Time of Financial and Economic Crisis From E-Government to Connected Go-vernance. www.unpan.org/egovkb/global_reports/08report.htm,

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Fonte: Centro de Audiovisuais do Exército, 2011

CONCLUSÕES DAS JORNADAS ACADÉMICAS PRO-MOVIDAS PELO EXÉRCITO (ACADEMIA MILITAR)

E PELA CÂMARA MUNICIPAL DE BRAGANÇA – COMEMORAÇÕES “DIA DO EXÉRCITO 2011”

A Academia Militar, através do Departamento de Ciências e Tecnologias Militares da sua Direcção de Ensino, em parceria com a Câmara Municipal de Bragança, levou a efeito naquela cidade transmontana, em 21 de Outubro de 2011, as Jornadas Académicas inseridas no Dia do Exército.

A sessão de abertura das Jornadas Académicas contou com as intervenções do Presidente da Câmara Municipal de Bragança, Engenheiro António Jorge Nunes; e do Comandante da Academia Militar, Tenente – General Vitor Manuel Amaral Vieira (figura 1).

Figura 1 – Mesa de Honra das Jornadas Académicas

As diversas comunicações apresentadas, subordinadas ao tema geral “O Exército nas Crises Nacionais”, lançaram ideias para o debate em torno da influência e da actividade do Exército naquela região ao longo da história e na actualidade. Para o efeito organizaram-se três painéis de debate.

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Fonte: Centro de Audiovisuais do Exército, 2011

O primeiro painel, subordinado ao tema “O Exército Português em Bragança”, foi moderado pelo Sr. Major-General Adelino Matos Coelho e compreendeu duas temáticas: a primeira, intitulada “A influência do Exército na edificação da cidade de Bragança” e proferida pelo Sr. Professor Doutor Luís Alexandre Rodrigues, docente na Faculdade de Letras da Universidade do Porto; e a segunda, denominada “A crescente importância do Exército nas missões de interesse público”, apresentada pelo Sr. Tenente-Coronel de Enge-nharia João Paulo de Almeida, do Comando das Forças Terrestres.

A comunicação do Professor Alexandre Rodrigues começou por abordar o estabelecimento dos limites do território nacional em finais do século XIII e as implicações da definição da linha da raia, bem como do povoamento e da melhoria do nível de vida da população. Estes aspectos surgem registados em vários diplomas régios que regularam a circulação de produtos entre os aglomerados de ambos os lados deste segmento, que se inicia em Miranda do Douro e se prolonga para além da praça de Chaves.

Neste contexto, os castelos surgem, directa e indirectamente, como referên-cias do domínio que o poder central em construção tendia a exercer. Domínios que se materializavam na obrigatoriedade de os habitantes de algumas povo-ações fazerem contributos em dinheiro, oferecendo o seu trabalho e animais para ajudar na construção e reparação das muralhas que cercavam os núcleos

Figura 2 – Assistentes e um tribuno do primeiro painel

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populacionais de maior importância. Sendo este o caso de Bragança, podemos afirmar que, desde 1253, as empreitadas de natureza defensiva, em que se en-quadram os castelos, estão estreitamente relacionadas com o nascimento das finanças municipais.

A comunicação abordou ainda as convulsões em que o país mergulhou durante a crise de 1383-1385, que retardou até 1400 o regresso de Bragança, Mogadouro e Vinhais à soberania portuguesa. Explica-se desta forma a clari-ficação dos poderes, bem como o reforço, em robustez e altura, da Torre de Menagem do castelo de Bragança. A obra iniciou-se em 1409, e demoraria quatro décadas a ser concluída. Cerca de 1509, os desenhos de Duarte d’Armas mostram a solidez da estrutura e a relação com o volume da alcáçova, registando em simultâneo danos na muralha e na barbacã, numa altura em que o casario já se afastava da muralha. Outros segmentos defensivos iriam ser construídos para protecção dos arrabaldes mas, com os feitos de 1580, seriam destruídos pelos cidadãos.

Readquirida a soberania em 1640, a urgência da defesa levou a engenharia militar a agir sobre praças militares como Miranda do Douro, Bragança e Cha-ves. À época, o poder da artilharia obrigava a abordagens inovadoras. Por tal, as torres do castelo de Bragança seriam cortadas e rebaixadas para receberem bocas de fogo. Ao mesmo tempo, nas imediações do castelo, o casario que formava alguns arruamentos seria eliminado para dar lugar a esplanadas ou áreas despojadas de obstáculos, enquanto o perfil de alguns baluartes se eviden-ciava no novo aro que se esticava para cercar a cidade. Então, a malha urbana seria forçada a uma recomposição, já que as ideias de racionalidade funcional pretendiam obter acessos rápidos aos pontos nevrálgicos das novas barreiras.

A um tiro de mosquete da cidade, levantava-se o Forte de S. João de Deus, obra regular de quatro ângulos, com quatro baluartes e dois revelins, como se mostra numa gravura do tratado de Luís Serrão Pimentel. No seu planeamento participaria o engenheiro militar Pierre Giles de Saint Paul, cer-tamente seguindo orientações de Miguel de Lescoles, um francês que já havia exercido funções no Brasil.

A partir deste momento, o conjunto urbano podia facilmente ser decomposto em três organismos: o castelo, a cidade e o forte. Já na centúria de setecentos, registam-se outros estudos defensivos saídos da mão dos elementos da enge-nharia militar que ia vistoriando o estado das praças fronteiriças.

Em 1762, após a destruição de Miranda do Douro, o exército castelhano que ocupou Bragança, além de incapacitar definitivamente o Forte de S. João de Deus, destruiu a maior parte da muralha do castelo. Perto do final da cen-túria avaliava-se a utilidade das velhas fortalezas. Contudo, os pesados custos

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da reconstrução e os sinais que anunciavam profundas modificações a todos os níveis da vida interna das nações e nas relações internacionais sancionaram a inutilidade militar que estas posições ofereciam.

A comunicação apresentada pelo TCor Eng. João Paulo de Almeida, “A crescente importância do Exército nas missões de interesse público”, abordou a participação do Exército em missões de protecção civil, na satisfação das necessidades básicas das populações ou de melhoria das suas condições de vida, também conhecidas por Outras Missões de Interesse Público (OMIP). O orador referiu que podemos apontar o final dos conflitos africanos, em meados da década de 70 do século passado, como a altura em que este tipo de missões se começou a definir nos moldes em que hoje as conhecemos.

Em termos legislativos, existe uma panóplia de instrumentos enquadrantes quer ao nível das Forças Armadas (FFAA), quer das entidades-chave com que estas se relacionam na sua missão de apoio às populações, sendo de destacar a componente de protecção civil e de actividades estratégicas para a economia nacional, como a defesa da floresta. Em termos de satisfação de necessidades básicas e melhoria das condições de vida das populações, tarefas que mais se evidenciaram na fase embrionária das OMIP, existem hoje acordos de referência que as enquadram e lhes dão um carácter sistemático e programado.

A Lei de Bases da Protecção Civil divide a tipologia do apoio das FFAA em programado e não programado, sendo que o primeiro se refere ao apoio efectuado em antecipação, face à possibilidade de ocorrência de determinado evento ou, no caso de uma ocorrência já materializada, para mitigar os seus efeitos ou proteger pessoas e bens. A maioria das actividades do Exército insere-se neste âmbito.

Os Planos de Operações LIRA, no apoio ao combate a incêndios; ALUVIÃO, no apoio à resolução e neutralização das consequências nefastas de cheias; e CÉLULA, na área da defesa Biológica, Química e Radiológica são exemplos de OMIP, enquadrados por planos devidamente implementados e testados.

O Plano de Operações VULCANO é um exemplo de actividade programada e planeada na área da prevenção e defesa da floresta contra incêndios, uma vez que no seu âmbito o Exército executa tarefas que vão desde o combate de primeira intervenção até às acções de vigilância, sensibilização e alerta oportuno de ocorrências de incêndios ou de situações potencialmente perigosas. Este plano realiza-se através de equipas com formação específica que vão para o terreno e aí permanecem, enquanto o risco de incêndio o justificar, em patrulhas e acções de sensibilização contínuas. O Plano de Actividade Operacional Militar, agindo na satisfação das necessidades básicas das populações e melhoria das

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suas condições de vida, constitui uma ferramenta que reúne vários actores para tornar possível ao Exército, de forma objectiva e enquadrada, a realização de intervenções cuja necessidade é apresentada pelos Municípios nacionais.

As OMIP são uma realidade também nas Regiões Autónomas, que são abrangidas por planos de âmbito nacional (caso do Célula) e por planos existentes nos comandos militares dessas regiões, e que melhor traduzem as realidades locais.

Apesar das actividades de OMIP existirem há muito tempo, foi nas duas últimas décadas que se introduziram e se foram aperfeiçoando os mecanismos de coordenação entre as várias entidades intervenientes no processo. No entanto, a importância destas actividades mantém-se, uma vez que a última década viu aumentar o número de planos e a tipologia de apoio existentes. Esta importância é atestada pelo Plano de Operações VULCANO iniciado em 2004 por parce-ria com a Autoridade Florestal Nacional, bem como pelo Plano de Operações CÉLULA, que existe desde 2008, para uma mais eficaz actuação na área das ameaças emergentes em parceira com outros agentes de protecção civil.

As OMIP são consideradas pelo Exército actividades da mais elevada im-portância, que permitem uma rentabilização de recursos e capacidades existentes nas FFAA, mas que não lhe sendo exclusivas, ou que o sendo possibilitam que as populações em geral disso tirem proveito. Em termos de actuação conjunta com os outros agentes de protecção civil, para além das anteriores vantagens de optimização de recursos, outras podem ser apontadas como a criação de proce-dimentos e técnicas de actuação comuns, condição indispensável ao sucesso de uma resposta a indesejáveis, mas infelizmente possíveis situações de catástrofe.

O segundo painel, subordinado ao tema “As Ameaças Externas: As Invasões Francesas (1807-1810)”, foi moderado pelo Sr. Dr. Teófilo Vaz, Professor da Escola Secundária Emídio Garcia, e abordou duas temáticas: a primeira, intitulada “O levantamento a partir de Trás-os-Montes”, proferida pelo Sr. Major de Artilharia Paulo Jorge Fernandes Rodrigues, Director do Museu de Bragança; e a segunda, apresentada pelo Sr. Tenente-Coronel Nuno Lemos Pires, da Academia Militar, designada “As Operações a partir de Trás-os-Montes”.

A comunicação do Maj Art Paulo Rodrigues recordou como ocorreu o levantamento contra a ocupação francesa em Trás-os-Montes. Após ter sido recebida em Bragança a notícia do levantamento popular do Porto de 6 de Junho de 1808 por Madureira Cirne, abade de Carrazedo, de imediato se de-cidiu realizar o levantamento em armas de Bragança. O capitão Bernardo de Figueiredo Sarmento, do Regimento de Infantaria 24, com o governador do bispado, Paulo Miguel Rodrigues de Morais e com o Sargento-Mor de milícias,

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Manuel Ferreira de Sá Sarmento logo se disponibilizaram, a agrupar soldados, milicianos e populares para o efeito, encaminhando-os para a frente da Igreja de São Vicente.

O General Manuel Sepúlveda, na altura Governador Militar Provincial, organizou e comandou as gentes que se iam juntando e ordenou a reestruturação de todas as forças militares regulares, levando à reactivação do Regimento de Infantaria 24 e do Regimento de Cavalaria 12, bem como à criação do Regi-mento de Milícias e da Brigada de Ordenanças. Solicitou ainda aos Bragançanos um contributo financeiro e em géneros para a causa. A originalidade da revolta em Bragança prende-se com o facto de na noite de 11 de Junho as palavras do general Sepúlveda terem sido lavradas em papel, num claro gesto de firmeza, sendo então afixadas num edital.

A proclamação de Sepúlveda arrastou outros concelhos da província à revolta. Em Miranda do Douro, o Capitão de ordenanças, com o consentimento da magistratura e da igreja, procurou de imediato organizar um corpo de in-tervenção, com a ajuda de um filho e de um criado. Em Vila Real, o Tenente-Coronel Francisco da Silveira conduziu uma multidão excitada.

Moncorvo, que se distinguiu por cenas particularmente frenéticas praticadas por gentes então identificadas como sendo de baixa condição, levantaram-se igualmente contra a ocupação francesa.

Também Mirandela e Alfândega da Fé se juntaram ao levantamento popular. Em Trancoso, um Tenente-Coronel de milícias assumiu a responsabilidade da insurreição, que todas as classes entusiasticamente aprovaram. Assim, Trás-os-Montes ergueu-se como um todo em armas.

O TCor Inf Lemos Pires, na exposição da segunda temática, destacou que a Guerra Peninsular foi muito mais do que as grandes Batalhas de Wellington ou dos Marechais Franceses. Com efeito, revelou-se a Guerra dos povos contra o ocupante, uma guerra terrível entre forças regulares, irregulares, guerrilhas e população em armas. Em suma, foi uma guerra geral para os povos da Pe-nínsula Ibérica. Para Portugal constituiu acima de tudo uma Guerra Global, de duração e espaço muito superiores ao que a designação de Guerra Peninsular ou Invasões Francesas nos dão a entender, do Brasil a Moscovo, de 1793 a 1817.

Os transmontanos cumpriram o seu papel nesta prolongada Guerra Global. Estiveram entre os primeiros a levantarem-se contra o ocupante francês, ajudaram no levantamento nacional, integraram as forças armadas portuguesas em todas as suas vertentes - nacional, regional e local -, no exército de primeira linha, nas milícias e nas ordenanças, mas também em grupos espontâneos, guerrilhas locais ou simplesmente, na defesa dos seus.

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Fonte: Centro de Audiovisuais do Exército, 2011

Figura 3 – Moderador e oradores do terceiro painel

De Trás-os-Montes saiu a maioria dos combatentes que infligiram a primeira derrota aos Franceses na Batalha dos Padrões da Teixeira em 1808. Na segunda invasão francesa estes combatentes conseguem garantir, não só o ataque permanente aos adversários franceses, como ainda fazer com sucesso a primeira retomada de uma cidade portuguesa ocupada – Chaves – e assegurar que nenhuma tropa francesa conseguisse passar o território transmontano de ou para Espanha. Na última das invasões foram novamente os transmontanos os primeiros a entrar em combate, para lá da fronteira portuguesa em Puebla de Sanabria e a ganhar o primeiro troféu – uma das águias francesas.

Até ao final da Guerra Peninsular, os transmontanos e as restantes forças portuguesas seguem com os seus aliados britânicos para expulsar os franceses de Espanha, que viriam a derrotar na própria França, em 1814, enquanto por cá, garantem a segurança permanente da sua região para que ninguém duvide “Para lá do Marão mandam os que lá estão!”.

O terceiro painel, dedicado ao tema “O Exército Nas Crises Nacionais e a Sua Função Social”, foi moderado pelo Sr. Tenente-General Gabriel Es-pírito Santo (figura 3) e compreendeu duas temáticas: a primeira intitulada “O Exército nas Crises Nacionais Contemporâneas”, proferida pelo Sr. Professor Doutor António José Telo, da Academia Militar; a segunda, como conferência de encerramento, abordou “A Função Social Das Forças Armadas” e foi apre-sentada pelo Sr. Professor Doutor Adriano Moreira.

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A comunicação do Professor Doutor António Telo caracterizou o papel do Exército em particular e das Forças Armadas em geral nas crises nacionais contemporâneas, que identifica com as transições entre sistemas políticos e sistemas económico-financeiros.

Destacou uma primeira constatação de que no Portugal contemporâneo todas estas transições sofreram cortes bruscos e não mudanças graduais, como é normal noutras sociedades. A segunda constatação é que estes cortes brus-cos são normalmente protagonizados pelas Forças Armadas, desempenhando o Exército um papel central e de locomotiva em todos eles.

Foram examinadas as 13 principais características desses movimentos, sendo confirmado que todas estão 100% presentes em metade dos casos e nos restantes 70%, pelo que se pode falar de um padrão ou regra.

Em seguida, foi exposta uma teoria que procura explicar as razões do empenho das Forças Armadas nestas mudanças, levando em conta factores en-dógenos e exógenos do processo, nomeadamente o enquadramento de Portugal no sistema internacional, os conflitos e a relação com os aliados. Verifica-se igualmente a existência de um padrão com fortes semelhanças neste contex-to, embora cada caso tenha a sua especificidade, dependendo da forma como Portugal se insere no sistema internacional, em particular quanto à economia e aos fluxos financeiros internacionais.

A intervenção do Professor Telo terminou com algumas conclusões sobre o processo de mudança de fundo na sociedade portuguesa e a forma como este se liga à chegada de novas tecnologias à arte militar e ao processo de inovação nas Forças Armadas. Faz-se a ligação lógica e conceptual entre estes processos, aparentemente diferentes mas na realidade, intimamente interligados.

A conferência de encerramento “A Função Social das Forças Armadas”, apresentada pelo Sr. Professor Doutor Adriano Moreira, destacou que «na época de globalização, desregulada, em que vivemos, com poderes atípicos de espécies diferentes, desde as finanças e economia às organizações militarizadas mas sem território nem povo, e com uma crise evidente das autoridades supranacionais organizadas depois da guerra de 1939-1945, com expressão principal na ONU, o Estado continua a ser uma referência privilegiada, mesmo que algumas das funções tendam, em vários casos, para exíguas.

A revisão das suas funções, que não obedece a um modelo definido para todos, tem sobretudo que ver com as fronteiras que delimitam o seu poder, mas também com os separatismos que atingem alguns, designadamente pelo renas-cimento de nacionalismos antes apaziguados pelas soberanias agora em crise» sendo que «justamente uma das funções das Forças Armadas, diz respeito à

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importância do que especialistas chamam – government through symbols. Esta expressão que se refere a uma demonstração frequente, de regra temporalmente referida a datas históricas e a feitos notáveis, cujo fim é manter e fortalecer as devoções e fidelidades à forma do Estado, monarquia ou república, democracia ou autoritarismo, mas afirmando pela bandeira, pelo desfile das tropas, pelos feitos recordados, pela simbologia mantida e usada, a maneira do país estar no mundo, os seus valores, a sua independência, firme nas raízes e no futuro.»

O orador referiu ainda a necessidade de encontrar «uma fórmula que procure, certamente com a debilidade de todas as fórmulas, evidenciar o traço essencial dessa fidelidade, poder-se-á dizer que a fidelidade é finalmente os va-lores da maneira portuguesa de estar no mundo, o eixo da roda que não muda com as mudanças dos regimes políticos: a Nação no mundo, salvaguardando o seu património, material e imaterial, atentas as Forças Armadas à mudança da roda do tempo.

Se admitimos que essa maneira portuguesa de estar no mundo – o que inclui um complexo de valores relacionados com o amor à Pátria, com o modelo de sociedade civil aberta, com a justiça efectiva e não formal, com as raízes da unidade como alicerce de um futuro digno em liberdade, tudo tendo como centro o conceito que mais facilmente se intui de que com dificuldade recebe forma normativa, que é o de ser português, é um paradigma que antecede as instituições jurídicas da organização do Estado, também de tal paradigma se pode entender que inspirou, por um lado, os comportamentos de sacrifício como foram impostos pelas campanhas, na Europa e na África, de defesa contra a agressão alemã em 1914-1918, ou até ao fim do Império de 1974, e, por outro lado, as intervenções militares para a mudança de regime da política, como aconteceu com as guerras liberais, com o 28 Maio, com 1974, mesmo que, dando como certo o paradigma legitimador, sejam discutíveis as interpretações desse paradigma em cada intervenção e circunstância.

É por isso que também uma velha instituição desaparecida no nosso tempo, a do serviço militar obrigatório, tinha esse paradigma a de presidir as intervenções das Forças Armadas, quando a população era alfabetizada, profissionalizada, e instruída nos valores da maneira de ser português – tudo com expressão num símbolo que não seria mais esquecido que era a Bandeira.

Tal como o jovem Clausewitz escreveu no seu tempo, a mudança das cir-cunstâncias foi rápida e profunda sem precedente comparável, e a questão é a da relação da premissa – a maneira portuguesa de estar no mundo – com essa mudança. Os avanços da ciência e da técnica, em cooperação com a teologia de mercado que se instalou, tornam evidente esta consequência: que são necessárias pessoas altamente qualificadas e menos gente, ao mesmo tempo que a resposta

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que se traduziu na contratação do contingente, e no outsorsing relacionado com a progressiva privatização da guerra, implicaram uma substituição do dever cívico, realmente limitada aos quadros permanentes, pelo dever contratual, que privou a sociedade civil de um instrumento de integração, privação que acompanha a queda de influência e presença das religiões institucionalizadas, na Europa as cristãs, e das famílias tradicionais desafiadas pelas novas formas legais e de facto.»

O Professor Doutor Adriano Moreira referiu ainda que «As Forças Arma-das são indispensáveis neste Nex Deal, e a situação de Portugal exige extrema atenção e consideração deste facto. Em primeiro lugar porque sem apoio ex-terno, que neste milénio é a União Europeia, a sua capacidade é, como sempre foi ao longo dos séculos, debilitada; porque está no centro dos desafios dos Atlânticos, e do turbilhão do Mediterrâneo; porque não pode deixar de estar presente na definição estratégica do Ocidente (NATO), nem da sua extensão no Atlântico Sul (Oceano Moreno) membro activo como é da CPLP. A alternativa é, como aconteceu na crise da economia e finanças, ter um programa de guerra ditado por um acordo com instituições que não parecem necessitar do aparelho complexo do Estado para imporem os seus pontos de vista, é que se perca a capacidade demonstrada na guerra fria de ter uma voz autorizada agora subs-tituída por decisões alheias; temos hoje, na CPLP, as Forças Armadas como o instrumento mais visível e respeitado da colaboração. E por fim, não obstante a alteração que substitui o dever cívico pelo dever contratual dos contingentes, que parece irreversível, temos neles o exemplo e sustentação da maneira por-tuguesa de estar no mundo, paradigma de qualquer organização política, com expressão simbólica na Bandeira. E que têm na sua história duas práticas, que não deviam ser nem alteradas, nem esquecidas: a homenagem que anualmente se prestava aos mortos da Grande Guerra, o 9 de Abril que não consagrava uma vitória mas glorificava a capacidade de sacrifício; a homenagem anual, junto ao tumulo do soldado desconhecido, que honrava os cidadãos humildes que, mesmo quando mal governados, não omitiram o dever. Estamos com evidên-cia a sofrer uma crise do Estado, que se verifica em vários países ocidentais, sendo que o valor da confiança no Estado, na União Europeia, e no regime internacional em vigor, está afectado severamente pela falta de confiança no poder e nas lideranças. Mas a crise do Estado não é a crise da Nação, e é sempre altura de a Nação corrigir o Estado, para que o paradigma da maneira portuguesa de estar no mundo seja respeitado. O exemplo das Forças Armadas é, para isso, indispensável e fundamental.»

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NORMAS PARA PUBLICAÇÃO NA REVISTA PROELIUM

1. A PROELIUM é uma revista de divulgação científica, aberta à colaboração de todos os investigadores nacionais e internacionais.

2. Os artigos devem ser enviados para o e-mail: [email protected].

3. Cada artigo será revisto, pelo menos, por dois avaliadores.

4. A notificação do resultado será efectuada por correio electrónico ao autor principal (pri-meiro) do artigo. As notificações de recusa irão acompanhadas da correspondente folha de avaliação.

5. Em cada número da PROELIUM, um investigador só aparecerá uma vez como autor principal.

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10. A revista PROELIUM adoptou a Norma Portuguesa (NP 405-1) do Instituto Português da Qualidade, homologada no Diário da República, III Série, N.º 128 de 03 de Junho, de 1994.

11. De acordo com a NP 405-1, as citações e referências a autores no texto devem ser efec-tuadas do seguinte modo:

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renciadas por uma letra minúscula a seguir à data - (Bastos, 2002a), (Bastos, 2002b);

1 Grau Académico, Categoria Profissional, Estabelecimento de Ensino Superior, Disciplinas ministradas.

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c. quando a obra ou artigo tiver dois autores - (Bastos e Almeida, 2002);d. quando a obra ou artigo tiver três ou mais autores - (Bastos et al, 2002).

12. As notas de rodapé devem conter informações complementares de natureza substantiva.

13. A bibliografia deve ser colocada no final do artigo e contém apenas a lista das referên-cias feitas no texto, ordenadas alfabeticamente e, por ordem cronológica crescente para referências do mesmo autor.

a. LivrosWRIGHT, Quincy (1942). A Study of War, The University Chicago Press, Chicago, Estados Unidos da América.CARDOSO, Cristóvão e ALMEIDA, Manuel (2002). Trânsitos coloniais: diálogos críticos luso-brasileiros, Imprensa de Ciências Sociais, Lisboa.HENRIQUES et al (1999). Educação para a Cidadania, Plátano Editora, Lisboa.

b. Artigos em revistasCABRAL, Mário (2003). “O exercício da cidadania política em perspectiva histórica (Portugal e Brasil)”, in Vários, Revista Brasileira de Ciências Sociais, N.º 51, Volume 3, Janeiro, p. 31-60 [indicar as páginas do artigo].

c. InstituiçõesMDN (1998). Cooperação Técnico-Militar com os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa: relatório de actividades de 1998, Ministério da Defesa Nacional, Lisboa.

d. Artigos em Revistas on-lineHIDI, Samuel (2006). “Interest: a unique motivational variable”, in Vários, Edu-cational Research Review, n.º 2, p. 69-82. Internet: http://www.sciencedirect.com, consultado em [dia, mês e ano].

e. Documentos on-lineWEDGEWORTH, Richard (2005). State of Adult Literacy. Internet: http://www.proliteracy.org/downloads, consultado em [dia, mês e ano]

f. Artigos de JornaisGEADA, Eduardo (1987). “O espaço aberto da filosofia e do saber”, in A Capital, 19 de Novembro, p. 9.

g. LegislaçãoDECRETO-LEI n.º 192/89. D.R I Série, 131 (89-06-08), 2254-2257.

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