princípios constitucionais e valores da u.e

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Direito da União Europeia, Fausto Quadros (Portugal)

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Page 1: Princípios Constitucionais e Valores da U.E

Princípios Constitucionais e Valores da U.E.:A Importância dos Direitos já referidos na

Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia

Os Princípios e Valores da União não devem ser vistos apenas como produto de uma abstracção normativista. Eles não são apenas princípios, são verdadeiros valores. São princípios estruturantes do conjunto da União e do seu sistema jurídico. Formam o núcleo da Constituição Material da União Europeia (eles são os princípios que dão corpo às opções fundamentais da União e aos valores que ela escolheu para regerem a sua existência e a sua actividade). Fazem parte da ordem pública comunitária e por isso, ocupam o lugar cimeiro entre as fontes do Direito Comunitário e constituem autênticos limites materiais à revisão dos tratados. Portanto, eles concentram uma força jurídica muito grande.

Os Princípios são: Princípio da Integração; Princípio do Respeito pela Identidade Nacional dos Estados membros; Princípio do Respeito pela Diversidade Cultural dos Povos Europeus; Princípio da Solidariedade; Princípio da Lealdade Comunitária; Princípio do Gradualismo; Princípio do Respeito pelo Adquirido Comunitário; Princípio da Democracia; Princípio da Subsidiariedade; Princípio da Proporcionalidade; Princípio da Integração Diferenciada; Princípio do Equilíbrio Institucional; Princípio da Transparência; Princípio da Economia Social de Mercado; Princípio da Não-Discriminação.

O Princípio da Integração é o mais importante princípio constitucional da União. Isto por que a União e a sua Ordem Jurídica têm por objectivo primordial fomentar a criação de interesses comuns entre os Estados, valorizá-los e ampliá-los. Visa assim, a criação entre os Estados (e entre eles e os indivíduos) uma margem tão ampla quanto possível de solidariedade que impõe a criação de um poder integrado.

Este princípio leva ao surgimento de outros dois princípios como expressões dessa integração, são eles o Princípio da Efectividade (ele postula que o Direito da União Europeia seja aplicado de modo eficaz, com respeito pelas características próprias de cada Estado) e o Princípio da Uniformidade (este impõe que a Ordem Jurídica da União seja interpretada e aplicada de modo uniforme no espaço comunitário e na ordem interna de todos os Estados membros).

O Princípio do Respeito pela Identidade Nacional dos Estados membros tem estado presente na integração europeia desde o seu início. Jean Monnet afirmava que “a Europa não se fará sem os Estados e muito menos contra os Estados”. Este princípio quer então dizer que no processo evolutivo da integração será preservada e respeitada a identidade própria de cada Estado.

“Identidade Nacional” significa identidade política, jurídica e cultural. Sendo assim, a União deve respeitar o direito de cada Estado membro definir a sua organização política e administrativa interna; a especificidade dos Direitos nacionais dos Estados membros e a língua, a História, as tradições e a cultura de cada um.

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Os princípios de Integração e Respeito pela Identidade Nacional dos Estados membros completam-se. Embora os dois aparentem a primeira vista ideias opostas, o motor de integração europeia reside, exactamente, na constante tensão dialéctica entre a integração e a interestadualidade, isto é, uma relação de integração e cooperação.

O Princípio do Respeito pela Diversidade Cultural dos Povos Europeus, em parte, concretiza o princípio do Respeito pela Identidade Nacional dos Estados membros, mas se refere mais especificamente aos “povos europeus” e não aos Estados membros, e portanto tem um valor acrescido. Ao falar em “povos” e não em Estados, quer-se dizer que a União Europeia pretende preservar a cultura própria, não apenas dos Estados, como também dos outros grupos dentro dos Estados.

Este princípio quer dizer que a União não se fará sobre a unicidade cultural dos diversos povos europeus, mas sobre o seu pluralismo. Ou seja, a União respeitará a especificidade das culturas dos seus povos e, portanto, a sua diversidade.

Este princípio pretende, então, que haja uma união não só de Estados, mas de Estados e de povos, todos eles devidamente respeitados quanto a sua especificidade histórica e cultura e reconhecidos seus direitos a preservarem sua diversidade.

O Princípio da Solidariedade constitui um corolário do princípio de integração. Constituem, simultaneamente, a razão de ser e a característica determinante da União e do seu sistema jurídico.

A solidariedade referida aqui é a solidariedade entre os Estados e entre estes e a União. Quer dizer que existe um interesse geral, ou seja, um interessa global da União que não deve ser confundido com a soma dos interesses individuais dos Estados membros, e que este deve prevalecer sobre esses interesses particulares.

Os Estados membros devem aceitar esse contrato social, segundo o qual, o interesse da União sobrepõe aos interesses específicos dos Estados, sendo esses “sacrifícios” compensados pelas vantagens que daí advêm o interesse de todos.

O Princípio da Lealdade Comunitária consagra a obrigação de lealdade, fidelidade ou boa-fé comunitária análoga que deve vigorar nos Estados membros. Ele está intimamente ligado ao princípio de solidariedade.

Este princípio assume importância vital na definição das relações entre a União e, por um lado, as Comunidades e por outro, os Estados membros.

Impõe uma obrigação negativa, quando proíbe que os Estados ponham em perigo a realização dos objectivos do Tratado, e uma dupla obrigação positiva, que desdobra-se em uma obrigação de resultado (a obrigação dos Estados de tomar todas as medidas gerais ou especiais capazes de assegurar o cumprimento das obrigações decorrentes dos Tratados ou resutantes de actos das Instituições das Comunidades) e em outra de obrigação de meio (os Estados devem facilitar à Comunidade o cumprimento da sua missão).

O Princípio de Gradualismo diz que o processo de integração deve ser paulatino e progressivo, ou seja, deve ser por etapas de modo a não pôr em risco todo o processo de integração, e por outro lado que este processo não deve ser interrompido.

Uma outra vertente do princípio de gradualismo estabelece que o processo de integração, dado que está consumada a integração economica, deverá ser completada por um grau análogo de integração política. Mas, não deixa claro até que nível esta integração política deve alcançar.

O Princípio do Respeito pelo Adquirido Comunitário decorre do princípio de lealdade comunitária, do princípio de gradualismo e do carácter dinâmico e evolutivo que este segundo impõe à União.

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Postula que o processo de integração deve ser considerado, a todo momento, como definitivamente consolidado e, portanto, tem de ser encarado como jurídica e politicamente irreversível. Ou seja, pode-se progredir na integração, mas não pode regredir nela.

O Princípio da Democracia enforma toda a União e a sua Ordem Jurídica.Este princípio nos aparece dividido em várias ideias-motoras: a Democracia

propriamente dita, a liberdade, o respeito pelos direitos fundamentais e o Estado de Direito.A ideia de democracia quer dizer, na integração europeia, antes de mais, paz. Mas este

princípio também quer dizer que a União defende uma Democracia política, económica e social.

O Princípio da Subsidiariedade vem fundamentalmente disciplinar o exercício das atribuíções concorrentes (aquelas que tanto podem ser exercidas por ela como pelos Estados membros), dizendo que a União só pode exercer essas atribuições se demonstrar que os Estados não são capazes de as exercer de modo suficiente e que a União é capaz de o fazer melhor a fim de alcançar os objectivos dos Tratados.

Assim, este principio dá aos Estados a oportunidade de manter e reforçar sua especificidade e, concretamente, a especificidade do seu ordenamento jurídico e dos princípios e valores que o regem.

É um princípio jurídico com grande alcance político pois adopta uma filosofia descentralizadora nas relações entre a União e os Estados, ampliando a sua soberania. Este princípio também relativiza o âmbito da soberania que cada Estado membro vai conservando no processo de integração europeia (ele guardará mais soberania quanto mais capaz for de exercer sozinho as atribuições concorrentes e assim puder dispensar a intervenção da Comunidade).

Importância: é uma das vias mais importante para a preservação e a defesa da identidade nacional dos Estados membros; vem fazer da Comunidade uma União de Estados, de povos e de cidadãos.

O Princípio da Proporcionalidade, de acordo com Miguel Gorjão Henriques, “está consagrado expressamente no Tratado da Comunidade Europeia como o princípio limitativo da acção desta, através dos seus órgãos - Artigo 5.º/3: ‘A Acção da comunidade não deve exceder o necessário para atingir os objectivos do presente Tratado.’ E esteve, desde muito cedo, presente na jurisprudência do Tribunal de justiça como o princípio geral do direito comunitário.”

A ideia de proporcionalidade aqui é, simultaneamente, de necessidade de medida e proíbição do seu excesso.

O Princípio da Integração Diferenciada permite que alguns Estados possam avançar na integração mais depressa que outros.

O problema levantado por esse princípio: com os sucessivos alargamentos da União, aumentou o fosso que separa os Estados no grau do seu desenvolvimento, pois nem todos eles estão em condições de manter o mesmo ritmo de integração.

É necessário que se atenuem os inconvenientes da diferenciação da integração para a coesão económica e social no seio da União e para a aplicação do princípio da uniformidade da Ordem Jurídica Comunitária.

O Princípio do Equilíbrio Institucional pretende significar que os Tratados devem manter uma relação de pesos e contrapesos (sistema que pretende respeitar nas relações entre os vários orgãos um equilíbrio entre os vários interesses em presença) e, por conseguinte, os orgãos devem respeitar reciprocamente a sua competência e a relação que entre eles se estabelece por via dos Tratados no processo de decisão na União.

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O Princípio de Transparência postula que na União as decisões deverão ser tomadas de uma forma tão aberta quanto possível.

Este princípio, assim enunciado, ultrapassa bastante as matérias específicas da informação e do acesso a documentos para englobar o conjunto global do exercício do poder político na União. Por isso a quem o chame de “princípio da abertura”.

O Princípio da Economia Social de Mercado apresenta como corolários a livre circulação e a concorrência.

Na União Europeia, a Economia Social de Mercado é marcada pela sua componente social pelos limites colocados às quatro liberdades e pelos mecanismos previstos para se evitar que se falseie a concorrência.

O Princípio de Não-Descriminação diz que, salvo razões objectivamente demonstradas, situações idênticas ou análogas não podem ser tratadas de modo diferente.

Aqui prefere-se dizer “não-descriminação” no lugar de “igualdade”, já que os Estados não estão em pé de igualdade no Direito Comunitário.

Visto os Princípios e Valores da União, analisaremos agora a face dos Direitos Fundamentais que regem a União Europeia.

A ideia da salvaguarda e da proteção dos direitos fundamentais encontra-se presente no processo da integração europeia desde o seu início.

É certo que não constava dos Tratados instituitivos das Três Comunidades, na sua versão original, nenhum preceito específico sobre a matéria dos direitos fundamentais, significando que os autores daqueles Tratados não os consideravam imprescindíveis numa altura em que se iniciava o processo da integração, ou seja, os objectivos primários da integração eram apenas objectivos políticos e económicos.

Actualmente existe a Carta dos Direitos Fundamentais da União, proclamada em Nice, em 7 de Dezembro de 2000, ela enuncia todos os direitos actualmente reconhecidos pelos seus Estados-Membros e respectivos cidadãos. E nela está contido, para além de direitos políticos e económios, direitos civis, sociais e culturais.

Surgiu por um desejo de “constitucionalizar” os direitos reconhecidos aos cidadãos da União. Assim, ficou determinado que deveria ser elaborada uma Carta dos Direitos Fundamentais na qual ficassem consiguinados, com toda a evidência, a importância primordial dos direitos e o seu alcance para os cidadãos da União.

A convenção incumbida de elaborar a Carta foi formada por representantes dos Chefes de Estado e de Governo, do Parlamento Europeu, dos Parlamentos Nacionais e por um representante da Comissão Europeia, num total de 62 membros.

O trabalho da convenção durou dez meses para ser concluído e resultou em um texto composto por um preâmbulo e 54 artigos.

Não houve acordo na Convenção para que à Carta fosse dado carácter obrigatório, ou seja, efeito vinculativo para os seus destinatários, não podendo assim ser incluída no Tratado da União Europeia. Ela acabou por assumir a forma de uma Proclamação solene do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão, o que lhe conferiu a natureza jurídica de um acordo interinstitucional.

Os Direitos reconhecidos pela Carta são:

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DIGNIDADE Dignidade do ser humano Direito à vida Direito à integridade do

ser humano Proibição da tortura e dos

tratos ou penas desumanos ou degradantes

Proibição da escravidão e do trabalho forçado

LIBERDADES Direito à liberdade e à

segurança Respeito pela vida privada

e familiar Protecção de dados

pessoais Direito de contrair

casamento e de constituir família

Liberdade de pensamento, de consciência e de religião

Liberdade de expressão e de informação

Liberdade de reunião e de associação

Liberdade das artes e das ciências

Direito à educação Liberdade profissional e

direito de trabalhar Liberdade de empresa Direito de propriedade Direito de asilo Protecção em caso de

afastamento, expulsão ou extradição

IGUALDADE Igualdade perante a lei Não discriminação Diversidade cultural,

religiosa e linguística Igualdade entre homens e

mulheres Direitos das pessoas

idosas Integração das pessoas

com deficiência

SOLIDARIEDADE

Direito à informação e à consulta dos trabalhadores na empresa

Direito de negociação e de acção colectiva

Direito de acesso aos serviços de emprego

Protecção em caso de despedimento sem justa causa

Condições de trabalho justas e equitativas

Proibição do trabalho infantil e protecção dos jovens no trabalho

Vida familiar e vida profissional

Segurança social e assistência social

Protecção da saúde Acesso a serviços de

interesse económico geral Protecção do ambiente Defesa dos consumidores

CIDADANIA Direito de eleger e de ser

eleito nas eleições para o Parlamento Europeu

Direito de eleger e de ser eleito nas eleições municipais

Direito a uma boa administração

Direito de acesso aos documentos

Provedor de Justiça Direito de petição Liberdade de circulação e

de permanência Protecção diplomática e

consular

JUSTIÇA Direito à acção e a um

tribunal imparcial Presunção de inocência e

direitos de defesa Princípios da legalidade e

da proporcionalidade dos delitos e das penas

Direito a não ser julgado ou punido penalmente

Page 6: Princípios Constitucionais e Valores da U.E

mais do que uma vez pelo mesmo delito

Âmbito de aplicação

Proibição do abuso de direito

Importância do Conteúdo da CartaConstitui o mais ambicioso e elaborado texto jurídico sobre

Direitos Internacionais do Homem no plano Internacional. Sendo o primeiro texto que compila simultaneamente direitos civis, políticos, sociais, culturais e econômicos. O que leva a vantagem de amplitude dos direitos reconhecidos pela Carta e afirmação da incindibilidade desses direitos.

A Carta demonstra, assim, a sua superioridade em relação aos outros textos clássicos do Direito Internacional sobre o Direito do Homem. Ela sozinha representa o somatório da Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948) e dos Pactos das Nações Unidas (1966), com a vantagem dela actualizar a formulação, o conteúdo e o alcance dos direitos elencados nesses textos e completa-os com “novos direitos”. Ela também, sozinha, vai muito além da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e dos seus Protocolos (estes não abrangem os direitos de forma tão completa quanto a Carta – apenas direitos civis e políticos – e também tem falhas quanto à actualização).

O arrolamento dos direitos pela Carta encontra-se valorizado pelo facto de os direitos fundamentais serem apresentados como emanação de valores-chave, cada um deles vertidos numa única palavra e de forma muito expressiva. Mais do que um modo de agrupar e aglutinar os direitos, esses valores têm de passar a ser considerados valores constitucionais básicos de todo o ordenamento jurídico da União.

A Carta afirma a sua função codificadora e enuncia até as fontes onde foi buscar os direitos por ela reconhecidos. Significa que a Carta nasceu com um intuito muito ambicioso de codificar os direitos consagrados nos referidos textos (das Nações Unidas, na CEDH e nos seus Protocolos, nos Tratados Comunitários, na jurisprudência quer no TJ, quer no TEDH, e nas tradições constitucionais dos Estados membros).

Nesta função codificadora, a Carta fornece resposta às exigências actuais dos Direitos do Homem, ao acolher, ao lado dos direitos clássicos, os direitos novos e até os novíssimos. Ou seja, trata-se de um texto moderno elaborado para o século XXI.

A Carta não reconhece direitos apenas aos nacionais dos Estados Membros, mas sim, a todas as pessoas sujeitas a sua jurisdição.

Conclusão

O que podemos notar na analise dos Princípios Constitucionais e Valores da União Europeia conjulgados com o conteúdo da Carta dos Direitos Fundamentais da mesma é que, nos primeiros, existe uma preocupação maior entre a relação dos Estados com a União, mas é visível que pretende-se, dentro desta

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relação, salvaguardar sempre as pessoas que constituem cada um desses Estados e, depois, a União de uma forma geral. Já na Carta dos Direitos fundamentais, a protecção a estas pessoas vem muito mais forte, trata-se na verdade da preocupação central da Carta.A existência de Direitos Fundamentais acaba por criar um sentimento de “parentesco” entre os europeus, ou seja, um laço de pertença que é muito importante para a integração dos Estados na União.

Portanto, a Carta reforça e promove o alcance dos Princípios Constitucionais da União Europeia e protege os seres humanos que a constitui.

Trabalho em grupo desenvolvido por Flávia Machado, Paulo Palma, Tam Chin Neng e Yara Oliveira em Março de 2010 no âmbito da cadeira de Introdução ao Direito Comunitário II, leccionada pela Prof. Teresa Bracinha na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias - Lisboa, Portugal.Fonte Bibliográfica principal: Direito da União Europeia, Fausto Quadros, Ed. Almedina.