presença da igreja na formação do território no brasil colônia

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PRESENÇA DA IGREJA NA FORMAÇÃO DO BRASIL COLÔNIA: Do descobrimento às Minas do Ouro VASCONCELLOS, FÁBIO AZEVEDO Centro de Formação Tecnológica de Minas Gerais CEFET MG CAMPUS TIMÓTEO. Departamento de Computação e Construção Civil Rua 19 de Novembro, 121 Centro Norte Timóteo [email protected] RESUMO: No processo de de ocupação do território brasileiro, tiveram vários atores que transformaram a sua paisagem numa mescla de Metrópole e Colônia .Num período onde as forças principais eram os reinados absolutistas, mais precisamente na península Ibérica, e a Igreja Católica, essas atores se transformaram nos principais agentes formadores do território. A Igreja Católica sempre esteve presente na ocupação do Brasil, desde a primeira incursão oficial no continente. Fazendo-se necessária em vários momentos da história brasileira com papeis de extrema importância, nas primeiras ocupações do litoral, servido como edificações de auxílio à proteção contra nativos e nações estrangeiras, passando por trabalhos de catequização do gentio e ensino, como também assumindo ações que a Coroa não queria se envolver, como ajuda aos desvalidos e construção de hospitais. Teve papel de grande importância na formação da paisagem das vilas do ouro, papel sempre secundário se comparado à presença da Coroa, nessas localidades, mas não de menor importância. Desenhando uma paisagem singular na ocupação de pontos estratégicos e criando perspectivas existentes somente na região das Minas, se comparado ao resto do Brasil. Palavra chave: Arquitetura; Igreja; Minas Gerais.

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Page 1: Presença da Igreja na formação do território no Brasil colônia

PRESENÇA DA IGREJA NA FORMAÇÃO DO BRASIL COLÔNIA: Do descobrimento às Minas do Ouro

VASCONCELLOS, FÁBIO AZEVEDO

Centro de Formação Tecnológica de Minas Gerais – CEFET MG CAMPUS TIMÓTEO. Departamento de Computação e Construção Civil

Rua 19 de Novembro, 121 – Centro Norte Timóteo

[email protected]

RESUMO: No processo de de ocupação do território brasileiro, tiveram vários atores que transformaram a sua paisagem numa mescla de Metrópole e Colônia .Num período onde as forças principais eram os reinados absolutistas, mais precisamente na península Ibérica, e a Igreja Católica, essas atores se transformaram nos principais agentes formadores do território. A Igreja Católica sempre esteve presente na ocupação do Brasil, desde a primeira incursão oficial no continente. Fazendo-se necessária em vários momentos da história brasileira com papeis de extrema importância, nas primeiras ocupações do litoral, servido como edificações de auxílio à proteção contra nativos e nações estrangeiras, passando por trabalhos de catequização do gentio e ensino, como também assumindo ações que a Coroa não queria se envolver, como ajuda aos desvalidos e construção de hospitais. Teve papel de grande importância na formação da paisagem das vilas do ouro, papel sempre secundário se comparado à presença da Coroa, nessas localidades, mas não de menor importância. Desenhando uma paisagem singular na ocupação de pontos estratégicos e criando perspectivas existentes somente na região das Minas, se comparado ao resto do Brasil. Palavra chave: Arquitetura; Igreja; Minas Gerais.

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4º Seminário Ibero-Americano Arquitetura e Documentação Belo Horizonte, de 25 a 27 de novembro

1. Introdução

O presente trabalho tem o objetivo de levantar uma discussão a respeito do grau de

importância da igreja católica na organização do espaço no Brasil colônia mais

especificamente, nas Minas Setecentistas.

A percepção da questão foi iniciada ao longo da docência em história da arquitetura e

urbanismo durante alguns anos.

Durante o século XVI, época do descobrimento do Brasil, a Europa passava por um período

onde o absolutismo prevaleceu em grande parte do seu território. Neste período a Igreja

Católica, que havia se tornado extremamente forte e poderosa, estava com suas estruturas

abaladas pela Reforma Protestante que se alastrava pelo continente. Dividindo a Europa em

países protestantes e católicos.

Após o Concílio de Trento, várias medidas foram tomadas para barrar a expansão

protestante e reforçar a fé católica na Europa e no mundo. Portugal e Espanha países

católicos, se lançaram ao mar para conquista de novos territórios para expandir seus reinos

e aumentar recursos, fato que coincidiu com os desejos da Igreja Católica em conseguir

mais fiéis, a fim de compensar as perdas na Europa protestante. Esses dois desejos, o dos

Reis e o da Igreja, viabilizou uma parceria estratégica na conquista e colonização das terras

Americanas.

A presença da Igreja se fez presente em todos os momentos da colonização do Brasil, em

várias escalas e formas. Desde a presença das primeiras expedições ao continente até suas

incursões pelos sertões do Brasil, na busca de metais preciosos.

O trabalho tenta resgatar esse processo de inserção do poder da igreja no período colonial

brasileiro, focando um pouco mais nas na região das Minas no período setecentista. E sua

relação com a Coroa, como também como elemento formador de uma sociedade singular,

fazendo do Barroco mineiro, não somente um estilo arquitetônico, mas em uma sociedade

singular. Traça um histórico desde a presença dos jesuítas, como a primeira ordem religiosa

a fazer parceria com a coroa portuguesa, e a iniciar seus trabalhos de catequização no

Brasil, e se posicionando estrategicamente no sítio encontrado. Neste período com um

território inóspito, tinha grande necessidade de proteção, contra ataques tanto de nativos

como de nações inimigas. E a presença das Ordens Terceiras nas Minas setecentistas,

após a proibição das ordens seculares pelo Marques de Pombal.

Esse período de uma formação urbana mais consistente no Brasil, em função da mineração,

teve a Igreja, que no caso das regiões mineradoras foi através das ordens terceiras,

confrarias e irmandades, como elemento atuante na organização das vilas e cidades.

Proporcionando vários elementos de destaque na paisagem e a ocupação de destaque nas

praças, juntamente com os edifícios oficiais da Coroa.

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Segundo LOBO e JÚNIOR no capítulo: As colinas de Vila Rica de Ouro Preto, do livro

Urbanismo de Colina – Uma tradição luso-brasileira, 2012, “As igrejas e capelas do Ouro

Preto são elementos relevantes na formação e qualificação do espeço urbano da cidade,

pois todas apresentam características similares em relação ao sítio, à paisagem à estrutura

urbana”...

O artigo não pretende colocar um ponto final ou uma definição final na discussão sobre a

presença da Igreja, mas sim iniciar um debate a respeito.

2. Contextualização século 16

Para iniciarmos o entendimento do de aconteceu no Brasil é de grande importância que entendamos

o contexto europeu no período, século 16.

Foi no Renascimento que se iniciaram as expansões ultramarinas e no fervor religioso da

Contra Reforma que deu início ao Barroco. Essas expansões encontraram um vasto

território para as realizações urbanísticas, sociais e religiosas. Isso se justifica pelo fato da

Europa já se encontrar com uma mancha urbana muito consolidada, criada ainda na Idade

Média, sendo apenas modificadas em parte para atender às necessidades da sociedade.

Nas Américas poderia se começar do zero.

A Europa passava por profundas transformações politico religiosas. Dentro dessas

transformações, a Reforma Protestante iniciada por Martin Lutero em 1517, divide o

continente em dois polos religiosos. De um lado a Santa Igreja Católica e de outro, os

Protestantes.

Foram três décadas de expressiva expansão do protestantismo, fazendo com que os

católicos, isso inclui e Santa Igreja e a nobreza, passassem a temer a perda de poderes, em

consequência da evasão de fieis.

Em 1545, o concílio de Trento, convocado pelo Papa Paulo III, teve como objetivo criar

mecanismos que impedissem a saída de fiéis e o arrebanhamento de outros. Surgindo aí,

uma nova fase da Igreja Católica, intitulada de Contra Reforma. Uma verdadeira jogada de

marketing para os dias de hoje. Dentre várias mudanças, temos novas propostas litúrgicas e

como consequência, novos edifícios religiosos com espaços destinados ao Novo e Velho

testamento.

Em 1500, ano do “descobrimento” do Brasil, a coroa portuguesa estava com Dom Manoel I,

O Venturoso, genro e rival dos Reis Católicos da Espanha. Sendo um homem muito

religioso, investiu uma boa parte da fortuna portuguesa na construção de mosteiros e

igrejas, assim como, o patrocínio da evangelização das novas colônias através dos

missionários católicos.

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3. As Missões Jesuítas

Com enormes dificuldades na ocupação do Brasil, no início do século 16 tais como, poucos

recursos financeiros, reduzido contingente de pessoas que estariam dispostas a vir para a

colônia, uma grande extensão territorial, e a evangelização do gentio a Coroa Portuguesa

acabou por fazer um acordo com a Igreja Católica para o processo de colonização. Assim, o

governo associa-se à Companhia de Jesus, que eram os preferidos da Coroa para a

evangelização, antes da Unificação Ibérica e sustentados pela Coroa, por ser integrante do

clero regular. Após a morte de D. Sebastião, sob a égide de Felipe II da Espanha, outras

ordens seculares começaram a se instalar na Colônia.

Chegando ao Brasil em 1549, os jesuítas, liderados por Manoel da Nóbrega, tiveram grande

importância na relação entre os portugueses e os nativos.

Ao mesmo tempo em que colaborava com o reino na evangelização, a Ordem Jesuíta

edificava seus conjuntos compostos por igreja e colégio, em algumas localidades, originava

núcleos de grande importância. Como podemos ver no mapa abaixo, entre os séculos 16 e

17, os jesuítas alcançaram praticamente toda a costa brasileira.

Figura 1. Ocupações Jesuítas. Fonte: Mendes, Francisco Roberval, 1949 – Arquitetura no Brasil: de

Cabral a D. João VI / Chico Mendes, Francisco Veríssimo, William Bittar. – Rio de Janeiro Novo

Milénio, 2009

Com o tempo a Ordem se tornou um problema para a Coroa. Oposições à escravatura, e

uma grande influência sobre as tribos do Sul da Colônia, chegando até mesmo, a fundar

uma liga de cidades-estados, denominadas Missões, foram os motivos de sua expulsão da

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Colônia, por Marques de Pombal em 1759, que também proibira a presença de ordens

religiosas no interior, principalmente nas regiões de mineração.

Sendo as primeiras edificações na Colônia, as igrejas e colégios jesuítas, se destacaram

principalmente em sua localização. A escolha do sítio era, por muitas vezes definidas

usando critérios de segurança, contra as hostilidades encontradas, tanto por nativos como

por estrangeiros de outras nações europeias, como é o caso do Colégio jesuítico dos Reis

Magos em Nova Almeida, atual Serra no Espirito Santo (figura2).

Figura 2 (desenho do próprio autor).

4. Primeiras ocupações

As primeiras ocupações em território brasileiro foram os povoados de São Vicente ao sul,

Olinda ao Norte, e posteriormente Salvador, este, passando a ser sede do governo e

juntamente com o estabelecimento dos engenhos, marcou-se o progresso da colônia.

Antes de 1700, ou nos últimos cinco anos do século XVII, os arraiais nasciam

exclusivamente do trabalho dos aventureiros paulistas e baianos que se estabeleciam onde

existia a ocorrência do ouro. Como forma de estimular os descobertos, a coroa portuguesa

cedia as datas, 60 braças de frente por 30 de fundo e começavam a batear. O trabalho era

pesado, o clima rigoroso, a ausência de conforto total.

As dificuldades encontradas, foram muitas, entre elas podemos salientar a invasão

espanhola e holandesa, a dominação espanhola entre 1580 e 1640 em Portugal, e num

primeiro momento, a falta de recursos destinados à colônia.

Esses fatores, não impediram que a Igreja e os portugueses tomassem seu espaço junto às

terras conquistadas. Esses fatores causaram prejuízos à economia da Metrópole e foram

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significativos para a posterior utilização do Barroco como afirmação de glória e poder na

colônia. Se comparadas as construções barrocas que foram sendo difundidas na Europa,

durante o período do estilo em voga, as construções portuguesas se apresentam de forma

mais modesta e tímida.

A falta de autonomia do Vaticano em Portugal desfavoreceu ainda mais o desenvolvimento

de edificações de cunho religioso, ficando a cargo da coroa e das ordens religiosas

(jesuítas, carmelitas, dominicanos, franciscanos, entre outros) a continuidade das

construções de caráter religioso.

5. Organização das cidades da América Portuguesa

No Brasil Colônia, não existia uma regulamentação urbanística consolidada, apesar de

existir algumas normas para a organização das vilas medievais europeias.

Normalmente, se encontrava a igreja e o castelo em posições de destaque, muito por

questões de estratégia de defesa, e por outro lado, em vias sinuosas, os outros edifícios se

organizavam. Em alguns núcleos eram empregados as Leis das Índias, com a lógica das

ruas dispostas em quadras, que trazia uma influência romana. “Quando fizerem o plano do

lugar, distribuam em praças, ruas e parcelas, com cordão e régua, a partir da praça principal

em direção às entradas e caminhos principais, deixando território suficiente para o

crescimento da cidade.”

Na América espanhola essas determinações eram seguidas à risca, diferentemente do que

ocorria no Brasil. Muito em função do perfil dos colonizadores, que no caso da Espanha,

eram militares cumprindo ordens. E de Portugal, chegaram, camponeses, mercenários e

degredados.

Um dos elementos marcantes nos dois modelos de organização urbana foi a presença da

praça, que desde a ágora grega é um espaço inseparável do imaginário urbano. Local de

festas, quermesses, procissões, execuções, protestos e clamor popular.

Usados como elementos definidores de espaços a partir do século XVII, alguns modelos de

praças europeias, foram transpostos para o Brasil pombalino. E da mesma forma que os

engenheiros militares foram utilizados nos projetos das fortificações, foram também nas

remodelações urbanas, como o caso de Alpoim, que atuou no Rio de Janeiro, Vila Rica e

Mariana.

Vila Rica, atual Ouro Preto, possui uma praça central que conseguia sintetizar os aspectos

que simbolizavam esse espaço, com a presença da administração colonial da região. O

Palácio dos Governadores, misto de fortaleza e paço, projetado por Alpoim, ocupa a área

mais alta da praça. Do lado oposto, idealizada pelo governador Luiz da Cunha Menezes, a

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Casa de Câmara e Cadeia. Entre ambos, no centro do espaço publico, havia o pelourinho e

um chafariz.

Neste espaço, pela primeira vez a Coroa portuguesa revela seu caráter dominador, inclusive

em relação à igreja, que nesta praça desempenhava papel secundário, pois as duas

matrizes localizavam-se relativamente afastadas, nos núcleos dos antigos arraiais do Pilar e

Antônio Dias.

6. A Região das Minas

Em meados do século 16, exploradores portugueses já haviam chegado, às cabeceiras do

rio Jequitinhonha, na serra do Espinhaço, penetrando essa cadeia de montanhas, atingindo

a bacia do rio São Francisco. Encontraram ali, turmalinas que pensaram serem esmeraldas.

A esse período, pertence à lenda sobre a existência de uma cadeia de montanhas

rebrilhantes de metais preciosos, a serra do Sabarabuçu. Essa passou a exercer sobre os

primeiros exploradores do Brasil Central a mesma atração mágica.

Várias tentativas fracassadas na segunda metade do século XVI causou decepção e

desencorajou novas tentativas de descobrir esmeraldas e prata. Em busca de remediar a

falência econômica de Portugal, ocasionada por 40 anos de guerras com a Holanda e a

Espanha, em 1660, reiniciam-se as buscas por metais preciosos. Como a coroa não poderia

mais arcar com as expedições, ela confia essa tarefa aos exploradores brasileiros, os

paulistas.

Segundo Bury 2006, quando D. Afonso VI de Bragança escreveu aos paulistas para

conclamar sua ajuda, não poderia ter escolhido homens mais aptos para as explorações

propostas. Desde 1603, quando uma bandeira, ou seja, uma expedição em busca de

indígenas para escravizar, comandada por Nicolau Barreto, penetrou em Potosí, no vice-

reino espanhol do peru, os aventureiros paulistas vinham explorando os enormes sertões do

continente, atacando as aldeias dos missionários jesuítas pelo domínio das nações

indígenas do interior.

Os pontos culminantes da conquista das Minas se deram no Carmo, Ouro Preto e Sabará.

Desses pontos irradiou-se a ocupação do território. Ouro Preto foi o mais culminante deles,

cuja presença do Itacolomi representava o farol atraente e desejado dos bandeirantes

(Vasconcelos 1999). A região do Carmo fora descoberta por acaso, ou por engano,

acreditando-se ser Tripuí. Sabará, ou Sabará-buçu, não era desconhecida, tendo sido

conhecida por Borba Gato.

Logo a região estaria cheia de paulistas, como também de baianos reinóis, além de

brasileiros de todos os lugares. E nessa mistura, se fez a formação do povo da região das

Minas.

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Ninguém queria saber de outra atividade além da lavra. Fazendo da região extremamente

rica em metais preciosos, mas pobre em suprimentos. E adquirindo uma lei própria. “Como é

bem de se considerar aquela multidão entrou, invertendo a sociedade pela base, pois, visto

que o ouro não escolhia favoritos, criou mandões, que emergiram da ínfima camada,

perante os quais toda autoridade pública desapareceu para largar espaço a uma

demagogia, feroz e brutal.”(Vasconcelos 1999).

Aos poucos os comerciantes se enriquecem, já que os paulistas não se inclinavam ao

comércio e os reinóis assumem a maioria das catas. De certa forma, fazendo os paulistas

perderem poder na região das Minas.

6.1. As Vilas do Ouro

Durante o século XVII, a Capitania de Minas Gerais fundou 14 vilas e uma cidade. Segundo

Oliveira 2003, a fundações ocorreram em dois ciclos. Não ocorrendo regularidade na

formação das vilas no período setecentista.

No início do século XVII, ocorreu o primeiro ciclo, onde as vilas foram criadas em

consequência da corrida que os descobertos auríferos provocaram, juntamente com as

confusões causadas pelas disputas das lavras. O segundo ciclo ocorreu na ultima década

do século XVII.

Ainda segundo Oliveira 2003, sabe-se que as vilas fundadas no primeiro ciclo, por

demandas superiores, de “cima para baixo”, não sendo por solicitações locais, mas sim, por

ordem e desejo da Coroa. No caso do segundo ciclo, ocorreu o inverso, foram fundadas de

“baixo para cima”, ou seja, por meio de solicitações ao Rei, pelos locais.

Nos primeiros anos de ocupação da região das Minas, a presença da igreja esteve sempre

presente, inicialmente em pequenas ermidas, erguidas juntamente com os primeiros

arraiais. Surgia dessa forma, a capela, na maioria das vezes em taipa e sapé, planta

quadrada, cumeeira e duas águas, sem torres e janelas. Posteriormente, cuidavam de

construir uma capela maior, com o quadrado ampliado, altar-mor ao fundo e uma torre

lateral ou central. Em alguns casos a torre destacada do corpo da igreja como na de Padre

Faria, em Ouro Preto e na capela do “O” de Sabará, cuja sineira central é posterior. (Figura

3)

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Figura 3: Igreja do Ó, Sabará (desenho do próprio autor)

Nesse processo, vários arraiais foram se formando com estradas interligando-os, que

posteriormente se tornariam ruas. Conforme as figuras 4 e 5 abaixo nas cidades de Sabará e

São João Del Rei.

Essa ocupação se deu no sentido ascendente, do leito dos rios, onde aconteceu a primeira

extração do ouro de aluvião, e posteriormente subindo para as áreas mais inclinadas atrás

do ouro que começara a se esgotar no leio dos rios.

Figura 5: Inicio da formação urbana de Sabará.

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Figura 4: Inicio da formação urbana de São João Del Rei

No auge do período aurífero, com a descoberta do ouro em terras mineiras, e a formação

das classes sociais, as grandes igrejas matrizes também se dissiparam nos centros urbanos

que cresciam rapidamente, como Mariana, Ouro Preto, São João Del Rei, Sabará, dentre

outros. Transformando a organização do território mais uma vez. Em função desses novos

edifícios representantes do poder.

Esses centros auríferos se transformaram em cidades compostas por uma sociedade

heterogênea, por volta de 1760, com sua igreja matriz. Essas surgem em centros urbanos

com uma estabilização já garantida.

7. A presença da Igreja

O papa Júlio III transfere para o rei de Portugal, Dom João III, em 1551, toda a competência

em relação à colônia, fazendo parte dessas, a nomeação de bispos, e o recebimento e

autorização de contribuições e despesas referentes à igreja.

A partir dai as ordens religiosas se estabelecem no litoral do Brasil, sendo os jesuítas os

primeiros a chegarem, como já foi mencionado. Até o final do século XVI, todas as ordens

religiosas que precederam os jesuítas, beneditinos, carmelitas e franciscanos, e os próprios

já estavam situados, e já haviam dado início às construções religiosas. É importante

lembrar, que as ordens religiosas atuavam de preferencia nas colônias, que eram locais de

possíveis expansões. Além das ordens religiosas, ordens terceiras, confrarias e irmandades,

ou seja, organizações religiosas laicas, também se estabeleceram junto aos povoados.

O estado Absolutista português era ligado à igreja e esta polarizava a vida social na colônia

desde os primeiros anos. Assim que surgia um arruado e os simples aglomerado de

casebres, cuidava-se da igrejinha. Em geral, o próprio descobridor da região encarregava-se

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da construção dessas capelas iniciais, pois a coroa portuguesa absorvia as rendas, mas não

queria investir. De acordo com a concepção da coroa portuguesa, administrar significava

espoliar.

8. As Ordens Terceiras

Em Minas Gerais, a inexistência de ordens religiosas e congregações caracterizou o

desenvolvimento da arquitetura religiosa pela formação de grupos, que geraram

irmandades, confrarias e ordens terceiras. Segundo Sylvio de Vasconcellos (2004), na

sociedade urbana mineira, faz-se a distinção de duas fases da civilização que formaram a

arquitetura mineira. A primeira foi de influência dos imigrantes, que estavam se acomodando

na região; e a segunda seria a expansão dos naturais da região.

As Ordens terceiras, irmandades e confrarias, eram instituições compostas por leigos que

participavam da vida religiosa, em busca de cultuar seus santos, tantos homens como

mulheres, de todas as camadas da sociedade se agrupavam nessas irmandades,

oferecendo serviços de ajuda aos seus membros e aos desvalidos. Como descreve Boschi

(1986):

As irmandades ofereceram para a Igreja uma dupla vantagem: foram simultaneamente gestoras e sedes de devoção, além de serem eficientes instrumentos de sustentação material do culto (...) substituíram o papel precípuo do clero, como agentes e intermediarias da religião. No segundo momento, arcando com os onerosos encargos dos ofícios religiosos, eximiram esse mesmo clero de combater a instituição do Padroado régio (..) além de aliviar o Estado do compromisso de aplicação dos dízimos eclesiásticos recolhidos na implementação do culto religioso, os irmão leigos acabaram por absorver a responsabilidade dos serviços de toda a população colonial .

O século XVII não apresentou edificações com grande significado nem das Ordens

Seculares e nem das Terceiras. Estas ocupavam capelas inseridas no corpo das igrejas

primeiras ou segundas, optando pela construção de edifícios próprios e independentes do

conjunto principal somente depois da valoração das cidades, principalmente após o ciclo do

ouro. E transformando a paisagem. E perspectivas. Conforme figura abaixo.

As irmandades religiosas foram estimuladas desde os primeiros anos, pela Coroa, com o

objetivo de transferir para o povo as despesas da construção de templos, e hospitais. Tais

irmandades promoveram a construção de matrizes e capelas, por toda Minas Gerais. Sendo

assim, diferentemente do que aconteceu no litoral, as igrejas não foram construídas por

grandes ordens religiosas.

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No final do ciclo do ouro, ocorre o declínio das ordens terceiras e suas capelas, ocasionando

o retorno da população às matrizes. Algumas capelas, foram construídas já no período de

decadência como a de São Francisco de Paula em Ouro Preto.

9. Conclusão

Pode-se perceber que a Igreja esteve em todos os momentos da colonização brasileira

desde os primórdios.

Fato aliado ao momento vivido na Europa com a Contra Reforma aliada aos governos

absolutistas na Península Ibérica, fizeram com que a Igreja se transformasse em um

importante instrumento de ocupação do território.

Inicialmente transformou e marcou a paisagem no litoral com construções ao mesmo tempo

de caráter religioso e militar, ocupando pontos estratégicos na orla.

Posteriormente tivemos complexos núcleos urbanos erguidos pelos jesuítas (as Missões),

um pouco precários tecnologicamente, mas de uma complexidade organizacional importante

para a formação do território. Os conventos, mosteiros e colégios erguidos, principalmente

nas cidades litorâneas marcaram também de forma significativa a paisagem reforçando o

poder e a parceria Coroa/Igreja, em terras brasileiras.

Por fim, a Igreja se fez presente na expansão para o interior do Brasil, desde oratórios,

carregados pelos bandeirantes, passando a capelas inseridas no corpo das casas

bandeiristas, até se fixaram nos primeiros núcleos urbanos no interior. Impulsionados pela

descoberta de ouro, mais precisamente em Minas Gerais.

Passando a representar todo o esplendor do barroco, causando espanto tanto em quem

circulava pelas vilas como que adentrava nas edificações.

Além das visadas e os espaços criados na inserção dos edifícios, as cidades foram se

organizando em função das irmandades, nas cidades do ciclo do ouro. Cada núcleo/arraial

que surgia, erguia-se uma capela, posteriormente essas capelas cresceram em função da

necessidade de ampliações, já que a quantidade de imigrantes que chegavam às terras

mineiras não parava de crescer. Esses arraiais se interligaram formando vilas e

posteriormente cidades. A religião tinha papel importante na aglutinação das pessoas, com

missas, procissões, festas, e os sinos, que com seu badalar anunciavam desde casamentos

até falecimentos.

O governo nem sempre dedicava-se às melhorias urbanas, cabendo à população e nesse

caso, os ordens religiosas e confrarias, boa parte dos serviços públicos.

Conforme descrito por Righi (2012):

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“As igrejas e capelas de Ouro Preto são elementos relevantes na formação e qualificação do

espaço urbano da cidade pois todas apresentam características similares em relação ao

sítio, à paisagem, e à estrutura urbana. Essas características são:

Em geral, estão em posição dominante na paisagem (figura 5 e 6), formando esplanadas, a

cavaleiro, no divisor de águas; localizam-se na Rua Direita, ou no máximo próximas, ligadas

por travessas; abrigam equipamentos públicos essenciais à vida urbana, tais como

chafarizes e cemitérios; quando no tecido urbano, com pouco destaque, formam conjuntos

urbanísticos sofisticados e articulados, definindo praças e largos”. Como ilustra a figura 7. A

igreja de São Francisco de Assis em ouro Preto e seu largo à frente. E a perspectiva criada

pela Igreja do Pilar, também em Ouro Preto (figura 8)

Sendo assim, podemos verificar que Igreja foi um dos principais agentes conformadores do

território brasileiro.

Figura 5: Capela de Santa Rita – Serro/MG (Desenho do próprio autor)

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Figura 6: Matriz de Santo Antônio – Tiradentes/MG (Desenho do próprio autor)

Figura 7: Igreja de São Francisco de Assis – Ouro Preto/MG (Desenho do próprio autor)

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Figura 8: Desenho do próprio autor

10. Bibliografia

BOSCHI, Caio César. Os Leigos e o Poder. Irmandades Leigas e Política colonizadora em

Minas Gerais. São Paulo: Ática, 1986, p. 93.

BURY, John. A arquitetura e a arte do Brasil colonial. In: Arquitetura e Arte no

Brasil Colonial. São Paulo: Nobel, 1991ª

VASCONCELLOS, Sylvio de. Sylvio de Vasconcellos: arquitetura, arte e cidade; textos

reunidos. Organização de Celina Borges de Lemos. Belo Horizonte: BDMG Cultural, 2004.

p119.

OLIVEIRA, Myriam Andrade Ribeiro de. O Rococó religioso no Brasil e seus antecedentes

europeus. São Paulo: Cosac e Naify, 2003. 343p.

LOBO e JÚNIOR, Manuel Leal da Costa e José Geraldo Simôes (org) . Urbanismo de Colina: Uma

tradição luso-brasileira. Cap 5: As Colinas de Vila Rica de Ouro Preto

MENDES, Francisco Roberval, 1949 – Arquitetura no Brasil: de Cabral a D. João VI / Chico

Mendes, Francisco Veríssimo, William Bittar. – Rio de Janeiro Novo Milénio, 2009.