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Preço € 1,00. Número atrasado € 2,00 L’O S S E RVATORE ROMANO EDIÇÃO SEMANAL Unicuique suum EM PORTUGUÊS Non praevalebunt Ano XLIX, número 29 (2.525) Cidade do Vaticano quinta-feira 19 de julho de 2018 y(7HB5G3*QLTKKS( +{!z!/!$!;! Francisco explicou que o evangelizador não é um empresário O estilo do missionário Plenária da Amecea Em África é preciso sanar as divisões étnicas e tribais PROTASE RUGAMBWA NA PÁGINA 6 Entre tecnologias novas e tradicionais PAOLO RUFFINI NA PÁGINA 7 A sociedade diante da morte Espelho de uma cultura LUCETTA SCARAFFIA NA PÁGINA 8 Congresso continental Por uma sociedade mais justa e solidária «Os mensageiros do reino de Deus não são «empresários omnipotentes» nem «funcionários rigorosos» e mui- to menos «estrelas em tournée», porque o «Mestre os quer livres e li- geiros, sem apoios nem favores, for- talecidos unicamente pela sua pala- vra», como “peregrinos” que dis- põem apenas «do cajado e das san- dálias». Eis o perfil do missionário delineado pelo Papa no Angelus re- citado ao meio-dia de domingo, 15 de julho, com quinze mil fiéis pre- sentes na praça de São Pedro. Antes da prece mariana o Pontífice comen- tou o Evangelho do dia (Marcos 6, 7-13) que «narra o momento em que Jesus envia os Doze em missão». O Papa indicou neles uma espécie de «estilo do missionário», frisando em particular que «nenhum cristão anuncia o Evangelho “por conta própria”» e indicando o exemplo de alguns santos da diocese de Roma como Filipe Neri, Bento José Labre, Aleixo, Ludovica Albertoni, Francis- ca Romana e Gaspar del Bufalo». «Não eram funcionários nem empre- sários — observou — mas humildes trabalhadores do Reino». No mesmo dia o Santo Padre enviou uma men- sagem vídeo aos jovens das Antilhas reunidos na assembleia trienal orga- nizada pela Conferência episcopal. PÁGINAS 2 E 12 Será Puerto Rico, em 2023, a sede do próximo Congresso missionário americano (Cam). O anúncio foi dado no sábado, 14 de julho, durante a missa conclusiva da quinta edição, realizada na Bolívia, em Santa Cruz de la Sierra. Ao esperar as conclusões oficiais, os congressis- tas elaboraram um esboço que sintetiza o método de trabalho seguido e concretas propostas opera- cionais para «uma conversão missionária da Igre- ja na América»: com o objetivo de «promover mudanças nas atividades e nas estruturas eclesiais a fim de que esta Igreja “em saída” responda fiel- mente a Deus na sua missão aberta ad gentes,e sobretudo aos pobres e aos descartados». PÁGINA 5

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Page 1: Preço € 1,00. Número atrasado € 2,00 OL’ S S E RVATOR E … · «Os mensageiros do reino de Deus ... do um tablet, no dia 11 de feve-reiro, no final do Angelus do-minical

Preço € 1,00. Número atrasado € 2,00

L’O S S E RVATOR E ROMANOEDIÇÃO SEMANAL

Unicuique suum

EM PORTUGUÊSNon praevalebunt

Ano XLIX, número 29 (2.525) Cidade do Vaticano quinta-feira 19 de julho de 2018

y(7HB5G3*QLTKKS( +{!z!/!$!;!

Francisco explicou que o evangelizador não é um empresário

O estilo do missionário

Plenária da Amecea

Em África é preciso sanaras divisões étnicas e tribais

PR O TA S E RU G A M B WA NA PÁGINA 6

Entre tecnologiasnovas e tradicionais

PAOLO RUFFINI NA PÁGINA 7

A sociedade diante da morte

Espelho de uma cultura

LU C E T TA SCARAFFIA NA PÁGINA 8

Congresso continental

Por uma sociedade mais justa e solidária

«Os mensageiros do reino de Deusnão são «empresários omnipotentes»nem «funcionários rigorosos» e mui-to menos «estrelas em tournée»,porque o «Mestre os quer livres e li-geiros, sem apoios nem favores, for-talecidos unicamente pela sua pala-vra», como “p eregrinos” que dis-põem apenas «do cajado e das san-dálias». Eis o perfil do missionáriodelineado pelo Papa no Angelus re-citado ao meio-dia de domingo, 15de julho, com quinze mil fiéis pre-sentes na praça de São Pedro. Antesda prece mariana o Pontífice comen-

tou o Evangelho do dia (Ma rc o s 6,7-13) que «narra o momento em queJesus envia os Doze em missão». OPapa indicou neles uma espécie de«estilo do missionário», frisando emparticular que «nenhum cristãoanuncia o Evangelho “por conta

própria”» e indicando o exemplo dealguns santos da diocese de Romacomo Filipe Neri, Bento José Labre,Aleixo, Ludovica Albertoni, Francis-ca Romana e Gaspar del Bufalo».«Não eram funcionários nem empre-sários — observou — mas humildes

trabalhadores do Reino». No mesmodia o Santo Padre enviou uma men-sagem vídeo aos jovens das Antilhasreunidos na assembleia trienal orga-nizada pela Conferência episcopal.

PÁGINAS 2 E 12

Será Puerto Rico, em 2023, a sede do próximoCongresso missionário americano (Cam). Oanúncio foi dado no sábado, 14 de julho, durantea missa conclusiva da quinta edição, realizada naBolívia, em Santa Cruz de la Sierra.

Ao esperar as conclusões oficiais, os congressis-tas elaboraram um esboço que sintetiza o métodode trabalho seguido e concretas propostas opera-

cionais para «uma conversão missionária da Igre-ja na América»: com o objetivo de «promovermudanças nas atividades e nas estruturas eclesiaisa fim de que esta Igreja “em saída” responda fiel-mente a Deus na sua missão aberta ad gentes, esobretudo aos pobres e aos descartados».

PÁGINA 5

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página 2 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 19 de julho de 2018, número 29

L’OSSERVATORE ROMANOEDIÇÃO SEMANAL

Unicuique suumEM PORTUGUÊSNon praevalebunt

Cidade do Vaticanoed.p [email protected]

w w w. o s s e r v a t o re ro m a n o .v a

GI O VA N N I MARIA VIANd i re t o r

Giuseppe Fiorentinov i c e - d i re t o r

Redaçãovia del Pellegrino, 00120 Cidade do Vaticano

telefone +390669899420fax +390669883675

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ça para ir emfrente e reali-

zar a transfor-mação. E não

vos esqueçaisque o amor tem

força própria. Oamor nunca acaba.

São Paulo afirma: a fé e aesperança acabarão quando es-

Logótipo da assembleiada juventude das Antilhas

Bom dia!Saúdo-vos com afeto, a vós jo-vens, que desejais transformar afamília no Caribe. Um trabalhoimenso! Vê-se que tendes deter-minação e vontade de lutar. Ideem frente.

É um tema que vos desafia,sois jovens, mas pergunto-me:sois jovens ou jovens envelheci-dos? Porque se sois jovens enve-lhecidos nada podereis fazer. De-veis ser jovens “jovens”. Com to-da a força da juventude paratransformar. E a primeira coisaque deveis fazer é verificar se es-tais “acomo dados”. Não; se vosacomodastes, não está bem.Quantos de vós estais acomoda-dos, deveis desacomodar-vos ecomeçar a lutar. Quereis transfor-mar, desejais realizar e fizestesvossas as diretrizes da Exortaçãopós-sinodal sobre a família, paralevar em frente a família, a fimde transformar a família no Cari-be. Levá-la em frente hoje para ofuturo, isto é, do presente para ofuturo. E hoje, para compreen-der o presente, vós deveis saberdescrevê-la, compreendê-la paraenfrentar o amanhã. No cami-nho de hoje para o amanhã ten-des necessidade da doutrina so-bre a família, podeis encontrá-lano quarto capítulo da Exorta-ção: ali está o núcleo. Estudai-o.Lede-o e tereis os modelos parair em frente. Hoje e amanhã. Fi-ca-nos o ontem. Não podemosolhar para amanhã sem olharpara ontem. Não podemos ver ofuturo sem refletir sobre o passa-do. Preparai-vos para transfor-mar algo que vos foi doado pe-los vossos idosos. Recebestes ahistória de ontem, as tradiçõesde ontem. Tendes raízes e sobreisto gostaria de refletir um ins-tante: nada podeis fazer no pre-sente nem no futuro se não esti-verdes radicados no passado, navossa história, na vossa cultura,na vossa família; se não tiverdesas raízes bem plantadas. A forçapara ir em frente vem da raiz.Todos nós, e vós, não fomos fa-bricados em laboratório, temosuma história, raízes e o que fa-zemos, os frutos que damos, a

tivermos com o Senhor, mas oamor continuará com o Senhor(cf. 1 Cor 13, 13). Estais a trans-formar algo que é para toda aeternidade. A força própria quepermanecerá para sempre. Quelinda obra iniciastes! Ide emfrente. Que Deus vos abençoe,rezo por vós e, por favor, nãovos esqueçais de rezar por mim.Até à vista!

Publicamos o texto da transcrição da mensagemvídeo que o Papa Francisco enviou a 15 de julho aos participantesna assembleia trienal dos jovens, organizada pela Conferênciaepiscopal das Antilhas, que decorre de 10 a 23 do mês corrente naarquidiocese de Fort-de-France, na Martinica. Nesta ocasião, o SantoPadre exortou os jovens a desacomodar-se para começar a lutar.

beleza que podemos criar de-pois, provêm destas raízes.

Um poeta concluiu um seulindo poema com este verso:«Eu sei da árvore que a belezado florido sobrevive do que vivesepultado!». Olhai para trás, in-clusive para ter raízes, olhai pa-ra os vossos avós, para os vossosidosos e falai com eles, aprendeitudo isto e levai-o em frente.

Mudando, mas ali tereis as raí-zes, a força para transformar afamília. É uma tensão transfor-madora. Não se pode transfor-mar sem tensão.

Disse-vos que o núcleo daAmoris laetitia está no capítuloquatro. Como viver o amor. Co-mo viver o amor da família. Falaientre vós sobre o capítulo qua-tro. Nele encontrareis muita for-

O Papa Francisco foi o primei-ro a inscrever-se online — usan-do um tablet, no dia 11 de feve-reiro, no final do Angelus do-minical — como peregrino emvista da Jornada mundial dajuventude no Panamá. Agorachegou a confirmação oficialdas datas da sua viagem aopaís centro-americano que, aconvite do governo e dos bis-pos locais, o Pontífice visitaráde 23 a 27 de janeiro de 2019.

Ao marcar idealmente o bi-lhete para a América Central,no momento da inscriçãoFrancisco convidou «todos osjovens do mundo a viver comfé e entusiasmo este evento degraça e fraternidade» nas dio-ceses, sobretudo participandodiretamente na JMJ, que terá

início um dia antes da suachegada. E eles, como sempre,estão a responder com entu-siasmo: até agora os peregri-nos inscritos são 180.000. Asexpetativas, como foi eviden-ciado no recente encontro pre-paratório internacional realiza-do na capital panamense, sãode cerca de 300.000 inscriçõesque depois, como geralmenteacontece, se traduzem em pre-senças efetivas duas ou três ve-zes superiores.

Entretanto, nos dias passa-dos foi lançado o vídeo inter-nacional do hino oficial da tri-gésima quarta JMJ. Compostopor Abdiel Jiménez e realiza-do em cinco línguas (portu-guês, espanhol, inglês, francêse italiano), exprime os ritmos

caraterísti-cos da culturalocal, com títuloinspirado no trecho do Ma g n i -ficat, escolhido como lema daJornada: «Faça-se em mim se-gundo a tua palavra». Foiapresentado a milhares de pes-soas no centro Atlapa durantea tradicional “Ceia de pão evinho”, organizada para anga-riar fundos a favor do seminá-rio São José.

Para o dia mundial da juventude

Em janeiro o Papa irá ao Panamá

Transformar as famíliasMensagem vídeo do Pontífice aos jovens das Antilhas

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número 29, quinta-feira 19 de julho de 2018 L’OSSERVATORE ROMANO página 3

Os verdadeiros protagonistasA presença juvenil na Igreja

ENZO BIANCHI

Existem dois aspetos fun-damentais relacionadoscom o próximo Sínododos bispos, dedicado aos

jovens e ao discernimento, que pa-recem ser omitidos em muitas dasnossas análises, talvez por causade uma excessiva simplificação datemática. Antes de tudo, o factode se tratar de um Sínodo daIgreja católica, presente nos cincocontinentes, e não de uma assem-bleia limitada unicamente à Itáliaou à Europa e aos países de antigacristandade. Isto significa que nãose pode descuidar que as Igrejasonde a presença juvenil é mais es-cassa são também aquelas de tra-dição mais antiga, e que as Igrejasmais jovens por época de funda-ção são também aquelas onde osjovens por idade são mais numero-sos, em sintonia com a idade mé-dia da sociedade circunstante. Istocomporta, entre outras coisas, quea transmissão da sabedoria ligadaà antiguidade ocorre com maiordificuldade quando não se favore-cem os intercâmbios e os contac-tos entre Igrejas de países e re-giões não homogéneos: teremos,por um lado, Igrejas peritas quefalam a idosos e têm dificuldadede encontrar linguagens para asnovas gerações e, por outro, Igre-jas com raízes ainda frágeis, àsquais faltam referências e interlo-cutores que tenham valorizado sé-culos de confronto com sociedadescada vez menos “cristãs”. A estadiferença de faixa etária das váriasIgrejas acrescenta-se àquelas liga-das às caraterísticas étnicas, cultu-rais, económicas e sociais que dis-tinguem as sociedades em cujo in-terior a Igreja se põe como instân-cia significativa de uma “d i f e re n ç acristã” radicada no Evangelho.

O segundo dado é que o “obje-to” — e, de certa forma compatí-vel com a própria natureza de umSínodo dos bispos, o “sujeito” —das reflexões é a juventude pre-sente ou ausente nas nossas co-munidades eclesiais. Com dema-siada frequência damos por certaesta “inclusividade”, mas quemtem um mínimo de experiênciadireta do mundo juvenil está per-feitamente consciente daquilo queas pesquisas sociológicas mais sé-rias assinalam regularmente: exis-tem diferenças significativas noscomportamentos e na linguagem,ligadas inclusive ao género.

Tendo estas duas observaçõespreliminares como pano de fundocrítico e focando a reflexão sobreo mundo italiano e europeu, quemais frequento, é preciso ressaltarque na história nunca houve umaatenção tão acentuada à chamadapastoral juvenil como nas décadaspassadas; mas infelizmente esteesforço não foi suficiente, tam-bém porque se continuou a pen-sar numa relação exterior, por umlado, entre a Igreja e, por outro,

os jovens. Não basta ouvir os jo-vens, e muito menos enjaulá-losem estereótipos que fazem deles“o futuro da Igreja” ou “as senti-nelas do porvir”; ao contrário, épreciso considerá-los e ouvi-losnão como uma categoria teológi-ca, nem como uma entidade ex-terna à qual a Igreja se dirige,mas como um componente daIgreja de hoje, atores e protago-nistas já agora; é necessário pen-sá-los no “nós” da Igreja.

O documento preparatório pa-ra o Sínodo chama os jovens e asjovens a «ser protagonistas» (III,1) e «capazes de criar novas opor-

zado nem massificador, mas comatitudes e palavras capazes de res-peitar e despertar a especificidadede cada um: os jovens têm sedede encontros pessoais, diálogos di-retos, sobretudo no nosso contex-to social dominado pelo virtual, epedem silenciosamente, sem con-seguir expressar-se de modo com-pleto, para ser “re c o n h e c i d o s ”, ca-da um e cada uma ao longo dopróprio caminho de busca de sen-tido e plenitude de vida.

Para os adultos, isto significamudar o olhar sobre os jovens,aceitar pôr em questão as pró-prias aquisições, aceitar que nem

pelos jovens: encontro gratuito edisponibilidade a caminhar juntospermanecem urgências absolutasnum novo paradigma de evangeli-zação na sociedade atual.

A minha experiência de escuta,encontro e caminho com tantosjovens — muito diferentes por cul-turas e atitudes em relação à inte-rioridade, à espiritualidade, à reli-gião e à Igreja — convence-me ca-da vez mais que quando eles che-gam a conhecer a vida de Jesus,ficam fascinados e sensibilizadospor ela. A vida de Jesus como vi-da boa, na qual Ele “praticou ob em”, ou seja, escolheu o amor, a

tunidades» (I, 3), indicando assimà Igreja inteira caminhos de evan-gelização e novos estilos de vida.Só uma escuta recíproca, um con-fronto, um diálogo entre todos oscomponentes do povo de Deus,de qualquer idade e de ambos ossexos, podem desencadear umprocesso de “inclusividade” dasnovas gerações na Igreja. Eis odesafio do próximo Sínodo. E avontade do Papa Francisco de ofazer preceder por encontros nosquais os jovens possam tomar apalavra e sentir-se partícipes da“conversão” exigida de toda aIgreja lançou premissas favoráveisà passagem de uma pastoral “paraos jovens”, para uma pastoral“com os jovens”.

Usando uma expressão queridaao Papa Francisco, trata-se de«iniciar processos», não de con-quistar, nem de «fazer retornar»os jovens à Igreja, ou de medir oêxito segundo o número de res-postas obtidas. É necessária “umaIgreja em saída”, capaz de se uniraos jovens que já a frequentam,para ir onde se encontram os seuscoetâneos, onde eles moram, vi-vem, sofrem e esperam. É precisoalcançá-los de modo não generali-

sempre se consegue entendê-los e,todavia, renovar sempre a con-fiança neles, olhando para os jo-vens como para “histórias extre-mamente pessoais” e sustentandoa sua busca cansativa de uma vi-da boa.

Nesta forma de pastoral “com”os jovens, além da cultura do en-contro deve sobressair também ada gratuitidade. Com efeito, se «aIgreja não cresce por proselitis-mo, mas por atração» (Evangeliigaudium, 14), é necessário vivercada atitude de evangelização sobo sinal da gratuitidade, sem o an-seio de resultados em termos nu-méricos de jovens comprometi-dos, vocações suscitadas ou servi-ços assumidos.

O encontro que se deve favore-cer é o humaníssimo, no qual sejagratuitamente possível entrar emrelação com Jesus através da fé edo testemunho do evangelizador.Portanto, não o encontro comuma doutrina, e muito menoscom uma grande ideia nem comuma moral, mas com uma realida-de viva que atraia, seja portadorade sentido e promessa de vidaplena. A gratuitidade é um dosvalores mais sentidos e vividos

proximidade, o relacionamentonunca excludente, o cuidado dopróximo e sobretudo dos necessi-tados, é vida não apenas exem-plar, mas capaz de fascinar e derevelar a possibilidade de uma“b ondade” que seria bom quefosse inspiradora para a própriavida. Mas há também uma atra-ção pela vida bela, levada por Je-sus: o seu nunca estar isolado, oseu viver numa comunidade, nu-ma rede de afetos, o seu viver aamizade, a sua relação com a na-tureza permanecem deveras elo-quentes. Por fim, há grande inte-resse pela sua vida próspera, nãono sentido de uma vida isenta dedificuldades, crises e contradições,mas próspera porque Jesus tinhauma razão pela qual valia a penadespender a vida, dar a vida até àmorte: esta é a sua alegria, a suaprosp eridade.

Os jovens não são insensíveis,nem refratários às importantesquestões da existência, mas dese-jam ser ajudados neste caminhopor adultos fiáveis, que saibamacompanhá-los sem pretensõesnem constrangimentos nas vere-das que levam à plenitude da vi-da e do amor.

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página 4 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 19 de julho de 2018, número 29

Encontros de formação no Peru e na Colômbia

Novas estratégias para tutelar os direitosdos povos da Amazónia

Rumo ao sínodo sobre a região pan-amazónica

Reconhecer o protagonismo dos indígenas

Projeto dos orionitas no Brasil

Acolhimento dos venezuelanos em fuga«Coração sem confins» é o título do no-vo projeto missionário lançado pela Pe-quena obra da divina providência no Bra-sil. Ele tem sede em Pacaraima, no Esta-do de Roraima, a poucos quilómetros dafronteira com a Venezuela, para respon-der precisamente às necessidades urgentesdas populações em fuga daquele país,atingido por uma tremenda crise econó-mica e forte instabilidade política e so-cial. Calcula-se que nos últimos dois anosda Venezuela fugiram para o estrangeirocerca de dois milhões de pessoas, a maio-ria para nações confinantes como a Co-lômbia e o Brasil.

A cidade de Pacaraima é a principalporta de acesso, via terrestre, ao Brasil pa-

ra os venezuelanos que buscam refúgiocontra uma situação terrível, agravada re-centemente por inundações causadas porfortes chuvas. Trata-se de acolher do pon-to de vista material e apoiar espiritual-mente uma verdadeira torrente de ho-mens, mulheres e crianças que têm neces-sidade de tudo e às vezes chegam a Paca-raima depois de quase duzentos quilóme-tros de caminho, carregando as própriasmalas cheias de roupas, alimentos, remé-dios e muita esperança.

O projeto de ajuda será apoiado pelasprovíncias religiosas orionitas da AméricaLatina, com a coordenação da provínciado Norte do Brasil. À cidade — referiu aagência Fides — já chegou padre José Se-bastião Barros da Silveira, brasileiro, e da-qui a algumas semanas outro religiosoorionita, padre Miguel Alberto Fernández,argentino, chegará para trabalharem como pároco local, padre Jesús López Fernán-dez de Bobadilla, missionário espanhol fi-dei donum.

O grupo orionita, além de trabalharcom a comunidade na missão evangeliza-dora, terá também a tarefa de ajudarquantos estão a atravessar a fronteira, es-pecialmente os indígenas que fogem dafome, da falta de assistência médica, ecom frequência da marginalização social.

A nova missão nasceu depois do apelolançado pelo diretor-geral da Pequenaobra da divina providência, padre TarcísioGregório Vieira, para responder ao povovenezuelano como «filhos do grandeapóstolo da caridade, pai dos pobres ebenfeitor da humanidade sofredora eabandonada. Sentimo-nos interpelados —explicou padre Vieira — pela situação dra-mática do povo venezuelano que em gran-de número está a atravessar a fronteirabrasileira em busca de melhores condiçõesde vida. No confim entre as duas naçõesassiste-se a uma verdadeira emergênciapastoral e humana e por isso, de acordocom o bispo de Roraima, D. Mário Antô-nio da Silva, decidimos aceitar este novodesafio». Já nos meses passados, numanota pastoral, a CNBB solicitou que as au-toridades civis adotassem medidas apro-priadas a fim de gerir um fenómeno mi-gratório de dimensões tão amplas.

As populações indígenas da Amé-rica Latina aguardam com grandeesperança a assembleia especialdo sínodo dos bispos para a re-gião pan-amazónica, programadaem Roma no mês de outubro de2019. Eis quanto afirma o padreRobert Carrasco, sacerdote perua-no que nos últimos dias, junta-mente com o arcebispo de Huan-cayo, cardeal Pedro Ricardo Bar-reto Jimeno, acompanhou ao Va-ticano uma delegação de indíge-nas do rio Napo que participounos trabalhos da conferência in-ternacional «Saving our commonhome and the future of life on

earth», organizada pelo Dicasté-rio para a promoção do desenvol-vimento humano integral por oca-sião do terceiro aniversário da en-cíclica Laudato si’.

Carrasco — numa declaração aoSir — evidenciou «a importânciada presença dos representantes dospovos indígenas, não só prove-nientes da região pan-amazónica,mas também de outros países domundo»; eles «participaram comas suas propostas e tornaram-se osprotagonistas desta conferência».Nesta ótica, acrescentou, tambéma recente criação cardinalícia doarcebispo Barreto Jimeno (uma

das vozes que hoje na Igreja en-carna com maior decisão o temada defesa do meio ambiente comosolução para um desenvolvimentorespeitador dos povos indígenas)«significou para a Igreja na pan-Amazónia um sinal de esperançaem vista do sínodo que terá lugarem outubro de 2019». Opiniãocompartilhada também por Cris-tiano Morsolin, perito em direitoshumanos na América Latina, queexplicou à agência Sir que o PapaFrancisco está a falar com decisãode uma «mudança de paradigma»e isto «lança as bases inclusive pa-ra uma mudança que reconheça oprotagonismo dos povos indíge-nas». A questão ambiental esteveno centro também da última reu-nião do grupo de trabalho sobre

as mudanças climáticas do WorldCouncil of Churches realizada re-centemente em Buenos Aires, parase confrontar sobre a just transi-tion, ou seja, sobre as intervençõesde transição necessárias para pro-teger a biodiversidade e limitar asconsequências de uma exploraçãoinsensata do planeta. «A transiçãopara uma economia livre de com-bustíveis fósseis é um aspeto ur-gente», afirmou o pastor HenrikGrape, coordenador do grupo detrabalho, recordando que «numcontexto no qual quase um biliãode pessoas vive na pobreza e asdesigualdades socioeconómicascontinuam a crescer, é necessáriomover-se com ações categóricas etempestivas. Fazê-lo é uma ques-tão de justiça».

Concordar as estratégias oportunas para defenderos direitos dos povos indígenas em isolamento:com este objetivo a Rede eclesial pan-amazónica(Repam) promoveu, em Puerto Maldonado, noPeru, um encontro no qual participaram numero-sos delegados provenientes do Brasil e do Equa-dor, missionários católicos e leigos, pesquisadores edescendentes das populações indígenas. Duranteos trabalhos, os delegados procuraram partilharum diagnóstico da situação de cada povo, inclusi-ve as ameaças recebidas, e o quadro jurídico quedisciplina os seus direitos. Além disso, tentou-seindicar o método de trabalho para a obtenção e agestão das informações sobre os povos indígenas eas «propostas concretas para a defesa, a nível polí-tico, jurídico e académico, e a averiguar em quaisáreas e de que modo agir», como recita um comu-nicado.

O encontro em Puerto Maldonado, no sudesteperuano, foi organizado pela Comissão das popu-lações indígenas em isolamento voluntário, peloEixo dos povos indígenas da Repam, com o apoiodo vicariato apostólico de Puerto Maldonado,através da Cáritas.

Também na Colômbia, em Puerto Leguízamo,se realizou um encontro no qual participaram cercade sessenta animadores, animadoras e missionários

de trinta e seis comunidades indígenas da bacia dorio Putumayo para analisar a situação da sua esco-la de formação semestral. Um percurso formativocaraterizado por um pensamento e coração amazó-nicos, um diálogo que abrange três confins e é in-tercultural. De facto, os participantes provenientesdos vicariatos de San Miguel de Sucumbíos(Equador), San José del Amazonas (Peru) e PuertoLeguízamo — Solano (Colômbia), encontraram-separa refletir sobre os temas da família, da comuni-dade e da liderança, evidenciando a preocupaçãoda Igreja que será expressa no sínodo especial paraa Amazónia convocado para outubro de 2019 noVaticano. Nos últimos três anos — referiu a agênciaFides — os participantes na escola de formação rea-lizaram um percurso conjunto das comunidadesindígenas, estimulando a preparação de um oudois animadores a fim de acompanhar a experiên-cia de fé e os processos de vida comunitária. A res-peito disto, D. Joaquín Humberto Pinzón Güiza,vigário apostólico de Puerto Leguízamo — Solano,definiu o itinerário traçado pelos animadores, ani-madoras e missionários para formar os líderes lo-cais como «um percurso de crescimento» que for-taleceu a sua fé, adquirindo «os instrumentos ne-cessários para exercer a própria liderança nas co-munidades».

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número 29, quinta-feira 19 de julho de 2018 L’OSSERVATORE ROMANO página 5

O enviado do Papa à Bolívia para o Cam5

Por uma sociedade mais justa e solidária

Alegria do anúncio

«Unidade, solidariedade e paz» (mural realizado na embaixada da Bolívia em C a ra c a s )

«O Senhor nos faça evangelizadores e missionários jubilosos e entusiastas delevar o seu nome às periferias do mundo atual e ao serviço de uma sociedademais justa, solidária e fraterna», auspiciou o enviado especial do PapaFrancisco à Bolívia, para o quinto congresso missionário americano (CAM

5), presidindo ao ato inaugural na manhã de 11 de julho, em Santa Cruz dela Sierra. A seguir, publicamos quase na íntegra o discurso proferido pelocardeal prefeito da Congregação para a evangelização dos povos.

CO N T I N UA NA PÁGINA 11

FERNAND O FILONI

Este congresso liga-seao celebrado em Mara-caibo e aos preceden-tes, que representametapas significativas docompromisso missioná-rio neste grande Conti-nente. Por sua vez, elesfazem parte do projetomissionário de Cristo,que primeiro enviou osseus discípulos a pre-parar-lhe o caminhonos povoados aosquais estava prestes air, e depois ampliou ocampo, enviando-os aomundo inteiro paraanunciar a Boa Novado Evangelho e parabatizar todos os povos,no sinal e no nome daTrindade. Não pode-mos deixar de pensarna esperança e conso-lação com que Jesus ti-nha convidado os seusdiscípulos a olhar parao novo e vasto hori-zonte da humanidade:«Eis que vos digo, le-vantai os vossos olhose vede os campos, por-

que já estão brancos para a ceifa»(Jo 4, 35). Deus tem um desígniotambém, e de modo especial, paraeste Continente americano aoqual, como pôde relevar com fre-quência João Paulo II, a Igrejadeu um grande impulso missioná-rio na segunda parte do miléniopassado.

Com efeito, na convocação destecongresso os organizadores escre-veram que «as Igrejas particularesdas Américas, desde a época deAparecida, se comprometeram namissão de anunciar a Boa Nova deJesus Cristo na realidade social que

desafia o nosso Continente, emresposta aos desafios destes temposmarcados por profundas e vertigi-nosas mudanças de alcance global,que comportam oportunidades,mas também impactos que descon-certam o nosso povo nos âmbitoscultural e religioso. Neste contexto,hoje a missão pede às nossas co-munidades que respondam comgenerosidade, criatividade e ardorà chamada constante e incessantedo Papa Francisco, a fim de cami-nhar rumo a um profundo proces-so de evangelização no nosso Con-tinente e no mundo».

São palavras que compartilhoplenamente e que terão um desen-volvimento não apenas durante es-te congresso, mas também na as-sembleia especial do Sínodo dosbispos para a região pan-amazóni-ca, em outubro de 2019, e que serácelebrado em coincidência com omês missionário extraordinário,através do qual o Pontífice tencio-na chamar a Igreja inteira — comoescreveu na carta que me enviouno dia 22 de outubro de 2017 — aum renovado compromisso e entu-siasmo missionário. Este mês mis-sionário extraordinário foi procla-mado pelo Papa na celebração docentenário da Carta Apostólica deBento X V, Maximum illud, com aqual desejava «requalificar evange-licamente» a obra missionária adgentes, «purificando-a de quaisquerincrustações coloniais» separando-a das «ambições nacionalistas e

expansionistas que tinham causa-do muitos desastres». Os frutosdeste impulso especial, dado àmissio ad gentes por Bento X V, fo-ram amplamente reconhecidos erecolhidos pelo Concílio VaticanoII, cujo decreto Ad gentes foi umacoluna de suporte e abriu o cami-nho para dois sucessivos e ines-quecíveis documentos, tambémeles pilares no grande e meritóriodesenvolvimento da missionarieda-de destas últimas décadas: a Exor-tação Apostólica Evangelii nuntian-di (1975), de Paulo VI, e a CartaEncíclica Redemptoris missio (1990),de João Paulo II.

Por fim, nos nossos dias temosmais um desenvolvimento, que é aExortação Apostólica do PapaFrancisco, Evangelii gaudium (Eg),onde o Santo Padre põe a Igrejainteira em estado permanente deevangelização. Portanto, este con-gresso é chamado a recolher tal vi-são do Papa, a fazê-la sua e aadaptá-la à rica variedade das si-tuações no Continente americano.Como muitos de nós sabemos, oPapa Francisco reconhece três âm-bitos de ação na obra de evangeli-zação, que já foram traçados numaPropositio (7) do Sínodo dos bis-pos de 2012, acerca da «Novaevangelização para a transmissãoda fé cristã»: o primeiro âmbito éo da pastoral que orienta para ocrescimento espiritual e moral doscrentes, a fim de que respondammelhor e com toda a sua vida aoamor de Deus; o segundo é o daspessoas batizadas que vivem asexigências do batismo, ou seja,que aparentemente já não experi-mentam a consolação da fé; e porfim o terceiro é o âmbito missio-nário ad gentes, isto é, daquelesque não conhecem Cristo e que orejeitaram (cf. Eg, n. 14). No seuconjunto, estes três âmbitos estãopresentes nas Américas e hoje re-presentam o máximo desafio paraa Igreja (cf. ibid., n. 15).

Gostaria de alertar contra umperigo em que caímos quando es-morecem o vigor do Evangelho eo entusiasmo da vocação missioná-ria, e quando nos deixamos levar

A exortação a todos os batizadospara que levem a alegria do Evan-gelho às periferias, aos marginali-zados e a quantos procuram o Se-nhor, foi dirigida pelo cardeal Fer-nando Filoni, prefeito da Congre-gação para a evangelização dospovos, no dia 9 de julho na suachegada à Bolívia como enviadoespecial do Papa Francisco à cele-bração do quinto Congresso ame-ricano missionário (CAM5), que te-ve lugar em Santa Cruz de la Sier-ra e se concluiu a 14 de julho.

Conferências, debates, trabalhosde grupo, fóruns, testemunhosmissionários e momentos de ora-

ção, no Colégio Dom Bosco, rit-maram os dias da Conferência queteve início oficialmente na tardede 10 de julho com a missa presi-dida pelo enviado papal no adroda catedral de Santa Cruz, e de-pois com a bênção da estátua docardeal Julio Terrazas (1936-2015),arcebispo de Santa Cruz de laSierra, durante muito tempo presi-dente da Conferência episcopal,que desejou imensamente este en-contro. O objetivo geral da reu-nião — que tem por lema «Améri-ca em missão, o Evangelho é ale-gria» — é fortalecer na Igreja donovo continente a identidade e o

compromisso para a missão adgentes, ao serviço de uma socieda-de mais justa, solidária e fraterna,com particular referência aos te-mas da profecia, reconciliação ecomunhão.

As origens dos Congressos mis-sionários americanos (CAM) re-montam aos congressos nacionaisdo México, especialmente ao séti-mo que se celebrou em Torreónem 1977. A presença do então pre-feito de Propaganda fide, o car-deal brasileiro Agnelo Rossi, e dedelegações de diversos países daAmérica Latina e do Caribe, àque-le evento deu um caráter continen-

tal, tornando-o o primeiro Con-gresso missionário Latino-Ameri-cano (COMLA1).

Nos últimos dias do CAM5 osparticipantes refletiram sobre dozetemáticas resultantes do trabalhopré-congressual, enquanto cincoassembleias foram dedicadas aaprofundar os temas apresentadosna sessão inaugural. Por fim qua-tro mesas-redondas trataram asnovas perspetivas da missiologia,sobre comunicação e missão, in-fância e adolescência missionária emissão e pastoral universitária.

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número 29, quinta-feira 19 de julho de 2018 L’OSSERVATORE ROMANO página 6/7

Em África é preciso sanaras divisões étnicas e tribais

Pela primeira vez em Adis Abeba

Entre tecnologiasnovas e tradicionais

Oscar Olufisayo Awokunle«Unidade na diversidade»

«Diversidade palpitante, igual dignidade,unidade pacífica em Deus na região»: eis o

tema da décima nona assembleia plenáriada Associação das conferências episcopais

da África oriental (Amecea), que decorreem Adis Abeba até 23 de julho. Por dezdias, os cem bispos das nove naçõesque aderem à Associação — E r i t re i a ,Etiópia, Quénia, Malawi, Sudão,Sudão do Sul, Tanzânia, Uganda eZâmbia — estão reunidos na capitaletíope, que pela primeira vez hospeda

os trabalhos. Nestas páginas publicamosamplos trechos do relatório proferido

pelo arcebispo secretário da Congregaçãopara a evangelização dos povos, na tarde de

15 de julho, e o texto integral da mensagemenviada aos participantes no congresso, pelo

prefeito do Dicastério para a comunicação.

PR O TA S E RU G A M B WA

Pediram-me para pronunciar umdiscurso sobre o tema: «Diversida-de palpitante, igual dignidade, uni-dade pacífica em Deus na regiãoda Amecea». Tendo em devidaconta os limites de tempo, assimcomo a principal solicitude daCongregação para a evangelizaçãodos povos, ou seja, a animaçãomissionária, limitar-me-ei a pôr emevidência alguns pontos em relaçãoao Dicastério que eu represento.

apostolado social sem se afastar dasua vocação e missão essenciais,que consistem em levar o Evange-lho ao mundo e orientar as pessoaspara Cristo, noutras palavras, evan-gelizar. Não obstante seja respon-sabilidade da esfera política criaruma ordem social justa, a Igreja —mesmo evitando a participação di-reta em manobras políticas que po-deriam comprometer a identidadeda sua missão — deve continuar adedicar-se plenamente à promoção

desafio de promover unidade, har-monia e paz, por minha vez desejochamar a vossa atenção para a «di-mensão ad intra» dessa mesmamissão, ou seja, o compromisso detornar as nossas Igrejas locais teste-munhas mais credíveis de unidade,harmonia e paz.

Antes de nos empenharmos naação social, devemos ter a certezade promover uma espiritualidadede comunhão e harmonia entre nósmesmos e no seio das instituiçõesdas nossas Igrejas locais.

A região da Amecea, como ou-tras partes da África, carateriza-sepor múltiplas diferenças entre osseus habitantes: diversidades decultura e costumes, de língua, per-tença étnica e tribal, de ritos litúr-gicos, orientação sociopolítica, eassim por diante. No entanto, nomeio de todas estas diferenças, aquestão mais sentida, e que muitasvezes é motivo de controvérsiasnalgumas áreas da região da Ame-cea, é a diversidade étnica. É tristedizer, mas todos vós bem sabeisque os conflitos étnicos dividiramnão apenas as nossas sociedades,mas também os nossos presbitérios,os nossos institutos religiosos e atéas nossas conferências episcopais.Estes conflitos causaram muito so-frimento e até escândalo públiconalgumas regiões do nosso conti-nente. Por isso hoje, mais do quenunca, a Igreja na África sente-sedesafiada pela responsabilidade es-pecífica de sanar estas divisões, co-meçando pela própria Igreja.

Há três anos, o Papa Franciscovisitou a África como peregrino dapaz e da reconciliação. Refiro-me àsua viagem apostólica ao Quénia,Uganda e República Centro-Afri-cana. Em muitas ocasiões ele faloude várias questões que ameaçam apaz, especialmente o problema dosconflitos étnicos e tribais. Portanto,devemos fazer com que a mensa-gem do Santo Padre continue aressoar e a dar fruto. Conservemosvivos e eficazes, tanto a visita doPapa à África, como também a suapreocupação e o seu amor pelonosso continente!

Devemos dar testemunho da ca-tolicidade que professamos e mani-festá-lo. Sem dúvida, uma Igrejaorientada etnicamente não seria ca-tólica.

Em vez de ser vista como umobstáculo para a coexistência pací-fica, a nossa diversidade deveria serreconhecida como positiva e, efeti-

vamente, como algo a ser preserva-do e aproveitado.

Com efeito, se Deus tivesse feitotodos os seres humanos idênticosdesde o princípio — iguais em tu-do, até ao último detalhe, sem ne-cessidades e todos com os mesmosdotes e capacidades — a sociedadehumana permaneceria um merofacto decorativo, sem significadonem importância. Poderíamos atéchegar a dizer que Deus fez comque houvesse diferenças, a fim deassegurar que os seres humanos se-jam impelidos — e que num certosentido lhes seja pedido — a contri-buir, cada qual segundo os pró-prios dons e capacidades, para oenriquecimento do próximo. Estasdiferenças deveriam encorajar acomplementaridade mútua.

No entanto, existem diferençasque não são desejadas por Deus,isto é, que se desenvolvem e seconsolidam no contexto do peca-do, tornando-se fonte de discrimi-nação entre seres humanos. Comefeito, em vez de se tornar fonte deoportunidades de enriquecimento,lesam e corroem a dignidade hu-mana. O verdadeiro cristão não po-de aceitá-las, uma vez que estão emaberta contradição com o Evange-lho.

Por conseguinte, à luz da fé cris-tã, o sentido último das diferençashumanas encontra-se no facto deque as pessoas podem trocar entresi os próprios dons recebidos deD eus.

Com a finalidade de permanecerancorados na missão própria daIgreja, é importante recordar, du-rante toda a nossa reflexão e deba-te, que o tema do presente encon-tro diz respeito à atividade evange-lizadora da Igreja no contexto dosdesafios que as Igrejas locais de-vem enfrentar na região da Ame-cea, neste caso derivantes de confli-tos, divisões, violência, violação dadignidade humana, entre outros.Enfrentar tais desafios e procurarsoluções adequadas é, sem dúvida,uma parte integrante do ministériode evangelização da Igreja. No en-tanto, vale a pena recordar que aIgreja deveria desempenhar o seu

dos direitos humanos, da justiça eda paz.

Um dos melhores modos paraincidir na vida social é a educaçãoe a formação de cristãos maduros,capazes de responder com eficáciaaos atuais desafios que a nossa re-gião deve enfrentar. A tal propósi-to, a Congregação para a evangeli-zação dos povos exprime grandeapreço pelo notável investimentona educação, realizado até agora naregião da Amecea, e encoraja-vos aestabelecer como objetivo horizon-tes novos e mais vastos.

Enquanto outros oradores prova-velmente enfrentarão aquela que eudefiniria a «dimensão ad extra» do

Através do seu magistério, aIgreja fixou progressivamente prin-cípios-chave para a arquitetura dapaz, princípios que devemos ter emmente durante as reflexões e os de-bates que faremos em seguida. Osfundamentos sobre os quais deveser construída a paz autêntica sãoo reconhecimento e a defesa dainerente e igual dignidade de todosos membros da família humana.

Os pilares que conferem solideze consistência ao edifício da pazsão quatro: verdade, justiça, amor eliberdade. Estes quatro pilares sãonecessários para uma sociedadebem organizada e constituem osvalores que devem estar presentesem qualquer sociedade verdadeira-mente pacífica.

A ideia que a Igreja tem da paci-ficação põe em relevo não somenteos fundamentos e os pilares, masinclusive alguns tijolos, que são asações e as medidas concretas queabrem o caminho para a paz. Umdestes tijolos da paz é a promoçãodo desenvolvimento humano inte-gral. O desenvolvimento e a pazsão interdependentes e fortalecem-se reciprocamente. Os desafios mo-dernos da pobreza, da fome, da en-fermidade e do analfabetismo, en-tre outros,são obstáculos para apaz e criam um terreno fértil parao conflito [...].

Também opor-se à corrida aosarmamentos é um importante tijoloda paz. Combater a pobreza, e não

os seres humanos, eis o caminhopara a paz autêntica.

Outro tijolo é o apoio às insti-tuições internacionais que promo-vem a paz. As organizações inter-governamentais (Oig), as organiza-ções não governamentais (Ong) eos organismos regionais (por exem-plo, a União africana) são institui-ções dotadas de um certo potencialpara promover vínculos globais eregionais de solidariedade, assimcomo para realizar uma ordemmundial que permita a paz.

Um último elemento que gosta-ria de indicar como tijolo para apaz é o perdão.

O tema do perdão faz parte inte-grante da ideia de pacificação quea Igreja tem.

Portanto, em síntese, pôr fim àcorrida aos armamentos para inves-tir num desenvolvimento que erra-dique a pobreza, fundar institui-ções globais para uma nova ordemmundial e infundir a força transfor-madora do perdão na vida socialsão três temas recorrentes, que oPapa continua a apresentar comocaminhos rumo à paz.

Paulo VI foi um dos Papas quemanifestou grande amor pela Áfri-ca. A sua canonização terá lugarpoucos meses antes do cinquente-nário do Secam, que ele mesmoinstituiu em 1969, em Kampala.Enquanto esperamos com trepida-ção estes dois acontecimentos, per-gunto-me se este encontro não éuma ocasião adequada para reler amensagem do Papa Paulo VI àIgreja na África. Um dos docu-mentos preciosos com os quais elemanifestou a sua preocupação pelaÁfrica é a sua Carta Apostólica de1967, Africae terrarum. Convidoutambém os africanos a encontrarnovos modos para se tornaremmissionários.

Portanto, a Igreja na região daAmecea deve renovar a consciênciade que o seu futuro já não depen-de de missionários, nem de agentesde desenvolvimento humano prove-nientes de outros continentes. Oporvir do nosso continente depen-de dos próprios africanos e daIgreja local, que é chamada a per-mear a sociedade inteira e a trans-formá-la, tornando-se com efeito«sal da terra» e «luz do mundo».A Igreja na África já deveria ser ca-paz de cuidar de si mesma, de ge-rir as possíveis crises e de impelir ocontinente rumo ao desenvolvimen-to. Inevitavelmente, isto requer umrenovado espírito de solidariedadee «a partilha de recursos e pessoasentre as Igrejas particulares» (Ec-clesia in Africa, 63). Por conseguin-te, exorto-vos a nunca deixar defortalecer a solidariedade em todaa região da Amecea e até fora dela.

Por fim, a meu ver, seria bomque vós revísseis a estrutura opera-cional e a eficácia desta Associação,voltando a definir o seu modus ope-randi, com a finalidade de garantirque ela ofereça o serviço almejado.

A 4 de maio de 2017, na sua mensa-gem à então Secretaria para a comunica-ção, durante a primeira assembleia ple-nária do Dicastério, o Papa Franciscodisse-nos que, considerando a nova cul-tura digital no mundo, os meios de co-municação digitais precisavam de se in-serir numa plataforma primária para di-fundir o Evangelho.

Não obstante a reforma dos meios decomunicação do Vaticano, na sua históri-ca mensagem de maio de 2017 o PapaFrancisco expressou também categorica-mente o seu desejo de prestar atenção ecuidado aos países com escasso acesso àsnovas tecnologias digitais. A reforma damídia do Vaticano não quer descuidarnem abandonar tais países, um númerosignificativo dos quais está na África. ARádio Vaticano continua a transmitir emnovas plataformas digitais, mas conservatambém as suas modalidades de trans-missão tradicionais, como as ondas cur-tas para os países que ainda precisamdeste serviço.

Assim como a Amecea, podeis contartambém com a colaboração constante doDicastério para a comunicação. No futu-ro, é desejável que possamos colaborarmais estreitamente para a realização doDia mundial das comunicações sociais,que celebra a mensagem do Santo Padre.Além de levar o anúncio do Evangelho ea voz do Santo Padre aos lares católicos,o Dicastério está determinado a anunciarao mundo notícias sobre a vivaz Igrejada África, em todos os seus sucessos,bênçãos mas também desafios e dor.

Por fim, não é maravilhoso que aAmecea se reúna em Adis Abeba nummomento em que a Eritreia e a Etiópiaestão a iniciar um processo de paz? OPapa Francisco resumiu tudo há duas se-manas, quando disse: «No meio de tan-tos conflitos, é necessário assinalar uma

PAOLO RUFFINI

Mesmo tendo sido nomeado há poucopelo Santo Padre prefeito do Dicastériopara a comunicação da Santa Sé, eu nãopodia perder esta ocasião da vossa im-portante assembleia.

Permiti que eu comece expressando,em nome do Dicastério para a comunica-ção da Santa Sé, como nos sentimos feli-zes por termos sido convidados para par-ticipar na XIX assembleia plenária dosmembros da Associação das Conferênciasepiscopais da África Oriental (Amecea).

Estou profundamente consciente deque, depois da Assembleia especial paraa África do Sínodo dos bispos de 1994,os países da Amecea investiram muitonas emissoras de rádio diocesanas. Esteinvestimento foi profético e prestou umótimo serviço à Igreja desta região. Aolongo dos anos, em colaboração com aRádio Vaticano, as vossas rádios diocesa-nas levaram não apenas o Evangelho,mas também a voz do Santo Padre amuitos lares católicos. Obrigado pelavossa coragem e pela vossa clarividência.

Apraz-me informar-vos que a reformada mídia do Vaticano, conduzida peloDicastério, começa a dar os seus frutos.Hoje podemos ver uma crescente inte-gração, colaboração e coesão entre osmeios de comunicação da Santa Sé queaté agora eram autónomos.

Por exemplo a Rádio Vaticano, queaté hoje interagiu com as vossas estaçõesde rádio na região da Amecea, foi inte-grada no Dicastério para a comunicação.Esta incorporação foi necessária, em par-te, devido à mudança do panoramamundial da mídia. O contexto que esta-mos a viver viu uma significativa conver-gência dos meios de comunicação digi-tais. Trata-se de uma realidade que aSanta Sé não pôde ignorar.

iniciativa que se podedefinir histórica, e pode-mos considerá-la umaboa notícia: nestes dias,depois de vinte anos, osgovernos da Etiópia e daEritreia voltaram a falarde paz. Possa tal encon-tro acender uma luz deesperança para estes doispaíses do Corno de Áfri-ca e para todo o conti-nente africano».

Embora eu não estejafisicamente presente con-vosco em Adis Abeba,permiti que conclua ga-rantindo-vos que o meuescritório está aberto sevierdes a Roma.

Finalmente, rezo afim de que a colabora-ção existente entre aAmecea e o Dicastériopara a comunicação daSanta Sé não só conti-nue, mas também sefortaleça.

Plenária da Amecea

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página 8 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 19 de julho de 2018, número 29

AT UA L I D A D E

Espelho de uma culturaA sociedade diante da morte

LU C E T TA SCARAFFIA

Como é difícil morrer na nossa socie-dade! Já estamos acostumados com ofacto de que há cada vez menos nas-

cimentos, de que a crescente esterilidade,acompanhada por um aumento da idadedas mulheres que tentam conceber um filho,tornou difícil a procriação. Para muitas mu-lheres ter um filho está a transformar-se nu-ma corrida de obstáculos, exige tratamentoshormonais, relações com horários determi-nados e, até mesmo, o recurso à engenhariaprocriativa. Entendemos que é difícil nascer,mas se prestarmos mais atenção e olharmosao nosso redor, para muitos — pelo menosnos chamados países avançados — tamb émse tornou difícil morrer. Isto é-nos reveladopor um sintoma evidente, que até agoranunca se tinha apresentado com tamanhaurgência e força: o pedido de eutanásia.

Não devemos pensar que se trata apenasde um desejo do ser humano, que se tornousoberbo a ponto de querer controlar cadaaspecto da sua vida, por conseguinte, até amorte, e tão-pouco que por trás do pedidode eutanásia haja sempre um desprezo pelosofrimento e pela fragilidade que podemocorrer em fases extremas — felizmente, ajustificação das «dores insuportáveis» já estáa ceder diante da afirmação dos cuidadospaliativos — não obstante estes aspectos es-tejam certamente presentes. Mas, em muitossentidos, o pedido de eutanásia é uma rea-ção — contudo errada — a uma experiênciacada vez mais generalizada: ou seja, viven-ciar como é difícil morrer para aqueles queestão hospitalizados — isto é, quase todos —por causa dos tratamentos dispensados commodalidades muito próximas da obstinaçãoterapêutica. Sem dúvida, são poucos aquelesque conseguem entender os problemas mé-dicos de maneira pormenorizada, mas todospercebem que há algo inatural nos calváriosterapêuticos, que acabam por desembocarnas longuíssimas agonias dos idosos interna-dos. E isto é suficiente para invocar um per-curso abreviado que conduz à morte, ou se-ja, a eutanásia, considerada e propagandea-da como uma passagem fácil e indolor.

E sob alguns pontos de vista eles estãocertos: perdeu-se o significado da morte nosentido mais profundo do termo, da mortecomo momento da verdade e da salvação deuma inteira vida humana, e então invoca-seapenas — como repetem as celebridades sub-metidas pelos jornais ao questionário deProust — uma morte no sono, inconsciente esem dor.

Exceto pelo facto de que a eutanásia, pordefinição, não é uma morte inconsciente, épossível até levantar dúvidas sobre a possi-bilidade que seja realmente indolor: comefeito, sabemos muito pouco acerca damorte e, ainda menos, sobre a morte infligi-da por outro. Além disso, um dado inquie-tante leva-nos a refletir sobre o facto deque o fármaco usado pelas várias Dignitas,ou clínicas suíças afins que praticam a euta-násia, é o mesmo utilizado nalguns Estadosdos Eua para executar a pena de morte.Neste segundo caso, muitos ativistas protes-taram afirmando que a substância não seriatão indolor... na Suíça, as pessoas pagam eficam caladas. Nas clínicas não há ativistascontra a pena de morte que controlam aexecução.

Mas para muitos, tudo isto parece, aindaassim, melhor do que a longa espera pela

dos e pacientes que dividiam o espólio ameias. Naturalmente, foi necessário adotarmedidas para evitar que estruturas, já emcrise económica crónica, sofressem estas he-morragias, e a solução foi identificada nosprotocolos terapêuticos. Para cada patolo-gia, para cada situação de hospitalização, éprevisto um protocolo, confirmado por es-pecialistas e idêntico para todos, que prote-ge o hospital dos riscos legais. Seguindo oprotocolo, tem-se a certeza de que não sepossibilitará qualquer contencioso legal.Portanto, os protocolos, sob este ponto devista, são uma bênção, e em muitos casostambém ajudam os médicos que talvez nãoestejam à altura da sua tarefa para escolhercom confiança as terapias adequadas. Porconseguinte, deste ponto de vista, desempe-nham uma função positiva.

Diann Blevins«O fim da vida»(2015)

Mas há também muitos aspectos negati-vos, que penalizam sobretudo os idosos. Defacto, as terapias previstas são as mesmaspara qualquer idade, e o modelo de pessoaescolhido é de um jovem que tem todas aschances de cura. Aplicar as mesmas terapiasa um nonagenário pode tornar-se um exem-plo de obstinação terapêutica. Não obstantetudo, quando alguém está no hospital, é ne-cessariamente obrigatório seguir o protocolopara se proteger contra as ações judiciais, edeste modo, se um nonagenário em fim devida, já imobilizado no leito, reclama quetem dor numa perna, embora cada desloca-mento lhe cause enjoo e vómito, é transpor-tado para outra unidade para fazer uma ra-diografia e verificar se tem algo quebrado.Caso tivesse, o que fariam eles ? Nada, além

As terapias previstas são as mesmas para qualqueridade, e o modelo de pessoa escolhido é de um jovemque tem todas as chances de cura.Aplicar as mesmas terapias a um nonagenário podetornar-se um exemplo de obstinação terapêutica

morte de pacientes submetidos aterapias que contribuem para osmanter vivos. Obviamente, todostêm as próprias razões e tudo seexplica. Não há ninguém quequeira por crueldade manter vi-vos seres humanos, frequente-mente muito idosos, que sofrem.É um sistema geral que, de certomodo, obriga todos a ter com-portamentos insensatos. D eve-mos lembrar que nos últimosanos, intercalados até entre osanúncios televisivos, multiplicavam-se as pu-blicidades de escritórios de advocacia queconvidavam os espectadores a intentar pro-cesso judicial pelos tratamentos recebidos econsiderados ineficazes, escritórios de advo-cacia que aceitavam empreender a ação judi-cial sem pedir uma caução, portanto, acessí-veis a todos. Bastava ter a ideia e o desejode os procurar. E muitos fizeram isto.

Dada a proverbial lentidão da justiça ita-liana e os seus mecanismos muitas vezesinexplicáveis, as administrações hospitalaresperceberam rapidamente que para elas eramais conveniente, contudo, pactuar, ou se-ja, pagar uma quantia contanto que se en-cerrasse o contencioso. Desta forma, as em-presas hospitalares perderam muito dinhei-ro, enquanto quem ganhava eram advoga-

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de lhe dar um sedativo, o que seria feito dequalquer maneira.

Aquela radiografia não só é dolorosa edesnecessária para o paciente, mas é tam-bém cara para o contribuinte, e os nossosserviços de saúde certamente não têm di-nheiro para esbanjar: constatamos isto aoobservar as longas filas de pessoas nas ma-cas do pronto-socorro aguardando em vãoum leito disponível nas unidades hospitala-res superlotadas, vemo-lo também no rostoexausto dos enfermeiros no final do turno,em número sempre inferior ao necessário.Mas é preciso fazer tal radiografia, para evi-tar contestações. Mesmo se, naquele caso es-pecífico, é evidente, não haveria impugna-ção: a regra — neste caso o protocolo — éigual para todos.

Certamente, há também exemplos opos-tos que nos colocam perante decisões impie-dosas: uma amiga minha holandesa contou-me que a sua mãe, com cerca de 85 anos, ti-nha quebrado o fémur e a assistência públi-ca não queria pagar a operação nem a pró-tese porque já não valia a pena. Mas nãopoderíamos pensar numa via intermédia debom senso, seguida pelos médicos tirandoproveito do seu sentido de responsabilida-de? Talvez apoiados por uma comissão ética

venosa, seria certo e apropriado. Mas obri-garia os médicos a admitir que a medicinanão é omnipotente e os parentes a não re-correr a um tribunal para protestar contra asuspensão de alguns tratamentos. Obrigariatodos nós a pensar na morte como se fosseuma eventualidade inevitável. Como é pos-sível enfrentar a morte num hospital ondepraticamente não há um capelão, onde a ca-pela se tornou a sala do silêncio que está fe-chada aos sábados e domingos, onde ummoribundo experimenta a sua agonia ao la-do de doentes vivazes, que gritam ao tele-móvel e recebem visitas sempre barulhentas,como se o grande mistério do fim não lhesdissesse respeito?

Uma conspiração da negação e do silên-cio estreita-se em volta do moribundo, que— como transparece do olhar assustado —gostaria de falar sobre o que o espera, doseu medo, talvez até mesmo pensar nas suasúltimas vontades que nem sequer se atreve arevelar, nesta torrente de esperanças exibi-das.

Neste caso não há diferença entre leigos ecrentes, diante da morte todos somos domi-nados pela angústia, precisamos de falar so-bre isto, mas parece impossível quebrar o ta-bu. São recebidos com exclamações de júbi-lo os últimos sinais ténues de interesse pelapolítica ou pelo desporto, pelos homens,pelos filhos e netos, pelas mulheres: ao mo-ribundo é pedido que recite o papel dodoente em processo de restabelecimento, senão quiser ser excluído do mundo ao seuredor, sejam eles familiares ou enfermeiros emédicos. Os moribundos devem guardar tu-

clusive faltaria um clima de privacidade pa-ra uma confissão.

Felizmente, em muitos casos, vê-se queexiste a graça, que Deus não presta atençãoàs circunstâncias terríveis nas quais o mori-bundo está imerso: a mesma pessoa que nanoite anterior parecia devastada pelo terror,pode transformar-se no dia seguinte numaimagem de paz, de mansidão para os ou-tros, que não conseguem explicar isto e,portanto, fingem que nada aconteceu. Aproximidade do mistério da morte pode en-sinar muitas coisas, sobre a morte e a vida, eé uma das ocasiões para compreender aação do Espírito. Mas somente se não esti-vermos demasiado ocupados a fechar osolhos, a cancelar tudo por medo.

Porque, sem dúvida, é o medo que domi-na os presentes, que paralisa: felizmente umtemor atravessado, de vez em quando, poruma ação de amor puro, mesmo por partede médicos e enfermeiros, e até por outrospacientes. É neste lugar de desespero que sevê com maior clareza a mão de Deus quepassa através da intervenção humana.

Quando finalmente morre, o corpo serálevado para o necrotério, que se encontrasempre no lugar mais horrível do hospital,com as paredes manchadas pela humidade,muitas vezes ao lado do depósito de lixo.Um lugar aonde ir para uma visita já é porsi só uma penitência, sem falar das relaçõesque ligavam ao falecido e a dor pela perda.

Se pensarmos que a cultura humana étestemunhada, nas suas primeiras formaspré-históricas, precisamente pela existênciado culto dos mortos, devemos concluir que,

do dentro de si, sem mostrar a sua angústia:já é um incómodo para os outros que elesestejam para morrer, recordando-lhes destemodo que também eles vão morrer, não pre-tenderão incomodá-los ainda mais falandosobre o assunto abertamente? Nem se falaem chamar um sacerdote — admitindo queainda existam alguns capazes de ajudar emtais situações — traz má sorte, os compa-nheiros de quarto ficariam contentes, e in-

para além das nossas conquistas técnico-científicas, estamos a tocar o fundo. Se umcentro comercial, um restaurante, uma salade cinema — agora já somos capazes deconstruir só isso — são mais bonitos que umhospital ou um necrotério, a ponto de fazerbrotar lágrimas nos olhos quando temos quevisitar estes últimos, qual é o verdadeiro es-tado da nossa cultura? Quem somos? Noque nos estamos a transformar?

Como é possível enfrentar amorte num hospital ondepraticamente não há umcapelão, onde a capela setornou a sala do silêncio queestá fechada aos sábados edomingos, onde o moribundoexperimenta a sua agonia comose o grande mistério do fim nãolhe dissesse respeito?

liares com meias-palavras e olhares baixos,compreendem o que está a acontecer, mashá um acordo tácito que leva a fingir quetudo vai melhorar. Neste clima de otimismoforçado e aparente, pode até acontecer queo doente peça desculpa por não correspon-der às expectativas, aos cuidados, mas porpiorar constantemente.

Ao contrário, deixá-lo morrer protegendo-o da dor, evitando intervenções que prolon-gam a sua agonia como a alimentação intra-

a ser consultada rapidamente,sem muita burocracia, mas ca-paz de compreender a realidadeda vida humana?

Ao contrário, pelas razões su-pracitadas, nos hospitais osdoentes, inclusive os nonagená-rios, são submetidos a trata-mentos de todos os tipos comose ainda pudessem viver muitosanos, como se o seu organismofosse forte e não já debilitado,como se tivessem que lutar co-mo jovens atletas pela sua vida.Em síntese, como se a mortenão existisse. Como se a mortenão estivesse a esperar por eles,devido a um processo naturalque diz respeito a todos os se-res humanos.

Deste modo, em vez de reco-nhecer os sinais da morte imi-nente, o paciente é instigado alutar contra a doença, a apegar-se à vida. Os médicos prome-tem essencialmente o que nãopodem manter, para salvar ahonra — ou o que na opiniãodeles é a honra — da medicina.Naturalmente, o doente no ínti-mo do seu coração, e os fami-

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página 10 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 19 de julho de 2018, número 29

Ao prefeito da Congregação para as Igrejas orientais

Dia muito feliz

NICOLA GORI

Por um dia Bari tornou-se outra As-sis. Fraternalmente, São Franciscopassou o testemunho para o bispoSão Nicolau, a fim de que a pazpredomine sobre guerras e violên-cias. Aconteceu no dia 7 de julhodurante o encontro de oração e re-flexão pelo Médio Oriente, que reu-niu com o Papa Francisco os chefesdas Igrejas e das comunidades da re-gião. Foi um dia memorável no sinalda partilha, que transformou a capi-tal da Puglia em centro do ecume-nismo para unir Oriente e Ocidente.O cardeal Leonardo Sandri, prefeitoda Congregação para as Igrejasorientais, falou sobre este evento nu-ma entrevista concedida a L’O sser-vatore Romano.

Poderia traçar um balanço do encon-t ro ?

Penso que, com toda a humilda-de, podemos dizer que foi um diafelicíssimo. O Papa, juntamente comos patriarcas e os representantes dospatriarcas do Oriente, pôde focalizara atenção de toda a Igreja naquelaregião de sofrimento a um nível ele-vado como nunca. Mesmo sem ne-gligenciar os sofrimentos da África,da América Latina, da Ásia e tam-bém pelos quais choramos inclusiveperto de nós — refiro-me ao queacontece no Mediterrâneo — o que oMédio Oriente sofre não tem com-paração. É suficiente pensar nasguerras no Iraque e na Síria, nosmuitos conflitos que se apagam e re-

começam como o fogo dos vulcões.Neste encontro, o Pontífice pôde di-zer juntamente com os chefes dasIgrejas e comunidades médio-orien-tais: queremos apoiar os nossos ir-mãos cristãos vítimas da guerra, dasperseguições, da luta de poder quese desencadeou por causa de interes-ses alheios aos da região e do povo.Mas que provoca esta hecatombe derefugiados e causa uma ferida tre-menda aos cristãos que diminuíramno Médio Oriente a ponto de levaro Papa a dizer: o Médio Orientesem cristãos é outro Médio Oriente.

Durante os momentos de fraternidadepôde compreender os humores e as rea-ções dos patriarcas?

Todos estavam contentíssimos eentusiastas, porque não só responde-ram com grande alegria a esta inicia-

tiva do Papa mas tiveram a confir-mação de que esta ideia partira demuitos deles. Sobretudo dos bisposque vinham em visita «ad limina»como os caldeus, assim como dosbispos ortodoxos que pediam aoPontífice para fazer algo. Recordoque os bispos do Médio Oriente es-creveram ao Papa pedindo uma reu-nião especial de todos, católicos eortodoxos, a favor dos cristãos quevivem na área médio-oriental. Cons-tatar que foram atendidos e que istose tenha feito de maneira deverassensível foi uma alegria para eles.Apreciaram muito o acolhimento e aparticipação da cidade e da arqui-diocese de Bari-Bitonto que os hos-pedou. Unido ao facto de que sesentiam felizes por estarem ao ladodo Papa. Em relação à competênciado nosso dicastério, a presença dospatriarcas católicos foi total. Só fal-tou o patriarca melquita que por ra-zões de força maior não pôde adiara sua visita aos Estados Unidos.Contudo, foi representado por ummetropolita muito importante: o deAlepo, arcebispo Jeanbart.

Pode ser considerado um passo a maisno ecumenismo?

De facto, é um passo concreto,não programado mas nascido do es-tar juntos. Como se se redescobrisseuma nova forma de oração e coló-quio que possa mostrar ao mundouma unidade pela qual choramosporque já não a temos. A unidade àqual todos queremos chegar. Comefeito, vendo-nos unidos, todos po-diam dizer: «Como é bom e agradá-vel estarem os irmãos unidos».

Sem revelar os conteúdos, quais impres-sões teve do encontro a portas fecha-das?

Além do relatório do arcebispoPierbattista Pizzaballa, todos pude-ram intervir e manifestar a própriaopinião quer a propósito do mesmorelatório quer oferecendo ideias e su-gestões que podiam ser um contri-buto válido para resolver certos pro-blemas. Penso que se tratou precisa-mente de um facto único, porqueaté o Papa e todos se pronunciaram,dizendo o que os tinha impressiona-do no relatório do administradorapostólico do patriarcado latino deJerusalém. Penso que foi um facto

deveras novo que tenha podido falarentre si deste modo e recolher con-tributos, pontos de vista, opiniõesque fazem esperar num trabalho co-mum para o futuro.

O que pensa sobre a escolha de Baricomo sede do encontro?

Bari é um lugar de peregrinaçãomundial, não só europeu, mas tam-bém do Médio Oriente e não ape-nas católico. Os ortodoxos veem napessoa de São Nicolau a presençado Oriente no Ocidente. Esta devo-ção ao bispo de Mira explica porqueo encontro se realizou em recorda-ção dele. Mas Bari conserva tambémo ícone de Nossa Senhora Odigitria.No domingo celebrámos a missacom o arcebispo de Bari-Bitonto, D.Francesco Cacucci, dois patriarcasorientais e outros bispos e sacerdotesna cripta da catedral. Ali encontra-sea imagem da Odigitria, que remontaaos primeiros séculos e é deveras oprograma de vida do ecumenismo. ÉNossa Senhora que, com o gesto dasua mão diz a todos nós, ao Papa,aos patriarcas, eis o caminho: Jesus.Se formos testemunhas de Jesus eanunciarmos a sua Palavra não sócom os meios, mas com a nossa vi-da, então estaremos a realizar o ecu-menismo verdadeiro. Devo dizer quea organização, a oração comum, aparticipação popular neste gestonum lugar aberto ao Oriente comoBari, foi uma iniciativa felicíssima,da qual só podemos dizer que obte-ve êxito positivo.

Por conseguinte abrem-se novas perspe-tivas?

Infelizmente, as notícias que che-gam do Médio Oriente deixam-nossem palavras. Diante de tanto sofri-mento não sabemos o que dizer.Contudo, podemos esperar que osresponsáveis por estas catástrofes daguerra tenham ouvido a mensagemdo encontro de Bari. Sobretudo, emrelação aos sofrimentos do povo, dosmais débeis, das crianças, como fri-sou o Papa antes de libertar em vooas pombas no adro da basílica deSão Nicolau. Podemos esperar queouçam a voz da humanidade queclama: paz! Sobre ti haja paz. Nãohá outro caminho para construir ofuturo se não se oferecer paz e segu-rança, liberdade, justiça e progressoa essas regiões. Estou convicto deque também para a Itália e para Ba-ri foi um dia de grande serenidade.De facto, todos constataram o papelque elas têm na construção de umfuturo mundo de justiça e paz emnome de Cristo.

CO N T I N UA Ç Ã O DA PÁGINA 5

Alegria do anúncio

E N T R E V I S TA

Um primeiro fruto dos trabalhosfoi um testemunho de proximida-de dos delegados e de todas asIgrejas americanas às situações deviolência, pobreza, sofrimentoque hoje se verificam no conti-nente, porque «quando um mem-bro sofre — explicaram — todo ocorpo sofre».

Expressão da assembleia intei-ra, lido publicamente pelo diretornacional das POMs do Uruguai,padre Leonardo Rodríguez, o co-municado começa com a exorta-ção a ouvir «o clamor e o prantodos mais débeis»; em particulardas vítimas «da exploração, daperseguição que destrói a digni-dade». Nestes dias «de reflexão,de oração e de celebração — p ro s -seguiu o comunicado — re c o rd e -mos o sofrimento de cada um eexpressemos a nossa solidarieda-de». Comentando o lema do en-contro — «América em missão, oEvangelho é alegria» — os con-gressistas explicaram que «alegriaé justiça, é verdade, é respeito pe-los direitos de todos», sobretudodos povos indígenas, e condena-

ram qualquer ação violenta, ape-lando aos governantes a fim deque se comprometam «a viver epropor uma autêntica cultura dedefesa e promoção da vida e dobem comum, da verdade, da jus-tiça e da paz».

Por fim, dado que «a missãoda Igreja deve seguir a via do en-contro, da escuta, do diálogo, doperdão e da reconciliação», o co-municado exortou também «osmeios de comunicação a torna-rem-se protagonistas ao narrar atransformação dos corações de to-dos, informando a verdade dosfactos». Tudo deposto idealmenteaos pés da imagem escolhida co-mo símbolo do CAM5: a grandecruz da evangelização que reali-zou uma longa peregrinação pelocontinente em preparação para ocongresso. Trata-se de uma répli-ca da cruz da redução jesuíta deSan Javier, que se encontra numapraça de Santa Cruz de la Sierra;precisamente como as pequenas,que foram benzidas e entreguespelo Papa Francisco aos represen-tantes das Igrejas americanas du-rante a viagem à Bolívia em julhode 2015.

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número 29, quinta-feira 19 de julho de 2018 L’OSSERVATORE ROMANO página 11

De 22 a 25 de setembro

Programa da viagem apostólicaaos países bálticos

O santuário Mater misericordiae em Vilnius

CO N T I N UA Ç Ã O DA PÁGINA 5

Congresso missionário americano

Renúncias

O Papa aceitou a renúncia:

No dia 14 de julhoDe D. Antony Devotta, ao go-verno pastoral da Diocese deTiruchirapalli (Índia).De D. Gerulfus Kherubim Pe-reira, S.V.D., ao governo pasto-ral da Diocese de Maumere(Indonésia).

Nomeações

O Sumo Pontífice nomeou:

A 14 de julhoBispo de Maumere (Indoné-sia), o Rev.do Pe. Ewaldus Mar-tinus Sedu, até hoje Vigário-Geral da mesma Diocese.

D. Ewaldus Martinus Sedunasceu a 30 de julho de 1963,em Bajawa (Indonésia). Foi or-denado Sacerdote no dia 7 de ju-lho de 1991.

Bispo de Purwokerto (Indoné-sia), o Rev.do Pe. Christopho-rus Tri Harsono, até esta dataVigário-Geral da Diocese deB o g o r.

D. Christophorus Tri Harsononasceu em Bogor (Indonésia), nodia 18 de janeiro de 1966. Rece-beu a Ordenação sacerdotal a 5de fevereiro de 1995.

A 16 de julhoArcebispo Metropolitano deCap-Haïtien (Haiti), D. Lau-nay Saturné, até hoje Bispo deJacmel.

Disposições especiais

Sua Santidade dispôs:

No dia 14 de julhoEm vista da XV AssembleiaGeral Ordinária do Sínododos Bispos, sobre o tema “Os

jovens, a fé e o discernimentovo cacional”, a nomeação dePresidentes Delegados, os Se-nhores Cardeais: Sua BeatitudeLouis Raphaël I Sako, Patriar-ca de Babilónia dos Caldeus,Chefe do Sínodo da IgrejaCaldeia (Iraque); Désiré Tsa-rahazana, Arcebispo de Toa-masina (Madagáscar); CharlesMaung Bo, S.D.B., Arcebispode Yangon (Myanmar); e JohnRibat, M.S.C., Arcebispo dePort Moresby (Papua-NovaGuiné).

Prelados falecidos

Adormeceram no Senhor:

A 11 de julhoD. Giovanni Marra, ArcebispoEmérito de Messina — Lipari —Santa Lucia del Mela (Itália).

O saudoso Prelado nasceu a 5de fevereiro de 1931 em Cinque-frondi (Itália). Recebeu a Orde-nação sacerdotal no dia 19 desetembro de 1953. Foi ordenadoBispo em 28 de junho de 1986.

D. Richard John Garcia, Bispode Monterey, na Califórnia(E UA ).

O ilustre Prelado nasceu emSão Francisco (EUA), no dia 24de abril de 1947. Foi ordenadoSacerdote a 13 de maio de 1973.Recebeu a Ordenação episcopalem 28 de janeiro de 1998.

Quatro dias nos três países bál-ticos, de 22 a 25 de setembro,durante os quais o Papa Fran-cisco pronunciará cerca dequinze discursos, homilias esaudações: o programa da via-gem internacional à Lituânia,Letónia e Estónia, vigésimaquinta do pontificado, foianunciado pela Sala de impren-sa da Santa Sé a 5 de julho.

A primeira etapa em terralituana será a mais longa: defacto, ali o Papa permaneceráno sábado 22 e domingo 23,visitando as duas principais ci-dades do país. Além disso, da-li partirá na segunda-feira 24,dia dedicado à nação letã, re-gressando à noite, e na terça-feira 25 para participar no últi-mo encontro com o povo esto-niano.

No sábado 22 no aeroportointernacional de Vilnius terálugar a cerimónia de boas-vin-das, seguida pela visita de cor-

No domingo 23, da capital oPontífice irá de automóvel aKaunas, para celebrar a missano parque Santakos e, depoisdo Angelus, almoçará com osbispos lituanos no Palácio dacúria. Na parte da tarde en-contrar-se-á com o clero, asconsagradas e os seminaristasna catedral, em seguida voltaráa Vilnius para uma oração nomuseu que recorda períodosdas ocupações e lutas pela li-b erdade.

Na segunda-feira 24 o Papairá de avião para Riga, onde acerimónia de boas-vindas serárealizada no pátio do Paláciopresidencial: na mesma sedeterão lugar a visita de cortesiaao presidente da Letónia e ohabitual discurso às autorida-des do país, que precederão adeposição de uma homenagemfloreal diante do monumentoda liberdade, um encontro ecu-ménico na Ri gas Doms, a ca-

tesia ao presidente da Lituâniae pelo encontro com as autori-dades, a sociedade civil e ocorpo diplomático na praçadiante do palácio presidencial.Na parte da tarde Francisco re-zará no santuário Mater mise-ricordiae e encontrar-se-á comos jovens na catedral.

tedral protestante, e uma visitaà católica dedicada a São Tia-go. Depois do almoço com oepiscopado no paço episcopalda Sagrada Família, o Papa iráde helicóptero ao santuárioMãe de Deus em Aglona paraa celebração eucarística. Apósa cerimónia de despedida dasautoridades letãs, voltará a Vil-nius de helicóptero.

Por fim, na terça-feira 25 es-tão programadas a despedidada Lituânia no aeroporto dacapital, a partida de avião paraTallinn com a cerimónia deboas-vindas, a visita ao chefede Estado e o discurso às auto-ridades estonianas no Paláciopresidencial; um encontro ecu-ménico com os jovens na igrejaluterana de São Carlos e o al-moço no convento das irmãsbrigidinas em Pirita. Na con-clusão o Papa saudará os assis-tidos pelas obras de caridadeda Igreja na catedral católicados Santos Pedro e Paulo e ce-lebrará a missa na praça da Li-berdade. Voltará para Romano final da tarde.

INFORMAÇÕES

pelas infidelidades pessoais oupela crise da eficácia e das apa-rências; quero dizer que já nãoconfiamos na palavra de Jesus,que no contexto da missionarie-dade ainda nos recorda: «Se al-guém quiser vir após mim, rene-gue-se a si mesmo, tome cada diaa sua cruz e siga-me» (Lc 9, 23).Devemos precaver-nos contra alógica do algoritmo, considerandoo eficientismo solucionista como averdadeira lógica a seguir. Nemsequer diminuindo o nível da ge-nerosidade resolveremos, por

exemplo, o problema das voca-ções missionárias; ao contrário, eledeve ser enfrentado incrementan-do uma autêntica pastoral missio-nária, uma generosa partilha deagentes apostólicos entre Igrejasmais ricas e Igrejas mais pobres e,enfim, deixar-nos levar por umprofundo e generoso amor peloserviço às comunidades desprovi-das do anúncio do Evangelho.Além disso, é necessário motivar afavor da missionariedade todas asrealidades eclesiais: bispos, sacer-dotes, religiosas, religiosos, leigos,paróquias, associações, grupos epessoas individualmente, porque a

missionariedade ajuda a fé e a en-tusiasma. Devemos ir sempre àsraízes e à substância da questãosem ceder, nas dificuldades ou nasproblemáticas, ao declínio eclesio-lógico nem ao ocasionalismo dassoluções, especialmente quando setrata da qualidade dos agentes edo compromisso missionário. Emmuitas regiões da América há ne-cessidade de autênticos ministrosdo Evangelho. Com efeito, todosnós somos devedores da nossa féà generosidade de evangelizadorese missionários que nos precede-ram e acho que esta generosidadeainda não se esgotou.

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página 12 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 19 de julho de 2018, número 29

Exéquias do cardeal Tauran na presença do Papa

Ao serviço da Igreja e do diálogo

Tiveram lugar na basílica de São Pedro a 12 de julho, na presaença do Sumo Pontífice,as exéquias do cardeal Jean-Louis Tauran, presidente do Pontifício conselho

para o diálogo inter-religioso e carmerlengo da Santa Igreja Romana,falecido nos Estados Unidos da América no dia 5 do corrente mês.

O rito foi presidido pelo decano do colégio cardinalício, cardeal Angelo Sodano.

Angelus

Sobriedade e pobrezacom o estilo do missionário

Amados irmãos e irmãs, bom dia!O Evangelho de hoje (cf. Mc 6, 7-13) narra o momento no qual Je-sus envia os Doze em missão. De-pois de os ter chamado pelo no-me um por um, «para andaremcom Ele» (Mc 3, 14) ouvindo assuas palavras e observando osseus gestos de cura, convocava-osagora para os «enviar dois adois» (6, 7) às aldeias que Ele sepreparava para visitar. É uma es-pécie de “a p re n d i z a g e m ” daquiloque serão chamados a fazer de-pois da Ressurreição do Senhorcom o poder do Espírito Santo.

O trecho evangélico analisa oestilo do missionário, que podemosresumir em dois pontos: a missãotem um c e n t ro ; a missão tem umro s t o .

O discípulo missionário temantes de mais um seu c e n t ro de re-ferência, que é a pessoa de Jesus.A narração indica isto usandouma série de verbos que têm aEle como sujeito — «chamou»,«enviou-os», «dava-lhes poder»,«ordenou», «dizia-lhes» (vv.7.8.10) — de modo que o ir e oagir dos Doze aparecem como oirradiar-se de um centro, o repro-por-se da presença e da obra deJesus na sua ação missionária. Is-to manifesta que os Apóstolos na-da têm de seu para anunciar, nemcapacidades próprias para de-monstrar, mas falam e agem por-que foram «enviados», enquantomensageiros de Jesus.

Este episódio evangélico refere-se também a nós, e não só aos sa-cerdotes, mas a todos os batiza-dos, chamados a testemunhar, nosvários ambientes de vida, o Evan-gelho de Cristo. E também paranós esta missão é autêntica ape-

nas a partir do seu centro imutá-vel que é Jesus. Não é uma inicia-tiva dos fiéis individualmentenem dos grupos, nem sequer dasgrandes agregações, mas é a mis-são da Igreja inseparavelmenteunida ao seu Senhor. Cristão al-gum anuncia o Evangelho «porconta própria», mas unicamenteenviado pela Igreja que recebeu omandato do próprio Cristo. Éprecisamente o Batismo que nostorna missionários. Um batizadoque não sentir a necessidade deanunciar o Evangelho, de anun-ciar Jesus, não é um bom cristão.

A segunda característica do es-tilo do missionário é, por assimdizer, um ro s t o , que consiste napobreza dos meios. O seu equipa-mento responde a um critério desobriedade. Com efeito, os Dozereceberam a ordem de «que nadalevassem para o caminho a nãoser um cajado: nem pão, nem al-forge, nem dinheiro no cinto» (v.8). O Mestre quis que eles fossemlivres e ligeiros, sem apoios nemfavores, com a única certeza doamor d’Aquele que os envia, for-talecidos unicamente pela sua pa-lavra que vão anunciar. O cajadoe as sandálias são o equipamentodos peregrinos, porque eles sãomensageiros do reino de Deus,não e m p re s á r i o s omnipotentes, nãofuncionários rigorosos nem estre-las em tournée. Pensemos, porexemplo, nesta Diocese da qualeu sou o Bispo. Pensemos nal-guns Santos desta Diocese de Ro-ma: São Filipe Neri, São BentoJosé Labre, Santo Aleixo, BeataLudovica Albertoni, Santa Fran-cisca Romana, São Gaspar delBufalo e muitos outros. Não eramfuncionários nem empresários,mas trabalhadores humildes do

Reino. Tinham este rosto. E a es-te “ro s t o ” pertence também a ma-neira como a mensagem é acolhi-da: com efeito, pode que aconte-cer não sejamos acolhidos nemouvidos (cf. v. 11). Também isto épobreza: a experiência da falên-cia. A vicissitude de Jesus, que foirejeitado e crucificado, antecipa odestino do seu mensageiro. E sóse estivermos unidos a Ele, mortoe ressuscitado, conseguiremos en-contrar a coragem da evangeliza-ção.

A Virgem Maria, primeira dis-cípula e missionária da Palavra deDeus, nos ajude a levar ao mun-do a mensagem do Evangelhonuma exultação humilde e ra-diante, além de qualquer rejeição,incompreensão ou tribulação.

No final da prece mariana oPontífice saudou os grupos presentes.

Amados irmãos e irmãs!Saúdo de coração todos vós, ro-manos e peregrinos da Itália e devárias partes do mundo: as famí-lias, os grupos paroquiais, as as-so ciações.

Em particular, saúdo as Irmãsdo Preciosíssimo Sangue, vindasde Monza, as noviças das Filhasde Maria Auxiliadora provenien-tes de diversos países e os jovenspolacos da Diocese de Pelplin,que participam num curso deexercícios espirituais em Assis.

A todos desejo bom domingoe, por favor, não vos esqueçais derezar por mim. Bom almoço e atéà vista!

Sobriedade e pobreza de meios: eis «o estilo do missionário» indicado peloPapa Francisco no Angelus de domingo, 15 de julho, recitado com os fiéispresentes na praça de São Pedro. Comentando como de costume o evangelhodo dia (Marcos 6, 7-13) que descreve o momento no qual Jesus envia osDoze em missão, o Pontífice frisou que «os mensageiros do reino de Deusnão são empresários omnipotentes» nem «funcionários rigorosos» e muitomenos «estrelas em tournée».