prática pedagógica iii -...

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Governo FederalDilma Vana Rousseff

Presidente

Ministério da EducaçãoFernando Haddad

Ministro

Secretaria de Educação a DistânciaCarlos Eduardo Bielschowsky

Secretário

Diretor do Departamento de Políticas em Educação a DistânciaHélio Chaves Filho

CAPESJorge Almeida Guimarães

Presidente

Diretor de Educação a DistânciaJoão Carlos Teatini de Souza Clímaco

Governo do EstadoRicardo Vieira Coutinho

Governador

UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA

Marlene Alves Sousa LunaReitora

Aldo Bezerra MacielVice-Reitor

Eli Brandão da SilvaPró-Reitor de Ensino de Graduação

Eliane de Moura SilvaCoordenação Institucional de Programas Especiais – CIPE

Secretaria de Educação a Distância – SEAD

Assessora de EADCecília Queiroz

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Prática Pedagógica III

Amasile Coelho Lisbôa da Costa Sousa

Campina Grande-PB2011

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371.3S725l Sousa, Amasile Coelho Lisboa de.

Licenciatura em Letras/Português: Prática pedagógica 3./ Amasile Coelho Lisboa de Sousa; UEPB / Coordenadoria Institucional de Programas Especiais, Secretaria de Educação a Distância._Campina Grande: EDUEPB, 2011. 118 p.: il.

1. Métodos e Técnicas de Ensino. 2. Prática Pedagógica. 3. Redação e Produção textual. 4. Reescritura. I.Título. II. EDUEPB / Coordenadoria Institucional de Programas Especiais.

21. ed.CDD

FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL - UEPB

Universidade Estadual da ParaíbaMarlene Alves Sousa LunaReitora

Aldo Bezerra MacielVice-Reitor

Pró-Reitora de Ensino de Graduação Eliana Maia Vieira

Coordenação Institucional de Programas Especiais-CIPE Secretaria de Educação a Distância – SEADEliane de Moura Silva

Cecília QueirozAssessora de EAD

Coordenador de TecnologiaÍtalo Brito Vilarim

Projeto GráficoArão de Azevêdo Souza

Revisora de Linguagem em EADRossana Delmar de Lima Arcoverde (UFCG)

Revisão LinguísticaMaria Divanira de Lima Arcoverde (UEPB)

Diagramação Arão de Azevêdo SouzaGabriel Granja

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SumárioI UnidadeUma volta ao tempo: da redação à produção de textos.....................7

II UnidadeA desmistificação da produção escrita.....................................................21

III UnidadeTipologia textual X gênero textual.............................................................39

VI UnidadeGêneros textuais e ensino............................................................................53

V UnidadeJornal na escola: propostas teórico-metodológicas de orientação para um trabalho de leitura e produção de textos.........67

VI UnidadeA atividade de produção textual e o livro didático................................81

VII UnidadeProdução textual e o processo de reescritura.........................................93

VIII UnidadePráticas de escrita X Oralidade................................................................107

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 7

I UNIDADE

Uma volta ao tempo: da redação à

produção de textos

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8 SEAD/UEPB I Prática Pedagógica III

Apresentação

Iniciaremos aqui mais um Componente Curricular – Práti-ca Pedagógica III do Curso de Letras. Este componente abor-dará a produção textual no cotidiano escolar e as relações entre os diversos gêneros textuais, permitindo que se faça uma reflexão sobre os aspectos ideológicos e as condições de produção que envolvem a atividade de escrita.

Analisaremos a prática de ensino legitimada pela escola que revela produtos meramente escolares. Em contraposi-ção a essa prática escolar, ampliamos a concepção de escri-ta enquanto processo, e, consequentemente, as práticas de letramento desenvolvidas na escola.

Nesta aula, faremos um breve percurso sobre a prática de escrita no contexto escolar. Quem não lembra as famosas redações que éramos obrigados a fazer para atender a uma exigência escolar? E o caráter de artificialidade que se atri-buía à linguagem? Nessa perspectiva, eram criadas “fórmu-las” pré-estabelecidas em que restava ao aluno seguir esses passos e cumprir a obrigação da redação escolar.

Percebemos assim, a ênfase nos aspectos normativos e um olhar voltado quase exclusivamente para o produto fi-nal.

Mas, com o avanço da linguística textual, o termo Re-dação foi sendo aos poucos substituído por produção de textos, o que representou novas diretrizes para um trabalho de escrita mais eficaz. Nessa perspectiva, esta aula busca-rá analisar as diferentes práticas de escrita, tomando como referencial o paradoxo Redação X Produção de texto. Para tan-to, apresentaremos para análise resultados de práticas de escrita vivenciadas no contexto escolar para que, você pro-fessor, a partir de uma dimensão sócio-interacionista possa refletir sobre essas práticas.

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 9

O desenvolvimento das unidades desse componente cur-ricular ocorrerá partir da leitura dos textos teóricos e das atividades, buscando a reflexão dos conteúdos abordados. Na abordagem teórica e nas atividades propostas, você terá a oportunidade de refletir sobre a prática de escrita e as condições de produção que envolvem essa atividade, re-presentando assim uma oportunidade de refletirmos sobre a prática de escrita no contexto escolar e sobre nossa atuação enquanto Professor de Língua Portuguesa.

Objetivos

Ao final da unidade você deverá:

• diferenciar as duas práticas de escrita Redação X pro-dução de texto;

• refletir sobre as diferentes práticas de escrita vivencia-das no contexto escolar

• compreender a atividade de escrita como fazendo parte de um processo.

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10 SEAD/UEPB I Prática Pedagógica III

Agora é por sua conta

Inicialmente, gostaríamos nesta unidade, de propor uma reflexão conjunta sobre as práticas pedagógicas de ensino da escrita no con-texto escolar.

Em um primeiro momento, convidamos você a tentar responder a partir de sua prática alguns questionamentos:

1. Que critérios você utiliza para elaborar uma proposta de produção de textos?

2. O que você considera uma boa proposta de produção de tex-tos?

3. Na sua prática de ensino, de Língua Portuguesa, você ainda utiliza o termo Redação? Como você conceituaria essa prática de escrita?

4. A cada Redação ou Produção de texto, o que você espera do seu aluno?

5. Você acredita que a abordagem de escrita que você utiliza com seus alunos amplia a competência textual? Justifique

As reflexões aqui apresentadas devem ser compreendidas como ponto de apoio para tentar minimizar as distâncias que separam as investigações científicas e as práticas pedagógicas, no que tange à ampliação da competência para a escrita.

Vale a pena observar que quando falamos em ampliar competên-cias, estamos considerando que o aluno ao chegar a escola já sabe muita coisa, já desenvolveu muitas competências e que cabe a escola ampliar essas competências. Na visão de Antunes (2009), a prática de escrita deveria, portanto, centrar-se em descobrir o que os alunos já sabem, o que ainda não sabem e o que precisam saber.

Apesar de todo o desenvolvimento teórico no campo do ensino da escrita, muitas vezes as práticas de escrita no contexto escolar se esgotam no conhecido exercício escolar de redação. Antunes (2009) aponta alguns fatores responsáveis por essa prática.

COMPETÊNCIA TEXTUAL - Capacidade para produzir texto

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 11

Fonte: ANTUNES, Irandé. Língua, texto e ensino- Outra escola possível. São Paulo: Parábola, 2009, p.162.

o caráter de artificialidade dos contextos escolares em que a es-crita é solicitada;

a ausência de uma dialogicidade, ainda que apenas simulada;

o afastamento das propostas de produção escrita em relação aos usos sociais que efetivamente são feitos;

a representação que os alunos construíram, na própria escola, acerca da escrita e os requisitos que determinam sua adequação e qualidade;

a estreiteza na compreensão das operações processuais implica-das na atividade de escrever.

Atividade I

Leia as propostas de escrita abaixo e confronte com os pontos elencados no quadro acima

Proposta 1

Produza um relato de uma viagem (que você realmente tenha feito ou apenas imaginada mas relatada como se tivesse ocorrido). Siga o modelo lido, comece seu texto da mesma forma. Veja uma sugestão:

O velho fusca estava prestes a dar a partida para Praia Grande para continuarmos nossa solitária volta pelo litoral paulista. A próxima parada seria o Forte, mas mudei de ideia e segui para Ocean.

Fonte: CAMPOS, Elizabeth; CARDOSO Paula Marques e ANDRADE, Silvia Letícia. Viva Português. v único ensino médio. São Paulo: Ática, 2008, p. 132

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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12 SEAD/UEPB I Prática Pedagógica III

Proposta 2

Escolha um dos temas abaixo e redija uma descrição em prosa ou em verso, procurando utilizar-se dos mesmos recursos expressivos observados nos poemas lidos.- Meu bem, amor meu-Meu melhor amigo- Uma pessoa inesquecível-Um operário

Fonte: CEREJA William Roberto & MAGALHÃES Thereza Cochar. Português linguagens. V. 1: ensino médio. São Paulo: editora Atual, 2005, p. 56

Uma volta ao tempo: da redação à produção de textos

Foi só nos anos 80 que o termo produção de textos passou a ser utilizado, pois até então. Os professores utilizavam o termo Redação. Essa mudança representa também uma mudança na concepção de sujeito, pois “produzir implica alguém que produza” (GERALDI, 2000, p.19)

Esse sujeito é concebido assim como produto de herança cultural, mas também de suas ações sobre ela.

Desse modo, conceber o texto como produção é pensá-lo em for-ma de processo. Sendo assim, a escrita deve ser compreendida como uma atividade processual e recursiva, que permite avanços e recuos, de forma a aprimorar a produção textual.

É uma tarefa realizada em etapas que, segundo Geraldi (1997) exige do produtor do texto ter o que dizer e a quem dizer.

Desse modo, podemos entender o quanto pode ser complicado escrever sem saber como fazer ou sem ter o que dizer, e ainda sem ter um leitor para quem escrever.

O processo de ensino-aprendizagem da escrita deve segundo Ge-raldi (1997) ultrapassar a artificialidade instituída no contexto escolar quanto ao uso da linguagem.

Dentro desse contexto, o sujeito desse processo o aluno – se anula, assumindo o discurso autoritário da escola em que cabe ao professor e a escola ensinarem e aos alunos aprenderem.

Como resultado dessa artificialidade no ensino aprendizagem da escrita, temos as práticas desenvolvidas nas escolas, nas quais não se escrevem textos, produzem-se redações.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

ATIVIDADE PROCESSUAL E RECURSIVA - A escrita como resultado de diversas ativida-des

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Atividade II

Se entendermos a escrita como uma tarefa que requer tomada de decisões, escolha da forma do dizer, ajuste do que se diz, e para quem se escreve, quais são, na sua opinião, as maiores dificuldades dos alunos ao produzir textos escritos? Por quê?

Ao contrário do que demonstram as práticas escolares, não se deve imaginar fórmulas para ensinar alguém a escrever.

O que podemos constatar é que quanto ao aspecto formal é muito comum encontrarmos em muitos textos vocábulos oriundos de fórmu-las prontas.

Yeso Ribeiro em artigo publicado na Revista Língua Portuguesa (2008) levanta alguns problemas recorrentes em textos de opinião, e que são tratados pela escola como fórmulas a serem seguidas.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

•Tomar todasas questõesdomundocomo atuais,oque dámargem a introduções sempre muito marcadas por expressões do tipo “atualmente”, “nos dias de hoje”, “hoje em dia”, como para dizer que há uma polêmica em pauta. Ora, se a questão não fosse polêmica sequer figuraria no debate, não?

•Imaginarquetodadissertaçãoseresolveemapenastrêsparágra-fos. Na verdade, há três momentos na dissertação - introdução, desenvolvimento e conclusão -, o que não implica necessidade de haver sempre três parágrafos;

• Introduzirumargumentodeautoridade sob fórmulasprontascomo “Segundo o grande /famoso/ilustre/conhecido”.

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14 SEAD/UEPB I Prática Pedagógica III

Atividade III

A partir dos pontos levantados na seção anterior, escolha uma uma atividade de produção textual de um livro didático de Língua Portuguesa e analise de que forma os problemas levantados por Ribeiro permeiam as orientações para a produção de textos nos manuais didáticos.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

•Proporsoluçõesatodasasquestõesdomundo.Éprecisonotarque na maioria das vezes não se pede que solucionemos os proble-mas do mundo, mas que apenas possamos discuti-los, agregando ideias à discussão, e só, sem que haja a necessidade de solucionar o que não tem resposta;

•Aindanaesteiradoproblemaanterior,proporumasoluçãoparaa questão em pauta exigindo uma “conscientização urgente do go-verno, das pessoas, para a situação do país, etc, etc, etc..., como se realmente isso fosse uma ideia nunca proposta ou pensada por alguém;

• Iniciar uma carta argumentativa pelo desgastadíssimo “venhopor por meio desta”, como se isso fosse garantia de um texto bem introduzido.

Fonte: Revista Língua Portuguesa – Especial

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O professor e a formação de saberes

Silva e Rego (2009) ressaltam os inevitáveis conflitos instaurados no processo de apropriação de saberes da da teoria à prática do texto escrito. Essas práticas pedagógicas refletem saberes caracterizadores da cultura docente, através de escolhas, estratégias didáticas, meto-dologias e as mais diversas situações de ensino.

Essa resistência dos professores em desvincularem as práticas de produção escrita das tradicionais propostas de produção de disserta-ções escolares, pode ser percebida nos relatos transcritos abaixo:

Relato reflexivo

Incentivamos também a importância da leitura e da escrita, ex-plicamos o grande valor do estímulo à leitura e à escrita que tem como objetivo formação de leitores competentes.

Pedimos para os alunos produzirem algumas redações relacio-nadas ao tema escolhido, o que proporcionou um comparativo entre a língua falada e a escrita, e os problemas apresentados nos textos mostraram a verdadeira imagem do processo de ensi-no/aprendizagem da produção textual. O trabalho pedagógico com produção textual, certamente possui falhas graves que im-pedem o enriquecimento da expressão escrita dos alunos.

Fonte: GONÇALVES, Adair Vieira e BAZARIM, Milene (org.). Interação, gêneros e letramento: A reescritura em foco. São Carlos. Claraluz, 2009, 199

O relato acima comprova a visão tradicional da escrita enquanto redação escolar, limitando-se à dequação textual ao modelo de refe-rência proposto pela escola.

A esse respeito, Silva e Rego (2009, p.20) reconhecem que “a re-dação escolar poda por completo a possibilidade de o aluno conhecer diversos gêneros textuais, considerando a enorme necessidade advinda do próprio cotidiano de qualquer indivíduo”.

Desse modo, o professor de língua portuguesa em suas práticas de ensino deve criar situações que propiciem a exposição a diferentes gêneros de outras esferas sociais e não só do contexto escolar.

Batista (1997), ao questionar o objeto de ensino das aulas de lín-gua portuguesa, alerta para as condições em que os alunos aprendem redação. De um lado, encontra-se o aluno e do outro o professor.

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16 SEAD/UEPB I Prática Pedagógica III

Parece-nos, portanto, que essa é uma das realidades vivenciadas pelos professores de português em sua prática de ensino. Sendo assim, deve-se atentar para a natureza da atividade de escrita que é transmi-tida no contexto de práticas de ensino. Para tentar modificar essa situ-ação, o professor precisa repensar sua prática, e modificar a natureza do saber que permeia o ensino da escrita.

Atividade IV

Considerando a distinção entre Redação e Produção de textos levantada por Sercundes (2000), Geraldi (2000) e Antunes (2009), desenvolva seu próprio texto,explicitando as condições que devem ser preenchidas por professor e aluno para desenvolver uma produção textual.

Este é o grande desafio de ser professor, entender que estamos só no início de uma grande caminhada pela frente. Encerramos, por enquanto, apenas um momento da prática, pois muitos outros virão pela frente. Vamos em frente!!

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 17

Leituras recomendadasOs conceitos tratados de maneira breve até aqui, merecem uma

exploração mais detalhada. Para isso, vale a pena ler também as obras relacionadas a seguir:

ILARI, Rodolfo. Uma nota sobre redação escolar. In: A linguística e o ensino de língua portuguesa. São Paulo: Martins Fontes, 1992, p.69-91

Este artigo além de mostrar a distinção entre redação e produção de texto, apresenta uma nova dimensão para o trabalho com texto na sala de aula.

MARCUSCHI, Beth e MARIANNE Cavalcante. Atividades de escrita em livros didáticos de língua Portuguesa: perspectivas convergentes e divergentes. In: COSTA VAL, Maria da Graça e MARCUSCH, Beth (org.). Livros didáticos de Língua Portuguesa: letramento e cidadania. Belo Horizonte: Ceale; Autêntica, 2005.

O foco de interesse das autoras nesse artigo são as atividades de produção de texto escrito em livros didáticos de Língua Portuguesa e Alfabetização, revelando com isso uma compreensão do papel da escola no ensino da Língua Portuguesa.

SERAFINI, Maria Teresa. Redação, objeto misterioso. In: A linguística e o ensino de Língua Portuguesa. São Paulo: Martins Fontes, 1992, p. 19-22.

O artigo sugerido faz tanto o aluno quanto o professor refletir sobre a prática de redação no contexto escolar e aponta alternativa para um trabalho de escrita eficaz.

Vale a pena ler também Os Parâmetros Curriculares Nacionais no ponto que trata de produção textual. A leitura desse material deverá servir como reflexão dos conceitos tratados nesta unidade.

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18 SEAD/UEPB I Prática Pedagógica III

Resumo

Durante muito tempo, o termo Redação foi utilizado no contexto escolar, só com o avanço da linguística é que esse termo foi sendo aos poucos substituído por produção de textos. Tal fato repercutiu nas prá-ticas de ensino da escrita, pois a artificialidade das redações foi dando espaço para a efetiva atividade de produção de texto. Essa mudança de perspectiva acarretou, consequentemente, numa nova postura do professor de língua portuguesa que passou a trabalhar a escrita en-quanto uma atividade processual e recursiva. É sob esse viés que se fundamentou nossa primeira aula.

Autovaliação

Na sua opinião, nas práticas de escrita desenvolvidas no contexto escolar produzem-se textos ou redações?

O que representa para um professor de Língua Portuguesa a diferença entre Redação e Produção de texto?

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 19

Referências

ANTUNES, Irandé. Língua, texto e ensino: Outra escola possível. São Paulo: Parábola,2009.

BATISTA, Antonio Augusto G. Aula de Português. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

GERALDI, João Wanderley (org.).Da redação à produção de textos. In: CHIAPPINI, Ligia. Aprender e ensinar com textos de alunos. V.1. São Paulo: Cortez, 2000

GONÇALVES, Adair Vieira e BAZARIM, Milene (org.). Interação, gêneros e letramento:a reescrita em foco. São Carlos: Claraluz, 2009.

SERCUNDES, Maria Madalena Iwamoto. Ensinando a escrever. In: CHIAPPINI, Ligia. Aprender e ensinar com textos de alunos. v. 1. São Paulo: Cortez, 2000.

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II UNIDADE

A desmistificação da produção escrita

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22 SEAD/UEPB I Prática Pedagógica III

Apresentação

A escrita é uma atividade de extrema necessidade tanto na vida escolar como na vida profissional e no dia a dia. Por outro lado, não se constitui em uma tarefa muito fácil, pois há toda uma tradição escolar que fundamenta uma práti-ca de mistificação da escrita. Nesta unidade, você leitor se reconhecerá em muitas das situações aqui descritas, pois discutiremos os diferentes posicionamentos acerca da escrita na tentativa de desmistificar as práticas de escrita que, na maioria das vezes, representam atitudes negativas em rela-ção a essa atividade.

Desse modo, espero que durante esta unidade possamos desconstruir ideias equivocadas sobre a escrita e construir uma nova perspectiva teórica.

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 23

Objetivos

Ao final desta unidade, esperamos que o aluno possa:

a) Identificar os mitos que cercam a atividade de escrita;

b) Conhecer as práticas de escritas tomando como referên-cia as concepções teóricas descritas como dom, produto e processo;

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24 SEAD/UEPB I Prática Pedagógica III

A desmistificação da produção escrita

Durante muito tempo, década de 60 e 70, acreditou-se que para escrever bastava ter dom. Ideias como essa foram se fortalecendo, re-sultando em histórias de relação com a escrita não muito satisfatórias.

As dificuldades no tratamento com a escrita parecem atingir tanto professores quanto alunos. De um lado, deparamo-nos com profes-sores que tentam inovar suas práticas pedagógicas, utilizando-se das orientações metodológicas advindas de livros didáticos de Língua Por-tuguesa. E, de outro lado, alunos com verdadeira aversão à escrita.

A escrita era assim considerada como um ato espontâneo, que não exigia empenho, desvinculada das práticas sociais em que restava ao indivíduo apenas seguir algumas dicas. A partir dessa perspectiva, ape-nas os que tiverem vocação para escrever conseguirão êxito e os que forem desprovidos desta vocação se sentirão incapazes para o desen-volvimento de tal habilidade.

Em oposição a essa corrente teórica, surge na década de 80, com os avanços da linguística textual, a concepção da escrita como produ-to, denominada por Sercundes (2000) de escrita como consequência, uma vez que a escrita era considerada como resultado de leituras feitas, cumprindo apenas uma função comunicacional, desprezando, dentre outros, os aspectos cognitivos e sócio-históricos que interferem na pro-dução de textos.

Nessa visão, a atividade de produção textual é resultado de ativida-de prévia a partir de textos e não de temas e títulos ou frases, conforme visão estruturalista. Por outro lado, esta metodologia apresenta falhas, uma vez que a atividade de escrita se encerra no momento da produ-ção do texto, sendo considerado, portanto, como produto.

E, finalmente surge a concepção de escrita que concebe a pro-dução de textos como um processo, realizado por meio de atividades mentais conscientes e inconscientes que envolvem diversos níveis de planejamento e etapas de elaboração. A esse respeito, Garcez (2004) acrescenta que:

“conhecimento de natureza diversa são acessados para que o texto tome forma. É necessário que o redator utilize simultaneamente seus conhecimen-tos relativos ao assunto que quer tratar, ao gênero adequado à situação em que o texto é produzido, aos possíveis leitores, à língua e suas possibilidades estilísticas.” (p.3)

Nesse sentido, a escrita é uma atividade processual e recursiva, o que significa dizer que a atividade de produção textual é uma tarefa

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 25

realizada por etapas, em que o escritor avança e recua no texto, na tentativa de aprimorar seu texto.

Dentro dessa perspectiva, encontram-se os estudos de Meurer (1997) para quem a atividade de escrita é um processo que envolve estágios: o estágio inicial que antecede o ato de escrever e o estágio seguinte que é o momento da produção propriamente dita. O processo de escrita constitui-se assim em uma prática recursiva.

Garcez (2004) partilha com essa ideia ao argumentar que:

A escrita é uma atividade que envolve várias ta-refas, às vezes sequenciais, às vezes simultâneas. Há também idas e vindas: começa-se uma tarefa e é preciso voltar a uma etapa posterior ou avan-çar para um aspecto posterior. Todas essas ações estão profundamente articuladas ao contexto em que se originou e em que acontece a produção de texto. Escrever exige, portanto, empenho e prática de leitura. (p. 14)

Infelizmente, a prática pedagógica de grande parte dos professores do ensino fundamental e médio se apoia numa concepção tradicional de escrita, de cunho estruturalista que acredita que bastam algumas “dicas” oferecidas pelos professores para a elaboração de um texto fluente e claro.

É provável que uma das principais causas da aversão à escrita en-contre explicação na metodologia utilizada pelo professor no tocante à produção de textos, uma vez que, na maioria das vezes, opera-se com uma visão limitada de escrita como algo pronto e acabado, não exi-gindo do produtor um planejamento, revisão ou quebra no fluxo linear, como tão bem argumenta Passarelli (2001).

Etapas de pensar, selecionar, rascunhar descrever e reescrever, ten-do como meta o aperfeiçoamento, são negadas ao aluno que acaba concebendo o texto como um produto acabado, e não como um lugar de reflexão sobre os mais variados recursos linguísticos de que dispõe para expressar suas ideias.

É nessa busca por metodologias mais eficazes no tratamento com a escrita, que os professores recorrem a livros didáticos e se apegam a este como elemento norteador de suas práticas.

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26 SEAD/UEPB I Prática Pedagógica III

Chegou a sua vez!!!

Atividade I

Reveja todo o seu percurso escolar e profissional, focalizando principalmente as situações de escrita que ficaram gravadas em sua memória. Formule um relato que explique ou justifique como foi construída a sua experiência de escrita até hoje.

Atividade II

A partir da teoria de escrita como processo defendido por Garcez (2004), crie uma atividade de produção textual.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 27

Veja o que pensam alguns grandes escritores sobre o ato de escrever:

Depoimento de Lygia Fagundes Telles

- Como você definiria o ato de escrever?

- Uma luta. Uma luta que pode ser vã, como disse o poeta, mas que lhe toma a manhã. E a tarde. Até a noite. Luta que requer paciência. Humildade. Humor. Me lembro que estava num hotel em Buenos Aires,vendo na tevê um drama de boxe. Desliguei o som, ficou só a imagem do lutador já cansado (tantas lutas) e reagindo. Resistindo. Acertava às vezes, mas tanto soco em vão, o adversário tão ágil, fugidio, desvianddo a cara. E ele ali inves-tindo, insistindo - mas o que mantinha o lutador em pé? Duas vezes beijou a lona. Poeira, suor, sangue. Voltava a reagir, alguém sugeriu que lhe atirassem a toalha, é melhor desistir, chega! Mas ele ia buscar forças sabe Deus onde e se levantava de novo, o fervor acendendo a fresta do olho quase encoberto pela pálpebra inchada. Fiquei vendo a imagem silenciosa do lutador solitário - mas quem podia ajudá-lo? Era a coragem que o sustentava? A vaidade? Simples ambição de riqueza, aplauso? (...) E, de repente me emocionei: na imagem do lutador de boxe vi a imagem do escritor no corpo- a- corpo com a palavra.

Fonte: Para gostar de ler. Vol.9. São Paulo: Ática, 1988, p. 7.

Para nós, só mesmo Lygia Fagundes Telles poderia expressar com tanto brilhantismo, o ato de escrever.

Fernando Sabino, por sua vez, assim define o ato de escrever:

Para mim, o ato de escrever é muito difícil e penoso, tenho sempre de corrigir e reescrever várias vezes. Basta dizer, como exemplo, que escrevi 1100 páginas datilografadas para fazer um romance no qual aproveitei pouco mais de 300.

Fonte: Para gostar de ler. Vol.3. Crônicas. São Paulo: Ática, 1987, p. 7.

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28 SEAD/UEPB I Prática Pedagógica III

O escritor Fernando Sabino, através de sua própria experiência de-monstra como a atividade de escrita é um ato laborioso, através das inúmeras reescrituras que um texto pode exigir.

Já o escritor Paulo Mendes Campos, quando questionado sobre o ato de escrita defende:

-Quando escrevo sob encomenda, não há muito tempo para cor-rigir. Quando escrevo para mim mesmo, costumo ficar corrigindo dias e dias - uma curtição. Escrever é estar vivo.

Fonte: Para gostar de ler. Vol. 3. Crônicas. São Paulo: Ática, 1987, p. 7-8.

Através do depoimento do admirável poeta e cronista podemos per-ceber que a escrita é compreendida não apenas como uma atividade que exige trabalho, mas também como uma diversão.

Atividade IIIEm todos os depoimentos está subjacente uma teoria de escrita. Identifique e justifique a presença dessa teoria.

Atividade IV

Explique de que forma se diferenciam as práticas de escrita desses grandes escritores e as práticas de escrita desenvolvidas no contexto escolar.dica. utilize o bloco

de anotações para responder as atividades!

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 29

Confirmando a escrita numa visão processual

O trecho abaixo faz parte da entrevista publicada na Revista Língua Portuguesa realizada com o grande escritor Rubem Alves, autor de mais de 70 livros.

“_ Autores dizem que começam a escrever e não sabem o que vai ocorrer depois. Que a história se conduz sozinha. Como é no seu caso?

-Olha, quando vou escrever, coloco as ideias no papel, como se fossem um mapa a ser seguido. Mas sei que é inútil. Porque na viagem eu vejo cenários imprevistos e me embrenho por eles. Tenho a sensação de que, quando estou fazendo meu esbocinho, as ideias comentam: “Ele está só fazendo esboço. Não é preciso ir lá. Quando ele começar a escrever, então apareceremos.

Fonte: Revista Língua Portuguesa, Ano II, número 20, 2007

Atividade V

Ao mesmo tempo em que Rubens Alves afirma que quando vai escrever coloca as ideias no papel, como se fosse um mapa, seguindo, portanto, um planejamento, o autor enfatiza que esse é um procedimento inútil, porque no processo de escrita ele se depara com cenários imprevistos e que se deixa embrenhar por eles. A posição de Rubem Alves contraria o pensamento de autores como Garcez (2004), Sercundes (2000) de que os bons escritores planejam e revisam até chegar ao produto final. Comente.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Concepções de linguagem X ensino de línguaAntunes (2003) atesta que para toda prática pedagógica está sub-

jacente uma concepção de língua, ou seja, tudo que se realiza no con-texto escolar está respaldado em princípios teóricos.

Nesse contexto, Antunes apresenta duas concepções que norteiam o fazer do professor em sala de aula.

“a) uma tendência centrada na língua enquanto sistema em potencial, enquanto conjunto abstrato de signos e de re-gras, desvinculado de suas condições de realização;

b) uma tendência centrada na língua enquanto atuação so-cial, enquanto atividade e interação verbal de dois ou mais interlocutores e, assim, enquanto sistema-em-fun-ção, vinculado, portanto, às circunstâncias concretas e diversificadas de sua atualização”.

Essa segunda tendência teórica possibilita um trabalho pedagógico mais produtivo e relevante, pois promove um ensino da língua a partir da perspectiva interacionista. Esse deve constituir o ponto de referência para qualquer ação pedagógica.

Práticas de produção de textos na escolaA prática de produção de textos na escola tem se limitado a exer-

cícios mecânicos, de decodificação e repetição de estruturas “prontas” preconizadas pelo professor. Privilegia-se desse modo, a forma em de-trimento do conteúdo. Cabe ao aluno, cumprir uma tarefa solicitada pelo professor, a quem cabe avaliar apenas o produto final, com base nas normas que regem a língua padrão.

Fala-se, todo momento em “crise da leitura” e atribui-se a culpa do baixo desempenho linguístico dos alunos a falta de leitura. Tal fato acaba por provocar uma ruptura da noção de líng ua subjacente às Teorias da Comunicação e às da linguagem, em contraposição à con-cepção de linguagem da Análise do Discurso que concebe a linguagem não como um mero transmissor de informações, mas como produto de efeitos de sentido entre interlocutores, a partir de um contexto social e histórico. Dessa forma, numa visão discursiva, a linguagem tem que se relacionar com a exterioridade, tendo em vista determinadas condições de produção, para fazer sentido.

Apesar de o professor, na maioria das vezes, tentar trabalhar com temas que considera estarem diretamente ligados à realidade dos alu-nos, estes se reconhecem neste processo como um mero cumpridor de tarefas, alguém que produz um texto para um destinatário - o professor, mas ao contrário, como um ser social que busca interagir com um leitor potencial através de seu texto.

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Atividade VISegundo Garcez (2004), é sobre uma base de orientação que o produtor do texto vai coordenar seu próprio trabalho, monitorando-o para que não fuja da rota e desande em outras direções. Leia as propostas de escrita abaixo retiradas de livros didáticos de Língua Portuguesa e comprove até que ponto essa base de orientação está sendo colocada em prática nos livros didáticos.

Proposta A

Produza um relato de uma viagem (que você realmente tenha feito ou apenas imaginado, mas relate como se tivesse ocorrido). Siga o modelo lido, comece seu texto da mesma forma. Veja uma su-gestão:

O velho fusca estava prestes a dar a partida para a Praia Gran-de para continuarmos nossa solitária volta pelo litoral paulista. A próxima parada seria o Forte, mas mudei de ideia e segui para Ocean.

Fonte: CAMPOS, Elizabeth; CARDOSO, Paula Marques e ANDRADE, Silva Letícia. Viva Português. V. único - ensino médio. São Paulo: Ática, 2008, p. 132

Uma escrita controladaDentro desse mesmo contexto, Soares (2001) ao tratar do texto es-

crito nas séries iniciais defende que “aprender a escrita não é um pro-cesso de etapas sucessivas, em que, numa primeira etapa, instrumen-taliza-se o aprendiz (para que se aproprie do sistema de escrita), e só numa segunda etapa se passa a desenvolver o uso efetivo da escrita.” (p. 57)

A escola parece ter uma necessidade de controlar as condições de escrita, através da imposição de temas, obedecendo a “sugestões” que segundo a autora “cerceiam as possibilidades de uso da escrita como forma de comunicação e de interação” (p. 58). É o que podemos cons-tatar na proposta de escrita descrita a seguir:

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ZACCUR, Edwiges (org.). A magia da linguagem. Rio de Janeiro: DP e A: SEPE, 2001, p.59.

Podemos comprovar que esse tipo de proposta de escrita controla tudo o que a criança terá que escrever, estabelecendo até mesmo a estrutura do texto e dos períodos, cabendo ao aluno apenas preencher as lacunas de um modelo que lhe é imposto.

Sendo assim, na descrição, não há lugar para a “invenção”, pois cada característica que progressivamente vai constituindo o objeto des-crito se inspira nestas representações, não permitindo o desenvolvimen-to da “imaginação”, conforme o próprio título da proposta de escrita “Vamos imaginar”.

A escola utiliza uma “linguagem vazia” em que os princípios básicos da textualidade são violados, reduzindo-se a escrita a uma sequência de frases desligadas uma das outras sem obedecer a nenhuma ordem, progressão sem remeter a um contexto social.

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 33

Essa é uma concepção de escrita que se fundamenta ns repetição, imitação, denominada por Soares (2001) de “escrita controlada” (p. 55). É o que podemos comprovar na situação de escrita abaixo:

ZACCUR, Edwiges (org.). A magia da linguagem. Rio de Janeiro: DP e A: SEPE, 2001, p.54.

Ao abordar a questão das descrições, Geraldi (1997) argumenta que “as instruções sobre a descrição acabam esquecendo que as ativi-dades discursivas de descrição de um objeto são reguladas em que a criança apenas imita, reproduz frases soltas, treinadas nas chamadas redações escolares.

a) pela finalidade da descrição;

b) pela natureza do objeto da descrição;

c) pelos interlocutores a que a descrição se destina;

d) pelas representações que faz o locutor do objeto que descreve. ”(148)

Isso ocorre porque os textos produzidos na escola não são resultado de um trabalho discursivo, mas limitam-se a meros exercícios de descri-ção para comprovar que o aluno aprendeu a descrever.

Ao descrever os aspectos físicos e psicológicos de uma pessoa, po-de-se generalizar o que deveria ser exemplar, particular.

Na tentativa de minimizar as dificuldades enfrentadas no momento da produção textual, Geraldi (1997) aponta algumas condições exigi-das no momento da produção de textos:

a) se tenha o que dizer;

b) se tenha para quem dizer o que se tem a dizer;

c)o locutor se constitui como tal, enquanto sujeito que diz o que diz para quem diz (o que implica responsabilizar-se, no processo, por suas falas);

d) se escolhem as estratégias para realizar (a), (b), (c), e (d). (p. 160)

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Nesse contexto, o aluno assume o papel de condutor do processo de aprendizagem, considerando a relação interlocutiva como princípio básico a orientar todo o processo de produção de textos.

Se tomarmos o texto como parte constitutiva a partir de uma visão interacionista, a atividade de escrita deve ser compreendida a partir das condições de produção defendidas por Geraldi (1997).

Sendo assim, nas palavras de Antunes (2003), “a escrita, na diver-sidade de seus usos, cumpre funções comunicativas socialmente espe-cíficas e relevantes”. (p. 47).

Por outro lado, as práticas de escrita no contexto escolar nem sem-pre cumprem com essas funções comunicativas. Veja o depoimento de um aluno sobre a prática de escrita:

“Não, eu não faço nada para a escola, a maioria do tempo eu não aproveito nada (...) eu não apro-veito a escola, (...) eu não gosto de estudar (...) prefiro fazer para mim do que para a escola.”

Na fala desse aluno parece haver uma diferença muito grande entre aquilo que ele gosta, valoriza, o que lhe interessa é muito diferente do que é oferecido pelos esquemas institucionais, pela escola.

Dessa forma, Freitas (2003) lamenta que a escola desperdice os potenciais criativos dos alunos, seus interesses, tornando-se incapaz de explorá-los.

A escola precisa, portanto, acabar com o discurso da mesmice, com uma escrita que não existe socialmente e dar espaço para um trabalho funcional, de forma a ampliar as competências comunicativo-interacionais do aluno.

Resumo

Os avanços nos estudos sobre produção de textos apontam a escri-ta não como um dom- restrito a poucos- ou como produto- resultado de atividades prévias, mas como uma atividade processual e recursiva, sendo, portanto, realizada em etapas. Aqui sintetizamos alguns mitos que se perpetuam ao longo de toda uma tradição escolar sobre o pro-cesso de escrita a partir de posicionamentos de grandes escritores sobre

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 35

essa atividade. Nesta unidade buscou-se oferecer condições para que você leitor pudesse analisar suas próprias práticas de escrita e as viven-ciadas no contexto escolar fazendo um paralelo com as perspectivas teóricas abordadas.

Autovaliaçãoa) Em sua opinião, qual a importância do conhecimento das correntes

teóricas e as práticas efetivas de produção de texto?

b) Nesta unidade, você pode rever todo o seu percurso escolar e profissional quanto à atividade de escrita. Agora após toda a teoria estudada, faça um confronto com o que você considera uma escrita eficaz

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Leituras recomendadas

SCHON, Carme Regina e RÖSING, Tania M. K. Questões de escrita. Passo Fundo: UPF, 2005.

Esta é uma boa oportunidade para você leitor aprofundar seus conhecimentos, a partir da multiplicidade de abordagens que a escrita suscita.

COSTA VAL, Maria da Graça e ROCHA, Gladys e (orgs.). Reflexões sobre práticas escolares de produção de texto. Belo Horizonte: Autêntica/CEALE/FAELE/UFMG, 2005.

Encontramos nesta obra uma reflexão sobre os processos de apropriação de habilidades textuais-discursivas, tendo como eixo principal a construção do discurso escrito no contexto escolar.

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 37

ReferênciasANTUNES, Irandé. Aula de Português: encontro e interação. São Paulo: Parábola, 2003.

GARCEZ, Lucília H. do Carmo. Técnica de redação: o que é preciso saber para bem escrever. São Paulo: Martins Fontes, 2004.

PASSARELI, Gliuro Liliaan. Por que eles relutam em escrever. São Paulo: Olho D´ água, 2001.

SERCUNDES, Maria Madalena. Ensinando a escrever. In CHIAPPINI, Ligia (coordenad.). Aprendera ensinar com textos. São Paulo: Cortez, 2002. p. 75-97.

YUNES, Eliana e OSWALD, Maria Luiza. A experiência da leitura. São Paulo: dições Loyola, 2003.

ZACCUR, Edwiges (org.). A magia da linguagem. Rio de janeiro: DP&A: SEPE, 2001.

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III UNIDADE

Tipologia textual X

gênero textual

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Apresentação

O advento da análise linguística transfrástica nos anos 60 trouxe com ela a origem da linguística textual que impul-sionou uma discussão sobre os tipos de textos. Os próprios PCNs recomendam que o ensino de língua portuguesa deve se respaldar na diversidade textual.

Por outro lado, não basta que o aluno tenha acesso a uma diversidade de textos de cunho social, é preciso tam-bém que o professor oriente o trabalho com textos, a partir de objetivos bem definidos, da identificação das formas de organização dos textos, das situações de uso (quem escreve sobre o que escreve, para quem escreve, e com que objetivo escreve.

Deve-se ressaltar, entretanto, que não se pode garantir uma tipologia única e sistemática dos textos. Tal constata-ção resultou em diferentes trabalhos sobre esse tema. De um lado, teorias que defendem a forma ou a estrutura, limi-tando-se a um repertório de expressões estilísticas e organi-zacionais, e, de outro, as teorias de texto que concebem os gêneros como entidade dinâmica, processual, social, intera-cionista e cognitiva.

Todo esse trabalho tem como objetivo facilitar a operacio-nalização no contexto escolar de atividades de interpretação e produção de textos que circulam no contexto social. Nesta unidade, trabalharemos esse primeiro enfoque – tipologia textual- e, posteriormente, trabalharemos com o segundo

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 41

enfoque – gêneros textuais discursivos.

Objetivos

Desse modo, temos como objetivo nesta unidade:

• Refletir sobre o trabalho com a diversidade de textos no contex-to escolar;

• Compreender práticas de escrita a partir da teoria da tipologia de textos;

• Constatar as limitações de um trabalho com tipologia para o ensino de texto

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Tipo ou gênero: eis a questãoIniciaremos esta unidade com uma reflexão sobre as diferentes te-

orias de gênero.

Scneuwly e Dolz (2004), professores da Universidade de Genebra e seguidores da teoria do interacionismo sociodiscursivo, defendem uma proposta de ensino de gêneros textuais em sala de aula que pode tra-zer resultados significativos para o trabalho com leitura e produção de textos no contexto escolar. Esses autores argumentam que é dever da escola auxiliar o aluno a dominar as características específicas de de-terminados gêneros de textos. Diante disso, questionamos:

• O que são gêneros textuais?

• Qual a diferença entre tipo e gênero?

Tentaremos a partir de agora responder a esses questionamentos.

Adotaremos, aqui o conceito de Backtin (2003) sobre gênero tex-tual, denominado por esse autor de gênero do discurso “tipos relati-vamente estáveis de enunciados, definidos por seu conteúdo temático, por seu estilo e por sua construção composicional”.

Desse modo, os tipos de texto abrangem um número finito de ca-tegorias, (narrativo, descritivo, informativo, argumentativo, injuntivo e explicativo) ao contrário dos gêneros que são inúmeros: contos, piadas, cartas, listas de compras, artigos horóscopo, resenha, charge, cartum, outdoor, notícia, receita, etc. A seguir apresentaremos exemplos de três gêneros, aproveite para identificá-los.

Gênero textual: _________________________________________

Fonte: NASPOLINI, A. T. Didática de português: tijolo por tijolo: leitura e produção escrita. São Paulo: FTD, 1996.

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Gênero textual: ____________________________

Gênero textual: ____________________________

Fonte: Mini Almanaque de receitas - Ano 2º, nº 23, 2008.

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44 SEAD/UEPB I Prática Pedagógica III

A busca por uma classificação dos gêneros

É inegável que com o desenvolvimento da linguística textual, o tra-balho com os gêneros assumiu uma outra dimensão no tratamento com o texto. Evidencia-se assim uma preocupação em criar uma tipologia para os textos. E, para isso, foram sendo estabelecidos critérios de clas-sificação de textos a partir das funções da linguagem, intencionalida-de do emissor, prosa de base, traços linguísticos ou estruturais, efeitos pragmáticos, variedades da linguagem, recurso estilísticos e retóricos (KAUFMAN, 1995).

Com a criação de tipologias textuais, esperava-se que os profes-sores pudessem agora operacionalizar com os textos de forma a fa-cilitar o processo de produção e interpretação de textos no contexto escolar,melhorando a competência comunicativa dos alunos.

Ao tentar designar os diferentes textos, Kaufman e Rodrigues (1995), mesmo reconhecendo as variedades, peculiares aos diferentes textos, apontam dois critérios para a categorização dos textos - o da função da linguagem e o da trama - que predominam na construção dos textos.

Considerando-se as funções da linguagem, os textos podem ma-nifestar diferentes intenções do emissor: convencer, seduzir, entreter, sugerir estados de ânimo, etc.. Consequentemente, pode-se categori-zar os textos, levando-se em consideração a função da linguagem que neles predomina.

Já a trama consiste em diferentes modos de apresentar determina-dos conteúdos: alguns textos narram acontecimentos, outros comen-tam, explicam e discutem. Essas tramas são as chamadas narrativas, argumentações, descrições e conversação.

Desse modo, por entendermos o critério das funções da linguagem como reducionista, incapaz, portanto, de isoladamente dar conta de uma classificação satisfatória para os textos, adotou-se o critério da trama em correspondência com as funções da linguagem. Tal proce-dimento resultou no quadro abaixo apresentado por Kaufman e Rodri-gues na tentativa de estabelecer uma classificação para os textos.

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Prática Pedagógica III I SEAD/UEPB 45

KAUFMAN, A. M.; RODRÍGUEZ, M. H. Escola, leitura e produção de texto. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995, p 18.

Vamos para a prática...

Atividade I

Leia os textos a seguir e, como forma de aprimorar seu olhar frente à questão dos gêneros e dos tipos textuais, preencha o roteiro de análise a seguir:

TEXTO 1

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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46 SEAD/UEPB I Prática Pedagógica III

Revista Língua Portuguesa. Ano II. Nº 24, 2007. p. 10

TEXTO 2

Jornal da Paraíba, 08/08/2010.

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Um olhar sobre o trabalho com gêneros nos livros didáticos

Atividade IIApesar de os livros didáticos reconhecerem a necessidade de um trabalho voltado para os gêneros textuais, parece ainda haver uma grande preocupação com a tradicional classificação dos textos quanto à sua tipologia. Em uma seção do livro didático, intitulado “Redação”, a ênfase recai sobre a descrição em detrimento do gênero utilizado. Leia a situação abaixo e comente de que forma o estudo da tipologia se sobrepôs ao do gênero.

FARACO E MOURA, linguagem nova. São Paulo: Atica, 2002, p.39 e 40.

Faça a descrição subjetiva de um objeto que chama sua atenção ou pelo qual você tem muito apego. Pode ser um objeto de sua casa, da escola, da sua cidade etc.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Atividade III

É comum encontrarmos em livros didáticos um trabalho voltado para os gêneros textuais. No livro Português: Linguagens: Literatura-produção de texto-gramática: volume 1: ensino médio, de Cereja e Magalhães, os autores após apresentarem textos de diferentes gêneros, solicitam que o aluno aponte o texto cujo objetivo principal é:

a) relatar experiências vividas;b) narrar uma história fictícia;c) argumentar para persuadir o interlocutor sobre um ponto de vista;d) instruir como proceder para obter um resultado

Analise a proposta de leitura acima, mostrando até que ponto o estudo dos gêneros está sendo contemplado em uma atividade desse tipo e de que forma percebe-se uma superficialidade no tratamento dos gêneros textuais.

Em toda a disciplina Prática Pedagógica III, tentaremos oferecer subsídios, para um trabalho voltado para a produção textual no coti-diano escolar. Para tanto, trabalharemos com uma variedade de textos, atentando para as condições de produção em que esses textos circu-lam dentro e fora do contexto escolar, uma vez que acreditamos na concepção de que a diversidade textual contribui para a expansão do conhecimento do aluno.

É seguindo esse paradigma que esta disciplina orientará o aluno para as tendências metodológicas voltadas para a produção de textos, a partir da análise de materiais didáticos utilizados, muitas vezes como único material de suporte do professor.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Leituras recomendadas

Segue algumas indicações de leitura que permitirão um maior aprofundamento do tema abordado nesta unidade:

ROJO, Roxane (org.). A prática de linguagem em sala de aula: praticando os PCNs. São Paulo: EDUC; Campinas, SP: Mercado de Letras, 2000.

Obra voltada para o professor, discute propostas e experiências de implementação do PCN – Língua

Portuguesa, no que diz respeito à organização de programas de ensino, à preparação e uso de material didático.

BAZERMAN, Charles. Gêneros textuais, tipificação e interação. São Paulo: Cortez, 2005.

Esta é uma enriquecedora contribuição para os estudos da tipologia textual. Nesta obra podemos encontrar uma visão menos delimitada e mais dinâmica da tipificação.

Resumo

É explícita a preocupação das escolas quanto à necessidade do tra-balho com a diversidade textual no ensino de língua portuguesa. Essa nova perspectiva de trabalho com o texto lançou uma luz sobre o tema e já apresenta resultados significativos. Dentro desta reflexão cabe um espaço especial ao ensino de gêneros textuais. Por outro lado, essa perspectiva teórica de texto tem trazido limitações, pois não consegue dar conta da gama de textos presentes na sociedade, originando as-sim, novas teorias de texto que concebem o texto a partir da teoria dos gêneros textuais.

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50 SEAD/UEPB I Prática Pedagógica III

Autovaliação

A teoria da tipologia textual consegue dar conta da gama de textos presentes na sociedade?

Em que consiste a limitação da teoria de texto centrada na tipologia textual?

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Referências

BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

KAUFMAN, Ana M. e H. RODRIGUES. Escola, leitura e produção de textos. Porto Alegre: Artes Médicas.

SCHNEUWLY, Bernard e DOLZ, Joaquim. Gêneros orais e escritos na escola. Campinas: Mercado de Letras, 2004

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IV UNIDADE

Gêneros textuais e ensino

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Apresentação

Dando continuidade ao trabalho com o texto, convida-mos você leitor para uma reflexão mais profunda sobre as teorias de gênero que concebem os gêneros como entidades dinâmicas, processuais, sociais, interativas e cognitivas.

Os gêneros serão entendidos a partir do seu caráter de dinamicidade, situacionalidade, e historicidade, não deven-do ser classificáveis como formas puras, nem catalogadas de maneira rígida. Esse é portanto, o momento em que você poderá refletir sobre a sua prática com o texto escrito, não apenas no contexto escolar, mas em toda a sua experiência.

Tendo em vista as mudanças ocorridas no tratamento com o texto, orientadas principalmente pelos documentos oficiais, cabe ao professor viabilizar o acesso do aluno ao universo dos gêneros textuais, considerando as práticas so-ciais em que estão inseridos.

O grande desafio do professor é, portanto, buscar estra-tégias eficazes para inserir o aluno no contexto letrado de escrita, em função das situações em que os leitores estão inseridos. Trabalharemos com atividades práticas e/ou de análises, com vistas a um aprofundamento da sua prática pedagógica.

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Objetivos

Esperamos que ao final dessa unidade, você

• Compreenda a relação entre tipologia e gênero textual;

• Saiba identificar atividades de produção textual em livros didá-ticos, numa perspectiva dos gêneros textuais

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Primeiras palavrasÉ consenso que o ensino de língua portuguesa deve estar centra-

do no texto. No entanto, algumas práticas comprovam que o texto é, muitas vezes, compreendido como fonte ou pretexto para exploração de questões gramaticais e atividades de decodificação de leitura. Desse modo, no contexto escolar ainda predomina uma prática chamada por Antunes (2009) de reducionista, em que o texto é visto como um objeto meramente lingüístico, deixando para trás outras dimensões textuais relevantes em situações sociocomunicativas.

Por outro lado, assistimos a um amplo desenvolvimento de novos modelos teóricos através da instauração dos documentos oficiais (PCN, PNLD e SAEB) que representaram um redimensionamento do estudo da linguagem.

A esse respeito, Albuquerque (2006) alerta que “os professores pa-recem não estar se servindo dos novos modelos teóricos que estão pre-sentes nos documentos oficiais orientadores da organização da prática docente” (p. 11). Para essa autora, o texto deve ser o eixo norteador do ensino de língua portuguesa na sala de aula e, por isso “enfatiza-se a necessidade de se ler, produzir diferentes gêneros de textos, conside-rando seus portadores, funções sociais, o contexto de produção, suas estruturas e características linguísticas, entre outros aspectos mencio-nados nas propostas curriculares para o ensino dessa disciplina nas escolas” (p. 22).

Desse modo, Brandão (2001) defende uma abordagem sócio-inte-racionista da linguagem, considerando-se os tipos diferentes de textos e as diferentes formas de textualização, de acordo com as situações de interlocução.

Nesse sentido, cada texto se identifica pela predominância de um desses modos de organização. Vejamos os textos a seguir e o quadro demonstrativo das características do gênero RECEITA e do modo de organização predominante, a injunção.

TEXTO 1

Fonte: COCCO, Mª Fernandes. HASLER, Marcos Antonio. Didática da alfabetização decifra o mundo: alfabetização e socioconstrutivismo. São Paulo: FTD, 1996, p. 48.

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TEXTO 2

COCCO, Mª Fernandes. HASLER, Marcos Antonio. Didática da alfabetização decifra o mundo: alfabetização e socioconstrutivismo. São Paulo: FTD, 1996, p. 61.

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Quadro demonstrativo

Gênero Receita

Objetivo do gênero Ensinar os passos de um procedimento

Modo de organização do discurso Injuntivo

Objetivo da organização injuntiva Dizer como fazer, requerer uma ação, levar à realização de uma situação

Ponto de vista do enunciador Perspectiva do fazer posterior ao momento da produção do texto

Tempo de ocorrência no mundo real Sequencialidade

Recursos lingüísticos utilizados pelo autor Como a injunção é o discurso do fazer e do acontecerem, os recursos lingüísticos predominantes dizem respeito ao uso do modo imperativo, de expressões temporais, de substantivos e adjetivos para enumerar os ingredientes, de numerais para quantificá-los

Fonte: PEREIRA, Cilene Mª da Cunha at all. Gêneros textuais e modos de organização do discurso.: uma proposta para o ensino de leitura. In. PAULIUKONIS, Mª Aparecida Lino e SANTOS, Leonor Werneck (orgs.). Estratégias de leitura texto e ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2006, p. 27-58.

Por outro lado, apesar de os textos 1 e 2 se diferenciarem quanto à linguagem utilizada (texto1 = referencial e texto2 = metafórico), ambos apresentam estrutura de textos injuntivos, como poderemos ver a seguir.

a) Objetivo com que o texto é produzido

O texto 1 tem como objetivo ensinar a preparar uma torta de ba-nana; já o texto 2, utilizou-se da organização injuntiva para criticar o método tradicional de alfabetização. Por isso, nos dois textos há uma preocupação em primeiro listar os ingredientes e depois explicar o modo de fazer (denotativamente no texto 1 e metaforicamente no texto 2), permitindo ao leitor alcançar o sucesso desejado.

b) Ponto de vista em que o locutor /enunciador se coloca – perspectiva do fazer posterior ao momento da produção do texto

Percorrem-se mentalmente as etapas indicadas nas duas receitas, pensa-se em como cada uma delas deve ser executada. É possível no texto 1 formar uma representação do prato, mas no texto 2, apesar de a autora seguir os mesmos procedimentos do texto 1, isso não foi possível, uma vez que o sentido de cada enunciado do texto 2 está não no nível explícito dos enunciados, mas no nível mais profundo do texto, cabendo ao leitor perceber a intencionalidade do autor, através das pis-tas linguísticas deixadas no texto. Sendo assim, apesar de os dois textos

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serem construídos seguindo a estrutura injuntiva, no texto 2, a constru-ção de sentidos dependerá dos conhecimentos prévios do leitor sobre a temática desenvolvida no texto, no caso métodos de alfabetização.

c) Tempo de ocorrência no mundo real – sequencialidade

No texto injuntivo, a sequencialidade é de suma importância, pois ajudará o leitor a realizar a tarefa e ser bem sucedido no caso do texto 1, já no caso do texto 2, se seguida essa sequência, o leitor terá como resultado uma alfabetização tradicional.

d) Recursos linguísticos utilizados pelo autor – discurso do fazer (ações) e do acontecer (fatos e fenômenos)

• Os verbos que ocorrem nos dois textos referem-se ao fazer: mis-ture, arrume, cubra leve, pegue, limpe, lave, enfie coloque-a, sirva,ponha, abra, mexa, entre outros;

• O que diferencia os dois textos é a linguagem metafórica utili-zada para nomear tanto os ingredientes quanto as ações;

• Nos dois textos, o uso do imperativo serve para expressar o desejo de executar uma tarefa ou induzir um determinado com-portamento: arrume misture, sirva, espete, entre outros.

Situações como as expostas acima devem ser incorporadas as prá-ticas pedagógicas, de forma a ampliar a competência de leitura e pro-dução de textos do aluno.

Sendo assim, ao se trabalhar com produção de um determinado gênero deve-se entender essa operacionalização como um modo de atuação sócio-discursiva numa cultura.

A escola deve, portanto, promover situações reais em que o aluno possa conhecer e utilizar os mais diferentes gêneros de circulação so-cial, pois conhecer os diferentes gêneros faz parte de nosso conheci-mento de mundo e nosso acervo cultural.

Atividade I

Leia os textos abaixo e relacione as características do gênero e do modo de organização dos discursos, preenchendo os quadros a seguir: dica. utilize o bloco

de anotações para responder as atividades!

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Texto 01

Fonte: Jornal da Paraíba, 12/12/2010.

Gênero

Objetivo do gênero

Modo de organização do discurso

Objetivo da organização expositiva

Ponto de vista do enunciador

Tempo de ocorrência do mundo real

Recursos linguísticos

TEXTO 2

O anúncio de Bilac(A função do poeta)

O dono de um pequeno comércio, amigo do grande poeta Olavo Bilac, abordou--o certa vez na rua:

- Sr. Bilac, estou a precisar vender a minha propriedade, que o Senhor tão bem conhece. Poderia, por gentileza, redigir o anúncio para a venda no jornal?

Olavo Bilac apanhou o papel que o amigo lhe estendia e escreveu:

VENDE-SE ENCANTADORA PROPRIEDADE

“Vende-se encantadora propriedade, onde cantam os pássaros ao amanhecer no extenso arvoredo. Cortada por cristalinas e marejantes água de um ribeiro. A casa, banhada pelo sol nascente, oferece a sombra tranqüila das tardes, na varanda”.

“Meses depois, o poeta reencontrou o comerciante e perguntou-lhe se havia con-seguido vender a propriedade”.

- Nem pense mais nisso Sr. Bilac! Quando li o anúncio que o senhor escreveu é que percebi a maravilha que tinha nas mãos.

Às vezes não descobrimos as coisas boas que temos conosco e vamos longe atrás de Miragens e falsos tesouros. Valorize o que você tem. A pessoa que está a seu lado, os amigos que estão junto a você, o emprego que Deus lhe proporcionou, o conhecimento adquirido, a sua saúde, o sorriso... Enfim, tudo aquilo que Nosso Senhor nos oferece diariamente para o nosso crescimento espiritual.

Disponível em: http://www.pensador.info/autor/Olavo_Bilac/.

Acesso em: 28 de setembro de 2010.

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Gênero

Objetivo do gênero

Modo de organização do discurso

Objetivo da organização expositiva

Ponto de vista do enunciador

Tempo de ocorrência do mundo real

Recurso linguísticos

É nessa linha de pensamento que se inserem os estudos da lingua-gem na busca por uma classificação dos diferentes gêneros do discurso e suas implicações para o ensino.

Na verdade, os estudos sobre gêneros surgiram desde Platão e Aris-tóteles e têm ao longo dos tempos representado uma preocupação dos estudiosos da linguagem.

Desse modo, à medida que avançam os estudos sobre o texto, como objeto de ensino, surge a necessidade de uma tipologização, termo utilizado por Brandão 2001. Ao mesmo tempo, essa autora re-conhece a limitação de uma teoria baseada em tipologia, devido ao caráter heterogêneo da linguagem.

Nesse contexto teórico, destacamos o posicionamento de Pereira (2006) ao afirmar que “em cada texto, portanto, podem-se combinar diferentes modos de organização do discurso (narrativo, descritivo, ex-positivos, argumentativos, injuntivos e dialogal) em função do tipo de interação que se estabelece entre os interlocutores” (p. 42).

É nesse contexto que surgem os gêneros do discurso, que segundo Brandão 2001:

As ações de linguagem se concretizam discursivamen-te dentro de um gênero de discurso como um pro-cesso de decisão. Nas mesmas condições contextuais, para um mesmo referente, os discursos produzidos podem apresentar características diferentes. (p. 26)

Na verdade, vislumbra-se uma mudança no foco quanto ao trata-mento da linguagem.

Hila (2009) relaciona a questão de gêneros à noção de práticas sociais. Para a autora,

A escola precisa formar leitores críticos que consi-gam construir significados para além da superficia-lidade do texto, observando as funções sociais da leitura e da escrita nos mais variados contextos, a fim de levá-los a participar plena e criticamente de práticas sociais que envolvem o uso da escrita e da oralidade. (p. 159)

Nesse sentido, os gêneros correspondem as diferentes maneiras de expressar a linguagem a partir de determinadas práticas sociais na ma-terialização dos diferentes tipos de textos. A esse respeito, Hila (2009)

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defende a idéia de que não se pode mais usar em sala de aula ape-nas a noção de tipologias textuais, definindo os textos em narrativos, descritivos, expositivos e injuntivos, uma vez que essas formas textuais não dão conta dos inúmeros textos que circulam no contexto social, a exemplo dos textos que trazem múltiplos sistemas de linguagem (verbal, visual, audiovisual, gestual), como as histórias em quadrinhos, charges, anúncios publicitários, e muitos outros textos.

Desse modo, nas palavras de Hila (2009) “cabe ao professor a tarefa de dar a oportunidade aos alunos de se apropriarem das carac-terísticas discursivas e linguísticas dos mais variados gêneros textuais, inseridos em práticas reais e contextualizadas, de modo a fazê-los le-trados” (p. 161).

Reflexão sobre as teorias de gênero

Vale frisar aqui o posicionamento de Antunes (2009) ao criticar o fato de os estudos da linguagem considerarem, até certo momento, especificamente aspectos lingüísticos em detrimento das práticas so-ciais e das práticas discursivas, pois só essas práticas permitem que se percebam os modos de construção de textos reais, situados no tempo e no espaço.

Sob essa perspectiva teórica dos gêneros, Antunes (2009, p.54) destaca os seguintes pontos:

Fonte: ANTUNES, Irandé. Língua, texto e ensino: outra escola possível. São Paulo: Parábola, 2009, p. 54.

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Nessa perspectiva teórica dos gêneros discursivos, Bazerman (2006) defende que os textos que circulam no contexto escolar devem significar mais do que uma repetição ritual de proposições padronizadas. Sendo assim, a escolha dos gêneros escritos que os alunos produzirão não pode ser feita aleatoriamente, nem sem que os alunos tomem consciência dessas escolhas, uma vez que toda produção escrita exige diferentes posiciona-mentos, comprometimentos e metas. Nesse sentido, nas palavras desse autor, o gênero exerce papel modelador na atividade educacional. Assim, decidir quais textos funcionam em uma determinada sala de aula vai de-pender de uma negociação entre as instituições, o professor e os alunos, de forma a atingir os objetivos e suprir as necessidades de cada parte.

Dentro desse contexto, Bazerman (2006) chama atenção para a importância da motivação. Nas palavras desse autor,

Aprender a escrever é um trabalho duro, que re-quer o domínio de problemas de escrita cada vez mais difíceis, de modo que, se quisermos que nos-sos alunos aprendam a escrever, nós precisamos identificas os tipos de produção escrita com os quais eles vão querer trabalhar com afinco e os tipos de problemas de escrita que eles vão que-rer solucionar. Uma vez que os alunos aprendem o que é comprometer-se profundamente e escrever bem em circunstâncias particulares, eles passam a perceber as possibilidades de participação letra-da em qualquer arena discursiva. Além disso, em qualquer nova circunstância discursiva em que se envolvam, eles terão pelo menos um conjunto de práticas bem desenvolvidas com as quais podem fazer analogias e estabelecer contrastes (p. 33).

Atividade IILeia a proposta de escrita abaixo e confronte com a posição de Bazerman de que os textos que circulam na escola devem significar mais do que uma repetição ritual de proposições padronizadas.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Como os escritores MIllôr Fernandes e Sérgio Capparelli, recriam a fábula “O sapo e o boi” ou a fábula “A cigarra e a formiga”, apresentada no boxe “Fábulas em verso de Bocage, Machado de Assis e outros”.

Siga estas orientações:

a) As personagens das fábulas “O sapo e o boi” ou “A cigarra e a formiga” devem ser as mesmas de sua história. Os fabulistas geralmente escolhem animais como personagens porque eles apresentam certas características que fazem lembrar atitudes humanas. A formiga, por exemplo, é trabalhadeira, organizada; a raposa, esperta, inteligente; o cão, fiel, amigo, protetor; a cobra, astuta, perigosa; o corvo, agourento; o leão, vaidoso; o cordeiro, ingênuo, inocente.

b) Caracterize as personagens de forma simples. Para isso, empregue palavras como, por exemplo, astuto, frágil, inteligente, lento, forte, perigoso, feroz, desconfiado, esperto, traiçoeiro, etc.

c) Lembre-se de que a fábula constitui uma narrativa curta. Se quiser, você pode escrever sua narrativa em forma de diálogo. A linguagem empregada deve estar de acordo com a variedade padrão da língua.

d) Como nas fábulas o tempo e o lugar são imprecisos, procure iniciar seu texto de forma direta, isto é, com as personagens em plena ação. Lembre-se de que sua história deve transmitir um ensinamento.

e) No final, escreva a moral da história, adaptada à nova situação, e dê um título à sua fábula.

f) Faça um rascunho e só passe seu texto a limpo depois de realizar uma revisão cuidadosa, seguindo as orientações do boxe Avalie sua fábula. Refaça o texto, se necessário.

FONTE: CEREJA, Willian Roberto e MAGALHÃES, Thereza Cochar Magalhães. Português Linguagens: Literatura – produção de texto – gramática: volume 1: ensino médio. 5 ed. São Paulo: Atual, 2005.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Leituras recomendadas

DIONISIO, Angela Paiva. Gêneros textuais e ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.

As discussões teóricas e as análises de gê-nerosincluídas neste livro trazem uma contri-buição valiosa para o ensino e a formação de professor de língua.

Resumo

Nos últimos anos, os estudos da linguagem tomaram um novo rumo. O texto passou a ser o foco no ensino de Língua Portuguesa. Surgem, com isso, as teorias de gênero, que aos pouco vão sendo incorporadas as práticas pedagógicas e ampliando a competência de leitura e produção de texto dos alunos. O texto passa a ser compreen-dido a partir de seu caráter de dinamicidade, situacionalidade e histori-cidade, deixando de lado a classificação rígida e pura dos textos como era entendida anteriormente.

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Autovaliação1) Em forma de depoimento, descreva como foi sua prática com os gêneros

no contexto escolar e confronte com os novos estudos sobre gênero.

2) Leia no volume de Língua Portuguesa dos Parâmetros Curriculares Nacionais o tópico referente aos gêneros textuais e verifique o que você já realiza na sua prática.

3) Aponte as limitações de um trabalho com textos que despreza as práticas sociais e mostre de que forma o professor pode possibilitar o acesso do aluno ao contexto letrado de escrita.

ReferênciasALBUQUERQUE, Eliana Borges Correia de. Mudanças didáticas e pedagógicas no ensino da língua portuguesa: apropriações de professores. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.

ANTUNES, Irandé. Língua, texto e ensino: outra escola possível. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.

BAZERMAN, Charles; HOFFNAGEL, Judith Chambliss e DIONISIO, Ângela Paiva (orgs.). Gênero, agência e escrita. São Paulo: Cortez, 2006.

BRANDÃO, Helena Nagamine. Texto, gênero do discurso e ensino. In. CHIAPPINI, Ligia (org.). Gêneros do discurso na escola. São Paulo: Cortezeditora, 2001, p. 17-45

HILA, Cláudia Valéria Dona. Ressignificando a aula de leitura a partir dos gêneros textuais. In: NASCIMENTO, Elvira Lopes (org.). Gêneros textuais: da didática das línguas aos objetivos de ensino. São Carlos: Claraluz, 2009, p. 151-194

PEREIRA, Cilene Mª da Cunha at all. Gêneros textuais e modos de organização do discurso.: uma proposta para o ensino de leitura. In. PAULIUKONIS, Mª Aparecida Lino e SANTOS, Leonor Werneck (orgs.). Estratégias de leitura texto e ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2006, p. 27-58.

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V UNIDADE

Jornal na escola: propostas teórico-metodológicas

de orientação para um trabalho de leitura e produção de textos

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Apresentação

Nesta unidade, você terá a oportunidade de trabalhar com o jornal no contexto escolar, de forma a ampliar o uni-verso dos alunos, ajudando a formar leitores e produtores de textos competentes. Defende-se a utilização do jornal na sala de aula como instrumento de apoio pedagógico, de incentivo à prática de leitura e como forma de superar as dificuldades de leitura, incentivando práticas que levem a um convívio natural com os gêneros de textos que compõem um jornal. Desse modo, o trabalho com o jornal possibilita a formação de leitores críticos e conscientes. Nesta aula, os alunos aprenderão a reconhecer e utilizar as diferentes for-mas de organização textual e os recursos linguísticos típicos de cada gênero presente no jornal. O trabalho com textos de jornais permitirá o reconhecimento de regularidades na estrutura desses gêneros textuais. A utilização desses textos é uma oportunidade de o aluno utilizar a língua nos mais di-versos usos do dia a dia, uma vez que constituem interações sociais, semelhantes as realizadas na escola.

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Objetivos

Esta unidade permitirá ao aluno:

• Reconhecer os gêneros textuais que circulam em jornais impres-sos;

• Utilizar o jornal como instrumento de apoio didático, de incen-tivo à prática de leitura e escrita no contexto escolar;

• Analisar as diferentes formas de organização textual e recursos linguísticos presentes nos textos jornalísticos.

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Desenvolvendo competências leitoras

Para desenvolver competências leitoras, a escola deve possibilitar o acesso do aluno à leitura de jornais , considerando que o jornal traz uma gama variada de assuntos abordados que podem interessar tanto adultos quanto crianças. Nesse sentido, é importante que a escola trate o aluno como um leitor comum do jornal, permitindo que manuseiem por inteiro e não apenas recortes de textos, levando o aluno a buscar os cadernos que mais interessem, e que decidam se após a leitura de títulos, subtítulos e início de cada texto se vale a pena ler até o final. Esse fato ocorre por-que, segundo Boa Ventura e Diniz Bahia (2007), ao manusear um jornal,

o aluno está aprendendo a fazer escolhas críticas em relação ao que quer e quando quer ler. Ele elege a reportagem, seção ou coluna que mais desperta seu interesse naquele momento. E esta seleção, em si, já implica em posicionamento crítico, participativo, de-notando liberdade democrática de escolha. (p. 174)

A esse respeito, reportamo-nos também a Daniel Pennac sobre os direitos do leitor, em que o autor chama atenção sobre o direito de não ler e de pular páginas.

Diante da diversidade de textos presentes nos jornais, Paulino (2001) recomenda a utilização de diferentes estratégias de leitura, uma vez que os textos de jornal foram construídos com objetivos e públicos diversificados.

Sendo assim, diante de um texto assume-se diferentes posiciona-mentos, pode-se ler uma notícia buscando somente informações a res-peito de um fato, sem se preocupar com análise nem comparações com outras notícias, e de outro lado, lê-se uma notícia, reconhecendo que esta é sempre resultado de uma subjetividade de quem a escreveu, considerando o lugar social e uma visão de mundo.

Essa última abordagem pressupõe um leitor crítico, pois mesmo diante de textos de natureza imparcial, lê nas entrelinhas, buscando estabelecer sentido para o texto. Nesse contexto, Paulino (2001) reforça

Para se fazer essa leitura, torna-se necessário conhe-cer o processo de enunciação em que se envolve o jornal. Um jornalista, o enunciador da notícia, é o sujeito primeiro da cadeia enunciativa, o respon-sável pela notícia, até mesmo juridicamente. Mas, como já foi dito, ele se inscreve num processo mais complexo que implica outros enunciadores: a equi-pe de redação, o editor, os agentes de notícias, os proprietários dos jornais, os valores que circulam nos textos, tanto os explícitos pela linha editorial, como aqueles inerentes ao grupo social do jornalista ou

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dos anunciantes que, na verdade, mantêm o jornal. A organização textual por mais que se queira isenta, deixa transparecer valores que, muitas vezes, não se queriam explícitos. Além da cadeia enunciativa, ou-tros elementos podem ser eficientes operadores de leitura crítica, entre eles, o espaço. (p. 47)

Desse modo, cabe a escola trabalhar com a linguagem do jornal, mostrando os valores e preconceitos incutidos nos mais diferentes textos que compõem um jornal.

A leitura do jornal permite ainda que os alunos aprendam a reco-nhecer e a utilizar diferentes formas de organização textual e os recur-sos lingüísticos típicos de cada modalidade.

Diniz (2007) defende a leitura do jornal como uma alternativa para superar as dificuldades de leitura dos alunos. O jornal na escola representa um instrumento de apoio didático e de incentivo à prática de leitura, pois oferece atualidade e contexto, contribuindo assim para a formação de lei-tores críticos e conscientes da realidade social e política que os cerca.

Nas palavras de Boa Ventura e de Diniz Bahia (2007)

a leitura de jornal enriquece o vocabulário, amplia a compreensão de textos e reforça a capacidade de retenção de conhecimento, alarga a visão pes-soal de mundo e estimula o interesse por temas atuais e assuntos locais, regionais ou globais. Traz portanto,o pensamento nacional para a escola e provoca os alunos para questões próximas a eles,pois dizem respeito direta ou indiretamente às suas vidas,demandando posicionamento crítico,o que colabora para a formação cidadã. A compe-tência em leitura é requisito imprescindível à con-solidação da plena cidadania. (p.175)

Desse modo, os professores podem planejar e produzir junto aos alu-nos seus próprios jornais escolares, podendo ser veiculados na própria escola, ou na sociedade, o que importa é que a produção do jornal repre-senta um instrumento de comunicação social legítimo e independente.

Lerner (2002) questiona como são hoje as práticas de leitura e de-nomina as leituras de jornais como leituras privadas ou compartilhadas, pois lê-se um jornal na intimidade e comentam-se as notícias. Desse modo, nas palavras dessa autora,

“as leituras e as escritas aparecem sempre inseridas nas relações com as outras pessoas, supõem inte-rações entre leitores acerca dos textos: comentar com outros o que se está lendo, recomendar o que se considera valioso, discutir diversas interpretações de uma mesma obra, intercambiar ideias sobre as relações entre diferentes obras e autores.” (p. 61)

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Vale lembrar que o uso dos jornais na escola atende também aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). A utilização do jornal per-mite que se trabalhe com leitura/interpretação sob o prisma reflexivo e crítico, podendo ser trabalhado não apenas na disciplina de língua portuguesa e em qualquer faixa etária.

A prática de utilização do jornal na escola, segundo Lerner, permite que o aluno se aproprie

dos traços distintivos - mais ou menos canônicos - de certos gêneros, de ir detectando matizes que distin-guem a linguagem que se escreve e a diferenciam da oralidade coloquial, de pôr em ação – enquanto praticantes da leitura e da escrita – recursos linguís-ticos aos quais é necessário apelar para resolver os diverso problemas que se apresentam ao produzir ou interpretar textos. (p. 64)

Dentro desse contexto, Lerner afirma que a escola tem hoje um grande desafio o de inserir todos os alunos à cultura do escrito. E, para isso, “é necessário reconceituar o objeto de ensino e construí-lo tomando como referência fundamental as práticas sociais de leitura e escrita.” (p. 17)

É necessário, no entanto, que o professor tenha conhecimento do nível dos alunos para poder introduzir as atividades propostas a partir dessa realidade.

A falsa impessoalidade e objetividade do texto jornalístico é per-cebida no momento em que esse veículo de comunicação “filtra as notícias que lhe interessam e utilizam tipos de discurso que servem aos seus propósitos ideológicos e políticos” (FARIA, 1989).

Os integrantes dos jornais afirmam que procuram apresentar a in-formação sem julgamento, com imparcialidade. Porém pela perspec-tiva Baktiniana, todo enunciado constitui-se a partir de outros com os quais dialoga.

(...) todo enunciado é dialógico. Portanto o dialogis-mo é o modo de funcionamento real da linguagem, é o princípio constitutivo do enunciado. Todo enun-ciado constitui-se a partir de outro enunciado, é uma réplica a outro enunciado. Porém, nele ouvem-se sempre, ao menos duas vozes. Mesmo que elas não se manifestem no fio do discurso, estão aí presentes. Um enunciado é sempre heterogêneo, pois ele re-vela duas posições, a sua e aquela em oposição a qual ele se constrói. (FIORIN 2006, p. 24)

Com a utilização de textos de jornais além de aprofundarmos o do-mínio da língua, desenvolvemos o espírito crítico e possibilitamos que o aluno identifique a linha editorial do jornal.

Kaufmam (1995) chama a atenção para a distribuição e o destaque

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dado aos títulos dos textos jornalísticos, como uma forma de melhor conhecer a ideologia do jornal, permitindo, portanto, ao leitor perceber a importância que a publicação deu ao conteúdo desses textos. Nesse sentido, Kaufman, declara que

É pertinente observar como os textos jornalísticos distribuem-se na publicação para melhor conhecer a ideologia da mesma. Fundamentalmente, a pri-meira página, as páginas ímpares e o extremo su-perior das folhas dos jornais trazem as informações que se quer destacar. Esta localização antecipa ao leitor a importância que a publicação deu ao con-teúdo desses textos. (p. 25)

Dentro dessa mesma linha de pensamento Paulino () acrescenta que “o jornal não é um veículo isento e imparcial como quer parecer, pois está vinculado ao interesse dos anunciantes, além, é claro, da sua linha política.” (p. 55).

Para entendermos melhor o funcionamento dos textos jornalísticos, remeteremos a uma breve explanação sobre os gêneros notícia e re-portagem.

NotíciaKaufman e Rodrigues definem notícia como “unidades informativas

completas que contêm todos os dados necessários para que o leitor compreenda a informação, sem necessidade ou de recorrer a textos anteriores (Poe exemplo, não é necessário ter lido os jornais do dia anterior para interpretá-la), ou de ligá-la a outros textos contidos na mesma publicação ou em publicações similares.”

Segundo Faria (), a notícia se caracteriza pela objetividade em que predomina a função referencial. Sendo assim, na produção de uma no-tícia é necessário que se apure os fatos, selecione os dados importantes e os interprete, utilizando para tanto da linguagem formal.

Por outro lado, Paulino () a respeito da objetividade da notícia alerta para o fato de que

a notícia é sempre fruto de um recorte do real, já que quem escreve o faz a partir de um lugar social, o que implica uma visão de mundo marcada pela subjetividade em suas relações com outras pessoas e com os fatos. Além disso, tal postura é restrita pelo próprio jornal e sua linha ideológica. (p. 46)

Para tanto, convém observar também o espaço da notícia no jornal, pois esse fato revela a importância dada a notícia pelo jornal em que uma seção ou caderno ela foi veiculada. A esse respeito, Paulino cha-

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ma atenção para a organização textual desse gênero textual, deixando transparecer valores que, muitas vezes, não se pretendia explicitá-los. Seguindo essa perspectiva teórica, podemos trabalhar na sala de aula, comentando uma notícia e respeitando as diferentes posturas adotadas pelos alunos.

ReportagemÉ um texto jornalístico que assim como a notícia, exige uma apu-

ração e seleção dos fatos, interpretando o tratamento a partir de uma apresentação mais livre e mais variada.

Faria () aponta os seguintes passos para a elaboração de uma re-portagem:

• Elaboração da pauta;

• Planejamento de como o assunto deverá ser tratado, desde as leituras até discussões sobre o assunto até chegar à redação final;

• Trabalho de campo – entrevista, enquetes, fotos, levantamento de dados, observação direta dos fatos, etc.;

• Apuração, análise e organização dos fatos;

• Redação da reportagem – une informação e emoção.

Fonte: http://maringa.odiario.com/blogs/odiarionaescola/files/2010/06/2010-FOTO-LEITURA-O-diario-na-escola-ivatuba.jpg

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Atividade I

1. Escolha um jornal de divulgação local e aponte os gêneros de textos encontrados.

2. Examinar as manchetes da primeira página de um jornal de circulação local e analisar a posição ideológica do jornal em função do espaço destinado a cada manchete.

3. Escolha uma notícia sobre um fato que lhe tenha chamado atenção e compare o tratamento dado a um mesmo tema em, pelo menos, dois jornais.

Ao final desta atividade você verá que a notícia relatada no texto jornalístico pode não ser exatamente o fato ocorrido, mas a versão do jornal sobre esse fato.

A linguagem jornalística e as funções da linguagem

Faria () chama atenção para três funções da linguagem - expressiva, referencial e a conativa- utilizadas de forma explícita ou implícita nos textos jornalísticos.

Desse modo, para essa autora cada jornal buscando atingir um público alvo, escolhe a função lingüística predominante, de modo a atrair os leitores. Assim, alguns jornais procuram tornar dominante o aspecto referencial das informações, outros se concentram na função expressiva, explorando mais questões emocionais e sensacionalistas e outros se utilizam da função conativa, tendo como objetivo orientar o leitor a partir de posições ideológicas. Essa última função, geralmente, aparece disfarcadamente em alguns jornais.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Função referencial Ao se utilizar da função referencial, o texto jornalístico prioriza a

mensagem sem distorção da informação. Através desta busca-se nar-rar os fatos com a maior objetividade possível, sem grandes interferên-cias da posição ideológica do jornal. Vale frisar, portanto, que é a partir da linguagem referencial que podemos medir o maior ou menor grau de objetividade dos jornais.

Essa busca pela objetividade é percebida, segundo Faria () pelo “vocabulário escolhido e certas estruturas lingüísticas, tendendo a subs-tituir o acidental, o particular, o individual pelas formas impessoais e genéricas (p. 51).

Dentro desse mesmo contexto, Lage (1990) conclui que

a busca de enunciados mais referenciais, concretos justifica muito do trabalho na apuração de notícias: a hora exata do atropelamento, a placa do carro, o nome inteiro das pessoas, o número do túmulo vão ter, no texto, efeito de realidade, isto é, contribuir para a verossimilhança da história (p. 42).

Esse mesmo autor ressalta a importância do vocabulário jornalísti-co como influência ideológica na escolha de determinadas palavras. Sendo assim, o trabalho com o texto jornalístico na sala de aula é, se-gundo Lage ( 1990) “ um bom momento para o professor conscientizar os alunos sobre a extrema dependência da semântica em relação ao contexto em que as palavras são usadas” (p. 53).

Função expressivaFunção centrada no remetente, com ênfase na carga emocional.

Esta função pode ser reconhecida quando o redator posiciona-se dian-te dos fatos. Farias lembra, no entanto, que essa carga emocional, às vezes, ocorre de forma dissimulada numa aparente objetividade.

No texto jornalístico, isso é percebido em manchetes com o objetivo de prender a atenção do leitor. Segundo Faria (1989),

é comum também em textos de redatores que usam o jornal para fazer o leitor viver emocionalmente um acontecimento qualquer, sobretudo os ligados às ocorrências policiais, catástrofes e coisas do gênero, onde os elementos passionais são predominantes. Frequentemente ela se entrelaça com a função co-nativa, às vezes de forma indivisível, quando o texto quer ao mesmo tempo influenciar o leitor e passar--lhe, através da vivência das emoções, determinadas idéias, versões do fato, posturas ou reações (p. 63).

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É comum nessa função utilizar-se vocabulário de impacto, denomi-nada Por Faria de palavra-choque.

A apelação a emoção é percebida, principalmente, nos textos vei-culados em sessões policiais e esportivas de um jornal, buscando atin-gir, segundo essa autora “o sadismo disfarçado, o gosto pelo mórbido (doença, morte) e servindo de catarse para seus impulsos inconscientes anti-sociais recalcados” (p. 65). Nesse contexto, recorre-se muitas ve-zes para o imaginário do leitor.

A partir desses diferentes níveis de linguagem, o professor poderá aprofundar os recursos da língua, bem como a percepção do valor se-mântico atribuído as palavras, do valor conotativo diferente e da impor-tância da sinonímia. Entendendo que os sinônimos nunca substituem totalmente outra palavra, pois a significação dependerá dos diferentes contextos em que as palavras podem ser usadas.

Função conativaFunção centrada sobre o destinatário. É comum encontrarmos não

só em textos publicitários, mas também em textos jornalísticos que bus-cam induzir posturas ideológicas. Vale ressaltar, no entanto, que nem sempre essas posturas são explicitas, às vezes dissimula-se uma deter-minada ideologia, buscando atingir uma classe social menos escolari-zada e mais passível de ser manipulada.

Atividade II

1. Analisar manchetes sensacionalistas, procurando descobrir os elementos lingüísticos que estão ali presentes

2. Reescrever essas mesmas manchetes utilizando-se da função expressiva.

3. Análise dos efeitos de sentidos causados a partir da mudança lingüística realizada no item 1 e 2.

4. Escolha livros didáticos do primeiro grau e analise até que ponto o trabalho com o jornal está desenvolvendo a capacidade lingüística dos alunos. Não esqueça de utilizar exemplos.

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Resumo

Esta unidade oferece encaminhamento teórico-metodológicos para a orientação no trabalho com a leitura e produção de textos a partir da apropriação do texto jornalístico como instrumento de apoio didático para o incentivo à prática de leitura e produção de textos, bem como o desenvolvimento do senso crítico.

AutovaliaçãoAnalise até que ponto as atividades de leitura e escrita desenvolvidas a partir de textos jornalísticos, propiciam ao aluno aprendiz produzir textos autênticos que reproduzam as práticas de linguagem.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Rerefências

DINIZ BAHIA, José Péricles. Jornal na escola: estratégias de uso para a construção de cidadania. Salvador, nº 11, p. 171-187, 2007.

FARIA Mª Alice de Oliveira. O Jornal na sala de aula. São Paulo: Contexto, 1997.

FIORIN, José Luiz, O dialogismo. In: Introdução ao pensamento de Backtin. São Paulo: Ática, 2006, p. 18-59.

KAUFMAN, Ana Maria e RODRIGUES, Maria Helena. Escola, leitura e produção de textos. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.

LAJE, Nilson. A estrutura da notícia. São Paulo, Ática, 1985.

_________. Linguagem Jornalística. São Paulo: Ática, 1990.

LERNER, Delia. Ler e escrever na escola: o real, o possível e o necessário. Porto Alegre: Artmed, 2002

PAULINO, Graça et. al. Tipos de textos, modos de leitura. Belo Horizonte: Formato, 2001.

PONTUAL, Joana Cavalcanti. O jornal como proposta pedagógica. São Paulo, Paulino 1999.

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VI UNIDADE

A atividade de produção textual e o livro didático

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Apresentação

Esta 6ª unidade estará focada nas atividades de produ-ção textual nos livros didáticos, atentando para as condições de produção que envolvem o processo da escrita.

A atividade de escrita deve ser aqui compreendida como uso lingüístico, a partir de um contexto histórico e social. Utilizaremos como suporte teórico as recomendações dos PCNs que determinam que a atividade de escrita deveria re-sultar de algumas decisões: escolher um determinado gêne-ro discursivo, atentando assim para o que se escreve, para que se escreve e em que esfera e em que suporte os textos deverão circular.

Nesta unidade, buscaremos discutir aspectos relaciona-dos à concepção de escrita em livros didáticos de língua portuguesa, considerando-se o papel do livro didático no ensino aprendizagem da escrita.

Trataremos nesta unidade de aspectos relacionados ao processo de didatização como recurso indispensável no en-sino da escrita, e a posição do professor diante desses textos, assumindo uma postura crítica a partir de práticas sociais re-ais em que os alunos estão inseridos.

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Objetivos

Nesta unidade, você deverá:

• Analisar atividades de escrita em manuais didáticos, a partir da perspectiva de uso da língua;

• Refletir sobre o processo de didatização e as conseqüências para um trabalho de produção textual.

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O livro didático em questão

O Livro didático é considerado como um discurso de verdade, de-vido o seu caráter homogeneizante, a repetição de estruturas homo-geinizantes, a repetição de estruturas comuns a todas as unidades e a apresentação dos conteúdos. Segundo Coracini (1999), essa estrutura cristalizada dos livros didáticos “contribui para corroborá-lo como um discurso de verdade, revela o seu caráter massificante ao negar espaço para a individualidade do aluno, abafando a expressão da voz de cada um.” (p. 69)

Por outro lado, não se pode negar que o livro didático tem sido quase que exclusivamente, a principal fonte de material didático utili-zado pelo professor. No tocante às atividades de produção de texto, a autora alerta que “as atividades de escrita apenas camuflam o desejo de fixação da gramática da língua, do vocabulário, da ortografia e de outros aspectos formais, nem sempre assumidos como objetivos das atividades”. (p. 129).

A autora levanta ainda um importante questionamento

“se considerarmos que os objetivos pretendidos são o desenvolvimento da produção escrita, aqui entendida como momento de expressão criativa, qual seria a função de tantos exercícios de cópia, ou de respostas a perguntas sobre um texto já lido, ou de reescritura de frases, substituindo algumas palavras pelos seus sinônimos”, (p. 129).

As atividades de redação ocupam quase sempre a última seção do livro didático. Subjacentes a essas atividades de escrita estão as concep-ções de professor e de aluno apresentadas por Carmagnani (1999)

a) Professor como reprodutor de conteúdos X Aluno como receptor;

b) Professores e alunos como seres despolitizados e ideologicamente neutros;

c) Professores e alunos como personagens executoras de tarefas;

d) Professores e alunos como sujeitos despreparados para a produ-ção escrita

Vale ressaltar ainda que o livro didático utiliza-se, na maioria das vezes, de roteiros, fórmulas, contendo a verdade do processo de apren-dizagem como se houvesse apenas uma maneira de proceder.

Dessa forma, além do tema que é sempre sugerido e das ações, que se deseja dirigir, encontram-se atividades que delimitam o que o

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aluno deverá escrever, ou até mesmo as palavras que devem ser intro-duzidas.

Segundo Coracini (1999), “a escola deveria ser o lugar que pro-move a possibilidade de autoria vista enquanto produção de sentidos e não enquanto reprodutora da impossibilidade de criatividade espontâ-nea, romântica e idealizada, fruto de inspiração divina” (p. 140)

Chegou a hora de exercitar!!!

Atividade ILeia a atividade de produção textual retirada do livro didático “Linguagem Nova – 6 série, de Faraco e Moura e confronte com o posicionamento de Carmagnani ao afirmar que algumas atividades de escrita no livro didático apenas camuflam o desejo de fixação de alguns aspectos formais, nem sempre assumidos como objetivos das atividades.

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Vamos trilhar os caminhos do livro didático...

Atividade IILeia as propostas de produção de texto e explique de que forma essa tendência dos livros didáticos de roteirização pode levar a homogeinização dos textos produzidos e construir no imaginário do aluno a noção de que escrever é sempre uma tarefa escolar obrigatória e vigiada.

Proposta 1

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Proposta 2

Atividade III1. Leia as duas propostas de escrita abaixo e identifique em qual dessas

propostas, o roteiro oferece orientações mais consistentes. Justifique seu ponto de vista.I

Proposta 1

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Proposta 2

2. A partir dos pontos levantados até aqui, a que fatores você atribui as dificuldades que muitos alunos demonstram no momento da produção escrita? Comente.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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O processo de didatizaçãoX

atividades de produção textual

Brandão (2001) define os textos que circulam na escola de textos didatizados. Esse processo de didatização ocorre em dois níveis.

No primeiro nível de didatização, inserem-se os textos encontrados nos livros didáticos. Esses textos, embora não tenham sido escritos com a finalidade do ensino são utilizados para a elaboração de exercícios pelos autores desses manuais.

Para Brandão, ao se utilizar dos textos do livro didático, o professor representa o papel de mero transmissor de textos já didatizados.

No segundo nível, o professor exerce papel mais atuante, parti-cipando mais ativamente do processo, recorrendo a textos de fontes diversas e elaborando sua proposta de trabalho. Brandão alerta, no entanto, para as três formas de manusear esses materiais:

• “a primeira, quando o professor, no momento da pesquisa, se restringe a consultar outros materiais e deles retira seu material de aula, sem uma elaboração própria. Apesar do recorte, ele ainda é um mero transmissor de um processo já desenvolvido por outrem, e assim a didatização de texto se aproxima do pri-meiro nível;

• a segunda, quando o professor consulta vários livros didáticos, seleciona um texto e elabora seu próprio trabalho. Aqui a dida-tização se aproxima do segundo nível;

• a terceira, quando o educador pesquisa diretamente em jor-nais, revistas, livros, e, com o que considera adequado, elabora ele mesmo o seu trabalho. Com essa postura, ele se instaura como sujeito do processo de didatização. Nesse momento, tem--se o segundo nível propriamente dito.” (p. 32)

O livro didático representa, na maioria das situações, recurso de larga utilização tanto de professor como de alunos, que passaram a utilizá-lo como passo a passo para o ensino-aprendizagem. Espera-se, no entanto, que o trabalho com esses gêneros didáticos aconteça a partir de condições de produção que se aproximem ao máximo de reais situações de comunicação.

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Conteúdo ideológicodos livros didáticos

Brandão alerta para o conteúdo ideológico veiculado através dos textos dispostos nesses manuais. Trata-se assim, de “valores Pré-estabe-lecidos na sociedade e que são mantidos sutilmente através de estereó-tipos sociais registrados em suas páginas. Esse fato pode ser percebido através da forma uniforme e de estruturas cristalizadas do livro didático, transformando-se em regras a serem seguidas, não deixando espaço para que se possa discordar e se discutir a respeito.

A realidade das práticas de escrita a que os alunos foram subme-tidos no processo escolar, tem papel significativo para entendermos a realidade de escrita dos nossos alunos.

Costa Val (2003) analisando as propostas de escrita de livros di-dáticos, conclui que “as propostas, em geral, não indicam objetivos para a elaboração textual: o aluno é convidado a escrever sem refletir quanto às metas que deveria imprimir a seu texto. A não explicitação de finalidades para a escrita faz pensar em objetivos de natureza escolar, pressupostos e previamente aceitos por todos os envolvidos: escrever para atender às demandas do professor, para ter nota”. (p. 133).

Produção de texto X destinatário

Um outro aspecto muitas vezes ignorado nas propostas de escrita nos livros didáticos é a necessidade de indicar destinatário para o texto do aluno, tendo-se na maioria das situações, o professor como leitor preferencial dessas produções. Consequentemente, parece não haver uma preocupação com a construção da imagem adequada do leitor, a partir da perspectiva dialógica.

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Por outro lado, alguns livros didáticos, segundo Costa Val utilizam, embora de forma eventual da figura abstrata de um leitor, sem que tenha uma preocupação em delinear um perfil desse leitor.

A esse respeito, Costa Val (2003) adverte que ao se caracterizar um possível leitor, deve-se também encaminhar uma reflexão sobre as estratégias discursivas mais apropriadas para que se alcance os obje-tivo da produção textual, fato não comprovado no exemplo acima. As propostas de escrita deveriam, assim dedicar uma atenção maior aos recursos lingüísticos: escolha de palavras, construção sintática, dando ao texto o tom adequado de acordo com o estilo do leitor que se quer atingir.

Leitura RecomendadaGERALDI, João Wanderley. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

Esta é uma obra que nos remete ao mundo da escrita e aos aspectos envolvidos nessa ativida-de. Não perca a oportunidade de ler !!

Resumo

Considerando que os livros didáticos representam, na maioria das vezes, o único material utilizado pelos professores, dedicamos esta 6ª aula a uma análise das práticas de escrita no livro didático. A partir das propostas de escrita analisadas, constatou-se que muitos materiais didáticos, apesar de inovarem quanto à presença constante de gêne-ros, limitam-se a imitação de modelos de textos, desprezando a função social. Há portanto, uma tendência à didatização dos textos, ou seja, trabalha-se com diferentes gêneros sem que se tenha uma preocupa-ção com um destinatário real.

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AutovaliaçãoProduza um resumo informativo sobre o conteúdo abordado nesta unidade. Lembre-se de seguir a estrutura de resumo: um único parágrafo, ser fiel as idéias dos autores, não copiar, não utilizar-se de exemplos).

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

Referências

BRANDÃO, H. e MICHELETTI, G. (Orgs.) Aprender e ensinar com textos didáticos e paradidáticos. São Paulo: Cortez, 2001.

CARMAGNANI, Anna Maria G. A concepção de professor e de aluno no livro didático e o ensino de redação em LM e LE. In CORACINI, Mª José. Interpretação, Autoria e Legitimação do Livro Didático. Campinas, São Paulo: Pontes, 1999.

CORACINI, Maria José. (Org.) .Interpretação, Autoria e legitimação do livro didático. Campinas, São Paulo: Pontes, 1999.

COSTA VAL, Maria da Graça. Atividades de produção de textos escritos em livros didáticos de 5ª a 8ª séries do ensino fundamental. In: ROJO, Roxane e BATISTA, Antônio Augusto Gomes (Orgs.). Livro didático de língua portuguesa, letramento e cultura da escrita. Campinas, São Paulo: Mercado das Letras, 2003. P.125-152.

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VII UNIDADE

Produção textual e o processo de reescritura

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Apresentação

Até agora defendemos a perspectiva teórica de escrita como processo. Para dar continuidade a esse trabalho, de-dicaremos esta sétima unidade a Reescritura, considerando uma das etapas, indispensáveis no momento da produção textual.

A atividade de escrita representa um desafio não apenas para o aluno, mas também para o professor, que diante das inovações nos estudos, considerando hoje a teoria dos gê-neros como elemento norteador para um trabalho de escrita eficaz, procura adaptar-se as novas metodologias, encon-trando nesse momento dificuldades de conduzir o processo.

A esse respeito, caros alunos, tentaremos apresentar um encaminhamento teórico que possibilite um melhor encami-nhamento das práticas de escrita no contexto escolar. Nesta unidade serão analisadas questões diretamente relaciona-das à condução das atividades de reescritura textual.

Tentaremos juntos dar um novo direcionamento as ativi-dades de escrita. E, para isso, adotaremos procedimentos mais eficazes no tratamento com a escrita, enfatizando, neste momento, a etapa de reescritura, como uma etapa indispen-sável no processamento de produção textual. Desse modo, a aprendizagem da escrita deve ser aqui compreendida como um processo e não um produto. Consideraremos a escrita como uma atividade de interlocução e de mediação pelo outro que não se encerra quando termina a primeira versão. A reescritura faz parte do processo de produção de textos em que sob a orientação do professor, o aluno é instigado a aprimorar seu texto.

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Objetivos

Ao término desta unidade, esperamos que você:

• Compreenda quais aspectos da estrutura do texto são mais re-levantes no momento da reescritura;

• Entenda a reescritura como uma etapa do processo de produ-ção de texto;

• Analise até que ponto as orientações do livro didático sobre reescritura contribuem para o desenvolvimento da capacidade de produzir textos escritos.

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Um pouco de teoria...

O processo de reescritura de textos

A atividade de reescritura representa etapa indispensável no proces-so de escrita. E, para tanto deve-se fazer releituras que ajudarão nesse processo de reconstrução textual.

Na visão de Garcez (2004), ao revisar o texto, o aluno terá a opor-tunidade de reavaliar algumas decisões tomadas no início do processo – o da produção do texto, colocando-se agora na posição de leitor, para observar se há incoerência e descontinuidades. A esse fenômeno, Gehrke (1993) chama de “troca de papéis de leitor e escritor: nesse processo interativo, as estratégias do leitor para abordar o texto estão inter-relacionadas com as habilidades do escritor de ajustar a sua ex-pressão às avaliações do seu outro-leitor.” (p. 11)

Garcez (2004) aponta algumas decisões importantes neste processo:

• Ao leitor: inseri-lo no texto ou tratá-lo de forma neutra e distan-ciada. A opção escolhida foi mantida durante todo o texto? O leitor que você tem em mente é atendido durante todo o texto?

• Ao gênero de texto: que plano de escrita utilizar para a situação. O formato é adequado à situação? As exigências referentes ao gênero foram respeitadas ou há ambigüidades e inconsistên-cias?

• Às informações: o que informar e o que considerar pressuposto. As informações fornecidas são suficientes ou o texto ficou muito denso, exigindo muito do leitor? A introdução de informações novas é bem realizada? Há informações irrelevantes que podem ser dispensadas? Há excesso de informações? Há informações incompletas ou confusas? As informações factuais estão corre-tas?

• À linguagem: formal ou informal. A linguagem está adequada à situação? A opção escolhida tornou o texto harmonioso ou há oscilações súbitas e inadequadas?

• À impessoalidade ou subjetividade. O posicionamento adotado como predominante mantém-se ou essa opção não ficou con-sistente no texto?

• Ao vocabulário. As escolhas estão adequadas ou há repetições enfadonhas e pobreza vocabular? Algum termo pode ser subs-tituído por expressão mais exata? Há clichês, frases feitas, ex-cesso de adjetivos, expressões coloquiais inadequadas, jargão profissional?

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• Às estruturas sintáticas e gramaticais. O texto está correto quan-to às exigências da língua padrão? As transições entre as idéias estão corretas e claras? Os conectivos são adequados às re-lações entre as idéias? A divisão de palavras corresponde às unidades de idéias?

• Ao objetivo e à situação. Está de acordo com o objetivo estabe-lecido inicialmente? As idéias principais estão evidentes? (p. 125)

Garcez (2004) defende ainda que na primeira versão de um texto priorizemos a criação das idéias, articulando-as de forma clara e co-erente. Há uma preocupação com o registro do fluxo do pensamento. Já no momento da reescritura, há uma preocupação com a forma mais adequada e com a melhor organização final das idéias.

Nesse aspecto, é imprescindível a releitura como uma forma de aperfeiçoar o texto, pois permite que se avalie o funcionamento do texto e se proponha reformulações.

Dentro desse contexto, remetemos ao pensamento de Schons (2005) para quem “a concepção de linguagem que orienta o trabalho da es-crita numa perspectiva discursiva é a da incompletude, tem memória e historicidade, haja vista que uma escrita apenas como uma estrutura, não produz sentidos, não tem autor, tem-se apenas, no caso da escola, um ‘aluno função’” (p. 142)

Desse modo, o trabalho de reescritura deve ocorrer de forma pro-cessual, constituindo-se etapa por etapa, e caracterizando o que alguns autores denominam de escrita como trabalho.

A noção de erroA atividade de reescritura segundo Leite e Pereira (2009) compre-

ende competências advindas tanto do professor como do aluno, o que nos faz refletir sobre “(1) a natureza da correção comumente realizada pelo professor; (2) a concepção tradicional do “erro” e (3) a importân-cia da reescritura no desenvolvimento das capacidades do aluno em elaborar textos”. (p. 6).

Deve-se atentar para a natureza dos erros. A esse respeito, Jesus (2001) alerta que, muitas vezes, o trabalho com reescritura na escola tem se limitado a elementos superficiais do texto em detrimento de aspectos textuais e discursivos característicos do texto. Essa autora denomina esse tipo de reescritura de “higienização” do texto ou “operação limpeza”.

Ao se limitar o processo de reescritura a elementos formais do texto, admite-se que um texto bem escrito é uma mera questão de domínio do código lingüístico. Assim, Jesus afirma que

A reescrita transformava-se numa espécie de “ope-ração limpeza”, em que o objetivo principal consis-tia em eliminar as “impurezas” previstas pela pro-filaxia lingüística, ou seja, os textos são analisados

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apenas no nível da transgressão ao estabelecido pelas regras de ortografia, concordância e pontu-ação, sem se dar a devida importância as relações de sentido emergentes na interlocução.” (p. 102)

Nesse sentido, afirma Antunes (2006) “fazer um texto não é apenas uma questão de gramática. É uma forma particular de atuação social que inclui o conhecimento de: a) elementos lingüísticos; b) elementos de textualização e c) elementos da situação em que o texto ocorre”. (p. 171)

Elementos lingüísticos correspondem ao léxico (conjunto de palavras da língua) e a gramática (conjunto de normas que regulam a combina-ção das palavras). No domínio do léxico, a autora alerta para a extre-ma importância que tem a escolha das palavras. Sendo assim, deve-se fazer uma análise cuidadosa quanto à escolha das palavras, buscando clareza e adequação ao contexto.

Elementos de textualização “abrangem todas as propriedades do texto (coesão, coerência, informatividade e intertextualidade) e todos os pro-cedimentos e estratégias de construção da sequência do texto” (p. 173);

Elementos da situação em que o texto ocorre dizem respeito a intenção ao se produzir um texto que pode ser de informar, advertir, expor, resumir, convencer, etc. Deve-se atentar também para as convenções que carac-terizam determinados gêneros textuais e ainda o domínio discursivo, ou seja, saber diferenciar um texto literário de um texto didático.

O interlocutor previsto diz respeito à previsão de um interlocutor, para podermos fazer escolhas, tomar decisões do que dizer e do como dizer (geralmente a escola não tem essa preocupação com o interlocutor, o aluno escreve para o professor.

As condições materiais são os suportes de divulgação, lugar onde o texto vai ser impresso.

Ancoragem do texto “em um contexto particular de enunciação, cujos componentes são essenciais para regular a forma e o conteúdo do texto que se vai produzir. Por exemplo, a interação que acontece numa aula ou numa conferência é bem diferente daquela que acontece numa lanchonete quando dois amigos conversam. (p. 175)

Desse modo, um texto não é composto apenas de elementos lin-güísticos em sua superfície, deve-se considerá-lo numa perspectiva multidimensional, podendo a qualquer momento mobilizar diferentes estratégias na sua construção.

Na visão de Leite e Pereira a reescritura deve ser entendida “ como etapa de melhoramento do texto, de forma a deixá-lo mais com-preensível ao interlocutor e a cumprir sua função comunicativa”. (p. 8)

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Atividade I1. A proposta de escrita abaixo se utiliza de dois modelos textuais –notícia e

crônica. Comente essa proposta, apontando as limitações desse tipo de proposta.

2. Leia as atividades a seguir e explique até que ponto a orientação para as reescritura representa uma possibilidade de um texto mais bem escrito.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

Proposta 1

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Proposta 2

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Papel do professor no processo de reescritura: uma intervenção necessária

Leite e Pereira chamam a atenção para a necessidade de orienta-ção dessa atividade de reescritura nas séries iniciais, para que passem posteriormente a condição de revisores de seus próprios textos. A esse respeito, Prestes (2001) defende

É extremamente importante uma intervenção eficaz do professor na fase de correção. E essa correção pouco ou nada adiantará aos alunos se cada falha não for localizada e designada de maneira mais rigorosa possível, explicitando os modos de funcio-namento que lhe dizem respeito. Assim, todas as tarefas de autocorreção precisam ser devidamente orientadas pelo professor. (p.31).

Por outro lado, deve-se tomar cuidado para que a orientação do professor não seja vaga e confusa para os alunos para que o processo de reescritura aconteça de forma satisfatória, levando o aluno a refletir sobre os pontos levantados no textos e aperfeiçoar cada vez mais a competência de escrita.

Assim, a presença do professor é indispensável, não como indi-cador dos desvios a serem solucionados, mas principalmente, como mediador do processo de reescritura.

Ruiz (2001) defende esse tipo de orientação a partir das correções feitas nos próprios textos dos alunos, através de correções escritas ao apontar determinados problemas, direcionando o olhar dos alunos para determinados aspectos das produções textuais. Desse modo, Ruiz defende correção como:

(...) o trabalho que o professor (visando à reescri-tura do texto do aluno) faz nesse mesmo texto, no sentido de chamar a sua atenção para algum pro-blema de produção. Correção é, pois, o texto que o professor faz por escrito no (e de modo sobre-posto ao) texto do aluno, para falar desse mesmo texto.” (RUIZ, 2001, p. 27)

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Tipos de correçãoRuiz (2001) apresenta quatro tipos de correção: correção resoluti-

va, correção indicativa, correção classificatória e correção textual inte-rativa.

a) Correção Resolutiva: o professor marca no texto os erros do aluno e ele mesmo reescreve. Limita-se principalmente a aspectos su-perficiais – convenções da escrita e norma padrão.

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b) Correção Indicativa: o professor apenas detecta os erros, cabendo a correção aos alunos. Neste caso, como não há nenhum co-mentário sobre a natureza do erro a reescritura pode não trazer resultados satisfatórios, pois o aluno pode não compreender a correção do professor quanto ao tipo de erro indicado.

c) Classificatória: consiste na identificação e classificação dos er-ros por meio de um conjunto de símbolos. Esses códigos podem aparecer tanto no corpo do texto como nas margens.

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d) Correção textual-interativa: ocorre através de comentários mais longos, através de bilhetes feitos à margem do texto ou abaixo do texto. Esses bilhetes servem tanto para “orientar a tarefa de revisão quanto aos problemas textuais (principalmente os de na-tureza mais global), seja para falar sobre a tarefa de correção do professor”. (LEITE e PEREIRA, 2009)

Leite e Pereira (2009) alertam para a pouca utilização desse tipo de correção e que quando acontecem às vezes restringem-se a comentá-

rios vagos e genéricos, que poderiam ser aplicados a quaisquer textos.

No entanto, considerando a escrita a partir de uma visão proces-sual, “a intervenção corretiva do professor pode orientar positivamente as atividades de reescritura, desde que sejam utilizados critérios que, de fato, promovam momentos de reflexão e reelaboração produtivas” (LEITE E PEREIRA, 2009, P. 44)

Esses autores apresentam um esboço dos elementos constitutivos do texto, considerando as capacidades de linguagem, a partir dos estudos do Interacionismo Sociodiscursivo.

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Atividade II

1) Escolha um livro didático de Língua Portuguesa de 1º ou 2º grau e analise até que ponto a atividade de reescritura está sendo contemplada nas atividades de produção textual. Não esqueça de apresentar exemplos dos próprios manuais e de estabelecer relação com os conhecimentos adquiridos nesta unidade.

2) Selecione três produções textuais de qualquer série e aplique os tipos de correção apontados por Ruiz (2001). Em seguida, demonstre qual tipo de correção é mais eficaz no processamento do texto.

Leituras recomendadasGARCEZ, L. A escrita e o outro: os modos de participação na construção do texto. Brasília: Editora da UnB, 1998.

Neste livro encontramos uma abordagem sobre o modo de participação dos alunos durante a atividade de produção textual em pesquisa realizada em uma escola pública.

SCHNEWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. Gêneros orais e escritos na escola. Tradução e organização Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas: Mercado de Letras, 2004.

Esta obra oferece orientações sobre os novos referenciais trabalhados nos PCNs sobre gêneros escritos e orais e como direcionar um trabalho de produção a partir dessas modalidades de texto.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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ResumoO trabalho com produção textual na escola ainda é considerado

um desafio tanto para alunos quanto para professores. Parece não ha-ver orientações consistentes no tratamento da escrita. A atividade de produção textual resume-se na maioria das vezes, a produção da pri-meira versão, desprezando a atividade de reescritura tão importante no processo de escritura. Observam-se algumas tentativas de trabalhar a escrita numa perspectiva processual, mas infelizmente, essa atividade limita-se, muitas vezes, à correção de elementos superficiais do texto, desprezando fatores semânticos e discursivos.

AutovaliaçãoFaça uma volta ao passado, no tempo em que você fazia 1º e 2º graus e reveja como acontecia a produção textual, e, em seguida confronte com as práticas de escrita nos dias atuais.

ReferênciasPEREIRA, Regina Celi Mendes e LEITE, Evandro Gonçalves. Implicações da correção do professor na reescrita do aluno: desenvolvendo as capacidades de linguagem. In GONÇALVES, Adair Vieira e BAZARIM, Milene (org.). Interação, Gêneros e Letramento: a reescrita em foco. São Paulo: ClaraLuz, 2009. P. 35-62.

RUIZ, Eliana. Como se corrige redação na escola. Campinas: Mercado de Letras, 2001.

JESUS, C.A.de. Reescrevendo o texto: a higienização do texto escrito. In: GERALDI, J. W.; CITELLI, B. Aprender e ensinar com textos de alunos. São Paulo: Cortez, 2001.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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VIII UNIDADE

Práticas de escrita X Oralidade

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Apresentação

Tentamos, ao longo desta caminhada pelas prática peda-gógica de ensino, refletir sobre as práticas de escrita no con-texto escolar. Nesse percurso, encontramos alguns desafios, abandonar a concepção de escrita como dom e adotar uma nova postura diante do texto escrito, a abordagem processu-al. Nesse sentido, tentaremos nessa unidade relacionar prá-ticas sugestivas que permitam um trabalho mais funcional, eficiente e prazeroso com a escrita.

Convém também nessa nossa caminhada dedicarmos um espaço para a questão da produção do texto oral e suas implicações para o ensino. Esse é o momento de nos de-bruçarmos sobre as características que delimitam os gêneros orais e repensarmos práticas pedagógicas capazes de reo-rientar o ensino de Língua Portuguesa, que durante muito tempo restringiu as aulas de produção do texto escrito, dei-xando em segundo plano os textos da oralidade.

Sabemos que o livro didático representa um guia de re-ferência para o trabalho do professor em sala de aula, por isso faremos nessa reta final uma reflexão mais detalhada do estudo dos gêneros orais nesses manuais.

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Objetivos

Sendo assim, ao final dessa unidade, esperamos que você:

• Compreenda a atividade de escrita a partir de uma abordagem processual;

• Reflita sobre as condições de produção fornecidas pelo livro didático para um trabalho eficiente com os gêneros orais.

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Usos da escrita – Escrita pra que te quero

Rememorando os principais usos da escrita, na visão de Vieira (2005,29), muito além de informar, a escrita é usada para dentre os usos, para:

• resolver nossas necessidades materiais;• influenciar os outros, mudando seu comportamento ou crenças;• estabelecer ou refletir relações com outras pessoas;• revelar como percebemos a nós mesmos, expressando senti-

mentos;• buscar novos conhecimentos;• exercitar a imaginação;• descrever e criticar situações ou idéias;• divertir;• estabelecer concordância ou expectativas;• rememorar o passado.

Podemos ainda usar a linguagem para informar, narrar, descrever, argumentar, elogiar, contestar, reclamar pedir, exigir, persuadir, fazer humor, entre tantas outras ações.

Em situações do dia a dia, as pessoas sabem para que e para quem estão escrevendo. Já no contexto escolar, esses fatores relativos à situação comunicativa e ao contexto que envolve a escrita não são considerados, pois, muitas vezes, o aluno é levado a escrever para “ninguém” ou para o professor ali, ao seu lado, sem entender, portanto, a finalidade dessa atividade.

Diante da complexidade do processo de escrita, assumimos dife-rentes posturas que vão desde a organização das idéias no texto, à escolha de suas estruturas e palavras, adequando esses fatores ao nível de formalidade e propósito comunicativo.

Motivação e o Desenvolvimento da EscritaA escrita passou nos últimos 30 anos por uma mudança de pers-

pectiva teórica, ampliando à visão de produto para processo. A partir da década de 60, foram acrescidos aspectos sociais e interacionais envolvidos na atividade de escrita.

Desse modo, independente da perspectiva teórica ou das implica-ções pedagógicas para o ensino, deve-se atentar para o aspecto da motivação para escrever, como tema indispensável de reflexão.

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Na tentativa de compreender a relação entre motivação e o desen-volvimento da escrita, Vieira (2005) apresenta dois tipos de motivação: a extrínseca e a intrínseca. A motivação extrínseca está condicionada, de acordo com a teoria do behaviorismo, a recompensas externas, e a motivação intrínseca diz respeito à liberdade de escolha e autonomia, “o que tem mais peso são as fontes de motivação e o poder de se auto- gratificar” (p.72).

Nos deteremos aqui a motivaçâo intrínseca, proveniente, de dois tipos de auto –percepção: a competência e a auto- determinação. Nas palavras de Vieira (2005), “o indivíduo é intrínsecamente motivado quando se percebe capaz de se envolver e de completar uma tarefa específica, assim como de ter algum controle sobre ela” (p.73).

O quadro abaixo reproduz algumas atitudes de intervenção possí-veis, tendo em vista uma maior motivação para redigir:

Neste âmbito, a escrita deve ser compreendida com uma atividade comunicativa, a partir de funções definidas e cada vez mais diversifica-

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das em uma sociedade letrada.

Nesse sentido, Vieira aponta para o caráter dialógico da escrita, mostrando a inoperância de práticas de escrita puramente escolares que não consideram os propósitos comunicativos. Senso assim, nas palavras desse autor, “o bom redator não se preocupa apenas com o modo como o texto é escrito, mas também como será lido. Deste jogo de ausência (distância espaço-temporal) e presença (representação mental do leitor) nasce, pois, o texto escrito (em papel)” (p. 83).

Convém ressaltar alguns aspectos que caracterizam um bom leitor:

a) planejamento;

b) releitura durante a elaboração do texto;

c) revisão;

d) consciência da audiência1.

A compreensão desses procedimentos de escrita representa mudan-ças significativas nos estudos sobre escrita. Desse modo, a escrita deixa de ser uma inspiração divina ou dom para ser entendida como ativi-dade recursiva, sujeita a retomadas e alterações em toda a produção textual.

Sob essa ótica, Vieira acrescenta que a atividade de escrita

requer o domínio integrado de um conjunto de habilidades. Deveríamos também compartilhar as diferentes versões por que um texto passa até atin-gir sua forma final, não escondendo os problemas a solucionar em cada novo texto, nem passando a falsa idéia de que na prática de redigir exista uma sequência rígida e linear de procedimentos (p. 100).

Nesse cenário,

pode-se dizer que a produção de um texto supõe competência para gerar e organizar ideias, conec-tando-as temática e estruturalmente num todo co-erente e coeso que atenda a diferentes propósitos comunicativos e/ ou expressivos (p.103).

Infelizmente, a produção de textos ainda é vista na escola, na maio-ria das vezes, com uma forma utilitária, visando atender as tarefas es-colares.

Assim, urge que se desenvolva um trabalho de valorização da escri-ta a partir de sua função comunicativa e se reflita sobre a compreensão do professor sobre a atividade de escrita, bem como as implicações das instruções de orientação para produção de textos.

1 Audiência - Consciência para quem se es-creve, ou seja, o destinatário.

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Oralidade e ensino Apesar das orientações dos PCNs (2001) sobre a valorização da

oralidade na escola, o trabalho com o texto oral ainda é pouco fre-qüente nas salas de aula. Talvez isso ocorra devido a abordagem in-significante dessa modalidade nos livros didáticos, que limitam-se, na maioria das vezes, a simples leitura em voz alta, ou a debates de um determinado tema.

Por outro lado, estudos apontam que o trabalho com a oralidade deve ir mais além do que a simples leitura em voz alta e debates de temas.

A escola deve permitir que o aluno interaja nas mais diversas situ-ações de interação comunicativa do cotidiano, sejam elas formais ou informais. Desse modo, os usos da língua podem significar um meca-nismo de controle e reprodução de esquema de dominação.

Assim, o grande desafio das escolas consiste em considerar a lin-guagem em funcionamento, relacionando atividades de falar, ler e de escrita com práticas discursivas, de modo que nenhuma se sobreponha a outra. A escola deve, portanto, permitir que o aluno conheça os pro-cessos de produção do texto, seja ele oral ou escrito. Interessa assim saber o que e de que forma falar/ escrever de acordo com a situação discursiva.

Trabalhamos aqui com o que Silva (2010, p.119) chamou de

paralelismo entre as modalidades oral e escrita, não como oposições textuais, mas sim como enun-ciados complementares na ação comunicativa, vi-sualizamos propostas de trabalho que permitissem ao falante observar que há grande intimidade entre essas modalidades, razão por que podemos e de-vemos privilegiar e oportunizar nossos alunos com as múltiplas manifestações da língua em uso seja em situações formais ou não (p.119).

Silva, em pesquisa realizada com professores sobre a prática com textos orais na sala de aula, conclui que o descaso com o texto oral se dá, na maioria dos casos, devido “a sobrecarga de trabalho e desco-nhecimento de novas metodologias que poderiam auxiliá-los em suas atividades de sala de aula”. (p.121)

As principais preocupações apontadas pelos professores foram:

• Condições de execução com alunos dispersos ou muito agita-dos;

• Capacidade de avaliar o processo, sem se prenderem a notas fechadas;

• Possibilidade de avaliar os resultados, sem ter um parâmetro como referência;

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• Insegurança na condução das apresentações orais, ou interme-diação entre os participantes em situações polêmicas, envolven-do valores sociais/morais dos próprios alunos. (p.122)

Com isso, percebe-se que os professores necessitam de um emba-samento teórico que possibilite planejar melhor as práticas de oralida-de em sala de aula.

Diante disso, Silva (2010) levanta o questionamento sobre a impor-tância de se ensinar o texto oral na sala de aula, tendo em vista chegar-mos à escola quase sempre falando. O problema reside na capacidade de articulação dos diferentes gêneros orais, de forma a manter clareza nas idéias, fazer com que o outro respeite nosso ponto de vista, consi-derando por outro lado, a opinião do outro, sem que nos perdamos em frases feitas, divagações ou objeções incoerentes.

Nesse âmbito, convém lembrar a importância de se trabalhar com gêneros textuais, possibilitando assim a inserção em eventos comuni-cativos os mais diversos, a partir de uma intenção marcada na própria construção dos enunciados e nos aspectos sócio- históricos que anco-ram esses textos. Assim como no texto escrito, nos textos orais, devemos atentar para a função e a razão desses textos solicitados no contexto escolar.

Nessa perspectiva, Silva (2010) aponta alguns procedimentos ne-cessários para a aplicação de atividades oralizadas na sala de aula:

• A finalidade desse evento comunicativo

• Os participantes desse evento

• As condições de produção desse evento

• As características lingüístico- discursivas desse evento

• Os resultados que se pode ter a partir de sua efetivação.

Desse modo, Marcushi (2001, p.22) ressalta “não se trata de ensi-nar a falar. Trata-se de identificar a imensa riqueza e variedade de usos da língua.”

Diante do exposto, percebemos que apesar do pouco espaço destinado à oralidade na escola, os livros didáticos influenciados pelos PCN que recomendava o trabalho com a oralidade, passaram a se preocupar com a questão da oralidade. No entanto, parece haver ainda uma grande dificuldade de didatização do conhecimen-to nessa área de estudo. Sobre esse aspecto, Cavalcante e Melo (2006) argumentam que “os autores de manuais didáticos, em sua maioria, ainda não sabem onde e como situar o estudo da fala. Muitas vezes, os livros dão a impressão de que a análise da fala figura apenas como curiosidade” (p.182).

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Atividade I

1. Leia a proposta de oralidade retirada do Livro didático Tudo é linguagem, de Ana Mª Borgatto, do 6º ano e a orientação dada pelos autores no próprio manual didático, no item “Dialogicidade, intertextualidade, interdisciplinaridade” e em seguida responda as questões:

PROPOSTA DE ORALIDADE

Um bom debate

“Conte aos seus colegas e ouça o que eles têm a contar sobre situ-ações vivenciadas ou conhecidas em que uma trapaça prejudicou alguém.

No mundo em que vivemos, há muitos casos de injustiça, de des-respeito, que fazem as pessoas se sentirem infelizes e desamparada. Na sua opinião, é possível melhorar as relações entre as pessoas? Como elas precisariam ou poderiam agir para tornar o mundo me-lhor?

Princípios gerais: Orientação dos autores do Livros Didáticos

Dialogicidade, intertextualidade, interdisciplacidade

A significação do leitor e produtor de textos supõe que se agregue à prática pedagógica de ensino/ estudo da língua a dialogicida-de tanto como condição para o desenvolvimento da criticidade, da capacidade de posiciona-se frente á realidade, de interagir com o outro (...) quanto como propriedade fundamental na interlocução texto leitor para uma construção de sentidos mais pertinente e con-sistente (p. 27).

a) A proposta de oralidade contempla o que recomenda os autores dos Livros Didáticos em análise?

b) Entendendo-se que o debate permite desenvolver capacidades lingüísticas e cognitivas, você acredita que ao realizar essa atividade, o aluno estará desenvolvendo essas capacidades? Justifique.

c) Faça uma avaliação da atividade acima, escrevendo uma carta para um colega professor de língua Portuguesa, mostrando se o livro didático em

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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análise é referência ou não para o estudo da oralidade. Proponha uma discussão sobre a temática abordada. Volte as reflexões teóricas dessa unidade para reforçar sua avaliação.

Atividade II

1) Escolha um manual didático de língua Portuguesa do 1º ou 2º grau e complete o quadro abaixo:

Seções do L.D. em que se trabalha oralidade

Objetivos das atividades de oralidades

Orientação dos manuais sobre oralidade

a) A partir das respostas do quadro, produza um relato escrito, descrevendo os resultados obtidos. Não esqueça de confrontar com as teorias trabalhadas até aqui.

b) Tornando como referência, o estudo da oralidade, se você tivesse que recomendar para outro professor o livro didático em questão, você o recomendaria? Liste, pelo menos 3 motivos que justifiquem sua resposta.

c) Aproveite, vá ao Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) e registre sua opinião sobre o Livro Didático, considerando as propostas de oralidade apresentadas e as recomendações dos autores.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Leitura recomendada SCHNEUWLY, Bernard e Dolz, Joaquim. Gêneros orais e escritos na escola/Tradução e Organização Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, SP. Mercado de Letras, 2004.

Nesta obra podemos encontrar suporte teórico para entender as modalidades de textos orais e escritos.

Resumo

Os estudos sobre escrita têm, nos últimos anos, sofrido modifi-cações nas perspectivas teóricas, passando da visão de escrita como dom, produto e processo, como defendem hoje muitos estudiosos. Por outro lado, as propostas de escrita presentes nos livros didáticos estão muito distantes de um trabalho de escrita numa visão processual. Um outro ponto abordado nessa unidade é a necessidade de inclusão da oralidade no ensino de Língua Portuguesa. Nesse sentido, recorremos a livros didáticos para verificar o tipo de abordagem que é feita nesses manuais sobre essa modalidade da língua.

AutovaliaçãoEscreva um resumo informativo desta unidade. Para isso releia toda a unidade, reflita e escreva. Mãos a obra!!

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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ReferênciasBRASIL. SEF. PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS: primeiro e segundo ciclos do ensino fundamental: Língua Portuguesa. Brasília, MEC/SEF, 1997.

CAVALCANTE, Marianne C. B. e MELO, Cristina T.V. de Oralidade no ensino médio: em busca de uma prática. In: BUNZEN, clécio e MENDONÇA, Márcia (org). . Português no ensino médio e formação do Professor. São Paulo: Parábola Editorial, 2006. p. 181-198.

FÁVERO, Leonor, L. et. al. oralidade e escrita: perspectivas para o ensino de língua materna. 6. ed- São Paulo: Cortez, 2007.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. Oralidade e ensino de língua: uma questão pouco falada. In: DIONIZIO, Ângela Paiva e BEZERRA Mª Auxiliadora (Orgs). Livro Didático de Português: múltiplos olhares. Rio de Janeiro. Lucerna, 2001. (p.19-32)

PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS: Língua Portuguesa. Ministério da Educação. Secretária de Educação Fundamental. Brasília: A Secretária, 1998.

PEREIRA, Regina Celi (ORG). Ações de linguagem: da formação continuada à sala de aula. João Pessoa: Editora Universitária da UEPB, 2010.SILVA, Joselé Mª da. Gêneros Orais na Escola: é proibido fazer silêncio! In: Ações de linguagem da formação continuada a sala de aula. João Pessoa: Editora Universitária da UEPB, 2010. P. 117-147.

VIEIRA, luta lerche. Escrita, para que te quero? Fortaleza: Edição Demócrito Rocha; UECE, 2005.

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