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Pranayama Alcançando a Plenitude Através da Respiração Edição Limitada 2010 Jayadvaita Das

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Pranayama Alcançando a Plenitude Através Da Respiração Jayadvaita

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Pranayama Alcançando a Plenitude Através da Respiração

Edição Limitada 2010

Jayadvaita Das

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Pranayama - Alcançando a Plenitude Através da Respiração Copyright © 2005 by Jayadvaita Das Todos os direitos reservados. Capa: Jiv Jago Web Design by Sanga Editoração Eletrônica: Ananta Shakti Dasi e Jayadvaita Das Revisão Gráfica: Rogério Mandelli e Jaya Devaki Dasi Das, Jayadvaita, 1974 - Pranayama - Da Respiração à Plenitude/Jayadvaita Das. - Vrajabhumi, Teresópolis - RJ: Om Tat Sat, 2005. 1. Yoga - Filosofia 2. Pranayama - Ciência da Respiração 3. Meditação - Espiritualidade 4. Yogaterapia - Ayurveda 5. Vaishnava - Hinduísmo. I. Das, Jayadvaita. II. Título. 05 Índices para catálogo sistemático: 1. Yoga e Pranayama : Filosofia do Yoga : Asthanga-yoga e Patanjali 2. Hatha-yoga e Ayurveda : Yogaterapia 3. Meditação e Transcendência : Bhagavad-gita : Hinduísmo e

Vaishnavismo

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Agradecimentos

Agradeço Suas Onipotências Sri Krishna e Sri Balarama por me abrigarem; A Srila Prabhupada por dar-me refúgio em seus livros; Ao meu Mestre Espiritual, Hrdayananda das Goswami, por inspirar-me na propagação da consciência de Krishna; Chandramukha Swami por guiar-me no serviço devocional a Srila Prabhupada; Lilaraja Prabhu por entusiasmar-me, com sua dedicação, no projeto Ashram Vrajabhumi; A todos os devotos de Vrajabhumi que, de alguma maneira, ajudaram-me neste intento; minha esposa e companheira Jaya Devaki Dasi, Gurudas Dasa, Ananta Shakti Dasi e Rogério Mandelli que ajudaram a concluir este trabalho.

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Sumário Mangalacarana ix Prefácio xi Introdução 1 Parte Um – Filosofia 1.1 Iniciando a Prática do yoga: Propósitos do Pranayama 13 1.2 O Propósito do Pranayama 22 1.3 Compreendendo a Transcendência 25 1.4 Diferentes Aspectos da Compreensão Espiritual 29

1.4.1 Brahman 31 1.4.2 Paramatma 34 1.4.3 Bhagavan 37

1.5 Pranayama e Bhakti-yoga 39

Parte Dois - Teoria 2.1 Prana 50 2.2 Yama 56 2.2.1 Histórico e Científico 58 2.2.2 Medicina e Técnica 59 2.3 Os Diferentes Ares do Corpo 60 2.3.1 Panca-vrtti 60 2.3.1.1 Prana Vayus 61 2.3.1.2 Prana 61 2.3.1.3 Apana 64

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2.3.1.4 Samana 65 2.3.1.5 Udana 65 2.3.1.6 Vyana 66 2.3.2 Upa Prana 67 2.3.2.1 Naga 67 2.3.2.2 Kurma 67 2.3.2.3 Krkara 67 2.3.2.4 Devadatta 68 2.3.2.5 Daranjaya 68 2.4 Movimentos Respiratórios 68 2.4.1 Kumbhaka 70 2.4.2 Puraka 71 2.4.3 Rechaka 72 2.4.4 Tempo e Ritmo Respiratório 72 2.5 Nadis: Os Canais Energéticos 73 2.5.1 Sushumna 74 2.5.2 Ida Nadi 74 2.5.3 Pingala Nadi 75 2.6 Pranayama e os Três Tipos Constitucionais 76 2.7 Uma Fisiologia do Pranayama 77 2.7.1 Órgãos Respiratórios 78 2.7.2 Sistema Circulatório 79 2.7.3 Sistema Nervoso 82 2.8 Os Tipos de Respiração 84 2.8.1 Respiração Nasal 85 2.8.2 Adhyama-pranayama (Respiração Alta) 86 2.8.3 Madhyama-pranayama (Respiração Média) 87 2.8.4 Adhama-pranayama (Respiração Baixa) 88 2.8.5 Maha-pranayama (Respiração Completa) 89 2.9 Técnicas Para Ativar a Musculatura Respiratória 91 2.9.1 Ativação do Diafragma 92 2.9.2 Ativação dos Intercostais 94 2.9.3 Ativação dos Esternocleidos 94

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Parte Três – Prática 3.1 Preparando o Corpo e a Mente 97 3.2 O que Antecede a Prática 99 3.3 Conceito Básico de Pranayama 102

3.3.1 Mahadi-pranayama 103 3.3.2 Técnicas 109

i. Agni-pranayama 109 ii. Respiração Completa 111 iii. Respiração Purificadora 114 iv. Respiração Revitalizadora do Sistema Nervoso 116 v. Respiração Vocal 118 vi. Respiração Retida 119 vii. Respiração Célula-pulmonar 121 viii. Respiração Expansiva das Costelas 122 ix. Respiração Expansiva do Tórax 124 x. Respiração do Amanhecer 126 xi. Respiração Estimulante Para Circulação 127 xii. Respiração Rítmica 129 xiii. Respiração Mental (Manas-pranayama) 131 xiv. a) Distribuindo o Prana Pelo Corpo 134 xiv. b) Pranayama Para Alívio de Dores 135 xv. Maha-manas-pranayama 136 xvi. Surya Bedhana (Caminho do Sol) 137 xvii. Sukha-Purvak (Respiração Polarizada)138 xviii. Ujjayi 139 xix. Bhastrika 141 xx. Nadi-shodana Pranayama (Purificação dos Canais de Energia) 143 xxi. Shitali 145 xxii. Sitkari 147 xxiii. Kapalabhati 148

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3.4 Complementos da Prática do Pranayama 151

3.4.1 Mula-bandha 151 3.4.2 Uddiyana-bandha 153 3.4.3 Jalandhara-bandha 154 3.4.4 Jivha-bandha 155

Nota Final 157 Referências Bibliográficas 159

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Mangalacarana

Nasci na mais completa ignorância, mas meu mestre espiritual está abrindo meus olhos

com o archote do conhecimento. Portanto, ofereço minhas respeitosas reverências a ele

que é como um cisne e que, com sua inteligência transcendental e extática,

está dando prazer a Srila Prabhupada, destruindo todas as filosofias ateístas.

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Prefácio

dharmam tu saksad bhagavat-pranitam na vai vidur rsayo napi devah

na siddha-mukhya asura manusyah kuto nu vidyadhara-caranadayah

“Os verdadeiros princípios religiosos são apresentados apenas pela Suprema Personalidade de Deus. Mesmo que estejam situados no modo da bondade, nem mesmo os grandes sábios que ocupam os mais elevados planetas podem averiguar estes princípios autênticos, nem os semideuses ou os líderes de Siddhaloka, o que dizer dos ateístas, dos seres humanos ordinários, Vidyadharas e Caranas.”

Apenas a Suprema Personalidade de Deus

é quem pode apresentar as diretrizes autênticas e inadulteradas sobre a ciência transcendental. Podemos até tentar criar um sistema religioso ou um processo de yoga que vise arrebanhar adeptos e seguidores, mas não teremos bases sólidas para manter por muito tempo algo que não tenha raízes no dharma apresentado por bhagavat.

Dharma são os princípios que orientam os seres humanos sobre a importância da busca pela auto-realização espiritual. Não são apenas dogmas ou preceitos religiosos. Eles indicam como podemos encontrar nossa natural ocupação eterna. Nesse sentido, o dharma significa a essência do yoga com propósito e método prático bem definido.

É um fato que, como almas espirituais, fazemos parte do Senhor Supremo. Estando esquecido desta realidade, o ser vivo, condicionado pela energia material, pensa erroneamente que faz parte da matéria

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que tem como característica o fator temporário de existência. E isto é incompatível com a natureza eterna do ser vivo. Não somos partes integrantes da natureza material; embora estejamos inseridos nela somos espirituais - aham brahmasmi. Este desajuste tem causado inumeráveis problemas à humanidade, de distúrbios psicológicos às guerras.

Para tentar um alívio, temos buscado por refúgios em religiões, no yoga, na meditação, na arte e nos arriscados desfrutes das facilidades materiais. A pergunta é: será que há ainda algum processo autêntico sendo oferecido ao seres humanos que buscam por respostas e soluções aos problemas que estão no âmago da existência?

No momento atual em que vivemos, onde os valores humanos e espirituais são vistos como mercadorias e símbolos manipuláveis da realidade pós-moderna, qualquer tentativa de apresentar algo sério torna-se banalizado. Isto se aplica ao sistema de yoga, que muito está em voga hoje em dia, e é o tema deste trabalho.

Praticamente todos os textos de yoga, que estão sendo divulgados e utilizados como fonte filosófica e teórica sobre o assunto, foram compilados há menos de quatro mil anos. O mais citado e conhecido é Patanjali, o compilador do famoso yoga-sutra, texto onde se encontra delineado o sistema de asthanga-yoga. Além deste podemos encontrar outros que também perderam sua essência original - perderam um compromisso real com o propósito do yoga tal qual fora apresentado originalmente há milhares de anos pelo grande sábio Kapila Muni.

Kapila Muni foi uma encarnação de Vishnu. Ele veio ao planeta e ensinou o sistema de sankhya yoga que constitui uma importante herança filosófica da antiga Índia. A sankhya yoga é um

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conhecimento metafísico que envolve a compreensão física do universo a partir de uma ciência transcendental que leva à obtenção plena da consciência sobre a Verdade Absoluta. Todos os ensinamentos deixados por Kapila estão registrados no Srimad-Bhagavatam - mais conhecido como Bhagavat-Purana. Este Srimad-Bhagavatam foi escrito há mais de cinco mil anos por uma outra poderosa encarnação divina chamada Sri Krishna Dvaipayana Vyasa. Ele é na verdade o autor de todas as escrituras Védicas (Puranas, Upanisads, Vedas...). Todos os textos que surgiram depois das compilações de Vyasa são textos que, ou perderam sua autenticidade, ou beberam na fonte Védica e acabaram deturpando sua essência. E este fato é corroborado pelas escrituras Védicas: vedah pasanda-dusitah, ou seja, os Vedas serão deturpados por líderes ateístas.

Krishna mesmo diz no Bhagavad-gita (15.15), que Ele é a meta de todo conhecimento, o compilador e Aquele que melhor conhece os Vedas. Vedais ca sarvair aham eva vedyo vedanta-krd veda-vid eva caham. Portanto, de acordo com o sistema de yoga original apresentado por Kapila Muni, yoga significa adhyatmika, isto é, despertar a entidade viva para sua natureza original como alma espiritual eterna e parte integrante do Senhor Supremo.

Assim, baseando-se nos ensinamentos de Sua Divina Graça A.C. Bhaktivedanta Swami Prabhupada, e vendo a situação em que o yoga chegou nestas últimas décadas, foi criada, no Ashram Vrajabhumi, em Teresópolis - RJ, a Escola Vedanta Vaishnava Yoga que tem como objetivo restabelecer a tradição Vedanta Vaishnava do yoga.

Dividido em três partes (filosofia, teoria e prática do pranayama), este trabalho, unido com o VVY, vem humildemente tentar auxiliar na

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recuperação da herança cultural, científica e filosófica do yoga para aqueles que estão buscando pelo aperfeiçoamento da vida humana sem abrir mão de boa saúde.

Esperamos que esta leitura seja o início de uma nova jornada para você, um yogi em potencial.

Jayadvaita das Ashram Vrajabhumi Dhama,

Teresópolis - RJ 21 de Setembro de 2004 Radhastami-mahotsava

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Introdução

A forma humana de vida é uma oportunidade rara que a alma espiritual individual (jivatma) assume depois de milhares de vidas em diferentes espécies e corpos (samsara). Brahmanda brahmite kona bhagyavan jiva. A jivatma está viajando pela criação material, indo dos mais elevados planetas celestiais aos mais baixos e infernais. Identificada com sua situação ilusória temporária, ela pensa que permanecerá eternamente no atual corpo seja ele de cão, gato, tigre ou humano.

Um cão, quando identificado com sua personalidade canina, late. Um gato mia. Um tigre rosna e um ser humano comete tolice atrás de tolice. Não há muita diferença. Apenas, talvez, no aspecto corpóreo.

Do ponto de vista espiritual todas as almas são qualitativamente iguais. Ela passa por todas as espécies de vida e mantém a mesma essência espiritual. Esta jivatma, a alma espiritual individual, é mantida nestes diferentes corpos graças a dois fatores primordiais. O primeiro, e mais importante, é o Paramatma, a Superalma que habita o coração de todas as entidades vivas, inclusive dos seres e objetos imóveis. Este Paramatma é a porção plenária da Suprema Personalidade de Deus, é o aspecto localizado da Verdade Absoluta. Tanto o Paramatma quanto a jivatma são qualitativamente iguais. Esta essência qualitativa transcendental é definida como sat-cit-ananda, ou seja, eternidade, conhecimento pleno e bem aventurança.

Enquanto a jivatma é uma gota dágua o Paramatma é o oceano. Embora a gota dágua contenha as mesmas qualidades que o oceano todo

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(fórmula química, ponto de ebulição, sal) ela não deixa de ser uma simples gota que depende completamente do oceano, caso contrário ela se evaporará. Analogamente, a jivatma necessita de um contato consciente com o Paramatma. Eternamente já existe uma relação ininterrupta entre jivatma e Paramatma, mas que no atual estado condicionado a jivatma não se lembra desta relação. Isto se deve à cortina da energia ilusória que nos confunde e nos ilude e, conseqüentemente, nos separa desta consciência original, a consciência de Krishna.

Neste estado condicionado a jivatma não pode compreender o que está acontecendo realmente. Permanecendo com a consciência cativada pela energia ilusória material, ela não consegue perceber a realidade que existe por trás desta aparente “realidade” temporária. Se um dia, ao longo de sua existência dentro da atmosfera material, ela decide rasgar esta cortina, que funciona como o pano de fundo de um telão de cinema, ela poderá vislumbrar a realidade transcendental da Suprema Personalidade de Deus, o Senhor Supremo, com Suas atividades, formas e sentimentos inconcebíveis.

Somente chegando neste nível de consciência é que a jivatma pode encontrar verdadeira felicidade (ananda), conhecimento (cit) e eternidade (sat). Todas as condições oferecidas no mundo material sem esta consciência original são destituídas de qualquer prazer.

Na verdade todas as jivatmas estão buscando por prazer, mas estão buscando na plataforma errada. Resultado: nunca poderão encontrar verdadeiro prazer. Somente quando se restabelece este relacionamento esquecido com o Paramatma é que se pode encontrar a fonte última de todo o prazer que se deseja.

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É um fato que apenas os seres humanos podem empreender esta busca. Daí o fato da forma humana ser tão rara. Não podemos desperdiçá-la!

Como jivatma, para recobrar nossa consciência original, deve-se seguir o sistema científico muito antigo chamado yoga. Pode-se definir yoga como o processo que eleva nossa consciência a um nível onde a atmosfera material já não mais nos afeta. Yoga tem sua raiz etimológica na palavra yajur que significa unir, conectar, ligar. Nesse sentido podemos entender que o yoga visa nos auxiliar na reconexão com a consciência Suprema; em outras palavras, ligar a jivatma ao Paramatma.

Em termos de consciência, a jivatma é consciência pura e tem sua fonte no Paramatma. Temporariamente a jivatma assume um corpo material e, identificando-se com ele, passa a agir em função do corpo e de tudo que esteja relacionado com o corpo. Neste momento, a consciência original se ramifica em centenas e milhares de situações dentro dos limites da natureza material e permanece condicionada pelas leis da natureza. Por exemplo, imaginemos um indivíduo que tenha seu dia todo ocupado por atividades profissionais, familiares, lazer, enfim, todo o seu dia é ocupado em diferentes tarefas que envolvem sua consciência. Cada um destes departamentos ocupa a consciência de maneira total. Então, terá ilimitados departamentos abertos em sua consciência, porém todos eles estarão limitados pela atmosfera material e ele permanecerá sem uma oportunidade de sair desta esfera de ações e reações. Ele poderá ser consciente de infinitos fatos ocorridos e guardará em sua memória muitos dados para sua manutenção, mas ele deverá, no decorrer do tempo, abrir o departamento da auto-realização espiritual. Quando se abre este departamento, uma nova realidade se aflora dentro da

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consciência individual e a realidade externa, com seus obstáculos e dificuldades, com suas ondas de felicidade e sofrimento, euforia e lamentação não mais atuarão com força e violência. Sem um canal que possamos conectar nossa consciência a consciência Superior estaremos fadados a sofrer constantemente dentro dos limites deste mundo material. O yoga faz este ajuste e cria este canal em nossa consciência ligando-nos com o Paramatma.

Sem o auxílio de um mestre espiritual fidedigno, dificilmente a jivatma conseguirá se conectar com o Paramatma. O guru nos auxilia na compreensão de nossa natureza original que nos levará a compreender a diferença existente entre jivatma e Paramatma.

De acordo com as escrituras Védicas, a jivatma é consciência individual limitada ao seu próprio corpo; ela não consegue saber o que se passa dentro de outra jivatma, o que ela pensa, sente ou deseja. Por outro lado, o Paramatma é superconsciência; Ele é consciente de todas as jivatmas. Ele acompanha todas as jivatmas eternamente.

O Paramatma habita dentro do coração das jivatmas e por este motivo Ele também é chamado paramatmanah, a alma de todas as almas.

O Paramatma está presente em toda a criação e até mesmo dentro dos átomos; logo, o único dever da jivatma é se ocupar em yoga e religar-se no Senhor Supremo. No Srimad-Bhagavatam (11.11.43-45), encontramos uma referência quanto à posição do Paramatma dentro do coração das entidades vivas. Nesta passagem o próprio Senhor Krishna diz ao Seu amigo Uddhava: “Pela meditação constante Eu sou adorado no espaço dentro do coração, e dentro do ar Eu posso ser adorado pelo conhecimento de que

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prana, o ar vital, é o principal entre os elementos.” Isto nos faz pensar no fato de que realmente estamos sempre em contato com o Senhor.

Se considerarmos que em tudo há a presença do Senhor - e este é um fato muito claro apresentado pelas escrituras Védicas – então, tudo deve ser utilizado na busca da auto-realização espiritual. Já que tudo tem uma relação eterna com Deus. Mesmo a energia material tem relação direta com as infinitas e ilimitadas potências do Senhor.

No Srimad-Bhagavatam (11.3.38), há uma boa definição das funções transformadas do prana dentro do corpo:

natma jajana na marisyati naidhate ‘sal na ksiyate savana-vid vyabhicarinam hi

sarvatra sasvad anapayy upalabdhi-matram prano yathendriya-balena vikalpitam sat

“Brahman, a alma eterna, nunca nasceu e jamais morrerá tampouco ela cresce ou definha. Essa alma espiritual é de fato o conhecedor da juventude, maturidade e morte do corpo material. Pode-se, entender, então, que a alma é consciência pura, existente em toda parte, em todas as ocasiões e jamais é destruída. Assim como o ar vital dentro do corpo, embora sendo um, manifesta-se de muitas maneiras em contato com os vários sentidos materiais, a alma individual parece assumir diversas designações materiais ao entrar em contato com o corpo material.”

Portanto, é um fato que toda a interação

que desenvolvemos com o mundo material externo e também os movimentos internos do pensamento, da razão e do intelecto – bem como os ares circulatórios do corpo - deve-se ao prana. O poder de visão, o poder

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do paladar, da audição e assim por diante resultam da presença funcional do prana dentro do organismo material. É o prana que fornece suporte interativo da jivatma com o mundo dos objetos dos sentidos: som, forma, aroma, tato e paladar.

Entretanto, as funções do prana não se limitam apenas à interação funcional com os sentidos. Ele pode e deve ser utilizado com um propósito muito mais significativo pelo sistema de yoga, ao se trabalhar o controle respiratório. Tal processo é mais conhecido como pranayama.

Da mesma forma no Srimad-Bhagavatam (11.17.33), encontramos a palavra praninah, que significa “a vida de todas as entidades vivas”. Sabendo que o Senhor é a fonte de todas as manifestações e de todas as energias, logicamente, Ele também é a fonte da vitalidade da jivatma. Assim, se Ele fornece a energia vital para as entidades vivas seria natural elas usarem esta mesma vitalidade para serví-Lo. É uma maneira de cooperar com a fonte última de tudo. Pois, esta energia vital nos é fornecida para que possamos usá-la na busca pela auto-realização.

Qualquer ser vivo possui este prana em potencial para ser usado em sua vida instintiva; porém o ser humano deve racionalmente usá-lo para o prazer do Senhor enquanto busca por sua perfeição espiritual. Por isto, esta é a ciência mais avançada que existe: a ciência da vida transcendental, do amor a Deus. E esta é a essência do sistema de yoga. Se o ser humano não utiliza sua energia vital para satisfazer ao Senhor ele, além de não sentir satisfação alguma em sua vida sem sentido, não deixará de viver como qualquer outro animal. Aqueles que não utilizam sua vida na busca do conhecimento transcendental, da auto-realização espiritual ou do amor ao Senhor Supremo são chamados de krpanas, ou seres

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avarentos que preferem arriscar sua vida em função do próprio ego material e não para sua plenitude espiritual em comunhão com Deus.

Uma sociedade humana verdadeira é uma sociedade de brahmanas, ou seres humanos que possuindo conhecimento transcendental utilizam sua vitalidade para dar prazer ao Senhor e alcançar a auto-realização espiritual. Um verdadeiro yogi deve viver o yoga com consciência de brahmana e utilizar o yoga como um processo para elevação espiritual; no caso de um yogi sem muita seriedade o yoga será usado apenas como uma ferramenta a mais para o seu desfrute material dos sentidos. Neste segundo caso, tal yogi não passa de um krpana, uma pessoa presa ao próprio egoísmo. Em outras palavras, o yogi deve ser um brahmana.

Um verdadeiro yogi é citado no Srimad-Bhagavatam (11.3.38), como aquele que se ocupa no transcendental serviço amoroso ao Senhor com consciência devocional. Nesta citação encontramos a palavra pranataya que indica um yogi plenamente rendido ao seu objeto de meditação, a Suprema Personalidade de Deus. Esta rendição é realizada quando o yogi dirige sua consciência para dentro do coração e não para algo externo. Dirigir a consciência sempre para o exterior é a grande causa dos problemas da vida material desregrada. Isto gera também uma má compreensão para quem está tentando trilhar o caminho de vida espiritual, principalmente porque rendição nos leva a pensar em abrir mão da individualidade. Esta compreensão não é correta e não deve fazer parte da consciência do yogi que deseja progredir espiritualmente.

Quando pensamos no sentido de rendição pensamos de maneira pejorativa. No entanto, rendição é a atitude correta que o yogi deve tomar com relação

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à sua vida. Isto também é corroborado por Patanjali no Yoga-sutra (1.23):

isvara-pranidhanad va

Deve-se assumir uma atitude de rendição

ao Senhor Supremo. Render-se ao Senhor significa dedicar todas as possibilidades tal como suas atividades, pensamentos, desejos e todas as suas capacidades de forma que possa estar sempre se lembrando de Krishna; isto é meditação. Portanto, para alcançarmos o objetivo do yoga e da meditação devemos assumir uma atitude de rendição ao Senhor.

Em pranataya, mais uma vez notamos a raiz da palavra prana presente. Tudo conduz ao fato de que devemos utilizar as técnicas de pranayama do sistema de yoga para a auto-realização espiritual, unicamente.

Se o pseudo yogi desperdiça o propósito original da prática de yoga ele estará vivendo como um passageiro que é conduzido por um veículo sem motorista e totalmente desorientado. Isto é citado no Bhagavad-gita (18.61):

isvara sarva-bhutanam hrd-dese ‘rjuna tisthati

bhramayan sarva-bhutani yantrarudhani mayaya

“Eu, como o Senhor Supremo, estou sentado no coração de todos, ó Arjuna, e estou dirigindo as andanças de todas as entidades vivas, que estão sentadas num tipo de máquina feita pela energia material.”

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E por este mecanismo sutil das leis da natureza material, aqueles que não se valem desta oportunidade acabam permanecendo presos pela energia ilusória, vida após vida. Nem por isto deve-se supor que o Paramatma seja condicionado ou encoberto pela energia material como a jivatma. A Suprema Personalidade de Deus é absolutamente transcendental a tudo. Mesmo que Ele esteja dentro do coração de todas as jivatmas Ele permanece imune à influência de Sua energia externa. Por outro lado, a jivatma está encoberta por cinco níveis de ego material que a condicionam. Estes cinco níveis são chamados anna-maya, prana-maya, mano-maya, vijñana-maya e ananda-maya.

Anna-maya refere-se à energia do Senhor que está ligada à dependência de alimentação. Anna significa alimento e durante a primeira fase de vida a jivatma permanece com a consciência voltada à satisfação que provém dos alimentos. É um nível de consciência muito condicionante. A entidade viva vive em função de comer. Neste nível de consciência a meta é o desenvolvimento econômico. Depois desta, adquiri-se a consciência de prana-maya e passa-se a compreender a presença divina em tudo que apresente sintomas vitais. Nesta fase, que se caracteriza pela consciência da própria existência, a jivatma pode sentir felicidade ao encontrar segurança de viver sem ser atacada ou destruída por outras entidades vivas. Aqui a consciência busca basicamente o abrigo e a proteção dos perigos da vida material. Após encontrar uma proteção econômica e uma segurança material temporária, o próximo estágio da consciência condicionada é situar-se num nível mental onde se passa a questionar os valores reais da vida. Nesta fase chamada mano-maya, a entidade viva inicia um processo de especulação sobre a existência e seus

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valores. Até esta etapa é onde a civilização materialista alcança em termos de evolução da consciência, que apenas reflete uma seca especulação filosófica.

A verdadeira vida humana começa em vijñana-maya. Nesta fase a consciência se expande para além dos sintomas vitais do corpo e manifesta-se como pensamento, sentimento e desejo. Neste nível de consciência a jivatma pode alcançar a percepção do aspecto impessoal de Brahman e compreender que ela não é o corpo material. A vida espiritual inicia-se neste ponto, pois a jivatma percebe a distinção entre a mente, os sintomas vitais e ela mesma como alma espiritual eterna.

Partindo desta realização a entidade viva chega ao estágio de desenvolver consciência espiritual e prestar transcendental serviço amoroso a Krishna. Desta maneira a alma espiritual pode restabelecer sua eterna relação com Deus situando-se em ananda-maya, estágio onde se desfruta de bem aventurança pura. Na verdade, apenas em ananda-maya é que a jivatma pode transcender a natureza material e conquistar sua igualdade qualitativa com a Suprema Personalidade de Deus. Esta unidade com o Senhor Supremo também é chamada de brahma-bhuta, como Krishna descreve no Bhagavad-gita (18.54):

brahma-bhuta prasannatma na socati na kanksati

samah sarvesu bhutesu mad-bhaktim labhate param

“Aquele que está situado nesta posição transcendental compreende de imediato o Brahman Supremo e torna-se completamente feliz. Ele nunca se lamenta nem deseja ter nada e é equânime com todas as entidades vivas.

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Neste estado ele passa a Me prestar serviço devocional amoroso puro.”

Estando situado em unidade qualitativa

com o Absoluto (brahma-bhuta), o ser vivo desfruta de completa felicidade espiritual (prasannatma) e, conseqüentemente, não mais se lamenta (na socati), nem anseia (na kanksati) nada. Vendo com equanimidade todas as entidades vivas ele passa a praticar bhakti-yoga: transcendental serviço amoroso ao Senhor Supremo.

Nesta etapa transcendental de brahma-bhuta, ou ananda-maya, o yogi eleva sua consciência ao nível de igualdade qualitativa com a Pessoa Absoluta. Isto quer dizer que é mantida uma distinção individual entre jivatma e Paramatma, pois a idéia de fundir-se no Absoluto não é aceito pelas escrituras Védicas como sendo a meta última. Por ser mantida esta distinção individual das personalidades originais é que o yogi pode sentir verdadeiro prazer e bem aventurança reais. Por outro lado, perdendo sua identidade, a jivatma deixa de reciprocar relacionamentos (rasas), com o Senhor Supremo.

No Vedanta-sutra (1.1.12), há o aforismo ananda-mayo bhyasat, ou seja, Krishna é a fonte absoluta de todo prazer e quando a entidade viva alcança a meta máxima do sistema de yoga ela efetua intercâmbios amorosos com o Senhor; e, Ele sendo a fonte de ananda, o prazer proveniente deste relacionamento é absoluto e inconcebível para a alma condicionada. Sem manter sua identidade individual o yogi nunca alcançará esta plataforma de prazer absolutamente puro.

Portanto, por mais que se projete no caminho da elevação espiritual o yogi sincero deve ter sempre em mente que existem três fatores que

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definem o sucesso ou o fracasso dentro do sistema de yoga: bhakta, bhakti e bhagavan. Sempre estarão presentes o bhakti-yogi, o processo de bhakti-yoga e o beneficiário último de todas as práticas espirituais: Bhagavan.

Com esta base de conhecimento em bhakti-yoga o yogi pode praticar qualquer uma das diferentes técnicas de yoga (hatha, asthanga vinnyasa, karma e raja-yoga), e obter o sucesso mais desejado que é o amor puro pela Suprema Personalidade de Deus, através do relacionamento transcendental do serviço devocional amoroso. Yoga significa devoção ao Senhor Supremo, e esta devoção é a meta máxima da vida humana.

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Parte Um - Filosofia

1.1 Iniciando a Prática do Yoga: Propósitos do Pranayama

No sistema de asthanga-yoga, que é composto de oito estágios seqüenciais (yama, niyama, asana, pranayama, pratyahara, dharana, dhyana e samadhi), pranayama compõe o quarto estágio. Sua finalidade é, por um lado, auxiliar no controle da mente e dos sentidos ajudando, com isto, a alcançar a auto-realização espiritual e, por outro, promover a cura dos males da saúde. Em última análise, qualquer prática que siga fielmente o sistema de yoga autêntico tem como finalidade promover a emancipação espiritual do ser humano, além de qualquer benefício à saúde.

Segundo o Vedanta, o ser vivo, jivatma, está numa condição doentia dentro deste mundo material, não apenas no sentido físico-biológico, segundo o conceito ayurveda, mas também no nível espiritual. A falta de autocontrole gera uma forte identificação com o mundo material e toda a identificação que desenvolvemos com os objetos dos sentidos nos causa limitações cada vez maiores. Limitações que sugam nossa verdadeira vida, liberdade, conhecimento e prazer. E, como almas espirituais eternas, nada temos em comum com estas limitações impostas pelas leis da natureza material.

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Por este motivo, dentro do sistema de yoga há o urgente trabalho de controle dos sentidos. Sem controle adequado do que comemos, do que assistimos, do que pensamos, sentimos e desejamos nos tornamos presas fáceis das armadilhas presentes no mundo material. Como se declara no Bhagavad-gita (5.22):

ye hi samsparsaja bhoga

dukha-yonaya eva te ady-antavantah kaunteya

na tesu ramate budhah “A pessoa inteligente não participa das fontes de misérias, que surgem do contato com os sentidos materiais. Ó filho de Kunti, esses prazeres tem um começo e um fim, e por isso o homem sábio não se deleita com eles.”

A palavra budhah designa uma pessoa inteligente.

Tal pessoa, sendo um verdadeiro yogi, não deixará sua mente se atrair por objetos que são yonayah, fontes de misérias, duhkha. Ele consegue tal controle dos sentidos e da mente evitando samsparsa-jah, o contato material dos sentidos com os objetos dos sentidos. Não que o mundo material seja miserável e mais nada. O problema é que a energia material, e conseqüentemente seus subprodutos são temporários e limitados. Assim, esses prazeres surgidos da fonte material são prazeres falsos e uma pessoa inteligente, um yogi auto-realizado, não se interessará por esse tipo ilusório de prazer. Não é sensata uma alma eterna buscar por prazeres temporários.

Por outro lado, controlando os sentidos o yogi desfruta de um verdadeiro prazer, pois não haveria lógica viver neste mundo sem nenhum tipo de prazer. Entretanto, o prazer mais elevado que um yogi místico pode alcançar é o prazer transcendental, ananda, como é citado no Padma Purana:

ramante yogino’ante

satyanande cid-atmani iti rama-padenasau

param brahmabhidhiyate

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“Da Verdade Absoluta os yogis obtém prazeres transcendentais ilimitados, e por isso a Suprema Verdade Absoluta, a Personalidade de Deus, também é conhecido como Rama.”

Rama significa o reservatório de todo o prazer e

bem-aventurança que estamos procurando. Neste mundo material tudo é um reflexo pervertido, uma sombra, da realidade do mundo espiritual. Desse modo, o que estamos buscando como prazer, felicidade ou paz existe em estado puro e real na plataforma espiritual. Quem pratica o processo de yoga observando o controle dos sentidos poderá alcançar, sem grandes dificuldades, esta fonte suprema de todo prazer.

Há uma necessidade de buscarmos por compreensão espiritual, pois somos eternos, mas temos que conviver dentro de circunstâncias efêmeras; temos todo potencial de conhecimento ilimitado dentro de nós, mas vivemos imersos numa realidade que transborda ilusão e ignorância; somos plenos de bem-aventurança, mas estamos sempre buscando por alguma forma de prazer em coisas supérfluas e sem gosto que, ao contrário do prazer, só nos traz ansiedade, lamentação e sofrimento. Esta é a pior e mais profunda doença que ataca todas as entidades vivas condicionadas. E todo sofrimento, ansiedade e frustração nasce desta doença. Sem um controle dos sentidos, a doença material que infecta a alma condicionada a arrasta durante vidas e vidas em diferentes corpos dentro desta esfera de existência material.

Do ponto de vista filosófico, esta doença tem sua origem muito profunda e se manifesta desde tempos imemoriais em todas as almas condicionadas. A falsa identificação que assumimos em relação a este corpo temporário é a causa da doença material. Estando numa condição ilusória não podemos entender o que nos envolve. Passamos a pensar que somos um corpo que possui uma alma, e, tendo vitalidade, força e saúde concedida pela centelha espiritual dentro do corpo, buscamos os prazeres e a felicidade, tendo como parâmetros apenas nosso limitado corpo material. Esta busca de gratificação dos sentidos através da exploração

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dos elementos da natureza material se deve à luxúria. Isto é apresentado no Bhagavad-gita (3.40):

indriyani mano buddhir asyadhisthanam ucyate

etair vimohayaty esa jñanam avrtya dehinam

“Os sentidos, a mente e a inteligência são os lugares que servem de assento para a luxúria. Através deles, a luxúria confunde o ser vivo e obscurece o verdadeiro conhecimento que ele possui.”

Luxúria é o insaciável desejo material. É desse

incontrolável desejo de satisfazer materialmente os sentidos e a mente que surge o falso ego, ahamkara, a falsa identificação que nos faz pensar em função de eu e meu. É nesse momento que se inicia todo o problema da vida condicionada. A causa de toda aflição material se origina dessa falsa identificação corpórea que nos leva pensar que somos americanos, brasileiros, homens, mulheres, rico ou pobre. Todas as designações referentes ao corpo são temporárias e ilusórias. Mas, identificando-se com tais designações o ser vivo sofre ou desfruta limitadamente dentro da plataforma material. Logo, é inútil manter expectativas que dependerão do desempenho e funções do corpo material falível.

A rainha Devahuti, mãe de Kapiladeva, pedindo por conhecimento transcendental, orou da seguinte maneira ao seu amado filho (Srimad-Bhagavatam, 3.25.10):

atha me deva sammoham apakrastum tvam arhasi

yo ‘vagraho ‘ham mametity etasmin yojitas tvaya

“Agora, meu Senhor, por favor, dissipe minha grande ilusão. Devido a meu sentimento de falso ego, tenho sido ocupada por Tua energia ilusória e tenho me identificado com o corpo e conseqüentes relações corpóreas”.

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Avagrahah, a ilusão de identificar o corpo como sendo o verdadeiro eu é causada pela luxúria. Avagrahah é como uma armadilha que captura a entidade viva que tenta desfrutar independente do Controlador Supremo. Dentro desta armadilha, a entidade viva se esquece de sua natureza original de serva eterna do Senhor e torna-se escrava dos sentidos materiais.

Na verdade, existe um ego real e este nunca deve ser negado. Devemos apenas coibir a atuação do ego falso. No Brhad-aranyaka Upanisad (1.4.10), afirma-se que aham brahmasmi: eu sou espírito; porém, este “eu sou” refere-se ao ego verdadeiro, à alma espiritual, mas aplicar este “eu sou” ao corpo material é um conceito errado relacionado ao falso ego. Segundo algumas filosofias superficiais, devemos abandonar o ego. Isto é um erro. Abandonar o ego significa perder a identidade espiritual. Devemos, sim, abandonar nossa falsa identificação corpórea. Este tipo de consciência material é nefasto para a entidade viva que deseja avanço espiritual progressivo. Temos que agir com conhecimento espiritual; isto é o que Krishna chama de karma-yoga - agir com consciência espiritual -, tendo a Pessoa Suprema como o centro de tudo em nossas vidas.

Agir com o verdadeiro ego é agir para o prazer do Senhor, sem interesse pessoal egoísta. Deixando de lado nossa identificação corpórea podemos agir como almas espirituais, verdadeiros yogis. Isto dará o prazer mais elevado à entidade viva. Do contrário, viver em consciência material é um tanto incômodo e limitado para a alma espiritual. O falso ego não aceita abrir mão de seu prazer ínfimo e, tolamente, deixa de sentir o prazer absoluto da consciência espiritual. Este tipo de ego nunca aceitará perder sua falsa concepção de ser o centro de tudo; nunca se submeterá a um subjugador Supremo.

O remédio é compreender que somos almas espirituais eternas e não o corpo material feito de energia temporária. E se somos conscientes de nossa posição real não aceitaremos a falsa realidade oferecida pela energia ilusória. Porém, apenas compreender que não somos o corpo é uma compreensão insuficiente. Devemos compreender que somos brahman, e assim poderemos nos situar em nossa verdadeira

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posição constitucional, servos eternos da Suprema Personalidade de Deus. Krishna diz no Bhagavad-gita (18.54):

brahma-bhuta prasannatma

na socati na kanksati samah sarvesu bhutesu

mad-bhaktim labhate param “Aquele que está situado nessa posição transcendental compreende de imediato o Brahman Supremo e torna-se completamente feliz. Ele nunca se lamenta nem deseja ter nada e é equânime para com todas as entidades vivas. Nesse estado, ele passa a Me prestar serviço devocional puro.”

Somos espirituais, logo a fonte de nossa felicidade e

prazer também deve ser espiritual. O contrário disso é a causa de nossa doença. E como podemos alcançar este estágio de felicidade plena? Krishna explica no Bhagavad-gita (14.26):

mam ca yo vyabhicarena bhakti-yogena sevate

sa gunan samatityaitan brahma-bhuyaya kalpate

“Aquele que se ocupa em serviço devocional pleno e não falha em circunstância alguma transcende de imediato os modos da natureza material e chega então ao nível de Brahman.”

Usando todas as nossas capacidades para

satisfazer a Deus, estaremos evitando o vírus da doença material. Mas, se agirmos com o intuito de sermos o centro da satisfação estaremos infectados pelo falso ego, a causa da doença material.

Uma vez manifesta no nível sutil, ou espiritual, ela vem à tona no nível grosseiro do corpo físico e temos então a doença propriamente dita. Atualmente, e a tendência neste século é aumentar em proporções sem precedentes, temos os mais variados quadros de doenças que atuam no nível mental como depressão, angústia, fobias, síndromes. E daí, todo um

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quadro clínico se manifesta e permanece registrado em cada órgão do corpo físico.

É um fato que o corpo material está fadado a nascer, envelhecer, adoecer ou morrer, e não há como mudar isto. Ninguém quer envelhecer ou morrer, no entanto a velhice e a morte chegam para todos os seres corporificados. Ninguém quer ficar doente, mas a doença chega sem que peçamos, pois faz parte das condições materiais do corpo. Porém, a alma nada tem haver com estas inconveniências corpóreas. No Bhagavad-gita (2.20), Krishna diz:

na jayate mriyate va kadacin nayam bhutva bhavita va na bhuyah

ajo nityah sasvato ‘yam purano na hanyate hanyamane sarire

“Para a alma, em tempo algum existe nascimento ou morte. Ela não passou a existir, não passa a existir e nem passará a existir. Ela é não nascida, eterna, sempre existente e primordial. Ela não morre quando o corpo morre.”

Portanto, a alma não sofre as mudanças que

ocorrem com o corpo. Todo corpo material passa por nascimento, permanece por algum tempo, cresce, produz alguns efeitos, definha gradualmente e acaba caindo no esquecimento. Mas, a alma está além de todas estas mudanças.

Considerando todas estas referências dadas pelas escrituras, podemos concluir que, o controle dos sentidos e da mente é o primeiro objetivo do yoga. Entretanto, para iniciar com sucesso o caminho espiritual, temos que entender a necessidade do controle dos sentidos antes mesmo de tentar alcançar algum objetivo através do yoga. Temos que iniciar as práticas já com os sentidos controlados. Estes são yama e niyama, que correspondem aos primeiros estágios de asthanga-yoga. Sem controle dos sentidos não temos garantia de alcançar qualquer objetivo do yoga. Krishna diz no Bhagavad-gita (6.24) que:

as niscayena yoktavyo

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yogo ‘nirvinna-cetasa sankalpa-prabhavan kamams

tyaktva sarvan asesatah

manasaivendriya-gramam viniyamya samantatah

“É necessário ocupar-se na prática de yoga com determinação e fé, e não se desviar do caminho. Devem-se abandonar, sem exceção, todos os desejos materiais nascidos da especulação mental e desse modo controlar com a mente todos os sentidos por todos os lados.”

A mente e os sentidos são inconstantes e instáveis

e isso torna difícil o seu controle, porém, quando usamos nossas capacidades físicas, mentais e intelectuais a serviço de Deus, naturalmente todos os sentidos e a mente ficam sob controle, sem nenhum esforço extra. Esta é a mais completa ciência do yoga, que pode nos levar à auto-realização espiritual. Isto também é garantido no Bhagavad-gita (6.28):

yunjann evam sadatmanam

yogi vigata-kalmasah sukhena brahma-samsparsam

atyantam sukham asnute “Assim, o yogi autocontrolado, constantemente ocupado na prática de yoga, livra-se de toda a contaminação material e alcança a etapa mais elevada - a felicidade perfeita no transcendental serviço amoroso ao Senhor.” 1.2 O Propósito do Pranayama

É fácil de entender que qualquer animal nunca se interessará por praticar yoga, pranayama, ou tentará compreender tópicos referentes à Verdade Absoluta. Isto cabe somente ao seres humanos.

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Dessa maneira, pode-se argumentar: e por que deve haver algum propósito na prática de yoga além da questão de saúde e bem estar? Sim, isto é importante; mas não devemos achar que é tudo. O corpo é importante, mas não é o propósito permanecer nele ou em outros corpos materiais eternamente.

Há um exemplo que ilustra bem este fato. Têm-se um pássaro preso na gaiola e com todo cuidado e dedicação nos ocupamos em limpar, decorar, pintar, enfeitar, lustrar, enfim, tudo para a gaiola; se cuidamos apenas da gaiola e não damos a mínima ao pássaro, em pouco tempo a gaiola perderá todo o sentido, pois o pássaro morrerá de fome e sede. Então, temos que cuidar da alma. E toda prática de yoga deve, não apenas se preocupar com os resultados fisiológicos, mas também com os efeitos benéficos à nossa constituição espiritual.

Toda a cultura e filosofia Védica visam solucionar os problemas que afetam a plenitude da alma. E somente na forma humana é que podemos nos posicionar com relação à nossa existência espiritual. Após frustrar-se com a vida material desregrada, a entidade viva passa a indagar sobre a Verdade Absoluta. Por isso, se declara no Vedanta-sutra (1.1):

athato brahma-jijnasa

“Estando agora na forma humana de vida deve-se indagar a respeito de Deus.”

No Bhagavat Purana (3.28.12), é explicado o

propósito específico do pranayama:

pranayamair dahed dosan dharanabhis ca kilbisan

pratyaharena samsargan dhyanenanisvaran gunan

“Aquele que pratica o processo de pranayama pode erradicar a contaminação de sua condição fisiológica e, concentrando a mente, pode livrar-se de todas as atividades pecaminosas. Controlando os sentidos, ele pode livrar-se do contato com a

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matéria e, meditando na Suprema Personalidade de Deus, pode livrar-se dos três modos do apego material.”

Portanto, há um desenvolvimento gradual até se

alcançar a meta última da prática do pranayama. Ele serve como um instrumento na busca da auto-realização. A palavra prana (ar vital) indica que o Senhor está presente e personificado no ar vital de todas as entidades vivas e, por este motivo, os diferentes elementos se agregam para dar as variadas formas de vida.

Pela prática correta, como resultado inicial, teremos uma melhora em nossa saúde e, conseqüentemente, ficaremos com a mente mais tranqüila. Estando a mente sob controle iremos nos afastar de atividades que possam nos degradar. Tendo a mente concentrada, não iremos nos envolver com situações que sejam desfavoráveis ao avanço espiritual. E, por fim, podemos meditar na eterna forma Absoluta do Senhor e alcançar o estágio mais elevado na vida - realizar a Suprema Personalidade de Deus e manter-se transcendental à influência da natureza material. Kapiladeva, a encarnação divina que trouxe o conhecimento do yoga para a humanidade, diz no Srimad-Bhagavatam (3.28.12):

yada manah svam virajam

yogena susamahitam kastham bhagavato dhyayet

sva-nasagravalokanah “Ao purificar a mente por completo mediante esta prática de yoga, deve-se concentrar na ponta do nariz com os olhos semicerrados e ver a forma da Suprema Personalidade de Deus.”

Na verdade, o processo de controle dos ares vitais

dentro do corpo é uma etapa na elevação da consciência espiritual. Não devemos nos limitar apenas aos aspectos corpóreos que, apesar de serem também importantes, não são o objetivo máximo do ser vivo. Há algo mais importante do que o corpo material: a alma. Como já dissemos, o corpo definhará a qualquer momento; temos que cuidar do pássaro

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alimentando-o com conhecimento espiritual e matando sua sede com o transcendental serviço amoroso ao Senhor. Isto satisfará realmente a alma espiritual e cumprirá o propósito do yoga na forma humana de vida. 1.3 Compreendendo a Transcendência

O prana tem uma função importante no corpo material. Todas as funções químicas, biológicas e intelectuais estão relacionadas com o prana e sua reserva dentro do organismo. Sabemos que a alma espiritual habita o corpo material que, assim como toda a criação material, é feito de cinco elementos básicos: terra, fogo, água, ar e éter. Estes elementos se relacionam compondo diferentes formas e constituições dentro da natureza; porém, o que favorece o delicado relacionamento desta mistura de elementos materiais é justamente o prana, a energia vital. Tendo deficiência de prana o corpo ou a mente acabará desenvolvendo algum dano funcional.

Segundo a ciência médica ayurvédica, os três itens kapha, pitta e vata (fleuma, bílis e ar) mantém a condição fisiológica do organismo. Se estiverem desequilibrados o corpo adoecerá. Agora, é importante notar que tanto estes três itens quanto o prana são constituintes materiais do corpo, não são espirituais.

A presença do prana dentro do corpo ajuda no metabolismo dinâmico dos órgãos e atua como uma ferramenta útil na prática de meditação. No contexto da pós-modernidade, perderam-se as raízes do yoga como ele é. O prana é visto apenas como um elemento da natureza presente no ar que pode dar ao ser vivo maiores condições de desfrutar, se iludir e se enredar na natureza material. Mas, o prana tem seu valor dentro do sistema autorizado de asthanga-yoga. Isto fica claro no Bhagavad-gita (8.12), onde Krishna esclarece:

sarva-dvarani samyamya mano hrid nirudhya ca

murdhny adhayatmanah pranam

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asthito yoga-dharanam “A yoga consiste no desapego de todas as ocupações sensuais. Para estabelecer-se em yoga deve-se fechar todas as portas dos sentidos e fixar a mente no coração e o ar vital no topo da cabeça.”

Porém, esta prática como ela é parece ter se

perdido. Poucas são as pessoas que se interessam por uma aula de yoga com fundo filosófico ou espiritual. Nos dias atuais tudo acaba virando moda e um sistema científico de autoconhecimento torna-se banalizado. O que mais encontramos atualmente é enganadores e uma legião de enganados.

Yoga significa conexão espiritual com o Senhor. Podemos pensar também em yoga no sentido de acréscimo. Mesmo sem ter em mente o objetivo de avanço espiritual, com uma simples prática de yoga bem conduzida o praticante poderá ser despertado para sua verdadeira natureza. Dado este passo, tudo ocorrerá como um acréscimo em sua vida espiritual. Parte-se do ponto de que nós somos almas espirituais corporificados e o yoga tem como finalidade acrescentar autoconhecimento espiritual em nossas vidas. Estamos sempre acrescentando problemas, desculpas, ansiedade em nossa mente ou em nossa consciência. Com o yoga podemos acrescentar espiritualidade e uma nova perspectiva na vida.

Isto significa superar a influência da energia ilusória (maya) de Krishna. O Senhor Kapiladeva afirma no Srimad-Bhagavatam (3.28.44):

tasmad imam svam prakrtim daivim sad-asad-atmikam durvibhavyam parabhavya

svarupenavatisthate

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“Assim, o yogi pode situar-se na posição auto-realizada após conquistar o insuperável encanto de maya, que se apresenta tanto como a causa como o efeito desta manifestação material e, portanto, é muito difícil de ser entendida.”

Naturalmente, o yoga visa elevar o praticante à

compreensão de sua natureza espiritual, svarupena, chegando ao nível de compreensão de Brahman, após longa prática de yoga com um mestre, ou instrutor, autorizado. Compreender svarupa, a nossa forma espiritual original, é compreender que somos partes integrantes (jivatmas) do Senhor, a Alma Suprema, e que nunca seremos esta Alma Suprema.

Prakrti significa natureza material, mas ela também é divina, daivim. Assim, uma vida de acréscimos materiais nos prenderá a uma rede de ilusões enquanto que uma vida equilibrada com práticas espirituais nos fará compreender o que há de divino nesta natureza material. Esta compreensão pode nos libertar do cativeiro existencial, e ela só surge após uma sincera rendição ao Senhor. No Bhagavad-gita (7.14), Krishna diz:

daivi hy esa guna-mayi mama maya duratyaya

mam eva ye prapadyante mayam etam taranti te

“Esta minha energia divina, que consiste nos três modos da natureza material, é difícil de ser superada. Mas aqueles que se renderam a Mim podem facilmente atravessá-la.”

De certa forma, tudo é espiritual, mesmo a energia

material. A diferença é que a energia material (maya-prakrti) tem a função de encobrir nossa verdadeira identidade e a energia espiritual (daivi-prakrti) de nos atrair à Verdade Absoluta, a Suprema Personalidade de Deus. Mas ambas são espirituais.

Interagir com o mundo material valendo-se deste conhecimento é rendição ao Senhor, prapadyante. Quando usamos todas as nossas capacidades para dar prazer ao Senhor, vendo que tudo é espiritual, estamos agindo como

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servos rendidos a Ele. Este estágio último de avanço em yoga é chamado bhakti-yoga. Este estágio de rendição é muito elevado. Somente algumas almas dotadas de poder espiritual conseguem alcançá-lo. Esta rendição supera qualquer benefício material que possamos imaginar. Por exemplo, dentro das práticas de yoga muitas pessoas buscam desenvolver poderes místicos; porém, o estágio de rendição devocional amorosa a Deus é superior a qualquer benefício material, bem como a qualquer poder místico limitado. O verdadeiro poder místico é ver a presença de Deus em toda a criação e agir em conformidade com Seu desejo transcendental. E este é o verdadeiro propósito de todo sistema de yoga autorizado. Kapiladeva diz no Srimad-Bhagavatam (3.27.30):

yada na yogopacitasu ceto mayasu siddhasya visajjate ‘nga

ananya-hetesv atha me gatih syad atyantiki yatra na mrtyu-hasah

“Quando a atenção do yogi perfeito não é mais atraída pelos subprodutos de poderes místicos, que são manifestações da energia material, seu progresso em direção a Mim torna-se ilimitado, e assim o poder da morte não pode dominá-lo.”

Qualquer benefício material alcançado será perdido

quando se abandonar o corpo atual. Todo esforço por alcançar algum objetivo que não seja espiritual faz do yoga um mero exercício físico. O ser humano deve ser inteligente o bastante para compreender a meta da vida e empreender uma busca constante pela auto-realização espiritual; neste caso o yoga cumpre perfeitamente seu papel como instrumento para o aperfeiçoamento e liberação espiritual da entidade viva.

Ainda dentro deste processo, o estágio mais elevado é o de transcendental serviço amoroso ao Senhor Supremo, que veremos adiante.

1.4 Diferentes Aspectos da Compreensão Espiritual

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A Verdade Absoluta é compreendida em três diferentes aspectos que correspondem ao nível de realização do yogi. Progressivamente se avança até a compreensão mais completa sobre a Verdade Absoluta em Seu aspecto Pessoal. Todas as escrituras védicas enfatizam este ponto. Pode-se avançar em conhecimento espiritual ilimitadamente, mas se este não culmina em conhecer a Verdade Absoluta em Sua forma Pessoal, todo o acúmulo de conhecimento torna-se insignificante. No Srimad-Bhagavatam (1.2.11), encontra-se a seguinte explicação:

vadanti tat tattva-vidas tattvam yaj jñanam advayam

brahmeti paramatmeti bhagavan iti sabdyate

“A Verdade Absoluta é percebida em três fases de compreensão pelo conhecedor da Verdade; todas elas são idênticas e são expressas como Brahman, Paramatma e Bhagavan.”

Isto indica que tanto a energia quanto o energético

são iguais do ponto de vista qualitativo. A Verdade Absoluta é tanto sujeito quanto objeto, pois no plano absoluto não há distinções entre o criador e Sua criação, e ainda assim a criação é mantida sob o controle do criador e nunca o contrário. Esta não-dualidade é apresentada pelo termo advayam. Entender esta qualidade específica de Krishna é algo muito elevado, mas que pode ser facilmente alcançado com a prática de bhakti-yoga.

tat chraddadhana munayo jñana-vairagya-yuktaya

pasyanty atmani catmanam bhaktya sruta-grhitaya

“O sábio seriamente inquisitivo, bem equipado de conhecimento e desapego, compreende esta Verdade Absoluta prestando

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serviço devocional amoroso, de acordo com o que ouviu das escrituras védicas.”

O conhecimento autorizado transmitido por um

mestre espiritual autêntico, o conseqüente desapego por atividades mundanas e a prática adequada de bhakti-yoga, orientada por um guru, pode revelar ao yogi a compreensão mais elevada sobre a Verdade Absoluta. É dentro de si, em sua consciência, que o yogi poderá perceber a Suprema Verdade Absoluta reciprocando as atividades do serviço devocional que o yogi executa em consciência espiritual. Gradualmente o yogi avança e percebe a energia divina presente em tudo, depois a presença divina dentro de si acompanhando sua alma individual e por fim percebe a existência da Suprema Personalidade de Deus em Sua morada transcendental e eterna. Vejamos agora cada um destes aspectos do Absoluto. 1.4.1 Brahman

A Suprema Personalidade de Deus, a Verdade Absoluta, é compreendida pelos jñanis, estudantes vedantistas dos Upanisads, como Brahman. Ele é, na verdade, um aspecto limitado da Verdade Absoluta, pois representa apenas a refulgência transcendental impessoal que emana do corpo do Senhor.

Não há erro neste nível de compreensão. No entanto, aqueles que buscam a liberação no aspecto impessoal privam-se da felicidade alcançada no aspecto pessoal de Deus, uma vez que fundir-se no Absoluto impessoal é considerado pela literatura Védica como um suicídio espiritual. Embora o Brahman seja um aspecto da Verdade Absoluta, nele não há variedade, atividade e nem mesmo reciprocidade da alma espiritual individual com a Alma Suprema. Para a alma espiritual esta falta de relacionamento gera um sofrimento incalculável, o que fará com que ela tenha que novamente reencarnar num corpo material e continuar sua jornada de retorno à sua origem eterna.

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Mas, isto não descarta as evidências de que o Senhor também seja energia impessoal. Qualitativamente fonte e energia são idênticas, mas quantitativamente são diferentes. Os raios do sol não deixam de ser o sol, num sentido, mas dizer que as partículas dos raios do sol é o sol em potencial não tem muita lógica. O sol é a fonte da energia que se espalha por todo o universo, mas a energia nunca pode ser considerada como a fonte do sol. São categorias diferentes com as mesmas qualidades.

Por este motivo, as escrituras confirmam a Verdade Absoluta como sendo também impessoal. Krishna diz no Bhagavad-gita (14.27):

brahmano hi pratisthaham amrtasyavyayasya ca

sasvatasya ca dharmasya sukhasyaikantikasya ca

“Eu sou a base do Brahman impessoal, que é imortal, imperecível e eterno, e é a posição da felicidade última.”

Krishna mesmo evidencia este ponto: ele, a Verdade

Absoluta, é a fonte do Brahman. Por este motivo, muitas escrituras, principalmente os Upanisads estudados pelos jñanis, apresentam o Brahman como meta última sem compreendê-Lo como pessoal. Pois, este Brahman referido nas escrituras é o Param Brahman, o Energético, o Brahman Pessoal que é a própria base do Brahman impessoal. Em outras palavras, este Param Brahman é a Suprema Personalidade de Deus. Parar no meio do caminho não é muito vantajoso para quem busca a autorealização.

Além de ser uma realização parcial, muitas escolas de yoga frisam a meditação no vazio ou na energia impessoal de Deus. Mas, muitas evidências anulam este equívoco filosófico. Primeiro: de acordo com os Vedas não existe vazio em nenhuma parte da criação, apesar desta idéia ter sido muito difundida no ocidente. Segundo: meditar em algo impessoal, sem forma é muito mais complicado do que fixar a mente numa forma pessoal, e isto é um fato apresentado pelas escrituras. No Bhagavad-gita (12.5), Krishna diz a Arjuna:

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kleso ‘dhikatara tesam avyaktasakta-cetasam

avyakta hi gatir duhkham devahadbhir avapyate

“Para aqueles cujas mentes estão apegadas ao aspecto impessoal e imanifesto do Supremo, o progresso é muito problemático. Progredir nesta disciplina é sempre difícil para aqueles que estão corporificados.”

Portanto, permanecer neste degrau não dará a realização mais elevada da Verdade Absoluta. Alcançar a compreensão Brahman não garante a liberação da entidade viva, pois ela poderá cair novamente em atividades materiais a qualquer momento. Isto é confirmado pelo Srimad-Bhagavatam (10.2.32), onde se declara:

aruhya krcchrena param padam tatah patanty adho ‘nadrta-yusmad-anghrayah

“Com grande esforço e dificuldades os pretensos yogis ascendem rumo à refulgência impessoal, mas tornam a cair no mundo material por não se refugiarem na Personalidade de Deus.”

1.4.2 Paramatma

Paramatma é o aspecto localizado de Deus que se encontra dentro de todas as entidades vivas. É Ele quem mantém a jivatma de duas maneiras: como kriya-shakti (a potência da ação), que também é conhecida como prana, e como jñana-shakti (a potência do conhecimento), que também é conhecida como consciência. Ambas se manifestam do Brahman e permanecem dentro do corpo da alma espiritual individual como Paramatma. Tanto o Paramatma quanto a

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jivatma deixa o corpo material da entidade viva juntas na hora da morte.

O sistema de asthanga-yoga praticado pelos yogis místicos destina-se a concentrar a mente neste aspecto da Verdade Absoluta. Assim, muitos yogis param neste degrau de realização espiritual visando apenas compreender que Deus está presente em seu coração e no coração das demais entidades vivas; ou seja, este estágio ainda é incompleto, porém mais elevado do que a realização Brahman impessoal. Enquanto na realização impessoal o yogi realiza dentro de si a sua eternidade, na realização Paramatma o yogi realiza o conhecimento eterno. Neste degrau a meta é alcançar o conhecimento sobre o Senhor em Seu aspecto de Superalma localizada, vasudeva-para yoga (Srimad-Bhagavatam 1.2.29). Entretanto, a meta do conhecimento é descrita no Svetasvatara Upanisad (3.8):

tam eva viditvati mrtyum eti “Só conhecendo-O é que se pode transpor os limites impostos por nascimentos e mortes”

Se o yogi persiste no caminho de avanço espiritual

seguindo as instruções de um guru fidedigno, ele poderá alcançar o objetivo mais elevado do sistema de yoga. Sem seguir as orientações de um mestre espiritual verdadeiro o yogi não conseguirá compreender a Verdade Absoluta em Seu aspecto mais abrangente. Com o poder limitado de nossos sentidos materiais fracassaremos nesta tentativa. Apenas um guru autêntico que pertença à corrente de sucessão discipular original pode nos iluminar com o conhecimento mais profundo. Isto está confirmado no Bhagavad-gita (4.34):

tad viddhi pranipatena pariprasnena sevaya

upadeksyanti te jñanam jñaninas tattva-darsinah

“Tenta aprender a verdade aproximando-se de um mestre espiritual. Faze-lhe perguntas submissas e presta-lhe serviço. As

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almas auto-realizadas podem transmitir o conhecimento porque viram a verdade.”

Este conhecimento autêntico, transmitido por um

guru que tenha profundo conhecimento realizado das escrituras, fará o yogi entender que todas as entidades vivas são partes integrantes da Suprema Personalidade de Deus. Esta deve ser a visão de um yogi auto-realizado. Isto também é confirmado no Bhagavad-gita (5.18):

vidya-vinaya-sampanne brahmane gavi hastini suni caiva sva-pake ca

panditah sama-darsinah “O verdadeiro yogi, em virtude do conhecimento autêntico, vê com a mesma visão um brahmana erudito e cortês, uma vaca, um elefante, um cachorro e um comedor de cachorro.”

No entanto, realizar apenas o Paramatma localizado

não nos capacita, ainda, a reciprocar relacionamentos transcendentais com o Senhor e, conseqüentemente, não oferece um prazer absoluto.

Segundo as evidências védicas o Paramatma habita o coração de todos os seres vivos móveis e inertes. Ele atua como a testemunha Suprema que acompanha todas as atividades das entidades vivas; Ele está presente até mesmo dentro dos átomos da energia material, como se confirma no Bhagavad-gita (13.16):

bahir antas ca bhutanam acaram caram eva ca

suksmatvat tad avijneyam dura-stham cantike ca tat

“A Verdade Suprema existe fora e dentro de todos os seres vivos móveis e inertes. Porque é sutil, Ele está além do poder cognitivo dos sentidos materiais. Embora longe, muito longe, Ele também está perto de todos.”

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A relação com a Superalma localizada é baseada no

respeito, temor e reverência. Não há ainda reciprocidade amorosa. Nesta relação ainda permanece certa distância entre o yogi e o Senhor.

1.4.3 Bhagavan

De acordo com as escrituras védicas, Bhagavan se refere ao aspecto da Verdade Absoluta que possui perfeito conhecimento da criação e destruição de todas as entidades vivas. Ele está situado em completa onisciência e é transcendental a todas as variedades e atividades do mundo material. Bhagavan é a entidade viva Suprema detentora de opulências ilimitadas tais como beleza, fama, renúncia, força, riqueza e inteligência. Ele está acima de qualquer nível de consciência material.

Para o yogi que superou as dualidades da mente e os desejos impetuosos dos sentidos através do transcendental serviço amoroso ao Senhor alcança a compreensão mais elevada sobre a Verdade Absoluta - Seu aspecto de Bhagavan - a Pessoa Suprema. Este processo é praticado pelos bhakti-yogis.

No Bhagavad-gita (7.13), há um verso onde Krishna estabelece que:

tribhir guna-mayair bhavair abhih sarvam idam jagat

mohitam nabhijanati mam ebhyah param avyayam

“Iludido pelos três modos de ignorância, paixão e bondade, o mundo inteiro não conhece a Mim, que estou acima da natureza material e Sou inesgotável.”

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Para possuir as opulências descritas acima somente uma Pessoa Absoluta. Por isso, Bhagavan se refere ao aspecto pessoal de Deus, a Suprema Personalidade de Deus, que possui uma morada transcendental, amigos, parentes, atividades, sentimentos e desejos; tudo absoluto, nada contaminado ou condicionado pela energia material ilusória. Neste aspecto, Ele é o Senhor de toda a criação e, dessa maneira, não é dominado por ela. No Katha Upanisad (2.2.13), há a seguinte declaração:

nityo nityanam cetanas cetananam eko bahunam yo vidadhati kamam

tam atma-stham ye ‘nupasyanti dhiras tesam santih sasvati netaresam

“Ele é o Supremo ser vivo mantenedor de inumeráveis entidades vivas; Ele é o Supremo ser consciente de todos os seres conscientes; através de Suas porções plenárias Ele vive nos corações de todos os seres vivos. Somente pessoas santas que interna e externamente podem ver o mesmo Senhor Supremo conseguem de fato alcançar a paz eterna e perfeita.”

Poucos são aqueles que alcançam verdadeiramente

este estágio de compreensão. Na verdade, apenas os bhakti-yogis é que o alcançam com facilidade. Nele se desenvolverá intercâmbios amorosos com o Senhor Supremo, que é a meta última de todos os sistemas de yoga e o objetivo máximo da vida humana.

Um ponto importante enfatizado nas escrituras Védicas é que mesmo um jñani e um yogi místico, só conseguem seus objetivos (fundir-se no absoluto impessoal e adquirir poderes místicos, respectivamente), se praticarem o processo de bhakti-yoga juntamente com seu processo específico. Ou seja, é compulsória a prática de bhakti para qualquer transcendentalista sério. Sem devoção amorosa por Deus não há como realmente progredir na vida espiritual. Isto porque é necessário e natural desenvolver o relacionamento recíproco e amoroso com a Suprema Personalidade de Deus, principalmente para quem quer amadurecer sua consciência espiritual. E somente com serviço devocional amoroso é que se

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pode vivenciar realmente o que é vida espiritual autêntica. Qualquer transcendentalista pode praticar e experimentar este despertar da espiritualidade. Não é privilégio apenas de alguns, se não que todos podem se beneficiar independentemente da fé ou crença. É um processo para todos que querem vida espiritual real e com amor absoluto. 1.5 Pranayama e Bhakti-yoga

Pode parecer estranho que pranayama seja realmente um método para se alcançar a liberação do enredamento dos sofrimentos materiais. Mas, de acordo com as escrituras Védicas, ele faz parte de aprimoradas técnicas utilizadas pelos primeiros yogis há milhares de anos.

Atualmente soa até como exagero pensar que podemos nos auto-realizar com um processo de controle dos ares vitais, simplesmente. Se creditarmos apenas a prática seca do pranayama certamente seremos enganados em nosso intento. Na atual era em que vivemos é totalmente inválido qualquer processo de auto-realização destituído de bhakti, devoção pelo Senhor. É fácil de compreender.

Originalmente, o sistema de yoga foi introduzido na sociedade humana com o propósito de facilitar a liberação das almas espirituais e harmonizar o ritmo entre a matéria e o espírito; em outras palavras, fazer com que os seres humanos elevassem a consciência à Suprema Personalidade de Deus, a Verdade Absoluta. Neste contexto, o pranayama é apenas um estágio do asthanga-yoga. O objetivo inicial é chegar ao estágio de meditação (dhyana), na Pessoa Suprema. Entretanto, a prática da meditação nesta era só é possível mediante a devoção amorosa a Deus, mediante o processo de cantar Seus Santos Nomes. No Bhagavad-gita (8.13), há a seguinte citação:

om ity ekaksaram brahma

vyaharam mam anusmaram yah prayati tyajan deham

as yati paramam gati

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“Após situar-se nesta prática de yoga e vibrar a sagrada sílaba om, a suprema combinação de letras, se o yogi pensar em Mim, a Suprema Personalidade de Deus, e deixar o corpo, com certeza alcançará os planetas espirituais.”

A palavra anusmaram é muito importante neste

verso. Ela significa lembrar-se. Não lembrar-se de qualquer coisa insignificante que tenha nos ocorrido durante nossa curta duração de vida, mas algum fato que tenha nos marcado profundamente e tenha sido registrado em nossa memória. Este termo anusmaram se refere à lembrança da forma pessoal do Senhor que foi cultivada em nossa memória ao longo da vida e que devemos manter fixa em nossa mente até o último instante. Por este motivo é que se faz importante o processo de bhakti.

Qualquer processo destituído de bhakti não promoverá este benefício ao yogi sincero. Só pode manter a forma pessoal do Senhor fixa na mente aquele que se ocupou em adorá-Lo com amor e devoção. Krishna garante isto no Bhagavad-gita (12.6-7):

ye tu sarvani karmani

mayi sannyasya mat-parah ananyenaiva yogena

mam dhyayanta upasate

tesam aham samuddharta mrtyu-samsara-sagarat bhavami na cirat partha mayy avesita-cetasam

“Mas aqueles que Me adoram, abandonando todas as atividades por Mim e não se afastando de sua devoção por Mim, ocupando-se em serviço devocional e sempre meditando em Mim, tendo fixado suas mentes em Mim, ó filho de Prtha - a eles Eu sou o pronto salvador do oceano de nascimentos e mortes.”

A Suprema Personalidade de Deus torna-se

(bhavami) o salvador da entidade viva condicionada. Ele naturalmente já é o libertador de todas as almas espirituais,

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mas, quando assumimos uma atitude de serví-Lo com devoção amorosa, Ele se lança em direção ao yogi rendido que abrigou sua consciência (cetasam) nEle através de bhakti-yoga (yogena). Simplesmente por ocupar-se em bhakti, sob orientação de um mestre espiritual fidedigno, nossa mente se absorverá em meditação (dhyayantah), sem necessariamente ter que seguir mecanicamente os oito degraus do asthanga-yoga de Patanjali.

Seguindo estas diretrizes podemos realmente praticar pranayama de maneira eficaz e chegar a um resultado satisfatório. A idéia é que todas as nossas atividades devem ser executadas em plena consciência devocional, com consciência da Suprema Personalidade de Deus. Ele é unicamente o beneficiário último de todas as atividades executadas pelas entidades vivas, e quando se age com esta consciência age-se em bhakti. Portanto, quando damos este direcionamento em nossas práticas de pranayama recebemos os benefícios transcendentais do processo de yoga. Isto é autêntico. Apenas ginástica ou exercícios pulmonares não correspondem ao propósito apresentado pelas escrituras Védicas que tratam do sistema de yoga original.

Como foi citado acima no verso 23 do capítulo 8 do Bhagavad-Gita, o cantar do mantra Om torna-se bhakti quando se canta o maha-mantra hare krishna, pois aquele está inserido neste.

Bhakti-yoga tem como base o cantar de mantras para gradualmente purificar a consciência, a mente e os sentidos. Man, em sânscrito significa mente e tra significa algo que libera a mente. Assim, quando se canta o maha-mantra hare krishna estamos indo direto ao objetivo do pranayama que é liberar a alma condicionada. Se usarmos apenas a técnica de pranayama levará um tempo maior e talvez até não alcancemos o objetivo. No Mundaka Upanisad (3.1.9), se declara:

eso ‘nur atma cetasa veditavyo yasmin pranah pancadha samvivesa

pranais cittam sarvam otam prajanam yasmim visuddhe vibhavaty esa atma

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“O tamanho atômico da alma pode ser percebido por uma inteligência perfeita. Esta alma atômica flutua nas cinco espécies de ar (prana, apana, vyana, samana e udana), está situada dentro do coração, e exerce sua influência por todo o corpo das entidades vivas corporificadas. Quando a alma se purifica da contaminação das cinco espécies de ar material, sua influência espiritual manifesta-se.”

Existem três inimigos que sempre estão prontos

para degradar a mente da entidade viva: o desejo, o medo e a ira. Com o controle da mente pelo processo de bhakti-yoga é possível ficar livre da influência negativa destes inimigos. Nela também se inclui a prática de pranayama, como cita o Senhor Krishna no Bhagavad-gita (5.27-28):

sparsan krtva bahir bahyams

caksus caivantare bhruvoh pranapanau samau krtva nasabhyantara-carinau

yatendriya-mano-buddhir munir moksa-parayanah vigateccha-bhaya-krodho yah sada mukta eva sah

“Repelindo todos os objetos sensoriais externos, mantendo os olhos e a visão concentrados entre as sobrancelhas, suspendendo dentro das narinas os alentos que entram e que saem, e assim controlando a mente, os sentidos e a inteligência, o yogi que visa a liberação livra-se do desejo, do medo e da ira. Alguém que está sempre neste estado decerto é liberado.”

Este mesmo mecanismo é aplicado hoje em dia,

mas sem o mesmo sucesso de cinco mil anos atrás. Quando Arjuna se negou a seguir o processo de asthanga-yoga apresentado pelo Senhor Krishna, ele ainda não tinha conhecimento de bhakti. É significativo que, se Arjuna não se adaptou ao processo há cinco mil anos, para o homem moderno este processo seja ainda mais inadaptável se não houver bhakti. Quando Krishna apresenta o processo prático

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de bhakti-yoga para Arjuna este o aceita e aplica em sua vida, dentro do campo de batalha de Kuruksetra, e ao final ele sai vitorioso sobre suas crises psicológicas e existenciais.

Todas as diferentes linhas de yoga visam chegar à devoção amorosa pelo Senhor. Nesse sentido bhakti é o ponto onde culminam todos os outros sistemas de yoga. E baseando-se nos registros escriturais Védicos concluiremos, sem dúvidas, que o sistema de yoga original deixado por Kapiladeva foi bhakti-yoga. Com o passar dos milênios esta essência foi sendo perdida e diluída em distorções filosóficas e práticas. Infinitas variedades de escolas surgiram promulgando seu próprio processo de yoga sem nenhuma relação com a tradição autêntica e científica da auto-realização. No entanto, o Senhor Kapiladeva explana a essência de Seu sistema de yoga no Srimad-Bhagavatam (3.28.34):

evam harau bhagavati pratilabdha-bhavo bhaktya dravad-dhrdaya utpalakah pramodat autkanthya-baspa-kalaya muhur ardyamanas

tac capi citta-badisam sanakair viyunkte “Seguindo o processo de bhakti, aos poucos o yogi desenvolve amor puro pela Suprema Personalidade de Deus, Hari. No transcurso de seu progresso em transcendental serviço devocional amoroso, os pêlos de seu corpo se arrepiam devido ao júbilo excessivo, e ele banha-se constantemente numa torrente de lágrimas ocasionadas pelo amor extático intenso. Gradualmente, até mesmo a mente, que ele usava como um meio para atrair o Senhor, assim como um peixe é atraído a um anzol, afasta-se da atividade material.”

Notamos que os princípios de yoga utilizados para

a meditação são úteis até chegar ao estágio de bhakti, depois se tornam desnecessários. Tendo chegado a este ponto não faz mais sentido ficar sentado em posturas para meditar. Não nos resta muito tempo no dia-dia corrido. Podemos então meditar de maneira prática e dinâmica através de bhakti.

Entretanto, não devemos considerar que seja algo fácil chegar ao ponto de meditar espontaneamente na forma Pessoal de Deus. Devem-se seguir progressivamente os estágios

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de bhakti. No início temos que ocupar a mente de maneira até artificial, ou forçá-la a pensar no Senhor. Esta fase é chamada de yoga sem vida. Podemos passar vidas e vidas neste estágio sem progresso espiritual tangível. Porém, quando pensamos ou meditamos na Suprema Personalidade de Deus de maneira natural estamos vivenciando nossa eternidade em relação com o Senhor; esta fase é considerada yoga viva. Estar nesta situação também é definido como bhavena, prestar transcendental serviço devocional amoroso ao Senhor em nossa posição natural eterna. Kapila diz à Sua mãe no Srimad-Bhagavatam (3.32.11):

atha tam sarva-bhutanam hrt-padmesu krtalayam

srutanubhavam saranam vraja bhavena bhamini

“Portanto, Minha querida mãe, através do serviço devocional, refugia-te diretamente na Suprema Personalidade de Deus, que está sentado no coração de todos.”

Ocupar-se em bhakti é algo natural para o ser vivo

(bhavena). Antinatural é ocupar-se nas atividades insensatas de tentar explorar a natureza material independente de Deus. Se a Personalidade de Deus está no coração de todos como Paramatma é porque devemos nos ocupar em nossa verdadeira atividade: serví-Lo.

No Srimad-Bhagavatam (8.5.38), os semideuses encabeçados por Brahma ofereceram orações glorificando ao Senhor Supremo, dizendo que “a força vital (prana), os sentidos, a mente, o ar dentro do corpo e o éter, que é o abrigo do corpo, vêm” do umbigo do Senhor. Assim, o prana tem relação direta com a Suprema Personalidade de Deus. O yogi que pratica pranayama com consciência transcendental conquista sua liberação. Ainda no mesmo capítulo do Srimad-Bhagavatam (8.5.37), Brahma diz que:

pranad abhud yasya caracaranam prana saho balam ojas ca vayuh

anvasma samrajam ivanuga vayam

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prasidatam nah as maha-vibhutih “Todas as entidades vivas, móveis e imóveis, recebem do ar sua força vital, sua força física e suas próprias vidas, exatamente como os servos rendem-se ao imperador. A força vital do ar é gerada da força vital original que existe na Suprema Personalidade de Deus. Que este Senhor Supremo esteja satisfeito conosco.”

A causa remota de tudo que existe é a Verdade

Absoluta, a Suprema Personalidade de Deus. Então, a idéia é que tudo é espiritual, pois Ele é a Transcendência Suprema e, desse modo, qualquer atividade que realizamos ou pode ser canalizada pela energia espiritual ou encoberta pela energia material. Dependerá de nossa consciência. Como tudo tem uma única fonte original em Bhagavan logo tudo é espiritual e deve ser utilizado em bhakti para a satisfação transcendental dEle.

O pranayama ou qualquer sistema de yoga autêntico não foge desta regra. Dessa maneira, conclui-se que inteligente é o yogi que aproveita esta forma humana de vida para se auto-realizar através de um processo simples, prático e direto, sem desperdiçar um momento sequer de sua preciosa vida em algo que não seja benéfico à sua jornada espiritual. Devemos ser cautelosos a cada decisão que tomamos na vida e atentarmos para a necessidade urgente de desenvolvermos amor puro por Deus - este é o objetivo do yoga como ele é.

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VAISHNAVA VEDANTA YOGA VEDYAH EDITORA VIRTUAL

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OM TAT SAT