poz-grim

44
POZ-GRIM UFRRJ | Ano 1 - nº1 Dezembro de 2011

Upload: carolina-vaz

Post on 22-Mar-2016

219 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

Poz-grim é uma revista idealizada e realizada por quatro estudantes de Jornalismo da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), no final de 2011. Alan Miranda, Carolina Vaz, Igor Ferraz e Pollyana Lopes estavam no quarto período do curso e queriam falar de expressões artísticas e culturais - dança, música, artes plásticas, etc - na região em que estudavam e moravam: Baixada Fluminense.

TRANSCRIPT

Page 1: Poz-grim

POZ-GRIMUFRRJ | Ano 1 - nº1Dezembro de 2011

Page 2: Poz-grim

Reza a lenda que a Universi-dade Rural abriga entre seus recantos e refúgios verdoengos duendes e gnomos. Na verdade, a “lenda” não é muito clara. E nem deve ser. Não se sabe ao certo se as criaturas existem ou se os estudantes desenvolvem a capacidade de vê-las ao aden-trar na vivência e hábitos do campus.

Cultura e mais especificamente cultura artística, é algo místico. A música, o cinema, o teatro e todo tipo de arte carrega uma parte abstrata e imaginária dos autores. Eu (Alan), Carolina, Igor e Pollyana, alunos da Rural, pre-tendemos com essa revista ex-por a cultura artística da região. Da Rural para... o mundo? Talvez nem tanto.

Ao olhar as manifestações cul-turais dessa região – Seropédi-ca, Paracambi, Itaguaí, Nova

CapaDAN

IELLA VIANA

Iguaçu e Zona Oeste –, sem os estereótipos e senso comum reproduzidos pelos meios tradi-cionais, nos propomos a mos-trar o que há além do verde dessas abordagens. Sessões de cineclubes, escolas de música, companhia de dança e teatro têm público cativo e movimen-tam o cenário cultural dessas cidades.

A idéia da capa é associar num só retângulo de cores a magia da arte desde a “cultura rurali-na” até manifestações culturais da região. Quanto à atividade que cada duende desempenha na ilustração, deixo a cargo do leitor interpretar durante a leitura de cada matéria. No fim das contas, a capa inaugural da Poz-Grim não passa de uma “viagem”, de uma possibilidade, de uma brincadeira fazendo arte de verdade.

Poz-Grim e os duendes, aqui estamos nós

Page 3: Poz-grim

Editorial

“Sabe aquele cachorrinho espalhado em vários muros da Zona Oeste? Dava uma pauta interessante.” Foi com um desses e outros ensejos que surgiu a linha editorial da revista Poz-Grim. Pretendía-mos buscar um modelo de texto em que houvesse maior liberdade dos repórteres em sua descrição. Diferente dos gêneros jornalísti-cos mais comuns, buscamos, de certo modo, um texto mais íntimo e “prafrentex”. O uso da 1ª pessoa do plural ao longo do texto não se deve apenas ao fato de não ser assinado, mas representa a uni-dade do grupo em diversos âmbitos, desde a afinidade de gêneros jornalísticos ao desenvolvimento das pautas e reportagens.

Nossa publicação tem caráter cidadão e pretende levar infor-mações sobre eventos da região de Seropédica, Itaguaí, Nova Iguaçu e Zona Oeste, muitas vezes gratuitos e acessíveis ao público. A cultu-ra surge em cada beco e esquina no cotidiano dessas cidades, mas muitas vezes permanece reclusa a alguns poucos.

A intenção da Póz-Grim é justamente trazer à tona essa cultura. Acreditamos que o tema seja capaz de instigar senso crítico nos lei-tores acerca do que é cultura no sentido de entretenimento. Mos-traremos que existem opções de atividades, capazes de divertir e ensinar, como, por exemplo, encenação teatral de Franz Kafka e ci-neclubes.

Em sua primeira edição, a Póz-Grim teve como editoria de destaque Artes Plásticas, com cinco reportagens, além da entrevista perfil com um artista, aluno da UFRRJ. Acreditamos que essa editoria apareça como um exemplo da nossa proposta, pois contém formas diversas de linguagem, uma vez que os textos foram escritos, cada um, com características marcantes de cada repórter. E também porque traz temas e opções diversas. Há, por exemplo, a reportagem sobre a revista Beleléu, uma publicação independente de quadrinhos, bem como a matéria sobre os trabalhos de um conhecido grafiteiro da Zona Oeste do Rio de Janeiro.

A Póz-Grim é de fato uma publicação ousada, por investir em um segmento editorial inexplorado na região. Cremos que o incentivo às manifestações artísticas pode ser melhor desenvolvido e é esse, o nosso principal propósito.

“Sabe aquele cachorrinho espalhado em vários muros da Zona Oeste? Dava uma pauta interessante.” Foi com um desses e outros ensejos que surgiu a linha editorial da revista Poz-Grim...

Page 4: Poz-grim

Sumário

6

24

14

Entrevista: Beatriz Wey

2617

12

16

19

Artes Plásticas: Foi pro Beleléu

Artes Plásticas: “Nós Brasileiros”

Artes Plásticas: Há arte sem humor?

Artes Plásticas:Shun: o cachorrinho mais

famoso da zona oeste

Música: Black Bird: Beatles em alto nível

Cinema: Amigos, filmes e altos papos

Cinema:Cinecasulo: um cine-clube e muitas caras

Page 5: Poz-grim

ExpedienteExpediente34

30

37

40

42

Esta revista teve suas repor-tagens e entrevistas apura-das, escritas e editadas por: Alan Miranda, Carolina Rober-ta Vaz, Igor Ferraz e Pollyana Faria Lopes.Os mesmos também foram os

fotógrafos e diagramadores.

Colaboraram nesta edição, como fotógrafos, Pablo Fer-reira de Lima, Letícia Santos e Daniella Viana

Artes Cênicas: Dança democrática

na universidade

Artes Cênicas: Alô, garotada!O circo chegou

Artes Cênicas:Kafka: escritor, crítico,

visionário

Personagem: Marcelo Amaral

Agenda

Page 6: Poz-grim

Entrevista

A professora Beatriz Wey foge do tradicional. Ao encenar peças que aparentemente nada têm haver com a política habitual, ela põe uma lupa sobre as relações pessoais do cotidiano e mostra como as decisões políticas estão inseridas na vida de cada cidadão comum. Beatriz tem doutorado em Ciência Política

pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ) e, atualmente, desenvolve pesquisas sobre Política e Arte e Teatro Político. Desde agosto de 2011, ensaia a peça Punições, uma interseção de três contos de Franz Kafka – A Metamorfose, O Veredito e Na Colônia Penal -, para apresentá-la em dezembro por uma companhia de estudantes de Ciências Sociais da UFRRJ. Além disso, em outubro deste ano, a professora apresentou uma demonstração de leituras sobre Hannah Arendt no Festival Ibero-americano em Cádiz, na Espanha.Nesta entrevista, Wey comenta sua

iniciação ao teatro político, seus projetos atuais e futuros.

6Poz-Grim

Page 7: Poz-grim

Poz-Grim: Como e quando o teatro político começou a te interessar?Beatriz Wey: O teatro me interes-sa, na verdade, desde o início do meu mestrado quando comecei a trabalhar em um núcleo de pes-quisa em arte e política. Nesse primeiro momento, eu não tinha ideia ainda de que ia trabalhar com teatro político, mas eu sabia que o teatro é uma arte interes-sante para pensarmos a ação po-lítica. Então, concretamente, eu acho que eu já trabalho com esse tema de forma indireta, há mais ou menos uns 15 anos.

PG: Como é atuar, produzir e dirigir? Qual dessas tarefas a senhora prefere?

BW: É muito difícil conciliar essas três funções, mas eu acho que é uma realidade para os grupos pe-quenos, ou todas as companhias que não conseguem patrocínio, por consequência, elas enfrentam. As pessoas precisam se dividir para que todas as tarefas sejam realizadas. Sem dúvida nenhuma, eu gosto muito de atuar, embora eu não tenha formação em artes cênicas. Eu acho que é o momento em que a gente pode pensar sobre o trabalho construído e ao mesmo tempo fazer uma reflexão sobre a maneira como ele foi assimilado por nós e como ele modificou a nossa própria maneira de pensar e de se colocar diante do especta-dor.

PG: Dentro de uma universida-de como a UFRRJ, quais são as possibilidades de unir a pes-quisa acadêmica à prática te-atral?

BW: O espaço da universidade pú-blica é bastante democrático. Ele permite que os profissionais que queiram trabalhar com pesquisa

e com as manifestações artísticas, façam isso. É um espaço de um di-álogo muito plural e interessante. O problema é que toda vez que a gente se aventura numa temática que exige patrocínio, que exige uma verba, a gente sempre es-barra numa grande dificuldade, a verba. Então embora o espaço seja aberto, enfrentamos dificul-dades em obter recursos. A UFRRJ não tem ainda o curso de artes cênicas, e isso é um entrave por-que toda a minha proposta se dá dentro de um curso que, na sua es-sência, não precisa do diálogo com as artes e com o teatro. Então, o que eu proponho é uma coisa um pouco diferente do convencional. Tenho encontrado eco nessa mi-nha descoberta, nessa minha pro-posta, mas dificuldade no que diz respeito ao financiamento.

PG: A senhora já desenvolveu outros trabalhos semelhantes em outras universidades em que trabalhou. Como é quan-do esses projetos extrapolam

o âmbito da universidade?BW: Eu acabei descobrindo com a experiência que é uma consequên--cia que ele extrapole a universi-dade. Uma montagem teatral, ela não é o resultado de um trabalho acadêmico pura e simplesmen-te. Ela acaba sendo o resultado de algo que diz respeito à comu-nidade, que diz respeito ao lugar onde a gente convive, e faz parte a própria comunidade acadêmica. Em outras palavras, a comunidade acadêmica, e a comunidade mes-mo, elas acabam interagindo no momento em que a gente fala de arte, que a gente fala de teatro. Então isso aconteceu nessa uni-versidade no interior do estado que eu trabalhava. Inicialmente era um trabalho voltado para uni-versidade, um trabalho que nas-ceu na universidade e tinha uma questão colocada para os cursos envolvidos, mas nós fomos aos teatros da região e a gente aca-bou viajando com esse trabalho. E isso fez com que a gente virasse um grupo de teatro. Então eram alunos, mas eram atores para nós que estavam em cartaz com o nos-so trabalho. Então eu acho que é uma consequência. Não que par-tamos do pressuposto que isso vai realmente acontecer, mas é uma tendência natural que extrapole o campus universitário. O que é uma coisa extremamente positiva.

PG: O seu objeto de pesquisa já foi o direito e o sistema de justiça. Como a literatura de Franz Kafka se relaciona com esse contexto?

BW: Na verdade, o meu objeto de pesquisa sempre foi a política e eu acabei sempre esbarrando em ou-tros temas diretamente ou indire-tamente relacionados ao estado e sua organização. Daí o porquê do direito como um objeto importan-te de estudo. Acontece que, como

7 Poz-Grim

“As primeiras leituras que eu fiz do Kafka me fizeram perceber que eu conseguia compreender muito melhor o século XX a partir da literatura do que pensando de forma sistemática e coerente...

Page 8: Poz-grim

eu disse anteriormente, a relação entre arte e política é muito an-tiga. Então, eu sempre fui buscar em outros meios, que não aquele centrado em torno de questões teóricas, epistemológicas da ciên-cia política respostas para a políti-ca. Então eu faço investigação so-bre dramaturgia e literatura para encontrar a política. Eu acho que esse caminho é um pouco diferen-te, se não muito, do convencional. O que se faz é concentrar em tor-no das produções teóricas e a par-tir delas a gente produzir nossas formas de conhecimento. Eu acho que isso acaba limitando a nos-sa possibilidade de um processo mais amplo e importante para nós que é pensar a política de forma atemporal. Que é buscar, não uma explicação específica para um fato, mas que possamos, ao partir de um entendimento mais abran-gente da política, encontrar assim esforços mais claros, mais interes-santes e muito mais verdadeiros do que essas da ciência política, fadadas à ideologia, a concepções partidárias que acabam limitando uma compreensão maior do uni-verso da política. Então meu in-teresse pelo direito, pelo sistema judiciário, pelo estado, pela ação política de uma maneira geral sempre foi algo em mim, mas eu sempre busquei nisso para além da ciência política como forma de encontrar melhor a explicação so-bre essa temática.

PG: O Kafka se encaixa nisso então?

BW: Completamente. As primei-ras leituras que eu fiz do Kafka me fizeram perceber que eu conse-guia compreender muito melhor o século XX a partir da literatura do que pensando de forma siste-mática e coerente, uma lógica par-tindo da ciência política. Então, é muito curioso como a literatura

pode fazer isso, como os artistas fazem isso. Uma explicação que ajuda a entender é pensar o quan-to, em determinados momentos da história, nas ditaduras diver-sas, como é que os artistas são perseguidos, como é que os es-critores são perseguidos. Se eles não estivessem falando coisas tão importantes, fazendo coisas tão importantes, não haveria tanta perseguição, não haveria tanto medo em relação àquilo que eles fazem. Até porque eles conse-guem ter uma visão que muitas vezes a gente não consegue. Con-seguem ver um estranhamento em relação à realidade que os leva a desenvolverem uma concepção sobre a realidade muito inteligen-te, muito abrangente e sensíveis. E o Kafka foi um dos grandes gê-

nios da compreensão da moder-nidade.

PG: Agora, você acabou de voltar do festival Ibero-ame-ricano em Cádiz, na Espanha. Você apresentou um monólo-go lá?

BW: O que eu apresentei é o que é chamado de uma “demo”. É uma demonstração de um trabalho que tende a evoluir para um es-petáculo. É como se a gente apre-sentasse uma sinopse em cena de um trabalho que está sendo cons-truído e que vai ter uma recepção, a partir da demonstração. A gente demonstra, para ver como é que isso chega até as pessoas e a partir dessas respostas a gente constrói o espetáculo.

8Poz-Grim

Page 9: Poz-grim

PG: E como é que foi a impres-são das pessoas?BW: Esse festival é um festival muito interessante porque partici-pam dele vários países da América Latina que têm uma vivência po-lítica muito intensa. Isso é muito curioso, principalmente para nós brasileiros. Eles fazem o tempo inteiro o teatro político, falam o tempo inteiro sobre política, te-mas atuais, temas do passado, sa-bem numericamente tudo o que acontece na realidade dos países. São extremamente estimulados a pensar e produzir artisticamente a partir dessas realidades. Então eu sabia que eu ia encontrar um público bastante estimulado por uma discussão política. O que eu fiz foi levar um trabalho que diz respeito a uma leitura muito par-

ticular que eu tenho feito sobre Hannah Arendt sobre o verdadei-ro sentido da política. Foi muito bacana porque enquanto eu apre-sentava o meu trabalho, eu via as pessoas se colocando, não se es-pontaneamente ou se como uma necessidade, de concordarem. Então as pessoas falavam: “É isso mesmo!” “Certo”. Era uma como-ção assim, em alguns momentos. Em determinado momento no fi-nal do meu trabalho, uma pessoa, uma moça, entrou no meu traba-lho. Acho que tinha tanto espaço para que ela se colocasse que ela nem se deu conta que eu estava no meio de um trabalho. O que eu achei ótimo embora eu confesse que não soube lidar muito bem com aquilo. Mas eu percebi que eu consegui fazer o que eu real-

mente queria. Eles se mobilizaram e aquela informação de algum jeito os transformou, de alguma forma chegou até eles. Foi então, para mim uma sensação muito ba-cana de estar lá, de fazer aquele trabalho. Eu terminei com a sen-sação de que, se isso não se trans-formar em um espetáculo, não tem problema. É como se o meu objetivo tivesse, de verdade, sido atingido. Depois dele eu participei do fórum de criadores, que é o momento em que atores, direto-res, dramaturgos dialogam sobre as obras teatrais. Tão interessan-te quanto a apresentação cênica, foi quando, enquanto eu dizia para eles do grande problema de trabalhar com a questão política, ver a forma como eles reagiram, muito positivamente. Então a mi-nha questão era dizer o seguinte: a gente fala da política sempre usando o discurso político, acredi-tando que esse é o único caminho para fazer isso. É uma forma mui-to equivocada porque se eu falo para você de alguma coisa que diz respeito à nossa política você vai falar: “Ah, verdade! Você tem ra-zão, é isso mesmo que acontece.” Você sai daqui, da mesma manei-ra que entrou. Isso acontece por-que às vezes o problema está tão próximo de nós, que a gente não consegue ver como existem esses problemas e a minha ação parti-cular. Não há um distanciamen-to, um estranhamento suficiente para me levar a uma reflexão. Então, talvez, o melhor para falar sobre política, é não falar sobre política. A partir de outra temáti-ca, posso apreender a atenção e levar à mobilização. Porque o ob-jetivo nosso, quando pesquisamos cenicamente a política é pensar o quanto ele pode se transformar em ação. Mas na verdade, o tea-tro político fica com esse equívoco de que ele tem que estar o tempo inteiro pensando numa temática

9 Poz-Grim

“Então, talvez, o melhor para falar sobre política, é não falar sobre política...

Professora encena, na UFRRJ, monólogo apresentado na Espanha

POLLYAN

A LOPES

Page 10: Poz-grim

e colocando sobre nós apenas em relação ao tema. O conteúdo não é importante. O mais importante do teatro político é o como fazer.

PG: A peça Punições vai ser encenada em dezembro. Qual é a expectativa?

BW: Esse trabalho nós já fizemos antes, com o grupo anterior que eu tinha na UBM (Universidade de Barra Mansa). Tivemos a pos-sibilidade de apresentar em vários lugares e foi muito interessante. Essa montagem da Rural, por uma questão de tempo, número de en-contros, ensaios, ela está um pou-co diferente da minha proposta inicial. Eu trabalhei com o diretor Almir Ribeiro no interior do esta-do. Está um pouco diferente, mas é o mesmo trabalho. Então, eu acho que ele traz aí uma novida-de, que é a gente fazer, pensar a ciência política, em uma univer-sidade que não tenha teatro, de forma cênica. Como um escritor que tenha essa abordagem polí-tica, nada direta, propriamente dita, mas que traz aí pontos muito importantes para a gente estar re-fletindo. Como é teatro, eu acho que a expectativa é que cada um, de forma muito subjetiva, encon-tre, na verdade nesse momento de si em cena, uma resposta para modificar sua própria maneira de agir. Por outro lado, também te-nho uma expectativa que esse ins-trumento de trabalho seja apenas o primeiro trabalho, que possa-mos deslanchar num grande mo-vimento de pensar a política pelo teatro e tenhamos um respaldo maior da universidade e das agên-cias de fomento. Que isso leve um trabalho a desenvolver um pro-cesso contínuo.

PG: Esse processo talvez leve a peça para fora da universida-

10Poz-Grim

de. Como é que você pretende articular isso?BW: Isso nós vamos fazer mesmo. Nós já temos convênio com algu-mas universidades: Unirio, UERJ, UFRJ, Universidade de Valença e provavelmente a USP que vão re-ceber a gente nos teatros que elas têm. Então a ideia é que não seja apenas uma apresentação, mas após a apresentação teremos um debate bastante diverso. Como vai acontecer na Rural em dezembro. Nós vamos ter pessoas de áreas diferentes que vão pensar essa posição e vão dialogar com os ou-tros interlocutores. Eu acho que isso vai enriquecer muito. Embora a gente não precise de um debate após a peça. A peça bastaria para que as pessoas saíssem mobiliza-das em relação àquilo que viram, mas como é um espaço acadê-mico, então espero que o debate consolide melhor essa concepção de pensar, refletir, falar, enfim, trocar ideias diferentes. Na Rural,

nós vamos ter um especialista em direito, literatura, psicologia, polí-tica e sociologia em nosso debate. Então eu acho que vai ser bem interessante, bem enriquecedor. Agora, após isso, talvez a gente se aventure em outros lugares. O professor Marcelo, que compõe a nossa equipe, tem uma grande vontade de entrarmos em cartaz no teatro. Mas ainda não é um dado que a gente possa dar como certeza. No início, são realmente apresentações em universidades.

PG: Quase todos os atores são alunos da universidade. E como esses alunos se inscre-vem para participar do teatro?

BW: Nós começamos o projeto sem um compromisso acadêmico e então, nós percebemos que isso não funcionava muito bem. Os alunos têm outras preocupações, têm aulas. Então, a pró-reitora (de Graduação), professora Ni-dia Majerowicz, me sugeriu que transformasse esse projeto numa disciplina. Que ele tivesse um re-conhecimento de verdade pelo Pró-reitoria de Graduação. Foi aí que tornamos o grupo de teatro num laboratório do curso de Ci-ências Sociais. Então nós forma-lizamos nosso trabalho. Eu achei ótimo porque conseguimos um espaço de trabalho. Hoje ocupa-mos uma sala no Colégio Fernan-do Costa. Já está sendo pensado um espaço para essas oficinas, para esses laboratórios de tea-tro. Por outro lado, também vou poder conseguir alguns recursos como transportar os alunos. Esta-mos dialogando com a Pró-reitoria para o caso de precisarmos dormir em outro estado, outra cidade. Então, estamos atrás de recursos para que tudo funcione bem. Foi muito bom que o projeto tivesse o reconhecimento do Decanato para ele continuar existindo.

“a expectativa [com a peça] é que cada um, de forma muito subjetiva, encontre (...) uma resposta para modificar sua própria maneira de agir...

Page 11: Poz-grim

Artes Plásticas

Page 12: Poz-grim

Foi pro BeleléuSub-mundo dos quadrinhos brasileiros é tema de palestra na Rural

Super-herói justiceiro, ombros largos, quadril estreito. Caracterís-ticas humanas, mas poderes incal-culáveis, muitas vezes explorados para o “bem da sociedade”. Típico herói americano, características típicas dos quadrinhos Comix.

Nos EUA, o universo dos qua-drinhos é, em massiva maioria, ligado ao padrão do quadrinho Comix. Nesse tipo de publicação há toda uma máquina editorial à disposição. Artistas são contrata-dos pelas grandes empresas para alimentarem esse mercado de-senhando temas, histórias e per-sonagens pré-determinados pela indústria. O desenhista apenas segue o roteiro e as histórias se

tornam cada vez mais parecidas umas com as outras.

Diferente do Comix, os quadri-nhos europeus valorizam as histó-rias autorais, personagens pouco estereotipados, traços diferencia-dos. Há, nessa medida, histórias de autores e não histórias de es-túdios. O artista é o diferencial, concebe um traço, e aprimora sua técnica, sem precisar adaptar-se ao modelo da empresa. É também central na construção da narrativa e do roteiro.

Também no Brasil, há público para os quadrinhos. Os comix che-garam ao país no início do século XX e começaram a se popularizar na década de 60 com “A turma

do Pererê”, a primeira revista de quadrinhos com personagens e temas brasileiros publicada no país.

O estilo comix ainda predomina no negócio editorial brasileiro, concorrendo apenas com mangás japoneses, e em menor medida, os quadrinhos europeus.

ARTE

S PL

ÁSTI

CAS

SERO

PÉDI

CA

Procurando independência

Apesar desse tipo padronizado de HQ dominar o mercado, os chamados quadrinhos indepen-dentes têm conquistado espaço dentre o público brasileiro. Artis-

12Poz-Grim

Page 13: Poz-grim

tas, na maioria das vezes, influen-ciados pelas histórias europeias e nacionais, com experiência em fanzines - tipo de informativo des-pretensioso, autoral, com público alvo bastante específico e geral-mente com pouca qualidade grá-fica -, unem suas histórias e pu-blicam.

Nesse tipo de revista, os autores são responsáveis por mais que o trabalho artístico. Preocupam-se também com a logística: enviar para a gráfica, distribuir em locais de venda, cobrar os valores aos comerciantes etc.

A independenteEsse é o caso de Tiago “Elcerdo”

Lacerda, Daniel Lafayette, Estêvão “Stêvz” Vieira e Eduardo Arruda. Os quatro são os autores da Bele-léu, uma revista independente, pensada em conjunto. A revista possui 80 páginas, é colorida, e composta por histórias curtas, de no máximo sete páginas.

Para superar as dificuldades en-frentadas pelos meios fora das editoras, os quatro artistas cri-aram uma série de soluções. A relação íntima com a internet, a participação em feiras e a comer-cialização de outros produtos são as principais.

A revista possui um site (www.revistabeleleu.com.br), no qual é possível conhecer a formação dos

artistas, os outros produtos dos autores, a linha de produtos da Beleléu, notícias sobre a revista, entre outros. Segundo Tiago La-cerda, “a facilidade, hoje em dia, acaba sendo a internet (...) e o site ajuda muito porque você pode in-clusive vender pelo site”.

A Beleléu também esteve pre-sente no evento Rio Comicon, nas edições de 2010 e de 2011. Os ar-tistas se uniram a outros que tam-bém trabalham de forma inde-pendente e alugaram um estande no festival. O Rio Comicon (Festi-

val Internacional de Quadrinhos e Cultura Pop), reúne exposições, oferece palestras, debates e oficinas.

Beleléu na RuralNo dia 17 novembro de 2011,

Tiago Lacerda e Estêvão Vieira es-tiveram presentes na UFRRJ para ministrar a palestra “O fortaleci-mento dos Quadrinhos Independ-entes (O nascimento da Beleléu)”. O evento estava incluído na pro-gramação da I Semana Acadêmica do Curso de Belas Artes da Univer-sidade.

Os quadrinistas contaram aos estudantes um pouco das próprias trajetórias, suas principais influên-cias, a motivação para criar a re-vista, as dificuldades enfrentadas, o reconhecimento que ganharam após a publicação etc. Também mostraram fases do processo de criação por meio de estudos e rascunhos das tiras e histórias que compõem a revista.

Na banca montada após a pa-lestra, os estudantes e convidados puderam conhecer e comprar os produtos beleléu.

13 Poz-Grim

Elcerdo e Stêvz expõem mais um produto beleléu

Estudantes acompanham atentos palestra expositiva

PABL

O F

ERRE

IRA

POLLYAN

A LOPES

Page 14: Poz-grim

“Nós brasileiros”Aprendendo a desenhar diferentes etnias: oficina de estudantes alia identidade a medidas

Conceitos como etnia, identidade e anatomia unem-se à linhas, traços e medidas na oficina “Nós Brasileiros”. Esta foi a primeira atividade da primeira Semana Acadêmica do curso de Belas Artes (SABA) da Rural de Seropédica. A SABA aconteceu entre os dias 16 e 18 de novembro.

A oficina propôs-se a mostrar e explicar as diferenças nas estruturas cranianas de três etnias que formam o povo brasileiro – negro, branco e oriental – através do desenho.

Realizada pelos alunos de Belas Artes Rafael Grillo, Priscila da

Silva e Pablo Ferreira, a oficina foi idealizada nas aulas de Plástica II da professora Marisa Vales. Além de ministrar a técnica do desenho, a disciplina trata de estruturas familiares, herança genética e a formação étnica do país.

Segundo Grillo, estudante do segundo período, o minicurso já fora realizado no XV Encontro Nacional dos Estudantes de Arte (Enearte), em outubro, na cidade de Natal-RN. O encontro tinha como questão central o “Caldeirão de Identidades”, tema relacionado à oficina. Enquanto prática de um curso de licenciatura, os

Oficina pensada para Encontro de estudantes foi

levada para universidade

CAROLIN

A VAZAR

TES

PLÁS

TICA

S SERO

PÉDI

CA

14Poz-Grim

“o minicurso já fora realizado no XV Encontro Nacional dos Estudantes de Arte (Enearte), em outubro, na cidade de Natal-RN...

“Nós brasileiros”Aprendendo a desenhar diferentes etnias: oficina de estudantes alia identidade a medidas

ARTE

S PL

ÁSTI

CAS SE

ROPÉ

DICA

Page 15: Poz-grim

organizadores acreditam ser possível levá-la, às escolas. Eles almejam instigar a reflexão aos alunos sobre suas origens, além de incentivar à aproximação entre os familiares.

Tim-tim por tim-timOs alunos que participaram

da oficina puseram a mão na massa. Para por no papel as características de cada uma das três etnias escolhidas, eles foram orientados sobre as questões das diferentes idades da humanidade e diversas etnias.

Após, os participantes receberam o folheto explicativo das medidas usadas por artistas para fazer desenhos e esculturas das diferentes etnias. Por exemplo, em uma imagem de um negro de perfil, a distância utilizada entre a ponta do nariz e o canto de um olho seria de três dedos. Entre a ponta do nariz e o início da orelha, quatro dedos.

Uma foto de uma pessoa de cada etnia, uma folha de papel vegetal e outra sulfite de tamanho A3 foram os materiais distribuídos. Ao marcar os principais pontos do rosto no papel vegetal, o desenhista tinha, então, que aplicar os conhecimentos das medidas para reproduzir a imagem na folha A3.

Os alunos que ministravam a oficina explicavam a cada participante o porquê das

medidas, como nos casos dos olhos menores dos orientais e os olhos mais fundos dos negros. Ao saber como se fazia a medida com os dedos e também pelo tamanho dos olhos da pessoa estudada, o participante não era mais espectador. Passava a aplicar os conhecimentos na prática.

Estudantes de Belas-Artes estavam em maioria, mas tiveram a companhia de História e Comunicação Social.

Participantes aplicam conhecimentos de medidas das etnias

PABLO FERREIRA

CAROLIN

A VAZ

Pablo, Priscila e Rafael apresentaram conceitos e

ensinaram na oficina

15 Poz-Grim

Page 16: Poz-grim

Há arte sem humor?Casa de Cultura promove concurso para jovens desenhistas de humor afinado

ARTE

S PL

ÁSTI

CAS

ITAG

UAÍ

Sem palavras, mas somente com traços e cores precisos se diz mui-to. Ao redor do mundo, desenhos em jornais e revistas marcam opi-niões e relatos sobre o cotidiano. A irreverência de charges e car-tuns do Pasquim fez escola no jor-nalismo brasileiro. Jaguar, Ziraldo, Millôr, Henfil e Fortuna iam de ironias a insinuações para con-frontar o regime político e social estabelecidos.

Hoje, com mais liberdade, a cria-tividade dos artistas floresce no cotidiano. Os cursos de desenho para crianças ajudam a desenvol-ver tanto o senso crítico quanto as habilidades nas artes plásti-cas. A Casa de Cultura de Itaguaí é um dos espaços públicos onde moradores do município podem freqüentar esses cursos gratuita-mente. A Casa também promove um concurso anual para difundir a produção dos próprios alunos e de outros artistas da cidade.

Concurso e exposiçãoEm setembro, aconteceu o II

Concurso de Desenhos de Humor promovido pela prefeitura e ou-tros artistas aspirantes de Itaguaí.

Dividido nas categorias Cartum, Caricatura e Charge, o concurso reuniu dezenas de participantes em mais de 50 trabalhos. O suces-so do concurso e da exposição se deve, segundo a diretora da Casa de Cultura, Maria das Graças, a vontade das pessoas de utilizar os espaços públicos voltados à cultura.

Régis, dono de um curso de de-senho no centro de Itaguaí, teve seus alunos premiados com o primeiro lugar nas três categorias em disputa. “Foi uma grande sur-presa”, disse. Seu curso prepara os alunos para o Teste de Habilidade Específica (THE) do vestibular das universidades. Além disso, os pe-quenos têm a possibilidade de ini-ciar seus estudos de desenho.

A Casa de Cultura também pro-move cursos de artes plásticas, e gratuitamente. A diretora revela o orgulho de ter um ex-aluno do curso de desenho como professor da casa. “O Giliardi foi nosso aluno aqui em 2005, hoje é professor”, afirma a diretora, orgulhosa.

Os trabalhos ficam expostos no salão do prédio, antiga estação ferroviária da cidade, e depois são arquivados digitalmente.

Caricatura de Amy Winehouse ganha prêmio de terceira colocada

Page 17: Poz-grim

Shun: O cachorrinho mais famoso da Zona Oeste

Aprendendo a desenhar diferentes etnias: oficina de estudantes alia identidade a medidas

ARTES PLÁSTICASSE

ROPÉDICA

ARTES PLÁSTICASZO

NA O

ESTE

Se você costuma passar por Campo Grande, Bangu, Santa Cruz com os olhos atentos às artes dos muros, já deve ter visto esse cachorrinho. Seu nome é “Shun” e foi criado pelo grafiteiro Leonardo dos Santos. Além dele, o artista formou também um estilo: o Persona, uma mistura de pichação e grafiti. Grafiti, porque é uma ilustração artística, e pichação porque é uma “assinatura” que o autor espalha por onde passa. O estilo atraiu muitos outros grafiteiros da região e a cidade hoje tem centenas de cogumelos, hidrantes e “black powers” espalhados pelos muros e prédios.

Leonardo mora em Bangu e começou a pichar em 1996, aos 10 anos. Em 2002, entrou para igreja e parou definitivamente. Desde os seis já desenhava e em 2003 conheceu o grafiti. O jovem se encantou, buscou informações sobre o gênero, aprendeu a técnica e, daí em diante, não parou mais.

A criação do estilo “Persona” foi uma sacada de Leonardo. Além de es-palhar as suas mensagens, o artista vislumbrou a oportunidade de tirar outros jovens da pichação. O estilo mantém a prática dos pichadores: espalhar a assinatura por onde passa. No entanto, em vez dos “rabiscos inelegíveis”, espalham seus respectivos personagens.

Preconceito X ReconhecimentoEmbora a maioria das pessoas reconheça o grafiti como manifestação

artística, o preconceito ainda existe. Leonardo já o experimentou algu-mas vezes: um caso foi com a própria família. - Foi o mais difícil para mim. Meus pais não aceitavam que eu fosse grafiteiro, tive que conquis-tar a confiança deles aos poucos. Mas passou, hoje todos me apóiam. - desabafa.

Apesar do preconceito e alguns constrangimentos, Leonardo também experimentou o reconhecimento ao longo de seu trabalho. Muitos co-mentam sobre o cachorrinho que ficou conhecido em grande parte do Rio de Janeiro, e em outras cidades, como na Zona Oeste, onde mora.

Personagem ganha expressões emotivas

Page 18: Poz-grim

Música

Page 19: Poz-grim

Black Bird: Beatles em alto nível

A história da banda considerada a melhor cover de Beatles no Brasil

Eles já se apresentaram no Canecão, para três mil pessoas; na platafor-ma da Petrobrás; no Big Brother Brasil (2010); no Garden Hall; no Hard Rock Café; no Ballroom; no Golden Room do Copacabana Palace e em diversos Pubs da Inglaterra, incluindo o Cavern Club (Liverpool). Acredi-te: trata-se de uma banda cover.

Black Bird é uma banda carioca, que toca na íntegra o repertório do “Quarteto Fabuloso”, como eram chamados os Beatles pela imprensa britânica. No entanto, o “Fab. Four” brasileiro é, na verdade, um sexteto. O que à primeira vista pode parecer uma ligeira vantagem na hora de reproduzir canções permeadas por tantos instrumentos e efeitos, pode também sugerir uma questão razoável: O que pode realmente significar “vantagem” na tentativa de interpretar uma banda que se tornou refe-rência mundial para sua geração em diante? É, no mínimo, um grande desafio. Aliás, a banda só se assemelha aos Beatles em duas caracterís-ticas: na qualidade vocal do grupo e na fidelidade instrumental. Basta! Eles aceitam e cumprem o desafio com maestria.

REPRODU

ÇÃO: IN

TERNET

Apresentação da banda em festa particular no Copacabana Palace

SICAZO

NA O

ESTE

19 Poz-Grim

Page 20: Poz-grim

Era Uma Vez em 1998...

Xande Maio, baterista e voca-lista, é um dos fundadores da banda, o único que permaneceu desde a primeira formação e con-ta à Poz-Grim sobre a trajetória da Black Bird. Tudo começou em 1998, com um acidente muito promissor: “Eu tinha uma banda e marquei ensaio aqui nesse estú-dio (no Valqueire - onde ensaiam até hoje). Houve uma confusão na reserva de horário e a banda do Ivan, um amigo meu, estava lá para ensaiar também. Depois de resolvido o mal entendido, eu e Ivan acabamos formando uma banda juntos.” conta Xande.

Tocar cover dos Beatles foi uma unanimidade entre os dois que já eram fãs. Na época, o tio de Xande faria aniversário e iria comemorar

no espaço onde funcionava sua academia em Realengo. Foi onde o jovem músico vislumbrou a oportunidade de colocar aqueles ensaios em prática. O tio era um daqueles coroas que ouvia o LP dos Beatles em casa, e tudo coin-cidiu positivamente. O nome foi escolhido através de sorteio, onde cada um sugeria o nome de uma música. Black Bird foi a sugestão de Alan Marques, que era voca-lista e saiu da banda em meados de 2005. O show foi um sucesso e dali em diante a banda engrenou. Ganharam o primeiro cachê, em uma apresentação no Rio Shop-ping e se criaram nas lonas cultu-rais do Rio de Janeiro. Já tocaram em todas.

Ao longo desses 13 anos de es-trada, a formação do grupo pas-sou por mudanças, mas todas mantiveram a qualidade de ar-

ALAN MIRANDA

20Poz-Grim

“Ao longo desses 13 anos de estrada, a formação do grupo passou por mudanças, mas todas mantiveram a qualidade de arranjos e fidelidade às canções...

Xande Maio: baterista, vocalista e fundador da Black Bird

Page 21: Poz-grim

ranjos e fidelidade às canções do quarteto de Liverpool. Quando surge a comparação entre Beatles e Mutantes, Arnaldo Batista cos-tuma dizer que sua banda tinha uma coisa que o grupo inglês não tinha: uma mulher. Pois a Black Bird já teve. Daniele, conhecida do grupo, foi uma das primeiras inte-grantes, entrou no início, mas só ficou cerca de seis meses. No ano seguinte à formação, Xande viajou para a Bolívia com a namorada, onde ficaria por cinco meses. Zé Mauro, amigo do grupo, assumiu a bateria. Quando retornou, Xan-de assumiu o vocal e o violão. Ivan desceu dos palcos, mas permane-ce no grupo, como empresário.

O SextetoHoje a Black Bird tem seis inte-

grantes: Xande Maio – bateria e voz -; Thiago Peguet – baixo e voz -; Bruno Viana – teclados -; Aisse Gaertner – guitarra e voz -; Chris Bastos – guitarra e voz – e Oscar Henriques - violão e voz. Além da banda, alguns integrantes tam-bém têm outras fontes de ren-da. Thiago compõe músicas para trilhas sonoras de filmes, jingles e é produtor musical de bandas; Bruno Viana, formado em músi-ca pela Vila Lobos, é professor de matemática e de música; Aisse, formado em música (harmonia funcional) pela Musiarte, também é professor de música e produtor musical e Oscar é dublador de fil-mes, desenhos e séries em geral.

Da formação atual, Oscar foi o último a entrar e, embora seja o membro caçula, é também o mais velho, com 58 anos. Sua afinidade com a música dos Beatles já era bem apurada, pois já havia tocado em uma outra banda cover (Terra Molhada) durante 21 anos. Chega-do recentemente, não é poupado das “broncas” quando o assunto é qualidade do som. A música dos

Beatles causa uma euforia e con-tentamento que não permeiam somente os palcos, mas todos os lugares onde é reproduzida. O ensaio, carregado de coros e sorrisos, só dá lugar a seriedade em um momento: quando Thiago chama a atenção de Oscar pela terceira vez, cobrando o empenho em acertar uma música que en-saiavam. O grupo se apresentaria na Estudantina Musical (centro), dia sete de dezembro, com um tri-buto a George Harrisson. No fim do ensaio, ele comenta a situação “É assim mesmo, tem que ter essas coisas. Se for para o som ficar o mais perfeito possível, tá valendo”.

21 Poz-Grim

ALAN

MIR

ANDA

Thiago Peguet: baixista, vocalista e produtor musical da banda

“É assim mesmo. Tem que ter essas coisas, se for para o som ficar o mais perfeito possível, tá valendo.” - Comenta Oscar, a respeito da bronca...

Page 22: Poz-grim

The Number One Beatles Cover Band in Brazil

O reconhecimento da Black Bird como uma das melhores bandas cover de Beatles existente não se limita aos fãs. A banda já foi convi-dada para tocar em vários eventos grandes e de expressão, inclusive em outros estados do país, como Curitiba e São Paulo. (de novo?) Em 2001 se apresentaram na fes-ta em homenagem ao aniversá-rio da rainha, realizada na sede da Comunidade Britânica, no Rio de Janeiro e foram condecorados pela Comunidade Inglesa do Bra-sil como “The Number One Be-atles Cover Band in Brazil” (“A banda cover de Beatles núme-ro um do Brasil”).

Em 2004 viveram um ano glo-rioso, com uma média de mais de 100 shows. Até em alto-mar, as músicas dos Beatles ecoaram: a banda foi convidada para tocar no aniversário do presidente da Petrobrás, na plataforma. “Viaja-mos de helicóptero durante uma hora até chegarmos. Foi sensa-cional”, lembra o baterista. No mesmo ano, tocaram para três

mil pessoas, no (antigo) Canecão e em nove shows na Internatio-nal Beatle Week, em Liverpool, terra do “quarteto fabuloso”. Lá, encantaram os ingleses e os “bea-tlemaníacos” presentes com apre-sentações em lugares famosos da região, como o Cavern Club, onde os Beatles iniciaram a carreira, o Cavern Pub e o Hotel Adelphi, dentre outros.

Em 2010, tocaram no Internatio-nal Fifa Fan Fest, estrutura monta-da na praia de Copacabana duran-te a Copa e no Big Brother Brasil, à convite da rede Globo. Nesse último show algumas boas lem-branças, outras nem tanto. “Esse dia foi perrengue. Choveu muito, molhou os instrumentos, a gente tomou choque nos microfones, dava para tirar a água do teclado com um rodo, mas valeu a experi-ência”, relembra o tecladista Bru-no.

Apesar dos grandes eventos o grupo não faz distinção. “Todos os shows são marcantes, cada um tem uma peculiaridade”, comenta Bruno. A banda é muito querida nas lonas culturais e também na Universidade Rural (RJ), onde já tocaram mais de dez vezes. Inclu-sive, fazem um apelo: “Aí, quando é que vão convidar a gente para tocar de novo? Dá uma força lá”, sugere Xande.

A Black Bird é uma banda que cativa o público. A interação com o público e a fidelidade que eles buscam em suas apresentações são os únicos atrativos. Diferente de outras bandas cover, como as argentinas The Beats e Star Beetle, a Black Bird não faz questão de se vestir ou se assemelhar fisicamen-te aos Beatles. Seu trunfo está no som. Os fãs fecham os olhos e ou-vem “os Beatles” tocando na ínte-gra seus clássicos atemporais.

22Poz-Grim

“Aí, quando é que vão convidar a gente para tocar de novo? Dá uma força lá.” - sugere o baterista Xande Maio

Ensaio da Black Bird, no estúdio em Valqueire

ALAN MIRANDA

Page 23: Poz-grim

Cinema

POZ-GRIM

Page 24: Poz-grim

Amigos, filmes e altos paposCineclube Buraco do Getúlio, em Nova Iguaçu, é referência na baixada

Não tem nem mistério, nem mi-nistério que complique. A vontade de ter acesso a curtas e longas metragens não disponíveis usu-almente no circuito de cinemas convencionais tomou força na última década. A rearticulação da cena brasileira de cineclubes levou para além das principais ca-pitais as condições técnicas para a realização dessas sessões. Po-rém, a motivação e as inspirações sempre estiveram nas cabeças das pessoas.

Na França, como em toda Euro-pa, o pós-guerra foi um período de reconstrução e luta pela pre-servação das obras de arte. Henri Langlois fundou a Cinèmathéque Française com Georges Franju e Jean Miltry em 1948 para exibir a incrível coleção de filmes salva dos nazistas. As constantes exi-

CIN

EMA

NO

VA IG

UAÇU

CIN

EMA

Espaço Cultural recebe cineclube todas as terças

bições na década seguinte for-maram uma geração de cinéfilos. Alguns dos ávidos freqüentadores das sessões tornaram-se os cine-astas da Nouvelle Vague, alcunha criada para fazer referência ao novo olhar conferido à produção cinematográfica francesa a partir do final dos anos 1950.

Na simpática Casa de Cultura, de pintura amarela e próxima a estação de trem de Nova Iguaçu, funciona a Secretaria de Cultura do município, e também está a sala de projeções utilizada pelo Cineclube Buraco do Getúlio. Die-go Bion, seu idealizador, credita o surgimento deste espaço à vonta-de de pessoas se reunirem para falar de cinema, mas também para exibir a produção própria, que não encontra espaço em salas comerciais. “Eu já tinha estudado

POLLYANA LOPES

Page 25: Poz-grim

25 Poz-Grim

“Além da exibição e bate-papo, há também música e poesia...

audiovisual naquela época e ou-tras pessoas estavam começando a estudar e produzir e queriam exibir num local ao acesso do pú-blico”, contou Bion, relembrando o início do cineclube.

Em 2006, no mês de junho, a pri-meira sessão do cineclube ocor-reu no bar do Ananias, próximo a uma passagem sob a linha do trem conhecida pela população como “buraco do Getúlio”. As atividades do bar aconteciam si-multaneamente ao cineclube, que ocupava o espaço uma vez por se-mana. “Então, tinha caminhão de lixo passando, gente assistindo fu-tebol. O bar não podia parar para o cineclube”, recordou. Além das exibições cinematográficas, Bion incentivava quem escrevia poesia ou fazia música, tornando o espa-ço ainda mais plural.

Ao utilizar a sala de projeções do município, a partir de 2007, as estripulias do cineclube tomaram novas pretensões e possibilidades. Um dos exemplos a ser seguidos é o Cineclube “Mate com Angu”, organizado em Duque de Caxias. “O “Mate com Angu” é a nossa

inspiração. Eles já completaram 10 anos e estão alguns anos-luz da gente. Toda sessão deles, sai um ônibus da frente da Escola de Música da UFRJ para Caxias. Eles já chegaram a colocar 300 pessoas numa sessão”, explicou Bion, que pretende utilizar a ideia.

A região cresce na onda do Getúlio

O sucesso do “Buraco”, que pro-move cinco reuniões por mês – as terças e nos primeiros sábados de cada mês -, inspirou a realização de novos cineclubes. Bion cita o Cineclube Digital, que funciona no SESC de Nova Iguaçu. Este cineclu-be foi idealizado e posto em prá-tica por ex-alunos da Escola Livre de Cinema, que também funciona em Nova Iguaçu. Há menos de um ano, criou-se o Cineclube Wilson Grey no campus da Rural daquela cidade.

Bion também acredita na organi-zação entre os cineclubistas para a maturação de políticas públicas na área. Segundo ele, o “Buraco” par-

ticipa tanto do Conselho Nacional de Cineclubes Brasileiros (CNC) quanto da Associação de Cineclu-bes do Rio de Janeiro (ASCINE-RJ). Um dos efeitos destas representa-ções é o edital “Cine+Cultura” do Ministério da Cultura, que prevê o repasse de equipamentos para projeção material audiovisual. Os cineclubes escolhidos tomam o dever de realizar uma sessão semanal por dois anos com data, lugar e horário fixo. O “Buraco” é contemplado deste programa e pôde acrescentar as terças-feiras em seu calendário de funciona-mento. Sempre às sete da noite na sala de exibição da Casa de Cul-tura, há uma projeção de um filme brasileiro.

Nas sessões de sábado, aconte-cem, além da projeção de curtas e longas metragens, as apresen-tações de bandas e declamações de poesias de artistas locais. Esta organização leva cineclubes como este a tornar-se um ponto de en-contro para pessoas com uma idéia na cabeça e uma câmera na mão; ou uma guitarra, ou, sim-plesmente, papel e caneta.

Diego Bion é o idealizador do cineclube

IGOR FERRAZ

Page 26: Poz-grim

26Poz-Grim

SERO

PÉDI

CACI

NEM

A

Cinecasulo, um cineclube e muitas carasCineclube da Rural, que já ofereceu in-gressos de teatro e passou filmes comer-ciais, retorna à ideia inicial: o alternativo

A Proposta, em seu inícioMuitos estudantes da Universi-

dade Federal Rural do Rio de Ja-neiro (UFRRJ) podem não saber, ou saber e nunca lembrarem, mas a universidade possui um cineclu-be: o Cinecasulo. Ele foi criado no início de 2008 por uma iniciativa de três pessoas: Monique (SOBRE-NOME DA MONIQUE), sua amiga Juliana, e Nádia Alvarez. Monique era jornalista do Decanato de Gra-duação, setor da universidade que trata de assuntos da graduação, Juliana era estagiária do mesmo setor, e Nádia coordenadora do Centro de Arte e Cultura (CAC) da UFRRJ, um centro que oferece atividades culturais e artísticas à comunidade local. Juliana e Mo-nique, após conversarem a ideia do cineclube com Nádia, escreve-ram o projeto, que foi articulado ao CAC, e o batizaram. Como um cineclube com a proposta de pas-sar curtas e filmes que causassem reflexão e debate, o nome Cine-casulo vem como uma metáfora à metamorfose da borboleta no período em que passa dentro do casulo. O momento de assistir ao filme ou curta também deveria ser um tempo de transformação. Aprovado o projeto, as sessões passaram a acontecer a cada quarta-feira, no auditório Gusta-

vo Dutra, às 19h, somente com curtas nacionais e filmes fora do circuito comercial, como clássicos nacionais e diretores consagrados.

O filme vinha por empréstimo até à Rural a partir de um convênio com duas produtoras, de amigos de Monique, e também de uma videolocadora de Seropédica, mas que não possuía muitos clássicos. Em sua primeira sessão, exibiram três curtas, dentre os quais havia Campo Branco, de Telmo de Car-valho, Carnaval de Arroz, de Ro-drigo Voiullet. O próprio Rodrigo, diretor do filme, que era presiden-te da Associação de Cineclubes do Rio de Janeiro, ASCINE, veio à es-treia. Esse era outro aspecto: sem-pre trazer alguém ligado ao filme, fosse um diretor, um produtor, um ator, ou um professor, para o de-bate. Trouxeram também a atriz Fernanda Carvalho, protagonista do curta Anjos do Sol. Não havia, porém, um público formado para esse tipo de cinema, alternativo. Então, começou-se a atrair espec-tadores por algumas associações, ou melhor, brindes. Uma parceria do Centro de Arte e Cultura com a pizzaria local Sabor Anthigo levou ao sorteio de algumas pizzas, e um contato de Monique com funcio-nários da Secretaria de Cultura do Rio de Janeiro trouxe ingressos de

Page 27: Poz-grim

teatros cariocas que eram sortea-dos nas sessões. Monique diz que esse foi um incentivo que agra-dou bastante. A ideia de passar curtas não ia muito para a frente, de modo que só acontecia de vez em quando antes ou depois de um filme. Juliana saiu do projeto, e Monique ficou até a última ses-são de 2008, que exibiu a versão antiga de A Fantástica Fábrica de Chocolate. Segundo ela, esse foi um período de que gostou muito, tanto pela experiência como pelas pessoas que conheceu, apesar de alguns dos objetivos, como o de associar o cineclube à Ascine, não terem sido atingidos. O início de 2009 data a entrada de quem leva o projeto para frente até hoje: Ariadine Braga.

Ariadine Braga, estudante de Educação Física e cinéfila, já era uma frequentadora assídua do ci-

neclube quando surgiu uma vaga na equipe do projeto. A coorde-nadora, Nádia Alvarez, ofereceu a vaga aos frequentadores e Ariadi-ne foi selecionada.

O filme ainda tinha a proposta de passar filmes de temas atuais, polêmicos, que estimulassem o debate com a comunidade acadê-mica, porém a videolocadora que os emprestava era um fator limi-tante. Além de os filmes disponí-veis serem somente os que que lá havia, algumas vezes a equipe chegava para retirar o filme com-binado e não estava disponível. Problema parecido acontecia com os filmes emprestados por profes-sores ou outros: às vezes ele não aparecia trazendo o filme. Esses eram, então, obstáculos para se cumprir a proposta do projeto, que só pode acontecer por filmes doados ou emprestados e origi-

27 Poz-Grim

“Cinecasulo: um momento de metamorfose...

POLLYAN

A LOPES

Monique Lima foi quem escreveu o projeto, com uma amiga

Page 28: Poz-grim

nais. “Chegamos a comprar filme, mas não é viável porque o Cineca-sulo não recebe verba da universi-dade”, explica Ariadine.

Demanda: filmes comerciaisEla conta que chegou uma épo-

ca em que os frequentadores re-clamavam desse estilo de filmes. “Eles falavam: ‘não aguento mais ver filme em preto-e-branco. Que-ro ver filme que assisto no cine-ma.’” Ou seja, a escolha dos filmes não podia ser apenas pensada de acordo com a disponibilidade dos “fornecedores”, mas também com os espectadores. Assim, há cerca de um ano começaram a trabalhar com os filmes do estilo “quero ver no cinema”, como filmes de ação e comédia romântica. Por exemplo: no final de outubro de 2010, exibi-ram “Ensaio sobre a Cegueira”, fil-me brasileiro adaptado do roman-ce homônimo de José Saramago, conhecido por seu gênero de dra-ma e que levanta várias questões sobre a humanidade. Na semana seguinte, Clube da Luta, filme de ação que levanta discussões sobre o sistema capitalista. Na seguinte, metade de novembro, A Múmia, filme amplamente conhecido que envolve aventura e comédia. A ele, seguiu-se o musical de co-média Mamma Mia. A diferença entre Clube da Luta e a Múmia é clara e reflete essa mudança no padrão de filmes projetados.

“Quero ver O Poderoso Chefão numa sala de cinema!”

Desde maio, um frequentador não muito assíduo do Cineca-sulo começou a conversar com Ariadine sobre esses filmes mais comerciais que eram exibidos no projeto. Era o professor cinéfilo Jaime Miranda. Jaime é profes-sor do curso de Ciências Sociais, ministrando as disciplinas de Ex-tensão Rural e Metodologia da Ciência. Começou a dar aulas na

universidade no segundo semes-tre de 2010, mas só chegou a frequentar o cineclube em 2011. Porém, não muito, porque achava que os filmes exibidos eram mui-to americanizados e voltados ao entretenimento. Como alguém que nasceu numa cidade grande, Belo Horizonte, acostumado a ir a cinemas – e não sala de cinema dentro de shopping -, quando o professor conheceu o cineclube, se encantou pelo espaço de exi-

28Poz-Grim

“O cineclube chegou a trazer diretor e atriz de curtas...

bição, o Auditório Gustavo Dutra, mais conhecido pelos estudantes da UFRRJ como “Gustavão”.

Nunca imaginava poder colabo-rar com o projeto, e em conversas com Ariadine perguntou se ela não tinha interesse em trabalhar com filmes menos comerciais. Ele enfatiza que “Hoje, há muitos pa-íses que produzem bons filmes, mas o que chega à nossa cultura é mais a produção americana.” Então ele pensou que, como uma universidade com alunos e profes-sores de culturas tão diferentes seria interessante passar filmes que provocassem debate. Segun-do ele, os filmes que assistiu ali eram muito voltados ao entrete-nimento. O fato é que ele possuía esses filmes menos comerciais.

Jaime coleciona filmes desde 1998, dos tempos de VHS. Diz que nunca estudou cinema, não tem visão técnica, embora ache que entende um pouquinho. Apenas tem enorme gosto pela arte do ci-nema, que cultua desde a infância. Nas conversas que Ariadine e Jai-me tinham depois das sessões, ele comentou sobre essa proposta, de

Ariadine Braga assumiu o cineclube em 2009

Page 29: Poz-grim

exibir filmes que provocam novas discussões, e ofereceu a ela a lis-ta de filmes de seu acervo, com cerca de 1300 títulos. Ela acei-tou a generosa oferta e criou um novo esquema na programação do segundo semestre desse ano. A proposta era que a cada mês, a partir de setembro, seriam exibi-dos filmes de um grande diretor. Em setembro, foi Stanley Kubrick, com os filmes “Laranja Mecânica”, “De Olhos Bem Fechados” e “O Iluminado”. Em outubro, alguns clássicos de Alfred Hitchcock: “Pacto Sinistro” e “Psicose”. Em novembro, filmes do diretor espa-nhol Pedro Almodóvar: “Ata-me!”, “Tudo sobre minha mãe”, e “Fale com ela.” E em dezembro, have-rá apenas duas sessões, de clás-sicos brasileiros: “O Pagador de Promessas” e “O Diabo na Terra do Sol”. O professor fez ainda al-gumas sugestões para a continui-dade das sessões, como Mostra de Filme Italiano, Mostra de Filme Francês, Impressionismo Alemão , filmes da década de 40.

O professor diz que temia dar a impressão de que estivesse eli-tizando a arte, tornando essas sessões “coisa de intelectual”, mas é uma visão com a qual ele não concorda, porque a arte, em qualquer forma, é pública, para todos. A proposta somente foi de aproveitar o espaço para projetar filmes de qualidade que levantas-sem discussões.

PúblicoAriadine conta que, desde que

a nova proposta começou, houve uma queda no público espectador. Segunda ela, parece que os alunos da Rural querem duas coisas nos filmes: “romance e porradaria”, pois são os tipos que mais dão audiência no Cinecasulo. Ou seja, querem filmes em que o especta-dor chega, assiste, relaxa – ou ri,

se emociona – e depois vai embo-ra, sem uma reflexão profunda. Os filmes da nova – ou velha - propos-ta têm um caráter mais críticos de temas políticos. O público flutu-ante caiu muito, e continuaram a ir os frequentadores assíduo, que são principalmente estudantes de cursos de agrárias e Educação Fí-sica, e que moram no alojamento da universidade. Poucos saem do

centro de Seropédica para ir, ou saem das aulas de dia e ficam um pouco mais para assistir à sessão.

Alguns obstáculos para se au-mentar a frequência do cineclube estão na divulgação e no acesso pelos estudantes. O evento é di-vulgado toda semana pelo jornal da universidade, o Rural Semanal. Além de sempre estar no final da última página do jornal, muitos alunos não leem o jornal, e por-tanto não sabem que o evento vai acontecer. Portanto, a divulgação é pouca e falha. Outro fator perti-nente é que muitos alunos da uni-versidade têm aulas à noite, prin-cipalmente de cursos das áreas de Humanas e Sociais. Justamente os estudantes que poderiam se inte-ressar pelas questões levantadas pelo debate, na maior parte das vezes não podem comparecer. A solução estaria em fazer uma maior divulgação do projeto e dos filmes exibidos, para que profes-sores dessa área orientassem seus alunos a assistir a filmes específi-cos, ou os levassem, fazendo da sessão de cinema conteúdo da aula.

29 Poz-Grim

“Após um ano de circuito comercial, a volta dos diretores consagrados...

O professor Jaime Miranda é o atual fornecedor dos clássicos

Page 30: Poz-grim

Artes Cênicas

Page 31: Poz-grim

Dança democrática na universidade

Companhia de Dança da Rural possibilita dança livre e aprendizado, sem distinções

30 Poz-Grim

“E a companhia? Tá todo mundo bem? Sem estresse? Todo mundo dedicado?” Foram as perguntas da professora Valéria Nascimento à sua aluna e monitora, Thalita Malafaia, ao interromper a entre-vista sobre a Companhia de Dança da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). O grupo de dança é composto por alunos de diversos cursos e dançam vários estilos, do balé ao funk, passando por dança de salão, samba e forró.

A série de preocupações da pro-fessora retrata como ela organiza a Companhia: os alunos devem ser dedicados, cumprir os horá-rios e agir com respeito e cola-boração em relação aos demais. A Companhia de Dança foi criada

em 2010, mas a história de Valéria com a Rural não é de hoje, e tem grande influência em seu método de ensino.

A idealizadoraA professora entrou como estu-

dante na universidade em 1988, para cursar Licenciatura Plena em Educação Física. Nessa época, existia o Grupo de Dança, da pro-fessora “Marisa”. Valéria já tinha feito jazz e outras danças livres quando entrou no grupo. Ao falar sobre aquele momento, a profes-sora disse: “Eu fui me apaixonan-do cada vez mais pela arte de dan-çar, mas por meio da liberdade de expressão, da espontaneidade, da

criatividade, do poder que a gente tem de dançar livremente.”

Formou-se em 1990 e foi morar em São Paulo. Lá se especializou em atividades rítmicas de acade-mia e começou um mestrado em Ciência da Motricidade Humana que concluiu no Rio de Janeiro. Após, foi professora na Universi-dade do Grande Rio (Unigrario), e também em uma Vila Olímpica, um projeto social que ensinava esportes a pessoas pouco privile-giadas socialmente, de crianças a idosos. Naquele lugar, a professo-ra ensinou dança, ginástica artís-tica, ginástica rítmica e dança do ventre.

Em 2007, Valéria tornou-se pro-fessora substituta das disciplinas

Professora Valéria recebe homenagem e se emociona

IGO

R FE

RRAZ

ARTES CÊNICAS

SEROPÉDICA

Page 32: Poz-grim

de dança na Rural, e constatou que o Grupo de Dança já não exis-tia. Ao ingressar como professo-ra efetiva, em 2009, junto à sua primeira e ainda atual monitora, Thalita Malafaia, vislumbrou a oportunidade de realizar um so-nho: reorganizar o grupo de dan-ça e aplicar os valores aprendidos quando participou dos anos 80.

Nasce a CompanhiaValéria, então, escreveu o pro-

jeto, que passou por todos os trâmites legais da universidade e foi institucionalizado. No início de 2010, nascia a Companhia de Dan-ça da UFRRJ, como um grupo que ensinaria e praticaria a dança, não tradicional como o balé, mas mais livre e diversa.

Na primeira inscrição, 50 alunos do curso candidataram-se. No De-partamento de Educação Física, sugeriram à professora que fizes-se uma seleção para descobrir quem era bailarino e podia parti-cipar. Sua resposta foi: a seleção é natural. Todos os 50 inscritos foram aprovados. Alguns não se ajustaram e saíram pelo caminho. Segundo ela, “quem ama, quem vai gostar e se dedicar, vai perma-necendo.”

Não existe um limite de tempo para um dançarino ficar no grupo. Como diz a professora Valéria, “È ficar, e dançar, e viver aqui en-quanto estiver como aluno.” Se-gundo ela, a intenção é construir os valores de dedicação e cola-boração e levar para a vida, tanto profissional quanto social.

É com esse comportamento, de dar oportunidades, e de cobrar dedicação, que a Companhia fun-ciona até hoje. Atualmente, são 30 participantes, a maioria cursa

Educação Física, mas também há alunos de Biologia, Comunicação Social, Veterinária e Zootecnia. No início, Valéria, que leciona as dis-ciplinas Dança I, Dança II, Dança III e Metodologia da Consciência Corporal aos graduandos de Edu-cação Física, assumia o grupo com a monitora. Hoje, conta com uma

“equipe técnica”, alunos da Com-panhia que assumem a responsa-bilidade de ensino, coreografia e para as apresentações, figurino, cenário, sonoplastia. Ela só apa-rece para “dar uns pitacos” nas atividades.

Diferentemente das disciplinas de dança do curso de Educação Física, na companhia há menos di-dática, volta-se para a técnica e a prática. Não há, por exemplo, a se-paração em turmas por níveis. São todos de um grupo só, seja novato seja experiente. Ninguém é obri-gado a participar de coreografia, alguns só dançam como esporte.

No início de 2010, a Companhia foi agraciada pela universidade com alguns incentivos, como bol-sas a alunos. Cinco bailarinos são bolsistas pelas atividades, e uma tem bolsa de pesquisa. Eles são a “equipe técnica” da professora Va-léria, que cumprem suas funções e mantêm a coesão do grupo. Vale ressaltar que nem todos são baila-rinos profissionais.

Professora e aluna foram as criadoras da Companhia

CAROLIN

A VAZ

32Poz-Grim

“a intenção é construir os valores de dedicação e colaboração e levar para a vida, tanto profissional quanto social....

Page 33: Poz-grim

Assim como o profissionalismo e a habilidade não são pré-requi-sitos principais para entrar, tam-bém não são para o aluno manter--se no grupo. Acima de tudo vêm a responsabilidade e a dedicação. “Esses bolsistas”, opina a profes-sora, “são os que estão empe-nhados em dar continuidade ao grupo”. As bolsas facilitam alguns membros comprarem os elemen-tos do figurino, roupas e sapatos. Há bailarinos na Companhia que não podem participar das apre-sentações porque não podem ar-car com o custo do figurino. Por isso, há a esperança de que mais bolsas sejam obtidas, como a bol-sa-atleta, também oferecida na universidade.

Mesmo com todo o estímulo, a Companhia passa por problemas. As aulas ocorrem numa quadra da universidade carinhosamente chamada de “forninho”, pois tra-ta-se de um lugar muito quente. Além de precisar de reformas, não é uma estrutura ideal para aulas de dança. Não tem um chão ideal ou ao menos um espelho.

Apresentações

Além de ensinar a dançar, a Companhia de Dança também ensaia coreografias para apresen-tações. Apresentou-se em dezem-bro deste ano na Mostra de Dança da rural, evento em que os alunos das disciplinas de Dança são ava-liados. A professora explica que existe uma grande diferença na dança das disciplinas e na da Com-panhia, pois as disciplinas são vol-tadas para a dança escolar, a ser ensinada nas escolas, e a da Com-panhia é mais profissional, ligada a arte e cultura.

Ainda na universidade, apresen-taram-se na abertura do Festival de Dança Escolar, que leva ao meio acadêmico a apresentação de várias escolas de Seropédica. Também participaram de even-tos em outras cidades, como o Expodance no Rio de Janeiro, no bairro de Realengo, em junho, e no evento em comemoração ao dia do professor de educação físi-ca no município Duque de Caxias (RJ), em outubro.

Do tradicional à dança livre

Thalita Malafia, bailarina forma-da, é a primeira e única monitora da Companhia de Dança. Prestes a se formar, ela tem 23 anos e parti-cipa do grupo desde sua reorgani-zação. Ela incentivou Valéria a for-mar o grupo de dança, pois queria dar aulas e praticar. Quando a professora tornou-se efetiva, pu-deram colocar em prática a ideia. Thalita já era monitora das disci-plinas de dança desde a metade de 2009, e se tornou monitora da Companhia assim que esta surgiu.

Formada desde os 16 anos em balé clássico, jazz e sapateado, a Companhia, para ela, representa um meio de romper um pouco com sua formação técnica siste-matizada e pouco educacional. Segundo ela, “mudaram muitos conceitos sobre a dança, não a dança como é dançada, mas como é ensinada. Foi uma grande expe-riência na minha vida, tanto na vida acadêmica quanto na vida profissional da dança.”

33 Poz-Grim

LETÍCIA SANTOS

Apresentação da Companhia de dança empolga plateria

Page 34: Poz-grim

Alô, garotada! O circo chegou

O segredo aqui é a ousadia. A possibilidade de união entre artes cênicas “tradicionais” do teatro e artes circenses, aparentemente, povoa o ima-ginário de qualquer diretor, roteirista ou ator. Porém, poucos têm força suficiente para seguir neste caminho. O Circo Roda escapa da repetição na mescla de teatro e circo. Isso, aliado a percussão ao vivo, tira o fôlego da plateia. Sons e acrobacias precisas fizeram o público se surpreender no Teatro do SESC Nova Iguaçu, na tarde de 23 de setembro.

Como atração principal do festival Encontrarte, o Roda dividiu o palco com a homenagem a Orlando Orfei, logo após o fim de seu último es-petáculo na cidade. Artista polivalente e nato, Orfei descende de uma família marcada pela trajetória no circo desde o século XIX. Sua primeira apresentação foi aos cinco anos e, depois disso, sua vida foi dentro do picadeiro. Os aplausos do público no SESC foram para mais de 70 anos de carreira, 180 pontos no corpo por ferimentos diversos durante as apresentações, 63 idas ao hospital e incontáveis sorrisos conquistados.

Saltos, danças, luzes e palhaçadasO Roda existe desde 2006 e nasceu da parceria dos grupos teatrais

Pia Fraus e Parlapatões, com o intuito de inovar na arte circense. Em seu espetáculo atual, DNA, 19 artistas, entre palhaços, acrobatas, ma-labaristas e outros personagens aliam a arte circense à arte cênica. Em performances de movimentos exatos e humor inocente, interagem ao vivo com o público. Utilizam muletas, cadeiras de rodas e aparatos tecnológicos como o light grafitti, onde imagens de vídeo são pro-jetadas no cenário. Outra particularidade é a sonoplastia ao vivo

Encerramento do Encontrarte conta com Circo Roda e homenagem a Orlando Orfei em Nova Iguaçu

Orlando Orfei recebe homenagem do EncontrArte

IGOR FERRAZ

NO

VA IG

UAÇU

ARTE

S CÊ

NIC

AS

Page 35: Poz-grim

“o festival, além de realizar a qualificação de grupos teatrais e oferecer espetáculos gratuitos, gera um mercado cultural e movimenta a econo-mia...

exercida pelo baterista Beto Montag. Ele fica no palco e, com bateria e outros instrumentos de percussão, faz todos os sons sincronizados aos movimentos dos artistas.

O enredo da apresentação tra-ta de um palhaço, Inadequado, que tenta ajudar Anja, que caiu do céu. A partir daí são apre-sentados vários números que tratam de ciência, doenças, curas, mutações, clonagem e outros temas. Ronaldo Aguiar, que interpreta o palhaço Inade-quado, afirma que o espetáculo quer falar do DNA cultural, dos diversos tipos de pessoas, de grupos, de raças.

A intenção do Circo Roda de trabalhar no espetáculo circense o teatro, a dança e o teatro de bonecos vem como uma herança do grupo Pia Fraus, e o humor, do Parlapatões. O palhaço Ronaldo acredita no circo como fator de união dos públicos de todas as

idades, pois “quando as pessoas pensam em circo, pensam em e-lementos e personagens tradicio-nais, como trapezista, palhaço, acrobata, e querem assisti-los independentemente do estilo do circo, seja tradicional, moderno ou contemporâneo”, diz ele.

O palhaço-ator percebe dificul-dades na manutenção das artes no cenário cultural brasileiro. “Aqui, poucos circos tradicionais vivem sem patrocínio, apenas de bilheterias. O Circo Roda, por e-xemplo, é apoiado através da Lei Rouanet e de outros fomentos do governo, como o Programa de Ação Cultural, que apoia, pa-trocina e divulga produções cul-turais no estado de São Paulo, e o Prêmio Funarte Carequinha de Estímulo ao Circo”, conta o artista.

Ronaldo Aguiar tem 34 anos, é palhaço há 10. Tem formação em dança e teatro, já trabalhou em vários circos de estilos diferentes e valoriza no Circo Roda a coope-

Orlando Orfei recebe homenagem do EncontrArte

CAROLINA VAZ

35 Poz-Grim

Page 36: Poz-grim

“O investimento em arte e cultura ainda não é do interesse de políticos e em-presários, embora os empresários estejam começando a ‘acord-ar’ para a importância do investimento no entretenimento...

ração, admiração e o respeito en-tre os artistas.

Encontrarte completa uma década

O Festival EncontrArte reúne manifestações culturais na região. Todas as atrações são gratuitas, e na edição desse ano se dividi-am entre dois espaços de Nova Iguaçu: o SESC e o Teatro Sylvio Monteiro, na Secretarjia de Cultu-ra da cidade.

Neste ano, de 22 a 30 de setem-bro, houve oficinas de dança e de circo, a apresentação de 14 peças teatrais, e as apresentações do Circo Roda. Em 10 anos, já ocorre-ram 190 espetáculos, 34 oficinais teatrais, e diversas homenagens a artistas teatrais e circenses, como, nesse ano, a Orlando Orfei.

Segundo Fábio Matheus, um dos realizadores do festival, o grupo de produtores vem lutando para

desenvolver a cultura na região, que ele considera carente nesse quesito, com muito poucos tea-tros. “O investimento em arte e cultura ainda não é do interesse de políticos e empresários, em-bora os empresários estejam começando a ‘acordar’ para a im-portância do investimento no en-tretenimento”, analisa o ativista.

O evento e as ações culturais do grupo de produtores do Encon-trArte, para Fábio, são mais valori-zados em outros estados e cidades do que por possíveis investidores da região. Segundo ele, “o festival, além de realizar a qualificação de grupos teatrais e oferecer espe-táculos gratuitos, gera um mer-cado cultural e movimenta a eco-nomia. Isso mostra que o mercado de cultura e entretenimento pode ser importante para a economia sem cobrar altos valores nos in-gressos e oferecendo manifes-tações artísticas de qualidade”.

CAROLINA VAZCoração inflável anima plateia

36Poz-Grim

Page 37: Poz-grim

Kafka: escritor, crítico, visionário

Autor tcheco tem obras encenadas no auditório Paulo Freire

1945, marco zero para a Alema-nha. Devastadas pelos seis anos de bombardeios e artilharia pesa-da da guerra, as principais cidades eram apenas a fachada simbólica daqueles anos. O rastro mais sinis-tro do conflito estava, porém, nos campos de concentração com os milhões de judeus e outros inimi-gos do estado totalitário executa-dos em massa.

Gabriele, Valerie e Ottilie pode-riam ser nomes que passariam despercebidos na lista de vítimas de Auschwitz, mais de quarenta

anos depois do fim da guerra, se não fosse pelo sobrenome Kafka. Seu irmão, Franz Kafka, escrevera nas primeiras décadas do século XX sobre a desvalorização das li-berdades individuais em favor do sistema econômico em contos, novelas e alguns romances.

Várias obras do autor tcheco tornaram-se universais e ainda inspiram pessoas pelo mundo. Em 2011, jovens dos principais centros econômicos de países de-senvolvidos ocuparam praças e vias públicas para terem o direito

SEROPEDICA ARTES CÊN

ICAS

37 Poz-Grim

“A alegoria de A Metamorfose reflete a desumanização do indivíduo frente ao capital...

As “lâminas” do estado

IGO

R FE

RRAZ

Page 38: Poz-grim

38Poz-Grim

originais, em alemão. Em 2009, a editora Lumiares lançou Sonhos, texto nunca antes trazido ao por-tuguês.

Ensaios, encontros e desencontros

Para a peça Punições, encenada em dezembro no auditório Paulo Freire da UFRRJ, foram necessá-rios quatro meses de ensaios se-manais após a formação do gru-po e a reportagem da Poz-Grim acompanhou a companhia. Com oito alunos no total, dos cursos de Relações Internacionais, História e Ciências Sociais, a apresentação adaptava três contos ao mesmo tempo no palco. A Metamorfo-se, Na Colônia Penal e O Veredito eram três núcleos que se mistu-ravam a tal ponto que, em certos momentos, personagens de um conto pareciam dialogar com o outro.

O entrosamento do grupo foi aprimorado a cada encontro, prin-cipalmente mais perto da data da apresentação. O primeiro ensaio com todos os integrantes levou mais de um mês para acontecer. A diretora da peça e professora do Curso de Ciências Sociais, Bea-triz Wey, aproveitava para ensaiar com o núcleo cujos integrantes es-tavam todos presentes.

No decorrer dos meses, os deta-lhes eram pensados e encaixados. Grande parte do grupo começava a encenação sentada na plateia. A música baixava e, um de cada vez, caminhavam para a cena inicial onde os protagonistas de A Metamorfose e O Veredito os esperavam deitados. Com a cena completa, vinha dos personagens principais a instigante pergunta: “O que aconteceu comigo?”. “Pes-soal, esses são contos irmão. Em vários momentos as situações de um dialogam com a do outro”, orientava a professora Wey du-

e a educação alemã contribuíram para sua sensação de estrangeiro na própria terra. Ironicamente, hoje, o turismo em Praga é im-pulsionado também pela fama do escritor de personalidade ar-redia e insegura.

Outros fatores demonstram o crescente grau de interesse na li-teratura kafkiana, termo cunhado no inglês que remete ao absurdo que parece banal e talvez desa-gradasse o autor. O número de traduções para o português, cada vez maior, é um deles. A primeira tradução de Kafka para o portu-guês foi na década de 1950, do conto A Metamorfose. Esta ten-tativa inicial partiu de uma edição em inglês, o que permitiu inúme-ros problemas de adaptação. Nos anos 1990, surgiram as primeiras traduções diretamente dos textos

Em cenário minimalista, atores se ambientam

IGOR FERRAZ

de não acordarem numa manhã transformados num inseto, como Gregor Samsa, em A Metamor-fose. A alegoria deste conto é uma das mais famosas de Kafka e numa análise pelo prisma da ciência política remete a ideia da desumanização frente ao interes-se de empresas ávidas pelo lucro imediato. O sistema de reprodu-ção do capital torna, nesta crítica, as pessoas tão parte de uma en-grenagem que podem ser substi-tuídas em qualquer momento.

Muitas das inspirações de Kafka para sua obra vieram de refle-xões sobre a própria vida e a so-ciedade na qual estava inserido. A cidade de Praga, onde nasceu o escritor, era parte do Império Austro-Húngaro, e foi assim até o fim da Primeira Guerra Mun-dial, em 1918. A religião judaica

Page 39: Poz-grim

“Em Na Colônia Penal, para especialistas, Kafka vislumbrou o nazismo...

rante os ensaios. Estes dois contos eram simultâneos, e observados pelo narrador e pelo condenado de A Colônia Penal, o conto do desfecho do espetáculo.

A Máquina do Estado ou do Tempo

Os atores aos poucos ficam à vontade nas cenas, com roupas e acessórios que remetem à épo-ca e aos lugares pretendidos. A expressão corporal é trabalhada com especial afinco, nas últimas semanas de ensaios. Na literatu-ra de Kafka, o que se fala é tão importante quanto os gestos das mãos, o olhar ou o semblante. “Mesmo que não está no primeiro plano da cena não pode ficar pa-rado. Isso é difícil para quem está começando. Pegar esse ritmo”, ex-plica a diretora.

Finalmente no dia da apresen-tação, o palco está montado com

Último ensaio da companhia no dia anterior à apresenstação

um fundo preto e três cadeiras, uma na esquerda e outra na direi-ta. A do meio tinha dez elásticos presas a ela, em diferentes partes que partiam do mesmo ponto no teto. Ela representava a Máquina de Na Colônia Penal. Este conto foi encenado a partir do momento em que os outros dois termina-ram. A Máquina, um equipamen-to de tortura, inicialmente des-tinada ao soldado desobediente que observara todas as cenas, é usada pelo próprio comandante para demonstrar a eficácia do mé-todo a um observador estrangei-ro. Muitos especialistas acreditam que, aqui, Kafka pôde vislumbrar as práticas de regimes totalitários que estavam prestes a emergir pela Europa.

No final, a inquietante pergunta: Quantas pessoas acordam todos os dias como Gregor Samsa e se perguntam “O que aconteceu comigo?”

IGOR FERRAZ

Page 40: Poz-grim

Personagem

1234Poz-Grim

Torcedor do Tupi Futebol Clube, de Juiz de Fora - campeão brasileiro da série D em 2011, Marcelo Amaral não esconde sua preferência clubística. Quando pergunta-do por seus alunos sobre o assunto, causa empatia a favor do time. Graduado em Letras pela Universidade Es-

tácio de Sá há um ano. Marcelo é estudan-te do curso de Belas Artes da UFRuralRJ desde 2009. Isso significa que ele cursou os dois últimos anos em Letras concomitante-mente aos dois primeiros em Belas Artes.

Marcelo Amaral fala à Poz-grim

Page 41: Poz-grim

1234 Poz-Grim

Marcelo lê bastante des-de pequeno, de textos em jornais até e, principalmente, a bíblia. Sem dinheiro para comprar livros de arte, ele colecionou, ao longo dos anos, recortes de editorias culturais, como o Segun-do Caderno de O Globo, e do Caderno B do Jornal do Brasil. Ainda com a leitura de textos religiosos e também jornalísticos, Marcelo notava um desequilíbrio entre sua religiosidade, e as de demais crentes, e o discurso da mídia quanto à sua crença. Foi por isso que decidiu estudar mais a fundo o assunto e apareceu a vontade de escrever críticas sobre arte.

A idéia para a monografia é sobre a pintura de batistérios. Ele já produziu oito destes e defende uma postura de reflexão do artista destas obras. Normalmente, à enco-menda, o profissional apenas reproduz o que lhe é pedido e recebe por isso, postura que Marcelo discorda.

Sobre a infância, Juiz de Fora traz todas as lembranças das férias. No quintal da casa dos avós paternos avistava-se a Avenida Rio Branco inteira. Gostava de comprar pão de manhã, bem cedo, e ver a neblina sobre a rua.

Seu pai, natural da cidade mineira, trabalhava em uma empresa de ônibus em Itaguaí quando conheceu a mãe de Marcelo. Com o relaciona-mento, moraram na cidade mineira até um mês depois do nascimento do filho. Então o pai perdeu o emprego e a re-

até se estabelecer como pro-fessor de artes, fez de carta-zes de políticos até decoração para quarto de bebê.

Como membro da primei-ra turma do curso de Belas Artes, teve aula no Centro de Arte e Cultura (CAC) e ajudou transportar os equipamentos quando o curso foi convidado a se mudar para o Salão No-bre do Prédio principal. Hoje, monitor de pintura, Marcelo aprende ainda mais, sempre se esforçando para oferecer um pouco mais aos alunos.

Hoje a crítica artística, prin-cipal objetivo ao entrar na universidade, está um pouco de lado e a pintura à flor da pele. A carreira acadêmica é sua meta. O mestrado e o doutorado estão em seu horizonte, muito em função de sua descrença na educação fundamental e médio.

Marcelo e a esposa, Grazie-le, esperam o segundo filho. Lucca, de 10 anos, já pede a camisa do Tupi.

cém formada família mudou--se para Itaguaí.

Sobre a carreira profissional,

O torcedor do exótico Tupi pretende enveredar pelo ramo acadêmico. O mestrado e o doutorado envolvendo pintura estão em seu horizonte.

Page 42: Poz-grim

42Poz-Grim

AgendaSeropédicaNa UFRRJ

ItaguaíNa Casa de Cultura de Itaguaí

Exposição dos trabalhos dos cursos de Artesanato. De 1º a 20 de dezembro.

Oficina sobre Meio Ambiente, com alunos do CIEP 496 Munic. Ma-estro Francisco Mignone. Dia 08 de dezembro, às 10 horas.

Hora do Conto pelo dia da Declaração Universal dos Direitos Huma-nos. Dia 10 de dezembro, às 10h, na Biblioteca Municipal Machado de Assis.

III Salão de Arte Infantil. Abertura dia 14 de dezembro, às 10h. Ex-posição dos trabalhos de alunos do Curso Infantil de pintura em tela e desenho artístico. A exposição ficará aberta ao público até o dia 22.

Peça teatral “O presente não foi entregue”, 1º de dezembro, 12h, Auditório Gustavo Dutra; e 02 de dezembro, 20h, Auditório Paulo Freire. Ensenada pela Companhia de Teatro Criaturas com Máscaras, a peça será apresentada na universidade

Mostra de Dança com o tema “Fantasia”, dia 6 de dezembro, às 19h, no Auditório Gustavo Dutra. O evento contará com abertura da Companhia de Dança da universidade e apresentação de alunos das disciplinas de Dança I e Dança III do curso de Educação Física.

Peça teatral Punições, dia 07 de dezembro, às 17h, no Audi-tório Paulo Freire. Baseada em textos do escritor alemão Franz Kafka, a peça é parte da programação do evento “As Relações de Poder na Litera-tura de Franz Kafka”, que também terá leituras dramáticas de textos de Kafka e debate com professores da universidade.

Page 43: Poz-grim

43 Poz-Grim

Buraco do Getúlio, dia 03 de dezembro, às 19h. A última sessão do ano contará com a exibição de cinco curta-metragens. Haverá também intervenções artísticas em homenagem aos 20 anos do Desmaio Públiko, o grupo de poesia mais importante, e provavelmente o mais antigo, da Baixada Fluminense, segundo o idealizador do Buraco, Bion. Todos os filmes exibidos serão de realizadores da Baixada Fluminense. São os curtas:

- A Máquina do Tempo do Mundo, de Josy Antunes- Prazer, Meu Nome é Nova Iguaçu, de Yasmin Thainá- CSI Nova Iguaçu, de Ian “SBF”- Juntos eles vão fazer muito mais, de Milena Manfredini

E as intervenções artísticas:- Desmaio Públiko (poesia);- Cretinos Iluminados (teatro);- DJ Zeh Alsanne (música);- Blake Rimbaud (música)

Festival de Ficção Científica, dias 06 e 07 de dezembro, às 16h. Em sua primeira edição,o festival tem como tema “A Verdade é Ilusão”. O projeto, desen-volvido pela produtora 3 Tempos - que significa literatura, música e cinema - tem o objetivo de desenvolver nas pessoas análise crítica da realidade, pensando mui-tas possibilidades de uma mesma situação. Diferente de muitos filmes de ficção científica, os desse Festival pretendem causar a valorização do mundo e da vida, gerando uma transformação pessoal em casa espectador.. Para mais informações, acesse o blogue da produtora: http://www.3-tempos.blogspot.com/

Mostra Independente Cinerock 4,dia 11 de dezembro. A quarta edição do Cinerock traz a Nova Iguaçu exibição de trabalhos artísticos nos formatos audio-visual, artes visuais e música. Na categoria audiovisual, foram escolhidos 7 curtas a serem projetados, de diversas partes do Brasil, do Rio Grande do Sul à Bahia. Na exposição de artes visuais, 25 obras. Como música, apresentação de duas bandas. É realizado pelo grupo coletivo de criatividade Pública Alternativa. Para conhecer os artistas e obras selecionados acesse o site da Mostra: http://cinerock.com.br/

Nova IguaçuNo Espaço Cultural Sylvio Monteiro

Page 44: Poz-grim

POZ-GRIM

Universidade Federal Rural do Rio de JaneiroInstituto de Ciências Humanas e SociaisCurso Comunicação Social - Jornalismo