pouco é necessário!

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Mensagem ministrada na Estação do Caminho em 15/01/2012, com base no texto de Lucas 10: 38-42.

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O Caminho da Graça

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Pouco é necessário! Caio Fábio

Vamos ler Lucas 10: 38-42

“Indo eles de caminho, entrou Jesus num povoado. E certa mulher, chamada Marta, hospedou-o na sua casa. Tinha ela

uma irmã, chamada Maria, e esta quedava-se assentada aos pés do Senhor a ouvir-lhe os ensinamentos. Marta agitava-se

de um lado para outro, ocupada em muitos serviços. Então, se aproximou de Jesus e disse: Senhor, não te importas de que

minha irmã tenha deixado que eu fique a servir sozinha? Ordena-lhe, pois, que venha ajudar-me. Respondeu-lhe o Senhor:

Marta! Marta! Andas inquieta e te preocupas com muitas coisas. Entretanto, pouco é necessário ou mesmo uma só coisa;

Maria, pois, escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada.”

Indo eles, Jesus e os seus discípulos, de

caminho, entrou Jesus num povoado (esse

povoado certamente é a cidadezinha de

Betânia, que fica ao lado de Jerusalém, a

dois quilômetros e meio ou, no máximo, a

três quilômetros de Jerusalém). E certa

mulher, chamada Marta, hospedou-o na

sua casa. Marta era provavelmente a mais

velha de uma família de irmãos, que eram

chamados, os outros dois, de Lázaro e

Maria. Maria provavelmente era a caçula.

Então, essa mulher chamada Marta

hospedou Jesus na sua casa; e sua irmã,

Maria, quedava-se assentada aos pés do

Senhor – Jesus assentado não em uma

cadeira, porque naquele tempo as cadeiras

não eram como as nossas; eram, no

máximo, uns divãzinhos, ou, então a pessoa

se assentava ao chão com o cotovelo ao

lado, com pufes para descanso do

cotovelo. O fato é que Jesus estava na casa

e essa mulher mais jovem da família, Maria,

quedava-se a ouvir-lhe os ensinamentos.

Literalmente ela deitava-se com a mão no

queixo, ficava bem juntinho, coladinha,

assentada aos pés do Senhor Jesus, a ouvir-

lhe os ensinamentos. Marta, a mais velha,

agitava-se de um lado para o outro,

ocupada com muitos serviços, enquanto a

Maria estava ali sentadinha, com o olhinho

fixo nele, segurando a cabeça, ouvindo os

ensinamentos, sem despregar a atenção do

que Jesus dizia a ela e da conversa que eles

tinham.

Então, chegando perto daquela cena de

Jesus com Maria, Marta disse: Senhor, não

te importas de que minha irmã tenha

deixado que eu fique a servir sozinha,

preparando comida, limpando, pra um lado

e pra outro, enquanto ela se derrama, ela se

refestela, ela se queda, ela se joga,

eletrizada, fascinada, mesmerizada,

ouvindo os teus ensinamentos? Ordena-

lhe, pois, que venha ajudar-me. Marta

transformou Jesus num mordomo dela: dá

uma ordem para Maria vir trabalhar em

casa, chega! Respondeu-lhe o Senhor:

Marta! Marta! Ô, Marta... Andas inquieta e te

preocupas com muitas coisas (é cebola, é

tomate, é salsinha, é panela, é muita coisa;

é muita varreção, é organização, é muita

exterioridade para me agradar...) Marta!

Marta! Andas inquieta e te preocupas com

muita coisa; tu não estás nem ocupada, tu

estás pré ocupada, a tua mente está num

processo de ziguezagueamento inquieto, o

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tempo todo, com muitas coisas, coisas que

nem aconteceram mas já te ocupam

previamente. Entretanto, Marta, pouco é

necessário ou mesmo uma só coisa; Maria,

pois, escolheu a boa parte, e esta não lhe

será tirada.

Pouco é necessário ou mesmo uma só

coisa; Maria, pois, escolheu a boa parte, e

esta não lhe será tirada.

Agora guardem essa imagem da casa de

Marta, Maria e Lázaro, essa dinâmica, esse

diálogo, esse ensino, essa atitude de Marta,

agitada, inquieta, preocupada, meio

amargurada; querendo chamar para si um

determinado tipo de atenção pelos

excessos de serviço, de movimentação, de

ativismo, e o coração dela se amargura

mesmo; e se amargura não apenas com a

sua irmã, mas também com Jesus – de que

ele estivesse tão enternecido, focado,

dedicado a ensinar e a derramar a

eternidade, os fluxos da eternidade, no

biquinho da alma de Maria; a ponto de que

ela, Marta, chega a ele e diz: Tu não te

importas de que eu fique aqui a servir

sozinha? Ordena a ela que venha me

ajudar! E é por isso que Jesus diz: Marta!

Marta! Andas inquieta demais; é muita

preocupação, é muita metafísica na tua

mente, não existem nem as fisicalidades do

que se possa tratar como algo que nos

ocupe, tu estás é pré ocupada; os teus

conceitos estão invadidos pela filosofia do

ativismo, achando que é por essa

movimentação intensa que tu chamas a

minha atenção, ou que constróis alguma

coisa em ti, para ti, quando não é nada

disso; porque, ouça: muito pouco é

necessário, pouco, mesmo.

Nós gastamos uma energia enorme, na

vida, com um monte de coisas que a

sociedade estabeleceu que são de natureza

fundamental, ou essencial, ou de

importâncias quase finais para nós. Mas do

ponto de vista de Deus são muito poucas

as coisas necessárias. Prova disso é que até

cem anos atrás nós vivíamos, como

sociedade, com apenas cinco por cento

daquilo que hoje a sociedade diz que não

vive sem; e até trezentos anos atrás nós

vivíamos com cinco por cento a três por

cento; e seiscentos anos atrás nós vivíamos

com um por cento do que hoje a sociedade

diz que são coisas sem as quais a gente não

vive. E se a gente for viajando para trás vai

chegar a um momento em que a

humanidade vivia com 0,3 por cento

daquilo que hoje nós dizemos que são

coisas sem as quais não vivemos. E isso

ainda é a humanidade pagã vivendo;

imagine o que Deus pensa, de fato, do que

seja vida e do que seja necessário e do que

seja essencial!

“Pouco é necessário”. E, aí, o que Einstein

não conseguiu fazer, que foi reduzir todas

as fórmulas universais a uma só, na física,

Jesus fez na dimensão da espiritualidade:

“Pouco é necessário, ou mesmo uma só

coisa”. No fim, o que vale, o que fica, o que

se eterniza, o que se pereniza, o que se

qualifica em nós é uma só coisa. Quem a

tem, tem; quem não tem essa uma só coisa

pode ter tudo e não terá nada. E a Maria,

aqui, entendeu, percebeu, discerniu,

escolheu essa uma só coisa. E ela não lhe

será tirada.

Agora voltem-se comigo para o Evangelho

de João, capítulo 11, onde essas duas

personagens, Marta e Maria, aparecem

outra vez, a propósito do fato de que havia

falecido o irmão delas, chamado Lázaro,

que também era amigo de Jesus:

Mandaram, pois, as irmãs de Lázaro dizer a Jesus:

Senhor, está enfermo aquele a quem amas. Ao receber a

notícia, disse Jesus: Esta enfermidade não é para morte,

e sim para a glória de Deus, a fim de que o Filho de

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Deus seja por ela glorificado. Ora, amava Jesus a

Marta, e a sua irmã, e a Lázaro. Quando, pois, soube

que Lázaro estava doente, ainda se demorou dois dias no

lugar onde estava. Depois, disse aos seus discípulos:

Vamos outra vez para a Judéia. Disseram-lhe os

discípulos: Mestre, ainda agora os judeus procuravam

apedrejar-te, e voltas para lá? Respondeu Jesus: Não são

doze as horas do dia? Se alguém andar de dia, não

tropeça, porque vê a luz deste mundo; mas, se andar de

noite, tropeça, porque nele não há luz. Isto dizia e depois

lhes acrescentou: Nosso amigo Lázaro adormeceu, mas

vou para despertá-lo. Disseram-lhe, pois, os discípulos:

Senhor, se dorme, estará salvo. Jesus, porém, falara com

respeito à morte de Lázaro; mas eles supunham que

tivesse falado do repouso do sono. Então, Jesus lhes disse

claramente: Lázaro morreu; e por vossa causa me alegro

de que lá não estivesse, para que possais crer; mas vamos

ter com ele. Então, Tomé, chamado Dídimo, disse aos

condiscípulos: Vamos também nós para morrermos com

ele. Chegando Jesus, encontrou Lázaro já sepultado,

havia quatro dias. Ora, Betânia estava cerca de quinze

estádios perto de Jerusalém. Muitos dentre os judeus

tinham vindo ter com Marta e Maria, para as consolar

a respeito de seu irmão. Marta, quando soube que vinha

Jesus, saiu ao seu encontro; Maria, porém, ficou sentada

em casa. Disse, pois, Marta a Jesus: Senhor, se estiveras

aqui, não teria morrido meu irmão. Mas também sei

que, mesmo agora, tudo quanto pedires a Deus, Deus to

concederá. Declarou-lhe Jesus: Teu irmão há de ressurgir.

Eu sei, replicou Marta, que ele há de ressurgir na

ressurreição, no último dia. Disse-lhe Jesus: Eu sou a

ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que

morra, viverá; e todo o que vive e crê em mim não

morrerá, eternamente. Crês isto? Sim, Senhor, respondeu

ela, eu tenho crido que tu és o Cristo, o Filho de Deus

que devia vir ao mundo. Tendo dito isto, retirou-se e

chamou Maria, sua irmã, e lhe disse em particular: O

Mestre chegou e te chama. Ela, ouvindo isto, levantou-se

depressa e foi ter com ele, pois Jesus ainda não tinha

entrado na aldeia, mas permanecia onde Marta se

avistara com ele. Os judeus que estavam com Maria em

casa e a consolavam, vendo-a levantar-se depressa e sair,

seguiram-na, supondo que ela ia ao túmulo para chorar.

Quando Maria chegou ao lugar onde estava Jesus, ao vê-

lo, lançou-se-lhe aos pés, dizendo: Senhor, se estiveras

aqui, meu irmão não teria morrido. Jesus, vendo-a

chorar, e bem assim os judeus que a acompanhavam,

agitou-se no espírito e comoveu-se. E perguntou: Onde o

sepultastes? Eles lhe responderam: Senhor, vem e vê!

Jesus chorou. Então, disseram os judeus: Vede quanto o

amava. Mas alguns objetaram: Não podia ele, que abriu

os olhos ao cego, fazer que este não morresse? Jesus,

agitando-se novamente em si mesmo, encaminhou-se para

o túmulo; era este uma gruta a cuja entrada tinham

posto uma pedra. Então, ordenou Jesus: Tirai a pedra.

Disse-lhe Marta, irmã do morto: Senhor, já cheira mal,

porque já é de quatro dias. Respondeu-lhe Jesus: Não te

disse eu que, se creres, verás a glória de Deus? Tiraram,

então, a pedra. E Jesus, levantando os olhos para o céu,

disse: Pai, graças te dou porque me ouviste. Aliás, eu

sabia que sempre me ouves, mas assim falei por causa da

multidão presente, para que creiam que tu me enviaste.

E, tendo dito isto, clamou em alta voz: Lázaro, vem

para fora! Saiu aquele que estivera morto, tendo os pés e

as mãos ligados com ataduras e o rosto envolto num

lenço. Então, lhes ordenou Jesus: Desatai-o e deixai-o ir.

Muitos, pois, dentre os judeus que tinham vindo visitar

Maria, vendo o que fizera Jesus, creram nele. Outros,

porém, foram ter com os fariseus e lhes contaram dos

feitos que Jesus realizara.

Vejam a total ausência de inquietação e de

preocupação em Jesus, pois é dada a

notícia de que Lázaro estava enfermo (e o

verso 3 desse capítulo ainda diz: está

enfermo aquele a quem amas) e Jesus, ao

receber essa notícia, diz: Esta enfermidade

não é para morte, e sim para a glória de

Deus, a fim de que o Filho de Deus seja por

ela glorificado. E se diz ainda mais: que

Jesus amava a Marta, a Maria e a Lázaro, e

que quando ele soube que Lázaro estava

doente ainda se demorou dois dias no

lugar onde estava.

Somente dois dias depois de saber que o

amigo estava doente e morrendo, mesmo,

foi que Jesus disse a seus discípulos: Vamos

voltar lá para a Judeia, para Betânia. E os

discípulos disseram: Mas não faz muito

sentido, por mais que tu ames essa família

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e a Lázaro, pois há pouco os judeus

estavam procurando apedrejar-te. Tu

queres voltar para lá?! Então, Jesus disse: Eu

tenho as minhas razões, agora é hora de

voltar, vocês me sigam; se vocês me

seguirem, não vão tropeçar. E Jesus

acrescentou aos discípulos a seguinte

informação: Nosso amigo Lázaro

adormeceu, mas vou para despertá-lo. Os

discípulos, então, começaram a querer

fazer ilações: Senhor, se dorme, estará salvo

(porque Jesus não dissera “Lázaro morreu”.

Ele disse: “Nosso amigo Lázaro

adormeceu”. Aí, o literalismo interpretativo,

hermenêutico, deles, já disse: Escuta, se ele

entrou em um estado de catalepsia

permanente, estará salvo. Jesus, porém,

falava não a respeito de sono, mas falava,

de fato, a respeito da morte de Lázaro).

Então Jesus disse a eles: Lázaro morreu; e

por vossa causa me alegro de que lá eu não

estivesse, para que possais crer; vamos lá

ter com ele, que está morto. Então, Tomé,

chamado Dídimo, disse aos seus outros

amigos e discípulos: Vamos também com

ele, que é para a gente morrer com ele,

porque o bicho vai pegar lá, se nós

voltarmos para Betânia.

Chegando Jesus, encontrou Lázaro já

sepultado havia quatro dias. Dois dias

antes ele recebera a informação, não fez

nada, Lázaro morreu; o lugar não era

próximo, eles saíram de lá, de volta para a

Judeia, e quando chegaram Lázaro já

estava podre. Podre. Já cheirava mal.

Imaginem... um corpo morto há quatro

dias, sem formol, sem nenhuma dessas

injeções de preservação, para atrasar o

processo de decomposição física e

orgânica – o cérebro dele tinha virado uma

papa, o sangue era salmoura, o pulmão já

tinha se liquefeito, as carnes estavam em

estado de putrefação, o corpo inchado,

com gases vazando por todos os lados. Era

uma situação horrorosa, nenhum de nós

gostaria de estar próximo desse amigo

amado, Lázaro, em um quarto fechado,

nesse estado tão cruento: quatro dias,

podre. E é esperando que o apodrecimento

ganhe essas configurações, esses

contornos horrorosos de filme de terror,

que Jesus ainda fica no lugar onde estava. E

quando chega a Betânia é essa situação

que está conflagrada.

Os verso 19 e 20 dizem o seguinte: “Muitos

dentre os judeus tinham vindo ter com

Marta e Maria, para as consolar a respeito

do seu irmão. Marta, quando soube que

vinha Jesus, saiu ao seu encontro; Maria,

porém, ficou sentada em casa”. Marta,

quando soube que Jesus estava chegando,

saiu correndo para fora da aldeia, ao

encontro dele; largou a casa e todo mundo,

e saiu correndo, correndo, correndo. Olhem

o tipo: saiu correndo. Agora, olhem a Maria:

Maria ficou sentada em casa. A Maria que lá

em Lucas 10 ficava sentadinha aos pés de

Jesus, considerava: Jesus é Jesus, tanto faz

se ele está vindo ou se ele está aqui, ou se

está ali; onde ele estiver, ele é ele. Meu

irmão está morto, correr para quê? Se Jesus

está vindo, ele está vindo, eu não tenho

nada a provar. A minha correria até lá não

vai adiantar nenhum processo da graça de

Deus; eu ficar quieta aqui não vai atrasar

nem atrapalhar nada na graça de Deus. Eu

aprendi, um dia, que escolher a boa parte é

escolher a confiança, o descanso, a

quietude, a paz, o sossego; e se é assim

quando Jesus está aqui em casa, é assim

que o meu espírito vai viver, mesmo

quando a fisicalidade dele não esteja

presente dentro da minha casa. De modo

que a mesma Maria de Lucas 10 está

presente em João 11, e a mesma Marta de

Lucas 10 está presente em João 11: Marta,

quando ouviu dizer que Jesus estava vindo,

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saiu correndo; Maria, porém, ficou sentada

em casa.

Disse, pois, Marta a Jesus (quando chegou

lá, ofegante): “Senhor, se estiveras aqui, não

teria morrido meu irmão”. O que essa frase

quer dizer? Se tu estivesses aqui meu irmão

não teria morrido. Pelo amor de Deus, é

uma acusaçãozinha piedosa: ou o Senhor

se atrasou, ou não se importou; a gente

avisou a tempo e o Senhor não chegou,

não sei por que, só sei que se o Senhor

estivesse, ele não teria morrido; porque o

Senhor não estava, ele morreu. Tem um

mecanismo de transferência, piedoso,

velado, que frequentemente a gente faz

para Deus: Senhor, se eu tivesse ouvido a

tua palavra naquele dia, não teria casado

com aquele cara, eu bem que pedi: Fala,

Senhor! Mas como não ouvi nada, casei.

Aquele negócio que eu ia fazer, eu bem

que disse: Senhor, hoje às seis da tarde

tenho de fechar esse negócio, fala até às

seis. Como não ouvi nada, eu fechei, e me

estrepei; se o Senhor tivesse falado, eu não

teria feito. É um mecanismo de

transferência que vem desde o Éden: O que

foi que tu fizeste, Adão? Eu não fiz nada, foi

a mulher que tu me deste que disse: Come,

Adão; e eu comi. Se o Senhor quisesse, era

só ter chegado e dado um tapa na minha

mão: Adão, para com isso, Adão! A nossa

idiotice é assim, normal desse jeito. Se

estiveras aqui meu irmão não teria morrido.

Aí, transfere para Deus.

Mas como o coração dela é piedoso (como

o nosso também é, extremamente piedoso;

a gente primeiro morde Deus: se o Senhor

tivesse falado, se estivesse presente, se

tivesse me advertido, se tivesse mandado

alguém, isso não teria acontecido; mas... a

esperança é a última que morre – eu sou

mais crente do que tu, Jesus...) ela

acrescenta: mas também sei que mesmo

agora, hoje, com ele podre, tudo quanto

pedires a Deus, Deus to concederá. Parece

uma declaração de uma veemência, de um

volume de fé extraordinário, não acham?

Parece que essa segunda fala redime a

primeira. Se tu estiveras aqui, meu irmão

não teria morrido. Mas eu sei que, mesmo

agora, tudo quanto pedires ao Pai, o Pai to

concederá.

E o que ela queria, se o assunto todo era

Lázaro morrer ou Lázaro não morrer? A

conversa era: se tu estivesses aqui, ele não

teria morrido; mas como não estavas, ele

morreu; mas eu sei que, mesmo agora,

tudo quanto tu pedires ao Pai, o Pai to

concederá. Portanto, por uma lógica

absolutamente irrefutável, ela falava –

numa redenção fraseológica e conceitual –

que, apesar de ela ter ficado meio chateada

por Jesus ter se atrasado demais quanto a

impedir que Lázaro morresse, ela sabia que

o fato de ele não ter sido impedido de

morrer (tendo de fato morrido) não era

ainda nada final, porque, mesmo agora,

tudo quanto Jesus pedisse ao Pai, o Pai lho

concederia. E ela foi abrangente, ela disse,

primeiro, que era “agora”; que ela cria que

os dias de atraso não contavam, “agora”

ainda dá para tudo, cabe tudo, no hoje. E,

depois, ela usa, de fato, a palavra “tudo”:

hoje, agora, tudo quanto pedires ao Pai, o

Pai to concederá – incluindo, obviamente,

aquilo sobre o que ela tratava.

E do que ela tratava? Da ressurreição de

Lázaro. Já que ela não tinha podido contar

com Deus para o impedimento da morte

de Lázaro, esse “tudo” dela, que o Pai

concederia “agora” a Jesus, significaria, no

mínimo, a ressurreição de Lázaro. Essa não

é a lógica mais básica? Caso se leia em

Português, Hebraico, Inglês, Francês,

qualquer língua, é isso que está dito. E

porque ela tinha dito isso, Jesus (vejam

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como ele foi simples com ela) vira-se para

ela e declara: Marta, teu irmão há de

ressurgir. Porque era o que se deveria falar

para alguém que chega transferindo para

Deus uma responsabilidade e tirando

imediatamente a responsabilidade de

Deus, dizendo que sabia que agora tudo

quanto se pedisse poderia ser feito, pois o

Pai o concederia. O irmão estava morto. A

resposta de Jesus, causa e efeito na lógica

proposta, é: Teu irmão há de ressurgir.

Aí, nasce a teóloga Marta: “Eu sei, replicou

Marta...” (o teólogo é que diz “eu sei”). Olha

só que teologia extraordinária: Eu sei que

ele há de ressurgir na ressurreição, no

último dia.

Meu Deus, Marta é absolutamente igual a

nós! É um ativismo danado: se dizem que

Jesus está ali, nós corremos... É Marcha para

Jesus... E nós vamos pra lá, vamos pra cá...:

onde é que eu posso ajudar? E nós temos

esperanças infantis, nós estabelecemos

datas, nós criamos cronogramas, nós

fazemos do nosso capricho a vontade que

Deus tem de obedecer; Deus não entra no

capricho por nós estabelecido, nós nos

frustramos mas não desistimos; nós

ouvimos dizer que ele chegou, nós vamos

lá; e chegamos absolutamente cheios de

declarações peremptórias, e dizemos: Ah,

Senhor amado, se tu estiveras aqui isso não

teria acontecido! É uma pena que o Senhor

tenha se atrasado tanto, mas eu sei que

mesmo agora – essa é a minha fé, Jesus –

tudo quanto pedires ao Pai, o Pai to

concederá, Aleluia! Aí, Jesus diz: Teu irmão

há de ressurgir. Ah, eu sei! Eu sei, eu sei, eu

estudei teologia na escola dominical,

aprendi sistematização escatológica, eu sei

que ele há de ressurgir na ressurreição, no

último dia; no último dia, pelo menos, ele

vai ressurgir, Aleluia! Então, para que dizer:

“Mas eu sei que, mesmo agora (agora!),

tudo quanto pedires ao Pai, o Pai to

concederá”, se a cabeça dela só pode

acreditar em ressurreição no último dia?

A ambivalência da nossa alma é uma coisa

extraordinária. “Este povo honra-me com

os lábios, mas o seu coração está longe de

mim”. Com a boca nós fazemos declarações

peremptórias. A nossa boca acusa

veladamente a Deus de tudo quanto não se

case com os nossos caprichos. E como nós

transferirmos, como nós acusamos, como

nós murmuramos, como nós nos

queixamos, como nós, sutil e

piedosamente, blasfemamos. E nós

fazemos isso com uma elegância piedosa

extraordinária, ao mesmo tempo em que

usamos de recursos filosóficos e

psicológicos de autoengano o tempo todo.

De modo que, de um lado, nós mordemos

a divindade, e, de outro, nós assopramos,

com uma boa e veemente confissão de fé,

dizendo: Mas eu sei...! Eu sei...! Eu me

superei, Senhor, já passou; doeu muito, eu

aguardei, aguardei, tu não chegaste, mas

eu me reinventei!

“Mas também sei que, mesmo agora, tudo

quanto pedires a Deus, Deus to concederá”.

Parecia que a idiotice tinha sido vencida

pela fé. Mas não; era somente credo, era

somente confissão verbal, era somente

aquele tipo de coisa que parece que a

gente fala para diminuir a nossa blasfêmia,

diminuir a declaração verdadeira do nosso

coração com uma falsificação de natureza

teológica, politicamente correta,

divinamente correta: O Senhor tinha de ter

chegado, mas não chegou; mas, olha só,

não se preocupa com o que eu falei não,

porque eu sei que, mesmo agora, tudo

quanto pedires ao Pai, o Pai to concederá.

Aí, Jesus diz: Vamos ver se ela está falando,

de fato, o que ela está dizendo. Marta, o teu

irmão vai ressurgir. Ah! Eu sei, Senhor, que

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ele há de ressurgir na ressurreição, lá no

último dia, ele vai, sim, ele vai. Sabem

aquele sorriso cheio de raiva? Ele vai – é a

esperança do crente –, ele vai ressurgir, sim,

lá no último dia.

Então, Jesus se vira para ela (e essa é uma

fala para Marta!) e diz: Marta, olha aqui para

mim: Eu sou a ressurreição e a vida. Todo

aquele que crê em mim, ainda que morra

fisicamente terá morrido apenas

fisicamente, porque continuará vivendo;

viverá, vai transcender a morte física. Quem

crê em mim, ainda que morra, viverá. E

todo aquele que vive e crê, ou vive crendo

em mim, não morrerá eternamente, ainda

que morra temporalmente; porque nem

verá a morte da qual venha a morrer, pois

já passou da morte para a vida. Jesus nem

está falando, aqui, de ressurreição de

corpos – isso é uma banalidade física que

acontecerá –; ele está tratando daquilo que

acontece todo dia, com ou sem

ressurreição física de corpos. Marta, eu sou

a ressurreição e a vida, aquele que crê em

mim, ainda que morra fisicamente, viverá. E

todo aquele que vive crendo em mim não

morrerá eternamente, já passou da morte

para a vida; o que o acometer como morte,

ele nem conhecerá como morte, porque já

passou da morte para a vida; ele já está

invadido pela eternidade, a morte já não

existe para ele. Crês tu isto?

Jesus perguntou a ela: Crês tu isto? Eu não

estou querendo saber se tu crês em

escatologia, se crês que no último dia vai

todo mundo ressuscitar; eu só quero saber

em que estado a tua alma está. A tua fé em

mim te faz olhar para o teu irmão hoje e

dizer: “Ele morreu no corpo, mas ele passou

da morte para a vida”? E a tua fé em mim

faz tu viveres com aquela consciência de

que até mesmo o morrer, tu não terás a

oportunidade de vivê-lo na consciência do

morrer, porque tu já terás passado da

morte para a vida, porque todo aquele que

vive e crê em mim viverá eternamente, de

modo que a morte está anulada? Tu crês

isso? Crês nesse nível de ressurreição que

vos dá vida, estando vós mortos em delitos

e pecados e vos vivifica para a eternidade,

de modo que a morte deixa de ser um

dado e tu passas a ser apenas um ente que

existe num estado de eternidade

ininterrupta? Essa é a ressurreição para a

qual eu te chamo e chamo a todos a

crerem. Tu crês isso?

Essa é a boa parte que não será tirada. Essa

é a boa parte que não é tirada quando nós

morremos, essa é a boa parte que não é

tirada se nós estamos morrendo, essa é a

boa parte que não é tirada se nós vivemos,

essa é a boa parte que não é tirada se nós

estamos vivendo. Essa é a boa parte que

ninguém tira de nós. Pouco é necessário,

mas esta aqui é a boa parte. E Maria

escolheu essa boa parte. Marta só vem a

entender lá adiante, do que Jesus falava:

daquilo que a morte não arranca, que a

vida não arranca, que o morrer não mata e

que o viver não extingue!

E quem escolheu essa boa parte, essencial,

esse está de posse daquilo cuja condição e

cuja consciência não serão roubadas por

nada.

Eu sou a ressurreição e a vida. Todo aquele

que crê em mim não morrerá eternamente.

E todo aquele que vive e crê em mim pode

ter certeza absoluta de que não terá

descontinuidade de nada, porque já está

invadido pela eternidade. Essa é a boa

parte que não é tirada. Porque, se vivemos,

para o Senhor vivemos; se morremos, para

o Senhor morremos. Quer, pois, vivamos ou

morramos, somos do Senhor. Essa é a boa

parte. Quem possui isso possui tudo. Quem

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não possui isso, pode possuir qualquer

outra coisa, mas não tem nada.

Aí, Marta diz ao Senhor: “Sim, Senhor, eu

tenho crido que tu és o Cristo, o Filho de

Deus que devia vir ao mundo”. Novamente,

ela não responde em relação à certeza da

ressurreição; ela faz uma declaração que

tem a ver com uma crença que já está

instalada nela, de que Jesus é o Messias.

Amém, Marta, que bom; bom para você,

dizer isso. Mas Jesus estava perguntando

acerca de algo muito mais visceral do que

apenas uma declaração de credo. “Sim,

Senhor, eu tenho crido que tu és o Cristo, o

Filho de Deus que devia vir ao mundo”.

Amém, mas tendo dito isto, o que é que ela

fez? Ela retirou-se na carreira. Assim como

veio correndo, ela saiu correndo. Ela falou:

Eu não devia ter tido essa pressa toda,

deixa eu voltar para casa. E largou Jesus lá.

Tendo chegado em casa, ela entrou.

E agora, ela que tinha feito tudo de maneira

tão pública (no encontro com Jesus ela foi

lá fora, na aldeia, com todo mundo, e todo

mundo ouviu o escarcéu!), sai dali

quietinha, volta para casa e procura por

Maria, que está em casa. Vejam o que o

texto diz: Ela retirou-se, chamou a Maria,

sua irmã, e lhe disse em particular (em

particular, agora; nada de publicidade):

Maria, Maria, o Mestre chegou e te chama;

vai, Maria, vocês é que entendem desse

negócio de borogodó, de uma só coisa que

não é tirada, de essencialidades sem

teologia mas com a profundidade do amor

calado, quieto, confiante; vai lá, Maria, vai

lá. E ela, Marta, ficou por ali. Maria foi até lá.

Os judeus que estavam com Maria em casa

e a consolavam, vendo-a levantar-se

depressa e sair, seguiram-na, supondo que

ela ia até o túmulo para chorar. Quando

Maria chegou ao lugar onde estava Jesus,

ao vê-lo, lançou-se-lhe aos pés. Vocês

vejam que não vai haver nenhuma

diferença entre o que Marte disse na

chegada e o que Maria disse na chegada. A

diferença é na atitude.

Gente, atitude é a linguagem. Atitude é,

sempre, a linguagem; não é a fala, não é a

oralidade, não é a construção, não é o dizer.

Porque dependendo da atitude, a mesma

fala significa outra coisa. A fala de Marta é

idêntica à de Maria, a fala de Maria é

idêntica à de Marta; mas Marta fica em pé e

diz: Se estiveras aqui meu irmão não teria

morrido, mas eu sei que, mesmo agora,

tudo quanto pedires ao Pai, o Pai to

concederá, agorinha mesmo. E ao ouvir

Jesus dizer Marta, teu irmão vai ressurgir,

ela diz: Eu sei que ele vai ressurgir na

ressurreição, no último dia. E ao ouvir a

declaração de Jesus: Marta, eu sou a

ressurreição e a vida, quem crê em mim,

ainda que morra viverá, e todo o que vive e

crê em mim não morrerá eternamente; crês

isto? Ela responde: Ah, eu creio que tu és o

Filho do Deus vivo; e sai, para chamar

Maria. E Maria vai lá. Chega lá e se prostra

aos pés de Jesus.

Olha que diferença! Esse é o discurso!

Chega e se joga aos pés. Ela está

acostumada a estar aos pés de Jesus –

Lucas 10 diz que ela quedava-se aos pés do

Senhor, a ouvir-lhe os ensinamentos. Ela

voltou para o lugar que ela conhecia

melhor que qualquer outro, para os pés do

Senhor. E ali aos pés do Senhor ela pode

falar o que ela falar, porque a atitude dela

não dirá nada além do que a atitude dela

diz, as palavras dela jamais suplantarão a

atitude dela. E o que ela diz quando

chegou lá? Ela simplesmente olhou para

Jesus e, tendo se jogado aos pés dele, disse

ao Senhor Jesus: Senhor, se estiveras aqui

meu irmão não teria morrido. A mesma

frase, outra atitude, outra comunicação,

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outro dizer, outra linguagem. Outro tudo,

que prescindia de argumentos. Era a

conversa de quem tinha entrado na

dimensão da melhor parte, onde a oração

não é feita de palavras, a oração é

constituída de atitudes. Onde a vida é feita

de atitudes – atitudes que decorrem da

escolha essencial.

E vejam só como, inegavelmente, Deus,

que ama a todos, se comove. Como se diz

no texto, o Senhor amava a Marta, a Maria e

a Lázaro. E o amor de Deus é amor de Pai. E,

à semelhança do amor de todo pai e de

toda mãe, se iguala na direção de todos os

filhos. Mas a intimidade de pai e mãe com

os filhos decorre, essencialmente, da

atitude dos filhos para com eles, os pais. Pai

e mãe verdadeiros e sinceros amam seus

filhos de maneira absolutamente

igualitária, mas a intimidade vai crescer

mais com uns e menos com outros,

dependendo da atitude dos filhos, porque

um pai não pode arrombar o coração de

um filho. Ele trata a todos com amor,

oferece a mesma coisa, se disponibiliza do

mesmo modo, vai aos mesmos lugares,

chega do mesmo jeito, dispõe-se às

mesmas coisas; mas tem filho que chega e

o que diz é cobrança; tem filho que chega e

remenda as cobranças com afirmações que

nem sempre são, genuinamente e

intrinsecamente, as mais profundas e

sinceras do coração, são apenas aquilo que

ele sabe que o pai ou a mãe gostaria de

ouvir; tem filho que quando ouve a certeza

materna ou paterna de que aquilo que ele

ou ela está falando é o que se fará, sai,

escapa e diz: Eu sei que vai ser assim

mesmo, mas vai ser daqui a muito tempo. E

é amado. É amado. É amado mesmo, mas

não se desenvolverá a intimidade. São

filhos que estão o tempo todo perdendo a

melhor parte; são completamente amados,

mas nunca recebem a herança da

intimidade paterna, porque não se

entregam com visceralidade.

E à semelhança do que acontece em

família, onde pai verdadeiro e mãe

verdadeira amam igualmente aos seus

filhos porém desenvolvem níveis de

amizade diferentes, de acordo com a

atitude da resposta do filho ou da filha ao

amor que é dado a todos – mas que nem

todos respondem com a mesma

profundidade, com a mesma atitude, com a

mesma generosidade, com o mesmo

carinho, com a mesma confiança – também

é com o nosso Pai, que está nos céus.

Porque Maria vem e responde exatamente

como Marta, mas responde com o rosto no

lugar que ela melhor conhecia: aos pés do

Senhor; quedada aos pés dele. E aí, quando

Jesus vê aquilo, não se segurou, agitou-se

no espírito e se comoveu.

Diz o verso 33: “Jesus, vendo-a chorar...”. A

outra falou, argumentou, discutiu. Essa

aqui se jogou aos pés de Jesus e chorou. E

o que ela falou era sincero, não era

nenhuma cobrança, ela só estava dizendo

aquilo que qualquer um poderia dizer sem

ofender; porque não tinha cobrança, tinha

intimidade, confiança, quebrantamento,

choro, impotência. Tinha aquela piedade

burra, que Deus ama: ah, Senhor, se tu

estiveras aqui, é óbvio que ele não teria

morrido, porque o Senhor não ia deixar...

Mas ela não elaborou nada, não teologizou

nada, não falou nada; ela apenas se jogou

aos pés dele. O Senhor não estava, mas o

Senhor está agora; pronto, o que importa é

que o Senhor está, os teus pés estão aqui; e

é aqui que eu gosto de estar: aos teus pés.

E aí, Jesus, quando a viu chorar, não se

segurou. Diz o verso 33: “Jesus, vendo-a

chorar, e bem assim os judeus que a

acompanhavam, agitou-se no espírito e

comoveu-se”. Comoveu-se desde as

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entranhas. É uma crise intestinal do

espírito, é cólica do espírito.

“E perguntou: Onde o sepultastes? Eles lhe

responderam: Senhor, vem e vê! Jesus

chorou. Então, disseram os judeus: Vede

quanto o amava”. Mas ele não estava

chorando somente por Lázaro, estava

chorando por tudo. O choro dele foi,

primordialmente, provocado por Maria, por

aquela entrega aos pés dele, sem conversa,

sem teologia, com a liberdade de dizer: Se

estiveras aqui, não teria acontecido; mas

não estavas, o importante é que estás

agora; e olha para a gente, a gente está

assim como a gente está. Aí, Jesus chorou.

E mandou que medidas fossem tomadas,

chegou à porta da gruta e mandou tirar a

pedra.

Aí, Marta entra novamente em ação. Olha

Marta aí, novamente, em ação, com aquela

objetividade de enfermeira, de diretora de

IML, de um ativismo, de preocupação. Está

lá Jesus dizendo “tirem a pedra”, e ela diz:

Já cheira mal, Senhor, porque já é de

quatro dias. Imaginem como ela,

coitadinha, atrapalha o processo. Ela não

sai de perto, mas ela atrapalha. Então, Jesus

vira-se para ela, novamente, e diz: Marta,

não te disse eu que se creres tu verás a

glória de Deus? Marta, por favor, Marta, tira

a pedra.

Então, tiraram a pedra. E Jesus, levantando

os olhos aos céus, disse: Pai, graças te dou

porque me ouviste; aliás, eu sabia que

sempre me ouves, mas assim falei por

causa da multidão toda (e por causa da

Marta), que está aqui presente. Se fosse

somente eu e Maria, eu não falava nada, eu

oraria quieto; mas como eles precisam

tanto ouvir, discursar e falar (Marta e a

multidão) eu falei. Se fôssemos eu e Maria

aqui, não tinha conversa, mas assim falei

para que creiam que tu me enviaste. E

tendo dito isto, clamou em alta voz: Lázaro,

vem para fora! E saiu aquele que estivera

morto, tendo os pés e as mãos ligados com

ataduras e o rosto envolto num lenço.

Então, lhes ordenou Jesus: Desatai-o e

deixai-o ir. E muitos, pois, dentre os judeus

que tinham vindo visitar Maria, vendo o

que fizera Jesus, creram nele (vejam como

Maria ganha uma preeminência; no início

era tudo Marta; Maria era a irmã dela: “tinha

uma irmã chamada Maria”. Mas no fim

dessa história, os judeus tinham vindo

visitar a Maria). E saíram crendo nele.

Outros, porém, foram ter com os fariseus e

lhes contaram dos feitos que Jesus

realizara.

O que eu estou querendo dizer,

concluindo? Há uma coisa apenas, que eu

quero dizer a vocês: a gente fala demais, a

gente argumenta demais, a gente se

debate demais; a gente desenvolve mil

processos mentais, a gente quer entender

Deus, a gente quer pensar Deus, a gente

quer discutir Deus, a gente quer

compreender os caminhos de Deus; a

gente quer servir a Deus, a gente se agita

em nome de Deus, a gente se incomoda

pela causa de Deus; a gente quer expressar

a Deus, na forma de movimentos,

inquietações, preocupações, de missões

ansiosas, de realizações múltiplas, coisas

diversas que escolhemos fazer para

explicar para Deus, para provar para Deus,

para ilustrar a Deus, para ser a nossa defesa

pública diante de Deus quanto ao fato de

que Deus é importante para nós, de que

nós somos membros da causa de Jesus, de

que a gente tem alegria em hospedá-lo, de

que a gente tem prazer em servi-lo, de que

a gente o confessa, de que a gente diz que

ele é o enviado. Mas, na maioria das vezes,

trata-se de uma espiritualidade toda para o

lado de fora; que se define, também na

maioria das vezes, como inquietação que a

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gente chama de missão; de preocupação

que a gente chama de serviço, de

dedicação, de piedade; de orações a Deus

pedindo a Deus que acorde os outros

irmãos: Senhor, tu não te importas de que

eu te sirva sozinho?! Levanta teu povo,

Senhor! Ó Jesus, sacode Maria! E isso tudo é

construído sobre um arcabouço de tanto

autoengano, são piedades tão camufladas,

são tantas máscaras que escondem a nossa

insegurança, a nossa vontade de aparecer,

a nossa vontade de publicidade, o nosso

desejo de ser enxergado, o nosso desejo de

ser benquisto por Deus, de dar

demonstrações de quem nós somos.

Escondem até as pulsões da nossa

superioridade, e são feitas com motivações

de inquietação, de preocupação com

muitas coisas, enquanto a gente vai

deixando de lado o pouco que é necessário

e deixando de enxergar aquela uma só

coisa que é essencial.

A gente se agita em nome de Deus, de

todos os modos, e não tem nunca, no

coração, o lugar reservado para se quedar

aos pés dele, para ouvir a sua palavra – não

para os outros, mas ouvi-la para nós – e

sorvê-la, bebê-la, aproveitá-la, internalizá-

la, deixarmo-nos pacificar por ela,

crescermos por meio dela, alimentarmo-

nos nela e sermos fomentados para a vida

presente e eterna por essa alegria de

absorvê-la. Enquanto nos inquietamos e

transformamos nossa ansiedade em

devoção, nossa inquietação em fé, nossa

preocupação em missão, que nada mais

são do que coisas que escondem as nossa

inseguranças e também as nossas

compensações. Porque é muito mais fácil

viver as inquietações exteriores em nome

de Deus do que assumir as quietudes

profundas que serenam o mar revolto da

alma, que eliminam das falsas prioridades

do ser um bilhão de desnecessidades, e vão

fazendo, dia a dia, a nossa vida se

simplificar nas escolhas que elegem o que

é absolutamente necessário e, no

necessário, o que é apenas o único

essencial: conhecer e ser conhecido por

Deus, carregar no peito a ressurreição e a

vida.

Além disso, nós tapeamos muito, também,

as nossas amarguras, a nossa ideia de que,

como nós conhecemos Jesus e sabemos

que ele visita a nossa casa, e sabemos que

temos uma relação com ele, tem de haver

tratamento especial para nós. Nós

começamos a ficar arrogantes, sem querer,

e achamos que se mandarmos um recado o

Senhor tem de se manifestar na hora; e que

se houver alguém a respeito de quem a

gente diga “nós o amamos e o Senhor

também, então vem, e faze logo o que tem

que ser feito”, ele tem de levantar tudo e

fazer. E se, porventura, ele se atrasar do

ponto de vista da nossa cronologia, nós

vamos fazer discursos de piedade pública

diante dele, vamos mostrar a nossa

intimidade com ele ofendendo-o com toda

a polidez: ah, se tu tivesses chegado na

hora isso não teria acontecido; e vamos nos

defender da nossa ofensa com uma boa

teologia, com um salmo da hora ou um

salmo do dia, que é apenas uma poesia que

não se faz construir como declaração

sincera relacionada a cada palavra que se

diga. Porque o que se diz é de uma ousadia

enorme, e por tal ousadia se poderia crer

em qualquer coisa, em qualquer hora, em

qualquer dia; no entanto, uma vez tendo

dito “mas eu sei que, mesmo agora, tudo

quanto pedires a Deus, Deus to concederá”,

se Deus assim o considerar em Cristo e

Cristo Jesus disser: “o teu irmão há de

ressurgir”, nós vamos teologizar a respeito

e escatologizar a conversa, mas não vamos

assumir as implicações de nada agora, por

uma única razão: nós cremos na teologia

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da ressurreição, nós só não vivemos a

existencialidade da ressurreição.

Ressurreição é um evento histórico, ainda

não é um fator existencial, em nós. E é isso

que Jesus pergunta a Marta: Tu crês nisto:

que a ressurreição não é apenas um fato

histórico? Que a ressurreição pode se

historificar agora e se historificará para

todos, um dia, mas tu crês que, antes de ser

isso, a ressurreição é um fator existencial?

Que eu sou a ressurreição e a vida e que

aquele que crê em mim, ainda que morra

no físico, viverá? E que todo aquele que

vive e crê em mim, vive crendo em mim,

não morre nunca, está cheio de vida

eterna? Que a morte morreu para ele? Tu

consegues entender que esta é a boa parte

que não pode ser tirada, que este é o

galardão, que este é o tesouro dos

tesouros? Crês isto?

Então, gente, a maioria de nós tem de ser

honesto e ver que o nosso caminho

espiritual é o da nossa amiga Marta. É

muita falação, é muita conversa, é muito

argumento, é muita necessidade de

afirmação. E o chamado de Jesus é para

uma só coisa, para muito poucas. E ele não

está querendo saber dos nossos

argumentos exteriores, ele quer conhecer

as nossas atitudes. Há horas em que a

gente se levanta e ajuda a lavar a casa, a

fazer faxina, a fazer tudo. Mas existem

aqueles momentos quando a realidade da

santidade de Deus se adensa tanto, que

qualquer outra coisa vira blasfêmia quando

aquilo está presente. E o nosso espírito tem

que discernir, todo dia, esses momentos,

essas horas eternas, esses instantes

eternos, de Deus com a gente. Quem não

tem isso não tem nada. Quem tem isso tem

tudo; pode chegar e falar a mesma coisa

que o outro falou, mas a atitude dele

arromba os céus, faz Deus chorar, comove

anjos, tira pedras das tumbas; não tem

argumentos a dar, não tem temperaturas a

medir, não tem cheiros a verificar, não tem

nada a dizer, o Senhor está aqui, e eu estou

diante dele, ele é meu, eu sou dele. Essa é

que é a parte, é o encontro, é a

inseparabilidade, é o casamento, é a

conjugalidade com ele, é o mergulho nele,

é o mergulho dele em mim. É essa

intimidade por onde nós enxergamos o

melhor ângulo de Deus, olhando desde os

pés dele, para ele.

Eu não quero olhar nos olhos de Deus; se

eu olhar nos pés dele, eu estou

enxergando. O coração de Deus nós

enxergamos quebrantando-nos aos pés

dele. E, aí, céus e terra se transtornam,

Jesus chora, anjos se comovem, o inferno

se abre. Essa é a boa parte, esse é o tesouro,

essa é a amizade de Deus com os homens,

esse é o caminho para o qual eu e você

somos convidados. Esse é o escaninho, esse

é o divã, esse é o namoro com a eternidade.

Esta é a boa parte que de nós jamais será

tirada:

Mensagem ministrada em 15/01/2012

Estação do Caminho - DF